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H I S T Ó R I A S P E L O A V E S S O L I A N E I V A HISTÓRIAS PELO AVESSO i l u s t r a ç õ e s d e E l i s a b e t h T e i x e i r a e

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HIS

TÓRIA

S PELO AVESSO

L I A N E I V A

HISTÓRIASPELO AVESSO

i l u s t r a ç õ e s d eE l i s a b e t h T e i x e i r a

Em Histórias pelo avesso, a já consagrada

Lia Neiva nos apresenta, com muito bom

humor, uma nova visão dos tradicionais

contos de fadas. Aqui, como o próprio título

sugere, tudo é meio fora do comum: nada

garante que a princesa vá quebrar o encanto

do sapo; que o príncipe se casará com a

mais bela princesa; ou até mesmo que as

histórias terão um fim — feliz ou não.

O livro conta com as belíssimas ilustrações

de Elisabeth Teixeira.

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ISBN: 9788500032110

Historias pelo avesso CAPA PNLD 2018.indd 1 08/05/18 15:28

HIS

TÓRIA

S PELO AVESSO

2

L I A N E I V A

HISTÓRIASPELO AVESSO

4a edição

i l u s t r a ç õ e s d eE l i s a b e t h T e i x e i r a

e

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Copyright © 2014 by Lia NeivaCopyright © das ilustrações 2014 by Elisabeth Teixeira

Direitos de edição da obra em língua portuguesa adquiridos pela Ediouro Gráfica E Editora ParticiPaçõEs s.a. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser apropriada e estocada em sistema de banco de dados ou processo similar, em qualquer forma ou meio, seja eletrônico, de fotocópia, gravação etc., sem a permissão do detentor do copirraite.

Ediouro Gráfica E Editora ParticiPaçõEs s.a.Rua Nova Jerusalém, 345 – Bonsucesso – 21042-235Rio de Janeiro – RJ – Brasil

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

Neiva, Lia Histórias pelo avesso / Lia Neiva ; ilustração Elisabeth Teixeira. - 4. ed. - Rio de Janeiro : Edipar, 2018. il.                 ISBN 9788500032110 1. Ficção infantojuvenil brasileira. I. Teixeira, Elisabeth. II. Título.

CDD: 028.5CDU: 087.5

N338h4. ed.

Querido aluno, querida aluna, Histórias pelo avesso foi escrito por Lia Neiva, que já teve livros premiados pela Fun-

dação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), tendo recebido em 1994 também o prêmio de Melhor Livro Infantil da Associação Paulista de Críticos de Arte. A obra é ilus-trada por Elisabeth Teixeira, que já recebeu o prêmio Jabuti na categoria Ilustração, além do prêmio O Melhor para a Criança e o selo Altamente Recomendável da FNLIJ.

Histórias pelo avesso é composto de quatro contos, os quais apresentam uma visão bem-humorada dos tradicionais contos de fada. Você, ao longo das histórias curtas e mui-to ilustradas, vai conhecer situações imprevisíveis e “pelo avesso”, como anuncia o título. Mas, se avesso é do lado contrário, por que histórias pelo avesso?

À medida que os personagens vão aparecendo, você será convidado a preencher os sentidos do texto, lembrando-se das histórias de contos de fada, as quais aparecerão de forma irônica, irreverente e inusitada. A diversão está garantida!

Lendo sozinho ou em turma, você vai reconhecer características dos contos de fa-das, que são histórias que você já leu ou ouviu algumas vezes, como Cinderela ou Branca de Neve e os sete anões. E vai ver como é divertido contar uma história, como faz a escritora Lia Neiva. E quem sabe você não vai tentar o mesmo que a autora e escrever histórias co-nhecidas, só que de um outro jeito?!

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Romualdo, o Solitário, príncipe do reino das Três Montanhas, estava de

casamento marcado com Docemel, uma donzela de terras distantes.

Naqueles tempos, os noivos se viam pela primeira vez na hora da cerimônia. Antes

desse dia, eram os ministros casamenteiros quem se encarregavam de procurar noivas

para os seus príncipes, noivas que levassem na bagagem um rico tesouro para aumentar

as riquezas dos reinos. Em Três Montanhas, procurar uma donzela para o herdeiro era

uma tarefa difícil: Romualdo já recusara três candidatas.

O

CASAMENTO

DE

ROMUALDO

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— Esta é branca demais! Não quero!

— Esta me parece muito distraída e

é bem capaz, até, de perder os sapatos! Não serve!

— Esta tem tranças mais compridas do que as torres deste castelo. Não me agrada!

O ministro casamenteiro de Três Montanhas já visitara todos os reinos da vizinhança

levando presentes, cartas e retratos do príncipe e voltava com presentes, cartas e retratos

das princesas casadouras.

O rei Dadivoso I, pai de Romualdo, não entendia a razão de tanto não serve, não

quero, não me agrada e perguntava desanimado:

— Como pode o meu filho recusar princesas tão lindas?

A resposta do ministro era sempre a mesma:

— São os olhos dele, majestade! Romualdo enxerga muito mal!

Mas um dia, o ministro visitou um reino afastado, que ficava depois das terras

vizinhas, e retornou com uma pintura, em tamanho natural, de uma princesa chamada

Docemel. A donzela estava longe de ser uma beleza, e era conhecida em seu reino como

Docemel, a Feia; o ministro achou-a feiíssima, porém, como Dadivoso I ordenara-lhe que

só retornasse depois de encontrar uma nova candidata, ele se fez de cego e pediu a mão da

moça para Romualdo. O pai da princesa consentiu imediatamente, pois Docemel já havia

sido recusada por vários cavaleiros.

Dadivoso I aguardou a chegada do ministro com muita ansiedade e preocupação.

Um filho de Romualdo era tudo o que ele queria, pois o reino era rico, e o príncipe,

enxergando cada vez menos, arriscava-se a todo tipo de acidentes. Podia cair do cavalo,

de escadas, de muros, de precipícios e, até, de uma das Três Montanhas.

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1110

O ministro chegou e foi procurar o rei, levando a tal pintura em tamanho natural.

— Majestade — ele disse ressabiado antes de desembrulhar o retrato —,

essa é Docemel, a nossa última esperança. Ela é a única princesa a procurar

marido em toda esta parte do mundo. — E muito desconsolado, ele descobriu

a pintura.

— Como ela é feia, ministro!

— Mas, como já disse, ela é a nossa última esperança, majestade.

— Tem razão! — Dadivoso falou resignado. — Tomara que dê certo. Tomara!

E lá se foram os dois levar o retrato para Romualdo. Foram com os dedos cruzados

para dar sorte. Acharam o príncipe pensando na vida.

— Meu filho, contemple esta imagem! É de uma princesa ansiosa para se casar com

você.

Romualdo olhou para Docemel. Primeiro de longe; depois de perto para ver melhor;

depois de longe para conferir e disse com voz trêmula:

— Que olhos! Que mãos! Que rosto! Agora sim, meu pai! Agora, o nosso ministro

acertou. Ela é uma bela mulher.

O rei e o casamenteiro pularam de alegria, e Dadivoso murmurou:

— Que bom que Romualdo está enxergando pior.

— Sem dúvida, majestade! Sem dúvida! Mas isso é a salvação do reino.

A corte de Dadivoso era muito festeira e ficou radiante com a ideia de um casamento

esplendoroso. E Romualdo, contagiado pela alegria de todos, passou a cantar melados

versos de amor louvando a noiva.

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1312

Ordenou-se para as bodas uma festa sem igual; uma festa para ofuscar os suntuosos

casamentos de Branca e de Rapunzel. Preparou-se um banquete com lebres e faisões,

vinhos e refrescos espumantes, bolos e tortas de todas as frutas que existem. Contrataram-

se palhaços e malabaristas, e engolidores de espadas, e ursos dançarinos, e atores, cantores

e lutadores. Convidou-se a melhor nobreza de perto e de longe.

Dadivoso I, com a sua habitual bondade, mandou sortear, entre o povo,

quatro súditos para assistirem à festança, encarapitados no muro que cercava

o castelo.

— Esses privilegiados poderão se regalar com os aromas das comilanças e se alegrar

com a alegria dos convidados. Não é justo privá-los de tanto prazer — disse satisfeito.

Só de um detalhe esqueceu-se o rei: de convidar Perversa, a bruxa do reino. A

feiticeira, muito irritada com tamanha ofensa, jurou vingança e preparou uma desforra

para desgraçar Três Montanhas. Assim, no primeiro minuto do grande dia, o feliz

noivo foi atacado por algo que ele nem via nem sabia o que era. Um inimigo invisível

que o mordia, o espetava, o azucrinava causando-lhe um sofrimento terrível. Era algo

monstruoso que gelava e escaldava, subia e descia, apertava e cutucava. E cada mordida,

cada espetadela, cada subida, cada descida, cada apertão e cada pontada provocava

uma reação esquisita que o fazia gemer: “Caso ou não caso? Caso ou não caso? Caso ou

não caso?”

Foi um desespero, um verdadeiro tormento. E, de repente, Romualdo ouviu a voz

tenebrosa de Perversa ecoando na escuridão do quarto.

— Você, meu príncipe, foi apanhado pelo terrível dragão da dúvida, o monstro

que rouba a vontade das pessoas. Quem é atacado por ele não sabe mais o que fazer. De

agora em diante, você viverá no poço sem fundo da indecisão, e seu pai lamentará ter se

esquecido de me convidar. Ninguém pode desprezar Perversa! — E gargalhou triunfante.

E, assim, como tinha surgido, a voz de Perversa se foi.

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Morto de medo, Romualdo gritou e seu grito voou acordando quem dormia. No

castelo, alastrou-se uma grande confusão; a corte correu para o quarto do príncipe, e de

todas as bocas ouviu-se:

— O que houve? O que foi?

Romualdo respondeu aflito:

— Aconteceu uma tragédia, um desastre! Não sei mais se caso ou

não caso!

Horror, espanto, lágrimas e gritos. A caravana trazendo Docemel estava às portas

da cidade; os convidados chegando e Romualdo mergulhado na incerteza. Como livrá-

-lo da dúvida horrível? O rei e a rainha, os condes e os barões, os criados e as criadas não

tinham a menor ideia e palpitaram, discutiram, segredaram e ameaçaram. No meio do

tumulto, Romualdo murmurou:

— Vou ali e volto já!

Nunca mais apareceu; Docemel enrugou de esperar; o reino, sem herdeiro,

entristeceu.

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1716

O tempo se espichou e espichou até que, um belo dia, um jovem pobre e formoso

chamado Felizardo se perdeu nas montanhas e apareceu no castelo pedindo ajuda.

Conversa vai, conversa vem, Dadivoso soube que o moço era órfão, sem casa e sem

família. Foi o que bastou para que ele o adotasse na hora. Para apresentá-lo ao reino, o

rei imediatamente preparou uma festa sem igual, com lebres e faisões assados, vinhos

e refrescos espumantes, bolos e tortas de todas as frutas que existem. Contrataram-se

palhaços e malabaristas, e engolidores de espadas, e ursos dançarinos, e atores, cantores

e lutadores. Para garantir que Perversa não atrapalhasse a vida de Felizardo, o Sortudo,

Dadivoso enviou-lhe um convite especial e ordenou aos súditos que a tratassem muito

bem, para felicidade do reino. Todos o obedeceram e, durante a festa, foi um não acabar

mais de paparicos:

— Magnifica bruxa, como está a sua saúde?

— Sente-se ao meu lado, senhora Perversa!

— Como vão passando os seus ratos e os seus morcegos?

E foram tantos os agrados e salamaleques, tantos “apareça lá em casa”, “prazer em

vê-la”, “mas que linda vassoura” que Perversa murmurou para a grama do jardim:

— Que chatice! Bruxas não devem ser queridas; bruxas devem ser temidas!

E vendo que o seu futuro no reino de Dadivoso seria cheio de gentilezas, Perversa

tomou uma decisão:

— Magnifico rei, os meus livros mágicos me aconselharam uma mudança de clima:

abandonar as montanhas e viver nas planícies. Por isso, estou me despedindo deste lindo

reino. Adeusinho e passar bem!

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1918

E montada em sua vassoura, ela desapareceu entre as nuvens.

Para comemorar o sumiço da bruxa, Dadivoso e Felizardo prepararam outra festa

de arromba com tudo o que vocês já sabem e mais alguma coisa.

Infelizmente, eu não fui convidada, mas a vida é assim mesmo: num dia, se ganha;

no outro, se perde. O jeito é saber esperar.