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Ia 234 Vinhos

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2006

ISSN 0100-3364

Informe Agropecuário

Uma publicação da EPAMIG

v.27 n.234 set./out. 2006

Belo Horizonte-MG

Informe Agropecuário Belo Horizonte v. 27 n. 234 p. 1-132 set./out.

Editorial ........................................................................................................................... 3

Entrevista ......................................................................................................................... 4

Vitivinicultura brasileira: regiões tradicionais e pólos emergentes

José Fernando da Silva Protas, Umberto Almeida Camargo e Loiva Maria Ribeiro deMello ............................................................................................................................. 7

Implantação e manejo do vinhedo para produção de vinhos de qualidade

Murillo de Albuquerque Regina, José Carlos Fráguas, Ângelo Albérico Alvarenga,Claudia Rita de Souza, Daniel Angelucci de Amorim, Renata Vieira da Mota e AnaCarolina Fávero ............................................................................................................. 16

Caracterização macroclimática e potencial enológico de diferentes regiões com

vocação vitícola em Minas Gerais

Jorge Tonietto, Rubens Leite Vianello e Murillo de Albuquerque Regina ........................... 32

Fatores que afetam a maturação e a qualidade da uva para vinificação

Renata Vieira da Mota, Murillo de Albuquerque Regina, Daniel Angelucci de Amorim eAna Carolina Fávero ......................................................................................................... 56

Elaboração de vinho tinto fino

Daniel Angelucci de Amorim, Murillo de Albuquerque Regina, Ana Carolina Fávero,Renata Vieira da Mota e Giuliano Elias Pereira ................................................................ 65

Elaboração de vinho branco fino

Luiz Antenor Rizzon e Júlio Meneguzzo .......................................................................... 77

Elaboração de vinho espumante

Ana Carolina Fávero, Daniel Angelucci de Amorim, Renata Vieira da Mota e Murillo deAlbuquerque Regina ......................................................................................................... 94

Vinhos tropicais: novo paradigma enológico e mercadológico

Celito Crivellaro Guerra, Giuliano Elias Pereira, Márcia Valéria Lima e Márcia MariaPereira Lira ..................................................................................................................... 100

Vinhos de altitude: característica e potencial na produção de vinhos finos

brasileiros

Jean Pierre Rosier ............................................................................................................. 105

Novos pólos vitícolas para produção de vinhos finos em Minas Gerais

Murillo de Albuquerque Regina, Daniel Angelucci de Amorim, Ana Carolina Fávero,Renata Vieira da Mota e Daniel José Rodrigues ............................................................... 111

Vinho e saúde: o estado da arte

Jairo Monson de Souza Filho ............................................................................................ 119

Degustação de vinhos e espumantes

Mauro Celso Zanus e Giuliano Elias Pereira ................................................................... 126

Sumário

O aumento do consumo de vinhos finos, por

parte da população brasileira, tem levado a um

crescimento das áreas de cultivo com videiras da

espécie Vitis vinifera e ao investimento em tecnolo-

gias vitícolas e enológicas, que permitam a melhoria

da qualidade do vinho nacional. No campo, o prin-

cipal desafio enfrentado pela maioria das regiões

produtoras é o de encontrar melhores condições

para o bom amadurecimento das uvas, fator indis-

pensável na obtenção de vinhos finos.

O Sudeste brasileiro, notadamente o estado de

Minas Gerais, possui características particulares que

podem permitir, por meio de técnicas de manejo

apropriadas, a colheita de uvas em épocas dife-

renciadas e sob condições climatológicas bastante

favoráveis à sua qualidade. Vários projetos vitícolas

foram instalados recentemente em diferentes ma-

crorregiões geográficas mineiras, e é de se esperar

que, em breve, o Estado se insira no cenário nacional

da produção de vinhos finos. Para tanto, tecnologias

que visem otimizar essa atividade, reduzindo os

riscos dos investimentos, devem estar à disposição

dos agricultores.

O Informe Agropecuário reúne, nesta edição,

importantes elementos para tomada de decisão, tan-

to no campo quanto na vinícola, a partir de tecno-

logias geradas dentro do Estado, pela EPAMIG em

parceria com a iniciativa privada, e também pe-

la experiência vinda de outras regiões brasileiras.

Espera-se, com esta edição, uma efetiva colaboração

científica e tecnológica para a exploração do po-

tencial mineiro na produção de vinhos finos.

Daniel Angelucci de Amorim

Murillo de Albuquerque Regina

Renata Vieira da Mota

Apresentação

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Governo do Estado de Minas Gerais

Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento

Sistema Estadual de Pesquisa Agropecuária - EPAMIG, UFLA, UFMG, UFV

Assinatura anual: 6 exemplares

Aquisição de exemplares

Setor Comercial de Publicação

Av. José Cândido da Silveira, 1.647 - Cidade Nova

Caixa Postal, 515 - CEP 31170-000 Belo Horizonte - MG

Telefax: (31) 3488-6688

E-mail: [email protected] - Site: www.epamig.br

CNPJ (MF) 17.138.140/0001-23 - Insc. Est.: 062.150146.0047

© 1977 EPAMIG

ISSN 0100-3364

INPI: 006505007

CONSELHO DEDIFUSÃO DE TECNOLOGIA E PUBLICAÇÕESBaldonedo Arthur NapoleãoLuiz Carlos Gomes GuerraManoel Duarte XavierÁlvaro Sevarolli CaputeMaria Lélia Rodriguez SimãoArtur Fernandes Gonçalves FilhoJúlia Salles Tavares MendesCristina Barbosa AssisVânia Lacerda

DEPARTAMENTO DE TRANSFERÊNCIA

E DIFUSÃO DE TECNOLOGIA

Cristina Barbosa Assis

DIVISÃO DE PUBLICAÇÕESEDITOR

Vânia Lacerda

COORDENAÇÃO TÉCNICADaniel Angelucci de Amorim, Murillo de Albuquerque Regina e

Renata Vieira da Mota

REVISÃO LINGÜÍSTICA E GRÁFICA

Marlene A. Ribeiro Gomide e Rosely A. R. Battista Pereira

NORMALIZAÇÃO

Fátima Rocha Gomes e Maria Lúcia de Melo Silveira

PRODUÇÃO E ARTE

Diagramação/formatação: Rosangela Maria Mota Ennes,Maria Alice Vieira, Fabriciano Chaves Amaral, Letícia Martinez eLetícia Gomes (Estagiária)

Capa: Letícia Martinez e Fabriciano Chaves AmaralFotos da capa: Laenio Graciano Prado

PUBLICIDADEDécio CorrêaAv. José Cândido da Silveira, 1.647 - Cidade NovaCaixa Postal, 515 - CEP 31170-000 Belo Horizonte-MGTelefone: (31) [email protected]

Informe Agropecuário é uma publicação da

Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais

EPAMIG

É proibida a reprodução total ou parcial, por quaisquer meios, sem

autorização escrita do editor. Todos os direitos são reservados à

EPAMIG.

Os artigos assinados por pesquisadores não pertencentes ao quadro

da EPAMIG são de inteira responsabilidade de seus autores.

Os nomes comerciais apresentados nesta revista são citados apenas

para conveniência do leitor, não havendo preferências, por parte da

EPAMIG, por este ou aquele produto comercial. A citação de termos

técnicos seguiu a nomenclatura proposta pelos autores de cada artigo.

O prazo para divulgação de errata expira seis meses após a data de

publicação da edição.

A EPAMIG integra o Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária, coordenado pela EMBRAPA

O Informe Agropecuário é indexado naAGROBASE, CAB INTERNATIONAL e AGRIS

Informe Agropecuário. - v.3, n.25 - (jan. 1977) - . - BeloHorizonte: EPAMIG, 1977 - .

v.: il.

Cont. de Informe Agropecuário: conjuntura e estatísti-ca. - v.1, n.1 - (abr.1975).

ISSN 0100-3364

1. Agropecuária - Periódico. 2. Agropecuária - AspectoEconômico. I. EPAMIG.

CDD 630.5

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Governo do Estado de Minas GeraisAécio NevesGovernador

Secretaria de Estado da Agricultura, Pecuária e AbastecimentoMarco Antonio Rodrigues da Cunha

Secretário

Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas GeraisConselho de Administração

Marco Antonio Rodrigues da CunhaBaldonedo Arthur Napoleão

Silvio CrestanaMaria Lélia Rodriguez SimãoOsmar Aleixo Rodrigues Filho

Décio BruxelSandra Gesteira Coelho

Adauto Ferreira BarcelosWillian Brandt

Joanito Campos JúniorHelton Mattana Saturnino

Conselho FiscalCarmo Robilota ZeituneHeli de Oliveira Penido

José Clementino dos SantosEvandro de Oliveira Neiva

Márcia Dias da CruzCelso Costa Moreira

PresidênciaBaldonedo Arthur Napoleão

Diretoria de Operações TécnicasManoel Duarte Xavier

Diretoria de Administração e FinançasLuiz Carlos Gomes GuerraGabinete da PresidênciaÁlvaro Sevarolli Capute

Assessoria de ComunicaçãoRoseney Maria de Oliveira

Assessoria de Desenvolvimento OrganizacionalRonara Dias Adorno

Assessoria de InformáticaRenato Damasceno Netto

Assessoria JurídicaPaulo Otaviano Bernis

Assessoria de Planejamento e CoordenaçãoJosé Roberto Enoque

Assessoria de Relações InstitucionaisArtur Fernandes Gonçalves Filho

Auditoria InternaCarlos Roberto Ditadi

Departamento de Transferência e Difusão de TecnologiaCristina Barbosa Assis

Departamento de PesquisaMaria Lélia Rodriguez Simão

Departamento de Negócios TecnológicosArtur Fernandes Gonçalves Filho

Departamento de Prospecção de DemandasJúlia Salles Tavares Mendes

Departamento de Recursos HumanosFlávio Luiz Magela Peixoto

Departamento de Patrimônio e Administração GeralMarlene do Couto Souza

Departamento de Obras e TransportesLuiz Fernando Drummond Alves

Departamento de Contabilidade e FinançasCelina Maria dos Santos

Instituto de Laticínios Cândido TostesGérson Occhi

Instituto Técnico de Agropecuária e CooperativismoMarcello Garcia Campos

Centro Tecnológico do Sul de MinasEdson Marques da Silva

Centro Tecnológico do Norte de MinasMarco Antonio Viana Leite

Centro Tecnológico da Zona da MataJuliana Cristina Vieccelli de CarvalhoCentro Tecnológico do Centro-Oeste

Cláudio Egon FacionCentro Tecnológico do Triângulo e Alto Paranaíba

Roberto Kazuhiko Zito

Tecnologia é a chave paraprodução de vinho de qualidade

O Brasil produz 1,2 milhão de toneladas anuais de uvas,

das quais 45% são destinadas ao processamento, e importa mais

de 40 milhões de litros de vinhos. A produção de vinhos nacionais

concentra-se, principalmente, nos estados do Rio Grande do Sul e

Santa Catarina, sendo que, ainda hoje, 81% dos produtos pro-

cessados são de vinhos de consumo corrente e sucos de uva,

elaborados a partir de uvas da espécie Vitis labrusca. Apenas 10%

são vinhos finos, elaborados com castas de Vitis vinifera.

Em Minas Gerais, esta produção é uma atividade agríco-

la bastante tradicional e está concentrada na região Sul, mais

especificamente no município de Andradas. Entretanto, devido a

uma tendência mundial e nacional para a diversificação de re-

giões produtoras, este cenário vem-se modificando também no

Estado, que busca a produção de vinhos finos. Destacam-se como

novos pólos vitícolas em Minas Gerais a região Norte e o Vale do

Submédio São Francisco, caracterizados pelo clima tropical. Essa

alteração no mapa da viticultura mineira e brasileira, antes

centralizada em áreas de clima mais ameno, é resultado da grande

evolução tecnológica dessa cultura, principalmente no que diz

respeito à adaptação e definição de sistema de produção para

variedades européias, viabilizando técnica e economicamente esta

atividade.

Com o objetivo de contribuir para a diversificação de pólos

vitícolas no Estado e apoiar o produtor mineiro, o Núcleo Tecnológico

EPAMIG Uva e Vinho, em Caldas, MG, desenvolve projetos para a

produção de mudas de qualidade, através da técnica de enxertia

de mesa, tecnologia para produção de vinhos finos e adaptação

de técnicas de cultivo para atender regiões de climas mais secos e

com maior luminosidade.

Esta edição do Informe Agropecuário vem complementar

esse trabalho, levando aos produtores resultados e alternativas

capazes de promover o desenvolvimento da vitivinicultura brasilei-

ra pela qualidade e diversidade de seus produtos.

Baldonedo Arthur Napoleão

Presidente da EPAMIG

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I n f o r m e A g r o p e c u á r i o , B e l o H o r i z o n t e , v . 2 7 , n . 2 3 3 , j u l . / a g o . 2 0 0 6

Diversidade de regiões produtoras édiferencial para vinho brasileiro

O enófilo Júlio Anselmo de Sousa Neto é

médico e professor de Neuroanatomia da Uni-

versidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Filiado

a sociedades e confrarias enológicas, coordena e

profere cursos e palestras e promove degustações

em eventos sobre vinhos. É um dos criadores do site

Guia do Vinho, hoje denominado Academia do

Vinho, o primeiro site brasileiro de informação sobre

essa bebida. É autor de diversos artigos sobre vinho

em publicações especializadas, em revistas médicas

e na imprensa em geral, onde manteve colunas

específicas sobre o assunto. Em 2004, publicou o

livro O Vinho no Gerúndio, que aborda, de forma

descontraída e didática, os diversos aspectos do

vinho. Atualmente, ocupa o cargo de Presidente da

Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho - Regional

Belo Horizonte (SBAV-MG).

IA - O que inibe o consumo de vinhos

finos no Brasil?

Júlio Anselmo - Em primeiro lugar,

o preço. Somos um país de baixíssi-

ma renda per capita e os altos impostos

que incidem sobre o vinho, aliados à

ganância de muitos produtores e co-

merciantes, tornam-no inacessível à

maioria da população, resultando no

pífio consumo anual de vinhos no

Brasil: 2 litros per capita. Em segundo

lugar, a falta da cultura enológica e sua

tradição no País. Isso privou os bra-

sileiros do conhecimento sobre o vinho

e do hábito de consumi-lo regular-

mente. A única exceção é o Rio Grande

do Sul, onde os imigrantes italianos

trouxeram e mantiveram a cultura e

a tradição do vinho, transformando

aquele Estado na maior região vinícola

do País, responsável por cerca de 90%

da produção de nossos vinhos. É tam-

bém importante lembrar que recen-

temente a Assembléia Legislativa gaú-

cha aprovou uma lei que, a exemplo da

existente na Espanha, classifica o vinho

como alimento funcional, que contém

substâncias ou nutrientes benéficos à

saúde e diminui o risco de algumas

doenças. Assim, o vinho deixará de ser

I n f o r m e A g r o p e c u á r i o , B e l o H o r i z o n t e , v . 2 7 , n . 2 3 3 , j u l . / a g o . 2 0 0 6

qualificado como bebida alcoólica e

ingressará no grupo da cesta alimentar

e, como tal, poderá vir a sofrer redução

na alíquota do ICMS, de 12% para cerca

de 7%. Mesmo assim, os gaúchos, tal

como os demais brasileiros, consomem

mais vinho de mesa, feito de uvas ame-

ricanas, mais barato, como os vinhos

de garrafão, do que vinho fino, mais

caro, feito de uvas européias da espécie

Vitis vinifera.

Na última década, explodiu o in-

teresse pelo vinho fino no País, mas,

infelizmente, apenas entre as classes

alta e média, permanecendo a eterna

distância entre o vinho e a maioria da

população brasileira.

IA - De modo geral os restaurantes são

aliados ou inimigos do consumo de

vinhos?

Júlio Anselmo - Raros são os res-

taurantes que estimulam o consumo de

vinhos. A maioria cobra pelos vinhos

preços exagerados, quando não exor-

bitantes. Na maioria dos restaurantes,

os vinhos custam entre duas e cinco

vezes o preço de varejo, isto é, de lojas

e supermercados! Ora, no preço de

varejo já estão computados os lucros

de todos os componentes da cadeia

comercial do vinho (produtor, im-

portador, distribuidor e/ou represen-

tante comercial) e os restaurantes

compram os vinhos a preços inferiores

aos de varejo. Ou seja, o lucro do res-

taurante pode chegar a dez vezes o

preço de custo do vinho.

É compreensível que um restauran-

te que oferece itens diferenciados (adega

climatizada, atendimento por pessoal

qualificado, taças de cristal, etc.) agre-

gue custos desses itens ao preço do

vinho, mas não é preciso exagerar. A

razão de ser de um restaurante é a co-

mida que, se excelente, pode ser cara.

Ela é a “estrela” da casa e não o vinho.

Ele é apenas o “ator coadjuvante”.

O preço exorbitante do vinho nos

restaurantes, além de reforçar o falso

mito de ser bebida de gente rica e es-

nobe, afugenta os amantes do vinho,

para os quais é impensável o acom-

panhamento de um bom vinho para

uma boa comida!

IA - Qual o conceito do consumidor

brasileiro sobre os vinhos na-

cionais?

Júlio Anselmo - O consumidor bra-

sileiro de vinho fino, leia-se: as classes

alta e média, ainda tem muito pre-

conceito contra o vinho nacional, mas

os conhecedores sabem que a qua-

lidade desses vinhos melhorou tre-

mendamente e os consomem. O Brasil

possui bons tintos e os melhores es-

pumantes do Novo Mundo (África do

Sul, Argentina, Austrália, Brasil, Chile,

EUA, Nova Zelândia e Uruguai) e só

ficam atrás dos melhores espuman-

tes do mundo: o Champanhe francês e

o Franciacorta italiano. No entanto,

mesmo nas classes economicamente

favorecidas, o fator limitante do vinho

brasileiro também é o preço, pois ele

perde na relação preço-qualidade em

comparação ao vinho fino importado,

sobretudo os argentinos e os chilenos.

Na mesma faixa de preço dos melhores

vinhos brasileiros, encontram-se os

importados de melhor nível. Pagando-

se alguns reais a mais é possível dar

um salto enorme e comprar vinhos

importados de qualidade superior à dos

nacionais.

IA - Diante desse avanço, a opinião do

consumidor tem evoluído?

Júlio Anselmo - Não, porque os im-

postos sobre os vinhos nacionais con-

tinuam altíssimos, mais de 40%, e a

cada dia aumenta mais o volume de

vinhos importados de países como

Argentina, Chile e Uruguai, graças às

facilidades do Mercosul. O caminho é

diminuir os impostos dos vinhos na-

cionais, tornando-os mais baratos e ca-

pazes de competir com os importa-

dos.

IA - Quais tipos de vinhos nacionais

têm mais chances de sucesso no

mercado interno?

Júlio Anselmo - Certamente, são os

espumantes, mas a chance dos tintos

pode crescer, caso os preços diminuam

e a qualidade melhore. Cabe ressaltar

um ponto muito importante: a negli-

gência dos produtores brasileiros com

os vinhos brancos e rosés. Esses vi-

nhos, como os espumantes, são os mais

adequados ao nosso país, que tem clima

tropical e verões escaldantes.

I n f o r m e A g r o p e c u á r i o , B e l o H o r i z o n t e , v . 2 7 , n . 2 3 4 , s e t . / o u t . 2 0 0 6

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Diversidade de regiões produtoras édiferencial para vinho brasileiro

O enófilo Júlio Anselmo de Sousa Neto é

médico e professor de Neuroanatomia da Uni-

versidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Filiado

a sociedades e confrarias enológicas, coordena e

profere cursos e palestras e promove degustações

em eventos sobre vinhos. É um dos criadores do site

Guia do Vinho, hoje denominado Academia do

Vinho, o primeiro site brasileiro de informação sobre

essa bebida. É autor de diversos artigos sobre vinho

em publicações especializadas, em revistas médicas

e na imprensa em geral, onde manteve colunas

específicas sobre o assunto. Em 2004, publicou o

livro O Vinho no Gerúndio, que aborda, de forma

descontraída e didática, os diversos aspectos do

vinho. Atualmente, ocupa o cargo de Presidente da

Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho - Regional

Belo Horizonte (SBAV-MG).

IA - O que inibe o consumo de vinhos

finos no Brasil?

Júlio Anselmo - Em primeiro lugar,

o preço. Somos um país de baixíssi-

ma renda per capita e os altos impostos

que incidem sobre o vinho, aliados à

ganância de muitos produtores e co-

merciantes, tornam-no inacessível à

maioria da população, resultando no

pífio consumo anual de vinhos no

Brasil: 2 litros per capita. Em segundo

lugar, a falta da cultura enológica e sua

tradição no País. Isso privou os bra-

sileiros do conhecimento sobre o vinho

e do hábito de consumi-lo regular-

mente. A única exceção é o Rio Grande

do Sul, onde os imigrantes italianos

trouxeram e mantiveram a cultura e

a tradição do vinho, transformando

aquele Estado na maior região vinícola

do País, responsável por cerca de 90%

da produção de nossos vinhos. É tam-

bém importante lembrar que recen-

temente a Assembléia Legislativa gaú-

cha aprovou uma lei que, a exemplo da

existente na Espanha, classifica o vinho

como alimento funcional, que contém

substâncias ou nutrientes benéficos à

saúde e diminui o risco de algumas

doenças. Assim, o vinho deixará de ser

I n f o r m e A g r o p e c u á r i o , B e l o H o r i z o n t e , v . 2 7 , n . 2 3 3 , j u l . / a g o . 2 0 0 6

qualificado como bebida alcoólica e

ingressará no grupo da cesta alimentar

e, como tal, poderá vir a sofrer redução

na alíquota do ICMS, de 12% para cerca

de 7%. Mesmo assim, os gaúchos, tal

como os demais brasileiros, consomem

mais vinho de mesa, feito de uvas ame-

ricanas, mais barato, como os vinhos

de garrafão, do que vinho fino, mais

caro, feito de uvas européias da espécie

Vitis vinifera.

Na última década, explodiu o in-

teresse pelo vinho fino no País, mas,

infelizmente, apenas entre as classes

alta e média, permanecendo a eterna

distância entre o vinho e a maioria da

população brasileira.

IA - De modo geral os restaurantes são

aliados ou inimigos do consumo de

vinhos?

Júlio Anselmo - Raros são os res-

taurantes que estimulam o consumo de

vinhos. A maioria cobra pelos vinhos

preços exagerados, quando não exor-

bitantes. Na maioria dos restaurantes,

os vinhos custam entre duas e cinco

vezes o preço de varejo, isto é, de lojas

e supermercados! Ora, no preço de

varejo já estão computados os lucros

de todos os componentes da cadeia

comercial do vinho (produtor, im-

portador, distribuidor e/ou represen-

tante comercial) e os restaurantes

compram os vinhos a preços inferiores

aos de varejo. Ou seja, o lucro do res-

taurante pode chegar a dez vezes o

preço de custo do vinho.

É compreensível que um restauran-

te que oferece itens diferenciados (adega

climatizada, atendimento por pessoal

qualificado, taças de cristal, etc.) agre-

gue custos desses itens ao preço do

vinho, mas não é preciso exagerar. A

razão de ser de um restaurante é a co-

mida que, se excelente, pode ser cara.

Ela é a “estrela” da casa e não o vinho.

Ele é apenas o “ator coadjuvante”.

O preço exorbitante do vinho nos

restaurantes, além de reforçar o falso

mito de ser bebida de gente rica e es-

nobe, afugenta os amantes do vinho,

para os quais é impensável o acom-

panhamento de um bom vinho para

uma boa comida!

IA - Qual o conceito do consumidor

brasileiro sobre os vinhos na-

cionais?

Júlio Anselmo - O consumidor bra-

sileiro de vinho fino, leia-se: as classes

alta e média, ainda tem muito pre-

conceito contra o vinho nacional, mas

os conhecedores sabem que a qua-

lidade desses vinhos melhorou tre-

mendamente e os consomem. O Brasil

possui bons tintos e os melhores es-

pumantes do Novo Mundo (África do

Sul, Argentina, Austrália, Brasil, Chile,

EUA, Nova Zelândia e Uruguai) e só

ficam atrás dos melhores espuman-

tes do mundo: o Champanhe francês e

o Franciacorta italiano. No entanto,

mesmo nas classes economicamente

favorecidas, o fator limitante do vinho

brasileiro também é o preço, pois ele

perde na relação preço-qualidade em

comparação ao vinho fino importado,

sobretudo os argentinos e os chilenos.

Na mesma faixa de preço dos melhores

vinhos brasileiros, encontram-se os

importados de melhor nível. Pagando-

se alguns reais a mais é possível dar

um salto enorme e comprar vinhos

importados de qualidade superior à dos

nacionais.

IA - Diante desse avanço, a opinião do

consumidor tem evoluído?

Júlio Anselmo - Não, porque os im-

postos sobre os vinhos nacionais con-

tinuam altíssimos, mais de 40%, e a

cada dia aumenta mais o volume de

vinhos importados de países como

Argentina, Chile e Uruguai, graças às

facilidades do Mercosul. O caminho é

diminuir os impostos dos vinhos na-

cionais, tornando-os mais baratos e ca-

pazes de competir com os importa-

dos.

IA - Quais tipos de vinhos nacionais

têm mais chances de sucesso no

mercado interno?

Júlio Anselmo - Certamente, são os

espumantes, mas a chance dos tintos

pode crescer, caso os preços diminuam

e a qualidade melhore. Cabe ressaltar

um ponto muito importante: a negli-

gência dos produtores brasileiros com

os vinhos brancos e rosés. Esses vi-

nhos, como os espumantes, são os mais

adequados ao nosso país, que tem clima

tropical e verões escaldantes.

I n f o r m e A g r o p e c u á r i o , B e l o H o r i z o n t e , v . 2 7 , n . 2 3 4 , s e t . / o u t . 2 0 0 6

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Os brancos foram os primeiros vi-

nhos finos brasileiros a atingir um bom

nível de qualidade e, pelo agradável

caráter frutado e adequada acidez de

grande frescor, superaram durante al-

gum tempo os brancos de outros países

sul-americanos na preferência do con-

sumidor brasileiro. No entanto, desde

a década de 90 seu volume e qualidade

caíram, porque os produtores passaram

a dedicar mais atenção aos tintos, cuja

demanda cresceu mundialmente. Esse

declínio foi lamentável, pois os vinhos

brancos nacionais, tal como os nossos

espumantes, já haviam percorrido boa

parte do caminho da qualidade e pa-

raram no meio do percurso. O problema

é que os tintos ainda terão que percorrer

um caminho muito mais longo e só ago-

ra começam a atingir o patamar de

qualidade internacional que, infelizmen-

te, é bem mais elevado do que o de vinhos

brancos e, pior, seu mercado é disputado

por um número muito maior de vinhos

de altíssimo nível.

No tocante aos rosés, é bom lembrar

que, ao contrário do que se diz, não

são “vinhos para quem não entende”

e, também não são “necessariamen-

te vinhos ruins”. Há vinhos rosés eu-

ropeus de ótimo nível e lá nos seus

países de origem são muito apreciados

nos meses quentes do verão. No Brasil,

bons rosés poderiam ser consumidos

durante o ano todo. O problema é que

nossos rosés atuais são de baixa qua-

lidade, doces ou suaves, feitos para o

público não conhecedor e só servem

para deseducar o paladar do consumi-

dor. Seria auspicioso investir na pro-

dução de rosés secos, frutados e ele-

gantes, adequados ao clima tropical

brasileiro.

Por Vânia Lacerda

IA - E quanto ao surgimento de novas

regiões vitícolas? Quais as chances

de regiões, em especial mineiras,

se estabelecerem com sucesso den-

tro do panorama atual de produção

de vinhos?

Júlio Anselmo - O melhor caminho

para o vinho brasileiro é a busca por

novos terroirs (termo enológico francês

que designa o conjunto de fatores am-

bientais naturais - solo, topografia e cli-

ma - de uma área vitícola ou vinhedo).

O terroir determina a qualidade do vi-

nho e, na imensidão do Brasil, deve

haver regiões vinícolas melhores do

que a Serra Gaúcha, maior produtora

de vinhos finos. Essa busca começou e

os resultados têm sido promissores nas

novas regiões “descobertas”, entre as

quais estão: Ametista, Campanha Gaú-

cha, Campos de Cima da Serra e Pla-

nalto - RS; São Joaquim - SC; Vale do

Rio São Francisco - MG, BA e PE.

Mais recentemente, iniciou-se um

excelente projeto na região Sul de Mi-

nas, fora do eixo Andradas-Caldas,

principal região vinícola de Minas Ge-

rais, mas que praticamente só produz

vinhos de mesa. O projeto é desenvol-

vido no município de São Bento do

Abade, próximo a Três Corações, sob

a coordenação do Núcleo Tecnológico

EPAMIG Uva e Vinho, localizado em

Caldas, Sul de Minas. O grande di-

ferencial do projeto é o uso de técnicas

de cultivo que ajustam o ciclo de vida

das videiras ao ciclo chuva/seca, per-

mitindo que a maturação e a colhei-

ta das uvas ocorram entre abril e julho,

quando os dias são secos e ensolara-

dos e as noites frescas, propiciando

plena maturação das uvas (no Brasil,

os períodos de maturação e colheita

das videiras ocorrem entre novembro e

março, quando há muita chuva, o que

dificulta a plena maturação e a colhei-

ta das uvas). Já foram colhidas duas

safras da uva ‘Syrah’ e, em ambas, o

vinho obtido em caráter experimen-

tal surpreendeu a todos. Degustei e

achei o vinho da safra 2004 bom e o

vinho da safra 2005 muito bom! A

produção comercial terá início em

2007 e, espero que até lá, o vinho me-

lhore ainda mais! Como já disse uma

vez, essa será a Inconfidência Vinifera

Mineira.

O caminho é diminuir os

impostos dos vinhos

nacionais tornando-os

mais baratos e capazes

de competir

com os importados.

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7Vinhos finos: rumo à qualidade

INTRODUÇÃO

A viticultura brasileira nasceu com achegada dos colonizadores portuguesesno século 16. Permaneceu como cultura do-méstica até o final do século 19, tornando-se uma atividade comercial a partir do iníciodo século 20, por iniciativa dos imigrantesitalianos estabelecidos no Sul do País, apartir de 1875.

As videiras de origem americana, prin-cipalmente cultivares de Vitis labrusca, fo-ram a base para o desenvolvimento da viti-

Vitivinicultura brasileira:regiões tradicionais e pólos emergentes

José Fernando da Silva Protas1

Umberto Almeida Camargo2

Loiva Maria Ribeiro de Mello3

Resumo - A viticultura brasileira ocupa uma área de, aproximadamente, 71 mil hectares,

com vinhedos estabelecidos desde o extremo sul do País até regiões situadas muito

próximas à linha do equador. Em função da diversidade ambiental, existem pólos com

viticultura característica de regiões temperadas, com um período de repouso hibernal;

pólos em áreas subtropicais, onde a videira é cultivada com dois ciclos anuais, definidos

em função de um período de temperaturas mais baixas, no qual há risco de geadas; e,

pólos de viticultura tropical, onde é possível a execução de podas sucessivas, com a

realização de dois e meio a três ciclos vegetativos por ano. Como zonas de viticultura

temperada destacam-se as regiões da Fronteira, Serra do Sudeste e Serra Gaúcha, no

estado do Rio Grande do Sul; a região do Vale do Rio do Peixe, no estado de Santa

Catarina; a região Sudeste do estado de São Paulo e, a região Sul do estado de Minas

Gerais. A região Norte do Paraná é tipicamente subtropical. As regiões Noroeste do

estado de São Paulo, Norte do estado de Minas Gerais e Vale do Submédio São Francisco

caracterizam-se como zonas tropicais. Além desses, novos pólos produtores estão

surgindo em diferentes regiões do País, seja sob condições temperadas (região de São

Joaquim, no estado de Santa Catarina), tropicais (Santa Helena, Goiás e Nova Mutum,

Mato Grosso) ou subtropicais (Rolândia, Norte do Paraná).

Palavras-chave: Vitis vinifera. Uva. Viticultura. Produção. Vinho. Pólo produtor.

1Economista, Ph.D., Pesq. Embrapa Uva e Vinho/IBRAVIN, Caixa Postal 130, CEP 95700-000 Bento Gonçalves-RS. Correio eletrônico:[email protected]

2Engo Agro, M.Sc., Pesq. Embrapa Uva e Vinho, Caixa Postal 130, CEP 95700-000 Bento Gonçalves-RS. Correio eletrônico:[email protected]

3Economista, M.Sc., Pesq. Embrapa Uva e Vinho, Caixa Postal 130, CEP 95700-000 Bento Gonçalves-RS.Correio eletrônico:[email protected]

vinicultura brasileira. Destacaram-se as cul-tivares Isabel, como uva para a elaboraçãode vinho, Niágara branca e Niágara rosa-da, como uvas para consumo in natura.Outras uvas importantes na vitivinicultu-ra da época foram ‘Jacquez’ e ‘Herbemont’,ambas cultivares de Vitis bourquina, ea híbrida interespecífica ‘Seibel 2’, entreoutras de menor importância. As castaseuropéias (Vitis vinifera), apesar dos es-forços envidados para seu cultivo, não ti-veram expressão nos primórdios da viti-

vinicultura comercial brasileira, devidoàs perdas causadas pela incidência de do-enças fúngicas, especialmente pelo míldio(Plasmopara viticola) e pela antracnose(Elsinoe ampelina).

Com o advento dos fungicidas sintéti-cos, efetivos no controle dessas doenças, apartir de meados do século 20, as videiraseuropéias ganharam expressão com o culti-vo de uvas para vinho no estado do Rio Gran-de do Sul e com a difusão da uva ‘Itália’,especialmente no estado de São Paulo.

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8 Vinhos finos: rumo à qualidade

Desde seu início até a década de 60, aviticultura brasileira ficou restrita às Re-giões Sul e Sudeste, mantendo as ca-racterísticas de cultura de clima tempera-do, com ciclo vegetativo anual e períodode repouso definido pela ocorrência dasbaixas temperaturas dos meses de inver-no. A partir de então, o cultivo da uva ‘Itália’foi levado, com sucesso, para a região Semi-Árida do Vale do Submédio São Francis-co, marcando o início da viticultura tropi-cal no Brasil. Sempre com base na uva‘Itália’, a viticultura tropical expandiu-serapidamente, com a consolidação do pólodo Norte do Paraná, na década de 70, e dospólos do Noroeste de São Paulo e do Nortede Minas Gerais na década seguinte. Apartir de 1990, surgiram diversos pólosvitícolas, alguns voltados à produção deuvas para consumo in natura, outros di-recionados à elaboração de vinho e suco.

Este artigo apresenta a viticultura brasi-leira, com descrição das regiões tradicio-nais e emergentes na produção de uva.

PANORAMA GERAL DAVITICULTURA BRASILEIRA

A viticultura, no Brasil, ocupa uma áreade, aproximadamente, 71 mil hectares, comvinhedos estabelecidos desde o extremosul do País, em latitude de 30o 56’ 15’’S, atéregiões situadas muito próximas à linhado equador, em latitude de 5o 11’ 15’’S. Emfunção da diversidade ambiental, existempólos com viticultura característica de regiõestemperadas, com um período de repousohibernal; pólos em áreas subtropicais, ondea videira é cultivada com dois ciclos anuais,definidos em função de um período de tem-peraturas mais baixas, no qual há risco degeadas; pólos de viticultura tropical, onde épossível a realização de podas sucessivas,com a realização de dois e meio a três ciclosvegetativos por ano. A produção de uvas éda ordem de 1,2 milhão de toneladas/ano.Deste volume, cerca de 45% são destina-dos ao processamento, para elaboração devinhos, sucos e outros derivados, e 55%comercializados como uvas para consumo innatura.

Do total de produtos industrializados,60% são vinhos de mesa e 21% sucos deuva, ambos elaborados a partir de uvas deorigem americana, especialmente cultiva-res de Vitis labrusca, Vitis bourquina ehíbridos interespecíficos diversos. Cercade 10% são vinhos finos, elaborados comcastas de Vitis vinifera; o restante (9%),dos produtos industrializados, é para ou-tros derivados da uva e do vinho. Grandeparte da produção brasileira de uvas e de-rivados da uva e do vinho é destinada aomercado interno. O principal produto deexportação, em volume, é o suco de uva,sendo cerca de 30% do total destinado aomercado externo. Apenas 5% da produçãode uvas para consumo in natura é des-tinada à exportação e menos de 1% dovinho produzido é comercializado fora doPaís (Quadro 1).

PRINCIPAIS REGIÕESPRODUTORAS

A viticultura é uma atividade tradicio-nal em nove regiões brasileiras. Como zonasde viticultura temperada destacam-se asregiões da Fronteira, Serra do Sudeste e SerraGaúcha, no estado do Rio Grande do Sul; aregião do Vale do Rio do Peixe, em SantaCatarina; a região Sudeste de São Paulo e aregião Sul de Minas Gerais. A região Nortedo Paraná é tipicamente subtropical. Asregiões Noroeste de São Paulo, Norte deMinas Gerais e Vale do Submédio São Fran-cisco caracterizam-se como zonas tropicais,com sistemas de manejo adaptados às suascondições ambientais específicas. Alémdesses, novos pólos produtores estão sur-gindo em diferentes regiões do País, sejasob condições temperadas, tropicais ousubtropicais.

1990 786.218 1.845 14.682 490.930 308.125

1991 648.026 2.882 12.131 339.369 317.906

1992 800.112 6.877 4.786 398.089 399.932

1993 785.958 12.552 4.508 401.472 376.442

1994 800.609 7.092 8.384 450.561 351.340

1995 836.545 6.786 23.891 455.772 397.878

1996 730.885 4.516 56.817 313.331 442.945

1997 855.641 3.705 23.222 414.485 460.673

1998 736.470 4.405 26.492 348.523 410.034

1999 868.349 8.083 8.599 469.870 398.870

2000 978.577 14.343 9.903 549.306 424.831

2001 1.062.817 20.660 7.457 469.098 580.516

2002 1.120.574 26.357 11.003 506.799 598.421

2003 1.054.834 37.601 7.612 425.946 598.899

2004 1.281.802 28.815 6.072 624.450 634.609

QUADRO 1 - Produção, importações, exportações e consumo de uvas no Brasil, no período

1990-2004 (em toneladas)

FONTE: Mello (2006).

Ano Produção Exportação Importação ProcessamentoConsumoin natura

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9Vinhos finos: rumo à qualidade

A viticultura brasileira desenvolvidasob condições temperadas segue, no geral,os mesmos procedimentos utilizados empaíses tradicionais no cultivo da videira.Já nas regiões de clima quente, adaptaram-se técnicas de manejo a cada situação es-pecífica. Os ciclos vegetativo e de produ-ção são definidos em função das condiçõesclimáticas e das oportunidades e exigênciasdo mercado. Sob condições subtropicais etropicais são utilizadas técnicas específicaspara a indução da brotação, superação deproblemas, devido à dominância apical,indução da ontogênese floral em cultiva-res com problemas de adaptação, controledo vigor vegetativo e manejo fitossanitá-rio. Os principais problemas de ordem fi-tossanitária são similares, tanto nas re-giões temperadas como nos climas maisquentes, destacando-se o míldio (Plasmoparaviticola), pela sua agressividade em to-das as regiões. Outras doenças fúngicasimportantes são o oídio (Uncinula necator),nas regiões quentes, e a antracnose (Elsinoeampelina), nas temperadas.

Viticultura de climatemperado

É uma viticultura tradicional, con-centrada nos estados do Sul e do Sudestedo Brasil, representando cerca de 88% daárea de vinhedos do País e mais de 98%da uva utilizada para processamento devinhos, sucos e outros derivados. Váriossão os sistemas de manejo utilizados, de-pendendo da região e do tipo de produto-objeto da produção. Em sua maioria sãousados cultivares e porta-enxertos con-vencionais, oriundos de outros países. En-tretanto, algumas novas cultivares, obtidasno Brasil, estão em fase de expansão.

Campanha e Serra do Sudeste

do Rio Grande do Sul

Localizada na metade Sul do Estado, éuma região de campo, com topografiaondulada, apta à mecanização, cuja si-tuação geográfica está entre 29o45’23’’S/57o05’37’’W (município de Uruguaiana) e31o33’45’’S/53o26’15’’W (município de

Gráfico 1 - Evolução das áreas com videira na microrregião de Campanha

FONTE: Mello (2001, 2005).

Pinheiro Machado), com altitude variandoentre 75 e 420 m. A temperatura média naregião varia entre 17,6oC e 20,2oC, a pre-cipitação média varia entre 1.367 e 1.444 mm,e a umidade relativa do ar, em média, situa-se entre 71% e 76%. Essa diversidadeambiental propicia a produção de uvas queoriginam vinhos com diferentes carac-terísticas de tipicidade dentro da própriaregião, de acordo com as condições climá-

ticas específicas de cada local de produção.A microrregião de Campanha, hoje com,aproximadamente, 1.500 ha (Gráfico 1),consolidou-se como produtora de vinhosfinos na década de 80 a partir de um Projetoimplantado por uma empresa multinacio-nal localizada no município de Santanado Livramento, na fronteira com o Uruguai.Na Serra do Sudeste (Gráfico 2), a viti-vinicultura veio a ganhar importância

Gráfico 2 - Evolução das áreas de cultivo na microrregião da Serra do Sudeste

FONTE: Mello (2001, 2005).

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10 Vinhos finos: rumo à qualidade

econômica mais recentemente a partir deinvestimentos efetuados por vinícolaslocalizadas na Serra Gaúcha, onde elabo-ram os vinhos com as uvas produzidas naregião. Em ambos os pólos produtores sãocultivadas exclusivamente castas de Vitisvinifera, com predominância das uvastintas ‘Cabernet sauvignon’, ‘Merlot’,‘Tannat’, ‘Cabernet franc’ e ‘Pinot noir’;entre as uvas brancas destacam-se ‘Char-donnay’, ‘Sauvignon blanc’ e ‘Ugni blanc’(‘Trebbiano’). O principal porta-enxertoutilizado na região é o SO4. Os vinhedossão conduzidos em espaldeira simples,espaçamento de 3,5 m x 1,5 a 2,0 m, podaem cordão esporonado tipo Royat ouGuyot. O período vegetativo começa emsetembro, com poda realizada em agosto, ea colheita transcorre em janeiro e fevereiro.A produtividade dos vinhedos na regiãositua-se entre 8 e 12 t/ha, dependendo dacultivar e da safra.

As uvas produzidas originam prin-cipalmente vinhos tranqüilos, embora venhacrescendo em importância a produção deuvas das castas ‘Chardonnay’ e ‘Pinot noir’,para elaboração de espumantes.

Serra Gaúcha

A Serra Gaúcha está localizada no Nor-deste do estado do Rio Grande do Sul, cujascoordenadas geográficas e indicadoresclimáticos médios são: latitude 29oS,longitude 51oW, altitude 600-800 m, pre-cipitação 1.700 mm, temperatura 17,2oC eumidade relativa do ar 76%. É a maiorregião vitícola do País, com cerca de 32 milhectares de vinhedos. Trata-se de uma vi-ticultura de pequenas propriedades, poucomecanizada, devido à topografia aciden-tada, onde predomina o uso da mão-de-obra familiar. A poda é realizada em julho-agosto e a colheita concentra-se nos mesesde janeiro e fevereiro. Mais de 80% daprodução da região origina-se de cultiva-res de uvas americanas (V. labrusca, V.bourquina) e híbridas interespecíficas,sendo ‘Isabel’, ‘Bordô’ (‘Ives’), ‘Niágarabranca’, ‘Concord’, ‘Niágara rosada’, ‘Jac-quez’ e ‘Seibel 1077’ as de maior expressãonesse grupo. Referente às castas de Vitis

vinifera (5.376 ha), destacam-se as cul-tivares de uvas brancas ‘Moscato bran-co’, ‘Riesling itálico’, ‘Chardonnay’ e‘Trebbiano’ (‘Ugni blanc’); entre as tintas,as principais são ‘Cabernet sauvignon’,‘Merlot’, ‘Cabernet franc’, ‘Tannat’, ‘An-cellota’ e ‘Pinotage’. São utilizados maisde dez porta-enxertos, predominando o‘Solferino’ (seleção local de V. berlandierix V. riparia) e o ‘1103 Paulsen’. No Gráfi-co 3, são apresentados os dados relativosà área, em hectare, ocupada por grupo decultivares na Serra Gaúcha.

A densidade de plantio situa-se entre1.600 e 3.300 plantas por hectare e pre-domina o sistema de condução em latadaou pérgola (horizontal), proporcionandoprodução de 10 a 30 t/ha, de acordo com acultivar e as condições climáticas da sa-fra. A maior parte da uva colhida é destina-da à elaboração de vinhos, sucos e outrosderivados. As uvas de origem americanasão utilizadas sobretudo para elabora-ção de suco e de vinho de mesa, produtosmuito bem-aceitos no mercado interno,devido a sua tipicidade de sabor e aroma,característicos das uvas labruscas, e pre-

ços acessíveis. No que se refere aos vinhosfinos, merece destaque a produção de es-pumantes de alta qualidade, além dosvinhos tranqüilos, brancos e tintos. De-tentora de alta tecnologia enológica, essaregião vem crescendo, sobretudo no seg-mento de vinhos finos e de qualidade. Umaevidência da evolução organizacional davitivinicultura da região foi a criação daIndicação Geográfica Vale dos Vinhedos,em 2002, iniciativa que motivou outrosgrupos de produtores da região a segui-rem o mesmo caminho. Dado o adianta-do estádio dos estudos desenvolvidos pelaEmbrapa Uva e Vinho, espera-se, para ospróximos anos, o surgimento de mais duasIndicações Geográficas na Serra Gaúcha.Embora com menor expressão econômica,uma pequena porcentagem da produção deuvas, especialmente de uvas americanas,como ‘Niágara rosada’ e ‘Isabel’, é des-tinada ao mercado de uvas para consumoin natura.

Vale do Rio do Peixe

Localizada no estado de Santa Catarina,latitude de 27oS, longitude 51oW, altitude

Gráfico 3 - Evolução das áreas com videiras na região da Serra Gaúcha

FONTE: Mello (2001, 2005).

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11Vinhos finos: rumo à qualidade

600-800 m, a região do Vale do Rio do Peixeapresenta como indicadores climáticosmédios 1.800 mm de precipitação anual,temperatura de 17,1oC e umidade relativado ar de 80%. A viticultura ocupa cerca de1.800 hectares. Apresenta grande simi-laridade com a região da Serra Gaúcha,quanto à estrutura fundiária, topografia etipo de exploração vitícola, que se baseiano uso da mão-de-obra familiar voltada àprodução de uvas, em sua maioria, paraprocessamento agroindustrial (vinhos esucos). A cultivar ‘Isabel’ ocupa cerca de75% da área de vinhedos, seguida poroutras cultivares de V. labrusca e híbridasinterespecíficas como ‘Niágara branca’,‘Niágara rosada’, ‘Ives’ e ‘Couderc 13’.Predomina o sistema de condução em lata-da e a densidade de plantio situa-se entre1.600 e 3.000 plantas por hectare. A regiãoconsolidou-se produzindo vinhos de mesa,à base de uvas labruscas, destinados aomercado interno. Entretanto, é evidente atendência de um redirecionamento na es-trutura produtiva do setor, a fim de aumentara produção do suco de uva em detrimentodo vinho de mesa.

Nessa região, a produção de uvas vi-níferas não chega a 5% do volume totalproduzido, entretanto chama a atenção ofato de que os projetos implantados nes-se sentido são recentes e há a manifestaintenção de produtores tradicionais devinhos de mesa migrarem para a produçãode vinhos finos. Esse programa, que sepode considerar de reconversão parcial, temo apoio da Estação Experimental de Videirada Empresa de Pesquisa Agropecuária eExtensão Rural de Santa Catarina (Epagri)e deverá promover nos próximos anos,juntamente com o crescimento da produ-ção de suco de uva, uma mudança signi-ficativa na estrutura produtiva desse pólovitivinícola. Entretanto, a acirrada com-petitividade existente nos mercados internoe externo de vinho fino é elemento deter-minante do ritmo dessa mudança.

Leste de São Paulo

Situada a 23oS 47oW e entre 700 e 900 mde altitude, a região Leste do estado de

São Paulo apresenta médias anuais de1.400 mm de precipitação, temperatura de19,5oC e umidade relativa do ar de 70,6%. Éuma região onde a altitude compensa alatitude, condicionando à prática de umaviticultura de clima temperado. O invernoé ameno, porém sujeito à ocorrência degeadas, e com baixa precipitação. O verãoé quente e chuvoso, propiciando a inci-dência de doenças fúngicas como míldio,oídio, podridões do cacho, entre outras. Aárea de vinhedos é da ordem de 7.250hectares e a produção vitícola da regiãoestá distribuída em três categorias. Des-taca-se, num primeiro grupo, a produçãode uva americana para consumo in natura,com predomínio absoluto da ‘Niágararosada’. Com uma área de parreirais de cercade 5.025 ha, este grupo representa 44% daárea cultivada da região. Os vinhedos sãoconduzidos em espaldeira simples, numadensidade de 4.000 plantas/ha, enxerta-dos sobre porta-enxertos 106-8 Mgt ouIAC 766. A produtividade média nesse sis-tema é de 8 a 10 t/ha e a colheita é con-centrada em dezembro-janeiro. No segundogrupo estão as uvas européias para con-sumo in natura, representadas pela cultivarItália e suas mutações ‘Rubi’ e ‘Benitaka’,com uma área de parreirais de cerca de2.170 ha, este grupo representa cerca de34% da área total cultivada na região. Osvinhedos são conduzidos em latada, com330 a 625 plantas por hectare, enxertadassobre os porta-enxertos 420A ou IAC 766.A colheita concentra-se nos meses de fe-vereiro e março. A produtividade situa-seem torno de 30 t/ha. Em terceiro lugar, estãoas uvas destinadas à elaboração de vinho,representando, aproximadamente, 0,7%do total, todas americanas e híbridas, comdestaque para a ‘Seibel 2’. Os vinhedos,em geral, são enxertados sobre os porta-enxertos 106-8 Mgt ou IAC 766. Tambémexistem áreas plantadas em pé-franco. Osistema de condução mais utilizado é o deespaldeira simples. São fortes os indíciosde que a atividade vitícola, voltada à ela-boração de vinho na região, tem os diascontados. Tomando como exemplo o muni-cípio de São Roque, importante pólo viní-

cola da região, onde estão instaladas 15vinícolas, estima-se que existam, atual-mente, apenas 35 ha de parreirais. Cerca de12 milhões de litros de vinho, engarrafadospelas vinícolas da região, são importadosa granel do Rio Grande do Sul. Estão naorigem desse fato a exploração imobiliária,que alavancou os preços das terras na re-gião, o envelhecimento da sua populaçãorural e a existência de uma estrutura deprodução de vinho de mesa na Serra Gaú-cha voltada a abastecer os engarrafadoresdo centro do País com preços competitivos.

Sul de Minas Gerais

A região do Sul de Minas situa-se a21oS 40oW e altitude de 1.150 m. O climacaracteriza-se por precipitação média de1.500 mm, temperatura média anual de 19oCe umidade relativa do ar de 75%. É tradicio-nal no cultivo de uvas de origem americana(Vitis labrusca e Vitis bourquina), com áreade produção estabilizada em torno de 350 ha.As principais cultivares utilizadas são ‘Bordô’(localmente conhecida por ‘Folha de figo’),‘Jacquez’, ‘Ives’, ‘Niágara rosada’ e ‘Niágarabranca’. A latitude é compensada pela altitu-de, onde se pratica uma viticultura de climatemperado, com poda em julho e agosto ecolheita em dezembro e janeiro. O perfil doviticultor da região é de agricultura familiare tradicional. Os parreirais são conduzidosno sistema de espaldeiras e grande parteimplantado em pé-franco (sem o uso de porta-enxerto). Nessas condições, a produtividademédia da região gira em torno de 8 toneladasde uva por ha. Recentemente, têm sido im-plantadas novas áreas de vinhedos com baseem tecnologia melhorada, com maiorescuidados no aspecto sanitário do material aser utilizado e com o uso de porta-enxertos.Entretanto, na maioria dos casos são in-vestimentos com base na cultivar Niágararosada, cuja produção é destinada ao con-sumo in natura. Existem diversas ações depesquisa e desenvolvimento, lideradas pe-la EPAMIG em seu Núcleo TecnológicoEPAMIG Uva e Vinho, em Caldas, MG, comobjetivos de introduzir novas variedadespara a produção de vinho de mesa (‘MoscatoEmbrapa’) e de fazer seleção clonal das cul-tivares tradicionais (‘Bordô’).

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12 Vinhos finos: rumo à qualidade

Quanto à produção de vinho na região,que em grande maioria (95%) é vinho demesa, estima-se que cerca de 2,4 mil to-neladas das uvas processadas anualmentesejam produzidas na região, às quais sesomam mais de 2 mil toneladas de uvas(principalmente ‘Bordô’ e ‘Isabel’), adqui-ridas no Rio Grande do Sul. Portanto, ovolume de vinho processado no pólo é decerca de 3 milhões de litros, adicionadosmais 700 mil litros de vinho importado agranel do Rio Grande do Sul. Embora ha-ja uma manifesta vontade de técnicos eprodutores de tornar a região auto-su-ficiente na produção de uvas e de vinhos,cuja defasagem hoje é de cerca de 150 hade parreirais, o que se vê é uma lentidão noprocesso de renovação dos parreirais an-tigos e investimentos em novas áreas deprodução de uvas, sem incentivos gover-namentais.

A característica mais marcante na re-gião é a grande proliferação de pequenascantinas produtoras de vinhos artesanais,que produzem individualmente volumesde vinhos que variam de 1 a 5 mil litros, co-mercializados no local. Relativamente, aestrutura tecnológica para produção de vi-nhos existe em apenas três cantinas locais,que apresentam bom nível, as demais aindase utilizam de processos artesanais tecno-logicamente defasados. Embora a viti-vinicultura do pólo de Caldas e Andradasseja focada na produção de vinhos de me-sa e suco de uva, existem ações de empre-sários e da própria EPAMIG para incentivara produção de uvas viníferas, não tanto nopólo em questão, que apresenta problemascom altos índices pluviométricos no ve-rão, mas principalmente em regiões maissecas como no Cerrado mineiro. Entretan-to, há vinícolas na região que adquiremuvas viníferas no Rio Grande do Sul, comas quais elaboram, localmente, vinhos finos.Essas vinícolas recentemente têm realizadoinvestimentos na implantação de parreiraiscom cultivares viníferas.

No que se refere às ações de merca-do, verifica-se na região, principalmente porparte das principais vinícolas, um forte fo-co em ações de enoturismo, embora nesse

caso, diferentemente do pólo de São Ro-que, as ações não tenham apoio direto dosgovernos municipal e estadual.

Pólos emergentes

Destaca-se como pólo emergente da vi-ticultura brasileira de clima temperado aregião de São Joaquim no estado de SantaCatarina. Situada a 28oS e 49oW, com al-titude variando entre 950 m e 1.400 m, essepólo produtor está voltado exclusivamen-te ao cultivo de castas de Vitis vinifera,para a produção de vinhos finos, parti-cularmente vinhos tintos. Os primeirosvinhedos foram plantados na região em2001, chegando, em 2005, a uma área totalde 180 ha. A principal cultivar plantada naregião é a ‘Cabernet sauvignon’, em cercade 90% da área, seguida pela ‘Merlot’ (7%),e os demais 3% são ocupados pelas culti-vares Pinot noir, Chardonnay, Cabernetfranc, Malbec e Sauvignon blanc. O obje-tivo dos empreendimentos da região é aprodução de vinhos finos de alta qua-lidade, utilizando estruturas industriaismodernas, recém-instaladas ou em fase deinstalação. Atualmente, encontram-se ins-taladas e em operação as cantinas do Pro-jeto Vila Francione (pioneiro na região), comcapacidade para 300 mil garrafas/ano (oequivalente à produção de uva dos 50 hade videiras previstos no Projeto), e a doProjeto da Cooperativa Agrícola de SãoJoaquim (Sanjo), com capacidade inicialpara processar 100 toneladas de uva/ano,e também uma pequena cantina particulardo Projeto Quinta Santa Maria, que pro-cessou cerca de 15 toneladas de uva em2005 e prevê expansão para mais 10 tone-ladas a partir do ano de 2006. Segundo asestatísticas e previsões da Estação Expe-rimental de São Joaquim da Epagri, no anode 2004 foram processadas na região 90toneladas de uva, em 2005, aproximada-mente, 300 toneladas e, em 2006, cerca demil toneladas.

Viticultura subtropical

A viticultura subtropical brasileira, pro-priamente dita, desenvolveu-se apenas noNorte do estado do Paraná, onde predo-

mina o cultivo de uvas finas para consumoin natura. Essa região tem um papel im-portante no abastecimento do mercadointerno de uvas para consumo in natura.

Norte do Paraná

As coordenadas geográficas dessa re-gião vitícola são: latitude 23oS, longitu-de 51oW e altitude variando entre 250 e800 m. Trata-se de uma região tipicamentesubtropical, cujos indicadores climáticosmédios são de 1.600 mm de precipitação,temperatura de 20,7oC e 73% de umidaderelativa. A temperatura média dos mesesmais frios (junho e julho) situa-se em tornode 16,7oC, havendo risco de geadas nesseperíodo. A precipitação concentra-se entreoutubro e abril. Entre maio e setembro, asmédias são inferiores a 100 mm mensais,havendo necessidade de irrigação. Pre-dominam as pequenas propriedades com ouso da mão-de-obra familiar. O principalproduto da região são as uvas finas paraconsumo in natura, destacando-se a culti-var Itália e suas mutações coloridas ‘Rubi’,‘Benitaka’ e ‘Brasil’, com uma área aproxi-mada de 3.300 ha, em vinhedos conduzidosem pérgola e com densidade de plantio quevaria de 400 a 800 plantas/ha. Também re-presenta grande importância econômicapara a região a produção de uvas labrus-cas para consumo in natura, com cerca de700 ha de ‘Niágara rosada’, em vinhedosconduzidos em espaldeira e com alta den-sidade de plantio (4 mil plantas/ha). Osporta-enxertos mais usados são 420 A e IAC766. Normalmente, são colhidas três sa-fras a cada dois anos, com podas em junho/julho e janeiro/fevereiro. Nesse sistema, hánecessidade de tratamento para induzir euniformizar a brotação das gemas. A co-lheita ocorre em dezembro-janeiro e abril-maio, respectivamente.

Pólos emergentes

O Projeto Vitivinícola de Rolândia de-senvolve-se no âmbito da CooperativaAgroindustrial de Rolândia (Corol) e estáfocado, exclusivamente, na produção desuco de uva concentrado, já que se origi-nou da necessidade de viabilizar uma al-

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ternativa para utilização da estrutura agro-industrial já existente, produtora de sucode citros concentrado, que ficava ociosacerca de seis meses por ano.

Atualmente, estão implantados 260 hade parreiras com as variedades Isabel,Concord e BRS Rúbea, em 35 municípiosda região Norte do Paraná. Cada produtorpossui, em média, cerca de 2 ha de parrei-rais. A meta do Projeto é de ter implanta-do, até 2008, cerca de 1.000 ha de parreiras.O sistema de condução recomendado noProjeto é o GDC, que permite o uso de má-quinas e equipamentos utilizados na re-gião para outros cultivos, sem prejudicara produtividade. Entretanto, há produ-tores que estão utilizando o sistema delatada. No ano de 2005, ocorreu a primeiracolheita que girou em torno de 40 tone-ladas de uvas. A expectativa é de que nasafra de 2006 sejam colhidas cerca de 300toneladas de uva.

Viticultura tropical

A viticultura tropical, apesar de rela-tivamente recente, alcançou significativaevolução tecnológica no Brasil. Da pro-dução inicial de uva ‘Itália’, praticamen-te única opção até a década de 90, a vi-ticultura tropical brasileira ingressou noséculo 21 com tecnologia para a produçãode ‘Niágara rosada’, antes restrita ao Suldo País, para a produção de uvas finas (Vitisvinifera), visando à elaboração de vinhosde alta qualidade em regiões tropicais, paraa produção de uvas labruscas de alta qua-lidade, próprias para a elaboração de sucosob condições tropicais. Com base em no-vas cultivares e porta-enxertos, desen-volvidos pelos programas brasileiros depesquisa em viticultura, especificamentepara o ambiente tropical e usando técnicasde manejo finamente ajustadas, viabili-zaram-se e consolidaram-se as regiõesdescritas a seguir, ao mesmo tempo em quese criaram fortes perspectivas de sur-gimento de novos pólos de produçãovitícola nos trópicos do Brasil.

Noroeste de São Paulo

Essa região que tem como município-

pólo Jales, está localizada a 20oS, 50oW ealtitude que varia de 450 a 550 m. O climacaracteriza-se por uma estação chuvosa,entre novembro e abril, e uma estação seca,entre maio e outubro, sendo a irrigação umaprática indispensável. A precipitação médiaanual é da ordem de 1.300 mm e a tem-peratura média anual de 22,3oC. As tem-peraturas são elevadas ao longo do ano,com riscos mínimos de ocorrência degeadas, viabilizando ciclos vegetativossucessivos. Em função da distribuição dachuva, são feitas duas podas anuais, umapara produção entre março e junho e outrapara formação das plantas entre outubro edezembro. Assim, o período de colheita naregião vai de agosto a novembro, sendoos meses de agosto e setembro mais fa-voráveis à qualidade em função da baixaprecipitação no período. A área de vinhe-dos está em torno de 900 ha, com pre-domínio absoluto de uvas para consumoin natura. A principal cultivar é a ‘Itália’,seguida por suas mutações ‘Rubi’ e ‘Beni-taka’, entre as uvas finas (Vitis vinifera). A‘Niágara rosada’ (Vitis labrusca), antes au-sente nos vinhedos da região, vem cres-cendo em área cultivada a partir do ano de2000, estimando-se que atualmente existamcerca de 250 ha dessa cultivar em produ-ção na região. O ‘IAC 572’ é o porta-enxertomais utilizado. Com menor expressão, apa-recem o ‘IAC 313’ e o ‘420A’. Os vinhedossão conduzidos em pérgola e apresentamprodutividade elevada, entre 25 e 40 t/ha. Éuma viticultura desenvolvida em pequenaspropriedades, com base na mão-de-obrafamiliar complementada por parcerias, cujotrabalho é remunerado com porcentagenssobre a produção. O destino da produçãoregional é o mercado interno.

Norte de Minas Gerais

Este pólo produtor está às margens doRio São Francisco, a 17oS, 44oW e a umaaltitude média de 470 m. A quantidade mé-dia anual de chuvas é de aproximadamen-te 1.050 mm e a temperatura média anual éde 23oC. A área de vinhedos é de cerca de500 ha, com produção totalmente voltadapara o mercado de uva para consumo in

natura. A base da produção ainda é a uva‘Itália’ e suas mutações ‘Rubi’, ‘Benitaka’e ‘Brasil’. Entretanto, vem crescendo o cul-tivo da ‘Niágara rosada’ e de cultivares deuvas sem sementes, principalmente cul-tivares brasileiras (‘BRS Clara’, ‘BRSMorena’ e ‘BRS Linda’). São utilizados osporta-enxertos tropicais, ‘IAC 313’, ‘IAC572’ e ‘IAC 766’. Os vinhedos são condu-zidos em pérgola e realizados dois ciclosvegetativos e apenas uma colheita/ano, noperíodo de julho a outubro, aproveitan-do a estiagem, que se estende de maio aoutubro. Grande parte da produção é parao abastecimento do mercado brasileiro,porém, tem ocorrido exportação de peque-nas partidas para os países vizinhos daAmérica Latina.

Vale do Submédio São

Francisco

Situa-se no trópico Semi-Árido bra-sileiro, em latitude 9oS, longitude 40oW ealtitude em torno de 350 m. Apresenta in-dicadores climáticos médios de 500 mm deprecipitação, concentrada entre dezembroe março, temperatura de 26oC e 50% deumidade relativa do ar. É a principal regiãovitivinícola tropical brasileira, com cercade 10 mil hectares de vinhedos, distribuídosnos estados de Pernambuco e Bahia. Aestrutura produtiva da região compõe-sede pequenos produtores, vinculados aosprojetos de colonização e associados emcooperativas, e de médios e grandes pro-dutores que atuam em escala empresarial.Cerca de 95% da área plantada com vi-nhedos visa à produção de uvas para con-sumo in natura, com destino tanto paraabastecimento do mercado interno, como,principalmente, para exportação. A uva‘Itália’, cultivada em grande escala prin-cipalmente pelos pequenos produtores,vem cedendo espaço para as uvas semsementes, mais valorizadas no mercadointernacional. Entre as uvas sem semen-tes destacam-se pela área de cultivo as cul-tivares Festival (Sugraone ou Superior),Thompson seedless e Crimson seedless,todas de plantio recente e responsáveispelo aumento das exportações brasilei-

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14 Vinhos finos: rumo à qualidade

ras nos últimos anos, conforme pode serobservado no Quadro 1. A viticultura vol-tada à produção de vinhos concentra-seno cultivo de castas de Vitis vinifera, comdestaque para as cultivares Syrah, Ca-bernet sauvignon e Ruby cabernet, entreas tintas, e Moscato canelli e Chenin blanc,entre as brancas. Atualmente, estima-se aexistência de uma área de 500 ha de par-reirais com estas cultivares que dão origema, aproximadamente, 6 milhões de litrosde vinho/ano, sendo 80% vinho tinto e 20%branco. Os porta-enxertos mais utilizadossão ‘IAC 572’, ‘IAC 313’, ‘IAC 766’, de-senvolvidos especialmente para regiõestropicais do Brasil, além de ‘Harmony’,‘SO4’ e outros de importância menor. Agrande maioria dos vinhedos é conduzidaem pérgola, embora algumas vinícolasestejam implantando novas áreas com ouso do sistema em espaldeira. Iniciativasrecentes, a partir de 2004, buscam também odesenvolvimento da viticultura para a pro-dução de suco de uva, utilizando novascultivares de Vitis labrusca desenvolvidaspara as condições tropicais do Brasil.

Regiões tropicais emergentes

Existem iniciativas vitícolas em váriasregiões do Brasil tropical, com destaque pa-ra a Região Nordeste, nos estados de Per-nambuco, Bahia, Ceará, Maranhão e Piauí,Região Centro-Oeste, nos estados do MatoGrosso e Goiás e Região Sudeste, nos es-tados de Minas Gerais e Espírito Santo. Emsua maioria são ainda empreedimentos depequeno porte, voltados principalmente àprodução de uvas para consumo in natura.

Santa Helena (GO)

O pólo vitivinícola do município deSanta Helena (GO) surgiu a partir de umprojeto de empresários tradicionais pro-dutores de vinho de mesa na Serra Gaúcha,os quais optaram por investir no Centro-Oeste, por entenderem que, no seu ramode negócio (produção de vinho de mesapara venda a granel a engarrafadores docentro do País), a localização lhes dariadiversas vantagens em relação à SerraGaúcha, como por exemplo baixo preço

da terra, topografia mecanizável, pos-sibilidade de duas safras anuais e con-dições favoráveis de logística. No ano de2002, foram instalados 40 ha de parreirascom as variedades Isabel, Isabel Precoce,BRS Rúbea e, mais recentemente, BRSCora. No ano de 2004, foi inaugurada avinícola com capacidade para elaborarum milhão de litros de vinho/ano. A metado projeto era criar uma estrutura comcapacidade para elaborar 33 milhões delitros de vinho/ano. A produtividade dosparreirais tem girado em torno de 25 tone-ladas de uva/ha/safra, ou seja, 50 tonela-das de uva/ha/ano. O grau glucométricoda uva, na safra de verão (novembro e de-zembro), é em média de 16o Babo e, na sa-fra de inverno (junho e julho), varia entre18o e 20o Babo. Na safra de verão de 2004,foram elaborados cerca de 250 mil litrosde vinho e, na safra de inverno de 2005, emtorno de 600 mil litros de vinho. O proje-to da vinícola Centro-Oeste contemplatambém a instalação de uma linha paraprodução de suco de uva, a meta é de queem 2008, essa linha já esteja em operação.A política da empresa e das liderançaslocais é de incentivar os produtores daregião para a produção de uva, entretantocomo se trata de uma atividade poucoconhecida e ainda em fase de adaptaçãono plano tecnológico, verifica-se umaatitude de cautela por parte dos produtoresnativos.

Nova Mutum (MT)

Há alguns anos, o município de NovaMutum (MT) possuía em torno de 30 hade parreirais distribuídos entre diversospequenos produtores, na maioria des-cendentes de italianos emigrados do suldo País. A produção era com base na cul-tivar Niágara rosada, destinada ao mer-cado de uva para consumo in natura. De-vido a problemas de ordem tecnológica,relacionados com o manejo da cultivar emcondições tropicais e outros como, porexemplo, a deriva do produto 2-4D, utilizadocomo herbicida nas plantações de soja ealgodão existentes em grande escala naregião, praticamente todos os produtores

do município abandonaram a atividadevitícola.

O projeto que hoje sustenta o pólovitivinícola de Nova Mutum pertence àAgropecuária Melina Ltda. Iniciou-se noano de 2001 numa parceria entre os pro-prietários e a Embrapa Uva e Vinho. O projetoestá focado exclusivamente na produção deuvas americanas e híbridas para elaboraçãode suco de uva. O projeto conta atualmentecom uma área total de 35 ha de parreirais,conduzidos no sistema de latada, assimdistribuídos: 9 ha de ‘Isabel’; 22 ha de ‘IsabelPrecoce’; 2,5 ha de ‘Cora’ e 1,5 ha com novasseleções da Embrapa Uva e Vinho ainda emavaliação. São realizadas, anualmente, duassafras, uma nos meses de junho e julho eoutra nos meses de novembro e dezembro.A produtividade varia entre 35 e 40 tone-ladas/ano e o grau glucométrico está entre18o e 22o, na safra de inverno, e 16o e 20o, nasafra de verão. O suco de uva elaborado énatural e integral, sem adição de açúcar ouconservantes. O resultado do projeto, comoito ha de videiras que entraram em pro-dução em 2005, é de cerca de um milhão dequilos de uva, o que corresponde, apro-ximadamente, a 1,5 milhão de garrafas de500 mL de suco.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O cenário atual de vitivinicultura bra-sileira, fortemente marcado pelo surgimentode novos pólos produtores em regiões nãotradicionais, também evidencia um pro-cesso que envolve, respectivamente, açõesde modernização, reconversão e diversi-ficação da produção nos pólos tradicio-nais. As mudanças em andamento nospólos tradicionais originam-se, sobretu-do, da necessidade de uma melhoria qua-litativa e competitiva de seus produtos. Apressão exercida pela crescente presençade vinhos importados no mercado bra-sileiro, principalmente argentinos e chi-lenos, que inicialmente concorriam e afe-tavam exclusivamente a competitividadedo vinho fino nacional, nos últimos doisanos (2004 e 2005), dado os baixos preçoscom que são colocados no mercado, come-çaram a competir também com o vinho de

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mesa (comum). Por outro lado, o mercadodo suco de uva, tanto interno quanto ex-terno, tem demonstrado grande potencialde crescimento. Apenas no ano de 2005, ovolume desse produto, comercializado nomercado interno, apresentou um cresci-mento acima de 50%, confirmando umatendência já verificada nos anos anterio-res. Com base nesse cenário, constata-se,não só o surgimento de novos pólos vi-tivinícolas voltados à produção de suco(Nova Mutum e Rolândia), mas tambémnovos investimentos (Serra Gaúcha e Va-le do Submédio São Francisco) e redire-cionamento da produção (Vale do Rio doPeixe). Relativo ao surgimento de novospólos vitivinícolas em regiões tropicais esubtropicais, é importante que se registrea grande evolução tecnológica na viticul-tura brasileira, principalmente no que dizrespeito à adaptação e definição de sistemade produção para variedades americanas e

REFERÊNCIAS

MELLO, L.M.R. de (Ed.). Cadastro vitícola do

Rio Grande do Sul 1995-2000. Bento Gonçalves:

Embrapa Uva e Vinho, 2001. 1 CD-ROM.

híbridas, viabilizando técnica e econo-micamente tal atividade. Diante do novomapa/cenário da vitivinicultura brasilei-ra, com pólos produtores espalhados porgrande parte do território nacional, é dese esperar que a cultura do vinho e dosderivados da uva e do vinho também se-ja disseminada e que o consumo per capitaevolua dos baixos níveis atuais 1,7 litro devinho; 0,37 litro de suco de uva e 3,52 quilosde uva, para patamares bem mais altoscomo, por exemplo, 9 litros de vinho percapita em 2025 (valor estimado e esta-belecido como meta no Programa de De-senvolvimento Estratégico da Vitivini-cultura do Rio Grande do Sul - Visão 2025).

_______. Cadastro vitícola do Rio Grandedo Sul 2001-2004. Bento Gonçalves: Embrapa

Uva e Vinho, 2005. 1 CD-ROM.

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Embrapa Uva e Vinho, 2006. Disponível em:

<http://www.cnpuv.embrapa.br/publica/artigos/

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2006.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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Gonçalves: IBRAVIN, [2005]. Disponível em:

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Acesso em: 10 jan. 2006.

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1Engo Agro, Pós-Doc, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

2Engo Agro, D.Sc., Pesq. Embrapa Uva e Vinho/EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico:[email protected]

3Engo Agro, D.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agra, D.Sc., Embrapa Semi-Árido/Bolsista CNPq, Caixa Postal 23, CEP 56302-970 Petrolina-PE. Correio eletrônico:

[email protected] Agro, M.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correio

eletrônico: [email protected] Agra, Dra, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correio

eletrônico: [email protected] Agra, B.S., Mestranda UFLA, Caixa Postal 3037, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: [email protected]

Implantação e manejo do vinhedopara produção de vinhos de qualidade

Murillo de Albuquerque Regina1

José Carlos Fráguas2

Ângelo Albérico Alvarenga3

Claudia Rita de Souza4

Daniel Angelucci de Amorim5

Renata Vieira da Mota6

Ana Carolina Fávero7

Resumo - A produção de vinho de qualidade inicia-se pela obtenção de uvas maduras,sadias e com bom equilíbrio entre seus constituintes, capazes de proporcionar, à bebida,informações degustativas que expressem as condições ecológicas na qual foramproduzidas. Além dos fatores genéticos e climatológicos, a maturação e a qualidade dauva dependem fundamentalmente de vários outros fatores afetados pelo manejo dovinhedo, tais como a nutrição da planta, o porta-enxerto, o sistema de condução e poda,a disponibilidade hídrica dos solos e o controle sanitário. O conjunto dessas informaçõesé abordado sob a ótica de produzir uvas para obtenção de vinhos finos.

Palavras-chave: Vitis vinifera. Nutrição. Porta-enxerto. Cultivar. Condução.

INTRODUÇÃO

A obtenção de vinho de qualidadedepende de um grande número de fatoresnaturais e humanos. Dentre os fatoresnaturais, destacam-se a composição emaçúcares, ácidos, taninos, antocianinas,polifenóis não oxidáveis, aromas, enzimasoxidorredutoras e microelementos, quegarantem o caráter distintivo e de qualida-de nos vinhos e estão correlacionados como ecossistema vitícola (clima, solo, cultivar,porta-enxerto) e às técnicas culturais (irri-

gação, controle de pragas e doenças, adu-bação).

A otimização desses fatores através deum manejo adequado pode resultar emaumento significativo da qualidade do vi-nho com agregação de valor a ele e viabi-lização da atividade vitivinícola em de-terminada região.

Entretanto, o papel que o terroir (con-junto de fatores que abrangem tipo de solo,relevo, clima, cultivares, manejo) desem-penha na qualidade da uva na colheita e

no tipo de vinho (tipicidade) só pode sercompreendido a partir do conhecimento dovinhedo e das transformações bioquímicasda baga durante o seu desenvolvimento(DELOIRE et al., 2005).

ESCOLHA DO LOCAL, PREPARODO SOLO E NUTRIÇÃO DEVIDEIRA

O solo, por ser a base de sustentação edesenvolvimento para as plantas, mereceatenção especial desde a sua escolha até

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os últimos preparativos para a instalaçãodo vinhedo. A nutrição equilibrada davideira é outro fator importante para aprodução qualiquantitativa na elabora-ção de vinhos finos. Portanto, como aviticultura é um trabalho de longa duração,todos os cuidados para a escolha do local,preparo do solo (correção da acidez e dafertilidade) e nutrição das plantas devemser executados com muito planejamento.

No momento da escolha do local para aimplantação do vinhedo, alguns fatoresprecisam ser considerados, destacando-se:a exposição, a declividade, a possibilidadede mecanização e a reserva de água emquantidade e qualidade.

A videira adapta-se a diferentes tiposde solos, exceto aos muito compactados,aos turfosos e aos úmidos. Assim, dentrodas possibilidades de escolha de áreas napropriedade, deve-se evitar a implanta-ção de vinhedos em baixadas úmidas eem solos rasos (rochas e lençol freáticopróximos da superfície). Em solos areno-sos é preciso programar o uso periódi-co de matéria orgânica (esterco curtido degado), para melhoria das condições físi-cas e de fertilidade do local (FRÁGUAS etal., 2002ab). Dois desses fatores devem sercuidadosamente analisados por ocasião daimplantação do vinhedo:

a) exposição: deve-se dar preferên-cia para a posição da área voltadapara o norte, com as filas de plantioorientadas no sentido norte – sul,para melhor insolação nas plan-tas. Como opções, pode-se usar aexposição noroeste, nordeste oumesmo leste e oeste. Deve ser evi-tada a exposição sul, principalmen-te em regiões que recebam ventosfrios, pois estes podem propiciar osurgimento de certas doenças fún-gicas. Conforme a região, é acon-selhável o uso de quebra-ventos;

b) declividade: os terrenos de meia-encosta, com declividade inferior a15%, devem ser preferidos por nãoter problemas com drenagem e sermenos sujeitos à formação de gea-

das tardias (primaveris). Encostasmuito íngremes (acima de 20%)oneram os trabalhos de proteção àconservação do solo e inviabilizamos trabalhos de preparo e correçãodo solo, bem como a aplicação detratamentos fitossanitários.

Em relação aos tipos de solos, os maisarenosos podem produzir vinhos com ca-racterísticas mais florais do que os ar-gilosos. Já os solos mais argilosos tendema produzir vinhos mais tânicos e com bu-quê menos acentuado. Há, portanto, umarelação entre a taxa de argila do solo e onível médio de adstringência do vinho, quereflete em sua maciez e leveza (HUGLIN,1986). Resumindo, das principais carac-terísticas que os solos transferem aos vi-nhos podem-se destacar aquelas enu-meradas por Fregoni (1980):

a) solos argilosos: vinhos ricos em ex-trato seco, bem coloridos (tintos),macios, de boa acidez e com con-servação mais prolongada;

b) solos arenosos: vinhos finos, po-rém fracos em extrato seco e albu-minas;

c) solos pedregosos: vinhos de eleva-da qualidade e ótima graduaçãoalcoólica;

d) solos muito argilosos: vinhos ricosem extrato seco, aromáticos, inten-samente coloridos (tintos) e fre-qüentemente grosseiros (excessode taninos);

e) solos ligeiramente ácidos: produzemvinhos delicados, bons em corpo ecor, com ótima qualidade geral (daía correção da acidez do solo serindicada para elevar o pH a 6,0);

f) solos calcáricos: vinhos muito alcoó-licos, de baixa acidez e buquê acen-tuado;

g) solos úmidos: vinhos de baixa gra-duação alcoólica, muito ácidos,ricos em albumina (excesso de N) ede fraca qualidade geral;

h) solos humíferos: vinhos grosseiros,de reduzida conservação, ricos em

albumina (excesso de N), instáveise pobres em aromas.

Limpeza da área

Essa atividade é importante para deixaro solo livre de obstáculos (raízes, partesvegetais, pedras), para maior eficiência dostrabalhos de preparo do solo. Conformea área escolhida, devem ser realizadosos trabalhos de roçada, desmatamento,destocas e retiradas de restos vegetais epedras da superfície. O local deve estarlimpo com antecedência ao plantio (6meses). Nessa fase, podem-se retirar assubamostras para formar a amostra quedeverá ser enviada ao laboratório paraanálise de solo, caso não seja realizada asubsolagem. Recomendam-se duas pro-fundidades de amostragens para melhorconhecimento da fertilidade do perfil dosolo, que são de 0-20 cm e 20-40 cm. Se osolo mostrar-se com teor elevado de matériaorgânica, acima de 50,0 g/kg de solo (5,0%),primeiro deverá ser cultivado com umacultura anual (milho, feijão etc.), para evi-tar o excesso de nitrogênio às videiras(FRÁGUAS et al., 2002ab), o qual é pre-judicial à boa fermentação e equilíbrio dovinho fino.

Preparo do solo

Na implantação do vinhedo é que setem a melhor oportunidade de realizaçãode um bom preparo e correção do solo, queviabilizarão o desenvolvimento radicu-lar e, portanto, o bom desempenho dasplantas. As técnicas de preparo do solodevem ser adequadas ao tipo de solo(argiloso, siltoso, arenoso, profundo ouraso) (FRÁGUAS et al., 2002ab). Um dosprocessos que tem dado melhores re-sultados é o da subsolagem ou araçãoprofunda (acima de 30 cm). Essa técnicadependerá da presença de camadas com-pactadas em profundidades maiores do quea alcançada pela aração normal. Contudo,é uma prática que melhora as condiçõesfísicas do solo e facilita a distribuição emprofundidade do calcário e fertilizantes,propiciando maior eficiência na correção

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da acidez e da fertilidade da área. Tanto asubsolagem como a aração profunda de-vem ser cruzadas, sendo a primeira nosentido do declive do terreno e a segundaperpendicular à primeira. Sempre que sur-gir novos restos vegetais e pedras, após opreparo do solo, devem ser retirados daárea. Se não foi necessária a coleta deamostras de solo para a análise no mo-mento da limpeza do terreno, então essasdevem ser retiradas após o preparo. Re-tiram-se as subamostras apenas a 20 cmde profundidade. Os detalhes da amos-tragem de solos estão descritos em Ribeiroet al. (1999).

Correção da acidez -calagem

De posse dos resultados da análise desolo, passa-se a calcular a necessidade decalcário (NC) para a área, visando elevar opH para 6,0 (pH em água). Em Minas Geraisesse cálculo pode ser realizado por meiode dois métodos:

a) neutralização do alumínio e ele-vação dos teores de cálcio e mag-nésio trocáveis;

b) saturação por bases.

O método de saturação por bases temproporcionado ótimos resultados para odesenvolvimento dos vinhedos. A calagemdeve ser realizada com antecedência míni-ma de seis meses ao plantio, logo após opreparo do solo. A quantidade de calcárioa ser usada deve ser corrigida em funçãoda superfície a ser coberta (SC) (no casoda implantação ser em área total), daprofundidade (PF) de incorporação (comsubsolagem deve-se considerar, pelomenos, 40 cm) e do poder relativo de neu-tralização (PRNT) do calcário (correção pa-ra 100%). Assim, a quantidade corrigida(QC) do calcário é dada por:

Para uma melhor distribuição do cal-cário no perfil do solo trabalhado (hori-zontal e vertical) e correção da acidez(FRÁGUAS et al., 2002ab), sugerem-se asseguintes seqüências lógicas de ativi-dades:

a) subsolagem ou aração profundacruzada;

b) distribuição uniforme do calcário;

c) gradagem superficial com grade dedisco leve ou enxada rotativa (pré-mistura calcário-solo);

d) aração profunda para incorporaçãodo calcário;

e) gradagem final para destorroa-mento e nivelamento da superfícietrabalhada. Para quantidades su-periores a 5,0 t/ha, a distribuiçãodeve ser em duas vezes, sendo ametade logo após o preparo do soloe a outra metade após a primeiragradagem superficial.

Correção da fertilidade dosolo

Após três meses de realizada a calagem,passa-se a fazer a correção da fertilidadedo solo, através dos resultados de suaanálise. Nessa etapa, faz-se a correção pa-ra fósforo (P), potássio (K) e boro (B). Asinterpretações para os níveis de P e de K,bem como as sugestões para suas cor-reções, para o estado de Minas Gerais,encontram-se em Ribeiro et al. (1999),enquanto que para o B está em Fráguas etal. (2002a). O B é muito importante para afloração e fecundação da videira e os so-los sob cerrados são deficientes nesse nu-triente. Para o B pode-se considerar o seunível de suficiência como sendo de 0,6 a1,0 mg/kg de solo (= mg/dm). Estando seunível no solo entre 0,5 e 0,2 mg/kg, a reco-mendação é de se usar entre 50 e 70 kg/hade Bórax.

Nutrição da videira

A nutrição equilibrada da videira temo objetivo de obter produção com qua-lidade para a elaboração de vinhos finos, o

que se consegue com produções maisreduzidas. Menor produção proporcionabom acúmulo de açúcares, de polifenóis evitaminas C e B1, que transferem ao vinhoexcelentes aroma, buquê e sabor. É preci-so cautela na produção para que o produtofinal alcance bom equilíbrio com álcool/extrato seco reduzido, o pH e a acidez dovinho, que favorecerão a estabilidade nacor e na conservação dele. As recomen-dações de adubações para a fase de plantio,de formação das plantas e de produçãopodem ser resumidas em:

a) nitrogênio (N): o excesso de N nasvideiras acarreta diminuição dafotossíntese, pelo efeito de som-breamento (excesso de folhagem),retarda a maturação reduzindo oteor de açúcar e dos compostos fe-nólicos, e aumenta o teor de ácidosaminados (arginina e histamina) e,portanto, a acidez do mosto dasuvas. O excesso de N, em clima comverão quente e úmido, favorece odesenvolvimento da podridão docacho, causada por Botrytis cinereae outros fungos. Estes reduzem aformação de substâncias aromá-ticas, pela degradação do linalol eoutros terpenos, com prejuízo naqualidade do vinho. Por outro lado,a deficiência do N conduz à baixaprodução de açúcar e de amino-ácidos, que resultará em vinhosmenos aromáticos e com poucobuquê (BOULTON, 1980; FREGONI,1980; HUGLIN, 1986; SCHUBERT etal., 1987; DELAS, 1993);

b) fósforo (P): embora a videira nãoseja exigente em P, este nutrientetem importância na formação dearomas, do buquê, na leveza e finezados vinhos. A deficiência de Pprovoca redução no teor de açú-cares, interferindo na relação álcool/acidez e na má-formação dos ca-racteres de qualidade já citados. Oexcesso de P conduz ao aumentona acidez do suco celular com re-flexos na qualidade final do vinho;

Detalhes dessa prática encontram-seem Ribeiro et al. (1999) e Fráguas et al.(2002ab).

QC = NC x SC/100 x PF/20 x 100/PRNT

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c) potássio (K): é um dos elementosmais extraídos do solo pelas vi-deiras, tendo grande influência noprocesso de fermentação inicial(tumultuosa), que é essencial naseletividade das leveduras e na fer-mentação malolática. Isso resulta-rá na formação do buquê e aroma,melhorando a leveza e o sabor dovinho. O excesso de K diminui aacidez do vinho (aumento do pH)por acelerar a oxidação e a sali-ficação do ácido málico, tornan-do o vinho branco de aspecto ama-relado (oxidado), o que diminui seuperíodo de conservação. Regiõesde clima mais quente têm a ten-dência de produzir vinhos menosácidos, pela maior absorção deK, aliado ao fato de maior insola-ção, associada a temperaturas maiselevadas, promover maior degra-dação do ácido málico e maioracúmulo de açúcares (BOULTON,1980; FREGONI, 1980; HUGLIN,1986; SCHUBERT et al., 1987;RYSER et al., 1989);

d) cálcio (Ca) e magnésio (Mg): par-ticipam como ativadores das en-zimas fosfatase, peptidase e ade-nosinatrifosfatase, que atuam nometabolismo glucídico e protéico,aumentando o teor de açúcar, neu-tralizando o ácido oxálico e outrosácidos orgânicos do mosto dasuvas, influenciando na produção desubstâncias aromáticas no vinho etornando-o mais apreciável (FRE-GONI, 1980);

e) micronutrientes: participam comoativadores e catalisadores do sis-tema enzimático das plantas, cominfluência direta na produção equalidade das uvas e dos vinhos.Entre eles, o B, o ferro (Fe) e o man-ganês (Mn) têm atuação marcan-te na produção de açúcar, no teoralcoólico e no extrato seco do vi-nho, favorecendo o melhor en-velhecimento e desenvolvimento

dos aromas, com melhores qua-lidades organolépticas (FREGONI,1980).

PORTA-ENXERTOSRECOMENDADOS À PRODUÇÃODE UVAS PARA ELABORAÇÃODE VINHOS DE QUALIDADE

Para o viticultor que busca a obten-ção de vinhos de qualidade, a escolha doporta-enxerto tem uma importância par-ticular em razão da sua influência diretasobre o rendimento e a qualidade da pro-dução. O volume de produção alcançada,a cultivar, a densidade de plantio, o sistemade condução, o manejo do cultivo e as con-dições de solo e clima somam-se às van-tagens alcançadas pelo porta-enxerto comdestaque para sua adaptação (POUGET;DELAS, 1989; ALVARENGA, 2001).

A escolha do porta-enxerto ideal paradeterminado vinhedo deve ser precedidade uma análise físico-química do solo, oque permitirá adequar as características dosolo ao porta-enxerto, bem como do tipode produto que se quer obter (POUGET;DELAS, 1989). Dentre as características aserem observadas destacam-se três comofundamentais:

a) profundidade do solo;

b) disponibilidade de água no solo;

c) reação química do solo (solos cal-cários ou solos ácidos).

Profundidade do soloexplorado pelas raízes

O volume de solo e a capacidade dasraízes do porta-enxerto em explorá-lo sãode suma importância para a alimentaçãomineral e hídrica da planta, bem como pa-ra uma boa sanidade e produção do vi-nhedo. Deve-se conhecer bem o solo, aprofundidade explorada pelas raízes e sehá camadas que dificultam a penetra-ção (rocha, camada compacta de argila).Desse modo, os solos podem ser clas-sificados em três categorias (POUGET;DELAS, 1989; SOUSA, 1996):

a) solos superficiais, onde as raízes

não conseguem ultrapassar a pro-fundidade de 40 cm;

b) solos medianamente profundos,com até 80 cm;

c) solos profundos, superiores a80 cm.

Disponibilidade de água nosolo

A regularidade de alimentação de águaao vinhedo, desde a brotação até o períodoque antecede a maturação e a colheita éfator essencial para a qualidade da matéria-prima a ser obtida. Em solos bem drenados,medianamente profundos ou profundos,onde a alimentação é equilibrada duran-te todo o ciclo vegetativo, sem condiçõeslimitantes como seca ou excesso de umi-dade, a qualidade é favorecida. É eviden-te que a escolha do porta-enxerto depen-de muito dessas condições particulares(POUGET; DELAS, 1989).

Reação química do solo(solos ácidos, neutros oucalcários)

Os solos vitícolas podem ser divididosem duas grandes categorias: solos nãocalcários ou solos calcários. Os solos nãocalcários distinguem-se em solos neutroscom pH entre 6,5 e 7,2 e solos ácidos compH inferior a 6,5. Abaixo de um valor depH compreendido entre 5,5 e 6,0, a aci-dez prejudica o desenvolvimento da vi-nha, e, nesse caso, os solos devem obri-gatoriamente receber, antes do plantio,correção com calcário e uma forte adubaçãoorgânica para elevar o pH e diminuir atoxidez de metais, notadamente do alumí-nio e manganês. Como na Europa, a gran-de maioria dos solos é calcário, o de-senvolvimento dos porta-enxertos é namaior parte direcionado para esse tipo desolo. Assim, são poucos os porta-enxertosadaptados às condições de pH muito ácido.Estudos preliminares realizados em Mi-nas Gerais com cultivares americanasapontam o porta-enxerto Gravesac comouma boa opção para condições de terre-no ácido, em vinhedos onde se quer limi-

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tar o vigor das plantas e a produtividade(ALVARENGA, 2001; ALVARENGA et al.,2002).

Os solos calcários, com excesso doelemento cálcio, normalmente apresentamuma baixa disponibilidade de ferro para asplantas, devido ao antagonismo dessesdois cátions pelo sítio de absorção. Dessemodo, é comum as plantas cultivadas nessemeio apresentarem deficiência em ferro,manifestado através de uma clorose muitotípica das folhas (POUGET; DELAS, 1989;SOUSA, 1996).

A maioria dos solos brasileiros, poroutro lado, é de natureza ácida, neces-sitando de porta-enxertos adaptados paraessa condição, além de uma boa correçãoatravés da calagem, visando não só oaumento do pH, como também o aumentoda disponibilidade de nutrientes para asplantas, notadamente do cálcio e fósforo

(ALVARENGA, 2001; POUGET; DELAS,1989; SOUSA, 1996).

Essas características não devem serconsideradas isoladas, mas junto a outras,num conjunto global, para a escolha domelhor porta-enxerto. A cada categoria deprofundidade de solo explorado podem-seencontrar solos ácidos, neutros ou calcá-rios. Assim, a partir das características físicasdo solo, combinadas com a adaptação dacultivar porta-enxerto, poderá ser escolhidaa melhor com maiores possibilidades deadaptação (POUGET; DELAS, 1989).

Para a produção de vinhos finos, a es-colha do porta-enxerto que vise um produ-to de qualidade, exclui a busca sistemáticade altos rendimentos. Esta restrição conduza eliminar diversos porta-enxertos quefavorecem a extração de um vigor ex-cessivo e, por conseqüência, altos ren-dimentos.

Uma classificação de porta-enxertos emfunção das suas aptidões particulares àscondições de profundidade do solo ex-plorado, do regime hídrico e da reação dosolo e vigor conferido à copa aparece noQuadro 1. As informações sintetizadasneste Quadro são resultantes de experi-mentações vitícolas executadas em di-versas regiões (ALVARENGA, 2001;NOGUEIRA, 1984; POUGET; DELAS, 1989;SOUSA, 1996). Para simplificar a decisãodo viticultor foram excluídos os porta-enxertos que apresentam excessivo vigor,retendo somente aqueles de maior empregoatualmente.

O vigor conferido à copa pelo porta-enxerto é uma característica específica decada variedade que determina, ao lado deoutros fatores, a quantidade e a qualidadeda produção. Ela é influenciada de manei-ra bastante intensa pelas características

Traviú + + + + + + + + Neutro a levemente ácido

Kober 5BB + + + + + + + Alcalino

IAC 766 + + + + + + + + Neutro a levemente ácido

Gloria de Montpellier + + + + + Neutro a alcalino

RR 101-14 + + + + + + + + a + Neutro a levemente ácido

3309 C + + + + + + Neutro a alcalino

Gravesac + + + + + + + Neutro a levemente ácido

110 R + + + + + + + + a + + Neutro a alcalino

140 Ru + + + + + + + + + + Neutro a alcalino

1103 P + + + + + + + + + + + + a + + Neutro a levemente ácido

S04 + + + + + + + + + a + + + Neutro a alcalino

420 A + + + + + + + Alcalino

196-17 Cl + + + + + + Neutro a levemente ácido

QUADRO 1 - Principais características das variedades de porta-enxertos

Cultivar(porta-enxerto)

Resistênciaà seca

Tolerância aoexcesso de

umidade no solo

Resistência anematóides

(Meloidogyne)

Vigor conferido ao

enxertoTipo de solo

NOTA: + + + - Elevada; + + - Média; + - Fraca.

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físicas e químicas do solo. A classificaçãodas variedades de porta-enxertos em trêscategorias, tal como no Quadro 1, não écom base numa determinação objetiva eprecisa do vigor através de teste rigoroso,mas é resultado de estudos experimentaise de observações do comportamento dosdiferentes porta-enxertos. O limite entre astrês categorias propostas (fraca, média eelevada) não é tão preciso em virtude dainteração complexa que existe entre a copa,o porta-enxerto e o meio. Uma mesmavariedade pode figurar em duas categoriasvizinhas. O vigor conferido é então maiorem solos mais férteis e menor em solospobres (ALVARENGA, 2001; POUGET;DELAS, 1989; SOUSA, 1996).

Como o objetivo da produção de uvapara vinhos finos é obter qualidade, a es-colha do porta-enxerto para solos férteisdeve dar preferência a cultivares maisfracas. Inversamente, para solos fracos,deve-se recorrer a variedades vigorosaspara contrabalançar a falta de fertilidade.Mesma orientação deve ser dada no casode vinhedos instalados em regiões ondese pretende praticar a dupla poda (doisciclos anuais de vegetação e um de pro-dução), com vistas à alteração da época deprodução. Nesse caso, deve-se orientarpara a escolha de porta-enxertos com vigormédio a elevado, buscando imprimir bomvigor vegetativo no segundo ciclo, sem oqual o dossel vegetal não terá área foliarsuficiente para atender às necessidades deassimilação de carbono necessárias àmaturação dos frutos.

CULTIVARES E CLONES DEVIDEIRA VOLTADOS ÀPRODUÇÃO DE UVAS PARAVINHOS FINOS

Cultivares de videira paraprodução de vinhos finos

A dispersão dos centros de origemecológica ou zonas de refúgio da videiraatravés do globo terrestre está na origemda enorme variabilidade genética destaplanta. Apenas para a espécie Vitis vinifera

existem milhares de variedades cataloga-das (HUGLIN,1986). Evidentemente, se forconsiderada a produção de vinhos finosem todas as regiões vitícolas da Terra, oelenco de variedades exploradas co-mercialmente reduz-se a algumas centenasdelas. Os países do continente europeu,principalmente França, Itália, Portugal eEspanha, destacam-se por apresentar umgama considerável de variedades au-tóctonas. A maioria dessas variedades écultivada desde muito tempo e encontram-se bastante associadas às característicasdos vinhos de cada região, contribuindo,ao lado do clima, solo e fatores tec-nológicos, para formação do conceito deDenominação de Origem Controlada quevaloriza a tipicidade dos vinhos.

Por outro lado, a maioria dos paísesvitícolas do novo mundo, no qual seincluem Austrália, Nova Zelândia, Chile,Argentina, EUA, Brasil, entre outros,explora variedades introduzidas a partir dospaíses europeus e que apresentaram boaadaptação às condições locais permitindoa elaboração de vinhos de grande qua-lidade. A busca por produtos autênticos ede tipicidade local com alto valor é que temlevado vários desses países a identificaremaquelas variedades que melhor expressemos vinhos de suas regiões. É assim que,atualmente, e citando apenas alguns exem-plos, como Syrah da Austrália, Sauvignonblanc da Nova Zelândia, Malbec daArgentina, Carmenère do Chile são vinhosque possuem grande valor de mercado eestão associados à imagem de marca devárias regiões vitícolas desses países.

Nesse sentido, o conceito de “plas-ticidade” das variedades, ou seja, a fa-culdade de adaptação a diferentes re-

giões ecológicas é que permite que umadeterminada variedade de videira pos-sa ser cultivada em regiões de clima e so-lo bastante díspares, originando vinhosde qualidade. É o caso das variedadesCabernet sauvignon, Merlot, Syrah eChardonnay, ditas internacionais, que su-postamente apresentariam como interesse,além da notoriedade dos vinhos sob o pla-no comercial, a regularidade de adaptaçãoexpressa pela estabilidade do teor de açú-cares, a resistência à seca e, em segundaescala, a resistência à podridão e ao de-savinho. Por outro lado, cultivares como a‘Pinot noir’, originária de zonas temperadasfrancesas, possuem grande dificuldade deadaptação em outros climas, perma-necendo, assim, em uma zona de produçãobastante restrita.

Mesmo possuindo boa capacidadeadaptativa, uma mesma variedade de vi-deira dará certamente produtos extre-mamente diferentes de acordo com a regiãoonde ela se encontra cultivada. A título deexemplo, o Quadro 2 mostra o grau de ma-turação expresso em teor de açúcares dacultivar Syrah em diferentes regiões mun-diais, segundo os dados apresentadosoriginalmente por Huglin (1986), em Col-mar, França, García de Luján et al. (1990),em Jerez, na Espanha, Ginestar et al. (1998),em Nuriootpa, na Austrália, e Amorim et al.(2005) e Souza et al. (2002), no Brasil.

Esses dados devem ser analisados comparcimônia, pois exprimem apenas aconcentração de açúcares das bagas e nãofazem menção a outros componentesimportantes da maturação como a acidez,taninos e antocianinas. Há também o efei-to safra que pode induzir a variações con-sideráveis da maturação. Entretanto, pode-

QUADRO 2 - Teor de açúcares das bagas da cultivar Syrah em diferentes regiões de cultivo

Açúcares 147 236 228 212 151

Teor(g/L)

Colmar Jerez Nuriootpa CaldasTrês

Corações

Região

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se observar que nas regiões mais frias, oucom verão chuvoso, como Colmar, na Fran-ça, e Caldas, em Minas Gerais, o teor deaçúcares é nitidamente mais baixo, e as uvasoriginadas nessas regiões dificilmente terãocondições de permitir que o vinho expresseo potencial qualitativo da variedade, poisoutros constituintes da maturação da uva,tais como a acidez e polifenóis totais,certamente serão afetados negativamen-te. Conclui-se que nessas regiões não sedeve indicar o cultivo dessa variedade,visando à obtenção de vinhos tintos en-corpados, a não ser que técnicas de mane-jo diferenciadas propiciem melhores con-dições para o amadurecimento das uvas. Épor esta razão, aliás, que Colmar, na regiãoda Alsácia, especializou-se na produção devinhos brancos, e Caldas, em Minas Gerais,é tradicional produtora de vinhos comunselaborados a partir de uvas da espécie Vitislabrusca.

Por outro lado, em Jerez, Nuriootpa eTrês Corações, verifica-se que os teoresde açúcares foram mais elevados, tra-duzindo os efeitos favoráveis do meio àmaturação da uva. No caso específico dacomparação entre as regiões brasileiras, háque se considerar que a colheita de Caldasfoi realizada no período chuvoso (janeiro),enquanto que em Três Corações a vindimafoi feita em julho, época de seca. Nessacomparação seria importante analisar tam-bém a acidez total, pois uvas com mui-to potencial alcoólico (como seria o casode Jerez de la Frontera e Nuriootpa) e aci-dez baixa podem originar vinhos dese-quilibrados e de qualidade inferior.

Nesse contexto e de forma geral, tem-se que normalmente regiões mais frias oude verão chuvoso são mais propícias aocultivo de cultivares brancas para ela-boração de vinhos brancos tranqüilos ouespumantes ou, no máximo, de uvas tintasprecoces, que neste último caso seriamempregadas para elaboração de vinhosrosés ou tintos jovens.

Por outro lado, regiões quentes esecas, ou ainda aquelas onde é possívelalterar o período de colheita através dapoda, prestam-se ao cultivo de variedades

tintas mais tardias que poderão dar origema vinhos mais alcoólicos e encorpados.

Uma exceção a esta regra tem sidoexplorada com bastante sucesso em SãoJoaquim, Santa Catarina, onde as tem-peraturas ambientais mais baixas asso-ciadas à poda tardia induzem a um ciclobastante longo e as uvas da ‘Cabernet sau-vignon’ (cultivar tardia) têm sido colhidasem abril, quando as condições climáticassão favoráveis à maturação, originan-do vinhos encorpados com grande in-tensidade de cor e potencial para enve-lhecimento.

A escolha por determinada cultivar nomomento de implantação de um vinhedodeve-se orientar, a priori, pela experiêncialocal ou pelos dados de experimentaçõesquanto ao comportamento produtivo equalitativo das variedades.

Em Minas Gerais, os estudos de adap-tação de cultivares viníferas para produ-ção de vinhos finos são bastante recentese ainda precisam ser enriquecidos poranálises de comportamento em diferentesregiões além da validação do potencialenológico em ensaios de microvinificação.Dos resultados das avaliações feitas emCaldas por Souza et al. (2002) para um gruporepresentativo de cultivares de videiraseuropéias, em regime de poda única e co-lheita no verão, pode-se concluir que asmais produtivas foram as variedades Ca-bernet sauvignon e Malbec, para as tintas,e Sémillon, Riesling e Trebbiano, para asbrancas. Por outro lado, para o regime depoda dupla e produção no inverno, técnicarecomendada para regiões mais quentes,os resultados preliminares têm apontado acultivar Syrah como bastante promissora(AMORIM et al., 2005).

Finalmente, um outro aspecto a serconsiderado na escolha das cultivares paraelaboração de vinhos finos, em especialpara as regiões de verão chuvoso, é aresistência às doenças fúngicas, parti-cularmente ao míldio e às podridões.Cultivares sensíveis ao míldio, além desofrerem o risco de ter a colheita perdida,se o ataque ocorrer nas inflorescências,dificilmente alcançarão um bom estado de

maturação sob ataque severo nas folhas,devido ao dano causado à atividade fo-tossintética. Já as podridões dos cachossão particularmente danosas à produçãode vinhos de qualidade, afetam tanto aprodução, pois induzem o viticultor a co-lheitas prematuras com uvas ainda verdes,quanto diretamente a qualidade do vinho,quando bagas atacadas estiverem pre-sentes no mosto.

O Quadro 3 resume algumas carac-terísticas de um grupo de cultivares de Vitisvinifera de origem francesa e de empregocomum em diversas regiões, que pode serútil ao viticultor no momento da decisãode plantio.

Emprego de clonesselecionados para produçãode vinhos finos

O emprego de clones selecionados emviticultura já é bastante comum na maiorparte dos países vitícolas e data dos anos60, notadamente na França e Itália, onde oprocesso de seleção orienta-se por duaslinhas específicas, uma sanitária, que bus-ca isenção das principais viroses que ata-cam a videira (GRENAN et al., 1998;BOUBALS, 1996; WALTER, 1996, 1997ab)e outra genética, com base na origem po-liclonal e sensibilidade da espécie à ocor-rência de mutações somáticas espontâ-neas, orientando-se pelas diferenças namorfologia e potencial produtivo das plan-tas (BOIDRON, 2000; HUGLIN, 1986;AUDEGUIN et al., 1998, 1999). Inicialmente,a seleção clonal buscou clones mais pro-dutivos e sadios, mas, numa segunda eta-pa, orientou-se preferencialmente para aseleção de clones qualitativos que pudes-sem contribuir para a qualidade dos vinhos.Atualmente, já existe um gama importan-te de clones das principais cultivares devideira que atendem às diferentes exigên-cias de produção, sendo, no caso específicoda seleção clonal francesa, separados emgrupos qualitativos (A), medianos (B) eprodutivos (C) (ENTAV, 1995).

O conceito de qualidade de um clone éfundamentado, na maioria das vezes, em:

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a) baixa produtividade (derivada ou deuma baixa fertilidade das gemas oudo pequeno tamanho dos cachos)com conseqüente aumento da qua-lidade de maturação das uvas;

b) tamanho das bagas, em que as me-nores e com melhor relação película/polpa são favoráveis à qualidade dovinho;

c) capacidade genética de um determi-nado clone em acumular açúcares.

A identificação de clones com expres-siva variabilidade genética, que permitama distinção da qualidade da produção,

somente é possível, na maioria dos casos,nas zonas de origem de uma determinadacultivar, onde o cultivo por centenas deanos levou ao surgimento de mutantes. NoBrasil, como a maior parte das cultivaresde Vitis vinifera teve introdução relativa-mente recente, ainda não existem clonesselecionados das principais variedades deuva empregadas para elaboração de vi-nhos finos. Assim, ao optar por clones me-lhorados e qualitativos, os viticultores bra-sileiros utilizam normalmente aqueles se-lecionados nos países de origem da va-riedade a ser cultivada.

Por outro lado, é importante lembrar

que os clones de videira são selecionadose validados dentro de uma determinadaregião de cultivo, e que ao serem trans-portados para regiões com clima diferente,suas respostas agronômicas não são,necessariamente, as mesmas verificadas noseu Centro de origem. Por exemplo, clonesqualitativos, caracterizados por apresentarbaixa fertilidade das gemas e pequenotamanho das bagas, quando cultivados emregiões mais quentes do que aquelas desua origem, normalmente serão maisprodutivos e apresentarão bagas maiores,perdendo assim o seu interesse. Dessaforma, a noção de clone qualitativo deve

QUADRO 3 - Características genéticas e agronômicas de um grupo de cultivares de videira

Alicante boushet T Mediana Alto Média Elevada Elevada Vinhos com muita cor para corte

Cabernet franc T Mediana Médio Alta Média Média Vinhos aromáticos, jovens,

frutados

Cabernet sauvignon T Tardia Alto Alta Média Média Vinhos tânicos encorpados

Carmenère T Mediana Médio Baixa Média Média Vinhos aromáticos, tânicos

Chardonnay B Precoce Baixo/Médio Baixa Elevada Elevada Vinhos elegantes e espumantes

Gamay T Precoce Baixo/Médio Média Média Elevada Vinhos frutados e jovens

Gewuztraminer B Precoce Baixo/Médio Baixa Média Elevada Vinhos aromáticos

Malbec T Mediana Médio/Alto Média Média Média Vinhos de cor intensa, tânicos

Merlot T Mediana Médio Alta Elevada Média Vinhos aveludados de cor intensa

Petit verdot T Tardia Médio Baixa Média Média Vinhos de cor intensa tânicos

Pinot noir T Precoce Baixo/Médio Baixa/Média Elevada Elevada Vinhos elegantes, espumantes

Riesling renano B Mediana Médio Baixa Média Elevada Vinhos elegantes e aromáticos

Sauvignon B Mediana Elevado Elevada Média Elevada Vinhos elegantes estruturados

Semillon B Mediana Médio Elevada Média Elevada Vinhos neutros de baixa acidez

Syrah T Mediana Elevado Elevada Média Elevada Vinhos complexos e aromáticos

Tannat T Tardia Médio/Elevado Elevada Média Média Vinhos encorpados e tânicos

Tempranillo T Mediana Elevado Elevada Elevada Média Vinhos de cor intensa e

encorpados

Ugni blanc B Tardia Elevado Elevada Média Média Vinhos neutros e destilados

Viognier B Mediana Médio/Elevado Média Média Baixa Vinhos aromáticos e complexos

Variedade Cor Precocidade Vigor ProduçãoSensibilidade

ao míldioSensibilidade

à podridão Vocação

NOTA: T - Tinto; B - Branco.

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24 Vinhos finos: rumo à qualidade

ser sempre colocada em uma ótica depotencial qualitativo e, no momento daimplantação de um vinhedo, encarada comouma “sintonia fina”, quando outros cri-térios de importância maior, como escolhacorreta da cultivar, clima e solo já estiveremequacionados. Não obstante, a garantiasanitária oferecida por um clone sele-cionado é imperativa no momento daescolha da muda e instalação do vinhedo,garantindo longevidade, produção equalidade.

SISTEMAS DE CONDUÇÃO EPODA PARA PRODUÇÃO DEVINHOS FINOS

A videira é uma planta sarmentosa, dehábito trepador e que se adapta às maisdiversas formas de condução, desde ossistemas livres de suporte (Gobelet), pas-sando pelos rudimentares, como o en-forcado, até os sistemas mais modernoscomo a lira, tendo sido relatados mais de50 tipos diferentes por Carbonneau eCargnello (2003). A escolha do melhor sis-tema de condução no momento de ins-talação de um vinhedo deve-se orientar pordiversos aspectos, tais como, topografia efertilidade do solo, vigor, clima, possi-bilidade de mecanização, destino da co-lheita e custo de instalação (REGINA et al.,1998).

Na ótica da produção de vinhos finos,essa questão tem sido exaustivamentedebatida nos países europeus e bons ele-mentos de análise podem ser encontradosnos diversos trabalhos executados porCarbonneau (1982, 1989, 1991) e Car-bonneau e Cargnello (2003). Estes autoresconsideram que o sistema de condução davideira deve ser analisado dentro doconjunto de variáveis, às quais estãosubmetidas a instalação do vinhedo, taiscomo, densidade do plantio, orientação ealtura das linhas de plantio, altura dotronco, poda, carga de gemas e orientaçãoda folhagem. Segundo Carbonneau (1991),este conjunto de fatores deve privilegiar aSuperfície Foliar Exposta (SFE), como formade assegurar, ao mesmo tempo, maior in-

terceptação e distribuição dos raios sola-res, com incidência direta no aumento daatividade fotossintética das folhas e con-seqüente aumento no acúmulo de açúcarese outros constituintes das bagas.

Dentre os vários sistemas de conduçãoexistentes, normalmente a lira (dois planosde vegetação oblíquos), a espaldeira e alatada, desde que não sejam muito densas(com camadas de folhagem sobrepostas emrazão do excesso de vigor), apresentambons índices de SFE.

No Brasil, os sistemas de conduçãomais empregados são a latada, para as uvaspara consumo in natura nas regiões tro-picais e uvas comuns para vinhos e sucosno Sul; a espaldeira para vinhos finos noSul, uvas para consumo in natura e uvaspara vinhos comuns no Sudeste. Recen-temente, alguns vinhedos para produçãode vinhos finos têm sido implantados nosistema de lira aberta no Sul, e alguns emGDC no Nordeste. Uma revisão sucintasobre as características de cada um dessessistemas pode ser encontrada no trabalhode Regina et al. (1998). A escolha por umou outro sistema deve-se orientar pelaexperiência regional ou, na sua ausência,pela experimentação em pequenas parcelasantes de definir qual o mais apropriado paracada região.

Alguns parâmetros, entretanto, podemser levados em conta para auxiliar naescolha de um ou outro sistema, visando àprodução de uva para vinhos finos. Emregiões de verão chuvoso, com tempe-raturas mais baixas, e sem possibilidade dealteração do ciclo da videira pela poda,como é o caso das zonas de altitude do suldo estado de Minas Gerais, deve-se darpreferência por sistemas onde o plano devegetação seja vertical e os cachos bemexpostos. Assim, aumenta-se a aeração, oque permite maior insolação direta sobreas folhas e cachos, evitando a manutençãode um microclima favorável à disseminaçãode fungos das folhas e cachos. Os sistemasem espaldeira e lira prestam-se bem a essepropósito, com vantagem para o primeiro,por apresentar custo de instalação mais

baixo e maior facilidade na operação dostratos culturais de manutenção das vi-deiras.

Em regiões mais quentes e secas, co-mo aquelas comuns no Norte de MinasGerais, deve-se cuidar para que a exposiçãoexcessiva dos cachos aos raios solares nãoleve a um aumento exagerado da tem-peratura das bagas, o que poderá acarretarem forte degradação dos ácidos orgânicos(TODA, 1991) e de precursores de aroma,originando vinhos com acidez muito baixa,desequilibrados e sem fineza aromática.Nesse sentido, sistemas de condução quepropiciem alguma proteção dos cachos,como o GDC e mesmo a latada, parecem sermais indicados, com maiores vantagenspara o primeiro por apresentar custo deinstalação mais baixo e facilitar o manejodas videiras.

Poucas informações experimentais es-tão disponíveis para auxiliar a escolha pelomelhor sistema de condução de vinhedosvoltados à produção de vinhos finos pa-ra as diferentes regiões de Minas Gerais.Ainda que de forma empírica e sem com-parações com outros sistemas, tem-seobservado que a espaldeira adapta-semuito bem à condução da dupla poda para‘Syrah’ em Três Corações (AMORIM etal., 2005) e ao sistema de poda única emCaldas (SOUZA et al., 2002).

Por outro lado, no Vale do Rio Paracatu,região noroeste de Minas Gerais, e em Pi-rapora, Vale do Rio São Francisco, os siste-mas de latada, espaldeira, lira e GDC estãosendo comparados para as cultivares Syrahe Sauvignon como forma de dar subsí-dios a novos plantios. As Figuras de 1 a 3ilustram os sistemas testados em João Pi-nheiro para a cultivar Syrah.

Alguns elementos básicos de compa-ração entre diferentes sistemas de con-dução são resumidos no Quadro 4.

PODA DA VIDEIRA VOLTADA ÀPRODUÇÃO DE VINHOS FINOS

Na maior parte das regiões onde écultivada, a videira apresenta um ciclo devegetação e de produção e um de repouso.

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25Vinhos finos: rumo à qualidade

Ao fim deste e antes de iniciar a brotação,a planta deve ser sistematicamente sub-metida a diferentes tipos de poda, pois suaprodução só ocorre em ramos do ano. Assim,a poda atua como um regulador entre avegetação e a frutificação, equilibrando-aao longo da vida útil da videira.

De forma geral, deve-se entender comopoda da videira o conjunto de operações

Figura 2 - Videira conduzida em GDC

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que vai desde a formação da planta até aspodas de frutificação e rejuvenescimento.Dividi-la ainda nas intervenções execu-tadas no inverno (poda seca) e primavera/verão (poda verde).

Poda de formação

Uma vez definido o sistema de con-dução a ser adotado, a poda de formação

obedecerá aos imperativos deste sistema,com relação à altura do tronco, número ecomprimento dos braços. O ritmo deformação dessas estruturas está dire-tamente ligado às condições de clima daregião de cultivo e vigor das plantas, mas,na ótica da produção de vinhos finos, deve-se evitar que a formação seja feita muitorápida, sem possibilitar uma boa co-lonização do solo pelo sistema radicular damuda, sem o que a produção e a qualidadedas primeiras safras serão diretamenteafetadas. Nesse sentido, é preferível perderum ano rebaixando a muda, o que con-tribuirá para que a longevidade do vinhedoe a qualidade da produção sejam ga-rantidas (HIDALGO, 1985; HUGLIN, 1986).

A altura do tronco também é outroaspecto importante definido durante a po-da de formação, notadamente para ossistemas de condução em espaldeira e lira.Em regiões de verão chuvoso, sem pos-sibilidade de escalonamento da produção,deve-se evitar a formação de troncos muitobaixos, para que a umidade do solo e res-pingos de chuva não ocasionem maioresataques de podridões aos cachos.

Um outro aspecto importante ligado àpoda de formação é a estrutura dos braçosdas plantas. No sistema de cordão espo-ronado, os braços são mantidos fixos e osesporões de produção distribuídos sobreeles. Já para o sistema tipo guyot, os bra-ços não são permanentes e as varas deprodução são renovadas anualmente. Paraas condições de Minas Gerais, tanto para aregião Sul como para a região Norte, osistema de cordão esporonado tem-semostrado mais vantajoso, pois além de pos-sibilitar o acúmulo de reservas nas estru-turas dos braços (importante para o iníciodo período de vegetação), as feridas deixa-das pela poda de inverno são bem menoresque no sistema guyot. Por outro lado, nascondições climáticas de Minas Gerais, a fer-tilidade das gemas da base para a maiorparte das cultivares viníferas parece ser su-ficientemente boa para permitir a poda curta(SOUZA et al., 2002).

Finalmente, deve-se atentar para que,em regiões onde não ocorre frio de inverno

Figura 1 - Videira conduzida em espaldeira

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26 Vinhos finos: rumo à qualidade

e a brotação primaveril é irregular, os bra-ços sejam formados gradativamente, emdois ou até três anos, para que não ocorramfalhas na emissão dos esporões ao longodeles. Para espaçamentos entre plantasdentro da linha de 1,00 a 1,50 m, recomenda-se a formação de dois braços laterais comalongamentos anuais de 25 a 30 cm.

Poda de produção

A poda de produção é realizada com oobjetivo de suprimir os ramos que já pro-duziram na safra anterior e forçar a emissão

de novas brotações que se alojarão à pro-dução do novo ciclo. Na maior parte dasregiões vitícolas mundiais ela é realizadaanualmente e ao fim do inverno, para que anova brotação coincida com o aumento dastemperaturas ambientais verificadas noinício da primavera.

Em Minas Gerais, assim como na maioriadas regiões de viticultura tropical, essa po-da pode ser realizada em várias épocas emais de uma vez por ano na mesma planta,de acordo com a conveniência de desviaro ciclo de produção da videira. No caso da

produção de vinhos finos, essa orienta-ção é dada de maneira que o período dacolheita coincida com os meses mais secosdo ano. Dessa forma, pode-se esquemati-zar a poda de produção da videira em MinasGerais em pelo menos duas formas:

a) poda única: nas regiões mais friasdo Sul do Estado, onde há restriçõestérmicas à obtenção de mais de umciclo anual para a videira, a podadeve ser efetuada no mês de agostoou, mais tardar, no início de setem-bro. A brotação ocorrerá em setem-bro, a florada em outubro e o períodode maturação iniciará em dezembropara colheita entre os meses de ja-neiro e fevereiro. Essa poda pode sercurta, com duas gemas por esporãoe com, aproximadamente, 22 a 26gemas por planta, o que ocasionaráuma carga de 66 a 78 mil gemas parauma densidade de plantio de 3 milplantas por hectare. Esse sistema po-de ser preconizado para produçãode uvas finas, para produção de vi-nhos brancos e tintos jovens emcolheita de verão;

b) dupla poda: em regiões mais quen-tes, onde as temperaturas médiasambientais sejam superiores a 10°C,a videira, dependendo da cultivar,pode vegetar praticamente o anotodo, permitindo o escalonamentoda produção para a época do anoque mais convenha ao viticultor.Esse princípio já é explorado emvárias regiões do País, com muitosucesso, principalmente para a pro-dução de uvas para consumo innatura. No caso dos vinhos finos,ele é mais recente. Miolo (2003) re-lata os resultados obtidos para Pe-trolina, destacando que os vinhosde melhor qualidade são aqueleselaborados a partir das uvas co-lhidas entre junho e julho.

A EPAMIG iniciou estudos da via-bilidade da dupla poda em Minas Geraisem 2001, no município de Três Corações(AMORIM et al., 2005), e tem demonstrado

Figura 3 - Videira conduzida em lira

QUADRO 4 - Características gerais de diferentes sistemas de condução para a videira

(1) A superfície foliar exposta nesse sistema é muito variável de acordo com a espessura da

folhagem. Deve-se evitar a sobreposição de camadas pelo vigor excessivo das plantas.

Espaldeira 1 plano vertical Média Médio Baixa Zonas

temperadas

Lira 2 planos oblíquos Elevada Alto Alta Zonas

temperadas

Latada Horizontal (1)Média/Elevada Alto Alta Zonas tropicais

GDC Vertical prostrado Baixa Baixo Baixa Zonas tropicais

Orientação davegetação

Superfície FoliarExposta (SFE)

Custo deinstalação

Dificuldade deoperações

IndicaçãoSistema decondução

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27Vinhos finos: rumo à qualidade

bons resultados para cultivar Syrah. Aexecução dessa poda consiste em duasetapas, uma de formação dos ramos pro-dutivos e outra de produção propriamentedita. A poda de formação dos ramos éexecutada em meados de agosto com podacurta (duas gemas), seguida da aplicaçãode cianamida hidrogenada (Dormex®) a5% do produto comercial, visando unifor-mizar a brotação. As inflorescências surgi-das nas brotações podem ser eliminadasou, se deixadas, a produção colhida noverão poderá ser utilizada para elaboraçãode um vinho tinto leve ou, eventualmente,um vinho rosé. A partir do mês de janeiro,quando os sarmentos já estão lignificados(mas ainda enfolhados) é realizada a podade produção dos ramos. Esta poda tambémé curta e seguida da aplicação de Dormex®a 6%, imediatamente após a poda. Aoperação da poda pode ser facilitada pelaprévia remoção das folhas. A carga de ge-mas pode ser a mesma para as videirasconduzidas em ciclo único, ou seja, em tor-no de 66 a 78 mil gemas por hectare. Nessesistema, as videiras brotarão por volta de10 a 12 dias após a poda, a florada ocorreno final de fevereiro, o fechamento do cachono final de março, a maturação inicia-se emmeados a final de abril, para colheita emfinal de junho a início de julho (AMORIMet al., 2005). Especial atenção deve ser dadaao controle das enfermidades fúngicas noinício do ciclo, pois o mesmo ocorre sobcondições de altas temperaturas e pre-cipitação pluviométrica. Após a colheita,as plantas devem repousar em torno de 30dias, a partir dos quais inicia-se um novociclo de poda de formação dos ramos.

Poda verde

Entende-se por poda verde da videiratodas as operações realizadas na primave-ra e verão com vistas à formação e aopreparo da produção, tais como, desponte,desfolha, raleio dos cachos, desbrota, etc.

Na ótica da produção dos vinhos fi-nos, especial atenção deve ser dada às se-guintes operações:

a) desponte: consiste na supressão da

extremidade dos ramos da videi-ra, visando eliminar a competiçãopor fotoassimilados entre os ca-chos e a região de crescimento. Elefavorece o vingamento e o desen-volvimento dos frutos, a qualidadeda uva, por evitar sombreamentoexcessivo do dossel vegetal, e a in-festação por doenças fúngicas, emespecial o míldio, nas folhas maisjovens e tenras. Na prática, o des-ponte é efetuado quando os ramosultrapassam o terceiro fio de arameda espaldeira ou latada, ou seja,quando os ramos ultrapassam ocomprimento de 1,20 a 1,50 m. Ou-tro critério é deixar um mínimo dedez folhas após o último cacho(TODA, 1991). Com relação à época,o mais oportuno é iniciar o desponteno período que antecede a floraçãoou, mais tardar, durante esta. Emplantas muito vigorosas ele deveser repetido várias vezes durante ociclo;

b) desfolha: consiste na eliminação doexcesso de folhas próximas à zonade produção dos cachos, visandomelhor aeração e penetração dosraios solares, o que favorece a ma-turação da uva e reduz a incidên-cia de podridão nos cachos. A des-folha não deve ser executada preco-cemente e nem ser muito excessiva,pois é sabido que as folhas próxi-mas aos cachos mantêm atividadefotossintética importante para oacúmulo de açúcares nas bagas,favorecendo o rendimento e a qua-lidade da colheita. De forma geral,pode-se recomendar que a desfolhaseja feita somente ao redor da zonados cachos e em torno de três se-manas antes da colheita (TODA,1991);

c) raleio dos cachos: o raleio dos ca-chos tem por objetivo eliminar oexcesso de produção, o que fa-vorece a qualidade, e reduzir a he-terogeneidade de maturação das

bagas em situações onde a bro-tação da videira não é regular.

Para o sistema de condução em es-paldeira, com poda curta e densidade deplantio de, aproximadamente, 3 mil plan-tas por hectare, pode-se esperar uma pro-dutividade variável de 9 a 12 toneladas porhectare, o que corresponde a uma produ-ção de 3 a 4 kg/pl, ou seja, 20 a 26 cachospor planta, se considerarmos um pesomédio de até 150 gramas por cacho.Produções muito superiores a esta devemser eliminadas, sem o que as uvas terãodificuldade em atingir um bom estado dematuração. O período compreendido entrevingamento das bagas e fechamento doscachos parece ser o mais indicado pararealização dessa operação (GALET, 1993).

MANEJO DA IRRIGAÇÃO PARAPRODUÇÃO DE VINHOS DEQUALIDADE

O sucesso na produção de vinhos dequalidade em vinhedos irrigados dependedo equilíbrio ideal entre o desenvolvimentovegetativo e reprodutivo, uma vez que oexcesso de vigor dos ramos, causado poruma irrigação excessiva, pode ter um im-pacto negativo sobre o desenvolvimentoe a composição da uva. Um elevado vigorvegetativo aumenta a competição porfotoassimilados entre frutos e ramos, alte-ra o microclima na região dos cachos com-prometendo a síntese de compostos fe-nólicos, reduz a fertilidade das gemas edificulta os tratamentos fitossanitários(JACKSON; LOMBARD, 1993).

Colheitas com alta qualidade sãoobtidas nos vinhedos submetidos às con-dições hídricas subótimas, uma vez que odéficit hídrico durante certos estádios fe-nológicos limita o crescimento vegetati-vo e beneficia a composição das uvas(MCCARTHY, 1997). Com base nos co-nhecimentos obtidos em relação à respostada videira ao déficit hídrico, foram desen-volvidas, recentemente, duas estratégiasde irrigação para manipular o crescimen-to vegetativo e reprodutivo da videira:

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28 Vinhos finos: rumo à qualidade

irrigação com déficit hídrico controlado(RDI) e irrigação parcial das raízes (PRD).

Irrigação com déficit hídricocontrolado (RDI)

A irrigação com déficit hídrico con-trolado foi inicialmente desenvolvida parapessegueiros e ameixeiras e consiste naimposição de estresse hídrico às plantasatravés da redução, em determinados pe-ríodos fenológicos, da quantidade de águaaplicada na irrigação. No caso específicoda videira, a redução ou corte da água éfeito após o pegamento dos frutos, com afinalidade de controlar o crescimento dosramos e reduzir o tamanho das bagas. Aredução no tamanho das bagas deve-se,principalmente, à restrição da expansãocelular, não tendo impacto sobre o núme-

ro de células (OJEDA et al., 2001). A menorrazão entre película e polpa favorece oacúmulo de antocianinas, polifenóis earomas, além de proporcionar cachos maissoltos, aerados e sadios, sendo fator de-terminante na qualidade da uva, prin-cipalmente das variedades tintas (WIL-LIAMS; MATHEWS, 1990; DRY et al.,2001; DELOIRE et al., 2004).

No Quadro 5, encontram-se os prin-cipais efeitos do estado hídrico da videi-ra de acordo com Deloire et al. (2004),avaliado em função do potencial hídricode base (

b), medido antes do amanhecer

com auxílio de uma câmera de pressão(SCHOLANDER et al., 1965). De modogeral, valores de

b superiores (menos

negativos) a -0,2 MPa, mantidos duran-te todo o ciclo de produção, induzem a um

vigor excessivo dos ramos, sendo desfa-vorável à produção de vinhos de quali-dade. Vinhedos com

b entre -0,2 e -0,4 MPa

encontram-se sob estresse hídrico mo-derado, cujo benefício sobre a qualidadeda produção depende da fase em que ocor-re. No RDI, é necessário um monitoramen-to rigoroso da umidade do solo para evitara ocorrência de estresse hídrico severo (

b

inferior a -0,6 MPa) durante a imposição dodéficit hídrico. Condições de forte estres-se hídrico, durante o período de matura-ção dos frutos, reduzem fortemente a capa-cidade fotossintética da videira, afetandoa síntese e translocação de fotoassimiladosdas folhas para os cachos, o que compro-mete também a síntese de compostos fe-nólicos (WANG et al., 2003; SOUZA et al.,2005ab; DELOIRE et al., 2004).

QUADRO 5 - Efeitos fisiológicos e morfológicos do estado hídrico da videira em diferentes estádios fenológicos

Potencial hídricode base

0 a -0,2 MPa

0 a -0,2 MPa

-0,2 a -0,4 MPa

-0,4 a -0,6 MPa

-0,4 a -0,6 MPa

<-0,6 MPa

Vigor excessivo; competição entre ramos e cachos;

diluição dos componentes das bagas

Crescimento normal

Vigor controlado; redução no crescimento; bagas pe-

quenas, aumento da razão película/polpa

Redução e/ou retenção do crescimento; desequilíbrio

entre parte aérea produção; bagas pequenas; possível

redução na síntese de taninos e antocianinas

Redução e/ou retenção do crescimento; redução na

fotossíntese; amarelecimento das folhas basais, re-

dução no acúmulo de acúcares e aumento no Brix; ba-

gas pequenas; estímulo da síntese de antocianinas;

maturação lenta; concentração de metabólitos

Retenção do crescimento; amarelecimento e quedas

das folhas basais; forte redução da fotossíntese; bagas

pequenas; redução no acúmulo de açúcares, redução

da síntese de antocianinas

Brotação à maturação

Brotação à floração

Floração ao pintor

Floração ao pintor

Pintor à colheita

Pintor à colheita

Nulo a moderado

Nulo a moderado

Moderado

Moderado a forte

Moderado a forte

Forte a muito forte

Desfavorável

Favorável

Favorável

Desfavorável

Favorável

Desfavorável

ComentáriosEfeitos morfológicos e

fisiológicosRestrição hídricaEstádio fenológico

FONTE: Deloire et al. (2004).

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29Vinhos finos: rumo à qualidade

O elevado custo dos equipamentos usa-dos para medir a umidade do solo e as difi-culdades para evitar a ocorrência de déficithídrico severo, associados às perdas naprodução, devido à redução do tamanho dasbagas, são considerados as principais li-mitações do uso do RDI na vitivinicultura.Entretanto, a redução na produção pode serevitada ou minimizada através do aumen-to da carga deixada na poda mínima, ou ain-da ser compensada pela melhoria na qualidadeda uva, favorecendo a obtenção de melhorespreços no mercado dos vinhos produzidos(DRY et al., 2001).

Irrigação parcial das raízes(PRD)

A irrigação parcial das raízes (PRD),derivado do inglês partial rootzonedrying, manejo de irrigação originalmentedesenvolvido na Austrália, consiste emirrigar apenas metade do sistema radicu-lar da planta, permanecendo a outra meta-de em contato com o solo seco. Um dosprincipais efeitos atribuídos a PRD é oaumento na eficiência do uso da água,redução do vigor vegetativo sem, no en-tanto, comprometer a produção e o ta-manho das bagas (LOVEYS et al., 2000).O princípio de PRD baseia-se na emissãode sinais químicos sintetizados nas raízesem contato com o solo seco e transmitidosà parte aérea através do fluxo transpirató-rio (STOLL et al., 2002). O ácido abscísico(ABA) e as citocininas têm sido citadoscomo os principais fitormônios que atuamsobre o comportamento estomático e ocrescimento vegetativo das videiras sub-metidas a PRD. O aumento do pH e da con-centração de ABA do xilema ocasiona ofechamento dos estômatos, evitando asperdas de água por transpiração, enquan-to a redução de citocininas nos ramos, ge-mas e raízes limita a área foliar da videira,devido, principalmente, à restrição no cres-cimento dos ramos laterais (netos) (STOLLet al., 2000; DRY et al., 2001). Para garantir acontinuidade da síntese de ABA pelasraízes é necessário alternar os lados irriga-dos e não irrigados a cada duas ou três se-manas, dependendo do tipo de solo e dascondições climáticas da região (DRY et al.,

REFERÊNCIAS

ALVARENGA, A.A. Avaliação de cultivares

porta-enxertos e produtoras de videira (Vitis

2001). Exposições prolongadas das raízesao déficit hídrico podem acarretar mortee/ou suberização das raízes, diminuindo asíntese de ABA. Além disso, a alternânciada irrigação estimula o crescimento de no-vas raízes, favorecendo a síntese de ácidoabscísico (DRY et al., 2000ab; KANG;ZHANG, 2004).

A quantidade reduzida de água aplica-da em PRD (aproximadamente 50% daevapotranspiração da cultura, ETc) nãotem impacto negativo sobre a capacidadefotossintética e produção, resultando noaumento da eficiência no uso da água (LO-VEYS et al., 2000; SANTOS et al., 2005). Amenor área foliar das videiras submetidasao manejo PRD, não compromete o ta-manho das bagas, nem o acúmulo deaçúcares (glucose e frutose) e ácidos (má-lico e tartárico) nas uvas (SOUZA et al.,2005b). Além disso, a menor densidade dacopa altera o microclima na videira, fa-vorecendo a síntese de antocianinas ecompostos fenólicos, devido às melhorescondições de radiação e temperatura naregião dos cachos (SANTOS et al., 2005).As explicações fisiológicas para a ausênciade efeito de PRD sobre o tamanho das ba-gas residem no melhor estado de hidrataçãodas videiras e também devido ao fato de,após o início de mudança de cor das bagas,ou pintor, o fluxo de seiva para as bagasatravés do xilema ser restrito, reduzindo oefeito negativo do ABA sobre a expansãocelular dos frutos (DAVIES et al., 2000).

Como o custo de implantação de PRDé relativamente mais alto que o conven-cional, pois utiliza dois tubos de irrigaçãopor linha de plantio, pode-se optar poruma irrigação deficitária (DI). Na DI,aplica-se a mesma quantidade de água queem PRD, distribuída nos dois lados dosistema radicular, durante o período decrescimento e maturação das uvas, umavez que não existem grandes diferençasfisiológicas e de produção entre PRD e DI(SANTOS et al., 2003, 2005; SOUZA et al.,2005 ab).

spp.) em condições de solos ácidos e

alumínio. 2001. 153p. Tese (Doutorado) -

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32 Vinhos finos: rumo à qualidade

Caracterização macroclimática e potencial enológico dediferentes regiões com vocação vitícola de Minas Gerais

Jorge Tonietto1

Rubens Leite Vianello2

Murillo de Albuquerque Regina3

1Engo Agro, D.Sc., Pesq. Embrapa Uva e Vinho, Caixa Postal 130, CEP 95700-000 Bento Gonçalves-RS. Correio eletrônico:[email protected]

2Engo Agro, Pós-Doc., Pesq. INMET-5o Distrito de Meteorologia, Av. do Contorno, 8159, Santo Agostinho, CEP 30110-051 Belo Horizonte-MG.Correio eletrônico: [email protected]

3Engo Agro, Pós-Doc, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

Resumo - A qualidade do vinho está intimamente associada à qualidade de maturação da

uva e esta, por sua vez, ligada às características de solo, de manejo e, principalmente, de

clima da região de cultivo. Minas Gerais apresenta uma grande variação de condições

climáticas em seu território, contrastando o clima seco e quente da região Norte com as

condições de temperaturas mais amenas e precipitações mais abundantes e distribuí-

das das regiões montanhosas do Sul. Nesse contexto, as possibilidades enológicas para

elaboração de vinhos finos são bastante variáveis e devem ser equacionadas, a priori e

como fator preponderante, quando da instalação de projetos vitícolas. As possibilida-

des e os riscos de cada região devem ser analisados, orientando-se em modelos de

climatologia vitícola que permitem indicar quais os tipos de vinhos que podem ser ela-

borados nas diferentes regiões. Atualmente, novos projetos vitícolas encontram-se

instalados ou em fase de instalação em praticamente todas as macrorregiões geográficas

do Estado.

Palavras-chave: Vitis vinifera. Uva. Viticultura. Vitivinicultura. Climatologia. Tem-

peratura. Precipitação.

INTRODUÇÃO

A qualidade do vinho é uma resultantedireta da qualidade da uva. Por sua vez, nasdiferentes regiões de produção de vinho domundo, a qualidade da uva é fortementeinfluenciada pelo clima vitícola (TONIETTO;CARBONNEAU, 1999). Alguns trabalhosjá sinalizam para a possibilidade de produ-ção de uvas para vinhos em Minas Gerais,especialmente considerando a produção naestação seca (CONCEIÇÃO; TONIETTO,2005; AMORIM et al., 2005). Nesse sentido,este estudo tem por objetivo caracterizar o

potencial climático existente ao longo doano em diferentes regiões do estado de Mi-nas Gerais, buscando-se alternativas paraa produção de vinhos finos. Não se pre-tende fazer uma abordagem climatológicaampla para todo o Estado, mas tão-somenteenfocar a questão sob o ângulo de seupotencial vitivinicultor, uma alternativapromissora para a agroindústria do Estado.

CARACTERIZAÇÃO GEOGRÁFICADO ESTADO

O estado de Minas Gerais situa-se na

Região Sudeste do Brasil, entre os paralelos14° 13' 57" e 22° 55' 47" de latitude sul eentre os meridianos 39° 51' 24" e 51° 02'56" de longitude oeste. Abrange uma áreade 582.586 km², que representa 6,9% daárea total do Brasil. Portanto, é um Estadointeiramente contido na zona intertropi-cal (CUPOLILLO, 1997).

Minas Gerais apresenta considerávelcomplexidade climatológica, levando-seem conta a diversidade de fatores presentesem todo o seu território. O extremo norte,parte integrante do Polígono das Secas,

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33Vinhos finos: rumo à qualidade

seco e quente, contrasta com o sul, de to-pografia acidentada e chuvas mais ou me-nos bem distribuídas ao longo do ano etemperaturas amenas; grandes formaçõesmontanhosas contrastam com vales ex-tensos, com variações de altitude de 250 ma 2.700 m, ora intensificando, ora inibindoas formações pluviais; a porção leste, su-jeita à influência oceânica, contrasta com acontinentalidade do Triângulo Mineiro edo Noroeste do Estado. Contrastantes tam-bém são suas paisagens vegetais, desde acaatinga no extremo norte, passando porvastas áreas ocupadas pelo Cerrado dediferentes densidades, aos campos demontanhas e às formações florestais re-manescentes da floresta Atlântica (VIA-NELLO et al., 2004).

Quanto à dinâmica atmosférica, o Estadoacha-se sujeito à influência de mecanismosde larga escala, como os Anticiclones quase-estacionários do Atlântico Sul e do PacíficoSul, responsáveis, em grande parte, pelascondições do tempo meteorológico sobreo Estado, uma vez que exercem influênciadestacável na penetração das massas dear tropicais úmidas e polares. Particu-larmente, o Anticiclone do Atlântico Suldestaca-se pelo papel que desempenhasobre o clima. Sua presença dominantesobre o continente brasileiro, no inverno,é o principal mecanismo a justificar a es-tação seca em Minas Gerais. Por outro lado,no verão, localizando-se sobre o AtlânticoSul, induz uma circulação nos quadrantesNorte e Leste, com a conseqüente invasãode ar quente e úmido, principal responsá-vel pelas chuvas de verão, especialmentequando aquela massa de ar encontra-secom a massa fria polar oriunda do Sul. Outrocentro de destaque sobre o continente, embaixos níveis, é a Baixa do Chaco, formadapelo grande aquecimento continental, noverão. Esse centro de baixa pressão pro-voca intensas formações convectivas quepenetram o estado de Minas Gerais, asso-ciando-se às frentes polares e dando ori-gem a uma larga faixa de grande nebu-losidade, não raras vezes estacionando-sesobre Minas Gerais no sentido noroeste-sudeste, por vários dias, dando origem à

denominada Zona de Convergência doAtlântico Sul, responsável por chuvascontínuas. Associados a esses sistemas,ocorrem as frentes quentes e as linhas deinstabilidade, principalmente no verão,provocando chuvaradas convectivas in-tensas e localizadas. A topografia de MinasGerais atua como modulador climático, comatuação de destaque sobre a distribuiçãodas chuvas e sobre as variações térmicas,tanto no verão quanto no inverno. Em al-tos níveis, a Alta da Bolívia, localizada a150 hPa, no verão, exerce forte influênciasobre o regime de chuvas em Minas Gerais,Estado que se situa entre esse centro dealta pressão e o cavado compensador deleste (VIANELLO, 1986).

ANÁLISE CLIMATOLÓGICA

Os dados climatológicos usados parao traçado dos mapas apresentados (Fig. 1a 5), bem como aqueles utilizados para acaracterização climática das localidadesdiscriminadas neste artigo, foram obser-vados pelo Instituto Nacional de Me-teorologia (INMET), cobrindo o período de1961 a 1990. Os mapas foram preparadospela Seção de Análise e Previsão do Tempo/5o Distrito de Meteorologia (SEPRE/5o

DISME) do INMET, com a participaçãoativa da Seção e Observação e Meteo-rologia Aplicada (SEOMA). Esclareça-seque nem todas as localidades possuem asérie completa, sendo utilizada, nesse caso,a maior série disponível em cada local. Osdados de irradiância solar global (radiaçãosolar) incidente à superfície foram extraídosdos campos mensais estimados por Nuneset al. (1979).

As Figuras 1 a 5 mostram, claramente,a variação climática (temperatura, pluvio-sidade, umidade), para os meses de janei-ro e julho, representativos, respectiva-mente, das estações do verão e inverno emMinas Gerais.

Quanto ao regime pluvial (Fig. 1A e 1B),observam-se, claramente, dois períodosbem definidos. Um chuvoso, de verão, eoutro seco, de inverno. A precipitação, emquase sua totalidade, concentra-se em seisou sete meses do ano (outubro a abril),

sendo o trimestre dezembro-fevereiro oresponsável por mais de 50% do total anual.Os valores da precipitação média anualvariam bastante: no Norte, Nordeste eLeste do Estado, oscilam entre 700 e1.000 mm; no Triângulo Mineiro e AltoParanaíba, entre 1.400 e 1.700 mm; no No-roeste, entre 1.000 e 1.500 mm; no restantedo Estado, há uma variação entre 1.200e 2.500 mm, correspondendo os valoresmais altos às regiões de maior altitude dasserras do Espinhaço e Mantiqueira. Pelasconseqüências negativas sobre a agricul-tura, há que se destacar a ocorrência dofenômeno denominado “veranico”, perío-do entre 10 e 25 dias, por vezes mais, du-rante o período chuvoso, em que não ocor-rem chuvas, coincidindo ainda com altastemperaturas e, conseqüentemente, comevapotranspiração elevada. Ocorre, nor-malmente, em janeiro ou fevereiro, perío-do de maior desenvolvimento das cultu-ras, por isso chegando a provocar reduçãode 30% a 40% nas safras (ANTUNES,1986).

Os valores observados das tempe-raturas são bastante influenciados pelalatitude e, principalmente, pela altitude,dado o relevo acentuado de grande partedo Estado (Fig. 2A, 2B, 3A e 3B). Asmédias compensadas mensais vão de13°C, nas regiões mais elevadas das Serrasda Mantiqueira e do Espinhaço, até 27°C,no Norte e Leste do Estado. As médiasmensais das temperaturas extremas variamde 4oC a 33oC.

Nas regiões Sul, Sudoeste, Centro-Sule Triângulo podem ocorrer geadas, fe-nômeno restrito à estação do inverno, comuma ocorrência anual de 50%, no extremosul; 20%, no Sudoeste e no Centro-Sul; e10%, no Triângulo Mineiro (Fig. 4).

Os pontos sobre as isolinhas preta,azul e vermelha têm, respectivamente, 50%,20% e 10% de probabilidade de que ocor-ra pelo menos uma geada por ano. Emoutras palavras, pontos sobre as isoli-nhas preta, azul e vermelha devem esperaruma geada a cada dois, cinco e dez anos,respectivamente (Fig. 4).

É notável a correlação que se observa

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34 Vinhos finos: rumo à qualidade

Figura 1 - Regime de chuvas para o verão e inverno em Minas Gerais

NOTA: Figura 1A - Normal de chuva, no período 1961-1990, para o mês de janeiro. Figura 1B - Normal de chuva, no período 1961-1990, para o mês de julho.

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35Vinhos finos: rumo à qualidade

Figura 2 - Temperaturas médias para o verão e inverno em Minas Gerais

NOTA: Figura 2A - Normal de temperatura média compensada, no período 1961-1990, para o mês de janeiro. Figura 2B - Normalde temperatura média compensada, no período 1961-1990, para o mês de julho.

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36 Vinhos finos: rumo à qualidade

Figura 3 - Temperaturas máximas e mínimas no verão e inverno em Minas Gerais

NOTA: Figura 3A - Normal de temperatura máxima, no período 1961-1990, para o mês de janeiro. Figura 3B - Normal de temperaturamínima, no período 1961-1990, para o mês de julho.

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37Vinhos finos: rumo à qualidade

entre os campos de umidade relativa comos de temperaturas e de chuvas.

A umidade relativa média mensal(Fig. 5A e 5B) varia entre 52%, no extremonorte do Estado, a 84%, no sul. Normal-mente, o mês mais úmido é dezembro, po-dendo chegar a 85% no sul do Estado, e omais seco é agosto, com valores médiosque chegam a 45% (ANTUNES, 1986).

Os valores médios anuais do númerode horas de brilho solar variam entre 1.600horas, na Zona da Mata mineira, e 2.800horas, no Norte e Triângulo Mineiro (AN-TUNES, 1986).

Classificação climáticasegundo Köppen

Segundo a classificação climática deKöppen, os tipos de clima que prevalecemem Minas Gerais são os seguintes (AN-TUNES, 1986):

a) Aw: clima tropical úmido (mega-térmico) de savana, com invernoseco e verão chuvoso. A tempe-ratura média do mês mais frio ésuperior a 18°C. A precipitação domês mais seco é inferior a 60 mm.Esse tipo climático predomina nasáreas de altitude mais baixas, ou seja,parte oeste do Triângulo Minei-ro, praticamente toda a metade doNorte, com exceção de regiões ser-ranas e de algumas áreas de climaBSw e no Sudeste do Estado, naregião de Muriaé – Cataguases –Leopoldina;

b) BSw: clima seco, com chuvas no ve-rão e precipitações anuais sempreinferiores a 1.000 mm e, normalmente,inferiores a 750 mm. Predomina empequenas áreas do Norte do Estadoe do Vale do Jequitinhonha;

c) Cwa: clima temperado quente (me-sotérmico), com inverno seco everão chuvoso. A temperatura domês mais frio é inferior a 18°C e, ado mês mais quente, superior a 22°C.Predomina nas regiões serranas docentro e sul do Estado e no nortedas serras do Espinhaço e Cabral;

d) Cwb: clima temperado chuvoso(mesotérmico), também chamadosubtropical de altitude. Difere dotipo anterior pela temperatura médiado mês mais quente ser inferior a22°C. Predomina nas regiões dealtitude mais elevadas da Serra daCanastra, Espinhaço e Mantiqueira,numa pequena área em torno deAraguari e, outra, ao sul de Carmodo Paranaíba.

A Figura 6 ilustra a distribuição dostipos climáticos em Minas Gerais.

Figura 4 - Mapa de freqüência de ocorrência anual de geadas em Minas Gerais

FONTE: Brasil (1992).

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38 Vinhos finos: rumo à qualidade

Figura 5 - Umidade relativa média para o verão e o inverno em Minas Gerais

NOTA: Figura 5A - Normal de umidade relativa média, no período 1961-1990, para o mês de janeiro. Figura 5B - Normal deumidade relativa média, no período 1961-1990, para o mês de julho.

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39Vinhos finos: rumo à qualidade

A caracterização e avaliação do po-tencial climático das dez regiões de MinasGerais, descritas a seguir, foram realizadasatravés da análise das bases de dados cli-máticos das respectivas regiões, em par-ticular calculando-se índices climáticos deinteresse vitícola.

Uberaba

Aw - tropical chuvoso (megatérmi-co), com estação seca no inverno. SegundoKöppen, o tipo climático Aw significa cli-ma tropical chuvoso; a temperatura mé-dia do mês mais frio, tomando-se por ba-se a temperatura média de muitos anos, ésuperior a 18oC. A época mais seca, com

duração de quatro a cinco meses, coincidecom o inverno, comportando pelo menosum mês com precipitação, em média, inferiora 60 mm. A evapotranspiração potencialacumulada para o ano é de 1.328 mm,estimada pelo método Thornthwaite ecorrigida em 28%, a mais, pelo métodoPenman-Monteith.

Diamantina

Cwb - temperado quente (mesotér-mico). A temperatura média do mês maisfrio acha-se entre 18oC e -3oC. A temperaturamédia do mês mais quente é inferior a 22°Ce, durante pelo menos quatro meses, ésuperior a 10°C. A época mais seca, com

Para a instalação do vinhedo, é impor-tante considerar a possível ocorrência degeadas nas regiões de cultivo, como in-dicado na Figura 4.

Classificações climáticaspara algumas localidadesde interesse

Estas classificações foram realizadasutilizando-se da metodologia proposta porVianello e Alves (1991) com colaboraçãode Rebello e Sediyama4 . Para facilitar avisualização geográfica das localidadesestudadas, apresenta-se o mapa de MinasGerais (Fig. 7) com as respectivas locali-zações.

Figura 6 - Distribuição dos tipos climáticos em Minas Gerais, segundo a classificação de Köppen

FONTE:Dados básicos: Antunes (1986).Modificado por Vianello, com a colaboração de Luciana D´Albuquerque Ferreira.

4Dados fornecidos através de: Cálculo de evapotranspiração potencial pelo método Thornthwaite por E. Rebello e Evapotranspiração dereferência para o estado de Minas Gerais por G.C. Sediyama, K.C.F. Mello Júnior e A.R. Santos, em 2005.

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40 Vinhos finos: rumo à qualidade

duração de quatro a cinco meses, coinci-de com o inverno, comportando pelo menosum mês com precipitação, em média, infe-rior a 60 mm. A evapotranspiração potencialacumulada para o ano é de 1.141 mm, es-timada pelo método Thornthwaite e cor-rigida em 41%, a mais, pelo método Pen-man-Monteith.

Pirapora e João Pinheiro

Aw - tropical chuvoso (megatérmi-co), com estação seca no inverno. O mêsmais frio, tomando-se por base a tempe-ratura média de muitos anos, é superior a18oC. A época mais seca, com duraçãode quatro a cinco meses, coincide com oinverno, comportando pelo menos ummês com precipitação, em média, infe-rior a 60 mm. A evapotranspiração poten-cial acumulada para o ano é de 1.363 mm,estimada pelo método Thornthwaite ecorrigida em 26%, a mais, pelo métodoPenman-Monteith.

Ituiutaba

Aw - tropical chuvoso (megatérmico),com estação seca no inverno. O mês maisfrio, tomando-se por base a temperaturamédia de muitos anos, é superior a 18oC. Aépoca mais seca, com duração de quatro acinco meses, coincide com o inverno, com-portando pelo menos um mês com pre-cipitação, em média, inferior a 60 mm. Aevapotranspiração potencial acumuladapara o ano é de 1.379 mm, estimada pelométodo Thornthwaite e corrigida em 34%,a mais, pelo método Penman-Monteith.

Pedra Azul

Aw - tropical chuvoso (megatérmico),com estação seca no inverno. O mês maisfrio, tomando-se por base a temperaturamédia de muitos anos, é superior a 18oC. Aépoca mais seca, com duração de quatro acinco meses, coincide com o inverno, com-portando pelo menos um mês com pre-cipitação, em média, inferior a 60 mm. A

evapotranspiração potencial acumuladapara o ano é de 1.344 mm, estimada pelométodo Thornthwaite e corrigida em 26%,a mais, pelo método Penman-Monteith.

Passa Quatro

Cwb - temperado quente (mesotérmico).A temperatura média do mês mais frio acha-se entre 18oC e -3oC. A temperatura média domês mais quente é inferior a 22°C e, duran-te pelo menos quatro meses, é superior a10°C. A época mais seca, com duração detrês a quatro meses, coincide com o inver-no, comportando pelo menos um mês comprecipitação, em média, inferior a 60 mm. Aevapotranspiração potencial acumulada pa-ra o ano é de 1.106 mm, estimada pelo méto-do Thornthwaite e corrigida em 26%, a mais,pelo método Penman-Monteith. Como nãoexistia padrão de comparação para PassaQuatro, usou-se a correção com o fator deSão Lourenço, pela semelhança climáticaentre as duas localidades.

Figura 7 - Estudo do potencial vitivinicultor, para alguns municípios de Minas Gerais

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41Vinhos finos: rumo à qualidade

Caldas

Cwb - temperado quente (mesotérmico).A temperatura média do mês mais frio acha-se entre 18oC e -3oC. A temperatura médiado mês mais quente é inferior a 22°C e, du-rante pelo menos quatro meses, é superiora 10°C. A época mais seca, com duração detrês a quatro meses, coincide com o in-verno, comportando pelo menos um mêscom precipitação, em média, inferior a60 mm. A evapotranspiração potencial acu-mulada para o ano é de 1.109 mm, estima-da pelo método Thornthwaite e corrigidaem 24%, a mais, pelo método Penman-Monteith. Como não existia padrão de com-paração para Caldas, usou-se a correçãocom o fator de Machado, pela semelhançaclimática entre as duas localidades.

Três Corações

Cwa - temperado quente (mesotérmico).A temperatura média do mês mais frio acha-se entre 18oC e -3oC. A temperatura médiado mês mais quente é inferior a 22oC edurante pelo menos quatro meses é su-perior a 10°C. A época mais seca, com du-ração de três a quatro meses, coincide como inverno, comportando pelo menos ummês com precipitação, em média, inferior a60 mm. A temperatura média do mês maisquente é superior a 22°C.

Os valores médios climatológicos foramobtidos pela média aritmética dos valoresdas localidades de São Lourenço, Lavras eMachado. A evapotranspiração potencialfoi estimada pela média entre São Lourençoe Machado.

Cordislândia

Cwa - temperado quente (mesotérmico).A temperatura média do mês mais frio acha-se entre 18oC e -3oC. A temperatura médiado mês mais quente é inferior a 22°C e,durante pelo menos quatro meses, ésuperior a 10°C. A época mais seca, comduração de três a quatro meses, coincidecom o inverno, comportando pelo menosum mês com precipitação, em média, inferiora 60 mm. A temperatura média do mês maisquente é superior a 22°C.

Como não existem observações pa-ra esta localidade, foram usados os dados

observados em Machado, por ser loca-lidade distante apenas de 25 km e comcaracterísticas climáticas semelhantes.

CLIMA VITÍCOLA EM DISTINTASREGIÕES DE MINAS GERAIS

O estudo das regiões está focado so-bretudo na busca de padrões de qualidadediferencial na produção de vinhos. Por isso,utiliza-se como metodologia de referência pa-ra o estudo o Sistema de Classificação Cli-mática Multicritério Geovitícola (CCM)(TONIETTO; CARBONNEAU, 2004), combase em índices climáticos (térmico, nicto-térmico de maturação e hídrico), que ca-racterizam as regiões e que são marcadoresda qualidade potencial da uva para vinho.

Tendo em vista que Minas Geraisencontra-se em zona intertropical e pos-sui condições características de clima vi-tícola com variabilidade intra-anual (climavitícola que, em condições naturais, mudade classe de clima em função do períododo ano no qual a uva pode ser produzida),os índices vitícolas foram calculados paratodos os períodos do ano, visando avaliaras diferentes condições climáticas para pro-dução ao longo do ano:

a) índice heliotérmico IH: informa dopotencial heliotérmico ligado à ma-turação da uva (açúcar, acidez) e aocomprimento do ciclo. Ele incorporaum fator de correção para altaslatitudes. A fórmula é a proposta porHuglin (1978):

onde,

T = temperatura média do ar (oC);

Tx = temperatura máxima do ar (oC);

K = coeficiente comprimento dodia, variando de 1,02 a 1,06entre 40 e 50 graus de latitude(para Minas Gerais o coefi-ciente é 1,00);

b) índice de frio noturno (IF): informasobre as condições térmicas re-lativas ao frio noturno, indicativaspara o período de maturação da uva.

(expressão do potencial de cor earoma - antocianinas e polifenóis).A fórmula é a proposta por Tonietto(1999):

IF = Temperatura mínima do ar(média das mínimas) no mês dematuração da uva, estimadopelos 30 dias precedentes àdata de colheita da uva;

c) precipitação pluviométrica mensal(P): associado ao risco de incidênciade doenças fúngicas, incluindo aspodridões do cacho, bem como àscondições de maturação da uva;

d) excedente ou déficit hídrico (P-ETc):indicador de condições de matura-ção da uva, nível de estresse hídricoassociado, síntese de polifenóis,tendo sido calculado mês a mês pelaprecipitação subtraída da eva-potranspiração estimada para acultura (ETc), onde ETc = Kc.ETP.Para efeito desse estudo, foi uti-lizado 0,8 como o valor do Kc.

Os índices climáticos IH, IF, P-ETc e P,que caracterizam o “clima vitícola comvariabilidade intra-anual”, foram calculadospara os 12 meses do ano nas regiões deUberaba, Diamantina, Pirapora, João Pi-nheiro, Passa Quatro, Caldas, Cordislândia,Três Corações, Ituiutaba e Pedra Azul(Gráficos 1 a 10).

O IH foi calculado para o período clás-sico de seis meses (de 01/10 a 31/03). Foitambém incluído o cálculo do IH aplicado aperíodos menores, com o objetivo de teruma estimativa do comprimento do cicloda videira para diferentes períodos de pro-dução ao longo do ano a partir da data depoda/brotação, sobretudo possível nas re-giões mais quentes (ex.: ‘Syrah’ necessita,em condições de clima temperado, de umIH de, aproximadamente, 2.100 para ma-turar): IH1 = IH do mês; IH3 = IH dos trêsmeses precedentes; IH4 = IH dos quatromeses precedentes e IH5 = IH dos cincomeses precedentes.

As coordenadas geográficas e os dadosmensais de temperatura máxima do ar,amplitude térmica diária, umidade relativado ar e insolação das dez localidades sãoapresentados no Quadro 1.

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42 Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 1 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Pirapora

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

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43Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 2 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Uberaba

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

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10111213141516171819202122

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44 Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 3 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de João Pinheiro

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10111213141516171819202122

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45Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 4 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Cordislândia

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10111213141516171819202122

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46 Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 5 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Três Corações

0200400600800

1.0001.2001.4001.6001.8002.0002.2002.4002.6002.8003.0003.2003.400

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47Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 6 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Passa Quatro

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

IH1 IH3 IH4 IH5 IH6

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48 Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 7 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Caldas

56789

10111213141516171819202122

Índi

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IH1 IH3 IH4 IH5 IH6

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

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49Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 8 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Diamantina

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200

240

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

IH1 IH3 IH4 IH5 IH6

0255075

100125150175200225250275300325

Pre

cipi

taçã

opl

uvio

mét

rica

(mm

)

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

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50 Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 9 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Ituiutaba

0200400600800

1.0001.2001.4001.6001.8002.0002.2002.4002.6002.8003.0003.2003.400

56789

10111213141516171819202122

Índi

cede

frio

notu

rno

(IF

)(C

º)Ín

dice

helio

térm

ico

(IH

)

-80

-40

0

40

80

120

160

200

240

Exc

eden

teou

défic

ithí

dric

o(P

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)(m

m)

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

IH1 IH3 IH4 IH5 IH6

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

IH1 IH3 IH4 IH5 IH6

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

0255075

100125150175200225250275300

Pre

cipi

taçã

opl

uvio

mét

rica

(mm

)

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51Vinhos finos: rumo à qualidade

Gráfico 10 - Índices climáticos vitícolas de janeiro a dezembro para a região de Pedra Azul

56789

10111213141516171819202122

Índi

cede

frio

notu

rno

(IF

)(C

º)

0200400600800

1.0001.2001.4001.6001.8002.0002.2002.4002.6002.8003.0003.2003.400

Índi

cehe

lioté

rmic

o(I

H)

-80

-40

0

40

80

120

160

200

240

Exc

eden

teou

défic

ithí

dric

o(P

-ET c

)(m

m)

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

IH1 IH3 IH4 IH5 IH6

JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ.

0255075

100125150175200225250275

Pre

cipi

taçã

opl

uvio

mét

rica

(mm

)

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52 Vinhos finos: rumo à qualidade

Pirapora Temperatura máxima do ar (oC) 30,7 32,2 31,8 30,8 29,8 28,7 28,7 30,5 31,6 32,3 30,8 29,7 30,6

Latitude: 17° 21' S Amplitude térmica diária (oC) 10,3 11,5 11,3 12,4 13,3 15,0 16,1 15,3 13,8 13,6 10,3 9,2 12,7

Longitude: 44° 55' W Umidade relativa do ar (%) 78,0 75,0 78,2 78,3 75,5 70,4 64,6 57,3 58,1 60,7 74,5 80,1 70,9

Altitude: 505 m Insolação total mensal (horas) 193 220 229 241 255 238 257 268 231 226 177 158 2.695

João Pinheiro Temperatura máxima do ar (oC) 29,2 29,7 29,9 29,3 28,4 27,4 27,2 27,7 30,5 30,3 28,0 28,4 28,8

Latitude: 17° 42' S Amplitude térmica diária (oC) 11,6 11,8 12,2 12,4 12,8 13,5 13,8 13,0 13,7 12,5 10,0 10,9 12,4

Longitude: 46° 10' W Umidade relativa do ar (%) 78,2 76,2 75,2 72,6 64,4 67,3 64,0 58,4 59,3 68,0 73,6 78,9 69,7

Altitude: 760 m Insolação total mensal (horas) 190 203 186 237 260 254 273 252 219 218 189 114 2.596

Uberaba Temperatura máxima do ar (oC) 29,7 30,2 30,3 28,6 27,9 27,2 27,0 29,4 29,9 30,3 29,7 29,2 29,1

Latitude: 19° 44' S Amplitude térmica diária (oC) 10,5 11,2 11,5 11,5 13,6 14,6 14,8 15,2 13,3 12,4 11,3 10,2 12,5

Longitude: 47° 57' W Umidade relativa do ar (%) 80,5 80,9 79,5 76,2 74,6 73,1 67,3 58,9 63,0 70,6 75,2 80,4 73,4

Altitude: 737 m Insolação total mensal (horas) 193 187 218 232 253 255 256 271 230 230 217 172 2.713

Três Corações Temperatura máxima do ar (oC) 28,4 28,8 28,2 26,6 25,1 24,0 24,1 25,8 26,6 27,4 27,8 27,6 26,7

Latitude: 21°41' S Amplitude térmica diária (oC) 10,5 11,1 11,2 12,2 12,8 14,5 15,3 15,5 13,7 12,2 11,5 10,4 12,6

Longitude: 45°15' W Umidade relativa do ar (%) 79,3 77,6 77,3 77,9 77,3 75,5 72,2 67,2 67,7 72,9 75,2 79,3 75,0

Altitude: 865 m Insolação total mensal (horas) 189 175 197 200 203 192 222 223 188 182 177 188 2.334

Cordislândia Temperatura máxima do ar (oC) 28,6 29,0 28,6 27,0 25,2 23,9 24,0 26,0 27,0 27,5 28,0 27,6 26,9

Latitude: 21º 40' S Amplitude térmica diária (oC) 10,8 11,4 11,6 12,8 11,6 14,5 15,2 15,6 13,9 12,2 11,6 10,2 12,6

Longitude: 45° 55' W Umidade relativa do ar (%) 77,2 76,4 75,6 74,8 74,5 72,9 68,5 63,5 63,8 69,9 72,6 77,3 72,3

Altitude: 873 m Insolação total mensal (horas) 159 158 171 180 185 172 201 195 163 164 161 140 2.050

Caldas Temperatura máxima do ar (oC) 26,4 26,5 26,2 25,6 22,9 22,5 22,7 24,5 25,4 26,0 26,1 26,2 25,1

Latitude: 21° 55' S Amplitude térmica diária (oC) 9,6 10,0 10,6 12,9 13,9 16,1 16,7 17,6 14,7 12,7 11,2 10,1 13,0

Longitude: 46° 23' W Umidade relativa do ar (%) 82,0 82,0 81,0 77,0 78,0 77,0 75,0 70,0 69,0 74,0 77,0 80,0 76,8

Altitude: 1.150 m Insolação total mensal (horas) 124 132 142 186 185 181 172 210 152 166 159 141 1.949

Passa Quatro Temperatura máxima do ar (oC) 26,5 28,3 27,7 26,2 24,3 23,2 23,1 24,9 25,1 26,3 26,6 26,6 25,7

Latitude: 22° 23' S Amplitude térmica diária (oC) 9,8 11,3 11,7 12,0 13,8 15,2 15,9 16,2 13,7 12,1 11,2 10,0 12,7

Longitude: 44° 58' W Umidade relativa do ar (%) 77,3 77,1 76,4 76,8 76,6 77,1 74,1 70,0 69,9 72,0 73,9 78,0 74,9

Altitude: 920 m Insolação total mensal (horas) 182 164 207 223 234 195 227 245 201 182 200 176 2.436

Diamantina Temperatura máxima do ar (oC) 24,9 27,8 25,8 23,6 22,5 21,2 21,2 22,7 23,5 24,4 24,2 24,2 23,8

Latitude: 18° 15' S Amplitude térmica diária (oC) 8,8 11,7 9,6 8,7 9,1 9,5 10,2 11,2 10,4 9,8 8,9 8,4 9,7

Longitude: 43° 36' W Umidade relativa do ar (%) 79,6 76,1 78,7 79,5 78,4 75,7 73,0 69,8 72,3 75,4 79,6 81,8 76,7

Altitude: 1.296 m Insolação total mensal (horas) 191 206 201 202 219 200 246 251 199 176 151 157 2.397

Ituiutaba Temperatura máxima do ar (oC) 31,3 31,4 31,3 31,5 29,4 28,8 29,7 31,3 32,5 33,5 31,8 31,2 31,1

Latitude: 18° 58' S Amplitude térmica diária (oC) 10,1 10,7 10,8 12,4 13,7 14,2 15,6 16,0 14,2 13,4 11,1 10,1 12,7

Longitude: 49° 27' W Umidade relativa do ar (%) 77,8 78,5 78,2 74,7 72,9 69,3 63,1 55,1 58,6 62,5 72,4 76,2 70,0

Altitude: 604 m Insolação total mensal (horas) 170 152 189 218 218 213 235 232 179 201 188 175 2.368

Pedra Azul Temperatura máxima do ar (oC) 29,4 30,1 29,9 28,4 27,2 25,7 25,1 26,3 27,3 28,3 28,2 28,7 27,9

Latitude: 16° 00' S Amplitude térmica diária (oC) 10,1 10,7 10,3 9,8 10,4 10,4 10,3 10,8 10,4 10,1 9,3 9,4 10,2

Longitude: 41° 28' W Umidade relativa do ar (%) 75,2 72,3 73,7 75,0 75,2 72,2 72,7 70,1 68,7 72,2 75,0 76,8 73,3

Altitude: 650 m Insolação total mensal (horas) 212 204 218 190 186 166 193 208 179 184 154 177 2.270

Jan. Fev. Mar. Abr. Maio Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.

MêsAnoRegião Variável climática

QUADRO 1 - Localização geográfica e dados climáticos mensais de temperatura máxima do ar, amplitude térmica diária, umidade relativa do ar e insolação de 10 localidades do estado de

Minas Gerais

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53Vinhos finos: rumo à qualidade

DIFERENÇAS DO CLIMAVITÍCOLA ENTRE REGIÕES NAESTAÇÃO ÚMIDA E NAESTAÇÃO SECA

A qualidade da uva produzida em re-giões com disponibilidade hídrica tenden-do a ser elevada pode ser afetada nega-tivamente. É por esta razão que há interesseem avaliar o potencial das regiões de MinasGerais para a produção de uvas no períodode seca, visando à busca de padrõesdiferenciais de qualidade para vinificação.Para tal, compararam-se as regiões de estu-do em dois períodos: para o período úmido,utilizaram-se os índices vitícolas dos Grá-ficos de 1 a 10 (IH, IF, P-ETc, P), relativos aomês de janeiro e para o período seco, uti-lizaram-se o índices relativos ao mês de julho.

Foi realizada uma análise de com-ponentes principais (ACP) sobre os quatroíndices (IH, IF, P-Etc, P) dos dois perío-dos referidos (seco e úmido), para as dezregiões. Os resultados da ACP são apre-sentados na Figura 8.

Observam-se, na Figura 8, dois grandesagrupamentos. Um, representado pela es-tação seca (cor laranja) e outro, pela estaçãoúmida (cor azul), caracterizando situaçõestotalmente distintas do ponto de vista dascondições térmicas e hídricas para todasas regiões nas duas estações.

Na análise comparativa entre regiões,identificam-se quatro agrupamentos entreregiões (Fig. 8), explicados sobretudo pelasdiferenças de potencial térmico e nicto-térmico, que é menor no agrupamento 1,formado por Caldas, Passa Quatro e Dia-

mantina. Essa condição climática mais friamostra um potencial para a produção dauva em ciclo normal (poda em agosto e co-lheita em janeiro/fevereiro). Ao tomarmoscomo exemplo o ciclo da cultivar ‘Cabernetsauvignon’ para Caldas (SOUZA et al.,2002), pode-se observar que, nessas con-dições, a videira brota em setembro e flo-resce em outubro. O período de maturaçãoinicia-se em dezembro e a colheita em fe-vereiro, coincidindo com a época de maio-res precipitações pluviométricas, o quelimita as possibilidades de obter vinhos dequalidade, em razão dos efeitos negativosdo excesso de chuvas à maturação da uva,notadamente da maturação fenólica (GUER-RA, 2002). A princípio, a produção devinhos nessas regiões, que coincide como período úmido, deverá ser orientada paravinhos brancos tranqüilos e espumantese, eventualmente, tintos leves para prontoconsumo. Neste último caso, deve-se aten-tar para a escolha de variedades de ciclocurto ou, no máximo, de meia estação, comopor exemplo a ‘Merlot noir’, de forma queevite que o longo período de maturaçãoocorra sob condições climáticas desfa-voráveis, afetando-as negativamente, tan-to pela diluição dos constituintes da uva,como pelo ataque das podridões diversasàs bagas.

Os agrupamentos 2, 3 e 4 apresentampotencial térmico crescente em relação aoagrupamento 1 (Fig. 8).

No agrupamento 2 estão Três Coraçõese Cordislânda. Utilizando-se o ciclo normal,estas regiões assemelham-se ao potencialdaquelas do agrupamento 1, embora sejamum pouco mais quentes. Nessas condi-ções, as cultivares mais vigorosas e querespondam bem a uma poda de verão po-dem ser indicadas para a produção no ciclode outono, com poda no início do ano(janeiro) e colheita no período seco, prefe-rencialmente nos meses de junho a agosto.Dessa forma, o período de colheita ocorreráem condições de solo seco, dias enso-larados e noites frescas com maior am-plitude térmica. Para Três Corações, osprimeiros resultados obtidos mostram quea cultivar Syrah presta-se a esse tipo de

Figura 8 - Análise de componentes principais (APC) - clima víticola de regiões de MinasGerais

Posicionamento das variáveisno círculo de correlações

CP1 72,43%

1,0

0,0

-1,0-1,0 0,0 1,0

CP

22

4,5

5%

P-ETc

P

IF

IH

CP 1

Estação seca

Pedra Azul

1

2

3

4

Estação úmida

CP

2Diamantina

Caldas

Passa Quatro

João Pinheiro

Uberaba

Pirapora

Ituiutaba

Ituiutaba

1

2

Caldas

Cordislândia

Passa QuatroDiamantina

Três Corações

4

Pirapora

UberabaPedra Azul

João Pinheiro

3

Três Corações

Cordislândia

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54 Vinhos finos: rumo à qualidade

manejo e que as uvas colhidas no invernoapresentam melhor potencial de matura-ção do que aquelas produzidas no verão(AMORIM et. al., 2005). Espera-se que asuvas colhidas nessas regiões originemvinhos com bom equilíbrio entre álcool eacidez, pois as temperaturas mais baixasverificadas entre os meses de junho e julhocontribuem para a manutenção de maioresteores de acidez na baga, uma vez que acombustão respiratória do ácido málico émais intensa em temperaturas próximas a30°C (TODA, 1991). Outras cultivares vi-gorosas, tais como ‘Cabernet sauvignon’,‘Tempranillo’ e ‘Sauvingon’ já se en-contram em fase de experimentação emCordislândia. É de se esperar que as regiõesdesse agrupamento sirvam à produção devinhos tintos e brancos mais encorpa-dos com expressão aromática. Nessascondições, cultivares pouco vigorosas(‘Chardonnay’, ‘Pinot’, ‘Merlot’) parecemapresentar dificuldade para um novo ciclovegetativo. Entretanto, é de se supor quepoderiam prestar-se à elaboração, em ciclonormal de verão, de vinhos brancos tran-qüilos, espumantes ou ainda de vinhostintos jovens para consumo imediato. Éimportante avaliar o risco de ocorrência degeadas na estação seca dessas regiões.

As localidades inseridas nesse agru-pamento estão situadas no centro da regiãoprodutora de café do Sul de Minas Gerais.O cafeeiro não tolera a geada e por esta ra-zão é cultivado nas partes mais altas daspropriedades. As zonas de encosta si-tuadas logo abaixo das parcelas cultivadascom o café podem prestar-se perfeitamenteao cultivo da videira, oferecendo alter-nativas interessantes para diversificaçãoda exploração agrícola.

Finalmente, há que se considerar aindaque o volume de precipitações que ocorrenessa região durante os meses de novem-bro a março, aliados à natureza argilosa damaioria dos terrenos de vocação agrícola,normalmente permitem à videira completarum novo ciclo vegetativo e produtivo, apartir da poda de verão (janeiro), sem ne-cessidade de irrigação complementar. Ava-liações do potencial hídrico de base e das

trocas gasosas foliares executadas em vi-deiras da cultivar Syrah enxertada sobre oporta-enxerto 101-14, em vinhedo não irri-gado, no período de abril a julho, demons-traram não haver quaisquer restrições àtranspiração foliar e assimilação do car-bono atribuídas ao déficit hídrico (AMO-RIM et al., 2005).

No agrupamento 3, estão Uberaba eJoão Pinheiro. Nestas regiões, e a exemplodo agrupamento 2, a produção de vinhosfinos deveria concentrar a colheita das uvasnos meses de junho a agosto. Como trata-se de regiões mais quentes e com eva-potranspiração mais elevada, o emprego dairrigação deve ser generalizado, sem o qualas restrições hídricas afetariam o desen-volvimento da videira no segundo ciclo.

A possibilidade de ocorrência de míldiono período úmido (sobretudo na floração)seria um fator de risco que não recomen-daria a poda no mês de janeiro, mas sim nomês de março, visando induzir um novociclo vegetativo fora do período de maiorocorrência de chuvas (janeiro/fevereiro). Astemperaturas mais elevadas verificadasnesse período permitem a brotação da vi-deira e não constituem um fator limitante.Aliás esse manejo já é empregado em Pi-rapora pelos produtores de uvas para con-sumo in natura, para variedades da espécieVitis vinifera. Nessas condições, poderiamser buscadas a produção de vinhos tintose brancos com maior teor de açúcar e maisencorpados.

Se comparado com o agrupamento 2,as temperaturas mais elevadas verificadasno momento da colheita deverão propiciarvinhos com teores alcoólicos mais elevadose acidez mais baixa, notadamente em ra-zão da maior degradação do ácido málicopelo metabolismo respiratório das bagas(CHAMPAGNOL, 1984; TODA, 1991).

Um projeto em desenvolvimento, ins-talado no ano de 2003, em João Pinheiro,tem mostrado um excelente desenvolvi-mento da cultivar Syrah. Nos dois primeirosanos de cultivo, esta variedade mostrou-se vigorosa e com boa indução à fru-tificação. A primeira safra, para validaçãodo potencial qualitativo dos vinhos, foi

colhida em agosto de 2006. Outras va-riedades mais vigorosas, como ‘Cabernetsauvignon’, ‘Malbec’ , ‘Tannat’ e‘Sauvignon blanc’ também merecem sertestadas.

No agrupamento 4, estão Pirapora eItuiutaba sendo mais quentes que Ubera-ba e João Pinheiro. Nessas condições, opotencial vitícola assemelha-se ao do agru-pamento 3, contudo com um ciclo vege-tativo potencialmente um pouco mais cur-to e condições nictotérmicas de maturaçãomais quentes. A princípio recomenda-setambém para essa região que o ciclo produ-tivo das videiras comece a partir da podade produção em março, para evitar o ex-cesso de precipitações dos meses de janei-ro e fevereiro. É de se supor ainda que, aexemplo do que deve ocorrer em João Pi-nheiro, os vinhos originados dessa regiãotenham teores alcoólicos mais elevados eacidez mais baixa em razão das temperaturaselevadas no momento da colheita.

Já para Pedra Azul, verifica-se que operíodo de seca é assemelhado à condiçãode Uberaba e João Pinheiro, enquanto quena estação úmida ele se distingue porapresentar uma condição menos úmida quea padrão das demais regiões e menor am-plitude térmica no período seco. Isto podeorientar para a possibilidade de poda davideira no início do ano, com menores riscosde doenças fúngicas, e com a colheita nosmeses de junho/julho, onde o índice de frionoturno é o mais baixo para a região e,potencialmente, pode favorecer a qualidadeda uva para vinificação, incluindo vinhostintos de guarda.

Na análise global, o excedente hídricoverificado nos meses de novembro a marçoé o principal fator climático limitante para aprodução de vinhos finos em todas asregiões analisadas de Minas Gerais, no-tadamente quando se buscam vinhos tin-tos encorpados e com potencial para en-velhecimento. Por isso, torna-se necessárioalterar o ciclo da videira para o outono-inverno seco. Por outro lado, em regiõesonde a alteração do ciclo da planta en-contrar limitações térmicas (caso de Caldas,Passa Quatro e Diamantina), ou que as

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55Vinhos finos: rumo à qualidade

cultivares empregadas não responderem auma dupla poda anual, as alternativas en-contradas para elaboração de vinhos finosdeveriam orientar-se para os vinhos bran-cos tranqüilos e espumantes, e eventual-mente para rosés ou tintos jovens.

De forma complementar aos índicesclimáticos apresentados para as diferen-tes regiões em estudo (Gráficos 1 a 10), oQuadro 1 apresenta um conjunto de dadosclimáticos de interesse para subsidiar aanálise das características e do potencialvitícola de cada região. Uma avaliaçãoconsistente do potencial das diferentes re-giões somente poderá ser feita a partir deavaliação nas condições locais, tendo emvista as interações complexas que ocorremna relação clima-solo-videira, resultando emuvas com características específicas quedevem ser avaliadas quanto ao seu po-tencial enológico e às características sen-soriais dos vinhos.

Por essa razão, a EPAMIG desenvolveexperimentos em rede, os quais visamavaliar o comportamento agronômico dediversas cultivares de videiras em dife-rentes regiões do Estado. Como já foi citadoanteriormente, hoje existem projetos emdesenvolvimento em João Pinheiro, Cordis-lândia, Pirapora, Diamantina e Três Cora-ções. Em cada uma dessas regiões optou-se por um elenco de cultivares que poderáexprimir o potencial enológico regional,buscando-se sempre a elaboração de umdeterminado tipo de vinho que possa ex-primir alguma identidade regional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A componente climática será sem dú-vida a principal variável que determinará operfil dos vinhos a serem obtidos em cadaregião vitícola. Certamente ocorrerão casosem que as limitações térmicas não per-mitirão alterar o ciclo da videira. Dessaforma, há que escolher aquelas cultivaresmais adaptadas ao ciclo normal da videira,como as cultivares precoces ou, no máximo,de meia estação, voltadas à produção devinhos brancos ou jovens. Por outro ladoregiões como a cafeeira do Sul de Minas(situada em altitudes próximas a 900 metros)e outras localizadas mais ao norte, como as

do Vale do Rio Paracatu (João Pinheiro),Vale do Rio São Francisco e Vale do Je-quitinhonha poderão surpreender muito ocenário vitícola brasileiro, oferecendocondições para obtenção de vinhos tintosencorpados e com potencial de enve-lhecimento. O maior atributo dessas regiõesseria o fato de que elas oferecem a pos-sibilidade de intervenção humana no cicloda videira, desviando a colheita para umaépoca que apresenta um período de secabem definido, associado a variações detemperatura entre dia e noite bastante con-sideráveis, condição sabidamente promo-tora de bom potencial de amadurecimentopara as uvas.

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Fatores que afetam a maturaçãoe a qualidade da uva para vinificação

Renata Vieira da Mota1

Murillo de Albuquerque Regina2

Daniel Angelucci de Amorim3

Ana Carolina Fávero4

1EngaAgra, Dra, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

2Engo Agro, Pós-Doc, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

3Engo Agro, M.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

4Enga Agra, B.S., Mestranda UFLA, Caixa Postal 3037, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: [email protected]

Resumo - O incremento na produção de vinhos finos no Brasil limita-se principalmente namelhoria da qualidade da matéria-prima, uma vez que a tecnologia enológica brasileirajá se encontra equiparada àquela das principais regiões vitícolas mundiais. Dentre osfatores determinantes da qualidade da matéria-prima, as condições climáticas verificadasdurante o período de maturação da uva são preponderantes, podendo alterar fun-damentalmente a qualidade da bebida obtida. Também, a determinação do ponto decolheita através do acompanhamento dos índices de maturação contribui para a melhoriada qualidade do mosto e, conseqüentemente, do vinho elaborado.

Palavras-chave: Vitis vinifera. Vinho. Fisiologia. Colheita.

INTRODUÇÃO

A obtenção de vinho de qualidadedepende de um grande número de fatoresnaturais e humanos. Dentre os fatoresnaturais, destacam-se a composição emaçúcar, ácidos, taninos, antocianinas, po-lifenóis não oxidáveis, aromas, enzimasoxidorredutoras e microelementos que ga-rantem o caráter distintivo e de qualidadenos vinhos e estão correlacionados com oecossistema vitícola (clima, solo, cultivar,porta-enxerto) e com as técnicas culturais(irrigação, controle de pragas e doenças,adubação).

A otimização desses fatores através deum manejo adequado pode resultar emaumento significativo da qualidade dovinho, pois agrega valor e viabiliza a ati-

vidade vitivinícola em determinada re-gião.

FISIOLOGIA DA MATURAÇÃO

A fase de maturação abrange o períodoque vai da mudança de cor até a colheita.Pode durar de 30 a 70 dias, dependendo dacultivar e da região de cultivo. A so-brematuração começa a partir do momentoem que não há mais síntese notável deaçúcares nem decréscimo apreciável daacidez. As flutuações dos teores de açú-cares e ácidos nessa fase devem-se a fe-nômenos de diluição ou dessecação dasbagas, ocasionados por ocorrência de chu-vas ou por períodos de seca, respectiva-mente. Por outro lado, os teores de po-lifenóis das cascas continuam a aumentar

nessa fase. Em regiões onde não há excessode chuvas outonais, essa fase caracteriza-se por certo dessecamento da uva, comconseqüente perda de peso. O incrementona composição fenólica contribui paramelhorar a qualidade das vinificações emtinto.

As principais modificações que ocorremnas bagas e na composição da uva durantea maturação são:

a) aumento da baga: esta aumentacontinuamente de tamanho e, no fi-nal, uma semana antes da colhei-ta, há pequena diminuição de até10% relativa a fenômenos de trans-piração da uva. O crescimento é de-corrente principalmente do acúmulode substâncias nutritivas (em par-

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ticular o açúcar) e de água, atraídapela baga graças à elevada pressãoosmótica, devido aos glicídios e, emparte, aos ácidos;

b) variação hormonal: enquanto odesenvolvimento das bagas é con-trolado pelos hormônios promotoresdo crescimento, a fase de maturaçãoé influenciada pela presença de ácidoabscísico (ABA), inibidor do pro-cesso mitótico, que transforma abaga em um órgão senil e de acúmuloatravés do processo de maturação.A casca tem uma participação im-portante no controle endógeno dodesenvolvimento e maturação dasbagas, observando-se que, durantea maturação, o ABA acumula-semais velozmente na casca do que napolpa;

c) acúmulo de açúcares: fenômenomais importante da maturação, nãosomente pela quantidade de álcoolque dele deriva, mas por servir deorigem a outros compostos comoos polifenóis, a antocianina ou oaroma. Os açúcares contidos na uvasão representados principalmen-te pela glicose e frutose, além deuma pequena quantidade de sa-carose e de algumas pentoses, co-mo a arabinose. Esses açúcares têmorigem na própria planta (raízes,tronco), na atividade fotossintéti-ca e de transformação do ácido má-lico:

- açúcares procedentes da ma-deira: as raízes, troncos e sar-mentos contêm açúcares re-dutores, sacarose e amido. Essasreservas migram até a baga,aumentando nesta a quantidadede açúcares,

- açúcares procedentes da fotos-síntese das folhas: a sacarosesofre variações significativas noseu conteúdo, aumentando du-rante o dia e diminuindo à noite.Esse açúcar é considerado umareserva glicídica de utilização rá-

pida, já que migra até a bagahidrolisando-se pouco a poucoao sair das folhas. Esta migra-ção é realizada normalmente ànoite, e o conteúdo de sacarosediminui durante o percurso dafolha à baga, chegando na formade traços. Os açúcares redutoresproduzidos pela fotossíntese,glicose e frutose, apresentamevolução distinta. Na uva verde,a glicose é o açúcar predomi-nante (85%), mas com o amadu-recimento, os teores de frutoseaumentam consideravelmente,de forma que a relação glicose/frutose diminui rapidamente nocurso da maturação até chegarao final desta com uma relaçãode, aproximadamente, 0,95. Istoocorre porque a glicose é umsubstrato mais sensível à res-piração celular, sendo consu-mida preferencialmente, tantodurante a migração quanto naprópria baga. A respiração ce-lular é o único fator que causadiminuição no conteúdo deaçúcares na uva, mas essa re-dução é desprezível diante doaumento geral que se produzdesses compostos durante a ma-turação,

- açúcares produzidos a partir doácido málico: nos cachos verdese nas folhas produz-se a reaçãode transformação da glicose emácido málico. Nos cachos ma-duros, pelo contrário, essa rea-ção praticamente não ocorre e,sim, a reação inversa. Isto explicaprincipalmente um dos fatoresque fazem diminuir a quantida-de de ácido málico na uva, em-bora com relação aos teores deaçúcares, o aumento decorrentedesta reação é mínimo, quandocomparado com a fotossíntese.

O depósito de açúcar nasbagas é um fenômeno de caráter

osmótico e hormonal. O teor co-meça a aumentar na polpa a partirda viragem, continuando portoda a maturação, até que, nafase de sobrematuração, torne-se parcialmente oxidado. Baixastemperaturas são nocivas aoacúmulo de açúcar, devido aoseu consumo na respiração ce-lular. Entretanto, uma variaçãoda amplitude térmica diária for-nece, além do aumento da con-centração de açúcar, aumentodos polifenóis e aroma;

d) diminuição da acidez: os princi-pais ácidos da uva são o tartárico,málico, cítrico, ascórbico e fosfó-rico. Entretanto, somente os ácidostartárico e málico constituem maisde 90% do total. Nas bagas em cres-cimento, há um incremento pro-gressivo no conteúdo de ácidos atéque chegam a ter aproximadamen-te a metade do seu tamanho total,pouco antes de iniciar a maturação.A partir da maturação, tanto o con-teúdo de tartaratos, quanto o demalatos, diminuem gradualmente. Aredução da acidez é causada por trêsfatores:

- migração das bases: o potássioé a substância mineral que majo-ritariamente neutraliza os ácidoslivres da baga. Essa migração debases ocorre, principalmente,das raízes com uma pequenaparticipação a partir das folhas.Essas bases neutralizam os áci-dos com o que se produz au-mento do pH e redução na acideztotal,

- fenômenos de combustão res-piratória: os substratos para arespiração celular são os açú-cares e os ácidos orgânicos. Oconsumo de um ou de outrodepende diretamente da tempe-ratura. Em baixas temperaturas,o substrato consumido é o açú-car. Em regiões quentes, onde a

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maturação ocorre em condiçõesde temperaturas elevadas, ossubstratos para a respiração ce-lular são os ácidos e, em propor-ção muito maior, o ácido máli-co. Estudos demonstraram queem temperatura aproximada de37°C, o ácido tartárico é o subs-trato consumido na respiração;a 30°C, consome-se o ácido má-lico e, a 20°C, o açúcar (MUÑOZ,2004),

- fenômenos de diluição na baga:durante a maturação, as célulasda baga aumentam de volume,devido ao aumento contínuo daágua intracelular. Esse aumentode água produz uma redução naacidez, especialmente no ácidotartárico. Por essa razão, esse fe-nômeno é a causa principal dadiminuição desse ácido, já quesua combustão na respiração émuito pequena;

e) aumento do pH: o aumento gradualde pH durante a maturação reflete aformação de sais ácidos às custasdo ácido livre. A relação entre saisácidos e ácido livre é influenciadapela quantidade total de calor efetivodurante a maturação. O pigmentodas uvas de cor é afetado pela acideze pH das uvas. A cor é roxa e bri-lhante no fruto com acidez mo-derada a alta e de baixo pH, e tendea ser azulada e escura em frutos combaixa acidez e alto pH;

f) desaparecimento da clorofila e acú-mulo de pigmentos corantes nacasca: ao mudar de cor, as bagasperdem a coloração verde, devido àclorofila, assumindo a coloraçãotípica da variedade. Os pigmentosque colorem a casca das bagas sãoos polifenóis, isto é, os flavonóides.Os flavonóides que se formam nasuvas brancas são de cor amarela erecebem o nome de flavonas, en-quanto que nas tintas chamam-seantocianinas. A síntese das anto-

cianinas na casca ocorre a partir deaçúcares, de modo que práticas cul-turais que estimulam o vigor da plan-ta não são favoráveis ao acúmulode substâncias corantes, uma vezque retardam o processo de ma-turação, dirigindo o produto dafotossíntese para a síntese protéicaao invés da síntese de açúcares. Umbom equilíbrio nos teores de fós-foro, potássio, magnésio, boro,manganês e outros microelementosestimulam a síntese da antocianina.A relação K

2O/MgO pode diminuir

a produção de antocianinas, quan-do o magnésio for limitante. O climainfluencia diretamente o conteúdode antocianinas nas uvas. Assim,temperatura e luminosidade exces-sivamente baixas ou elevadas nãosão favoráveis. Uma faixa ótima paraa produção desses compostos é de17oC a 26oC. Com a maturação ousobrematuração das variedadestintas, as células internas da películarompem-se e exudam a cor, de modoque a polpa, especialmente a porçãopróxima à película, se colore;

g) variação de polifenóis: os polifenóislocalizados na casca, nas sementese no suco são moléculas poliméri-cas de fenóis simples denominadastaninos. Constituem um grupo com-plexo de componentes, importantespara a caracterização dos vinhos(cor, sabor, resistência à oxidação eenvelhecimento, adstringência). Apolpa das bagas verdes contémuma grande quantidade de taninos.Durante a maturação, essas subs-tâncias são hidrolisadas e as uvastornam-se menos adstringentes;

h) amolecimento das bagas: a con-sistência das bagas está correla-cionada com a presença de pectatode cálcio e magnésio nas paredescelulares e na lamela média. Quandoa baga amadurece, verifica-se ahidrólise enzimática do pectato,realizada pela enzima pectina me-

tilesterase, com a liberação do ácidopéctico e de íons cálcio e magné-sio. A quantidade de pectato é de-terminada geneticamente. A uvados híbridos euro-americanos temmuita pectina e, por essa razão, afermentação pode dar origem aquantidades superiores de álcoolmetílico em relação às variedadesde Vitis vinifera. Uma vez que ospectatos têm função de cimenta-ção das paredes celulares, a suahidrólise leva a um amolecimentodos tecidos e aumento da permea-bilidade aos gases. Disso resultammuitos fenômenos enzimáticosoxidativos. Da quantidade de pec-tato presente na baga depende tam-bém o rendimento do mosto: as ba-gas sucosas (variedades de vinho)têm um rendimento muito elevado eseus pectatos estão grandementesujeitos à hidrólise. Durante a cla-rificação do mosto, a pectina pre-cipita solidificando-se com o cál-cio;

i) aparecimento da pruína: durante amaturação, a cutícula da casca torna-se mais ou menos recoberta depruína, substância cerosa que tema função de proteção contra o am-biente externo. A pruína é um com-ponente que influi notavelmentenos resultados quantiqualitativosdas uvas de vinho, pois contribuicomo uma proteção contra os raiosultravioletas, reduz a transpiraçãoe a respiração das bagas, funcio-na como uma barreira a parasitas eabriga as leveduras responsáveispela fermentação;

j) compostos nitrogenados: são im-portantes no crescimento de mi-crorganismos. As quantidadesmáximas de proteínas solúveis apre-sentam-se antes da maturação to-tal e depois decrescem até a co-lheita. Podem-se apresentar comoamônio, aminoácidos, polipeptí-deos pouco polimerizados ou pro-

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teínas. O amônio provém dos nitra-tos do solo e de sua degradação. Onitrogênio amínico e os polipep-tídeos provêm das transformaçõesrealizadas pelas folhas. As pro-teínas, moléculas grandes, são ela-boradas na baga a partir das formasanteriores. De 70% a 80% do ni-trogênio da baga está acumuladona película e nas sementes, e o restoencontra-se na polpa;

k) compostos minerais: de todas assubstâncias minerais existentes nauva, somente o potássio representaquase 50% do total, por isso é abase que principalmente salifica osácidos. Encontra-se, em especial, nacasca e, por isso, o fluxo de potás-sio ao mosto/vinho depende da ma-ceração. Além do potássio, há tam-bém na uva outros cátions como ocálcio, magnésio, sódio, ferro e co-bre. O ferro encontra-se em quan-tidades iguais na película e na pol-pa, o magnésio em quantidadesiguais na película, polpa e sementes.Todos esses compostos, durante amaturação, aumentam de forma con-tínua. Juntamente com os cátions,também aumenta constantementena baga o nível dos ânions mine-rais como sulfatos, cloretos, fosfa-tos e silicatos. O aumento progres-sivo de todos esses compostosocorre porque na combustão respi-ratória consomem-se parcialmen-te os ânions orgânicos (tartara-tos, malatos), mas não os cátions(potássio, cálcio), nem os ânionsinorgânicos (sulfatos, cloretos), oque faz com que esses compostosacumulem-se progressivamente au-mentando a matéria mineral da uva;

l) síntese de substâncias aromáti-cas: os compostos aromáticos pre-sentes na uva madura são, prin-cipalmente, de origem genética. Osmais importantes são o moscatel, ofoxado e o herbáceo, encontrando-se como moléculas odoríferas na

forma livre ou combinada a açúcares(glicose, arabinose ou ramnose). Atemperatura correlacionada comoutros fatores, como latitude e al-titude, pode influenciar a síntese ea destruição dos aromas. Assim,temperatura elevada aumenta a sín-tese dos aromas e também a velo-cidade de destruição deles. Durantea maturação, as uvas formam váriassubstâncias que dão a cada va-riedade seu aroma característico. Assubstâncias do aroma e da cor estãoprincipalmente confinadas na pelí-cula das bagas. Embora os materiaisprecursores dessas substâncias se-jam produzidos nas folhas, o aromaé sintetizado nas bagas. De maneirageral, durante a maturação, os aro-mas varietais seguem a evoluçãodos açúcares, mas não de formatotalmente paralela, diminuindoposteriormente no período de so-brematuração, com o possível apare-cimento de aromas indesejáveis quepodem depreciar o vinho obtido. Asuvas sadias apresentam um máxi-mo aromático até duas horas após acolheita e, mais tarde, entre o 7o e o14o dia. Dessa forma, para obter omáximo aroma, é necessário vinifi-car as uvas antes das duas horastranscorridas desde a colheita.

A presença de substâncias aro-máticas e sua quantidade, cada umacom seu aroma específico, não de-termina por si só a intensidadearomática do mosto ou vinho. Estadepende, em primeiro lugar, da vola-tilidade da substância, e também dacomposição do meio, pois o álcool,a acidez e a riqueza em açúcares exer-cem um importante papel. Além dis-so, existem interações entre os pró-prios componentes aromáticos;

m) sabor: é uma reação complexa dosreceptores olfativos e do gosto.Muitas substâncias contribuem pa-ra dar sabor às uvas. Os saboresprimários dos açúcares e ácidos são

os dominantes. Em uma menor es-cala, o tanino influi na adstringên-cia do fruto e, conseqüentemen-te, no sabor. O sabor não se de-termina pelas quantidades efetivasde açúcares, ácidos e taninos pre-sentes, mas pelas quantidadesrelativas dessas substâncias entresi.

FATORES QUE INFLUEM NAMATURAÇÃO

Diversos fatores influenciam na ma-turação da uva. Eles podem ser divididosem quatro grupos, conforme sua ocorrên-cia e possibilidade de interferência pelohomem.

Fatores permanentes

São constantes e não variam de um anoa outro. São eles a região, o solo, a varie-dade, o porta-enxerto.

O aspecto regional é o elemento quedeve ser avaliado em primeiro lugar, quan-do se planeja instalar um vinhedo, pois éresponsável pela diversidade de resulta-dos em matéria de qualidade e tipicidadedos seus produtos. De forma geral, a vi-deira em climas quentes fornece mostos ri-cos em açúcares e pobres em acidez e o in-verso em climas frios.

A fim de avaliar o comportamento dascultivares viníferas, a EPAMIG mantémvinhedos instalados em diferentes regiõesprodutoras para acompanhar a qualidadedo mosto obtido sob condições climáticasdiversas.

Como nas outras regiões do Sul e Su-deste brasileiros, a principal limitação doestado de Minas Gerais para produção dauva com destino à elaboração de vinhosde qualidade é o fato de a colheita coincidircom o período chuvoso. A única alternativapara favorecer os processos metabólicosda maturação seria a de alterar o ciclo davideira, desviando-o, através da poda equebra de dormência, para o período dassecas compreendido entre os meses de abrile outubro, conforme já é realizado pelosprodutores de uva para consumo in natura

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do Vale do Rio São Francisco. Entretanto,na região vitícola tradicional do Sul deMinas (Andradas, Caldas), esta técnica nãoé possível em função dos limites térmicosnecessários à obtenção de um novo ciclo.Por outro lado, na região Norte do País, afalta de amplitude térmica limita o acúmulodos polifenóis.

Uma alternativa é a produção em áreacom condições de temperaturas ambien-tais situadas entre os extremos de invernorigoroso e falta de amplitude térmica, ca-pazes de, ao mesmo tempo, permitir à vi-deira um segundo ciclo anual e possuiramplitudes térmicas aliadas a um outonoseco que favoreça a maturação da uva. Aregião cafeeira do Sul de Minas Gerais, emprincípio, reúne estas características e foiescolhida para as avaliações.

Os pesquisadores do Núcleo Tecno-lógico EPAMIG Uva e Vinho acom-panharam a evolução da maturação dacultivar Syrah em duas regiões produtoras,Caldas e Três Corações. Em Três Corações,as uvas foram colhidas no segundo cicloanual, no mês de julho, caracterizado porapresentar dias ensolarados, noites frescase precipitações pluviométricas pratica-mente inexistentes reunindo, assim, todasas condições ideais para a perfeita ma-turação da videira (Gráfico 1).

Observa-se no Gráfico 1 que os mostosobtidos das uvas cultivadas em Três Co-rações apresentaram teores de açúcaressuperiores (21,75 contra 18,5) e de acideztotal inferiores (101 contra 120) aos obti-dos das uvas colhidas em Caldas. Estudosestão sendo realizados para verificar oefeito do clima nos compostos fenólicos ena qualidade do vinho elaborado a partirdas duas regiões produtoras.

A natureza do solo e sua composiçãofísica e química exercem influência sobre aquantidade e a qualidade da uva. Sobre aqualidade influem positivamente carac-terísticas físicas como solos francos, soltos,profundos, mesmo que pedregosos e, entreas químicas, o potássio e o fósforo. Sobre aprodução influem positivamente, entre oscomponentes físicos, o predomínio da maté-ria orgânica e da argila e, entre os químicosos compostos nitrogenados.

Da variedade depende o tipo de vinho(fino ou comum), que a uva seja aromáticaou de gosto simples, ou de maturaçãoprecoce, média ou tardia. Também dependedesse fator o rendimento ou a quantida-de de produção e a sensibilidade ou re-sistência a pragas e doenças.

O porta-enxerto deve ser selecionadoconforme as condições do local de culti-vo e finalidade, pois confere à cultivar ca-racterísticas de resistência a condiçõesadversas do solo, fungos, além de ser res-ponsável pelo vigor da planta.

Fatores variáveis

São aqueles que não estão sujeitos àvontade do homem e estão relacionadoscom o clima anual. Estabelecem o ritmo dociclo vegetativo da planta e são consti-tuídos pela temperatura, luz e umidade.

A temperatura ou o calor é um fator queexerce influência importante sobre o ren-dimento e a qualidade da uva. A faixa ótimapara a atividade fotossintética e produçãode compostos fenólicos, principalmenteantocianinas é entre 25°C e 30°C.

A riqueza em açúcares da uva maduraestá diretamente relacionada com a in-solação, ou seja, a intensidade e a duraçãodas radiações luminosas sobre as folhas eos cachos. Da mesma forma, quanto maiora luminosidade, mais intensa é a cor da uva.

A água desempenha um importante pa-pel durante a maturação da uva, pois é o veí-culo de transporte das substâncias pelosórgãos vegetais. Entretanto, o excesso, assimcomo a escassez, pode afetar negativamen-te a quantidade e a qualidade dos frutos.

Rizzon et al. (2000) e Rizzon e Miele(2003, 2004) avaliaram a maturação das uvase caracterizaram o mosto e o vinho tintoelaborado a partir das uvas das cultivaresIsabel, Merlot e Tannat, obtidas de vinhe-dos instalados na cidade de Bento Gon-çalves (RS), em diferentes safras. Con-dições climáticas favoráveis verificadas noano de 1991 resultaram em maior teor deaçúcar no mosto e, conseqüentemente,maior graduação alcoólica e melhor qua-lidade dos vinhos elaborados a partir dastrês cultivares (Quadros 1 e 2).

Fatores modificáveis

Referem-se às práticas culturais, comopoda, adubação, irrigação.

Nos parreirais, a irrigação tem o pro-pósito de reduzir e conduzir a deficiên-cia hídrica da cultura e, dessa forma, maxi-mizar a produção e a qualidade do mosto, afim de aumentar os lucros. Estudos recen-tes de Riou e Lebon (2000), Salón et al.(2005) e Sivilotti et al. (2005) indicam que airrigação deve ser adaptada às condiçõesde cada parcela, pois a prática sistemática

Gráfico 1 - Evolução dos teores de acidez total (--)e açúcares (--) da cultivar Syrah,em Caldas e Três Corações, MG, safra 2003

FONTE: EPAMIG – Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho.

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61Vinhos finos: rumo à qualidade

de padronizar a irrigação por região resultaem erros que prejudicam a qualidade dasbagas. Um déficit hídrico moderado e pre-coce, antes do início da maturação, é fa-vorável à qualidade da uva.

A adubação deve manter o equilíbrioentre a alimentação da planta e a produ-ção e não forçar a planta a uma produçãoexcessiva. O excesso de potássio decor-rente da adubação desequilibrada aumentaa produção, porém reduz a concentraçãode açúcar nas bagas, aumenta o pH e,conseqüentemente, resulta em um vinhode qualidade inferior.

Fatores acidentais

Incidência de doenças e alterações cli-máticas, como geadas, granizo, seca.

ÍNDICES DE MATURAÇÃO DEUVAS DESTINADAS ÀVINIFICAÇÃO

A uva destinada à produção de vinhoé colhida sob diferentes critérios, em funçãodo país ou da região de produção, do tipode vinho a ser elaborado e das condiçõesnaturais reinantes em determinada safra. Osíndices de maturação para todo tipo de uvasão reunidos em quatro grupos.

Índice de maturação externo

Coloração da baga própria da varie-dade; lignificação da ráquis; facilidade dedesprendimento do pedúnculo, deixandoaderida uma porção da polpa (pincel); saborsuave, açucarado e agradável; aroma va-rietal próprio. Na baga madura, o mosto éviscoso e pegajoso; as sementes separam-se facilmente da polpa, as quais, por com-pressão, saem límpidas da película.

Índice de maturação físico

Cor da baga, peso do cacho, que deveser constante na uva madura ou apresentarredução pela evaporação de água e com-bustão de açúcares ou ácidos na sobre-maturação; redução da resistência do pe-dúnculo e película e da firmeza da polpa;aumento do rendimento em mosto emanutenção da sua densidade. A uva está

QUADRO 1 - Características do mosto das uvas das cultivares Isabel, Tannat e Merlot provenientesde Bento Gonçalves, RS, nas safras de 1991 e 1994

Densidade a 20°C (g/mL) 1,092 1,075 1,082 1,073 1,088 1,077

Brix 21,5 17,9 19,2 17,1 20,7 18,3

Acidez total (meq/L) 60,0 50,0 178,0 168,0 86,0 108,0

Brix/acidez total 47,8 47,1 14,3 13,6 31,8 22,6

pH 3,45 3,26 3,07 3,11 3,30 3,20

Ácido tartárico (g/L) 3,9 4,3 4,9 5,8 4,2 5,7

Ácido málico (g/L) 2,3 1,5 7,3 7,0 4,3 3,3

Tartárico/Málico 1,7 2,9 0,7 0,8 1,0 1,7

1991 19941991199419911994

Isabel MerlotTannatVariável

FONTE: Rizzon et al. (2000) e Rizzon e Miele (2003, 2004).

FONTE: Rizzon et al. (2000) e Rizzon e Miele (2003, 2004).

0,9965

9,44

78

8

3,01

20,8

2,84

18,96

3,98

1,85

22,4

140

30,4

0,8

288

0,160

0,295

0,455

0,542

34,6

0,9953

10,90

84

10

3,78

23,6

2,21

22,39

3,89

3,15

32,8

79

38,5

1,5

379

0,300

0,466

0,766

0,644

22,4

0,9925

12,38

64

7

3,59

22,0

2,34

20,66

4,79

2,20

20,8

217

34,1

1,37

295

0,244

0,390

0,634

0,626

28,8

1991 19941991199419911994

Isabel MerlotTannatVariável

QUADRO 2 - Características analíticas do vinho elaborado com as uvas das cultivares Isabel,Tannat e Merlot provenientes de Bento Gonçalves, RS, nas safras de 1991 e 1994

Densidade a 20°C (g/mL)

Álcool (% v/v)

Acidez total (meq/L)

Acidez volátil (meq/L)

pH

Extrato seco (g/L)

Açúcares redutores (g/L)

Extrato seco reduzido (g/L)

Álcool em peso/extrato seco

reduzido

Cinzas (g/L)

Alcalinidade das cinzas

Nitrogênio total (mg/L)

Polifenóis totais (I280)

Taninos (g/L)

Antocianinas (mg/L)

DO 420 nm

DO 520 nm

Intensidade de cor

(DO420+DO520)

Coloração (DO 420/DO 520)

SO2 total (mg/L)

0,9974

8,82

68

9

3,55

20,4

2,68

18,72

3,77

3,35

32,4

70

38,6

1,6

458

0,244

0,419

0,663

0,582

34,6

0,9954

10,00

70

7

3,24

19,6

3,23

17,37

4,60

2,35

22,0

158

31,9

1,39

289

0,184

0,314

0,498

0,586

32,0

0,9940

12,02

81

8

3,53

25,2

2,84

23,36

4,12

2,05

22,4

236

29,5

0,5

250

0,276

0,305

0,581

0,905

16,0

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62 Vinhos finos: rumo à qualidade

madura, quando a densidade, ou riquezaem açúcares, não varia sensivelmente numperíodo de dois ou três dias.

Índice de maturaçãoquímico

Durante a maturação, a concentraçãode açúcares mantém-se em constante esustentável aumento, enquanto a acideztitulável diminui. No momento da ma-turação industrial, os dois componentesmantêm-se praticamente estáveis durantealguns dias.

Índice de maturaçãofisiológico

Por si só são inexatos, mas tornam-seúteis, se acompanham o cálculo de outrosíndices de maturação. Compreendem o de-saparecimento da clorofila; respiração;análise de etileno.

Existem três pontos de colheita para auva, estabelecidos conforme o destino daprodução:

a) colheita fisiológica: é determinadaquando as sementes estão perfei-tamente conformadas para sua ger-minação;

b) colheita industrial: corresponde aomomento em que a uva tem o teormáximo de açúcar;

c) colheita tecnológica: correspondeao momento ótimo de colher a uva,conforme o seu destino. A uva paraconsumo in natura é colhida maiscedo do que a destinada à produçãode vinho, e esta varia conforme otipo de vinho que se deseja produ-zir (jovem ou para envelhecimento).A maturação tecnológica é o pontoa partir do qual não há acúmulo sig-nificativo de açúcares na baga deuva, nem expressiva queda da aci-dez.

O critério mais utilizado para a de-terminação do ponto de colheita é o teor deaçúcares. Isto porque o vinho é o produ-to da transformação do açúcar da uva emálcool e em produtos secundários. Sabe-se que, para a obtenção de 1°GL de álcool,são necessários 18 g/L de açúcar na uva. A

legislação brasileira determina que os vinhosde mesa devem ter entre 10°GL e 13°GL deálcool e proíbe qualquer adição de álcool aeles. No caso de colheita de uvas com baixoteor de açúcares, a legislação permite oacréscimo de açúcar, processo denominadode chaptalização, em quantidade suficientepara gerar no máximo 3°GL de álcool eenquadrar-se na faixa permitida.

Outro critério de mensuração da ma-turação da uva é o teor em ácidos. Este cri-tério, normalmente, é empregado junto como teor de açúcar, pois o balanço açúcar/acidez confere ao vinho um equilíbrio gus-tativo muitas vezes determinante para suaqualidade geral. Ao contrário dos açú-cares, os ácidos da uva diminuem a partirda mudança de cor. A determinação da aci-dez tartárica e málica da uva, aliada à medidados açúcares, fornece uma boa visua-lização do estádio de maturação da uva.

Entretanto, quando se produzem uvaspara elaboração de vinhos de qualidade, arelação açúcar/acidez total não é suficientepara assegurar que a uva foi colhida noseu ponto de máximo potencial qualitati-vo. Outros constituintes da baga são res-ponsáveis pelo aspecto visual (cor), gus-tativo (amargor, adstringência, corpo) ouaromático. Nos vinhos tintos, os polifenóissão importante parâmetro a ser levado emconta. Assim, desenvolveu-se recente-mente uma metodologia que permite avaliaro estado de maturação da uva tinta em fun-ção dos polifenóis em adição ao estudo doequilíbrio álcool potencial/acidez. É a de-terminação da maturação fenólica, ou seja,método de acompanhamento da maturaçãoda baga que compreende a determinaçãodo potencial antociânico e tânico e a suaextratibilidade a partir do material vegetal(AUGUSTIN; GLORIES, 1992; GUERRA,2002).

ACOMPANHAMENTO DAMATURAÇÃO PARADETERMINAÇÃO DO PONTO DECOLHEITA

O exame visual e a degustação das ba-gas constituem ferramenta de avaliação doestádio de maturação das uvas que permite,

em complemento às informações obtidasatravés das análises físico-químicas, decidirsobre a data de colheita, indicar os tiposde vinho que poderão ser elaborados e astécnicas de vinificação a serem utilizadas.

O método baseia-se na degustaçãosucessiva da polpa, da película e das se-mentes e da anotação de descritores bemdefinidos. Lotes de três bagas são forma-dos de forma aleatória em número de-pendente do tamanho e da homogeneidadedas parcelas. As bagas de cada lote sãoexaminadas na seguinte ordem:

a) aspecto das bagas;

b) degustação da polpa;

c) degustação da casca;

d) aspecto e degustação eventual dassementes.

O estado de maturação é caracterizadocom o auxílio de 20 notas descritoras, cadauma de um a quatro (Quadro 3).

Durante a maturação, o valor de algunsdescritores aumenta (açúcares, aroma fru-tal), enquanto outros diminuem (acidez, aro-mas herbáceos, adstringência dos taninos).

Para o acompanhamento da maturaçãoatravés de métodos físicos e químicos,colhem-se dois lotes de duzentas bagasrepresentativos do vinhedo. Com o pri-meiro lote faz-se o controle da maturaçãotecnológica, isto é, a densidade, o álcoolpotencial, o pH, a acidez total e o teor deaçúcar. Além disso, determina-se a relaçãobagaço/mosto.

O segundo lote será utilizado no estu-do da maturação fenólica. A partir dela,separam-se sementes e cascas. Das se-mentes são extraídos os taninos, via pro-cesso de extração sólido/líquido, com aajuda de um solvente orgânico. Os taninosassim extraídos e presentes na solução deextração são dosados pelo método deanálise de taninos totais. As cascas sãoanalisadas quanto aos teores de taninos eantocianinas totais.

A determinação das antocianinas é feitaem duas soluções. Uma parte da amostra étriturada numa solução a pH 3,2 e a outra édiluída numa solução a pH 1,0. Dessa forma,é possível mensurar o total dos compostosfenólicos da uva que pode ser extraído

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63Vinhos finos: rumo à qualidade

(pH 1,0) e ter uma idéia da quantidade doscompostos fenólicos extraídos num pro-cesso tecnológico normal (pH 3,2).

Durante a maturação, a diferença entreos resultados a pH 1,0 e pH 3,2 diminui, oque determina que a extratibilidade dospigmentos aumenta paralelamente a uma re-dução da extração dos taninos das sementes.

González-Neves e Ferrer (2005) ava-liaram a evolução da maturação das cul-tivares tintas ‘Tannat’ e ‘Merlot’ no sul doUruguai durante três safras. Estes autoresconstataram grande influência do efeitoanual sobre a composição polifenólica dauva e que a observação apenas dos índi-ces de maturação fenólica não foram su-ficientes para definir o momento ótimo decolheita, mas constituem dados importantespara definir as condições de vinificação.

Dessa forma, conclui-se que o acompa-nhamento da maturação deve ser realizadoatravés de avaliações conjuntas dos aspectostecnológicos (açúcares e acidez), de matu-ração fenólica (extratibilidade e teores deantocianinas e taninos), e de avaliações sen-soriais para fornecer informações sufi-cientemente precisas sobre o estádio dematuração e permitir escolher com precisão adata de colheita, visando à maior qualidadepossível para cada situação.

COLHEITA

A uva convenientemente monitorada aolongo da maturação será colhida no momen-to mais adequado à máxima expressão do seupotencial de qualidade em determinada sa-fra ou região. Desse modo, os procedimen-tos a serem adotados na colheita devem le-var em consideração a preservação desse po-tencial. Alguns cuidados básicos a seremobservados no momento da colheita são:

a) colher as uvas pela manhã, evitan-do as horas mais quentes do dia ereduzindo assim o calor de campo,indesejável para as fases iniciais deelaboração dos vinhos;

b) proceder à colheita manual, quepreserva mais a integridade física dauva, em relação à colheita mecânica;

c) acondicionar a uva colhida em cai-xas plásticas especiais, limpas, comcapacidade máxima de 20 kg;

d) manter a uva colhida à sombra emanuseá-la o menos possível;

e) encaminhar a uva à unidade benefi-ciadora imediatamente após a co-lheita;

f) evitar transportes a longas distân-cias e danos mecânicos;

g) proceder à seleção da uva colhida,de modo que venha a vinificar lotessemelhantes e sem problemas depodridão ou de desuniformidade dematuração;

h) se possível, resfriar rapidamente a uvana vinícola, antes do esmagamento.Este procedimento tem a vantagemde reduzir a atividade enzimáticaoxidativa na fase de esmagamento eprensagem, limitando o desenvol-vimento e a ação de bactérias acé-ticas. A conseqüência é a limitaçãoda produção de acidez volátil e apreservação da qualidade do vinho.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A qualidade do vinho depende, emprimeiro lugar, da qualidade da fruta. Estaqualidade está relacionada com a compo-sição química da uva que é dependente dometabolismo da planta, eventualmente deorganismos que parasitam a baga, dosfenômenos ligados à natureza do solo eclima e da intervenção humana.

REFERÊNCIASAUGUSTIN, M.; GLORIES, Y. Maturite phe-nolique des raisins rouges: application au millesime1991. In: UNIVERSITY DE BORDEAUX.Rapport des activités de recherches 1990-1992. Bordeaux, 1992, p.55-57.

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_______; _______. Avaliação da cv. Tannat paraelaboração de vinho tinto. Ciência e Tecnologia

FONTE: Rousseau (2001).NOTA: As observações representam as três bagas de uvas colhidas ao acaso.

QUADRO 3 - Descritores utilizados no método de degustação das bagas

Semente

Exame visual 1 - cor das bagas 16 - cor externa

2 - resistência mecânica

3 - capacidade de desgrana

Exame gustativo 4 - aderência à casca 9 - textura 17 - dureza

5 - açúcares 10 - intensidade tânica 18 - aromas

6 - acidez 11 - acidez dos taninos 19 - intensidade tânica

7 - aromas herbáceos 12 - adstringência 20 - adstringência

8 - aromas frutais 13 - secura dos taninos

14 - aromas herbáceos

15 - aromas frutais

Polpa CascaMétodo

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64 Vinhos finos: rumo à qualidade

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65Vinhos finos: rumo à qualidade

Elaboração de vinho tinto fino

Daniel Angelucci de Amorim1

Murillo de Albuquerque Regina2

Ana Carolina Fávero3

Renata Vieira da Mota4

Giuliano Elias Pereira5

1Engo Agro, M.Sc., Pesq.EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

2Engo Agro, Pós-Doc, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

3Enga Agra, B.S., Mestranda UFLA, Caixa Postal, 3037, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agra, Da, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correio eletrônico:

[email protected] Agro, Ph.D., Pesq. Embrapa Uva e Vinho/Embrapa Semi-Arido, Caixa Postal 23, CEP 56302-970 Petrolina-PE. Correio eletrônico:

[email protected]

INTRODUÇÃO

A legislação brasileira (BRASIL, 1990)define vinho como a bebida obtida pelafermentação alcoólica do mosto simples dauva sã, fresca e madura.

A denominação Vinhos Finos é utiliza-da para designar os vinhos elaborados apartir de uvas européias da espécie Vitisvinifera L. Ao contrário destes, vinhos quesão produzidos de uvas americanas comoa Vitis labrusca e seus híbridos são clas-sificados como Vinhos Comuns.

É importante ressaltar que esta clas-sificação é empregada unicamente para adiferenciação entre as espécies de uva uti-lizadas na elaboração do vinho, não es-

tando implícita a qualidade delas. O re-sultado dos métodos, os equipamentos eos cuidados utilizados durante o proces-so de elaboração, bem como na produçãoda uva, imprimem a qualidade do vinho.Existe maior apreciação, pelo consumidor,do vinho fino ou do vinho comum, emfunção das características gustativas decada tipo. Além disso, os consumidoressão bastante diferenciados, não existindoum tipo de vinho que seja considerado deaceitação global. Cada pessoa possui umperfil de exigência de qualidade, que deveser respeitado, em função do gosto pes-soal, do grau de conhecimento ou de seupoder aquisitivo.

O preço mais elevado de comercia-lização dos vinhos tintos finos é devido àsua elaboração e aos maiores custos deprodução da uva, sendo seu valor cada vezmaior em função da qualidade e mesmo dararidade de obtenção de determinado pro-duto. Ao contrário, o vinho comum, porapresentar custos de produção nitidamen-te mais baixos em todas suas etapas, nãoconsegue alcançar maiores preços de co-mercialização. Aproximadamente, 20% domercado nacional é abastecido com vinhosfinos, e a maior parte ainda é importada, eos outros 80% com vinhos comuns.

Existem centenas de variedades de Vitisvinifera que são utilizadas para elaboração

Resumo - A obtenção de vinhos tintos finos de qualidade depende de inúmeros fatoresque se iniciam na escolha do terreno, da variedade de videira e do porta-enxerto, dosistema de condução e do manejo da produtividade. Esses fatores, aliados às condiçõesmicroclimáticas do vinhedo, permitem a adequada maturação das uvas e estendem-seaté os processos enológicos de elaboração e conservação dos vinhos. As técnicasenológicas empregadas durante a vinificação devem estar em estreita relação com ascaracterísticas iniciais da uva e com o vinho que se pretende obter, buscando orientar-se para valorização das potencialidades e tipicidade que cada região pode oferecer aovinho. Estas técnicas são discutidas dentro de uma ótica de valorização do potencialqualitativo do vinho a ser obtido.

Palavras-chave: Vitis vinifera. Uva. Maturação. Vinificação.

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de vinhos tintos finos, distribuídas nasdiferentes regiões vitícolas do mundo.

Um fator primordial na elaboração debons vinhos finos é a qualidade da matéria-prima. É extremamente importante a boaadaptabilidade da variedade às condiçõesedafoclimáticas do local de instalação dovinhedo, fato que, aliado ao adequadomanejo agronômico, possibilita um ótimoestádio de maturação da uva. Este pré-requisito contribui muito para as po-tencialidades qualitativas do vinho, o quepossibilita, por exemplo, a elaboração devinhos tintos encorpados. Por outro lado,a tecnologia enológica empregada tambémé fundamental para a qualidade do vinho.Os equipamentos adequados (tanques,desengaçadeiras, bombas, prensas, filtros,etc.), uma vinícola bem dimensionada, autilização de insumos enológicos dequalidade, bem como a qualidade técnicaempregada, são essenciais à obtenção deum grande produto. Por fim, a logística e afilosofia de trabalho desde o planejamentodo vinhedo até a comercialização do pro-duto serão os determinantes desta qua-lidade.

Pode-se dizer que o vinho começa a serproduzido no vinhedo, sendo importanteo adequado manejo agronômico e o acom-panhamento da maturação das uvas, bemcomo os cuidados durante a colheita. Essasetapas são anteriores à chegada das uvasna vinícola que devem ser acompanhadaspelos enólogos (os profissionais do vinho),em estreita relação com os técnicos res-ponsáveis pelo vinhedo (agrônomos etécnicos em viticultura).

Este artigo descreve, resumidamente,as etapas e algumas técnicas de vinifica-ção em tinto tradicional, que são as maisutilizadas em todo o mundo, objetivando aobtenção de um vinho tinto fino. Existemvários outros tipos de vinificação, como,por exemplo, a vinificação por maceraçãocarbônica e a termovinificação, bem comotécnicas enológicas e detalhes de vi-nificações específicas em função das di-ferentes regiões vinícolas do mundo. Oprocesso de vinificação será descrito emdiferentes etapas de forma cronológica,

destacando a importância e os cuidadosde cada fase para a qualidade do vinho.Este processo está descrito, resumidamen-te, na Figura 1.

É importante ressaltar ainda que osdiversos trabalhos enológicos executadosna elaboração de um vinho são diferentesem função das condições climáticas nasquais ocorreu a maturação da uva e a vini-ficação. Assim, trabalhos preconizadospara elaboração de vinhos produzidos emregiões temperadas, como por exemplo,Bordeaux na França, ou com característicastemperadas como a região de altitude doSul de Minas Gerais, o Rio Grande do Sul eSanta Catarina, diferem em muitos aspec-tos dos de regiões quentes como Men-

donza, na Argentina, Jerez de la Frontera,na Espanha e de regiões tropicais comoPetrolina, no Brasil.

MATURAÇÃO DAS UVAS

Como já mencionado anteriormente, apossibilidade de elaboração de um vinhotinto de qualidade depende da qualidadeda matéria-prima, sendo esta intrinsecamenteligada à adequada maturação das uvas.

Por maturação entende-se o períodoque vai do início de mudança de cor dasbagas, ou pintor, à colheita, no qual ocorrea evolução dos teores de açúcares, deácidos e de compostos fenólicos dasbagas. Durante o processo de maturação,os teores de açúcares (majoritariamente

Figura 1 - Esquema de vinificação tradicional para vinho tinto seco

FONTE: Girard (2001).

Operações facultativas Operações obrigatórias

Colheita

Esmagamento

Maceração

Fermentaçãoalcoólica

Descuba

Proteção (SO2)

Adição de leveduras

Proteção contra alterações

Desengace

Prensagem

Assemblage

Fermentaçãomalolática

Trasfegas

Bagaço

Vinho prensa

Vinho gota

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glicose e frutose) sobem, alcançando va-lores aproximados de 170 a 230 gramas porlitro, os ácidos (principalmente tartárico emálico) abaixam para valores aproxima-dos de 75 a 110 meq/L (pH 3,6 a 3,4), asantocianinas acumulam-se e os taninos va-riam em função de sua estrutura (polime-rização) e de sua origem (sementes, cas-ca).

O acompanhamento da maturação e adefinição do adequado ponto de colhei-ta em função desses aspectos são os pri-meiros passos para a elaboração de umvinho de qualidade.

A maturação é acompanhada sema-nalmente após a fase de início de mudançade cor das bagas, ou pintor, e duas vezespor semana, quando da proximidade dacolheita. Para tanto, são realizadas análisesde refratometria (°Brix), de acidez total epH. Outras técnicas importantes de acom-panhamento da maturação são a degus-tação das bagas e avaliações de matura-ção fenólica que devem ser empregadasquando se pretende obter vinhos tintosfinos qualitativos.

COLHEITA E TRANSPORTE

Alguns cuidados devem ser tomadospor ocasião da colheita das uvas, duranteo transporte das caixas e na chegada à vi-nícola.

Sugere-se que os vinhedos sejam sub-divididos em parcelas, em função das varie-dades, produtividade, idade das plantas,porta-enxerto, tipo de solo, qualidadesalcançadas pelas colheitas anteriores, ín-dices de maturação, entre outros fatores,e, por conseguinte, as vinificações sejamrealizadas utilizando tanques de fermen-tação separados. Para as parcelas de mes-ma variedade que apresentarem a mesmaqualidade, as uvas podem ser fermentadasconjuntamente, objetivando otimizar ostrabalhos enológicos. Ao atingir o pontoideal de maturação de cada parcela, planeja-se a colheita em função da capacidade deprocessamento da vinícola.

A título de exemplo, em regiões quen-tes, mesmo em parcelas homogêneas, po-

dem ocorrer variações de maturação doscachos da mesma planta em vinhedo nosistema de espaldeira, em função da orien-tação das linhas de plantio em relação àtrajetória do sol. Para tal, a amostragem paraacompanhamento de maturação pode serrealizada adotando também este critério emesmo a colheita pode ser feita sepa-radamente.

No Brasil, a colheita da uva é feita ma-nualmente e demanda um grande númerode trabalhadores para sua realização. Comoem outras etapas da viticultura, a colheitaé forte geradora de trabalho temporário,exercendo importante papel social paraalgumas regiões agrícolas brasileiras, nasquais existe um grande número de famíliasque depende da agricultura. Em algunspaíses, onde há escassez de mão-de-obrapara a viticultura, parte de suas colheitas érealizada com máquinas. A colheita manual,se bem orientada, é mais qualitativa, pos-sibilita uma seleção dos cachos e podeevitar a ocorrência de danos físicos.

A estimativa da quantidade e da qua-lidade de uvas da parcela deve ser de-terminada antecipadamente à colheita pa-ra a correta programação do processo devinificação. De preferência, a colheita deveser realizada nas horas mais frescas do dia,mantendo as caixas sombreadas, e trans-portadas para a vinícola o mais rápidopossível. As caixas normalmente utiliza-das são de plástico com capacidade para,aproximadamente, 15 kg de uvas cada. Érecomendável que a metade inferior dessascaixas seja perfurada. As uvas são colhidascom o auxílio de uma tesoura de colheita ecolocadas sobre as caixas, evitando qual-quer choque ou injúrias. A caixa é com-pletada até um limite máximo que permita asobreposição de uma outra caixa sem queas uvas sejam amassadas. Deve-se evitaro contato direto da caixa com o solo paraque terra, folhas e ciscos não tombem so-bre a caixa inferior durante o transporte.Para tal, cada colhedor pode ter uma caixavazia que é deixada em contato com o solodurante todo o período de colheita, o queserve como suporte para as outras caixasde colheita.

No momento da colheita, realiza-se umaprimeira seleção de cachos, evitando os nãomaduros, atacados por insetos e pássarose com sintomas de podridões.

À medida que se colhe o número decaixas suficiente para preencher a carroceriado veículo (trator, caminhão), a carga é ime-diatamente conduzida à vinícola. Ela podeser acondicionada em paletes para facilitaro descarregamento. Para vinhedos maisdistantes, a utilização de refrigeração parao transporte da carga é importante para apreservação da qualidade da uva.

No momento da colheita também é feitauma amostragem bem representativa paraa avaliação de acidez total, oBrix e pH.

RESFRIAMENTO

Ao chegar à vinícola, caso haja a dis-ponibilidade de câmara fria, as uvas po-dem ser refrigeradas, possibilitando a di-minuição do calor de campo e a ação de en-zimas oxidativas por ocasião do proces-samento, período este que pode durar de 6a 24 horas, sendo de grande importânciaem regiões ou épocas quentes.

PESAGEM E RENDIMENTO

Assim que as uvas chegam à vinícolaelas são pesadas. Esta operação possibilitaestimar o volume de vinho a ser elaborado,bem como realizar os cálculos dos insumosa serem utilizados na vinificação.

O rendimento em vinho varia em funçãoda variedade, do ano, da época de colheita,do tamanho das bagas, da compactaçãodos cachos, entre outros fatores. Em suma,depende da relação mosto/(casca + se-mentes). Pode-se estimar, em média, de 65%a 70% do peso total das uvas em rendi-mento de vinho ao final de seu proces-samento. Uma aferição mais completa po-de ser realizada previamente através deuma amostra representativa das uvas, porprensagem e por verificação da relaçãomosto/bagaço.

SELEÇÃO DE CACHOS(TRIAGEM)

Atualmente, a seleção prévia de cachos

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vem sendo utilizada por vinícolas que obje-tivam alta qualidade para seus vinhos. Estaseleção consiste em eliminar os cachos nãomaduros, danificados, com podridões eaqueles originados de brotações secun-dárias, bem como folhas, pecíolos, pe-quenos ramos e qualquer outro materialindesejável. Este procedimento já é rea-lizado por ocasião da colheita e pode serreforçado através da utilização de uma me-sa de triagem para uma seleção mais cri-teriosa de cachos. Essa mesa de triagemconsiste em uma estrutura com um tapeterolante por onde os cachos são trans-portados até a desengaçadeira, e, no qual,de cada um de seus lados, são dispostosos operadores com a função de seleção doscachos.

DESENGACE

Esta operação é muito importante paraa qualidade do vinho e consiste na se-paração das bagas dos engaços (ráquis),realizada por uma máquina denominadadesengaçadeira (Fig. 2). Este equipamentonormalmente é construído em aço inox econsiste em um eixo com pás, preferen-cialmente em disposição helicoidal, quegira dentro de um cilindro perfurado emsentido contrário a este. Assim, as pásrealizam a separação das bagas que tom-bam pelas perfurações, enquanto que osengaços são arremessados pelas pás e eli-minados.

A desengaçadeira deve exercer suafunção de separação das bagas o mais sua-ve possível, evitando choques mecâni-cos abruptos. Para tanto, a disposição, onúmero e as dimensões das pás e sua prote-ção com borrachas, por exemplo, o contro-le da velocidade de rotação, o dimen-sionamento adequado em diâmetro e ocomprimento do cilindro, são importantesna qualidade do desengaçamento. O cor-reto dimensionamento do equipamentofavorece a maior eficiência na separaçãodas bagas, a presença da menor quantidadepossível de pedaços de engaços que se-guirão a linha de processamento, evita aocorrência de ferimentos fortes nos enga-

ços e dilacerações das bagas, contribuindopara minimizar a ocorrência de aromas etaninos herbáceos ao futuro vinho.

Normalmente as desengaçadeiras sãoacopladas de rolos para o esmagamentodas bagas logo após o desengaçamento,sendo denominadas desengaçadeiras-esmagadeiras. Entretanto, atualmente, al-gumas vinícolas fazem a triagem da uvaapós o desengace para obtenção de vinhosmais qualitativos. Dessa forma, o esma-gamento das bagas será realizado somenteapós a triagem.

TRIAGEM APÓS DESENGACE

Esta operação consiste na eliminação

de pequenos pedaços de engaços quepassam pela desengaçadeira.

Após o desengace das uvas, as bagastombam sobre uma mesa de triagem queas transporta intactas até a esmagadeira.Neste percurso são retirados os pequenospedaços de engaços que porventura te-nham passado pela desengaçadeira. Essamesa pode ser com estrutura rolante ouvibratória.

ESMAGAMENTO DAS BAGAS

O esmagamento das bagas é realizadopor uma esmagadeira, composta por doisrolos de material plástico ou revestidos deborracha, por onde as bagas passam e so-

Figura 2 - Desengaçadeira com controle de velocidade

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frem uma pressão suficiente para seu rom-pimento. Este procedimento deve serdelicado de tal maneira que permita a pri-meira separação do mosto da parte sólidasem que ocorram dilacerações das cascas.

Geralmente, a esmagadeira está lo-calizada acoplada à desengaçadeira ou estálocalizada ao final da mesa de triagem, aco-plada à bomba, quando se utiliza este tipode seleção (Fig 3). Em casos especiais, elasestão localizadas sobre os tanques de fer-mentação e, nesses casos, as bagas sãotransportadas intactas, com auxílio de es-teiras rolantes, só sofrendo o rompimentopor ocasião da entrada no tanque. Em al-gumas vinícolas, principalmente em re-giões mais quentes, o esmagamento nãovem sendo mais utilizado, somente o de-sengace, pelo fato de ser observada umaalta formação de borras ao final da fermen-tação, estando as películas desintegradas.

ADIÇÃO DE ANIDRIDOSULFUROSO

Assim que a uva é esmagada é essencialproteger o mosto contra a ação do oxigênioe da contaminação microbiana. O produtoenológico utilizado para esse fim é o dióxidode enxofre ou anidrido sulfuroso (SO

2) que

possui as funções de proteção contra asoxidações (antioxidante), inibição do de-senvolvimento de microrganismos (anti-séptico), inibição de enzimas oxidativas(antioxidásico) e proteção dos aromas dovinho (RIBÉREAU-GAYON et al., 2004).

O produto é apresentado em forma depó ou pastilhas efervescentes de me-tabissulfito de potássio, soluções aquosasde bissulfito de potássio ou de meta-bissulfito de potássio em concentração de5% a 20%, ou em forma de gás.

As dosagens utilizadas são de acordocom a sanidade das uvas e o pH do mosto.De modo geral, utiliza-se a dose de SO

2 de

50 mg/L (5 g/hL) de mosto obtido de uvassadias, com pH em torno de 3,3 a 3,4, po-dendo utilizar até 100 mg/L (10 g/hL), oumais, em uvas com ataque de podridões ouquando apresentam pH elevado, em tornode 3,8 a 4,0, como o verificado em regiões

muito quentes. No caso específico de ocor-rência de podridões nas uvas, a qualidadedo vinho estará comprometida.

O emprego do SO2 deve ser muito cui-

dadoso, pois pode afetar negativamente aqualidade do vinho, seja por degradaçãodas antocianinas, ou por gerar defeitosorganolépticos desagradáveis causadospor compostos enxofrados - como é o ca-so do H

2S, que gera odor de ovo podre -

e outros compostos responsáveis pelosodores de redução. O seu excesso podegerar dificuldades iniciais da fermentaçãoalcoólica, inibir as bactérias láticas e retar-dar a realização da fermentação malolática,e ainda provocar corrosão do aço inox dosequipamentos.

Outro fator importante referente à adoçãodo SO

2 é com relação à toxicidade dos sulfi-

tos à saúde humana. A organização mundialda saúde fixou a dose diária admissível desulfitos de 0,7 mg/dia/kg, por ser um produ-to que causa alergia a pessoas sensíveis,provoca dores de cabeça e favorece a asma.

Novas correções com SO2 são realiza-

das em outras etapas da vinificação, bus-cando sempre deixar entre os valores de 25a 30 mg/L de SO

2 livre (SO

2 molecular, que

é sua forma eficaz de ação). O máximo permi-tido pela legislação brasileira é de 350 mg/Lde dióxido de enxofre total (soma do SO

2

livre com o SO2 combinado), valor bem

superior aos 160 mg/L regulamentadospara os países europeus em vinhos secos.

Assim, devem-se adotar medidas quepossibilitem a menor utilização do anidri-do sulfuroso, tais como, zelar pelo ótimoestado sanitário da colheita, evitar oxige-nação excessiva, adição de forma criteriosade aditivos como a vitamina C (antioxi-dante), ácido cítrico (redução do pH) ou degases protetores como o nitrogênio, gáscarbônico e o gelo carbônico (GIRARD,2001).

ACONDICIONAMENTO NOTANQUE

Após o esmagamento e adição de ani-drido sulfuroso, as uvas são transporta-das por mangueiras até o tanque de fer-mentação (Fig. 4), com o auxílio de bomba.Neste trajeto é importante que as uvas nãosofram esmagamento excessivo, atentandopara as especificações e qualidade de tra-balho da bomba, bem como para as di-mensões da mangueira. Sugere-se a utili-

Figura 3 - Bomba helicoidal acoplada com esmagadeira e dosador automático de

SO2

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zação de bombas helicoidal (Fig. 3) ou pe-ristáltica para esse trabalho. As bombasdo tipo centrífuga e de piston devem serevitadas, pois podem causar danos àsuvas, como quebra das sementes e di-lacerações excessivas das películas, comconseqüente liberação de taninos duros,herbáceos e adstringentes, o que causadesequilíbrio aos vinhos.

ANÁLISES DO MOSTO

Após o esmagamento das uvas sãoretiradas amostras representativas do mos-to para a realização de avaliações de den-sidade, teores de açúcares ou de sólidossolúveis (oBrix), acidez total, pH, nitrogênioassimilável e para a realização de umaprimeira degustação. Estas análises sãocomplementares às realizadas por ocasiãodo acompanhamento de maturação no vi-nhedo. Elas fornecem informações do po-tencial de produção de álcool, da neces-sidade ou não de correções de acidez e deaçúcares.

MACERAÇÃO E FERMENTAÇÃOALCOÓLICA

Uma vez acondicionado o mosto com

Para a realização da fermentação utilizam-se leveduras secas ativas (Saccharomycescerevisiae), na dosagem de 20 g/hL, quesão previamente hidratadas em água mor-na a 40oC. A adição desse preparado aotanque faz-se por ocasião da remontagemde homogeneização. A rápida multiplicaçãodas leveduras é garantida através de re-montagens com aeração no período inicialdo processo de fermentação. As análisesde nitrogênio assimilável e tiamina pre-sentes no mosto, que são fatores nutri-cionais essenciais às leveduras, são im-portantes para o uso adequado, e somentese necessário, de produtos comerciais paraa nutrição das leveduras, evitando o efeitoprejudicial, quando utilizados excessiva-mente. A utilização de compostos nitro-genados (sulfato ou fosfato de amônio,tiamina) faz-se necessária quando os va-lores de nitrogênio assimilável estão abaixode 150 mg/L.

Cabe ressaltar que a adição de SO2, após

o esmagamento, possibilita o controle deboa parte das leveduras indígenas e demaismicrorganismos naturalmente presentes nasuvas. Assim, a adição de uma leveduraselecionada que proporcione característicasfavoráveis ao vinho a ser elaborado garanteum ganho qualitativo ao produto.

As enzimas pectiolíticas constituemoutro adjuvante enológico que pode serutilizado no processo de vinificação. Elastêm como vantagens facilitar a extração depolifenóis, em especial as antocianinas,realçando a cor vermelha mais intensa dovinho tinto; favorecer a prensagem, aumen-tando o rendimento em mosto; favorecer aclarificação e a filtração. Normalmente, ospreparados comerciais são utilizados nadosagem de 2 a 5 g/hL e adicionados logoapós o esmagamento ou no início da fer-mentação alcoólica.

Em uma primeira fase, denominada tu-multuosa, o processo de fermentação émuito intenso, com aumento de tempe-ratura e forte liberação de gás carbônicoque faz com que as partes sólidas das uvassubam e formem o “chapéu”. Com isso, boaparte do bagaço não estará mais em contatocom o líquido e para a adequada extração

Figura 4 - Tanque de fermentação com

controle de temperatura interno

as bagas no tanque de fermentação co-meça-se o processo de maceração, queconsiste no período em que as cascas esementes ficam em contato com o mosto.Este processo busca extrair principalmen-te os compostos fenólicos presentes nascascas. Dentre eles pode-se, resumida-mente, citar: as antocianinas que são osprimeiros a serem extraídos e os respon-sáveis pela cor do vinho tinto; e os taninos,fortes antioxidantes, responsáveis pelaestrutura dos vinhos e pela sensação deadstringência na boca. Os taninos tambémsão extraídos das sementes durante a ma-ceração ou podem vir da madeira da barrica,quando os vinhos são estagiados nesta.

É durante o processo de maceração efermentação que o enólogo define e executaos procedimentos de vinificação que emmuito contribuem para a qualidade final dovinho. Alguns cuidados são imprescin-díveis nessa fase.

Atualmente, a grande maioria das vi-nícolas que trabalham com elaboração devinhos finos utiliza tanques em aço inoxpara a realização da maceração/fermenta-ção e para o armazenamento dos vinhos.São materiais considerados de excelentequalidade para estes fins. Os tanques defermentação são dotados de sistemas derefrigeração do mosto em fermentação pa-ra a adequação da temperatura (cintas ex-ternas ou serpentinas internas). Na parteinferior desses tanques encontra-se umapequena porta para a retirada do bagaçopor ocasião da descuba (separação do vi-nho do bagaço). Importante também sãoas dimensões desses tanques, que nãodevem ser de grande volume e a sua alturadeve estar próxima da medida de seu diâ-metro, o que possibilita um formato quemantém maior contato entre o mosto e aparte sólida durante o processo de ma-ceração e um rápido enchimento que per-mite as vinificações separadas das di-ferentes parcelas dos vinhedos.

Junto ao processo de maceração ocorrea fermentação alcoólica, que consiste natransformação dos açúcares (glicose e fru-tose) em álcool etílico e gás carbônico, rea-lizada por ação de leveduras.

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dos compostos fenólicos é necessária arealização de remontagens, que consistemna retirada do líquido da parte inferior dotanque, através de bombeamento, e suadistribuição sobre o chapéu. Numa se-gunda fase, agora lenta, a intensidade defermentação diminui, devido à diminuiçãodos açúcares e ao aumento do álcool.

Além das operações físicas, como aremontagem e a prensagem, a temperaturae o teor em álcool também favorecem aextração de polifenóis.

Em alguns casos, para valorizar a ex-tração de aromas, pode ser realizada umapré-extração a frio, antes da fermentação,entre 8-10°C, durante 24-72 horas, depen-dendo da qualidade das uvas na colheita.

Todo o processo de fermentação éacompanhado através de avaliações diárias(duas vezes ao dia) da densidade do mostoe de sua temperatura. O valor inicial dadensidade fornece o teor em açúcares e oprovável teor alcoólico que o vinho al-cançará, e o seu acompanhamento permiteanalisar o avanço da fermentação. Comessas avaliações pode-se, por exemplo,descobrir uma possível parada de fermen-tação (quando a densidade se estabiliza)por excesso de temperatura ou elevaçãodo teor alcoólico e solucionar o problema atempo, realizando a descuba com aeração.Assim um mosto, por exemplo, que comecea fermentar com densidade 1088, quecorresponde a 204 g/L de açúcar, tem po-tencial de gerar 12oGL de álcool (valoresestimados por tabelas específicas, commosto a 20oC), considerado um mínimo ade-quado para a conservação dos vinhos tin-tos. Com o passar dos dias, a densidade vaidiminuindo e em seu final de fermentaçãochega a valores um pouco abaixo de 996.Quando se estabiliza o valor da densidade,considera-se o fim da fermentação alcoólica.

A avaliação da densidade é utiliza-da também para a correção do teor de açú-car do mosto, operação denominada chap-talização, realizada no início do processode fermentação. Mostos de uvas que nãotenham atingido uma boa maturaçãonecessitam da adição de açúcar para al-cançar um grau alcoólico mais elevado e

garantir a melhor conservação do vinho.Por exemplo, um mosto com densidade de1078 (10,5oGL de álcool provável) paraalcançar 12oGL no futuro vinho precisa daadição de 27 g/L de açúcar. Considera-seque 18 g/L de açúcar de cana geram 1oGLde álcool. A quantidade total de açúcar aadicionar é de acordo com o volume demosto, calculado através do total de quilosde uvas adicionadas ao tanque.

A utilização de açúcar para a correçãode mosto é realizada em anos em que asuvas apresentam dificuldades de acumu-lação de açúcares, sendo permitido le-galmente o aumento de até 3oGL de álcoolcom a utilização de açúcar de cana. O idealpara a qualidade do vinho é que a ma-turação da uva ocorra adequadamente, nãonecessitando, assim, da chaptalização,sendo extremamente importante a boaadaptabilidade da variedade às condi-ções edafoclimáticas da região, bem comoo adequado manejo vitícola.

Outras correções de mosto dizem res-peito à acidificação, para o caso de uvasproduzidas em regiões ou épocas quentes,ou a desacidificação, quando, por exem-plo, as uvas são produzidas em condiçõeschuvosas que dificultam a completa ma-turação e a queda do ácido málico. Paratanto, pode-se lançar mão do ácido tartáricopara a acidificação e do carbonato de cálciopara a desacidificação, ou de produtos co-merciais afins.

As avaliações diárias de temperaturasão importantes para a correta programaçãoda temperatura de fermentação. A tempe-ratura de fermentação é modulada de acor-do com a programação inicial da vinificaçãoem função da qualidade da matéria-prima edo vinho que se busca elaborar. De maneirageral, a extração de compostos fenólicosaumenta com a temperatura. Por outro lado,a preservação dos aromas é garantida comas baixas temperaturas. Assim, quando setêm uvas bem maduras e o objetivo é a ela-boração de vinhos encorpados com po-tencial de guarda, com passagem embarricas de carvalho, propõem-se tem-peraturas de 25oC a 28oC, que possibilitama maior extração dos polifenóis da uva ou

até mesmo 28oC a 30oC. Temperaturas muitoelevadas favorecem a perda de aromas defrutas vermelhas e a elevação da acidezvolátil. Ao contrário, para elaboração devinhos mais leves, frutados e para con-sumo jovem deve-se optar por temperaturasde fermentação mais baixas.

Da mesma forma, o tempo de macera-ção e a intensidade das remontagens tam-bém definem essas características citadas.Para vinhos de guarda, as remontagens sãomais intensas e o período de maceração élongo. Na região de Bordeaux, na França,tradicional na elaboração de vinhos tintosde guarda, fazem-se três remontagens pordia no início da maceração e em cadaremontagem há a passagem de 1 a 1,5 vezeso volume de líquido do tanque, e o períodode maceração estende-se de 20 a 30 dias,sendo importante nesses casos a proteçãodo chapéu contra contaminações. Para tal,o tanque que começa, durante a fermen-tação tumultuosa, com a tampa superioraberta para facilitar a eliminação do gáscarbônico é fechado a partir de 1010 dedensidade, colocado o batoque hidráulico(sistema que permite a saída de gás car-bônico e impede a entrada de ar), e segueem sistema fechado até a sua descuba. Aintensidade das remontagens é definidaatravés das degustações diárias. Assim, ovolume bombeado em cada remontagem vaidiminuindo em função da queda da den-sidade e também da qualidade e intensida-de tânica do mosto em processo de fer-mentação.

Já em outras regiões, para a elabora-ção de vinhos jovens, preconizam tem-peraturas abaixo de 25oC e maceraçõesabaixo de sete dias, até, às vezes, com tem-peraturas entre 18oC a 22ºC e maceraçãode três a quatro dias. É importante res-saltar que todas estas definições estãoestritamente ligadas à variedade de uva eao seu potencial para um determinado ti-po de vinho, à região do vinhedo e às con-dições climáticas predominantes durantea maturação da uva, à qualidade da uva,ao objetivo da vinícola, ao mercado parao vinho, entre outros fatores.

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DESCUBA E PRENSAGEM

Após a decisão de finalizar a macera-ção, por meio das degustações, realiza-sea descuba, que consiste na separação daparte líquida e sólida. Retira-se o mostoatravés do registro inferior e o acondicionaem outro tanque, completando-o, sendoprovido de batoque hidráulico. Assim, omosto continua em fase de fermentaçãolenta. Este mosto é considerado o vinho-gota, de melhor qualidade.

Como uma considerada parte de mostoainda está aderida ao bagaço, é necessá-rio realizar uma prensagem, obtendo-se ovinho prensa. Este vinho, em função dapressão utilizada, principalmente ao fi-nal da prensagem, é de qualidade inferior,apresentando gosto herbáceo e maior ads-tringência, devendo ser acondicionadoseparadamente. Já o vinho de início de pren-sagem poderá ser misturado, operaçãodenominada assemblage ou corte, ao vinho-gota, desde que comprovada sua qualida-de por degustações e análise de pH.

Existem diversos tipos de prensas como,por exemplo, a prensa vertical descontínuae a prensa pneumática (Fig. 5).

FERMENTAÇÃO MALOLÁTICA

Esta fermentação consiste na trans-formação do ácido málico em ácido lácticopor ação de bactérias lácticas, presentesnaturalmente no vinho ou adicionadasartificialmente, como é o caso dos pre-parados à base da espécie Oenococcusoeni, para garantir uma perfeita trans-formação. É importante para a melhoragustativa do vinho, diminuindo sua acideztotal (aumento de pH), a adstringência e asensação de calor ligado ao álcool. Nor-malmente, todos os vinhos tintos realizama fermentação malolática.

As bactérias lácticas desenvolvem-semais facilmente em um meio rico em vi-taminas e aminoácidos, de pH elevado,pobre em álcool e em SO

2, e a uma tem-

peratura aproximada de 25oC.

TRASFEGAS E ATESTOS

Trasfega é a operação de passagem do

vinho de um tanque para outro, eliminando-se a borra decantada ao fundo. É um dosprocessos mais simples de limpeza (clari-ficação) do vinho. É realizada após a fer-mentação malolática e conforme a neces-sidade, normalmente a cada três a quatromeses.

Durante estes processos realizam-seanálises químicas do vinho e, quando ne-cessário, corrige-se o teor de SO

2 livre, man-

tendo-o entre 25 e 30 mg/L.O atesto é a operação para completar o

tanque com vinho de mesma qualida-de, evitando a presença de ar. É realizadorotineiramente, devido às variações devolumes causadas por evaporação e mu-dança de temperatura.

ESTÁGIO EM BARRICAS DECARVALHO

O objetivo da utilização de barricas decarvalho é enriquecer a qualidade dovinho, seja para conferir novos aromas(baunilha, café, coco, cravo-da-índia, etc.),diferente tonalidade de cor, enriquecimen-

to em polifenóis, seja para obtenção detaninos mais arredondados (macios) emboca. São os chamados vinhos de guarda,que somente estarão aptos para ser con-sumidos após alguns anos de envelhe-cimento em garrafas. Trata-se de vinhosque apresentam uma grande complexidadearomática e gustativa e possuem valorescomerciais maiores.

As barricas mais tradicionais são de225 litros de capacidade, podendo ser decarvalho europeu ou americano. Atual-mente, tem-se destacado muito as barri-cas francesas (espécies Quercus robur eQuercus petraea) e as americanas (Quercus

alba). A origem geográfica e a espécie in-terferem bastante no conteúdo aromáticoe polifenólico da madeira. De maneiracomparativa, as barricas de carvalho fran-cês aportam mais taninos, porém as barri-cas americanas são muito ricas em subs-tâncias aromáticas.

Os vinhos estagiados em barricasapresentam uma melhor estabilidade damatéria corante, coloração mais escura e

Figura 5 - Prensa pneumática

Danie

l A

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morim

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73Vinhos finos: rumo à qualidade

taninos mais macios, quando a extraçãodos compostos da madeira não tenha sidomuito violenta, e o tempo de permanênciana madeira seja suficientemente longo. Paratanto, é extremamente importante conhe-cer o potencial da uva, principalmente aintensidade e a qualidade dos taninos, etrabalhar toda elaboração com o objetivode obter vinhos com uma carga tânicasuficiente para a permanência em barricas.Neste ponto, são importantes um períodode maceração maior e uma realização deremontagens mais freqüentes e enérgicas.No manejo com barricas, devem-se tomaralguns cuidados. Durante a realização dastrasfegas pode ocorrer uma excessivaoxigenação com riscos de desenvolvimen-to de bactérias acéticas, sendo muito im-portante o acompanhamento da acidezvolátil do vinho e a correção do SO

2 livre,

bem como a adequada lavagem da barricae seu tratamento com enxofre. A cave, ondese localizam as barricas, deve ser mantidacom umidade relativa entre 70% e 90% etemperatura próxima a 15oC, para evitar oexcesso de evaporação da água e do álcool.

O tempo de permanência dos vinhosem barricas deve ser em função do seu po-tencial, de forma que os aromas originadosda uva e revelados pela fermentação (pri-mários e secundários, respectivamente)não sejam mascarados pelos aromas damadeira. Atualmente, verifica-se a presençade notas aromáticas oriundas da madeirade carvalho em muitos vinhos, mas muitasvezes não são trabalhados no conceito deelaboração de vinhos de guarda. Passampoucos meses em barricas ou são tra-balhados com a utilização de chips decarvalho (pequenos pedaços de madeira).

COLAGEM

É uma operação que consiste na apli-cação de produtos clarificantes para asse-gurar a clarificação e a estabilização dovinho, eliminando partículas coloidais,principalmente de proteínas, suspensas novinho, bem como metais como ferro e cobre,diminuindo os riscos de casses metálicase diminuindo também a carga de micror-

ganismos. Para tanto, utilizam-se colasorgânicas (gelatinas, albuminas, caseínas,etc.) ou colas minerais (Bentonites), de-vidamente preparadas e dosadas.

TRATAMENTO A FRIO

O tratamento do vinho através de baixatemperatura objetiva insolubilizar sais debitartarato de potássio, o que auxilia naredução da acidez total do vinho e evita oaparecimento de cristais destes sais dentrodas garrafas, quando o vinho é submeti-do a baixas temperaturas após o engar-rafamento.

O frio que ocorre no inverno auxilianeste tratamento, mas não é suficiente paraa adequada insolubilização e precipita-ção dos sais. Para tanto, utiliza-se tratar ovinho com frio gerado por equipamentosespecíficos, mantendo-o a temperaturas emtorno de -3ºC por um período de, apro-ximadamente, 15 dias.

FILTRAÇÃO

A filtração é um tratamento físico queconsiste em passar o vinho por um subs-trato poroso. Complementando o efeito daclarificação natural do vinho e da colagem,a filtração objetiva eliminar partículas emsuspensão, deixando o vinho límpido ebrilhante, melhorando sua qualidade visual,bem como auxiliando na redução da po-pulação microbiana e na sua estabilidademicrobiológica.

Normalmente, utilizam-se filtros a ter-ra (diatomáceas) para filtrações das par-tículas mais grosseiras; filtros a placas(celulose), com diferentes porosidades, pa-ra intensidade de filtrações que variamdesde a retenção de partículas maiores, pas-sando pela filtração mais fina até a este-rilizante, e filtros esterilizantes, utilizadosantes do engarrafamento.

A filtração contribui para a clarifica-ção do vinho e para sua estabilidade mi-crobiológica, porém elimina compostosfavoráveis à qualidade sensorial do vinho.A proporção de compostos aromáticos, depigmentos e de taninos eliminados au-menta com a fineza da filtração e com o

número de manipulações, razão pela qualesse tratamento deve ser realizado com mui-to critério.

Em regiões tradicionais de elaboraçãode vinhos de guarda da França, muitasvinícolas não utilizam o processo de fil-tração, realizando apenas a colagem comalbumina de ovo, além das várias trasfegas.Para esse procedimento é essencial umcontrole higiênico rigoroso de todas asetapas da vinificação (da produção da uvacom qualidade até o engarrafamento).

CORTES

Os cortes são as misturas de diferentesvinhos (de diferentes parcelas, proce-dências, ou mesmo variedades de uva), quetêm como objetivo melhorar o equilíbrio(características visuais, olfativas e gus-tativas) entre seus componentes (acidez,teor alcoólico, resíduos de açúcar, taninos,coloração) e, conseqüentemente, melhorara qualidade. Previamente fazem-se de-gustações dos diferentes vinhos e definem-se os cortes, que são feitos em pequenasproporções e, em seguida, passam poranálises sensoriais. Definidas as melhoresproporções, os vinhos são misturados emgrandes quantidades.

ENGARRAFAMENTO

Antes do engarrafamento algumasanálises do vinho são importantes, taiscomo: teor alcoólico, açúcares residuais,acidez total e pH, acidez volátil, teores deoxigênio, ferro, cobre, proteínas, SO

2 livre

e total. Estas informações permitem ve-rificar, se o vinho está em conformidadecom os limites analíticos estabelecidos pelalegislação brasileira (BRASIL, 1988), bemcomo conhecer seu potencial de conser-vação, sensibilidade às oxidações e àscasses protéicas, férricas ou cúpricas. Ou-tras análises complementares podem serrealizadas para melhor conhecer o vinho,tais como: o teor de CO

2, turbidez, cor

(antocianinas), índice de polifenóis totais(IPT), a população e espécies de micror-ganismos.

O engarrafamento é uma etapa fun-

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damental na manutenção da qualidade dovinho elaborado. A qualidade da água delavagem, a higiene e a esterilização ade-quadas dos equipamentos, a correta lava-gem das garrafas, a eficiência qualitativada engarrafadora e da arrolhadora e a qua-lidade das rolhas são alguns detalhes destaimportante etapa.

Existem vários tipos, modelos, cores,pesos e dimensões de garrafas, mas nor-malmente são utilizadas garrafas novascom capacidade de 750 mL, sendo as maiscomuns as do tipo bordalesa ou borgonha.As garrafas novas são lavadas com pro-dutos específicos e enxaguadas abun-dantemente com água estéril, garantindo asua desinfecção, eliminação de poeira e departículas de vidro que porventura possamexistir. Após, são devidamente escorridase seguem à linha de engarrafamento.Normalmente, utilizam-se engarrafadoras denível constante, devidamente esterilizadaspor ocasião do uso, que injetam gás inerte(N

2 ou CO

2) antes do enchimento com o

vinho e novamente antes da colocação darolha, procedimentos realizados para di-minuir os efeitos oxidativos do ar.

A maior parte das rolhas utilizadas é decortiça natural inteiriça ou aglomerada.Atualmente, já é comum a utilização derolhas sintéticas. As rolhas de cortiçapossuem dimensões variadas, com diâme-tros que variam de 22 a 38 mm e com-primento de 38 a 53 mm. O diâmetro maisutilizado é o de 24 mm e o comprimentovaria em função do potencial de lon-gevidade do vinho, de 40 mm para vinhosfinos de consumo jovem e 44 a 50 mm paravinhos de guarda. A preservação dascaracterísticas do vinho depende muito docorreto arrolhamento, que é função daqualidade e do adequado armazenamentodas rolhas e das corretas especificaçõestécnicas da arrolhadeira.

Após a colocação das rolhas, as gar-rafas permanecem por algumas horas naposição vertical e, em seguida, são acon-dicionadas em paletes na posição horizontalque são levados ao local de armazena-mento.

ARMAZENAMENTO EENVELHECIMENTO NAGARRAFA

O local de armazenamento das garrafasde vinho deve ser escuro, bem higienizado,ventilado, com temperaturas amenas econstantes (aproximadamente 16°C), umi-dade relativa moderada. Ele pode ser feitoem caves subterrâneas ou depósitos apro-priados com controle das condições am-bientais.

O processo de envelhecimento do vi-nho acontece dentro da garrafa, sob umambiente redutor, onde ocorrem diversastransformações físico-químicas responsá-veis pela evolução dos compostos fenó-licos, afetando as propriedades organo-lépticas do vinho, modificando sua cor,amargor, adstringência e aromas. A cor dovinho evolui do vermelho-violeta, quan-do jovem, ao vermelho-amarronzado. Ostaninos polimerizam-se diminuindo aadstringência e contribui com o arredon-damento do vinho. Seus aromas iniciaisevoluem formando os aromas terciários quecompõem o buquê do vinho (conjunto dosaromas primários, secundários e terciários).A complexidade organoléptica do vinho,que traz sua valorização, está correlacio-nada com as adequadas práticas de vini-ficação, em função do potencial e da qua-lidade da uva, e aumenta com a utilizaçãocorreta de barricas de carvalho.

ROTULAGEM E CAPSULAGEM

Atingido o momento adequado para osvinhos serem comercializados estes sãocapsulados e rotulados. As informaçõesobrigatórias presentes no rótulo e contra-rótulo são: marca, teor alcoólico, volume,aditivos utilizados, local de origem, dadosdo produtor, classificação quanto à cor eao teor de açúcares, responsável técnico,número e registro no Ministério da Agricul-tura, Pecuária e Abastecimento (MAPA),prazo de validade, composição do produtoe informações que atendam ao Código deDefesa do Consumidor. Outras infor-mações facultativas são: nome da va-riedade, safra, indicação de origem ou

procedência, indicação do processo de vi-nificação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O planejamento da atividade vitivi-nícola, que agrega desde a escolha da regiãopara a implantação dos vinhedos até oconhecimento do mercado, é o principalfator de sucesso do produto vinho. Assim,com o conhecimento prévio das condiçõesclimáticas, dos tipos de solos, relevos e deseus regimes hídricos, aliados à pos-sibilidade de diferentes manejos vitícolas,podem-se escolher as variedades de videirae de porta-enxertos que melhor expres-sem a qualidade da uva para a vinificação.Todos estes parâmetros técnicos, de ex-trema importância, só serão atendidosquando houver uma sintonia fina entre ostécnicos da viticultura e os enólogos. Umaequipe bem coesa possibilita que a uva se-ja bem trabalhada no campo e atenda àqualidade necessária para elaboração deum bom vinho tinto. A partir da colheita,compete aos enólogos a responsabilidadeda transformação da uva em vinhos dequalidade. Neste ponto o adequado di-mensionamento da vinícola e dos equi-pamentos, a higiene, sempre em primeiroplano, e a utilização dos recursos eno-lógicos apropriados, sem exageros, farãocom que o objetivo seja alcançado.

A busca pela qualidade deve ser in-cessante, não apenas por possibilitar aagregação de valor ao produto, mas tam-bém por disponibilizar produtos cada vezmais agradáveis e seguros, além de soli-dificar o conceito das regiões vitícolasjunto aos consumidores.

Apesar dos notáveis ganhos qua-litativos que a indústria enológica brasileiravem alcançando recentemente, boa partedos consumidores nacionais ainda des-conhece a qualidade dos vinhos bra-sileiros, seja por falta de informação, oumesmo por preconceito motivado pelahistória recente da produção de vinhosfinos no Brasil. Assim, torna-se extre-mamente importante que os diferentesatores da cadeia produtiva da vitivini-

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76 Vinhos finos: rumo à qualidade

cultura nacional organizem-se cada vezmais em busca da obtenção de vinhos dequalidade e, ao mesmo tempo, dêem aoconsumidor melhor informação sobre ovinho.

Por outro lado, e no caso particular dasnovas regiões vinícolas brasileiras, além daqualidade, torna-se imprescindível a bus-ca pela identidade própria de novos vinhosque retratem ao mesmo tempo o clima, osolo e a cultura da região de cultivo, sem oque todo esforço investido na produçãopoderá ser perdido pela excessiva con-corrência com vinhos de regiões maistradicionais. Neste contexto, e por se tra-tar de regiões pioneiras, o papel das ins-tituições de pesquisa e desenvolvimentoé muito importante no auxílio ao equa-cionamento das inúmeras variáveis téc-nicas que viabilizem a elaboração de vi-nhos finos com qualidade.

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Elaboração de vinho branco fino

Luiz Antenor Rizzon1

Júlio Meneguzzo2

1Engo Agro, D.Sc., Pesq. Embrapa Uva e Vinho, Caixa Postal 130, CEP 95700-000 Bento Gonçalves-RS. Correio eletrônico:[email protected]

2Engo Agro, M.Sc., Prof. Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET), Av. Osvaldo Aranha, 540 – Juventude, CEP 95700-000 BentoGonçalves-RS.Correio eletrônico: [email protected]

INTRODUÇÃO

Segundo a legislação brasileira, vinhobranco fino é aquele elaborado a partir deuva da espécie Vitis vinifera L. Emborapossam ser feitos também com uvas tin-tas, na Serra Gaúcha são utilizadas essen-cialmente uvas brancas. Com um volumede, aproximadamente, 20 milhões de litros,esses vinhos representam uma parcelaimportante da produção de vinhos finos.A qualidade do vinho branco fino estárelacionada com a qualidade da uva e coma tecnologia empregada em sua elaboração.Na vinificação em branco, as operações pré-fermentativas determinam a passagem parao mosto dos compostos responsáveis pelaqualidade e possíveis defeitos do vinho.Portanto, a obtenção de um vinho brancode qualidade depende muito da maneira de

extrair e manipular o mosto antes da fer-mentação alcoólica.

Para a extração dos constituintes da pe-lícula, o produtor de vinho branco dispõede prazo limitado, geralmente algumas ho-ras, no máximo alguns dias, que antecedema fermentação. Por isso, a definição de as-pectos importantes da qualidade é feita an-tes de iniciar a fermentação alcoólica.

A fineza, a complexidade e a intensida-de de aroma varietal são as principais qua-lidades exigidas para o vinho branco fi-no. Nesse sentido, os ésteres e álcoois su-periores produzidos na fermentação alcoó-lica pelas leveduras, não são suficientespara conferir ao vinho branco a tipicidadearomática. Ter aroma varietal também não ésuficiente para se ter vinho branco dequalidade. As características qualitativas

de um vinho branco somente são obtidas apartir da vinificação da uva madura. O es-tado sanitário e a maturação da uva, emespecial a de cultivares aromáticas, são oscritérios essenciais de seleção da colhei-ta destinada para elaborar um vinho brancode qualidade. A podridão da uva branca éresponsável por uma redução do aromavarietal, aumento da acidez volátil e ins-tabilidade do aroma fermentativo, além defavorecer o aparecimento de defeitos ol-fativos, que estão relacionados com o en-velhecimento oxidativo prematuro do vinhobranco.

Tratando-se de uva destinada à ela-boração de vinho branco aromático, a ma-turação não pode considerar somente o teorde açúcar e a acidez do mosto. A com-posição em aromas e em precursores par-

Resumo - Fatores naturais de solo e clima da maior parte das regiões vitícolas do Sul eSudeste brasileiros determinam a aptidão enológica para a produção de vinho brancofino e espumante. Entre os fatores que contribuem com a tipicidade desses vinhosdestacam-se a adaptação das cultivares de uvas brancas e seu nível de maturação quedefine a composição do mosto. Entre as principais características sensoriais salientam-se o excelente aspecto visual, especialmente devido a sua limpidez e coloração amarelo-palha, e o aroma que, embora sutil, é extremamente fino. No gosto, predomina ocaráter ácido que lhe garante o frescor, fator de qualidade. A tecnologia de vinifica-ção utilizada é moderna e comparável à aplicada nas melhores regiões vitícolas mun-diais, especialmente quanto às etapas pré-fermentativas – extração e clarificação do mosto,na utilização de leveduras selecionadas e no controle da temperatura de fermentação.A constituição química desses vinhos caracteriza-se pelo baixo teor de extrato seco ecinzas, fatores indicativos de vinhos leves.

Palavras-chave: Enologia. Vinificação. Tecnologia de elaboração. Característica sensorial.Composição. Mosto. Cultivar.

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78 Vinhos finos: rumo à qualidade

ticipa também de maneira determinante.A gênese dos diferentes aromas do vinhobranco é complexa. Alguns existem no es-tado livre na uva, outros formam-se a par-tir de precursores aromáticos presentes nomosto. Esses aromas são liberados, prin-cipalmente, na fase pré-fermentativa e nafermentação alcoólica pela ação das en-zimas da uva.

Mesmo que as condições edafocli-máticas dessa região não sejam as ideaispara a produção de vinhos finos, o esforçorealizado tanto no aspecto agronômico, daprodução da uva, como no enológico per-mite obter vinhos brancos com certo carátere fineza. A incidência de precipitaçãopluviométrica elevada durante todo operíodo vegetativo da videira, em especialnos meses de maturação e colheita, limita aobtenção de uvas brancas de melhor qua-lidade enológica, principalmente devido aoseu estado sanitário. Por isso, a tecnolo-gia enológica, no que se refere à vinifica-ção em branco, exerce um papel funda-mental para reduzir eventuais carênciasqualitativas da uva.

CULTIVARES DE VIDEIRARECOMENDADAS PARAELABORAÇÃO DE VINHOBRANCO FINO

‘Riesling itálico’

Uva branca, provavelmente originá-ria da Europa Central (Fig.1). Cultivar ho-mogênea, com boa brotação. Folha médiainteira ou trilobada, limbo verde-claro, re-luzente, com dentes pronunciados. Cachomédio a pequeno, cilíndrico, alado e com-pacto. Baga média, esferóide de cor ama-relada. Película consistente com “umbigo”evidente, polpa sucosa, doce e de saborsimples.

Videira de bom vigor, brotação inter-mediária, internódios médios e vegetaçãoequilibrada. Adapta-se a diversos tiposde solo, desde que não seja limitante emmagnésio e excessivamente úmido, e a di-versos sistemas de condução e podas.Recomenda-se evitar podas muito ricas

(com excesso de gemas), para não desequi-librar a planta e baixar a qualidade da uva.

Trata-se de uma cultivar bem adapta-da às condições de cultivo da Serra Gaúchano Rio Grande do Sul. Possui produti-vidade média entre 16 e 18 t/ha. É colhidageralmente entre 20 de janeiro e 10 de fe-

Figura 1 - Cacho de uva da cv. Riesling itálico

FONTE: Embrapa Uva e Vinho.

vereiro. Sensível ao míldio e à podridão docacho.

Possui bom potencial de acúmulo deaçúcar na baga. Origina vinho com aro-ma varietal pouco pronunciado e aromasecundário suficiente para ser classifica-do como vinho frutado. Contribui para a

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formação de aromas finos e leves, espe-cíficos do vinho branco fino da região.

‘Chardonnay’

Uva branca de origem francesa muitocultivada na região de Champagne e Bor-gonha, sendo também muito difundida emvárias regiões vitícolas do mundo (Fig. 2).

Cultivar bastante homogênea, precocee pouco produtiva. Folha de tamanhomédio, arredondada quase inteira, verde-escura e com cavidades laterais poucoevidentes. Cacho pequeno, tronco-cônico,alado e bastante compacto. Baga média decoloração amarelo-dourada, película demédia consistência, polpa sucosa, doce, desabor simples e aroma evidente.

Videira vigorosa, brotação muito pre-coce. Ramos vigorosos com internódioscurtos. Adapta-se em diversos ambientes,desde que não sejam muito úmidos e su-jeitos a geadas tardias. Aceita vários tiposde sistema de condução e podas. É im-portante realizar a poda verde para melhorara maturação e arejar a região do cacho, poistrata-se de cultivar sensível à podridão eao míldio.

É uma uva de introdução relativamen-te recente na Serra Gaúcha, mas que apre-sentou boa adaptação. Sua produtividadeé relativamente baixa, entre 12 e 14 t/ha,sendo colhida geralmente entre 10 de ja-neiro e 20 de fevereiro. Possui bom poten-cial para acumular açúcar na baga. Originavinho branco equilibrado, com poucoaroma varietal, porém de elevada com-plexidade, que o torna bastante aprecia-do pelos consumidores. A cultivar Char-donnay contribui com a fineza e a sua-vidade do vinho branco fino produzido naregião.

‘Moscato branco’

A denominação Moscato é empregadapara muitas cultivares de videira. A maisutilizada para elaboração de vinho brancofino e Moscatel Espumante na Serra Gaú-cha é a ‘Moscato branco’ ou ‘Moscato ita-liano’ (Fig. 3).

Cultivar muito antiga, proveniente dabacia oriental do Mediterrâneo. Na região

de Piemonte na Itália, é a base para a pro-dução do “Asti Espumante”. No Brasil, foiuma das primeiras cultivares de uva brancadifundida, sendo hoje a que possui maiorvolume de produção dentre as brancasviníferas para processamento.

Cultivar bastante homogênea, pro-dutiva e aromática, refletindo bem o local eo sistema de condução. Possui folha detamanho médio, pentagonal-arredondada,trilobada, dentes muito pronunciados,limbo fino, de cor verde-escuro e liso. Ca-cho de tamanho médio, semicompacto,cilíndrico-piramidal e alado. Baga média,elipsoidal, de cor amarelo-âmbar e de fácilseparação. Película consistente e polpacarnosa com sabor moscatel.

Videira de médio vigor, vegetação equi-librada, brotação de média estação, ramosrobustos com internódios médio a curto.Adapta-se a diversos ambientes, prefe-

rindo os locais secos e bem arejados. Acei-ta vários tipos de sistema de condução epoda, porém para manter o equilíbrio daplanta e boa qualidade dos frutos, deve-seevitar poda muito rica. É importante efe-tuar poda verde, pois trata-se de uma cul-tivar sensível ao míldio e à podridão do ca-cho.

É uma cultivar muito produtiva, o quelimita, em alguns casos, a qualidade da uva.Para maior acúmulo de açúcar e maior qua-lidade enológica, é preferível evitar pro-duções acima de 25 t/ha. Sua maturação étardia, sendo colhida geralmente entre 20de fevereiro e 5 de março. Origina vinhobranco relativamente ácido, com aromavarietal característico e elevada tipicidade.

Além dessas cultivares são utilizadastambém para elaboração de vinho brancofino as uvas ‘Gewürztraminer’, ‘Trebbiano’e ‘Malvasias’, embora em menor proporção.

Figura 2 - Cacho de uva da cv. Chardonnay

FONTE: Embrapa Uva e Vinho.

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Essas cultivares são recomendadas nes-se estudo, devido às suas características eadaptação nas condições da Serra Gaúcha,objetivando produzir tanto vinho branconão aromático como aromático. No entan-to, podem ser alteradas em função das con-dições climáticas, do solo onde serão plan-tadas, do sistema de cultivo, do tipo de vinhoque se pretenda produzir.

OPERAÇÕES PRÉ-FERMENTATIVAS

Os principais processos pré-fermen-tativos são: colheita, transporte e rece-bimento da uva, separação da ráquis, ex-tração e seleção do mosto, clarificação e,eventualmente, a maceração pelicular e ahiperoxidação. Geralmente, após a extraçãodo mosto, este é conduzido aos tanques

equipados com cintas térmicas para ocor-rer a clarificação e posterior fermentação.Também no caso de efetuar a maceraçãopelicular, a uva após ser desengaçada eesmagada, é enviada para os tanques deaço inoxidável, por um período determi-nado, sendo, após, conduzida à prensa paraa extração do mosto.

Colheita e transporte da uva

Devido à topografia montanhosa daSerra Gaúcha, a colheita da uva é sempremanual. O cacho é separado da planta comauxílio de canivete ou tesoura. Inicialmente,a uva colhida é colocada diretamente empequenos recipientes e depois repassadapara caixas plásticas de 20 kg, com furosna parte inferior. Nessas caixas, efetua-seo transporte até o estabelecimento eno-lógico, geralmente em caminhões. Os vi-nhedos localizam-se num raio de, apro-ximadamente, 50 km das cantinas, demaneira que a uva é colhida e vinificada nomesmo dia. O transporte, da maneira comoé realizado, não interfere negativamente naqualidade da uva.

O início da colheita da ‘Chardonnay’ocorre, geralmente, entre 10 e 15 de janeiro,sendo logo seguida pela ‘Riesling itálico’,estendendo-se até os dias 10 e 15 de fe-vereiro. Já para a ‘Moscato branco’, a co-lheita ocorre entre 20 de fevereiro e 5 demarço, podendo adiantar ou atrasar emfunção das condições climáticas e do lo-cal onde se situa o vinhedo. A colheita éefetuada durante os períodos da manhã eda tarde, evitando o período de temperaturaelevada e quando a uva estiver molhadaem dias de precipitação pluviométrica.

Para determinar o ponto adequado decolheita da uva é recomendável efetuar oacompanhamento da maturação atravésdo peso da baga, do teor de açúcar e daacidez total. É interessante também a de-terminação do ácido málico e do pH domosto. Quando em duas determinaçõesseguidas o teor de açúcar mantém-se cons-tante e o peso da baga não diminui, é indi-cativo do final da fase de maturação. Épossível definir para cada cultivar e paracada região produtora uma concentração

Figura 3 - Cacho de uva da cv. Moscato branco

FONTE: Embrapa Uva e Vinho.

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mínima de açúcar do mosto, abaixo do qualnão é possível produzir vinho branco dequalidade. A degustação da uva também éimportante para avaliar a qualidade eno-lógica, pois normalmente na maturaçãoobserva-se o desaparecimento dos aromasherbáceos e o surgimento de aromas fru-tados e florais característicos.

Outra observação constatada é quequanto mais lenta for a redução da aci-dez na maturação da uva, mais tarde podeser colhida, sem comprometer os aromasfrutados. Os melhores locais para a pro-dução de vinho branco são aqueles em quea uva mantém o aroma frutado e o mostopermanece suficientemente ácido até o fimda maturação.

A colheita das uvas brancas exige maiscuidados do que a uva para elaboração dovinho tinto, pois são mais suscetíveis àoxidação, o que provoca defeitos olfativosgraves no vinho. Ela deve ser realizada emcondições de elevado grau de sanidade eno melhor estádio de maturação enológica(açúcar, acidez, aroma). Entre a colheita e orecebimento na cantina, a uva deve per-

causam a instabilidade dos aromas fru-tados extraídos, como é o caso dos com-postos fenólicos.

A extração do mosto bem conduzidadeve limitar os problemas de oxidação edissolução dos compostos fenólicos dapelícula, semente e ráquis, como também oaumento do pH, que está relacionado coma extração de potássio da parte sólida dauva.

Recebimento da uva

Por ocasião do recebimento da uva, éfeita uma avaliação não só do seu estadosanitário, mas também da confirmação dacultivar, e efetuada a pesagem. Além dis-so, pode ser retirada uma amostra para adeterminação analítica do mosto, feita,posteriormente, no laboratório.

Uma boa higienização das caixas é fun-damental para a qualidade do vinho branco.Além da presença de terra no fundo da caixae na própria uva, uma das causas do au-mento do teor de ferro no vinho, restos demosto em fermentação e em estado adian-tado de acetificação comprometem a fer-mentação alcoólica e a qualidade do vinho.Nesse sentido, recomenda-se a lavagemdas caixas com água de boa qualidade, sobpressão, imediatamente após a retirada dauva, não esperando secar, o que dificultariasua limpeza e necessitaria um gasto maiorde água.

Com a separação da ráquis e o esma-gamento, inicia-se o processamento tec-nológico da uva.

Separação da ráquis

A elaboração de vinho branco fino re-quer que a uva se conserve inteira até omomento da extração do mosto. Com a re-tirada da ráquis, operação realizada de mo-do generalizado, iniciam-se as operações paraextração do mosto, tendo em vista que aráquis não alcança um nível adequado dematuração e a sua separação antecipada é defundamental importância para a qualidadedo vinho. A presença da ráquis acentua osgostos herbáceos e amargos que tanto de-preciam os vinhos brancos. Por outro lado, aráquis, quando esmagada, é responsável por

Características da uva

Peso do cacho (g) 102,0 15,4

Peso da baga (g) 1,2 0,2

Peso da ráquis/Peso do cacho (%) 4,81 0,57

Características do mosto

Densidade a 20ºC (g/L) 1081 0,005

Brix 18,9 1,2

Acidez total (meq/L) 126,9 25,6

Brix/Acidez total 20,9 5,6

pH 3,16 0,06

Nitrogênio amoniacal (mg/L) 96,8 22,3

Prolina (mg/L) 828,7 363,7

(1)Médias e desvios-padrão da uva e do mosto da ‘Chardonnay’ proveniente de diferentes

municípios da Serra Gaúcha.

QUADRO 1 - Características do cacho e do mosto da uva ‘Chardonnay’

Variável Desvio-padrão(1)Média

manecer o mais intacta possível para limi-tar a oxidação do mosto e a maceração. Épreferível que a colheita seja feita emtemperatura inferior a 20oC e quando a uvaestiver seca. A colheita pode ser feita emuma única passagem, quando a maturaçãofor homogênea ou, em diversas passagens,quando a uva estiver sendo atacada pelaspodridões do cacho e não estiver sufi-cientemente madura. As características docacho e do mosto da ‘Chardonnay’, naSerra Gaúcha, são indicadas no Quadro 1.

Na vinificação em branco, a condu-ção das operações pré-fermentativas, istoé, a manipulação da uva e do mosto é deter-minante para a qualidade do vinho. Essasoperações consistem em extrair o máximode mosto e, após, clarificá-lo. Mas, alémdisso, devem favorecer a difusão no mostode determinados constituintes da pelícu-la, em particular os aromas frutados e flo-rais da uva e seus precursores. Simul-taneamente, procura-se limitar a dissoluçãodos compostos de aromas herbáceos esabor amargo. Deve-se procurar evitar aomáximo a passagem de substâncias que

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uma diluição do mosto, pois possui mais águaque a uva. Além disso, devido a sua consti-tuição em elementos minerais interfere nacomposição do mosto.

A operação mecânica de retirada daráquis da uva branca é feita utilizando doistipos de equipamentos. Um com as desen-gaçadeiras do tipo AMOS, que separa aráquis antes de esmagar a uva, processoenológico mais recomendado (Fig. 4). Essetipo de equipamento está mais difundi-do na Serra Gaúcha. Outro, utilizado emmenor escala, com desengaçadeira verticalque funciona através da força centrífuga.Embora esse tipo de equipamento apre-sente um rendimento mais elevado em

relação ao anterior, enologicamente o tra-balho não é adequado para a elaboraçãode vinho branco, pois trata-se de um pro-cesso muito violento que tritura a ráquis eforma quantidades elevadas de borra.

Para a elaboração do vinho branco fino,após a separação da ráquis, a uva pode ounão ser esmagada antes da extração domosto, o que depende do tipo e da qua-lidade da uva, bem como da característi-ca do vinho que se pretende obter. No pri-meiro caso, a máquina utilizada é a mesmapara o vinho tinto, a qual é formada por umcilindro horizontal de teflon ou aço ino-xidável perfurado e giratório, de tal formaque não triture a película e a ráquis. No

interior do cilindro, gira um eixo em sentidocontrário e com pás de tamanho variável evelocidade regulável, de modo a separar aráquis da baga, sem triturá-la. A baga seráesmagada pela passagem entre dois rolosrevestidos de borracha com distância re-gulável de acordo com o diâmetro da baga.Com a separação da ráquis e da parte sóli-da (película e semente), observa-se umaredução de, aproximadamente, 30% do pesoinicial da uva. Já quando o objetivo é a ex-tração do mosto sem esmagar a uva, pode-se utilizar a mesma máquina desengaçadei-ra - esmagadeira, porém deve-se desacoplaro sistema de rolos esmagadores, permi-tindo que a uva seja enviada às prensasapenas desengaçadas.

Para a movimentação do mosto, quandonecessário, devem-se utilizar bombas quenão triturem a uva, do tipo helicoidal ou apistão, que funcionem a baixa vazão. Asmangueiras utilizadas devem apresentardiâmetro superior a 10 cm para favorecer ofluxo do mosto e serem confeccionadascom material inerte para não liberar subs-tâncias tóxicas para o vinho.

Extração e seleção do mosto

A extração do mosto pode ser realiza-da através de diferentes processos, depen-dendo da disponibilidade de equipamen-to na cantina. O importante é extrair o mostoo mais rapidamente possível, evitando aomáximo a maceração da parte sólida. O sis-tema mais utilizado na Serra Gaúcha é aqueleque, a partir da uva separada da ráquis eesmagada, utiliza prensas descontínuas dotipo vertical de madeira, as mais antigas;ou as horizontais de pratos com capacidadepara quatro a cinco toneladas de uva; ouas prensas pneumáticas de volume variável,que também podem operar com a uva in-teira. Através dessas linhas de extração épossível efetuar a seleção dos mostos, istoé, separar aquele que escorre antes (mos-to gota), de melhor qualidade, daquele quenecessita mais pressão para ser extraído,designado mosto-prensa. Além dessesprocessos são utilizados, também, outroscom maior rendimento, mas que não apre-sentam a mesma qualidade, pois favorecema maceração da parte sólida e fornecem

Figura 4 - Máquina para separar a ráquis e esmagar a uva

FONTE: Enobrasil (2005).

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maior quantidade de borra. Entre essesprocessos destaca-se aquele que utiliza umesgotador dinâmico com rosca sem fim in-clinada, que conduz a parte sólida para umaprensa contínua e o mosto é retirado naparte inferior do aparelho. Esse mecanismoprocessa rapidamente uma grande quan-tidade de uva, no entanto produz mostocom teor elevado de borra e, conseqüen-temente, com turbidez elevada.

Outro processo utilizado para sepa-ração do mosto é através de tanques do tipopoter. Esse sistema consiste em colocar auva esmagada e sem ráquis em tanques comuma espécie de camisa dupla tipo funilperfurado, que retém a parte sólida, pos-sibilitando a passagem do mosto. Esse pro-cesso permite trabalhar com grandes vo-lumes de uva e possibilita a obtenção demostos límpidos com pouca borra, pois elesofre uma verdadeira filtração através dapassagem entre a parte sólida da uva. Oinconveniente é favorecer a maceração e aoxidação dos mostos. Esses problemasacentuam-se com o aumento de perma-nência da uva esmagada no recipiente dotipo poter. Esse processo é sempre com-plementado por um trabalho de prensagem,pois não permite extrair mais do que 50%do total do mosto.

Clarificação do mosto

O mosto da uva logo após a extraçãoapresenta-se mais ou menos turvo, poiscontém em suspensão partículas de terra,fragmentos da película, da ráquis e dapolpa. As macromoléculas em soluçãocoloidal ou em vias de precipitação tam-bém participam da turbidez do mosto, entreelas as substâncias pécticas têm uma par-ticipação importante. No caso das uvascom sintomas de podridão, a dificuldadede clarificação é devida à presença depolissacarídeos produzidos por Botrytiscinerea na baga. Essas substâncias in-terferem na clarificação do mosto, limitandoou impedindo a floculação e a sedimen-tação das partículas e colmatando as su-perfícies filtrantes. A ação das pectinasesnaturais da uva, ou adicionadas, facilita aclarificação através da sedimentação

natural. A clarificação propriamente ditaconsiste em separar o mosto claro dasborras antes da fermentação alcoólica.

A quantidade de borra formada naextração do mosto e a rapidez da sedi-mentação dependem da cultivar, do estadosanitário da uva, de sua maturação e, so-bretudo, das condições de trabalho porocasião do esmagamento e prensagem dauva.

Os vinhos elaborados com mostos,contendo quantidade elevada de borra emsuspensão, apresentam aromas pesados,herbáceos e de sabores amargos, commaior teor de compostos fenólicos e coma cor menos estável e mais sujeitos à oxi-dação. Geralmente, esses vinhos apre-sentam defeitos olfativos de redução maisou menos fáceis de eliminar através deaerações e trasfegas. O caráter frutado dovinho branco é mais nítido e mais estável,quando obtido a partir de mosto límpido.

Recentemente, tem-se verificado que osvinhos brancos feitos com mostos nãoclarificados apresentam teor mais elevadode compostos de enxofre pesado pro-duzidos pelas leveduras, como o methionolque apresenta cheiro desagradável e con-tribui negativamente para a qualidade dovinho.

Os vinhos provenientes de mosto cla-rificado apresentam teores mais baixos deálcoois superiores, que transmitem aromaspesados, e teores mais elevados de ésteresde ácidos graxos e ésteres de álcoois su-periores, que possuem aromas mais agra-dáveis. A clarificação limita também o teorde álcoois superiores com seis átomos decarbono, responsáveis pelos aromas her-báceos.

Na fermentação alcoólica, a clarifica-ção provoca inicialmente uma redução damicroflora do mosto. A adição de leveduraseca ativa torna-se necessária e garante oinício da fermentação alcoólica.

O modo mais simples e mais eficaz deefetuar a clarificação do mosto é atravésdo processo estático, isto é, pela sedimen-tação natural das borras seguida de umadecantação. A sedimentação geralmente éfavorecida por um resfriamento do mosto

entre 5oC e 7oC, para retardar o início dafermentação alcoólica e limitar a oxidação.A clarificação ideal do mosto deve ficarentre 100 e 250 NTU, medida num ne-felômetro, o que corresponde entre 0,3% e0,5% de partículas em suspensão.

Quando a clarificação não alcança onível desejado ou é muito demorada,podem-se utilizar enzimas pectolíticas co-merciais. Convém utilizar preparados co-merciais que não apresentem atividade decinamato esterase para limitar a formaçãode vinil-fenol e vinil-guaiacol, compo-nentes prejudiciais à qualidade aromáticado vinho. Em determinados casos, a utili-zação de preparados enzimáticos comer-ciais pode provocar uma clarificação muitoacentuada do mosto.

Além desse processo, a clarificação domosto pode ser feita através de filtros cir-culares rotativos a vácuo, através da uti-lização de filtros prensa, da microfiltraçãotangencial, da flotação e da centrifuga-ção.

A centrifugação, embora seja um pro-cesso rápido, não possibilita boa qualida-de de clarificação, pois provoca sempre umacerta oxidação do mosto. Os sistemas defiltração, por sua vez, originam mostosmuito límpidos.

A utilização de produtos enológicostais como, enzima pectolítica, gelatina,solução de sílica, bentonite, caseinato depotássio, para clarificação do mosto, alémde possibilitar uma boa sedimentação,reduz o período de clarificação de 8 a 12horas.

Por outro lado, as borras podem desem-penhar algumas funções desejáveis du-rante a vinificação. Sua ação estimulantena fermentação alcoólica faz intervir umconjunto de ações físicas; elas podem for-necer às leveduras elementos nutritivos,ao mesmo tempo em que adsorvem certosmetabólitos inibidores.

O principal aporte nutricional das borrasé formado pelos ácidos graxos insaturadosde cadeia longa, que a célula da levedurapode incorporar. De outra parte, as borrassão capazes de adsorver os ácidos graxostóxicos liberados no mosto no decorrer da

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fermentação alcoólica e que possuem efeitoinibidor do desenvolvimento da levedura.A combinação desses dois efeitos (nutri-ção lipídica e adsorção dos ácidos graxostóxicos) confere às borras um efeito de pro-longamento da vida útil das leveduras.

Enzimas pectolíticas

As enzimas são produtos naturais queestão presentes em todos os organismosvivos. As uvas, as leveduras e as bactériascontêm enzimas que são substâncias (pro-teínas) que favorecem as transformações,como a do açúcar em álcool.

As primeiras aplicações dos prepa-rados enzimáticos em enologia visavammelhorar a extração de mostos na pren-sagem e na clarificação. Mais recentementepassou-se a utilizar os preparados enzimá-ticos para facilitar a filtração dos vinhos ea liberação de aromas.

As enzimas utilizadas na vinificação sãoobtidas por fermentação de cultivos de ce-pas selecionadas da espécie Aspergillusniger para obtenção de pectinases, e daespécie Trichoderma harzianum para obteras glucanases. Os preparados enzimáticosencontram-se na forma granulada, em pó eem estado líquido. Eles apresentam a van-tagem de estarem concentrados e, con-trariamente aos preparados líquidos, estãodesprovidos de agentes estabilizantes.São utilizados em doses pequenas (de 1 a5 g/hL) e são facilmente solúveis. Não sãoafetados pelas doses de SO

2 normais ge-

ralmente utilizadas na vinificação.A atividade das enzimas varia em função

da temperatura. Na fase pré-fermentativa,com a uva esmagada ou após a extração domosto, os preparados de pectinases podemser utilizados nas doses recomendadas apartir de 10oC. Com temperaturas abaixo de10oC, convém aumentar ligeiramente a dose.Na fase de pós-fermentação, os preparadosliberadores de aromas e as betaglucanasesnecessitam temperaturas superiores a 15oCe maior tempo de ação. Recomenda-se efe-tuar o tratamento enzimático antes de umacolagem com bentonite, para evitar a absor-ção das enzimas.

Para a clarificação, as enzimas exercem

fundamentalmente atividades de pecti-nases. São adicionadas logo após a extra-ção do mosto. A hidrólise das pectinas temcomo efeito principal diminuir a viscosida-de do mosto e destruir o poder colóideprotetor das substâncias pécticas (fase dedespectinização). Esses dois fenômenostêm como efeito aumentar a velocidade deprecipitação das partículas na fase de se-dimentação e reduzir o tempo de clarifica-ção. Como efeito, a turbidez do mosto podedesestabilizar-se rapidamente após a adiçãodas enzimas, porém a redução do tempo totalde clarificação pode ser considerável. Ge-ralmente, a clarificação depois da adição dasenzimas não supera dez horas.

A eliminação das borras permite limitarconsideravelmente a formação de com-postos de seis átomos de carbono que atri-buem gosto herbáceo ao vinho. Uma hi-drólise rápida das pectinas permite tambémmelhorar sensivelmente o rendimento dacentrífuga, bem como a filtração do vinhoem terra diatomácea.

Como na maceração em tinto, são re-comendados preparados enzimáticos pu-rificados, tanto para vinificação de uvasbrancas, como para a vinificação em brancode uvas tintas, com o objetivo de limitar aformação de fenóis voláteis (vinil-fenol evinil-guaiacol).

As enzimas com atividade glicosidásica(betaglicosidases) são utilizadas na fase depós-fermentação em vinhos jovens parafavorecer a liberação dos precursores dearomas associados aos açúcares. Em mui-tas cultivares, os precursores glicosídi-cos inodoros são mais abundantes que osaromas livres odorosos. Portanto, é in-teressante explorar tal reserva aromática.

As enzimas glicosidásicas são adi-cionadas no final da fermentação alcoólica,com temperatura superior a 15oC e comtempo de contato de, aproximadamente, ummês. É aconselhável controlar regularmenteo teor de SO

2 livre. A enzima libera pro-

gressivamente os aromas. Em função dascultivares, a intensidade aromática aumentae os caracteres organolépticos evoluem.Degustações regulares permitem apreciaro resultado obtido, sendo possível deter o

tratamento com a adição de 10 g/hL de ben-tonite. Na prática, pode-se tratar só umaparte dos vinhos e utilizá-los em cortes. Osmelhores resultados são obtidos com cas-tas ricas em precursores de aromas de na-tureza terpênica (‘Moscato’, ‘Gewürz-traminer’, ‘Riesling renano’) e outras apa-rentadas.

Gelatina

As gelatinas enológicas são classi-ficadas como colas protéicas, assim comoa bentonite é classificada como cola mi-neral. Trata-se de auxiliares tecnológicosque, quando utilizados adequadamente,contribuem para a qualidade dos vinhos.

As gelatinas enológicas estão dispo-níveis na forma sólida e líquida. Na formasólida elas se encontram em pó ou gra-nulada, nesse caso, são solúveis a quente(35oC – 45oC) ou a frio (5oC – 20oC), de-pendendo do nível de hidrólise. Na formalíquida, as gelatinas são estabilizadas como dióxido de enxofre, estando disponíveisem concentrações variáveis de 100 a 300 g/L,segundo o grau de hidrólise.

No primeiro caso, é conveniente res-peitar o tempo de hidratação (60 minutos,aproximadamente), antes de incorporar aovinho para obter o máximo de poder cla-rificante. Na forma líquida, é necessáriodiluir antes, em cinco a seis vezes seu vo-lume em água. É conveniente controlar ocheiro do produto antes da sua utilização.A gelatina não deve apresentar cheiro es-tranho especialmente pútrido. Devido àgrande diversidade de produtos, cada mar-ca comercial de gelatina é acompanhadade uma ficha técnica, com a dose recomen-dada pelo fabricante e em relação ao tipode vinho. A dose final deve ser definidapor testes enológicos efetuados no própriovinho. No momento de aplicação da gela-tina no vinho, ela deve ser bem homo-geneizada. Caso seja feita uma colagemmista, é recomendável adicionar antes osprodutos com cargas eletronegativas, co-mo é o caso da bentonite e da sílica.

Bem adicionada, a gelatina melhora sen-sivelmente a filtrabilidade e a estabilidadecoloidal do vinho. Os limites de utilização

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da gelatina, na maioria dos casos, variamde 5 a 20 g/hL.

Solução de sílica

É uma suspensão coloidal aquosa dedióxido de silício, utilizada em combina-ção com gelatina para clarificação de mos-tos. O sol de sílica é constituído de par-tículas de forma esférica e de diâmetrovariável entre 2 e 30 milimicrons, em cujasuperfície encontra-se química e fisicamen-te fixada a água. Está carregado eletro-negativamente, apresentando grande afi-nidade com as substâncias protéicas car-regadas eletropositivamente e, em especial,com clarificantes protéicos entre os quaisa gelatina. O sol de sílica deve ser em-pregado sempre em conjunto com a ge-latina, pois sua ação clarificante baseia-sena reatividade do dióxido de silício, na for-ma coloidal, com as frações protéicas in-troduzidas de gelatina.

Tal combinação precipita as subs-tâncias de alto peso molecular, tendo poucainfluência sobre as de baixo peso molecu-lar, onde a bentonite age de modo maisevidente. Além disso, combina-se com ocomplexo tanino-gelatina e também comuma eventual maior quantidade de gelati-na presente, permitindo obter melhor cla-rificação.

Resultados adequados na clarificaçãodo mosto são obtidos, utilizando entre 50 e100 g/hL de sol de sílica, em conjunto coma gelatina, porém para melhor resultado éimportante efetuar um ensaio em labo-ratório. Na maioria dos casos, recomenda-se a adição do sol de sílica antes da gelatina,limitando-se em alguns casos a exigênciade inverter a ordem, como por exemplo, paraos mostos ricos em polifenóis.

No caso de mostos com elevada quan-tidade de pectinas, é importante procedera um tratamento com enzima pectolítica.A clarificação do mosto ocorre em 8 a 12horas em depósito e em 2 a 3 horas comcentrifugação ou com filtração. O depósitoobtido após 8 a 12 horas é da ordem de10% a 15%.

A atividade do sol de sílica não é in-fluenciada pela temperatura. Deve ser adi-

cionado no líquido a tratar sem diluiçãoprévia, mantendo a massa em remonta-gem. A gelatina pode ser utilizada tal qual,operando sempre em remontagem.

O sol de sílica pode ser conservadoilimitadamente desde que a temperaturade conservação não seja inferior a 0oC.Nesse caso, o produto congela-se e nãopode ser utilizado nem mesmo após o seureaquecimento.

Bentonite

A bentonite é usada largamente emEnologia desde 1930, porém, mais recen-temente, passou-se a utilizá-la associadaao caseinato de potássio e de diversasmaneiras: durante a fermentação (cha-mados coadjuvantes da fermentação) eapós o vinho novo, ou mesmo para es-tabilização, em vinhos mais evoluídos. Aaplicação da bentonite e do caseinato depotássio conjuntamente segue o princí-pio de maximizar o processo de clarifica-ção, apesar de os dois poderem ser usadosisoladamente.

A bentonite é um clarificante mineralobtido da argila do tipo montmorilonita,sendo constituída principalmente de si-licato de alumínio com quantidades va-riáveis de magnésio, álcalis, óxido de ferroe outros componentes. As propriedadesda bentonite devem-se à capacidade deabsorção de água ou outro líquido, au-mentando, assim, o volume e formandouma pasta gelatinosa a qual, devido a suasuperfície de contato, apresenta grandecapacidade de troca.

Possui carga elétrica negativa que lhepermite flocular, além de íons metálicos,principalmente as partículas coloidais deproteínas (uma das causas mais freqüen-tes de alterações na limpidez de vinhosbrancos), que no pH 2,9 a 3,7 do vinho sãocarregadas de eletricidade positiva. A ben-tonite absorve a maior parte das polife-noloxidases (lacase e tirosinase) presentes,sobretudo nas uvas deterioradas, o quepermite trabalhar com doses mais baixasde SO

2. Também diminui o teor de ami-

noácidos não nobres responsáveis porgostos desagradáveis.

As doses utilizadas variam de 50 a100 g/hL, sendo melhor especificadas comtestes prévios. Devem-se diluir as quan-tidades antecipadamente (10 horas), em 8 a10 partes de água morna, homogeneizan-do bem para evitar a formação de grumos eformar um gel perfeito. Homogeneizar no-vamente o gel no momento do uso, adi-cionando ao mosto mediante remontagem.

Caseinato de potássio

É um preparado protéico obtido do leiteque, através de procedimentos industriais,torna-se solúvel na água. Atualmente, é en-contrado na forma micronizada, isto é,finamente pulverizado. O caseinato de po-tássio possui pH neutro, teor de proteínasuperior a 96% e odor neutro.

Devido às características de adsorção,o caseinato de potássio provoca uma níti-da diminuição de polifenóis oxidáveis (ca-tequinas e leucoantocianos), ferro e cobre,com conseqüente diminuição da cor. Per-mite vinificar em branco, além de uvasbrancas, também uvas tintas. O caseinatode potássio substitui o carvão descoran-te que absorve também os constituintesdo aroma, deixando os vinhos tratadosvazios e insípidos, portanto, não reco-mendado. É utilizado na proporção de 50 a100 g/hL, conforme testes prévios. Assimcomo para a bentonite, devem-se dissolverenergicamente as doses em 8 a 10 partesde água fria ou morna, evitando a formaçãode grumos. Adicionar lentamente ao mostoe misturar rapidamente, sem produzir es-puma.

Maceração pelicular

Os princípios gerais da vinificação embranco preconizam macerações mais re-duzidas possíveis das partes sólidas dauva. Trata-se de evitar que as partes sóli-das provoquem no mosto determinadosdefeitos bem conhecidos, como aromasvegetais de uva verde, adstringência e gos-tos amargos, devidos a compostos fenó-licos provenientes das sementes, películase ráquis. Além disso, podem ocorrercheiros de mofo, de terra e fúngicos de uvasalteradas. Quando se vinifica uva de ma-

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turação e estado sanitário heterogêneos, autilização do processo clássico de vini-ficação em branco, isto é, a extração ime-diata e rápida do mosto é indispensável,seguido por uma seleção rigorosa do mos-to. No entanto, com determinadas cul-tivares e quando as condições de solo eclima permitem obter uva madura e sã, amaceração pelicular contribui na extraçãodos constituintes da película que favore-cem o aroma e proporcionam caracte-rísticas agradáveis aos vinhos brancos. Amaceração pelicular consiste em condu-zir tecnicamente, em condições contro-ladas, o contato entre o mosto e a película.A uva previamente separada da ráquis eesmagada suavemente é colocada em umrecipiente para maceração, à baixa tem-peratura (5oC-8°C), para facilitar a extraçãode aroma por algumas horas, sendo a se-guir separado o mosto-gota e a parte sólidaprensada e clarificada.

A prensagem lenta posterior favorecea extração dos componentes aromáticos dapelícula da uva. Nesse sentido, o mosto-prensa resulta de uma certa maceração e asua adição pode ser benéfica em determi-nados casos. Quanto maior o teor de açúcare a intensidade aromática e quanto me-nor o pH do mosto, maior é o benefício domosto-prensa à qualidade do vinho.

Proteção do mosto contra aoxidação

A oxidação do vinho branco pode in-tervir durante todo o processo de elabo-ração. O consumo de oxigênio no mosto édevido essencialmente a uma oxidação en-zimática dos compostos fenólicos. Duasoxidases participam: a tirosinase da uva sãe a lacase de Botrytis cinerea encontradana uva com podridão. Na prática é difícilevitar, na vinificação em branco, um certoconsumo de oxigênio pelo mosto antes daproteção pelo dióxido de enxofre.

Para limitar a oxidação do mosto, po-dem-se utilizar diferentes técnicas:

a) utilização do dióxido de enxofre, comfunção antioxidante e antioxidá-sica;

b) adição de ácido ascórbico pelo efei-to antioxidante;

c) esfriamento da uva e do mosto, coma finalidade de reduzir a velocidadedas reações de oxidação;

d) aquecimento do mosto a 60oC du-rante alguns minutos para des-truição das enzimas oxidásicas;

e) manipulação da uva em ambienteprotegido do ar para limitar a dis-solução do oxigênio;

f) clarificação do mosto para eliminaruma parte da atividade oxidásica.

A adição do dióxido de enxofre é o pri-meiro, o mais simples e o mais eficaz modo deproteção do mosto contra a oxidação. Paradestruir a tirosinase são necessários 50 mg/Lde dióxido de enxofre. Para os mostos deprensa, de coloração intensa, a adição dedióxido de enxofre deve ser da ordem de70 mg/L para inativar a tirosinase. O dióxidode enxofre deve ser adicionado de uma únicavez e de modo mais homogêneo possível.Não é recomendável adicionar menos de50 mg/L. A adição de dióxido de enxofre, noentanto, favorece a extração de compostosfenólicos da película. O ácido ascórbico nãoapresenta esse inconveniente, não possuiação antioxidásica. Nesse sentido, a utilizaçãodo ácido ascórbico deve ser acompanhadade uma limitação do contato da uva com ooxigênio e da utilização simultânea do dióxidode enxofre.

O esfriamento da uva e do mosto é ex-tremamente eficaz para reduzir a oxidação domosto. A velocidade de consumo do oxigênioé três vezes maior a 30oC do que a 12oC.

A clarificação do mosto limita a ativida-de oxidásica, mas não é suficiente para impe-dir seu escurecimento. Sempre permanece umpouco de atividade tirosinase solúvel no mos-to não protegido do oxigênio. O aquecimentodo mosto permite teoricamente a destruiçãodas oxidases. No entanto, deve intervir ra-pidamente logo após a extração.

DIÓXIDO DE ENXOFRE NAVINIFICAÇÃO EM BRANCO

Um dos objetivos principais da utili-

zação de dióxido de enxofre é obter mostosmais protegidos da ação bacteriana, prin-cipalmente, no decorrer da fermentaçãoalcoólica. Essa proteção é mais importanteno caso dos mostos com teor de açúcarelevado e de acidez baixa e em temperatu-ra elevada, onde os casos de parada de fer-mentação são mais evidentes. Na fermen-tação alcoólica, as bactérias acéticas tra-zidas pela uva e as leveduras com baixacapacidade fermentativa, quando não fo-rem totalmente eliminadas, são desati-vadas naquele meio. O desenvolvimentobacteriano na presença de açúcar na fer-mentação alcoólica é extremamente pre-judicial à qualidade do vinho.

A quantidade de dióxido de enxofre aaplicar no mosto por ocasião da vinificaçãoem branco é variável em função do pH, datemperatura do mosto e do estado sanitá-rio da uva, de modo que a fermentaçãoalcoólica se desenvolva normalmente atéo desdobramento total dos açúcares. Odesenvolvimento bacteriano, quando ne-cessário para a realização da fermentaçãomalolática, deve ocorrer quando todo oaçúcar foi transformado para que as bac-térias utilizem exclusivamente o ácido má-lico como substrato. No caso da vinificaçãoem branco para safras de uvas sadias eacidez elevada a quantidade recomenda-da é de 5 g/hL de dióxido de enxofre. Nocaso de safras com uvas sadias, mas comacidez baixa recomenda-se utilizar de 6 a8 g/hL de dióxido de enxofre. Na vinificaçãode uvas com podridão (Botrytis cinerea),a recomendação é utilizar 8 a 10 g/hL dedióxido de enxofre.

Tendo em vista a velocidade de oxi-dação do mosto, a eficácia do dióxido deenxofre depende da rapidez de aplicação eda homogeneização com o mosto antes doinício do processo fermentativo. Caso umaporção do mosto fermente antes de ser sul-fitado, é que este mosto não foi protegidoda oxidação, pois o dióxido de enxofre com-bina instantaneamente com o etanal pro-duzido pela levedura em fermentação.

Considerando também a rapidez deconsumo de oxigênio pelo mosto para al-cançar uma proteção adequada contra a

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oxidação, cada porção do mosto deve re-ceber a parte do dióxido de enxofre que lhecabe nos primeiros minutos que seguem oesmagamento da uva. Muitas vezes a apli-cação adequada do dióxido de enxofre émais importante que a quantidade utilizada.Considerando esses aspectos, a maneiramais racional de utilizar o dióxido de enxofreé colocá-lo regularmente, à medida que omosto é extraído. As adições sucessivasefetuadas, muitas vezes, no momento depassagem do mosto para o recipiente, nãosão eficazes, mesmo após uma homo-geneização por ocasião do enchimento dorecipiente; pois nesse momento uma partedo dióxido de enxofre já se encontra com-binada. Uma conseqüência é a necessidadede aplicar o dióxido de enxofre na formalíquida para facilitar a diluição com o mosto.Recomenda-se elevar progressivamente adose de dióxido de enxofre no decorrer doperíodo da colheita para compensar o au-mento do inóculo, especialmente bacte-riano, que se observa no ambiente de vi-nificação.

Na vinificação em branco, devem-seevitar doses excessivas de dióxido de en-xofre aplicadas no mosto, que acrescida àquantidade adicionada no final da fer-mentação alcoólica, causem cheiros dereduzido. Considerando a velocidade deoxidação do mosto e para assegurar suaproteção, a sulfitagem deve ser feita o maisrapidamente possível, na separação domosto.

Teor de dióxido de enxofre econservação do vinho branco

No período de conservação do vinhobranco o dióxido de enxofre tem a finalida-de de protegê-lo da oxidação. Os riscosmanifestam-se no caso de uma conserva-ção prolongada, quando o teor de dióxidode enxofre livre do vinho branco for inferiora 20 mg/L. Sob o aspecto microbiológico, aadição de dióxido de enxofre no período deconservação do vinho seco deve evitar odesenvolvimento de leveduras e bactérias.Geralmente, a eficácia de uma sulfitagem, éavaliada pelo controle do número de célulasde leveduras viáveis. Para a conservação

adequada de um vinho branco seco, a quan-tidade recomendada de dióxido de enxofrelivre deve ser de 30 a 40 mg/L.

O teor de dióxido de enxofre não é cons-tante durante o período em que o vinhobranco permanece armazenado em tanquesde aço inoxidável ou amadurecido em bar-rica. O teor diminui até mesmo na garrafa eessa redução é conseqüência da oxidaçãocatalisada pelo ferro e cobre. Mesmo que odióxido de enxofre seja muito volátil, elenão se evapora e não se combina em quan-tidades apreciáveis no período de con-servação. Geralmente, depois de cinco diasda adição do metabissulfito, os cons-tituintes do vinho não se combinam mais;o equilíbrio é alcançado e a diminuiçãodeve-se à oxidação. Para que uma novacombinação ocorra, é necessária uma mo-dificação da composição química do vinho,isto é, a formação de novas moléculas com-binantes como o etanal, através do desen-volvimento limitado de leveduras ou pelaoxidação do etanol.

A oxidação do ácido sulfuroso formaácido sulfúrico que no pH do vinho en-contra-se praticamente todo na forma desulfatos. Essa reação é mais acentuada nosvinhos conservados em barricas e menosintensa nos vinhos brancos conservadosem recipientes de aço inoxidável. Essa for-mação traduz-se em redução do valor dopH e certa aspereza no vinho; razões queexplicam, porque a qualidade dos vinhosconservados por longo período na barricapode diminuir.

Formas de utilização dodióxido de enxofre

Uma das vantagens desse anti-sépticoé de apresentar-se de diversas formas: es-tado gasoso resultante da combustão doenxofre, gás liquefeito, solução e sais cris-talizados.

O dióxido de enxofre pode ser adicio-nado no processo de vinificação na formade gás, de solução líquida, solução de bis-sulfito de potássio (KHSO

3) ou de me-

tabissulfito de potássio (K2S

2O

5). O efeito

da adição é o mesmo, não dependendo daforma do produto adicionado. O equilí-

brio que se estabelece no vinho dependedo pH e da presença de constituintes, quecombinam com o dióxido de enxofre.

O gás sulfuroso liquefaz-se à tempe-ratura de -15°C na pressão normal ou sobpressão de três bars à temperatura am-biente. É um líquido incolor, de densidade1,396 a 15°C, conservado em cilindros de10 a 50 kg. São utilizados dessa forma emgrandes estabelecimentos enológicos, on-de a quantidade adicionada é controladaatravés do peso do cilindro. Para tratamentode pequenos volumes de vinhos, existemaparelhos designados dosadores de sul-fitos que podem ser utilizados.

Na elaboração de pequenos volumesde vinho ou ainda no caso de vinificaçõespara alcançar melhor homogeneização, é re-comendável utilizar soluções com 5% a 6%de dióxido de enxofre preparadas com água,a partir do gás sulfuroso liquefeito. O con-trole da concentração de dióxido de enxofreda solução é feito através da medida dadensidade ou por determinação química.A solução tem tendência a diminuir a con-centração, devido ao contato com o ar. Umasolução com 5% de dióxido de enxofreapresenta densidade de 1,0275 g/mL. Essassoluções são desagradáveis de manipular,pois exalam cheiro intenso de dióxido deenxofre. No entanto, preparadas na própriacantina são práticas e favorecem a homo-geneização com o mosto. As soluções con-centradas com 10% de dióxido de enxofreobtidas através do gás liquefeito ou com adiluição de 18% a 20% de bissulfito depotássio são mais fáceis de manipular, poiso cheiro não é acentuado. No entanto, sen-do mais concentradas, a homogeneizaçãoé mais difícil. Essas soluções são menosacidificantes que as anteriores, pois a aci-dez é parcialmente neutralizada. O meta-bissulfito de potássio, quando utilizado naforma de sal, recomenda-se diluí-lo na águaantes da aplicação, para facilitar a homo-geneização no mosto ou no vinho.

Outra maneira de adicionar dióxido deenxofre nos vinhos é através da queimade mechas de enxofre, neste caso efe-tivada somente em barricas e recipientespequenos de madeira. Trata-se possi-

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velmente da forma mais antiga de utili-zação do dióxido de enxofre em enologia.Na prática, é utilizada para ajustar a quan-tidade de dióxido de enxofre livre nosvinhos por ocasião das trasfegas ou tam-bém para a conservação de recipientesvazios. O efeito esterilizante do dióxidode enxofre acontece no vinho e nas pa-redes internas do recipiente. A queima demechas de enxofre deve ser feita exclusi-vamente em recipientes de madeira, poiso gás sulfuroso proveniente de com-bustão do enxofre ataca as paredes daspiletas de cimento e de recipientes me-tálicos, favorecendo as alterações e pro-vocando corrosões até mesmo no açoinoxidável.

A produção de dióxido de enxofre pelacombustão da mecha na barrica é irregu-lar, da mesma forma que a utilização dodióxido de enxofre pelo vinho, por ocasiãodo enchimento da barrica. A combustãode 5,0 g de enxofre através da mecha, emuma barrica de 225 L, aumenta o teor dedióxido de enxofre em, aproximadamente,10 mg/L no vinho. Assim, após a queimado enxofre através da mecha é necessáriohomogeneizar o vinho. Essa forma de uti-lização é recomendada apenas para con-servar recipientes de madeira, não sendoindicada para incorporar dióxido de enxofreao vinho.

FERMENTAÇÃO ALCOÓLICA

A fermentação alcoólica representa aatividade fisiológica das células de leve-duras presentes no mosto controlada pelasenzimas que transformam os açúcares, es-pecialmente a glicose e a frutose em álcooletílico, dióxido de carbono e outros com-postos secundários. Devido ao dióxido decarbono e ao calor liberado durante o pro-cesso, a fermentação foi comparada à fer-vura, fervere do latim, que originou o termofermentação.

As leveduras são os agentes micro-biológicos da fermentação alcoólica e estãodisponíveis num grande número de es-pécies, que se diferenciam pela morfologia,modo de reprodução e pela maneira quetransformam o açúcar. Aquelas presentes

na fermentação alcoólica em relação à mor-fologia apresentam-se na forma elíptica ouovóide, alongada, esférica e apiculada, quelembra o formato de um limão. O tamanhodas leveduras varia segundo a espécie. Seudiâmetro é de 2 a 10 microns e para observá-las no microscópio é necessário um aumen-to de 400 a 900 vezes. O número de célulasde leveduras encontradas em um mosto emfermentação varia de 6 a 120 milhões decélulas/mL. Em apenas uma gota de mostoem fermentação encontram-se seis milhõesde células de leveduras. Na natureza, as le-veduras estão aderidas à pruína da pelícu-la da uva, outras encontram-se no próprioambiente de fermentação.

A distribuição das leveduras em umdeterminado vinhedo depende das condi-ções climáticas e dos tratos culturais dis-pensados. No entanto, nem todas as leve-duras presentes na uva e na cantina sãoadequadas para a vinificação. Algumassão formadoras de véu, apresentam bai-xo poder alcoógeno e juntamente com asbactérias acéticas e algumas láticas sãoprejudiciais à qualidade do vinho. Certosprodutos fitossanitários aplicados na vi-deira interferem na microflora natural dasleveduras e alteram a fermentação alcoólica.

Na fermentação espontânea, as dife-rentes formas de leveduras alternam-se doinício ao fim do processo. Nos mostos compouco dióxido de enxofre, as leveduras api-culatas predominam na primeira fase defermentação e formam os primeiros grausde álcool. Essas leveduras não alcançammais do que 3% a 4% v/v de álcool e, comosão sensíveis ao dióxido de enxofre, suaparticipação é tanto mais reduzida, quantomaior a quantidade do anti-séptico apli-cada.

Na seqüência, o mosto em fermentaçãoé dominado por Saccharomyces cerevisiaecom poder alcoógeno de 8% a 14% v/v. Apredominância dessas leveduras, nessa fa-se, é devida à maior capacidade fermen-tativa e a sua resistência ao álcool. No fi-nal da fermentação alcoólica dos mostos,com teor elevado de açúcar, predominaSaccharomyces cerevisiae var. oviformis,levedura mais resistente ao álcool e que

pode produzir até 16% v/v de álcool. Essalevedura é útil para finalizar a fermentaçãoalcoólica e para realizar a tomada de espumaem vinho espumante. No entanto, podetornar-se levedura contaminante e cau-sar problemas de turvações nos vinhos.Determinadas espécies de leveduras sãoresponsáveis por contaminações do am-biente e de todo o material enológico. Sãoresistentes ao álcool e ao dióxido de en-xofre, permanecendo viáveis no vinho, noestado latente por alguns meses.

Nos últimos anos, a utilização de le-veduras secas ativas tornou-se uma práti-ca generalizada na elaboração de vinhobranco de qualidade. A adição de le-veduras substitui a utilização de pé-de-cuba, que consistia em colocar no reci-piente a fermentar um volume de 2% a 5%de mosto em fermentação, preparadoalguns dias antes. Para a elaboração do pé-de-cuba, geralmente, é utilizada uma dosemaior de dióxido de enxofre, para eliminaras leveduras de baixo poder fermentativo efavorecer as leveduras de vinificação.

Atualmente, um número elevado delinhagens de leveduras secas ativas deSaccharomyces cerevisiae está disponível,para a utilização na vinificação. Essas li-nhagens foram selecionadas pelas aptidõesenológicas nas diferentes regiões vitíco-las mundiais. A definição por uma levedu-ra seca ativa para a elaboração de um vinhobranco tem conseqüências importantessobre a fermentação alcoólica e as carac-terísticas aromáticas do vinho. A primeiraqualidade exigida para uma levedura é deassegurar a fermentação completa do mos-to clarificado, sem formar quantidadeelevada de ácido acético e de acetato deetila. A capacidade de fermentar mostoclarificado não é muito difundida entre asleveduras nativas. Determinadas linha-gens de leveduras produzem quantidadeselevadas de ésteres, em especial os ace-tatos de álcoois superiores. O empregodessas leveduras é indicado para elabo-ração de vinhos de cultivares neutras, poisestas valorizam o aroma dos vinhos.

Outras leveduras foram selecionadaspela baixa produção de fenóis voláteis

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especialmente o vinil-fenol, composto dearoma de remédio que deprecia a qualidadedo vinho. Essas leveduras apresentam re-duzida atividade descarboxilase cinamato,enzima que catalisa, durante a fermentaçãoalcoólica, a transformação parcial do ácido-cumárico e ferúlico do mosto em vinil-4-fenol e vinil-4-guaiacol. Como esta enzi-ma é inibida pelos compostos fenólicos,somente os vinhos brancos apresentamquantidades de vinil-fenol que podem in-terferir no aroma. A utilização de linhagensde leveduras com baixa atividade descar-boxilase cinamato é recomendada espe-cialmente para os mostos que possuemconcentrações elevadas de ácidos hidro-xicinâmicos.

A participação da linhagem de levedu-ra no aroma varietal dos vinhos aromáti-cos ainda é pouco conhecida, pois comexceção do aroma moscato, os demais aindasão pouco estudados. A levedura liberapequenas quantidades de álcoois terpê-nicos livres a partir dos terpênicos glico-sídicos do mosto. Logo, a levedura utiliza-da para fermentar um mosto de ‘Moscato’não interfere muito na composição deálcoois terpênicos do vinho. No entanto, éconhecida, na prática, a capacidade parti-cular de determinadas leveduras para re-alçar o aroma varietal de algumas cultiva-res, contribuindo com a tipicidade dedeterminados vinhos. Nesse caso, é a com-posição da uva em precursores de aromasque origina a intensidade e a característi-ca aromática do vinho. A participação dalevedura é transformar o potencial aromá-tico da uva em aroma livre no vinho, con-tribuindo, assim, com o realce das safrasvitícolas e da origem geográfica.

Uma levedura adequada para a vini-ficação em branco deve contribuir paraexpressar a fineza e a complexidade aro-mática da cultivar, sem extrapolar na produ-ção de aromas fermentativos e nem evi-denciar algum aroma particular. Nessesentido, a utilização de levedura seca ativanão conduzirá à uniformização das ca-racterísticas organolépticas dos vinhosbrancos.

A quantidade de levedura a adicio-

nar na vinificação em branco varia de 15 a20 g/hL de mosto. Com essa concentração,a fermentação se processa com, aproxi-madamente, 106 células/mL de mosto. Aadição das leveduras deve ser feita com ascélulas previamente ativadas por 20 minutosem uma solução formada por partes iguais deágua e de mosto a 35°C. Caso a clarificaçãodo mosto tenha sido feita à baixa temperatu-ra (10°C-12°C), não é necessário esperar omosto aquecer para fazer a adição da levedura.

A adição da levedura deve ser realiza-da com uma boa homogeneização do mostocom vistas a alcançar uma distribuição uni-forme das borras no momento da multi-plicação das células. Quando a adição delevedura é feita em grandes recipientes épreferível incorporá-la pela parte de baixocom o auxílio de uma bomba do que pelaparte de cima, onde o mosto encontra-semais límpido.

Controle da temperatura defermentação

Os vinhos brancos elaborados em gran-des recipientes devem ser resfriados porequipamentos apropriados para evitar oaumento da temperatura. Atualmente, amaior parte dos estabelecimentos enoló-gicos que elaboram vinhos brancos dispõede estrutura adequada para o controle datemperatura de fermentação. O sistema maisdifundido é formado por um aparelhofrigorífico que mantém à baixa tempera-tura uma solução hidroalcoólica em umrecipiente isotérmico e através de um cir-cuito secundário é distribuído nos tro-cadores de calor ou nos recipientes defermentação onde o frio é necessário.

No vinho branco, o controle da tem-peratura é necessário para evitar a perdados componentes aromáticos formados. Atemperatura superior a 20°C na vinificaçãoem branco diminui a quantidade de éste-res formados pela levedura e aumenta aprodução de álcoois superiores. Com tem-peraturas mais elevadas, 28oC a 30oC, odesprendimento rápido do dióxido de car-bono provoca perda de aroma pelo arraste.No entanto, a condução de uma fermen-tação alcoólica a 18°C não é suficiente para

exaltar o aroma frutado de um vinho de umacultivar aromática. As operações pré-fer-mentativas e a escolha da levedura inter-ferem de maneira mais significativa.

Recomenda-se, como regra geral, evitara redução rápida da temperatura do mostoem qualquer estádio da fermentação alcoó-lica, tanto em grandes recipientes como embarricas. O choque térmico provoca re-dução e até mesmo parada da fermentação.

CHAPTALIZAÇÃO

Nas safras, quando houver neces-sidade, será efetuada a correção do teor deaçúcar do mosto com sacarose. Para defi-nir a intensidade de correção será neces-sário realizar análises de açúcar e álcoolpara determinar a quantidade de açúcar aadicionar ao mosto.

Calcula-se que, para cada 1% v/v deálcool, seja necessário adicionar 1,7 kg deaçúcar para 100 L de mosto. Recomenda-se a utilização de açúcar cristal de boa qua-lidade, previamente diluído numa peque-na quantidade de mosto. A chaptalizaçãoserá efetuada no início da fermentação eno terceiro dia após o início, dividindo aquantidade de açúcar em duas etapas e cer-tificando-se que o mosto fique bem homo-geneizado. A chaptalização, quando efe-tuada, não deverá ultrapassar a correçãomáxima de 3% v/v de álcool.

FERMENTAÇÃO MALOLÁTICA

Uma vez concluída a fermentação al-coólica, é importante que se realize afermentação malolática naqueles vinhosbrancos com acidez excessiva. O efeitoprincipal da fermentação malolática é atransformação do ácido málico em láticocom conseqüente redução da acidez to-tal. Além dessa transformação, ocorremigualmente reações secundárias, tais co-mo o desprendimento de dióxido de car-bono, um pequeno aumento da acidezvolátil e do pH do vinho. Visto que a fer-mentação malolática reduz a acidez e,conseqüentemente, o frescor, aspecto im-portante para a qualidade de determina-dos vinhos brancos, a sua realização não é

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sempre desejável e benéfica. No entanto,ela é sempre importante para os vinhosbrancos muito ácidos e nos vinhos-basepara espumantes, especialmente quandoelaborados pelo processo champenoise.Os agentes microbiológicos responsáveispelas transformações são as bactérias lá-ticas, microrganismos muito difundidosna natureza, mas com elevado grau de es-pecificidade.

Além do ácido málico, as bactérias dafermentação malolática utilizam comosubstrato o açúcar residual da fermen-tação alcoólica e o ácido cítrico. Quandoa quantidade de açúcar residual é elevada,a degradação pelas bactérias pode pro-vocar a fermentação manítica e conse-qüente formação de quantidades elevadasde manitol e de ácido acético.

Os principais fatores que interferemno desenvolvimento da fermentação ma-lolática são: temperatura, acidez, teor deoxigênio, presença de anti-sépticos epresença de borras.

ESTABILIZAÇÃO TARTÁRICA

Este tratamento consiste em esfriaros vinhos até uma temperatura inferior a0oC, próxima ao ponto de congelamento,deixando-o repousar por um período de 8a 10 dias nessa temperatura e, em seguida,clarificá-lo por meio da filtração. Dessa ma-neira, obtém-se a estabilidade dos vinhosbrancos necessária para o engarrafamen-to. A aplicação do frio permite realizar ar-tificialmente, durante alguns dias, o efeitodo frio de distintos invernos. A refrige-ração do vinho provoca somente altera-ções físicas, principalmente insolubili-zações.

Estabilizar um vinho não quer dizerimpedir a sua evolução normal, o seu en-velhecimento, mas evitar possíveis al-terações que possam lhe proporcionaruma coloração e limpidez instáveis com opassar do tempo. Entre as alterações quepodem ocorrer no vinho branco e interferirna limpidez e no seu aspecto destaca-se aprecipitação do bitartarato de potássio edo tartarato de cálcio.

CARACTERÍSTICAS ANALÍTICASDO VINHO BRANCO FINO

As principais características analíti-cas do vinho branco fino das cultivaresChardonnay, Riesling itálico e Moscatobranco da Serra Gaúcha são indicadas noQuadro 2.

Diferentemente dos vinhos tintos emque a composição é mais influenciada peloperíodo de maceração, os vinhos brancossofrem maior interferência do processo deextração e de clarificação do mosto e tam-bém das condições fermentativas.

O teor alcoólico do vinho branco finodeveria refletir o grau de maturação da uva,mas como a chaptalização é uma práticaenológica permitida e difundida na Ser-

ra Gaúcha, ela aumenta o teor alcoólicodo vinho. O teor alcoólico relativamen-te elevado do vinho branco fino é reco-mendável para o equilíbrio sensorial e, con-seqüentemente, para a qualidade e con-servação.

A acidez total do vinho branco fino,juntamente com o pH, garante suas ca-racterísticas de frescor. Na fermentaçãoalcoólica, a acidez do mosto proporcionauma fermentação mais pura. O vinhobranco fino da Serra Gaúcha caracteriza-sepor apresentar acidez volátil baixa, ge-ralmente inferior a 10 meq/L. Essa acidez éum indicativo importante da qualidade dovinho. Em relação ao extrato seco e ao ex-trato seco reduzido, o vinho branco fino

Densidade a 20ºC (g/mL) 0,9918 ± 0,0005 0,9916 ± 0,0007 0,9935 ± 0,0011

Álcool (% v/v) 11,30 ± 0,7 11,13 ± 0,3 11,05 ± 0,2

Acidez total (meq/L) 87,2 ± 4,1 77,2 ± 3,6 77,4 ± 7,5

Acidez volátil (meq/L) 8,0 ± 3,1 6,8 ± 1,1 12,6 ± 2,2

pH 3,09 ± 0,10 3,15 ± 0,04 3,39 ± 0,21

Extrato seco (g/L) 16,5 ± 1,2 15,3 ± 1,1 21,4 ± 2,3

Extrato seco reduzido (g/L) 16,3 ± 0,9 14,6 ± 1,2 18,4 ± 1,5

Açúcares redutores (g/L) 1,2 ± 0,7 1,3 ± 0,2 4,0 ± 1,8

Relação álcool em peso/ 5,55 ± 0,4 5,94 ± 0,5 4,82 ± 0,4

Extrato seco reduzido

Cinzas (g/L) 1,45 ± 0,1 1,61 ± 0,2 2,02 ± 0,39

Alcalinidade das 11,1 ± 2,3 12,0 ± 2,2 20,0 ± 6,1

cinzas (meq/L)

DO (420 nm) 0,056 ± 0,011 0,056 ± 0,012 _ _

Dióxido de 149,0 ± 46,9 128,3 ± 22,4 127,9 ± 45,0

enxofre total (mg/L)

Prolina (mg/L) 904,0 ±504,0 151,0 ± 73,0 83,4 ± 46,4

(1)Médias e desvios-padrão das análises clássicas dos vinhos brancos das cvs. Chardonnay, Riesling

itálico e Moscato branco, provenientes de diferentes municípios da Serra Gaúcha.

QUADRO 2 - Características analíticas dos vinhos brancos das cvs. Chardonnay, Riesling itálico e

Moscato branco

Variável (1)Chardonnay Riesling itálico Moscato branco

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91Vinhos finos: rumo à qualidade

da Serra Gaúcha também se caracterizapor ser leve, com pouco corpo em con-seqüência do grau de maturação da uva.

A alcalinidade das cinzas do vinhobranco fino indica que os ácidos orgâni-cos encontram-se em maior quantidade naforma livre, o que se evidencia pelo baixovalor detectado. A cor do vinho branco fi-no da Serra Gaúcha detectada através dadensidade ótica (DO) (420 nm) indica umatonalidade amarelo-clara com reflexosesverdeados pouco intensos. O dióxidode enxofre detectado corresponde àqueleadicionado por ocasião da vinificação.A prolina é um dos aminoácidos mais im-portantes do vinho. Algumas cultivarescomo a ‘Chardonnay’, entre as brancas,caracterizam-se por possuir teor elevadode prolina.

Os compostos voláteis do vinho brancofino das cultivares Chardonnay, Rieslingitálico e Moscato branco da Serra Gaúchaestão indicados no Quadro 3.

O aldeído acético do vinho branco finoé um indicador do nível de oxidação e estárelacionado com a quantidade de dióxi-do de enxofre utilizado na vinificação. Osteores detectados nos vinhos brancos cor-respondem aos indicados para esse tipode vinho. Valores acima de 70,0 mg/L sãoconsiderados elevados e prejudiciais à sua

(1)Chardonnay Riesling itálico Moscato branco

QUADRO 3 - Compostos voláteis do vinho das cvs. Chardonnay, Riesling itálico e Moscato branco

Etanal 46,4 ± 3,9 47,3 ± 23,1 85,6 ± 48,5

Acetato de etila 86,8 ± 34,9 61,9 ± 19,2 68,7 ± 19,8

Metanol 35,2 ± 6,3 35,7 ± 12,3 54,7 ± 12,3

1-Propanol 54,8 ± 19,0 34,5 ± 5,2 18,9 ± 4,3

2-Metil-1-propanol 30,2 ± 9,8 30,1 ± 13,6 63,3 ± 9,4

2-Metil-1-butanol + 178,0 ± 32,7 179,5 ± 20,2 118,2 ± 23,0

3-Metil-1-butanol

Soma dos álcoois superiores 262,8 ± 36,8 244,1 ± 28,4 200,4 ± 27,6

Compostos voláteis(mg/L)

(1)Médias e desvios-padrão dos compostos voláteis dos vinhos brancos das cvs. Chardonnay,

Riesling itálico e Moscato branco, provenientes de diferentes municípios da Serra Gaúcha.

qualidade. O acetato de etila é um dos éste-res mais importantes do vinho sob o as-pecto qualitativo. Teores baixos são fun-damentais para a qualidade do vinho eteores elevados são responsáveis pelo aro-ma e gosto acético.

O metanol é um álcool encontrado na-turalmente nos vinhos e nos sucos defrutas, sempre em concentrações baixas. Elese forma por ocasião da maceração da pe-lícula, no caso do vinho tinto, e no processode extração do mosto, no caso do vinhobranco. Portanto, o metanol não é um pro-duto secundário da fermentação alcoólica,mas provém da hidrólise da pectina da uva.O teor de metanol no vinho branco fino éde, aproximadamente, 50,0 mg/L. A legis-lação brasileira estabelece em 350 mg/L oteor máximo de metanol do vinho. Álcooissuperiores são os que possuem mais dedois átomos de carbono e são considera-dos produtos secundários da fermentaçãoalcoólica. A quantidade de álcoois supe-riores do vinho está relacionada com ascondições fermentativas – temperatura,clarificação do mosto, levedura, níveis denitrogênio e de dióxido de enxofre. Teoresmuito elevados de álcoois superiores, acimade 300 mg/L, determinam aromas grosseirosnos vinhos brancos finos.

Os elementos minerais do vinho branco

fino das cultivares Chardonnay, Rieslingitálico e Moscato branco da Serra Gaúchasão indicados no Quadro 4. O teor de cadaelemento mineral do vinho branco fino estárelacionado com o sistema de vinifica-ção utilizado, especialmente com a tecno-logia aplicada na extração do mosto. Demodo geral, o vinho branco caracteriza-sepor apresentar teor inferior de minerais emrelação ao vinho tinto, devido à menor par-ticipação da película na vinificação embranco.

O potássio é o cátion mais importanteda uva, do mosto e do vinho. Ele representaentre 40% e 50% do peso das cinzas. Opotássio forma um sal insolúvel com o áci-do tartárico precipitando no fundo e nasparedes do recipiente na forma de tartara-to ácido de potássio ou bitartarato de po-tássio.

O cálcio é encontrado no vinho em quan-tidade variável de 70,0 mg/L a 100,0 mg/L.O teor final de cálcio no vinho depende dainsolubilização na forma de tartarato decálcio. O vinho branco geralmente apre-senta teor mais elevado de cálcio em re-lação ao tinto, devido à acidez que mantémmaior quantidade solúvel.

O magnésio é encontrado no vinho emconcentrações semelhantes ou até su-periores ao cálcio, visto que seus sais sãomais solúveis. No entanto, o teor de cálcioe magnésio do vinho pode ser influenciadopela pulverização de calda bordalesa novinhedo.

O teor de sódio no vinho branco fino émuito influenciado pelos produtos eno-lógicos utilizados – tais como bentonite,caseinato, terras filtrantes. A concentraçãode sódio natural do vinho branco fino daSerra Gaúcha é inferior a 10,0 mg/L.

O manganês do vinho tem origem nosolo, onde é cultivada a videira. O teornormalmente encontrado no vinho varia de1,5 mg/L a 4,0 mg/L. Segundo Ribéreau-Gayon et al. (1976) e Flanzy (1998), a par-ticipação da semente pode liberar maiorquantidade de manganês para o vinho,no entanto, trabalho efetuado por Rizzon(1985), com diferentes tempos de mace-ração, não confirma esse fato. Os vinhos

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brancos, geralmente, apresentam con-centrações mais baixas de manganês emcomparação com os tintos. O ferro e o cobreestão presentes no vinho em concen-trações baixas e participam de sua esta-bilidade. Teor de ferro acima de 4,0 mg/Lpode causar problema de turvação, assimcomo teor de cobre superior a 1,0 mg/L.Teores elevados desses dois elementosminerais são incorporados ao vinho atra-vés do contato com equipamentos e re-cipientes utilizados para sua conservação.No caso do cobre, as aplicações de caldabordalesa no vinhedo determinam teoreselevados desse elemento no mosto. Noentanto, na fermentação alcoólica forma-se o sulfeto de cobre que é precipitado eeliminado juntamente com as borras dovinho. O zinco está presente no vinho embaixas concentrações, normalmente inferiora 1,0 mg/L. Teores elevados devem-se aocontato com material que contém zinco. Orubídio é outro elemento mineral encon-trado no vinho, proveniente do solo ondeé cultivada a videira. Os teores variam de3,0 mg/L a 7,0 mg/L. Esse elemento mine-ral é importante na diferenciação dos vi-

nhos em função da região vitícola. Nessesentido, constatou-se que os vinhos bra-sileiros caracterizam-se por apresentar teorde rubídio mais elevado em relação ao vinhodos demais países do Mercosul.

Quanto ao fósforo, este está presenteno vinho principalmente na forma de fos-fato. Antigamente, relacionava-se o teor defósforo do vinho com sua qualidade.Atualmente, observa-se que o teor de fós-foro está relacionado com a intensidade deprensagem da uva por ocasião da extraçãodo mosto.

CARACTERÍSTICAS SENSORIAISDO VINHO BRANCO FINO

O vinho branco fino produzido no Suldo Brasil, em particular na Serra Gaúcha,caracteriza-se por apresentar bom aspecto,chegando a impressionar pela limpidez etonalidade amarelo-palha, com reflexosesverdeados, que geralmente apresenta. Oaspecto do vinho é conseqüência, prin-cipalmente, da tecnologia utilizada na vi-nificação. No entanto, deve-se considerartambém a qualidade da uva produzida naregião.

Em relação ao olfato, os vinhos brancosfinos da Serra Gaúcha dividem-se em doisgrupos: um grupo formado por vinhosbrancos aromáticos, onde predominam osaromas varietais, devido à presença dosálcoois terpênicos da uva, como os Mos-cato, Gewürztraminer e os de Malvasia; ooutro grupo é formado principalmentepelos vinhos Chardonnay e Riesling itáli-co, em que predominam os aromas de fer-mentação e, especialmente no caso da‘Chardonnay’ em pequena escala, um pou-co de aroma varietal. Os vinhos do primei-ro grupo apresentam boa intensidade aro-mática com predominância da característicamoscato. Os vinhos brancos finos sãodescritos como frutados e florais, poisapresentam menos aromas primários e maissecundários, no entanto, o aroma é fino. Acaracterística aromática desses vinhosdeve-se muito à tecnologia de elaboração(clarificação do mosto, temperatura de fer-mentação, utilização adequada do dióxidode enxofre, utilização de levedura seca ati-va), no entanto, os aspectos culturais da re-gião determinam uma composição de mos-to que favorece a formação de compostossecundários da fermentação alcoólica.

No aspecto sensorial, os vinhos bran-cos finos da Serra Gaúcha mostram umapredominância ácida sobre o gosto doce e,devido ao pouco corpo, são classificadoscomo leves. O vinho branco deve apre-sentar gosto franco de Moscato, ou varie-tal para o Chardonnay e Riesling itálico. Afranqueza e a intensidade do gosto sãoavaliadas após colocar um volume su-ficiente de vinho na boca. O corpo expressaas sensações do gosto e do olfato juntas.

A sensação final deixada pelo vinhodeve-se aos estímulos produzidos pela rea-ção química da saliva com o resto de vinhoque fica na boca. Essa sensação é positiva,quando se percebe um aroma fino, frutadoe suave, formando um conjunto harmôni-co perfeito.

VINHO BRANCO E SAÚDE

Mesmo que o vinho tinto seja mais va-lorizado em relação ao vinho branco, no

(1)Médias e desvios-padrão dos elementos minerais dos vinhos brancos das cvs. Chardonnay,

Riesling itálico e Moscato branco, provenientes de diferentes municípios da Serra Gaúcha.

QUADRO 4 - Elementos minerais dos vinhos das cvs. Chardonnay, Riesling itálico e Moscato

branco

Minerais(mg/L)

(1)Chardonnay Riesling itálico Moscato branco

Potássio 513,0 ± 76,9 594,3 ± 128,6 856,3 ± 270,0

Cálcio 75,7 ± 6,9 75,5 ± 6,1 86,9 ± 13,5

Magnésio 55,2 ± 4,4 54,0 ± 2,8 50,9 ± 6,4

Sódio 16,5 ± 3,1 17,9 ± 3,8 34,7 ± 10,8

Manganês 1,4 ± 0,3 1,5 ± 0,4 1,8 ± 0,3

Ferro 2,1 ± 0,4 2,2 ± 0,6 4,1 ± 2,4

Cobre 0,1 ± 0,1 0,2 ± 0,1 0,8 ± 1,3

Zinco 0,5 ± 0,3 0,5 ± 0,3 0,4 ± 0,2

Lítio 7,6 ± 1,8 8,2 ± 0,7 _ _

Rubídio 3,5 ± 0,5 4,2 ± 0,6 3,7 ± 0,4

Fósforo 65,2 ± 7,3 63,8 ± 10,8 38,9 ± 8,8

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93Vinhos finos: rumo à qualidade

aspecto farmacológico, ele apresenta nacomposição determinados elementos quelhe atribuem ação diurética, refrescante,anti-séptica e eupéptica.

Os sais de potássio são indicados comoos responsáveis pela ação diurética dovinho branco. O potássio encontra-se emconcentração elevada no vinho e exerceum poder diurético específico, sendo uti-lizado na terapêutica. Esse cátion, muitoativo, exerce um papel indispensável, mes-mo no interior da célula viva, ao contráriodo sódio. O potássio intervém na con-tração muscular tendo particular interessea relação potássio/cálcio na manutençãodo automatismo cardíaco.

Os vinhos brancos possuem menor teorde potássio, mas são mais diuréticos queos tintos, pois o teor mais elevado de ta-ninos no vinho tinto retarda a absorção dolíquido e provoca uma redução da açãodiurética.

Os vinhos brancos apresentam teoresmais elevados de flavonóis, componentesque juntamente com o ácido tartárico e opotássio provocam efeito diurético.

O vinho apresenta variação de pH de3,0 a 3,7, situando-se numa região ácida. Apepsina do suco gástrico apresenta ati-vidade ótima próxima de pH 2,0, e essa con-dição é alcançada pela secreção do ácidoclorídrico pela mucosa estomacal. O vinho,devido a sua acidez, contribui com a açãoda pepsina. No entanto, o poder da pepsinaé comprometido com uma quantidadeelevada de dióxido de enxofre que inibe asua secreção.

A propriedade eupéptica é conferidapelos ácidos tartárico, málico e cítrico. Oácido lático do vinho exerce um poderdesinfetante utilizado há muito tempo naterapêutica de putrefações intestinais.

Ruano-Ravina et al. (2004) atribuemefeitos benéficos do vinho branco sobre oaparelho respiratório. Sem contar aindaque, tal como o vinho tinto, ele tambémpossui características particulares capa-zes de encantar e conquistar sentimentos;possui história, cultura e é “fruto” do tra-balho do homem e da ciência enológica.

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Elaboração de vinho espumante

Ana Carolina Fávero1

Daniel Angelucci de Amorim2

Renata Vieira da Mota3

Murillo de Albuquerque Regina4

1Enga Agra, B.S., Mestranda UFLA, Caixa Postal, 3037, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agro, M.Sc., Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correio

eletrônico: [email protected] Agra, Dra, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correio

eletrônico: [email protected] Agro, Pós-Doc, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correio

eletrônico: [email protected]

INTRODUÇÃO

Espumante é o vinho cuja eferves-cência, proveniente do dióxido de carbono(CO

2), resulta de uma segunda fermentação

alcoólica que ocorre em um vinho-base,quando se adiciona açúcar, leveduras enutrientes, podendo ser realizada dentrode garrafas (método Champenoise) ou emgrandes recipientes fechados (método

Charmat), com uma pressão mínima de 4atmosferas a 20ºC e com um conteúdoalcoólico de 10% a 13% (LONA, 2001).

Os vinhos espumantes são produzi-dos em quase todas as regiões vinícolasdo mundo, com destaque para França, Es-panha, Itália, Austrália, Nova Zelândia,Brasil, Chile, Argentina e outros. No Brasil,as principais regiões produtoras são a Serra

Gaúcha (principalmente os municípios deGaribaldi e Bento Gonçalves) e o Vale doSão Francisco.

Ultimamente, o Brasil vem ganhandodestaque na qualidade de seus espuman-tes, sendo estes considerados o melhor pro-duto da agroindústria enológica nacional.Essa qualidade está associada não somente

ao elevado nível tecnológico empregado,

Resumo - A produção de vinhos espumantes no Brasil tem ganhado ênfase especial nos

últimos anos, notadamente em função do bom padrão de qualidade obtido no Sul do

País. Na maioria das regiões vitícolas nacionais, as condições de clima, verificadas

durante o período de maturação e colheita, impedem a perfeita maturação da uva,

especialmente das tintas, afetando negativamente a qualidade dos vinhos. Já para os

vinhos brancos tranqüilos e espumantes tal fato não ocorre, pois o índice de maturação

obtido permite um bom equilíbrio entre açúcares e ácidos, além de boa intensidade

aromática, condições essenciais para obtenção de bons vinhos espumantes. Apesar de

possuir condições climáticas semelhantes àquelas verificadas no Sul do País, Minas

Gerais, em particular nas zonas de vocação vitícola do Sul do Estado, ainda não possui

tradição na produção de vinhos espumantes. Recentemente, inúmeras iniciativas têm

sido tomadas em conjunto, Estado e iniciativa privada, para equacionar alguns aspectos

relativos a essa produção, tais como cultivares, regiões, manejo e processos de

elaboração que permitam a inserção de Minas Gerais no cenário nacional de produção

desse tipo de vinho.

Palavras-chave: Enologia. Vinificação. Fermentação. Tecnologia de elaboração. Uva.

Cultivar. Vinho-base.

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mas também às condições climáticasfavoráveis à obtenção da matéria-prima.Via de regra, nas Regiões Sul e Sudestebrasileiras, onde o ciclo da videira ocorreuma só vez por ano e é determinado fun-damentalmente pelas temperaturas am-bientais, o período de maturação coincidecom a época chuvosa, afetando o acúmulode açúcares, a redução dos ácidos orgâ-nicos e a maturação fenólica da uva, origi-nando, assim, vinhos pouco encorpados,de pouca expressão varietal e sem condi-ções de envelhecimento. Essas condições,entretanto, não impedem a produção deespumantes de qualidade, uma vez que amaturação da película não é indispensá-vel no seu processo de elaboração e o equi-líbrio entre açúcares e ácidos das uvas commenor índice de maturação é favorável àapreciação sensorial deles.

Essas condições ambientais são encon-tradas na Serra Gaúcha, de onde provém aquase totalidade do vinho espumante bra-sileiro, e também na região serrana do Sul deMinas Gerais que ainda não produz es-pumantes. Em virtude de o grande poten-cial existente para Minas Gerais tornar-seum novo pólo vinícola de elaboração deespumantes de qualidade, a EPAMIG, pormeio do seu Núcleo Tecnológico EPAMIGUva e Vinho, está desenvolvendo trabalhoscom adaptação de cultivares e técnicas demanejo voltados à produção de espumantes.

CULTIVARES E PONTO DECOLHEITA

Para a elaboração dos espumantes tra-dicionais, são utilizadas basicamente trêsvariedades: ‘Pinot noir’ e ‘Chardonnay’(oriundas da região de Champagne, naFrança) e ‘Riesling itálico’, que entrou noBrasil a partir da década de 60. Cada varie-dade possui características importantespara a elaboração do espumante. Na Fran-ça, além das variedades Chardonnay ePinot noir, a ‘Pinot meunier’ também fazparte da composição do champanhe. Al-guns espumantes produzidos na Itália e noBrasil empregam variedades aromáticas dogrupo Moscatel.

A ‘Pinot noir’ é a principal uva tinta,usada geralmente para dar maior estruturaao produto. As demais são brancas. A‘Chardonnay’ origina um vinho brancoequilibrado, com pouco aroma varietal,porém de elevada complexidade. Para aprodução de vinho espumante, deve sercolhida com potencial alcoólico entre 9% e10% v/v. Sua presença contribui com oaroma e harmoniza os demais aspectos. A‘Riesling itálico’ possui bom potencial deacúmulo de açúcar na baga, origina vinhocom aroma varietal pouco pronunciadoe aroma secundário suficiente para serclassificado como vinho frutado. Deve sercolhida com um potencial alcoólico entre9% e 10% v/v por apresentar a estruturaácida necessária para garantir o frescor dovinho espumante (RIZZON et al., 2000;REETZ et al., 2004).

A uva deve apresentar estrutura ácidaconsiderável, pois a acidez é responsávelpelas características de frescor do vinhoespumante. A princípio, os vinhos paraelaboração de espumantes devem apre-sentar um grau alcoólico mais baixo e acidezmais alta em relação ao vinho de mesa. Porisso, recomenda-se colher a uva antes dealcançar a maturação plena e nunca esperara sobrematuração.

PROCESSO DE ELABORAÇÃODO ESPUMANTE

A elaboração do espumante é divididaem duas etapas, sendo a primeira destinadaà obtenção do vinho-base e a segunda àtomada de espuma (segunda fermentação),que pode ser realizada pelos métodosChampenoise e Charmat.

Elaboração do vinho-base

Vinho-base é o vinho branco, elabora-do a partir de uvas brancas ou tintas (vi-nificadas em branco), que possui baixo teoralcoólico (10°GL a 10,5°GL) e acidez ex-pressiva.

Atingido o ponto de colheita ideal paraelaboração do vinho-base, as uvas devemser colhidas no período mais fresco do diae, caso não sejam processadas logo após a

colheita, devem ser transportadas ime-diatamente para um local refrigerado. Oscuidados na colheita, transporte e res-friamento são fundamentais para a qua-lidade do vinho, pois, dessa forma, evita-se o início dos processos fermentativos eoxidativos da uva, além de manter as ca-racterísticas aromáticas da variedade. Paratanto, um controle na colheita evitando-secachos danificados ou com sintomas depodridões faz-se necessário.

No processamento, as uvas são pe-sadas e podem passar por uma mesa detriagem para seleção prévia dos cachos.Posteriormente, são desengaçadas e le-vadas a uma prensa de pressão controla-da para separar a casca e o engaço do mostoa ser vinificado. Atualmente, as empresastêm realizado a prensagem dos cachos emprensas pneumáticas, sem a realização dodesengace. Tal prática, apesar de ter me-nor rendimento industrial proporciona aoproduto um ganho de qualidade por evi-tar um trabalho mecânico a mais que seriao processo de desengace. De acordo comRizzon et al. (2000), um aspecto carac-terístico do vinho espumante é a tecnolo-gia de extração do mosto, a qual se baseiaem evitar o esmagamento e a maceração dauva para reduzir o teor de compostosfenólicos do vinho, principalmente ostaninos herbáceos da ráquis ou pedicelo ecascas, e para evitar teores de potássio emexcesso. Nesse sentido, o mosto deve serobtido por meio da prensagem da uva,realizada o mais rapidamente possívelapós o resfriamento. Durante a prensa-gem, é adicionado SO

2 na dosagem de 5 a

8 g/hL de mosto em função do estadosanitário da uva, com o objetivo de evitar aoxidação do mosto, eliminar leveduras in-desejáveis provenientes do campo e evitaro início da fermentação. Outro aspecto im-portante é o seu fracionamento, seguindoa operação de prensagem. O mosto-flor éutilizado na preparação do vinho espu-mante de qualidade superior, enquantoaqueles obtidos de primeira e segundaprensagem, mais encorpados, menos finose menos ácidos são utilizados para elabo-ração de vinhos de qualidade inferior. Ge-

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ralmente, com o aumento de intensidadede prensagem, o mosto apresenta pH maiselevado. A acidez total diminui do mosto-flor para o mosto-prensa devido ao aumen-to dos cátions, especialmente o potássio,e à redução do teor de ácido tartárico emálico.

Quanto às cultivares tintas, como é ocaso da ‘Pinot noir’ e da ‘Pinot meunier’,para evitar a presença de cor vermelha,devido à passagem das antocianinas dapelícula para o mosto, é necessária a rea-lização de uma prensagem delicada quesepare as cascas o mais rápido possível.

Toda essa etapa inicial de processa-mento ganha qualidade quando a matéria-prima encontra-se refrigerada, fato quecontribui, juntamente com o SO

2, para a

redução da ação das enzimas oxidativas.Em seguida, o mosto é clarificado, pro-

cesso também conhecido por debourbage,que tem por objetivo eliminar partículasvegetais (películas, ráquis, sementes) eestranhas (terra, metais, etc.) antes da fer-mentação. Essa clarificação pode ser está-tica, que é uma simples decantação reali-zada por ação da sulfitagem, do frio, de umacolagem (bentonite, caseína) ou ainda porenzimas pectolíticas, ou pode ser dinâmica,por utilização de métodos físicos como acentrifugação, filtração ou flotação. A efi-ciência da clarificação é medida por sua tur-bidez, com valores de 100 a 200 NTU (GI-RARD, 2001).

A fermentação alcoólica é realiza-da por ação de leveduras selecionadas(Saccharomyces cerevisiae) que são pre-viamente hidratadas em água morna, naproporção de 20 g/hL, em tanques fermen-tadores de aço inoxidável, equipados comdispositivo para controle da temperatura.O mosto em fermentação deve ficar abaixode 20ºC, entre 18ºC e 20ºC (FLANZY et al.,2000) até a transformação de todo o açúcarem álcool. Para alcançar o grau alcoólicodesejado é permitido efetuar a correção domosto com sacarose, processo conhecidopor chaptalização.

O vinho-base para espumante deveapresentar grau alcoólico relativamentebaixo, entre 10oC e 10,5% v/v; acidez total

elevada, entre 80 e 90 meq/L; pH abaixo de3,2; acidez volátil inferior a 10 meq/L; açúcartotal inferior a 1,5 g/L e teor de dióxido deenxofre total inferior a 50 mg/L (RIZZON etal., 2000; REETZ et al., 2004).

Terminada a fermentação alcoólica é im-portante que o vinho-base realize a fer-mentação malolática, que é a transformaçãodo ácido málico em ácido lático por açãode bactérias láticas, naturalmente presen-tes no vinho. Esse processo visa obter aestabilidade microbiológica e evita asgraves conseqüências de uma fermenta-ção malolática durante a segunda fer-mentação ou no envelhecimento do vinho,como também baixa a acidez do vinho eparticipa da complexidade aromática, comono caso dos vinhos tranqüilos da cultivarChardonnay (RIBÉREAU GAYON et al.,2004). A utilização de cepas de bactériaslácticas comerciais permite um melhorcontrole das condições de fermentação,encurtando o período em que o vinho ficaa 18oC-20oC (LAURENET e VALADE, 1993apud FLANZY et al., 2000), diminuindo, porexemplo, os riscos de oxidação, quando afermentação malolática é muito demora-da. A utilização de cepas neutras podeevitar ou amenizar o aparecimento de carac-teres organolépticos de manteiga, lácteos,que normalmente não são objetivados parao caso de vinhos-base para espumantes.Por outro lado, geralmente os vinhos quenão sofreram a fermentação malolática con-servam melhor as características aro-máticas da variedade e possuem uma melhorcapacidade de envelhecimento devido a suaacidez mais elevada (FLANZY et al., 2000).

Após o fim da fermentação malolática,as borras, leveduras mortas e produtosenológicos irão depositar-se no fundo dotanque. A separação deste precipitado domosto é realizada através de uma atividadedenominada trasfega. Após a primeiratrasfega, o vinho é novamente sulfita-do, mantendo-o com a dosagem de 30 a40 mg/L de SO

2 e clarificado com o auxílio

de clarificantes, como gelatina, cola de peixee bentonite em doses moderadas, com ousem adição de taninos, objetivando a es-tabilidade protéica. Ocorrendo uma nova

precipitação, o mosto é trasfegado pelasegunda vez e filtrado.

As etapas de elaboração do vinho-basepara espumante estão descritas resumi-damente na Figura 1. Esse processo segue,em grande parte, os mesmos princípios deelaboração de vinho branco seco.

Elaborados os diferentes vinhos-baseinicia-se o processo de definição dos vi-nhos que irão compor o vinho-base defi-nitivo. Após a escolha desses vinhos reali-zam-se, em escala amostral, assemblagesou cortes dos vinhos, que é a mistura dedois ou mais vinhos (variedades e safras)em proporções diferentes, objetivandoalcançar o melhor equilíbrio entre as ca-racterísticas sensoriais. Assim, a definiçãoda combinação do vinho-base definitivofaz-se pela degustação das diferentesamostras dos possíveis cortes. Uma vezdecidida a melhor combinação, é realiza-do o corte dos vinhos em grande volu-me, com as devidas correções, deixando-opronto para seguir o processo da segundafermentação.

Em seguida é realizado um tratamentode frio no vinho, resfriando-se o tanque a-3°C por um período de, aproximadamente,10 a 15 dias, para a obtenção da estabilida-de tartárica. Em certos casos, uma últimacolagem é realizada antes ou após a esta-bilidade tartárica. Após o tratamento de frio,o vinho é novamente trasfegado e filtradopor uma última vez, sendo colocado em tan-que de armazenamento até o início da se-gunda etapa de elaboração do espumante.

Formação de espuma ouchampanhização

Concluída a elaboração do vinho-base,passa-se à fase de formação de espuma ouchampanhização, que é a produção do gáscarbônico através de uma segunda fer-mentação em recipientes fechados. Lona(2001) define estes vinhos, cujo gás é ori-ginário de uma segunda fermentação, comoespumantes naturais. Os espumantes ga-seificados, de qualidade notadamente in-ferior, são aqueles em que ocorre a injeçãoexógena de gás carbônico ao produto.

Os métodos mais utilizados para a for-

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mação de espuma são os métodos fran-ceses Champenoise e Charmat, descritos aseguir. Outros processos, como os citadospor Navarre (1998), Flanzy et al. (2000) eRibéreau Gayon et al. (2004), são: métodode transferência isobarométrica garrafa-tanque-garrafa; método tradicional e mé-todo ancestral; método contínuo e métodopara elaboração do Asti.

Método Champenoise

O método champenoise é o tradicio-nal, obrigatoriamente utilizado na regiãofrancesa de Denominação de Origem Con-trolada da Champagne. Por este método, asegunda fermentação do vinho-base ocor-re diretamente em garrafas especiais tam-padas com tampas próprias (tipo corona),que suportam a pressão gerada pela libe-ração do gás carbônico da fermentação.

Após o período de envelhecimento em con-tato com as borras e leveduras realiza-se odégorgement, com o objetivo de eliminar osdepósitos decantados, seguido da adiçãodo licor de expedição (açúcar e vinho), doarrolhamento e, por fim, do engaiolamento.

Enchimento das garrafas

O enchimento das garrafas faz-se apósa adição do licor de tirage, que é uma so-lução de sacarose feita na proporção de500 g/L de vinho. A quantidade de licor aadicionar é calculada de modo que permi-ta a formação de dióxido de carbono su-ficiente para gerar a pressão mínima de 5 a6 bars, a 10oC-12oC. Teoricamente, são ne-cessárias 4 g/L de sacarose para obter 1bar de pressão. Assim, para obter 5 bars depressão dentro de uma garrafa a 10oC, sãonecessários 20 g/L de sacarose para refer-mentar. Considerando uma temperatura de

20ºC, esta pressão alcançará 6,8 bars. Estaquantidade de açúcar elevará o teor alcoó-lico do vinho, após a fermentação a, aproxi-madamente, 1,1 % v/v.

Junto com o licor são adicionadas le-veduras selecionadas de Saccharomycescerevisiae, específicas para a segundafermentação de vinho-base. Laurent e Va-lade (1994 apud RIBEREAU GAYON et al.,2004) sugerem uma adição controlada dasleveduras, com uma população inicial de1,5 x 106 células/mL. Abaixo desta, a re-fermentação é mais lenta e pode sobraraçúcar não fermentado e, acima desta po-pulação, a fermentação é mais rápida,podendo desvalorizar qualitativamente oespumante, deixando o gosto de levedura,dependendo das linhagens de levedurasutilizadas.

A adição do licor de tirage e das leve-duras pode ser feita dentro do tanque antesdo enchimento das garrafas ou, de outraforma, pode ser realizada no momento doenchimento, adicionando-os dentro de ca-da garrafa por meio de bombas dosadoras.

Também pode-se lançar mão de algunsadjuvantes, como o fosfato de amônio (até30 g/hL), tiamina (6 g/hL) e caseinato depotássio (4 g/hL), respectivamente, para darmelhores condições de fermentação, re-duzir o teor de aldeído acético e precipi-tar os compostos fenólicos (catequinas),protegendo o vinho da oxidação (RIZZONet al., 2000), bem como a bentonite (3 g/hL)ou alginato (0,2 a 0,7 g/hL), destinados afacilitar a eliminação do depósito de leve-duras por ocasião do dégorgement (RIBÉ-REAU GAYON et al., 2004). A Figura 2ilustra o processo de enchimento das gar-rafas para segunda fermentação pelo pro-cesso Champenoise.

Fermentação alcoólica (champa-

nhização) e envelhecimento em

contato com as borras

As garrafas para espumantes são resis-tentes para suportar a pressão e de co-loração verde-escuro. No momento dofechamento é utilizado um opérculo deplástico e sobre este é presa a tampa do ti-po corona. A seguir, as garrafas são em-pilhadas na posição horizontal para a rea-

Figura 1 - Esquema de vinificação de vinho branco base para elaboração de espumantes

FONTE: Dados básicos: Girard (2001).

Vinho-base 2

Operações facultativas

Operações obrigatórias

Clarificação(debourbage)

Prensagem

Desengace

Colheita

Fermentaçãoalcoólica

Fermentaçãomalolática

Trasfega

Vinho-basepara espumante

Vinho-base nVinho-base 1

Proteção contra alterações

Proteção contra alterações

Estática ou dinâmica

Adição de leveduras

Proteção (SO )2

Cortes (assemblages)

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98 Vinhos finos: rumo à qualidade

lização da fermentação alcoólica, em con-dições de temperaturas estáveis que po-dem variar de 10oC a 15oC (FLANZY et al.,2000), sendo de 11oC-12oC nas condiçõesde Reims e Èpernay, na França (RIBÉREAUGAYON et al., 2004) e de 12oC a 14oC, nascondições da Serra Gaúcha, conformecitado por Rizzon et al. (2000). É importantetambém que as garrafas estejam protegidasda luz, de correntes de ar, de umidade e deodores estranhos. Após o término da fer-mentação, período que pode durar de um atrês meses (FLANZY et al., 2000), em funçãoda temperatura, do teor alcoólico e dosadjuvantes enológicos presentes, o vinhoespumante permanecerá em contato comas leveduras por um período mínimo de umano, podendo chegar a dois ou três anos(RIZZON et al., 2000), ou até mesmo a oitoanos para os vinhos de grande qualidadeda região de Champagne. A posição dasgarrafas deitadas permite um maior contatoentre o vinho e as leveduras. Durante esseperíodo ocorre progressivamente a mortedas leveduras e, por fenômenos de au-tólises de suas células, há a liberação dediversas substâncias, particularmente deaminoácidos, que são responsáveis pela

qualidade do espumante e que estão dire-tamente correlacionadas com a qualidadedo vinho-base (RIBÉREAU GAYON et al.,2004).

Eliminação das borras

Concluída a fase de formação de es-puma e de permanência do vinho sobre asborras, observa-se na parte de baixo da gar-rafa, mantida horizontalmente, um depósitoformado por células de leveduras e porprodutos enológicos utilizados. Esse de-pósito será conduzido lentamente para obico da garrafa, para ser retirado depois(RIZZON et al., 2000; REETZ et al., 2004).Esta operação é realizada manualmente pormeio de giros aplicados nas garrafas,processo conhecido como “remuage”. Paratal, as garrafas são colocadas em pupitres(suportes de madeiras) que permitemcolocá-las quase horizontalmente (20o a 25º)ao princípio do processo de remoção. Pro-gressivamente as garrafas são giradas elevantadas para terminar em posição quasevertical (60o a 75º). Para a realização daoperação de remuage, necessitam-se porvolta de 20 a 25 operações com um giro pordia (FLANZY et al., 2000). O tempo de du-

ração e a facilidade desta operação de-pendem da natureza do vinho e de sua es-trutura coloidal, da natureza das levedurase de sua capacidade à aglutinação, bemcomo dos coadjuvantes enológicos uti-lizados, durando, aproximadamente, de trêssemanas a um mês (RIBÉREAU GAYONet al., 2004).

Atualmente, existem sistemas auto-máticos para a realização das operações deremuage (giropalettes), que possibilitammaior rapidez e maior racionalização doespaço da cave pela redução dos númerosde pupitres necessários durante o pro-cesso.

Separação do depósito, adição

do “licor de expedição” e arrolha-

mento

O depósito acumulado no bico da gar-rafa é eliminado em uma operação deno-minada dégorgement. Caracteriza-se porcongelar o bico da garrafa através da imer-são deste em um líquido refrigerante a -25ºC,por um período de 2 a 3 minutos (FLANZYet al., 2000). Este procedimento é realiza-do em equipamentos específicos para odégorgement, onde as garrafas são mer-gulhadas com a boca para baixo. Após con-gelar, aproximadamente, 2 cm abaixo datampa, justamente onde se encontra o de-pósito que se objetiva eliminar, as garrafassão colocadas em pé e abertas utilizando-seuma destampinhadora. Nesse momento,o depósito congelado que se encontra ade-rido ao opérculo de plástico é expulso pelapressão existente dentro da garrafa.

Em seguida nivela-se o espumante eadiciona-se o licor de expedição, que con-siste em uma solução de vinho reserva com600 g/L de açúcar que permite ajustar o es-pumante em função do tipo de produtodesejado (Quadro 1). Se necessário, o li-cor pode ser acidificado com ácido cítrico.Além disso, o licor contém a quantidadede dióxido de enxofre necessária para elimi-nar o oxigênio dissolvido e, eventualmente,pode conter ácido ascórbico - 50 mg/L(RIBÉREAU GAYON et al., 2004). O licorde expedição é adicionado para contribuir coma harmonia e suavidade do vinho espumante,

Figura 2 - Esquema do processo de enchimento das garrafas

FONTE: Dados básicos: Flanzy et al. (2000).

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REFERÊNCIAS

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GIRARD, G. Bases scientifiques et tech-nologiques de l’oenologie. Paris: Tec. & Doc.Lavoisier, 2001. 240p.

GUERRA, C.C. Processamento. In: GUERRA,C.C.; SILVA, G.A.; TONIETTO, J.; MELLO,L.M.R. Uva para processamento pós-colheita.Bento Gonçalves: Embrapa Uva e Vinho/Brasília:Embrapa Informação Tecnológica, 2003. p.30-35.

LONA, A.A. Vinhos: degustação, elaboração eserviços. Porto Alegre: AGE, 2001. 151p.

NAVARRE, C. L’oenologie. 4. ed. Paris: Tec. &Doc. Lavoisier, 1998. 354p.

REETZ, E.; SANTOS, C.; KIST, B.B.; CORRÊA,S.; BELING, R.R.; SCHEMBRI, T.M. A boa terra.Anuário Brasileiro da Uva e do Vinho 2004,Santa Cruz do Sul, p.112-119, 2004.

RIBÉREAU-GAYON, J.; GLORIES, Y.;MAUJEAN, A.; DUBOURDIEU, D. Traitéd’oenologie - 1: microbiologie du vin -vinifications. 5.ed. Paris: DUNOD, 2004. 661p.

RIZZON, L.A.; MENEGUZZO, J.; ABARZUA,C.E. Elaboração de vinho espumante napropriedade vitícola. Bento Gonçalves:Embrapa Uva e Vinho, 2000. 24p. (Embrapa Uvae Vinho. Documentos, 29).

além de melhorar o aroma e as característicasgustativas do vinho (RIZZON et al., 2000).

para uma autoclave para a realização doprocesso de formação de espuma. Nessemomento, faz-se a adição de leveduras edo licor de tirage com a quantidade de açú-car necessária para a formação da espuma,na pressão desejada e com permanênciade um residual para manter a dosagem deaçúcar necessária ao produto final, se-gundo sua classificação em extra brut, brut,seco, etc. Essa autoclave é equipada comsistema de refrigeração e aquecimento pararealizar a fermentação na temperatura de20oC a 25oC. Assim que a pressão atinge 5bars, a fermentação é interrompida porrefrigeração e sulfitagem. Em seguidarefrigera-se para -5ºC, passando para umaoutra autoclave, mantendo o espumantepor vários dias nesta temperatura para asse-gurar a estabilização. Após, o espumante éfiltrado, passando para uma outra auto-clave e, a partir desta, é engarrafado. Osprocessos de filtração e engarrafamentosão isobáricos, o que garante a manuten-ção da pressão ao produto.

Este rápido tempo de elaboração dovinho espumante, alcançado com a manu-tenção de temperaturas de fermentação maiselevadas e com a separação rápida dasleveduras após alguns dias de fermenta-ção, conforme descrito anteriormente,objetiva reduzir custos e, conseqüente-mente, elaborar produtos mais baratos,porém de qualidade organoléptica inferior,se comparados àqueles obtidos pelo pro-cesso Champenoise.

Por outro lado, a partir de uvas de qua-lidade que possibilitem a obtenção de bonsvinhos-base, um ganho qualitativo doproduto é alcançado, quando o processofermentativo ocorre lentamente, o que éobtido através de uma modulação da tem-peratura de fermentação baixa e com umperíodo maior de permanência do vinho emcontato com as leveduras. Assim, são ela-borados os bons vinhos espumantes bra-sileiros. O método utilizado pelas vinícolasbrasileiras diferencia em alguns aspectosdo método descrito por Ribéreau-Gayon etal. (2004), sendo a temperatura da segundafermentação mais baixa, inferior a 20ºC. O vinhoé mantido em contato com as borras por um

período mais longo para adquirir o sabor e osaromas característicos. Neste processo, o licorde expedição é adicionado após a estabiliza-ção e filtração isobárica, na graduação deaçúcar, conforme o tipo de espumante (Qua-dro 1), seguindo-se o engarrafamento e acolocação da rolha e da gaiola (RIZZON et al.,2000; GUERRA, 2003; REETZ et al., 2004).

Em Minas Gerais, através de projeto fi-nanciado pela Fundação de Amparo à Pes-quisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig)estão sendo testados os vinhos espumantesproduzidos em três regiões (Caldas, Diamanti-na e Cordislândia), a partir de duas cultivares(‘Chardonnay’ e ‘Pinot noir’) e dois métodosde elaboração (Champenoise e Charmat).

Por fim, as garrafas são fechadas com autilização de rolhas de cortiça específicaspara espumantes, compostas por cortiçasaglomeradas e com duas a três peças decortiça natural inteira. Esta operação é rea-lizada com uma máquina de arrolhar quecomprime a parte inferior da rolha para queela possa penetrar no bico da garrafa. Aparte superior da rolha permanece do ladoexterno da garrafa, onde será colocada agaiola que deve ser presa a ela. A gaiolaconsiste em uma peça de arame galva-nizado, utilizada para evitar que a rolha sedesprenda da garrafa devido à pressão.

Depois de arrolhadas, as garrafas de-vem permanecer por um período de 24horas na posição vertical para, em seguida,serem armazenadas em posição horizontal(RIZZON et al., 2000).

Método Charmat

Quando se trata do processo Charmat,todas as operações são feitas dentro deautoclaves, com temperatura e pressãocontroladas. É um método mais simples e,apesar do produto ser de boa qualidade,geralmente apresenta sabor e aromas me-nos complexos que o obtido pelo métodoChampenoise.

Conforme descrito por Ribéreau-Gayonet al. (2004), para elaboração do espumantefrancês pelo método Charmat (tanquefechado), prepara-se um tanque a partir dediferentes vinhos-base, como mostrado naFigura 1, e em seguida o vinho é transferido

QUADRO 1 - Teor de açúcar (g/L) por tipo de

espumante

FONTE: Reetz et al. (2004).

Tipo Mínimo Máximo

Extra brut 4,0 6,0

Brut 6,1 15,0

Seco 15,1 20,0

Demi-sec 20,1 60,0

Doce 60,1 _

AGRADECIMENTO

À Fundação de Amparo à Pesquisa doEstado de Minas Gerais (Fapemig), peloapoio à execução do projeto de pesquisapara elaboração de vinhos espumantes emMinas Gerais.

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100 Vinhos finos: rumo à qualidade

Vinhos tropicais:novo paradigma enológico e mercadológico

Celito Crivellaro Guerra1

Giuliano Elias Pereira2

Márcia Valéria Lima3

Márcia Maria Pereira Lira4

1Engo Agro, Dr., Pesq. Embrapa Uva e Vinho, Caixa Postal 130, CEP 95700-000 Bento Gonçalves-RS. Correio eletrônico: [email protected] Agro, Ph.D., Pesq. Embrapa Uva e Vinho/Embrapa Semi-Árido, Caixa Postal 23, CEP 56302-970 Petrolina-PE. Correio eletrônico:

[email protected]ímica, M.Sc., Instituto Tecnológico do Estado de Pernambuco (ITEP)-Núcleo de Gestão dos Centros Tecnológicos, Av. Prof. Luiz Freire, 700,

Cidade Universitária, CEP 50740-540 Recife-PE. Correio eletrônico: [email protected]ímica, M.Sc., Instituto Tecnológico do Estado de Pernambuco (ITEP)-Núcleo de Gestão dos Centros Tecnológicos, Av. Prof. Luiz Freire, 700,

Cidade Universitária, CEP 50740-540 Recife-PE. Correio eletrônico: [email protected]

INTRODUÇÃO

A produção mundial de vinhos estáconcentrada em regiões de clima temperadoou subtropical, localizadas entre os pa-ralelos 30o e 45o de latitude norte e entre 30o

e 40o de latitude sul. No Brasil, a vitivi-nicultura de vinhos finos está localizadanas regiões geográficas Sul e Nordeste,totalizando cinco regiões vitivinícolas. Trêsdelas estão localizadas no Rio Grande doSul (Serra Gaúcha, Campanha e Serra do

Sudeste) e uma em Santa Catarina (PlanaltoCatarinense). Na junção dos estados daBahia e Pernambuco localiza-se a região doVale do Submédio São Francisco (VSMSF).

O VSMSF está entre as principais re-giões vitivinícolas intertropicais de impor-tância econômica do planeta. Está loca-lizado entre os paralelos 8o e 9o de latitudesul e em altitude não superior a 400 m acimado nível médio do mar (diferentemente deoutras regiões vitivinícolas da zona inter-tropical, como no Peru e na Bolívia, onde

estão localizadas em altitudes conside-ráveis). Na região, as temperaturas sãoelevadas durante todo o ano. Por conse-qüência, não há indução da videira à dor-mência invernal, o que permite que seobtenha pelo menos dois ciclos produtivospor ano, através do manejo da irrigação dovinhedo associado a outras técnicas vi-tícolas.

No Brasil, país de grande extensãoterritorial, há outras regiões com caracte-rísticas semelhantes ao VSMSF, onde a

Resumo - As regiões vitivinícolas intertropicais são responsáveis por novo conceito naenologia mundial: a enologia tropical. Nesse particular, a região brasileira do Vale doSubmédio São Francisco (VSMSF) alcançou um grau de desenvolvimento e de notoriedadeque a torna consolidada como região vitivinícola de importância nacional e internacional.Essa região possui um atributo singular: o clima vitícola com variabilidade intra-anual(corresponde à região que, sob condição climática natural, muda de classe de clima vitícolaem função da época do ano, na qual a uva pode ser produzida; definição aplicável às re-giões de clima quente, onde é possível mais de um ciclo vegetativo por ano), o que aumentao leque de possibilidades de elaboração de produtos de qualidade. Os desafios para aconsolidação definitiva da região são imensos, assim como as oportunidades dedesenvolvimento. Os trabalhos em curso na região, tanto no que se refere ao em-preendedorismo da iniciativa privada, quanto no que se refere ao incremento da infra-estrutura regional e aos esforços públicos em pesquisa, educação e desenvolvimento,deverão permitir em breve um incremento do status de região produtora de vinhos dequalidade e incentivar outras regiões vitivinícolas tropicais a seguirem seu exemplo.

Palavras-chave: Uva. Variedade. Qualidade. Viticultura. Enologia tropical. Trópico semi-árido

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101Vinhos finos: rumo à qualidade

viticultura para a produção de vinhos en-contra-se em fase embrionária. Desse mo-do, é provável que no futuro, o mapa dasregiões vitivinícolas tropicais brasileirasvenha a ser aumentado.

Este artigo tem por objetivo abordar as-pectos da produção de vinhos em regiõestropicais, aportando elementos que possamservir de base a projetos de desenvol-vimento de novas regiões no País.

VARIEDADES DE UVAADAPTADAS A REGIÕESTROPICAIS

Existem várias regiões vitivinícolas declima temperado situadas em locais cujoverão é particularmente quente e seco. Asmais conhecidas são aquelas próximas aomar Mediterrâneo na Itália, França e paí-ses ibéricos. Por serem locais onde a vitivi-nicultura é praticada há vários séculos,já foram há muito tempo identificadasas variedades de uva que mais se adaptamàs suas potencialidades naturais. Outrasregiões de clima estival quente nos EstadosUnidos da América, Austrália e África doSul também já encontraram as variedadesmais adaptadas às condições locais, que,na maioria, são as variedades cultivadasnas regiões mediterrâneas.

No VSMSF, região tropical pioneira naprodução de uvas finas para vinificação,algumas variedades têm sido cultivadas hápelo menos 20 anos, com resultados apa-rentemente satisfatórios. São as varieda-des tintas ‘Syrah’, ‘Cabernet sauvignon’ e‘Alicante bouschet’ e as brancas ‘Moscatocanelli’, ‘Chenin blanc’ e ‘Sauvignon blanc’.Ultimamente, a uva ‘Itália’ tem sido tam-bém empregada na elaboração de vinhoespumante do tipo Moscatel (HOFFMANNet al., 2005). Entretanto, as observaçõesexistentes sobre o potencial dessas varie-dades para a elaboração de vinhos de qua-lidade têm validade apenas parcial, uma vezque as uvas têm sido produzidas sob sis-temas de produção que necessitam seraperfeiçoados. Assim, variedades que têmmostrado potencial mediano, se fossemconduzidas sob sistemas de produção maisbem adaptados, poderiam mostrar maiorpotencial para vinhos de melhor qualidade.

Em função das temperaturas cons-tantemente altas, o ciclo das variedades deuva encurta consideravelmente em regiõestropicais. Por exemplo, a variedade Ca-bernet sauvignon, cultivada no PlanaltoCatarinense, leva cerca de 90 dias para atin-gir a maturação tecnológica, a partir doinício da mudança de cor da uva. Na SerraGaúcha, a mesma variedade leva em média60 dias para atingir o mesmo estádio dematuração. No VSMSF, este período reduz-se para 30 dias. Além disso, as altas tempe-raturas acarretam uma grande combustãode diversos compostos da uva, princi-palmente os ácidos orgânicos, aromas ematéria corante (no caso de uvas tintas).Assim, em teoria, as variedades que melhorse adaptam em tais condições são as de ci-clo médio a tardio, com alta capacidade deprodução de ácidos, de aroma delicado e,no caso das tintas, com alta capacidade deproduzir matéria corante estável.

Recentemente, novas variedades deuva foram introduzidas no VSMSF, obje-tivando avaliar sua potencialidade para aprodução de uvas destinadas à elaboraçãode vinhos tintos e brancos tranqüilos,espumantes e licorosos (FINEP, 2001). Asvariedades introduzidas foram:

a) tintas: ‘Ruby cabernet’, ‘Merlot’,‘Ancellota’, ‘Castelão’, ‘Deckrott’,‘Grenache’, ‘Barbera’, ‘Tempranillo’,‘Alicante bouschet’, ‘Moretto’,

‘Trincadeira’, ‘Montepulciano’,‘Sangiovese’, ‘Petit verdot’, ‘Mos-cato de hamburgo’ e ‘Alfrocheiro’;

b) brancas: ‘Sylvaner’, ‘Viognier’,‘Malvasia bianca’, ‘Colombard’,‘Flora’, ‘Muscadelle’, ‘Moscato dehamburgo’ (branca), ‘Regner’,‘Schönburger’ e ‘Siegerebe’.

A partir de observações do compor-tamento agronômico e pelo acompanha-mento da maturação da uva em distintasépocas do ano, foram selecionadas asseguintes variedades:

a) tintas: ‘Castelão’, ‘Deckrott’, ‘Bar-bera’, ‘Tempranillo’, ‘Trincadeira’,‘Petit verdot’ e ‘Alfrocheiro’;

b) brancas: ‘Malvasia bianca’, ‘Colom-bard’, ‘Flora’ e ‘Schönburger’.

O Quadro 1 mostra diferenças signi-ficativas na aptidão enológica de setevariedades de uvas tintas cultivadas noVSMSF. Uvas com maior porcentagem decascas relativas ao peso total das bagastendem a gerar vinhos com maior inten-sidade de cor (tintos), mais encorpados eaptos ao envelhecimento. Ao contrário,uvas com menor peso de cascas e/ou maiorpeso de sementes tendem a gerar vinhosmenos encorpados, sem aptidão ao en-velhecimento, ao estilo vinhos jovens.

No Quadro 2, podem ser observadasdiferenças significativas na aptidão eno-

QUADRO 1 - Variáveis físicas da uva madura de variedades tintas selecionadas para a produção de

vinhos no VSMSF

NOTA: Dados relativos a outubro-novembro de 2005.VSMSF - Vale do Submédio São Francisco.

Alfrocheiro 123,3 22,24 18,04 7,90 6,41

Barbera 216,9 45,85 21,14 9,45 4,36

Castelão 226,1 35,70 15,79 7,69 3,40

Deckrott 100,7 20,64 20,50 5,89 5,85

Petit verdot 134,3 30,94 23,04 9,37 6,98

Tempranillo 170,6 34,82 20,41 4,94 2,90

Trincadeira 105,9 23,95 22,62 7,63 7,20

(%)(g)(%)(g)

Uva(variedade)

Peso de100 bagas

(g)

Peso da sementePeso da casca

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102 Vinhos finos: rumo à qualidade

lógica das onze variedades de uvas re-centemente selecionadas para cultivo noVSMSF, em função de variáveis físico-químicas. Tais variáveis representam mar-cadores da qualidade da uva para a ela-boração de vinhos. As uvas mais aptas àqualidade são aquelas que apresentamteores mais elevados de açúcares e de aci-dez. Para as tintas, o maior potencial dequalidade está também relacionado com osteores mais elevados de antocianinas e detaninos das cascas e aos teores menos ele-vados de taninos das sementes.

ADAPTAÇÃO DA TECNOLOGIAAGRONÔMICA E ENOLÓGICAPARA A VINIFICAÇÃO DE UVASDE REGIÕES QUENTES

O manejo agronômico do vinhedoutilizado em regiões tropicais de clima secodeve levar em conta dois fatores principais:

a) a variabilidade intra-anual do clima:

- característica da região que, sobcondição climática natural, mudade classe de clima vitícola emfunção da época do ano na quala uva pode ser produzida,

- definição aplicável às regiões declima quente, onde é possívelmais de um ciclo vegetativo porano da videira;

b) regime de chuvas.

Na região do VSMSF, quando o manejoé feito de modo que se obtenha a maturaçãoda uva nos meses de junho a agosto, tem-se observado melhor qualidade e maiorpotencial alcoólico nos vinhos, devido àstemperaturas mais amenas e à ausência dechuvas no período. Por outro lado, quan-do a maturação da uva ocorre nos mesesde dezembro a fevereiro, os vinhos obtidostendem a apresentar menor potencial al-coólico e menor qualidade, devido às os-cilações da temperatura e à ocorrência es-porádica de chuvas intensas e de nebu-losidade nessa época.

O regime de chuvas determina o perfilda irrigação a aportar ao vinhedo. Uvas comalto potencial de qualidade para vinificaçãosão produzidas em regiões que apresentamum déficit hídrico moderado para a videira.A irrigação por gotejamento, alternada decada um dos lados da fila, é um exemplo detécnica que permite irrigar o vinhedo man-

tendo um pequeno déficit hídrico contro-lado. Entretanto, este manejo só é possívelem épocas secas do ano, quando a ocor-rência de precipitação é baixa ou nula.

Quanto ao manejo geral do vinhe-do, há poucas informações técnicas dispo-níveis até o momento para o VSMSF. Naregião, que é referência na produção devinhos finos tropicais no País, o sistemade produção adotado na maioria dos vi-nhedos era o mesmo adotado para a pro-dução de uva para consumo in natura, compequenas modificações. Atualmente, no-vos empreendedores estão modificandosubstancialmente esses sistemas, empre-gando sistema de condução vertical (es-paldeira) e limitando a produtividade dasparcelas. No sistema em espaldeira, a uvadeve ficar coberta por uma camada de fo-lhas, para evitar exposição solar direta. Essaexposição provocaria queima de bagas econseqüente perda de qualidade. Por outrolado, os cachos não devem estar muito co-bertos pela folhagem, para evitar ataque defungos causadores de podridões.

No atual estádio de desenvolvimen-to da vitivinicultura tropical brasileira,buscam-se conhecimentos básicos em vá-rios aspectos de manejo do vinhedo, taiscomo: porta-enxertos, arquitetura do dos-sel vegetativo em função do sistema decondução; sistema de poda; adubação,manejo fitossanitário e da irrigação. O efeitodessas variáveis no ciclo fenológico da vi-deira, no vigor e na fertilidade das plantase na qualidade da uva, está sendo estudado.

A tecnologia enológica aplicada à ela-boração de vinhos de qualidade caracteriza-se pela aplicação da tecnologia clássica,dando-se especial atenção a um grande nú-mero de pequenos detalhes que, no con-junto, fazem a diferença entre um vinho dequalidade limitada ou alta. Nesse sentido,a tecnologia enológica adaptada às regiõestropicais é ainda uma ciência embrioná-ria. Há muito a ser testado e melhorado.Todavia, alguns princípios gerais devemser seguidos.

Controle da maturação dauva

Um dos principais atributos de vinhos –especialmente brancos e espumantes – é o

QUADRO 2 - Variáveis físico-químicas da uva madura de variedades tintas e brancas selecionadas

para a produção de vinhos no VSMSF

NOTA: Dados relativos a outubro-novembro de 2005.

VSMSF - Vale do Submédio São Francisco.

(1)Resultados expressos em g/L de solução de extração, utilizando método que imita a extração de

antocianinas e taninos que ocorre em uma vinificação clássica em tinto.

Colombard 2,87 108,0 165,0 _ _ _

Flora 3,10 90,0 251,2 _ _ _

Malvasia bianca 3,14 97,0 188,7 _ _ _

Schönburger 3,46 87,5 177,1 _ _ _

Alfrocheiro 3,65 97,0 225,3 754,3 2,40 2,42

Barbera 3,65 103,5 241,5 548,1 1,20 1,04

Castelão 3,87 64,0 178,6 302,6 1,45 1,32

Deckrott 3,47 163,0 153,4 245,6 1,08 1,74

Petit verdot 3,33 76,0 224,2 767,1 2,40 0,86

Tempranillo 3,87 104,0 218,8 429,1 2,11 0,91

Trincadeira 3,87 90,0 242,7 173,4 1,16 0,83

(1)Tanino(semente)

(1)Tanino(casca)

(1)AntocianinaAçúcar(g/L)

Acidez(meq/L)

pH domosto

Uva(variedade)

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103Vinhos finos: rumo à qualidade

chamado frescor aromático e gustativo,fenômeno diretamente ligado ao teor deacidez da uva. Para consegui-lo, é impor-tante colher as uvas com adequado teor deaçúcares e também adequado e relativa-mente elevado teor de acidez (Quadro 2).Esse controle é, particularmente, importanteem regiões de clima quente, onde é intensaa combustão dos ácidos da uva. Um efeitosecundário – mas não menos importante –da escolha correta do momento de colheras uvas é a preservação do aroma varietal.Uvas colhidas além do ponto ideal (so-bremaduras) perdem e/ou transformam boaparte de seus compostos aromáticos. Comoresultado, o aroma do vinho não será floral,mas terá notas de frutas sobremaduras ecompota, o que acarreta a diminuição dofrescor e da qualidade aromática do vinho.No caso de uvas tintas, é importante obser-var a maturação fenólica, que correspondeao teor e à extratibilidade de taninos dascascas e sementes e das antocianinas dascascas da uva. Em situações de clima muitoquente, pode haver um descompasso im-portante entre o momento ideal de colher auva em relação a açúcares e ácidos (matu-ração tecnológica) e aos compostos fe-nólicos (maturação fenólica).

Colheita, transporte erecepção da uva na vinícola

É importante efetuar a colheita nashoras menos quentes do dia, transportarrapidamente a uva à vinícola, acondicio-nada em embalagens que assegurem amanutenção das integridades física e quí-mica das bagas (caixas plásticas para 20 kgde uva são aptas a esse propósito). Aochegar à vinícola, a primeira e imprescin-dível tarefa é efetuar um rápido resfria-mento da uva até cerca de 10oC. A retira-da do calor de campo inibe quase comple-tamente o desenvolvimento de micror-ganismos nocivos à qualidade do vinhonas primeiras horas de processamento ereduz drasticamente a velocidade de rea-ções de oxidação do mosto e de várioscompostos nele contidos.

Controle estrito davinificação

A vinificação é composta de uma se-

qüência de etapas interdependentes: esma-gamento e desengaçamento da uva,prensagem das partes sólidas e desborrado mosto (na vinificação em branco), ma-ceração (na vinificação em tinto), fermen-tações alcoólica e malolática, estabilizaçõesquímica e microbiológica e envelhecimentoem garrafa. Em cada uma dessas etapas,um grande número de procedimentos éaplicado (adição de culturas de levedurase bactérias puras, adição de antioxidante,trasfegas, atestos, desborra, filtrações, pas-sagem por barricas, resfriamento, etc.).

Uvas produzidas em condições de climaquente apresentam composição químicamuito semelhante àquela de uvas pro-duzidas em regiões de clima temperado. Odiferencial está na estabilidade química deum grande número de compostos da uva,que pode ser significativamente menor nasuvas produzidas em climas quentes. Estefato tem conseqüência direta sobre a qua-lidade, a longevidade e o equilíbrio orga-noléptico dos vinhos, razão pela qual ocontrole nas diversas etapas da vinificaçãodeve ser particularmente severo.

Atualmente, estudos estão em anda-mento, objetivando entender melhor osmecanismos que levam à instabilidade dasmatérias corante e tânica de certos vinhos va-rietais produzidos no VSMSF (FINEP, 2001).

TIPOS DE PRODUTOS EPOTENCIAL DE QUALIDADE

É estratégico para o desenvolvimentode toda e qualquer nova região vitivinícolaque os produtos identifiquem-se com ascondições naturais locais, o que lhes con-fere tipicidade própria. Assim, evita-se acópia de modelos de produção e de pro-dutos já clássicos das regiões tradicionais.Do mesmo modo, é importante a busca porprodutos diferenciados, priorizando o cul-tivo de variedades de videira que possamtornar-se emblemáticas, em detrimento dasvariedades ditas internacionais. Tal filo-sofia de produção proporciona a criaçãode uma identidade regional própria, pro-jetando a região no contexto daquelasprodutoras de vinhos de qualidade.

As regiões de clima temperado apre-sentam particularidades que as habilitam

à produção de um único produto de exce-lência. Como exemplos, há os vinhos tintosda região francesa de Bordeaux, os vinhosbrancos de regiões da Austrália, os espu-mantes do Nordeste francês (Champagne)ou os licorosos do Sul da Espanha (Jerez).Nenhuma dessas regiões caracteriza-se porproduzir mais de um tipo de produto dealta qualidade. No VSMSF, por outro lado,dada sua característica climática particular,com variação intra-anual, pode-se visua-lizar a produção de mais de um tipo deproduto, com qualidade.

Os estudos em curso na região (FINEP,2001) objetivam revelar as potencialidadesnaturais, selecionando técnicas e pro-cessos que permitam obter vinhos de qua-lidade dentro dos seguintes tipos:

a) vinhos tintos finos secos: pro-dutos, varietais ou não, com boaestrutura e complexidade química,características de vinho jovem etipicidade original;

b) vinhos brancos finos secos ou sua-ves: vinhos de aroma primário deli-cado e floral, frescor e tipicidadeidentificada com a região;

c) vinhos espumantes e frisantes: pro-dutos de aroma primário delicado ecaracterístico;

d) vinhos licorosos: vinhos docesnaturais.

Para a avaliação da qualidade dos pro-dutos, são efetuadas análises químicas esensoriais. As análises químicas dividem-se em duas categorias:

a) análises de controle de qualidadeglobal dos produtos em elaboração:acidez total e volátil, pH, densidade,anidrido sulfuroso, álcool, açúcaresredutores, etc.;

b) análises para avaliação e classi-ficação qualitativa dos produtos:cor, pigmentos, polifenóis, com-postos voláteis e minerais.

POTENCIALIDADESMERCADOLÓGICAS DE VINHOSDE REGIÕES QUENTES

No Brasil e no mundo, o consumo devinhos finos vem reforçar significativamen-

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104 Vinhos finos: rumo à qualidade

te a tendência de procura por vinhos dequalidade. Essa tendência deve-se manter nofuturo, o que representa uma oportunidadepara a produção de vinhos de qualidade emnovas regiões, já que estes tendem a servalorizados por sua tipicidade, oriunda dosfatores de produção ligados a cada regiãovitivinícola. Além desse aspecto, atributoscomo capacidade antioxidante e/ou nu-tracêutica e aptidão ao consumo moderado econtínuo (vinhos agradáveis de beber nocotidiano, que não causam dor de cabeça ououtros transtornos à saúde) têm sido cadavez mais valorizados.

No Brasil, o consumo per capita devinhos tem acompanhado o crescimentovegetativo da população. Apenas o seg-mento dos espumantes (em especial osmoscatéis) tem apresentado aumento sig-nificativo no consumo. Entretanto, verifica-se que em muitas regiões do País, o con-sumo de vinho simplesmente não é esti-mulado. Não há vinhos para vender em su-permercados, lojas ou restaurantes (quan-do há, a qualidade dos produtos ofertadose as condições de estocagem são muitasvezes inadequadas), não há produção localnem cultura do consumo cotidiano da be-bida. Em muitas regiões povoadas pre-dominantemente por imigrantes euro-peus, uma cultura incipiente do cultivo davideira e da produção e consumo de vinhosque existia foi desaparecendo ao longo dotempo.

O fato mais importante dos últimos tem-pos, relacionado com o incremento do con-sumo de vinho, foi o conjunto de descobertascientíficas que estabeleceu uma ligação dire-ta entre seu consumo moderado e regular àsaúde humana. A partir de então, verifica-seque a cultura da produção e consumo de vinhocaseiro vem aos poucos sendo recuperada.Mais significativo ainda é o fato de o sur-gimento de novas regiões vitivinícolas criarum efeito irradiador da cultura vínica e, porconseqüência, do consumo. Este efeito en-contra eco em outro fenômeno atual: a cons-tante presença do vinho na mídia. Programasde rádio e televisão, revistas e jornais têmabordado cada vez mais o tema, o que faz comque mais e mais pessoas informem-se e iniciem-se no consumo do vinho.

As regiões vitivinícolas intertropicaisbrasileiras, e em especial o VSMSF, podem-se beneficiar desse cenário favorável. Porém,muito mais importante é o fato de essasregiões possuírem vantagens comparativasexcepcionais: podem vir a produzir vinhosde qualidade dentro de um novo conceito,o vinho tropical; podem produzir mais deum tipo de produto com alto potencial dequalidade e, por fim, estão situadas em áreasrelativamente populosas, onde é grande opotencial de expansão da cultura vínica edo consumo. Ademais, tais produtos ten-dem a gerar curiosidade em todo o mundo,pelo novo apelo ligado ao exotismo, geran-do possibilidades concretas de exportaçãoe de desenvolvimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A enologia tropical é hoje um novo con-ceito no mundo vitivinícola. No Brasil, aregião intertropical do VSMSF alcançou umgrau de desenvolvimento e de notoriedadeque a torna consolidada como região vi-tivinícola de importância nacional e inter-nacional. Essa região possui um atributosingular: o clima vitícola com variabilida-de intra-anual, fator que pode aumentar o le-que de possibilidades de elaboração dediferentes produtos de qualidade. Entretan-to, os desafios para a consolidação definitivada região são imensos, assim como as opor-tunidades de desenvolvimento. Os traba-lhos em curso na região, tanto no que se refe-re ao empreendedorismo da iniciativa priva-da, quanto no que se refere ao incremento dainfra-estrutura regional e aos esforços pú-blicos em pesquisa, educação e desenvol-vimento, deverão permitir em breve um in-cremento do status de região produtora devinhos de qualidade e incentivar outras re-giões vitivinícolas tropicais a seguirem seuexemplo.

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Gonçalves. Anais... Bento Gonçalves: Embrapa

Uva e Vinho, 1999. p.75-90.

AGRADECIMENTO

À Financiadora de Estudos e Projetos(Finep) pelo apoio financeiro aos projetosde pesquisa em viticultura e enologiaatualmente em execução pela Embrapa eparceiros no Vale do Submédio São Fran-cisco (VSMSF).

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105Vinhos finos: rumo à qualidade

Vinhos de altitude: característica e potencial na produçãode vinhos finos brasileiros

Jean Pierre Rosier1

1Engo Agro, Dr., Pesq. Epagri-Gerência Regional de Videira, Caixa Postal 21, CEP 89560-000 Videira-SC. Correio eletrônico: [email protected]

Resumo - O vinho é uma bebida que pode ser definida pela variação e complexidade deseus constituintes. Esta variação está intimamente ligada à origem da uva produzida eàs técnicas enológicas utilizadas em sua elaboração, sendo uma inteiramente dependenteda outra. Foram observados comportamentos vitícola e enológico de viníferas de origemfrancesa, espanhola, italiana e portuguesa, cultivadas em regiões com altitude superior amil metros do nível do mar, que se caracterizam por apresentar condições climáticas queinfluenciam no ciclo vegetativo e, conseqüentemente, na composição dos frutos e dosvinhos.

Palavras-chave: Vitis vinifera. Ciclo vegetativo. Metabolismo. Qualidade. Altitude.

INTRODUÇÃO

No Brasil, os locais de climas mais ame-nos concentram-se na Região Sul do País,onde os estados do Paraná, Santa Catarinae Rio Grande do Sul destacam-se por apre-sentar, aliados à latitude elevada, locais dealtitude superiores a mil metros do nível domar.

Algumas dessas áreas, graças as suascondições climáticas particulares, têm re-centemente sido cultivadas com variedadesde uvas Vitis viniferas, as quais atingemíndices de maturação que permitem fornecermatéria-prima para elaboração de vinhosdiferenciados por sua intensa coloração,definição aromática e equilíbrio gustativo.

VITICULTURA EM SANTACATARINA

Em Santa Catarina, o desenvolvimentodesses vinhedos nas localidades de ÁguaDoce, Bom Retiro, Campos Novos, Iomerê,São Joaquim, Serra do Marari e Tangarávem sendo acompanhado desde 1991 pelasequipes de pesquisa da Empresa de Pes-

quisa Agropecuária e Extensão Rural deSanta Catarina (Epagri), nas Estações Ex-perimentais de Videira e de São Joaquim(Fig. 1).

As variedades que se encontram emmaior quantidade são a ‘Cabernet sau-vignon’, ‘Merlot’ e ‘Chardonnay’, cul-tivadas sobre os porta-enxertos 1103P e

SO4, correspondendo hoje a, aproxima-damente, 300 hectares de vinhedos em al-titude, conduzidos em espaldeiras e man-jedouras, mas com perspectivas de dobraresta área em um futuro próximo.

Experimentalmente, estão sendo obser-vados os comportamentos vitícolas e en-ológicos de viníferas de origem francesa,

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Figura 1 - Vinhedo de São Joaquim-SC

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espanhola, italiana e portuguesa, em di-versos locais em Santa Catarina com al-titude superior a mil metros do nível do mar,que se caracterizam por apresentar con-dições climáticas que influenciam no ci-clo vegetativo e, conseqüentemente, nacomposição dos frutos e dos vinhos.

Entre os que já se encontram em fase deprodução podem ser citados Água Doce,Salto Veloso, a Serra do Marari em Tangará,Bom Retiro, alguns microclimas de Videira eIomerê, e a região dos vinhedos da SerraCatarinense de São Joaquim situada entre1.200 e 1.400 m de altitude (Fig. 2).

CICLO DA VIDEIRA

Nas regiões de elevada altitude, as con-dições climáticas particulares influenciadase dirigidas pela altitude em relação ao níveldo mar fazem com que o ciclo vegetativodas videiras seja deslocado em até 45 dias,ocasionando uma maturação em períododistinto do tradicionalmente realizado nasdemais regiões produtoras de uvas doBrasil (ROSIER, 2003).

A maturação deslocada para o mês deabril permite desfrutar de condições cli-máticas de pequena pluviosidade, boa in-solação e gradiente térmico intenso em umafaixa de baixas temperaturas, que permi-tem a ocorrência de maturação completa,fortalecida pelo desvio metabólico do ci-clo das hexoses para o ciclo das pentoses(ROSIER et al., 2004), o que favorece a con-centração fenólica das cascas e das semen-tes dos frutos.

A influência climática dada à altitudeelevada, na latitude de 28o, proporciona umdeslocamento de todo o ciclo produtivoda videira, que, em algumas variedades,inicia suas atividades vegetativas somentena segunda quinzena do mês de outubro efinaliza sua maturação na segunda quin-zena do mês de abril.

Este deslocamento propicia a ocorrênciade condições climáticas diferenciadas emrelação ao restante do País nas diferentesetapas do desenvolvimento das plantas.Nas regiões tradicionalmente produtorasde uvas no Sul do País, este ciclo tem início

no mês de setembro e normalmente findano mês de fevereiro, quando as condiçõesclimáticas, principalmente de altas tem-peraturas e pluviosidade, são tradicional-mente difíceis.

O deslocamento do ciclo vegetativo nasregiões de altitude caracteriza-se por duassituações distintas em seus dois extremos.Por um lado, as baixas temperaturas notur-nas retardam o início da brotação (Gráfi-co 1), mas devido à ocorrência de geadastardias nos locais de altitude, podem ser,muitas vezes, um fator limitante à produção

dependendo da localização do vinhedo eda precocidade das variedades. No outroextremo do ciclo vegetativo, na maturação,as temperaturas noturnas amenas retardamo amadurecimento dos frutos, reduzem ocrescimento das plantas e influenciam nometabolismo, propiciando uma colheita emépoca que historicamente os índices depluviosidade são bem menores que nosmeses de vindima das regiões tradicional-mente produtoras (Gráfico 2), permitindocom isso uma maturação, principalmentefenólica, mais completa.

Figura 2 - Vinhedo de Água Doce

Gráfico 1 - Evolução das temperaturas médias, mínimas e máximas (oC) e número degeadas ocorridas em São Joaquim, SC, durante o ciclo vegetativo da cultivarCabernet sauvignon

FONTE: EPAGRI - Estação Experimental de São Joaquim.

NOTA: Valores referentes à média de 30 anos de observações.

0

3

6

9

12

15

18

21

24

set. out. nov. dez. jan. fev. mar. abr. maio jun. jul. ago.

temperatura mínima temperatura máxima

2,5 0,7 0,3 0,8 0 0 3,50,1 1,2 3,5 5,5 4,5Dias de geada

Brotação Floração Pinta das bagas Repouso vegetativoVindima

oC

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107Vinhos finos: rumo à qualidade

O deslocamento do ciclo vegetativo davideira, graças às condições climáticasparticulares, é o responsável por uma sériede fenômenos metabólicos que, por suavez, são responsáveis pela diferenciaçãodos vinhos dessas regiões, a principal delasdiz respeito à composição fenólica dasuvas e, conseqüentemente, dos vinhos.

Estas observações encontram apoio nateoria que se segue.

As variações das quantidades de hor-mônios existentes nas plantas durante ociclo vegetativo são responsáveis pela in-dução do início ou do término das dife-rentes fases do desenvolvimento, e estasregem o comportamento das plantas emrelação à produção e à armazenagem dosdiversos compostos que formam a com-plexidade da matéria-prima dos vinhos.

A ocorrência de baixas temperatu-ras noturnas, que provocam uma alteraçãohormonal, é que determina a parada decrescimento vegetativo e o início da ma-turação com seus conseqüentes acúmulosde açúcar e de substâncias fenólicas, assimcomo de alguns precursores de aroma.

O período que antecede o fenômenode pinta das bagas caracteriza-se por umaredução da concentração dos hormôniosdo crescimento, como as auxinas, e é a par-

tir desta fase que inicia o surgimento doácido abcísico (ABA) denominado hor-mônio do estresse determinante da co-loração das bagas.

Caso este fenômeno ocorra paralela-mente ao crescimento dos ramos, seja pelastemperaturas elevadas, seja pela indispo-nibilidade hídrica e de nitrogênio no solo, apinta das bagas surgirá mais tardiamentee, em conseqüência, o período de maturaçãoserá reduzido. Nesse caso, produz-se umamatéria-prima de menor qualidade.

No caso dos vinhedos de altitude, paraa cultivar Cabernet sauvignon, constatou-se uma redução drástica do crescimentovegetativo a partir do mês de março.

METABOLISMO E COMPOSIÇÃODAS BAGAS

A síntese de compostos fenólicos estáintimamente ligada ao metabolismo dosaçúcares e ao metabolismo do nitrogênio.O açúcar é de importância vital no acúmulode compostos fenólicos, pois, sem estafonte de energia disponível, a formação decompostos fenólicos é reduzida (GUERRA,2002).

Depois da mudança de cor das bagas,que marca o início da maturação, ocorrem

novamente profundas mudanças metabó-licas, e a principal delas é a redução da viada glicólise e, conseqüentemente, da pro-dução de ácido málico. É a partir desse mo-mento que a célula vai armazenar açúcar enão consumi-lo.

Durante o desenvolvimento da planta,uma vez que os açúcares se encontram emfase de armazenagem, podem ocorrer viasmetabólicas alternativas para o acúmulodos compostos fenólicos.

A glicólise, via piruvato, é uma delas e éresponsável também pelas principais fun-ções vitais da planta como respiração, forma-ção de ácidos e desenvolvimento vegetativo.Portanto, é uma via de metabolismo que secaracteriza pela multiplicidade de funções,isto é, por uma repartição vital da energia.

Uma outra via metabólica bastante co-nhecida é a via das pentoses. Nesta bios-síntese encontra-se um aminoácido deno-minado fenilalanina, que comandado pelaconcentração hormonal, direciona a ener-gia para o acúmulo de proteína e, portanto,ao crescimento vegetativo.

Quando ocorre uma variação das ta-xas hormonais, o metabolismo, pela viadas pentoses, faz com que a fenilalani-na desta vez contribua para a formação dafenilalanina-amonialiase (PAL), que é a en-zima ligada ao aparecimento da coloraçãodurante a pinta das bagas. Esta enzimaparticipa do deslocamento da via meta-bólica, que antes proporcionava o cres-cimento, para a via ácido cinâmico, direcio-nando a energia para dois pontos distintose importantíssimos, sejam eles, a forma-ção de lignina para reserva da planta e aformação de chalcona, precursor comum dostaninos, flavonóides e antocianidinas,que, sem a concorrência do crescimentovegetativo, recebem sua cota de energia deforma redobrada, via glicólise e via pentose.

A via das pentoses, também conhecidacomo via shiquímica, que passa pela fe-nilalanina, permite verificar a concorrênciapor este aminoácido que é solicitado paraa síntese protéica durante o crescimentoda planta ou para a formação fenólica viachalcona (Fig. 3).

Gráfico 2 - Precipitação em mm (média de 30 anos) em São Joaquim-SC durante ociclo vegetativo da cultivar Cabernet sauvignon

FONTE: EPAGRI - Estação Experimental de São Joaquim.

0

30

60

90

120

150

180

set. out. nov. dez. jan. fev. mar. abr. maio jun. jul. ago.

Precipitação (mm)

Brotação Floração Pinta das bagas Repouso vegetativoVindima

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Portanto, para que ocorra síntese doscompostos fenólicos, tem-se uma con-corrência entre os compostos primários,indispensáveis à vida celular, e os secun-dários, que só aparecem em quantidadesmaiores, se as células reduzirem sua ati-vidade metabólica.

Sempre que houver redução do cres-cimento vegetativo, graças ao desequilíbriohormonal, ocorrerá o favorecimento de acú-mulo de compostos fenólicos. Se a plantacrescer ao mesmo tempo em que amadure-cerem os frutos, este acúmulo será reduzido.

As uvas da cultivar Cabernet sauvig-non, cultivadas em climas de altitude,apresentaram como características mar-cantes e diferenciadas a maturação fenólicacompleta.

A avaliação organoléptica dessas uvas,em meados do mês de abril, apresentoubagas com coloração intensa, pequenaadstringência e taninos macios ao seremmastigadas as cascas. Observou-se tam-bém, com notoriedade, a ocorrência detonalidade escura nas sementes em suatotalidade, o que pode ser considerado

como uma das características da maturaçãocompleta dos taninos.

Os mostos obtidos destas uvas apre-sentam composição em ácidos orgânicoscom acidez total média de 12,5 meq/L eelevados teores de ácido málico (6 g/L) quese diferencia dos mostos tradicionalmen-te encontrados nas regiões onde o períodode maturação ocorre em temperaturas maiselevadas.

A pequena degradação do ácido má-lico durante as baixas temperaturas cola-bora de forma minoritária para o incremen-to do acúmulo de açúcar, já que esta podechegar a ser deficiente em alguns anos. Agluconeogênese via síntese das hexo-ses pode ocorrer nos dois sentidos tantoglicose-piruvato-malato como malato-piruvato-glicose.

O acúmulo de açúcar das uvas obtidasnos locais de altitude pode ser consideradocomo normal se comparado com os demaislocais de produção de uva do Sul do Brasil.

Apesar do início antecipado da pintadas bagas em relação ao término do ciclo eàs baixas precipitações nos meses de co-

lheita (90 mm em abril), o acúmulo de açú-cares fica em torno de 18 a 22oBabo. Estesteores relativamente pouco elevados po-dem ser considerados normais para essetipo de clima, uma vez que as baixas tempe-raturas no final do período de maturaçãonão estimulam a produção de açúcar pelavia das hexoses, favorecendo a via das pen-toses na produção de compostos fenólicos.

VINIFICAÇÃO DE VINHOS DEALTITUDE

As técnicas enológicas de elaboraçãodos vinhos devem ser adequadas a estascaracterísticas da matéria-prima, a fim depermitir uma extração completa e fiel dascaracterísticas do conjunto solo, clima eplanta, permitindo enaltecer a tipicidade dosprodutos.

Para atingir este ápice de qualidade, aelaboração do vinho deve ser norteada poralgumas características organolépticas queatendam aos principais quesitos básicosdas avaliações visual, olfativa e gustativa,as quais variam intensamente com o tipo

Figura 3 - Vias de biossíntese dos compostos fenólicosFONTE: Goodwin e Mercer (1983).NOTA: PEP - Fosfoenolpiruvato; PAL - Fenilalanina - amonialiase.

Viaglicólise Hexoses

(açúcares)

Viapentoses

Piruvato

Fenóis

Antocianinas

Ácido benzóico

Lignina

Ácido cinâmico Proteínas

Fenilalanina

PAL

Crescimento

Ácidoshiquímico

Reservas

Eritrose 4P

Flavonóides

Chalcona(precursor comum)

Taninos

Acetil CoAMalonil CoA

PEP

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de produto. Isto é, vinhos brancos, ro-sados e tintos não apresentam os mesmosparâmetros que norteiam a qualidade, amesma diversidade ocorre para vinhostintos leves e vinhos tintos encorpados,onde a qualidade de um pode ser con-siderada como defeito do outro. Dentrodesta enorme diversidade é evidente queos parâmetros variam de acordo com o tipode produto.

Como a produção de vinhos na SerraCatarinense ainda é jovem, e apesar de játermos conhecimento de vinhos bran-cos de ‘Chardonnay’, de tintos leves de‘Pinot noir’, de ‘Merlot’ estruturados e dosextremamente encorpados ‘Montepulc-cianos’, vamos nos ater, neste trabalho, emdescrever as particularidades dos vinhosda cultivar Cabernet sauvignon que re-presenta hoje a maior parte dos vinhos dealtitude produzidos comercialmente emSanta Catarina.

Entre as características visuais quediferenciam estes vinhos encontram-se acor e a viscosidade. A coloração dos vi-nhos tintos é regida por substâncias de-nominadas antocianinas e estas se dividemem relação à tonalidade que emprestam aosvinhos. Geralmente, em uvas de maturaçãonormal, a maior influência na cor é a decoloração vermelho-vivo ou rubi. Com amaturação fenólica das cascas mais com-pleta, pode-se observar, em algumas varie-dades, com vinificação de longa macera-ção das cascas, a ocorrência de nuançascromáticas azuladas tendendo, em con-junto com o vermelho-rubi, a apresentar

tonalidades bordô ou lilás, quando os vi-nhos são jovens. Esta característica visualprepara o consumidor para a degustaçãode um produto encorpado com presençamarcante de taninos no paladar.

Outra característica bem observada vi-sualmente nos vinhos serranos são aslágrimas que representam a viscosidade.Estas lágrimas apresentam-se grossas e delento escorrimento, o que se deve à boaformação de glicerol na fermentação. Esteálcool, de grande importância sensorial eque apresenta características de untuo-sidade e doçura no paladar, é formado emmaior quantidade, quando as uvas apre-sentam maturação lenta e completa.

As características aromáticas dos vi-nhos também estão intimamente ligadasàs técnicas enológicas, principalmente asde controle de temperatura de fermentação,intensidade de maceração das cascas e tem-po de descuba, podendo salientar as vir-tudes ou aumentar os defeitos de acordocom o tipo de uva.

Estes produtos caracterizam-se porapresentar teor alcoólico elevado, 11,5oGL,acidez total média de 80 meq/L, coloraçãode boa intensidade, com valores de 1,4 a3,6 vezes mais antocianinas considerando-se o somatório cianidina, malvidina edelfinidina, se comparados com vinhosprovenientes de uvas produzidas a 650 mde altitude. Estes vinhos apresentam ex-pressão aromática intensa que salienta atipicidade varietal, com participação de aro-mas herbáceos quase nula, o que tambémos diferencia dos tradicionalmente pro-duzidos no Brasil.

Entre as principais características gus-tativas dos vinhos, observa-se a maciez dostaninos, mesmo em vinhos jovens e oequilíbrio gustativo dado ao equilíbrio dasfunções álcool – ácido, que graças à im-portante participação do ácido lático,proveniente da fermentação malolática doexpressivo teor de ácido málico dos mostos,empresta aos vinhos características deuntuosidade e amplitude em boca.

A avaliação olfativa dos vinhos é a partemais completa e mais complexa da de-gustação e, talvez por isso, a que apresen-ta menos respostas técnicas e objetivas paraexplicar os fantásticos estímulos que ela pro-porciona aos apreciadores do bom vinho.

Normalmente, os vinhos da cultivarCabernet sauvignon são conhecidos porapresentar, entre outros, aromas muitosemelhantes aos que caracterizam os dopimentão-verde. Esta característica é dadaa pequenas quantidades de uma substânciadenominada pirazina. Quando esta subs-tância faz parte do conjunto dos aromas,mas não se impõe em excesso aos demaisaromas dos vinhos, sua participação noconjunto torna-se agradável. Porém, seuexcesso torna os vinhos com aromas agres-sivos demasiadamente vegetais e, por-tanto, grosseiros.

Uvas de ‘Cabernet sauvignon’ produ-zidas em locais frios que possibilitam amaturação longa e completa, apresentamestas substâncias em quantidades redu-zidas em relação aos vinhos produzidos emlocais quentes e, portanto, de maturaçãorápida.

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A característica vegetal de ‘Cabernetsauvignon’ dos vinhedos de altitudemescla-se aos demais aromas frutados eflorais provenientes da fermentação, po-rém sua expressão aromática é apenas demédia intensidade não sendo a força aromá-tica sua maior virtude, mas sim sua harmonia.

Finalmente, a avaliação gustativamistura-se em sua essência e complexidadeà olfativa. Quando se coloca um vinho naboca, imediatamente antes de produzir assensações gustativas, ele alcança a tem-peratura do corpo humano, se aquece elibera os aromas mais voláteis que são sen-tidos pela via retronasal.

Esta característica permite voltar a sen-tir os aromas iniciais ou até outros que, porserem mais sutis, aparecem mais facilmen-te nesta etapa da avaliação. É nesta fase quese sente mais facilmente os aromas floraisdo vinho ‘Cabernet sauvignon’ serrano.

De grande importância gustativa e decerta forma auxiliar na olfativa encontra-sea força em álcool e os taninos. É nestes úl-timos que concentram alguns comentáriosque diferenciam os vinhos ‘Cabernet sau-vignon’ de altitude.

Graças à maturação completa das uvas,observada na maior parte dos anos ava-liados, são encontrados nos vinhos ta-ninos provenientes das cascas com pre-sença marcante no que diz respeito aovolume dos vinhos na boca, mas princi-palmente pela maciez que apresentam. Aconstituição da matéria-prima permite umagrande maceração das cascas, conseqüen-temente, a extração de taninos também éintensa e apesar de macios requerem umamaturação dos vinhos de pelo menos umano entre tanques e barricas e seis mesesem garrafa antes do consumo.

A força em álcool que se obtém nestesvinhos não é muito intensa. O frio na ma-turação e as reduzidas horas de insolaçãono mês de abril, em Santa Catarina, quandoé realizada a colheita, não são característi-cas climáticas ideais para a produção deaçúcar nas uvas e, conseqüentemente, deálcool nos vinhos. Entretanto os vinhosde ‘Cabernet sauvignon’ das regiões serra-nas caracterizam-se por apresentar teoresalcoólicos naturais em torno de 12% vol.

Ainda em boca, sua característica mar-cante é o volume. Esta sensação deve-se, emparte, à grande quantidade de ácido láticoproveniente da transformação do ácido málicodurante a fermentação malolática. Na ma-turação dos frutos, o ácido málico é degra-dado em grande parte pelo metabolismo dasplantas, quando estas se encontram em re-giões de clima quente, onde a necessidadede respiração e transpiração é maior. No ca-so dos climas frios, a degradação deste ácidoé minimizada durante a maturação dasuvas, sendo, portanto, indispensável à rea-lização da fermentação malolática comtransformação de ácido málico em grandequantidade de ácido lático, o qual empres-ta aos vinhos um maior volume em boca euma sensação de acidez moderada em rela-ção à produzida pelo ácido málico.

O atual mercado de vinhos finos noBrasil apresenta-se promissoramente aber-to para os que apresentem as característicasorganolépticas citadas.

Os consumidores de vinhos finos têmrepartido suas aquisições entre vinhosfinos nacionais de elevado valor e vinhosimportados de valor mediano. Atualmente,as oscilações cambiais têm favorecido acompra de vinhos importados, princi-palmente da Argentina, porém produtosnacionais com qualidade garantida têmconquistado consumidores ávidos por no-vidades, como é o caso de vinhos de al-titude em toda América do Sul, e, quandoencontram ali a qualidade compatível com ocusto, tornam-se consumidores habituais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O pioneirismo de uma atividade em umaregião traz consigo riscos decorrentes dodesconhecimento de alguns fatores que, nofuturo, podem vir a influenciar na produção.

O plantio de uvas nas regiões de alti-tude deve ser uma realização muito bemavaliada pelos produtores, visto as difi-culdades observadas em alguns casos nopreparo do solo. A escolha do local deimplantação do vinhedo pode ser deimportância vital, pois a possibilidade deocorrência de geadas tardias pode ser acausa de inviabilização total do projeto.

REFERÊNCIAS

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no sul do Brasil. In: CONGRESSO BRASILEIRO

DE VITICULTURA E ENOLOGIA, 10.;

SEMINÁRIO CYTED: INFLUÊNCIA DA

TECNOLOGIA VITÍCOLA E VINÍCOLA NA

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Anais... Bento Gonçalves: Embrapa Uva e Vinho,

2003. p.137-140. (Embrapa Uva e Vinho.

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_______; BRIGUENTI, E.; SCHUCK, E.; BONIN,

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Sauvignon cultivada em vinhedos de altitude em São

Joaquim - Santa Catarina. In: CONGRESSO

BRASILEIRO DE FRUTICULTURA, 18., 2004,

Florianópolis. Anais... Florianópolis: Sociedade

Brasileira de Fruticultura/EPAGRI, 2004. 1 CD-Rom.

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1983. 677p.

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vinificação para a elaboração dos vinhos. In:

SIMPÓSIO MINEIRO DE VITICULTURA E

ENOLOGIA, 1., 2002, Andradas. [Anais]...

Viticultura e enologia: atualizando conceitos.

Caldas: EPAMIG-FECD, 2002. p.179-192.

A falta de mão-de-obra especializada ea inexistência de um pólo de produçãotambém são fatores a ser considerados.

Porém, as novas regiões não trazem con-sigo vícios herdados do conhecimento em-pírico e estão mais receptivas às inovaçõestecnológicas, como a utilização de sistemasde condução de alta eficiência e coberturaplástica nos vinhedos. A ausência de pragastradicionais e a menor quantidade de inóculode doenças, aliados às boas condições cli-máticas e aos resultados animadores atéagora obtidos, somados ao espírito em-preendedor de alguns empresários, semdúvida são as grandes propulsoras da ex-pansão dessas áreas.

Portanto, para vislumbrar um horizon-te dourado os produtores de vinhos pro-venientes de vinhedos de altitude devemdelimitar essas regiões sob a forma de De-nominação de Origem Controlada (DOC),a fim de garantir, juntamente com a qua-lidade, a segurança do consumidor e, comisso, o mercado.

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Novos pólos vitícolas para produção de vinhos finosem Minas Gerais

Murillo de Albuquerque Regina1

Daniel Angelucci de Amorim2

Ana Carolina Fávero3

Renata Vieira da Mota4

Daniel José Rodrigues5

1Engo Agro, Pós-Doc, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

2Engo Agro, M.Sc., Pesq EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG. Correioeletrônico: [email protected]

3Enga Agra, Mestrando UFLA, Caixa Postal 3037, CEP 37200-000 Lavras-MG. Correio eletrônico: [email protected] Agra, Dra, Pesq. EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas- MG. Correio

eletrônico: [email protected]éc. Agrícola EPAMIG-CTSM-Núcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho, Caixa Postal 33, CEP 37780-000 Caldas-MG.

Resumo - Minas Gerais, tradicional Estado produtor de uvas para consumo in natura evinhos de consumo corrente, busca inserir-se no cenário da produção de vinhos finos. Ascondições climáticas podem ser favoráveis, quando as técnicas de manejo do vinhedopermitem mudar o período de colheita para as épocas mais secas do ano. Os resultadospreliminares são encorajadores. Atualmente, vários projetos já estão instalados em di-ferentes macrorregiões geográficas mineiras, o que permitiu a introdução de diversascultivares de Vitis viniferas até então sem registro de cultivo em Minas Gerais. As parce-rias público-privadas entre EPAMIG e agricultores têm permitido equacionar questõesagronômicas e enológicas, com vistas à identificação de produtos de qualidade e expres-são regional, que possam criar alternativas para a exploração agrícola mineira.

Palavras-chave: Vitivinicultura. Tipicidade. Ciclo da videira. Desenvolvimento vitícola.

INTRODUÇÃO

A constante evolução do hábito deconsumir vinho fino no Brasil, aliada à me-lhoria do vinho nacional, tem levado a umaforte demanda de informações sobre aspossibilidades de produzir vinhos finos nasdiferentes macrorregiões geográficas doestado de Minas Gerais.

A viticultura mineira data do século 19e iniciou-se com a matriz das videiras ame-ricanas cultivadas nas regiões de altitudedo Sul de Minas Gerais, mais especifica-mente em Andradas, Caldas e Baependi(SOUZA, 1996; SILVA, 1998). Posteriormen-

te, durante a década de 80, expandiu-se pa-ra regiões mais quentes, em especial para oVale do Rio São Francisco, onde o manejode poda, a irrigação e a quebra de dormênciapermitiram a produção de uvas para con-sumo in natura com interesse comercial,principalmente por conseguir o escalona-mento da produção para períodos de es-cassez de oferta da fruta no mercado.

Atualmente, a viticultura mineira ocupauma área de 1.000 hectares em dois pólosdistintos, um ao sul e outro ao norte doEstado (ORLANDO 2002; ORLANDO et al.,2003).

Os vinhos produzidos em Minas Geraissão, em sua grande maioria, de consumocorrente, originados principalmente dascultivares Jacquez, Folha de Figo (sinoní-mia regional da Bordô) e Niágara branca,elaborados quase que exclusivamente nomunicípio de Andradas, situado no sul doEstado.

A Empresa de Pesquisa Agropecuáriade Minas Gerais (EPAMIG), em 1996, in-troduziu cultivares viníferas em sua Fa-zenda Experimental de Caldas (FECD), atualNúcleo Tecnológico EPAMIG Uva e Vinho,e, a partir dos resultados dessa coleção

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112 Vinhos finos: rumo à qualidade

(SOUZA et al., 2002), começou a atuar emprojetos de desenvolvimento para incre-mentar a produção de vinhos finos no Es-tado.

Os projetos em desenvolvimento es-tão assentados em duas linhas básicas depesquisa, que busca identificar qual a va-riedade e o melhor manejo do vinhedo, pa-ra a produção de matéria-prima capaz deelaborar vinhos finos com tipicidade re-gional em diferentes regiões mineiras.

Antes de abordar os projetos atual-mente em desenvolvimento, há que seconsiderar que, historicamente, as con-dições climáticas predominantes em Mi-nas Gerais, assim como na maior parte doSudeste brasileiro, não são consideradascomo as mais indicadas para o cultivo davideira, notadamente para aquelas vol-tadas à elaboração de vinhos finos. Aquestão climatológica na produção deuvas finas é primordial para a qualidadedos vinhos.

Nessas condições e a exemplo do queocorre em todas regiões do Sul e Sudestebrasileiros, a videira possui um ciclo derepouso, um de crescimento e produçãoanual. É podada em agosto, brota-se emsetembro e floresce em outubro. A ma-turação inicia-se em dezembro e a colheitaé escalonada entre janeiro e fevereiro, emfunção da precocidade da variedade.

Todo o período de vegetação e de pro-dução ocorre em condição de elevadatemperatura do ar e precipitação pluvio-métrica, o que acarreta inconveniênciascomo maior incidência de doenças fúngi-cas e diluição, pelo excesso de chuvas, deaçúcares e outros constituintes dos frutos.

As temperaturas elevadas associadasà presença de água no solo induzem a umdesenvolvimento vegetativo vigoroso, le-vando o crescimento dos ramos a compe-tir com os frutos pelo acúmulo dos car-boidratos gerados pela atividade fotos-sintética, impedindo a maturação completadas uvas, notadamente a maturação fe-nólica, importante para elaboração de vi-nhos encorpados e de guarda (CHAM-PAGNOL, 1984; TODA, 1991; GUERRA,2002). Salienta-se, aliás, que foi justamente

em razão desse cenário que a matriz vi-tivinícola brasileira orientou-se preferen-cialmente para o cultivo da espécie Vitislabrusca, que se apresenta mais rústica eprodutiva sob estas condições climáticas,mas que, em razão de suas característicasorganolépticas, não se presta à elaboraçãode vinhos finos.

A busca por novas regiões de cultivo,que permitam um manejo diferenciado paravideira, orientou-se principalmente nosseguintes princípios:

a) vinhos finos são produzidos emregiões onde a colheita da uva é feitaem períodos secos e com tempe-raturas amenas e contrastantesentre dias e noites;

b) existe um zero de vegetação (± 10°C),acima do qual a videira pode vegetarpraticamente o ano todo e, dessaforma, seu ciclo é definido em funçãoda data de poda.

Como as chuvas na maior parte dasregiões mineiras, encerram-se a partir deabril, foram identificadas regiões onde astemperaturas ambientais nesse períodopermitissem a manifestação de um novociclo para a videira. Esse ciclo, compreen-dido entre poda e colheita, para maioria dascultivares, situa-se por volta de 130 a 150dias em Minas Gerais (SOUZA et al., 2002).

Assim, pode-se esperar que videiras po-dadas entre janeiro e março serão colhidasentre junho e agosto, época em que, apriori, as chuvas são mais escassas e aamplitude entre temperaturas diurnas enoturnas mais elevadas, permitindo me-lhores condições para o amadurecimentoda uva. O Gráfico 1 ilustra a evolução datemperatura média do ar, precipitaçãopluviométrica e ciclo da videira ao longodos meses do ano para o município de TrêsCorações. Pode-se observar, também noGráfico 1, que o período chuvoso inicia-seem meados de outubro e estende-se até omês de abril, acompanhado por elevaçãodas temperaturas ambientais. A partir dessaépoca verifica-se, além da queda da tem-peratura, uma redução drástica das chuvas,que atingem um volume mínimo entre osmeses de junho a agosto.

Os primeiros projetos, com vistas aexplorar esses princípios, foram instaladosa partir do ano 2001, em Três Corações, emárea privada denominada Fazenda da Fé.Os resultados preliminares de três colhei-tas permitiram comprovar que videirasda cultivar Syrah podadas em janeiro ma-nifestam um novo ciclo de vegetação e pro-dução normais, com bons índices debrotação, fertilidade das gemas, e que che-gam à maturação durante o mês de julho,com índices de maturação e sanidade niti-

Gráfico 1 - Evolução da temperatura média do ar, precipitação pluviométrica e ciclo davideira ao longo dos meses do ano para o município de Três Corações, MG

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113Vinhos finos: rumo à qualidade

damente superiores àqueles observadospara esta mesma cultivar durante o verão(AMORIM et al., 2005).

A partir dessas constatações vários ou-tros projetos foram gradativamente implan-tados, sempre com o propósito da iden-tificação de regiões, cultivares e manejoque permitam a obtenção de matéria-primacom qualidade para elaboração de vinhosfinos em diferentes regiões mineiras.

A parceira pública-privada tem sidouma constante nesses projetos, onde aEPAMIG, através do seu Núcleo Tec-nológico EPAMIG Uva e Vinho, além deexecutar os estudos climatológicos e desolo, indicar cultivares, porta-enxertos,sistema de condução e manejo a serem ado-tados, capacita a mão-de-obra especia-lizada para condução do vinhedo e fi-nalmente age como uma base incubadorade empresa, vinificando as primeiras safrasem sua Vinícola Experimental “AmintasAssis Lage”, instalada em Caldas. Por suavez, os parceiros custeiam a implantaçãodos vinhedos e as experimentações embu-tidas no processo, permitindo o levan-tamento de informações técnicas indispen-sáveis ao desenvolvimento da viticulturade cada região.

Atualmente, já são cinco projetos ins-talados em diferentes regiões mineiras,totalizando 26 hectares de videiras de vá-rias cultivares da espécie Vitis vinifera,voltadas à produção de vinhos finos.

PROJETOS EMDESENVOLVIMENTO EMPARCERIA COM A EPAMIG

Três Corações - regiãocafeeira do Sul de MinasGerais

Projeto instalado em 2001, em parce-ria com as empresas Fazenda da Fé e Vitá-cea Brasil e apoio da Fundação de Amparoà Pesquisa do Estado de Minas Gerais(Fapemig). Inicialmente, foram implantadasexperimentalmente as cultivares Syrah,Cabernet sauvignon, Chardonnay e Merlot.A cultivar Syrah mostrou melhor desen-volvimento e produção e, por isso, a área

foi ampliada. Atualmente, já são cultiva-dos 4 hectares e outros 5 hectares estãoem fase de preparo para implantação em2006.

Cultivam-se os clones 747 e 470 da‘Syrah’, enxertados sobre os porta-en-xertos 101-14, 110R, SO4 e 1103 Paulsen. Osistema de condução é em espaldeira comtrês fios de arame e a densidade de plantioé de 3 mil plantas por hectare. São realiza-das duas podas anuais, sendo uma emagosto, para formação de ramos, e outraem janeiro para produção.

Neste projeto busca-se, principalmen-te, a elaboração de um vinho tinto en-corpado que tenha aptidão para passagemem barricas de carvalho e envelhecimento.Outras cultivares serão instaladas na pró-xima etapa, com ênfase para ‘Sauvignonblanc’. A primeira produção comercial des-se projeto foi colhida em julho 2006. AsFiguras 1 e 2 ilustram o projeto.

Cordislândia - regiãocafeeira do Sul de MinasGerais

Projeto instalado em 2005, em proprie-dade privada denominada Fazenda do

Porto. Implantou-se, inicialmente, 15 hec-tares com as cultivares Tempranillo, Ca-bernet sauvignon, Syrah, Cabernet franc,Pinot noir, Merlot noir, Sauvignon blanc eChardonnay, todas enxertadas sobre oporta-enxerto 1103 Paulsen.

As mudas foram plantadas em janeirode 2005 e o vinhedo encontra-se em fasede formação. O sistema de conduçãoadotado é o de espaldeira com três fios dearame e densidade de 3.100 plantas porhectare. Pelo menos quatro tipos de pro-dutos são esperados neste projeto: vinhotinto jovem, vinho tinto encorpado, vinhobranco tranqüilo e vinho branco espu-mante. As Figuras 3 a 5 ilustram o desen-volvimento inicial das plantas, com especialdestaque para ‘Syrah’, ‘Sauvignon blanc’,‘Tempranillo’ e ‘Pinot noir’. A primei-ra produção comercial deste projeto é es-perada para 2007/2008.

João Pinheiro - Vale do RioParacatu

Projeto instalado em 2003, em uma áreainicial de 5 hectares em parceira com aFazenda Salvaterra II. Foram plantadasinicialmente as cultivares Syrah, Tem-

Figura 1 - Área experimental da cultivar Syrah

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114 Vinhos finos: rumo à qualidade

Figura 2 - Detalhe do cacho da cultivar Syrah

Figura 3 - Vinhedo recém-instalado

pranillo, Marsanne e Roussanne. Atual-mente, optou-se pelo cultivo de ‘Syrah’em razão do seu melhor desenvolvimen-to. A ‘Sauvignon blanc’ também será tes-tada. A videira da cultivar Syrah estásendo conduzida em três diferentes sis-temas: espaldeira, lira e GDC, em densi-dade de plantio variável de 2.700 a 3.600plantas por hectare. A opção por dife-rentes sistemas de condução fez-se emfunção do desconhecimento da influên-cia do clima quente da região na quali-dade final das uvas para vinificação. Es-pera-se, com a adoção de sistemas queprotejam mais os cachos, a criação de ummicroclima mais favorável. A primeira pro-dução deste projeto é esperada para agos-to 2006. As Figuras 6 a 9 ilustram o proje-to.

Diamantina - Vale do RioJequitinhonha

Projeto instalado em 2005, em parceriacom a empresa Quinta d’Alva, em área ex-perimental inicial de 1 hectare. As cul-tivares testadas são ‘Tempranillo’, ‘Caber-net sauvignon’, ‘Syrah’, ‘Merlot’, ‘Pinotnoir’, ‘Pinot meunier’, ‘Marsanne’, ‘Char-donnay’, ‘Muscat petit grain’.

Diamantina possui um histórico volta-do para a elaboração de vinhos e esteprojeto pretende resgatar essa atividadeorientando-se, entretanto, para a produ-ção de vinhos finos. A conotação deturismo gastronômico de Diamantina éum dos principais trunfos a serem ex-plorados neste projeto. As videiras estãoenxertadas sobre o porta-enxerto 1103Paulsen e conduzidas em espaldeira comtrês fios de arame. Pode-se destacar o de-senvolvimento inicial das variedadesSyrah, Tempranillo, Marsanne e Muscatpetit grain. Pretende-se, a partir da basevarietal escolhida, a identificação das cul-tivares que propiciem o manejo dife-renciado para produção no inverno. É dese esperar a produção de vinhos tintosencorpados, mas também de vinhos bran-cos tranqüilos e espumante em safra deverão. As Figuras 10 e 11 ilustram esteprojeto.

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Figura 4 - Plantas em formação

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115Vinhos finos: rumo à qualidade

Figura 5 - Detalhe do vigor das plantas da ‘Sauvignon blanc’

Figura 9 - Detalhe dos cachos

Figura 7 - Adoção de sistemas de condução que protegem maisos cachos

Figura 8 - Sistema de condução em GDC

Figura 10 - Início do projeto

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Figura 6 - Vista geral do projeto instalado em João Pinheiro

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116 Vinhos finos: rumo à qualidade

Figura 11 - Vinhedo em desenvolvimento

Pirapora - Vale do SãoFrancisco

Este projeto foi implantado em 2005, emparceria com a Cooperativa Agrícola dePirapora (CAP) e suporte financeiro daFapemig. Pirapora já possui uma viticulturaempresarial sólida e produtiva voltada àprodução de uvas finas para consumo innatura. A busca por alternativas da pro-dução vitícola levou à implantação desteprojeto que tem como objetivo centralvalidar o potencial enológico na região dePirapora, equacionando três componentesbásicos, quais sejam: cultivar, porta-enxertoe sistema de condução. Estão sendo tes-tados quatro sistemas de condução paraas cultivares Syrah e Sauvignon blanc,14 porta-enxertos para a cultivar Cabernetsauvignon e 16 cultivares para vinhos tin-tos e brancos, incluindo, além daquelas jácitadas para os outros projetos, as cul-tivares Malbec, Tannat, Marselan, Petitverdot e Viognier. As Figuras 12 a 15 ilus-tram as etapas iniciais de implantação desteprojeto.

O Quadro 1 resume as principais in-formações dos projetos vitivinícolas emdesenvolvimento em Minas Gerais, queenvolvem a parceria da EPAMIG com ainiciativa privada.

O Quadro 2 resume as variedades in-troduzidas pela EPAMIG nos diferentesprojetos em parceria com a iniciativa privada.

Figura 12 - Sistema em espaldeira

Figura 14 - Sistema em lira Figura 15 - Sistema em GDC

Figura 13 - Sistema em latada

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117Vinhos finos: rumo à qualidade

Três Corações

QUADRO 2 - Cultivares de videira Vitis vinifera introduzidas recentemente pela EPAMIG em diferentes regiões mineiras

Syrah X X X X X X

Cabernet sauvignon X X X X X

Cabernet franc X X X

Merlot noir X X X X X

Pinot noir X X X X

Pinot meunier X X X

Tempranillo X X X X X

Tannat X X X

Malbec X

Chardonnay X X X X X

Sauvignon blanc X X X X X

Marsanne X X X

Roussanne X

Muscat petit grain X X

Viognier X X

Marselan X X

DiamantinaPiraporaJoão PinheiroCordislândiaCaldasCultivar

Três Corações 2001 4,0 20,0 120

Cordislândia 2005 15,0 25,0 150

João Pinheiro 2003 5,0 50,0 300

Diamantina 2005 1,0 30,0 180

Pirapora 2005 1,0 50,0 300

Total 26,0 175,0 1.050

QUADRO 1- Informações dos projetos de desenvolvimento vitivinícola de Minas Gerais

Município Ano deinstalação

Área plantada(ha)

Projeção de plantio(ha)

Produção estimada(mil litros)

Vários outros projetos têm sido im-plantados pela iniciativa privada em pra-ticamente todas as macrorregiões geográ-ficas mineiras e em escala variável. Atual-mente, foram relatados novos plantios deVitis vinifera em Alfenas, Andrelândia,Carandaí, Santa Luzia, Delfim Moreira, SãoJoão Batista do Glória.

A própria região de Andradas e Caldas,tradicional produtora de vinhos comuns,tem implantado diversos vinhedos comcultivares finas por iniciativa privada, já

tendo sido relatadas, além dos vinhedosexperimentais, parcelas comerciais de ta-manho variado com as cultivares Char-donnay, Cabernet sauvignon, Merlot,Cabernet franc e Syrah.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A inclusão do estado de Minas Geraisno cenário dos vinhos finos brasilei-ros parece possível. A princípio, buscam-se possibilidades agronômicas e clima-tológicas de desviar o ciclo da videira,

permitindo que a colheita seja feita emcondições que otimizem o potencial qua-litativo dos vinhos a serem elaborados.Os vinhos obtidos de uvas colhidas nooutono-inverno, com certeza, serão su-periores àqueles de uvas colhidas no verãoe poderão surpreender pela sua origina-lidade. Neste processo, busca-se a valori-zação de tipicidades regionais e por quenão imaginar, que dentro em breve, MinasGerais poderá oferecer aos consumidores,entre outros, o “vinho do Cerrado”, o vinho

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118 Vinhos finos: rumo à qualidade

da região cafeeira” e o “vinho do Vale doRio São Francisco”. Para tanto, diversosprojetos já estão implantados e possibi-litaram a introdução, em Minas Gerais, dediversas cultivares de Vitis vinifera, atéentão sem registro de cultivo no Estado.

A valorização do vinho mineiro tem sidobuscada a partir de um modelo exemplar deparceria público-privada, em que ganhamo Estado, pela agilidade de gerar tecnologiae promover o desenvolvimento, e a inicia-tiva privada, por via direta de incorporaçãotecnológica e racionalização dos inves-timentos financeiros.

O conjunto dos projetos implantados eem fase de implantação permite prever que,em breve, Minas Gerais poderá inserir-seno cenário nacional da produção de vinhosfinos. Neste contexto, o papel da EPAMIGtem sido decisivo, não só pela transferênciade tecnologia para implantação de manejode vinhedos, mas principalmente pelafunção de “base incubadora de novasempresas”, que a “Vinícola ExperimentalAmintas Assis Lage” tem exercido. Estavinícola, inteiramente modernizada, como suporte financeiro da Fapemig e Finan-ciadora de Estudos e Projetos (Finep),constitui-se, atualmente, no único centro

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1991. 346p.

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A dimensão do impacto futuro dessesprojetos na viticultura mineira vai dependermuito da qualidade e do valor mercadológi-co dos vinhos produzidos, mas é de se es-perar que tais iniciativas exerçam um papeldecisivo na criação de alternativas agrícolasque possam contribuir para o desenvolvi-mento da agricultura mineira, gerando ren-da e empregando mão-de-obra especializada.

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Vinho e saúde: o estado da arte

Jairo Monson de Souza Filho1

1Médico, Especialista em Clínica Médica, CEP 95720-000 Garibaldi-RS. Correio eletrônico: [email protected]

Resumo - O vinho bebido regularmente e com moderação junto às refeições, por aquelesque não tenham qualquer contra-indicação ao uso de bebidas alcoólicas, agrega ao pra-zer de beber benefícios para a saúde. Isso é o que evidenciam milhares de pesquisas.Estudos médicos mostram que a ingestão regular e moderada de vinho pode diminuir aincidência de doenças cardiocirculatórias, cânceres, reumatismo e doenças advindas doenvelhecimento.

Palavras-chave: Álcool. Coração. Hipertensão arterial. Acidente vascular cerebral (AVC).Câncer. Doenças pépticas. Bactérias. Vírus. Osteoporose. Envelhecimento. Demência.Pele. Visão. Diabete.

INTRODUÇÃO

O vinho é, sem dúvida, entre todas asbebidas, a mais favorável à saúde. Isto sebebido junto às refeições, regularmente ecom moderação, por aqueles que não te-nham contra-indicação à ingesta de bebi-das alcoólicas.

O que chamou a atenção das pessoasem geral e dos cientistas em particular paraas virtudes terapêuticas do vinho, foi o“Paradoxo Francês”. É bem sabido quecomer gorduras saturadas, fumar e ser se-dentário, entre outras coisas, são fatoresde risco para doenças do coração. Osfranceses, quando comparados com outrospovos do mesmo nível socioeconômico-cultural, são mais sedentários, fumam maise comem mais gorduras saturadas – osqueijos, patês e manteigas são usuais naculinária francesa – e, no entanto, têm ametade dos problemas cardiocirculatórios.A divulgação do “Paradoxo Francês” foifeita por Serge Renaud, inicialmente nosEstados Unidos, no programa 60 minutesda CBS, na noite de 7 de novembro de 1991e, posteriormente, na revista científica TheLancet, em julho de 1992 (RENAUD;LORGERIL, 1992). Ele afirmou que a ingestamoderada de bebidas alcoólicas, sobretudo

vinho, reduzia o risco de morbimortalidadecardiovascular em 40% a 60%. Isso causouum grande interesse sobre o assunto, prin-cipalmente da comunidade científica quenão pára de estudar esse fenômeno. Hoje aprodução de trabalhos científicos que têmrelação direta e indireta com o consumo debebidas alcoólicas, principalmente o vi-nho, com a saúde é crescente e chega à ca-sa dos milhares.

A dose baixa de álcool e os polifenóissão os grandes responsáveis – mas não osúnicos – pelos benefícios do vinho para asaúde (SOUZA FILHO, 2002).

Os polifenóis são o que torna o vinhouma bebida e um alimento diferente detodos os outros. São eles que, em harmo-nia com o álcool e outros compostos, fa-zem do vinho o verdadeiro “néctar dosdeuses”. Os polifenóis existem apenas noreino vegetal, onde se identificam maisde 8 mil tipos. A eles cabe proteger os ve-getais dos ataques físicos como a radia-ção ultravioleta do sol e dos ataques bio-lógicos – dos fungos, vírus e bactérias.Briosos que são, para desempenhar tãonobre encargo, armaram-se de importanteação antibiótica, potente efeito antioxidantee distribuíram-se, quase que unicamente,

nas cascas, sementes e folhas dos vege-tais (SOUZA FILHO, 2002).

Nos vinhos já se identificaram cerca de200 polifenóis. Eles têm origem quase queexclusivamente – cerca de 95% – nascascas e sementes das uvas. É por issoque os vinhos tintos (que são fermentadoscom as cascas e sementes de uva) têm cercade dez vezes mais polifenóis que os vinhosbrancos (que fermentam na ausência delas).Portanto, os tintos, como regra, têm maisvirtudes para a saúde. Os polifenóis exis-tentes nos vinhos brancos são em menornúmero, porém com uma ação antioxidantemais potente (SOUZA FILHO, 2002).

VINHO E CORAÇÃO

Uma quantidade muito grande de es-tudos epidemiológicos mostra que a in-gesta moderada de bebidas alcoólicas,sobretudo de vinho, diminui as doençascardíacas e circulatórias e as mortes porestas causas.

Já se evidenciaram os seguintes meca-nismos para a proteção cardiovascular ofe-recida pelo consumo moderado de vinho:

a) aumento do colesterol HDL, prin-cipalmente as frações HDL2 e HDL3:considerado o bom colesterol, pe-

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120 Vinhos finos: rumo à qualidade

las ações benéficas que exerce aosistema cardiocirculatório. Este au-mento é tanto na quantidade, quan-to na qualidade desse tipo de co-lesterol, cuja composição é rica emfosfolipídios poliinsaturados, comoo ácido ômega-3 – reconhecido peloseu efeito cardioprotetor (DIEHL etal., 1988);

b) diminui o colesterol LDL e sua oxi-dação: situação inicial do processode aterosclerose (LASUNCIÓN etal., 1996);

c) diminui a agregação plaquetária e ofibrinogênio e aumenta a ativida-de fibrinolítica e antitrombina: todasações que dificultam a formação decoágulo, que é a causa principal deoclusão dos vasos sangüíneos. Fa-to este que causa infarto do miocár-dio, derrame cerebral e gangrenas(RENAUD et al., 1992);

d) modifica a camada interna dos va-sos sangüíneos: o endotélio, alte-rando a produção de óxido nítrico ediminuindo outras moléculas deadesão ao endotélio, dificultan-do dessa maneira a aterosclerose(LAUG, 1983);

e) aumento da resistência e elasti-cidade da parede vascular (SOUZAFILHO, 2002);

f) dilata os vasos sangüíneos dimi-nuindo a resistência ao trabalho docoração (VENKOV et al., 1999).

VINHO E ACIDENTE VASCULARCEREBRAL (AVC)

Os acidentes vasculares cerebrais(AVCs) podem ser isquêmicos (quando háuma obstrução de um ou mais vasos di-minuindo o aporte sangüíneo) ou hemor-rágicos (quando um ou mais vasos rompeme extravasam sangue no tecido cerebral).Os AVCs isquêmicos representam 70% dasocorrências dessa patologia.

As pessoas que mantêm o hábito re-gular de beber vinho moderadamente têm40% a 60% menos riscos de desenvolver

AVC isquêmico (JAMOROZIK et al., 1994).Já o consumo abusivo (mais de cinco copospor dia) aumenta o risco de AVC hemor-rágico (KLATSKY et al., 1981).

VINHO E PRESSÃO ARTERIAL

A relação da ingesta moderada debebidas alcoólicas, inclusive vinho, com apressão arterial não está definitivamenteesclarecida. Existem muitos estudos, al-guns contraditórios.

O consumo elevado de álcool (50 g oumais por dia, que equivalem a mais de 5 co-pos de vinho) aumenta a pressão arterial(KLATSKY et al., 1977).

Estudos feitos em várias partes do mun-do sugerem que a ingesta baixa de bebidasalcoólicas diminui a pressão arterial, tantoa sistólica (máxima) como a diastólica (mí-nima) (MARMOT et al., 1994).

Um estudo feito no Brasil pelo Dr. Mou-ra, da Universidade do Estado do Rio deJaneiro (UERJ), encontrou num polifenoldo vinho, oriundo da casca da uva, umaação vasodilatadora. Isso reduz a pressãoarterial. Desse modo, o vinho bebido mo-derada e regularmente, junto às refeições,teria uma ação anti-hipertensiva maior queas outras bebidas alcoólicas. Neste estu-do feito pelo Dr. Moura, com ratos, eleencontrou um efeito hipotensor nas va-riedades de uva Vitis labrusca (usadas parafazer vinhos comuns) maior que nas va-riedades Vitis vinifera (usadas para fazervinhos finos) (MOURA, 2005).

VINHO E CÂNCER

Apesar dos avanços da medicina, o cân-cer ainda é a segunda causa de morte nomundo, depois das doenças cardiocir-culatórias, representando um grande pro-blema de saúde.

As pessoas que mantêm o hábito re-gular de beber vinho moderadamente juntoàs refeições têm 20% menos chance de de-senvolver câncer de qualquer tipo (CA-MARGO JUNIOR et al., 1997). E essaproteção deve-se aos polifenóis que agembloqueando tanto o início, como o cres-

cimento e a disseminação da doença (JANGet al., 1997).

Alguns cânceres têm relação direta como consumo de bebidas alcoólicas. Issosignifica dizer que quanto maior a inges-ta de álcool maior o risco de ter a doen-ça. Entre eles estão os cânceres de boca(GRONBAEK et al., 1995), pulmão (PRES-COTT et al., 1999), próstata (SCHOONENet al., 2005), mama (ZHANG et al., 1999) eintestino (WOLTER; STEIN, 2002). Essarelação é verdadeira apenas para cervejase destilados. O vinho mostrou uma pro-teção ao desenvolvimento dessas doenças.As mulheres que têm o hábito regular debeber vinho moderadamente têm 50% me-nos chance de desenvolver câncer deovário (WEBB et al., 2004).

Um estudo feito na Universidade de Da-vis mostrou que ratos cancerosos quereceberam uma dieta com extrato seco devinho tiveram uma sobrevida significa-tivamente superior ao grupo controle(CLIFFORD et al., 1996).

VINHO E DIABETE

O vinho bebido com moderação e juntoàs refeições é a bebida mais favorável parao diabético. Isso porque ele aumenta a sen-sibilidade das células à ação da insulina.Em decorrência disso, observa-se que:

a) melhora o aproveitamento dos açú-cares pelas células, evitando o acú-mulo no sangue, o que é danosopara o organismo;

b) diminui a insulina circulante, o quedesencadeia uma série de reaçõesmetabólicas que culminam com o ga-nho de peso;

c) diminui a necessidade de medica-mentos;

d) diminui a hemoglobina glicosilada(um marcador bioquímico usadopara avaliar o controle da doença);

e) favorece ao emagrecimento (GIN,1992).

A principal causa de morte dos diabéticossão as doenças cardiocirculatórias. O efeitocardioprotetor do vinho é bem conhecido e

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representa um benefício adicional para quemsofre desse mal (TANASESCU et al., 2001).

Vários estudos epidemiológicos mos-tram que a ingesta leve e moderada de be-bidas alcoólicas, sobretudo vinho, diminuio risco de desenvolver diabete (NAKA-NISHI et al., 2003).

Os diabéticos que forem tomar bebi-das alcoólicas devem atentar às seguintesorientações:

a) só beba se estiver com a doençacontrolada;

b) beba junto ou logo após uma refeição;

c) beba acompanhado;

d) esteja preparado para hiper e princi-palmente hipoglicemia;

e) diante de sintomas, faça um testerápido da glicemia;

f) monitore os níveis de triglicerídeos,se beber regularmente;

g) contabilize as calorias da bebida nasua dieta;

h) se beber à noite, faça um lanche an-tes de dormir;

i) prefira vinho tinto seco (é menoscalórico);

j) evite dirigir automóveis e operar má-quinas, se beber.

VINHO E OBESIDADE

O vinho, principalmente o tinto seco(que é menos calórico), em quantidade quenão ultrapasse 10% do valor calórico detoda a dieta, é muito favorável para o obeso(VADSTRUP et al., 2003). Muitas clínicasde emagrecimento incluem o vinho no seucardápio.

Alguns polifenóis que existem no vi-nho tinto destroem os adipócitos por ini-bição de enzimas metabolizadoras de gor-dura como a lipase pancreática, a lipaselipoprotéica e a glicerofosfatodesidroge-nase (YOSHIKAWA et al., 2002).

Os polifenóis do vinho diminuem aresistência das células à insulina melho-rando o aproveitamento dos carboidratospelo organismo e, com isso, a quantidadede insulina circulante, o que está sempre

relacionado com uma série de reações me-tabólicas que culminam com ganho de peso(BHATHENA; VELASQUEZ, 2002).

VINHO E ENVELHECIMENTO

Quem bebe vinho às refeições, mode-rada e regularmente, morre mais tarde e temmelhor qualidade de vida.

O envelhecimento das células, dos te-cidos e do organismo como um todo é umaação dos radicais livres. O organismo pro-duz substâncias que são neutralizadorasdos radicais livres, mas esta produçãodiminui com o aumento da idade. Isso étrágico, pois desse modo ficamos mais ex-postos à ação dos radicais livres conformeenvelhecemos (BONNEFOY et al., 2002).Como os vinhos, mormente os tintos, sãoricos em polifenóis que são potentes eli-minadores de radicais livres, é fácil enten-der o efeito anti-envelhecimento dessa be-bida (KLATSKY; ARMSTRONG, 1993). Aslocalidades no mundo onde as pessoas sãomais longevas são, quase todas, regiõesvitivinícolas.

Pesquisadores de Harvard conseguiramcom o resveratrol (que existe em abundân-cia nos vinhos tintos) ativar o gen Sir2, queestabiliza o DNA e, com isso, diminui o de-clínio celular. Dessa maneira eles consegui-ram aumentar em 70% a vida de alguns seresunicelulares e em 33% a da mosca-das-fru-tas (HOWITZ et al., 2003). Esses são dadosexperimentais e em animais muito simples,embora animadores, esses resultados aindanão podem ser transpostos para o homem.

VINHO E DEMÊNCIA

As pessoas que bebem vinho regular emoderadamente criam uma barreira ao de-senvolvimento de demência pelo enve-lhecimento. Uma pesquisa feita na regiãode Bordeaux, na França, mostrou que aspessoas que bebiam de 250 a 500 mL devinho por dia tinham 75% menos chancede desenvolver o mal-de-Alzheimer (OR-GOGOZO et al., 1997).

Uma série de estudos demonstrou quea ingesta regular e moderada de vinho pre-serva diretamente o neurônio (SUN et al.,

2002), além de proteger a circulaçãocerebral (LETENNEUR, 2004). Com isso, háuma proteção ao desenvolvimento de de-mências e outras doenças degenerativasdo sistema nervoso (MUKAMAL et al.,2003). Desse modo, as pessoas envelhecemcom melhor qualidade de vida, porqueapresentam um bom perfil social (MOR-TENSEN et al., 2001) e psicológico (MC-GRECOR et al., 2003).

VINHO E O SISTEMADIGESTÓRIO

A digestão de uma refeição acompa-nhada de vinho é melhor por vários mo-tivos. Um ácido orgânico presente nessabebida, o cinâmico, estimula a vesículabiliar, que descarrega uma quantidade maiorde biles no início do intestino delgado, me-lhorando e aumentando a digestão dasgorduras. Há ainda as oxidases e pectases,enzimas que aceleram e facilitam o processode digestão. O sorbitol, um álcool derivadode açúcar, que existe no vinho, estimula assecreções biliar e pancreática, importantesna digestão (MASQUELIER, 1992). O au-mento da sensibilidade dos tecidos àinsulina favorece a digestão dos carboi-dratos (GIN, 1992). Alguns polifenóis dovinho diminuem os movimentos peris-tálticos do intestino delgado e do intestinogrosso. Isso diminui o trânsito intestinal eaumenta o tempo de permanência dosalimentos no tubo digestivo. Com isso asenzimas têm mais tempo para processaremos alimentos, melhorando a digestão, o queé muito saudável (SOUZA FILHO, 2002).

As pessoas que bebem vinho modera-da e regularmente, junto às refeições, têmuma proteção ao desenvolvimento de úlce-ras pépticas. Esta condição clínica é muitasvezes causada por uma bactéria que sechama Helicobacter pylori e está associa-da a uma quantidade aumentada de hista-mina. A histamina origina-se da histidinapor ação da histidina descarboxilase. Elase difunde e exerce os seus efeitos no orga-nismo pela ação de outra enzima: a hia-luronidase. Os polifenóis do vinho ageminibindo tanto a histidina descarboxilase

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como a hialuronidase (WEISSE, 1995) einativa o Helicobacter pylori (TUTEL’IANet al., 2003).

VINHO E AS INFECÇÕES

Desde a antiguidade se reconhece novinho um efeito antiinfeccioso. Acre-ditava-se inicialmente que este efeito eradevido ao seu pH muito ácido (2,7 a 3,2) eao álcool. Estas seriam condições muitohostis às bactérias, que aí não conse-guiriam sobreviver. Isso funciona para al-guns microrganismos (SOUZA FILHO,2002). Mas na verdade a principal açãoantiinfecciosa do vinho deve-se aos an-tocianos, que têm uma atividade bacte-ricida direta, quando na presença doálcool. Esse polifenol encontra-se na cas-ca da uva e é o responsável pela cor da uvae do vinho. O espectro de ação dele égrande e pode ser visto do Quadro 1. Anatureza, sabiamente, colocou este an-tibiótico natural na casca das uvas, comoum mecanismo de proteção. Certamente,este é um dos fatores que a torna tãoresistente e permitiu que ela atravessasseos tempos, desde a pré-história.

O vinho e o suco de uva, mesmo a di-luições muito altas, como 1:1000, inativamuma série grande de vírus, entre eles oherpes vírus simples tipo I (causador doherpes labial), Poliovirus I (causador dapoliomielite), o Echovirus, Coxsachie B5.Os grandes responsáveis por isso são asprocianidinas, polifenol abundante novinho e no suco de uva. Elas se ligam aosvírus, impedindo-os de entrarem nas cé-lulas, onde causariam a infecção (MAS-QUELIER, 1992).

Um estudo feito durante os anos de1998 e 1999 na Universidade de Composte-la, Espanha, com 4.272 professores de cin-co universidades daquele país, evidenciouque quem tomava mais de 14 taças de vinhopor semana tinha 40% menos resfriado doque os abstêmios e os que bebiam cervejaou destilados. Eles observaram também queesse efeito era mais significativo para osque tomavam vinho tinto (TAKKOUCHEet al., 2002). Figura 1 - Estradiol, diethylstilbestrol e resveratrol

VINHO E A SAÚDE DA MULHER

As mulheres que bebem vinho commoderação e regularmente têm atenuadasas manifestações do climatério e da me-nopausa. Estas manifestações ocorremquando os ovários entram em falência ediminuem a produção de estrógeno – ohormônio feminino. Esse efeito deve-se aoresveratrol, que existe em abundância, prin-cipalmente nos vinhos tintos, e tem umasemelhança estrutural (Fig. 1) e funcionalcom o hormônio feminino, sendo por issoreconhecido como um fitoestrógeno (CA-LABRESE, 1999).

Um estudo feito com 1.482 mulheresaustralianas mostrou que a ingesta regularde destilados e cerveja não aumenta a in-cidência de câncer de ovário, mas a ingestaregular e moderada de vinho diminui em

50% a chance de elas desenvolverem essetipo de doença (WEBB et al., 2004).

A osteoporose é uma situação clíni-ca onde há perda de massa óssea, favore-cendo as fraturas. Ocorre com mais fre-qüência em pessoas acima dos 45 anos,principalmente em mulheres, sobretudona menopausa, quando diminui muito aprodução de estrógeno, que é importan-te na manutenção da arquitetura óssea. Umestudo reuniu um número impressionante(7.598) de mulheres com mais de 75 anos,recrutadas em cinco centros diferentes daFrança, entre 1992 e 1994. Esse estudomostrou que as mulheres que tomam deuma a três taças de vinho por dia (sobre-tudo o tinto), junto à refeições, ganhammassa óssea (ao contrário da história na-tural) e têm uma proteção ao desenvol-

FONTE: Masquelier (1992).

QUADRO 1 - Espectro antibiótico do vinho

Bactérias que sofrem ação bactericida do vinho

Staphylococcus Shighellas

Streptococcus Salmonellas

Pneumococcus Colibacilos

_ Proteus sp.

Gram + Gram -

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vimento de osteoporose (GANRY et al.,2000). Esse efeito protetor do osso deve-se a três dos componentes do vinho:

a) álcool;

b) quercitina;

c) resveratrol.

O álcool, em doses baixas (até 30 g pordia), age principalmente inibindo a ativi-dade dos osteoclastos – as células que des-troem o osso. Acima dessa dose o efeito édanoso ao metabolismo ósseo e aumentaos riscos de fraturas. Isso ocorre porqueem doses altas o álcool passa a ter um efei-to tóxico direto e indireto sobre o osso.Essa ação é do álcool e, portanto, comum atodas as bebidas alcoólicas (SOUZAFILHO, 2002).

A quercitina é um polifenol da uvaencontrado em quantidade apreciável nosvinhos tintos. Ela tem um efeito direto so-bre o osso aumentando a ação dos osteo-blastos (células formadoras de osso) einibindo os osteoclastos (células que des-troem osso). Esse é um benefício en-contrado apenas nos vinhos, sobretudo ostintos (SOUZA FILHO, 2002).

O resveratrol tem uma estrutura quími-ca e funcional semelhante às dos hormôniosfemininos, que, como bem sabemos, sãousados para tratamento da osteoporose pelasua capacidade de evitar a perda e de rege-nerar o tecido ósseo (SOUZA FILHO, 2002).

O consumo de bebidas alcoólicas au-menta a infertilidade feminina na proporçãoda ingesta. Isso é rigorosamente verda-deiro para outras bebidas, que não o vinho,porque esse aumenta a fertilidade comoficou bem demonstrado pela equipe doDr. Tolstrup (TOLSTRUP et al., 2003).

VINHO E PELE

Um dos efeitos mais espantosos dovinho é na pele. Ele é tão impressionantetalvez porque a pele está exposta e nelapodem-se observar diretamente os resul-tados. O colágeno e a elastina são subs-tâncias que dão consistência e elasticidadeà pele. A colagenase e a elastase são en-zimas que destroem o colágeno e a elastina,

respectivamente, fazendo com que a pelefique atrófica e menos elástica. Os poli-fenóis do vinho bloqueiam a ação dacolagenase e da elastase, deixando a pelemais elástica e consistente. Além disso, elesmelhoram a sua microcirculação e a hi-dratação. Esses efeitos ocorrem por viatópica (direto na pele) e são potencializa-dos (aumentam em muitas vezes) se tambémforem ingeridos polifenóis – e a maneira maisagradável é, sem dúvida, bebendo vinhomoderadamente (MASQUELIER, 1992).

O resveratrol elimina alguns fungoscomo o Tricophyton sp., Epidermophytonfloccosum e Microscoporum gypseum,causadores de micoses cutâneas (CHAN,2002).

VINHO E VISÃO

As duas principais causas de ceguei-ra em pessoas idosas são a catarata e a de-generação macular. A primeira é a opa-cificação do cristalino – uma lente internado olho – por ação dos radicais livres. Issoaltera muito a refração dificultando a visão.A degeneração macular é uma alteração damicrocirculação da retina que leva à ce-gueira. Ela acomete 30% das pessoas commais de 75 anos de idade e é a primeiracausa de cegueira nos países desenvol-vidos. Como os polifenóis do vinho sãopotentes varredores de radicais livres emelhoram muito a circulação, as pessoasque têm o hábito de beber vinho mode-radamente têm 20% menos cegueira poridade (OBISESAN et al., 1998).

VINHO E REUMATISMO

Já em 1950 dizia-se que os polifenóisdo vinho tinham uma ação anti-reumática.Atribuía-se esta ação ao seu potente efeitoantioxidante. Foi em 1997 que se constatouação antiinflamatória dos polifenóis. Ficoudemonstrado que ela ocorre tanto por viaoral como por via tópica (local) (BLAZSOet al., 1997).

O resveratrol tem um efeito semelhan-te e superior a alguns antiinflamatórios nãohormonais amplamente usados na medici-na contemporânea, como por exemplo, a

fenilbutazona e a indometacina. Ele age blo-queando as ciclooxigenases, que são co-nhecidas pela sigla de COX. Estas enzimasestão implicadas nas reações bioquímicasque culminam com a inflamação. Ele blo-queia tanto a COX1, como a COX2 (GROOT;RAVEN, 1998).

O ácido úrico é um cristal que tem umapredileção por pequenas articulações, ondese deposita e causa inflamação – a gota. Écorrente que quem sofre deste reumatis-mo não deve ingerir bebida alcoólica. Masum estudo feito na Escola Médica deHarvard, Boston, Massachusetts, EstadosUnidos avaliou especificamente a ingestade diferentes bebidas alcoólicas e os níveisde ácido úrico. Eles estudaram 14.809 pa-cientes, sendo 6.932 homens e 7.877 mu-lheres, todos com mais de 20 anos de idade,entre os anos de 1988 e 1994. A conclusãoque chegaram é que cerveja e destiladosaumentam fortemente os níveis de ácidoúrico no sangue e o vinho não (CHOI;CURHAN, 2004).

VINHO E PULMÃO

Os pacientes portadores de DoençaPulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) sebeberem vinho moderadamente terãoatenuadas as suas manifestações clínicas.Isso porque o resveratrol, abundante nosvinhos, diminui as ocitocinas inflamatóriasdos macrófagos alveolares (CULPITT et al.,2003).

Pesquisadores da Universidade de Bú-falo, Nova Iorque, observaram que as pes-soas que têm o hábito regular de bebervinho branco moderadamente têm umamelhor função pulmonar. E função pul-monar tem relação direta com quantidade equalidade de vida (SCHUNEMANN et al.,2002).

Fumantes que tomam vinho regular emoderadamente têm atenuado os malefíciosdo cigarro (HAKIM et al., 2003).

Entre as bebidas alcoólicas a que maisatenua manifestações alérgicas, como ur-ticária e asma, é o vinho. Os componentessulfurosos são os principais responsáveispor isso (VALLY; THOMPSON, 2001).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Da mesma forma que se sabe que o con-sumo abusivo de álcool é danoso ao or-ganismo, há muitas evidências dos be-nefícios do consumo moderado, mormentedo vinho. Apesar disso ainda existe muitaresistência de autoridades sanitárias e al-guns médicos para dizerem que bebidaalcoólica, sobretudo vinho, ingerida regulare moderadamente com as refeições é be-néfica para a saúde. Isso, a meu ver, deve-se a três fatores: aos níveis de evidências,à dependência e à tolerância induzidas pe-lo álcool. Tolerância é o fato de serem ne-cessárias doses progressivamente maioresde uma substância para fazer o mesmoefeito. Isso pode levar à dependência, oque é um problema social e de saúde.

Hoje vivemos uma época em que o exer-cício da medicina baseia-se em evidências.Estamos também em um processo de mu-dança de conceito. Até há bem pouco tempodizia-se que tomar bebidas alcoólicas era tãoprejudicial quanto fumar. Quase a totalida-de dos estudos na área de “vinho e saúde”é dos últimos 20 anos. Na verdade, milha-res de pesquisas ainda não são suficientespara mudar um conceito na rigorosa ciên-cia médica. Isso também porque a maiorparte das pesquisas a esse respeito tem bai-xo nível de evidência. Mas é necessárioentender que todos os estudos que hojetêm níveis altos de evidência, no início eramde nível baixo. Hoje já começam a apareceros estudos com alto nível de evidência e aresistência das autoridades e dos médicosserá progressivamente menor para reco-mendar a ingesta moderada de vinho e depreferência junto às refeições.

O mais importante é saber que as virtudesterapêuticas do vinho só ocorrem se ele forbebido regularmente, com moderação juntoàs refeições e se não houver nenhuma contra-indicação à ingesta de bebidas alcoólicas.

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126 Vinhos finos: rumo à qualidade

Degustação de vinhos e espumantes

Mauro Celso Zanus1

Giuliano Elias Pereira2

1Engo Agro, Ph.D., Pesq. Embrapa Uva e Vinho, Caixa Postal 130, CEP 95700-000 Bento Gonçalves-RS. Correio eletrônico:[email protected]

2Engo Agro, Ph.D., Pesq. Embrapa Uva e Vinho/Embrapa Semi-Árido, Caixa Postal 23, CEP 56302-970 Petrolina-PE. Correio eletrônico:[email protected]

Resumo - O vinho apresenta uma composição química muito variada e complexa. Dessaforma, as análises químicas, mesmo que detalhadas, não são suficientes para avaliá-locompletamente, pois os resultados obtidos não permitem distinguir um vinho finoexcepcional de um vinho de consumo corrente ou comum. Nesse caso, a degustação irápermitir elaborar um julgamento sobre sua qualidade e complementar a avaliação, comdescrição sensorial dos exames visual, olfativo, gustativo e de sensações tácteis de algunsvinhos varietais.

Palavras-chave: Vinho. Qualidade. Análise sensorial. Temperatura.

INTRODUÇÃO

A avaliação das características organo-lépticas de um alimento, no caso específicodo vinho, é chamada análise sensorial. Aanálise sensorial é o conjunto dos méto-dos e das técnicas que permitem perce-ber, identificar e apreciar, pelos órgãos dosentido, um certo número de proprieda-des, ditas organolépticas, dos alimentos(ABNT, 2003 apud FERREIRA et al., 2000).Uma outra definição de importância é ada degustação. Degustar é provar, comatenção, um produto que se quer apreciara qualidade. É submetê-lo aos nossos sen-tidos, particularmente o gustativo e o ol-fativo. É tentar conhecê-lo, procurando-seexpressar os seus defeitos e suas quali-dades. É estudar, analisar, descrever, julgare classificar (CONFRARIA DO VINHO DEBENTO GONÇALVES, 1998).

Segundo Peynaud (1997), distinguem-se quatro fases na degustação:

a) observação pelos órgãos do sentido;

b) descrição das percepções;

c) comparação em relação às normasconhecidas e vigentes;

d) julgamento justificado.

ANÁLISE SENSORIAL DEVINHOS

Normalmente, uma análise sensorial érealizada por um grupo de degustadoresde, no mínimo, 12 pessoas, para que namédia geral dos parâmetros avaliados se-jam obtidos resultados corretos e con-fiáveis. A análise organoléptica de vinhosexige uma grande concentração por partedo painel de degustadores, sendo de ca-ráter subjetivo e individual (PEYNAUD,1997). O degustador deve saber exprimir oque ele sente, descrever as sensações re-cebidas no ato de degustar, em termos cla-ros, e ser capaz de formular uma opinião. Ovinho é uma bebida/alimento que apresentauma composição química muito variada ecomplexa. Entre os compostos podem-secitar a água, os álcoois, os açúcares redu-tores, os ácidos orgânicos, os compostosfenólicos, os compostos aromáticos, osaminoácidos, dentre outros (USSEGLIO-TOMASSET, 1995).

O vinho é feito para ser consumido e

apreciado e a degustação permitirá elaborarum julgamento sobre sua qualidade. Aanálise química, mesmo que detalhada, nãoé suficiente para avaliar a qualidade de umvinho. Ela esclarece e ajuda a degustação,mas não a descarta. Um vinho de qualidadeexcepcional não pode ser distinguido deum vinho de consumo corrente ou comum,apenas pela sua análise química. Existemalguns tipos de análise sensorial, como adegustação profissional, a hedônica e a ana-lítica.

A degustação profissional pode serdividida em simples e limitada, em detalhadae completa, rápida ou aprofundada. Pode-se degustar para determinar o tipo de vinho,para avaliar sua qualidade, para estimar ovalor comercial, para definir a compra devinhos pelos comerciantes, para determinarsua origem, para comparar com outrosvinhos e classificá-los, para seguir seu de-senvolvimento, para determinar um trata-mento, para definir e manter a uniformidadecomercial, para definir cortes ou misturas.Pode-se também degustar um vinho pelosimples prazer de beber (degustação he-dônica).

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A degustação praticada pelo técnicoe/ou enólogo é mais detalhada dentro doesforço de análise e de suas conclusões,quando comparada à degustação co-mercial. Entre os aspectos avaliados elaprocura explicar o caráter sensorial e or-ganoléptico de um vinho em relação à suacomposição, tenta decompor a com-plexidade das sensações em caracteressimples, relacionar os parâmetros avaliadosaos constituintes responsáveis, relacionaruma característica às condições de vini-ficação, de conservação, prever o enve-lhecimento. É, portanto, explicativa, sendochamada degustação analítica (PEYNAUD,1997).

Na degustação de vinhos são empre-gados os sentidos visão, olfato, gosto (pa-ladar) e também o tato. Algumas difi-culdades são encontradas na degustação,principalmente devidas à subjetividadepessoal, ao ritmo fisiológico, ao cansaçosensorial, ao costume (degustação dosmesmos vinhos), às comparações e con-trastes (deve-se comparar o que é com-parável) e à multiplicidade de tipos devinhos encontrados. Muitos outros fato-res externos, que estão relacionados com adegustação, são de grande importânciapara o sucesso de uma análise sensorial. Asala utilizada deve ser inodora, o ambientedeve ser tranqüilo e sem barulhos paranão desconcentrar os degustadores, a lu-minosidade deve ser clara para não interferirna coloração dos vinhos. O tipo de taçautilizada é fundamental para o sucesso dadegustação. Atualmente, o fato da adoçãodas taças recomendadas pela Internatio-nal Organization for Standardization (ISO)ou Association Française de Normalisa-tion (Afnor), padronizadas mundialmen-te para a degustação de vinhos, colaboroue facilitou a arte da degustação técnica.

A análise sensorial é realizada para secomparar e descrever o que é comparável.Não se pode degustar em uma mesmaseqüência vinhos brancos e tintos, vinhossecos e doces. Devem-se separá-los emgrupos ou seqüências, para que sejamavaliados corretamente:

a) entre brancos secos, dos vinhospouco até muito ácidos;

b) entre os tintos secos, de baixa con-centração, até os mais concentradosem taninos, os de pouco até os maisalcoólicos;

c) os licorosos.

A seqüência da degustação de vinhosdeve ser bem definida e respeitada, sendofundamental para que se consiga descrevero vinho de uma maneira precisa, detalhadae completa. Além disso, o emprego de umvocabulário objetivo é fundamental para adescrição das características sensoriais.

Técnica da degustação

Exame visual

Corresponde à primeira etapa na ava-liação de um vinho. O exame visual permi-te caracterizar o aspecto do vinho. Apósser servido, normalmente um terço da taçapara facilitar as operações seguintes, é rea-lizado o exame visual contra uma superfí-cie luminosa, onde se busca descrevê-loquanto às características de intensidadede cor, tonalidade, limpidez e, para algunsdegustadores, usam-se descrever as “lá-grimas” ou as “pernas” do vinho. A profun-didade de cor pode ser avaliada através doexame do disco (olhando a taça de cimapara baixo contra uma superfície branca).Observa-se, também, a presença de gáscarbônico que, principalmente em vinhostintos, é considerado um defeito.

O exame visual, sendo a primeira in-dicação percebida de um vinho, é instintivo,influenciando muito nas próximas etapasda degustação. O degustador é tentado porjulgar mais severamente um vinho turvoou de coloração anormal. Normalmente, osvinhos, nas degustações técnicas, são de-gustados às cegas, sem a prévia revelaçãodo tipo, nem da cultivar, zona de produ-ção, dentre outras características. A co-loração de um vinho é caracterizada sobtrês aspectos:

a) a tinta propriamente dita (cor);

b) a luminância que corresponde ànuança clara ou escura;

c) a saturação que corresponde à no-ção de vivo ou opaco.

A seguir, são apresentados exemplosde características visuais dos vinhos:

a) intensidade de cor: a coloração po-de ser fraca, média ou intensa (pro-funda). Observa-se a profundida-de da coloração, quando a taça éinclinada para frente, de modo quese observe no centro a característicada coloração;

b) tonalidade: a avaliação da tona-lidade permite descrever e analisaruma possível evolução do vinho,observando o halo periférico, po-dendo ser descrito se um vinhoguarda a mesma coloração de quan-do foi engarrafado, ou se apresentaevolução na coloração. Por exem-plo, vinhos brancos podem variarde incolor a dourado, passando poresverdeado, amarelo-claro e palha.Vinhos tintos podem-se apresen-tar de cor clarete, carmim, vermelho-rubi, violeta e púrpura. Nas degus-tações técnicas, complementando acaracterização das cores, utilizam-se normalmente metáforas, a títulode comparação, que ajudam na de-signação da cor de um vinho, comoé o caso do amarelo-limão, amarelo-palha, vermelho-rubi, vermelho-cereja, vermelho-castanho, entreoutros. Vinhos tintos envelhecidostendem a apresentar uma coloraçãomenos intensa, com reflexos de cortijolo, marrom ou telha. Quando aextração dos pigmentos da casca dauva durante a elaboração dos vi-nhos é pouco intensa e de curtaduração, têm-se os vinhos rosadosou “rosés”. A tonalidade dependedo grau de maturação das uvas, doprocesso de elaboração, do contatocom a madeira, da variedade e daidade do vinho;

c) limpidez: vinhos defeituosos apre-sentam partículas em suspensão,sendo denominados turvos, opa-lescentes, velados. Aqueles sem de-

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128 Vinhos finos: rumo à qualidade

feitos e de melhor qualidade sãolímpidos, brilhantes, cristalinos. Alimpidez do vinho, juntamente coma nuança da coloração, é carac-terizada como o “vestido” do vinho(la robe, como descrevem os fran-ceses), sendo comumente descritapelos degustadores;

d) lágrimas: observa-se a intensida-de de sua formação junto à parededa taça. Sua origem deve-se ao fenô-meno denominado efeito Gibbs-Marangoni, de tensão superficialdos líquidos. A composição quí-mica das lágrimas é principalmenteágua. Sua formação é tanto maisintensa quanto maior a quantidadede álcool no vinho. Quando o vinhoalcança a parede do copo, após agi-tação, ocorre que o álcool se eva-pora e a água escorre pela parede,dando origem às lágrimas ou pernas.

Exame olfativo

O exame olfativo é a segunda etapa naseqüência de uma análise sensorial. Dentroda fisiologia humana do exame olfativo, aregião da olfação está situada na partesuperior das fossas nasais. O vinho emiteestímulos através da molécula olfativa, queé formada por cadeias de átomos. Essesestímulos são detectados pelos cíliosolfativos, onde será percebido o odor ou oaroma, após atravessarem a mucosa ol-fativa. Os cílios estão ligados por neurô-nios ao bulbo olfativo onde será realizadauma discriminação e uma concentraçãodos odores percebidos, ou seja, das in-formações que chegam. Na seqüência,esses estímulos chegam ao córtex olfati-vo, sendo o local onde o cérebro realiza otratamento das informações, a memo-rização, o discurso e o reconhecimento dassubstâncias olfativas. Para que uma subs-tância olfativa seja percebida e detectadapelo sistema, ela deve ter o peso molecularmédio (entre 30-300 g/mol), ser volátil(passar do estado sólido para o gasoso),ter por natureza um odor, ser hidrossolúvel(para atravessar a mucosa olfativa) e ser

lipossolúvel (para sair do vinho) (BRO-CHET; DUBOURDIEU, 2001).

Deve-se sempre sentir o vinho, intensae longamente, antes de colocá-lo na boca.A análise olfativa é considerada comomuito complexa e de grande variação emrelação aos degustadores. A subjetivida-de da degustação, nesse caso, é mais pro-nunciada, devido ao fato de termos quelevar em conta os limites de detecção e deidentificação das substâncias olfativaspresentes nos vinhos. O limite de detecçãoé a quantidade mínima de uma substânciaolfativa para ser detectada no vinho pelodegustador. O limite de identificação é nãosomente perceber a substância olfativa,mas identificá-la e descrevê-la.

Muitos são os fatores que irão influen-ciar na capacidade de reconhecer um aro-ma em um vinho, como a fisiologia dodegustador, a cultura (contato com aromasde flores, frutos ou outros em períodos maisantigos, durante a infância, a adolescên-cia e o dia a dia), o estado emocional, otreinamento, o estado de saúde (se gripado,a detecção e o reconhecimento serãoprejudicados, pelo excesso de mucosaproduzido). Cada pessoa possui uma cartade identidade olfativa. Não existem duaspessoas no mundo que percebam da mes-ma maneira, na mesma intensidade, por issoa complexidade desse parâmetro.

Em degustações técnicas empregam-setaças de cristal padrão ISO, para favorecera percepção olfativa. É feito inicialmentecom o copo em repouso, quando são per-cebidas e descritas as substâncias olfativasmais voláteis, em que se detecta tambémos principais defeitos dos vinhos, como asnotas de redução, de anidrido sulfuro-so, a acidez volátil, as notas herbáceas e asnotas animais dos fenóis voláteis, prove-nientes da contaminação por Brettanomyces.Esta etapa é conhecida como o primeironariz do vinho. Em seguida, analisa-se ovinho com um leve movimento giratórioe, posteriormente, com um movimento gira-tório mais intenso. A agitação da taçafavorece o desprendimento das substân-cias menos voláteis do estado líquido paraa fase gasosa, sobre a superfície. Nesta eta-

pa, busca-se identificar e descrever assubstâncias olfativas, caracterizando o se-gundo nariz do vinho.

Os aromas percebidos diretamente den-tro da etapa olfativa são caracterizadoscomo odores, detectados pela via ortonasalou direta.

Em seguida, são apresentados exem-plos de descrições dos vinhos quanto àavaliação olfativa:

a) intensidade: nulo (neutra), fraco, po-bre, rico, aromático;

b) clareza: corresponde à capacidadede detecção dos aromas, a nitidezcom que o perfil aromático é per-cebido e descrito;

c) qualidade: corresponde à caracte-rística dos aromas detectados, comosendo defeitos ou qualidades. Osaromas podem ser divididos emprimário (associado à variedade deuva empregada); aroma secundário(proveniente da fermentação e dosprocessos pré-fermentativos – ex:aldeídos provenientes do esma-gamento e prensagem das cascas -ésteres voláteis) e terciário ou bu-quê (associado à transformação naestrutura das moléculas – por oxi-dação, hidrólise ou rearranjo mo-lecular na fase de envelhecimentoem garrafa);

d) característica: pode ser varietal(quando associado a uma variedadeespecífica de uva), de especiarias,animal (ex: couro, suor de cavalo),vegetal, essências, frutado, floral,tostado, químico, madeira (carva-lho, grápia, pinho), ou complexo(quando originado de um corte ouassemblage entre diferentes va-riedades), dando origem a vinhosconsiderados como difíceis de des-crever, pela sobreposição de aro-mas. Esta sobreposição ainda épouco compreendida quimicamen-te, pois a adição de dois aromasdistintos, no caso de duas dife-rentes variedades, pode dar origema aromas que podem ser detectados

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separadamente ou também a umterceiro aroma, de estrutura químicadesconhecida. Por isso, o voca-bulário deve ser amplo para poderdescrever diferentes tipos de vi-nhos.

Exame gustativo

Esta etapa corresponde à terceira naseqüência da análise sensorial. As célulassensíveis ao gosto estão situadas uni-camente sobre a língua, sendo chamadaspapilas gustativas. Estas são encontradasem forma de cogumelo, estando repartidassobre a língua de maneira irregular, nãotendo papilas na parte central. O vinhopossui quatro gostos elementares:

a) o gosto doce dado pelo álcool eeventualmente pelos açúcares;

b) o gosto ácido originado dos ácidosorgânicos livres;

c) o gosto salgado dado pelos sais deácidos;

d) o gosto amargo dado pelos com-postos fenólicos, principalmente ostaninos.

Na degustação de um vinho, estesgostos não são percebidos ao mesmo tem-po, por isso deve-se estar atento à modi-ficação progressiva das sensações perce-bidas. De maneira geral, o gosto de umvinho não se encontra dentro da taça, eleestá na cabeça do degustador, pelo caráterpessoal e subjetivo.

Coloca-se uma quantidade adequadade vinho na boca, promovendo em segui-da uma movimentação do líquido, dis-tribuindo-o em todo o palato (língua e mu-cosas laterais). Em seguida, procura-sedescrevê-lo em relação ao ataque (primeiraimpressão) ou gosto instantâneo, duranteos primeiros três segundos, a evolução, du-rante cerca de dez-doze segundos, que é avariação contínua da sensação. Duranteesta etapa poderão ser percebidas a tem-peratura, a viscosidade, a eventual pre-sença de gás carbônico e a adstringência.As sensações tornam-se por conseqüênciamais complexas e revelam relações permi-

tindo apreciar a harmonia e o volume dovinho. O equilíbrio álcool/acidez/taninos,as sensações tácteis da mucosa, a persis-tência (tempo de percepção olfativa) e asensação de final de boca. No exame gus-tativo, procura-se descrever o aroma retro-nasal ou por via indireta, que constitui osaromas propriamente ditos do vinho (como aquecimento na boca, pela movimentaçãoe aeração do vinho, o desprendimento dassubstâncias voláteis aumenta).

Com a avaliação gustativa completa-sea análise sensorial do vinho. Esta etapa éde grande importância e complexidade,sendo necessária muita atenção por partedos degustadores para se chegar a umaconclusão objetiva, que resuma a caracte-rística global do vinho. Busca-se em segui-da traçar um esboço geral que descrevaprecisamente a qualidade global do vinhoanalisado.

A seguir são apresentadas algumascaracterísticas gustativas descritas pelosdegustadores:

a) acidez: baixa (chato ou plano),fresco, vivaz, acerbo, ácido, acídu-lo. Os ácidos orgânicos são os res-ponsáveis;

b) doçura: seco, doce, licoroso. O eta-nol aumenta a percepção, pois apre-senta um certo grau de doçura, alémdo açúcar residual no vinho;

c) salgado: é uma sensação pouco per-ceptível em vinhos, cujos com-postos responsáveis são os saisdos ácidos e os minerais;

d) amargo: depende principalmente doconteúdo e da qualidade dos ta-ninos e compostos fenólicos;

e) persistência: pode ser fugaz, curta,média, prolongada.

Sensações tácteis

As sensações tácteis são importan-tes para um vinho. Nestas, incluem-se asimpressões de temperatura, de consis-tência, de viscosidade, de untuosidade ede volume. Certos gostos são na verdadesensações tácteis, de reações com a mu-

cosa e a saliva, da mesma forma para assensações com o teor alcoólico, devido àlipossolubilidade e à desidratação, as sen-sações de adstringência dos taninos, de-vido à complexação dos taninos do vinhocom a mucosa lingual e à coagulação dasaliva, que é responsável pela lubrificaçãobucal.

A seguir, são descritos alguns voca-bulários dos parâmetros tácteis encon-trados nos vinhos:

a) temperatura: gelado, frio, tépido,quente;

b) álcool: lavado, fraco, capitoso,cáustico;

c) adstringência (tanino): vazio, ru-goso, áspero, adstringente, tânico.A percepção desta característicadepende, principalmente, da formamolecular do tanino, do seu graude polimerização e da temperaturado vinho;

d) gás carbônico: nulo, gaseificado,agulha, picante.

CARACTERÍSTICAS DOSVINHOS DE ALTA QUALIDADE

A qualidade de um vinho depende daharmonia de todos os seus componen-tes, que dependem em sua maior parte daqualidade da matéria-prima, ou seja, dauva que deu origem. Os fatores naturais,representados pelo termo francês terroir(influência do clima, do solo e do homem,com os tratos culturais, sobre a composi-ção das uvas) são responsáveis por cercade 80% da qualidade de um vinho. A eno-logia permite a correção de alguns fatoresque não foram suficientemente adquiri-dos durante o desenvolvimento em campo,mas o ideal é a obtenção de uvas de altaqualidade. A coloração deve ser intensa,límpida e brilhante, sendo fundamentais oscompostos que participam de sua defini-ção (compostos fenólicos, representadospelas antocianinas). As substâncias vo-láteis, que definem o aroma, devem estarpresentes, sem defeitos, com nitidez, in-tensidade e qualidade. Os gostos devem

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estar equilibrados, principalmente no quediz respeito ao ácido, ao doce (em vinhossecos, representado pelo álcool), ao sal-gado e ao amargo, este deve ser evitado,pela perfeita maturação dos taninos. Maisdo que a concentração é o balanço e o equi-líbrio entre as diversas substâncias quedefinem se um vinho é de excelente qua-lidade ou apenas medíocre. Muitas vezesum vinho aparenta ser agradável na primei-ra taça e, posteriormente, mostra-se enjoa-tivo ou demasiado ácido ou adstringenteou com algum sabor desarmônico (ex.: do-minância da madeira).

Vinhos de alta qualidade, independen-te das diferentes categorias ou estilos, apre-sentam-se primeiramente sem defeitos(odores estranhos), com elevada nitidez efineza de aroma e sabor, boa intensidadede paladar e expressão varietal (vinhosvarietais), harmônicos na relação álcool/acidez e persistência média/alta. Os níveisde adstringência e amargor são baixos, oque caracteriza uma bela maturação fenólica(taninos); a acidez deve estar presente, poisrepresenta o frescor do vinho, contribuindotambém para o envelhecimento dele, comofator de proteção. Normalmente, os grandesvinhos têm uma boa persistência aromática.Devem ser lembrados por um período queultrapasse os dez segundos após seremdegustados, quando são caracterizadoscomo de persistência longa. A persistênciaaromática dos vinhos permite fazer umahierarquia deles em uma degustação com-parativa.

Os grandes conhecedores mundiaisdizem que um bom vinho deve ter persistên-cia aromática e comparam a presença destapersistência à calda de um pássaro, tãonecessária para ele voar. “Os grandes vinhosdevem ter calda”. Outra definição corren-temente utilizada pelos conhecedores é a“rabo de pavão”, definindo vinhos compersistência aromática interminável, sendotambém utilizada para descrever vinhos mui-to complexos aromaticamente, não tendouma nota que sobressai, sendo o perfil aro-mático de grande qualidade e complexidade,quase indescritíveis.

DESCRIÇÃO DE VINHOSVARIETAIS

Vinhos varietais de qualidade apre-sentam aromas e sabores expressivos –não, necessariamente, intensos – com ca-racterísticas peculiares de aroma que per-mitam distingui-los dos demais vinhos.Cada variedade possui uma característi-ca aromática que a difere das demais. Esteperfil aromático é muito procurado porpaíses que produzem vinhos varietais,principalmente aqueles conhecidos comodo “Novo Mundo”, como Estados Unidos,Chile, Argentina, África do Sul, Austrália eNova Zelândia. Os países do “VelhoMundo”, representados pelos europeus,como França, Itália, Espanha, Alemanha ePortugal, produzem vinhos que são nor-malmente cortes ou assemblages entrediversas variedades.

Sob o ponto de vista da bioquímica eda genética, faz bastante sentido compa-rar o aroma dos vinhos com o aromaencontrado em outros frutos ou vegetais.A natureza, apesar da ampla heteroge-neidade de tipos, se repete ao sintetizar seusaromas. O metabolismo secundário dasplantas, responsável pela grande quan-tidade de produtos naturais e essências noreino vegetal, não é tão diverso quanto sepensa. Muitas rotas metabólicas são co-muns a diferentes grupos de plantas.Assim, a rota metabólica responsável pelaformação de compostos terpênicos, pre-sente nos frutos cítricos (laranja, limão,pomelos), não difere em essência daquelaencontrada nas variedades de uva do tipoMoscatel ou Riesling itálico. Pequenasvariações na configuração das moléculasdeste grupo podem, no entanto, determinaruma diferente característica aromática.

Porém, não é somente a genética quecontrola a qualidade e quantidade dosaromas. O meio ambiente interfere em todoo metabolismo vegetal, regulando suaintensidade. A concentração e a diver-sidade de moléculas orgânicas e inor-gânicas dependem da localização dovinhedo, do grau de maturação atingido

pelos frutos (determinado pelas condi-ções climáticas e de cultivo do vinhedo),do processo e tecnologia de vinificação edas condições de conservação e idade dosvinhos.

A seguir, são apresentados algunsaromas que aparecem com freqüência nosvinhos varietais:

a) branco:

- Chardonnay: maçã verde, melão,pêssego, amêndoas, abacaxi, pê-ra, frutos cítricos, tabaco, man-teiga (malolática). Quando emcontato com carvalho: tostado,baunilha, caramelo, coco, cravo-da-índia,

- Chenin blanc: goiaba, damasco,abacaxi, maçã, camélia,

- Gewürztraminer: citronela, espe-ciarias (cravo-da-índia), gerânio,rosas, papaia, pomelo, lichia,

- Moscatos: floral, frutos cítricos,papaia, jambo,

- Pinot gris/grigio: frutado, queijoromano,

- Riesling itálico: limão, tangerina,casca de laranja, flores brancas,carambola,

- Riesling renano: rosas, pinus, li-mão, jasmim, abacaxi,

- Sauvignon blanc: pimentão ver-de, aspargos, floral, herbáceo,maracujá, pomelo, pêra, arruda,

- Sémillon: figo, melão, tabaco,

- Viognier: pêssego, damasco, cas-ca de limão ou laranja;

b) tinto

- Cabernet franc: frutos vermelhos(amoras, cereja, ameixas), pimen-tão verde (ocasional),

- Cabernet sauvignon: cassis, pi-mentão verde, eucalipto, amora-preta, framboesa, azeitona preta,carvalho, fumo,

- Gamay: framboesa, banana (asso-ciado ao processo de maceraçãocarbônica),

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- Merlot: cassis, ameixa, eucalipto,anis, fumo, chocolate, café, azei-tona preta, amora-preta,

- Nebbiolo: violeta, rosa, trufas,menta, eucalipto,

- Pinot noir: cereja, framboesa, men-ta, violeta, tomate maduro,

- Syrah/Shiraz: violeta, geléia deamoras ou framboesa, pimenta-preta,

- Tannat: vegetal, champignon,amoras, framboesa, cereja, hor-telã, eucalipto, pinus, marmelo,damasco, figos secos, couro (ani-mal), chocolate,

- Tempranillo: frutas vermelhas (es-curas), incenso, geléia de amorasou framboesa, trufas, chá-preto,

- Touriga nacional: cereja, amora,frutas silvestres, uvas-passas,

- Zinfandel: framboesa, geléia deamoras ou framboesa, pimenta-preta, uvas-passas, ameixa, café.

DEGUSTAÇÃO DOSESPUMANTES

Espumantes tipo Champanhe

O vinho espumante natural é a bebi-da cujo dióxido de carbono resulta uni-camente de uma segunda fermentaçãoalcoólica do vinho. Este vinho pode serproduzido pelo método tradicional Cham-penoise (a segunda fermentação alcoólicaocorre na própria garrafa) ou pelo métodoCharmat (a segunda fermentação ocorre emrecipientes de grande volume resistentes àpressão, chamados autoclaves).

Os principais aspectos observados nadegustação desses vinhos consistem em:

a) exame visual: empregam-se os vo-cábulos limpidez, tonalidade, efer-

vescência, coloração, quantidadede espuma, tamanho de borbulha ecolar. Um espumante de qualidadeapresenta uma moderada eferves-cência, formando uma espumadelicada. Nas bordas da taça forma-se um colar de espuma, que apre-senta boa persistência graças àconstante emissão de borbulhasprovenientes da base e da lateralda taça. As borbulhas são de ta-manho pequeno e persistentes aolongo do tempo. O desprendimen-to de borbulhas é extremamentedependente da qualidade da taça eda presença de microscópicas par-tículas de poeira que funcionam co-mo núcleos de inicialização deborbulhas. Resíduos de detergen-tes nas paredes do cristal tambémprejudicam a formação das bor-bulhas. Caso um espumante não

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n.2, p.187-196, May 2001.

CONFRARIA DO VINHO DE BENTO GON-

ÇALVES. Noções básicas para a degustação

de vinhos. Bento Gonçalves, 1998. 29p. Apostila.

FERREIRA, V.L.; ALMEIDA, T.C.A.; PET-

apresente boa efervescência, ve-rifique a presença de gás carbônicopelo paladar, através do despren-dimento do gás em boca. Se houveruma liberação intensa de gás (pe-quenas explosões) o problema é dataça, não da qualidade do espumante;

b) exame olfativo: vocábulos comointensidade, nitidez, fineza, com-plexidade, caráter varietal, odoresindesejáveis são empregados naanálise olfativa. Diferente dos vi-nhos, não há a necessidade de agi-tar a taça em movimentos circulares,uma vez que o estourar das bor-bulhas provoca a liberação dos aro-mas para as camadas acima da su-perfície do líquido;

c) exame gustativo (paladar): empre-gam-se vocábulos como intensida-de (expressão de sabor), volume,estrutura, desprendimento de gáscarbônico em boca (explosão), ni-tidez, acidez (frescor), fineza, amar-gor, complexidade, persistência;

d) descritores (aroma e sabor): frutoscítricos, abacaxi, pêssego, melão,maçã verde, maçã cozida, frutado(do Pinot noir ou variedades tintas),levedura, pão, pão tostado, bauni-lha, chá-preto, feno seco, caramelo,uvas-passas, manteiga, amêndoa,café, fumaça, mel, couro.

Espumantes Moscatéis

Denominação dos vinhos espumanteselaborados pelo processo chamado Asti, queconsiste na fermentação parcial de mostoclarificado de uvas viníferas aromáticas.

Na degustação dos espumantes Mos-catéis, são considerados os seguintesaspectos:

a) exame visual: ocorre maior eferves-cência e formação de espuma doque em vinhos espumantes tipochampanhe. A cor da espuma é pre-dominantemente branca;

b) exame gustativo: avaliam-se o frescor(acidez), a cremosidade, a doçura, osabor intenso e a persistência longa;

c) descritores (aroma e sabor): floresde acácia ou laranjeira, mel, abacaxi,mamão papaia, jambo, pitanga,maracujá, amoras-brancas, pêrasmaduras, pêssego, frutas cítricas,sálvia, manjericão, alecrim, arruda,nota de herbáceo, gerânio, guaraná,uvas moscato bem maduras.

TEMPERATURA CORRETA PARASE APRECIAR VINHOS

Existe uma temperatura ideal que per-mite intensificar a percepção dos aromas edo sabor, equilibrando no paladar as ca-racterísticas de doçura, alcoolicidade, aci-dez, amargor e adstringência.

Diversas substâncias voláteis e não-voláteis determinam a percepção do aroma

e sabor dos vinhos. A temperatura é umamedida do grau de movimento (energiacinética) destas substâncias e afeta nãosomente a intensidade, mas também o perfildos estímulos sensoriais que são enviadospara o cérebro – gerando sensações diversas.A temperatura também pode influenciar aligação química (através de pontes de H) detaninos com as proteínas da saliva, modi-ficando a percepção de adstringência. Asdiversas categorias de vinhos diferem mui-to na quantidade e qualidade de substân-cias sensorialmente ativas (voláteis e não-voláteis) – por isso, para cada perfil de vinhodevem-se empregar temperaturas diferen-tes. A Figura 1 apresenta as temperaturasque permitem uma melhor percepção dosaromas e dos sabores dos vinhos.

TINELLI, M.L.C.V.; SILVA, M.A.A.P.; CHAVES,

J.B.P.; BARBOSA, E.M.M. Análise sensorial:

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Paris: Tec. & D. Lavoisier, 1995. 387p.

Figura 1 - Temperaturas de serviço para vinhos, espumantes e licorosos

ºC

19

17

16

14

13

4

3

2

1

0

20

18

15

12

11

10

9

8

7

6

5

Tintos bastante estruturados, longamente envelhecidos e complexos

Moscatel Espumante e Asti Espumante

Espumantes Demi-Sec e seco

Vinhos brancos doces

Espumantes Brut e Prosecco, Vinhos brancos aromáticos secos

Espumantes extra-brut, Brut mais evoluídos e complexos, Vinhos brancos secos

Champanhes envelhecidos e de elevada qualidade, Málaga, Porto Branco, Sherry

Brancos secos de elevada qualidade e complexidade, Vinhos rosados

Licorosos tintos, Porto Tawny e Ruby, Madeira, Sauternes e de Colheita Tardia, Lambrusco

Tintos jovens (tipo Noveau), frutados e leves, com moderado tanino

Tintos de média estrutura e de elevada qualidade

Tintos estruturados e envelhecidos, Porto Vintage e LBV (Late Bottled Vintage)

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