IED - resumos

Embed Size (px)

Citation preview

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Exame de Introduo ao Estudo do DireitoEstudo do Direito: O Direito uma realidade social e cultural multifacetada, pelo que ele pode constituir objecto de estudo de vrias disciplinas e pode ser analisado segundo uma multiplicidade de perspectivas: Histria do Direito ramo da histria que se ocupa com a formao e da evoluo do direito. Normalmente, a Histria do Direito analisa o direito como uma realidade cultural e toma como base uma certa homogeneidade cultural. Sociologia do Direito ramo da Sociologia que se ocupa do direito enquanto facto social, procurando determinar o grau de efectividade do direito numa sociedade e analisando as relaes mtuas entre a ordem jurdica e a realidade social (a realidade social sempre determinante para a formao do direito, pois que o direito pretende dar resposta aos problemas sociais e procura orientar e conformar a realidade social). Filosofia do Direito ramo da Filosofia que se ocupa da gnese e fundamento do Direito, bem como a sua essncia, do seu contedo e do seu fim. A perspectiva da anlise da Filosofia do Direito sobre a realidade jurdica uma perspectiva exterior, ou seja, uma viso que transcende o direito positivo. Correntes jusfilosficas: Uma orientao positivista ou normativista o direito legitimado pelos valores do prprio direito, pois que irrelevante tudo o que no seja direito positivo. Uma orientao antipositivista ou antinormativista o direito definido em funo de critrios extrajuridicos e suprapositivos (valores morais de justia e de direito natural) e a legitimao do direito depende da sua conformidade com esses mesmos critrios. Definio de direito: - pode ser entendida em vrios sentidos: Sentido conceptual a resposta fornecida atravs de uma definio de direito; Sentido Normativo a resposta fornecida atravs da determinao das finalidades do direito; considera-se que direito, aquilo que necessrio para atingir determinados fins; Sentido emprico a resposta dada atravs da determinao da origem do direito; considera-se que direito, aquilo que resulta destas fontes. Mais simples do que responder questo O que o Direito?, fornecer uma simples descrio do que o direito. Para isso h que contar com dois elementos: O direito uma ordem normativa, isto , uma ordem de dever ser; Esta ordem normativa e o correspondente dever ser beneficiam da proteco e da tutela do Estado.Daniel Filipe Bento Marques 1

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Funes do Direito: Funo politica: organiza o poder poltico numa determinada sociedade, legitima o seu exerccio pelos rgos competentes e coloca limites ao seu exerccio; a esta funo politica do direito liga-se a noo de Estado de Direito Funo social: define os comportamentos que so permitidos, obrigatrios ou proibidos; esses comportamentos tornam-se previsveis e expectveis por todos os membros da sociedade; Funo pacificadora: define e impe os modos de aplicao das sanes decorrentes da sua violao e determina os modos de soluo dos conflitos de interesse entre os membros da sociedade. Teoria do Direito analisa o direito vigente no seu conjunto e procura abarc-lo como sistema. Para isso, a Teoria do Direito: Constri algumas estruturas formais do direito como as fontes do direito e as regras jurdicas; Procura delimitar a ordem jurdica de outras ordens normativas; Recebe contributos de outras reas do saber. A Teoria do Direito distingue-se da Filosofia do Direito pela perspectiva de anlise: - A Filosofia uma reflexo sobre a essncia, o fundamento e o contedo do direito enquanto a Teoria do Direito uma reflexo sobre o direito vigente e as suas estruturas formais. Cincia do Direito tem por objecto o direito vigente num ornamento jurdico, isto , o direito positivo. A Cincia do Direito, procura determinar o sentido das normas e dos institutos jurdicos, integrar essas normas e instituto num sistema coerente e formular proposies correspondentes aos conhecimentos adquiridos. A Cincia do Direito distingue-se da Filosofia do Direito pela perspectiva de anlise: - A filosofia coloca-se numa perspectiva exterior ao sistema jurdico; faz uma crtica externa ao sistema jurdico e responde pergunta Quid est ius? (o que o direito na sua essncia?) enquanto a Cincia do Direito posiciona-se numa perspectiva interna ou imanente ao sistema jurdico; constri a partir do sistema jurdico, faz uma crtica interna a esse sistema e responde pergunta Quid iuris? (que direito deve valer?). A Cincia do Direito distingue-se da Teoria do Direito pelo respectivo mbito: - A Teoria do Direito determina e analisa o direito vigente; ela visa determinar e ordenar o direito vigente, mas no se preocupa com a resoluo dos casos concretos. - A Cincia do Direito uma cincia orientada para a prtica jurdica, ou seja, para a resoluo de casos concretos atravs da aplicao do direito vigente.

Daniel Filipe Bento Marques

2

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

A Cincia do Direito uma cincia orientada para a prtica: o seu objectivo definir proposies que permitem a deciso de casos concretos. Isto significa que se verifica uma interdependncia entre a anlise terica e a prtica jurdica num duplo sentido: - a Cincia do Direito fornece as solues tericas de casos concretos e a prtica jurdica testa as solues tericas fornecidas pela cincia do Direito; - os casos concretos requerem a ateno e tornam-se igualmente objecto da Cincia do Direito. A Cincia do Direito realiza as seguintes funes: Funo de ordenao e de sistematizao a Cincia do Direito constri conceitos jurdicos e elabora proposies baseadas em dogmas, princpios e regras; Funo estabilizadora as proposies normativas fornecem modelos de deciso de casos concretos que evitam uma constante discusso sobre a soluo de novos casos concretos. Funo critica e de aperfeioamento do sistema jurdico a Cincia do Direito assume uma perspectiva critica sobre o direito vigente, chamando a ateno para as incoerncias, as insuficincias e as lacunas do mesmo. A Cincia do Direito formula proposies de dois tipos; Proposies descritivas descrevem a realidade jurdica tal como ela se apresenta a partir das fontes; so simples reprodues de regras jurdicas; possuem apenas um carcter explicativo; a actividade de formulao de proposies descritivas chama-se Dogmtica do Direito. Podem conter regras jurdicas ou princpios jurdicos. Proposies normativas so elaboradas a partir da interpretao das fontes de direito e da integrao de lacunas. Tm carcter vinculativo e correspondem ao nvel mais elaborado da Cincia do Direito. O resultado decorrente da formulao de proposies normativas chama-se Doutrina. No se limitam a descrever o direito vigente, antes procuram fornecer uma soluo para o problema. Caractersticas da Cincia do Direito: - uma cincia prtica, na medida em que ela prope solues aplicveis a casos concretos; - uma cincia hermenutica, dado que ela fornece interpretaes das fontes de direito; - uma cincia normativa decisria, na medida que ela prope e discute a aplicao de regras a casos concretos.

Daniel Filipe Bento Marques

3

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Histria da Cincia do Direito portugus: O direito portugus integra-se na famlia romano - germnica. tributria do direito romano e da reelaborao desse direito realizada pela pandectstica alem do sculo XIX. por isso que o conhecimento da doutrina alem particularmente til para o estudo do direito portugus, podendo mesmo dizer-se que no tem sentido procurar aprofundar alguns temas, mas mais variadas reas jurdicas, sem o conhecimento dessa doutrina. A doutrina alem sem dvida a mais pujante do continente europeu. Nela impressiona particularmente o nmero e a qualidade das revistas e dos manuais, bem como a profundidade e a actualizao dos comentrios aos cdigos e a outras leis. Cincias auxiliares: Poltica do Direito a funo da poltica do direito precisamente a de assegurar esta correspondncia do direito vigente com realidades extra jurdicas e com sentimento jurdico, pelo que ela fornece as orientaes para o desenvolvimento e o aperfeioamento do direito vigente. Cincia Econmica o direito no pode ignorar as leis econmicas que regem aquela produo e distribuio. por isso que a cincia econmica uma das cincias auxiliares do direito. Da relao entre o direito e a economia nasceu a chamada Anlise Econmica do Direito. Esta anlise ocupa-se de saber como que as regras jurdicas devem ser construdas e aplicadas de modo a garantir a utilizao mais eficiente dos mis e recursos econmicos. Outras Cincias podem ainda ser referidas a Economia Politica, a Cincia Politica, a Criminologia e a Medicina Legal. Facto jurdico todo o facto que relevante para o Direito. Pode ser: um Acto jurdico ( todo o facto humano e voluntrio juridicamente relevante) e um Facto jurdico stricto sensu ( todo o facto no humano e no voluntrio). Regra Jurdica determina a relevncia jurdica do acto; s factos subsumveis a regras jurdicas so factos jurdicos. Efeito Jurdico resultado da aplicao de uma regra jurdica a um acto jurdico; esse efeito traduz-se na definio de uma situao jurdica. O efeito jurdico pode decorrer: - da aplicao automtica da regra jurdica a um facto jurdico (art.122 CC); - de um acto voluntrio de aplicao da regra a um facto jurdico; na esfera privada, importa referir como consequncia da autonomia privada, o negcio jurdico; atravs do negcio jurdico, as partes tornam aplicvel, uma ou vrias regras jurdicas a uma determinada situao.

Daniel Filipe Bento Marques

4

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Viso esttica do Direito: Considera-se o direito em si mesmo, independentemente dos efeitos (jurdicos) que ele produz e das situaes (jurdicas) que ele cria. Isto significa que eles analisam apenas os factos jurdicos e as regras jurdicas em si mesmo, sem haver a preocupao de determinar o efeito jurdico que decorre de um facto atravs da aplicao de uma regra. No ensino da Disciplina de Introduo ao Estudo do Direito, h que seguir a perspectiva esttica de anlise do Direito. A preocupao no incide sobre os efeitos e as situaes que resultam da aplicao das regras jurdicas a certos factos jurdicos mas sobre as regras jurdicas e o ordenamento jurdico considerado no seu conjunto. Neste sentido, a perspectiva utilizada radicalmente diversa daquela adoptada na generalidade das outras Disciplinas leccionadas e estudadas no Curso de Direito. Na verdade, do que se trata de determinar os efeitos e as situaes que decorrem da aplicao de regras jurdicas a certos factos jurdicos. A palavra direito pode ser aplicada: Num sentido objectivo Direito objectivo em ingls law, ou seja, um conjunto de regras jurdicas vigentes numa ordem jurdica. Num sentido subjectivo Direito subjectivo em ingls right, ou seja, a posio de um sujeito titular de direito quanto a um determinado modo de actuar ou a um certo modo de ser tratado. O direito subjectivo j foi concebido: - Como um poder de vontade; - Como um interesse juridicamente protegido; - Como um direito de exigir e de constituir. O direito subjectivo pode ser definido como a faculdade, exercida com base numa vontade livre, de impor e defender os seus interesses atravs de meios concedidos pela ordem jurdica. Tipos de direitos subjectivos: Direitos da pessoa (so direitos inerentes qualidade de pessoa ex.: direitos fundamentais e os direitos de personalidade) Direitos relativos a bens (estes direitos podem ser): - Direitos de monoplio (so direitos que permitem que o titular use e disponha do bem com excluso dos no titulares. Podem incidir sobre bens materiais ou sobre bens imateriais). - Direitos de crdito (so direitos realizao de uma prestao por um terceiro). Direitos relativos a situaes jurdicas (so direitos constituio, modificao ou extino de situaes jurdicas, direito a resolver um contrato por incumprimento, direito a dissolver o casamento por divrcio).

Daniel Filipe Bento Marques

5

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

O direito subjectivo pode ser classificado atravs de vrios critrios: Quanto ao contedo, os direitos subjectivos podem ser: Direitos patrimoniais, isto , direitos susceptveis de avaliao econmica. Direitos no patrimoniais, ou seja, direitos insusceptveis de avaliao econmica. Quanto aos efeitos, os direitos subjectivos classificam-se em: Direitos subjectivos stricto sensu (so direitos de usar ou dispor de um bem; so correlativos de um dever, porque impem uma conduta a outra pessoa) Direitos potestativos (so direitos de constituir, modificar ou extinguir uma situao jurdica; so correlativos de uma sujeio, dado que impem uma constituio, a modificao ou uma extino da situao jurdica a outra pessoa).

NOTA: Na Disciplina de Introduo ao Estudo do Direito analisa-se apenas o direito objectivo. Diferena entre ser e o dever ser: O ser pertence ao domnio da razo terica, ou seja, da razo que orienta o pensamento; o dever ser compete ao mbito da razo prtica, isto , da razo que orienta a aco. O ser descrito; o dever ser prescrito. O ser verdadeiro ou falso; o dever ser vlido ou invlido, nomeadamente em funo da autoridade ou da competncia da entidade que define o dever ser. O dever ser respeita o ser, ou seja, no invade todas as zonas do ser e no pretende moldar todo o ser; o ser aceita o dever ser como elemento crtico e como impulsionador de transformao da realidade.

Dever ser e querer: o dever ser relaciona-se com o querer (ou com a vontade) em duas vertentes: A da origem do dever ser o dever ser tem origem num querer; o dever ser resulta de um querer de algum ou de algum rgo. A do destinatrio do dever ser o dever ser orienta o querer do destinatrio, pois que este v limitado ou mesmo excludo o seu querer; se a algum imposto um dever ser, ele deixa de ter a liberdade de querer algo de diferente daquilo que lhe determinado como conduta.

Daniel Filipe Bento Marques

6

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Ordem social e ordem normativa: A toda a sociedade inerente uma determinada ordem isto , o comportamento harmonioso dos membros de uma sociedade observvel em toda a sociedade, pelo que em qualquer sociedade existe uma ordem social. H vrias explicaes possveis para o carcter espontneo da ordem social: Explicao cultural a ordem social resulta de uma comunidade de valores e de normas que so compartilhados por todos os membros da sociedade; Explicao utilitarista a ordem social corresponde ao interesse pessoal de cada membro da sociedade, porque, as pessoas dependem umas das outras. Explicao politica a ordem social resulta de uma posio de domnio exercida por certos membros da sociedade sobre outros membros. Os membros da sociedade orientam as suas condutas: Por hbitos social correspondem a regularidades sociais, ou seja, decorrem do comportamento da maioria dos membros da sociedade, sem que lhes seja subjacente qualquer fundamento normativo ou qualquer dever ser; Por regras de dever ser estas regras determinam o que os membros da sociedade podem fazer, o que eles devem cumprir e o que eles no devem realizar. Elementos da ordem social: Elementos fcticos (da ordem do ser) o que a maioria dos membros da sociedade faz considerado normal, mas os desvios de comportamento no so censurados. Elementos normativos (da ordem do dever ser) todo o comportamento desviante considerado violador da ordem social e susceptvel de determinar a aplicao de uma sano e o uso da coero. Elementos normativos: a ordem social comporta elementos normativos, significa que existem vrias ordens normativas, nomeadamente: Ordem religiosa a ordem que regula a relao do crente com Deus; a ordem religiosa uma ordem intra-individual, porque no regula relaes entre pessoas. Alguns aspectos seculares da ordem religiosa podem ter relevncia jurdica (ex.: casamento catlico art. 1577/1 CC) Ordem Moral a ordem que, com base numa orientao assente em vises filosficas e em experincias culturais, orienta a conduta humana para a realizao do bem. uma ordem intra-individual, mas ela adquire uma dimenso inter-subjectiva quando se trata da moral social, ou seja, de aspectos relacionados com o decoro, a decncia e a probidade do comportamento em sociedade. A moral social pode ser relevante para a ordem jurdica: por exemplo, na ofensa dos bons costumes, uma das causas de nulidade dos negcios jurdicos e est subjacente invalidade dos negcios usurios.

Daniel Filipe Bento Marques

7

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Ordem de trato social resulta de convencionalismos sociais (ex.: boa educao; vesturio adequado a cada acontecimento); uma ordem intersubjectiva e extra-juridica na qual podem ter expresso sanes de carcter psquico. Pode estar na origem do costume, que uma das possveis fontes de direito. Ordem jurdica constituda pelas regras jurdicas; uma ordem intersubjectiva e a mais importante ordem normativa da ordem social.

Ordem social e ordens no normativas: Ordem social e ordem natural so ordens que so geralmente aceites e respeitadas pela generalidade dos membros de uma sociedade. Distino: A ordem natural regida por leis naturais fsica, qumica ou outras; as leis naturais enunciam relaes entre uma causa e um efeito, no tm coordenadas geogrficas ou temporais. Podem ser verdadeiras ou falsas e no so violveis. Em contraposio a ordem social uma ordem da liberdade. Deve ser entendida em dois sentidos: - a afirmao significa que s em sociedade o homem livre, porque sempre uma liberdade perante um outro. - tambm significa que a ordem social deixa sempre ao agente uma opo entre a adeso norma e a sua violao. No uma ordem determinista, ou seja, pode ser violada; espera a adeso dos membros da sociedade, mas tambm tem de p+rever que estes membros no a respeitem e a violem; disto decorre que a ordem social tem de estar preparada para aplicar sanes para que a desrespeite ou viole. Ordem social e a ordem tcnica:

Orienta condutas humanas. Pretendese alcanar um determinado resultado e tem de se assumir uma determinada conduta. Distino entre as ordens normativas e a ordem tcnica: As ordens normativas so ordens que impem um dever ser; conduta pelo qual se pratica o que proibido ou se omite o que obrigatrio viola uma regra de uma ordem normativa e, em geral, sujeita o infractor a uma sano. A ordem tcnica uma ordem que determina a adequao dos meios aos fins desejados. uma ordem orientada pela contingncia e pela racionalidade instrumental.8

Daniel Filipe Bento Marques

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Grupos sociais so constitudos por conjuntos de indivduos que interagem entre si e que estabelecem determinadas relaes sociais. Funo: Tem a funo integradora das vrias condutas individuais, porque as orienta para a obteno de uma finalidade comum. A participao de uma mesma pessoa em diversos grupos permite-lhe a realizao de vrios fins. Classificao: Grupos primrios so pequenos grupos em que se verifica uma interaco entre todos os seus membros (famlia). Caracterizam-se por uma grande solidariedade entre os seus membros e definem, eles mesmos, orientaes de condutas. Grupos secundrios so grupos maiores em que nem todos os membros interagem com todos os membros do grupo (sindicatos, associaes, partidos polticos). Necessitam de uma sistema normativo bastante mais elaborado do que os grupos primrios. Instituies: Baseiam-se num processo de habituao, ou seja, numa aco que repetida com frequncia e que molda um padro de comportamento. So realidades sociais em que se estabelecem relaes de interdependncia entre diferentes actividades dos seus membros. Conjugam uma pluralidade de finalidades e diferentes membros desempenham diferentes papis sociais. So realidades sociais com carcter supra-individual, porque elas so independentes dos seus membros e so portadoras de tradio e possuem uma ordem normativa prpria. Mostram como a realidade social composta, como ela assume um carcter formativo e como ela se desenvolve. So realidades sociais presentes em todas as sociedades ligadas, entre outras, s seguintes funes: Reproduo da espcie humana; Prossecuo de objectivos comuns; Orientao dos comportamentos por valores; Transmisso de conhecimentos e experincias; Produo e distribuio de bens. Distino entre grupos e instituies: Nos grupos visa-se a obteno de uma nica finalidade comum a todos os seus membros; em contrapartida, nas instituies so realizados, de forma coordenada, vrios fins; Os grupos so realidades inter-individuais, porque eles so o resultado da interaco entre os seus membros; em contrapartida, as instituies so independentes dos seus membros que a compem e, por isso, so realidades supra-individuais.

Daniel Filipe Bento Marques

9

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

A distino entre grupos e instituies tambm se reflecte na respectiva ordem social: Nos grupos, a ordem social assenta no interesse dos seus membros e nos compromissos que eles alcanam Nas instituies, a ordem social imanente instituio. Cada instituio tem uma ordem normativa prpria que orienta os comportamentos dos seus membros de acordo com o sistema social que elas constroem. Funes das instituies: Funo de socializao coordenam a actividade de cada um dos seus membros, isto , organizam a distribuio dos diferentes papis sociais dos seus membros. Funo de estabilizao definem normas de comportamento de acordo com valores prprios, do a conhecer aos seus membros esses valores e definem comportamentos expectveis, pelo que elas so um meio de controlo social. Na rea jurdica, a palavra instituies , h muito, empregue com os seguintes sentidos: Numa acepo mais antiga, designam os conceitos fundamentais e os princpios de um ramo do direito. Numa acepo mais recentes, designam algumas categorias jurdicas fundamentais, nomeadamente, s relaes entre particulares, s relaes econmico-sociais, organizao politica ou actividade religiosa. Relativamente s concepes da instituio numa perspectiva jurdica, podem ser referidos os seguintes exemplos: A instituio possui trs elementos constitutivos: - O nascimento num grupo da ideia de constituir um empreendimento; - A constituio, no seio do grupo, de um poder que assegura, atravs do domnio, a realizao daquela ideia; - A aceitao do poder de governo pelos membros do grupo. A instituio possui as seguintes caractersticas: - um ente ou corpo social com uma existncia objectiva e concreta; - um ente fechado, porque tem uma individualidade prpria; - uma unidade permanente que no perde a sua identidade atravs da mudana dos seus elementos individuais.

Daniel Filipe Bento Marques

10

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Ordem social e ordem jurdica: Toda a sociedade exige regulao pelo direito, logo fcil concluir o seguinte: A convivncia em sociedade pressupe organizao politica, ou seja, ela tem que se fundar no direito e de ser limitada pelo direito Estado de Direito; O comportamento de cada um dos membros da sociedade tem de coexistir e que se compatibilizar com o comportamento de todos os demais; para isso, imprescindvel o direito, nomeadamente porque: - necessrio para regular a sua repartio pelos membros da sociedade; - indispensvel para assegurar que os interesses alheios e os interesses colectivos so igualmente respeitados. Caractersticas do direito: uma realidade humana estabelece regras de conduta humanas; apenas podem ser reguladas pelo direito, pelo que s as pessoas podem ser destinatrias do direito. uma realidade social a sociabilidade inerente pessoa e o direito inerente vida em sociedade; vises de uma sociedade primitiva sem direito nunca foram confirmadas e vises utpicas de construo de uma sociedade sem direito apenas conduziram construo de sociedades quase sem direitos. uma realidade cultural o direito resulta de uma actividade atravs de rgos competentes ou atravs da prpria sociedade; como fenmeno cultural, o direito um sistema de valores e de convices que pode ser apreendido e transmitido s geraes seguintes.

Imperatividade do direito: As ordens normativas so caracterizadas pela imperatividade: pretendem orientar condutas humanas, impondo ou proibindo a sua realizao e aplicando uma sano no caso de violao de conduta devida. Duas observaes: As ordens normativas so ordens imperativas, mas nem todas as regras jurdicas so necessariamente regras imperativas; mesma na ordem jurdica existem regras no imperativas art. 1305 CC. frequente a regra jurdica ser formulada atravs de uma proposio condicional ou hipottica art. 483, n 1, CC; a formulao hipottica da regra no retira o seu carcter imperativo. Necessidade do direito: O direito s existe em sociedade, mas tambm imprescindvel em todas as sociedades. No preciso mais do que uma ordem puramente formal para possibilitar a harmonia dos comportamentos sociais. A necessidade do direito tambm se pode situar num plano poltico: ele serve ento para evitar a anarquia e o caos e para combater o despotismo e esclarecer o Estado de Direito.Daniel Filipe Bento Marques 11

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Superao da anarquia: A anarquia consiste na ausncia de poder poltico, uma sociedade livre de qualquer domnio. Dificilmente se podem encontrar exemplos concretos de sociedades anrquicas, exactamente porque toda a sociedade exige um conjunto, ainda que mnimo, de regras destinadas a possibilitar a convivncia social. O que h so sociedades em que transitoriamente reina a anarquia pela falta de um poder politico organizado e legtimo. Combate do despotismo: Caracteriza-se pela formulao arbitrria de regras jurdicas por um poder politico que no controlado. O direito obsta ao poder absoluto, definindo a repartio de poderes soberanos e a competncia dos rgos polticos e garantindo as liberdades cvicas. Subsidiariedade do direito: O direito necessrio em toda e qualquer sociedade, mas isso no significa que todas as relaes sociais devem ser reguladas pelo direito. O direito deve reger-se por um princpio de subsidiariedade, que assenta nas seguintes premissas: O direito no deve sobrepor-se a outras ordens normativas quando no houver que assegurar o cumprimento das suas regras por rgos do Estado. O direito pode destruir relaes sociais: basta pensar no que sucederia se uma promessa realizada entre amigos fosse tratada pela perspectiva do direito ou se o direito pretendesse regular o espao de intimidade e de privacidade que prprio da famlia. Proteco de bens jurdicos: O direito no deve intrometer-se em todos os aspectos da vida social, mas limitar-se a proteger certos bens os chamados bens jurdicos. Os bens jurdicos so, antes de mais, aqueles que satisfazem necessidades bsicas, como a sobrevivncia da pessoa e a sua realizao nos mais variados campos. Da posio do direito perante o bem jurdico decorrem vrias consequncias: Os bens jurdicos so protegidos atravs do direito constitucional e do direito penal; Os bens jurdicos so indisponveis, mesmo pelo seu titular exs.: bens pessoais e estados pessoais casado, solteiro, etc. Uma das consequncias da indisponibilidade do bem jurdico, a irrelevncia do consentimento do lesado na sua violao art. 340, n 2, CC; art. 38, CP.

Daniel Filipe Bento Marques

12

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Ordem jurdica e a ordem moral: As relaes entre o direito e a moral podem ser de coincidncia ou de no coincidncia: h regras jurdicas que concordam com as regras morais, mas tambm h regras jurdicas que divergem das regras morais ou que so moralmente neutras. As regras jurdicas podem coincidir com as regras morais de vrios modos: Pela incorporao das regras morais no direito transformao da moral em direito. O Direito Penal um ramo do direito onde a coincidncia entre a moral e o direito mais patente (ex.: proibio de matar, proibio de furtar, proibio de difamar); Pela concesso de relevncia jurdica a valorao quer morais (boa f), quer tico-sociais (bons costumes); Pela atribuio de relevncia jurdica a deveres morais, sem, no entanto, os transformar em deveres jurdicos, cuja caracterstica essencial a impossibilidade de exigir o seu cumprimento atravs dos tribunais. As regras jurdicas podem no coincidir com as regras morais, nomeadamente porque: H regras jurdicas que no tm qualquer correspondncia com as regras morais; H regras morais que no possuem qualquer correspondncia com as regras jurdicas; H regras morais que so contrariadas por regras jurdicas (ex.: a regra moral que justifica que se possa retirar aos ricos para dar aos pobres contrariada pela regra jurdica que probe o furto; as regras morais que probem o aborto ou a eutansia activa esto em confronto com as regras jurdicas que consideram lcita essas condutas) No h uma coincidncia necessria entre a ordem jurdica e a ordem moral. Isto justifica-se pela diferente perspectiva do direito e da moral no tratamento dos mesmos problemas: O direito preocupa-se com a convivncia em sociedade; para o direito, a proibio do homicdio justificada pela necessidade de assegurar a convivncia humana; A moral pretende orientar as conscincias para a realizao do bem; para a moral, a proibio do homicdio um imperativo tico imposto pelo amor devido ao prximo.

Daniel Filipe Bento Marques

13

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Esta diferena de perspectivas entre a moral e a ordem jurdica justifica que possa ser imposta uma responsabilidade jurdica mesmo quando no haja qualquer responsabilidade moral. Apesar de no haver uma concordncia entre o direito e a moral, isso no significa que o direito deva ficar indiferente perante a moral. Duas regras devem ser observadas nesta matria: O direito no deve contrariar a moral, isto , no deve impor o que imoral ou proibir o que moral; Mas o direito tambm no tem que receber toda a moral, ou seja, o direito no tem que procurar impor pelas suas regras tudo o que moral; dois princpios devem ser seguidos nesta matria: - Principio da necessidade: o direito s deve receber as regras morais que sejam necessrias convivncia social - Principio da universalizao: o direito s deve receber as regras morais que possam ser aceites consensualmente por todos, independentemente das suas vises do mundo e das suas orientaes religiosas. O que acaba de ser afirmado coincide com a tese da separao entre o direito e amoral, dado que nem tudo o que moral deve ser tutelado e protegido pelo direito. A separao entre o direito e a moral pode ser obtida atravs de duas vias: o direito pode limitar-se a permitir tanto o que moral, como o que imoral, deixando ao individuo a opo do seu comportamento; o direito pode considerar o que indiferente o que imoral, no tomando qualquer posio perante u comando ou proibio moral. A separao entre o direito e a moral no pode fazer esquecer que, nos tempos actuais, a moral coloca alguns desafios ao direito. Basta pensar nos problemas que so levantados por realidades como: - A reproduo mdica assistida; - A interrupo voluntria da gravidez; - A Biotecnologia (produo de transgnicos; investigao sobre o genoma humano; decifrao do cdigo; investigao sobre clulas terminais); - As decises sobre a vida e a morte, quer prpria, quer alheia (problema da eutansia activa). Critrios de distino: Tanto a moral como o direito correspondem a ordens normativas, coloca-se o problema de saber como pode realizar-se a sua distino. so vrios os critrios que tm sido utilizados para procurar estabelecer esse distino. Critrios inaceitveis: Alguns dos critrios propostos para distinguir a moral do direito so claramente inaceitveis. So eles os seguintes: O critrio do destinatrio das regras jurdicas e das regras morais: as regras jurdicas tm como destinatrio a pessoa na sua relao com outros e as regras morais tm por destinatrio a pessoa isolada. No aceitvel porque nenhuma pessoa vive isolada e a solidariedade com os outros tambm uma virtude moral.Daniel Filipe Bento Marques 14

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

O critrio da origem das regras jurdicas e das regras morais: o direito tem uma origem heternima (exterior ao sujeito) e a moral, uma origem autnoma (definida pelo sujeito). Tambm no aceitvel, seja porque a ordem moral no pelo menos em parte criao do sujeito, seja porque o sujeito pode criar o direito atravs da chamada autonomia negocial ou contratual.

Critrio proposto: A distino entre o direito e a moral pode ser realizada atravs do critrio da exterioridade das regras jurdicas (o direito ocupa-se dos comportamentos exteriorizados e do lado externo das condutas) e da interioridade das regras morais (a moral preocupa-se com a inteno do agente e com o lado interno da conduta). Aparentemente, tambm este critrio inaceitvel, como parece decorrer das seguintes observaes: - No exacto que o estado anmico (psicolgico) do agente seja irrelevante para o direito, por exemplo: * A conduta do agente pode ser dolosa (se o agente tem a inteno de provocar um certo resultado) ou negligente (se o agente no tem a inteno de produzir um resultado, mas este verifica-se como consequncia da violao de um dever de cuidado ou de diligncia). A diferena entre actuao dolosa ou actuao diligente pode ser importantes consequncias; * O direito valora negativamente a declarao que emitida sob coaco fsica ou moral ou em erro motivado por dolo do declaratrio ou de terceiros exactamente porque a coaco ou o dolo levam o declarante a emitir uma declarao que no tem inteno de exteriorizar. - Tambm no exacto que a exteriorizao da conduta seja irrelevante para a moral; a inteno no chega, pois que melhor do que pensar em fazer fazer efectivamente. Em todo o caso, o critrio acima referido permite uma distino entre o direito e a moral nos seguintes termos: Para o direito, a exteriorizao sempre necessria e a mera inteno ou a falta de inteno, quando no exteriorizada, nunca so juridicamente relevantes; o direito no se ocupa de estados anmicos que no tenham sido exteriorizados. Para a moral, a inteno sempre relevante e pode mesmo ser suficiente. Para a moral, a falta de inteno sempre relevante, mesmo que a conduta esteja de acordo com a moral.

Daniel Filipe Bento Marques

15

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Ordem jurdica e fontes de direito: Fontes de Direito pode ser tomada nos seguintes sentidos: Num sentido histrico so os antecedentes histricos do direito vigente; Num sentido sociolgico so as circunstancias histrico-sociais que motivaram a produo de determinadas regras juridicas. Num sentido orgnico so os rgos que produzem as regras juridicas; Num sentido tcnico-jurdico so os modos de formao (so perspectivadas como um processo, isto , atravs do processo que conduo formao de regras juridicas) e de revelao (so consideradas como um resultado, isto , como o resultado de formao de regras juridicas) das regras juridicas. So vrias as respostas possveis questo de saber quais so, num determinado ornamento, as fontes do direito num sentido tcnico-jurdico: O direito constitui-se atravs de decises de rgos polticos; O direito forma-se atravs das decises proferidas pelos tribunais na apreciao dos casos concretos. O direito constitui-se atravs do costume, ou seja, atravs de uma prtica reiterada que observada na sociedade com a convico de que ela corresponde a um dever ser. Ordem jurdica e regras juridicas: Relativamente s relaes entre a ordem jurdica e as regras juridicas, so possveis duas posies: Uma posio normativista, a ordem jurdica reconduz-se ao conjunto de regras juridicas; um complexo de regras juridicas, pelo que a soma das regras juridicas constitui a ordem jurdica; Uma posio no normativista, a ordem jurdica mais do que um conjunto de regras juridicas nela existentes, pelo que as regras juridicas so apenas um dos componentes da ordem jurdica, que, em si mesma, comporta ainda outras elementos alm dessas regras. De acordo com a posio no normativista de Oliveira Ascenso, as regras juridicas no compem a ordem jurdica, antes so expresso dessa mesma ordem. Quer dizer: a ordem jurdica um envolvente que d origem s regras juridicas, pelo que estas regras so realidades normativas que do expresso a uma realidade normativa mais vasta que engloba: - as instituies; - os rgos; - as fontes de direito; - a vida ou actividade jurdica; - as situaes juridicas, como o direito subjectivo.

Daniel Filipe Bento Marques

16

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Critica: No o direito que deve ser extrado da regra, mas a regra que deve ser extrada do direito e das respectivas fontes. Portanto, o ponto de partida sempre o direito e nunca a regra, pelo que o direito no pode ser confundido com a regra jurdica. No h qualquer espao da ordem jurdica que no seja ocupado por regras juridicas; O que no abrangido por regras juridicas constitui o espao livre do direito ou a zona de metajuridicidade; o que est fora das regras juridicas no direito, mas nodireito. Por isso, sem negar o papel das instituies, dos rgos e da vida jurdica, para a formao e aperfeioamento do direito, no parece aceitvel que a ordem jurdica possa ser mais do que um conjunto de regras que brotam das fontes de direito e que regulam as instituies, regem os rgos, alimentam a vida jurdica ou definem as situaes juridicas. Tudo o que feito na ordem jurdica decorre da aplicao de regras juridicas ou desencadeia a aplicao de regras juridicas. Imperatividade do direito: A ordem jurdica uma ordem normativa e tal como todas as demais uma ordem imperativa. A ordem jurdica estabelece um determinado dever ser e espera que os agentes actuem de acordo com esse dever ser. Isto coloca a questo de saber o que sucede quando o dever ser determinado pela regra jurdica no observado. A da ordem jurdica orienta pelos seguintes parmetros: - Nalguns casos, o direito limita-se a atribuir um certo desvalor ao acto jurdico que foi realizado; portanto, uma das consequncias da imperatividade do direito a atribuio de um desvalor ao acto antijurdico. - Noutros casos, comina a aplicao de uma sano ao autor do acto; o direito pode querer atingir o prprio agente, pelo que outra das consequncias da imperatividade a imposio e aplicao de uma sano quele que violou o direito. Coaco e coercibilidade: A imposio de uma sano ao agente que viola o dever ser mostra que a ordem jurdica uma ordem coactiva. Essa ordem impe uma sano para a violao do dever ser, pelo que coage os agentes a respeitarem o direito. Estabelecida a sano que corresponde violao do dever ser, ainda necessrio que essa sano seja efectivamente aplicada. a coercibilidade a susceptibilidade de impor pela fora o cumprimento da sano. Caractersticas da ordem jurdica: - h que distinguir a imperatividade, a coaco e a coercibilidade: A imperatividade manifesta-se na prescrio de um dever ser e na reaco contra a violao desse dever ser. A coaco exprime-se na imposio de uma sano ao agente que viola uma regra jurdica; A coercibilidade manifesta-se na efectivao da sano que imposta ao agente que infringiu uma regra jurdica.

Permite concluir que a ordem jurdica simultaneamente uma ordem imperativa, coactiva e coerciva.Daniel Filipe Bento Marques 17

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Desvalores jurdicos: A actuao dos sujeitos jurdicos tem certos limites, pelo que nem tudo o que eles fazem pode ser valorado pelo direito. Os valores jurdicos negativos so os seguintes: ilegalidade; ilicitude; ineficincia lato sensu. Objectos dos desvalores: Podem incidir sobre condutas ou sobre actos jurdicos que decorrem dessas condutas. Assim, em concreto: A ilegalidade e a ilicitude so desvalores de condutas que decorrem da infraco de normas de comportamento; A ineficincia lato sensu um desvalor dos prprios actos jurdicos; de uma conduta resulta um acto jurdico sendo a esse acto que cominado o desvalor de ineficincia. Desvalores de conduta: Ilegalidade: a contrariedade de uma conduta ao direito. um desvalor com algum carcter residual e por isso com pouca expresso na ordem jurdica. Ilicitude: a desconformidade de uma conduta com o direito que passvel de um juzo de censurabilidade assente na culpa do agente. a prtica de um acto ilcito que implica responsabilidade civil, disciplinar, contra-ordenacional ou penal do agente. Exemplo: art. 483, n 1, CC. Uma s conduta pode originar vrios tipos de responsabilidade. Desvalores dos actos jurdicos: Ineficcia lato sensu: a insusceptibilidade de um acto jurdico produzir efeitos jurdicos. A ineficcia lato sensu comporta as seguintes modalidades: - Inexistncia jurdica; - Invalidade; - Ineficcia stricto sensu. Inexistncia jurdica: a forma mais grave da ineficcia lato sensu. Juridicamente, considera-se que nada existe (art. 1628, alnea E, CC). Invalidade: a desconformidade do acto com o direito menos grave do que a inexistncia jurdica. Comporta as modalidades nulidade (decorre da violao dos interesses mais relevantes, por, isso, invocada a todo o tempo e pode ser conhecida oficiosamente pelo tribunal mais grave) e de anulabilidade (decorre da violao de interesses menos relevantes; por isso, a anulabilidade tem de ser arguida pelos interessados num determinado prazo e sanvel pelos interessados mediante confirmao ou ratificao menos grave).

Daniel Filipe Bento Marques

18

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Ineficcia stricto sensu: O acto pode no ser nem inexistente, nem valido, mas meramente ineficaz. Surge na maior parte dos casos como uma situao de inoponibilidade de um acto (existente e vlida) a certas pessoas. Sanes juridicas: o meio a que o direito recorre para impor o cumprimento ou evitar o incumprimento de uma regra jurdica: esse meio normalmente a imposio de uma desvantagem ao infractor da regra, mas tambm pode consistir na atribuio de uma vantagem a quem observou a regra. A sano manifesta a reprovao da ordem jurdica perante a conduta anti-jurdica e anti-social do infractor, porque, para a ordem jurdica no indiferente que o agente opte por observar a regra ou sujeitar-se sano. As sanes podem prosseguir as seguintes finalidades: - Finalidade preventiva, quando as sanes procuram obstar violao do direito; - Finalidade repressiva, quando as sanes visam impor uma pena ao infractor; - Finalidade de restituio, quando as sanes visam reconstruir a situao que existia antes da violao das regras. Independentemente de terem uma finalidade repressiva ou de restituio, todas as sanes prosseguem igualmente uma finalidade preventiva, j que o receio da sua cominao conduz o potencial violador e, em geral, todos os membros da sociedade a procurar evitar a violao da regra. Regras sancionatrias: A sano um efeito jurdico definido por uma regra jurdica. No existe, no entanto, unanimidade sobre qual seja esta regra jurdica: Pode entender-se que a sano decorre de uma regra autnoma (definem a conduta que obrigatria ou proibida e outras regras), complementar ou subsidiria - determinam a respectiva sano na hiptese de desrespeito do comportamento devido. Assim, em concreto: - A norma de comportamento define a conduta obrigatria ou proibida; - A regra sancionatria determina a sano aplicvel no caso de violao da norma de comportamento. Pode igualmente entender-se que no h qualquer diferena entre as regras sancionatrias e as normas de comportamento, no sentido de que toda a regra sancionatria tambm uma norma de comportamento. Esta separao entre as normas de comportamento e as regras sancionatrias no parece aceitvel, porque toda a regra sancionatria contm igualmente uma norma de comportamento, ou seja, de toda a regra sancionatria possvel extrair qual o comportamento devido. A regra sancionatria e a regra de comportamento distinguem-se apenas pelos respectivos destinatrios directos: a regra sancionatria dirige-se ao rgo ou entidade que tem que aplicar a sano, a regra de comportamento, quando aparece separada da regra sancionatria, dirige-se ao agente da conduta.

Daniel Filipe Bento Marques

19

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Modalidades das sanes: As sanes podem ser positivas ou premiais (so aquelas que atribuem uma vantagem a quem observa a regra jurdica) e negativas (so aquelas que atribuem uma desvantagem ao infractor ou transgressor da regra jurdica). Sanes negativas: As sanes negativas comportam os seguintes tipos: sanes preventivas; compulsrias; reconstitutivas; compensatrias e punitivas. Sanes preventivas: so aquelas que visam prevenir a violao futura do direito. Ex.: - No mbito geral, a Liberdade Condicional; - No mbito civil, podem ser referidos os seguintes exemplos: art. 781; 934 CC. Sanes compulsrias: so aquelas que se destinam a levar o infractor a adoptar, depois de a infraco j ter sido cometida, o comportamento devido. No dispensam a colaborao volitiva do infractor no cumprimento da regra. (direito de reteno art. 754, CC). Sanes reconstitutivas: so aquelas que se destinam a reconstruir a situao que existiria sem a violao da regra jurdica, ou seja, a situao que existiria se o agente no tivesse violado o direito. Exemplos: - Reconstituio natural ou indemnizao especifica ( a forma de reparao de um dano atravs da reposio do lesado na situao que existiria se a leso se no tivesse verificado (art. 562, CC); - Execuo especifica (consiste em obter, atravs do recurso ao tribunal, a prestao a que o devedor est obrigado. Ex.: 827 e 828 CC). - Reintegrao ou restituio da posse (aquele que tiver sido desapossado de um bem tem o direito de ser reintegrado na sua posse at se determinar a titularidade do direito (art. 1278, CC). Sanes compensatrias: so aquelas que se destinam a colocar numa situao equivalente quela que existiria se no tivesse ocorrido a violao do direito. Tm por finalidade atribuir ao lesado um sucedneo dessa mesma situao. Operam atravs da imposio de uma obrigao de uma indemnizao do lesado que fixado em dinheiro. Do disposto no art. 566 CC resulta que as sanes compensatrias so subsidirias das obrigaes reconstitutivas, dado que a indemnizao s fixada em dinheiro nos seguintes casos: Quando a reconstituio natural no seja possvel; Quando a reconstituio natural no repare integralmente os danos; Quando a reconstituio natural seja excessivamente onerosa para o devedor. A indemnizao em dinheiro pode reparar os seguintes danos: Danos no patrimoniais ou morais, ou seja, danos resultantes da leso de bens sem expresso econmica (ex.: art. 483 e 496/1 CC); Danos patrimoniais, isto , danos provocados em bens que podem ser economicamente avaliados (ex.: 483/1 CC).20

Daniel Filipe Bento Marques

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Sanes punitivas: consistem na imposio de uma pena ao infractor ou transgressor do direito. Atendendo ao respectivo domnio de aplicao, as penas podem ser: civis; disciplinares; contra-ordenacionais ou criminais: As penas civis so aquelas que valem no domnio do direito civil; podem ser dados os seguintes exemplos de penas civis: art. 2034, CC; art. 1913, CC; art. 1604, alnea A, CC. Uma pena disciplinar aquela que corresponde a uma infraco disciplinar e que aplicada por entidades providas de poder disciplinar. A pena contra-ordenacional a coima; consiste num montante pecunirio que deve ser pago pelo infractor; A pena criminal aquela que aplicada ao agente do crime; pode ser uma pena de priso, de multa, de prestao de trabalho a favor da comunidade e de admoestao. Imperatividade e coaco a distino entre imperatividade e coaco a seguinte: A imperatividade exprime-se na prescrio de um dever ser; A coaco manifesta-se na imposio de uma sano no caso de violao do dever ser. Normalmente, a imperatividade acompanhada da definio de uma sano (imperatividade coactiva); mas h alguns casos excepcionais em que isso no sucede (imperatividade no coactiva). Imperatividade coactiva Circunstancia de a coaco se manifesta na aplicao de uma qualquer sano no impede que se considere separadamente duas situaes: - Aquela na qual a coaco se traduz na aplicao de sanes com expresso fsica; - Aquela na qual a coaco significa a aplicao de sanes sem expresso fsica. Coaco fsica: Possibilidade de aplicao de sanes com expresso fsica uma caracterstica da generalidade das ordens juridicas. Coaco no fsica: nem todas as sanes implicam o recurso fora, pelo que tambm importa considerar as situaes em que a imperatividade no acompanhada da aplicao de sanes com expresso fsica. isso sucede, em especial: - No mbito das instituies, nas quais se justificam apenas sanes de carcter institucional; - Em algumas ordens juridicas, como, por exemplo, aquela que regulada pelo direito cannico atribui Igreja o direito originrio e prprio de punir com sanes penais os fiis delinquentes. Imperatividade no coactiva: Em casos excepcionais, a imperatividade no acompanhada de qualquer sano, pelo que se trata de uma imperatividade no coactiva: est definido um dever ser, mas no existe qualquer sano aplicvel na hiptese da sua violao. Um dos raros exemplos encontra-se mas obrigaes naturais. Estas obrigaes fundam-se num mero dever de ordem moral ou social e correspondem a um dever ser de justia, mas o seu cumprimento no judicialmente exigvel (art.402CC). As dvidas de jogo constituem um dos raros exemplos de obrigaes naturais (art. 1245. CC).Daniel Filipe Bento Marques 21

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Imperatividade e coercibilidade: A coercibilidade a susceptibilidade de aplicar uma sano jurdica pela fora. A coero o uso da fora na aplicao de uma sano jurdica. A coero s conduz aplicao de uma regra jurdica quando a sano a aplicar for uma sano preventiva ou compulsria. A coero nunca visa impor o respeito de uma regra jurdica, mas aplicar, se necessrio pela fora, uma sano jurdica. Coero e poder: A coero pressupe o exerccio do poder do uso da fora. Nas sociedades modernas, esse poder compete ao Estado, que reivindica o monoplio do uso da fora. Este monoplio tem um duplo sentido: Num sentido positivo, esse monoplio significa que o Estado se substitui a qualquer outra entidade no uso da fora que necessrio coero; Num sentido negativo, esse monoplio significa que o Estado no tolera que qualquer outra entidade possa usar a fora para exercer a coero. Coaco com coero: Dado que a coaco resulta da imposio de uma sano e a coero consiste na aplicao dessa sano pela fora, pode concluir-se que a coao completada pela coero. Em concreto, pode afirmar-se o seguinte: - Primeiro, define-se a sano, ou seja, coage-se o agente a actuar de certa forma sob a ameaa da aplicao de uma sano; - Depois recorre-se coero para aplicar a sano ao agente que infringiu a regra jurdica ou que importa acautelar que no viole o direito. Torna-se igualmente claro que a coaco pretende levar o agente a orientar a sua conduta pelo direito e que a coero s actua quando agente viola a regra. Importa considerar quanto s relaes entre a coaco e a coero as seguintes situaes: - Quando a sano tiver expresso fsica conduz necessariamente ao uso da coero contra o infractor. - Quando a sano no tiver expresso fsica, a coaco no necessariamente acompanhada pela coero contra o infractor. Coaco sem coero: Certas ordens juridicas no comportam coero: o caso do direito cannico, dado que a ordem jurdica cannica no comporta qualquer autoridade que possa exercer a coero, nomeadamente para impor o cumprimento de sanes com expresso fsica. Problema da coero: as regras de coero podem impor um comportamento ao agente a quem compete impor a coero e portanto podem ser violadas por esse mesmo agente o que origina a aplicao de uma sano a esse sujeito. Coero sobre coero: Se algum est sujeito coero, compete a uma autoridade estadual o exerccio do poder de coero; mas se essa prpria autoridade estadual est sujeita coero, cabe perguntar a quem cabe exercer esse poder coercivo. O problema pode ainda tornar-se mais complicado quando a sano recair sobre o prprio Estado e for sobre este que dever incidir a coero.Daniel Filipe Bento Marques 22

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Ordem jurdica e a tutela jurdica: O ornamento jurdico portugus admite dois tipos de tutela jurdica: - Hetero-tutela (aquela que realizada por uma entidade que no o titular do direito subjectivo); - Auto-tutela (aquela que realizada pelo prprio titular do direito subjectivo) Hetero-tutela: Quando se fala em hetero-tutela est-se a falar da tutela realizada atravs dos tribunais estaduais (rgo imparcial e independente), mais concretamente aqueles que so referidos no art. 202, CRP. Qualquer titular de direitos subjectivos pode recorrer aos tribunais para assegurar os seus direitos, sejam eles tribunais estaduais ou arbitrais. Os tribunais arbitrais podem ser voluntrios (tribunais constitudos por particulares aos quais estes recorrem mediante acordo prvio entre as partes) e necessrios (so aqueles que a lei impe situao no muito frequente). Auto-tutela jurdica: s situaes de tutela opem-se as situaes de auto-tutela. Costuma dizer-se que estas situaes so particularmente frequentes nas sociedades primitivas. Contudo, certo que a evoluo histrica fez permanecer a hetero-tutela sobre a auto-tutela. Assim sendo, os casos em que se admite auto-tutela so situaes muito particulares, com justificao especial; essas modalidades so quatro: Estado de necessidade situao de constrangimento em que fica quem sacrifica coisa alheia com o fim de afastar um perigo actual de um prejuzo manifestamente superior. Actua-se por iniciativa prpria e como meio de defesa para afastar um perigo que pode ter variada provenincia, mas nunca a agresso de outrem. Art. 339/1, CC Legitima defesa situao em que se considera justificado o acto destinado a afastar qualquer agresso dirigida contra o agente ou terceiro, desde que na agresso e na defesa se verifiquem os requisitos que a lei enumera: agresso actual e ilcita; defesa necessria e proporcional. Art. 337, CC. Direito de Resistncia reaco contra uma agresso aos direitos, liberdades e garantias dos seres humanos. Art. 21, CRP. Aco directa situao em que se considera justificado o recurso fora com o fim de preservar ou realizar o prprio direito, quando se verifica a impossibilidade de recorrer em tempo til aos meios coercivos normais e desde que o agente use da fora apenas na medida necessria para evitar o prejuzo. Art. 336, CC. Ordem jurdica e sistema jurdico: Sistema Jurdico um sistema unitrio e coerente de regras juridicas que se distingue dos outros sistemas por um critrio prprio de pertena das regras que o compem. Dentro do sistema jurdico temos trs conceitos para analisar: - Os elementos que compem o sistema jurdico regras juridicas; - Os elementos que atribuem carcter unitrio e coerente ao sistema jurdico princpios jurdicos; - Os elementos que atribuem carcter de pertena de uma regra jurdica ao sistema jurdico critrio da verdade.

Daniel Filipe Bento Marques

23

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Regras jurdicas: So enunciados que se extraem das fontes de direito. As regras juridicas comportam trs elementos: Previso elementos da regra da qual derivam duas coisas: o destinatrio da prpria regra; o facto ou situao da qual se pressupe a aplicao da norma. Estatuio juridica elemento da norma que define o prprio efeito jurdico que decorre da aplicao da norma; Operador dentico elemento da norma que define a relao entre previso e estatuio, relao essa que pode ser uma relao de comando; uma relao de proibio; e uma relao de permisso. Princpios jurdicos: Enunciados valorativos uma vez que os princpios encerram sempre uma valorao. So enunciados de valor destinados optimizao da organizao social, sendo um instrumento para obter este fim. So susceptveis de serem consagrados na ordem juridica com valoraes diferentes. Como tal, possvel concluir que na ordem juridica existem determinados valores que so absolutos. Tendo em conta esta concluso, os princpios jurdicos so sempre algo com diferentes consagraes, isto , so sempre relativos, conduz-nos a uma outra concluso: os valores absolutos da ordem juridica no so princpios porque no so susceptveis de serem relativizados. Estes podem distinguir-se em Princpios Jurdicos Formais definem determinados fins e objectivos. So princpios-valor, uma vez que definem que o legislador deve procurar atingir. Existem trs ideias fundamentais que correspondem aos princpios formais: - Principio da Justia que concretizam-se em dois sub-princpios: Principio da igualdade (art. 13/2, CRP) e o principio da proporcionalidade (os meios utilizados devem ser adequados e proporcionais aos fins que se pretende atingir ou realizar). - Principio da Segurana juridica - o sistema jurdico deve conferir confiana e previsibilidade. - Princpio da eficincia o sistema jurdico deve procurar obter a melhor organizao social com o menor dispndio de recursos. Princpios Jurdicos Materiais concretizam os fins e objectivos definidos pelos princpios formais, na medida em que definem o plano pelo qual se orientam as condutas que so permitidas, proibidas ou obrigatrias para se atingirem esses fins e objectivos; so princpios-regra, uma vez que tm uma estrutura semelhante das regras juridicas. Critrio da validade: um conceito jurdico fundamental, pois para que o sistema jurdico seja vlido necessrio que comporte regras vlidas. A validade do sistema jurdico pode ser analisada atravs de duas perspectivas: - Se tentarmos fundamentar a validade do sistema jurdico atravs da validade das regras juridicas que se compem, o que est em causa saber se essas regras so vlidas; para tal necessrio conjugar dois pressupostos: competncia do rgo que emite a regra; observncia do prprio procedimento legislativo. - Se tentarmos fundamentar a validade do sistema jurdico na sua prpria globalidade a resposta mais complexa, pois agora trata-se de justificar com o sistema jurdico vlido na sua globalidade e no atravs das suas regras.Daniel Filipe Bento Marques 24

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Unidade do Sistema Jurdico: Para a unidade do sistema jurdico contribuem fundamentalmente, os princpios jurdicos pois o que com eles for coerente tambm coerente com o sistema assegurado, assim, a sua unidade. Os princpios jurdicos so hierarquicamente superiores s regras juridicas. A unidade do sistema jurdico decorre da sua perspectivao prtica, isto , do seu prprio funcionamento; como tal para assegurar o sistema jurdico seja uno necessrio que se verifique a resoluo das contradies entre regras juridicas; que as regras juridicas sejam produzidas com base noutras regras; que exista uma aplicao das normas ao caso concreto e que se verifique uma abertura do sistema jurdico a outros sistemas. Resoluo de contradies entre regras juridicas: O sistema jurdico no pode comportar normas contraditrias pois para serem contraditrias porque uma delas h-de ser invlida ou deixou de vigorar. Existem trs regras para a resoluo de conflitos entre regras juridicas: Regra de hierarquia superior prevalece sempre sobre a regra de hierarquia inferior; Prevalncia da regra posterior sobre a regra anterior; Prevalncia da regra especial sobre a regra geral. Produo das regras juridicas com base noutras regras juridicas: Do prprio sistema jurdico se produz Direito e disso se pressupe que o Direito que produzido pelo sistema jurdico produzido segundo as suas prprias regras, mantendo o sistema jurdico uno. Aqui se faz referencia a uma caracterstica do sistema jurdico: o seu carcter autopoitico (este carcter advm de duas ideias: a competncia para elaborar regras juridicas consta de outras regras juridicas; a prpria validade das regras aferida em funo de outras regras). Aplicao das normas ao caso concreto: O que est em causa a relevncia do pensamento sistemtico, isto , a relevncia do pensamento do Direito enquanto sistema para o prprio Direito: - Interpretao da lei (art. 9/1, CC): quando se interpreta a lei deve-se ter em conta que o resultado tem de ser coerente com o sistema jurdico; como tal, o critrio de interpretao da lei baseia-se na unidade do sistema. - Integrao de lacunas (art. 10, CC): para integrar lacunas o primeiro critrio o da analogia; na sua falta, o segundo critrio a coerncia dentro do sistema jurdico. - Orientao dada pelo legislador (art. 8/3, CC): a aplicao da norma tem que ser coerente com outras aplicaes. Abertura do sistema jurdico a outros sistemas normativos: O sistema jurdico no um sistema fechado que no comunica com outros sistemas normativos; pelo contrrio, ele um sistema aberto que recebe a influncia de outros sistemas normativos. Encontramos essas manifestaes quando o sistema jurdico utiliza conceitos indeterminados (boa-f e os bons costumes que pertencem ordem moral) que necessitam de valorao e que so conceitos pertencentes a outras ordens normativas.

Daniel Filipe Bento Marques

25

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Direito Pblico e Direito Privado:O Direito Pblico definido por respeitar organizao do Estado e a disciplina da sua actividade. O Direito Privado definido por respeitar utilidade dos particulares. S nos interessa porm acentuar que estes dois pontos de vista esto na origem das concepes fundamentais sobre o critrio desta classificao. De facto, defrontam-se dezenas de critrios, mas os principais so trs: 1. Critrio do interesse: O Direito Pblico visar satisfao de interesses pblicos e o Privado satisfao de interesses privados. Mas este critrio insustentvel. O interesse pblico corresponde, pelo menos indirectamente, aos interesses particulares; os interesses particulares so protegidos porque h um interesse pblico nesse sentido. certo que se procurou reformular este critrio, dizendo-se que direito pblico seria aquele que servisse predominantemente, ou essencialmente, a prossecuo de interesses pblicos, e direito privado o que, nas mesmas condies de prevalncia, servisse interesses privados. Mas ento, a determinao dos ramos do Direito, que uma operao pragmtica destinada a permitir o estudo em melhores condies do material jurdico, passa a estar dependente de difceis e arriscadas valoraes sobre o interesse que em cada caso se apresenta como prevalente. 2. Critrio da qualidade dos sujeitos: Seria pblico o direito que regulasse situaes em que interviesse o Estado, ou em geral qualquer ente pblico; privado, o direito que regulasse as situaes dos particulares. Este critrio tambm inaceitvel. O Estado e os demais entes pblicos podem actuar nos mesmos termos que qualquer outro sujeito, utilizando as mesmas armas que os particulares. No pelo facto de os entes pblicos celebrem compras e vendas, por exemplo, que as respectivas regras deixam de ser Direito Privado e passam a ser Direito Pblico. 3. Critrio da posio dos sujeitos: Segundo este critrio, o Direito Pblico ser o que constitui e organiza o Estados e outros entes pblicos e regula a sua actividade como entidade dotada de Ius Imperii; Direito Privado o que regula situaes em que os sujeitos esto em posio de paridade. Este nos parece o critrio que mais til e correctamente explica a diviso tradicional. O Direito Privado no pode ser considerado o direito dos egosmos individuais, como o Direito Pblico no pode ser considerado o direito das relaes de dominao. So ambos indispensveis e entre si complementares.

Daniel Filipe Bento Marques

26

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Ramos do Direito Pblico: Direito Fiscal (regula a criao de impostos e a sua recolha); Direito Penal (determina os pressupostos do crime; um direito tipificado, ou seja, s crime o que a lei diz e a encontramos a definio das consequncias); Direito Contra Ordenacional (direito sancionatrio a consequncia e a aplicao de uma coima); Direito Processual (conjunto de normas jurdicas que regulam o processo, isto , determinam o conjunto de formalidade que devem ser desenvolvidas em tribunal para a resoluo de um litgio). Ramos do Direito Privado: (distingue-se em direito privado comum Direito Civil e especial todos os outros que no so direito civil). Direito Civil (conjunto de normas que regulam os direitos das pessoas como particulares, bem como as relaes patrimoniais que estabelecem entre si, desde que no tenha por objecto actos de comrcio): - Direito das Obrigaes; - Direitos Reais; - Direito da Famlia; - Direito das Sucesses. Direito Privado Especial: - Direito Comercial (conjunto de normas que regulam as relaes entre os indivduos enquanto comerciantes e que tem por objectivo actos do comrcio); - Direito do Trabalho (conjunto de normas que regulam as relaes do trabalho subordinado perante outrem). Direito Internacional (direito relacionado com o uso de instituies); Direito Comum (regula matria fora de qualquer instituio).

Direito Comum e Direito Institucional:No ponto de vista cientifico: deveriam dividir-se os ramos do direito em ramos de direito comum e ramos de direito institucional. Os vrios ramos do direito podem referir-se ou no a instituies. A figura da instituio apresenta-se como decisiva. Assim, o Direito da Famlia regula a instituio familiar; o Direito Pblico afinal o direito que regula a instituio Estado, no sentido mais utilizvel da expresso; e assim por diante. Grande nmero de regras no esto por si ligadas a nenhuma instituio em particular, estabelecem antes princpios tcnicos que podem ser aplicados independentemente, ou submetidos aos fins de uma instituio. Assim, as matrias que estudamos nesta introduo so de direito comuns. E de direito comum o que respeita Teoria Geral do Direito Civil. So depois retomadas pelos ramos institucionais do direito, e a adaptadas de modo a servirem finalidades especficas.

Daniel Filipe Bento Marques

27

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

No ponto de vista pragmtico a posio diferente. Continuaremos a falar de Direito Pblico e de Direito Privado e a distinguir os vrios ramos por referncia quela diviso fundamental. Isso levar por arrastamento a que utilizemos na subdiviso do direito privado um critrio pouco cientfico, a chamada classificao germnica das relaes jurdicas. Dois ramos porm tero de ficar de fora, pois no cabem de toda a maneira, nem no direito pblico, nem no direito privado. Referimo-nos ao Direito Internacional Pblico e ao Direito dos Organismos Intermdios.

Fontes do Direito:Sentido Histrico corresponde aos antecedentes histricos do direito vigente; Sentido Sociolgico circunstncias histrico sociais que mantiveram a produo de uma determinada regra jurdica; Sentido orgnico rgos que produzem as regras jurdicas; Sentido tcnico jurdico modos de revelao das regras jurdicas. Espcies de fontes critrios: Critrio do modo de formao das fontes: Intencionais ou voluntrias (tem por base um acto jurdico); No intencionais ou involuntrias (tem na origem um facto jurdico, um facto no voluntrio. Ex.: Costume). Critrio quanto eficcia: Fontes mediatas (so fontes de direito porque outras fontes do direito classificam-nas como tal. Ex.: art. 3/1 CC usos); Fontes imediatas (so fontes de direito por si prprias. Art. 1 CC leis e normas corporativas). Critrio quanto sua origem: Origem interna (ex.: lei feita pela a Assembleia da Repblica. So elaboradas pela ordem jurdica portuguesa); Origem externa (ex.: Regulamentos da Unio Europeia. So incorporadas na ordem jurdica portuguesa). No Fontes do Direito: Doutrina trabalho dos jurisconsultos sobre a lei e as disposies legais. Jurisprudncia actividade exercida pelos tribunais para a resoluo de casos concretos.

Daniel Filipe Bento Marques

28

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Jurisprudncia constante espcie de modelo para outras decises anlogas. Quando os tribunais decidem constantemente casos idnticos de forma igual. Desta forma garante-se a igualdade para julgar casos anlogos. Poupa os trabalhos aos tribunais e h segurana jurdica porque as decises so previsveis e h tambm uma interpretao e integrao uniforme da jurisprudncia. No fonte de direito porque no obrigatria. reas importantes da jurisprudncia: Adaptao dos textos legais actualidade; Concretizao dos conceitos indeterminados (ex.: juzo manifestamente superior; costumes; boa f); Preenchimento de lacunas. NOTA: como no fonte de direito, qualquer tribunal pode decidir casos semelhantes, de forma diferente se assim o decidir, caso se vier uma deciso por via de recurso. Jurisprudncia uniformizada mecanismos que pretendem uniformizar a prpria jurisprudncia. O tribunal fixa a jurisprudncia para casos semelhantes. o tribunal de justia a quem compete a uniformizao da jurisprudncia para os tribunais inferiores. No fonte de direito porque no obrigatria. Equidade justia dos casos concretos. No fonte de direito porque, sendo a equidade a justia dos casos concretos no possui as caractersticas da generalidade a da abstraco das normas jurdicas. Fontes de Direito no ordenamento Jurdico Portugus: Fontes externas: Direito Internacional Pblico Geral/Comum: regula as relaes entre os Estados. So fontes de Direito Internacional Pblico: - Costume Internacional; - Princpios Gerais do Direito (art. 8/1 CRP); - Decises judiciais (jurisprudncia); - Doutrina dos juristas prestigiados de vrios Estados. Direito Internacional Pblico Convencional: so fontes do direito as Convenes Internacionais (art.8/1 CRP). Fontes de origem comunitria (U.E.): - Direito Comunitrio Originrio (art.8/4 CRP); - Direito Comunitrio Derivado: direito comunitrio produzido pelas prprias instituies comunitrias (Conselho Europeu; Comisso Europeia; Parlamento Europeu): * Regulamentos: tem um carcter geral e so directamente aplicados e obrigatrios por todos os ordenamentos jurdicos dos Estados Comunitrios;

Daniel Filipe Bento Marques

29

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

* Directivas: tm de ser transpostas pelos Estados Membros para vigorarem nos ordenamentos jurdico interno. Pode no vincular em todos os Estados membros, mas apenas no Estado membros destinatrio, quanto ao resultado. Quanto aos meios e forma deixa encarregue aos Estados; * Decises e Pareceres: no so vinculativos Fontes internas imediatas: (lei; Costume e normas corporativas) Lei enunciado lingustico que contm regras jurdicas. Em princpios, ou na sua maioria, so gerais e abstractas, mas existem regras que no o so. Ex.: Regras concretas e genricas (Estado de Sitio); Regras concretas e individuais (lei que atribui competncia para a regulamentao de determinada matria A.R. atribui competncia ao Governo para legislar em determinada matria).

Lei em sentido material qualquer enunciado lingustico que contm regras jurdicas gerais e abstractas. Lei em sentido formal lei que emana/provm de um rgo que tem uma funo legislativa (acto legislativo). Exige que tenha uma regra jurdica emanada por um rgo com competncia legislativa e no exerccio dessa mesma competncia legislativa. Lei em sentido material e formal: lei da Assembleia da Repblica; decreto lei do Governo. Lei em sentido material e no formal: decreto regulamentar do Governo; regulamentos das Autarquias Locais tm competncia administrativa e no legislativa e encontram-se consagrados no art. 112 CRP. Lei em sentido formal e no material: lei da Assembleia da Repblica que eleva categoria de cidade ou de uma vila. Actos normativos dois tipos: Actos legislativos s podem ser praticados por um rgo com competncia legislativa. Esto consagrados no art. 112 CRP. Os rgos com competncia so o Governo e a Assembleia da Repblica. Actos regulamentares decorre de uma competncia administrativa. Ex.: actos normativos emanados pelo Governo que tm o objectivo a boa execuo das funes administrativas (199/C CRP).

Actos regulamentares do Governo: - Decretos; - Decretos regulamentares; - Portarias.

Daniel Filipe Bento Marques

30

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Actos regulamentares produzidos pelas Regies Autnomas: - Posturas. Actos regulamentares da Administrao indirecta: - Avisos do Banco de Portugal; - Estatutos da Universidade de Lisboa; - Regulamento de avaliao da Faculdade; - Regimentos (definem o modo de organizao e funcionamento de um rgo colectivo); - Instrues (actos de carcter administrativo que regulam a organizao administrativa); - Despachos. Costume prtica reiterada com convico de obrigatoriedade e jurisdicidade. Pertence ordem do dever ser. Dois elementos: - Elemento fctico: uso (prtica social reiterada = fonte mediata); - Elemento normativo: convico de obrigatoriedade (O.A.) /jurisdicidade (T.S.). NOTA: a Jurisdicidade necessita da tutela jurdica a quem viole normas jurdicas atravs da aplicao de sanes jurdicas. A convico de obrigatoriedade suficiente para outras ordens jurdicas (social, moral). No exige a aprovao da tutela jurdica, ao contrrio da convico de jurisdicidade. Extino do Costume: - Desaparecimento do uso; - Desaparecimento da conveno social; - Apesar de haver o uso e a conveno social, desaparece a aprovao judicial. Uso prtica social reiterada. No acompanhada da convico de obrigatoriedade e jurisdicidade ao contrrio do costume. o elemento fctico do costume. fonte mediata do Direito na medida que a lei assim o permita. (218; 234; 1121; 1359 CC). Costume Secundem Legem costume segundo a lei. A regra consuetudinria coincide com a lei. Costume Prater Legem o costume no contraria a lei, mas vai alm dela. Tem por objecto matrias que a lei no regula. Costume que contempla a lei. No coincide mas completa. Costume Secundem Legem existncia de oposio/contradio entre a norma costumeira e a norma legal.

Daniel Filipe Bento Marques

31

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Desuso e costume contra legem: Quando h desuso, h uma grandeza meramente negativa. Pelo contrrio, no costume contra legem h um verdadeiro costume que se ope h regra jurdica. mais difcil de provar, visto supor a demonstrao da convico de obrigatoriedade, mas natural que actue mais energicamente, pois h tambm um negcio enrgico repdio da lei. Ora bem: o mero desuso de uma lei no importa a extino desta. Com isso, a lei no cessa a sua vigncia. S cessar se se criar a convico de que lcito de se proceder assim, portanto, se se formar um verdadeiro costume contra legem. Fontes mediatas: 1. Usos (218; 234; 885/2; 1121 + 1128 CC) 2. Jurisprudncia normativa: - Costume Jurisprudencial conjunto de prticas reiteradas com convico de obrigatoriedade aplicadas pelos tribunais. S h costume jurisprudencial quando houver um nmero significativo de decises naquele sentido e uma persistncia considervel naquela orientao; - Acrdos com fora obrigatria geral (281/1 e 3 CRP). 3. Contratos normativos instrumentos de carcter negocial que constituem/estabelecem regras jurdicas. Ex.: Convenes colectivas de Trabalho. Desvalores dos actos jurdicos: Ineficcia lato sensu: a insusceptibilidade de um acto jurdico produzir efeitos jurdicos. A ineficcia lato sensu comporta as seguintes modalidades: - Inexistncia jurdica; - Invalidade; - Ineficcia stricto sensu. Inexistncia jurdica: a forma mais grave da ineficcia lato sensu. Juridicamente, considera-se que nada existe (art. 1628, alnea E, CC). Invalidade: a desconformidade do acto com o direito menos grave do que a inexistncia jurdica. Comporta as modalidades nulidade (decorre da violao dos interesses mais relevantes, por, isso, invocada a todo o tempo e pode ser conhecida oficiosamente pelo tribunal mais grave. Ex.: 3/3; 204; 277/1; 281 CRP) e de anulabilidade (decorre da violao de interesses menos relevantes; por isso, a anulabilidade tem de ser arguida pelos interessados num determinado prazo e sanvel pelos interessados mediante confirmao ou ratificao menos grave). Ineficcia stricto sensu: O acto pode no ser nem inexistente, nem valido, mas meramente ineficaz. Surge na maior parte dos casos como uma situao de inoponibilidade de um acto (existente e vlida) a certas pessoas.

Daniel Filipe Bento Marques

32

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Vicissitudes de Vigncia da Lei: 1. Impedimento de vigncia da lei a lei antiga nunca entra em vigor porque publicada uma lei nova no perodo de Vaccacio Legis que vai impedir o incio de vigncia da primeira lei. Ex.: |--------------------| |---------------| 2. OU |-------------| |-------------|

Cessao da vigncia da lei: - Declarao de inconstitucionalidade ou ilegalidade com fora obrigatria geral (281/1 e 3; 282 CRP); - Costume contra legem; - Caducidade (destina-se a ter uma vigncia temporria); - Revogao (quando uma lei que est em vigor e a uma dada altura aprovada uma nova lei que afastar a antiga da sua vigncia. Ex.: |--------------| |--------------| OU |-----------------| ----------------|

Formas de revogao: Expressa quando a lei nova declara que revoga uma determinada lei anterior. Ex.: art. 3 do decreto lei sobre a formao do Cdigo Civil; Tcita quando resulta da incompatibilidade entre as normas da nova lei a as da lei anterior; Total quando todas as disposies de uma lei so atingidas, ou seja, quando revogado todo o regime jurdico. Tambm conhecida por ab rogao. Parcial quando s algumas disposies da lei antiga so revogadas pela lei nova, ou seja, so apenas revogadas algumas regras da lei anterior. Tambm conhecida por derrogao. Global revoga todo o instituto jurdico ou todo o um ramo do Direito (ex.: famlia, adopo, casamento...); Individualizada atinge uma ou algumas regras jurdicas. Simples revoga a lei antiga e entra em vigor uma nova lei e nada diz sobre qualquer outro regime jurdico; Substitutiva revoga a lei antiga e entra em vigor uma nova lei e define um novo regime jurdico. Referncia realidade extra jurdica que se refere lingustica. Tipos de referncias das regras jurdicas: quanto ao efeito, a uma conduta ou a um poder. Sentido pensamento que qualquer expresso lingustica transmite.Daniel Filipe Bento Marques 33

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Regras jurdicas define uma qualquer conduta. So vlidas ou invlidas. Para alm de ser um enunciado lingustico tambm um enunciado normativo. Proposies jurdicas uma discrio dessa mesma regra. Podem ser verdadeiras ou falsas (875; 348 CC). Estrutura das regras jurdicas: 1. Previso elemento em que define as condies em que a regra aplicada. Contm dois elementos: - Subjectivo (destinatrio da regra); - Objectivo (pressuposto de aplicao da regra. Pode ser uma situao jurdica -tem uma certa permanncia no tempo ou um facto jurdico tem pouca durao no tempo). 2. Operador: Modal (refere-se a um efeito jurdico e pode ser necessrio, impossvel ou contingente); Dentico (refere-se a condutas ou poderes e pode ser obrigatrio, proibido ou permitido. 3. Estatuio elemento da qual se define as consequncias jurdicas da sua prpria aplicao. Relao entre previso e estatuio Causal: se se verificar um determinado facto constitui-se um determinado efeito. Relao causa/efeito. Hierarquia das Fontes de Direito: Fontes externas: (prevalecem sobre a ordem interna) Direito Internacional Pblico Geral ou Comum (art. 8/1 + ver art. 7/4 CRP); Direito Internacional Pblico Convencional (tem de estar em conformidade com a Constituio art. 279/3 + 280/4 CRP); Direito Comunitrio (art. 8/4 CRP). Fontes Internas: Actos Legislativos (art. 112/1 CRP prevalecem sobre os actos regulamentares). So actos legislativos: Leis Constitucionais (166/1; 286/2 CRP); Leis de valor reforado (112/3; 166/2; 168/5 e 6) e as Leis da Assembleia da Repblica (166/3; dec. lei; 198/1; 112/3). Actos Regulamentares. So actos regulamentares os decretos e decretos regulamentares, Portarias e Resolues do Conselho de Ministros e Despachos Normativos. Classificao das regras jurdicas: 1. Quanto ao efeito: - Constitutivas (constituem um efeito ou situao jurdica. Definem situaes jurdicas quer activas ou passivas 1327 CC); - Impeditivas (impede um efeito ou situao jurdica 1628 CC); - Modificativas (modifica um efeito ou uma situao jurdica 754 CC); - Extintivas (extingue um efeito ou uma situao jurdica 182; 192 CC).34

Daniel Filipe Bento Marques

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

2.

Quanto referncia: - Primrias (regulam condutas ou poderes. Podem revestir a forma de permisso, proibio ou imposio 397; 1305 CC); - Secundrias (tm como referencia outras regras. So regras sobre regras. Modalidades: regras de produo, interpretativas ou revogatrias). Quanto ao sentido: - Completas (so as que definem o efeito jurdico decorrente de um facto ou de uma situao jurdica); - Incompletas (so aquelas que s podem ser aplicadas em conjunto com outras regras). Quanto disponibilidade: - Injuntivas (so as que se aplicam haja ou no declarao de vontade dos sujeitos nesse sentido). - Dispositivas (so aplicadas se os destinatrios declararem vontade da sua aplicao ou se o destinatrio no afastar a aplicao dessa mesma regra Quanto s relaes entre regras: - Gerais (estabelecem um regime comum para determinada matria); - Especificas (definem um regime prprio, contido na regra geral, para certas situaes. Critrios: Funo da matria (em razo da matria o legislador define um regime especifico dentro da regra geral): - Especialmente referente a Ramos do Direito ex.: Direito Comercial, Privado; - Especialmente referente a Institutos Jurdicos ex.: Arrendamento Urbano perante a locao; - Especialmente referente a regras jurdicas. Funo do Destinatrio atendendo aos destinatrios, regula a situao de certas pessoas: - Regras Comuns (aplicam-se a todos) VS Regras Particulares (aplicam-se a uma categoria de pessoas); Factores territoriais aplicado num certo territrio: - Regras nacionais (valem para todo o territrio nacional e originria dos rgos centrais do Estado) VS Regras Regionais (Regies Autnomas 225 a 234 CRP) VS Regras Locais (Autarquias Locais. S so aplicadas nas respectivas circunscries territoriais).

3.

4.

5.

Daniel Filipe Bento Marques

35

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Duas categorias: * Especiais definem um regime para uma espcie que est regulado por uma regra geral. Ex.: art. 131 CP refere-se ao homicdio e o 136 CP refere-se ao infanticdio que uma espcie de homicdio; 309 CC refere-se regra geral enquanto o 310 CC a regra especial. * Excepcionais instituem um regime contrrio implementado na regra geral. Trs princpios: Segurana; Justia e Eficincia. Dois fundamentos: fundamentos sistmicos (decorrem de princpios comuns ao sistema jurdico na sua globalidade art. 219 refere-se ao principio da eficincia, logo, regra geral, enquanto o 875 ao principio da segurana, logo, regra excepcional; o art. 219 refere-se novamente ao principio da eficincia e assim a regra geral enquanto o 1143 ao principio da segurana e assim a regra excepcional); fundamentos sub sistmicos (decorrem de motivos de sub sistemas jurdicos. Sero pautados por princpios prprios: 27/1 CRP a regra geral que estabelece o Direito Liberdade enquanto o 27/3 + o 28/1 a regra excepcional em determinadas circunstncias o Direito Liberdade suspenso nos termos da lei). Caractersticas das regras jurdicas: Hipoteticidade ou condicionais as normas contemplam hipteses. S so aplicveis quando se aplicam quando se integra a respectiva previso da regra jurdica. Abstraco refere-se a uma pluralidade de factos ou situaes indeterminadas. No se pode dizer que uma caracterstica essencial porque existe regras concretas. Uma regra de factos passados no abstracta porque refere-se a um facto passado concreto. (ex.: indulto). Generalidade refere-se a uma pluralidade indeterminada e indeterminvel de destinatrios. No uma caracterstica essencial porque existe regras individuais. Regras particulares (tem como destinatrio um conjunto de pessoas. Ex.: alunos de uma sub turma). Falsa Generalidade (dirige-se, supostamente, a uma generalidade de pessoas mas s quer atingir um s individuo ou uma pluralidade de indivduos). Falsamente individuais (133; 134 CRP). Regras supletivas encontram-se principalmente no mbito do Direito Privado relativo rea contratual (405/1 CC). So aplicadas na falta de regulamentao sobre determinada matria, pela vontade e estipulao dos interessados. Se as partes nada estipularem, so aplicadas as normas supletivas constantes do Cdigo Civil. (771; 1026; 1129 a 1141 CC). Regras permissivas permitem a realizao de uma conduta ou o exerccio de um poder. Distino entre regras dispositivas e regras injuntivas: So regras injuntivas, aquelas que impem um comando/obrigao ou proibio. Se se forem de permisso referem-se a regras dispositivas; So regras injuntivas, aquelas que o prprio legislador classifica como tal (809; 2008; 772/1; 777/1; 878 CC);Daniel Filipe Bento Marques 36

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

So regras injuntivas, aquelas que so essenciais a um determinado regime jurdico; So regras dispositivas, aquelas em que o prprio legislador fixa que podem ser afastadas da vontade das partes. Critrio Valorativo: - Injuntivas as regras essenciais a um determinado regime, as que projectam determinados interesses das partes que elas mesmo no podem afectar (814/2 CC); - Dispositivas as que referem a interesses das quais as partes podem dispor (1196 CC). Modalidade de invalidade: 1. Falta de regra de produo; 2. Inadmissibilidade do seu contedo. Regras remissveis: Remetem para outra regulamentao jurdica/para outro regime jurdico. Dispensa regular situaes que se encontrem reguladas noutros regimes jurdicos (499 + 1873 CC). Modalidades de regras remissivas: Regras de devoluo dispensa regular situaes que se encontrem reguladas noutros regimes jurdicos (678 CC). Assenta numa analogia entre a situao j regulada e a que vai ser regulada. Regras de conflito escolhe, entre duas ou mais regras aplicveis, a regra a aplicar. Conflitos no espao e no tempo: - Espao: quando um determinado acto jurdico tem uma determinada conexo com outras ordens jurdicas (situao plurilocalizada); - Tempo: quando se verifica sucesses de leis no tempo (12 e 13 CC). Fices legais regras que ficcionam que duas realidades distintas so afinal idnticas (275/2). Presunes: 349 CC so as ilaes que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido. De um facto conhecido presumindo um facto desconhecido. Dois tipos: - Ilidiveis todas as presunes admitem que provem o contrrio (350/1; 1268/1 CC); - Inilidiveis no admitem que provm o contrrio (350/2 CC). Regras definitrias: - Definio de dicionrio: significado que a palavra ou a expresso tem no seu quotidiano; - Definio estipulativa: um dos exemplos de definio estipulativa so as definies jurdicas que definem um determinado conceito que significa em termos jurdicos (840; 1122; 1142; 204/2; 362).

Daniel Filipe Bento Marques

37

Faculdade de Direito de Lisboa

Exame de Introduo ao Estudo do Direito

Regras modais o operador de necessidade, impossibilidade ou contingncia. Aplicam-se aos efeitos jurdicos. - Exemplo de efeitos necessrios (66; 68; 874 CC); - Exemplo de efeitos impossveis (associados a desvalores jurdicos 875 CC); - Exemplo de efeitos contingentes (efeitos que no so possveis, nem necessrios, ou seja, tanto pode-se produzir como no produzir-se 287 CC). Regras denticas o operador de comando, proibio ou permisso. Acaba por ser um prolongamento da lgica modal. So aplicadas a condutas e a poderes. NOTA: Lei Geral posterior no revoga Lei Especial anterior. S se poder revogar uma lei especial atravs de outra lei especial. Prevalece sempre a lei geral; Lei especial no revogar uma lei geral posterior. Poder adaptar o regime geral a uma situao concreta; Lei Comum no revoga lei particular. Art. 7/3 CC lei geral posterior no revoga lei especial anterior, excepto se se entender que o legislador a queria revogar ou tenha dado a entender.

Interpretao jurdica actividade atravs da qual se extrai a regra jurdica que est contida na fonte de direito. Trs aspectos: - Ter em conta a finalidade da interpretao; - Seleccionar os elementos da interpretao; - Conjugar os vrios elementos da interpretao para extrair a regra jurdica. Elemento gramatical perspectivas: - Historicista (sentido que a lei tinha no momento da sua elaborao); - Actualista (sentido que a lei possui na actualidade. Deve prevalecer sobre a perspectiva historicista). Elemento histrico: Occasis legis circunstancias da elaborao da lei. Precedentes normativos tudo o que constitui antecedentes da regra jurdica: - Histrico (situao anterior regra); - Comparativos (so precedentes constitudos por regras de outra ordem jurdica). Como saber a inteno do legislador: Trabalhos preparatrios evoluo de um ante projecto at aos projecto; Exposies oficiais de motivos (prembulos dos diplomas) o prprio legislador expe as suas prprias ideia