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DA ILUMINAÇÃO À INOVAÇÃO: AS ORGANIZAÇÕES DESCOBREM MINDFULNESS Rodrigo Siqueira 1 Introdução O que duas das empresas mais inovadoras e valiosas do planeta - Google e Apple - têm em comum e possui sua raiz em ensinamentos orientais que datam de 2500 anos atrás? Talvez a pergunta cause estranhamento. Esta mesma sensação, ou similar, foi sentida por neurocientistas quando em 2005 a Sociedade para a Neurociência 2 convidou Tenzin Gyatso, o 14º. Dalai Lama, para comparecer em seu encontro anual em Washington (DC). Parte da comunidade científica fez uma petição formal para que o convite fosse desfeito. O convite foi ratificado e na oportunidade o líder do Budismo Tibetano colocou uma intrigante pergunta: “Qual relação poderia haver entre Budismo e ciência moderna ocidental?”. Os cientistas que desconheciam a resposta compreenderam o acerto em convidar o líder budista ao longo do encontro e o conceito chave que explicaria a razão para tal. O Monge Zen e a Tangerina Era uma manhã fria em Tóquio. Lembro-me de estar sentado em um banco no parque Ueno, um dos mais frequentados parques públicos do Japão. Estava sozinho e decidi parar com as fotos e sentar-me um pouco. A ideia era relaxar e apreciar as pessoas e a paisagem. Entretanto, meu pensamento insistia em muitas vezes voltar ao Rio de Janeiro e passar por Paris, cidade que estaria em três semanas em meu voo de retorno ao Brasil. Percebi um monge Zen-Budista não muito distante que também parecia ter me avistado. Aos poucos, voltei minha atenção ao parque, esquecendo-me do monge. Sem perceber, também esqueci, ou ao menos não mais prestava atenção do que me rodeava no parque e fiquei no usual divagar entre estar ali em corpo mas estar em outro lugar com a mente, numa viagem ao tempo para o passado ou em um futuro hipotético. Não sei ao certo quanto tempo havia passado, quando de repente, me vi resgatado subitamente para o aqui e agora. Senti uma presença ao meu lado e percebi 1 Coach, palestrante e pesquisador acadêmico em Mindfulness. Contato: [email protected] 2 Saiba mais: http://www.scientificamerican.com/article/neuroscience-reveals-the-secrets-of- meditation-s-benefits/

Iluminação e Inovação: As Organizações Descobrem Mindfulness

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DA ILUMINAÇÃO À INOVAÇÃO: AS ORGANIZAÇÕES DESCOBREM MINDFULNESS

Rodrigo Siqueira1

Introdução

O que duas das empresas mais inovadoras e valiosas do planeta - Google e Apple - têm

em comum e possui sua raiz em ensinamentos orientais que datam de 2500 anos

atrás? Talvez a pergunta cause estranhamento. Esta mesma sensação, ou similar, foi

sentida por neurocientistas quando em 2005 a Sociedade para a Neurociência2

convidou Tenzin Gyatso, o 14º. Dalai Lama, para comparecer em seu encontro anual

em Washington (DC). Parte da comunidade científica fez uma petição formal para que

o convite fosse desfeito. O convite foi ratificado e na oportunidade o líder do Budismo

Tibetano colocou uma intrigante pergunta: “Qual relação poderia haver entre Budismo

e ciência moderna ocidental?”. Os cientistas que desconheciam a resposta

compreenderam o acerto em convidar o líder budista ao longo do encontro e o

conceito chave que explicaria a razão para tal.

O Monge Zen e a Tangerina

Era uma manhã fria em Tóquio. Lembro-me de estar sentado em um banco no parque

Ueno, um dos mais frequentados parques públicos do Japão. Estava sozinho e decidi

parar com as fotos e sentar-me um pouco. A ideia era relaxar e apreciar as pessoas e a

paisagem. Entretanto, meu pensamento insistia em muitas vezes voltar ao Rio de

Janeiro e passar por Paris, cidade que estaria em três semanas em meu voo de retorno

ao Brasil. Percebi um monge Zen-Budista não muito distante que também parecia ter

me avistado. Aos poucos, voltei minha atenção ao parque, esquecendo-me do monge.

Sem perceber, também esqueci, ou ao menos não mais prestava atenção do que me

rodeava no parque e fiquei no usual divagar entre estar ali em corpo mas estar em

outro lugar com a mente, numa viagem ao tempo para o passado ou em um futuro

hipotético. Não sei ao certo quanto tempo havia passado, quando de repente, me vi

resgatado subitamente para o aqui e agora. Senti uma presença ao meu lado e percebi

1 Coach, palestrante e pesquisador acadêmico em Mindfulness. Contato: [email protected]

2 Saiba mais: http://www.scientificamerican.com/article/neuroscience-reveals-the-secrets-of-

meditation-s-benefits/

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que era o monge. O cumprimentei com um olhar e um meneio com a cabeça,

prontamente retribuído com um sorriso. Procurei continuar (ou finalmente) observar o

movimento no parque quando ele retira de um saco uma tangerina, a mim oferecida

com um sorriso. Aceito a oferta com gratidão e orgulhoso de meu escasso japonês,

falo: arigatou gozaimasu! (obrigado, dito formalmente em japonês). Tiro a casca e

aprecio meu primeiro gomo. O monge permanece ao meu lado comendo sua tangerina

com seu sorriso permanente. Ao final do meu primeiro gomo, em bom inglês com

típico sotaque japonês ele me pergunta:

- Estava boa?

- Muito gostosa! - Respondo.

- Tinha semente? – Pergunta o monge. (Sim, também estranhei a pergunta).

- Sim. - Respondo, sem conseguir deixar de esconder minha surpresa com a pergunta

pouco usual.

- Muitas? Quantas?

- Não muitas. Poucas. Mas estava uma delícia!

- Quantas? – insistia o monge.

- Uma...não, acho que duas. – Respondo de improviso.

- Vamos praticar de novo? Coma mais um gomo.

Eu compreendi de imediato que o monge não era obcecado em sementes e que não

estava se atrapalhando com o inglês: ele realmente quis falar “praticar” e seu interesse

não era a quantidade de sementes em minha tangerina.

- “Mindful Eating” - ele falou.

Entendi perfeitamente. Ele me convidava a ficar no presente e estar consciente. Foi

inevitável me lembrar de Mestre Yoda falando sobre Luke Skywalker3, que nunca

poderia treiná-lo já que sua mente estava sempre distraída, seja no futuro ou no

passado, e nunca no presente.

Eu, positivamente impactado pela minha recém-descoberta identidade de padawan4

do monge, comecei a novamente me ver no futuro contanto esta história para meus

amigos no Brasil quando mais uma vez tive meus pensamentos interrompidos pelo

generoso monge que repentinamente fala sobre seu gomo:

3 Personagens pertencentes à Ordem Jedi na série de filmes “Guerra nas Estrelas”.

4 “Aprendiz Jedi” na terminologia da séria supramencionada.

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- Uma semente!

Mindfulness: origem e conceituação

Buda não imaginaria – talvez - que um de seus ensinamentos centrais como caminho

para a iluminação, mindfulness, seria estudado e praticado por pessoas tão distantes

no tempo e na cultura de sua época. A palavra “mindfulness” é derivada da palavra

Sati, que em Pali – dialeto indiano falado no tempo de Buda - significa “recordar-se

continuamente do seu objeto de atenção” (Siegel, Germer and Olendzky, 2009)

Usualmente traduzida para o português como Atenção Plena, muitos trabalhos,

entretanto, mantêm o termo usado em inglês: mindfulness.

Entender a origem do termo a de sua origem oriental nos ajuda a compreender

porque hoje encontramos definições de mindfulness associadas tanto a um construto

teórico, uma habilidade cognitiva, um traço psicológico ou a um meio ou conjunto de

práticas meditativas para se desenvolvê-la (Brown, Ryan e Creswell, 2007; Hayes e

Wilson, 2003).

Olhando Mindfulness como uma habilidade cognitiva, temos “prestar atenção de

maneira particular, intencionalmente, ao que se apresenta no momento presente sem

julgamentos” (Kabat-Zinn, 1994, p. 4) como a definição clássica. Como podemos

perceber, possui influencia direta da psicologia budista. Não é ao acaso.

Kabat-Zinn, cientista biomédico com doutorado no MIT em biologia molecular, teve

seu primeiro contato com a meditação em uma palestra proferida no MIT por Philip

Kapleau, um missionário Zen Budista. Com o interesse despertado pelo tema, Kabat-

Zinn se tornou aluno de Thich Nhat Hanh e estudioso acadêmico sobre o tema. Fundou

a Clinica de Redução de Estresse na Escola de Medicina da Universidade de

Massachusetts, onde ele adaptou os ensinamentos budistas sobre mindfulness e

desenvolveu sua metodologia de intervenção terapêutica: o Mindfulness-Based Stress

Reduction (MBSR)5. Após os estudos de Kabat-Zinn, a meditação e os estudos sobre

5 Ver: http://www.umassmed.edu/cfm/

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mindfulness passaram a ser parte do mainstream da comunidade médica científica

internacional.

Similarmente, Brown e Ryan (2003) definem formalmente mindfuless como a atenção

receptiva e a consciência dos eventos e experiência do presente. Bishop et al (2004)

ofereceram uma definição mais ampla: auto-regulação da atenção de forma que a

mantenhamos na experiência imediata, permitindo assim maior reconhecimento dos

eventos mentais que ocorrem no momento presente, com maior curiosidade, abertura

e aceitação. Germer, Siegel & Fulton (2005), após um estudo sobre as diversas

definições encontradas, sugerem que mindfulness é composta de 3 características

base: (1) consciência (2) da experiência presente (3) com aceitação.

Ao ler este artigo, você pode se perceber distraído em alguns momentos e terá que

recorrer a ler novamente trechos que já foram lidos de forma desatenta. Mais ainda,

pode ter sensações prazerosas ou de desconforte que podem passar sem maior

consciência de sua parte e que poderiam lhe oferecer pistas interessantes sobre suas

crenças e atitudes. Pode ainda reconhecer tais sensações e pensamentos, mas reprimi-

los, ou distorcê-los para reforçar paradigmas bem estabelecidos em seu modelo

mental e não ter consciência de que está fazendo isso. Isso é estar mindless, um estado

oposto a mindfulness.

A boa notícia é que mindfulness é uma habilidade e pode ser desenvolvida. Siegel,

Germer e Olendzky (2009:8) esclarecem: “assim como podemos melhorar nosso

desempenho físico por meio da prática regular de exercício físico, nós podemos

desenvolver mindfulness por meio de práticas mentais deliberadas”. Ou seja,

meditações específicas baseadas em mindfulness6. Estudos indicam que desenvolver

esta habilidade nos traz diversos benefícios relacionados a bem-estar, autocompaixão,

sistema imunológico, pressão arterial, concentração e processamento cognitivo entre

outros (Siegel, Germer e Olendzky, 2009; Brown, Ryan e Creswell, 2007; Brown e Ryan,

2003; Kabat-Zinn, 2003).

6 Nem toda prática meditativa é baseada em mindfulness. Ver Siegel, Germer e Olendzky (2009).

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Com tantas evidências encontradas sobre os benefícios de mindfulness no campo da

saúde, o campo das organizações poderia se beneficiar de alguma forma? Por exemplo,

qual o impacto no potencial de inovação das organizações caso meditações do tipo

mindfulness seja incentivada como prática entre seus colaboradores?

Da Índia para o Vale do Silício: a descoberta e prática de Mindfulness

Podemos argumentar que se se algo faz bem ao indivíduo, fará bem à

organização ao qual o indivíduo trabalha. Em reportagem da revista The Economist

(2013), temos: “em seu livro de 1905 - A ética protestante e o espírito do capitalismo -

Max Weber creditou à ética protestante ao crescimento do capitalismo. Agora parece

como que a ética Budista que faz o capitalismo continuar”. A reportagem se baseia

em diversas iniciativas de meditações mindfulness em empresas. A Google, com seu

projeto “Search inside Yourself” (Busque dentro de si mesmo) criado para aumentar a

inteligência emocional e criatividade de seus colaboradores é um dos exemplos. A

gigante do Vale do Silício realiza além das sessões de meditação regulares, encontros

bimestrais de “mindful lunches”, realizados em completo silêncio. Recentemente a

experiência deste projeto e as práticas realizadas se tornaram livro (ver: Chade- Meng,

2014). Ebay, Twitter, Facebook e Apple possuem programas regulares de meditação e

o crescimento da prática no Vale do Silício é tão grande que fez surgir um novo

mercado: o mindfulness coaching.

Na reportagem da revista Wired - Enlightenment Engineer - Shachtman (2013)

afirma que aulas para estar consciente de forma não julgadora à experiência presente

tornou um elemento comum e fundamental de muitas das maiores empresas

localizadas no Vale do Silício. Afirma a reportagem: “a contemplação é vista como uma

nova cafeína, um combustível que liberta a produtividade e impulsiona a criatividade”.

Não parece exagero, visto que já existe uma conferência dedicada ao tema: Wisdom

2.0 Conference7. O evento em 2013 contou com mais de 1700 inscritos e tendo

executivos do alto escalão de empresas como Cisco, LinkedIn e Ford como palestrantes,

entre especialistas em meditação. O objetivo destas empresas, obviamente, não é

desfrutar de práticas budistas para iluminar seus funcionários, mas sim ter um retorno

no investimento realizado. Shachtman (2013) destaca que a meditação no Vale do 7 Veja: http://www.wisdom2summit.com/

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Silício não é uma oportunidade de se contemplar a impermanência da existência e

demais temas de interesse em sua origem, mas sim uma ferramenta de melhorar a si,

incentivar a criatividade e aumentar a produtividade.

Mindfulness e Criatividade: e a opinião da ciência?

Alguns trabalhos científicos mostram que de fato o movimento em direção à

mindfulness ocorrendo no Vale do Silício possui aval científico. Dr. Daniel Siegel,

neurobiologista formado em Harvard e professor da UCLA, afirma que a pesquisa atual

sobre o cérebro indica que a criatividade pode ser impulsionada pela prática de

mindfulness (2010).

Nosso processo cognitivo tem por função nos servir como recurso para interpretarmos

a realidade e interagirmos com o mundo. Nós reconhecemos um estímulo e atribuímos

um significado a ele. Quando um estímulo é percebido, ele é focado por um

determinado período (podendo ser esquecido rapidamente) e a partir daí é

desencadeada alguma reação, seja cognitiva ou emocional, de maior ou menor

intensidade.

Brown, Ryan e Creswell (2007) destacam que estas rápidas reações perceptuais

possuem várias características relevantes para nossa experiência subjetiva e

funcionamento no mundo: primeiro, nossas reações usualmente de natureza

discriminativa, em que uma avaliação primária do objeto é feita basicamente em

termos de “bom”, “ruim” ou “neutro”, usualmente em referência a si mesmo. Segundo,

elas são baseadas em experiências passadas com o objeto ou com objetos similares o

suficiente para evocarem associações em nossa memória. Terceiro, a experiência

perceptual é facilmente assimilada ou, por meio de adicionais operações cognitivas em

relação ao objeto, então assimilada em esquemas cognitivos – ou paradigmas – já

existentes.

Estar consciente às experiências que ocorrem no momento presente, sem julgamentos,

capacitaria o indivíduo para reagir às situações de modo mais deliberado e menos

automaticamente (Bishop et al., 2004). Como nossa consciência sobre nosso processo

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cognitivo está desperta, consequentemente reduzimos nossos automatismos. Brown,

Ryan e Creswell (2007) afirmam que isto nos permite um contato direto imediato com

eventos assim que ocorrem, sem o habitual processo cognitivo de discriminação e

categorização quase que imediatos e inconscientes, pois a consciência [dos eventos]

ocorre de forma menos enviesada e mais límpida, permitindo respostas psicológicas e

comportamentais mais flexíveis.

Greenberg, Reiner e Meiran (2012), destacam que a regulação do foco da atenção para

a experiência corrente, ou seja, uma disposição em estar em contato com e estar

receptivo à experiência presente - ao invés de evitá-la ou reprimi-la de alguma forma -

associada a uma atitude de “mente de principiante” e de ver as coisas de uma forma

“nova” (Kabat-Zinn, 1994) nos traria maior flexibilidade em nossa experiência diária.

Isso os levou a conduzir um estudo onde analisaram a relação entre mindfulness e

rigidez cognitiva. Rigidez cognitiva é definida como uma resistência em mudar crenças,

atitudes e hábitos pessoais, ou ainda, a tendência em desenvolver e persistir no uso de

modelos mentais e comportamentais (Schultz e Searleman, 2002). O resultado dos

dois experimentos conduzidos apontou que praticantes experientes de meditação

mindfulness foram melhores em interpretar situações de forma nova assim como

identificar uma solução simples e nova do que o grupo de não-meditantes.

Em outro estudo relacionado à criatividade, Colzato, Ozturk e Hommel (2012)

investigaram o impacto da meditação de monitoramento amplo (Open-Monitoring –

OM, um dos tipos de meditação mindfulness) com tarefas de criatividade.

Encontraram evidências de que a OM permite à mente a produzir o pensamento

divergente, um tipo de pensamento que permite muitas novas ideias em um contexto

em que mais de uma solução é correta.

Reconhecemos que inovação é a bem sucedida implementação de ideias

criativas dentro de uma organização e que a criatividade é condição necessária, porém

não suficiente para uma inovação (Amabile, 1996). Entretanto, diante das evidências já

encontradas, podemos argumentar que mindfulness, criatividade e inovação nas

Page 8: Iluminação e Inovação: As Organizações Descobrem Mindfulness

organizações parecem estar relacionadas entre si, como variáveis em um modelo

causal.

Devemos evitar posicionar a prática de mindfulness como uma solução mágica

para a questão da inovação em empresas, mas sim apresentar mais um recurso que

pode impulsionar o potencial inovador das organizações. Funciona para Google e

Apple. Talvez funcionasse para sua empresa.

Vamos praticar?

Podemos apresentar muitas definições de mindfulness e ainda assim a experiência

direta sempre será a melhor professora. Praticar a consciência do momento presente

sem julgamentos é acima de tudo uma jornada de (re)descobrimento de si mesmo, da

forma como vemos e sentimos o mundo. Nas palavras de Henry David Thoreau8:

“Direct your eye right inward, and you'll

find a thousand regions in your mind

yet undiscovered. Travel them, and

be expert in home-cosmography"

Existem mais de uma forma de se praticar. A simplicidade das instruções não deve

confundir o leitor: trata-se de um treinamento mental e demanda prática e constância

para termos resultados mais efetivos.

Prática:

1. Fique em uma posição confortável.

2. Reconheça seu corpo, sinta o toque do seu corpo onde você estiver. Comece a

se conectar ao presente por meio da conexão com seu corpo. Permaneça um

tempo percebendo e sentindo seu corpo, por partes e depois como um todo.

8 Citação extraída do site da Mindful Awareness Research Center (MARC), da UCLA e presente no

capítulo 18 do livro Walden.

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3. Direcione o foco de sua atenção para sua respiração. Você pode tentar sentir a

entrada e saída do ar pela narina ou ainda, ou focar no movimento do

abdômen enquanto respira. Sinta a respiração. Inspirando, reconheça que está

inspirando. Expirando, reconheça que está expirando. Permaneça assim por

uns instantes.

(Sensações, emoções e pensamentos surgirão. Não há problema, é normal que

assim seja. Observe-os e retorne “gentilmente” sua atenção à respiração.

Permita-se permanecer no presente por meio da conexão com respiração).

4. Coloque-se aberto agora às sensações de seu corpo. Comece pela parte

superior da cabeça e desça lentamente, passando pelas partes de seu corpo.

Faça um escaneamento detalhado e observe com aceitação, abertura e não

julgamento às sensações. Não reaja, apenas observe. Estabeleça uma postura

de observador, sem julgar a sensação como boa, ruim, correta ou incorreta.

Acolha a tudo que surgir com aceitação e abertura.

5. Retorne a atenção após um tempo para a respiração.

(Sensações, emoções e pensamentos surgirão. Não há problema, é normal que

assim seja. Fale para si mesmo: “divagando” e retorne “gentilmente” sua

atenção à respiração).

6. Abra o foco, monitore o ambiente a sua volta e mantenha-se aberto ao que

surgir, com uma atitude aberta, sem julgamentos e de observador. Retorne, ao

seu tempo, ao foco inicial: a respiração.

7. Finalize a prática ao seu tempo.

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Quanto tempo praticar? Você pode praticar por 5, 10, 20, 30, 60 minutos ou mais. Não

é uma maratona, mas sim um processo de treinamento mental que deve ser

conduzido com respeito e gentileza à sua mente.

A UCLA oferece gravações de meditações guiadas (em inglês) na página da UCLA

Mindful Awareness Research Center9. Visite.

Comentários finais

Desejamos que este artigo possa despertar a curiosidade do leitor pelo tema, tanto em

nível acadêmico, quanto pessoal. Por mais que no budismo mindfulness tenha sido

ensinada para levar seus seguidores a obter insights sobre a realidade, podemos nos

beneficiar de alguns de seus ensinamentos ainda que não busquemos o objetivo

último de sua tradição religiosa. Essa instrumentalidade dos ensinamentos budistas

sofre crítica de alguns de seus seguidores, entretanto, em nossa visão, há outras

maneiras de se ver esta questão.

O experimento de Ruedy e Schweitzer (2011) nos mostra que o comportamento não

ético é reduzido em pessoas com maior mindfulness, por estarem mais conscientes

sobre seus processos cognitivos e motivações momento a momento e ainda

apresentarem um aumento na importância percebida de uma identidade moral e ética.

Ou seja, encontraram evidências de que mindfulness nos faz ter consciência das

implicações éticas de nossas decisões, mas também faz decidir de forma mais ética. Os

benefícios para a sociedade são inquestionáveis.

Assim, deixamos algumas perguntas para objeto de reflexão:

Qual seria o impacto na sociedade em termos tomadores de decisão em instituições

públicas e privadas mais criativos e éticos?

9 http://marc.ucla.edu/body.cfm?id=22

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Qual seria o impacto em nossas vidas pessoais em desenvolvermos uma mente mais

focada na experiência presente, mais criativa e sem julgamentos imediatos?

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