- As guerras parecem nao mais seconstituir em causas de protesto e luta das novas gera96es; pelo menos nao foi assim com a guerra do lraque. 0 atua/ movimento eco/6gico seria uma manei­ra da nova gera9ao continuar sua re­volu9ao, coma ocorre� com os hippies nos a-nos 60?

- Todos precisamos de umacausa, precisamos de alga maior do que n6s mesmos para nos iden­tificar. 0 nacionalismo serviu a esse prop6sito par muitos anos e ainda o faz. Quero dizer: ha alga especial em ser um brasileiro leal. Mas o tipo de motivac;:ao que costumava man­dar milhares de pessoas para mor­rer par suas fronteiras eu gostaria de acreditar que nao existe mais.

- 0 senhor falou no /ado bom da TV.E sua influencia negativa sabre as artes em gera/, a pintura, par exemplo?

- A pintura esta sofrendo. Naose veem pinturas muito boas agora. Era uma emoc;:ao ver na Renas­cenc;:a, par exemplo, quando co­mec;:aram a pintar os homens do jeito que eles realmente eram, a beleza que a arte produzia. Essa emoc;:ao foi mantida durante o im­pressionismo - era excitante ver a luz do jeito que aparecia na pintura.

as agora, com a TV, e diffcil ima­g nar qualquer emoc;:ao que seus

olhos possam ver fora do cinema ou da TV. Os olhos qu�rem mais, querem mais ac;:ao e movimento.

- E sabre Andy Warhol, que trouxepara a arte o que estava na TV e no supermercado?

- Eu gostava dele, mas haviaum limite para o alcance daquilo tudo. De certa forma hoje parece uma piada; uma boa piada, mas uma piada. Acho que ele disse mui­tas coisas inteligentes. Andy tinha um born entendimento sabre o tipo do mundo para o qual estavamos caminhando. Dizer que todos terfa­mos nossos 15 segundos de fama foi uma tirada genial. Nas entrevis­tas ao vivo na TV sempre vemos pessoas par tras dos entrevistados, acenando para a camara e bus­cando seus 15 segundos. E todos estao na TV ate certa forma. E po­de-se dizer que a fama se espalhou ate o ponto de nao ter mais nenhum sentido, nao significar mais nada. A vida se move rapido e e diffcil ser um artista. Sou um escritor profis­sional e, nesse campo, as coisas se movem mais lentamente. Mas que­remos velocidade, estamos acos­tumados a ela. Temos que assistir a alga nova e excitante todas as noi­tes na TV, nao se quer ver que nada aconteceu, que todos estavam feli-

0 coe/ho de verdade e menos real que oRabbit da fic�ao. Updike reconhece que a telicidade nao ea materia-prima dos seus livros.

zes, mais bebes nasceram etc. , felicidade nao e notfcia.

-A telicidade, alias, nao e a materi,prima de seus romances ...

- Ouando comecei a escreveIha muitos anos, minha ideia basic era que havia mais a ser dito sobr a vida ou sabre as pequenas cidc des, e eu venho de uma pequen cidade, sabre sua infelicidade e� sencial. Sabre a dor e os conflito da vida cotidiana. A tetralogia d Coelho e muito sabre isso. Tente coma escritor, chamar a atenc;:a sabre os pequenos dramas do die a-dia, a textura delicada da vid,em vez de lidar com grandes drcmas, com situac;:oes-limites A fiec;:ao do seculo 19 e muito grandicsa. Temos essa influencia desde ogregos, quando apenas os soberEnos eram importantes. Tentei trazEa literatura os pequenos reis e ranhas que ha em todo mundo. TentEescrever de forma bonita sabreque nao e bonito.

- Coelho e um americano medicnao um her6i e, coma disse, nao e ta bonito, e a senhor o descreve de form bonita. 0 que o faz pensar que as amer canos gostam do quadro que o senhc pintou sob re sua sociedade?

- Nern todos gostam. Meus 11vros nao sao exatamente besi

sellers. 0 que me interessa ness, homem, o Coelho, e coma soma egofstas e impulsivos. Mas ha ur tipo de amor nele e quanta mai velho ele fica, mais ele vai ficand gentil. Meus leitores lamentarar ve-lo morrer. Talvez eu estivess querendo dizer que a vida nos fa sermos mais bondosos com o pa� sar do tempo.

- E quanta ao senhor? As vesperados 60 anos melhorou com o tempo Alcan9ou o que desejava?

- Sim, eu me tornei um autcamericano grisalho, mas nao m sinto ainda acostumado com ess papel. Sempre pensei sabre mir coma um jovem. As pessoas a m nha volta eram mais velhas, meu editores eram mais velhos. Toda eram mais velhos e eu admirav sua sabedoria. Agora as pessoa em minha vida sao mais jovens e o escritores, em meu pafs, tamber sao mais jovens. Os americano nao sao muito bans em envelhece1 Nao sei coma e no Brasil, mas no EUA e da juventude que gostamm A juventude e que esta nos comer ciais de TV.

-:-- O senhor nao se sente a vontaa falando de si mes mo?

- Par isso escrevo ficc;:ao. Tenhcerteza de que voce conseguiu melhor entrevista que darei no Brc sil. Se o seu gravador nao funcic nar, pode inventar o que eu dissE

DENISE CAVALCANTEI

FOTO DE MARCOS MUZI

14 DE MAR<;:o DE 1992 IMaml