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8 o Congresso Brasileiro de Metrologia, Bento Gonçalves/RS, 2015 1 Impacto do sombreamento parcial na conversão fotovoltaica: experimentos e simulação Impact of partial shading on photovoltaic conversion: experiments and simulation R C Surichaqui 1 , M N Frota 1 , E M Ticona 2 1 Programa de Pós-Graduação em Metrologia para Qualidade e Inovação, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro; 2 Instituto de Energia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro E-mail: [email protected] Resumo: O objetivo deste trabalho é avaliar o impacto do sombreamento parcial que limita a radiação solar incidente sobre um módulo de conversão fotovoltaica de substrato policristalino. A comparação dos resultados da simulação numérica com resultados de medições experimentais de grandezas elétricas permitiu validar a eficácia do modelo proposto de um único diodo. Na máxima potência e condição de sombreamento parcial, o erro relativo (ER) da potência medida e simulada foi 4,2 %. Palavras-chave: conversão fotovoltaica, sombreamento parcial, metrologia. Abstract: The aim of this paper is to evaluate the impact of the partial shading that limits the incident solar radiation on a polycrystalline photovoltaic module. A comparison of the results of a numerical simulation with experimental measurements of electrical magnitudes allowed validating the effectiveness of a single diode model. At the maximum power and shading condition, the relative error (RE) of measured and simulated power was 4.2 %. Keywords: photovoltaic conversion, partial shading, metrology. 1. INTRODUÇÃO Não são raras as situações em que o engenheiro projetista se vê forçado a projetar a instalação de módulos fotovoltaicos (PV, da denominação Photovoltaic), em coberturas de edifícios, fachadas ou em ambientes urbanos expostos a efeitos adversos que comprometem a eficiência da conversão PV. Nesse contexto, o sombreamento parcial constitui um desses efeitos adversos que limita de forma drástica a incidência da radiação solar sobre o módulo PV, a exemplo de sombras inevitáveis ocasionadas pela presença de edificações e árvores na adjacência de instalações, ou mesmo, indesejáveis depósitos de sujeira, nuvens que se interpõem à radiação. Este trabalho concentra-se no estudo do impacto causado pelo sombreamento parcial. Sob certas condições operacionais, uma célula PV exposta ao

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8o Congresso Brasileiro de Metrologia, Bento Gonçalves/RS, 2015

1

Impacto do sombreamento parcial na conversão fotovoltaica: experimentos

e simulação

Impact of partial shading on photovoltaic conversion: experiments and

simulation

R C Surichaqui 1, M N Frota 1, E M Ticona 2

1 Programa de Pós-Graduação em Metrologia para Qualidade e Inovação, Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro; 2 Instituto de Energia, Pontifícia Universidade

Católica do Rio de Janeiro

E-mail: [email protected]

Resumo: O objetivo deste trabalho é avaliar o impacto do sombreamento parcial que

limita a radiação solar incidente sobre um módulo de conversão fotovoltaica de

substrato policristalino. A comparação dos resultados da simulação numérica com

resultados de medições experimentais de grandezas elétricas permitiu validar a

eficácia do modelo proposto de um único diodo. Na máxima potência e condição de

sombreamento parcial, o erro relativo (ER) da potência medida e simulada foi 4,2 %.

Palavras-chave: conversão fotovoltaica, sombreamento parcial, metrologia.

Abstract: The aim of this paper is to evaluate the impact of the partial shading that

limits the incident solar radiation on a polycrystalline photovoltaic module. A

comparison of the results of a numerical simulation with experimental measurements

of electrical magnitudes allowed validating the effectiveness of a single diode model.

At the maximum power and shading condition, the relative error (RE) of measured

and simulated power was 4.2 %.

Keywords: photovoltaic conversion, partial shading, metrology.

1. INTRODUÇÃO

Não são raras as situações em que o engenheiro

projetista se vê forçado a projetar a instalação de

módulos fotovoltaicos (PV, da denominação

Photovoltaic), em coberturas de edifícios,

fachadas ou em ambientes urbanos expostos a

efeitos adversos que comprometem a eficiência

da conversão PV. Nesse contexto, o

sombreamento parcial constitui um desses efeitos

adversos que limita de forma drástica a

incidência da radiação solar sobre o módulo PV,

a exemplo de sombras inevitáveis ocasionadas

pela presença de edificações e árvores na

adjacência de instalações, ou mesmo,

indesejáveis depósitos de sujeira, nuvens que se

interpõem à radiação. Este trabalho concentra-se

no estudo do impacto causado pelo

sombreamento parcial. Sob certas condições

operacionais, uma célula PV exposta ao

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8o Congresso Brasileiro de Metrologia, Bento Gonçalves/RS, 2015

2

sombreamento parcial dissipa potência elétrica

podendo aquecer ao ponto de comprometer o

próprio material do seu substrato [1], tal

fenômeno é conhecido como “pontos quentes”

[2]. Adicionalmente à perda de potência causada

pelo sombreamento parcial no sistema PV,

ocorrem perdas por dissociação ou descasamento

no arranjo de células do módulo fotovoltaico,

comumente denominado como “mismatch”

(resulta, também, de diferenças no processo de

fabricação, em que as células dos módulos não

são necessariamente idênticas entre si [3]).

2. CARACTERISTICAS I-V DA CÉLULA

O comportamento elétrico de uma célula PV

pode ser convenientemente representado pelo

circuito equivalente conforme ilustrado na figura

1. Este circuito elétrico é denominado de modelo

de um único díodo [4]. A discussão detalhada

desta alternativa constituiu objeto de pesquisa

recente dos autores [5].

Figura 1. Circuito equivalente de uma célula PV.

O modelo de um único diodo de uma célula

PV é representado por (1):

𝐼 = 𝐼𝑝ℎ − 𝐼𝑠𝑎𝑡[𝑒𝑉+𝑅𝑠𝐼𝑛𝑠𝑉𝑡 − 1] −

𝑉 + 𝑅𝑠𝐼

𝑅𝑝 (1)

𝑉𝑡 =𝐴𝑘𝑇

𝑞 (2)

Nestas equações, 𝐼 (A, ampère) denota a

corrente elétrica; 𝑉 (V, volt) a diferença de

potencial; 𝐼𝑝ℎ (A) a corrente induzida pelo efeito

PV; 𝐼𝑠𝑎𝑡 (A) a corrente de saturação reversa do

diodo; 𝐴 o fator adimensional de idealidade do

diodo; 𝑅𝑝 (Ω) a resistência paralela; 𝑅𝑠 (Ω) a

resistência em série; 𝑘 (J/K) a constante de

Boltzmann; 𝑞 (C, Coulomb) a carga do

elétron; 𝑛𝑠 o número de células em série e 𝑇 (K)

a temperatura da célula PV.

Com base no método desenvolvido em [5], os

parâmetros elétricos do módulo PV são

calculados (para a condição-padrão de referência)

a partir de especificações técnicas normalmente

disponibilizadas pelo fabricante do módulo

fotovoltaico. Os dados da tabela 1 comparam os

resultados dos parâmetros do modelo de um

diodo de um módulo PV (Sun Earth Solar Power,

TPB156X156-60-P, 235 W, policristalino) com

resultados obtidos no software comercial PVsyst

e SAM.

Tabela 1. Parâmetros elétricos do módulo PV.

𝐈𝐩𝐡(𝐀) 𝐈𝐬𝐚𝐭 (𝑨) 𝐑𝐬(Ω) 𝐑𝐩(Ω) 𝑨

PVsyst 8,47 3,60E-10 0,32 350,00 0,99

SAM 8,56 2,18E-09 0,39 682,87 0,98

Simulação 8,49 1,12E-09 0,33 799,93 1,05

O impacto do sombreamento parcial em um

módulo PV foi avaliado resolvendo

numericamente o circuito elétrico mostrado na

figura 2 em condições adversas específicas de

operação.

Figura 2. Arranjo elétrico de células de um

módulo PV (OrCAD/PSpice).

3. VALIDAÇÃO EXPERIMENTAL

Em estrita conformidade com o protocolo de

ensaios proposto pelo Departamento de Energia

I

+Iph

Id

-

VRp

Rs

U2

Celula SE235 0%

-+

U3

Celula SE235 0%

-+

U4

Celula SE235 0%

-+

U5

Celula SE235 0%

-+

U6

Celula SE235 0%

-+

U7

Celula SE235 0%

-+

U8

Celula SE235 0%

-+

U9

Celula SE235 0%

-+

U10

Celula SE235 0%

-+

U11

Celula SE235 0%

-+

U12

Celula SE235 0%-+

U13

Celula SE235 0%-+

U14

Celula SE235 0%-+

U15

Celula SE235 0%-+

U16

Celula SE235 0%-+

U17

Celula SE235 0%-+

U18

Celula SE235 0%-+

U19

Celula SE235 0%-+

U20

Celula SE235 0%-+

U21

Celula SE235 0%-+ U22

Celula SE235 0%

-+

U23

Celula SE235 0%

-+

U24

Celula SE235 0%

-+

U25

Celula SE235 0%

-+

U26

Celula SE235 0%

-+

U27

Celula SE235 0%

-+

U28

Celula SE235 0%

-+

U29

Celula SE235 0%

-+

U30

Celula SE235 0%

-+

U31

Celula SE235 0%

-+

U32

Celula SE235 0%-+

U33

Celula SE235 0%-+

U34

Celula SE235 0%-+

U35

Celula SE235 0%-+

U36

Celula SE235 0%-+

U37

Celula SE235 0%-+

U38

Celula SE235 0%-+

U39

Celula SE235 0%-+

U40

Celula SE235 0%-+

U41

Celula SE235 0%-+ U42

Celula SE235 0%

-+

U43

Celula SE235 0%

-+

U44

Celula SE235 0%

-+

U45

Celula SE235 0%

-+

U46

Celula SE235 0%

-+

U47

Celula SE235 0%

-+

U48

Celula SE235 0%

-+

U49

Celula SE235 0%

-+

U50

Celula SE235 0%

-+

U51

Celula SE235 0%

-+

U52

Celula SE235 0%-+

U53

Celula SE235 0%-+

U54

Celula SE235 0%-+

U55

Celula SE235 0%-+

U56

Celula SE235 0%-+

U57

Celula SE235 0%-+

U58

Celula SE235 0%-+

U59

Celula SE235 0%-+

U60

Celula SE235 0%-+

U61

Celula SE235 0%-+

D1

MBR1540

D2

MBR1540

D3

MBR1540

Carga

Rload

0

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8o Congresso Brasileiro de Metrologia, Bento Gonçalves/RS, 2015

3

dos Estados Unidos (DOE/USA) e homologado

pelo seu Laboratório Nacional de Energia

Renovável (NREL) [6], experimentos foram

realizados no Laboratório de Energias

Alternativas da PUC-Rio, para diferentes níveis

de sombreamento controlado fazendo uso de telas

semipermeáveis à radiação solar.

A figura 3 ilustra o aparato experimental, que

faz uso de instrumentos calibrados (piranômetro

Eppley (PSP); transdutor Pt-1000, de fabricação

Fronius e módulo PV Sun Earth Solar Power

TPB156X156-60-P 235 W, policristalino).

Medições de tensão e corrente elétrica nos bornes

do módulo PV foram realizadas e monitoradas

durante os experimentos, conforme descrito na

seção subsequente.

A incerteza associada às medições de 𝐼 (A)

e 𝑉 (V) foram estimadas pela propagação das

incertezas associadas à instrumentação acima

descrita, resultando nos seguintes valores de

incerteza expandida: 𝑢𝑉 = ± 0,11 %, 𝑢𝐼 = ± 2,3 %

e 𝑢𝑃 = ± 2,3 % no ponto de máxima potência.

Figura 3. Aparatos experimental utilizado.

3.1. Medições na ausência de sombreamento

A curva característica do módulo PV foi

construída, com base em medições de parâmetros

elétricos controlados realizadas na ausência de

exposição do módulo PV ao sombreamento.

Resultados dessas medições realizadas em dia de

céu limpo sem nuvens (dezembro/2014) são

mostrados nas figuras 4 e 5, para duas condições

de temperatura do módulo PV e de radiação solar

incidente e para diferentes valores da resistência

de carga.

Figura 4. Curva I-V e P-V, sem sombreamento.

Em ambos os casos, as resistências (30 Ω e 20

Ω, respectivamente) foram impostas para

viabilizar o fluxo de corrente entre os bornes do

módulo PV durante o intervalo de tempo dos

experimentos, que não excedeu 5 min. Para efeito

dos cálculos, foram considerados valores médios

medidos da radiação solar incidente e da

temperatura do módulo PV nesse curto intervalo

de tempo.

Figura 5. Curva I-V e P-V, sem sombreamento.

3.2. Medições na presença de sombreamento

Similarmente às medições reportadas na ausência

de sombreamento, experimentos foram repetidos

expondo o módulo PV a um sombreamento

parcial controlado induzido pelas telas-filtro

utilizadas [6]. A figura 6 ilustra a montagem do

experimento realizado na presença de

Pt1000 Piranômetro Módulo PV

Agilent 34970A Data Acquisition

Carga

Resistor shunt

0 5 10 15 20 25 30 35

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

11

12

13

14

15

Medições realizadas

Método proposto

Tensão (V)

Co

rre

nte

(A

)

0

25

50

75

100

125

150

175

Po

tên

cia

(W

)

G = 985,6 W/m2

Tc = 53,7 °C

0 5 10 15 20 25 30 35

0

1

2

3

4

5

6

Medições realizadas

Método proposto

Tensão (V)

Co

rre

nte

(A

)

0

25

50

75

100

Po

tên

cia

(W

)

G = 462,4 W/m2

Tc = 44.6 °C

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8o Congresso Brasileiro de Metrologia, Bento Gonçalves/RS, 2015

4

sombreamento parcial (malha semi-transparente

com fator 0,75 % de sombreamento), para uma

situação em que apenas 33 % do módulo PV foi

exposto à radiação solar incidente.

Figura 6. Experimentos com sombreamento.

A figura 7 mostra a curva característica do

módulo PV, construída com base em resultados

de medições realizadas quando este foi exposto a

sombreamento parcial (dados coletados dia 10/

dezembro/2014), durante o intervalo de tempo

entre 12:18:43:480 e 12:22:25:218. Os valores

reportados da radiação solar incidente e da

temperatura do módulo fotovoltaica referem-se a

valores médios medidos nesse intervalo de tempo,

para uma carga máxima imposta de 20 Ω.

Figura 7. Curvas características I-V e P-V, com

exposição a sombreamento parcial.

4. CONCLUSÕES

A comparação entre os resultados de corrente e

tensão elétrica determinados de forma

independente, quer pela simulação numérica,

quer pelas medições realizadas, permite concluir

que a modelagem por um único diodo constitui-

se em alternativa prática para simular os

parâmetros elétricos do módulo fotovoltaico. É

com base nesses parâmetros que se consegue

calcular os valores de corrente e tensão

requeridos para a construção das curvas

características quando o módulo fotovoltaico é

submetido a sombreamento parcial. Conforme

mostrado na figura 7, a simulação não apenas

reproduz os dados experimentais para diferentes

condições como, também, a forma das curvas

características I-V e P-V, drasticamente afetadas

pela condição de sombreamento parcial.

A qualidade da comparação da simulação

𝑃𝑐𝑎𝑙 (W, watt) pelo modelo de um único diodo

com os resultados das medições de 𝐼𝑒𝑥𝑝 (A) e

𝑉𝑒𝑥𝑝 (V) realizadas foi comprovada pelo RMSE

(Raiz média quadrática do erro) entre os N

resultados obtidos, calculados pela equação (3):

𝑅𝑀𝑆𝐸 = √1

𝑁∑(𝑃𝑖,𝑒𝑥𝑝 − 𝑃𝑖,𝑐𝑎𝑙)

2𝑁

𝑖=1

(3)

Os valores de RMSE (W) foram de 5,5; 1,87 e

8,62 que correspondem às figuras (4), (5) e (7)

respectivamente.

REFERÊNCIAS

[1] Silvestre S and Chouder A 2008 Progress in

Photovoltaics: Research and Applications 16 141

[2] Molenbroek E, Waddington D W and Emery

K A 1991 PV Specialists Conference 1 547

[3] Wilson K, De Ceuster D and Sinton R A 2006

4th World Conf. on PV Energy Conversion 1 916

[4] Kennerud K L 1969 Aerospace and

Electronic Systems AES-5 912

[5] Surichaqui R 2015 Dissertação (Mestrado em

Metrologia) PUC-Rio

[6] Deline C, Meydbray J, Donovan M and

Forrest J 2012 National Renewable Energy

Laboratory 303 275

Pt1000

Piranómetro

Módulo fotovoltaico

Malha semi-transparente

0 5 10 15 20 25 30

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

Medições realizadas

Método proposto

Tensão (V)

Co

rre

nte

(A

)

G = 697,9 W/m2

Tc = 48,7 °C

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

Po

tên

cia

(W

)