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Publicação co-financiada ao abrigo do Regulamento (CE) n.º 2152/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Novembro de 2003 - “Forest Focus”.

Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

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Este Estudo publicado pela Liga para a Protecção da Natureza (LPN), com a colaboração da Autoridade Florestal Nacional, apresenta un diagnóstico da evolução dos incêndios florestais e das políticas de Defesa da Floresta Contra Incêndios em Portugal nos cinco anos que precederam os grandes incêndios de 2003.

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Publicação co-financiada ao abrigo do Regulamento (CE) n.º 2152/2003, doParlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Novembro de 2003 - “Forest Focus”.

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FICHA TÉCNICA

Editores

Joaquim Sande Silva

Ernesto de Deus

Lúcia Saldanha

Publicação

Liga para a Protecção da Natureza

Autoridade Florestal Nacional

Desenvolvimento e Design gráfico

ImagemPlus multimédia, lda.

Impressão

Outubro de 2008

ISBN

978-972-98961-8-7

05 Nota Introdutória

07 Apresentação - Presidente da LPN

09 Apresentação - Presidente da AFN

11 INTRODUÇÃO

PARTE I

13 Evolução dos incêndios florestais em Portugal, antes e de-

pois de 2003

15 1. Estatísticas gerais sobre incêndios

16 2. Evolução do quadro legal e institucional

30 3. As ignições

34 4. A propagação

47 5. O combate

PARTE II

65 Comunicações apresentadas no Workshop “Incêndios Flo-

restais - 5 anos após 2003”

67 Américo Carvalho Mendes

77 Domingos Xavier Viegas

87 François Binggeli

97 Joaquim Sande Silva, Ernesto de Deus, Lúcia Saldanha

111 José Cardoso Pereira, Bernardo Mota, Ana Sá, Ana Barros,

Sofia Oliveira

125 Jordi Pages

131 Mark Beighley

139 Paulo Fernandes

149 Pedro Almeida Vieira

PARTE III

163 Contribuições dos participantes no Workshop “Incêndios

Florestais - 5 anos após 2003”

PARTE IV

195 Conclusões gerais

203 LISTA DE SIgLAS E ABREVIATURAS

ESTUDOS FOREST FOCUS

O estudo a que respeita a obra ora impressa foi realizado pela Liga para a Protecção da Natureza para a Autoridade Florestal Nacional

com co-financiamento do Regulamento (CE) n.º 2152/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Novembro de 2003 -

“Forest Focus”.

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NOTA INTRODUTÓRIAA Estratégia Nacional para as Florestas, adoptada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 114/2006,

identifica a minimização dos riscos de incêndios florestais como uma das seis linhas de acção estratégicas para

o desenvolvimento sustentável do sector florestal em Portugal.

A acção do Governo, que visa uma intervenção estruturada, de forma objectiva e concertada de curto e

médio prazo na mitigação do flagelo dos incêndios florestais em Portugal, encontra-se consubstanciada no

Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros

n.º 65/2006 e que estabelece a meta de reduzir a menos de 100.000 ha/ano de área ardida em 2012.

Igualmente em 2006, foi publicado o Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de Junho, que estabelece o Sistema

Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios, o qual estabelece um quadro de responsabilidades muito

claro e comete a responsabilidade da coordenação das acções de prevenção estrutural à Autoridade Florestal

Nacional, a vigilância, detecção e fiscalização à Guarda Nacional Republicana e o combate à Autoridade

Nacional de Protecção Civil.

Os dois documentos base referidos são o ponto de partida para uma reflexão independente sobre a forma

como Portugal respondeu aos desafios resultantes dos grandes incêndios florestais de 2003, cinco anos após

esse Verão trágico, em que os incêndios florestais afectaram cerca de 5% do território nacional, motivando,

inclusive, a mobilização dos apoios comunitários do Fundo de Solidariedade de União Europeia para o esforço

de recuperação das infra-estruturas e habitações destruídas pelo fogo. Esta análise enquadra-se igualmente

no estudo encomendado pelo Parlamento Europeu “Forest fires: Causes and contributing factors”, publicado

em Fevereiro último.

O presente livro surge como o corolário do estudo “Incêndios florestais em Portugal: uma análise crítica do

pós-2003”, realizado pela Liga para a Protecção da Natureza (LPN) a convite da Autoridade Florestal Nacional,

no quadro de execução do Programa Nacional (2005-2006) do Reg. (CE) nº 2152/2003, do Parlamento Euro-

peu e do Conselho, de 17 de Novembro de 2003, “Forest Focus”, que tem por objecto o apoio financeiro a

estudos relacionados com os incêndios florestais e as suas causas, na perspectiva da sua prevenção.

Foi, portanto, tendo em consideração o estatuto independente e o trabalho científico desenvolvido neste

domínio pela Liga para a Protecção da Natureza, de que se destaca a recente produção da série de livros “Ár-

vores e Florestas de Portugal” (edição conjunta com o Jornal Público e com a FLAD) onde se inclui um volume

exclusivamente dedicado à protecção da floresta e aos incêndios florestais, que a AFN propôs a realização do

estudo, constituído por duas partes distintas:

• A primeira parte, de carácter introdutório, apresenta o diagnóstico da evolução dos incêndios florestais e

das políticas de Defesa da Floresta Contra Incêndios em Portugal nos últimos cinco anos;

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A Liga para a Protecção da Natureza (LPN) é uma organização não governamental e uma instituição de utili-

dade pública sem fins lucrativos, que visa a protecção da natureza, isto é, a protecção dos recursos naturais,

ar, solo, água e diversidade biológica, bem como o património humanizado e a paisagem.

Desde a sua fundação, iniciada pela necessidade de salvar da degradação as manchas mais importantes do

património florestal (Arrábida, Gerês), que a LPN conta com ilustres silvicultures entre os seus associados e di-

rigentes, nunca deixando de se preocupar com as questões da salvaguarda do património florestal nacional.

Ainda antes do ano catastrófico de 2003, foi por iniciativa de um membro seu que o Conselho Nacional

do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS) produziu a “Reflexão sobre a Sustentabilidade da

Politica Florestal Nacional“.

Em 2003 desenvolvemos várias actividades ligadas aos incêndios, entre as quais a realização da conferência

“Incêndios 2003 - A reflexão inadiável“ e o lançamento de uma campanha de sensibilização sobre incêndios

a nível nacional.

Já em 2007, sempre com a consciência de que a floresta é um património essencial para o desenvolvimento

sustentável, a LPN diligenciou no sentido de conseguir promover a informação necessária à população portu-

guesa sobre a importância deste património, cada vez em maior risco devido às alterações climáticas, às alte-

rações do coberto vegetal e ao abandono do espaço rural. Assim, em edição conjunta com a Fundação Luso

Americana para o Desenvolvimento - FLAD e com o jornal Público, lançou a colecção de nove livros “Árvores

e Florestas de Portugal“. De entre estes livros, a preocupação com a protecção da floresta contra os incêndios

volta a sobressair com o Volume VIII – “Proteger a Floresta - Incêndios, Pragas e Doenças“, onde colaboram

novamente dirigentes da Associação, agora como especialistas.

Assim, aceitámos de muito bom grado e com entusiasmo a proposta da Autoridade Florestal Nacional, na

altura Direcção-Geral dos Recursos Florestais, para realizar uma análise critica das medidas adoptadas, 5 anos

após 2003, ano da maior tragédia de sempre ao nível dos incêndios em Portugal. Este estudo inclui uma

caracterização da evolução recente dos incêndios e uma análise critica dos factores que determinam a sua

ocorrência em Portugal, focando as vertentes da ignição, da propagação e do combate. Para a concretização

da presente edição, contámos ainda com os contributos de diversos especialistas, reunidos num Workshop

realizado em Coimbra a 17 de Outubro de 2008.

No presente volume, referem-se os problemas da organização institucional, das causas das ignições e das

medidas necessárias para a sua redução, da situação preocupante da estrutura fundiária, do planeamento e

gestão florestal e da sua certificação, da gestão dos combustíveis e do dispositivo de combate aos incêndios,

entre outros aspectos.

• A segunda parte, de carácter mais operacional, que faz a análise critica dos factores que determinam a

ocorrência dos incêndios florestais, designadamente as vertentes da ignição, propagação e combate, para

a qual o Workshop realizado em Outubro último, com a presença de especialistas nacionais e estrangeiros,

deu um contributo precioso e que permitiu a identificação de alguns factores críticos para a melhoria do

desempenho do Sistema Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios.

O estudo, cujos resultados são agora publicados, teve a coordenação científica do Prof. Doutor Joaquim San-

de Silva (Escola Superior Agrária de Coimbra), tendo decorrido entre Maio e Outubro de 2008.

Autoridade Florestal Nacional

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| 8 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 9 |

Esta publicação final resulta de meio ano de trabalho intenso de colegas que a ele dedicaram a sua elevada

competência e entusiasmo, esperando a Liga para a Protecção da Natureza que seja útil para o futuro da Flo-

resta Portuguesa e para a sua necessária reconversão, no sentido de salvaguardar o património insubstituível

que ela constitui.

Eugénio Sequeira, Presidente da LPN

Os incêndios devastadores que ocorreram no ano de 2003 foram determinantes para a decisão de realização

deste livro. Com uma área ardida de 425.000 ha, valor nunca antes imaginável, o país assistiu durante esse

Verão a uma gravíssima situação social, económica e ambiental sem precedentes em termos nacionais, mas

também europeus. Após esse Verão de 2003, os incêndios florestais deixaram de ser, definitivamente, um

problema apenas do sector florestal para passar a ser uma preocupação da sociedade portuguesa.

A floresta, que ocupa 34% do território nacional, é um bem fundamental para o bom ordenamento, desen-

volvimento e valorização dos espaços rurais e também da economia nacional. A floresta portuguesa assume

igualmente, de forma diversificada, um papel ambiental de enorme relevância, cada vez mais reconhecido

pela sociedade. É nessa perspectiva que a Estratégia Nacional para as Florestas tem na minimização dos riscos

de incêndios florestais uma das suas principais linhas de acção estratégicas.

Foi, neste quadro, que a Autoridade Florestal Nacional convidou a Liga para a Protecção da Natureza (LPN)

- a mais antiga Organização Não-Governamental de Ambiente da Península Ibérica - para fazer um balanço

independente, com origem na sociedade civil, sobre a evolução ocorrida no domínio da Defesa da Floresta

Contra Incêndios durante os últimos cinco anos.

Com co-financiamento comunitário do Programa “Forest Focus”, durante seis meses, a LPN realizou um im-

portante e intenso trabalho de recolha e tratamento de informação, considerado no relatório de diagnóstico,

que serviu de base ao Workshop realizado em Outubro último.

A presente publicação constitui assim, como se pretendia, uma reflexão e contribuição independentes sobre

a evolução dos incêndios florestais e da política de Defesa da Floresta Contra Incêndios em Portugal, em três

domínios: as ignições, a propagação e o combate.

Portugal dispõe, desde Maio de 2006 de um Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PNDFCI

- RCM n.º 65/2006), que define as grandes linhas de actuação e um conjunto de acções destinadas a intensi-

ficar e alargar a gestão activa da floresta. Foram assim estabelecidas as condições para a redução progressiva

da incidência dos incêndios florestais, de modo a que a área ardida em Portugal seja, em concreto, reduzida

a menos de 100 mil ha/ano em 2012 e a que sejam eliminados os incêndios com áreas superiores a 1000 ha,

que têm sido os responsáveis pelas grandes áreas ardidas.

Para alcançar os objectivos, acções e metas consagradas no PNDFCI, estão previstas intervenções em três domí-

nios prioritários: prevenção estrutural, vigilância e combate. Domínios prioritários que, por sua vez, têm corres-

pondência em cinco eixos estratégicos de actuação: aumento da resiliência do território aos incêndios florestais;

redução da incidência dos incêndios; melhoria da eficácia do ataque e da gestão dos incêndios; recuperação e

reabilitação dos ecossistemas e a adopção e instalação de uma estrutura orgânica funcional e eficaz.

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INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 11 |

INTRODUÇÃOA presente edição insere-se no âmbito do estudo “Incêndios em Portugal: uma análise crítica do pós-2003”,

encomendado pela Autoridade Florestal Nacional (ex Direcção-Geral dos Recursos Florestais) à Liga para a

Protecção da Natureza. Este estudo foi co-financiado pelo Programa Europeu “Forest Focus” e envolveu

várias iniciativas, incluindo a elaboração de um relatório com a caracterização da evolução recente do siste-

ma de Defesa da Floresta Contra Incêndios (DFCI) e a realização, em 17 de Outubro de 2008, do Workshop

“Incêndios Florestais – 5 anos após 2003”. O presente volume inclui assim as contribuições quer do relatório

quer do Workshop, no sentido de permitir uma reflexão sobre o percurso da DFCI em Portugal desde 2003,

ano em que se registou a maior área ardida de sempre no nosso país.

A PARTE I deste volume tenta caracterizar a evolução recente de todo o sistema de DFCI em Portugal e é uma

versão condensada do relatório “Evolução dos Incêndios Florestais em Portugal, antes e após 2003”, elabo-

rado no âmbito do estudo já referido. O trabalho realizado consistiu sobretudo na recolha de informação

publicada e não publicada, junto das várias instituições ligadas à DFCI em Portugal e o seu posterior trata-

mento. Foi claramente privilegiada a recolha de dados publicados que pudessem ser referenciados e, apenas

nos casos em que a informação não se encontrava disponível dessa forma, se procedeu à recolha directa junto

das instituições responsáveis. Tratou-se de um trabalho difícil, quer devido ao pouco tempo disponível para o

concluir (Junho – Agosto de 2008), coincidente com o período de férias, quer devido aos constrangimentos

de natureza burocrática que foi necessário ultrapassar. Deste modo, existem lacunas de informação que, ape-

sar dos nossos esforços, não foi possível colmatar em tempo útil. De entre estas lacunas salientamos os dados

de natureza financeira, em termos da execução do Orçamento de Estado e em termos dos prejuízos causados

pelos incêndios. Em particular teria sido muito importante ter dados actualizados sobre a execução do Fundo

Florestal Permanente, mas tal não nos foi de todo possível apesar da nossa insistência junto do Instituto de Fi-

nanciamento da Agricultura e Pescas, através dos serviços da ex-DGRF. Por outro lado, estivemos conscientes

da impossibilidade de vir a recolher informação sobre medidas e actividades não sujeitas a qualquer registo

sistematizado, como por exemplo os aspectos associados à formação e treino dos bombeiros voluntários

no seio das suas corporações ou os aspectos associados à gestão de combustíveis. Foi dada bastante mais

importância à perspectiva temporal que à perspectiva espacial. As séries temporais apresentadas padecem

das dificuldades já referidas mas foram estendidas o mais possível a períodos anteriores a 2003, de modo a

dar uma perspectiva histórica alargada. Em termos de actualização tentámos obter os dados mais recentes,

mesmo tendo em conta que, no caso de 2008, os dados se referem apenas a uma parte do ano.

A PARTE II do presente volume é constituída por textos que serviram de base às apresentações orais do

Workshop “Incêndios Florestais – 5 anos após 2003”. Deste modo, o conteúdo dos textos é da responsa-

bilidade dos respectivos autores, a quem nos limitámos a dar indicações de natureza editorial. O grupo de

autores inclui especialistas nacionais e estrangeiros que foram convidados a dar a sua opinião sobre os desen-

volvimentos recentes no panorama dos incêndios florestais em Portugal. No referido Workshop foi também

Os resultados obtidos após 2006 deixam-nos confiantes quanto ao futuro, mas também com a consciência

de que ainda temos pela frente muito caminho a percorrer e trabalho árduo a realizar, com particular relevo

no domínio da prevenção estrutural, cujo adequado planeamento e boa execução é fundamental para o

sucesso desta.

A prevenção estrutural dos incêndios florestais, abrangendo designadamente os domínios do planeamento,

da formação e do conhecimento, da sensibilização e da gestão dos combustíveis é uma missão complexa

e uma das principais missões cometidas à Autoridade Florestal Nacional. A elaboração e edição deste livro,

quanto a nós, insere-se assim no âmbito dos referidos eixos da prevenção estrutural e constitui um apoio e

um contributo sobre esta problemática, que cremos do maior interesse para todas as entidades que integram

o Sistema Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios e para a própria sociedade em geral.

António José L. Martins Rego,

Presidente da Autoridade Florestal Nacional

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PARTE IEVOLUÇÃO DOS INCÊNDIOS FLORESTAIS EM PORTUgAL,

ANTES E DEPOIS DE 2003

JOAQUIM SANDE SILVA, ERNESTO DE DEUS, LÚCIA

SALDANHA - LIGA PARA A PROTECÇÃO DA NATUREZA

feita uma ronda por todos os restantes participantes convidados, todos eles representando instituições de

alguma forma ligadas à DFCI em Portugal. As intervenções orais resultantes desta participação foram regis-

tadas e transpostas para texto, constituindo a PARTE III do presente volume. Finalmente a PARTE IV resulta

da análise que fizemos de todas as contribuições, retendo os aspectos que foram referidos por mais que um

participante, de modo a fazer uma súmula dos resultados do Workshop.

O presente volume assume-se assim como uma tentativa de fazer um balanço crítico à evolução recente da

DFCI em Portugal, tendo como base as contribuições de um leque alargado de pessoas com conhecimento

aprofundado sobre os aspectos associados ao problema dos incêndios florestais. Mais do que um mero listar

de opiniões, pretende-se que o presente volume possa ser utilizado por todos os que têm e terão algum papel

na definição e na aplicação das políticas de DFCI em Portugal, no sentido de serem corrigidos os aspectos

negativos e reforçados os aspectos positivos. Num cenário de incertezas, não apenas climáticas mas também

económicas e sociais, é ainda mais importante ter em conta os ensinamentos do nosso passado recente, de

modo a podermos tomar as decisões mais correctas no sentido de evitarmos a todo o custo que os aconteci-

mentos de 2003 se voltem a repetir.

Os editores

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INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 15 |

1. ESTATÍSTICAS gERAIS SOBRE INCÊNDIOS

Nos dados disponíveis referentes às ocorrências ve ri fi-

ca-se em Portugal um aumento significativo a partir de

meados da década de 90. O ano de 1995 representa o

iní cio de um período com valores muito elevados (Figu-

ra 1). O número de ocorrências atinge valores má ximos

nos anos de 1998 (34.676 ignições), 2000 (34.109) e

2005 (35.698) (Tabela 1). No entanto, devemos enca-

rar esta evolução com alguma reserva, dado que os

critérios e o procedimento utilizados pa ra o registo de

novas ocorrências têm variado ao longo do tempo.

O número de ocorrências em Portugal tem-se des-

tacado no âmbito do conjunto dos países da Europa

mediterrânica. A par de Portugal, também a Espanha

revelou um agravamento, embora menor, nestes re-

gistos. Espanha é de facto o país com a variação mais

semelhante à do nosso país.

FIgURA 1 A evolução anual do n.º de ocorrências para o período 1980–2007. FONTES: DGRF, 2007a; European Commission, 2008.

TABELA 1 Dados estatísticos sobre o número de ocorrências e áreas ardidas em Portugal desde 1998. FONTE: AFN, 2008a. Os dados de 2008 referem-se ao período compreendido entre 1 de Janeiro e 15 de Outubro.

ANOS OCORRÊNCIAS ÁREA ARDIDA (ha)

Incêndios Fogachos (<1 ha) Total Povoamentos Matos Total

1998 8.834 25.842 34.676 57.393 100.975 158.368

1999 5.782 19.695 25.477 31.052 39.561 70.613

2000 8.802 25.307 34.109 68.646 90.958 159.604

2001 6.869 20.073 26.942 45.609 66.557 112.166

2002 6.492 20.000 26.492 65.164 59.245 124.409

2003 5.309 20.886 26.195 286.055 139.671 425.726

2004 5.020 16.950 21.970 56.109 73.430 129.539

2005 8.179 27.519 35.698 213.517 124.745 338.262

2006 3.455 16.466 19.921 36.320 39.189 75.509

2007 3.566 15.166 18.732 9.638 21.812 31.450

Média 98-07 6.231 20.790 27.021 86.950 75.614 162.564

2008 2.162 9.752 11.914 5.006 9.404 14.410

1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006

Portugal Espanha França Itália Grécia

40.000

30.000

20.000

10.000

0

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| 16 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 17 |

o Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvol-

vimento da Agricultura e das Pescas (IFADAP). Em

vir tude desta reestruturação, em 1997 foi aprovada

a Lei Orgânica da DGF, através do Decreto Regula-

mentar n.º 11/97, de 30 de Abril, investindo-a das

funções de autoridade florestal nacional pelo Decre-

to-Lei n.º 256/97, de 27 de Setembro.

Entre outras consequências, os incêndios de 2003

vêm despoletar mais uma reforma estrutural do Sec-

tor Florestal. No início de Outubro de 2003 é criada

a Secretaria de Estado das Florestas, representando

a ten tativa de centralizar numa só entidade as ques-

tões da política florestal, concentrando a prevenção

dos in cêndios e a primeira intervenção no âmbito do

MADRP (RCM n.º 65/2006, de 26 de Maio). Pouco

mais tarde, a Reso lução do Conselho de Ministros

n.º 178/2003, de 17 de Novembro, vem materializar

as grandes linhas orientadoras da reforma estrutural

do sector florestal, organizando-as em cinco gran-

des Eixos: a reforma ins titucional, o reordenamento

e a gestão florestal, o financiamento e fiscalidade,

a reestruturação do sis tema de defesa florestal con-

tra incêndios e a reflorestação das áreas ardidas. As

medidas no âmbito do financiamento e da reflores-

tação das áreas ardidas são as primeiras a avançar,

nomeadamente através da criação da Equipa de

Reflorestação (Resolução de Conselho de Ministros

n.º 17/2004, de 2 de Março) e da criação do Fundo

Florestal Permanente (FFP) (DL n.º 63/2004, de 22 de

Março). Em 2004, os serviços florestais são de novo

reestruturados, criando-se a Direcção-Geral dos Re-

cursos Florestais (DGRF), entrando a respectiva Lei

Orgânica em vigor com a publicação do Decreto-Lei

n.º 80/2004, de 10 de Abril. A DGRF assume o es-

tatuto de orga nis mo público investido de autorida-

de florestal na cio nal, que integra o Corpo Nacional

da Guarda Flo res tal (CNGF), sendo coadjuvada pelo

Conselho da Autoridade Florestal. Esta reestrutura-

ção traz de volta os serviços re gionais, sendo defini-

das as suas unidades orgânicas e suas competências

pela Portaria n.º 574/2004, 28 de Maio. São criadas

três circunscrições florestais (Norte, Centro e Sul) e

21 núcleos florestais.

A reforma institucional vem expressar-se também

através da criação da Agência para a Prevenção de

In cêndios Florestais (APIF) e da atribuição de todas as

funções de prevenção ao MADRP. A criação da APIF

dá-se através do Decreto Regulamentar n.º 5/2004,

de 21 de Abril, como um serviço central de coorde-

nação dependente do MADRP, ten do por missão a

concertação de estratégias, promovendo a compa-

tibilização das intervenções a nível central e local no

âmbito da prevenção e protecção da floresta contra

incêndios florestais.

A APIF era composta por um coordenador e por

um Conselho de Representantes. Este conselho era

constituido pelos dirigentes da DGRF, ICN, ANMP,

IM, SNBPC, PJ, GNR e ainda por representantes dos

três ramos das Forças Armadas. De entre as compe-

tências atribuídas, a APIF deveria coor denar as medi-

das e iniciativas no âmbito da pre ven ção dos fogos

florestais, devendo elaborar o Plano Na cional de De-

fesa da Floresta Contra Incêndios (PN DFCI), coorde-

nar a elaboração dos Planos Mun i cipais de Defesa da

Floresta Contra Incêndios (PMDFCI) e o seu acom-

panhamento e avaliação, gerir os sistemas de infor-

mação geográfica, coordenar o sistema de detecção,

incluindo o desenvolvimento de um sis tema de alerta

eficaz, reforçar a dimensão e as competências das

equipas de sapadores florestais (eSF), e estimular a

profissionalização dos bombeiros. Das atribuições da

Durante o período 1980 – 2007, estes países tota-

lizaram cerca de 13,8 milhões de hectares de áreas

ar didas, sendo Espanha (37%), Itália (24%) e Por-

tugal (23%) os responsáveis pelo maior contributo

para este total. Limitando esta análise aos últimos

dez anos (1998 – 2007), Portugal assume 38% do

total (cerca de 1,6 milhões de hectares).

2. O QUADRO LEgAL E INSTITUCIONAL

As reformas estruturais do sector florestal

A organização dos Serviços Florestais do Estado tem

sofrido alterações constantes nos últimos anos, fru-

to de sucessivas reestruturações (Figura 3). Na sua

his tória recente destaca-se a reestruturação do Mi-

nistério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e

das Pescas (MADRP), ocorrida em 1996. Através do

Decreto-Lei n.º 74/96, de 18 de Junho, aprovou-se a

Lei Orgânica do MADRP, extinguindo o Instituto Flo-

restal e criando a Direcção-Geral das Florestas (DGF).

Em simultâneo, ocorre a reorganização das Direcções

Regionais de Agricultura, publicada no Decreto-Lei

n.º 75/96, de 18 de Junho, que passam a integrar

os serviços florestais regionais. Desta reestruturação

resultou também a transição da administração de

apoios públicos comunitários e gestão florestal para

O ano de 2003 registou os mais elevados valores

de área ardida em toda a história dos incêndios em

Portugal. Nesse ano arderam cerca de 426.000 ha,

um valor anormalmente elevado face às restantes es-

tatísticas relativas à superfície queimada anualmen-

te. De facto, o máximo antes registado havia sido

em 1991, com cerca de 182.000 ha, e entre 1980

e 2002 ardiam em média cerca de 94.000 ha por

ano. Se juntarmos os resultados do período 2003 –

2007, a área ardida média aumenta para cerca de

100.000 ha anuais. Espanha, durante a década de

80 e primeira metade da década de 90, registou va-

lores recorde em áreas ardidas, ultrapassando por

três vezes os 400.000 ha: em 1985 (484.000 ha),

em 1989 (426.999 ha) e em 1994 (437.000 ha) (Fi-

gura 2). Merece especial referência o ano de 2007

na Grécia, que com cerca de 225.000 ha de área

ardida, constituem um resultado claramente superior

a qualquer um registado neste país durante este pe-

ríodo de análise.

1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006

Portugal Espanha França Itália Grécia

600.000

500.000

400.000

300.000

200.000

100.000

0

ha

FIgURA 2 Evolução anual da área ardida para o período 1980 – 2007. FONTES: DGRF, 2007a; European Commission, 2008.

Page 12: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 18 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 19 |

As reformas da política de Protecção Civil

No Verão de 2003, a Protecção Civil tinha como enti-

dade responsável o Serviço Nacional de Bombeiros e

Protecção Civil (SNBPC). De referir que o SNBPC tinha

sido criado apenas em Maio de 2003, em resultado

da fusão do Serviço Nacional de Bombeiros (SNB) e

do Serviço Nacional de Protecção Civil (SNPC). O Li-

vro Aberto do Sistema de Protecção e Socorro em

Portugal (LBP, 2003) aponta o facto de que a cria-

ção do SNBPC não foi seguida de uma revisão da

estrutura organizacional. Segundo este relatório, o

passa a integrar a Unidade de Defesa da Floresta, que

contempla os riscos bióticos e abióticos. No âmbito

da DFCI, a AFN tem como atribuições (1) promover a

formulação e impulsionar a monitorização das políti-

cas de DFCI, (2) promover a criação e estruturar um

dispositivo de prevenção estrutural, (3) coordenar o

Programa Nacional de Sapadores Florestais, (4) gerir

o Sistema de Informação de Incêndios Florestais, (5)

assegurar a gestão de combustíveis, (6) acompanhar

as actividades agrícolas e de silvo-pastorícia na sua

interacção com a DFCI, e (7) promover os trabalhos

necessários à elaboração de índices de risco temporal

e espacial no âmbito dos incêndios florestais.

APIF, destacou-se o seu esforço na cria ção dos Gabi-

netes Técnicos Florestais (GTF). Para a realização do

PNDFCI, contratou uma equipa do Instituto Superior

de Agronomia (ISA) para a elaboração de uma pro-

posta técnica (ISA, 2005).

Foram criadas, através da Lei n.º 14/2004, de 8 de

Maio, as Comissões Municipais de Defesa da Floresta

Contra Incêndios (CMDFCI) no seio do Serviço Mu-

nicipal de Protecção Civil (SMPC). Estas comissões,

vieram extinguir as Comissões Especializadas em Fo-

gos Florestais (CEFF) municipais e distritais, tendo por

missão coordenar, a nível local, as acções de DFCI e

promover a sua execução.

Prosseguindo a Reforma do Sector Florestal, em

Agosto com o Decreto-Lei n.º 127/2005, foi publi-

cado o regime de criação de Zonas de Intervenção

Florestal (ZIF) e os princípios reguladores da sua cons-

tituição, funcionamento e extinção.

Foi entretanto concluída e aprovada pelo Governo a

Estratégia Nacional para as Florestas (ENF) pela Reso-

lução do Conselho de Ministros n.º 114/2006, de 15

de Setembro, depois de um processo de discussão

pública. Pretendeu-se com a ENF dotar o sector flo-

restal de um elemento de referência das orientações

e planos de acção públicos e privados para o desen-

volvimento do sector nas próximas décadas.

No âmbito do Programa de Reestruturação da Ad-

ministração Central do Estado (PRACE), o MADRP

so fre uma revisão da sua Lei Orgânica, aprovada no

Decreto-Lei n.º 209/2006, de 27 de Outubro. Em

2006, processa-se a extinção da APIF em simultâneo

com a transição das respectivas atribuições para a

DGRF (DL n.º 68/2006 e 69/2006, de 23 de Março).

São também excluídas as referências ao CNGF cujo

pessoal tinha sido integrado no Serviço de Protec-

ção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da Guarda

Nacional Republicana (GNR) (DL n.º 22/2006, de 2

de Fevereiro). Na sequência da nova Lei Orgânica

do MADRP, a DGRF foi objecto de reestruturação,

mantendo-se como serviço central da Administração

directa do Estado, tendo contudo a necessidade de

proceder a alterações na sua organização interna

no sentido de reforçarem a sua missão e respecti-

vas competências no âmbito do Sistema Nacional de

Defesa da Floresta Contra Incêndios (SNDFCI) e de

garantirem a adequada operacionalização da ENF. A

nova Lei orgânica da DGRF é aprovada pelo Decreto

Regulamentar n.º 10/2007, de 27 de Fevereiro, des-

tacando as suas atribuições na coordenação e apoio

da execução da política florestal no âmbito da ENF. A

Portaria n.º 219-E/2007, de 28 de Fevereiro, vem de-

terminar a estrutura nuclear dos serviços e as compe-

tências das respectivas unidades orgânicas. Assim, a

estrutura nuclear da DGRF passa a ser composta por

cinco direcções, entre as quais a Direcção de Serviços

de Defesa da Floresta Contra Incêndios.

Em 2008, é publicada a nova Lei Orgânica da Auto-

ridade Florestal Nacional (AFN) (DL n.º 159/2008, de

8 de Agosto). A desconcentração dos serviços é fei ta

através da criação de cinco Direcções Regionais das

Florestas: Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alen-

tejo e Algarve, de acordo com as NUT nível II. A nova

Lei Orgânica cria o Conselho Florestal Nacional (CFN)

que é um órgão consultivo de concertação de âmbito

nacional. Este CFN tem como competências a emissão

de pareceres sobre a legislação estruturante do sector,

as estratégias florestais e planos de defesa da floresta,

programas de actividades do SNDFCI e políticas na-

cionais de caça e pesca nas águas interiores. A DFCI

FIgURA 3 Alterações recentes na Administração Florestal FONTE: Adaptado de RCM n.º 114/2006.

1993

1996

2004

2006

2007

2008

Direcções Regionais de Agricultura

Agência para a Pre venção de IncêndiosFlorestais

Direcção-geraldas Florestas

Direcção-geral dos Recursos Florestais

Circunscrições Flo res tais Norte, Centro, Sul

Núcleos Florestais (21)

Direcção-geral dos Recursos Florestais

Direcção de Serviços de DFCI

Direcção da Uni-da de de Defesa da Floresta

Direcções Regio nais das Florestas: Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve

Corpo Nacional da guarda Florestal

Equipa de Reflores tação Conselho Na cio nal de Reflorestação

SEPNA (gNR)

IFADAP

(Fundo Florestal Permanente)

IFAP

(Serviços Regionais) (QCA/PAC)

Autoridade Florestal Nacional

Instituto Florestal

Page 13: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 20 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 21 |

Depois da transferência do pessoal do CNGF para a

GNR, a Portaria n.º 798/2006, de 11 de Agosto, veio

definir os termos em que se processa a coordenação

da actividade dos serviços dependentes dos MAI, MA-

OTDR e MADRP, no âmbito da defesa da floresta con-

tra incêndios florestais, na protecção contra agentes

bióticos e na prevenção de outras agressões.

A Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) su-

cede em 2007 ao SNBPC. Prevista na Lei de Bases da

Protecção Civil, que redefine o sistema de protecção

civil, é regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 75/2007,

de 29 de Março. A ANPC tem como missão plane-

ar, coordenar e executar a política de protecção civil,

designadamente, na prevenção e reacção a aciden-

tes graves e catástrofes, de protecção e socorro de

populações e de superintendência da actividade dos

bombeiros. A ANPC tem como atribuições no âmbito

das actividades dos bombeiros: orientar, coordenar e

fiscalizar a actividade dos corpos de bombeiros (CB),

promover e incentivar a participação das populações

no voluntariado e todas as formas de auxílio na mis-

são das associações humanitárias de bombeiros e

dos CB, assegurar a realização de formação pessoal

e profissional dos bombeiros portugueses, e assegu-

rar a prevenção sanitária, a higiene e a segurança

do pessoal dos CB. Conforme previsto no SIOPS, foi

também definido o Comando Nacional de Opera-

ções, que compreende as células de planeamento,

operações e informações, a de logística, a de gestão

de meios aéreos e a de comunicações. O desdobra-

mento regional é feito através dos CDOS.

Enquadramento legislativo e institucional

da DFCI

O Decreto-Lei n.º 156/2004, de 30 de Junho, veio

es tabelecer o Sistema Nacional de Prevenção e Pro-

tecção da Floresta Contra Incêndios (SNPPFCI), pre-

vendo um conjunto de medidas e acções estruturais

e operacionais relativas à prevenção, sensibilização,

silvicultura preventiva, vigilância, detecção, rescaldo,

vigilância pós-incêndio e fiscalização, cabendo à APIF

a coordenação do sistema e a intervenção no sentido

de assegurar a execução das medidas e acções nele

previstas (Figura 5). A nível municipal, as CEFF são

substituídas pelas CMDFCI, que constituem centros

de coordenação e acção local das acções de DFCI

(Figura 4 e Figura 5).

Em 2005 é aprovado o Plano Operacional de Pre-

venção e Combate aos Incêndios Florestais através

da Resolução do Conselho de Ministros n.º 58/2005,

de 8 de Março, onde se refere que “a experiência

de épocas de incêndios transactas permitiu avaliar a

coordenação operacional do SNBPC, tendo sido de-

tectada a necessidade de adoptar medidas que visem

reforçar e melhorar neste domínio”.

Pretendia esta Resolução reforçar os meios ao nível

da prevenção e vigilância orientadas para a sensibi-

lização e dissuasão, no âmbito das competências do

MADRP, e constituir um sistema de comando único

para as acções de vigilância, detecção e combate a

fogos florestais, dirigido pelo MAI. Este sistema de

comando seria suportado por uma célula de apoio

à decisão (técnicos do MAI, do MADRP, do MAOT

- Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Ter-

ritório e da AFOCELCA).

De acordo com as medidas propostas e orçamenta-

das nesta Resolução, a verba dedicada a silvicultura

preventiva, fiscalização e prevenção era praticamen-

te o dobro da dedicada ao dispositivo especial de

Centro Nacional de Operações de Socorro (CNOS) foi

criado sem ser dotado da estrutura técnica e humana

adequadas, o mesmo sucedendo com os Centros Dis-

tritais de Coordenação de Socorros (CDCS). Segun-

do a Liga dos Bombeiros Portugueses (LBP), o SNBPC

acabou por se transformar na soma aritmética dos

recursos de dois serviços extintos, correspondendo o

CNOS ao anterior Centro Nacional de Coordenação

de Socorro do extinto Serviço Nacional de Bombei-

ros (SNB), e correspondendo os Centros Distritais de

Operações de Socorro (CDOS) aos CDCS, aos quais

foram acrescentadas as competências de Protecção

Civil. Refere também que a Lei Orgânica foi também

omissa quanto ao nível municipal, previsto na Lei de

Bases da Protecção Civil.

Em 2006, ocorre uma nova reforma legislativa da po-

lítica de protecção civil executada pelo Governo. No

contexto do PRACE, são aprovadas as Leis Orgânicas

do Ministério da Administração Interna (MAI) (DL n.º

203/2006, de 27 de Outubro), do Ministério do Am-

biente, do Ordenamento, do Território e do Desen-

volvimento Regional (MAOTDR) (DL n.º 207/2006,

de 27 de Outubro) e do MADRP (DL n.º 209/2006,

de 27 de Outubro).

No plano da reforma institucional, foi publicado o

Decreto-Lei n.º 21/2006, de 2 de Fevereiro, com a

al te ração à Lei Orgânica do SNBPC, procurando-se

corrigir as fragilidades verificadas nas estruturas de

comando das operações e completar o processo ini-

ciado em 2005, com a recuperação da capacidade

de comando ao nível das estruturas nacional e dis-

tritais do SNBPC.

A nova Lei de Bases da Protecção Civil foi aprovada

em Julho de 2006 (Lei n.º 27/2006, de 3 de Julho),

trazendo uma nova organização operacional. O di-

ploma organiza-se em torno do princípio da subsi-

diariedade, que determina que o subsistema de pro-

tecção civil de nível superior só deve intervir se e na

medida em que os objectivos da protecção civil não

possam ser alcançados pelo subsistema de protecção

civil ime diatamente inferior, dependendo da dimen-

são e da gravidade dos efeitos das ocorrências.

A revisão legislativa levou à constituição do Siste-

ma Integrado de Operações de Protecção e Socorro

(SIOPS) (DL n.º 134/2006, de 27 de Julho), que surge

pela necessidade de criar um instrumento global e

centralizado de coordenação e comando de opera-

ções de socorro, cuja execução compete a entidades

diversas e que dependem para efeitos operacionais

deste sistema. O SIOPS consiste num conjunto de

estruturas, normas e procedimentos que asseguram

que todos os agentes de protecção civil actuam no

plano operacional articuladamente sob um comando

único, sem prejuízo da respectiva dependência hie-

rárquica. A coordenação institucional é assegurada,

a nível nacional e a nível distrital, pelos Centros de

Coordenação Operacional, que integram represen-

tantes das entidades cuja intervenção se justifica em

função de cada ocorrência.

Prosseguindo a necessidade de reforço da capacida-

de de vigilância e fiscalização do território nacional,

procedeu-se à consolidação do SEPNA, no âmbito

orgânico da GNR, integrando nesse serviço o pessoal

do CNGF da DGRF, entretanto extinto. Foram tam-

bém criados no âmbito da GNR os Grupos de Inter-

venção de Protecção e Socorro (GIPS), com acção na

prevenção e intervenção de primeira linha em caso

de incêndios florestais e outras situações de emer-

gência (DL n.º 22/2006, de 2 de Fevereiro).

Page 14: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 22 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 23 |

dios; Eixo 3 – Melhoria da eficácia do ataque e da

gestão dos incêndios; Eixo 4 – Recuperar e reabilitar

os ecossistemas; Eixo 5 – Adaptação de uma estrutu-

ra orgânica funcional e eficaz.

Incorporando os resultados da experiência de duas

épo cas de incêndio, foi publicado o Decreto-Lei

n.º 124/2006, de 28 de Junho, que revoga o Decreto-

-Lei n.º 156/2004 e define o SNDFCI. No SNDFCI as

responsabilidades de coordenação foram repartidas

por três entidades (Figura 6): a DGRF (actualmente

AFN) como responsável pela coordenação das acções

de prevenção estrutural, ver te ntes da sensibilização,

planeamento, organização do território florestal, silvi-

cultura e infra-estruturação; a GNR como responsável

pela coordenação das acções de prevenção operacio-

nal nas vertentes de vigilância, detecção e fiscalização;

a ANPC como responsável pela coordenação das ac-

ções de combate, rescaldo e vigilância pós-incêndio.

À DGRF acrescia ainda a responsabilidade de manter

o Sistema de Gestão e Informação de Incêndios Flo-

restais e o registo cartográfico das áreas ardidas.

O planeamento da DFCI, considerando inicialmente

o nível nacional e municipal (2004), foi revisto pas-

sando a contemplar quatro níveis: nacional, regional

ou supra-regional, municipal e intermunicipal e local

(2006). Os PMDFCI prevêem agora a possibilidade

dos municípios criarem e implementarem programas

especiais de intervenção florestal no âmbito de pla-

nos de defesa da floresta para áreas de grande valor

estratégico nacional e para áreas florestais estraté-

gicas e de elevado valor. Na revisão do SNDFCI tam-

bém ficou previsto que a não aprovação do PMDFCI

privaria as autarquias do direito de subsídio ou bene-

fício dado pelo Estado no âmbito da DFCI.

A integração e compatibilização com os instrumen-

tos de ordenamento de ordem superior (PMDFCI e

Plano Regional de Ordenamento Florestal - PROF)

devem estar presentes no planeamento local da

DFCI, devendo todas as iniciativas estar articuladas e

enquadradas pelos PMDFCI. Às ZIF, entretanto cria-

das, é pedida a apresentação dos instrumentos de

gestão à DGRF no prazo de 180 dias a contar da sua

constituição.

O Decreto-Lei n.º 124/2006, revê a DFCI ao nível da

organização do território, estabelecendo as Redes

de Defesa da Floresta (RDF) que integram: as redes

de faixas de gestão de combustível, os mosaicos de

parcelas de gestão de combustível, a rede viária flo-

restal, a rede de pontos de água, a rede de vigilância

e detecção de incêndios, e a rede de infra-estruturas

de apoio e combate. Diferentes entidades têm com-

petências sobre a RDF, sendo a DGRF a responsável

pela sua monitorização e desenvolvimento no âmbi-

to do planeamento regional da DFCI. No entanto, de

acordo com as responsabilidades atrás referidas no

SNDFCI, a rede de vigilância é da competência da

Na sequência das reflexões efectuadas sobre as altera-

ções introduzidas após os incêndios de 2003, assume

importância a crítica da necessidade da definição de

comando único, sendo unânime a necessidade de in-

tro duzir o conceito operacional que viria a tomar forma

através da criação da ANIF – Autoridade Na cio nal para

os Incêndios Florestais. A ANIF funcionou de 1 de Maio

a 31 de Outubro, tendo no final desse período apre-

sentado um relatório onde identificou os estrangula-

mentos verificados, as debilidades e oportunidades de

melhoria, as recomendações de alterações legislativas

e de alterações de regras e procedimentos e que viria a

ser determinante na reforma operada em 2006.

O Relatório da ANIF viria a concluir que, quanto ao

dis positivo de combate, “o caminho a seguir não

pas se pelo incremento destes meios, mas sim pelo

aumento da sua eficácia com base num novo con-

ceito de recrutamento, de formação e organização

operacional dos recursos humanos, da adequação e

op timização dos recursos materiais ao combate dos

in cêndios florestais, com os necessários meios de

apoio à decisão, de comunicações e logísticos”.

Tendo como base uma versão bastante alterada do

trabalho realizado pela equipa do ISA, o PNDFCI foi

aprovado e publicado pela Resolução do Conselho

de Ministros n.º 65/2006, de 26 de Maio, após con-

sulta pública. O Plano está estruturado em cinco Ei-

xos, desdobrados em objectivos estratégicos: Eixo 1

– Aumento da resiliência do território aos incêndios

florestais; Eixo 2 – Redução da incidência dos incên-

combate. O custo total estimado dos dispositivos es-

peciais de prevenção, pré-supressão e do Dispositivo

Especial de Combate a Incêndios Florestais (DECIF)

foi de 131.204 mil euros.

Em 2005, foi elaborado o Plano Operacional Nacional

de Combate a Incêndios Florestais (PONACIF), onde

se estruturou o dispositivo de combate, em termos de

meios humanos e equipamentos, definindo o DECIF.

O PONACIF, estabelecendo a regulação e articulação

da in tervenção dos organismos e instituições envolvi-

das ou a envolver nas operações de combate e apoio,

es ta va especialmente vocacionado para a organização

do combate, privilegiando a actuação dos bombeiros.

Combate

ANPC

CNOS

CDOS

Bombeiros

CMPC

MAI/SEPC

CCON

CCOD

SIOPS

GNR PSP

INEMIM

AFN

FIgURA 6 Competências actuais relacionadas com a DFCI.

Prevenção

CMDFCI

Câmaras Municipais

MADRP/SEDRF

AFN

Sapadores Florestais

OPF e Baldios

DFCI

Detecção

GNR

SEPNA(Fiscalização)

FIgURA 4 Competências relacionadas com a DFCI antes dos in-cêndios de 2003. FONTE: MADRP, 2003.

FIgURA 5 Competências relacionadas com a DFCI após os incên-dios de 2003. FONTE: MADRP, 2003.

Combate Prevenção

MAI

SNBPC

CNOS NPF

CDOS

Bombeiros

CEFFd

CEFFm

Câmaras Municipais

MADRP

SEDR

DRA DGF

CPD CNGF

MCOTA

ICN

Áreas Protegidas

Sapadores Florestais

OPF e Baldios

ANMP

IM

ICN

Combate Prevenção

CMDFCI

Câmaras Municipais

MADRP

SEF

APIFDGRF

CPD

CNGF

Sapadores Florestais

OPF e Baldios

MAI

SNBPC

CNOS

CDOS

Bombeiros

Page 15: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 24 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 25 |

O Estudo de monitorização e avaliação do Sistema

Nacional de Defesa da Florestal Contra Incêndios,

realizado em 2007 pelo Instituto de Estudos Sociais

e Económicos (IESE), aponta três problemas de base

nos GTF, nomeadamente: o facto de serem ocupados

por técnicos inexperientes, em muitos casos recém-

-licenciados ou provenientes de Organizações de

Produtores Florestais (OPF), encontrarem-se isolados

nas Câmaras Municipais ou integrados em Gabinetes

de Protecção Civil ou mesmo em divisões do ambien-

te (situação que implicou a integração numa hierar-

quia pesada, em nada facilitando o exercício das suas

atribuições) e serem frequentemente desviados para

outras funções no âmbito da reestruturação orgâni-

ca no seio das Câmaras Municipais.

O planeamento da DFCI a nível municipal teve como

primeira figura o Plano Municipal de Intervenção na

Floresta (PMIF; DL n.º 423/93, de 31 de Dezembro)

com o objectivo de definir as medidas de protecção

das florestas contra incêndios dentro das competên-

cias das Câmaras Municipais. Nos PMIF pretendiam-

se identificar as situações-tipo relacionadas com os

incêndios e indicar as estruturas e meios logísticos

de prevenção, detecção e apoio ao combate dos in-

cêndios. Este diploma teve um baixo impacto, con-

tando-se em 2005 apenas 18 concelhos com PMIF

aprovados pela DGRF.

A aprovação do SNPPFCI em 2004 (DL n.º 156/2004, de

30 de Junho) vem constituir os PDF como instrumentos

de planeamento das medidas de DFCI ao nível muni-

cipal, substituindo os PMIF. Os requisitos para elabora-

ção dos PDF são definidos na Portaria n.º 1185/2004,

de 15 de Setembro, destacando-se a análise do risco,

vulnerabilidade aos incêndios e zonagem do território,

através da elaboração de cartas de combustíveis flores-

tais, riscos de incêndio e prioridades de defesa.

A reforma do SNDFCI aprovada no Decreto-Lei n.º

124/2006, de 28 de Junho, abrangeu também os

planos municipais, que se passaram a designar por

PMDFCI. No final de 2006 viria a sair a Portaria n.º

1136/2006, de 25 de Outubro, que regulamenta os

PMDFCI. Em 2007 foram entregues na DGRF 239 pla-

nos para aprovação, tendo sido aprovados 234, o que

representa um nível de concretização dos PMDFCI

GNR e a rede de infra-estruturas de apoio e combate

é da responsabilidade da ANPC.

A vigilância e detecção de incêndios, anteriormente da

responsabilidade da DGRF, passa a ser da responsabili-

dade da GNR, que coordena a Rede Nacional de Pos-

tos de Vigia (RNPV), decidindo sobre a sua localização

mediante parecer da DGRF. A vigilância é também da

competência da GNR, que deve coordenar as acções

de vigilância levadas a cabo pelas diversas entidades.

As Forças Armadas e corpos especiais de vigilantes

participavam nas acções de vigilância, prevenção,

detecção, rescaldo e vigilância pós-incêndio. A revi-

são do SNDFCI alargou a participação destas Forças à

abertura de aceiros, acções de gestão de combustível

das matas nacionais ou administradas pelo Estado e

no patrulhamento da floresta.

De acordo com o SNDFCI na sua versão de 2006, o

combate de incêndios era assegurado por entidades

com responsabilidades no combate a incêndios e por

profissionais credenciados para o efeito pela ANPC e

com parecer da DGRF.

As estruturas municipais

As CMDFCI vêm constituir o modo de garantir a

ar ticulação da actuação dos organismos com com-

petências em matérias florestais ao nível mu ni cipal

ou intermunicipal, tendo sido consideradas co mo

“uma das medidas prioritárias das grandes li nhas

orientadoras da reforma estrutural do sector flores-

tal” (CEFF, 2006). Tendo como missão coordenar as

acções de DFCI ao nível local e promover a sua exe-

cução, elas deveriam ser responsáveis pela elabora-

ção dos PMDFCI em consonância com o PNDFCI e

com os PROF.

O processo de constituição das CMDFCI avançou de

modo bastante rápido, já que passados dois anos

após a sua criação, 94% dos municípios tinham

esta estrutura formada. Actualmente encontram-se

constituídas 274 Comissões, representando cerca de

99% do total dos municípios de Portugal Continental

(Tabela 2).

A criação dos GTF teve origem num protocolo esta-

belecido entre o MADRP e a Associação Nacional de

Municípios Portugueses (ANMP) em 13 de Julho de

2004. Este protocolo tinha como principal objectivo

garantir a operacionalização do SNDFCI e proceder

à implementação das CMDFCI. A APIF era respon-

sável por este processo estabelecendo, juntamente

com a ANMP, protocolos com as Câmara Municipais

para a criação dos seus GTF. Este protocolo definia

o perfil do técnico do Gabinete e o plano geral de

actividades a executar, sendo a sua principal missão

a elaboração dos Planos de Defesa da Floresta (PDF),

mais tarde designados por PMDFCI, em conjun-

to com as CMDFCI. O apoio financeiro necessário

foi garantido pelo FFP. A evolução da constituição

dos GTF foi mais lenta do que a verificada para as

CMDFCI, envolvendo actualmente cerca de 89%

dos municípios portugueses na constituição dos 210

GTF (Tabela 3 e Tabela 4).

TABELA 2 Evolução na constituição de Comissões Municipais de Defesa da Floresta Contra Incêndios. FONTE: Dados cedidos pela

DGRF (Julho, 2008); AFN (2008b). Os dados de 2008 referem-se ao período

de 1 de Janeiro até 15 de Outubro.

ANO VALOR ACUMULADO DE CMDFCI CONSTITUÍDAS

2004 181 65%

2005 245 88%

2006 261 94%

2007 272 98%

2008 274 99%

TABELA 4 Evolução no número de municípios envolvidos na constituição de Gabinetes Técnicos Florestais. FONTE: Dados cedidos pela DGRF (Julho, 2008); AFN(2008b). Os dados de 2008 referem-se ao período de 1 de Janeiro até 15 de Outubro.

ANO VALOR ACUMULADO DE MUNICÍPIOS

ENVOLVIDOS NA CONSTITUIÇÃO DE gTF

2004 57 21%

2005 189 68%

2006 212 77%

2007 228 82%

2008 246 89%

TABELA 3 Evolução na constituição de Gabinetes Técnicos Flo restais. FONTE: Dados cedidos pela DGRF (Julho, 2008); AFN (2008b). Os dados de 2008 referem-se ao período de 1 de Janeiro até 15 de Outubro.

ANO gTF MUNICIPAIS gTF INTERMUNICIPAIS VALORES ACUMULADOS

2004 56 1 57

2005 116 7 180

2006 10 5 195

2007 4 5 204

2008 2 4 210

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| 26 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 27 |

líferos, do rendimento de material lenhoso resultante

da exploração florestal de matas públicas e comu-

nitárias sob a gestão do Estado, da percentagem

do valor das coimas que lhe sejam afectadas por

lei (conforme previsto no Decreto-Lei n.º 156/2004,

mas entretanto retirada na revisão efectuada a este

diploma), entre outras origens.

O Regulamento do FFP é aprovado com a Porta-

ria n.º 679/2004, de 19 de Junho, sendo o então

IFADAP/INGA a instituição responsável pela admi

nistração e gestão. É o Gabinete do Fundo Flores-

tal Permanente (GFFP), criado nessa instituição, que

assegura a gestão do Fundo, tendo como princi-

pais funções a coordenação das acções técnicas,

financeiras e administrativas do Gabinete, assegu-

rar a análise/decisão de parecer de candidaturas re-

cepcionadas e o apoio à elaboração de protocolos

destinados a associar entidades públicas e privadas à

realização dos objectivos do FFP.

O Programa de Apoios para 2004, publicado no Des-

pacho normativo n.º 36/2004, 30 de Julho, apresen-

tava-se estruturado em cinco áreas de intervenção,

definidas em estreita proximidade com os objectivos

anteriormente estabelecidos: (1) Prevenção de incên-

dios e respectivas infra-estruturas; (2) Ordenamento e

gestão florestal; (3) Reestruturação fundiária, empar-

celamento e aquisição de terras; (4) Sistemas de certi-

ficação de gestão e dos produtos florestais; (5) Acções

específicas de investigação aplicada, demonstração e

experimentação. Os apoios seriam concedidos normal-

mente na forma de subsídios não reembolsáveis, com

comparticipação, geralmente entre 85% a 100%.

Em 2005 é aprovado o Regulamento do Programa

de Apoios a conceder pelo FFP em 2005 e 2006

(Despacho normativo n.º 35/2005, 25 de Julho). Nes-

te Regulamento é estabelecido um limite máximo de

200.000€ anuais por entidade proponente, indepen-

dentemente do número de candidaturas e das áreas

apresentadas. O Programa de 2005/2006 reforça o

apoio das áreas 1 e 2: prevenção e protecção da flo-

resta contra incêndios e promoção do ordenamento

e gestão florestal.

O programa de apoios para 2007 – 2008 sofre uma

revisão mais profunda, procurando alinhar a sua in-

tervenção com a ENF, com o SNDFCI e com as ac-

ções e metas estabelecidas no PNDFCI. De forma a

evitar a dispersão de recursos, concentra-se agora

em apenas três grandes áreas de intervenção, vindo

duas delas na sequência dos programas anteriores: a

prevenção e protecção da floresta contra incêndios

e a promoção do ordenamento e gestão florestal. A

terceira área de intervenção diz respeito à promo-

ção das funções ecológicas, sociais e culturais dos

espaços florestais e criação de novos instrumentos

para a defesa e sustentabilidade da floresta. Deixam

de ser apoiadas as acções de gestão de combustí-

veis. Se analisarmos o apoio financeiro previsto nos

diferentes programas verificamos que a prevenção

e protecção da floresta contra incêndios é a área

mais privilegiada do Fundo, tendo-se verificado ao

longo da evolução do programa um aumento gra-

dual das verbas dedicadas às acções incluídas nesta

área, tendo sido previsto atribuir nos anos de 2007

e 2008 cerca de ¾ do Fundo a esta área de inter-

venção (Tabela 5). Por outro lado, a área de reestru-

turação fundiária tem uma evolução oposta, já que

sendo dotada de uma verba bastante significativa

no início do Programa, acaba por não ter continui-

dade na última revisão do Programa de Apoio para

os anos de 2007 e 2008.

em aproximadamente 84% do total de 278 municí-

pios de Portugal Continental. Estes planos vigoram

por cinco anos. Em 2008, assistiu-se à entrega de

207 planos para análise e aprovação, correspon-

dendo na sua maioria a reformulações de planos já

aprovados. Actualmente restam 22 municípios sem

PMDFCI, sendo que a inexistência de PMDFCI está

maioritariamente relacionada com a ausência de

GTF. Pese embora as CMDFCI estejam constituídas, a

não criação dos GTF impede a sua operacionalização

e, consequentemente, a elaboração dos instrumen-

tos de planeamento necessários à DFCI.

A componente operacional dos PMDFCI é constituí-

da pelos Planos Operacionais Municipais (POM), que

abordam em especial as componentes de vigilância,

detecção, fiscalização, 1ª intervenção e combate,

com vigência anual. A elaboração e execução dos

POM veio permitir criar uma dinâmica entre os inter-

venientes na DFCI ao nível municipal.

Em 2007 a DGRF constituiu um Gabinete de Apoio

aos Gabinetes Técnico e de Planeamento na sua es-

trutura de DFCI, com o objectivo de dar apoio admi-

nistrativo e técnico para a elaboração dos PMDFCI e

dos POM. Analisando as acções a desenvolver que

foram estabelecidas em sede do PNDFCI, verifica-

mos que as metas estabelecidas estão amplamente

superadas. De facto, as metas para a realização dos

PMDFCI projectadas para 2009, já foram ultrapas-

sadas em 2007/2008, uma vez que a ambição do

PNDFCI para 2006 e para 2009 se cifrava em 184 e

216 PMDFCI realizados, respectivamente.

O Fundo Florestal Permanente

A Lei de Bases da Política Florestal de 1996 (Lei

n.º 33/1996) previa a criação de um fundo finan-

ceiro de carácter permanente destinado a apoiar

a gestão florestal sustentável. O fundo previsto

destinar-se-ia a apoiar as medidas de fomento flo-

restal, financiar projectos de rearborização de áreas

afectadas por incêndios e ressarcir economicamen-

te os proprietários de ecossistemas sensíveis pelos

prejuízos com origem em restrições impostas pela

necessidade da sua conservação. Teria ainda como

objectivo criar um sistema bonificado de crédito

florestal, destinado à viabilização das intervenções

silvícolas de resultados líquidos imediatos negati-

vos e às acções de emparcelamento.

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 178/2003,

de 17 de Novembro, que aprova as grandes linhas

orientadoras da reforma estrutural do sector das flo-

restas, vem determinar a criação do FFP (ponto 2,

alínea vii), “destinado a apoiar o sector florestal e as

actividades não imediatamente rendíveis, financiado,

nomeadamente, pelo rendimento das matas públi-

cas e comunitárias, pelo produto de coimas aplicadas

e por uma imposição fiscal sobre o consumo dos pro-

dutos petrolíferos”.

Em 2004, o Decreto-Lei n.º 63/2004, de 22 de Março,

cria de facto o FFP. No referido diploma destacam-se

como princípios relevantes para a sua actuação “a

transparência e a simplificação de procedimentos,

apoiadas numa organização de planeamento, orça-

mentação, reporte de actividades e prestação de con-

tas que, a todo o momento, permitam o completo

escrutínio púbico do seu funcionamento”. O financia-

mento do Fundo é feito a partir do produto de im-

posto ou taxa sobre o consumo dos produtos petro-

Page 17: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 28 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 29 |

No âmbito do apoio à constituição de ZIF e elaboração

de PDF, em 20051 o valor total foi de 538.435,54€,

tendo em 2006 mais do que duplicado esse valor. A

baixa taxa de execução financeira poderá estar relacio-

nada com o facto de as candidaturas apresentadas em

2005, só terem efectuado a assinatura do contrato em

2006. A componente destinada à elaboração de PGF

e PDF foi de 46.894,47€ em 2005 e de 381.520,38€

em 2006, o que cria uma expectativa positiva quanto

ao aumento significativo da área sujeita a PGF.

O relatório realizado pelo IESE refere ainda, relativa-

mente às acções de “protecção” das zonas de interfa-

ce urbano/florestal e implementação do programa de

redução de combustíveis, que em 2005 foram apre-

sentados 31 projectos de redução de combustíveis

por parte de Câmaras Municipais, aos quais corres-

pondeu um montante global de 9.258.933,12€. No

entanto, desse montante apenas 4,1% foi executado,

não tendo havido candidaturas no ano de 2006. Se-

gundo o mesmo relatório, a ausência de candidaturas

deveu-se à alteração legislativa ocorrida no SNDFCI,

que retirou às Câmaras Municipais a obrigação de

procederem a intervenções de gestão de combustível

em torno dos aglomerados populacionais.

As acções de sinalização de áreas florestais de acesso

condicionado foram objecto de cinco candidaturas2

por parte das autarquias, que obtiveram um apoio de

34.309,26€, que, no entanto, não chegaram a ser rea-

lizadas. Deste modo, a execução desta acção foi nula,

não tendo ocorrido novas candidaturas em 2006.

O apoio do FFP atribuído em 2006 ao 2º Eixo estraté-

gico do PNDFCI – “Redução da incidência dos in-

cêdios”, foi no montante de 3.313.305€, tendo sido

executado praticamente na sua totalidade (98,9%).

Das iniciativas apresentadas, o “Programa de Volun-

tariado Jovem para as Florestas” e a im plementação

das acções de sensibilização por parte da DGRF foram

as mais dispendiosas, representando cerca de 82% do

investimento realizado.

No âmbito das medidas para a melhoria da eficá-

cia do ataque e da gestão dos incêndios florestais,

o FFP, através de protocolos estabelecidos com a

DGRF durante o ano de 2006, concedeu um apoio

de 2.887.231€, ou seja, cerca de 66% do apoio

programado (4.348.500€). Este investimento con-

cretizou-se no apoio à formação e equipamento das

eSF, na execução de acções de beneficiação de infra-

estruturas e de combate aos incêndios em primeira

intervenção, acções que absorveram 92% do mon-

tante total dedicado neste âmbito. Os restantes 8%

foram distribuídos entre a vigilância aérea no âmbito

dos incêndios florestais, a cartografia de estruturas

susceptíveis ao fogo e o apoio ao financiamento do

Sistema de Informação de Prevenção Florestal (SIPF).

No âmbito dos projectos de investigação, demonstra-

ção e transferência de conhecimentos, o FFP apoiou

ao longo de três anos (2004, 2005 e 2006) um total

de 14 projectos no montante de 4 milhões de euros.

Deste montante, apenas cerca de 6,9% foi pago. A

baixa execução financeira é atribuída, de acordo com

o IESE (IESE, 2007), à complexidade dos projectos e à

carga burocrática e administrativa do FFP e das insti-

tuições proponentes.

No âmbito do Programa do FFP para 2007 – 2008

foram estabelecidos protocolos pela DGRF no âmbi-

to da DFCI no montante global de 18.240.000€. Das

acções previstas, a que representa o maior encargo

é dedicada ao apoio dos GTF, representando cerca

A informação relativa à execução financeira do FFP

é dispersa e insuficiente para permitir uma análise

adequada, apesar dessa análise ser fundamental no

âmbito deste texto. Dada a indisponibilidade de da-

dos oficiais, optou-se pela utilização, enquanto fonte

principal, do relatório elaborado pelo IESE em 2007

a propósito do “Estudo de Monitorização e Avalia-

ção do Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra

Incêndios”. A informação constante neste relatório

sobre o FFP refere-se aos anos de 2005 e 2006.

A Tabela 6 apresenta o resultado da execução do FFP

para os anos de 2004 a 2006, destacando os protoco-

los e as candidaturas e, em cada um destes casos, dis-

tinguindo os montantes afectados e os executados.

É possível constatar que a taxa de execução é muito

superior nos protocolos celebrados que nas candida-

turas aprovadas. A esta baixa taxa de execução estão

associados problemas de tramitação burocrática, que

vêm prolongar demasiado os prazos de execução.

TABELA 5 Evolução na distribuição do apoio do Fundo Florestal Permanente em percentagem, pelas diferentes áreas. FONTE: Portaria n.º 679/2004, de 19 de Junho, Despacho normativo n.º 35/2005, 25 de Julho, Despacho normativo n.º 23-A/2007, de 15 de Junho. * 4% para investigação e 2% para outras acções não especificadas; ** Corresponde à área “Promoção das funções ecológicas, sociais e culturais dos espaços florestais e criação de novos instrumentos”.

ÁREAS 2004 2005 – 2006 2007 – 2008

1. Prevenção e protecção da floresta contra incêndios 45 60 73

2. Promoção do ordenamento e gestão florestal 12 30 17

3. Reestruturação fundiária, emparcelamento e aquisição de terras 33 3

10**4. Promoção de sistemas de gestão florestal sustentável e certificação 4 2

5. Acções de investigação aplicada, demonstração e experimentação 6* 5

TABELA 6 Execução do Fundo Florestal Permanente no período de 2004 a 2006. FONTE: IESE, 2007. NOTA Inclui apenas informação relativa às Acções 1, 2 e 5 do FFP.

PROTOCOLOS Homologado

Executado

Taxa de

execução (%)

2004 8.048.933 5.187.745 64,5%

2005 12.464.438 9.585.247 76,9%

2006 13.761.805 11.001.134 79,9%

Total 34.275.176 25.774.126 75,2%

CANDIDATURAS Homologado

Executado

Taxa de

execução (%)

2004 12.919.439 4.616.767 35,7%

2005 11.663.697 458.982 3,9%

2006 4.816.850 27.551 0,6%

Total 29.399.986 5.103.300 17,4%

No âmbito do 1º Eixo estratégico do PNDFCI - “Au-

mento da resiliência do território aos incêndios flo-

restais” - foi programado um investimento de cerca

de 6.100.000€, o qual teve uma execução de cerca

de 79%. No entanto, a relativamente baixa taxa de

execução foi compensada com a possibilidade de al-

gumas verbas transitarem para o ano seguinte.

Dos apoios concedidos, destaca-se a ajuda ao funcio-

namento dos GTF. Só esta acção representa cerca de

93% dos montantes executados em 2006 no âmbito

das medidas previstas neste Eixo. Os outros proto-

colos estabelecidos tiveram como objectivo o apoio

à constituição de equipas de prevenção, detecção e

vigilância na Rede de Áreas Protegidas do Instituto

da Conservação da Natureza e da Biodiversidade

(ICNB), a sinalização informativa do risco de incêndio

e a utilização de fogo controlado ou fogo técnico, na

componente de formação sobre a sua utilização.

1 Segundo IESE (2007). as candidaturas foram apresentadas em 2005 mas os contratos só foram assinados em 2006. 2 Estas candidaturas foram efectuadas em 2005 tendo sido contratualizadas em 2006.só foram assinados em 2006

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Na Figura 9 apresentam-se os resultados das investi-

gações com causa determinada. De um modo geral

a categoria “incendiarismo” apresenta os valores

mais elevados, seguida da categoria “negligência”.

As causas “acidentais” apresentam uma média de

10% ao longo destes anos embora tivessem mais ex-

pressão entre 2003 e 2006. As ignições por causas

“estruturais” apresentam uma média de 3% duran-

te este período, revelando-se as menos frequentes.

As causas “naturais” registam uma média de 4%.

Em todo o caso há que encarar com grande reserva

esta informação, sobretudo quando se tentam traçar

tendências temporais, devido às alterações verifica-

das nos agentes responsáveis pelas investigações,

devido a alterações nos critérios de classificação de

causas e devido ainda à inexistência de um mecanis-

mo de controlo que permita aferir a qualidade e a

fiabilidade dos dados.

de 24% da área de intervenção em que se insere

e 20,4% do total do Fundo.

A participação da Assembleia da Republica

A Assembleia da República tem-se empenhado em

acompanhar de forma bastante activa a questão

dos incêndios florestais. Nesse sentido, desde 2003

que, através da criação de comissões eventuais,

procura contribuir para a reflexão sobre a floresta

e os incêndios florestais e acompanha a implemen-

tação das medidas do Governo, nesta área. Desde

2003 foram criadas: a Comissão Eventual para os

Incêndios Florestais (Resolução da Assembleia da

República n.º 74/2003, de 20 de Setembro), a Co-

missão Parlamentar Eventual de Acompanhamento

e Avaliação das Medidas para a Prevenção e Vi-

gilância e Combate a Fogos Florestais (designada

como Comissão Eventual para os Fogos Florestais,

criada pela Resolução da Assembleia da República

n.º 56/2005, de 7 de Outubro) e a Comissão Even-

tual de Acompanhamento e Avaliação das Políticas

de Defesa da Floresta Contra Incêndios (criada pela

Resolução da Assembleia da República n.º 18/2007,

de 15 de Maio). Do trabalho destas comissões re-

sultaram quatro relatórios: Março de 2004, Julho

de 2006, Janeiro de 2007 e Março de 2008.

3. AS IgNIÇõES

A investigação das causas dos incêndios

A investigação criteriosa das causas de incêndios em

Portugal teve início em 1989, com a formação da

primeira Brigada de Investigação de Fogos Florestais

(BIFF). Em 1997 dá-se a desarticulação das BIFF, com a

inclusão desta valência técnica específica nas demais

funções das brigadas do CNGF. Em 2006, o CNGF foi

extinto e os seus técnicos transitaram para o SEPNA/

GNR que, actualmente e desde 2006, é a entidade

responsável, em primeira instância, pela investigação

das causas dos incêndios florestais. Deste modo, po-

de-se diferenciar um período até 2005, com as inves-

tigações a cargo do CNGF, e um período após 2005

já sob a responsabilidade do SEPNA/GNR. Durante

o primeiro período, houve uma média de 1.200 in-

vestigações por ano, cerca de 4% do total anual de

ignições (2001-2005). No ano de 2006 aumentaram

para cerca de 1.600, e em 2007 para cerca 6.000

investigações realizadas (30% do total das 18.722

ignições desse ano) (Figura 7).

Para além do total anual de investigações, é impor-

tante ter em conta a “taxa de sucesso” na determi-

nação das causas, entendendo-se por “taxa de su-

ces so” a percentagem de causas determinadas face

ao total de investigações realizadas. Entre 2000 e

2005 esta taxa de sucesso manteve-se relativamente

estável entre os 62 e 79%. Em 2006 a eficácia nas

investigações reduziu-se consideravelmente, com

36% de causas apuradas no total de investigações.

Em 2007, a taxa de sucesso nas investigações au-

mentou para 51%, totalizando mais de 3.000 causas

determinadas, um valor claramente superior aos re-

gistados desde que se deu início às investigações de

incêndios florestais em Portugal (Figura 8).

FIgURA 8 Evolução anual (%) das investigações com causa conhecida e desconhecida durante 2000 – 2007. FONTE: Dados cedidos pela DGRF (Julho, 2008); Galante, 2005; DGRF, 2007a; DGRF, 2008a. Valores nas colunas referentes à “taxa de sucesso” nas investigações.

2000

Incêndios investigados com causa desconhecida

100

80

60

40

20

0

%

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Incêndios investigados com causa conhecida

Incêndios não investigados

62 66 73 79 75 76 36 51

FIgURA 7 Evolução anual do n.º de ignições e n.º de investigações durante 2000 – 2007. FONTE: Dados cedidos pela DGRF (Julho, 2008); Galante, 2005; DGRF, 2007a; DGRF, 2008a.

2000

Nº de ocorrências

40.000

30.000

20.000

10.000

0

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Nº de investigações

Page 19: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 32 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 33 |

Em 2004, a responsabilidade pelas acções e medidas

de sensibilização e informação pública, com especial

incidência no correcto uso do fogo, é atribuída à

DGRF, à APIF e às CMDFCI, no âmbito do SNPPFCI

(DL n.º 156/2004, de 30 de Junho).

A campanha nacional de sensibilização preconizada

em 2003 (RCM n.º 178/2003, de 17 de Novembro) vi-

ria a materializar-se em 2004 com o lema “Juntos pela

floresta, todos contra o fogo” com divulgação diária

durante o período de Maio a Setembro na RTP, SIC e

TVI. Em 2005 surge a campanha “Entre o cinza e o

verde você decide”, tendo a duração de dois anos, em-

bora vigorasse apenas durante alguns meses do ano,

mais precisamente entre Agosto e Outubro de 2005, e

Junho e Outubro de 2006. Esta campanha foi desen-

volvida pela DGRF em colaboração com organismos

federativos de produtores florestais e, para além da po-

pulação em geral, destinou-se também a grupos espe-

cíficos da população rural, como pastores, agricultores,

proprietários e produtores florestais (CEFF, 2007).

Em 2006, agora no âmbito das acções e medidas

do SNDFCI, a prevenção estrutural assume um papel

predominante, e a DGRF é apontada como a enti-

dade responsável pela coordenação das acções de

prevenção estrutural, onde se inclui a sensibilização,

independentemente das entidades que as realizem

(DL n.º 124/2006, de 28 de Junho).

Em 2007, é desenvolvida a campanha “Portugal sem

fo gos depende de todos”. Distingue-se das antece-

dentes pelo seu carácter plurianual e por resultar de

uma acção conjunta, com partilha de responsabilida-

des, entre o MAI e o MADRP. Assim, o MAI desenvol-

ve acções destinadas ao grande público e o MADRP a

públicos-alvo mais específicos (CEAAPNDFCI, 2008).

O slogan desta campanha é utilizado pela generali-

dade dos diversos intervenientes nas campanhas de

sensibilização e a mensagem chega de uma forma

qua se personalizada a vários indivíduos através dos

mais diversos agentes e veículos, incidindo principal-

mente nos comportamentos negligentes associados

a um elevado número de ignições.

Como referimos inicialmente, apenas é possível

quan tificar o número de campanhas e não a sua

real eficácia. No ano 2007, ambas as tutelas, MAI e

MADRP, consideraram que a redução do número de

ignições e o maior empenho dos cidadãos no alerta

de incêndios através das linhas telefónicas 112 e 117

foram reflexo de uma estratégia de sensibilização

mais eficaz (CEFF, 2007).

Os meios de comunicação social têm um papel re-

levante na sensibilização dos cidadãos. Em Abril de

2003, a Assembleia da República salientou o seu

papel para “melhorar as políticas de prevenção e

combate aos fogos florestais”, nomeadamente na

divulgação da informação relativa ao risco de incên-

dio durante toda a época estival e, especialmente

os meios audiovisuais, na promoção dos programas

de sensibilização ambiental e de defesa da floresta

(Resolução da Assembleia da República n.º 25/2003,

de 2 de Abril).

Devido a esta importância tem sido relativamen-

te frequente, nos últimos anos, a organização de

workshops, conferências e acções de formação e

sen sibilização destinadas a jornalistas, nas quais são

abor dadas questões como a terminologia/lingua gem,

um melhor entendimento do “fenómeno incêndios”

e noções sobre o dispositivo e a estratégia nacional

de combate aos incêndios florestais.

A sensibilização das populações

O conceito “sensibilização” tem sido amplamente ex-

plo rado em vários relatórios e diplomas legislativos. Na

definição das bases da política florestal nacional em

1996, formulada no ano seguinte ao violento Verão

de 1995, em que se registou um elevado número de

ignições (34.116 ignições) e um total de áreas ardidas

anormalmente elevado relativamente aos anos ante-

riores (169.000 ha), a sensibilização é encarada como

“acção de carácter prioritário” assim como a “promo-

ção, a todos os níveis, de acções de sensibilização dos

cidadãos, em particular dos jovens, para a importância

da salvaguarda e valorização dos recursos florestais”

(Lei n.º 33/96, de 17 de Agosto, art. 21.º, alínea n)).

Na sequência do ano de 2003, o envolvimento acti-

vo dos cidadãos na defesa dos espaços florestais foi

objectivado enquanto uma das grandes linhas orien-

tadoras para a reforma estrutural do sector florestal.

Para a concretização deste objectivo foi perspectiva-

da a realização de campanhas de sensibilização das

populações para a problemática das florestas, desig-

nadamente no âmbito da gestão sustentável e da

promoção dos produtos florestais, e o lançamento

de uma campanha nacional de prevenção dos fogos

florestais (RCM n.º 178/2003, de 17 de Novembro).

É naturalmente difícil avaliar o efeito que teriam se

am plamente desenvolvidas anteriormente, mas é um

facto que, neste ano (2003), não houve qualquer

campanha consistente de sensibilização sobre incên-

dios desenvolvida pelo Estado (Damasceno & Silva,

2007). As únicas informações recolhidas de acções

de sensibilização no ano 2003 referem-se à distri-

buição, pelos distritos de Aveiro, Braga, Bragança,

Coimbra, Leiria, Porto, Viana do Castelo, Vila Real

e Viseu, de 50.000 exemplares de um cartaz com o

tí tulo “Não junte lenha pa ra se queimar”, onde se

informava acerca da nova legislação referente a quei-

madas. Juntamente com estes cartazes, distribuíram-

-se ainda 500.000 desdobráveis com o título “Vol-

ta à floresta”, em escolas do ensino básico com

particular incidência nos distritos anteriormente re-

feridos. Ambas as acções foram promovidas pelo

extinto Núcleo de Protecção da Floresta, unida-

de orgânica do recém-criado SNBPC (MAI, 2003).

FIgURA 9 Evolução percentual das causas determinadas (por categorias) durante 2001 – 2007. FONTE: Dados cedidos pela DGRF (Julho, 2008); DGRF, 2007a; DGRF, 2008a.

2001

60

50

40

30

20

10

0

%

2002 2003 2004 2005 2006 2007

Naturais Uso do Fogo Acidentais Estruturais Incendiarismo

Page 20: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 34 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 35 |

Analisando a composição dos povoamentos florestais,

mantém-se a baixa diversidade específica com cerca de

dois terços da área florestal concentrados em apenas 3

espécies, uma das quais exótica: pinheiro-bravo, euca-

lipto e sobreiro (Tabela 9). Esta tendência é mais pro-

nunciada em 2005, já que a quarta espécie mais repre-

sentada, a azinheira, sofre uma redução significativa.

No entanto, o IFN 2005/6 é apresentado com uma ca te-

goria de Povoamentos jovens não discriminados por es-

pécie. Estes povoamentos jovens surgem com uma área

importante, de 295,5 mil hectares, ou seja, quase 10%

da área total de povoamentos. O facto desta área não

se encontrar diferenciada por espécie não permite tirar

conclusões claras quanto à evolução das principais espé-

cies na última década. Assim, é apenas possível garantir

com certeza que a área de sobreiro e pinheiro-manso

aumentou. De modo a tentar ultrapassar esta limita-

ção podemos distribuir a área de povoamentos jovens

na proporção em que estes ocorriam no inventário de

1995/8. Este exercício permite obter uma estimativa da

evolução das principais espécies provavelmente mais

próxima da realidade que a proporcionada pela compa-

ração de áreas com e sem povoamentos jovens. As di-

ferenças notam-se em particular para o eucalipto, com

uma grande percentagem de povoamentos jovens.

4. A PROPAgAÇÃO

Evolução recente da floresta em Portugal

Em 2007 foram divulgados pela ex-DGRF os dados

relativos à 4ª Revisão do Inventário Florestal Nacional

(IFN) realizada em 2005/6. Estes resultado permitiram

avaliar a evolução da floresta relativamente à revisão

anterior do IFN, levada a cabo em 1995/8.

Neste período de cerca de 10 anos o uso do solo per-

maneceu sensivelmente o mesmo, não se verificou

uma variação significativa nos grandes grupos e a

área dedicada a florestas sofreu um ligeiro aumento

(Tabela 8). A este aspecto não é alheio o facto de as

áreas ardidas, continuarem em muitos casos a ser clas-

sificadas como floresta, mesmo depois de o fogo ter

passado. O impacte dos fogos reflecte-se assim muito

mais no estado de desenvolvimento e no volume de

material lenhoso, que na área total de floresta.

Vários sectores têm criticado a “espectacularização”

dos incêndios por parte das televisões. Em meados

de 2006, a RTP promoveu internamente a auto-re-

gulação na cobertura noticiosa dos incêndios, acção

sem correspondência nas estações televisivas priva-

das. Estas não terão concordado com alguns dos

pressupostos por detrás destas orientações, entre os

quais a relação directa entre as imagens televisivas e

os comportamentos criminosos no atear de fogos.

A controvérsia à volta deste tema surge com a publi-

cação do artigo “Como se faz censura em Portugal”

no Jornal “Público” a 20 de Agosto de 2006, onde é

denunciada a interferência do governo sobre a Direc-

ção de Informação da RTP na cobertura dos incêndios

florestais e questiona-se a independência da RTP pe-

rante o poder político. Na sequência desta notícia, e

da queixa da RTP contra o autor da notícia à Entidade

Reguladora para a Comissão Social (ERC), foi elabo-

rado um relatório sobre a cobertura jornalística dos

incêndios florestais, em que foram analisados os con-

teúdos de blocos informativos da RTP, TVI e SIC, no

período de 15 de Maio a 15 de Setembro de 2006,

anexados à deliberação da ERC (ERC, 2006a).

No período de 15 de Maio a 15 de Setembro de 2006,

foram transmitidas pelas três estações televisivas um

total de 422 peças enquadradas na ampla temática

dos incêndios, 166 das quais (mais de um terço) na

semana entre 7 e 13 de Agosto (Tabela 7).

TABELA 7 Modalidades de mediatização das peças transmitidas pelas estações televisivas portuguesas no período de 15 de Maio a 15 de Setembro de 2006. FONTE: ERC, 2006b.

RTP SIC TVI TOTAL

N.º total de peças emitidas 122 153 147 422

Peças de abertura 5 10 9 24

Peças com directo 27 49 46 122

Peças em destaque 19 40 33 92

Duração total das peças analisadas 3:44:23 5:27:00 4:46:54 13:58:17

Duração média das peças analisadas 0:02:42 0:02:15 0:02:58

TABELA 8 Áreas por Uso do solo (1000 ha). FONTE: DGRF, 2007c.

USO DO SOLO 1995/8 2005/6

Floresta 3.349,3 3.412,3

Matos 2.054,6 1.898,6

Agricultura 2.972,9 3.028,3

Áreas sociais e outras (inclui improdutivos) 395,7 413,5

Águas interiores 107,3 143,8

TabEla 9 Áreas (1000 ha) por espécie (povoamentos puros e mistos dominantes) em Portugal Continental de acordo com os dois últimos inventários florestais. A última coluna incorpora os povoamentos jovens (excepto folhosas e resinosas diversas) de acordo com a proporção existente em 1995/98. FONTE: DGRF, 2007c.

ESPÉCIES 1995/98 2005/06 2005/06

CORRIgIDO

Pinheiro-bravo 976,1 710,6 784,8

Eucalipto 672,1 646,7 829,6

Sobreiro 712,8 736,7 751,6

Azinheira 461,6 388,3 390,4

Carvalhos 130,9 117,9 119,4

Pinheiro-manso 77,6 83,9 99,3

Castanheiro 40,5 28,2 29,2

Folhosas diversas 102,0 96,8

Resinosas diversas 27,3 14,2

Outras formações lenhosas 18,0

Povoamentos jovens 295,5

Total 3.200,9 3.136,8

Page 21: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 36 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 37 |

jectivo de envolver as OPF na actualização expedita do

cadastro florestal, devendo ser concluída no 3º trimes-

tre de 2003. Seria responsável por esta acção a DGF,

associando-se o Instituto Geográfico Português (IGP),

o IFADAP e as principais associações e confederações

de produtores florestais.

As solicitações de cadastro aumentam com a criação

das ZIF em 2005, já que este é um dos elementos

necessários à sua constituição, devendo ser substituí-

do, na sua ausência, pelo inventário da estrutura da

propriedade na escala adequada à sua identificação.

De forma a permitir concretizar este requisito, o FFP

no seu programa de 2005 – 2006 vem apoiar a ela-

boração do cadastro em ZIF nas acções enquadradas

na promoção do ordenamento e gestão florestal.

Destinadas à regularização da situação jurídica dos

prédios rústicos em áreas florestais (registo predial)

são estabelecidas medidas de carácter excepcional e

transitório. Estas medidas, nomeadamente a redu-

ção e isenção de emolumentos em actos notariais

e registos, vigoraram inicialmente por um prazo de

2 anos e estavam consagradas no Decreto-Lei n.º

135/2005, de 17 de Agosto. Em 2 de Novembro de

2007 foi publicado o Decreto-Lei n.º 347/2007, que

dispõe a prorrogação por mais 3 anos dessas medi-

das legislativas.

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 45/2006,

de 4 de Maio, aprova as linhas para a execução,

manutenção e exploração da informação cadastral

através da criação do Sistema Nacional de Explora-

ção e Gestão da Informação Cadastral (SINERGIC).

O SINERGIC deverá permitir, entre outros objectivos,

assegurar a identificação unívoca dos prédios, me-

diante a utilização de um número único de identi-

ficação do prédio, comum a toda a Administração

Pública, promovendo a criação futura de uma infor-

mação predial única.

A Matriz de responsabilidades e indicadores da ENF,

inclui nas acções relativas à melhoria geral da eficiên-

cia e competitividade do sector, o objectivo de reali-

zação do cadastro florestal a desenvolver no âmbito

do SINERGIC. Este objectivo tem como responsável o

IGP, participando a actual AFN, os proprietários flo-

restais e as suas organizações, devendo ser apoiado

em termos de instrumentos financeiros pelo Fun-

do Europeu de Desenvolvimento Regional – FEDER

(2007 – 2013). As metas estabelecidas apontam

para que o cadastro florestal das áreas comunitárias

e nas áreas integradas em ZIF seja concluído no final

de 2009 e o restante no final de 2013.

Neste âmbito, é criado um subprojecto denominado

«Cadastro das áreas de floresta», cujo desenvolvi-

men to incumbe a um grupo de trabalho coordenado

pelo IGP e que deve incluir a DGRF, bem como outras

entidades na dependência do MADRP que produzam

ou detenham informação cadastral, cabendo-lhe pro-

por a planificação dos trabalhos e dos recursos finan-

ceiros e humanos necessários para que, no prazo de

três anos, se possa avançar significativamente nos

trabalhos do cadastro das áreas de floresta. Constitui

como objectivo mínimo assegurar a cobertura das áre-

as públicas comunitárias e as áreas integradas em ZIF.

Para além deste grupo de trabalho, funcionam ou-

tros dois com os objectivos de, nomeadamente, pro-

ceder à elaboração de uma proposta do quadro legal

de suporte ao SINERGIC e de definir o modelo do

sistema de informação do SINERGIC e sua forma de

implementação.

A propriedade florestal

No regime de propriedade florestal é conhecida a

pequena representatividade da floresta do domí-

nio privado do Estado (2%), em comparação com

a floresta detida pelos proprietários privados, quer

os particulares (77%) quer as empresas industriais

(8%). A floresta comunitária (baldios) representa

apro ximadamente 13% da área florestal total.

É também recorrente encontrar referências à frag-

mentação da propriedade. Os dados publicados na

ENF de 2006 relativos ao número de prédios rústi-

cos por região são extremamente expressivos dessa

reali dade, sendo que, atendendo ao número total de

prédios rústicos, praticamente todos os residentes em

Portugal Continental poderiam ter o seu próprio pré-

dio rústico (Tabela 10). Esta realidade não terá, muito

provavelmente, sofrido alterações nos últimos anos. A

distribuição nas diferentes NUT II vem ressaltar as par-

ticularidades regionais, sendo que no Norte e Centro

do País predomina a pequena (1 a 5 ha) e muito pe-

quena propriedade (<1 ha), concentrando-se a gran-

de propriedade na região do Alentejo e de Lisboa.

Dados os grandes constrangimentos estruturais deri-

vados do excessivo parcelamento das propriedades flo -

restais, a necessidade de realização de um cadastro pre-

dial é unanimemente considerada muito importante.

No período de 1930 a 1990 decorreu a elaboração

do cadastro geométrico da propriedade rústica em

126 concelhos, correspondendo a 50% da área do

País. Neste cadastro, apenas os prédios rústicos fo-

ram abrangidos, correspondendo a área coberta a

regiões onde o fraccionamento da propriedade não

é muito significativo, equivalente a 2 milhões de pré-

dios, cerca de 12% do universo dos prédios rústi-

cos de Portugal Continental. Este cadastro tinha um

objectivo essencialmente tributário, não tendo sido

objecto de actualização, a não ser por iniciativa dos

proprietários que o solicitaram.

Em 1995 é publicado o Decreto-Lei n.º 172/95, de

18 de Julho, que aprova o Regulamento do Cadastro

Predial. O cadastro geométrico da propriedade rústi-

ca, com finalidade essencialmente fiscal, deu origem

a um cadastro com carácter multifuncional, o cadas-

tro predial. Este conceito foi aplicado no final da dé-

cada de 90 em apenas sete concelhos do País (Ílhavo,

Vagos, Mira, Santa Maria da Feira, Tavira, Loulé e Vila

do Porto).

As referências legislativas à necessidade de realiza-

ção do cadastro da área florestal iniciam-se com a

Lei de Bases da Política Florestal de 1996, que inclui a

realização do cadastro da propriedade florestal como

uma das medidas prioritárias.

Segue-se o Programa de Acção para o Sector Flores-

tal (RCM n.º 64/2003, de 30 de Abril), onde se refere

a necessidade do cadastro da propriedade florestal,

para que o emparcelamento da propriedade seja efec-

tivo ou funcional e assim se adeque à gestão florestal,

a dimensão da propriedade em zonas de característi-

cas minifundiárias. Propõe-se uma acção com o ob-

TABELA 10 Número de prédios por região NUT II. FONTE: ENF. RCM n.º 114/2006, de 15 de Setembro.

REgIÃO PRÉDIOS RÚSTICOS (Nº)

Alentejo 351.065

Algarve 437.031

Centro 5.806.923

Lisboa 104.243

Norte 4.098.603

Total 10.797.865

Page 22: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 38 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 39 |

encontram-se mais 147 ZIF (Figura 10 e Figura 11),

prevendo-se que em tempos próximos ocorra um au-

mento significativo das áreas abrangidas.

Ainda em 2006 teve início o projecto-piloto de reali-

zação do cadastro predial na freguesia de Albergaria

dos Doze no concelho de Pombal. Este projecto-pi-

loto foi entretanto concluído, sendo a freguesia de

Albergaria dos Doze a única área do País onde está

aplicada a actual concepção do cadastro predial.

Com o objectivo de testar a adequabilidade e eficácia

das soluções consagradas, o Decreto-Lei n.º 224/2007,

de 31 de Maio, vem criar um regime experimental para

funcionamento do SINERGIC, permitindo que da ava-

liação dos resultados obtidos sejam feitas as necessárias

correcções e ajustamentos. Este regime experimental

funcionará apenas em determinadas freguesias.

Em 2007 são aprovadas as Grandes Opções do Plano

para 2008 (Lei n.º 31/2007, de 10 de Agosto). Nelas

se incluem a continuação da execução cadastral a nível

nacional, no quadro do projecto SINERGIC. Refere o

Plano que o processo decorrerá em 10 anos, sendo os

3 primeiros dedicados ao cadastro das áreas florestais.

O projecto de realização do cadastro predial para o

País foi revisto, tendo um período de realização pre-

visto de 15 anos, estando em preparação processos de

candidatura a diversas fontes de financiamento, entre

as quais o Banco Europeu de Investimento. Parte inte-

grante destes processos constitui o estudo de análise

de custo-benefício da realização do cadastro predial

nacional, documento ainda não concluído até à data

Medidas para ultrapassar as deficiências

da estrutura fundiária

A criação das ZIF merece um destaque particular

pelo conceito inovador que representa em Portugal.

A Lei de Bases da Política Florestal (Lei n.º 33/96, 17

de Agosto) preconizava já os princípios que viriam a

reger o conceito “ZIF”, nomeadamente a “dinami-

zação e apoio do associativismo” (artigo 4.º, alínea

e)) e a “constituição de explorações florestais com

dimensão que possibilite ganhos de eficiência na sua

gestão, através de incentivos fiscais e financeiros ao

agrupamento de explorações” (artigo 8.º, alínea a)).

A criação de uma ZIF é um processo relativamente

moroso, podendo demorar, de acordo com o preco-

nizado no respectivo diploma legislativo, cerca de ano

e meio desde a primeira reunião de consulta prévia

até à sua publicação e oficialização em Portaria do

MADRP. Este período poderá ser reduzido para me-

nos de meio3 ano caso o respectivo núcleo fundador

(da ZIF) tenha prontos todos os elementos referentes

à ZIF necessários para a fase de Consulta Pública.

A nível nacional, a maior fonte de financiamento

das ZIF é o FFP. Aquando da sua criação, em Mar-

ço de 2004 (DL n.º 63/2004, de 22 de Março), e da

aprovação do programa de apoios para 2005 – 2006

(Despacho Normativo n.º 35/2005, de 25 de Julho),

as ZIF ainda não tinham o enquadramento legal de-

finido, o qual viria a estar formalizado em Agosto de

2005 (DL n.º 127/2005, de 5 de Agosto). Em Outu-

bro desse ano houve a necessidade de ajustar alguns

conceitos no FFP através do Despacho Normativo n.º

49/2005, de 26 de Outubro, harmonizando-os com

o novo conceito de ZIF. No entanto, apenas uma ZIF

(ZIF de Alva e Alvoco) viria a ser criada no decorrer

deste período 2005 – 2006, mais precisamente em

Novembro de 2006.

Desde Novembro de 2006 até Outubro de 2008

foram declaradas e oficializadas, por Portaria do

MADRP e sob proposta da DGRF/AFN, 30 ZIF, totali-

zando 150.831,66 ha. Em processo de constituição,

3 Este ano e meio inclui a prorrogação pelo prazo máximo de um ano para a organização de elementos referentes à ZIF a apresentar na Consulta Pública, nomea damente o cadastro predial geométrico ou, na ausência deste, o inventário da estrutura da propriedade na escala adequada à sua identificação.

FIgURA 10 Total de ZIF de acordo com a situação até Outubro de 2008. FONTE: Dados cedidos pela AFN (Outubro, 2008); Portal electrónico da AFN (dados on-line).

Nº de ZIF

ZIF constitu-ídas

60

50

40

30

20

10

0

Audiência Final

Consulta Pública

Consulta Prévia

Requeri-mento

30

19

49

3841

FIgURA 11 Evolução do n.º de ZIF e respectivas áreas afectas desde Novembro de 2006 a Outubro de 2008. FONTE: Dados cedidos pela AFN (Agosto, 2008); Portal electrónico da AFN (dados on-line); Portarias do MADRP para oficialização das respectivas ZIF.

Evolução área afecta às ZIF (ha)

Nov

-06

200.000

150.000

100.000

50.000

0

ha

Evolução do nº de ZIF (Nº)

Jan-

07

Mar

-07

Mai

-07

Jul-0

7

Set-

07

Nov

-07

Jan-

08

Mar

-08

Mai

-08

Jul-0

8

30

25

20

15

10

5

0

Set-

08

Uma outra forma de tentar diminuir os constrangimen-

tos estruturais da propriedade florestal tem passado pela

constituição de OPF. O associativismo florestal rege-se

pelo princípio fundamental de que a associação de vá-

rios proprietários permitirá ganhos de eficiência, devido

à diminuição do isolamento técnico e económico. Das

179 OPF existentes à data do presente texto, 80 locali-

zam-se na ex-Circunscrição Florestal do Centro (50%),

50 localizam-se na ex-Circunscrição Florestal do Norte

(28%) e 39 na ex-Circunscrição Florestal do Sul (22%).

Page 23: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 40 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 41 |

a cobertura dos riscos por seguros e a certificação

da gestão florestal sustentável. A política de investi-

mento do fundo aponta para a aquisição de prédios

rústicos, ou do respectivo direito de superfície com

potencialidades para produção e exploração flores-

tal, com base na instalação de novos povoamentos

e gestão dos já existentes, com predomínio para o

pinheiro bravo, procurando a diversificação de ac-

tividades e segmentos de produtos, promoção da

produção e valorização das externalidades positivas

e arrendamento de superfície para utilizações não

conflituantes com o uso florestal. De acordo com o

Regulamento de gestão de 15 de Abril de 2008, a

política de investimento do fundo terá sempre como

objectivo a constituição de unidades de exploração

que justifiquem em termos económicos e ambien-

tais a exploração florestal, designadamente através

do emparcelamento de prédios rústicos que, isola-

damente, não permitiam a sua exploração. Os inves-

timentos imobiliários do fundo serão efectuados de

preferência no Centro e Norte do País. Concluído em

Abril o processo de subscrição de Unidades de Par-

ticipação, a Floresta Atlântica SGPS encontra-se em

fase de angariação de activos, tendo um prazo de

2 anos para concretizar 75% do seu valor em acti-

vos, e estabelecimento de parcerias.

A gestão florestal

Importa considerar as duas figuras de planeamento

instituídas pela Lei de Bases da Política Florestal em

1996 (Lei n.º 33/96, de 17 de Agosto): os Planos Re-

gionais de Ordenamento Florestal (PROF) e os Planos

de Gestão Florestal (PGF).

Em 1999 é aprovado o regulamento para a elabo-

ração dos PROF, definindo como base geográfica de

referência as NUT III, a elaborar em 2 anos. A Reso-

lução do Conselho de Ministros n.º 118/2000, de 13

de Setembro, vem incumbir as Direcções Regionais

de Agricultura de elaborar os PROF, sendo posterior-

mente revista pela Resolução do Conselho de Minis-

tros n.º 179/2003, de 18 de Novembro, em função

de alterações nas regiões NUT. O Programa de Acção

para o Sector Florestal aprovado em Abril de 2003

(RCM n.º 64/2003), vem introduzir acções no sentido

de promover a avaliação e simplificação da filosofia

de elaboração dos PROF como forma de ultrapassar

os atrasos verificados. Em 2004, com a criação da

DGRF, as competências de realização dos PROF tran-

sitam para esta entidade. O processo de realização

arranca de facto em força em 2003, após decisão de

adjudicar a sua realização a empresas de consultoria

florestal, já que até essa data nenhum PROF tinha

sido realizado. Num período de cerca de três anos

os PROF são elaborados, sujeitos a discussão por

parte das Comissões de Acompanhamento, revistos

e disponibilizados para consulta pública. Apesar de

nem todos os PROF terem uma realização simultâ-

nea, verifica-se que a sua maioria terminou a fase

de discussão pública em 2006, tendo a publicação

e entrada em vigor decorrido entre Julho de 2006 e

Abril de 2007.

O PGF é um instrumento de planeamento que ac-

tua ao nível da unidade de gestão. Previsto na Lei

de Bases da Política Florestal e definido o processo

de elaboração, aprovação, execução e alteração no

Decreto-Lei n.º 205/1999, de 9 de Junho, foi neces-

sário aguardar a conclusão dos PROF, para se iniciar

a sua realização uma vez que, para além de ser este

instrumento que viria a definir a área mínima para

a elaboração do PGF, também nele constariam as

orientações regionais a que o PGF deve obedecer.

Estão sujeitas a PGF as explorações florestais públicas

A formação de OPF tem tido um crescimento linear

ao longo das últimas três décadas (Figura 12), em-

bora nos últimos anos seja perceptível um aumento

mais pronunciado com a formação de 49 associações

entre 2002 e 2007. Para tal, poderão ter sido deter-

minantes os apoios previstos no Quadro Comunitário

de Apoio III (2000 – 2006), promovendo a competi-

tividade e gestão do sector agro-florestal numa pers-

pectiva sustentável, nomeadamente nos programas

AGROS4 e AGRIS5. Neste último (Acção 3 – Gestão

Sustentável e Sustentabilidade Ecológica das Flores-

tas) destaca-se a promoção e instalação de OPF.

4 Programa Operacional da Agricultura e Desenvolvimento Rural (AGROS). 5 Medida Agricultura e Desenvolvimento Rural dos Programas Operacionais Regionais (AGRIS).

1975

200

150

100

50

0

Nº OPF

1978

1981

1984

1987

1990

1993

1996

1999

2002

2005

FIgURA 12 Evolução do número de associações florestais desde a década de 70. FONTE: AFN (Portal electrónico).

2008

16

67

130141

168179

Uma solução apontada para contribuir para o em-

parcelamento das propriedades é a constituição de

fundos de investimento imobiliário. Actualmente en-

contramos dois fundos de investimento imobiliário

flo restal com constituição aprovada pela Comissão

do Mercado de Valores Mobiliário da Bolsa de Va-

lores de Lisboa: Josiba Florestal, constituído em 27

de Dezembro de 2006; Floresta Atlântica, constituído

em 18 de Outubro de 2007.

Estes fundos constituem-se como fundos especiais de

investimento imobiliário fechado, de subscrição parti-

cular, com duração de 10 anos, prorrogável, e com um

montante de 25 e 20 milhões de euros, respectivamen-

te. Têm atraentes benefícios fiscais, como seja a isenção

de IRC dos rendimentos obtidos pelo Fundo, isenção

de IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) e IMT (Impos-

to Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis)

e retenção na fonte de IRS ou IRC à taxa de 10% para

os rendimentos das Unidades de Participação.

O fundo Josiba Florestal é gerido pelo BPI Gestão

de Activos, e contava em 31 de Dezembro de 2007

com uma área de 5.655 ha, localizados essencial-

mente em Coruche e Alcácer do Sal (Josiba Flores-

tal, 2008). O fundo Floresta Atlântica foi constituído

com o apoio do Estado através de fundos comunitá-

rios provenientes do Programa Agro e é gerido pela

Floresta Atlântica SGPS. A intervenção do Estado

vem justificar-se pelo carácter demonstrativo deste

projecto. Considera a Resolução do Conselho de

Ministros n.º 55/2005, de 7 de Outubro, que cons-

titui uma forma inovadora de captação de recursos

financeiros, e de encurtamento do longo período de

tempo sem proveitos que o investimento florestal

implica. Para além dos aspectos financeiros, aponta

a criação do fundo como sendo uma solução para a

desfragmentação da propriedade que impede a exe-

cução de uma gestão sustentável da floresta com a

contribuição inerente na resolução do problema dos

incêndios. Será demonstrativo também ao abordar

Page 24: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 42 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 43 |

gência com parecer favorável da corporação de bom-

beiros local. Da acção do fogo resultam os relatórios

de execução e avaliação dos resultados, que são dados

a conhecer à CMDFCI e aos serviços locais da AFN.

Em 2006 ocorreu uma missão de cinco especialistas

em fogo controlado dos Serviços Florestais dos Estados

Unidos da América, resultante de um pedido de cola-

boração técnica do MADRP. Das recomendações pro-

duzidas pelos especialistas destacam-se as seguintes: a

necessidade de definir um Programa Nacional de Fogo

Controlado e criar uma organização dedicada exclu-

sivamente à sua implementação; requerer que todas

as utilizações de fogo controlado sejam investigadas;

criar um programa de educação pública nacional per-

manente e de longo prazo sobre os benefícios do uso

do fogo controlado; e disponibilizar incentivos para en-

corajar proprietários privados a recorrer a esta técnica.

A equipa de peritos norte-americanos concluiu que

os Serviços Florestais já dispunham de uma boa base

para a criação de um Programa Nacional de Fogo

Controlado, alertando contudo para que a sua cria-

ção fosse feita de forma cuidadosa e demorada,

pois o processo de desenvolvimento de uma orga-

nização com as competências necessárias, o treino

e o equipamento para atingir os objectivos do pro-

grama (Torrez et al., 2006) é necessariamente moro-

so. O Programa Nacional de Fogo Controlado não

chegou a concretizar-se, tendo no entanto, ainda

em 2006, surgido por parte da DGRF a proposta de

constituição de um grupo de especialistas (técnicos

credenciados em fogo controlado) para execução de

fogos controlados, intervindo em áreas extensas com

PFC aprovado pela respectiva CMDFCI e com POQ.

Pretendeu-se igualmente que a actividade deste

grupo permitisse uma maior divulgação e expansão

do uso do fogo controlado e que contribuisse para

aumentar a experiência, o intercâmbio e a formação

prática das equipas, assim como proporcionar situ-

ações de queima, com vista ao treino das técnicas

do fogo de supressão. A actividade deste grupo, de-

signado como GEFoCo, teve início na campanha de

2006/2007, tendo permitido desde então aumentar

substancialmente a área intervencionada com fogo

controlado e sistematizar alguma da informação so-

bre o recurso a esta técnica.

No sentido de garantir o desenvolvimento de com-

petências no âmbito da utilização da técnica de fogo

controlado, a DGRF estabeleceu parcerias com a Uni-

versidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e

com a Forestis para a realização de acções de forma-

ção. A Federação de Produtores Florestais de Portugal

foi outra entidade que realizou acções de formação.

Desde 2002 até ao momento, foram realizadas 9

acções de credenciação de técnicos em fogo con-

trolado, com 158 formandos, e 10 acções para

ope racionais de fogo controlado para eSF que en-

volveram 196 formandos. De forma a apoiar os

técnicos dos GTF no planeamento e avaliação de

planos de fogo controlado, foram realizadas 4 ac-

ções com cerca de 120 participantes. Das acções de

formação decorreram os pedidos de credenciação

de técnicos, encontrando-se, até Junho de 2008,

70 técnicos credenciados. Nem todos os técnicos

formados prosseguiram com o processo de creden-

ciação. Estes resultados estão próximos da meta es-

tabelecida no PNDFCI que pretendia formar e cre-

denciar 20 técnicos por ano até 2012 e proceder

à capacitação de 80% das eSF na utilização desta

técnica. No entanto, de acordo com informações ob-

tidas, a formação de técnicos em fogo controlado

e comunitárias, as ZIF e as explorações privadas de

acordo com a área mínima definida no PROF respec-

tivo. O prazo definido no PROF para elaboração dos

PGF é de 3 anos, o que significa que, tomando como

referência a data da publicação do último PROF a

ser aprovado, deverão estar concluídos em 2010. No

caso de baldios, os critérios definidos para elabora-

ção do PGF são definidos também no Decreto-Lei n.º

205/99, constituindo o plano de utilização do baldio

previsto na Lei n.º 68/93, de 4 de Setembro.

Em Julho de 2008, cerca de 203 mil hectares tinham

já sido objecto de Plano de Gestão, sendo que ape-

nas 5% dos quais correspondiam a áreas privadas

(Tabela 11). Ao pretendermos analisar a área cober-

ta por PGF, deveremos ter em consideração as áreas

certificadas, já que, qualquer que seja a iniciativa de

certificação adoptada (em Portugal existem as inicia-

tivas FSC e PEFC), a elaboração do plano de gestão é

um dos requisitos a cumprir, pese embora o plano de

gestão elaborado possa não cumprir todos os requi-

sitos definidos pela legislação aplicável. Também a

constituição de ZIF representa uma forma de garantir

a existência de PGF, sendo este documento um dos

requisitos previstos para o seu funcionamento. A con-

jugação destes elementos permite acreditar que as

metas estabelecidas no PNDFCI de ter 250 mil hecta-

res de áreas com PGF em 2009 e de 500 mil hectares

em 2012, poderão ser atingidas.

No tocante às medidas associadas à gestão de com-

bustíveis impõe-se uma referência à técnica do fogo

controlado, devido às suas potencialidades em ter-

mos de elevada eficiência e baixo custo. O fogo

con trolado como técnica de gestão de combustíveis

florestais está previsto desde 1981, no Decreto Regu-

lamentar n.º 55/81, de 18 de Dezembro. Em 2004,

quando foi definido o SNPPFCI, o fogo controlado foi

assumido como uma técnica de gestão de combustí-

veis, sendo o seu regulamento publicado na Portaria

n.º 1061/2004, de 21 de Agosto, passando assim

a existir um enquadramento legal para a uti lização

desta técnica na gestão de combustíveis.

De acordo com o Regulamento de Fogo Controlado,

este só pode ser realizado sob responsabilidade de

técnicos credenciados. A credenciação dos técnicos

especializados fica a cargo da DGRF, devendo os

técnicos ter formação de base de nível superior ou

desenvolverem actividade profissional na gestão do

fogo, requerendo em ambos os casos a frequência

com aprovação num curso de especialização. Esta

credenciação é válida por dois anos carecendo de ser

renovada mediante a avaliação de desempenho.

A entidade que pretenda utilizar a técnica de fogo

controlado deve elaborar um Plano de Fogo Contro-

lado (PFC), para um determinado período que pode

ser no máximo de 5 anos, para apreciação da DGRF.

A CMDFCI avalia a sua exequibilidade de acordo com

as intervenções no PMDFCI. Ambos os pareceres têm

de ser positivos.

Cada acção de fogo prevista no plano tem um Plano

Operacional de Queima (POQ) que inclui toda a infor-

mação operacional necessária para executar e avaliar

o fogo controlado e um plano de emergência/contin-

TABELA 11 Planos de Gestão Florestal para aprovação até Julho 2008. FONTE: Dados cedidos pela AFN (Agosto, 2008).

PLANOS NÚMERO ÁREA (HA)

Planos de utilização de baldios 284 141.909

Matas nacionais 9 8.827

Perímetros florestais 17 42.792

Privados 5 9.440

Total 315 202.968

Page 25: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 44 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 45 |

O número de eSF por distrito reflecte-se na taxa de

cobertura6 do respectivo território por estas equipas.

Os valores da taxa de cobertura são mais elevados

nos distritos das regiões Norte e Centro de Portugal,

em especial Viana do Castelo (cobertura de 84% do

distrito), Guarda (80%), Coimbra (79%), Castelo

Branco (77%) e Vila Real (75%). Esta taxa de co-

bertura a nível distrital está directamente relacionada

com o número de concelhos dentro dos respectivos

distritos com uma ou mais eSF.

No âmbito da gestão de combustíveis importa igual-

mente considerar o resultado do trabalho realizado

pelo Conselho Nacional de Reflorestação (CNR), cujo

relatório final preconiza a infra-estruturação dos

deverá ser preterida nos anos próximos, em benefí-

cio do apoio aos técnicos já credenciados.

A DGRF, no seu relatório da Defesa Florestal Con-

tra Incêndios de 2007 para as fases Bravo e Charlie,

apresenta um balanço das acções de fogo contro-

lado planeadas em 2007, agregando a informação

por regiões, conforme informação recolhida pelo

grupo GeFoCo. Na época de 2006/2007, o recurso

à técnica de fogo controlado resultou na interven-

ção em cerca de 1.400 hectares, tendo sido utilizado

essencialmente no Norte e Centro do País. O fogo

controlado foi executado quase exclusivamente em

matos, correspondendo os povoamentos florestais

a apenas cerca de 2% da área de intervenção. A

área executada em 2007 foi de cerca de 950 ha, e

em 2008 cerca de 700 ha, sendo este valor ainda

provisório. A maioria das acções ocorreu em áreas

sob a gestão da DGRF/AFN (matas nacionais ou perí-

metros florestais) ou em áreas protegidas sob gestão

do ICNB.

Uma outra iniciativa importante em termos de ges-

tão de combustíveis foi a criação de eSF. A regula-

mentação das eSF remonta a 1999 (DL n.º 179/99,

de 21 de Maio). Desde então foram constituídas 300

eSF e extintas 37, estando operacionais (em 2008)

263 eSF, compostas por 1.315 elementos e 263 via-

turas (DGRF, 2008b) (Figura 13).

As eSF poderão ser constituídas por organizações

de agricultores e de produtores florestais, entidades

gestoras de ZIF, conselhos directivos dos baldios, por

autarquias locais, por organismos da Administra ção

Pública responsáveis pela gestão de espaços florestais,

empresas de capitais públicos e qualquer outra enti-

dade privada detentora ou gestora de espaços flores-

tais (DL n.º 38/2006, de 20 de Fevereiro). A Tabela 12

mostra a distribuição da actividade destas equipas.

Um dos principais objectivos para a criação, em 1999,

destas equipas especializadas, foi dar resposta a um

dos princípios na Lei de Bases de Política Florestal que

pressupunha uma maior participação e responsabili-

zação dos produtores florestais e outros agentes eco-

nómicos na DFCI. A constituição de novas equipas

tem sido regular, embora se destaquem alguns anos

pelo grande reforço em eSF, como foi o caso de 2004

e 2008 respectivamente com 61 e 60 novas equipas.

Das 263 eSF operacionais, 166 foram constituídas por

OPF, 45 por órgãos de gestão de baldios, 31 por au-

tarquias (Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia) e

21 por organismos da Administração Pública. A nível

distrital destacam-se os distritos de Castelo Branco,

Coimbra, Guarda, Viana do Castelo, Vila Real e Viseu,

com mais de 20 eSF cada um. Há de facto uma pre-

sença mais forte de eSF nos distritos das regiões Nor-

te e Centro do País, onde existe um maior número de

ocorrências e ainda um maior número de OPF.

6 A taxa de cobertura calcula-se através da área de intervenção das eSF (área de intervenção/área do distrito * 100). A área de intervenção define-se como o território (município, freguesia ou parte destes) onde a equipa pode desenvolver a sua actividade e que corresponde à área referida na candidatura (DL n.º 38/2006, de 20 de Fevereiro).

TABELA 12 Actividades desenvolvidas no âmbito do programa de sapadores florestais em 2007. O Serviço Público corresponde ao trabalho realizado para a entidade pública da qual depende a equipa. FONTE: DGRF, 2007b.

REgIÃO SAPADORES FLORESTAIS SILVICULTURA

PREVENTIVA (ha)

PONTOS DE ÁgUA

(N.º)

BENEFICIAÇÃODE

CAMINHOS (kM)

Norte Serviço Público 43 7 25

Actividade Regular 800 25 200

Total 843 32 225

Centro Serviço Público 563 11 139

Actividade Regular 2.209 113 911

Total 2.772 124 1.050

Sul Serviço Público 50 0 0

Actividade Regular 622 4 173

Total 672 4 173

Total Serviço Público 656 18 164

Actividade Regular 3.631 142 1.284

Total 4.287 160 1.448

1999

300

250

200

150

100

50

0

Nº eSF

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

FIgURA 13 Evolução da constituição de novas eSF durante o periodo 1999 – 2008. FONTE: DGRF, 2008b.

2007 2008

33

69

11

84102

163 163183

203

263

Page 26: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 46 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 47 |

No âmbito das CRR (Ribatejo, Algarve, Alto Alentejo,

Pinhal Interior e Beira Interior), foi delineada a rede

primária de gestão de combustíveis para todo o terri-

tório que era objecto da sua missão, o qual abrangeu

a superfície total de 1.353.000 ha, correspondendo a

aproximadamente 15% do território nacional conti-

nental. Para além desta área, há a considerar 800 mil

ha com delineamento da RDF em curso, com conclu-

são prevista para 2009. Estes valores estão bastante

aquém do estabelecido ao nível do PNDFCI.

A informação disponível sobre a implementação da

rede de gestão de combustível remete-nos para os

dados disponibilizados no relatório provisório da

DFCI/DGRF de 2007, apresentados na tabela rela-

tiva à infra-estruturação executada no âmbito das

CMDFCI, sendo que não se conhece a relação en-

tre os dados referentes a intervenção (1.983 ha) e a

Rede Primária de Defesa da Floresta já delineada.

5. O COMBATE

O dispositivo integrado de combate aos

incêndios florestais

Enquadrada pela Lei de Bases da Protecção Civil e

pelo PNDFCI surge em 2006 a Directiva Operacio-

nal Nacional n.º 01/2006. Esta directiva define o

Dispositivo Integrado de Defesa da Floresta Contra

Incêndios (DIDFCI ou DECIF, como mais tarde se viria

a designar), constituindo-se como numa plataforma

estratégica que garante a articulação das várias enti-

dades e agentes de protecção civil enquanto estrutu-

ras do Sistema Integrado de Operações de Protecção

e Socorro (SIOPS). Pretendia-se assim optimizar os re-

cursos humanos e materiais, garantindo uma melhor

eficácia no ataque e gestão dos incêndios, aumen-

tando a coordenação entre as forças de intervenção

de todas as organizações integrantes.

Vigorando durante todo o ano, considera diferen tes

níveis de prontidão dos sistemas de resposta, com

ba se em períodos de perigo de incêndio, distinguin-

do-se os períodos seguintes:

FASE ALFA – de 01 JAN a 14 MAI (meios activados

à ordem);

FASE BRAVO – de 15 MAI a 30 JUN;

FASE CHARLIE – de 01 JUL a 30 SET;

FASE DELTA – de 01 OUT a 15 OUT;

FASE ECHO – de 16 OUT a 31 DEZ (meios activados

à ordem). Esta fase surge apenas em 2008 e resulta

do desdobramento da Fase Delta.

A estratégia de intervenção definida previu a cria-

ção de uma Força Operacional Conjunta (FOCON)

constituída por meios humanos e por equipamentos

(terrestres e aéreos) de intervenção, reforço, apoio e

assistência, pertencentes aos CB, à GNR, à DGRF, ao

ICNB, às Forças Armadas, à AFOCELCA e a outras

entidades públicas e privadas.

Em 2007, a Directiva Operacional foi já definida pela

recentemente criada ANPC, introduzindo várias al-

terações face a 2006, resultado da avaliação do de-

sempenho desse ano. São reforçados os meios do

dispositivo humano de vigilância, detecção, combate

e do dispositivo de ataque inicial helitransportado do

GIPS/GNR. É constituída a segunda Coluna Nacional

de Incêndios Florestais (CNIF) e entra em funciona-

mento um novo sistema de informações. São ainda

previstas as Equipas de Reconhecimento e Avaliação

da Situação (ERAS), destinadas a assegurar a análi-

espaços rurais através da constituição de Redes de

Defesa da Floresta (RDF). Encontra-se actualmente a

ser definida a RDF da Região Centro, numa área de

intervenção de cerca de 800.000 ha, envolvendo 34

municípios, no âmbito do projecto “Infraestrutura-

ção do Território e Defesa da Floresta Contra Incên-

dios” desenvolvido pela DGRF e financiado através

da iniciativa internacional EEA – Grants. A concep-

ção, planeamento e execução da RDF incidirá em

duas zonas: a designada “montanhas Ocidentais”,

que inclui as zonas de Dão-Lafões, o Centro Litoral e

a “Cordilheira Central”, que inclui as zonas da Beira

Interior Norte e Pinhal Interior Norte. O projecto, que

se prevê concluído no final de 2009, tem um finan-

ciamento de 1,2 milhões de euros.

A monitorização do funcionamento da RDF compe-

tia às Comissões Regionais de Reflorestação (CRR),

sendo actualmente, por extinção destas, da respon-

sabilidade da AFN. É também definido que a moni-

torização a realizar à RDF deve ter particular atenção

à avaliação da eficácia das medidas propostas e da

relação custo-benefício das opções técnicas. Não

existe, no entanto, informação organizada disponí-

vel relativamente ao trabalho realizado no âmbito da

recuperação das áreas ardidas a propósito do qual

incidiu a actividade das CRR, nem da implementação

da RDF proposta pelas mesmas CRR.

Os dados disponíveis limitam-se ao ano de 2007, no

qual a DGRF começa a monitorizar o trabalho realiza-

do no âmbito da Rede Primária de Defesa da Floresta

apresentando os dados relativos a intervenções na

rede primária e secundária, pontos de água e benefi-

ciação de caminhos, no âmbito quer das CMDFCI quer

do programa de sapadores florestais (Tabela 13).

TABELA 13 Infra-estruturação no âmbito das CMDFCI em 2007. FONTE: DGRF, 2007b.

REgIÃO REDE

PRIMÁRIA(ha)

REDE

SECUNDÁRIA (ha)

PONTOS

DE ÁgUA (N.º)

BENEFICIAÇÃO DE

CAMINHOS (kM)

Norte 67 1.446 42 387

Centro 261 2.034 69 2.919

Sul 1.655 0 7 1.151

Total 1.983 3.480 118 4.457

TABELA 14 Metas estabelecidas no PNDFCI para a acção de cria-ção de redes de gestão de combustível. FONTE: RCM n.º 65/2006.

ANO DELINEAR IMPLEMENTAR

2006 20% 1.500 ha

2009 60% 10.000 ha

2012 100% 25.000 ha

No PNDFCI, no âmbito do 1º Eixo estratégico – “Au-

mento da resiliência do território aos incêndios

florestais” – é definido o objectivo de implemen-

tar um programa de redução de combustíveis que

conta com a acção de criação de redes de gestão

de combustível. As metas, estabelecidas em função

do delineamento da rede e da sua implementação,

encontram-se expressas na Tabela 14.

Page 27: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 48 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 49 |

Para além do reforço do número de bombeiros, nos

últimos anos assistiu-se ao reforço e criação de no-

vas forças com formação no combate a incêndios

florestais, na sua maioria vocacionadas para a pri-

meira intervenção e com recurso a técnicas de com-

bate indirecto, nomeadamente através da utilização

de ferramentas manuais (Figura 16).

É esse o caso das equipas de Sapadores Florestais (eSF)

criadas em 1999 que, conforme referido anteriormen-

te, passaram de 11 neste primeiro ano para 263 eSF

em 2008, num total de 1.315 SF com 263 viaturas7.

No ano 2008, cerca de 51% dos concelhos de Por-

tugal Continental (141 concelhos) contam com pelo

menos uma eSF (DGRF, 2008b), com especial predo-

mínio nos concelhos das Regiões Norte e Centro.

Em 2006, foram criados os Grupos de Intervenção

de Protecção e Socorro (GIPS) na dependência do

comando-geral da GNR que, no âmbito do combate

a incêndios florestais, são forças especialmente pre-

paradas para a primeira intervenção (DL n.º 22/2006,

de protecção e socorro. Tomando como exemplo

o ano 2003, 93% do universo nacional de 41.630

bombeiros eram voluntários (MAI, 2003). O maior

acréscimo no número de bombeiros deu-se nos anos

2005 e 2006 com um aumento de 1.665 elemen-

tos (Figura 15). De uma forma geral, o número de

elementos pertencentes aos CB com a missão de

combate a incêndios florestais, tem revelado uma

evolução positiva. Entre o ano 2000 e 2008 houve

um aumento de 1.622 elementos. Também no que

diz respeito às viaturas dos bombeiros, houve um au-

mento significativo durante o período 2000 – 2008

(429 viaturas), com especial reforço também em

2005 e 2006, com um acréscimo de 399 viaturas.

De um modo geral, o maior número de bombeiros

no dispositivo de combate durante a “Fase Charlie”

encontra-se nos distritos da Região Norte, Centro e

Lisboa (NUT II), em especial nos distritos de Lisboa

(487 bombeiros), Viseu (414), Porto (396), Santarém

(375), Aveiro (324) e Coimbra (316). Os distritos com

menos bombeiros são: Viana do Castelo (90 bombei-

ros), Portalegre (124), Évora (139) e Beja (154).

se de incidentes complexos para apoio operacional

do CDOS, que mais tarde viriam a ser concretizadas

através do Grupo de Análise e Uso do Fogo (GAUF).

O esquema de organização global da resposta em

vigor, é apresentado na Figura 14, conforme foi defi-

ni do na Directiva Operacional Nacional n.º 1/ 2008.

A organização global da resposta não sofreu signi-

ficativas alterações desde 2006 para cá, tendo sido

ampliada ao nível dos intervenientes no ataque ini-

cial e no dispositivo de prevenção, detecção, vigilân-

cia e fiscalização.

Outros

APC

Postos

de Vigia

Vigilância

Móvel

Sapadores

FlorestaisGNR

Mapas Florestais

Meteo

Base de dados

CDOS

Operacionalização Municipal

Dispositivo de Prevenção , Detecção, Vigilância e Fiscalização

Ataque Inicial

Ataque Ampliado

BBSFECINESEGIPSFEBEHATI

Outros Agentes AFOCELCA ESF

Rescaldo e Vigilância pós-rescaldo

Outros AgentesBombeiros

Outros

Agentes

Forças

Armadas

Sapadores

Oficial GNRComandan-

te Distrital

FIgURA 14 Organização global da resposta – Directiva operacional nacional n.º 01/2008. EHATI: Equipas Helitransportadas de Ataque Inicial; FEB: Força Especial de Bombeiros; GIPS: Grupos de Intervenção Protecção e So-corro; ESE: Equipas de Sapadores do Exército; ECIN: Equipas de Combate a Incêndios; BBSF: Brigadas de Bombeiros Sapadores Flo-restais; ESF: Equipas de Sapadores Florestais; APC: Agentes de Protecção Civil; AFOCELCA: Agrupamento Complementar de Empresas – Aliança Florestal, Celbi & Caima. FONTE: Reproduzido de (ANPC, 2008).

2008

FIgURA 15 Evolução do n.º de bombeiros e respectivas viaturas durante o período 2000 – 2008. FONTE: MAI, 2003; Dados cedidos pela ANPC (Setembro, 2008); SNBPC, 2006; ANPC, 2007; ANPC, 2008.

2001

6.000

5.000

4.000

3.000

2.000

1.000

0

2002 2003 2004 2005 2006 2007

Bombeiros Viaturas (bombeiros)

2000

Meios humanos e materiais

De entre os meios humanos, os bombeiros são a

força de combate a incêndios florestais mais nu-

merosa. Actualmente, Portugal conta com cerca de

4.900 bombeiros no dispositivo de resposta perma-

nente dos CB, que correspondem a mais de 50%

do total de elementos que integram a FOCON para

a Fase Charlie de 2008. No âmbito do combate aos

incê dios florestais, as forças que integram a FOCON

participam no ataque inicial, no ataque ampliado, no

reforço, no rescaldo, na vigilância activa pós-rescal-

do e no apoio e assistência (ANPC, 2008). O valor

apresentado referente ao total anual de bombeiros

diz respeito aos bombeiros voluntários remunerados

que integram o dispositivo permanente de combate

aos incêndios florestais. Os bombeiros voluntários

são de facto a força mais numerosa nas missões

7 Nos valores referentes às eSF apresentados na Directiva Operacional Nacional n.º 1/2008, não estão incluídas as 60 novas eSF criadas em 2008, as quais foram já incluídas nas presentes apresentações que incluem o número de SF/eSF e respectivas viaturas.

Page 28: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 50 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 51 |

No que toca aos meios do dispositivo de combate,

importa fazer uma referência especial aos meios aé-

reos. Nos últimos anos (2001 – 2008), tem-se verifi-

cado um reforço dos meios aéreos no dispositivo de

tégica de Combustíveis (GUFGEC), criado em 2007,

dotando a DGRF de um carácter operativo na gestão

estratégica dos combustíveis através do uso do fogo

e no apoio técnico nas fases de ataque ampliado

a incêndios florestais (GUFGEC, 2008a). Os GAUF

são, an tes de mais, um grupo especializado em aná-

lise de in cên dios. Um dos objectivos para a sua cons-

tituição foi apoiar os Comandantes das Operações

de Socorro (COS) em situações de incêndio, por nor-

ma em incêndios de grandes dimensões ou quando

se conjugam as condições para adquirirem dimen-

sões preocupantes. Este apoio consuma-se através

da aná lise do comportamento do fogo e delinea-

mento de estratégias de combate, nas quais poderá

recorrer-se ao uso de fogo de supressão (fogo táctico

e contra-fogo). Assim, este grupo é encarado na du-

pla perspectiva de analistas do fogo e técnicos cre-

denciados para o uso do fogo, resultado da junção

de valências das Equipas de Analistas de Incêndios e

Equipas de Fogos Tácticos de Supressão previstas na

Directiva Operacional Nacional n.º 2/2007, de 6 de

Fevereiro de 2007.

O início dos GAUF remonta a 2006, dado que existia

já um conjunto de 11 técnicos que desenvolviam e

aperfeiçoavam estas acções e viriam posteriormente

a formar estas equipas. O grupo inicial era constitu-

ído por 5 portugueses, 3 argentinos, 2 catalães e 1

francês. Os técnicos estrangeiros deram um impor-

tante contributo inicial na partilha de experiências,

no apoio técnico e na formação dos técnicos por-

tugueses, em especial os espanhóis (GRAF) e argen-

tinos (Plano Nacional del Manejo del Fuego), dada

a sua experiência no combate a incêndios florestais

com recurso a ferramentas manuais e uso do fogo.

Durante este ano, os GAUF intervieram em 6 incên-

dios ocorridos em 3 distritos diferentes (Tabela 15).

Em 2007, os GAUF eram constituídos por 19 técnicos

e 6 viaturas. Entre eles contavam-se 10 portugueses,

5 argentinos, 1 catalão e 1 francês. Foram chama-

dos por 97 vezes em 14 distritos, e recorreram ao

fogo de supressão por 57 vezes. À data da presente

publicação os GAUF dispõem de 10 viaturas e são

constituídos por 26 técnicos, com 21 portugueses,

3 argentinos, 1 catalão e 1 francês. Os técnicos por-

tu gueses distribuem-se pela AFN, por Câ maras Mu-

nicipais, associações florestais e Tapada Nacional de

Mafra. Durante o Verão, encontram-se à disposição

da AFN (GUFGEC, 2008b). Fora do “período crítico”

estes técnicos realizam acções de fogo controlado

em colaboração com diferentes entidades na DFCI,

nomeadamente os SF, os bombeiros, os técnicos da

indústria papeleira, as FEB e os GIPS.

Ainda no âmbito do combate indirecto, no ano 2007,

o dispositivo foi reforçado com os Grupos de Análise

e Uso do Fogo (GAUF). Os GAUF foram constituídos

dentro do Gabinete de Uso do Fogo e Gestão Estra-

de 2 de Fevereiro). Desde então, houve também um

aumento significativo do número de elementos que

compõem os GIPS, passando de 196 elementos e 36

viaturas em 2006 para 720 elementos e 92 viatu-

ras em 2008, distribuídos pelos distritos de Viana do

Castelo, Braga, Porto, Aveiro, Vila Real, Viseu, Coim-

bra, Leiria, Faro, Bragança e Lisboa (ANPC, 2008).

A partir de Junho de 2007, a ANPC teve a possibi-

li dade de constituir forças especiais com base no

re cru tamento de oficiais bombeiros e bombeiros

do quadro activo dos corpos mistos ou voluntários

(DL n.º 247/2007, de 27 de Junho) e, em Novem-

bro do mesmo ano, foram criadas as Forças Espe-

ciais de Bombeiros Canarinhos (FEB) (Despacho

n.º 22 396/2007, de 16 de Setembro), também es-

pecializadas na primeira intervenção. No entanto, as

FEB remontam já a 2005, quando o então SNBPC

constituiu brigadas helitransportadas de combate a

incêndios florestais formadas por bombeiros voluntá-

rios, conhecidas por “Canarinhos”. No presente ano

(2008), as FEB contam já com 210 elementos e 28

viaturas distribuídas pelos distritos da Guarda, Caste-

lo Branco, Santarém, Portalegre, Évora, Beja e Setú-

bal (ANPC, 2008). Desde 2008 que todas as equipas

helitransportadas de ataque inicial são profissionais e

com cobertura nacional.

Para além destas forças, o dispositivo de combate a

incêndios florestais conta ainda com outros meios

humanos de diferentes entidades preparados para

acções de primeira intervenção com recurso a fer-

ramentas manuais, como as equipas de vigilância e

primeira intervenção do ICNB, os Sapadores Flores-

tais do Exército, as brigadas da Medida AGRIS 3.4 da

ex-DGRF e as brigadas terrestres e helitransportadas

da AFOCELCA (Figura 16).

FIgURA 16 Evolução do número de elementos das forças de combate alargado e das forças especializadas em primeira intervenção. Nas forças especializadas em primeira intervenção estão incluídas as brigadas da Medida AGRIS 3.4 e SF sob coordenação da DGRF, os GIPS, as FEB, os SF e equipas de vigilância e primeira intervenção do ICNB, os SF do Exército e os SF e brigadas helitransportadas da AFOCELCA. No caso das brigadas da Medida AGRIS 3.4 da DGRF, dos elementos do ICNB, da AFOCELCA e das FEB/brigadas helitrans-portadas dos bombeiros, apenas foi possível a obtenção de dados a partir de 2006, embora a criação destas forças seja anterior a este ano. FONTE: DGRF, 2008b; MAI, 2003; SNBPC, 2006; ANPC, 2007; ANPC, 2008; Dados cedidos pela ANPC (Setembro, 2008).

2001

8.000

6.000

4.000

2.000

0

2002 2003 2004 2005 2006 2007

Forças de combate alargado Forças especializadas em 1ª intervenção

2000 2008 TABELA 15 Evolução dos GAUF e das intervenções durante o período 2006 – 2008. FONTE: GUFGEC, 2008b; Dados cedidos pela AFN (Agosto, 2008). Os dados relativos a 2008 reportam-se apenas ao periodo até final de Setembro.

ANO N.º DE

ELEMENTOS

N.º DE

VIATURAS

N.º DE

ACTIVAÇõES

INTERVENÇõES COM

FOgO DE SUPRESSÃO

N.º DISTRITOS

DE ACTUAÇÃO

2006 11 2 6 0 3

2007 19 6 97 57 14

2008 22 10 18 - -

Page 29: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 52 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 53 |

aos Incêndios Florestais” (CEEMA), com vista à for-

mulação de um relatório/proposta que planeasse a

aquisição e a contratação de meios aéreos (CEEMA,

2005). As recomendações desta comissão especial

foram seguidas e autorizou-se a realização de des-

pesas inerentes à celebração dos contratos para os

meios aéreos propostos para o ano 2006, nomea-

damente a aquisição de 4 HEBL, 6 HEBM e 4 AETP.

Foi ainda autorizado o aluguer de 16 HEBL, 4 HEBM

e 14 AETL/M com a duração máxima de cinco anos

(RCM n.º 182/2005, de 22 de Novembro). Conside-

rando que os prazos para a construção dos aparelhos

novos a adquirir inviabilizaria a sua disponibilização

no ano 2006, foi necessário suprir esta lacuna com

a contratação de meios aéreos adicionais (RCM

n.º 197/2005, de 2 de Dezembro).

Deste relatório surge ainda a proposta de criação

de uma “Unidade Gestora do Programa”, a qual

seria responsável pelo acompanhamento de todo

o processo de aquisição e instalação dos meios/

aeronaves, participaria no processo organizativo e

asseguraria a ligação com a entidade operadora de

manutenção, e participaria na elaboração do pro-

grama de formação e treino do pessoal, dos manu-

ais de operação e dos procedimentos de execução

(CEEMA, 2005). Esta entidade viria a ganhar forma

no ano 2007 sob a designação “Empresa de Meios

Aéreos”, com a forma de sociedade anónima de ca-

pitais exclusivamente públicos (DL n.º 109/2007, de

13 de Abril).

Seria também em 2007 que teria início a consti-

tuição da frota portuguesa de meios aéreos, com

a aquisição do total de helicópteros proposto pela

CEEMA, nomeadamente quatro helicópteros ligeiros

franceses ECUREIL (a 3 de Agosto de 2007) e seis

helicópteros pesados russos KAMOV (a 8 de Agosto

de 2007) (CEAAPNDFCI, 2008).

A formação e o treino

O centro de formação da Lousã da Escola Nacional

de Bombeiros (ENB) foi criado em 1999, com sede no

Aeródromo da Lousã, em terrenos e instalações ce-

didos pela Câmara Municipal da Lousã. Desde 2004

ministra apenas formações no âmbito do combate

a incêndios florestais, nomeadamente: “Combate a

incêndios florestais para grupos de primeira interven-

ção”, “Chefe de equipa de combate a incêndios flo-

restais”, e “Apoio ao combate a incêndios florestais

para sapadores municipais”. A partir de 2004, passa

a designar-se como Centro de Formação Especializa-

do em Incêndios Florestais (CFEIF).

O CFEIF tem 3 formadores na área da DFCI (incluídos

nos dez formadores com vínculo directo à ENB) e conta,

nas acções formativas, com a colaboração de especia-

listas de outras entidades, tais como a ANPC, a AFN, o

Instituto de Meteorologia (IM) e o Laboratório de Estu-

dos sobre Incêndios Florestais (LEIF) da Associação para

o Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial (ADAI).

Entre os anos 2000 e 2007, a ENB ministrou 221 ac-

ções formativas na área da DFCI (248, incluindo o

plano para 2008) a 3.936 formandos (4.376, incluin-

do 2008), num total de 9.622 horas de formação

(21.300, incluindo 2008). Houve uma média de 492

formandos por ano durante este período (486, in-

cluindo 2008)11. Não se tem verificado uma evolução

constante destes indicadores ao longo dos últimos

anos (2000 – 2008), embora exista uma tendência

geral de crescimento (Tabela 17). Para além disso, ve-

rificou-se uma progressiva diversificação das acções

formativas na área da DFCI.

combate aos incêndios florestais (Figura 17), passan-

do de 35 em 2001 para 56 aparelhos em 20088. Os

helicópteros eram 23 em 2001 e 40 em 2008 (Tabela

16). O número de aviões aumentou de 12 em 2001

para 16 em 2008, sendo que no ano 2006, houve

um máximo de 19 aviões. Consequentemente, os

encargos9 com os meios aéreos têm também au-

mentado, passando de cerca de 10 milhões de euros

(M€) em 2001 para cerca de 16M€ em 2006, atin-

gindo os 31M€ no ano 2005.

FIgURA 17 Evolução dos meios aéreos (helicópteros, aviões e total) entre 2001 – 2008 e evolução dos respectivos encargos entre 2001 – 2006 (valores não disponíveis para 2007 nem 2008). FONTE: Tribunal de Contas, 2007; ANPC, 2007; ANPC, 2008.

60

50

40

30

20

10

0

Nº / M€

2002 2003 2004 2005 2006 2007

Total de meios aéreos (Nº)

2001 2008

Total de aviões (Nº) Total dos encargos

(milhões de euros - M€)

Total de helicópteros (Nº)

TABELA 16 Evolução anual dos meios aéreos por tipo de aparelhos durante o periodo 2001 – 200810, não incluindo os meios da AFOCELCA. HEBL – Helicópteros bombardeiros ligeiros; HEBM – Helicópteros bombardeiros médios; HEBP – Helicópteros bombardeiros pesados; AETL – Aerotanques ligeiros; AETM – Aerotanques médios; AETP – Aerotanques pesados. FONTE: Tribunal de Contas, 2007; ANPC, 2007; ANPC, 2008.

MEIOS AÉREOS 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

HEBL 16 16 19 18 29 22 20 35

HEBM 3 3 3 2 8 6 8 --

HEBP 4 4 4 6 0 0 6 5

AETL 10 10 10 10 6 8 8 8

AETM 0 0 0 0 4 8 6 6

AETP 2 2 2 2 2 3 2 2

Total 35 35 38 38 49 47 50 56

11 Os dados de 2008 correspondem ao que está programado para este ano e não ao executado

Tendo em conta a importância dos meios aéreos no

dispositivo de combate a incêndios florestais, o MAI

determinou que fosse constituída uma “Comissão Es-

pecial para o Estudo dos Meios Aéreos de Combate

8 Em situações mais graves, tem-se recorrido ao auxílio internacional que se traduz num reforço em meios aéreos que raramente é contabilizado no total de meios aéreos. Foi o que sucedeu em 2003, com um reforço com 3 helicópteros pesados alemães, 3 AETL marroquinos, 1 AETP marroquino, 2 AETP italianos e 2 AETP espanhóis. Há ainda a juntar neste ano 2 helicópteros da Força Aérea Portuguesa com missão de coordenação e reconhecimento (MAI, 2003). 9 Os encargos com os meios aéreos incluem a execução financeira dos contratos e ainda o pagamento de horas adicionais. Nos anos 2005 e 2006, estes encargos com os meios aéreos corresponderam respectivamente a 33% e 19% das despesas do então SNBPC (Tribunal de Contas, 2007). 10 O valor referente ao número de HEBM no ano 2008 está incluído no total de HEBL do mesmo ano, tal como é apresentado na Directiva Operacional n.º 1/2008 (ANPC, 2008), não tendo sido possível discriminar este valor.

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| 54 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 55 |

tras acções de formação, sem perda de remuneração

ou quaisquer outros direitos e regalias, desde que o

número de faltas não exceda, em média, três dias por

mês. Este último mecanismo é extensível aos bombei-

ros voluntários dos quadros de comando e activo (DL

n.º 241/2007, de 21 de Junho, art. 26.º, ponto 1).

Houve uma alteração no panorama formativo dos

bombeiros voluntários a partir de Agosto de 2008,

pois nas 275 horas anuais obrigatórias de serviço ope-

racional passaram a estar incluídas 70 horas de forma-

ção e instrução (Portaria n.º 571/2008, de 3 de Julho).

No entanto, não são discriminadas as temáticas que

deverão estar incluídas nestas 70 horas de formação.

Para além dos bombeiros, importa abordar a forma-

ção dos outros intervenientes no combate a incên-

dios. No caso dos Sapadores Florestais (SF), o seu

programa de formação é definido pela AFN com a

participação de outras entidades com competências

nesta área (DL n.º 179/99, de 21 de Maio). Os apoios

à formação e qualificação profissional dos SF esta-

vam enquadrados no sistema de apoio à formação

dos recursos humanos incluído no âmbito do Fundo

Social Europeu (FSE), sem prejuízo de outros apoios

(DL n.º 179/99, de 21 de Maio), mas a partir de 2004

estes apoios passaram a estar a cargo da DGRF (DL

n.º 94/2004, de 22 de Abril). Juntamente a este novo

quadro de apoios, a competência para a formação

de novos elementos a integrar nas equipas de SF fi-

cou a cargo das OPF, sob coordenação da DGRF, be-

neficiando de apoios específicos para tal. Por outras

palavras, o processo burocrático para a formação

dos SF passou para as OPF.

Um dos principais critérios para a formação dos SF,

independentemente da entidade formadora, sempre

foi a uniformização dos conteúdos programáticos.

Estes conteúdos têm sofrido algumas alterações des-

de a criação dos SF em 1999. O plano de formação

para o período 1999 – 2005 incluiu uma formação

base e uma formação complementar, totalizando

165 horas de formação, 75 horas de formação teó-

rica técnica e 91 de formação prática simulada. No

período 2006 – 2007, o plano de formação foi re-

formulado e beneficiou de um aumento da carga

horária para 212,5 horas. A formação dos SF para o

período 2008 – 2012 consta no Catálogo Nacional

de Qualificações da Agência Nacional para a Qualifi-

cação (ANQ) e o conteúdo programático sofreu uma

reestruturação. A carga horária de formação tecno-

lógica passa para 875 horas.

A formação dos GIPS teve início no CFEIF da Lousã

com militares do Regimento de Infantaria da GNR,

formando comandantes de operações e chefes de

grupos de combate, adquirindo estes formandos as

competências para formar os novos membros que vi-

riam a integrar esta força de combate. A informação

obtida acerca da formação dos GIPS, refere-se ape-

nas ao conteúdo programático do curso “Combate

a Incêndios Florestais” (para GIPS/GNR) realizado no

CFEIF. Este curso de formação teve uma carga horária

de 120 horas, não tendo sido possível discriminar a

carga horária das diferentes temáticas leccionadas.

As FEB foram criadas com esta designação em 2007

(Despacho n.º 22 396/2007, de 16 de Setembro). O

recrutamento dos elementos das FEB (quadros de co-

mando, oficiais-bombeiros e bombeiros) é efectuado

a partir do universo dos corpos mistos e voluntários

e o respectivo plano de formação e certificação dos

bombeiros compete à ENB. A informação obtida re-

ferente à formação teórica e técnica dos elementos

das FEB diz respeito aos cursos realizados no CFEIF,

Quanto às exigências de formação para a carreira

de bombeiro, encontrámos sobretudo informação

relativa aos bombeiros profissionais. O ingresso nos

CB profissionais12 é antecedido por um período de

formação inicial em que são abordadas/leccionadas,

por entre o largo espectro de serviços operacionais,

algumas matérias relativas a incêndios florestais. A

formação teórica dos estágios nos bombeiros pro-

fissionais é coordenada pelo Centro de Estudos e

Formação Autárquica (CEFA) e é ministrada pelas en-

tidades públicas ou privadas, ou por elementos dos

próprios CB (Despacho conjunto n.º 298/2006, de 31

de Março13). No decorrer deste estágio de ingresso,

são dedicadas 140 horas às temáticas relacionadas

directamente com incêndios, embora estejam inclu-

ídos outros tipos de incêndios (não florestais), não

tendo sido possível ter acesso ao número de horas

exclusivamente dedicadas aos incêndios florestais.

No que toca aos bombeiros voluntários, o ingresso no

quadro activo da corporação é igualmente antecedi-

do por um período de formação inicial, normalmente

com uma duração aproximada de 9 meses. Os conte-

údos programáticos do estágio de ingresso nos bom-

beiros voluntários são delineados por regulamento

da ANPC, ouvida a ENB e o Conselho Nacional de

Bombeiros (CNB) (DL n.º 241/2007, de 21 de Junho).

No entanto, não foi possível obter um plano de for-

mação detalhado deste período de formação inicial.

Uma das diferenças relativamente aos bombeiros

pro fissionais é a formação contínua. A formação

contínua nos CB voluntários, para além de ocasional,

depende principalmente da própria iniciativa dos res-

pectivos CB e comandantes. A falta de tempo dispo-

nível é a principal justificação para o reduzido número

de acções formativas. Assim, as acções formativas

são esporádicas e na sua maioria são formações in-

ternas, tendo por base os manuais da ENB. Para além

disso, são poucos os CB, incluindo bombeiros profis-

sionais, que possuem uma sala de formação adequa-

da e com os materiais pedagógicos necessários (ISA,

2005). Não foi também possível quantificar o núme-

ro de formações internas relacionadas ao combate a

incêndios florestais.

Apesar das limitações em disponibilidade horária,

têm-se criado mecanismos que pretendem pro-

porcionar mais horas de formação aos bombeiros

voluntários. É o exemplo da frequência dos cursos

de formação na ENB (exclusivos para as categorias

médias e superiores), durante os quais os bombei-

ros voluntários podem faltar ao respectivo trabalho

sem perda de direitos até ao máximo de 15 dias por

ano, sendo as entidades patronais compensadas dos

salários pagos pelos dias de trabalho perdidos (DL

n.º 241/2007, de 21 de Junho, art. 26.º, pontos 4 e

5). Podem ainda faltar ao trabalho para realizar ou-

12 Entende-se por bombeiros profissionais, os bombeiros municipais que desempenham funções de carácter profissionalizado e a tempo inteiro e os bombeiros sapadores, ambos integrados nos quadros de pessoal das câmaras municipais. 13 Este Despacho Conjunto veio dar seguimento às disposições legais referentes à formação dos bombeiros profissionais no Decreto-Lei n.º 106/2002, de 13 de Abril.

TABELA 17 N.º de acções formativas em DFCI no CFEIF, total de horas de formação e n.º de formandos, entre os anos 2000 – 2008. FONTE: Dados cedidos pela ENB (Agosto, 2008).

ANOS N.º ACÇõES

MINISTRADAS

TOTAL DE

HORAS DE

FORMAÇÃO

N.º

FORMANDOS

2000 17 595 335

2001 26 910 426

2002 12 420 234

2003 32 1.120 519

2004 38 1.330 740

2005 10 797 189

2006 35 1.610 540

2007 51 2.840 953

2008 27 1.028 440

Total 248 10.650 4.376

Page 31: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 56 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 57 |

A infracção mais detectada em 2007 diz respeito à

gestão das faixas de combustível junto a habitações e

infra-estruturas, sendo também este ti po de infracção

aquele que tem sido objecto de mais denúncias.

Em termos de detecção de incêndios, para além da

detecção móvel efectuada por diferentes agentes da

DFCI, há que referir os resultados obtidos pela Rede

Nacional de Postos de Vigia (RNPV). Apesar do eleva-

do número de postos de vigia (263), a sua actual dis-

tribuição deixa ainda espaços sem visibilidade. Num

trabalho realizado pela Associação de Desenvolvi-

mento do Instituto Superior de Agronomia (ADISA),

através do Centro de Ecologia Aplicada “Prof. Baeta

Neves” e pelo Instituto de Novas Tecnologias (INOV),

conclui-se que cerca de 28% do território nacional

continental não é vigiado pela RNPV, 31% é vigiado

apenas por um posto de vigia, cerca de 41% é vigia-

do por dois ou mais postos de vigia e cerca de 12%

desta área é visível por quatro ou mais postos de vigia

(CEABN/ADISA & INESC-INOVAÇÃO, 2004). Durante

o período 2001 – 2007, a participação da RNPV nos

alertas oscilou entre os 12% e os 17% do total de

alertas até 2005, baixando nos anos 2006 e 2007

para cerca de 4% e 3% respectivamente (Figura 18).

O contacto directo com as forças de segurança por

parte dos populares, possibilitado pela massificação

do telemóvel e, eventualmente, por uma maior cons-

ciencialização e assimilação do dever cívico quanto

ao problema dos incêndios florestais, tem levado a

um maior protagonismo da população. Foi o que terá

provavelmente sucedido nestes dois últimos anos e

poderá justificar a diminuição da proporção de de-

tecções pela RNPV. A utilização de números telefóni-

cos de emergência manteve-se relativamente estável

durante este período, entre os 10% e 5%.

designados por “Curso de Brigadas Helitransporta-

das”, com uma carga horária de 90 horas.

De entre as forças do dispositivo de combate aos

incêndios florestais, aqui analisadas no âmbito da

respectiva formação, os SF beneficiam de um maior

número de horas de formação, especialmente consi-

derando o mais recente programa de formação (2008

– 2012) que contempla 875 horas de formação tecno-

lógica segundo o catálogo de qualificações da ANQ.

No entanto, para além das questões específicas do

combate a incêndios, o programa de formação inclui

outras matérias associadas ao trabalho na floresta.

Em termos do programa de formação, verifica-se

que os conteúdos sobre “incêndios florestais” são

mais limitados no caso dos bombeiros (excluindo

FEB) comparativamente com as restantes forças es-

pecializadas em combate a incêndios. Os bombeiros

voluntários não são incluídos nesta análise conjunta

dado que nem sequer foi possível obter informações

concretas sobre o respectivo programa formativo. No

entanto, a falta de treino dos bombeiros voluntários

portugueses é apontada em vários relatórios como

uma deficiência grave no combate aos incêndios

florestais (e.g. Beighley&Quinsenberry, 2004; ISA,

2005; European Parliament, 2008).

A performance do Sistema Nacional de DFCI

Importa aqui considerar as várias vertentes do siste-

ma de DFCI, incluindo nomeadamente a vigilância,

a pré-supressão, a primeira intervenção, o combate

alargado e o rescaldo.

A vigilância e a pré-supressão estão actualmente sob

a competência da GNR. O SEPNA tem particulares

responsabilidades na vigilância e na dissuasão de ac-

tividades de risco na área da DFCI. Os relatórios de

actividade do SEPNA mostram a evolução em termos

de infracções cometidas no âmbito da legislação de

DFCI nos últimos anos (Tabela 18).

Verifica-se que, os registos de crimes e contra-orde-

nações, têm crescido substancialmente nos últimos

anos. Estes resultados estão relacionados com o au-

mento de competências no processo de consolida-

ção do SEPNA no seio da GNR, depois da mudança

institucional operada em 2006.

Algumas das infracções registadas têm origem em

denúncias recebidas através da Linha SOS Ambien-

te e Território (Linha Azul do Ambiente). No ano de

2006 foram recebidas 101 denúncias e em 2007 esse

número aumentou para 162 denúncias. Os tipos de

infracção mais representados estão relacionados es-

pecificamente com a gestão das faixas de combustí-

vel junto a habitações e infra-estruturas e a queima

de sobrantes (Tabela 19). De notar que, de 2006

para 2007, ocorreu uma inversão na infracção pre-

dominante. A queima de sobrantes, a que correspon-

diam mais de 70% das infracções em 2006, passou a

representar menos de 40% das infracções em 2007.

TABELA 18 Infracções detectadas pelo SEPNA no âmbito da legislação de incêndios florestais (dados incompletos para 2008).FONTE: Portal Electrónico do SEPNA (www.gnr.pt). Dados disponíveis em Outubro de 2008.

ANO CRIME CONTRA-ORDENAÇõES

2002 18 33

2003 29 27

2004 62 37

2005 96 1.774

2006 462 1.968

2007 825 2.656

2008 498 1.859

TABELA 19 Importância relativa (dados em percentagem) dos di ferentes tipos de infracções detec tadas pelo SEPNA no âm-bi to da le gislação de incêndios florestais. FONTE: SEPNA, 2007; SEPNA, 2008.

TIPO 2006 2007

Queima de sobrantes 72 36

Gestão de faixas de combustível 24 52

Queimada 2 6

Outros 2 6

FIgURA 18 Evolução da contribuição das principais fontes de alerta dos focos de incêndio no período 2001 – 2007. FONTE: CEABN/ADISA & INESC-INOVAÇÃO, 2004; Dados cedidos pela DGRF (Julho, 2008).

100

80

60

40

20

0

%

2002 2003 2004 2005 2006

Outros

2001 2007

RNPV Populares Linhas telefónicas (117)

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No que diz respeito à eliminação de tempos de che-

gada superiores a 60 minutos (Figura 20), verifica-se

que houve ainda um número significativo de ocor-

rências nesta situação, especialmente em 2005 com

318 ocorrências (1,8% do total de ocorrências). O

ano 2007 terá apresentado o resultado mais positivo

com 44 ocorrências (0,5% do total).

Uma das metas delineadas no PNDFCI, a atingir até

2012, é a redução, para menos de 150, do número

de incêndios activos com duração superior a 24 ho-

ras, objectivo já cumprido nos anos 2003, 2004 e

2007 (Figura 21). Atentando no ano 2003, os valores

surpreendem pela positiva (96 incêndios). Nas classes

de duração mais elevadas, o número de incêndios é

relativamente reduzido quando comparado com os

de outros anos, apesar da área ardida total, sem pa-

ralelo, que se verificou neste ano.

Um dos factores apontados para a prestação da RNPV

abaixo do esperado é a sua estruturação geográfica,

concebida sem um projecto de raiz com vista à opti-

mização dos recursos. Segundo o trabalho referido,

o mesmo grau de probabilidade de detecção da

actual RNPV poderia ser assegurado com apenas 142

PV, sendo necessário proceder a 103 relocalizações.

Para além de uma rápida detecção e comunicação, a

redução dos tempos de chegada aos incêndios é funda-

mental para o sucesso da DFCI. Prevê-se no PNDFCI que,

com o reforço do número de unidades de SF, o papel

dos GIPS, a melhoria da capacidade de intervenção dos

bombeiros voluntários que integram as Equipas de Com-

bate a Incêndios e a progressiva introdução de Grupos

de Intervenção Permanentes no âmbito das Associações

Humanitárias de Bombeiros Voluntários, seja possível a

eliminação de tempos de chegada superiores a 60 mi-

nutos. É ainda apontado como objectivo a chegada ao

local do incêndio em menos de 20 minutos em 90% das

ocorrências (RCM n.º 65/2006, de 26 de Maio).

Quando as condições meteorológicas facilitam a rápi-

da propagação do incêndio, a rapidez na chegada ao

local da ignição torna-se ainda mais decisiva. Mesmo

para tempos de chegada inferiores a 20 minutos, é

ainda significativo o número de incêndios com du-

ração superior a 3 horas (Figura 19). Tomando como

exemplo o ano de 2003, com um recorde de área

ardida, obtiveram-se neste ano os melhores resulta-

dos do período sob observação (2001 – 2007) em

tempos de chegada inferiores a 10 minutos (57% das

ocorrências) e 20 minutos (89%), este último bastan-

te próximo do valor ambicionado no PNDFCI (90%).

O ano 2003 foi surpreendentemente satisfatório em

termos de rapidez da 1ª intervenção, mas com as

condições meteorológicas excepcionalmente severas,

bastou ter “escapado” uma pequena percentagem

de incêndios para que se produzisse uma enorme

área queimada. Exceptuando os anos 2001 e 2005,

com 75% e 81% do total de ocorrências com tempos

de chegada inferiores a 20 minutos, todos os anos

apresentaram resultados superiores a 85%. Os resul-

tados para tempos de primeira intervenção inferiores

a 20 minutos podem ser observados na Figura 20

(soma das classes 0-10 minutos e 10-20 minutos).

2005

2% 2%

42%

39%

15%

2006

1% 1%

51%37%

10%

2007

1% 1%

45%42%

11%

2004

2% 1%

32% 55%

10%

2003

1% 1%

32% 57%

9%

2002

2% 1%

51%35%

11%

2001

38%

37%

19%

4% 2%

Os tempos de chegada aos incêndios: 2001 - 2007

> 60 min40 - 60 min20 - 40 min0 - 10 min

FIgURA 20 Os tempos de chegada aos incêndios nos anos 2001 – 2007. FONTE: DGRF, 2008a.

10 - 20 min

3 - 6h

2.500

2.000

1.500

1.000

500

0

incê

ndio

s

Duração incêndios

6 - 9h 9 - 12h 12 - 24h > 24h

200720062005 2004200320022001

FIgURA 19 N.º de incêndios de acordo com classes de duração para tempos de chegada inferiores a 20 minutos entre 2001 – 2007.FONTE: DGRF, 2008a.

Page 33: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 60 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 61 |

A iniciativa COTEC

A COTEC Portugal, Associação Empresarial para a

Inovação, lançou em 2004 uma iniciativa sobre In-

cêndios Florestais que assentou em três grandes

projectos: benchmarking de sistemas de prevenção

e combate a incêndios; apoio à prevenção e comba-

te de incêndios florestais com base em cartografia

de risco e modelos de comportamento; vigilância

florestal, detecção e alerta.

Destes projectos foram produzidas recomendações

que viriam a ser incorporadas na DFCI, das quais

destacamos a necessidade da criação de uma cadeia

de comando e de um centro de comando únicos;

uma primeira intervenção baseada em meios huma-

nos e materiais especializados, enfatizando o papel

dos sapadores florestais e do recurso ao helicópte-

ro; a criação de um corpo autónomo de bombeiros

florestais, profissionalizado com formação e treino

adequados; e a disponibilização de um sistema de

comunicação eficaz.

No PNDFCI foi ainda delineado o objectivo de, até

2012, reduzir o número de reacendimentos para me-

nos de 1% do total de ocorrências. Até 2018, o ob-

jectivo é de 0,5% (RCM n.º 65/2006, de 26 de Maio).

Considerando o período 2001 – 2007, é apresentado

na Figura 22 o número anual de reacendimentos e

respectiva percentagem face ao total de ocorrências

nesse período. Os anos 2002 e 2005 registaram os

piores resultados com mais de 1.500 reacendimentos

correspondentes a, respectivamente, 6,3% e 5,1%

dos respectivos totais de ocorrências. Seguem-se

os anos 2003 e 2004 com mais de 1.000 reacendi-

mentos, com 4,4% e 5,2% do total de ocorrências,

respectivamente. Entre 2001 e 2005, o número de

reacendimentos foi sempre superior a 3% do total

de ocorrências. Os anos 2006 e 2007 registaram os

valores mais reduzidos deste período, com cerca de

500 reacendimentos, correspondentes a, respectiva-

mente, 2,5% e 2,9% dos respectivos totais de ocor-

rências. Não obstante, em qualquer um destes anos,

os resultados encontram-se relativamente afastados

do ambicionado para 2012 no PNDFCI.

TABELA 20 N.º de ocorrências anuais e respectivas percentagens por classes de duração no período 2001 – 2007. FONTE: DGRF, 2007a e DGRF, 2008a.

CLASSES DE DURAÇÃO DAS OCORRÊNCIAS

0-3h 3-6h 6-9h 9-12h 12-24h >24h

Anos N.º % N.º % N.º % N.º % N.º % N.º %

2001 7.244 70,2 1.919 18,6 540 5,2 236 2,3 199 1,9 174 1,7

2002 13.480 78,0 2.559 14,8 627 3,6 242 1,4 214 1,2 158 0,9

2003 11.764 83,7 1.553 11,0 377 2,7 146 1,0 119 0,8 96 0,7

2004 7.101 82,1 1.081 12,5 228 2,6 92 1,1 73 0,8 69 0,8

2005 13.520 74,8 2.681 14,8 782 4,3 355 2,0 415 2,3 318 1,8

2006 15.802 78,9 2.831 14,1 660 3,3 253 1,3 253 1,3 231 1,2

2007 6.848 76,9 1.464 16,4 300 3,4 127 1,4 105 1,2 65 0,7

2.000

1.500

1.000

500

0

%

2002 2003 2004 2005 20062001 2007

7

6

5

4

3

2

1

0

Objectivo do PNDFCI

para 2018 (%)

Reacendimentos

(% do total de ocorrências)

Objectivo do PNDFCI

para 2012 (%)

Total de reacendimentos

FIgURA 21 Número anual de reacendimentos e respectiva percentagem face ao total de ocorrências no período 2001 – 2007.FONTE: Dados cedidos pela DGRF (Julho de 2008); DGRF, 2006; DGRF, 2007a; DGRF, 2008a.

Page 34: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 62 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 63 |

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pdf [consultado em Julho de 2007].

Page 35: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

PARTE IICOMUNICAÇÕES APRESENTADAS NO WORKSHOP

INCÊNDIOS FLORESTAIS5 ANOS APÓS 2003AméRIco cARvAlho mEndEs DOMINgOS XAvIER vIEgAS

FRAnçoIs BInggElI JOAqUIM SANDE SIvA ERnEsTo dE

dEus LúCIA SALDANHA José cARdoso PEREIRA BER-

NARDO MOTA AnA sÁ ANA BARROS soFIA olIvEIRA

JORDI PAgES mARk BEIghlEy PAULO FER NANDES PE-

dRo AlmEIdA vIEIRA

Page 36: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 67 |

POLÍTICA FLORESTAL EM PORTUgAL DEPOIS DE

2003

AméRIco m. s. cARvAlho mEndEs1

Faculdade de Economia e gestão, universidade ca-

tólica Portuguesa - Porto

1. Evolução da política florestal até 2003

Portugal é um dos países do mundo onde a proprie-

dade florestal privada tem maior peso relativo.

com efeito, 93.4% da área florestal do continente

está neste regime de propriedade, 5.4% correspon-

de a baldios e só 1.2% é do Estado (mendes et al.,

2004). Apesar desta importância tão grande da flo-

resta privada que não é de agora e da percentagem

tão diminuta de área florestal pública que também

não é de agora, o essencial da actividade do organis-

mo público com maiores responsabilidades na for-

mulação e na implementação da política florestal em

Portugal centrou-se desde o tempo da sua criação,

no final do século XvIII2, até há poucos anos atrás,

na gestão da floresta pública e na gestão da floresta

baldia tratada como se fosse pública.

Esta situação é um dos casos mais notáveis nas po-

líticas públicas em Portugal de um fenómeno cha-

mado “dependência da trajectória”, ou seja, uma

situação onde as condições que vigoravam na altura

da criação de uma organização influenciaram signi-

ficativamente a sua trajectória futura. neste caso, os

serviços Florestais que foram criados tendo como

primeira missão proteger e gerir a floresta pública

revelaram, ao longo do tempo, uma grande dificul-

dade em fomentar o desenvolvimento da floresta

privada (mendes, 2008a; Fernandes, 2008).

Presidiu a esta orientação de política florestal a se-

guinte visão do sector florestal em Portugal:

• o país tem um grande potencial de recursos flores-

tais por aproveitar;

• embora grande parte desses recursos estejam nas

mãos de privados, estes são incapazes de aprovei-

tar o seu potencial como deve ser;

• o motor do desenvolvimento florestal do país deve

ser o Estado através de um organismo da sua Ad-

ministração central com capacidade técnica voca-

cionada para o efeito, a saber, os serviços Flores-

tais, e privilegiando instrumentos de política do tipo

“comando e controlo”3 acompanhados de acções

que são essencialmente de carácter técnico (ex. di-

fusão de “boas práticas de gestão florestal”).

o máximo até onde esta orientação de política conse-

guiu ir foi no alargamento da jurisdição dos serviços

Florestais às áreas baldias, tendo o primeiro grande

passo nesse sentido sido dado com a pas sagem para

a responsabilidade dos serviços Florestais dos baldios

do gerês e da serra da Estrela, na década de 1880.

Este processo acentuou-se a partir da década de

1930, com a implementação do Plano de Povoamen-

to Florestal que durou até ao início dos anos 70.

1 declaração de interesses: o autor é Presidente da Associação Florestal do vale do sousa. 2 Está aqui a fazer-se alusão à criação, em 1796, da Real Junta da Fazenda da marinha cuja missão era a conservação e gestão dos pinhais reais. depois da

Revolução liberal, em 1824, foi criada a Administração geral das matas com uma missão semelhante de conservação e gestão das florestas da coroa. Este organismo que perdurou durante grande parte do século XIX foi, depois, substituído por outro cuja denominação foi mudando ao longo do tempo, até dar lugar à actual Autoridade Florestal nacional. Esta sucessão de organismos vai ser aqui designada por “serviços Florestais”.

3 no século XIX chegou a advogar-se e a colocar-se em letra de lei ir até à expropriação da floresta privada.

Page 37: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 68 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 69 |

Esta arborização dos baldios que, conjuntamente

com a arborização das dunas do litoral, foram, até

hoje, as duas obras principais dos serviços Florestais,

eram missões que estavam esgotadas no início dos

anos 70. depois disso, e até agora, este organismo

tem passado por um longo período de crise sem

ainda ter conseguido redefinir claramente as suas

missões e o seu posicionamento adequado face aos

restantes parceiros do sector, a começar pelos pro-

prietários florestais privados. um indício dessa crise

de identidade têm sido as várias designações e re-

organizações por que estes serviços têm passado ao

longo deste período e que ainda agora continuam.

depois do período áureo de arborização dos baldios

e quando os serviços Florestais já estavam na fase

descendente da sua influência, houve dois momen-

tos capitais onde tiveram oportunidade e meios para

redefinirem as suas missões de maneira a adequa-

rem-se ao que era necessário para fomentar o desen-

volvimento do sector florestal. um desses momentos

foi a década de 50. A partir dessa altura a população

activa agrícola começou a diminuir. Era de prever

que esta tendência iria pôr cada vez mais em causa

o modelo socio-económico em que tinha assentado

até aí o crescimento da área e da produção florestal.

Esse modelo era baseado na iniciativa privada e

individual dos proprietários florestais, com acesso

fácil a mão de obra barata para a gestão da sua flo-

resta e com uma procura de produtos florestais que

teve uma tendência de longo prazo positiva desde

o início do século XIX. Esta iniciativa permitiu que

a área e a produção florestal crescessem, fazendo

com que o sector ga nhas se uma grande importância

económica em termos agregados, embora interna-

mente muito heterogéneo, com diferenças eco-

nómicas, sociológicas e de implantação geográfica

entre as suas três componentes principais: a baseada

no pinheiro-bravo, a baseada no sobreiro e a basea-

da no eucalipto, esta última tendo-se desenvolvido a

partir dos anos 50. outra característica desse modelo

era o facto do risco de incêndio estar controlado

devido à existência de uma população rural numero-

sa e com usos e costumes que permitiam o controlo

da massa combustível na floresta a níveis que redu-

ziam esse risco de incêndio.

com o êxodo agrícola esse modelo foi posto em cau-

sa. A partir de então os custos de mão de obra para

uma gestão florestal sustentável começaram a ser

cada vez mais elevados, conduzindo a rentabilidade

privada da produção florestal para níveis negativos,

mesmo que a sua rentabilidade social fosse positiva.

o epifenómeno desta alteração nas condições socio-

económicas da produção florestal foi o agravamento

do problema dos incêndios florestais. os grandes in-

cêndios de 2003 e 2005 não são mais do que o auge

das consequências negativas desse problema econó-

mico de fundo que se tem vindo a desenvolver, pelo

menos, desde os anos 50, sem políticas públicas que

ajudem a resolvê-lo, ou, pelo menos, a atenuá-lo.

com o êxodo agrícola e o consequente agravar do

problema dos incêndios houve uma outra mudança

estrutural nas condições da produção florestal. Até

então a gestão florestal sustentável e o crescimento

da área e da produção florestal tinham podido ser as-

segurados de forma mais ou menos satisfatória pela

iniciativa privada e individual dos proprietários flo-

restais. num contexto de risco de incêndio cada vez

maior deixa de ser assim, uma vez que estamos em

presença de uma externalidade negativa com a na-

tureza de um risco social, cuja redução só pode ser

conseguida através de formas de organização da ac-

ção colectiva não só dos proprietários florestais, mas

também doutros agentes relevantes para o efeito (ser-

viços Florestais e outros organismos da Administração

central, autarquias, indústrias florestais e outros).

Assim sendo, o que se deveria ter imposto desde

então como prioridade de uma política florestal

adequada à realidade do sector deveria ter sido pro-

mover essas formas de organização colectiva que

ajudassem a produção florestal privada a fazer face

a custos de produção cada vez mais elevados e a um

risco de incêndio cada vez maior. uma das maneiras

de o fazer poderia ter sido empenhar-se no apoio ao

associativismo dos proprietários florestais privados

e na promoção de formas de gestão agrupada da

produção florestal privada. nada disso foi feito na for-

ma e na escala que seriam necessárias. Algumas ini-

ciativas que surgiram do lado dos serviços Florestais

no apoio à floresta privada nessa época foram mais

para o apoio a alguns proprietários individualmente

considerados e não nas direcções atrás referidas.

Tinha também sido preciso começar a organizar,

desde essa altura, mecanismos que permitissem in-

ternalizar em favor dos proprietários florestais parte

dos benefícios sociais correspondentes aos serviços

ambientais que a sua floresta produz, isto desde que

dessem provas de se estarem a esforçar por melhorar

a sua gestão florestal. dessa forma, combater-se-ia a

tendência para uma rentabilidade privada negativa

da produção florestal. Também nada disto foi feito.

um outro momento capital de novas oportunidades

para a redefinição das missões dos serviços Florestais

foi a década de 80. nessa altura, com a missão de

gestão estatal dos baldios em plena crise e com as

novas oportunidades de financiamento externo que

a democracia permitiu, os serviços Florestais viram

aí a necessidade e os meios para se redireccionarem

no sentido do apoio à floresta privada. no entan-

to, começaram por fazê-lo replicando, no essencial,

as ilusões e as práticas velhas de mais um século e

meio, ou seja, através da sua intervenção directa

na floresta privada. Foi assim com o Projecto Flores-

tal Português (PFP) do Banco mundial onde uma das

componentes foi a arborização realizada com base

em projectos para áreas privadas e de baldios que

eram elaborados e executados directamente pelos

serviços Florestais.

com o PAF-Programa de Acção Florestal, e depois de

terem aprendido alguma coisa com os erros do PFP,

os serviços Florestais recuaram nessa via da interven-

ção directa sobre a floresta privada. deu-se, então,

uma mudança estrutural na política florestal que ain-

da hoje perdura, com o recurso, em larga escala, a

incentivos financeiros com a forma de subsídios a

fundo perdido, para o investimento em arborização

e beneficiação de áreas florestais, co-financiados pe-

los fundos estruturais da união Europeia. com esta

mudança, que é uma forma de internalizar alguns

benefícios sociais que a floresta gera, os serviços

Florestais procuraram chegar à floresta privada es-

sencialmente através do controlo da gestão desses

incentivos4. numa fase inicial do PAF isso ainda foi

assim, embora os serviços Florestais não estivessem

adequadamente equipados, à partida, para exer-

cerem as tarefas de recepção, análise, aprovação e

acompanhamento das candidaturas a esses sistemas

de incentivos. de qualquer maneira, esforçaram-se

por isso o melhor que puderam, recorrendo ao seus

4 numa primeira versão do PAF elaborada pelos responsáveis dos serviços Florestais da altura reivindicava-se para este programa uma fatia de leão do PEdAP - Programa Específico de Apoio à Agricultura Portuguesa enquadrado nas Ajudas de Pré-Adesão da cEE. Esta versão teve que ser rapidamente reformulada para valores bem inferiores por pressão dos interesses agrícolas que existiam dentro do ministério da Agricultura.

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| 70 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 71 |

técnicos com alguma experiência de relação com a

propriedade privada do tempo do Fundo de Fomen-

to Florestal, mas acabaram, depois, por perder gran-

de parte desse poder em benefício do IFAdAP.

Em vez deste esforço pelo controlo dos sistemas de

incentivos financeiros ao sector, o que os serviços

Florestais poderiam ter feito nessa altura e não fize-

ram, apesar de terem meios financeiros para o efeito

no PFP e no PAF, era regressarem ao terreno. Esse

regresso deveria ter sido não tanto para as Adminis-

trações Florestais que durante anos foram instâncias

com grande influência local através das competên-

cias que tinham na gestão dos baldios, mas antes

para a proximidade dos proprietários florestais pri-

vados, com a criação de um serviço de extensão

florestal que os ajudasse a melhorar a gestão da

sua floresta. Também nada disto foi feito, desta vez

apesar de existirem recursos financeiros suficientes

para o efeito.

Estes serviços de apoio técnico no terreno aos pro-

prietários florestais privados acabaram, finalmente,

por aparecer, na década seguinte, mas não por ini-

ciativa e com o apoio directo dos serviços Florestais,

através de um programa de incentivos que este orga-

nismo ou outro tenham desenhado especificamente

para este efeito. o que então aconteceu foi a cons-

tituição de organizações de produtores florestais

sus citada, em boa parte, pela procura de serviços de

apoio técnico por parte de produtores florestais que

pretendiam candidatar-se a sistemas de incentivos

ao investimento florestal no âmbito dos programas

co-financiados pela união Europeia. Embora estes

programas não contemplassem medidas específi-

cas para apoiar a constituição daquele tipo de or-

ganizações, acabaram por ser um factor importante

motivador dessa constituição. A principal fonte de

financiamento dessa constituição foram outros pro-

gramas vários aos quais essas organizações procu-

raram candidatar-se mesmo que não tivessem sido

desenhados especificamente para responder às suas

necessidades.

2. Condições favoráveis a reformas estrutu-

rais na política florestal a seguir a 2003

depois dos grandes incêndios de 2003 estavam reu-

nidas três condições favoráveis muito importantes

para favorecer uma reforma estrutural no modelo de

política florestal que foi seguido desde o início do

século XIX e que só tinha começado a mudar subs-

tancialmente nos anos 80.

uma condição é que, pela primeira vez na história

deste sector, existia um problema unificador do

conjunto de agentes mais relevantes que o cons-

tituem. Esse problema era o dos incêndios, com a

magnitude que então tiveram. com efeito, nesse

ano foi destruído, com uma extensão significativa,

o seguinte:

• não só a floresta de pinheiro-bravo, mas também a

de eucalipto (incluindo aqui a da indústria de pasta

e papel) e a de sobreiro;

• não só a floresta das zonas rurais, mas também a

que ficava muito perto das cidades;

• não só árvores e mato, mas também vidas huma-

nas e postes eléctricos e de telecomunicações.

Ao causar grandes prejuízos em tantas zonas do país

e em tantos grupos sociais, os grandes incêndios de

2003, com os que se lhe seguiram em 2005, aca-

baram por gerar uma conjugação momentânea de

interesses até ali dispersos no sentido de se fazer

qualquer coisa que pudesse contribuir para reduzir,

de uma forma duradoura este problema que afecta

todo o sector.

outra condição favorável para a realização de refor-

mas estruturais na política florestal era o facto de

o país dispor de um conjunto de organizações de

produtores florestais que, pelo menos, em termos

das respectivas áreas sociais, já cobria satisfatoria-

mente grande parte do país florestal. Após séculos

durante os quais a propriedade florestal privada não

esteve organizada de forma colectiva, e num contex-

to onde a necessidade dessa organização era cada

vez maior para fazer face a riscos sociais como o dos

incêndios, finalmente estavam lançadas as bases

desse tipo de organização em quase todo o país.

A terceira condição favorável a uma mudança estru-

tural na política florestal tem que ver com a constitui-

ção do Fundo Florestal Permanente (FFP) que tinha

sido instituído pela lei de Bases da Política Florestal de

1996, mas que ainda não tinha passado da letra da

lei para a prática. com este fundo passou a dispor-se

de um instrumento financeiro de base inteiramente

nacional e, portanto, não sujeito aos calendários e aos

condicionalismos dos programas co-financiados pela

união Europeia. Este instrumento, tal como a legisla-

ção de 1996 o determinava, deveria destinar-se essen-

cialmente à internalização de externalidades positivas

que a floresta gera, obviamente em favor dos produ-

tores florestais que a gerirem no sentido de promover

esse tipo de benefícios sociais.

3. O que faltava fazer a seguir a 2003 e não

foi feito

A reforma estrutural que era e é preciso fazer numa

situação onde o sector florestal se confronta com

graves riscos sociais, nomeadamente o dos incên-

dios florestais e outros (agora o nemátodo), e num

país onde a floresta privada é largamente predomi-

nante, deve consistir em colocar bem no topo das

prioridades da política florestal o fomento do asso-

ciativismo florestal. Embora comece a haver cada vez

mais pessoas a reconhecer esta necessidade, esta-

mos ainda longe do ponto onde a política florestal

em Portugal trata esta questão como deve ser.

o que é que faltou, então, fazer depois de 2003 para

que esta mudança de política acontecesse?

Era preciso ter havido nos decisores políticos, nos

agentes económicos relevantes do sector, nomeada-

mente as indústrias florestais, e nas instâncias com

influência na formação da opinião pública (meios de

comunicação social e intervenientes em colóquios

sobre estes temas), um diagnosticar correcto das

causas mais profundas dos incêndios florestais para,

depois, a partir daí desenhar medidas de política

adequadas para lidar com elas. ora quem presen-

ciou os inúmeros debates que houve sobre o pro-

blema dos incêndios e leu o muito que se escreveu

sobre o assunto nessa altura terá observado que a

maior parte dos diagnósticos acabavam por apon-

tar como causa principal dos incêndios o “absen-

tismo” dos proprietários florestais privados. daí só

muito raramente se partia para a identificação das

causas mais profundas desse “absentismo”, nomea-

damente as de natureza económica: rentabilidade

privada negativa da produção florestal para a qual

tinha contribuído o êxodo rural e o consequente

agravamento dos custos privados dessa produção.

Em vez disso, desse tipo de diagnóstico partia-se

depois quase sempre para a defesa de medidas de

política que, com formatos variados, consistiam ou

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| 72 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 73 |

em substituir os proprietários florestais privados por

outros agentes considerados mais capazes para rea-

lizar uma gestão florestal sustentável (os serviços

Florestais devidamente reformados e reforçados, os

municípios ou empresas públicas e os fundos de in-

vestimento imobiliário florestal a criar para o efeito),

ou em impor-lhes, por via coerciva, determinadas

práticas de boa gestão florestal.

Incorreram e continuam a incorrer nestes erros de

diagnóstico e de terapêutica não só as entidades pú-

blicas com mais responsabilidades na formulação e

na implementação da política florestal, mas também

entidades privadas com muita relevância no sector

florestal, nomeadamente as indústrias florestais.

Embora nos últimos tempos as necessidades eco-

nómicas decorrentes de questões que afectam es-

pecificamente cada uma delas (redução da área de

pinheiro-bravo, aumento de capacidade da produção

de papel, aparecimento de substitutos para a rolha de

cortiça) tenham levado estas indústrias a dar alguns

passos no sentido de se aproximarem dos produtores

florestais, esses passos são ainda curtos e replicam ve-

lhos erros da nossa política florestal como o de pensar

que muito da solução para os problemas do sector

passa por medidas de carácter técnico (ex. difusão

de boas “práticas” e de plantas seleccionadas).

Para além da mudança de mentalidades que tinha

sido necessária para evitar os erros de diagnóstico e

de terapêutica atrás referidos, tinha sido preciso fa-

zer mais coisas, nomeadamente em relação às duas

realidades emergentes nessa altura, a saber: as orga-

nizações de produtores florestais e o FFP.

Em relação às organizações de produtores florestais

cuja principal fonte de financiamento era, e ainda

é, o que elas vão podendo obter de financiamentos

públicos, impunha-se que fossem instituídos me-

canismos de monitorização da aplicação desses

financiamentos e de avaliação do desempenho

das organizações que os recebem. Estes mecanismos

eram e continuam a ser necessários, pelo menos, por

duas razões:

• prevenção e irradicação de comportamentos opor-

tunistas na utilização desses recursos financeiros;

• mudança no modo como são formulados os critérios

de elegibilidade para acesso aos financiamentos

públicos estabelecendo-os com base em indicado-

res de desempenho em vez de ser com base numa

lista pré-determinada de acções supostamente

necessárias para o desenvolvimento do sector, em

todo o país e para todas as organizações.

nada disto foi feito, com as consequências que são

de esperar:

• situações de aproveitamento oportunista de finan-

ciamentos públicos no associativismo florestal;

• aplicações ineficientes desses financiamentos por-

que enviesadas em função de critérios de elegibi-

lidade que não se adequam às principais neces-

sidades de desenvolvimento dos territórios e das

organizações onde são aplicados, nem discriminam

positivamente quem tem dado melhores provas de

os utilizar com eficiência.

Ainda em relação ao FFP, há mais dois problemas re-

levantes a referir. mal dotado em recursos humanos,

este organismo tem tido tempos de resposta no pro-

cessamento das candidaturas e dos pedidos de pa-

gamento que são demasiado elevados para a frágil

tesouraria das organizações de produtores florestais

cujo fundo de maneio é muito reduzido.

o último problema tem que ver com as entidades

beneficiárias das verbas do FFP. se, para além do

maior cuidado na prevenção, detecção e sanção do

oportunismo, não tivesse havido desvio de verbas

substanciais do FFP para outras entidades que não

os produtores florestais e as suas organizações, os

recursos do FFP chegariam para apoiar o arranque e

o desenvolvimento de uma rede de organizações de

produtores florestais que seria suficiente para cobrir

adequadamente todo o país florestal, até ao ponto

de serem capazes de gerar receitas próprias que lhes

permitissem passar a depender menos dos financia-

mentos públicos. há, no entanto, aqui um problema

de que vamos falar a seguir.

4. A municipalização da política florestal

os grandes incêndios de 2003 e 2005 acabaram por

gerar mudanças estruturais na política florestal que

vieram para ficar. o problema é que, pelo menos,

uma delas não foi na boa direcção. Essa mudan-

ça corresponde àquilo que aqui será designado por

“municipalização da política florestal”. Trata-se das

competências e recursos acrescidos atribuídos aos

municípios para intervirem em matérias relevantes da

gestão florestal nas áreas privadas.

os municípios chegaram a este ponto em resultado

da combinação de vários factores. um deles é a ten-

dência geral de reforço do poder municipal que tem

acontecido desde o 25 de Abril de 1974.

outro factor é o agravamento dos incêndios flores-

tais e as competências que os municípios já tinham

na área da protecção civil, levando-os daqui para

uma intervenção cada vez maior na gestão florestal

em áreas privadas.

o terceiro factor é o facto do agravamento do pro-

blema dos incêndios florestais atrás referidas ter tra-

zido este sector para o palco das disputas de prota-

gonismo político a nível nacional e local.

o quarto factor tem que ver com a preponderância

das visões dos problemas florestais atrás referidas que

desaguam em terapêuticas de substituição dos pro-

prietários florestais por outros agentes considerados

mais “capazes” de proteger e valorizar a floresta,

neste caso, os municípios. mantém-se, assim, o velho

erro da política florestal em Portugal que consiste em

considerar que o motor do desenvolvimento do sector

deve residir em entidades públicas. A diferença agora

é que, numa situa ção onde os serviços Florestais já

não têm as estruturas de que antes dispunham no ter-

reno e já não as podem restaurar e desenvolver, a Ad-

ministração local vai ocupando esse terreno que este

organismo da Administração central deixou vago, ou

onde nunca chegou a estar em permanência.

um dos principais instrumentos para sustentar esta

municipalização da política florestal tem sido o FFP

ao financiar projectos dos municípios e o pessoal que

recrutaram para constituir os chamados “gabinetes

Técnicos Florestais”. com isto, desviam-se para enti-

dades públicas recursos financeiros que se deveriam

destinar a apoiar a organização dos proprietários flo-

restais privados para a melhoria da gestão florestal.

com isto não se quer dizer que os municípios de-

veriam ser arredados da área florestal e privados de

meios para ter aqui alguma actividade. há competên-

cias importantes que têm e devem conservar (orde-

namento do território, construção e manutenção de

caminhos e infra-estruturas de apoio ao combate a

incêndios, etc.) precisando, obviamente, de recursos

Page 40: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 74 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 75 |

humanos e financeiros para isso. o problema é que

essa intervenção dos municípios não deve ser organi-

zada nem financiada do modo como está a ser feita

até agora.

Em primeiro lugar a escala municipal é uma escala de-

masiado pequena para ser eficiente em várias das ac-

tividades que os municípios estão a assumir. Era mais

aconselhável a escala inter-municipal. com isso,

aproveitar-se-iam economias de escala e reduzir-se-

-iam os custos com os gabinetes Técnicos Florestais.

À escala inter-municipal também se reduziria o risco

das intervenções dos municípios ficarem demasiado

sujeitas ao jogo político a nível local.

Assim sendo, os financiamentos públicos a atribuir

aos municípios em matéria florestal deveriam ser con-

dicionados à sua aplicação à escala inter-municipal.

Além disso, estas actividades dos municípios deve-

riam ser suportadas pelas suas fontes de financia-

mento próprias, ou seja, pelos impostos municipais

e pelas verbas que os municípios recebem ao abrigo

da lei das Finanças locais, em vez de serem retiradas

do FFP cuja vocação central é a internalização dos

benefícios sociais que a floresta gera.

Finalmente deveriam ser instituídos mecanismos que

desincentivassem os municípios de pretenderem ser

substitutos, ou até concorrentes, dos proprietários

florestais privados e das suas organizações, incenti-

vando-os, antes, a desempenhar um papel construti-

vo no fomento do associativismo florestal.

5. As ZIFs

outra reforma estrutural na política florestal que re-

sultou dos grandes incêndios de 2003 e 2005 tem

que ver com o fomento da gestão florestal agrupa-

da, através da constituição das chamadas “Zonas de

Intervenção Florestal” (ZIF).

Em si, e sem mais, esta medida não é necessaria-

mente boa. depende das condições em que uma

ZIF é constituída e da forma como for depois ge-

rida. Boas condições nesta matéria seriam as que

passamos a expor. Existe no terreno, há vários anos,

uma organização de produtores com provas dadas

de bom desempenho e que, uma vez publicada a

legislação reguladora das ZIF, se empenhou na sua

constituição, mas sem vender ilusões aos potenciais

aderentes só para os trazer a este processo. desse

trabalho resultariam ZIFs que teriam naturalmente

essa organização de produtores como entidade ges-

tora. mesmo que algumas dessas ZIFs pudessem não

ser de grande dimensão física, o facto de estar toda

sob a responsabilidade da mesma entidade gestora

dar-lhes-ia dimensão económica.

Para as organizações de produtores florestais em-

penhadas nesta tarefa as ZIF constituiriam uma boa

oportunidade a aproveitar porque lhes permitiriam

passar de uma intervenção em manta de retalhos

(um sócio aqui e outro além) para uma interven-

ção em mancha contínua.

As ZIFs permitiriam também às organizações de pro-

dutores florestais reduzir os custos de transacção

cada vez maiores com que se confrontam para fa-

zer crescer o seu número de associados, a partir do

momento em que já atraíram a si os que têm uma

dimensão da propriedade e um nível de interesse na

melhoria da gestão florestal que os leva a procurar

este tipo de organizações.

As organizações de produtores florestais que se em-

penham na constituição de ZIFs têm podido ir buscar

algum financiamento ao FFP. o problema é que, para

além de condições de elegibilidade que deixam a de-

sejar, a demora no processamento dos pagamentos

é de tal ordem que faz com que as que empenharam

os seus recursos humanos neste trabalho estejam em

situação de colapso de tesouraria e, portanto, em

risco de deitar a perder o que já fizeram.

Quando as condições atrás referidas não ocorrem,

as ZIFs podem ser um logro. Em vez de se promo-

ver o necessário associativismo florestal, promove-se

o minifúndio organizativo. Em vez de se chamar os

proprietários à assunção das suas responsabilidades

na gestão florestal, promove-se, mais uma vez, o

oportunismo na utilização dos fundos públicos e o

descrédito relativamente ao associativismo.

Aqui, como noutras matérias atrás referidas, cabe ao

Estado assumir e exercer bem o seu papel regulador.

é necessário que isso aconteça quanto antes.

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| 76 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 77 |

REFERÊNCIAS BIBLIOgRáFICAS

As ideias aqui expressas têm sido apresentadas em intervenções públicas diversas ocorridas de 2003 para cá.

Parte delas estão contidas em textos publicados, alguns dos quais constam da lista seguinte, remetendo-se para

eles o leitor interessado nas fontes que sustentam afirmações que aqui são feitas.

FERNANDES, L. C. R. M. (2008). Os Serviços Florestais desde a sua criação até às leis do Regime Florestal. lisboa: universidade

católica Portuguesa.

MENDES, A. M. S. C. (2005). Florestas Portuguesas: emparcelar o quê e para quê? Cadernos de Economia, 71, 36-40.

MENDES, A. M. S. C. (2006). Forest owners’ associations in Portugal: are the infant going to survive? Paper presented at the small-

scale forestry and rural development: The intersection of ecosystems, economics and society. IuFRo 3.08 conference, galway-mayo

Institute of Technology, galway, Ireland.

MENDES, A. M. S. C. (2006). Implementation Analysis of Forest Programmes: some theoretical notes and an example. Forest Policy

and Economics, 8(5), 512-528.

MENDES, A. M. S. C. (2006). Private forestry and forest policu reforms in Portugal in the context of increasing risk of forest fires.

Paper presented at the legal Aspects of European Forest sustainable development. 8th International IuFRo Rg 6.13.00 Forest law and

Environmental legislation symposium, Instambul.

MENDES, A. M. S. C. (2008). The role of Institutions in Forest Development: The Case of Forest Services and Forest Owners’ Associa-

tions in Portugal. Paper presented at the The multifunctional Role of Forests - Policies, methods and case studies, Joensuu.

MENDES, A. M. S. C. (2008). ZIF criadas, fadigas dobradas. Notícias FORESTIS, 0, 12-13.

MENDES, A. M. S. C., FELICIANO, D., TAvARES, M. & DIAS, R. (2004). The Portuguese Forests (country level report delivered to

the EFFE Project - Evaluating Financing of Forestry in Europe). Porto: Faculty of Economics and management, Portuguese catholic

university.

MENDES, A. M. S. C. & FERNANDES, L. C. R. M. (2007). Políticas e instituições florestais em Portugal - desde o final do Antigo Re-

gime até à actualidade. In J. s. silva (Ed.), Floresta e sociedade - uma história em comum (vol. vII, pp. 77-125). lisboa: Jornal Público/

Fundação luso-Americana para o desenvolvimento/liga para a Protecção da natureza.

A SITUAÇãO DOS INCÊNDIOS FLORESTAIS EM

PORTUgAL APÓS 2003

domIngos XAvIER vIEgAs

departamento de Engenharia mecânica, universida-

de de coimbra

Introdução

muitas coisas sucederam em Portugal, no âmbito

dos incêndios florestais, no ano de 2003 e desde en-

tão, que são justamente objecto de reflexão critica,

no contexto desta iniciativa da Autoridade Florestal

nacional (AFn) e da liga para a Protecção da nature-

za (lPn), que saúdo pela sua oportunidade e relevân-

cia. levanta-se aqui a questão de saber se estaremos

ou não no bom caminho, depois de um ano, o de

2003, em que o nosso País sofreu a maior desgraça

de sempre no campo dos incêndios florestais, que

levou toda a gente a clamar: “nunca mais!”. Apesar

disso no ano seguinte, em 2004, íamos quase pelo

mesmo caminho e, por fim em 2005, voltámos a ser

atingidos pelo desastre, embora desta vez de propor-

ções um pouco menores.

Esta repetição das situações reforça a impressão ge-

ral de que nem tudo está bem, pese embora as múl-

tiplas reuniões, debates, deliberações, estudos, pro-

jectos, investimentos, diplomas legais, mudanças nas

pessoas e nas estruturas que houve desde 2003.

A nossa memória é curta. Ao preparar esta interven-

ção, confesso que tive dificuldade em recordar toda

a panóplia de eventos e de mudanças que houve,

tal foi o ritmo a que os acontecimentos se sucede-

ram. Tive de voltar a ler muitos documentos e re-

latórios de diversas instituições, comissões, grupos

de trabalho e similares, que foram criados ou que se

constituíram como vectores de reflexão ou de acção,

para mudar a situação. não tenho qualquer preten-

são de ser completo ou exaustivo, nem o espaço e o

tempo disponíveis mo permitiriam. Irei referir apenas

alguns dos aspectos que mais impacto me causaram.

Presumo que o simples recordar dos factos já consti-

tui matéria suficiente de reflexão, sem haver mesmo

a necessidade de introduzir grandes comentários;

ainda assim comentarei sempre que for oportuno.

Retenho que em 2003 e nos anos seguintes apren-

demos a pôr em questão muitas das ideias feitas que

tínhamos acerca dos incêndios. nestes anos muitos

mitos foram quebrados.

Tenho dito muitas vezes que o problema dos incên-

dios florestais constitui um misto de factores naturais

– de grande importância – e de factores humanos.

Em relação aos primeiros há que analisá-los e com-

preendê-los. como em boa parte não dependem

de nós, podem servir de atenuante ou de desculpa,

mas dentro de certas medidas. os factores huma-

nos, entre os quais incluo a actuação das instituições

e das pessoas que gerem o problema dos incêndios

florestais em Portugal, merecem talvez uma atenção

mais profunda, uma vez que são também relevantes

e, além disso, são aqueles em que podemos actuar

mais directamente.

Page 42: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 78 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 79 |

Análise da Situação

é normal começar por referir as estatísticas dos in-

cêndios para ter uma base objectiva de análise. nas

figuras 1 e 2 mostram-se os dados do número de

incêndios e de área ardida em Portugal nos últimos

anos, desde 1980 até 2008 (setembro de 2008).

como se pode ver, o número de incêndios tem vin-

do a crescer ao longo das primeiras duas décadas

deste período, estabilizando em torno de um valor

muito elevado, da ordem dos 20 mil por ano, mas

felizmente durante os últimos anos este valor tem

vindo a regredir. mais significativo parece ser o nú-

mero de incêndios propriamente ditos, ou seja os

fogos que consumiram mais de 1 hectare (ha), cujo

número se tem mantido inferior a cerca de 5000

por ano, sendo que nos últimos anos este valor se

tem reduzido.

A estatística das áreas ardidas, que se mostra na Fi-

gura 2, indica uma maior variabilidade inter-anual,

que reflecte claramente o papel dos factores físicos

associados à meteorologia. Ainda assim é visível uma

tendência para um crescimento nas duas primeiras

décadas, com valores extremos em 2003 e 2005. os

três últimos anos, desde 2005, apresentam uma re-

dução gradual, mesmo drástica, das áreas ardidas.

é interessante verificar que entre 2003 e 2008 re-

gistámos os valores mais alto e mais baixo da área

ardida durante as passadas duas décadas, com uma

amplitude que vai desde os 20 aos 430 mil ha.

Alguém mais apressado poderia concluir que o pro-

blema dos incêndios florestais se encontra em vias

de resolução, se é que não estará já resolvido em

Portugal. mas uma leitura mais atenta destas estatís-

ticas e dos factos que lhes estão associados não nos

permite ser tão optimistas.

Irei dizer umas breves palavras acerca das condições

meteorológicas, remetendo a consulta das referên-

cias viegas et al. (2006) e viegas et al. (2008) para

uma análise mais detalhada das condições climáticas

e meteorológicas associadas aos incêndios destes úl-

timos anos. como é sabido o outono e Inverno que

precederam o ano de 2003 foram anormalmente

chuvosos, o que correspondeu a um elevado cresci-

mento de vegetação fina, que ficou disponível para

arder; com uma Primavera e verão muito secos, esta

vegetação adquiriu uma elevada combustibilidade po-

tencial. nesse ano uma parte importante do interior

do País foi atingida por uma ou mais ondas de calor

que contribuíram para uma incidência muito elevada

de incêndios, mesmo em distritos, como o de Portale-

gre, que eram considerados de risco não muito alto.

Tivemos ainda uma série de trovoadas secas, na noite

de 1 para 2 de Agosto, que percorreram o interior

centro do País, originando centenas de focos de in-

cêndio, que vieram a produzir a completa ruptura do

sistema, a partir desse dia. de acordo com os registos

oficiais, os incêndios verificados nesse dia 2 de Agosto

destruíram mais de 100 mil ha, que constitui o valor

que ardia, em média no País, durante um ano.

o ano de 2004 começou por ser um ano “normal”,

mas durante cerca de duas semanas no final de Julho

e no princípio de Agosto verificaram-se condições ex-

tremas em boa parte do País e em pouco mais de dez

dias perdemos quase 100 mil ha. Felizmente ocorreu

chuva e o resto do verão acabou por ser muito ameno,

tendo a área total ficado na ordem de 140 mil ha.

o ano de 2005 foi extremamente seco; a ocorrência

de alguns períodos muito quentes durante o verão

viria a torná-lo um ano semelhante a 2003, com uma

área ardida de 230 mil ha. Este ano confirmou-se

uma vez mais que, apesar das mudanças e das boas

intenções expressas, o País continuava – e continua –

à mercê das condições de risco extremas.

os anos de 2006 e 2007 voltaram a ser normais, com

verões relativamente frescos e sem períodos críticos.

Estas condições, aliadas à melhoria geral do sistema

– de que falaremos adiante – contribuíram decisiva-

mente para os bons resultados verificados.

deve dizer-se que o ano de 2008 se iniciou com um

deficit de precipitação ainda superior ao do ano de

2005. daí que era fundado um alarme que foi lan-

çado por algumas entidades, ao qual também me

associei, de que poderíamos ter um ano muito com-

plicado no campo dos incêndios florestais. Felizmen-

te uma precipitação anormal na Primavera e alguns

episódios de precipitação que pontuaram o verão

têm contribuído para o bom resultado que se verifica

no corrente ano até o final de outubro.

FIgURA 1 número anual de incêndios florestais ocorridos em Portugal entre 1980 e 2008; dados totais e incêndios superiores a um hectare (Dados DGRF).

40.000

35.000

30.000

25.000

20.000

15.000

10.000

5.000

0

nIn

c

Total

1978 1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008

>1ha

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| 80 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 81 |

não posso deixar de referir, como parte muito impor-

tante das estatísticas dos incêndios florestais em Por-

tugal, as vítimas de acidentes mortais relacionados

com os incêndios. no ano de 2003 registaram-se 21

vítimas mortais e em 2005 registaram-se 22.

no âmbito da perda de vidas humanas devem referir-

se os seguintes casos: o acidente que vitimou quatro

Bombeiros profissionais em mortágua, no dia 25 de

Fevereiro de 2005, e o que vitimou outros seis Bom-

beiros, entre os quais cinco chilenos, em Famalicão

da serra, em 9 de Julho de 2006. Estes dois aciden-

tes causaram um impacto muito grande em todo o

País, muito especialmente no seio da comunidade

dos Bombeiros. Este segundo acidente daria origem

e força a um movimento de Bombeiros que procura

chamar a atenção para as condições de segurança

em que os Bombeiros trabalham.

neste contexto ainda, dos acidentes mortais, devo

referir o acidente de guadalajara, em Espanha, no

dia 16 de Julho de 2005, no qual morreram 12

Bombeiros profissionais, num acidente que teve e

continua a ter um grande impacto público, em boa

parte pelas acções judiciais que motivou. na croácia,

num acidente ocorrido na Ilha de kornati, em 31 de

Agosto de 2007, um grupo de 13 Bombeiros foi sur-

preendido pelo fogo num desfiladeiro, tendo apenas

sobrevivido um deles.

no ano de 2007 a grécia e outros países do mediter-

râneo oriental tiveram o seu “2003”. Acompanhámos

FIgURA 2 Área percorrida pelos incêndios florestais em Portugal entre 1980 e 2008; dados totais e áreas florestadas. (Dados DGRF).

450.000

400.000

350.000

300.000

250.000

200.000

150.000

100.000

50.000

0

Áre

a h

a

Total

1978 1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008

Áreas Florestadas

mais de perto a situação na grécia, que nos fez lem-

brar muito a situação em Portugal em 2003. nesse

ano na grécia perderam a vida 77 pessoas, em aci-

dentes relacionados com os incêndios florestais. na

sua maioria tratou-se de civis.

Algumas Mudanças

nestes anos em Portugal foram tomadas muitas me-

didas e feitas diversas mudanças, a maioria delas logo

após 2003, mas algumas de uma forma continuada.

nem sempre estas mudanças foram feitas com muita

reflexão e quase nunca com análise e avaliação das

soluções anteriores.

As mudanças nas estruturas e as novas medidas le-

gislativas eram produzidas, muitas vezes, como se se

tratasse da solução do problema. Algumas dessas

medidas e planos de acção iam ao ponto de definir

valores concretos para metas de áreas ardidas, como

se tal dependesse dessas medidas ou, sequer, da ac-

tividade das pessoas e das instituições.

Torna-se difícil reconstituir o turbilhão de acções que

ocorreu em Portugal neste período, irei por isso refe-

rir apenas as que me pareceram mais relevantes.

Em Abril de 2003, isto é pouco antes do verão, ti-

nha sido extinta a comissão nacional Especializada

em Fogos Florestais (cnEFF) e foi criado o núcleo

de Protecção da Floresta (nPF), também no seio do

ministério da Administração Interna (mAI). não me

recordo quem foi designado para dirigir esta Entida-

de e, menos ainda, se teve algum papel relevante

na realização de acções que ajudassem a preparar o

País para a pior desgraça que viríamos a enfrentar na

nossa história. como é lógico, Portugal atravessou

essa crise sem dispor de um organismo que fizesse

a cúpula ou a coordenação das restantes instituições

envolvidas no problema.

no ano de 2004 foi extinto este nPF e criada a Agên-

cia para a Prevenção de Incêndios Florestais (APIF),

sob a alçada do ministério da Agricultura (mA) e de-

pendendo duma recém criada secretaria de Estado

das Florestas (sEF). Foi como se o mAI não apenas

tivesse “sacudido a água do seu capote” dos in-

cêndios florestais (IF), mas também tivesse deitado

para longe esse mesmo capote, passando muitas das

atribuições que tinha, na gestão do IF, para o mA.

um livro Branco que as estruturas do mAI produ-

ziram ainda em 2003, foi rapidamente esquecido e

as medidas que nele se preconizavam deixaram de

ter seguidores, como se tal livro nunca tivesse sido

produzido.

Em 2004 foi operacionalizado o Fundo Florestal Per-

manente (FFP), apesar de estar criado formalmente

desde 1996. Este Fundo destinava-se a gerir uma

parte dos gastos em combustível de cada um dos

Portugueses – um cêntimo por cada litro de com-

bustível adquirido – aplicando-a em acções de pre-

venção da floresta, tendo em particular atenção o

problema dos incêndios.

o serviço nacional de Bombeiros (snB) e o serviço

nacional de Protecção civil (snPc) tinham-se fundido

num novo organismo designado por serviço nacional

de Bombeiros e Protecção civil (snBPc). Embora esta

mudança tenha ocorrido no inicio do ano de 2003,

não creio que esta alteração tenha contribuído de

modo decisivo para agravar a situação no verão de

2003. Em 2007 o snBPc passaria a designar-se por

Autoridade nacional de Protecção civil (AnPc).

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| 82 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 83 |

Falou-se da aquisição de meios aéreos próprios. Foi

anunciada a aquisição de alguns aviões Beriev, que

chegaram a ser testados operacionalmente em Por-

tugal. Felizmente esta compra não se veio a concre-

tizar. Foi criada uma empresa pública para gerir os

novos meios a adquirir.

durante os últimos anos a direcção de Florestas mu-

dou de nome por diversas vezes. não há muitos anos

designava-se por direcção-geral das Florestas (dgF),

tendo passado a ser o Instituto Florestal (IF) durante

algum tempo. Passou a designar-se por direcção-ge-

ral dos Recursos Florestais (dgRF) até há bem pouco

tempo, em que se passou a chamar Autoridade Flo-

restal nacional (AFn).

nesta altura deu-se também a entrada da guarda

nacional Republicana (gnR) com um papel mui-

to mais interventivo e visível no processo. Foram

reforçados os serviços de Protecção da natureza e

do Ambiente (sEPnA) e criados os grupos de Inter-

venção de Protecção e socorro (gIPs). Estas medidas

controversas, iriam causar algum mal-estar ao início,

porque foram introduzidas sem grande preparação

do terreno, mas que se mostraram eficazes a muitos

títulos, sendo hoje em dia aplaudidas pela generali-

dade dos agentes.

Em 2006 foi criada a Auroridade nacional para os

Incêndios Florestais (AnIF), no seio do mAI. Esta en-

tidade, ao situar-se acima da APIF, restituiu a coorde-

nação das acções ao mAI, mas na realidade coexis-

tiram as duas com alguma duplicação de funções. A

AnIF foi extinta em finais de 2006, tal como estava

anunciado, depois de ter produzido um relatório crí-

tico da situação, com propostas de medidas de acção

para o futuro.

Em virtude destas mudanças e como expressão dos

avanços e recuos do sistema, chegaram-se a extin-

guir os “canarinhos”, em 2005, para se restabele-

cerem em 2007.

os guardas Florestais (gF) foram integrados nos

sEPnA e foram reforçados os grupos de sapadores

Florestais. Foi activado o núcleo de Reflorestação, no

seio da dgRF, que acabou por fazer uma boa parte

do planeamento das medidas de prevenção que se

deveriam adoptar no futuro imediato.

o País passou de uma situação em que se dizia que

não havia qualquer planeamento, para uma outra em

que se multiplicavam os planos. Foram produzidos

planos a nível municipal, distrital, regional e nacional,

por diferentes entidades. com diversos critérios e me-

todologias, mas sempre com um propósito de reduzir

a incidência dos incêndios. Perguntamo-nos sobre o

valor técnico de muitos destes planos, da sua articula-

ção mútua e mais ainda acerca da sua aplicação.

Dois Casos

A título de exemplo de como no nosso País não sabe-

mos aproveitar bem as oportunidades que algumas

crises nos proporcionam, para alterar profundamen-

te as atitudes e os modos de proceder, vou referir-me

à actuação e funcionamento de duas entidades que

surgiram no “pós 2003”: a APIF e o FFP.

A APIF rapidamente se viria a revelar como sendo

não uma entidade coordenadora das restantes,

mas antes como mais uma entidade, com funções

próprias e nalguns casos sobrepostas às de outras

instituições já existentes e actuantes. A atitude de

auto-suficiência e de predominância que a APIF assu-

miu na sua actuação seria em parte explicável através

do decreto da sua constituição (dl n.º 156/2004 de

30 de Junho) que, no seu Art. 2º. 2, estipulava que

“compete à Agência para a Prevenção de Incêndios

Florestais a coordenação do sistema nacional de Pre-

venção e Protecção da Floresta contra Incêndios e a

intervenção no sentido de assegurar a execução das

medidas e acções nele previstas”. uma interpreta-

ção muito estrita dos termos “intervenção” e “exe-

cução” terá certamente levado os responsaveis pela

APIF a tomar as atitudes referidas. cito alguns casos,

a título de exemplo.

uma das primeiras medidas adoptadas pela APIF, de-

corrente alias do seu decreto de constituição, foi o de

alterar as designações dos niveis de risco de incendio

e as cores dos respectivos códigos. Embora as desig-

nações e códigos de cores já estivessem enraizados

na comunidade operacional, foi imposto este novo

esquema. mas foi-se ainda mais longe. Embora se re-

conhecesse que o índice de perigo era calculado com

base em dados meteorológicos – obviamente obtidos

e tratados pelo Instituto de meteoro logia (Im), no nº 2

do seu art.º 5º dizia-se que “o índice de risco de in-

cêndio é elaborado pela Agência para a Prevenção

de Incêndios Florestais”. Qual seria o alcance desta

norma é dificil de comprrender. como seria lógico, foi

o Instituto de meteorologia que continuou a elabo-

rar o índice e a divulgá-lo também, em 2005. Apesar

disso na contribuição que a APIF deu para o relatório

final da AnIF, sobre este assunto, a APIF afirma o se-

guinte: “dificuldades decorrentes da falta de recursos

humanos, impediram a interpretação da informação

produzida pelo Instituto de meteorologia, pelo que

esta foi divulgada sem qualquer tratamento. Está em

curso a elaboração de um relatório que irá comparar

os valores do FWI com aqueles que foram calculados,

neste caso, atribuindo diferentes intervalos de classe,

em função dos distritos e não do perigo objectivo.”

devo confessar a minha incapacidade para compre-

ender o sentido técnico desta última frase.

o que é mais estranho é que esta mesma ideia é

recuperada em 2008, na versão que conheço da re-

visão do mesmo decreto-lei, quando se estabelece

que “o índice de risco temporal de incêndio será ela-

borado sob a coordenação e validação da AFn”.

outro exemplo de actuação da APIF diz respeito mais

directamente à minha equipa. Refere-se a um estu-

do de dois grandes incêndios ocorridos em 2004, na

Arrábida e em Almodôvar, que a minha equipa co-

meçara a estudar pelo facto de terem sido os dois

mais importantes incêndios daquele ano. Ao tomar

conhecimento que a APIF decidira estudar precisa-

mente aqueles dois incêndios, coloquei-me à dispo-

sição da APIF para prestar a colaboração que fosse

requerida. Foi com surpresa que em Janeiro de 2005

recebi da APIF a seguinte resposta: “A participação da

Associação para o desenvolvimento da Aerodinâmica

Industrial (AdAI) no estudo dos incêndios de Almo-

dôvar e Arrábida foi considerada inadequada dado

que as análises a efectuar não têm um carácter téc-

nico-científico”. Admitindo tratar-se de um engano,

tomei a iniciativa de insistir, mas recebi como resposta

que a APIF mantinha a sua posição de “não formular

qualquer convite, para participar na elaboração destes

estudos, a nenhuma entidade que não tenha assento

no conselho de Representantes, razão pela qual não

se justifica a participação da AdAI, nem a título de

observador”.

Transcrevo o que se diz no Relatório da APIF/AnIF, so-

bre a realização de inquéritos aos grandes incêndios

Page 45: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 84 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 85 |

florestais: “Recursos humanos escassos para a abran-

gência da missão”. Por tudo isto, suponho que já

nada nos deveria surpreender.

mais ainda haveria a dizer sobre a APIF e a sua ex-

tinção, mas passemos ao outro caso, o FFP. Embora

o FFP já existisse formalmente desde há alguns anos,

a sua operacionalização apenas ocorreu em 2004.

Apesar de se tratar de gerir dezenas de milhões de

Euros do Erário Público, não foi criada qualquer es-

trutura administrativa, dotada de pessoal adequada

para este fim.

no primeiro concurso lançado pelo FFP em 2004,

terão sido apresentadas algumas centenas de pro-

postas, que se candidatavam em pelo menos cinco

medidas ou eixos de acção, com um financiamento

total de cerca de quarenta milhões de euros. sabe-

se hoje que um pequeno grupo de pessoas, ligadas

aos gabinetes das entidades estatais decisoras, criou

uma lista de cerca de trinta projectos que deveriam

ser financiados, independentemente de qualquer

avaliação!

Tive oportunidade de analisar os cinco projectos que

foram financiados no âmbito da medida 5, de apoio

à investigação científica, os quais receberam um

apoio de cerca de quatro milhões de euros. Em meu

entender, nem um desses projectos havia sido apro-

vado correctamente. um deles, que recebeu cerca de

1.6 milhões de euros, era liderado por uma pessoa

ligada ao próprio FFP. o segundo, que recebeu um

apoio de 1.1 milhões de euros era proposto por en-

tidade à qual esta pessoa estava ligada. denunciei

este processo junto das autoridades e em resultado

disso houve profundas alterações no FFP.

noutros países, com muito menos do que este di-

nheiro faz-se muito mais no apoio à investigação

científica. sintomaticamente, em 2008, um dos pro-

jectos que referi acima, com um financiamento atri-

buído de 1.1 milhões de euros, foi anulado pelo FFP,

ao fim de não ter obtido resultados válidos após dois

anos de execução!

Tal como disse, perante o relato destes factos, supo-

nho que não são precisos mais comentários. Basta

reflectir no que foi descrito e no que isto supõe de

falta de sentido de serviço público e de gestão efi-

ciente dos recursos.

Avaliação global

A título de resumo irei analisar cada uma das prin-

cipais componentes do sistema, comentando breve-

mente cada um deles e atribuindo uma classificação

global, numa escala de 0 a 20 valores.

Prevenção

• melhoria das limpezas, sobretudo em torno das

povoações e das rodovias.

• Balanço do Plano de criação de faixas de descon-

tinuidade?

• lançamento do plano de fogo controlado.

• 13 valores.

vigilância

• maior visibilidade da autoridade e consequente

papel dissuasor.

• Repressão do crime de fogo posto com grande vi-

sibilidade e impacto.

• 17 valores.

Sensibilização

• Algumas medidas e campanhas de sensibilização.

• Presença do problema junto da população em ge-

ral, graças, em boa medida, à comunicação social.

• 15 valores.

Formação

• melhoria da formação e treino ao nível dos Bom-

beiros e, segundo creio, também junto dos técni-

cos florestais.

• 16 valores.

Integração de Entidades

• Alguma melhoria da articulação entre as entidades,

apesar de não existir uma cúpula bem definida e de

persistirem os espíritos de corpo e as capelinhas.

• conselho de Representantes (da ex-APIF) coexis-

tente com um órgão similar na AnPc!

• 9 valores.

Combate

• melhoria da organização.

• melhoria do ataque inicial.

• melhoria da comunicação com o público.

• 16 valores.

Apoio à investigação científica

• Acções avulsas e em geral desprovidas de coerên-

cia ou de critério.

• Falta de um programa nacional.

• 7 valores.

Confiança no sector

• Em vias de extinção, devido aos incêndios florestais

e a outros factores.

• caso do nemátodo do pinheiro [episódio de se-

túbal].

• 7 valores.

Conclusão

nestes anos foram desperdiçadas muitas oportunida-

des. continuamos a desbaratar recursos, boas von-

tades e esforços, por falta de organização, de escrú-

pulos e de querer. nalguns sectores, nomeadamente

aqueles a que dei uma nota negativa, suponho que

não estamos melhor do que em 2003.

Em conclusão direi que o sistema tem mexido desde

2003. Parece-me que não só se está a caminho, mas

que estamos no bom caminho, mas falta ainda mui-

to terreno a percorrer.

Page 46: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 86 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 87 |

REFERÊNCIAS

vIEgAS, D. X., ABRANTES, T., PALHEIRO, P., SANTO, F. E., vIEgAS, M. T., SILvA, J., ET AL. (2006). Fire weather during the

2003, 2004 and 2005 fire seasons in Portugal. Paper presented at the v International conference on Forest Fire Research, Figueira

da Foz, Portugal.

vIEgAS, D. X., ABRANTES, T., RIBEIRO, L., SANTO, F. E., vIEgAS, M. T. & SILvA, J. (2008). Fire weather in the last five years fire

seasons in Portugal. Geophysical Research Abstracts, 10.

ALgUMAS REFLEXÕES, 5 ANOS APÓS 2003

FRAnçoIs BInggElI

Espaces méditerranéens

Esta intervenção é um exercício delicado. necessita de

algum distanciamento para compensar o meu envolvi-

mento nas florestas portuguesas, em especial ao nível

do uso do fogo na prevenção e no combate, para tra-

zer um olhar complementar ao relatório muito com-

pleto, preparado pela liga para a Protecção da na-

tureza, cinco anos após os acontecimentos de 2003.

1. Progressos significativos

As previsões meteorológicas: A disponibilização

pública dos mapas de risco que não são um segredo

de Estado, como é o caso em muitos outros países,

deve assinalar-se.

A informação sobre os incêndios: o esforço de

transparência em tempo real realizado pela Autori-

dade nacional de Protecção civil (AnPc) na sua pá-

gina Internet é completamente notável e algo certa-

mente único na Europa.

Coordenação nacional do combate: sente-se no

terreno a vontade marcada e a forte implicação da

AnPc ao nível central para apagar o melhor possível

os incêndios, em especial antes do fim da noite em

incêndios importantes, estimulando as forças contra-

tadas.

O dispositivo “Canarinhos”: Foi uma feliz surpre-

sa descobrir estas novas unidades profissionais de

bombeiros equipados com veículo ligeiro, com pou-

ca água e muitas ferramentas. Esta orientação vai

contra o movimento dominante na Europa, de uma

mecanização sempre mais importante à base de equi-

pamentos hidráulicos, logo merece ser sublinhada.

O dispositivo “grupo de Intervenção de Protec-

ção e Socorro (gIPS)”: Poderia haver cepticismo

quanto à sua criação. o compromisso nos incêndios

de um organismo sem competência histórica na ma-

téria, apresentava com efeito um risco de dispersão

suplementar das forças de combate. Após ter estado

2 anos, lado a lado, com estas novas unidades, é

uma visão positiva que se liberta: coesão de grupo,

disciplina, forte implicação, motivações individuais,

condição física notável.

Tal como em Itália, apresenta uma dupla competên-

cia de polícia e força de patrulha, no contacto com

a população e como força de combate em primei-

ra intervenção. Pode também chegar pelos ares em

missão helitransportada, e por isso deve provavel-

mente ter um efeito evidente na redução do número

de incêndios, quer por efeito pedagógico quer por

dissuasão.

seria interessante estudar a evolução comparativa do

número de partidas de fogo nos distritos de interven-

ção gIPs comparativamente ao contexto nacional.

O dispositivo “Sapadores florestais”: nas acções

de gestão de combustível como no apoio ao comba-

te, em especial para consolidar as acções de extin-

ção, há um reforço real do potencial de intervenção

no meio florestal. Esta é uma mais-valia apesar da

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| 88 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 89 |

grande heterogeneidade relativa à experiência ad-

quirida, tanto ao nível do enquadramento, como ao

nível do funcionamento diário.

O fogo controlado: doravante em Portugal, consa-

gra-se mais energia a realizar os fogos controlados

do que a fazer estudos, planos e colóquios sobre o

assunto.

A progressão é particularmente rápida, comparada

com a evolução temporal do seu desenvolvimento em

França desde há 20 anos. do minho, onde foi desen-

volvido, e em algumas zonas de divulgação como na

serra da lousã, a prática torna-se nacional, até ao sul.

O fogo no combate: há uma progressão notável,

mesmo espectacular, que é atípica na Europa à es-

cala de um país. Esta forte dinâmica portuguesa tem

agora um efeito de treino em Itália.

Um olhar analítico sobre os incêndios: A inte-

gração de uma componente de análise do com-

portamento do fogo e de conselho na estratégia a

adoptar em incêndios complicados é igualmente um

progresso significativo.

Os balanços anuais das áreas queimadas: há

muito pouca auto-satisfação na análise dos balanços

dos dois últimos anos, 2007 e 2008, que foram anos

húmidos, contrariamente ao que é possível constatar

em outros países com contextos meteorológicos simi-

lares. é um sinal muito positivo de uma grande pru-

dência e sabedoria em relação aos próximos anos.

2. Interrogações

numerosos aspectos comportam uma parte de in-

terrogações. A dinâmica futura dos incêndios vai de

facto depender da evolução das várias componentes

sociais, económicas e técnicas.

O declínio agrícola: é provável que a fragilização

do tecido agrícola irá prosseguir nas zonas de fraca

produtividade, nomeadamente em pequenas par-

celas localizadas na parte inferior dos vales, devido

à evolução das técnicas e à saída de uma geração

de agricultores ainda cuidadosos com as suas terras

familiares.

Irá existir, por conseguinte, mais superfície combus-

tível e sobretudo menos linhas de defesa naturais

e menos zonas de ancoragem para o combate. Em

2003, o incêndio da serra de são mamede contido

nos cerca de 10.000 hectares entre Portugal e Es-

panha, foi extinto em vários quilómetros no fundo

de um vale ainda cultivado por tradição. mas em 10

ou 20 anos, esta boa oportunidade terá em grande

parte desaparecido.

O futuro da pastorícia: há menos animais e me-

nos controlo da vegetação rasteira, em especial das

ervas nas linhas de corta-fogo. Ao redor das aldeias

há uma forte redução da recolha do sub-bosque flo-

restal para fazer a cama do gado. nas zonas monta-

nhosas, existe um menor uso do fogo. Pode ser uma

vantagem imediata reduzindo uma causa de incên-

dios, mas representa mais biomassa e menos zonas

favoráveis ao combate, como se verifica na córsega,

antiga terra de pastores.

Urbanização rural e reconquista florestal: A du-

pla dinâmica de desenvolvimento do espaço rural e

de redução do espaço agro-pastoral em redor das

aldeias, aproxima as habitações e os espaços com-

bustíveis. Além disso, verifica-se uma explosão de

construções mais ou menos dispersas, desde há mui-

tos anos. Independentemente dos esforços efectua-

dos no interface entre construções e espaço combus-

tível, estas zonas habitadas irão ser cada vez mais um

motivo para fixar os meios de combate.

Tendo como base a experiência de outras regiões do

sul da Europa, como a região de côte-d’Azur em

2003, e após o voo frequente em numerosas regi-

ões portuguesas, pode-se pensar que o dispositivo

português de combate poderá ser neutralizado em

parte, em sectores florestais entre habitações e ins-

talações industriais dispersas, em especial no litoral

norte e centro.

O nemátodo do pinheiro: Perante a explosão que

se está a tornar numa epidemia, é preciso integrar hi-

póteses, tendo em conta as fortes incertezas ligadas

este ano à passagem brutal de uma situação sani-

tária localizada, para uma vigorosa disseminação de

focos contaminadores à escala nacional.

A propagação deste nemátodo em Portugal apre-

senta numerosas semelhanças epidemiológicas e

socioeconómicas com a gripe aviária. E, tal como os

incêndios, desenvolve-se também por radiação con-

cêntrica pelo insecto vector e “saltos” com focos se-

cundários devido às actividades socioeconómicas.

Tendo em conta a dificuldade em Portugal para ge-

rir correctamente o rescaldo dos incêndios e o risco

imediato de reacendimentos, não se pode excluir

que a gestão da epidemia do nemátodo no terreno

possa ser ainda mais aleatória, porque o impacto é

visível apenas no ano seguinte. há por conseguinte

um nível de percepção da gravidade da situação que

é fortemente atenuado e que leva a que se interve-

nha apenas após a disseminação da doença.

A incidência do nemátodo começa a ser eviden-

te com o uso do fogo controlado, com o risco que

se atribui a esta gestão do combustível pelo fogo a

mortalidade dos pinheiros pelo nemátodo ou o agra-

vamento do seu impacto.

de acordo com a evolução da gravidade e as medi das

administrativas e financeiras que vão ser tomadas,

podem existir rapidamente outras consequências, di-

rectas ou indirectas, para a prevenção dos incêndios:

• perda de oportunidades de benefício para a defesa

da Floresta contra Incêndios (dFcI), nos povoa-

mentos de pinheiro-bravo, árvore perfeitamente

adaptada para resistir a uma prevenção eficaz atra-

vés do uso do fogo de Inverno;

• modificação natural ou voluntária das espécies

(acácias, eucaliptos, matos,…) e por conseguinte

dos combustíveis;

• fragilidade da economia florestal com menor lim-

peza das florestas;

• fortes custos adicionais para o orçamento do Es-

tado, com risco eventual de decisões orçamentais

em detrimento da dFcI num contexto económico

e orçamental desfavorável.

A título comparativo, a região do litoral noroeste da

Itália, seguida da região de côte-d’Azur, no sudeste

de França, foram atacadas por Matsucoccus feytaudi,

o cochonilha do pinheiro-bravo. A epidemia progride

agora na córsega. nos anos 60, a região do massif

des maures foi atingida por uma forte deterioração

levando a uma exploração maciça de prevenção dos

pinheiros. seguiu-se uma forte redução da presença

do pinheiro-bravo, que ainda hoje tem consequên-

cias sensíveis para a dFcI.

Page 48: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 90 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 91 |

O fogo controlado: Apesar de um forte desenvol-

vimento, o impacto actual das intervenções mais

recentes foi até agora irrisório perante a amplitude

do trabalho ainda a realizar para estruturar o com-

bustível a nível nacional.

convém, por conseguinte, aumentar o potencial de

intervenção. Além disso, é um trabalho delicado e

com riscos, que pede uma forte motivação dos ope-

radores e um quadro favorável de realização. Prome-

tedora, a actual dinâmica é frágil. Pode ser posta em

causa, quer brutalmente por uma mudança de orien-

tação, quer por uma apatia geral. Este último ponto

é o risco principal, encontrado em França nos anos

que precederam os grandes incêndios de 2003.

A dinâmica gAUF (grupo de Análise e Uso do

Fogo): o potencial actual de eficácia das equipas

gAuF é provavelmente cerca de 20 a 30% do que po-

derá ser daqui a cerca de 5 anos se o desenvolvimento

deste grupo prosseguir com a mesma forte dinâmica.

mas o factor humano é ainda mais preponderante

do que para o fogo controlado, com incidências mui-

to fortes em termos de risco associado, exposição à

crítica pública e constrangimentos na organização da

vida pessoal.

Em comparação com as forças constituídas pelo po-

der público como os canarinhos e os gIPs, os gAuF

são uma forma de “bricolage”, com pessoas em in-

certeza permanente. desde o seu arranque em 2006,

a sua visibilidade raramente excedeu os 6 meses e o

uso do fogo no combate - como na prevenção - é

um trabalho à parte que pede muita consideração,

estabilidade e serenidade.

A perspectiva gAuF é portadora de um potencial

enorme, sobretudo em situações de crises meteoro-

lógicas. Apresenta contudo uma fragilidade muito

forte, que constitui uma anomalia - de juventude -

no quadro estatal.

o uso do fogo contra o incêndio: Em Portugal, o

fogo no combate é utilizado abundantemente, por

bombeiros, florestais, populares, … de 2003 até 2006,

são dezenas de quilómetros de perímetros de incêndio

fixados em caminhos e estradas que, observados do

céu, apresentam as características de uso do fogo.

no Teatro de operações, podem-se observar frequen-

temente usos do fogo impróprios numa perspectiva

global e acções que visam só proteger um bem e não

apagar o incêndio.

Incluindo as acções gAuF, é até agora impossível di-

zer se existem mais superfícies protegidas ou destruí-

das, como se não tivesse existido uso do fogo.

“Os grandes incêndios”: Primeiro, uma questão

de terminologia: fala-se cada vez mais de “grandes

incêndios” para fogos com mais de 100 ha. Esta ma-

neira de fazer a escala das superfícies é perniciosa.

100 ha é de facto 100 vezes menos do que é o nível

de referência realista em situação de crise meteoro-

lógica no sul da Europa, ou seja 10.000 ha. Este va-

lor foi atingido, no ano passado na sardenha, numa

tarde e numa noite.

O excesso de confiança: A serra de Açor é a zona

histórica dos grandes incêndios portugueses. no fim

dos anos 80, numerosas pessoas afirmavam que o pro-

blema dos grandes incêndios de aproximadamente

10.000 ha e com duração de vários dias era resolvido,

graças à melhoria da organização do combate e dos

novos equipamentos à disposição. Isto, uma quinze-

na de anos antes de 2003.

3. Convicções

Máquinas de rasto: Embora mais importante do

que na França, mas aparentemente menos do que

há 10 ou 15 anos, existe uma sub-utilização notória,

frequentemente tardia e ocasional, das máquinas

para retirar o combustível da frente do fogo ou para

preparar linhas de ignição de contra-fogos.

Monitorização aérea: As missões aéreas que são

conduzidas pela Autoridade Florestal nacional (AFn)

com a Federação Portuguesa de Aeronáutica (FPA)

e a organização Espaces méditerranéens, no âmbito

do programa europeu Fire Paradox, estão desde há 3

anos numa fase de grande mutação.

desde 2006, passou-se de simples voos de detecção

desligados do risco de incêndio, a missões de infor-

mação com transmissão de imagens aos centros e

postos de comando.

Esta componente aérea deveria ainda ser mais reforça-

da. como para as aeronaves de combate, seria neces-

sário sobretudo prever um potencial de reserva (pilotos

de substituição, avião de socorro em caso de avaria,

volume complementar de horas de voo) para permitir

uma mobilização intensiva em anos de forte risco de

incêndio. Porque é nas situações de crise que a infor-

mação aérea será mais importante e permitirá tomar

decisões mais rápidas e fazer balanços mais relevantes.

“Sinergia entre meios aéreos de combate e con-

tra-fogo”: o apoio aéreo com água pode permitir

aumentar o espectro do uso do fogo no combate,

como ve ri fiquei este verão, na sardenha. é preciso

um conhecimento mútuo entre os especialistas no

uso do fogo e os pilotos, para além de treinos utili-

zando as acções de fogo controlado.

Incidência da vegetação: Em relação ao balanço

realizado 5 anos após 2003, seria útil refinar a noção

de combustível, diferenciando dois níveis:

• o efeito de continuidade horizontal que permite

a propagação, com uma reconstituição rápida, em

apenas alguns anos;

• o efeito da espessura da biomassa e, consequente-

mente, a espessura da camada morta e do húmus.

nestas situações, o impacto das descargas dos aviões

e helicópteros é fortemente atenuado porque a água

permanece nas componentes aéreas e na camada

superficial. o mesmo acontece com as chuvas mo-

deradas - menos de 10 até 20 mm - no verão e no

início do outono.

Abundante, o húmus aumenta os riscos de novas ig-

nições. os sectores regularmente sujeitos a fogo são,

por conseguinte, mais fáceis de apagar, e mais rapi-

damente, do que os que são privados de fogo num

longo período. Este factor amplificador não é tido

muito em conta na gestão preventiva dos riscos.

O conhecimento dos incêndios: Apesar duma

experiência de muitos anos pode-se afirmar que se

conhecem mal os incêndios. Quem esteve presente

no incêndio do sardoal, o incêndio mais importante

de 2007, pode afirmar que este se propagou rapida-

mente, com numerosos focos secundários que cria-

ram novos incêndios. mas o que se passou realmen-

te? Qual foi a dinâmica de saltos em quantidade e

Page 49: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 92 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 93 |

distância? Qual foi a velocidade de propagação das

diferentes frentes de fogo assim constituídas? Quais

foram as dinâmicas entre elas? E com o mesmo tipo

de incêndio, mas num ano severo, com mais seca e

vento, qual será a estratégia de combate que será

necessário definir? uma vez que não se sabe o que

se passou realmente neste incêndio em condições

muito mais favoráveis que em 2003 ou 2005, só há

esta certeza: “só sei que nada sei”, pelo menos não

o bastante para estar à altura do acontecimento.

Existe um grande campo de investigação a explorar.

4. Factores humanos, sociais e culturais

se o contexto da prevenção e do combate conhece

uma melhoria significativa, certos aspectos funda-

mentais fragilizam os ganhos.

A impulsividade e a improvisação: A quase todos

os níveis, o comportamento nos incêndios é a ima-

gem do que se verifica nas estradas portuguesas. há

muitas acções inscritas, no imediato e no local, em

detrimento de uma visão alargada, da capacidade de

organização e do sentido da antecipação.

é um traço cultural marcado, provavelmente reforça-

do pela geografia e pela história de um país que tem

estado até recentemente como “uma ilha” entre a

Europa, a África e a América latina, e que tem pas-

sado muito rapidamente, para uma geração, quase

sem transição, da ruralidade ao modernismo, da pro-

dução ao consumo.

Esta capacidade de improvisação permite contudo

muita flexibilidade e oferece uma preciosa capaci-

dade de adaptação a certas situações, o que seria

inconcebível nos grandes países europeus.

Uma cultura citadina em meio rural: mesmo nas

zonas rurais, o pessoal de combate é desligado cada

vez mais das suas raízes rurais, com uma perda de

“know-how” e da relação de bom sentido com a re-

alidade do fogo e dos territórios rurais. Esta mutação

sociológica constitui um enfraquecimento progressivo

dentro do dispositivo de combate, tanto ao nível das

motivações como da implicação e da experiência.

O risco do virtual: Portugal poderia ser contamina-

do por uma tendência pesada que surge em nume-

rosos países europeus, nomeadamente na França e

Itália, onde os responsáveis operacionais saem das

escolas com muitos conhecimentos teóricos, mas

pouca prática efectiva do fogo e ainda menos de in-

cêndios catastróficos. gestores de meios pesados e

numerosos, estes responsáveis são capazes de efec-

tuar combates virtuais, sem a experiência adquirida

pelos antigos no terreno, na escola da realidade.

5. As aptidões

o defeito cultural de organização e as lacunas téc-

nicas poderiam ser compensados em parte por um

reforço nas acções de formação, de modo a adqui-

rirem-se novos conhecimentos através de um treino

mais eficaz.

Complementos de formação: Pequenos módulos

de formação muito práticos, permitiriam maior ra-

pidez na extinção e uma redução significativa dos

reacendimentos: destinados a todo o pessoal de ter-

reno, dos sapadores aos bombeiros, passando pelos

gIPs e pelos canarinhos.

um melhor conhecimento real do fogo e do incêndio

permitiria retornar a uma abordagem mais pragmáti-

ca do combate e ao seu enquadramento.

Para estes dois aspectos fundamentais, devem-se

analisar as suas aplicações nos próximos anos e o

benefício potencial poderia calcular-se em várias de-

zenas de milhares de hectares preservados.

O treino em condições reais: operações efectivas

com fogo em parcelas de fogo controlado com múl-

tiplas forças de combate permitiriam progressos con-

sideráveis, tanto em aquisições de saber como em

conhecimento mútuo.

A formação nos grandes incêndios: A gestão de

incêndios com mais de 3.000 ou 5.000 ha pediria

idealmente uma formação pela experiência que pode

adquirir-se apenas a longo-prazo, pelo menos em 10

anos. no que diz respeito ao trabalho gAuF como

um grupo de especialistas, esta situação não pode

referir-se a todos os responsáveis e o investimento

em tempo não o justifica. deste ponto de vista, a

escala distrital não é a mais eficiente para formar

algumas pessoas para gerir tais acontecimentos à

escala nacional.

Os choques de culturas: operações formativas em

comum permitiriam melhores osmoses entre corpos

profissionais, particularmente entre florestais e bom-

beiros. no que respeita aos outros países europeus, a

mobilidade profissional é notável ao nível das instân-

cias de decisão. mas ao nível da execução, existem

dois mundos que poderiam interagir com mais sere-

nidade e eficácia.

do mesmo modo, o dispositivo de combate deve

adaptar-se para integrar colectivamente as neces-

sárias novas aptidões: conhecimento do fogo e dos

incêndios, visão estratégica, determinação das prio-

ridades, gestão optimizada no terreno do pessoal e

dos meios. é particularmente importante num siste-

ma nacional de combate, multipolar, com numero-

sos intervenientes, como na França ao contrário da

sardenha ou da catalunha.

Conhecer o incêndio pela experiência: Após qual-

quer intervenção, seria muito enriquecedor reunir os

diferentes responsáveis para analisar o que se pas-

sou, de modo a melhorar o conhecimento dos fenó-

menos em jogo. Esta situação ofereceria uma mais-

-valia muito forte, como já acontece internamente

com as equipas gAuF após as suas intervenções.

O acompanhamento profissional: A dinâmica

colectiva instaurada para o fogo controlado entre

instituições, empregadores e beneficiários, merece-

ria ser estendida, em especial ao nível das diferentes

missões dos sapadores florestais.

o isolamento geográfico e pior ainda a marginaliza-

ção pela rotina são factores muito perniciosos, seja a

nível local ou nacional. é útil favorecer a partilha de

experiência com parceiros que intervêm em contex-

tos diferentes. Por exemplo, uma dinâmica nacional

apoiando um nível local ou apoiando a experiência

nacional com acções de cooperação internacional,

como foi o caso no início do fogo controlado no mi-

nho nos anos 80.

A animação: historicamente, Portugal integrou

pou co a cultura da animação (convívio, partilha,

intercâmbio) que permite pôr em movimento as

componentes humanas. com a formação pela expe-

riência e o treino sistemático, a animação constitui o

terceiro factor considerável de melhoria da eficácia

para o dispositivo de prevenção e de combate em

Portugal.

Page 50: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 94 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 95 |

6. Pensar na duração

é fundamental sair do imediato que governa o dia-a-

-dia e ver mais longe no tempo. sem estar a perder

de vista o médio prazo, convém no mínimo pensar a

curto prazo. E no domínio dos incêndios dos espaços

florestais e rurais, o curto prazo é pelo menos uma

perspectiva de… 10 anos.

Os contextos meteorológicos exacerbados: o po-

tencial dos fenómenos meteorológicos agravados é

provavelmente mais forte do que as forças contrárias

exercidas pelas políticas de prevenção e de combate

instauradas para se lhe oporem.

Em 2003, no ano do calor, e em 2007 e 2008, dois

anos particularmente clementes, a dinâmica das áre-

as queimadas foi semelhante em França e em Portu-

gal nestes três anos extremos.

o verão de 2006 foi marcado por uma subida da

“febre” dos incêndios no norte de Portugal, em es-

pecial no sector do gerês, e na galiza.

nestes diferentes contextos, os destinos foram co-

muns, independentemente das políticas seguidas.

Os ciclos meteorológicos: A relativa instabilidade

meteorológica que governa Portugal e por conse-

guinte a grande variedade das condições climáticas

que decorrem, obriga-nos a projectar episódios me-

teorológicos contrastados, sob a forma de ciclos. Em

França, com a experiência dos episódios críticos de

1989/1990 e de 2003, convém projectar a um prazo

de 10 a 15 anos para se reencontrarem contextos

similares. no caso de Portugal, mais exposto, uma

dezena de anos poderia ser suficiente.

Factores amplificadores: Tal como na finança es-

peculativa, podem-se constatar efeitos amplificado-

res. Assim, numa fase calma do ciclo meteorológico,

marcado pela redução do fenómeno de incêndio, to-

dos os factores se exprimem o melhor possível mas-

carando o risco estrutural, quer se trate de factores

naturais ou de melhoria dos dispositivos.

os bons resultados assim obtidos em termos de ba-

lanço provocam às vezes um reforço do efeito, que

se pode exprimir por uma tendência de redução dos

meios humanos e financeiros. mais perniciosamen te,

pode simplesmente ocorrer uma diminuição de vigilân-

cia. os bons resultados obtidos são então enganosos.

À imagem da finança ou do sector imobiliário, com

o risco de se criar “uma bolha” de auto-sa tisfação,

como na França no início dos anos 2000.

Pelo contrário, pode produzir-se um exagero dos

efeitos destrutivos em contextos meteorológicos

severos.

As médias e os extremos: A noção de média anual

é excelente para exprimir tendências. Por outro lado,

não tem sentido em gestão de risco de incêndio. A

pergunta que é preciso fazer é: qual é o objectivo em

que a sociedade se fixa.

• Quer-se ser bom em média, e por conseguinte na

maioria das vezes? Em que caso se deve ser logica-

mente mau nas crises meteorológicas?

• ou quer-se ser o mais eficiente possível para as

situações extremas, como os bombeiros dos ae-

roportos durante um “crash” de ocorrência alea-

tória? neste caso é necessário aceitar ter-se uma

sobrecapacidade em períodos ditos “normais”.

7. Um estímulo à vigilância

oferecendo uma visão sintética e uma útil aposta na

perspectiva histórica, o relatório realizado pela liga

para a Protecção da natureza deveria ser considera-

do apenas como um trabalho a prosseguir.

2008, o imediato amanhã de 2003: o ano de 2006

foi marcado por numerosas mudanças nas políticas

conduzidas. o ano de 2007 conheceu um verão par-

ticularmente fresco e húmido. o ano de 2008 não co-

nheceu um episódio significativo de vento quente e

seco de leste, nem uma real subida de calor de sul.

os anos de 2007 e 2008 são por conseguinte anos

de minimização do fenómeno de incêndio. o único

período significativo para apreciar as mudanças ocor-

ridas após 2003 é o verão de 2006. um único verão

não permite ter a distância necessária. Para nos pro-

nunciarmos de maneira relevante após o choque de

2003 e do novo alerta de 2005, é necessário no mí-

nimo um período de tempo de uma dezena de anos.

conviria por conseguinte actualizar este excelente

trabalho em 5 anos e considerar este livro como um

precioso documento… e uma etapa.

2013, a próxima etapa: Esta perspectiva de 10 anos

teria além disso a vantagem considerável de permitir

a uma componente importante da sociedade civil de

continuar a ser mobilizada e vigilante, como senti-

nela, para se precaver colectivamente da erosão do

tempo, das cíclicas tentações de economias orça-

mentais e do efeito perverso dos hábitos.

Page 51: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 97 |

ANáLISE CRÍTICA à EvOLUÇãO DA DFCI EM

PORTUgAL DESDE 2003

JoAQuIm sAndE sIlvA, ERnEsTo dE dEus, lúcIA

sAldAnhA

liga para a Protecção da natureza

Introdução

neste texto tentámos resumir o resultado da análise

feita a quatro documentos que foram elaborados na

sequência dos incêndios de 2003, no sentido de veri-

ficar até que ponto as sugestões e as críticas tiveram

consequências em termos da evolução do sistema

de defesa da Floresta contra Incêndios (dFcI) em

Portugal. Esses documentos foram: o livro Branco

dos Incêndios Florestais ocorridos no verão de 2003

(mAI, 2003), o livro Aberto do sistema de Protecção

e socorro em Portugal (lBP, 2003), o Relatório Final

da comissão Eventual para os Incêndios Florestais da

Assembleia da República (cEIF, 2004) e o Relatório

da liga para a Protecção da natureza elaborado na

sequência da conferência “Incêndios 2003 – a re-

flexão inadiável” (lPn, 2003). Para cada um destes

documentos tentámos apurar quais as críticas que

foram tidas em conta e quais as medidas que foram

entretanto tomadas. de modo a darmos um carácter

bastante objectivo a este exercício, tentámos não in-

cluir juízos de valor ou sequer quantificar o nível de

resposta às críticas/propostas feitas nos documentos

em análise. Essa análise foi dividida de acordo com

os três grandes domínios da dFcI: as ignições, a pro-

pagação e o combate. Em todo o caso nem sempre

foi possível obter as informações necessárias relativa-

mente a cada um dos aspectos abordados, pelo que

o resultado final não é de forma alguma exaustivo,

relativamente ao conteúdo dos documentos analisa-

dos. Por outro lado, devido a exigências editoriais,

tivemos que optar por fazer uma selecção de todas

as críticas/propostas que encontrámos, incluindo

apenas as mais relevantes.

Para além desta análise com um carácter objectivo e

sistematizado, fazemos no final algumas considera-

ções críticas de carácter mais geral, tendo em conta

a perspectiva da lPn sobre as políticas seguidas re-

centemente.

As ignições

o factor ignições constitui o aspecto mais a montan-

te no complexo problema dos incêndios florestais,

encerrando em si mesmo uma enorme complexida-

de dadas as múltiplas vertentes a ter em conta. Esta

enorme complexidade está directamente relacionada

com as inúmeras actividades e comportamentos que

estão na origem dos incêndios florestais. listamos de

seguida as críticas e as propostas associadas à ques-

tão das ignições, assim como os desenvolvimentos

verificados desde 2003.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: no relatório da comissão Even-

tual para os Incêndios Florestais (cEIF) foi proposto

reverem-se os diplomas legais que regulamentam a

realização de queimadas e as largadas de fogo de ar-

tifício, para torná-los menos permissivos e responsa-

bilizar as entidades que licenciam estas actividades.

Page 52: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 98 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 99 |

Evolução: o uso do fogo foi regulamentado no

âm bito do sistema nacional de defesa da Flores-

ta contra Incêndios (sndFcI), nos decretos-lei n.º

156/2004, de 30 de Junho, e 124/2006, de 28 de Ju-

nho, e na Portaria n.º 1061/2004, de 21 de Agosto.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: no relatório da Assembleia da Re-

pública (AR) de 2004, propõe-se o desenvolvimento

de um sistema integrado de identificação criminal

pela Polícia Judiciária, a regulamentar em lei, e pro-

mover a sua utilização ao serviço da prevenção do

incendiarismo.

Evolução: o sistema Integrado de Informação cri-

minal, aprovado no ano 2000, foi desenvolvido em

2004 com a inclusão e a classificação de potenciais

incendiários. A identificação destes indivíduos, com

historial e registo criminal associados à ignição de in-

cêndios florestais, permite a actuação numa lógica

de prevenção, através do seu acompanhamento e

dissuasão de eventuais reincidências.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: no âmbito da prevenção, propõe o

relatório da AR que sejam equacionadas medidas que

permitam afastar compulsivamente os incendiários

inimputáveis de áreas florestais onde constituem um

risco, nomeadamente através da aplicação de sanções

penais com penas descontinuadas a serem cumpridas

em períodos estivais.

Evolução: Esta proposta veio a ser contemplada com a

revisão do código Penal, que prevê que “quando qual-

quer dos crimes previstos (provocar incêndio, impedir o

seu combate ou dificultar a extinção) for cometido por

inimputável, é aplicável a medida de segurança, sob

a forma de internamento intermitente e coincidente

com os meses de maior risco de ocorrência de fogos”.

Fonte: lPn 2003; cEIF 2004

Crítica/proposta: Ambos os relatórios propõem

o condicionamento do acesso e da circulação nos

períodos e nas áreas florestais com maior risco de

incêndio.

Evolução: Esta proposta foi introduzida em 2004 na

definição do sndFcI e mantida na revisão efectuada

em 2006. A sua aplicação está restrita às áreas sob

gestão do Estado. não existe conhecimento da sua

aplicação para além destas áreas. Apesar de prevista

na legislação não foi possível avaliar o nível de cum-

primento desta medida.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: Ao nível da fiscalização era pro-

posto o reforço do corpo nacional da guarda Flo-

restal (cngF) repondo o seu efectivo, que se tinha

deteriorado significativamente nos anos anteriores.

Evolução: A situação alterou-se devido à integração

do pessoal do cngF no serviço de Protecção da na-

tureza e do Ambiente (sEPnA) em 2006. Independen-

temente de qualquer julgamento que se possa fazer

sobre a extinção do cngF, a integração no sEPnA

representou um grande aumento dos recursos de-

dicados à fiscalização e à investigação das causas de

incêndio (491 efectivos do sEPnA e 439 ex-cngF,

num total de 930 elementos).

Fonte: lBP 2003; lPn 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: Falhou a campanha de sensibili-

zação do grande público e a formação das camadas

mais jovens. Aponta-se para a necessidade de fortes

campanhas de sensibilização e formação, “executa-

das por uma única entidade”, e para a actuação jun-

to das escolas de ensino básico, dando continuidade

ao Projecto de sensibilização e Educação Florestal da

População Escolar (PRosEPE).

Evolução: Em 2007 veio a concretizar-se uma cam-

panha nacional permanente e de carácter plurianual

com o slogan “Portugal sem fogos depende de to-

dos. o PRosEPE, com a iniciativa “clubes da Flo-

resta”, teve o máximo de escolas aderentes no ano

lectivo 2001/2002 com cerca de 350 clubes da Flo-

resta. desde então este número sofreu uma redução

significativa, estabilizando por volta dos 170 clubes

da Floresta nos últimos anos.

A propagação

no que toca à limitação do potencial de propagação

dos incêndios, todas as medidas tomadas até agora

têm esbarrado em condicionalismos estruturais de

natureza fundiária. o facto de sermos um dos países

do mundo com menor percentagem de floresta pú-

blica, associado à extrema fragmentação da proprie-

dade nas zonas do país com maior ocupação florestal

e susceptibilidade a incêndios, torna extremamente

difícil a implementação de políticas e medidas desti-

nadas a possibilitar uma efectiva gestão de combus-

tíveis. As questões estruturais dos espaços florestais

mereceram bastante atenção, quer nos documentos

analisados quer nas medidas tomadas.

Fonte: lPn 2003; cEIF 2004

Crítica/proposta: A liga para a Protecção da natu-

reza (lPn) identifica como falha, a ausência da defini-

ção de critérios de ordenamento e infra-estruturação

dos espaços florestais que “prevaleçam e disciplinem

os interesses individuais”. os dois documentos apon-

tam para a necessidade de concluir e operacionalizar

os Planos Regionais de ordenamento Florestal (PRoF)

e, na sua sequência, os Planos de gestão Florestal

(PgF) para todas as matas Públicas e comunitárias.

Evolução: A elaboração dos 21 PRoF só avançou

de facto em 2004 e o último PRoF foi aprovado em

Abril de 2007 após um processo de consulta bastan-

te participado. uma vez concluídos os PRoF, foi dado

início à elaboração dos PgF, existindo neste momen-

to cerca de 203 mil ha sujeitos a PgF que aguardam

aprovação pela Autoridade Florestal nacional (AFn),

dos quais 91% correspondem a matas públicas e co-

munitárias.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: no seu relatório a cEIF vem recla-

mar a actualização do Inventário Florestal nacional

(IFn), cuja última revisão datava de 1995.

Evolução: A revisão do IFn foi efectuada em 2005/6,

tendo sido divulgados em 2007 dados preliminares

relativos à ocupação florestal.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: Enquadrando-se nas medidas pre-

vistas na Reforma Florestal, a implementação do

Fundo Florestal Permanente (FFP) deveria representar

a disponibilização de meios financeiros para realizar

as várias operações de ordenamento, gestão flores-

tal e reflorestação, apoio à floresta de conservação,

bem como de reestruturação fundiária.

Evolução: o FFP foi constituído tendo inicialmen-

te previsto um programa de apoios diversificado e

ambicioso. contudo, a execução deste Fundo tem-

se concentrado na dFcI, nomeadamente através

da criação e manutenção dos gabinetes Técnicos

Florestais (gTF) existentes nas autarquias. Por outro

lado, a informação disponível sobre o FFP é bastante

limitada contrariando a legislação onde se refere a

sua utilização transparente e a disponibilização de

informação para escrutínio público.

Fonte: lPn 2003

Crítica/proposta: Em 2003, a lPn apontava a au-

Page 53: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 100 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 101 |

sência de técnicos florestais em concelhos com gran-

de vocação florestal. Para colmatar a insuficiência de

técnicos propõe-se dar continuidade à constituição de

organizações de Produtores Florestais (oPF) e dotar

as autarquias de técnicos florestais que “participem

na execução das competências das câmaras muni-

cipais (cm) na temática florestal e que dinamizem e

qualifiquem o desempenho das comissões Especiali-

zadas de Fogos Florestais municipais” (cEFFm).

Evolução: As oPF têm registado um aumento subs-

tancial nos últimos anos, estando actualmente cons-

tituídas 179 oPF, 78% das quais nas ex-circunscri-

ções Florestais do norte (28%) e centro (50%). os

gTF estão constituídos para a maioria dos municípios

(88%). no entanto, a acção dos gTF tem sido limi-

tada pelo facto de os seus técnicos se encontrarem

frequentemente isolados ou integrados em gabine-

tes de Protecção civil ou mesmo em divisões do am-

biente, sendo frequentemente desviados para outras

funções no âmbito da reestruturação orgânica no

seio das câmaras municipais (IEsE, 2007).

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: o relatório da cEIF em 2004 vem

propor que sejam “definidos mecanismos legais,

em caso de necessidade, que permitam ao Estado,

câmaras municipais ou entidades a quem estes de-

leguem, a tomada de posse administrativa de pro-

priedades que estejam abandonadas, para efeitos

de limpeza e desmatação e ainda, quando tal seja

necessário, para corte parcial ou total de árvores aí

existentes.”

Evolução: de forma a contrariar a ausência de inter-

venção, o sndFcI veio introduzir a possibilidade de,

em caso de incumprimento por parte do proprietário

na gestão de combustível, este poder ser substituído

por outra entidade, a autarquia ou a direcção-geral

dos Recursos Florestais (dgRF, actual AFn), conforme

a situação. mais tarde, após a revisão da legislação

efectuada em 2006, passou a ser possível aos pro-

prietários vizinhos substituírem-se ao proprietário

faltoso na realização destas operações. no entanto,

não se conhece o nível de aplicação desta medida.

Fonte: lPn 2003

Crítica/proposta: no âmbito da prevenção de in-

cêndios florestais através de medidas de silvicultura

preventiva, a lPn propôs que fossem clarificadas as

operações silvícolas mínimas, previstas na lei de Ba-

ses da Política florestal. Também foi proposto que o

ministério da Agricultura, do desenvolvimento Rural

e das Pescas (mAdRP) diligenciasse para que fosse

efectuado o cantonamento dos espaços florestais

com divisórias criando descontinuidades permanen-

tes de combustível, determinado por critérios míni-

mos estabelecidos nos PRoF.

Evolução: As medidas de silvicultura preventiva

estão definidas no sndFcI e nos PRoF. Estes dois

instrumentos contêm as orientações a ser seguidas

pelas comissões municipais de defesa da Floresta

contra Incêndios (cmdFcI) na elaboração dos Pla-

nos municipais de defesa da Floresta contra Incên-

dios (PmdFcI), ao nível municipal, e nos PgF, ao nível

das propriedades florestais. o conselho nacional de

Reflorestação (cnR) estabeleceu os critérios a que

deve obedecer a Rede de defesa da Floresta (RdF),

tendo esses critérios sido incorporados também pe-

los PRoF. o delineamento da RdF foi concretizado

para as áreas ardidas que integraram as comissões

Regionais de Reflorestação (cRR).

Fonte: lPn 2003; cEIF 2004

Crítica/proposta: de acordo com proposta da lPn e

no âmbito das medidas para a gestão de combustível,

o mAdRP deve estabelecer e executar um Programa

Anual de Fogo controlado incidindo nas áreas diag-

nosticadas como “críticas” ou em que a riqueza flo-

restal seja excepcional. Por outro lado, o relatório da

AR defende que deve promover-se a formação neces-

sária para que o uso do fogo controlado se torne uma

ferramenta frequente da silvicultura preventiva.

Evolução: o programa de fogo controlado não foi

estabelecido. A opção tomada passou pela criação

de um grupo (gEFoco) que faz o acompanhamento

das acções de fogo controlado que lhe são comuni-

cadas, dando apoio técnico e encorajando o recurso

a esta técnica. no que diz respeito à preparação para

o uso da técnica de fogo controlado na gestão de

combustível, foram realizadas diversas acções de for-

mação com vista à atribuição de competências para

a credenciação de técnicos, estando actualmente

cerca de 70 técnicos credenciados. não existe uma

monitorização completa do trabalho realizado no

âmbito do uso de fogo controlado, a nível nacional.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: o Relatório da AR identifica a

oportunidade que constitui a dimensão da área ardi-

da nos incêndios de 2003 para introduzir critérios de

ordenamento, diversificação, compartimentação flo-

restal e de organização da gestão das propriedades

florestais. A recuperação destas áreas deverá ocorrer

num prazo de 2 anos.

Evolução: o cnR e as cRR tiveram como resultado

a elaboração de normas para orientação das acções

de reflorestação. no entanto, não existem relatórios

sobre a execução da reflorestação das áreas ardidas.

As orientações Estratégicas estabelecidas foram

aprovadas em conselho de ministros mas não há evi-

dências da sua aplicação prática no terreno ao nível

da reflorestação.

Fonte: lPn 2003; cEIF 2004

Crítica/proposta: A aplicação de medidas que vi-

sem a reestruturação fundiária ou que pretendam

a penalização da gestão florestal carece do conhe-

cimento da propriedade e respectivos proprietários,

informação actualmente impossível de obter. é por

este motivo que, quer a lPn quer a AR, reclamaram

como medida urgente a realização do cadastro da

propriedade florestal.

Evolução: nos últimos cinco anos, o IgP e outras

entidades trabalharam no sentido de preparar as

condições para permitir a realização do cadastro a

nível nacional. Foram estabelecidas com a ex-dgRF

as prioridades em termos de realização do cadastro

florestal e foram realizados os estudos e os projectos

de demonstração prévios à sua implementação. A

realização do cadastro da propriedade florestal ainda

não é uma realidade, prevendo-se no entanto o seu

início em 2009.

Fonte: lPn 2003; cEIF 2004

Crítica/proposta: o Relatório da AR aposta na cria-

ção de Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) como

uma proposta viável para “inverter a situação de

abandono hoje existente nas áreas florestais”. são

pedidas pela lPn medidas legislativas que contrariem

e penalizem jurídica e fiscalmente a fragmentação

da exploração florestal e, em oposição, medidas que

promovam o emparcelamento da propriedade rústi-

ca florestal. é também pedida a revisão do “Regula-

mento emolumentar dos registos e notariado”, de

modo a que a incidência fiscal promova a viabilidade

das explorações florestais.

Evolução: com vista à regularização da situação ju-

rídica dos prédios rústicos em áreas florestais, foi

estabelecida uma medida de carácter excepcional e

transitório durante um prazo de 2 anos, que consistiu

Page 54: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 102 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 103 |

na redução dos emolumentos em 80% por actos

notariais e no registo público e na gratuitidade das

inscrições nas respectivas matrizes prediais (dl n.º

136/2005, de 17 de Agosto). Em 2007 esta medida

foi prorrogada por mais 3 anos (dl n.º 364/2007).

o FFP incluiu no seu programa de 2005-2006 uma

acção para apoiar o emparcelamento e aquisição de

terra (3% da verba disponível) que não foi aplica-

da por não ter existido enquadramento legislativo

específico para apoiar a reestruturação fundiária. A

aprovação da legislação que regula a criação das ZIF

em 2005 teve como resultado a constituição de 30

ZIF (até setembro de 2008) que cobrem uma área de

cerca de 150 mil ha.

O Combate

o combate é o aspecto mais a jusante na dFcI e

aquele que tem maior visibilidade junto da opinião

pública e junto do poder político. é sem dúvida o

aspecto que tem tido maior evolução e que tem en-

volvido maior investimento. devido ao número de

instituições e pessoas envolvidas, tem sido sujeito a

pressões vindas de vários sectores, o que nem sem-

pre tem permitido a tomada das decisões mais ade-

quadas. salientamos o Estudo Técnico encomendado

pela Agência para Prevenção de Incêndios Florestais

(APIF) ao Instituto superior de Agronomia (IsA), que

foi bastante alterado na sua forma original devido

precisamente aos custos políticos e financeiros que a

sua aplicação implicaria. Apresentamos assim o ba-

lanço das medidas tomadas tendo em conta os rela-

tórios que servem de referência à presente análise.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: Propõe-se a participação das For-

ças Armadas (FA) como forma de aumentar a capa-

cidade de intervenção na prevenção e detecção de

incêndios florestais, através da colaboração da en-

genharia militar na abertura de aceiros, na limpeza

das matas nacionais e nas acções de patrulhamento

e vigilância.

Evolução: Em 2005 e 2006, o Exército colaborou

com a dgRF no âmbito de um protocolo que previa

a beneficiação de infra-estruturas, abertura de acei-

ros e de caminhos, combate ao fogo em primeira

intervenção, patrulhamentos apeados, motorizados

e a cavalo, e vigilância fixa. As FA encontram-se en-

quadradas na directiva operacional integrando a

Força operacional conjunta (Focon). Em 2007, no

âmbito do Plano vulcano, concretizado ao abrigo de

um protocolo celebrado entre a dgRF e o centro

operacional das Forças Terrestres do Exército (coFT),

estiveram no terreno 20 equipas de sapadores es-

peciais do Exército (240 militares), uma força que

duplicou os seus efectivos face a 2006. no âmbito

do Plano lIRA, (articulação das Forças Armadas com

a Autoridade nacional de Protecção civil - AnPc),

24 pelotões do exército colaboraram em acções de

rescaldo e vigilância pós-rescaldo.

Fonte: lBP 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: desenvolvimento de uma rede

nacional de grupos de intervenção permanente, a

instalar em corpos de bombeiros (cB) associativos e

municipais voluntários.

Evolução: Apenas em Junho de 2007, na definição

do regime jurídico aplicável aos bombeiros (dl n.º

247/2007, de 27 de Junho), é referida a possibilida-

de de, “nos municípios em que se justifique”, criar

equipas de intervenção permanente (EIP) nos cB vo-

luntários ou mistos detidos pelas associações huma-

nitárias de bombeiros. é em outubro de 2007 que

são definidas as funções e demais especificidades

das EIP, as quais seriam constituídas nos concelhos

de maior risco. no entanto, este conceito de risco

não contempla apenas o risco de incêndio flores-

tal. Por outro lado, as funções destas EIP, e conse-

quente formação técnica, incluem outras missões

de protecção e socorro comuns à generalidade dos

bombeiros. Foi definido como objectivo, até 2009, a

constituição de 200 EIP.

Fonte: lPn 2003

Crítica/proposta: segundo o relatório da lPn, justi-

fica-se a profissionalização das equipas de sapadores

florestais (esF), ampliando e reforçando o seu núme-

ro, e dotando-as de condições efectivas para as tare-

fas de primeira intervenção nos incêndios florestais.

Evolução: houve um aumento significativo das esF,

passando de 102 esF em 2003 para 263 esF em

2008, sendo que só neste último ano foram criadas

60 novas esF. Em 2004 houve uma reformulação

das regras e procedimentos referentes às esF (dl n.º

94/2004, de 22 de Abril). A nível operacional, verifi-

ca-se em 2004 uma alteração importante ao diplo-

ma de criação e regulação das esF com a criação de

novas competências para a realização de “primeira

intervenção” no combate aos incêndios.

Fonte: cEIF 2004

Crítica/proposta: Propõe o Relatório da AR de 2004

que as câmaras municipais tenham um papel de-

terminante no trabalho de prevenção dos incêndios

florestais, fazendo com que esta matéria também

faça parte do processo de descentralização. deverá

incentivar-se a organização, estruturação e coorde-

nação dos meios disponíveis a nível concelhio e a sua

articulação com as estruturas distritais do serviço na-

cional de Bombeiros e Protecção civil (snBPc).

Evolução: Em 2004 foram criadas as cmdFcI, que

vieram substituir as extintas cEFF. A operacionalização

das cmdFcI foi conseguida com a criação de gTF

através do apoio do FFP. A definição do sndFcI vem

estabelecer a necessidade de elaboração dos PmdFcI,

da competência das cmdFcI, e dos Planos opera-

cionais municipais (Pom). A cobertura dos PmdFcI a

nível nacional está praticamente completa, estando

actualmente a proceder-se à revisão para melho-

ria dos documentos originais. Em 2007, a lei n.º

65/2007, de 12 de novembro, publica o enquadra-

mento institucional e operacional da protecção civil

no âmbito municipal, e com ela a criação da figura

de comandante operacional municipal, que estabe-

lece a articulação operacional com o comandante

operacional distrital.

Fonte: lBP 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: um ponto comum nas falhas apon-

tadas em vários relatórios refere-se à insuficiente for-

mação e qualificação dos meios humanos no combate

aos incêndios florestais, especialmente dos bombei-

ros. no livro Branco refere-se a importância de uma

política adequada de formação contínua semanal nos

cB, acompanhada de uma eficaz supervisão.

Evolução: no caso dos bombeiros voluntários, a par-

tir de Agosto de 2008 os quadros activos passaram a

ter 70 horas anuais de formação e instrução obrigató-

rias, embora não existam indicações das temáticas a

serem ministradas. A formação no combate a incên-

dios florestais continua a depender essencialmente

de formação interna da iniciativa dos comandantes

do cB que por sua vez recebem formação através

da EnB. Para além da falta de disponibilidade de

grande parte dos bombeiros voluntários, juntam-se

ainda as insuficiências em meios logísticos, financei-

ros e técnicos para as acções de formação, facto que

se estende também a vários cB profissionais.

Page 55: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 104 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 105 |

Fonte: lBP 2003; lPn 2003

Crítica/proposta: notou-se uma falta de preparação

dos bombeiros para dominarem a técnica do fogo

de supressão. Propôs-se então um investimento na

formação dos bombeiros na utilização deste método

de combate.

Evolução: Foram criados em 2007 os grupos de

Análise e uso do Fogo (gAuF) que, por entre o es-

pectro de valências e missões, estão devidamente

habilitados para o uso de fogo de supressão, facto

que resulta da formação específica e treino nesta

técnica. no entanto não houve um investimento as-

sumido na formação dos bombeiros no uso do fogo

de supressão. um outro aspecto negativo prende-se

com a falta de regulamentação neste domínio, dan-

do competência aos comandantes de operações de

socorro (cos) para a utilização desta técnica, inde-

pendentemente da sua formação.

Fonte: lBP 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: Algumas críticas foram também di-

rigidas aos grupos de Reforço. muitos destes grupos

tiveram um baixo rendimento operacional, em parte

devido ao seu desenquadramento no Teatro de ope-

rações (To), chegando por vezes a combater isolados

sem nenhuma missão específica, juntando-se o facto

de não conhecerem o território. A proposta vai no

sentido de criar grupos de Reforço permanentes, com

veículos e efectivos adequados que se desloquem an-

tecipadamente para as áreas de risco mais elevado.

Evolução: verifica-se uma diferença importante a

nível operacional na directiva operacional nacional

n.º 1/2008 relativamente às anteriores, nomeada-

mente o enquadramento dos grupos de Reforço na

fase preventiva (antecipação da acção), que consiste

no pré-posicionamento destes grupos em distritos

onde se antevejam ocorrências. Pelo contrário, em

anos anteriores os grupos de Reforço enquadravam-

-se nas acções de ataque ampliado, sendo apenas soli-

citados quando esgotadas as capacidades do distrito.

Fonte lBP 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: é referida, em vários relatórios, a

utilização exclusiva da água como método de extin-

ção em detrimento do uso de ferramentas manuais,

o que condiciona o desempenho no combate, em

especial nas acções de rescaldo, justificando em par-

te as elevadas percentagens de reacendimentos.

Evolução: A principal forma de aplicar as ferramen-

tas manuais no combate aos incêndios florestais

traduziu-se no reforço e criação de equipas especia-

lizadas nesta técnica, como são exemplo as esF, os

grupos de Intervenção de Protecção e socorro (gIPs)

e as Forças Especiais dos Bombeiros (FEB). As per-

centagens de reacendimentos reduziram-se conside-

ravelmente, passando de 6,3% em 2002, 4,4% em

2003 e cerca de 5% nos anos de 2004 e 2005, para

resultados inferiores a 3% em 2006 e 2007.

Fonte: lBP 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: os dois relatórios referem falhas na

concretização do sistema de comando operacional

(sco), que resultaram na desorganização operacio-

nal nos To. A falta de quadros de comando para as

diferentes funções de chefia nos To contribuiu tam-

bém para este facto. A principal proposta baseia-se

em aumentar o número de acções de formação para

quadros de comando e incluir o sco nas matérias dos

cursos da EnB. Por outro lado, deveriam ser aprofun-

dados os mecanismos de aplicação prática do sco,

em especial o princípio da unidade de comando.

Evolução: segundo dados fornecidos pela EnB, em

2005 deu-se início à formação em “organização de

Postos de comando”. Em 2007 deu-se início à for-

mação em “organização inicial de To no combate

a incêndios florestais”. o sistema da organização

operacional é revisto em Julho de 2006, através da

criação do sistema Integrado de operações de Pro-

tecção e socorro (sIoPs), tendo em vista uma melhor

organização e gestão dos To, onde passa a funcio-

nar um comando único do qual dependem todas as

forças de combate.

Fonte: lBP 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: verificou-se que há um número li-

mitado de elementos dos cB que ocupam cargos de

chefia e comando, o qual é claramente insuficiente

e poderá comprometer a concretização e funciona-

mento do sco nos To. Para além disso, alguns dos

quadros de comando têm um défice formativo. A

principal solução apontada consistia na intensifica-

ção dos cursos para chefias da EnB.

Evolução: Todos os anos são realizados na EnB cur-

sos para funções de chefia dos bombeiros no com-

bate a incêndios florestais, nomeadamente os cursos

para “chefe de equipa de combate a incêndios flo-

restais” e “chefe de grupo de combate a incêndios

florestais”. Em 2008 perspectivam-se 10 cursos e

um total de 147 formandos não tendo existido, des-

de 2003, um aumento das acções de formação de

chefias. Em 2007, pretendeu-se tornar mais célere

o processo de progressão na carreira dos bombeiros

sapadores e voluntários através de um despacho que

permitiu, durante o período de um ano após a sua

entrada em vigor, uma redução considerável da car-

ga horária dos cursos de promoção.

Fonte: mAI 2003

Crítica/proposta: o sistema de comunicações cons-

tituiu uma das falhas técnicas mais graves nos To,

apontada quer no livro Branco quer no livro Aberto.

A esta limitação técnica juntava-se ainda a indiscipli-

na na realização das comunicações. no livro Branco,

refere-se a urgência na implementação do sistema

Integrado das Redes de Emergência e segurança de

Portugal (sIREsP).

Evolução: o sIREsP havia sido definido já em 2002 e

perspectivou-se a instalação de toda a infra-estrutura

tecnológica em todos os distritos do continente num

prazo de 5 anos, até 2007 (Rcm n.º 26/2002, de

5 de Fevereiro). o sIREsP viria a ser renegociado e

adjudicado em 2006. Em 2008, foi criada a unida-

de de missão do sIREsP responsável, de uma forma

geral, pela gestão do programa definido no contra-

to de implementação deste sistema, e coordenação

e planeamento do seu desenvolvimento (Rcm n.º

129/2008, de 26 de Agosto). Em Agosto de 2008,

já ultrapassado o prazo previsto, o sistema está im-

plementado em pouco mais de 50% do território

nacional.

Fonte: lBP 2003; lPn 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: Foi criticado o reduzido número de

especialistas em coordenação de meios Aéreos (mA),

a sua fraca formação e a de alguns pilotos, o que

conduziu nalgumas situações a uma falta de coorde-

nação entre os mA e terrestres. uma das propostas

prendia-se com a formação/qualificação, quer de co-

ordenadores de mA, quer mesmo dos pilotos. é ainda

proposta a eventual colaboração de antigos pilotos

enquanto especialistas na coordenação de mA, liber-

tando assim alguns quadros de comando. Propõe-se

ainda um plano de reequipamento em mA e a reali-

zação de um estudo onde se pondere a contratação

de mA face à afectação de mA da Força Aérea.

Evolução: no seguimento do estudo da comissão

Especial para o Estudo dos meios Aéreos de comba-

te aos Incêndios Florestais” (cEEmA) foi autorizada

Page 56: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 106 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 107 |

a realização de despesas inerentes à celebração de

contratos para aquisição de 4 helicópteros ligeiros,

6 helicópteros médios e 4 aerotanques pesados. Ao

nível da formação, foram realizados na EnB três cur-

sos de “coordenação de meios aéreos”. Para 2008,

estava programado um curso de “comandante de

operações aéreas”.

Fonte: lBP 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: melhoria e maior rentabilização

do investimento nos cursos da EnB relacionados com

os incêndios florestais, através da descentralização

da formação específica. Propôs-se ainda a criação de

um centro de Formação Especializada em Incêndios

Florestais (cFEIF) e de centros de formação operacio-

nais distritais.

Evolução: Em 2004, o centro de formação da EnB

na lousã passa a designar-se cFEIF e a dedicar-se

exclusivamente à formação em combate a incêndios

florestais. no entanto, não houve uma descentraliza-

ção destas formações da EnB, através dos centros de

formação operacionais distritais propostos. A única

forma de descentralização são as formações internas

nos cB, embora não exista informação sobre a forma-

ção em dFcI. de destacar ainda a capacidade da EnB,

a partir de 2004, de emitir o certificado de Aptidão

Pedagógica Profissional, possibilitando a formação de

formadores credenciados pela EnB distribuídos pelo

país, com especial importância para as formações in-

ternas nos cB, embora não tenha sido possível obter

informações sobre a formação em dFcI.

Fonte: mAI 2003

Crítica/proposta: As máquinas de rasto muitas ve-

zes trabalham desenquadradas quando a organiza-

ção no To se mostra deficiente. Para além disso, não

é dada qualquer qualificação aos manobradores em

questões de segurança. é proposta a utilização de

máquinas de rasto mais pequenas, mais manobráveis

e com um desempenho semelhante.

Evolução: Actualmente há instruções nas directivas

operacionais nacionais para a utilização de máquinas

de rasto nas diferentes fases do combate a incêndios

florestais, desde o ataque inicial à fase de rescaldo.

Para tal, os cdos estão incumbidos da elaboração de

uma listagem das máquinas de rasto e de outro tipo

de maquinaria disponíveis nos respectivos distritos e

municípios. grande parte destes equipamentos per-

tence a câmaras municipais, às Forças Armadas, a

associações de produtores florestais e a empreiteiros

florestais. não foram criados mecanismos concretos

para a qualificação dos manobradores das máquinas

no que toca à segurança e ao combate.

Fonte: lBP 2003; mAI 2003

Crítica/proposta: conclui-se haver um défice de

equipamentos de protecção individual (EPI) em vá-

rios cB. os EPI não se enquadram, por norma, nas

prioridades de investimento dos cB, e verifica-se

mesmo uma falta de formação dos bombeiros que

leva à não utilização de EPI. no livro Branco (mAI,

2003) é proposto um plano de aquisição de EPI. Para

além disso, propõe-se determinar a obrigatoriedade

da sua utilização em combate.

Evolução: no início de 2006, o mAI anunciou que

iria fornecer EPI a todos os cB que possuiam Equipas

de combate a Incêndios, através de verbas dispo-

nibilizadas pelos governos civis. Este processo tem

sido lento e pontual, e nalguns distritos apenas nos

últimos anos (2007 e 2008) os governos civis dis-

ponibilizaram EPI aos cB dos respectivos distritos.

Apesar das recomendações para a utilização de EPI,

não foi definida qualquer obrigatoriedade da sua uti-

lização no combate a incêndios florestais.

Aspectos gerais

Em termos gerais há a salientar o facto de os incên-

dios de 2003 terem dado origem (ou acelerado a

elaboração) a uma série de figuras de planeamento

(Estratégia nacional para as Florestas - EnF, PndFcI,

PmdFcI, Pom, PRoF, PgF) para além de relatórios de

grande valia técnica como o relatório final do conse-

lho nacional de Reflorestação. no entanto, à excep-

ção de alguns trabalhos residuais para implementa-

ção da RdF, até agora não existe evidência sobre a

transposição destes documentos para o terreno. As

razões para esta dificuldade são conhecidas e pren-

dem-se com as características da estrutura fundiária

e do regime de propriedade em Portugal. Também é

consensual que as medidas para combater esta difi-

culdade terão que passar pela obtenção de informa-

ção sobre as propriedades rústicas em Portugal. Esta

lacuna de informação não começou sequer a ser col-

matada o que, quanto a nós, representa a maior falha

no balanço que fazemos destes cinco anos. A pouca

importância atribuída pelos governos relativamente a

essa medida fundamental que é a elaboração de um

cadastro dos prédios rústicos, só encontra explicação

nos baixos dividendos políticos que daí podem advir e

no elevado investimento que tal representa.

um outro aspecto a salientar e que deriva directa-

mente da experiência recolhida durante a prepara-

ção do presente trabalho, tem a ver com a ausência

de monitorização e de informação sobre a aplicação

das medidas adoptadas. um caso paradigmático é o

do FFP, directamente financiado por uma taxa sobre

os combustíveis paga pela esmagadora maioria dos

portugueses. A utilização dos dinheiros deste Fundo

não tem sido transparente nem sujeita a escrutínio

público como se preconizava aquando da sua cria-

ção. é inexplicável que não tenhamos conseguido

ter acesso a informação completa relativa à utiliza-

ção que tem sido feita destes dinheiros públicos. de

resto, muitas das restantes medidas tomadas não

podem sequer ser avaliadas, dado que não existem

elementos sobre a sua aplicação.

Algo que devemos igualmente referir tem a ver com

a inconstância das políticas e das instituições ao lon-

go deste escasso período de cinco anos. o sndFcI já

teve duas versões e no momento em que escrevemos

prepara-se uma terceira. A AFn surge após duas leis

orgânicas que fizeram com que os serviços florestais

do Estado assumissem 3 designações diferentes ao

longo do período em análise. o PndFcI foi enco-

mendado pelo governo que cessou em 2005, ten-

do resultado numa Proposta Técnica elaborada pelo

Instituto superior de Agronomia. o governo que se

seguiu decidiu não seguir as recomendações princi-

pais dessa Proposta, perdendo-se assim uma grande

oportunidade para melhorar substancialmente o sis-

tema de dFcI no nosso País. Para além destes, muitos

outros exemplos poderiam ser apontados, ilustrando

a tradicional insensibilidade dos sucessivos governos

para a instabilidade e entropia causadas pelas cons-

tantes alterações introduzidas nas políticas e no qua-

dro legal e institucional.

como liga para a Protecção da natureza e dando

voz à nossa sensibilidade sobre este assunto, não

podemos igualmente de deixar de nos manifestar

relativamente à política florestal que tem sido segui-

da, nomeadamente no que diz respeito às directrizes

expostas na EnF (dgRF, 2006). Ao vocacionar a área

do país com maior produtividade e maior risco de

incêndio, para a produção florestal lenhosa, e ao dar

um peso excessivo ao papel económico da floresta,

Page 57: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 108 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 109 |

dando continuidade ao modelo seguido até agora,

a EnF mais não fez que encorajar o mesmo tipo

de ocupação florestal que se afirmou ao longo do

século XX (primeiro com o pinheiro-bravo e depois

com o eucalipto) e que resultou nas estatísticas de

incêndios que conhecemos. Pensamos que está pro-

vada até à exaustão a necessidade de diversificação

da nossa floresta e a necessidade de optarmos cada

vez mais por modelos de florestação baseados em

espécies nativas, promotoras de ambientes menos

susceptíveis ao fogo e integrantes dos nossos ecos-

sistemas naturais. um trabalho recente em vias de

publicação (silva et al. 2008) demonstra que, apesar

de terem as características estruturais mais favoráveis

(normalmente povoamentos com pouco sub-coberto

e com árvores altas e desramadas), os povoamentos

de eucalipto estão entre os que apresentam as maio-

res probabilidades de arder. Por outro lado assistimos

actualmente a uma progressiva invasão de algumas

áreas queimadas, e não só, por plantas de eucalipto

regeneradas naturalmente, constituindo massas ve-

getais muito resilientes e com elevada combustibili-

dade. é verdade que, dada a natureza privada da flo-

resta, esta terá que ser viável economicamente, mas

também é verdade que a criação do FFP contemplava

mecanismos (nunca aplicados) de ressarcimento dos

proprietários pelos serviços prestados pelas suas flo-

restas de conservação. Em vez disso, temos antes as-

sistido à canalização desses fundos para sustentar os

gTF das câmaras municipais, com resultados muito

pouco perceptíveis no terreno. é necessário que o Es-

tado olhe para a floresta nas suas diferentes vertentes

e não apenas na vertente económica, como tem sido

a tónica até agora. Esta visão abrangente da floresta

não tem feito parte da política florestal em Portugal,

contrariamente à dos outros países europeus.

BIBLIOgRAFIA

CEIF. (2004). Relatório Final. lisboa: comissão Eventual para os Incêndios Florestais da Assembleia da República.

DgRF. (2006). Estratégia Nacional para as Florestas. lisboa: dgRF.

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Instituto de Estudos sociais e Económicos.

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SILvA, J. S., MOREIRA, F., vAZ, P., CATRy, F. & gODINHO-FERREIRA, P. (2008). Assessing the relative fire proneness of different

fores types in Portugal. Plant Biosystems, in press.

Page 58: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 111 |

DETECÇãO REMOTA DA RESPOSTA DA vEgETA-

ÇãO EM áREAS qUEIMADAS EM 2003

José cARdoso PEREIRA, BERnARdo moTA, AnA sÁ,

AnA BARRos, soFIA olIvEIRA

departamento de Engenharia Florestal, Instituto su-

perior de Agronomia

Introdução

o verão de 2003 foi precedido por um Inverno chu-

voso, seguido de um mês de maio muito seco (Trigo

et al. 2006). A chuva invernal favoreceu a acumula-

ção de vegetação herbácea e de vegetação lenho-

sa fina, enquanto que a escassez de precipitação

primaveril iniciou cedo o processo de secagem do

combustível e dos solos. viegas e viegas (1994) já

tinham identificado esta conjugação de condições

meteorológicas como sendo favorável à ocorrência

de verões com área queimada acima da média. Pe-

reira et al. (2005) mostraram que cerca de 2/3 da va-

riabilidade interanual da área queimada é controlada

por processos meteorológicos ocorrendo em dois

tempos distintos: a já referida seca primaveril, de es-

cala mensal ou mesmo mais longa, conjugada com

a ocorrência de ondas de calor estivais com duração

típica de alguns dias. Estas ondas de calor proporcio-

nam as condições ideais para a combustão intensa

do combustível vegetal, abundante e muito seco.

Agosto de 2003 iniciou-se com o registo dos valores

mais altos de sempre, em Portugal, para a temperatu-

ra máxima (47.3°c, na Amareleja) e mínima (30.6°c,

em Portalegre) do ar, correspondendo ao começo de

uma vaga de calor excepcionalmente intensa e lon-

ga, que afectou grande parte da Europa. stott et al.

(2004) e Beniston (2004) consideraram que o verão

de 2003 poderá ter sido o mais quente na Europa

desde a primeira metade do século XvI. Para além

disso, stott et al. (2004) afirmaram ser muito prová-

vel (grau de confiança > 90%) que a influência das

actividades humanas tenha pelo menos duplicado o

risco de ocorrência de uma onda de calor da mag-

nitude da verificada em Agosto de 2003. Beniston

(2004) chamou a atenção para o facto de que esta

onda de calor apresentou muitas semelhanças com

as projecções de modelos regionais de clima para o

sul da Europa, admitindo o seu eventual carácter

precursor de ocorrências que poderão tornar-se bas-

tante mais comuns nas últimas décadas do presente

século.

As condições meteorológicas excepcionalmente se-

veras do início de Agosto de 2003 imediatamente se

traduziram na ocorrência de numerosos incêndios,

que deram origem a áreas queimadas muito exten-

sas. Assim, entre os dias 1 e 7 de Agosto, arderam

mais de 200.000 ha de florestas, matos e culturas

agrícolas, um valor praticamente igual ao dobro da

área queimada média anual dos últimos 30 anos.

A distribuição geográfica dos grandes incêndios de

2003 concentrou-se fortemente em duas regiões: no

centro do país e no Barlavento algarvio, contrastan-

do de algum modo com outros anos de muita área

queimada e grandes incêndios, como 1985, 1991,

1998 e 2005, quando a distribuição espacial do fogo

Page 59: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 112 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 113 |

foi mais dispersa. no fim do verão de 2003, tinha-

-se atingido uma área queimada total próxima dos

450.000 ha, cerca de 50% superior ao anterior re-

cord de 300.000 ha em 1985 e tinham-se também

verificado os maiores incêndios de que há registo

fiável, com um máximo de cerca de 40.000 ha, em

nisa. outra especificidade importante da época de

incêndios de 2003 foi o facto de 2/3 da área queima-

da ter atingido povoamentos florestais, contrariando

a tendência dominante de predomínio da incidência

do fogo sobre matagais.

As perturbações paisagísticas de larga extensão es-

pacial e de recorrência relativamente baixa num mes-

mo local (as “large, infrequent disturbances”, lId,

da literatura científica de língua inglesa, e.g. Foster

et al. 1998 e Turner et al. 1998) deixam um lega-

do ecológico de magnitude e persistência variáveis,

afectando os padrões de fertilidade do solo, de ba-

lanço energético da superfície, várias componentes

do ciclo hidrológico, a estrutura e composição das

comunidades vegetais e a biodiversidade em geral.

Portanto, é importante acompanhar a resposta da

paisagem após a ocorrência de grandes incêndios,

com ênfase na monitorização do coberto vegetal, de

modo a poder avaliar-se da recuperação dos ecossis-

temas, mas também da regeneração do combustível,

capaz de suportar novos fogos. o objectivo do pre-

sente estudo é analisar quantitativamente e de modo

espacialmente explícito as trajectórias temporais da

vegetação nas áreas mais atingidas pelos fogos de

2003, desde antes dessa data até ao presente, re-

correndo a séries cronológicas de dados obtidos por

detecção remota.

áreas de estudo, dados e métodos.

A presente análise exploratória da dinâmica da ve-

getação nas áreas atingidas pelos incêndios de 2003

incide em duas áreas geográficas distintas, situadas

no centro e no sudoeste de Portugal (Figura 1). A

primeira área abrange parte dos distritos de leiria,

santarém, castelo Branco e Portalegre, num total de

8732 km2. A segunda área localiza-se maioritaria-

mente no Algarve (incluindo um pouco do distrito de

Beja) e cobre uma extensão de 2060 km2. os incên-

dios da área de estudo do centro ocorreram, na sua

maioria, entre o fim de Julho e o meio de Agosto. na

área do Algarve, dois grandes incêndios ocorreram

em Agosto e um terceiro no início de setembro.

FIgURA 1 Áreas de estudo do centro e Algarve.

42º n

41º n

40º n

39º n

38º n

37º n

42º n

41º n

40º n

39º n

38º n

37º n

-9º W -8º W -7º W -6º W

-9º W -8º W -7º W -6º W

janela 1

janela 2

As Figuras 2 e 3 mostram a ocupação do solo pré-

-fogo, de acordo com a cartografia coRInE2000

e a frequência de incidência do fogo, entre 1975

e 2002, contextualizando o impacto dos fogos de

2003. A ocupação do solo na área do centro ca-

racterizava-se pela presença de uma grande mancha

de floresta e mato, no terço central, com maior ex-

tensão de terrenos agrícolas nos terços ocidental e

oriental da zona. A considerável extensão de matos

nesta área é consequência dos fogos que afectaram

a grande mancha do pinhal interior durante as últi-

mas décadas. no Algarve, a floresta e matos predo-

minavam na metade sul e no canto nordeste da área.

A zona central apresentava uma mistura retalhada

de manchas de floresta e agricultura, enquanto que

as terras agrícolas predominavam fortemente junto à

costa vicentina. o historial de incidência do fogo na

área do centro, entre 1975 e 2002 (Figura 3) mostra

uma clara concentração de grandes fogos coincidin-

do com a floresta e mato do terço central da região.

A maior parte da área afectada pelo fogo durante

este período ardeu apenas uma vez, mas uma exten-

são ainda considerável ardeu duas vezes. no canto

noroeste da imagem nota-se uma mancha que foi

queimada três e quatro vezes. As zonas de maior

frequência de fogo são demasiado pequenas para

aparecer, à escala da Figura. no Algarve, a grande

maioria da área queimada entre 1975 e 2002 ardeu

apenas uma vez, havendo uma pequena extensão

que ardeu duas vezes. Frequências de fogo mais ele-

vadas ocupam áreas bastante reduzidas ou mesmo

insignificantes. o fogo incidiu sobretudo na mancha

florestal mais extensa e contínua da metade sul desta

zona de estudo.

Page 60: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 114 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 115 |

Algarve

FIgURA 2 ocupação do solo de acordo com a cartografia coRInE 2000, actualizada com as áreas queimadas entre 2000 e 2002.

Centro

CLC00Fogos 2002 Fogos 2001 Floresta matos Agricultura urbano Água

CLC00Fogos 2002 Fogos 2001 Floresta matos Agricultura urbano Água

Centro

Nº de vezes ardido 1 2 3 4 5 6

Algarve

FIgURA 3 Frequência de incidência do fogo, no período 1975-2002.

Nº de vezes ardido 1 2 3 4 5 6

Page 61: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 116 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 117 |

A observação da dinâmica da vegetação nas áreas de

estudo teve início em Janeiro de 2000 e prolongou-

-se até Agosto de 2008 com periodicidade mensal,

condicionada pela disponibilidade de imagens sufi-

cientemente livres de nuvens. usaram-se imagens do

painel h17v05, que abrange Portugal a sul da latitu-

de de 40°n, recolhidas pelo sensor Terra, situado a

bordo do moderate Resolution Imaging spectrome-

ter (modIs). o Terra adquire imagens em 32 canais

espectrais (Tabela 1), com resolução espacial variável

entre os 250m e os 1000m (Justice et al. 1998).

USO PRIMáRIO CANAL LOCALIZAÇãO

ESPECTRAL (nm)

demarcação entre Terra/

nuvens/Aerossóis

1 620 - 670

2 841 - 876

Propriedades da Terra/

nuvens/Aerossóis

3 459 - 479

4 545 - 565

5 1.230 - 1.250

6 1.628 - 1.652

7 2.105 - 2.155

côr do oceano /

Fitoplâncton/

Biogeoquímica

8 405 - 420

9 438 - 448

10 483 - 493

11 526 - 536

12 546 - 556

13 662 - 672

14 673 - 683

15 743 - 753

16 862 - 877

vapor de Água

Atmosférico

17 890 - 920

18 931 - 941

19 915 - 965

Temperatura da

superfície/nuvens

20 3.660 - 3.840

21 3.929 - 3.989

22 3.929 - 3.989

23 4.020 - 4.080

Temperatura Atmosférica 24 4.433 - 4.498

25 4.482 - 4.549

detecção de cirros 26 1.360 - 1.390

vapor de Água 27 6.535 - 6.895

28 7.175 - 7.475

Propriedades das nuvens 29 8.400 - 8.700

ozono 30 9.580 - 9.880

Temperatura da

superfície/nuvens

31 10.780 - 11.280

32 11.770 - 12.270

Altitude do Topo das

nuvens

33 13.185 - 13.485

34 13.485 - 13.785

35 13.785 - 14.085

36 14.085 - 14.385

TABELA 1 características espectrais dos sensores Terra e Aqua, transportados pelo satélite modIs. destacam-se a cinza e negrito os canais usados no cálculo do Enhanced vegetation Index (EvI).

Para a monitorização da dinâmica do coberto ve-

getal nas áreas queimadas em 2003 recorreu-se a

imagens do Enhanced vegetation Index (EvI, hue-

te et al. 2002), um índice de vegetação produzido

especificamente para os sensores Terra e Aqua, do

satélite modIs. o EvI foi desenvolvido para optimi-

zar o sinal da vegetação, e tem maior sensibilidade

em regiões de biomassa elevada, relativamente a

índices tradicionais, como o normalised difference

vegetation Index (ndvI). Também apresenta capaci-

dades aperfeiçoadas de monitorização da vegetação

através da minimização de perturbações induzidas

pelo solo subjacente aos copados e pela atmosfera.

A equação do EvI é:

, onde

G – factor de escala (=2.5)

ρIvP

– reflectância no Infra-vermelho Próximo (canal 2

do modIs, 841- 876 nm)

ρv – reflectância no vermelho (canal 1 do modIs,

620- 670 nm)

ρA – reflectância no Azul (canal 3 do modIs, 459-

479 nm)

C1, C

2 – coeficientes de resistência ao efeito dos ae-

rossóis atmosféricos (=6 ; =7.5)

L – factor de ajustamento para a clareza do solo (=1)

o EvI representa uma evolução do ndvI, combinan-

do índices posteriores, vocacionados para a atenua-

ção do efeito atmosférico, nomeadamente o Atmos-

pherically Resistant vegetation Index (ARvI, kaufman

et al., 1992) e para a atenuação do efeito da super-

fície sob o copado vegetal, no caso o Soil Adjusted

Vegetation Index (sAvI, huete, 1988), como mostra

a Figura 4.

EVI = GρIVP - ρV

C1 ρ V + -C2 ρ A +Lρ IVP

normalized diference

vegetation Index

canopy

Background

correction

soil-adjusted

vegetation Index

EvI

Enhanced vegetation Index

Atmosphere

Resistance

NDvI

SAvI

(msAvI, TsAvI)

ρ

ρ

ρ

ρNIR Red

RedNIR

-

+

ARvI

ρρ

ρρ

NIR

NIR

-,

+rb

rb

ρ ρ ρRed Red- -γ(ρ )=rb blue

ρ

ρ

ρNIR Red

RedNIR

-

+ +L)(1+L)*

( L + ρ C1 ρ RedNIR

ρ ρNIR Red-

+ -C2 ρ blue)G *

Combined soil - and atmosphere - resistant vegetation indices

FIgURA 4 combinação de índices de vegetação pré-existentes, resistentes aos efeitos da atmosfera e da superfície subjacente ao copado, resultando no EvI. (retirado de http://tbrs.arizona.edu/forest/projects/evi.htm).

Page 62: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 118 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 119 |

A fAPAR é uma variável biofísica directamente rela-

cionada com a produtividade primária vegetal e que

pode ser usada como indicadora do estado e evolu-

ção do coberto vegetal. o presente uso do EvI para

monitorizar a dinâmica da vegetação nas principais

áreas queimadas em Portugal, durante o verão de

2003, apoia-se precisamente na existência desta for-

te relação entre o EvI e a fAPAR.

Para avaliar os efeitos dos fogos de 2003 sobre a vege-

tação, extraíram-se todos os valores máximos mensais

de EvI em cada pixel (≈ 1km2) da área de estudo, ten-

do-se construído séries cronológicas separadas para

os pixels correspondentes às áreas queimadas e não

queimadas em 2003. A análise destas séries cronoló-

gicas permite identificar o período durante o qual os

valores de EvI (e, consequentemente, de fAPAR) per-

maneceram deprimidos relativamente aos das áreas

circundantes, não afectadas pelo fogo nesse ano.

Resultados

As Figuras 6 e 7 mostram imagens EvI das duas áreas

de estudo, datadas dos anos de 2002 (pré-fogo),

2003 (logo após o fogo) e de 2008 (os 5 anos após

os fogos de 2003, que são o foco do presente livro).

Tal como indicado na legenda, os tons mais claros

correspondem a EvI mais elevado, representativo de

valores mais altos de fAPAR e % de coberto vegetal.

na imagem central de ambas as Figuras, adquirida

em 2003 pouco tempo após os fogos, as superfícies

afectadas estão desprovidas de vegetação, apare-

cendo muito escuras. nas imagens de 2008 já é bas-

tante difícil perceber a localização das áreas queima-

das em 2003, aparentando estar repostos, de modo

genérico, os valores de EvI pré-fogo.

A formulação mais sofisticada do EvI, relativamente

à maioria dos índices de vegetação seus precursores,

permite-lhe estabelecer uma relação com caracte-

rísticas funcionais da vegetação muito mais robusta

face a variações do tipo de solo e da % de coberto

vegetal do que, p.ex., o ndvI, para a fracção absor-

vida de radiação fotossinteticamente activa (fAPAR)

de uma cultura cerealífera (Figura 5).

FIgURA 5 Relações do ndvI e do EvI com a fAPAR de uma cultura cerealífera (% de coberto de 25%, 50% e 100%), à qual subjazem um solo claro, um solo escuro, e uma superfície de reflectância quase nula. (retirado de http://tbrs.arizona.edu/forest/projects/evi.htm).

1.0

0.8

0.6

0.4

0.2

0.0

nd

vI

fAPAR

0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0

1.0

0.8

0.6

0.4

0.0

EvI

fAPAR

0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0

25% Zero dark Bright 50% Zero dark Bright 100% Zero dark Bright

FIgURA 6 Imagens EvI da área de estudo do centro, datadas de 1 de outubro de 2002 (pré-fogos), 1 de setembro de 2003 e 1 de Agosto de 2008. os polígonos vermelhos delimitam as áreas queimadas no verão de 2003, que estão bem visíveis como manchas muito escuras na imagem do meio.

EvI0.53

0.1

EvI0.52

0.05

EvI0.61

0.1

Page 63: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 120 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 121 |

FIgURA 7 Imagens EvI da área de estudo do Algarve, datadas de 1 de outubro de 2002 (pré-fogo), 1 de dezembro de 2003 e 1 de Agosto de 2008. os polígonos vermelhos delimitam as áreas queimadas no verão de 2003, que estão bem visíveis como uma grande mancha escura na imagem do meio.

EvI0.54

0

EvI0.57

0

EvI0.48

0

As séries cronológicas de valores mensais de EvI,

em cada área de estudo, e nas zonas afectadas e

não afectadas pelos fogos de 2003 constam das

Figuras 8 e 9.

FIgURA 8 série cronológica de valores do Enhanced vegetation Index (EvI) sobre a área da região centro, de Janeiro de 2000 a Agosto de 2008. A janela demarcada entre Agosto de 2003 e novembro de 2005 destaca o período em que o EvI da área queimada é clara-mente inferior ao da área não queimada. As barras de incerteza representam ± 1 desvio-padrão.

FIgURA 9 série cronológica de valores do Enhanced vegetation Index (EvI) sobre a área do Algarve, de Janeiro de 2000 a Agosto de 2008. A janela demarcada entre Agosto de 2003 e dezembro de 2004 destaca o período em que o EvI da área queimada é claramente inferior ao da área não queimada. As barras de incerteza representam ± 1 desvio-padrão.

J-00

A-0

0

J-00

0.5

0.45

0.4

0.35

0.3

0.25

0.2

0.15

0

EvI

o-0

0

J-01

A-0

1

J-01

o-0

1

J-02

A-0

2

J-02

o-0

2

J-03

A-0

3

J-03

o-0

3

J-04

A-0

4

J-04

o-0

4

J-05

A-0

5

J-05

o-0

5

J-06

A-0

6

J-06

o-0

6

o-0

7

J-07

A-0

7

J-07

J-08

A -

08

J -0

8

novembro 2005Agosto 2003

nuvens

não-queimado queimado 2003

data

Centro

J-00

A-0

0

J-00

0.55

0.5

0.45

0.4

0.35

0.3

0.25

0.2

0.15

0.1

EvI

o-0

0

J-01

A-0

1

J-01

o-0

1

J-02

A-0

2

J-02

o-0

2

J-03

A-0

3

J-03

o-0

3

J-04

A-0

4

J-04

o-0

4

J-05

A-0

5

J-05

o-0

5

J-06

A-0

6

J-06

o-0

6

o-0

7

J-07

A-0

7

J-07

J-08

A -

08

J -0

8

novembro 2003Agosto 2003

não-queimado queimado 2003

data

dezembro 2004Agosto 2003

Algarve

Page 64: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 122 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 123 |

na zona centro (Figura 8) observa-se que em Agos-

to e setembro de 2003 a área queimada sofreu um

abaixamento do EvI muito mais profundo que o típi-

co dessa época do ano, demarcando-se claramente

dos valores observados na zona não afectada pelo

fogo. os valores de EvI da zona queimada permane-

cem consistentemente abaixo dos da área de referên-

cia até novembro de 2005, 27 meses após os fogos.

é também interessante notar que durante o ano de

2004 e 2005, os valores de EvI da área não afecta-

da pelo fogo também foram anomalamente baixos,

evidenciando os efeitos da forte seca que vigorou du-

rante a maior parte desse período. Após novembro

de 2005, as trajectórias temporais dos valores de EvI

nas zonas queimada e não queimada em 2003 ficam

quase sobrepostos, revelando que as áreas queima-

das dois anos antes readquiriram algumas das princi-

pais características estruturais e funcionais das áreas

vizinhas que não foram afectadas pelo fogo.

na zona de estudo do Algarve (Figura 9), é interes-

sante notar que nos anos anteriores a 2003, as áreas

que viriam a arder nesse ano evidenciavam valores

de EvI quase sistematicamente superiores aos da

zona de referência. mas, tal como na zona centro,

a occorrência dos fogos deprime fortemente os va-

lores de EvI nas áreas afectadas, com um impacto

que parece ser mesmo ligeiramente mais forte do

que o observado no centro. Porém, a recuperação

da vegetação queimada no maciço da serra de mon-

chique é muito mais rápida do que a do centro,

completando-se num período de apenas 16 meses.

A partir do verão de 2006, a série cronológica de va-

lores de EvI na zona percorrida pelos fogos de 2003

volta a ser superior aos valores de EvI da zona de

referência, muitos dos quais correspondem a áreas

mais secas, pertencentes ao distrito de Beja.

Discussão e conclusões

o objectivo principal deste estudo era avaliar a evolu-

ção da vegetação após os grandes fogos do verão de

2003, nas duas regiões portuguesas mais afectadas,

recorrendo a informação obtida por detecção remo-

ta. A análise é assumidamente preliminar e explora-

tória, mais visual do que quantitativa. Apesar disso,

foi possível demonstrar que o EvI, desenvolvido para

o modIs, é muito sensível à perda de vegetação pro-

vocada pelo fogo e permite acompanhar a dinâmica

da recuperação de atributos estruturais e funcionais

do coberto vegetal, após o fogo. A periodicidade

de observação aqui escolhida foi mensal, mas estão

disponíveis dados para monitorizar o coberto vege-

tal, à escala de 1km2, com frequências de oito e de

dezasseis dias.

os resultados obtidos evidenciam a rápida recupe-

ração da vegetação após o fogo. Porém, nada nos

permitem concluir quanto, por exemplo, à compo-

sição específica das comunidades sucessionais, um

aspecto importante no que respeita à conservação

da biodiversidade. o estudo também não abrangeu

outros aspectos com interesse científico e prático,

como a estratificação da análise de resposta da ve-

getação em função do historial prévio de incidência

do fogo, do número de anos desde o último fogo,

coberto vegetal presente antes do fogo, tipos de solo

e contexto topográfico. o desenvolvimento de estu-

dos que permitam monitorizar de modo operacional

a dinâmica da vegetação após o fogo contribuirá

para melhorar:

• o conhecimento da resiliência da paisagem rural

portuguesa face ao fogo,

• a definição de prioridades/condicionantes de inter-

venção nas áreas queimadas,

• a dinâmica da recuperação do perigo de incêndio,

• o impacto do fogo sobre o balanço de carbono da

vegetação portuguesa.

As ferramentas tecnológicas para executar estas ta-

refas e a capacidade de as utilizar adequadamente

existem e poderão, a breve prazo e com reduzido

investimento, ser postas ao serviço de uma gestão

mais eficaz, eficiente e ambientalmente sensível do

espaço florestal de Portugal.

Page 65: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 124 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 125 |

REFERÊNCIAS

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EvENTO gLOBAL DE INCENDIOS EN 2003. y LUE-

gO qUE?

JoRdI PAgEs

grup de Recolzament d’Actuacions Forestals – Espanha

Resumen

desde el evento de grandes Incendios Forestales

(gIF) del año 2003, Europa ha empezado a compren-

der la necesidad de la lucha conjunta y coordinada

contra los grandes incendios forestales.

durante el último siglo hemos visto que cuánto más

eficientes somos luchando con el fuego, más gran-

des y mayores llegan a ser estos incendios. la necesi-

dad de cambiar la manera de luchar contra el fuego

es evidente, y se ha de trabajar antes, durante y des-

pués del fuego. se necesitan más conocimientos y

planificación de la emergencia para hacer frente a los

fuegos y, a la vez, se hace más necesario el uso del

fuego para la seguridad y ecología de les bosques.

Esto implica un cambio de planteamiento tanto en

la gestión de la emergencia como en la percepción

social de los efectos y usos del fuego.

Tanto para enfrentarse a estos rápidos y intensos in-

cendios, como para confinar un frente o gestionar

un incendio, requiere una estructura de los servicios

de extinción dinámica y flexible, basada en la anti-

cipación del comportamiento del fuego, la toma de

decisiones dinámica en la línea de fuego y la gestión

integral del incendio como emergencia. Este aumen-

to de flexibilidad requiere que los bomberos sean

expertos y formados, que sean capaces de decidir

como, cuando y donde, y que los mandos marquen

estrategias y sean gestores de la emergencia.

El fuego es un elemento dinamizador de los ecosis-

temas mediterráneos, inevitable, y tanto las infra-

estructuras humanas como las estructuras vegetales

deben ser tolerantes a los incendios forestales. Es

necesario un cambio cultural que permita que la

gente entienda el cambio del fuego como enemi-

go total, a fuego como parte del ecosistema, que

aprenda a vivir con él y, en consecuencia, que di-

mensione las infraestructuras y zonas de interfase

teniendo en cuenta su vulnerabilidad y la necesidad

de la autoprotección.

Portugal desde el año 2003 ha experimentado gran-

des cambios en su modelo de extinción de grandes

incendios forestales. Aun así el camino esta aún en

sus orígenes. se han planteado algunas dudas que

tienen que ser resueltas para que el sistema de extin-

ción de incendios forestales sea eficiente.

gIF al mundo

los episodios de grandes incendios forestales no son

un problema local de determinado país o región. Por-

tugal en el año 2003 no fue el único país ni la única

región afectada por un episodio de gIF. El evento de

gIF del 2003 lo padecieron en primer lugar los habi-

tantes de la zona sur-Este de Australia el invierno del

2002-2003. luego lo padecieron de forma simulta-

nea los países de la riba mediterránea (Portugal, Es-

paña, catalunya, sur de Francia, corcega, sardeña,

Italia, e incluso en menor medida algunos países del

Page 66: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 126 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 127 |

norte de Europa y Rusia. y en otoño quemaba la re-

gión mediterranea de la costa oeste Americana.

veamos algunas de las conclusiones sacadas tras los

incendios, que hacen intuir el cambio en el modelo

a nivel mundial:

Portugal

El gobernador civil de Coimbra, Henrique Fernandes,

ha pedido hoy a la población que limpie de maleza

en un perímetro de seguridad de 50 metros alrede-

dor de sus casas para evitar más destrucción. En un

momento de crisis es adecuada, esta acuación?

Portugal pidió ayuda a la unión Europea y en res-

puesta a esa demanda, se envió un hidroavión es-

pañol, dos franceses, otro más de Italia y cuatro

helicópteros alemanes. se trata de un contingente

suficiente para dar respuesta a una situación de

emergencia nacional generada por la ola de incen-

dios forestales?

Catalunya

“Se constatan las limitaciones del modelo implantado

hasta ahora que se ha basado en reaccionar una vez

el fuego ya se ha declarado y en una gestión silvícola

muy limitada que no ha reducido la vulnerabilidad de

los bosques”. y la prevención para cuando?

Australia

“Estos GIF demuestran la necesidad de permitir el

uso de herramientas silvícolas en los Parques Nacio-

nales para permitir reducir las cargas de combusti-

bles” Asociación de industrias de la madera.

“Es conveniente no crear mas parques nacionales sin

los recursos para poder gestionarlos. Más gestión

de combustibles por parte del estado podría haber

evitado la crisis de Camberra” Ministro de Boques y

Conservación.

“No se realizó la reducción de combustible alrededor

de Camberra, el público no quería humo, y no quería

ver zonas quemadas alrededor de sus casas” Jefe del

servicio de extincición de Camberra.

“La amenaza de los incendios nunca será conquis-

tada. Con la naturaleza, no hay ninguna garantía”

John Howard, Primer Ministro.

USA

“En las regiones mediterráneas de la costa california-

na se deben reintroducir las quemas prescritas para

evitar los fuegos catastróficos. Necesitamos espacio

defendible alrededor de las comunidades. Hay que

plantear se como convivir con el fuego. Mientras la

sociedad no lo acepte continuaremos enfrontados a

estas graves campañas”. Jefe del Forest Service.

Esta simultaneidad en la afectación de un evento de

grandes incendios forestales en la región medite-

rránea ha llevado a la imposibilidad de que Europa

pueda prestar ayuda a un país miembro que ha de-

clarado su estado de emergéncia.

En la actualidad existen convenios de cooperación

entre los diferentes miembros de la union Europea?

I entre países de los dos hemisferios?

Todo el mundo ha sacado conclusiones parecidas del

evento de gIF, han sido compartidas? El proyecto Eu-

ropeo FireParadox, en el que diferentes organismos

Portugueses participan, trata de intecambiar expe-

riencias operativas y académicas para aumentar el

conocimiento en el ámbito de los incendios foresta-

les y sacar conclusiones aplicables para el operativo.

Las respuestas sobre extincion

El primer paso para trabajar en la mejora de la res-

puesta del operativo frente a una situación de gIF es

aceptar la evidencia de la incapacidad que tienen los

sistemas de extición de incendios para combatir este

tipo de emergencia. delante de este problema los

servicios de extinción deben afrontar un importante

cambio. A nivel general se apuesta por aumentar la

capacidad de gestión, a partir de la anticipación del

comportamiento del fuego, de la toma de decisiones

dinámica con los cambios en el frente, y a la vez con

una gestión integral del incendio como emergencia.

la respuesta del sistema de extinción de incendios

Portugues ha trabajado intensamente para dar res-

puesta a esta nueva realidad mediante distintas so-

luciones:

• la creación de unidades especializadas, las unida-

des de “canarinhos” en bomberos, que permiten

la diversificación del tipo de actuaciones como el

trabajo con herramientas manuales.

• la creación de unidades especializadas, los gIPs

dentro del cuerpo de la guardia nacional Republi-

cana, en ataque inmediato en conatos, altamente

efectivas el control de las igniciones y de los res-

ponsables de estas igniciones.

• la creación de unidades especializadas, gAuF en

Autoridade Florestal nacional. unidades capaces

de analizar “in situ” el comportamiento del fue-

go, y plantear una estrategia de ataque. y también

adiestradas para el uso del fuego como herramien-

ta de extinción de incendios forestales y para ges-

tión del monte en quemas prescritas.

• la unificación de un mando único a través de la

“Autoridade Nacional de Protección Civil” que dirige

“in situ” las actuaciones con independencia de

los organismos que están trabajando en él. Fuera

del ámbito estricto de las intervenciones en incen-

dios forestales, esta diversidad de organismos que

tienen responsabilidades en materia de incendios

forestales, puede conducir a un trabajo de preven-

ción y de gestión del entorno forestal, descoordi-

nado con los otros estamentos.

Las conclusiones sobre interfície zona (IZ)

Es necesaria la creación de unidades semi-autónomas

que sean capaces de actuar de forma autonoma, ca-

paces de tomar decisiones tácticas para resolver las

situaciones que se generan en un incendio forestal

que afecta a zonas urbanizadas. la coordinación de

este tipo de actuaciones obliga a cambiar la función

de los mandos; Estos deberán marcar la estrategia

para resolver la emergencia y gestionar los medios

para que sea posible sin implicar-se en las tácticas

que es emplean en cada uno de los puntos de actua-

ción. Este esquema de funcionamiento requiere un

nivel alto de formación de todos los miembros del

operativo para que sean capaces de entender la es-

trategia y poder desarrollar una táctica para resolver

la situación que se le plantea.

Las conclusiones sobre régimen de incendios

los servicios de extinción han de tener una impor-

tante interrelación con los responsables de gestión

del ecosistema. Por un lado, en la planificación hay

que asegurar la integración del fuego en la gestión

forestal, y por el otro lado en el momento del incen-

dio hay que vincular a los responsables de gestión del

territorio en las decisiones relativas al papel del fuego

en el ecosistema.

Page 67: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 128 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 129 |

hasta el momento la gestión forestal ha planificado

sin considerar el fuego como una parte del ecosiste-

ma. Esto ha propiciado la expansión de masas fores-

tales con una estructura que facilita el fuego de co-

pas como podrían ser las plantaciones de eucaliptus

para producción de madera. Estas formaciones rom-

pen un principio basico de la silvicultura; asegurar la

persistencia de la masa.

va a llegar el momento de exigir responsabilidades al

propietario por haber aplicado una gestión forestal

productiva sin haber tomado las medidas de segu-

ridad necesarias para mitigar los daños causados a

un tercero por un incendio en su propiedad y a las

administraciones por autorizar estas practicas sin te-

ner en consideración los efectos sobre el resto de la

comunidad.

Asegurar la dinámica de perturbaciones para la per-

sistencia del paisaje es la única forma de convivencia

con ecosistemas dominados por fuegos de alta in-

tensidad. El conocimiento del régimen de incendios

y las estructuras forestales asociadas y la respuesta

de cada una de las especies delante del fuego son

las herramientas imprescindibles para la gestión del

fuego. Por este motivo es imprescindible que el mun-

do de la extinción de incendios forestales, el de la

gestión forestal, el de la prevención y el de la pre-

extinción aprendan a trabajar juntos.

Las respuestas sobre quemas

El nexo que hace posible una producción forestal pla-

nificada y un paisage resistente a la perturbación

causada por fuegos de alta intensidad es el regimen

de incendios de baja intensidad que controlan la

acumulación de combustibles en el monte. El cam-

bio de régimen hacia fuegos de alta intensidad es el

resultado de no considerar la estrecha relación entre

el fuego y el resto de los elementos del ecosistema.

con el fin de no cometer el mismo error dos veces, la

gestión del monte mediante quemas prescritas ha de

partir de un estudio previo de los posibles efectos del

fuego sobre una estructura forestal concreta.

La política de la ecologia del fuego

la posibilidad que se produzcan cambios en la políti-

ca del fuego requiere que coincidan:

• Episodio de gIF grave, con perdidas importantes.

• movimiento social o político fuertemente afectado,

suficiente para asustar a los estamentos políticos

pero no tan fuerte como para que se anule su ca-

pacidad de actuar.

• Amplia significación cultural: A partir de un punto

de vista común que permita a la sociedad enten-

derlo.

• hay un margen de dos años para actuar.

• los encargados de producir el cambio tengan nue-

vas ideas y una estructura organizativa capaz de

hacer el cambio.

• hace falta una gran inversión para provocar el cam-

bio cultural en la sociedad, para aprender a convivir

con el fuego forestal. Aprovechar el valor cultural

de zonas rurales que entienden el fuego como un

elemento del medio. I en el ambiente urbano pa-

sar de una emergencia causada por un incendio

forestal a un acontecimiento normal causado por

un fuego forestal.

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Page 68: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 131 |

REFLECTIONS ON THE USA/PORTUgAL WILDLAND

FIRE TECHNICAL EXCHANgE PROJECT

mARk BEIghlEy, BEIghlEy consulTIng llc, usA

The year 2003 brought Portugal the worst fire sea-

son in recent history in terms of area burned and lives

lost. some attribute this to an unusual weather ano-

maly but then the 2005 fire season has already de-

monstrated that a continuing potential exists for lar-

ge, multiple day, campaign fire combat events when

conditions are right. climatologists also suggest that

increasing climate variability could lead to extreme

deviations from average conditions, including some

years being significantly hotter and drier and others,

significantly cooler and wetter. Portugal needs be

prepared for more years of unusually severe fire wea-

ther similar to what occurred in 2003 and 2005.

during the summer, 2004, I participated in a usA-

Portugal wildland fire technical exchange project to

observe and evaluate wildland fire protection capabi-

lity. during my 3 week visit we observed fire combat

operations and interviewed fire brigade comman-

ders, emergency command center (centros distritais

de operações de socorro/centros de Prevenção e de-

tecção - cdos/cPd) supervisors and staff, personnel

from the national service for Fire and civil Protection

(serviço nacional de Bombeiros e Protecção civil -

snBPc), the Forest service (direcção-geral dos Recur-

sos Florestais - dgRF), Forest owners Associations,

first intervention assets for private fiber companies

(Agrupamento complementar de Empresas – Aliança

Floresta, celbi & caima - AFocElcA), mayors, gover-

nors, and technical staff from several municipalities.

As a result, we developed some general impressions

about the wildland fire program in Portugal.

We concluded that the initial attack capability of the

individual fire brigades, the first intervention efforts

of the sapadores Florestais and private company first

response assets (e.g. AFocElcA) were quite good.

however, what was lacking was a single, unifying

command structure and common communications

capability that provided for an integrated, coordina-

ted attack to ensure maximum effectiveness of all

firefighting assets. Initial attack efforts were aggres-

sive and often successful, however, once fires beca-

me large, or burned more than a single burn period,

there was a limited ability to successfully plan and

implement effective perimeter control strategies and

provide for multiple day logistical needs. The limited

number of hand crews also made it difficult to imple-

ment a perimeter control strategy, especially in rug-

ged or remote areas. The lack of these “specialized

forces” to handle hotspots in difficult, roadless ter-

rain resulted in an unacceptably high rekindle rate.

The wildland fire program also appeared unbalanced.

great emphasis was given to increasing combat ca-

pability, specifically in terms of acquiring equipment,

with less emphasis given to fire prevention, in terms

of education programs, law enforcement, fuels re-

duction and silviculture treatments. more effort in

prevention activities was needed. A fire that is pre-

vented need not be extinguished, nor can it rekindle.

Finally, we determined that a comprehensive training

program was needed, within this broader framework

of improvements, to ensure that knowledge and

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| 132 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 133 |

skills are being successfully imported and transferred

to those that must implement the actions.

Portugal’s forests and rural agricultural zones are va-

luable national assets that deserve protection. Trends

in increasing climate variability, demographic shifts

caused by a rural exodus, the management comple-

xities associated with fragmented, small dimension

real estate, and forest and agricultural economics

that limit fire protection investments suggest that

more challenging times lie ahead. several key struc-

tural and technical changes will help stop the conti-

nuing erosion of productivity resulting from wildland

fire damage.

At the time, Portugal had all the pieces of the puzzle

to construct a world-class fire prevention, detection,

first intervention and combat program. however, it

lacked a comprehensive plan to fit them together.

A national strategy was needed to effectively educa-

te policy makers and the public, to build a balanced

arsenal of assets, to ensure integrated, coordinated

utilization of assets, to provide logistical support for

combat on multiple-day campaign fires, and to attain

the knowledge and training to effectively apply peri-

meter control strategies and tactics on large, landsca-

pe-scale fires. This plan needed to identify a broader

mix of activities to support fire prevention education,

fuel reduction and silviculture treatments, detection

and first intervention, wildland fire combat and tac-

tics, and the restoration of severely burned areas.

In 2004, the emphasis was to increase fire combat

forces, an understandable reaction to the experien-

ces of 2003. however, this represented a last resort

strategy. until the National Plan for Prevention and

Protection of Forest Against Fire (Plano Nacional de

Prevenção e Protecção da Floresta Contra Incêndios)

was completed, Portugal had focused most efforts on

building a strong combat force. A more balanced ap-

proach was needed, and this plan recognized that.

This plan clearly defines the roles and responsibili-

ties of all participants including national, district

and municipal government agencies as well as Fo-

rest owners Associations and private companies. It

strives to focus all the components of a balanced

program in a synergistic fashion to gain the grea-

test improvement for the least cost. no single entity

has the budget or the assets to independently solve

the problem. All stakeholders must work together,

in a well coordinated way, to realize the full value of

Portugal’s wildland fire defense capability.

Portugal has implemented many positive changes

since the usA/Portugal Wildland Fire Technical Ex-

change Project Report was released in 2004. many

of these improvements are still maturing and may

take several more years to bear fruit. others changes

have provided immediate improvement in both per-

formance and outcomes.

In 2004 we identified four strategic opportunities to

reduce wildland fire losses.

01. Prevent fires through public education, high risk

area patrols and law enforcement programs.

02. create fire resistant landscapes through strate-

gic application of fuel reduction and silviculture

treatments.

03. maintain a strong fire detection and first inter-

vention program to extinguish fires before they

become destructive.

04. Effectively engage in large fire combat.

A single minded focus on any one of these strategic

opportunities will fall short. A balanced approach is

required to optimize effectiveness. In the wake of

catastrophic fire losses, there’s always a strong ten-

dency to focus primarily on strengthening defensive

measures, strategic opportunities 3 and 4. however,

sustained, long-term success can only be achieved

by aggressively attacking the root of the problem;

minimizing numbers of fires and their potential to

spread. By also taking the strong offensive position

provided by strategic opportunities 1 and 2, the

demand on first intervention and combat forces is

reduced, allowing greater success.

many changes have occurred in government structu-

re in an attempt to provide more effective coordina-

tion in the campaign against wildland fire. some of

these changes, like the creation of the FEB—Forças

Especiais de Bombeiros (canarinhos), have proven to

be valuable. others, like the creation of the APIF—

Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais,

have already been determined to be of little value,

and dismantled. Benefits resulting from changes

such as these are often difficult to directly correlate

to any one specific annual outcome. It can also be

very difficult to isolate the degree to which weather

has been a factor in the results.

For example, burned area statistics for 2007 and

2008 look very promising, but can this be attributed

to improvements made to the fire defense program,

or was it just the result of a wet weather pattern

that existed throughout the summer? It will take

many years, possibly even a decade, before trends in

fire statistics can be reasonably correlated to annual

actions taken. Just in the last 5 years (2003-2007)

Portugal has seen a year of record high temperatures

(2003), a year of record drought (2005), and a very

wet summer (2007).

We know that global climate variability is expected

to increase. This means that greater annual deviation

from average annual climatic conditions can be ex-

pected. The trend is for some years to be significantly

hotter and drier than average (e.g. 2003 and 2005),

while other years will be significantly cooler and wet-

ter than average (e.g. 2007). Together, both of these

conditions present a problem for reducing wildland

fire losses. The cooler, wetter years will provide better

growing conditions resulting in an increasing accu-

mulation of flammable fuel. The hotter, drier years

will provide meteorological conditions that allow

this additional fuel to burn with greater intensity,

spreading fires faster, resulting in more large des-

tructive fires.

As illustrated in Figure 1, during the late 80s and 90s

decades, the 4-year moving average for burned area

was relatively constant at about 100,000 ha annually.

however, in the most recent period from 2003-2007,

the deviation from the annual burned area increased

dramatically in both directions by a factor of 4. This

pattern of extreme annual deviation is now being

termed Asymmetric Fire, and is showing up in other

geographic areas of the globe as well. It has been

mostly attributed to two factors. 1) A similar increase

in the annual deviation of climate variables that most

influence burned area; hot/dry and cool/wet years

and, 2) an increase in the continuity of fuels across

large landscapes without meaningful interruption.

Page 70: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 134 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 135 |

This type of wide fluctuation in annual burned area

presents a difficult problem for fire defense organi-

zations. Budgeting for fire defense based on average

annual numbers and sizes of fires may have provided

sufficient information for funding in decades past,

but now is increasingly prone to failure. Budget plan-

ning for an average year when significant deviations

could occur has two inherent risks. Either too much

money will be spent for a fire defense capability that

isn’t needed during a cool/wet year or, if a hot/dry

year develops, fire defense capability will be signi-

ficantly deficient. Budgeting for a fire defense pro-

gram to always be successful during extreme years,

when it’s most important, is cost prohibitive. This is

why it’s so important to increase the odds of success

in ways that aren’t dependent on betting on a par-

ticular annual climate/weather scenario to play out.

detection, first intervention and fire combat capa-

bility have been greatly strengthened since 2003.

Improvements in radio communication and the co-

ordination of first intervention and combat forces is

ongoing and showing promise. Training programs

have been developed to improve fire defense skills.

however, two very significant problems remain in

Portugal that, without significant improvement, will

only continue to result in greater losses from wildland

fire. Both of these have a strong human connection

with either the cause, or the cure.

The first is the high number of human-caused ig-

nitions. statistics show that Portugal, as compared

with mediterranean countries having similar fuel and

weather conditions, has a disproportionately high

number of human caused ignitions relative to popu-

lation. For example, spain is 5 times larger than Por-

tugal, and has 4 times the population, yet has fewer

ignitions. This high number of ignitions contributes

to reduced success in first intervention, initial attack

and fire combat. generally speaking, more ignitions

increase the probability they will occur on severe fire

weather days, presenting an even greater challenge

for first intervention success.

Even more disturbing is the high proportion of in-

cendiary fires intentionally-set to cause damage, to

2004

2006

FIgURA 1 Annual totals of burned area, with 4-year moving average (green line) for the period 1980-2007. The light brown horizontal line represents the annual burned area objective, in accordance with the PndFcI up to 2012. DGRF (2008).

média móvelÁrea Ardida

1980

500.000

400.000

300.000

200.000

100.000

0

ha

1982

1984

1986

1990

1988

1992

1994

1996

2002

1998

2000

The second significant problem is the increase in

large, continuous areas of unmanaged or inade-

quately managed flammable vegetation. This ranges

from vast landscapes of even-aged commercial eu-

calyptus forests, to once cultivated agriculture lands

that have been abandoned and are now dense with

flammable weeds and shrubs. In addition, thousan-

ds of small, individual tracts of once well-mana-

ged forest are going unattended, only to become

indistinguishably aggregated into the next future

fire storm.

Financial incentives to plant monoculture forests in

previously cultivated and marginal lands with no forest

maintenance requirements has resulted in increasin-

gly uniform expanses of highly flammable vegetation.

Fires that could once be stopped at cultivated land

boundaries are now spreading through them, faster

and hotter than ever before. This landscape conver-

sion from a fine scale mosaic of cultivated plots and

tended forests to large scale, unmanaged wildlands

has set the stage for the future: one of bigger, more

destructive fires. Just add the next drought or heat

voice political or social discontent, or to cause civil

disruption. This phenomenon isn’t just a techni-

cal fire prevention problem. The reasons are more

cultural, psychological and demographic in nature.

unemployment, low wages, poor living conditions,

egocentrism, grudges against society, boredom, and

criminal intent are all possible root causes for this

behavior. A broader range of expertise is needed to

shed more light on the cultural, social and psycholo-

gical drivers that create a desire to use fire for des-

tructive purposes. These issues deserve more study in

relation to preventing incendiary fires.

on the bright side, the total number of annual igni-

tions has been trending downward, with the notable

exception of 2005 which set a new record (Figure 2).

That spike could certainly be attributed to the severe

drought conditions that existed, causing many po-

tential ignition sources to start fires that might not

have otherwise occurred given more average mois-

ture conditions. This indicates that some prevention

measures undertaken in the last 5 years have been

working. more effort is needed, however, to reduce

the still unacceptably high number of human-caused

ignitions in Portugal.

FIgURA 2 Annual number of ignitions with 4-year moving averages (green line). DGRF (2008).

média móvelnº Ignições

1980

40.000

30.000

20.000

10.000

0

1982

1984

1986

1990

1988

1992

1994

1996

2002

2004

1998

2000

2006

Page 71: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 136 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 137 |

The solution seemed obvious; to break the forest up

into a mosaic of different age classes, much like a

patchwork quilt or a chessboard with smaller blocks

of older, flammable forest surrounded by blocks of

younger, more fire resilient forest. This crown fire

spread-resistant pattern could be accomplished by

designing a patchwork using computer fire behavior

simulation programs and then implementing a har-

vest schedule to create the mosaic. The downside is

that this strategy would likely increase the cost of

harvesting, but the resource damage and financial

losses reduced over the long term could certainly

offset those costs.

unfortunately, in August 2006, an intense fire swept

through the serra d’ossa destroying 5,344 hectares.

helicopter video clips, compliments of Bombeiros

voluntários de Estremoz, show an intense crown fire

burning in a large, continuous, mostly unharvested

area of the forest.

http://www.youtube.com/watch?v=ytUkxny9fb

4&feature=related (from 2 to 4 minute marker)

The abandonment of cultivated lands that once pro-

vided effective fire breaks, the creation of large ex-

panses of even-aged, monoculture forests and the

establishment of natural Areas with unmanaged

vegetation all potentially increase fire risk. These

situations invariably result in an unacceptable fuel

accumulation and continuity that make fire suppres-

sion difficult, and consequently increase the risk of

destruction of those ecosystems and resources inten-

ded for preservation.

wave to the equation and any ignition potentially be-

comes an instant inferno. so what can be done?

during the technical review in 2004, standing on a fire

detection tower in serra d’ossa, it was apparent that

any fire escaping first intervention efforts had the po-

tential of burning a very large area of the forest. This

conclusion was based on viewing large continuous

blocks of dense Eucalyptus forest with no break in

fuels sufficient to offer much assistance in stopping a

running crown fire. harvesting was conducted in lar-

ge continuous tracts, starting at one end and working

across the landscape, like a Pac man sequentially ea-

ting dots in a line. While this approach reduced fire

risk where harvesting occurred, it offered little pro-

tection to the remaining large blocks of unharvested

area. The result is that much of the forest is left highly

vulnerable to crown fire propagation and spread.

FIgURA 3 large, continuous tracts of harvested and unharvested areas in serra d’ossa Forest (Beighley 2004).

In addition, this situation is complicated by an incre-

ase in unauthorized building in the middle of forests

and other wildland areas. First intervention and fire

combat forces needed to protect natural resources

are often diverted to defend structures rather than

stopping the fire from spreading into new, unbur-

ned areas. As a result, buildings are protected but

fires continue to get bigger and threaten additional

buildings. Fire combat forces are then required to

leap-frog from building to building rather than stop-

ping fire perimeter growth. Protecting structures will

always take priority over protecting wildlands. This

contributes to a continuing degradation of forests

and other natural resources by fire.

large tracts of highly flammable forest and abando-

ned agricultural land need to be managed to reduce

the potential for fire growth and improve resilience

to damage by fire. Public policies that affect land use

changes such as planting forests in agricultural land

set-asides and conservation rules for natural areas

need to be reviewed and revised to insure compa-

tibility with the wildland fire prevention scheme for

a given area and with a full understanding of the

potential effects of a changing global climate.

In 2004, we asked many questions about fire pro-

gram effectiveness and most went unanswered. mul-

tiple levels of government and private funding sour-

ces contribute to the overall wildland fire protection

program but there was no attempt to summarize all

these expenditures in an annual report. What effect

do various elements of the program (prevention,

detection, first intervention, and combat) have on

the overall objective of defending forests from fire?

Which activities are the most effective and which are

the least? nationally, how much money is spent on

extinguishing rekindled fires? It’s now encouraging to

see that much of this information is being accumula-

ted, analyzed, published and discussed at workshops

and conferences.

Portugal’s forests and rural agricultural zones are va-

luable national assets that deserve protection. seve-

ral key structural and technical changes would help

stop the continuing erosion of productivity resulting

from wildland fire damage. specifically, reducing the

number of human-caused ignitions and creating fire-

resilient landscapes are the most daunting problems

left to solve. Progress in these areas would better po-

sition Portugal to minimize future fire related losses.

Page 72: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 138 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 139 |

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DESEMPENHO DO SISTEMA DE DFCI EM PORTU-

gAL CONTINENTAL NOS PERÍODOS DE 2001-2005

E 2006-2008

PAulo m. FERnAndEs

departamento Florestal, universidade de Trás-os-mon-

tes e Alto douro

Enquadramento e metodologia

o impacto nas características do regime de fogo cons-

titui uma medida do desempenho a longo prazo de

um sistema de defesa da Floresta contra Incêndios

(dFcI). o regime de fogo, incluindo a sua intensidade

(que condiciona a efectividade dos meios de combate e

consequentemente a área ardida), conjuga as influên-

cias do clima, vegetação (combustível) e topografia.

Estes factores exercem o seu efeito a escalas temporais

e espaciais distintas, cuja importância relativa é muito

debatida (e.g. Fernandes e Botelho, 2003; moritz et al.

2004; drever et al. 2008). À escala regional é de espe-

rar que prevaleçam os factores climáticos, enquanto

que as características do combustível e do terreno con-

trolam o fogo localmente (heyerdahl et al. 2001).

é nosso objectivo a quantificação de alterações re-

centes na incidência de fogos rurais em Portugal

continental. Porque a dinâmica temporal da activi-

dade de fogos depende largamente do contexto me-

teorológico este tem que ser considerado ao emitir

juízos sobre o eventual (des)agravamento da situa-

ção de incêndios. Em Portugal a variação meteoro-

lógica inter-anual explica cerca de 80% da variação

na área ardida (Pereira et al. 2003). Assim, e a fim

de detectar diferenças objectivas entre os período de

2001-2005 e 2006-2008, apreciamos a evolução re-

cente de indicadores da efectividade das várias com-

ponentes da gestão do fogo através de uma análise

estatística que procura anular o “ruído” associado

às condições atmos féricas. A selecção da fronteira

entre os dois períodos de tempo foi determinada

pela gravidade dos incêndios em 2005 e porque

muitas das decisões e medidas pós-2003 apenas

se consolidaram ou concretizaram em 2006-2008.

os indicadores adoptados constam da Tabela 1. Por ra-

zões óbvias não é possível tratar o efeito da gestão de

combustíveis e silvicultura preventiva, que qualquer um

dos indicadores implicitamente reflectirá. os três primei-

ros indicadores foram calculados diariamente à escala

nacional a partir da análise da informação constante na

base de dados fornecida pela Autoridade Florestal na-

cional (AFn). A mediana da dimensão dos grandes in-

cêndios (acima de 100 ha) foi calculada semanalmente,

uma vez que os maiores fogos se prolongam por vários

dias e é impossível associar as condições meteorológi-

cas de um determinado dia à área ardida nesse dia.

TABELA 1. Indicadores de desempenho das actividades de gestão do fogo.

ACTIvIDADE INDICADOR

Prevenção de ignições número de ocorrências

detecção e 1ª intervenção Proporção de ocorrências ≥ 1 hectare

Ataque inicial Proporção de fogos ≥ 100

hectares

Ataque ampliado dimensão mediana dos fogos ≥

100 hectares

Page 73: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 140 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 141 |

o sistema FWI (van Wagner, 1987) integra o sistema

canadiano de indexação do perigo meteorológico de

incêndio, comprovadamente robusto e interpretável

operacionalmente. o FWI discrimina índices da hu-

midade de três estratos do combustível (FFmc, dmc,

dc) e índices do comportamento potencial do fogo,

respectivamente IsI (velocidade de propagação), BuI

(consumo de combustível) e FWI (intensidade do fogo).

os componentes do FWI podem medir a combustibili-

dade mas não indicam o risco de incêndio (Alexander,

1994), mas a sua aferição para Portugal baseou-se

num estudo climatológico e em correlação com as es-

tatísticas de incêndios (viegas et al. 2003). Palheiro et

al. (2006) estabeleceram classes de FWI que definem

dificuldades crescentes de extinção do fogo em pinhal

e nas quais assentam os usos operacionais actuais.

os indicadores de desempenho correlacionaram-se

com os vários índices que constituem o FWI, calcu-

lados pelo Instituto de meteorologia com base nos

dados individuais de 61 ou 85 estações meteoroló-

gicas, dependendo do ano. Para 2008 só foi possí-

vel apurar a informação respeitante aos meses de

Abril a setembro. os indicadores número de ocor-

rências, proporção de ocorrências com área igual

ou superior a um hectare, e proporção de fogos

com área igual ou maior que 100 hectares foram

confrontados com as médias diárias nacionais dos

índices do FWI. A dimensão dos fogos ≥ 100 hec-

tares examinou-se em função dos índices da esta-

ção (ou estações) meteorológicas mais próximas.

A análise estatística incluiu dois procedimentos com-

plementares:

01. Análise de covariância para identificação de di-

ferenças entre os períodos 2001-2005 e 2006-

2008 para os vários indicadores de desempenho.

A análise testou a existência de diferenças esta-

tisticamente significativas entre as médias por

período das predições do modelo FWI ajustadas

para condições meteorológicas neutras.

02. modelação por regressão não-linear da variação

dos indicadores em função dos índices do FWI

para o período 2001-2005, aplicação dos mo-

delos a 2006-2008, e determinação do desvio

dos valores observados em relação aos valores

estimados. Esta análise não se efectuou para os

indicadores que o procedimento anterior identi-

ficou como não sendo estatisticamente distintos

entre os dois períodos.

Prevenção de ignições

os resultados das análises figuram na Tabela 2. o nú-

mero diário de ocorrências é o indicador que numa

análise à escala diária está mais fortemente associa-

do às condições meteorológicas, sendo grandemen-

te explicado pelo FFmc, índice do teor de humidade

do combustível morto e fino. Este índice em conjun-

to com o índice dmc (que reflecte a humidade da

folhada inferior) e com o período (2001-05 ou 2006-

08) explica 76% da variação observada no número

diário de ocorrências. o número de fogos ajustado

para condições meteorológicas neutras foi significa-

tivamente inferior no período mais recente, sofrendo

uma redução de 22% face a 2001-2005. verifica-se

porém que o peso relativo da mudança de período

no número de ocorrências é somente de 8%.

TABELA 2 variáveis explicativas da variação dos indicadores de desempenho e diferenças entre os períodos 2001-2005 e 2006-2008. * Ajustamento para condições meteorológicas neutras. valores na mesma linha acompanhados por letras distintas são significativamente diferentes (p<0.05, teste de Tukey-hsd) ** calculado como [(observado – estimado) / estimado] x 100, sendo as estimativas efectuadas com o modelo 2001-05.

INDICADOR vARIávEIS NO MODELO MéDIAS AJUSTADAS *

2001-05

2006-08 DESvIO (%)**

2006-08

nº ocorrências FFmc, dmc 74 a 61 b -21,5

Prop. fogos >1 ha nº ocorrências, IsI, época 0.197 a 0.129 b -36,6

Prop. fogos >100 ha FWI, prop. ocorr. > 1 ha 0.0036 a 0.0018 b -63,1

dimensão mediana

dos fogos >100 ha

FWI, nº fogos >100 ha 245 a 253 a _

FIgURA 1 número observado de ocorrências diárias em 2006-2008 versus estimativa efectuada com o modelo desenvolvido para 2001-2005. Fogos de outono-Inverno a castanho.

nº estimado de ocorrências

100

500

400

300

200

100

0

obse

rvad

o de

oco

rrên

cias

200 300 400 5000

6 -

13 A

gost

o 20

06

nov

embr

o 20

07

Page 74: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 142 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 143 |

Detecção e primeira intervenção

A proporção diária de fogos cujo tamanho final su-

perou 1 ha aumentou com o número de ocorrências.

mais ignições significam maior secura do combustí-

vel, mas também maior lentidão no processo de des-

pacho e menor disponibilidade de meios para a 1ª

intervenção. o índice IsI (expressão conjunta da ve-

locidade do vento e humidade do combustível fino)

revelou-se porém mais importante na explicação

da variância remanescente. uma variável adicional

mostrou-se influente: em igualdade de circunstân-

cias uma maior percentagem das ocorrências cresceu

para lá de um hectare na época de novembro-Abril

em comparação com maio-outubro, provavelmente

em resultado das diferenças no nível de prontidão.

A Figura 1 confronta os números observado e esti-

mado de ignições para o período 2006-2008. Para

os fogos de Primavera-verão há uma tendência

notória de decréscimo de ocorrências, excepto na

semana mais quente e seca de Agosto de 2006, o

que realça a facilidade de ignição nas condições mais

extremas e sugere limites para a efectividade das ac-

ções de sensibilização e dissuasão. note-se também

o extraordinariamente elevado número de fogos em

novembro de 2007. os desvios sazonais ao número

expectável de ignições em 2006-2007 foram 95% no

Inverno (Janeiro-março), -35% na Primavera (Abril-

Junho), -25% no verão (Julho-setembro) e 104% no

outono (outubro-dezembro). o duplicar do número

de ocorrências no outono-Inverno é sintomático da

importância do uso do fogo no espaço rural, num

contexto em que o patrulhamento durante a época

“normal” de fogos aumentou.

o número de ignições ajustado para condições me-

teorológicas neutras é substancialmente menor a

partir de 2004, tendo atingido o mínimo em 2008

(Figura 2).

FIgURA 2 desvio anual ao número de ocorrências de acordo com o modelo desenvolvido para 2001-2005.

2002

20

10

0

-10

-20

-30

-40

varia

ção

(%)

2003 2004 2005 2006 2007

Ano

2001 2008

Ataque inicial

A Figura 4 mostra que o índice FWI está bastante

bem correlacionado com a proporção mensal de

grandes (>100 ha) incêndios. os pontos correspon-

dentes a 2006-08 estão quase sempre abaixo da

curva exponencial ajustada, sendo que em alguns

meses da época “baixa” (Janeiro, outubro e dezem-

bro de 2005; Fevereiro de 2006; Abril de 2008) a

importância relativa dos fogos >100 superou a ex-

pectativa, provavelmente devido a menor prontidão

do dispositivo de combate.

considerados os efeitos da meteorologia (FWI) e

da redução no número de fogos > 1 ha, ocorreram

menos gran des incêndios em 2006-2008 em com-

paração com 2001-2005, com um desvio de -63%.

cerca de 20% da redução é atribuível ao período.

A Figura 5 mostra que nos anos de 2006 a 2008

houve uma redução real na proporção de grandes

incêndios, ou seja, que a quebra registada não se

deveu somente a condições meteorológicas favo-

ráveis. Pelo contrário, a meteorologia de 2004 não

justifica que a fracção de grandes fogos seja a maior

de todos os anos desde 2001.

neutralizando os factores meteorológico e sazonal

verifica-se que a proporção de fogos >1 ha foi sig-

nificativamente inferior no período 2006-2008, com

um desvio negativo de 37%. A importância relativa

do período temporal na redução da proporção de

ocorrências >1ha foi de 33%.

A Figura 3 mostra um decréscimo − apenas inter-

rom pido em 2004 − da fracção de fogos >1 ha

ao longo do período de análise, o que indicia um

aumento progressivo do desempenho da detecção

/ 1ª intervenção.

FIgURA 3 desvio anual à proporção de fogos com dimensão superior a 1 ha de acordo com o modelo desenvolvido para 2001-2005.

2002

30

20

10

0

-10

-20

-30

-40

-50

varia

ção

(%)

2003 2004 2005 2006 2007

Ano

2001 2008

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| 144 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 145 |

FIgURA 4 Proporção mensal de fogos maiores que 100 ha versus índice FWI. os pontos castanhos correspondem aos meses de 2006-2008.

0.020

0.015

0.010

0.005

0.000

prop

orçã

o de

fog

os >

100

ha

10 20 30

FWI

0 40Ataque ampliado

o indicador dimensão (mediana) dos grandes fogos

variou em função do índice FWI e do próprio número

de grandes fogos, denotando a dispersão de meios

de combate que usualmente acompanha as situações

meteorológicas mais adversas. A dimensão dos fogos

>100 ha foi substancialmente superior do que o FWI

deixaria antever nos meses de Agosto de 2003, mar-

ço e Junho de 2004, e Janeiro e dezembro de 2005.

não foi possível detectar uma evolução positiva no

desempenho do ataque ampliado em 2006-2008,

uma vez que a média ajustada para um FWI neu-

tro não difere estatisticamente da média do período

2001-2005. Este resultado não surpreende, dada a

fragilidade do ataque ampliado, tal como constata-

do durante a monitorização de incêndios individuais

efectuada durante a fase charlie (1 de Julho a 30

de setembro) de 2007. As deficiências do ataque

ampliado, e do combate a incêndios em geral em

Portugal, incluem (Botelho et al. 2008):

• Atribuição rígida dos níveis de prontidão;

• estratégia e tácticas de combate que não conside-

ram a evolução previsível do incêndio;

• meios e tácticas desadequados ao nível do compor-

tamento do fogo;

• alocação e gestão de meios não ajustados ao ciclo me-

teorológico diário nem ao ciclo de vida do incêndio;

• à excepção dos grupos de Análise e uso do Fogo,

não há pessoal dotado de competências essenciais

a um controlo perimetral efectivo (avaliação do pi-

ro-ambiente, meteorologia de incêndios, análise

avançada de incêndios);

• muitas normas operacionais ligadas à coordenação

e organização do teatro de operações não têm cor-

respondência no terreno, por falta de uma estrutu-

ra de comando que as implemente.

FIgURA 5 desvio anual à proporção de fogos com dimensão superior a 100 ha de acordo com o modelo desenvolvido para 2001-2005.

2002

40

20

0

-20

-40

-60

-80

-100

varia

ção

(%)

2003 2004 2005 2006 2007

Ano

2001 2008

Page 76: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

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Conclusão

A principal limitação da análise efectuada prende-se

com a sua resolução espacial e temporal. A enorme

extensão do território que ardeu de 2001 a 2005,

mais de 1.2 milhões de hectares, terá forçosamente

limitado a extensão dos fogos ocorridos em 2006-

2008 em várias regiões do país. uma terceira limi-

tação residirá na capacidade do sistema FWI para

representar adequadamente o potencial de compor-

tamento do fogo em ambientes meteorológicos ex-

tremos, nomeadamente em situações de forte ins-

tabilidade atmosférica após um período de secura

bastante prolongado. Em formações dominadas por

vegetação arbustiva o FWI sobrestima o potencial de

fogo na Primavera, mas é possível que o subestime

nos verões mais secos.

As análises efectuadas permitem concluir que o de-

sempenho combinado das actividades de prevenção

de ignições, detecção/1ª intervenção e ataque inicial

ao fogo evoluiu favoravelmente de 2001-2005 para

2006-2008. os ganhos de eficiência atribuíveis ao

período 2006-2008 verificaram-se principalmente

na detecção/1ª intervenção e, em menor grau, no

ataque inicial. é especialmente relevante constatar a

diminuição da fracção de fogos que excedem 100

ha de tamanho, uma vez que são responsáveis pelos

impactes mais severos e por grande parte da área ar-

dida total. Em 2006-2008 os grandes incêndios cor-

responderam a 65,5% da superfície queimada total,

face a 84,3% em 2001-2005. não há porém evidên-

cias de melhorias nos resultados do combate amplia-

do a incêndios, o que significa que não é de excluir

uma repetição dos anos críticos de 2003 e 2005.

A reforma do sistema dFcI encetada após 2003 inci-

diu essencialmente em alterações com repercussões

na prevenção de ignições e nas actividades de pré-

-supressão e supressão do fogo. os resultados po-

sitivos alcançados reflectem este esforço − e uma

visão essencial mente de protecção civil, que a mu-

nicipalização do planeamento da dFcI reforça − mas

não são sustentáveis a médio e longo prazo sem um

empenho comparável em medidas de efectiva pro-

tecção florestal. Adicionalmente, não é plausível que

o actual (e economicamente irracional) modelo de

combate a incêndios, onde a força se substitui ao

conhecimento técnico, seja compatível com ganhos

de efectividade na supressão de grandes incêndios.

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Page 77: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 149 |

DO PAÍS DAS CHARNECAS AO PAÍS DOS INCÊN-

DIOS – A EvOLUÇãO DA FLORESTA E DOS FO-

gOS NA IMPRENSA PORTUgUESA

PEdRo AlmEIdA vIEIRA1

Em 1815, José Bonifácio de Andrada e silva, admi-

nistrador das matas, lamentava, na sua obra memó-

ria sobre a necessidade e utilidades do Plantio de

novos Bosques em Portugal, que «apesar de muitas

Ordenações e Regimentos que mandam fazer novas

sementeiras e plantações, e dão providências para a

sua guarda, conservação e aproveitamento, os nos-

sos bosques estão desaparecendo com uma rapidez

espantosa há pouco mais de um século, porque des-

de então não têm cessado as causas da sua ruína».

Especialista em minas, Andrada e silva olhava para

a floresta portuguesa como um filão já exaurido, re-

ferindo que, em relação aos bosques existentes no

início do século XvII, «desapareceram uns de todo e

outros só têm famintos restos para nossa saudade».

nesta sua obra – que constituía uma apologia à arbo-

rização do país com pinheiro-bravo, Andrada e silva

– considerava que o aumento demográfico, os arro-

teamentos de áreas para lavoura e a instalação desre-

grada de unidades fabris eram problemas que pode-

riam ser corrigidos e minorados, mas que acabavam

por ser «filhas meramente do nosso desmazelo».

Perante este cenário, não surpreende que o botânico

Avelar de Brotero tenha apurado, em 1827, que as

zonas de incultos representavam então metade de

Portugal, englobando «quase todas as serras (...),

nuas de arvoredo nos seus cumes (...), cheios de ur-

zes, carquejas, estevas, sargaços, tojos, silvas, fetos e

outras plantas bravas, arbustivas e herbáceas».

os problemas diagnosticados por Andrada e silva,

e confirmados por Avelar de Brotero, não se resol-

veram nos anos seguintes. Em 1866, um inventá-

rio pormenorizado do património florestal regido

pelo Estado apurou a existência de apenas 18.310

hectares, dos quais somente cerca de 15 mil se en-

contravam arborizados. destes, 80% constituíam

o pinhal de leiria. Posteriormente, uma estimati-

va elaborada em 1868 pelo agrónomo Rebello da

silva apontava para apenas 112.436 hectares de

floresta em todo o país, o que representaria uns

meros 1,3% do território! Portugal era então um

autêntico país escalvado ou coberto de matagais.

As campanhas de arborização encetadas a partir da

parte final do século XIX aumentaram significativa-

mente o risco de incêndios florestais. o motivo é

óbvio: o Portugal de charnecas transformou-se num

Portugal de floresta.

no primeiro inventário florestal, efectuado entre

1902 e 1907, a área arborizada em Portugal atin-

gia já os 1,96 milhões de hectares. comparativa-

mente a 1875, constituía um ritmo de arborização

notável, com a duplicação dos povoamentos de pi-

nheiro, sobreiro e azinheira. neste período, as três

principais espécies florestais estavam mesmo quase

em equilíbrio: o pinheiro ocupava 430 mil hectares,

os montados de azinho estendiam-se por 417 mil e

montado de sobro abrangiam 366 mil. E mesmo as

outras formações arbóreas – sobretudo castanheiro

1 licenciado em Engenharia Biofísica e jornalista. Este texto baseia-se sobretudo no livro de sua autoria Portugal: O Vermelho e o Negro, publicado em 2006 pelas Publicações dom Quixote.

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e carvalhos – mais que decuplicaram, passando dos

60 mil hectares, estimados em 1875, para mais de

700 mil.

Este incremento da florestação manter-se-ia com gran-

de dinamismo até final dos anos 30 do século XX,

tendo beneficiado sobretudo o pinheiro-bravo. Em

poucas décadas, a «pinheirização» tornaria dominan-

te esta espécie na floresta portuguesa. consideran-

do correctos os valores de 1875, os pinhais mais que

quintuplicaram a sua área em seis décadas, passando

de 210 mil hectares para 1,16 milhões em 1939.

o sobreiro também haveria de beneficiar com esta

vaga silvícola do país. devido ao aumento da renta-

bilidade da cortiça, como produto industrial, a área

de montados de sobro quase duplicou entre 1910 e

1939, atingindo-se então os 690 mil hectares. Ape-

nas se evita a palavra «sobreirização» por estarmos

perante uma espécie autóctone do país.

contudo, a azinheira não teve a mesma sorte e, du-

rante este período, registou uma ligeira redução da

área, passando de 417 mil hectares para 360 mil.

certo é que, pela primeira vez na história de Portu-

gal, a floresta começou a mostrar sustentabilidade

e rentabilidade económica, distribuída ao longo do

território. A cortiça, por um lado, constituía uma im-

portante fonte de receitas no sul do país, enquanto

os pinhais beneficiavam sobretudo as regiões do nor-

te e centro. os pinheiros ainda se rentabilizaram mais

por via da exploração de uma outra mais-valia, para

além da madeira: a resina. de facto, o valor deste

produto teve um crescimento quase exponencial a

partir de 1920. nesse ano, a resina portuguesa ex-

portada tinha sido apenas de duas mil toneladas,

mas em finais dos anos 30 já atingiu as 58 mil, repre-

sentando então quase 100 mil contos. nessa altura,

os produtos resinosos ocupavam a quarta posição

nas exportações portuguesas, a seguir aos vinhos, à

cortiça e às conservas, dado que Portugal passou a

produzir cerca de 9% da resina mundial.

Perante o sucesso da arborização do país, o Estado

novo pretendeu mais. Em 1937, três anos depois de

ser criada a Junta de colonização Interna, foi aprova-

do o Plano de Povoamento Florestal com o objectivo

de arborizar cerca de 420 mil hectares, sobretudo

com pinheiro-bravo, em terrenos baldios de regiões

serranas do centro e norte do país. A contestação

popular que se seguiu terá sido algo semelhante à

ocorrida no início do século, durante a primeira fase

da «pinheirização». no entanto, devido às caracte-

rísticas do regime fascista, a sua repercussão chegou

até à actualidade. muito também por via do roman-

ce «Quando os Lobos Uivam», escrito em 1958 por

Aquilino Ribeiro2. é certo que a arborização durante

este período foi, sem dúvida, imposta com coacção,

mas não se pode defender que tenha lesado os in-

teresses da generalidade dos portugueses. A floresta

era sentida como um produto bastante rentável e o

marketing político conseguia convencer que assim se

assegurava «continuidade à alma nacional».

os efeitos sociais da execução do Plano de Povoa-

mento Florestal ainda não estão devidamente ava-

liados – pelo menos, com a devida frieza histórica.

Em todo o caso, se em algumas zonas a «usurpa-

ção» dos baldios contribuiu para um êxodo rural, em

termos regionais a floresta não foi responsável pelo

despovoamento progressivo do interior do país. com

efeito, nos anos 40 – ou seja, durante a primeira fase

de arborização dos baldios –, todos os distritos por-

2 o romance retrata a luta de uma povoação na ficcionada «serra dos milhafres» contra a arborização dos baldios. o livro seria apreendido pelo Estado novo, que intentou um processo ao escritor Aquilino Ribeiro, que apenas por pressões internacionais se livrou de uma condenação.

tugueses aumentaram a sua população. o despovoa-

mento do interior apenas se iniciou em meados da

década de 50, e com uma espantosa expressão nos

anos 60, estando na sua génese factores sociais mais

globais. ou seja, jamais teria sido evitada se não hou-

vesse floresta nos baldios; muito pelo contrário3.

Por outro lado, convém também relativizar a sempre

propalada «pinheirização» do Estado novo. o Plano

de Fomento Florestal apenas conseguiu, até 1974,

aumentar a área de pinhal em cerca de 200 mil hec-

tares, metade do previsto pela Junta de colonização

Interna. E a «culpa» foi de uma árvore que era quase

ornamental no final do século XIX: o eucalipto.

de facto, como espécie silvícola em Portugal, o euca-

lipto é um novato. no início do século XX nem tinha

qualquer expressão territorial e em 1956 somente

ocupava uma área de 76 hectares. o boom ocorreu

após a inauguração de uma fábrica de celulose em

cacia, perto de Aveiro, que pela primeira vez a nível

mundial começou a produzir pasta de papel recorren-

do ao eucalipto. no início, pensou-se que seria uma

unidade fabril economicamente insustentável, mas o

tempo e a tecnologia mostrariam o contrário. E logo

o Estado novo viu ali um bom negócio «patriótico»,

reorientando a sua política de arborização. Assim,

quando em 1966 foi criado o Fundo de Fomento

Florestal – para arborização de terrenos privados –,

os eucaliptais foram os mais beneficiados. Porém, tal

como já acontecera com o pinheiro no início do século

XX, nesta fase também houve acções «pedagógicas»

para convencer os proprietários privados. As vanta-

gens económicas então apontadas para os eucaliptos

eram, de facto, tentadoras: lucros 10 vezes superio-

res ao que se obtinham com outras espécies florestais

ou com a agricultura. Foi, por exemplo, neste período

que se fizeram as grandes plantações de eucalipto na

serra da ossa. no Alentejo, entre 1965 e 1974 terão

sido arborizados cerca de 80 mil hectares.

o inventário florestal de 1974 revelaria, assim, uma

inédita e profundíssima alteração do coberto arbó-

reo do país. Apesar do «incumprimento» das me-

tas previstas pela Junta de colonização Interna, o

pinheiro atingiu o seu pico máximo – 1,33 milhões

de hectares –, mas o eucalipto mostrou já que estava

a encetar a sua escalada expansionista, totalizando

então os 215 mil hectares. Porém, em abono da ver-

dade, os montados não ficaram esquecidos durante

o Estado novo. Embora as intensas secas dos anos

40 tenham afectado bastante o sobreiro – resultou

numa elevadíssima mortalidade e na perda de área

de quase 125 mil hectares até meados na década

de 504 –, registou-se depois uma ligeira recupera-

ção, da ordem dos 30 mil hectares. Quem acabou

por beneficiar, numa primeira fase, foi o montado de

azinho, pois aguentando melhor as secas conseguiu,

entre 1934 e 1956, expandir-se mais quase 200 mil

hectares, passando a ocupar 573 mil hectares, o que

constitui o valor mais elevado de sempre5. Este incre-

mento deveu-se também a outro factor: o melhor

aproveitamento da bolota como fonte de alimenta-

ção do porco alentejano.

Porém, as duas décadas seguintes, até à chegada da

democracia, já não foram tão positivas. Por um lado,

a contínua procura de terrenos para a campanha do

Trigo do Estado novo «roubou-lhe» alguma área. E

no início da década de 60, a eclosão da peste suína

africana retirou-lhe a importante mais-valia econó-

mica associada à pecuária extensiva. mesmo assim,

3 Pode-se sim acusar o Estado novo de ter tido uma inadequada política rural – sendo a campanha do Trigo um paradigma –, por insistir em cultivar cereais em solos inadequados. A floresta, ao invés, manteve uma razoável rentabilidade, mesmo nas épocas de maior crise.

4 Entre 1949 e 1956 terão sido cortados mais de um milhão de sobreiros decrépitos e doentes. 5 desde que existem registos estatísticos fiáveis, este foi o único período de expansão da azinheira em Portugal. o Inventário Florestal de 1995 aponta um

acréscimo de seis mil hectares na área ocupada por montados de azinho em relação a 1985, mas com um grau de incerteza estimado de ± 10.678 hectares, pelo que, a ter ocorrido, a expansão foi residual.

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| 152 | IncÊndIos FloREsTAIs - 5 Anos APÓs 2003 | 153 |

em 1974, a azinheira estendia-se ao longo de 536

mil hectares, mais do dobro daquela então ocupada

pelo eucalipto.

mas a democracia iria revolucionar mais a floresta

portuguesa. neste caso, mais para o mal do que para

o bem. E sobretudo por causa dos incêndios.

Os fogos na imprensa

mais árvores adultas, mais combustível, logo maior

risco de incêndio. Parece uma verdade do senhor de

la Palice. Porém, mesmo admitindo que o número

de fogos tenha aumentado à medida que os povoa-

mentos florestais se foram tornando adultos em fi-

nais do século XIX, o risco não se transformou logo

em catástrofe. na imprensa portuguesa do início

do século XX indicia que não deveriam existir fogos

de dimensão relevante ou estes eram raros – tanto

assim que nas poucas notícias sobre este tema até

se destacava a morte de coelhos6. no entanto, os

que existiam eram quase sempre considerados actos

criminosos7. vivia-se então num período de euforia

florestal e a gestão era considerada exemplar8. Para

os jornais portugueses, incêndios pavorosos apenas

ocorriam no estrangeiro9.

Para esta situação muito contribuiu a estrutura social

e demográfica do país. A floresta passara a ser vis-

ta como uma fonte de rendimento e explorada em

todas as suas mais-valias. no caso dos montados, no

sul do país e na zona de Trás-os-montes, o pastoreio

extensivo e agricultura evitavam o crescimento dos

matos. no restante território, com maior abundân-

cia de pinhal, a utilização do subcoberto (agulhas,

matos e restos de madeira) para usos quotidianos

e pecuários possibilitava uma redução do risco de

incêndios. Por outro lado, a própria exploração da

resina implicava uma maior vigilância e controlo dos

pinhais, mesmo durante o verão.

no entanto, isto não significa que os incêndios eram

inexistentes durante o Estado novo. Em vários livros

técnicos era uma das grandes preocupações, obri-

gando mesmo a alterações ao nível das casas rurais.

Por exemplo, uma notícia da edição de 10 de Julho

de 1943 do século Ilustrado – intitulada «A terrível

catástrofe de castanheira de chã» – referia-se que

este «humilde povoado de (...) Trás-os-Montes, foi

inteiramente devorado pelas chamas», acrescentan-

do-se que «em parte a tragédia foi maior (...) porque

os telhados eram de colmo, material que não será

autorizado na futura reedificação». Em todo o caso,

até aos anos 60, raras são as notícias em jornais

sobre os fogos. Estes terão começado a surgir com

maior frequência a partir dos anos 60, porventura

em consequência do início do despovoamento do

interior e da litoralização do país.

6 numa consulta à imprensa da época encontram-se, de facto, poucas notícias de incêndios. As mais relevantes no jornal o século são as seguintes: «A serra da Carregueira em chamas» (12 de setembro de 1927), que refere ter o fogo reduzido «a cinzas milhares de pinheiros», causando a morte de «centenas de coelhos bravos»; «Incêndios» (10 de outubro de 1927), alegadamente de origem criminosa, na região de sernancelhe; «Incêndio de Leomil» (26 de Agosto de 1929), que destaca um fogo em moimenta da Beira, que durou três dias; «Dois pinhais em chamas», (5 de setembro de 1932), no concelho de sintra; «Dois incêndios, num dos quais foram devorados vinte mil pinheiros» (10 de Julho de 1933), acrescentando que foram carbonizados «dezenas de coelhos»; «2000 metros quadrados de matos e pinhal destruído» (31 de Julho de 1933); «Está a lavrar um grande incêndio nos campos entre Redondo e Alvarim» (28 de Agosto de 1933); «Mal dominado ainda, o fogo que lavra na serra da Carregueira já produziu estragos em valor superior de mil contos», (15 de outubro de 1934), no concelho de sintra; e «Quilómetros e quilómetros de matos, pinhais e oliveiras que as chamas devoraram» (20 de setembro de 1937).

7 Por exemplo, na Ilustração Portuguesa: «A nossa riqueza florestal e o vandalismo» (10 de Junho de 1912) e «O fogo no Pinhal de Leiria» (4 de setembro de 1916), destaca-se a alegada origem criminosa dos incêndios.

8 no artigo «Os incêndios nas florestas», da edição do jornal o século de 14 de março de 1927, a pretexto da publicação do livro «Noções de silvicultura» da autoria de horácio da silva Eliseu, abordava-se o problema dos incêndios florestais, destacando as medidas preventivas que se deveriam tomar. o artigo considerava modelar o serviço de incêndios do pinhal de leiria.

9 Por exemplo, no dia 13 de Agosto de 1928, o jornal o século titulava «Mil pessoas mortas no incêndio de uma floresta em França». Este fogo ocorreu nas regiões francesas de saint lauren e saint Julien, nos Pirenéus orientais. Este incêndio não se encontra referenciado na Emergency disasters data Base (EddB), embora esta base de dados da universidade católica de louvain tenha poucas referências a incêndios florestais anteriores à década de 80. Em todo o caso, a dimensão deste desastre em França pode mesmo ter sido real, tendo em conta que em outubro de 1918 surge reportado na EddB incêndios nos Estados norte-americanos de minnesota e Wisconsin que causaram também mil mortes.

de facto, entre 1961 e 1973 contabilizam-se 216 ar-

tigos publicados no diário de notícias sobre esta te-

mática. na maior parte dos casos fazendo descrições

aterradoras, com títulos que hoje poderiam ser uti-

lizados em qualquer redacção, plagiando-se mesmo

a localização e o conteúdo do artigo10. nessa altura,

tal como agora, os fogos nas imediações de lisboa –

sobretudo se afectassem as serras de sintra e da Ar-

rábida, bem como os concelhos vizinhos da capital –

eram sempre alvo de notícia, independentemente da

sua dimensão. mas com maior frequência eram publi-

cados artigos sobre incêndios no interior do país. Por

exemplo, o concelho de Pampilhosa já então ardia

nos anos 60. o mesmo para Figueiró dos vinhos, via-

na do castelo, Abrantes, gondomar, coimbra, etc.11.

curiosamente, pela leitura destes artigos sobre fo-

gos, numa escrita quase sempre pungente, não pare-

ce que haja sinais evidentes de censura por parte do

Estado novo. Pormenorizam-se as casas ardidas e a

aflição nas povoações em perigo, bem como os epi-

sódios mais trágicos, como as mortes de populares,

militares e bombeiros12. Em algumas notícias chega-

-se a apontar mesmo as lacunas existentes em ter-

mos de meios e experiência no combate. é certo que

isto se torna mais evidente no início da década de 70,

embora nessa época já houvesse uma maior abertu-

ra à liberdade de expressão. Por exemplo, na edição

de 1 de setembro de 1972, a revista vida mundial

publicaria um artigo – intitulado «Incêndios: Reflexo

de uma situação» – em que destacava a falta de lim-

peza das matas, o equipamento técnico pouco fiável

e o mau estado dos caminhos florestais. Em suma,

exceptuando o estilo de escrita então utilizado, não

se notam diferenças substanciais na abordagem dos

temas relacionados com os incêndios florestais entre

as notícias no Estado novo e a actualidade.

os incêndios durante o Estado novo eram vividos

com o desespero que se pode imaginar. um fogo é

sempre um fogo, que causará sempre pavor. E houve

alguns que terão provocado muito, pois envolveram,

no seu combate, centenas e mesmo milhares de pes-

soas13. Porém, pela leitura dos jornais da época torna-

-se difícil aquilatar a verdadeira dimensão da maioria

dos incêndios. A sua caracterização nas notícias é,

por regra, ambígua, destacando apenas a destruição

de uma «vasta área de pinheiros» ou a queima de

«grandes extensões de matos e arvoredo». Em ou-

tras notícias, as dimensões são apresentadas, mas

imprecisas por apenas apontarem o comprimento da

frente de fogo e não a área destruída14. de facto, a

10 A título de exemplo, no diário de notícias: «A aldeia de Carradas mutilada pelo fogo é um campo de desolação» (26 de Agosto de 1962); «Violentos incêndios em vários pontos do país» (29 de Agosto de 1962); «Pavoroso incêndio entre Pedrógão Grande e a Sertã», (24 de Julho de 1966); «A serra de Sintra e Malveira da Serra devastadas» (8 de setembro de 1966); «Pavorosos incêndios em Miranda do Corvo, Poiares e Coimbra» (2 de setembro de 1967); «Violento incêndio no concelho de Ferreira do Zêzere põe em perigo três povoações» (7 de outubro de 1967); «Incêndios em série na área de Lisboa», (14 de Julho de 1968); «Pavoroso incêndio ameaça quatro povoações na região de Trancoso» (26 de Julho de 1968); «Mil soldados e numerosos bombeiros combatem um dantesco incêndio que deflagrou perto do monte de Santa Luzia», (6 de setembro de 1970); «Pavoroso incêndio lavra há mais de três dias na zona da Pampilhosa da Serra» (5 de outubro de 1970), «A região de Bouça está transformada em autêntico braseiro» (1 de setembro de 1973). E ainda noutros jornais: «O fogo trouxe a morte e a desolação», (9 de setembro de 1961) e «Todos os anos, no Verão», (6 de setembro de 1969), no século Ilustrado; «Fogo e desgosto no mês de Agosto» (6 de setembro de 1968) e «Gigantesco incêndio na região de Águeda» (22 de Agosto de 1969), na vida mundial.

11 nas notas de rodapé seguintes estão referidos, na maior parte das notícias, a localização dos concelhos e regiões onde, com maior frequência, lavravam os incêndios durante este período.

12 sem se pretender ser exaustivo, por exemplo: duas pessoas carbonizadas em Figueiró dos vinhos em 1961; um bombeiro e um jornalista do diário de coimbra em 1962, três homens e um rapaz carbonizados num incêndio em Boticas em 1963, três crianças num fogo em corgouço em 1964, uma mulher carbonizada na serra da Póvoa de santo Adrião em 1965, e 25 militares mortos na serra de sintra em 1966. Esta última tragédia, ocorrida em 9 de setembro, é até agora a maior de sempre, superando os 14 bombeiros falecidos exactamente 19 anos depois (em 1985), no concelho de Armamar, e os 12 bombeiros mortos das corporações de Águeda e Anadia durante um incêndio em 15 de Junho de 1986.

13 Embora os bombeiros, durante o Estado novo, tivessem já alguma participação no combate aos fogos, essa tarefa era desempenhada sobretudo pelos guardas florestais e militares, auxiliados sempre pela população local, com meios básicos – e eficientes – de sapador. Algumas notícias apontam números bastante impressionantes, talvez exagerados. Por exemplo, em 6 de Agosto de 1971, o diário de notícias titulava «No combate ao fogo da região de Olalhas colaboraram mais de mil pessoas», e em 27 de Julho de 1965, «Mais de três mil pessoas dão combate num incêndio em Valongo».

14 Por exemplo, consulte-se os seguintes artigos do diário de notícias: «O fogo destruiu árvores e madeira, numa frente de 12 quilómetros no concelho da Mortágua» (8 de setembro de 1967); «Elevados prejuízos materiais em incêndio que destruiu dois quilómetros de mata na região de Penamacor» (16 de Agosto de 1968); «Violento incêndio na serra da Argemela com frente de 30 quilómetros» (21 de Julho de 1970); «Círculo de fogo de 10 quilómetros nas serras da Carregueira e Dona Maria» (7 de outubro de 1971); e «40 quilómetros de matas destruídos por fogo em Tomar» (15 de Julho de 1972).

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destruição media-se sobretudo «contabilizando» as

árvores – «centenas» ou «milhares» –, o que permi-

te deduzir que, nestes casos, a área efectivamente

destruída foi reduzida15. noutras notícias destacam-

-se sobretudo os prejuízos, mas também de forma

grosseira16. Em todo o caso, alguns incêndios terão

atingido dimensões significativas, pois demoraram

vários dias até serem extintos17. contudo, os gran-

des incêndios terão sido excepções. na verdade, até

1974, nas poucas notícias que apontam a área efec-

tivamente ardida, chega-se à conclusão que muito

poucos terão destruído mais de mil hectares18.

um sinal de que a destruição total dos fogos durante

o Estado novo não atingia grandes proporções nota-

-se pela inexistência de dados oficiais, tanto mais que

noutros sectores florestais havia um controlo esta-

tístico muitíssimo detalhado e rigoroso. Apenas em

jornais da década de 70 se começam a encontrar al-

gumas referências às áreas ardidas durante o regime

do Estado novo. nesses artigos, por regra, indica-se

que, entre 1968 e 1973, os fogos destruíam cerca de

10 mil hectares por ano, tendo sido inferior a cinco

mil hectares em 1969 e 1971. E os prejuízos totais te-

rão ficado sempre abaixo dos 50 mil contos por ano.

Estes valores – que tornam os incêndios no período

do fascismo quase irrelevantes – são actualmente

aceites como válidos. num relatório da equipa res-

ponsável pela proposta técnica do Plano nacional de

defesa da Floresta contra Incêndios assume-se mes-

mo que na década de 50 e 60 arderiam, em média,

somente cinco mil hectares por ano.

obviamente que estes valores devem ser vistos com

alguma reserva, mas não parecem existir quaisquer

dúvidas que os fogos florestais durante o Estado novo

eram raros e a esmagadora maioria pouco destruti-

vos. Algo que haveria de se modificar após a Revolu-

ção dos cravos. E sobretudo nos últimos 10 anos.

com a liberdade trazida pela Revolução dos cravos,

a floresta começou a arder. Embora as estatísticas

oficiais tenham mantido alguma falta de rigor até,

pelo menos, aos anos 80, a democracia anunciou-se

inequivocamente com uma quantidade inusitada de

incêndios. logo em 1974, a área ardida terá atingi-

do cerca de 30 mil hectares, o valor mais elevado de

sempre. Porém, esse seria apenas um prenúncio dos

novos tempos.

o ano de 1975, com o seu famoso verão Quente,

que convulsionou o país, deixou marcas profundas

na floresta. o país não esteve a ferro e fogo apenas

15 Esta «contabilidade» estava sobretudo no corpo da notícia, mas por vezes constava também no título. Por exemplo, em artigos do diário de notícias: «Na serra de Monsanto, maia de mil árvores foram destruídas» (20 de Agosto de 1961); «Milhares de pinheiros e eucaliptos destruídos na região do Sardoal» (20 de Julho de 1963); «Mais de 500 oliveiras em chamas próximo de Santarém» (1 de Agosto de 1967); e «Na serra de Montejunto, milhares de pinheiros e outras árvores destruídas» (4 e novembro de 1970). um pinhal em boa exploração tem cerca de duas mil árvores por hectare até aos 20 anos. com os desbastes subsequentes terá cerca de 500 árvores ao fim de 40 anos.

16 Por exemplo, consulte-se os artigos do diário de notícias: «Em Tondela causou mais de 100 contos de prejuízos» (20 de Agosto de 1961); «Em Tabuaço causou prejuízos de 400 contos» (24 de Agosto de 1961); «Incêndio em Soure com prejuízos de 800 contos» (12 de setembro de 1967); «Elevados prejuízos causados pelo fogo em vasta extensão de matos na Beira Litoral» (7 de Fevereiro de 1969); «Águeda (...) centenas de milhares de contos de prejuízos» (22 de Agosto de 1969); «15 casas de uma aldeia de montanha destruídas pelo fogo – Quase dois mil contos de prejuízo» (7 de outubro de 1971); e «50 mil contos de prejuízo em Nelas» (1 de setembro de 1973).

17 Por exemplo, em 1965, um incêndio nos concelhos de castanheira de Pêra e Figueiró dos vinhos surgiu relatado nas edições de 13, 14 e 17 de setembro do diário de notícias. Em 1966, o incêndio da serra de sintra que vitimou 25 militares, terá durado mais de três dias. Em 1967, dois grandes incêndios em gondomar e góis foram noticiados nas edições de 31 de Agosto e 1 de setembro. Em 1969, ocorreram incêndios com duração de dois dias nas regiões de souto de lafões, caminha e valongo. E em 1970, um fogo na serra da lousã terá lavrado quase uma semana. no mesmo ano, surge a referência, na edição de 5 de outubro do diário de notícias, a um incêndio que lavrava há mais de três dias na zona da Pampilhosa da serra. Em 23 de Agosto de 1972, o mesmo jornal titulava «Ao fim de 4 dias e 4 noites dominado incêndio em Vale do Vouga». E numa das primeiras edições do semanário Expresso, em 8 de setembro de 1973, destacava-se um incêndio na serra do gerês que «durante oito dias lavrou na única reserva zoológica oficial do nosso país».

18 Por exemplo, no diário de notícias: «Devorados 1.500 hectares de sobreiros perto de Lagos» (2 de Agosto de 1962); «Incêndio em Avintes afectou 20 Km2» (16 de Junho de 1967), ou seja, 2.000 hectares queimados; «Cerca de 130 hectares de matas destruídas pelo fogo na região de Vila Real» (3 de setembro de 1967); «30 mil metros quadrados de mato no lugar da Ferreirinha» (3 de Junho de 1968), ou seja, apenas três hectares destruídos; «2500 contos de prejuízo em incêndio que destruiu 250 hectares de pinhais em Vouzela» (22 de Agosto de 1968); «Incêndio na Serra de Carnaxide – cerca de 20 mil metros quadrados de mato» (21 de Agosto de 1970), ou seja, apenas dois hectares queimados; e «Dez hectares ardem em Alcochete e ameaçam campo de tiro» (12 de Agosto de 1974).

em termos políticos e sociais – ardeu literalmente.

Até ao 25 de novembro desse ano, contabilizam-

-se mais de meia centena de artigos sobre incên-

dios nas edições do diário de notícias. muitos são

respeitantes a fogos em várias fábricas, armazéns e

edifícios públicos, decorrentes do PREc, mas cerca

de 20 referem-se a fogos florestais. Alguns destes

também terão sido incêndios «políticos». de facto,

num ambiente social e politicamente muito tenso,

as diversas facções políticas digladiavam-se à beira

da guerra civil e acusavam-se mutuamente de fogo-

-posto nas florestas. E os próprios técnicos florestais

ao serviço do Estado ajudavam a instigar mais os

ânimos, apelando à «vigilância dos povos sobre as

matas», através da criação de milícias populares19.

Isso foi levado tão a sério que, além de acusações de

incendiarismo metendo avionetas com pára-quedas

incandescentes, houve casos caricatos e dramáticos.

Por exemplo, milícias que supostamente estavam a

vigiar incendiários, foram presos pela polícia... por

incendiarismo. E em são Pedro do sul houve o lin-

chamento de um homem acusado de fogo-posto20.

Todo este canário revolucionário resultou nuns inédi-

tos 82 mil hectares queimados ao longo de 1975.

os dois anos seguintes foram mais amenos: em 1976

a área queimada rondou pouco mais de 20 mil hec-

tares e em 1977 ficou nos 10 mil hectares. voltou-se,

portanto, à situação habitual. mas o verão Quente

tinha arreigado, para sempre, o mito dos incendiá-

rios. As notícias sobre a detenção de incendiários

aumentaram, mais por via das caças ao homem do

que por um aumento do fogo-posto. Fica a sensa-

ção, pela frequência de notícias sobre esta questão,

que existiam mais incendiários do que incêndios21.

Em 1978 – ano em que aumentou a área ardida,

atingindo-se os 68 mil hectares –, a confederação

nacional da Agricultura garantia mesmo que 90%

dos incêndios em Portugal tinham origem crimino-

sa. E para contribuir para enraizar essa ideia, surgiria

nos finais dessa década um grupo de pirómanos, ou

brincalhões, que se autodenominou «Esquadrão In-

cendiário», reivindicando a origem de vários fogos.

Embora a própria Polícia Judiciária tenha então des-

mentido a sua existência, certo é que a generalidade

dos portugueses via nos incêndios uma origem ex-

clusivamente criminosa. Apesar de tudo, a década de

70 terminaria com dois anos relativamente amenos:

em 1979 foi dizimada uma área de 48 mil hectares e

em 1980 atingiu-se os 44 mil hectares.

Embora a área queimada, e no número de notícias

nos jornais22, tivesse aumentado significativamente

durante os primeiros anos de democracia, o país

não sofrera incêndios de dimensões catastróficas. o

maior fogo da década de 70, registado na zona de

oleiros em Agosto de 1979, «apenas» afectou 2.500

hectares23. E mesmo tendo havido vários incêndios

que demoraram mais de um dia a serem extintos,

áreas contínuas ardidas com mais de mil hectares

19 A edição de 28 de Agosto de 1975 do diário de notícias titulava «Forças reaccionárias responsáveis pela vaga de incêndios – afirmou um técnico da Direcção-Geral dos Recursos Florestais».

20 Em 29 de Agosto, o diário de notícias titulava «O povo alerta as autoridades para avionetas incendiárias». no dia 3 de setembro, noticiava-se «Misteriosa avioneta vermelha acusada de provocar dois incêndios perto de Castelo Branco» e no dia 24 do mesmo mês, voltava ao tema: «Avioneta incendiária alarma a população da malveira». no dia 2 de setembro de 1975, informava que «oito antifascistas que procediam a acções de vigilância na zona de Amarante foram detidos por supostos incendiários». noutra notícia, do mesmo dia, referia-se que «em São Pedro do Sul, um homem foi morto à paulada por populares que suspeitaram que fosse incendiário».

21 no diário de notícias surgem, por exemplo, os seguintes títulos: «Devastados por incêndios matas e florestas – em vários casos há suspeitas de fogo posto» (8 de Agosto de 1977); «Fogos suspeitos nas minas da Panasqueira» (6 de setembro de 1977); «Fogos na Barquinha tiveram origem muito suspeita» (7 de setembro de 1977); «Incêndios em várias matas do nosso país, alguns possivelmente de origem criminosa» (19 de Julho de 1978); «Serra de Sintra – administração do perímetro florestal admite causa criminosa» (21 de Agosto de 1978); «Fogo posto em Odivelas» (18 de Agosto de 1979); «Grande maioria dos incêndios é provocada por actos criminosos» (25 de Agosto de 1979); «Representantes de 13 corporações de bombeiros do distrito de Viseu decidiram reclamar ao Governo medidas enérgicas contra os incendiários» (9 de outubro de 1979).

22 Entre 1974 e 1980, só o diário de notícia publicou cerca de 180 artigos sobre esta temática.23 na edição de 21 de Agosto de 1979, o diário de notícias titulava «Extinto fogo em Oleiros, tendo destruído a maior mancha florestal da Europa, numa extensão

de 250 quilómetros quadrados», ou seja, 2.500 hectares.

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continuaram a ser pouco frequentes. no entanto,

esta inédita vaga de incêndios era então considera-

da catastrófica. num artigo d’o Jornal, de Agosto

de 1979, em que se fazia um balanço dos fogos,

titulava-se «Portugal caminha para o deserto». E isto

porque, na década anterior, tinham ardido 300 mil

hectares – ou seja, uma média inferior a 30 mil hec-

tares por ano24. um valor que hoje seria considerado

extraordinariamente... bom!

na década de 80, a situação ainda pioraria mais.

logo em 1981 bateu-se o recorde de 1975, com uma

área queimada de quase 90 mil hectares, tendo três

concelhos registado uma destruição superior a sete

mil hectares. os três anos seguintes seriam menos

lesivos, com valores entre 40 mil e 50 mil hectares

de área queimada, mas foi apenas uma pausa. A ten-

dência já estava em aceleração. com efeito, em 1985

ultrapassar-se-ia, pela primeira vez em Portugal, a

fasquia dos 100 mil hectares ardidos, contabilizando-

-se 146 mil hectares ao fim desse ano. À dimensão de

floresta e matos queimados, acrescentou-se também

a tragédia humana, em resultado da morte de 14

bombeiros em Armamar. Perante este novo cenário,

as notícias de fogos durante o primeiro quinquénio

da década de 80 aumentaram e mantiveram o dra-

matismo noticioso de outrora25 – porém, desta vez,

com razão, uma vez que a dimensão geográfica dos

incêndios e a respectiva área ardida já o justificavam.

curiosamente, este coincidiu com uma profunda

reorganização da política florestal. Em 1981, o go-

verno do Partido social democrata reformulara a le-

gislação fundamental da prevenção aos incêndios e

as competências do combate aos serviços florestais,

transferindo-a para os bombeiros, que passavam a ser

«tutelados» pelo novo serviço nacional de Bombei-

ros. Perante o fracasso desta solução, procuraram-se

bodes expiatórios. E havia para todos os gotos. Re-

nasceu o mito dos aviões incendiários, apenas com a

variante de então se afirmar serem provenientes de

Espanha. os madeireiros começaram a ser olhados

com desconfiança, por alegadamente beneficiaram

da madeira queimada, mais barata. como se estava

então em plena vaga de «eucaliptização», as celulo-

ses também foram parar à lista de suspeitos, dado

que ofereciam valores irrisórios pela compra terrenos

aos proprietários afectados. E, claro, também a seca

e o tempo seco surgiram, de tempos em tempos,

como justificativo. Em suma, atribuiu-se às forças

malignas, um problema que já começava a ser evi-

dente: a fraca aposta na prevenção e as deficiências

na gestão da floresta.

Indiferente a estas discussões sobre os culpados, o

fogo foi continuando o ataque. E a segunda metade

dos anos 80 iniciou-se mesmo com novo drama hu-

mano: 12 bombeiros de Águeda e Anadia morreram

em combate às chamas em 1986, a que acresceu

o maior incêndio até então: 10 mil hectares, em

vila de Rei26. no rescaldo desse ano, a área ardida

aproximou-se dos 100 mil hectares. Por essa altura,

aumentaram na imprensa as críticas à falta de coor-

denação nos bombeiros, às lacunas na formação e

ao arcaísmo dos meios de combate imprensa27. Po-

rém, o governo de cavaco silva pouco fez a não ser

24 cerca de 40% da área queimada localizava-se no distrito da guarda e 75% na região centro. o distrito da guarda era, de acordo com a notícia, o único do país que ainda não possuía qualquer corpo de bombeiros.

25 Por exemplo, alguns títulos do semanário Expresso denotam esse revivalismo noticioso, mas já extensível a todas as regiões de Portugal: «Violentos incêndios no distrito de Coimbra» (16 de setembro de 1982); «Vaga de incêndios alastra» (10 de setembro de 1983); «Violento incêndio no Algarve» (7 de Julho de 1984); «Incêndios assolam as florestas» (4 de Agosto de 1984); «Incêndios por todo o lado» (11 de Agosto de 1984); «Incêndios por todo o país» (27 de Julho de 1985); «Recorde de incêndios no Alentejo» (10 de Agosto de 1985); «Incêndio em Monchique continua incontrolável» (17 de Agosto de 1985).

26 Este fogo mereceria destaque na edição de 19 de Julho de 1986 do semanário Expresso, que titulou: «Vila de Rei: o maior incêndios de sempre».27 Por exemplo, no semanário Expresso: «Bombeiros e protecção civil não se entenderam na região Centro» (21 de setembro de 1985); «5200 escudos poderiam

ter salvo os 26 bombeiros em Águeda e Armamar» e «Papéis a mais, guardas a menos» (28 de Junho de 1986, ambas), que destacam a falta de organização das entidades públicas e a carência de formação dos bombeiros; «Gardunha: Fogo avança e não há bombeiros» (19 de Julho de 1986); «Desentendimentos chegam aos bombeiros» (8 de Agosto de 1987); e «Não funciona a prevenção aos fogos florestais» (1 de Abril de 1988).

injectar mais verbas nas corporações de bombeiros,

comprar-lhes mais viaturas e construir mais quartéis.

E ficou satisfeito com isso, tanto mais que, nos dois

anos seguintes, a área queimada regrediu: em 1987

atingiu 77 mil hectares, e em 1988 desceu para 22

mil hectares. o serviço nacional de Bombeiros até re-

jubilou, garantindo que essas reduções na destruição

se deviam à melhoria do equipamento de combate e

também ao uso de aviões, que se tinham começado

a usar com maior frequência28.

os festejos duraram pouco. nos três anos seguintes

ardeu sempre, em cada um, mais de 100 mil hec-

tares29 – situação até então sem precedentes. E os

grandes incêndios generalizaram-se pelo território:

chamusca (1989), sabugal, Pampilhosa da serra e

vila Pouca de Aguiar (1990), e mação, oleiros, co-

ruche e Tomar (1991), entre outros. Até a cidade de

coimbra, em 14 de Agosto de 1991, foi ameaça-

da pelas chamas30. durante esta vaga de chamas, a

imprensa mostrava, cada vez mais, a sua estupefac-

ção, transmitindo-a sobretudo em editoriais e títulos

bombásticos31. E mais ainda quando os fogos come-

çaram a afectar as «jóias da Coroa»: os parques e

reservas naturais.

não era situação nova, arderem áreas protegidas,

mas jamais com tamanha frequência. Em 1989, um

incêndio no Parque nacional da Peneda-gerês foi

então considerado uma catástrofe. o Parque natural

da serra da Estrela foi também devastado, de forma

recorrente, durante este período32. mas acabaram

por ser os fogos nas áreas protegidas junto a lisboa

que causaram maior projecção mediática. Em 1990,

arderam 120 hectares na Área de Paisagem Protegi-

da (actualmente Parque natural) de sintra-cascais.

contudo, o impacte mediático foi maior por causa

das suspeitas que recaíram na família champalli-

maud. A zona mais afectada – o Abano, onde defla-

graram três frentes de fogo no dia 2 de novembro

– estava então a ser cobiçada para fins imobiliários33.

Em 1991 seria a vez do Parque natural da Arrábida a

ser palco das chamas. A ineficiência no combate – o

fogo apenas se extinguiu após uma salvadora chuva

–, desencadeou as críticas no seio do governo contra

os bombeiros, criando mesmo um facto político34.

Além dos efeitos no terreno, este triénio também

produziu um forte impacte psicológico, pois nunca

Portugal vira mais de 440 mil hectares serem consu-

midos em apenas três anos. mas, claro, nem assim

se modificou nada. Preferiu-se «diabolizar» o fogo-

posto, aproveitando alguns casos em que parece ter

mesmo ocorrido. E assim aproveitando a onda, o

então governo social-democrata publicou um diplo-

ma que proibiu a alteração do uso do solo em áreas

queimadas durante um período de 10 anos. A lei ti-

nha boas intenções, mas os incêndios não cessaram.

Pelo contrário.

A década de 90 ficaria marcada por uma alternância

de anos catastróficos e anos «amenos». o fogo ganhou

28 Por exemplo, «Florestas ardem menos», na edição do Expresso de 1 de outubro de 1988, e «Balanço da utilização dos aviões é positivo», na edição do Jornal do Fundão de 4 de setembro de 1987.

29 Em 1989 arderam 126 mil hectares; em 1990 atingiu-se 137 nil hectares e em 1991 queimaram-se 182 mil hectares.30 «Coimbra cercada por um inferno de chamas», na edição do diário de notícias de 10 de Agosto de 1991.31 Por exemplo, em 1990 e 1991, o diário de notícias publicou 51 notícias sobre fogos, das quais seis foram manchete: «Cinco aldeias atingidas por incêndio na

Pampilhosa» (12 de Julho de 1990); «Fogo destruiu Mata do Sobral e ameaçou várias povoações» (22 de Julho de 1990); «Fogo incontrolável cerca Covilhã e devasta serra da Estrela» (12 de Agosto de 1990); «Populações evacuadas e fogo por todo o lado» (15 de Agosto de 1991); «Fogo em Pedrógão Grande só poupou pessoas e casas» (17 de Agosto de 1991).

32 «Chamas destroem Parque do Gerês» e «Incêndios destruiu coração do Gerês», nas edições do Expresso de 9 e 16 de setembro de 1989. E no diário de notícias titulou-se: «Fogo incontrolável cerca Covilhã e devasta a serra da Estrela» (12 de Agosto de 1990, em manchete); «Enorme incêndio na serra da Estrela» (28 de maio de 1991); e «Chamas consomem Gerês e Estrela» (28 de Julho de 1991).

33 «Incêndio no Guincho denuncia caos urbanístico», na edição do Expresso de 9 de novembro de Junho de 1991.34 As críticas do então ministro do Ambiente, carlos Borrego, causariam mal-estar no governo social-democrata que obviamente «protegia» os bombeiros,

apesar das evidências. o semanário Expresso abordou esta questão em quatro notícias: «Arrábida – Borrego acusa bombeiros» e «Alertas em saco roto» (21 de setembro de 1991), «Balbúrdia na Arrábida» e «Borrego surpreende Primeiro-Ministro» (28 de setembro de 1991).

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uma personalidade sádica: dava uma bordoada for-

te, deixava as costas da sua vítima descansar, até esta

estar confiante de não haver mais paulada; e então

desferia nova arrochada. com efeito, depois de em

1991 se ter ultrapassado o recorde de área queima-

da – cerca de 182 mil hectares queimados –, os três

anos seguintes foram amenos: 57 mil hectares, em

1992; 50 mil, em 1993; e 77 mil, em 1994. Em todo

o caso, os incêndios em anos «calmos» mostravam

uma selectividade muito peculiar: passaram a des-

truir de uma forma concentrada, temporal e regio-

nalmente. Por exemplo, em 1992, a área queima-

da no pequeno concelho de Arganil, no distrito de

coimbra, representou quase 30% do total nacional.

um desses fogos viria mesmo a tornar-se o mais des-

truidor da década de 90, com cerca de 9.700 hec-

tares, causando também quatro mortos. Em 1993,

outro ano ameno, também se registou outro grande

incêndio, no mês de Junho, que destruiu 7.700 hec-

tares de pinhais do concelho de mira.

mas como os fogos dos anos «amenos» atacavam

rápido, o tema incêndios caiu no esquecimento

mediático. Em 1993 e 1994, o diário de notícias

apenas publicou 10 artigos sobre a florestas, dos

quais somente cinco abordando incêndios. E o Ex-

presso apenas três artigos. durante esse período, o

governo rejubilava, confiante na irrepetibilidade de

novos fogos catastróficos. o então ministro da Ad-

ministração Interna, dias loureiro, não queria nem

ouvir falar em prevenção; não era necessário, pois

os bombeiros pareciam estar a dar conta do recado.

Assim se perdeu a oportunidade de usar os fundos

comunitários para a prevenção dos incêndios. E as-

sim se deixou de aproveitar, como fez a Espanha, os

dinheiros da Europa para adquirir meios aéreos para

o Estado, em vez de manter o polémico sistema de

aluguer de aeronaves35.

o ano de 1995 demonstrou que nada estava sob

controlo. no último verão da segunda maioria abso-

luta social-democrata, cavaco silva despediu-se de

primeiro-ministro com um país chamuscado à força

de quase 170 mil hectares consumidos pelas chamas.

Bastaram quatro incêndios para «limpar» mais de 22

mil hectares – outra situação inédita à data. mas o

ministro dias loureiro estrebuchava, vendo incendiá-

rios por todo o lado, e em plena campanha para as

eleições legislativas de outubro, surgiu na televisão

de dedo acusador, destacando o anormal aumento

no número de fogos36. Ao pior estilo do PREc, nesse

ano chegaram a ser criadas milícias populares, uma

das quais, em Arouca, até recebeu o apoio de Pau-

lo Portas, então candidato a deputado pelo cds-PP

no distrito de Aveiro. Este espírito de vitimização do

moribundo governo trouxe apenas um resultado: a

opinião pública (re)viu incendiários por todo o lado.

nesse verão, uma sondagem do semanário Expresso

apurou que 85% dos portugueses consideravam que

os incêndios florestais tinham uma origem exclusiva-

mente criminosa.

depois do infernal ano de 1995, o governo socialis-

ta entrou com o pé direito em matéria florestal. ou

seja, teve sorte. de facto, em 1996 ardeu «apenas»

89 mil hectares e em 1997 somente 30 mil hecta-

res37. A euforia, que já se manifestara com o gover-

no social-democrata entre 1992 e 1994, instalou-se

35 num artigo do diário de notícias, da edição de 29 de Julho de 1993 – «Dinheiros da Europa contra incêndios» –, o ministro dias loureiro referia que a compra de aviões canadair não era uma prioridade. o governo social-democrata sempre preferiu investir os dinheiros públicos e comunitários nos bombeiros e no aluguer de meios aéreos.

36 contabilizou-se, de facto, um número anormal de ignições, comparando com os anos anteriores. mas esse aumento deveu-se sobretudo à alteração na forma de registo das ocorrências e não ao seu efectivo crescimento. Este aspecto será aprofundado no próximo capítulo.

37 A noção de ano ameno foi modificando-se ao longo das décadas, sobretudo quando passou a arder mais de 150 mil hectares em alguns anos. Afinal, em 1996, embora os incêndios tenham afectado somente 89 mil hectares, ardeu mais do que em 1975. Porém, do ponto de vista noticioso, dir-se-ia que aconteceu o oposto: por exemplo, o diário de notícias em 1996 apenas publicou, durante o verão, seis notícias sobre fogos, duas das quais para destacar a morte de bombeiros (três devido à queda de helicóptero na covilhã, e outro em sabugal, numa operação de contrafogo), enquanto em 1975 publicou cerca de duas dezenas.

de novo no «reinado» socialista. cantou-se vitória.

no início de Agosto de 1998, o secretário de Estado-

-adjunto da Administração Interna, Armando vara,

foi a imagem do optimismo. num artigo do Expresso

publicado na edição de 8 de Agosto – sugestivamen-

te intitulada «Área ardida é inferior a 1997» –, este

governante congratulava-se com o sucesso que até

então se registava. E salientava que tudo se devia à

melhoria dos meios de combate, designadamente ao

nível de caminhos rurais, meios aéreos, bombeiros

helitransportados e grupos de primeira intervenção.

Quase por ironia, as declarações de Armando vara

ao jornalista daquele semanário já estavam desactua-

lizadas quando a notícia saiu publicada. com efeito,

no final dessa semana, o paraíso virou inferno, com

incêndios a rebentarem e a alastrarem por todo o

país. o secretário de Estado foi então a imagem do

político apanhado em contra-pé, desorientado. dias

depois, ao diário de notícias, Armando vara tentava

segurar-se a tudo o que o pudesse salvar. E por isso

fez uma estrambólica sugestão: «Os comandantes

operacionais têm de ter consciência de que há certo

tipo de incêndios, onde não está nada vital em peri-

go, em que devem deixar arder, porque, se não for

agora, esses terrenos ardem em Setembro. Por esta

lógica, um fogo que lavrasse em matos iria automati-

camente estancar quando se abeirasse de floresta.

Este ano de 1998 foi, aliás, o mais politizado de todos

em matéria de contabilização dos estragos. Aprovei-

tando-se de um verão em que a comunicação social

andava demasiado entretida com a Expo-98 e com a

polémica dos touros de Barrancos, as notícias na im-

prensa escrita foram pouco abundantes. no entanto,

os três canais de televisão estavam mais atentos, di-

fundindo as imagens de desespero. Armando vara,

mais uma vez, surgiu a defender o indefensável: que

«o país só ardia nas televisões». contudo, em abono

da verdade, quem manipulou foi o governo. numa

entrevista publicada na edição de 5 de setembro de

1998 do semanário Expresso, aquele governante

chegou a apontar que «até agora, a área ardida é

de cerca de 50 mil hectares». Poucos meses depois,

no seu balanço anual, a direcção-geral das Florestas

indicaria que, afinal, a área queimada tinha sido mui-

to superior: 158 mil hectares! E mesmo assim, este

valor pecou por defeito. um levantamento posterior,

realizado pelo Instituto superior de Agronomia, com

base em imagens de satélite, indicaria afinal 230 mil

hectares, o que colocaria o ano de 1998 como o pior

de sempre38.

Apesar do descalabro de 1998, o governo socialista

manteve o optimismo e, portanto, fez promessas.

Aproveitando-se das dificuldades de memória dos

portugueses, bem como da inata falta de jeito para

números, Armando vara garantiu que, em 1999, a

área total ardida se iria situar em 40% da média dos

últimos 18 anos. ora, conta feitas, isso significaria

cerca de 35 mil hectares. contudo, esse ano – o da

reeleição de António guterres a caminho do pântano

– a área queimada atingiu 70 mil hectares, mais do

dobro do prometido pelo seu secretário de Estado.

Em todo o caso, menos mal teria ficado o país se ti-

vesse mantido, nos anos seguintes, a área queimada

em 1999. mas não. Até 2005, aquele seria o último

ano abaixo da fasquia dos 100 mil hectares. com

efeito, o século XX, no ano 2000, despedir-se-ia com

os fogos a percorrerem quase 160 mil hectares. o

novo século começou mal: em 2001 queimou-se

uma área ardida de 112 mil hectares, em 2002 as-

cendeu aos 124 mil. E piorou de forma impensável

38 somente a partir de 2001, os relatórios oficiais, apresentados ao longo da época de fogos e no final do ano, passaram a ser mais rigorosos – e, portanto, a não permitirem uma manipulação por parte do governo. Tal situação deveu-se sobretudo aos levantamentos realizados em tempo quase real quer pelo Instituto superior de Agronomia quer da própria comissão Europeia. Em todo o caso, nas análises posteriores, para o ano de 1998 considerar-se-á sempre o valor oficial de área ardida.

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em 2003, com os incêndios a consumirem 426 mil

hectares, causando também a morte de 20 pessoas,

bem como a destruição de mais de meio milhar de

casas e outros edifícios. Assim, em apenas um ano,

Portugal ardeu uma área bem superior à registada

nos 40 anos do Estado novo; mais 100 mil hecta-

res do que se queimou nos anos 70; metade do que

ardeu em toda a década de 80; e cerca de 40% do

total dos anos 90.

os prejuízos causados pelos incêndios nesse ano

também bateram recordes, atingindo os 1,5 mil

milhões de euros. de acordo com a Emergency di-

sasters data Base (EddB), gerida pela universidade

católica de louvain, constitui o segundo valor mais

elevado de sempre a nível mundial para este tipo de

catástrofe natural39.

Tamanha devastação deveria ter resultado, necessa-

riamente, numa muito menor área ardida nos dois

anos seguintes, nem que fosse pela simples razão

de mais de 10% da área de aproveitamento florestal

do país ter ficado «imune» aos fogos a médio prazo,

por ter ardido em 2003. E também por «força» das

promessas do então ministro da Agricultura, sevina-

te Pinto, que desejava «transformar a desgraça numa

oportunidade»40. contudo, nova oportunidade só a

teve o fogo, que ainda tinha muito para queimar. E

assim, em 2004, ardeu uma área próxima dos 130

mil hectares e em 2005 atingiu-se os 325 mil. ou

seja, em apenas um quinquénio, Portugal viu ser di-

zimado uma área de 1,1 milhões de hectares – cerca

de um terço da área de aproveitamento florestal e

mais de 12% do território do país41.

Perante este historial, com uma área ardida de 1,6

milhões de hectares numa década (1996-2005) e

com dois anos (2003 e 2005) a superarem os 300

mil hectares, a comunicação social olhou para o ano

de 2007 como o prenúncio de nova catástrofe. E a

denominada época dos fogos florestais desse ano

começou, de facto, bastante mal, com uma tragédia

humana: seis bombeiros morreriam num combate na

guarda42. como noutros anos subsequentes a anos

catastróficos, a comunicação social foi genericamen-

te acompanhando com detalhe algumas das vagas

de incêndios sobretudo até à primeira quinzena de

Agosto43. no entanto, uma sucessão de períodos de

calor seguidos de chuva acabou por fazer com que

2006 conseguisse pela primeira vez desde o início da

década baixar a fasquia dos 100 mil hectares. Apesar

disso, os 75 mil hectares ardidos – o segundo «me-

lhor ano» da década 1998-2006 – foi visto como

uma vitória pelo governo, que foi tentando passar

na comunicação social que os resultados apenas não

foram melhores por o verão de 2006 ter sido asso-

lado por sucessivas ondas de calor44. se é certo que

houve tempo quente (e ondas de calor), esse fenó-

meno fez-se sentir com o surgimento de fogos. na

verdade, apesar de um ano relativamente «ameno»

39 os incêndios que causaram mais danos económicos ocorreram em 1997 na Indonésia, com prejuízos de 17 mil milhões de dólares. das 10 piores vagas de in-cêndios registadas pela universidade de louvain, três verificaram-se durante o ano de 2003: além de Portugal, atingiram o canadá e a Austrália, com prejuízos da ordem dos 545 milhões e 300 milhões de dólares, respectivamente.

40 Esta frase está inserida na notícia intitulada «verão escaldante», na edição do Expresso de 29 de setembro de 2003.41 A cobertura televisiva dos incêndios – com noticiários, por vezes excessivos, de mais de meia hora, sobretudo gastos em directos – foi retirando algum

protagonismo à imprensa escrita em relação aos relatos dos fogos. os jornais começaram assim a dispensar um maior espaço de análise de crítica. Por exemplo, entre 2003 e 2005, o diário de notícias fez quatro manchetes sobre a dimensão global dos fogos em Portugal: «25% da floresta portuguesa ardeu na última década» (8 de Agosto de 2004); «mais de 20% da floresta nacional ardeu em cinco anos» (15 de Julho de 2005); «37% da floresta ardida na Europa do sul é portuguesa» (10 de Agosto de 2005). o semanário Expresso também salientou, em primeira página, esta nova realidade: «14% da área ardida são parques naturais» (9 de Agosto de 2003, como subtítulo da manchete) e «Área ardida é igual ao Algarve» (23 de Agosto de 2003, em manchete). outros jornais, sobretudo o diário Público, deram, de igual modo, um forte destaque.

42 «seis bombeiros mortos na guarda», foi manchete do diário de notícias em 10 de Julho de 2006.43 A título de exemplo, o diário de notícias destacou os incêndios florestais, em manchete ou chamada de primeira página, em cinco edições da primeira quinzena

de Agosto de 2006: nos dias 8, 12, 13, 14 e 15.44 o caso mais chocante constata-se na edição de 5 de setembro de 2006 do diário de notícias que surgiu com a manchete: «Portugal atravessa a 5ª onda de

calor de 2006». na verdade, em nenhuma zona do país se tinha verificado mais do que três ondas de calor e todas elas intercaladas com precipitação.

à escala nacional, 2007 foi o segundo pior ano no

distrito de évora e o terceiro nos distritos de viana

do castelo e Braga desde a década de 80 em termos

de área ardida. Além disso, 2006 registou um verão

particularmente húmido: desde a década de 80 foi

o 25º mais seco (terceiro mais chuvoso) e o 18º com

mais área ardida.

contudo, certo foi que a generalidade da comuni-

cação social – que aproveitava os relatórios oficiais

– acabou por destacar sobretudo os resultados relati-

vos do ano de 2006 comparando-os com os dos anos

catastróficos de 2003 e 2005. Além disso, como a

galiza foi assolada por uma vaga de incêndios quase

sem precedentes, também contribuiu para sustentar

os aparentes bons resultados em Portugal45.

o ano de 2007 ainda seria mais parco em fogos,

com um verão extremamente ameno em termos

de temperaturas e bastante chuvoso em que ape-

nas arderam cerca de 17 mil hectares até finais de

setembro. E os fogos quase saíram das páginas dos

jornais, excepção para dois dias no final de Julho.

maior destaque, sim, tiveram os fogos na grécia

e nas canárias46. A sensação de um «bom» verão

acabou até por levar a imprensa a quase ignorar

os fogos ocorridos num novembro particularmente

seco, em que arderam cerca de 13 mil hectares. Isto

implicou assim que o ano de 2007 tivesse ficado com

uma área ardida ligeiramente acima do ano de 1997

e sendo até então o terceiro menos destrutivo desde

a década de 80.

o ano de 2008 manteve a tendência decrescente dos

últimos três anos. Até meados de setembro apenas

arderam pouco mais de 10 mil hectares, sendo muito

provável que se venha a registar o valor mais baixo

desde 1977. E, por isso, com naturalidade, os incên-

dios «fugiram» das páginas de destaque dos jornais,

circunscrevendo-se as notícias a pequenos artigos so-

bre pontuais incêndios e os saldos quinzenais, onde

sempre são feitas comparações (optimistas) com as

áreas ardidas na última década.

Posto isto, a pergunta que se deve portanto colocar

– depois de o último triénio ter causado uma afecta-

ção de «apenas» cerca de 120 mil hectares (menos

de um terço do que ardeu somente em 2003) – é se

os fogos florestais, a sua capacidade de destruição, é

coisa do passado ou apenas estamos a assistir a uma

fase de «hibernação». do ponto de vista jornalísti-

co, talvez fosse interessante fazer análises sobretudo

à evolução da gestão da floresta em vez de olhar

para os valores deste triénio e considerá-los extraor-

dinários. na verdade, os últimos três anos, malgrado

algumas melhorias nos meios operacionais de com-

bate, beneficiaram muito de condições meteoroló-

gicas favoráveis (ou não agrestes) e das catástrofes

da «década do fogo» (1996-2005, em que ardeu

cumulativamente 1,625 milhões de hectares), cujas

áreas não só estiveram imunes ao fogo como cria-

ram zonas-tampão que impedem agora destruições

de milhares de hectares.

45 no entanto, em termos de área florestal, os fogos da galiza consumiram cerca de 5% da área florestal daquela região espanhola, enquanto que os incêndios no mesmo ano no minho atingiram 5% da área florestal.

46 os incêndios nacionais apenas tiveram primeira página no diário de notícias nas edições de 29 e 30 de Julho e 24 de Agosto, neste último caso por causa de um incêndio de 200 hectares na zona de sintra. os incêndios no estrangeiro, por sua vez, foram primeira página nas edições de 1 de Agosto (canárias), 26 de Agosto (grécia, onde morreram cerca de meia centena de pessoas).

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| 162 |

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Page 85: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

PARTE IIIContribuições dos par ti Cipantes no Workshop

inCÊndios FLorestais5 anos apÓs 2003ComPIlAção ElAboRAdA PoR lIlIAnA bEnTo

Page 86: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 165 |

nota introdutÓria

Pretende-se nesta PARTE III do presente volume, reunir os contributos de todos os participantes convidados

a assistir ao Workshop “Incêndios Florestais – 5 anos após 2003”, realizado no dia 17 de outubro, nas insta-

lações da Escola Superior Agrária de Coimbra. os convites para participação no Workshop foram feitos com

o objectivo de tentar reunir um leque diversificado de individualidades de algum modo ligadas à dFCI em

Portugal. os textos que seguem são o resultado de uma ronda de intervenções por todos os participantes,

seguida de uma pequena discussão. o trabalho de transcrição das intervenções orais foi feito respeitando fiel-

mente tudo o que foi dito, excepto quando as frases padeciam de deficiências gramaticais que dificultassem

o entendimento do texto. Em muitos casos os intervenientes tiveram a oportunidade de corrigir o texto da

sua intervenção tendo-se utilizado a versão que nos foi enviada. Resolvemos incluir também nesta colectânea,

pelo seu interesse, um texto que nos foi enviado por uma das pessoas que assistiram ao Workshop e que

reflecte a visão de um operacional relativamente às questões abordadas.

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InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 167 |

intervenção: antÓnio CarvaLho – poLíCia JudiCiária

Tomando por assunto a temática dos «5 anos após 2003», a instituição que represento, teve que se reestru-

turar, na estratégia, no que diz respeito à investigação dos incêndios.

o que foi referido, pelo orador anterior [Pedro Almeida Vieira], de que a investigação dos incêndios tem

andado de certo modo em roda livre, não poderei concordar porque a polícia judiciária tem a competência

para a investigação deste tipo de crime já há alguns anos e, através de formação no exterior, foi a mola dina-

mizadora da formação dada ao Corpo nacional da Guarda Florestal (CnGF), no ano de experiência de 1989

e de forma sistemática desde 1990.

Isto levou a que cerca de 70% do CnGF, agora integrado nas equipas do Serviço de Protecção da natureza e

do Ambiente (SEPnA), tivesse formação na investigação das causas, segundo o modelo americano aplicado

à legislação e à estrutura nacional.

A pergunta que se pode colocar é se efectivamente o conhecimento desses dados, a nível de distritos e con-

celhos, teve aplicação prática para além do estritamente criminal? ou seja, se o conhecimento das causas teve

ou tem tido uma aplicação objectiva, na perspectiva da gestão da prevenção dirigida que deve ser feita. Isto

porque na questão de evitar a ocorrência de incêndios, existe uma grande confusão entre o que é prevenção

estrutural, a prevenção por campanha, que é meramente unidireccional e onde o receptor ouve ou não e,

prevenção dirigida e objectiva, operativa sobre os potenciais autores para evitar que os factos se verifiquem.

Em Portugal, e contrariamente ao que se pensa, fomos nós que em 1993 iniciámos a formação em Espanha,

sobre as técnicas da investigação das causas, em consequência de nessa altura, naquele país terem com-

preen dido que os incêndios não eram cíclicos e não aconteciam porque eram um mal necessário. Portugal

foi pioneiro nesta matéria e dinamizou na península ibérica uma metodologia de investigação. o “mundo”,

na área dos incêndios não começou em 2003, é consubstanciado em determinados conhecimentos que nos

permitiram evoluir para outros patamares.

A partir de 2003 a Polícia Judiciária dinamizou a investigação, em termos de estratégia da sua própria estrutura,

reforçámos os meios, elaborámos protocolos com a Autoridade Florestal nacional (AFn), fomentando a aplica-

ção do conhecimento das causas e interagimos com outras instituições e organizações, ao nível da formação.

Potenciámos também o conhecimento da determinação do perfil socio-psicológico do incendiário, o que em

termos policiais facilita o interrogatório e auxilia a investigação porque sabemos quem são os indivíduos com

potencialidade para delinquir daquela forma. Estando definido o perfil do indivíduo com capacidades para

provocar incêndios intencionalmente, esse conhecimento deveria ser adoptado para controlar e acompanhar

os mesmos, de forma a evitar que esses delinquíssem dessa forma.

Page 88: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

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intervenção: antÓnio saLgueiro – autoridade FLorestaL naCionaL

Algumas considerações sobre o que aqui foi dito. Uma delas é sobre o estudo que fez a liga para a Protecção

da natureza: antes de mais, o mérito é todo vosso por terem feito já em 2003 e agora terem voltado a fazer.

no entanto, uma coisa que não posso deixar de reparar é que a liga fez o estudo com um pendor negativo,

de tudo o que falta fazer.

não nos interessa só analisar aquilo que falta fazer, antes disso é importante analisar o que foi feito e o que

resultou. devemos dar o benefício ao que foi feito e que resultou, para que isso seja incrementado, pois esse é o

aspecto mais positivo de uma análise, e só depois fazer a avaliação do que correu mal e que deve ser alterado.

neste estudo vi muito pouca coisa sobre combate. Como o próprio estudo refere, o combate continua a

ter um peso bastante elevado na política e no financiamento das acções ligadas à defesa da floresta contra

incêndios. Se tem um peso tão grande, a avaliação também deve ser proporcional.

no que refere à lei e à dificuldade da sua aplicação, eu vejo várias razões pelas quais é difícil aplicar as leis em

Portugal. Uma delas é a frequência com que são feitas alterações à lei, incorrecções, novos regulamentos, ou

seja, é difícil para qualquer instituição acompanhar este ritmo; nota-se também que existe algum autismo da

parte dos legisladores, muitas leis são desadequadas à nossa realidade e logo muito difíceis de aplicar. no caso

do decreto-lei n.º 124/2006, um aspecto muito positivo que se realça da aplicação da lei, foi a diminuição do

número de ocorrências. Penso que existiu um aspecto muito positivo nos últimos dois anos, que foi o controlo

do número de ocorrências, ou seja, da aplicação do decreto-lei n.º 124/2006, que é a principal razão pela

qual temos tido tão poucas ocorrências nos últimos 2 anos.

Existe algo de assustador na associação entre a meteorologia e o número de ocorrências, porque se constata

que quanto mais elevado é o índice de risco de incêndios, maior é o número de ocorrências. Esta relação

não pode apenas ser explicada pela maior probabilidade de uma ignição dar origem a uma ocorrência nas

situações mais extremas, mas sobretudo pela evidência de uma forte intencionalidade no uso do fogo. não

digo intencionalidade no incêndio, porque muitas pessoas fazem fogo e não querem provocar incêndio mas

usam o fogo para diversos fins e alguns deles dão origem a um incêndio.

Fazemos sensibilização há muitos anos, e este é outro aspecto referido no estudo da liga, que é a sensibiliza-

ção do público em geral. Eu pessoalmente estou convencido que a sensibilização do público em geral é muito

bonita, é agradável mas tem muito poucos resultados. o problema dos incêndios é um problema rural, e é aí

que nós temos que focar as nossas actividades, para que tenham algum impacto no número de ocorrências.

A desadequação da lei tem a ver com o facto de Portugal ser um país de clima mediterrânico e porque duran-

te milhares de anos sempre se utilizou o fogo. durante muitos anos considerou-se que era preciso impedir o

no que respeita aos potenciais autores, a capacidade que estes têm para delinquir ou reincidir naquele tipo de

actuação e crime, maioritariamente com motivações fúteis, que os levam a colocar incêndios, resulta da sua

desinserção social. o conhecimento dos perfis dos incendiários deveria também ser utilizado na perspectiva

da prevenção dirigida a indivíduos em concreto que estão desinseridos do meio social.

Também inserimos numa base de dados a identificação desses incendiários, de forma a fazer-lhes um acom-

panhamento na época estival.

Em relação à aplicação do código penal, actualmente o que se verifica é que os incêndios que ocorram fora

das áreas onde esteja inserida floresta, mata, arvoredo ou seara não são puníveis pelo código penal. logo, a

transferência da penalização deste tipo de crimes poderá recair no decreto-lei n.º 124/2006, o que nos leva a

pensar se a reestruturação deste diploma não deveria ter outro alcance, de modo a compensar condutas que

não se encontrem previstas no código penal.

outra conclusão a tirar é o número mais reduzido que existe de autores identificados, porque a maior parte

das situações de ocorrências, com combustões descontroladas, incêndios ou fogachos, não cabem dentro do

código penal como incêndio florestal, nomeadamente os incêndios em matos, incultos e terrenos agrícolas.

Page 89: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

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intervenção: arménio dos santos Castanheira – instituto geográFiCo portuguÊs

Um dos aspectos referenciados hoje, a propósito da temática dos incêndios florestais, foi a questão dos pro-

prietários florestais. no decurso dos grandes incêndios de 2003 o Estado colocou a hipótese de exercer me-

didas coercivas sobre os proprietários que não limpassem os seus terrenos. A questão que se coloca é: como

será possível ao Estado identificar a quem pertencem as propriedades descuradas, de forma a actuar e impedir

assim que o risco de incêndio aumentado, em resultado da incúria, se propague a prédios (terrenos) vizinhos.

Fruto de um conjunto de sinergias com outros ministérios e secretarias de estado (Finanças, Justiça, obras

Públicas, Agricultura, Administração local e modernização Administrativa) surgiu um projecto, que está ago-

ra em curso e que se designa Sistema nacional de Exploração e Gestão de Informação Cadastral (SinErGIC)

que assegura, entre outros objectivos, a identificação dos proprietários florestais e da localização geográfica

dos seus terrenos.

no âmbito do SinErGIC, foi realizada uma experiência piloto na freguesia de Albergaria dos doze, no conce-

lho de Pombal. A escolha da freguesia obedeceu aos seguintes critérios: dimensão não superior a 2 500 ha;

existência de espaço urbano, rural e florestal; e que tenha sido alvo de incêndios florestais. Apesar de todo

o apoio do Presidente da Junta de Freguesia e do envolvimento dos agentes locais, no final do estudo não

foi possível cadastrar, por não terem sido encontrados os respectivos proprietários ou pura e simplesmente

porque estes não existem, cerca de 50% da área geográfica da freguesia. Apesar de tudo é muito importante

para o Estado saber quais são efectivamente as áreas sem titular e, em particular, onde estas se encontram.

Só assim é possível tomar medidas pró-activas e consistentes de planeamento, gestão e ordenamento do

território. Sem a existência de cadastro predial é impossível saber onde estão os “terrenos de ninguém” e

portanto definir políticas que assegurem uma intervenção efectiva do Estado. Presume-se, é um valor que há

muito circula, que cerca de 20% do território possa não ter dono, mas tão importante como a área envolvida

é saber com exactidão onde é que esta se encontra. o projecto SinErGIC permitirá dar resposta a questões

que hoje são insolúveis e que dificultam em muito as actividades aos diferentes agentes que intervêm sobre

o território.

A execução do cadastro, sobre o ponto de vista técnico, não apresenta qualquer dificuldade, no entanto

como a componente financeira é muito elevada o investimento tem de ser muito bem ponderado e acautela-

do. não se pode correr o risco, num projecto com esta dimensão financeira e com uma transversalidade tão

abrangente, de se transformar algo que se pretende que seja um investimento, numa mera despesa pública.

Foi assim que surgiu a necessidade de executar, por elementos externos e isentos, uma análise custo-benefício

que, além de avaliar a componente de despesa e de retorno, analisasse também um conjunto de circuns-

tâncias que, a não serem acauteladas, poderiam dar pouca eficiência ao processo. A análise monetarista

consciencializou-nos que por cada unidade convenientemente investida retornariam potencialmente para o

Estado cerca de 3,8 unidades. na análise efectuada não foi ponderada qualquer alteração quantitativa dos

uso do fogo e o Estado, quando tornou a lei mais flexível permitindo o seu uso fora do período crítico, criou

barreiras, que são os licenciamentos na forma como estão a ser praticados nalguns municípios. os principais

utilizadores de fogo, no nosso território, são os pastores e pedir a um pastor que se desloque a uma Câmara

municipal, que pague uma taxa para ter um papel que lhe permite fazer uma queimada é algo muito compli-

cado. E por isso é que digo que devemos pensar melhor na adequação da lei.

outro aspecto é o decréscimo da população rural e se temos tão pouca população rural, temos que pensar

o que podemos fazer para a manter e para que esta possa ser uma aliada na luta contra os incêndios. Uma

das coisas que temos de saber é porque usam tanto o fogo, quais são os objectivos e como é que podemos

colocá-los a utilizar melhor o fogo.

Existe uma expressão que se usa muito agora e que faz parte da sensibilização do grande público que é

«Portugal sem fogos» o que implica irremediavelmente “Portugal com mais incêndios”, e por isso temos que

repensar esta filosofia. outro aspecto em que devemos evoluir é o passar de “apagar incêndios em qualquer

circunstância dentro do período crítico”, para “apagar incêndios e gerir fogos”. Isto só pode ser feito por

gestores do território. o trabalho da liga recomenda que seja dada formação sobre o uso do fogo de su-

pressão ao pessoal dos corpos de bombeiros, mas temos que ter em atenção que o seu uso pode ser positivo

mas também extremamente negativo. o fogo não é uma ferramenta só por si, não é um utilitário, não é

um isqueiro, é uma técnica. A água não é expansível, quando se põe água com uma agulheta ela acaba no

local em que é aplicada. o fogo replica-se. Quanto mais fogo, maior intensidade, logo maior probabilidade

temos de ter fogo. o fogo deve ser uma técnica entregue a gestores do território que sabem quais são as

implicações quando estão a usar fogo. É preciso algum cuidado nesta vulgarização do uso do fogo. o fogo

deve ser uma ferramenta técnica que está nas mãos de algumas pessoas e não nas mãos de todas as pessoas

que combatem incêndios florestais.

Existia a vontade de se criar um plano nacional de fogo controlado. Porquê GEFoCo e não Plano nacional de

Fogo Controlado? Um plano é algo impositivo e o GEFoCo foi pensado de uma forma diferente. Foi pensado

de forma a ir ao encontro de uma vontade cada vez maior de diversas entidades em gerir com fogo controla-

do. Assim criou-se um instrumento que fosse de encontro a essa necessidade, em que cada interveniente tem

a sua contribuição, mas em que a iniciativa de base parte das entidades que solicitam o apoio do GEFoCo.

Criar equipas que possam apoiar essas pessoas na execução desses fogos controlados é o objectivo principal

do GEFoCo.

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| 172 | InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 173 |

intervenção: CarLos maChado – siLviConsuLtores

no âmbito desta temática pensamos que a máxima a ter em conta é que «os incêndio florestais não se

combatem, evitam-se».

os incêndios florestais em Portugal são uma consequência da ausência de gestão dos espaços florestais. Se quere-

mos resolver o problema dos incêndios florestais temos de resolver as causas que levam a esta ausência de gestão.

na nossa perspectiva, após 2003 não existiram modificações significativas para a solução do problema es-

trutural, tendo-se melhorado efectivamente no tratamento das consequências. no entanto, é preciso ter em

atenção que os bons resultados, ao nível da área ardida, são justificados em grande parte pela meteorologia.

É óbvio que mesmo com uma gestão florestal activa, os incêndios florestais vão continuar a existir, são um

factor intrínseco à floresta mediterrânea, mas vão ter um comportamento totalmente diferente e a forma de

equacionar essa realidade será completamente diferente.

Temos assim de colocar a questão – Como conseguir que haja Gestão florestal quando 95% dos espaços

florestais são de privados? A solução passa por criar as condições para que a actividade florestal possa gerar o

valor necessário à sua sustentabilidade. Para que isto possa acontecer é necessário criar Unidades de Gestão

Florestal viáveis, não precisam de ser de milhares de hectares, mas têm de ter um mínimo dimensão para per-

mitir uma gestão eficiente. o que implica resolver a pulverização da propriedade existente no minifúndio.

Para que tal aconteça é necessário conhecer a realidade existente, para isso é fundamental a concretização do

Cadastro Geométrico em todo o país. Sem conhecermos onde e quem são os proprietários não será possível

resolver de vez o problema. Este conhecimento é fundamental para uma gestão efectiva do território, nomea-

damente em termos de gestão florestal.

Em segundo lugar, tem de haver políticas que promovam um maior dinamismo do mercado de solos flores-

tais. não é aceitável que grande parte do território se encontre ao abandono por parte dos seus donos sem

que daí exista qualquer consequência. É necessário colocar sob gestão todos os espaços florestais. Tal pode

ser conseguido através de uma penalização efectiva e significativa deste comportamento em termos fiscais.

no entanto, para esta medida ser efectiva é fundamental que o cadastro exista.

Por outro lado, sabendo-se já que grande parte do território está verdadeiramente sem dono, é fundamental

que se criem os mecanismos para que estes solos tenham gestão efectiva. Uma possibilidade é a sua passa-

gem temporária para um banco de terras, sendo posteriormente vendidos ou concessionados a entidades

capazes de promover à sua gestão. desta forma, além de permitir a constituição de áreas passíveis de gestão,

permitia-se também manter um efeito regulador sobre o valor da terra, evitando-se a especulação.

impostos. Contudo, e apesar de alguns benefícios não terem sido quantificados, por falta de tempo ou de

informação, foi possível, como já referi, determinar um rácio de custo-benefício de 1 para 3,8.

Actualmente está em curso um estudo sobre o modelo de negócio. Perspectiva-se, neste âmbito, um co-

-fi nanciamento do Quadro de Referência Estratégico nacional (QREn) complementado por outra fonte de

financiamento. Se não houver nenhum imponderável, tudo aponta para que seja lançado o primeiro concurso

público para a execução de cadastro predial no início do próximo ano. As áreas de floresta a cadastrar priori-

tariamente serão definidas pelo ministério da Agricultura e genericamente envolverão espaços florestais que

disponham de ZIF constituídas ou em vias de constituição.

no âmbito das nossas competências e em colaboração com a Autoridade nacional de Protecção Civil (AnPC)

e na altura com a ex-direcção-Geral dos Recursos Florestais (dGRF), actual AFn, desenvolveram-se alguns tra-

balhos de colaboração que permitiram criar a base para alguns instrumentos relevantes para a temática dos

incêndios florestais. Em resultado desses trabalhos foi produzida uma Carta de Risco de Incêndio Florestal (CRIF)

e estabelecida também uma legenda para uma nova Carta de ocupação do Solo com uma unidade mínima de

1 ha. A CRIF tem cobertura integral do continente e dispõe de uma resolução de pixel de 25 metros. o seu ob-

jectivo foi o de assegurar mais um instrumento de planeamento que, no período de Inverno, facilite aos agentes

locais uma intervenção activa e geograficamente dirigida para os locais que nesta Carta apresentam um maior

grau de susceptibilidade ao incêndio. É para as regiões assinaladas na Carta a vermelho e laranja que devemos

dirigir prioritariamente a nossa atenção, actuando nesses locais de forma a reduzir-lhes a capacidade de alimen-

tar uma qualquer ignição que se verifique. Esta carta tem por base variáveis ditas estruturais como a ocupação

do solo, a rede hidrográfica e a orografia, a exposição das vertentes, a rede viária e ferroviária e a demografia.

o outro instrumento acordado com os parceiros, uma nova Carta de ocupação dos Solos com unidade mí-

nima de 1 ha, está neste momento a ser executado por um conjunto de empresas a quem foi adjudicado o

trabalho. Se tudo correr como o previsto este instrumento estará concluído no final de 2009.

outro projecto do Instituto Geográfico Português e que também é relevante para a temática dos incêndios

florestais é o da cobertura ortofotocartográfica do território continental de 2 em 2 anos com pixel de 50

cm. Esta resolução de imagem é compatível tecnicamente com uma escala 1:5000. Este projecto prevê que

os voos sejam realizados nos anos ímpares, demorando a ortorrectificação cerca de meio ano, findo o qual

estará a cobertura cartográfica respectiva disponível para a comunidade. neste momento está acessível, sob

licenciamento, a cartografia correspondente ao voo de 2007. A versão anterior, de 2005, está online em

diferentes plataformas e por diferentes formas. no IGP poderá ser acedida a partir do serviço WmS (Web

map Service- serviço standard aberto) ou dos visualizadores do IGP. Em termos de visualização também está

disponível, entre outros, no Google Earth (da Google) e no Virtual Earth (da microsoft).

Page 91: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

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intervenção: CLara Feitas – instituto de meteoroLogia

os anos de 2003 e 2005 foram anos extremamente quentes. no ano de 2004 registaram-se temperaturas

bastante elevadas, apesar de inferiores comparativamente a 2003 e 2005. Em 2006 verificaram-se duas

ondas de calor. Uma delas ocorreu no mês de Julho e foi a mais significativa desde 1941, quer em termos

geográficos, quer em termos temporais. Em termos geográficos, porque atingiu praticamente todo o País, e

temporal, porque existiram algumas regiões, como por exemplo o Alentejo, que estiveram 11 dias sucessivos

em onda de calor.

os anos de 2007 e 2008 foram considerados em termos climatológicos como anos normais, com tempera-

turas um pouco abaixo do que é considerado valor normal. no entanto, é importante realçar que neste ano

de 2008, o risco de incêndio foi bastante elevado nas regiões do Interior, norte e Centro. Como oficial de

ligação na Autoridade nacional de Protecção Civil (AnPC) desde 2005, tenho notado que toda a estrutura de

protecção civil, está muito mais coesa e funciona muito melhor.

Por fim, é importante criar veículos de investimento flexíveis e adaptados à realidade sócio-económica do

país. Se tivermos presente que a matriz empresarial do país assenta essencialmente em PmE’s, facilmente se

compreende que, para além dos já existentes Fundos de Investimento Imobiliário Florestal, é fundamental

que exista a possibilidade de desenvolver modelos de negócio mais simples e menos exigentes em termos

de capital e, desta forma, permitir a disseminação das iniciativas empresariais de forma generalizada a todo

o país. Uma possibilidade é a de contratos de parceria, possibilitando desta forma a partilha de riscos entre

proprietário e investidor.

Este modelo além de ser extremamente flexível tem as seguintes vantagens:

a) Promove um alinhamento estratégico entre o proprietário e o investidor, já que a receita de ambos depen-

de do sucesso obtido;

b) Potencia o aumento da remuneração do proprietário dado que ao assumir o risco, será expectável que este

venha a ser remunerado;

c) Permite a diminuição do risco associado ao investimento, dado que o proprietário assume também parte

desse risco;

d) Que por sua vez diminui a necessidade de capital e, por esse motivo, permite a entrada no negócio de mais

players, aumentando assim a concorrência no sector o que se traduz em competitividade e inovação no

mercado de arrendamento de terras florestais.

Inexplicavelmente esta modalidade é liminarmente proibida por lei.

Acreditamos que estas medidas, a par de uma visão mais empenhada na gestão comum, assente nas Zonas

de Intervenção florestal, poderão ser um contributo decisivo para a mudança da realidade da gestão da flores-

tal em Portugal e desta forma levar a uma mudança da realidade dos incêndios florestais em Portugal.

Page 92: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 176 | InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 177 |

intervenção: domingos pataCho – QuerCus

na minha opinião, começaram-se a sentir mudanças importantes e significativas, a partir de 2006. Essas

mudanças tiveram a ver essencialmente com a estratégia de combate, principalmente ao nível da primeira

intervenção, em que se começou a verificar uma maior rapidez na actuação, um aumento e uma melhoria da

actuação dos meios aéreos, o que ajudou a minimizar a área ardida.

o problema que continua a persistir é o elevado número de ignições, independentemente das questões estru-

turais e da gestão florestal. Verifica-se um uso do fogo negligente, logo é preciso apostar numa campanha de

sensibilização mais eficaz para que se reduza o uso do fogo na floresta durante o período crítico.

As pessoas não têm noção que a sua fogueira ou a sua queimada pode originar um incêndio. É preciso me-

lhorar a transmissão da mensagem à sociedade para que as pessoas possam mudar os seus comportamentos.

Esta sensibilização não deve ser coerciva mas sim apelativa.

intervenção: giL martins – autoridade naCionaL de proteCção CiviL

A tónica na questão dos incêndios florestais é sempre o combate mas deveria ser a prevenção estrutural. o

ano de referência não é o de 2003 mas o de 2005. Se 2005 não tivesse tido uma área ardida tão grande,

pensar-se-ia que a situação estaria resolvida e não teria acontecido nada. Aconteceu o que aconteceu em

2005 e felizmente a equipa do ministério da Administração Interna da altura, quis alterar a situação.

os resultados de 2007 e 2008 mostram que existiu uma evolução positiva em termos de combate, com a

criação de um sistema coerente, a definição de uma estratégia e a consolidação de uma doutrina. no entanto

não significa que o problema esteja resolvido porque esta batalha nunca está ganha. Este é um problema que

é de todos, é da sociedade portuguesa e de todas as instituições.

Um aspecto importante e positivo que se destaca essencialmente após 2005 foi o acompanhamento da

Assembleia da República a estas questões, promovendo uma nova sensibilidade política para este problema,

levando a uma rápida evolução e incremento de várias melhorias.

As nossas preocupações para o futuro estão obviamente relacionadas com as questões das alterações cli-

máticas, com a pouca área ardida ocorrida nestes dois últimos anos e com a necessidade de programas de

gestão de combustíveis a curto prazo. Também a diminuição do número de ocorrências em Portugal - este

ano e à data de 15 de outubro são cerca de 11.800 ocorrências, valor muito inferior comparativamente a

outros anos – é factor crítico de sucesso, sendo para isso necessário apostar fortemente na sensibilização, na

fiscalização e na vigilância.

o dispositivo especial integrado de combate a incêndios florestais está preparado para os desafios futuros

mas nunca estará preparado para fazer milagres.

Page 93: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 178 | InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 179 |

intervenção: tenente-CoroneL João pauLo seguro – guarda naCionaL repubLiCana

no âmbito da temática proposta, “Incêndios Florestais - 5 anos após 2003”, a Guarda nacional Republicana

(GnR) não pode fazer o histórico da sua intervenção a partir dessa data porque só integra o dispositivo dFCI

desde 2006. no período antecedente, a Guarda apenas participava no âmbito da sua missão como órgão de

protecção civil.

Com a introdução da nova legislação, nomeadamente o decreto-lei nº 22/2006, que consagra no âmbito da

GnR, o Serviço de Protecção da natureza e do Ambiente (SEPnA) e cria o Grupo de Intervenção de Protecção

e Socorro (GIPS), a Guarda assume em pleno esta nova faceta da sua missão e, desde aí e até à data, tem sido

considerada e reconhecida como uma mais-valia decisiva na defesa da floresta contra os incêndios, pelo rigor,

pela disciplina, e pelo profissionalismo que caracteriza a sua actuação.

outra componente de actuação da GnR na área dos incêndios florestais, materializa-se na responsabilidade

pela coordenação das acções de vigilância, detecção e fiscalização no âmbito do Sistema nacional de defesa

da Floresta Contra Incêndios, onde se integra a Rede nacional de Postos de Vigia.

Este importante elemento do sistema tem já algumas décadas de funcionamento e a sua implantação está

desajustada das necessidades actuais, pelo que é urgente a sua reestruturação e a definição do modelo que

se pretenda adoptar no futuro. o actual está esgotado, tornando-se necessário proceder a alterações na sua

implantação territorial, definir os postos que devem ser suprimidos, os que devem ser alterados em termos

de localização, e explorar as possibilidades que a tecnologia disponibiliza nesta área da detecção e vigilância,

ultrapassando a exclusiva dependência do elemento humano como único veículo de observação e transmis-

são de informação.

o problema central dos incêndios florestais continua a ser o elevado número de ignições, apesar deste ter

vindo a diminuir nos últimos anos, circunstância a que não será alheio o grande empenho da Guarda em

acções de prevenção e de fiscalização que diariamente leva a efeito em todo o território nacional – em 2007

contabilizaram-se 5.385 autuações por contra-ordenação no âmbito do decreto-lei nº 124/2006.

no entanto, o efeito dissuasor da fiscalização não deve ser menosprezado, e certamente diluir-se-á no tempo

se não lhe corresponder um acto decisório que, devendo ser sensato, deve também ser firme e consequente na

aplicação das penalizações previstas na lei, por parte da entidade administrativa com competência para o efeito.

Importa ainda referir a evolução das investigações das causas dos incêndios florestais nos últimos anos,

registando-se também um forte aumento desde que as mesmas ficaram sob a responsabilidade do SEPnA,

acentuando-se esse aumento de forma muito significativa no ano 2007, em que foram investigadas 53,44%

das ocorrências registadas, comparativamente com o ano de 2003 em que esse valor foi de 18,40%.

intervenção: henriQue pereira dos santos – instituto da Conservação da natureza

e da biodiversidade

Relativamente à temática dos incêndios florestais, julgo importante referir que 95% do país não ardeu em

2003, ou se se preferir, 90% das áreas de matas e matos não arderam em 2003. o que significa que estas

áreas estiveram a acumular combustível. Esta situação já acontece há muitos anos, desde a emigração em

massa, quando começou a deixar de existir gado no monte.

os incêndios florestais não são um problema de gestão florestal mas sim são um problema de gestão do terri-

tório e de gestão da paisagem. É preciso não esquecer que os produtores florestais e os produtores agrícolas,

como qualquer um de nós, são pessoas racionais do ponto de vista económico. A razão pela qual as pessoas

não fazem gestão é porque o rendimento retirado é inferior ao investimento que têm que fazer. Se não se

resolver o problema da produtividade e da competitividade, que se verifica em mais de 50% do território do

país que não é competitivo, o problema da acumulação do combustível não será resolvido.

na minha opinião, de 2003 a 2008, a única medida verdadeiramente relevante que foi aprovada, porque é

a que diz respeito à competitividade das explorações e poderia influenciar a acumulação de combustível, é o

Programa de desenvolvimento Rural. não considero como relevante o Fundo Florestal Permanente enquanto

uma das regras da sua gestão não seja um tecto de 5 a 10% do total do fundo como máximo de financia-

mento ao Estado.

Sendo o PRodER a única medida verdadeiramente relevante, é dramático que do ponto de vista da gestão

dos incêndios florestais seja um desastre.

Page 94: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 180 | InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 181 |

intervenção: nuno CaLado – unaC – união da FLoresta mediterrâniCa

desde 2003, destaca-se principalmente a eficácia e a melhoria da actuação da Autoridade Florestal nacional

(AFn) no que concerne à defesa da Floresta Contra Incêndios (dFCI). É óbvio que a AFn deveria ter assumido

um papel de liderança nas suas outras áreas de intervenção mas deve-se realçar a sua forte intervenção em

termos de dFCI, com uma maior concentração de meios humanos e financeiros e com uma maior produção

ao nível do planeamento, da organização e da informação. no entanto, e sendo importante este trabalho e

estando por fazer, não se fez praticamente nada sobre a gestão do território.

E face ao problema da gestão do território, da gestão da paisagem, verifica-se a questão da rentabilidade.

neste contexto, ou se encara a actividade florestal como uma actividade económica, com os seus direitos e

deveres ou não. Se for encarada como uma actividade económica é preciso criar condições para que esta pos-

sa funcionar como uma tal. Actualmente não se pode esperar que as pessoas investam por iniciativa própria,

com expectativas de retorno a 40 ou 50 anos. É preciso criar condições e mecanismos fiscais e financeiros

para que essa actividade económica possa ser rentável, alguns dos quais estão previstos em diversos planos

e programas para o sector florestal, e que visam dar mais equidade ao tratamento fiscal a que a actividade

florestal está sujeita.

A nova abordagem das zonas de intervenção florestal (ZIF) como veículo de investimento agrupado não

funciona verdadeiramente como tal. Por exemplo, existe uma associação da Chamusca, a ACHAR, que na

sequência dos incêndios de 2003 fez um projecto agrupado para recuperação de áreas ardidas no que diz

respeito a incêndios florestais, pragas e doenças. Funcionou como um veículo para um investimento agru-

pado, no entanto, como não é proprietária das terras onde foram feitos os investimentos, a Administração

Fiscal não lhe reconhece o direito à devolução do IVA, que lhe é legítimo porque esta associação suportou

todos os custos. Esta situação traz prejuízos significativos para a Associação, penalizando-a, da mesma forma

que vai penalizar as futuras ZIF. Por isso, é preciso ter em consideração algumas questões relacionadas com

a gestão e funcionamento das ZIF, como as diferenças entre o que a entidade gestora da ZIF vai pagar face

ao que vai suportar em termos de IVA, o IRC, a responsabilidade legal, etc. São questões que têm que ser

analisadas e enquadradas para que seja possível criarem-se condições atractivas para motivar as pessoas para

o investimento florestal.

É necessário pensar nos problemas do território que precisam de ser resolvidos, é preciso criar formas eficazes

de investimento, de modo a viabilizar a gestão. É preciso pensar nos diferentes tipos de produtores florestais

que existem, com diferentes necessidades e que requerem soluções diferentes.

Para terminar quero apenas expressar a especial atenção e o grande empenho com que a GnR abraçou

esta nova vertente da sua missão, sendo que o SEPnA tem como um dos seus objectivos prioritários para os

próximos anos o reforço da acção em matéria de prevenção, vigilância, detecção e investigação de incêndios

florestais, contribuindo assim para o desígnio nacional de reduzir de forma consolidada os efeitos negativos

dos fogos florestais.

Page 95: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 182 | InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 183 |

Isto significa que no concelho de loures existem por exemplo 700 bombeiros e no concelho da Pampilhosa

da Serra existem 40. A sua actual distribuição no território é inversamente proporcional aos locais onde

realmente são precisos. A solução passa pela criação da categoria do bombeiro territorial, ou seja, por cada

5000 ha (por ex.) de território perigoso deve existir um ou dois profissionais permanentes, pagos pelo Estado

central, integrados nos corpos de bombeiros locais que tenham como função a responsabilidade de conhecer

como ninguém essa parcela do território e assim possam aí desempenhar múltiplas funções: desde assessorar

decisores, a coordenar os outros bombeiros e a integrar sinergicamente os esforços de outros intervenientes,

ao nível do combate mas também da prevenção e planeamento.

intervenção: pedro Cortes – geoterra, Lda

A grande falta de diálogo entre as várias instituições, organizações e pessoas ligadas à floresta é a minha

principal crítica ou constatação depois de 2003. Antes de 2003 existiam muitos estudos, pesquisas e traba-

lhos que poderiam ser uma mais-valia mas que não foram tomados em consideração por falta desta troca

de ideias. Este diálogo é importante porque só assim se pode caminhar num único sentido: concretamente

o diálogo necessário para se avançar nesta realidade tão importante e complexa, num sistema tipo “puzzle”

cada um encaixando a sua peça, sacrificando quantas vezes for preciso a procura da detenção duma verdade

absoluta/óptimo, em prol do verdadeiro avanço mesmo com base em múltiplas pequenas conquistas e apro-

veitando sempre todo o esforço possível e suficiente.

no que diz respeito à defesa da Floresta Contra Incêndios, existe uma má informação territorial. Todo o

planeamento que é feito a partir dessa informação não é correcto, logo não permite fazer uma alocação

eficiente dos recursos. Esta alocação de recursos ao território não pode estar dependente duma informação

desactualizada porque assim não funciona. A realidade a tratar é cada vez mais desconhecida e complexa,

envolta num carácter de urgência e mesmo catástrofe no que toca à questão de incêndios e, por outro lado,

nunca existiram tantas ferramentas que facilitam a sua análise: nos dias de hoje não há assim qualquer jus-

tificação para se pouparem esforços em trazer a realidade do campo para os gabinetes onde se analisam,

decidem e planeiam todas as questões de ordenamento e desenvolvimento rural tanto a nível local como a

nível central. os territórios com melhor informação, que podem fomentar melhor os investimentos, deveriam

ser os mais apoiados, por uma questão de justiça, pedagogia e eficiência dos recursos. deveria existir uma

base de informação territorial comum aos vários instrumentos de planeamento e, portanto, com grande

detalhe e sempre actualizada.

É preciso ter em atenção que o território pós-2003 está muito mais perigoso. Por um lado, a carga combus-

tível já recuperou, com a agravante de apresentar uma estrutura espacial caótica, com lenhas, paus e árvores

caídas e de se tratarem de massas horizontalmente mais homogéneas. Por outro lado, existem mais terrenos

agrícolas abandonados, e a malha social está ainda mais fragilizada, com menos capacidade e vontade de

intervir. A solução passa pela criação de projectos integrados à escala municipal que integrem as actividades

florestais e agrícolas, segundo uma boa base territorial – tirando partido das autarquias que são instituições

já existentes, sem acréscimo de estruturas e que coordenam muitas funções que complementam a defesa

contra incêndios, e com proximidade e conhecimento local.

no que diz respeito ao actual sistema de combate a incêndios florestais baseado em bombeiros voluntá -

rios, é preciso repensar este sistema. Actualmente os bombeiros voluntários são pessoas cada vez mais

urbanas, com escassas ligações ao espaço rural, e a categoria de voluntariado não permite um empenha-

mento de tempo suficiente no conhecimento do território. outra questão é a sua proporcionalidade à

densidade populacional.

Page 96: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 184 | InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 185 |

mas é necessário continuar a melhorar. Para isso, é necessário investir em prevenção e não continuar com a

aposta recorrente no combate. É preciso valorizar a prevenção em detrimento do combate, porque o investi-

mento na prevenção tem retorno. E por prevenção, significa reduzir o número de ignições, reduzir a magni-

tude dos incêndios, através da educação das pessoas, do controlo dos comportamentos e do tratamento dos

combustíveis para que não hajam danos significativos.

01. A floresta é uma propriedade política e a sociedade terá que começar valorizar adequadamente o sector.

Em termos de políticas públicas é necessário integrar as políticas no ordenamento agrícola, fiscal, legal e

naturalmente proceder ao cadastro.

02. devem-se operacionalizar os dinheiros da prevenção de forma eficiente e os estímulos têm que ser orien-

tados na silvicultura preventiva com uma dedução fiscal das suas despesas, os municípios devem receber

os apoios não em prol da área ardida mas sim da área não ardida, ou seja, pela positiva.

03. Continuar a aposta na fiscalização e na aplicação da lei das queimas e queimadas.

04. o sistema de detecção de incêndios florestais tem que funcionar de forma mais exacta, muitas vezes

existe a dificuldade de detectar o ponto exacto do incêndio porque a detecção não funciona 24 horas e

tem debilidades em indicar as coordenadas exactas do incêndio.

05. As competências florestais de base dos recursos humanos envolvidos em todo o sistema têm de melhorar.

06. É preciso comandar e controlar o programa nacional de sapadores florestais que conta com mais de 1.200

homens e 250 viaturas que carecem de organização e gestão.

07. Por fim, gostaríamos que houvesse uma avaliação internacional aos recursos e ao sistema dFCI, uma

avaliação externa e independente.

numa perspectiva integrada e balanceada das medidas de política de defesa da floresta contra incêndios é

necessário minimizar a soma dos custos de prevenção, combate, seguros e perdas e simultaneamente ma-

ximizar o valor da floresta para o proprietário. Para isso é necessário efectuar outras iniciativas no domínio

político, como por exemplo, medidas que promovam a viabilização do sector, nomeadamente na esfera no

domínio fiscal e financeiro, que potenciem o negócio da terra e da floresta, a estabilização dos usos do solo

e uma integração da economia paralela na economia real.

intervenção: tiago oLiveira – grupo portuCeL/soporCeL

Atendendo a que desenvolvi funções na esfera pública entre 2003 e 2006, gostaria de realizar uma declara-

ção de interesses prévia antes de efectuar os comentários que me trouxeram aqui. Tendo sido coordenador

executivo da equipa que realizou a Proposta Técnica do Plano nacional de defesa da Floresta Contra Incên-

dios, 3 anos volvidos após a sua entrega a proposta organizativa efectuada (então considerada como atrevida)

continua actual e, com o tempo, está a tornar-se consensual e adequada à realidade. A proposta tinha por

base «defender a floresta não pode ser confundível, sempre, com o combater incêndios florestais». É preciso

separar estas duas componentes, uma vez que muitas vezes quando se combate um incêndio não se está

sempre, ou necessariamente, a defender a floresta.

Entrando agora nos comentários que me trouxeram aqui e sobre o documento desenvolvido pela lPn, consi-

dero que este está demasiado focado em medidas desenvolvidas desde 2003 e com base em reportes pouco

quantificados, pese sabermos que existem problemas de acesso e disponibilização de informação. Poder-se-

-ia ter aproveitado os trabalhos já feitos (outros diagnósticos) e acrescentar os dados mais recentes, o que

significaria que o relatório apresentado dedicaria mais tempo a fazer análise e menos reporte, centrando a

discussão na política pública de defesa da Floresta Contra Incêndios (dFCI).

Sobre como o grupo Portucel/Soporcel vê a evolução desde 2003, e uma vez que não existe uma avaliação ao

sistema, aproveito a apresentação feita à Comissão Parlamentar e ao CnoS (dia 15/10/08). Assim, observan-

do os resultados observados desde 2003, provisoriamente, destacamos os seguintes aspectos positivos:

01. A existência do PndFCI que permitiu uma abordagem comum a todas as instituições, assegurando que

todas seguem na mesma direcção e para um mesmo objectivo. o facto de existir um PndFCI com metas

e com objectivos mensuráveis é muito importante, uma vez que reúne todas as instituições no mesmo

objectivo que pode ser revisto e, consequentemente, ajustadas as medidas.

02. outro aspecto positivo foi a alteração da estratégia de combate a incêndios florestais, com a importação

para o sistema nacional de dFCI da técnica do golpe único e do ataque massivo.

03. observa-se ainda que existem meios (equipamento, estradas e pontos de água), bem como se destaca a

disponibilização pública da informação dos tempos de chegada aos incêndios e a crescente transparência.

04. destaca-se também o facto do conhecimento florestal começar a ser incorporado na decisão, como uma

mais-valia para o Teatro de operações, ao nível do conhecimento dos caminhos, dos terrenos e das opor-

tunidades, nomeadamente também através dos GAUF.

05. outro aspecto a realçar foi também uma melhor gestão e controlo dos meios aéreos.

06. A existência de uma filosofia de comando único na AnPC com incorporação das valências florestais e a

legislação adequada, permite uma especialização no tema da defesa da floresta e a separação da defesa

da vida e dos bens.

Page 97: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 187 |

disCussão FinaL do Workshop “inCÊndios FLorestais – 5 anos

apÓs 2003”

amériCo mendes CoLoCa Questão a arménio Castanheira:

pergunta de américo mendes – “Gostaria de colocar duas perguntas ao responsável do Instituto

Geográfico Português, dr. Arménio Castanheira. A primeira questão que coloco relaciona-se com o facto

de que as zonas que necessitam desesperadamente de cadastro são as zonas de intervenção florestal (ZIF)

e neste âmbito gostaria de saber se na elaboração do cadastro, estas zonas são consideradas prioritárias? A

segunda questão que gostaria de ver respondida é se na realização dos trabalhos de cadastro é possível ou

útil a participação das associações de proprietários florestais?”

resposta de arménio Castanheira – “Relativamente às zonas de intervenção florestal é preciso referir

que as prioridades não são definidas pelo Instituto Geográfico Português. A nossa função é de coordenação

e supervisão deste trabalho de cadastro. É o ministério da Agricultura, do desenvolvimento Rural e das Pescas

que vai definir as zonas de intervenção florestal que são prioritárias. Quando for feita a realização do trabalho

de produção cadastral não se vai fazer só a área circundante à ZIF mas sim vai ser feito o concelho na sua

totalidade. na própria Resolução de Conselho de ministros nº 45/2006, que aprovou a criação do SinErGIC,

está previsto que a prioridade em termos de produção cadastral são as áreas onde predomina a floresta e

depois, dentro destas, as zonas onde existem ZIF’s constituídas ou em vias de constituição.

Relativamente às associações de proprietários florestais faz todo o sentido que, no âmbito da execução

cadastral, participem neste trabalho todos aqueles que facilitem e ajudem a encontrar os proprietários e os

terrenos. Um processo de produção cadastral é mais fiável e mais consistente se as populações se envolverem

neste processo. Todos vamos ser poucos para atingir os resultados desejados. o que está previsto é que, mes-

mo que não sejamos nós a produzir o cadastro, as orientações que vamos dar às empresas que irão executá-

-lo é que contactem as associações florestais e as outras forças vivas das áreas alvo de cadastro, de modo a

incorporar todo esse conhecimento no trabalho a desenvolver.

os custos elevados do cadastro prendem-se com o facto deste ter que ser feito na presença do proprietário e

dos confinantes. no âmbito do cadastro estamos a lidar com direitos das pessoas, direitos tutelados pela lei e

pelo Código Civil, que são direitos reais ou de posse e nós não podemos espoliar esses direitos.”

Page 98: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

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migueL gaLante CoLoCa Questão a José migueL Cardoso pereira:

pergunta de miguel galante – “Se colocarmos a estratégia nacional de defesa da Floresta Contra os

Incêndios Florestais numa lógica de um filme, o PnFdCI, é o guião e os actores principais são os responsáveis

pelas diferentes componentes desta estratégia, ou seja, são os responsáveis pela prevenção estrutural, pela

prevenção operacional e pelo combate, a AFn, a GnR e a AnPC respectivamente. o produtor é o Fundo

Florestal Permanente, uma vez que assegura o financiamento. Contudo, julgo que nesta matéria, o Fundo

Florestal Permanente deveria ter um papel mais activo para uma melhor concretização das medidas.

Após 2003, e sobretudo após 2005, verificou-se a operacionalização de um conjunto vasto de medidas. Con-

tudo falta medir o impacto dessas medidas. Por exemplo, o impacto da redução da taxa do IVA para os

trabalhos de silvicultura preventiva. É uma medida positiva mas não se sabe o seu real impacto. Também é

necessário medir-se o real impacto da redução dos custos para a regularização do cadastro florestal. Em relação

à utilização do fogo controlado também é preciso saber o seu real impacto nas zonas criticas do nosso território

A sensibilização é o caso mais grave, porque não se medem os impactos reais da sensibilização dirigida junto

dos diferentes públicos-alvo.

numa entrevista do Prof. José miguel Cardoso Pereira, ao jornal Público em 2006, perguntava-se «Passaram

três anos depois de 2003. Já se começaram a sentir mudanças na floresta?» e a sua resposta foi «onde se

pode mudar rapidamente é na percepção do público, e noto que existe uma mudança substancial.» E de

facto o público mudou. Este facto é comprovado por um estudo de opinião, encomendado pela AFn que

envolveu 1.500 portugueses inquiridos, no meio rural e urbano e cuja resposta a esta mesma pergunta foi

que «o País realmente mudou após 2003 e 60% consideraram que mudou para melhor.» Agora pergunto ao

Prof. José miguel Cardoso Pereira «5 anos após 2003 o que acha desta mudança?»”.

resposta de José miguel Cardoso pereira – “não tenho muito mais a acrescentar ao que referi

nessa entrevista em 2006. Aumentou a visibilidade do assunto e, portanto, a sensibilização e a percepção do

público para o problema também aumentou. Contudo, a seguir às percepções vêm as atitudes e a seguir às

atitudes vêm os comportamentos. Entre estar mais alertado e isso traduzir-se num impacto sobre a realidade

ainda existe um caminho muito grande a percorrer. não é com campanhas de sensibilização completamente

desfocadas e genéricas que se atinge esse objectivo”.

pedro almeida vieira:

“Eu só gostava de referir que a fraca investigação dos incêndios florestais, no período de 2001 a 2005, é

justificável pelo valor baixo que esta apresentava face às ocorrências totais, ou seja, 4,5%. E na minha opi-

nião isto não é significativo. A situação grave do ponto de vista criminal é que não se investigavam as zonas

de elevado número de ocorrências. Por exemplo, a freguesia com maior número de ocorrências, no período

de 1999-2004 era São Pedro da Cova, no concelho de Gondomar, com 697 ocorrências e mesmo com este

elevado número, nenhuma ignição foi investigada. outro exemplo, é o distrito do Porto, que é o distrito his-

toricamente com maior número de ocorrências e que neste período de 1999-2004 apenas 0,2% das ignições

tinham sido investigados.

Já o distrito de Coimbra era o que apresentava uma melhor investigação, uma vez que até investigava fo-

gachos porque o número de ocorrências investigadas era superior ao número de incêndios com mais de

1 hectare.

Um aspecto fundamental para o qual gostaria de chamar a atenção é que é preciso definir o melhor caminho

para a nossa floresta, tendo em conta os incêndios florestais, a alteração brusca das áreas afectadas, o pro-

blema do nemátodo e o problema das alterações climáticas.”

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texto enviado peLo partiCipante Luis siLva – bombeiro na Companhia de bombeiros

sapadores de Coimbra

o tema que ronda os incêndios florestais tem sido sem sombra de dúvidas um dos mais debatidos por toda

a sociedade. noutros tempos, falava-se sobretudo na época de Verão, com a ocorrência e divulgação pelos

media dos mesmo incêndios, e onde apenas se comentavam situações inerente ao combate, falta de limpeza

das matas, incendiarismo, etc. Actualmente, em minha opinião, a discussão sobre esta problemática alterou-

-se substancialmente para melhor, para outros vectores de conhecimento, o que veio implementar obviamen-

te uma nova dinâmica e adicionar muito conhecimento científico ao até aqui pequeno grupo de interessa-

dos no assunto. Actualmente relacionam-se incêndios florestais com cotas de carbono, aproveitamento de

biomassa, ordenamento do território, ordenamento florestal, custos de operações de manutenção florestal e

de combate a incêndios florestais, repovoamentos florestais, erosão hídrica e por último, hábitos, atitudes e

comportamentos da sociedade. Felizmente, começam-se a observar e a estudar os incêndios florestais numa

perspectiva muito mais abrangente, do que a, até aqui, redutora vista do próprio incêndio. Contudo, observo

que a parte comportamental da sociedade está a ser deixada de lado em prol das ciências exactas, quando,

essencialmente o problema começa precisamente aqui, com o comportamento pouco adequado de um ou

outro cidadão, que de forma negligente ou não faz uso do fogo.

Em todas as jornadas de trabalho em que tenho estado presente, sejam reuniões, seminários, colóquios,

workshop’s ou mesmo cursos e acções de formação, reparo que o debate em torno da prevenção e combate,

se resume a ideias defendidas sob o ponto de vista técnico, desprezando o ponto de vista social. A inter-

venção dos técnicos de áreas sociais, sejam, sociólogos, antropólogos ou psicólogos, apenas se verifica já na

situação pós incêndio, onde intervêm na situação de avaliação comportamental de um ou outro presumível

incendiário.

Relativamente ao Workshop em causa, verifiquei com agrado a pluridisciplinaridade quer dos oradores, quer

dos convidados. no que às intervenções diz respeito, verifico a preocupação generalizada na procura de solu-

ções com vista à resolução de um problema que afecta a globalidade da nossa população, contudo verifiquei

a falta de discussão em torno do aproveitamento de biomassa, com recurso à limpeza das florestas, apesar de

do lado dos participantes ainda se ter ouvido falar por palavras do Eng.º Carlos machado, da Silviconsultores

uma pequena referência ao aproveitamento de biomassa, assim como por parte do Eng.º Henrique Santos do

ICnb, que referiu não haver rentabilidade dos espaços florestais, que acabam por acumular materiais com-

bustíveis, onde os matos, se não ardem, simplesmente continuam a crescer e também por parte do Tenente

Coronel Seguro, que manifestou a falta de possibilidade no sentido de encaminhar os resíduos agrícolas e

florestais, verificada ao sentir necessidade de aconselhar a população sobre o assunto.

É do conhecimento geral que após 2003, não com o objectivo principal do combate aos incêndios florestais,

mas mais numa perspectiva de produção de energia, foi aprovado um determinado número de construções

henriQue pereira dos santos CoLoCa Questão a antÓnio saLgueiro:

pergunta de henrique pereira dos santos – “o Fundo Florestal Permanente para ser uma medida

verdadeiramente relevante para a questão central da competitividade rural teria que ter uma regra básica:

o dinheiro deste fundo não pode retornar ao Estado. deveria também estar direccionado para aqueles que

efectivamente precisam. Este fundo poderia ser um instrumento interessante desde que realmente orientado

para resolver o problema da competitividade na gestão do território, pagando os serviços que são prestados

pelos donos e pelos gestores dos terrenos. Gostaria de saber porque razão não se inclui neste tipo de dis-

cussão o pastoreio, quer o tradicional, quer o orientado como ferramenta de redução de combustíveis, da

mesma forma que se inclui o fogo controlado?”.

resposta de antónio salgueiro – “no seio da AFn existe a vontade de dar uma maior possibilidade

de utilização do fogo aos pastores que têm o conhecimento e sabem trabalhar com o fogo e de enquadrar e

apoiar os pastores que já não sabem trabalhar com o fogo em época própria. Esperemos que rapidamente se

inicie um trabalho com esses utilizadores do território, que são os principais utilizadores de fogo”.

Page 100: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 192 | InCÊndIoS FloRESTAIS - 5 AnoS APÓS 2003 | 193 |

actualmente são responsáveis pelas estruturas locais que operam na área de socorro, obrigando a que inte-

ragissem muito mais entre si, deduzo que facilmente veríamos melhoradas as prestações de socorro, nome-

adamente ao nível do combate alargado, onde se cruzam competências ao nível de autoridade de protecção

civil, autoridade florestal, autoridades policiais e responsáveis municipais e intermunicipais.

deixo o desafio de que, nesta área em especifico, seja efectuada a caracterização profissional, nomeadamen-

te ao nível de formação adquirida nos últimos 10 anos e mais especificamente após 2003, dos comandantes

de corpos de bombeiros do nosso país, uma vez que são eles, uns dos principais responsáveis pelas operações

de socorro no âmbito do combate a incêndios florestais, quer em termos de ataque inicial, quer em termos

de ataque ampliado.

de centrais de produção de energia a partir de consumo de biomassa, nomeadamente o uso da estilha,

situação que não se encontra em prática, uma vez que apenas 3 centrais se encontram em funcionamento,

não consumindo toda a produção existente, fazendo com que muita da biomassa produzida em Portugal

“emigre” para a bélgica e para Itália. Parece-me claro que, caso o processo de implantação de outras centrais

previstas seja executado, vai haver uma crescente procura desta matéria, com todas as consequências que

dai advirão.

Um outro aspecto que foi referido foi o desempenho do dispositivo de Combate a Incêndios Florestais onde

o dr. Paulo Fernandes da UTAd referiu haver lacunas na fase do combate, nomeadamente no ataque amplia-

do. no meu ponto de vista, e com algum conhecimento sobre esta matéria, uma vez que faço parte de um

corpo de bombeiros, verifico no distrito de Coimbra – falo deste por ser o meu de origem, mas que poderá

ser reflexo generalizado de todo o pais – um aumento no rigor das directivas que são dirigidas aos corpos de

bombeiros por parte do CdoS. Entidade onde o CodIS teve um papel preponderante ao conseguir impor a

sua disciplina e competência, o que obviamente se reflecte no rigor e nas prestações em termos individuais

dos respectivos corpos de bombeiros, não se verificando de forma generalizada grandes problemas na parte

do ataque inicial. não nos podemos esquecer que este ataque inicial foi ampliado com outras forças que não

os bombeiros e que essas mesmas forças foram formadas única e exclusivamente para aquela tarefa, como

é o caso do GIPS-GnR, FEb-AnPC e SF-AnF. As estratégias tomadas actualmente são fundamentadas em

conhecimentos científicos de várias áreas, em vez do vulgo conhecimento comum do comandante local que

havia sido convidado a dirigir a estrutura distrital, que até aqui se aplicava. Contudo, facilmente podemos

observar a discrepância de evolução entre os responsáveis pelas estruturas distritais quando comparadas com

as locais.

no que se refere às estruturas locais, verifica-se haver preocupação na solução desta fragilidade, uma vez que

se criou o cargo de comandante municipal de operações de socorro; figura profissional, com todas as respon-

sabilidades que daí advêm. Contudo, tal cargo continua por ocupar na grande maioria dos concelhos deste

país, recaindo toda a responsabilidade operacional local nos comandantes dos corpos de bombeiros, muitos

deles com muito pouca formação para tal desempenho. Também aqui se manifesta alguma preocupação na

resolução do problema, uma vez que foi criado o cargo de oficial bombeiro, já legislado, mas também este

por aplicar em muitos dos casos. Com toda esta instabilidade no sistema, facilmente se compreende a falta de

coerência e organização numa situação de ataque ampliado; onde, de uma forma simples, se resume a somar

a uma ocorrência em larga escala, a desorganização e a falta de rigor e de conhecimento que se encontra

algo dissimulada a níveis locais.

Concordando de certa forma com o CnoS Gil martins, sob o ponto de vista de que o dispositivo não faz

milagres, não quero deixar de acrescentar, que este não faz milagres, mas pode ser melhorado. Se fosse

dada continuidade ao que até aqui foi legislado e se fosse aumentado o nível formativo de muitos dos que

Page 101: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

PARTE IVCONCLUSÕES GERAIS DO WORkShOp

INCÊNDIOS FLORESTAIS5 ANOS ApÓS 2003

Page 102: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 197 |

CONCLUSÕES GERAIS DO WORkShOp “INCÊN-

DIOS FLORESTAIS – 5 ANOS ApÓS 2003”

JOAquIm SANDE SILVA, ERNESTO DE DEuS, LúCIA

SALDANhA

A partir das comunicações dos oradores e das par-

ticipações dos restantes intervenientes, tentámos

sintetizar os aspectos mais relevantes, comuns a di-

ferentes intervenções. De modo a utilizar um critério

objectivo, retivemos os aspectos constantes em pelo

menos duas das intervenções realizadas durante o

Workshop “Incêndios Florestais – 5 anos após 2003”.

Deste modo, estas “Conclusões” não pretendem tra-

duzir o ponto de vista dos editores do presente vo-

lume, mas apenas reflectir opiniões partilhadas pelos

participantes no Workshop, não distinguindo entre

oradores e não oradores. utilizámos aqui o mesmo

critério já utilizado antes, na classificação dos dife-

rentes aspectos ligados à Defesa da Floresta Contra

Incêndios (DFCI), agrupando-os em: Ignições, Propa-

gação e Combate.

IGNIçÕES

Apesar do número anual de ignições tender a dimi-

nuir, o que demonstra alguma eficácia das medidas

tomadas nos últimos 5 anos, nomeadamente a imple-

mentação do Sistema Nacional de Defesa da Floresta

Contra Incêndios (SNDFCI) (DL n.º 124/2006), este

número continua ainda muito elevado. Conside rando

a diminuição do número de ocorrências um factor

crítico de sucesso, é necessário apostar ainda mais na

sensibilização, na fiscalização e na vigilância. Por ou-

tro lado, a investigação das causas tem registado um

aumento nos últimos anos. No entanto, verifi ca-se a

ausência da aplicação prática dos resultados dessa in-

vestigação, para além do foro estritamente criminal.

Este conhecimento deveria ter uma aplicação objec-

tiva na perspectiva da gestão da prevenção dirigida.

Apesar das melhorias verificadas ao nível da sensibili-

zação, existem ainda aspectos a melhorar. Nomeada-

mente, foi afirmada a necessidade de adequar a sen-

sibilização ao público-alvo, adequando a transmissão

da mensagem aos diferentes grupos específicos, de

modo a conseguir a mudança de comportamentos.

Na perspectiva de que o fogo é um problema rural,

a sensibilização deve ser dirigida para esse meio, de

modo a que tenha impacto no número de ocorrên-

cias, o que não se consegue utilizando apenas cam-

panhas generalistas.

No âmbito da vigilância, existiu uma maior visibili-

dade da autoridade, fruto do número de elementos

da Guarda Nacional Republicana actualmente no

terreno, com essa função. O efeito dissuasor dessa

visibilidade poderá ter contribuído para a diminuição

do número de ocorrências. No entanto, este efeito

dissuasor poderá dissipar-se se não for acompanha-

do da penalização adequada.

Page 103: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 198 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 199 |

municipalização da DFCI estará no entanto a contri-

buir para alterar os seus objectivos, dando-lhe antes

um cariz de Protecção Civil, ou seja, de DCFI (Defe-

sa Contra Incêndios Florestais, em vez de Defesa da

Floresta Contra Incêndios). quanto à transparência e

à eficácia, tem sido notória a falta de informação, a

ausência de escrutínio público e a elevada morosida-

de contrariando aquilo que previa o diploma que deu

início ao processo de constituição do FFP.

COmbATE

O sistema de detecção fixa deve ser revisto, de modo

a ultrapassar as actuais fragilidades, tendo em conta:

a reestruturação proposta para a Rede Nacional de

Postos de Vigia, o seu modelo de funcionamento e as

potencialidades oferecidas pelas novas tecnologias.

É unânime a opinião de que se verificaram mudanças

positivas significativas ao nível do combate, princi-

palmente depois de 2006. Essas mudanças eviden-

ciam-se através de um sistema coerente e através

da definição de uma estratégia. muito embora seja

difícil fazer uma análise rigorosa ao real efeito dessas

mudanças positivas nas estatísticas das áreas quei-

madas, um dos trabalhos apresentados evidenciou

que os resultados dos últimos 3 anos são compa-

rativamente melhores que os esperados, tendo em

conta a relação entre os incêndios e a meteorologia

durante o quinquénio anterior. A estratégia basea-

da na redução do tempo de chegada e no ataque

massivo (golpe único) constitui um aspecto positi-

vo, verificando-se assim uma melhoria na primeira

intervenção. A capacidade de combate foi também

grandemente reforçada, havendo uma melhoria nos

diferentes meios de combate e na gestão e controlo

dos meios aéreos.

Para esta melhoria da performance terá contribuído

bastante o notável aumento no terreno de forças

especializadas em primeira intervenção, como os

GIPS, as FEB, os Sapadores Florestais (AFN e Exército)

e as equipas de primeira intervenção da AFOCELCA

e do ICNB. O aparecimento dos GAuF é também

tido como um contributo importante para melho-

rar a capacidade técnica do dispositivo de combate,

nomeadamente através da utilização tecnicamente

fundamentada do fogo de supressão.

pROpAGAçãO

É consensual a necessidade de levar a gestão ao ter-

reno de modo a evitar o aumento de grandes áreas

de vegetação contínua (plantações equiénias, áreas

naturais, áreas abandonadas). No entanto, já não é

igualmente óbvia a forma de o concretizar, devido à

dificuldade em conseguir que os proprietários façam,

ou permitam que se faça, essa gestão. De entre os

mecanismos possíveis para resolver esta questão os

participantes salientaram:

• a implementação de projectos integrados à escala

municipal que integrem as actividades florestais e

agrícolas;

• a introdução de medidas que penalizem a ausência

de gestão dos espaços florestais;

• a criação de unidades de gestão florestal viáveis para

permitir que a gestão dos espaços florestais possa

gerar o valor necessário à sua sustentabilidade;

• a criação de mecanismos fiscais e financeiros para

que a gestão dos espaços florestais possa ter renta-

bilidade, enquanto actividade económica;

• a compensação dos proprietários pela prestação de

serviços à sociedade, tal como previa o diploma de

criação do Fundo Florestal Permanente (FFP).

No que diz respeito ao uso da técnica de fogo con-

trolado para a gestão de combustíveis, apesar do

desenvolvimento verificado nos últimos anos, o im-

pacto das intervenções mais recentes é, até agora,

irrisório perante a amplitude do trabalho a realizar.

As razões para este baixo valor de áreas tratadas não

se prendem necessariamente com o facto de não se

ter criado o Programa Nacional de Fogo Controlado,

inicialmente previsto.

Apesar das muitas diligências efectuadas desde há

vários anos e das perspectivas positivas anunciadas,

a verdade é que até ao momento o cadastro dos pré-

dios rústicos tem sido um projecto adiado, em boa

parte devido ao elevado investimento que envolve.

No entanto, de acordo com a análise de custo-bene-

fício efectuada, irá permitir um retorno de 3,8 vezes

o investimento realizado. A necessidade de realiza-

ção do cadastro dos prédios rústicos, constituiu um

dos aspectos mais unânimes da sessão, uma vez que

é consensual a dificuldade de aplicação de medidas

de gestão, sem que se conheçam os interlocutores

que detêm de facto o poder de decisão sobre essa

mesma gestão. O cadastro irá permitir igualmente

conhecer os “terrenos sem dono”, estimados actual-

mente em 20% do território.

É reconhecido o importante papel que as Zonas de

Intervenção Florestal (ZIF) poderão ter na mudança da

realidade da gestão florestal em Portugal. No entan-

to, vários participantes fizeram notar que poderá ser

uma oportunidade perdida, quanto à possibilidade de

gerir em conjunto unidades territoriais de pequenas

dimensões. Na verdade não se encontram garantidas

as condições para que os proprietários constituintes

das ZIF abdiquem de facto de fazer uma gestão in-

dividualizada das suas parcelas de terreno. Por outro

lado o quadro fiscal actual penaliza as entidades ges-

toras, por não serem titulares dos prédios rústicos.

Vários participantes fizeram críticas ao FFP, quer à

forma como tem sido aplicado, quer à sua falta de

transparência. quanto à sua aplicação, tem-se veri-

ficado um desvirtuar dos objectivos iniciais do FFP,

com uma clara preferência para a canalização de fun-

dos para estruturas municipais de apoio à DFCI. Esta

Page 104: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 200 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 201 |

NOTAS FINAIS

Alguns participantes referiram a instabilidade criada

pelas constantes alterações no quadro legal e insti-

tucional. No que diz respeito à legislação em parti-

cular, referiu-se o ritmo com que esta é produzida e

alterada, dificultando a sua aplicação. No momento

preciso em que o presente texto era ultimado, foi

aprovado um pacote legislativo destinado a alterar

aspectos fundamentais da legislação que estabe-

lece o SNDFCI, nomeadamente o Decreto-Lei n.º

124/2006, o qual constituiu, por sua vez, uma versão

revista do Decreto-Lei nº 156/2004.

Apesar das críticas que acompanharam o processo

de implementação do Plano Nacional de Defesa da

Floresta Contra Incêndios (PNDFCI), reconhece-se

que este instrumento permitiu definir papéis e res-

ponsabilidades, fornecendo uma abordagem co-

mum a todas as instituições, unificadas num mesmo

objectivo e numa mesma direcção. No entanto, al-

guns participantes criticaram o facto de não se ter

adoptado por inteiro a Proposta Técnica de PNDFCI

elaborada pelo Instituto Superior de Agronomia, que

acabou por ser bastante desvirtuada relativamente

aos seus princípios fundamentais.

A análise e acompanhamento das medidas defini-

das e aplicadas e dos seus resultados é fundamental

para o desenvolvimento do sistema de DFCI, sendo

fundamental levar as informações compiladas, à

discussão pública, ou através de uma avaliação in-

ternacional independente. A este respeito destaca-

-se algum progresso através do acompanhamento

feito pela Assembleia da República depois de 2005,

promovendo uma nova visibilidade e uma nova sen-

sibilidade política para estas questões.

Os anos de 2007 e 2008 foram marcados por condi-

ções meteorológicas atípicas com implicação directa

nos resultados obtidos e afectando necessariamente

a avaliação. uma perspectiva de 10 anos sobre 2003

permitirá um balanço melhor, para além de manter

a sociedade civil mobilizada e vigilante. Este aspecto

foi reforçado por um dos trabalhos apresentados,

que evidenciou a elevada taxa de recuperação da

carga de combustível, fazendo com que as áreas

queimadas em 2003 tenham rapidamente readquiri-

do as condições para vir de novo a permitir o desen-

volvimento de grandes incêndios, dependendo das

características meteorológicos dos próximos anos.

A disponibilização de informação foi também me-

lhorada significativamente no sentido de uma maior

transparência e acessibilidade, sendo pública a infor-

mação sobre a performance das forças de combate e

sobre a evolução dos incêndios .

Apesar das melhorias registadas, a formação dos

bombeiros, que continuam ainda a constituir o gros-

so dos efectivos nos Teatros de Operações, continua

a ser uma das maiores fragilidades do sistema. A

agravar este aspecto está um cada vez maior afas-

tamento dos bombeiros do meio rural, com todas as

consequências que tal acarreta em termos do desco-

nhecimento da realidade no terreno. Estes e outros

aspectos, fazem com que não exista ainda uma ca-

pacidade de resposta adequada ao nível do combate

alargado, ou seja a partir do momento em que falha

a primeira intervenção. Esta conclusão foi igualmen-

te referida no estudo apresentado sobre o desempe-

nho do sistema de DFCI no periodo 2006–2008.

Page 105: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

lista de siglas e abre

viat

uras

Page 106: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 204 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 205 |

LISTA DE SIGLAS E AbREvIATURAS

ADAI – Associação para o Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial

ADISA – Associação de Desenvolvimento do Instituto Superior de Agronomia

AETL – Aerotanque Ligeiro

AETm – Aerotanque médio

AETp – Aerotanque Pesado

AFOCELCA – Agrupamento Complementar de Empresas dos grupos Portucel/Soporcel e Altri

AFN – Autoridade Florestal Nacional

ANIF – Autoridade Nacional para os Incêndios Florestais

ANmp – Associação Nacional de municípios Portugueses

ANpC – Autoridade Nacional de Protecção Civil

ANQ – Agência Nacional para a qualificação

ApIF – Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais

bIFF – Brigada de Investigação de Fogos Florestais

bUI – Buildup Index

Cb – Corpo de Bombeiros

CCOD – Centro de Coordenação das Operações Distrital

CCON – Centro de Coordenação Operacional Nacional

CDCS – Centro Distrital de Coordenação de Socorros

CDOS – Centro Distrital de Operações de Socorro

CEEmA – Comissão Especial para o Estudo dos meios Aéreos de Combate aos Incêndios Florestais

CEFA – Centro de Estudos e Formação Autárquica

CEFF – Comissão Especializada em Fogos Florestais

CEFFd – Comissão Especializada em Fogos Florestais distrital

CEFFm – Comissão Especializada em Fogos Florestais municipal

CEIF – Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais

CFEIF – Centro de Formação Especializado em Incêndios Florestais

CFN – Conselho Florestal Nacional

CmDFCI – Comissão municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios

CmpC – Comissão municipal de Protecção Civil

CNEFF – Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais

CNGF – Corpo Nacional da Guarda Florestal

CNOS – Centro Nacional de Operações de Socorro

CNR – Conselho Nacional de Reflorestação

COS – Comandante das Operações de Socorro

CpD – Centro de Prevenção e Detecção

CRR – Comissão Regional de Reflorestação

DC – Drought Code

Page 107: Incêndios Florestais 5 Anos após 2003

| 206 | INCÊNDIOS FLORESTAIS - 5 ANOS APÓS 2003 | 207 |

LAETA – Laboratório Associado em Energia, Transportes e Aeronáutica

Lbp – Liga dos Bombeiros Portugueses

LpN – Liga para a Protecção da Natureza

mADRp – ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas

mAI – ministério da Administração Interna

mAOT – ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território

mAOTDR – ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional

mCOTA – ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente

NpF – Núcleo de Protecção da Floresta

NUT – Nomenclatura de unidades Territoriais

OpF – Organização de Produtores Florestais

pDF – Plano de Defesa da Floresta

pEFC – Programme for the Endorsement of Forest Certification

pFC – Plano de Fogo Controlado

pGF – Plano de Gestão Florestal

pmDFCI – Plano municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios

pmIF – Plano municipal de Intervenção Florestal

pNDFCI – Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios

pOm – Plano Operacional municipal

pONACIF – Plano Operacional Nacional de Combate a Incêndios Florestais

pOQ – Plano Operacional de queima

pROF – Plano Regional de Ordenamento Florestal

pSp – Polícia de Segurança Pública

RDF – Rede de Defesa da Floresta

RNpv – Rede Nacional de Postos de Vigia

SEDR – Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural

SEDRF – Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas

SEF – Secretaria de Estado das Florestas

SEpC – Secretaria de Estado da Protecção Civil

SEpNA – Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente

SF – Sapadores Florestais

SINERGIC – Sistema Nacional de Exploração e Gestão da Informação Cadastral

SIOpS – Sistema Integrado de Operações de Protecção e Socorro

SNb – Serviço Nacional de Bombeiros

SNbpC – Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil

SNpC – Serviço Nacional de Protecção Civil

SNppFCI – Sistema Nacional de Prevenção e Protecção da Floresta Contra Incêndios

ZIF – Zona de Intervenção Florestal

DECIF – Dispositivo Especial de Combate aos Incêndios Florestais

DFCI – Defesa da Floresta Contra Incêndios

DGF – Direcção-Geral das Florestas

DGRF – Direcção-Geral dos Recursos Florestais

DmC – Duff moisture Code

DRA – Direcção Regional de Agricultura

ECIN – Equipas de Combate a Incêndios

ENb – Escola Nacional de Bombeiros

ENF – Estratégia Nacional para as Florestas

ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social

eSF – Equipas de Sapadores Florestais

FEb – Força Especial de Bombeiros

FFmC – Fine Fuel moisture Code

FFp – Fundo Florestal Permanente

FOCON – Força Operacional Conjunta

FSC – Forest Stewardship Council

FSE – Fundo Social Europeu

FWI – Fire Weather index

GAUF – Grupo de Análise e uso do Fogo

GEFoCo – Grupo de Especialistas de Fogo Controlado

GF – Guarda Florestal

GIpS – Grupo de Intervenção, de Protecção e Socorro

GNR – Guarda Nacional Republicana

GTF – Gabinete Técnico Florestal

hEbL – helicóptero Bombardeiro Ligeiro

hEbm – helicóptero Bombardeiro médio

hEbp – helicóptero Bombardeiro Pesado

ICN – Instituto de Conservação da Natureza

ICNb – Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade

IESE – Instituto de Estudos Sociais e Económicos

IF – Instituto Florestal

IFADAp – Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e das Pescas

IFAp – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas

IFN – Inventário Florestal Nacional

IGp – Instituto Geográfico Português

Im – Instituto de meteorologia

INEm – Instituto Nacional de Emergência médica

ISA – Instituto Superior de Agronomia

ISI – Initial Spread Index

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