68
José Galvão-Alves (coordenador) Carlos de Barros Mott Dulce Reis Guarita Alexandre Rezende Andréa de Faria Mendes Antonio A. Siciliano Carlos Frederico P. P. A. Rosa Columbano Junqueira Neto Glaciomar Machado Heber Azevedo Jorge Carvalho Guedes José Eduardo M. da Cunha José Marcus Raso Eulálio Júlio Maria Fonseca Chebli Marcel Machado Maria da Penha Zago Gomes Marianges Zadrozny G. da Costa Marta Carvalho Galvão Martha Regina Arcon Pedroso Paulo Brant Raquel Canzi Almada de Souza Raul Carlos Wahle Ricardo Henrique R. Rodrigues Rubens Basíle Simone Guaraldi iago Tatagiba Amanda Melo de Paula Fernando Assed Gonçalves Eric Silva Pereira A Sociedade Brasileira do Pâncreas, com o apoio da Federação Brasileira de Gastroenterologia, reuniu, nos dias 25 e 26 de fevereiro de 2016, no Hotel Excelsior, no Rio de Janeiro, um grupo de estudiosos das doenças pancreáticas para discutir e elaborar a II Diretriz de Pancreatite Crônica sob a visão de experts habituados aos ensino e prática clínica da Pancreatologia. Os temas elaborados pela coordenação do Consenso foram distribuídos entre gastroenterologistas, cirurgiões, radiologistas e endoscopistas habituados ao convívio frequente com a especialidade. Em um total de 29 participantes, permanecemos, por dois dias, em assembleia permanente até que houvesse um consenso na elaboração e resposta dos questionamentos elaborados. Foi um encontro produtivo, trabalhoso e altamente educativo, cujo material final certamente traduz o momento atual da pancreatite crônica no Brasil. Esta iniciativa objetiva uma disseminação maior do conhecimento das doenças pancreáticas em nosso meio e busca contribuir de forma efetiva a prática da pancreatologia. Com o apoio ético, e sem qualquer interferência, a Abbott Laboratórios foi decisiva para a reunião, elaboração e distribuição deste material. Ao finalizar, meus agradecimentos à Profª Dra. Maria do Carmo Friche Passos (presidente da FBG - 2015/2016) pela iniciativa e apoio na realização desta Diretriz, que contou, ainda, com o empenho dedicado de Denise Gimenez (FBG-Eventos) e de Newton Neves (secretário da Galppe Eventos). Aos nossos professores e médicos participantes de todo Brasil, a eterna gratidão da Sociedade Brasileira do Pâncreas. José Galvão-Alves Presidente da Sociedade Brasileira do Pâncreas Apresentação Nota do Coordenador: Nesta publicação, estão apresentados os textos originais da II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica (páginas 01 a 17), complementados pelos comentários dos próprios autores (páginas 18 a 66). Conteúdo do material de responsabilidade dos autores.

INDICADO PARA: Eficaz em - bvsalud.org

  • Upload
    others

  • View
    1

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

José Galvão-Alves (coordenador)

Carlos de Barros Mott

Dulce Reis Guarita

Alexandre Rezende

Andréa de Faria Mendes

Antonio A. Siciliano

Carlos Frederico P. P. A. Rosa

Columbano Junqueira Neto

Glaciomar Machado

Heber Azevedo

Jorge Carvalho Guedes

José Eduardo M. da Cunha

José Marcus Raso Eulálio

Júlio Maria Fonseca Chebli

Marcel Machado

Maria da Penha Zago Gomes

Marianges Zadrozny G. da Costa

Marta Carvalho Galvão

Martha Regina Arcon Pedroso

Paulo Brant

Raquel Canzi Almada de Souza

Raul Carlos Wahle

Ricardo Henrique R. Rodrigues

Rubens Basíle

Simone Guaraldi

Thiago Tatagiba

Amanda Melo de Paula

Fernando Assed Gonçalves

Eric Silva Pereira

A Sociedade Brasileira do Pâncreas, com o apoio da Federação Brasileira de Gastroenterologia, reuniu, nos dias 25 e 26 de fevereiro de 2016, no Hotel Excelsior, no Rio de Janeiro, um grupo de estudiosos das doenças pancreáticas para discutir e elaborar a II Diretriz de Pancreatite Crônica sob a visão de experts habituados aos ensino e prática clínica da Pancreatologia.

Os temas elaborados pela coordenação do Consenso foram distribuídos entre gastroenterologistas, cirurgiões, radiologistas e endoscopistas habituados ao convívio

frequente com a especialidade. Em um total de 29 participantes, permanecemos, por dois dias, em assembleia permanente até que houvesse um consenso na elaboração e resposta

dos questionamentos elaborados.

Foi um encontro produtivo, trabalhoso e altamente educativo, cujo material final certamente traduz o momento atual da pancreatite crônica no Brasil.

Esta iniciativa objetiva uma disseminação maior do conhecimento das doenças pancreáticas em nosso meio e busca contribuir de forma efetiva a prática da pancreatologia.

Com o apoio ético, e sem qualquer interferência, a Abbott Laboratórios foi decisiva para a reunião, elaboração e distribuição deste material.

Ao finalizar, meus agradecimentos à Profª Dra. Maria do Carmo Friche Passos (presidente da FBG - 2015/2016) pela iniciativa e apoio na realização desta Diretriz,

que contou, ainda, com o empenho dedicado de Denise Gimenez (FBG-Eventos) e de Newton Neves (secretário da Galppe Eventos).

Aos nossos professores e médicos participantes de todo Brasil, a eterna gratidão da Sociedade Brasileira do Pâncreas.

José Galvão-Alves

Presidente da Sociedade Brasileira do Pâncreas

Apresentação

José Galvão-Alves (coordenador)

Carlos de Barros Mott

Dulce Reis Guarita

Alexandre Rezende

Andréa de Faria Mendes

Antonio Alexandre Siciliano

Carlos Frederico Pereira Porto Alegre Rosa

Columbano Junqueira Neto

Glaciomar Machado

Heber Azevedo

Jorge Carvalho Guedes

José Eduardo Monteiro da Cunha

José Marcus Raso Eulálio

Júlio Maria Fonseca Chebli

Marcel Machado

Maria da Penha Zago Gomes

Marianges Zadrozny Gouvêa da Costa

Marta Carvalho Galvão

Martha Regina Arcon Pedroso

Paulo Brant

Raquel Canzi Almada de Souza

Ricardo Henrique Rocha Rodrigues

Rubens Basíle

Simone Guaraldi

Thiago Tatagiba

Amanda Melo de Paula

Fernando Assed Gonçalves

Eric Silva Pereira

Nota do Coordenador: Nesta publicação, estão apresentados os textos originais da II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica (páginas 01 a 17), complementados pelos comentários dos próprios autores (páginas 18 a 66).Conteúdo do material de responsabilidade dos autores.

REVECTINA® (ivermectina) MS: 1.0553.0351. USO ADULTO E PEDIÁTRICO (crianças acima de 5 anos de idade ou com mais de 15 kg). VIA ORAL. Indicações: tratamento de estrongiloidíase intestinal, � lariose, ascaridíase, escabiose, pediculose e oncocercose (NOTA: a ivermectina não possui atividade contra parasitas Onchocerca volvulus adultos). A retirada cirúrgica pode ser considerada no tratamento de pacientes com oncocercose. Contraindicações: pacientes com meningite ou outras afecções do Sistema Nervoso Central que possam afetar a barreira hematoencefálica; para uso em crianças com menos de 15 kg ou menores de 5 anos; e para pacientes com hipersensibilidade à ivermectina ou a algum dos componentes da fórmula. Advertências: após o tratamento com drogas micro� laricidas, os pacientes com oncodermatite hiper-reativa (sowda) podem apresentar maior probabilidade que outros de sofrer reações adversas severas, especialmente edemas e agravamento da oncodermatite. Estrongiloidíase: fazer exames de fezes repetidos para comprovar a ausência do parasita Strongyloides stercoralis. Oncocercose: o tratamento com REVECTINA® não elimina os parasitas Onchocerca adultos, podendo ser requisitado um novo tratamento. Filariose: a medicação elimina apenas as micro� lárias e, portanto, não haverá reversão das alterações clínicas já existentes decorrentes dos parasitas adultos. Ascaridíase: necessidade de submeter-se a exames de fezes para acompanhamento e certi� cação de cura. Pediculose e escabiose: deverá ser reavaliado no intervalo de 1 a 2 semanas para certi� car-se da cura. Nesses casos também devem ser tratados os contactantes infestados. As drogas micro� laricidas podem causar reações cutâneas e/ou sistêmicas de variada gravidade (reações de Mazzotti) e reações oftálmicas em pacientes com oncocercose. Essas reações provavelmente se devem a respostas alérgicas e in� amatórias à morte das micro� lárias. Pacientes com oncocercose tratados com a ivermectina podem sofrer essas reações, além de possíveis reações adversas relacionadas com a própria droga. O tratamento das reações de Mazzotti não foi submetido a estudos clínicos controlados. Hidratação oral, repouso, soluções salinas intravenosas e/ou corticosteroides parenterais foram usados no tratamento da hipotensão postural. Anti-histamínicos e/ou ácido acetilsalicílico foram usados na maioria dos casos leves a moderados. Estrongiloidíase em hospedeiros imunocomprometidos: em pacientes imunocomprometidos (incluindo os portadores de HIV) em tratamento de estrongiloidíase intestinal, pode ser necessário repetir a terapia. Estudos clínicos adequados e bem controlados não foram conduzidos nesses pacientes para a determinação da dosagem ótima. Vários tratamentos, com intervalos de duas semanas, podem ser necessários e a cura pode não ser conseguida. O controle de estrongiloidíase não intestinal nesses pacientes é difícil e pode ser útil a terapia supressiva, isto é, uma vez por mês. Sarna crostosa em hospedeiros imunocomprometidos: em pacientes imunocomprometidos (incluindo os portadores de HIV) em tratamento de sarna crostosa, pode ser necessário repetir a terapia. Uso em idosos: as recomendações são semelhantes às destinadas aos pacientes adultos. Uso em crianças: não foram estabelecidas a segurança e e� cácia em crianças com menos de 15 kg ou menores de 5 anos, o uso deste medicamento por pacientes desta faixa etária não deve ser realizado. Gravidez: não há estudos adequados e bem controlados em mulheres grávidas. Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica. Categoria de risco C. Amamentação: é excretada no leite materno em baixas concentrações. O tratamento de mães que planejam amamentar somente deve ser feito quando o risco de retardar o tratamento da mãe superar o possível risco para o recém-nascido. Carcinogenicidade, mutagenicidade e teratogenicidade: não foram realizados estudos em longo prazo com animais para avaliar o potencial carcinogênico da ivermectina. A ivermectina demonstrou ser teratogênica em camundongos, ratos e coelhos quando administrada em doses repetidas de 0,2; 8,1 e 4,5 vezes a dose máxima recomendada para humanos, respectivamente (baseada em mg/m2/dia). A teratogenicidade foi caracterizada nas três espécies testadas por � ssuras palatinas. Observou-se também deformação das patas dianteiras em coelhos. Esses efeitos foram obtidos somente com doses iguais ou próximas aos níveis tóxicos para as fêmeas prenhes. Portanto, a ivermectina não parece ser seletivamente tóxica para o feto em desenvolvimento. A ivermectina não teve efeitos adversos sobre a fertilidade de ratos em estudos com doses repetidas de até três vezes a dose máxima recomendada para humanos, de 200 mcg/kg (baseada em mg/m2/dia). Para evitar futuras infestações por parasitas, orientar o paciente a adotar as seguintes medidas: 1) Manter limpas as instalações sanitárias e lavar as mãos após utilizá-las. 2) Evitar andar descalço. 3) Cortar e manter limpas as unhas. 4) Beber água � ltrada ou fervida. 5) Lavar e cozinhar bem os alimentos. 6) Manter os alimentos e depósitos de água cobertos. 7) Combater os insetos. 8) Lavar as mãos antes das refeições. 9) Lavar os utensílios domésticos. 10) De forma cuidadosa para se evitar queimaduras, ferver roupas íntimas,de cama e banho (lençóis, fronhas e toalhas) do paciente e trocá-las diariamente. Utensílios e acessórios (escovas de cabelo, pentes, presilhas de cabelo e bonés) devem ser higienizados da mesma forma Estas medidas se estendem a todos os membros da família.11) Não compartilhar objetos de uso pessoal, tais como pentes e bonés.12) Evitar contato direto com outras pessoas durante o tratamento (infectadas ou não).13) Todas as pessoas da família devem veri� car se estão infestadas. Em caso positivo, procurar orientação médica para o correto tratamento simultâneo de todos os infestados para evitar-se a re-infestação cruzada entre os membros da família. Interações medicamentosas: não há relatos sobre interações medicamentosas, no entanto, REVECTINA® deve ser administrada com cautela a pacientes em uso de substâncias que deprimem o Sistema Nervoso Central. Reações adversas: em geral, de natureza leve e transitória. Raras: diarreia, náusea, astenia, dor abdominal, anorexia, constipação e vômitos. Relacionadas ao sistema Nervoso Central: tontura, sonolência, vertigem e tremor. Reações epidérmicas: prurido, erupções e urticária. As reações do tipo Mazzotti e oftálmicas, associadas ao tratamento da oncocercose ou à própria doença, não devem ser esperadas em pacientes com estrongiloidíase tratados com REVECTINA®. Oncocercose: reações de hipersensibilidade resultantes da morte das micro� lárias provocam sintomas de reação do tipo Mazzotti: artralgia/sinovite, dor abdominal, aumento e sensibilidade dos nódulos linfáticos, principalmente os nódulos axilares, cervical e inguinal; prurido, edema, erupções, urticária e febre. Reações oftálmicas, podem estar ligadas à doença. Efeitos secundários após o tratamento: sensação de anormalidades nos olhos, edema de pálpebra, uveíte anterior, conjutivite, limbite, queratite e coriorretinite ou coroidite. Raramente podem tornar-se graves ou são associadas com perda de visão. De forma geral, resolvidas sem a necessidade de tratamento com corticosteroides. Gerais: edema facial e periférico, hipotensão ortostática, taquicardia, cefaleia, mialgia e exacerbação da asma brônquica. Alterações em testes de laboratório: eosino� lia transitória, elevação das transaminases e aumento da hemoglobina (1%). Leucopenia e anemia foram veri� cadas em um paciente. Posologia: Estrongiloidíase – Filariose – Ascaridíase – Escabiose – Pediculose: dose oral única de 200 mcg de ivermectina/kg de peso corporal. Em geral, não são necessárias outras doses. Contudo, devem ser feitos exames de fezes para acompanhamento (estrongiloidíase) e avaliações clínicas (demais afecções), para veri� car a eliminação da infecção. PESO CORPORAL (kg) / DOSE ORAL ÚNICA: 15-24 kg: ½ comprimido, 25-35 kg: 1 comprimido, 36-50 kg: 1 ½ comprimidos, 51-65 kg: 2 comprimidos, 66-79 kg: 2 ½ comprimidos, acima de 80 kg: 200 mcg/kg. Oncocercose: dose oral única de 150 mcg de ivermectina/kg de peso corporal. Em campanhas de distribuição em massa, inseridas em programas de tratamento internacional, o intervalo entre doses usado de forma mais comum foi de doze meses. No tratamento individual de pacientes, pode-se reconsiderar uma nova dosagem em intervalos de três meses. PESO CORPORAL (kg) / DOSE ORAL ÚNICA: 15-25 kg: ½ comprimido, 26-44 kg: 1 comprimido, 45-64 kg: 1 ½ comprimidos, 65-84 kg: 2 comprimidos, acima de 85 kg: 150 mcg/kg. VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA. Registrado por: Abbott Laboratórios do Brasil Ltda - Rua Michigan, 735 - São Paulo – SP - CNPJ 56.998.701/0001-16. ABBOTT CENTER: 0800 703 1050. MB 01 (BU 12).

CONTRAINDICAÇÃO: PACIENTES COM MENINGITE OU OUTRAS AFECÇÕES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL QUE POSSAM AFETAR A BARREIRA HEMATOENCEFÁLICA. USO POR CRIANÇAS COM MENOS DE 15 kg OU MENORES DE 5 ANOS. INTERAÇÃO MEDICAMENTOSA: DEVE SER ADMINISTRADA COM CAUTELA A PACIENTES EM USO DE SUBSTÂNCIAS QUE DEPRIMEM O SISTEMA NERVOSO CENTRAL.

BRREV170155 – Anúncio Revectina – Mar/17 MATERIAL DESTINADO EXCLUSIVAMENTE À INFORMAÇÃO DA CLASSE MÉDICA.

PRODUZIDO EM MARÇO/2017. REPRODUÇÃO PROIBIDA.

100% estrongiloidiáse2

98,6% ascaridíase2

Eficaz em: ECTOparasitoses:pediculose e escabiose1

INDICADO PARA:

ENDOparasitoses:oncocercose, � lariose, ascaridíase e estrongiloidíase1

O FIM DA ECTO E ENDOPARASITOSEEM DOSE ÚNICA1,2

2 comprimidos

4 comprimidos

Referências bibliográ� cas: 1. Revectina (ivermectina): bula do produto. 2. Heukelbach J, Wilcke T, Winter B et al. Ef� cacy of ivermectin in a patient population concomitantly infected with intestinal helminthesand ectoparasites. Arzneimitteforschung. 2004;54(7):416-21.

(Crianças acima de 5 anos de idade ou com mais de 15 kg) abaixo do uso adulto e pediátrico.

USO ADULTO E PEDIÁTRICO1

REVECTINA_002_17 ANUNCIO_AF.indd 1 09/03/2017 17:23:42

Índice

17 Pancreatite crônica - definição e classificação

18 Epidemiologia da pancreatite crônica

19 Etiologias

23 Diagnóstico clínico da pancreatite crônica

25 Avaliação laboratorial diagnóstica - pancreatite crônica

30 Achados encontrados na radiologia convencional na pancreatite crônica

31 Achados encontrados na ultrassonografia do abdômen na pancreatite crônica

31 Achados encontrados na tomografia computadorizada do abdômen na pancreatite crônica

32 Ressonância magnética na pancreatite crônica: principais aspectos

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica e artigos comentados

artigos originais

artigos comentados

1 a 16

35 Contribuição da colangiopancreato-grafia retrógrada endoscópica (CPRE) no manejo da pancreatite crônica

36 Papel da ecoendoscopia no diagnóstico da pancreatite crônica

37 Dor na pancreatite crônica

40 Insuficiência exócrina na pancreatite crônica

43 Terapêutica da insuficiência endócrina

45 Avaliar e tratar as complicações vasculares associadas à pancreatite crônica

46 Como avaliar e tratar o pseudocisto pancreático

56 Como avaliar e tratar o derrame pleural na pancreatite crônica

57 Fístula pancreática interna – ascite pancreática

62 Obstruções das vias biliares e do trato gastrointestinal

63 Fístulas pancreáticas

66 Conduta na necrose da pancreatite crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

1

Pergunta 1 - Como definir e classificar a pancreatite crônica?

Resposta

As pancreatites crônicas (PC) se caracterizam, do ponto de

vista anátomo-patológico, pela fibrose progressiva do parên-

quima glandular, inicialmente focal e, a seguir, difusa por todo

o pâncreas.

Do ponto de vista evolutivo, geralmente há persistência das lesões, mesmo com a retirada do fator causal, determinando alterações pancreáticas residuais anatômicas e funcionais.

As classificações mais comumente utilizadas para as PC são a de Marselha-Roma (quadro 1), a TIGAR-O (quadro 2) e a M-ANNHEIM (quadro 3).

Quadro 1: Marselha-Roma, 1988

Calcificante• Alcoolismo crônico• Tropical• Hereditária (CFTR, PRSS1, SPINK1 etc.)

Hipercalcemia• Idiopática

Obstrutiva• Obstrução benigna do ducto pancreático• Estenose pós-pancreatite aguda• Estenose traumática• Estenose do esfíncter de Oddi• Disfunção do esfíncter de Oddi• Pâncreas divisum• Obstrução periampular (divertículo e cisto de parede

duodenal)• Obstrução maligna de ducto pancreático, adenocarcinoma

de pâncreas, papila e duodeno

Inflamatória• Autoimune• Idiopática senil

Quadro 2: TIGAR-O, 2001

Tóxico-metabólica• Álcool• Tabaco• Hipercalcemia (hiperparatireoidismo)• Hipertrigliceridemia• Insuficiência renal crônica• Medicações• Toxinas

Idiopática• Início precoce• Início tardio

Tropical• Outras

Genéticas• Mutações dos genes CFTR, SPINK1 e PRSSI• Deficiência de alfa-1-antitripsina

Autoimune• PC isolada• PC sindrômica (associação com Sjögren,

colangite esclerosante primária etc.)

Fonte: Sarles H, Adler G, Dani R et al. The pancreatitis classification of Maseille-Rome 1988. Scand. J. Gastroenterol. 1989;24:641-42

Fonte: Eternad B, Whitcomb DC. Chronic pancreatitis: diagnosis, classification and new genetic developments. Gastroenterology. 2001;120:682-707

Não há, no presente momento, especialmente levando em conta o avanço do conhecimento sobre as PC, uma classi-ficação ideal para elas, sendo que a literatura cita especial-mente as propostas TIGAR-O e M-ANNHEIM. A utilização de uma classificação própria (quadro 4), adaptada às carac-

terísticas das pancreatites crônicas em nosso meio, obtida a partir da classificação de Marselha-Roma e modificada por sugestões contidas em outras classificações, é adequada até que uma nova e melhor proposta surja na literatura.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

2

Quadro 3: M-ANNHEIM

Fatores de risco• Álcool• Tabaco• Fatores nutricionais• Fatores hereditários• Fatores relacionados ao ducto eferente• Fatores imunológicos• Miscelânea e fatores metabólicos raros

Estágios clínicos• Pancreatite crônica assintomática• Pancreatite crônica sintomática

Gravidade• Índice de gravidade (A, B, C, D, E)• Nível de gravidade (pequeno, aumentado, avançado, intenso,

exacerbado)• Pontuação

Quadro 4: Pancreatite crônica classificação

Pancreatite crônica calcificante• Álcool• Genética• Metabólica• Nutricional• Idiopática

Pancreatite crônica obstrutiva• Pâncreas divisum• Estenose do ducto pancreático principal• Estenose da papila• Tumores do pâncreas e periampulares

Pancreatite autoimune• PC isolada• PC sindrômica

Pancreatite não classificada

Fonte: Schneider A, Löhr JM, Singer MV. The M-ANNHEIM classifi-cation of chronic pancreatitis: introductions of a unifying classification system based on a review of previous classifications of the disease. J. Gastroenterol. 2007;42:101-19

Fonte: adaptado de Etemad B, Whitcomb DC. Chronic pancreatitis: diagnosis, classification and new genetic developments. Gastroentero-logy. 2001;120:682-707; Sarles H, Adler G, Dani R et al. The pancreatitis classification of Marseille-Rome 1988. Scand. J. Gastroenterology. 1989;24:641-2

REFERÊNCIAS 1. Etemad B, Whitcomb DC. Chronic pancreatitis: diagnosis, classification and new genetic developments. Gastroenterology. 2001;120:682-707. 2. Guarita DR, Felga GEG, Marzinotto M et al. Doenças Pancreáticas. In: Martins MA, Carrilho FJ, Alves VAF et al. (eds.). Clínica Médica. 2 ed. São Paulo: Manole; 2016. p. 136-50. 3. Mott CB, Guarita DR, Pedroso MRA. Pancreatite Crônica. In: Lopes AC, Amato-Neto V (eds.). Tratado de clínica médica. 2 ed. São Paulo: Roca; 2009. p. 1060-3. 3. 4. Sarles H, Adler G, Dani R et al. The pancreatitis classification of Marseille-Rome 1988. Scand. J. Gastroenterol. 1989;24:641-2. 5. Schnei-der A, Löhr JM, Singer MV. The M-ANNHEIM classification of chronic pancreatitis: introduction of a unifying classification system based on a review of previous classifications of the disease. J. Gastroenterol. 2007;42:101-19.

Pergunta 2 - Qual é a epidemiologia da pancreatite crônica?

RespostaEstudos populacionais abordando a epidemiologia da pancreatite crônica são pouco frequentes e as informações a respeito da incidência e da prevalência da patologia são, na maioria das vezes, procedentes dos Estados Unidos, da Europa e do Japão.

No Brasil, um levantamento a respeito da frequência de internações por PC no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), no período entre 1975 e 1995, encontrou um total de 0,49%.

Podem ser observadas diferenças de acordo com a região geográfica e com a época de realização da pesquisa, o que poderia ser explicado pela variabilidade na frequência das causas da doença, pela origem étnica ou pela exposição desigual a fatores de risco ambientais. No entanto, compara-ções são difíceis, pois classificações e critérios diagnósticos variaram e, com o passar do tempo, os métodos diagnós-ticos se tornaram mais sensíveis, sugerindo que as diferenças podem não refletir mudanças reais na incidência da doença.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

3

Pergunta 3 - Quais são as principais etiologias da pancreatite crônica?

Resposta

A pancreatite crônica (PC) é uma afecção complexa de etio-

logia diversa, predominando no Ocidente e, especialmente

no Brasil, a etiologia alcoólica. O álcool é o principal fator

etiológico da PC, atuando como um cofator em pessoas que

são suscetíveis a desenvolver a patologia por outros motivos,

dentre eles genéticos e ambientais.

O tabagismo aumenta o risco de PC e acelera a progressão

de todas as formas da doença. O risco de pancreatite crônica

é sete a 17 vezes maior para tabagistas, quando comparados

a não fumantes.

De acordo com Dani et al., em estudo epidemiológico das PC

em Belo Horizonte e São Paulo, o álcool responde por cerca

de 90% da etiologia em nosso meio.

Tabela 1: Incidência e prevalência da PC

Referência Incidência por mil habitantes

Prevalência por mil habitantes

Período País

Andersen et al., 1982 6,9 10

1970-19751975-1979

Dinamarca

Dzieniszewski, et al., 1990

5 17 1982-1987 Polônia

Johnson e Hosking, 1991

4,3 (M) / 2,1 (F) 1960-1964 Inglaterra

Jaakkola e Nordback, 1993

13,4 1989 Finlândia

Dite, 2001 7,9 1999 República Tcheca e Eslováquia

Lankish et al., 2002 6,4 1988-1995 Alemanha

Levy et al., 2006 7,7 26,4 2003 França

Hirota et al., 2007 11,9 36,9 2007 Japão

Wang et al., 2009 3,08 13,52

1996 2003

China

Yadav et al., 2011 4,05 41,76 1997-2006 EUA

Garg e Tandon, 2004 114-200 Índia

REFERÊNCIAS 1. Copenhagen pancreatitis study. An interim report from a prospective epidemiological multicentre study. Scand. J. Gastroenterol. 1981;16(2):305-12. 2. Domínguez-Muñoz E et al. A Spanish multicenter study to estimate the prevalence and incidence of chronic pancreatitis and its complications. Rev. Esp. Enferm. Dig. 2014;106(4):239-45. 3. Garg PK, Tandon RK. Survey on chronic pancreatitis in the Asia-Pacific region. J. Gastroenterol. Hepatol. 2004;19(9):998-1004.4. Hirota M et al. The sixth nationwide epidemiological survey of chronic pancreatitis in Japan. Pancreatology. 2012;12(2):79-84. 5. Lévy P et al. Estimation of the prevalence and incidence of chronic pancreatitis and its complications. Gastroenterol. Clin. Biol. 2006;30(6-7):838-44. 6. Lin Y et al. Nationwide epidemio-logical survey of chronic pancreatitis in Japan. J. Gastroenterol. 2000;35(2):136-41. 7. Yadav D et al. Incidence, prevalence, and survival of chronic pancreatitis: a population-based study. Am. J. Gastroenterol. 2011;106(12):2192-9.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

4

Esses dados foram confirmados em outros centros brasileiros. Recentemente ganharam importância outras etiologias de PC, particularmente formas genéticas, obstrutivas e autoimunes, que devem ser fortemente consideradas, em especial, na ausência de alcoolismo.

Sumarizando, a PC é uma patologia complexa que envolve predisposição genética, resposta imune e inflamatória, além da participação de fatores ambientais (álcool, tabagismo, nutrição) e metabólicos, que atuam de forma interativa, na maioria das vezes.

REFERÊNCIAS1. Dani R, Mott CB, Guarita DR, Nogueira CED. Epidemiology and etiology of chronic pancreatitis in Brazil: a tale of two cities. Pancreas. 1990;5:474-478. 2. Etemad B, Whitcomb DC. Chronic pancreatitis: diagnosis, classification, and new genetic developments. Gastroenterology. 2001;120:682-707. 3. Maisonneuve P, Lowenfels AB, Mullhaupt B et al. Cigarette smoking accelerates progression of alcoholic chronic pancreatitis. Gut. 2005;54:510-514. 4. Kamisawa T, Chari ST, Lerch MM et al. Recent advances in autoimmune pancreatitis: type 1 and type 2. Gut. 2013;62:1373-1380.

Pergunta 4 - Quais são as principais manifestações clínicas da pancreatite crônica?

RespostaA pancreatite crônica (PC) incide predominantemente em pacientes do sexo masculino, com ingestão alcoólica elevada, por tempo prolongado.

As principais manifestações observadas nesses indiví-duos são, habitualmente, características, sem grandes variações de um caso a outro (tabela 1)

Tabela 1: manifestações clínicas observa-das em pacientes portadores de pancreatite crônica, investigados no Grupo de Pâncreas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP)

Dor abdominal 92,2%

Emagrecimento 91,5%

Esteatorreia 33,9%

Diabetes 46,2%

Icterícia 24,6%

Pseudocistos 35,9%

Derrames cavitários 13,3%

Hemorragia digestiva 2,3%

A dor abdominal é o sintoma mais comum, sendo, em geral, a primeira exteriorização clínica da doença. Rela-ciona-se à hipertensão ductal provocada pelas rolhas proteicas depositadas, cálculos e fibrose, tanto nos ductos pancreáticos secundários, quanto no ducto prin-

cipal. Além disso, as inflamações perineural intra e peripancreá-tica também contribuem para a intensidade álgica.

Os períodos de acalmia variam de meses a anos e os episódios são desencadeados, quase sempre, pelo abuso alcoólico e/ou por alimentação gordurosa. Em geral, o paciente relata como fator de melhora do quadro doloroso a adoção da posição genupeitoral.

Há evidências de comprometimento em todos os níveis do sistema nervoso, central e periférico nos portadores de pancrea-tite crônica com dor. Face à existência desse comprometi-mento extrapancreático, pacientes submetidos a derivações ou, mesmo, a ressecções pancreáticas podem ter dor, má resposta a bloqueios celíacos e alterações eletroencefalográficas.

A redução do peso corpóreo é notada em quase todos os pacientes, pois não se alimentam durante as crises de dor e não voltam a se alimentar como antes. Com o avançar da fibrose pancreática, surgem a esteatorreia e o diabetes, que trazem perda de peso ainda maior.

A má absorção se manifesta pela presença de gordura nas fezes (esteatorreia) em níveis acima de 7g/dia, sendo uma manifes-tação tardia da pancreatite crônica. No entanto, a avaliação nutricional desses indivíduos demonstra a presença precoce de desnutrição, muito antes do surgimento de esteatorreia.

O diabetes surge quando o parênquima pancreático endócrino é substituído por fibrose e, uma vez instalada a lesão, o paciente pode ter as mesmas complicações de qualquer outro paciente diabético, como polineuropatias, lesões oculares, impotência sexual etc.

As complicações clínicas das pancreatites crônicas podem surgir em qualquer fase da doença, porém são mais frequentes em seu início, quando ainda há parênquima pancreático funcionante.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

5

A icterícia, clínica e/ou laboratorial, geralmente fugaz e com baixos níveis de bilirrubina direta, ocorre em, aproximadamente, um quarto dos pacientes, em função da compressão do colé-doco distal por edema, nódulos fibróticos, cálculos pancreáticos ou pseudocistos, localizados na porção cefálica da glândula pancreática.

Os pseudocistos, presentes em cerca de um terço dos pacientes, podem gerar outras complicações, como compressões de órgãos ou estruturas vizinhas (estômago, cólon, vesícula, colé-doco), infecção (abscessos), hemorragia, fistulização para vísceras ocas ou para o peritônio livre (ascite), mas se resolvem espontaneamente em quase 70% dos casos.

Ascite, derrame pleural e, raramente, derrame pericárdico podem ser evidenciados durante a evolução da pancreatite crônica, sendo a ascite mais frequente. Qualquer dos derrames de origem pancreática surge pela ruptura de um pseudocisto ou do próprio ducto pancreático.

Durante a evolução das pancreatites crônicas, podem ocorrer hematêmese ou melena, causadas, em geral, pela ruptura de varizes esôfago-gástricas, secundárias à compressão ou trom-bose da veia esplênica por um pseudocisto, ou pelo aumento do volume do pâncreas. A hemorragia digestiva pode ser decor-rente, ainda, da ruptura de vasos intracísticos ou da formação de pseudoaneurismas.

Necrose pancreática, estéril ou infectada, abscessos e fístulas podem estar presentes, mas são complicações pouco frequentes.

Ao fazer a avaliação clínica do paciente portador de pancrea-tite crônica, essas manifestações devem ser lembradas como doenças que podem acompanhar o comprometimento crônico da glândula pancreática.

Assim, a incidência de úlcera péptica é maior que na popu-

lação em geral, provavelmente pela deficiência da produção de secreção alcalina pelo pâncreas, o que torna a neutralização da secreção ácida gástrica insuficiente.

Em relação à ocorrência de litíase biliar, há significativo retardo do esvaziamento da vesícula biliar no pancreatopata crônico, o que propicia estase biliar e formação de cálculos.

Os pacientes com pancreatite crônica têm mais litíase renal em função da maior excreção renal de oxalato de cálcio, especial-mente quando já apresentam esteatorreia. Pela mesma razão, há maior ocorrência de osteoporose, mesmo naqueles pacientes do sexo masculino.

Neoplasias álcool-tabaco relacionadas, como aquelas que se desenvolvem em boca, faringe, estômago e pulmão, são mais observadas entre os pacientes com pancreatite crônica alcoó-lica. Apesar da referência da literatura, os dados disponíveis em relação ao câncer de pâncreas em nosso meio são inconsis-tentes e conflitantes.

Finalmente, em portadores de pancreatite crônica de causa indeterminada, devem ser lembradas as possibilidades, raras, de pancreatite hereditária ou autoimune e de fibrose cística.

Nas pancreatites hereditárias, há relato familiar da existência da afecção. A doença tem, comumente, caráter evolutivo mais grave e há, em longo prazo, maior incidência de neoplasia de pâncreas.

Nas pancreatites autoimunes ocorre, com frequência, além da elevação de IgG4, o comprometimento, também por alterações da imunidade e de outros órgãos.

A fibrose cística pode se manifestar somente pelo envolvimento pancreático, com manifestação clínica apenas na idade adulta, sob a forma de episódios de pancreatite aguda ou, mesmo, já como uma pancreatite crônica.

REFERÊNCIAS1. Frokjaer JB, Bouwense SAW, Olesen SS et al. Reduced cortical thickness of brain areas involved in pain processing in patients with chronic pancreatitis. Clin. Gastroenterol. Hepatol. 2012:10:434-8. 2. Guarita DR, Felga GEG, Marzinotto M et al. Doenças Pancreáticas. In: Martins MA, Carrilho FJ, Alves VAF et al. (eds.). Clínica Médica. 2 ed. São Paulo: Manole; 2016. p. 136-50. 3. Machado MCC, Cunha JEM, Bacchella T, Mott CB, Duarte I, Bettarello A. Acute pancreatic necrosis in chronic alcoholic pancreatitis. Dig. Dis. Sci. 1984;29:709-13. 4. Mott CB, Guarita DR, Pedroso MRA. Pancreatite Crônica. In: Lopes AC, Amato-Neto V (eds.). Tratado de Clínica Médica. 2 ed. São Paulo: Roca; 2009. p. 1060-3. 5. Pedroso MR, Cunha RM, Guarita DR, Buchpieguel CA, Mott CB, Laudanna AA. Gallbladder emptying evaluation in chronic calcifying pancreatitis, by means of a scintilographic study with Tc-99m DISIDA. Rev. Hosp. Clin. Fac. Med. São Paulo. 1997;52:197-208.

Pergunta 5 - Como avaliar laboratorialmente os pacientes com suspeita de pancreatite crônica?

RespostaO diagnóstico laboratorial da PC se fundamenta na avaliação da função exócrina da glândula, com identifi-cação de insuficiência exócrina pancreática (IEP). Esta, porém, não é específica da PC, pois pode estar relacio-nada a outras alterações pancreáticas, como obstruções

ductais (benignas e malignas), fibrose cística do pâncreas e anomalias congênitas, entre outras.

As dosagens séricas da amilase e da lipase têm baixa sensibilidade para a PC, embora, quando elevadas, nos induzam ao diagnóstico de agudização da PC ou de complicações, como pseudocisto.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

6

Os testes laboratoriais que documentam a insuficiência glan-dular exócrina são sensíveis apenas em fases avançadas da PC. Os que avaliam a secreção da glândula têm potencial para detectar a PC em fases iniciais e são chamados de testes funcio-nais diretos, pois analisam os componentes do suco pancreático após estímulo hormonal. No entanto, são invasivos e não estão disponíveis na prática clínica diária.

Entre os testes laboratoriais que avaliam a IEP na PC de forma indireta, a dosagem fecal da elastase-1 por ser enzima exclu-sivamente pancreática e não degradável no trato digestório, é útil nos casos de insuficiência exócrina moderada ou grave. O teste respiratório com triglicerídeos marcados com C13 também auxilia na detecção da IEP, em fases avançadas da PC, mas não é acessível em nosso meio.

A quantificação da gordura fecal é um método para diagnóstico da esteatorreia. Pode ser útil, em alguns casos específicos, para a avaliação da resposta à reposição exógena de enzimas. É um método de realização difícil e pouco disponível em nosso meio.

A pesquisa qualitativa de gordura fecal (Sudam III) não é útil como critério diagnóstico de esteatorreia, por sua baixa sensi-bilidade.

Em relação à PC de origem autoimune, os exames laboratoriais podem contribuir para o diagnóstico, principalmente os marca-dores de autoimunidade. Merecem destaque a hiperglobuli-nemia, o fator antinuclear (FAN) e a IgG4.

REFERÊNCIAS1. Conwell DL. American Pancreatic Association Practice Guidelines in Chronic Pancreatitis: evidence-based report on diagnostic guidelines. Pancreas. Nov 2014;43(8):1143-62. 2. Chowdhury RS, Forsmark CE. Review article: pancreatic function testing. Aliment. Pharmacol. Ther. 2003;17:733-750. 3. Domín-guez-Muñoz JE. Pancreatic exocrine insufficiency: diagnosis and treatment. J. Gastroenterol. Hepatol. 2011;26(Suppl. 2):12-16. 4. Dominguez-Munoz JE, Hieronymus C, Sauerbruch T, Malfertheiner P. Fecal elastase test: evaluation of a new noninvasive pancreatic function test. Am. J. Gastroenterol. 1995;90:1834-1837. 5. Draganov P, Patel A, Fazel A et al. Prospective evaluation of the accuracy of the intraductal secretin stimulation test in the diagnosis of chronic pancre-atitis. Clin. Gastroenterol. Hepatol. 2005;3:695-699. 6. Etemad B, Whitcomb DC. Chronic pancreatitis: diagnosis, classification and new genetic developments. Gastroenterology. 2001;120:682-707. 7. Garcia-Bueno CA, Rossi TM, Lee KW et al. Quantification of fecal elastase-1 using either polyclonal or monoclonal antibodies. Gastroenterology. 2002;122(4):A510. 8. Hart PA, Conwell DL. Diagnosis of Exocrine Pancreatic Insufficiency. Current Treatment Options in Gastro-enterology. 2015;13(3):347-353. 9. Katschinski M, Schirra J, Bross A et al. Duodenal secretion and fecal excretion of pancreatic elastase-1 in healthy humans and patients with chronic pancreatitis. Pancreas. 1997;15(2):191-200. 10. Lankisch PG, Schmidt I, Konig H et al. Faecal elastase 1: not helpful in diagnosing chronic pancreatitis associated with mild to moderate exocrine pancreatic insufficiency. Gut. 1998;42:551-554. 11. Lieb II JG. Draganv PV. Pancreatic function testing. Here to stay for the 21st century. World J. Gastroenterol. 28 maio 2008;14(20):3149-3158. 12. Lindkvist B. Diagnosis and treatment of pancreatic exocrine insufficiency. World J. Gastroenterol. 2013;19(42):7258-7266. 13. Loser C, Mollgaard A, Folsch UR. Fecal elastase 1: a novel, highly sensitive, and specific tubeless pancreatic function test. Gut. 1996;39:580-586.

REFERÊNCIAS1. Perez-Johnston R, Sainani NI, Sahani DV. Imaging of chronic pancreatitis (including groove and autoimmune pancreatitis). Radiol. Clin. N. Am. 2012;50:447-466. 2. Choueiri NE, Balci NC, Alkaade S, Burton FR. Advanced imaging of chronic pancreatitis. Curr. Gastroenterol. Rep. 2010;12:114-120. 3. Raman SP, Salaria SN, Hruban RH, Fishman EK. Groove pancreatitis: spectrum of imaging findings and radiology-pathology correlation. AJR. 2013;201(1):W29-W39. 4. Zamboni GA, Ambrosetti MC, D’Onofrio M, Mucelli RP. Ultrasonography of the pancreas. Radiol. Clin. N. Am. 2012;50:395-406.

Pergunta 6 - Embora pouco utilizada, quais são os achados encontrados na radiologia convencional na pancreatite crônica?

RespostaA radiografia panorâmica do abdômen tem uma boa sensi-bilidade para detectar a calcificação pancreática (mais alta que a da ultrassonografia e mais baixa que a da tomo-grafia computadorizada). Embora altamente sugestiva de pancreatite crônica, sobretudo em pacientes alcoolistas, a calcificação no leito pancreático tem outros diagnósticos diferenciais, como hematoma e/ou infarto pancreáticos, metástases, pseudocistos, neoplasias císticas e tumores neuroendócrinos, entre outros.

Alterações calcificantes na coluna lombar e ateroma aórtico podem ser confundidos com calcificação pancre-

ática na incidência frontal, podendo ser diferenciados com a inci-dência em perfil.

Outro achado menos específico que sugere mas sa na cabeça pancreática é a presença de alargamento do arco duodenal, mais bem visibilizado com uso de contraste oral baritado, mas que, hoje, com a disponibilidade da ultrassonografia e tomo-grafia computadorizada, não constitui uma indicação formal para essa finalidade. Aumentos focais em outros locais do pâncreas podem determinar rechaço de alças digestivas.

A radiografia do tórax deve complementar o estudo radiológico, pois pode identificar complicações, como derrame pleural e pseudocistos intratorácicos, entre outras.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

7

REFERÊNCIAS1. Perez-Johnston R, Sainani NI, Sahani DV. Imaging of chronic pancreatitis (including groove and autoimmune pancreatitis). Radiol. Clin. N. Am. 2012;50:447-466. 2. Choueiri NE, Balci NC, Alkaade S, Burton FR. Advanced imaging of chronic pancreatitis. Curr. Gastroenterol. Rep. 2010;12:114-120. 3. Raman SP, Salaria SN, Hruban RH, Fishman EK. Groove pancreatitis: spectrum of imaging findings and radiology-pathology correlation. AJR. 2013;201(1):W29-W39.

REFERÊNCIAS1. Perez-Johnston R, Sainani NI, Sahani DV. Imaging of chronic pancreatitis (including groove and autoimmune pancreatitis). Radiol. Clin. N. Am. 2012;50:447-466. 2. Choueiri NE, Balci NC, Alkaade S, Burton FR. Advanced imaging of chronic pancreatitis. Curr. Gastroenterol. Rep. 2010;12:114-120. 3. Raman SP, Salaria SN, Hruban RH, Fishman EK. Groove pancreatitis: spectrum of imaging findings and radiology-pathology correlation. AJR. 2013;201(1):W29-W39. 4. Zamboni GA, Ambrosetti MC, D’Onofrio M, Mucelli RP. Ultrasonography of the pancreas. Radiol. Clin. N. Am. 2012;50:395-406.

Pergunta 7 - Quais são os achados encontrados na ultrassonografia do abdômen na pancreatite crônica?

Pergunta 8 - Quais são os achados encontrados na tomografia computadorizada do abdômen na pancreatite crônica?

RespostaAtrofia glandular, heterogeneidade parenquimatosa, calcificações, irregularidade e/ou dilatação ductal e complicações, como formações císticas e/ou sólidas,

RespostaAtualmente, a tomografia computadorizada (TC) é o método de imagem de escolha na avaliação inicial da pancreatite crônica clinicamente suspeita. Aumento ou atrofia do pâncreas, dilatação do ducto pancreático prin-cipal, presença de calcificações, pseudocistos, pseudoa-neurismas, obstrução do tubo digestivo, espessamento de planos fasciais e envolvimento dos ductos biliares são achados e complicações detectáveis.

A diferenciação entre pancreatite crônica e carcinoma pancreático, quando encontramos aumento focal ou difuso da glândula e/ou alteração textural, é, por vezes, impossível pelos métodos de imagem, até mesmo pela ressonância magnética e ecoendoscopia, sem a comple-mentação histológica. Se há extenso tecido fibroso, nota-se retardo da captação por meio de contraste, o que dificulta ainda mais o diagnóstico diferencial.

dilatação das vias biliares e derrames intracavitários, podem

ser detectadas à ultrassonografia transabdominal. Não avalia

pequenas alterações ductais (irregularidades ou dilatações

menores).

No entanto, é a presença de calcificações parenquimatosas o achado mais sensível e específico para pancreatite crônica.

Presença de mais de dez focos de calcificações parenquima-tosas correlaciona-se com fibrose em estágio avançado. A TC é mais sensível para detecção de calcificações parenquimatosas que os demais métodos de imagem não invasivos.

A atualmente denominada pancreatite da goteira duodenopan-creática (groove pancreatitis) é uma forma rara de pancrea-tite crônica que afeta o espaço entre a cabeça pancreática, o duodeno e o colédoco. A causa é desconhecida, mas há forte associação com o abuso do álcool, a hiperplasia da glândula de Brunner e a obstrução funcional do ducto de Santorini (papila menor). No entanto, pode ser difícil a diferenciação de maligni-dade periampular apenas pela imagem.

Uma forma não rara de pancreatite crônica é a de etiologia autoimune, como componente da síndrome IgG4.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

8

Pergunta 9 - Quais são os achados encontrados em ressonância magnética (RM) na pancreatite crônica?

Pergunta 10 - Qual é a contribuição da colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) no manejo da pancreatite crônica?

RespostaA ressonância magnética (RM) tem a capacidade de detectar e caracterizar alterações do parênquima pancreático e dos ductos pancreáticos na pancreatite crônica, valendo-se de sequências que propiciam dife-renciação tecidual e da técnica de colangiopancreato-grafia por ressonância magnética (CPRM).

Os aspectos de imagem mais típicos da pancreatite crônica são as calcificações, mais facilmente identifi-cadas na tomografia computadorizada e de caracteri-zação difícil nos exames de RM. A atrofia e a heteroge-neidade parenquimatosa são idealmente verificadas com a administração intravenosa de substância de contraste (gadolínio). Associam-se a esses achados a dilatação do ducto principal e/ ou secundários, bem como o padrão

RespostaEmbora até o momento não exista um verdadeiro “padrão-ouro”, a endoscopia ainda é considerada o melhor método para o diagnóstico de pancreatite crônica, especialmente em um subgrupo de pacientes com dor abdominal crônica e suspeita diagnóstica, mas que não apresentam evidências clínicas claras de insuficiência pancreática ou imagenologia anormal. Atualmente, a posição ocupada pela endoscopia tornou-se ainda mais forte, considerando-se, em conjunto, a complementação da CPER pela ecoendoscopia, que, além das imagens que fornece, possibilita a colheita de material por meio de agulhas, para avaliação histopatológica. Do ponto de

alternado de estenose/dilatação ductal, a presença de cálculos intrapancreáticos e de pseudocistos. Quando disponível, preco-niza-se a utilização da secretina por via endovenosa nos proto-colos de CPRM (sCPRM), que, em vista da maior quantidade de secreção resultante, propicia melhor identificação de altera-ções morfológicas dos ductos pancreáticos, inclusive em fases precoces da pancreatite crônica.

Sendo assim, a análise morfológica completa do pâncreas pela ressonância magnética, nos casos confirmados de pancreatite crônica ou nas suspeitas, deve incluir as sequências multipla-nares tradicionalmente aplicadas para caracterização tecidual (sequências pesadas em T1, antes e após a administração de contraste paramagnético, e sequências pesadas em T2, ambas associadas a técnicas com supressão de gordura), bem como técnica para análise da morfologia ductal (CPRM).

REFERÊNCIAS1. Miller FH, Keppke AL, Wadhwa A et al. MRI of pancreatitis and its complications: part 2, chronic pancreatitis. Am. J. Roentgenol. 2004;183:1645-1652. 2. Sica GT, Miller FH, Rodriguez G, McTavish J, Banks PA. Magnetic resonance imaging in patients with pancreatitis: evaluation of signal intensity and enhancement changes. J. Magn. Reson. Imaging. 2002;15:275-284. 3. Siddiqi AJ, Miller F. Chronic pancreatitis: ultrasound, computed tomography, and magnetic resonance imaging features. Semin. Ultrasound. CT MR. Out 2007;28(5):384-94.

vista da CPER, representam limitações ao exame papilas locali-zadas no interior de divertículos duodenais que tenham orifício de entrada muito estreito. Pacientes gastrectomizados à Billroth II com alça aferente longa ou com reconstrução do trânsito à Y de Roux ou submetidos à cirurgia bariátrica, cujas papilas se localizam a uma distância fora do alcance dos duodenoscópios convencionais, são hoje factíveis ao procedimento, com o uso dos enteroscópios-balão(ões) assistidos.

Atualmente, com o advento da pancreatografia por ressonância magnética e da ecoendoscopia, a CPER tornou-se um método mais terapêutico que diagnóstico. Por exemplo: a estenose e a litíase no ducto pancreático principal geralmente se acompa-nham de hipertensão canalicular. No caso de estenose única

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

9

RespostaA ecoendoscopia (EE) deve ser indicada para o diag-nóstico de PC após o insucesso dos outros métodos de imagem. A EE produz imagens detalhadas do pâncreas. Esse método possibilita avaliar critérios morfológicos parenquimatosos (focos e traves hiperecoicas, lobulari-dade glandular, cistos e calcificações) e ductais (ectasia ductal principal e secundária, irregularidade ductal, paredes ductais hiperecoicas e calcificações), possibi-litando estadiar a PC.

Não existe padronização da técnica e a maioria das publicações emprega terminologia ecográfica não consensual, dificultando a interpretação e a concor-dância dos achados, sobretudo entre os observadores. Organizando os critérios morfológicos ecográficos, o 1º Consenso de Rosemont (2007) propôs uma classifi-cação diagnóstica gradativa.

A EE permite a detecção de alterações da PC leve, possi-velmente não visíveis em outros métodos de imagem, unindo elementos qualitativos e quantitativos, no intuito de estabelecer o diagnóstico ecoendoscópico da PC por meio da soma de seus critérios.

REFERÊNCIAS1. Catalano MF et al. EUS-based criteria for the diagnosis of chronic pancreatitis: the Rosemont classification. Gastrointest. Endosc. 2009;69(7):1251-61. 2. Catalano MF et al. Prospective evaluation of endoscopic ultrasonography, endoscopic retrograde pancreatography, and secretin test in the di-

REFERÊNCIAS1. Classen M, Koch H, Frühmorgen P et al. Results of retrograde pancreatography. Gastroent. Jap. 1972;7:131-34. 2. Machado G. Colangiopancreatografia retrógrada endocópica. Tema apresentado na mesa-redonda “Recentes Avanços em Endoscopia Digestiva”, I Seminário Brasileiro de Endoscopia Digestiva. Rio de Janeiro. 14 jul 1973. 3. Saleem A, Baron TH, Gastout CJ et al. Endoscopic retrograde cholangiopancreatography using a single-balloon enteroscope in patients with altered Roux-en-Y anatomy. Endoscopy. 2010;42:656-60. 4. RöschT, Daniel S, Scholz M et al. Endoscopic treatment of chronic pancreatitis: a multicenter study of 1000 patients with long-term follow-up. Endoscopy. 2002;34(10):765-771.

No entanto, tomando por base apenas achados ecoendoscó-picos, ainda permanece controverso o diagnóstico da PC inicial.

Com a progressão da doença, achados como cálculos, focos hipe-recoicos, focos com sombra acústica posterior e ectasia ductal principal podem estar correlacionados à insuficiência pancreática, possivelmente contribuindo com a decisão terapêutica.

Representando um novo recurso semiológico ecográfico, a elasto-grafia qualitativa e a quantitativa podem contribuir na identificação gradativa dos diferentes grupos descritos na classificação de Rosemont e da probabilidade de haver insuficiência pancreática.

Pelo risco de complicação e pela ausência de critérios histoló-gicos definidos para PC, a indicação de punção ecoguiada aspi-rativa com agulha fina (EE-PAAF) ficou restrita ao diagnóstico diferencial das massas pancreáticas, notadamente das neopla-sias malignas pancreáticas. Embora sem consenso, e reco-mendando considerar a relação custo-benefício em cada caso, estudos recentes demonstram que a EE-PAAF melhora o valor preditivo negativo da EE e, combinada aos seus achados, pode contribuir na compreensão da fase de doença.

localizada no óstio do canal pancreático principal, é possível o tratamento endoscópico pela osteotomia seletiva do Wirsung e nas estenoses múltiplas, pelo emprego de balões hidrostáticos. Igualmente, na litíase pancreática, é possível a extração dos cálculos empregando as cestas de Dormia, após a realização de osteotomia e litotripsia mecânica ou por ondas de choque. Nas fístulas, a endoscopia possibilita a implantação de endo-próteses plásticas, que devem permanecer até que ocorra seu fechamento ou que se torne óbvio o insucesso dessa terapêu-

tica. De igual forma, é possível a drenagem dos pseudocistos, principalmente os que estão em contato com a parede posterior do estômago ou duodeno, considerados de localização ideal para abordagem endoscópica. Além disso, nos 10% a 30% dos pacientes com pancreatite crônica que desenvolvem estenose da porção intrapancreática do colédoco, a endoscopia oferece a alternativa de drenagem biliar por endopróteses nos casos que representem alto risco cirúrgico.

Pergunta 11 - Qual é o papel da ecoendoscopia no diagnóstico da pancreatite crônica?

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

10

agnosis of chronic pancreatitis. Gastrointest. Endosc. 1998;48(1):11-7. 3. DeWitt J et al. EUS-guided Trucut biopsy of suspected nonfocal chronic pancreatitis. Gastrointest. Endosc. 2005;62(1):76-84. 4. Gutman J, Ullah A. Advances in Endoscopic Ultrasound. Ultrasound Clinics. 2009;4(3):369-384. 5. Hollerbach S et al. Endoscopic ultrasonography (EUS) and fine-needle aspiration (FNA) cytology for diagnosis of chronic pancreatitis. Endoscopy. 2001;33(10):824-31. 6. Kalmin B, Hoffman B, Hawes R, Romagnuolo J. Conventional versus Rosemont endoscopic ultrasound criteria for chronic pancreatitis: Comparing interobserver reliability and intertest agreement. 7. Can. J. Gastroenterol. 2011;25(5):261-264. 8. Lees WR. Endoscopic ultrasonography of chronic pancreatitis and pancre-atic pseudocysts. Scand. J. Gastroenterol. Suppl. 1986;123:123-9. 9. Sahai AV et al. Prospective assessment of the ability of endoscopic ultrasound to diagnose, exclude, or establish the severity of chronic pancreatitis found by endoscopic retrograde cholangiopan- creatography. Gastrointest. Endosc. 1998;48(1):18-25. 10. Sivak MV, Kaufman A. Endoscopic ultrasonography in the differential diagnosis of pancreatic disease. A preliminary report. Scand. J. Gastroenterol. Suppl. 1986;123:130-4. Tandan M, Reddy DN. Endotherapy in chronic pancreatitis. World J. Gastroenterol. 2013;19(37):6156-6164. 11. Wallace M, Massimo R. Endoscopic ultrasound in chronic pancreatitis. UpToDate [Internet]. Set 2009 [acessado em: 4 mar 2009]. 12. Wiersema M et al. Prospective evaluation, of endoscopic ultrasonography and endoscopic retrograde cholangiopancreatography in patients with chronic abdominal pain of suspected pancreatic origin. Endoscopy. 1993;25:555-64.

Pergunta 12 - Como tratar a dor da pancreatite crônica?

RespostaA dor é sintoma cardinal da PC, acometendo mais de 90% dos casos, sendo incapacitante na metade deles. Seu controle é objetivo principal no tratamento da doença.

Entre as medidas gerais para o controle da dor, a absti-nência alcoólica é indispensável, sendo o álcool agressor direto ao pâncreas, promotor de inflamação e estímulo secretório com modificações na composição do suco pancreático, agravando a obstrução intracanalicular1,3.

A suspensão do tabaco é essencial, pois a nicotina é fator de risco independente na gênese da PC e na instalação e progressão da dor por mecanismos neuropáticos1-3.

A restrição dietética se aplica apenas aos episódios de agudização, devendo a alimentação ser retomada tão logo possível. O consumo de alimentos ricos em nutrientes antioxidantes, como frutas e legumes, deve ser estimulado, embora não seja suficiente como medida isolada para controle da dor1,3.

A reposição de enzimas pancreáticas, embora com resul-tados inconsistentes como medida analgésica isolada em estudos de meta-análise, tem sido largamente empre-gada para permitir o suporte nutricional adequado em pacientes com dor, mesmo na ausência de esteatorreia. Essa reposição inibiria o estímulo alimentar do pâncreas pela secretina/colecistocinina e as formulações micro-capsuladas e microesferuladas podem também ser empregadas com essa finalidade1,3.

O uso concomitante de inibidor da bomba de próton, para a neutralização ácida, complementaria essa inibição

e permitiria o controle de sintomas resultantes da redução da secreção de bicarbonato pelo pâncreas1.

A intensidade da dor e seu caráter crônico determinam quase sempre a necessidade de tratamento analgésico medicamentoso escalonado, começando pelos analgésicos comuns em asso-ciação com codeína e progredindo para os outros opioides1,3.

A resposta inadequada ao tratamento com opioides mais leves deve levar, sem retardos, à utilização de analgésicos de ação central empregados no tratamento da dor crônica neuropática, sendo a amitriptilina, a gabapentina e a pregabalina os mais indicados.

A pregabalina deve ser empregada com cautela nos pacientes em uso de insulina pelo risco de hipoglicemia2-4.

A falência do tratamento clínico impõe a busca de outras causas de dor, como pseudocistos que podem causar hipertensão pancreática parenquimatosa e ductal. Essas causas podem exigir tratamento endoscópico ou cirúrgico1,5.

Uma vez que a dor não sedada tende a se perpetuar por meca-nismos de reorganização neural, e que as cirurgias que combinam técnicas de ablação com descompressão ductal e parenquima-tosa são menos eficientes no controle da dor quando indicadas tardiamente, casos refratários ao tratamento clínico devem ser considerados candidatos para tratamento cirúrgico, pesando-se os riscos e as complicações cirúrgicas, entre as quais a insta-lação do diabetes e a piora da insuficiência exócrina4-6.

O bloqueio neural do plexo celíaco deve ser reservado para pacientes com dor refratária sem condições para outras técnicas cirúrgicas, sendo seus efeitos transitórios1,5.

REFERÊNCIAS1. AGA Technical Rewiew Treatment of pain in chronic pancreatitis. Gastroenterology. 1998;115(3):765-776. 2. Gilron I et al. Neuropathic pain: prin-ciples of diagnosis and treatment. Mayo Clin. Proc. 2015;90(4):532-45. 3. Moran R et al. Pancreatic Pain. Curr. Opin. Gastroenterol. 2015;31:407-415. 4. Olessen SS et al. Pain-associated adaptative cortical reorganization in chronic pancreatitis. Pancreatology. 2010;10(6):742-51. 5. Talukdar R et al. Pain in chronic pancreatitis: managing beyond the pancreatic duct. Word. J. Gastroenterol. 2013;19(38):6319-28. 6. Yang CJ et al. Surgery for chronic pancreatitis: the role of early surgery in pain management. Pancreas. 2015;44(5):819-23.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

11

REFERÊNCIAS1. Dominguez-Muñoz JE. Pancreatic exocrine insufficiency: When is it indicated, what is the goad and how to do it? Adv. Med. Sci. 2011;56:1-5. 2. Gupte A, Forsmark CE. Chronic pancreatitis. Curr. Opin. Gastroenterol. 2014;30:500-505. 3. Lindkuist B. Diagnosis and treatment of pancreatic exo-crine insufficiency. World J. Gastroenterol. 2013;19(42):7258-7266. 4. Lindkuist B, Dominguez-Muñoz JE, Luacis-Regueira M et al. Serum nutritional markers for prediction of pancreatic exocrine insufficiency in chronic pancreatitis. Pancreatology. 2012;12:305-310. 5. Löhr JM. Exocrine pancreatic insufficiency. 2 ed. Bremen: UNI-MED Scienci. 2010:91.

Pergunta 13 - Como e quando administrar suplemento enzimático na pancreatite crônica?

Pergunta 14 - Como conduzir a terapêutica da insuficiência endócrina na pancreatite crônica?

RespostaA pancretite crônica é a principal causa de insuficiência exócrina do pâncreas em adultos no mundo ocidental e tem no etilismo crônico seu principal fator de risco.

No paciente com PC, a reposição enzimática deve iniciar-se precocemente, quando a desnutrição de micro e macronutrientes se faz evidente, mesmo na ausência de esteatorreia.

Recomenda-se, já no primeiro contato com o paciente, a mensuração laboratorial de pré-albumina, albumina, vita-minas lipossolúveis e B12, ácido fólico, magnésio, cálcio, zinco e tiamina, que ajudarão no diagnóstico precoce de IEP, avaliação nutricional e resposta terapêutica.

Recomendam-se enzimas pancreáticas, em forma de minimicroesferas acidorresistentes, que tenham como principal componente a lipase, para que se misturem ao quimo e atinjam o duodeno, no qual, em pH > 5, promo-verão uma adequada digestão.

A dose inicial é a avaliada de acordo com o grau de insu-ficiência ou disfunção exócrina do pâncreas. Em geral,

RespostaO diabetes mellitus decorrente da PC (tipo III-c), caracte-rizado pela redução da insulina, pela hipoglucagonemia e pela consequente labilidade do controle glicêmico, necessita de orientação dietética com aporte calórico de acordo com o IMC e índices glicêmicos de jejum e pós-prandiais.

A adaptação ao extrato enzimático prescrito deve ser observada, pois muitas formulações não apresentam biodisponibilidade enzimática adequada, seja por alte-

inicia-se com 25.000-50.000 unidades durante as principais refeições (café, almoço e jantar), relacionando-se com o grau de lipídios ingeridos.

Não são aconselhadas dietas hipolipídicas, pois, além de pouco palatáveis, aumentam o risco de déficit de ácidos graxos e de vitaminas lipossolúveis. Além disso, a presença de gordura na dieta estimula a ação da enzima administrada.

Em caso de carência de micronutrientes, orienta-se associá-los sob a forma de reposição junto às refeições.

Frente a uma resposta parcial ou inadequada, deve-se asso-ciar um bloqueador H2 antes do café da manhã e jantar ou um inibidor da bomba de prótons em jejum.

Caso o objetivo não seja atingido, pode-se acrescentar mais 25.000 unidades numa dose máxima de 75.000U por refeição.

O paciente não responsivo e com diarreia e/ou esteatorreia deve ser avaliado quanto a supercrescimento bacteriano ou enteropa-rasitoses, como giardíase ou estrongiloidíase.

ração na conformação espacial da enzima pelo pH gástrico (formulações não protegidas contra a acidez gástrica) ou condi-cionadas em cápsulas de difícil degranulação, impossibilitando a adequada distribuição junto ao bolo alimentar.

Na PC, a necessidade de altas doses de insulina é incomum, por causa do déficit concomitante da secreção de glucagon e pela desnutrição.

A utilização de hipoglicemiantes orais é a opção inicial em determinados casos, seguida por insulinoterapia monitorada por mensurações dos níveis glicêmicos nos períodos pré e pós-prandiais. Essas dosagens poderão auxiliar na posologia

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

12

adequada da insulina, evitando-se, assim, os frequentes casos de hipoglicemia, habitualmente mais graves do que os episódios de hiperglicemias moderadas. O diabetes tipo III-c raramente se complica com cetoacidose.

A raridade dos acidentes de cetoacidose pode estar ligada à diminuição paralela de glucagon, que exerce um papel impor-tante no agravamento da cetoacidose do diabetes tipo I. Também não parece haver diferença significativa na necessidade de insu-lina entre os pacientes portadores de diabetes tipo I, II e III-c.

As complicações tardias do diabetes tipo III-c, sobretudo

aquelas relacionadas às microangiopatias, merecem atenção especial. Estudos sugerem que a microangiopatia diabética e suas complicações estão mais relacionadas aos desequilíbrios metabólicos do diabetes tipo III-c do que às desordens imunoló-gicas ligadas ao DM tipo I.

A pancreatite autoimune necessita de tratamento específico com corticosteroides de excelente resposta em curto prazo. No entanto, trabalhos recentes têm mostrado ocorrência frequente de resistência à corticoterapia e, nesses casos, a terapia imunos-supressora é uma opção.

REFERÊNCIAS1. Beger HG, Schlosser W, Friess HM, Büchler MW. Duodenum-preserving head resection in chronic pancreatitis changes the natural course of the disease: a single-center 26-year experience. Ann. Surg. 1999;230:512-9 2. Choudhuri G, Lakshmi CP, Goel A. Pancreatic diabetes. Trop. Gastroenterol. Abr-jun 2009;30(2):71-5. 3. Maekawa N, Ohneda A, Kai Y, Saito Y, Koseki S. Secondary diabetic retinopathy in chronic pancreatitis. Am. J. Ophthalmol. 1978;85:835-40. 4. Couet C, Genton P, Pointel JP, Louis J, Gross P, Saudax E et al. The prevalence of retinopathy is similar in diabetes mellitus secondary to chronic pancre-atitis with or without pancreatectomy and in idiopathic diabetes mellitus. Diabetes Care. 1985;8:323-8. 5. Larsen S, Hilsted J, Philipsen EK, Tronier B, Damkjaer NM, Worning H. The effect of insulin withdrawal on intermediary metabolism in patients with diabetes secondary to chronic pancreatitis. Acta Endocrinol. (Co-penh). 1991;124:510-5. 6. Levitt NS, Adams G, Salmon J, Marks IN, Musson G, Swanepoel C et al. The prevalence and severity of microvascular complications in pancreatic diabetes and IDDM. Diabetes Care. 1995;18:971-4. 7. Malka D, Hammel P, Sauvanet A, Rufat P, O’Toole D, Bardet P et al. Risk factors for diabetes mellitus in chronic pancreatitis. Gastroenterology. 2000;119:1324-32. 8. Nealon WH, Thompson JC. Progressive loss of pancreatic function in chronic pancre-atitis is delayed by main pancreatic duct decompression. A longitudinal prospective analysis of the modified puestow procedure. Ann. Surg. 1993;217:458-66. 9. Silva L, Oliveira RB, Troncon LE, Foss MC, Souza CS, Gallo L Jr. Autonomic nervous function in alcohol-related chronic pancreatitis. Pancreas. 2000;20:361-6.

Pergunta 15 - Como avaliar e tratar as complicações vasculares associadas à pancreatite crônica?

RespostaAs complicações vasculares da PC, apesar de incomuns, associam-se à elevada morbimortalidade, especial-mente se não diagnosticadas precocemente e tratadas de modo adequado. Devem ser consideradas no diag-nóstico diferencial de pacientes com PC, evoluindo com sangramento intracavitário e/ ou gastrointestinal. Tais complicações decorrem de lesões da vascularização pancreática ou peripancreática, podendo ser de origem arterial ou venosa.

O acometimento vascular de artérias próximas ao pâncreas – esplênica, hepática, gastroduodenal ou pancreaticoduo-denal – pode levar à formação de lesão cística vascular denominada pseudoaneurisma.

A evolução do pseudoaneurisma é variável, podendo haver sangramento arterial para o interior do pseudo-cisto (aumento do volume do mesmo), para a cavidade peritoneal (hemoperitônio) ou sangramento para o inte-rior do ducto pancreático (hemosuccus pancreaticus). Nesse último caso, o paciente pode apresentar-se clini-camente com quadro de hemorragia digestiva alta, que varia desde sangramento gastrointestinal intermitente até hemorragia maciça com colapso circulatório e óbito.

As complicações vasculares da pancreatite crônica associadas ao acometimento venoso, resultam de inflamação e trombose da veia esplênica – que apresenta anatomia vulnerável, por locali-zar-se próxima à borda ínfero-posterior do pâncreas – podendo desencadear hipertensão portal segmentar, seletiva ou esquerda, com consequente formação de varizes, predominantemente gástricas. Raramente há compressão ou obstrução portal.

A obstrução ou a trombose da veia esplênica pode advir de diversas causas, como edema pancreático, fibrose e pseudocisto pancreá-tico, com estase venosa, lesão da íntima e hipercoagulabilidade.

Clinicamente, tais pacientes podem ser assintomáticos ou apre-sentar sangramento gastrointestinal de intensidade variável (sangue oculto, hematêmese, melena, hematoquezia ou anemia ferropriva).

Os métodos de avaliação por imagem – ultrassonografia abdo-minal com doppler, angiografia por tomografia computadori-zada ou por ressonância magnética e ecoendoscopia – são fundamentais para confirmar a suspeita clínica de complicação vascular em paciente com PC. Porém, a angiografia mesentérica permanece com papel expressivo nesse contexto clínico, pois, além de permitir o diagnóstico de tais complicações e localização da origem do sangramento, possibilita conduta terapêutica.

Em pacientes com sangramento proveniente de pseudoaneu-risma, a embolização angiográfica está indicada, com o intuito

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

13

REFERÊNCIAS1. Beattie GC, Hardman JG, Redhead D, Siriwardena AK. Evidence for a central role for selective mesenteric angiography in the management of the major vascular compli-cations of pancreatitis. Am. J. Surg. 2003;185:96. 2. Heider TR, Azeem S, Galanko JA, Behrns KE. The natural history of pancreatitis-induced splenic vein thrombosis. Ann. Surg. 2004;239:876. 3. Marshall GT, Howell DA, Hansen BL, Amberson SM, Abourjaily GS, Bradenberg CE. Multidisciplinary approach to pseudoaneurysms complicating pancreatic pseudocysts: impact of pretreatment diagnosis. Arch. Surg. 1996;131:278-83. 4. Nadkarni NA, Khanna S, Vege SS. Splanchnic venous thrombosis and pancreatitis. Pancreas. 2013;42:924. 5. Sakorafas GH, Sarr MG, Farley DR, Farnel MB. The significance of sinistral portal hypertension complicating chronic pancreatitis. Am. J. Surg. Fev 2000;179(2):129-33. 6. Worning H. Incidence and prevalence of chronic pancreatitis. In: Beger HG, Buchler M, Ditschuneit H, Malfertheiner P (eds.). Chronic Pancreatitis. Berlin: Springr-Verlag; 1990. p. 8-14. 7. Yeo CJ, Bastidas JA, Lynch-Nyhan A et al. The natural history of pancreatic pseudocysts documented by computed tomography. Surg. Gynecol. Obstet. 1990;170:411.

Pergunta 16 - Como avaliar e tratar o pseudocisto pancreático?

RespostaO pseudocisto pancreático pode ser definido como uma coleção organizada, rica em enzimas pancreáticas, que surge como consequência e permanece após um episódio de pancreatite aguda, ou após exacerbação de uma PC. Desenvolve-se quando o ducto pancreático principal ou um dos seus ramos se rompe, liberando secreção pancreática para o retroperitônio ou para os planos peritoniais peripancreáticos. Sua parede é formada por uma cápsula fibrosa, sem epitélio próprio.

A classificação revisada de Atlanta (2012) conceitua pseudocisto como uma coleção exclusivamente líquida e com parede fibrosa. As coleções com mais de quatro semanas de evolução, parede formada por tecido de granulação e conteúdo misto em seu interior secundá-rias à pancreatite aguda são, atualmente, caracterizadas como necrose organizada (walled off necrosis WON).

História e exame clínico de PC, associados com exame de ressonância magnética ou tomografia evidenciando alterações pancreáticas compatíveis (calcificações, ducto pancreático em rosário, atrofia parenquimatosa) e coleção peripancreática exclusivamente líquida com mais de quatro semanas de evolução, são os achados típicos de um pseudocisto.

O diagnóstico diferencial deve ser feito com: 1) coleções fluidas agudas peripancreáticas, 2) coleções necróticas agudas, 3) necrose organizada (walled off necrosis WON) e 4) neoplasias císticas do pâncreas.

A ressonância magnética é, hoje, o exame de primeira linha na identificação de um pseudocisto, uma vez que caracteriza melhor as diferenças entre pseudocistos e

necrose organizada, secundária aos processos agudos. Para o planejamento do tratamento, é importante ter informações deta-lhadas sobre o ducto pancreático, bem como as relações anatô-micas do pseudocisto.

A CPRE deve ser indicada criteriosamente, devido a seu poten-cial de complicações, mas, dentre as modalidades de imagem, é a que melhor oferece visão anatômica e dinâmica do ducto pancreático. É importante para caracterizar a comunicação entre o pseudocisto e o ducto pancreático, e na suspeita de síndrome de desconexão distal.

A ecoendoscopia, além do estudo morfológico, permite obter material para análise bioquímica e citopatológica na dúvida diagnóstica.

O risco de complicações graves em pseudocistos assintomá-ticos tem sido referido como menor que 10%. Diferentemente da concepção anterior, em que pseudocistos maiores que 6cm e seis semanas de evolução sem regressão eram drenados, atual-mente, considera-se que pseudocistos assintomáticos devem ser inicialmente observados. A drenagem percutânea só deve ser feita nos casos sintomáticos em que não há comunicação da coleção com o ducto pancreático e com janela segura de drenagem. A drenagem endoscópica é considerada a primeira escolha no tratamento de pseudocistos sintomáticos, estando a cirurgia indicada nos casos de insucesso ou impossibilidade do tratamento endoscópico. Estudo randomizado (Varadalajulu et al., 2013) comprova essa afirmativa.

Quando indicado, o tratamento cirúrgico habitualmente é reali-zado por cistogastrostomia e cistojejunostomia em Y de Roux.

Na presença de síndrome de desconexão distal, o tratamento cirúrgico permanece como primeira opção.

de promover hemostasia definitiva e/ou estabilização hemodinâ-mica. Quando do insucesso ou indisponibilidade do tratamento angiográfico, o tratamento cirúrgico deve ser feito, apesar de associar-se com alto índice de morbidade e mortalidade.

A esplenectomia é o procedimento cirúrgico mais eficaz em controlar, de forma permanente, o sangramento gastrointestinal por varizes nos pacientes com trombose de veia esplênica e hipertensão portal segmentar.

REFERÊNCIAS1. Frulloni L, Falconi M, Gabbrielli A et al. Italian consensus guidelines for chronic pancreatitis. Dig. Liver Dis. Nov 2010;42(Suppl. 6):S381-406. 2. Ge PS et al. Pancreatic Pseudocysts Advances in Endoscopic Management. Gastroenterol. Clin. N. Am. 2015;45(1):9-27. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1016/j.gtc.2015.10.003>. 3. Varadarajulu S, Bang JY, Sutton BS, Equal Efficacy of Endoscopic and Surgical Cystogastrostomy for Pancreatic Pseudocyst Drainage in a Randomized Trial. Gastroenterology. 2013;145:583-590. 4. Zhao X, Feng T, Ji W. Endoscopic versus surgical treatment for pancreatic pseudocyst. Digestive Endoscopy. 2016;28:83-91.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

14

REFERÊNCIAS1. Chebli JM, Gaburri PD, De Souza AF, Ornellas AT, Martins Junior EV, Chebli LA, Felga GE, Pinto JR. Internal pancreatic fistulas: proposal of a man-agement algorithm based on a case series analysis. J. Clin. Gastroenterol. 2004;38:795-800. 2. Mirtallo JM, Forbes A, McClave SA, Jensen GL, Waitz-berg DL, Davies AR. International consensus guidelines for nutrition therapy in pancreatitis. J. Parenter. Enteral Nutr. 2012;36:284-291. 3. Nandasena, Wijerathne, De Silva. Fluctuating serum amylase levels in a patient with pancreatic ascites. Ceylon Medical Journal. 2015;60:161-162. 4. Varadarajulu S, Rana SS, Bhasin DK. Endoscopic Therapy for Pancreatic Duct Leaks and Disruptions. Gastrointest. Endoscopy Clin. N. Am. 2013;23:863-892.

REFERÊNCIAS1. Chebli JM, Gaburri PD, de Souza AF, Ornellas AT, Martins Junior EV, Chebli LA, Felga GE, Pinto RJ. Internal pancreatic fistulas: proposal of a management algorithm based on a case serie analisys. 2.J. Clin. Gastroenterol. 2004;38:795-800. 3. Cunha JE, Machado M, Bacchella T et al. Surgical treatment of pancreatic ascites and pancreatic pleural effusions. Hepatogastroenterology. 1995;42:748-51. 4. Gomez-Cerezo J, Barbado Cano A, Suárez I et al. Pancreatic ascites study of therapeutic options by analysis of case reports and case series between the years 1975 and 2000. Am. J. Gastroenterol. 2003;98:568-77. 5. Kaman L, Behera A, Singh R, Katariya RN. Internal pancreatic fistulas with pancreatic ascites and pancreatic pleural effusions: recoginition and management. ANZ J. Surg. 2001;71:221-225. Kozarek RA, Ball TJ, Patterson DJ et al. Endoscopic transpapillary therapy for disrupted pancreatic duct and peripancreatic fluid collections. Gastroenterology. 1991;100:13-62. 6. Pai CG, Suvarna D, Bhat G. Endoscopic treatment as first-line therapy for pancreatic ascites and pleural effusion. J Gastroenterol Hepatol. Jul 2009;24(7):1198-202. 7. Subrt Z, Ferko A, Papík Z, Vacek Z, Sedlácek Z. A rare cause of mediastinal expansion with a massive pleural effusion. Postgrad. Med. J. 2005;81:18.

Pergunta 17 - Como avaliar e tratar o derrame pleural na pancreatite crônica?

Pergunta 18 - Qual é a conduta atual para o tratamento da ascite pancreática na pancreatite crônica?

RespostaO derrame pleural é uma apresentação clínica que resulta do escoamento do suco pancreático para o espaço pleural secundário ao rompimento de ductos pancreáticos ou de um pseudocisto. Pode ser volu-moso e dificultar a dinâmica respiratória, sendo uma complicação incomum. Se não tratada adequada-mente associa-se a alta taxa de morbimortalidade.

É mais comum à esquerda e corresponde a um exsudato rico em amilase e lipase. Os pacientes, quando sintomá-ticos, apresentam-se mais comumente com tosse, dor torá-cica e dispneia. Em até um quarto dos pacientes, pode-se verificar a presença simultânea de ascite pancreática.

O diagnóstico depende de uma grande suspeição clínica, devendo ser considerado na vigência de derrame pleural sem etiologia definida. Pode ser confirmado por exames de imagem (RX e TC de tórax) e análise labo-

RespostaAscite pancreática é uma complicação pouco frequente na PC, associada a morbidade e mortalidade altas. É necessária grande suspeição clínica, porém o diagnós-tico é fácil de realizar, pois as dosagens de amilase e proteína elevadas no fluído cavitário confirmam a hipó-tese diagnóstica. Atualmente, a dieta enteral é a mais importante conduta terapêutica clínica. A realização de um exame de imagem (CPRM, CPRE e TC) com a iden-tificação do local de ruptura do ducto ou do pseudocisto determina o tipo de tratamento.

ratorial do líquido pleural, que demonstra alto conteúdo de amilase (> 1.000UI/L) e proteínas (> 3g/dL).

A TC e a RM com colangiorressonância são úteis na avaliação da morfologia pancreática, dilatação, estenose dos ductos, pseudocisto e fístula. A CPRE é indicada em casos de não identificação do trajeto fistuloso pelos exames anteriores ou quando a colocação de endopróteses torna-se necessária.

O tratamento inicial é conservador e consiste em repouso gastrointestinal com dieta oral zero, nutrição preferencial-mente enteral elementar ou, eventualmente, parenteral total nos casos de desnutrição grave ou não funcionamento do trato gastrointestinal. Repetidas drenagens (toracocenteses) podem ser necessárias. A utilização de droga antissecretora (octreotide) permanece controversa. O tratamento endos-cópico/cirúrgico tem indicação na falha da terapia conser-vadora, que deve durar até duas a três semanas. O tipo de intervenção depende da anatomia do ducto pancreático prin-cipal visto à CPRE.

Frente à ruptura de ductos secundários ou quando não é iden-tificado o ponto de ruptura, deve-se optar por um tratamento clínico conservador. Na falha do tratamento clínico, após três semanas, a terapia endoscópica é a conduta de escolha. Nas rupturas parciais do ducto principal, a papilotomia com colo-cação de prótese pancreática ou sonda nasopancreática está indicada; nos casos de ruptura total, o tratamento inicial deve ser cirúrgico. Quando há ruptura de um pseudocisto comunicante com o ducto pancreático, a drenagem endoscópica do ducto é a primeira opção.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

15

REFERÊNCIAS1. Abdallah AA, Krige JE, Bornman PC. Biliary tract obstruction in chronic pancreatitis. HPB (Oxford). 2007;9:421-8. 2. Cunha JE, Bacchella T, Mott C, Jukemura J et al. Surgical treatment of biliary complications from calcifying chronic pancreatitis. International Surgery. 1984;69:149-54. 3. Frey CF, Suzuki M, Isaji S. Treatment of chronic pancreatitis complicated by obstruction of the common bile duct or duodenum. World Journal of Surgery. 1990;14(1):59-69. 4. Huizinga WK, Baker LW. Surgical intervention for regional complications of chronic pancreatitis. International Surgery. 1993;78(4):315-9. 5. Stabile BE, Calabria R, Wilson SE, Passaro E Jr. Stricture of the common bile duct from chronic pancreatitis. Surgery, Gynecology & Obstetrics. 1987;165(2):121-6. 6. Taylor S, Adams D, Anderson M. Duodenal stricture: a complication of chronic fibrocalcific pancreatitis. South. Med. J. 1991;84:338-341. 7. Vijungco JD, Prinz RA. Management of biliary and duodenal complications of chronic pancreatitis. World Journal of Surgery. 2003;27(11):1258-70.

Pergunta 19 - Qual é a conduta na obstrução biliar ou do trato gastrointestinal na pancreatite crônica?

RespostaA incidência da obstrução das vias biliares em pacientes com PC varia de 4% a 30%. As manifesta-ções clínicas, quando presentes, são variáveis e carac-terizam-se por episódios de exacerbação e remissão. A principal queixa é a presença de icterícia intermi-tente ou contínua eventualmente acompanhada por episódios de colangite. Inicialmente, opta-se pelo tratamento conservador, pois a icterícia pode ser auto-limitada pela diminuição do edema da região ou reso-lução de um pseudocisto cefálico. A descompressão da via biliar é indicada quando a icterícia persiste por mais de 30 dias ou na vigência de colangite.

A drenagem endoscópica constitui uma solução acei-tável em curto e médio prazos, mas não deve ser recomendada como tratamento definitivo que é obtido com maior sucesso pela cirurgia; entretanto, pode ser a única opção de tratamento nos casos com hiper-tensão portal seletiva e com contraindicação cirúrgica.

A experiência clínica tem demonstrado piores resul-tados do tratamento endoscópico nos pacientes com calcificação da porção cefálica do pâncreas. A cirurgia com anastomose coledocojejunal em Y de Roux

proporciona ótima drenagem biliar, sendo a melhor opção terapêutica em longo prazo. No entanto, a escolha do tipo de cirurgia baseia-se também na condição do paciente e na presença de outros fatores concomitantes, como obstrução duodenal e complicações pancreáticas que requeiram trata-mento cirúrgico.

A obstrução duodenal é menos frequente que a da via biliar, ocorrendo em 0,5% a 13% dos pacientes internados. Pode se apresentar de forma transitória, mais comum, sendo causada pelo edema característico dos episódios de agudização e, mais raramente, como obstrução prolongada ou permanente, pela fibrose ou pseudocisto cefálicos. A obstrução duodenal na PC pode se resolver com tratamento conservador de modo semelhante à obstrução biliar.

Os pacientes que persistem com sintomas após três a quatro semanas ou que apresentam obstrução total do duodeno têm indicação de tratamento cirúrgico. Os raros casos de pacientes com obstrução duodenal persistente devem ser tratados por meio de gastroenteroanastomose, derivação ou drenagem de pseudocisto ou, mesmo, duodenopancreatec-tomia, dependendo da associação com outras lesões e com quadro de dor não responsiva ao tratamento clínico.

Pergunta 20 - Qual é a definição, a classificação e as causas das fístulas pancreáticas?

RespostaAs fístulas pancreáticas são definidas como a ocor-rência de um extravasamento de secreção pancreá-tica exócrina, a partir de uma solução de continuidade do sistema ductal pancreático.

Podem ser divididas em fístulas internas (fluido pancreático drena para cavidade peritoneal, pleural ou para vísceras adjacentes) ou externas, com exteriorização cutânea da secreção pancreática.As externas ocorrem quase sempre em decorrência de uma manipulação direta do pâncreas, por procedimentos propedêuticos ou terapêuticos.

As principais caracterizações de fístulas externas atualmente empregadas são a do International Study Group for Pancre-atic Fistulae (ISGPF, 2005), em que qualquer volume drenado a partir do terceiro dia, com amilase superior a três vezes o nível sérico é considerado fístula, e a de Sarr (2007), que conceitua fístula pancreática como a drenagem superior a 30ml, após o quinto dia, com amilase superior a cinco vezes o valor de referência para o nível sérico desta, embora não exista consenso sobre o assunto.

As fístulas pancreáticas são classicamente divididas em grau A (tratada conservadoramente), grau B (necessita procedi-mentos intervencionistas) e grau C (necessita reoperações

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

16

Pergunta 21 - Qual é a conduta na necrose da pancreatite crônica?

RespostaNecrose pancreática é definida como presença de parênquima não viável detectável pela TC ou RM com contraste. Não é uma complicação comum na PC, apresentando-se em, aproximadamente, 10% dos casos, de forma localizada e em qualquer estágio da doença, mas sempre em episódio de agudização.

Existem, ao menos, dois mecanismos de necrose pancreática na PC: ativação intrapancreática de enzimas e obstrução dos ductos pancreáticos, levando à elevação da pressão intraductal, redução do fluxo sanguíneo, isquemia e necrose. As necroses na PC determinam uma série de complicações. Nas

situações de necrose focal, seguida de fibrose acometendo o ducto pancreático principal, pode-se seguir dilatação ductal, hipertensão intraparenquimatosa, que pode resultar em novos focos de necrose pelos mecanismos anteriormente assinalados ou então uma progressiva atrofia e disfunção do órgão. Em algumas situações, a necrose pode evoluir para pseudocistos pancreáticos de dimensões variáveis e com complicações diversas anteriormente citadas.

Embora menos comum do que na pancreatite aguda, esse tecido inviável pode infectar-se (necrose infectada) ou orga-nizar-se e também se infectar. Ambos os casos merecem drenagem preferencialmente por procedimento endoscópico ou radiológico e, eventualmente, cirúrgico.

REFERÊNCIAS1. Bernardino AL, Guarita DR, Mott CB, Pedroso MR, Machado MC, Laudanna AA, Tani CM, Almeida FL, Zatz M. CFTR, PRSS1 and SPINK1 mutations in the devel-opment of pancreatitis in Brazilian patients. JOP. Set 2003;4(5):169-77. 2. Blasbalg R, Baroni RH, Costa DN, Machado MC. MRI features of groove pancreatitis. Am. J. Roentgenol. Jul 2007;189(1):73-80. 3. Cunha JEM, Bacchella T, Mott CB, Machado MC. Management of pancreatic pseudocysts in chronic alcoholic pancreatitis with duct dilatation. Int. Surg. Jan-mar 1985;70(1):53-6. 4. Cunha JEM, Bacchella T, Mott CB, Jukemura J, Abdo EE, Machado MC. Surgical treatment of biliary complications from calcifying chronic pancreatitis. Int. Surg. Abr-jun 1984;69(2):149-54. 5. Cunha RM, Mott CB, Guarita DR, Pedroso MR, Jukemura J, Bacchela T, Cunha JE, Machado MC, Laudanna AA. Complications of chronic pancreatitis in São Paulo (Brazil). Rev. Hosp. Clin. Fac. Med. São Paulo. Nov-dez 1997;52(6):306-15. 6. Machado MC, Cunha JEM, Bacchella T, Mott CB, Duarte I, Bettarello A. Acute pancreatic necrosis in chronic alcoholic pancreatitis. Dig. Dis. Sci. Ago 1984;298):709-13. 7. Machado MC, Cunha JEM, Bacchella T, Penteado S, Jukemura J, Abdo EE, Montagnini AL. Pylorus-preserving pancreatoduodenectomy associated with longitudinal pancreatojejunos-tomy for treatment of chronic pancreatitis. Hepatogastroenterology. Jan-fev 2003;50(49):267-8. 8. Machado MC, Cunha JEM, Bacchella T, Penteado S, Jukemura J, Mott CB, Pinotti HW. Surgical treatment of ascites and pleural effusion in patients with chronic pancreatitis. Rev. Hosp. Clin. Fac. Med. São Paulo. Set-out 1989;44(5):237-43.

REFERÊNCIAS1. Barreto G, D’Souza MA, Shukla PJ et al. The gray zone between post pancreaticoduodenectomy collections and pancreatic fistula. Pancreas. 2008;37(4):422-5. 2. Bassi C, Dervenis C, Buttunini G et al. Postoperative pancreatic fistula: an international study group (ISGPF) definition. Surgery. 2005;138(1):8-13. 3. Buchler M, Friess H, Klempa I et al. Role of octreotide in the prevention of postoperative complications following pancreatic resec-tion. Am. J. Surg. 1992;163:125-30. 4. Heintges T, Luthen R, Niederau C. Inhibition of exocrine pancreatic secretion by somatostatin and its analogues. Digestion. 1994;55(Suppl. 1):1-9. 5. Klempa I, Schwedes U, Usadel KH. Verhütung von postoperativen pankreatitischen Komplikationen nach Duode-nopankreatektomie durch Somastostatin. Chirurg. 1979;50:427-31. 6. Kutz K, Nuesch E, Rosenthaler J. Pharmacokinetics of SMS 201-995 in healthy subjects. Scand. J. Gastroenterol. 1986;21(Suppl. 119):65-72. 7. Parr ZE, Sutherland FR, Bathe OF et al. Pancreatic fistulae: are we making progress? J. Hepatobiliary Pancreat. Surg. 2008;15(6):563-9. 8. Pederzoli P, Bassi C, Falconi M et al. Efficacy of octreotide in the prevention of complications of elective pancreatic surgery. Br. J. Surg. 1994;81:265-9. 9. Reichlin S. Somatostatin (two parts). N. Engl. J. Med. 1983;309:1495-501;1556-63. 10. Reid-Lombar-do KM, Farnell MB, Crippa S et al. Pancreatic anastomotic leakage after pancreaticoduodenetomy in 1.507 patients: a report from the Pancreatic Anas-tomotic Leak Study Group. J. Gastrointest. Surg. 2007;11(11):14511-8. 11. Sheppard M, Shapiro B, Pimstone B et al. Metabolic clearance and plasma half-disappearance time of exogenous somatostatin in man. J. Clin. Endocrinol. Metab. 1979;48:50-3. 12. Strasberg SM, Linehan DC, Clavien PA et al. Proposal for definition and severity grading of pancreatic anastomosis failure and pancreatic occlusion failure. Surgery. 2007;141(4):420-6.

em caráter de urgência). A ocorrência de fístulas de grau C se associa, frequentemente, a outros eventos abdomi-nais (sepse, sangramento ou perfuração de vísceras ocas), sendo diretamente responsável por um aumento na morta-lidade desses pacientes. Existe, atualmente, uma tendência a substituir a atual classificação do grau das fístulas pelos critérios de Dindo-Clavien, que relacionam aspectos clínicos da evolução do paciente à necessidade de intervenções em cada caso.O tratamento das fístulas pancreático-cutâ-neas é, em geral, conservador. Fístulas direcionadas, não associadas a fatores obstrutivos, tendem a evoluir bem,

com fechamento espontâneo, na maioria dos casos. O emprego de antibióticos pode ser necessário. Coleções localizadas podem ser drenadas, preferencialmente por via percutânea. No entanto, a drenagem pode ser guiada por ecoendoscopia nos casos em que uma janela adequada não possa ser obtida.É importante obter uma drenagem ampla, independente da via de acesso escolhida. Inter-venções cirúrgicas (abertas ou laparoscópicas) podem ser necessárias em situações especiais, por sepse, hemorragia ou perfuração visceral, estando sempre associadas a um aumento significativo da mortalidade.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

1. Professora Livre-Docente em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e Membro da American Gastroenterological Association. 2. Professor Livre-Docente em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Pancreatite crônica - Definição e Classificação

Dulce Reis GuaRita,1 caRlos De BaRRos Mott2

As pancreatites crônicas (PC) caracterizam-se, do ponto de vista anatomopatológico, pela esclerose mutilante do parên-quima glandular, incialmente focal e, a seguir, difusa por todo o pâncreas.1 Do ponto de vista evolutivo, geralmente há persistência das lesões, mesmo com a retirada do fator causal, determinando alterações pancreáticas residuais anatômicas e funcionais2,3. As classificações mais comumente utilizadas para as PC são a de Marselha-Roma4 (Quadro 1), a TIGAR-O1 (Quadro 2) e a M-ANNHEIM5 (Quadro 3).

No Brasil, habitualmente, a classificação de Marselha-Roma é a mais utilizada. Baseia-se na etiopatogenia da doença, sendo a forma calcificante a mais frequente e o álcool, o agente etiológico mais comum. Apesar de sua apresentação clínica poder ser como a das pancreatites crônicas, a forma obstrutiva, uma vez tratada, pode involuir e não desenvolver fibrose; dentre as inflamatórias, a pancreatite autoimune pode ter regressão de suas lesões histológicas com o trata-mento corticoterápico.

Outras condições que acometem secundariamente o pâncreas (tuberculose, sífilis, actinomicose, esquistosso-mose, hidatidose, hiperlipoproteinemia familiar, etc.) não devem ser classificadas entre as PC.

17

Quadro 1. Marselha-Roma, 1988

Calcificante • Alcoolismo crônico • Tropical • Hereditária (CFTR, PRSS1, SPINK1, etc) • Hipercalcemia • Idiopática

Obstrutiva • Obstrução benigna do ducto pancreático • Estenose pós-pancreatite aguda • Estenose traumática • Estenose do esfíncter de Oddi • Disfunção do esfíncter de Oddi • Pâncreas divisium • Obstrução periampular (divertículo e cisto de

parede duodenal) • Obstrução maligna de ducto pancreático,

adenocarcinoma de pâncreas, papila e duodeno

Inflamatória • Autoimune • Idiopática senil

Quadro 2. TIGAR-O, 2001

Tóxico-metabólica • Álcool • Tabaco • Hipercalcemia (hiperparatireoidismo) • Hipertrigliceridemia • Insuficiência renal crônica • Medicações • Toxinas

Idiopática • Início precoce • Início tardio

Tropical • Outras

Genéticas • Mutações dos genes CFTR, SPINK1 e PRSSI • Deficiência de alfa-1-antitripsina

Autoimune • PC isolada • PC sindrômica (associação com Sjögren,

colangite esclerosante primária, etc.)

Recorrente • Pós-pancreatite necrosante • Pancreatite aguda recorrente • Doenças vasculares/isquêmicas • Pós-radioterapia

Obstrutiva • Pâncreas divisum - Neoplasia mucinosa intraductal (IPMN) • Disfunção do esfíncter de Oddi • Cistos periampulares do duodeno • Estenose ductal pancreática • Obstrução ductal maligna/ traumática

Fonte: Sarles H et al.19894 Fonte: Etemad B&Whitcomb DC, 20011

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

36 (1

): 1-

6

Estudos populacionais abordando a epidemiologia da pancrea-tite crônica são pouco frequentes e as informações a respeito da incidência e da prevalência da patologia são, na maioria das vezes, procedentes dos Estados Unidos, da Europa e do Japão.

No Brasil, um levantamento a respeito da frequência de inter-nações por PC no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medi-cina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), no período entre 1975 e 1995, encontrou um total de 0,49%.

As pancreatites crônicas por alterações genéticas (mutação do CFTR para fibrose cística, PRSS1 para pancreatite here-ditária e SPINK1 como “facilitador” para o aparecimento das pancreatites crônicas, além de vários outros genes envol-vidos) devem fazer parte da classificação a ser utilizada. Em conclusão, não há, no presente momento, especialmente face ao avanço do conhecimento sobre as PC, uma classifi-cação ideal para as mesmas, sendo que a literatura cita espe-cialmente as propostas TIGAR-O e M-ANNHEIM.

A utilização de uma classificação própria (Quadro 4), adap-tada às características das pancreatites crônicas em nosso meio, obtida a partir da Classificação de Marselha-Roma4 e modificada por sugestões contidas em outras classificações1, além das ressalvas aqui mencionadas, nos parece adequada até que uma nova e melhor proposta surja na literatura.

REFERÊNCIAS

1. Etemad B, Whitcomb DC. Chronicpancreatitis: diagnosis, classification and new geneticdevelopments. Gastroenterology 2001;120,682-707.

2. Guarita DR, Felga GEG, Marzinotto M, Teixeira ACS, Pedroso MRA, Mott CB. Doenças Pancreáticas. In: Martins MA, Carrilho FJ, Alves VAF, Castilho EA, Cerri GG, eds. Clínica Médica. 2aed.São Paulo, Editora Manole. 2016, p.136-150.

3. Mott CB, Guarita DR, Pedroso MRA. Pancreatite Crônica. In: Lopes AC, Amato-Neto V, eds. Tratado de clínica médica. 2ªed. São Paulo: Roca; 2009. p.1060-1063.

4. Sarles H, Adler G, Dani R, Frey C, Gullo L, Harada H, Martin E, Noronha M, Scuro LA. The pancreatitisclassificationof Marseille-Rome 1988. Scand J Gastroenterol.1989;24:641-2

5. Schneider A, Löhr JM, Singer MV. The M-ANNHEIM classification of chronic pancreatitis: introduction of a unifying classification system based on a review of previous classifications of the disease. J Gastroenterol. 2007;42:101-19

1. Médica Assistente do Serviço de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Mestre e Membro do Grupo de Pâncreas do Serviço de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Gastroenterologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e Professor de Gastroenterologia da Santa Casa de São Paulo.

Epidemiologia da pancreatite crônica

MaRianGes ZaDRoZny Gouvêa Da costa,1 Paulo BRant2

18

Quadro 3. M-ANNHEIM

Fatores de Risco • Álcool • Tabaco • Fatores nutricionais • Fatores hereditários • Fatores relacionados ao ducto eferente • Fatores imunológicos • Miscelânea e Fatores metabólicos raros

Estágios clínicos • Pancreatite crônica assintomática • Pancreatite crônica sintomática

Gravidade • Índice de gravidade (A,B,C,D,E) • Nível de gravidade (pequeno, aumentado, avançado,

intenso, exacerbado) • Pontuação

Quadro 4. Pancreatite Crônica-Classificação

Pancreatite Crônica Calcificante • Álcool • Hereditária • Metabólica • Nutricional • Idiopática

Pancreatite Crônica Obstrutiva • Pâncreas divisum • Estenose ducto pancreático principal • Estenose papila • Tumores pâncreas e vias biliares

Autoimune • PC isolada • PC sindrômica (associação com Sjögren, colangite

esclerosante primária)

Fonte: Adaptado de Schneider A et al.,2007 5 Fonte: Adaptado de Sarles et al., 19894 e Etemad & Whitcomb, 20011

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Podem ser observadas diferenças de acordo com a região

geográfica e com a época de realização da pesquisa, o que

poderia ser explicado pela variabilidade na frequência das

causas da doença, pela origem étnica ou pela exposição

desigual a fatores de risco ambientais.

No entanto, comparações são difíceis, pois classificações e

critérios diagnósticos variaram e, com o passar do tempo, os

métodos diagnósticos se tornaram mais sensíveis, sugerindo

que as diferenças podem não refletir mudanças reais na inci-

dência da doença.

REFERÊNCIAS1. Copenhagen pancreatitis study. An interim report from a prospective epidemiological multicentre

study. Scand. J. Gastroenterol. 1981; 16(2): 305-12.2. Domínguez-Muñoz E et al. A Spanish multicenter study to estimate the prevalence and incidence of

chronic pancreatitis and its complications. Rev. Esp. Enferm. Dig. 2014; 106 (4): 239-45.3. Garg PK, Tandon RK. Survey on chronic pancreatitis in the Asia-Pacific region. J. Gastroenterol.

Hepatol. 2004; 19(9): 998-1004.4. Hirota M et al. The sixth nationwide epidemiological survey of chronic pancreatitis in Japan.

Pancreatology. 2012; 12(2): 79-84.5. Lévy P et al. Estimation of the prevalence and incidence of chronic pancreatitis and its complications.

Gastroenterol. Clin. Biol. 2006; 30(6-7): 838-44. 6. Lin Y et al. Nationwide epidemiological survey of chronic pancreatitis in Japan. J. Gastroenterol. 2000;

35(2): 136-41.7. Yadav D et al. Incidence, prevalence, and survival of chronic pancreatitis: a pvopulation-based study.

Am. J. Gastroenterol. 2011; 106(12): 2192-9.

Etiologias

Julio MaRia Fonseca cheBli1, GuilheRMe eDuaRDo Gonçalves FelGa2

1. Professor Titular da Disciplina de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora - Minas Gerais, Membro Titular da Federação Brasileira de Gastroenterologia e Pesquisador pelo CNPq. 2. Médico do Hospital Israelita Albert Einstein – São Paulo – SP.

As pancreatites crônicas (PC) são afecções caracteri-zadas por processo inflamatório pancreático crônico que conduz à substituição progressiva do parênquima pancre-ático normal, exócrino e endócrino, por tecido fibrótico, levando a alterações morfológicas, como estenoses e

irregularidades nos ductos pancreáticos e calcificações parenquimatosas, e manifestações clínicas prototípicas.

Com relação às suas etiologias, as PC podem ser divididas em três grupos principais: alcoólica, idiopática e outras.

19

Tabela 1 - Incidência e prevalência da PC

Referência Incidência por mil habitantes

Prevalência por mil habitantes Período País

Andersen et al., 1982.6,9 10

1970-1975 1975-1979

Dinamarca

Dzieniszewski, et al., 1990. 5 17 1982-1987 Polônia

Johnson e Hosking, 1991 4,3 (M) / 2,1 (F) 1960-1964 Inglaterra

Jaakkola e Nordback, 1993 13,4 1989 Finlândia

Dite, 2001 7,9 1999República Tcheca

e EslováquiaLankish et al., 2002 6,4 1988-1995 Alemanha

Levy et al., 2006 7,7 26,4 2003 França

Hirota et al., 2007 11,9 36,9 2007 Japão

Wang et al., 20093,0813,52

19962003

China

Yadav et al., 2011 4,05 41,76 1997-2006 EUA

Garg e Tandon, 2004 114-200 Índia

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

36 (1

): 1-

6

Nos países ocidentais, o álcool é o fator etiológico respon-sável por 70% a 80% dos casos1-6. Alguns estudos epide-miológicos exemplificam as diferenças. Na Austrália, 95% dos casos se devem ao álcool, enquanto na Coréia e Japão estas porcentagens são de 64% e 54%, respectivamente. Na China e Índia, a pancreatite idiopática ou tropical foi responsável por 70% dos casos 7-8.

No Brasil, entre 545 pacientes investigados prospectiva-mente por Mott e Guarita9, 509 (93,4%) referiram alcoolismo crônico pregresso, sendo raras outras causas para a doença. Tais dados são corroborados por outros autores brasileiros em Belo Horizonte e Goiânia, e esta prevalência é significa-tivamente maior do que aquela observada em casuísticas de outros países. O padrão de consumo alcoólico destes pacientes encontra-se disposto na tabela 1.

Analisando-se estes dados, observa-se que os portadores de PC alcoólica iniciam o consumo de álcool em torno dos 20 anos de idade, permanecendo assintomáticos, em média, por 15 anos. A quantidade média diária de etanol consumida é elevada, correspondendo, aproximadamente, a uma garrafa de aguardente diária, de modo regular, durante 20 anos.

A PC alcoólica é altamente prevalente no Brasil, atribuin-do-se esta frequência ao elevado teor alcoólico existente na bebida mais consumida, a aguardente de cana, e seu baixo custo. Sabe-se hoje que qualquer tipo de bebida alcoólica, fermentada ou destilada, pode levar à lesão pancreática crônica, desde que a quantidade de etanol consumida em determinado espaço de tempo supere a dose considerada crítica para que o pâncreas seja cronicamente comprome-tido (do ponto de vista epidemiológico, em torno de 80 e 100 ml. de etanol puro diário, respectivamente para o sexo feminino e para o masculino, por um período superior a cinco anos). Interessantemente, somente 5% a 15% dos alcoo-listas desenvolvem doença pancreática. Possivelmente, isto se deve à associação de outros fatores, como predisposição genética e influências ambientais, como a dieta e o tabaco.

O tabagismo e fatores dietéticos podem contribuir para um risco aumentado de desenvolvimento de PC por álcool. Embora as grandes casuísticas possuam vieses que tornam difícil a interpretação dos dados, trabalhos recentes sugerem que o tabagismo seja um fator de risco independente para a ocorrência da PC alcoólica e idiopática, e que o mesmo acelera a progressão da doença nos indivíduos afetados, inclusive do aparecimento de calcificações pancreáticas10,11. O risco de PC aumenta proporcionalmente com a quantidade cres-cente cumulativa do consumo de tabaco. Além disso, o taba-gismo associa-se com o início mais precoce de PC alcoólica e aumenta sobremaneira o risco de câncer em pacientes com PC hereditária. Finalmente, embora o papel do tabaco em causar

PC na ausência de alcoolismo seja fortemente suspeito, estudos adicionais são necessários para que esta possibilidade seja conclusivamente provada. Dietas ricas em proteínas e gorduras podem exacerbar o curso das pancreatites crônicas, enquanto a ingestão de substâncias antioxidantes na dieta, como a vita-mina E, parece reduzir o efeito do álcool 12.

Cerca de 20% dos casos de PC se devem à PC idiopática, enquanto os 10% restantes decorrem de outras etiologias, entre as quais se incluem o hiperparatireoidismo, obstruções ductais, pâncreas divisum, pancreatite autoimune e doenças hereditárias.

Em virtude dos avanços acerca do conhecimento sobre a etiopatogênese das pancreatites, uma nova sistematização foi proposta em 2001 (tabela 2) e cunhada de sistema de classificação TIGAR-O, no qual os fatores de risco para o desenvolvimento das PC são divididos em seis grandes cate-gorias: tóxico-metabólicos (T), idiopáticos (I), genéticos (G), autoimune (A), pancreatite crônica pós-pancreatite aguda grave recorrente (R) e obstrutiva (O)13. Mais recentemente, o sistema de classificação M-ANNHEIM foi proposto, permi-tindo a classificação segundo etiologia, estágio evolutivo e gravidade da doença. Baseia-se no conceito de que as PC se devem à interação de múltiplos (M) fatores de risco: consumo de álcool (A), consumo de nicotina (N), fatores nutricionais (N), fatores hereditários (H), fatores morfoló-gicos relacionados aos ductos pancreáticos eferentes (E), fatores imunológicos (I) e fatores metabólicos diversos (M)14.

20

Tabela 1 – Características do consumo alcoólico observado em 509 portadores de PC, investigados no Grupo de Pâncreas do Hospital

das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo9

Características do consumo alcoólico

Idade do início da ingestão (anos)

19,5 ± 6,5

Idade do início dos sintomas (anos)

34,9 ± 9,8

Consumo alcoólico (gramas de etanol/dia)

358,6 ± 282,0

Tempo de consumo (anos)

19,8 ± 8,8

Tipos de bebidas: Destiladas

504 (99,2%)

Fermentadas 5 (0,98 %)

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A evolução dos conhecimentos de biologia molecular permitiu o reconhecimento de mutações genéticas nos genes CFTR (cystic fibrosis transmembrane conductance regulator), SPINK1 (serine protease inhibitor Kazal type 1) e PRSS1 (cationic trypsinogen) em pacientes com pancreatite crônica idio-pática ou naqueles com agregação familiar dos casos.15 O reconhecimento das mesmas é importante, sobretudo pelo risco progressivo de desenvolvimento do câncer de pâncreas entre os indivíduos com pancreatite hereditária.

A pancreatite crônica hereditária apresenta-se como uma síndrome de pancreatite aguda recorrente, geralmente levando à pancreatite crônica, com menção familiar de casos e ausência de fatores etiológicos evidentes para a doença.

A

sintomatologia surge precocemente e a gravidade dos surtos de pancreatite é variável, mas os casos graves estão sujeitos às mesmas complicações habitualmente observadas nas demais formas de pancreatite. Por seu início precoce, a ocorrência de insuficiência pancreática exócrina ou endó-crina é comum com o passar do tempo. A sua principal causa é a mutação R117H do gene do tripsionogênio catiônico (PRSS1).16,17 O reconhecimento desta etiologia é importantís-simo, pois estes pacientes possuem elevado risco de câncer de pâncreas após 30 a 40 anos da instalação da doença.

Portadores de desnutrição proteica grave podem apresentar lesões compatíveis com o diagnóstico de PC, embora o mecanismo exato para sua ocorrência seja pouco conhecido. Esta forma da doença é mais observada em países pobres de regiões tropicais, sobretudo na África e na Ásia tropical, havendo particular concentração na Índia. No Brasil, há relatos de casos em Belo Horizonte e no Nordeste, mas os mesmos são raros em São Paulo e no Sul do país18,19.

A prevalência da pancreatite crônica idiopática é variável de acordo com a população estudada, variando de 4 e 40%. No Brasil, devido à esmagadora prevalência da pancreatite alcoólica, esta forma de pancreatite responde por cerca de 10% dos casos20. Do ponto de vista clínico, a doença possui apresentação bimodal, com o primeiro pico de incidência por volta de 25 anos e o segundo por volta de 60 anos, caracte-rizando-se por episódios de dor recorrente e, em fases mais tardias, associando-se à má absorção e ao diabetes mellitus.

A pancreatite crônica autoimune é caracterizada por icterícia obstrutiva, massa inflamatória pancreática e irregularidades ductais nos exames de imagem, associadas à presença de hipergamaglobulinemia (particularmente, à custa da fração IgG4 a qual é um dos marcadores para o diagnóstico desta afecção) e, em geral, autoanticorpos 21. O principal diagnós-tico diferencial nesta situação é com as neoplasias sólidas pancreáticas. A boa resposta destes pacientes à cortico-terapia favorece a ideia de uma etiologia inflamatória e é comum a associação com outras doenças autoimunes, como a cirrose biliar primária, a síndrome de Sjögren e a colangite esclerosante. Esta afecção predomina no sexo masculino e manifesta-se, predominantemente, nas 6a ou 7a décadas de vida, principalmente com icterícia indolor (70% a 80%), dor abdominal leve (35%) ou aparecimento de massa pancreá-tica (10%), especialmente na cabeça pancreática.

Os critérios denominados HISORt, elaborados pelo grupo da Mayo Clinic, permitem o diagnóstico desta condição de forma menos rígida, o qual pode ser feito de três maneiras: histo-logia, imagem e sorologia ou sorologia adicionada a outro envolvimento orgânico e resposta à terapia com corticoste-roide (tabela 3) 22.

21

Tabela 2 – Sistema de classificação TIGAR-O

Tóxico-metabólicos

• Álcool• Tabaco• Hipercalcemia

(hiperparatieoidismo)• Hipertrigliceridemia• Insuficiência renal crônica• Medicações• Toxinas

Idiopáticos

• Início preoce• Início tardio• Pancreatite crônica tropical• Outras

Genéticos• Mutações do genes CFTR,

SPINK e PRSS1

Autoimune

• Pancreatite crônica autoimune isolada

• Pancreatite crônica autoimune sindrômica

Pancreatite crônica pós-pancreatite aguda

grave recorrente

• Pós-necrótica• Pancreatite aguda recorrente• Doenças vasculares/isquêmicas• Pós-radioterapia

Obstrutivo

• Pâncreas divisum• Disfunção do esfíncter de Oddi• Obstruções ductais malignas• Cistos periampulares

de duodeno• Estenoses ductais pancreáticas

traumáticas

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A sua fisiopatologia é pouco conhecida, mas supõe-se que seja uma forma de doença sistêmica que curse com inflamação e fibrose do pâncreas e de outras glândulas exócrinas, como, por exemplo, as salivares. Associa-se a uma resposta imune predominantemente Th1, de modo semelhante à síndrome de Sjögren e à colangite esclero-sante, e ao haplótipo de HLA DRB1*0405-DQB1*040123. Pode apresentar-se sob duas formas. A pancreatite autoimune tipo 1, conhecida como pancreatite esclero-sante linfoplasmacítica, que representa a manifestação da síndrome sistêmica relacionada à presença de altos níveis de IgG4, e a pancreatite autoimune tipo 2, conhe-cida como pancreatite idiopática ductocêntrica, cuja etiologia é desconhecida. Histologicamente, ambas as formas apresentam um denso infiltrado linfoplasmocítico e o acometimento ductal. É característica a boa resposta aos corticoides sistêmicos bem como à terapia imunomo-duladora com azatioprina, 6-mercaptopurina, micofeno-lato ou, eventualmente, rituximabe 24, 25.

Qualquer situação que resulte em dificuldade de drenagem da secreção pancreática para o duodeno pode provocar uma pancreatite crônica. As principais causas são as estenoses cicatriciais, estenoses congênitas, estenoses traumáticas ou cirúrgicas do ducto pancreático principal, inflamações da papila duodenal, pâncreas divisum, más formações da junção biliopancreática e neoplasias intraductais mucinosas. Todas estas situações são, em geral, prontamente identificadas pela colangiopancreatografia por ressonância magnética e, menos frequentemente, pelo ultrassom endoscópico e pela colangiopancreatografia endoscópica. Esta última deve ser reservada para os casos em que se contempla terapêutica endoscópica concomitante.

REFERÊNCIAS1. Forsmark C. Chronic pancreatitis. In: Feldman M, Friedman LS, Sleisenger

MH, eds. Sleisenger and Fordtran’s Gastrointestinal and Liver Disease: Pathophysiology, Diagnosis, Management. London: WB Saunders, 2002: 943–69.

2. Schenker S, Montalvo R. Alcohol and the pancreas. Recent Dev Alcohol 1998;14:41–65.

3. Dufour MC, Adamson MD. The epidemiology of alcohol induced pancreatitis. Pancreas 2003;27:286–90.

4. Go V, Everhart J. Pancreatitis. In: Everhart JE, ed. Digestive Diseases in the United States: Epidemiology and Impact. NIH publication no. 94-1447. Washington, DC: US Government Printing Office, 1994: 693–712.

5. Singer MV. Effect of ethanol and alcoholic beverages on the gastrointestinal tract in humans. Rom J Gastroenterol 2002; 11:197–204.

6. Maisonneuve P, Lowenfels AB. Chronic pancreatitis and pancreatic cancer. Dig Dis 2002;20:32–7.

7. Garg PK, Tandon RK. Survey on chronic pancreatitis in the Asia-Pacific region. J Gastroenterol Hepatol 2004;19:998–1004.

8. Ryu JK, Lee JK, Kim YT et al. Clinical features of chronic pancreatitis in Korea: a multicenter nationwide study. Digestion 2005;72:207–11.

9. Mott CB, Guarita DR. Pancreatite Crônica. In Mincis M eds. Gastroenterologia e Hepatologia. Diagnóstico e Tratamento. São Paulo, Lemos Editorial, 2002: 521-553.

10. Morton C, Klatsky AL, Udaltsova N. Smoking, coffee, and pancreatitis. Am J Gastroenterol 2004;99:731–8.

22

Tabela 3 - Critérios HISORt para o diagnóstico de pancreatite autoimune22

Histologia

Pelo menos um dos seguintes:• Infiltrado linfoplasmocítico periductal com

flebite obliterante e fibrose estoriforme• Infiltrado linfoplasmocítico com fibrose

estoriforme e plasmóticos IgG4-positivos abundantes (>10/campo em grande aumento)

Imagem

Típicos: glândula difusamente aumentada com realce tardio do contorno, ducto pancreático difusamente irregular e atenuadoOutros: massa pancreática ou aumento focal, estreitamento focal do ducto pancreático, atrofia pancreática, calcificação, ou pancreatite

Sorologia Nível sérico de IgG4 elevado

Envolvimento de outros

órgãos

Estenoses biliares intra-hepáticas ou hilares, estenose do ducto biliar distal (intrapancreático), envolvimento de glândula parótida ou lacrimal, linfadenopatia mediastinais, fibrose retroperitoneal

Resposta à terapia com

glicorticoides

Resolução ou melhora marcante das manifestações pancreáticas ou extrapancreáticas

Grupos diagnósticos

Grupo A: histologia pancreática diagnóstica• Amostra demonstrando o espectro

completo de PELP ou ≥10 células/campo em grande aumento IgG4-positivas

Grupo B: imagem e sorologia típicas• TC ou RMN exibindo pâncreas

difusamente aumentado com realce tardio do seu contorno

• Pancreatograma mostrando ducto pancreático difusamente irregular

• Nível sérico elevado de IgG4 Grupo C: resposta aos glicorticoides• Doença pancreática inexplicada depois

de análise diagnóstica negativa para outras causas e

• Nível sérico elevado de IgG4 ou envolvimento de outros órgãos confirmado pela presença de células IgG4-positivas abundantes

• Resolução ou melhora marcante nas manifestações pancreáticas ou extrapancreáticas com a terapia de glicorticoide

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

11. Maisonneuve P, Lowenfels AB, Mullhaupt B et al. Cigarette smoking accelerates progression of alcoholic chronic pancreatitis. Gut 2005;54:510–14.

12. Lin Y, Tamakoshi A, Hayakawa T, Ogawa M, Ohno Y. Associations of alcohol drinking and nutrient intake with chronic pancreatitis: findings from a case-control study in Japan. Am J Gastroenterol 2001;96:2622–7.

13. Etemad B & Whitcomb DC. Chronic pancreatitis: diagnosis, classification, and new genetic developments. Gastroenterology 2001; 120: 682–707.

14. Schneider A, Lohr JM & Singer MV. The M-ANNHEIM classification of chronic pancreatitis: introduction of a unifying classification system based on a review of previous classifications of the disease. J Gastroenterol 2007; 42: 101–119.

15. Whitcomb, DC. Value of genetic testing in the management of pancreatitis. Gut 2004;53:1710-1717.

16. Whitcomb, DC, Gorry, MC, Preston, RA, et al. Hereditary pancreatitis is caused by a mutation in the cationic trypsinogen gene. Nat. Genet. 1996:14;141-145.

17. Whitcomb, DC. Hereditary pancreatitis: new insights into acute and chronic pancreatitis. Gut 1999;45:317-322.

18. Dani R, Mott CB, Guarita DR, Nogueira, CED. Epidemiology and etiology of chronic pancreatitis in Brazil: A tale of two cities. Pancreas 1990; 5: 474-478.

19. Mott CB, Guarita DR. Pancreatite Crônica. In: Lopes AC, Amato-Neto V, eds. Tratado de Clínica Médica.São Paulo, Editora Roca.2006,p.1148-1161.

20. Guarita DR, Felga GEG, Pedroso MRA, Mott CB. Doenças pancreáticas. In: Milton de Arruda Martins; Flair José Carrilho; Venâncio Avancini Ferreira Alves; Euclides Ayres de Castilho; Giovanni Guido Cerri; Chao Lung Wen. (Org.). Clínica Médica. 1 ed. São Paulo: Editora Manole, 2009, v. 4, p. 132-149.

21. Okazaki K, Kawa S, Kamisawa T, Naruse S, Tanaka S, Nishimori I, Ohara H,

Ito T, Kiriyama S, Inui K, Shimosegawa T, Koizumi M, Suda K, Shiratori K,

Yamaguchi K, Yamaguchi T, Sugiyama M, Otsuki M; Research Committee of

Intractable Diseases of the Pancreas. Clinical diagnostic criteria of autoimmune

pancreatitis: revised proposal. J Gastroenterol 2006; 41:626–631.

22. Chari ST, Smyrk TC, Levy MJ, Topazian MD, Takahashi N, Zhang L, Clain JE,

Pearson RK, Petersen BT, Vege SS, Farnell MB. Diagnosis of autoimmune

pancreatitis: the Mayo Clinic experience. Clin Gastroenterol Hepatol.

2006;4:1010-1016.

23. Kawa S, Ota M, Yoshizawa K, Horiuchi A, Hamano H, Ochi Y, Nakayama K,

Tokutake Y, Katsuyama Y, Saito S, Hasebe O, Kiyosawa K. HLA DRB10405-

DQB10401 haplotype is associated with autoimmune pancreatitis in the

Japanese population. Gastroenterology 2002;122(5):1264-9.

24. Kamisawa T, Chari ST, Lerch MM, Kim MH, Gress TM, Shimosegawa T. Recent

advances in autoimmune pancreatitis: type 1 and type 2. Gut 2013;62:1373–

1380.

25. Hart PA, Kamisawa T, Brugge WR, et al. Long-term outcomes of autoimmune

pancreatitis: a multicentre, international analysis. Gut 2013;62:1771–1776.

Diagnóstico clínico da pancreatite crônica

Dulce Reis GuaRita1, MaRtha ReGina aRcon PeDRoso2

A pancreatite crônica (PC) incide predominantemente em pacientes do sexo masculino, com ingestão alcoólica elevada, por tempo prolongado.

As principais manifestações observadas nestes doentes são habitualmente características, sem grandes variações de um caso a outro (tabela 1).

A dor é o sintoma mais comum e é, em geral, a primeira exterio-rização clínica da doença; pode ocorrer em surtos (Tipo A) ou contínua (Tipo B) e deve ser avaliada por escala visual analó-gica (EVA). Relaciona-se à hipertensão ductal provocada pelas rolhas proteicas depositadas, tanto nos ductos pancreáticos secundários, quanto no ducto pancreático principal; além disso, a inflamação perineural intra e peripancreática também contri-buiriam para a intensidade álgica.

As crises dolorosas são comumente recorrentes, intensas, loca-lizadas no andar superior do abdômen, com duração de um a sete dias (Tipo A); os períodos de acalmia variam de meses a anos e os episódios são desencadeados, quase sempre, pelo abuso alcoólico e/ou por alimentação gordurosa. O paciente relata como fator de melhora para o quadro doloroso a adoção da posição em prece maometana. Há evidências de compro-metimento em todos os níveis do sistema nervoso, central e periférico, nos portadores de pancreatite crônica com dor e

1. Professora Livre-Docente em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e Membro da American Gastroenterological Association. 2. Doutora em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e Membro do Grupo de Pâncreas do Serviço de Gastroenterologia da Divisão de Clínica Médica II do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

23

Tabela 1. Manifestações observadas em pacientes portadores de pancreatite crônica,

investigados no Grupo de Pâncreas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

Dor 92,2%

Emagrecimento 91,5%

Má absorção 33,9%

Diabete 46,2%

Icterícia 24,6%

Pseudocistos 35,9%

Derrames cavitários 13,3%

Hemorragia digestiva 2,3%

Necrose 4,7%

Abscesso 3,6%

Fístulas 1,1%

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

36 (1

): 1-

6

as mesmas alterações neuronais ocorrem tanto nestes pacientes, quanto naqueles com carcinoma de pâncreas. Face à existência deste comprometimento que vai além da glândula pancreática, pacientes submetidos a derivações ou, mesmo, a ressecções pancreáticas podem ter dor, há má resposta a bloqueios celíacos, há alterações eletroencefalográficas e os doentes podem responder à pré-gabalina.

A redução do peso corpóreo é notada em quase todos os pacientes, pois os mesmos não se alimentam durante as crises de dor e não voltam a se alimentar como antes, pois logo correlacionam à intensa cólica abdominal com a utilização de álcool e/ou alimentos, especial-mente gordurosos. Com o avançar da fibrose pancreática surgem a esteatorreia e o diabete, que trarão ainda maior perda de peso.

A má absorção se manifesta pela presença de gordura nas fezes (esteatorreia) em níveis acima de 6g/dia; para que possa ser detec-tada, há necessidade de comprometimento de mais de 75% do parênquima pancreático exócrino por fibrose, tratando-se, portanto, de uma manifestação tardia da pancreatite crônica. No entanto, a avaliação nutricional destes pacientes demonstra a presença precoce de desnutrição, muito antes do surgimento de esteator-reia. O diabete surge quando o parênquima pancreático endócrino é substituído por fibrose; em geral, as ilhotas de Langerhans são mais resistentes ao avanço da doença, exceto se há antecedentes familiares de diabete. Uma vez instalada a lesão, o paciente pode ter as mesmas complicações de qualquer outro paciente diabético, como polineuropatias, lesões oculares, impotência sexual etc.

As complicações clínicas das pancreatites crônicas podem surgir em qualquer fase da doença, porém são mais frequentes no início da mesma, quando ainda há parênquima pancreático funcionante. Podem ser locais ou sistêmicas e a sua incidência é elevada entre nós, sobretudo quando comparada às casuísticas de outros países. A icterícia, clínica e/ou laboratorial, observada em aproximadamente um quarto dos pacientes, resulta da compressão do colédoco terminal, retropancreático, por aumento do volume da cabeça do pâncreas, secundário a edema, nódulos fibróticos, cálculos pancre-áticos ou pseudocistos localizados na porção cefálica da glândula pancreática. Trata-se, em geral, de icterícia discreta, fugaz e apiré-tica e a frequência dos episódios de icterícia e os níveis de bilirru-bina não se relacionam à fase evolutiva da doença, e sim à relação anatômica entre colédoco terminal e cabeça da glândula.

Os pseudocistos, presentes em aproximadamente um terço dos pacientes, podem surgir em qualquer fase evolutiva da afecção, sendo pequenos, intraglandulares (cistos de retenção) ou maiores, extraglandulares (cistos necróticos). Podem, eventualmente, ser a razão para outras complicações como compressões de órgãos ou estruturas vizinhas (estômago, cólon, vesícula, colédoco), infecção (abscessos), hemorragia, fistulização para vísceras ocas ou para o peritônio livre (ascite), mas se resolvem espontaneamente em

cerca de 70% dos casos. Ascite, derrame pleural e, raramente, derrame pericárdico podem surgir durante a evolução da pancrea-tite crônica, sendo a ascite mais frequente. Qualquer dos derrames de origem pancreática surge pela ruptura de um pseudocisto ou do próprio ducto pancreático principal para a cavidade abdominal; tanto a cirrose hepática quanto a lesão linfática concomitante não costumam estar presentes nestes casos.

Durante a evolução das pancreatites crônicas, os doentes podem desenvolver hemorragia digestiva, exteriorizada sob a forma de hematêmese ou melena; estas são causadas, em geral, pela ruptura de varizes esôfago-gástricas, secundárias à compressão ou trom-bose da veia esplênica pela presença de um pseudocisto ou pelo aumento de volume do pâncreas. A hemorragia digestiva pode ser decorrente, ainda, da ruptura de vasos intracísticos ou da formação de pseudo microaneurismas. Necrose pancreática, estéril ou infec-tada, abscessos e fístulas podem estar presentes, mas são compli-cações raras. As fístulas podem se abrir para outros órgãos, espe-cialmente estômago, intestino delgado, cólons e baço, a partir de necrose ou de um pseudocisto infectado.

Ao fazer a avaliação clínica do paciente portador de pancrea-tite crônica não devem ser esquecidas as doenças, que podem acompanhar o comprometimento crônico da glândula pancreática. Assim, a incidência de úlcera péptica é maior que na população em geral, provavelmente pela deficiência da produção de secreção básica pelo pâncreas, o que torna a neutralização da secreção ácida gástrica insuficiente.

Em relação à ocorrência de litíase biliar, há significativo retardo do esvaziamento da vesícula biliar no pancreatopata crônico, o que propicia estase biliar e formação de cálculos. Os pacientes com pancreatite crônica têm mais litíase renal em função da maior excreção de oxalato de cálcio, especialmente quando já apresentam esteatorreia. Pela mesma razão, há maior ocorrência de osteopo-rose, mesmo naqueles pacientes do sexo masculino.

Neoplasias álcool-tabaco relacionadas, como aquelas que se desen-volvem em boca, faringe, estômago e pulmão, são mais observadas entre os pacientes com pancreatite crônica alcoólica; apesar da referência da literatura, não tem sido verificado maior número de casos de câncer de pâncreas entre os portadores de pancreatite crônica acompanhados entre nós. A associação com cirrose hepá-tica nas fases iniciais das pancreatites crônicas é excepcional e, ao que tudo indica, fatores genéticos determinam o órgão alvo para as lesões causadas pela ingestão crônica de álcool em cada indivíduo.

Finalmente, em pacientes portadores de pancreatite crônica de causa indeterminada, devem ser lembradas as possibilidades, raras, de pancreatite hereditária, de pancreatite autoimune e de fibrose cística. Nas pancreatites hereditárias, há relato familiar da existência da afecção; a doença tem, comumente, caráter

24

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

evolutivo mais grave e há, a longo prazo, maior incidência de neoplasia de pâncreas.

Nas pancreatites autoimunes há, com frequência, além da elevação de IgG4, o comprometimento, também por alterações da imunidade, de outros órgãos como os rins ou a tireoide. A fibrose cística pode se manifestar somente pelo envolvimento pancreático, com manifestação clínica apenas na idade adulta, sob a forma de episódios de pancreatite aguda ou, mesmo, já como uma pancreatite crônica.

REFERÊNCIAS1. André SB, Guarita DR, Mott CB, Leitão R, Laudanna AA. Secretory,

endoscopic and histopathologic changes and prevalence of Helicobacter pylori in the gastroduodenal mucosa in patients with chronic alcoholic pancreatitis. Rev Hosp Clin Fac Med Sao Paulo.1996;51:175-9. 2. Chehter EZ, Pinheiro e Coelho ME, Guarita DR, Mott Cde B, da Cunha JE, Machado MC, Laudanna AA. Cavity effusions in patients with chronic pancreatitis. Rev Hosp Clin Fac Med Sao Paulo. 1993;48:60-8.

2. Coelho MEP. Excreção urinária de oxalato na pancreatitie crônica de etiologia alcoólica. 1992. Tese (Doutorado). Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

3. Costa MZ, Guarita DR, Ono-Nita, SK., Nogueira,JD, Nita ME., Paranaguá-Vezozzo DC, Souza MT, do Carmo EP, Teixeira AC, Carrilho FJ. CFTR polymorphisms in patients with alcoholic chronic pancreatitis. Pancreatology., 2009; 9:173 – 81.

4. Cunha JEM, Machado M, Bacchella T, Penteado S, Mott CB, Jukemura J, Pinotti HW. Surgi…..cal treatment of pancreatic ascites and pancreatic pleural effusions. Hepatogastroenterology. 1995;42:748-51.

5. Cunha, JEM, Penteado, S, Jukemura, J, Machado, MCC, Bacchella, T. Surgical and interventional treatment of chronic pancreatitis. Pancreatology 2004;4:540-550.

6. Frokjaer JB, Bouwense SAW, Olesen SS, skildsen SF, Goor HV, Wilder-

Smith OHG,Drewes AM. Reduced cortical thickness of brain areas

involved in pain processing in patients with chronic pancreatitis. Clin

Gastroenterol Hepatol. 2012:10:434-438.

7. Guarita DR, Coelho MEP, Mott CB, Bettarello A. Pancreatites

crônicas:características clínicas, complicações e associação com

outras afecções. Rev Hosp Clin São Paulo 1989; 44:221-226.

8. Guarita DR, Felga GEG, Marzinotto M, Teixeira ACS, Pedroso MRA,

Mott CB. Doenças Pancreáticas. In: Martins MA, Carrilho FJ, Alves

VAF, Castilho EA, Cerri GG,eds. Clínica Médica. 2aed. São Paulo, Editora

Manole. 2016, p.136-150.

9. Guarita DR, Mott CB, Cerri GG, Bettarello A. Spontaneous remission of

pancreatic cysts in patients with chronic pancreatitis. Rev Hosp Clin Fac

Med Sao Paulo. 1989;44:227-31.

10. Machado MCC, Cunha JEM, Bacchella T, Mott CB, Duarte I, Bettarello

A. Acute pancreatic necrosis in chronic alcoholic pancreatitis. Dig Dis

Sci.1984;29:709-13.

11. Mott CB, Guarita DR, Coelho MEP, Monteiro-da-Cunha JE, Machado

MC, Bettarello A. Etiology of chronic pancreatitis in São Paulo: a study

of 407 cases. Rev Hosp Clin Fac Med Sao Paulo.1989;44:214-20.

12. Mott CB, Guarita DR, Pedroso MRA. Pancreatite Crônica. In: Lopes AC,

Amato-Neto V, eds. Tratado de clínica médica. 2ªed. São Paulo: Roca;

2009. p.1060-1063.

13. Pedroso MR, Cunha RM, Guarita DR, Buchpieguel CA, Mott CB,

Laudanna AA. Gallbladder emptying evaluation in chronic calcifying

pancreatitis, by means of a scintilographic study with Tc-99m DISIDA.

Rev Hosp Clin Fac Med Sao Paulo. 1997;52:197-208.

14. Sobral-Oliveira MB, Faintuch J, Guarita DR, Oliveira CPMS, Carrilho FJ.

Nutritional profile of assymptomatic alcoholic patients. Arq Gastroenterol.

2011; 48: 112-18.

Avaliação laboratorial diagnóstica - pancreatite crônica

Raquel canZi alMaDa De souZa1

1. Mestre e Doutora em Medicina Interna – UFPR, Médica do Serviço de Endoscopia digestiva do HC da UFPR, Ambulatório de Pâncreas e Vias Biliares do HC da UFPR, Professora da Disciplina de Clínica Médica da UFPR e Doutora em Medicina Interna (Gastroenterologia) pela UFPR.

25

Introdução

A PC é uma doença progressiva caracterizada por infla-mação e destruição do parênquima pancreático, que vai sendo pouco a pouco substituído por tecido fibrótico. O diagnóstico costuma ser muito fácil em fases avan-çadas da doença. Por outro lado, o grande desafio é o diagnóstico precoce da doença naqueles indivíduos com

dor abdominal sugestiva, mas com estudos de imagem

pancreáticas normais ou com alterações inespecíficas.

Vários testes foram descritos na literatura, mas ainda

não se definiu o exame laboratorial padrão ouro que, ao

mesmo tempo, seja prático e tenha acurácia semelhante à

análise histopatológica pancreática.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

26

Os testes que avaliam a produção e secreção exócrina pancreática, chamados testes funcionais da função exócrina do pâncreas (FEP), revestem-se de uma especial importância naqueles indivíduos em que o quadro clínico e os métodos de imagem não definam o diagnóstico e haja suspeita de pancreatite crônica.

Em geral, a evidência clínica de insuficiência exócrina pancreática (IEP) é um evento tardio e costuma aparecer de forma muito lenta e insidiosa, manifestando-se por esteator-reia quando a capacidade exócrina do pâncreas está redu-zida a menos de 10%. Podem ser classificados em testes indiretos quando detectam as consequências clínicas ou efeitos secundários da diminuição ou ausência das enzimas pancreáticas proteolíticas e lipolíticas; ou testes diretos, quando analisam o volume e composição (bicarbonato e enzimas digestivas) do suco pancreático propriamente dito.

Também podem ser utilizados para determinar intensidade da doença, ou melhor, da disfunção pancreática, e orientar dose de enzimas a serem repostas. Importante salientar que o grau de anormalidade funcional da glândula é vari-ável, dependendo, além do tempo de evolução da doença, também da etiologia da PC. Naqueles com PC alcoólica, o tempo de aparecimento da insuficiência exócrina e endócrina é menor do que naqueles com PC tida como idiopática.

Teoricamente, os testes funcionais diretos (que analisam o suco pancreático) são ideais, mas, na prática clínica, são invasivos, de custo elevado e não disponíveis no nosso meio. A tabela 1 resume os principais testes funcionais que avaliam FEP usados no diagnóstico de PC.

Testes Funcionais Indiretos

Determinação de esteatorreiaA determinação de esteatorreia somente indica má-absorção de gordura, não definindo a causa dessa má-absorção, porém pode indicar diminuição da lipase pancreática. Outras causas para a ocor-rência da esteatorreia devem ser lembradas e afastadas. Além disso, na PC, qualquer método de diagnóstico de esteatorreia só é sensível em fases avançadas da doença, com franca insuficiência pancreáti-ca, ou seja, muitas vezes não é necessária esta determinação para o diagnóstico da PC.

O diagnóstico laboratorial da esteatorreia é tradicionalmente realiza-do pelos seguintes métodos:

• Dosagem de gordura fecal em amostras de fezes de 72 horas. • Dosagem de gordura fecal em amostras de fezes de 24 horas. • Pesquisa da gordura fecal em amostras de fezes coradas

pelo Sudan III. • Esteatócrito.

DOSAGEM DE GORDURA FECAL EM AMOSTRAS DE FEZES DE 72 HORASÉ um método quantitativo que permite calcular a taxa diária de excreção de gordura fecale padrão ouro para quantificação da esteatorreia, porém não é específico para doença pancreática, já que diagnosticará esteatorreia também em outras situações como em doenças da mucosa do intestino delgado, na síndrome do in-testino curto, etc.

Este método tem várias limitações e vem sendo pouco utilizado, principalmente pela necessidade de dieta prévia hipergordurosa (ao menos três dias antes do início da coleta e durante toda a coleta) e da parada na reposição de enzimas pancreáticas (ao menos uma semana antes do início da coleta e durante toda a coleta), atitudes que podem causar ou acentuar dor abdominal. Além disso, a pró-pria coleta das fezes por tempo tão prolongado é fator limitante do método.

Dosagem de gordura nas fezes maior que 7g/dia é considerado anormal, embora na PC possa ser superior a 20g/dia.

DOSAGEM DE GORDURA FECAL EM AMOSTRAS DE FEZES DE 24 HORASSemelhante ao método descrito anteriormente, é mais usado para monitorar a resposta à terapia com enzimas em indivíduos que apresentam aumento inexplicado de esteatorreia, porém não sendo empregado na rotina de diagnóstico da esteatorreia.

PESQUISA DA GORDURA FECAL – SUDAN IIITeste qualitativo servindo na triagem, porém tem baixa sensibilidade para má-absorção de gordura, geralmente detectando esteatorreia acima de 25g/dia ou mais. Por requerer pequena amostra de fezes, tem maior aderência, porém tem falsos positivos em indivíduos uti-lizando medicamentos como orlistat (Xenical®) ou ezetimibe (anti--hiperlipêmico), ou ingerindo alimentos contendo gordura sintética como olestra (usada em alguns alimentos dietéticos), que não é nor-malmente absorvida no intestino delgado mesmo por indivíduos sem PC.

ESTEATÓCRITOTrata-se de um método quantitativo relativamente simples. Peque-nas quantidades de fezes são homogeneizadas com areia e, após centrifugação, observa-se a formação de três camadas: uma fase sólida inferior (S), uma fase líquida intermediária (L) e uma fase superior (G) que constitui a gordura presente nas fezes; esta última é então quantificada e comparada a médias.

Avaliação Indireta de Proteases Pancreáticas

Quimotripsina fecalComo esta protease secretada pelo pâncreas não sofre degradação no intestino delgado (diferente da tripsina), pode ser dosada nas fe-zes correspondendo à quantidade secretada pela glândula, estando diminuída naqueles com PC, mas somente nas fases avançadas da

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

27

doença (sensibilidade de 50-80%), ou seja, é pouco sensível nas fases iniciais.Esta enzima é alterada pela ingesta de enzimas pan-creáticas, podendo ser útil para avaliar aderência ao tratamento. A dosagem menor que 3 U/g sugere PC avançada.

Elastase pancreática fecalA elastase-1 pancreática também é uma protease secretada espe-cificamente pelo pâncreas, que também é minimamente degrada-da durante o trânsito intestinal e parece alterar-se precocemente na PC. A concentração da elastase nas fezes medida por ELISA se correlaciona bem com a secreção pancreática, ajudando no diag-nóstico da IEP.

Dosagem menor que 100 μg/g é indicativo de PC avançada; já valo-res entre 100 a 200 μg/g são indeterminados, porém se associado a outras evidências da doença pode contribuir no diagnóstico. Valores acima de 200μg/g são normais.

A sensibilidade do método é baixa nas fases iniciais da doença (0-65%) aumentando para 33-100% na PC avançada, com especifici-dade de 29-95%.

Alguns trabalhos mostraram que a dosagem de elastase-1 fecal é superior à dosagem de quimotripsina fecal. Também este método não sofre influência da ingesta de enzimas pancreáticas exógenas e a amostra de fezes necessária é pequena. Porém, o custo do exame é superior ao da dosagem da quimotripsina fecal.

Lipase fecal Método de determinação imunológica da concentração da lipase nas fezes também só é sensível em fases avançadas da PC, não sen-do afetado pela terapia de reposição enzimática, porém com custo também elevado.

Tripsina séricaA tripsina é a principal protease secretada pelo pâncreas, mas sofre degradação no intestino delgado distal, portanto sua dosagem fecal não é útil no diagnóstico da PC. A detecção sérica por imunorreação por RIA (Radio Immune Assay) é um método sensível, mas só na PC avançada. A sensibilidade varia de 33-65% na PC leve a avançada, mas a especificidade é alta.

Dosagem menor que 20ng/ml é específico para PC. De 20-29 ng/ml é indeterminado, mas às vezes representam PC inicial. Valores supe-riores a 150ng/ml são indicativos de inflamação ativa no pâncreas.

Teste Respiratório com Triglicerídeos Marcados com C13

Os testes respiratórios, utilizando radioisótopos estáveis, são con-siderados, desde há alguns anos, métodos seguros, cômodos e de fácil aplicação na prática clínica corrente.

O teste respiratório baseia-se na administração oral de um substrato de triglicerídeos de cadeia média marcado com13C (TGM 13C), o qual é digerido pelas enzimas pancreáticas (lipase), sendo em seguida absorvido e metabolizado com liberaçãode 13CO2 para a corrente sanguínea e posterior eliminação, após algumas horas, pelo ar expi-rado, que é então dosado por um espectrômetro. Então, este teste avalia a capacidade de degradação dos triglicerídeos ingeridos.

Valores de 13CO2 exalados inferiores a 29% são considerados compatíveis com IEP, com sensibilidade e especificidade de 89 e 81%, respectivamente, tendo como referência a prova da secre-tina-pancreozimina.Também só é sensível em fases avançadas da IEP e não está disponível no nosso meio.

Teste de bentiromida e pancreolaurilA bentiromida e o dilaurato de fluoresceína (pancreolauril) são substâncias que sofrem ação das enzimas pancreáticas quimio-tripsina e acil-transferase, havendo liberação de ácido para-amino benzóico (PABA) e fluoresceína respectivamente. Estes substratos serão absorvidos pelo intestino delgado, metabolizados no fígado e excretados pelos rins.

Após ingestão da bentiromida ou pancreolauril, a dosagem renal dos substratos correlaciona-se com o grau de suficiência pancreáti-ca, desde que problemas de absorção intestinal, metabolismo hepá-tico e excreção renal sejam levados em conta. A dosagem urinária de 50% ou mais da quantidade administrada é considerado normal. Este teste também tem menor sensibilidade nas fases iniciais da do-ença e há alguns anos seu uso vem sendo abandonado no nosso meio.

Amilase e lipase séricasA determinação sérica de enzimas pancreáticas como amilase e lipase tem valor diagnóstico muito limitado na avaliação da PC, não sendo útil para o diagnóstico da doença propriamente, mas eventu-almente contribuindo para indicar complicações como agudização da doença (fases iniciais) e desenvolvimento de pseudocistos. Já a determinação de isoamilase é útil na investigação de hiperamilase-mia inexplicável.

Testes Funcionais Diretos ou Invasivos

Análise do suco pancreático após estímulo hormonal exógeno - teste da secretina/pancreaziminaEsta análise mede a função pancreática após estímulo fisiológico ou suprafisiológico. Sem este estímulo há grande dificuldade na avalia-ção da secreção pancreática devido a não constância na quantidade de secreção basal pancreática. O estímulo da glândula é feito pela infusão de secretina sintética, e/ou colecistoquinina (pancreazimi-na), ou bombesina, ou ceruleína ou estas substâncias associadas.

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

28

Há grande variação na dosagem e substância utilizada, sem aparen-te vantagem de uma técnica sobre outra.

A secretina vai estimular a secreção de bicarbonato e eletrólitos pela glândula. Já a colecistoquinina estimulará a produção de enzimas pancreáticas. O suco pancreático é então coletado. A técnica da coleta também é bastante variável podendo ser ou no duodeno por meio de sonda naso-duodenal de duplo lúmen e balões que permi-tam a oclusão do piloro e duodeno distal; ou por meio de aspiração endoscópica; ou diretamente do canal pancreático, principal por sonda naso-pancreática inserida por via endoscópica durante CPRE. O material coletado é analisado quanto ao volume, concentração de bicarbonato, enzimas pancreáticas entre outros parâmetros.

A coleta intraductal teria vantagens por não ocorrer contaminação do suco pancreático pela bile e suco gástrico presentes no duode-no, além de ser possível a realização naqueles com gastrectomia e reconstrução a BI e BII. Por outro lado requer especialista em colan-giopancreatografia endoscópica, estando sujeito às complicações desse método. A coleta por meio de aspiração endoscópica apesar de atrativa parece não ter relação custo-benefício favorável em rela-ção às outras formas de coleta.

Apesar de ser bastante sensível (67-88%) e específica (90-100%) na detecção de estágios iniciais da PC, a análise do suco pancreáti-co após estímulo hormonal exógeno é método limitado pela dificul-dade na colocação das sondas de coleta, que devem permanecer por tempo relativamente prolongado na posição adequada, o que é desconfortável. Além disso, está associado a falsos positivos até meses após um episódio de pancreatite aguda.

Outras situações como cirrose hepática e diabete também podem estar acompanhadas de testes falsos positivos pela diminuição da secreção pancreática. Estes exames não são feitos na prática clínica diária.

A dose habitual de secretina para estímulo pancreático 1U/Kg EV em bolus (secretina Porcina) ou 0,2mg/kg (secretina humana sintética). Os testes funcionais diretos como o teste da secretina têm sido pouco utilizados, necessitando ainda simplificação para uso rotineiro.

Avaliação laboratorial diagnóstica - Pancreatite autoimuneNa PC autoimune ocorre um processo inflamatório pancreático se-cundário à agressão de autoanticorpos (doença autoimune), com acentuado infiltrado linfocitário associado à fibrose do pâncreas, causando disfunção orgânica. A pancreatite autoimune será confir-mada quando da presença de determinados critérios diagnósticos como denso infiltrado linfoplasmocitário e acentuada fibrose peri-ductal encontrado na análise histopatológica do pâncreas; presença de níveis séricos elevados de imunoglobulina G4; acometimento de outros órgãos pelo mesmo processo autoimune; e pela resposta clí-nica e radiológica à corticoterapia.

Além disso, a detecção de autoanticorpos antianidrase carbônica e antilactoferrina podem ajudar no diagnóstico, embora sejam pouco disponíveis no nosso meio. Em muitos casos é feito somente a pes-quisa de hiperglobulinemia, de fator antinuclear (FAN) e a dosagem da IgG4 que pode estar elevada.

ConclusãoA escolha de qual teste laboratorial será feito leva em conta não somente a sua acurácia diagnóstica, mas principalmente a sua disponibilidade. É importante ressaltar que, na grande maioria das situações, o diagnóstico da PC dispensará exames laboratoriais complementares e que estes devem utilizados de maneira individu-alizada, indicando-se testes indiretos de função pancreática por não serem invasivos, associados a métodos de imagem.

É frequente a recomendação da dosagem da elastase-1 fecal, dis-ponível no nosso meio e que é minimamente degradada durante o trânsito intestinal, além da realização da tomografia do pâncreas. Porém a dosagem daelastase-1 fecal é útil somente nos casos de insuficiência exócrina moderada ou grave.

A dosagem de esteatorreia pode ser útil em alguns casos especí-ficos, na avaliação da resposta à reposição exógena de enzimas, sendo restrito seu uso no diagnóstico da PC. Há ainda necessida-de de um teste laboratorial simples, não invasivo, com baixo cus-to e acurácia adequada para as fases iniciais da doença. Até lá, é necessário lembrar, que o seguimento clínico a longo prazo permi-tirá o diagnóstico de muitos, senão de todos os casos duvidosos.

Referências1. Amman RW,Buehker H, Pei P. Comparative diagnostic accuracy of four

tubeless pancreatic function tests in chronic pancreatitis. Scand J Gastro-enterol. 1982; 17: 997-1002.

2. Borgstrom A, Wehlin L. Correlation between serum concentrations of three specific exocrine pancreatic proteins and pancreatic duct morpho-logy at ERCP examinations. Scand J Gastroenterol. 1984; 19: 220-227.

3. Bożek M, Jonderko K, Piłka M. On a refinement of the ¹³C-mixed TAG breath test.Br J Nutr. 2012;107:211-217.

4. Chowdhury RS, Forsmark CE. Review article: pancreatic function testing. Aliment PharmacolTher. 2003; 17: 733-750.

5. Conwell DI, ZuccaroGJr, Vargo JJ et al. An endoscopic pancreatic function test with synthetic porcine secretin for the evaluation of chronic abdominal pain and suspected chronic pancreatitis.GastrointestEndosc. 2003; 57: 37-40.

6. Conwell DL.American Pancreatic Association Practice Guidelines in Chro-nic Pancreatitis: evidence-based report on diagnostic guidelines.Pancreas. 2014 Nov;43(8):1143-62. doi: 10.1097/MPA.0000000000000237.

7. Czakó,L. Diagnosis of early-stage chronic pancreatitis by secretin-enhan-ced magnetic resonance cholangiopancreatography. J Gastroenterol.2007 ; 42 (suppl XVII) 113-117.

8. Delachaume-Salem E, Sarle H. Normal human pancreatic secretion in re-lation to age. BiolGastroenterol. 1970; 2: 135-46.

9. Dominguez-Munoz JE, Hieronymus C, Sauerbruch T, Malfertheiner P. Fe-cal elastase test: evaluation of a new noninvasive pancreatic function test. Am J Gastroenterol.1995; 90: 1834-1837.

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Tabela 1- Testes que avaliam a função exócrina do pâncreas, utilizados no diagnóstico da PC

Classificação Teste funcional Característica

Avalia capacidade digestiva do pâncreas**

Avalia concentração de enzimas pancreáticas

Não Invasivos

Determinação de esteatorreia

Dosagem de gordura fecal - 72 horas

Teste fecal Sim (especificidade baixa) -

Dosagem de gordura fecal 24 horas

Teste fecal Sim (especificidade baixa) -

Pesquisa da gordura fecal - Sudan III

Teste fecal Sim (especificidade baixa) -

Esteatócrito Teste fecal Sim (especificidade baixa) -

Lipase fecal Imunorreação Teste fecal - Sim

Teste Respiratório com Triglicerídeos Marcados com 13C

Utiliza radioisótopos

Teste oral-respiratório Sim -

Quimotripsina fecal Imunorreação Teste fecal - Sim

Elastase-1 fecal ELISA*** Teste fecal - Sim

Tripsina sérica Imunorreação (RIA)**** Teste sérico - Sim

Teste de bentiromida- pancreolauril

Teste oral- urinário Sim -

Ressonância Magnética após estímulo pancreático*

Necessita uso de secretina *

Exame de imagem - -

Invasivos

Teste da secretina/pancreazimina * -Teste de Lundh

Clássico - sonda nasoduodenal de duplo lúmen.Necessita uso de secretina *

Tubagem duodenal - Sim

Coleta por sonda nasopancreática. Necessita uso de secretina *

Tubagem pancreática - Sim

Coleta no duodeno durante endoscopia. Necessita uso de secretina *

Exame endoscópico - Sim

*Não disponível rotineiramente / **Testes que dependem da capacidade de absorção intestinal / ***ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay)/ **** RIA(Radio Immune Assay)

29

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A radiografia panorâmica do abdômen tem uma boa sensi-bilidade para detectar a calcificação pancreática (mais alta que a da ultrassonografia e mais baixa que a da tomografia computadorizada). Embora altamente sugestiva de pancrea-tite crônica, sobretudo em pacientes alcoolistas, a calcificação no leito pancreático tem outros diagnósticos diferenciais, como

hematoma e/ou infarto pancreáticos, metástases, pseudocistos, neoplasias císticas e tumores neuroendócrinos, entre outros. Alterações calcificantes na coluna lombar e ateroma aórtico podem ser confundidos com calcificação pancreática na inci-dência frontal, podendo ser diferenciados com a incidência em perfil.

1. Professora Coordenadora do Curso de Radiologia da Fundação Técnico Educacional Souza Marques,Radiologista do Hospital da Lagoa (RJ) e Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia.

Achados encontrados na radiologia convencional na pancreatite crônica

MaRta caRvalho Galvão1

30

10. Domínguez-Muñoz JE. Pancreatic exocrine insufficiency: diagnosis and treatment. J GastroenterolHepatol. 2011;26Suppl 2:12-16.

11. Draganov P, Patel A, Fazel A, et al. Prospective evaluation of the accuracy of the intraductal secretin stimulation test in the diagnosis of chronic pan-creatitis. ClinG astroenterolHepatol. 2005; 3: 695-699.

12. Etemad B, Whitcomb DC. Chronic pancreatitis: diagnosis, classification and new genetic developments. Gastroenterology.2001; 120:682-707.

13. Galvão-Alves J, Galvão MC. Pancreatite autoimune.JBM.2014.102; 1:17-22.

14. Garcia-Bueno C A, Rossi T M, Lee K W, et al Quantification of fecal elasta-se-1 using either polyclonal or monoclonal antibodies. Gastroenteorology .2002; 122, 4 : A 510.

15. Hart,P.A.Conwell,DL.Diagnosis of Exocrine Pancreatic Insufficiency.Current Treatment Options in Gastroenterology.2015; vol.13, Issue 3, pp 347-353.

16. Hayakawa,T. Kondo T. Shib At A T. Noda A. Suzuki T. Nakano S. Rela-tionship between pancreatic exocrine function and histological changes in chronic pancreatitis. Am J Gastroenterol. 1992; 87 (9): 1170-4.

17. Jacobson DG, Currington C, Connery K, et al. Trypsin like immunoreactivity as a test for pancreatic insufficiency. N Engl J Med. 1984; 310: 1307-1308.

18. Katschinski M, Schirra J, Bross A, et al. Duodenal secretion and fecal excretion of pancreatic elastase-1 in healthy humans and patients with chronic pancreatitis.Pancreas. 1997;15(2):191-200.

19. Lambiase L. Forsmark CE Toskes PP Secretin test diagnoses chronic pan-creatitis earlier than ERCP. Gastroenterology. 1993: 104: A315 (Abstract).

20. Lankisch P. Exocrine pancreatic function tests.Gut.1982 ; 777-798.

21. Lankisch PG, Schmidt I, Konig H, et al. Faecal elastase 1: not helpful in diagnosing chronic pancreatitis associated with mild to moderate exocrine pancreatic insufficiency. Gut.1998; 42: 551-554.

22. Layer P, Yamamoto H, Kalthoff L, et al. The different courses of early- and late-onset idiopathic and alcoholic chronic pancreatitis.Gastroenterology. 1994; 107(5): 1481-7.

23. LiebIi JG,.Draganov PV. Pancreatic function testing. Here to stay for the 21st century. World J Gastroenterol. 2008 28; 14(20): 3149-3158.

24. Lindkvist B. Diagnosis and treatment of pancreatic exocrine insufficiency. World J Gastroenterol 2013; 19(42): 7258-7266.

25. Lopes, S. et al . Avaliação Comparativa do Teste Respiratório com Trigli-cerídeos Marcados com 13C no Diagnóstico não Invasivo da Insuficiência Pancreática Exócrina. J Port Gastrenterol., 2011; 18; 4:. 179-185.

26. Loser C, Mollgaard A, Folsch UR. Fecal elastase 1: a novel, highly sensiti-ve, and specific tubeless pancreatic function test. Gut.1996; 39: 580-586.

27. Niederau C, Grendell JH. Diagnosis of chronic pancreatitis.Gastroentero-logy. 1985; 88: 1973-1995.

28. Ochi K, Harada H, MizushimaT,et al. Intraductal secretin test is as useful as duodenal secretin test in assessing exocrine pancreatic function. Dig Dis Sci 1997; 42:492-496.

29. Phuapradit P, et al. The steatocrit: a simple method for estimating stool fat content in newborn infants. Arch Dis Child.1981; 56:725-728.

30. Safdi M, BelcalPk, Martim S, et al. The effects of oral pancreatic enzymes (Creon 10 capsule) on steatorrhea: a multicenter. Placebo-controlled, pa-rallel group trial in subjects with chronic pancreatitis.Pancreas.2006; 33: 156-162.

31. Scotta MS, Marzani MD, Maggiore G, etal.Fecal chymotrypsin a new diagnostic test for exocrine pancreatic insufficiency in children with cystic fibrosis. ClinBiochem. 1985; 18: 233-234.

32. Walkowiak J, Herzig K, Strzykala K, et al. Comparison of fecal lipase test and fecal elastase-1 test in the assessment of exocrine pancreatic function in cystic fibrosis.Gastroenterology.2003. 124; 4: A517-A517.

33. Walkowiak,J. Herzig,K.et al. Fecal Elastase-1 is superior to Fecal Chymo-trypsin in the assessment of pancreatic involvement in cystic fibrosis. Pe-diatrics. 2002; 110, 1-7.

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Achados encontrados na ultrassonografia do abdômen na pancreatite crônica

MaRta caRvalho Galvão1

1. Professora Coordenadora do Curso de Radiologia da Fundação Técnico Educacional Souza Marques, Radiologista do Hospital da Lagoa (RJ) e Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia.

Atrofia glandular, heterogeneidade parenquimatosa,

calcificações, irregularidade e/ou dilatação ductal e

complicações, como formações císticas e/ou sólidas,

dilatação das vias biliares e derrames intracavitários,

podem ser detectadas à ultrassonografia transabdo-

minal. Não avalia pequenas alterações ductais (irre-

gularidades ou dilatações menores).

REFERÊNCIAS1. Perez-Johnston R, Sainani NI, Sahani DV. Imaging of chronic

pancreatitis (including groove and autoimmune pancreatitis). Radiol. Clin. N. Am. 2012; 50: 447-466.

2. Choueiri NE, Balci NC, Alkaade S, Burton FR. Advanced imaging of chronic pancreatitis. Curr. Gastroenterol. Rep. 2010; 12: 114-120.

3. Raman SP, Salaria SN, Hruban RH, Fishman EK. Groove pancreatitis: spectrum of imaging findings and radiology-pathology correlation. AJR. 2013; 201(1): W29-W39.

Outro achado menos específico que sugere massa na cabeça pancreática é a presença de alargamento do arco duodenal, mais bem visibilizado com uso de contraste oral baritado, mas que, hoje, com a disponibilidade da ultrassonografia e tomografia computa-dorizada, não constitui uma indicação formal para essa finalidade. Aumentos focais em outros locais do pâncreas podem determinar rechaço de alças digestivas.

A radiografia do tórax deve complementar o estudo radiológico, pois pode identificar complicações, como derrame pleural e pseu-docistos intratorácicos, entre outras.

REFERÊNCIAS

1. Perez-Johnston R, Sainani NI, Sahani DV. Imaging of chronic pancreatitis

(including groove and autoimmune pancreatitis). Radiol. Clin. N. Am. 2012;

50: 447-466.

2. Choueiri NE, Balci NC, Alkaade S, Burton FR. Advanced imaging of chronic

pancreatitis. Curr. Gastroenterol. Rep. 2010; 12: 114-120.

3. Raman SP, Salaria SN, Hruban RH, Fishman EK. Groove pancreatitis:

spectrum of imaging findings and radiology-pathology correlation. AJR.

2013; 201(1): W29-W39.

4. Zamboni GA, Ambrosetti MC, D’Onofrio M, Mucelli RP. Ultrasonography of

the pancreas. Radiol. Clin. N. Am. 2012; 50:395-406.

Atualmente, a tomografia computadorizada (TC) é o método de imagem de escolha na avaliação inicial da pancreatite crônica clinicamente suspeita. Aumento ou atrofia do pâncreas, dilatação do ducto pancreático prin-

cipal, presença de calcificações, pseudocistos, pseudo-aneurismas, obstrução do tubo digestivo, espessamento de planos fasciais e envolvimento dos ductos biliares são achados e complicações detectáveis.

1. Professora Coordenadora do Curso de Radiologia da Fundação Técnico Educacional Souza Marques, Radiologista do Hospital da Lagoa (RJ) e Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia.

Achados encontrados na tomografia computadorizada do abdômen na pancreatite crônica

MaRta caRvalho Galvão1

31

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A diferenciação entre pancreatite crônica e carcinoma pancreá-tico, quando encontramos aumento focal ou difuso da glândula e/ou alteração textural, é, por vezes, impossível pelos métodos de imagem, até mesmo pela ressonância magnética e ecoen-doscopia, sem a complementação histológica.

Se há extenso tecido fibroso, nota-se retardo da captação por meio de contraste, o que dificulta ainda mais o diagnós-tico diferencial. No entanto, é a presença de calcificações parenquimatosas o achado mais sensível e específico para pancreatite crônica.

Presença de mais de dez focos de calcificações parenquima-tosas correlaciona-se com fibrose em estágio avançado. A TC é mais sensível para detecção de calcificações parenqui-matosas que os demais métodos de imagem não invasivos.

A atualmente denominada pancreatite da goteira duode-nopancreática (groove pancreatitis) é uma forma rara de pancreatite crônica que afeta o espaço entre a cabeça pancreática, o duodeno e o colédoco.

A causa é desconhecida, mas há forte associação com o abuso do álcool, a hiperplasia da glândula de Brunner e a obstrução funcional do ducto de Santorini (papila menor). No entanto, pode ser difícil a diferenciação de malignidade periampular apenas pela imagem.

Uma forma não rara de pancreatite crônica é a de etiologia autoimune, como componente da síndrome IgG4.

Referências

1. Perez-Johnston R, Sainani NI, Sahani DV. Imaging of chronic

pancreatitis (including groove and autoimmune pancreatitis). Radiol.

Clin. N. Am. 2012; 50: 447-466.

2. Choueiri NE, Balci NC, Alkaade S, Burton FR. Advanced imaging of

chronic pancreatitis. Curr. Gastroenterol. Rep. 2010; 12: 114-120.

3. Raman SP, Salaria SN, Hruban RH, Fishman EK. Groove pancreatitis:

spectrum of imaging findings and radiology-pathology correlation. AJR.

013; 201(1): W29-W39.

4. Zamboni GA, Ambrosetti MC, D’Onofrio M, Mucelli RP. Ultrasonography

of the pancreas. Radiol. Clin. N. Am. 2012; 50: 395-406.

As alterações ductais e parenquimatosas encontradas na pan-creatite crônica podem ser demonstradas por vários métodos complementares de imagem, como a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE), a ecoendoscopia, a ultrasso-nografia, a tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM).

Tradicionalmente, a CPRE tem sido considerada o método padrão ouro no diagnóstico da pancreatite crônica. Nos últi-mos anos, observa-se um progressivo avanço nas técnicas de obtenção da imagens por RM, sobretudo a custa de estudos mais rápidos e com maior resolução espacial, consolidando sua capacidade de detectar e caracterizar alterações do pa-rênquima pancreático e dos ductos biliares e pancreáticos.

Resumidamente, são obtidas sequências de imagem com ênfase na caracterização tecidual, usualmente valendo-se da utilização de substância de contraste (gadolínio), acrescidas da técnica de colangiopancreatografia por ressonância mag-nética (CPRM), que gera imagens colangiográficas a partir de líquido estacionário, ou com fluxo muito lento, como a bile e o suco pancreático.

Os aspectos de imagem mais típicos da pancreatite crônica são as calcificações, usualmente de difícil caracterização nos exames de RM, a atrofia parenquimatosa (Figura A), a dila-tação do ducto principal e/ou secundários (Figura B), bem como o padrão de estenose/dilatação ductal e a presença de cálculos intrapancreáticos e de pseudocistos.

1. Membro Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diretor do Centro de Imagem – RICHET Medicina & Diagnóstico.

Ressonância magnética na pancreatite crônica:principais aspectos

antonio alexanDRe De oliveiRa siciliano1

32

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Sendo assim, a análise morfológica completa do pâncreas pela ressonância magnética, nos casos confirmados de pancreatite crônica ou nas suspeitas, deve incluir as sequências tradicio-nalmente aplicadas para caracterização tecidual (sequências pesadas em T1, antes e após a administração de contraste para-magnético, e sequências pesadas em T2, ambas associadas a técnicas com supressão de gordura), bem como técnica para análise da morfologia ductal (CPRM) da árvore biliar e dos ductos pancreáticos. A pancreatite crônica se manifesta na RM por achados no parênquima e nos ductos pancreáticos.

A fibrose e a inflamação crônica reduzem a intensidade de sinal no parênquima pancreático nas sequências pesadas em T1 sem supressão de gordura (Figuras C e D), aspecto que fica mais nítido na sequência com supressão de gordura (Fi-guras E e F).

33

Figura A - Pancreatite crônica. Pâncreas atrófico e com dilatação do ducto (seta) Wirsung, em sequência de RM pesada em T1.

Figuras C, D, E e F - Pancreatite crônica em paciente com pâncreas divisum. Pâncreas atrófico, notando-se parênquima com sinal difusamente reduzido na sequência pesada em T1, destacando-se áreas com sinal normal, não acometidas pela fibrose no pâncreas ventral (seta em C e em E) e na cauda (seta em D e em F). Os aspectos ficam mais nítidos nas imagens pesadas em T1 com supressão de gordura (Figuras E e F), onde o parênquima poupado do processo inflamatório crônico torna-se mais evidente, com sinal elevado face ao seu conteúdo proteico no interior dos ácinos.

Figura B - Pancreatite crônica. Dilatação difusa e irregular (setas) do ducto Wirsung em imagem de CPRM. Hepatocolédoco (HC).

A

B

C

D

E

F

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Além disso, há também redução difusa da intensidade do realce na fase precoce (Figuras G e H) após a administração intravenosa de contraste paramagnético (gadolínio), associado ao retardo na obtenção do pico máximo de realce pós contraste do parênquima, o que determina um realce relativamente mais intenso na fase tardia (figuras I e J)

Histologicamente, existe substituição do parênquima pancreático normal por tecido fibroso, que carece da estrutura e do conteúdo proteico acinar bem como é menos vascularizado. Apesar da difi-culdade inerente ao método de detectar calcificações, é possível verificar a presença de cálculos, caracterizados pela presença de focos de “falha de enchimento” intraductal na CPRM.

A pancreatite crônica em fase inicial pode apresentar dilatação de ductos secundários, mas sua detecção pela CPRM é limitada quando comparada à CPRE, especialmente quando ocorre de forma discreta e isoladamente no corpo e/ou cauda devido às limitações de reso-lução espacial do método.

A dilatação do ducto pancreático principal, quando não acompa-nhada de focos de estenose, pode simular o padrão de dilatação encontrado em outras entidades como, por exemplo, na neoplasia papilar mucinosa intraductal. Entretanto, mais frequentemente ocorre a forma de dilatação irregular associada à tortuosidade difusa, com focos curtos (em sua maioria com menos de 1 cm de extensão) de estenose e dilatação alternados, aspecto que pode ser identificado na CPRM com sensibilidade significativa. Vale

ressaltar, no entanto, que há também formas focais/segmentares de dilatação ductal, bem como formas caracterizadas pela formação de massa inflamatória em até 30% dos pacientes com pancreatite crônica, ambas de difícil diferenciação do adenocarcinoma ductal do pâncreas. Existem, entretanto, aspectos na pancreatite crônica que podem auxiliar na diferenciação com lesão neoplásica, utilizando-se as técnicas de RM supracitadas:

• A dilatação do ducto pancreático principal e dos ductos secundá-rios distalmente ao foco de estenose é irregular e não uniforme, notando-se com frequência outros focos estenóticos curtos no ducto principal e secundários de aspecto irregular na CPRM;

• Também pode-se verificar a presença de dilatação ductal no inte-rior da massa inflamatória, o que usualmente não ocorre no car-cinoma;

• Atrofia da glândula dá-se de forma difusa na pancreatite crôni-ca, diferentemente do que ocorre no carcinoma, onde observa-se atrofia intensa distalmente à lesão, e

• O carcinoma ductal se manifesta como lesão hipovascular após a administração de contraste paramagnético, isto é, a impregnação de contraste na lesão neoplásica é marcadamente menos inten-sa do que no parênquima pancreático normal adjacente, e alguns trabalhos demonstraram, porém de forma inconsistente, maior frequência de hipersinal nas sequências pesadas em difusão nos carcinomas ductais, quando comparados aos casos de pancreatite crônica com formação de massa. Ainda assim, a biópsia perma-

34

Figuras G, H, I e J - Pancreatite crônica em paciente com pâncreas divisum. Imagens obtidas precocemente (fase pancreática) após a administarção IV de contraste paramagnético (gadolínio) demonstram o realce mais intenso e homogêno no pâncreas ventral (seta em G) e em área na cauda (seta em H), ambos poupados do processo inflamatório crônico. A impregnação pelo contraste no parênquima acometido ocorrerá de forma mais intensa na fase tardia (Figuras I e J).

G H

I J

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Embora até o momento não exista um verdadeiro żpadrão ouroż, a endoscopia ainda é considerada o melhor método para o diagnóstico de pancreatite crônica, especialmente em um subgrupo de pacientes com dor abdominal crônica e suspeita diagnóstica, mas que não apresentam evidências clínicas claras de insuficiência pancreática ou imagenologia anormal. Atual-

mente, a posição ocupada pela endoscopia tornou-se ainda mais forte, considerando-se, em conjunto, a complementação da CPER pela ecoendoscopia que, além das imagens que fornece, possibilita a colheita de material por meio de agulhas, para avaliação histopatológica. Do ponto de vista da CPER, representam limitações ao exame papilas localizadas no inte-

1. Professor Titular de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina - UFRJ, PhD pela Universidade de Bristol - Inglaterra, Membro Titular da Cadeira 18 da Academia Nacional de Medicina e Presidente honorário da Organização Mundial de Endoscopiaa Digestiva (OMED).

Contribuição da colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) no manejo da pancreatite crônica

GlacioMaR MachaDo1

nece como a ferramenta diagnóstica mais confiável nos casos em que a diferenciação pelos métodos de imagem entre neoplasia e pancreatite crônica não é possível.

A formação de pseudocistos é a complicação mais comum da pancreatite crônica, ocorrendo em até 25% dos casos, indepen-dentemente da coexistência de evento de pancreatite aguda. Usual-mente se manifestam como pequenos cistos intrapancreáticos, apresentam conteúdo liquefeito e homogêneo, tem paredes lisas, sem septações grosseiras e podem ou não apresentar comuni-cação com o ducto pancreático principal. Outras complicações da pancreatite crônica incluem a formação de trajeto fistuloso, de pseu-doaneurisma e trombose da veia porta e tributárias. Existe também a possibilidade de estenose coledocociana, usualmente com aspecto de afilamento progressivo e regular.

A pancreatite do sulco duodeno pancreático (pancreatite de sulco) é uma forma de pancreatite crônica rara, que acomete o espaço potencial entre a cabeça do pâncreas, o duodeno e o colédoco. Pode ocorrer envolvimento da porção mais superior da cabeça pancreática e com aspectos na RM de difícil diferenciação de lesão neoplásica. Com frequência há também estenose e espessamento parietal do duodeno, associados à presença de pequenas imagens císticas em sua parede. A estenose do hepatocolédoco é regular, não abrupta, diferente do carcinoma ductal, que usualmente deter-mina estenose irregular e abrupta, levando à icterícia obstrutiva.

A pancreatite autoimune representa cerca de 2-11% dos casos de pancreatite crônica, é considerada como parte do conjunto de afecções que constituem a doença esclerosante associada à IgG4 e caracterizada por processo inflamatório primariamente linfoplas-mocitário. Apesar de existirem também relatos de formas focais, as imagens de RM mais comumente retratam uma glândula difu-samente aumentada de volume, com perda do contorno lobular e parênquima heterogêneo nas sequências pesadas em T2, asso-ciados ao ducto pancreático com leve redução difusa e irregular

de calibre, ou mesmo de calibre normal na CPRM. Ocasionalmente, observa-se halo peripancreático com hipossinal após a adminis-tração de contraste, considerado mais específico em relação aos demais achados. Observa-se esclerose difusa e fibrose nas fases mais avançadas, notando-se atrofia do parênquima nas regiões acometidas.

Os métodos de imagem ofereciam técnicas de acurácia limitada na avaliação da pancreatite crônica, detectando e caracterizando a doença somente em estágios mais avançados. Entretanto, os avanços e o emprego adequado dos métodos não invasivos, como a RM e a CPRM, propiciaram um diagnóstico e tratamento mais precoce.

Referências 1. Gabata T, Kadoya M, Terayama N et al. (2003) Groove pancreatic carcinomas: radiological and pathological fin-

dings. Eur Radiol 13:1679-1684.

2. Ichikawa T, Sou H, Araki T et al. (2001) Duct-penetrating sign at MRCP: usefulness for differentiating inflammatory

pancreatic mass from pancreatic carcinomas. Radiology 221 : 107–116.

3. Miller FH, Keppke AL,Wadhwa A et al. (2004) MRI of pancreatitis and its complications: part 2, chronic pancrea-

titis. Am J Roentgenol 183 : 1645–1652.

4. Raman S, Salaria S, Hruban R, Fishman E. (2013) Groove Pancreatitis: Spectrum of Imaging Findings and radiolo-

gy-Pathology Correlation. Am J Roentgenol 201: W29-W39.

5. Sandrasegara K, Nutakki K, Tahir B et al. (2013) Use of Diffusion Weighed MRI to Differentiate Chronic Pancreatitis

from Pancreatic Cancer. Am J Roetgenol 201: 1002-1008.

6. Shanbhogue A, Fasih N, Surabhi V et al. (2009) A clinical and radiologic review of uncommon types and causes of

pacreatitis. Radiographics 29: 1003-1026.

7. Sica GT, Miller FH, Rodriguez G, McTavish J, Banks PA. (2002) Magnetic resonance imaging in patients with

pancreatitis: evaluation of signal intensity and enhancement changes. J Magn Reson Imaging 15: 275–284.

8. Siddiqi AJ, Miller F (2007) Chronic pancreatitis: ultrasound, computed tomography, and magnetic resonance ima-

ging features. Semin Ultrasound CT MR. Oct; 28(5): 384-94.

9. Vlachou P, Khalili K Jang H et al. (2011) IgG4 related esclerosing disease: autoimmune pancreatitis and extrapan-

creatic manifestations. Radiographics 31: 1379-1402.

10. Winston CB, Mitchell DG, Outwater EK, Ehrlich SM (1995) Pancreatic signal intensity on T1-weighted fat saturation

MR images: clinical correlation. J Magn Reson Imaging 5 : 267–271.

35

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A ecoendoscopia (EE) deve ser indicada para o diag-nóstico de PC após o insucesso dos outros métodos de imagem.

A EE produz imagens detalhadas do pâncreas. Esse método possibilita avaliar critérios morfológicos paren-quimatosos (focos e traves hiperecoicas, lobularidade glandular, cistos e calcificações) e ductais (ectasia ductal principal e secundária, irregularidade ductal, paredes ductais hiperecoicas e calcificações), possibilitando esta-diar a PC.

Não existe padronização da técnica e a maioria das publi-cações emprega terminologia ecográfica não consen-

sual, dificultando a interpretação e a concordância dos achados, sobretudo entre os observadores. Organizando os critérios morfológicos ecográficos, o 1º Consenso de Rosemont (2007) propôs uma classificação diagnóstica gradativa.

A EE permite a detecção de alterações da PC leve, possi-velmente não visíveis em outros métodos de imagem, unindo elementos qualitativos e quantitativos, no intuito de estabelecer o diagnóstico ecoendoscópico da PC por meio da soma de seus critérios.

No entanto, tomando por base apenas achados ecoendos-cópicos, ainda permanece controverso o diagnóstico da PC

1. Especialização em Ecoendoscopia pela Universidade de Marselha – França, Especialização em Hepatogastroenterologia pela Universidade de Lyon – França, Especialista em Gastroenterologia pela FBG e Especialista em Endoscopia Digestiva pela SOBED.

Papel da ecoendoscopia no diagnóstico da pancreatite crônica

thiaGo anDRaDe tataGiBa1

rior de divertículos duodenais que tenham orifício de entrada muito estreito. Pacientes gastrectomizados à Billroth II com alça aferente longa ou com reconstrução do trânsito à Y de Roux ou submetidos à cirurgia bariátrica, cujas papilas se localizam a uma distância fora do alcance dos duodenoscópios convencionais, são hoje factíveis ao procedimento, com o uso dos enteroscópios-balão(ões) assis-tidos.

Atualmente, com o advento da pancreatografia por ressonância magnética e da ecoendoscopia, a CPER tornou-se um método mais terapêutico que diagnóstico. Por exemplo: a estenose e a litíase no ducto pancreático principal geralmente se acompanham de hipertensão canalicular.

No caso de estenose única localizada no óstio do canal pancreá-tico principal, é possível o tratamento endoscópico pela osteotomia seletiva do Wirsung e nas estenoses múltiplas pelo emprego de balões hidrostáticos. Igualmente, na litíase pancreática, é possível a extração dos cálculos empregando as cestas de Dormia, após a realização de osteotomia e litotripsia mecânica ou por ondas de choque.

Nas fístulas, a endoscopia possibilita a implantação de endopró-teses plásticas, que devem permanecer até que ocorra seu fecha-

mento ou que se torne óbvio o insucesso dessa terapêutica. De igual forma, é possível a drenagem dos pseudocistos, principal-mente os que estão em contato com a parede posterior do estô-mago ou duodeno, considerados de localização ideal para abor-dagem endoscópica.

Além disso, nos 10% a 30% dos pacientes com pancreatite crônica que desenvolvem estenose da porção intrapancreática do colé-doco, a endoscopia oferece a alternativa de drenagem biliar por endopróteses nos casos que representem alto risco cirúrgico.

Referências1. Classen M, Koch H, Frühmorgen P et al. Results of retrograde pancreatography.

Gastroent. Jap. 1972; 7: 131-34.2. Machado G. Colangiopancreatografia retrógrada endocópica. Tema

apresentado na mesa-redonda żRecentes Avanços em Endoscopia Digestivaż, I Seminário Brasileiro de Endoscopia Digestiva. Rio de Janeiro. 14 jul 1973.

3. Saleem A, Baron TH, Gastout CJ et al. Endoscopic retrograde cholan-giopancreatography using a single-balloon enteroscope in patients with altered Roux-en-Y anatomy. Endoscopy. 2010; 42: 656-60.

4. RöschT, Daniel S, Scholz M et al. Endoscopic treatment of chronic pancreatitis: a multicenter study of 1000 patients with long-term follow-up. Endoscopy. 2002; 34(10): 765-771

36

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

inicial. Com a progressão da doença, achados como cálculos,

focos hiperecoicos, focos com sombra acústica posterior e

ectasia ductal principal podem estar correlacionados à insu-

ficiência pancreática, possivelmente contribuindo com a

decisão terapêutica.

Representando um novo recurso semiológico ecográfico, a

elastografia qualitativa e a quantitativa podem contribuir na

identificação gradativa dos diferentes grupos descritos na

classificação de Rosemont e da probabilidade de haver insu-

ficiência pancreática.

Pelo risco de complicação e pela ausência de critérios histo-

lógicos definidos para PC, a indicação de punção ecoguiada

aspirativa com agulha fina (EE-PAAF) ficou restrita ao diag-

nóstico diferencial das massas pancreáticas, notadamente

das neoplasias malignas pancreáticas.

Embora sem consenso e recomendando considerar a relação

custo-benefício em cada caso, estudos recentes demonstram

que a EE-PAAF melhora o valor preditivo negativo da EE e,

combinada aos seus achados, pode contribuir na compre-

ensão da fase de doença.

Referências1. Catalano MF et al. EUS-based criteria for the diagnosis of chronic pancreatitis: the

Rosemont classification. Gastrointest. Endosc. 2009; 69(7): 1251-61.2. Catalano MF et al. Prospective evaluation of endoscopic ultrasonography, endoscopic

retrograde pancreatography, and secretin test in the diagnosis of chronic pancreatitis. Gastrointest. Endosc. 1998; 48(1): 11-7.

3. DeWitt J et al. EUS-guided Trucut biopsy of suspected nonfocal chronic pancreatitis. Gastrointest. Endosc. 2005; 62(1): 76-84.

4. Gutman J, Ullah A. Advances in Endoscopic Ultrasound. Ultrasound Clinics. 2009; 4(3): 369-384.

5. Hollerbach S et al. Endoscopic ultrasonography (EUS) and fine-needle aspiration (FNA) cytology for diagnosis of chronic pancreatitis. Endoscopy. 2001; 33(10): 824-31.

6. Kalmin B, Hoffman B, Hawes R, Romagnuolo J. Conventional versus Rosemont endoscopic ultrasound criteria for chronic pancreatitis: Comparing interobserver reliability and intertest agreement. Can. J. Gastroenterol. 2011; 25(5): 261-264.

7. Lees WR. Endoscopic ultrasonography of chronic pancreatitis and pancreatic pseudocysts. Scand. J. Gastroenterol. Suppl. 1986; 123: 123-9.

8. Sahai AV et al. Prospective assessment of the ability of endoscopic ultrasound to diagnose, exclude, or establish the severity of chronic pancreatitis found by endoscopic retrograde cholangiopancreatography. Gastrointest. Endosc. 1998; 48(1): 18-25.

9. Sivak MV, Kaufman A. Endoscopic ultrasonography in the differential diagnosis of pancreatic disease. A preliminary report. Scand. J. Gastroenterol. Suppl. 1986; 123: 130-4.

10. Tandan M, Reddy DN. Endotherapy in chronic pancreatitis. World J. Gastroenterol. 2013; 19(37): 6156-6164.

11. Wallace M, Massimo R. Endoscopic ultrasound in chronic pancreatitis. UpToDate [Internet]. Set 2009 [acessado em: 4 mar 2009].

12. Wiersema M et al. Prospective evaluation, of endoscopic ultrasonography and endoscopic retrograde cholangiopancreatography in patients with chronic abdominal pain of suspected pancreatic origin. Endoscopy. 1993; 25: 555-64.

A dor é o sintoma cardinal da pancreatite crônica (PC), ocorrendo em torno de 90% dos casos e, associada às manifestações clínicas da insuficiência exócrina e endó-crina do pâncreas, compõem o quadro diagnóstico clínico da doença.

Embora a dor possa se manifestar em episódios de exacer-bação associados, em geral, à libação alcoólica e alimentar, a maior parte dos pacientes apresenta dor visceral crônica contínua, localizada no abdome superior, com irradiação para o dorso; e algumas vezes no hipocôndrio esquerdo.

Em levantamento realizado no ambulatório de pâncreas da UFBA (Universidade Federal da Bahia), 81% dos pacientes apresentaram essa forma de dor característica, sendo que 32% com intensidade suficiente para tornar-se incapacitante. A dor tem grande impacto na qualidade de vida, contribuindo para a desnutrição por redução da ingesta alimentar.

Associa-se à perda da capacidade laborativa, às comorbi-dades, à depressão e à drogadição. Considerando-se que não há tratamento curativo efetivo para a PC, o controle da dor é uma das principais metas terapêuticas, junto com a

1. Doutorado em Medicina e Saúde pela Universidade Federal da Bahia, Brasill (2004) e Coordenador- Residência em Gastroenterologia da Universidade Federal da Bahia - Brasil.

Dor na pancreatite crônica

JoRGe caRvalho GueDes1

37

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

recuperação nutricional e o controle do diabetes mellitus secun-dário.1 Ainda que existam estudos mostrando a tendência à extinção da dor com o progredir da doença, sua intensidade e o período de tempo necessário para sua diminuição, supe-rior a dez anos, indica a necessidade de medidas terapêuticas efetivas.. 1, 6

Mecanismos Fisiopatológicos

Os mecanismos da dor pancreática são múltiplos. Atribui-se papel importante à hipertensão intrapancreática, que pode ser intraductal, associada aos fenômenos obstrutivos decor-rentes de alterações ductais e modificação da composição do suco pancreático, com precipitação proteica e de cálcio, e agravada pela estimulação secretória provocada pelo álcool, consumo de gordura e nicotina.

Pode haver ainda hipertensão intraparenquimatosa, asso-ciada à inflamação crônica e déficit na drenagem linfática, com isquemia tissular resultante. 6

O processo crônico de inflamação, com liberação de cininas, prostaglandinas e citocinas, e atração de células inflamató-rias, entre as quais mastócitos, pode levar à dor, tanto por estímulo neural direto, com infiltração perineural, como pelo encarceramento das terminações nervosas em meio ao tecido fibroso. 4,7

Essas terminações sofrem hipertrofia e emaranhamento, e passam a expressar mais receptores de membrana com hiperssensibilização nociceptiva em resposta a estímulos tissulares como acidose, pressão osmótica e mecânica, peptídeos da dor e metabólitos do ácido araquidônico. 4

O TGF Beta e o NGF (Nerve Growth Factor) estão entre os agentes da inflamação que promovem a hiperssensibilização visceral. A hiperssensibilização por modificação neural ocorre também a nível central, seja por recrutamento de novas vias aferentes espinhais da dor, seja pela desregulação de vias inibitórias descendentes.4,5,6

Há ainda reorganização das áreas corticais de ativação, tradu-zidas inclusive por mudanças no EEG e nos exames funcio-nais de bioimagem, que levam ao aumento da percepção visceral, com alodinia e hiperalgesia. 4,5

Tais fatores complicam o tratamento da dor, pois os meca-nismos se autoperpetuam. Desta forma, quanto mais precoce o tratamento, maior a chance de êxito. O intervalo de tempo entre o início dos sintomas e o tratamento, no nosso meio, pode chegar a seis anos, conforme a experiência da Bahia.

Tratamento

O estabelecimento de evidências clínicas para o tratamento da dor é dificultado pela falta de correlação entre dano estru-tural, função e sintomas. A comparação entre modalidades de tratamento deve levar ainda em conta o tempo de início, o fator etiológico e a presença de cofatores, como o taba-gismo na gênese da dor. Poucos estudos levam em conta esses fatores, e ainda assim sua comparação é dificultada pelas diferentes classificações de estadiamento empregadas. Há ainda a superposição do efeito placebo, que ocorre em 30% dos pacientes.1

O ponto principal para o tratamento é a abstinência alcoólica. O álcool atua como agressor direto ao pâncreas, aumentando o estresse oxidativo pericelular e os processos inflamató-rios com ativação das células estrelares, além de promover estímulo secretório e modificações na composição do suco pancreático, aumentando a obstrução intracanalicular.1,2,4,6

Pacientes que continuam a beber dificilmente atingirão um controle satisfatório da dor. O tabagismo é outro fator impor-tante na manutenção dos estímulos dolorosos, com a nicotina sendo fator direto de ativação neuropática, sendo um item de mudança comportamental mais difícil que a abstinência alco-ólica. Pacientes com pancreatite crônica e tabagismo devem se submeter a tratamento antifumo, inclusive com suporte medicamentoso. 1,4

Quanto à dieta, a possibilidade de suplementação enzimática modificou o paradigma de supressão de gorduras, o que difi-cultava o consumo de calorias suficientes para o alcance do valor energético total diário.

Atualmente, propõe-se dieta com composição semelhante à de indivíduos normais quanto ao consumo lipídico, acompa-nhada do fornecimento de pancrelipase em quantidade sufi-ciente para o processo digestório.

O consumo de alimentos com potencial antioxidante tem sido proposto como importante estratégia no controle da dor, com respaldo em estudos controlados. Em nosso meio, avaliando-se 82 pacientes com PC, a melhora da dor esteve correlacionada à melhora global do estado nutricional e ao consumo energético diário adequado, mas não ao consumo de Vitaminas A, C e E, nem Zinco ou Selênio.1,2,4,6

Isso pode explicar o sucesso empírico obtido com a suple-mentação de enzimas no controle da dor. Advoga-se que essa suplementação, através da inibição do peptídeo libe-rador de colecistocinina, exerceria controle do estímulo secretório, com redução da dor.

Os resultados no uso de enzimas divergem entre os traba-lhos. O controle da dor seria mais eficiente através do uso de enzimas não microcapsuladas. Os poucos estudos que

38

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

chegaram a essa conclusão, entretanto, não estabelecem parâmetros adequados para comparação entre os grupos em uso de enzimas microcapsuladas ou sem cobertura.1,4,6

Em nossa experiência, a administração de enzimas microcap-suladas tem sido eficiente no controle da dor pancreática, em associação com a melhora do estado nutricional e da quali-dade de vida.

A ausência de resposta à suplementação pode ser decorrente de inativação pela acidez gástrica ou ao uso em subdoses. É interessante, nessas circunstâncias, associar um inibidor de bomba de próton e ajustar as doses, incluindo todas as refei-ções do dia, inclusive os lanches.1,6

Quanto ao uso de analgésicos, a melhor estratégia é seu uso escalonado. O uso de dipirona e paracetamol pode ser útil nas dores mais leves, e analgésicos opioides estão indicados para as dores moderadas ou intensas, aferidas por escala analógica.1,2,4

A despeito de um potencial risco de agravamento dos sintomas em função de provocar espasmo do esfíncter de Oddi, esse efeito, visto em ambiente experimental, não foi demonstrado na clínica. O uso de codeína associada ao para-cetamol dá conta da maioria dos casos.

Casos mais intensos podem ser controlados com tramadol. Meperidina se associa à maior drogadição, devendo ser evitada. Na vigência de dor resistente aos opioides, as medi-cações de efeito central analgésico podem ser empregadas. A amitriptilina em doses baixas, associada aos analgésicos, bloqueia, em nível do sistema límbico, a passagem de estí-mulos viscerais para o córtex cerebral, provavelmente por ação serotoninérgica, além de seu leve efeito anticolinérgico.3,5

Dores crônicas intensas necessitam do uso de analgésicos para dor neuropática, tais como gabapentina ou pregabalina. A dose de pregabalina 75 mg, duas vezes, ao dia é empre-gada com sucesso, podendo atingir 300 mg/dia. A pregaba-lina tem efeito GABAérgico, lembrando-se que o efeito do álcool no SNC é também através desse neurotransmissor, devendo ser usada com cautela em pacientes que continuam bebendo.3,7

O efeito colateral mais temível da pregabalina, entretanto, é a hipoglicemia, sobretudo em pacientes com uso concomitante de insulina. Uma vez que pacientes com PC não têm síntese adequada de hormônios antagonistas da insulina, como glucagon, e podem ter neuropatia autonômica, gerando déficit de liberação de catecolaminas, a hipoglicemia pode ser grave levando ao coma e ao óbito. 7

A ausência de resposta ao tratamento medicamentoso deve ser abordada inicialmente através da busca de complicações concomitantes; uma vez afastada a persistência de uso de álcool e tabaco, e na vigência de uso adequado de medicações.

A possibilidade de úlcera péptica deve ser cogitada, uma vez que, em pacientes com PC, há redução da secreção de bicarbonato no suco pancreático, reduzindo a neutralização do ácido gástrico. A presença de pseudocistos ou cistos de retenção, mesmo de pequeno tamanho, sobretudo em topo-grafia de cabeça de pâncreas, pode levar à persistência da dor.

A ocorrência de neoplasia de pâncreas associada não pode ser negligenciada nos casos de dor refratária, consideran-do-se a maior incidência desse tumor em pacientes com PC.

Tratamento Intervencional

O tratamento intervencional consiste em procedimentos de drenagem ou ablação pancreática e neuroablação. A drenagem pancreática endoscópica estaria indicada nos casos de clara obstrução do ducto pancreático principal. O uso de stents pancreáticos promove melhora temporária e complica-se com piora da obstrução e agudizações, e vem sendo evitado.1,6,8

A litotripsia extracorpórea, indicada para os casos de obstrução ductal causada por cálculos, teve resultados decepcionantes, inclusive após tentativas de uso em nosso meio.

A abordagem cirúrgica, com resultados superiores a 70% de alívio sintomático, tem sido indicada com ou sem ablação cefálica do pâncreas. Embora usualmente empregada em casos refratários ao tratamento clínico, com dilatação do Wirsung, os novos estudos fisiopatológicos referentes à dor pancreática neuropática sugerem melhores resultados em casos mais precoces. 9,10

Temos indicado cirurgia com bons resultados em pacientes com dor persistente sem dilatação importante do Wirsung. A abordagem cirúrgica, embora deva ser feita por cirurgiões experientes, pois dependente de curva de aprendizado, tem atualmente índices de mortalidade baixos, embora a morbi-dade, sobretudo representada pelas fístulas pancreáticas, permaneça como complicação ameaçadora.1,6,9,10

Uma das principais complicações cirúrgicas, entretanto, é a piora da insuficiência endócrina do pâncreas com instalação do diabetes, nem sempre prevista em função das dimensões da ablação prati-cada, tendo em vista a disfunção pancreática prévia.1,10

Os procedimentos paliativos de neuroablação, através da destruição ou bloqueio do plexo celíaco, podem ser adotados nos casos refratários, com pior prognóstico cirúrgico, pela via percutânea, guiada por bioimagem por toracoscopia ou por abordagem cirúrgica. 1, 2, 4, 6

O bloqueio ou destruição do plexo celíaco raramente tem resultados permanentes, necessitando de repetições por

39

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

vezes com intervalos semestrais, sendo considerada uma terapia paliativa de última escolha na abordagem da dor.

Procedimentos alternativos

Procedimentos tais como acupuntura, técnicas de relaxa-mento e meditação, eletroestimulação percutânea, têm sido indicados, inespecificamente, para casos de dor crônica, com resultados variáveis e sem previsibilidade, dependentes dos pacientes.4

Conclusões

A dor pancreática é o sintoma cardinal da PC, ocorrendo em mais de 80% dos casos, tendo origem multifatorial e levando à autoperpetuação por mecanismos de rearranjo neural.

A abordagem da dor é um dos objetivos principais do tratamento da PC. Abstinência alcoólica e do tabaco são passos essenciais para o controle da dor. A suplementação enzimática tem sido empregada na maioria dos casos com bons resultados empíricos, embora as evidências científicas para seu uso não sejam completamente estabelecidas. As medidas dietéticas resumem-se ao consumo de alimentos com potencial antioxidante, devendo ser evitadas dietas muito restritivas. A analgesia deve ser escalonada conforme a intensidade da dor, abrangendo de analgésicos comuns às medicações empregadas na dor neuropática.

A refratariedade da dor ao tratamento deve ser abordada inicialmente na busca de complicações concomitantes. O tratamento endoscópico não parece ser muito eficiente no controle da dor. O tratamento cirúrgico é eficiente no controle da dor, devendo ser cogitado precocemente nos casos de dor intensa.

Referências1. AGA Technical Rewiew Treatment of pain in chronic pancreatitis.

Gastroenterology, 115(3): 765-776, 1998.2. Gachago, G et al. Pain management in chronic pancreatitis. World J.

Gastroenterol. 14(20):3137-3148, 2008.3. Gilron, I et al. Neuropathic pain: principles of diagnosis and treatment.4. Moran, R et al. Pancreatic Pain. 2015. Curr Opin Gastroenterol, 31:407–

415; 2015.5. Olessen, S.S et al. Pain-associated adaptative cortical reorganization in

chronic pancreatitis. Pancreatoolgy, 10(6):742-51, 2010.6. Pitchumoni, C.S. Chronic Pancreatitis: Pathogenesis and management

of pain. J. Clin. Gastroenterol. 27(2):101-7, 1998.7. Rosenquist, E.W. Overview of treatment of chronic pain. UpToDate,

Post TW (Ed), UpToDate, Waltham, MA. (Acesso em 19 de agosto de 2015).

8. Talukdar R, et al. Pain in chronic pancreatitis: managing beyond the pancreatic duct. Word. J Gastroenterol 2013. 19(38):6319-28.

9. Yang, C.J. et al. Surgery for chronic pancreatitis: the role of early surgery in pain management. Pancreas, 2015. 44(5):819-23.

10. Zhou, Y et al. Frey procedure for chronic pancreatitis: Evidence-based assessment of short- and long-term results in comparison to pancreatoduodenectomy and Beger procedure: A meta-analysis. Pancreatology, 2015; 15(4): 372-9.

Insuficiência exócrina do pâncreas define-se como um distúrbio da função de secreção de enzimas acinares (lipase, amilase, e proteases) e da produção ductal de bicarbonato.

A pancreatite crônica (PC), em especial a de etiologia alcoólica, é a principal causa de insuficiência exócrina do pâncreas (IEP) no mundo ocidental em adultos e esta deve ser sempre considerada neste grupo de pacientes1.

A expressão clínica da insuficiência exócrina é um evento geralmente tardio na PC alcoólica (após 10 anos do início da doença) e ainda mais na PC de outra etiologia – 20 a 30 anos. Isto se deve à grande reserva pancreática em que se observa que a esteatorreia (7 gramas de gordura fecal/dia) só é percebida após a destruição de sua função exócrina em 90% ou mais2. A digestão de gordura no intes-tino delgado é resultado principalmente da ação combi-nada de lipase pancreática e seus cofatores, em especial

1. Membro Titular da Academia Nacional de Medicina, Professor Titular de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques, Professor Titular de Pós-Graduação em Gastroenterologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Docente do Curso de Medicina da Universidade Estácio de Sá e Responsável pelas Disciplinas de Propedêutica Médica e Gastroenterologia.

Insuficiência Exócrina na Pancreatite Crônica

José Galvão-alves1

40

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

a colipase e ácidos biliares. A lipase é a mais instável das enzimas pancreáticas. A amilase em quantidade significativa e as proteases em mais de 20% são recuperadas no íleo terminal ao passo que a lipase está presente em menos que 1%. Isto se deve ao fato da lipase ser altamente sensível à atividade proteolítica das enzimas tripsina e, principalmente, quimiotripsina.

A lipase é também inativada em pH ácido, o que é comum no portador de PC em razão da pobreza de bicarbonato no suco pancreático.

Agravando os fatores acima citados tem-se o fato de os meca-nismos não pancreáticos de secreção de lipase serem muito pobres (lipase gástrica e lingual). Logo, quando da insufici-ência exócrina do pâncreas, a má-absorção de gordura e os micronutrientes lipossolúveis (vitaminas A, D, E e K) serão os mais prejudicados. A consequência é perda calórica, emagrecimento, desnutrição, hipovitaminoses e, mais recen-temente em avaliação do estado nutricional, tem-se incluido a mensuração de zinco, cálcio, magnésio, tiamina e ácido fólico que, por vezes, estão reduzidos3.

Estas deficiências têm sido vistas em paciente aparentemente bem nutrido e até com sobrepeso.3 Aproximadamente 50% dos pacientes com PC desenvolverão esteatorreia, em torno de 10 a 12 anos do início da doença, e este início nem sempre é fácil de determinar. Acreditamos que tanto o início da PC (diagnóstico precoce) quanto o início da má-absorção sejam diagnosticados tardiamente.4

Estudos randomizados e placebo têm mostrado que o trata-mento com suplemento de enzimas pancreáticas melhora a esteatorreia, observada pelo aumento da absorção de gordura, redução da excreção de gordura fecal, diminui o peso e a frequência de evacuação e melhora a consistência das fezes.

A reposição enzimática diminui os distúrbios de motilidade observados na insuficiência exócrina do pâncreas, decor-rentes da liberação anormal de colecistoquinina (CCK) e poli-peptídio pancreático (PP) que tem, como consequência, um maior tempo de esvaziamento gástrico, alteração da motilidade antroduodenal e dismotilidade da vesícula biliar com redução de seu débito. Estes fatores contribuem para a diarreia da PC5.

Embora incomuns sob o ponto de vista clínico, as deficiências de vitaminas A, D, E e K podem cursar com diminuição da visão noturna, osteoporose, ataxia cerebelar e aumento do tempo de protrombina, respectivamente. Enfase importante tem-se dado à osteopenia e osteoporose neste grupo de pacientes5.

Em adição, pode-se observar carência de vitamina B12 em razão de sua menor liberação de complexo B12 - Fator Intrínseco e supercrescimento bacteriano, comum na PC.

Com a reposição enzimática, notaria ganho de peso, aumento de micro e macronutrientes, porém, com associação de dieta e reposição vitamínica adequadas.

Terapêutica de Reposição Enzimática

A pedra angular da terapêutica da Insuficiência Exócrina do Pâncreas recai sobre a reposição enzimática e o suple-mento de micro e macronutrientes. Deve-se adotar uma dieta frequente, balanceada, em pequenos volumes, sem sobre-carga de gorduras mas não hipolipídica, pois isto a torna pouco palatável e aumenta o risco de déficit de ácidos graxos essenciais, como o ácido linoleico e de vitaminas lipossolú-veis O uso de tabaco e álcool devem se extintos.

As enzimas pancreáticas de origem suína são consideradas a melhor opção para o tratamento da insuficiência exócrina do pâncreas e, quando com revestimento acidorresistente, não serão degradadas no estômago, podendo atingir o duodeno, seu principal local de ação. Pancreatina e pancrelipase são as duas formas primárias de lipase disponíveis6,1.

As enzimas bovinas são indicadas para aqueles que não podem usar a suína, por motivos alérgicos ou religiosos, e contam com 75% menos lipase, o que limita seu uso em casos de esteatorreia.

Preparações de enzimas pancreáticas originárias de micró-bios (fungo e bactérias) também existem e parecem resis-tentes à degradação ácida do estômago. No entanto, a lipase fúngica é rapidamente degradada no duodeno por ácidos biliares e proteases. Já a lipase bacteriana mostra-se estável em ambos, estômago e duodeno, podendo no futuro ser utli-zada com sucesso.

Gens de lipase humana têm sido transferidos e expressados por adenovírus recombinante, no entanto, aguardam-se pesquisas futuras. Uma outra característica do suplemento enzimático é a capacidade de ser transportado através do antroduodeno junto com o alimento triturado no estômago. Isto se consegue com os compostos na forma de microes-feras (1-2 mm de diâmetro) que são transportados juntos ao quimo gástrico.

Por fim, a dose ideal de lipase em caso de insuficiência exócrina do pâncreas diagnosticada é de 25.000 a 50.000 unidades, de acordo com a nomenclatura farmacêutica

41

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

americana (U. USP) ou europeia (U.F. Eur.), administradas durante as duas principais refeições e 25.000 U nas ingestas menores (café e lanche). 1,6,7

Um estudo recente, prospectivo, comparou a ingestão de enzima antes, durante e após as refeições e não houve dife-rença de eficácia quando ingeridas durante e após, mas ambas foram superiores aos que ingeriram antes da refeição. Portanto recomendamos o uso durante a refeição9.

Em caso de insucesso da reposição enzimática em doses convencionais, devemos dobrar a dose e/ou associar um bloqueador H2 de histamina (ranitidina 150mg 2 vezes ao dia) ou um inibidor de bomba de prótons (omeprazol ou pantoprazol 40 mg/dia). Se apesar disso o quadro diarreico se mantiver, deve-se investigar a presença de enteropara-sitoses (giardíase ou estrongiloidíase) e supercrescimento bacteriano. O suplemento de cálcio, magnésio, ácido fólico, vitaminas hipossolúveis e B12 dependerão da carência específica de cada, avaliadas quando de suas mensurações sanguíneas9.

Quando Iniciar a Terapêutica de Reposição Enzimática Pancreática

Desde o inicio da reposição enzimática em medos do século XIX por Fles (1864) até os nossos dias, não há consenso em que momento iniciar a administração de enzimas na IEP no portador de Pancreatite Crônica (Lohr)8.

Durante o final do século passado, muitos utilizavam a estea-torreia como indicador da terapia. Atualmente acredita-se que, na PC, com sintomas apenas dispeptico já devamos introduzir a lipase pancreática. Isto melhoraria também estados de carência de macro e micronutrientes.

Esperar, para iniciar a terapêutica, que exista estea-torreia, emagrecimento e desnutrição nos parece por demais tardio.

Efeitos Colaterais

Reações alérgicas a proteínas suínas podem ocorrer. Hipe-ruricemia e hiperuricosúria com cristalúria e disúria têm sido descritas em pacientes com fibrose cística (FC) em uso de suplemento enzimático. Colopatia fibrosante tem sido descrito em crianças com FC usando 24.000 unidades de lipase/kg/dia. Estudos recentes têm demonstrado que, para tal efeito, estaria relacionado com enzima que tem altas doses de copolímero metacrílico, usado como revestimento resis-tente ao ácido.

Como Monitorar a Resposta Clínica

Finalmente, devemos considerar na fase terapêutica inicial a avaliação periódica (1-2 meses) de nossos pacientes em uso de reposição de enzimas e/ou micronutrientes.

Observar a resolução ou melhora dos sintomas como dispepsia, diarreia, esteatorreia e medir o peso com avaliação do índice de massa corporal (IMC).

Mensuração laboratorial de nutrientes como as vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K), B12, tiamina, ácido fólico, albumina, pré-albumina, lipidograma, cálcio e magnésio10.

O acompanhamento cuidadoso nos permitirá o melhor manuseio da reposição enzimática bem como a necessidade de mudanças terapêuticas nutricionais.

Referências1. Lindkuist B. Diagnosis and treatment of pancreatic exocrine

insufficiency. World J Gastroenterol 2013; 19 (42): 7258-7266.

2. Di Magno EP, Go VL, Summerskill WH. Relations between pancreatic

enzyme ouputs and malabsorption in severe pancreatic insufficiency.

3. Lindkuist B, Dominguez-muñoz JE, Luacis-Regueira M, et al. Serum

nutritional markers for prediction of pancreatic exocrine insufficiency in

chronic pancreatitis. Pancreatology 2012;12:305-310.

4. Layer P, Yamsmoto H, Kalthoffl, et al. The different course of

early-and late-onset idiopathic and alcoholic chronic pancreatitis.

Gastroenterology 1994;107:1481-1487.

5. Sonnenday CJ. Disorders of the Exocrine Pancreas. IN: Hammer GD

and McPhee SJ. Pathophysiology of Disease. New York: McGraw-Hill

Education, 2014:427-453.

6. Dominguez-muñoz JE. Pancreatic exocrine insufficiency: When is it

indicated, what is the goad and how to do it? Adv Med Sci 2011; 56:1-

5.

7. Hoffneister A et al. Consensus guidelines on definition, etiology,

diagnosis and medical, endoscopic and surgical management of

chronic pancreatitis German Society of Digestive and metabolic

Disesess. (DGVS). Z Gastroenterol 2012;50:1176-1224.

8. Löhr JM. Exocrine pancreatic insufficiency. 2nd Edition. Bremen: UNI-

MED Science, 2010:91.

9. Gupte A and Forsmark CE. Chronic pancreatitis. Curr Opin Gastroenterol

2014;30:500-505.

10. Hart PA and Conwell DL. Challenges and Updates in the Management

of Exocrine Pancreatic Insufficiency. Pancreas 2016; 45(1):1-4.

42

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Diabetes

O diabetes mellitus (DM) secundário ou tipo III é uma grave complicação, que pode surgir no seguimento clínico de várias doenças pancreáticas de curso prolongado ou mesmo preceder o diagnóstico etiológico definitivo do comprometimento pancreático.

No momento do diagnóstico, as causas evidentes do envol-vimento pancreático incluem: traumatismo do pâncreas, hemocromatose, mucoviscidose, câncer de pâncreas e as pancreatites crônicas associadas ao etilismo crônico, doença autoimune, pancreatite tropical e desnutrição grave. Outras vezes, o diabetes secundário surge sem que se tenha um comprometimento pancreático tão evidente quando surge em pacientes idosos (>70 anos), com peso normal e ausência de antecedentes familiares de pancrea-topatia ou associados a um déficit exócrino pancreático. A pancreatite crônica calcificante (PCC), associada ao etilismo crônico, é causa frequente de DM secundário e está dire-tamente relacionada ao tempo de curso da doença3-6. Pode surgir na fase inicial do diagnóstico principalmente nas formas oligosintomáticas ou indolores.18

A frequência estimada dos distúrbios da glicorregulação na PCC está em torno de 25 a 30 % em cinco anos, de 40 a 65% em 10 anos e de 43 a 80% após 15 anos do diag-nóstico.5-6-7-10 O risco de diabetes insulino-dependente é de 12%-24% e 36% nos respectivos períodos de doença10. Vários estudos epidemiológicos demonstraram que o surgi-mento dos cálculos pancreáticos nos exames de imagens está relacionado ao agravamento da função endócrina e o surgimento do diabetes.5,6,10

As ressecções pancreáticas distais (corpo e cauda) podem agravar os riscos de diabetes. As pancreatectomias esquerdas estão associadas à diabetes em 60% após cinco anos contra 36% das duodenopancreatectomias3. O papel das derivações Wirsungo-jejunais precoces como fator protetor no surgimento de diabetes é discutível 3-19.

Mecanismos Fisiopatológicos

Na hemocromatose existe uma insulino resistência secun-dária à sobrecarga de ferro intra-hepático e nas ilhotas

pancreáticas, ocasionando um déficit da secreção insulínica associada ao aumento da resistência insulínica periférica em função da sobrecarga de ferro na musculatura34. Na muco-viscidose, a insulinopenia é secundária à destruição as ilhotas de Langerhans por um fenômeno de fibrose e degeneração gordurosa 35. Nas pancreatites crônicas, em que a principal causa é o etilismo (neste caso, pancreatite crônica calcifi-cante), o processo inflamatório crônico peri canalicular difuso evolui, comprometendo tardiamente as regiões centro acinares levando ao déficit hormonal. 3-36

A fisiopatogenia do diabetes na evolução das PCC está muito provavelmente relacionada aos mecanismos da fibrose e destruição acinar e centro-acinar como demons-tram as dosagens do peptídeo C periférico em portadores de PCC com ou sem distúrbios da glicorregulação. Existe uma correlação entre a baixa da secreção da insulina e a secreção exócrina enzimática. Não existem estudos que justifiquem correlacionar o DB secundário à PCC à imuni-dade humoral ou celular e a fatores genéticos. 20-23

Aspectos metabólicos

O diabetes secundário à PCC raramente se complica com ceto-acidose 1,4,23 e os acidentes de hipoglicemia são frequentes24-25. Não existem estudos comparativos entre o diabetes da PCC e o DM tipo I. A raridade dos acidentes de cetoacidose pode estar relacionada à diminuição paralela de glucagon, que exerce um papel importante no agravamento da cetoacidose do diabetes tipo I.18,19,26,27. Também não parece haver diferença significativa na necessidade de insulina entre os pacientes portadores de DM tipo e DM secundário.

Complicações tardias do diabetes

As complicações tardias do diabetes secundário, sobre-tudo aqueles relacionadas à micro angiopatias, são menos frequentes e mesmo a retinopatia e a glomerulopatia são descritas como as de menor gravidade. O espessamento da membrana basal capilar, que é um bom marcador da micro angiopatia diabética, é encontrada em apenas 15% dos pacientes com DM secundário contra 98% descritas no

1. Gastroenterologista e Endoscopista do Gastrocentro Brasília - DF, Preceptor do Programa de Residência Médica em Gastroenterologia do Hospital de Base do DF, Escola Superior de Ciências da Saúde do DF, Titular de FBG-GEDIIB- SOBED-SBUS, Assistente estrangeiro da Universidade de Aix-Marseille França.

Terapêutica da insuficiência endócrina

coluMBano JunqueiRa neto1

43

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

DM tipo I 31. A retinopatia é observada entre 7 a 48% dos DM 29,30,32,33. A porcentagem de retinopatia foi observada em 48% após oito anos de DM secundário 33. A nefropatia é observada apenas após 10 anos de doença instalada seja nos DB secun-dários ou no DM tipo I. Estudos sugerem que a micro angio-patia diabética e suas complicações estão mais relacionadas aos desequilíbrios metabólicos do DB do que as desordens imunológicas ligadas ao DM tipo I.

Na ausência de tratamento específico para a PCC de lado, a corticoterapia para as PC autoimunes e o tratamento do fator obstrutivo canalicular das pancreatites crônicas obstrutivas, rela-cionadas às estenoses cicatriciais pós-pancreatites agudas e a pequenos tumores intracanaliculares, modificar a história do DM no curso das PCC se limita a lutar contra os fatores de risco para o surgimento do diabetes e, uma vez diagnosticado, prevenir e tratar as complicações crônicas e agudas.

Fatores de Risco

EtiologiaA etiologia alcoólica das PCC parece não estar associada direta-mente ao risco de DM nem da insulino-dependência 1.

Complicações da PCCEstatisticamente, o único fator clínico independente, associado ao risco de DM, é o aparecimento de calcificações 1, todas as outras complicações; crises de pancreatites agudizadas, pseu-docistos, estenose duodenal, trombose portal, colestase e hepatopatia, não estão associados a um risco maior de DM 1.

A obstrução canalicular pancreática, acompanhando a destruição parenquimatosa acinar, joga um papel menor no surgimento de DM no curso das PCC 11.

Cirurgia PancreáticaAs melhores séries publicadas, comparando as duodeno pancreatectomias cefálicas e o risco de DM não mostraram aumento significativo. As pancreatectomias cefálicas sem duodenectomias mostraram melhores resultados com relação aos riscos de DM provavelmente em função da preservação do eixo entero-insulinico.8,9 Nas pancreatectomias esquerdas, a maioria dos estudos mostra um aumento significativo do risco de diabetes 1.

Complicações Agudas do Diabetes

HipoglicemiaÉ mais frequente no curso do DM do PCC do que no DM tipo I.

Principais fatores:

• Insuficiência da contra regulação adrenérgica ou glucagônica.

• Resistência periférica à insulina. • Aporte nutricional não adaptado à atividade física. • Insuficiência hepática associada. • Persistência da consumação alcoólica. • Aporte insulínico excessivo2,12-18

• Cetoacidose diabética

São raras no DM secundário da PCC em função, sobretudo, da hipoglucagonemia relacionada à fibrose parenquimatosa, diferente-mente do DM tipo I que cursa com hiperglucagonemia.

As principais causas de cetoacidose nestes pacientes estão relacionadas à:

• Insulino terapia insuficiente. • Complicações da Pancreatite Crônica Calcificante. • Infecção. • Aporte nutricional excessivo (associado ao aumento do

aporte de extrato enzimático).

Tratamento

A terapêutica específica do diabetes relacionado à pancreatite crônica calcificante não apresenta diferenças marcantes em relação ao trata-mento usual dos diabetes tipos I e II: Orientação dietética com aporte calórico de acordo como IMC e índices glicêmicos de jejum e pós prandiais.

Observar a adaptação ao extrato enzimático prescrito, pois muitas formulações não apresentam biodisponibilidade enzimática adequada seja por alteração na conformação espacial da enzima pelo pH gástrico (formulações não protegidas contra o acidez gástrica) ou condiciona-das em cápsulas de difícil degranulação, impossibilitando a adequada distribuição junto ao bolo alimentar.

Evidentemente que maior digestibilidade implica em maior absorção de nutrientes com consequente hiperglicemia. Na PCC a necessidade de insulinoterapia é mínima, sobretudo quando existe um déficit con-comitante da secreção de Glucagon e em pacientes desnutridos. A utilização de hipoglicemiantes orais é a opção inicial em determinados casos seguida da insulinoterapia cuidadosa de acordo com os níveis glicêmicos dosados em períodos pré prandiais durante toda a jornada; estas dosagens domiciliares poderão auxiliar na posologia adequada de insulina evitando-se assim os frequentes casos de hipoglicemias frequentemente mais graves do que os episódios de hiperglicemias moderadas. 28

44

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Referências 1. Sarles H, Bernard JP, Gullo L. Pathogenesis of chronic pancreatitis. Gut 1990; 31:629-32.2. Markowitz JS, Rattner DW, Warshaw AL. Failure of symptomatic relief after pancreaticojejunal decompression for chronic

pancreatitis. Strategies for salvage. Arch Surg 1994; 129:374-9.3. Briani G, Riva F, Midena E, Trevisan R, Sgnaolin E, Jori E et al. Prevalence of microangiopathic complications in

hyperglycemia secondary to pancreatic disease. J Diabetes Complications 1988; 2:50-2.4. Stone WM, Sarr MG, Nagorney DM, McIlrath DC. Chronic pancreatitis. Results of Whipple’s resection and total

pancreatectomy. Arch Surg 1988; 123:815-9.5. Rumstadt B, Forssmann K, Singer MV, Trede M. The Whipple partial duodenopancreatectomy for the treatment of chronic

pancreatitis. Hepatogastroenterology 1997; 44:1554-9.6. Warshaw AL. Conservation of pancreatic tissue by combined gastric, biliary, and pancreatic duct drainage for pain from

chronic pancreatitis. Am J Surg 1985; 149:563-9.7. Larsen S, Hilsted J, Philipsen EK, Tronier B, Damkjaer NM, Worning H. The effect of insulin withdrawal on intermediary

metabolism in patients with diabetes secondary to chronic pancreatitis. Acta Endocrinol (Copenh) 1991;124:510-5.8. Mosnier-Pudar H et Robert JJ. Diabète de la mucoviscidose. In: Traité de diabétologie. Grimaldi A. (éditeur). Flammarion,

deuxième édition 2009. p. 918–33.)9. �Lanng�S�et�al.�Diabetes�mellitus�in�cystic�fibrosis:�effect�of�insulin�therapy�on�lung�function�and�infections.�Acta�Paediatr�

1994;83:849–53.10. �Tattersall�S�et�al.�A�fire�inside:�current�concepts�in�chronic�pancreatitis.�Intern�Med�J�2008;38:592–8.11. Barnes AJ, Bloom SR, Goerge K, Alberti GM, Smythe P, Alford FP et al. Ketoacidosis in pancreatectomized man. N Engl

J Med 1977;296: 1250-3.12. O’Keefe SJ, Cariem AK, Levy M. The exacerbation of pancreatic endocrine dysfunction by potent pancreatic exocrine

supplements in patients with chronic pancreatitis. J Clin Gastroenterol 2001;32:319-23.13. Sevel D, Bristow JH, Bank S, Marks I, Jackson P. Diabetic retinopathy in chronic pancreatitis. Arch Ophthalmol

1971;86:245-50.14. Maekawa N, Ohneda A, Kai Y, Saito Y, Koseki S. Secondary diabetic retinopathy in chronic pancreatitis. Am J Ophthalmol

1978;85:835-40.15. Levitt NS, Adams G, Salmon J, Marks IN, Musson G, Swanepoel C et al. The prevalence and severity of microvascular

complications in pancreatic diabetes and IDDM. Diabetes Care 1995;18:971-4.16. Malka D, Hammel P, Sauvanet A, Rufat P, O’Toole D, Bardet P et al. Risk factors for diabetes mellitus in chronic pancreatitis.

Gastroenterology 2000;119:1324-32.17. Couet C, Genton P, Pointel JP, Louis J, Gross P, Saudax E et al. The prevalence of retinopathy is similar in diabetes

mellitus secondary to chronic pancreatitis with or without pancreatectomy and in idiopathic diabetes mellitus. Diabetes Care 1985;8:323-8.

18. Tiengo A, Segato T, Briani G, Setti A, Del Prato S, Devide A et al. The presence of retinopathy in patients with secondary diabetes following pancreatectomy or chronic pancreatitis. Diabetes Care 1983;6:570-4.

19. �Marre�M,�Hallab�M,�Roy�J,�Lejeune�JJ,�Jallet�P,�Fressinaud�P.�Glomerular�hyper�filtration�in�type�I,�type�II,�and�secondary�diabetes. J Diabetes Complications 1992;6:19-24.

20. Silva L, Oliveira RB, Troncon LE, Foss MC, Souza CS, Gallo L, Jr. Autonomic nervous function in alcohol-related chronic pancreatitis. Pancreas 2000;20:361-6.

21. Raskin P. Diabetic regulation and its relationship to microangiopathy Metabolism 1978 ; 27 : 235-252.22. Sevel D., Bristow J.H., Bank S., Marks I., Jackson P. Diabetic retinopathy in chronic pancreatitis Arch. Ophthalmol. 1971

; 86 : 245-250.23. Maekawa N., Ohneda A., Kai Y., Saito Y., Koseki S. Secondary diabetic retinopathy in chronic pancreatitis Am. J.

Ophthalmol. 1978 ; 85 : 835-840.24. Verdonk C.A., Palumbo P.J., Gharib H., Bartholomew L.G. Diabetic microangiopathy in patients with pancreatitic diabetes

mellitus Diabetologia 1975 ; 11 : 394-400.25. Gullo L., Parenti M., Monti L., Pezzilli R., Barbara L. Diabetic retinopathy in chronic pancreatitis Gastroenterology 1990

; 98 : 1577-1581.26. Nealon WH, Thompson JC. Progressive loss of pancreatic function in chronic pancreatitis is delayed by main pancreatic

duct�decompression.�A�longitudinal�prospective�analysis�of�the�modified�puestow�procedure.�Ann�Surg�1993;217:458-66.27. Beger HG, Schlosser W, Friess HM, Büchler MW. Duodenum-preserving head resection in chronic pancreatitis changes

the natural course of the disease: a single-center 26-year experience. Ann Surg 1999;230:512-9.28. Malfertheiner P, Sarr MG, Nelson DK, DiMagno EP. Role of the duodenum in postprandial release of pancreatic and

gastrointestinal hormones. Pancreas 1994;9:13-9.29. Linde J, Nilsson LH, Barany FR. Diabetes and hypoglycemia in chronic pancreatitis. Scand

J Gastroenterol 1977;12:369-73.30. Larsen S, Hilsted J, Philipsen EK, Tronier B, Christensen NJ, Damkjaer NM et al. Glucose counterregulation in diabetes

secondary to chronic pancreatitis. Metabolism 1990;39:138-43.31. Keller U, Szollosy E, Varga L, Gyr K. Pancreatic glucagon secretion and exocrine function (BT-PABA test) in chronic

pancreatitis. Dig Dis Sci 1984;29:853-7.32. Bank S. The management of diabetes in the underprivileged, with special reference to pancreatic diabetes. S Afr Med

J 1966;40:342-6.33. Bank S, Marks IN, Vinik AI. Clinical and hormonal aspects of pancreatic diabetes. Am J Gastroenterol 1975;64:13-22.34. Larsen S, Hilsted J, Philipsen EK, Lund-Andersen H, Parving HH, Worning H. A comparative study of microvascular

complications in patients with secondary and type 1 diabetes. Diabet Med 1990;7:815-8.35. Verdonk CA, Palumbo PJ, Gharib H, Bartholomew LG. Diabetic microangiopathy in patients with pancreatitic diabetes

mellitus. Diabetologia 1975;11:394-400.36. Choudhuri G, Lakshmi CP, Goel A. Panceatic diabetes. Trop Gastroenterol. 2009 Apr-Jun;30(2):71-5.

As complicações vasculares da PC, apesar de incomuns, associam-se à elevada morbimortalidade, especialmente se não diagnosticadas precocemente e tratadas de modo adequado. Devem ser consideradas no diagnóstico dife-rencial de pacientes com PC, evoluindo com sangramento intracavitário e/ou gastrointestinal.

Tais complicações decorrem de lesões da vascularização pancreática ou peripancreática, podendo ser de origem arterial ou venosa. O acometimento vascular de artérias próximas ao pâncreas esplênica, hepática, gastroduo-

denal ou pancreaticoduodenal pode levar à formação de lesão cística vascular denominada pseudoaneurisma. A evolução do pseudoaneurisma é variável, podendo haver sangra-mento arterial para o interior do pseudocisto (aumento do volume do mesmo), para a cavidade peritoneal (hemoperitônio) ou sangramento para o interior do ducto pancreático (hemosuccus pancreaticus).

Nesse último caso, o paciente pode apresentar-se clinica-mente com quadro de hemorragia digestiva alta, que varia desde sangramento gastrointestinal intermitente até hemorragia

Avaliar e tratar as complicações vasculares associadas à pancreatite crônica

AndréA de FAriA Mendes1, Mendes, José GAlvão-Alves2

1. Especialista em Gastroenterologia pela Federação Brasileira de Gastroenterologia, Médica da 18ª Enfermaria da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro – Serviço do Prof. José Galvão-Alves, Prof. Pós-Graduação de Gastroenterologia/PUC-RJ, Membro Titular da Sociedade Brasileira de Hepatologia e Fellow em Hepatologia – King’s College Hospital, Londres. 2. Membro Titular da Academia Nacional de Medicina, Professor Titular de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques, Professor Titular de Pós-Graduação em Gastroenterologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Docente do Curso de Medicina da Universidade Estácio de Sá e Responsável pelas Disciplinas de Propedêutica Médica e Gastroenterologia.

45

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

1. Doutorado em Medicina (Cirurgia Geral) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil(2002) e Professor Adjunto do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da UFRJ.

maciça com colapso circulatório e óbito. As complicações vascu-lares da pancreatite crônica, associadas ao acometimento venoso, resultam de inflamação e trombose da veia esplênica que apre-senta anatomia vulnerável por localizar-se próxima à borda ínfero--posterior do pâncreas podendo desencadear hipertensão portal segmentar, seletiva ou esquerda, com consequente formação de varizes, predominantemente gástricas. Raramente há compressão ou obstrução portal. A obstrução ou a trombose da veia esplênica pode advir de diversas causas, como edema pancreático, fibrose e pseudocisto pancreático, com estase venosa, lesão da íntima e hipercoagulabilidade.

Clinicamente, tais pacientes podem ser assintomáticos ou apre-sentar sangramento gastrointestinal de intensidade variável (sangue oculto, hematêmese, melena, hematoquezia ou anemia ferropriva).

Os métodos de avaliação por imagem ultrassonografia abdo-minal com doppler, angiografia por tomografia computado-rizada ou por ressonância magnética e ecoendoscopia são fundamentais para confirmar a suspeita clínica de compli-cação vascular em paciente com PC. Porém, a angiografia mesentérica permanece com papel expressivo nesse contexto clínico, pois, além de permitir o diagnóstico de tais complicações e localização da origem do sangramento, possibilita conduta terapêutica.

Em pacientes com sangramento proveniente de pseudo-aneurisma, a embolização angiográfica está indicada, com o intuito de promover hemostasia definitiva e/ou estabilização hemodinâmica. Quando do insucesso ou indisponibilidade do tratamento angiográfico, o tratamento cirúrgico deve ser feito, apesar de associar-se com alto índice de morbidade e mortalidade.

A esplenectomia é o procedimento cirúrgico mais eficaz em controlar, de forma permanente, o sangramento gastrointes-tinal por varizes nos pacientes com trombose de veia esplê-nica e hipertensão portal segmentar.

Referências1. Beattie GC, Hardman JG, Redhead D, Siriwardena AK.

Evidence for a central role for selective mesenteric angiography in the management of the major vascular complications of pancreatitis. Am. J. Surg. 2003; 185: 96.

2. Heider TR, Azeem S, Galanko JA, Behrns KE. The natural history of pancreatitis-induced splenic vein thrombosis. Ann. Surg. 2004; 239: 876.

3. Marshall GT, Howell DA, Hansen BL, Amberson SM, Abourjaily GS, Bradenberg CE. Multidisciplinary approach to pseudoaneurysms complicating pancreatic pseudocysts: impact of pretreatment diagnosis. Arch. Surg. 1996; 131: 278-83.

4. Nadkarni NA, Khanna S, Vege SS. Splanchnic venous thrombosis and pancreatitis. Pancreas. 2013; 42: 924.

5. Sakorafas GH, Sarr MG, Farley DR, Farnel MB. The significance of sinistral portal hypertension complicating chronic pancreatitis. Am. J. Surg. Fev 2000; 179(2): 129-33.

6. Worning H. Incidence and prevalence of chronic pancreatitis. In: Beger HG, Buchler M, Ditschuneit H, Malfertheiner P (eds.). Chronic Pancreatitis. Berlin: Springr-Verlag; 1990. p. 8-14.

7. Yeo CJ, Bastidas JA, Lynch-Nyhan A et al. The natural history of pancreatic pseudocysts documented by computed tomography. Surg. Gynecol. Obstet. 1990; 170: 411.

Como avaliar e tratar o pseudocisto pancreático1,2

José MaRcus Raso eulálio1

Definição

Inicialmente descrito em 1761 por Morgagni, um pseu-docisto pancreático pode ser definido como uma coleção organizada, rica em enzimas pancreáticas, que surge como consequência, e permanece após, de um episódio de pancreatite aguda, ou após exacerbação de uma pancrea-

tite crônica. Este se desenvolve quando o ducto pancreá-tico principal ou um dos seus ramos se rompe, liberando secreção pancreática para o retroperitônio ou para os planos peritoniais peripancreaticos. Sua parede se caracteriza por ser formada por uma pseudo-cápsula fibrosa, sem epitélio próprio 3. Por muitos anos, foram ainda classificados como pseudocistos, coleções com conteúdo variável, predomi-

46

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

nantemente líquido, podendo ou não apresentar material necró-tico e debris 4. Hoje, para que seja pseudocisto, o conteúdo deve ser exclusivamente líquido. Para entendermos esta mudança, é necessário revisarmos inicialmente a definição proposta na clas-sificação de Atlanta de 19925. A definição de pseudocisto nesta classificação era a seguinte:

Coleção de suco pancreático limitada por uma parede de tecido fibroso ou de granulação, que se instala como consequência de uma pancreatite aguda, trauma pancreático ou pancreatite crônica; comumente arredondado ou ovoide, apresenta parede bem definida; requer 4 ou mais semanas após o episódio de pancreatite aguda.

Embora esta classificação tenha sido aceita e sua terminologia tenha sido bem conhecida, um estudo de 2008 mostrava que a mesma já não era universalmente aplicada na literatura.4A possi-bilidade de ter parede fibrosa ou de granulação sugere etiolo-gias e comportamentos diferentes. O conteúdo naquela classifi-cação podia ser totalmente ou parcialmente líquido, havendo ou não necrose em seu interior.

A tendência para o refinamento do sistema original de modo que a terminologia pudesse refletir as muitas variações nos exames de imagem e as características clínicas que existem em pacientes com pancreatite, levou a mudanças consolidadas na Classificação de Atlanta de 201262. Basicamente, na nova clas-sificação, o pseudocisto é uma coleção exclusivamente líquida e com parede fibrosa. As coleções com parede formada por tecido de granulação e conteúdo misto em seu interior secundarias à pancreatite aguda são atualmente caracterizadas como “necro-seorganizada - walled off necrosis”.

A Classificação de Atlanta de 201262 define pseudocisto pancreático da seguinte forma:

“O termo pseudocisto pancreático refere-se especificamente a uma coleção líquida nos tecidos peripancreáticos (ocasionalmente pode ser parcial ou totalmente intra-pancreática). O pseudocisto pancreático é rodeado por uma parede bem definida e não contém essencialmente qualquer material sólido. O diagnóstico, geral-mente, pode ser feito por critérios morfológicos. Quando é reali-zada aspiração do conteúdo do cisto, é frequente encontrarmos aumento da amilase. O pseudocisto pancreático é consequência do rompimento do ducto pancreático principal ou de seus ramos intra-pancreáticos, sem necrose parênquimatosa em seu interior. Esta teoria sugere que o extravasamento de suco pancreático forma uma coleção fluida persistente, localizada, com evolução maior do que 4 semanas. Quando existe material necrótico sólido evidente dentro da cavidade cística, mesmo com a maior parte preenchida por líquido, o termo Pseudocisto não deve ser usado. O desenvolvimento de um pseudocisto pancreático é extremamente raro na pancreatite aguda, assim, o termo pseudocisto pancreático na definição de pancreatite aguda pode mesmo cair em desuso.”

“O pseudocisto também pode surgir no cenário de uma pancrea-tite necrosante aguda como resultado de uma “Síndrome de Desconecção Ductal”, onde a necrose do parênquima pancreático do colo ou corpo da glândula isola uma porção remanescente distal ainda viável”.

Nessa recente “revolução”, os pseudocistos devem ser distin-guidos das: (1) coleções fluidas agudas peripancreáticas; (2) coleções necróticas agudas; (3) necrose pancreática organi-zada - walled-off necrosis - WON; e (4) neoplasias císticas do pâncreas.

Coleção Fluida Aguda Peripancreática

Associadas a um episódio de pancreatite aguda edematosa. Não têm cápsula e não penetram o parênquima pancreático, somente o circundam. Contém apenas elementos fluidos e, de regra, não necessitam de qualquer terapia. Em geral, se resolvem com o tempo. Algumas podem desenvolver cápsula fibrosa e, então, se transformar em pseudocistos.

Coleção Necrótica Aguda

Associadas a um episódio de pancreatite aguda necrótica.Envolvem o pâncreas e/ou tecidos peripancreáticos e podem conter elementos sólidos e sangue.

Com o passar das semanas, pode haver liquefação parcial ou total do conteúdo necrótico e desenvolvimento de uma “parede”, cápsula formada por tecido de granulação. A formação da cápsula de granulação muda o status da coleção.

Necrose Organizada (walled-off necrosis - WON)

Corresponde a uma possível evolução temporal de uma coleção necrótica aguda que não se resolve espontaneamente. Com o passar das semanas, ocorre liquefação parcial ou total do conteúdo necrótico e desenvolvimento de uma “parede”, cápsula, formada por tecido de granulação. A formação da cápsula de granulação determina a necrose organizada (walled--off necrosis - WON).

A diferenciação entre necrose organizada (walled-off necrosis - WON) e pseudocisto pode ser particularmente difícil através de tomografia computadorizada. Isso porque os componentes sólidos ou semi-sólidos comuns na necrose organizada são melhor definidos pela ressonância magnética. Essa diferenciação tem implicações práticas, uma vez que o tratamento da necrose organizada possui dificuldades e técnicas específicas.

Finalmente, os pseudocistos devem ser diferenciados dos tumores císticos. Nestes últimos, o tratamento é sempre quando

47

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

existe suspeita ou confirmação de malignidade, a ressecção. A diferenciação evita que seja feita uma incorreta drenagem interna de um tumor cístico, tratamento preferencial para a maioria dos pseudocistos sintomáticos ou complicados.

Com definições claras, a seleção de pacientes pode ser mais adequada e focada para a modalidade terapêutica com maior chance de sucesso.

Classificação

D’Egidio e Schein, em 1991, descreveram a classificação dos pseudocistos com base na etiologia (aguda ou crônica), na anatomia ductal, e na presença de comunicação entre o cisto e o ducto pancreático 6,7,8,9. Foram definidos três tipos distintos de pseudocistos.

Tipo I ou pseudocisto “pós-necrótico” agudo - secundário a uma pancreatite aguda, associado com anatomia ductal normal e raramente apresentando comunicação entre o pseudocisto e o ducto.

Tipo II ou pseudocisto “pós-necrótico” crônico - desenvolvido após agudização de uma pancreatite crônica. Neste caso, o ducto pancreático é doente mas sem estenose, e frequentemente existe comunicação com o ducto pancreático principal.

Tipo III ou pseudocisto de retenção - desenvolvido em pacientes com pancreatite crônica e, de regra, associado com estenoses e ou obstruções ductais e com comunicação com o ducto pancreático.

Embora historicamente útil, esta classificação não discrimina uma série de possibilidades que pode modificar o tipo de terapia a ser proposto.

Nesse sentido, Nealon e Walser10 propuseram outra classi-ficação, mais detalhada, composta de sete (07) tipos dife-rentes, baseada na anatomia ductal e suas relações com o pseudocisto.

Tipo I: ducto normal /sem comunicação com o pseudocisto.

Tipo II: ducto normal com comunicação ducto-cisto. Tipo III: ducto anormal com estenose e sem

comunicação ducto-cisto. Tipo IV: ducto anormal com estenose e comunicação ducto-cisto. Tipo V: ducto anormal com obstrução completa “cut-off”. Tipo VI: pancreatite crônica, sem comunicação

ducto-cisto. Tipo VII: pancreatite crônica, com comunicação

ducto-cisto.

Com o advento e aceitação da Classificação de Atlanta de 2012, os pseudocistos passam a ser entidades principal-mente associadas à pancreatite crônica. Como as classifica-ções acima mesclam situações em que coleções se formam nas pancreatites aguda e crônica, e incluem coleções que não são consideradas pseudocistos pela nova Classificação de Atlanta (2012)62, a tendência é que as mesmas sejam adaptadas ou abandonadas.

De toda forma, para a pancreatite crônica consideramos válidos o tipo III de D’Egidio, e os tipos VI e VII de Nealon.

Diagnóstico

História e exame clínico de pancreatite crônica, associados com exame de ressonância magnética ou tomografia, eviden-ciando alterações pancreáticas compatíveis (calcificações pancreáticas, ducto pancreático em rosário, atrofia parenqui-matosa) e coleção peri-pancreática exclusivamente líquida com mais de quatro semanas de evolução. Estes são os achados que compõem o diagnóstico típico de um pseudocisto. Nem sempre é tão simples. Por vezes não existe história pregressa de pancreatite e nem sempre a pancreatite crônica exibe calci-ficações.

A ressonância magnética é o exame ideal para identificação de um pseudocisto uma vez que se caracteriza melhor as cole-ções organizadas (WONs) secundárias aos processos agudos. Recentemente, foi demonstrado que a tomografia computado-rizada identificou 23% de debris em coleções pós-necróticas, enquanto a ressonância magnética identificou os mesmos em 89% dos pacientes114,62. Para o planejamento do trata-mento, é importante termos informações detalhadas sobre o ducto pancreático, bem como a relação anatômica entre este e o pseudocisto. A colangiopancreatorressonância magnética (CPRM) é menos invasiva e será o exame de escolha na maioria dos casos.

Na prática clínica, os exames mais utilizados para o diagnóstico e para a decisão terapêutica são: Tomografia Computadorizada multi-canais, Ressonância Magnética Nuclear com pancreator-ressonância, Colangipancreatografia Endoscópica Retrógrada e Ecoendoscopia com punção e biópsia. Estes quatro exames, em conjunto, são capazes de definir a anatomia do parênquima pancreático, do ducto pancreático, as relações anatômicas entre o pseudocisto e suas adjacências, bem como se existe ou não comunicação entre o pseudocisto e o ducto pancreático principal.

A Tomografia Computadorizada é o exame mais disponível e difundido, mas não define tão bem a anatomia do ducto pancre-ático, nem a presença de debris no interior de uma coleção. Útil no diagnóstico diferencial de lesões parenquimatosas asso-ciadas a uma imagem cística.

48

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A pancreatorressonância tem a vantagem de não ser invasivo, não possui as complicações da CPER, mas também não oferece o mesmo padrão de detalhe e informação sobre o ducto pancreático. A utilização de secretina para estudo dinâmico aumenta a capacidade da pancreatorressonância fornecer detalhes anatômicos dos dutos pancreáticos, mas raramente está disponível em nosso meio.

ACPER deve ser ponderada cuidadosamente devido às suas complicações, mas, dentre as quatro modalidades acima, é a que oferece a melhor e mais pormenorizada visão anatômica e dinâmica do ducto pancreático. Importante nos casos de suspeita de síndrome de desconecção distal, por ser mais sensível que a pancreatorressonância41,42.

A Ecoendoscopia tem a vantagem de poder fornecer material puncionado do interior da coleção para análise bioquímica e citopatológica. Estudos recentes têm comprovado a relevância destas informações para o diagnóstico diferencial e planeja-mento do tratamento dos pseudocistos. 3, 15

Nas coleções peripancreáticas, em que a relação com pancre-atite crônica não é evidente, deve ser estabecido o diagnóstico diferencial entre pseudocisto e neoplasia cística do pâncreas. Neste processo é necessária a compreensão e pesquisa de diversos fatores, como a história da doença, a revisão de exames de imagem antigos quando estes estão disponíveis e, em alguns casos, deve ser feita a análise bioquímica e citológica do líquido peripancreático15,16(tabela 1).

Tabela 1. Diagnóstico diferencial das lesões císticas do pâncreas

CAS NCM CAM Pseudocisto

CEA baixo alto Alto Baixo

CA 125 variável variável Alto Baixo

CA 19-9 variável variável-alto variável-alto Variável

Amilase baixo-alto baixo-alto baixo-alto Alto

Lipase baixo baixo Baixo Alto

CAS – cistoadenoma seroso; NCM – neoplasia cística mucinosa; CAM –

cistoadenocarcinoma mucinoso

Uma neoplasia cística pode resultar em um processo infla-matório moderado do pâncreas que, por sua vez, pode mimetizar pancreatite crônica. Esta situação é particular-mente mais frequente nos casos de Tumor Papilar Mucinoso Intraductal.

É importante que toda a história radiológica disponível do paciente seja revista. Uma tomografia abdominal pode definir a presença ou ausência da lesão cística ao longo do tempo. Quando não existe esta possibilidade, os exames de resso-nância magnética e ultrassom endoscópico podem auxiliar no diagnóstico diferencial. Ambos podem revelar septações,

componente sólido dentro do cisto, ou uma comunicação entre o cisto e o ducto pancreático principal. 15,16,17

Ressaltamos que a comunicação entre o ducto pancreático principal e o cisto pode ocorrer tanto em uma pancreatite crônica com pseudocisto associado como em uma neoplasia papilar mucinosa de ducto principal. No primeiro caso, em geral, existem outros sinais associados de pancreatite crônica como calcificações e múltiplas estenoses ductais. No segundo caso, a lesão cística se associa com dilatação do ducto principal. Se ainda assim o diagnóstico permanece indefinido, deve ser feita aspiração do cisto com análise citológica e testes bioquímicos.18

Finalmente, é fundamental termos em mente que as informa-ções sobre a arquitetura ductal podem afetar o tratamento de um pseudocisto, o que justificou o desenvolvimento de diferentes classificações.9,10

Os principais exames utilizados para se obter informações sobre a anatomia ductal pancreática em pacientes com pseu-docisto são a CPER e a pancreatorressonância. Não existe consenso sobre a seleção de pacientes, sobre o método, ou sobre o tempo ideal de realização de cada exame. Se apenas um, ou se os dois exames devem ser realizados. Ao conside-rarmos a drenagem interna versus a drenagem percutânea, uma série de casos sugere que a CPER deve ser realizada antes da intervenção para guiar o tratamento. 10

Outro estudo retrospectivo defende a utilização da CPER conforme algoritmo e relata menos efeitos adversos nos pacientes tratados segundo o algoritmo20. Porém, os bene-fícios de se definir a anatomia ductal com CPER devem ser ponderados com o risco potencial de infecção de uma coleção fluida estéril.

Devido a este risco, a CPER é geralmente realizada imediata-mente antes de uma intervenção planejada. A pancreatorres-sonância oferece uma alternativa não invasiva e pode ter sua qualidade aumentada com a injeção de secretina. Com esta técnica pode ser feita a avaliação detalhada da arquitetura ductal, bem como a avaliação da capacidade funcional do parênquima.

Infelizmente, em nosso meio, a ressonância com secretina é disponível apenas em alguns centros especializados. Não identificamos estudos comparando diretamente a qualidade da informação diagnóstica obtida pela CPER em relação àquela obtida com a pancreatorressonância para o diagnós-tico e tratamento de pseudocistos pancreáticos especifica-mente.

Nossa opinião pessoal é de que a CPER seja realizada caso a Ressonância Magnética e a TC não ofereçam informa-ções suficientes para a decisão terapêutica. A CPER deve ser realizada quando se pondera a drenagem externa de um pseudocisto.

49

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Como tratar um pseudocisto pancreático?

Princípios gerais: indicações de tratamento dos pseudocistos pancreáticos

Até a década de setenta (1970), o tratamento dos pseudo-cistos era empírico devido à falta de informações sobre sua fisiopatologia e história natural.

Em 1979, Bradley e cols. publicaram um estudo examinando a história natural de 54 pacientes quanto ao risco de compli-cações e encontraram relação com o tempo de evolução 11. Pacientes não tratados tinham maior risco de complicação (46%) após sete semanas de observação.

E este risco era maior que o risco da cirurgia.12 Na década seguinte, pacientes cujos pseudocistos não se resolviam em até seis semanas eram submetidos à drenagem entérica com mortalidade de 7% e morbidade > 40% . A terapia cirúrgica predominou até o início dos anos 90 quando dois estudos sugeriram que o risco de complicações estava associado com o tamanho da lesão. Pseudocistos assintomáticos menores que 6,0 cm poderiam ser acompanhados conservadora-mente por tomografia. Os demais deveriam ser operados.19-25

No estudo de Vitas e Sarr, curiosamente, sete pacientes com pseudocistos maiores que 10,0 cm foram apenas observados com sucesso. Esta conduta passou a sofrer variações com a introdução da punção percutânea para pseudocistos e para coleções fluidas agudas.22 A carência de parâmetros para indicação deste procedimento e a pouca compreensão das diferenças de comportamento entre pseudocistos, com ou sem comuniação com o ducto pancreático, se associou com alta morbidade e necessidade de tratamento cirúrgico em mais de 30% dos pacientes tratados por punção.20

As linhas de tratamento tradicionais se baseiam em poucos estudos nível III e IV, tornando a evidência destas recomen-dações limitada 26. Em contraste com o tratamento tradicional, guiado por um tamanho e um tempo de duração arbitrários, as evidências recentes indicam que o tratamento endoscó-pico ou cirúrgico deve ser reservado para os pacientes que desenvolvam sintomas, ou que desenvolvam alguma compli-cação.

Atualmente, a disponibilidade limitada de estudos clínicos prospectivos sugere que este campo permanece aberto para a pesquisa 33. Como o número de pacientes por instituição é pequeno, um estudo multicêntrico será necessário para responder esta questão.

Quando um pseudocisto se desenvolve, o conhecimento atual sugere que os mesmos podem ser tratados de forma expectante, exceto se apresentarem sintomas ou complica-

ções relacionadas. Estes sintomas geralmente estão relacio-nados com um efeito de massa do pseudocisto, ou com a resposta inflamatória associada. Eles incluem dor abdominal, saciedade precoce, perda de peso e febre persistente.

As principais complicações são a infecção do pseudocisto, das vias biliares, obstrução pilórica, ruptura para a cavidade peritonial livre, ou trombose vascular levando à hipertensão portal segmentar. A erosão para vasos adjacentes pode causar um pseudoaneurisma, ou mesmo hemorragia impor-tante para o trato gastrointestinal, ou para a cavidade peri-tonial.

A intervenção preventiva está indicada se os achados clínicos e radiológicos indicarem erosão para o hilo esplênico ou um pseudoaneurisma em expansão.

Qual a tendência para o desenvolvimento de complicações ?

O tratamento das complicações dos pseudocistos tem sido pouco abordado em estudos controlados. Consequente-mente, as abordagens correntes se baseiam em relatos observacionais e na experiência de alguns cirurgiões.

Pseudocistos gigantes foram definidos por alguns como maiores que 15,0 cm de diâmetro 35, ou maiores que 10,0 cm de diâmetro 36. A observação inicial de que pseudocistos maiores que 15,0 cm obrigatoriamente necessitariam inter-venção não foi corroborada por estudos caso-controle ou coorte.

No estudo caso controle de Soliani 36 e colaboradores, 41 pacientes com pseudocistos maiores que 10,0 cm (incluindo 19 maiores que 14,0 cm) foram comparados com 30 pacientes com pseudocistos menores que 10,0 cm. Não foram encontradas diferenças entre os dois grupos no que diz respeito à morbidade, mortalidade ou recorrência após o tratamento. O risco de complicações graves em pseudo-cistos assintomáticos tem sido referido como<10% 59, 60.

Baseados nestes estudos limitados, até o momento não existem indicadores clínicos ou achados anatômicos que consigam predizer a tendência para complicações, incluindo o tamanho.

Diferentes abordagens no tratamento do pseudocisto pancreático sintomático

Pseudocistos sintomáticos ou com complicações devem ser tratados preferencialmente por drenagem interna. As vias de acesso para drenagem interna incluem Tratamento Endoscó-

50

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

pico, Tratamento Cirúrgico Videolaparoscópico, Tratamento Cirúrgico Aberto.

Nos últimos anos, o tratamento endoscópico se tornou progressivamente a opção primária com dois tipos diferentes de abordagem43–46: (1) drenagem endoscópica transmural e (2) drenagem transpapilar.

A primeira é realizada quando o pseudocisto deforma ou abaula a parede gástrica ou duodenal. A ecoendoscopia, por detectar a espessura da parede e vasos em seu trajeto, é útil para a segurança e efetividade da técnica. A drenagem transpapilar é mais efetiva para pseudocistos de tamanho moderado, próximos da cabeça do pâncreas e com comu-nicação com o ducto pancreático. Até 85% dos pacientes tratados por estes métodos obtêm bons resultados a longo prazo, desde que se abstenham do uso do álcool.

A despeito do atual sucesso da drenagem endoscópica46, os pseudocistos mais complexos continuam a ser abordados preferencialmente por cirurgia. Uma vantagem adicional da cirurgia é a possibilidade de se obter um fragmento da cápsula para análise histológica.

A via laparoascópica tem sido prograssivamente mais utiliza-da.47-55As abordagens laparoscópicas mais comuns são: (1) a cistogastrostomia com abordagem gástrica através da bolsa omental, (2) o procedimento combinado de laparoscopia e endoscopia, (3) a cistogastrostomia por abordagem anterior do estômago semelhante à técnica aberta, e (4) a cistojeju-nostomia.47-55

Drenagem Endoscópica x Drenagem Cirúrgica

Existe carência de estudos controlados na literatura em relação a esta questão. O procedimento tradicional por via aberta para pseudocistos sintomáticos, não infectados, é a cistoenterostomia (drenagem interna). Mas mesmo em relação a esta conduta tradicional, não há estudos contro-lados para guiar a seleção de pacientes ou o tipo de operação. A topografia do cisto e suas relações anatômicas mais próximas são fatores importantes que guiam o cirurgião a optar por uma drenagem gástrica, duodenal ou jejunal.

Entre os estudos retrospectivos, citamos dois que compa-raram o tratamento cirúrgico e o endoscópico. O primeiro comparou 79 pacientes que apresentaram complicações da drenagem percutânea, endoscópica, ou ambas, com 100 pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico somente.27. O trabalho sugere que as complicações são menores nos pacientes com tratamento cirúrgico. Porém o número de pacientes com sucesso no tratamento não cirúrgico é desco-nhecido.

O segundo, um coorte retrospectivo, comparando 10 pacientes submetidos à cistogastrostomia com 20 pacientes submetidos à drenagem endoscópica transgástrica, não demonstrou diferença nas taxas de sucesso entre os grupos, complicações dos procedimentos ou necessidade de rein-tervenção. 28

A drenagem endoscópica tem sido aplicada para pseudo-cistos e para necrose pancreática. Baron e colaboradores29, em revisão retrospectiva, drenaram a coleção em 113 de 138 pacientes (82%), com tempo médio de resolução de 40 dias. Pacientes com pseudocistos crônicos (classificação da época do estudo) tiveram maior probabilidade de resolução (59 de 64 pacientes, 92%) que aqueles com pseudocistos agudos (23 de 31 pacientes, 74%, p = 0,02), ou necrose (31 de 43 pacientes, 72%, p = 0,006).

Na análise multivariada, os pseudocistos crônicos foram marcadores de sucesso da drenagem. Necrose foi um marcador de insucesso, complicações e recorrência. Estes autores demonstraram a viabilidade desta técnica para o tratamento de pseudocistos sintomáticos por endoscopia30,37.

A drenagem endoscópica tem sido descrita pelas técnicas, transpapilar, transgástrica e transduodenal 31.

A abordagem transpapilar requer que o pseudocisto se comunique com o ducto pancreático principal, e que não haja septações importantes que impeçam a drenagem completa. As estenoses ductais, se identificadas, podem ser dilatadas por balão, após a qual, uma prótese é deixada dentro do ducto pancreático.

Para a drenagem endoscópica transentérica (transgástrica ou transduodenal) ser realizada com segurança, é neces-sário que seja identificado um abaulamento intraluminal perceptível durante a endoscopia tradicional. Quando isto não é possível, é necessário o apoio do ultrassom endoscó-pico (USE) na busca de evidências de espessamento parietal e áreas de aderência entre as paredes do tubo digestivo e o pseudocisto. Uma vez que o acesso seja estabelecido, o orifício é dilatado por balão. Um ou mais pigtails podem ser deixados com o objetivo de manter a cistoenterostomia. Um estudo prospectivo e randomizado recente sugere que a reti-rada precoce destes drenos se associa com recorrência do pseudocisto, provavelmente por obstrução ou fechamento prematuro da cistoenterostomia.32.

O uso de grampeadores cirúrgicos acoplados ao endos-cópio para criar a cistoenterostomia endoscópica poderá, no futuro, superar esta limitação ajudando a criar uma comu-nicação com o diâmetro adequado 33. A disponibilidade de novas próteses autoexpansíveis e recobertas tem permitido a abordagem de pseudocistos com complexidade crescente. Próteses de longa permanência estão em avaliação em pacientes com Síndrome de Desconecção Distal 56.

51

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Recente metanálise57 avaliou a eficácia e a segurança do trata-mento endoscópico dos pseudocistos pancreáticos compa-rada ao tratamento cirúrgico. De 1375 publicações identifi-cadas até 05/05/2015 incluiu cinco estudos comparativos, com 255 participantes. Três retrospectivos, um caso controle e um randomizado. O grupo Cirúrgico apresentou maior taxa de sucesso (OR, 0.43; 95% CI, 0.20–0.95; P=0.04). Não houve diferença nas taxas de eventos adversos (OR, 0,67; IC 95%, 0,33-1,36; p = 0,27) ou de recorrência (OR, 1,53; IC 95%, 0,37-6,39; p = 0,56) entre os tratamentos endoscópico e cirúrgico. Houve menor tempo de permanência hospitalar e menor custo hospitalar no grupo submetido ao tratamento endoscópico. Concluiu que o tratamento endoscópico deve ser a primeira linha de abordagem para pacientes com pseu-docisto pancreático.

É importante o conhecimento da Síndrome de Disconecção Ductal. É definida pela presença de tecido pancreático viável na cauda do pâncreas com destruição do ducto principal na adjacência proximal à cauda. Desta forma, o tecido viável distal produzirá secreção pancreática que não poderá ser conduzida anatomicamente até o duodeno.

Varadalajulu et al. 61 publicou recentemente estudo unicên-trico, avaliando as drenagens cirúrgica e endoscópica dos pseudocistos. Quarenta (40) pacientes foram randomizados em dois grupos de 20 pacientes e submetidos à cistogas-trostomia cirúrgica e 20 pacientes submetidos à cistogastros-tomia endoscópica. O objetivo principal foi comparar a taxa de recorrência após dois anos de acompanhamento.

O tratamento endoscópico incluiu a punção transgástrica guiada por ecoendoscopia, e a colocação de duas próteses tipo pigtail entre o estômago e o pseudocisto. Colangio-pancreatografia endoscópica foi realizada com o propósito de auxiliar a colocação de prótese, transpassando lesões no ducto pancreático, sempre que havia estenose ou rotura sem síndrome de desconecção. Nesse último caso, a prótese transentérica era deixada indefinidamente. A terapia cirúrgica consistiu em cistogastrostomia aberta (não laparoscópica). Em termos de recuperação primária, não houve diferença estatística entre os grupos. Os autores concluíram que a cistogastrostomia cirúrgica não foi superior à drenagem endoscópica a longo prazo, e que esta última era associada a um custo menor, tempo menor de internação e escores de qualidade de vida superiores.

Algumas questões porém, não ficam claras. O diagnóstico foi baseado em tomografia computadorizada, a qual não é o exame ideal para identificação do pseudocisto, uma vez que a resso-nância magnética caracteriza melhor as coleções organizadas (walled-off necrosis - WON) secundárias aos processos agudos. A proporção de alcoólatras era maior no grupo endoscópico (55% x 20%). Dois pacientes do grupo endoscópico apresen-taram rotura ductal e quatro síndrome de desconecção. Estas informações não existem no grupo cirúrgico.

Mesmo com estas dúvidas, este trabalho é o primeiro rando-mizado que estuda e compara de forma objetiva as opções cirúrgica e endoscópica para o tratamento de pseudocistos. Na metodologia é utilizada a definição mais recente, excluindo necrose organizada e coleções não maturadas.

A definição sobre qual técnica é mais efetiva ainda necessita uma amostragem maior. Atenção especial merece a questão da síndrome de desconecção, em que o tratamento endos-cópico deixa indefinidamente uma prótese transgástrica, que aumenta os riscos de infecção e migração da mesma. Nesse caso, em especial, o tratamento cirúrgico permanece como primeira opção e a abordagem endoscópica deve continuar a ser aprimorada.

Embora na maioria dos casos o tratamento endoscópico seja atualmente utilizado como opção inicial, existem situações especiais:

1. Em pacientes nos quais coexiste dor crônica, obstrução biliar ou envolvimento da cauda pancreática, a drenagem endoscópica exclusiva pode não ser o método de escolha.

2. Pacientes nos quais coexiste dor crônica e ducto pancreático dilatado (maior que 1,0 cm tradicionalmente, hoje maior que 7 mm) podem ser tratados com pancreato-jejunostomia. Este procedimento será preferível à tradicional cistoenterostomia por evitar a recidiva, resolvendo o conjunto de anormalidades.38

3. A drenagem cirúrgica tem sido preferida para os pseudocistos gigantes (>15,0 cm) e para aqueles não abordáveis por endoscopia.35,36

4. Pseudocistos sintomáticos pequenos em cauda são preferencialmente ressecados.

5. Eventualmente, pacientes com dor crônica, pseudocisto cefálico e pseudotumor inflamatório em cabeça do pâncreas necessitarão de pancreatectomia cefálica com preservação do duodeno.39

6. Atualmente, os centros que possuem expertise profissional e infraestrutura tecnológica adequada preferem a abordagem endóscópica. Especialmente a abordagem guiada por ecoendoscopia e, quando necessário, apoiada por colangiopancreatografia endoscópica retrógrada. Esta preferência não é uniforme e varia com a avaliação individual de cada caso.

Drenagem Percutânea

Devido a sua morbidade no tratamento de pseudocistos crônicos, a drenagem percutânea tem sido utilizada apenas em situações especiais. Morton19, em um coorte rele-vante, mostrou que a drenagem percutânea está associada com alta mortalidade, tempo prolongado de internação e maior incidência de complicações que a drenagem cirúr-gica. Numerosos estudos observacionais indicam que esta técnica, embora aparentemente conveniente para o médico

52

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

e para o paciente, só deve ser realizada em pacientes com pseudocistos que radiologicamente estejam associados com anatomia ductal normal (raros casos associados com pancreatite aguda), ou em casos em que comorbidades associadas tornem a cirurgia um procedimento de alto risco.

A tendência atual é buscar o tratamento através de abor-dagem única, seja ela endoscópica ou cirúrgica, sem neces-sidade de drenagem percutânea prévia. Os principais predi-tores de falência da drenagem percutânea são a obstrução ductal súbita (“cut-off ”), comunicação entre o cisto e o ducto pancreático e associação com pancreatite crônica. 10,34

A drenagem percutânea raramente é adequada para pacientes com pancreatite crônica19. A sepse por infecção do pseudocisto é uma destas situações e será abordada adiante. Pacientes com comunicação entre o ducto e o cisto, estenoses ou obstruções apresentam resultados insatisfatórios com a drenagem percu-tânea e devem ser tratados por endoscopia ou cirurgia.10,40

Tratamento de complicações incomuns associadas aos pseudocistos pancreáticos?

Complicações incluindo hemorragia e ruptura podem ocorrer. A hemorragia associada pode ser controlada com embolização endovascular do vaso afetado, que geralmente é um ramo da artéria esplênica ou gastroduodenal. Alguns pseudocistos possuem alto risco para hemorragia aguda e devem ser tratados profilaticamente por ressecção cirúrgica. Este é o caso dos pseudocistos de cauda pancreática que incorporam o hilo esplênico.

Embora rara, a ruptura para o peritônio tipicamente resulta em peritonite e requer cirurgia aberta para lavagem da cavi-dade e drenagem externa da cavidade do pseudocisto. Em alguns casos, a ruptura para cavidade livre não causa perito-nite, se manifestando como ascite pancreática.

Nesses casos, o tratamento pode ser conservador e deve incluir nutrição enteral elementar e avaliação clínica e radiológica seriada pela possibilidade de formação de coleções septadas. Na literatura, não existe avaliação sobre os preditores destes eventos provavelmente devido a sua baixa frequência.

Tratamento do Pseudocisto Infectado

A infecção de um pseudocisto pode levar o paciente ao quadro de sepse. Porém, a distinção clínica entre inflamação peripancreática e infecção pode não ser tão simples. A presença de gás dentro de um pseudocisto sugere clara-mente infecção. Na ausência de evidências definitivas, o

médico assistente deve considerar a aspiração por agulha fina para pesquisa de infecção.

Embora não exista consenso, na nossa opinião, nos casos em que existe desconexão de um segmento pancreático, a drenagem interna é obrigatória e deve ser ponderada sempre como primeira opção terapêutica, mesmo quando coexiste infecção do pseudocisto.

Na presença de comunicação com o ducto pancreático prin-cipal, a punção percutânea tem tendência a não resolver a coleção, especialmente em casos de pancreatite crônica, onde coexistem frequentemente outras lesões ductais impondo estenoses e obstruções.

Por outro lado, a infecção do pseudocisto foi por muito tempo considerada uma contraindicação para a confecção de uma cistoenterostomia. A abordagem endoscópica veio simplificar este procedimento e ampliar suas indicações. Atualmente, consideramos a cistoenterostomia endoscópica a primeira opção nestes casos. O limite para não se realizar o proce-dimento, quando coexiste infecção, é o estado clínico do paciente e a presença de sepse e instabilidade hemodinâ-mica associada. Nesses casos é mais prudente a abordagem conservadora com drenagem externa.

É importante ressaltar que esta é uma situação incomum no pseudocisto secundário à pancreatite crônica, e quando a mesma ocorre, não há necrose infectada, apenas infecção da coleção exclusivamente líquida já encapsulada. Dessa forma, na maioria das vezes, mesmo na presença de infecção, será possível ser realizada a drenagem interna da coleção. A abordagem endoscópica é particularmente atraente nestas circunstâncias por atingir os objetivos terapêuticos com menor trauma cirúrgico e sem a criação de uma fístula externa de difícil manejo.

ConclusÃoNo atual estágio de desenvolvimento do tratamento dos pseu-docistos na pancreatite crônica, ressaltamos os seguintes aspectos:

1. Pseudocistos assintomáticos devem ser inicialmente ob-servados;

2. Nos pseudocistos sintomáticos ou complicados, havendo equipe treinada e condições técnicas, a abordagem en-doscópica deve preceder a cirúrgica;

3. Na presença de Síndrome de Desconecção Distal, a abordagem cirúrgica permanece como primeira opção, e

4. A abordagem endoscópica para a Síndrome de Desco-necção Distal deve continuar a ser estudada e aprimo-rada em centros de excelência, em estudos controlados.

53

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

As mudanças na terminologia abrem novo campo de infor-mações na medida em que estudos futuros versarão sobre grupos mais homogêneos. O debate entre as diversas técnicas está longe de terminar. A compreensão da fisiopa-tologia e história natural tem auxiliado na escolha da melhor forma de tratamento. O fundamental é que os princípios terapêuticos sejam executados por profissionais experientes e envolvidos com o tratamento da pancreatite crônica como um todo.

REFERÊNCIAS 1. Ridgway PF, Guller U. Interpreting study designs in surgical re-

search: a practical guide for surgeons and surgical residents. J Am

Coll Surg 2009; 208:635–645.

2. Oxford Centre for Evidence-Based Medicine Levels of Evidence

(May 2001). Available at: http://www.cebm.net/index.aspx?o_1025.

Accessed January 9, 2009.

3. Cannon JW, Callery MP, Vollmer CM Jr. Diagnosis and Management

of Pancreatic Pseudocysts: What is the Evidence? J Am Coll Surg.

2009 Sep; 209(3):385-93

4. Bollen TL, van Santvoort HC, Besselink MG, et al. The Atlanta Clas-

sification of acute pancreatitis revisited. Br J Surg 2008; 95: 6–21.

5. Bradley EL, 3rd. A clinically based classification system for acute

pancreatitis. Summary of the International Symposium on Acute

Pancreatitis, Atlanta, GA, September 11–13, 1992. Arch Surg 1993;

128:586–590.

6. van Santvoort HC, Bollen TL, Besselink MG, et al. Describing peri-

pancreatic collections in severe acute pancreatitis using morpholog-

ic terms: an international interobserver agreement study. Pancreatol-

ogy 2008; 8:593–599.

7. Ammann RW, Akovbiantz A, Largiader F, Schueler G. Course and

outcome of chronic pancreatitis. Longitudinal study of a mixed

medical-surgical series of 245 patients. Gastroenterology 1984; 86:

820–828.

8. Maringhini A, Uomo G, Patti R, et al. Pseudocysts in acute nonalco-

holic pancreatitis: incidence and natural history. Dig Dis Sci 1999;

44:1669–1673.

9. D’Egidio A, Schein M. Pancreatic pseudocysts: a proposed classifi-

cation and its management implications. Br J Surg 1991; 78: 981-984

10. Nealon WH, Walser E. Main pancreatic ductal anatomy can direct

choice of modality for treating pancreatic pseudocysts (surgery ver-

sus percutaneous drainage). Ann Surg 2002; 235: 751-758

11. Bradley EL, Clements JL Jr,Gonzalez AC.The natural history of pan-

creatic pseudocysts: a unified concept of management. Am J Surg

1979; 137:135–141.

12. Vitas GJ, Sarr MG. Selected management of pancreatic pseudocysts:

operative versus expectant management. Surgery 1992; 111:123–

130.

13. Warshaw AL, Rattner DW.Timing of surgical drainage for pancreatic

pseudocyst. Clinical and chemical criteria. Ann Surg 1985; 202:720–

724.

14. Yeo CJ, Bastidas JA, Lynch-Nyhan A, et al. The natural history of

pancreatic pseudocysts documented by computed tomography.

Surg Gynecol Obstet 1990;170: 411–417.

15. G. Garcea G, Ong SL, Rajesh A, Neal C P, et cols Cystic Lesions of

the Pancreas A Diagnostic and Management Dilemma Pancreatolo-

gy 2008;8:236–251.

16. Scheiman J M. Management of Cystic Lesions of the Pancreas. J

Gastrointest Surg (2008) 12:405–407.

17. Warshaw AL, Rutledge PL. Cystic tumors mistaken for pancreatic

pseudocysts. Ann Surg 1987;205:393–398.

18. Brugge WR, Lewandrowski K, Lee-Lewandrowski E, et al. Diagnosis

of pancreatic cystic neoplasms: a report of the cooperative pancre-

atic cyst study. Gastroenterology 2004;126:1330–1336.

19. Morton JM, Brown A, Galanko JA, Norton JA, Grimm IS, Behrns KE.

A national comparison of surgical versus percutaneous drainage

of pancreatic pseudocysts: 1997–2001. J Gastrointest Surg 2005;

9:15–20

20. Ahearne PM, Baillie JM, Cotton PB, et al. An endoscopic retrograde

cholangiopancreatography (ERCP)-based algorithm for the man-

agement of pancreatic pseudocysts. Am J Surg 1992; 163:111–115;

discussion 115–116.

21. Heider R, Meyer AA, Galanko JA, Behrns KE. Percutaneous drain-

age of pancreatic pseudocysts is associated with a higher failure

rate than surgical treatment in unselected patients. Ann Surg 1999;

229:781–787.

22. Vitas GJ, Sarr MG. Selected management of pancreatic pseudo-

cysts: operative versus expectant management. Surgery 1992; 111:

123–130.

23. Cahen D, Rauws E, Fockens P, Weverling G, Huibregtse K, Bruno M.

Endoscopic drainage of pancreatic pseudocysts: long-term outcome

and procedural factors associated with safe and successful treat-

ment. Endoscopy 2005; 37:977–983.

24. Varghese JC, Masterson A, Lee MJ. Value of MR pancreatographyin

the evaluation of patients with chronic pancreatitis. Clin Radiol 2002;

57:393–401.

25. Bradley EL, Clements JL Jr., Gonzalez AC. The natural history of pan-

creatic pseudocysts: a unified concept of management. Am J Surg

1979; 137:135–141.

26. Jacobson BC, Baron TH, Adler DG, et al. ASGE guideline: The role

of endoscopy in the diagnosis and the management of cystic lesions

and inflammatory fluid collections of the pancreas. Gastrointest En-

dosc 2005; 61:363–370

27. Nealon WH, Walser E. Surgical management of complications as-

sociated with percutaneous and/or endoscopic managementof

pseudocyst of the pancreas. Ann Surg 2005; 241:948–957; discus-

sion 957–960.

28. Varadarajulu S, Lopes TL,Wilcox CM, et al. EUS versus surgical

cyst-gastrostomy for management of pancreatic pseudocysts. Gas-

trointest Endosc 2008; 68:649–655.

29. Baron TH, Harewood GC, Morgan DE, Yates MR. Outcome differ-

ences after endoscopic drainage of pancreatic necrosis, acute pan-

creatic pseudocysts, and chronic pancreatic pseudocysts. Gastroin-

test Endosc 2002; 56:7–17.

54

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

30. Papachristou GI, Takahashi N, Chahal P, et al. Peroral endoscopic

drainage/debridement of walled-off pancreatic necrosis. Ann Surg

2007; 245: 943–951.

31. Harewood GC,Wright CA, Baron TH. Impact on patient outcomes of

experience in the performance of endoscopic pancreatic fluid collec-

tion drainage. Gastrointest Endosc 2003;58: 230–235.

32. Arvanitakis M, Delhaye M, Bali MA, et al. Pancreatic-fluid collections:

a randomized controlled trial regarding stent removal after endo-

scopic transmural drainage. Gastrointest Endosc 2007; 65:609–619.

33. Natural orifice translumenal endoscopic surgery (NOTES) cystgas-

trostomyfor the treatment of pancreatic pseudocysts (NCT00541593).

Available at: http://www.clinicaltrials.gov.Accessed June 29, 2008.

34. Heider R, Meyer AA, Galanko JA, Behrns KE. Percutaneous drain-

age of pancreatic pseudocysts is associated with a higher failure

rate than surgical treatment in unselected patients. Ann Surg 1999;

229:781–787; discussion 787–789.

35. Johnson LB, Rattner DW,Warshaw AL. The effect of size of giant

pancreatic pseudocysts on the outcome of internal drainage proce-

dures. Surg Gynecol Obstet 1991;173:171–174.

36. Soliani P, Ziegler S, Franzini C, et al. The size of pancreatic pseudo-

cyst does not influence the outcome of invasive treatments. Dig Liver

Dis 2004;36:135–140.

37. Coelho D, Ardengh JC, Eulálio JM, Manso JE, Mönkemüller K, Coel-

ho JF. Management of infected and sterile pancreatic necrosis by programmed endoscopic necrosectomy.Dig Dis. 2008; 26(4):364-9.

38. Nealon WH, Walser E. Duct drainage alone is sufficient in the oper-

ative management of pancreatic pseudocyst in patients with chronic

pancreatitis. Ann Surg 2003; 237:614–62

39. Izbicki JR, Bloechle C, Broering DC, Knoefel WT, Kuechler T, Bro-

elsch CE. Extended drainage versus resection in surgery for chronic

pancreatitis: a prospective randomized trial comparing the longitu-

dinal pancreaticojejunostomy combined with local pancreatic head

excision with the pylorus-preserving pancreatoduodenectomy. Ann

Surg 1998; 228:771–779.

40. Nealon WH, Walser E. Duct drainage alone is sufficient in the oper-

ative management of pancreatic pseudocyst in patients with chronic

pancreatitis. Ann Surg 2003; 237:614–620.

41. Varghese JC, Masterson A, Lee MJ. Value of MR pancreatography in

the evaluation of patients with chronic pancreatitis. Clin Radiol 2002;

57:393–401.

42. Vitellas KM, Keogan MT, Spritzer CE, Nelson RC. MR cholangiopan-

creatography of bile and pancreatic duct abnormalities with empha-

sis on the single-shot fast spin-echo technique. Radiographics 2000;

20:939–957.

43. Baillie J. Pancreatic pseudocysts (part I). Gastrointest Endosc 2004;

59:873–879.

44. Baillie J. Pacreatic Pseudocysts (part II). Gastrointest Endosc 2004;

60:105–113.

45. Baron TH, Harewood GC, Morgan DE, Yates MR. Outcome differ-

ences after endoscopic drainage of pancreatic necrosis, acute pan-

creatic pseudocysts, and chronic pancreatic pseudocysts. Gastroin-

test Endosc 2002; 56:7–17.

46. Cahen D, Rauws E, Fockens P, Weverling G, Huibregtse K, Bruno M.

Endoscopic drainage of pancreatic pseudocysts: long-term outcome

and procedural factors associated with safe and successful treat-

ment. Endoscopy 2005; 37:977–983.

47. Atabek U, Mayer D, Amin A, Camishion RC. Pancreatic cystogastros-

tomy by combined upper endoscopy and percutaneous transgastric

instrumentation. J Laparoendosc Surg 1993; 3:501–504.

48. Gagner M. Laparoscopic transgastric cystogastrostomy for pancre-

atic pseudocyst. Surg Endosc 1994; 8:239.

49. Mori T, Abe N, Sugiyama M, Atomi Y. Laparoscopic pancreatic cyst-

gastrostomy. J Hepatobiliary Pancreat Surg 2002; 9:548–554.

50. Park AE, Heniford BT. Therapeutic laparoscopy of the pancreas. Ann

Surg 2002; 236:149–158.

51. Roth JS, Park AE. Laparoscopic pancreatic cystgastrostomy: the

lesser sac technique. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech 2001;

11:201–203.

52. Siperstein A. Laparoendoscopic approach to pancreatic pseudo-

cysts. Semin Laparosc Surg 2001; 8:218–222.

53. Trias M, Targarona EM, Balague C, Cifuentes A, Taura P. Intraluminal

stapled laparoscopic cystogastrostomy for treatment of pancreatic

pseudocyst. Br J Surg 1995; 82:403.

54. Way LW, Legha P, Mori T. Laparoscopic pancreatic cystogastrosto-

my: the first operation in the new field of intraluminal laparoscopic

surgery. Surg Endosc 1994; 8:235–239.

55. Obermeyer RJ, Fisher WE, Salameh JR, Jeyapalan M, Sweeney JF,

Brunicardi FC. Laparoscopic pancreatic cystogastrostomy. Surg Lap-

arosc Endosc Percutan Technol 2003; 13:250–253.

56. Phillip S. Ge et cols. Pancreatic PseudocystsAdvances in Endoscop-

ic Management, article in press, Gastroenterol Clin N Am - (2015)

-http://dx.doi.org/10.1016/j.gtc.2015.10.003

57. Zhao X, Feng T, Ji W. Endoscopic versus surgical treatment forpan-

creatic pseudocyst, Digestive Endoscopy 2016; 28:83–91

58. [238] Gouyon B, Levy P, Ruszniewski P, et al. Predictive factors in the

outcome of pseudocysts complicating alcoholic chronic pancreatitis.

Gut 1997; 41:821−5.

59. Yeo CJ, Bastidas JA, Lynch-Nyhan A, et al. The natural history of

pancreatic pseudocysts documented by computed tomography.

Surg Gynecol Obstet 1990; 170:411−7.

60. Vitas GJ, Sarr MG. Selected management of pancreatic pseudo-

cysts: operative versus expectant management. Surgery 1992;

111:123−30.

61. Varadalajulu S, JI YOUNG Bang JY,Sutton BS, Equal Efficacy of En-

doscopic and Surgical Cystogastrostomy forPancreatic Pseudocyst

Drainage in a Randomized Trial. Gastroenterology 2013; 145:583–

590

62. BanksPA, Bollen TL, Dervenis C,Classification of acute pancreati-

tis--2012: revision of the Atlanta classification and definitions by inter-

national consensus. Acute Pancreatitis Classification Working Group.

Gut. 2013 Jan; 62(1):102-11. doi: 10.1136/gutjnl-2012-302779.

Epub 2012 Oct 25

63. Frulloni L, Falconi M, Gabbrielli A, et cols.Italian consensus guide-

lines for chronic pancreatitis.Dig Liver Dis. 2010 Nov;42 Suppl

6:S381-406. doi: 10.1016/S1590-8658(10)60682-2.

55

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

1. Professor de Clínica Médica da Fundação Técnico Educacional Souza Marques, Professor de Clínica Médica da Universidade Estácio de Sá, Professor de Clínica Médica do Centro Universitário de Volta Redonda – UNIFOA, Titular da Federação Brasileira de Gastroenterologia e Titular da Sociedade Brasileira de Hepatologia. 2. Membro Titular da FBG, Membro Titular do GEDIIB (Grupo de Estudos das Doenças Intestinais Inflamatórias), Staff 18ª Enfermaria – Serviço do Prof. José Galvão-Alves/Hospital Santa Casa da Misericórdia/RJ, Membro do Ambulatório de DII – Serviço Prof. José Galvão-Alves, Professor de Medicina da UNESA (Universidade Estácio de Sá) e Professor de Pós-Graduação de Gastroenterologia/PUC-RJ.

Como avaliar e tratar o derrame pleural na pancratite crônica

RuBens Basile 1, caRlos FReDeRico PoRto aleGRe 2

Derrame pleural na pancreatite crônica é uma das apre-sentações clínicas dos derrames cavitários na pancrea-tite crônica; a outra é a ascite pancreática, decorrente de fístulas pancreáticas devido à lesão de um ducto pancre-ático ou da ruptura de um pseudocisto pancreático.

Os derrames cavitários na pancreatite crônica são justifi-cados por duas teorias: podem surgir do escoamento do suco pancreático anteriormente para o peritônio (ascite pancreática) ou posteriormente para o espaço pleural (derrame pleural) a partir do rompimento do ducto pancreático principal ou um de seus ramos ou, mais rara-mente, do rompimento de um pseudocisto para a cavi-dade peritoneal ou torácica, causando ascite de grande monta ou derrame pleural volumoso capaz de dificultar a dinâmica respiratória.

O derrame pleural pode ainda ser justificado pela passagem de sangue e linfa, ricos em enzimas pancre-áticas, na intimidade da pleural, causando um pleuris reacional com derrames de pequena monta. É uma complicação incomum e história recente de pancreatite aguda raramente está presente.

O derrame pleural é mais comum à esquerda e corres-ponde a um exsudato rico em amilase e lipase. Os pacientes, quando sintomáticos, apresentam-se mais comumente com tosse, dor torácica, dispneia e perda de peso.

O diagnóstico depende de uma grande suspeição clínica e pode ser confirmado por exames de imagem e análise de líquido pleural e demonstrando alto conteúdo de amilase (> 1.000 UI/L) e proteínas (> 3g/dL).

Em até um quarto dos pacientes, pode-se verificar a presença simultânea de ascite pancreática e derrame pleural pancreático. Os exames de imagem não invasivos,

como TC helicoidal e a CPRM, (colangiopancreatografia por ressonância magnética) são úteis em se demonstrar calcificações do parênquima pancreático, dilatação e estenoses do ducto de Wirsung e a presença de pseu-docisto e fístulas.

A CPRE (colangiopancreatografia retrógrada endoscó-pica) é indicada em todos os casos de fístulas pancreá-ticas internas com derrame pleural na busca de patologia ductal e localização do trajeto fistuloso. Pode ser utilizado como terapêutica invasiva como a colocação de endo-próteses.

O tratamento não cirúrgico está indicado em pacientes com derrame pleural de origem pancreática. A base racional do tratamento consiste em diminuir a secreção pancreática exócrina, estimulando, assim, o fechamento do ducto pancreático no local de ruptura.

O tratamento inclui suspensão da ingestão oral, nutrição enteral e o uso de toracocenteses, conforme apropriado, a fim de eliminar o líquido pleural. O uso de octreotídeo, um análogo da somatostatina de ação prolongada, pode ser benéfico em casos selecionados. Recomenda-se o tratamento não cirúrgico durante um período de 2 a 3 semanas, podendo-se observar resolução da entidade clínica em 50% a 60% dos pacientes. No entanto, o sucesso a longo prazo dessas abordagens é incerto.

O tratamento endoscópico com esfincterotomia com inserção de endoprótese pancreática, caso o tratamento conservador não obtenha sucesso, apresenta-se na lite-ratura como procedimento terapêutico seguro e efetivo no fechamento do trajeto fistuloso.

O tratamento cirúrgico baseia se nos achados da CPRE e reservados aos pacientes que não respondem aos trata-mentos clínicos e endoscópicos.

56

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

1. Doutorado em Ciências Fisiológicas pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e Unidade do Aparelho Digestivo do Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, Espírito Santo.

Fístula pancreática interna ascite pancreática

MaRia Da Penha ZaGo-GoMes1

REFERÊNCIAS

1. Balthazar EJ. Imaging diagnosis of acute pancreatitis. In:Berger HG,

Matsuno S. Cameron JL. Disease of the pancreas .New York: Springer.

2008: 201.

2. Galvão-Alves J. Pancreatite Crônica Alcoólica ż complicaçõesż Análise

crítica de 210 pacientes. [Memória à AcademiaNacional de Medicina]

Academia Nacional de Medicina. Riode Janeiro, 2004. 57 p. Galvão-

Alves J. Pancreatite Crônica Alcoólica ż complicaçõesż Análise crítica de

210 pacientes. [Memória à Academia Nacional de Medicina] Academia

Nacional de Medicina. Rio de Janeiro, 2004. 57 p.

3. Chebli JM, Gaburri PD, de Souza AF, Ornellas AT, Martins Junior

EV, Chebli LA, Felga GE, Pinto RJ. Internal pancreatic fistulas:

proposal of a management algorithm based on a case serieanalisys. J

ClinGastroenterol 2004; 38:795-800.

4. Cunha JE, Machado M, Bacchella T et al. Surgical treatment of pancreatic

ascites and pancreatic pleural effusions. Hepatogastroenterology 1995;

42:748-51.

5. Gomez-Cerezo J, Barbado Cano A, Suárez I. et al. Pancreatic ascites

study of therapeutic options by analysis of case reports and case series

between the years 1975 and 2000. Am J Gastroenterol 2003; 98:568-

77

6. Kaman L, Behera A, Singh R, Katariya RN.Internal pancreaticfistulas

with pancreatic ascites and pancreatic pleuraleffusions: recoginition

and management. ANZ J Surg 2001; 71: 221-225.

7. Kozarek RA, Ball TJ, Patterson DJ, et al. Endoscopic transpapillary

therapy for disrupted pancreatic duct and peripancreatic fluid

collections. Gastroenterology 1991; 100:1362.

8. Owyang C, DiMagno MJ. Chronic pancreatitis. In: YamadaT. Textbook

of Gastroenterology. Oxford: Wiley-Blackwell.2009: 1833-1850.

9. Pai CG, Suvarna D, Bhat G. Endoscopic treatment aas first-line therapy

for pancreatic ascites and pleural effusion. J GastroenterolHepatol.

2009 Jul; 24 (7):1198-202.

10. Ramos-De la Medina A, Reid-Lombardo KM, Sarr MG.Strategies for

surgical treatment of pseudocysts after acutepancreatitis. In: Hans B,

Warshaw M, Büchler M, KozarekR, Lerch M, Neoptolemos J, Shiratori

K, Whitcomb D. ThePancreas: an integrated textbook of basic science,

medicine and surgery.Blackwell Publishing.2008: 359.

11. Subrt Z, Ferko A, Papík Z, Vacek Z, Sedlácek Z. A rare causeof

mediastinal expansion with a massive pleural effusion.Postgrad Med

J 2005; 81: e18.

12. Yeo CJ, Cameron JL. Pâncreasexócrino.In: Towensend MCJr,

Beauchamp RD, Evers BM, Mattox KL. Tratado de cirurgia ż As bases

biológicas da prática cirúrgica moderna. Rio deJaneiro: Guanabara

Koogan. 2004: 1235-1242.

INTRODUÇÃO

A ruptura de um ducto pancreático, como vazamento de suco pancreático, é uma complicação resultante de pancreatite aguda ou crônica, neoplasia maligna de pâncreas, ou trauma abdominal, ou após cirurgia abdominal21 . A interrupção pode ocorrer no ducto principal (ducto de Wirsung) ou nos ductos secundá-rios. O resultado é a formação de ascite pancreática, derrame pleural pancreático, derrame pericárdico pancreático e fístulas pancreáticas externas.

A presença de fístulas para outros locais ou órgãos pode ocorre, porém é muito rara21.

O diagnóstico e tratamento das Fístulas Pancreáticas Internas (FPI) apresentaram modificações nos últimos anos, com a melhoria das técnicas de imagens não inva-sivas com cortes finos, como a Ressonância Magnética (RM) e Tomografia Computadorizada (TC).

Também ocorreram avanços no tratamento clínico conservador (instituição da nutrição enteral e o uso análogos da somastotatina) e o advento de técnicas endoscópicas (papilotomia e colocação de próteses endoscópicas pancreáticas).O algoritmo de tratamento, instaurando progressivamente o tratamento conser-vador, endoscópico e depois cirurgia orienta correta-mente a condução do tratamento16.

57

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

HISTÓRIA

O primeiro relato na literatura de FPI foram dois casos de ascite pancreática, descrito em 1953 por Smith5, 1995), em pacientes com Pancreatite Crônica (PC). Em 1976, Cameron e cols. caracterizaram esta complicação e cunharam o termo “Fístula Pancreática Interna” para definir os derrames cavitá-rios decorrentes da lesão pancreática.

FISIOPATOLOGIA

A formação das FPIs depende de vários fatores, incluindo a etiologia, local e extensão da interrupção, a taxa de secreção de suco pancreático, a localização do extravazamento do suco pancreático em relação aos planos anatômicos, a capacidade da respostai nflamatória sistêmica em conter este extravaza-mento, e a presença de obstrução à jusante do ducto por estreitamentos ou cálculos. A ruptura de um ducto pancreá-tico, com um pequeno vazamento de suco pancreático de um dos ramos laterais, pode resolver-se espontaneamente21.

Aproximadamente 95% dos casos de ascite pancreática ou derrame pleural panreático estão associados à PC. A fisiopatologia exata para a ruptura ducto ou pseudocisto é desconhecida. Necrose pancreática localizada, com aumento da pressão intraductal devido à obstrução, seria um meca-nismo provável. Calcificação extensa na cabeça do pâncreas causando distorção de canal, obstruindo e levando a elevada pressão intraductal pode ser uma possível causa à ruptura espontânea.

O aumento da pressão dentro do pseudocisto, erosão locais da parede do cisto por autodigestão ou isquemia, e aumento da pressão abdominal são outros possíveis mecanismos de lesão de ductos14.

Após a ruptura de um ducto pancreático, dependendo do caminho do suco pancreático, pode haver a formação de pseudocistos, FPI ou as fístulas pancreáticas externas. Se as secreções pancreáticas acompanhar em espaços internos, forma-se a FPI.

Uma ruptura anterior do ducto pancreático leva à fuga do suco pancreático para dentro da cavidade peritoneal, com o desenvolvimento de ascite pancreática. Se a lesão for poste-rior, o suco pancreático é encaminhado superiormente para o mediastino através do hiato esofágico ou aórtico e para a cavidade pleural. As FPIs ocasionalmente podem se comu-nicar com outros espaços como o pericárdio, brônquio, estô-mago e intestino delgado ou grosso21.

INCIDÊNCIA

A real prevalência de FPI não é conhecida, porém estima-se seu desenvolvimento em 3 a 6% dos pacientes com PC e 6 a 14 % dos pacientes com pseudocisto pancreático apre-sentam FPI. O derrame pleural na pancreatite crônica é raro, constitui 1% dos casos de derrame pleural2.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

O diagnóstico dos derrames cavitários pancreáticos depende de uma grande suspeita clínica. Geralmente, a FPI ocorre mais no sexo masculino, com história de alcoolismo, entre 40 e 50 anos de idade. Cerca de metade dos pacientes não tem história anterior sugestiva de pancreatite. Pseudocisto pode ser visto em cerca de 69 a 77% dos pacientes12.

Geralmente os pacientes apresentam emagrecimento recente e anorexia. Aqueles com ascite pancreática relatam história de dor abdominal de forte intensidade e aparecimento de aumento de volume abdominal. Frequentemente os pacientes alcoolistas com ascite pancreática são mais novos que os pacientes porta-dores de cirrose hepática e sem sinais periféricos de hepato-patia crônica6,10.

O exame do líquido livre na cavidade confirma o diagnóstico de FPI; desta maneira, a paracentese abdominal, a toracocen-tese e a drenagem de líquido mediastinal são mandatórias na suspeita clínica. O aspecto do líquido é sero-sanguinolento e o exame bioquímico demonstra amilase acima de 1000 UI/litro e níveis de proteína acima de 3 g/100ml10.

A amilase sérica comumente está acima do valor normal pelo fato de haver reabsorção passiva de amilase pela superfície do peritônio e da pleura em uma série de 50 casos conse-cutivos.

DIAGNÓSTICO POR IMAGEM

Uma vez o derrame cavitário pancreático é diagnosticado, a fístula pode ser visualizada usando investigação radiológica. A sensibilidade de diversas modalidades de imagem para delinear a fístula é variável, com os valores de 47%, 78% e 80% para a TC, colangiopancreatografia endoscópica retró-grada (CPRE) e colangiopancreatografia por ressonância magnética (CPRM), respectivamente2.

A CPRE permite avaliação anatômica dos ductos pancreá-ticos, podendo definir um mapa do sistema ductal e demons-trar o local da FPI. Este método também é importante na tera-pêutica, pois através da CPRE pode ser feita a papilotomia endoscópica e colocação de prótese pancreática9.

58

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A CPRE foi durante muitos anos o método responsável pela loca-lização da FPI e pelo planejamento de estratégias de terapêuticas invasivas. Contudo, este procedimento invasivo, a canalização e a colocação de prótese podem não ser possíveis na presença de estenose ductal e grandes calcificações. CPRE requer sedação e apresenta risco de complicações, principalmente infecção devido ao cateterismo da papila.

Com as novas técnicas de aquisição de imagens com cortes finos, que avaliam o pâncreas e do ducto pancreático com mais qualidade, os exames de imagens não invasivos tornaram-se uma alternativa na detecção de FPI. Com estes métodos não é possível realizar procedimentos, mas as imagens auxiliam na decisão terapêutica.

A TC e CPRM, além da identificação da FPI, também permitem a identificação de atrofia da glândula, dilatação ductal e compro-metimento de tecidos peripancreáticos. O uso de ambos, TC e CPRM, aumentam a possibilidade de detecção da FPI. O`Toole e cols.16, em 2007, estudando uma série de casos, demonstraram que a CT identificou 50% dos casos de fístulas e CPRM conse-guiu demonstrar 67% dos locais de ruptura, porém o diagnós-tico foi feito em 15/16 pacientes com a combinação das duas técnicas.

O diagnóstico e caracterização da ruptura do ducto é um primeiro passo para seleção de uma estratégia de gestão adequada.

TRATAMENTO CLÍNICO

Como a ruptura dos ductos pancreáticos não é comum, as evidências científicas sobre a conduta clínica são limitadas a relatos de casos e séries de casos. O manuseio envolve a estabilização do paciente, a identificação da anatomia do ducto rompido e do tipo de ruptura e gestão definitiva da interrupção da ruptura. Muito importante é a manutenção de uma boa hidratação, nutrição e equilíbrio de eletrólitos21.

Dieta

Após o diagnóstico de FPI, o tratamento convencional deve ser instituído com medidas para diminuir a produção de suco pancreático. Como medida inicial indica-se dieta oral zero. O Concenso da the American Society for Parenteral and Enteral Nutrition, de 2012, recomenda o uso de nutrição enteral na presença de complicações de fístulas pancreáticas, não mais sendo recomendada a nutrição parenteral, exceto em situa-ções especiais13.

Quanto à composição dos nutrientes, tanto as fórmulas com nutrição polimérica como a nutrição elementar podem ser utilizadas15. A nutrição deve ser instituída por sonda naso-enté-rica ofertando entre 1500 e 2000 calorias16. Deve ser realizada paracentese ou toracocentese total sempre que houver recor-rência do derrame2.

Derivados da Somatostatina - Octeotride

O uso de análogos de somatostatina, utilizados como adju-vantes no tratamento das FPI18. não apresentam evidência científica clara de benefício em diminuir a drenagem e fechar as FPI quando comparado a placebo, porque existe grande dificuldade de análise dos dados, sendo apresentada na lite-ratura relatos de casos1 com pequeno número de pacientes, variabilidade da dose utilizada nos diferentes trabalhos e heterogeneidade dos pacientes. A medicação mais comu-mente utilizada é o octeotride, na dose de 100 msg, realizado por via subcutânea, duas vezes ao dia11.

Falência do Tratamento Clínico

Considera-se falência do tratamento clínico quando o paciente mantiver recorrência do derrame cavitário com alto teor de amilase, após 3 semanas de tratamento medi-camentoso16. Usa-se arbitrariamente o tempo de 3 semanas, baseado em primeiros trabalhos que definiram o tratamento clínico entre 2 e 4 semanas. Considera-se falência quando após este tempo reinicia-se alimentação via oral e ocorre a recidiva do derrame cavitário. A falência ao tratamento clínico ocorre entre 33 e 50 % dos casos19,20 dos pacientes que são submetidos ao tratamento clínico convencional.

Tratamento Endoscópico

Uma estratégia alternativa ao tratamento convencional dos pacientes com FPI e exame de imagem evidenciando ruptura de ducto pancreático principal é a esfincterotomia pancreá-tica endoscópica com colocação de próteses intra-pancreá-ticas3,4, ou dreno nasopancreático3.

Teoricamente a colocação de uma prótese no ducto que apresenta lesão de continuidade seria capaz de ocluir parcialmente o local e a esfincterotomia diminuiria a pressão intraductal. A descompressão do sistema ductal pancreático e a colocação da prótese manteriam a drenagem, facilitando o fechamento do trajeto fistuloso8. O procedimento consiste em esfincterotomia pancreática e colocação de dreno de polietileno de 5F ou 7F, ou na colocação de dreno nasopan-creático. Quando o local da ruptura está situado na cabeça ou corpo do pâncreas, geralmente a prótese ultrapassa o local de ruptura do ducto, porém mesmo em lesões de cauda, a colocação do dreno com descompressão do sistema ductal favorece o fechamento do trajeto fistuloso.

Pai, Suvarna e Bhat, em 200917, relatam trabalho com 28 pacientes que apresentavam FPI e receberam, com primeira escolha, a endoterapia pancreática, obtendo controle da fístula em 27 casos (96,4%), com tempo médio de 5 semanas. A prótese foi removida entre 3 e 6 semanas e não houve mortalidade entre os pacientes acompanhados. Os autores consideram esta terapêutica como efetiva, simples e segura

59

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

para o tratamento de ascite e derrame pleural pancreático, porém é uma terapêutica que requer profissional e material especializado.

Complicações da endoterapia incluem perfuração de duodeno, sangramento, exacerbação da dor, pancreatite aguda, infecção do fluido, infecção biliar, alteração da morfo-logia do ducto pela prótese e morte. Dificuldades técnicas como pâncreas divisun, localização da ruptura muito poste-rior, grandes cálculos impedindo boa drenagem ou cirurgias anteriores que impeçam a abordagem da papila podem difi-cultar o tratamento endoscópico em alguns pacientes17.

Tratamento Cirúrgico

Cirurgia na FPI é sempre difícil devido ao processo inflama-tório peripancreático, o envolvimento de vasos mesentéricos, a presença de pseudocistos e abscessos. Nestes pacientes, a identificação do sítio de ruptura é o primeiro passo, para então ser programada uma cirurgia de derivação ou ressecção11.

A cirurgia está reservada aos pacientes que não respondem aos tratamentos clínicos e endoscópicos, ou com compli-cações nos derrames como infecção. Também é primeira escolha quando há ruptura completa do ducto pancreático principal6. A técnica cirúrgica deve ser decidida individual-mente, baseada no local de ruptura do ducto ou pseudocisto e nas relações anatômicas estabelecidas7. Este procedimento deve ser realizado preferencialmente por cirurgião com expe-riência em doenças pancreáticas 16.

Algoritmos de Tratamento das FPI

Em 2004, Chebli e cols6, pesquisadores brasileiros da cidade de Juiz de Fora, MG, publicaram o primeiro algoritmo de tratamento das FPI da literatura mundial (Figura 1), no qual propuseram critérios para decisão da conduta clínica.

Neste algoritmo, após o diagnóstico, o tratamento conser-vador deveria ser instituído quando houvesse ruptura de ducto secundário ou quando não se observa o local da lesão. Na ruptura parcial do ducto pancreático principal, o trata-mento endoterápico deve ser instituído.

Nos casos de ruptura total, o tratamento inicial deveria ser cirúrgico e quando a ruptura for de um pseudocisto, deveria ser tentado o tratamento de drenagem endoscópica como primeira opção. Em falência terapêutica do tratamento conservador, realizar primeiro endoterapia, depois cirurgia.

Em 2009, Kurumboor e cols. 11, na Índia, publicaram uma série de casos de 11 pacientes com Pancreatite Crônica Tropical

complicada com ascite pancreática e trataram seguindo o protocolo proposto por eles. Realizou o tratamento nutri-cional com dieta zero, alimentação com sonda nasoenteral com 1500 a 2000 Kcal/dia e octeotride subcutâneo (100 msg duas vezes ao dia) em 7 pacientes. Em dois pacientes não conseguiram realizar o tratamento endoscópico (múltplos cálculos e pseudocisto na cabeça de pãncreas). O trata-mento endoscópico precoce consistiu na papilotomia e colo-cação de prótese, ultrapassando ou não o local de ruptura. Dos nove submetidos à endoterapia precoce, cinco tiveram boa resposta e quatro foram à cirurgia, sendo que 1 destes pacientes morreu.

CONCLUSÃO

FPI é uma complicação pouco frequente da PC, porém de alta morbidade e mortalidade. É necessária grande suspeição clínica, porém o diagnóstico é fácil de realizar pois a dosagem de amilase elevada no fluído cavitário confirma a hipótese diagnóstica. Atualmente dieta enteral é a mais importante conduta terapêutica clínica.

A realização de um exame de imagem (CPRM, CPRE ou TC) com a identificação do local de ruptura determina a conduta clínica. Na ruptura de ductos secundários ou quando não é identificado o ponto de ruptura, deve-se optar por tratamento clínico conservador. Nas rupturas parciais, endoterapia. Nos casos de ruptura total, o tratamento inicial deve ser cirúrgico. Quando a ruptura é de um pseudocisto, a drenagem endos-cópica é a primeira opção. Na falha do tratamento clínico, a endoterapia com papilotomia e colocação de prótese, ou a colocação de dreno naso pancreático é a opção terapêutica.

REFERÊNCIAS

1. Akahane T, Kuriyama S, Matsumoto M, et al. Pancreatic pleural effusion with a pancreaticopleural fistula diagnosed by magnetic resonance cholangiopancreatography and cured by somatostatin analogue treatment. Abdom Imaging. 2003;28(1):92Y95.2. Aswani Y, Hira P. Pancreaticopleural Fistula: A Review. JOP. J Pancreas (Online) 2015 Jan 31; 16(1):90-94.3. Bhasin D K, Rana SS, Siyad I et al. Endoscopic transpapillary nasopancreatic drainage alone to treat pancreatic ascites and pleural effusion. J. Gastroenterol. Hepatol. 2006; 21: 1059–64.4. Bracher GA, Manocha AP, DeBanto JR, et al. Endoscopic pancreatic duct stenting to treat pancreatic ascites. Gastrointest Endosc. 1999;49:710– 715.5. Cameron JL, Kieffer RS, Anderson WJ, et al. Internal pancreatic fistulas: pancreatic ascites and pleural effusions. Ann Surg. 1976;184:587–593.6. Chebli JM, Gaburri PD, de Souza AF, Ornellas AT, Martins Junior EV, Chebli LA, Felga GE, Pinto JR. Internal pancreatic fistulas: proposal of a management algorithm based on a case series analysis. J. Clin. Gastroenterol. 2004; 38: 795–800.7. Cunha JE, Machado M, Bacchella T et al. Surgical treatment of pancreatic ascites and pancreatic pleural effusions. Hepatogastroenterology 1995; 42: 748–51.8. Farnbacher MJ, Radespiel-Tröger M, König MD, Wehler M, Hahn E,

60

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Schneider HT. Pancreatic endoprostheses in chronic pancreatitis: criteria to predict stent occlusion. Gastrointest. Endosc. 2006; 63: 60–6.9. François CJ, Demos TC, Iqbal N. Pancreaticothoracic fistulas: imaging findings in five patients. Abdom Imaging. 2005;30(6):761Y767.10. Kaman L, Behera A, Singh R, Katariya RN . Internal pancreatic fistulas with pancreatic ascites and pancreatic pleural effusions: recognition and management.ANZ J Surg. 2001;71:221–225. 11. Kurumboor P, Varma D, Rajan M, Kamlesh NP, Paulose R, Narayanan RG · Philip M. Outcome of pancreatic ascites in patients with tropical calcific pancreatitis managed using a uniform treatment protocol. Indian J Gastroenterol 2009(May–June):28(3):102–10612. Machado NO. Pancreaticopleural Fistula: Revisited.Diagnostic and Therapeutic Endoscopy. 2012, Article ID815476,1-5 doi:10.1155/2012/815476.13. Mirtallo JM, Forbes A, McClave SA, Jensen GL, WaitzbergDL, Davies AR. International consensus guidelines for nutrition therapy in pancreatitis. JPEN J Parenter Enteral Nutr 2012; 36: 284-291.14. Nandasena, Wijerathne, de Silva. Fluctuating serum amylase levels in a patient with pancreatic ascites. Ceylon Medical Journal 2015; 60: 161-162.15. Oláh A, Romics Jr. L Enteral nutrition in acute pancreatitis: A review of the current evidence. World J Gastroenterol 2014 November 21; 20(43): 16123-1613116. O’Toole D, Vullierme MP, Ponsot P, Maire F, Calmels V, Hentic O, Hammel P, Sauvanet A, Belghiti J, Vilgrain V, Ruszniewski P, Lévy P. Diagnosis

and management of pancreatic fistulae resulting in pancreatic ascites or

pleural effusions in the era of helical CT and magnetic resonance imaging.

Gastroenterol Clin Biol. 2007 Aug-Sep;31(8-9 Pt 1):686-93.

17. Pai CG, Suvarna D, Bhat G. Endoscopic treatment as first-line therapy

for pancreatic ascites and pleural effusion. J GastroenterolHepatol. 2009

Jul;24(7):1198-202. Epub 2009 May 26.

18. Segal I, Parekh D, Lipschitz J, et al. Treatment of pancreatic ascites

and external pancreatic fistulas with a long-acting somatostatin analogue

(Sandostatin). Digestion. 1993;54(Suppl 1):53–58.

19. Uchiyama T, Yamamoto T, Mizuta E, Suzuki T. Pancreatic ascites—a

collected review of 37 cases in Japan. Hepatogastroenterology 1989; 36:

244–8.

20. Varadarajulu S, Noone TC, Tutuian R, Hawes RH, Cotton PB. Predictors

of outcome in pancreatic duct disruption managed by endoscopic

transpapillary stent placement. Gastrointest Endosc 2005;61:568–75.

21. Varadarajulu S, Rana SS, Bhasin DK. Endoscopic Therapy for Pancreatic

Duct Leaks and Disruptions. Gastrointest Endoscopy Clin N Am 23 (2013)

863–892.

ASCITEPANCREÁTICAOUDERRAMEPLEURAL

Imagemparaidentificarpontoderuptura (TC,RMouCPRE)

Ductopancreáticodilatado

Ductoprincipalcomrupturaouestenoseparciais

Ductoprincipalcomrupturacompletaouestenose

Pseudocisto

Tratamentoconservador

Papilotomia+endoprótese

Cirurgia

Drenagemendoscópica

Falência Falência

Falência

Figura 1: Algoritmo do tratamento de Fístulas Pancreáticas Internas segundo e Chebli cols., de 2004 (traduzido de Chebli e cols., de 2004, publicado J. Clin. Gastroenterol. 2004; 38: 795–800). TC: Tomografia Computadorizada de Abdômen; RM: Ressonância Magnética de Abdômen; CPRE: Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica.

61

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A substituição do parênquima pancreático por tecido fibroso, que ocorre na pancreatite crônica (PC), pode deter-minar compressão extrínseca das estruturas vizinhas, prin-cipalmente na região da porção cefálica do pâncreas, repre-sentadas por colédoco terminal e segunda porção duodenal, com eventual obstrução mecânica destas estruturas.

A extensão da estenose coledociana dependente do compri-mento da porção intrapancreática do colédoco. A obstrução da via biliar intrapancreática ocorre em 4% a 30% dos casos de PC hospitalizados. Pacientes com intenso processo infla-matório e fibrose da cabeça do pâncreas podem apresentar obstrução biliar em até 50% dos casos.

A compressão da via biliar pode ser de natureza definitiva quando produzida pela fibrose pancreática nos casos avan-çados ou, como decorre na maior parte das formas iniciais da doença, de maneira transitória sendo causada pelo edema do surto inflamatório agudo.

A obstrução biliar da PC pode cursar de forma total-mente assintomática. As manifestações clínicas, quando presentes, são variáveis e caracterizam-se por episódios de exacerbação e remissão. A principal queixa é a presença de icterícia intermitente ou contÍnua acompanhada de dor abdominal, eventualmente episódios de colangite e, mais raramente, emagrecimento, náuseas e vômitos.

A elevação da fosfatase alcalina é a alteração laboratorial mais específica e precoce, mesmo na ausência de hiperbi-lirrubinemia. Exames de imagem não invasivos são funda-mentais nestes pacientes, a US, a TC e a RM, permitem diagnosticar a obstrução da via biliar extra-hepática, porém pode ser difícil o diagnostico diferencial com neoplasias periampulares. A introdução da ecoendoscopia no arma-mentário diagnóstico pode, eventualmente, auxiliar nesta diferenciação.

O tratamento deve basear-se na forma de apresentação clÍnica e na avaliação dos riscos envolvidos na conduta expectante que pode ser adotada em casos selecionados.

A descompressão da via biliar é indicada quando a icterícia persiste por mais de 30 dias. Inicialmente opta-se pelo tratamento conservador pois a icterícia pode ser autolimi-tada pela diminuição do edema da região ou resolução de um pseudocisto. A drenagem endoscópica constitui uma solução aceitável a curto e médio prazos mas não deve ser recomendada como tratamento definitivo que é obtido com maior sucesso pela cirurgia, entretanto, pode ser a única opção de tratamento dos casos; com hipertensão portal com contraindicação cirúrgica.

A experiência clínica tem demonstrado piores resultados do tratamento endoscópico nos pacientes com calcificação da porção cefálica do pâncreas. A cirurgia com anastomose coledocojejunal em Y-de-Roux proporciona ótima drenagem biliar, sendo a melhor opção terapêutica a longo prazo. Entretanto a escolha do tipo de cirurgia baseia-se também na condição do paciente e na presença de outros fatores concomitantes, como obstrução duodenal e outras compli-cações pancreáticas, que requeiram tratamento cirúrgico.

Além da obstrução da via biliar determinada pela fibrose pancreática, esta também pode determinar processo compressivo e obstrutivo do trato gastrointestinal, sendo o duodeno o segmento mais comumente envolvido. A obstrução duodenal isolada é muito mais rara do que a obstrução biliar.

Ela ocorre em 0,5% a 13% (média de 1,2%) dos casos, e também pode resultar da inflamação e da compressão determinada pela presença de pseudocistos. Pode apre-sentar-se de forma transitória, mais comum, causada pelo edema característico dos episódios de agudização e, mais raramente, uma obstrução prolongada ou permanente, pela fibrose cefálica do pâncreas.

Os principais sintomas são náusea e vômito não acom-panhados de dor, persistentes de intensidade crescente. Esta obstrução pode ser demonstrada pela endoscopia digestiva alta ou exame radiológico contrastado do estô-mago e duodeno. A obstrução duodenal na PC pode se

Obstruções das vias biliares e do trato gastrointestinal

José eDuaRDo MonteiRo Da cunha1

1. Professor. Associado do Departamento de Gastroenterologia Faculdade de Medicina da USP e Gestor Acadêmico do Curso de Medicina da Universidade de Mogi das Cruzes.

62

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

Fístulas pancreáticas

alexanDRe PRaDo De ResenDe1, leanDRo RicaRDo De navaRRo aMaDo2

resolver com tratamento conservador de modo semelhante à obstrução biliar.

Os pacientes que persistem com sintomas após 3 a 4 semanas ou que apresentam obstrução total do duodeno têm indi-cação de tratamento cirúrgico. Os casos de obstrução rela-cionada à compressão por pseudocisto podem apresentar alívio após a drenagem do pseudocisto.

Os raros casos de pacientes com obstrução duodenal persis-tente secundária à inflamação e à fibrose da cabeça do pâncreas devem ser tratados através de gastroenteroanas-tomose ou mesmo duodenopancreatectomia, dependendo da associação com outras lesões e com quadro de dor não responsiva ao tratamento clinico.

Referências1. Abdallah AA, Krige JE, Bornman PC. Biliary tract obstruction inchronic pancreatitis. HPB (Oxford) 2007; 9:421-8.2. Cunha JE, Bacchella T, Mott C, Jukemura J et al. Surgical treatmentof biliary complications from calcifying chronic pancreatitis.International Surgery. 1984; 69:149-54.3. Taylor S, Adams D, Anderson M. Duodenal stricture: a complicationof chronic fibrocalcific pancreatitis. South. Med. J. 1991; 84:338–341.4. Vijungco JD, Prinz RA. Management of biliary and duodenal complications of chronic pancreatitis. World journal of surgery. 2003;27(11):1258-70.5. Frey CF, Suzuki M, Isaji S. Treatment of chronic pancreatitis complicated by obstruction of the common bile duct or duodenum. World journal of surgery. 1990;14(1):59-69.6. Stabile BE, Calabria R, Wilson SE, Passaro E, Jr. Stricture of the common bile duct from chronic pancreatitis. Surgery, gynecology & obstetrics. 1987;165(2):121-6.7. Huizinga WK, Baker LW. Surgical intervention for regional complications of chronic pancreatitis. International surgery. 1993;78(4):315-9.

1. Pós-Graduação em Cirurgia Digestiva e Transplantes pela Universidade Louis Pasteur em Estrasburgo – França e Chefe do Serviço de Cirurgia Geral II, com atuação nos Hospitais Mater Dei e Vera Cruz em Belo Horizonte – MG. 2. Membro do Grupo de Transplantes do Instituto Alfa de Gastroentrologia do Hospital das Clínicas da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e Especialista em Cirurgia Hepatobiliar e Transplante de Fígado pela Universidade de Rennes – França.

INTRODUÇÃO

As fístulas pancreáticas são definidas como a ocorrência de um extravasamento de secreção pancreática exócrina, ocorrido a partir de uma solução de continuidade do sistema ductal pancreático. Elas podem ser desencadeadas por crises de pancreatite aguda ou crônica, trauma e manipu-lação cirúrgica, dentre outras causas. As fístulas podem ser divididas em fístulas internas (fluido pancreático drena para cavidade peritoneal, pleural ou para vísceras adjacentes) ou externas, com exteriorização cutânea da secreção pancreá-tica.

Neste capítulo, abordaremos especificamente as fístulas pancreáticas externas visto que a ascite pancreática e o derrame pleural receberão abordagem específica em outras seções. As fístulas externas ocorrem quase sempre em decorrência de uma manipulação direta do pâncreas através de procedimentos cirúrgicos ou propedêuticos. Sua ocorrência está associada a um aumento da morbidade, da permanência hospitalar, do custo hospitalar e até da morta-lidade nestes pacientes. Dentre as cirurgias, destacamos as ressecções pancreáticas (de qualquer segmento) e as cirur-

gias de derivação pancreática, estas indicadas quase sempre para o tratamento da dor em portadores de pancreatite crônica. Procedimentos propedêuticos ou terapêuticos como punções (de cistos, pseudocistos, tumores císticos e cole-ções peri-pancreáticas) e biópsias podem também desenca-dear a ocorrência de uma fístula pancreática.

O estudo das fistulas pancreáticas externas é uma tarefa bastante trabalhosa, visto que existe uma indefinição na lite-ratura médica sobre o conceito da mesma.

Em uma revisão de 1426 pubilicações sobre o tema, Parr et al.1 referem que em apenas 43 deles existia uma clara definição dos critérios de inclusão e exclusão. Dentre estes 43 artigos, os autores referem que foram identificadas 32 diferentes caracterizações de fístula pancreática. Tal achado demonstra a dificuldade na análise de dados, em especial nos estudos comparativos ou multicêntricos. Tal dificuldade motivou a realização de um grupo de estudo específíco para tentar uniformizar os termos e publicações referentes às fístulas International Study Group for Pancre-atic Fistulae (ISGPF) 2. Ainda assim, existem ainda hoje duas definições de fístula pancreática comumente empregadas.

63

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

A da International Study Group for Pancreatic Fistulae (ISGPF)

2, em que qualquer volume drenado a partir do terceiro dia, com nível de amilase superior a três vezes o nível sérico, é considerado fístula, e a de Sarr3, que conceitua fístula pancre-ática como a drenagem superior a 30 ml, após o quinto dia, com amilase superior a cinco vezes o valor de referência para o nível sérico desta. Tais critérios são ainda hoje questio-nados, não havendo consenso na literatura médica quanto ao tema4,5. A esta divergência deve ser atribuída a grande variação na incidência de fístulas pancreáticas pós-operató-rias, que podem variar de 0 a 50% em algumas séries3.

Quanto à classificação, as fístulas pancreáticas são classi-camente divididas em grau A (tratada conservadoramente), grau B (necessita procedimentos intervencionistas) e grau C (necessita reoperações em urgência). A ocorrência de fístulas de grau C se associam frequentemente a outros eventos abdominais (sepse, sangramento ou perfuração de vísceras ocas), sendo diretamente responsável por um aumento na mortalidade destes pacientes.

Em interessante publicação, Reid-Lombardo et al. 3 Comparam séries de pacientes oriundos de 16 instituições quanto à inci-dência de fístula pancreática, segundo critérios da ISGPF, ou de Sarr. Nesta publicação, seguindo a definição da ISGPF a incidência de fístula foi de 26,7%, enquanto segundo o critério de Sarr, na mesma série de pacientes, a incidência de fístula foi de 14,3%.

Vale ressaltar que a incidência de fístulas graus A e B foi maior segundo a definição da ISGPF, mas a incidência de fístulas grau C foi a mesma nas duas classificações. Existe atualmente uma tendência a substituir a atual classificação do grau das fístulas pelos critérios de Dindo-Clavien, que associa aspectos clínicos da evolução do paciente à necessidade de intervenções em cada caso.

Ao considerarmos especificamente os portadores de pancreatite crônica, devemos ter em mente que se trata de um grupo de pacientes que possui uma textura do parên-quima pancreático firme e rígida, associado a uma elevada pressão intra-ductal. Estas variáveis se traduzem em alguns aspectos de importância prática.

A primeira delas é que as anastomoses realizadas nos porta-dores de pancreatite crônica, após ressecção cefálica ou em cirurgias de derivação, são menos propensas à ocorrência de fístulas pancreáticas. Isto ocorre tanto pela utilização de um tecido rígido e que permite a realização de uma sutura em melhores condições técnicas, como pela redução da pressão intra-ductal decorrente destas anastomoses. Já os pacientes submetidos às pancreatectomias corpo-caudais ou drenagem externa (por pseudocistos ou coleções), são reco-nhecidos como sendo de alto risco para o desenvolvimento de fístulas, visto que a hipertensão ductal é mantida.

Uma vez reconhecidos os fatores de risco, devemos tentar atuar sobre os mesmos buscando reduzir a ocorrência de fístula e consequente morbidade e mortalidade dos pacientes. Uma das propostas é a do emprego de análogos da somatos-tatina em pacientes de alto risco. Com esta finalidade, Buchler et al.11 selecionaram 246 pacientes de 18 centros alemães. Considerando a consistência do pâncreas um fator de grande importância na incidência de fístulas, os autores estratificaram os pacientes em alto risco (parênquima macio) e baixo risco (parênquima fibroso). Diversas foram os procedimentos realizados: duodenopancreatectomia cefálica com ou sem preservação pilórica, pancreatojejunostomia, enucleações e outras. A incidência de fístulas pancreáticas em pacientes de alto risco (parênquima macio) foi significativamente reduzida com o uso da octreotida, embora em pacientes de baixo risco esse benefício não tenha sido observado.

Em outra análise, com 252 pacientes recrutados em 20 dife-rentes centros italianos, Pederzoli et al.12 avaliaram pacientes portadores de adenocarcinoma de pâncreas e pancrea-

QUADRO 1

Estudo Algumas das diferentes definição de fístula pancreática

Buchler et al 11

Concentração de amilase e lipase do líquido drenado > 3 vezes o valor sérico e com volume > 10mL/24h, por pelo menos três dias no pós-operatório

Pederzoli et al 12

Drenagem de líquido rico em amilase > 3 vezes o valor sérico e com volume > 10mL/24h, por mais de 4 dias, apartir do 4° dia pós-operatório

Montorsi et al 13

Concentração de amilase e lipase no líquido drenado > 3 vezes o valor sérico e com volume > 10mL/24h, por pelo menos três dias no pós-operatório

Lowy et al 15

Bioquímica: >2,5 vezes o valor da amilase sérica no líquido drenado após o 3° dia pós-operatório, sem sintomas e com resolução espontâneaClínica: >2,5 vezes o valor da amilase sérica no líquido drenado associado à febre, leucocitose, sepse ou necessidade de drenagem percutânea de coleção abdominal

Yeo et al 16

Concentração de amilase no líquido drenado > 3 vezes o valor sérico e com volume > 50mL/24h, após o 10° dia pós-operatório DPO, ou ruptura anastomótica demonstrada radiograficamente

ISGPF Bassi et al 2

Qualquer volume drenado a partir do terceiro dia, com nível de amilase superior a três vezes o nível sérico

Saar et al 3

Drenagem > 30mL/24h, a partir do 5º dia e com nível de amilase superior a cinco vezes o nível sérico

64

II Diretriz Brasileira em Pancreatite Crônica

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

tite crônica. Assim como Buchler et al., os pacientes foram estratificados de acordo com a consistência do parênquima pancreático. Os procedimentos realizados foram: pancreatec-tomia cefálica com ou sem preservação do piloro, pancrea-tojejunostomia, pancreatectomia corpo-caudal, pancreatec-tomia central e enucleações. Contrariamente ao estudo de Buchler, neste estudo, a incidência de fístulas foi significa-tivamente reduzida mas nos pacientes de baixo risco, e não houve benefício de seu emprego em pacientes de alto risco.

Contrapondo ainda aos dois estudos anteriores, em publi-cação oriunda de um centro único, com padronização da técnica de ressecção e da anastomose pancreto-jejunal e envolvendo apenas pacientes submetidos à duodenopan-createctomia cefálica, Yeo et al.16 analisaram 211 pacientes. Estes autores concluíram que o uso profilático da octreotida não reduziu a incidência de fístulas, sugerindo que o emprego desta deva ser abolido das cirurgias pancreáticas.

Como podemos ver, através da discrepância dos diferentes resultados publicados, o uso de análogos da somatostatina deve ser avaliado criteriosamente em cada caso ou obedecer ainda a protocolos específicos de cada instituição.

Outro grupo reconhecido com sendo de alto risco para desenvolvimento de fístulas pancreáticas são os portadores de pancreatite crônica submetidos a ressecções distais (corpo e cauda) ou a drenagem percutânea de pseudocistos ou coleções peri-pancreáticas. Nestes casos, o risco se associa especificamente ao aumento da pressão intra-ductal. A prevenção da fístula, nestes casos, pode ser feita através do posicionamento endoscópico de uma prótese endoscó-pica no ducto pancreático, associado ou não a um esfincte-rotomia. Tal procedimento levará a uma redução da pressão intra-ductal, reduzindo o risco de fístula após a intervenção sobre o pâncreas.

Quando não utilizadas profilaticamente, nestes pacientes com pressão ductal elevada, as próteses endoscópicas podem também ser utilizadas no tratamento de fístulas, em especial em casos de fístula com alto débito ou de fechamento tardio.

O tratamento das fístulas pancreáticas é em geral conser-vador. Fístulas direcionadas, não associadas a fatores obstru-tivos, tendem a evoluir bem, com fechamento espontâneo na enorme maioria dos casos. O emprego de antibióticos pode ser necessário, devendo ser avaliado caso a caso, levando em consideração aspectos clínicos do paciente. Em casos de coleções localizadas, podem ser necessários procedimentos de drenagem. Tal drenagem deverá ser feita preferencial-mente por via transcutânea, podendo, no entanto, ser dirigida

por ecoendoscopia nos casos em que uma janela adequada para a punção percutânea não possa ser obtido.

É importante obter uma drenagem ampla, independente-mente da via de acesso escolhida. Intervenções cirúrgicas (abertas ou laparoscópicas) podem ser necessárias em situa-ções especiais por sepse, hemorragia ou perfuração visceral, estando sempre associadas a um aumento significativo da mortalidade.

Como considerações finais, gostaria de ressaltar a impor-tância da prevenção das fístulas ou, em sua presença, do adequado tratamento das mesmas. Uma vez proposta uma intervenção sobre o pâncreas (propedêutica ou terapêu-tica) é de extrema importância uma avaliação detalhada de todas as particularidades de cada caso. É preciso uma análise detalhada das imagens, uma seleção adequada de materiais a serem empregados, um planejamento adequado e especí-fico para cada caso. Exige-se também refinamento técnico e extremo critério na execução dos procedimentos propostos.

Nas intervenções cirúrgicas, um especial cuidado deve ser com o tipo e posicionamento de drenos. A ocorrência de uma fístula direcionada, grau A, pouco altera a evolução do paciente. Fístulas não direcionadas que exigem intervenções invasivas, por sua vez, associam-se a elevada morbimortalidade.

Referências 1. Parr ZE, Sutherland FR, Bathe OF et al. Pancreatic fistulae:

are we making progress? J Hepatobiliary Pancreat Surg 2008;15(6):563-9.

2. Bassi C, Dervenis C, Buttunini G et al. Postoperative pancreatic fistula : an international study group (ISGPF) definition. Surgery 2005;138(1):8-13.

3. Reid-Lombardo KM, Farnell MB, Crippa S et al. Pancreatic anastomotic leakage after pancreaticoduodenetomy in 1.507 patients: a report from the Pancreatic Anastomotic Leak Study Group. J Gastrointest Surg 2007;11(11):14511-8.

4. Strasberg SM, Linehan DC, Clavien PA et al. Proposal for definition and severity grading of pancreatic anastomosis failure and pancreatic occlusion failure. Surgery 2007;141(4):420-6.

5. Barreto G, D´Souza MA, Shukla PJ et al. The gray zone between postpancreaticoduodenectomy collections and pancreatic fistula. Pancreas 2008;37(4):422-5.

6. Klempa I, Schwedes U, Usadel KH. Verhütung von postoperativen pankreatitischen Komplikationen nach Duodenopankreatektomie durch Somastostatin. Chirurg 1979;50:427–31

7. Reichlin S. Somatostatin (two parts). N Engl J Med 1983;309:1495–501, 1556–63.

8. Heintges T, Luthen R, Niederau C. Inhibition of exocrine pancreatic secretion by somatostatin and its analogues. Digestion 1994;55(suppl 1):1–9.

9. Kutz K, Nuesch E, Rosenthaler J. Pharmacokinetics of SMS 201-995 in healthy subjects. Scand J Gastroenterol 1986;21(suppl 119):65–72.

65

GED gastroenterol. endosc. dig. 2017: 36 (supl. 1):01-66

COD.

BRC

RE17

0347

ABR

IL/2

017

10. Sheppard M, Shapiro B, Pimstone B et al. Metabolic clearance and plasma half-disappearance time of exogenous somatostatin in man. J Clin Endocrinol Metab 1979;48:50–3.

11. Buchler M, Friess H, Klempa I et al. Role of octreotide in the prevention of postoperative complications following pancreatic resection. Am J Surg 1992;163:125-30.

12. �Pederzoli�P,�Bassi�C,�Falconi�M�et�al.�Efficacy�of�octreotide�in�the�prevention�of�complications�of�elective�pancreatic�surgery.�Br�J�Surg 1994;81:265-9.

13. �Montorsi�M,�Zago�M,�Mosca�F�et�al.�Efficacy�of�octreotide� in�the� prevention� of� pancreatic� fistula� after� elective� pancreatic�resections: a prospective, controlled, randomized clinical trial. Surgery�1995;117:�26-31

14. Friess H, Beger HG, Sulkowski U et al. Randomized controlled multicenter� study� of� the� prevention� of� complications� by�octreotide� in� patients� undergoing� surgery� for� chronic�pancreatitis. Br J Surg 1995; 82:1270-3

15. �Lowy�AM,� Lee� JE,� Pisters� PW�et� al.� Prospective,� randomized�trial� of� octreotide� to� prevent� pancreatic� fistula� after�

pancreaticoduodenectomy� for� malignant� disease.� Ann� Surg�1997;226:632-41.

16. �Yeo� CJ,� Cameron� JL,� Lillemoe� KD� et� al.� Does� prophylactic�octreotide� decrease� the� rates� of� pancreatic� fistula� and� other�complications� after� pancreaticoduodenectomy?� Results� of� a�prospective randomized placebo-controlled trial. Ann Surg 2000; 232:419-29.

17. Fuks D, Piessen G, Huet E et al. Life-threatening postoperative pancreatic� fistula� (grade�C)�after�pancreaticoduodenectomy� :�incidence,�prognosis�and�risk� factors.�Am�J�Surg�2008�(Epub�ahead�of�print)

18. �Butturini� G,� Daskalaki� D,� Molinari� E� et� al.� Pancreatic� fistula:�definition�and�current�problems.�J�Hepatobiliary�Pancreat�Surg�2008;15(3):247-51.

19. Stojadinovic A, Brooks A, Hoos A et al. An evidence-based approach to the surgical management of respectable pancreatic adenocarcinoma.�J�Am�Coll�Srug�2003;196(6):954.64.

20. Dindo D., Demartines N., Clavien P.A.; Ann Surg. 2004; 244: 931-937

Conduta na necrose da pancreatite crônica

Marcel c. c. Machado1

1. Professor Emérito FMUSP.

Necrose�pancreática�é�definida�como�presença�de�parên-quima não viável detectável pela TC ou RM com contraste. Não�é�uma�complicação�comum�na�PC,�apresentando-se�em, aproximadamente, 10% dos casos, de forma locali-zada�e�em�qualquer�estágio�da�doença,�mas�sempre�em�episódio�de�agudização.

Existem, ao menos, dois mecanismos de necrose pancreática�na�PC:�ativação�intrapancreática�de�enzimas�e�obstrução�dos�ductos�pancreáticos,�levando�à�elevação�da� pressão� intraductal,� redução� do� fluxo� sanguíneo,�isquemia e necrose.

As necroses na PC determinam uma série de complica-ções.�Nas�situações�de�necrose�focal,�seguida�de�fibrose�acometendo o ducto pancreático principal, pode-se seguir� dilatação� ductal,� hipertensão� intraparenquima-tosa, que pode resultar em novos focos de necrose pelos mecanismos anteriormente assinalados ou então uma progressiva� atrofia� e� disfunção� do� órgão.� Em� algumas�situações,� a� necrose� pode� evoluir� para� pseudocistos�pancreáticos�de�dimensões�variáveis�e�com�complicações�diversas anteriormente citadas.

Embora menos comum do que na pancreatite aguda, esse�tecido�inviável�pode�infectar-se�(necrose�infectada)�ou organizar-se e também se infectar. Ambos os casos merecem drenagem preferencialmente por procedimento endoscópico ou radiológico e, eventualmente, cirúrgico.

REFERÊNCIAS1. Bernardino AL, Guarita DR, Mott CB, Pedroso MR, Machado MC, Laudanna

AA, Tani CM, Almeida FL, Zatz M. CFTR, PRSS1 and SPINK1 mutations in the

development�of�pancreatitis�in�Brazilian�patients.�JOP.�Set�2003;�4(5):�169-77.

2. Blasbalg R, Baroni RH, Costa DN, Machado MC. MRI features of groove

pancreatitis.�Am.�J.�Roentgenol.�Jul�2007;�189(1):�73-80.

3. Cunha JEM, Bacchella T, Mott CB, Machado MC. Management of pancreatic

pseudocysts�in�chronic�alcoholic�pancreatitis�with�duct�dilatation.�Int.�Surg.�an-

mar�1985;�70(1):�53-6.

4. Cunha JEM, Bacchella T, Mott CB, Jukemura J, Abdo EE, Machado MC.

Surgical�treatment�of�biliary�complications�from�calcifying�chronic�pancreatitis.�

Int.�Surg.�Abr-jun�1984;�69(2):�149-54.

5. Cunha RM, Mott CB, Guarita DR, Pedroso MR, Jukemura J, Bacchela T,

Cunha JE, Machado MC, Laudanna AA. Complications of chronic pancreatitis

in�São�Paulo�(Brazil).�Rev.�Hosp.�Clin.�Fac.�Med.�São�Paulo.�Nov-dez�1997;�

52(6):�306-15.

6. Machado MC, Cunha JEM, Bacchella T, Mott CB, Duarte I, Bettarello A. Acute

pancreatic necrosis in chronic alcoholic pancreatitis. Dig. Dis. Sci. Ago 1984;

298: 709-13.

7. Machado MC, Cunha JEM, Bacchella T, Penteado S, Jukemura J, Abdo EE,

Montagnini� AL.� Pylorus-preserving� pancreatoduodenectomy� associated�

with�longitudinal�pancreatojejunostomy�for�treatment�of�chronic�pancreatitis.�

Hepatogastroenterology.�Jan-fev�2003;�50(49):�267-8.

8. Machado MC, Cunha JEM, Bacchella T, Penteado S, Jukemura J, Mott CB,

Pinotti�HW.�Surgical�treatment�of�ascites�and�pleural�effusion�in�patients�with�

chronic pancreatitis. Rev. Hosp. Clin. Fac. Med. São Paulo. Set-out 1989;

44(5):�237-43.

66