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Revista Brasileira de Geografia Física v.6 n.4 (2013) 1356-1370 Santos, T. S.; Silva, A. R.; Gomes, A. C. S.; Coutinho, M. D. L.; Castro, A. A 1356 ISSN:1984-2295 Revista Brasileira de Geografia Física Homepage: www.ufpe.br/rbgfe Análise de Eventos Extremos na Região Amazônica Thalyta Soares dos Santos¹, Ana Carla dos Santos Gomes 2 , Maytê Duarte Leal Coutinho 3 , Allan Rodrigues Silva 4 , Aline Anderson de Castro 5 1 Doutoranda em Ciências Climáticas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte, Brasil, [email protected]. 2 Doutoranda em Ciências Climáticas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte, Brasil, [email protected]. 3 Doutoranda em Ciências Climáticas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte, Brasil, [email protected]. 4 Doutoranda em Ciências Climáticas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte, Brasil, [email protected]. 5 Doutoranda em Ciência do Sistema Terrestre do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial, São José dos Campos, São Paulo, [email protected]. Artigo recebido em 31/07/2013 e aceito em 05/08/2013 R E S U M O A frequência de eventos severos e extremos de seca e chuva na Amazônia foi analisada utilizando o Índice de Precipitação Normalizada (SPI) nas escalas de 6 (sazonal estação seca/chuvosa) e 12 meses (interanual). A frequência de eventos secos e chuvosos é importante para a climatologia da região, que é considerada um regulador climático global. Para isso foram selecionadas as séries climatológicas, de 1925 a 2000, de seis localidades da região Amazônica: Belém, Cuiabá, Iauretê, Manaus, Porto Velho, Taguatinga. Os SPIs, 6 e 12, que quantificam excesso ou déficit de chuva, nestas duas escalas de tempo, foram calculados a partir dos ajustes de distribuição gama, pelo método da máxima verossimilhança às médias móveis de 6 e 12 meses das precipitações mensais. Esses foram computados a partir da normalização das probabilidades gama, pelos seus respectivos desvios padrões. As séries temporais dos SPIs 6 e 12, mostram longos períodos de oscilação entre eventos secos e chuvosos. A frequência decenal de ambos SPIs indica variações entre as décadas mais chuvosas e secas nos municípios estudados. As décadas mais chuvosas e secas são periódicas para as duas escalas de tempo analisadas em todas as estações, exceto Iauretê. Palavras-Chave: SPI, Amazônia, Seca, Chuva Analysis of Extreme Events in the Amazon Region A B S T R A C T The frequency of severe and extremes events of drought and rainfall in the Amazon was analyzed using the Standardized Precipitation Index (SPI) in the scales of six months (dry/wet seasons) and 12 months (inter-annual). This is important for the climatology of the region, which is considered a global climate regulator. With this objective, the climatological series from 1925 to 2000 were selected for six locations in the Amazon region: Belém, Cuiabá, Iauretê, Manaus, Porto Velho and Taguatinga. With the aim of quantify the excess or deficit of rainfall in the selected time scales, the SPIs 6 and 12 were calculated using the fit of the gamma distribution by the maximum likelihood method for the moving averages 6 and 12 months of monthly precipitation. These were computed from the normalization of gamma probabilities by its standard deviation. The time series of SPIs 6 and 12, show long periods of oscillation between dry and wet events. The frequency of both SPIs indicates variations between wet and dry decades in the cities studied. Wetter and drier decades were shown to be periodic for the two time scales considered in all locations, except for Iauretê. Key-Words: SPI, Amazon, Drought, Rain * E-mail para correspondência: [email protected] (Soares, T. S.).

influência neotectônica identificada atráves de dados morfométricos

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Revista Brasileira de Geografia Física v.6 n.4 (2013) 1356-1370

Santos, T. S.; Silva, A. R.; Gomes, A. C. S.; Coutinho, M. D. L.; Castro, A. A 1356

ISSN:1984-2295

Revista Brasileira de

Geografia Física

Homepage: www.ufpe.br/rbgfe

Análise de Eventos Extremos na Região Amazônica

Thalyta Soares dos Santos¹, Ana Carla dos Santos Gomes2, Maytê Duarte Leal Coutinho

3, Allan

Rodrigues Silva4, Aline Anderson de Castro

5

1

Doutoranda em Ciências Climáticas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte,

Brasil, [email protected]. 2 Doutoranda em Ciências Climáticas da Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, Natal, Rio Grande do Norte, Brasil, [email protected]. 3

Doutoranda em Ciências Climáticas da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte, Brasil, [email protected]. 4

Doutoranda em Ciências Climáticas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte,

Brasil, [email protected]. 5Doutoranda em Ciência do Sistema Terrestre do Instituto Nacional de Pesquisa

Espacial, São José dos Campos, São Paulo, [email protected].

Artigo recebido em 31/07/2013 e aceito em 05/08/2013

R E S U M O

A frequência de eventos severos e extremos de seca e chuva na Amazônia foi analisada utilizando o Índice de

Precipitação Normalizada (SPI) nas escalas de 6 (sazonal estação seca/chuvosa) e 12 meses (interanual). A frequência

de eventos secos e chuvosos é importante para a climatologia da região, que é considerada um regulador climático

global. Para isso foram selecionadas as séries climatológicas, de 1925 a 2000, de seis localidades da região Amazônica:

Belém, Cuiabá, Iauretê, Manaus, Porto Velho, Taguatinga. Os SPIs, 6 e 12, que quantificam excesso ou déficit de

chuva, nestas duas escalas de tempo, foram calculados a partir dos ajustes de distribuição gama, pelo método da

máxima verossimilhança às médias móveis de 6 e 12 meses das precipitações mensais. Esses foram computados a partir

da normalização das probabilidades gama, pelos seus respectivos desvios padrões. As séries temporais dos SPIs 6 e 12,

mostram longos períodos de oscilação entre eventos secos e chuvosos. A frequência decenal de ambos SPIs indica

variações entre as décadas mais chuvosas e secas nos municípios estudados. As décadas mais chuvosas e secas são

periódicas para as duas escalas de tempo analisadas em todas as estações, exceto Iauretê.

Palavras-Chave: SPI, Amazônia, Seca, Chuva

Analysis of Extreme Events in the Amazon Region

A B S T R A C T

The frequency of severe and extremes events of drought and rainfall in the Amazon was analyzed using the

Standardized Precipitation Index (SPI) in the scales of six months (dry/wet seasons) and 12 months (inter-annual). This

is important for the climatology of the region, which is considered a global climate regulator. With this objective, the

climatological series from 1925 to 2000 were selected for six locations in the Amazon region: Belém, Cuiabá, Iauretê,

Manaus, Porto Velho and Taguatinga. With the aim of quantify the excess or deficit of rainfall in the selected time

scales, the SPIs 6 and 12 were calculated using the fit of the gamma distribution by the maximum likelihood method for

the moving averages 6 and 12 months of monthly precipitation. These were computed from the normalization of gamma

probabilities by its standard deviation. The time series of SPIs 6 and 12, show long periods of oscillation between dry

and wet events. The frequency of both SPIs indicates variations between wet and dry decades in the cities

studied. Wetter and drier decades were shown to be periodic for the two time scales considered in all locations, except

for Iauretê.

Key-Words: SPI, Amazon, Drought, Rain

* E-mail para correspondência:

[email protected] (Soares, T. S.).

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Santos, T. S.; Silva, A. R.; Gomes, A. C. S.; Coutinho, M. D. L.; Castro, A. A 1357

Introdução

Na região Norte do Brasil diversos

trabalhos mostram que existem diferenças

significativas na distribuição temporal,

espacial e na natureza das precipitações.

Marengo e Nobre (2009) afirmam que nesta

região, onde se situa a floresta amazônica,

observa-se um clima equatorial chuvoso,

praticamente sem estação seca. Ainda

segundo esses autores, esta região apresenta

significativa heterogeneidade espacial e

sazonal da pluviosidade, sendo a região com

maior total pluviométrico anual. Dessa forma,

o conhecimento conciso da distribuição

espaço-temporal da precipitação é de extrema

importância para o entendimento dos sistemas

locais, de meso e grande escala que atingem a

região, contribuindo então para a evolução do

clima e da sustentabilidade dos seus

ecossistemas como um todo.

Dessa forma, o estudo da distribuição,

quantidade e monitoramento das

precipitações, têm sido estudadas em diversas

pesquisas. Para isso são utilizados modelos

estatísticos e também índices de precipitação

como: o de Severidade de Secas (Palmer

Drought Severity Index, PDSI), o de

Anomalia de Precipitação (Rainfall Anomaly

Index, RAI), o de Precipitação Normalizada

("Standardized Precipitation Index, SPI),

dentre outros.

O índice de precipitação normalizada

(SPI) foi proposto por Mckee et al.(1993)

para quantificar o déficit de precipitação nas

diversas escalas de tempo, e comparar regiões

com diferentes características climáticas,

podendo também ser utilizado para

excedentes de precipitação. Esse índice pode

ser calculado em diversas escalas de tempo (1,

2, 3, 6, 12, 24, ... meses). Apesar de sua

origem na América do Norte, a utilização

desse índice se encontra em expansão por

todo mundo. No Brasil, o SPI é um dos

métodos preconizados pelo Instituto Nacional

de Meteorologia (INMET) para caracterizar

anomalias de precipitação. Desde janeiro de

2002 o SPI vem sendo calculado para todo

país e, recentemente, esses resultados têm

sido disponibilizados para o público em forma

de mapas.

O SPI é considerado um dos melhores

índices para avaliar eventos severos e

extremos de seca e de chuva nas diversas

escalas de tempo para fins climatológicos e de

monitoramento. De maneira geral o SPI é

simplesmente a diferença normalizada de uma

média móvel das precipitações numa escala

de tempo (3, 6, 12 meses) em relação à

climatologia deste mesmo período. Esse

índice tem como base o ajuste de séries de

precipitação à distribuição gama incompleta.

Alguns pesquisadores afirmam que o

Brasil é vulnerável às mudanças climáticas

atuais e mais ainda às que se projetam para o

futuro, especialmente quanto aos extremos

climáticos. As áreas mais vulneráveis

compreendem a Amazônia e o Nordeste do

Brasil, como mostrado em estudos recentes

(Marengo, 2007; Ambrizzi et al., 2007;

Marengo et al., 2007). O conhecimento sobre

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Santos, T. S.; Silva, A. R.; Gomes, A. C. S.; Coutinho, M. D. L.; Castro, A. A 1358

possíveis cenários climático-hidrológicos

futuros e as suas incertezas pode ajudar a

estimar demandas de água no futuro e

também a definir políticas ambientais de uso e

gerenciamento de água para o futuro.

De acordo com Marengo (2004) para a

Amazônia não se observa uma tendência clara

de aumento ou redução nas chuvas (em razão

do desmatamento), apresentando mais uma

tendência de variações interdecadais

contrastantes entre a Amazônia do Norte e do

Sul.

Li et al. (2006), usando resultados de

diversos modelos climáticos globais do

Intergovernmental Panel on Climate Change

Fourth Assessment Report (IPPC AR4)

preveem diferentes padrões da precipitação na

Amazônia sob a influência do cenário SRES

A1B (caracterizado rápido crescimento

econômico mundial) para a mudança

climática global. Cinco de onze modelos

estudados preveem um aumento da

precipitação anual, três modelos preveem um

decréscimo na precipitação e os outros três

não indicam padrão significativo de mudança

da precipitação na Amazônia.

Segundo Marengo e Nobre (2009)

pesquisas recentes das tendências climáticas

na Amazônia não demonstram tendências

unidirecionais em grande escala na chuva.

Esses autores afirmam ainda que segundo

análises observacionais, ainda não foram

notadas tendências de redução na precipitação

na região, e são mais notórias as tendências

interanuais e interdecenais típicas da

variabilidade do clima. Cox et al. (2008)

ainda afirma que as chances de ocorrerem

períodos de intensa seca na região da

Amazônia podem aumentar dos atuais 5%

(uma forte estiagem a cada vinte anos) para

50% em 2030 e até 90% em 2100.

As projeções de clima futuro,

liberadas pelo Quarto Relatório do IPCC AR4

(IPCC, 2007 a, b), e pelo Relatório de Clima

do INPE (Marengo et al., 2007 a e b;

Ambrizzi et al., 2007) têm mostrado cenários

de secas e eventos extremos de chuva em

algumas regiões do Brasil. Esses relatórios

apontam que uma região bastante vulnerável,

do ponto de vista social à mudança de clima,

seria o interior de Nordeste, conhecida como

semi-árido, ou simplesmente o sertão.

Reduções de chuva aparecem na maioria dos

modelos globais do IPCC AR4. Isso acarreta

reduções de até 15-20% nas vazões do rio São

Francisco.

Dessa forma, o objetivo deste trabalho é

avaliar o comportamento decenal dos eventos

severos e extremos de seca e chuva na região

Amazônica.

Material e Métodos

O estudo será realizado para as regiões

Norte do Brasil. A escolha destas regiões

deve-se ao fato que a região Norte inclui a

maior extensão de floresta tropical da Terra,

superior a 5 milhões de quilômetros

quadrados, e responde por aproximadamente

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um quarto das espécies animais e vegetais do

planeta. A região Amazônica desempenha um

importante papel no clima global, e a floresta

amazônica é considerada um importante

regulador dos balanços de energia e hídrico,

pode influenciar a circulação atmosférica e a

precipitação regional (Marengo e Nobre,

2009).

Figura 1 - Localização das estações na região Amazônica, utilizadas no estudo.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Neste trabalho foram utilizados séries

de dados climatológicas mensais de 6

estações meteorológicas do Instituto Nacional

de Meteorologia (INMet) na Amazônia, no

período de 1925 a 2000, para realizar o

cálculo do SPI nas escalas de tempo 1, 3, 6 e

12 meses (SPI-1,SPI-3, SPI-6 e SPI-12). As

localidades selecionadas no estudo estão bem

distribuídas ao longo da região Amazônica

possuem diferentes características climáticas,

e são identificadas na figura 1 e detalhadas na

tabela 1.

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Tabela 1 – Localização das estações meteorológicas.

Estação Latitude Longitude Altitude

Belém – PA 1027’ S 48

028’ W 24 m

Cuiabá 15033’S 56

007’ W 151 m

Iauretê 0037’ N 69°12’ W 120 m

Manaus – AM 3008’ S 60

001’ W 72 m

Porto Velho 08046’ S 63

055’ W 95 m

Taguatinga 12024’ S 46

026’ W 604 m

Foram selecionadas as escalas de

tempo do SPI de 3, 6 e 12 meses, para as

quais é construído médias móveis das séries

temporais de SPI semestral (SPI-6) e anual

(SPI-12) centrada nos 12 meses do ano. A

escala semestral do SPI representa os eventos

de média duração; É importante para

monitoramento do período de transição entre

estação seca e a chuvosa. O SPI anual reflete

padrões de precipitação de longo prazo; É

uma importante ferramenta para monitorar a

variabilidade anual e interanual.

A escolha da escala temporal usada

para o cálculo do índice relaciona-se com o

tempo necessário para que os efeitos para que

os eventos de seca e de chuva se façam sentir

sobre os diferentes setores de atividade e

sobre os recursos hídricos em geral. Deste

modo, escalas de tempo mais curtas ou mais

longas refletem diferentes tempos de resposta

dos recursos hídricos às anomalias de

precipitação. À medida que a escala temporal

aumenta, o SPI responde mais lentamente a

mudanças na precipitação (McKee et al.,

1993).

De maneira geral, o SPI denota

quantidade de precipitação para uma dada

escala de tempo, dando a indicação da relação

dessa quantidade com uma distribuição

normal, indicando então se vai ocorrer um

período seco ou chuvoso. De acordo com

McKee et al. (1993) a série histórica é

ajustada a uma distribuição de probabilidade

gama (pelo método da máxima

verossimilhança neste estudo), a qual é então

transformada em uma distribuição normal.

Como as precipitações têm uma distribuição

assimétrica, a distribuição gama, é geralmente

utilizada para representar a distribuição

teórica para essa variável. Vários estudos

mostram que a distribuição gama descreve

adequadamente o comportamento das chuvas,

dentre os quais podem ser citados os de Thom

(1958), Castro (1996) e Cunha et al. (1997).

De acordo com Wilks (1990), a popularidade

da distribuição gama para descrever dados de

precipitação se deve do fato de que ela

fornece uma representação flexível

envolvendo apenas dois parâmetros (forma e

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escala), daí ser amplamente utilizada em

climatologia de precipitação.

Os parâmetros de forma (alfa) e escala

(beta) são estimados para cada ponto de

grade, para cada mês do ano e para cada

escala temporal (3, 6 e 12 meses).

A distribuição gama de probabilidade

tem como função densidade ( ), McKee et

al., 1993:

( )

( ) para x>0

na qual:

= parâmetro de forma da distribuição

gama (simetria e achatamento dos dados)

= parâmetro de escala da distribuição

gama (dispersão)

= quantidade de precipitação para o mês

de interesse (mm)

( ) = função gama completa

Os parâmetros e da distribuição

gama para uma dada variável aleatória ( )

foram inicialmente estimados pelo método da

máxima verossimilhança conforme Thom

(1958), por:

( √

)

Na qual:

( ) ∑

Como a distribuição gama é indefinida

pra , deve-se corrigi-la para as não

ocorrências de chuva ( ) ,

McKee et al., (1993):

( ) ( ) ( )

na qual:

= probabilidade de ocorrência de

precipitação zero

= número de observações com chuva igual

a zero

= número total de observações

A conversão equiprobabilística de uma

variável ( ) gama distribuída numa normal

(SPI) pode ser feita simplesmente usando a

média ( ) e o desvio padrão da gama

( √ ) na variável reduzida da normal

( ) .

Na qual:

= 3, 6, 12 meses

Os SPIs para cada mês foram obtidos

como os desvios normalizados pela média e

desvio padrão da distribuição gama. Os SPIs

mensais, nas escalas de tempo de (6 e 12

meses) foram classificados segundo McKee

(1993), e a cada valor de precipitação

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corresponde um valor de SPI, como mostrado

na tabela 2.

Tabela 2- Classificação do SPI segundo McKee et al. (1993)

Valores do SPI Categoria Probabilidade

> 2 Chuva extrema 2,3%

1,5 a 1,99 Chuva severa 4,4%

1,0 a 1,49 Chuva moderada 9,2%

-0,99 a 0,99 Normal 68,2%

-1,0 a -1,49 Seca moderada 9,2%

-1,5 a -1,99 Seca severa 4,4%

< -2 Seca extrema 2,3%

Resultados e Discussão

O número de casos dos eventos

severos e extremos de seca e chuva pelo SPI-

6 e 12, no período das décadas de 30 a 90 é

apresentado na tabela 3 e, de maneira geral, os

eventos severos e extremos de chuva

mostraram-se mais frequentes tanto para 6

quanto para 12 meses em Cuiabá e

Taguatinga, enquanto os eventos secos foram

superiores aos chuvosos apenas em Belém. O

número de casos em Iauretê e Porto Velho

diferem apenas para o SPI-12, onde

prevalecem eventos chuvosos e secos,

respectivamente. Em Manaus é possível

verificar a predominância de chuva no SPI-6 e

no SPI-12, apesar da pouca diferença, eventos

de seca.

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Tabela 3 – Número de casos de eventos severos e extremos de chuva e seca para o SPI-6 e SPI-12

nas 6 localidades consideradas entre 1925 e 2000.

SPI-6 SPI-12

Chuva Seca Chuva Seca

BELÉM 54 63 40 60

CUIABÁ 69 45 76 56

IAUARETÊ 63 63 70 50

MANAUS 62 53 49 52

PORTO VELHO 48 49 43 59

TAGUATINGA 61 33 58 54

A frequência percentual decenal dos

eventos severos e extremos de chuva e seca

pelo SPI-6 são mostradas na figura 2 (a e b).

Em relação aos eventos severos e extremos de

precipitação nota-se que na década de 70

esses representaram uma maior porcentagem

em todas as localidades quando comparados

aos eventos de seca. Para Cuiabá é possível

verificar nas primeiras 3 décadas consideradas

uma baixa frequência de eventos tanto de seca

quanto de chuva, situação que muda na

década de 60, que apresenta apenas eventos

de seca (cerca de 20%, pouco mais do dobro

do que era observado) e nas ultimas 3 décadas

os eventos chuvosos cresceram gradualmente,

enquanto os de seca só voltaram apresentar

resultados relevantes em 90. Iauretê apresenta

uma grande porcentagem de eventos de chuva

entre 40 e 70, enquanto nas 2 últimas décadas

consideradas são observados apenas eventos

severos e extremos de seca que chegam a

atingir 40% do total; Em Taguatinga a

ocorrência mais relevante encontra-se nas

ultimas 3 décadas analisadas, quando a

frequência dos SPIs passam de cerca de 30%

de chuva nos anos 70 para 20% de seca em

90, apresentando um mínimo (menos de 5%)

na década de 80, para ambos os casos. A

década mais chuvosa e seca nas estações de

Belém foram respectivamente 80 e 60,

Manaus 80 e 50 e Porto Velho 70 e 30, nessas

estações não foram observadas características

predominantes com o passar das décadas.

Na figura 2 (c e d) é apresentada a

frequência percentual decenal dos eventos

severos e extremos de chuva e seca pelo SPI-

12, e é notável que os padrões se mantém

quando comparados aos resultados

apresentados pelo SPI-6. As variações

ocorrem apenas nos valores das frequências.

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Figura 2 - Frequência percentual decenal de eventos severos e extremos: SPI-6 de chuva (A) e seca

(B); SPI-12 de chuva (C) e seca (D).

Na tabela 4 observam-se as

características (início, fim, duração e SPI

médio) dos principais eventos severos e

extremos secos e chuvosos pelo SPI-12, para

as seis estações do estudo, entre 1925 e 2000,

para eventos que persistiram por 6 meses ou

mais. Todos os eventos observados no SPI-6

estão embutidos no SPI-12. Foram observadas

seqüências de eventos severos e extremos de

seca e de chuva em todas as estações, exceto

em Manaus, que não ocorreu persistência de

seca. As sequências mais chuvosas duraram

13 meses e ocorreram em: Belém, Taguatinga

e Iauretê. Em Belém este período chuvoso

coincidiu com a forte La Nina em 1988-1989,

que também pode ter influenciado um período

de 10 meses chuvosos em Manaus. A mais

longa seca durou 14 meses, em Iauretê (de

maio 1990 a junho 1991), quando

simultaneamente houve a ocorrência de um El

Niño de forte intensidade (1990 a 1993). Este

resultado corrobora os de Cotrim et al. (2000)

que observou que eventos de El Niño no

Oceano Pacífico parecem diminuir os totais

pluviométricos na Amazônia, enquanto nos de

La Niña se observam anomalias positivas de

precipitação.

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Tabela 4 - Características dos principais eventos extremos de chuva e de seca, na região de estudo.

Sequências Chuvosas pelo SPI-12 Sequências de Secas pelo SPI-12

Início Fim Duração

(meses)

SPI

médio

Início Fim Duração

(meses)

SPI

médio

BELÉM

Ago1962 Mai 1963 10 3,2 Ago 1966 Abr 1967 9 -2,3

Jul 1987 Jul 1988 13 2,4

CUIABÁ

Nov 1944 Mai 1945 7 2,2 Mai 1993 Nov 1993 8 -2,4

Set 1998 Jun 1999 10 2,4

IAUARETÊ

Dez 1960 Mai 1961 6 2,5 Mai 1990 Jun 1991 14 -2,4

Ago 1969 Ago 1970 13 3

Dez 1973 Mai 1974 6 2,2

Nov 1974 Jun 1975 8 2,2

MANAUS Nov 1987 Ago 1988 10 2,8

PORTO

VELHO

Nov 1974 Ago 1975 10 3,1 Out 1940 Abr 1941 6 -2,5

Set 1986 Fev 1987 6 -2,1

Out 1987 Ago 1988 11 -2,9

TAGUATINGA

Nov 1944 Jun 1945 8 2,2 Jul 1999 Mar 2000 9 -2,1

Jun 1978 Jun 1979 13 2,3

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Na Figura 3 encontram-se as séries

temporais do SPI-6 e 12 e suas médias móveis

de 60 meses para as 6 localidades

consideradas. Nota-se que para todos os casos

apesar da similaridade dos eventos, a

amplitude apresentada pelo SPI-12 é menor

que os apresentados pelo SPI-6, já que à

medida que a escala de tempo aumenta o SPI

responde mais lentamente às variações na

precipitação. De acordo com McKee (1993)

quando o período é curto (3 ou 6 meses), o

SPI se move freqüentemente próximo ao zero;

Quando a escala de tempo é maior (12, 24 ou

48 meses), o SPI responde mais lentamente as

mudanças na precipitação e os períodos com

SPI negativo ou positivo se tornam menores,

mas aumenta a duração dos eventos.

Os maiores valores de SPI positivo

foram observados para Belém e Iauretê, em

1962 e 1970, respectivamente; Nas duas

localidades verificou-se SPI-6 iguais a 5 e o

SPI-12 de 3,4. Para SPI negativo o menor

valor foi em Porto Velho (3,8) tanto para o

SPI-6 como para o SPI-12 em 1988. Em

Iauretê também nota-se, através das médias

móveis, longos períodos de SPI positivo e

negativo. Cuiabá apresenta em geral valores

próximos de zero, exceto na década de 60

(negativo) e a partir do fim da década de 80

quando passa a ser predominantemente

positivo. Em Taguatinga, a partir da década

de 70, ocorre um aumento no comprimento de

onda da oscilação, passando 15 anos (1940

até 1955 e 1955 até 1970) para cerca de 30

anos (1970 a 2000). Não foi observado

nenhum padrão de oscilação em Belém,

Manaus e Porto Velho. Todos esses resultados

corroboram com os observados nas

frequências de SPI (figura 2).

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Figura 3- Séries temporais dos SPI-6 e SPI-12 e suas e médias móveis de 60 meses para Belém (A),

Cuiabá (B), Iauaretê (C), Manaus (D), Porto Velho (E) e Taguatinga (F).

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Conclusões

Este trabalho teve como objetivo

realizar uma análise anual e sazonal regional

das frequências e intensidades de eventos

severos e extremos de seca e de chuva usando

os SPIs de 6 e 12 meses. Conclui-se que o SPI

é uma ferramenta muito útil para avaliar a

variabilidade espacial das frequências e

intensidades dos diferentes eventos de seca e

chuva em diversas escalas de tempo, além de

suas principais características.

As frequências decenais do SPI 6 e 12

concordam entre si na maioria dos casos,

indicando variações entre as décadas mais

chuvosas e secas nos municípios estudados.

As décadas mais chuvosas e secas foram

respectivamente, em Belém 80 e 60, em

Cuiabá 90 e 60, em Manaus 80 e 30, em Porto

Velho 70 e 80 e em Taguatinga 70 e 90. Em

Iauretê a década mais chuvosa de acordo com

o SPI-6 é a de 60, enquanto pelo SPI-12 foi a

de 70, e a mais seca a de 90. Foram

observados eventos com precipitação extrema

com duração superior a 10 meses em todas as

estações, e eventos com mais de 1 ano em

Belém, Iauretê e Taguatinga. E uma seqüência

de mais de 1 ano de seca em Iauretê. De

maneira geral, as estações localizadas na

região Norte sofrem a influência de La Ninã

para eventos chuvosos, e de El Niño para

eventos secos. As séries temporais dos SPIs 6

e 12 mostram longos períodos de oscilação

entre eventos secos e chuvosos, sem

tendências lineares significativas para Belém,

Manaus, Cuiabá e Porto Velho. Em Iauretê e

Taguatinga as médias móveis de 60 meses

mostram uma maior frequência de eventos

secos.

Agradecimentos

Os autores deste trabalho agradecem a

Fundação de Amparo a Ciência do Estado de

Pernambuco (FACEPE) pelo apoio financeiro

aos estudos e ao LAMEPE pela

disponibilização dos pluviométricos.

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