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UNIJUÍ- UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL
JEAN PATRICK JORIS
INFOGRÁFICOS SUPERINTERESSANTES:
UMA PROPOSTA CONTEMPORÂNEA PARA
O JORNALISMO INFORMATIVO
Ijuí
2010
2
JEAN PATRICK JORIS
INFOGRÁFICOS SUPERINTERESSANTES:
UMA PROPOSTA CONTEMPORÂNEA PARA
O JORNALISMO INFORMATIVO
Monografia apresentada ao Curso de
Comunicação Social – Habilitação
Jornalismo da Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul,
como requisito parcial para a obtenção do
grau de Bacharel em Comunicação Social.
Orientadora: Vera Lucia Spacil Raddatz
Ijuí
2010
3
TERMO DE APROVAÇÃO
UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO JORNALISMO
A COMISSÃO EXAMINADORA, ABAIXO ASSINADA, APROVA A MONOGRAFIA
INFOGRÁFICOS SUPERINTERESSANTES: UMA PROPOSTA CONTEMPORÂNEA
PARA O JORNALISMO INFORMATIVO
ELABORADA POR
JEAN PATRICK JORIS
COMO REQUISITO PARCIAL PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE BACHAREL EM
COMUNICAÇÃO SOCIAL
COMISSÃO EXAMINADORA
PROFª. DRª VERA LUCIA SPACIL RADDATZ - ORIENTADORA
PROF. MS. MARCIO GRANEZ – BANCA
PROFª. MS. ROSANA DA SILVA BERWANGER - SUPLENTE
5
RESUMO
Comunicar é intrínseco à humanidade. Foi graças ao contínuo desenvolvimento de códigos
lingüísticos que culturas se estabeleceram, sociedades se desenvolveram e identidades se
consolidaram ao longo dos séculos. Sempre organizada a partir de grupos socioculturais, é
pela comunicação que se dá o fluxo de toda a sorte de informações entre os sujeitos.
Todavia, instaurada a pós-modernidade a partir de meados do século XIX, fruto de
revoluções sociais e industriais, os valores culturais que norteavam o indivíduo foram
desestruturados. Sua identidade, então, fragmentou-se, inspirada em inúmeras referências
desconexas de diferentes manifestações artístico-culturais. Isso se refletiu diretamente na
comunicação que, industrializada, teve sua produção deslocada do sujeito para a indústria.
Assim, novas formas passaram a discutir as mensagens e transitar entre diferentes estilos,
buscando efetivar estratégias de sucesso para atingir os receptores. Aliados tanto às práticas
de comunicação como de design, os infográficos figuram como uma opção diferenciada,
somando mensagens visuais e textuais em um único meio e elencando a elas igual
importância, fomentando novas práticas do consumo comunicacional, mais abertas à
construção coletiva de conteúdos e significados.
Palavras-chave: Cultura, Pós-modernidade, Jornalismo, Infografia.
6
ABSTRACT
Communicating is a part of humanity. Is by the development of linguistic codes that cultures
were established, societies developed and identities have been consolidated over the
centuries. Always organized into socio-cultural groups, its’ trough communication that all
sorts of information flow between people. However, established post-modernity from the
mid-nineteenth century, resulting from social and industrial revolutions, cultural values that
shaped people were unstructured. The identity, then, has become fragmented, disjointed
inspired numerous references to different artistic and cultural expressions. This was reflected
in the communication, which turns shifted into industrialized production. Thus, new forms
began to discuss the messages and move it between different styles, looking forward to
accomplish successful strategies to get to the receivers. Allied, communication and design
suggested infographics as a unique option, adding visual and textual messages in a single
work and casting them equal importance, improving new communication consumption
practices, openly to collective creation of content and meaning .
Keywords: Culture, Post-modernity, Journalism, Infography.
7
LISTA DE FIGURAS
1. Figura 01: Infográfico “Códigos do além” .................................................................... 35
2. Figura 02: Infográfico “Grandes navegações” ................................................................ 37
3. Figura 03: Infográfico “A mansão do terror” ................................................................ 39
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 09
1. FRAGMENTO ........................................................................................................... 11
1.1. Modernidade, pós-modernidade e o sujeito ................................................... 12
1.2. Cultura das mídias: um produto pós-moderno de comunicação ................... 15
1.3. O delírio da cultura de massa ........................................................................ 18
2. ARTE ......................................................................................................................... 20
2.1. Alfabetismo visual: arte, design e gestalt ...................................................... 21
2.2. Infografia: informação e estética ................................................................... 25
2.3. A contribuição do design gráfico .................................................................. 27
3. CONTEÚDO .............................................................................................................. 30
3.1. Superinteressante: uma revista conceito ........................................................ 32
3.2. Infográficos “superinteressantes” .................................................................. 34
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 42
REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 44
ANEXOS ....................................................................................................................... 46
9
INTRODUÇÃO
É por meio da comunicação que a linguagem se consolida e opera práticas sociais
que identificam indivíduos e grupos culturais. Desde os tempos primitivos, processos
lingüísticos se difundem pelo do compartilhamento de signos comuns, democratizando
saberes e colaborando de maneira fundamental para a perpetuação do conhecimento
humano.
Foi justamente pelo seu poder de abstrair conceitos, resumi-los em códigos e
transmiti-los entre seus círculos sociais que o homem mostrou-se capaz de promover
revoluções significativas para a história mundial. A revolução industrial, por exemplo,
representou um divisor de águas entre organizações comunitárias tradicionais e novas
nações efervescentes, ansiosas pela modernidade. Nesse contexto, cultura, comunicação e
uma série de valores intrínsecos à constituição de identidade do sujeito tiveram seus
processos de produção industrializados e passaram a servir não mais como suporte exclusivo
para emancipação cultural e identificação de grupos sociais, mas ganharam conotação
reificada e, com intensidade, tornaram-se um produto da indústria cultural.
Foi automático que novas formas, meios e metodologias passassem a operar. O
conhecimento se disseminou, mas sempre controlado por instituições de poder maior. Até o
advento da pós-modernidade, quando, em meados do século XIX, o homem contemporâneo
percebeu que a consequência dos processos até então predominantes acabara fomentando a
fragmentação das identidades e corroborava com a massificação de produtos e veículos de
mídia. Naturalmente, tal homem passou a procurar por diferentes atributos que lhe
ajudassem a reorganizar sua percepção de mundo e oferecessem conhecimento e
informações diferenciadas para seu crescimento intelectual.
Atenta à dinâmica do consumo de massa, a mídia produziu novas abordagens,
desenvolveu estilos e propôs formatos que explorassem mensagens em que textual e visual
se complementassem. De fato, o público pós-moderno participa cada vez mais ativamente do
10
processo de comunicação e seu conhecimento, ainda que fragmentado, é maior. A proposta
que nasceu daí foi uma produção que falasse a esse novo perfil de identidades, onde a
importância estética se assemelhasse ao desenvolvimento de conteúdo e a opinião do grande
público fosse fundamentadora para a produção de novos materiais. Surgiu, assim, a
infografia.
Compreender as relações entre identidades pós-modernas e o consumo deste novo
estilo de jornalismo informativo é a proposta deste trabalho. É nítido na teorização de
diversos autores que novas práticas se consolidam no mercado editorial, mudanças estas
embasadas, sobretudo em uma constante reformulação dos desejos do sujeito deste tempo.
Efêmero é a palavra que, talvez, melhor resuma o período.
Assim, elucidar como se desenvolve a infografia, quais são suas técnicas
fundamentadoras e, principalmente, como uma nova maneira de organização de mensagens
como esta possibilita a assimilação de informações e conhecimentos diversos introduz a
justificativa de tal pesquisa. Sim, porque, visto que os hábitos de consumo mudam
paulatinamente, há uma necessidade iminente de analisar o fenômeno e buscar, no suporte
teórico, posicionamentos que atestem a validade da infografia e orientem sua produção para
a otimização de o cumprimento dos objetivos a que se propõem a difusão de informações:
espalhar saberes.
A metodologia empregada para o desenvolvimento do assunto se embasa em
pesquisa bibliográfica e documental para encontrar autores cujas teorias se complementem
na formação de uma compreensão crítica, tanto do sujeito pós-moderno quando da
comunicação que ele consome, com ressalva especial à infografia como estilo midiático. Em
Hall (1998) e Santaella (2008), a identidade do sujeito será discutida para, em seguida, ser
aplicada por Kopp (2002) e Dondis (2007) em esquemas de representação simbólica que
alteram os padrões e consumos da comunicação no tempo contemporâneo, embasados em
estudos recentes sobre a participação psicofisiológica e subjetiva na construção da
comunicação por processos coletivos de significação. Finalmente, Cairo (2008) e Teixeira
(2009) explicam a infografia como solução para o novo mercado editorial que emerge da
pós-modernidade, explicando suas práticas e avaliando sua importância enquanto formato
relativamente mais rico e completo para a veiculação de informações.
Ou seja, discutem-se, em três capítulos seqüenciais, fragmentos de identidade pós-
modernas, arte e comunicação como vias de produção de sentido e conhecimento e novas
metodologias e estilos técnicos para promover um estilo de comunicação que atenda às
expectativas do sujeito contemporâneo.
11
Capítulo 01
Fragmento
A fragmentação de identidades do sujeito pós-moderno aspira por
novas demandas da produção midiática
É o tempo da travessia
E se não ousarmos fazê-la
Teremos ficado, para sempre
À margem de nós mesmos.
Fernando Pessoa
A travessia de que fala o poeta português Fernando Pessoa diz respeito a um
período bastante importante para a história mundial. Modernista por estilo e vocação, o
escritor consagrou sua obra literária durante um período em que diferentes nações
experimentavam novas manifestações artísticas e, por conseqüência, também culturais. Em
contraponto aos conceitos e posicionamentos em voga nas tradicionais repúblicas e jovens
democracias ocidentais, o modernismo buscava criar novas abordagens das práticas sociais,
influenciado, sobretudo, pelo realismo e o racionalismo, produtos do avanço científico.
Nesta época, final do século XIX, um vislumbre lampejava novos rumos
modernistas. Era 1895 e, na Itália, sem antever os efeitos de sua invenção, o físico
Guglielmo Marconi apresentava ao mundo a radiotelegrafia, resultado de experiências
embasadas nas descobertas dos também físicos Nikola Tesla e Heinrich Hertz. Inauguravam-
se a sombra de tal acontecimento as ferramentas que mais tarde fomentariam outra
revolução: a da comunicação.
12
Assim, a ousadia proposta por Pessoa em uma travessia que reinventasse as
abordagens e práticas culturais podia tomar corpo. E, de fato, através das ondas
eletromagnéticas dos primeiros telégrafos de Marconi, os processos de comunicação que
sustentariam a primazia da cultura pós-moderna se configuraram.
1.1. Modernidade, pós-modernidade e o sujeito
Para Kopp (2002), falar de modernidade implica analisar o movimento modernista e
todas as suas abordagens. Citando Kumar (1997), Kopp entende a modernidade como uma
designação abrangente de todas as mudanças, sejam intelectuais, sociais ou políticas, que
fomentaram a revolução que aconteceu na transição entre os séculos XIX e XX.
Essas mudanças, segundo o autor, modificavam a conjuntura social na qual o sujeito
se inseria, sugerindo que o mesmo atuasse de maneira direta na reformulação de seus valores
e ideais, rompendo o vínculo com dogmas e tradições e atuando no sentido de pluralizar e
legitimar a liberdade, o trabalho e a vida social. Em linhas gerais, a modernidade se
consolidou com a revolução industrial, fundamentando-se na busca pela verdade através da
razão, graças ao desenvolvimento científico que ganhava forças, e, ainda, sugerindo modelos
sociais lineares que direcionassem sociedades e nações ao progresso. Os valores propostos
são, em Kopp, menos fechados e categorizantes, buscando assimilar ciência e tecnologia na
fundamentação de novas práticas sociais genéricas e abrangentes.
Todavia, justamente por se apresentar genérica e relativamente abrangente, não
tardaram em se pronunciar autores que questionassem as propostas da modernidade. De fato,
o desligamento como passado, o abandono de costumes tradicionais e a reformulação
cultural não são medidas de fácil assimilação às práticas sociais já estabelecidas. Ao explicar
cultura como a própria vida e indicar sua tendência de crescimento, desenvolvimento e
proliferação, Lúcia Santaella (2008) ilustra sua percepção acerca do assunto:
Até meados do século XX, dois tipos de cultura se delineavam nas sociedades
ocidentais: de um lado, a cultura erudita das elites, de outro lado, a cultura popular,
produzida no seio das classes dominadas. O advento da cultura de massas a partir
da explosão dos meios de reprodução técnico-industriais – jornal, foto, cinema –,
seguida da onipresença dos meios eletrônicos de difusão – rádio e televisão –,
produziu um impacto até hoje atordoante naquela tradicional divisão da cultura em
erudita, culta, de um lado, e cultura popular, de outro. Ao absorver e digerir, dentro
de si, essas duas formas de cultura, a cultura de massas tende a dissolver a
polaridade entre o popular e o erudito, anulando suas fronteiras. Disso resultam
cruzamentos culturais em que o tradicional e o moderno, o artesanal e o industrial
mesclam-se em tecidos híbridos e voláteis próprios das culturas urbanas
(SANTAELLA, 2008, p. 52).
13
Percebendo como, na verdade, o tradicional e o moderno se costuravam em tecidos
híbridos e caracterizavam sociedades e modos de consumo completamente diferentes das
práticas recorrentes até então e, a um só tempo, também dos ideais modernistas, diversos
autores passaram a denominar “pós-moderno” o período que sucedeu o alvoroço inicial do
século XX e assimilou as transformações fomentadas pela comunicação de massa recorrente
da revolução industrial.
Discutindo Lyotard, Kopp (2002) sugere que o saber e a sociedade passaram a se
caracterizar pós-modernos no final da década de 1950, momento em que o discurso científico
moderno passa a ser questionado ou, como escreve,
as metanarrativas que recorrem a algum tipo de grande relato moderno, tais como a
dialética do espírito, a hermenêutica do sentido, e emancipação do sujeito racional
ou trabalhador, ou o desenvolvimento da riqueza, perdem força como critério de
legitimação. A época que desponta acredita menos na possibilidade das grandes
formas de explicação e aposta mais nos discursos particulares, restritos a universos
menores (KOPP, 2002, p. 30).
Visão esta compartilhada por Eagleton, que define pós-modernidade como uma
época que “questiona noções clássicas de verdade, razão, identidade e objetividade, a idéia
de progresso ou emancipação universal, os sistemas únicos, as grandes narrativas ou os
fundamentos definitivos de explicação” (EAGLETON, 1998, p. 07).
Em ambos os discursos denota-se uma grande descentralização do coletivo, ao
passo que o individual começa a ganhar forças e ser percebido como cerne do processo pós-
moderno. É na subjetividade pessoal de cada indivíduo que brotam as percepções e
manifestações culturais, desde a ligação folclórica com tradições comunitárias até o
seqüencial desapego de identificações históricas para a adoção de posturas diferenciadas e
únicas.
A identidade, neste sentido, torna-se constante discussão e tema de análise na teoria
social, sobretudo por Hall. Para o filósofo e sociólogo, a essência do argumento é a seguinte:
as velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em
declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno,
até aqui visto como um sujeito unificado. A assim chamada “crise da identidade” é
vista como parte de um processo mais amplo de mudança que está deslocando as
estruturas e processos centrais das sociedades modernas, abalando os quadros de
referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social
(HALL, 1998, p. 07).
Enfatizando as diferenças abruptas entre os sujeitos denominados por Hall como
sujeito iluminista – aquele típico do modernismo, centrado, unificado e puramente racional –
e sujeito sociológico – que brota da pós-modernidade – entende-se que a nova configuração
14
da identidade neste segundo modelo se aproxima das manifestações recorrentes na medida
em que leva em consideração o interior e o exterior do indivíduo.
Essa segunda noção não concebe mais que a pessoa construa sua identidade a partir
de uma manifestação autônoma. O mundo em que ele habita, suas relações,
mediações e interações com os valores, símbolos e sentidos – a cultura – é que
determinam, juntamente com seu núcleo interno, a sua identidade (KOPP, 2002, p.
37).
Percebida, assim, a concepção de sujeito sociológico como aquele que interage e
caracteriza a pós-modernidade, Hall retoma, ainda, enunciados de Marx a respeito do
assunto:
É o permanente revolucionar da produção, o abalar ininterrupto de todas as
condições sociais, a incerteza e os movimentos eternos... todas as relações fixas e
congeladas, com seu cortejo de vetustas representações e concepções, são
dissolvidas, todas as relações recém-formadas envelhecem antes de poderem
ossificar-se. Tudo o que é sólido se desmancha no ar... (MARX e ENGELS, 1973,
p. 70)
A máxima metafórica da Marx realmente é capaz de explicar com bastante clareza o
sentimento que emana a pós-modernidade ao envolver o sujeito: dissolução. Ao dizer que o
sólido se desmancha, Marx e, por pressuposto, também Hall, afirmam categoricamente que
as mudanças estruturais da pós-modernidade estão fragmentando as paisagens culturais de
classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, processo que Hall denomina como
deslocamento ou descentração do sujeito e se resume, basicamente, na perda de si mesmo.
Importante ressaltar que quando os autores colocam suas afirmativas e assertivas a
respeito do assunto, usam o modo temporal presente, dado o fato de que a pós-modernidade
perdura ao longo da atualidade e tem, em sua proposta, idéias que eles próprios classificam
como de difícil superação para que adentre o que chamam de um novo grande período
histórico-social.
É, finalmente, também a opinião de Giddens, cuja contribuição acerca da rápida e
permanente mudança do tecido social estabelece a principal distinção entre sociedades
tradicionais e pós-modernas:
Nas sociedades tradicionais, o passado é venerado e os símbolos são valorizados
porque contam e perpetuam a experiência de gerações. A tradição é um meio de
lidar com o tempo e o espaço, inserindo qualquer atividade ou experiência
particular na continuidade do passado, presente e futuro, os quais, por sua vez, são
estruturados por práticas sociais recorrentes (GIDDENS, 1990, p. 37-38).
As referências simbólicas tradicionais se mixam com identidades descentralizadas e
singulares típicas da pós-modernidade e chega ao que Giddens identifica como uma
liberdade bastante inédita dos princípios de ordem social. Isso porque, para o autor, as
15
transformações são mais profundas que em qualquer período anterior, já que, no plano
territorial, cobrem muito rapidamente o globo com interconexões sociais novas e efêmeras e,
em termos de intensidade, tem força capaz de alterar características até mesmo íntimas da
essência cotidiana.
Essas condições fomentam o fortalecimento da comunicação, sobretudo a
comunicação de massa, percebida como atributo e produto intrínseco ao estilo de vida pós-
moderno por possibilitar o intercâmbio de idéias e permitir a fluidez de múltiplas facetas de
identidades e sujeitos em constante construção e remodelação. Tem-se, então, um novo
modo de se produzir informação, modo este que leva em conta todas as características de
descentração, desapego do antigo, reformulação do novo e reafirmações identitárias
propostas por Giddens (1990), Hall (1998), Kopp (2002), Lyotard (1998) e Santaella (2008)
até aqui.
1.2. Cultura das mídias: um produto pós-moderno de comunicação
Os estudos culturais que transitam e permeiam teorias e práticas de comunicação se
preocupam em compreender e analisar os produtos da cultura popular e de massa na medida
em que eles expressam os rumos da cultura contemporânea (ESCOSTEGUY, 1998). Isso
porque, segundo Santaella (2008), aumentou consideravelmente a tendência para trânsitos e
hibridismos dos meios de comunicação entre si, criando redes de complementaridade. Esse
fenômeno é nomeado pela autora de cultura das mídias, ao qual ela atribui o seguinte
conceito:
Sob essa denominação de cultura das mídias, procurava-se dar conta de fenômenos
diferentes e novos na dinâmica cultural, quer dizer, o surgimento de processos
culturais distintos da lógica que era a própria cultura de massas. Contrariamente a
esta que é essencialmente produzida por poucos e consumida por uma massa que
não tem poder para interferir nos produtos simbólicos que consome, a cultura das
mídias inaugura uma dinâmica que, tecendo-se e alastrando nas relações das mídias
entre si, começava a possibilitar aos seus consumidores a escolha entre produtos
simbólicos alternativos (SANTAELLA, 2008, p. 53).
Eis a primeira relação entre a pós-modernidade e o indivíduo enquanto consumidor
de comunicação: no período em questão, que pode ser também compreendido como
contemporâneo e passa a ser utilizado como sinônimo, a grande variedade de veículos e
ferramentas midiáticas, somada à ampliação do acesso e facilitação de acessibilidade,
permite ao indivíduo que ele escolha os produtos que mais lhe interessam segundo suas
afinidades e, inclusive, identidades.
16
Em um período onde até mesmo identidades são transitórias, cambiáveis e, por
consequência, bastante plurais, perceber a mídia e seus recorrentes processos de forma
fragmentada é nada mais que assumir que a mesma precisa suprir as expectativas de seu
consumidor. Santaella continua:
De fato, a cultura midiática propicia a circulação mais fluida e as articulações mais
complexas dos níveis, gêneros e formas de cultura, produzindo o cruzamento de
suas identidades. Inseparável do crescimento acelerado das tecnologias
comunicacionais, a cultura midiática é responsável pela ampliação dos mercados
culturais e pela expansão e criação de novos hábitos no consumo da cultura.
Inseparável também da transnacionalização da cultura e aliada a nova ordem
econômica e social das sociedades pós-industriais globalizadas, a dinâmica cultural
midiática é a peça chave para se compreender os deslocamentos e contradições, os
desenhos móveis da heterogeneidade pluritemporal e espacial que caracteriza as
culturas pós-modernas (SANTAELLA, 2008, p. 59).
Trazendo importantes considerações que abordam teorias da comunicação, Medina
acrescenta que “é em torno da identificação da mensagem com o gosto do público que se
teoriza o critério da proximidade da informação”(1998, p. 20). Tomando por base as teorias
de Moles, ela complementa que
Quando Moles divide a cultura antiga e a nova cultura, já está introduzindo toda
uma aproximação à cultura de massa que nos interessa. A cultura antiga conduz a
ideia de uma pirâmide cultural e encontra, teoricamente, sua fonte primordial na
educação. A nova cultura é formada por duas camadas: a alimentada pelos mass
media, “fluxo contínuo de atividades de toda a espécie, de todos os sentidos, mas
dirigindo sem esforço e sem duração fragmentos de conhecimentos disparatados,
perpetuamente submetidos ao esquecimento. A outra, constituída pela sociedade
intelectual dos criadores, “absorve os elementos que lhe são propostos para fazer
uma série de outras mensagens que vão ser difundidas pelos mass medias (1998, p.
34)
Em outras palavras, Medina percebe que as práticas contemporâneas do jornalismo
se dão por uma angulação cujo cerne da informação é regulado pelos gostos do consumidor.
Isso acontece resumidamente por dois motivos: o neoliberalismo que fomenta a
fundamentação tecnológica dos meios de comunicação tem por premissa que o resultado
final de suas atividades retorne em lucros para seus proprietários; soma-se a isso a constante
discussão acerca dos valores de objetividade e imparcialidade exigidos dos profissionais de
comunicação, percebidos cada vez mais como utópicos ou intangíveis justamente pelo ideal
neoliberal que sustenta o modelo econômico brasileiro, por exemplo. O resultado final é um
produto de comunicação dirigido a um público que seleciona, diferencia, elenca e detém o
poder de escolha, justamente porque paga por ele.
Vista no complexo da comunicação de massa, a mensagem jornalística é realmente
um dos produtos de consumo da indústria cultural. Mas não um produto só
revestido de conotações negativas associadas à crítica do sistema pós-
industrialização. Um produto dinâmico pelo ângulo da oferta e da demanda. Um
17
produto típico das sociedades urbanas e industrializadas, reproduzido em grande
escala, fabricado para atingir a massa. Neste sentido, a informação editorial [...] é
conseqüência natural de uma órbita que ultrapassa fronteiras nacionais como a
própria industrialização (MEDINA, 1998, p. 40).
Exemplificando em uma curta narrativa, Medina relembra o contexto histórico em
que a imprensa brasileira começou a se reorganizar conforme as demandas do consumidor
contemporâneo. Com as pessoas e empresas mais conectadas e bem informadas, houve
pressa por parte de todos em ficar sabendo dos acontecimentos no país e no mundo,
configurando um universo de leitores até então inexistente. Este público não denota interesse
pela opinião, transformando o gênero informativo em foco das redações, assumindo a
estrutura industrial cultural que já vogava em agências de notícias internacionais.
Assim, desenvolveram-se novos estilos e componentes verbais com nítido apelo
para chamar a atenção do leitor, e estes, aos poucos, se mesclaram com elaborados apelos
artísticos visuais, incluindo gradativamente recursos das artes e da fotografia na composição
do produto jornalístico. A estética foi equiparada ao conteúdo na ordem de importâncias
compositivas, a linguagem assimilou um narrador repórter que conduziu uma metamorfose
do relato direto a um narrativo contar de histórias. Sucessivamente, títulos, subtítulos, lead,
legendas, olhos e uma vasta gama de recursos passaram a fortalecer a informação
transformada em notícia, que, finalmente, ganhou ainda o suporte fotográfico e, dali, em um
piscar de olhos páginas coloridas para, como brinca Medina, “agarrar o consumidor”.
Como a autora conclui,
Os valores se configuram em comportamentos que tendem a ser homogêneos,
uniformes, nivelados, cambiantes, fluidos, inconstantes. São as últimas três
características que equilibram essa dinâmica, já que fogem do controle dos
manipuladores da indústria cultural (MEDINA, 1998, p. 36).
Esta é a cultura das mídias que propõe Santaella: a grande oferta possibilitando uma
demanda personalizada pelo consumidor que, mais do que consumir, se torna também co-
produtor ao passo que interfere nos meandros organizacionais da cultura de massa para, seja
nos meios impressos ou na internet, personalizar, justificar e manifestar sua presença
segundo as múltiplas identidades que assume.
Nas palavras de Lipovetsky,
O consumo passou a ser regido de acordo com escolhas pessoais, não mais
explicitamente em relação à preocupação com a mensagem que os produtos
consumidos passavam aos outros. A busca por satisfação social permanece, mas
agora se encontra num patamar mais baixo, juntamente com outros diversos fatores
que buscamos na busca pela felicidade: “o consumo ‘para si’ suplantou o consumo
‘para o outro” (LIPOVETSKY, 2007, p. 42).
18
1.3. O delírio da cultura de massa
As escolas teóricas de comunicação concordam que, no decorrer de sua história, a
cultura de massa teve a representação máxima de sua crítica entre os frankfurtianos Adorno e
Horkheimer, para os quais a efemeridade e a vulgaridade dos produtos culturais de massa
subjugavam tanto o potencial revolucionário da comunicação quanto o homem em si, ao
passo que o reiteravam.
Os argumentos que sustentavam tal crítica, basicamente, tratavam de expor o risco
que a “coisificação” da sociedade e as respectivas culturas representava para a emancipação
de sujeitos participativos e cuja crítica fosse apuradamente racional.
Lohisse, sociólogo belga pós-moderno cujos estudos se dedicam em analisar os
processos da comunicação de massa, discorda. “Os críticos não são capazes de ver que os
conteúdos, aparentemente insignificantes, são capazes de assegurar a difusão de
informações, de suscitar curiosidades, alargar horizontes” (LOHISSE apud MEDINA, 1998,
p. 37), afirma ele, apontando o potencial democrático da comunicação, ainda que de massa.
De fato, consumir um produto de comunicação industrializado pela cultura de massa
é, na opinião de Medina, preferível à ausência da comunicação em qualquer que seja a
organização social. Ela argumenta que
Onde a contribuição de Jean Lohisse se transforma de descrição do fenômeno em
compreensão de seu papel histórico é na reabilitação da mensagem-consumo da
cultura de massa. O problema da disfunção narcotizante, alienação ou evasão da
realidade, em que os críticos jogam pedras, ressurge em outra perspectiva nesse
autor. Lugares de evasão, os conteúdos tornam-se paradoxalmente modelos de
bem-estar e amor. Os heróis superiores dão lugar às estrelas acessíveis pelo menos
em aparência. O sonho torna-se informação, raramente fantástico, na medida do
impossível. As imagens do real que a cultura de massa apresenta, somadas às
informações de nível pessoal e de nível grupal, são traduzidas em possibilidade e
projetos históricos (MEDINA, 1998, p. 39).
Isso porque, visto que a comunicação é intrínseca à atividade social, o tráfego de
saberes através do consumo de informações emana um considerável potencial de
crescimento intelectual. “A linguagem sempre ocupou uma posição única no aprendizado
humano. Tem funcionado bem como meio de armazenar e transmitir informações, veículo
para intercâmbio de idéias e meio para que a mente humana seja capaz de conceituar”
(DONDIS, 2007, p. 14). Por vias de aproximação, é pela linguagem que se estabelece a
comunicação e dela que brotam temas capazes de resultar na popularização e assimilação de
saberes, segundo Dondis.
Os reflexos da pós-modernidade são, então, incorporados até mesmo nas
metodologias de transmissão do conhecimento, reconfigurando as práticas comunicacionais e
19
constituindo por meio delas alicerces para a formatação de novas abordagens culturais. Esta
é a visão compartilhada pelo sociólogo francês Dominique Wolton, quando explica que “a
revolução da comunicação e da informação [...] sacode todas as relações entre comunicação,
cultura e conhecimento, contribuindo para que sejam repensadas as condições do laço social
contemporâneo” (WOLTON, 2010, p. 27).
Para explicar a comunicação como meio de democratização de conhecimento,
Wolton faz questão de frisar a diferença entre os termos comunicação e informação. Segundo
ele, “a informação é a mensagem. A comunicação é a relação, que é muito mais complexa”
(2010, p. 12). E continua:
Não apenas informar é insuficiente para comunicar por haver cada vez mais
mensagens e a comunicação exigir uma seleção, mas também por ter crescido o
papel dos receptores. Os receptores negociam, filtram, hierarquizam, recusam ou
aceitam as incontáveis mensagens recebidas. O receptor, que nunca foi passivo,
está cada vez mais ativo para resistir ao fluxo de informações. Seria mais adequado
falar em receptor-ator para destacar o aspecto dinâmico dessa função. Revalorizar o
estatuto do receptor passa também pela revalorização da própria problemática da
comunicação, o que fizeram autores contemporâneos, infelizmente raros, como
Jürgen Habermas, Umberto Eco, Michel Serres, Edgar Morin, Regis Debray e mais
alguns. Nada mais simples do que incontáveis discursos mais ou menos hostis a
comunicação que desvaloriza o estatuto do receptor, sempre sob suspeita de ser
meio estúpido e facilmente manipulável (2010, pg. 18).
Com isso, também em Wolton fica nítido o perfil do sujeito pós-moderno, ou, como
classifica o autor, do receptor. Um ator social que está, sim, inserido em uma cultura de livre
mercado onde inclusive a comunicação se torna um produto industrializado. Porém, na
contramão, um ator que se torna também crítico e participativo, inspirando a formação de um
mercado editorial jornalístico que trabalha em cenários não mais hierarquizados de
comunicação, mas em pé de igualdade com públicos que negociam e respondem.
“O ideal da comunicação está evidentemente ligado ao compartilhamento, aos
sentimentos, ao amor. É, com certeza, a situação na qual a comunicação percorre o presente,
reencontra o passado e torna possível o futuro” (WOLTON, 2010, p. 17), finaliza o autor,
deixando implícito em seu discurso o fato de que, pelos motivos citados, a comunicação,
tratada por Santaella (2008) na concepção de cultura das mídias, se reinventa em novas
abordagens, novas possibilidades e novos estilos.
20
Capítulo 02
Arte
Agora, as formas e estilos de comunicar
escancaram beleza e conhecimento
“Temos a arte para não morrer da verdade”.
Friedrich Nietzsche
Tal afirmação de Nietzsche foi, acertadamente, proclamada no período em que
ideais modernistas se enfraqueciam e cediam lugar à fragmentação da pós-modernidade,
meados da década de 1920, quando seu trabalho ganhava projeção internacional pelos
estudos da psicanálise humana. Surge daí uma relação metafórica bastante importante nas
palavras do filósofo: a gestalt, expressa na frase através da lembrança artística, e os
processos de identificação de um sujeito que buscava compreensão e harmonia entre
identidades e valores desconexos, denotados no que se refere à verdade.
Em outras palavras, quando Nietzsche faz tal citação, fala das metodologias
artísticas utilizadas para expressar e ilustrar as vanguardas e tendências que reconstruíam as
sociedades e permitiram ao homem liberdades criativas de vanguarda, com princípio ousado
e transformador. Em um ambiente que ainda pulsava com a revolução industrial, onde
sociedades se redesenhavam rapidamente e culturas idem, os impactos de tamanhas
mudanças certamente punham em xeque valores tradicionais que alicerçavam o indivíduo.
Assim, ele buscava na arte o pulso de vida e ânimo para manter-se motivado. Vivo.
Essa herança cultural sem dúvida nenhuma continua bastante presente, atrelada à
produção da comunicação de massa que propagou hábitos de consumo, perfis de público e se
21
instaurou no mundo neoliberal como uma prática que, embasada sobretudo em Santaella o
Lohisse, difunde conhecimento e democratiza a informação.
2.1. Alfabetismo visual: arte, design e gestalt
“A arte e o significado da arte, a forma e a função do componente visual da
expressão e da comunicação, passaram por uma profunda transformação na era tecnológica”
(DONDIS, 2007, pg. 01). Essa transformação, em continuísmo às comparações de Nietzsche
e os efeitos da gestalt sobre seu enunciado, leva em conta os estudos a respeito da
capacidade humana de abstração e visualização mental na elaboração de inteligentes
sistemas sígnicos de linguagem.
Dondis, citando Kostler, formula o processo da seguinte maneira: “O pensamento
por conceitos surgiu do pensamento por imagens através do lento desenvolvimento dos
poderes de abstração e simbolização, assim como a escritura fonética surgiu, por processos
similares, dos símbolos pictóricos e dos hieróglifos” (KOSTLER apud DONDIS, 2007, p.
14). Com isso, ele explica que a evolução da linguagem teve início em imagens, passando
por pictogramas, cartuns, unidades fonéticas e chegando, finalmente, ao alfabeto. Cada novo
passo representou um importante avanço no estabelecimento de uma comunicação mais
eficiente.
Neste processo, porém, para Dondis, são inúmeros os indícios que apontam uma
possível reversão rumo à retomada da imagem, buscando, sobretudo, o aprimoramento do
processo de comunicação. Isso acontece pois, para o autor, nunca antes uma variedade tão
grande de sociedades teve acesso praticamente ilimitado à informação. Dessa maneira, o
repertório conceitual, seja de conhecimento ou de experiências, aumenta, habilitando o
indivíduo contemporâneo a compreender, analisar e participar mais efetivamente de uma
gama infinita de interpretações da realidade circundante. Isso permeia os processos de
comunicação de massa e amplia a compreensão acerca de imagens e diferentes recursos
visuais nos materiais ligados a tal produção. Hoje em dia, segundo Dondis,
O nível representacional da inteligência visual é fortemente governado pela
experiência direta que ultrapassa a percepção. Aprendemos sobre coisas das quais
não podemos ter experiência direta através dos meios visuais, de demonstrações e
de exemplos em forma de modelos. Ainda que uma descrição verbal possa ser um
explicação extremamente eficaz, o caráter dos meios visuais é muito diferente do
da linguagem, sobretudo no que diz respeito a sua natureza direta. Não se faz
necessária a intervenção de nenhum sistema de códigos para facilitar a
compreensão, e de nenhuma codificação que retarde o entendimento. As vezes
basta ver um processo para compreender como ele funciona. Em outras situações,
22
ver um objeto nos proporciona um conhecimento suficiente para que possamos
avaliá-lo e compreendê-lo. Essa experiência da observação serve não apenas como
um recurso que nos permite aprender, mas também atua como nossa mais estreita
ligação com a realidade de nosso ambiente. Confiamos em nossos olhos, e deles
dependemos (DONDIS, 2007, p. 21).
Ao confiar na visão, o indivíduo atribui a interpretação e releitura de qualquer sorte
de material ou situação a um vasto sistema de signos e símbolos que traduzem seu
significado conceitual em um conteúdo compreensível. Os meandros de tal processo são o
principal objeto de estudo da semiótica que, explicada por Peirce (2005), assume a postura
de ciência dos signos e tem por objetivo a investigação das linguagens e seus métodos para a
constituição de fenômenos de produção de significações e sentidos. “Tudo é signo e,
portanto, a semiótica estuda os signos e como eles se relacionam” (PEIRCE, 2005, p. 46).
Peirce (2005), ainda, estabelece que o signo deve ser compreendido como a
materialização da linguagem. Assim, pode ser percebido através dos sentidos, como a visão
(imagens), audição (língua, música), olfato (cheiros) ou tato (textura). Sempre atrelado à
parte perceptiva do signo está o conceito que a expressão material quer designar. Um signo,
então, é uma representação de outra forma/conceito. As formas indiretas de expressar e
designar os elementos da realidade surgiram da necessidade de comunicação, assim como da
impossibilidade de referência direta a todos os elementos que compõe uma mesma realidade.
Não obstante, algumas idéias abstratas do homem só podem ser exteriorizadas através de
conceitos que, por sua vez, só existem e se concretizam na linguagem. É por isso que o signo
denomina algo que está ausente.
Quanto à gestalt, é importante, ainda, citar Arnheim (apud DONDIS, 2007) e a
contribuição dos experimentos no campo da percepção, articulando justificativas que
contribuam no esclarecimento do iminente processo de valorização da imagem no consumo
midiático pós-moderno. Dondis complementa, explicando o aprendizado pela gestalt como
psicofisiológico, ou seja, que se dá conceitualmente e, a um só tempo, envolve a estrutura
mecânica da visão:
Todo o padrão visual tem uma qualidade dinâmica que não pode ser definida
intelectual, emocional ou mecanicamente, através de tamanho, forma, direção ou
distância. [...] As coisas visuais não são simplesmente algo que está ali por acaso.
São acontecimentos visuais, ocorrências totais, ações que incorporam a reação ao
todo (DONDIS, 2007, p. 31).
Munido, então, dos conceitos de gestalt e de alfabetismo visual, Dondis propõe
chamar o estudo destas aplicações, somadas à arte, de sintaxe visual, cujo propósito maior é
o de reunir as percepções sígnicas, emocionais e sentimentais com quaisquer significados
23
universais que permeiam o consciente e o inconsciente para estabelecer experiências
compartilhadas que se apliquem à análise dos produtos contemporâneos da comunicação.
O conteúdo e a forma são, assim, indissociáveis e integrantes básicos da sintaxe
visual. “Seja qual for a substância visual, a composição é de importância fundamental em
termos informacionais. [...] A mensagem e o significado não se encontram na substância
física, mas sim na composição. A forma expressa o conteúdo” (DONDIS, 2007, p. 132).
Características estas, segundo Kopp, similares às do design. O autor chama de
cambiante a estética do design gráfico que se assemelha aos elementos compositivos da
sintaxe visual e o comparativo reflete sua condição num meio de caminho entre indústria,
tecnologia, arte, cultura e consumo por parte de um público que reflete as transformações nas
esferas mais sensíveis da sociedade.
Se até nossa identidade cultural é cambiante, sem lastro crível como se acreditava
há poucas décadas, não representa uma surpresa tão grande percebermos que a
indústria tem uma produção flexibilizada, pronta para se reprogramar facilmente,
ou ainda, que os tão conhecidos projetos gráficos fixos não simbolizem mais a
quintessência do design gráfico (KOPP, 2002, p. 93).
Neste emaranhado de conceitos e leituras contemporâneas, absolutamente
condizentes com a pós-modernidade, a sintaxe visual ganha corpo no processo midiático. Já
que conteúdo e forma tornam-se um, a idéia fundadora que passa a regular os interesses de
emissores e receptores se desloca para a estética. A estética torna-se um valor coletivo e
passa a ser interpretada como único código de regras em um dado grupo de interesse,
categoriza Maffesoli (2005), ao ilustrar que o compartilhamento de experiências corresponde
aos valores que configuram vetores de criação, englobando a vida social.
De que maneira, então, o jornalismo é capaz de explorar características tão
singulares e corroborar com milhares, senão milhões, de expectativas e identidades
consumidoras tão distintas? McLuhan (1964) dá uma dica: o meio é a mensagem. A resposta
fornecida por teóricos que se debruçam sobre tal questionamento aponta para a fusão de
todos os conceitos abordados até aqui. Uma proposta no mínimo ousada, que unifica
imagem, texto, forma e conteúdo obedecendo a padrões estéticos contemporâneos e perfis
efêmeros de consumo.
Ao colocar ênfase nos meios, McLuhan insistia na impossibilidade de separar a
mensagem do meio em que ela é veiculada, já que a mensagem é determinada muito mais
pelas especificidades técnicas, endereçamento e público do que pelas intenções de seu autor.
Assim, o meio incorpora a mensagem em si e passam a ser indissociáveis, resultado de um
produto final desenhado objetivamente para um perfil de consumidor contemporâneo.
24
Kopp (2002, p. 93) sugere que, “se até nossa identidade cultural é cambiante, sem
lastro crível como se acreditava há poucas décadas, não representa uma surpresa tão grande
percebermos que a indústria tem uma produção flexibilizada, pronta para se reprogramar
facilmente”.
Essa teoria é similar à de Dondis (2007), para quem os significados podem ser
encontrados não apenas em dados representacionais, tais como a informação, a notícia ou até
mesmo a linguagem, mas também em formas compositivas que existem ou coexistem com a
expressão visual e factual. É neste argumento que a indústria cultural pós-moderna tem
embasado estudos e pesquisas que indicam novas metodologias e técnicas para o fazer
jornalístico.
Na busca de qualquer objetivo fazem-se escolhas através das quais pretende-se
reforçar e intensificar as intenções expressivas, para que se possa deter controle
máximo das respostas. Isso exige uma enorme habilidade. A composição é o meio
interpretativo de controlar a reinterpretação de uma mensagem visual por parte de
quem a recebe. O significado se encontra tanto no olho do observador quanto no
talento do criador. O resultado final de toda experiência visual, na natureza e,
basicamente, no design, está na interação de polaridades duplas: primeiro, as forças
do conteúdo (mensagem e significado) e da forma (design, meio e ordenação); em
segundo lugar, o efeito recíproco do articulador e do receptor. Em ambos os casos,
um não pode se separar do outro. A forma é afetada pelo conteúdo; o conteúdo é
afetado pela forma. A mensagem é emitida pelo criador e modificada pelo
observador (DONDIS, 2002, p. 131).
A estrutura da obra visual, assim, é a força que determina quais elementos visuais
estarão presentes, com que ênfase e com que freqüência, justificando a máxima de Dondis de
que a maior razão motivadora da utilização de todos os níveis de dados visuais busca,
majoritariamente, ampliar o processo da comunicação humana.
Sempre que algum material é projetado, esboçado, desenhado, enfim, constituído, a
substância visual da obra é composta a partir de uma lista básica de elementos, que Dondis
numera em: ponto, linha, forma, direção, tom, cor, textura, dimensão, escala e movimento.
Organizados em livre composição, são estes os elementos que, segundo a sintaxe visual,
estruturam toda a composição do meio. “Por poucos que sejam, são a matéria-prima de toda
a informação visual” (DONDIS, 2007, p. 51).
Percebendo que os dados visuais sempre agregam o potencial de transmitir
informação e, ainda, retomando a re-consolidação da imagem nos processos comunicativos,
Dondis afirma:
no universo dos meios de comunicação visual, inclusive as formas mais causais e
secundárias, algum tipo de informação está presente, tenha ela recebido uma
configuração artística ou seja ela resultado de uma produção casual. Em qualquer
nível de avaliação sempre inconstante do que constitui arte aplicada ou belas artes,
toda forma visual concebível tem uma capacidade incomparável de informar o
25
observador sobre si mesma e seu próprio mundo, ou ainda sobre outros tempos e
lugares, distantes e desconhecidos (DONDIS, 2007, p. 184).
Finalmente, consultando Medina acerca das contribuições teóricas específicas do
jornalismo, a autora categoriza que a mensagem jornalística resulta da articulação de
elementos estruturais característicos do processo de informação:
Da realidade, atual e significativa para o homem de hoje, a representação que se faz
dessa realidade num veículo de comunicação, a mensagem codificada pode ser
analisada nas relações dos principais elos do processo. A consciência dessa
codificação é importante para que faça parte não como simples executivo, mas com
certa lucidez crítica (MEDINA, 1988, p. 73).
2.2. Infografia: informação e estética
Titulo+Texto+Foto. Segundo Errea (2008), por décadas esta foi a fórmula clássica
que assegurou sucesso ao jornalismo de massa. Um grande e articulado título, um texto bem
escrito e uma fotografia que complementasse a linguagem textual tratavam de conquistar a
atenção do leitor. Não se pode negar que até agora esta fórmula funciona, mas, para o autor,
a nova configuração de mercado, as interações com o público e o perfil das identidades pós-
modernas estão redirecionando as ferramentas para um novo estilo de produção: o
infográfico.
Historicamente, foi nos primórdios do século XIX que a imprensa inglesa veiculou
o primeiro infográfico de que se tem notícia. Era 07 de abril de 1806 e o tabloide britânico
The Times inovou na divulgação de um assassinato, reunindo em um gráfico chamado “Mr.
Blight’s House” imagens, informações descritivas e dados sobre a reconstituição do crime.
Foi na década de 1980, contudo, que os infográficos se popularizaram e
disseminaram na mídia, a começar pelos jornais norte-americanos e, a partir daí, para todo o
mundo ocidental que se espelhava em tal produção. Valero Sancho (2001) e De Pablos
(1999) ressaltam este como o período de renascimento da infografia impressa, possibilitado
sobretudo graças ao desenvolvimento tecnológico e informático que agregou à prática da
comunicação computadores que permitiam a produção de arte-finalizações com mais
agilidade, destreza e qualidade. Na seqüência, surgiram softwares de editoração, desenho e
tratamento de imagens que impulsionaram os meios impressos a um salto de qualidade no
que diz respeito ao processo de criação por parte dos jornalistas e designers nas redações.
26
Nesse contexto, o primeiro jornal a apresentar infografia diária em suas páginas é o
norte-americano USA Today, intensificando o uso deste novo gênero estilístico para a
massificação dos infográficos no jornalismo impresso. Assim,
tem inicio a consolidação do jornalismo visual, com o uso de cores, textos curtos e
a valorização das imagens (infografias e fotografias) como discurso jornalístico.
Uma das filosofias que o USA Today definia era economizar tempo do leitor no
que se refere a compreensão da matéria, bem como na identificação do tema
abordado. Ou seja, favorecia-se uma leitura rápida, em que as imagens gráficas
tinham como propósito substituir o texto (RODRIGUES, 2009, p. 197).
“Mostre, não conte”. Esta foi, de acordo com Peltzer (1991), a expressão cunhada
pelo USA Today para definir em poucas palavras a nova cultura midiática que se instalava.
Outros grandes momentos históricos que contribuíram para o amadurecimento do estilo
foram a Guerra do Golfo e o 11 de Setembro, ambos extensivamente explorados através de
imagens, mapas e dados para intensificar o apelo emocional através do endereçamento e
fortalecer a indústria da informação.
Em linhas gerais, Cairo (2008) define a infografia como a apresentação impressa do
binômio imagem + texto, qualquer que seja o suporte. A morfologia do termo é advinda do
inglês informational graphics (gráficos informativos) e resume sua aplicação no uso de
ferramentas visuais como mapas, tabelas, desenhos, ilustrações, legendas e texto
compositivamente combinados para transmitir informações de fácil compreensão.
Explicando, Rodrigues prossegue: “Info significa informação, e não informação automática,
mas carregando um sentido informativo. Já grafia vem de gráfica – quando direcionada para
as produções impressas – e que resulta na infografia, ou seja, informação gráfica” (2009, pg.
194).Teixeira, explorando a argumentação de Errea, alega que,
como narrativa, a infografia pode se caracterizar como um diferencial necessário
em tempos nos quais se proclama o fim do jornal impresso, tal como o
conhecemos. Os infográficos não só atraem o leitor como são capazes de fazê-los
permanecer em uma determinada página (TEIXEIRA, 2009, p. 02).
A isto soma-se a contribuição do próprio Errea, quando diz que “o poder da
infografia é imenso e significa, literalmente, que há um mundo novo de formatos a explorar.
Que, definitivamente, a chave está tanto nas histórias que se contam e no método que são
contadas. A novidade: adequar as histórias a uma narrativa” (ERREA apud TEIXEIRA,
2009, p. 02).
Uma ressalva importante: para compreender o que são infográficos e seu futuro
entusiástico para muitos meios e profissionais, é preciso entender também o processo de
produção. Todo o produto jornalístico é construído a partir de uma relação indissociável
entre produção, circulação e consumo. Neste sentido, Teixeira (2009) descreve o produto
27
jornalístico como uma construção narrativa que tem o objetivo de produzir conhecimento e
se tornar socialmente relevante. De igual modo, o infográfico busca, em apelos diretos a
suportes artísticos e de linguagem, tornar a informação ou o conhecimento agregado em suas
páginas ainda mais passivo de fácil assimilação e entendimento. Justamente por isso, sua
classificação enquadra-se na teorização de Melo (2003) sobre o jornalismo: há os gêneros
opinativo e informativo, este último abraça a infografia.
Steve Dunes (apud TEIXEIRA, 2009), diretor gráfico do jornal norte-americano
The New York Times, afirmou em um de seus artigos que um infográfico de sucesso não
desenha sua atenção conduzido pela beleza das páginas, mas, sim, na forma como elementos
harmonicamente organizados conduzem o leitor à uma informação interessante e a
complementam. Para Dunes, infográficos comunicam o que é mais interessante e relevante
em uma notícia ou informação e, se o jornalista ou editor não for bem sucedido na
organização e apresentação da informação, não será nenhum recurso visual que terá a
capacidade de salvar o trabalho.
É por isso que infográficos bem planejados estão se convertendo em um recurso
vital, “responsáveis por sintetizar e facilitar a compreensão da notícia, uma forma de fazer
frente à protuberância das imagens [...] cujas tramas escriturais assentam-se nos dispositivos
icônicos e gráficos” (BORGES, 2010, p. 04) e, ainda, tornar-se pólo de atração para a leitura.
Quando se trata de infográficos, o significado da forma é sobremodo comparado ao
do conteúdo. Em franco crescimento graças a uma cultura cambiante de consumo da
informação, é necessidade da infografia preocupar-se com a estética e garantir que os
elementos visuais, de traços, linhas e cores até tabelas e fotografias, sejam essenciais para a
construção da informação. Assim,
A escolha de um caractere, o formato, a paginação, o espaçamento entre as
palavras, a qualidade do papel utilizado têm também efeitos de sentido, visual e
tátil, e essas formas gráficas antecipam o estatuto social do que é apresentado para
ser lido (e, portanto, a recepção reservada pelo leitor) (DEBRAY, 1994, p. 32).
2.3. A contribuição do design gráfico
É pela construção coletiva que a técnica infográfica resulta em um eficiente produto
típico da indústria da informação. Seu resultado final, o infográfico, é a soma dos esforços de
jornalistas e designers de cuja sinergia se constroem infográficos de sucesso.
Ao jornalista compete a tarefa de apurar as informações e notícias, selecionar fontes
e desenvolver a linguagem textual. Ao designer, cabe o tratamento de todos os dados e sua
28
consecutiva organização. É nesse momento que ambos os profissionais elencam estratégias e
definem através de que tipo de linguagem cada fragmento do todo de uma notícia será
veiculado. Então, linguagem textual se converte em pequenos textos e boxes que, no
infográfico, serão distribuídos de modo a explicar uma seqüência de fatos ou dados ,
enquanto que a linguagem visual trata de criar imagens e elementos artísticos visuais que
fortaleçam o texto, quando não substituem-no.
De fato, infográficos devem ser construídos de modo a assegurar sua autonomia
enunciativa. “O público deve entender o que a sua narrativa encerra sem precisar
obrigatoriamente recorrer a outros textos” (TEIXEIRA, 2009, p. 04) ou, ainda, “em alguns
casos o texto de acompanhamento ou explicação não é necessário e, inclusive, pode chegar a
obstacularizar a compreensão do conteúdo (CAIRO, 2008, p. 21). Trata-se, em suma, do
compromisso com a legibilidade.
Villas-Boas (2001, p. 07) busca teorizar o design para compreender sua
contribuição enquanto ferramenta de comunicação: o design gráfico está diretamente ligado
à sociedade industrial e surge como a “área do conhecimento e a prática profissional
específicas relativas ao ordenamento estético-formal de elementos textuais e não textuais que
compõem peças gráficas destinadas à reprodução com objetivo expressamente
comunicacional”.
O autor prossegue, pontuando três aspectos básicos para a classificação de um
infográfico: o primeiro deles diz respeito à combinação de elementos, onde ilustrações,
tipografia, fotos e demais elementos visuais têm o objetivo de comunicar, persuadir, guiar a
leitura e vender um produto; o segundo trata da metodologia de apresentação, ou seja, o
planejamento de como o infográfico será recebido/consumido, por qual tipo de público e em
que condições; o último dos aspectos é o que embasa a funcionalidade simbólica,
possibilitando compreensões e construções sígnicas do leitor com o material e possibilitando
a identificação do público com os elementos compositivos.
Percebe-se aí a ligação fundamental entre a comunicação estabelecida como pós-
moderna e seu público consumidor: o infográfico surge como solução de um consumo de
informações fragmentado e endereçado, sem, contudo, deixar de transmitir conhecimento ou
propiciar a identificação do indivíduo com a forma ou o conteúdo explícitos em sua
composição.
Em seus elementos, o infográfico dialoga com o conhecimento e a bagagem cultural
do indivíduo, possibilitando, em cada leitor, uma construção plural e nova. Permite que sua
leitura se dê até mesmo de maneiras desordenadas e, sobretudo, enseja uma possibilidade de
29
construção onde a comunicação, produzida segundo o público que vai consumi-la, fomente a
democratização do saber, a construção coletiva e o estímulo à participação e produção
artística e informativa.
Alvin Toffler (1980), autor de “A terceira onda”, escreveu em seu livro que a
informação tornou-se, talvez, o negócio mais importante e que mais cresce no mundo. Não
obstante, então, o consumo de tal negócio mira com boas expectativas o consumidor pós-
moderno e prevê em ferramentas como o infográfico uma grande estratégia para pluralizar a
comunicação e ampliar os processos comunicativos enquanto vias de tráfego de diferentes
saberes.
30
Capítulo 03
Conteúdo
Forma e conteúdo dialogam em um
processo democrático cuja intenção maior é a informação
“O meio é a mensagem”.
Marshall McLuhan
Uma vez que o formato e o meio são determinantes na formulação da mensagem e,
como se viu até aqui, a comunicação de massa contemporânea como produto cultural se
consolida nessa prática, McLuhan (1964) tem sabidamente razão em sua afirmação.
Neste sentido, todos os elementos textuais e visuais incorporados à mensagem
cumprem a função de significar algo que está ausente, colocados no âmbito representacional
do conteúdo. Em outras palavras, semioticamente, eles são apenas uma idéia que referencia
seu original. Esta significação ocorre através de um processo sígnico cuja lógica de
funcionamento encontra-se no campo da comunicação visual. Seus significantes são aqueles
que estimulam o sentido da visão e a memória e, assim, os significados são produzidos
através de uma construção que se dá por meio de analogias. Este é, fundamentalmente, o
princípio de um infográfico.
O teórico Roland Barthes (1990) propôs algumas reflexões interessantes sobre o
caráter das imagens visuais. Em primeiro lugar deve-se entender que a descrição dos tipos de
mensagem que compõe uma imagem visual é a ferramenta inicial para a análise. Descrever
os elementos sígnicos observados em uma imagem é tarefa essencial, ainda que possa
parecer muito simples. Constitui-se como a transformação das percepções visuais em
31
linguagem verbal, o que implica escolhas e interpretações. Quando realizada coletivamente,
a descrição pode revelar uma diversidade interessante de pontos de vista, o que enriquece a
análise. Não obstante, apontar os diferentes tipos de signos que compõem uma mensagem
visual leva inevitavelmente à constatação de que uma imagem é heterogênea, ou seja, sua
significação é traçada a partir da relação entre diversos signos, que podem ser icônicos ou
textuais, de modo que já não se pode tratar o conceito de imagem visual sob o caráter
exclusivo de ícone puro.
É nesta mesma relação que Barthes (1990, p. 13) elenca a interpretação dos signos
em dois sistemas diferentes: mensagens denotadas e conotadas. Conforme seus próprios
nomes sugerem, enquanto a primeira resulta da percepção direta dos elementos visuais
presentes no infográfico, a segunda explica as relações subjetivas que surgem de modo não
implícito entre estes mesmos elementos e o conhecimento ou cultura do receptor.
Tal pensamento consolida o caráter ambíguo da imagem, que, segundo o autor,
sempre pretende dizer algo diferente do que representa em primeiro grau, ou no grau de
denotação. Apesar de análoga ao referente, a imagem, portanto, sempre produz um
significado além, que pode estar vinculado a uma ideologia, à história, etc. Logo, é possível
estender este caráter a outros tipos de linguagem e concluir que qualquer forma de
comunicação é conotativa e que esta dinâmica sugerida por Barthes para os signos está
fundamentada em evoluções perpétuas de sentido. Ou seja, um significante remete a um
significado, que remete a outro significante, que por sua vez, está ligado a outro significado e
assim sucessivamente. Esta é uma construção lógica coerente com a pluralidade,
complexidade e transformação do pensamento humano pós-moderno.
Tomando, então, as análises de leitura e interpretação acerca de produtos midiáticos
por Barthes, identificam-se três tipos principais de mensagens presentes, por exemplo, em
um infográfico: o primeiro tipo é o lingüístico verbal, presente no texto em todas as suas
formas; o segundo é a linguagem visual, expressa nos elementos artísticos e dispositivos
imagéticos; o terceiro é o sentido conotativo, fruto das mensagens conotativas, onde residem
as interpretações, assimilações e o intercâmbio entre a mensagem e o meio com o subjetivo
do sujeito.
Buscando, finalmente, elucidar de modo ilustrativo todos os embasamentos teóricos
apresentados até aqui, é trazido à análise um produto midiático recorrente, atual e presente
no mercado editorial brasileiro: a revista Superinteressante, cujo trabalho se destaca por
antecipar a vanguarda de novos estilos jornalísticos e, sobretudo, pela adoção da infografia
32
como estratégia fundamental para a perpetuação no mercado e, a um só tempo, também para
a formatação e diálogo com um novo perfil de consumidor.
Os procedimentos metodológicos para a análise que segue se baseiam em análise
exploratória e documental de edições da revista selecionadas aleatoriamente entre as
publicações já veiculadas no corrente ano de 2010. Não obedecendo a questões de
seqüencialidade, as publicações escolhidas se referem aos meses de janeiro (edição 274),
março (edição 276) e julho (edição 280). Especificamente, a mensuração qualitativa a
respeito das abordagens teóricas discutidas até aqui e sua análise empírica se deram em duas
editorias específicas: 1) o editorial, nomeado de “Escuta” e assinado pelo diretor de redação
Sérgio Gwerkman, buscando identificar o posicionamento da revista e suas práticas
jornalísticas e de mercado; 2) a editoria “Infográfico”, onde assuntos gerais são discutidos
segundo a formatação e propostas da infografia, conforme discutidas no capítulo anterior.
Nesta segunda editoria, a análise procura estabelecer aspectos comparativos entre as
produções infográficas de modo a avaliar sua proximidade com os pensamentos teóricos e a
eficácia de sua proposta enquanto produto pós-moderno de comunicação. Para tanto, serão
submetidas tais editorias às seguintes análises: a) relação entre mensagens textual e visual; b)
apresentação de mensagens denotadas e possibilidade de leituras conotadas; c) organização
dos elementos compositivos d) apelo estético.
3.1. Superinteressante: uma revista conceito
Publicada mensalmente pela Editora Abril desde 1987 no mercado editorial
brasileiro, a Superinteressante baseia sua produção na pauta de curiosidades culturais e
científicas.
Nas palavras do atual diretor de redação, Sérgio Gwerkman, “o jornalismo existe
nas perguntas – e um jornalista não deve deixar de fazê-las”. (2010, edição 277, p. 10). Ele
afirma: “trabalhamos com as dúvidas e os fatos: nenhuma idéia é absolutamente verdadeira
se não puder ser verificada” (2010, edição 279, p. 10), bem como delineia: “ciência serve
para entender o que ainda não entendemos. Fazer ciência não é escrever sobre Newton ou
Einstein. É usar a suspeita o ceticismo, a racionalidade e o método para mirar o
desconhecido. Perfeito. Essa é a ciência que você encontra na Super” (2010, edição 276, p.
10).
33
A aproximação com o leitor e as estratégias de endereçamento são percebidas em
diversas matérias, com ressalva importante para ampliada seção de participação do público
na editoria “Fórum”, destinada ao debate e crítica do leitor. “Informação é bom, mas sozinha
não costuma fazer muito sentido. Aí entra a Super. A gente trabalha para traduzir essa
revolução pra você (tratando da revolução da informação). Apuramos os tais dados e os
transformamos em visualizações: gráficos e infográficos que permitem entender e dar
contexto aos números, enxergar as tendências, as anomalias, as transformações” (2010,
edição 274, p. 10).
Sobre os recursos humanos operacionais e a metodologia de trabalho adotada,
Gwerkman escreve: “a Super tem uma bela equipe de jornalistas e designers na redação –
uma das melhores do país, sem dúvida. Mas tem também colaboradores sem os quais seria
impossível manter nossa qualidade. Eles são parte de uma nova realidade no mercado de
trabalho – os nacionalmente famosos frilas – e costumam ser contratados para participar de
uma reportagem. Pensando o mundo com a cabeça diferente, que não está dentro da redação
todos os dias, eles nos ajudam a oxigenar idéias e trazem linguagens variadas, propostas
inovadoras” (2010, edição 275, p. 10).
Percebe-se, portanto, a constante preocupação da revista em corresponder às
expectativas de seu leitor e reinventar-se paulatinamente, lançando propostas e apostando em
idéias inéditas. Exatamente como figuram as teorias de Santaella (2008) e Hall (1998)
quando afirmam, como antevisto, que as novas configurações identitárias do sujeito na pós-
modernidade demandam uma postura diferenciada na confecção de produtos culturais ditos
industrializados. A revista não deixa de ser um produto de massa, mas, a um só tempo, é
também personalizada e efêmera, apostando no contato com o leitor/consumidor e
promovendo interação.
No editorial de julho (2010, edição 280, p. 10), isto se confirma quando Gwerkman,
depois de informar que os infográficos e matérias da Superinteressante estão sendo
comprados e reproduzidos por diversas revistas mundiais, escreve: “o valor financeiro dessas
vendas não é nada que mude a balança comercial brasileira. Mas tampouco estamos falando
de laranjas ou minério de ferro: o que fazemos é exportação de conhecimento. Algo de que
nos orgulhamos muito. E de que você também deveria se orgulhar. Porque isso significa que
não é mais somente a nossa matéria prima que vendemos: é a nossa criatividade, visão de
mundo. E este é um círculo virtuoso: quanto melhor for nossa produção, melhores serão
nossos leitores. E quanto melhores forem nossos leitores, melhor será nossa produção
editorial. Estamos juntos nessa”.
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O maior destaque, porém, como não podia deixar de ser, cabe à apresentação
estética da revista. Desde seu lançamento, há vinte e dois anos, a Superinteressante tomou
por comprometimento a produção de abordagens diferenciadas a respeito de assuntos que,
basicamente, transitam entre cultura e ciência, denotando evidente aprofundamento. E,
inovando na forma de apresentar tal conteúdo, a revista desponta como referência na
produção infográfica nacional.
3.2. Infográficos “superinteressantes”
A partir das teorias de Barthes, (1990) apresentadas neste capítulo, e de todo o
embasamento teórico previamente citados nas figuras de Cairo (2008), Santaella (2008),
Kopp (2002), Dondis (2007), Hall (1998), Teixiera (2009) e teóricos afins, é possível
analisar praticamente todos os argumentos de tais estudos nas produções da revista
Superinteressante.
Como delimitado pela metodologia, também previamente, especificada, a amostra
toma por base as edições de janeiro, março e julho de 2010 e, para tratar da análise dos
elementos compositivos da infografia, estabelece foco na editoria denominada “Infográfico”.
O assunto de tal editoria é sobremodo generalizado e, percebe-se, busca endereçar-
se de acordo com grandes temas pautados pela mídia. A numerar:
1) “Códigos do além”
A revista de janeiro de 2010, edição 274, traz na editoria “Infográfico” um
elaborado esquema de apresentação de simbologias adotadas em cemitérios antigos,
intitulado “Códigos do além” (ANEXO 01). Sua autoria é dos repórteres e designers
Emiliano Urbim, Gabriel Gianordoli, Juliana Cunha e Pedro de Kastro. Resumidamente, em
dez itens, se discutem símbolos expressos através de estátuas, bustos, esculturas ou materiais
usados para compor os sepulcros tradicionais.
As cores predominantes são preto, branco e vermelho, fazendo ligação da imagem
com o tema pela idéia do suspense e do macabro. Ao fundo, uma única composição gráfica
apresenta um cemitério em perspectiva, desenhado à mão, onde dispõem-se todos os
elementos abordados nos boxes textuais. A idéia do desenho a traço de mão livre atenua, de
certa forma, a leitura e a própria relação do expectador com a imagem, conotando um
implícito distanciamento do real já que, comparativamente, por exemplo, o desenho não tem
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a força da fotografia para fazer referência à realidade. A imagem ocupa praticamente dois
terços da área compositiva.
Figura 01: Infográfico “Códigos do além”, Superinteressante, edição 274, janeiro de 2010, p. 46-47
No área restante, cerca de um terço, a mensagem textual se distribui
horizontalmente, estritamente resumida a conceituar os elementos simbólicos com destaque
na imagem. Os títulos de cada box são o próprio nome do elemento, e em não mais do que
dez linhas cada um deles conta, muito brevemente, a origem, tradição e razão de sua
utilização.
Todavia, como argumentado em Cairo (2008), apenas caracterizam-se infográficos
obras cuja linguagem visual e textual são indissociáveis. Neste caso, tem-se compreensão do
texto ainda que ausente o suporte da imagem, portanto, para fins de aplicação teórica, tal
produção não se configura como um infográfico.
Com aporte à Barthes (1990), é possível perceber também que a mensagem
denotada é, logicamente, bastante evidente. À primeira leitura fica absolutamente claro para
o leitor o conteúdo da composição e sua intenção enquanto informação. Talvez por ser seu
conteúdo bastante evidente, a mensagem denotada não oferece grande potencial de abstração
conceitual, senão pela retomada de memórias visuais que aproximem a imagem visual de
alguma recordação imagética real do leitor.
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O apelo estético, avaliado segundo Dondis (2007) e Kopp (2002), busca no design
uma composição gráfica equilibrada e estável, de modo que o olho do espectador se
direciona diretamente para a área central do gráfico, onde estão os pictogramas e onde, por
isso, se desperta a curiosidade inicial da matéria.
A organização dos elementos não deixa dúvidas de que intenção da obra é o dialogo
entre as mensagens icônicas e o texto, mas esta relação não é determinante para sua
coexistência. Teixeira (2009) a perceberia como um gráfico ilustrativo, onde a relação é
muito mais de complementaridade do que de suporte ao entendimento das mensagens.
2) “Grandes navegações”
Março (edição 276) traz o infográfico batizado de “Grandes navegações” (ANEXO
02), autoria de Emiliano Urbim e Gabriel Gianordoli. Acompanhando a cobertura midiática
do lançamento de novos softwares para navegação na internet, a edição deste mês elabora
um inteligente e detalhado gráfico em espiral ascendente para demonstrar o crescimento,
popularização e aprimoramento deste tipo de software nos últimos quinze anos. Trazendo as
diferentes marcas que competem neste nicho de mercado e demonstrando sua participação
efetiva, tanto no crescimento quanto no aprimoramento de tecnologias, a composição
consegue aliar de maneira interativa os recursos visuais e textuais, como proposto por
Teixeira (2009) e, ainda, seguir o ideal que Peltzer (2001) difundia ao afirmar a máxima
“mostre, não conte”.
Na obra, a mensagem textual é resumida, utilizada apenas para apresentar as
instruções de leitura do infográfico e trazer detalhes breves a respeito de cada navegador
incluído no comparativo. É na mensagem visual que se ancora o potencial informativo desse
infográfico, ao elucidar de maneira compreensivelmente simples dados como
desenvolvimento e crescimento histórico, quantidade de usuários, comparação com
concorrentes e os diferenciais de cada navegador. Ainda no que diz respeito à organização
icônica, a referenciação de legendas para explicação de cada elemento a partir de dados
simples, como cores diferentes ou linhas progressivas, caracteriza uma estratégia ímpar para
conquistar o público.
De fato, como aponta Dondis (2007) quando fala da sintaxe visual, apesar da
organização de elementos visuais se restringir apenas a diferentes formatos geométricos, é
tácito ao indivíduo incluir-se em uma das grandes proporções representativas de cada opção
e identificar-se no contexto. Em outras palavras, é implícito que o sujeito, dentro da
concepção pós-moderna de consumo, se identifique através do navegador que
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costumeiramente utiliza e, a partir daí, ele próprio se caracterize em grupos metafóricos
como “o mais usado” ou “o que mais cresce”. Importante perceber que o esquema cromático
não foi organizado de modo aleatório: os leitores com maior afinidade com conhecimentos
de informática percebem rapidamente que as cores que preenchem cada seção do gráfico são
as mesmas cores que compõe, com predominância, a logomarca de cada um dos navegadores
a que vem representar. O arranjo visual, portanto, facilita a compreensão da informação e
convida à leitura.
Figura 02: Infográfico “Grandes navegações”, Superinteressante, edição 276, março de 2010, p. 48-49
Ademais, como Medina (1988) resume, a formatação da informação, na medida em
que inclui elementos visuais, artísticos e linguagem verbal que se aproxime do público leitor,
tem potencial de assegurar uma atenção muito maior para o meio ou suporte que a veicula,
fato que não se pode negar quando comparado o infográfico desta edição com notícias
meramente textuais a respeito do tema. Isso indubitavelmente tem embasamento válido
quando, além de comunicar, o produto tem intuito também de vender, em se tratando de uma
revista comercial.
Na peça, textual e visual são inseparáveis, pois uma categoria de elementos permeia
a outra formando uma mensagem única (Cairo, 2008). A mensagem, por sinal, também se
enquadra nas definições de Barthes (1990) sobre a divisão denotativa e conotativa de seu
conteúdo: ao mesmo tempo em que testifica os índices de crescimento de forma clara, o
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infográfico também conota, para o leitor informado sobre as áreas de informática e
tecnologia, qual dos softwares está evidentemente em declínio e sugere relações de
concorrência entre as empresas desenvolvedoras de tais produtos, tendo potencial para, até
mesmo, influenciar na escolha por um deles. Uma curiosidade interessante reside no titulo:
conotativamente, e de maneira bastante inteligente, a frase que titula o infográfico faz
analogia com o período histórico das grandes navegações e descobrimentos, sugerindo já no
princípio a idéia de que a internet e, dentro deste contexto, os navegadores, são os veículos
pelos quais grandes descobertas se tornam acessíveis ao público.
Em “Grandes navegações”, até mesmo a medida real do infográfico facilita a leitura
dos dados e liga os elementos, figurando cálculos percentuais de fácil realização mental.
Também isso fortalece sua definição como infográfico, na lembrança teórica de que permitir
que o público construa a leitura e interaja com a peça conforme livre possibilidade é um dos
artifícios desse estilo (Santaella, 2008).
3) “A mansão do terror”
Na edição de julho (edição 280), os autores Emiliano Urbim, Jorge Oliveira e Olavo
Costa apresentam o infográfico intitulado “A mansão do terror” (ANEXO 03). Sua proposta
é apresentar a história dos filmes de horror, desde seu lançamento nas telas de cinema até sua
modernização nos dias atuais, classificando cada período e estilo com informações ricas e
detalhadas que permitem ao leitor compreender as diferenças entre cada item classificado.
No lead, uma breve contextualização histórica abre a mensagem textual convidando
o leitor a entrar em uma casa que, infograficamente, representa a evolução deste gênero do
cinema.
A mensagem textual se divide em duas organizações complementares que,
seqüencialmente, tratam de explicar sinteticamente os estilos dos filmes de terror e sua
evolução ao longo das períodos históricos. Na primeira, os estilos são divididos em
“monstros e assassinos”, “sobrenatural”, “trash”, “tortura” e “asiático”, sendo acompanhados
de conceituação, principais obras/autores e época em que se destacaram. A segunda explica
como as ferramentas e tecnologias fomentaram o aprimoramento de cada estilo ao longo de
décadas de evolução. Medina (1988) contribui ao avaliar a narrativa jornalística
contemporânea como uma história constituída em detalhes efêmeros em vez de simples
relatos, técnica que se faz presente no discurso textual da obra.
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Figura 03: Infográfico “A mansão do terror”, Superinteressante, edição 276, julho de 2010, p. 52-53
Visualmente, é o infográfico de conteúdo mais rico entre os analisados. Nele, a
iconografia é intensa e repleta de sentidos. É na mensagem visual que a obra se realiza
plenamente enquanto infográfico, pois organiza com sucesso diferentes níveis de leitura e
informação. A seqüência de leitura recai primeiro sobre as imagens, que trazem charges para
ilustrar cada filme citado através de referência às suas personagens. Depois, abrange a
esquematização cromática para, arbitrariamente, realizar os agrupamentos conforme
interesse do leitor. Aqui, vale retomar Santaella (2008) e a cultura das mídias, já que em
infográficos como o citado, ainda que o suporte midiático se classifique como um produto de
massa, o conteúdo e sua metodologia alternativa de apresentação buscam contemplar um
público que não é massivo, que pontua interesse por informações diferenciadas e sabe operar
neste meio para assimilar aquilo que consome.
Enquadrado na teorização de Cairo (2008) e Teixeira (2009), é sem dúvida um
infográfico completo, na premissa de que permite interação, suas partes são indissociáveis e
busca articular as informações de modo a potencializar e enriquecer todos os elementos e
formas de linguagem. Isso percebe-se mais nitidamente, por exemplo, através da divisão das
informações em setores (andares) e cores, possibilitando ao leitor mixar os diferentes boxes
de informação e filmes de modo que ele próprio constrói a ordem de leitura que mais lhe
parecer pertinente. Ou, ainda, no fato de que o livre cruzamento de dados convida o leitor a
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somar também aquilo que já é de seu conhecimento e o coloca, assim, em uma posição de
participante na construção do conteúdo. Essa possibilidade só se torna factual porque, como
lembra Dondis (2007), os níveis representacionais da inteligência visual, resumidos no
alfabetismo que o autor chama de sintaxe visual, estão mais arraigados a automáticos no
processo da linguagem humana do que nunca antes.
Denotadas, mensagens como a evolução dos filmes do gênero e a forma de
organização adotada para categorizar cada um saltam aos olhos, conforme Barthes (1990).
Percebe-se, por exemplo, o foco e conteúdo da matéria, a esquematização comparativa e as
charges que aludem aos filmes referenciados, fazendo-se entender sobretudo pela relação
entre signos apontada por Peirce (2003). A mensagem conotada é mais rica, e já começa na
percepção do formato do infográfico: para os conhecedores do gênero cinematográfico, é
nítido que o formato da casa que delineia o infográfico se assemelha à fachada de uma casa
assombrada no clássico filme de terror “Horror em Amytville”, dirigido por Stuart
Rosenberg em 1977. Ainda, a idéia de utilizar personagens para representar os filmes é
provocativa, falando diretamente ao subconsciente e ativando, assim como a lembrança dos
filmes, eventuais sentimentos, como medo ou temor, que eles provoquem. Até mesmo o
esquema cromático corrobora para a fundamentação de conotações que estimulam a
apreensão e a identificação com o tema.
De modo intuitivo, a visualização e assimilação de todo o conteúdo do infográfico
transcorre através de conexões entre os elementos. Não existe ordem de leitura, nem regra
para compreensão, e o resultado disso é um trabalho onde a narrativa encerra-se em si
mesma sem que seja necessário qualquer outro suporte senão o dos próprios elementos
visuais e textuais, condição obrigatória para a infografia segundo Teixeira (2009).
Infográficos como estes, sobretudo os das edições 276 (figura 02) e 280 (figura 03)
da Revista Superinteressante, colaboram com a disseminação de informações e
conhecimento através de novas metodologias, como percebe Wolton (2010), sugerindo novas
formatações para a produção da comunicação e, indo mais longe, constituindo também novas
práticas culturais de consumo dos produtos midiáticos.
São reflexos de hábitos pós-modernos, como ilustra Santaella (2008), com
consumidores efêmeros e uma produção diferenciada da comunicação. Estabelecendo
comparação entra a proposta da autora sobre a teoria das mídias e a produção infográfica da
Revista Superinteressante, segundo amostra metodologicamente selecionada, é possível
41
perceber que a segunda exemplifica muito bem a primeira. Em outras palavras, tem-se um
produto com características da produção de massa, mas dada a condição imposta pelo
público consumidor, este produto assume atributos personalizados, a citar a preocupação
com forma e conteúdo e a participação do leitor na construção de mensagens a partir de sua
posição sócio-cultural.
Afinal, como retoma Cairo (2008), o maior compromisso que qualquer tipo de estilo
jornalístico assume para com a sociedade é o de legibilidade e legitimidade. A julgar pela
conformidade dos estilo infográfico com estes valores, estratégias editoriais que trilhem esta
metodologia tem potencial par despontar como tendência midiática e consolidar-se como
alternativa de evidente sucesso para a prática da comunicação.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
De fato, como trazem Santaella (2007) e Hall (1998), o indivíduo pós-moderno tem
sua identidade fragmentada e isso se reflete diretamente em sua releitura a respeito do
ambiente social e suas práticas culturais. Manifestando, na verdade, diversas identidades e
percebendo isso como normal para uma única pessoa, esse indivíduo participa ativamente
dos processos que o permeiam e, cada vez mais, demonstra interesse e necessidade de
incluir-se, reafirmar-se a e posicionar-se no coletivo.
O reflexo, entre tantos outros, se dá também na maneira como ele consome e
participa da comunicação. Cada vez mais crítico, exige da comunicação de massa que ela o
escute e busque meios de, em sua totalidade, também falar-lhe em particular. É a
personalização, técnica de endereçamento que ganha forma na proposta estilística do
infográfico justamente por permitir que a totalidade do conteúdo informativo seja construída
aleatoriamente pelo próprio leitor, que toma por índice as mensagens textuais e visuais de
uma reportagem para contribuir com seu prévio conhecimento.
Além disso, a tendência de Dondis (2007) se confirma de igual modo através da
infografia, orientando as futuras práticas da comunicação para a revalorização da imagem
como meio significativamente mais rico para transmissão de mensagens. O sujeito pós-
moderno, graças aos avanços científicos e tecnológicos que implicam na facilidade de acesso
à comunicação e informação, tem fortalecida sua capacidade de abstração, conceituação e
construção, configurando-se capaz de compreender e atuar junto ao mix de informações em
que se resumem os infográficos. É também isso que sustentam Cairo (2008) e Teixeira
(2009) ao tratar do compromisso da infografia com a legibilidade através de um novo estilo
para o jornalismo informativo.
Uma análise infográfica deve ser capaz de identificar uma igual valorização das
mensagens textuais e visuais presentes na obra, uma vez que, como percebido ao longo do
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trabalho, o público contemporâneo busca cada vez mais nas imagens suporte para suas
leituras e compreensões acerca do conteúdo. É intrínseco ao infográfico, de igual maneira,
uma grande preocupação com a estética e o arranjo dos elementos compositivos no meio
midiático que os veicula, já que é pela beleza em apresentar a informação que este estilo se
diferencia dos demais. Finalmente, e de modo mais importante, a principal característica de
um infográfico completo é a fusão de suas mensagens: elas devem construir um discurso
narrativo em que texto e imagem sejam indissociáveis, cuja relação de complementaridade
agregue valor um ao outro, não apenas reforce sua relação.
Assimilar este conhecimento técnico e pô-lo em prática segundo as teorias que
revestem seu conceito é, sem dúvida nenhuma, uma estratégia capaz de emancipar a
comunicação social, convidando o público a interagir e percebendo nele um elo de grande
importância para a disseminação de notícias e informações com potencial para, de fato,
revolucionar. E é pelo modo de se posicionar, pela assimilação de conhecimentos cada vez
mais claros e, como conseqüência, pela sua participação ativa nos processos culturais que o
indivíduo pós-moderno pode revolucionar seu contexto.
Revolução esta percebida não necessariamente como gigantes e majestosos
movimentos históricos, mas uma constante transformação do cotidiano que, baseando-se na
legitimidade da comunicação para discutir valores e fundamentar identidades, seja capaz de
fomentar no sujeito a compreensão de seu meio e estimular-lhe à ação.
Medina (1988) relembra que o jornalismo, hoje, é um dos principais meios para a
obtenção de conhecimento por parte da sociedade. Atribuir ao jornalismo estilos e
características que o permitam interagir e dialogar diretamente com o público
contemporâneo é nada mais que qualificar sua atividade e tornar mais eficaz sua proposta. É
aí que se percebe a importância da infografia: ela é o constante evoluir da linguagem e do
meio, um estilo pelo qual o jornalismo amplia sua capacidade de disseminar informação e
conhecimento, auxiliando a construção de identidades culturais mais esclarecidas e,
logicamente, contribuindo para o desenvolvimento social.
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