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Inovação, universidade e relação com a sociedade

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Page 1: Inovação, universidade e relação com a sociedade
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INOVAÇÃO, UNIVERSIDADE

E RELAÇÃO COM A SOCIEDADE:

BOAS PRÁTICAS NA PUCRS

Page 3: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Chanceler: Dom Dadeus Grings

Reitor:

Joaquim Clotet

Vice-Reitor: Evilázio Teixeira

Conselho Editorial:

Antônio Carlos Hohlfeldt Elaine Turk Faria

Gilberto Keller de Andrade Helenita Rosa Franco

Jaderson Costa da Costa Jane Rita Caetano da Silveira Jerônimo Carlos Santos Braga

Jorge Campos da Costa Jorge Luis Nicolas Audy (Presidente)

José Antônio Poli de Figueiredo Jussara Maria Rosa Mendes

Lauro Kopper Filho Maria Eunice Moreira

Maria Lúcia Tiellet Nunes Marília Costa Morosini

Ney Laert Vilar Calazans René Ernaini Gertz

Ricardo Timm de Souza Ruth Maria Chittó Gauer

EDIPUCRS: Jerônimo Carlos Santos Braga – Diretor Jorge Campos da Costa – Editor-chefe

Page 4: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Jorge Luis Nicolas Audy

Marília Costa Morosini

(Orgs.)

INOVAÇÃO, UNIVERSIDADE

E RELAÇÃO COM A SOCIEDADE:

BOAS PRÁTICAS NA PUCRS

PORTO ALEGRE

2009

Page 5: Inovação, universidade e relação com a sociedade

© EDIPUCRS, 2009

Capa: Vinícius Xavier

Diagramação: Gabriela Viale Pereira

Revisão: dos autores

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

I58 Inovação, universidade e relação com a sociedade [recurso

eletrônico] : boas práticas na PUCRS / Jorge Luis Nicolas Audy, Marília Costa Morosini (Orgs.). – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : EDIPUCRS, 2009. 324 p.

Sistema requerido: Adobe Acrobat Reader Modo de acesso: World Wide Web:

http://www.pucrs.br/orgaos/edipucrs/ ISBN 978-85-7430-872-2 (on-line)

1. Ensino Superior. 2. Universidade – Aspectos Sociais. 3.

Universidade e Sociedade. 4. Responsabilidade Social. 5. PUCRS – Ação Social. I. Audy, Jorge Luis Nicolas. II. Morosini, Marília Costa.

CDD 378.155.

Ficha Catalográfica elaborada pelo Setor de Tratamento da Informação da BC-PUCRS

Av. Ipiranga, 6681 - Prédio 33

Caixa Postal 1429 90619-900 Porto Alegre, RS - BRASIL

Fone/Fax: (51) 3320-3711 E-mail: [email protected]

http://www.pucrs.br/edipucrs

Page 6: Inovação, universidade e relação com a sociedade

SUMÁRIO

Apresentação .........................................................................................................9 Joaquim Clotet

Prefácio ................................................................................................................12

Gabriela Cardozo Ferreira

BOAS PRÁTICAS NAS CIÊNCIAS HUMANAS Um pacto pela Terra: a colaboração da Teologia na formação da consciência ecológica .............................................................................................................14

Leomar Antônio Brustolin Renato Ferreira Machado

I Olimpíada de Filosofia do RS.............................................................................35

Sérgio Augusto Sardi Muita Prosa e Muito Verso: idosos e a literatura ..................................................45

Maria Tereza Amodeo

Intervenção na Comunidade por meio dos Contos de Fadas ..............................56 Nadia Maria Marques Leanira Carrasco Mônica Kother Macedo

“Formação de Jovens e Adultos Leitores na comunidade do Morro da Cruz”......67 Maria Conceição Pillon Christofoli Maria Inês Côrte Vitória Jussara Margareth de Paula Loch

BOAS PRÁTICAS NAS CIÊNCIAS SOCIAIS

Saúde e trabalho no Mercosul: a experiência do Centro Colaborador e suas estratégias............................................................................................................78

Jussara Maria Rosa Mendes

SET Universitário: 21 anos comunicando-se com a sociedade............................86 Vitor Necchi Fábian Chelkanoff Thier Neka Machado

Por uma teoria dos direitos e deveres socioambientais: aproximações sociais e jurídicas a partir do exemplo da judicialização do direito fundamental à saúde ..95

Ingo Wolfgang Sarlet Carlos Alberto Molinaro

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Laboratório de Mercado de Capitais – A Universidade capacitando gratuitamente a sociedade........................................................................................................107

Letícia Braga de Andrade Leandro Antonio de Lemos

BOAS PRÁTICAS NAS CIÊNCIAS BIOMÉDICAS

Integrando ensino, pesquisa e extensão para resolver um problema de conservação ambiental e saúde pública ............................................................119

Júlio César Bicca Marques

Banco de Dados em Saúde Bucal: uma forma inovadora da descoberta do conhecimento na odontologia.............................................................................131

Eduardo Gonçalves Mota José Antônio Poli de Figueiredo Duncan Dubugras Ruiz Luciano Costa Blomberg

A formação de uma rede de pesquisa científica através da criação de uma “Liga da Pesquisa Cirúrgica” .......................................................................................139

Jefferson Braga Silva Lucas Colomé Alessandra Sebben Martina Lichtenfels Marcelo Rabello

Análise do salto horizontal em contexto inclusivo ..............................................145 Daniela Boccardi Goerl

A oferta de medicamentos de qualidade para a sociedade................................157 Ana Lígia Bender Cristina Maria Moriguchi Jeckel Flavia Valladão Thiesen José Aparício Brittes Funck

Efeito da modificação do estilo de vida sobre os fatores de risco cardiovascular que compõem os critérios de diagnóstico da Síndrome Metabólica, marcadores inflamatórios e balanço autonômico: um estudo randomizado...........................161

Ana Maria Pandolfo Feoli Fabrício Edler Macagnan Virgínia Schmitt Márcia Koja Bregeiron Maria Terezinha Antunes

BOAS PRÁTICAS NAS CIÊNCIAS EXATAS

Prática de ensino em ambientes não-formais de educação: um projeto social que envolve docência e pesquisa .............................................................................173

Monica Bertoni dos Santos

Page 8: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Ensino de Física para inclusão: o reconhecimento da diversidade e a superação das dificuldades de aprendizagem.....................................................................183

João Bernardes da Rocha Filho Valderez Maria do Rosário Lima Nara Regina de Souza Basso

Desafio de Robôs: Integrando a Sociedade no Mundo da Robótica ..................194 Rubem Dutra Ribeiro Fagundes André Luiz Tietböhl Ramos

ENADE Comentado-Computação: Compartilhando Contribuições para a Avaliação de Cursos ..........................................................................................203

Flávio M. Oliveira Carlos A. Prolo Avelino F. Zorzo Gilberto K. Andrade

Porto Alegre Acessível: estratégias inovadoras para a política de acessibilidade e Inclusão Social ...................................................................................................213

Mario S. Ferreira Ana R.S. Cé José C. B. Campos João F.D. Moraes Suzana C. Barboza Paulo H. Regal

Nova abordagem Safety na segurança de cabine..............................................224 Ubirajara Kneipp Andréa Kneipp Dal Bosco

Inovação na formação de professores de Química: a integração ensino-pesquisa-extensão.............................................................................................................235

Maurivan Güntzel Ramos Concetta Schifino Ferraro Rejane Rolim Azambuja

BOAS PRÁTICAS NOS INSTITUTOS ESPECIAIS

Gestão Ambiental na Universidade e a busca de uma sociedade sustentável ..250 Jorge Alberto Villwock Betina Blochtein

Atividade auto-instrutiva em Bioética: a educação à distância como ferramenta de aprendizagem para profissionais de nível técnico na assistência a pessoas vivendo com HIV/AIDS.......................................................................................258

Anamaria G. S. Feijó Mauro C. Ramos Paulo R. Wagner

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Gerontoarquitetura - O Despertar da Consciência de uma Nova Regulamentação Arquitetônica ......................................................................................................269

Fabiane Azevedo de Souza Antonio Carlos Araújo Souza Mario dos Santos Ferreira Irenio Gomes

Determinação de malondialdeído em amostras biológicas por cromatografia líquida de alta eficiência .....................................................................................282

Carlos Eduardo Leite Guilherme Oliveira Petersen Mariel Raquel Borges Betto Maria Martha Campos

Planejamento Estratégico na Fundação Irmão José Otão .................................290 Álvaro Gehlen de Leão Ana Lúcia Suárez Maciel André Hartmann Duhá

Educação online: uma educação inovadora?.....................................................304 Lucia Maria Martins Giraffa Elaine Turk Faria

O Museu de Ciências e Tecnologia da PUCRS: mediação entre conhecimento e sociedade. ..........................................................................................................318

Melissa G. Simões Pires Luiz Marcos Scolar Emílio A. Jeckel-Neto

Page 10: Inovação, universidade e relação com a sociedade

APRESENTAÇÃO

Inovação, universidade e relação com a sociedade são conceitos

instigantes que ocupam e desafiam instituições internacionais como a UNESCO e

a OCDE, bem como as autoridades nacionais, seus respectivos conselhos e os

envolvidos com a Educação Superior. Inovação e relação com a sociedade

constituem-se em imperativos da universidade do século XXI.

A PUCRS, como universidade comunitária, confessional católica e

integrante da quase bicentenária tradição educativa marista, vem se dedicando à

reflexão e ao planejamento, alicerçada nesses temas. Prova disso são os

seminários anuais dedicados a esses tópicos e que congregam um bom número

dos nossos docentes, pesquisadores e membros da administração superior, bem

como outras relevantes iniciativas tais como os cursos de atualização docente e

os dedicados aos gestores.

Refletindo mais uma vez sobre a missão que nos é própria e sobre a

realidade da Educação Superior em nosso país, para além das fronteiras e do

continente, constatamos uma série de variantes que condicionam e desafiam o

nosso compromisso com a Instituição de qualidade quer no âmbito nacional, quer

no âmbito internacional. Considero relevante destacar as seguintes:

- a mudança do perfil cognitivo, social e relacional dos nossos atuais

alunos em relação aos acadêmicos das últimas décadas;

- os diferentes métodos e instrumentos de ensino, de pesquisa e de

aprendizagem devidos às novas possibilidades oferecidas pelas

tecnologias da informação e da comunicação;

- a progressiva mobilidade acadêmica de pesquisadores, de professores e

de alunos e a correspondente internacionalização dos nossos curricula,

cursos e instituições;

- as contínuas e exigentes demandas de novos cursos e especializações

para atender às exigências e às competências próprias do mundo do

trabalho.

Isso tudo abre a porta da inovação na Educação Superior para responder

às mudanças e às exigências apresentadas, que tornam-se inexoráveis, quais

sejam:

Page 11: Inovação, universidade e relação com a sociedade

10 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

- o esforço inquestionável pela qualidade;

- o melhor alinhamento entre as inovações introduzidas no processo

ensino-aprendizagem e na pesquisa;

- a maior flexibilidade dos projetos pedagógicos à luz das diretrizes

curriculares;

- o incentivo dado aos estudos e às pesquisas multidisciplinares e

transdisciplinares;

- o incremento da educação continuada ou formação permanente (life long

learning);

- a pertinência da pesquisa e da inovação com as necessidades regionais.

Além disso, resulta imprescindível considerar as exigências éticas ou de

boa conduta, vinculadas também à inovação na Educação Superior. Cabe

mencionar entre elas:

- o respeito aos direitos humanos;

- a educação para todos;

- a responsabilidade social;

- a erradicação da violência;

- a promoção da paz;

- a eliminação da pobreza;

- a sensibilidade ecológica;

- o surgimento de economias mais integradoras, equitativas e

sustentáveis.

Os meus sinceros agradecimentos aos destacados professores de

reconhecidas universidades da Espanha, dos Estados Unidos da América, de

Israel, do México, de Portugal e do nosso querido país, que contribuíram com seu

legado intelectual para a reflexão sobre esses importantes temas.

Da mesma forma, manifesto minha gratidão aos representantes de

agências e entidades nacionais e internacionais da Educação Superior por

possibilitarem indubitável conexão entre seu ideário e o fazer próprio da

academia.

Aos distintos professores da nossa estimada Universidade a minha

admiração e o meu reconhecimento por diferentes formas de participação na

busca da inovação na Educação Superior.

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 11

Merecem uma menção especial o Prof. Jorge Audy, Pró-Reitor de

Pesquisa e Pós-Graduação, e a Professora Marília Costa Morosini, Diretora da

Faculdade de Educação da PUCRS, pelo seu denodado esforço na realização do

evento e na organização da presente publicação. Aos tradutores, revisores e

demais colaboradores os meus sinceros cumprimentos pelo trabalho realizado.

Tenho certeza de que inovação e relação com a sociedade ficarão como

referência e como prioridade para todos os participantes deste seminário na hora

de planejar e de dialogar sobre a Educação Superior no momento atual.

Joaquim Clotet

Reitor da PUCRS

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PREFÁCIO

No contexto da Sociedade do Conhecimento emerge um novo papel para a

Universidade, expandindo seu foco tradicional na formação e capacitação (ensino

e pesquisa), e agregando à sua missão a atuação direta no processo de

desenvolvimento social, econômico e cultural da sociedade. Neste sentido, a

relação com a sociedade é, sem dúvida, uma questão central na atuação da

universidade. Para a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul -

PUCRS, a relação com a sociedade é também um dos seus eixos de gestão,

pautada ainda pela inovação e empreendedorismo.

Como parte integrante do IV Seminário de Inovação, Universidade e

Relação com a Sociedade, a Mostra de Boas Práticas reúne uma seleção de

práticas inovadoras da PUCRS na interação com a sociedade. De variadas

formas a universidade demonstra sua interação com o entorno por meio da

relevância de suas pesquisas e ações. Este volume apresenta na forma de textos

o que foi apresentado durante o seminário na forma de exposição.

Obrigada a todos os Diretores, Agentes de Inovação e participantes por

tornarem possível esta Mostra.

Gabriela Cardozo Ferreira

Coordenadora de Inovação – PRPPG/PUCRS

Page 14: Inovação, universidade e relação com a sociedade

BOAS PRÁTICAS NAS CIÊNCIAS HUMANAS

Page 15: Inovação, universidade e relação com a sociedade

UM PACTO PELA TERRA: A COLABORAÇÃO DA TEOLOGIA NA FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA

ECOLÓGICA

Unidade Acadêmica: Faculdade de Teologia Responsáveis: Prof. Dr. Leomar Antônio Brustolin ([email protected])

Ms. Renato Ferreira Machado ([email protected])

Resumo: Através de Palestras e oficinas realizadas em escolas, igrejas, rádios e

centros culturais, analisam-se os valores e paradigmas de plenitude da

modernidade e suas conseqüências para o planeta. Criticam-se os modelos de

pessoa, ciência e sociedade desenvolvidos a partir da modernidade. Propõe-se a

superação do individualismo por uma identidade humana relacional e a superação

da ciência instrumental pelo saber participativo.

Palavras-chave: Ecologia, Pós – Modernidade, Teologia .

Abstract: Through lectures and workshops in schools, churches, radio stations

and cultural centers, it examines the values and paradigms of fullness of

modernity and its consequences for the planet. Criticism is the model person,

science and society developed from modernity. It is proposed to overcome the

individualism of a human identity and relationship of science overrun by

instrumental know participatory.

Keywords: Ecology, Post Modernity, Theology.

Introdução

A luta pela preservação ambiental atingiu o mesmo nível de importância da

busca pela paz mundial. Ao conceder o Prêmio Nobel da Paz ao ex-vice-

presidente dos EUA, Al Gore e ao Painel Intergovernamental sobre Mudanças

Climáticas (IPCC, órgão das Nações Unidas que reúne cientistas do mundo

inteiro), o comitê norueguês deu uma amostra de que o problema do aquecimento

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 15

global passou a ser o epicentro da preocupação e das disputas políticas

internacionais.

Por estes motivos, o problema interpela também o fazer teológico.1

Faz-se necessário que cada pessoa lance um olhar de cuidado e

reparação à vida que se encontra ao seu redor, vida que já estava lá antes do

homo sapiens fazer seus primeiros ensaios sociais e antropológicos. A maior

contribuição da Teologia, por isso, virá no nível da interpretação dos significados

que perpassam esta situação e sua relação com as grandes questões de fundo

que incidem na relação trinômica “pessoa-ambiente-sagrado”. Junto a isso devem

vir propostas concretas de uma prática que contribua com respostas a estes

problemas a partir da dimensão transcendente humana, embasadas na fé

professada pelas tradições judaica e cristã.2 Tendo estas questões presentes,

pergunta-se: de que forma a Tradição Cristã (nas suas várias confissões e em

conjunto com a Tradição Judaica) interpreta a história, o tempo, o papel do ser

humano e sua relação com aquilo que se revela como criação de Deus? Que

olhar pode ser lançado sobre a chamada “Pós-Modernidade” e seus elementos a

partir disso, ou seja, em que ponto da História da Salvação a humanidade está

inserida? Aliás, a humanidade (de maneira especial o ocidente cristão) ainda se

vê como participante de uma história de salvação? Neste sentido, a crise

ambiental talvez se torne o mais forte sinal surgido neste tempo: sinal de que o

ser humano pós-moderno, com toda a sua autonomia e liberdade, ainda precisa

ser salvo e talvez dele mesmo.

Este itinerário, que foi desenvolvido como pesquisa em nível de Mestrado

Acadêmico no Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Teologia, tem

recebido uma grande demanda de pedidos de divulgação e partilha. Assim, desde

a defesa da dissertação, em dezembro de 2008, a temática foi trabalhada em

cursos de extensão na área da Teologia e do Ensino Religioso e ganhou espaço

na programação da Semana Teológica de Farroupilha e de Caxias do Sul. Além

disso, já foi tema de entrevista para a Rádio Mírian (1160 AM, de Caxias do Sul) e

ganhou publicação, como artigo, na revista Teocomunicação e nos anais da

1 Cf. TILLICH, Paul. Teologia Sistemática, p. 20. 2 É necessário colocar o Islamismo junto a estas tradições. Para que não se amplie demais, porém, a temática que se deseja abordar, por hora, não se fará referência a ele.

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16 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Semana Teológica de Caxias do Sul, revelando a urgência de abordagem do

tema e o quanto o prisma teológico tem a contribuir para ele.

Objetivos

Objetivo Geral

Analisar a crise ambiental à luz da Teologia, buscando a possibilidade de

novos paradigmas de coexistência, que ressignifiquem o agir humano no cosmos

a partir de sua condição de criatura à espera do cumprimento da promessa de

seu criador.

Objetivos Específicos

• Caracterizar o ser humano e a pós-modernidade a partir dos paradigmas

e rompimentos antropoteológicos assumidos neste tempo.

• Identificar a crise ambiental em suas causas teológicas.

• Propor uma pedagogia de bases teológicas que possibilite um pacto pela

vida no planeta para a agenda teológico-ecológica do Século XXI.

Descrição do Processo

A crise ambiental como crise dos valores estabelecidos na modernidade

De certa forma, o que caracteriza uma mudança de época é a transição de

paradigmas socialmente aceitos dentro de certa normalidade para novos

paradigmas, que abrirão novos horizontes, delinearão novos perfis e inspirarão

novos ideais. O gênero humano encontra-se hoje em uma fase nova de sua história, na qual mudanças profundas e rápidas estendem-se progressivamente ao universo inteiro. Elas são provocadas pela inteligência do homem e por sua atividade criadora e atingem o próprio homem, seus desejos individuais e coletivos, seu modo de pensar e agir tanto em relação às coisas quanto em relação aos homens. Já podemos falar então de uma verdadeira

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 17

transformação social e cultural, que repercute na própria vida religiosa.3

Ao lançar-se no esforço de descrever o zeitgeist que perpassava os

meados da década de sessenta do Século XX, a Igreja Católica Apostólica

Romana, reunida no Concílio Vaticano II intuía não apenas uma época de

mudanças, mas uma mudança de época, com radicais rupturas ao status quo de

então. Na Constituição Pastoral Gaudium et Spes pode se ler, no número 212 que

“a própria história acelera-se tão rapidamente que os homens conseguem segui-

la com dificuldade” e que tal fenômeno dá a luz um “complexo novo de

problemas, que provoca novas análises e sínteses”, tudo isso sem que,

necessariamente os “velhos problemas” tenham sido resolvidos. O fato de

constatarem-se novas problemáticas significa que se colocou em andamento

processos que não foram mantidos “sob controle” e avançaram para além daquilo

que se esperava ou que seria aceitável. A Gaudim et Spes, porém, não fala

apenas em “novos problemas”, mas em um “complexo de novos problemas”: ou

seja, há uma conjuntura nova e problemática vivida pela humanidade e que não

poderá ser resolvida com soluções de tempos passados, pois esta mesma

conjuntura pode ter se erguido como superação da anterior. (...)no limiar da era moderna fomos emancipados da crença no ato da criação, da revelação e da condenação eterna. Com essas crenças fora do caminho, nós, humanos, nos encontramos “por nossa própria conta” – o que significa que, desde então, não conhecemos mais limites ao aperfeiçoamento além das limitações de nossos próprios dons herdados ou adquiridos, de nossos recursos, coragem, vontade e determinação. E o que o homem faz, o homem pode desfazer.4

Na afirmação de Bauman é possível encontrar uma primeira característica

marcante deste tempo, ou melhor, das pessoas deste tempo: vive-se a época da

“autonomia do ser humano” ou de sua emancipação, como o mesmo autor se

refere a este fenômeno. Há de se perguntar, então, do que este ser se emancipou

e ao que ele vivia “atrelado” antes. Jürgen Moltmann faz, sobre esta questão, uma

classificação simples e profunda: diz ele que na sociedade de tipo “tradicional” a

existência de uma pessoa era predeterminada e regulada, por inteiro, pela

3 Gaudium et Spes 206 4 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida, p. 36 - 37

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18 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

pertença a certa família, casta, extrato social ou população, havendo pouco

espaço para decisões individuais. Completa ele, dizendo que o nome de uma

pessoa, sozinho, valia pouco.5 Constata ele, na mesma obra, que o mundo

moderno nasce no momento em que a cultura humana se livra de sua

dependência para com a natureza e da própria harmonia com a terra.6 Encontra-

se aqui, portanto, a síntese da emancipação que embasa a modernidade e a pós-

modernidade: não há tradição que determine o futuro, nem natureza que impeça

os projetos do presente. Que pessoa e que mundo nascem desta situação?

Este é o ideário que, de certa forma, transforma a história humana em uma

“linha” de fatos que se sucedem e sinalizam a passagem do tempo: o progresso.

É com esta idéia fixa que se começa, no mundo moderno, a distinguir o que já

passou daquilo que se vive e a projetar possíveis futuros para a humanidade.

Futuros estendidos ad infinitum e alicerçados naquilo que a imaginação humana

pensar em fazer com os recursos da terra.7 Uma idéia fascinante e sedutora, mas

que apresenta conseqüências difíceis de administrar: conseqüências que formam

o “complexo de novos problemas” do qual falava a Gaudium et Spes.

No Judaísmo e no Cristianismo, o tempo é lugar de encontro com o Criador

que alenta no presente e orienta para o futuro. Na teologia de Moltmann, a

criação é possibilidade do Espírito Criador de Deus, imanente a ela, em uma

dinâmica constante de possibilidades e realidades. O problema, assim, passa a

ser não apenas orientar-se para um futuro linear de salvação, mas para que

possibilidade de futuro orientar-se. Enquanto a experiência das tradições

históricas busca um futuro guiado por uma promessa de plenitude e para a

glorificação (que pode ser entendida aqui como vida plena) de tudo que existe, a

“civilização emancipada” tem, muitas vezes, orientado seu futuro a um vazio

hedonista, em nome de um progresso que, ao invés do “sonho da vida”, traz

“sonhos de consumo” e acaba consumindo a própria vida. Neste contexto, pode-

5 “Nelle societá di tipo tradizionale l‟intera esistenza delle persone veniva predeterminata e regolata dalla culla allá tomba, condizionata dall‟appartenenza ad una certa famiglia, casta, ceto ociale,popolazione,disponendo di bene scarso margine di manovra per le decisioni e gli sviluppi individuali. Il nome della persona singola valeva poco.” MOLTMANN, Jürgen. Dio nel Progetto del Mondo Moderno – Contributi per una rilevanza pubblica della teologia. p. 84 6 “(...) il mondo moderno nasce nel momento in cui la cultura umana si scrolla di dosso lê dependenze dalla natura della terra e le consonanze com essa” idem, p. 75 7 Ver, também, SUSIN, Luis Carlos. A Criação de Deus.p. 12

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 19

se concluir que tal projeto leva todos os viventes a existirem sob o tempo de

Chronos, o titã da mitologia grega que devora seus filhos e não sob o Kayrós do

Deus da Revelação, que torna eterno cada momento e promete novos céus e

nova terra.

Segundo Leonardo Boff, no livro Ética e Moral: a busca dos fundamentos,

o ocidente sempre teve a obsessão persistente de levar sua cultura e visão de

mundo a todos os povos da terra. O autor enumera esta constatação em vários

fatos históricos, iniciando por Alexandre Magno, na Grécia, passando pelo

Império Romano, pelo cristianismo e, finalmente, pelo imperialismo ocidental

secularizado, o que “significou impor, por bem ou por mal, os valores e as

instituições ocidentais a todos os povos submetidos.” 8 Se atualmente não se fala

tanto em imperialismo como processo de expansão, o termo globalização tem,

muitas vezes, feito este papel, sendo identificado como uma infiltração da

economia ocidental em vários âmbitos socioculturais por novos meios e com

novos fins. O momento que se vive atualmente parece pedir uma prestação de

contas dos valores pregados por este Ocidente expansionista, que tem se

mostrado como “senhor da verdade” e detentor de uma salvação movida à

esperteza, oportunismo e individualismo. Sobre isso, Edgar Morin lembra que,

“desde Maquiavel, a ética e a política acham-se oficialmente separadas, visto que

o príncipe (governante) deve obedecer à lógica da eficácia, não à moral.” 9, ou

seja: caminha-se sob a égide do pragmatismo, que nem sempre abre espaços

para que a vida seja contemplada em seu valor mais profundo. Tal realidade é

constatada no segundo capítulo do Documento de Aparecida, ao se referir à

situação sócio-cultural da América Latina, mais precisamente no item de número

46. Verifica-se, em nível intenso, uma espécie de nova colonização cultural pela imposição de culturas artificiais, desprezando as culturas locais e com tendência a impor uma cultura homogeneizada em todos os setores. Esta cultura se caracteriza pela auto-referência do indivíduo, que conduz à indiferença pelo outro, de quem não necessita e por quem não se sente responsável. Prefere-se viver o dia a dia, sem programas a longo prazo nem apegos pessoais, familiares e comunitários. As

8 Cf. BOFF, Leonardo. Ética e Moral: a busca dos fundamentos .p. 75 9 Cf. MORIN, Edgar. O Método6: Ética, p. 25

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20 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

relações humanas estão sendo consideradas objetos de consumo, conduzindo a relações afetivas sem compromisso responsável e definitivo.10

Assim, é preciso perguntar: se esta civilização chegou a certo patamar de

desenvolvimento e progresso com seus próprios esforços, por que ela estaria

errada? Afinal, não seria a vontade do próprio Deus criador que sua criatura

desenvolvesse suas potencialidades ao máximo e transformasse em realidade

tudo aquilo com que sempre sonhou? Sem dúvida que não se trata, aqui, de

demonizar todos os avanços tecnológicos desenvolvidos pelo ser humano, mas

de afirmar que há, sim, um desvio de caminho, teologicamente falando. Este

desvio é apontado muito claramente por um fator que grita aos ouvidos da pós-

modernidade: o clamor das vítimas deste processo, incluindo aí a natureza. Se a

história iniciada com a migração de Abraão é a História da Salvação, certamente

não é salvadora a história escrita pela civilização moderna, industrial e pós-

industrial, pois na primeira não pode haver exclusões ou vitimações de qualquer

espécie.

Na presença deste paradigma desenvolvem-se algumas características

predominantes no sistema de pensamento pós-industrial: o individualismo,

preconceitos de diversas espécies, hedonismo e um grande silêncio sobre a

morte. Produz-se, neste contexto, um ser humano em eterna busca de

compensações para as decepções que a vida lhe coloca no caminho e que vive a

lógica do mérito e do prazer: ou seja, o acesso à qualidade de vida é algo a ser

conquistado e, uma vez conquistado, deve ser extremamente usufruído. Tal

visão, no pensamento de Bauman, traz à sociedade um padrão de

“acampamento”, aonde os “hóspedes” vêm e vão, preocupados apenas com o

espaço que seu trailer ou barraca irá ocupar, com a garantia de um bom

funcionamento do lugar (que deve ser providenciado por quem o administra) e

com o quanto os vizinhos irão ou não incomodá-los.11

Surge, assim, um ser humano que, tentando estar em todos os lugares ao

mesmo tempo, acaba não estando em lugar nenhum, nunca; procurando uma

10 CELAM, V Conferência Geral do Episcopado Latino Americano e do Caribe, disponível em <http://redelatina.marista.edu.br/VConfer%C3%AAnciaCELAM/Portugu%C3%AAs/DocumentoVers%C3%A3oAparecida/tabid/248/Default.aspx> Acesso em: 07 de abril de 2008. 11 Cf. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. p. 31

Page 22: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 21

hiperconexão, se desvincula das realidades palpáveis e mergulha em tempos e

realidades virtuais. Como, mesmo assim, ainda é impossível frear o tempo, os

grandes vazios existenciais decorrentes da rejeição das ações deste são

preenchidos com botox (congelando rostos em uma juventude forçada), cartões

de crédito (que pagam, aparentemente, qualquer coisa – de alimentos ao corpo

alheio, alugado para o prazer de quem paga) e a própria busca do paraíso bíblico.

É interessante notar como são cada vez mais freqüentes as propagandas

imobiliárias oferecendo residências “junto à natureza”, em lugares calmos e

seguros, onde se possa respirar ar puro: ou seja, em sua “autoexpansão”, o

pretenso semideus pós-moderno compra o seu próprio Éden e coloca em seus

portais querubins de alguma empresa de segurança, para impedir que demônios

de classes sociais diferentes da sua cometam o pecado de invadir sua

privacidade. Na contramão destas tendências, a Tradição Cristã afirma sua

crença em um Deus que se revela exatamente com atitudes contrárias a estas.

Na criação, é um Deus que se “autocontrai”, permitindo que os seres criados

tenham a vida da qual necessitam. Na encarnação, vive o esvaziamento kenótico

desde o nascimento até a cruz, entregando o próprio espírito em sua última

expiração humana. No Pentecostes, preenche os vazios de medo e insegurança

da primeira comunidade com um sopro de vida, coragem e entendimento. É um

Deus que não acumula, mas doa e, principalmente, expande-se em relações

profundas e complexas, onde não há dominação, mas fraternidade.

Ressignificando alguns paradigmas teológico-culturais do ocidente

Logicamente, não se pode pensar em um ser humano passivo diante de

seu ambiente e que, repentinamente, passa a dominá-lo e utilizá-lo: pelo

contrário, ao não se identificar como semelhante a nenhuma espécie que o

cercava e dar-se conta de que não havia nenhum nicho ecológico especialmente

preparado para ele, o ser humano passou a adaptar o ambiente para sua própria

sobrevivência. Nisto percebe-se o nomadismo característico dos primeiros

grupamentos hominídeos e a posterior sedentariedade através da agricultura. No

primeiro caso, a fuga de uma natureza que lhe colocava em perigo e, no segundo,

a descoberta de certa maleabilidade desta para produzir os alimentos que não

obtinha de forma espontânea no lugar onde se encontrava. Para esta situação

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22 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

aponta a narrativa da criação, no livro do Gênesis, quando trata da saída do

primeiro casal do Jardim do Éden: Ao homem, ele disse: “Porque escutaste a voz

de tua mulher e comeste da árvore que eu te proibira de comer, maldito é o solo

por causa de ti! Com sofrimentos dele te nutrirás todos os dias de tua vida. Ele

produzirá para ti espinhos e cardos, e comerás as ervas dos campos. Com o suor

de teu rosto comerás teu pão até que retornes ao solo, pois dele foste tirado. Pois

tu és pó e ao pó tornarás” (Gn 3, 17-19).

Ao amaldiçoar o solo por causa do homem, o narrador bíblico,

provavelmente, deseja indicar a condição deste ao se afastar de um Deus que é

criador dele e da natureza e não colocar o ambiente como inimigo da pessoa. O

texto quer indicar, de dentro da tradição judaico-cristã que a realidade poderia ser

diferente (menos sofrida), se o homem honrasse a fidelidade com seu criador e,

ao mesmo tempo, diferenciar-se de culturas circuncidantes, que divinizavam a

natureza12 e colocavam o ser humano como parte dela.13 O importante aqui,

porém, é detectar as raízes desta suposta “superação da natureza” idealizada no

seio do mundo moderno, visto que o texto bíblico não supõe que a continuidade

do “estado de paraíso” pelo gênero humano eliminaria a necessidade do trabalho

e do esforço no seio da criação. O que se aponta é que a relação, que seria de

cuidado, reciprocidade e partilha, em um bio-irmanamento a partir da presença do

próprio Deus Criador, passa a ser relação de sobrevivência e hostilidade.

No seguimento da caminhada teológica iniciada em Abraão e Sara, que se

tornam peregrinos de uma promessa, a civilização que daí decorre cometeu o

equívoco de pensar esta caminhada como conquista e de entender a promessa

de Deus como mérito. O mito de um reino eterno de paz, alimentado nos

primeiros tempos do cristianismo vai ganhar aportes no nascedouro da civilização

industrial ocidental, anunciada como último estágio da história, onde todos os

problemas se resolveriam pela distribuição dos bens e pela boa administração

econômica.14 Ao mesmo tempo, esta civilização entregará a natureza ao ritmo das

máquinas inanimadas, “fazendo dos bosques um monte de madeira utilizável, de

12 Cf. MOLTMANN, Jürgen. Dio nel Proggeto Del Mondo Moderno. p. 75 13 Cf. Ibidem, p. 78 14 Cf. MOLTMANN, Jürgen. El Hombre. p. 50

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 23

modo que depois se faz necessário criar parques naturais protegidos.”15 Para que

tais idéias se tornassem realidade no mundo, alguns paradigmas precisaram ser

adotados por esta civilização. Entre eles está a objetivação da natureza pelo ser

humano, que a reprime e viola, esgotando as possibilidades de parceria amistosa

com ela e o antropocentrismo cósmico, que se apodera de uma interpretação

equivocada da teologia da criação e coloca toda a natureza a serviço do

homem,16 ao entender que, por ter sido feito à imagem e semelhança do criador,

o ser humano possuiria autoridade semelhante a de Deus quanto à criação. A

questão, assim, talvez não comece pela visão que o ser humano tem daquilo que

o cerca, mas de sua visão sobre ele mesmo. Neste sentido, percebe-se na

história da Tradição Cristã uma tendência de deslocar as questões soteriológicas

da criação como um todo para a alma humana individual17: tal ideário

acompanhará a civilização cristã ocidental e formará uma estrutura de

pensamento onde o corpo será subestimado e até mesmo desprezado.

Assim, não haveria na crise ambiental de coisificação da natureza uma

crise do próprio cristianismo ocidental? Não seria correto afirmar que a Tradição

Cristã, por muito tempo, apregoando uma espiritualidade subjetiva e uma

salvação individual da pessoa, preparou o terreno e a justificativa para uma

dicotomia pessoa/natureza? É claro que respostas para estas perguntas não são

simples e diretas, pois exigem uma escuta histórica extensa e atenta, porém, é

possível que se aponte alguns sinais desta realidade em duas atitudes

largamente adotadas na pós-modernidade: a busca obsessiva de uma

transcendência solitária, conectada à rede mundial de computadores e o

enaltecimento de tradições religiosas orientais (e anômalas ao cristianismo) como

salvaguarda da relação entre humanidade e natureza.

Do conhecimento à ciência, da ciência à sabedoria

Se há um fator determinante da virada hermenêutica dada pela

modernidade sobre as eras anteriores da história humana, este se encontra na

15 Ibidem, p. 52 16 Cf. SUSIN, Luiz Carlos. A Criação de Deus. p. 13 17 Cf. MOLTMANN, Jürgen. El Hombre. p. 49

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24 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

concepção e prática das ciências sobre o mundo. Se a palavra “ciência” tem sua

origem no termo “saber”, o sentido de saber toma rumos diversos de uma

“sabedoria”, indo ao encontro da conquista de poder por parte do ser humano: tal

é o princípio do qual parte Francis Bacon, em sua Instauratio Magna, onde afirma

que esta ciência deve estabelecer o imperium hominis, visto que saber é possuir. A ciência da modernidade explora a natureza para que ela dê retorno aos

seus investimentos em pesquisa, que por sua vez se dão, na maioria dos casos,

para que haja mais lucratividade em determinada área do mercado: a floresta vira

um estoque de madeira, os rios viram hidrelétricas e espaços como a Amazônia

são desmatados para se tornarem pasto, onde se criará animais que servirão

para o abate. Leonardo Boff refere-se a isto em sua obra Princípio de Compaixão

e Cuidado, ao lembrar que a cultura ocidental se caracteriza pelo logocentrismo,

ou seja, pela soberania da razão (de modo especial, a razão instrumental) sobre a

realidade. Esta, porém, por ela mesma se faz irracional por ser produtivista e não

levar em conta as outras tantas dimensões que dinamizam a vida.18

Por isso mesmo, é só a partir de outros paradigmas, que não sejam

logocêntricos, que se pode fazer teologia sobre a questão ecológica, visto que

não há nenhuma ligação clara e lógica entre a fé judaico-cristã e o meio-

ambiente, ou melhor, pode-se até encontrar justificativas para esta utilização da

natureza nesta mesma fé. Apesar dos recentes esforços da Igreja para reler a

passagem da criação, a cultura ocidental absorveu muito bem a idéia de que a

natureza não existe em si, mas passa a ter sentido a partir da humanidade,

servindo-lhe como cenário e sustentáculo em sua história da salvação. A questão

chave para a tradição cristã seria, então, perguntar-se hoje, diante de um planeta

ameaçado: quem é o meu próximo?19

Tornar a natureza e a própria vida “útil” é atentar contra ambas. A vida só

pode se fazer útil quando ofertada livremente, como dom e não quando uma

utilidade alheia lhe é imposta. Por isso, a natureza se deixa verdadeiramente

utilizar apenas naquilo que oferece livremente em seus ciclos vitais. Avançar para

além disso é explorá-la.

18 Cf. BOFF, Leonardo. Princípio de Compaixão e Cuidado. p. 10-11 19Cf. SOFFIATI, Arthur. Ecologia: reflexões para debate.p.127-128

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 25

Uma criação explorada à espera de seu shabbat

Todas as idéias de chegada a um estágio ideal de vida para a

humanidade, com possibilidades e recursos infinitos, remetem ao conceito do

shabbat, no contexto da teologia da criação. Em si, é uma tentativa ontológica de

reestabelecer ligações com um estado de vida que parece ter se perdido em

algum ponto da história e livrar-se das maldições adquiridas pelas escolhas

equivocadas do ser humano. Semanticamente, portanto, esta busca é religiosa,

no sentido de religação e, por isso mesmo, tem sido feita de forma parcial e

equivocada. A busca de uma religação precisa passar por uma releitura e por

uma reeleição de prioridades e valores, visto serem, estes dois últimos termos,

também tradutores do termos “religião”. Por falta de releitura, estes esforços vêm

sendo empreendidos antropocentricamente, sem levar em consideração a

situação igualmente decaída e sofredora da criação como um todo. Sem isso,

obviamente, não se chega a uma reeleição. A releitura, por isso, precisa

recomeçar no momento imediatamente anterior ao afastamento do ser humano

de seu criador: no shabbat do sétimo dia, quando a criação havia sido concluída e

abençoada. O Deus da Bíblia não é somente o inquieto “Deus da História”. Ele é

também, na mesma medida, o Deus do repouso sabático, aquele que interrompe

a história e o tempo. (...) É um Deus que sai de si mesmo criando e que retorna

novamente a si mesmo repousando, concluindo sua obra do mesmo jeito que um

artista leva a cumprimento aquilo que de fato lhe estava retraído e o põe em

liberdade.20

A imagem de um Deus que contempla sua obra deveria corresponder à de

um músico que escuta sua composição ou de um pintor que contempla seu

quadro e não simplesmente a de alguém que terminou uma tarefa e precisa repor

suas forças. Desta forma, uma primeira releitura da narrativa da criação deve

remeter à concepção de uma obra de arte, onde a força do trabalho é movida por

paixão e sensibilidade, em busca de uma estética criadora que dê sentido ao

20 “Il Dio della Bibbia non è soltanto l'inquieto 'Dio della storia'. Egli è anche, in pari misura, il Dio del riposo sabbatico, colui che interrompe la storia e il tempo. È un Dio che esce da se stesso creando e che ritorna nuovamente in se stesso riposando, prendendo congedo dalle sue opere allo stesso modo dell'artista che porta a comprimento ciò che há fatto ritraendosene e lansciandolo in libertà.” MOLTMANN, Jürgen. Dio nel Progetto del mondo moderno. p. 77

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26 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

caos. Sendo tempo de contemplação do criado, o sábado convida a atitudes

diferenciadas daquelas que se fazem necessárias no período de labor criativo. O

sétimo dia acontece nas relações de gratuidade, onde todas as criaturas

convivem face a face pelo simples prazer do encontro. Não há vez, neste

ambiente, para a contagem cronológica dos dias que passam e nem para as

exigências de produção: tudo é reconciliação e fraternidade. Tudo é

escatológico.21 Nesta dinâmica, obviamente, não é apenas o humano que

vivencia esta qualidade de relações. Pelo contrário, como imagem e semelhança

do criador, é este o ser responsável pela descoberta e confirmação desta

reconciliação criacional em toda a biodiversidade. O tempo sabático é aquele em

que a natureza toda é ela mesma e a terra descansa em sua fecundidade,

deixando de ser objeto de posse de quem quer que seja. Desta forma, pode-se

identificar no Sábado da Criação, a mais profunda e verdadeira vocação

ecológica humana da criação.

A partir da tradição judaica, a teologia do sábado torna-se uma verdadeira

política ambiental divina. Sempre com o horizonte de “coroamento da criação”, a

observação sabática trará, por exemplo a prática do “ano sabático”: de sete em

sete anos, deve-se viver um ano inteiro da mesma forma que no sábado, com

repouso absoluto da terra (Lv 25, 4). Tal prática traz uma ligação intrínseca entre

o ecológico e o social, visto que, além da preservação do ambiente, sem

interferências neste, há também o perdão das dívidas e a restauração da

dignidade dos excluídos, devolvendo-lhes o que lhes fora destituído no ano do

jubileu (de cinqüenta em cinqüenta anos, cf. Lv 25, 8-17).93 Como resultado, o

Povo da Aliança faz, a partir da observância destes preceitos, a experiência de

um novo tempo e um novo espaço, aproximando-se, assim, do kayrós original da

criação. Teologicamente falando, portanto, a atual crise ambiental vem a revelar

uma criação que aguarda o seu shabbat, ou seja, uma natureza que espera pelo

tempo de ser ela mesma e uma terra que clama por descanso.

A experiência de fé, realizada no âmbito das Tradições Religiosas, apesar

de se constituir em ato público, resguarda uma atitude pessoal, a partir da qual se

opta ou não por determinada doutrina. Assim, não é possível considerar uma ou

21 Cf. SUSIN, Luiz Carlos. A Criação de Deus. p. 80-83 92Iibidem, p. 82

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 27

outra visão de vida, humanidade ou natureza como sendo a mais adequada para

todas as pessoas do planeta, sem que se entre em um conflito doutrinário e

dogmático sobre qual tradição seria guardiã da verdade e quais estariam

equivocadas. De certa forma, pode-se dizer que aquilo que as diversas Tradições

Religiosas possuem em comum são os seres humanos que as constituem e, por

isso, as noções recorrentes de humanidade e do valor desta, vêm, sim, destes

conjuntos de crenças.

À medida em que, historicamente, definia-se a idéia de ser humano, foram-

se definindo os direitos inerentes a ele. Mais precisamente, no contexto do

iluminismo ocidental e do nascimento das constituições norte-americanas e

européias, que traziam a noção de um “novo Estado”, formula-se a idéia de

“homem universal”, detentor de “direitos universais”. Nesse sentido, a novidade

que esta proposta trazia era a de que a humanidade das pessoas vinha antes de

suas nacionalidades, crenças, etnias e gêneros. Atualmente, pode-se dizer que a

afirmação destes direitos reforçam a perspectiva de legitimação de uma “política

humana” no planeta, unindo a comunidade humana frente a grandes ameaças

comuns, como a própria crise ambiental. É preciso constatar, porém, que o

momento que se vive hoje pede uma evolução no conceito destes direitos: além

do esforço para que sejam, de fato, cumpridos em todo o planeta, suplantando

interesses particulares de países, grupos, religiões e culturas, faz-se necessário

ampliar sua formulação e conceituação. O cenário hodierno pede que os direitos

humanos evoluam para “direitos da humanidade” e, daí, para os “direitos da

Terra”, para se chegar aos “direitos de todos os viventes”.22

Um código de direitos da pessoa originado no seio do Iluminismo,

certamente traz, em si, muito de antropocentrismo. Há de se pensar, por exemplo,

qual a justa medida entre o direito que todos possuem à autonomia e

desenvolvimento no âmbito de sustentabilidade e a própria sustentabilidade do

ambiente no qual estas mesmas pessoas vivem. Há, de certa forma, uma

confusão de liberdade com poder de consumo, em um quadro alimentado pelos

interesses de grandes empresas e corporações, que colocam no mercado mais

produtos do que aquilo que seria possível adquirir e utilizar por um tempo

22 102Cf. MOLTMANN, Jürgen. Dio nel progetto del mondo moderno. p. 115-116

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28 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

razoável, sem necessidade de substituição. Aliado a isso, há uma ansiedade

coletiva por um reconhecimento que vem daquilo que se pode comprar e ostentar,

sustentado por uma falácia desenvolvimentista que enxerga apenas o âmbito

econômico.23 Desta forma, faz-se importante perguntar: é possível pensar em

dignidade humana sem pensar em um ambiente digno para que as pessoas

vivam? É possível ser digno como pessoa ou sociedade sem reconhecer a

dignidade intrínseca aos biossistemas onde se vive?

Ao se falar em direitos da pessoa, normalmente se faz referência ao

esforço pela garantia da dignidade do ser humano frente às ameaças que esta

sofre atualmente, em vários cenários do planeta. Em sua concepção, porém, este

estatuto carrega a idéia de transformar realidades que põem em risco a vida para

que esta não volte a correr perigo no futuro. Assim, lutar pelos direitos das

pessoas significa dar continuidade a um pacto que a humanidade vem fazendo

com as gerações futuras, para que estas não sofram o que as gerações passadas

sofreram e nem o que as atuais sofrem e para que certos quadros, onde direitos

fundamentais foram assegurados não revertam ao que eram antes. Por esta

razão é preciso que, neste momento, se faça a pergunta pelo futuro do planeta e

da humanidade que nele habita: o que se faz necessário realizar hoje para que as

próximas gerações tenham sua sobrevivência e dignidade garantidas?

Ora, ao longo da história as demandas pelo futuro da humanidade foram

se modificando de acordo com as circunstâncias históricas e as necessidades de

cada época. Pode-se enumerar uma evolução na idéia de direitos fundamentais

que resguardam a pessoa em sua dignidade: uma primeira geração se encontra

na Declaração Universal de Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789. Lá,

defende-se a idéia de liberdade diante de um Estado que não deveria intervir na

vida de seus cidadãos, mas deixar-lhes espaço para o desenvolvimento. Uma

segunda geração virá no final do Século XIX e primeira metade do Século XX,

onde se fala em Direitos Fundamentais Sociais: é o momento em que o Estado

deve intervir, praticando uma justiça distributiva para equilibrar desigualdades e

garantir o direito ao trabalho, à justa remuneração e à previdência social, por

23 103Cf. SUNG, Jung Mo. Sustentabilidade e Ecologia in MOURA, Marlene Castro Ossami de (org.). Ecologia e Espiritualidade: os gritos da Mãe-Terra. p. 61-71

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 29

exemplo. A terceira geração pode ser entendida como os Direitos de

Solidariedade, onde figuram os direitos à paz, ao desenvolvimento, à

autodeterminação dos povos e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.24

Desafios

Uma lenta e progressiva transformação de paradigmas

Ao se fazer a constatação das características do cenário onde a crise

ambiental surge e se desdobra, nas assessorias que temos prestado, nos

preocupamos em apontar possibilidades de reversão deste quadro a partir de

seus aspectos teológicos. Estas possibilidades, porém, não pretendem ser

soluções imediatas para um problema que se encontra enraizado em nossas

crenças: a proposta é de uma longa e árdua caminhada de esperança por uma

nova rota, a ser construída passo a passo.25 Esta rota terá de passar pela

concepção que o ser humano tem dele mesmo a partir do sagrado onde deposita

sua fé, bem como por seu conceito de conhecimento, ciência e sabedoria e,

principalmente por sua ética de convivência, abrindo mão, talvez, daquilo que

considere seguro. Chega-se, desta forma, aos três principais paradigmas

indicados na teologia de Moltmann como chave de mudança para a vida neste

planeta: o paradigma de superação do indivíduo pelo humano, que só se

compreende na ressonância de suas relações; o paradigma de superação da

ciência-dominação pela ciência-participação, que aponta para a vivência da

sabedoria como entendimento da vida; finalmente, o paradigma de superação da

sociedade estratificada em grupos analógicos pela sociedade do amor ao inimigo,

onde a responsabilidade mútua de todos os viventes poderá levar a um pacto

pela terra.

Por adentrar o campo dos significados últimos da existência, o evento

ambiental se torna teológico e a problemática com a natureza se torna pergunta

pela criação, uma vez que esta mesma cultura que ameaça o planeta foi gestada

no seio da Tradição Cristã do ocidente. O pensamento de Moltmann alerta para o

24 Cf. AZEVEDO, Plauto Faraco de. Ecocivilização – Ambiente e Direito no limiar da vida. p.47-48 25 Cf. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p.54

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30 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

perigo de nos imaginarmos na época da consumação de todas as potencialidades

humanas devido às mudanças e avanços ocorridos nas últimas décadas. O sinal

de que não se chegou à plenitude são as vítimas destes processos e o próprio

fato de que as pessoas cada vez mais têm se compreendido a partir de uma

individualidade fechada. Reler a pós-modernidade à luz da História da Salvação,

por isso, significa perguntar-se pelas possibilidades de abertura ou fechamento ao

vir-a-ser proporcionado pelo Espírito da Vida, que respira em cada ser criado.

Para tanto, é preciso passar do tempo-quantidade (cronos) para o tempo-

qualidade-eternidade (kayrós) e isto só é possível no espaço do encontro das

essências criaturais.

Qualquer que seja o tempo desta história da esperança que a criação vive,

ele sempre apontará para a escatologia sabática, que é o tempo da convivência

do Criador com suas criaturas. O shabbat revela o valor de cada vida, levando-as

ao encontro fraterno de convívio, onde cada ser vale pelo que é e não pelo que

produz. A possibilidade de se viver isso encontra-se na hermenêutica trinitária do

Deus Criador, que cria em aliança e para a aliança. Uma vez que o ser humano é

imagem deste mesmo Deus, então, sua vocação é ser espelho de relações

comunitárias abertas e favoráveis à vida, ao invés de arremedo de uma divindade

onipotente e escravizadora de seu ambiente. Se, ao saber-se livre o ser humano

chegou ao individualismo para afirmar identidades individuais, chegou o momento

de usufruir da liberdade para além das relações de poder (entre os seres

humanos e destes para com a natureza). Para tanto, Moltmann aponta mais duas

dimensões do ser livre que precisam ser contempladas: a dimensão da liberdade

como qualidade de convivência e a dimensão da liberdade como possibilidade

criativa de futuro e esperança. É no equilíbrio destas três dimensões que se

encontraria a possibilidade de abertura para o porvir de relações com o planeta.

Junto a isso, a capacidade humana de conhecer e criar conhecimento precisaria

ser revista em função dos paradigmas assumidos como ciência: Moltmann

assume que a ciência guiada pela razão instrumental esgotou-se e igualmente

está esgotando as possibilidades de vida na Terra. Se a vida se dá na abertura

para as relações e para o futuro, conhecer teria muito mais a ver com participar

dos sistemas a serem conhecidos do que com uma exploração de utilidades do

que se quer conhecer. Ciência teria de ser uma relação entre sujeitos e não entre

sujeito e objeto. Neste nível, o conhecimento pode se tornar sapiencial,

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 31

renovando a essência das relações e questionando a validade de algumas formas

de viver consagradas culturalmente na civilização ocidental e eurocêntrica. É por

isso que a chave para um pacto pela Terra reside na sociedade do amor ao

inimigo, que acolhe a diversidade em conflito e rompe os ciclos de violência,

dominação e exploração entre os seres humanos e destes com o planeta. O

segredo deste pacto está exatamente na livre decisão de irmanamento possível

com as criaturas, principalmente com aquelas escolhidas para não serem

“próximas”, por causarem temor ou desestabilizarem a maneira como se está

acostumado a viver.

O conflito que se instaura frente à crise ambiental e às medidas

necessárias para sua reversão não passam mais apenas pelos cálculos

econômicos que precisam ser feitos ao se pensar em redução da emissão de

gases na atmosfera. O conflito é de crenças a respeito do futuro: enquanto se

acreditar que o problema ambiental é apenas um percalço a ser superado para se

manter o modus vivendi globalizado pelo ocidente neoliberal, que se mostra

consumista e individualista, mais se agravarão os quadros preocupantes da

saúde do Planeta Terra. A esperança, por isso, pode encontrar renovação no

exercício de um silêncio de cumplicidade com a criação, onde o ser humano

sinta-se novamente integrado e saiba do que abrir mão para ser essencialmente o

que foi criado para ser.

Atores Envolvidos

As assessorias prestadas sobre a questão têm tido variados interlocutores.

Em Caxias do Sul, trabalhamos, ao longo de um mês, com alunos do Curso em

Extensão de Teologia, grupo formado por adultos oriundos de diferentes

atividades profissionais e sociais (empresários, médicos, advogados, educadores,

etc.). Quadro semelhante foi encontrado na 8ª Semana Teológica de Farroupilha.

Já no curso de Extensão em Ensino Religioso, em Porto Alegre, a grande maioria

dos atores eram professores de Ensino Religioso da capital e região

metropolitana. Na 16ª. Semana Teológica de Caxias do Sul a temática será

tratada na interface com a Bioética

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Resultados Alcançados

A natureza da pesquisa e sua proposta de reflexão sobre paradigmas

talvez não permitam vislumbrar resultados imediatos. O que tem se percebido,

nas assessorias, pronunciamentos e palestras é uma certa surpresa pelo prisma

de abordagem da questão ambiental e a possibilidade de retomada de algumas

idéias no dia a dia. A expectativa é de que a uma nova ótica sobre a questão

permita uma nova ética ecológica. Neste sentido, talvez seja interessante

descrever os processos de divulgação da temática a partir do que cada grupo

atingido buscava.

No Curso em Extensão de Teologia, no contato com atores sociais em

busca de formação complementar às suas áreas de atuação profissional e

pastoral, havia a curiosidade sobre a como a Teologia poderia dialogar com a

questão ecológica. Neste sentido, buscou-se uma abordagem a partir de uma

releitura das narrativas da criação, em perspectiva pastoral. Enfatizou-se a busca

por uma sensibilidade maior nas relações interbiológicas, referendando-se em

uma hermenêutica de aliança, presente na teologia da criação. Da mesma forma

conduziu-se nossa participação na 8ª Semana Teológica de Farroupilha, sendo

que, no momento de debate com o público, emergiram de forma clara as crises

entre práticas buscadas para “solucionar” a crise ambiental e a necessidade de

uma gradual mudança de mentalidade, que resultará em novas ações. Na mesma

oportunidade, em entrevista à Rádio Mírian, buscamos propor caminhos mais

reflexivos para a questão ambiental, enfatizando que ações isoladas e paliativas

não levarão a uma reversão deste quadro.

No Curso em Extensão de Ensino Religioso, a busca maior era por uma

aplicabilidade da questão na sala de aula e possíveis interfaces interdisciplinares.

Nossa proposta, junto aos educadores foi a de releitura do simbólico e do

teológico que perpassam a cultura ocidental, buscando novas significações para o

fator ambiental. Da mesma forma, havia uma certa expectativa pela apresentação

de dinâmicas e trabalhos “práticos” a serem desenvolvidos com os educandos,

apontando para ações como separação e reciclagem de lixo e promoção de

campanhas temáticas. Novamente, propomos uma reflexão mais aprofundada,

compreendendo que a possibilidade de atuações como as supracitadas devem

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 33

ser conseqüência da renovação das mentalidades e relações interpessoais e

ecológicas.

Enfatizamos, ainda, como parte da metodologia adotada, a inserção de

videoclipes, peças publicitárias, trechos e trailers de filmes que enfatizam as

questões abordadas. Ao fazermos isto, não estamos buscando meras ilustrações

mas indicando que, um dos caminhos possíveis para a reversão de alguns

paradigmas está na busca da sabedoria contida na arte, que sintetiza o

conhecimento de forma lúdica e contundente. Assim, nos utilizamos dos clipes

musicais “Do the Evolution”, da banda norte americana Pearl Jam, “Original of the

Species”, da banda Irlandesa U2 e “Vilarejo” da cantora brasileira Marisa Monte;

dos trailers cinematográficos de “Ensaio sobre a Cegueira” (Blindness), de Vítor

Meirelles e de “Batman, o Cavaleiro das Trevas” (The Dark Knight), de

Christopher Nolam e também da peça publicitária “Sustente-se” da Grendene.

Referências Bibliográficas

AZEVEDO, Plauto Faraco de. Ecocivilização – Ambiente e Direito no limiar da vida. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005 . BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001 JUNGES, José Roque. Ética Ambiental. São Leopoldo: Unisinos, 2004 KERBER, Guillermo. O Ecológico e a Teologia Latino-Americana.Porto Alegre: Sulina, 2006 MOLTMANN, Jürgen. A Biotecnologia à luz da nova Neurobiologia e de uma Teologia Integral. Humanística e Teologia. Porto, tomo XXVIII, fascículo 1 / 2, p. 88-110, dez. 2007. ______. Deus na Criação: Doutrina Ecológica da Criação. Petrópolis: Vozes, 1992. ______. Dio nel Progetto del Mondo Moderno – Contributi per una rilevanza pubblica della teologia. Brescia: Queriniana, 1999 ______. Experiências de Reflexão Teológica – Caminhos e Formas da Teologia Cristã. São Leopoldo: UNISINOS, 2004 ______. La Justicia crea futuro: Política de paz y ética de la creación em um mundo amenazado. Santander: Sal Terrae, 1992

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34 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

______. O que é a Vida Humana? Antropologia e desenvolvimento biomédico. Humanística e Teologia. Porto, tomo XXVIII, fascículo 1 / 2, p. 67-87, dez. 2007 MORANDINI, Simone. Teologia ed Ecologia. Brescia: Morcelliana, 2005 SUNG, Jung Mo. Sustentabilidade e Ecologia in MOURA, Marlene Castro Ossami de (org.). Ecologia e Espiritualidade: os gritos da Mãe-Terra. Goiânia: Editora da UCG, 2007. p. 61-77 VIEIRA, Tarcísio Pedro. O nosso Deus: um Deus Ecológico – Por uma compreensão ético-ecológica da teologia. São Paulo: Paulus, 1998

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I OLIMPÍADA DE FILOSOFIA DO RS

Prof. Dr. Sérgio Augusto Sardi Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas

[email protected]

Resumo. A I Olimpíada de Filosofia do RS promoveu a realização de atividades

de cunho filosófico. Seu tema foi: “É possível uma sociedade justa?”. As

atividades consistiram em: a) diálogos em grupo em torno do tema, seguidos ou

não de b) produção de textos e/ou obras artísticas relacionadas ao tema. A

Olimpíada destinou-se a alunos do Ensino Infantil, Fundamental e Médio,

representando suas respectivas instituições de ensino. As Atividades Pré-

Olímpicas foram coordenadas pelos respectivos educadores das turmas/grupos

participantes. No dia 22 de novembro de 2008, no prédio 5 do Campus Central da

PUCRS foi realizado o encontro Regional da Olimpíada. Nesse dia as atividades

foram promovidas e coordenadas pela Coordenação das Olimpíadas de Filosofia.

Abstract. The I Olympic Games of Philosophy promotes activities regarding

philosophical matters. Its subject was: “Is it possible a fair society?” The activities

consisted in: a) group dialog refered to the subject, followed or not by b) artistical

works related to the subject. The Olympics was destined to students of all grades,

representing their respective educational institutes. The Pre-Olympics activities

were coordinated by the respective educators of the participant classes/groups.

On 22th November 2008, Central Campus of PUCRS, building 5, occurred the

Olympic Regional Meeting. On such day, the activities were coordinated by the

Coordenation of the Olympic Games of Philosophy.

Introdução

Em termos mundiais, o movimento olímpico em Filosofia já tem mais de

uma década. Em 1995, a Unesco, no marco do programa “Filosofia e Democracia

no Mundo”, recomendou promover as Olimpíadas de Filosofia, tanto em nível

nacional como internacional, a fim de estimular o interesse dos jovens por essa

disciplina. Na América Latina realizam-se Olimpíadas de Filosofia em diversos

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36 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

países, como na Argentina, Uruguai, Chile, Paraguai, Peru e Colômbia.

Periodicamente, organizam-se também Olimpíadas do Rio de La Plata, entre

Argentina e Uruguai, e existe o projeto de organizar Olimpíadas do Mercosul.

As Olimpíadas de Filosofia nasceram da convicção de que as questões

filosóficas aparecem na vida de todas as pessoas e em todas as idades. Assim,

elas precisam de um cuidado e um estímulo especial para não serem erradicadas

violentamente do nosso cotidiano ou tratadas superficialmente. Com um espírito

de acolhimento das diferenças, as Olimpíadas pretendem convocar alunos para

um exercício de investigação solidária, num clima que pretende ser não de

competição, mas de colaboração e de estímulo para o pensamento. A idéia é de

que a partir da proposta, processos filosóficos criativos sejam construídos através

da interlocução, interação e participação autônoma dos ‘jogadores’. Com a

obrigatoriedade da Filosofia no Ensino Médio no Brasil, as Olimpíadas podem se

constituir em um pólo agregador de interesses de alunos e professores,

fortalecendo e contribuindo com os objetivos pelos quais o Ministério de

Educação introduziu a Filosofia no Ensino Médio.

A Olimpíada de Filosofia do RS é um evento educacional incentivado e

assessorado pela Associação de Cursos de Filosofia do Sul do Brasil (Fórum Sul

de Filosofia) e pelos Cursos de Filosofia do RS.

A iniciativa propõe a realização de atividades didáticas de Filosofia,

desenvolvidas nas escolas de Ensino Infantil, Fundamental e Médio do Rio

Grande do Sul, versando sobre um tema geral. É sugerido que os estudantes

participem de atividades de diálogo em forma de Comunidade de Investigação ou

outro processo que promova a solidariedade investigativa, assim como de

atividades de produção textual e de apresentação de trabalhos artístico-filosóficos

durante todas as etapas das Atividades Olímpicas.

Objetivos

• Subsidiar uma efetiva contribuição da Filosofia à formação dos

participantes;

• Fomentar o espírito crítico e dialógico entre os estudantes;

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 37

• Desenvolver nos jovens cidadãos o aprimoramento das habilidades de ler

e escrever textos filosóficos, bem como de realizar diálogo filosófico em

solidariedade investigativa;

• Promover a interface entre a Filosofia e outras áreas do conhecimento;

• Promover a integração entre as escolas, os estudantes e os professores

participantes.

Descrição do Processo de Inovação Desenvolvida e Resultados Obtidos

Atividades

Foram realizadas, nas Instituições de Ensino Infantil, Fundamental e Médio

do Estado do Rio Grande do Sul devidamente inscritas, atividades curriculares e

extracurriculares, protagonizadas pelos estudantes e seus professores, sobre a

temática da Olimpíada. Incluem-se aí atividades de diálogo em forma de

Comunidade de Investigação (ou outros processos que promovam a

solidariedade investigativa), bem como oficinas, teatro, poesia, desenhos,

exposições e outras atividades pedagógicas e artístico-filosóficas. Desde o início

foi proposto que as ações relativas às Atividades Pré-Olímpicas da I Olimpíada

de Filosofia do Rio Grande do Sul, tanto do ponto de vista da organização como

dos métodos, fossem autônomas e que realizassem um intercâmbio de

experiências.

As Atividades Pré-Olímpicas foram realizadas entre maio e setembro de

2008, em caráter experimental. Durante este processo as escolas e professores

participantes realizaram a seleção dos trabalhos artístico-filosóficos a serem

apresentados e dos estudantes a serem inscritos nos Encontros Regionais da I

Olimpíada de Filosofia do RS, realizados em novembro de 2008. Tais alunos e

professores participaram do Encontro Estadual, realizado no prédio 5 do Campus

Central da PUCRS.

Foram selecionados três estudantes por turma nas quais as Atividades

Pré-Olímpicas tenham sido realizadas para a participação na modalidade

Debates e produção textual.

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38 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Também foi selecionado um trabalho artístico-filosófico por turma onde

as Atividades Pré-Olímpicas tenham sido realizadas para a participação na modalidade Apresentação de obra artístico-filosófica.

Atividades Olímpicas – Encontro Regional e Encontro Estadual

Os Encontros Regionais(opcionais) reuniram os estudantes selecionados

pelas escolas inscritas e que participaram das Atividades Pré-Olímpicas

realizadas em todo o Estado.

Do Encontro Estadual da I Olimpíada de Filosofia do RS participaram os

trabalhos e estudantes selecionados nos Encontros Regionais.

As modalidades das atividades realizadas nos Encontros Regionais e no

Encontro Estadual são as mesmas propostas para a etapa Pré-Olímpica.

As atividades foram realizadas com base no Tema Geral proposto para a I

Olimpíada de Filosofia do Rio Grande do Sul: “É possível uma sociedade justa?”.

Figura 01 – Abertura do evento. Esquerda para direita: Prof. Me. Adão Clóvis dos Santos(PUCRS), Prof. Dr. Draiton Gonzaga de Souza(PUCRS), alunos participantes(ao centro); Prof. Dr. Sérgio Augusto Sardi(PUCRS).

Page 40: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 39

Figura 02 – Apresentação artística sob a forma de peça de teatro, feita pelos alunos do Colégio

Kennedy.

Modalidades

As modalidades de inscrição para apresentação de trabalhos consistiram

nas seguintes:

• Debates e produção textual: 1. Realização, durante o evento, de

diálogo filosófico em forma de Comunidade de Investigação (ou outros

processos que promovam a solidariedade investigativa), com base no

tema geral da Olimpíada. 2. Produção de texto individual, pelos

estudantes, com base na ação precedente e sobre o tema geral da

Olimpíada, no decorrer das Atividades Olímpicas. A Comissão

Organizadora poderá avaliar a necessidade de propor textos base para o

debate e a produção textual, respeitando os níveis estabelecidos no item

2.

• Apresentação de obra artístico-filosófica: Apresentação, durante o

evento, de peças teatrais, poesia, desenhos, vídeos, exposições, música,

dentre outras formas de expressão artística. Os trabalhos apresentados

devem incidir sobre o tema geral da Olimpíada e poderão ser objeto de

diálogo filosófico em forma de Comunidade de Investigação pelos

participantes e público presente em cada atividade.

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40 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

As escolas foram responsáveis pela seleção dos estudantes que a

representaram na modalidade Debates e produção textual, bem como dos

trabalhos a apresentados na modalidade Apresentação de obra artístico-filosófica.

Os mesmos estudantes selecionados para representar as escolas puderam

participar das duas modalidades, ficando esta definição a critério das escolas. À

elas também foi possível se fazer representar por estudantes distintos para as

duas modalidades ou, ainda, optar por participar de apenas uma das modalidades

descritas acima.

As escolas inscritas ficaram responsáveis pela seleção dos professores

que acompanhar seus estudantes durante todo o processo das Atividades

Olímpicas.

Apoio Institucional e Interação Docente

Em apoio à realização e articulação das Atividades Pré-Olímpicas e das

Atividades Olímpicas, bem como em vista da promoção do intercâmbio de

experiências entre os professores de Ensino Infantil, Fundamental e Médio

inscritos na I olimpíada de Filosofia do RS foi previsto desde o início:

• Elaboração e manutenção de um site oficial da Olimpíada, construído

durante o segundo semestre de 2008, que continua ativo.

• Divulgação, no site, de relatos de atividades dos professores

participantes;

• Divulgação, no site, de referências bibliográficas, textos de apoio, por

parte da coordenação do evento;

• Realização, pelos cursos de Filosofia, dentro de plano a ser elaborado e

a partir das demandas de cada região, de conferências, seminários e/ou

oficinas para professores e estudantes, relacionados com o tema da

Olimpíada.

Foi solicitado aos professores, desde o princípio do processo, o envio de

materiais sobre atividades realizadas para divulgação no site da Olimpíada de

Filosofia do RS com a finalidade de realização de intercâmbio de experiências

entre os docentes. Estes materiais foram enviados por meio eletrônico para

[email protected]. Informações sobre conferências, seminários e

oficinas oferecidas pelas Instituições de Ensino Superior, relacionadas com a

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 41

Olimpíada de Filosofia do RS, foram enviadas por meio eletrônico para as escolas

inscritas no evento.

Figura 03 – Atividades de diálogo em grupo, realizadas em torno do tema, sob a forma de

pergunta provocativa: “É possível uma sociedade justa?”.

Critérios e Sistema de Avaliação

A seleção dos trabalhos para representação das escolas nas Atividades

Olímpicas(Encontro Regional) da I Olimpíada de Filosofia do Rio Grande do Sul

(2009) foi realizada pelos professores das escolas participantes durante as

Atividades Pré-Olímpicas.

Para a seleção dos trabalhos nas escolas foi sugerida a seguinte estrutura

de avaliação, a qual coincidiu com a estrutura de avaliação a ser praticada na

Atividades Olímpicas da I Olimpíada de Filosofia do RS:

• Quanto à modalidade 1 – Debates e produção textual – foram

avaliados: a pertinência do desenvolvimento do tema em relação ao tema

central da Olimpíada; a coerência interna do discurso, não só do

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42 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

individual, mas também do que circula e se constrói no seio do grupo; a

capacidade de síntese, de análise, de dar exemplos, de relacionar e

comparar; a criatividade; a construção e formulação de problemas e

conceitos filosóficos.

• Quanto à modalidade 2 – Apresentação de obra artístico-filosófica –

foram avaliados: a pertinência do desenvolvimento do tema em relação

ao problema central da Olimpíada, a potencialidade de cada obra

apresentada em estimular o debate coletivo em vista do seu conteúdo, na

medida em incida sobre a produção de conceitos e problemas filosóficos,

bem como sua criatividade estética na medida em que contribua para as

finalidades acima descritas.

No trabalho seletivo, em cada escola ou turma, sugeriu-se considerar as

seguintes perguntas orientadoras:

- Quais estudantes e/ou obra artístico-filosófica melhor representam o

grupo?

- Qual trabalho artístico-filosófico apresentado mais estimulou o trabalho

de investigação filosófica coletiva?

Evita-se, com isso, o aspecto de uma competição onde um seja o vencedor

e, outros, os perdedores, ressaltando a dimensão de representação do trabalho e

dos estudantes escolhidos, sendo que, deste modo, estima-se que toda a turma

poderá se sentir incluída turma nesta seleção.

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 43

Figura 04 – Acima: Atividades de produção textual, realizadas após os diálogos em grupo. Abaixo:

encerramento do evento.

Premiação

No evento das Atividades Olímpicas da I Olimpíada de Filosofia do RS, os

participantes foram premiados com medalhas e/ou livros de filosofia e com a

publicação de seus trabalhos no site oficial da Olimpíada:

1. Os estudantes selecionados na modalidade Debates e produção

textual, tanto em função dos textos elaborados como de suas

participações nas atividades de diálogo em forma de Comunidade de

Investigação;

2. Os estudantes responsáveis pelos trabalhos selecionados na

modalidade Apresentação de obra artístico-filosófica.

A seleção dos estudantes e dos trabalhos apresentados durante as

Atividades Olímpicas em suas duas etapas – Encontros Regionais e Encontro

Estadual - foi realizada por Comissões Julgadoras compostas por professores

universitários, estudantes de Graduação e de Pós-graduação em Filosofia, bem

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44 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

como professores de Filosofia do Ensino Médio, Infantil e Fundamental

designados pelas Instituições de Ensino Superior responsáveis pelos eventos.

Nas Atividades Olímpicas foi respeitada a divisão dos níveis estabelecidos

quanto ao público-alvo para todos os atos de premiação. O número de trabalhos

que serão selecionados pela Comissão Julgadora foi determinado pela Comissão

Organizadora da I Olimpíada de Filosofia antes da realização das Atividades

Olímpicas. Os estudantes premiados foram incentivados a participar da segunda

edição da Olimpíada, a ser realizada em 2009.

Considerações finais

Desde sua gênese até sua realização efetiva, a proposta da Olimpíada de

Filosofia calcou-se na convicção de que os questionamentos filosóficos, enquanto

comuns à todos os seres humanos, possuem um papel importante na formação

do espírito crítico. Dado este princípio, antes de fomentar a competição, a

Olimpíada de Filosofia pretende provocar os participantes a pensar, seja

individualmente, seja em conjunto, acerca das questões fundamentais que, de

forma direta ou indireta, concernem a todos enquanto humanos. Nesse sentido,

obteve-se êxito em tal empreitada, visto que a recepção por parte dos

participantes quanto à estrutura de organização das atividades, bem como sua

dinâmica foi a melhor possível. Inúmeros trabalhos foram publicados no site

www.olimpiadadefilosofia.org e estão disponíveis a todos aqueles interessados.

Relatos dos professores que coordenaram as atividades Pré-Olímpicas em suas

respectivas Instituições do Ensino, provenientes de todo o Estado do RS também

encontram-se disponíveis no site da Olimpíada. As preparações para a II

Olimpíada de Filosofia do RS, a ser realizada em 2009, já estão em andamento.

Seu tema será “A humanidade tem fome de quê? O que de fato precisamos para

viver...”.

Referências bibliográficas

BECKER, Marceli Andresa; BITTENCOURT, Juliano Mernak de; PARES, André; SANTOS, Dayanne Ferreira dos; SARDI, Sérgio Augusto. Projeto da I Olimpíada de Filosofia do RS, In http://olimpiadadefilosofia.org acesso em 22.05.2009.

Page 46: Inovação, universidade e relação com a sociedade

MUITA PROSA E MUITO VERSO: IDOSOS E A LITERATURA

AMODEO, Maria Tereza; PhD; FALE - PUCRS [email protected]

Resumo

A ação apresentada visa à promoção da autonomia, integração e

participação mais efetiva na sociedade de indivíduos idosos por meio de

encontros semanais organizados a partir da leitura e da análise de textos

literários, da narração de histórias/recitação de poemas e da produção de textos

em prosa e em verso. A partir da Teoria da Estética da Recepção e dos Estudos

Culturais, estimula-se a leitura da literatura como prazer estético e fonte de

reflexão sobre a vida e o mundo, com vistas a ampliar os horizontes de

expectativas das pessoas engajadas espontaneamente ao grupo. Os resultados

obtidos motivam os pesquisadores a investirem nesse caminho que, de forma

muito particular, associa ensino, pesquisa e extensão. Nos encontros gratuitos

oferecidos aos idosos, alunos da graduação em Letras acompanham a

intervenção teoricamente fundamentada da coordenadora e também participam

na orientação de atividades de leitura, análise e produção de textos. Realiza-se,

dessa forma, uma prática inovadora, que alia Teoria da Literatura a

conhecimentos acerca das condições biopsicossociais e indivíduos idosos,

revelando-se como fértil campo de pesquisa. Focaliza-se a inserção do idoso à

sociedade por meio de uma ação que busca resgatar a auto-estima, estimulando

a expressão oral e escrita, ampliando os referentes culturais e, assim, também as

capacidades cognitivas.

Palavras-chave: literatura, idosos, integração.

Os Novos Alunos da Letras

O homem nunca é velho enquanto estiver buscando alguma coisa. Jean Rostand

Page 47: Inovação, universidade e relação com a sociedade

46 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

A aproximação entre idosos e literatura implementada pela Faculdade de

Letras da PUCRS tem favorecido, continuadamente, o surgimento de novas

possibilidades de pesquisa e de integração social. A proposta, que investe nos

vínculos que os leitores podem estabelecer com o texto literário, tem respondido à

predisposição desse público para o novo - o que reiteradamente surpreende e

estimula os pesquisadores e estudantes envolvidos no processo.

Os vínculos possíveis de serem estabelecidos pelo ato da leitura da

literatura são tantos quantos permitir o grau de polissemia do texto. Assim,

diferentes leitores relacionam-se de formas diferentes com os textos, ao

acionarem seus referenciais linguísticos, culturais, cognitivos, afetivos, dentre

outros.

Nesse sentido, a ação configura-se como uma possibilidade ímpar de

promover um redimensionamento da existência desses indivíduos, que passam a

refletir sobre suas próprias experiências, a rever seus conflitos de ordem interna

por meio de projeções (inconscientes ou não) realizadas a partir da palavra

literária. Ampliam-se, assim, suas capacidades expressivas e também as

cognitivas.

O procedimento ganha importância na medida em que é dirigido a um

público cuja imagem é geralmente associada à ociosidade, à improdutividade,

exatamente por se encontrar fora do circuito de produção de capital ou de

serviços. No entanto, são pessoas que efetivamente realizaram atividades

importantes nos seus grupos sociais e/ou familiares e que vêm à universidade em

busca de novas perspectivas para as suas vidas - o que leva ao entendimento de

que ainda podem, se bem orientadas e estimuladas, atuar de forma competente

na sociedade, realizando ações ligadas ou, pelo menos, motivadas pelo trabalho

com a linguagem literária.

Nessa medida, promovem-se a leitura e a análise de textos escolhidos

segundo o critério temático (considerando-se os interesses demonstrados pelos

integrantes) e de qualidade estética, a narração de histórias/recitação de poemas

e a produção, tanto em prosa como em verso, de acordo com as preferências e

aptidões pessoais. Enfim, conforme o próprio título da ação sugere, nos encontros

com os idosos que se estendem por cerca de duas horas, ocorre “muita prosa”, o

que corresponde a análise, conversa, debate e discussão em torno das idéias e

imagens sugeridas pelos textos literários. E, ainda, nesses encontros, há “muito

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 47

verso”, no sentido da criação, o que equivale a dizer que a expressão oral e

escrita são também vitalizadas.

As abordagens dos textos literários são organizadas em termos de desafio

intelectual, sem, entretanto, estimular a competição, mas focalizadas na reflexão

e na expressão, através de atividades lúdicas de socialização, potencialmente

sistematizadas para canalizar o desejo de saber e aprender, sempre manifestado

pelas pessoas engajadas à proposta.

Cultivando Palavras

Uma simples e tímida participação em evento da universidade deu origem

às várias modalidades desenvolvidas em torno do Muita Prosa e Muito Verso e

que hoje, inclusive, se expande para além da FALE. Na Semana de Solidariedade

de 2001, o Grupo de Contadores de Histórias do CELIN - Centro de Referência

para o Desenvolvimento da Linguagem1, a convite da Universidade da Totalidade

da PUCRS, contou algumas histórias a um grupo de idosos. Associando a técnica

de narração desenvolvida junto a grupos de crianças a uma criteriosa seleção de

textos, tendo em vista o público em questão, estabeleceu-se uma conexão que

surpreendeu a equipe encarregada do evento e o grupo que implementou a ação

– professora e estudantes de Letras.

O procedimento estimulou o grupo a organizar, no ano seguinte, encontros

quinzenais que passaram a ser oferecidos a idosos da comunidade interessados

em ler, ouvir, analisar e produzir textos literários. As atividades do grupo

passaram a ser divulgadas na imprensa escrita local, numa iniciativa da Pró-

Reitoria de Assuntos Comunitários da PUCRS (PRAC), o que ampliou de forma

substancial o público.

Tendo em vista as características desse grupo que se formava

espontaneamente e evidenciava suas necessidades, expectativas e recepção às

propostas desenvolvidas, constatou-se que a aproximação entre literatura e

idosos estava potencialmente articulada para se orientar para uma investigação

acerca das condições biopsicossociais dos indivíduos dessa faixa etária.

Transformando-se, no ano seguinte, em projeto de pesquisa, com o apoio da Pró-

Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PRPPG), o MPMV passa a oferecer

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48 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

encontros semanais planejados cuidadosamente a partir dos objetivos

estabelecidos.

Firma-se, assim, uma indissociável e frutífera relação entre pesquisa,

ensino e extensão. Através da ação da PRAC, que divulga o projeto dentro e fora

da PUCRS, desenvolve-se a pesquisa, que envolve alunos graduação e

professora/pesquisadora do curso de Letras. Os encontros com idosos em torno

da literatura, ao mesmo tempo em que estimulam a interação social desse

público, constituem-se em profícuo campo de pesquisa.

Sintonizado com as emergências da contemporaneidade, o Muita Prosa e Muito Verso (MPMV) vem trilhando um caminho muito particular, dinâmico e

plural, transitando, inicialmente, por veredas que aliam práticas pedagógicas de

abordagem do texto literário - geralmente dirigidas a estudantes de Literatura - ao

conhecimento sobre o indivíduo idoso - área que, cada vez mais, se expande,

exigindo o estreitamento das relações com outros campos do saber.

Um Novo Caminho para as Letras

Sabe-se que os avanços da Medicina e de áreas afins provocam o

crescimento da população idosa mundial. Entretanto, o aumento da média de vida

atual deve corresponder à melhoria da qualidade dessa sobrevida; sob pena de

se considerar inútil tanto avanço nas pesquisas na área da saúde. Estimular, pois,

uma experiência cultural significativa, como a proposta pelo MPMV, efetivamente

permite que as pessoas revisitem suas próprias potencialidades, muitas vezes

pouco trabalhadas durante a vida dita produtiva. Muitas pessoas, inseridas na

automatização do mundo capitalista, nunca chegam a desenvolver suas

capacidades, seus talentos, por estarem envolvidas nas atividades cotidianas na

busca da própria sobrevivência e a da família.

Na Terceira Idade, na Melhor Idade, na Velhice - seja o termo que se

escolher para denominar a fase em que se encontram as pessoas já afastadas do

circuito de produção capitalista - surge a oportunidade de viver, de forma plena,

todos os desejos, anseios, gostos pessoais, muitas vezes sufocados pelas

anteriores imposições cotidianas. Contudo, nessa fase, muitas pessoas já

perderam o vínculo com a sociedade, pois seus amigos, por várias razões, já se

dispersaram, assim como alguns de seus familiares. Alijados de seus referentes,

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 49

podem ficar também sem projetos de vida, o que, na maioria dos casos, acelera o

processo de envelhecimento2.

Impõe-se, portanto, o incentivo à organização de grupos que reúnam

pessoas dessa faixa etária, que tenham a oportunidade de refletir sobre a vida,

mas com a possibilidade de compartilhar suas experiências, encontrar novos

objetivos e construir novos projetos. É nesse sentido que o texto literário, como

promotor de sensações, análises, etc. pode contribuir para sensibilizar tais

pessoas a estabelecerem outros vínculos com seus pares. A literatura, dadas as

suas especificidades, é potencialmente promotora da liberdade, da criatividade e

da capacidade de refletir sobre a vida.

Procurando valorizar as características de cada indivíduo, as atividades

desenvolvidas no MPMV estimulam as trocas entres os participantes, assim como

com a equipe de trabalho constituída por graduandos da Faculdade de Letras,

sob a orientação da coordenadora. Estabelece-se, assim, um diálogo respeitoso

entre as gerações. A partir dos temas e imagens sugeridos pelos textos literários,

os idosos trazem suas experiências, reflexões, elucubrações e informações -

resultantes da vida profissional, acadêmica, familiar, etc. Os graduandos, por

outro lado, têm a oportunidade de compartilhar uma rica experiência docente,

que, naturalmente, alia teoria e prática – o que, definitivamente, qualifica a

formação dos futuros professores/pesquisadores, engajados a uma abordagem

humanista do conhecimento.

Segundo Jéssica Colvara Chacon, ex-bolsista do projeto, a turma do MPMV é muito singular.São alunos sedentos por literatura. Eles têm uma experiência de vida muito maior que a minha. Tive de aprender a lidar com a diversidade das suas contribuições e, ao mesmo tempo, dar conta do planejamento. Foi ali que aprendi a dar aula - uma aula realmente planejada com base teórica. Este tipo de qualidade de aula ficou sendo o meu padrão, o meu modelo. 3

Aprendem os idosos, aprendem também os futuros professores. Assim,

conforme recomendam especialistas das áreas da Gerontologia e da Geriatria,

ações semelhantes às desenvolvidas no MPMV, promovem um verdadeiro

convívio com o mundo real, em que pessoas de diferentes idades podem conviver

e interagir, anulando o prejuízo decorrente da segregação dos idosos em grupos

específicos - tal com ocorre em asilos com modelos tradicionais. O caminho

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50 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

percorrido em termos de procedimentos e estratégias eleitas e os resultados

obtidos até o presente momento devem ser recuperados no sentido de oferecer

um panorama da proposta da FALE.

Leitores em Interação

A obra literária é um evento linguístico que projeta o mundo ficcional que inclui falantes, atores, acontecimentos e um público implícito (um público que toma forma através das decisões da obra sobre o que deve ser explicado e o que se supõe que o público saiba). (...) A ficcionalidade da literatura separa a linguagem de outros contextos nos quais ela poderia ser usada e deixa a relação da obra com o mundo aberta à interpretação.4

A literatura efetivamente nos leva para outras paragens e nos faz voltar e

pensar no nosso lugar no mundo. É o trabalho artístico com a linguagem que

move o leitor para esse “mundo de papel” e, ao mesmo tempo, para o seu próprio

mundo interior. A literatura constrói universos ficcionais autônomos de forte

sentido imaginativo e apelo estético, captando o leitor para outras realidades que

representam simbolicamente o mundo em que está inserido.

A partir dessa premissa, organizam-se as atividades de aproximação entre

idosos e a literatura em torno de três modalidades, descritas a seguir, que são

desenvolvidas em grupos separados ou oferecidas a todos simultaneamente. A

opção por um ou outro caminho depende sempre das preferências do grupo.

1. Leituras Orientadas de Crônicas, Contos, Poemas, Novelas e Romances

O objetivo desta abordagem é ampliar as possibilidades de leitura e de

reflexão do texto literário, através da análise dos efeitos provocados pelo

tratamento artístico da linguagem, ao mesmo tempo promovendo uma leitura da

realidade, marcada por um olhar desautomatizado, que surge do estranhamento

provocado pelo próprio texto literário, estimulando os leitores a se posicionarem

criticamente diante da realidade textual e extra-textual. Dessa forma, em torno

dos textos cuidadosamente selecionados, são propostas atividades de análise

com vistas à compreensão dos elementos constitutivos das narrativas literárias ou

dos poemas, à interpretação e à leitura crítica.

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 51

2. Capacitação de Contadores de Histórias

Com o objetivo de estimular a integração de idosos na comunidade, a

modalidade se organiza no sentido de capacitá-los para se tornarem contadores

de histórias. São oferecidas aos integrantes do grupo todas as etapas da

capacitação tradicionalmente realizada no CELIN para professores e outros

interessados na formação de leitores. O procedimento constitui-se numa

possibilidade concreta de interação social para os idosos, que passam a ter a

opção de contar histórias em escolas, instituições de saúde ou beneficentes,

associações comunitárias e na própria família. Ao recuperarem aquela

experiência primordial que acompanha o homem de todos os tempos, ao

reviverem aquele impulso atávico de inventar, contar e conhecer histórias,

estabelecem laços afetivos com os outros – familiares ou não.

3. Produção de Textos

O interesse em escrever contos e poemas é compartilhado por um número

muito expressivo de participantes do grupo. Estes efetivamente têm aspirações

mais ousadas: querem ser escritores. Alguns inclusive têm contos e poemas

publicados em antologias. Nesse sentido, propostas de produção de textos são

apresentadas a partir da análise de textos literários. Estimula-se a criação por

meio da expressão individual e da utilização dos recursos da linguagem literária,

trabalhados de forma sistemática através da análise dos textos e de exercícios.

Os textos produzidos pelos integrantes são socializados com o grande grupo.

Resultados Sempre Parciais

A partir dos dados coletados junto ao grupo pelos estudantes de Letras,

que registram as suas observações durante as sessões semanais, pelas

manifestações espontâneas e pelas avaliações individuais dos integrantes,

propostas sistematicamente pela equipe responsável pelo projeto, é possível

afirmar que os idosos vinculados ao programa:

a) mostram disposição para aprender e valorizam o aprendizado;

b) sentem, em relação às atividades propostas, vontade de participar,

incentivados pela busca de respostas às questões propostas;

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52 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

c) esforçam-se para apresentarem um bom desempenho;

d) admitem, durante as atividades, que apresentam dificuldades como

falta de memória e/ou conhecimento;

e) consideram que são estimulados a vencer as dificuldades;

f) valorizam a troca de experiências entre as coordenadoras e a equipe e

os participantes;

g) valorizam o que aprendem por meio da intervenção dos próprios

colegas;

h) demonstram que aprendem novos conceitos e fazem novas

associações;

i) passam a ler mais fora do âmbito da PUCRS;

j) passam a escrever mais;

k) envolvem-se em atividades culturais com maior frequência.

Assim, percebe-se que a possibilidade inerente à literatura de provocar

sensações e reflexões, desacomodar, repensar, questionar assume contornos

muito específicos, sendo o interlocutor o indivíduo idoso que busca novas

alternativas para a sua vida.

As reflexões que se estabelecem em torno dos textos literários evidenciam

que os idosos vinculados ao grupo efetivamente revisitam suas próprias

experiências, recuperam lembranças, associam fatos, põem em dúvida crenças e

verdades que trazem desde a infância e a adolescência, enfim reavaliam sua

função na sociedade. O olhar sensível, inquisidor e crítico da literatura os motiva

a ampliarem os seus horizontes de expectativas, por meio da reflexão, da criação

e da ação efetiva no mundo real.

Alguns dos idosos vinculados ao grupo têm efetivamente atuado como

contadores de histórias em centros comunitários, creches ou outras instituições

(inclusive no Hospital São Lucas, nos setores de Pediatria e Oncologia). A

produção de textos realizada durante as sessões os estimula a participarem de

concursos literários e de coletâneas publicadas de forma independente. A

qualidade literária dos textos de alguns participantes motivou a coordenação do

projeto a organizar uma publicação a ser ultimada ainda em 2009.

A adesão contínua de novos integrantes, já que a proposta se caracteriza

por essa abertura (que surgem por convite de amigos/parentes, por terem sido

informados pela imprensa, ou convidados pela coordenação), e a frequência

Page 54: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 53

expressiva de um grupo fiel, que participa desde os primeiros encontros,

evidenciam que o trabalho desenvolvido realmente tem atendido às expectativas

de uma parcela da sociedade que, fora do mercado de trabalho, ainda possui

potencialidades para reflexão e ação - o que é corroborado pelos integrantes do

grupo, que, reiteradamente manifestam seu contentamento por se sentirem

valorizados e respeitados como indivíduos.

Uma Nova Parceria

O caminho percorrido tem assumido, efetivamente, diferentes formatos,

que surgem conforme os resultados obtidos. O Projeto Muita Prosa e Muito Verso apresenta dados coletados a partir de atitudes, respostas, ações,

manifestações e produções de textos orais e escritos. Entretanto, processos

internos dos indivíduos, que ocorrem a partir da leitura da literatura, em termos de

processamentos cognitivos, não podem ser avaliados no campo das Letras.

Portanto, abrindo um outro flanco de pesquisa, a FALE se associa à Faculdade

de Psicologia, num novo projeto interdisciplinar, também apoiado pela PRPPG

(EDITAL PRAIAS) 5.

Por intermédio da parceria firmada com a FAPSI6, os subsídios teóricos e

os procedimentos metodológicos da Psicologia Cognitiva e da Neuropsicologia

foram eleitos para examinar a forma como indivíduos idosos processam funções

neuropsicológicas comunicativas e cognitivas antes e após sua participação em

um programa cultural com base na literatura, no contexto da contemporaneidade.

O mundo atual, marcado por tantas idiossincrasias, apresenta-se como um

desafio para os indivíduos, especialmente aqueles que não acompanharam o

advento da tecnologia da informação, que rompe com os conceitos tradicionais

em todos os campos. Para os idosos, compreender esse processo constitui-se

uma dificuldade e, ao mesmo tempo, um desafio.

A promoção de programas de intervenção cultural envolvendo a população

idosa configura-se como uma necessidade nos dias de hoje, frente o rápido

crescimento da população de idosos em todo o mundo, incluindo o Brasil, onde os

prognósticos estimam para 2050, um aumento de 18% da população idosa, muito

longe dos 5% do ano 20007 - o que pode provocar transtornos neuropsicológicos

importantes, que devem ser prevenidos.

Page 55: Inovação, universidade e relação com a sociedade

54 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Nesse sentido, o projeto busca avaliar a forma como especificamente os

idosos reagem a estímulos culturais, verificando como processam a informação e

como adquirem conhecimento num contexto tão controverso, plural, rico e

multifacetado como o atual. A partir dos dados obtidos em relação à aproximação

entre idosos e literatura já descrita, o espaço dessa modalidade artística deve ser

analisado no que se refere ao contexto contemporâneo, que a coloca em

constante interação com outras áreas e modalidades culturais, influenciando-a e

definindo novos padrões estéticos.

A pesquisa em desenvolvimento na FALE associa um rico, variado e

atualizado programa cultural, com base na literatura, oferecido ao novo grupo de

idosos, sendo subsidiada pela análise comparativa pré e pós-intervenção,

norteada por um processo de avaliação neuropsicológica.

Uma História sem Fim

A nova pesquisa reúne grupos de idosos selecionados especialmente para

esta investigação, seguindo critérios bem definidos de inclusão para garantir o

seu caráter científico. O programa cultural oferecido, de uma forma análoga,

reedita a ação desenvolvida com o grupo original do MPMV, utilizando-se dos

equipamentos e materiais agora disponíveis. A literatura, entretanto, define os

rumos da ação. A literatura pode muito. Ela pode nos estender a mão quando estamos profundamente deprimidos, nos tornar ainda mais próximos dos outros seres humanos que nos cercam, nos fazer compreender melhor o mundo e nos ajudar a viver. Não que ela seja, antes de tudo, uma técnica de cuidados para com a alma; porém, revelação de mundo, ela pode também, em seu percurso, nos transformar a cada um de nós a partir de dentro. 8

As novas iniciativas que surgem na esteira do Muita Prosa e Muito Verso vêm confirmar a força da palavra literária exatamente como revelação,

especialmente para os integrantes do grupo original que continuam,

invariavelmente, se encontrando nas tardes de quartas-feiras nas dependências

da FALE, aceitando, sempre, novos adeptos. Circulando entre os jovens

estudantes de Letras, lendo os textos que eles lêem e tendo “aulas” como eles,

estes senhores e senhoras sentem que a vida vale a pena. Integrados à

comunidade acadêmica, estimulados pela potencialidade da arte literária, não

sabem que, mais do que serem acolhidos pela PUCRS, estão contribuindo para

Page 56: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 55

uma pesquisa que diz respeito a todos nós – crianças, jovens, adultos – os idosos

do século XXI.

Notas

1 O Centro de Referência para o Desenvolvimento da Linguagem tem por objetivo

levar as pesquisas desenvolvidas na Universidade em torno da linguagem e da

literatura para além dos limites da academia.

2 CANÔAS, Cilene Swain. A condição humana do velho. São Paulo: Cortez,

1983.

3 Jessica vinculou-se ao MPMV como bolsista, do já projeto de pesquisa. Hoje é

professora da rede pública de ensino do município de Guaíba, RS. Este

depoimento foi dado ao ser questionada pela coordenadora sobre a relação entre

a sua experiência como bolsista do projeto e a sua atuação profissional.

4 CULLER, Jonathan. Teoria literária: uma introdução. São Paulo: Beca, 1999.

5 Potencializando Habilidades Neuropsicológicas de Indivíduos Idosos: a

intervenção da literatura em programa cultural sintonizado com a

contemporaneidade.

6 A partir da orientação da professora Dr. Rochele Paz Fonseca.

7 BGE-Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da população,

Expectativa de vida 2004. Disponível

em:<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/30082004projecaopopulac

aoshtm>. Acesso em: 08 nov. 2007

8 TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.

p.76

Referências

CANÔAS, Cilene Swain. A condição humana do velho. São Paulo: Cortez, 1983. CULLER, Jonathan. Teoria literária: uma introdução. São Paulo: Beca, 1999. BGE-Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da população, Expectativa de vida 2004. Disponível em:<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/30082004projecaopopulacaoshtm>. Acesso em: 08 nov. 2007. TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.

Page 57: Inovação, universidade e relação com a sociedade

INTERVENÇÃO NA COMUNIDADE POR MEIO DOS CONTOS DE FADAS

Marques, Nadia Maria; Ms, Faculdade de Psicologia – PUCRS

[email protected]

Carrasco, Leanira; Dra, Faculdade de Psicologia

[email protected]

Macedo, Mônica Kother; Dra; Faculdade de Psicologia – PUCRS

[email protected]

Resumo

A prática de interação com a sociedade, desenvolvida pela clínica-escola

da Faculdade de Psicologia, o Serviço de Atendimento e Pesquisa em Psicologia

(SAPP) ocorre desde 1994, consistindo em uma intervenção clínica junto a

crianças em situação de vulnerabilidade social, que freqüentam em turno integral

uma creche da comunidade de Porto Alegre. Este trabalho de prevenção primária,

baseado no referencial psicanalítico, objetiva favorecer o desenvolvimento

psicológico, cognitivo e social da referida população infantil de forma saudável.

Como instrumentos mediadores são utilizados os Contos de Fadas, visando

desenvolver a capacidade simbólica das crianças, incentivando a atividade lúdica

como forma de expressão da criatividade, da espontaneidade, da elaboração de

experiências traumáticas, da socialização e da aprendizagem. A possibilidade de

criar um mundo de ilusão saudável contribui para a organização da

personalidade, para o desenvolvimento da linguagem e para a construção de uma

imagem valorizada de si mesmo, promovendo recursos mais eficazes de

enfrentamento das adversidades da vida e incrementando a capacidade de

resiliência. Com esta prática abre-se a possibilidade de considerar o contexto

social como constitutivo do sujeito assim como se oportuniza o contato dos

estagiários com a realidade social brasileira.

Palavras-chave: intervenção psicológica, infância, contos de fadas.

Page 58: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 57

Contando nossa História

O SAPP, clínica-escola da Faculdade de Psicologia, busca viabilizar aos

estudantes de graduação em Psicologia, um campo de experiências que lhes

ofereça condições de aprimoramento e qualificação em sua formação. Neste

sentido, a clínica-escola é um lugar privilegiado para a continuidade do processo

de ensino e aprendizagem no contexto universitário. A atividade de intervenção

com os Contos de Fadas realizada na comunidade se constitui em uma

ampliação do campo de estágio e também de promoção do contato dos alunos

com as condições socioeconômicas da população. Por meio desta intervenção o

estagiário é inserido na comunidade demonstrando a amplitude do fazer em

Psicologia.

Iniciamos nosso trabalho, em 1994, realizando uma avaliação das

necessidades e características da população de uma creche da comunidade a fim

de definirmos os marcos norteadores de nosso fazer. Tendo como base esse

estudo inicial, elaboramos um projeto que contemplasse a demanda advinda das

diversas faixas etárias das crianças.

Essas crianças, residentes em uma vila da periferia de Porto Alegre,

possuem um padrão sócio-econômico bastante precário que as coloca em uma

situação de vulnerabilidade social. Observamos que esta realidade menos

favorecida, determinada por um estado de múltiplas carências, dificultava o

estabelecimento de uma relação estável e produtiva entre as crianças, entre elas

e suas educadoras, refletindo-se, também, na relação com nossa equipe da

Psicologia. Identificamos famílias sobrecarregadas na luta pela sobrevivência

diária, assim como cuidadores que, por suas próprias faltas e traumas, nem

sempre estavam suficientemente disponíveis para facilitar o desenvolvimento

físico e emocional saudável de seus filhos. Como afirma Albornoz (2006), a

comunicação limitada e o apoio restrito, características típicas de populações de

risco, dificultam o entendimento e a apropriada expressão das experiências

emocionais. A criança não consegue conhecer e lidar com suas intensas

emoções, aparecendo seqüelas no desenvolvimento da cognição, da linguagem e

dos aspectos sócio emocionais.

Um bebê não existe sozinho e um início de vida mal vivido prejudica o

futuro de sua história, lembra Gutfreind (2005). Reforçando esta proposição

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58 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Albornoz (2006), por meio de sua pesquisa com crianças negligenciadas e

abandonadas, verificou que a falta destes cuidados determina privações que

deixarão marcas na construção da subjetividade de cada sujeito e que se

refletirão na sociedade. O não-aprender, decorrente desta situação, pode

significar que a criança evita pensar para não conhecer conteúdos dolorosos e

insuportáveis relacionados a sua história de vida. As crianças que não podem

pensar sobre sua história encontrarão impedimentos e conflitos em investigar as

verdades da vida que poderão causar rupturas no processo histórico e tornar a

vida sem sentido. Esta situação tende a dificultar a adaptação pessoal, escolar,

institucional, social e familiar dessa população infantil, determinando vivências de

rejeição e exclusão.

Frente a estas constatações, passamos a nos perguntar: como as crianças

da Creche em questão, pertencentes a uma população de risco, poderiam

sonhar? Como reconstruiriam as histórias não contadas em suas brincadeiras?

Como poderiam aprender sobre suas próprias vidas e se construírem como

sujeitos psicossociais?

As conseqüências desta realidade podem determinar situações como as

que constatamos na expressiva incidência de crianças que apresentavam

quadros psicossomáticos, depressões, estados de ansiedade e comportamentos

diruptivos. Verificamos que, em parte, estas manifestações associavam-se as

precárias possibilidades destas crianças de expressarem, através de meios de

comunicação mais eficazes, suas necessidades, sentimentos, desejos e

sofrimentos. Visualizamos, a partir desta avaliação inicial, riscos de ocorrerem as

chamadas síndromes do vazio nas quais predominam a pobreza da vida

imaginativa, o pensamento e o funcionamento concreto; transtornos no

estabelecimento de vínculos significativos; quadros de delinqüência e atuações

sexuais precoces. Estas manifestações podem inibir ou bloquear o

desenvolvimento emocional saudável e impedir o adequado ajuste do sujeito à

sociedade.

Nosso principal objetivo foi interagir com as crianças, das diversas faixas

etárias, oferecendo a elas um modelo de relação baseado no respeito, no afeto e

na continência. O trabalho foi centrado na possibilidade de auxiliar as crianças a

pensarem o impensável para que pudessem significar suas angústias,

Page 60: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 59

sentimentos e necessidades nomeando-os. Organizamos encontros semanais, de

uma hora de duração, com cada uma das turmas durante um ano letivo.

Os jogos, o brinquedo, os desenhos, a dramatização e, particularmente, os

contos de fadas têm sido utilizados como instrumentos mediadores através dos

quais as crianças podem fantasiar, criando um mundo de ilusão saudável.

Pensamos que desta maneira poderemos, também, contribuir para desenvolver a

capacidade de resiliência, favorecendo com que a criança, submetida a uma

realidade de risco, encontre esperanças e recursos mais satisfatórios para

enfrentar as dificuldades que surgirem em suas vidas.

Integração com a Faculdade de Psicologia

Entendemos que a Psicologia deve se fazer presente nas instituições que

tenham vínculo com a saúde, com a educação e com a comunidade. Atendendo a

este objetivo o SAPP, afinado com as diretrizes curriculares, oportuniza aos

estagiários de Psicologia Clínica realizar um trabalho supervisionado de

intervenção clínica na comunidade. Esta prática se integra à Faculdade de

Psicologia através de seu Departamento de Clínica que, representado pela

Coordenadora Professora Leanira Carrasco, vem, nos últimos dois anos,

organizando e estimulando a participação do corpo docente, discente e de

funcionários numa ação solidária que acontece na época do Natal. A partir da

indicação dos nomes das crianças e suas respectivas idades, cada professor,

aluno ou funcionário responsabiliza-se por uma ou mais dessas crianças

adquirindo um presente adequado com a mesma. Em prévia combinação com a

Creche, os estagiários do SAPP e os supervisores realizam a festa de Natal para

a entrega desses presentes. É o momento no qual se encerram as atividades dos

estagiários junto às crianças, proporcionando a todos os envolvidos um espaço

de confraternização. No ano de 2008, além dos presentes, nasceu a idéia de

organizar uma biblioteca infantil com o objetivo de incentivar as crianças a buscar

nos livros repostas, resoluções, sentidos, inspirações que façam pensar e

significar a realidade que elas enfrentam.

Page 61: Inovação, universidade e relação com a sociedade

60 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Trabalhando com grupos de crianças pré-escolares

Um grupo se constitui em agente terapêutico, um meio ativo e econômico

no sentido de influir sobre seus participantes. Com a ajuda dos membros do

grupo e a dos coordenadores, a criança pode ter a oportunidade de se conhecer

melhor, perceber como são suas atitudes para com os outros, qual a origem de

seus conflitos e buscar saídas mais sadias para resolver os seus problemas,

assim como aqueles que emergem no grupo (Zimerman, 1997). A interação entre

os companheiros do grupo auxilia na aprendizagem e na internalização de limites

que os tornam mais autônomos e organizados. Gutfreind (2003) acrescenta a

idéia de um aparelho psíquico grupal que oferece a oportunidade da criança

empobrecida emocionalmente de utilizar recursos psíquicos que pertencem à

outra criança e ao grupo. Tomando estes pressupostos teórico-técnicos como

fundamentais para nossa prática clínica, os adaptamos a demanda e a realidade

de nossos grupos de crianças pertencentes as turmas do Maternal, Jardim A e

Jardim B.

O lugar dos contos de fadas no desenvolvimento infantil

Os contos de fadas por serem relatados de maneira breve e lúdica, são

acessíveis à criança e suas estruturas correspondem às necessidades infantis.

Em uma linguagem simples elas mostram questões e enigmas que a criança

vivencia, mas ainda não tem condições de verbalizar de forma consciente. Os

contos se apresentam como cenário para seus sonhos, aguçando a imaginação e

favorecendo o seu processo de simbolização, tão necessário a sua inserção em

um mundo cultural. Assim os contos “dão rosto aos desejos” de forma que a

criança possa vivenciá-los sem culpa e sem temor (FERRO, 1995).

Os contos, ao serem introduzidos com a expressão: era uma vez há muitos

e muitos anos atrás, permitem com que a criança se identifique com um dos

personagens, tendo a oportunidade de deparar-se com seus desejos e

necessidades mais secretas e explicitá-las de forma simbólica, através do

deslocamento para outro espaço e outro tempo longe de sua realidade. Então,

sentimentos como medo, raiva, inveja, alegrias e curiosidades a respeito da

sexualidade, entre outros, que já estão inscritos dentro da criança, encontram a

possibilidade de expressão distanciada do aqui-agora que pode ser vivida de

Page 62: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 61

forma compartilhada com os personagens e com o grupo de iguais. Esta

experiência alivia as ansiedades e o sofrimento, contribuindo para a organização

mental.

O final feliz dos contos de fadas, ao contrário de transmitir uma visão irreal

do mundo e da vida, transmite a segurança de que existe a possibilidade da

criança resolver suas dificuldades e angústias de forma a amadurecer e se tornar

independente. Apresentados de forma simbólica os contos possibilitam uma

melhor assimilação dos conflitos da criança de acordo com o seu estágio de

desenvolvimento intelectual e emocional. Esse é o seu final feliz.

A preciosidade dos contos reside na sua “insaturabilidade”, isto é, na

possibilidade da criança preencher qualquer conto, em momentos diferentes de

seu estado emocional ou de seu crescimento, com significados diferentes. Esta

possibilidade explica, em parte, porque as crianças pedem para que um mesmo

conto seja narrado por diversas vezes.

Além dessas possibilidades, os contos de fadas se constituem em

relevante técnica pedagógica, porque transmitem uma linguagem simbólica

necessária para a inserção da criança em um mundo letrado, além de ativar a

memória, o vocabulário, a capacidade de abstração, a criatividade, a aquisição do

pensamento conceitual, a compreensão e assimilação da realidade, e o

alargamento de seu domínio lingüístico (RADINO, 2003).

Resta destacar que nos contos de fadas a presença afetiva e o olhar do

outro são indispensáveis para que estas situações tenham um sentido

transformador para a criança. A transmissão oral de um conto exige trabalho

artístico e artesanal, uma vez que cada fato precisa ser metabolizado pelo

contador para poder ser contado.

Conta outra vez.....

Tínhamos o desafio de trabalhar com grupos de quinze a vinte crianças

pré-escolares e, para isso, precisávamos criar um ambiente suficientemente

estruturado para que construíssemos o cenário necessário para a atividade de

ouvir e contar histórias. As educadoras da creche foram convidadas a estabelecer

uma parceria com nossa equipe, pois o convívio diário com as crianças favorecia

a formação de um vínculo de confiança com as mesmas o qual, além de ser

Page 63: Inovação, universidade e relação com a sociedade

62 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

facilitador para a organização e estruturação do grupo, também dava suporte para

as reações desencadeadas pelos contos que pudessem permanecer presentes

ao longo da semana.

Em cada uma das salas, correspondentes aos níveis do Maternal, Jardim A

e do Jardim B, foi escolhido um local específico denominado o “cantinho do conto”

que pudesse ser investido simbolicamente. Este recanto era formado por cadeiras

dispostas de maneira a favorecer o contato visual de todas as crianças com o

contador, recriando o clima nutridor encontrado na relação mãe-bebê.

No primeiro momento, dedicado à conversa e a interação entre as

crianças, as estagiárias realizavam a chamadinha, nomeando cada uma das

crianças, como uma forma de demarcar as diferenças entre o espaço dos contos

e o espaço das demais atividades pedagógicas. Abria-se um tempo para que as

crianças pudessem se manifestar livremente através da palavra, contando

acontecimentos de sua vida diária, trazendo suas queixas ou falando de seus

desejos.

No segundo momento, após a acomodação das crianças em seus

respectivos lugares, seguia-se a narração do conto escolhido a partir de um

consenso estabelecido entre as estagiárias, as educadoras e as crianças. As

ansiedades, sentimentos, pensamentos e desejos mobilizados pela escuta dos

contos foram trabalhados na terceira etapa, logo após a sua narração, através de

meios lúdicos, como: desenhos, modelagens com argila, colagens, brincadeiras,

músicas, teatro de fantoches e dramatizações. Ao final de cada encontro, as

estagiárias, sempre buscando a participação e colaboração das crianças,

realizavam um fechamento da atividade comentando a respeito do que tinham

conhecido e aprendido do grupo naquele dia.

O desenrolar desta atividade ocorreu de forma diferenciada em cada

turma. A partir do conto escolhido, foram consideradas as singularidades de cada

grupo, suas necessidades nos encontros anteriores e as percepções dos

estagiários e das educadoras. Assim, cada trajetória tornou-se única e

imprevisível, pois ocorreu a partir da interação do movimento do grupo e dos

olhares e escutas daqueles com os quais seus participantes interagiam. A

flexibilidade do setting foi um fator importante, para que pudéssemos adequar o

trabalho às manifestações e aos diferentes movimentos das crianças que

emergiam a cada encontro.

Page 64: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 63

Na turma do Jardim A, por exemplo, constituída por crianças de três e

quatro anos, foi escolhido o conto do Pinóquio, próprio para tal faixa etária. A

escolha do conto foi feita a partir de uma sugestão da educadora, que se justificou

dizendo que as crianças estavam muito “mentirosas” e que, ao escutarem essa

história, talvez aprendessem que é “feio mentir”. Durante um semestre letivo,

respeitando o princípio da insaturabilidade, a história do Pinóquio foi contada em

quatorze encontros. Nesses encontros, buscamos respeitar o tempo de cada

criança para internalizar o conteúdo narrado e, assim, permitir a sua expressão

através do simbólico e da palavra. Observamos, através das nossas conversas

com as crianças, realizadas no primeiro tempo do encontro, que elas abordavam

assuntos pessoais, e que estes estavam relacionados com a história do Pinóquio.

Contaram que ganharam de seus pais mochilas, bicicletas e piscinas. Através da

educadora, verificamos que o que as crianças contavam não correspondia à

realidade de suas possibilidades. Mas será que podemos chamar isso de

mentira? Devemos relembrar que as crianças das quais estamos falando fazem

parte de uma população carente que, na maioria das vezes, não têm a

oportunidade de desejar e de sonhar. Cabe aqui comentar que o sonho, o desejo

e a idealização são componentes fundamentais no desenvolvimento normal do

ego. A criança necessita poder idealizar, a fim de aliviar suas ansiedades e

angústias. Nesse espaço, ela encontra uma zona de refúgio, onde se sente

segura para explicitar seus desejos e fantasias, sendo, assim, capaz de suportar

uma situação real que não pode modificar (ALVAREZ, 1994).

Constatamos, ao longo dos encontros, a expressão do processo de

identificação das crianças com o personagem Pinóquio. Da mesma maneira que

ele, elas buscavam lidar com sentimentos de perda e de falta, através de recursos

idealizados compensatórios. A mentira pode ser a marca entre a separação do

pensamento do adulto e a subjetividade da criança (Corso & Corso, 2006). O

nariz comprido do Pinóquio parece estar relacionado com um desejo que não se

realizou e que encontrou na mentira uma forma de expressão.

Sabemos que para uma criança de três anos, não existe distinção entre a

verdade, a mentira ou a fantasia. A mentira se apresenta no desenvolvimento

como uma expressão do mundo interno repleto de sonhos e fantasias. Porém,

Freud (1913/1976) não deixou de alertar que as mentiras se acham vinculadas às

forças motivadoras poderosas nas mentes das crianças e podem anunciar

Page 65: Inovação, universidade e relação com a sociedade

64 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

disposições que levarão a dificuldades posteriores em suas vidas ou a futuros

padecimentos psíquicos.

É preciso entender que as supostas mentiras de caráter compensatório

que esses menores contavam encobriam as falhas e ausências ocorridas em seu

desenvolvimento. Esclarecemos às crianças que, assim como o Pinóquio, elas

também queriam coisas novas, introduzindo, desta maneira, o tema da mentira

em nossos encontros. Mostramos a elas que, muitas vezes, quando as coisas

não acontecem como as crianças querem, elas podem imaginar, sonhar e contar

da forma como gostariam que as mesmas se realizassem. Procuramos, então,

nomear os sentimentos e as angústias do grupo, propondo um movimento de

reflexão que auxiliasse seus membros a pensar sobre sentimentos e

necessidades.

A repetição desta história oportunizou aos membros do grupo compartilhar

entre si as sensações de falta, reforçando sua auto-imagem e seus mecanismos

de enfrentamento. As crianças mostravam-se muito atentas e concentradas na

narração e, com a evolução do trabalho, passaram a ter uma maior participação

na hora do conto. Os membros do grupo substituíram a posição de observadores

passivos por outra de maior participação, antecipando frases, imitando os gestos

do narrador e incluindo novos elementos ao conto.

No terceiro tempo utilizamos, num primeiro momento, recursos como o

desenho para que as crianças pudessem expressar o que sentiram e pensaram

durante a narração do conto. Os primeiros desenhos evidenciavam que o

conteúdo da história fora associado com temas relacionados a aniversários,

bolos, presentes e brinquedos. Pensamos que este conteúdo manifesto encobria

o desejo das crianças de construírem um espaço mágico, de ilusão onde

pudessem suprir suas carências, fortificando-se para crescerem. A dramatização

do conto surgiu como uma iniciativa das crianças que, mais criativas e

espontâneas, não queriam apenas dramatizar o conto do Pinóquio, mas também

mostrar seus talentos. A turma propôs apresentar um “show” de música e dança,

onde algumas canções eram conhecidas, outras inventadas e sempre

acompanhadas de coreografias. As crianças que participavam como platéia

permaneciam atentas ao trabalho dos colegas com exclamações como: “nosso

show é fantástico”.

Page 66: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 65

Constatou-se que, através do aspecto lúdico proporcionado por este conto

de fadas, os alunos do Jardim A desenvolveram a imaginação, a capacidade de

fantasiar, descobrindo que possuíam recursos próprios capazes de levá-los a

criarem a sua própria produção. Pensamos que os sentimentos iniciais de

desvalorização e de falta, expressos através das mentiras, deram lugar para

sentimentos de maior auto confiança e produtividade.

Considerações Finais

Acompanhamos e avaliamos o desenvolvimento e o aproveitamento do

trabalho realizado, com as diferentes turmas das crianças desta Creche, através

da observação da evolução dos grupos; dos desenhos; das dramatizações; da

capacidade de expressão verbal; do desenvolvimento da socialização; da

possibilidade de ouvir, olhar, prestar atenção, criar e fantasiar.

Nos primeiros encontros, nos deparamos com grupos regressivos e

desorganizados. Ansiosas as crianças falavam ao mesmo tempo, se queixavam

de dores físicas, se agrediam, não se centravam na tarefa, disputavam por

materiais e pela atenção dos estagiários. Os desenhos eram pobres e escuros. A

possibilidade de aproveitamento foi se revelando através da diminuição da

ansiedade e, consequentemente, comportamentos mais maduros surgiram. As

crianças, imersas nas histórias, enriqueciam o conteúdo das mesmas com novos

detalhes, antecipando falas e transportando elementos para suas experiências de

vida. Vimos que, de forma lúdica, podiam compartilhar com os personagens, com

os colegas e conosco algumas situação difíceis de seu cotidiano. Assim, as

crianças ampliavam sua capacidade de pensar sobre suas histórias de vida e

crescia a possibilidade de investigar as verdades de si mesmas, diminuindo os

riscos de rupturas no processo histórico que compromete a necessidade de

significar a própria existência. Observamos que as crianças necessitavam de

experiências que possibilitassem o aprimoramento de sua criatividade, e de

atividades que favorecessem a sensação de alegria e de liberdade de expressão.

As histórias criadas, a música, a dança e a encenação assumiram esse papel,

estimulando a vida imaginativa e a fantasia. Os desenhos tornaram-se mais

estruturados e coloridos. Desenvolveu-se, também, um censo de grupo mais

integrado, as crianças mostravam-se mais colaborativas entre si, demonstravam

maior tolerância à frustração e conseguiam compartilhar brinquedos e material

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66 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

escolar. A possibilidade de expressão verbal tornou-se mais eficaz o que

contribuiu para o estabelecimento de uma comunicação mais efetiva entre os

membros do grupo.

Trabalhamos com crianças que possuem múltiplas carências e, por isso,

temos presente que não atingiremos de igual maneira a todas. Encontramos

crianças que por meio de suas distintas expressões revelam a dor de traumas

que se repetem e que necessitam de abordagens individuais, além das possíveis

no trabalho com o grupo. A elas dedicamos, em muitos momentos, atenção e

manejo específicos durante o trabalho com os contos. Incluímos, também, em

nosso programa a possibilidades destas crianças, mais prejudicadas em seu

desenvolvimento, serem encaminhadas para avaliação psicológica no SAPP,

onde se realiza uma intervenção terapêutica e posterior orientação de acordo com

suas singulares necessidades e as demandas de suas famílias.

Referências

ALBORNOZ, AC. Psicoterapia com crianças e adolescentes institucionalizados. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006. ALVAREZ,A. Companhia viva: psicoterapia psicanalítica com crianças autistas, borderline, carentes e maltratadas. Porto Alegre:Artes Médicas, 1994. CORSO, D., CORSO M. Fadas no divã: psicanálise nas histórias infantis. Porto Alegre: Atmed, 2006. FREUD,S. Duas mentiras contadas por crianças. In Obras Completas, Vol. XII, Rio de Janeiro: Imago, 1976.Originalmente publicado em 1913. FERRO, A. A técnica na psicanálise infantil. Rio de Janeiro: Imago, 1995. GLEN, J. Psicanálise e Psicoterapia de crianças. Porto Alegre: artes Médicas, 1996. GUTFRIEND, C. O terapeuta e o lobo: a atualização do conto na psicanálise de criança. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. GUTFRIEND,C. Vida e arte. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2005. LEWIS, M. Tratado de psiquiatria da infância e adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. RADINO,G. Contos de fadas e realidade psíquica: a importância da fantasia no desenvolvimento. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. ZIMERMAN,D.E.; OSÓRIO, L.C. Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

Page 68: Inovação, universidade e relação com a sociedade

“FORMAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS LEITORES NA COMUNIDADE DO MORRO DA CRUZ”

2008/2009

Projeto elaborado pelo Núcleo de Educação de Jovens e

Adultos/NEJA/FACED/PUCRS

[email protected]

Responsáveis pelo projeto:

Coordenação: Profª. Dr. Maria Conceição Pillon Christofoli [email protected]

Profª. Dr. Maria Inês Côrte Vitória [email protected]

Profª. MS.: Jussara Margareth de Paula Loch [email protected]

Resumo

O Núcleo de Educação de Jovens e Adultos – NEJA - da Faculdade de

Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) é

fruto de um grupo de estudos da Universidade, constituído desde julho de 1997,

com a proposição de ser um ambiente de estudo, pesquisa, formação, discussão

e debates direcionados para a Educação de Jovens e Adultos. Nesse sentido, o

presente projeto se insere na necessidade e responsabilidade social assumida

pela Faculdade de Educação – PUCRS – em promover no cenário da Educação

Brasileira a qualificação na formação de professores e, em especial, a formação

de educadores e professores de EJA. Para tanto, se estabelece como objetivo

geral deste projeto: Fomentar uma cultura de leitura entre jovens e adultos na

comunidade do Morro da Cruz. Dessa forma, se pretende que alunos de EJA e

dos anos finais do Ensino Fundamental, atuem como mediadores de leitura, junto

às bibliotecas escolares do Morro da Cruz, transformando os espaços das

mesmas (em sua maioria, mal utilizadas), em bibliotecas escolares atuantes e

abertas à comunidade.

Palavras-chave: formação de leitores, bibliotecas populares, Educação de

Jovens e Adultos.

Page 69: Inovação, universidade e relação com a sociedade

68 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Justificativa

A história do NEJA está vinculada aos movimentos de alfabetização: no

âmbito Federal, à Organização Não-Governamental AlfaSol1, parceria através da

qual já promovemos cursos de Formação de Alfabetizadores para

aproximadamente 1000 educadores-alfabetizadores, alcançando um total de

20000 jovens e adultos do interior, especialmente em comunidades rurais dos

seguintes estados brasileiros: Bahia, Rio Grande do Norte, Paraíba e Tocantins.

Nesses estados se evidenciam os mais altos índices de analfabetismo. Pela

mesma parceria (AlfaSol) atuamos, ainda na formação de educadores de jovens e

adultos, na África, em São Tomé e Príncipe. No âmbito municipal, atuamos junto

ao MOVA (Movimento de Alfabetização de Porto Alegre/RS), realizando cursos de

formação de educadores de jovens e adultos na cidade de Porto Alegre e região

metropolitana. Destaca-se que se manteve na PUCRS, ao longo de dez anos,

turma de Educação de Jovens e Adultos, em parceria da SMED/Porto Alegre com

o NEJA/FACED/PUCRS.

O presente projeto se insere na necessidade e responsabilidade social

assumida pela Faculdade de Educação – PUCRS – em promover no cenário da

Educação Brasileira a qualificação na formação de professores e, em especial,

com relação ao Núcleo de Educação de Jovens e Adultos em que atuamos, a

formação de educadores e professores de EJA. Ressalta-se que a questão da

expansão do atendimento na EJA, no Brasil contemporâneo, não envolve apenas

as pessoas que frequentaram a escola, mas as que não realizaram

aprendizagens suficientes para participar plenamente da cultura letrada do país,

utilizando os conhecimentos construídos em seu cotidiano. Superando-se a

questão dicotômica entre alfabetizado e não-alfabetizado, busca-se compreender

as habilidades de leitura e de escrita, que caracterizam o indivíduo capaz de

inserir-se de forma adequada no contexto social, respondendo adequadamente

1 Alfabetização Solidária (AlfaSol) é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos e de utilidade pública, que adota um modelo simples de alfabetização inicial, inovador e de baixo custo, baseado no sistema de parcerias com os diversos setores da sociedade. A Organização trabalha desde janeiro 1997 pela redução dos altos índices de analfabetismo no país (da ordem de 13,6 % segundo o censo de 2000 do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e pelo fortalecimento da oferta pública de Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Brasil. www.alfasol.org.br

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 69

às competências exigidas profissionalmente. O acesso à língua materna, sua

apropriação, sua utilização, sua (re) significação são construtos sobre os quais

deveriam se assentar os direitos de todos os pertencentes de comunidades

usuárias da leitura e da escrita.

Além disso, a aprovação do FUNDEB (Fundo Nacional de

Desenvolvimento da Educação Básica do Ministério da Educação do Brasil) no

ano de 2007, descortinou possibilidades de ampliação do atendimento a EJA,

pois pela primeira vez no país há garantia de financiamento para esse segmento

da população. Considerando também a existência de inúmeros Programas de

Alfabetização de Jovens e Adultos e a conseqüente demanda na continuidade de

Estudos de Jovens e Adultos não escolarizados, coloca-se como uma

necessidade fundamental a formação de educadores e professores para atuarem

de forma qualificada no Ensino Fundamental e Médio. Atualmente uma das ações

importantes desenvolvidas pelo NEJA/FACED/PUCRS, ocorre em convênio com

o ILEM, Instituto Leonardo Murialdo. O Instituto Leonardo Murialdo está presente

na comunidade do Morro da Cruz há 44 anos e atua no âmbito da assistência

social e educação de crianças, adolescentes, jovens e suas famílias. São quatro

casas cobrindo a área de atendimento do bairro contemplando, além da Biblioteca

Ilê Ará, um Centro Infantil (que atende crianças de 0 a 6 anos), Centro Infanto-

Juvenil (atende crianças de 7 a 14 anos), Centro de Formação Profissional

(adolescentes a partir de 13 anos, jovens e adultos) e uma pré incubadora para

empreendimentos populares de geração de trabalho e renda. A propósito disso,

nos parece importante apresentar de que contexto estamos falando.

A comunidade do Morro da Cruz está situada no Bairro Partenon, Zona

Leste de Porto Alegre. Segundo dados coletados pelo Instituto Leonardo

Murialdo, o Partenon colabora hoje com 8,88% da população de Porto Alegre,

sendo a segunda região mais populosa da cidade, com cerca de 129.100

habitantes, dos quais 8,27% são jovens entre 15 e 19 anos. Há cerca de 36.252

chefes de família na região, com renda média de 4,45 salários mínimos, sendo

que 37,8% destes percebem renda de até dois salários mínimos por mês. Destes

36.252 chefes de família, cerca de 10.544, 29,8%, são mulheres, das quais 1.131,

ou seja, 10,73%, são analfabetas. O analfabetismo em Porto Alegre atinge 3,3%

da população, enquanto no bairro Partenon este índice sobe para 4,1%.

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70 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Cabe ainda salientar que a FASC (Fundação de Assistência Social e

Cidadania), através do Programa Educação Social de Rua no Centro da Cidade,

abordou já seiscentos meninos e meninas em situação de rua. Segundo

levantamento realizado, o Partenon fica em 3º lugar na lista dos bairros com o

maior número de jovens em situação de rua na cidade. A grande maioria iniciou

sua vida nas ruas através da mendicância e do trabalho infantil na própria região.

Vários deixam a mendicância como segundo plano em favor do ingresso no

mundo das drogas e da prostituição. Em 1952, o Morro da Guampa, como era

chamado então, começou a ser ocupado, quando a área foi desapropriada para

fins de habitação. Durante um bom tempo, tal ocupação se deu muito

timidamente, de maneira a reproduzir os modos de vida e os modelos sociais de

comunidades rurais, de onde era oriunda a grande maioria dos primeiros

moradores. Outra parcela era formada por trabalhadores das docas, em sua

grande maioria afro-descendentes. A água era proveniente de fontes abundantes,

o que facilitava o plantio de milho, cana, batata doce, aipim e abóbora, além da

criação de porcos.

A partir de 1960, o Morro da Guampa passa a se chamar Morro da Cruz,

em função dos eventos religiosos da sexta-feira santa, quando as procissão que

começaram a subir o Morro com uma cruz todos os anos, deram à comunidade

essa identidade. Nos anos 70, o processo de ocupação do Morro da Cruz se

acelera. Fugindo do aluguel, muitas pessoas passam a ocupar áreas, construindo

pequenas casinhas de madeira. a fazer parte da rotina do Morro da Cruz, que

passam a exercer lideranças na comunidade. O Morro da Cruz é reconhecido em

toda a cidade por realizar, desde os anos sessenta, sempre às sextas-feiras

santas, a encenação da Paixão de Cristo, que mobiliza a comunidade e leva

centenas de pessoas para o Morro. Além disto, o Morro é também o berço de um

famoso grupo de senhoras que produz roupas que levam a marca do Morro da

Cruz, a partir da reciclagem de matérias têxteis.

Como conseqüência desta experiência de sucesso, inúmeros

investimentos em projetos alinhados com os preceitos da chamada “Economia

Solidária” vêm sendo levados a cabo na região, com resultados ora positivos, ora

nem tanto. Para fomentar estas iniciativas, o Instituto Leonardo Murialdo

transformou o galpão situado ao lado da creche, no topo do Morro, em uma

incubadora de projetos sociais. Dessa forma, a parceria entre NEJA/FACED e

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 71

ILEM se faz por meio de um trabalho de educação popular na comunidade do

Morro da Cruz, envolvendo desde alfabetização de jovens e adultos, assessoria

em projetos de educação e trabalho com jovens até a realização de cursos para

pessoas jovens e adultas, preparando-as para atuar como mediadores de leitura,

especialmente junto à Biblioteca Comunitária Ilê Ará.

Nesse sentido, através do Curso de Mediadores de Leitura percebeu-se a

necessidade de expandir para a comunidade do Morro da Cruz as ações

desenvolvidas pela Biblioteca Ilê Ará, quais sejam: contação de histórias;

empréstimo de livros; sacolas de leitura itinerante; sarau literário; visitas às casas,

escolas e associações comunitárias; levantamento de preferência de leitura;

rodas de leitura; círculos de cultura. A partir destas ações observou-se um

expressivo aumento nos empréstimos de livros (os primeiros registros dão conta

de aproximadamente 50 livros emprestados, enquanto que ao final do projeto

registraram-se uma média de 800 empréstimos mensais).

Há no Morro da Cruz 22 instituições escolares, mas lamentavelmente,

muitas das bibliotecas existentes nestas escolas atuam de forma restrita. Isso

significa que algumas estão fechadas, outras são utilizadas como depósito de

livro, outras ainda funcionam como laboratório de informática, raras são as que

funcionam à noite para as turmas de EJA e nenhuma é aberta para a

comunidade, além de contarem com acervo precário. Para . FREIRE( 1983, p..38)

a biblioteca popular,como centro cultural e não como depósito de livros,é vista

como fator fundamental para o aperfeiçoamento e a intensificação de uma forma

correta de ler o ler o texto em relação com o contexto.

O presente projeto pretende atuar junto às bibliotecas existentes nas

instituições escolares do Morro da Cruz no sentido de aproveitar as

ações/experiências desenvolvidas na Biblioteca Ilê Ará, expandido-as para as

demais bibliotecas da comunidade do Morro da Cruz. Com isso, o que se

pretende é que, além de cumprirem o seu papel dentro da escola, as bibliotecas

transformem-se também em espaços abertos à comunidade. Dessa forma, a

comunidade do Morro da Cruz será beneficiada com as ações das bibliotecas, o

que contribuirá expressivamente para a criação, formação e ampliação de uma

comunidade de leitura, fomentando uma cultura de leitura na comunidade do

Morro da Cruz, potencializando a ação das bibliotecas escolares e bibliotecas

comunitárias. Para tanto, iremos selecionar alunos de EJA, futuros mediadores de

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72 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

leitura, para atuar junto às bibliotecas escolares do Morro da Cruz;

instrumentalizar jovens, adultos e idosos para atuar como “contadores de

histórias” junto a seus grupos de idade e junto às crianças e adolescentes;

incentivar os jovens, adultos e idosos a reiniciar ou continuar seus estudos a partir

do gosto pela leitura.

Pressupostos teóricos

A questão da expansão do atendimento na EJA, no Brasil

contemporâneo, não envolve apenas as pessoas que freqüentaram a escola,

mas as que não realizaram aprendizagens suficientes para participar

plenamente da cultura letrada do país, utilizando os conhecimentos

construídos em seu cotidiano. Já não se pode mais banalizar a questão da

leitura, contentando-se com alfabetizados funcionais, pois que o mero caráter

utilitário do ato de ler retira dos sujeitos a possibilidade de perceber na cultura

letrada formas de ser e estar no mundo. A expansão da alfabetização

possibilita, igualmente, a expansão das categorias de leitores: crianças,

mulheres, trabalhadores. Se, por um lado, a entrada na cultura escrita parece

ser democratizada, por outro, a imposição de normas escolares, que tendem a

definir um modelo único de leitura/leitor, convivem com práticas extremamente

diversas, próprias das práticas de cada grupo de leitores. As diferenças entre

as práticas de leitura acentuam-se, dependendo dos usos sociais que

determinados grupos fazem da escrita.

Os séculos XIX e XX trazem o acentuar-se dessas diferenças. Observa-

se, em países mais desenvolvidos, baixos índices de analfabetismo. A

repercussão dessa Revolução na história das práticas de leitura e escrita é

inegável, e só é superada por outra revolução nessas práticas: a transmissão

eletrônica dos textos e as maneiras de ler que ela impõe (Cavallo e Chartier,

1998). A distância que separava o autor/leitor é quebrada pela cibernética. Se

antes o leitor possuía pouco espaço para interagir na obra impressa (apenas

anotações nas margens do texto), hoje ele pode realizar várias operações:

copiar, recompor, recortar, deslocar. O leitor, junto à tela, torna-se também um

autor, ele pode modificar e reescrever os textos, torná-los seus. As

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 73

intervenções do leitor, que eram limitadas no livro, passam a ser expressivas.

E é inegável que esse recurso tecnológico irá influenciar as práticas escolares. Outra questão importante que deve ser referida e trazida para ser

repensada, trata da formação dos leitores nas classes populares. De nada

adianta criarmos programas de alfabetização se não possibilitarmos que esses

sujeitos se tornem usuários da língua escrita,se não criarmos bibliotecas.

Freire(1983)ao falar das bibliotecas populares fala da importância de constituir um

acervo e em comunidades onde não há livros e outros materiais que se possa

criar um acervo registrando e escrevendo as histórias da comunidade.

Finalmente, e não menos importante, destacamos o fato de que o

referencial teórico por nós utilizado se sustenta fortemente nas questões de

escrita e leitura por acreditarmos na profunda relação existente entre ambas as

habilidades cognitivas. Assim, se já temos ações concretas referentes à

alfabetização no Morro da Cruz, nos parece que ações concretas referentes à

ampliação da leitura/escrita neste mesmo contexto poderia representar a

possibilidade de oferecer um trabalho pedagógico mais abrangente do ponto de

vista educativo, além de se configurar como um projeto com chances expressivas

de sustentabilidade. Por isso mesmo, acreditamos que os jovens e adultos teriam

a oportunidade de ler e ler melhor e, além disso, divulgar em seus grupos de

convivência, família, clubes, trabalho...a literatura, o gosto pelo estudo, além da

capacidade de organização e participação comunitária.

Ações previstas

O presente projeto se ampara nos princípios da pesquisa qualitativa,

adotando como diretriz metodológica a pesquisa-ação, que é uma pesquisa

eminentemente pedagógica, dentro da perspectiva de ser o exercício pedagógico,

configurado como uma ação que cientificisa a prática educativa, a partir de

princípios éticos que visualizam a contínua formação e emancipação de todos os

sujeitos da prática. Segundo Thiollent (2003)a pesquisa-ação é um tipo de

pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita

associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual

os pesquisadores e participantes representativos da situação ou do problema

estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. Muitos partidários

Page 75: Inovação, universidade e relação com a sociedade

74 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

restringem a concepção e o uso da pesquisa-ação a uma orientação de ação

emancipatória e a grupos sociais que pertencem às classes populares ou

dominadas.

A pesquisa não se limita a uma forma de ação: pretende-se aumentar o

conhecimento dos pesquisadores e o conhecimento das pessoas e grupos

considerados. Dessa forma, as ações previstas para a realização do projeto são

as seguintes:

• Convidar escolas/bibilotecas para participar do projeto – a primeira ação

prevista para o projeto dá conta de visitas realizadas às

escolas/bibliotecas com o objetivo de sensibilizar/apresentar os

propósitos do projeto. Este primeiro momento nos parece fundamental

para que a inserção das escolas se dê de maneira consciente e

informada sobre os processos que se pretende desencadear não

apenas na escola, mas de uma maneira mais geral também na

comunidade.

• Identificar jovens e adultos, alunos de EJA e também jovens alunos dos

Anos Finais do Ensino Fundamental, que tenham disponibilidade em

algum turno: manhã, tarde ou noite, para atuar como mediadores –

após a identificação dos jovens e adultos interessados em participar e

que tenham disponibilidade em algum turno, serão feitas entrevistas

para que se possa conhecer um pouco mais o perfil destes jovens e

adultos. Com isso, se pretende detalhar as funções, atribuições e papel

destes sujeitos na composição do projeto, assim como observar os que

mais se aproximam das expectativas previstas para este projeto.

• Organizar grupos de estudo, em cada turno, com a finalidade de

instrumentalização para a ação – parte-se da idéia de que não há como

realizar pesquisa-ação sem uma rigorosa sistematização de estudos e

discussão. Por isso mesmo, os grupos de estudo se configuram como

suporte sobre o qual se sustentarão as ações, os (re)encaminhamentos,

o desenvolvimento do projeto propriamente dito. A cada final de sessão

de estudos, serão encaminhados os textos da próxima reunião, aliando

permanentemente a práxis desenvolvida com as teorias pertinentes às

ações empreendidas.

Page 76: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 75

• Levantamento do acervo já existente em cada instituição escolar

pertencente ao projeto – o acervo das bibliotecas deverá ser

contabilizado, registrado e analisado. Somente a partir destes

levantamentos se poderá prever/planejar as necessidades mais

urgentes das bibliotecas, organizando/estabelecendo as prioridades de

acervo para cada espaço.

• Ativação do acervo – estas ações fazem parte do processo de

qualificação dos acervos das bibliotecas e também do processo de

colocar em marcha as sacolas de livros itinerantes, que perpassarão as

casas da comunidade, provavelmente ficando em cada residência

aproximadamente uma semana. O controle das sacolas itinerantes será

feito por monitores do projeto, sob supervisão dos professores

envolvidos no projeto.

Espera-se dessa forma, colocar em movimento as ações previstas neste

projeto, como forma de implementar/expandir/solidicar as práticas de leitura da

comunidade em questão. O acompanhamento de tais ações será realizado

através de reuniões sistemáticas (de estudo e encaminhamentos de ordem geral);

de registro de observações; de entrevistas realizadas junto à população do Morro

da Cruz; de cursos de formação permanente; de cursos de capacitação aos

mediadores de leitura. Os índices de empréstimo de livros serão antes, ao longo e

ao final do projeto serão mensurados através dos princípios da pesquisa

quantitativa e submetidos a percentuais e estatísticas.

Ações consolidadas

A primeira etapa do presente projeto, “Formação de Jovens e Adultos

Leitores na Comunidade do Morro da Cruz”, tem trazido resultados bastante

significativos no sentido de qualificar a atuação dos educadores populares. Nesse

sentido, ressaltam-se aspectos ligados ao aprimoramento na escolha do acervo; à

qualificação da mediação pedagógica na hora do conto; à seleção de textos para

leitura; à forma de apresentar o texto para os leitores; à organização dos

empréstimos das sacolas de leitura itinerantes; à relação dos mediadores de

leitura com a comunidade. Assim sendo, o trabalho realizado na primeira etapa

nos levou a ampliar a ação para as demais bibliotecas escolares do Morro da

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76 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Cruz, bibliotecas estas que, em algumas escolas, estão desativadas por falta de

recursos humanos. Pela atuação tão qualificada dos educadores populares é que

se pensou em aproveitar também os alunos dos Anos Finais e alunos de EJA

para participarem do Curso de Formação, na qualidade de mediadores de leitura,

e também acompanhá-los na tarefa de formar novos jovens e adultos leitores.

Referências

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Page 78: Inovação, universidade e relação com a sociedade

BOAS PRÁTICAS NAS CIÊNCIAS SOCIAIS

Page 79: Inovação, universidade e relação com a sociedade

SAÚDE E TRABALHO NO MERCOSUL: A EXPERIÊNCIA DO CENTRO COLABORADOR E SUAS ESTRATÉGIAS

Jussara Maria Rosa Mendes Assistente Social, Doutora em Serviço Social pela Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, Faculdade de Serviço Social da Pontifícia Universidade

Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, [email protected]

Resumo: O presente artigo apresenta a experiência do Centro Colaborador em

Saúde do trabalhador no MERCOSUL - COLSAT, sediado no Núcleo de Estudos

e Pesquisa em Saúde e Trabalho (NEST), da Faculdade de Serviço

Social/PUCRS, o qual se constitui numa cooperação técnico-científica

desenvolvida entre a universidade e o Ministério da Saúde. Demonstra como vêm

se dando o processo de inovação de metodologias que articulam o tripé ensino,

pesquisa e extensão. Evidencia as estratégias realizadas para contribuir com a

efetivação do direito a saúde no âmbito dos países membros do MERCOSUL,

potencializada através de diferentes diretrizes e ações, com destaque para o

trabalho em rede que vem dinamizando e integrando competências.

Palavras-chave: Saúde do trabalhador, Centro Colaborador, Mercosul.

Introdução

Este artigo tem por finalidade apresentar a estratégia de fortalecimento de

uma rede interativa através do trabalho de cooperação técnico-científica em

Saúde do Trabalhador, efetivada pelo Centro Colaborador em Saúde do

Trabalhador no Contexto do Mercosul (COLSAT-Mercosul), criado em 2006, a

partir de uma parceria com o Ministério da Saúde do Brasil, e sediado no Núcleo

de Estudos e Pesquisa em Saúde e Trabalho (NEST), da Faculdade de Serviço

Social/PUCRS.

O COLSAT-Mercosul tem como foco o fortalecimento de uma gestão

compartilhada entre os órgãos de gestão pública, a fim de incrementar a política

de Saúde do Trabalhador. Têm como uma das suas principais estratégias a

constituição da Rede de Saúde do Trabalhador para o desenvolvimento da

Page 80: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 79

informação, formação e ações de promoção à saúde da população trabalhadora

na região, além disso, está orientado por uma metodologia que visa como um dos

seus produtos o trabalho em rede e o espaço para a integração regional e

internacional, na perspectiva de incluir o direito à saúde na agenda política do

referido bloco

Objetivos

A implantação do COLSAT-Mercosul cumpre um papel estratégico de

fortalecimento da política de Saúde do Trabalhador no Contexto do Mercosul e a

sua implementação parte da apreensão desse contexto, das suas formas de

organização social e da identificação das assimetrias entre os Estados-membros.

Tem como objetivo geral estabelecer cooperação técnico-científica com a

Coordenação de Saúde do Trabalhador - COSAT - do Ministério da Saúde do

Brasil a fim de subsidiar ações em Saúde do Trabalhador no Contexto do

Mercosul. Esta cooperação ocorre por meio da articulação do tripé ensino,

pesquisa e extensão, e através de parcerias com instituições governamentais e

não-governamentais, de ensino e/ou ações voltadas para esta área.

Para efetivar esse papel, o COLSAT-Mercosul propõe-se a:

Estabelecer trabalho em rede e espaço sistemático para a integração

regional;

Desenvolver intercâmbio internacional por meio de Missões Regionais

nos Estados-membros do Mercosul: Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai

e Venezuela;

Realizar diagnóstico situacional em cidades-gêmeas;

Estabelecer uma agenda de trabalho conjunta que contemple as

demandas oriundas da análise situacional, pós diagnóstico;

Promover e desenvolver estudos multicêntricos e interdisciplinares sobre

metodologias de intervenção no campo da Saúde do Trabalhador nos

Estados-membros do Mercosul;

Disseminar informações e conhecimentos técnico-científicos sobre Saúde

do Trabalhador no contexto do Mercosul;

Page 81: Inovação, universidade e relação com a sociedade

80 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Realizar projetos e assessorar o desenvolvimento local de ações de

formação continuada de profissionais, gestores e movimentos sociais

responsáveis pelas ações de Saúde do Trabalhador;

Subsidiar a construção de políticas sociais que instrumentalizem uma

intervenção prática na situação de saúde e trabalho dos Estados-

membros do Mercosul (MENDES ET al., 2006).

O processo de inovação desenvolvida e resultados obtidos

A implementação do COLSAT-Mercosul representa o fortalecimento e a

ampliação das ações no campo da Saúde do Trabalhador centrado em cinco

diretrizes: 1) formação e pesquisa, 2) interdisciplinaridade, 3)

interinstitucionalidade, 4) trabalho em rede e 5) de gestão compartilhada

mediante cooperação entre poder público e a universidade para o cumprimento

dos respectivos papéis em prol do desenvolvimento social e da saúde do

trabalhador no contexto do Mercosul (MENDES et al, 2006).

Destaca-se que a diretriz referente ao trabalho em rede, a partir da

experiência do COLSAT-Mercosul, tem contribuído para a efetivação das demais

diretrizes, pois se tem como suposto a organização e a mobilização permanente

dessa rede. O centro colaborador1 tem se constituído em importante estratégia

para o estudo e produção de conhecimento de uma determinada área, sendo,

portanto, uma instituição que é designada por órgão nacional ou internacional

para participar de uma rede colaborativa, realizando atividades de apoio aos

programas desse órgão e contribuindo para o aumento da cooperação técnica

com e entre países, fornecendo-lhes informações, serviços e consultoria, além de

estimular e apoiar processos de formação, pesquisa e produção de

conhecimentos (MENDES et all, 1993).

1 “Antes da criação da Organização Mundial da Saúde (OMS), a Liga das Nações já tinha vivenciado a experiência de trabalhar com laboratórios por ela designados como Centro de Referência para padronização de produtos biológicos. Esta mesma filosofia foi aderida pela OMS, que em 1947 designou seu primeiro centro de Referência, direcionado para a investigação epidemiológica com abrangência mundial. Desde então, visualizou-se a necessidade de aproveitamento dos recursos de instituições já reconhecidas, as quais poderiam vir a tornar-se Centro de Referência da OMS, já que não cabia a este Organismo criar ou subsidiar instituições de pesquisa internacional que atendessem aos objetivos de seus programas” (Mendes et all, 1993, p. 56).

Page 82: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 81

No caso dos Centros Colaboradores vinculados às universidades destaca-

se a sua capacidade científica e profissional, aliada à estrutura de apoio que as

instituições de ensino costumam possuir e, no caso do COLSAT-Mercosul, a sua

localização no estado do Rio Grande do Sul, portanto, na região de fronteira com

os países que compõem o bloco em questão, tornam favorável e oportuna a sua

constituição e possibilidade de êxito naquilo que se propõe a atuar.

O trabalho desenvolvido pelo centro colaborador tem como cenário o

Mercosul, cujo território apresenta um conjunto de assimetrias econômicas,

políticas, culturais e sociais, nela incluída os aspectos da Saúde do Trabalhador

que necessitam investimentos públicos e estudos que, ao considerar as

expressivas diferenças, possam estimular o desenvolvimento de forma mais

equânime no campo da formação, pesquisa e proteção ao meio ambiente do

trabalho.

Desta forma, a constituição do trabalho em rede, representa esta

perspectiva e como proposta metodológica impõe como desafio à interlocução

sistemática entre estas instituições a fim de criar condições para o

desenvolvimento de atividades de investigação e intervenção com diferentes

sujeitos favorecendo a sinergia necessária para garantir um papel contributivo na

defesa das políticas públicas e, em especial, dos direitos à saúde e ao trabalho.

Entende-se que o processo de construção desta rede exige reconhecer e

identificar os interesses, nesta área e buscar os pontos comuns entre os países,

definindo uma agenda que contemple as diversidades de cada Estado-nação.

No COLSAT-Mercosul, foram empreendidas várias estratégias que visam a

materialização dessa rede, com destaque para as seguintes:

a) Inclusão da temática da Saúde do Trabalhador no Mercosul, a partir de

uma Oficina Pré-Congresso da ABRASCO em julho de 2007 (MENDES et all,

2007) que culminou com a construção de uma agenda que aponta para a

necessidade de aprofundar o debate sobre o modelo de desenvolvimento social

presente no bloco, a consolidação da rede de Saúde do Trabalhador no Mercosul

e mais um conjunto de proposições voltadas ao desenvolvimento de ações para a

área nos países-membros;

b) Criação e manutenção permanente de um site (www.colsatmercosul.org)

que vem se constituindo como um importante espaço de disseminação da

informação acerca da saúde do trabalhador no âmbito do Mercosul.

Page 83: Inovação, universidade e relação com a sociedade

82 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

c) Realização de um Simpósio sobre Saúde do Trabalhador e Proteção

Social em abril de 2008 (MENDES et all, 2008a) que teve como objetivo central

discutir a proteção social da saúde dos trabalhadores no âmbito do Mercosul com

a finalidade de potencializar os estudos, investigações e ações na região. O

evento expressou o compromisso do COLSAT-Mercosul com a articulação da

rede de pesquisadores e profissionais dos países membros e o Grupo do Direito à

Saúde no Mercosul, reunindo, aproximadamente, duzentos participantes,

constituindo-se num espaço privilegiado de discussão, cujas reflexões

contribuíram para a construção de uma agenda social tecida através da

proposição de políticas de proteção social centradas nos marcos de um projeto

societário.

d) Organização e publicação do livro: “Mercosul em Múltiplas Perspectivas:

Fronteiras, Direitos e Proteção Social” (Mendes, et all, 2008b), condensando as

principais reflexões de pesquisadores da área da proteção social no contexto do

Mercosul.

e) Articulação das funções precípuas da universidade, ou seja, ensino,

pesquisa e extensão, desenvolvidas no Núcleo e na Faculdade responsável pelo

Centro Colaborador, para favorecer a sinergia entre essas funções e as diretrizes

do Centro, materializando-se em: projetos de pesquisa de docentes e de alunos

de graduação e pós-graduação sobre a temática da proteção social, da saúde do

trabalhador e do Mercosul; oferta do Curso de Especialização em Saúde do

Trabalhador, entre outras ações. Destaca-se, a realização da pesquisa “A saúde

do trabalhador no Mercosul: um estudo do sistema de proteção social nos

cenários fronteiriços” , a qual vem sendo realizada em parceria com diversas

universidades e com os Centros de referência em Saúde do Trabalhador-

CEREST, localizados nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná

e Matogrosso do Sul.

O conjunto dessas estratégias tem resultado em importantes avanços no

campo da saúde e do trabalho no Mercosul, destacando-se a constituição dessa

rede, hoje composta por inúmeras organizações, profissionais e representantes

da academia e dos movimentos sociais, assim como a construção de uma

agenda comum entre os países para que se efetive o direito à saúde no bloco.

A discussão da saúde do trabalhador deve ser pautada na perspectiva da

discussão sobre proteção social que, por sua vez, se constitui num sistema

Page 84: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 83

mediado por um conjunto de relações entre os Estados e a sociedade, que

articula os patamares de cidadania e direitos sociais. (MENDES, CORRÊA e

WÜNSCH, 2008).

A constituição sócio-histórica da proteção social expressa um modelo

pendular marcado pelo viés securitário e universal. Portanto, o principal desafio

para o centro colaborador está em compreendê-la no cenário do MERCOSUL,

que vem se constituindo num espaço sócio-político que apresenta características

distintas, mas também, simétricas que têm instigado à construção do

conhecimento científico no sentido de contribuir para a apreensão dos elementos

constitutivos desta realidade.

Trabalha-se na perspectiva da construção de novas mediações que

possam responder a realidade, que se expressa nas desigualdades sociais que

conformam a questão social contemporânea, em tempos de novas formas de

acumulação e organização da sociedade capitalista. Uma das formas de

organização do capital está na sua mundialização que ultrapassa as fronteiras

entre as nações por meio das novas tecnologias da informação e pela

constituição de blocos regionais. Ao compreendermos essa nova dinâmica do

capital, identificamos que a estratégia da informação e da constituição de redes

que extrapolem as nações pode ser potencializada para fomentar a garantia dos

direitos e a proteção social, utilizando-se, para tanto, das mesmas estratégias que

o capital vem utilizando para internacionalizar-se cada vez mais, em uma

perspectiva que tem como horizonte o desenvolvimento social, como um todo.

Neste sentido, a construção de uma agenda organizada de forma a

estabelecer novos padrões de discussão que permitam avançar na concepção de

proteção social, por meio de políticas sociais de caráter universal, torna-se central

no fortalecimento dessa rede. Pressupõe, desta forma, uma nova correlação de

forças, a criação de um tecido social em torno de uma problemática capaz de

inseri-la no debate político, ou seja, estabelecer novas mediações entre o Estado

e a sociedade (FLEURY, 1994).

Tem-se na efetivação da Saúde do trabalhador, uma política transversal, a

potencialidade de estabelecer uma interação entre o conjunto de necessidades

sociais dos trabalhadores, independente de sua inserção no mercado produtivo. A

transformação destas necessidades em uma pauta política significa incorporar

princípios fundamentais do direito à saúde e do trabalho, no controle sobre as

Page 85: Inovação, universidade e relação com a sociedade

84 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

condições e os ambientes de trabalho enquanto estratégia de ação para a uma

nova agenda política comprometida com uma nova ordem societária.

O Colsat-Mercosul vem enfrentando os desafios de construir coletivamente

novas formas de contra-poderes na consolidação dessa agenda de proteção

social no MERCOSUL, através da mobilização da rede de pesquisadores e

trabalhadores, com o intuito de mobilizar os sujeitos sociais na afirmação da

equidade ao conjunto da população trabalhadora, ou seja, atingindo os excluídos

do mercado formal de trabalho e os desprotegidos do sistema de proteção social

na direção de luta pela universalidade dos direitos.

Em meio ao contexto onde ocorre a flexibilização e a redução do emprego,

que atingem as condições objetivas e subjetivas da classe trabalhadora, se tem

os elementos que determinam a possibilidade de fortalecimento dos movimentos

sociais na constituição de forças propulsoras ao estabelecimento de novos

padrões de seguridade social que atendam às demandas sociais de forma

universal, o que implica, por sua vez, na reflexão de outro modelo de

desenvolvimento que integre o econômico e o social.

Considerações finais

O conjunto de elementos abordados no decorrer deste artigo nos permite

concluir que o Colsat-Mercosul vem contribuindo para a Saúde do Trabalhador, a

partir da inserção das demandas pelo direito à saúde e à proteção social na

agenda política do MERCOSUL, bem como na conformação de um espaço - a

rede - que possa ser referência acadêmica e social para os inúmeros sujeitos

sociais que se encontram implicados e desafiados por essas demandas.

O Colsat-Mercosul, por ser uma estrutura acadêmica e de cooperação

técnico-científica, articula o tripé ensino, pesquisa e extensão, constituindo-se,

também, em um importante espaço de formação profissional na área de Serviço

Social. Desta forma, concomitantemente, favorece a interdisciplinaridade na área

da saúde e possibilita a consolidação da profissão em meio às diferentes áreas

do saber, ampliando o seu espaço de atuação e formação.

A cooperação internacional, nas suas múltiplas iniciativas, é uma estratégia

de integração de competências entre diferentes países e organizações para o

avanço multinacional de conhecimento e fortalecimento institucional para a

Page 86: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 85

promoção da atenção em Saúde do Trabalhador. O trabalho do Colsat-Mercosul

emerge dessa estratégia e busca dinamizar as relações internacionais, por meio

de suas estruturas consultivas, das suas ações e da intervenção dos sujeitos

sociais que atuam na área de Saúde do Trabalhador nos Estados-membros, a

partir da integração e de mecanismos que congreguem parceiros institucionais

identificados com a construção de práticas e teorias críticas no âmbito da região

do Cone Sul.

Por fim, contexto atual de globalização que intensifica o fenômeno da

produção fragmentada e multifacetada em diversas regiões, num processo de

exploração global da classe trabalhadora vem produzindo um impacto direto e

indireto que se expressa na forma de viver, trabalhar e morrer do conjunto da

população latino-americana. Este fenômeno, interconectado de variáveis sociais

determinadas no processo histórico exige avanços no trabalho em rede e

interdisciplinar, em metodologias inovadoras de investigação e intervenção. É

nessa direção que o Colsat-Mercosul tem caminhado e pretende avançar.

Referências Bibliográficas

COLSAT-MERCOSUL, site: www.colsatmercosul.org FLEURY, Sônia. Estado sem Cidadãos. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1994. MENDES, J. M. R. O verso e o anverso de uma história: o acidente e a morte no trabalho. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003. ______ et all. Projeto: Centro Colaborador em Saúde do Trabalhador no MERCOSUL. Porto Alegre: NEST/PUCRS, 2006. ______. Relatório da Oficina Pré-Congresso da ABRASCO. Salvador, 2007. ______. ANAIS do Simpósio Saúde do trabalhador e Proteção Social. Porto Alegre: PUCRS, 2008a. ______. MERCOSUL em Múltiplas Perspectivas: Fronteiras, Direitos e Proteção Social. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008b. (CONFERIR ESTA REFERÊNCIA) MENDES, CORREA E WÜNSCH. Proteção social e Saúde do trabalhador: a mediação para a construção da agenda política no MERCOSUL. IN: Anais do Simpósio Saúde do trabalhador e Proteção Social. Porto Alegre: PUCRS, 2008a. Mendes, Isabel Amélia Costa et all. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo: Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde. Revista Latino-Americana de Enfermagem - Ribeirão Preto - V. 1 - N. Especial - P. 53- 68 - Dez. 1993. www.scielo.br. Acesso Em 22.04.08.

Page 87: Inovação, universidade e relação com a sociedade

SET UNIVERSITÁRIO: 21 ANOS COMUNICANDO-SE COM A SOCIEDADE

SET UNIVERSITÁRIO: 21 YEARS TALKING WITH SOCIETY

Necchi, Vitor. Ms. FAMECOS - PUCRS

[email protected]

Thier, Fábian Chelkanoff. Ms. FAMECOS - PUCRS [email protected]

Machado, Neka. Dr. FAMECOS - PUCRS [email protected]

Resumo

Evento promovido pela Faculdade de Comunicação Social da PUCRS

(FAMECOS) desde 1988, o Set Universitário está entre os mais importantes

encontros de universitários da área de Comunicação no Brasil. Ao mixar uma

mostra competitiva com intensa programação de palestras e oficinas, o Set

encontrou uma identidade própria, que atrai estudantes e profissionais de vários

estados brasileiros e vem sendo aprimorada ao longo dos anos.

Palavras-chave: comunicação, festival, integração.

Abstract

Event promoted by the Faculdade de Comunicação Social da PUCRS

(FAMECOS) from 1988, the Set Universitário is one of the most important

meetings of students and teachers of the area of Communication in Brazil. While

mixing a display competiiva with intense planning of conversations and

workshops, the Set found an own identity, which attracts students and

professionals of several Brazilian states and is perfected along the years.

Keywords: communication, festival, integration.

Page 88: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 87

Introdução

Poucos – ou talvez nenhum outro – evento voltado para alunos de

Comunicação e de Cinema do Brasil seja tão longevo e tradicional quanto o SET

Universitário, promovido pela Faculdade de Comunicação Social (Famecos) da

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Desde 1988, o

campus central da universidade, em Porto Alegre, recebe milhares de estudantes

provenientes de diversos municípios gaúchos e de outros Estados que têm a

oportunidade de trocar experiências com professores, pesquisadores e

profissionais que atuam fora da academia. Em 2008, participaram também

universitários da Argentina, do Uruguai e de Portugal. Todos buscam sintonia com

as tendências da área, além de aprofundar as possibilidades de reflexão e de

experimentação. A cada edição, ocorrem palestras, oficinas e a Mostra

Competitiva – concurso que premia os alunos autores dos melhores trabalhos

desenvolvidos em atividades acadêmicas e os professores orientadores.

Em mais de duas décadas, o SET tornou-se referência para estudantes e

profissionais de todo o país. A edição de 2007 consagrou esta trajetória de

consolidação e provou a força que o evento detém. A de 2008, ampliou as

perspectivas. O caminho natural, portanto, só pode ser um: ir além. Para 2009, a

ideia é ousar mais, fazer mais, acolher mais, experimentar mais. Mais do que

manter a tradição, o que se pretende é ampliar as possibilidades, de forma que se

extraia a potencialidade máxima de uma iniciativa vocacionada ao sucesso.

Objetivos

Geral:

Integrar a comunidade acadêmica (alunos, professores e pesquisadores)

de cursos superiores do Brasil, da América do Sul e da Península Ibérica com

instituições e profissionais das diversas áreas da comunicação por meio de um

intercâmbio sociocultural.

Específicos:

Divulgar a produção acadêmica dos alunos de cursos superiores.

Propiciar aos alunos aproximação com profissionais do mercado.

Page 89: Inovação, universidade e relação com a sociedade

88 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Promover intercâmbio entre a academia e o mercado de trabalho.

Descrição do processo de inovação

A primeira edição do SET Universitário ocorreu em 1988. Desde o

princípio, o planejamento e a execução são desenvolvidos por alunos e

professores da Famecos, na medida em que o próprio evento se constitui um

espaço de aprendizagem.

Nas palestras e oficinas, sempre houve presença de renomados

profissionais do Estado e do país, entre eles Analisa de Medeiros Brum, Bruno

Wainer, Caíque Severo, Carlos Kober, Carlos Saul Duque, Cassiano Elek

Machado, Clóvis Dariano, Cyro Silveira Martins Filho, Dado Schneider, David

Coimbra, Diogo Mainardi, Edson Erdmann, Eduardo Axelrud, Eduardo Peñuela,

Eliane Ferreira, Erh Ray, Fabian Gloeden, Felipe Anghinoni, Fernando Pires,

Gisele Lorenzetti, José Alberto Andrade, Klester Cavalcanti, Leandro Sarmatz,

Luli Radfahrer, Marcello Dantas, Marcelo Pires, Marcelo Rech, Márcio Callage,

Marco Antônio Lage, Margarida Kunsch, Maria Rita Kehl, Marta Machado, Moacyr

Scliar, Nilson Lage, Núbia Silveira, Otto Guerra, Paulo Totti, Rafael Bohrer,

Ricardo Noblat, Roberto Philomena, Ruy Carlos Ostermann, Telmo Flor, Tiago

Mattos, Valpirio Gianni Monteiro, e do Exterior, como Bill Jonhson, Carl Botan

(Estados Unidos) e Maria Tereza Tellez (Bolívia).

Figura 1: Debate no Set Universitário de 2008

Page 90: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 89

Edição 2008 – o ano da inovação

Entre 22 e 24 de setembro de 2008, o 21º SET Universitário transformou a

Famecos. Quem chegasse ao saguão da faculdade – um amplo vão de circulação

e convivência para o qual convergem alunos de diversos cursos – já percebia, de

imediato, o porte do evento. O ambiente virou um imenso lounge, equipado com

mobiliário e tapetes para a integração dos participantes. A iluminação especial e o

palco montado pela Opinião Produtora criaram em pleno espaço universitário uma

estrutura similar à de um show. Durante os intervalos das oficinas e das palestras,

o local se consagrou como ponto de encontro dos participantes. Se a Famecos é,

de certa forma, a “casa” dos seus alunos, com o SET, essa característica se

ampliou.

Na organização do evento, trabalharam três professores, que contaram

com a atuação de 23 colegas e 60 alunos, além dos funcionários da secretaria e

dos laboratórios da Famecos.

Figura 2: Logo do Set Universitário 2008

Site

Em 2007, o site do evento (www.pucrs.br/famecos/set) foi reformulado,

passando a disponibilizar informações (programação, notícias, regulamento etc.)

e o sistema de inscrição de trabalhos para a Mostra Competitiva. Nas duas

últimas edições, o público pode assistir à transmissão ao vivo das palestras. Esse

material segue disponível.

Em setembro de 2008 – mês de realização do SET –, o site teve 12.812

acessos (em 2007, foram 7.924), com um pico de 1,3 mil nos dias do evento, e

45.975 pageviews (em 2007, pico de 700 e 25,7 mil pageviews). Os acessos

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90 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

foram provenientes também do Exterior (Argentina, Canadá, Colômbia, Estados

Unidos, Espanha, Chile, Portugal, Reino Unido e Peru). O tempo médio de

permanência dos brasileiros ficou em 4,32 minutos.

Mostra Competitiva

Desde a criação do SET Universitário, a Mostra Competitiva constitui-se

um dos principais propósitos da iniciativa, com o objetivo de valorizar a produção,

o empenho e o talento dos alunos. O concurso é voltado para discentes de cursos

superiores de Comunicação e de Cinema/Audiovisual que tenham desenvolvido

suas obras em alguma atividade acadêmica (disciplinas, laboratórios, estágios

etc.) nos dois semestres anteriores ao da realização do evento.

Na edição de 2008, as categorias da mostra eram (a) Jornalismo, (b)

Produção Audiovisual, Cinema e Vídeo, (c) Publicidade e Propaganda e (d)

Relações Públicas, todas divididas em subcategorias. Os alunos vencedores e os

professores orientadores ganharam certificados na cerimônia de encerramento. O

júri foi composto por 90 profissionais do mercado que não lecionam em cursos

superiores.

Houve 531 trabalhos inscritos provenientes de cinco Estados (Minas

Gerais, Paraná, Pernambuco, Santa Catarina e São Paulo) e de 12 municípios

gaúchos (Canoas, Caxias do Sul, Frederico Westphalen, Ijuí, Novo Hamburgo,

Passo Fundo, Pelotas, Porto Alegre, Santa Cruz do Sul, Santa Maria, São

Leopoldo e Taquara).

Figura 3: Palco onde aconteceu a cerimônia de premiação em 2008

Page 92: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 91

Palestras e oficinas

Um time de 20 especialistas atuou nas 12 palestras, realizadas em quatro

espaços da universidade (Auditório da Famecos, Auditório do Prédio 9, Teatro do

Prédio 40 e Centro de Eventos). Quase 5 mil pessoas debateram temas das

áreas de comunicação, jornalismo, publicidade e propaganda, relações públicas e

cinema. Não havia necessidade de inscrição prévia, e o acesso aos auditórios

obedeceu à capacidade dos espaços. As atividades se concentraram nos turnos

da manhã e da noite e eram gratuitas.

No turno da tarde, 545 alunos participaram de 17 oficinas, ministradas por

28 profissionais, que tiveram suas vagas esgotadas em menos de uma semana

de inscrição.

Figura 4: Oficina durante o Set 2008

Cerimônia de encerramento/premiação/festa

O SET Universitário tradicionalmente é encerrado com a divulgação dos

vencedores da Mostra Competitiva, momento em que ocorre a entrega dos

certificados aos autores dos trabalhos.

Em 2007, antes da cerimônia de premiação ocorreu uma edição especial

do Sarau Elétrico, um dos programas culturais de maior destaque do Rio Grande

do Sul. Trata-se de uma reunião informal em que conversas, entrevistas, leituras

e música formam o meio pelo qual se coloca a literatura acessível ao público.

Participaram a radialista Katia Suman, o professor Luís Augusto Fischer e a

Page 93: Inovação, universidade e relação com a sociedade

92 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

escritora Cláudia Tajes. O auditório da Famecos ficou completamente lotado para

a leitura dos textos.

Figura 5: Programa "Camarote" no Set Universitário

Não menos lotado o espaço ficou em 2008, quando o jornalista Carlos

Kober, da Rede Globo, comandou um talk-show. A comemoração prosseguiu até

altas horas na festa de encerramento realizada no Bar Opinião, quando milhares

de universitários assistiram ao show das bandas “Os Efervescentes”, “Os

Horácios”, “Motel Flamingo” e “Dama e os Valetes Doidos”. A seleção dos grupos

coube ao produtor Rei Magro e ao radialista Cristian dos Santos, o Pancho, da

rádio Ipanema. No total, 20 bandas se inscreveram para disputar uma das vagas.

Pelo menos um dos integrantes precisava ser aluno da Famecos.

Projeto para 2009

O SET Universitário ocorrerá de 28 a 30 de setembro (de segunda a

quarta-feira), mas, além dessas datas, haverá o +SET, que são edições

concentradas do evento ao longo do primeiro semestre, pois a consolidação da

marca e a maturidade da proposta permitem que se criem subprodutos vinculados

a ela.

Em cada mês que antecede o evento, a partir de maio, será realizada uma

atividade pautada pelo conceito do SET. Pode ser uma palestra, um debate, uma

exibição, uma oficina... Como o SET é múltiplo, as possibilidades de replicá-lo

durante o ano são, igualmente, múltiplas. O SET propriamente dito é dividido em

palestras (manhãs e noites) e oficinas (tardes).

Page 94: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 93

Saguão da Famecos

A experiência de transformar o saguão da Famecos em um lounge teve um

resultado altamente positivo. Durante os três turnos de cada dia, alunos da

PUCRS – em particular os da Famecos – e de outras instituições ocuparam todos

os espaços de convivência disponíveis. Em 2009, a ideia é expandir a área

reservada ao evento até os jardins da Famecos e à via localizada entre o prédio

da faculdade e o prédio 8. DJs farão apresentações antes do início das palestras

e nos intervalos das aulas.

Figura 6: O "Lounge" do Set 2008

Resultados Obtidos

A mídia, de uma maneira geral, dedica espaços expressivos para

publicação e veiculação de conteúdo relativo ao SET Universitário. Todos os

marcos do evento (lançamento, abertura das inscrições para Mostra Competitiva,

divulgação de palestras e oficinas, abertura de inscrições para oficinas,

divulgação do número de inscritos, início e desenvolvimento do evento,

divulgação dos vencedores, balanço do evento, informações em geral) ganham

espaço nos principais veículos e emissoras de Porto Alegre, além de revistas,

jornais e sites especializados.

Em 2008, a divulgação do evento foi potencializada com a cobertura

desenvolvida por 12 alunos de Jornalismo, que alimentaram o site com 48

notícias, centenas de fotografias e ainda criaram um blog que teve 4.234 acessos.

Do interior do Rio Grande do Sul e de estados mais próximos, anualmente

provêm caravanas de alunos. Nas últimas edições, universitários de Santa Maria,

Pelotas e Passo Fundo formam os grupos mais numerosos.

Page 95: Inovação, universidade e relação com a sociedade

94 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Uma situação que permite dimensionar a importância do SET é o valor

atribuído pelos alunos vencedores da Mostra Competitiva à distinção recebida.

Vários profissionais de grande expressão destacam em seus currículos e

entrevistas o fato de, em seu tempo de estudante, terem conquistado o 1º lugar

no concurso. É o caso da jornalista Eliane Brum, renomada por sua atuação em

Zero Hora e, nos últimos anos, na revista Época. Eliane, que venceu o prêmio

Jabuti de 2007 na categoria livro reportagem com a obra A vida que ninguém vê,

arrebatou o 1º lugar em “redação jornalística” na primeira edição do SET

Universitário com uma reportagem intitulada Esperando na fila da existência. A

vitória rendeu um estágio de um mês no jornal Zero Hora, onde permaneceu por

11 anos e, conforme ela mesma diz, descobriu que “ser repórter é a melhor

profissão do mundo”.

Considerações Finais

O sucesso de um evento como o Set Universitário depende de vários

fatores. Neste texto, destacamos dois deles: a construção de uma identidade

forte, que só pode ser obtida ao longo dos anos, pela insistência com práticas e

modelos que sejam absorvidos pelos participantes e proporcionem uma

fidelização cada vez maior; e a inovação, capaz de trazer sempre aspectos

originais a cada edição. Em 2008, após detectar onde o Set estava sendo

repetitivo e pouco atraente, a equipe de realização foi capaz de apresentar aos

participantes um ambiente diferenciado e novas atividades, com excelente

repercussão.

Page 96: Inovação, universidade e relação com a sociedade

POR UMA TEORIA DOS DIREITOS E DEVERES SOCIOAMBIENTAIS: APROXIMAÇÕES SOCIAIS E JURÍDICAS A PARTIR DO EXEMPLO DA

JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE

Ingo Wolfgang Sarlet – Doutor e Pós-Doutor em Direito pela Ludwig-

Maximillians- Universität-München; Professor Titular da Faculdade de Direito –

PUCRS. Coordenador do Programa de Mestrado e Doutorado em Direito, do

NEADF-Núcleo de Altos Estudos e Pesquisas em Direitos Fundamentais e do

Centro de Pesquisas da Faculdade de Direito da PUCRS.

e-mail: [email protected]

Carlos Alberto Molinaro – Doutor em Direito pela Universidad Pablo de Olavide,

Sevilha; Professor Adjunto da Faculdade de Direito e Vice-Diretor da Faculdade

de Direito da PUCRS. Professor do Doutorado em Direitos Humanos da

Universidade Pablo de Olavide, Sevilha.

e-mail: [email protected]

Resumo

Boa parcela dos projetos de investigação em desenvolvimento no âmbito

da Pós-Graduação em Direito da PUCRS, nomeadamente os vinculados à linha

de pesquisa Eficácia e Efetividade da Constituição e dos Direitos Fundamentais

no Direito Público e no Direito Privado, dirigem-se ao estudo dos direitos

fundamentais, com especial atenção à eficácia e à efetividade do direito

fundamental à saúde, tendo como norte orientador o estudo transdiciplinar e o

impacto na realidade social e ambiental, pensando-se até na estrutura de um

Estado socioambiental e democrático de direito. Nesta perspectiva, pretende-se,

em linhas gerais, desenhar uma deontologia destes direitos com o estudo dos

denominados deveres fundamentais, sejam eles correlativos aos direitos ou

autônomos. Desta forma, privilegia-se o estudo dos deveres do Estado e dos

particulares (eficácia entre terceiros) para a efetiva concretização dos direitos

fundamentais, forte no princípio da dignidade emprestada ao humano e suas

extensões, tendo sempre como ênfase os deveres de solidariedade, precaução e

proteção. O Direito (e dever) fundamental à saúde, especialmente sob o enfoque

concreto da produção jurisprudencial, tem importância central no trabalho

Page 97: Inovação, universidade e relação com a sociedade

96 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

desenvolvido, de modo a verificar os critérios e medidas adotadas pelo Poder

Judiciário (no Brasil e em perspectiva do Direito Comparado) na

concessão/negativa de prestações na área da saúde, o que não pode estar,

excessiva ou deficientemente, dissociado dos parâmetros constitucionais.

Palavras-chave: Estado Socioambiental, Direitos e Deveres Fundamentais,

Direito à Saúde.

Introdução

A gravidade dos problemas cotidianamente postos – envolvendo entre

outras as questões políticas, sociais, econômicas, ambientais, morais e jurídicas –

exige respostas rápidas e adequadas. Para os cultores das ciências,

especialmente aqueles dedicados às ciências sociais aplicadas, em particular as

jurídicas, impende a tarefa de construir uma perspectiva de conformação do

direito ajustado a esses novos tempos. Não basta, apenas, pensá-lo como

instrumento de pacificação dos conflitos sociais, ou como sistema ou

ordenamento de normas jurídicas que objetivam assegurar direitos e exigir o

cumprimento dos deveres ou, ainda, constituir garantias de qualquer tipo, bem

como atribuir e repartir competências e formatar o Estado; exige-se pensar o

Direito como um processo cultural de regulação e garantia das conquistas sociais

obtidas mediante os indispensáveis processos emancipatórios intercorrentes nas

sociedades, gestados no ambiente sociopolítico onde se processam as relações

inter-humanas que tem por objetivo a busca dos bens necessários para a

satisfação das necessidades. É precisamente neste percurso, da busca dos bens

indispensáveis para a satisfação das necessidades, que vamos encontrar

também a possibilidade de convergência de interesses imediatamente vinculados

às presentes e futuras gerações.

Neste cenário mostra-se de especial relevo a discussão acerca do espaço

socioambiental como ponto de partida para a construção de uma teoria tanto dos

direitos (já amplamente desenvolvida, mas igualmente carente de ajustes) quanto

dos deveres fundamentais deste modelo de Estado, isto é, um Estado

Socioambiental e Democrático de Direito que faça as necessárias conformações

entre direitos e deveres (ou, se preferirmos, entre direitos, deveres, pretensões,

Page 98: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 97

obrigações, ações e exceções, de acordo com a classificação de Pontes de

Miranda). Se a matriz socioambiental, também um produto cultural, intenta

construir um diálogo permanente entre necessidades sociais, exigências

ambientais, crescimento ou desenvolvimento econômico sustentável, parece

evidente a necessidade de lançar novas luzes ao tratamento jurídico do direito à

saúde, um direito umbilicalmente amarrado a uma ambiência construída e

constituída pelo entorno físico, social e político.

Nesta perspectiva o direito à saúde, isto é, a concretização preceptiva dos

mínimos constitucionais e legais estabelecidos se revela como um importante

fator de redução dos impactos ambientais decorrentes da insalubridade dos

meios, da deficiente proteção ambiental e humana relativamente ao déficit dos

mecanismos de saneamento, da agrupação de parcelas da população, e da

deficiente ou inadequada prestação das redes de promoção de saúde pública e,

mesmo, de educação para a saúde, elementos indispensáveis para a construção

de uma cidadania saudável e vigilante de uma ambiência em tudo favorável as

práticas da sustentabilidade socioambiental. Neste viés, indispensável pensar a

efetivação do direito, não exclusivamente pela atuação dos Poderes-funções

Legislativo e Executivo (encharcados dos resultados legitimados pelo sufrágio),

mas sim e, especialmente, pelo Judiciário, cujas decisões – se pode dizer –

completam o processo legislativo.

A partir daí, a juridificação e a sindicabilidade crescente das mais diversas

demandas, notadamente no que diz com a concretização do direito [fundamental

social] à saúde, assim como dos deveres conexos e autônomos que lhe são

correlatos, vem cobrando uma ação cada vez mais arrojada por parte dos

aplicadores do Direito, em especial do Estado-Juiz, que freqüentemente é

provocado a manifestar-se sobre questões antes menos comuns, como a

alocação de recursos públicos, o controle das ações (comissivas e omissivas) da

Administração na esfera dos direitos fundamentais sociais, e até mesmo a

garantia da proteção de direitos (e deveres) fundamentais sociais na esfera das

relações entre particulares.

Não é à toa, portanto, que também tem crescido o número dos que se

dedicam à discussão da legitimidade da intervenção judicial nesta seara, o que,

no seu conjunto e considerando o amplo acesso às redes de informação, tem

levado a uma sofisticação do debate e a uma evolução significativa tanto no que

Page 99: Inovação, universidade e relação com a sociedade

98 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

diz com a quantidade, quanto no respeitante à qualidade (ainda que não linear)

da produção doutrinária e jurisprudencial. Por outro lado, verifica-se que a maioria

das questões postas em causa na esfera pública segue em aberto, assim como

segue quase que desenfreada a busca por critérios seguros (?) que possam

garantir a construção de um processo decisório (também, mas não

exclusivamente na esfera jurisdicional) constitucionalmente adequado, mas acima

de tudo, condizente com a mais legítima expressão do “justo”.

Objetivos

O telos do trabalho desenvolvido está no lançar as bases para a

formulação de uma teoria do deveres fundamentais socioambientais, com a

preocupação de desenhar um Estatuto Deontológico dos Direitos e Deveres

Fundamentais Socioambientais, amparado, entre outros aspectos, na eficácia e

efetividade do direito fundamental à saúde. É conhecido que a expressão

deontologia no étimo significa ciência do dever, está em δέον –οντός, ou aquilo

que é devido, preciso ou necessário, particípio presente neutro de δέω1, logo,

vamos entender a expressão como aquilo que é necessário, conveniente.

Contudo, não é de esquecer que a criação do termo remonta a Benthan

(Deontology or the science of morality, 1834), e depois foi empregado pelos

utilitaristas para designar o estudo empírico que se necessita fazer em uma

situação determinada. Com o passar do tempo o uso do termo foi apropriado

pelas associações profissionais para construir um catálogo de deveres vinculados

à práxis profissional. A origem da necessária apropriação foi a dissimetria

ocasionada por alguns detentores do conhecimento e da técnica que lhes

outorgou um grande poder, e o usuário deste saber e técnica ficou reduzido a

uma dependência intelectual e econômica. Logo os códigos intentaram superar

essa dissimetria com regras formais cuja transgressão é passível de sanção.

O intento de formular uma teoria dos deveres fundamentais,

socioambientais por certo levando em conta que o binômio direito-dever ou o

direito e o dever isoladamente considerados sempre vai ocorrer em uma

ambiência identificada, está intimamente vinculado ao desenho de uma

1 Que é obrigar, mas, antes, ter falta ou estar necessitado de algo, também desejar, pretender

Page 100: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 99

Deontologia Socioambiental, e por conseqüência, não pode afastar-se do

indispensável estudo da Moral, esta contudo, na perspectiva de uma Moral

Pública. Neste sentido a deontologia possui um viés moral. Os deveres morais

freqüentemente denominam-se deontológicos. Há uma deontologia moral sem

dúvida, assim como há uma deontologia jurídica em sentido estrito, parcialmente

construída. O que interessa ao projeto é a deontologia jurídica, onde estão

contidos deveres jurídicos correlativos aos direitos ou àqueles a que não

corresponde qualquer direito. Atente-se que mesmo nos códigos de ética

profissional, a parte dispositiva sobre os deveres é jurídica, pois os atos de

coerção previstos não são unicamente aprovados pela consciência, mas são atos

coercitivos socialmente organizados que têm efeitos no próprio grupo profissional,

levando inclusive a interdição da profissão e com efeitos na ordem jurídica

estabelecida. Com maior razão, a construção de uma deontologia socioambiental,

inspirada na moralidade pública, mas com forte densidade jurídica é uma

exigência para a maior eficácia dos direitos fundamentais socioambientais que

todos, Estado e cidadãos, devem privilegiar. Portanto, a deontologia que o projeto

intenta desenhar é uma deontologia socioambiental que constrói e identifica os

deveres fundamentais socioambientais distintos das obrigações socioambientais.

Daí o fato da pesquisa enfocar a necessária distinção entre deveres, obrigações,

ônus e encargos socioambientais, privilegiando sempre a fundamentalidade dos

deveres e das responsabilidades inerentes ao próprio conceito dos Direitos e

Deveres Fundamentais. Neste sentido, foi feliz a Declaração de Responsabilidade

e Deveres Humanos de Valença de 1999, pois os deveres estão na base da

efetiva validez dos direitos humanos e fundamentais.

Ademais, um dos ambientes mais frágeis que reclamam a juridiciadade da

saúde e a conseqüente prestação dos serviços necessários a seu efetivo

exercício é nodal na perspectiva da socioambientalidade, neste sentido a

pesquisa intenta desenvolver, especificamente no que se refere ao direito

fundamental à saúde, elementos nucleares para sua eficácia e efetivação como,

por exemplo, a categoria jurídica da (reserva) (da) reserva do possível, do mínimo

Page 101: Inovação, universidade e relação com a sociedade

100 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

existencial e da isonomia, dialogando, num estudo transdiciplinar2, com o acervo

principiológico da ética e da Justiça distributiva na análise das demandas judiciais

referentes ao direito à saúde. Nesta perspectiva, mediante recurso também ao

direito comparado e um mapeamento das demandas judiciais no Brasil e em

outros países, será efetuada uma análise também dos principais aspectos que

têm sido discutidos na esfera judicial, seja no que diz com os critérios para o

atendimento e negação dos pleitos levados ao Judiciário, seja no que diz com a

definição do objeto e dos sujeitos do direito à saúde, além, entre outros pontos, a

definição dos deveres correspondentes e seu controle.

Descrição do Processo de Inovação Desenvolvido e Resultados Obtidos

O trabalho desenvolvido sobre direitos fundamentais socioambientais,

especialmente na área da concretização do direito fundamental à saúde, conta,

de forma inovadora e seminal, com a participação efetiva e integrada de alunos

de graduação, mestrado e doutorado em diversos projetos de pesquisa,

financiados pelas principais agências de fomento do Brasil e do exterior,

interligados pelo Núcleo de Estudos Avançados em Direitos Fundamentais

(NEADF/CNPq), resultando em diversas publicações e na realização de inúmeros

seminários e congressos internacionais sobre a temática.

No que se refere à área da transdisciplinariedade, a Faculdade de Direito,

juntamente com a Faculdade de Filosofia, vem desenvolvendo um projeto de

pesquisa que, em síntese, objetiva analisar as decisões judiciais envolvendo as

demandas por prestações materiais para a efetivação do direito à saúde sob a

perspectiva da Filosofia, notadamente na Ética, no intuito de estabelecer

parâmetros mais claros, ou esclarecedores, que auxiliem a tomada de decisões

por parte do Judiciário, de modo a aperfeiçoar, além do debate teórico, a própria

prática jurisdicional. Além deste projeto, realizaram-se parcerias entre as

Faculdades de Direito e Medicina, cujo objetivo principal centrou-se na análise do

2 Aqui o significado de transdiciplinar, se revela como o desvelamento da consciência que persegue o conhecimento com o objetivo de integração e inserção do outro, especialmente do sujeito plural conformado na sociedade, na interioridade da natureza e na ambiência das práticas sociais, seja na ciência, seja no convívio, todas moderadas pelo respeito, pelo esforço cooperativo e, notadamente pela solidariedade. Aliás, o próprio prefixo trans- dá a nota de além de, através de, e mais precisamente, transferência, transformação, trânsito.

Page 102: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 101

transtorno da identidade e de gênero, a partir da perspectiva jurídico-

constitucional, inserindo-se também neste projeto amplo relativo ao Direito à

saúde. Neste sentido, incluem-se diversos outros projetos que perpassam um

amplo espectro da ciência jurídica, desde a perspectiva da Teoria do Direito até

aspectos estritos da dogmática dos Direitos Fundamentais, como, por exemplo, a

análise crítica da jurisprudência referente ao direito à saúde, e a utilização, se

possível, de aportes filosóficos, especificamente a ética, da teoria da cultura, da

sociologia, da política, Justiça Distributiva e a isonomia, nas decisões judiciais.

Estes e outros estudos, pela relevância da matéria e pela importância dos artigos

e demais trabalhos publicados, resultaram na participação do coordenador do

NEADF na Audiência Pública promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o

qual pode contribuir diretamente com a mais alta corte de Justiça do país para

uma análise constitucionalmente adequada em matéria de Direito à saúde.

Em termos de metas mais específicas, além da integração de diversos

projetos, discentes e docentes, está prevista a realização, em parceria com o

Departamento de Antropologia da Universidade de Princeton (o coordenador do

NEADF participou de evento sobre o direito à saúde na Universidade de

Princeton, em abril de 2009) e o Centro de Estudos do Poder Judiciário da

AJURIS, de um seminário sobre o direito à saúde (agosto de 2009) e, em

setembro de 2009, do VIII Seminário Internacional de Direitos Fundamentais, com

ênfase nos direitos e deveres socioambientais, designadamente, na esfera da

saúde, reunindo painelistas do Brasil e do exterior (EUA, México, Alemanha,

Portugal). Além disso, já iniciaram os trabalhos no sentido da criação e

estruturação, junto ao NEADF, de um observatório em matéria de judicialização

dos direitos e deveres socioambientais, igualmente, na primeira fase, com

destaque para o direito à saúde.

Considerações Finais

A questão socioambiental é o atual foco das preocupações políticas e

sociais e, felizmente, de pesquisas tanto na área das ciências biológicas como na

área das ciências sociais aplicadas, crescente o papel desempenhado pelo

Direito. As pesquisas propostas tratam da conexão entre a regulação ambiental e

o direito constitucional, com foco nítido no direito fundamental à saúde, lançando

Page 103: Inovação, universidade e relação com a sociedade

102 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

mão de um estudo não apenas transdisciplinar, mas também orientado na prática

social e jurídica, impondo-se não só a necessária imbricação de conceitos

metajurídicos, como no caso da formatação do Estado Socioambiental, mas

também pela importância do tema.

Em matéria de regulação ambiental, e focando a análise para os aspectos

atinentes ao direito à saúde, a correlação entre direitos e deveres fundamentais é

estreita, o que por si, já justifica a importância de uma pesquisa sobre a temática.

Contudo, acrescenta-se o fato de que a matéria “deveres fundamentais” ainda

não está suficientemente explorada pela doutrina nacional, e mesmo estrangeira,

sendo pouquíssimos os trabalhos monográficos a ela dedicados, especialmente

no tocante aos identificados como deveres fundamentais autônomos. Mais

ineditismo ainda se reveste a presente pesquisa quando o projeto de uma teoria

dos deveres fundamentais se associa à vinculação dos particulares aos direitos e

deveres fundamentais em geral. Desta forma, a investigação destina-se não

somente a abordar uma teoria dos deveres fundamentais no Estado

Socioambiental, mas vai além e explora com base nos mais renomados autores

nacionais e estrangeiros, a vinculação da cidadania, trazendo-os para o contexto

da realidade brasileira.

Destarte, o programa de Pós-Graduação em Direito da PUCRS,

priorizando por uma atuação inovadora e imersa na realidade social da

coletividade, vem atuando no campo da pesquisa científica voltada à dogmática

dos direitos e deveres fundamentais, sem descurar, no entanto, de aportes

transdisciplinares, e do diálogo permanente entre a Academia, Tribunais e demais

setores da sociedade civil.

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Page 108: Inovação, universidade e relação com a sociedade

LABORATÓRIO DE MERCADO DE CAPITAIS – A UNIVERSIDADE CAPACITANDO GRATUITAMENTE A SOCIEDADE

Andrade, Letícia Braga de; Ms.; Faculdade de Administração, Contabilidade e

Economia - PUCRS

[email protected]

Lemos, Leandro Antonio de; Dr.; Faculdade de Administração, Contabilidade e

Economia - PUCRS

[email protected]

Resumo

O Laboratório de Mercado de Capitais (LABMEC) é resultado de uma

parceria entre a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, por sua

Faculdade de Administração, Contabilidade e Economia, Departamento de

Economia e a XP Investimentos, que é uma corretora de valores. Projeto pioneiro

no Brasil, o laboratório foi inaugurado em agosto de 2006 com o objetivo de disseminar o conhecimento sobre o mercado de capitais gerando distinção na

formação de competências e habilidades dos investidores. Tendo como missão

“desenvolver a cultura financeira oferecendo oportunidades para formação de

competências e habilidades de alunos, cidadãos e empresas”; e visão “até 2010,

ser referência nacional em educação financeira por sua efetiva contribuição ao

desenvolvimento da cultura financeira das famílias e empresas”, o laboratório já

efetuou cerca de 3 milhões de horas de capacitação em pouco mais de 2 anos de

existência. Considerado exemplo nacional e servindo como benchmark para

várias universidades do País, se consolidou como espaço de aprendizagem

inovador e tem a perspectiva da ampliação de interações entre educação-

mercado-governo para o desenvolvimento do mercado de capitais no Brasil.

Palavras-chave: interação universidade-empresa, relação universidade-

sociedade, capacitação gratuita.

Page 109: Inovação, universidade e relação com a sociedade

108 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Abstract

The Stock Market Lab (LABMEC) is the result of a partnership between the

University – Pontificia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, College of

Administration, Accounting and Economics and XP Investimentos. It is a

pioneering project in Brazil; the laboratory was opened in August 2006 with the

aim of disseminating the knowledge on stock market creating distinction in the

training of investors’ skills and abilities. Since the mission “to develop the financial

culture offering opportunities for training in skills and abilities of students, citizens

and businesses”; and the vision “by 2010, will be the national reference in financial

education for their effective contribution to the development of financial culture of

families and businesses, the laboratory has already made 3 million hours of

training in just over 2 years old. It is considered national example and benchmark

by several universities in the country, as a space for leaning and innovation and

the prospect of expansion of interactions between education, market and

government to develop the stock market in Brazil.

Keywords: university-business interaction, university-society relationship, free

training.

Introdução

Atualmente, o papel das Universidades vai além do ensino, envolve

também a produção de pesquisa e constituição de novas competências de modo

a colaborar para o desenvolvimento da competitividade sistêmica. Neste sentido,

as universidades são vistas como fonte principal de inovações e mudança

tecnológica, sendo referência na busca científica e tecnológica para o aumento da

produtividade e, consequentemente, da competitividade das empresas.

O Laboratório de Mercado de Capitais (LABMEC) é resultado de uma

parceria entre a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS),

por sua Faculdade de Administração, Contabilidade e Economia (FACE),

Departamento de Economia e a XP Investimentos. Projeto pioneiro no Brasil, o

laboratório foi inaugurado em agosto de 2006 como uma rede de alianças

estratégicas entre Agência Estado, BM&FBovespa, Gerdau, Intra Corretora, Lojas

Renner, Petrobrás e Zee Design Digital.

Page 110: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 109

Tendo por fim a educação financeira, o LABMEC é aberto ao público e

serve como locus de interação entre a legitimidade do conhecimento teórico

oferecido pela universidade e a velocidade do conhecimento prático viabilizado

pela XP Investimentos.

O objetivo principal da XP Investimentos com o laboratório é se diferenciar

das demais corretoras oferecendo a seus clientes-investidores e operadores uma

capacitação cada vez mais especializada. Para tanto, identificou no laboratório

um centro de estudos que oferece jogos, simulações de investimento, cursos,

palestras, apresentações de empresas, debates e boletins diários sobre

macroeconomia.

Para a FACE, o laboratório constitui uma oportunidade de unir teoria e

prática na formação de competências e habilidades dos seus alunos. Além dessa,

o LABMEC corrobora diretamente com a formulação estratégica da PUCRS no

que diz respeito à busca por diferenciação pela atualização e inovação,

integração entre o ensino, pesquisa, extensão e o exercício de ações solidárias.

Objetivos

Este trabalho tem por objetivo principal identificar a contribuição que a

FACE oferece à sociedade por meio do Laboratório de Mercado de Capitais.

Exemplo de inovação a partir da interação universidade-empresa, o laboratório é

referência nacional no País sendo copiado por universidades como a Nacional de

Brasília e as federais de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Neste sentido, entre os objetivos específicos estão (i) realizar uma revisão

bibliográfica sobre a relação universidade-empresa; (ii) conhecer a estrutura de

gestão e administração do laboratório; e (iii) identificar as formas de contribuição

da Universidade à sociedade através do LABMEC.

Descrição do processo de inovação

Atualmente, o papel das Universidades vai além do ensino, envolve

também a produção e divulgação de resultados de pesquisa básica e aplicada de

modo a colaborar para o desenvolvimento da competitividade sistêmica. Neste

sentido, as universidades são vistas como fonte principal de inovações e

mudança tecnológica, sendo referência na busca científica e tecnológica para o

Page 111: Inovação, universidade e relação com a sociedade

110 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

aumento da produtividade e, consequentemente, da competitividade das

empresas.

Um argumento que tem tido destaque é o “argumento da Hélice Tripla”

(HT). Assumindo a hipótese de que estaria ocorrendo um crescente virtuosismo

na relação Universidade-Empresa (U-E), o HT apresenta-se como resultado da

combinação de duas correntes de pensamento relacionadas ao tema, e da

proposição de um instrumento específico de promoção dessa relação (DAGNINO,

2003).

A primeira corrente trata especificamente da relação U-E. A abordagem

identificou a existência de um crescente número de contratos entre empresas e

universidades com vistas ao desenvolvimento de atividades conjuntas. Tais

atividades resultariam em transformações e ampliações quantitativas e

qualitativas, de modo que a universidade teria a função de participar ativamente

do processo de desenvolvimento econômico.

A segunda corrente atribui importância fundamental ao processo inovativo

que ocorre na empresa e às relações que ela estabelece com seu entorno. Isto

porque a competitividade da empresa passa a ser entendido como resultado de

sua capacidade de gerar internamente um processo de aprendizado contínuo

mediante a combinação dos insumos do ambiente externo com aquilo que só ela

pode realizar - o contato direto entre produção e mercado (DOSI & SOETE,

1988). Assim sendo, embora não considere a universidade como

desencadeadora de inovação, percebe-a como um agente privilegiado desse

entorno à medida que forma o egresso demandado pela empresa.

De modo geral, a universidade é entendida como um elemento privilegiado

do ambiente inovativo, ou melhor, como significativo fator de competitividade

sistêmica atuando direta e/ou indiretamente no processo de geração de inovação.

Segundo Webster & Etzkowitz (1991, apud DAGNINO, 2003), algumas das

razões que explicariam o interesse das empresas na ampliação das relações U-E

são:

• custo crescente da pesquisa voltada ao desenvolvimento de produtos e

serviços que assegurem posições vantajosas num mercado cada vez

mais competitivo;

• necessidade de compartilhar custos e riscos de pesquisas;

Page 112: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 111

• elevado ritmo de introdução de inovações bem como redução do

intervalo de tempo necessário para a obtenção dos primeiros resultados;

• decréscimo dos recursos governamentais para pesquisa.

Do lado da universidade, as principais motivações seriam:

• dificuldade crescente para obtenção de recursos públicos para a

pesquisa universitária;

• interesse da comunidade acadêmica em legitimar seu trabalho junto à

sociedade;

• a universidade estaria vivendo um período caracterizado por forte

sinergismo entre instituições acadêmicas e empresas (“Segunda

Revolução Acadêmica”).

Nos anos 1980, as interpretações latino-americanas sobre a relação U-E

assumiram duas abordagens distintas. De um lado, estavam aqueles que

enfatizavam os obstáculos de caráter estrutural e histórico resultantes da inserção

subordinada dos países latino-americanos na divisão internacional do trabalho

bem como decorrentes dos modelos de desenvolvimento (primeiro agrário-

exportador e depois de substituição de importações) adotados na região. Para

estes, as diferenças de cultura institucional dos dois atores, quais sejam, o

“imediatismo” do lado da empresa e o “diletantismo” do lado da universidade,

determinariam, em última instância, a impossibilidade da interação.

Do outro lado, estavam aqueles que, por preferências políticas,

experiências profissionais ou enfoques interdisciplinares, acreditavam que a

ampliação da relação U-E era mais uma questão de adequar sua forma de

gestão. Para estes, o problema se concentrava numa perspectiva micro,

conjuntural, incremental e pontual (enfoque disciplinar de Administração de

Empresas), de modo que as recomendações visavam à otimização do plano da

gestão da relação U-E (DAGNINO, 2003).

Contudo, a literatura aponta que a inovação é facilitada quando resultante

de um processo de construção social que abrange diferentes atores, como

universidades, empresas, governos, associações e centros de pesquisa.

Entretanto, dão que o espaço econômico não é homogêneo, as especificidades

locais precisam ser respeitadas. Neste sentido, abre-se espaço para busca de um

Page 113: Inovação, universidade e relação com a sociedade

112 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

entendimento mais adequado a respeito de como os conhecimentos são gerados,

internalizados, usados e difundidos.

A “economia do aprendizado”, definida como sistema no qual a

“capacidade de aprender é crucial para o sucesso econômico de indivíduos,

firmas, regiões e economias nacionais” (LASTRES; CASSIOLATO E ARROIO,

2005, p.86), é concebida por duas situações diferentes: a oportunidade de

aprender e a oportunidade de aplicar criativamente o que foi aprendido. Assim, os

autores destacam que políticas educacionais não são suficientes se a mão-de-

obra não tiver onde aplicar de forma criativa os seus conhecimentos

desenvolvendo capacidades para a inovação e dando origem à mudanças

qualitativas.

Neste contexto, a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

(PUCRS), por sua Faculdade de Administração, Contabilidade e Economia

(FACE), Departamento de Economia e a empresa XP Investimentos constituíram

o Laboratório de Mercado de Capitais (LABMEC). Projeto pioneiro no Brasil, o

laboratório foi inaugurado em agosto de 2006 com o apoio de empresas como

Agência Estado, BM&FBovespa, Gerdau, Intra Corretora, Lojas Renner,

Petrobrás e Zee Design Digital.

Tendo como objetivo a disseminação do conhecimento sobre o mercado

de capitais, o LABMEC é aberto ao público e serve como locus de interação entre

a legitimidade do conhecimento teórico oferecido pela Universidade e a

velocidade do conhecimento prático viabilizado pela XP Investimentos.

O LABMEC tem como missão “desenvolver a cultura financeira oferecendo

oportunidades para formação de competências e habilidades de alunos, cidadãos

e empresas”; como visão “até 2010, ser referência nacional em educação

financeira por sua efetiva contribuição ao desenvolvimento da cultura financeira

das famílias e empresas.” Para tanto, os valores assumidos são Inovação,

Excelência técnica, Relacionamento pró-ativo, Interatividade, Fraternidade e

Transparência.

Na PUCRS, o laboratório está vinculado a Pró-Reitora de Extensão (PROEX)

como um projeto de extensão universitária, devendo atender à alunos, seus

familiares e sociedade em geral. Na XP o LABMEC está lotado no departamento

de educação (XP Educação). A estrutura de gestão do laboratório é composta

pela seguinte linha de subordinação:

Page 114: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 113

I. Departamento de Ciências Econômicas – PUCRS/FACE;

II. Comitê Executivo: constituído por um representante do Departamento

de Ciências Econômicas, outro da FACE, um da XP Investimentos e

outro da XP Educação;

III. Coordenação do LABMEC: executada por um professor do

Departamento de Ciências Econômicas;

IV. Pessoal operacional: 2 estagiários alunos da Universidade contratados

pela XP Educação.

Em termos de estrutura física, o laboratório funciona numa sala com

120m2, localizada no 7º andar do prédio 50 da PUCRS. Neste prédio está

instalada a Faculdade de Administração, Contabilidade e Economia que atende

cerca de 4.500 alunos.

Sob regime de comodato, a XP Investimentos mantém 08 computadores,

02 aparelhos de televisão com canal especializado e internet à disposição da

sociedade nos horários de funcionamento do LABMEC. A PUCRS é encarregada

de prover serviços gerais, materiais de escritório e energia elétrica.

Contudo, a atual crise financeira mundial descortinou sérios problemas

econômicos estruturais, em especial a necessidade de uma melhor educação

financeira tanto dos cidadãos como das empresas. É neste contexto que o

LABMEC ampliou sua área de atuação para além do mercado de capitais

oferecendo semanalmente eventos gratuitos que abordam a (Re)educação

financeira, entre os quais estão:

Palestras:

• Como administrar suas finanças pessoais – Ministrante: Operador XP

Investimentos

• Seu Dinheiro – Ministrante: Prof. Dr. Alfredo Meneghetti Neto (PUCRS)

• Como investir em ações seguindo os passos de Warren Buffet –

Ministrante: Operador XP Investimentos

• Como e onde investir em 2009 – Ministrante: Operador XP Investimentos

• A psicologia do investidor – Ministrante: Prof. Ms. Bernardo Fonseca

Nunes (PUCRS)

• A crise financeira e suas repercussões – Ministrante: Prof. Ms. André

Scherer (PUCRS)

Page 115: Inovação, universidade e relação com a sociedade

114 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

• Instrumentos de análise de conjuntura – Ministrante: Profa. Ms. Cecília

Hoff (PUCRS)

Momento “A FACE do aluno”: apresentação de trabalhos desenvolvidos

pelos alunos durante o curso de graduação. Temas já abordados: “Marketing

multinível” e “O modelo dos três círculos na administração da empresa familiar”.

Parcerias com outras instituições de ensino superior: ofereceu 3

palestras sobre Mercado de Capitais durante a Jornada Acadêmica da Faculdade

Dom Bosco de Porto Alegre/RS.

Parcerias com outros organismos: Instituto Brasileiro de Direito

Empresarial (IBRADEMP) - palestra ministrada pelo Sr. Walter Jansen Neto,

entitulada “Construção de governança corporativa dentro de empresas familiares”.

Ademais os eventos gratuitos, o LABMEC ainda oferece os cursos de

extensão tais como Análise de Conjuntura, Finanças pessoais: segredo de

sucesso, Personal trainer em finanças pessoais, Finanças comportamentais,

Bolsa de Valores: aprenda a investir, Análise fundamentalista para tomada de

decisão, HP12C aplicada à administração financeira, entre outros. Tais cursos

têm diferentes cargas horárias assim como diferentes custos, porém em todos, a

comunidade PUCRS (alunos, diplomados, funcionários e professores) tem 50%

de desconto, já estudantes de outras instituições de ensino e pessoas com mais

de 60 anos têm 25%. As inscrições nos eventos promovidos pelo LABMEC

ocorrem pelo seu site (www.labmec.com.br) mas contam com o apoio

organizacional de toda estrutura da Universidade.

Considerando a importância da ampla e irrestrita disseminação do

conhecimento, assume singular importância a forma de divulgação dos eventos

do laboratório. Nesta questão, conta-se com o apoio da Assessoria de

Comunicação da Universidade, dos jornais de circulação estadual Zero Hora e

Correio do Povo, sites da PUCRS, do LABMEC e XP Investimentos, além do

cadastro de e-mails da PUCRS, da emrpresa parceira e do próprio laboratório.

Resultados

O sucesso da relação PUCRS-XP Investimentos expressa-se nas 1.326

horas de capacitação oferecidas pelo LABMEC em eventos como palestras

gratuitas e cursos de extensão. Em seus 2 anos e meio de existência, a visitação

Page 116: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 115

ao laboratório pela sociedade com a finalidade de realizar pesquisas, troca de

informações e simulações somou aproximadamente 16 mil acessos. O público

total que de alguma forma foi qualificada através do LABMEC fica em torno de

27,4 mil pessoas (Quadro 01).

Quadro 01 – Relatório de atividades do LABMEC Atividades promovidas Eventos Carga horária Inscrições

2009* Cursos de extensão 6 56 106 Palestras XP Investimentos 14 14 452 Outros eventos 6 7 153 Acessos ao Laboratório - - 430 Total de 2009 26 430 1.141 2008 Cursos de extensão 34 448 793 Palestras XP Investimentos 38 56 1.785 Outros eventos 15 134 2.867 Acessos ao Laboratório - - 5.496 Total de 2008 87 430 10.941 2007 Cursos de extensão 37 360 1.015 Palestras XP Investimentos 26 27 1.945 Outros eventos 27 97 928 Acessos ao Laboratório - - 7.696 Total de 2007 90 484 11.584 2006** Cursos de extensão 8 72 142 Palestras XP Investimentos 12 12 311 Outros eventos 24 43 1.056 Acessos ao Laboratório - - 2.317 Total de 2006 44 127 3.826 Total geral 247 1.471 27.492

* Inclui os meses de Janeiro a Abril. ** Inclui os meses de Agosto a Dezembro. Fonte: elaboração da autora a partir dos relatórios de atividades do LABMEC.

Analisando especificamente os eventos gratuitos, quais sejam, palestras e

apresentações de trabalhos acadêmicos, o Quadro 02 mostra crescente aumento

no número de pessoas participantes. Comparando os anos de 2006 e 2007, ainda

que o primeiro envolva apenas os seis últimos meses, observa-se um aumento

significativo de participantes equivalente a 148%. De 2007 para 2008, cujos

números estão totalizados no ano, observa-se um acréscimo de 51%. Para o ano

de 2009, as informações envolvem apenas os quatro primeiros meses, de modo

que o número perde um pouco de sua significância para comparações. No geral,

teve-se participação média por evento de 59 pessoas.

Page 117: Inovação, universidade e relação com a sociedade

116 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Quadro 02 – Oferta, carga horária e participantes nos eventos gratuitos

Ano Quantidade de eventos

Carga horária (h) Participantes

2009* 20 21 605 2008 51 154 4.347 2007 53 124 2.873

2006** 29 37 1.157 Total 153 336 8.982

Somatório de carga horária por participante 3.017.952 Média de presenças por evento 59

* Inclui os meses de Janeiro a Abril. ** Inclui os meses de Agosto a Dezembro. Fonte: elaboração da autora a partir dos relatórios de atividades do LABMEC.

Merece destaque especial o número de carga horária oferecida por

participante. A partir da interação U-E, foram promovidas mais de 3 milhões de

horas de capacitação gratuita e disponíveis à sociedade.

Considerações finais

Os tempos atuais conduzem à busca contínua por maior competitividade

sistêmica. Neste sentido, destoa a importância das Universidades não apenas

como formadora de mão-de-obra qualificada, mas, também, por sua capacidade

de produção científica e tecnológica. Assim, as universidades passaram a ser

vistas como fonte principal de inovações.

Neste contexto, o argumento da “Hélice Tripla” tem ganhado espaço nas

discussões sobre a relação Universidade-Empresa. De acordo com esta

abordagem, percebe-se um crescente número de contratos entre empresas e

universidades com vistas ao desenvolvimento econômico. De outra forma, a

competitividade da empresa passa a ser entendida como resultado de sua

capacidade de aprendizado. Assim sendo, a universidade passa a ser percebida

como um agente privilegiado desse entorno à medida que age em duas frentes:

formando o egresso demandado pela empresa e interagindo com essas no

processo de geração de inovação.

Dado este cenário, a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

(PUCRS), por sua Faculdade de Administração, Contabilidade e Economia firmou

uma parceria com a empresa XP Investimentos constituindo o Laboratório de

Mercado de Capitais (LABMEC). Tendo como objetivo inicial a disseminação do

Page 118: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 117

conhecimento sobre o mercado de capitais, o LABMEC é aberto ao público

servindo como locus de interação entre a legitimidade do conhecimento teórico

oferecido pela Universidade e a velocidade do conhecimento prático viabilizado

pela XP Investimentos.

Com pouco mais de dois anos de existência, o LABMEC já promoveu

cerca de 3 milhões de horas de capacitação gratuita disponíveis à toda

sociedade. Servindo como local de interação para pessoas interessadas no tema,

registrou aproximadamente 16 mil visitas. Em 2009, adaptando-se às exigências

do mercado diante da crise econômica mundial, PUCRS e XP Investimentos

identificaram a necessidade de ampliar a atuação do laboratório focando suas

ações no tema (Re)educação financeira. Com isto, o LABMEC promoveu, entre

palestras gratuitas e cursos de extensão, 1.326 horas de capacitação, atendendo

um total de cerca de 27,4 mil pessoas.

O desafio que se coloca é ampliar a abrangência do laboratório

qualificando mais pessoas e trazendo mais empresas parceiras e instituições

públicas de regulação do mercado de capitais como a Comissão De Valores

Mobiliários (CVM), sem, contudo, deixar esmorecer o sucesso da relação da

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e a empresa XP

Investimentos.

Referências bibliográficas

DAGNINO, Renato. A relação universidade-empresa no Brasil e o argumento da “hélice tripla”. Revista Brasileira de Inovação, Rio de Janeiro: FINEP, v.2, n. 2, p. 267-307, 2003. DOSI, G.; SOETE, L. “The nature of the innovative process”, in Dosi, G.; Soete, L. (orgs.), Technical Change and Economic Theory. Londres: Pinter Publishers, 1988. LASTRES, Helena M. M., CASSIOLATO, José E. e ARROIO, Ana (orgs.). Conhecimento, Sistemas de Inovação e Desenvolvimento. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/Contraponto. Coleção Economia e Sociedade, 2005. PUCRS. Plano Estratégico da PUCRS, 2001-2010. Porto Alegre : EPECÊ, 2000. ______. Relatório de Desempenho do Laboratório de Mercado de Capitais, 2006-2009 (mimeo).

Page 119: Inovação, universidade e relação com a sociedade

BOAS PRÁTICAS NAS CIÊNCIAS BIOMÉDICAS

Page 120: Inovação, universidade e relação com a sociedade

INTEGRANDO ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO PARA RESOLVER UM PROBLEMA DE CONSERVAÇÃO AMBIENTAL E SAÚDE PÚBLICA

INTEGRATING TEACHING, RESEARCH AND PUBLIC OUTREACH TO SOLVE

A PROBLEM IN ENVIRONMENTAL CONSERVATION AND PUBLIC HEALTH

Bicca-Marques, Júlio César; PhD; Faculdade de Biociências - PUCRS

[email protected]

Resumo

O surto de febre amarela silvestre que provocou a morte de sete pessoas e

de centenas de bugios no Rio Grande do Sul desde outubro de 2008 espalhou

pânico na população. O medo do avanço da doença e a desinformação acerca do

papel dos bugios na vigilância da circulação do vírus amarílico levaram

moradores de muitas regiões a exterminar os macacos das matas próximas as

suas residências. Devido à gravidade da situação e sua influência na

conservação do bugio-preto e do bugio-ruivo, espécies ameaçadas de extinção

no Estado, foi lançada a campanha “Proteja seu Anjo da Guarda”. A campanha

tem como objetivo principal esclarecer a população e a mídia acerca do

importante papel dos bugios no combate à febre amarela, salientando que eles

não são os responsáveis pelo ressurgimento dessa enfermidade de origem

africana, sua transmissão ou seu rápido avanço no Estado. A campanha conta

com a participação e o apoio de instituições educacionais, científicas,

governamentais das áreas de saúde e meio ambiente, religiosas e ONGs. Essa

aliança em prol da conservação da biodiversidade e da saúde pública tem sido

eficiente na alteração da qualidade das matérias veiculadas pela mídia, mas

ainda requer um grande esforço para atingir a sensibilização desejada da

população.

Palavras-chave: Conscientização ambiental, febre amarela, bugio.

Page 121: Inovação, universidade e relação com a sociedade

120 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Abstract

The yellow fever outbreak that caused the death of seven people and

hundreds of howler monkeys since October 2008 in the State of Rio Grande do

Sul spread panic among the population. The fear of the disease and the lack of

information about the role played by howler monkeys in the surveillance of virus

circulation led inhabitants of several regions to exterminate the monkeys from the

forests near their homes. Because of the severity of this situation and its effect on

the conservation of black-and-gold and brown howler monkeys, species

threatened with extinction in the State of Rio Grande do Sul, a campaign named

“Protect our Guardian Angels” was launched to inform the public and the media

about the important role howler monkeys play in fighting yellow fever, stressing

that the monkeys are not responsible for the re-emergence of this African disease,

its transmission or its fast spread within the State. The campaign is run and

supported by educational, scientific, governmental (health- and environment-

related) and religious institutions and NGOs. This alliance of a wide range of

institutions in favor of biodiversity conservation and public health has been

effective in changing the quality of the news transmitted by the media, but still

requires a great effort to achieve the necessary level of population awareness.

Keywords: Environmental awareness, yellow fever, howler monkey.

Introdução

As últimas décadas testemunharam um crescimento explosivo da

população humana mundial. Segundo as NAÇÕES UNIDAS (2009), éramos 2

bilhões de habitantes em 1927, pouco mais de 2,5 bilhões em 1950 e quase 5,3

bilhões em 1990. Em 2005, já havíamos ultrapassado a marca dos 6,5 bilhões de

habitantes. Esse crescimento ampliou a demanda por recursos naturais e espaço

para fornecer alimento, vestuário e habitação para a humanidade, a qual aliada a

um modelo de desenvolvimento predominantemente capitalista, consumista e

poluidor têm promovido um nível de impacto sobre os ambientes naturais sem

precedentes na história.

Especialistas acreditam que a Terra já é incapaz de suprir de maneira

sustentável as necessidades da humanidade e a degradação ambiental e as

Page 122: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 121

alterações climáticas são consequências diretas da pressão exercida sobre a

biosfera por essa população crescente (DANILOV-DANIL’YAN et al., 2009;

WACKERNAGEL e REES, 1996). Além de promover a pobreza, a desigualdade

social e a erosão de valores morais e éticos tradicionais, essas alterações

ambientais e o modelo prevalente de relação do homem com a natureza ao redor

do mundo têm facilitado o ressurgimento e a emergência de doenças infecciosas

que afligem a humanidade (LAFFERTY, 2009; MCMICHAEL e POWLES, 1999;

TOL et al., 2007).

O Estado do Rio Grande do Sul é um bom exemplo dessa nova realidade.

Na última década, os profissionais do Centro Estadual de Vigilância em Saúde

(CEVS) da Secretaria Estadual de Saúde (SES) têm investido esforços no

combate e prevenção a doenças infecciosas tradicionalmente tropicais, tais como

a dengue, a febre amarela e a leishmaniose (BERCINI et al., 2008; CARDOSO et

al., 2008; SANTOS et al., 2005, 2007). Em 2001, o Estado foi surpreendido por

uma epizootia de febre amarela silvestre que levou à morte uma grande

quantidade de bugios-pretos (Alouatta caraya) em alguns municípios da região

noroeste. Os moradores dos municípios afetados foram vacinados e, desde

então, a Divisão de Vigilância Ambiental do CEVS realiza o monitoramento da

população humana, a coleta de mosquitos silvestres vetores da doença

(Haemagogus leucocelaenus) e a captura de bugios-pretos e bugios-ruivos

(Alouatta guariba clamitans) para coleta de sangue em muitas regiões do Estado

visando a detecção da circulação do vírus (SANTOS et al., 2006; TORRES et al.,

2003, 2004).

Apesar desses esforços, uma nova epizootia de febre amarela silvestre foi

detectada na mesma região do Rio Grande do Sul no final de 2008. Essa

epizootia se alastrou rapidamente pelo Estado com consequências mais

devastadoras para as populações de bugios-pretos e bugios-ruivos e provocando

a morte de algumas pessoas. Além da mortalidade provocada pela doença, os

bugios estão sendo vítimas da desinformação. Como eles são extremamente

sensíveis à doença e podem vir a óbito num período de 3 a 7 dias após serem

picados por um mosquito infectado (BRASIL, 2005), a crença de que seriam os

responsáveis pela ocorrência e disseminação da febre amarela no Estado se

espalhou propagada, especialmente, por notícias divulgadas pela mídia.

Page 123: Inovação, universidade e relação com a sociedade

122 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Concomitante à divulgação da ampliação da área de risco de febre

amarela no Estado em decorrência da observação de bugios mortos, a mídia

começou a divulgar denúncias de que a população de algumas regiões estava

perseguindo os animais por medo do avanço da doença. Essa situação exigiu a

discussão de estratégias de sensibilização da população por parte de instituições

preocupadas com a proteção dos bugios, a qual foi coordenada pela bióloga

M.Sc. Soraya Ribeiro da Equipe de Fauna Silvestre da Secretaria Municipal do

Meio Ambiente de Porto Alegre (SMAM). Essa situação foi relatada na seção

“Conservation News” do periódico científico internacional “Oryx – The

International Journal of Conservation” (BICCA-MARQUES, 2009). A primeira ação

foi a elaboração de cartazes pelas equipes da SMAM, cuja primeira tiragem foi

financiada pela Sociedade Brasileira de Primatologia, e da Secretaria do Meio

Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul (SEMA) (Figura 1).

Continuava-se discutindo ações que pudessem reduzir o impacto da

doença sobre os bugios quando no dia 2 de abril de 2009 recebi uma mensagem

eletrônica da Dra. Thaïs Leiroz Codenotti da Associação para a Conservação da

Vida Silvestre, ONG de Passo Fundo, que realiza levantamentos populacionais de

primatas em várias regiões do Estado. A mensagem eletrônica relatava

informações confiáveis de que as pessoas estavam matando os bugios,

especialmente por envenenamento, e que os animais já haviam desaparecido de

muitas áreas monitoradas. Essa situação não podia ser negligenciada e requeria

uma estratégia mais contundente e abrangente. Decidi na noite do mesmo dia

lançar individualmente uma campanha na internet, pois senti a necessidade de

agir imediatamente. Como os bugios são considerados importantes sentinelas da

circulação do vírus amarílico pelo próprio Ministério da Saúde (JERUSALINSKY

et al., 2008), resolvi denominá-la campanha “Proteja seu Anjo da Guarda”.

Page 124: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 123

Figura 1 - Cartazes produzidos pela SMAM (esquerda) e SEMA (direita).

Objetivos

A campanha “Proteja seu Anjo da Guarda” visa estancar o processo de

perseguição aos macacos por meio da difusão de informações científicas

acessíveis para a população e os meios de comunicação esclarecendo o

importante papel desempenhado pelos bugios no combate à febre amarela e

salientando que eles não são os responsáveis pela existência da doença, pela

atual epizootia e pelo seu rápido avanço no Estado. Além disso, a campanha visa

reforçar a importância da vacinação e do combate aos focos do vetor da febre

amarela no ambiente urbano, o mosquito Aedes aegypti, como medidas

preventivas da contração da doença e de sua urbanização.

Descrição do processo de inovação desenvolvido

Por sugestão da Assessoria de Comunicação (ASCOM) da PUCRS redigi,

na manhã do dia 3 de abril, um texto para ser enviado aos jornais de Porto

Alegre. Esse texto também foi imediatamente repassado para os alunos das

disciplinas de Ecologia Geral II e Ecologia Aplicada do curso de Ciências

Biológicas com o pedido de que fosse amplamente divulgado. Assinei o texto com

meu nome completo, filiação profissional, endereço, telefones e link para meu

currículo a fim de expressar sua legitimidade. Na noite do mesmo dia, o texto foi

Page 125: Inovação, universidade e relação com a sociedade

124 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

publicado na íntegra no site da OSCIP Defender – Defesa Civil do Patrimônio

Histórico de Cachoeira do Sul por indicação do aluno de Ecologia Geral II Paulo

Cesar Patta.

Com um mês de campanha, o texto já havia sido veiculado em mais de 80

sites na internet, no blog da campanha

(http://ameacafebreamarela.wordpress.com/) desenvolvido e gerenciado pelo

mestrando David Santos de Freitas e na seção Superdicas do informativo PUCRS

Notícias no 293 (15 a 21 de abril). Sua mensagem também foi divulgada em

vários jornais (Gazeta de Rosário: 7 de abril; Correio do Povo: 8 de abril; Jornal

do Povo [Cachoeira do Sul]: 14 de abril; A Razão [Santa Maria]: 22 de abril; O

Estado de São Paulo: 29 de abril; Diário Gaúcho: 4 de maio; Zero Hora: 5 de

maio), em reportagem da TV Record que foi ao ar no dia 11 de abril e em

entrevistas a mais de 10 rádios com diferentes audiências. No dia 26 de abril, por

exemplo, participei do Programa Galpão do Nativismo com Dorotéo Fagundes na

Rádio Gaúcha por sugestão da aluna de Ecologia Aplicada Márcia Radaieski

Cunda. O programa teve a participação do famoso tradicionalista gaúcho J. C.

Paixão Côrtes que contou histórias sobre a origem do ritmo musical bugio,

inspirado no ronco e nos hábitos desses animais. Também participei dos

programas Pop Night Show da Rádio SP3, Sintonia da Terra do Núcleo de

Ecojornalistas do RS na Rádio da UFRGS e Conexão Regional da Rádio Santa

Cruz. Uma única entrevista concedida à Agência Radioweb teve 130

aproveitamentos por 122 rádios (69 comerciais, 51 comunitárias e 3 educativas)

de 101 cidades, especialmente gaúchas, com uma cobertura potencial de mais de

6,5 milhões de habitantes apenas nos dias 14 e 15 de abril. O texto da campanha

também foi utilizado para realizar um pedágio de conscientização organizado pela

Escola Técnica Estadual Dr. Rubens da Rosa Guedes de Caçapava do Sul.

Em reunião realizada no dia 23 de abril na sede do CEVS por solicitação

do biólogo M.Sc. Leandro Jerusalinsky, chefe do Centro de Proteção de Primatas

Brasileiros do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, e com a

presença de biólogos, veterinários e jornalistas da maioria das instituições locais

e estaduais envolvidas na questão ficou acertado que a campanha “Proteja seu

Anjo da Guarda” seria “adotada” pelas demais instituições (Figura 2). O convite à

Regional Sul 3 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil foi uma sugestão do

Prof. Dr. Pe. Érico José Hammes da Faculdade de Teologia da PUCRS, após o

Page 126: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 125

aluno Régis Rafael Hryçai da disciplina Ecologia Geral II ter salientado a

importância da Igreja Católica como instituição formadora de opinião,

especialmente no interior do Estado. A CNBB enviou o texto a todas as dioceses

do Estado, ampliando significativamente a área de abrangência da campanha.

Sociedade Brasileira de

Figura 2 - Instituições participantes da campanha “Proteja seu Anjo da Guarda”.

P i l i

Além das instituições participantes, as informações divulgadas pela

campanha foram legitimadas pelo apoio dos seguintes órgãos governamentais,

sociedades científicas, universidades e ONGs entre outros: Ministério da Saúde

(Secretaria de Vigilância em Saúde e Centro Nacional de Primatas), Sociedade

Brasileira de Parasitologia, Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, Asociación

Mexicana de Primatología, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

(Faculdade de Biociências, Museu de Ciências e Tecnologia e Instituto do Meio

Ambiente), One Earth Institute/EUA, Centro de Investigaciones del Bosque

Atlântico do Instituto de Biología Subtropical/Argentina, Departamento de

Vigilância Ambiental de Cachoeira do Sul, Instituto Orbis de Proteção e

Conservação da Natureza de Caxias do Sul e Rádio Santa Cruz de Santa Cruz do

Sul.

Page 127: Inovação, universidade e relação com a sociedade

126 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Com a adesão dessas instituições à campanha, o texto foi atualizado. A

linguagem utilizada e a ausência de referências bibliográficas visam torná-lo mais

acessível para o público leigo. O novo texto é transcrito a seguir:

“Campanha “Proteja seu Anjo da Guarda”!

A febre amarela é uma doença infecciosa de origem africana causada por

um vírus que é transmitido por mosquitos. Existem dois tipos: a febre amarela

urbana, erradicada do Brasil em 1942, e a febre amarela silvestre. Os vetores

(agentes responsáveis pela transmissão) da forma silvestre são mosquitos dos

gêneros Haemagogus e Sabethes, enquanto a forma urbana pode ser transmitida

pelo Aedes aegypti, o mesmo vetor da dengue.

A febre amarela silvestre já provocou a morte de algumas pessoas e de

muitos bugios em uma extensa área do Rio Grande do Sul desde o final de 2008.

No entanto, ao contrário da maioria das pessoas, os bugios são extremamente

sensíveis à doença, morrendo em poucos dias após contraí-la. Esses macacos já

estão ameaçados de extinção no Estado devido à destruição de seu habitat

natural (as florestas), à caça e ao comércio ilegal de mascotes.

Infelizmente, os bugios também estão sendo vítimas da doença e da falta

de informação da população. Inúmeros relatos indicam que habitantes das

regiões de ocorrência do bugio-preto e do bugio-ruivo estão matando os animais,

principalmente por envenenamento, por medo do avanço da doença.

Além de ilegal e de tornar mais crítico o estado de conservação desses

animais, essa atitude é extremamente prejudicial para o próprio homem. A morte

de bugios por febre amarela alerta os órgãos de saúde locais sobre a circulação

do vírus na região, os quais promovem campanhas de vacinação da população

humana, como se tem observado em mais de 200 municípios do Estado. O

Ministério da Saúde considera esses macacos importantes “sentinelas” da

circulação do vírus. Portanto, os bugios são nossos “ANJOS DA GUARDA”! Se

eles forem mortos pelo homem, descobriremos que a febre amarela chegou a

determinada região apenas quando as pessoas contraírem a doença. E talvez já

seja tarde para algumas (ou muitas) ...

Os bugios NÃO transmitem a febre amarela para o homem e NÃO são os

responsáveis pelo rápido avanço da doença no Estado. Eles são as principais

Page 128: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 127

vítimas. As mudanças climáticas e a degradação ambiental provocadas pelo

homem são as principais responsáveis pelo recente aparecimento de inúmeras

doenças infecciosas no Estado. Especialistas acreditam que o avanço da doença

tem sido facilitado pelo deslocamento de pessoas infectadas ou pela dispersão

dos mosquitos ou por outro hospedeiro ainda desconhecido.

Perguntamos: “Você mataria o seu anjo da guarda?””

O texto da campanha também foi enviado por correio eletrônico para

alguns artistas gaúchos e para todos os vereadores de Porto Alegre. Apenas o

vereador Paulinho Rubem Berta respondeu a mensagem com um convite para

participarmos do evento de comemoração do 22º aniversário do Bairro Rubem

Berta. Por iniciativa dos estudantes do Laboratório de Primatologia, em especial

os mestrandos Elenara Véras dos Santos e David Santos de Freitas, foi

elaborada uma peça teatral intitulada “O ronco, o zumbido e a febre amarela” que

foi apresentada no dia 25 de abril (Figura 3). A peça contém três músicas em

diferentes ritmos, incluindo o funk “Bugio 40oC” de autoria de MC Vacinou (Felipe

Ennes Silva, mestrando do Laboratório de Primatologia) e MC Imunizou (Rodrigo

Ennes da Cunha). Pelo menos outras três apresentações em locais públicos de

Porto Alegre já estão programadas para os meses de maio e junho de 2009.

A campanha também envolve a divulgação das informações através de

palestras para diversos públicos. A palestra “A febre amarela silvestre no Rio

Grande do Sul: doença e desinformação ameaçam os bugios” foi apresentada na

Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre a convite do Programa

CRIAR (Conscientizar, Reeducar, Inovar, Agir e Racionalizar) e na Universidade

Luterana do Brasil/Guaíba a convite da Diretoria de Meio Ambiente e

Sustentabilidade da Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Guaíba.

Essa palestra também foi proferida para estudantes de graduação da PUCRS e

estudantes do Ensino Fundamental do Colégio Marista Champagnat participantes

do Clube de Ciências coordenado pelas Profas. M.Sc. Berenice Alvares Rosito e

Dra. Melissa Guerra Simões Pires da Faculdade de Biociências.

A iniciativa independente do médico veterinário Elisandro Oliveira dos

Santos do Zoológico Municipal de Canoas e do Pampas Safari de produzir um

vídeo educativo sobre a relação do bugio e a febre amarela também tem

contribuído com a sensibilização pública. O vídeo está disponível no site YouTube

Page 129: Inovação, universidade e relação com a sociedade

128 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

(http://www.youtube.com/watch?v=b9VI10R8jkA&feature=related) e já foi exibido

mais de 12.000 vezes (considerando as versões original e atualizada juntas).

Figura 3 - Autores e atores da peça teatral “O ronco, o zumbido e a febre amarela”. Da esquerda para a direita: Danusa Guedes (mãe), Anamélia de Souza Jesus (bugio-ruivo fêmea), Marina Ochoa Favarini (mosquito), Elenara Véras dos Santos (bugio-ruivo fêmea), Jonas da Rosa Gonçalves (bugio-ruivo macho), David Santos de Freitas (filho), Leonel de Souza Martins (pai) e Júlio César Bicca-Marques (narrador).

Resultados obtidos

Em relação à qualidade da informação divulgada pela mídia pode-se

considerar que a campanha “Proteja seu Anjo da Guarda” atingiu grande parte de

seus objetivos. A mudança de atitude é clara na maioria das reportagens

veiculadas por jornais, programas de televisão, rádios e internet sobre a febre

amarela e sua relação com os bugios. Mesmo naquelas reportagens que relatam

a morte de bugios, os animais já não são tratados como responsáveis pela

infecção dos mosquitos que depois transmitem o vírus para o homem. Uma breve

descrição da doença publicada no jornal Correio do Povo do dia 3 de maio ilustra

essa mudança: “Febre amarela – Doença infecciosa causada por um flavivírus,

transmitida por mosquitos. Ocorre só na América Central, na América do Sul e na

África. No Brasil, a doença é adquirida quando uma pessoa não vacinada entra

em áreas de transmissão silvestre. A transmissão ocorre se o mosquito picar uma

pessoa infectada e, com o vírus multiplicado, picar quem ainda não teve a doença

e que não foi vacinado.”

Page 130: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 129

Infelizmente, no entanto, continuam as denúncias de perseguição aos

bugios em várias regiões do Estado. Essa informação sugere que a parcela da

população que vive próxima a áreas florestais habitadas por bugios e que tem

pouco ou nenhum acesso à internet ainda não foi devidamente sensibilizada ou

não crê na “nova” informação difundida pelos meios de comunicação.

Considerações finais

A campanha “Proteja seu Anjo da Guarda” se destaca por aliar um

problema de saúde pública à conservação ambiental e por transmitir uma

mensagem com base científica em linguagem acessível para o grande público. A

valorização da participação de atores multiplicadores de diversas áreas de

atuação vinculados à academia, órgãos governamentais, ONGs, clínicas

veterinárias e igreja foi essencial para legitimar a informação, ampliar o alcance

da campanha e qualificar as informações veiculadas pela mídia. Por fim, o

reconhecimento da importância do engajamento dos estudantes universitários na

divulgação da campanha e na participação nas suas ações representa um

aspecto de grande relevância no sucesso alcançado na sensibilização da

população.

Referências bibliográficas

BERCINI, M., CRUZ, L. L., GOMES, C. S., RAMOS, S. M. F., LAMMERHIRT, C. B., RANIERI, T. M. S., SPERB, A. F. e NUNES, Z. M. A. Surto de dengue autóctone no Rio Grande do Sul, 2007. Boletim Epidemiológico, no 10, p. 6-7, set 2008. BICCA-MARQUES, J. C. Outbreak of yellow fever affects howler monkeys in southern Brazil. Oryx, no 43, p. 173, abr 2009. BRASIL. Manual de vigilância de epizootias em primatas não-humanos. Brasília: Ministério da Saúde, 2005. CARDOSO, J. C., SANTOS, E., ALMEIDA, M. A. B., FONSECA, D. F., MARDINI, L. B. L. F., TORRES, M. A. N., GOMES, C. S., RAMOS, S., LAMMERHIRT, C. B. e CRUZ, L. L. Vigilância entomológica no Rio Grande do Sul: ações e perspectivas. Boletim Epidemiológico, no 10, p. 4-5, set 2008. DANILOV-DANIL’YAN, V. I., LOSEV, K. S. e REYF, I. E. Sustainable Development and the Limitation of Growth: Future Prospects for World Civilization. Chichester: Springer-Praxis, 2009.

Page 131: Inovação, universidade e relação com a sociedade

130 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

JERUSALINSKY, L., MARTINS, A. B., LAROQUE, P. O., LEVACOV, D., FERREIRA, J. G. e FIALHO, M. S. Nota Técnica. Nota técnica não publicada do Centro de Proteção de Primatas Brasileiros, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, 2008. LAFFERTY, K. D. The ecology of climate change and infectious diseases. Ecology, no 90, p. 888-900, abr 2009. MCMICHAEL, A. J. e POWLES, J. W. Human numbers, environment, sustainability, and health. British Medical Journal, no 319, p. 977-980, out 1999. NAÇÕES UNIDAS - Population Division of the Department of Economic and Social Affairs of the United Nations Secretariat. World population prospects: the 2008 revision. In: http://esa.un.org/unpp acesso em: 15.03.2009. SANTOS, E., ALMEIDA, M. A. B., FONSECA, D. F., VASCONCELOS, P. F. C. e RODRIGUEZ, S. G. Registro de anticorpos para o vírus Saint Louis em primata não humano no Estado do Rio Grande do Sul. Boletim Epidemiológico, no 8, p. 6-7, set 2006. SANTOS, E., ALMEIDA, M. A. B., SOUZA, G. D., RANGEL, S., LAMMERHIRT, C. B., CRUZ, L. L., BERCHT, D. B., FONSECA, D. F. e NETO, R. A. Situação da leishmaniose tegumentar americana no Rio Grande do Sul. Boletim Epidemiológico, no 7, p. 1-3, jun 2005. SANTOS, E., CARDOSO, J. C., FONSECA, D. F., DIEDRICH, G., BERCINI, M., SCHERER, S. B. e ALMEIDA, M. A. B. Vigilância do virus do Nilo occidental no Rio Grande do Sul. Boletim Epidemiológico, no 9, p. 5-7, jun 2007. TOL, R. S. J., EBI, K. L. e YOHE, G. W. Infectious disease, development, and climate change: a scenario analysis. Environment and Development Economics, no 12, p. 687-706, out 2007. TORRES, M. A. N., ALMEIDA, M. A. B., SANTOS, E., MONTEIRO, H. A. O., CARDOSO, J. C., COSTA, I. A. e FERREIRA, F. B. Vigilância entomológica da febre amarela silvestre no Rio Grande do Sul. Boletim Epidemiológico, no 6, p. 6, mar 2004. TORRES, M. A. N., SANTOS, E., ALMEIDA, M. A. B., CRUZ, L. L. e SPERB, A. F. Vigilância da febre amarela silvestre no Rio Grande do Sul. Boletim Epidemiológico, no 5, p. 1-7, 2003. WACKERNAGEL, M. e REES, W. Our ecological footprint: reducing human impact on the Earth. Gabriola Island, BC: New Society Publishers, 1996.

Page 132: Inovação, universidade e relação com a sociedade

BANCO DE DADOS EM SAÚDE BUCAL UMA FORMA INOVADORA DA DESCOBERTA DO CONHECIMENTO NA

ODONTOLOGIA.

ORAL HEALTH DATABASE

AN INNOVATIVE WAY OF KNOWLEDGE DISCOVERY IN DATABASE IN

DENTISTRY

Mota, Eduardo Gonçalves; PhD; Faculdade de Odontologia - PUCRS

Figueiredo, José Antônio Poli de; PhD; Faculdade de Odontologia - PUCRS

Ruiz, Duncan Dubugras; PhD; Faculdade de Informática - PUCRS

Blomberg, Luciano Costa; Faculdade de Informática - PUCRS

Resumo:

O objetivo deste artigo é documentar a condução do estudo realizado em

cooperação dos programas de pós-graduação em Odontologia (PPGO) e

Ciências da Computação (PPGCC) da Pontifícia Universidade Católica do Rio

Grande do Sul. O Banco de Dados em Saúde Bucal teve como objetivo a criação

de um ambiente de armazenagem, organização e recuperação dos dados de

procedimentos clínicos. Durante o período de três meses, entrevistas semi-

estruturadas foram realizadas em cinco áreas de atendimento ondotológico da

Faculdade de Odontologia (FO-PUCRS) a fim de se determinar a estrutura e

análise dos dados. Com base nas informações obtidas neste processo, modelos

lógicos, conceituais e físicos do banco de dados foram gerados assim como um

script em SQL (Structured Query Language). A ferramenta Oracle SQL Developer

(Oracle Corporation, Redwood Shores, CA, USA) foi usada para importar e criar o

BDSB (Banco de Dados em Saúde Bucal) implementado em Oracle 10g, um

sistema de gerenciamento relacional de banco de dados. A criação do BDSB em

conjunto dos programas de pós-graduação não só representa um importante

avanço na automatização das demandas operacionais, mas também é útil para a

exploração de uma valorosa fonte de conhecimento, rica em informações clínicas

e sociais.

Page 133: Inovação, universidade e relação com a sociedade

132 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Palavras-chave: saúde bucal, modelagem de dados, banco de dados.

Abstract:

The aim of this article was to document the study conducted in the Post-

graduation programs in Dentistry (PPGO) and Computational Science (PPGCC),

at the Pontifical Catholic University of Rio Grande do Sul (PUCRS), with the view

to building environment for storage, organization and recovery of data from

clinical records. During a period of three months, semi-structured interviews were

held with five areas of dental attendance connected with the Dental School (FO-

PUCRS) for requirement collection and analysis. Based on the information

obtained in this process, conceptual, logical and physical models of the database

were developed, as well as the generation of a script in SQL (Structured Query

Language). After generating the script, the tool Oracle SQL Developer (Oracle

Corporation, Redwood Shores, CA, USA) was used to import and create the

OHDB (Oral Health Database) implemented in the Oracle 10g, a relational

database management system (RDBMS). Building the OHDB in conjunction with

PPGO-PUCRS not only represents an important advance towards automating the

organization’s operational demands, but is also particularly useful for exploiting a

valuable source of knowledge, rich in clinical and social information.

Keywords: Oral health, data modeling, database.

Introdução

A história atual da ciência tem nos mostrado uma mudança radical na

forma da produção do conhecimento. Este vem substituindo o acúmulo simples e

puro da informação extremamente especializada pelo uso mais eficaz e aplicável

dos resultados obtidos na sociedade. Baseado neste pressuposto, os autores

identificaram uma necessidade frente a crescente geração de dados clinico e dos

acumulados ao longo dos últimos 50 anos da Faculdade de Odontologia. O que

fazer com a informação? Como obter conhecimento da produção gerada ao longo

dos anos? De que forma as opções tomadas nas manobras clínicas impactaram

na qualidade dos serviços prestados? É preciso, então, tornar os dados contidos

nos formulários de papel em conhecimento na forma de identificação de métricas

Page 134: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 133

e indicadores da saúde bucal, assim como, em uma ferramenta administrativa

para tomada de decisões.

Mediante esta limitação torna-se necessário à adoção de algum recurso

que possa processar este volume de dados e transformá-los em informação. Na

literatura identificaram-se alguns trabalhos [5] [8], embora não especificamente

em saúde bucal, que propõem o uso de ferramentas OLAP (Online Analytical

Processing) para análise de data warehouses médicos. Por outro lado, identificou-

se também, outro conjunto de publlicações [1] [2] [6] [7] que aborda este o mesmo

problema, porém, pelo uso da estatística descritiva em ferramentas como Excel e

SPSS.

Este artigo tem como objetivo propor um modelo analítico para indicadores

em saúde bucal, tendo como ponto inicial, o trabalho realizado junto à Faculdade

de Odontologia da PUCRS e suas unidades de atendimento odontológico. Como

resultado deste trabalho preliminar criou-se um BDSB (Banco de Dados em

Saúde Bucal). Por razões de conveniência, decidimos embasar o modelo analítico

especificamente sobre os dados do CEU Vila Fátima, os quais julgam-se de maior

relevância e representatividade.

Caso:

No intuito de conservar esta base histórica e viabilizar o resgate de

informações relevantes à pesquisa, como indicadores em saúde bucal,

desenvolveu-se em parceria com o PPGCC-FACIN um ambiente para

armazenamento, organização e recuperação destes dados.

Para tanto, foi realizado, durante o período de aproximadamente três

meses, um processo de coleta de dados, obtidos por meio de entrevistas semi-

estruturadas junto aos professores representantes das unidades de atendimento

odontológico vinculadas à Faculdade de Odontologia da PUCRS. Compondo

estas unidades estão: o Centro de Extensão Universitária Vila Fátima (Unidade de

Saúde SUS), o Hospital São Lucas (Serviço de Estomatologia) e o CERLAP

(Centro de Reabilitação de Fissuras Lábio-palatinas).

Nas entrevistas realizadas, coletaram-se informações referentes ao

processo de armazenamento dos dados nestas unidades, gerando-se ao final

desta etapa, uma documentação composta pela ata de reunião e por um modelo

Page 135: Inovação, universidade e relação com a sociedade

134 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

conceitual (diagramas de classe) em notação UML (Unified Modeling Language).

Para esta etapa de modelagem utilizou-se a versão freeware do software Jude

Community.

Após finalizada a primeira rodada de entrevistas com os professores das

unidades de atendimento odontológico, buscou-se analisar a documentação

gerada para cada uma delas, de forma que fosse possível compilar estes dados

em um único modelo. Ao final do processo de modelagem foram identificadas 92

classes, 202 atributos e 96 associações. Por questões de melhor apresentação e

compreensão dos dados, o modelo resultante deste trabalho é apresentado na

figura 1 apenas com suas principais classes, extraindo-se desta forma algumas

especializações e classes auxiliares de menor relevância a compreensão do

modelo.

Figura 1 – Modelo operacional.

Uma vez elaborado o modelo conceitual, buscou-se validá-lo junto aos

professores da Faculdade de Odontologia envolvidos no processo de coleta de

dados. Ao final desta etapa, foram realizadas correções na nomenclatura de

algumas classes, visando-se adequá-las a uma linguagem mais comumente

utilizada na área de odontologia. Posteriormente, obteve-se uma amostra dos

prontuários com os dados a serem apreendidos, onde foram realizados alguns

ajustes nos relacionamentos e na tipagem dos atributos do modelo, que não

correspondiam com a forma de preenchimento dos prontuários.

Page 136: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 135

Realizados os ajustes finais no modelo conceitual, utilizou-se a ferramenta

freeware DBDesigner 4 para a implementação do modelo lógico de dados. Neste

modelo foram definidas as chaves primárias e estrangeiras para o Banco de

Dados em Saúde Bucal. Realizado este processo, foi gerado um script SQL

(Structured Query Language) e posteriormente importado dentro do SGBD Oracle

10g.

A partir da criação do Banco de Dados em Saúde Bucal, buscou-se inserir

a amostra de dados disponibilizada, visando testar a aderência destes dados ao

banco projetado. Realizadas pequenas adequações, planeja-se a fase de

apreensão dos dados, onde inicialmente pretende-se inserir no BDSB um volume

de aproximadamente dois mil prontuários, referentes à aproximadamente 25 anos

anos de atendimento no CEU Vila Fátima.

Esta escolha justifica-se por uma série de razões, entre elas a

possibilidade de apreensão de dados em curto período de tempo e principalmente

pela relevância dos dados ali manipulados, uma vez que o CEU Vila Fátima é

uma unidade vinculada ao SUS que por sua vez, apoia-se em uma série de

indicadores para avaliação da qualidade de seus serviços.

Durante boa parte do trabalho realizado até este momento, buscamos

ressaltar a importância da análise de dados como um precioso recurso na

obtenção de informações gerenciais. Neste sentido, vimos em seções anteriores

que importantes indicadores são gerados a partir deste processo de análise, seja

pela aplicação de ferramentas estatísticas, ou seja, pelo desenvolvimento de

modelos analíticos aplicados em data warehouses médicos.

Dadas estas considerações, podemos observar que apesar de tratar-se de

abordagens diferentes, ambas referem-se a um mesmo processo: KDD

(Knowledge Discovery in Database). Para o seguimento deste trabalho, é

importante entendermos alguns conceitos e características relacionadas a este

processo.

Segundo Fayad [2], KDD é o processo não trivial de identificação de novos

padrões válidos, potencialmente úteis e compreensíveis em conjuntos de dados.

No entanto, como etapa preliminar à obtenção de conhecimento no processo de

KDD, é necessário que o conjunto de dados a ser analisado seja armazenado em

um ambiente conciso e confiável. Neste sentido, data warehouses tem se

mostrado um recurso fundamental dentro da arquitetura de KDD.

Page 137: Inovação, universidade e relação com a sociedade

136 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Segundo Inmon [3], um data warehouse é um conjunto de dados baseado

em assuntos, integrado, não volátil, e variável em relação ao tempo, de apoio a

decisões gerenciais. Uma popular abordagem para análise de data warehouses é

chamada de online analytical processing (OLAP)[5]. Segundo Machado [4], as

ferramentas OLAP são as aplicações às quais os usuários finais têm acesso para

extrair os dados de suas bases e construir relatórios capazes de responder as

suas questões gerenciais.

Ferramentas OLAP são utilizadas no desenvolvimento de modelos

analíticos que constituem uma representação de estruturas de armazenamento

de dados, o qual sua organização facilita o processo de descoberta de

conhecimento.

Existem três tipos principais de modelo analítico:

• Modelo Estrela – o modelo estrela caracteriza-se, basicamente, por

conter uma única tabela fato e várias dimensões;

• Modelo Floco de Neve – o modelo floco de neve é uma variante do

modelo estrela, diferindo-se por admitir que as tabelas dimensões

formem hierarquias com relacionamentos entre si;

• Modelo Constelação de Fatos – o modelo constelação de fatos admite

múltiplas tabelas fato compartilhando suas tabelas dimensões entre

outras tabelas. Este tipo de modelo pode ser visto como uma coleção de

estrelas.

Trazendo-se para o contexto do estudo realizado junto á Faculdade de

Odontologia, buscou-se apresentar na figura 2, a seguinte arquitetura de data

warehouse.

Figura 2 – Arquitetura data warehouse dentro de um ambiente de KDD.

Page 138: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 137

Ao final deste processo, o módulo de exploração da ferramenta

DBDesigner 4 foi usada para gerar o script na linguagem SQL com as

especificidades do Banco de Dados em Saúde Bucal como mostrado na figura 3.

Figura 3 – Script em SQL gerado no software DBDesigner 4.

Considerações finais

A criação do Banco de Dados em Saúde Bucal em conjunto dos programas

de pós-graduação em Odontologia e Ciências da Computação apresenta uma

grande contribuição, não apenas devido ao volume de dados envolvido, mas

também pela sua diversidade (textos, números e dados temporais) e das áreas de

conhecimento aplicadas neste estudo. Além do mais, a construção de tal banco

de dados fornecerá uma série de benefícios à organização, tais como a

automação das demandas operacioanais pelo desenvolvimento de sistemas

administrativos, mas principalmente à pesquisa pela exploração da rica base de

informações clínicas e sociais.

Referências

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Page 139: Inovação, universidade e relação com a sociedade

138 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

[4] MACHADO, F. N. R. Tecnologia e projeto de Data Warehouse: uma visão multidimensional. 1. ed. São Paulo: Érica, 2004. [5] SAHAMA, T. R.; CROLL, P. R. A Data Warehouse Architecture for Clinical Data Warehousing. ACM International Conference Proceeding Series; v249, p227-232, Ballarat, 2007. [6] SILVA, H. A. et al. Cárie Dentária em população Ribeirinha do Estado de Rondônia, Região Amazônica, Brasil 2005/2006. Cad. Saúde Pública. v24, n10, p2347-2353, Rio de Janeiro, 2008. [7] STEINER, M. T. A. et al. Abordagem de um problema médico por meio do processo de KDD com ênfase à análise exploratória dos dados. Gest. Prod. v11, n2, p11-25, 2006. [8] ZHOU, X. et al. Building Clinical Data Warehouse for Traditional Chinese Medicine Knowledge Discovery. Internacional Conference on BioMedical Engineering and Informatics. v1, p615-620, Sanya, 2008.

Page 140: Inovação, universidade e relação com a sociedade

A FORMAÇÃO DE UMA REDE DE PESQUISA CIENTÍFICA ATRAVÉS DA CRIAÇÃO DE UMA “LIGA DA PESQUISA CIRÚRGICA”

THE FORMATION OF RESEARCH MEDICAL THROUGH THE CREATION OF

CHIRURGICAL RESEARCH LEAGUE.

Prof. Dr. Jefferson Braga Silva [email protected]

Lucas Colomé [email protected]

Alessandra Sebben [email protected] Martina Lichtenfels [email protected]

Marcelo Rabello [email protected]

Resumo

A iniciação científica é conhecida por todos como a maneira mais

adequada de introduzir o jovem aluno à interrogação, ao questionamento e a

pesquisa científica. Esses serão os pesquisadores e professores responsáveis

pelo avanço da ciência e produção de meios para o bem social.

Educar, instruir e mostrar o “savoir faire” é assunto dos mais experientes,

aqueles que já enfrentaram as dificuldades do novo, do inesperado e sobretudo

do inusitado na ciência e em seus desdobramentos. Desta parceria entre

novidade e experiência buscou-se motivação para a construção de conhecimento.

O objetivo primordial da criação de uma Liga de Pesquisa Cirúrgica foi de

organizar um grupo de alunos engajados em rede com os alunos da pós-

graduação e pesquisadores em clínica cirúrgica da pós-graduação em medicina

da PUCRS.

Para a formação da rede os atores devem estar comprometidos e

motivados para interligar alunos da graduação, alunos da pós-graduação e

orientadores. Alunos da graduação materializam o auxílio nas revisões

bibliográficas, desenvolvimento de modelos experimentais, avaliação dos

resultados e treinamentos de habilidades macro e microcirúrgicas.

A experiência da criação da Liga e a formação da rede de pesquisa tem

sido extremamente valiosa e proveitosa a todos os atores envolvidos. Reuniões

mensais com 51 alunos da graduação dos quatro primeiros semestres de atuação

Page 141: Inovação, universidade e relação com a sociedade

140 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

ativa e produtiva e 12 alunos de pós-graduação de mestrado e doutorado são

estimulantes para os pesquisadores.

O estabelecimento da rede visa ainda criar a oportunidade de

colaborações, convênios e associações com outras entidades públicas e

privadas, seja na pesquisa ou na promoção de atividades de formação

profissional. Essa união dos projetos entre alunos de graduação e pós-graduação

certamente evoluirá para o desenvolvimento de projetos inovadores, produção de

conhecimento e novos parceiros da iniciativa privada.

Palavras-chave: conhecimento científico, inovação, pesquisa.

Abstract

The scientific initiation is known by everyone as the most appropriate way

to introduce a young student to question and scientific research. This will become

the researchers and teachers that will evolve the science for the society’s good

purpose.

Teach, instruct and show the “savoir faire”, is a matter of the most

experienced, those who already faced the novelty difficulties, the unexpected and

mainly the unusual on science and its developments. This partnership between

experience and new was motivation for the construction of knowledge. The

PUCRS’ Chirurgical Research League’s creation’s primordial objective was

organizing an engaged students group connected with post-graduation in surgical

clinic from PUCRS’ medicine post-graduation.

To form a net the actors must be compromised and motivated on

interconnection with the graduation students’, post-graduation students and

researchers. The graduation students help comes from bibliographic revisions,

experimental models creation, results appraise and macro and microsurgery ability

training.

The experience on Research League creation and the formation of

research nets was really valuable and fruitful for all evolved actors. Mensal

meetings with 51 graduation students from the first four active and productive

acting semesters and 12 post-graduation students from master’s degree and

doctor’s degree are stimulant for researchers.

Page 142: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 141

This network establishment aims to create the opportunity for collaboration,

partnership, and public and private entities associations, whether in research or in

the promotion of vocational training activities. This project’s union between post

and graduation students surely will evolve into the innovative projects

development, production of knowledge and new partnerships with the private

enterprise.

Keywords: scientific knowledge, innovation, research.

Introdução

Mais do que qualquer outra atividade econômica, o processo de inovação

está intimamente relacionado ao conhecimento. As universidades, fontes

primordiais de geração de aprendizado, desempenham um papel importante na

relação entre o saber científico e o processo tecnológico. O novo papel da

informação na economia e na indústria gerou um reposicionamento da atuação

das Instituições de Ensino Superior (IES), as quais não são apenas responsáveis

pelo treinamento, mas também por fornecerem o conhecimento crucial para a

evolução de muitos setores industriais (Rapini, 2006).

Na medida em que a Ciência e a Tecnologia foram reconhecidas como

essenciais no desenvolvimento econômico, cultural e social, o ensino das

Ciências em todos os âmbitos tornou-se muito importante, sendo objeto de

inúmeros movimentos de transformações no ensino (krasilchik, 2000).

Os setores que possuem maior atividade com interações intensas com a

ciência incluem áreas tecnológicas relacionadas à engenharia genética, química

industrial, biotecnologia e microeletrônica (processamentos de dados,

componentes eletrônicos, telecomunicações) (Godin, 1996; Mansfield, 1991;

Grupp, 1996)

Frente às transformações na relação entre Economia-Universidade-

Pesquisa, evidenciou-se a necessidade da criação de metodologias para

aproximar os alunos da graduação ao método científico desde seu ingresso na

universidade. A ocorrência da integração entre estes e alunos de pós-graduação,

já familiarizados com o método científico, garante a consistência e consolidação

das pesquisas realizadas. Desta forma, criou-se a “Liga da Pesquisa Cirúrgica”.

Page 143: Inovação, universidade e relação com a sociedade

142 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Objetivos

A Liga de Pesquisa Cirúrgica tem como objetivo reunir alunos de

graduação e pós-graduação da PUCRS e de outras instituições de ensino, como

Feevale, IPA, Univates e UFRGS que estejam engajados pelo mesmo ideal,

pretendendo aprimorar seu conhecimento científico e inseri-los em projetos de

pesquisas da área médica. A proposta visa identificar percepções, sentimentos,

atitudes e opiniões dos participantes a respeito de um determinado tema, produto

ou atividade. Também incentivar a formação de idéias ou hipóteses e estimular o

pensamento do pesquisador.

Descrição

As reuniões são mensais e ocorrem principalmente nas dependências do

Laboratório de Habilidades Médicas e Pesquisa Cirúrgica, no qual se reúnem

professores e/ou orientadores, alunos de graduação e pós-graduação da PUCRS

e de outras instituições de ensino que participam ativamente de estudos médicos.

As atividades, sob a coordenação do Professor Dr. Jefferson Braga Silva,

incluem revisões bibliográficas, criações de modelos experimentais, avaliação de

resultados e treinamentos de habilidades macro e microcirúrgicas, com ênfase em

terapia celular. Os grupos de pesquisa são organizados de maneira em que todos

os alunos da graduação estejam inseridos em algum projeto de pesquisa da pós-

graduação ou em linhas de pesquisa dos orientadores.

Em cada encontro são realizadas palestras, cujo objetivo é contribuir com

informações sobre conhecimento científico e divisão de experiências

metodológicas referentes aos diversos temas abordados em projetos, assim como

outros subsídios pertinentes.

Participantes e projetos

Atualmente, a Liga da Pesquisa Cirúrgica conta com cinquenta e um

alunos de graduação (figura 1) e doze da pós-graduação, os quais pertencem às

Faculdades de Medicina, biologia, biomedicina, veterinária e química.

Page 144: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 143

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

1º 2º 3º 4º 5º 6º

Período/Anos cursados da graduação

Núm

ero

de g

radu

ando

s

Figura 1. Percentual de alunos em relação ao ano cursado.

Dentre os projetos que vêm sendo executados por alunos do Mestrado e

Doutorado, destacam-se:

• Efeito de cimento α-Fosfato Tricálcico e Plasma Rico em Plaquetas na

Regeneração de Tecido Ósseo.

• Estudo Comparativo Controlado entre a Transferência Terminolateral em

Janela de Perineuro e a Transferência Terminolateral no Tratamento do

Músculo Denervado.

• Avaliação de Biopolímeros com Células-tronco.

• Modelo Experimental em Ratos no Reparo Ósseo do Fêmur Utilizando

Células-tronco Mononucleares no Plasma Rico em Plaquetas.

• Comparação do Uso de Radiofrequencia X Hidrojet na redução do

volume do disco intervertebral/ contagem de células em campo digital em

coluna de porco(pig).

• Estudo Prospectivo Randomizado da Integração de Enxertia de Gordura

no Dorso da Mão (Após Lesões Nervosas): Comparação Entre o Método

com Centrifugação Versus sem Centrifugação.

• A Utilização do Cateter Central de Inserção Periférica no Ambiente

Hospitalar.

• Uso de Fluoresceína Sódica em Ressecção de Tumores da Base do

Crânio para a Identificação de Nervos Cranianos.

• Estudo Experimental da Utilização de Células-tronco nos Traumatismos

Raqui-Medulares.

Page 145: Inovação, universidade e relação com a sociedade

144 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Resultados

Após sua criação em dezembro de 2008, observou-se um aumento

significativo do número de pesquisadores envolvidos com os trabalhos. O

provável motivo desse incremento na participação dos acadêmicos se dá pela

maior visibilidade de divulgação das atividades que já vinham sendo

desenvolvidas no Laboratório de Habilidades Médicas e Pesquisa Cirúrgica da

PUCRS. A Liga de Pesquisa Cirúrgica visa ainda estabelecer parcerias,

objetivando firmar convênios e associações com entidades públicas e privadas.

Estes resultados apontam para uma grande aproximação entre os alunos

de graduação e de pós-graduação, da PUCRS e de outras universidades, visando

aperfeiçoar o desenvolvimento científico e a formação de parceiros de pesquisa,

bem como a difusão de conhecimentos e consequentemente a qualificação

acadêmica e profissional dos alunos das áreas da Ciência da Saúde.

Referências Bibliográficas

RAPINI, MS. Interação Universidade-Empresa no Brasil: Evidências do Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq. Estud. econ., n.º 1 (37), p. 211-233, janeiro-março 2007. KRASILCHIK, M. Reformas e Realidade: o caso do ensino das ciências. São Paulo em Perspectiva, 14(1), p. 85-93, 2000. GRUPP, H. Spillover effects and science base of innovations reconsidered: an empirical aprroach. Evolutionary Economics, v. 6, p. 175-197, 1996. GODIN, B. Research and the practice of publication in industries. Research Policy, n.º 4 (25), p. 587-606, June 1996. MANSFIELD, E. Academic research and industrial innovation. Research Policy, n.º 1 (20), p. 1-12, February 1991.

Page 146: Inovação, universidade e relação com a sociedade

ANÁLISE DO SALTO HORIZONTAL EM CONTEXTO INCLUSIVO

Boccardi Goerl, Daniela; Ms; Faculdade de Educação Física – PUCRS

[email protected]

Resumo

Este estudo investiga a influência de um programa de intervenção motora

lúdica inclusiva na habilidade motora fundamental salto horizontal da criança com

Síndrome do X-Frágil e da criança típica em contexto inclusivo, na faixa etária dos

05 aos 08 anos de idade. A abordagem qualitativa com um delineamento

experimental do tipo estudo de caso foi utilizada. Treze crianças participaram da

intervenção, sendo que duas crianças com os respectivos quadros clínicos acima

citado constituíram do foco deste estudo. Para a análise da habilidade motora

fundamental foi utilizado a Seqüência de Desenvolvimento proposto por Roberton e

Halverson (1984). As informações coletadas respondem aos objetivos específicos

da pesquisa que são: identificar, descrever e analisar o nível de desenvolvimento

das habilidades motoras fundamentais frente a um programa de intervenção

motora lúdica inclusiva. A análise qualitativa dos resultados mostra que um

programa de intervenção motora lúdica inclusiva propicia melhorias no

desempenho motor das crianças com deficiência e um aperfeiçoamento das

habilidades motoras da criança típica. O brincar foi um instrumento valioso neste

estudo por que além de satisfazer as necessidades infantis, foi um recurso para

minimizar a resistência à inclusão da criança com deficiência junto à criança típica,

proporcionando novos referenciais motores a estes dois grupos de crianças. Os

resultados desta pesquisa sugerem a necessidade de investir em contextos

inclusivos que oferecem para todas as crianças oportunidades de trabalhar em

cooperação, propiciando diversidade de experiências que promovem a aceitação

mutua das diferenças.

Palavras-chave: salto horizontal, Inclusão, Intervenção Motora.

Page 147: Inovação, universidade e relação com a sociedade

146 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Abstract

This study investigated the influence of an inclusive ludic motor intervention

program on the fundamental motor skills jump of children with mental disorder, X-

fragile syndrome, Down syndrome, and children with typical development from 05

to 08 years of age. A qualitative approach using a case study experimental design

was used. Thirteen children participated in the intervention; however, only four

children with the clinical profiles cited above were focused on the present study.

The Development Sequence, proposed by Roberton e Halverson (1984), was

used to analyze the children’s motor skills performance. Collected information

attempted in this research was to: identify, describe and analyze the fundamental

motor skill level of development as a result of an intervention program with an

inclusion approach. The qualitative analyses of results suggested that the

inclusive ludic motor intervention program provided gains in the motor

development of the disabled children and an enrichment of the motor skill abilities

of the typical children. The playful environment was considered a powerful tool in

the study because it fulfilled the needs of the young children and minimized the

resistance to inclusion of the typical children to the disabled children. Overall, the

intervention helped all children to build new motor and social references,

regardless of disabilities. These results suggest that inclusive environments offer

better opportunities to all children in working together, providing them with

diversity experiences, which promote mutual acceptance of differences.

Keywords: Jump, Inclusive, Motor Intervention.

Introdução

Há uma escassez de estudos na área do desenvolvimento motor de

indivíduos com deficiência, quando comparado a outras populações, onde

situamos a pessoa deficiente apenas ao atendimento médico, fisioterápico,

fonoaudiológico e terapêutico. Esquecemo-nos que a Educação Física também

pode ser um fator altamente contribuinte para a otimização do potencial da

pessoa com deficiência.

Dessa forma, este trabalho centra-se no conceito de que o conhecimento e

o pensamento corporal são em si mesmos, basicamente vivenciais e de que suas

Page 148: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 147

propriedades distintivas provém do caráter da ação. Acreditamos que somos um

resultado vivo de todas as experiências e que a história de nossas vidas acontece

de forma única e individual. O que ocorre, é um processo elaborativo que une o

ser ao corpo, suas vivências e sua continuidade enquanto vida.

Partindo deste pressuposto e reconhecendo que o trabalho das habilidades

motoras e do fator interacional requerem uma condição vivencial, a pesquisa

voltou seu olhar para a prática educacional com crianças com Síndrome do X-

Frágil e criança típica, e tem como questões: qual a influência de um programa de

intervenção motora lúdica inclusiva na habilidade motora fundamental salto

horizontal da criança com Síndrome do X-Frágil e da criança típica, sob uma

perspectiva de tomada de um novo referencial de movimento?

Ao propor este estudo da análise dos mecanismos corporais escolhemos

como instrumento a atividade do brincar em um meio inclusivo. Nosso

pensamento insiste que, na atividade do brincar alguns mecanismos são

possíveis de serem trabalhados, sem que se tornem extremamente autoritários

e/ou inflexíveis, na qual o professor assume um papel de agente educativo

conseguindo incidir sobre o aluno, auxiliando-o na construção de um conjunto de

conhecimentos e, portanto, adquirindo uma série de aprendizagens relativas a

uma determinada questão objetivada.

A escolha do brincar como instrumento de trabalho vem do conceito de que

nas brincadeiras as crianças reproduzem muito daquilo que experimentam na

vida diária, contudo, isto vai além da mera reprodução, pois, pelo menos em

parte, ela tende a se afastar destes modelos convencionais e a imprimir um toque

pessoal às suas ações, criando um estilo individual.

O brincar, possibilita à criança manifestar um progressivo desejo de ocupar

um espaço, de desenvolver experiências e descobertas com seu corpo e utilizá-

lo em um contexto natural através de uma crescente identificação e entendimento

do mundo que a rodeia. Ter um corpo não é suficiente para estabelecer o

equilíbrio com o meio, é preciso percebê-lo através do espaço construído, espaço

de objetos e espaço social, e conectá-lo ao mundo de representações, de

imagens e de símbolos.

Aliado a atividade do brincar, optamos por uma situação inclusiva na busca

de propiciar novos referenciais a criança com Síndrome do X-Frágil e a criança

típica. Oportunizando um meio não segregado a criança com deficiência, sendo

Page 149: Inovação, universidade e relação com a sociedade

148 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

este não portador de um comprometimento grave, gera-se condições para uma

aprendizagem mais próxima da "normalidade". Isto justifica-se pelo fato de que,

na infância as crianças aprendem por imitação, e estando elas em um ambiente

educacional com crianças típicas, apresentarão referenciais motores mais

eficientes, e conseqüentemente, procurarão imitá-los, produzindo ações motoras

muito próximas dos padrões esperados para sua faixa etária.

Para Gallahue (2008) o desenvolvimento motor é definido como uma fase,

ou processo, cronologicamente dependente, levando ao status máximo de

maturidade de cada estrutura diferente.

O desenvolvimento humano implica transformações contínuas que ocorrem

através da interação dos indivíduos entre si e entre os indivíduos e o meio em que

vivem.

Castro (2005) relata que pesquisas demonstraram que o córtex motor

exerce uma função determinante em todas as funções de aprendizagem, sendo

as relações entre psicomotricidade e aprendizagem efetivamente inter-

relacionadas em termos de desenvolvimento psiconeurológico.

Durante o crescimento e a maturação de uma criança, ocorrem grandes

alterações no desenvolvimento motor típico, bem como no anormal.

Segundo Cardona (2004), o desenvolvimento motor típico significa um

desabrochar gradual das habilidades latentes de uma criança. Os movimentos

iniciais mostram-se simples nos recém-nascidos, se alteram e tornam-se mais

variados e complexos com o desenvolvimento. Estágio por estágio, as primeiras

aquisições são modificadas, elaboradas e adaptadas para padrões e habilidades

de movimentos mais finos e mais seletivos.

Este processo continua por muitos anos, porém as alterações maiores e

mais rápidas ocorrem nos primeiros 18 meses, tempo em que os marcos

fundamentais e importantes são atingidos.

Gimenez (2005) afirma que o desenvolvimento motor da criança com

deficiência intelectual obedece à mesma seqüência evolutiva das fases de

desenvolvimento da criança típica, porém de forma mais lenta.

Para Gallahue (2008), a criança com deficiência intelectual também se

desenvolve, mas em um ritmo mais vagaroso. Seu desenvolvimento, no entanto,

não é somente retardado, mas segue um curso anormal.

Page 150: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 149

Objetivo Geral

Investigar a influência de um programa de intervenção motora lúdica

inclusiva na habilidade motora fundamental salto horizontal da criança com

Síndrome do X-Frágil e da criança típica.

Objetivos Específicos

Identificar, descrever e analisar o nível de desenvolvimento da habilidade

motora fundamental salto horizontal da criança com Síndrome do X-Frágil e da

criança típica na faixa etária dos 05 aos 08 anos de idade, frente a um programa

de intervenção motora lúdica inclusiva.

Método

Participantes

Por tratar-se de um estudo de inclusão de crianças com deficiência e

crianças típicas, optamos por analisar um caso específico de deficiência

apresentado no programa de intervenção e um caso típico, com o propósito de

verificarmos os ganhos motores da criança deficiente junto a criança típica.

O programa compreendeu 10 (dez) crianças, sendo 01 (uma) com

Síndrome do X-Frágil, 02 (duas) com Síndrome de Down e 07 (sete) típicos.

Relativo à idade mínima, optamos por trabalhar com crianças a partir dos

05 (cinco) anos, em razão de que a brincadeira ainda estaria presente no

universo destas crianças. A idade máxima foi estabelecida em 08 (oito) anos.

Todos os participantes assumiram um termo de compromisso com a

pesquisa e autorizaram a participação do seu filho no programa e eventual

publicação dos dados obtidos.

Material

Foi utilizado a seqüência de desenvolvimento das habilidades motoras

fundamentais proposto por Roberton e Halverson (1984), instrumento que

identifica os níveis de desenvolvimento para cada um dos componentes

envolvidos na execução das habilidades de saltito em um pé, salto horizontal,

Page 151: Inovação, universidade e relação com a sociedade

150 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

arremesso sobre o ombro e recepção de um objeto. A análise ocorreu

segmentariamente, ou seja, foi verificado o nível de desenvolvimento em cada um

dos segmentos corporais (braços, pernas e tronco) através do registro do sistema

de vídeo cassete. Com este procedimento foi possível reproduzir inúmeras vezes,

em velocidade normal ou reduzida, a execução de um mesmo movimento.

Considerando o nível de desenvolvimento apresentado em cada tentativa, foi

estabelecida uma avaliação final para cada componente. O participante teve que

ser consistente pelo menos em quatro tentativas no mesmo nível de

desenvolvimento, como resultado da análise do componente. As observações

indiretas representaram um importante reforço para a descrição do processo de

desenvolvimento da habilidade motora do participante durante a aplicação do

programa. A seqüência de desenvolvimento da habilidade salto horizontal consiste em

dois componentes: o primeiro, refere-se ao componente pernas; e o segundo,

refere-se ao componente braço. O experimento constou de duas avaliações, a primeira pré-intervenção e a

segunda pós-intervenção, seguindo o mesmo protocolo que a anterior. Todos os

participantes, individualmente, executaram sete tentativas em cada uma da

habilidade de salto horizontal utilizando os mesmos equipamentos e protocolo de

avaliação segundo o plano de observação proposto por Roberton e Halverson

(1984). A orientação dada ao participante compreendeu informações a respeito

do que deveria fazer em cada tentativa, sendo que foi enfatizado o início da

atividade. A voz de comando “atenção - prepara - foi”, em todas as tentativas,

indicou o momento de iniciar a ação motora.

Implementação da intervenção motora

O programa de intervenção motora foi construído a partir dos aspectos

motores, com ênfase ao desenvolvimento de todas as habilidades e o

direcionamento desta investigação baseou-se na atividade lúdica. Desta forma, as

atividades possuíram metas para a realização de nossos objetivos e não foram

selecionadas aleatoriamente.

Consideramos os seguintes pontos durante a escolha das atividades:

• o objetivo à que se propõe;

Page 152: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 151

• a apreciação da atividade pelo participante, associado ao seu grau de

participação;

• a formação de grupos ou à individualidade, respondendo ao caráter de

socialização;

• os movimentos envolvidos;

• fornecimento de oportunidades à expressão da personalidade;

• respeito as característica individuais do participante, ou seja, cada

criança possui necessidades e potenciais diferentes, atitudes

diferenciadas, padrões de progresso diferentes e diferentes experiências.

Mediante as características dos participantes estudados, procuramos

estabelecer algumas condições de trabalho, tendo em vista, principalmente, a

estes princípios (Seaman e Depauw, 1982 apud Rosadas, 1994:34):

• progredir lentamente oferecendo-lhe primeiro atividades familiares;

• dizer-lhe claramente como vai ser a atividade;

• apresentar as idéias de forma lenta e com uma pequena quantidade de

informações por vez;

• prestar atenção ao seu nível de interesse em relação a atividade

proposta;

• usar exemplos concretos;

• estabelecer metas que estejam de acordo com o seu desenvolvimento e

que realmente possam ser alcançados, pois, "metas que mostrem-se

desafiadoras, atingíveis, realistas e específicas tem um efeito benéfico na

performance das pessoas, na qual a apresentação de metas realizáveis,

servem para aumentar a qualidade da experiência da aprendizagem"

(Schmidt, 2001:191);

• basear os novos movimentos naqueles que haviam sido aprendidos

anteriormente;

• elogiar as tentativas e dar ênfase ao bom desempenho;

• oferecer experiências que permitam cada aluno a participar.

Resultados

As informações coletadas a partir da análise das fitas de vídeo, referente

as duas coletas, a primeira Pré-Intervenção e a segunda, Pós-Intervenção para

Page 153: Inovação, universidade e relação com a sociedade

152 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

os componentes perna e braço da habilidade salto horizontal estão apresentadas

nos gráficos abaixo.

Para o componente perna (gráfico 1) na habilidade motora fundamental

salto horizontal, a criança A apresentou na Pré-Intervenção o nível 2; extensão do

joelho primeiro ao impulsionar. No Pós-Intervenção, A passou para o nível 3;

extensão simultânea dos joelhos e tornozelos ao impulsionar.

A criança B apresentou o nível 2 na Pré-Intervenção para o componente

perna na habilidade motora fundamental salto horizontal; extensão do joelho

primeiro ao impulsionar. No Pós-Intervenção, B passou para o nível 3; extensão

simultânea dos joelhos e tornozelos.

Gráfico 1: componente perna na habilidade motora fundamental salto horizontal

Para o componente braço (gráfico 2) na habilidade motora fundamental

salto horizontal, a criança A apresentou o nível 2 na Pré-Intervenção; braços

iniciam a ação do salto, durante o vôo movem-se para fora abrindo e

permanecem na frente do corpo durante o agachamento. No Pós-Intervenção, A

permanece no nível 2.

Para o componente braço na habilidade motora fundamental, a criança B

apresentou o nível 2 na Pré-intervenção; braços iniciam a ação do salto, durante

o vôo movem-se para fora abrindo e permanecem na frente do corpo durante o

agachamento. No Pós-Intervenção, B passou para o nível 3; braços iniciam o

movimento, extensão dos mesmos nos momentos iniciais do vôo com flexão

parcial.

Page 154: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 153

Gráfico 2: componente braço na habilidade motora fundamental salto horizontal

Discussão

Os resultados demonstram que as crianças se encontravam nos níveis

iniciais de aquisição, confirmando a afirmativa de que as crianças com deficiência

apresentam atraso no seu desenvolvimento motor, configurando níveis

rudimentares para os componentes envolvidos em cada habilidade; e a criança

típica, apresentando níveis muito próximos do padrão maduro para a habilidade.

Da primeira para a segunda coleta, a análise dos dados demonstraram que

as crianças evoluíram para estágios mais avançados, passando de níveis iniciais

para níveis praticamente maduros do movimento.

As alterações ocorridas nos componentes das habilidades motoras

fundamentais, são vistas como reflexo dos fatores maturacionais; uma

reconstrução do sistema nervoso, sendo que cada mudança de estágio

representa a substituição de um antigo "programa" neural por outro programa

(Roberton, 1984). O autor ainda refere que os níveis representam períodos no

desenvolvimento que são caracterizados por determinados tipos de

comportamento que refletem um estado neural e, do tipo de processamento

cognitivo que orientará uma determinada ação. Essa seqüência sucessiva de um

estágio a outro, representa a passagem de um nível rudimentar de execução à

níveis superiores.

Roberton e Halverson (1984), abordam que as crianças circulam por estes

níveis de formas diferenciadas, em que partes do corpo se desenvolvem

diferentemente, não exatamente de forma linear, na qual podem ocorrer

mudanças de um nível inicial para um nível mais avançado; e confirmam os

pressupostos de Ferraz (1992), Copetti et al (1993) e Lopes (2001).

Page 155: Inovação, universidade e relação com a sociedade

154 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Estas mudanças não desenvolvem-se apenas pelo processo de

maturação, como também, ocorrem pela influência das experiências ambientais à

que a criança está envolvida. Modificam-se por uma combinação de

oportunidades para a prática, o encorajamento e a instrução em um ambiente

sadio; condições essenciais para um bom desenvolvimento das habilidades

motoras fundamentais.

Com o emprego da demonstração, verificou-se resultados mais efetivos,

pois este continha mais informação a respeito da tarefa do que somente a

descrição da mesma. O excesso de informação verbal acabava por tirar o

interesse da criança pela atividade, pois a orientação verbal excessiva acabava

por eliminar o caráter lúdico da atividade.

Neste aspecto, fica comprovado que a ludicidade da tarefa modifica o

desempenho da criança na execução da habilidade, pois o envolvimento lúdico

gerou maior motivação para às atividades e, exercitou através das brincadeiras, a

memória, a atenção e o desempenho mais eficiente das habilidades motoras

fundamentais, porque as crianças queriam reproduzir exatamente as situações

que estavam sendo imaginadas, participar do "faz-de-conta" com a melhor

eficiência de suas ações.

O salto com os dois pés; habilidade que requer o desempenho coordenado

de todas as partes do corpo, trata-se de um padrão motor complexo, onde o

impulso e o pouso são feitos com os dois pés. Para a otimização do salto, todas

as partes do corpo encontram-se envolvidas, e é necessário a aplicação de força

no componente pernas para se alcançar grandes distâncias. As crianças

apresentaram grande predileção para execução desta habilidade, juntamente com

a habilidade motora do arremesso.

As dificuldades encontradas pelos participantes, relativo ao componente

perna, foi quanto ao agachamento preparatório insuficiente; e relativo ao

componente braço, uso impróprio dos mesmos associado a movimentos restritos.

A falta de força dos membros inferiores para a execução do impulso, foi um

agravante para o período inicial do programa; no entanto, propiciando à criança

um trabalho para esta capacidade, à ela foi proporcionada uma melhor condição

de realização da habilidade acima referida.

Page 156: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 155

Considerações finais

Constatou-se que um programa de intervenção motora que une crianças

com suas diferenças e utiliza o lúdico como meio de intervenção, é possível, sim;

não estamos afirmando que o processo é fácil, é um processo extremamente

difícil, que percorre inúmeras barreiras, mas é viável.

Respeitadas as características de desenvolvimento, muitas das crianças

que apresentam Síndrome do X-Frágil tem capacidade para atingir padrões

motores maduros, se lhes derem oportunidade e tempo suficientes de prática. A

falta de oportunidade de prática tem sido o motivo principal de entrave ao

desenvolvimento motor esperado para a faixa etária dos seis aos onze anos,

sendo verificado em alguns casos, regressão na qualidade de execução dos

padrões motores.

A prática de uma atividade motora deve proporcionar as crianças

oportunidades que possibilitem um desenvolvimento do seu comportamento

motor. Este desenvolvimento deve, através da interação entre o aumento da

diversificação e complexidade, possibilitar a formação de estruturas cada vez

mais organizadas, em que se alcançando um objetivo, novos objetivos são

estabelecidos e este processo não termina, porque a criança busca o

desenvolvimento máximo de todas as suas potencialidades.

E, reportando-se ao aspecto da aprendizagem, a referência de um

comportamento motor próximo ao maduro, representou um modelo mais eficiente

de realização motora, uma fonte de informação visual para a criança com

Síndrome do X-Frágil.

Referências

CARDONA MARTIN, Miguel. Incapacidade Motora: orientações para adaptar a escola. Porto Alegre: Artmed, 2004. CASTRO, Eliane Mauerberg de, Atividade Física Adaptada. São Paulo: Tecmedd, 2005. COPETTI, F. Nível de maturidade dos padrões fundamentais estabilizadores de crianças de seis anos do município de Agudo/RS. Santa Maria: UFSM/CEFD, 1993.

Page 157: Inovação, universidade e relação com a sociedade

156 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

GALLAHUE, David L. Educação Física Desenvolvimentista para todas as crianças. São Paulo: Phorte, 2008. GIMENEZ, Roberto. Atividade Física para Deficiência Mental. In: COSTA, Roberto Fernandes da, Atividade Física Adaptada. São Paulo: Manole, 2005. LOPES, K.A .T. Deficiência Física nas Aulas Regulares de Educação Física: prática viável ou não? Um estudo de caso. Revista Brasileira de Atividade Motora Adaptada: Curitiba, 2001. ROBERTON, M.A .; HALVERSON, L. Developing children: their changing movement. In: LOGSDON, B., ed. Physical education for children: a focus on the teaching process. Philadelphia, Lea & Fabiger, 1984. ROSADAS, S.C. Educação Física e Prática Pedagógica: portadores de deficiência mental. Vitória: UFES. Centro de Educação Física e Desportos, 1994. SCHMIDT, W. Aprendizagem e Performance Motora: uma abordagem da aprendizagem baseada no problema. 2 ed. Porto Alegre: Artmed Editora, 2001.

Page 158: Inovação, universidade e relação com a sociedade

A OFERTA DE MEDICAMENTOS DE QUALIDADE PARA A SOCIEDADE

Bender, Ana Lígia; PhD; Faculdade de Farmácia – PUCRS

[email protected]

Moriguchi-Jeckel, Cristina Maria; PhD; Faculdade de Farmácia – PUCRS

[email protected]

Thiesen, Flavia Valladão; PhD; Faculdade de Farmácia – PUCRS

[email protected]

Funck, José Aparício Brittes; PhD; Faculdade de Farmácia – PUCRS

aparí[email protected]

Resumo

O aumento do consumo de medicamentos pela população em geral é uma

realidade global que reflete o crescente aquecimento do setor farmoquímico.

Entretanto, a ausência de monitoramento de insumos no país, o desvio de

qualidade das matérias-primas e o aumento da importação de insumos de países

asiáticos clamava por medidas que pudessem oferecer garantia e segurança nos

medicamentos oferecidos à população.

Neste cenário, a criação do Laboratório Analítico de Insumos

Farmacêuticos representa um importante papel social tanto na qualificação de

insumos empregados na produção de medicamentos quanto na formação de

profissionais. Os procedimentos realizados no LAIF visam à segurança e à

certificação de matérias primas nacionais e importadas para promover a

qualidade dos medicamentos. Este laboratório, inserido no Parque Científico e

Tecnológico (TECNOPUC) PUCRS, é resultado de uma parceria entre a

Associação Brasileira da Indústria Farmoquímica – ABIQUIF, Ministério da Saúde,

Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, Financiadora de Estudos e

Projetos – FINEP e PUCRS.

Palavras-chave: insumos farmacêuticos, medicamentos, certificação de

qualidade.

Page 159: Inovação, universidade e relação com a sociedade

158 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Introdução

O Laboratório Analítico de Insumos Farmacêuticos é dotado de uma

estrutura inédita na América Latina. Localizado no Parque Científico e

Tecnológico da Universidade (Tecnopuc), o laboratório reúne equipamentos de

última geração para caracterizar, avaliar e monitorar os insumos utilizados na

produção de medicamentos. Com eles, é possível fazer a identificação de

materiais, o teor e o grau de pureza, a verificação da presença de contaminação

por metais pesados e a determinação do tamanho de partículas, entre outras

análises. A correta caracterização das substâncias que fazem parte de todos os

medicamentos é indispensável para assegurar a qualidade e a credibilidade

destes produtos e, consequentemente, contribuir para a saúde da população.

Além do diferencial de sua concepção, o LAIF se destaca pela extrema

importância na formação de profissionais qualificados em nível nacional, a

começar pelos acadêmicos. Este laboratório deve atender os laboratórios oficiais

e a indústria privada, dando suporte as suas análises e produtos.

Page 160: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 159

Objetivos

• Criar e viabilizar o laboratório analítico de insumos farmacêuticos na

PUCRS, integrando-o ao TECNOPUC.

• Dotar a PUCRS de capacidade para avaliação e caracterização de

insumos farmacêuticos, contribuindo com subsídios para a certificação de

matérias-primas farmacêuticas pela Farmacopéia Brasileira.

• Apoiar ações da ABIQUIF -Associação Brasileira de Indústria

Farmoquímica – e fabricantes nacionais, no que tange à certificação de

seus produtos.

• Prestar serviço às indústrias farmacêuticas, públicas e privadas, na

avaliação de insumos, monitoramento da qualidade e desenvolvimento

de metodologias analíticas.

• Apoiar ações da Farmacopéia Brasileira, elaborando monografias de

especificações de insumos, caracterizando-os, inclusive, quanto à

funcionalidade.

• Oferecer infra-estrutura laboratorial, que sirva de suporte para Curso de

Pós-Graduação na área de Farmácia, bem como amplie a produção

científica na área.

Descrição do Processo de Inovação

O processo de inovação através dos serviços ofertados pelo LAIF pode ser

descrito pelos impactos positivos causados em diferentes setores:

Social: garante a qualidade dos insumos utilizados na área de

farmoquímicos, os quais são consumidos pela população e a segurança dos

medicamentos produzidos, através de respostas terapêuticas uniformes e

controle dos riscos sanitários. Assegura o atendimento aos interesses

estratégicos do Sistema Único de Saúde.

Econômico: viabiliza as empresas farmoquímicas nacionais a competirem

no mercado externo, com produtos apresentando padrões de especificação de

qualidade.

Científico: o desenvolvimento do LAIF cria condições para a geração de

publicações científicas, bem como de patentes, ambas oriundas de pesquisas na

área de insumos e metodologias analíticas.

Page 161: Inovação, universidade e relação com a sociedade

160 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Resultados Obtidos

O trabalho desenvolvido no LAIF tem contribuído para o desenvolvimento

tecnológico e industrial do setor farmoquímico nacional, aumentando sua

competitividade no mercado global e oferecendo garantia e segurança dos

medicamentos utilizados no Brasil.

O LAIF possibilita a articulação ensino-pesquisa-extensão, através do

desenvolvimento de novas metodologias e articulação com programas de pós-

graduação (pesquisa). Os alunos da Faculdade de Farmácia realizam aulas

práticas e muitos alunos da graduação são bolsistas de Iniciação Científica neste

laboratório (ensino). São oferecidos serviços qualificados a indústrias

farmacêuticas e a laboratórios públicos e está prevista a realização de cursos

com foco em novas tecnologias (extensão).

Considerações Finais

O LAIF se constitui um verdadeiro centro de excelência e conhecimento,

porque torna possível realizar no Brasil, aquilo que os próprios órgãos

reguladores, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, solicita em termos

de análise para os insumos farmacêuticos. Este laboratório estabelecerá

parâmetros de qualidade que deverão ser seguidos por todos, fornecedores

nacionais e estrangeiros. Isto favorecerá o desenvolvimento e a produção de

outros insumos farmacêuticos pela indústria nacional, permitindo oferecer

medicamentos de qualidade e baixo preço.

Através do LAIF a Faculdade de Farmácia promove uma interação com a

sociedade, a qual é de extrema importância, tanto do ponto de vista econômico

como social.

Referências Bibliográficas

Um olhar sobre o mundo – Nº 77 – Associação Brasileira da Indústria Farmoquímica Farmacopéia Brasileira IV Ed. www.anvisa.gov.br

Page 162: Inovação, universidade e relação com a sociedade

EFEITO DA MODIFICAÇÃO DO ESTILO DE VIDA SOBRE OS FATORES DE RISCO CARDIOVASCULAR QUE COMPÕEM OS CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO DA SÍNDROME METABÓLICA, MARCADORES

INFLAMATÓRIOS E BALANÇO AUTONÔMICO: UM ESTUDO RANDOMIZADO

Feoli, Ana Maria Pandolfo; Dra.; FAENFI – Curso de Nutrição – PUCRS;

[email protected]

Macagnan, Fabrício Edler; Dr.; FAENFI – Curso de Fisioterapia – PUCRS;

[email protected]

Schmitt, Virgínia; Dra.; - Curso de Farmácia - FFARM – PUCRS

Bregeiron; Márcia Koja; Dra. – Universidade Federal de Ciências da Saúde de

Porto Alegre

Antunes, Maria Terezinha; Dra. – Universidade Federal de Ciências da Saúde

de Porto Alegre A principal característica inovadora desse estudo é a integração da

pesquisa com o ensino e a assistência. O objetivo do estudo é verificar o efeito da

associação da intervenção nutricional à suplementação de ácidos graxos ômega-

3 e à prática regular de exercício físico sobre os fatores de risco cardiovascular

que compõem a síndrome metabólica. Os voluntários foram acompanhados por 3

meses. Ao longo do estudo a circunferência abdominal, o peso corporal, os

hábitos alimentares, o perfil lipídico, os marcadores inflamatórios, a variabilidade

da freqüência cardíaca, a capacidade funcional e a qualidade de vida foram

avaliados antes e após a participação do programa. Os resultados mostram que

independente do tipo de intervenção todos os voluntários reduziram peso, IMC,

circunferência abdominal e glicose de jejum. No entanto, os voluntários que

participaram do programa de exercício físico apresentaram um benefício adicional

com redução da insulina, pressão arterial sistólica e aumento na capacidade

funcional. Estes resultados não acrescentam apenas subsídios às ações já

existentes de medidas preventivas e de tratamento das doenças crônicas não

transmissíveis, mas evidenciam a importância do atendimento, acompanhamento,

adesão ao tratamento e da atuação integrada da equipe de saúde garantindo

melhora na qualidade de vida e a preocupação com o viver saudável.

Palavras-chave: síndrome metabólica, estilo de vida, risco cardiovascular.

Page 163: Inovação, universidade e relação com a sociedade

162 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Introdução

A principal característica desse estudo, identificada aqui como sendo

inovadora, foi a forma pela qual estruturamos a ação integradora da pesquisa

com o ensino e a assistência. Em 2006 um grupo de professores da Faculdade da

Enfermagem, Nutrição e Fisioterapia FAENFI desenvolveu uma proposta de

estudo sobre modos de vida saudáveis. Essa proposta recebeu aporte de

recursos de agências federais e estaduais de fomento à pesquisa (CNPq e

FAPERGS) e conta com o apoio da PUCRS (estrutura física,

horas/pesquisadores e bolsas de iniciação científica - BPA). Além desses órgãos

de fomento públicos, várias empresas detectaram a oportunidade de investir em

pesquisa. Dentre elas, a Herbarium, Laboratórios Colbrás e Relthy, Ritter

Alimentos e Uniagro. Nesse sentido, o esforço conjunto da instituição de ensino

superior apoiando pesquisadores e alunos compõem o ambiente ideal para

experimentar novas abordagens terapêuticas, propostas de novos procedimentos,

que, pela riqueza de detalhamento e empenho do grupo, foi capaz de atrair

investimentos do setor privado. Uma área onde até então, poucas empresas

privadas têm alocado recursos para a prevenção. Com o amadurecimento do

grupo envolvido na medida em que o estudo foi se desenvolvendo, constituiu-se

uma nova uma linha de pesquisa denominada Vigilância, Gestão, Trabalho e

Educação em Saúde a qual integrada está ao Grupo Interdisciplinar de Pesquisas

e Estudos em Promoção e Vigilância da Saúde (GIPEPROVIS) da

FAENFI/PUCRS.

É nesse sentido que se detecta a característica inovadora desse projeto,

pois os resultados pretendem acrescentar subsídios às ações já existentes de

medidas preventivas e de tratamento das doenças crônicas não transmissíveis

relacionadas com obesidade e sedentarismo. Levando-se em consideração não

apenas os marcadores de risco cardiovascular, mas a ação integrada de

diferentes profissionais da área da saúde, que em conjunto somam esforços para

garantir, além da melhora da saúde, a melhora da qualidade de vida da

população.

Os indicadores de sucesso do programa de modificação do estilo de vida

proposto nesse estudo estão relacionados com o controle da Síndrome

Metabólica. Dessa forma, a normalização, de um ou mais, dos fatores de risco

Page 164: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 163

que compõe os critérios de diagnóstico adotados pela Diretriz Brasileira de

Diagnóstico e Tratamento da Síndrome Metabólica. Além de testar as orientações

propostas pela Diretriz Brasileira, nosso estudo propõe monitorar o atendimento,

acompanhamento, adesão ao tratamento e da atuação integrada da equipe de

saúde garantindo melhora na qualidade de vida e a preocupação com o viver

saudável.

Fundamentação Teórica

A síndrome metabólica (SM) é uma condição clínica definida pela

associação de alguns fatores de risco cardiovascular, que, quando presentes,

aumentam uma vez e meia a mortalidade geral e duas vezes e meia a

mortalidade por causas cardiovasculares1-3. Grandes estudos têm demonstrado

que a SM está intimamente ligada à deposição de gordura visceral e à resistência

à insulina4.

Segundo a Diretriz Brasileira, o tratamento da SM consiste basicamente

em modificar os fatores de risco cardiovascular, como a redução de peso, da

circunferência abdominal, a normalização da dislipidemia, a redução da pressão

arterial sistêmica (PAS) e a melhora do controle glicêmico. Associado às

estratégias farmacológicas para o tratamento da SM, a prática de exercício físico

regular e a modificação de hábitos alimentares desempenham papel central no

tratamento e prevenção da SM 5.

Há muito tempo se observa que a manutenção de uma alta capacidade

física atua favoravelmente sobre os fatores de risco cardiovascular,

principalmente aqueles ligados à SM, como sensibilidade à insulina e a redução

na incidência de diabetes tipo 2 e doença arterial coronariana (DAC)6,7. Além da

melhora da dislipidemia e da redução da pressão, indivíduos obesos podem se

beneficiar com a prática de exercício físico regular pela redução dos marcadores

inflamatórios, relacionados à obesidade central8. Espósito et al. (2003)9,

demonstraram o efeito antiinflamatório da mudança no estilo de vida, da dieta

estilo Mediterrâneo e de programas de exercício físico. Após dois anos de

acompanhamento, a mudança no estilo de vida de mulheres obesas reduziu o

índice de massa corporal e as concentrações plasmáticas de IL6, IL18 e proteína

C reativa (PCR), com concomitante aumento da adiponectina. O aumento nas

Page 165: Inovação, universidade e relação com a sociedade

164 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

concentrações plasmáticas de adiponectina reduz o risco de infarto do miocárdio

(IAM), explicada em parte pela redução plasmática dos lipídios, marcadores

inflamatórios e melhora do perfil glicêmico10.

Objetivo

Avaliar o efeito da suplementação de ácidos graxos ômega-3 e da prática

regular de exercício físico associados a uma intervenção nutricional sobre os

fatores de risco cardiovascular que compõem os critérios de diagnóstico da

síndrome metabólica. Além disso, avaliamos os hábitos alimentares (índice de

qualidade da dieta), perfil antropométrico, marcador Inflamatório (PCR-us),

balanço autonômico, capacidade funcional e qualidade de vida.

Descrição do Processo de Inovação Desenvolvido e Resultados Obtidos

Método

Este é um ensaio clínico randomizado controlado por placebo que estuda

os benefícios da modificação do estilo na SM. Os voluntários que entraram em

contado após a divulgação em mídia impressa foram selecionados conforme os

seguintes critérios: ter entre 30 e 59 anos de idade com três (03) ou mais dos

seguintes achados a) circunferência abdominal: ≥ 88 cm para mulheres e ≥ 102

cm para homens; b) pressão arterial: sistólica ≥ 130 mmHg e diastólica ≥85

mmHg; c) glicose de jejum: ≥ 100 mg/dl; d) triglicerídeos: ≥ 150 mg/dl; e) HDL

colesterol: ≤ 40 mg/dl para homens e ≤ 50 mg/dl para mulheres. Foram excluídos

do estudo os indivíduos que apresentarem uma (01) ou mais das seguintes

situações: a) contra-indicação absoluta para atividade física por problemas

músculo-esqueléticos, neurológicos, vasculares (claudicação intermitente),

pulmonares e cardíacos; b) uso de hipolipemiantes; c) indivíduos não sedentários

(30 min duas ou mais vezes por semana); d) difícil contato e incapacidade de

retorno e acompanhamento.

Descrição dos grupos

Os indivíduos aptos foram convidados a participar do estudo e receberam,

individualmente, as informações referentes aos procedimentos aos quais seriam

Page 166: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 165

submetidos (através do consentimento livre e esclarecido previamente aprovado

pelo comitê de ética em pesquisa da PUCRS- CEP). Após a avaliação inicial os

participantes foram randomizados em quatro grupos conforme descrito abaixo:

1. Grupo Intervenção Nutricional (IN): Neste grupo os integrantes foram

submetidos à intervenção nutricional e à administração de placebo

(1g/dia de óleo mineral) durante três meses.

2. Grupo Intervenção Nutricional + Suplementação Ômega-3 (INS3): Neste grupo os integrantes foram submetidos à intervenção nutricional

e à administração de suplemento de ácidos graxos Ômega-3 (1

grama/dia) pela ingestão de 3 cápsulas de óleo de peixe por dia

durante três meses.

3. Grupo Intervenção Nutricional + Exercício (INE): Neste grupo os

integrantes foram submetidos à intervenção nutricional e à

administração de placebo (1g/dia de óleo mineral) associado a um

programa de exercício físico durante três meses.

4. Grupo Intervenção Nutricional + Exercício + Suplementação Ômega-3 (INES3): Neste grupo os integrantes foram submetidos à

intervenção nutricional e à administração de suplemento de ácidos

graxos Ômega-3 (1 grama/dia) pela ingestão de 3 cápsulas de óleo de

peixe por dia durante três meses.

Intervenção Nutricional

A intervenção nutricional consistiu da orientação de um plano alimentar

individualizado e de reconsultas quinzenais. Em cada uma das reconsultas

abordavam-se temas sobre alimentação saudável, como: rotulagem de alimentos;

gorduras trans; alimentos funcionais; pirâmide dos alimentos; consumo de sódio;

programa 5 ao dia; substitutos alimentares; entre esclarecimentos de dúvidas. A

monitorização da dieta consistia de um inquérito recordatório de 24 horas e da

investigação das dificuldades encontradas pelo paciente para a adesão das

combinações realizadas na consulta anterior, bem como, do seguimento do plano

alimentar proposto. O plano alimentar está baseado nas recomendações da

Diretriz Brasileira para o Diagnóstico e Tratamento da Síndrome Metabólica5.

Page 167: Inovação, universidade e relação com a sociedade

166 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

A avaliação nutricional, que consistia de aferição do peso, circunferência

abdominal (CA) foi realizada no início e ao final de três meses de

acompanhamento.

O consumo alimentar foi medido pelo método recordatório de 24 horas e

registro alimentar de dois dias. As medidas caseiras foram convertidas em

gramas e mililitros e a quantificação dos nutrientes foi feita mediante programa

computadorizado da Escola Paulista de Medicina utilizando a Tabela de

Composição Química de Alimentos Brasileira (TACO).

A qualidade da dieta foi avaliada pelo Índice de Qualidade da Dieta (IQD).

O Índice de Qualidade da Dieta (Healthy Eating Index) proposto por Kant11 foi

considerado pela American Dietetic Association um instrumento adequado para

medir a qualidade global da alimentação na população. Este instrumento é

constituído por 10 componentes, sendo que seis medem o grau de adequação do

consumo de cada um dos cinco principais grupos de alimentos (Cereais, pães,

tubérculos e raízes; verduras e legumes; frutas; leite e produtos lácteos; carnes,

ovos e feijão), outros quatro medem a ingestão de gordura total, de gordura

saturada, de colesterol e de sódio, respectivamente, e o último mede a variedade

da dieta. Todos os componentes foram avaliados e pontuados de zero a dez,

sendo que os valores intermediários foram calculados proporcionalmente ao

consumido. A avaliação é feita através de escores: Abaixo ou igual a 40 pontos:

Dieta Inadequada; Entre 41 e 64 pontos: Necessita de modificação; Superior a 65

pontos: Dieta Saudável.

Avaliação da Capacidade Funcional

A capacidade funcional foi determinada pela estimativa do consumo

máximo de oxigênio. Para essa estimativa utilizamos a máxima velocidade e a

máxima inclinação tolerada pelos voluntários no teste incremental de membros

inferiores. Esse teste foi realizado em uma esteira ergométrica programada para

elevar ambos, velocidade e inclinação, a cada 03 minutos. O teste era

interrompido a pedido do paciente ou na vigência de algum sinal/sintoma de

alteração cardiopulmonar. Durante o teste foram avaliadas a PA, FC, escala de

esforço percebido, ECG e oximetria de pulso.

Page 168: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 167

Programa de exercício físico

A sessão de atividade física foi realizada em esteira por 30 minutos

contínuos, 3 vezes por semana, com uma intensidade de 60% a 70% da FC

máxima avaliada no teste incremental de membros inferiores, conforme

preconizado na Diretriz Brasileira5. Durante as sessões de exercício físico, a

equipe da fisioterapia monitorava constantemente a PA, FC, escala de esforço

percebida e oximetria de pulso. Tanto a velocidade quanto a inclinação foram

constantemente ajustadas a fim de manter a FC dentro do alvo de treinamento.

Marcadores Bioquímicos

Duas coletas de sangue foram realizadas, uma na avaliação inicial e outra

ao final do programa, após três meses. Os marcadores bioquímicos de risco

cardiovascular como glicemia de jejum, perfil lipídico, insulina e proteína C-reativa

foram analisado no laboratório de análises clínicas do HSL enquanto que os

marcadores inflamatórios (IL-6, IL-10, PCR e TNFα) foram analisados nos

laboratórios da faculdade de farmácia.

Qualidade de Vida

A qualidade de vida também foi avaliada no início e ao final do estudo.

Essa avaliação foi realizada através do questionário SF-36, o qual é subdividido

em 08 domínios: capacidade funcional (CF), aspecto físico (AF), vitalidade (V),

dor (D), aspecto social (AS), aspecto emocional (AE), aspecto de saúde mental

(ASM) e estado geral de saúde (EGS). Esse instrumento foi aplicado pelos

enfermeiros envolvidos no projeto12.

Resultados Parciais

A análise dos resultados de 62 pacientes (tabela 1) mostra que as

intervenções realizadas proporcionaram redução dos fatores de risco

cardiovasculares que compõem o diagnóstico da Síndrome Metabólica.

Fatores de Risco Cardiovasculares: Observamos que todos os grupos

apresentaram redução significativa do peso, IMC e da circunferência abdominal.

Os grupos INE e INSE3 apresentaram redução significativa de Colesterol Total e

Page 169: Inovação, universidade e relação com a sociedade

168 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Triglicerídeos. Observou-se também que houve redução, ainda que não

significativa, nos demais fatores de risco (glicose, colesterol total, triglicerídios,

HDL-colesterol PAS e PAD), em todos os grupos.

Índice de Qualidade da Dieta: O índice de qualidade da dieta (IQD) foi

avaliado antes e após a intervenção (tabela 2). Observa-se a melhora significativa

dos hábitos alimentares dos participantes da pesquisa. No momento pré-

intervenção a média do IQD apresentava uma classificação “necessita de

modificação” (escore = 55,96) e após os três meses de intervenção a

classificação evoluiu para “Dieta Saudável” (escore = 72,74). As principais

alterações observadas foram: adequação da quantidade de lipídios ingeridos,

adequação do consumo de frutas maior variedade da dieta.

Qualidade de vida: Observamos que o programa de modificação do estilo

de vida foi capaz de melhorar significativamente os domínios CF, EGS e AE,

como podemos notar pela diferença percentual entre os relatos obtidos no início e

ao final do programa: CF (19% e 9%; P=0,001), EGS (9% e 9%, P=0,007) e AE

(45% e 15%; P=0,012) respectivamente nos grupos INE e IN. Contudo, os

voluntários do grupo INE relataram melhora significativa em relação ao grupo IN

nos domínios AF (45% vs 13%; P=0,001), V (34% vs 9%, P=0,005), D (24% vs -

2%, P=0,020), AS (35% vs 1%, P=0,007), ASM (26% vs 7%, P=0,025). O

programa de modificação do estilo de vida altera benéfica e significativamente os

relatos de avaliação subjetiva da qualidade de vida (SF-36) sendo que nos

voluntários que participaram do programa de exercício físico houve relato de

melhora adicional em relação AF, V, D, AS e EGS. Em contrapartida, ambos os

grupos demonstraram melhora efetiva no domínio estado geral de saúde, sendo

que, no grupo INE a melhora foi significativamente maior.

Page 170: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 169

Tabela. 1. Efeito da mudança do estilo de vida sobre os fatores de risco cardiovascular que compõem os critérios de diagnóstico para Síndrome Metabólica.

IN INS3 INE INSE3

Pré (n=16)

Pós (n=13)

p Pré (n=21)

Pós (n=16)

p Pré (n=16)

Pós (n=16)

p Pré (n=20)

Pós (n=17)

p

Peso (kg) 83±12,1 80± 13 0,00* 87,4±13,6 83,8±12 0,00* 85,3±13 80,6±13,1 0,00* 93,6±13,4 88,2±13,4 0,00*

IMC (kg/m2) 32,6±3,4 31±4 0,00* 33,5±4,1 32±3,9 0,00* 32,4±5 30,6±4,9 0,00* 34,2±4 33,3±4,1 0,00*

CA (cm) 103,7±7,7 100±8 0,01* 108,6±10,6 104,4±10,6 0,01* 102±9,5 96,7±10,6 0,00* 110,2±6,3 105,4±8,4 0,00*

Glicose mg/dl) 98,7±9,6 93±8 0,08 111,5±33,6 100,6±14,5 0,11 113,6±63,5 96,3±22,3 0,18 102,8±25,7 101,8±23,7 0,26

CT (mg/dl) 255,3±77,3 234±55 0,21 226,1±41,2 224,5±50,8 0,19 229,9±45 217,8±31,9 0,14 210,6±29,6 207,6±37,2 0,03*

TG (mg/dl) 263,8±178,3 250±184 0,15 192,4±83,5 178,1±75,4 0,08 186,5±87,1 149,4±81,6 0,04* 212,4±83,6 160,7±67,5 0,00*

HDL – col 45,5±8,5 44±10 0,60 44,5±11,5 42,3±9,1 0,53 46,3±11,4 44,1±9,3 0,41 42,5±9,1 44,7±8,1 0,54

PAS (mmHg) 133,4±18 125±13 0,13 129,7±15,1 124,1±17,3 0,43 132,8±18,3 125,5±17 0,07 128,3±11 118,9±15,6 0,08

PAD (mmHg) 82,1±11,8 78±7 0,11 83,1±14,8 79,2±12,2 0,88 83,7±8,1 81,3±8,8 0,31 81,7±9,5 77,8±7,5 0,13

Os dados estão expressos em média ± desvio padrão. *P < 0,05 quando comparados com valores pré-intervenção. Abreviaturas: IN = Grupo Intervenção Nutricional; INS3 = Grupo Intervenção Nutricional + Suplementação Ômega-3; INE = Grupo Intervenção Nutricional + Exercício; INES3 = Grupo Intervenção Nutricional + Exercício + Suplementação Ômega-3; IMC= índice de massa corporal; CA= circunferência abdominal; CT = Colesterol Total; TG = triglicerídios; HDL- col= HDL colesterol; PAS= pressão arterial sistólica; PAD = pressão arterial diastólica;.

Tabela 02. Efeito da mudança do estilo de vida sobre o Índice de Qualidade da Dieta (IQD).

IQD Pré-Intervenção (n=44)

Pós-Intervenção (n=29)

p

Escore numérico 55,96±14,46 72,74±13,08* 0, 0001

Classificação Necessita de Modificação Dieta Saudável

Os dados estão expressos em média ± desvio padrão. *P < 0,05 quando comparados com valores pré-intervenção. Observação: Os dados sobre a qualidade da dieta ainda estão em processo de análise. Isto justifica a diferença do n pré e pós intervenção.

Considerações Finais

Nossos dados, ainda que parciais, corroboram resultados da literatura em

que a modificação do estilo de vida resulta em redução dos fatores de risco

cardiovascular que compõem os critérios de diagnóstico para Síndrome

Metabólica. Observou-se também uma melhora dos hábitos alimentares dos

participantes do estudo. Ressalta-se ainda como resultados positivos do estudo a

grande integração entre a equipe: pesquisadores, acadêmicos e bolsistas.

Avanço no grau de informação de fonte bibliográfica referente ao tema e,

principalmente, a satisfação demonstrada pela maioria dos voluntários

participantes do estudo, com os benefícios recebidos.

Page 171: Inovação, universidade e relação com a sociedade

170 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

É importante salientar que por tratar-se de um estudo randomizado e com

rigorosos critérios de inclusão, os grupos estão sendo formados aleatoriamente e

por este motivo os grupos apresentam um número de participantes ainda

heteregêneo. Até o momento, contamos com a participação de 62 voluntários

distribuídos nos 4 grupos. Cabe salientar que os critérios de inclusão rigorosos

estão dificultando a captação dos 120 participantes planejados pelos

pesquisadores, mas por outro lado, este rigor metodológico garante atingir aos

objetivos do trabalho. O grupo de pesquisadores está buscando estratégias para

atender ao número estimado de participantes, dentre elas: divulgação da

pesquisa em meios de comunicação e parceria com a rede básica de saúde.

Destaca-se a contribuição desse estudo para a formação do profissional de

saúde e participação de todos na melhoria da saúde.

Referências

1) Lakka HM, Laaksonen DE, Lakka TA, Niskanen LK, Kumpusalo E, Tuomilehto J, Salonen JT. The metabolic syndrome and total and cardiovascular disease mortality in middle-aged men. JAMA. 2002;288(21):2709-16.

2) Ford ES, Giles WH, Mokdad AH. Increasing prevalence of the metabolic

syndrome among u.s. Adults. Diabetes Care. 2004; 27(10):2444-9. 3) Girman CJ, Rhodes T, Mercuri M, Pyorala K, Kjekshus J, Pedersen TR, Beere

PA, Gotto AM, Clearfield M; The metabolic syndrome and risk of major coronary events in the Scandinavian Simvastatin Survival Study (4S) and the Air Force/Texas Coronary Atherosclerosis Prevention Study. Am J Cardiol. 2004;93(2):136-41.

4) Girman CJ, Rhodes T, Mercuri M, Pyorala K, Kjekshus J, Pedersen TR, Beere

PA, Gotto AM, Clearfield M; 4S Group and the AFCAPS/TexCAPS Research Group. The metabolic syndrome and risk of major coronary events in the Scandinavian Simvastatin Survival Study (4S) and the Air Force/Texas Coronary Atherosclerosis Prevention Study (AFCAPS/TexCAPS). Am J Cardiol. 2004 Jan 15;93(2):136-41.

5) Diretriz Brasileira para diagnóstico e tratamento da síndrome metabólcia.

Hipertensão 2004; 7(4): 121-163. 6) Franks PW, Ekelund U, Brage S, Wong MY, Wareham NJ. Does the

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7) Lee S, Kuk JL, Katzmarzyk PT, Blair SN, Church TS, Ross R.

Page 172: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 171

Cardiorespiratory fitness attenuates metabolic risk independent of abdominal subcutaneous and visceral fat in men. Diabetes Care. 2005 Apr;28(4):895-901.

8) Pischon T, Hankinson SE, Hotamisligil GS, Rifai N, Rimm EB. Leisure-time

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9) Esposito K, Pontillo A, Di Palo C, Giugliano G, Masella M, Marfella R,

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10) Pischon T, Girman CJ, Hotamisligil GS, Rifai N, Hu FB, Rimm EB. Plasma

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11) Kant AK. Indexes of overall diet quality: a review. J Am Diet Assoc 1996;

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questionário genérico de avaliação de qualidade de vida SF-36 (Brasil SF-36). Rev Bras Reumatol. São Paulo. v.39, n.3, p.143:150. Maio-Junho,1999.

Page 173: Inovação, universidade e relação com a sociedade

BOAS PRÁTICAS NAS CIÊNCIAS EXATAS

Page 174: Inovação, universidade e relação com a sociedade

PRÁTICA DE ENSINO EM AMBIENTES NÃO-FORMAIS DE EDUCAÇÃO: UM PROJETO SOCIAL QUE ENVOLVE DOCÊNCIA E PESQUISA

TEACHING PRACTICE IN NON FORMAL ENVIRONMENTS : A SOCIAL

PROJECT INVOLVING INSTRUCTION AND RESEARCH

Santos, Monica Bertoni dos; MS; FAMAT- PUCRS

[email protected]

Resumo

O presente artigo relata o desenvolvimento de um projeto que tem sido

realizado desde 2004/2 cujo objetivo é inserção profissional de licenciandos do

Curso de Licenciatura Plena em Matemática da Pontifícia Universidade Católica

do Rio Grande do Sul. Numa parceria com a Pequena Casa da Criança,

reconhecida sociedade filantrópica de Porto Alegre, em um ambiente não-formal

de educação, são ministrados módulos de Matemática para os adolescentes que

participam do Programa Adolescente Aprendiz em Serviços Bancários e

Administrativos, coordenado pela referida entidade. A cada semestre, os

licenciandos desenvolvem com dois grupos de adolescentes, um trabalho que se

caracteriza pela construção coletiva de conhecimento. A cada ano, os objetivos

específicos do projeto têm refletido a busca de metodologias e recursos

inovadores para o ensino e a aprendizagem de Matemática.

Palavras-chave: educação não-formal, docência, pesquisa.

Abstract

The present article exposes the development of a Project that has been

realized since 2004/2, in a join work with the “Small House of the Child”, a well

known philanthropic society of Porto Alegre City. The main idea of this project is

the professional insertion of the students of the Docent Math Course of PUCRS. In

a non formal educational environment, the teenager participants of the “Bank and

Administrative Service’s Teenager Apprentice” program, coordinated by the

Page 175: Inovação, universidade e relação com a sociedade

174 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

referred society, are presented to Math modules. At each semester, the Math

students work with two groups of teenagers, using the collective construction of

the knowledge. Every years, the specific objectives of this project have been

reflected the search of new methodologies and innovational resources to the

teaching and learning in Math sciences.

Keywords: non formal environment, instruction and research.

Introdução

Nas disciplinas de Metodologia A e B, de Prática de Ensino e de Estágios

Supervisionados do Curso de Licenciatura Plena em Matemática da Faculdade de

Matemática (FAMAT) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

(PUCRS), temos desenvolvido ações de pesquisa e ensino que pretendemos

sejam inovadoras e que denominamos Projeto de Inserção de Licenciandos de

Matemática no Campo Profissional, cujo objetivo geral é proporcionar aos futuros

professores, em sua formação inicial, uma visão da realidade do ensino em que

vão atuar. A cada ano, de acordo com o local e as características das ações

realizadas, são formulados os objetivos específicos.

A partir do segundo semestre de 2004, o Projeto tem se desenvolvido junto

ao Programa Adolescente Aprendiz em Serviços Bancários e Administrativos,

promovido pela Pequena Casa da Criança de Porto Alegre, uma das mais

tradicionais instituições filantrópicas do Rio Grande do Sul. O Programa, uma das

ações educacionais de profissionalização promovidas pela entidade, oferece um

espaço de educação não-formal que proporciona aos licenciandos que dele

participam, a oportunidade de conhecer a realidade dos alunos de Ensino

Fundamental e Médio e de realizar um trabalho coletivo, de pesquisa e ensino e

de desenvolvimento social.

Ao longo destes dez semestres em que se desenvolveu junto ao Programa

Adolescente Aprendiz em Serviços Bancários e Administrativos, o projeto contou

com a participação de licenciandos de matemática e de adolescentes, alunos de

escolas públicas, sendo que, nos anos 2006, 2007, 2008 e 2009, tem contado,

também, com a participação de um aluno bolsista de Iniciação Científica.

Page 176: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 175

As situações de aprendizagem organizadas e desenvolvidas pelos

licenciandos, ao longo deste tempo, foram sendo avaliadas, reformuladas e

reaplicadas, constituindo um acervo, organizado em Unidades de Aprendizagem.

Com isso, em 2009, um dos objetivos específicos do Projeto é a criação de um

ambiente virtual com o propósito de divulgar este acervo, o que poderá possibilitar

a interação com adolescentes que participam de programas semelhantes

realizados no interior do Estado do Rio Grande do Sul, com a supervisão da

Pequena Casa da Criança, bem como seus responsáveis.

Objetivos e Justificativa do Projeto de Inserção de Licenciandos de Matemática no Campo Profissional

O objetivo geral do Projeto é proporcionar aos alunos de Licenciatura

Plena em Matemática da PUCRS sua inserção na vida profissional, tendo a

oportunidade de desenvolver uma ação pedagógica de cunho social que se

caracterize pela pesquisa, pelo ensino e pelo trabalho de equipe.

Ao participar do projeto, pretende-se, ainda, que os licenciandos, num

ambiente não-formal de educação, possam desenvolver a capacidade de

trabalhar em equipe, de compartilhar tarefas, de liderar, de pesquisar, de planejar

e preparar suas aulas, de elaborar e aplicar instrumentos de avaliação, de coletar

e analisar dados e de elaborar relatórios, atuando como professores reflexivos e

pesquisadores, desenvolvendo seus saberes docentes, contribuindo para que

seus alunos tenham reais experiências de aprendizagem e de construção da

cidadania.

Nosso intuito a cada ano, ao idealizar o Projeto de Inserção do Licenciando

de Matemática no Campo Profissional é proporcionar aos licenciandos vivências

inovadoras que lhes confiram uma gama de experiências e a possibilidade de

construir saberes docentes nos dois eixos em torno dos quais se efetiva essa

construção: o afetivo e o cognitivo.

Segundo Santos (2004): Para cada um deles, entendemos dois domínios de construção dos saberes docentes. Ao eixo cognitivo, atribuímos a construção dos saberes da ciência, que chamaremos de disciplinares, e dos saberes da ação docente, que chamaremos da prática. No eixo afetivo, visualizamos que a construção dos saberes transita por um domínio pessoal, que chamaremos de intrapessoal, e outro

Page 177: Inovação, universidade e relação com a sociedade

176 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

social, que chamaremos de interpessoal, muito relacionados, mas distintos.(p.265).

Assim, além das aulas na Universidade, com todos os recursos que aí são

oferecidos, experiências diversificadas proporcionadas ao longo da formação

inicial, que envolvem diferentes situações de ensino e aprendizagem do tipo

formal e não-formal de educação, em espaços escolares e não-escolares, fazem

parte da formação docente.

Experiências na educação formal desenvolvidas em espaços escolares são

proporcionadas aos licenciandos de Matemática na medida que, ao longo do

Curso, há quatro estágios obrigatórios que são realizados em escolas de ensino

fundamental e médio. Com isso, a oportunidade de, em parceria com a Pequena

Casa da Criança de Porto Alegre, trabalhar com jovens adolescentes em um

espaço não-formal de educação, indicou-nos um caminho para proporcionar aos

licenciandos o conhecimento de diferentes realidades sociais e escolares e, ao

mesmo tempo, a vivência de uma prática pedagógica que permitisse a elaboração

e a avaliação de situações de ensino e aprendizagem, que se caracterizassem

por um trabalho de pesquisa e de prática de ensino, visando ao desenvolvimento

social.

Segundo Park, Fernandes e Carnicel (2007), O papel da universidade e dos trabalhos de pesquisa é pensar a realidade sob novos ângulos, de forma crítica e consciente, e propor intervenções reflexivas e práticas, preocupando-se, também com a formação de futuros educadores; é dialogar com quem já está na prática e formular questões e discussões para um público interessado em problemáticas da atualidade que nos tocam e envolvem de perto (p.27).

A partir disso, tais pesquisadores afirmam que, seus trabalhos “nos últimos

anos tem demonstrado uma preocupação com a construção do conhecimento nos

mais diversos segmentos: educadores que já estão nos espaços não-formais e

formais, com públicos freqüentadores e com pesquisadores” ( p.27).

Então, em nosso planejamento pedagógico, passamos a realizar com os

licenciandos da FAMAT, os Projetos anuais em parceria com a Pequena Casa da

Criança junto ao Programa Adolescente Aprendiz em Serviços Bancários e

Administrativos, organizando e ministrando módulos de Matemática para os

Page 178: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 177

adolescentes que dele participam, aos sábados de manhã, durante doze sábados

por semestre.

Considerando a educação como elemento importante e relevante na

construção da cultura, fica clara a importância dada à relação educacional em

interface com ações culturais e sociais que acontecem em ambientes

educacionais não-escolares, que caracterizam uma educação do tipo não-formal,

para a construção dos saberes docentes dos futuros professores de Matemática.

Nosso entendimento do termo educação não-formal pressupõe uma

complementaridade ao sistema formal-escolar na perspectiva de ampliar

experiências escolares, contando com uma flexibilidade tanto nos conteúdos

programados quanto na sua abordagem, nas metodologias utilizadas, nos tempos

previstos, o que, de maneira nenhuma, dispensa a existência do planejamento

que, certamente, tem incluído objetivos, conteúdos, recursos e procedimentos

relacionados às situações de aprendizagem, cuidadosamente organizadas e

avaliadas.

Afonso (1989), citado por Fernandes e Park (2007), assim aponta as

diferenças entre o formal e o não-formal: [...] por educação formal entende-se o tipo de educação organizada com uma determinada seqüência (prévia) e proporcionada pelas escolas , enquanto a designação não-formal, embora obedeça a uma estrutura e uma organização (distinta, porém das escolas) e possa levar a uma certificação (mesmo que não seja essa a finalidade), diverge ainda da educação formal no que respeita a não-fixação de tempos e locais e a flexibilidade na adaptação dos conteúdos de aprendizagem a cada grupo concreto (p.131).

Segundo Fernandes e Park (2007), ainda referindo-se a Afonso (1989), “ A

esses aspectos incorpora um diferencial: a preocupação com mudança ou

transformação social por buscarem projetos de desenvolvimento” (p.131).

Como se trata da formação de um profissional que trabalha com seres

humanos que devem se inserir em uma sociedade, é de se prever que a

Licenciatura promova o desenvolvimento de qualidades pessoais, sociais e

culturais de um sujeito que, ao construir-se como professor, como educador,

constrói-se como pessoa e como cidadão.

Conforme Ponte (2002):

Page 179: Inovação, universidade e relação com a sociedade

178 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

A formação nesses campos pode favorecer o desenvolvimento de capacidades de reflexão, autonomia, cooperação e participação, a interiorização de valores deontológicos, as capacidades de percepção de princípios, de relação interpessoal e de abertura às diversas formas de cultura contemporânea, todos eles capacidades e valores essenciais ao exercício da profissão. (p.3-4).

A formação inicial de professores de Matemática que queremos

educadores matemáticos, pressupõe o domínio dos conteúdos que ele vai

ensinar. No entanto, é importante destacar que a formação desse professor esteja

situada, de forma igualmente importante, no domínio educacional, que inclui as

contribuições das Ciências da Educação, em especial, da Didática, além da

tomada de consciência dos problemas educacionais e sociais e da reflexão sobre

eles.

Descrição e desenvolvimento do projeto

Desde 1992, temos, a cada ano, organizado projetos de ensino e pesquisa

que se caracterizam pela Inserção de Licenciandos de Matemática no Campo

Profissional: alguns localizaram-se na Vila Fátima outros em escolas regulares.

Desde 2004/2, os projetos são realizados na Pequena Casa da Criança de Porto

Alegre junto ao Programa Adolescente Aprendiz em Serviços Bancários e

Administrativos.

Participam do Projeto, coordenados pela professora orientadora e desde

2006, liderados pelo bolsista de Iniciação Científica, alunos do Curso de

Matemática, matriculados nas disciplinas de Metodologia de Matemática A e B, na

Prática de Ensino e nos Estágios Supervisionados do Curso de Matemática e,

ainda, outros, como voluntários, participação que conta como atividade

complementar.

As aulas, geralmente ministradas em forma de oficina, para duas turmas

de adolescentes, acontecem aos sábados pela manhã, das 8 às 12 horas, na

Pequena Casa da Criança, na Vila Nossa Senhora da Conceição em Porto Alegre

e são planejadas e preparadas durante a semana na PUCRS.

Os adolescentes que participam do referido Programa estão regularmente

matriculados de oitavo ano do ensino fundamental ao terceiro ano do ensino

médio de escolas públicas de Porto Alegre e da Grande Porto Alegre.

Page 180: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 179

Uma dupla de licenciandos, liderados pelo aluno bolsista, atua ora como

monitor, ora como professor titular, no mínimo, por três sábados que é o tempo

médio de duração de um módulo de trabalho. Como as atividades são planejadas,

realizadas e avaliadas, pelo grupo, os licenciandos têm a oportunidade, tanto de

conhecer e avaliar a realidade de alunos do ensino fundamental e médio de

escolas públicas das redes municipal e estadual de ensino, como de estudar

conteúdos e conhecer metodologias alternativas e recursos diferenciados para o

ensino e a aprendizagem de Matemática.

Os alunos bolsistas e os licenciandos têm realizado um trabalho de equipe

em que todos os envolvidos assumem a responsabilidade de planejar, efetivar e

avaliar as aulas referentes aos módulos de trabalho. O aluno bolsista, juntamente

com a professora orientadora, coordena as atividades, é o elo de ligação entre a

entidade promotora do Programa, os licenciandos e os adolescentes.

No início de cada semestre, é feita uma sondagem, bem como uma etapa

de conhecimento dos adolescentes, seu grau de escolaridade, suas preferências,

suas facilidades e dificuldades na aprendizagem de Matemática.

Após as sondagens, de acordo com o grau de escolaridade dos alunos é

feito o planejamento do semestre. Temos optado por abordar alguns assuntos

básicos de ensino fundamental, essenciais para a continuidade dos estudos,

importantes para a vivência em sociedade e para a leitura do mundo em que

vivem. Alguns temas como razões, proporções, regra de três simples e composta,

conceitos básicos de Geometria, de funções e de Matemática Financeira têm

sido, via de regra, trabalhados com os diferentes grupos.

Planejados os módulos de trabalho e as aulas dos respectivos módulos, os

materiais didáticos selecionados e utilizados nas oficinas são fornecidos pelo

Laboratório de Materiais Instrucionais da FAMAT ou são elaborados e construídos

pelos licenciando liderados pelo aluno bolsista.

Ao longo desses anos, temos elaborado um banco de planejamentos e

atividades para diferentes módulos de trabalho, os quais, semestralmente, são

selecionados e aprimorados a partir das demandas dos adolescentes. Os

materiais didáticos elaborados são preparados pelo aluno bolsista que se

encarrega de os distribuir para os outros licenciandos, esclarecendo as

combinações finais.

Page 181: Inovação, universidade e relação com a sociedade

180 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Ao final de cada semestre, como encerramento das atividades e como

culminância do trabalho, os adolescentes participam, na PUCRS, de um evento

organizado pelos licenciandos que, além de uma confraternização, inclui uma

visita ao Laboratório de Materiais Instrucionais da FAMAT, realizando jogos,

desafios e atividades envolvendo raciocínio lógico e conhecimentos matemáticos,

bem como uma visita ao Museu de Ciência e Tecnologia da PUCRS.

Resultados obtidos

Identificamos três diferentes categorias de análise dos resultados obtidos

no desenvolvimento do Projeto, ao longo destes dez semestres: os resultados

relacionados aos licenciandos, os relacionados aos adolescentes e os que se

referem ao acervo de materiais que constituem as Unidades de Aprendizagem.

Para os licenciandos da Matemática da PUCRS, certamente tem sido uma

experiência bastante enriquecedora e diferente, principalmente para aqueles que

nunca haviam atuado em sala de aula. O Projeto tem se caracterizado pelo

estudo e pelo trabalho de equipe, pela reflexão em grupo, pela pesquisa no

preparo dos materiais e pela docência, o que indica o alcance dos objetivos

propostos que, em última instância, referem-se à promoção de habilidades

relacionadas aos saberes docentes.

Esta inserção é tanto mais eficiente quanto mais perto estiver da realidade

social e escolar em que o licenciando irá atuar, num contato com os diferentes

cenários e atores, tendo oportunidade de discutir as questões do ensino e da

aprendizagem ainda na Universidade.

No relatório do SEMINÁRIO ESTADUAL SOBRE LICENCIATURAS EM

CIÊNCIAS E MATEMÁTICA, realizado em Ijuí em 1991, encontramos a seguinte

orientação: “A interação do estudante de licenciatura com a realidade escolar

deverá dar-se através de um processo de integração de educação continuada de

professores com a formação em nível de graduação, devendo isto ocorrer

tornando-se a prática docente com eixo direcionador e toda a educação básica”.

(p.16).

Nas avaliações e auto-avaliações que constam de seus relatórios, via de

regra, os licenciandos colocam que as vivências de prática de ensino na Pequena

Casa foram reais experiências de ensino e de aprendizagem, identificam-nas

Page 182: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 181

como gratificantes e momentos em que eles tiveram a oportunidade de

desenvolver um trabalho diferenciada no ensino de matemática e a oportunidade

de perceber o interesse dos seus alunos pela aprendizagem de Matemática.

Quanto aos adolescentes, é importante destacar a oportunidade que eles

têm de participar de situações de aprendizagem de Matemática que são

contextualizadas, que envolvem o uso da História da Matemática, que partem da

resolução de problemas e desafios propostos também através de jogos e do uso

de materiais concretos em situações diferenciadas daquelas geralmente

trabalhadas em salas de aula. Além da atitude positiva com que eles têm recebido

os licenciandos e as propostas de trabalho, do entusiasmo de suas participações

nas atividades desenvolvidas na PUCRS, em suas avaliações e auto-avaliações,

realizadas no final do semestre, eles identificam as formas diferentes de aprender

Matemática e o seu entendimento a respeito da importância da matemática para a

sua vida. O cunho de desenvolvimento social do Projeto, evidencia-se na medida

que os adolescentes têm a oportunidade de conviver tanto com universitários,

como no ambiente da Universidade, e os licenciandos têm a oportunidade de

conhecer a realidade de uma população carente que tem, na educação, a

oportunidade de integração socioeconômica e cultural.

O documento que denominamos Unidades de Aprendizagem, é o resultado

concreto da produção coletiva de um trabalho de pesquisa organizado na

Universidade. No que diz respeito ao Projeto de 2009, nosso objetivo é criar um

ambiente virtual onde possamos divulgar as Unidades de Aprendizagem e

interagir com mais adolescentes que participam, no interior do Estado, de

programas semelhantes, bem como com seus professores.

Considerações finais

A leitura das avaliações dos diferentes integrantes do Projeto levam-nos a

reflexões que nos permitem entendê-lo como uma ação inovadora de interação

com a sociedade, na medida que constatamos o desenvolvimento de cada um,

num processo de em interação com seus pares e com outros em diferentes

situações sócioeconômicas e culturais.

Para os licenciandos, ficam evidentes suas experiências de inserção na

profissão e a oportunidade de desenvolver pesquisa, um trabalho de produção

individual e coletiva de conhecimento.

Page 183: Inovação, universidade e relação com a sociedade

182 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Para os adolescentes, constatamos a oportunidade de contatar com

estudantes universitários que lhes mostram outras maneiras de valorizar o

conhecimento, em especial, o conhecimento matemático, estimulando gosto pela

disciplina, o desejo de saber, vislumbrando a possibilidade de continuar os

estudos. Observamos a cumplicidade desses dois grupos de jovens,

compartilhando de uma sociedade de conhecimento.

Entendemos que é preciso buscar a construção de um novo mundo, e que,

para isso, como diz Grossi 2002 é pensar que:

[...]um mundo com paz, com fraternidade e com justiça é possível, mas tem que ser construído diligentemente e como resultado de um esforço coletivo, onde não haja pretensões de preeminência de mais saber ou de mais valor moral de alguns que seriam os capazes de conduzir o processo; descobrir-se que todos podem aprender é algo de um estupendo poder democrático e revolucionário; que uma boa pedagogia fundamentada em pesquisa, desenvolvida num ambiente habilmente preparado dá conta de ensinar a todos (p.13).

Como formadores de formadores, estamos imbuídos da certeza de que o

momento que vivemos exige de nós a promoção de ações positivas de interação

da Universidade com a sociedade

Referências

FERNANDES R.S., PARK, M.B. Educação Não Formal. In: Pak, M.B., Fernandes, R.S., Carnicel, A. (org) Palavras-chave em EDUCAÇÃO NÃO-FORMAL. SP: Editora Setembro; Campinas , SP: Unicamp/CMU, 2007. GROSSI, E.P. Democracia s.f.1. sociedade onde todos aprendem. Porto Alegre:GEEMPA, 2002. PARK, M.B., FERNANDES, R.S., CARNICEL, A. (org) Palavras-chave em EDUCAÇÃO NÃO-FORMAL. SP: Editora Setembro; Campinas , SP: Unicamp/CMU, 2007. PONTE, J. P. da. A vertente profissional de formação inicial de professores de Matemática. In: Educação Matemática em Revista, v. 9, n.11, p. 3-8, abril 2002. Edição especial. SANTOS, M. B. dos. Saberes de uma Prática Inovadora: Investigação com egressos de um curso de Licenciatura Plena em Matemática. Dissertação de Mestrado - Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande d Sul, Porto Alegre, 2005.

Page 184: Inovação, universidade e relação com a sociedade

ENSINO DE FÍSICA PARA INCLUSÃO: O RECONHECIMENTO DA DIVERSIDADE E A SUPERAÇÃO DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

PHYSICS TEACHING FOR INCLUSION: THE DIVERSITY RECOGNITION AND

OVERCOMING DIFFICULTIES OF APPRENTICESHIP

Rocha Filho, João Bernardes da; Dr; FAFIS – PPGEDUCEM - PUCRS

[email protected]

Lima, Valderez Maria do Rosário; Dra; FACED - PROGRAD - PPGEDUCEM –

PUCRS

[email protected]

Basso, Nara Regina de Souza; Dra; FAQUI – PPGEDUCEM - PUCRS

[email protected]

Resumo

Apresentamos a inclusão e o respeito à diversidade, da forma em que são

expressos nos documentos oficiais que regem a Educação no Brasil, e

associamos estas diretrizes a uma ação exemplar que envolve o projeto Ensino

de Física para Cegos, realizado pela Faculdade de Física da PUCRS e o Instituto

Santa Luzia, uma escola inclusiva da cidade de Porto Alegre. A ação do professor

de Física que pretende utilizar o ensino desta ciência com o objetivo de formar

cidadãos aptos a intervir positiva e efetivamente na comunidade em que vivem é

descrita e analisada por meio de atividades que estão sendo realizadas no

contexto deste projeto de inclusão.

Palavras-chave: Ensino de Física para cegos, Inclusão, Diversidade cultural.

Abstract

This article presents the inclusion and the respect to the diversity, of the

form where they are express in the official documents that conduct the Education

in Brazil, and associates these directives to an exemplary action that involves the

Physics Education for Blind People Project, carried through inclusive school of

Page 185: Inovação, universidade e relação com a sociedade

184 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Porto Alegre city. The actions of the Physics teacher that intends to use the

science education with the objective to form apt citizens to positively and

effectively intervene in the community where lives are described and analyzed by

means of activities that are being implemented in this project.

Keywords: Physics education for blind people, Inclusion, Cultural diversity.

Introdução

A fim de manter coerência com o princípio de “igualdade de condições para

o acesso e permanência na escola”, expresso na Constituição Federal do Brasil,

torna-se capital, na atualidade, que as instituições escolares procedam revisão de

seus projetos educativos com o propósito de eliminar barreiras impostas à

educação e garantir a inclusão de todas as crianças e adolescentes em

processos pedagógicos que os qualifiquem para uma atuação satisfatória na

sociedade do século XXI.

Embora ocorra associação entre o termo inclusão escolar e inserção de

estudantes com deficiências físicas e mentais em classes de ensino regular, a

idéia mais amplamente defendida é a de que a inclusão escolar não se refere

somente a esses alunos. Nesta perspectiva, as instituições escolares precisam

estar preparadas para atender necessidades de todos, o que exige da

comunidade escolar a superação da idéia de que aqueles que não se ajustam a

determinados padrões singelos de normalidade devem ser banidos. Estabelecida

esta premissa, a escola, por meio das ações que desenvolve, torna-se local de

formação de uma cidadania fundada na tolerância e no respeito às diferenças.

O alinhamento à mudança pretendida requer que a proposta educativa da

escola se reorganize no que se refere às metodologias escolhidas para estruturar

as situações de aprendizagem. É necessário utilizar estratégias capazes de

deslocar o aluno de uma condição passiva e subalterna para uma condição de

sujeito da própria educação, tornando a sala de aula um ambiente de

desenvolvimento humano e aprendizagem significativa.

Para conhecer adequadamente o problema e interagir com a comunidade

com vistas a elaborar, conjuntamente com ela, ações que consistam em soluções,

a FAFIS esteve envolvida no projeto Ensino de Física para Cegos, realizado no

Page 186: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 185

âmbito do Ensino Médio em uma escola inclusiva de Porto Alegre. Nesta

experiência, a reorganização dos procedimentos didáticos e a aplicação de

materiais experimentais visaram reverter o tradicional processo de exclusão dos

alunos com necessidades especiais, mostrando uma ampliação substancial do

interesse pela disciplina e demonstrando, ainda, que os alunos cegos encontram

formas inusitadas de realizarem as atividades propostas e melhorarem suas

aprendizagens, aumentando suas auto-estimas.

Esta apresentação encontra-se organizada a partir da focalização da

problemática da inclusão de cegos em classes comuns do ensino regular, e

aborda estratégias de ensino de Física para o Ensino Médio explicitadas nos

Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), seguida de uma contextualização da

experiência do projeto supracitado, relatando as atividades desenvolvidas e

promovendo a análise de seus resultados. Situando a discussão na intersecção

desses temas, de um lado temos a constatação de que as dificuldades

encontradas pelos estudantes do Ensino Médio na disciplina de Física são, em

geral, maiores do que em outras disciplinas, e, de outro, que portadores de

deficiências visuais graves encontram-se entre estes estudantes da Educação

Básica, sendo sua inclusão em classes comuns dificultada pela metodologia

expositiva utilizada pela quase totalidade dos professores de Física.

Objetivos do Projeto

Na tentativa de oferecer soluções para este problema, permitindo aos

alunos uma melhor compreensão da Física e de sua linguagem, valorizando cada

indivíduo que compartilha o espaço da sala de aula, o projeto visou propor

modificações das estratégias de ensino, considerando a diversidade presente na

classe como uma possibilidade de enriquecimento dos processos de ensino e de

aprendizagem. Essas modificações incluíram ações pedagógicas que propiciaram

aos estudantes do Ensino Médio a reconstrução dos conceitos científicos,

ampliando sua autonomia e incentivando sua participação em projetos coletivos,

de modo a desenvolver a capacidade de convivência com as diferenças, assim

como a percepção das possibilidades de crescimento cognitivo e humano

oferecidas por tal convívio.

Page 187: Inovação, universidade e relação com a sociedade

186 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Descrição do Projeto de Inovação e dos Resultados Obtidos

Uma das principais causas das dificuldades dos estudantes na disciplina

de Física é a forma como ela é abordada no Ensino Médio. A exposição de

equações, princípios e leis, seguida da resolução de exemplos idealizados e

exercícios repetitivos, ocasionalmente interrompidos por uma demonstração

experimental, tornam difícil a compreensão e a contextualização dos conteúdos

conceituais da Física. O que já é cansativo e abstrato para os estudantes que

vêem se torna um drama para os que não podem ver os gestos e os materiais

que o professor manipula. Esses alunos terminam sendo excluídos do processo

educativo, acreditando que suas deficiências os impedem de compreender e

aplicar os conceitos apresentados na disciplina, sem perceberem que seus

colegas videntes estão em situação semelhante. A metodologia tradicionalmente

utilizada pelos professores de Física do Ensino Médio, centrada no professor e

distanciada de situações reais e do cotidiano, não cumpre o papel de oferecer ao

estudante acesso a conhecimentos que ampliem a possibilidade de sua inserção

qualificada nos diversos setores da atividade humana, impedindo-o de utilizar

esses conhecimentos para qualificar sua vida ou a de seus concidadãos.

Assim, o Instituto Santa Luzia, escola inclusiva de Ensino Fundamental que

comporta turmas mistas com alunos portadores de deficiência visual e alunos

videntes, localizada na Zona Sul de Porto Alegre e pertencente à congregação

das Irmãs Vicentinas, aceitou colaborar com a FAFIS em uma ação visando dar

respostas a esse problema. Iniciamos, então, um processo de intercâmbio

universidade-escola, primeiramente por uma solicitação da Direção, que entrou

em contato conosco solicitando que opinássemos em relação à estruturação de

um ambiente próprio para ensino de Física. A escola, que até então oferecia

somente o Ensino Fundamental, pretendia estender seus serviços também ao

Ensino Médio, destinando uma sala ao laboratório de Física, mandando construir

mesas adequadas e equipando este espaço com os materiais básicos

necessários, segundo nossas orientações, e em alguns meses recebeu

autorização oficial para iniciar suas atividades no nível médio.

Em seguida, dois professores se sucederam durante o primeiro ano de

implantação do projeto, deixando evidente que o professor de Física desta escola

em particular precisaria, além da capacidade técnica tradicionalmente

Page 188: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 187

desenvolvida nos anos de formação, abertura para acolher os alunos de turmas

inclusivas. Nessa época fomos contatados pela direção da instituição para que

sugeríssemos um candidato ao cargo de professor de Física, pois a carência de

pessoas aptas nessa carreira é reconhecida (MEC/CNE/CEB, 2007).

Apresentamos, então, um ex-aluno da Faculdade de Física da PUCRS, possuidor

de atitude educacional de caráter francamente humanista e que regressara

recentemente de seus estudos de pós-graduação, estando disponível.

Durante este período a escola também admitiu uma estagiária, e nós

solicitamos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul,

FAPERGS, uma bolsa de iniciação científica para que pudéssemos desenvolver

sugestões de experimentos adequados para ensino de Física em classes

inclusivas, visando dar apoio ao professor. Tanto o estágio quanto a bolsa foram

destinados a alunos de graduação em Licenciatura em Física da PUCRS, e por

meio deles mantivemos contato permanente com a escola, desde então. Quando

a bolsa foi outorgada a instituição escolar já contava com turmas de 1os e 2os

anos, e a bolsista começou a estudar a literatura sobre inclusão, observando e

acompanhando o desenvolvimento das aulas e criando, aplicando e corrigindo

experimentos adaptados ao ensino de Física em turmas mistas, enfim, buscando

meios para fazer com que o professor pudesse oferecer aos estudantes maior

acesso a recursos instrumentais e metodologias de ensino mais adequadas ao

trabalho. Essa bolsista, posteriormente, ingressou no magistério público estadual,

em uma escola inclusiva de Porto Alegre.

Desde o início do trabalho percebemos que entre os diferentes obstáculos

à inclusão em Física, dois eram especialmente importantes nesta escola: a

ausência de situações de investigação que incluíssem manipulação de objetos

em situações de aprendizagem, e a utilização de experimentos demonstrativos de

caráter eminentemente visual, cujas limitações são óbvias no caso de inclusão de

estudantes cegos.

Neste mesmo período, em outra pesquisa, estávamos desenvolvendo um

conjunto composto por ripas de madeira furadas, parafusos, discos, arruelas e

porcas, cujo objetivo era servir de material de sustentação para experimentos de

Física, quando percebemos que este material poderia ser uma alternativa para o

desenvolvimento de atividades investigativas em turmas inclusivas, possibilitando

a construção de conceitos e promovendo a autonomia dos estudantes.

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188 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Entregamos à bolsista, assim, o primeiro destes conjuntos, composto por 20

peças de cada tipo, manufaturado por um marceneiro local, e ela passou a ser

orientada a desenvolver experimentos com base neste material. O professor foi

chamado para capacitar-se para a utilização do conjunto, e o recebeu por

empréstimo para que se familiarizasse com ele. Posteriormente, a escola, assim

como a PUCRS, mandou produzir seus próprios conjuntos, que agora são

utilizados regularmente.

A partir deste ponto o professor, a bolsista e a estagiária passaram a

desenvolver experimentos utilizando o material, seja como elemento de

sustentação, seja como base única, e um encontro inaugural foi realizado na

Instituição, com a participação dos orientadores, do professor, da estagiária e da

bolsista, quando uma turma de estudantes foi atendida e realizou diversos

experimentos em caráter de primeira aproximação ao material. A reação dos

alunos foi positiva, e tanto videntes quanto deficientes visuais puderam criar

experimentos interessantes envolvendo Mecânica, tendo oportunidade de

reprojetar, construir, desconstruir e testar montagens destinadas ao estudo da

Física. Desde então as aulas de Física da escola têm sido oferecidas

principalmente no laboratório, com o professor propondo experimentos adaptados

para a modalidade investigativa e para as necessidades, possibilidades e

interesses dos diversos grupos atendidos.

As montagens têm incluído máquinas simples, como alavancas e sistemas

de roldanas, no estudo das forças, instrumentos de medição, como balanças,

dinamômetros e torquímetros, sistemas rotativos, para estudo das forças no

movimento circular, veículos sobre trilhos e sob cordas, para estudo do

movimento linear, pêndulos, para estudo dos movimentos periódicos, sistemas de

transmissão por correia, no estudo da cinemática do movimento circular, rodas

d’água, no estudo das transformações de energia, e suportes, em geral, para

outros experimentos e conteúdos.

Numa aula típica de laboratório os alunos são dispostos em grupos,

ocupando seis mesas hexagonais que compõem o laboratório, todas com

tomadas de eletricidade, espaços para os alunos guardarem seus materiais,

bancos altos e pia. Os grupos são formados ao gosto dos alunos, respeitando a

regra de que devem possuir pelo menos uma pessoa vidente. Essa regra objetiva

evitar acidentes quando os experimentos envolvem itens potencialmente

Page 190: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 189

perigosos, e os alunos videntes tornam-se cuidadores de seu colegas,

protegendo-os e orientando-os ao longo da aula.

O conteúdo conceitual é trabalhado previamente em aulas teóricas, e nelas

o professor conduz o trabalho problematizando e contextualizando o conteúdo. O

questionamento oportuniza aos estudantes a retomada de informações, a

explicitação de conhecimentos prévios e o avanço na construção de

conhecimentos. O estudo de determinado conteúdo parte de questões

desafiadoras, incentivando o aluno a expor argumentos e estabelecer hipóteses

explicativas, relacionando a situação apresentada com outras situações

relevantes sobre o tema. Nessas atividades o professor, ao invés de dar

respostas, instiga os alunos com novos questionamentos, aponta fragilidades no

raciocínio e auxilia na procura de respostas para os desafios colocados (LIMA,

2006).

Em algumas aulas de laboratório o professor faz referências ao conteúdo

que foi trabalhado teoricamente, ligando-o às vivências dos alunos e pedindo que

eles realizem montagens livres, relacionadas ao tema estudado em sala,

utilizando as ripas, parafusos, discos, porcas e arruelas distribuídas, alertando

para a necessidade de a montagem incluir a possibilidade de realização de

medições. Noutras, disponibiliza aos alunos um protótipo do experimento a ser

trabalhado, um sistema modelo ou um dispositivo comercial, como balanças,

pêndulos, lançadores, brinquedos, quebra-nozes, ferramentas e outros, deixando

que eles observem e manipulem livremente o material, e depois pede que eles

projetem e construam um sistema semelhante e façam medições de grandezas

relacionadas ao tema discutido em sala de aula. Este modo de condução da aula

de laboratório afasta-se da abordagem convencional de atividades de

experimentação, que consiste normalmente na realização pelos estudantes de

uma sequência de etapas com a finalidade de demonstrar uma verdade já

conhecida (ROSITO, 2000), ao mostrar-se desafiadora, ao valorizar a criatividade,

e ao criar condições para que o problema investigado esteja associado a

situações reais da vida dos alunos.

Ao final do período os grupos apresentam seus trabalhos aos demais em

suas próprias mesas, com os cegos mais próximos da bancada. Os

apresentadores, cegos ou não, conduzem as mãos dos alunos cegos até a

montagem, permitindo que eles vejam os seus trabalhos e compartilhem suas

Page 191: Inovação, universidade e relação com a sociedade

190 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

impressões. As avaliações são realizadas de modo tradicional, porém incluindo

questões interpretativas compatíveis com a dinâmica de sala de aula, o que

permite que os alunos posicionem-se criticamente sobre o tema e suas

implicações no cotidiano, assim como sobre a metodologia empregada pelo

professor.

A grande autonomia e ludicidade oferecidas por este trabalho faz com que

os alunos trabalhem com afinco e dedicação, realizando experimentos

interessantes e criativos, independentemente de suas deficiências.

Ocasionalmente surgem problemas isolados, como alunos que se negam a

realizar uma experimentação proposta ou que, mesmo incentivados pelo

professor, alegam falta de inteligência, inaptidão para a experimentação,

dificuldades em trabalhar sem diretivas simples, ou desejo de ficar apenas

assistindo. Com paciência o professor respeita-os nessas atitudes e dá

assistência a eles, de maneira que esses mesmo alunos voltam a participar

ativamente em outras ocasiões, de modo que a negativa ocasional não

caracteriza exclusão. A tolerância e flexibilidade do professor, nestas ocasiões,

são ótimas conselheiras da ação, pois evitam que um problema temporário e

menor desencadeie reações que podem produzir danos emocionais irreversíveis

na relação professor-aluno-escola-física, transformando um pequeno obstáculo

em barreira insuperável. O professor que promove a inclusão precisa estar atento

à sua interioridade, reconhecendo as próprias limitações e agindo

empaticamente, pois isso diminui o risco de ocorrer uma reação

desproporcionadamente grande quando a atitude de um determinado estudante

toca questões não resolvidas na estruturação da personalidade do educador

(ROCHA FILHO, 2007).

Os experimentos, portanto, são realizados com a participação ativa de

quase todos, e essa interação com o outro é essencial para os processos

individuais de aprendizagem. Ao mesmo tempo, as atividades nos grupos são

permanentemente assistidas pelo professor, no exercício de seu papel de

mediador entre o estudante e o objeto a ser conhecido, no caso um conceito ou

uma lei da Física. Para Vygotsky (1995), desenvolver ações em cooperação com

outros jovens, ou auxiliado por um adulto, é forma de atuar na Zona de

Desenvolvimento Proximal, espaço em que a intervenção do outro possibilita que

o indivíduo avance e solucione questões que não conseguiria resolver sozinho,

Page 192: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 191

naquele momento. Há, portanto, o entendimento de que a organização da

atividade, a relação de cooperação subjacente ao processo, e o diálogo

empreendido no desenvolvimento da aula foram fatores decisivos para a

atribuição de sentido aos conceitos trabalhados e para a construção do

conhecimento nos diferentes conteúdos da Física.

Kamii (1988, 1992) considera que a autonomia moral, como capacidade de

decidir qual o melhor caminho a seguir, e intelectual, como capacidade do

educando de responsabilizar-se por suas aprendizagens, tornam-se factíveis em

condições claramente definidas de manejo por parte dos adultos. Na proposta

apresentada estão presentes condições para o desenvolvimento de autonomia

nos âmbitos citados, pois há incentivo à gestão das ações em grupo, à discussão

e posicionamento frequente por parte dos jovens, e à tomada de decisões,

impulsionada pela reflexão e pelo diálogo, que são permanentes e essenciais

para a instituição da independência moral. O diálogo entre os estudantes e com o

professor é garantido pela natureza da atividade e pelo clima de confiança e

liberdade presente em aula, e Freire (1996) destaca que a relação dialógica,

dentre outros fatores, é importante, pois o bom senso na utilização da liberdade é

obtido pelo jovem com o exercício de se confrontar com pessoas investidas de

autoridade, tais como pais e professores.

A autonomia intelectual é oportunizada pelo modo de agir do professor,

que encaminha as atividades de forma a incentivar o estudante a desenhar seu

projeto experimental, organizando o experimento e procurando informações e

recursos para promover as atividades. Estas ações tendem a resultar na

desacomodação do aluno do papel passivo de ouvir, repetir e copiar para a

condição ativa de elaboração própria e articulação entre os conhecimentos

(DEMO, 1998). Os objetivos de uma ação inclusiva, entre os quais a valorização

da diversidade e seu reconhecimento como elemento de enriquecimento de

todos, parecem ser alcançados na ação descrita. Há evidente melhoria do

autoconceito e da autoestima dos alunos quando trabalham desta forma, e

demonstram desenvolver sentimentos positivos, tais como segurança,

desinibição, autoconfiança e liderança.

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192 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Considerações Finais

Esta experiência demonstrou que a recomendação mais enfática dos

PCNs para o Ensino de Física – a contextualização – é uma importante aliada do

professor no processo ensino-aprendizagem para turmas inclusivas, e que um

simples conjunto de montagens em madeira, usado adequadamente, ajuda muito.

Houve progressos consideráveis, traduzidos em diferenças positivas de atitude

dos alunos em relação aos inícios dos anos letivos. Foi perceptível o incremento

na habilidade de manusear os materiais e partilhar com os colegas as

descobertas feitas nas atividades de experimentação. O incentivo que receberam

para a realização do projeto, a construção e a proposição de medições em suas

próprias montagens experimentais em Física parece aumentar a vontade de

aprender dos alunos. Como os estudantes têm habilidades manuais e imaginação

espacial em graus diferentes, sentem-se motivados a ajudar seu colegas nas

tarefas, desenvolvendo e utilizando a imaginação, o senso de responsabilidade, a

tolerância às limitações dos outros, a habilidade de ensinar e de aprender e, por

conseqüência, ampliam suas autoestimas. Houve aumento do interesse dos

alunos pela Física, e um substancial incremento da interação na experimentação

em sala de aula.

Exercer atividades que incentivem a aplicação criativa de idéias e a

construção e medição em montagens relacionadas aos conteúdos da Física

também têm aumentado o número e a complexidade dos projetos relacionados à

Física nas Feiras de Ciências da escola. A atividade investigativa trouxe a Física

para a vida dos alunos, fazendo com que a ciência ganhasse um caráter prático

que dificilmente se encontra neste nível de ensino. O envolvimento de alunos

cegos em turmas inclusivas em atividades de experimentação criativa tem se

mostrado uma excelente alternativa às aulas tradicionais de laboratório didático,

principalmente em função do uso de materiais simples e baratos, como o conjunto

descrito. Ao invés de simplesmente contemplar o conhecimento do professor ou

as informações dos livros, o estudo individual e as capacidades de abstração e

memorização, que desfavorecem o cego, esta atividade desloca o foco do

processo educativo para o estudante inteiro, valorizando também sua destreza

manual, sua capacidade criativa, suas habilidades de relacionamento e seu

comprometimento com o outro, fatores decisivos no estabelecimento de vínculos

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 193

dos conteúdos de Física com as vivências de cada um. Os resultados têm sido

recompensadores em termos de aprendizagem, talvez porque esta seja uma

forma interessante de oferecer a todos os alunos, independentemente de suas

diferenças, uma chance de descobrir uma aprendizagem útil dentro e fora da

escola, que pode ser atingida de maneira lúdica e interativa.

Esta metodologia continua sendo aplicada, e foi estendida também aos

alunos do Ensino Fundamental, para que estes recebam as primeiras noções de

Física de uma forma positiva, evitando que uma abordagem equivocada desperte

preconceitos que dificultem, posteriormente, a inserção dos estudantes na Física

do Ensino Médio. Agradecemos à PUCRS, à FAPERGS e à Escola Vicentina

Instituto Santa Luzia pela oportunidade de realização deste projeto inovador.

Referências

DEMO, Pedro. (1998) Educar pela pesquisa. Campinas: Autores Associados. FREIRE, Paulo. (1996) Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra. KAMII, C.; DECLARK, G. (1988) Reinventando a aritmética: implicações da teoria de Piaget. Campinas: Papirus. KAMII, C. (1992) Aritmética: Novas perspectivas. Implicações da Teoria de Piaget. Campinas: Papirus. LIMA, V. M. R. ; PAAZ, A. (2006) Reflexões sobre o ensino de Ciências na educação de jovens e adultos. Ciências & Letras - Revista da Faculdade Porto Alegrense. Ministério da Educação do Brasil (2002). PCN+Ensino Médio: Orientações Educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Ciências da natureza, matemática e suas tecnologias. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Brasília: MEC: SEMTEC. MEC/CNE/CEB (2007) Escassez de Professores no Ensino Médio. Relatório da Câmara de Educação Básica, do Conselho Nacional de Educação e do Ministério da Educação, de autoria de RUIZ, Antonio Ibañez; RAMOS, Mozart Neves; HINGEL, Murílio. http://portal.mec.gov.br/cne/ ROCHA FILHO, João Bernardes.; BASSO, Nara Regina de Souza ; BORGES, Regina Maria Rabello. (2007) Transdisciplinaridade – A Natureza Íntima da Educação Científica. Porto Alegre: EDIPUCRS. ROSITO, Berenice Alvares ; RAMOS, M. G. ; MORAES, Roque ; COSTA, R. ; BATISTA, J. ; GALIAZZI, M. C. . Construtivismo e ensino de ciências. 1. ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. VYGOTSKY, L. (1995) Pensamentos e linguagem. São Paulo: Martins Fontes.

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DESAFIO DE ROBÔS: INTEGRANDO A SOCIEDADE NO MUNDO DA ROBÓTICA

CHALLENGE OF ROBOTS: INTEGRATING THE SOCIETY IN THE WORLD OF

THE ROBOTICS

Fagundes, Rubem Dutra Ribeiro, PhD, Faculdade de Engenharia – PUCRS

[email protected]

Ramos, André Luiz Tietböhl, MsC, Faculdade de Engenharia - PUCRS

[email protected]

Resumo

O projeto Robótica na PUCRS busca inserir estudantes no mundo

tecnológico atual através da implementação de um intercâmbio entre a Faculdade

de Engenharia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e as

escolas de ensino médio e fundamental públicas e privadas, no sentido de

promover a popularização da ciência e da tecnologia, integrando, a esta proposta,

alternativas de desenvolvimento e capacitação de acadêmicos da Universidade,

preparação de professores das escolas para interagirem com a Robótica, bem

como o atendimento às necessidades de complementação do processo de ensino

e de aprendizagem dos alunos do ensino médio e fundamental. A principal

atividade do projeto é o Desafio de Robôs, promovido pela PUCRS há dez anos,

com expressiva participação de estudantes de diversas regiões do país.

Palavras-chave: Robótica, integração Universidade/escolas, novas estratégias

pedagógicas.

Abstract

PUCRS Robotics Project main purpose is to insert students in the

technology world through a cooperation program between the Engineering School

of PUCRS and public and private high schools. The main goal is to promote

science and technology among students in general, also offering alternative

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 195

activities to the university’s students and recycling to high school teachers,

complementing the teaching/learning process. The project’s main activity is the

Robot Challenge, promoted by PUCRS in the last ten years, with huge

participation of high school students and also students from other universities,

from different country regions.

Keywords: robotics, university/high schools integration, new pedagogic

strategies.

Introdução

A crescente modernização do sistema produtivo mundial a partir da década

de 1960, bem como a automação crescente dos processos de manufatura em

distintos setores, aliadas à definição de novos tipos de equipamentos com

crescente digitalização alterou profundamente a manufatura em nível mundial.

Surgiu um novo dispositivo automatizado de produção com repetibilidade

garantida, alto desempenho e alta confiabilidade que permitiu o aumento da

eficiência e consequentemente do lucro de sistemas produtivos. Este

equipamento é conhecido popularmente pelo nome robô. Um robô é um

equipamento eletro-mecânico para execução de diversas tarefas industriais, de

forma repetitiva, com grande confiabilidade e tem a capacidade de ser

logicamente configurado para a realização de tarefas, pois é programável.

A PUCRS foi pioneira na criação, organização e implementação do curso

de graduação de Engenharia de Controle e Automação no Rio Grande do Sul.

Neste curso a Robótica é utilizada como um dos fundamentos do processo de

aprendizagem profissional. A Robótica possui atividades acadêmicas, através de

competições, desenvolvidas em âmbito nacional e internacional, como o futebol

de robôs (promovida inicialmente pela Coréia do Sul e hoje realizada

internacionalmente), as olimpíadas de robôs (promovidas também na Coréia do

Sul), a competição First (USA), dentre outras. Em 1998, a PUCRS criou e

promoveu o 10 Desafio de Robôs como uma competição de alcance nacional e,

desde então, já ocorreram dez edições deste evento. O conceito teve como base

um projeto semelhante no MIT (Massachusetts Institute of Technology) que é a de

um competição que segue a idéia da disciplina 6.270 do MIT iniciada em 1987.

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196 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Após as conclusões adquiridas nos primeiros eventos foi decidido padronizar a

competição sendo que a partir desta decisão foi desenvolvido um dispositivo

denominado Handyboard que é uma placa de controle fundamentada no

microcontrolador 68HC11 da Motorola. O Desafio de Robôs da PUCRS utilizou a

Handyboard até sua 3a edição em 2001. A partir de então, foi permitida a

utilização de outros controladores como, por exemplo, o RCX da LEGO Corp.,

dentre outros.

O grande diferencial desta competição é que os robôs são autônomos,

logo há um grande esforço em fazer o melhor robô e consequentemente o melhor

programa de controle. Os alunos, assim, devem utilizar conceitos avançados de

lógica, pois necessitam elaborar sua estratégia, levando em consideração as

estratégias dos adversários e desta forma definir a melhor tática conforme as

regras estabelecidas na competição.

A robótica é considerada atualmente a “mola” de uma grande

transformação nos meios de produção, devido à sua versatilidade, em oposição à

automação fixa, ou hard automation, atualmente dominante na indústria (Castilho,

2002).

Os robôs, graças a seu sistema lógico computacional, podem ser

reprogramados e utilizados em uma grande variedade de tarefas. Porém não é a

reprogramação o fator mais importante na versatilidade desejada e sim sua

adaptabilidade às variações no seu ambiente de trabalho mediante um sistema

adequado de percepção e tratamento de informações (Ferreira, 1991).

A robótica também pode ser um instrumento adicional de aprendizagem

escolar, usado de forma tradicional como meio de desenvolvimento de intelecto

ou como um “veículo” de aprendizagem. Segundo Papert (1994) a escola está no

contexto da sociedade: "A mesma revolução tecnológica que foi responsável pela forte necessidade de aprender melhor oferece também os meios para adotar ações eficazes. As tecnologias de informação, desde a televisão até os computadores e todas as suas combinações, abrem oportunidades sem precedentes para a ação a fim de melhorar a qualidade do ambiente de aprendizagem."

Neste contexto, o aprendizado, sob a análise de Piaget (1973, 1980 e

1981), passa por assimilações e acomodações, situações que advém do meio

onde o sujeito está inserido. Certamente Piaget não desenvolveu sua teoria a

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 197

partir do ambiente computacional e da inteligência artificial existentes atualmente,

porém os princípios piagetianos parecem bastante atuais quando analisados sob

o prisma da robótica educacional. Em processos de assimilação e de

acomodação é que se estrutura o pensamento e, portanto, o comportamento da

pessoa frente a uma nova realidade. Através da experimentação a pessoa tenta

assimilar novos estímulos às estruturas cognitivas que já possui. Desta forma,

comparando e diferenciando conceitos e esquemas a pessoa efetua a operação

cognitiva da acomodação. Piaget (1987) definiu o processo de assimilação como

integração a estruturas prévias que podem permanecer invariáveis ou são mais

ou menos modificadas por esta própria integração, porém sem descontinuidade

com o estado precedente: assim não são destruídas, mas simplesmente

acomodam-se à nova situação (Piaget, 1981). Piaget (1981) também salienta que

o conceito acomodação é utilizado para toda modificação dos esquemas de

assimilação sob a influência de situações exteriores a que se aplicam. Maturana

(1995) intensifica a idéia de que o ambiente onde a pessoa está inserida

proporciona situações de aprendizagem e que somente é possível promover

situações de aprendizagem se existir no meio ambiente o fator a que se pretende

a interação, aspecto que salienta a importância da iniciativa da PUCRS de

introduzir a robótica no processo de aprendizagem.

O Projeto Robótica da PUCRS busca inserir o aluno no mundo tecnológico

atual. Através deste projeto procura-se promover a interação entre a Faculdade

de Engenharia da PUCRS (alunos e professores, nos níveis de graduação e pós-

graduação), outras instituições de ensino superior e ainda as escolas de ensino

médio e fundamental, pública ou privada, no sentido de estimular a popularização

da ciência e da tecnologia através dos princípios da Robótica.

Atualmente o Projeto Robótica da PUCRS possui todos recursos físicos

necessários em Robótica para sua execução sendo que tais recursos estão

localizados em um ambiente tradicional de engenharia - especificamente ao lado

de um laboratório de Manufatura Integrada por Computador (CIM) - onde existe a

possibilidade de interação com 5 robôs semi-industriais de médio porte.

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198 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Objetivos

O principal objetivo do Projeto Robótica, como já salientado, é promover a

interação entre alunos de diversas instituições e também de diferentes níveis de

ensino, como forma de divulgar o aprendizado da ciência e da tecnologia

interagindo com diversos níveis da sociedade. Tal aprendizado é crucial nos dias

de hoje, não apenas para o indivíduo, como forma de aumentar suas chances no

mercado de trabalho, mas também para o país, pois na Nova Divisão

Internacional do Trabalho, os países líderes serão aqueles que apresentarem

maior grau de desenvolvimento tecnológico, o que requer um expressivo

contingente de profissionais capacitados nesta área.

Para as instituições de ensino envolvidas, o Projeto Robótica pretende

contribuir com os processos de ensino e de aprendizagem através da introdução

de uma nova tecnologia de ensino (re-visitando os conceitos tradicionais da aula

prática), permitindo que os alunos descubram novas formas de aprender.

No que diz respeito ao desenvolvimento pessoal, as atividades do Projeto

Robótica visam aperfeiçoar nos alunos participantes os seguintes pontos:

• habilidades psicomotoras;

• relacionamento inter-pessoal;

• interesse e curiosidade pela investigação científica;

• criatividade, senso crítico e paciência;

• aptidão pelo trabalho em detalhes;

• conhecimentos de física aplicada dentre outros;

• senso crítico na aplicação de tecnologias ;

• interesse para o aprendizado de novas tecnologias por intermédio da

robótica.

Descrição do Processo de Inovação Desenvolvido

O Projeto Robótica teve início com o Desafio de Robôs, evento que atraiu

a atenção de alunos de vários níveis de ensino, desde o ensino fundamental até a

pós-graduação. Como decorrência surgiram algumas parcerias com escolas de

ensino médio para o desenvolvimento de projetos específicos de robótica, como

por exemplo o projeto PAX, em parceria com o Colégio Marista Rosário, para o

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 199

desenvolvimento de um “robô mascote” em forma de periquito, do tamanho de

uma criança das séries iniciais de ensino fundamental. Encontra-se em fase de

implantação um projeto de parceria entre a PUCRS e diversas escolas de ensino

médio para o desenvolvimento do ensino de robótica, com a criação de um

Laboratório de Robótica Educacional, a ser sediado na Faculdade de Engenharia

da PUCRS. Outro evento marcante foi o 4o Campeonato Nacional de Futebol de

Robôs, realizado em 1999, com organização conjunta da PUCRS e do CTI/MCT,

com participação de equipes de São Paulo e Minas Gerais além de equipes

gaúchas.

Cabe ressaltar que o carro chefe do Projeto Robótica tem sido o Desafio

de Robôs, realizado já há dez anos, com intensa participação de escolas de

ensino médio e também de universidades de vários estados brasileiros.

O Desafio de Robôs consiste em uma competição de robôs autônomos

que realizam uma tarefa pré-definida em determinado espaço de tempo. O

objetivo do Desafio não é promover a destruição do adversário. Os robôs não

lutam, eles tentam realizar uma tarefa de forma mais eficiente que o robô

oponente. O ponto principal é que os robôs são autônomos, ou seja, não são

rádio controlados, sendo que é necessário criar um programa capaz de receber

status e interagir com o meio através de sensores e atuadores (os sensores

podem ser de inclinação, de presença de luz, de contagem de pulsos, de

aproximação, entre outros e os atuadores são motores, dispositivos mecânicos,

esteiras, braços mecânicos, etc).

A tarefa a ser executada é alterada a cada edição do Desafio e, ao longo

de seus dez anos de existência, o Desafio de Robôs já teve as seguintes tarefas:

• no primeiro desafio a tarefa foi “Robot Ant” ou Robôs Formigas, onde os

robôs representavam formigas recolhendo comida para seu formigueiro;

• no segundo desafio a tarefa foi o “Robot Pong” onde a mesa de

competições era dividida em duas partes e nela eram espalhadas bolas

de golf. Vencia o robô que terminasse com menos bolas no seu lado;

• o terceiro desafio representava uma Mina Abandonada com minério

radioativo e os robôs ganhavam pontos ao recolher minério e perdiam

pontos ao recolher lixo;

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200 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

• o quarto, o quinto e o sexto desafios tratavam de um Campo Repleto de

Explosivos, mas cada desafio possuía sua peculiaridade, como por

exemplo, no penúltimo havia um ponto sobre o campo no qual era

possível desarmar todos os explosivos;

• no sétimo e no oitavo desafios, a tarefa era um jogo de basquete,

somente entre dois robôs;

• o nono e o décimo desafios propuseram uma tarefa de inteligência e

estratégia: sobre a mesa estavam dispostos bolas e paralelepípedos a

serem recolhidos pelos robôs, cada qual com uma pontuação

predeterminada. O Robô vencedor seria aquele que obtivesse mais

pontos ao final do jogo.

Por traz da realização, da criação e da avaliação dos Desafios existe uma

comissão organizadora, criada com o intuito de agilizar as tomadas de decisões

relativas ao desafio, composta atualmente pelos professores da PUCRS André

Luiz Tietböhl Ramos (idealizador do Desafio de Robôs da PUCRS) e Rubem

Dutra Ribeiro Fagundes (que participa desde a segunda edição), e pelos

funcionários técnicos Filipi Damasceno Vianna e Tiago Leonardo Broilo. Além

destes, a cada ano alguns alunos da PUCRS (graduação e pós-graduação)

participam desta comissão. Entretanto, é uma tradição do Desafio que decisões

relativas à tarefa que os robôs devem cumprir, prazos, compra de material em

conjunto, sejam tomadas por um conselho composto por membros de todas as

equipes participantes. Este conselho é chamado de Conselho de Equipes.

O Desafio de Robôs é um evento aberto ao público, com entrada franca, e

aconteceu inicialmente durante a Semana de Engenharia da Faculdade de

Engenharia da PUCRS, sendo que nos dois últimos anos ele foi realizado durante

a Feira das Profissões da PUCRS.

Resultados Obtidos

O Projeto Robótica, e mais especificamente, o Desafio de Robôs,

promoveram uma expressiva aproximação entre escolas, principalmente alunos

de diferentes níveis do ensino, sendo que a partir deste contato, realizado no

desafio, a PUCRS passou a auxiliar algumas escolas no ensino de robótica.

Paralelamente, o número de escolas participantes no Desafio vem crescendo,

Page 202: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 201

denotando que este evento vem cumprindo sua proposta de divulgar o estudo de

ciência e desenvolver o interesse dos jovens no desenvolvimento de tecnologia.

Diversos alunos de ensino médio, ao concluírem seus estudos ingressaram

em Universidades em carreiras ligadas à engenharia e à computação e

continuaram participando do Desafio, agora com equipes de alunos de

graduação, o que têm incentivado as novas equipes de ensino médio.

A contribuição do Desafio para o ensino não se restringiu apenas aos

acadêmicos, diversos professores, motivados pelo entusiasmo de seus alunos,

têm procurado aperfeiçoar-se, de forma a poder prestar uma contribuição efetiva

para as equipes e não ser apenas o professor responsável pela saída dos alunos

da sala de aula, aquele que só assina os papéis necessários à participação das

equipes.

No tocante ao ensino de graduação da PUCRS o Desafio tem oferecido

aos discentes das diversas Engenharias (Elétrica, de Controle e Automação e da

Computação) uma oportunidade de colocar em prática, de forma integrada, os

conhecimentos adquiridos em diversas disciplinas, o que tem se mostrado

altamente motivante, pois muitas vezes os conteúdos aprendidos ao longo do

curso eram apenas temporariamente “arquivados” sem que os alunos

percebessem o potencial de integração destes conteúdos, ou seja a integração da

teoria com a prática e do concreto com o abstrato.

Considerações Finais

O Desafio de Robôs foi uma iniciativa pioneira da PUCRS, que além de

promover a integração entre a Universidade e as escolas, aproximou também

alunos de diferentes universidades, de várias regiões do país, com realidades e

hábitos culturais diversos.

A iniciativa do Projeto Robótica da PUCRS despertou nos adolescentes e

jovens o interesse pela robótica. Atualmente, a maior parte das escolas

particulares (e até mesmo algumas escolas públicas) mantém laboratórios de

robótica e participam de diversos campeonatos, alguns até internacionais, em

diferentes modalidades e com diferentes tipos de robôs.

Um dos grandes diferenciais do Desafio de Robôs da PUCRS é o fato de

que todas as equipes participam da disputa em igualdade, pois são necessários

Page 203: Inovação, universidade e relação com a sociedade

202 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

não apenas conhecimentos técnicos e de programação, mas também o

desenvolvimento de estratégias, favorecendo o raciocínio lógico. Em algumas

edições, equipes do ensino médio venceram equipes de universitários e até de

alunos de pós-graduação, o que pode ser explicado pelo fato de que se os

universitários dispõem de maior conhecimento técnico, os alunos do ensino médio

dispõem de mais tempo livre para dedicar-se ao projeto, estimulando assim a

dedicação e a perseverança além de uma criatividade mais aguçada.

Atualmente a meta dos organizadores deste evento é procurar possibilitar

a participação de alunos carentes. Neste sentido, está se buscado patrocinadores

que financiem os custos de aquisição dos componentes dos robôs e também a

criação de um Laboratório de Robótica Educacional, com infraestrutura para

receber estes alunos e seus professores, de forma que os equipamentos

adquiridos possam ser compartilhados por várias escolas. Tal laboratório serviria

como base para as equipes destas escolas, e nele também seriam desenvolvidas

outras atividades ligadas ao ensino de ciência e tecnologia, possibilitando ao

aluno carente a participação em atividades extra-curriculares.

Referências Bibliográficas

Castilho, Maria Inês. Robótica na Educação: com que objetivos? Monografia de Pós-Ggraduação da Informática, UFRGS, 2002. Ferreira, Edson de Paula. Robótica Básica, Modelagem de Robôs. 1991. Papert, Seymour. A máquina das crianças: repensando a escola na era da informática. Artes Médicas, 1994. Piaget, Jean. Lógica e Conhecimento Científico. Livraria Civilização, 1981. Piaget, Jean. Para onde vai a Educação? José Olympio, 1980. Piaget, Jean. Biologia e Conhecimento. Vozes, 1973. Piaget, Jean. Desenvolvimento e Aprendizagem, volume Disponível em Introdução aos Sistemas Especialistas. Livros Técnicos e Científicos Editora, 1987. Maturana, Humberto R. A árvore do conhecimento: as bases biológicas do entendimento humano. Psy II, 1995.

Page 204: Inovação, universidade e relação com a sociedade

ENADE COMENTADO-COMPUTAÇÃO: COMPARTILHANDO CONTRIBUIÇÕES PARA A AVALIAÇÃO DE CURSOS

COMMENTS TO ENADE-COMPUTER SCIENCE: A CONTRIBUTION FOR

EVALUATION OF UNDERGRADUATE PROGRAMS

Oliveira, Flávio M.; Dr.; FACIN – PUCRS

[email protected]

Prolo, Carlos A.; Dr.; FACIN – PUCRS

[email protected]

Zorzo, Avelino F.; Dr.; FACIN – PUCRS

[email protected]

Andrade, Gilberto K.; Dr.; FACIN – PUCRS

[email protected]

Resumo

Nos últimos anos, temos notado uma crescente demanda da sociedade,

em conhecer o resultado da avaliação de estudantes não somente em relação a

um determinado conteúdo, mas a um conjunto de conteúdos. Os estudantes de

cursos de graduação, ingressantes ou concluintes, são avaliados através do

Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE). Durante a preparação

para o ENADE 2008, os professores da FACIN constataram que os alunos têm

procurado provas já realizadas como fonte de consulta por diversos motivos: seja

para sentirem-se seguros quando da realização da prova, para verificar em que

áreas não possuem determinado conhecimento, como fonte de exercícios para os

cursos que estão realizando, ou mesmo por simples curiosidade. Diversas vezes

os estudantes trazem as questões para os professores no sentido de entender as

respostas apresentadas. Essa constatação motivou o grupo de professores a

consolidar a análise das questões na forma de um livro e disponibilizá-lo à

comunidade. Este artigo descreve a criação do e-book “ENADE 2008 Comentado:

Computação”, que é o resultado dessa experiência. Apresentamos o contexto em

que surgiu a ideia, o processo de elaboração do livro e as perspectivas para a

continuidade do trabalho.

Page 205: Inovação, universidade e relação com a sociedade

204 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Palavras-chave: Exame Nacional de Desempenho, avaliação de cursos de

graduação, currículos de Computação.

Abstract

In recent years, the Brazilian society has demanded for increased

knowledge of the evaluation results achieved by students in university courses,

not only in a specific subject, but in more broad disciplines and skills as well. The

National Students’ Performance Evaluation (Exame Nacional de Desempenho dos

Estudantes – ENADE) is the standard test for undergraduate students at junior

and senior levels. During the preparation for the ENADE 2008 Computer Science

test, professors from the Faculty of Informatics (FACIN) identified that students

requested additional information sources, such as early tests, for several reasons,

such as, to use the questions as exercises for their disciplines, reassurance before

doing the test, and even simple curiosity. Many students brought the questions to

their professors seeking advice in order to understand the questions and their

answers. The high level of interaction and interest found in students motivated us

to gather the discussions in a book format and make it available to the community.

In this paper, we describe the conception of the e-book “ENADE 2008

Comentado: Computação” (ENADE 2008 Commented: Computer Science), which

is the result of this initiative. We describe here the context of the book idea, the

design and writing process and our next steps.

Keywords: National Students’ Performance Evaluation, evaluation of

undergraduate degree programs, Computer Science curricula.

Introdução

A avaliação de estudantes tem sido prática há muitos anos como forma de

verificar o aprendizado dos alunos em relação a determinados conteúdos. Nos

últimos anos, temos notado uma crescente demanda, da própria sociedade, em

conhecer o resultado da avaliação de estudantes não somente em relação a um

determinado conteúdo, mas a um conjunto de conteúdos. Essas avaliações

buscam trazer informações sobre a formação de um determinado estudante nas

diversas instituições existentes no Brasil (o mesmo processo também acontece

Page 206: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 205

em diversos outros países). Na área de Computação as principais instituições de

ensino superior do Brasil com programas de pós-graduação sentiam a

necessidade de uma avaliação global de estudantes dos cursos de Computação.

Como a área não possuía um sistema de avaliação nacional, o Fórum de

Coordenadores de Pós-Graduação, um Grupo de Trabalho da Sociedade

Brasileira de Computação (SBC), propôs uma avaliação para todos os alunos que

desejassem concorrer a uma vaga em um programa de pós-graduação em

Computação no Brasil. Esta avaliação recebeu o nome de POSCOMP e é

realizada há diversos anos pela SBC. A necessidade desta avaliação surgiu para

que o processo de seleção fosse o mais justo possível, pois, em geral, a média

final de cada aluno difere muito de instituição para instituição. Entretanto, o

POSCOMP é uma avaliação individualizada, na qual os resultados não são

divulgados de maneira ampla e é realizada de maneira voluntária, não servindo

para um processo de avaliação de cursos ou institucionais de maneira ampla.

Para uma avaliação mais geral, no Brasil existem duas principais avaliações

oficiais realizadas com estudantes que finalizam o Ensino Médio ou Ensino

Superior. Quando terminam o Ensino Médio, os estudantes são avaliados por

meio do Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM). Por outro lado, os estudantes

ingressantes (aqueles que já realizaram de 7% a 22% da carga horária do curso)

ou concluintes (aqueles que já realizaram pelo menos 80% da carga horária do

curso) de algum curso de graduação são avaliados através do Exame Nacional

de Desempenho de Estudantes (ENADE). O ENADE faz parte do Sistema

Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) e busca aferir o

rendimento dos estudantes dos cursos de graduação das Instituições de Ensino

Superior no Brasil. Tal importância é dada ao ENADE pelo MEC, que o aluno

selecionado a participar tem sua formatura condicionada ao efetivo

comparecimento à prova, e atualmente cogita-se em universalizar a participação

do ENADE, tornando-o obrigatório a todos os estudantes.

O e-book “ENADE 2008 Comentado: Computação” (figura 01) surgiu de

um senso comum, existente entre os professores da FACIN, de que os alunos

têm procurado provas já realizadas como fonte de consulta por diversos motivos:

- para sentirem-se seguros quando da realização do ENADE;

- para verificar em que áreas não possuem determinado conhecimento;

- como fonte de exercícios para os cursos/disciplinas que estão realizando;

Page 207: Inovação, universidade e relação com a sociedade

206 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

- ou mesmo por simples curiosidade.

Apesar de indicar para os estudantes onde encontrar as provas e

resultados, diversas vezes os estudantes trouxeram as questões para os

professores no sentido de entender a resposta apresentada, seja pessoalmente

ou nos foruns de discussão das disciplinas. Os professores envolvidos

constataram que essa interação, esperável e encorajada, merecia ser

compartilhada com uma comunidade mais ampla através um registro formal das

respostas.

Figura 01 – Capa do e-book

Page 208: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 207

As próximas seções descrevem os objetivos da concepção do e-book, seu

processo de elaboração, os resultados da experiência e os próximos passos.

Objetivos

Os objetivos da elaboração do e-book foram:

- fornecer material de referência para os estudantes de graduação em

Computação;

- consolidar um registro das lições aprendidas e discussões propiciadas

pela preparação ao ENADE 2008 na comunidade docente/discente da

FACIN

- contribuir para o aperfeiçoamento do ENADE como referência de

avaliação em Computação.

Ao mesmo tempo, professores também poderão utilizar o mesmo para

enriquecer o material utilizado em sala de aula.

Descrição do processo

O processo de preparação para o ENADE 2008 na FACIN teve diversas

atividades, de maneira integrada a um processo mais geral que envolveu a

Universidade como um todo, dirigido pela Coordenadoria de Avaliação da

PROGRAD. No caso da FACIN, a preparação envolveu:

- Reuniões gerais com os alunos candidatos a fazer parte da amostra,

visando esclarecer o funcionamento da prova e conscientizar os

estudantes da sua importância;

- Criação de diversos fóruns no ambiente Moodle, para comunicação entre

os coordenadores de cursos e os alunos candidatos (e posteriormente

selecionados), bem como entre os alunos e os professores das diversas

áreas;

- Palestras sobre os conteúdos gerais, promovidas pela Coordenadoria de

Avaliação da PROGRAD;

- Discussões sobre questões do ENADE 2005 em sala de aula, antes da

prova, e sobre a edição 2008, após a sua realização.

Muitas das discussões sobre a necessidade de fontes de consulta para os

alunos aconteceram na sala de convivência dos professores da Faculdade de

Page 209: Inovação, universidade e relação com a sociedade

208 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Informática (FACIN) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

(PUCRS). Essas discussões aconteciam entre os intervalos de aula, quando o

professor Gilberto Keller de Andrade propôs um desafio ao conjunto de

professores: que os mesmos respondessem às questões do ENADE de maneira

comentada e juntassem essas respostas em um livro para consulta dos

estudantes.

O ENADE-Computação é composto por uma prova, um questionário de

impressões dos estudantes sobre a prova, um questionário socioeconômico e um

questionário do coordenador do(a) curso/habilitação. A prova é composta por 40

questões, sendo 10 questões de formação geral e 30 questões de componente

específico. No livro, apresentamos as questões do componente específico das

provas aplicadas aos alunos dos três cursos da área de Computação (Ciência da

Computação, Engenharia de Computação e Sistemas de Informação). As

questões estão assim distribuídas:

• 10 questões comuns aos três cursos;

• 20 questões particulares de cada curso (70 questões no total da obra).

Optou-se por não abordar no livro as 10 questões de conhecimentos gerais

comuns a todas as provas.

O livro contou com o apoio de 43 professores das Faculdades de

Informática, de Engenharia e de Matemática, incluindo uma apresentação do prof.

Avelino Zorzo, Diretor da FACIN. A organização das questões de cada uma das

provas foi realizada pelos professores Carlos Augusto Prolo (questões comuns e

do curso de Ciência da Computação), Fabiano Passuelo Hessel (questões do

curso de Engenharia de Computação) e Miriam Sayão (questões do curso de

Sistemas de Informação). Os professores foram orientados a responderem de

maneira livre, sem seguir um padrão predeterminado, podendo trabalhar questões

conceituais em suas respostas ou até observações críticas quanto à formulação

das questões. Algumas questões foram respondidas não por um único professor,

mas por um conjunto de professores que discutiram a melhor forma de responder

às mesmas. Após essa etapa, as respostas passaram por uma revisão dos

organizadores e uma revisão final na editora.

Page 210: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 209

A título de exemplo, apresentamos abaixo a questão 79a da prova e a

resposta/comentário incluídos no livro:

Texto para as questões 78 e 79

A Secretaria de Saúde de determinado município está executando um

projeto de automação do seu sistema de atendimento médico e laboratorial,

atualmente manual. O objetivo do projeto é melhorar a satisfação dos usuários

com relação aos serviços prestados pela Secretaria. O sistema automatizado

deve contemplar os seguintes processos: marcação de consulta, manutenção de

prontuário do paciente, além do pedido e do registro de resultados de exame

laboratorial. A Secretaria possui vários postos de saúde e cada um deles atende a

um ou mais bairros do município. As consultas a cada paciente são realizadas no

posto de saúde mais próximo de onde ele reside. Os exames laboratoriais são

realizados por laboratórios terceirizados e conveniados. A solução proposta pela

equipe de desenvolvimento e implantação da automação contempla, entre outros,

os seguintes aspectos:

sistema computacional do tipo cliente-servidor na web, em que cada

usuário cadastrado utiliza login e senha para fazer uso do sistema;

uma aplicação, compartilhada por médicos e laboratórios, gerencia o

pedido e o registro de resultados dos exames. Durante uma consulta o

próprio médico registra o pedido de exames no sistema;

uma aplicação, compartilhada por médicos e pacientes, permite que

ambos tenham acesso aos resultados dos exames laboratoriais;

uma aplicação, compartilhada por médicos e pacientes, que automatiza o

prontuário dos pacientes, em que os registros em prontuário, efetuados

por cada médico para cada paciente, estão disponíveis apenas para o

paciente e o médico específicos. Além disso, cada médico pode fazer

registros privados no prontuário do paciente, apenas visíveis por ele;

uma aplicação, compartilhada por pacientes e atendentes de postos de

saúde, que permite a marcação de consultas por pacientes e(ou) por

atendentes. Esses atendentes atendem o paciente no balcão ou por

telefone.

Page 211: Inovação, universidade e relação com a sociedade

210 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

QUESTÃO 79 – DISCURSIVA

Considerando as informações apresentadas no texto e considerando ainda

que entre os principais benefícios de um projeto de melhoria de sistema de

informação destacam-se o aumento da: (I) eficiência; (II) eficácia; (III) integridade;

e (IV) disponibilidade, faça o que se pede a seguir.

QUESTÃO 79 – A

(valor: 5,0 pontos) (A) Cite 4 vantagens da solução proposta, frente à atual, para tratar a interação

entre pacientes e os serviços de saúde, sendo duas delas relativas à

eficiência e duas relativas à eficácia.

Resposta e comentário:

Seguindo [Sommerville07], eficiência e eficácia são requisitos não

funcionais, dado que não são exatamente funcionalidades a serem atendidas pela

aplicação, e sim características que devem ser observadas na solução

implementada. Eficácia implica no atendimento de objetivos; eficiência está

relacionada a requisitos de desempenho (por exemplo, tempo de resposta em

sistemas interativos) e requisitos de espaço (espaço ocupado pela aplicação em

memória principal ou secundária).

Assim, com relação à eficácia, analisemos os objetivos:

1. melhorar a satisfação dos usuários com relação aos serviços;

2. automatizar marcação de consulta;

3. automatizar manutenção do prontuário do paciente;

4. automatizar pedido e registro de exame laboratorial.

Assim, são vantagens relativas à eficácia (a questão pede duas):

• o sistema provê uma aplicação para gerenciar o pedido e registro de

resultados dos exames (atende ao objetivo 4 acima)

• o sistema provê uma aplicação que permite aos médicos e pacientes

acesso aos resultados dos exames (apoia os objetivos 1 e 3 acima)

• o sistema provê uma aplicação que automatiza o prontuário dos

pacientes (atende ao objetivo 3 acima)

Page 212: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 211

• o sistema provê uma aplicação que permite a marcação de consultas

(atende ao objetivo 2 acima)

O “padrão de resposta” para as questões discursivas, na página do

ENADE foca no objetivo principal de satisfação do usuário, e cita como vantagens

que o paciente não precisará se deslocar até o posto de atendimento para marcar

consultas, nem ao laboratório para ter acesso aos exames. (Foi observado que o

texto não deixa claro se a satisfação do usuário de fato aumentou.)

São vantagens relativas à eficiência (também são pedidas duas):

• o sistema cliente-servidor permite acesso remoto fácil às aplicações por

todos os envolvidos no processo

• o próprio médico registra o pedido de exames, eliminando intermediários

e agilizando o processo

• a marcação de consultas pode ser feita pelo próprio paciente ou por

atendentes, e neste último caso com opção de ser feita no balcão ou por

telefone (na verdade isto também atende diretamente ao objetivo

principal de satisfação do cliente)

• o acesso às aplicações é compartilhado pelos diversos envolvidos no

processo

O “padrão de resposta” para as questões discursivas, na página do

ENADE também cita:

• menor quantidade de pessoas no atendimento à marcação de consultas

• maior quantidade de consultas realizadas por um médico em um mesmo

período de tempo

• menor tempo para marcação de consultas

• menor tempo para registro de prontuário pelo médico

• menor tempo de pedido de exames

• menor tempo no processamento do pedido de exame pelo laboratório

• menor tempo no registro do exame pelo laboratório

O processo de elaboração dessa resposta foi particularmente interessante,

pois teve o mais alto número de professores envolvidos (9 professores). A

questão envolve termos (eficiência/eficácia) que, não obstante serem usados

quase como sinônimos no cotidiano, receberam acepções distintas em

Computação. O debate originado foi dos mais ricos.

Page 213: Inovação, universidade e relação com a sociedade

212 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Resultados obtidos

O livro "ENADE Comentado 2008 - Computação" foi lançado em abril pela

EDIPUCRS na forma de publicação eletrônica e está disponível para acesso livre

no endereço http://www.pucrs.br/edipucrs/ - "publicações eletrônicas". Dessa

forma, o público-alvo prioritário da iniciativa, que são os próprios estudantes, tem

acesso facilitado. A Pró-Reitoria de Graduação da PUCRS, através da

EDIPUCRS, transformou a iniciativa em uma série, da qual o livro elaborado na

FACIN é o primeiro volume.

Considerações finais

Até onde sabemos, pelo menos na área de Computação, a iniciativa é

inovadora no país. Além de fornecer um material extremamente útil para os

estudantes, tanto como auxiliar na preparação dos candidatos ao ENADE

propriamente dito como para o aprendizado nas disciplinas, a riqueza das

discussões realimentou a prática pedagógica dos professores da FACIN, que

puderam levar os comentários para a sala de aula e, também, incrementar seus

materiais. Cada questão, acompanhada de sua resposta, propiciou um exemplo

de como abordar um mesmo conteúdo por diversos ângulos, incentivando os

alunos a desenvolver essa habilidade, tão importante para o aprendizado.

Acreditamos que o livro também pode contribuir para a construção das

provas de Computação nas próximas edições do ENADE; assim, pretendemos

divulgá-lo no âmbito da Comissão de Educação da Sociedade Brasileira de

Computação, pois essa Comissão é o fórum nacional de discussão das diretrizes

curriculares e currículos de referência da área, os quais servem de base para a

elaboração do ENADE. Outra direção proposta para a continuidade do trabalho é

gerar uma publicação análoga para a prova de 2005.

Bibliografia consultada

Prolo, C.A.; Sayão, M.; Hessel, F.P. ENADE 2008 Comentado: Computação. Porto Alegre, EDIPUCRS, 2008. 184p. Disponível em <http://www.pucrs.br/edipucrs/enade/computacao2008.pdf>. Acesso em: 18 mai. 2008.

Sommerville, Ian. Engenharia de software. 8. ed. São Paulo : Pearson Education, c2007. 552 p. : il.

Page 214: Inovação, universidade e relação com a sociedade

PORTO ALEGRE ACESSÍVEL: ESTRATÉGIAS INOVADORAS PARA A POLÍTICA DE ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO SOCIAL

ACESSIBILITY IN PORTO ALEGRE, BRAZIL:

INCLUDING PEOPLE BY INNOVATION IN URBAN PLANNING

Ferreira, Mario S., Dr., FAUPUCRS

[email protected]

Cé, Ana R.S., Me., FAUPUCRS

[email protected]

Campos, José C. B., Me., FAUPUCRS

[email protected]

Moraes, João F.D., Dr., FAMAT

[email protected]

Barboza, Suzana C., Esp., FAUPUCRS

[email protected]

Regal, Paulo H., Me, FAUPUCRS

[email protected]

Resumo

O documento descreve ações inovadoras para o estabelecimento de

políticas de acessibilidade em Porto Alegre, à luz de informações levantadas,

através de método científico, acerca de condições críticas para a rota acessível

da população, considerando as características, peculiaridades e limitações dos

grupos humanos da Cidade. Ao final, o texto aponta para oportunidades de

utilização do conhecimento gerado na pesquisa, além do objetivo principal da

pesquisa, qual seja, a fundamentação para um plano diretor de acessibilidade

para Porto Alegre.

Palavras-chave: acessibilidade, acessibilidade urbana, inovação urbana.

Page 215: Inovação, universidade e relação com a sociedade

214 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Abstract

The document describes innovation actions for the establishment of

accessibility politics in Porto Alegre, based in a raised information, through

scientific method, concerning critical conditions for the accessible route of the

population, considering the characteristics, peculiarities and limitations of the

human groups of the City. In the end, the text points for the chances of use of the

knowledge generated in the research, beyond the main objective of the research,

which is, to give tools for a accessibility urban planning for Porto Alegre.

Keywords: accessibility. urban accessibility, urban inovation.

A Demanda por Investigação: A Obsolescência das Cidades.

As mudanças trazidas pela revolução digital iniciada nos anos setenta

provocaram profundas transformações no modo de produção da cultura material

humana e, por conseguinte, trouxeram reflexos profundos no cenário global, do

ponto de vista dos modelos econômicos, políticos e sócio-culturais até então

adotados. Pode-se afirmar que a civilização encontra-se, hoje, num ponto de

inflexão, na medida em que paradigmas e dogmas vêm sendo substituídos,

discutidos e alterados.

O reflexo físico desta obsolescência é demonstrado na configuração das

grandes cidades, concentrando a mobilidade urbana no uso do automóvel. Novas

áreas de conhecimento e pesquisa surgem e, neste particular, áreas

tradicionalmente estabelecidas recebem novos nomes e significados. Neste

cenário de transição, ocorrem com freqüência confusões entre temas (ênfases e

diretrizes de projeto adotados) com áreas tradicionais de conhecimento.

A partir do final dos anos oitenta, o tema acessibilidade passa a integrar

áreas de pesquisa, ênfases de projeto e assume caráter oficial com a edição no

Brasil de normas específicas aplicáveis ao assunto. Sob o título NBR9050 -

Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos (ABNT,

2005), apresenta um conceito atual de acessibilidade: “... visa proporcionar à maior quantidade possível de pessoas, independentemente de idade, estatura ou limitação de mobilidade ou percepção, a utilização de maneira autônoma e segura do

Page 216: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 215

ambiente, edificações, mobiliário, equipamentos urbanos e elementos.”

Segundo Castro (2008), muitas das grandes e médias cidades brasileiras

apresentam configurações urbanas estabelecidas no período colonial. Estas, por

sua vez, apresentavam características de apropriação física do espaço segundo

modelo europeu do período medieval, com adaptação livre aos condicionantes

geográficos, com edificações desenvolvidas em altura e divisão em bairros

compactos. Benévolo (1997) demonstra que, com a inserção do automóvel no

ambiente urbano, no início do século vinte, o pedestre desloca-se para

extremidades das vias (calçadas) e o passeio passa a ocupar só a calçada. Desta

forma, as ações desenvolvidas para dotar as cidades atuais de condições de

acessibilidade, são, na realidade, exercícios de adaptação e adequação de

cidades com configuração do medievo.

Figura 1 - Constantinopla tomada pelos turcos, em 1435: profundas alterações urbanas, ascensão

da burguesia, assentamentos em torno dos castelos feudais, modelo físico das cidades atuais. Fonte: Benevolo, 1997.

A inadequação das calçadas para uso de equipamentos e produtos de uso

pessoal é outro ponto fundamental, na qualidade de uso do espaço destinado ao

pedestre nas cidades. A População com Mobilidade Reduzida (PMR) limita-se, na

maioria dos casos a uma condição de uso pleno destes produtos (órteses como

muletas, bengalas, etc.) em ambientes internos. Os carrinhos – de – bebê e

cadeiras de rodas, em sua maioria projetados e fabricados hoje, apresentam

Page 217: Inovação, universidade e relação com a sociedade

216 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

dificuldades de mobilidade em rampas e rebaixos de meio-fio, adaptados nas ruas

medievais do século XXI.

O Projeto Porto Alegre Acessível

A partir de março de 2008, a equipe de pesquisadores da FAUPUCRS,

envolveu-se no projeto denominado Diagnóstico das Condições de Acessibilidade

de Porto Alegre, em atendimento ao convênio celebrado entre o Município de

Porto Alegre, com interveniência da Secretaria Especial de Acessibilidade e

Inclusão Social - SEACIS, e a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do

Sul, através da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.

Figura 2 – Imagem adotada no vestuário de identificação no levantamento de campo e no material

da pesquisa.

O cronograma do projeto de pesquisa, denominado Porto Alegre-

Acessível, previu em sua gênese a execução da investigação em três etapas: o

levantamento na Área Central (com limites definidos pela 1ª. Perimetral de Porto

Alegre), o levantamento nas demais áreas urbanas do Município e a elaboração

de um diagnóstico das condições de acessibilidade da Capital.

Page 218: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 217

A definição dos procedimentos, para a obtenção dos objetivos propostos

para a investigação, orientou-se pelas premissas do Programa Brasileiro de

Acessibilidade Urbana, de junho de 2004: “Incluir uma nova visão no processo de construção das cidades que considere o acesso universal ao espaço público por todas as pessoas e suas diferentes necessidades” (Caderno 1 – Brasil Acessível, 2006).

Assim, ficou definido previamente pelo grupo de pesquisa que: Acessibilidade é uma situação de utilização de ambientes públicos e privados, em condição de conforto e segurança, através do provimento de dispositivos de circulação e mobilidade, oferta de produtos, serviços e sistemas de informação destinados aos diversos grupos de usuários dos ambientes urbanos. Incluem as pessoas com deficiência e necessidades especiais, idosos, crianças e população adulta em geral (Ferreira et al., 2007).

Buscou-se, desta forma, concentrar ações para a identificação de

situações de acessibilidade reduzida/prejudicada para a população em geral.

Procedeu-se, paralelamente aos estudos iniciais para compreensão e

percepção do porte do levantamento, sistema de inscrição, pré-seleção via

histórico escolar e entrevista e contratação de 30 estagiários, junto ao corpo

discente do curso de Arquitetura e Urbanismo da FAUPUCRS, para constituição

de equipes de levantamento, com preenchimento de formulários e registro

fotográfico, sob supervisão dos quatro pesquisadores envolvidos nesta

investigação inédita.

Modelagem e Estruturação de Instrumentos de Levantamento e Coleta de Dados

Foram desenvolvidos estudos e buscas de referências bibliográficas que

orientassem a montagem e edição de um instrumento adequado ao município. Do

ponto de vista da terminologia, buscaram-se informações nas normas

internacionais, normas brasileiras, na legislação municipal, além da informação

disponibilizada pela Secretaria Municipal de Acessibilidade e Inclusão Social -

SEACIS e na fundamentação teórica dos campos de conhecimentos específicos

de acessibilidade e mobilidade urbana (arquitetura e urbanismo; transporte;

circulação urbana; sistema de informação e orientação), complementares

Page 219: Inovação, universidade e relação com a sociedade

218 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

(ergonomia; design; engenharia; paisagismo; avaliação pós-ocupação urbana;

legislação) e interdisciplinares compromissados com à pesquisa (educação e

saúde, sociologia e política urbana, ética e estética).

A partir da informação levantada, a estruturação do instrumento de

levantamento (formulário) concentrou-se em itens essenciais para análise

proposta, dentre os quais destacam-se calçadas, rebaixos em calçadas,

mobiliário e equipamentos nas calçadas, vegetação, obstáculos de

direcionamento de circulação (container,tapumes e canteiros de obras, tampas de

caixas de inspeção, placas de sinalização de trânsito, bancas, guaritas de

vigilância, abrigos em pontos de embarque e desembarque de transporte (ônibus

e táxi) ;e o sistema viário.

As Áreas de Intervenção: O Levantamento

Foram estudados modelos de determinação de vias principais para

levantamento, tendo como referência teórica os instrumentos legais de gestão

urbana. Para o levantamento na Área Central de Porto Alegre dividida por

quadrantes, definidos pelos eixos da Avenida Borges de Medeiros e Avenida

Duque de Caxias (figura 2), a saber: Quadrante 01 - Noroeste; Quadrante 02 –

Nordeste; Quadrante 03 - Sudoeste; Quadrante 04 – Sudeste.

Figuras 3 e 4 – Divisão da Área Central de Porto Alegre em Quadrantes.

A estratégia adotada estabeleceu como fundamental a confrontação da

análise das imagens capturadas nas inspeções visuais (aspectos subjetivos, com

base no conhecimento científico do grupo de pesquisadores) com o tratamento

Page 220: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 219

estatístico das situações registradas em formulário (aspectos quantitativos das

ocorrências referentes á situações críticas de acessibilidade: freqüências, e

incidências e outros indicadores).

O modelo de levantamento consistiu em inspeção visual, com medição,

registro fotográfico e apontamento em formulário de situações consideradas

críticas, do ponto de vista da acessibilidade da população em geral, por trechos

de ruas.

Na etapa de levantamento das demais áreas do Município, foram

estabelecidos critérios pra definição de amostra considerando instrumentos

oficiais e, em especial, o plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental

de Porto Alegre - PDDUA/PoA. Em função da existência de diversos critérios para

identificação de bairros, adotados por órgãos municipais, estaduais, federais e

prestadores de serviços (CEEE, Correios, DMAE), a divisão para fins de

levantamento concentrou-se nas premissas do PDDUA-PoA, adotando as vias

perimetrais, radiais, estruturadoras, arteriais, coletoras e locais para o

estabelecimento de novos quadrantes de levantamento.

A figura 5, capturada de imagem de satélite, demonstra a malha da cidade

com a marcação das avenidas e artérias principais, do ponto de vista. A figura 6

apresenta a demarcação proposta pela pesquisa para estudo por amostragem

prevista para o levantamento dos bairros do município.

Figura 5 - Perimetrais, Radiais, Vias Estruturadoras, Vias Arteriais, Coletoras, Locais ( Google

Earth, 2008). Figura 6 – Zoneamento de quadrantes para levantamento nas áreas fora da região central de

Porto Alegre.

Page 221: Inovação, universidade e relação com a sociedade

220 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

A partir deste critério estabeleceu-se como amostra os Nós significativos

caracterizados pelo cruzamento entre as tipologias de vias adotadas. Assim, com

os quadrantes definidos por áreas entre vias perimetrais e áreas externas às

perimetrais, com posterior escolha dos nós significativos, foram elaborados

desenhos, por quadrante, para localização e levantamento pelos grupos

constituídos, de acordo com as áreas definidas, exemplificadas na figura 7.

Figura 7 - “NÓS”: cruzamentos entre vias com concentrações expressivas de população.

O exemplo apresenta o Nó 40, integrante do Quadrante Q5

Em agosto de 2008, encerrou-se a fase oficial de levantamento de campo

com o deslocamento da equipe de pesquisa, pesquisadores, estagiários e a

assessoria técnica da SEACIS para o último nó, no. 141, localizado na Ilha da

Pintada, quadrante 12. O termo fase oficial de levantamento foi utilizado

intencionalmente em função da previsão de retorno eventual a algum nó ou ponto

levantado para revisão de dados, mesmo na fase de tabulação, processamento

de informação e análise, fundamentais na etapa final de diagnóstico.

A Organização dos Dados e o Tratamento da Informação

As imagens organizadas e referenciadas na forma de catálogo, codificadas

por quadrantes, com identificação do formulário de levantamento, do trecho ao

qual se reportam, e acompanhadas de legenda, com registro e comentários das

situações identificadas foram armazenadas em banco de imagens para acesso e

Page 222: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 221

resgate de situações passíveis de destaque ao longo do relatório final – o

Diagnóstico.

Foram utilizadas, para análise, as técnicas de estatística descritiva, entre

elas, distribuição de freqüências e análise exploratória de dados (gráficos,

tabelas, medidas de tendência central e de variabilidade, valores mínimos,

máximos e percentis). Os dados levantados para a organização da informação

foram de efetiva utilidade, subsidiando a produção do conhecimento (o

diagnóstico) e que, pela observância das normas para registro e armazenagem

constituem, hoje um significativo banco de dados e imagens sobre o tema, no

escritório do Núcleo de Acessibilidade e Mobilidade Urbana da FAUPUCRS, à

disposição da comunidade acadêmica para outras investigações sobre

acessibilidade.

Cumpre destacar o uso das ferramentas estatísticas, as quais permitiram

fundamentar cientificamente algumas situações previamente identificadas pela

comunidade, profissionais e setor público, de forma sensorial e perceptual,

através do cotidiano da cidade.

Resultados Obtidos: Identificação de Situações Críticas e Necessidades de Atualização na Gestão Urbana.

Os resultados obtidos no levantamento, se analisados de forma isolada

não constituíram grande significado do ponto de vista da obstrução parcial do

passeio para a população. Foi possível analisar e concluir no documento final,

encaminhado ao poder executivo municipal, que as situações críticas apontadas,

do ponto de vista da acessibilidade, necessitam ações de adaptação imediata, em

função das características e configuração da cidade.

Foi possível concluir acerca da necessidade imediata de revisão da

legislação vigente, em nível federal, estadual e municipal, no que diz respeito à

atualização de leis, decretos, além da revisão de textos de normas. Foi possível

perceber, ainda, a necessidade de revisão da postura tradicional e do modelo de

gestão pública do espaço urbano, ao longo das diversas adminstrações. Órgãos

envolvidos com licenciamento, aprovação e fiscalização de elementos urbanos

como mobiliário, vegetação, obras, transportes, infra-estrutura e serviços

necessitam revisão do ponto de vista da performance isolada e independente, por

Page 223: Inovação, universidade e relação com a sociedade

222 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

ocasião de planejamento e instalação de equipamentos e serviços. A visão

integrada de cidade, neste particular é ponto fundamental, com resultados físicos

na qualidade da configuração do espaço urbano e reflexos na condição de

acessibilidade e mobilidade da população.

Considerações Finais

Ao final de 2008, a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da PUCRS

encaminhou à Secretaria Especial de Acessibilidade e Inclusão Social o

Diagnóstico das Condições de Acessibilidade em Porto Alegre. Resultado do

trabalho de um ano, suportado por fundamentos científicos e metodologia

específica, constituíram base teórica para os necessários estudos e discussões

do Grupo Técnico, constituído pelo Executivo Municipal em 2009, visando à

elaboração do I Plano Diretor de Acessibilidade da capital, tido pela atual

administração como inédito no país. A FAUPUCRS, por seu turno, recolhe de

todo esse processo as repercussões mais elevadas. Seu Núcleo de Pesquisa em

Acessibilidade e Mobilidade Urbana, a quem coube desenvolver as atividades,

teve a especial oportunidade de envolver-se com instigante trabalho de pesquisa,

análise e diagnóstico. Trinta alunos de graduação participaram efetivamente da

investigação, agregando método de pesquisa através desta iniciação científica e

disseminando informalmente, entre seus pares de graduação o tema

acessibilidade.

Um dos objetivos não menos importantes da investigação, foi o

estabelecimento de um método de levantamento para diagnósticos aplicáveis às

cidades em geral, com configurações e características tipológicas que se

aproximem do Caso Porto Alegre. A inovação deixa como saldo um formulário e

roteiro de levantamento, além de uma nova visão da cidade para abordagens de

planejamento urbano: a divisão da urbe em quadrantes. Após a conclusão do

trabalho, com o encaminhamento do Documento, pode-se perceber que antigas

teses sobre Porto Alegre foram desqualificadas do ponto de vista científico.

Assim, fica liberado o cenário para o estabelecimento de novos paradigmas e

conseqüente montagem de instrumentos de planejamento e controle da cidade, à

luz do tema acessibilidade.

Page 224: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 223

Pode-se perceber que acessibilidade passou a constituir variável intrínseca

às atividades de concepção dos espaços e equipamentos urbanos e da

qualificação das vivências humanas neles desenvolvidas. Pode-se afirmar que o

diagnóstico produzido foi e continua sendo de grande utilidade para os trabalhos

que se seguem, na medida em que os resultados a serem obtidos com o novo

projeto de lei, se aprovado, contribuirá significativamente para a qualidade de vida

da população de Porto Alegre.

Referências

BENEVOLO, Leonardo. História das cidades. 3ª. edição. São Paulo: Ed.Perspectiva, 1997. BRASIL. Cadernos do Programa Brasileiro de Acessibilidade Urbana – Brasil Acessível - Caderno 1: Atendimento às pessoas com deficiência e restrição de mobilidade , Brasília, Ministério das Cidades, 2006. BRASIL. NBR9050 - Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. ABNT, 2004. CASTRO, Maria Luiza A.C. de; AMARO, João Júlio Vitral, Implantação do sistema de saneamento em Ouro Preto no século XI: a disputa pela Capital. In: OS URBANITAS - Revista de Antropologia Urbana Ano 4. Disponível via WWW no URL http://www.aguaforte.com/osurbanitas5/Castro&Amaro2007.html. Internet, 2008. Capturado em 12/06/2008. FERREIRA, M.S.; CAMPOS, J.C.B.; BARBOZA, S.C.; CÉ, A.R.S. Acessibilidade e Mobilidade Urbana: Mapeamento das Condições Atuais de Porto Alegre / Termo de Referência. Porto Alegre, FAUPUCRS, 2007. GOOGLE EARTH. Imagem da Cidade de Porto Alegre. Captura em maio, 2008. PDDUA: Lei Complementar Nº 434 de 1999. Porto Alegre: Corag.

Page 225: Inovação, universidade e relação com a sociedade

NOVA ABORDAGEM SAFETY NA SEGURANÇA DE CABINE

KNEIPP1, Ubirajara; Faculdade de Ciências Aeronáuticas – PUCRS

[email protected]

DAL BOSCO2, Andréa Kneipp; Aerosul Instituto de Aviação

[email protected]

Resumo

Este trabalho tem por objetivo apresentar o processo de inovação

experimentado nos Treinamentos de Segurança de Cabine, originalmente

concebidos para serem ministrados a tripulantes de aeronaves civis brasileiras.

Em uma primeira etapa serão referidos os principais órgãos e sistemas,

internacionais e nacionais, responsáveis pela regulamentação desses

treinamentos; na seqüência, será mostrada a integração dos sistemas brasileiros

responsáveis pela segurança de vôo e a importância da prevenção de acidentes

aeronáuticos na formulação da filosofia e da política da segurança de vôo em

território brasileiro, salientado o papel balizador da prevenção na elaboração de

programas de treinamento visando evitar a ocorrência de acidentes aeronáuticos.

Na etapa final será descrita a experiência realizada na Disciplina Emergência,

Segurança e Sobrevivência com a inclusão de alunos oriundos de outras

Unidades de Ensino da PUCRS, e as estratégias empregadas para solucionar os

problemas relativos à diversidade de áreas do conhecimento, adequação do

programa para o novo público-alvo, bem como a estratégia empregada para a

mobilização de alunos estranhos ao Sistema de Aviação Civil para a apropriação

de conhecimentos específicos sobre segurança de cabine e que podem ser

aplicados no seu cotidiano.

Palavras-chave: Emergência, Segurança e Sobrevivência.

1 Docente da Faculdade de Ciências Aeronáuticas-PUCRS e da Aerosul Instituto de Aviação, Comissário de Vôo da Varig S.A. graduado em Pedagogia pela PUCRS 2 Docente da Aerosul Instituto de Aviação, Comissária de Vôo da Varig S.A. graduada em Hotelaria pela PUCRS

Page 226: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 225

Introdução

A OACI3, agência da Organização das Nações Unidas especializada em

aviação civil é o órgão internacional que determina os parâmetros de segurança

para a operação de aeronaves civis em mais de 190 países através de seus

dezoito Anexos Técnicos. De acordo com o artigo 44 da Convenção de Chicago4,

é da responsabilidade dos países membros da OACI o cumprimento de toda e

qualquer matéria de segurança recomendada pela Convenção de Aviação Civil e

de seus Anexos Técnicos, entre elas a eliminação das deficiências quanto à

segurança de vôo, a incorporação de progressos técnicos e a revisão contínua

dos regulamentos.

Para a Organização de Aviação Civil Internacional, os aspectos Safety5 da

Segurança de Cabine estão relacionados com os acidentes não intencionais,

como despressurização da cabine, eclosão de fogo acidental a bordo, pouso em

emergência e sobrevivência terra/água no pós-impacto, enquanto que os

aspectos da Segurança Security6 referem-se aos acidentes intencionais, como

interferência ilícita contra aeronaves, aeroportos e suas facilidades.

Cada Estado Contratante7 deve administrar os assuntos inerentes à

aviação civil, através de suas respectivas agências reguladoras8.

O modal de segurança aérea concebido e implantado no Brasil,

diferentemente dos demais países, engloba os segmentos de aviação militar e

civil, compondo-se de três grandes sistemas integrados:

Sistema de Prevenção e Investigação de Acidentes Aeronáuticos -

SIPAER, Sistema de Controle do Espaço Aéreo - SISCEAB e Sistema de Aviação

Civil - SAC. Cada qual possui o seu órgão central com funções reguladoras e

formadoras de recursos humanos nas respectivas áreas de atuação e trabalham

harmoniosamente integrados, tornando-se elos constituintes, simultaneamente,

de um e de outro sistema.

3 Organização de Aviação Civil Internacional/International Civil Aviation Organization 4 Convenção Internacional de Aviação Civil realizada em 1944 na cidade de Chicago, onde foi fundada a OACI 5 O mesmo que segurança 6 Segurança Contra a Apropriação Ilícita 7 País Signatário da Convenção de Chicago 8 Agências que regulamentam a Aviação Civil em cada País Signatário

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226 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

O SIPAER, criado em 1971, e de acordo com o Decreto Nº 87. 249 de 07

de junho de 19829 tem como atribuições planejar, orientar, coordenar, controlar e

executar as atividades de investigação e prevenção de acidentes aeronáuticos,

cujo Órgão Central é o CENIPA, Centro de Investigação e Prevenção de

Acidentes Aeronáuticos. Todas essas atribuições conferem ao CENIPA a

competência de elaborar a política e a filosofia de segurança para todos os

segmentos da comunidade aeronáutica brasileira. A figura 01 mostra os Elos

Constituintes do SIPAER.

Figura 01- Elos Constituintes do SIPAER

O Órgão central do SISCEAB é o DECEA10, a quem compete planejar,

gerenciar e controlar as atividades relacionadas com a segurança da navegação

aérea, incluindo as telecomunicações aeronáuticas, a tecnologia da informação e

o controle do espaço aéreo brasileiro. O Brasil é o único país do mundo a possuir

um sistema completamente integrado de Defesa Aérea e Controle do Espaço

Aéreo; assim, os mesmos equipamentos e demais meios físicos e de recursos

humanos que prestam assistência ao fluxo do tráfego aéreo civil executam, de

forma simultânea, a Defesa Aérea do País, em íntima e permanente interação

com a Força Aérea Brasileira.

O Sistema de Aviação Civil Brasileiro-SAC é composto de uma extensa e

complexa gama de atividades que compreendem e interligam órgãos civis e

9 Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Decreto/D5731.htm - 116k - 10 Departamento de Controle do Espaço Aéreo: www.decea.gov.br/?page_id=60 - 34k

Page 228: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 227

militares do Ministério da Defesa, sob controle governamental e entidades da

iniciativa privada. As atividades do SAC, representadas na figura 02,

compreendem a Indústria Aeronáutica, o Transporte Aéreo, a Infra-Estrutura

Aeroportuária, o Controle do Espaço Aéreo (realizado pelo DECEA) e, instituições

privadas de ensino que atuam na formação de recursos humanos para a aviação

civil, onde se incluem, entre outras, as Faculdades de Ciências Aeronáuticas e as

Escolas de Aviação Civil.

O Órgão Central do SAC é a ANAC11, a quem compete planejar, gerenciar,

controlar as atividades relacionadas à aviação civil, com exceção do controle do

espaço aéreo.

Figura 02- Atividades do Sistema de Aviação Civil Brasileiro

Na figura 02, pode-se verificar, ainda, a integração do DECEA ao SAC

como elo executivo, compartilhando uma infra-estrutura de apoio para a

promoção da Segurança de Vôo no Brasil.

Segundo Giddeon (2004), os custos de um acidente aeronáutico são

extremamente altos porque: Primeiro, há o custo da perda da aeronave, que considerando o valor desses veículos é uma perda considerável independentemente do tamanho da organização. Existe também o custo da perda de vidas e danos à propriedade. Aumentando a lista, outros custos indiretos como admissão e treinamento para

11 Agência Nacional de Aviação Civil: www.anac.gov.br/anac/atribuicoesAnac.asp - 48k

Page 229: Inovação, universidade e relação com a sociedade

228 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

substituição de pessoal, limpeza de ambiente, perda de uso do equipamento, aumento do uso do equipamento restante, taxas legais e processos, prêmios de seguros de vida, custo de operações corretivas, dentre outros.

A razão da existência de programas de Segurança Safety, além de ser

uma exigência legal, caracteriza uma resposta à ocorrência de acidentes

aeronáuticos possibilitando programar lições aprendidas de suas investigações

que podem trazer uma oportunidade de detectar e corrigir deficiências nos

sistemas de segurança de vôo. É uma forma de prevenir que aconteçam

acidentes similares ou outros novos.

Objetivos

O programa de Treinamento de Cabin Safety no Brasil é regulamentado

pela Agência Nacional de Aviação Civil - ANAC, em consonância com as

determinações da Organização de Aviação Civil Internacional-OACI. O principal

objetivo de um programa safety é a prevenção de acidentes, motivo pelo qual o

Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos - CENIPA é um

importante balizador desses treinamentos por ser o principal mentor da filosofia e

política de segurança da aviação civil brasileira que se completa com as ações

integradas dos órgãos componentes dos demais Sistemas.

Os acidentes aeronáuticos apresentam uma característica peculiar, pois

envolvem normalmente um grande número de fatalidades associadas ao impacto

com o solo de uma única aeronave. Investigações, análises e conclusões de

diversos acidentes envolvendo aeronaves têm demonstrado que a existência de

sobreviventes após essas ocorrências está diretamente relacionada,

principalmente, com a competência da tripulação para as corretas tomadas de

decisão e a execução dos procedimentos apropriados a cada situação de

emergência que se apresente, e esta competência somente é alcançada com o

suporte de um eficiente programa de treinamento.

A Formação de Cabin Safety na PUCRS é ministrada na Disciplina 47220-

4 Emergência, Segurança e Sobrevivência - ESS e foi concebida de acordo com

as determinações do Instituto de Aviação Civil do antigo Departamento de

Aviação Civil, a autoridade aeronáutica competente à época da implantação do

Curso de Ciências Aeronáuticas, em 1994, contemplando as recomendações de

Page 230: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 229

segurança advindas do Relatório Final do CENIPA sobre o Acidente Varig 254 de

1989 que passaram a exigir dos tripulantes de aeronaves civis brasileiras a

realização do Treinamento Prático de Sobrevivência na Selva. Até 1989 os

pousos forçados realizados em regiões de selva eram considerados “não

sobrevivíveis”, razão pela qual não eram exigidas dessas tripulações as práticas

de sobrevivência na selva, quando era ministrado tão somente um treinamento

teórico.

Cumprindo com as exigências das atualizações recomendadas, a

Disciplina ESS foi inserida no currículo do Curso de Ciências Aeronáuticas da

PUCRS com a seguinte ementa, ainda vigente:

“Disciplina teórico-prática que contempla o conhecimento das normas

legais de segurança, do uso dos equipamentos disponíveis e de aplicação dos

procedimentos adequados para as situações de emergência e sobrevivência,

incluindo exercícios práticos de combate ao fogo e de sobrevivência na água e na

mata.”

AERONAVE

INTENÇÃO DE REALIZAR UM VÔO

Figura 03- Abrangência da Disciplina Emergência, Segurança e Sobrevivência

A abrangência da Disciplina ESS, representada pela figura 03, reforça os

Oito Princípios do SIPAER12, onde se afirma que a responsabilidade pela

segurança de vôo é de todos os envolvidos com a operação de uma aeronave,

sejam fabricantes, tripulantes ou passageiros.

12 http://www.cenipa.aer.mil.br/cenipa/paginas/normas/NSCA3-3.pdf

OCUPANTES EQUIPAMENTOS

Aspectos Com

Aspectos Técnicos e Oportamentais peracionais

TRIPULANTES E PASSAGEIROS

FIXOS E PORTÁTEIS

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230 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Descrição do processo de inovação desenvolvido e resultados obtidos

No segundo semestre de 2007, ocorreu uma alteração relativa ao público-

alvo da Disciplina ESS, antes direcionada somente aos alunos do Curso de

Ciências Aeronáuticas e que passou a ser disponibilizada pela PUCRS aos

alunos de suas demais Unidades de Ensino na categoria de Disciplina Eletiva e,

aí então, um grande desafio foi lançado:

• Como incluir alunos estranhos ao Sistema de Aviação Civil na Disciplina?

• Como adequar o programa de treinamento regulamentado pela

Autoridade de Aviação Civil a um público tão diferenciado quanto

diversificado?

• Como mobilizar o aluno estranho ao Sistema de Aviação Civil para

aprender sobre temas referentes à segurança de cabine?

Com o pensamento voltado para os Oito Princípios do SIPAER foram

buscadas e encontradas as respostas para estas questões; os alunos estranhos

ao Sistema de Aviação Civil foram categorizados como os passageiros de uma

aeronave sendo conduzidos por tripulantes, representados neste contexto pelos

alunos do Curso de Ciências Aeronáuticas.

De acordo com Freire (2001), [...] “Antes de mais nada, estou convencido

de que, epistemologicamente, é possível, ouvindo os alunos falar sobre como

compreendem seu mundo, caminhar junto com eles no sentido de uma

compreensão crítica e científica dele;”

Para Freire, o currículo regular de uma determinada disciplina é

importante, porém, mais importante do que o currículo é o modo de ensinar.

Neste sentido, não foi necessária a inserção de qualquer alteração no programa

da Disciplina Emergência, Segurança e Sobrevivência que a Autoridade de

Aviação Civil determinava, foi adotada apenas uma nova abordagem para temas

de significado tão familiar para uns e demasiadamente científico para outros.

Assim, foi idealizado e instituído o Seminário de Cabin Safety13, preparando o

cenário e desafiando os atores para o desenrolar da Disciplina ESS, com a

13 Seminário de Segurança de Cabine

Page 232: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 231

finalidade de possibilitar uma troca entre os participantes no que se relacionava

ao conteúdo a ser trabalhado.

Em um primeiro momento, os alunos foram distribuídos, de acordo com

suas afinidades, em oito grupos de trabalho; a cada grupo foi a dada tarefa de

pesquisar o conteúdo de um conjunto de capítulos do Regulamento Brasileiro de

Aviação Civil 121 que fundamentam as unidades didáticas da disciplina sobre os

equipamentos de emergência existentes na aeronave. O Primeiro Trabalho

Escrito solicitado foi baseado na produção do conhecimento resultante dessa

pesquisa, aproveitada para avaliação na Primeira Prova Escrita. Com a

apropriação do conteúdo desses capítulos, cada grupo de alunos foi orientado

para elaborar um conjunto de questões dissertativas a serem empregadas na

composição de 40% da Prova Escrita P1, enquanto que os demais 60% foram

propostos pelo professor.

O próximo momento se constituiu na fundamentação teórica visando os

treinamentos práticos de Combate ao Fogo, Sobrevivência no Mar e

Sobrevivência na Selva, ministrada em aulas expositivas onde foi aberto um

fórum de discussão possibilitado pelo conhecimento produzido pelos alunos no

Primeiro Trabalho Escrito, ao mesmo tempo em que novos conteúdos iam sendo

apresentados no decorrer das aulas teóricas.

Após a realização das atividades práticas e as respectivas avaliações, com

a apropriação do conhecimento de todo o conteúdo programático proposto pela

Disciplina ESS, os alunos já estavam preparados para elaborar e apresentar o

Relatório Final do Seminário de Cabin Safety. As apresentações orais foram

programadas para serem realizadas em dois dias com os alunos se distribuindo

em quatro Grupos Verbalizadores e quatro Grupos Avaliadores no primeiro dia,

invertendo-se os papéis no segundo. Nessas duas sessões do Seminário os

alunos puderam apresentar, criticar, discutir e responder a questionamentos que

emergiam da assembléia do Seminário durante as apresentações orais. As

apresentações se caracterizaram por um misto de linguagem técnica e coloquial,

mas acima de tudo, atingindo todos os objetivos propostos ao longo do semestre.

O fechamento do curso foi a realização da Prova Escrita P2 que previa a

avaliação de todo o conteúdo abordado nas atividades teóricas e práticas

realizadas ao longo do semestre.

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232 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

As avaliações realizadas durante todo o processo confirmaram um bom

aproveitamento tanto por parte dos alunos da Faculdade de Ciências

Aeronáuticas como pelos demais.

A integração verificada entre alunos de diferentes Unidades da PUCRS

matriculados na Disciplina Emergência, Segurança e Sobrevivência comprovou a

viabilidade desse processo de inovação.

Em 2008, o processo foi consolidado registrando-se uma grande demanda

de matrículas na Disciplina ESS, por parte de alunos de todas as áreas do

conhecimento. Para as atividades acadêmicas do segundo semestre de 2009,

espera-se que esta demanda seja repetida.

Considerações finais

Esta qualificação visa o cumprimento das determinações da Agência

Nacional de Aviação Civil com relação aos iniciantes na carreira de Pilotos,

Mecânicos de Vôo e Comissários de Vôo de Aeronaves Civis Brasileiras.

A estrutura montada pela PUCRS para a realização de todas as atividades

teóricas e práticas relacionadas para esta formação mostraram-se adequadas e

eficientes. Embora o aumento significativo do número de alunos em formação

com relação aos semestre anteriores (de 22 para 66), não foi gerada a

necessidade de aquisição de mais equipamentos.

As atividades teóricas são desenvolvidas em sala de aula convencional e a

exposição teórica é realizada com o suporte de multimídia, contando com um

acervo de vídeos sobre operação de equipamentos e sobre acidentes

aeronáuticos; após a exibição se discutem os procedimentos adotados pelas

tripulações envolvidas nessas ocorrências.

As atividades práticas são ministradas em áreas específicas:

A formação Prática de Sobrevivência na Selva é ministrada em área de

mata primária e secundária. A carga horária prevista é de 18 horas. Os módulos

são compostos de:

1. Primeiros Socorros pós-Catástrofe

2. Construção de Abrigo

3. Obtenção e Manutenção de Fogo

4. Obtenção e Purificação de Água para consumo dos sobreviventes

Page 234: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 233

5. Preparação e Cozimento do Alimento para consumo dos sobreviventes

6. Sinalização às Equipes de Busca e Salvamento

7. Deslocamento pela mata em busca de socorro

A formação Prática de Marinharia é ministrada em piscina térmica, no

Ginásio Poliesportivo da PUCRS. A FACA dispõe de um barco salva-vidas do tipo

“lançamento na água” com os respectivos acessórios e de 40 coletes salva-vidas;

todos esses equipamentos são de uso aeronáutico. O treinamento é constituído

dos seguintes módulos:

1. Circuito Educativo dos Equipamentos Individuais de Flutuação

2. Circuito Educativo do Equipamento Coletivo de Flutuação

3. Circuito Educativo do Kit de Sobrevivência no Mar

4. Adaptação ao meio líquido

5. Simulações de Pouso na Água

6. Instruções sobre a “Jornada no Mar”

As atividades práticas de Combate ao Fogo são ministradas em área

disponibilizada pelo Campus PUCRS Viamão. A carga horária prevista é de 6

horas, empregando extintores de incêndio dos tipos “água pressurizada”, “pó

químico seco” e “dióxido de carbono”. É composto dos seguintes módulos:

1. Seleção de extintores

2. Operação de extintores em foco de fogo da Classe A

3. Operação de extintores em foco de fogo da Classe B

A participação de alunos oriundos de outros cursos das diferentes

Unidades Acadêmicas da PUCRS, na busca de conhecimentos relacionados à

segurança de cabine, permite afirmar que esta ação de ensino contribui

socialmente, pois, mais e mais pessoas estarão qualificadas para salvar vidas e

agir como multiplicadores da cultura de segurança, tão necessária em todos os

aspectos da vida humana.

Um programa de prevenção de acidentes é simplesmente uma prática

inteligente para qualquer organização conduzir seus negócios. Muitos aspectos

que fazem uma empresa segura para operar, também a fazem mais confiável e

lucrativa. Segurança é, então, um ótimo investimento. Prevenir acidentes

minimiza os custos e mantém a organização funcionando, preservando o seu bem

mais precioso: os recursos humanos.

Page 235: Inovação, universidade e relação com a sociedade

234 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Referências

GIDEON, Francis. The Standard Handbook for Aeronautical and Astronautical Engineers. McGraw-Hill, 2004 FREIRE, Paulo; SCHOR, Ira. Medo e Ousadia: o cotidiano do professor. Rio de Janeiro. Paz e Terra, 2001.

Page 236: Inovação, universidade e relação com a sociedade

INOVAÇÃO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE QUÍMICA: A INTEGRAÇÃO ENSINO-PESQUISA-EXTENSÃO

Ramos, Maurivan Güntzel; PhD; Faculdade de Química – PUCRS

[email protected]

Ferraro, Concetta Schifino; MS; Faculdade de Química – PUCRS

[email protected]

Azambuja, Rejane Rolim; MS;Faculdade de Química – PUCRS

[email protected]

Resumo

O texto apresenta a formação inicial de professores de Química na

PUCRS, por meio dos seus pressupostos e de informações sobre a sua prática, e

destaca seu caráter inovador na relação de parceria entre a Universidade e as

escolas. Por um lado está a formação do professor, alicerçada no educar pela

pesquisa, por outro está a escola como campo de estágio. Na lógica da formação

instituída pelo curso de Licenciatura em Química, a escola é espaço de ensino,

pois possibilita a prática docente dos licenciandos; é espaço de pesquisa, pois

tanto os licenciandos quanto os docentes coletam e analisam dados dessa

realidade, os quais são matéria-prima para a reflexão e formação; é espaço de

extensão, pois os estagiários, com a orientação dos docentes da universidade,

levam inovações, na forma de idéias, de materiais (kits para as aulas práticas) e

de ação voltada à aprendizagem dos alunos do ensino médio.

Palavras-chave: Formação de professores de Química, Pesquisa de sala de

aula, Inovação.

Introdução

O presente texto aborda o processo de formação inicial de professores no

curso de Licenciatura em Química da Pontifícia Universidade Católica do Rio

Grande do Sul – PUCRS, com destaque para a formação pedagógica nas

disciplinas sob a responsabilidade da Faculdade de Química, pelo seu caráter

inovador, com intensa articulação entre ensino, pesquisa e extensão.

Page 237: Inovação, universidade e relação com a sociedade

236 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

O ensino ocorre pela mediação docente em sala de aula, em processos

reflexivos, tendo por base as experiências dos licenciandos no espaço escolar.

Portanto, o ensino nas disciplinas de formação pedagógica da FAQUI são todas

realizadas com base na ação-reflexão-ação (Shön, 1983, 1992), fortemente

vinculadas ao contexto e à realidade escolar. Com isso, busca-se superar a

racionalidade técnica em favor de uma racionalidade prática e crítica.

A pesquisa ocorre de dois modos: pela ação dos licenciandos, sob

orientação dos docentes, por meio da coleta, análise e interpretação dos dados

relativos à escola e à sala de aula de Química, bem como pela apresentação

escrita dos resultados desse trabalho, que serve de base à reflexão em sala de

aula; pela ação dos docentes, com o auxílio de alguns licenciandos (bolsistas e

monitores), por meio da coleta, análise e interpretação de dados sobre as

ocorrências nessas disciplinas, na forma de uma meta-análise, para compreender

e avaliar esse processo de formação com vistas a sua permanente reconstrução

e qualificação. Além disso, as disciplinas de formação pedagógica da FAQUI têm

entre seus pressupostos teóricos o educar pela pesquisa (DEMO, 1998;

MORAES, GALIAZZI, RAMOS, 2004; LIMA, 2004), que se apóia no

questionamento, na reconstrução da argumentação e em processos de

comunicação para divulgação e validação dos conhecimentos reconstruídos,

tendo como pano de fundo a abordagem sociocultural da aprendizagem e do

desenvolvimento humano (VYGOTSKY, 1996; WERTSCH, 1998, 1999; WELLS,

2001; SCHNEUWLY, BRONCKART, 2008).

A extensão ocorre por meio de contribuições efetivas às escolas de ensino

médio, aos professores e aos alunos, em ações variadas que envolvem a

participação efetiva dos licenciandos nas atividades escolares e dos docentes do

Curso de Licenciatura em assessorias. Entre as atividades que podem ser

consideradas de extensão, apresentam-se: a contribuição às aulas de Química

pelo empréstimo de kits para as atividades experimentais, organizados pelos

licenciandos e que eles utilizam nas aulas de estágio, possibilitando a realização

de aulas experimentais, principalmente nas escolas públicas, necessárias para as

aulas de Química; a contribuição à qualificação do trabalho dos professores de

Química das escolas pela proposição de atividades de ensino elaboradas e

testadas na Universidade, tendo essa assessoria um caráter de educação

continuada; a contribuição aos alunos das escolas em função de um trabalho

Page 238: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 237

qualificado e com propostas atualizadas, o que implica aprendizagens

significativas, tanto dos alunos quanto dos licenciandos. Nesse sentido, a escola

não é apenas um espaço a ser ocupado pelos licenciandos para a realização das

suas atividades de estágio, mas, pelo contrário, é um espaço de interação onde

todos os participantes, alunos, professores da escola, licenciandos e docentes da

Universidade, aprendem e beneficiam-se mutuamente.

Essa experiência só tem se tornado possível graças à reformulação

curricular do curso aprovada em 1999 e implantada no primeiro semestre de

2000, na qual foram instituídas as disciplinas de Tutoramento em Prática de

Ensino I, II, III e IV e Estágio Supervisionado do Curso de Licenciatura em

Química, bem como as disciplinas de Projetos de Ensino de Química e

Metodologia de Ensino de Química. Essas mudanças ocorreram como solução da

Faculdade de Química para atender às exigências da nova Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996), da Resolução CNE/CES No

1/2002, que institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de

Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de

graduação plena (BRASIL, 2002a), da Resolução CNE/CES No 2/2002, que

institui a duração e a carga horária dos cursos de licenciatura, de graduação

plena, de formação de professores da Educação Básica em nível superior

(BRASIL, 2002b), bem como da Resolução CNE/CES No 8, de 11 de março de

2002, que estabelece as Diretrizes Curriculares para os cursos de Bacharelado e

Licenciatura em Química (BRASIL, 2002c).

Objetivos

No presente texto, argumenta-se que é inovadora a formação de

professores capaz de reconhecer e respeitar a complexidade das relações que

existem nesse processo, de interagir com o espaço escolar numa parceria, na

qual todos são beneficiados, alunos, licenciandos, professores das escolas e

docentes da Universidade e de assumir a pesquisa como modo de aprender.

Descrição do processo de inovação desenvolvido

A descrição do processo de formação de professores de Química, objeto

principal deste artigo, ocorre por meio da descrição da estrutura geral do curso,

Page 239: Inovação, universidade e relação com a sociedade

238 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

do trabalho realizado nas disciplinas pedagógicas da FAQUI e da discussão dos

pressupostos teóricos do curso.

O Curso de Licenciatura em Química da PUCRS

O curso atual de Licenciatura em Química de Faculdade de Química da

PUCRS tem a duração de sete semestres, totalizando 2940 horas. A formação

específica em Química ocorre por meio de disciplinas, em regime semestral, nas

áreas de Química Geral e Inorgânica, Química Inorgânica e Mineralogia, Físico-

Química e Química Orgânica, Química Ambiental, Química Analítica e Química

Biológica. Também integram a matriz curricular, as disciplinas de Física Geral e

Experimental, Matemática para Químicos, Ética e Filosofia da Ciência e

Humanismo e Cultura Religiosa, bem como as Atividades Complementares e as

disciplinas eletivas, que podem ser escolhidas entre as disciplinas dos demais

cursos de graduação da Instituição.

Figura 1 – Matriz Curricular da Licenciatura em Química – (4-309)

Em relação à formação docente, a matriz curricular do Curso está

organizada de modo a oferecer disciplinas de natureza pedagógica desde o

Page 240: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 239

primeiro nível, como Psicologia da Educação - ensino e aprendizagem (primeiro e

segundo níveis), Organização de Políticas para o Ensino Médio (segundo nível) e

Didática Geral (terceiro nível), todas de responsabilidade da Faculdade de

Educação. Em relação à formação pedagógica específica de Educação Química,

o licenciando cursa as disciplinas de Projeto de Ensino de Química (quinto nível)

e Metodologia de Ensino de Química (sexto nível), estas de responsabilidade da

Faculdade de Química. A primeira propõe estudo de propostas alternativas de

ensino existentes no país e realiza a análise de livros didáticos convencionais, e a

segunda propõe o estudo de metodologias para o ensino de Química, priorizando

a ação e a pesquisa pelos alunos. Além dessas, o licenciando inicia nas

atividades de prática docente, no ambiente escolar, por meio das disciplinas de

Tutoramento em Prática de Ensino I, II, III e IV, culminando com o Estágio

Supervisionado no sétimo semestre. Nessas disciplinas, o licenciando vai

gradativamente assumindo-se como professor, tendo o educar pela pesquisa

como base para a reconstrução do seu conhecimento profissional.

A grande inovação dessa matriz curricular está nestas disciplinas, as quais,

são denominadas “tutoramentos”.

Cada uma das disciplinas de Tutoramento em Prática de Ensino tem um

objetivo específico, que são: o Tutoramento em Prática de Ensino I propõe-se ao

reconhecimento e problematização da realidade escolar e da sala de aula; o

Tutoramento em Prática de Ensino II propõe-se ao estudo da experimentação no

ensino de Química, envolvendo a organização do espaço para as atividades

práticas, bem como a preparação e aplicação de aulas experimentais; o

Tutoramento em Prática de Ensino III propõe-se ao aprofundamento teórico e

prático do estudo das questões experimentais no ensino de Química, pela

integração com outras áreas, por meio do desenvolvimento de projetos com os

alunos, de atividades integradoras com o Museu da PUCRS, da pesquisa de

novas atividades experimentais e da produção escrita sobre o trabalho

desenvolvido; o Tutoramento em Prática de Ensino IV propõe-se ao planejamento

e à organização de recursos para as atividades futuras do Estágio

Supervisionado, que ocorre no último semestre do curso.

As disciplinas de Tutoramento em Prática de Ensino têm, portanto, o

caráter de estágio, pois ocorrem no campo real de trabalho, que é o ambiente

escolar, com a supervisão dos docentes da Universidade em diálogo com os

Page 241: Inovação, universidade e relação com a sociedade

240 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

demais colegas licenciandos. Para complementar essa formação, a disciplina

denominada de Estágio Supervisionado faz uma síntese desse processo,

consistindo em regência de classe, durante um semestre letivo, com a aplicação

de resultados dos estudos desenvolvidos ao longo dos Tutoramentos. No entanto,

os licenciandos não iniciam a organização e a prática de aula no último semestre.

A partir do Tutoramento em Prática de Ensino I, os licenciandos já preparam

planos de aula e realizam o trabalho sob a orientação de docente da Universidade

e sob a supervisão direta do professor titular da turma na escola. Isso foi se

construindo desse modo, pois é forte a convicção que o quanto antes o aluno

começa a assumir-se como professor, vai produzindo transformações importantes

na sua constituição profissional docente, principalmente pela reflexão sobre o que

faz.

Isso está de acordo com Mizukami, quando afirma que: A premissa básica do ensino reflexivo considera que as crenças, os valores, as suposições que os professores têm sobre o ensino, matéria, conteúdo curricular, alunos, aprendizagem etc. estão na base de sua prática de sala de aula. A reflexão oferece a eles a oportunidade de se tornarem conscientes de suas crenças e suposições subjacentes a essa prática. Possibilita, igualmente, o exame de validade de suas práticas na obtenção de metas estabelecidas. Pela reflexão eles aprendem a articular suas próprias compreensões e a reconhecê-las em seu desenvolvimento pessoal. (1996, p. 61)

Evidentemente que as disciplinas de prática pedagógica específicas de

Educação Química ocorrem em interação com as disciplinas das áreas

específicas de Química do curso, as quais também desenvolvem ações de

caráter pedagógico como o objetivo principal de aprofundamento e

complexificação do conhecimento químico.

Como ilustração, são apresentados alguns dados do primeiro semestre de

2009. Estão matriculados nas disciplinas de prática docente 92 alunos, os quais

estão realizando seus estágios/tutoramentos em 76 escolas, conforme mostra a

Tabela 1.

Page 242: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 241

Tabela 1 – Número de alunos matriculados nas disciplinas de prática pedagógica e número de escolas nas quais realizam seus estágios ou tutoramentos em 2009/1

Disciplina No de Alunos matriculados

No de Escolas de Tutoramento ou

Estágio TPE I 23 21 TPE II 17 16 TPE III 15 15 TPE IV 15 13

ES 12 11 Total 92 76

Considerando que há dez alunos cursando simultaneamente, pelo menos

duas dessas disciplinas, o número real é 82 alunos realizando suas atividades de

tutoramento ou estágio em 66 escolas da Capital e da Região Metropolitana de

Porto Alegre. Esse elevado número expressa a importância e o impacto que essa

atividade de formação tem em relação à realidade escolar do ensino médio. Esse

é mais um argumento de que os tutorandos/estagiários devem contribuir para a

qualificação da escola e da sala de aula, o que reflete na constituição formação

do seu “ser professor”. Isso está de acordo com o que afirma Arroyo (2003), que é

necessário investir na melhoria da escola e dos professores que lá trabalham

para melhorar o ensino e a aprendizagem em Química, pois não basta melhorar

os cursos de Licenciatura se os egressos desses cursos se defrontam com

situações de desqualificação e de desmotivação inerentes às relações de

produção e trabalho no contexto escolar.

Pressupostos teóricos da formação de professores de Química na PUCRS

Na formação de professores de Química desenvolvida nas PUCRS há

destaque para a interação dos licenciandos e dos docentes com os professores e

alunos das escolas, desde as disciplinas iniciais do curso, em um processo de

imersão gradativa do licenciando na escola.

Nessa perspectiva, o conceito de “tutoramento”, que perpassa as várias

disciplinas de formação em Educação Química, pode ser definido como “o

processo de aprender com o outro, numa relação de reciprocidade, no

espaço/tempo da escola e da Universidade”. (RAMOS e MORAES, 2006, p. 7).

Esse processo envolve saberes relacionados: à formação profissional (saberes

profissionais), associados aos conhecimentos docentes adquiridos durante o

Page 243: Inovação, universidade e relação com a sociedade

242 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

curso de licenciatura; à área específica ou disciplina (saberes disciplinares) de

Química, que emergem da tradição cultural e da comunidade científica dessa

ciência; ao currículo (saberes curriculares), associados à organização do ensino

(objetivos, conteúdos, métodos), concretizando-se sob a forma de programas

escolares, os quais os professores aprendem planejar e a colocar em ação;

experiência docente cotidiana (saberes experienciais), associada à prática

docente, aos hábitos de cada professor e ao conhecimento de seu meio (TARDIF,

2006).

Figura 2: Os saberes e a constituição do professor de Química

Para que ocorram aprendizagens relevantes associadas à constituição

docente é necessário perceber a interação dos quatro tipos fundamentais de

sujeitos do processo de formação inicial como uma rede de relações e partilha de

saberes: os docentes e os licenciandos, no âmbito da Universidade; os

professores e alunos, no âmbito da escola. Isso significa que há várias situações

de tutoramento, entre docentes, licenciandos, professores, alunos; entre docentes

e licenciandos, licenciandos e alunos, docentes das universidades e professores

das escolas, e professores e alunos das escolas. Essa rede complexa é

representada pelo esquema apresentado na Figura 3.

Page 244: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 243

Figura 3 – Relações de tutoramentos na formação de professores

É evidente que essa rede não para por aí, pois muitas vozes integram-se

aos diálogos entre esses quatro segmentos e cada sujeito passa a ser

multiplicador dessa rede.

É nessa interação complexa, envolvendo experiências e saberes

diferenciados, que ocorre a formação inicial de professores na PUCRS. Nesse

processo em rede, todos são ensinantes e aprendentes (FERNANDEZ, 2001).

Por outro lado, os processos de formação inicial de professores de

Química na PUCRS, principalmente no que se refere às disciplinas de natureza

pedagógica, com destaque para os tutoramentos e estágios estão fundamentados

no educar pela pesquisa (DEMO, 1998; MORAES, GALIAZZI, RAMOS, 2004;

LIMA, 2004). Desse modo, em um movimento reconstrutivo, são formuladas

perguntas e produzidas respostas ou argumentos, que são comunicados ao

próprio grupo ou a outros grupos, com o intuito de divulgar e validar o aprendido.

Esse processo parte do conhecimento que cada um tem em relação ao objeto de

estudo, que vai se tornando mais consistente e fundamentado, mais abstrato e

científico. Para tanto, é necessário que o professor seja mediador nesse processo

e que pense junto com os alunos até mesmo o que ainda não sabe. Mas é

importante considerar que os alunos também são mediadores, pois, de fato, quem

Page 245: Inovação, universidade e relação com a sociedade

244 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

faz a mediação entre o objeto de estudo e o sujeito é a linguagem em que se

movimentam os aprendentes e ensinantes.

Um aspecto importante da pesquisa, na abordagem deste texto, é que os

próprios alunos participam da formulação dos problemas, pois a possibilidade de

perguntar oportuniza a tomada de consciência em relação às lacunas do próprio

conhecimento e essa consciência das faltas pode contribuir para tornar os

sujeitos desejantes do aprender. Está na busca de solução dos desafios a

possibilidade da aprendizagem aos alunos. Cabe lembrar que a formação de

professores não consiste em fornecer fórmulas prontas para a solução de

problemas, pois é essa racionalidade que se quer superar.

O aprender, portanto, envolve a complexificação do senso comum, daquilo

que os alunos já conhecem e que aprenderam de modo experiencial ou pelo

ensino escolar vivenciado até o momento. Essa complexificação implica a

apropriação do discurso científico. Assim, não é o tipo de problemas que

influencia a aprendizagem dos alunos, mas o fato de eles mesmos os elaborarem,

pois “parece existir algo muito poderoso em relação ao fato de os próprios alunos

assumirem a função de perguntar” (WERTSCH, 1998, p. 129).

Trabalhar com pesquisa na sala de aula implica mudar as regras do

ensinar e do aprender. Neste caso, os caminhos não são dados, mas se

constroem cooperativamente em comunidades de aprendizagem voltadas para

reconstruções coletivas de conhecimentos, nas quais professor e alunos

assumem papéis de ensinantes e aprendentes. Mais do que ensinar (mostrar) conteúdos de conhecimentos, ser ensinante significa abrir um espaço para aprender, espaço objetivo-subjetivo em que se realizam dois trabalhos simultâneos: 1-construção de conhecimentos; 2-construção de si mesmo, como sujeito criativo e pensante. (FERNANDEZ, 2001, p. 30).

Pesquisar na sala de aula, numa perspectiva sociocultural, também

consiste em desenvolver competências associadas à linguagem, que possibilitam,

pelo diálogo e pelo confronto de idéias, formular problemas, encontrar soluções e

expressar os novos conhecimentos, que se qualificam por meio da crítica. Nesse

processo, a mediação, mais do que pelas pessoas, se dá pela linguagem numa

relação dialógica, pois quem conhece algo também ensina no processo de

conhecer. Pesquisar em aula implica a combinação de modos de linguagem,

Page 246: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 245

especialmente, a fala, a escuta, a leitura e a escrita e implica partir de

questionamentos relevantes e significativos associados aos conhecimentos

iniciais dos participantes, colocando-os em cheque. Falar ciência não significa simplesmente falar sobre a ciência. Significa fazer ciência por meio da linguagem. Falar ciência significa observar, descobrir, comparar, classificar, analisar, discutir, formular hipóteses, teorizar, questionar, desafiar, argumentar, planejar experimentos, seguir procedimentos, julgar, avaliar, decidir, concluir, generalizar, informar, escrever, ler e ensinar por meio da linguagem da ciência (Lemke, 1997, p. 11).

Isso significa valorizar a função epistêmica da linguagem, além da sua

função comunicativa. (MORAES, RAMOS, GALIAZI, 2007)

Em relação à formação inicial de professores de Química, as ações de

falar, ler, escrever e dialogar são valorizadas para a aprendizagem de

competências necessárias à profissão docente. Ao experimentar esses modos de

agir e aprender, os futuros professores tornam-se também capazes de colocá-las

em ação na sua prática docente. Para isso, as disciplinas voltadas à formação de

professores de Química propõem atividades que implicam envolver os alunos e o

professor em leituras, em relatos orais, em diálogos e em produção escrita,

associados às observações e ao trabalho realizado nas escolas. Isso se apóia na

tese de que os licenciandos tornam-se capazes de desenvolver uma prática

diferenciada e produtiva, com a emergência de aprendizagens significativas, se

experienciam esse modo de ensinar e aprender ao longo da sua formação inicial

em contatos com a realidade escolar.

Desse modo, durante os tutoramentos e estágios, os licenciandos têm a

oportunidade de reconstruir permanentemente o seu conhecimento e a sua visão

do que significa ser professor. Com isso, são favorecidos processos para

compreender a realidade no seu dinamismo e complexidade e de realizar um

trabalho mais adequado a esse contexto. A intensidade das ações realizadas, a

reflexão sobre essas ações e a possibilidade de reinventar a própria prática,

associadas às oportunidades de falar, ler dialogar e escrever contribuem para a

(trans)formação dos licenciandos em direção ao “ser professor”.

Nessa perspectiva, tornar-se professor implica assumir a posição de quem

pode e deve contribuir para mudanças relevantes e necessárias nessa área de

atuação. Ao compreender melhor a profissão e os problemas concernentes a ela,

Page 247: Inovação, universidade e relação com a sociedade

246 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

os licenciandos tornam-se protagonistas de um ensino mais qualificado, vital para

a emancipação social.

Resultados obtidos

A matriz curricular do Curso de Licenciatura em Química vem sendo

praticada desde 2000, portanto há quase uma década. Durante esse tempo várias

investigações vêm sendo feitas no sentido de se compreender-se, cada vez mais,

esse processo de formação com vistas a sua permanente qualificação. O que se

destaca é que os professores egressos do curso, em geral, apresentam um perfil

caracterizado por uma atitude empreendedora, questionadora, capaz de buscar

soluções frente aos desafios que se apresentam, com um discurso mais

qualificado e uma prática coerente ao discurso e com a vontade de continuar

aprendendo, pois têm consciência do seu papel social. Deparam-se, no entanto,

com as dissonâncias em relação à realidade escolar (RAMOS, 2008), mas

apresentam condições de pensar individual e coletivamente em soluções para

superar as dificuldades.

Considerações finais

No presente texto, foi apresentado sucintamente o modo de organização

curricular de formação de professores no curso de Licenciatura em Química da

PUCRS, com destaque para a dinâmica adotada no currículo do curso, com forte

interação entre as Universidades e as Escolas, desde o início da formação,

podendo-se perceber a integração pesquisa-ensino-extensão. Nesse sentido, os

principais argumentos presentes neste texto defendem a parceria efetiva entre a

Universidade e as escolas em favor de um trabalho que beneficie a todos os

envolvidos: professores, alunos, docentes e licenciados.

Foi intenção também destacar os aspectos epistemológicos que embasam

a formação pedagógica do curso descrito, com ênfase no educar pela pesquisa,

numa abordagem sociocultural, na qual é valorizada a função epistêmica da

linguagem além de sua função de comunicação.

Page 248: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 247

Referências

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248 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

de Química para a educação básica no Brasil. Ijuí: Editora UNIJUÍ, 2007. p. 191-210. RAMOS, M. As dissonâncias entre a formação inicial de professores de Química e os limites e possibilidades de escolas do ensino médio. In: XIV Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, 2008, Porto Alegre. Anais. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008. v.1. p.1 – 13. RAMOS, M. G.; MORAES, R. Avanços na formação de professores desenvolvida no Curso de Licenciatura em Química na PUCRS. In: IV Seminário Nacional de Pedagogia Universitária, 2006, Porto Alegre. IV Seminário Nacional de Pedagogia Universitária, Porto Alegre: PUCRS, 2006. (CD-ROM). SCHNEUWLY, B.; BRONCKART, J.P. (Orgs.) Vigotsky hoy. Madrid: Editorial popular, 2008. SCHÖN, D. The reflective practioner: how professional think in action. London: Temple Smith, 1983. ______. La formación de profissionales reflexivos: hacia un nuevo diseño de la enseñanza y el aprendizaje en las profesiones. Barcelona: Paidós, 1992. TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006. VYGOTKSKY. L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1996. WELLS, G. Indagación dialógica. Barcelona: Paidós, 2001. WERTSCH, J. V. Mind as action. New York: Oxford University Press, 1998 ______. La mente en acción. Madrid: Aique, 1999.

Page 250: Inovação, universidade e relação com a sociedade

BOAS PRÁTICAS NOS INSTITUTOS ESPECIAIS

Page 251: Inovação, universidade e relação com a sociedade

GESTÃO AMBIENTAL NA UNIVERSIDADE E A BUSCA DE UMA SOCIEDADE SUSTENTÁVEL

Villwock, Jorge Alberto; Dr; Instituto do Meio Ambiente – PUCRS

Blochtein, Betina; Dr; Instituto do Meio Ambiente – PUCRS

Resumo

A Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul tem assumido

uma postura pró-ativa no sentido de diminuir o impacto ambiental de suas

atividades. O desenvolvimento de procedimentos educacionais capazes de

despertar a consciência ambiental e de induzir a mudanças de atitude, nos seus

alunos, servidores, professores, e, conseqüentemente, nas comunidades onde

eles atuam, somado a tomada de iniciativas voltadas para o conhecimento e a

conservação da biodiversidade junto com projetos de pesquisa dirigidos ao

desenvolvimento de novas tecnologias, voltados para produção mais limpa,

energias renováveis, reciclagem de resíduos, redução de emissões, constituem

um elenco de ações destinadas a mitigar e mesmo reverter o estado de

degradação ambiental em que nosso planeta se encontra. A criação de um

Comitê de Gestão Ambiental ligado ao Instituto do Meio Ambiente, com o objetivo

de apoiar a administração universitária além de incentivar, aprovar e promover

atividades multi e interdisciplinares, relacionadas com o meio ambiente na

Universidade e na Sociedade que a envolve é mais uma atitude inovadora no

sentido de alcançar a sua sustentabilidade.

Palavras-chave: Gestão Ambiental, Universidade e Sustentabilidade.

Introdução

O estado de degradação das condições ambientais do planeta em que

vivemos tem sido motivo de preocupação global. Dele decorrem danos à

biodiversidade e a própria espécie humana tem sua existência ameaçada.

O despertar de consciências diante de tais fatos, a partir da segunda

metade do século passado, tem motivado ações no sentido de diminuir, parar e

mesmo reverter os processos de agressão ao meio ambiente decorrentes do

Page 252: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 251

desenvolvimento desenfreado e sem sustentabilidade. As Conferências de

Estocolmo e do Rio de Janeiro, e o Protocolo de Kioto, são alguns dos inúmeros

exemplos de iniciativas de envergadura mundial, direcionados à busca desta

sustentabilidade.

Sabe-se, entretanto, de que nada adiantarão esforços internacionais,

nacionais ou mesmo de menor abrangência, se eles não forem acompanhados de

uma mudança de atitude de cada indivíduo ou de um número cada vez maior de

indivíduos, no sentido de respeitar e proteger o meio em que vivemos, onde se

processa, constantemente, o milagre da vida.

A Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul está engajada

neste processo. As questões ambientais têm sido consideradas nas atividades de

ensino, pesquisa e extensão. A própria gestão universitária vem desenvolvendo

ações que visam a preservação de recursos naturais e do meio ambiente.

Gestão ambiental na Universidade

Em junho de 2008, a PUCRS criou, através de uma iniciativa inovadora da

Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós- Graduação, o Grupo de Trabalho de Gestão

Ambiental. Além de reunir informações e examinar as iniciativas de cunho

ambiental em curso na Universidade, o Grupo teve por meta a elaboração de uma

política de meio ambiente a ser adotada nos campi e extendida às comunidades

envolvidas pela atuação da PUCRS.

Em dezembro de 2008, o Grupo concluiu suas atividades, propondo

Diretrizes Ambientais e a criação de um Comitê de Gestão Ambiental (CGA-

PUCRS), ligado ao Instituto do Meio Ambiente, para atuar de modo permanente

na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. As sugestões foram

aprovadas e estão em fase de implementação.

Deste modo, o CGA-PUCRS terá por objetivos: apoiar à Administração

Superior na formulação de ações voltadas à gestão ambiental de seus campi,

além de incentivar, aprovar e promover atividades relacionadas com o meio

ambiente na Universidade e na Comunidade que a envolve, através de

procedimentos de ensino, pesquisa e extensão.

Page 253: Inovação, universidade e relação com a sociedade

252 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Principais eixos da política de atuação do CGA-PUCRS

As ações relacionadas com o meio ambiente, no âmbito da Universidade,

deverão ser desenvolvidas em torno de três eixos principais: educação ambiental,

redução de impactos ambientais e produção e disseminação de novas

tecnologias capazes de diminuir o estado de degradação em que a Terra se

encontra.

Em primeiro lugar, a Universidade, através de seus procedimentos

educacionais, proporciona, vivência e crescimento cultural para uma importante

parcela da comunidade, formando cidadãos que passam a ser agentes

multiplicadores destes conhecimentos nos seus locais de atuação e de vida.

Diante das atuais circunstâncias é fundamental que se desperte, nestas mulheres

e nestes homens, uma consciência ambiental, uma verdadeira Consciência

Verde, que permita o restabelecimento da sustentabilidade da vida.

Por outro lado, os impactos decorrentes da ação humana são os

responsáveis pela crise ambiental que afeta o nosso planeta. O desenvolvimento

desenfreado promove a degradação dos recursos naturais e humanos. A

modificação e a destruição dos ambientes de vida, afetam a biodiversidade e

provocam a extinção de espécies. A reversão desses processos é fundamental

quando se busca retomar a sustentabilidade ameaçada. É preciso promover e

implementar padrões de produção e de consumo que atendam às necessidades

básicas da humanidade reduzindo as pressões ambientais e mitigando os

impactos decorrentes.

Para atingir estas metas, a Universidade deve atuar como agente de

primeira linha na pesquisa, no desenvolvimento e na inovação, criando e

disseminando novas tecnologias que proporcionem mecanismos de produção

mais limpa, redução de emissões, reciclagem de resíduos, aumento da eficiência

energética e outros processos que reduzam o dano ambiental decorrente das

atividades do homem sobre o planeta. O mesmo deve ocorrer com tecnologias

destinadas a mitigar e/ou reverter processos de degradação objetivando a

regeneração ambiental.

Page 254: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 253

Ações em andamento na Universidade

As questões ambientais têm sido consideradas nas atividades de ensino,

pesquisa e extensão em diversas unidades da Universidade. A própria gestão

universitária vem desenvolvendo ações que visam o uso adequado de recursos

naturais e do meio ambiente. A seguir são apresentadas ações em andamento

promovidas pela PUCRS.

Centro de Pesquisas e Conservação da Natureza – PRÓ-MATA

O projeto Pró-Mata foi concebido dentro da Pontifícia Universidade

Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, em 1991, tendo como propósito a

aquisição de uma área a ser destinada como unidade de pesquisa e conservação.

Utilizando recursos próprios, complementados por significativa doação da

empresa Andreas Stihl, sediada na Alemanha, e com atividades industriais no Rio

Grande do Sul, a PUCRS, em abril de 1993, adquiriu várias propriedades

contíguas, que somadas a áreas de preservação permanente compõem

aproximadamente 3.000 hectares inseridos nos municípios de São Francisco de

Paula, Itati e Maquiné.

A área do Pró-Mata, localizada na região nordeste do RS, no Planalto das

Araucárias e borda da Serra Geral, é coberta por fragmentos de floresta e

pequenos trechos com campos nativos, os quais representam importantes

remanescentes da vegetação original do Rio Grande do Sul. A estratégia de

implantação do Centro nesta área buscou garantir a proteção de áreas,

particularmente aquelas com extrema importância biológica ou complexidade

paisagística e que cumprissem papel de corredor ecológico na região Sul do

Domínio da Mata Atlântica. Esses são alguns dos atributos dos ecossistemas no

Pró-Mata, considerados como prioritários no âmbito da Reserva da Biosfera da

Mata Atlântica da Unesco.

Em abril de 1996, foi oficialmente inaugurada a sede do Centro de

Pesquisas e nestes treze anos de existência, o Pró-Mata se consagrou como um

importante pólo de pesquisa, ensino e extensão, recebendo mais de 2 mil

visitantes ao ano. Em sua atuação, o Pró-Mata passou a trabalhar de forma

efetiva ao lado de inúmeras outras Universidades, entidades governamentais e

não-governamentais, integrado à estratégia de ação em nível nacional e

Page 255: Inovação, universidade e relação com a sociedade

254 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

internacional, que visa a encontrar e definir formas mais adequadas para as

interações do homem com o ambiente. O Pró-Mata adota o apoio à ética que

compatibiliza o desenvolvimento com a conservação na natureza. Assim, são

usuários do Centro pesquisadores, estudantes de graduação e pós-graduação,

participantes de atividades curriculares ou projetos de pesquisa, da PUCRS e de

instituições parceiras.

A dedicação da comunidade atuante no Pró-Mata, aliada à adequada infra-

estrutura para as atividades propostas, garantiu condições para a execução de

projetos de pesquisa, monografias, dissertações, teses e livros, além da produção

de centenas de artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais em

diferentes áreas do conhecimento. A vasta produção científica tem gerado um

amplo acervo de informações sobre o meio físico e biológico regional e local,

disponíveis em forma de relatórios, mapas e publicações. As abordagens do

Centro de Pesquisas integram aspectos que vão da sistemática à ecologia de

espécies e manejo de ecossistemas, e mais recentemente, passou a incluir

também a biologia molecular

Desde 1998, o Pró-Mata vem sendo administrado pelo Instituto do Meio

Ambiente.

Instituto do Meio Ambiente - IMA

A PUCRS criou, em 1998, o Instituto do Meio Ambiente na qualidade de

responsável pelo desenvolvimento de atividades de ensino de pós-graduação e

de pesquisa voltadas para questões ambientais. O IMA oferece o Curso de

Especialização em Gestão da Qualidade para o Meio Ambiente, já na décima

quarta edição. No início de suas atividades, o IMA criou a Comissão de

Gerenciamento de Resíduos da PUCRS – RECIPUCRS, nascedouro de muitas

das atividades que vem sendo levadas a efeito pela Prefeitura Universitária e pelo

Serviço Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho - SESMT e outros

setores da administração universitária. Paralelamente, o IMA tem coordenado

projetos de pesquisa e de extensão, dos quais várias outras unidades

universitárias da PUCRS têm participado, notadamente, a Faculdade de

Biociências, a Faculdade de Engenharia, a Faculdade de Química e o Museu de

Ciência e Tecnologia. Cabe ainda mencionar a criação, em 2007, do “Centro de

Page 256: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 255

Excelência em Pesquisa sobre o Armazenamento de Carbono” através de

convênio com a PETROBRAS e a Agência Nacional do Petróleo.

Centro de Excelência em Pesquisa sobre Armazenamento de Carbono – CEPAC

O CEPAC é um centro interdisciplinar para pesquisa, desenvolvimento,

inovação, demonstração e transferência de tecnologia (PDID&T) em

armazenamento geológico de carbono, vinculado ao Instituto do Meio Ambiente

da PUCRS. As atividades de pesquisa visam à análise da potencialidade, risco,

capacidade, durabilidade e rentabilidade desta atividade, associada ou não à

produção de energia (óleo, gás natural e hidrogênio). As tecnologias em que o

CEPAC se propõe a pesquisar e implantar, uma vez adotadas em escala

comercial, terão grandes conseqüências sociais e ambientais, tanto em nível local

como em nível global.

Ao desenvolver tecnologias para a redução das emissões de gases de

efeito estufa, o CEPAC contribui de forma efetiva para a mitigação das mudanças

climáticas e do aquecimento global, ajudando assim a estabilização da

concentração de CO2 na atmosfera, que em nível local pode ser refletido no não

aumento das ocorrências de eventos climáticos extremos e de mudanças

menores nos ciclos hidrológicos locais, evitando assim os impactos destas

mudanças no meio ambiente e na sociedade.

O CEPAC é o primeiro centro do gênero do país e também o mais bem

equipado para desenvolvimento de pesquisas na área de armazenamento de

carbono. O CEPAC já contribui para o posicionamento de destaque do Estado do

Rio Grande do Sul, com relação ao desenvolvimento de um pólo tecnológico na

área de seqüestro geológico de carbono.

O Centro conta com uma equipe multidisciplinar que envolve

pesquisadores, alunos de graduação, alunos de pós-graduação (mestrado e

doutorado) e professores da PUCRS. Integram a equipe do CEPAC

representantes das seguintes unidades acadêmicas da PUCRS: Instituto do Meio

Ambiente, Faculdade de Química, Faculdade de Engenharia, Faculdade de

Comunicação Social, Faculdade de Biociências e Faculdade de Filosofia e

Ciências Humanas.

Page 257: Inovação, universidade e relação com a sociedade

256 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

No momento, o CEPAC conta com sede própria de 1000 m2 de área

construída no Parque Científico e Tecnológico da Universidade, o TECNOPUC.

Plano Diretor do Campus Central

Considerando a importância da instituição de ensino e pesquisa e a

necessidade de uma adequada inserção na estrutura urbana na cidade é que a

PUCRS e a Prefeitura Municipal de Porto Alegre assinaram em 2003 um termo de

compromisso pelo qual a Universidade se comprometeu a elaborar um Plano

Diretor de Desenvolvimento do Campus Central, contemplando todo o atual

complexo universitário e hospitalar e as futuras obras de expansão.

Como complementação a este Plano Diretor, foi iniciado, em 2006, o

Relatório de Impacto Ambiental, envolvendo os meios físico, biótico e antrópico.

Foram analisadas questões referentes aos ruídos e vibrações, recursos hídricos,

cobertura vegetal, resíduos sólidos, circulação e acessibilidade, urbanização e

regime urbanístico, arqueologia, patrimônio histórico – Colégio Champagnat e

sistema viário. Várias iniciativas mitigatórias vêm sendo postas em prática.

Outras atividades

No âmbito da Universidade, poderiam ser mencionados numerosos

projetos de pesquisa voltados ao conhecimento da biodiversidade levados a efeito

pela Faculdade de Biociências e pelo Museu de Ciências e Tecnologia. O Livro

Vermelho da Fauna Ameaçada de Extinção é um dos importantes resultados que

a PUCRS coloca á disposição da Comunidade.

Projetos voltados para o aproveitamento da energia solar, desenvolvidos

na Faculdade de Física e que levaram à criação do Núcleo Tecnológico em

Energia Solar funcionando no TECNOPUC; projetos voltados para outras formas

de energias renováveis, desenvolvidos no Núcleo Tecnológico de Energia e Meio

Ambiente – NUTEMA e no Departamento de Energia Elétrica da Faculdade de

Engenharia; projetos de pesquisa e de extensão realizados pelo Núcleo de

Estudos e Pesquisa Ambiente e Direito - NEPAD da Faculdade de Direito,

atestam, entre vários outros, a potencialidade que a Universidade dispõe para

desenvolver atividades voltadas para o meio ambiente.

Page 258: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 257

Ações futuras

O Comitê de Gestão Ambiental da PUCRS, a partir de 2009, será

responsável pelo acompanhamento da aprovação e suporte na implementação

das Diretrizes Ambientais, conforme planejamento e prioridades da Instituição.

Deverá, por outro lado, acompanhar as ações ambientais em andamento

na Universidade, procurando atualizar o programa de atividades da Comissão de

Gerenciamento de Resíduos - RECIPUCRS, fazendo um completo levantamento

da produção, gerenciamento e tipos de resíduos nas diferentes unidades da

universidade.

No que diz respeito à educação ambiental deverá estimular a inserção de

conteúdos e atividades ambientais nas disciplinas dos cursos de graduação e

pós-graduação. Deverá, ainda, promover entre estudantes, servidores e

professores, a formação e capacitação de um grupo de agentes facilitadores /

multiplicadores nas diferentes unidades da universidade, capazes de estimular

ações capazes de despertar consciência ambiental.

O CGA deverá manter uma atitude inovadora, articulando seu trabalho com

as demais iniciativas institucionais na área de desenvolvimento social e

econômico, promovendo ações conjuntas de natureza inter e multidisciplinar, com

o objetivo de alcançar a sustentabilidade da Universidade e da Sociedade que a

inclui.

Page 259: Inovação, universidade e relação com a sociedade

ATIVIDADE AUTO-INSTRUTIVA EM BIOÉTICA: A EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA COMO FERRAMENTA DE APRENDIZAGEM PARA PROFISSIONAIS DE

NÍVEL TÉCNICO NA ASSISTÊNCIA A PESSOAS VIVENDO COM HIV/AIDS

SELF-INSTRUCTIVE ACTIVITY ON BIOETHICS: DISTANCE EDUCATION AS A

LEARNING TOOL FOR TECHNICAL LEVEL PROFESSIONALS ASSISTING

PEOPLE LIVING WITH HIV/AIDS

Feijó, Anamaria G. S.; PhD, Instituto de Bioética – PUCRS

[email protected]

Ramos, Mauro C.; PhD, Centro de Estudos de AIDS / DST do Rio Grande do Sul -

CEARGS

[email protected]

Wagner, Paulo R.; PhD, Coordenadoria de Educação à Distância - PUCRS

[email protected]

et al.1

Resumo

Antecedentes: Com a necessidade de aumentar os conhecimentos em

Bioética, a educação à distância pode ser uma ferramenta adequada alcançando

um grande número de profissionais da saúde e pesquisadores em diferentes

regiões geográficas a um baixo custo financeiro. Uma atividade auto-instrutiva

sobre fundamentos da bioética, baseada na Internet, foi desenvolvida em um

projeto conjunto entre o Centro de Estudos de AIDS/DST do Rio Grande do Sul -

CEARGS e a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS,

financiado pela The Wellcome Trust. Descrição: Uma atividade auto-instrutiva de

curta duração, com cinco módulos, objetivando prover instrução básica em

bioética foi desenvolvida por uma equipe multidisciplinar e disponibilizada à

comunidade na Internet, de forma gratuita, no web site da PUCRS, utilizando o

1 Loch, Jussara A; Gauer, Gabriel J.C.; Kipper, Délio J.; Oliveira, Marília G. ; Weber, João B.B.; Calvetti, Prisla U.; Carvalho, Fernanda T.; Müller, Marisa C.; Negreiros, Bruna F.; Nunes, Maura M. S.

Page 260: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 259

ambiente virtual moodle. Questões de avaliação devem ser respondidas pelo

aluno para evoluir para as lições seguintes. Ao completar o curso, os usuários

terão adquirido conhecimentos básicos e habilidades em questões éticas da

prática e pesquisa clínica, especialmente as relacionadas as DST e HIV/AIDS.

Lições aprendidas: O desenvolvimento desta atividade pedagógica foi uma rica

experiência de aprendizagem, em que os profissionais/docentes no campo das

DST/HIV/AIDS, da Bioética e da Informática interagiram de forma multidisciplinar.

Os alunos participantes foram unânimes em considerar o curso informativo, útil, e

de fácil execução.

Palavras-chave: Bioética, Educação à distância, Síndrome da Imunodeficiência

Adquirida.

Abstract

Background: With the need to improve knowledge of bioethics, distance

learning education can be a useful tool, reaching large numbers of health

professionals and researchers in different geographic regions with low cost. An

Internet-based self-instructive activity on fundaments of bioethics was developed

as a joint project of the Centro de Estudos de AIDS/DST do Rio Grande do Sul-

CEARGS and the Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul -

PUCRS, funded by The Wellcome Trust. Description: A five-module, Internet-

based self-paced activity, that intends to provide basic instruction in bioethics was

developed by a multidisciplinary staff and offered free-of-charge to general public

through PUCRS’ moodle web site. Evaluative questions must be answered in

order to proceed to other lessons. At the completion of the modules, users have

acquired basic knowledge and skills in ethics in clinical practice and research,

especially STI/HIV/AIDS issues. Lessons learned: Developing this pedagogical

activity was a rich learning experience in which faculty in the STI/AIDS field,

bioethics, and informatics interacted on a multidisciplinary basis. Participants

unanimously considered the course informative, useful and user-friendly.

Keywords: Bioethics, Education, distance, Acquired Immunodeficiency

Syndrome.

Page 261: Inovação, universidade e relação com a sociedade

260 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Introdução

O cuidado à saúde envolve tanto o atendimento individual, como ações

coletivas, participação política e controle social, já que a escuta à vida não pode

estar orientada somente para os processos fisiológicos ou patológicos. Esta

abordagem precisa fazer parte das reflexões das equipes e dos gestores em

saúde, sempre visando à humanização do atendimento aos pacientes, mediante

um aumento do grau de comprometimento no cuidado e nos serviços de saúde,

dando visibilidade às dimensões ética, subjetiva e humana de sua atuação

profissional. Além de ser uma prerrogativa da lei do Sistema Único de Saúde

(SUS), a humanização deve ser considerada, principalmente, como uma

necessidade de saúde. É importante haver uma constante troca de saberes entre

as diferentes áreas do conhecimento através do diálogo, da participação da

comunidade e do trabalho em equipe, especialmente quando tratamos de um

grupo específico de enfermidades - chamadas doenças infecto-contagiosas - e,

dentre elas, a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS). Estas

enfermidades tornam a pessoa extremamente vulnerável, demandando atenção,

respeito e cuidado especial.

Esta visão de cuidado especial com a vulnerabilidade é compartilhada pela

Bioética, área multidisciplinar de reflexão sobre conflitos que a sociedade

contemporânea nos apresenta em função dos avanços tecnológicos ou da má

distribuição de recursos. A verdade é que os conflitos que são estudados no

âmbito da Bioética resultam de uma situação histórica concreta, ou seja, de um

problema real que leva, naquele momento, a uma preocupação pública.

O Centro de Estudos de AIDS / DST do Rio Grande do Sul (CEARGS), sensível à

vulnerabilidade das pessoas vivendo com HIV/AIDS e preocupada com sua

responsabilidade em formar de maneira integral os cuidadores destas pessoas

em seus cursos e treinamentos, elaborou um projeto que foi financiado pela

Wellcome Trust. Sabedor do conhecimento aprofundado em Bioética de um grupo

de docentes da PUCRS, liderado, na época, pelo Prof. Dr. Joaquim Clotet, o

CEARGS estabeleceu contato com este professor visando propor a elaboração

de um instrumento educativo que pudesse auxiliar na formação de seus alunos.

Desta forma concretizou-se uma profícua parceria entre os docentes de

Bioética (hoje congregados no Instituto de Bioética) e do setor de Educação a

Page 262: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 261

Distância (EAD) da PUCRS com os profissionais do CEARGS, viabilizando uma

atividade auto-instrutiva de introdução à Bioética, disponível no site da nossa

Universidade e que traz aos interessados, já que é oferecida não apenas aos

alunos do CEARGS, mas à sociedade em geral, noções básicas de Bioética,

valorando o cuidado com a vulnerabilidade e salientando a atenção que deve ser

dada às pessoas vivendo com HIV/AIDS.

Objetivos

Geral: Propiciar à sociedade em geral e aos alunos do Centro de Estudos

de AIDS / DST do Rio Grande do Sul (CEARGS) informações e capacitação

teórica para refletir sobre as implicações ético-sociais da Síndrome de

Imunodeficiência Adquirida e da vulnerabilidade das pessoas vivendo com

HIV/AIDS, desde uma perspectiva bioética.

Específico: Elaborar uma atividade auto-instrutiva de introdução à

Bioética, a ser realizada de forma não presencial (à distância), para alunos e

técnicos científicos de nível médio do CEARGS e para sociedade em geral.

Descrição do processo de inovação

O CEARGS, atento às tendências educacionais contemporâneas,

entendeu que a Bioética seria uma área de importância para fornecer subsídios

teóricos fundamentais à formação dos alunos de seus cursos preparatórios,

inclusive por seu caráter multidisciplinar. Sendo assim, uma equipe deste órgão

propôs ao líder da Bioética na PUCRS, a elaboração conjunta de um projeto de

construção de uma atividade auto-instrutiva, semelhante a um curso de

capacitação, a ser submetido à aprovação de uma instituição internacional, a

Wellcome Trust, a qual possibilitaria os recursos financeiros para a execução do

projeto. A partir do aceite da Wellcome Trust elaborou-se um cronograma de

ações para organizar as reuniões e contatos visando dar conteúdo didático-

pedagógico ao projeto.

Page 263: Inovação, universidade e relação com a sociedade

262 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Opção pelo ensino à distância

A escolha de uma modalidade de ensino à distância, já esboçado no

projeto, tomou vulto, levando em consideração as exigências da

contemporaneidade, com aceleradas transformações, tanto culturais quanto nas

inovações tecnológicas, onde os espaços formais para a educação têm sido

complementados pela crescente demanda pela EAD, permitindo que várias

instituições de ensino e capacitação desenvolvam estudos e experiências para

aperfeiçoar o processo de transposição da educação para além de seus muros.

Ao fomentar a incorporação das tecnologias de informação e comunicação (TICs)

e das técnicas de educação a distância aos métodos didático-pedagógicos

tradicionais, a utilização da Internet na instrução auxilia no processo de

democratização do saber, na valorização da informação e no uso da informática e

da comunicação para integrar o humano e o tecnológico; o individual, o grupal e o

social.

Formação da equipe

A equipe formada para a elaboração dos conteúdos constou de três grupos

de profissionais: docentes de Bioética da PUCRS, responsáveis pelo

desenvolvimento dos temas éticos e bioéticos; técnico-científicos do CEARGS,

responsáveis pela assessoria nos temas relacionados ao HIV/AIDS; professores e

instrutores do Setor de EAD da PUCRS, responsáveis por adaptar os conteúdos

para o formato on-line e criar o espaço virtual do curso. Cada equipe contou com

um coordenador de área, conforme descrito na Figura 1.

Equipe Bioética/PUCRS Equipe CEARGS Equipe EAD/PUCRS

Anamaria G. S. Feijó – FABIO (coord) Délio J. Kipper - FAMED Gabriel J. C. Gauer - FAPSI João Batista B. Weber - FO Jussara de A. Loch - FAMED Marília G. de Oliveira - FO

Mauro C. Ramos (coord) Fernanda T. Carvalho Marisa C. Müller Prisla U. Calvetti

Paulo R. Wagner - (coord) Bruna F. de Negreiros Maura M. de Souza Nunes

Figura 1 – Equipe multiprofissional responsável pela elaboração do curso

Page 264: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 263

Elaboração e desenvolvimento dos conteúdos

As equipes trabalharam de forma multidisciplinar, lendo, revisando e

comentando o trabalho dos colegas, sendo que a maioria dos contatos para

leitura e comentários sobre o teor dos capítulos foram feitos de forma eletrônica

por e-mail. À medida que os capítulos iam sendo finalizados e aprovados pelos

coordenadores, eram encaminhados ao EAD para inserção em espaço específico

no ambiente virtual moodle da PUCRS.

Para determinar se o curso estava suficientemente claro para ser

disponibilizado à comunidade em geral, foi realizado um teste piloto com sete

profissionais de saúde que trabalham na área de DST/HIV/AIDS, que fizeram

comentários e sugestões, propiciando as necessárias adequações de conteúdo,

linguagem e ambiente gráfico. Desta forma, o layout foi melhorado e o conteúdo

revisado, antes do curso ser colocado on-line.

Os temas foram planejados e distribuídos em cinco módulos, com o

objetivo de sistematizar os assuntos, permitindo ao aluno uma aprendizagem

progressiva, de modo que conceitos fundamentais, necessários para o

entendimento dos conteúdos posteriores, fossem apresentados no início do

estudo.

O primeiro módulo tratou do histórico da Bioética, de conceitos importantes

da disciplina e procurou dar uma noção da Teoria Principialista. O segundo

módulo versou sobre Ética em pesquisa com seres humanos e animais. O

terceiro módulo e o quarto foram elaborados tratando das questões bioéticas e

deontológicas relacionadas às doenças infecto-contagiosas, enfatizando a AIDS,

e o quinto e último módulo tratou da vulnerabilidade na assistência e na pesquisa

em saúde (Figura 2)

Page 265: Inovação, universidade e relação com a sociedade

264 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Módulo 1 – Introdução à Bioética 1.1 Termos introdutórios fundamentais 1.2 Bioética - Histórico 1.3 Explicitando o conceito de Bioética (meio-ambiente, animal não-humano, área biomédica). 1.4 Principialismo (Denúncia de Beecher, Relatório Belmont, Teoria Principialista). Módulo 2 – Ética em Pesquisa 2.1 Pesquisa envolvendo seres humanos 2.1.1 Introdução e breve histórico dos aspectos regulatórios. 2.1.2 Ética aplicada à pesquisa com seres humanos. 2.1.3 Termos e definições referentes à pesquisa envolvendo seres humanos. 2.1.4 Requisitos mínimos para uma pesquisa eticamente correta. 2.2 Pesquisa envolvendo animais 2.2.1 Por que usamos animais na pesquisa científica? 2.2.2 Por que a preocupação com o uso de animais na investigação científica? 2.2.3 Quem pode auxiliar no uso eticamente adequado dos animais na pesquisa? 2.2.4 Que leis existem?Que legislação seguir? Módulo 3 - Os conflitos morais na prática clínica e a busca de soluções 3.1 Relação médico-paciente: 3.2 Direitos dos pacientes e o processo de consentimento livre e esclarecido. 3.3 Deveres de conduta dos profissionais de saúde: 3.3.1 Códigos deontológicos profissionais. 3.3.2 Ética dos Princípios, do Cuidado e das Virtudes. 3.4 Os Comitês de Bioética como instância de mediação dos conflitos: o que são e como funcionam. Módulo 4 - Infecção pelo HIV/AIDS 4.1 Cuidados clínicos e ética na sociedade 4.1.1 Aspectos legais, relacionados ao trabalho e à notificação dos casos. 4.1.2 Aspectos relacionados à testagem para o HIV e à responsabilidade do portador. 4.1.3 Privacidade, confidencialidade e revelação do diagnóstico para outras pessoas do convívio do doente. 4.1.4 Aspectos relacionados ao tratamento, à transmissão vertical e aos direitos reprodutivos. 4.1.5 Paciente terminal e risco de morte pelo HIV. 4.1.6 Ética na pesquisa em HIV/AIDS. Módulo 5 - Vulnerabilidade 5.1. Conceituação. 5.2 Vulnerabilidade no Ensino, na Pesquisa, na Extensão e na Prática Clínica Profissional.

5.3 O Consentimento Livre e Esclarecido nos casos de vulnerabilidade (Crianças e adolescentes; pessoas com desordens cognitivas; indígenas; população carcerária; grupos estigmatizados (raças e etnias; gênero e sexualidade; patologias psíquicas e somáticas).

5.4 Normas de pesquisa em saúde. Figura 2. – Quadro-resumo dos conteúdos dos módulos on-line

Além dos conteúdos considerados básicos para esta atividade introdutória,

passíveis de serem impressos para estudo, oportunizou-se ao aluno a ampliação

de seus conhecimentos através de leituras complementares, disponibilizadas nas

próprias lições através de links a artigos científicos, capítulos de livros

devidamente autorizados pelos autores, sugestões de filmes e visitas a páginas

web (Figura 3).

Page 266: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 265

Figura 3 – Sugestão de atividades complementares

Acesso ao moodle

Ao acessar a página do ambiente virtual moodle da PUCRS e localizar a

Atividade de Introdução à Bioética (Atividades Abertas à Comunidade), o aluno

tem condições de realizar seu registro por meio de senha personalizada e seus

acessos ao conteúdo das lições ficam garantidos por um período de um mês para

completar os cinco módulos. Quando realizadas em uma única sessão, a leitura

dos textos e quadros obrigatórios e as respostas às questões de avaliação,

permitem ao aluno concluir a atividade em um tempo aproximado de duas horas.

(Figura 4)

Figura 4 – Tela de acesso à Atividade Auto-Instrutiva de Introdução à Bioética

Page 267: Inovação, universidade e relação com a sociedade

266 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Avaliação da aprendizagem

A avaliação da aprendizagem do aluno é realizada também on line, no

decorrer dos capítulos, ao responder perguntas objetivas, possibilitando ao aluno

a verificação de quanto está aprendendo e apreendendo do assunto. Se as

questões não forem corretamente respondidas, o estudante é convidado a

retornar ao início do segmento, estudá-lo novamente e refazer o pós-teste. Se

aprovado, recebe autorização para passar ao módulo seguinte. Após a finalização

dos conteúdos, o aluno está autorizado a imprimir uma declaração eletrônica de

conclusão da atividade. (Figura 5)

Figura 5 – Exemplo de atividade de avaliação da aprendizagem do aluno

Resultados obtidos

O Atividade Auto-Instrutiva de Introdução à Bioética permanece disponível

no ambiente virtual moodle da PUCRS (http://moodle.pucrs.br – atividades

abertas à comunidade) desde março de 2008. Até a presente data, cerca de 200

alunos realizaram a atividade on-line, com aproveitamento integral, sendo que os

participantes foram unânimes em considerar os conteúdos informativos, úteis e de

fácil execução. O CEARGS também tem utilizado os módulos de Introdução à

Page 268: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 267

Bioética como pré-requisito para a realização de seus cursos de Metodologia em

Pesquisa Clínica.

Considerações finais

O desenvolvimento desta atividade didático-pedagógica foi uma rica

experiência de aprendizagem, em que os profissionais/docentes do campo das

DST/HIV/AIDS, da Bioética e da Informática interagiram de forma inter e

multidisciplinar.

O caso relatado exemplifica com propriedade a importância dada por

nossa Universidade ao diálogo e à interação com a Sociedade. Buscando

responder à realidade, necessidades e anseios da população, a PUCRS, nesta

parceria com o CEARGS, estende à comunidade - através de recursos

inovadores e atuais como as ferramentas de Educação à Distância - suas

atividades de ensino e pesquisa com vistas à elevação do nível de educação e

cultura do povo, como preconizado em seu Marco Referencial.

Referências

BEAUCHAMP, T.; CHILDRESS, J. Principles of biomedical ethics. New York: Oxford University, 1994. BEECHER, H. Ethics and Clinical Research. The New England Journal of Medicine, n.16, jun. 1966: 1340-60. BLOCH, S., CHODOFF, P. & GREEN, S. A. Psychiatryc Ethics.3 ed.New York: Oxford Press, 2003. BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE. Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº. 196/96. In: http://www.conselho.saude.gov.br/ Acesso em: 20.10.2007. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Recomendação para a terapia antiretroviral em adultos e adolescentes infectados pelo HIV: 2005/2006. 6 ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2007. CALVETTI P.; HARZHEIM E.; VIANA L., GERMANY C.; RAMOS M. Publicações científicas em DST, HIV e AIDS: descrição de procedimentos bioéticos nas recomendações para os autores e em artigos selecionados. Jornal Brasileiro de DST, 2005. v.17(3).p. 177-180.

Page 269: Inovação, universidade e relação com a sociedade

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Page 270: Inovação, universidade e relação com a sociedade

GERONTOARQUITETURA - O DESPERTAR DA CONSCIÊNCIA DE UMA NOVA REGULAMENTAÇÃO

ARQUITETÔNICA -

Souza, Fabiane Azevedo de; Arquiteta Me [email protected]

Souza, Antonio Carlos Araújo; PhD

Ferreira, Mario dos Santos; Arquiteto Dr [email protected]

Gomes, Irenio; PhD [email protected]

Resumo

Introdução: Poucos problemas têm despertado tanto a preocupação do

próprio homem em toda sua história como as alterações relacionadas ao

envelhecimento e à incapacidade funcional, associada a este período do

desenvolvimento humano. O projeto de ajuste dos espaços para o seu uso torna-

se cada vez mais importante, pois todos os esforços que tem como finalidade

aumentar a probabilidade de uma vida com maior autonomia, significam torná-la

mais segura e adaptada às limitações naturais decorrentes do envelhecimento. A

ausência de um conhecimento mais específico sobre as medidas antropométricas

desta população incorre em uma maior dificuldade de planejamento. Objetivos: O presente estudo teve como objetivo geral: Determinar padrões referenciais

antropométricos da população idosa de Porto Alegre. Os objetivos específicos

foram: Caracterizar física e dimensionalmente a população de idosos; avaliar as

alterações morfológicas relacionadas ao envelhecimento, através de

levantamento antropométrico; analisar e comparar os valores coletados na

amostra com os valores utilizados como referência na bibliografia; Materiais e Métodos: Inserido dentro do Projeto Multidimensional dos Idosos de Porto

Alegre, este trabalho foi definido como sendo transversal exploratório e

observacional de base populacional para os eventos mais freqüentes da

população idosa, com a participação de 476 idosos, com idade acima de 60 anos.

A coleta de dados foi realizada na PUCRS, após o preenchimento do termo de

consentimento. Resultados: O estudo mostrou que, de maneira geral, as

medidas avaliadas sofrem alterações significativas com o envelhecimento. E

estas são observadas principalmente no tronco. Os segmentos formados por

Page 271: Inovação, universidade e relação com a sociedade

270 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

ossos longos tendem a não sofrer reduções importantes. Comparadas às

dimensões utilizadas como referência na bibliografia, as medidas coletadas

apresentaram um perfil de idoso menor e com estatura inferior. Conclusões:

Através deste levantamento pudemos estabelecer comparações e apontar

diferenças suficientemente importantes para afirmar que os dados utilizados como

padrão não são adequados à nossa população.

Palavras–chave: antropometria aplicada, dimensionamento humano, habitação

adaptada.

O envelhecimento progressivo da população humana constitui um sério

desafio para a civilização contemporânea (Yusuff, 2007) e o projeto de ajuste dos

espaços e produtos para o seu uso torna-se cada vez mais importante, pois todos

os esforços que tem como finalidade aumentar a probabilidade de uma vida, com

maior autonomia, significam diretamente torná-la mais segura e adaptada às suas

limitações naturais decorrentes do envelhecimento.

O entendimento deste processo de envelhecimento como uma ocorrência

natural do ciclo de vida é fundamental na compreensão do seu impacto sobre as

condições de saúde associadas à longevidade e à qualidade de vida dos seres

humanos. Ele não deve ser considerado uma doença, mas um evento contínuo e

inevitável, com características específicas e alterações cumulativas (Hayflick,

1997). As conseqüências deste processo no ser humano pode nos levar a

generalizar o idoso como um potencial portador de deficiências, o que difere

radicalmente de rotulá-lo como deficiente físico.

Embora as perdas funcionais que ocorrem em nossos sistemas vitais em

função do envelhecimento sejam eventos esperados e aumentem a nossa

vulnerabilidade, as doenças associadas à velhice não são parte do processo

normal de envelhecimento (Hayflick, 1997).

A Organização Mundial de Saúde argumenta que os países podem custear

o envelhecimento se os governos, as organizações internacionais e a sociedade

civil implementarem políticas e programas de “envelhecimento ativo” que

melhorem a saúde, a participação e a segurança dos cidadãos mais velhos. A

hora para planejar e agir é agora (OMS, 2005).

Page 272: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 271

Cabe à área biomédica o estudo do processo biológico do envelhecimento.

À arquitetura, como uma área social, cumpre a missão de estudar as alterações

físicas que ocorrem nesta fase e relacioná-las ao meio ambiente no qual ele vive,

propondo soluções que facilitem a vida dos indivíduos idosos – é o que passamos

a partir de então de chamar de GERONTOARQUITETURA.

A seguir, serão apresentados aspectos do processo de envelhecimento

humano e suas principais alterações. Alterações estas que influenciam

diretamente no planejamento de ambientes adaptados a determinados grupos de

indivíduos. Finalizando este capítulo abordaremos os temas relacionados às

proporções humanas e sua relação nos idosos. Após, serão descritas as

implicações das barreiras arquitetônicas no cotidiano do idoso.

A existência de numerosos conceitos por si só deixa clara a dificuldade de

entendimento do processo de envelhecimento (Papaléo, 2005) Dentre tantas

definições, a que conceitua o envelhecimento como um processo dinâmico e

progressivo, no qual há modificações morfológicas, fisiológicas, bioquímicas e

psicológicas (Papaléo, 2002) determinando uma perda progressiva da capacidade

de adaptação do indivíduo ao meio ambiente, ocasionando maior vulnerabilidade

é a que mais se aproxima do complexo processo de envelhecer. No intuito de

incorporar esse rigor dentro de uma definição operacional, foi proposto (Jeckel,

2002) que mudanças fundamentais relacionadas com a idade devem obedecer a

quatro condições: devem ser deletérias - alteram e tendem a reduzir a

funcionalidade do organismo, devem ser progressivas - se estabelecem

gradualmente, devem ser intrínsecas - não é o resultado de um componente

ambiental modificável e devem ser universais: todos os membros de uma espécie

deveriam mostrar tais mudanças graduais com o avanço da idade.

As alterações fisiológicas que ocorrem com a idade nos seres humanos

resultam de um somatório do processo de envelhecimento associado ou não às

doenças crônicas. Existe consenso que, com o envelhecimento, ocorrem

alterações morfológicas intrínsecas aos tecidos e órgãos que por sua vez alteram

a morfologia externa do indivíduo durante o envelhecimento. É uma “Aging

Conspiracy” (Wajngarten, 2205) uma conspiração do envelhecimento contra o ser

humano.

Paralelamente à evolução cronológica, coexistem fenômenos de natureza

biopsíquica e social, importantes para a percepção da idade e do envelhecimento.

Page 273: Inovação, universidade e relação com a sociedade

272 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Nas sociedades ocidentais é comum associar o envelhecimento com a saída da

vida produtiva pela via da aposentadoria. São considerados velhos aqueles que

alcançam 60 anos de idade, o que torna difícil caracterizar uma pessoa como

idosa utilizando como único critério a idade. Além disso, neste segmento

conhecido como terceira idade estão incluídos indivíduos diferenciados entre si,

tanto do ponto de vista socioeconômico como demográfico e epidemiológico.

Mesmo reconhecendo que a idade não é o único parâmetro para definir o

processo sócio-demográfico do envelhecimento, o mesmo é usado a fim de

facilitar a análise dos dados e a construção de indicadores.

Todas as estruturas, tecidos e funções, modificam-se em alguma extensão

com o envelhecimento. Do ponto de vista do desenvolvimento de projetos que

visam à adequação da moradia para os indivíduos da terceira idade, algumas

alterações decorrentes deste processo são mais importantes.

Quando nos referimos às alterações morfológicas temos que as diferentes

populações mundiais são compostas de indivíduos de diferentes tipos físicos e

biótipos. Pequenas diferenças nas proporções de cada segmento corporal

existem desde o nascimento e tendem a acentuar-se durante o crescimento, até a

idade adulta. Destes, a composição corporal, a estatura e o peso são os que

influenciam diretamente na composição do envelope humano. O termo “envelope

humano” é constituído pelo delineamento externo do indivíduo, isto é, o espaço

que suas proporções ocupam em um ambiente.

No fator composição corporal, temos que o componente adiposo, tende a

aumentar e apresentar distribuição centrípeta com o avanço da idade,

depositando-se a gordura principalmente na região abdominal. Nas mulheres,

como o depósito de gordura é maior, a densidade corpórea é menor que a do

homem da mesma faixa etária (Papaléo, 2005). Com isso teremos diferenças

importantes, não só no gênero, mas também relacionadas às faixas etárias.

Outras alterações morfológicas importantes que devem ser consideradas

no projeto e/ou design de produtos para esta faixa da população são as

relacionadas ao aumento do diâmetro antero-posterior e redução do diâmetro

transverso do tórax nos idosos, constituindo o que chamamos de tórax senil.

A partir dos 40 anos de idade, que é até quando a estatura se mantém,

temos uma redução de cerca de um centímetro por década, devendo este fato a

um aumento das curvaturas da coluna, encurtamento da coluna vertebral devido

Page 274: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 273

às alterações nos discos intervertebrais (Panero, 2002). Acentuando-se após os

70 anos (Papaléo, 2002).

Entre as diversas alterações que podem acontecer no sistema nervoso

central, a redução dos reflexos é uma das que mais importam no que se relaciona

à autonomia do indivíduo pelo maior risco de quedas.

Em relação às alterações musculares há uma progressiva redução da força

motora em parte pela diminuição da atividade física que gradualmente ocorre com

a idade, mas igualmente pela redução do número de fibras musculares que

acontece com o envelhecimento, a sarcopenia.

Duas são as alterações mais freqüentes relacionadas à coluna vertebral

que ocorrem com o envelhecimento. A primeira é uma progressiva redução de

altura dos discos intervertebrais que reflete na diminuição da estatura, geralmente

da ordem de um centímetro a cada década, acentuando-se após os 60 anos de

idade (Dieter, 2005).

A segunda alteração está relacionada à osteoporose, que induz a uma

redução da massa óssea e da resistência da vértebra podendo ocasionar uma

redução da altura vertebral por deformidade, que pode acontecer de forma

progressiva, assintomática ou de forma aguda quando ocorre uma fratura. Esta

alteração, geralmente diminui a estatura em cerca de dois centímetros para cada

vértebra comprometida, ocorrendo em curto espaço de tempo (Souza, 2002).

Em relação às alterações sensoriais a visão é um dos aspectos mais

importantes que devem ser levados em conta no desenvolvimento de um projeto

arquitetônico, considerando-se que a visão é um dos sentidos que mais é afetado

pelo processo de envelhecimento. A diminuição da acuidade visual (Terra, 2003)

pode ser ocasionada, como na catarata, por uma redução da transparência do

cristalino, ou mesmo pelas alterações de outras estruturas do olho fazendo com

que o indivíduo idoso utilize óculos com grande freqüência. Este aspecto é

importante pelo fato de que idosos, muitas vezes, por não ajustarem com

freqüência suas lentes passam a ter dificuldades visuais que podem induzir aos

acidentes.

Além da redução da acuidade visual, temos as alterações na visão

periférica, a dificuldade de discriminação de cores e a incapacidade de equilibrar

o contraste de luz ao mudar de ambientes (Terra, 2003). Este declínio dos fatores

sensoriais é considerado freqüente dentro do processo do envelhecimento.

Page 275: Inovação, universidade e relação com a sociedade

274 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

A grande variabilidade das medidas corporais entre os indivíduos

apresenta um grande desafio(Kroemer, 2005) para o arquiteto e/ou designer de

equipamentos e espaços. Em cada processo projetual de arquitetura, as

dimensões e os movimentos do corpo humano (Boueri, 1999) são fatores

determinantes da forma e tamanho dos equipamentos, mobiliários e espaços

projetados.

O espaço que uma pessoa necessita para realizar uma atividade com

segurança depende do tipo de atividade executada, bem como de suas

características anatômicas e funcionais. A falta de espaço adequado pode

restringir o desenvolvimento correto da atividade doméstica, elevar o gasto de

energia humana e aumentar a incidência de erros (Kroemer, 2005).

Com importância fundamental em nossa qualidade de vida e bem-estar,

um ambiente físico adequado pode representar a diferença entre a dependência e

a independência para todos os indivíduos, mas especialmente para aqueles mais

idosos.

Pessoas que residem em moradias que oferecem múltiplas barreiras

físicas tendem a sair de casa com menos freqüência e por isso estão mais

sujeitas ao isolamento, depressão, menor preparo físico e conseqüentemente

terão problemas de mobilidade.

O fato de não existirem estudos antropométricos específicos para as

necessidades de adaptação do ambiente próprias à sua condição dificulta a

execução de projetos adequados para esta população, visto que, ao se projetar,

para se evitar erros, é preciso delinear o perfil do usuário.

Um ambiente adequado a idosos ativos atua como agente de prevenção

de eventos inesperados e por conseqüência, acidentes. Grande parte dos idosos

é capaz de reconhecer os perigos existentes relacionados ao manejo do

ambiente.

Estratégias ambientais que visam dar sustentação à mobilidade segura e

reduzir o risco de quedas baseiam-se em três abordagens gerais (Perracini,2005):

identificação e eliminação de barreiras, adaptação do ambiente e proporcionar

esquemas de emergência para o caso de eventuais acidentes; tais como

campainhas e alarmes de fácil acesso. Essas medidas, embora ainda pouco

realizadas, são os primeiros passos na direção da redução das barreiras

arquitetônicas.

Page 276: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 275

Embora as quedas não sejam eventos exatamente decorrentes do

processo de envelhecimento, a sua freqüente ocorrência nesta população a torna

um fato típico do paciente idoso (Iida, 2002). As quedas podem decorrer de uma

série de problemas, sejam eles intrínsecos ou extrínsecos. Os que se referem aos

fatores intrínsecos relacionam as mudanças relativas à idade, sedentarismo,

redução de reflexos, equilíbrio, negação da fragilidade, entre outros. Enquanto

que os extrínsecos referem-se aos problemas de barreiras ambientais, ambientes

potencialmente inadequados, medicação que afeta o equilíbrio, entre outros. No

que se refere ao risco acentuado de quedas de própria altura, temos que o tempo

de reação de uma pessoa de sessenta anos, segundo Iida, 2002, é 20% maior do

que de jovens com vinte anos e essa diferença tende a crescer em tarefas mais

complexas, que exijam capacidade de discriminação entre vários estímulos

diferentes.

Os idosos são mais vulneráveis a determinados tipos de acidentes, sendo

o banheiro o ambiente responsável por grande parte dos acidentes domésticos

tornando-se um local de atenção contínua. As quedas trazem consigo

complicações que por muitas vezes são as responsáveis pelo comprometimento

da qualidade de vida do indivíduo(Dieter, 2003). É de total importância diferenciar

os indivíduos idosos normais que apresentam alterações típicas do

envelhecimento com o grupo de indivíduos que possui deficiências físicas, quer

sejam elas por acidentes ou por demais causas, dessa forma entendemos a

urgente necessidade de avaliar as alterações morfológicas que os indivíduos

apresentam com o envelhecimento para, a partir daí, procurarmos as soluções

que poderiam estar relacionadas à criação de normas específicas para os idosos.

Em leis e normas, o idoso está associado ou incluído no grupo de pessoas

portadoras de deficiência. É necessário entender que o envelhecimento é uma

fase natural da vida do homem, apresentando limitações tanto quanto nos demais

ciclos da vida. As barreiras atitudinais existem e são reforçadas pelo estigma e

preconceito, não se devendo agregar aos já inúmeros preconceitos associados

aos idosos, também a condição de deficiente físico.

Por ser uma fase da vida de maior probabilidade de perdas contínuas:

limitações funcionais, perda do emprego, perda de companheiros, há uma

tendência à esteriotipação generalizada da velhice. Com o objetivo de se

Page 277: Inovação, universidade e relação com a sociedade

276 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

minimizar os preconceitos arraigados a esta população é que se torna tão

importante o conhecimento de suas características.

Sabe-se da forte influência que o ambiente físico exerce sobre o cotidiano

do indivíduo, especialmente no idoso em função do número de horas em que este

permanece na sua residência.

Torna-se necessário ratificar que as limitações decorrentes do avanço da

idade não são o verdadeiro problema, uma vez que são parte do ciclo natural de

vida humana. O problema real é a falta de interação entre as limitações e

diversidades humanas com o ambiente em que vivem fazendo-se com que a

tarefa do arquiteto seja a de superar essas dificuldades e projetar ambientes que

compensem essas limitações.

Justificativa

Estudos de amostras populacionais são fundamentais para o entendimento

dos desafios que surgem em uma população em processo de envelhecimento.

Superar esses desafios requer um planejamento inovador e reformas políticas

substanciais tanto em países desenvolvidos como em países em transição. Os

países em desenvolvimento enfrentam os maiores desafios, e a maioria deles

ainda não possui políticas abrangentes para o envelhecimento. A ausência de um

conhecimento mais específico sobre as medidas antropométricas desta

população incorre em uma maior dificuldade de planejamento, onde

normatizações específicas poderiam minimizar efeitos decorrentes de

inadaptação de espaços e ambientes através de uma prevenção seja ela primária

ou secundária. A relevância deste projeto está relacionada à definição de

parâmetros morfométricos dos idosos da nossa população de forma a permitir o

desenvolvimento de normas específicas. É sobre este estudo que se propõe um

trabalho de medição desta população que embora saudável possui limitações

reconhecidas pela avançada idade. Indivíduos que continuam exercendo

atividades profissionais, físicas, realizando viagens, desfrutando da condição

financeira que acumularam durante os anos de trabalho pleno.

Page 278: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 277

Objetivo Geral

Determinar padrões referenciais antropométricos da população idosa de

Porto Alegre.

Objetivos Específicos

Caracterizar física e dimensionalmente a população de idosos; Avaliar as

alterações morfológicas relacionadas ao envelhecimento, através de

levantamento antropométrico; Analisar e comparar os valores coletados na

amostra com os valores utilizados como referência na bibliografia para execução

de projetos de espaços e ambientes;

Delineamento Do Estudo

O projeto maior, Estudo Multidimensional dos Idosos de Porto Alegre, no

qual se insere este estudo foi definido como sendo transversal exploratório e

observacional de base populacional para os eventos mais freqüentes da

população idosa.

Seleção da Amostra

Os critérios norteadores da escolha da amostra foram os mesmos

empregados no Levantamento de 1995 e baseado no censo populacional de

2000. A determinação do n da amostra para o presente estudo baseou-se no

número de indivíduos avaliados no estudo anterior para cada bairro da cidade de

Porto Alegre, atualizados pelo IBGE de acordo com as estimativas de variação

populacional para 2005 que foram calculadas a partir dos resultados do censo de

2000. O número de indivíduos necessários para constituir uma amostra

representativa da população idosa de Porto Alegre em 1995 foi definido como

sendo de 880 indivíduos ou 0,69% da população idosa estimada de 132.965

habitantes para 1995. O mesmo percentual foi calculado para a população idosa

estimada em 2005, resultando em uma amostra de 1164 indivíduos, os quais

foram avaliados em seus domicílios. Do total de indivíduos da amostra inicial, 483

participantes, sendo 137 homens e 346 mulheres, compareceram à segunda

avaliação.

Page 279: Inovação, universidade e relação com a sociedade

278 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Critérios de Inclusão

Foram incluídos indivíduos socialmente ativos selecionados na Fase I e

que compareceram à Fase II deste estudo o qual obedeceu a um critério de

amostra populacional com base no censo do IBGE.

Critérios de Exclusão

Indivíduos portadores de deformidades físicas congênitas ou adquiridas

com uso de próteses; Indivíduos portadores de doenças neurológicas ou

degenerativas graves. Da amostra selecionada 7 indivíduos , 5 homens e 2

mulheres, foram excluídos.

Coleta dos Dados e Instrumentos

O levantamento de dados desta população foi realizado dentro do projeto

“Avaliação Multidimensional dos Idosos de Porto Alegre”, no qual os indivíduos

foram transportados até o Campus da PUCRS para estas coletas entre outras de

diversas unidades desta Universidade. A avaliação foi feita através de

instrumento de medida métrica validada pelo INMETRO (trena metálica

antropométrica marca Sanny). As medições na posição sentada foram realizadas

sobre um cubo de mdf laminado com 40 cm de largura, 40 cm de altura e 40 cm

de profundidade. A avaliação foi feita com os indivíduos descalços e com menor

volume de roupas quanto possível. A mensuração de estatura foi realizada com

estadiômetro.

As variáveis medidas foram as seguintes: Estatura em posição ortostática;

Altura de ombros em posição sentada; Altura de olhos em posição sentada;

Comprimento nádega-joelho em posição sentada; Comprimento nádega-poplítea

em posição sentada; Altura do joelho em posição sentada; Alcance da ponta da

mão estendida; Altura solo - virilha em posição ortostática; Altura solo - cotovelo

em posição ortostática;

Largura dos ombros em posição sentada;

Análise Estatística

Os dados foram armazenados em uma planilha Excel e Access. As

análises foram realizadas no programa SPSS (Statistical Package for the Social

Page 280: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 279

Sciences) versão 11.5. Adotou-se um nível de significância de 5%. Os resultados

foram comparados com os valores expressos em tabelas de referências para a

população adulta e avaliadas as respectivas diferenças entre as medidas.

Aspectos Éticos

A realização do presente estudo foi efetuada após a aprovação da

Comissão Científica do Instituto de Geriatria e Gerontologia da PUCRS e do

Comitê de Ética em Pesquisa na Área de Saúde da PUCRS. Os voluntários da

pesquisa assinaram termo de consentimento livre e esclarecido. A pesquisa foi

conduzida dentro das normas da Resolução 196/1996 do Conselho Nacional de

Ética em Pesquisa (CONEP) sob número de aprovação 1066/05-CEP, em 07 de

novembro de 2005 com o título “Estudo Multidimensional Comparativo de 10

anos: 1995-2005”.

Discussão e Considerações Finais

O presente estudo foi desenvolvido com o objetivo de produzir padrões de

referência dimensionais da população idosa que venham a auxiliar aos

profissionais, tanto da área biomédica quanto àqueles que desenvolvem projetos

relacionados à ergonomia ou ao planejamento de espaços para a população

idosa. Por ser uma fase da vida de maior probabilidade de perdas contínuas:

limitações funcionais, perda do emprego, perda de companheiros, há uma

tendência a esteriotipação generalizada da velhice. É importante enfatizar a

necessidade de se projetar ambientes seguros, sobre os quais os idosos possam

exercer as atividades com autonomia e, com isso, aumentar seu senso de

eficácia e auto-estima. Para vir de encontro a esta necessidade é que se propôs a

montagem deste trabalho a partir da ausência de dados morfométricos de

populações específicas tais como a população idosa. Através deste levantamento

pudemos estabelecer comparações com dados referenciais e encontrar

diferenças suficientemente importantes para afirmar que estes dados não são

adequados a esta população. A respeito da importância das diferenças

encontradas destacamos, por exemplo, a medida de altura do solo até o cotovelo,

que tem relação direta com o posicionamento de barras de segurança, pois é

essencial no estabelecimento das alturas dos planos horizontais. Para estas, a

Page 281: Inovação, universidade e relação com a sociedade

280 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

medida da colocação é normatizada através de uma regra de que a mesma deve

ser colocada sete centímetros abaixo do valor médio do indivíduo que a utiliza.

Como as normas brasileiras se baseiam em levantamentos considerados

universais (de origem européia e americana) têm-se para esta medida, em

especial, no percentil 5, 104,9 cm para homens e 97 para mulheres, gerando um

valor mínimo de altura de barras de 90 cm, como rege a ABNT. A importância

para qual nos referimos é que a altura encontrada no estudo foi de 95,7 cm para

homens e 89 cm para mulheres, no percentil 5, o que nos conduz à conclusão de

as barras devem ser reposicionadas quando forem indicadas para esta

população. Quando avaliamos as medidas de alcance da ponta da mão

estendida, ou também denominado alcance frontal de apreensão, temos que

utilizar os valores de percentis 5, pois são os menores valores que possibilitam a

determinação da amplitude espacial de alcance à volta do usuário. Também nesta

medida verificamos diferenças de até 7,5 cm, no sexo masculino, significando a

impossibilidade, por exemplo, de alcance de um balcão de agência bancária.

Salienta-se que, mesmo havendo uma diferença nas médias de estatura de até

16 cm entre os sexos, os valores médios de comprimento de nádega até joelho

da população estudada são muito próximos. Chegando, no percentil 95, a serem

iguais. Com isto podemos nos apoiar na bibliografia que nos diz que ossos

longos, como o fêmur, tendem a sofrer menor diminuição com o envelhecimento.

Sabe-se da forte influência que o ambiente físico exerce sobre o cotidiano do

indivíduo, especialmente no idoso em função do número de horas em que este

permanece na sua residência. Torna-se necessário ratificar que as limitações

decorrentes do avanço da idade não são o verdadeiro problema, uma vez que

são parte do ciclo natural de vida humana. O real problema é a falta de interação

entre as limitações e diversidades humanas com o ambiente em que vivem,

fazendo-se com que a tarefa do arquiteto seja a de superar essas dificuldades e

projetar ambientes que compensem essas limitações. A contribuição que este

trabalho pretende é no sentido de iniciar um processo de mudança na maneira de

pensar de forma que entendam a importância da adequação de um ambiente na

manutenção da capacidade plena de seu usuário.

Page 282: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 281

Referências Bibliográficas

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Page 283: Inovação, universidade e relação com a sociedade

DETERMINAÇÃO DE MALONDIALDEÍDO EM AMOSTRAS BIOLÓGICAS POR CROMATOGRAFIA LÍQUIDA DE ALTA EFICIÊNCIA

DETERMINATION OF MALONDIALDEHYDE IN BIOLOGICAL SAMPLES BY

HIGH PERFORMANCE LIQUID CHROMATOGRAPHY

Leite, Carlos Eduardo; Especialista em toxicologia; Instituto de Toxicologia –

PUCRS

[email protected]

Petersen, Guilherme Oliveira; Aluno de Graduação de Farmácia; Instituto de

Toxicologia - PUCRS

[email protected]

Betto, Mariel Raquel Borges; Aluna de Mestrado do Programa de Pós-

Graduação em Biologia Celular e Molecular; Instituto de Toxicologia/Laboratório

de Farmacologia Aplicada – PUCRS.

[email protected]

Campos, Maria Martha; PhD; Instituto de Toxicologia/Faculdade de Odontologia

– PUCRS.

[email protected]

Resumo

Um desequilíbrio no sistema de produção de espécies reativas do oxigênio

(ERO) ou a incapacidade do organismo em neutralizá-las, faz do estresse

oxidativo um mecanismo fisiopatológico crítico, ligado a doenças

cardiovasculares, neoplasias, doenças neurológicas e, processos fisiológicos

normais, como o envelhecimento. O conhecimento da extensão do estresse

oxidativo sobre o organismo é de extrema importância para o desenvolvimento de

novas terapias e medicamentos. A ação das ERO sobre os componentes

celulares gera diversos produtos secundários, como o malondialdeído (MDA). A

quantificação dos níveis de MDA é considerada um parâmetro confiável para a

avaliação do estresse oxidativo celular. O objetivo deste trabalho é validar um

método para quantificação de MDA em diferentes amostras biológicas. A

cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) foi a técnica escolhida, devido a

Page 284: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 283

sua alta especificidade e sensibilidade. Para a determinação do MDA, a amostra

é derivatizada e injetada no sistema CLAE, utilizando coluna C18 e detector de

fluorescência. Os parâmetros de validação seguem as normas preconizadas pela

ANVISA. Os resultados preliminares mostram que nas condições cromatográficas

utilizadas, foi possível detectar o MDA em concentrações normalmente

encontradas no plasma e, que será possível aperfeiçoar e validar o método.

Palavras-chave: estresse oxidativo, malondialdeído, cromatografia líquida de alta

eficiência.

Abstract

Oxidative stress is caused by an imbalance between the production of

reactive oxygen species (ROS) and the ability of biological systems to readily

detoxify these reactive intermediates, or even to repair the resulting damage.

Thus, oxidative stress is accepted as a critical pathophysiological mechanism in

several human pathologies such as, cardiovascular diseases, cancer, neurologic

alterations, and physiological processes as aging. The knowledge about the

extension of oxidative stress in the human body is extremely relevant for

developing new therapies. The action of ROS in cellular components generates

secondary products, such as malondialdehyde (MDA). The quantification of MDA

levels is a suitable parameter to assess cellular oxidative stress. The aim of this

work was to validate a high performance liquid chromatography (HPLC) method

for quantification of MDA in biological samples. HPLC was chosen due its high

specificity and sensibility. To determinate MDA, the sample is derivatized and

injected in the HPLC system, using a C18 column and a fluorescent detector. The

validation parameters followed the ANVISA recommendations. The preliminary

results, under the chromatographic conditions adopted by us, showed that it is

possible to detect MDA in concentrations often found in plasma of healthy rats,

and that it is possible to further improve and validate this method.

Keywords: oxidative stress, malondialdehyde, high performance liquid

chromatography.

Page 285: Inovação, universidade e relação com a sociedade

284 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Introdução

Diferentes estilos de vida e fatores ambientais (incluindo, por exemplo,

tabagismo, dieta, álcool, radiações ionizantes, biocidas, pesticidas e infecções

virais) e outros fatores relacionados à saúde (por exemplo, obesidade ou o

processo de envelhecimento) podem ser pró-carcinogênicos. Em todos estes

casos, o estresse oxidativo atua como um mecanismo fisiopatológico crítico

(Mena et al., 2009).

O estresse oxidativo é causado por um desequilibro no sistema de

produção de espécies reativas do oxigênio (ERO), ou radicais livres, e a

capacidade do organismo em neutralizar estes compostos ou reparar os danos

por eles causados. Desta forma, o estresse oxidativo é aceito como um processo

importante, envolvido em diferentes patologias, incluindo doenças

cardiovasculares, câncer, diabetes, artrite reumatóide, ou afecções neurológicas

como Doença de Alzheimer ou Parkinson (Del Rio et al., 2005; Mena et al., 2009)

As ERO são estruturas químicas, geralmente instáveis, que possuem o

átomo de oxigênio em sua constituição e, que conduzem a diversas interações

quando entram em contato com os tecidos biológicos. Estes compostos podem

ser produzidos no organismo como um resultado de processos bioquímicos

convencionais ou, podem ser atribuídos à estimulação externa por uma variedade

de características físicas, químicas ou biológicas (Angelopoulou et al., 2009).

Todos os componentes celulares são suscetíveis à ação das ERO; porém,

a membrana plasmática é um dos mais atingidos em decorrência da peroxidação

lipídica, o que frequentemente acarreta danos nas estruturas celulares e altera a

sua funcionalidade. Consequentemente, há perda da seletividade na troca iônica

e liberação do conteúdo de organelas, como as enzimas hidrolíticas dos

lisossomas, além da formação de produtos citotóxicos, culminando com a morte

celular (Ferreira e Matsubara, 1997; Bagis et al., 2005).

Os lipídios estão entre as principais classes atingidas pelo estresse

oxidativo, sendo que a peroxidação lipídica dá origem a diversos produtos

secundários. Estes produtos são principalmente aldeídos, como o malondialdeído

(MDA), que aumentam o dano oxidativo (Del Rio et al., 2005). O MDA possui

ação citotóxica e genotóxica, encontrando-se em níveis elevados em algumas

patologias associadas ao estresse oxidativo. Altos níveis de MDA podem afetar a

Page 286: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 285

funcionalidade mitocontrial, alterando a permeabilidade da membrana e a

excitabilidade celular. A quantificação dos níveis de MDA nos sistemas biológicos

é considerada um parâmetro confiável para a avaliação do estresse oxidativo

celular em amostras biológicas (Bagis et al., 2005; Del Rio et al., 2005).

Os métodos clássicos para a determinação do MDA em amostras

biológicas baseiam-se na sua derivatização com o ácido tiobarbitúrico (ATB). A

condensação destas duas espécies dá origem a um composto com alta

absortividade que pode ser quantificada em espectrofotômetro (Del Rio et al.,

2005). Embora estes métodos ainda sejam amplamente utilizados, eles não são

específicos para detecção dos produtos de peroxidação lipídica, uma vez que

quantificam a soma das diferentes substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico,

denominadas TBARS (Steghens et al., 2001; Del Rio et al., 2005). Nos últimos

anos diversas metodologias utilizando cromatografia líquida de alta eficiência

(CLAE) foram propostas, com o objetivo de melhorar a especificidade e a

sensibilidade, evitando os desvios dos métodos mais antigos (Del Rio et al.,

2005).

Objetivo e justifivativa

O objetivo deste trabalho é validar um método confiável para a

quantificação de MDA em plasma por CLAE. Posteriormente, este método será

utilizado para fazer o monitoramento do estresse oxidativo em diversas amostras

biológicas de interesse dos pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do

Rio Grande do Sul (PUCRS), que desenvolvem pesquisas em conjunto com o

Instituto de Toxicologia da PUCRS (InTox). Nestes projetos de pesquisa, a

avaliação do estresse oxidativo, seja ele induzido por fatores endógenos (como

por exemplo, envelhecimento e processos inflamatórios) ou exógenos

(medicamentos, radiações, drogas e pesticidas), é de extrema importância.

Materiais e métodos

Instrumentação e condições cromatográficas

Para a validação da metodologia foi utilizado um Cromatógrafo Líquido de

Alta Eficiência Agilent® 1100 SERIES (USA), equipado com degaseificador,

Page 287: Inovação, universidade e relação com a sociedade

286 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

bomba isocrática, injeção manual com loop de 20 μL e 50 μL e detectores

ultravioleta e de fluorescência.

Para a separação cromatográfica, foi utilizada uma coluna de fase reversa

C18 (250 mm x 4,6 mm, 5μm), sob fluxo de 1 mL/min da fase móvel, composta de

metanol/tampão fosfato (55:45 v/v). Os comprimentos de onda para a detecção

espectrofluorimétrica foram 532 nm (excitação) e 553 nm (emissão).

Preparação da amostra

As amostras utilizadas são de plasma proveniente de ratos machos da

espécie Wistar (Rattus norvegicus). Posteriormente, serão utilizadas outras

amostras biológicas como, por exemplo, fígado e cérebro. A análise de MDA

também será validada para amostras de plasma humano. As amostras de plasma

foram derivatizadas com ATB, aquecidas em condições ácidas por um período de

1 h, precipitadas, diluídas e centrifugadas. Posteriormente, 20 μL do

sobrenadante resultante do processo de centrifugação foram injetados no

cromatógrafo.

Desenvolvimento e validação da técnica

A validação de métodos pode ser definida como “o processo pelo qual

atributos ou figuras de mérito são determinados e avaliados, sendo estes

importantes em um programa de garantia de qualidade” (Valentini et al., 2004).

Portanto, o objetivo principal é assegurar que determinado procedimento analítico

apresente resultados reprodutíveis e confiáveis, que sejam adequados aos fins

para os quais tenha sido planejado.

Para o desenvolvimento da metodologia, foram utilizados trabalhos

publicados nos últimos anos em revistas conceituadas (Mão et al., 2006; Ghotto

et al., 2007; Candan e Tuzmen, 2008). O processo de desenvolvimento e

validação da metodologia para a medida de MDA foi realizado de acordo com as

normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e, envolveu: (i)

revisão bibliográfica (para seleção da técnica mais apropriada); (ii) adaptação do

método às condições do laboratório; (iii) otimização da técnica e; (iv) subsequente

determinação dos parâmetros especificidade e seletividade, linearidade, precisão,

limite de detecção (sensibilidade) e exatidão (ANVISA, 2003).

Page 288: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 287

Resultados

Os resultados preliminares mostram que nas condições cromatográficas

utilizadas e com o processo de extração empregado para o tratamento das

amostras, foi possível detectar o MDA nas concentrações normalmente

encontradas no plasma (Figuras 1 e 2).

Figura 1. Cromatograma do padrão de MDA adicionado a uma amostra de plasma.

Figura 2. Cromatograma obtido a partir de uma amostra de plasma.

Para confirmação da identidade, do tempo de retenção e, para uma

avaliação preliminar da recuperação do MDA nas amostras, foi adicionado 1 μM

de padrão de MDA a uma amostra de plasma. A amostra controle não recebeu

adição de MDA. As duas amostras foram injetadas separadamente (Figura 3). A

amostra sem adição de padrão apresentou uma área de 3.973 e a amostra com

adição apresentou 5.740. Desta forma, confirmou-se que o pico era

correspondente ao MDA. O tempo de retenção nas condições cromatográficas

utilizadas foi de 3.77 minutos. A recuperação, para testes preliminares, foi

considerada satisfatória.

Page 289: Inovação, universidade e relação com a sociedade

288 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Figura 3. Sobreposição dos cromatogramas da amostra de plasma e da amostra de plasma com

adição de padrão de MDA.

Considerações finais e perspectivas

Através da avaliação dos resultados obtidos até o momento, podemos

afirmar que o InTox tem condições de validar e aperfeiçoar a análise de MDA em

amostras biológicas. Esta análise será disponibilizada para a comunidade

científica da PUCRS, a fim de fornecer informações confiáveis para médicos,

farmacêuticos, dentistas, enfermeiros e outros profissionais da área da saúde,

para a avaliação do estresse oxidativo nas diversas situações em que a mesma

se aplica, contribuindo, dessa forma, para o aprimoramento de terapias e para o

desenvolvimento de novos fármacos com potencial anti-oxidante.

Referências

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Page 290: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 289

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Page 291: Inovação, universidade e relação com a sociedade

PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO NA FUNDAÇÃO IRMÃO JOSÉ OTÃO

STRATEGIC PLANNING IN THE IRMÃO JOSÉ OTÃO FOUNDATION

Gehlen de Leão, Álvaro; Dr.; Faculdade de Engenharia – PUCRS

[email protected]

Suárez Maciel, Ana Lúcia; Dr.; Faculdade de Serviço Social – PUCRS

[email protected]

Hartmann Duhá, André; Dr.; Faculdade de Administração, Contabilidade e

Economia – PUCRS

[email protected]

Resumo

Em anos recentes, como consequência do acentuado crescimento da

importância das entidades do Terceiro Setor nos contextos nacional e

internacional, o modelo de gestão utilizado por estas organizações sem fins

lucrativos passou a se constituir em um elemento-chave para a sua perenidade.

Assim, as entidades que integram esse setor têm sido desafiadas a rever seus

processos e práticas, reconhecendo que o paradigma organizacional que as

orienta ainda está sendo construído. Oriundos de três distintas áreas do

conhecimento, os autores deste artigo se propõem a compartilhar a experiência

vivenciada, a partir de junho de 2008, na Direção Executiva da Fundação Irmão

José Otão. Nesse sentido, o presente artigo descreve e reflete sobre o processo

desencadeado na referida Fundação, partindo da premissa de que o

planejamento estratégico é uma ferramenta essencial para a gestão das

organizações do Terceiro Setor, desde que observadas as suas particularidades.

Palavras-chave: planejamento estratégico, terceiro setor, inovação.

Abstract

In recent years, as a result of growing importance of the entities of the Third

Sector in the national and international contexts, the management model used by

Page 292: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 291

these non-profits organizations has turned into a key element for their survival.

Thus, the entities within this sector have been challenged to review their

procedures and practices, recognizing that the organizational paradigm is still

under construction. Coming from three different areas of knowledge, the authors

aim to share their experience lived from June 2008 on the Executive Board at

Irmão José Otão Foundation. Accordingly, this paper describes and reflects on the

process initiated at the Foundation, based on the premise that strategic planning is

an essential tool for the management of Third Sector organizations, provided that

their particularities are taken into account.

Keywords: strategic planning, third sector, innovation.

Introdução

A Fundação Irmão José Otão é uma entidade sem fins lucrativos, sediada

na cidade de Porto Alegre e instituída, em 1981, pela União Sulbrasileira de

Educação e Ensino, a partir de uma iniciativa do Conselho Universitário da

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

Ao longo dos seus quase vinte e oito anos de existência, a Fundação

Irmão José Otão vem consolidando a sua presença nos contextos local, regional,

nacional e internacional por um conjunto de iniciativas nas áreas educacional,

cultural e social, em sintonia com a direção estratégica da PUCRS e com as

tendências de gestão no âmbito do Terceiro Setor.

No ano de 2008, a Fundação Irmão José Otão passou por um processo de

realinhamento organizacional que possibilitou a revisão do seu posicionamento

perante o conjunto de stakeholders com o qual se relaciona. Nesse processo, a

necessidade de uma nova metodologia de trabalho passou a ser evidente e o

planejamento estratégico foi vislumbrado como uma ferramenta capaz de

qualificar esse processo.

O presente artigo tem por objetivo compartilhar a experiência dos autores

na Direção Executiva da Fundação Irmão José Otão, com vistas a permitir uma

reflexão sobre a aplicabilidade do planejamento estratégico na gestão de

organizações do Terceiro Setor, apresentando as etapas percorridas e os

resultados alcançados a partir da sua aplicação na referida Fundação.

Page 293: Inovação, universidade e relação com a sociedade

292 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Planejamento Estratégico Aplicado a Organizações do Terceiro Setor

O gerenciamento estratégico se constitui em um processo permanente,

desenvolvido em ciclos que abrangem as etapas de planejamento, execução,

monitoramento e avaliação. O planejamento estratégico, em particular, busca

uma gestão eficaz e sustentável da organização, destacando-se alguns aspectos

relevantes na sua elaboração: o estabelecimento da visão de futuro, como forma

de inspirar e mobilizar os stakeholders na realização das atividades da

organização; a abertura para a mudança, associada à capacidade de lidar com as

resistências inerentes ao processo; e a definição do nível de participação das

pessoas no processo de planejamento (Queiroz, 2004).

O processo de planejamento estratégico deve ser conduzido de forma a

responder às questões-chave para o sucesso da organização (Hudson, 2009),

entre as quais se pode ressaltar: o que, especificamente, a organização deseja

alcançar nos próximos anos? o que ela aprendeu com as experiências passadas?

como os recursos deveriam ser alocados entre os diferentes objetivos? quais os

padrões de qualidade a serem atingidos?

Ainda, segundo Hudson (2009), algumas características se destacam em

um processo de gerenciamento estratégico: a complexidade decorrente da

inserção da organização em um ambiente de alto grau de incerteza; a

necessidade de uma abordagem integrada, que perpasse a estrutura funcional da

organização; a clareza e a integração dos diversos elementos-chave do

planejamento estratégico, entre os quais a missão, a visão de futuro, os objetivos

estratégicos e os indicadores de desempenho.

Nesse sentido, e atendendo à solicitação do Conselho Deliberativo, a

Diretoria Executiva iniciou, no mês de outubro de 2008, as atividades de

preparação do Plano Estratégico da Fundação Irmão José Otão (FIJO, 2008) para

o período de 2009 a 2012.

O processo de planejamento estratégico foi precedido da elaboração de

um diagnóstico para análise do ambiente externo – envolvendo aspectos

políticos, econômicos, sociais, tecnológicos, ambientais e legais – e para análise

interna de desempenho e capacidade da organização, o qual foi apresentado aos

integrantes do Conselho Deliberativo em reunião realizada no dia 26 de setembro

de 2008. Os resultados deste diagnóstico permitiram definir a missão, os valores

Page 294: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 293

e a visão de futuro da Fundação Irmão José Otão, bem como estabelecer os

objetivos estratégicos e as iniciativas estratégicas a eles vinculadas.

Missão, Valores e Visão de Futuro

Ao longo do último trimestre do ano de 2008, em um trabalho desenvolvido

pela Diretoria Executiva, com o apoio de integrantes do Conselho Deliberativo,

foram redefinidos a missão, os valores e a visão de futuro da Fundação Irmão

José Otão, a seguir apresentados.

Missão – A Fundação Irmão José Otão tem por missão incentivar,

promover e viabilizar projetos e atividades de produção, difusão e aplicação do

conhecimento, em prol do desenvolvimento cultural, social e econômico do País.

Valores – Transparência, sustentabilidade, inovação e responsabilidade

social.

Visão de Futuro – Até 2012, ser reconhecida como uma Fundação de

referência na gestão de projetos e na realização de atividades que possibilitem o

aumento dos níveis de desenvolvimento cultural, social e econômico do País.

Objetivos Estratégicos

A partir da definição da missão, dos valores e da visão de futuro da

Fundação Irmão José Otão, iniciou-se o processo de estabelecimento dos

objetivos estratégicos para o período de 2009 a 2012, acompanhados de um

conjunto de iniciativas estratégicas, cuja implementação se inicia a partir do Plano

de Trabalho proposto para o ano de 2009.

Objetivo Estratégico 1: desenvolver projetos e atividades, nas áreas de

ensino, pesquisa e extensão, compondo parcerias e articulando redes de

cooperação, em âmbito nacional e internacional. Este objetivo possui três

iniciativas estratégicas a ele vinculadas: implementar o Project Management

Office na Fundação Irmão José Otão; prestar serviços de gerenciamento de

projetos; e prestar serviços na área da educação, envolvendo atividades de

ensino, pesquisa e extensão.

Objetivo Estratégico 2: mobilizar recursos visando a sustentabilidade dos

projetos e das atividades. Este objetivo possui duas iniciativas estratégicas a ele

Page 295: Inovação, universidade e relação com a sociedade

294 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

vinculadas: implementar o Setor de Captação de Recursos na Fundação Irmão

José Otão; e desenvolver um Programa de Relacionamento com organizações.

Objetivo Estratégico 3: colaborar no desenvolvimento e na disseminação

de tecnologias de inovação social. Este objetivo possui cinco iniciativas

estratégicas a ele vinculadas: promover um Projeto de Desenvolvimento Social na

Comunidade São Judas Tadeu; desenvolver o Projeto Observatório do Terceiro

Setor; promover articulação com o Torneio Talento Empreendedor da PUCRS;

desenvolver o Projeto Banco de Tecnologias Sociais; e implementar um modelo

de organização socialmente responsável na Fundação Irmão José Otão.

Objetivo Estratégico 4: apoiar atividades de capacitação no campo das

ciências, das artes e da cultura. Este objetivo possui quatro iniciativas

estratégicas a ele vinculadas: promover o Curso de Especialização em Gestão da

Responsabilidade Social; promover o Curso de Especialização em Gestão no

Terceiro Setor; promover cursos de capacitação na Área de Desenvolvimento

Social; e desenvolver atividades culturais com a comunidade.

Objetivo Estratégico 5: incentivar a formação acadêmica e profissional de

estudantes, mediante a viabilização de oportunidades de realização de estágios e

a concessão de bolsas de estudo. Este objetivo possui três iniciativas estratégicas

a ele vinculadas: aumentar a oferta de oportunidades de estágio para alunos de

graduação; preparar alunos de graduação para o ambiente profissional; e criar um

Fundo de Bolsas para alunos de graduação.

Objetivo Estratégico 6: fortalecer a imagem institucional da Fundação

Irmão José Otão junto à sociedade. Este objetivo possui uma iniciativa estratégica

a ele vinculada: implementar uma Política de Comunicação Social na Fundação

Irmão José Otão.

Iniciativas Estratégicas e Áreas de Atuação

A implementação do Plano Estratégico da Fundação Irmão José Otão teve

início logo após a sua apresentação e aprovação em reunião do Conselho

Deliberativo, realizada no dia 6 de janeiro de 2009.

Nesta reunião, através da apresentação do Plano de Trabalho 2009, foram

detalhadas as iniciativas estratégicas vinculadas aos objetivos definidos no Plano

Page 296: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 295

Estratégico, incluindo as metas, o período de realização, o orçamento e os

setores responsáveis por sua execução.

A figura 1 apresenta a nova estrutura organizacional da Fundação Irmão

José Otão (FIJO, 2009), adotada a partir de janeiro de 2009, visando atender às

iniciativas estratégicas estabelecidas no Plano de Trabalho.

Conselho Fiscal

Cursos e Eventos

Bolsas e Estágios

Administrativo Financeiro

Assessoria Jurídica

ConselhoDeliberativo

DiretoriaExecutiva

Desenvolvimento Social

Captação de Recursos

Coordenação de Projetos

Apoio e Secretaria

Assessoria de Comunicação

Prestação de Serviços

Figura 1 – Estrutura Organizacional da Fundação Irmão José Otão

A estrutura organizacional compreende os órgãos administrativos –

Conselho Deliberativo, Conselho Fiscal e Diretoria Executiva –, cujas atribuições

estão claramente definidas no Estatuto da Fundação Irmão José Otão, e uma

estrutura funcional composta por setores responsáveis pela execução das

atividades definidas no Plano de Trabalho.

As atribuições específicas dos setores funcionais – Coordenação de

Projetos, Captação de Recursos, Prestação de Serviços, Administrativo-

Financeiro, Bolsas e Estágios, Cursos e Eventos, Desenvolvimento Social, Apoio

e Secretaria, Assessoria Jurídica e Assessoria de Comunicação – podem ser

visualizadas na página disponibilizada na Internet, através do endereço eletrônico

www.fijo.org.br.

O Plano de Trabalho da Fundação Irmão José Otão, para o ano de 2009,

prevê o desenvolvimento de 18 iniciativas estratégicas, com a utilização do

Page 297: Inovação, universidade e relação com a sociedade

296 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

conceito de Gerenciamento de Projetos (PMI, 2000), que é definido como sendo a

aplicação sistemática de conhecimentos, habilidades, ferramentas e técnicas com

o intuito de alcançar os resultados esperados a partir da alocação criteriosa de

recursos na realização de projetos.

O conjunto de iniciativas estratégicas é apresentado na tabela 1,

classificando-as por áreas de atuação, e estando o seu gerenciamento e a sua

execução sob a responsabilidade da Diretoria Executiva e dos demais integrantes

da estrutura organizacional da Fundação Irmão José Otão.

Tabela 1 – Iniciativas Estratégicas, Áreas de Atuação e Setores Responsáveis

Iniciativas Estratégicas Áreas de Atuação Setores Responsáveis Aumentar a oferta de oportunidades de estágio para alunos de graduação. Preparar alunos de graduação para o ambiente profissional.

Central de Estágios FIJO Bolsas e Estágios

Promover o Curso de Especialização em Gestão da Responsabilidade Social. Promover o Curso de Especialização em Gestão no Terceiro Setor.

Cursos e Eventos

Promover cursos de capacitação na Área de Desenvolvimento Social.

Cursos e Eventos

Promover um Projeto de Desenvolvimento Social na Comunidade São Judas Tadeu. Desenvolver o Projeto Observatório do Terceiro Setor. Desenvolver o Projeto Banco de Tecnologias Sociais. Desenvolver atividades culturais com a comunidade.

Desenvolvimento Social

Promover articulação com o Torneio Talento Empreendedor da PUCRS.

Desenvolvimento Social

Prestar serviços de gerenciamento de projetos. Prestar serviços na área da educação, envolvendo atividades de ensino, pesquisa e extensão.

Escritório de Projetos FIJO Prestação de Serviços

Implementar o Project Management Office na Fundação Irmão José Otão.

Coordenação de Projetos

Implementar o Setor de Captação de Recursos na Fundação Irmão José Otão. Desenvolver um Programa de Relacionamento com organizações.

Captação de Recursos

Criar um Fundo de Bolsas para alunos de graduação. Bolsas e Estágios

Implementar uma Política de Comunicação Social na Fundação Irmão José Otão.

Assessoria de Comunicação

Implementar um modelo de organização socialmente responsável na Fundação Irmão José Otão.

Diretoria Executiva

Desenvolvimento Social

Page 298: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 297

Nas seções seguintes serão detalhadas as principais iniciativas

estratégicas ora em desenvolvimento, descrevendo as atividades executadas e os

resultados esperados.

Incentivo à Formação Acadêmica e Profissional de Estudantes: a Central de Estágios FIJO

A Central de Estágios FIJO está vinculada ao Setor de Bolsas e Estágios

na estrutura organizacional da Fundação Irmão José Otão, se constituindo em um

dos agentes de integração de estágios curriculares dos alunos de graduação da

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, estando sua atuação

balizada pelo objetivo estratégico de incentivar a formação acadêmica e

profissional de estudantes, mediante a viabilização de oportunidades de

realização de estágios e a concessão de bolsas de estudo.

Tendo como responsabilidade, para o ano de 2009, a operacionalização

das iniciativas estratégicas de aumento da oferta de oportunidades de estágio e

de preparação de alunos de graduação para o ambiente profissional, a Central de

Estágios FIJO desenvolve as seguintes atividades:

(a) elaboração de convênios com os locais de estágio;

(b) divulgação de ofertas para os alunos de graduação da PUCRS;

(c) agilização nos processos de recrutamento e seleção e de contratação

de estagiários dentro do perfil definido pelo local de estágio;

(d) acompanhamento dos alunos e assessoria aos locais de estágio, desde

o processo de recrutamento e seleção até a conclusão do estágio, seguindo o

enquadramento definido pela legislação e em conformidade com as

especificidades de cada curso de graduação;

(e) acompanhamento da avaliação das partes envolvidas durante o

processo de estágio, através de instrumento de acompanhamento do estágio, de

entrevistas individuais, de visitas aos locais de estágio, e de encontros com o

professor responsável nas Unidades Acadêmicas da PUCRS;

(f) participação em eventos referentes ao mundo do trabalho e captação de

novos locais e oportunidades de estágio, de acordo com as necessidades das

áreas de formação, analisando e avaliando as condições do local de estágio;

Page 299: Inovação, universidade e relação com a sociedade

298 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

(g) realização de eventos que auxiliem os alunos de graduação da PUCRS

na preparação para sua inserção no mundo do trabalho, orientando-os na

elaboração do seu currículo, no desenvolvimento das competências valorizadas

pelas organizações e no processo de seleção para uma vaga;

(h) participação em reuniões com professores coordenadores de estágios

das Unidades Acadêmicas da PUCRS e com o Núcleo de Estágios das Pró-

Reitorias de Graduação e de Assuntos Comunitários.

Apoio às Atividades de Capacitação no Campo das Ciências, das Artes e da Cultura

A Fundação Irmão José Otão, através do seu Setor de Cursos e Eventos,

atua na capacitação de profissionais no campo das ciências, das artes e da

cultura, ofertando Cursos de Especialização e Cursos de Extensão em parceria

com a PUCRS.

Como decorrência das novas diretrizes estabelecidas pelo seu Plano

Estratégico, esta oferta passa a contar com seguinte escopo: desenvolvimento de

projetos de cursos que tenham o Desenvolvimento Social como objeto de estudo,

bem como o fomento à realização de cursos de caráter interdisciplinar,

congregando várias Unidades Acadêmicas da PUCRS. Nesta linha de atuação, a

partir de abril de 2009, a Fundação Irmão José Otão está promovendo os

seguintes cursos:

(a) curso de especialização em Gestão do Terceiro Setor, visando à

qualificação de profissionais para a gestão de organizações do Terceiro Setor,

com senso ético, espírito crítico-reflexivo e competências teóricas e

metodológicas, através da análise da conformação contemporânea das

organizações de Terceiro Setor, da reflexão sobre as possibilidades e os limites

das práticas destas organizações no contexto da sociedade atual, e da habilitação

para a utilização de princípios, conceitos e metodologias de gestão social em

diferentes realidades organizacionais que compõem este setor;

(b) curso de especialização em Gestão da Responsabilidade Social, com o

objetivo de qualificar profissionais para a gestão da responsabilidade social no

âmbito das organizações de primeiro, segundo e terceiro setores, através da

análise do movimento da responsabilidade social na contemporaneidade, do

Page 300: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 299

estudo das suas determinações econômicas, políticas, sociais, culturais e

ambientais, da reflexão sobre as possibilidades e os limites das práticas de

responsabilidade social no contexto da sociedade atual, e da habilitação para a

utilização de princípios, conceitos e metodologias de gestão socialmente

responsável nas organizações.

Para ambos os cursos foram estabelecidas parcerias com organizações do

primeiro, segundo e terceiro setores do Estado do Rio Grande do Sul, viabilizando

a oferta de bolsas de estudo para os alunos. Dentre as organizações que

firmaram parceria para a realização dos cursos de especialização, destacam-se a

Associação Brasileira de Recursos Humanos – Seccional Rio Grande do Sul, a

Associação Cristã de Moços, a Associação Rio-Grandense de Fundações, a

Confederação Nacional das Cooperativas Médicas – UNIMED, o Instituto Renner,

a Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, a Fundação Projeto Pescar, o Grupo do

Terceiro Setor, a ONG Parceiros Voluntários, a Secretaria Estadual da Justiça e

Desenvolvimento Social do Rio Grande do Sul e o Serviço Nacional de

Aprendizagem Industrial – RS.

O Observatório do Terceiro Setor e o Projeto de Desenvolvimento Local Comunitário

O Observatório do Terceiro Setor está sendo concebido a partir do

compromisso com a disseminação da cultura e de um modelo de gestão inovador

e empreendedor no âmbito do Terceiro Setor, e da necessidade de implantar, na

Região Sul do País, um Observatório do Terceiro Setor, garantindo um espaço

que possa contribuir com o Desenvolvimento Social do Estado do Rio Grande do

Sul.

Nesse sentido, o Observatório possui os seguintes objetivos:

(a) colaborar com o desenvolvimento social do Estado do Rio Grande do

Sul, a partir da implantação de um Observatório do Terceiro Setor na Fundação

Irmão José Otão, visando à efetivação de um modelo de gestão pública que

garanta os direitos sociais da população gaúcha;

(b) realizar estudos sobre a situação do Terceiro Setor no Estado do Rio

Grande do Sul, mapeando e identificando tecnologias de intervenção social;

Page 301: Inovação, universidade e relação com a sociedade

300 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

(c) subsidiar os órgãos gestores das políticas sociais públicas com

propostas de ação sintonizadas com as demandas da sociedade gaúcha;

(d) mapear tecnologias sociais de caráter inovador, no contexto das

organizações de Terceiro Setor, visando favorecer a multiplicação de

experiências bem-sucedidas no âmbito da gestão social pública;

(e) contribuir com a qualificação dos agentes que atuam nesse contexto,

através de ações de assessoria às suas demandas, bem como de promoção de

processos formativos.

O Projeto de Desenvolvimento Local Comunitário, por seu turno, é

desenvolvido em parceria com a Coordenadoria de Desenvolvimento Social da

Pró-Reitoria de Extensão da PUCRS e com a Associação de Moradores da Vila

São Judas Tadeu (AMOVITA).

As principais atividades desenvolvidas neste projeto envolvem a

assessoria para implementação do Projeto Sócio-Educativo da AMOVITA e

elaboração de um diagnóstico social da realidade local para subsidiar a

comunidade na definição de futuros projetos sociais que possam apoiar o

desenvolvimento social sustentável, em especial as ações voltadas à infância e à

adolescência. Este projeto conta com a atuação de uma equipe técnica da

Fundação Irmão José Otão, composta por um assistente social, um pedagogo e

dois estagiários de Serviço Social.

Desenvolvimento de Projetos e Atividades através de Parcerias e Redes de Cooperação

O desenvolvimento de projetos e atividades através do estabelecimento de

parcerias e da articulação de redes de cooperação está vinculado à

implementação do Escritório de Projetos FIJO, que tem como finalidade principal

a prestação de serviços de gerenciamento de projetos (PMI, 2000) na área da

educação, envolvendo atividades de ensino, pesquisa e extensão.

Desde o início do ano de 2009, o Escritório de Projetos FIJO está apoiando

a PUCRS no Projeto Primeira Empresa Inovadora – PRIME, instituído pela

Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP, para a concessão de subvenção

econômica para empresas nascentes e inovadoras, com o objetivo de criar

Page 302: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 301

condições financeiras para que essas empresas possam enfrentar com sucesso

os principais desafios de seus estágios iniciais de desenvolvimento.

O Escritório de Projetos FIJO, como coordenador operacional do Programa

PRIME, tem como atribuição principal o apoio à Coordenação Geral do Programa

PRIME na PUCRS, executando as seguintes atividades:

(a) auxílio à divulgação do programa ao público em geral e atendimento

para o esclarecimento de dúvidas em relação ao programa;

(b) gerenciamento da documentação entregue pelas empresas e auxílio

administrativo na realização das atividades de seleção e de treinamento das

empresas participantes do programa;

(c) apoio para a realização de visitas às empresas selecionadas, com o

intuito de verificar o andamento do programa, a utilização dos recursos

financeiros e o cumprimento das metas previstas;

(d) elaboração de relatórios gerenciais para o controle da Coordenação

Geral do Programa na PUCRS e para o atendimento das solicitações da FINEP

junto à PUCRS.

Mobilização de Recursos para a Sustentabilidade dos Projetos e das Atividades da Fundação

Com o intuito de potencializar a mobilização de recursos para a

sustentabilidade dos projetos e das atividades da Fundação Irmão José Otão,

foram iniciados, ainda no segundo semestre de 2008, estudos para a estruturação

do setor de Captação de Recursos (Herbst e Norton, 2007; Norton, 2003), a partir

de uma série de atividades de benchmarking e de capacitação em âmbito

nacional e internacional, sob a responsabilidade da Diretoria Executiva.

Inclui-se nessa iniciativa a análise das possibilidades de implantação de

atividades de gerenciamento de endowment funds como um futuro pilar do

modelo de gestão da Fundação Irmão José Otão, com o intuito de prover os

recursos necessários para o cumprimento da sua missão, de forma sustentável e

no longo prazo.

Page 303: Inovação, universidade e relação com a sociedade

302 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Fortalecimento da Imagem Institucional da Fundação Irmão José Otão junto à Sociedade

A política de comunicação social da Fundação Irmão José Otão está sendo

definida com o objetivo de fortalecer a sua imagem institucional, incluindo a

alteração da sua identidade visual e ampliação da utilização dos meios de

comunicação eletrônica, através da remodelação da sua página na Internet e da

criação de uma newsletter digital.

Além disso, procurou-se estabelecer um mecanismo que viabilizasse a

participação mais intensa dos públicos que se relacionam com a Fundação,

destacando-se o convite efetuado aos integrantes do Conselho Deliberativo e do

Conselho Fiscal para participação em reuniões semanais com a Diretoria

Executiva.

Considerações Finais

Em seus quase vinte e oito anos de atuação, a Fundação Irmão José Otão

tem percorrido uma trajetória que reafirma o seu compromisso com o

desenvolvimento cultural, social e econômico do País. O presente artigo procurou

descrever as atividades de planejamento estratégico desenvolvidas pela

Fundação Irmão José Otão durante o ano de 2008, apresentando as principais

diretrizes do seu realinhamento estratégico, bem como as ações já

desencadeadas como fruto dessas propostas.

A partir destas atividades, a Fundação Irmão José Otão, em razão do seu

vínculo com a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, reforça a

sua identidade voltada para a consolidação de uma organização que tem as

marcas da Instituição Acadêmica. A materialização dessa identidade é reforçada

pelo intenso envolvimento dos integrantes do seu Conselho Deliberativo, do seu

Conselho Fiscal, do seu corpo funcional e da sua Diretoria Executiva, que é

composta por três professores oriundos de três distintas áreas do conhecimento –

administração de empresas, engenharia e serviço social –, vinculados às

Unidades Acadêmicas da PUCRS que, a partir de uma gestão interdisciplinar,

garantem a articulação da Fundação com a Universidade, com as suas

congêneres e com a sociedade em geral.

A tradução de uma boa prática, no âmbito das organizações de Terceiro

Setor, no caso ilustrado da Fundação Irmão José Otão, se alicerça nos seguintes

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 303

aspectos: a importância da missão organizacional na definição do seu papel no

conjunto da sociedade; a capacidade de decifrar as demandas e as necessidades

dos públicos com os quais interage, buscando incorporá-las no planejamento; a

busca pelo desenvolvimento de competências específicas para atuação no setor,

com vistas a uma atuação qualificada na área; a observância do marco legal

vigente no setor; a atenção à sustentabilidade da organização; e a

imprescindibilidade do planejamento estratégico como ferramenta de gestão

capaz de viabilizar um modelo de gestão competente e inovador.

Assim, a transparência, a sustentabilidade, a inovação e a

responsabilidade social passam a ser os valores a serem adotados para que os

resultados alcançados possam gerar impactos positivos para todos os públicos

que interagem com a Fundação Irmão José Otão e com a Universidade.

Por fim, reafirma-se o propósito da atual Diretoria Executiva de conduzir a

Fundação Irmão José Otão de forma a preservar a sua trajetória histórica e, ao

mesmo tempo, torná-la protagonista na construção de propostas inovadoras no

contexto das organizações que compõem o Terceiro Setor no Brasil.

Referências

FIJO. Planejamento Estratégico 2009-2012. Porto Alegre: Fundação Irmão José Otão, 2008. FIJO. Relatório de Atividades 2008. Porto Alegre: Fundação Irmão José Otão, 2009. HERBST, N. B.; NORTON, M. The Complete Fundraising Handbook. London: Directory of Social Change, 2007. HUDSON, M. Managing without Profit: leadership, management and governance of third sector organisations. London: Directory of Social Change, 2009. NORTON, M. The Worldwide Fundraiser’s Handbook: a resource guide for NGOs and community organisations. London: Directory of Social Change, 2003. PMI. A Guide to the Project Management Body of Knowledge: PMBOK Guide 2000 Edition. Newtown Square: Project Management Institute, 2000. QUEIROZ, M. O Planejamento Estratégico e as Organizações do Terceiro Setor. In: VOLTOLINI, R. (org). Terceiro Setor: Planejamento e Gestão. São Paulo: Editora SENAC, 2004. .

Page 305: Inovação, universidade e relação com a sociedade

EDUCAÇÃO ONLINE: UMA EDUCAÇÃO INOVADORA?

ONLINE DISTANCE EDUCATION: INNOVATION IN WHAT SENSE?

Lucia Maria Martins Giraffa, Dr.; FACIN/CEAD – PUCRS

[email protected]

Elaine Turk Faria, Dr.; FACED/CEAD - PUCRS

[email protected]

Resumo

A Educação a Distância (EAD) na PUCRS constituiu-se no ano de 1999 e

a nova forma de gestão estabeleceu-se em 2006, após estudos sobre a

caminhada percorrida e a necessidade de inovar com sustentabilidade para

manter-se na vanguarda do mercado nacional. Este capítulo apresenta o

resultado do projeto de renovação da Coordenadoria de Educação a Distância

(CEAD), mais conhecida como PUCRS VIRTUAL, destacando os aspectos de

mudanças e inovações relacionados à (re) estruturação da organização, opções

tecnológicas e paradigma educacional, aliados aos tempos de cibercultura e

educação virtual, sem perda dos princípios norteadores do Estilo Marista de

Educar.

Após a descrição do contexto e soluções implementadas para realizar as

mudanças e inovações no setor, apresenta-se algumas reflexões acerca das

possibilidades da EAD online mediada pela Internet e seus recursos. Conclui-se

que a gestão de projetos de EAD online com qualidade técnica, tecnológica,

pedagógica e de pessoal requer cuidados em muitos sentidos e envolve não

apenas o investimento, a aquisição dos equipamentos, e sim ênfase no preparo

dos profissionais que utilizarão estas mídias, mas também o tratamento

pedagógico a elas aplicado.

Palavras-chave: Educação a Distância online, Tecnologias Digitais, Inovação e

Aprendizagem.

Page 306: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 305

Introdução

A Educação a Distância (EAD) não é uma modalidade de ensino nova. A

EAD na sua forma mais tradicional se apoiava no uso da infraestrutura dos

correios para enviar os materiais e lições aos alunos distantes. Estabelecia-se o

modo assíncrono de estudar. Cabia ao professor estruturar o curso, organizar as

lições, criar materiais, dividindo os conteúdos entre informação teórica e

exercícios de fixação. Os alunos recebiam estes módulos, liam os textos, faziam

os exercícios e algumas vezes os remetiam para correção. A maioria dos cursos

enviava o gabarito dos exercícios confiando na autodisciplina do aluno e no seu

senso de responsabilidade. Com os avanços da tecnologia, o surgimento dos

computadores e, principalmente da rede Internet, vivenciamos um sistema social

baseado na viabilidade de atividades online (síncronas), onde o acesso à

informação está muito facilitado, permitindo que distâncias e tempo não sejam

mais fatores restritivos para comunicação, surgindo a “nova” EAD. Uma EAD

tecnologicamente dependente da evolução e consolidação das Tecnologias

Digitais (TDs). Uma EAD online que emerge de uma civilização científica e

técnica, imersa na globalização da economia, na mundialização da cultura e na

internacionalização da Educação.

Segundo (Aretio, 2007), esta nova realidade fez com que fosse estendida a

todo o planeta uma preocupação em adequar a formação dos indivíduos para que

eles desenvolvam as competências necessárias para trabalhar e conviver neste

novo cenário. Os ciclos de renovação do conhecimento associado às tecnologias

digitais se produzem num período temporal muito inferior a vida das pessoas.

Desta forma, se faz premente que o indivíduo se atualize constantemente para

poder acompanhar o ritmo da sociedade e sentir-se inserido e apto para

desenvolver funções produtivas.

A EAD não é por si só, inovadora, mas a Educação Virtual (Virtual

Learning), ou simplesmente EAD online, apoiada em Tecnologias Digitais permite

um novo olhar acerca de uma prática tradicional. Mudar os meios implica em

rever a prática docente e a forma como se deve organizar os cursos. É procurar

sublimar a perda da presença física, utilizando como elemento a virtualidade e

suas características. Neste novo contexto surgem os desafios para se fazer EAD

de qualidade. Como se resolve a questão de estar presente no virtual? A reposta

Page 307: Inovação, universidade e relação com a sociedade

306 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

é a interatividade mediada pelos recursos de comunicação hoje disponibilizados

nos AVEA’s (Ambientes Virtuais de apoio ao Ensino e a Aprendizagem).

Assim, apesar do termo EAD, essa alternativa de educação assume como

desafio, minimizar a importância da distância geográfica entre professores e

alunos, aproximando-os por meio da interatividade. Em muitas aulas presenciais,

a ‘distância’ entre mestre e educandos é grande, por isso muitas escolas, em que

a presença é obrigatória, estão adotando métodos e procedimentos que têm sido

bem sucedidos na EAD, promovendo a interatividade e a autonomia dos alunos.

Este relato apresenta o resultado do projeto de renovação da

Coordenadoria de Educação a Distância (CEAD), mais conhecida como PUCRS

VIRTUAL (PV), destacando os aspectos de mudanças e inovações relacionados à

estrutura da organização, escolhas tecnológicas e paradigma educacional,

aliados aos tempos de cibercultura e educação virtual, sem perda dos princípios

norteadores do estilo marista de educar. Enfatiza-se que a tecnologia é um meio

e não um fim quando se trata de educação de qualidade.

Objetivos

1. Relatar a proposta de mudança na Educação a Distância da PUCRS.

2. Promover reflexão acerca da necessidade da formação docente para

atuar com alunos oriundos da geração digital.

3. Divulgar o trabalho realizado no âmbito da PUCRS relacionado à oferta

inovadora de cursos virtuais online de extensão e especialização.

Mudança e Inovação estrutural para manter a competitividade

A PUCRS VIRTUAL foi criada em 1999 como uma Unidade autônoma e

em 2006 passou a ser uma Coordenadoria da PROEX (Pró-Reitoria de

Extensão), denominando-se, então, Coordenadoria de Educação a Distância

(CEAD). Neste momento, após uma reflexão sobre sua caminhada e os recursos

existentes na atualidade mudou-se a tecnologia e a gestão dos recursos humanos

da Unidade.

A solução encontrada na época da criação da EAD da PUCRS era a

utilização de satélite como tecnologia de comunicação para a geração e

transmissão de aulas fortemente associadas a videoconferências e/ou

Page 308: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 307

teleconferências. Os alunos interagiam com os professores pelo serviço telefônico

0800 e o material das aulas era disponibilizado na plataforma WEBCT (Web

Course Tools). O modelo ponderava as atividades síncronas e assíncronas em

função do projeto do curso, geralmente usando como base 20% das aulas

transmitidas via satélite e com alunos assistindo de forma simultânea nos pontos

distantes distribuídos pelo país. No auge deste modelo a PV possuía unidades

em quase todos os estados brasileiros, podendo, também, transmitir para

diversos países do continente americano, África e Europa; embora nunca tenha

ocorrido um curso internacional.

As aulas gravadas seguiam o modelo das aulas presenciais com uso de

slides em PowerPoint onde o conteúdo estava estruturado e o professor, sentado

a uma mesa, em frente a câmeras, em estúdio com cenário fixo, discorria sobre o

assunto do encontro. A interação era obtida por meio do uso de serviço telefônico

ou perguntas no ambiente na ferramenta de chat. Este modelo requereu a criação

de uma infraestrutura de pessoal de apoio ao docente, a fim de poder viabilizar o

atendimento dos inúmeros alunos matriculados no curso e espalhados

geograficamente no território brasileiro. Nem todos os cursos possuíam alunos

com tal granuralidade, mas a maioria deles era oriunda de pelo menos três

estados diferentes. Fato este que exigiu a criação de toda uma logística, ainda

existente, embora adaptada aos novos tempos e demandas.

A necessidade de comunicação síncrona, de o aluno receber a imagem em

um local distante e poder interagir com a equipe de professores e tutores, e a

diversidade geográfica do território brasileiro, considerando que estávamos no

final da década de 90, século XX, a opção recomendada na época era, sem

dúvida, a utilização de satélite; o qual garantia a abrangência e os serviços

demandados pela proposta pedagógica.

Com o passar dos anos, a evolução e consolidação da Internet, os custos

elevados da manutenção do sistema de satélite e, principalmente, da mudança na

proposta conceitual e entendimento do que seriam as aulas virtuais, a valorização

da interação, a ênfase na mediação no ambiente virtual de aprendizagem, a PV

muda sua forma de trabalhar. O foco deixa de ser a valorização das aulas

gravadas como elemento basilar da aprendizagem dos alunos, para se focar na

estruturação de cursos onde a aprendizagem do estudante está vinculada a uma

Page 309: Inovação, universidade e relação com a sociedade

308 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

postura de autonomia, desenvolvimento de competências de pesquisa, análise,

crítica, construção textual, argumentação e trabalho em equipe.

Nesta nova proposta a PV foi reestruturada no ano de 2006. Os cursos

foram reformulados, a equipe de professores foi renovada (hoje temos apenas

20% da equipe original), a fim de refletir o novo momento e nova percepção do

papel da unidade de EAD no contexto da Universidade. A PV é uma unidade de

serviços cujo papel é apoiar e gerir as ações e políticas da PUCRS no que tange

a modalidade de Educação a Distância.

A PUCRS VIRTUAL tem por missão auxiliar a produzir e difundir

conhecimento de forma inovadora, observando os preceitos do Estilo Marista de

Educar, fundamentada na formação humana, orientada por critérios de qualidade

e ética.

Segundo Rodrigues (2006) “a gestão estratégica das organizações é

influenciada e orientada pelas mudanças exógenas, relacionadas às estruturas de

mercado, e pelas mudanças endógenas, que devem ser implementadas no

ambiente interno da organização” (p. 223). Isto significa examinar as forças e os

elementos que impactam de modo crítico no desempenho da instituição, levando

em consideração o contexto competitivo.

Nesta perspectiva, necessitou-se examinar a estrutura organizacional e o

desenvolvimento dos recursos humanos da instituição em questão; realizando

mudanças que contemplassem os aspectos de atendimento diversificado e

flexibilizado. Neste sentido, a grande dificuldade encontra-se na própria legislação

trabalhista brasileira que não se atualizou. Não existem ainda subsídios legais

para se enquadrar os novos profissionais que atuam no segmento de EAD e este

é um grande desafio da gestão de pessoal.

A estrutura organizacional, atual, da PV contempla os seguintes

apoiadores:

• Gestores para organizar e atender as demandas relacionadas à

organização e supervisão dos cursos.

• Professores Colaboradores, lotados em unidades acadêmicas e com

horas cedidas para atuação na CEAD. Eles ministram aulas nos cursos

de capacitação dos professores para uso do AVEA, supervisionam a

Page 310: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 309

equipe na elaboração dos materiais e avaliações necessários para a

estruturação do espaço virtual de aprendizagem;

• Professores para ministrarem as aulas, atender os alunos e elaborarem

os materiais e avaliações necessários para a estruturação do espaço

virtual de aprendizagem.

• Auxiliares Técnicos em EAD (ATEDS) que organizam e sistematizam as

informações geradas no ambiente virtual em função do grande volume de

informações produzidos nos fóruns e, também, na publicação e

disponibilização de materiais elaborados pelos professores. Enfatiza-se

que a PV não “tutores” em seu quadro de pessoal.

• Núcleos de Informática associado à Gerência de Tecnologia de

Informação e Comunicação (GTIT) que cuida de todos os aspectos

relacionados à manutenção e infraestrutura de hardware da plataforma

onde estão os repositórios e sala de aula virtual.

• Help Class responsável pelo suporte aos usuários da plataforma

MOODLE (Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment).

• Nucleo de Mídia e Design (NMD) setor que trabalha com a manipulação,

formatação e disponibilização de objetos digitais em multimídia, que

viabilize os recursos a serem inseridos no repositório de recursos a

serem disponibilizados nas aulas virtuais. Importante salientar que o uso

de áudio e vídeos é cada vez mais explorado na EAD. Estes materiais

são produzidos a partir das demandas dos professores que fazem o

designer do curso. Neste setor também é fundamental a presença de

web designers que permitam a customização da plataforma e a

organização estética do ambiente.

• Estagiários são alunos da graduação da PUCRS que formatam os

materiais digitais, acompanham as gravações, organizam os materiais do

curso no arquivo virtual (webfólio) do curso, acompanham/registram a

entrega de materiais, de avaliações e de emails, organizam a modelagem

do ambiente virtual, entre outras atividades.

• Uma infraestrutura de secretaria e recepção que suporte todas as ações

administrativas e de serviço de correio.

Page 311: Inovação, universidade e relação com a sociedade

310 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Seguindo na linha inovadora e empreendedora da Universidade, aliada a

abertura da legislação educacional brasileira, a Coordenadoria de Educação a

Distância (CEAD) da PUCRS passou a estruturar as políticas de EAD da

instituição e a administrar o Ambiente Virtual de Ensino e Aprendizagem na

plataforma MOODLE, em substituição ao WEBCT. Este AVEA (MOODLE) foi

implementado em 2006 nas disciplinas semipresenciais da graduação, disciplinas

presenciais que optaram pelo ambiente para suporte as aulas e também em todos

os cursos virtuais.

Mudança e Inovação Pedagógica alinhada com a proposta Marista

O momento atual exige uma crescente interatividade e interconectividade,

propiciada pelas TDs, com emprego de vários meios de comunicação e diferentes

equipamentos interligados em rede. Essa interatividade se constitui no diferencial

da EAD da PUCRS VIRTUAL, na oferta dos seus cursos: disponibilidade de

acesso ao ambiente virtual do curso na modalidade 24x7 (todo o dia e durante

toda semana), comunicação facilitada com toda a equipe de apoio e professores,

uso de tecnologia digital de ponta, inibição da impressão de materiais em papel

(incentivo a uma cultura de responsabilidade ambiental, apesar do aluno poder

imprimir tudo o que desejar o curso apenas usa materiais digitais ou

digitalizados), interatividade freqüente entre os integrantes do curso e

disponibilização de áudios e vídeos contextualizados com o assunto do curso

(com baixo índice de reaproveitamento integral de materiais em função da

personalização das atividades a cada turma).

O uso de materiais multimídia especialmente elaborados para o curso

auxilia a superar o grande desafio da EAD com ênfase conteudista (mera

informação proporcionada pelo fácil acesso à Internet e aos hipertextos) sem

desenvolvimento efetivo da aprendizagem, abrindo espaço para cursos de baixa

qualidade e de resultado duvidosos os quais têm realizado um “desserviço” a

comunidade que acredita na EAD.

Destaca-se, ainda, como característica relevante, a versatilidade desta

metodologia, que tanto pode ser permeada pelo ensino presencial,

semipresencial ou virtual, como também se adequa ao ensino formal ou não-

formal.

Page 312: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 311

Com o advento da Internet, a qual completa dez anos de uso massivo, a

sociedade contemporânea mudou a forma como se comunica e, também, pode-

se dizer que existe uma mudança na forma como se aprende. Segundo Lévy

(2003), o aluno que navega no ciberespaço possui uma forma diferenciada de

trabalhar o conhecimento. Esta percepção pode ser facilmente comprovada pelos

inúmeros recursos que um aluno nativo do ciberespaço utiliza no seu cotidiano.

Estamos acostumados a observar o jovem de hoje usar de forma simultânea o

MSN, a Internet, jogar, falar no telefone e até mesmo estudar. Isto pode parecer

muito complexo e pouco provável para nós imigrantes do ciberespaço.

Além deste aspecto de mudança no comportamento, vamos encontrar a

questão da quebra do paradigma da presencialidade. Hoje um aluno não precisa

mais estar no mesmo espaço físico que seu professor e colegas. E, também, a

questão da sincronicidade fica relevada a outro plano, uma vez que o ferramental

disponível (fóruns, blogs, páginas e outros) permitem que a informação seja

disponibilizada e tratada de forma assíncrona, sem prejuízo da qualidade (desde

que bem planejada).

Hoje temos os nativos digitais sendo ensinados e tutelados por imigrantes

digitais (Prensky, 2001). Isto significa que os docentes não nasceram imersos nas

tecnologias e tiveram de aprendê-las. Logo, a percepção não é a mesma. O

desafio é grande e temos de vencer preconceitos antes de tudo. Esta nova

geração de discentes faz coisas diferentes e são expoentes de mudanças

relacionadas à globalização. Eles se comunicam com seus pares e demais

pessoas de forma mais intensa, usando o computador, o celular, os iPods, os

blogs, os Wikis, as salas de bate-papo na Internet, os jogos em rede e as diversas

plataformas de comunicação que a cada dia são criadas.

Não se sabe a novidade que vem por ai, mas se sabe que a comunicação

interativa é a base de toda oferta tecnológica. As pessoas querem se comunicar a

um simples toque de botão. Nada mais natural para quem desde bebê foi

estimulado a usar um controle remoto e foi educado que a distância física não é

fator impeditivo para comunicação e a aprendizagem. Esta geração denominada

de Homo Zappiens por Veen e Vrakking (2009) é agente de mudança na

educação. Os autores salientam que esta geração se difere de qualquer outra

porque cresceu numa era digital.

Page 313: Inovação, universidade e relação com a sociedade

312 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

EAD online: uma educação inovadora e de qualidade a partir da capacitação docente

A formação docente oferecida pela PUCRS VIRTUAL através de suas

Oficinas MOODLE

(http://www.ead.pucrs.br/cursos/oficinamoodle/portal/index.php) capacita o

professor da Universidade a criar a infraestrutura de sua sala de aula virtual em

função do projeto pedagógico da sua Unidade Acadêmica. As Oficinas tem sido

uma estratégia inovadora de proporcionar reflexões acerca do papel das

tecnologias versus o papel do docente neste novo e desafiador contexto que

emerge do uso massivo de TDs na sociedade. Estas Oficinas ocorrem durante os

semestres letivos e também nos períodos de recesso escolar, para turmas

pequenas, que tanto podem ser de mestres da mesma Unidade Universitária

como de grupos diversificados. O objetivo principal destas oficinas é o de levar os

professores a aprenderem a criar ambientes virtuais de ensino e de

aprendizagem, descobrindo as funcionalidades (recursos e atividades) do

MOODLE, utilizando diferentes serviços e ferramentas computacionais para

gestão e interação nestes ambientes.

Outro aspecto fundamental que se faz necessário no que tange a formação

do docente para atuar no ciberespaço está ligada a seleção e organização de

materiais digitais. Neste aspecto o uso Bibliotecas Virtuais (organizadas a partir

de links e materiais disponíveis na Internet) e disponibilização de livros virtuais (E-

Books) estão sendo cada vez mais incentivados na EAD. Nos cursos da PV

incentiva-se a utilização do acervo digital interno provindo da Biblioteca Central da

PUCRS e da Editora da PUCRS (EDIPUCRS), além do portal

www.dominiopublico.org.br o qual permite a coleta, a integração, a preservação e

o compartilhamento de conhecimentos, sendo seu principal objetivo o de

promover o amplo acesso às obras literárias, artísticas e científicas (na forma de

textos, sons, imagens e vídeos), já em domínio público ou que tenham a sua

divulgação devidamente autorizada, que constituem o patrimônio cultural

brasileiro e universal. Assim como estes, muitos outros sites e portais de editoras

nacionais ou internacionais são utilizados e incentivados seu uso, já que

disponibilizam ser acervo científico na íntegra e no formato digital.

Page 314: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 313

Outra estratégia utilizada para compor o acervo de materiais usados nos

cursos são os repositórios brasileiros de Objetos de Aprendizagem (OA), tais

como:

RIVED (http://www.rived.mec.gov.br)

CESTA (http://www.cinted.ufrgs.br/CESTA/)

LabVirt (www.labvirt.fe.usp.br)

Oe3-tools (http://www.cesec.ufpr.br/etools/oe3)

Banco Internacional de Objetos Educacionais

(http://objetoseducacionais2.mec.gov.br/)

Estes repositórios de OA permitem que se encontre uma série de

possibilidades gratuitas de softwares educacionais Se o curso permitir o uso de

programas escritos em inglês, alternativa interessante encontra-se em

repositórios internacionais tais como:

MERLOT (http://www.merlot.org/merlot/)

CAREO (http://www.ucalgary.ca/commons/careo),

ARIADNE (http://www.ariadne-eu.org)

Wisc-Online (http://www.wisc-online.com)

Os repositórios mencionados acima incorporam o conceito atual de tratar o

projeto de softwares educacionais na perspectiva de Objetos de Aprendizagem,

observando a questão do reuso e interoperabilidade. Segundo Weller, et al.

(2003), um OA é uma parte digital do material da aprendizagem que se dirige a

um tópico claramente identificável ou resultado da aprendizagem e tem o

potencial de reutilização em contextos diferentes.

A figura 1 apresenta a interface da Comunidade MOODLE de Professores

da PUCRS usuários do AVEA, devidamente capacitados nas Oficinas da CEAD, a

qual foi criada para permitir o intercâmbio de informações e boas práticas

adquiridas pelos docentes da Universidade. Esta ação, também inovadora, abriu

espaço para o professor dialogar com colegas de forma ágil e acessível, com total

autonomia e flexibilidade. E, sensíveis ao fato de que a maioria dos docentes são

imigrantes digitais e não é possível adquirir destreza com uso de ferramentas

digitais sem a devida reflexão e prática, esta comunidade permite ao professor

obter ajuda com seus pares e equipe da CEAD, a qual acompanha as

contribuições no intuito de fornecer apoio virtual.

Page 315: Inovação, universidade e relação com a sociedade

314 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Figura 1: Comunidade MOODLE de professores da PUCRS

Apesar de não ser possível, ainda, por questões legais, realizar cursos de

mestrado e doutorado totalmente a distância, a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-

Graduação (PRPPG) da PUCRS, ciente dos avanços tecnológicos, da

necessidade de se manter atualizada e das vantagens que estes recursos digitais

síncronos e assíncronos podem trazer para a pós-graduação Stricto Sensu e a

pesquisa define sua política de EAD a qual confere “um caráter de virtualidade e

ubiqüidade (pervasividade) que a própria natureza do desenvolvimento científico

e tecnológico requer, dentro dos padrões atuais da tecnologia”. Neste sentido ela

incentiva os professores a utilizarem salas de aulas virtuais como repositórios e

elementos de articulação e interação extraclasse, promovendo a cultura da

discussão virtual no âmbito das disciplinas presenciais. Além do uso destes

ambientes virtuais mais formais existe o estimulo à criação de blogs para os

professores colocarem materiais e divulgarem sua pesquisa e idéias. O uso

destes recursos tão comuns no ciberespaço amplia o espaço tradicional de

pesquisa e divulgação cientifica. A gerencia destes blogs e salas virtuais é

realizada em parceria com a CEAD, a qual funciona como elemento articulador

destas ações na comunidade de pesquisa da PUCRS.

A partir desta política de EAD, a PRPPG passa a usar “tecnologias de

comunicação síncronas na defesa das teses e dissertações, nos exames de

qualificação e em reuniões regulares de pesquisa, viabilizando o trabalho de

comissões e a discussão colegiada, exigindo menor esforço de deslocamento e

Page 316: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 315

possivelmente um menor volume de recursos financeiros, permitindo

participações que, tivessem de ser 100 % presenciais, nem sempre seriam

possíveis.”

Enfatiza-se que, para este novo discente, nesta nova instituição

educacional, é preciso que o professor se aproprie do paradigma da EAD,

compreendendo sua potencialidade e referencial teórico, para melhor usufruir dos

recursos tecnológicos, com vistas a uma educação interativa, inovadora e de

qualidade. Cabe à instituição e aos educadores criarem ambientes de

aprendizagem em que os alunos possam ser orientados, não só sobre onde

encontrar informações, mas, também, como avaliá-las, analisá-las, organizá-las,

tendo em vista seus objetivos.

Nessa proposta, os próprios professores passam a perceber o

conhecimento, cada vez mais, como um processo contínuo de busca e pesquisa

de recursos instrucionais e informações, atualizando mais fácil e rapidamente seu

material didático. Assim, a ameaça de padronização e massificação da EAD, ou

ainda, a pretensão de ser propiciadora de um curso de “aligeiramento” da

aprendizagem ficará descartada, assumindo uma postura política e

procedimentos pedagógicos adequados. A reflexão crítica sobre estas questões,

possivelmente, levará a uma prática de mediação pedagógica que favoreça a

interatividade.

Considerações finais

A experiência acumulada nesta área permite afirmar que não é só a

tecnologia que possibilita o sucesso da EAD online. Muito mais importante do que

ela oferece em termos de oportunidades e infraestrutura é a necessidade dos

professores entendê-la e utilizá-la. A tecnologia, em si, não é boa nem má, o uso

que se faz dela é que determina se o resultado é positivo ou negativo.

Organizar uma aula virtual não é tarefa fácil para quem possui pouca

familiaridade com uso de tecnologias e em especial os recursos da Internet. O

atributo difícil, também é relativo, uma vez que o docente que costuma planejar

criteriosamente e de forma diversificada sua aula presencial encontrará muita

similaridade no organizar as aulas virtuais. Evidente que o acompanhamento

virtual demanda uma nova postura e organização do tempo do professor, e

Page 317: Inovação, universidade e relação com a sociedade

316 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

principalmente, um entendimento por parte do aluno de que apenas o ambiente

virtual está sempre disponível e o professor não fica a sua disposição todo o

tempo.

Ensinar a distância no modo online é diferente de ensinar presencialmente,

mesmo para professores com larga experiência de magistério. Isso significa que é

necessário conhecer, estudar, pesquisar, avaliar e refletir sobre todos os aspectos

envolvidos nesse processo bem como ressignificar a trajetória já percorrida a

partir da experiência no presencial. Não há espaço para improvisação total, ou

seja, o docente tem de organizar todo o curso antes que o mesmo ocorra e no

caso de inclusão de recursos multimídia estes devem ser previamente projetados

e, preferencialmente, estar disponíveis por ocasião do curso. É uma nova forma

de pensar e realizar o espaço da sala de aula. Ao mesmo tempo em que se exige

este rigoroso planejamento, o professor deve ser flexível e apto a improvisar a

partir das intervenções dos seus alunos e ser capaz de corrigir eventuais lacunas

através da criação de atividades e disponibilização de materiais complementares.

Isto vai requerer cada vez mais domínio de conteúdo e expertise, razão pela qual

muitos pesquisadores de EAD questionam a formação que hoje se fornece aos

professores, a qual não os prepara devidamente para atuar nesta modalidade,

fazendo com que seja imperioso capacitar os professores.

Como toda educação, formal ou continuada, necessita ter qualidade, a

EAD online, especificamente, por ser inovadora e apresentar legislação

educacional própria, é avaliada constantemente, para ter autorização e

reconhecimento dos cursos desenvolvidos, bem como o credenciamento da

instituição de ensino. Nesse sentido, acredita-se que, como todos os cursos de

graduação e pós-graduação estão sendo sistematicamente avaliados

(interna/externamente) e redimensionados, na busca da qualidade (requisito

indispensável à Educação, tanto mais num país em desenvolvimento, não

importando se é presencial ou à distância), justifica-se repensar a tecnologia, o

paradigma educacional, a interatividade e as ações inovadoras no campo da EAD

cujo foco central é a qualidade da educação ofertada. “Em tempos de mudança, aqueles que aprenderem herdarão a Terra, enquanto aqueles que já aprenderam encontrar-se-ão esplendidamente equipados para lidar com um mundo que não mais existe.” Eric Hoffer

Page 318: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 317

Referências

ARETIO. G, L. (coord.) Ruiz Corbella, M.; Domínguez Fajardo, D. De la educación a distancia a la educación virtual. Barcelona: Ariel, 2007. LÉVY, Pierre. O que é virtual. São Paulo: Editora 34, 2003. PRENSKY, M. Digital Natives, Digital Immigrants. In: The Horizon, MCB University Press, Vol. 9 No. 5, October 2001. RODRIGUES, C. Blogs e a Fragmentação do Espaço Público. Covilhã-Portugual: Livros Labcom, 2006. Disponível em: <http://www.livroslabcom.ubi.pt/coleccoes.html> acesso em junho de 2009 WELLER et al. Putting the pieces together: What working with learning objects means for the educator. Disponível em: <http://iet-staff.open.ac.uk/m.j.weller/elearn.doc> acesso em junho 2009 VEEN, W.; VRAKKING, B. Homo Zappiens - Educando na Era Digital. Porto Alegre: ARTMED, 2009.

Page 319: Inovação, universidade e relação com a sociedade

O MUSEU DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DA PUCRS: MEDIAÇÃO ENTRE CONHECIMENTO E SOCIEDADE

THE MUSEUM OF SCIENCES AND TECHNOLOGY - PUCRS: MEDIATING

KNOWLEDGE AND SOCIETY

Simões Pires, Melissa G.; PhD; MCT- PUCRS

[email protected]

Scolari, Luiz Marcos; Esp; MCT - PUCRS

[email protected]

Jeckel-Neto, Emílio A.; PhD; MCT- PUCRS

[email protected]

Resumo

Discute-se um tipo de ação de responsabilidade social do Museu de

Ciências e Tecnologia da PUCRS (MCT-PUCRS) feita através da divulgação de

informações científicas relacionadas a temas atuais relevantes por meio de

exposições temporárias não previstas no calendário de atividades do Museu.

Estas exposições são elaboradas a partir de temas que têm grande impacto no

cotidiano da comunidade no momento. São apresentados dois casos que

exemplificam esta ação: as exposições sobre o surto de dengue e sua prevenção

em 2008 e sobre o impacto da ação das pessoas na população de bugios,

relacionada com o avanço da febre amarela no Rio Grande do Sul em 2009.

Palavras-chave: Papel social, Informação científica e tecnológica, Museu de

Ciências.

Abstract

One kind of social responsibility action of the Museum of Sciences and

Technology of PUCRS (MCT-PUCRS) is discussed. The Museum’s action is to

promote unscheduled exhibits on scientific information about current relevant

topics concerning the society. Two cases are presented: the an epidemic outbreak

Page 320: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 319

of dengue and its prevention in 2008, and the impact of people actions on the

bugio monkees related to the onset of yellow fever in the State of Rio Grande do

Sul in 2009.

Keywords: Social role, scientific and technological information, Sciences

museum.

Introdução

A exposição permanente do Museu de Ciências e Tecnologia da PUCRS

(MCT-PUCRS) foi inaugurada em 14 de dezembro de 1998 e, atualmente,

apresenta mais de 800 experimentos interativos, distribuídos na área de

exposições do Prédio 40 e no PROMUSIT (Programa Museu Itinerante). Através

de dioramas, multimeios, interações vivas, jogos virtuais e exposições

temporárias diversas, são envolvidas diversas áreas como: física, matemática,

astronomia, geologia, paleontologia, arqueologia, história e outras (Borges et al.,

2008).

Segundo Nicholson (2002), o estudo da museologia tem oportunizado uma

evolução nos processos de criação de uma exposição científica. Trabalhos como

o de Cazelli e colaboradores (2002), afirmam que duas dimensões têm sido

consideradas fundamentais nessas exposições: a primeira refere-se à promoção

da compreensão pública da ciência e da tecnologia (C&T). A segunda é a

abordagem social, que visa trazer a cultura da sociedade de um modo geral para

dentro dos museus, a fim de que os conhecimentos científicos e tecnológicos

atuais, que estão presentes na mídia e geram controvérsias, sejam

compartilhados e discutidos pelo público. Essa abordagem social está relacionada

à atuação do museu como responsável por processos de divulgação científica

junto à comunidade. Também diz respeito ao nível de entendimento de ciência e

tecnologia necessário para que cada cidadão tenha a condição de compreender o

seu entorno, ampliando as possibilidades e oportunidades de atuação no seu

meio social.

Valente e colaboradores (2005) ressaltam que as demandas da sociedade

e as questões educacionais vêm conformando o papel social dos museus de

ciência, sobretudo na absorção de novas idéias e tendências por parte dessas

Page 321: Inovação, universidade e relação com a sociedade

320 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

instituições, no replanejamento das formas de trabalho, especialmente para que

os museus possam acompanhar as rápidas mudanças do mundo contemporâneo.

O fato do MCT-PUCRS utilizar a exposição como ferramenta prática, tanto

para o meio científico quanto para o cidadão comum, permite que as

necessidades cotidianas de uma comunidade sejam utilizadas como ponto de

partida e de inspiração para o desenvolvimento da ciência, da tecnologia, da

inovação e da criação no espaço museal. Essa nova relação imediata entre a

demanda da sociedade e a inovação da exposição deve estar embasada no

reconhecimento mútuo das contribuições que cada lado pode oferecer para que,

juntos, tomem decisões e atitudes que dizem respeito à sociedade em geral

(Valente et al., 2005).

Nesse contexto insere-se o presente trabalho, apresentando duas ações

fora do calendário previsto, elaboradas pela equipe do MCT-PUCRS com a

finalidade de prestação de esclarecimentos a comunidade envolvendo os temas

dengue e febre amarela, em momentos distintos em que a compreensão pública

dos temas envolvia diretamente a tomada de decisões e atitudes da população.

Descrição do processo de Inovação

A primeira ação no âmbito do MCT-PUCRS ocorreu em março de 2008,

quando a dengue estava tornando-se um problema de saúde pública no Rio

Grande do Sul. A equipe do MCT-PUCRS procurou a Secretaria Municipal de

Saúde de Porto Alegre e estabeleceu uma parceria para elaborar a exposição

interativa denominada “Corrida contra a dengue”. Através de atividade lúdica, a

exposição alertou os visitantes sobre os riscos dessa doença, bem como as

maneiras de precaver-se contra a mesma. Tal iniciativa mostrou-se válida, pois

era buscada intensamente por alunos, professores e publico em geral. A

conscientização da comunidade quanto aos riscos e sua responsabilidade nos

cuidados para evitar a disseminação da dengue foram os focos principais dessa

exposição. Além de todas as informações técnicas contidas nesse espaço, havia

um jogo gigante com dados, onde os alunos disputavam uma “corrida contra a

dengue” ao longo de uma trilha Nesta trilha havia determinadas atitudes corretas

ou incorretas que faziam o participante avançar ou retroceder até que

Page 322: Inovação, universidade e relação com a sociedade

Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 321

conseguisse chegar ao ponto final. Os finalistas eram premiados com uma taça

comemorativa ao seu sucesso (Figura 1).

Figura 1 - Aspectos da exposição “Corrida contra a Dengue”.

A segunda ação de responsabilidade social ocorreu no início de 2009,

quando do avanço significativo da febre amarela no Estado do Rio Grande do Sul.

Essa exposição abrangia, não somente o tema “doença febre amarela”, mas

também envolvia um acontecimento que estava preocupando o meio científico de

forma importante: o abate de bugios no estado causado por informações

incorretas. Várias comunidades estavam, equivocadamente, considerando o

bugio como transmissor da enfermidade e, por medo, estavam matando estes

animais, quando estes macacos sofrem contaminação antes dos humanos e

morrem da doença ao invés de transmiti-la. Para a elaboração dessa exposição,

buscou-se o apoio das Unidades Acadêmicas da PUCRS, através de docentes e

discentes engajados na temática. Foi elaborada então a exposição “Proteja o seu

anjo da guardo” (Figura 2), que alertava para o fato de que os bugios eram, na

verdade, sentinelas sanitárias que indicavam a presença da doença em

determinada região e eram vítimas da mesma.

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322 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Figura 02 - Painel da exposição “Proteja seu anjo da guarda”.

Utilizou-se também nesse espaço o tema de uma campanha lançada pelo

professor da Faculdade de Biociências, Dr. Julio Cesar Bicca Marques que

divulgou a importância bugio como um indicador de que a doença estaria

presente em determinado local.

Além das informações citadas, outras buscavam alertar o público sobre a

importância de sua atuação contínua para o controle dos mosquitos

transmissores (Aedes aegypti), abordando temas como medidas de prevenção

(Figura 3), meios de propagação, além de mostrar os sinais e sintomas da doença

(Figura 4).

Figura 3 - Painel sobre a prevenção da febre amarela.

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Inovação, Universidade e Relação com a Sociedade: Boas Práticas na PUCRS 323

Figura 4 - Painel sobre os sintomas da febre amarela.

Resultados

Embora não se tenha mensurado sistematicamente o impacto dessas

exposições, um indicador de sua relevância é foi a grande procura por mais

informações dobre os temas abordados. Os visitantes em geral buscam essas

informações com a equipe de mediadores que trabalham na exposição do Museu.

Muitas vezes, conversavam com os mediadores para compartilharem seus

anseios e/ou sugestões para se ampliar a divulgação sobre as temáticas. Já os

professores que acompanharam grupos de estudantes, além de contarem com a

mediação no espaço museal, solicitaram informações sobre formas de trabalhar o

tema em sala de aula com a Coordenação Educacional do MCT-PUCRS.

Page 325: Inovação, universidade e relação com a sociedade

324 AUDY, J. L. N. & MOROSINI, M. C. (Orgs.)

Considerações Finais

Acreditamos que, pela credibilidade do MCT-PUCRS junto à sociedade,

todas as informações veiculadas pelo Museu sejam mais facilmente aceitas e

assimiladas por alunos, professores e pelo publico em geral, não somente pela

forma são como são elaborados os ambientes expositivos, mas também pela

qualidade e clareza do conteúdo trabalhado.

A finalidade do Museu como espaço de divulgação científica tem se

mostrado presente, pois, pelo relato de visitantes, após essa experiência, muitos

passam a ser multiplicadores de das informações obtidas na exposição por as

considerarem fidedignas. Também se mostraram sensibilizados pelo impacto

dessas doenças na vida das pessoas e no meio ambiente.

Assim, considera-se que estas ações focadas no cotidiano imediato da

sociedade contribuem de forma eficaz e comprometida para que, em tempo hábil,

as pessoas possam utilizar os conhecimentos da ciência para efetivarem-se como

cidadãos atuantes e conscientes do seu papel e da sua responsabilidade social.

Referências

BORGES, Regina Maria Rabello; LIMA, Valderez Marina do Rosário; IMHOFF, Ana Lúcia. Contextualização no Âmbito do Projeto Nº 057 CAPESFAPERGS: Observatório da Educação, Museu Interativo e Educação em Ciências. In: ______; MANCUSO; Ronaldo (orgs.). Museu Interativo: fonte de inspiração para a escola. 2ª ed. ver. e ampl. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008. p. 7-19. CAZELLI, S.; QUEIROZ, G.; ALVES, F.; FALCÃO, D.; VALENTE, M.; GOUVÊA, G.; COLINVAUX, D. Tendências Pedagógicas das Exposições de um Museu de Ciência. In: GUIMARÃES, V.; SILVA, G. Implantação de centros e museus de ciências. Rio de Janeiro: UFRJ, 2002. p. 208-218. NICHOLSON, F. Applied museology in exhibit development in the 21st century. In: GUIMARÃES, V.; SILVA, G. Implantação de centros e museus de ciências. Rio de Janeiro: UFRJ, 2002. p. 120-122. VALENTE, M. E., CAZELLI, S. e ALVES, F.: Museus, ciência e educação: novos desafios. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, vol. 12 (suplemento), p. 183-203, 2005.