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INSTITUIÇÕES DE DIREITO DO TRABALHO 20ª EDIÇÃO ATUALIZADA POR ARNALDO SUSSEKIND LIMA TEIXEIRA ORGANIZAÇÃO SINDICAL por Segadas Vianna 1 - UM POUCO DE HISTÓRIA DO SINDICALISMO Não caberia no âmbito deste livro e nos limites restritos de um capítulo proceder a um completo estudo da história do sindicalismo. Consoante a lição de René Maunier, antigo professor da Universidade de Paris, sendo quase infinitas as variedades de grupos concretos na sociedade, são poucos, porém, os princípios segundo os quais podem os mesmos ser classificados e, na verdade, se resumem a três: "Se se procura o que faz a unidade e a duração de um grupo humano; se se observa o motivo pelo qual os membros de um determinado grupo são ligados entre si; se se quer saber em virtude de que permanecem unidos, concluir-se-á que tal se dá, ou pelo parentesco, ou pela localidade, ou ainda pela atividade"'. Verificamos que a atividade cria laços mais profundos entre os homens do que os decorrentes da localidade e, em certos casos do parentesco, porque o exercício de uma atividade, e especialmente de uma profissão, cria características das quais o indivíduo jamais se liberta e que até transmite a seus descendentes. E isso aconteceu, nas épocas mais primitivas, nos povos ainda nas suas fases de formação social, unindo em grupos ou castas guerreiros, sacerdotes, pastores. Permitisse a angústia do espaço a que estamos submetidos e teríamos de ir procurar na história do antigo Egito a coalizão de trabalhadores, unidos pelas condições /home/website/convert/temp/convert_html/55cf85d7550346484b91ebc5/document.doc 1

Instituicoes de Direito Do Trabalho - Arnaldo Sussekind

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Direito do Trabalho - Arnaldo Sussekind

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A C R D O

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INSTITUIES DE DIREITO DO TRABALHO

20 Edio Atualizada por

ARNALDO SUSSEKIND

LIMA TEIXEIRA

ORGANIZAO SINDICAL

por Segadas Vianna

1 - UM POUCO DE HISTRIA DO SINDICALISMO

No caberia no mbito deste livro e nos limites restritos de um captulo proceder a um completo estudo da histria do sindicalismo. Consoante a lio de Ren Maunier, antigo professor da Universidade de Paris, sendo quase infinitas as variedades de grupos concretos na sociedade, so poucos, porm, os princpios segundo os quais podem os mesmos ser classificados e, na verdade, se resumem a trs: "Se se procura o que faz a unidade e a durao de um grupo humano; se se observa o motivo pelo qual os membros de um determinado grupo so ligados entre si; se se quer saber em virtude de que permanecem unidos, concluir-se- que tal se d, ou pelo parentesco, ou pela localidade, ou ainda pela atividade"'.

Verificamos que a atividade cria laos mais profundos entre os homens do que os decorrentes da localidade e, em certos casos do parentesco, porque o exerccio de uma atividade, e especialmente de uma profisso, cria caractersticas das quais o indivduo jamais se liberta e que at transmite a seus descendentes. E isso aconteceu, nas pocas mais primitivas, nos povos ainda nas suas fases de formao social, unindo em grupos ou castas guerreiros, sacerdotes, pastores.

Permitisse a angstia do espao a que estamos submetidos e teramos de ir procurar na histria do antigo Egito a coalizo de trabalhadores, unidos pelas condies profissionais semelhantes, fazendo verdadeiras greves, provocadas por interesses idnticos em atividades comuns. Velhas de milhares de anos, acharamos na ndia e na China certas instituies que marcaram, na sua constituio, na sua formao, a maneira que poderia levar a confundi-las com as instituies sindicais, se no fizssemos uma melhor anlise de suas origens. Mas, como afirmamos, tudo isso no se justificaria dentro de um captulo.

Caberiam tais pesquisas melhor, entretanto, num estudo de sociologia do que em uma histria do sindicalismo, que, para muitos, apenas nasceu com a Idade Moderna e conseqncia da Revoluo Industrial com a mquina e a fbrica.

A Colgios romanos. Apenas pela sua semelhana com alguns sistemas sindicais e com as corporaes, poderemos ir buscar na Antigidade as origens do sindicalismo nas instituies romanas, distribuindo o povo segundo artes e ofcios, numa organizao com certos pontos formais semelhantes aos sindicatos modernos. Mas, enquanto estes foram uma conseqncia do individualismo liberal, levando os trabalhadores, em face da absteno do Estado, a se unir para a defesa de seus direitos e reivindicaes, os colgios romanos nasceram por uma determinao da autoridade.

Uns atribuem a Srvio Tlio a criao dos colgios romanos, dissolvidos oficialmente no ano 64 a.C. e mantidos realmente at o ano 56 da era crist, mas Jos Nart Rodes da sua paternidade a Numa (763-671 a.C.) e nos explica as causas de sua instituio: "Entre todas as instituies que se devem a Numa, a que se aprecia mais e a distribuio do povo segundo as artes e ofcios, pois a cidade ento o Estado se compunha de duas naes, ou melhor, se dividia em duas faces que de modo algum queriam unir-se nem pagar as diferenas, causa diria de disputas e debates entre elas. Pensou que, similarmente aos corpos slidos, que, no se podendo misturar previamente enquanto se encontram inteiros, se incorporam com facilidade desde que so triturados e reduzidos a p, de vez que a pequenez das partes facilita a mistura, era, outrossim, necessrio dividir o povo em vrias partes diminutas, levando-o, com isto, para os interesses particulares que desapareceriam e trariam consigo o interesse geral, o qual j no significava nada, uma vez debilitado e dividido em tantas partes diferentes. Dividido, pois, o povo por ofcios, tais como msicos, ourives, carpinteiros, tintureiros, sapateiros, curtidores, ferreiros, oleiros e outros, colocando os artesos de cada um em um s e mesmo corpo, ordenando confrarias, festas e assemblias, e assinalando o culto que deviam tributar aos deuses, segundo a dignidade de cada ofcio"

B Corporaes e similares. Criados com o objetivo de dividir o povo, evitando o choque entre sabinos e romanos, os colgios tiveram, entretanto, como conseqncia, dar forma ao esprito de classe, a mentalidade grupal, que iria, sculos mais tarde, irmanar os trabalhadores oprimidos e desprezados.

Mil anos depois, em poca no exatamente determinada, mas que, segundo Levasseur, foi entre os sculos XII e XIII, surgiram, na Franca e na Alemanha, quando se construam as catedrais de Notre Dame e as de Colnia, as Bruderschaften e as Fraternits. Talvez mais antigos ainda, existiam os corps de mtiers dos fabricantes de velas (1061), dos carniceiros (1134) e dos padeiros (1162).

Tambm no se pode afirmar, com exatido, quando esses grupos profissionais receberam sua primeira regulamentao, mas Hekscher, com fundamentadas razes, afirma que foi no ano de 1351, com a Ordenana de Joo II, o Bom, e como conseqncia da peste que assolou o pas. Mais ou menos pela mesma poca, na Inglaterra, Eduardo III expedia os Statutes of Labourers. Mas o domnio e a organizao do trabalho j estavam nas mos da corporao, que constitua uma organizao com o privilgio de determinada atividade ou produo, e se apoiava em uma "carta-privilgio" dada pelo imperador, pelo senhor feudal ou pela cidade. Apoiadas pela Igreja, pois tinham finalidades tambm religiosas, as corporaes faziam do seu monoplio um meio de explorao dos trabalhadores, e, para isso, os mestres obtinham o apoio das autoridades porque se encarregavam de arrecadar os impostos e pagavam grandes quantias pela obteno dos privilgios.

Mas no s na Frana e na Inglaterra o sistema das corporaes dominava. Elas existiam tambm na Alemanha, na Itlia e na Espanha. Nesse ultimo pas, sua organizao tinha caractersticas marcantes: "Os manuais de Ben Abdum e Al Sagati nos ensinam que os artesos hispano-muculmanos estavam grupados em corporaes de ofcio, ou grmios, dirigidos por um sndico, a quem denominavam amin fiel e tambm arig pertencente ao ofcio. 0 amin era designado pela autoridade e tinha, perante esta, a responsabilidade do cumprimento das ordenanas do grmio e da observncia, entre seus membros, das regras de probidade comercial. Os artesos de um mesmo grmio costumavam agrupar-se formando ncleos de populao e seus estabelecimentos ocupavam toda uma rua e, s vezes, um bairro que recebia seu nome".

Com o mesmo sentido foram as primeiras sociedades portuguesas de ofcio, como nos conta Vieira Fazenda: "Segundo as tradies dos antigos grmios da Idade Mdia, os artistas eram, segundo sua profisso, divididos em 24 corporaes, cada uma das quais elegia o seu juiz, cuja reunio constitua a referida Casa dos 24.

Estes, dentre si, elegiam um presidente, chamado Juiz do Povo, e um escrivo, os quais tomavam assento no Senado. Cada um desses grmios tinha seus estatutos e regulamentos aprovados pelo Governo, debaixo da inspeo do Senado.

No Brasil tambm tivemos grmios, mas jamais atingiram o desenvolvimento que tinham em Portugal e Espanha. Imitaes determinadas pelos governadores quase no tiveram outra atuao que no fosse nas festas religiosas; deles temos notcia em 1693, quando o Conselho determinou, no Rio de Janeiro, que nas procisses os juzes de ferreiro e sapateiro apresentassem a imagem de So Jorge, que os alfaiates dariam a serpe, os dos marceneiros a imagem do Menino Deus, os dos ourives e pedreiros acompanhassem somente com suas tochas, e os taverneiros e mercadores apresentariam uma dana, para cujo fim se deveriam pintar". De idntica determinao temos notcia, em 1704, na Cmara do Maranho, da Bahia e de Pernambuco.

Em 1624, por intermdio de "misteres" ou "mesteres", faziam-se ouvir na Cmara da Cidade do Rio de Janeiro dois deles, eleitos pelos "oficiais mecnicos", e em 1736 a mesma Cmara informa ao Governador Silva Pais que nela se costumava ouvir o povo atravs de procuradores de "mercancia e mecnica". Infelizmente o incndio da Cmara, em 1790, destruiu seus arquivos, impedindo um estudo mais completo sobre os grmios, no Rio de Janeiro, dos quais s temos notcias esparsas.

Gilberto Freyre, no seu "Nordeste", tambm nos d notcia da unio dos negros escravos em Pernambuco: "No Recife, os negros dos prprios armazns de acar foram formando uma espcie de aristocracia de escravos, superiores em prestgio, embora nem sempre em condies materiais de vida, aos escravos das plantaes de cana. No ambiente da cidade, menos impregnado da autoridade dos senhores de engenho, eles formavam uma corporao parte e tinham o seu governador especial, como se v da Proviso de 18 de setembro de 1776, passada pelo Governador Jos Csar de Menezes, pela qual foi nomeado o preto crioulo Manuel Nunes da Costa governador dos pretos mercadores de caixas de acar desta praa".

Igualmente no pode ser esquecida, neste rpido esboo histrico do sindicalismo, a Deciso n. 17, do Conde de Aguiar, em 1812, estabelecendo em Pernambuco uma "companhia de pretos", com direitos e deveres especiais, "para fazer todo o trabalho que for necessrio ao bem comum do comrcio, fazendo arrumar e separar a carga de cada um dos navios", porque sua organizao foi, sem dvida, a primeira experincia da disciplinao das atividades de uma classe, com certas prerrogativas que ainda existem nos sindicatos de estivadores.

Por outro lado, como conseqncia do esprito de resistncia ao meio, fora criadora do sindicalismo de luta, devemos lembrar as confrarias de escravos que, a par de finalidades religiosas, visavam amealhar recursos para comprar sua carta de alforria, sendo de grande relevo a de Chico Rei, em Minas Gerais, no comeo do sculo XVII, que chegou a adquirir uma mina de ouro, em Vila Rica, usando sua produo para pagar a liberdade de outros escravos. E muitas outras existiram, com o nome de "Juntas de alforria", em vrias provncias do Sul e do Centro do Pas.

C Luta dos trabalhadores contra os mestres. No obstante o apoio que tinham dos detentores do poder, as corporaes no conseguiram dominar completamente os trabalhadores de que se serviam e, alm do mais, comeava a se produzir um sentimento de revolta contra os mestres que, na ambio de enriquecer e tambm para atender as exigncias de dinheiro para a manuteno dos privilgios, estendiam exageradamente o nmero de anos da aprendizagem e no aumentavam, na proporo do custo de vida, a remunerao de seus trabalhadores, ao mesmo tempo que impediam a abertura de novas oficinas para evitar a concorrncia no mercado da mo-de-obra.

Na Franca, os trabalhadores viam-se na necessidade de abandonar as cidades, correndo de vila em vila, oferecendo seus servios, originando-se, assim o que Esmein chama L'habitude du Tour de France. Aumentando seu nmero, os trabalhadores isolados sentiram a necessidade de se unir e surgiram na Frana as Associations Compagnonniques e, na Alemanha, as Gesellenverbalden. Adotando certos hbitos das corporaes, seu sentido era, entretanto, de luta e defesa; sua arma era, apenas, a "excluso". 0 trabalhador que no pertencia a associao no conseguia encontrar trabalho porque os companheiros no lhe davam ajuda, recusavam-lhe a palavra e o desprezavam publicamente. Se acontecia, mesmo assim, ser admitido em uma oficina, os demais operrios se despediam e h, na histria desse perodo, at o registro de greves, como a dos sapateiros, de Londres, em 1387, mencionada pelos esposos Sidney e Beatriz Webb, e a dos sapateiros de Emerich, em 1460.

Alarmados com a crescente fora dos trabalhadores, os mestres procuravam reagir. A deciso do Rei Eduardo, da Inglaterra, proibindo qualquer acordo visando modificar a organizao da indstria, o montante dos salrios e a durao do trabalho, foi ratificada pelo Parlamento, em 1525. Na Frana, em 1539, foram proibidos os pactos dos compagnons, como conseqncia das greves dos padeiros em Paris e dos impressores em Lio.

Na Alemanha, uma Ordenana da Polcia do Imprio, em 1530, proibiu a coalizo dos trabalhadores e, em 1731, o mesmo aconteceu em Viena, depois de uma greve de sapateiros, da qual resultaram tumultos e mortes.

Ainda fracos diante do Estado e das corporaes, sofrendo a violncia que ia desde o espancamento a decapitao, impedidos de se locomover e at mesmo de abandonar as cidades sem uma ficha de identificao e de autorizao, os trabalhadores comeavam a compreender que teriam de lutar muito para conseguir o reconhecimento de seus direitos.

D Proscrio e fortalecimento do sindicalismo. Comea, ento, outra fase de luta, j no mais com as corporaes, mas contra a solidariedade gerada pela vida em comum dos trabalhadores nas empresas que se multiplicam.

A Revoluo Francesa, em nome da liberdade, combatendo e suprimindo as corporaes, ia entregar os trabalhadores a livre explorao dos patres, o que, por sua vez, lhes dava, mais fortemente, a compreenso de que teriam de se unir para lutar.

Primeiro o fizeram com simples "coalizes", como uma forma incorprea de associao, em horas de dificuldades e conflitos sociais; depois como sindicatos, "coalizo durvel e permanente", na expresso de Paul Pic.Perseguidos e at proscritos dos quadros legais, os sindicatos conseguiram subsistir ou reaparecer porque, fruto da tendncia de unio que o homem, como zoom politicus, tem para alcanar certos objetivos, o "sindicato nasce a margem da ordenao oficial da sociedade e s vezes contra essa ordenao". Proibidas as coalizes na Inglaterra em 1799, "porque era medida absolutamente necessria para prevenir as exigncias ruinosas dos operrios que, se no fossem reprimidas, destruiriam completamente a indstria, as manufaturas, o comrcio e a agricultura da nao", meio sculo depois as trade-unions reuniam meio milho de membros. E o mesmo sucedia na Frana; proibidas as coalizes, em 1791, pela Lei Chapelier, e restauradas em 1884, pela Lei Waldeck-Rousseau, j em 1886 se realizava em Dijon o primeiro Congresso Nacional de Sindicatos Operrios.

Mas o sindicalismo nasceria, realmente, com a Revoluo Industrial, ou talvez um pouco antes j esboasse seu surgimento. Foi no sculo XVI que comeou a se desenvolver o comrcio internacional, com a criao de mercados, exigindo a produo de bens em maiores quantidades.

Para produzir no bastava, apenas, possuir dinheiro, no era suficiente que houvesse trabalhadores para executar tarefas e matrias-primas para serem usadas e ferramentas para transform-las.

Aperfeioavam-se as ferramentas e os meios de trabalho se transformavam, mas ainda sem o sentido de produo em massa, como j estudamos em captulo anterior.

0 homem isolado era substitudo pelo "homem-massa", pelo proletariado.

Surgiu o movimento sindical, ento, apenas com carter nitidamente reivindicatrio, mas o Tratado de Paz de Versailles, a que adiante nos referiremos, iria dar ao sindicalismo um sentido at antes no atingido.

Para que o sindicalismo adquirisse uma posio de real relevo ainda muito tempo decorreria, pois o movimento sindical era muito dividido, at mesmo dentro dos pases j industrializados.

Como assinalou Sssekind, a sindicalizao foi proibida a partir de 1791, na Frana; considerada delito de conspirao em 1799, na Gr-Bretanha e suas possesses (no mesmo sentido disps o Cdigo Penal francs, de 1810); tolerado, em vrios pases, quando o Parlamento britnico revogou aproibio das coalizes, atitude s imitada pela Frana em 1864; reconhecida, afinal, como direito na Gr-Bretanha (1871), na Frana (1884), nos Estados Unidos (decises judiciais) etc.

E Sindicalismo no Brasil. Oliveira Viana, em um de seus mais notveis trabalhos, traou um panorama da vida brasileira, acentuando "que a solidariedade humana , historicamente, um produto do medo, resulta da necessidade de defesa contra os inimigos comuns, feras ou homens. Dai vem que, em qualquer sociedade humana, desde que a presso de um grande perigo social deixa progressivamente de se fazer sentir, as formas objetivas da solidariedade se reduzem, pouco a pouco, e cada vez mais, a expresses rudimentares. Paralelamente as formas subjetivas decaem e se vo tornando em simples sentimentos de grupo inicial cada vez mais restritos, tendendo a circunscrever-se ao pequeno ambiente dos sentimentos intrafamiliares. E este o caso do povo brasileiro em geral. Como assinalou genialmente Saint-Hilaire, aqui no h sociedade; quando muito, existem certos rudimentos de sociabilidade. Este grande agente do gregarismo a luta contra o inimigo comum no se exerce nem sobre os vrios grupos regionais, nem sobre a totalidade da massa nacional". E mais adiante ressalta que essa fraqueza das populaes rurais e essa falta de esprito associativo existiam, tambm, entre os trabalhadores: "Falta-lhes para isto o esprito corporativo, que no chega a se formar. So meros conglomerados, sem entrelaamento de interesse e sem solidariedade moral. Em sntese: nem classe comercial; nem classe industrial; nem corporaes urbanas".02'

Os raros exemplos a que nos referimos, entre os negros, no passando de fenmenos isolados e temporrios, no serviram como base de partida para a organizao dos trabalhadores. No tnhamos indstria e, como acentuamos no Captulo II, no comrcio o sistema predominante era o patriarcal, na agricultura as lavouras intensivas do caf, da cana e do algodo eram trabalhadas pelo brao escravo e, depois da Abolio, pelos ex-escravos e seus descendentes na quase absoluta totalidade, desconhecendo inteiramente que, ao menos, o trabalhador pudesse ter outro direito a no ser o recebimento do salrio ajustado.

Na ento Capital Federal algumas sociedades que surgiam, como a Liga Operria, fundada em 1870, e a Unio Operria, em 1880, mesmo com nomes especficos indicando profisses ou atividades econmicas, no visavam propriamente a defesa de seus interesses, tanto que abriam o acesso a seus quadros sociais a elementos estranhos a tais atividades ou profisses. Timidamente nelas se agitara, vez por outra, algum problema que representava uma reivindicao ou um protesto.

Mesmo assim, no incio do sculo XX apareceram algumas associaes de classe: Sociedade Unio dos Foguistas (1903), Unio dos Operrios Estivadores (1903), Associao de Resistncia dos Cocheiros, Carroceiros e Classes Anexas (1906), Unio dos Operrios em Fbricas de Tecidos (1917) e poucas outras mais. No segundo quartel do sculo surgiram ento inmeras associaes, algumas subordinadas a orientao comunista. A primeira delas foi dissolvida pelo governo trs meses depois de instalada.

Mas o fato real e que o sindicalismo no Brasil nunca chegou a ter uma real expresso. Pela inexistncia de indstrias e, consequentemente, de massa operria e de luta de classes, o sindicalismo que surgiu depois da Revoluo Liberal, de 1930, deu-se sob o influxo e o patrocnio do Ministrio do Trabalho e assim permaneceu durante todo o chamado "Estado Novo". Mesmo depois do retorno ao regime constitucional os sindicatos continuaram sem expresso, salvo rarssimas excees; mas, na dcada de 80, houve notvel incremento da sindicalizao, a partir das greves do ABC paulista, especialmente no setor da metalurgia. Os sindicatos mais expressivos, nas grandes cidades, conquistaram sua autonomia, antes de proclamada pela Constituio de 1988.

Arnaldo Sssekind, em notvel tese apresentada no Colquio organizado pelo Instituto de Estudos Sociais da Espanha, em colaborao com a OIT, realizado em Madri em maio de 1980 e divulgada na Revista do Tribunal Superior do Trabalho, registrou a realidade do sindicalismo nos anos 70: "Frente a esse quadro, no difcil compreender porque o ndice de sindicalizao urbana em todo o Pas e de 31,9% (Inqurito Estatstico-Sindical do Ministrio do Trabalho, tomando por data-base o dia 31.12.76). Mas para essa mdia concorreu o Estado de So Paulo com o ndice de 36%, em contraste com Estados onde predomina a atividade rural, como o de Mato Grosso (ainda unificado), com 6,72%, ou do Acre com 9,39%. Estados com ampla atividade econmica, como os do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paran e Bahia, apresentaram, respectivamente, os seguintes percentuais: 29,88%, 27%, 28,85% e 26,50%. Computados os trabalhadores rurais, o ndice mdio de sindicalizao em todo o Pas, e estimado abaixo de 25%".

Hoje, no obstante tenha a Carta Magna de 1988 consagrado a unicidade sindical compulsria, os sindicatos de diversas tendncias se multiplicam exageradamente (mais de quinze mil) e se vinculam a cinco centrais sindicais de diretrizes diferentes.

F Primeiras leis sindicais em nosso pas. Foi com o alvorecer do sculo XX que se comeou a falar em sindicalismo, sob aspecto legislativo e legal, em nosso pas. Assim, em 1895, o engenheiro Carlos Alberto de Menezes, que cuidava de assegurar assistncia material a seus trabalhadores, promovia reunies para que expusessem seus anseios e em 1900, em uma tese apresentada ao 1 Congresso Catlico Brasileiro e sob a influncia das palavras de Leo XIII, na "Rerum Novarum", pugnava pela mutualidade operria, tendo fundado, logo depois, a Corporao Operria de Camarajibe. Do Congresso Catlico de Pernambuco, em 1902, surgiu a Federao Operria Crista, presidida por Carlos Alberto de Menezes, e, ainda em 1902, Joaquim Incio Tosta apresentou um projeto sobre sindicatos agrcolas, transformado em Decreto a 6.1.1903, sob o n. 979; mas o seu objetivo era a agremiao dos que se dedicavam as atividades rurais para facilitar a distribuio de crditos. Depois, em 5.1.1907, o Decreto n. 1.637 criava as sociedades corporativas e estendia o direito de se associar em sindicatos a todos os profissionais, inclusive os liberais. As organizaes que ento surgiram de sindicato apenas possuam o rtulo. Entre os trabalhadores do campo no existia uma base intelectual que lhes assegurasse capacidade para se organizar, e, alm disso, estavam economicamente subjugados aos senhores da terra, que no hesitavam em mandar liquidar os que tivessem coragem de reclamar qualquer medida em seu benefcio, j que direitos no existiam consagrados em textos de lei. E no era muito diferente a situao nos centros populosos, no obstante ter sido fundada no Estado do Rio de Janeiro, em 1903, a Federao das Associaes de Classe, que mais tarde passou a se denominar Federao Operria Regional, e realizou seu primeiro congresso em 1906, aconselhando a fundao de sindicatos, unies e resistncias. Em 1912, realizou-se outro congresso, j com a presena de muitas associaes.

Eram cinqenta e sete entidades, que resolveram fundar, mas no levaram a idia a efeito, a Confederao Brasileira do Trabalho.

Dois anos depois, fundava-se em Pernambuco a Federao Regional do Trabalho, agremiando cerca de duas dezenas de sociedades de trabalhadores.

Tudo isso, entretanto, se realizava num clima difcil, de oposio dos patres e do Governo, como nos conta o Professor Joaquim Pimenta, a cujo passado como grande lder revolucionrio j tivemos ocasio de nos referir "Organizar um sindicato, por mais pacficos que fossem os intuitos dos seus promotores; incutir no nimo dos companheiros uma noo, mesmo elementar, de direitos que se tornaram vulgares na legislao de outros povos; discutir uma tabela de salrios ou pleitear a reduo do horrio exaustivo, a que nem as crianas escapavam, eram motivo para ser despedido, boicotado, e se a dispensa do empregado provocava protestos ou reao pela greve, a interferncia do Estado imediatamente se fazia valer detendo os ousados, dispersando ajuntamentos a pata de cavalo, forando os mais tmidos a voltar ao trabalho.

Grandes empresas, exatamente as que exploravam servios pblicos, excediam-se na sua sistemtica hostilidade a todo movimento associativo. Poucos eram os sindicatos que poderiam manter-se desde que se organizassem sem sua aquiescncia, e ainda por elas controlados. Os que se constituram em divergncia acabavam por dissolver-se pelo afastamento inevitvel dos scios mais prestigiosos, demitidos ou removidos para onde no mais pudessem exercer qualquer influncia sobre a classe. Tais fatos tanto se verificaram no Norte e no Sul do Pais, como na prpria Capital da Repblica.

Ao mesmo tempo que se comprimia em um crculo de ferro todo impulso que se pretendesse comunicar ao esprito de organizao j em franco despertar nos meios proletrios urbanos, favorecia-se a sindicalizao ou outra forma de associao operria que, embora visasse, aparentemente, a defesa de interesses profissionais, se tornava, na realidade, campo de explorao eleitoral das faces polticas dominantes. Dessas associaes o verdadeiro mentor ou era o chefe poltico local ou autoridade policial do distrito"

Vencedora a Revoluo da Aliana Liberal, criado o Ministrio do Trabalho, Indstria e Comrcio e nomeado para ele Lindolfo Collor, em 15.3.31, na exposio de motivos que acompanhou o projeto de lei sindical (Decreto n. 19.770, de 19.3.31), dizia o ilustre titular da Pasta:

"No ponho dvida em afirmar a V. Ex. que este projeto representa, depois de longas e incompreensveis vacilaes, a primeira iniciativa sistemtica no sentido da organizao racional do trabalho em nosso Pas. A minha experincia de trs meses na nova Pasta j me deixou arraigada a convico de que, sem a organizao das classes profissionais, impossvel se torna qualquer resultado aprecivel na justa e necessria conjugao dos interesses patronais e proletrios.

A Revoluo de outubro encontrou o trabalho brasileiro na mais completa e dolorosa anarquia. De um modo geral, no ha exagero em dizer-se que na situao atual do Brasil o trabalho e ainda considerado mercadoria, sujeita as flutuaes da oferta e da procura. Intil seria a demonstrao de que esta concepo utilitarista e retrgrada no esta de acordo, j no apenas com as tendncias sociais contemporneas seno tambm com o nvel das conquistas e as prprias imposies econmicas, definitivamente reconhecidas e aceitas em quase todos os pases do Velho e em no poucos do Novo Mundo. Mas, no caso do Brasil, o menosprezo dos poderes pblicos pelos problemas do trabalho cresce de vulto ainda se considerarmos que o nosso Pas est, por acordos e convenes internacionais, obrigado ao reconhecimento dessas novas diretrizes da poltica social".

Combatido, tanto pelos extremados liberais como pelos no menos extremados conservadores, o Decreto n. 19.770, apesar de lei de experincia, marcou o incio de nossa verdadeira organizao sindical. Ainda uma vez se verificava no Brasil a "ao descendente" para a soluo do problema social.

Estabelecia o Decreto n. 19.770 a unidade sindical e, para evitar que os sindicatos tivessem desvirtuadas suas finalidades, determinava, no art. 1, alnea f, entre as condies para reconhecimento: absteno no seio das organizaes sindicais de toda e qualquer propaganda de ideologias sectrias, de carter social, poltico ou religioso.

Quando as entidades sindicais de grau superior, permitia a organizao de federaes regionais e de uma Confederao Nacional da Indstria e do Comrcio e de uma Confederao Brasileira do Trabalho. Tambm o Decreto n. 19.770 exclua dos que se podiam sindicalizar os empregados pblicos e os domsticos.

Medida da maior importncia, em face da mentalidade anti-sindical reinante, continha-se no 2 do art. 12, estabelecendo o pagamento de uma indenizao correspondente ao salrio de seis meses quando o patro demitisse o empregado por causa de sua ao sindical.

Promulgada a Constituio de 1934, nela se estabeleceu, de maneira taxativa, a pluralidade sindical, tendo sido expedido, pouco antes de 12.7.34, o Decreto n. 24.694, j de acordo com os princpios constitucionais, o qual, entretanto, frustrou os adeptos do pluralismo, tais as condies exigidas para a formao do segundo sindicato.

Em 1937, promulgada a Carta de 10 de novembro, voltou o regime da unidade sindical. As Constituies de 1946 e 1967 deixaram a lei a forma de organizao; mas a de 1988 repetiu a de 1937.

G Sindicalismo. Direito comparado. No obstante nos dedicarmos, neste livro, de maneira especial, ao estudo do Direito do Trabalho no Brasil, cremos ser de utilidade, mesmo em um rpido bosquejo, fixar as linhas mestras do sindicalismo em alguns pases.

Na Inglaterra, uma associao de classe tanto pode ser de patres como de empregados, mas, se perante a lei ambas tem os mesmos direitos, aquelas denominam-se simplesmente "associaes", enquanto as de trabalhadores adotam, em geral, o nome de "unies" (trade-unions).Os sindicatos britnicos classificam-se como "profissionais", "industriais" e "gerais". Os profissionais renem os operrios que abraam carreiras especializadas, como por exemplo: Sociedade Conjunta dos Trabalhadores em Madeira, Sociedade Unida dos Caldeireiros, Unio dos Modeladores etc. Neles se grupam os profissionais, independentemente da indstria em que estejam empregados.

Os sindicatos industriais procuram reunir os trabalhadores de toda uma indstria, sem olhar a funo especializada deles. So exemplos a Unio Nacional dos Ferrovirios e a Unio dos Mineiros.

Os sindicatos gerais abrangem no s os trabalhadores especializados ou semi-especializados, como de atividades diversas e de vrias empresas. Os exemplos salientes so a Unio dos Trabalhadores em Transporte e em Geral e a Unio dos Trabalhadores Municipais e em Geral.

No centro do movimento do sindicato britnico est o Congresso dos Sindicatos, composto de delegados provenientes dos sindicatos filiados, abrangendo aproximadamente oito milhes de membros. 0 Congresso se rene uma vez por ano.

A constituio do Congresso dos Sindicatos preserva a autonomia dos sindicatos constituintes: nem o Congresso nem seu Conselho Geral podem interferir nos assuntos internos de um sindicato filiado, ou em suas negociaes sobre salrios ou condio de emprego.

0 Congresso dos Sindicatos tem seu prprio rgo para solucionar disputas entre sindicatos, que surgem, em geral, ou de atividades organizadoras, ou de questes relativas a delegao de trabalho. Esse rgo, contudo, no posto em funcionamento antes que os sindicatos interessados tenham feito esforos para decidirem eles prprios a disputa ou depois de ter sido tentado e ter falhado qualquer meio adequado existente dentro da indstria para a soluo de disputas.

Os sindicatos britnicos so regidos pela Lei de 1871, denominada "Trade-Union Act", pela de 1906, conhecida como "Lei de Disputas na Indstria" e pela Lei de 1913 (dispondo sobre restries quanto a aplicao de fundos sindicais na poltica). A Lei de 1927, considerando ilegais certas greves, foi revogada em 1946, e a "Ordem 1.305" (Lei de Arbitragem, de 1940) foi substituda em 1951 por um novo Regulamento de Arbitragens nas Indstrias.

Na Inglaterra, os funcionrios pblicos podem sindicalizar-se, excetuados os membros das forcas policiais, em virtude de uma lei de 1919, que estabeleceu essa proibio. Embora seja facultada a pluralidade sindical, h unidade de fato.

Nos Estados Unidos existem atualmente menos de 200 sindicatos, quase sempre nacionais, na sua maioria filiados a CIO-AFL, a poderosa central sindical resultante da fuso do Congresso de Organizaes Industriais com a Federao Americana do Trabalho. As entidades no filiadas so conhecidas como "independentes". Existem ainda alguns sindicatos de empresas.

A tendncia, nos Estados Unidos, e para a existncia de sindicatos, abrangendo, cada um, todos os trabalhadores de uma atividade econmica, sejam quais forem suas profisses especficas, sistema esse semelhante ao vigente no Brasil.

Os sindicatos americanos no se filiam a partidos polticos, mas do apoio a candidatos por meio de Comits Polticos, organizados pela CIO-AFL.

Na realidade, entretanto, tem havido uma queda na filiao aos sindicatos nos Estados Unidos. Em 1988 apenas 24,9% dos trabalhadores estavam sindicalizados. Desde 1980, os sindicatos norte-americanos perderam mais dois milhes de associados.

Portugal, depois da queda do corporativismo de Salazar, assegurou a liberdade sindical (Constituio de 1976). Os sindicatos de trabalhadores esto filiados a Confederao Geral dos Trabalhadores Portugueses (comunista) e a Unio Geral do Trabalho (social-democrata).

Na Franca, a pluralidade sindical ensejou a formao de mltiplas correntes. As principais centrais sindicais so a CGT (comunista/socialista), a CGT Force Ouvrier (Independente) e a CFTC (crist).

Na Itlia, a Constituio de 1947 assegura a plena liberdade sindical, e o Estatuto do Trabalhador de 1970 penaliza a conduta anti-sindical. As principais centrais sindicais so a CGIL (comunista/socialista), a CISL (democrata-crist) e a UIL (social-democrata).

Na Espanha, a Constituio de 1978 tambm garante o livre direito de sindicalizao, sendo que as principais centrais so a UGT (vinculada ao Partido Socialista Obrero Espaol), a CCOO (congrega as comisses operrias de empresas, com influncia do Partido Comunista Espanhol) e a USO (defende a doutrina social da Igreja).

Quanto as organizaes sindicais de mbito internacional, a primeira delas, criada em Londres, em 1864 tomou o nome de Primeira Internacional dos Trabalhadores, mas, com a ciso de Bakunin e outros, desapareceu, para surgir em Amsterd a Segunda Internacional, com objetivos no apenas trabalhistas, mas tambm polticos. Depois da revoluo comunista de 1917, surgiu em 1920, em Moscou, a Terceira Internacional, com carter ainda mais acentuadamente poltico, e que se dissolveu em 1943.

Tomando a dianteira do movimento proletrio, os comunistas provocaram, num congresso em Paris, no ano de 1945, a fundao da Federao Sindical Mundial, que instalou sua sede na ustria, tendo sido proibido o seu funcionamento e determinada sua dissoluo pelo Governo austraco em fevereiro de 1956, em face de sua ao perniciosa a paz mundial e seu carter sectrio, conforme declaraes de Oskar Helmer, Ministro austraco do Interior: "A FSM e um agrupamento de organizaes sindicais de tendncias comunistas de diferentes pases". E disse ainda: "... ao contrrio dos estatutos depositados, os boletins de informaes da FSM continham, com relao a Estados soberanos e instituies estrangeiras, menes ultrapassando o quadro da crtica e de carter no sindical, e sim poltico".

Em contraposio a FSM, lderes sindicais dos pases democrticos fundaram em Londres, em 1949, a Confederao Internacional das Organizaes Sindicais Livres (CIOSL), sustentada inicialmente pelos sindicatos norte-americanos. Apesar desse defeito, a CIOSL e, sem dvida, uma grande organizao, contando j com apoio de sindicatos e federaes de todo o mundo, inclusive do Brasil.

A CIOSL possui quatro secretariados descentralizados: para a Europa, em Bruxelas; para a sia, em Carachi; para a Amrica Latina, no Mxico; e para a frica, em Duala.

Ainda no campo dos trabalhadores, existem outras organizaes internacionais de menor expresso. A Internacional Sindical Crist, fundada em 1920, para se opor a Terceira Internacional russa, e entre elas a mais importante. Em 1968, transformou-se na Confederao Mundial do Trabalho, com sede em Bruxelas, tendo por alvo prioritrio a articulao dos trabalhadores do terceiro mundo. Na Amrica Latina, a CMT e representada pela CLAT (Central Latino-Americana de Trabalhadores).

A proteo a liberdade de associao dos trabalhadores de h muito objeto de conferncias internacionais; mas somente com o trmino da Primeira Guerra Mundial foi consagrada com o princpio includo no art. 427, inciso 2, do Tratado de Versailles: "0 direito de associao, desde que no contrarie as leis, e reconhecido tanto para os assalariados como para os patres".

Vinte e nove anos mais tarde, na Assemblia Geral das Naes Unidas, realizada em Paris em 1948, aprovava-se a Declarao Universal dos Direitos do Homem, proclamando os princpios fundamentais de salvaguarda da dignidade e da liberdade humanas.

Nela se estabeleceu:

"4 Todo homem tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteo de seus interesses".

Ainda no que diz respeito a ao internacional no campo do sindicalismo, no pode ser olvidada a atuao da OIT na defesa das liberdades sindicais. Ela se desenvolve tanto na edio de normas como no controle de aplicao das mesmas.

A mais importante das Convenes da OIT, a 87, de 1948 da qual trataremos adiante dispe sobre a liberdade sindical e o direito de sindicalizao. Ela assegura a liberdade sindical sob o trplice aspecto: do grupo, do trabalhador ou do empresrio e da associao (autonomia).

Merecem ainda registro as Convenes ns. 98, de 1949 (proteo ao direito de sindicalizao e de negociao coletiva), 135, de 1971 (proteo aos representantes dos trabalhadores nas empresas), 141, de 1975 (organizao de trabalhadores rurais), e 151, de 1978 (direito de sindicalizao e de negociao coletiva dos servidores pblicos).

Desde 1951 funciona na OIT o Comit de Liberdade Sindical, que se tornou o mais conceituado frum de salvaguarda dos direitos sindicais.

Cumpre registrar que o Pacto Internacional sobre os Direitos Econmicos, Sociais e Culturais, que foi adotado pela Assemblia Geral das Naes Unidas, em 16 de dezembro de 1966, estabeleceu:

"Art. 8 Os Estados que so partes neste Pacto se obrigam a assegurar:

e) o direito que tm os sindicatos de exercerem livremente sua atividade sem outras limitaes previstas em lei e que constituem medidas necessrias numa sociedade democrtica, no interesse da segurana nacional ou da ordem pblica, ou para proteger os direitos e as liberdades de outrem".

Consoante revelou a OIT, com a globalizao da economia e o desemprego por ela irradiado, o ndice de sindicalizao foi reduzido, em mdia, em 25%. Somente na Espanha, frica do Sul, Dinamarca e Sucia houve aumento do nmero de sindicalizados.

2 - O SINDICATO, SUA POSIO E NATUREZA JURDICA

A Posio em face do Estado. Ningum pode contestar que, na nossa poca, o sindicato participa da vida social, econmica e poltica dos povos, direta ou indiretamente, como uma realidade sociolgica que o Estado no pode ignorar, tanto mais que necessita de sua colaborao. Mal conduzido pelos seus prprios lderes ou influenciados por aventureiros polticos, o sindicato poderia, at, pretender colocar-se acima das instituies ou substitu-las sob os rtulos de conceituao meio imprecisa de "repblica sindicalista" ou "Estado sindical", mas que representam, nessas denominaes, uma evidente subverso do regime democrtico. E merece ser acentuada, a esse propsito, a advertncia de Renard, em "Sindicatos, Trade-Unions y Corporaciones", quando diz que "o sindicato no ser toda a sociedade futura, mas poder dar a esta sociedade sua forma dominante de organizao do trabalho e, parcialmente, suas frmulas de organizao poltica" (o grifo nosso).

Mas, se repugna conscincia democrtica da sociedade o seu domnio por uma ou algumas classes, cumpre ter em vista que o Estado Tambm no pode, com o pretexto de defender as instituies, tutelar o sindicato, porque, quando isso sucede, o sindicato se burocratiza e, como ainda observa Gallart, "desgraadamente, at agora, o abrao do Estado nas organizaes sindicais tem sido um abrao que estrangula". E foi o que observamos pessoalmente em nosso trato de cerca de meio sculo com o sindicalismo, levando-nos a reformar pontos de vista anteriormente adotados.

Em trabalho publicado no "Digesto Econmico", rgo editado sob os auspcios das classes conservadoras de So Paulo, J. P. Galvo de Souza, estudando "O corporativismo e a reforma do Estado", ressalta esse papel importante dos agrupamentos Sociais e especialmente sindicais, mesmo nos pases democrticos. Diz ele: "Assim, Bryce, no seu clssico livro 'A repblica americana', observou que a base dos partidos polticos nos Estados Unidos reside nos agrupamentos sociais em que se desenvolve espontaneamente a vida coletiva, quer se trate de agrupamentos municipais, quer dos de tipo profissional estritamente dito. Semelhante observao foi feita por Tocqueville.O mesmo se pode dizer da experincia inglesa das instituies parlamentares. No s a Cmara dos Lordes expresso de uma classe social organizada a aristocracia como a prpria Cmara dos Comuns se compe de elementos que representam os interesses concretos de grupos e profisses, graas conexo entre os partidos l existentes e os organismos de tipo corporativo. A vida associativa se manteve sempre na Inglaterra, sem sofrer os efeitos desastrosos da devastao individualista que, na Frana, por exemplo, reduzia a sociedade a uma poeira de indivduos em face do Estado. Os grmios operrios trade-unions fornecem o contingente eleitoral do Partido Trabalhista, enquanto o Partido Conservador reflete os interesses da aristocracia terrantesa. Quanto ao Partido Liberal, mais vinculado classe mdia, justamente o partido que passou mais rapidamente por um colapso, o que em parte pode encontrar explicao na ausncia de um esprito corporativista na burguesia, mais dominada pelas influncias do liberalismo.

A sociologia dos partidos polticos na atualidade confirma as lies da histria: ontem como hoje, s nos grupos sociais se podero encontrar as fontes de uma autntica representao poltica".

Tudo isso comprova que o sindicato, graas ao forte vnculo de solidariedade profissional, transcende de um simples problema de trabalho para o campo sociolgico e, mais especialmente, para o campo poltico. Botija, que bem estuda a questo, nota, a respeito, que "o poder sindical influi de modo obsessor na vida poltica da sociedade contempornea e, decisivamente, na vida de seus filiados, atravs de um indiscutvel vnculo disciplinar". Essa influncia poltica tem sido exaustivamente provada no mundo atual; por meio do sindicato muitos governantes fizeram sua propaganda poltica entre os trabalhadores e, em alguns pases, entre os quais a Itlia fascista e a Argentina peronista, os sindicatos foram usados como foras de compresso contra adversrios e de luta para a defesa dos ditadores.

Por isso mesmo a legislao de vrios pases probe expressamente aos sindicatos qualquer interveno na vida poltica, ou, quando no se refere a esse aspecto, fixa as atribuies dos sindicatos excluindo referncia ao partidria, como teremos ocasio de examinar pouco adiante.

Como bem acentua Cabanellas, a intromisso da poltica e dos polticos na vida dos sindicatos cria um dos mais srios problemas que se podem apresentar porque, rapidamente, os agrupamentos profissionais se convertem em instrumentos a servio de interesses bastardos em vez de defender os verdadeiros interesses profissionais. E bem razo tem o ilustre autor, porque, na maioria dos casos, no so os sindicatos que se lanam poltica mas os polticos que invadem os sindicatos para arrast-los para seus objetivos de mando, como vimos em nosso pas, especialmente com as arremetidas para criar uma "repblica sindicalista" de origem suspeitosa e finalidade ainda mais suspeita.

Na 35 Conferncia Internacional do Trabalho, realizada em Genebra, e que tivemos a honra de presidir, foi aprovada a Resoluo n 150, cujo texto foi adotado pelo Comit de Liberdade Sindical e o seguinte:

"No interesse do desenvolvimento do movimento sindical, seria desejvel que as partes interessadas se inspirem nos princpios adotados na Conferncia, em sua 35 Reunio, que prev, especialmente, que a misso fundamental e permanente do movimento sindical o progresso econmico e social dos trabalhadores e que, em conseqncia, quando os sindicatos decidirem, de acordo com as leis e os costumes em vigor nos respectivos pases, estabelecer relaes com partido poltico e realizar uma atividade poltica, de acordo com a Constituio, para favorecerem a realizao de seus objetivos econmicos e sociais. Estas realizaes e esta ao poltica no devem ser de tal natureza que comprometam a continuidade do movimento sindical ou de suas funes sociais e econmicas, quaisquer que sejam as modificaes polticas que possam ocorrer no pas".

Ao legislador nacional cumpre, de acordo com a Constituio de 1988, estabelecer, com cautela, os meios pelos quais, sem asfixiar o sindicalismo, se evite que os sindicatos substituam ou se sobreponham aos partidos polticos, que so a essncia do regime democrtico.

No Congresso Brasileiro para a Definio das Reformas de Base, realizado em So Paulo em 1963, no qual tivemos a incumbncia do relatrio-geral sobre as questes ligadas ao Direito do Trabalho, vimos nossos pontos de vista aprovados pela unanimidade dos 250 congressistas presentes.

Matria que continua a provocar interesse de todas as classes Sociais, o Direito Sindical, propriamente dito, deve, segundo se anunciava, ser objeto de reforma sugerida pelo Governo, e isso nos leva a reproduzir conceitos ento emitidos e que podero servir de subsdio para que a nova legislao atenda s reais necessidades da vida sindical brasileira.

Iniciando o relatrio, dissemos:

"Problema que apaixona pela importncia que adquiriu no mundo contemporneo, pouco conhecido por muitos e temido por alguns, na verdade o sindicalismo, dentro de suas finalidades reais, pode e deve ser um movimento capaz de, cuidando da melhoria das condies de vida do proletariado, assegurar a paz social e a harmonia do trabalho e do capital visando aos interesses mais altos da coletividade.

Mais do que nunca devemos recordar as palavras de Ortega y Gasset:'H um fato que, para bem ou para mal, o mais importante na vida pblica da hora presente. Este fato o advento das massas ao pleno poderio social'. E, mais adiante: 'A multido, de repente, tornou-se visvel, e instalou-se nos lugares preferentes da sociedade. Antes, se existia, passava inadvertida, ocupava o fundo do cenrio social; agora adiantou-se at as gambiarras, ela o personagem principal. J no h protagonistas: s h coro'.

Se essa a realidade que, mais e mais, se faz sentir em todo o mundo, seja nas naes mais civilizadas, seja naquelas que mal acabam de ingressar no convvio das naes independentes, o que ningum pode contestar que, mais do que a massa, como avalancha humana que arrasa conceitos tradicionais numa sublevao de instituies e at de princpios da moral, h, na dinmica da humanidade, a formao de uma fora que, bem orientada, ser um elemento construtivo mas que, entregue aos que desejam explor-la, poder, pela unidade de sua estrutura e de seus componentes, impor transformaes que a ningum beneficiaro nem ao proletariado nem sociedade. Essa fora o sindicalismo.

Sem ser doutrina nem ideologia, ele se desenvolveu e se fortaleceu, atravs de atitudes, precedentes, direitos e privilgios e hoje em dia ningum pode contestar que sua presena se deve uma verdadeira revoluo no sistema capitalista-liberal, forado a ceder e a transigir.

Esse sindicalismo, que j em nosso Pas uma expresso real das foras da produo, que necessita ter seu estatuto bsico adequado s conquistas democrticas de que tanto nos orgulhamos para que se torne, tambm, um instrumento de aprimoramento da democracia e no uma ameaa ao sistema que a prpria segurana de sua vida e sua sobrevivncia".

Poucos problemas, no campo do Direito do Trabalho e, especialmente, no que se refere as relaes coletivas do trabalho, tm despertado to constantes e apaixonados debates, em nosso pas, quanto a liberdade sindical.

Tais debates tm sido, na maioria dos casos, desvirtuados pela paixo e pelos interesses polticos, e a liberdade sindical, desconhecida no seu conjunto pela maioria dos que a ela se referem. Ora o abrao que estrangula, ora a liberdade sem fronteiras que esmaga as liberdades de outros. Confundem-se, s vezes, liberdade sindical com soberania de um grupo dentro do Estado, e, outras vezes, em nome da soberania do Estado, nega-se toda liberdade ao sindicalismo.

No h dvida, entretanto, de que nenhuma liberdade pode estender suas fronteiras alm e acima da soberania do Estado, que, como acentua Kelsen, o poder supremo ao qual no pode haver similar. E isso porque, na lio de Duguit, "a soberania do Estado decorre do prprio conceito de Nao, que possui uma personalidade distinta dos indivduos que a compem e, como tal, tem uma soma que, naturalmente, superior s vontades individuais, porque a coletividade superior ao indivduo".

No diferente o pensamento de todos os estudiosos do problema sindical, mas onde estaro os limites liberdade do grupo, do sindicato?

Se formos procur-los no Direito Internacional, encontraremos na Conveno decorrente da Declarao Universal dos Direitos do Homem:

"Toda pessoa tem o direito liberdade de reunio pacfica e liberdade de associao, nela compreendido o direito de fundar, com outras, sindicatos, assim como o de se filiar a sindicatos para a defesa de seus interesses.

O exerccio desses direitos no pode ter outras restries seno as que so previstas pela Lei, constituindo medidas necessrias, numa sociedade democrtica, segurana nacional, segurana pblica, defesa da ordem e preveno do crime, proteo da sade ou da moral, ou ainda a proteo dos direitos e liberdades dos outros".

A Federao das Indstrias do Estado de Minas Gerais obteve o pronunciamento dos eminentes Mestres Arnaldo Sssekind e Dlio Maranho, que, com sua reconhecida competncia, teceram judiciosas consideraes sobre o tema em foco.

Tendo tido a honra de conhecer o parecer dos ilustres juristas, julgamos de imensa utilidade a transcrio de alguns trechos de seu pronunciamento, inclusive quando fixaram, como previsto, o conceito de "liberdade sindical", que abrange a autonomia:

"... essa garantia visa especialmente a assegurar s organizaes sindicais o direito de elaborar seus estatutos, de eleger seus representantes, de organizar sua prpria gesto e atividade, de estabelecer livremente sua prpria ao" ("La libert syndicale", BIT, Genebra, 1959, 37).

"Trata-se, pois, em uma palavra, da liberdade do sindicato estabelecer sua prpria organizao. Do seu direito de autoconstituio e do exerccio de sua atividade, sem interferncia das autoridades pblicas" ("Conveno Internacional da OIT", art. 3, item 2).

E os eminentes juristas definem a limitao dessa liberdade, dizendo:

"Mas a advertncia se impe salvo quando se trata dos direitos fundamentais (direito integridade fsica ou psquica, segurana, honra, ao nome, imagem, intimidade), nenhum direito absoluto, at porque, segundo a conhecida frmula kantiana, a liberdade de um h de encontrar limite na liberdade de outrem. A autonomia sindical se coloca, pois, em face do governo ('autoridades pblicas'), porque todo e qualquer direito h de ser exercido nos termos e nos limites da lei. Nesse sentido devem ser entendidas as expresses 'Estado' e 'Poder Pblico', constantes do art. 8, I, da Constituio, at porque ambos, lato sensu, compreendem, inclusive o Poder Judicirio e deste, como est tambm na Constituio, no se pode excluir a apreciao de leso ou ameaa a direito" (art. 5, XXXV).

"Da ter o Pacto Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais, aprovado pela Assemblia das Naes Unidas, e que regulamenta a Declarao Universal dos Direitos Humanos, deixado expresso (art. 8, alnea c) que o direito dos sindicatos de exercer sua atividade s admite as limitaes

'... previstas em lei e que constituem medida necessria numa sociedade democrtica... para proteger os direitos e as liberdades de outros'.

E, como est na citada Conveno n 87 da OIT, sobre liberdade sindical, os sindicatos, como quaisquer outras pessoas jurdicas, so obrigados a respeitar o princpio 'da legalidade'".

preciso no confundir a liberdade sindical com a soberania, e, a esse propsito, Joo Mangabeira definiu os limites, dizendo que autonomia " o poder que tem uma coletividade de organizar, sem interveno estranha, o seu governo e fixar regras jurdicas dentro de um crculo de competncia pr-traada pelo rgo soberano". Para Evaristo de Moraes Filho, " o direito de autodeterminao sindical; o poder que reconhecido ao sindicato para alcanar suas finalidades, dentro dos meios no contrrios lei e normas estabelecidas para a manuteno da ordem pblica".

E Arnaldo Sssekind, em parecer na Comisso Permanente do Direito Social, acentuou que "se o contedo da atividade sindical no pode extravasar a moldura configurada pelas disposies constitucionais e legais, oriundas da vontade da Nao, democraticamente manifestada, certo que o legislador ordinrio no deve regulamentar a organizao sindical de forma a violar o que explcita ou implicitamente se contm na Carta Magna".

Fixados esses aspectos da liberdade sindical, cumpre-nos examinar qual o campo de ao das entidades sindicais.

Problema de ainda maior complexidade do que o tratado anteriormente, sua conceituao tem variado, sobretudo porque muitos autores se situam, para examin-lo, frente s estruturas polticas de seus pases e prpria legislao bsica de sindicalismo neles existentes.

Naqueles em que o sindicato no seno uma associao de trabalhadores perseguindo interesses comuns, sem possuir prerrogativas do Estado, o campo de ao dos sindicatos se estende muitas vezes atividade poltica, direta ou indireta, sob a alegao de que todos os problemas, polticos ou econmicos, interessam ao proletariado. Essa no , entretanto, a tendncia geral da legislao estrangeira, e na 35 Conferncia Internacional do Trabalho, que tivemos a honra de presidir, foi adotada uma resoluo advertindo que qualquer ao poltica do sindicato no deve ser de modo a comprometer a continuidade do movimento sindical e suas funes sociais e econmicas.

Entendemos que essa a melhor orientao e deve ser mantida. A ingerncia do sindicato diretamente em atividades polticas corrompe seus lderes e abastarda o sindicalismo. Os movimentos de reivindicao dos trabalhadores passam a ser comandados com finalidades poltico-partidrias, e justos anseios muitas vezes so abandonados sem defesa porque os interesses polticos indicam que a hora no oportuna.

Alm do mais o sindicato um todo homogneo em torno de uma profisso ou de uma classe. Para ingressar nele o trabalhador apenas precisa ter status profissional idntico ou Semelhante, no se lhe exigindo semelhana de crenas ou idias, tido que defende ou esposa idias correspondentes s suas e filiaes polticas. Quando ele quer atuao poltica e procura o partido no se lhe exige, tambm, qualquer condio profissional aproximada dos demais partidrios.

B Conceito. Talvez justamente pela complexidade de suas atribuies na vida de um povo, tem variado a conceituao do sindicato do mesmo modo que, de maneira diversa, tem sido encarada sua posio no campo jurdico. E tambm julgada, por alguns, sua influncia, que admite que o sindicalismo j transps o mbito do Direito do Trabalho, no quadro de relaes coletivas onde o colocamos, para se apresentar como um ramo autnomo: o Direito Sindical.

Definindo o sindicato, os autores se situam na maneira de encar-los: uns o vem no sentido clssico de coalizo permanente para a luta de classe, outros j o entendem como rgo destinado a, de maneira ampla, solucionar o problema social, e ainda outros, como vimos, do-lhe uma posio de ao e influncia em todo o complexo social.

Entre os que seguem a definio clssica ou profissional, podemos citar, em primeiro lugar, Sidney e Beatriz Webb na sua conhecida "History of Trade Unionism", quando dizem que o "sindicato uma associao permanente de assalariados, com o fim de manter ou melhorar as condies de suas relaes de trabalho"; Rouast-Durand no fogem dessa definio, dando os sindicatos como "associaes que tm por objetivo a defesa de interesses profissionais", e para Todorovitch o "sindicato uma instituio ou grupo de defesa de interesses profissionais".

Le Bou, ainda sem avanar para a corrente colaboracionista, d uma conceituao mais ampla, situando o sindicato como um grupo de indivduos, sob direo nica, que tm interesses profissionais. Quase a mesma a definio de Gaston y Marin, em obra premiada pela Academia de Cincias Morais e Polticas, quando afirma que o "sindicato associao de indivduos que, por exercer a mesma profisso, tm os mesmos ou anlogos interesses e se entendem para melhor desenvolvimento e defesa dos mesmos".

J para Tannenbau, a posio do sindicato assume influncia muito mais vasta, deixando de ser uma aspirao, uma doutrina, para se transformar em uma nova fora "not an idea but a force" , que representa uma mudana na estrutura real da economia e, de tal natureza, "que impele a uma nova distribuio de poder dentro da comunidade", o que corresponde ao pensamento de Burns, quando diz que a influncia do sindicato to grande quanto a dos chefes das grandes empresas ou a dos professores universitrios, na evoluo do pensamento social.

Se a doutrina, no que concerne conceituao do sindicato, varia entre extremos afastados, a legislao se mantm, quase toda, dentro de um ponto de vista intermedirio entre a definio clssica e a que chamamos de moderna ou moderada.

A Lei francesa de 1884, reformada em 1920 e incorporada ao Cdigo do Trabalho, diz que os sindicatos so associaes "formadas por pessoas que exercem a mesma profisso e tm exclusivamente por objeto o estudo e a defesa dos interesses econmicos, industriais, comerciais, e agrcolas". Na Inglaterra o sindicato (trade-union) est definido na Lei de 1871, ainda vigente, como "associao temporria ou permanente para regular as relaes entre trabalhadores e empresrios e para impor condies restritivas em relao a qualquer profisso ou atividade".

Em nosso pas, o Decreto n. 19.770, elaborado sob a influncia da lei francesa, tambm conceituava o sindicato como rgo para o estudo, a defesa e o desenvolvimento dos interesses gerais e dos interesses profissionais de seus membros.

Essa conceituao incriminada pelo Professor Evaristo de Moraes Filho como "tendo sofrido aquela influncia com o sentido de liberalismo individualista". Mas o ilustre professor reconhece, pouco adiante, que "a lei era boa em suas linhas gerais. Liberal e democrtica".

E como as leis sofrem as influncias das pocas em que so expedidas e das condies sociais ento vigentes: em 1931, logo aps a Revoluo Liberal, era expedido pelo Chefe do Governo o Decreto n. 19.770, encaminhado pelo Ministro Lindolfo Collor e elaborado por trs grandes batalhadores das causas do proletariado: Joaquim Pimenta, Evaristo de Moraes e Agripino Trazareth.Em 1934, dias antes de promulgada a Constituio e j adaptado aos seus princpios, era aprovado o Decreto n. 24.694, que institua os sindicatos como tipos especficos de organizao das profisses e para atividades lcitas e, entre finalidades beneficentes, as de representar, perante as autoridades administrativas e judicirias, no s os seus prprios interesses e os de seus associados, como tambm os interesses da profisso respectiva, e, ainda, firmar ou sancionar convenes coletivas de trabalho.

Na vigncia da Carta Poltica de 1937, que imps a unicidade de representao sindical, foi elaborada a Consolidao das Leis do Trabalho (1943), que proclamou o sindicato como rgo de defesa e coordenao dos interesses econmicos ou profissionais de empregadores, empregados, agentes ou trabalhadores autnomos e profissionais liberais, alm de rgo de colaborao com o Estado no estudo dos problemas de interesse dos integrantes das respectivas categorias.

Essa legislao no foi alterada pelas normas inseridas sobre o tema nas Constituies de 1946 e 1967, tal como decidiu a Corte Suprema brasileira. A de 1988, no entanto, revogou grande parte do Titulo V da CLT, uma vez que consagrou a autonomia sindical. Mas recepcionou parte das suas disposies, ao manter o monoplio sindical de representao por categoria (art. 8, II) e a contribuio sindical compulsria (art. cit., IV).

C Natureza jurdica. Quanto a personalidade jurdica do grupo ou da associao, duas grandes correntes pretendem fix-la respectivamente como "personalidade de fico" e "personalidade-realidade". Para os primeiros no h personalidade jurdica sem concesso expressa do legislador; para os segundos, o grupo ou associao um organismo social que tende a alcanar um fim, que excede dos interesses pessoais, individuais, que capaz de ter um pensamento coletivo e uma realizao coletiva, com um sentido de estabilidade: a permanncia do grupo, mesmo com a variao de seus integrantes.

Cumpre verificar, entretanto, como se situa essa soma de vontades, essa personalidade coletiva, no campo do Direito. E sobretudo examinar sua posio no quadro jurdico de nosso pas. Antes de faz-lo, com apoio em notvel estudo do Professor Waldemar Ferreira, no nos podemos furtar a transcrio da argumentao clara, precisa, lgica de Ernesto Krotoschin: "As associaes profissionais so associaes do Direito Civil. No perdem esse carter fundamental ainda que se lhes conceda uma personalidade especfica (personalidade 'gremial'), pois o sindicato, em regra geral, tem direito a formar-se de um modo que o faz independente da administrao pblica, a qual no se encontra incorporado, e a viver livre de sua ingerncia ou de seu controle, em princpio. Nada ope a isto o fato j mencionado de que, de maneira sempre crescente, o Poder Pblico compartilhe com as associaes profissionais o desempenho de determinadas funes de interesse pblico e que, em alguns pases ao menos, os sindicatos mais representativos tenham chegado a gozar de certos privilgios, em cujo exerccio atuam, direta ou indiretamente, na prpria administrao geral do pas, mediante sua participao nos organismos de colaborao. Essa orientao nas atividades das associaes profissionais lhes assegurou, sobretudo na doutrina francesa, o reconhecimento como 'estabelecimento de utilidade pblica' ou de 'interesse pblico' (segundo terminologia mais recente), mas sem afetar seu carter de entes de direito privado. So tais, porque prevalecem os elementos tpicos destes: a origem, que se encontra no livre acordo dos membros; a finalidade, que no pblica no sentido de coincidir com os interesses do Estado, pois, at pelo contrrio, os sindicatos preparam e definem certas adaptaes importantes entre o Estado e os grupos que eles representam: a falta, ou pelo menos, restrio do poder de imprio (j que a relao entre a associao e seus membros de ordem privada); e, por fim, a ausncia de controle administrativo, em princpio, se bem que, justamente pela colaborao que prestam ao Estado, os sindicatos se encontrem submetidos muitas vezes a uma vigilncia mais ou menos acentuada".Em nosso pas o mais completo estudo que conhecemos sobre o assunto o do Professor Waldemar Ferreira, que, depois de examinar a posio do sindicato ao tempo do Decreto n. 26.694, cuja posio jurdica era estritamente de direito privado, refere-se aos direitos conferidos pela Carta de 1937, dizendo: "Ora, do ponto de vista do Direito brasileiro, o alargamento funcional do sindicato no o erige, realmente, em rgo do Estado. No o . Mas tambm no lhe modifica a natureza jurdica. Continua ele sendo o que era antes do reconhecimento governamental: no tem este por efeito necessrio retir-lo da ordem privada para situ-lo entre as pessoas jurdicas de direito pblico. 0 exerccio pela pessoa natural ou jurdica, de poderes ou funes pblicas, no opera nenhuma transfigurao". E mais adiante: "Ora, os sindicatos brasileiros no so, absolutamente, pessoas jurdicas de direito pblico interno, nem entram na economia dos poderes do Estado. Constitudos como simples associaes civis, tem apenas a sua personalizao jurdica a depender de reconhecimento do Poder Pblico. Podem estipular convenes coletivas de trabalho, certo; mas, para isso, sobre ser de mister disposio expressa de seus estatutos, permitindo-o, ou deliberao de assemblia geral especialmente convocada para este fim, e indispensvel a ratificao em outra assemblia, por maioria de dois teros dos associados ou em terceira convocao. As convenes coletivas, em tais condies, no obrigam seno os associados dos sindicatos, pela regra de fazerem os contratantes. H, portanto, manifestaes da vontade dos associados. No tm os sindicatos brasileiros a funo normativa, por via da qual os seus ajustes se tornam obrigatrios para todos os da mesma categoria".

Estamos de inteiro acordo com o saudoso professor da Faculdade de Direito de So Paulo, cujos argumentos nos parecem claros e convincentes. Mas ainda acrescentamos: o Estado no tem poder de criar sindicatos e apenas estabelece condies para que eles sejam registrados para o exerccio de direitos que as leis lhes conferem. Os sindicatos nascem da vontade de um grupo profissional homogneo, para a defesa de direitos e de reivindicaes desse grupo. Eles no se confundem, por isso, com as Ordens de Advogados ou Mdicos, por exemplo, criadas pelo Estado e com a delegao de exercer poderes estatais.

Pessoas jurdicas de direito privado, os sindicatos podem assumir obrigaes e respondem por elas perante a Justia.

3 0 SINDICATO E AS CONSTITUIES BRASILEIRAS

A Constituies de 1824 e 1891. Em nosso pas, como j tivemos ocasio de referir, a primeira afirmao em texto constitucional as organizaes profissionais aquele tempo mais religiosas e de orientao poltica do que profissional encontra-se na Constituio de 1824, na qual se estabelece no 25 do art. 179: "Ficam abolidas as corporaes de ofcio, seus juzes, escrives e mestres".

Na de 1891, feita sob a influncia da dos Estados Unidos, nem uma palavra existe a respeito, e somente o Supremo Tribunal Federal, em habeas corpus julgado em 22.11.20, foi que entendeu que o disposto no art. 72, 8, garantindo a liberdade de associao, tambm garantia o da sindicalizao e o da greve. Trs anos antes, julgando outro pedido de habeas corpus em 11.7.17, afirmara: "0 ideal Socialista de se substituir o contrato individual do trabalho pelo sindicalismo, tornado o operrio um simples autmato, que obedece cegamente s ordens dos diretores dos sindicatos, e formalmente condenado pelos mais autorizados mestres da prpria escola radical".

B Constituio de l934. 0 problema sindical foi mencionado de maneira expressa no art. 120 e seu pargrafo nico:

"Art. 120. Os sindicatos e as associaes profissionais sero reconhecidas de conformidade com a lei.

Pargrafo nico. A lei assegurara a pluralidade sindical e a completa autonomia dos sindicatos".

Tambm no art. 23 previa-se a existncia das organizaes sindicais, ao tratar da representao profissional na Cmara dos Deputados.

Adotando a pluralidade sindical, a orientao do legislador constituinte de 1934, procurando firmar um sentido antifascista ao texto, nada mais fez, entretanto, do que atender a necessidade poltica de criar sindicatos visando a formao da representao profissional. Vale a pena transcrever a justificao da emenda da qual resultou a pluralidade:

"Na verdade, o esprito associativo, que temos necessidade de estimular, precisamente amortecido e quase anulado pela falta de emulao decorrente do privilgio que se pretende dar, em dada localidade, a uma s associao. Alis, esse fenmeno se verifica na prpria Itlia, que modelou o sindicato nico. Dizem as estatsticas que nesse pas a sindicalizao diminuiu dia a dia pela falta de interesse que provoca a interveno direta e draconiana do Estado na sua existncia. Por efeito do sindicato nico na Itlia, as associaes profissionais tornaram-se ali instrumentos da poltica ditatorial do Duce".Segundo Oliveira Viana, desconhecia o autor da emenda o problema sindical e a realidade italiana e, mais do que isso, ignorava que "no se improvisa o sentimento e o hbito de corporao, o esprito sindicalista, a organizao corporativa".

Na realidade, porm, o Decreto Legislativo n. 24.694, expedido por Getlio Vargas s vsperas da promulgao da Constituio, frustrou a pluralidade sindical preconizada, ao exigir um tero do grupo de trabalhadores para a formao do sindicato.

C Carta Constitucional de 1937. De carter corporativo, ela previu que o Parlamento Nacional teria a colaborao do Conselho da Economia Nacional, constitudo este de representantes dos empresrios e dos trabalhadores, designados pelas respectivas entidades sindicais. Esse Conselho, porm, no chegou a ser instalado.

Outorgada por Getlio Vargas, com o ostensivo apoio das Foras Armadas, o Estatuto Poltico de 1937, depois de enunciar que "a associao profissional ou sindical e livre", deu ao sindicato reconhecido pelo Estado:

a) o privilgio de representar a todos os que integram a correspondente categoria; b) a prerrogativa de estipular contratos coletivos de trabalho; c) o poder de impor contribuies aos seus representados e de exercer funes delegadas do Poder Pblico (art. 138). A greve e o lockout foram declarados "recursos anti-Sociais, nocivos ao trabalho e ao capital e incompatveis com os superiores interesses da produo nacional" (art. 139, in fine).D Constituio de 1946. Novo golpe de Estado em 1945. Convocada a Assemblia Nacional Constituinte, a Lei Magna promulgada em 1946 estabelece a liberdade sindical, mas no impediu o regime da unidade. No art. 159 se estabeleceu:

" livre a associao profissional ou sindical, sendo reguladas por lei a forma de sua constituio, a sua representao legal nas convenes coletivas de trabalho e o exerccio de funes delegadas pelo Poder Pblico".

Deixou, assim, ao legislador ordinrio dispor como entendesse sobre a organizao sindical.

esse o pensamento de Carlos Maximiliano quando declara que a Constituio consagrou um princpio universal, "facultando, entretanto, ao legislador ordinrio regular a constituio e o exerccio das associaes profissionais, tanto as corporativas como as simplesmente sindicais", e Themstocles Brando Cavalcanti, em "A Constituio Federal Comentada", ressalta que "o princpio constitucional da margem ao legislador para, de acordo com o interesse nacional, estabelecer as normas principais para a organizao sindical, inclusive no que concerne a unidade ou a pluralidade; ser um critrio legislativo que no ofende, nenhum deles, o preceito constitucional, de modo que deixou ao legislador a determinao da forma de sua constituio".

Da ter o Supremo Tribunal Federal proclamado, reiteradamente, que as normas da CLT sobre organizao sindical haviam sido recepcionadas pela nova Carta Magna.

" E Constituio de 1967. Essa Lei Fundamental, resultante do projeto submetido pelo Presidente Castello Branco ao Congresso Nacional e por este aprovado, foi alterada pela Junta Militar que se encontrava no Poder em 1969. Mas no houve modificao de relevo no campo sindical.

De um modo geral, ela manteve, a propsito, as disposies da de 1946. Apenas tornou obrigatrio o voto nas eleies sindicais e delegou aos sindicatos a funo de "arrecadar, na forma da lei, contribuies para o custeio da atividade dos rgos sindicais e profissionais e para a execuo de programas de interesse das categorias por eles representadas" (art. 166, 1e 2).

F Constituio de 1988. Da Carta Poltica vigente trataremos na Seo 5 deste Captulo sobre "A legislao sindical e a Constituio de 1988". Nesta oportunidade convm assinalar apenas que o estatudo no seu art. 8 resultou de um acordo extico entre parlamentares do centro e algumas lideranas sindicais de trabalhadores e de empresrios. Da ter consagrado a plena autonomia sindical e, ao mesmo tempo, estabelecido o monoplio de representao sindical por categoria, que afronta o princpio da liberdade sindical. Por outro lado, possibilitou a manuteno da contribuio sindical compulsria e ainda conferiu um poder tributrio anmalo aos sindicatos.

4 OS DIREITOS SINDICAIS NOS TRATADOS INTERNACIONAIS

A Declarao Universal, dos Direitos do Homem. Os pases vitoriosos na guerra de 1939-1945 constituram a Organizao das Naes Unidas (ONU), cuja Assemblia Geral, reunida em Paris, adotou, a 10 de dezembro de 1948, a Declarao Universal dos Direitos do Homem, que substituiu a da Revoluo Francesa de 1789. A declarao no e ratificvel, mas, por consagrar princpios fundamentais da ordem jurdica Internacional, caracterizadores da civilizao contempornea, conceituada como fonte de mxima hierarquia no mundo do Direito. Tais princpios correspondem a direitos supraestatais, inerentes ao ser humano, que devem ser usufrudos e respeitados independentemente de tratados ratificados ou leis nacionais.

No concernente a sindicalizao, essa Declarao enuncia: "Todo homem tem direito de organizar sindicatos e neles ingressar para proteo de seus interesses" (art. XXIII, n. 4).

Os princpios elencados na Declarao foram regulamentados por dois tratados aprovados pela Assemblia Geral da ONU em 1966. No que tange aos direitos Sociais-trabalhistas, pelo Pacto Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais", cujo art. 8 dispe:

" 1. Os Estados partes no presente Pacto se comprometem a garantir:

a) o direito que tem toda pessoa de formar, com outras, sindicatos e de filiar-se ao sindicato de sua escolha, sujeitando-se unicamente s regras fixadas pela organizao interessada, para promover e proteger seus interesses econmicos e Sociais. 0 exerccio deste direito no pode ser objeto seno de restries previstas pela lei e que constituem medidas necessrias numa sociedade democrtica, no interesse da segurana nacional ou da ordem pblica, ou para proteger os direitos e as liberdades de outrem;

b) o direito que tem os sindicatos de formar federaes nacionais e o direito destas de formar organizaes sindicais internacionais ou de a elas filiar-se;

c) o direito que tem os sindicatos de exercer livremente sua atividade, sem outras limitaes do que as previstas pela lei e que constituem medidas necessrias numa sociedade democrtica, no interesse da segurana nacional ou da ordem pblica, ou para proteger os direitos e as liberdades de outrem;

d) o direito de greve, exercido conforme as leis de cada pas.

2. 0 presente artigo no impede restries legais no exerccio desses direitos pelos membros das foras armadas, da polcia ou da funo pblica.

3. Nenhuma disposio deste artigo permitir aos Estados partes na Conveno Internacional do Trabalho de 1948, sobre liberdade sindical e a proteo do direito de sindicalizao, adotar medidas legislativas que reduzem ou aplicar a lei de maneira a reduzir as garantias previstas nesta Conveno".

Como se infere, essas normas no consideram o exerccio dos direitos sindicais, inclusive o de greve, um direito absoluto e ilimitado. Por isso, o Pacto da ONU admite restries fundadas "no interesse da segurana nacional ou da ordem pblica" e, bem assim, "para proteger os direitos e liberdades de outrem", devendo os movimentos grevistas observar as leis do respectivo pas, elaboradas em consonncia com essas diretrizes.

Estranhamente, o Brasil ratificou o Pacto Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais, aprovado pela ONU em 1966, cujo art. 8 repete, ainda que sinteticamente, as normas da Conveno n. 87 da OIT sobre a garantia da liberdade sindical e o seu conceito.

Afigura-se-nos evidente a inconstitucionalidade do precitado artigo do Pacto em nosso territrio, por se atritar com o art. 8s da Constituio de 1988. Nesse sentido j decidiu a Suprema Corte brasileira no que tange a Conveno n. 110 da OIT. Como ponderou o mestre Pontes de Miranda, "o tratado que legisla sobre matria de direito pblico interno ou privado, ou que constitui negcio jurdico, precisa da completa observncia do direito constitucional". Nem se alegue que o 2 do art. 5 da Lei Fundamental assegura a eficcia da disposio do Pacto no territrio brasileiro, ao estabelecer que os direitos e garantias nela expressos no excluem outros decorrentes "dos tratados internacionais em que a Repblica Federativa do Brasil seja parte". Por uma questo de coerncia e lgica jurdica, esse princpio no pode ser invocado para tornar ineficaz preceito expresso da prpria Constituio. Se tal pudesse verificar-se, a reviso de diversos dispositivos constitucionais poderia efetivar-se mediante simples aprovao e ratificao de tratados bilaterais, regionais ou universais.

Persiste, porm, no caso, a responsabilidade do Pas no plano internacional, at que efetue a respectiva denncia. E que a Conveno sobre o Direito dos Tratados (Viena, 1969) s prev a nulidade do consentimento do Estado em obrigar-se por um tratado, quando "manifestado em violao de uma disposio do seu direito interno concernente competncia para celebrar tratados".

B Normas da OIT sobre direitos sindicais. Em 1944, quando j se vislumbrava a vitria das foras aliadas na segunda grande guerra, a Conferncia da OIT, realizada na cidade norteamericana de Filadlfia, aprovou a "Declarao referente aos fins e objetivos da OIT", a qual, dois anos depois, foi incorporada a Constituio da entidade. Ela preceitua que

"a liberdade de expresso e de associao e uma condio indispensvel para o progresso constante" (art. I, letra b)e, determinou que a OIT fomentasse, entre todas as naes,

"o reconhecimento efetivo do direito de negociao coletiva, a cooperao de empregadores e de trabalhadores para melhorar continuamente a eficincia na produo e a colaborao de trabalhadores e empregadores na preparao e aplicao de medidas Sociais e econmicas" (art. III, letra e).Em virtude desse preceito de hierarquia constitucional e dos relatrios a respeito recebidos da Federao Sindical Mundial e da Federao Americana do Trabalho (AFL), o Conselho Econmico e Social das Naes Unidas resolveu solicitar a OIT, em abril de 1947, que inscrevesse a questo da liberdade sindical na ordem do dia da sua Conferncia. E na reunio realizada na cidade norte-americana de So Francisco (1948) foi afinal aprovada a Conveno n. 87, considerada o mais importante tratado multilateral da OIT.

Esse instrumento normativo e completado pela Conveno n. 98, de 1949, referente ao "direito de sindicalizao e de negociao coletiva". Como escrevemos alhures, enquanto a primeira conveno "objetiva garantir a liberdade sindical em relao aos poderes pblicos, a segunda tem por finalidade proteger os direitos sindicais dos trabalhadores frente aos empregadores e suas organizaes, garantir a independncia das associaes de trabalhadores perante as de empregadores, e vice-versa, e, bem assim, fomentar a negociao coletiva"

Alm desses dois tratados multilaterais, a OIT adotou as seguintes convenes sobre direitos sindicais:

a) Conveno n. 11, de 1921 Direito de associao das pessoas ocupadas na agricultura iguais aos assegurados aos trabalhadores na indstria.

b) Conveno n. 84, de 1947 Direito de associao nos territrios no-metropolitanos. Dispe, em termos bem gerais, sobre o direito de sindicalizao, a negociao coletiva, a consulta as organizaes de trabalhadores e de empregadores e os procedimentos para a soluo dos conflitos trabalhistas;

c) Conveno n. 110, de 1958 Trabalho em plantaes: as partes IX e X dispem sobre direito de sindicalizao, liberdade sindical e negociao coletiva. Esse tratado rene, de forma sistematizada, normas de diversas convenes, com regras gerais adaptadas a cultura ou produo agrcola com fins comerciais em zonas tropicais e subtropicais;

d) Conveno n. 135, de 1971 Proteo e facilidades para os representantes dos trabalhadores nas empresas. As normas do instrumento se aplicam tanto aos representantes sindicais, quanto aos eleitos por seus companheiros no mbito da prpria empresa para funes que no constituam prerrogativas dos sindicatos. Eles devem gozar de proteo eficaz contra todas as medidas que possam prejudic-los, quando motivadas pelo exerccio da representao, da filiao sindical ou da participao em atividades sindicais, desde que observadas as leis, as convenes coletivas e outras normas jurdicas. A empresa deve conceder-lhes facilidades para cumprir rpida e adequadamente essas funes.

e) Conveno n. 141, de 1975 Organizao de trabalhadores rurais. aplicvel a todas as organizaes representativas de trabalhadores rurais, alcanando, inclusive, as que representam arrendatrios, parceiros agrcolas ou pequenos proprietrios, cuja principal fonte de receita seja a agricultura, quando a terra for trabalhada pessoalmente com a ajuda de seus familiares ou trabalhadores ocasionais. A esses agricultores assegurado o direito de sindicalizao, devendo o Estado por em prtica uma poltica de promoo das respectivas organizaes;

f) Conveno n. 144, de 1976 Consultas tripartites para a aplicao das normas internacionais do trabalho. Cria a obrigao de o Estado por em prtica procedimentos que assegurem consultas efetivas entre representantes do governo, dos empregadores e dos trabalhadores para promover a aplicao das normas previstas na Constituio da OIT e nos instrumentos aprovados pela Conferncia Internacional do Trabalho. Esses procedimentos, estabelecidos depois de consultadas as organizaes sindicais mais representativas de trabalhadores e de empregadores, tero por objeto as respostas dos governos aos questionrios sobre a ordem do dia da Conferncia e os correspondentes projetos de texto; a submisso de convenes e recomendaes a autoridade nacional competente; as questes atinentes aos relatrios anuais de aplicao de convenes ratificadas; o reexame peridico de convenes no ratificadas e de recomendaes escolhidas, para esse efeito, pelo Conselho de Administrao da OIT; as propostas de denncia de convenes ratificadas;

g) Conveno n. 151, de 1978 Direito de sindicalizao e de negociao coletiva dos servidores pblicos. Esse tratado abrange todas as pessoas empregadas pela administrao pblica, na medida em que no lhes sejam aplicadas disposies mais favorveis de outras convenes; mas a legislao nacional poder excluir da sua incidncia os empregados de alto nvel, assim considerados aqueles cujas funes possuem poder decisrio ou sejam de natureza altamente confidencial, e, bem assim, os integrantes das foras armadas e da polcia. Os empregados pblicos expresso genrica usada pela Conveno gozaro de proteo adequada contra todo ato de discriminao anti-sindical em relao ao seu emprego, no podendo as suas organizaes sofrer qualquer ingerncia por parte da autoridade pblica. Devero ser concedidas facilidades aos representantes das organizaes reconhecidas para desempenhar suas funes em eficincia, inclusive durante as horas de trabalho. Devero ser fomentadas os procedimentos de negociao entre as autoridades pblicas e as referidas organizaes, ou outros mtodos compatveis com as condies nacionais. A soluo dos conflitos coletivos referentes a condies de emprego poder ser obtida, seja pela negociao entre as partes, seja por procedimentos independentes e imparciais como a mediao, a conciliao e a arbitragem. Os empregados pblicos gozaro dos direitos civis e polticos essenciais ao exerccio da liberdade sindical, sob reserva somente das obrigaes oriundas da sua condio e da natureza das suas funes;

h) Conveno n. 154, de 1981 Fomento da negociao coletiva. Aplicvel a todos os ramos de atividade econmica, prescreve que o Estado adote medidas, compatveis com as circunstncias nacionais, visando a promover esse mecanismo peculiar ao Direito do Trabalho. Essas medidas devem fomentar no apenas o estabelecimento negociado de condies de trabalho e de emprego, mas tambm a previso de regras de procedimento para as relaes entre empregadores ou suas organizaes e uma ou vrias associaes sindicais de trabalhadores.

As convenes ns. 11, 98, 131, 141, 144 e 154 foram ratificadas pelo Brasil.

C A Conveno 87 da OIT Considerado o mais importante dos tratados aprovados pela Conferncia Internacional do Trabalho, a Conveno n. 87, concernente a liberdade sindical e ao direito de sindicalizao, em Janeiro de 2001 j havia sido ratificada por 134 dos 175 Estados-membros da OIT. A Constituio brasileira de 1988 impede a nossa ratificao, por ter imposto, tal como a Carta Poltica de 1937, o monoplio de representao sindical por categoria econmica ou profissional e a contribuio compulsria dos que compem a categoria representada.

No estudo de direito comparado elaborado por grupo de trabalho que tive a honra de integrar ao lado dos eminentes juristas Verdier (Frana), Bhgwati (ndia), Gubinski (Polnia) e John Wood (Gr-Bretanha), o qual foi adotado pela Comisso de Espertos na aplicao de Convenes e Recomendaes, tivemos a oportunidade de sublinhar que "o grau de liberdade de que desfrutam os sindicatos para determinar e organizar sua ao depende muito de certas normas legais de carter geral sobre o direito da livre reunio, o direito de livre expresso do pensamento e, genericamente, de todas as liberdades civis e polticas de que gozam os cidados do pas (...). Da a importncia que deve atribuir aos princpios fundamentais contidos na Declarao Universal dos Direitos do Homem, pois sua violao pode afetar de maneira determinante o livre exerccio dos direitos sindicais".

0 art. 1 da Conveno enfatiza que o Estado que a ratificar se obriga a dar efeito as suas disposies. Ressalta, assim, a prevalncia da norma Internacional a que o Estado soberanamente aderiu, tal como o fez, de maneira explcita, a Conveno de Viena sobre o Direito dos Tratados (1969):

"Art. 27. Uma parte no poder invocar do seu direito interno como justificativa do no-cumprimento de um tratado".

0 art. 2 da Conveno n. 87 e, sem dvida, o mais importante:

"Os trabalhadores e os empregadores, sem distino de qualquer espcie, tem o direito, sem autorizao prvia, de constituir organizaes de sua escolha, assim como o de se filiar a estas organizaes, a condio nica de se conformarem com os estatutos destas ltimas".

A esto afirmados:

a) a liberdade sindical coletiva, que assegura aos grupos de empresrios ou de trabalhadores, intervinculados por interesses econmicos ou profissionais comuns, o direito de constituir o sindicato de sua escolha, com a representatividade qualitativa (categoria, profisso, empresa, etc.) e a quantitativa (base territorial) que lhes convierem, independentemente da existncia de outro sindicato com a mesma representatividade;

b) a liberdade sindical individual que faculta a cada empresrio ou trabalhador filiar-se ao sindicato de sua preferncia, representativa do grupo a que pertence, e dele desfiliar-se, no podendo ser compelido a contribuir para o mesmo, se a ele no estiver filiado.

Esse artigo, como se v, assegura o direito de sindicalizao a todo trabalhador e a todo empregador, sem qualquer discriminao, salvo a que consta do art. 9 do prprio texto: excluso dos membros das foras armadas e da polcia.

Quanto a unidade ou pluralidade sindical, e inquestionvel que a expresso "direito, sem autorizao prvia, de constituir organizaes da sua escolha, assim como o de se filiar a estas organizaes", traduz o direito de qualquer grupo de trabalhadores ou de empregadores de formar um novo sindicato e o direito de cada trabalhador ou empregador de ingressar, permanecer ou desfiliar-se de qualquer das associaes existentes.

bvio que a Conveno no impe a pluralidade sindical, mesmo porque o ideal, afirmado por estudiosos e sindicalistas, a unidade sindical. 0 que a Conveno exige que o sistema legal dos pases que a ratificaram faculte aos empregadores e trabalhadores, se o desejarem, a constituio de outro ou outros sindicatos da mesma categoria, empresa, profisso ou ofcio na mesma base territorial do j existente. Neste sentido e unssona e iterativa a jurisprudncia dos rgos de controle da OIT:

"Apesar de que os trabalhadores podem ter interesse em evitar que se multipliquem as organizaes sindicais, a unidade do movimento sindical no deve ser imposta, mediante interveno do Estado, por via legislativa, pois essa interveno contrria ao princpio incorporado nos arts. 2 e 11 da Conveno n. 87" (Verbete n. 224 do Comit de Liberdade Sindical da OIT).

"Se evidente que a Conveno no quis fazer da pluralidade sindical uma obrigao, pelo menos exige que isto seja possvel em todos os casos" (Verbete n. 225, in fine).0 art. 2 ainda garante ao grupo organizador do sindicato o direito de estrutur-lo como lhe aprouver e o de fixar livremente o dimensionamento da correspondente representao. Da esclarecer o renomado Efrn Crdova, que por muitos anos chefiou a Diviso de Direito do Trabalho e Relaes do Trabalho da OIT:

"Os trabalhadores podero, por exemplo, preferir a constituio de um sindicato profissional ou de indstria, por empresa ou por profisses diversas; de mbito local, regional ou nacional; de primeiro, segundo ou terceiro grau. Consagra-se, deste modo, um modelo de organizao sindical espontneo que, segundo alguns autores brasileiros, representa o polo oposto de organizao no-espontnea estabelecida na CLT. Esta dispe um enquadramento rgido das organizaes sindicais, segundo critrios previamente fixados, no pelos interessados, mas pelas autoridades pblicas".

Relativamente a Contribuio sindical compulsria, parece certo que ela afronta igualmente o princpio da liberdade sindical, tal como consagrado na Conveno em foco. A vinculao indireta do no-associado a um sindicato e flagrantemente incompatvel com a pluralidade sindical.

Consoante resoluo do Comit de Liberdade Sindical:

"A faculdade de impor obrigatoriamente a todos os trabalhadores da categoria profissional interessada o pagamento de contribuio ao nico sindicato (...) no compatvel com o princpio de que os trabalhadores devem ter o direito de filiar-se as organizaes que estimem convenentes. Em tais circunstncias, a obrigao legal de pagar cotizaes ao monoplio sindical, estejam ou no os trabalhadores filiados a ele, representa uma nova consagrao e consolidao do dito monoplio" (Verbete n. 227 do Comit).

0 que a OIT tem admitido, para reforar as finanas do sindicato, a estipulao de uma quota de solidariedade na conveno coletiva por ele ajustada, a ser paga exclusivamente pelos no associados, como condio para que a estes se estendam as vantagens constantes do instrumento negociado (Verbete n. 324 do Comit).

0 art. 3 trata da autonomia sindical. Ele assegura as organizaes sindicais o direito de elaborar seus estatutos e regulamentos administrativos e, bem assim, o de eleger livremente seus dirigentes, organizar a respectiva ges