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INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O
DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL
A PERDA DO GRAU DE
INVESTIMENTO E A
VULNERABILIDADE EXTERNA
DA ECONOMIA BRASILEIRA
OUTUBRO/2015
Conselheiro Empresa
Amarílio Proença de Macêdo J.Macêdo Alimentos S/A
Bernardo Gradin GanBio S/A
Carlos Eduardo Sanchez EMS Indústria Farmacêutica Ltda
Carlos Francisco Ribeiro Jereissati Telemar Participações S/A
Carlos Mariani Bittencourt PIN Petroquímica S/A
Cláudio Bardella Bardella S/A Indústrias Mecânicas
Dan Ioschpe
Vice PresidenteIochpe Maxion S/A
Daniel Feffer Grupo Suzano
Décio da Silva WEG S/A
Eugênio Emílio Staub Conselheiro Emérito
Fabio Hering Companhia Hering S/A
Flávio Gurgel Rocha Confecções Guararapes S/A
Frederico Fleury Curado
Vice PresidenteEmbraer S.A.
Geraldo Luciano Mattos Júnior M. Dias Branco S.A
Henri Armand Slezynger Unigel S.A
Ivo Rosset Rosset & Cia. Ltda. / Valisere
Ivoncy Ioschpe Conselheiro Emérito
Jacks Rabinovich Campo Belo Ltda
Jorge Gerdau Johannpeter Gerdau Aços Longos S/A
José Antonio Fernandes Martins Marcopolo S/A
José Carlos Grubisich Eldorado Brasil Celulose S/A
José Roberto Ermírio de Moraes Votorantim Participações S/A
Josué Christiano Gomes da Silva Cia. de Tecidos Norte de Minas Coteminas
Laércio José de Lucena Cosentino TOTVS S/A
Lírio Albino Parisotto Videolar S/A
Lucas Santos Rodas Companhia Nitro Química Brasileira S.A.
Luiz Alberto Garcia Algar S/A Empreendimentos e Participações
Marcelo Bahia Odebrecht Construtora Norberto Odebrecht S/A
Murilo Pinto de Oliveira Ferreira Vale S.A.
Olavo Monteiro de Carvalho Monteiro Aranha S/A
Paulo Guilherme Aguiar Cunha Conselheiro Emérito
Pedro Franco Piva Klabin S/A
Pedro Luiz Barreiros Passos Natura Cosméticos S/A
Pedro Wongtschowski
PresidenteUltrapar Participações S/A
Ricardo Steinbruch Vicunha Têxtil S.A.
Robert Max Mangels Mangels Industrial S/A
Rodolfo Villela Marino
Vice PresidenteElekeiroz S.A.
Rômel Erwin de Souza Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais USIMINAS
Rubens Ometto Silveira Mello Cosan S/A Ind e Com
Salo Davi Seibel Duratex S/A
Victório Carlos De Marchi Cia. de Bebidas das Américas AmBev
Vitor Sarquis Hallack Camargo Corrêa S/A
Roberto Caiuby Vidigal
Paulo Francini
Conselho do IEDI
Membros Colaboradores
Paulo Diederichsen Villares
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 1
A PERDA DO GRAU DE INVESTIMENTO E A
VULNERABILIDADE EXTERNA DA ECONOMIA
BRASILEIRA
O mês de setembro foi marcado por vários eventos desestabilizadores,
que agravaram ainda mais o clima de incerteza que se instaurou no
Brasil desde o início do corrente ano e levou a taxa de câmbio a
atingir níveis superiores a R$ 4,00. Dentre esses eventos, destaca-se o
rebaixamento da nota do país de BBB- para BB+ (com perspectiva
negativa) pela Standard & Poor's (S&P) no dia 9/09, o que significou a
perda do grau de investimento obtido em 2008.
Em seu comunicado, a principal justificativa da S&P para a sua
decisão foi a deterioração das contas públicas e a falta de
comprometimento do governo com o ajuste fiscal, explicitada com o
envio ao congresso de uma proposta de orçamento deficitário em
2016. As duas outras agências de rating ainda não seguiram a decisão
da S&P: na Moody´s, o Brasil está no último degrau antes do grau
especulativo e na Fitch dois degraus acima.
Com isso, o risco soberano brasileiro (bem como de várias empresas e
bancos residentes) voltou à categoria de “grau especulativo”, o que
deve resultar em aumento do custo das captações externas. Ademais,
se mais uma agência retirar o “grau de investimento” do Brasil, vários
investidores institucionais globais ficarão proibidos de aplicar em
títulos emitidos por residentes.
Este Estudo IEDI analisa outra dimensão fundamental da condição
macroeconômica de um país considerada na classificação de risco de
crédito das agências de rating: a situação de vulnerabilidade externa.
Procuraremos mostrar que do ponto de vista da vulnerabilidade
externa no curto prazo, não haveria motivo para o rebaixamento da
classificação de risco de crédito do Brasil.
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 2
No caso de economias emergentes, como a brasileira, com déficits em
conta corrente recorrentes e dependência de fluxos de capitais
estrangeiros, que seguem uma dinâmica de “boom e bust”, essa
situação é sempre relevante. Contudo, ela ganha importância adicional
devido ao contexto internacional vigente, caracterizado por três
fatores inter-relacionados que afetam negativamente o Brasil.
O primeiro é a queda dos preços das commodities, que se acentuou no
corrente ano devido à sua interação com o segundo fator, qual seja, a
desaceleração da economia chinesa e as incertezas sobre eficácia das
medidas anticíclicas em resposta ao estouro da bolha acionária. O
terceiro fator refere-se à perspectiva de início de nova fase de alta da
taxa de juros básica nos Estados Unidos a partir do seu piso histórico
(0,25%).
Para dimensionar a situação atual de vulnerabilidade externa
examinou-se a evolução do passivo externo líquido (PEL) e dos seus
componentes a partir de dezembro de 2009. Em seguida, calculou-se
um conjunto de indicadores que sintetizam essa vulnerabilidade no
curto (liquidez externa) e médio e longo prazos (solvência externa),
dentre os quais o indicador de liquidez externa utilizado pela S&P.
Esse conjunto é mais abrangente que o geralmente utilizado nas
análises sobre o tema – de forma geral, indicadores relacionados à
dívida externa, que fornecem uma visão incompleta da vulnerabilidade
externa. Isso porque, a dívida externa de curto prazo é atualmente uma
fração muito pequena do passivo externo de curto prazo (PECP) e a
dívida externa líquida é negativa desde 2007 (devido à redução da
dívida externa pública e ao acúmulo de reservas internacionais).
A situação de liquidez externa foi avaliada a partir de quatro
indicadores, cujo denominador comum é a utilização no denominador
das reservas internacionais (ou seja, os recursos em divisas que podem
ser mobilizados no curto prazo frente a uma saída súbita de capitais
externos), se diferenciando somente na composição do numerador,
quais sejam:
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 3
• Indicador 1: razão entre a dívida externa de curto prazo e as
reservas
• Indicador 2: utilizado pela agência de classificação de risco
de crédito Standard & Poors, considera no numerador as
necessidades brutas de financiamento externo (NBFE), que
equivalem à soma do saldo em transações correntes, com o
principal vencível da dívida externa de médio e longo prazo
nos próximos 12 meses e o estoque da dívida de curto prazo;
• Indicador 3: razão entre o Passivo externo de curto prazo
(PECP) – equivalente à soma da dívida externa de curto prazo
e do estoque de investimento de portfólio estrangeiro no país
(IPE) - e as reservas;
• Indicador 4: elaborado especialmente para este Estudo,
consiste na soma das NBFE com o estoque de IPE; este
indicador mede a pressão potencial sobre as reservas
internacionais do País no curto prazo.
Na comparação com dez/10, os quatro indicadores atingiram um
patamar mais baixo em jul/15. Eles podem ser divididos em dois
grupos com patamares bem distintos. No primeiro grupo, estão os
indicadores 1 e 2, que não superaram 0,22 em todo o período. Ou seja,
as reservas foram mais que suficientes para fazer frente aos
compromissos de curto prazo: dívida externa de curto prazo no ind.1 e
NBFE no ind.2. Esse último, utilizado, como já observamos, pela
agência S&P, retornou ao patamar de dez/09 em jul/15 (0,18).
O segundo grupo engloba os indicadores 3 e 4, que incluem no
numerador o estoque de IPE no país. Ambos, que superavam 2 em
dez/09, traçaram uma trajetória de queda praticamente ininterrupta,
atingindo o patamar de 1,1 no final do período, ou seja, as reservas
eram quase suficientes para fazer frente à demanda potencial de
divisas.
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 4
Assim, do ponto de vista da vulnerabilidade externa no curto prazo,
não haveria motivo para o rebaixamento da classificação de risco de
crédito do Brasil para grau especulativo.
Já para avaliar a situação de solvência externa de um país, um
indicador fundamental é a razão entre o PEL e as exportações. Isto
porque, no caso dos países em desenvolvimento, como o Brasil, as
exportações são a fonte de geração autônoma de divisas, necessárias
para pagar a taxa de remuneração do PEL. O valor da razão indica o
número de anos, dado um determinado fluxo anual de exportação,
necessário para o pagamento do PEL. A condição para que esta razão
não tenha uma trajetória explosiva é que essa taxa seja inferior ao
ritmo de expansão das exportações. Caso contrário, a razão
PEL/exportações segue uma trajetória de expansão ilimitada.
No caso do Brasil, cujo desempenho exportador nos últimos anos
ancorou-se nas vendas externas de commodities, também é importante
incluir na análise a capacidade de geração de divisas pela indústria de
transformação (IT). Diante da deflação das cotações internacionais
desses bens e das mudanças em curso na China – desaceleração e
mudança no padrão de crescimento, com maior participação do
consumo na composição da demanda agregada, que resultarão em
menor demanda por esses produtos, sobretudo os minerais –, a
trajetória futura das exportações brasileiras (e nossa capacidade de
geração de divisas) será mais dependente do desempenho das vendas
externas da IT. Assim, além do indicador tradicional PEL/exportações,
três indicadores adicionais de solvência externa foram calculados:
• Indicador 1: PEL/exportações
• Indicador 2: PEL/exportações da IT;
• Indicador 3: Serviço do PEL/exportações: este é um indicador
alternativo ao PEL/exportações para avaliar a
sustentabilidade ou não de uma trajetória de acúmulo de
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 5
passivos externos, que depende exatamente da relação entre
as exportações e o serviço do PEL;
• Indicador 4: Serviço do PEL/exportações da IT.
A evolução dos indicadores mostra que, ao contrário da situação de
liquidez externa, a de solvência sofreu deterioração na comparação de
dez/09 e jul/15, que foi mais intensa no caso dos indicadores que
consideram as exportações de IT no denominador. Esse resultado era
esperado diante do impacto negativo do longo período de apreciação
cambial sobre a competitividade externa dessa indústria.
Como já destacado pelo IEDI, para garantir uma trajetória sustentável
de expansão das vendas externas da IT – fundamental para evitar uma
situação de insolvência externa –, ações de política econômica são
necessárias. O movimento recente de depreciação da moeda doméstica
é condição necessária, mas não suficiente para atingir esse objetivo.
O governo deve promover uma melhor coordenação junto à iniciativa
privada para estimular investimentos e a reindustrialização do país,
simultaneamente à intensificação das negociações comerciais para a
(re)inserção da indústria brasileira nas cadeias globais de valor.
Ademais, vale lembrar que as vantagens para o país das exportações
de produtos da IT comparativamente às commodities (inclusive
industriais): geram efeitos positivos e cumulativos sobre a
produtividade da indústria, são menos sujeitas às oscilações de preços
nos mercados internacionais e têm maior elasticidade-renda da
demanda.
Introdução
Este Estudo IEDI analisa a situação atual de vulnerabilidade externa da
economia brasileira, um dos fundamentos macroeconômicos
considerado pelas agências de rating na classificação de risco de
crédito soberano. Na conjuntura atual, avaliar essa situação é
importante não somente em função do rebaixamento da nota do Brasil
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 6
pela S&P para a categoria “grau especulativo” no início de setembro,
mas também devido ao contexto internacional vigente, caracterizado
por três fatores inter-relacionados que afetam negativamente as
condições de financiamento externo do país. Em ordem cronológica (e
não de importância), o primeiro fator é a queda dos preços das
commodities, que se acentuou no corrente ano devido à sua interação
com o segundo fator, qual seja, com o segundo fator, qual seja, a
desaceleração da economia chinesa e as incertezas sobre eficácia das
medidas anticíclicas em resposta ao estouro da bolha acionária. O
terceiro fator refere-se à perspectiva de início de uma nova fase de alta
da taxa de juros básica nos Estados Unidos a partir do seu piso histórico
(0,25%) nos próximos meses. Na reunião de setembro, o banco central
estadunidense (Federal Reserve – Fed) optou por adiá-lo exatamente
em função dessas incertezas e dos seus impactos potenciais sobre as
demais economias emergentes.
Para avaliar a vulnerabilidade externa da economia brasileira no
contexto atual, examina-se a evolução dos estoques, isto é, do passivo
externo líquido (PEL) e dos seus componentes a partir de 2010, quando
se inicia o primeiro governo da presidente Dilma Roussef, até julho de
2015, último dado disponível. Em seguida, analisa-se um conjunto de
indicadores que são influenciados por essa evolução e sintetizam a
situação de vulnerabilidade no curto (liquidez externa) e médio e longo
prazos (solvência externa).
A Evolução do Passivo Externo
O passivo externo líquido (PEL) é o resultado da diferença entre o
passivo externo bruto (PEB) e o ativo externo bruto (AEB). Esses três
termos tradicionais na literatura econômica são sinônimos,
respectivamente, dos conceitos “Posição internacional de
investimento”, “Posição internacional de investimento – Passivo” e
“Posição internacional de investimento – Ativo”, utilizados na
metodologia atual do Balanço de Pagamentos, que a partir de abril de
2015 passou a seguir a sexta edição do Manual de Balanço de
Pagamentos e Posição Internacional de Investimento (BPM6) do Fundo
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 7
Monetário Internacional (FMI). As estatísticas da Posição internacional
de investimento – Ativo” e “Posição internacional de investimento –
Passivo” também sofreram alterações e estão consolidadas nos Quadros
31 e 31A da Nota para Imprensa do Setor Externo (respectivos Quadros
60 e 60A da metodologia anterior). Com base nesses dois quadros,
calculou-se o PEL total e seus componentes. Como são dados de
estoque, as informações referem-se à posição de final de período:
dezembro de cada ano entre 2009 e 2014 e julho no caso de 2015.
No caso da economia brasileira, que tem PEL positivo, a posição
internacional de investimento é negativa. Sua dimensão depende não
somente do desempenho dos fluxos ao longo dos anos (acúmulo dos
déficits em conta corrente), mas também pelas variações dos preços dos
ativos (por exemplo, valorização das ações que compõem o portfólio
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 8
dos investidores não-residentes) e da taxa de câmbio, que afeta o valor
em US$ dos estoques de IDE e do investimento estrangeiro de portfólio
no país. Ou seja, variações cambiais e nos preços dos ativos, que foram
recorrentes no período analisado – em função, em grande medida, das
fases do novo ciclo de fluxos de capitais para as economias emergentes
que emergiu após a crise financeira global – também afetaram a
evolução do PEL.
Além do tamanho desse passivo, sua composição também é relevante
por duas razões principais. A primeira, importante para a situação de
liquidez externa, refere-se aos diferentes graus de volatilidade de cada
mobilidade do PEB, quais sejam: Investimento Direto Estrangeiro
(IDE); Investimento de Portfólio Estrangeiro (IPE); e Outros
Investimentos Estrangeiros (OIE). A segunda, que afeta a situação de
solvência externa, diz respeito à taxa de remuneração (ou serviço
financeiro) de cada modalidade do PEL (ou seja, remessas líquidas de
juros, lucros e dividendos e amortizações da dívida), que também é
bastante heterogênea.
No período dez/09-jul/15 (ou seja, nos 5,5 anos de governo Dilma), o
PEB cresceu 31,4% (de US$ 1.080 bilhões para US$ 1.419 bilhões), em
função do aumento de 111% do estoque de OIE (sobretudo, dívida
externa bancária) e de 69,9% do IDE. Já o estoque de IPE recuou
18,5% (de US$ 561,8 bilhões em dez/09 para US$ 457,7 bilhões em
jul/15) devido, exclusivamente, à depreciação do real e à queda dos
preços das ações brasileiras detidas por não-residentes, já que no
acumulado do período houve ingresso líquido nessa modalidade de
capital estrangeiro. Já na comparação entre dez/09 e dez/13 (10 governo
Dilma), o crescimento do PEB foi maior, de 39,5%. Isso porque entre
dez/14 e jul/15 o PEB recuou 8,9% em função da queda do IDE (-9,8%)
e do IPE (-13%) como reflexo, sobretudo, dos efeitos patrimoniais
mencionados acima, ou seja, da alta da taxa de câmbio no período (que
reduz o valor em dólares do estoque de investimentos diretos e de
portfólio denominados em reais) somada à deflação dos cotações no
bolsa de valores no caso dos IPE.
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 9
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 10
Assim, a composição atual do PEB, com a maior importância dos
investimentos estrangeiros diretos e portfólio relativamente à dívida
externa (denominada em dólar), além de reduzir o problema do
chamado descasamento de moedas (currency mismacht), faz com que
movimentos de depreciação cambial tenham um impacto positivo na
sua evolução (ou seja, de queda) e, assim, nos indicadores de
vulnerabilidade externa, analisados na próxima seção.
Outro dado que chama atenção é o aumento da participação do IDE no
período em tela, a modalidade menos volátil de capital externo. Esse
resultado explica-se tanto pelos fatores de atração – investimentos
“resourse seeking” nos setores produtores de commodities, com preços
em alta até 2011, e investimentos “market seeking” nos setores de
comércio e serviços beneficiados pelo crescimento da massa de
rendimentos até 2013 –, como por fatores que evitaram uma expansão
mais expressiva dos ingresso de IPE: os mecanismos de gestão dos
fluxos de capitais vigentes entre outubro de 2009 e maio de 2013 e a
turbulência nos mercados financeiros internacionais que têm marcado o
contexto pós-crise financeira global.
Esses mecanismos também contribuíram para a redução do passivo
externo de curto prazo PECP (que pode ser regatado num curto
período), que inclui a dívida externa de curto prazo (que recuou entre
dez/10 e dez/13, mas voltou a crescer a partir de 2014) e o estoque de
IPE no país. Esse estoque, atualmente o principal componente do
PECP, registrou queda de 37% entre dez/10 e jul/15 (passando de US$
560,5 bilhões em dez/2010, valor recorde no período, para US$ 354,7
bilhões, uma retração de 37%) em função dos dois efeitos patrimoniais
já mencionados: depreciação cambial e quedo do preço das ações. Esse
passivo, que somou US$ 410,6 bilhões em jul/15 (valor inferior
inclusive ao observado dez/09, quando o boom de fluxos de capitais do
pós-crise estava se iniciando), é uma das variáveis fundamentais para a
análise da situação de liquidez externa realizada a seguir, já que
equivale aos recursos que podem sair rapidamente do país (interrupção
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 11
da rolagem dos empréstimos externos e/ou resgate pelos não-residentes
das aplicações financeiras no país).
Já a solvência externa reflete a vulnerabilidade externa no médio e
longo prazos e depende da trajetória do PEL e do seu serviço financeiro
(a taxa de remuneração do PEL). Para não entrar numa trajetória
insustentável de acumulação de passivos externos em termos líquidos, a
economia brasileira precisa gerar divisas – assim como no caso dos
demais países em desenvolvimento, mediante exportações, sua fonte de
geração autônoma de divisas – num montante suficiente para honrar o
pagamento desse serviço.
Assim, um país que incorreu sucessivamente em déficits em transações
corrente e acumulou PEL pode ser solvente (se a condição acima for
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 12
cumprida) e, ao mesmo tempo, enfrentar uma situação de iliquidez
externa (insuficiência de divisas no curto prazo para fazer frente aos
compromissos em moeda estrangeira), que culmina numa crise cambial.
O PEL da economia brasileira atingiu US$ 782 bilhões em jul/15, cifra
63,3% maior que a registrada em dez/09 (US$ 479 bilhões). Esse
crescimento foi resultado do avanço de 54,4% do investimento direto
(ID) e de 211,9% dos outros investimentos (OI). Já o investimento de
portfólio (IP) recuou 21% devido, sobretudo, à redução do IPE entre
dez/14 e jul/15 e, em menor medida, ao aumento em 64,7% no
acumulado do período (dez/09 a jul/15) dos investimentos de portfólio
brasileiros (IPB), um dos componentes do AEB.
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 13
Os demais componentes desse ativo também aumentaram nesse
período, com destaque para o Investimento Direto Brasileiro (IDB) e as
reservas internacionais (92,3% e 54,4%, respectivamente). A
internacionalização dos capitais produtivos brasileiros, cujo estoque no
exterior atingiu US$ 300,7 bilhões em jul/15 contribui para a melhora
da situação de solvência externa pois resulta no recebimento de lucros e
dividendos por residentes no Brasil e, com isso, reduz a taxa de
remuneração líquida do PEL (questão retomada na próxima seção). Já a
estratégia defensiva de acúmulo de reservas contribui tanto para a
solvência como para a situação de liquidez externa, na medida em que
constituem o estoque de moeda estrangeira que pode ser imediatamente
utilizado frente a um aumento súbito da saída de recursos externos.
Vale mencionar que essa estratégia foi mais intensa no biênio 2010-
2011, perdendo ritmo a partir de então em função do aumento do seu
custo de oportunidade, qual seja: o gasto com juros decorrente das
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 14
operações de esterilização do impacto monetário das intervenções do
BCB no mercado de câmbio à vista (equivalente à diferença entre a
taxa paga nessas operações e a taxa de remuneração das reservas no
mercado externo)
Para completar a análise da situação atual de liquidez e solvência
externa da economia brasileira, a próxima seção apresenta um conjunto
de indicadores de vulnerabilidade externa, bem mais abrangente que o
utilizado nas análises recentes sobre o tema. Estas têm priorizado
indicadores relacionados à dívida externa – que é comparada às
reservas ou ao PIB (para mensurar, respectivamente, a liquidez e a
solvência externas) –, os quais, na perspectiva aqui adotada, fornecem
uma visão incompleta da vulnerabilidade externa de uma economia.
Isso porque, a dívida externa de curto prazo é atualmente uma fração
muito pequena do PECP e a dívida externa líquida é negativa desde
2007 (devido à redução da dívida externa pública e ao acúmulo de
reservas internacionais).
Indicadores de Vulnerabilidade Externa
Um indicador sintético de liquidez externa (ou da vulnerabilidade
externa no curto prazo) é a razão entre o PECP e as reservas
internacionais do país (ou seja, os recursos em divisas que podem ser
mobilizados no curto prazo frente a uma saída súbita de capitais
externos). Além deste indicador, também foram calculados três
indicadores, cuja característica comum é a utilização das reservas
internacionais no denominador, se diferenciando somente na
composição do numerador, quais sejam:
• Dívida externa de curto prazo/reservas: visa avaliar se há ou
não possibilidade de crise de liquidez externa por falta de
moeda estrangeira para honrar a dívida externa a vencer num
prazo inferior a 360 dias;
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 15
• Indicador utilizado pela agência de classificação de risco de
crédito Standard & Poors: considera no numerador as
Necessidades Brutas de Financiamento Externo (NBFE), que
equivalem à soma do saldo em transações correntes, com o
principal vencível da dívida externa de médio e longo prazo
nos próximos 12 meses e o estoque da dívida de curto prazo;
• Indicador amplo de liquidez externa: elaborado pelo IEDI,
consiste na soma das NBFE com o estoque de IPE; este
indicador mede a pressão potencial sobre as reservas
internacionais do País no curto prazo.
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 16
O significado de todos indicadores de liquidez que utilizam as reservas
no denominador é semelhante: se o valor da razão for igual a 1, as
reservas são suficiente para cobrir o estoque em questão (PECP ou
dívida externa de curto prazo) e/ou as NBFE; se for inferior a 1, as
reservas são mais que suficientes para cobri-los (por exemplo, um
indicador igual a 0,20 significa que somente 20% das reservas serão
utilizadas); se for superior a 1, as reservas são insuficientes (por
exemplo, um indicador igual a 1,20 significa que as reservas
precisariam ser 20% maiores para fazer frente à pressão cambial).
Na comparação entre dez/09 e jul/15, três indicadores diminuíram, o
que significa melhora da situação de liquidez externas; se adotarmos
como ponto inicial dez/10, os quatro indicadores atingiram um patamar
mais baixo em jul/15. Eles podem ser divididos em dois grupos com
patamares bem distintos. No primeiro grupo, estão os indicadores 1 e 2,
que não superaram 0,22 em todo o período. Ou seja, as reservas foram
suficientes em todos os meses considerados para fazer frente aos
compromissos de curto prazo: dívida externa de curto prazo no Ind.1 e
NBFE no Ind.2. Esse último, utilizado pela agência S&P, retornou ao
patamar de dez/09 em jul/15 (0,18).
Assim, do ponto de vista da vulnerabilidade externa no curto prazo, não
haveria motivo para o rebaixamento da classificação de risco de crédito
do Brasil para grau especulativo. Também vale destacar a mudança
positiva na composição das NBFE em jul/15 em relação ao biênio
2012-2013 (quando o Ind.2 atingiu seu piso no período em tela): a
redução do déficit em transações corrente associada, principalmente, à
melhora da balança comercial nos primeiros setes meses de 2015 em
função tanto da depreciação cambial como da recessão doméstica.
Contribuíram no mesmo sentido a queda dos gastos com viagens
internacionais e das remessas de lucros e dividendos.
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 17
O segundo grupo engloba os indicadores 3 e 4, cuja característica
comum é a inclusão, no numerador, do estoque de IPE no país. Ambos
indicadores indicam uma situação menos confortável de liquidez
externa do que os indicadores 1 e 2, pois continuavam maiores que 1
em jul/15, ou seja, as reservas eram insuficientes para fazer frente seja
ao PECP (Ind.3), seja à soma desse passivo com o saldo em conta
corrente e o principal vencível da dívida de médio e longo prazo
(Ind.4). Contudo, nos dois casos, a trajetória foi de queda praticamente
ininterrupta até atingir o patamar de 1,1 no final do período. Ou seja,
em meados de 2015, as reservas eram praticamente suficientes para
fazer frente à demanda potencial de divisas. O adjetivo potencial
decorre da composição atual do PECP, no qual predominam os IPE
(86% do total PECP em jul/15, percentual um pouco menor que os 94%
registrados em dez/09).
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 18
Em primeiro lugar, embora o comportamento de manada predomine em
mercados financeiros liberalizados e líquidos, não necessariamente
ocorrerá liquidação em massa das posições dos investidores
estrangeiros em moeda doméstica. No caso do Brasil, o elevado
diferencial de juros proporcionado pelo patamar exorbitante da taxa de
juros doméstica tem atuado como um importante fator de desestímulo a
essa liquidação no caso das aplicações em títulos públicos, que
representavam 39% do total do IPE no país em jul/15, recorde
histórico. Em segundo lugar, quando há liquidação de posições dos
investidores estrangeiros em moeda doméstica num regime de câmbio
flutuante, o valor em moeda estrangeira dessa modalidade de passivo
externo diminui em função da depreciação cambial e, no caso das
ações, da queda dos preços, como já ressaltado. Esses efeitos
patrimoniais têm um impacto positivo nos indicadores de liquidez
externa que incluem o IPE no numerador exatamente em momentos de
ataque especulativo contra a moeda nacional, como o vivenciado agora
em setembro.
Já a dívida externa de curto prazo gera compromissos fixos em divisas
e envolve descasamento de moedas. Mas, em contrapartida, essa
composição do PECP também tem uma implicação negativa: ela reforça
as correias de transmissão da instabilidade gerada nos mercados
financeiros internacionais para o mercado financeiro doméstico.
Já para avaliar a situação de solvência externa de um país, um indicador
fundamental é a razão entre o PEL e as exportações. Isto porque, no
caso dos países em desenvolvimento, como o Brasil, as exportações são
a fonte de geração autônoma de divisas, necessárias para pagar a taxa
de remuneração do PEL. Para que essa razão não tenha uma trajetória
explosiva, o ritmo de expansão das exportações precisa ser superior a
essa taxa. O valor da razão indica o número de anos, dado um
determinado fluxo de exportação (acumulado em 12 meses), necessário
para o pagamento do PEL. Vale mencionar que várias analises utilizam
o Produto Interno Bruto (PIB) ao invés das exportações no
denominador dos indicadores de solvência externa, o que carece de
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 19
sentido pois o PIB não equivale à capacidade de geração de moeda
estrangeira de um país.
No caso do Brasil, cujo desempenho exportador nos últimos anos
ancorou-se nas vendas externas de commodities, também é importante
incluir na análise a capacidade de geração de divisas pela indústria de
transformação (IT). Diante da deflação das cotações internacionais
desses bens e das mudanças em curso na China – desaceleração e
mudança no padrão de crescimento, com maior participação do
consumo na composição da demanda agregada, que resultarão em
menor demanda por esses produtos, sobretudo os minerais –, a
trajetória futura das exportações brasileiras (e nossa capacidade de
geração de divisas) será mais dependente do desempenho das vendas
externas da IT. Assim, além do indicador tradicional PEL/exportações,
três indicadores adicionais de solvência externa foram calculados:
• Indicador 1: PEL/exportações
• Indicador 2: PEL/exportações da IT;
• Indicador 3: Serviço do PEL/exportações: este é um indicador
alternativo ao PEL/exportações para avaliar a sustentabilidade
ou não de uma trajetória de acúmulo de passivos externos, que
depende exatamente da relação entre as exportações e o
serviço do PEL;
• Indicador 4: Serviço do PEL/exportações da IT.
A evolução dos indicadores mostra que, ao contrário da situação de
liquidez externa, a de solvência sofreu deterioração na comparação
entre dez/09 e jul/15, que foi mais intensa no caso dos indicadores que
consideram as exportações de IT no denominador. Esse resultado era
esperado diante do impacto negativo do longo período de apreciação
cambial sobre a competitividade externa dessa indústria, bem como do
menor ritmo de crescimento do comércio mundial e do acirramento da
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 20
concorrência nos mercados internacionais no contexto pós-crise.
Embora o ind.1 (PEL/exportações totais) tenha avançado 0,62 pontos
percentuais (p.p.), atingindo 2,84 no final do período, o ind. 2
(PEL/exportações da IT) avançou 1,36 p.p., para 5,3. Isso quer dizer
que, em jul/2015, enquanto seriam necessários 2,8 anos para pagar o
PEL com o fluxo em 12 meses das exportações de bens e serviços,
considerando somente as exportações da IT, seriam necessários mais de
5 anos. Os indicadores 3 e 4, que consideram o serviço do PEL no
numerador, também sugerem piora nas condições de solvência externa,
com destaque para o ind. 4, que atingiu 0,95 em jul/15; ou seja, o
serviço do PEL “consumiu” neste mês 95% das exportações da IT.
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 21
O pior desempenho (entre 2009 e 2015) dos indicadores que
consideram as exportações da IT no denominador é explicado pela sua
menor taxa de crescimento (26,2%) em relação às exportações totais
(32,7%), ao PEL (69,9%) e ao serviço do PEL (56,7%)., Esse aumento
expressivo da taxa de remuneração do PEL – que é motivo de
preocupação, assim como o baixo dinamismo das vendas externas da IT
– está associado, entre outros fatores, ao aumento das remessas de
lucros e dividendos pelas filiais da ETs, pressionadas pela redução da
rentabilidade nos países de origem no contexto da grande recessão, que
ainda não foi superada.
Como já destacado pelo IEDI, para garantir uma trajetória sustentável
de expansão das vendas externas da IT – fundamental para evitar uma
situação de insolvência externa –, ações de política econômica são
A Perda do Grau de Investimento e a Vulnerabilidade Externa da Economia Brasileira 22
necessárias. O movimento recente de depreciação da moeda doméstica
é condição necessária, mas não suficiente para atingir esse objetivo. O
governo deve promover uma melhor coordenação junto à iniciativa
privada para estimular investimentos em infra-estrutura e a
reindustrialização do país, simultaneamente à intensificação das
negociações comerciais para a inserção da indústria brasileira nas
cadeias globais de valor. Ademais, vale lembrar que as vantagens para
o país das exportações de produtos da IT comparativamente às
commodities (inclusive industriais): geram efeitos positivos e
cumulativos sobre a produtividade da indústria, são menos sujeitas às
oscilações de preços nos mercados internacionais e têm maior
elasticidade-renda da demanda.