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Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Escola Nacional de Botânica Tropical
Conhecimento etnobotânico de mateiros residentes no entorno de Unidades de Conservação no estado do
Rio de Janeiro
Felipe de Araújo Pinto Sobrinho
2007
ii
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Escola Nacional de Botânica Tropical
Conhecimento etnobotânico de mateiros residentes no entorno de Unidades de Conservação no estado do
Rio de Janeiro
Felipe de Araújo Pinto Sobrinho
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Botânica, Escola Nacional de Botânica Tropical, do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Botânica.
Orientador: Rejan R Guedes Bruni
Rio de Janeiro
2007
iii
Conhecimento etnobotânico de mateiros residentes no entorno de Unidades de Conservação no estado do Rio de Janeiro
Felipe de Araújo Pinto Sobrinho
Dissertação submetida ao corpo docente da Escola Nacional de Botânica Tropical, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro - JBRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Mestre.
Aprovada por: Prof. Dra Rejan R. Guedes-Bruni (Orientador) __________________ Prof. Dr. Rogério Ribeiro de Oliveira ___________________ Prof. Dr. Fábio Pedro Souza de Ferreira Bandeira ___________________
em 12/ 04/ 2007
Rio de Janeiro
2007
iv
Pinto Sobrinho, Felipe de Araújo
P659 Estudo etnobotânico de mateiros residentes no entorno de Unidades de Conservação no estado do Rio de Janeiro. – Rio de Janeiro, 2007.
xi, 73 f. : il. Dissertação (mestrado) – Instituto de Pesquisas Jardim Botânico
do Rio de Janeiro/Escola Nacional de Botânica Tropical, 2007. Orientadora: Dra. Rejan R. Guedes-Bruni. Bibliografia. 1. Mata Atlântica. 2. Etnobotânica. 3. Unidades de Conservação
(RJ) - Entorno. 4. Rio de Janeiro (Estado). I.Título. II. Escola Nacional de Botânica Tropical.
CDD 581.61
v
Resumo (Conhecimento etnobotânico de mateiros residentes no entorno de Unidades de Conservação no estado do Rio de Janeiro). No presente estudo propôs-se investigar o conhecimento local de mateiros moradores no entorno de duas Unidades de Conservação no estado do Rio de Janeiro: Reserva Biológica do Tinguá e Reserva Biológica de Poço das Antas. São reunidas informações sobre o uso de plantas a partir de entrevistas com oito informantes. Para o Entorno da Rebio do Tinguá (ERBT) foram obtidas 136 citações de uso de 116 espécies, subordinadas a 49 famílias, para o Entorno da Rebio de Poço das Antas (ERBPA) totalizaram-se 116 citações de uso de 76 espécies subordinadas a 30 famílias botânicas. As famílias que apresentaram maior riqueza no ERBT foram Leguminosae, Asteraceae, Myrtaceae, Bignoniaceae, Apocynaceae, Lauraceae e Anacardiaceae. Já para o ERBPA as famílias mais ricas em número de espécies foram Leguminosae, Lauraceae, Bignoniaceae e Asteraceae. A categoria de uso que se destacou no ERBT foi a medicinal, sendo a maioria dessas espécies, árvores com ampla ocorrência na Floresta Atlântica. Dentre essas espécies medicinais o Jatobá (Hymenaea courbaril) obteve o Índice de Importância Relativa (IR) máximo, sendo a espécie mais versátil em relação aos seus usos medicinais. Para o ERBPA as categorias combustível e construção tiveram destaque, sendo muitas dessas espécies bem comum na região do entorno e também nas áreas antropizadas da Rebio. O índice de Shannon (H’) obtido para as áreas foi de 2,02 para o ERBT e 1,85 para o ERBPA. O maior número de espécies citadas pelos mateiros do ERBT, pode estar relacionado a maior riqueza florística dessa região, o que ocasiona um maior número de recursos disponíveis. Verificou-se que existe uma diferença significativa entre o conhecimento dos mateiros nas duas áreas estudas (X2 = 49,59; g.l = 7; p<0, 010), valendo-se do teste Qui-Quadrado (X2). Estudos dessa natureza tornam-se cada vez mais importantes nas regiões sob domínio da Mata Atlântica, que apesar do histórico de destruição ainda possui uma grande importância econômica, ecológica, cultural e social. Esses mateiros, devido à grande vivência nas matas das regiões de estudo, podem ser consideradas como verdadeiros especialistas locais. Estes atores sociais não deveriam ser mais vistos como meros informantes locais, pois seus conhecimentos poderiam ser úteis na manutenção e administração das unidades de conservação. Palavras chaves: Floresta Atlântica, etnobotânica, conhecimento local, Entorno de Unidades de Conservação, mateiros.
vi
Abstract (Ethnobotanical knowledge of foresters residing at the surroundings of conservation units in the state of Rio de Janeiro). The present study proposes to investigate the local knowledge of foresters living at the surroundings of two conservation units in the state of Rio de Janeiro: Tinguá and Poço das Antas Biological Reserves. Informations about the use of plants were gathered from interviews with eight informants. For the surroundings of the Tinguá Biological Reserve (STBR) a total of 136 citations of use were found for 116 species, subordinated to 49 families. For the surroundings of the Poço das Antas Biological Reserve (SPABR) a total of 116 citations of use were found for 76 species subordinated to 30 botanical families. The families that presented the greatest richness at STBR were Leguminosae, Asteraceae, Myrtaceae, Bignoniaceae, Apocynaceae, Lauraceae and Anacardiaceae. For the SPABR the richest families in number of species were Leguminosae, Lauraceae, Bignoniaceae and Asteraceae. The medicinal use category was the most cited for STBR, most of these species being trees widely spread in the Atlantic Forest. Among these medicinal species the Jatobá (Hymenaea courbaril) obtaind the maximum relative importance index (RI), being the most versatile in relation to its medicinal uses. For SPABR, the categories fuel and construction were highlighted, many of these species being very common in the surroundings as well as the altered areas of the reserve. The Shannon index (H’) obtained for the areas was 2,02 for STBR and 1,85 for SPABR. The higher number of species cited by the STBR foresters can be correlated to a higher floristic richness of this region, generating a greater number of available resources. A significant difference between the knowledge of foresters from these studied areas was verified (X2 = 49,59; g.l = 7; p<0, 010), using the Qui-square (X2) test. This kind of study has become increasingly important in the Atlantic Forest domain, that although the history of devastation still present a great economical, ecological, cultural and social importance. These foresters, due to their great experience in the jungles of the studied region, can be considered true local experts. These social actors can be regarded as much more than local informers, being able to influence with their knowledge the administration of conservation units. Key words: Atlantic Forest, ethnobotany, local knowledge, Surroundings of Conservation Units, foresters.
vii
Agradecimentos Primeiramente a Deus, por me guiar nesse caminho de luz e paz, e por fazer da minha vida um eterno presente; À minha orientadora Dra Rejan, pela amizade e confiança e por todos os ensinamentos não só acadêmicos mais também de generosidade, humildade e paciência; Ao amigo Alexandre Gabriel Christo“Chicão”, pelo companheirismo, generosidade e pelas boas idéias que ajudaram a enriquecer nosso trabalho; À Escola Nacional de Botânica e, conseqüentemente, ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro, pela dedicação aos seus alunos de pós – graduação, por todo auxilio logístico e ao corpo de funcionários e de pesquisadores pelo apoio e entusiasmo. À Dra Ariane Luna Peixoto pela atenção e carinho ao ler a dissertação na disciplina seminários II e pelas importantes dicas para o trabalho; Aos pesquisadores e taxonomistas que me auxiliaram na valiosa identificação de material botânico, em sua maior parte em estado vegetativo, sem o qual o trabalho não poderia ter sido realizado com a acurácia desejada: Alexandre Quinet (Lauraceae), Adriana Lobão (Annonaceae), Marcelo de Souza (Myrtaceae), Ronaldo Marquete (Flacourtiaceae), Sebastião José da Silva Neto (Rubiaceae), Haroldo Cavalcante de Lima e Dra. Marli Pires Morim (Leguminosae), Dra. Ariane Luna Peixoto (Monnimiaceae), Dra. Elsie Frankling Guimarães (Boraginaceae e Piperaceae), Dr. José Fernando de A. Baumgratz (Melastomataceae), Claudine Massi Mynssen (Pteridófitas), Dra. Regina Helena Postch Andreata (Smilacaceae ); Ao Programa Mata Atlântica - PMA, e, por conseguinte à Petrobrás, pelos recursos alocados para o desenvolvimento da pesquisa. Agradeço também a ajuda dos bolsistas do PMA Leonardo Gnatalli e Rosenbergue da Silva na solução de alguns problemas relativos a informática e assuntos afins; À Curadoria do Herbário do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (RB) pela facilidade de acesso ao seu acervo, bem como pela qualidade do material consultado; À Márcia Aparecida Demby e Abílio Cardoso, ex-coordenadores do programa de pós-graduação da ENBT, por toda dedicação e auxilio, sempre preocupados com o bom andamento da dissertação; Ao irmão Bruno Rezende Silva, pela amizade, apoio e pelas meditações coletivas, que foram de fundamental importância para que a tranqüilidade e a paz sempre estivessem presente, fazendo com que tudo ocorresse da forma mais natural, sem estresse;
viii
Aos amigos de pós-graduação: Arno, Rodrigo, Maria, Daniele, Jack, Isabel, Marcelinho, Jerônimo, Rúbia e Inês, Ao Sr Cristiano Camerman por ter permitido que parte do estudo fosse realizado na RPPN (CEC) Tinguá, e a todos funcionários da RPPN, pela amizade e apoio; Aos professores de campo “mateiros”: Sr Walter, Sr Francisco, Sr Almir, Totonho, Adilson, Sr Antonio, Sr Durval e Sr Ismael, por todo apoio, paciência e ensinamento, sem vocês esse estudo não seria possível, valeu!!! Á minha família pelo apoio, amor e carinho; E finalmente, mas não menos importante e a todos meus irmãos e tios da Sahaja Yoga pela amizade e carinho e a Shri Mataji Nirmala Devi, por ter me ensinado o verdadeiro sentido da vida.
ix
Sumário 1. Introdução ...................................................................................................... 12 2. Síntese bibliográfica sobre conhecimento local............................................. 14 3. Área de estudo ............................................................................................... 17
3.1 - O município de Nova Iguaçu ............................................................ 17
3. 2 - A Reserva Biológica do Tinguá e seu entorno ................................ 18
3. 3 - O município de Silva Jardim ........................................................... 21
3.4 - A Reserva Biológica de Poço das Antas e seu entorno .................... 22 4. Métodos ......................................................................................................... 26
4.1 - Informantes locais “mateiros” .......................................................... 26
4.2 - Trabalho de campo ........................................................................... 27 5. Resultados e discussão ................................................................................... 30
5.1 - Entorno da Reserva Biológica do Tinguá ( ERBT ).......................... 30 5.2 - Entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas (ERBPA)............ 47
6. Comparação entre as áreas.............................................................................. 56 7. Conclusões ..................................................................................................... 62 8. .Referência bibliográficas ............................................................................. 64 Índice das tabelas; e figuras (mapas e gráficos ) Tabelas Tabela 1. Descrição das categorias de uso das espécies indicadas pelos mateiros nas áreas de estudo ................................................................................................
28
Tabela 2. Relação de espécies referenciadas como úteis nos entorno da Reserva Biológicas do Tinguá, Nova Iguaçu, RJ................................................................
35
x
Tabelas. continuação... Tabela 3. Categorias de doença associadas às espécies medicinais, citadas pelos informantes no ERBT, Nova Iguaçu, RJ, de acordo com a classificação da Organização Mundial de Saúde, porcentagem de espécie medicinais citada em cada categoria de doença e seus respectivos tratamentos segundo citações dos mateiros.................................................................................................................
44 Tabela 4. Índice de Importância Relativa (IR) das espécies indicadas como medicinais no entorno da Rebio do Tinguá, Nova Iguaçu,.. RJ............................
47
Tabela 5. Relação de espécies referentes como úteis no entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim, RJ....................................................
52
Tabela 6. Relação de espécies referentes como úteis comuns às duas áreas de estudo.....................................................................................................................
57
Tabela 7. Comparação de índices de diversidade em estudos realizados em comunidades situadas no domínio da Mata Atlântica e ecossistemas associados..............................................................................................................
61 Figuras Figura 1. Mapa de localização da Reserva Biologica do Tinguá, estado do Rio de Janeiro, Brasil, e municípios limítrofes, incluindo o bairro de Tinguá ............
24
Figura 2. Mapa de localização da Rebio de Poço das Antas. e da comunidade Gleba Aldeia Velha ...............................................................................................
25
Figura 3. Distribuição dos habitats das plantas citadas como úteis pelos mateiros moradores do ERBT, Nova Iguaçu RJ. ...........................................................................
31
Figura 4. Famílias que se destacaram quanto às suas riquezas específica no ERBT, Nova Iguaçu, Tinguá, RJ...........................................................................
33
Figura 5. Distribuição das formas de vida das espécies indicadas como úteis pelos mateiros moradores do ERBT, Nova Iguaçu, Tinguá, RJ...........................
33
Figura 6. Distribuição da porcentagem de espécies indicadas em cada categoria de uso, pelos mateiros moradores do ERBT, Nova Iguaçu, Tinguá, RJ................
34
Figura 7. Curva de esforço amostral relacionada às citações das espécies pelos mateiros moradores no ERBT, Nova Iguaçu, Tinguá, RJ.....................................
34
xi
Figuras. Continuação...
Figura 8. Distribuição das partes vegetais utilizadas para o preparo de remédios pelos mateiros do ERBT........................................................................................
42
Figura 9 - Distribuição dos habitats das plantas citadas como úteis pelos mateiros moradores do ERBPA, Silva Jardim, RJ................................................
47 Tabela 10 – Descrição das partes vegetais mais utilizadas pelos informantes.... 48 Figura 11. Famílias que se destacaram quanto às suas riquezas especificas no ERBPA, Silva Jardim, RJ......................................................................................
50
Figura 12. Distribuição das formas de vida das espécies indicadas como úteis pelos mateiros moradores no entorno da reserva Biológica de poço das Antas, Silva Jardim, RJ.........................................................................................................................
50
Figura 13. Distribuição da porcentagem de espécies indicadas em cada categoria de uso pelos mateiros moradores no entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim, RJ..........................................................................
51
Figura 14. Curva do esforço amostral relacionada às citações das espécies pelos mateiros moradores no Entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim, RJ.....................................................................................................
51
Figura 15. Distribuição do número de espécies indicadas em cada categoria de uso.nas duas áreas de estudo..................................................................................
59
Figura 16. Curva do esforço amostral relacionada às espécies citadas pelos mateiros no Entorno das Reservas Biológicas do Tinguá (ERBT) e de Poço das Antas (ERBPA).....................................................................................................
60 Anexos................................................................................................................... 72
12
1. INTRODUÇÃO
As formações florestais que compõem o Domínio Atlântico brasileiro têm sofrido
influência de antropização, que data desde a época da colonização até os dias atuais. A
despeito de sua descaracterização e fragmentação, elas possuem grande importância
ecológica, econômica, social e cultural, decorrentes de sua excepcional biodiversidade e
elevadas taxas de endemismo (Pavan-Fruehauf, 2000), razão pela qual é considerada o
quinto, dentre os 25 “hotspots” mais importantes do mundo, segundo Myes et al.
(2000).
A forte pressão antrópica que esses remanescentes vêm sofrendo tem levado à perda
de extensas áreas verdes, da cultura e das tradições das comunidades que habitam estas
áreas, as quais dependem muitas vezes de recursos do meio para sobreviver (Fonseca &
Sá 1997). Outro fator que contribuiu para a erosão dessa cultura local foi o modelo
excludente, adotado no Brasil, para a criação das unidades de conservação, para o qual,
essas populações, que habitavam dentro ou no entorno dessas áreas, constituíam uma
ameaça a sua integridade.
Atualmente, um novo paradigma vem surgindo, onde essas populações têm sido
vistas como atores sociais de grande importância, tanto na criação, como na manutenção
dessas áreas protegidas. Segundo Albuquerque (2002), os conhecimentos acumulados
pelas populações locais, constituem poderosa ferramenta dos quais, desenvolvimentistas
e conservacionistas podem se valer no planejamento e conservação.
Através do “saber local” podem surgir formas sustentáveis de utilização e,
conseqüente, conservação in situ dos recursos naturais existentes nessas florestas, o qual
corre o risco de se perder devido a fatores, tais como: falecimento ou doenças senis das
pessoas mais idosas que os detêm e, ao mesmo tempo, desinteresse ou até mesmo
empobrecimento de informações por parte dos indivíduos das camadas etárias mais jovens.
À perda do “saber local”, podem estar associados, também, fenômenos decorrentes da
urbanização, das migrações internas, da massificação imposta pelos veículos de
comunicação, da desvalorização do conhecimento dos mais velhos – estes dois últimos
mais relacionados aos jovens - que por sua vez, ocasionam a perda da identidade cultural.
13
Para Boerna & Koohafkan (2004) esse sistema de conhecimento é gerado pelas
práticas específicas da inter-relação entre esses atores com o ecossistema, incluindo sua
paisagem, água e recursos biológicos ocorrentes no mesmo. Esta relação esta legitimada,
regulada e orientada pelo direito de acesso aos recursos. Para proteger a existência desse
sistema de conhecimento e sua contínua evolução, primeiramente, temos que salvaguardar
a existência dessa específica relação entre o povo e seu ambiente. Essa relação é de crucial
importância para a sobrevivência desse sistema de conhecimento local e para o manejo
sustentável do ecossistema.
Na região do Domínio Atlântico, conhecedores locais - identificados em suas
regiões por seus elevados conhecimentos sobre trilhas, plantas e animais das áreas naturais
- designados como “mateiros” vêm desempenhando importante papel no auxilio para o
desenvolvimento de pesquisas científicas. Especialmente no âmbito do Programa Mata
Atlântica (PMA), do Instituto de Pesquisa Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ), há
dezoito anos, os raros mateiros encontrados nas regiões têm sido integrados à equipe
executora dos diferentes projetos em curso, em atendimento à missão de promover o
conhecimento das comunidades vegetais dos remanescentes de Mata Atlântica em diversas
Unidades de conservação (UC’s) do estado, entre elas: Reserva Ecológica de Macaé de
Cima, Estação Ecológica Estadual do Paraíso, Reserva Biológica de Poço das Antas,
Parque Nacional do Itatiaia e, mais recentemente, a Reserva Biológica do Tinguá.
De acordo com Rodrigues (1997) os estudos etnobotânicos têm sido de grande
importância, no resgate desses conhecimentos locais, principalmente, para áreas a serem
conservadas. Sua importância reside na constatação de que moradores locais conhecem,
profundamente, e, às vezes, de modo surpreendente ao universo acadêmico, os recursos
naturais disponíveis nessas áreas. Este conhecimento, denominado empírico, é
construído a partir de percepções e experimentações individuais, que acabam sendo
coletivizadas, decorrentes das necessidades de sobrevivência, pelas condições adversas
ao cotidiano do homem do campo. Os estudos etnobotânicos desenvolvidos sob o
Domínio Atlântico, são ainda poucos, muito recentes e corroboram sua relevância, a
exemplo de: Christo et al. 2006; Fonseca-Kruel et al. 2004; Medeiros et al. 2004;
Hanazaki et al. 2000; Rossato et al. 1999; Fonseca 1998; Figueiredo et al. 1993.
14
Partindo do princípio que não se pode conservar o que não se conhece, é de suma
importância o resgate do conhecimento das populações, que vivem no entorno de
Unidades de Conservação da Floresta Ombrófila Densa Atlântica, no estado do Rio de
Janeiro, pois esses estudos poderão servir como subsídios para melhor conhecermos o
potencial de uso dos recursos vegetais da floresta, e suportarmos, conceitualmente,
alternativas de manejo sustentado, além de destacar a importância desses agentes sociais,
como co-participes do processo de conservação não só da diversidade biológica como
igualmente das culturas locais.
Objetivando resgatar o conhecimento sobre a flora e uso dos recursos vegetais de
informantes locais, designados mateiros, elementos culturais raros à realidade do Brasil
sudeste, opta-se por explorar duas áreas de estudo, já previamente inventariadas pelo
Programa Mata Atlântica. Assim sendo, foram selecionadas, duas áreas de floresta
conservadas, adjacentes às Reservas Biológicas do Tinguá e Poço das Antas.
Sob esta ótica, busca-se reconhecer novos informantes, que detenham
conhecimento sobre a floresta e sobre os usos de seus componentes vegetais, bem como
agregar à interpretação ecológica e silvicultural, dados etnobotânicos como
instrumentos, de igual importância, à conservação e manejo de espécies vegetais típicas
à Floresta Ombrófila Densa Atlântica.
2. SÍNTESE BIBLIOGRÁFICA SOBRE CONHECIMENTO LOCAL
Atualmente diversos estudos sobre conservação e manejo sustentável (Wong 2000;
Pimpert, M. P & Pretty, J. N 2000; Sheil & Lawrence 2004; Donavan & Puri 2004; Boerna
& Koohafkan 2004; Albuquerque & Albuquerque 2005.), têm valorizado o conhecimento
local de populações diante do meio ambiente em que vivem.
A utilização do conhecimento local tem auxiliado projetos de conservação em
diversas linhas de investigação, quais sejam: quantificação da biodiversidade (Martins et al.
2001; Novotny et al. 2002 ), monitoramento de impacto ambiental (Basset et al. 2001),
15
manejo sustentável (Sheil et al. 2001), desenvolvimento de políticas para conservação (
Moef & Unep 2000), entre outras.
De acordo com Chaves (2002) o conhecimento local contribui na semantização do
território, se expressa nas práticas do dia a dia e é, por definição, heterogêneo. Segundo o
mesmo autor usualmente se confunde conhecimento local e tradição, e isto ocorre pelo
indiscutível fato de que dentro dos grupos que dependem em alto grau do ambiente natural,
o corpus central do conhecimento deriva do conhecimento acumulado, transmitido através
de várias gerações. Só que este conhecimento encontra-se profundamente misturado e em
meio ao processo de territorialização. A territorialização segundo o autor tem um sentido
dinâmico, onde a construção do espaço, a dotação do sentido do local que se habita toma
sua forma através das práticas cotidianas, não suprimindo também o valor dos processos
ocorridos no passado.
O conhecimento local é uma coleção de fatos e relaciona-se com todo o sistema de
conceitos, crenças e percepções que as populações têm sobre o mundo a sua volta. Isto
inclui a maneira como elas observam e mensuram o que os rodeia, de como resolvem seus
problemas, e validam novas informações. Inclui também os processos, através dos quais, o
conhecimento é gerado, armazenado, aplicado e transmitido aos outros. (FAO 2005).
O artigo 8 (J) da Convensão da Diversidade Biológica (CDB) reconhece a
importância das comunidades indígenas e locais na contribuição da conservação e do uso
sustentável da diversidade biológica. Assim diz o artigo:
“Cada Parte Contratante deve, na medida do possível e conforme
o caso:
(j) Em conformidade com sua legislação nacional, respeitar,
preservar e manter o conhecimento, inovações e práticas das
comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida
tradicionais relevantes à conservação e à utilização sustentável da
diversidade biológica e incentivar sua mais ampla aplicação com a
aprovação e a participação dos detentores desse conhecimento, inovações
e práticas; e encorajar a repartição eqüitativa dos benefícios oriundos da
utilização desse conhecimento, inovações e práticas”.
16
A importância desses saberes e as formas de manejo a eles pertinentes são
destacadas por Castro (2000) como de fundamental importância para intervir na crise
ecológica atual. Segundo a mesma autora, essa adaptação, a um meio ecológico complexo,
se deve ao acúmulo desses saberes sobre o território e às diferentes formas pelas quais o
trabalho é realizado, assim como também a complexidade dessa relação deve-se às
múltiplas formas de relacionamento com os recursos, muitas vezes com formas apropriadas
de manejo.
A característica chave do sistema de conhecimento local, segundo Boerna &
Koohafkan (2004), é que ele tem co-evoluído com o ambiente biofísico que o cerca, desde
o nível da paisagem até os recursos genéticos, incluindo outras associações sociais,
econômicas e culturais.
Pimpert & Pretty (2000), destacam a importância da utilização da diversidade: das
práticas locais de manejo dos recursos, complexas, flexíveis, não regulamentadas e de
longo termo, para o manejo de áreas protegidas, em substituição das técnicas atuais que são
impostas de cima para baixo, padronizadas, simplificadas, rígidas e de curto termo. Os
mesmos autores discorrem ainda:
“A descentralização do planejamento, implementação, manejo,
monitoramento e avaliação das áreas protegidas pelos comunitários e
grupos de baixa renda é uma fronteira que precisa ser explorada pelas
organizações conservacionistas modernas e pelos governos. Pessoas
dentro e ao redor de áreas protegidas deveriam não ser mais vistas como
simples informantes, mas sim como professores, ativistas, extensionistas e
avaliadores. Os especialistas locais abrangem guardas florestais,
veterinários, herbalistas, extrativistas, pastoralistas, pescadores etc... A
ênfase em especialistas locais e diferentes grupos de usuários dos
recursos permite que suas habilidades e conhecimentos dêem forma ás
prioridades administrativas das áreas protegidas .
O modelo emergente de proteção ambiental, e que se fortalece cada vez mais,
atribui um lugar fundamental à inserção e colaboração da população local, tanto na
concepção, quanto na implantação de áreas protegidas. Ele reconhece que as múltiplas
17
demandas sobre os recursos precisam ser satisfeitas e é favorável à formulação de planos de
uso dos recursos de maneira a permitir a satisfação das diferentes necessidades. Na prática,
já existem em alguns estados brasileiros e em outros países várias iniciativas que se
inscrevem neste modelo recente (Cribb 2005).
Algumas experiências vêm mostrando que o sucesso das ações de conservação de
um ecossistema em um espaço protegido depende da integração da população que habita o
entorno dessas áreas e da forma que essas pessoas se relacionam com a ambiente que os
cercam. Soares et al (2002) cita através de um estudo de caso a atuação positiva das
populações locais do entorno de UC’s em varias regiões do Brasil, na participação da
tomada de decisões tanto na manutenção dessas áreas como na construção de uma
economia ecológica.
Na região sob influência do Domínio Atlântico, muito se tem falado a respeito do
desenvolvimento sustentável, desde a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento - UNCED, celebrada no Rio de Janeiro em Junho de 1992.
Alguns projetos estão sendo desenvolvidos, a partir do envolvimento de Organizações não
Governamentais (ONGs), junto às populações locais que vivem no entorno de UC’s, porém
são ainda incipientes as políticas públicas que se propõem com vistas à consolidação da
sustentabilidade.
Torna-se cada vez mais necessário conhecermos melhor as relações entre a
manutenção da biodiversidade e a conservação da sociodiversidade, pois ambas são faces
de uma mesma moeda. Essas pessoas poderiam desempenhar um importante papel como
agentes multiplicadores para conscientização de atores sociais no entorno das UC’s.
3. ÁREA DE ESTUDO
3.1 - O MUNICÍPIO DE NOVA IGUAÇU.
O município de Nova Iguaçu situa-se na região geográfica denominada baixada
fluminense, na área metropolitana do Rio de Janeiro, o qual constitui seu maior município
(11,1% da Área Metropolitana) cuja coordenada central é 22º 45'33"S e 43º 27`04"W Gr.,
18
com população estimada em 830 mil habitantes (Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu
2006).
Sua cobertura florestal com remanescentes de Floresta Ombrófila Densa, constituída
por 19.973 ha, encontra-se reduzida a 38% de sua extensão original e integra o Corredor de
Biodiversidade da Serra do Mar (Corredores de Biodiversidade da Mata Atlântica 2006).
Segundo dados oficiais da Prefeitura Municipal de Nova Iguaçú (PMNI), 67% do
território do município foi transformado em área de preservação ambiental, dos quais fazem
parte unidades de conservação federais, estaduais e municipais. Destaca-se como a mais
relevante dentre todas as demais, em função de sua reconhecida importância para a
conservação da biodiversidade da porção do norte serrano da região de baixada, a Reserva
Biológica do Tinguá, unidade federal, subordinada ao IBAMA e cujos arredores
constituíram nossa área de interesse, para efeito de inventário das espécies vegetais e do
conhecimento dos moradores que auxiliam diversos pesquisadores que trabalham na região,
através de orientação pelas diversas trilhas de floresta, no desenvolvimento de diferentes
estudos ali implementados.
Um estudo detalhado sobre as transformações históricas da paisagem, os processos
de ocupação da região bem como o resgate das trilhas e coleções botânicas dos naturalistas
que por ali passaram no século XIX até os dias atuais pode ser encontrado em Custódio
(2007).
3.2 - A RESERVA BIOLÓGICA DO TINGUÁ E SEU ENTORNO.
A Reserva Biológica do Tinguá (Rebio) foi criada pelo Decreto Federal nº 97780 de
23 de maio de 1989. Localizada entre a Serra do Mar e a Baixada Fluminense, sua área
abrange os municípios de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, Miguel Pereira e Petrópolis
(coordenadas: 22º 28’ e 22º 39’S; 43º 13’ e 43º34’W) e possui uma área aproximada de
26.000 ha (Rodrigues 1996) (fig.1).
Segundo Vaz (1984), a serra do Tinguá, apesar da colonização a que foi submetida
no passado, constitui refúgio natural, cuja riqueza da flora e da fauna tornam-na uma das
mais importantes áreas de vida silvestre da região Centro-Sul do estado.
19
A vegetação da Reserva caracteriza-se como Floresta Ombrófila Densa, em suas
diferentes categorias: submontana, montana e alto-montana, além do Sistema dos Refúgios
Vegetacionais (Relíquias), segundo Veloso et al. (1991), também conhecidos como campos
de altitude. Este grande remanescente florestal, que recobre todo o Maciço do Tinguá,
torna-se de extrema relevância à medida que se encontra ilhado, face ao crescimento,
contínuo, dos municípios de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, Miguel Pereira e Petrópolis.
Estudos realizados por Lima (2002) na área da Rebio registraram a presença de
espécies arbóreas muito raras atualmente em áreas de Mata Atlântica destacando-se entre
elas: Manilkara salzmannii (maçaranduba), Myrocarpus frondosus (óleo-pardo ou
cabreuva), Aspidosperma ramiflorum (guatambu), Geissospermum laeve (pau-pereira),
Peltogyne angustiflora (pau-roxo), Teminalia januarensis (mirindiba), Ocotea odorifera
(canela-sassafrás), Apuleia leiocarpa (garapa), Copaifera lucens (óleo-copaíba), Pradosia
kuhlmannii (casca-doce), e entre estas a presença de uma reconhecida como ameaça de
extinção: Mezilaurus navalium (canela-tapinhoã).
Dentre as ameaças ambientais que ocorrem na Reserva podemos destacar a presença
de dutos de transporte de combustível que passam no seu interior, que tornam a área de alto
risco. Lima (2002).
A ocupação da área do entorno da Rebio do Tinguá caracteriza-se por uma
ocupação urbana onde se alternam espaços densamente urbanizados, com outros onde
predominam atividades rurais, além de malhas de loteamento, porém com baixa ocupação.
O estudo, ora apresentado, foi realizado no bairro de Tinguá, o qual se situa no
extremo nordeste do município de Nova Iguaçu, em áreas limítrofes à área da Reserva
Biológica do Tinguá. A vegetação local é caracterizada segundo Veloso et al. ( 1991) como
Floresta Ombrófila Densa Sub-montana.
Nesse bairro existe um grande número de fragmentos florestais, de diversos
tamanhos e diferentes níveis de degradação. Grande parte destes fragmentos está situada
em propriedades particulares, os quais, em sua maioria, são sítios de veraneio, onde os
proprietários passam os finais de semana. Existe apenas uma Reserva Particular do
Patrimônio Nacional (RPPN) nessa região do entorno denominada CEC Tinguá,
pertencente à organização não governamental (ONG): Centro de Assessoria ao Movimento
Popular (Campo).
20
Como atividades econômicas locais podem ser citadas: comércio, agricultura e
criação de animais, principalmente gado. Entre as espécies plantadas pelos habitantes locais
se inserem: mandioca (Manihot sculenta) e frutíferas como banana (Musa paradisíaca),
goiaba (Psidium guajava) e mamão (Carica papaya), além de oleaginosas, em geral.
Segundo comentário dos próprios agricultores, a maioria da produção é escoada para o
CEASA e, pequena parte, para o abastecimento local e de cidades vizinhas.
Essa região, por suas belezas naturais, atrai um grande número de visitantes nos
finais de semana, oriundos, principalmente, das demais cidades da baixada fluminense, em
busca das cachoeiras locais, únicas fontes de arrefecimento das elevadas temperaturas
típicas à região e áreas gratuitas de lazer, visto que as praias distam mais de uma hora e
meia de deslocamento.
Entre os principais problemas ambientais ocorrentes na região do entorno da
Reserva podemos destacar: (1) poluição dos mananciais hídricos, principalmente do rio
Tinguá, onde moradores despejam o esgoto de suas casas diretamente no rio; (2)
represamento dos locais para captação de água e utilização como piscinas naturais; e (3)
poluição das cachoeiras, devido ao lixo deixado pelos visitantes; (4) retirada de areia das
margens dos córregos e rios; (5) desmatamento para implantação de lavoura de mandioca,
banana, entre outras; (6) caça; (7) extração de palmito (Euterpe edulis); (8) contaminação
dos solos devido ao uso indiscriminado de agrotóxicos e (9) construção de residências nas
margens dos rios e córregos (Lima 2002).
Merece destaque o trabalho desempenhado pelas Organizações Não
Governamentais (ONG’S), tais como: Centro de Assessoria ao Movimento Popular
(Campo) e Centro Integrado de Educação Ambiental e Práticas Sustentáveis (Onda Verde)
que estão presentes na região desenvolvendo diversas atividades voltadas à conservação e
conscientização ambiental da população local.
A coleta de dados etnobotânicos ocorreu em fragmentos florestais presentes no
bairro, entre eles a RPPN Centro de Ecologia e Cidadania Tinguá (CEC Tinguá) que possui
uma área de 16,5 ha, além de coletas nos próprios quintais ou próximo às casas dos
informantes.
21
3.3 - O MUNICÍPIO DE SILVA JARDIM.
Localizado na parte central costeira do estado do Rio de Janeiro com coordenada
central de 22° 39’03”S lat, 42°23’30”W long, o município de Silva Jardim possui um
território com cerca de 1.000 km2 (Fundação CIDE, 2006). Sua cobertura florestal com
remanescentes de Mata Atlântica, constituída por 34.328 ha, encontra-se reduzida a 36% de
sua extensão original e também integra o Corredor de Biodiversidade da Serra do Mar
(Corredores de Biodiversidade da Mata Atlântica 2006).
Esse município possui o maior número de RPPN’s do Brasil. Devido ao elevado
grau de fragmentação dos remanescentes florestais da região do norte do estado, bem como
pela necessidade de áreas protegidas para assegurar a consolidação das populações
introduzidas do mico-leão-dourado, espécie ameaçada de extinção no Brasil, tem sido
levado ao longo dos últimos vinte anos, um intenso trabalho integrado entre Associação
Mico-leão-dourado (AMLD), World Wildlife Foundation (WWF) e o IBAMA,
representado pelas chefias das Reservas Biológicas de Poço das Antas e União. Este
esforço de esclarecimento dos proprietários rurais sobre a importância dos fragmentos para
suportar as populações de mico-leão-dourado (Leontopithecus rosalia), associado aos
benefícios financeiros oriundos desta prática de tombamento regulado da floresta, tem sido
responsável pelo sucesso deste modelo de RPPNs na região. Concorre ainda para este êxito,
os benefícios oriundos dos royaltes de petróleo a que fazem juz os municípios da região, o
que favorece a melhoria da qualidade de vida das cidades, aumentando o fluxo de visitantes
e potencializando a criação de estabelecimentos como pousadas e pequenos hotéis e que
têm nas RPPNs uma oportunidade de negócios.
Localizada neste município, a Reserva Biológica de Poço das Antas (Rebio),
subordinada ao IBAMA, foi criada para assegurar a sobrevivência do mico-leão-dourado e
de uma amostra de seu habitat - espécie de primata que só existe em sete municípios da
região dos Lagos fluminense e em nenhuma outra parte do mundo. (AMLD, 2006).
22
3.4 - A RESERVA BIOLÓGICA DE POÇO DAS ANTAS E SEU ENTORNO.
A Reserva Biológica de Poço das Antas (22º30’ e 22º33’S e 42º19’W) está situada
no município de Silva Jardim, a 130 km da capital do estado, com área de 5.000 ha,
limítrofes ao município de Casimiro de Abreu (IBAMA 2006).
Nos tempos anteriores à criação da Reserva, a área abrigava diversas fazendas de
gado, onde havia algumas culturas de subsistência, pomares, pastos e remanescentes
florestais.
Deste modo, a cobertura da Rebio segundo Lima et al. 2006, adotando o sistema de
classificação fisionômico-ecológico proposto por Veloso & Goes-Filho (1982), é
representada por um trecho de Floresta Ombrófila Densa subdividida em seis formações
obedecendo a uma hierarquia topográfica e fisionômica: Floresta aluvial, floresta
submontana, formação pioneira com influência fluvial, capoeira aluvial, capoeira
submontana e campo antrópico.
A estrada de ferro que corta o interior da unidade e a existência da barragem de
Juturnaiba afetam muito a Unidade. A barragem alagou terras da unidade a montante e
promoveu uma radical drenagem a jusante, ocasionando a modificação de parte do
ecossistema, que era de matas inundáveis (área de cerca de 900 ha), onde hoje ocorrem os
grandes incêndios da Reserva, aumentando a pressão antrópica sobre ela (IBAMA 2006).
Existem três assentamentos situados no entorno da ReBio, são eles: Gleba Aldeia
Velha (GAV) com cerca de 20 anos e Cambucaes (CAM) com aproximadamente 10 anos,
mais recentemente estabeleceu-se uma nova ocupação do Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra denominado assentamento Sebastião Lan (SEB).
Os habitantes destas comunidades subsistem da agricultura através do cultivo da
banana (Musa paradisiaca), inhame (Dioscorea sp), milho (Zea mays) mandioca (Manihot
sculenta), entre outros além da criação de animais como o gado, para corte e leite, os
produtos são vendidos em feiras na própria região.
As comunidades rurais habitantes de GAV e CAM são formadas por antigos
trabalhadores das fazendas locais e por seus descendentes, já em SEB residem moradores
que migraram das áreas canavieiras, principalmente da região norte fluminense (Christo et
al. 2006).
23
Segundo os mesmos autores, dentre às três comunidades a GAV é a que apresenta
uma maior relação com a Reserva, tendo inclusive alguns moradores que trabalham na
Rebio, muitos dos quais residem na região há mais tempo que aqueles das demais
comunidades e, por conseguinte, detendo maior parcela do conhecimento histórico da
região.
A coleta dos dados etnobotânicos ocorreu em um trecho de floresta pertencente à
Fazenda Santa Helena, localizada no distrito de Peclas, município de Silva Jardim, área
adjacente à Reserva Biológica de Poço das Antas e também nos próprios quintais dos
informantes, todos moradores da Gleba Aldeia Velha.
24
Figura 1 - Mapa de localização da Reserva Biológica do Tinguá, Estado do Rio de Janeiro, Brasil, e municípios limítrofes, incluindo o bairro de Tinguá. Fonte: Programa Mata Atlântica / JBRJ (modificado)
25
Figura 2 – Mapa de localização da ReBio de Poço das Antas e da comunidade Gleba Aldeia Velha (GAV). Fonte: Programa Mata Atlântica / JBRJ (modificado)
26
4. MÉTODOS
4.1 - INFORMANTES LOCAIS “MATEIROS”
O público alvo, “informantes chaves” do levantamento etnobotânico foi formado
por mateiros, habitantes nas circunvizinhanças das Reservas Biológicas do Tinguá (ERBT)
e de Poço das Antas (ERBPA).
Mateiros de acordo com a definição do dicionário da língua portuguesa (Houaiss
2001) são indivíduos que, por sua grande vivência em matas cerradas, trabalham como guia
para outras pessoas. Muitas vezes estas pessoas devido à grande vivência em campo,
passam a ser verdadeiros especialistas locais, se destacando quanto ao conhecimento da
biodiversidade regional.
Segundo Sheil & Laurence (2004), especialistas locais podem ser treinados para
serem efetivos parataxonomistas, desempenhando importantes papeis na documentação e
avaliação da biodiversidade tropical além de auxiliarem na administração dos recursos
naturais e na conservação.
No contexto internacional, o termo parataxonomista é definido por Janzen (2004)
como pessoas locais, vivendo em áreas relativamente rurais dos trópicos, e que tenham sido
treinados, especificamente, para atividades parataxonomistas. Dentre essas atividades
podemos citar inventários da biodiversidade e valoração, pesquisas ecológicas, plano de
conservação, manejo e monitoramento biológico.
Entre os mateiros escolhidos alguns já eram conhecidos, pois já vinham auxiliando,
nos últimos dezoito anos, o Programa Mata Atlântica do Instituto de Pesquisa Jardim
Botânico do Rio de Janeiro. Outros, por sua vez, também possuíam grande experiência de
campo decorrente do acompanhamento, durante muitos anos, a pesquisadores de outras
instituições públicas do estado do Rio de Janeiro como por exemplo a Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro, em seus projetos científicos.
Para seleção dos informantes, nos respectivos locais de estudo, foram realizadas
entrevistas informais e semi-estruturadas (Alexiades 1996), onde os informantes foram
entrevistados individualmente, e as conversas eram anotadas e às vezes gravadas. Alguns
27
foram escolhidos a partir da técnica conhecida como “bola de neve” (Snow ball), onde os
próprios informantes indicaram outras pessoas, as quais após entrevista informal, foram
acrescidos ao elenco de informantes para o trabalho (Bernard 1986).
Foram intrevistados oito informantes, sendo três residentes no entorno da Reserva
Biológica do Tinguá (ERBT), mais especificamente no bairro do Tinguá e cinco residentes
no entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas (ERBPA), mais precisamente na
localidade Gleba Aldeia Velha. Eles tinham idades entre 40 e 80 anos, todos do sexo
masculino.
4.2 - TRABALHO DE CAMPO
Os dados sobre as espécies úteis foram coletadas em excursões mensais, no período
de junho de 2005 a outubro de 2006, destinando-se os primeiros meses para a escolha das
áreas de estudo e seleção dos informantes.
Para tanto, a coleta de dados sobre a utilidade das espécies contou com entrevistas
abertas (Alexiades 1996) e caminhadas livres (walk-in-the-wood) (Phillips & Gentry 1993),
onde todas as espécies, reconhecidas como úteis, eram registradas através da técnica de
observação direta e listagem livre (Cotton 1996).
Para se verificar a suficiência amostral nas duas áreas estudadas, foi calculada a
curva de esforço amostral a partir do programa EXCELL.
As informações de cada espécie foram catalogadas através de fichas onde
constavam os seguintes dados: local de coleta, nome científico, família botânica, nome
local, hábitat, forma de vida, atribuições de uso(s), parte utilizada, forma de preparo, grupo
de afecções tratadas (quando espécie identificada como medicinal), nome do informante e
nome do coletor.
O material botânico coletado foi herborizado segundo os métodos usuais em
botânica, enquanto a identificação taxonômica do material foi feita valendo-se de
bibliografia especializada, bem como, através de comparação com exsicatas do herbário
do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (RB) e submetidas, quando necessário, aos
28
especialistas nos grupos taxonômicos complexos. O material botânico testemunho
encontra-se depositado no Herbário do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de
Janeiro (RB).
O sistema de classificação adotado foi o de Cronquist (1988) sendo Leguminosae
considerada como família única, adotando-se Polhill et al. (1981). A atualização
nomenclatural foi conferida através das bases de dados W3 Tropicos (Missouri Botanical
Garden's VAST -Vascular Tropicos) e IPNI (The International Plants Names Index).
As categorias de uso para as espécies úteis foram adaptadas e padronizadas de
acordo com o proposto por Rios (2002) totalizando nove tipos de usos: alimentação,
combustível, construção, medicinal, ornamental, ritualística, tecnologia, recurso para fauna
e veterinária.(Tabela 2).
Tabela 1. Descrição das categorias de uso das espécies indicadas pelos mateiros nas áreas de estudo. Alimentação
Utilizadas como alimentação Combustível
Utilizadas como combustível para fogões a lenha Construção
Construção de casas, ranchos (caibros, dormentes e ripas de telhado) e esteio para cerca. Medicinal
Utilizadas para curar e aliviar enfermidades. Ritualística
Plantas com efeito "mágico", utilizadas para tirar "mau olhado" e "abrir caminho". Recurso para fauna
Utilizadas como alimento pela fauna silvestre. Tecnologia
Construção de móveis, janelas, ferramentas, assoalho, etc. Ornamental
Plantas utilizadas para adornar quintais e residências.
Veterinária Utilizado para infestação de pulgas e carrapatos.
29
Os dados coligidos em campo e laboratório foram organizados numa matriz,
utilizando planilha EXCELL, contendo os seguintes campos: família botânica, nome
científico, nome popular, hábito, habitat, indicações de uso, coletor, número de coleta e
nome do informante.
As espécies indicadas para fins medicinais, tiveram anotadas suas indicações
terapêuticas, formas de uso, partes da planta utilizada, modo de preparo e dosagem.
Com o intuito de se comparar esse estudo com outros similares, desenvolvidos sobre
a região de influencia da Mata Atlântica, foi calculado, para as duas áreas, o Índice de
diversidade de Shannon (Magurran 1988), adaptado por Begossi (1996), para quem seu
emprego permite comparar o uso de plantas diferentes em ambientes distintos.
∑=
−=S
i
pipiH1
))(log(', nas bases 10 e e,
e N
nipi =
, onde:
s = número de espécies; ni = número de citações por espécie e N = número total de citações.
Devido ao elevado número plantas medicinais citadas pelos informantes, moradores
no entorno da Rebio do Tinguá (ERBT), as indicações das mesmas foram padronizadas e
adaptadas a partir da classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de acordo
com Almeida & Albuquerque (2002) e agrupadas nas seguintes categorias: (a) doenças
infecciosas e parasitárias, (b) doenças das glândulas endócrinas, da nutrição e do
metabolismo, (c) doenças do sangue e dos órgãos hematopoéticos, (d) transtornos do
sistema nervoso, (e) transtornos do sistema circulatório, (f) transtornos do sistema
respiratório, (g) transtornos do sistema digestivo, (h) transtornos do sistema genito-urinário,
(i) doenças da pele e do tecido celular sub-cutâneo, j) doenças do sistema osteomuscular e
do tecido conjuntivo, (k) afecções e dores não definidas, (l) inapetência sexual e (m)
debilidade física e mental. Em seguida foi calculado o Índice de Importância Relativa
30
(Bennett & Prance 2000) dessas espécies, onde o valor máximo alcançado por uma espécie
corresponde a 2,00 e é obtido através da fórmula:
NPNSCIR += , onde:
IR = índice de importância relativa; NSC = corresponde ao número de sistemas
corporais tratados, por uma determinada espécie (NSCE), dividido pelo número total de
sistemas corporais tratados pela espécie mais versátil (NSCEV); NP = corresponde ao
número de propriedades atribuídas a uma determinada espécie (NPE) dividido pelo número
total de propriedades atribuídas à espécie mais versátil (NPEV).
5 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
5.1 - ENTORNO DA RESERVA BIOLÓGICA DO TINGUÁ ( ERBT )
Das entrevistas com os informantes, totalizaram-se 136 citações de uso para as
plantas, sendo reconhecidas 116 espécies, das quais 13 em morfoespécies, pertencentes a
49 famílias (Tab. 2). As famílias mais representativas quanto ao número de espécies foram
Leguminosae (13 espécies), Asteraceae (12 espécies), Myrtaceae (5 espécies) e
Bignoniaceae, Apocynaceae Lauraceae e Anacardiaceae com 4 espécies cada. (fig 4).
A forma de vida predominante entre as plantas úteis foi a arbórea, representada por
69 espécies do total de espécies encontradas para a área de estudo, seguido por herbácea,
representada por 27 espécies. (Fig. 5).
As partes das plantas mais citadas foram: folha (32%), seguida por caule (20%),
fruto (19%), casca (11%), planta inteira (6,5%), raiz (4,3 %), seiva (3,6 %) e palmito
(1,4%).
Podemos observar, nesse estudo, a prática dos mateiros relacionada ao
reconhecimento e utilidade das espécies arbóreas nativas na região do (ERBT), Dentre
todas as plantas citadas como úteis, a maioria (58,6%) (Fig 3) é composta por plantas
nativas provenientes de remanescentes de florestas, sendo encontradas nas bordas ou
31
interior de fragmentos florestais estudados. Muitas dessas espécies foram registradas nos
levantamentos florísticos dentro da ReBio por Lima ( 2002 ), dentre elas podemos citar:
Apuleia leiocarpa (garapa), Cedrella odorata (cedro), Copaífera langsdorffii (copaíba),
Copaifera trapezifolia (copaíba-verdadeira), Cybistax antisyphilitica (ipê-cinco-folhas),
Geissospermum vellosii (pau-pereira), Hymenaea courbaril (jatobá), Malouetia arborea
(esperta-roxa), Myrocarpus frondosus (óleo pardo), Stifftia chrysantha (candeia, rabo-de-
cutia).
Figura 3 - Distribuição dos habitats das plantas citadas como úteis pelos
mateiros moradores do ERBT, Nova Iguaçu RJ.
As espécies espontâneas (20,7 %), se caracterizam por plantas que crescem em
diversos tipos de ambientes como beira de estradas, em gramados, beira de córregos, pastos
abandonados entre outros, sendo na grande maioria plantas herbáceas e arbustivas
utilizadas para fins medicinais. Já as plantas cultivadas em quintais (20,7 %) são formadas
por plantas herbáceas, sendo a grande maioria, para fins medicinais e por árvores frutíferas
que são utilizadas tanto para a alimentação como para fins medicinais.
As plantas foram agrupadas em oito categorias, segundo a sua utilização, sendo a
categoria medicinal a que apresentou o mais elevado nível de táxons (52 % das espécies),
seguido da categoria construção (13%) e alimentício (12 %) (Fig. 6). De todas as espécies
arbóreas encontradas no estudo, 49% apresentaram alguma propriedade medicinal.
O índice de Shannon (H’) obtido a partir das entrevistas com os mateiros habitantes
no ERBT foi de 2,02 (base 10) e 4,65 (base e) e assemelham-se aos valores encontrados por
32
outros autores, ainda que não tenham trabalhado com especialistas locais, mas sim com
uma amostra superior ao que identificamos como especialistas locais (Figueiredo et al.
1993, 1997; Hanazaki et al. 2000a, b; Lima et al. 2000; Fonseca-Kruel et al. 2004; Christo
et al. 2006).
Ao observarmos a curva do esforço amostral, relacionada às citações das espécies
para o ERBT, percebe-se que a curva não tendeu a se estabilizar, provavelmente, o que
denota que provavelmente um aumento no esforço amostral para a área irá acarretar num
aumento da riqueza observada (Fig. 7).
Para Pimpert & Pretty ( 2000), pessoas, dentro e ao redor de áreas protegidas,
deveriam não ser mais vistas como simples informantes, mas sim como professores,
ativistas, extensionistas e avaliadores. A ênfase em especialistas locais e diferentes grupos
de usuários dos recursos permitem que suas habilidades e conhecimentos dêem forma às
prioridades administrativas das áreas protegidas A descentralização do planejamento,
implementação, manejo, monitoramento e avaliação das áreas protegidas pelos
comunitários e grupos de baixa renda é uma fronteira que precisa ser explorada pelas
organizações conservacionistas modernas e pelos governos.
Algumas espécies pertencentes ao mesmo gênero botânico Copaifera trapezifolia
(copaíba verdadeira), Copaífera langsdorffii (copaíba), e Virola gardineri (Bicuiba
verdadeira), Virola oleifera (Bicuiba), são reconhecidos pelos mateiros pela sua
proximidade botânica ao nível de morfoespécies, sendo diferenciadas em verdadeira e não
verdadeira, devido a diferenças entre o crescimento das árvores, onde a verdadeira tem um
crescimento mais lento e como conseqüência, a madeira é de melhor qualidade para
utilização nas categorias de construção e tecnologia. Outra diferença reconhecida pelos
mateiros quanto à diferenciação dessas morfoespécies está relacionada à categoria
medicinal, pois para eles, a planta conhecida como verdadeira, possui seiva de melhor
qualidade para o tratamento de enfermidades.
A região do ERBT se destacou quanto ao uso dos recursos para fins medicinais,
dentre as quais podemos destacar espécies arbóreas típicas da Mata Atlântica: Hymenaea
courbaril (jatobá), Copaífera langsdorffii (copaiba), Copaifera trapezifolia (copaíba
verdadeira), Geissospermum vellosei (pau-pereira), Virola gardineri (bicuiba-verdadeira),
Virola oleifera (bicuiba), entre outras.
33
3
3
3
3
3
4
4
4
4
5
12
13
0 5 10 15
Annonaceae
Lamiaceae
Moraceae
Poaceae
Rutaceae
Anacardiaceae
Apocynaceae
Bignoniaceae
Lauraceae
Myrtaceae
Asteraceae
Leguminosae
fam
ília
s
número de espécies
Figura 4. Famílias que se destacaram quanto às suas riquezas específica no ERBT, Nova Iguaçu, RJ.
5
15
27
69
0 20 40 60 80
trepadeira
arbusto
herbácea
árvore
há
bit
o
número de espécies
Figura 5. Distribuição das formas de vida das espécies indicadas como úteis pelos mateiros moradores do ERBT, Nova Iguaçu, RJ.
34
Figura 6. Distribuição da porcentagem de espécies indicadas em cada categoria de uso, pelos mateiros moradores do ERBT, Nova Iguaçu, RJ.
Figura 7. Curva de esforço amostral relacionada às citações das espécies pelos mateiros moradores no ERBT, Nova Iguaçu, RJ.
0
15
30
45
60
75
90
105
120
10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130 140
número de citações
nú
me
ro d
e e
sp
éc
ies
1
2
3
5
11
12
13
52
0 10 20 30 40 50 60
veterinário
ritualistico
rec.fauna
tecnologia
combustível
alimentício
construção
medicinal
ca
t. u
so
porcentagem de espécies (%)
35
Tabela 2. Relação de espécies referidas como úteis pelos mateiros moradores no Entorno da Reserva Biológica do Tinguá (ENBT), Nova Iguaçu, RJ. Família/ espécie Nome local Hab Hat Uso Pu Nc ALISMATACEAE
Echinodorus grandiflorus (Cham. & Schltdl.) Micheli
chapeu-de-couro herb cult med fo FAS53
AMARANTHACEAE Amaranthus viridis L. caruru/amarantu herb esp alim fo FAS61
ANACARDIACEAE Astronium graveolens Jacq. aderne arv nat cons ca FAS77 Anacardium occidentale L. cajú arv cult med cas FAS46 Schinus terebenthifolia Raddi aroeirinha arv nat med cas FAS19 Spondias lutea Eng. caja-manga arv cult med fr -
ANNONACEAE Annona muricata L. graviola arv cult alim, med fo,fr FAS67 Guatteria candolleana Schltdl. conde arv nat comb, cons, rec ca,fr FAS82 Xylopia brasiliensis Spreng. pindaíba arv nat comb, rec ca,se FAS81
APOCYNACEAE Geissospermum vellosii Allemão pau-pereira arv nat med cas FAS88 Himatanthus sp1 aguniada arv nat med fo FAS87 Malouetia arborea
(Vell.) Miers esperta roxa arv nat
comb ca
FAS89 Peschiera affinis (Müll. Arg.) Miers esperta arv nat comb ca -
ARECACEAE Astrocaryum aculeatissimum
(Schott) Burret iri arv nat
alim, cons fr,pa
- Euterpe edulis Mart. juçara arv nat alim, cons pa -
ASTERACEAE Ageratum conyzoides L. erva-de-são-joão herb esp med int FAS60 Baccharis trimera (Less.) DC. carqueja herb cult med fo -
36
Tabela 2. Continuação. Família/ espécie Nome local Hab. Hat Uso Pu Nc ASTERACEAE
Bidens pilosa (L.) picão herb esp med ra FAS02 Emilia sonchifolia (L.)DC. pincel-de-estudante herb esp med fo FAS01 Solidago chilensis Meyen. arnica/cruzadinha herb esp med fo FAS15 Stifftia chrysantha Mikan. candeia/rabo-de-cutia arv nat cons ca FAS23 Stifftia sp1 candeia/rabo-de-cutia arv nat comb, cons ca FAS83 Taraxacum officinale L. dente-de-leão herb esp med fo - Vernona sp1 assa-peixe arb esp med fo FAS03 Vernonia discolor (Spreng.) Less. cambará arv nat comb, cons ca FAS84 Vernonia polyanthes Less. assa peixe preto arb esp med fo FAS66
BIGNONIACEAE Cybistax antisyphilitica (Mart.) Mart. cinco-folhas/ipê arv nat comb ca FAS74 Jacaranda macrantha Cham. caróba arv nat med ca,fo FAS72 Jacaranda semiserrata Cham. caróba arv nat med ca,fo FAS06 Sparattosperma leucantum Mart. ex Meisn
cinco-folhas/ipê-branco arv nat comb ca FAS73
BIXACEAE Bixa orellana L. urucum arb cult alim, med se FAS11
BORAGINACEAE Symphytum officinale L. confrei herb cult med fo -
BRASSICACEAE Nasturtium officinale R. Br. agrião herb cult med fo -
CAPRIFOLIACEAE Sambucus nigra L. sabugueiro arv cult med fo,fr FAS65
CARICACEAE Jacaratia spinosa (Aubl.) A. DC. mamão-jacatiá arv nat med fr FAS63
CECROPIACEAE Cecropia glaziovi Snethl. embaúba arv nat med fo,ra FAS54
37
Tabela 2. Continuação Família/ espécie Nome local Hab. Hat Uso Pu Nc CURCUBITACEAE
Momordica charantia L. melão-de-são-caetano trep esp med int FAS59 CRASSULACAEA
Kalanchoe brasiliensis Cambess. saião herb cult med fo FAS41 EUPHORBIACEAE
Joannesia princeps Vell. cotieira arv nat med se - Phyllanthus corcovadensis Müll. Arg. quebra-pedra herb esp med int FAS56 Ricinus communis L. mamona arb esp med se FAS38
HIPPOCRATEACEAE Tontelea ovalifolia (Miers) A.C. Sm. castanha-mineira trep nat med fr FAS34
LACISTEMATACEAE Lacistema pubescens Mart. sabonete arv nat comb ca -
LAMIACEAE Leonorus sibiricus L. macaé herb esp med fo FAS04 Leonotis nepetifolia (L.) R. Br. cordão-de-frade herb esp med int FAS52 Ocimum gratissimum L. alfavaca arb cult alim, med fo FAS14 Stachytarpheta canescens Kurth gervão-roxo herb esp med fo,fr FAS10
LAURACEAE Aiouea saligna Meisn. canela-parda arv nat cons ca FAS80 Mezilaurus navalium Taub.
Ex mez
tapinuã arv nat cons, tecn ca FAS26
Ocotea odorifera (Vellozo) Rohwer sassafraz arv nat med cas,ra FAS44 Persea americana Mill. abacate arv cult alim, med fo,fr FAS68
LECYTHIDACEAE
Cariniana sp1 jequitiba arv nat cons, med cas,ca - Lecythis pisonis Cambess. sapucaia arv nat alim, cons, med fr FAS75
38
Tabela 2. Continuação. Família/ espécie Nome local Hab. Hat Uso Pu Nc LEGUMINOSAE
Apuleia leiocarpa (Vogel) J.F. Macbr.
garapa/pau-de-preguiça arv nat comb, cons, tecn ca -
Bauhinia forficata Link pata-de-vaca arv nat med fo FAS64 Bauhinia radiata Vell. pata-de-vaca trep nat med fo FAS05 Copaífera langsdorffii Desf. copaíba arv nat med, tecn sei FAS25 Copaifera trapezifolia Haine copaíba-verdadeira arv nat med, tecn sei FAS27 Dahlstedtia pinnata (Benth.) Malme timbó arv nat vet int FAS70 Hymenaea courbaril L jatobá arv nat alim, med cas,fr,sei FAS24 Inga edulis Mart. ingá arv nat alim fr Inga subnuda subsp. luschnathiana
(Benth.) T.D. Penn. ingá-de-varzea arv nat alim, comb ca,fr FAS20
Mimosa pudica L. dormideira/sensitiva herb esp med fo FAS12 Myrocarpus frondosus Allemão óleo-pardo arv nat cons ca FAS93 Piptadenia gonoacantha (Mart.)
J.F. Macbr. jacaré arv nat comb ca FAS92
Pseudopiptadenia contorta (DC.) G.P. Lewis & M.P. Lima
angico-cambui arv nat comb ca FAS91
MALVACEAE Gossypium hirsutum L. algodão arb cult med fo FAS57
MELASTOMATACEAE Miconia cinnamomifolia (DC.)
Naudin
jacatirão arv nat cons ca FAS90
MELIACEAE Cabralea canjerana (Vell.) Mart. canjerana arv nat cons, tecn ca FAS76 Cedrella odorata L. cedro arv nat cons, med FAS37
MONIMIACEAE Siparuna guianensis Aubl. negramina arv nat rit ca,cas FAS85
39
Tabela 2. Continuação. Família/ espécie Nome local Hab. Hat Uso Pu Nc MORACEAE
Artacarpus altilis (Parkinson) Fosberg fruta-pão arv cult alim fr - Morus alba L amora arv cult alim, med fo,fr - Sorocea bonplandii (Baill.) W.C.
Burger, Lanj. & Wess. Boer espinheira-santa arv nat med fo FAS32
MYRISTICACEAE Virola gardneri (A. DC.) Warb. bicuiba-verdadeira arv nat cons, med ca,sei FAS28 Virola oleifera (Schott) A.C. Sm bicuiba arv nat med sei -
MYRTACEAE Eugenia uniflora L. pitanga arb cult med fo FAS43 Psidium guajava L. goiabeira arv cult med fo FAS40 Psidium guineense Sw. araça arv nat alim fr FAS79 Psidium sp. araça arb nat alim fr FAS69 Eugenia tomentulosa Standl cabeludinha arb nat alim fr FAS18
NYCTAGINACEAE Guapira opposita (Vell.) Reitz cebola arv nat rec fr - Mirabilis jalapa L. maravilha herb esp med fo,fl,fr FAS58
OXALIDACEAE Averrhoa carambola L. carambola arv cult med fo,fr FAS45
PHYTOLACACEAE Gallesia integrifolia (Spreng.) Harms pau-d'alho arv nat vet cas,fo FAS39
PIPERACEAE Piper anisum (Spreng.) Angely jaborandi arb nat med ra,fo FAS36 Piper aduncum L. jaborandi-falso herb esp med fo,fl FAS51
POACEAE Cymbopogon citratus (DC.) Stapf capim-limão herb cult med fo FAS16 Cynoddon dactylon (L.) pers. pé-de-galinha herb esp med int FAS49 Zea mays L.
milho arb cult med fr -
40
Tabela 2. Continuação Família/ espécie Nome local Hab. Hat Uso Pu Nc POLIGONACEAE
Poligonum persicaria L. erva-de-bicho herb esp med int FAS55 Rumex obtusifolius L. erva-grossa herb esp med fo FAS48
PROTEACEAE Roupala sculpta L carne-de-vaca arv nat cons, tecn ca FAS94
PTERIDACEAE Adiantum sp samambaia herb esp med, tox int FAS50
PUNICACEAE Punica granatum L. romã arb cult med fr FAS42
RUBIACEAE Genipa americana L. genipapo arv nat med cas,fr FAS17
RUTACEAE Hortia arborea Engl. casca-d'anta/para-tudo arv nat med cas FAS21 Citrus sp1 limão-galego arv cult alim, med fr - Zanthoxylum rhoifolium Lam. mamica-de-porca arv nat cons ca FAS78
SAPINDACEAE Cupania oblongifolia Mart. bilreira/camboatá arv nat comb, med, tecn, rec cas,fo FAS08 Cupania racemosa (Vell.) Radlk camboata arv nat comb, rec cau,fr -
SAPOTACEAE Pradosia kuhlmannii Toledo casca-doce arv nat med cas FAS35
SCHIZAEACEAE Lygodium volubile Sw. abre-caminho trep nat rit int FAS22
SMILACACEAE Smilax sp1 salsa-parrilha arb nat med ra FAS29 Smilax sp2 unha-de-gato trep nat med fo FAS71
SOLANACEAE Solanum americanum Mill. erva-moura herb esp med fo FAS62 Solanum paniculatum L.
jurubeba arb esp med fr FAS47
41
Tabela 2. Continuação Família/ espécie Nome local Hab. Hat Uso Pu Nc VERBENACEAE
Lantana camara L. cambará/erva-chumbinho herb esp med fo FAS07 Lippia alba (Mill) erva-cidreira arb cult med fo FAS13
ZINGIBERACEAE Costus spiralis (Jacq.) Roscoe cana-do-brejo herb cult med ca,fo -
INDETERMINADA Indet sp1 canela-de-cutia arv nat med cas,ra FAS33 Indet sp2 catuaba arv nat med cas - Indet sp3 catuaba-lisa arv nat med cas,fo,ra FAS30 Indet sp4 guiné-pipiu arv nat rit fo FAS31 Indet sp5 piquia arv nat tec ca FAS86
Hab - hábito: arb - arbusto; arv - arbóreo; herb - herbáceo; .Hat - habitat: cult - cultivada nos quintais; nat -nativa; Uso: ali - alimentar; comb -combustível; const -construção; med -medicinal; ornamental – orn; tecn – tecnologia; Pu: parte usada: ca – caule; cas – casca; fo – folha; fr: fruto; fl – flor; int - planta inteira; ; pa – palmito; ra - raiz ; se – semente; sei – seiva; N.c: Número de coleta: FAS - Sobrinho, F. A.
42
As famílias que apresentaram o maior número de espécies com propriedades
medicinais foram Asteraceae ( 8 spp.), Leguminosae (5 spp.) e Poaceae (3spp.). Outros
autores estudando as plantas medicinais em região sob Domínio Atlântico (Christo et al
2006, Fonseca-Kruel et al 2004 e Medeiros et al 2004) também encontraram a família
Asteraceae como a mais rica em relação ao número de espécies com propriedades
medicinais.
Todas as partes vegetais foram indicadas pelos mateiros para o preparo de remédios
sendo que as mais citadas foram: folhas (46,6%), fruto (14,8 %) e casca (13,6 9%) (Fig. 8).
3,4
5,7
8,0
8,0
13,6
14,8
46,6
0 10 20 30 40 50
semente
seiva
raiz
inteira
casca
fruto
folha
part
e u
sad
a
porcentagem (%)
Figura 8 - Distribuição das partes vegetais utilizadas para o
preparo de remédios pelos mateiros do ERBT.
Ao serem padronizadas e adaptadas, a partir da classificação da Organização
Mundial de Saúde (OMS), verificou-se que a maior freqüência das plantas medicinais,
reconhecidas como tais e citadas pelos informantes, destina-se ao tratamento de doenças
referentes a transtornos dos sistemas digestivo e circulatório, cada uma representada por
18% das espécies , vindo em seguida doenças infecciosas e parasitárias com 16%. (Tab. 3).
Na categoria de uso transtornos do sistema digestivo, a maioria dos tratamentos
indicados pelos informantes ao utilizar as plantas medicinais foram para a cura de úlcera,
43
enjôos do estômago, e má digestão. Já na categoria de uso transtorno do sistema
circulatório a maioria das plantas são utilizadas como depurativo do sangue, fortificante,
afrodiziaco e problema de pressão alta.
A espécie Hymenaea courbaril (jatobá) se destacou quanto a multiplicidade de uso
das plantas tratando cinco tipos de afecções orgânicas (fortificante, depurativo do sangue,
diabete, bronquite e afrodisíaco). Sendo que para todos esses tratamentos, utiliza-se a seiva
para a manufatura dos remédios que podem ser ingerida na sua forma pura ou na forma de
garrafada, misturada a outras plantas. Foi concenso dos informantes que a melhor época
para a retirada da mesma é na lua - nova.
Observa-se com o uso do Índice de Importância Relativa das espécies medicinais
(IR) que oito espécies apresentaram IR ≥ 1,00 e foram indicadas para o tratamento de até 5
categorias de doenças, dentre estas a espécie mais versátil em relação a seus usos, de
acordo com a Importância Relativa (IR) foi o jatobá (Hymenaea courbaril L.) que
apresentou o IR máximo (2,00), (Tab. 4). Christo et al (2006) estudando as plantas
medicinais utilizadas na comunidade Gleba Aldeia Velha em Silva Jardim-RJ, também
obtiveram resultado bem próximo a este com cinco espécies com IR ≥ 1, também indicadas
para o tratamento de até cinco categorias de doenças. Almeida & Albuquerque (2002)
utilizando o mesmo índice, em estudo realizado em Caruaru, estado de Pernambuco
encontraram resultado próximo, onde nove espécies com IR ≥ 1 foram indicadas para o
tratamento de até oito categorias de doença.
44
Tabela 3. Categorias de doença associadas às espécies medicinais, citadas pelos informantes no ERBT, Nova Iguaçu, RJ, de acordo com a classificação da Organização Mundial de Saúde, porcentagem de espécie medicinais citada em cada categoria de doença e seus respectivos tratamentos segundo citações dos mateiros. Categoria de doenças Espécies(%) Tratamentos Transtornos do sistema digestivo
18 % ulcera, digestivo, dor de estômago, enjôo do estomago, gastrite, prisão de ventre, dor de barriga
Transtornos do sistema circulatório 18 % fortificante, depurativo do sangue, problema de circulação, câimbra,
dormência, , abaixa pressão Doenças infecciosas e parasitárias 16 % piolho,sarna,caspa, resfriado, infecção interna, frieira,leptospirose,
sarampo, analgésico, intoxicação intestinal, inflamação geral, inflamação de garganta
Doenças das glândulas endócrinas, da nutrição e do metabolismo
13 % equilíbrio hormonal, diabete, problema de fígado, hepatite.
Transtornos do sistema genito-urinário
13 % diurético, acido úrico, pedra nos rins, inflamação genital, cistite, cólica renal, corrimento vaginal
Transtornos do sistema respiratório
12 % bronquite, expectorante, pneumonia, tuberculose
Doenças da pele e do tecido celular sub-cutâneo
12 % sarna, coceira, infecção de pele, inchaço na pele, furúnculo
Doenças do sangue e dos órgãos hematopoéticos
9 % anemia, furúnculo, colesterol alto, depurativo do sangue, cicatrizante
45
Tabela 3. Continuação. Categoria de doenças Espécies(%) Tratamentos Doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo
9 % reumatismo, contusão, pancada, torção, artrite, artrose, contusões, osteoporose
Transtornos do sistema nervoso 5 % calmante, sonífero, anti-depressivo Viroses 5 % resfriado, sarampo. Inapetênia sexual 4 % fortificante, afrodisíaco
Neoplasia 4 % câncer, câncer próstata. Debilidade física e mental 4 % Fortificante. Afecções e dores não definidas
3 % dor de dente e tônico capilar.
46
Tabela 4. Índice de Importância Relativa (IR) das espécies medicinais indicadas pelos mateiros como medicinais no entorno da Reserva Biologica do Tinguá., RJ.
IR Espécies
2,00 Hymenaea courbaril.
1,80 Smilax sp1.
1,40 Cymbopogon citratus, Jacaranda macrantha
1,20 Lippia alba, Nectandra odorifera, Piper anisum, Solidago chilensis
1,00 Copaífera langsdorffii, Copaifera trapezifolia, Gossypium hirsutum, Rumex obtusifolius, Vernonia
polyanthes.
0,80 Adiantum sp, Anacardium occidentales, Averrhoa carambola, Bauhinia radiata, Bidens pilosa,
Geissospermum vellosii, Genipa americana, Hortia arborea, Indet sp1, Indet sp2, Indet sp3, , Lecythis
pisonis, Morus alba, Poligonum persicaria, Psidium guajava, Sambucos nigra, Siparuna guianensis,
Solanum paniculatum
0,60 Ageratum conyzoides, Bixa orellana, Cecropia glaziovi, Cedrella odorata, Echinodorus grandiflorus, Emilia
sonchifolia, Leonorus sibiricus, Nasturtium officinale, Ocimum gratissimum, Phyllanthus corcovadensis,
Ricinus communis, Schinus terebenthifolia, Sorocea bonplandii, Taraxacum officinales
0,40 Baccharis trimera, Bauhinia forficata, Cariniana sp, Citrus sp, Costus spiralis, Cupania oblongifolia,
Cynoddon dactylon, Eugenia uniflora, Himatanthus sp1, Jacaratia spinosa, Kalanchoe brasiliensis, Lantana
camara, Leonotis nepetifolia, Mimosa pudica, Mirabilis jalapa, Momordica charantia, Persea americana,
Piper aduncum, Pradosia kuhlmannii, Punica granatum, Smilax sp2, Solanum americanum, Spondias lutea,
Stachytarpheta canescens, Tontelea ovalifolia, Vernona sp1, Virola gardineri, Virola oleifera, Zea mays
47
5.2 - ENTORNO DA RESERVA BIOLÓGICA DE POÇO DAS ANTAS (ERBPA)
A partir de 116 citações de uso das plantas indicadas pelos mateiros, foram
encontradas um total de 76 espécies, das quais 16 em morfo-espécies, subordinadas a 30
famílias botânicas (Tab. 5), As famílias que se destacaram quanto ao número de espécies
foram Leguminosae (20 espécies), Lauraceae (5 espécies), Bignoniaceae e Asteraceae com
3 espécies cada (fig. 11).
A forma de vida dominante foi a arbórea com 66 espécies citadas, em seguida
vieram as formas arbustiva e herbácea cada uma com cinco espécies citadas (fig. 12).
Dentre as plantas citadas como úteis pelos mateiros, a maioria (87 %) é representada
por espécies nativas da região, encontradas nas bordas e interior de fragmentos de
remanescentes florestais (Fig. 9). O restante das plantas citadas são cultivadas, provenientes
dos quintais e roças dos informantes, sendo a maioria das mesmas utilizadas como alimento
ou para fins medicinais.
Figura 9 - Distribuição dos habitats das plantas citadas como úteis
pelos mateiros moradores do ERBPA, Silva Jardim, RJ.
A parte das plantas mais utilizada, segundo as citações, foi o caule (68%), seguida
por folha (16%). Sendo que a maioria das citações para caule se referem ao uso
combustível, enquanto que as folhas são mais utilizadas para o preparo de medicamentos
(Tab.10).
48
1,3
2,5
3,8
7,6
16
68
0 10 20 30 40 50 60 70 80
Casca
Seiva
Flor
Fruto
Folha
Caule
Part
e u
sad
a
Porcentagem (%)
Figura 10 - Descrição das partes vegetais mais utilizadas pelos informantes.
As plantas foram agrupadas em seis categorias de uso, sendo que a maior freqüência
quanto a utilização das espécies citadas pelos mateiros estão inseridas nas categorias
combustível (29% das espécies) e construção (28% ) (Fig. 13).
A categoria de uso combustível esta relacionada às espécies utilizadas como lenha
para os fogões, e dentre elas se destacam espécies típicas e muito abundantes na região,
principalmente nas áreas antropizadas da Rebio, podendo destacar: Inga edulis (ingá),
Cupania oblongifolia (camboatá), Guarea guidonea (carrapeta) Miconia cinnamamifolia
(jacatirão) e Vernonia discolor (cambará).
Para a categoria construção se destacaram espécies que são reconhecidas pelos
mateiros devido à grande durabilidade da madeira, principalmente no que diz respeito: a
caibros e ripas para a construção de telhados de residências, tábuas utilizadas para o piso
das casas e ranchos para abrigar animais. Dentre estas espécies podemos destacar como as
mais citadas: Calophyllum brasiliense (guanandi), Dalbergia nigra (jacarandá),
Plathymenia foliolosa (vinhático), Senefeldera multiflora (sucanga) e iconia
cinnamomifolia (jacatirão). Sendo a lua-nova a melhor lua para a retirada das madeiras que
segundo os informantes protege a mesma contra ataque de insetos, aumentando assim a sua
durabilidade.
49
O grande conhecimento dos mateiros sobre as plantas relacionadas às categorias
combustível e construção pode ser explicado, em parte, ao histórico de uso da terra da
região no passado, pois os mesmos habitava as áreas da Reserva nas décadas de 1970 e
1980, época em que se estabeleceram grandes madeireiras na região. Este fato foi também
comentado por Christo et al ( 2006 ) ao estudarem o uso dos recursos vegetais no entorno
da Reserva Biológica de Poço das Antas.
Dentre as espécies reconhecidas como medicinal pelos mateiros, a maior parte delas
64 % são plantas nativas proveniente de áreas remanescentes de florestas, o restante das
plantas medicinais citadas são cultivadas nos quintais. Vale destacar o papel das mulheres
dos informantes que na maioria das vezes são as responsáveis pelo cultivo e manejo das
espécies encontradas nos quintais, e também é delas a responsabilidade de colher, preparar
e ministrar as plantas medicinais para toda a família..
A parte das plantas mais utilizada para o preparo de medicamentos foi a folhas
(79%), seguida pela seiva (14%) e casca (7%).
O índice de Shannon (H’) encontrado a partir das entrevistas com os mateiros
habitantes no ERBPA foi de 1,85 (base 10) e 4,25 (base e).
A curva do esforço amostral desenhada para a região do entorno da Reserva
Biológica de Poço das Antas mostrou uma tendência à estabilidade, provavelmente um
aumento no esforço amostral irá acarretar pouco ou nenhum incremento na riqueza
observada (fig 14).
50
2
2
2
2
2
2
3
3
4
4
5
20
0 5 10 15 20 25
Anacardiaceae
Annonaceae
Clusiaceae
Lamiaceae
Myrtaceae
Sapindaceae
Melastomataceae
Meliaceae
Asteraceae
Bignoniaceae
Lauraceae
Leguminosae
Fam
ília
s
Número de espécies
Figura 11 - Famílias que se destacaram quanto às suas riquezas especificas no ERBPA, Silva Jardim, RJ.
5
5
66
0 10 20 30 40 50 60 70
arbusto
herbaceo
árvore
há
bit
o
número de espécies
Figura 12 - Distribuição das formas de vida das espécies indicadas como úteis pelos mateiros moradores no ERBPA, Silva Jardim, RJ.
51
3
11
14
14
28
29
0 5 10 15 20 25 30 35
ornamental
alimentíco
medicinal
tecnologia
construção
combustível
cat.
uso
porcentagem de espécies
Figura 13 - Distribuição da porcentagem de espécies indicadas em cada categoria de uso, pelos mateiros moradores no ERBPA, Silva Jardim, RJ
Figura 14 - Curva do esforço amostral relacionada às citações das espécies pelos mateiros moradores no ERBPA, Silva Jardim, RJ.
0
15
30
45
60
75
90
10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120
número de citações
nú
mero
de e
sp
éc
ies
52
Tabela 5. Relação de espécies referentes como úteis pelos mateiros moradores no Entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas (ERBPA), Silva Jardim, RJ. Família/espécie Nome local Hab. Hat Uso Pu N.c ANACARDIACEAE
Tapirira guinensis Aubl. canela-cedro arv nat comb, const ca FAS116 Schinus terebinthifolius Raddi aroeira arv nat comb ca FAS110
ANNONACEAE - Guatteria sp. bicuibuçú arv nat comb ca Xylopia brasiliensis Spreng. Imbiú arv nat cons, tecn ca FAS115
ARECACEAE - Attalea humilis Mart. pindoba arv nat cons fo AGC339
ASTERACEAE - Baccharis trimera (Less.) DC. carqueja herb cult med fo AGC175 Coreopsis grandiflora Hogg ex Sweet camomila herb cult med fo AGC55 Lactuca sativa L. alface herb cult alim fo - Vernonia discolor (Spreng.) Less. câmara/cambará arv nat comb, med ca,fo AGC316
BIGNONIACEAE Jacaranda semiserrata Cham carobinha arv nat med fo FAS96 Sparattosperma leucanthum (Vell.)
K. Schum. cinco-folhas arv nat comb,cons,med ca,fo FAS105
Tabebuia cassinoides (Lam.) DC. ipê tamanco arv nat tecn ca FAS109 Tabebuia umbellata (Sond.) Sandwith ipê-amarelo arv nat orn, tecn ca/fl FAS97
BOMBACACEAE Bombacopsis glabra (Pasquale) Robyns castanheira arv nat orn fl AGC355
CARICACEAE - Jacaratia spinosa (Aubl.) A. DC. mamão-jacatiá arv nat alim ca AGC354
CLUSIACEAE Calophyllum brasiliense Cambess. guanandí arv nat cons ca FAS108 Symphonia globulifera L. F. guanandirana arv nat tecn ca FAS107
EUPHORBIACEAE Alchornea triplinervia (Spreng.) Müll. Arg. tapia arv nat tecn ca AGC361
-
53
Tabela 5. Continuação Família/espécie Nome local Hab. Hat Uso Pu N.c EUPHORBIACEAE
Manihot esculenta Crantz mandioca arb cult alim ra - Senefeldera multiflora Müll. Arg. sucanga arv nat cons ca AGC268
LAMIACEAE Plectranthus barbatus Andrews boldo arb cult med fo AGC44 Plectranthus grandis (Cramer) R. Willemse alcachofra arb cult med fo AGC240
LAURACEAE Aniba firmula (Nees & C. Mart.) Mez canela-cheirosa arv nat cons ca - Lauraceae sp1 canela arv nat tecn, const ca FAS120 Nectandra oppositifolia Nees & Mart. canela-jacú arv nat cons, comb ca FAS98 Nectandra puberula (Schott) Nees canela arv nat cons ca AGC318 Ocotea sp. canela arv nat cons ca AGC269
LECYTHIDACEAE Cariniana legalis (Mart.) Kuntze jequitibá arv nat cons ca -
LEGUMINOSAE Andira fraxinifolia Benth angelim-pedra arv nat comb ca FAS119 Leguminosae sp2 angelim arv nat comb ca FAS101 Balizia pedicellaris
(DC.) Barneby & J.W. Grimes cambuí-branco arv nat cons ca AGC328
Bauhinia forficata Link pata-de-vaca nat med fo FAS118 Chamaecrista ensiformis (Vell.) H.S.
Irwin & Barneby oiti arv nat comb ca AGC271
Copaifera langsdorfii. Desf. copaíba arv nat med sei AGC366 Copaifera trapezifolia Haine copaiba arv nat cons, med sei FAS111 Dalbergia nigra (Vell.) Allemao ex Benth. jacarandá arv nat cons ca AGC332- Hymenaea courbaril L. Jatobá arv nat cons ca - Inga laurina (Sw.) Willd. ingá-feijão arv nat alim fr FAS112 Inga edulis Mart. ingá arv nat alim, comb fr,ca FAS113 Inga sp1 ingá-banana arv nat alim fr FAS100 Leguminosae sp1. mal-casado arv nat comb ca AGC312 -
54
Tabela 5. Continuação Família/espécie Nome local Hab. uso Pu N.c LEGUMINOSAE
Leguminosae sp3 cambui-preto arv nat tecn ca FAS99 Machaerium nyctitans (Vell.) Benth. guaxumbé arv nat comb ca AGC333 Phaseolus vulgaris L. feijão herb cult alim fr - Piptadenia gonoacantha (Mart.) J. F. Macbr. pau-jacaré arv nat comb ca AGC364 Piptadenia paniculata Benth. angicão arv nat cons ca AGC329 Plathymenia foliolosa Benth. vinhático arv nat cons, tecn ca FAS102 Pseudopiptadenia contorta
(DC.) G.P. Lewis & M.P. Lima angico-preto arv nat cons ca AGC266
MELASTOMATACEAE - Miconia cinnamomifolia (DC.) Naudin jacatirão arv nat cons ca FAS117 Miconia lepidota Schrank & Mart. ex DC. mirindiba arv nat comb ca AGC278 Tibouchina granulosa (Desr.) Cogn. quaresmeira arv nat orn fl AGC330
MELIACEAE Cabralea canjerana (Vell.) Mart. cedro-rosa arv nat tecn ca AGC383 Guarea guidonia (L.) Sleumer carrapeta arv nat comb, med ca,fo AGC349
MONIMIACEAE Siparuna guianensis Aubl. fedegoso arv nat comb ca AGC359
MORACEAE Sorocea guilleminiana Gaudich. espinheira-santa arv nat med fo AGC280
MYRISTICACEAE Virola gardneri(A. DC.) Warb. imbiú-preto arv nat comb ca AGC273
MYRSINACEAE Rapanea ferruginea (Ruiz & Pav.) Mez capororoca arv nat comb ca AGC357
MYRTACEAE Myrciaria floribunda
(H. West ex Willd.) O. Berg goiabeira-do-mato arv nat comb ca AGC275
Myrtaceae sp1 canema arv nat comb ca FAS95 POACEAE
Oryza sativa L.
arroz herb nat alim fr -
55
Tabela 5. Continuação Família/espécie Nome local Hab. uso Pu N.c RUBIACEAE
Genipa americana L. genipapo arv nat alim fr AGC362 RUTACEAE
Zanthoxylum rhoifolium Lam. mamica-de-porca arv nat tecn ca FAS114 SAPINDACEAE
Cupania oblongifolia Mart. cambotá arv nat comb,cons, tecn ca FAS103 Cupania racemosa (Vell.) Radlk. camboatazinho arv nat cons, tecn ca FAS104
SAPOTACEAE Ecclinusa ramiflora Mart. acá arv nat comb ca AGC276
SIMAROUBACEAE Picramnia ciliata Mart pau-pereira arv nat med cas AGC272
SOLANACEAE Solanum tuberosum L. batata arb cult alim -
ULMACEAE Trema micrantha (L.) Blume crandiúba arv nat comb, tecn ca FAS106
VERBENACEAE Lippia alba (Mill.) N.E. Br. erva-cidreira arb cult med fo AGC157
VOCHYSIACEAE Vochysia sp. tarumã arv nat comb ca AGC321
INDETERMINADA Indet 1 milho-cozido arv nat comb ca AGC270 Indet 2 bacubichá arv nat comb ca AGC279 Indet 3 mirindiba-ipê arv nat cons ca AGC282 Indet 4 araribá-rosa arv nat cons ca AGC284 Indet 5 bico-de-papagaio arv nat cons ca AGC324 Indet 6 gameleira arv nat cons ca AGC325
Hab - hábito: arb - arbusto; arv - arbóreo; herb - herbáceo; .Hat - habitat: cult - cultivada nos quintais; nat – nativa; Uso: ali - alimentar; comb – combustível; const – construção; med – medicinal; ornamental – orn; tecn – tecnologia. N.C: Número de coleta: AGC – Christo, A. C. e FAS – Sobrinho, F. A. Pu: parte usada: ca – caule; cas – casca; fo – folha; fr: fruto; fl – flor; ra - raiz ; se – semente; sei – seiva; N.c: Número de coleta: FAS - Sobrinho, F. A; AGC – Christo, A. G.
56
6 - COMPARAÇÃO ENTRE AS ÁREAS
Comparando as duas áreas de estudo percebeu-se que, em ambas, a família
Leguminosae se destacou quanto à sua riqueza específica, apresentando maior quantidade
de espécies úteis segundo a citação dos informantes. Outros estudos relacionados ao uso de
recursos vegetais e etnobotânica na região da Mata Atlântica (Christo et al. 2006 e Cunha et
al. 2005) também encontraram a família Leguminosae como a mais representativa quanto
ao número de espécies úteis.
Quanto à forma de vida das plantas citadas pelos mateiros a arbórea se destacou nas
duas áreas, perfazendo 70 % (135 espécies) de todas as espécies citadas para as duas
regiões (192 espécies), com isso podemos perceber o grande conhecimento local dos
mateiros moradores nas duas regiões referente às espécies arbóreas típicas da Mata
Atlântica.
Entre todas as espécies citadas pelos mateiros, 28 espécies foram comuns às duas
áreas de estudo (Tab 6), sendo que desse total, a grande maioria (26 espécies) são arbóreas
e de ampla ocorrência nas regiões circunscritas ao domínio da Mata Atlântica.
No total, as plantas citadas como úteis, foram agrupadas em nove categorias de uso,
sendo que para a região do ERBT totalizou-se oito categorias enquanto que no ERBPA
somaram-se seis categorias, sendo cinco categorias comuns às duas áreas: medicinal,
combustível, tecnologia, construção, alimentício (Fig. 15).
As plantas mais citadas pelos mateiros, nas duas comunidades, foram espécies
muito encontradiças em áreas alteradas de floresta e margens de caminhos e trilhas, a saber:
camboatá (Cupania oblongifolia), jacatirão (Miconia cinnamomifolia) e aroerinha (Schinus
terebinthifolius) cada uma citada por cinco mateiros.
As espécies mais versáteis quanto ao número de categorias de uso, nas duas áreas,
foram: Cupania oblongifolia (camboatá), incluída nas categorias combustível, medicinal,
tecnologia, construção e recursos para fauna e Xilopia sericea (pindaíba), cujas categorias
foram combustível, construção, recurso para fauna e tecnologia.
57
Tabela 6. Relação de espécies referentes como úteis comuns às duas áreas de estudo. Hab: hábito: arb – arbusto; arv – arbóreo; herb – herbáceo; Uso: ali – alimentar; comb – combustível; const – construção; med – medicinal; ornamental – orn; tecn – tecnologia. Sendo os nomes populares e citações de uso referentes: 1 ao conhecimento dos mateiros residentes no entorno da Rebio do Tinguá e; 2 ao conhecimento dos mateiros residentes no entorno da Rebio de Poço das Antas. Família/nome científico Nome popular Hab. Uso. ANACARDIACEAE
Schinus terebenthifolius Raddi aroeirinha1, aroeira2 arv med1, comb2 ANNONACEAE
Xylopia sericea A. St.-Hil. pindaíba1, imbiu2 arv comb1, rec1, cons2, tecn2 ASTERACEAE
Baccharis trimera (Less.) DC. carqueja1,2 herb med1,2 Vernonia discolor (Spreng.) Less. cambará1,camará2 arv comb1,2, cons 1
BIGNONIACEAE
Jacaranda semiserrata Cham caróba1, carobinha 2 arv med1, 2 Sparattosperma leucanthum (Vell.) K. Schum. cinco-folhas1,2, ipê-branco1 arv comb1,2, med2
CARICACEAE
Jacaratia spinosa (Aubl.) A. DC. mamão-jacatiá1,2 arv med1, alim2
LEGUMINOSAE Copaífera langsdorffii Desf. copaiba1,2 arv med1,2, tecn1 Copaifera trapezifolia Haine copaíba-verdadeira1, copaíba 2 arv , med1, 2, tecn1, cons 2 Hymenaea courbaril L jatobá1,2 arv alim1, med1, cons2 Inga edulis Mart. ingá1, 2 arv alim1, 2, comb 2 Piptadenia gonoacantha (Mart.) J. F. Macbr. pau -jacaré1, 2 arv comb1,2 Pseudopiptadenia contorta (DC.) G.P.
Lewis & M.P. Lima angico-cambui1, angico-preto2 arv comb1, cons2
MELASTOMATACEAE Miconia cinnamomifolia (DC.) Naudin jacatirão1,2 arv cons1,2
58
Tabela 6. continação Família/nome científico Nome popular Hab. Uso. MELIACEAE
Cabralea canjerana (Vell.) Mart. canjerana1, cedro-rosa2 arv cons1, tecn1,2 MONIMIACEAE
Siparuna guianensis Aubl negramina1, fedegoso2 arv med 1, rit1, comb2 MORACEAE
Sorocea guilleminiana Gaudich. espinheira-santa1, 2 arv med1, 2 MYRISTICACEAE
Virola gardneri (A. DC.) Warb. bicuiba-verdadeira1, imbiú-preto2 arv cons1, med1, comb2 RUBIACEAE
Genipa americana L. genipapo1,2 arv med1, alim2 RUTACEAE
Zanthoxilum rhoifolium Lam. mamica-de-porca1, 2 arv cons1, tecn 2 SAPINDACEAE
Cupania oblongifolia Mart. bilreira1, camboatá1,2 arv comb1,2, med1, tecn1, rec1 Cupania racemosa (Vell.) Radlk camboata1, camboatazinho2 arv comb1,2, rec1cons2, tecn2 Lippia alba (Mill) erva-cidreira1,2 arb med1,2
59
Verificou-se que existe uma diferença significativa entre o conhecimento dos
mateiros nas duas áreas (X2 = 49,59; g.l = 7; p<0, 010) valendo-se do teste Qui-Quadrado
(X2). O principal motivo quanto a essa diferença está no grande número de espécies
utilizadas na categoria de uso medicinal, citadas pelos mateiros moradores do ERBT.
Figura 15 – Distribuição do número de espécies indicadas em cada categoria de
uso.nas duas áreas de estudo.
Comparando-se a curva do esforço amostral, relacionando-a as citações das espécies
úteis (fig 16), percebe-se que a curva para o ERBT obteve maior inclinação, apresentando
um maior número de espécie por unidade de esforço amostral. Provavelmente um aumento
no esforço amostral para a área do ERBT acarretará num acréscimo da riqueza observada.
Para Amoroso (2002), a disponibilidade das espécies a serem utilizadas, influencia o
conhecimento de uso das mesmas, logo, uma região que possua uma maior riqueza
florística apresentará um maior número de espécies a serem utilizadas pelas populações.
Os resultados, ora obtidos, corroboram esta observação de Amoroso (2002), visto
que apesar da região do ERBT ter apresentado um menor número de informantes (3
informantes) do que o ERBPA (5 informantes), essa apresentou um maior número de
espécies citadas pelos referidos informantes.
60
Figura 16 - Curva do esforço amostral relacionada às espécies citadas pelos mateiros no Entorno das Reservas Biológicas do Tinguá (ERBT) e de Poço das Antas (ERBPA).
A diversidade de espécies, expressa através do índice de Shannon (H’), adaptado
por Begossi (1996), tem sido utilizado em comparações de estudos etnobotânicos realizados
no Brasil, alguns dos quais analisados neste trabalho, os quais encontram-se sumarizados na
Tabela 7. No estado do Rio de Janeiro em um estudo realizado em Gamboa, Ilha de
Itacuruçá, Figueiredo et al. (1993) obtiveram 558 citações de uso de plantas
correspondendo a 90 espécies vegetais. Os mesmos autores, em 1997, ao estudarem a
diversidade de espécies indicadas como úteis por uma comunidade situada na Baía de
Sepetiba, encontraram 75 espécies entrevistando 42 informantes. Fonseca-Kruel & Peixoto
(2004) em um estudo realizado em Arraial do Cabo, Rio de Janeiro, obtiveram 68 espécies
das 444 citações de uso de plantas. Em estudo realizado em Ponta do Almada e Praia de
Camburí (SP) por Hanazaki et al. (2000), os autores obtiveram 152 e 162 espécies úteis
utilizadas, respectivamente, pelas comunidades. No Paraná, Lima et al. (2000) catalogaram
uma diversidade de 445 plantas em entrevistas realizadas com 90 informantes na Área de
Proteção Ambiental de Guaraqueçaba.
0
20
40
60
80
100
120
10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130 140
número de citações
nú
mero
de e
sp
éc
ies
Tinguá Poço das Antas
61
O índice de Shannon (H’) obtido neste estudo foi de 2,02 (base 10) e 4,65 para o
entorno da Reserva Biológica do Tinguá (ERBT) e 1,85 (base 10) e 4,25 (base e) para o
Entorno da reserva Biológica de Poço das Antas (ERBPA), indicando que os mateiros
moradores destas regiões detém um bom conhecimento sobre o uso de recursos vegetais.
Quando estes índices são comparados aos demais das sete comunidades anteriormente
citadas, os mateiros do ERBT situam-se em terceiro lugar, em relação ao índice de
diversidade H’, já os mateiros do ERBPA ficaram em quinto lugar no que tange a esse
parâmetro (Tab. 7).
Tabela 7. Comparação de índices de diversidade em estudos realizados em comunidades
situadas no domínio da Mata Atlântica e ecossistemas associados. (NE: número de
espécies; NI: número de informantes; NC: número de citações de uso; H’: índice de
Shannon), ERBT: Entorno da Reserva Biológica do Tinguá, Nova Iguaçu, RJ ERPA:
Entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas, Silva Jardim, RJ.
H’ Local de estudo NE NI NC base 10 base e
Fonte:
Gamboa, RJ 90 58 558 1,65 - Figueiredo et al. 1993 Chalhaus, RJ 75 42 482 1,53 - Figueiredo et al. 1997 Arraial do Cabo, RJ 68 15 444 1,78 4,10 Fonseca-Kruel et al. 2004 Praia de Camburí, SP 162 57 541 1,98 4,57 Hanazaki et al. 2000 Ponta do Almada, SP 152 45 434 1,99 4,59 Hanazaki et al. 2000 Guaraqueçaba, PR 445 90 3.400 2,38 5,48 Lima et al. 2000 Silva Jardim, RJ 209 19 548 2,20 5,07 Christo et al. 2006 ERBPA 76 5 116 1,85 4,25 Este estudo ERBT 116 3 136 2,02 4,65 Este estudo
62
7 – CONCLUSÃO
Percebeu-se com esse estudo o grande conhecimento local dos mateiros no que diz
respeito a utilização dos recursos vegetais, dentre todas as espécies úteis a maioria são
árvore típicas da Mata Atlântica.
No ERBT a maioria das plantas reconhecidas pelos mateiros como úteis, possui
alguma utilidade medicinal, sendo grande parte, árvores nativas da região.
No ERBPA a categoria de uso combustível teve o maior destaque entre todas as
plantas citadas como úteis, sendo a maioria, árvores típicas de áreas antropizadas do
interior da Rebio.
As espécies Cupania oblongifolia (camboatá), Miconia cinnamomifolia (jacatirão)
e a Schinus terebinthifolius (aroerinha) foram as espécies mais citadas nas duas áreas de
estudo.
Entre as espécies mais versáteis se destacaram Cupania oblongifolia (camboatá) e
Xilopia sericea (pindaíba), sendo, cada uma, incluída em cinco e quatro categorias de uso,
respectivamente.
A região do ERBT apresentou um maior número de espécies por unidade de esforço
amostral, o qual ficou evidenciado devido à maior inclinação da curva de esforço amostral,
esse fato pode estar associado à maior riqueza florística existente na região do Entorno da
Reserva Bilógica do Tinguá, o que conseqüentemente, acarreta uma maior disponibilidade
de recursos.
Verificou-se com o teste Qui- quadrado X2 que existe diferença significativa quanto
ao conhecimento local dos mateiros entre as duas áreas estudadas.
Na região do ERBT, as famílias Asteraceae, Leguminosae e Poaceae apresentaram
um maior número de espécie com propriedades medicinais.
A maioria das plantas medicinais, quando padronizadas de acordo com a
classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS), são utilizadas para problemas
relacionados a transtornos do sistema digestivo e do sistema circulatório
A espécie Hymenaea courbaril (jatobá) apresentou o IR máximo, e consiste na
espécie mais versátil, em relação a seus usos medicinais.
Muitas plantas freqüentemente utilizadas por populações locais ainda não foram
estudadas ou seus princípios ativos ainda não foram identificados para validá-las como
63
medicamentos ou para aproveitá-las economicamente (Berg 1993). Ainda assim, muitas
plantas são utilizadas e comercializadas na atualidade e o Brasil, um dos países com maior
biodiversidade do mundo, se revela como um importante e potencial provedor de um
recurso tão valioso como as plantas medicinais.
Essas pessoas, devido à grande vivência nas matas das regiões de estudo, podem ser
consideradas como verdadeiros especialistas locais, reconhecendo diversas morfoespécies .
Estes atores sociais não deveriam ser mais vistos como meros informantes locais,
pois seus conhecimentos poderiam ser úteis na manutenção e administração das unidades
de conservação inclusive auxiliando no plano de manejo das mesmas, além de serem
importantes aliados no desenvolvimento de projetos de educação ambiental em suas
regiões.
Tão importante como resgatar as informações sobre a diversidade biológica é o
resgate da cultura do uso de plantas por parte destes informantes, que desde o século XVIII,
acompanham os naturalistas em suas expedições científicas. Assim como a fragmentação
das áreas naturais têm influenciado as taxas demográficas e fluxos gênicos de espécies
vegetais - no passado, abundantes na natureza - assim também se dá, nos dias atuais, com
os reconhecidos mateiros. O resgate da diversidade cultural que estes informantes detêm
não só é importante como prioritário. A corrosão do conhecimento que se dá através das
migrações de populações humanas e envelhecimento das mesmas, faz com que a
apropriação do conhecimento empírico, que se dá via oral pelas gerações posteriores, é
perdido, Prova disto é a dificuldade encontrada, mesmo por instituições que trabalham a
longo prazo em determinadas áreas (como é o caso do Jardim Botânico do Rio de Janeiro),
de encontrarem informantes que saibam, realmente, o que é, onde se encontram e como se
diferenciam as espécies procuradas pelos representantes da academia.
Assim, todo informante que seja encontrado numa área de estudo deve ser
valorizado pelo volume de informação qualificada que coloca à disposição do estudo,
independente do que se preconiza como ideal de amostra para fins de análises quantitativas.
A área de Mata Atlântica está muito distante desta recomendação de desenho experimental.
Estudos dessa natureza tornam-se cada vez mais importantes nas regiões sob
domínio da Mata Atlântica, que apesar do histórico de destruição ainda possui uma grande
importância econômica, ecológica, cultural e social.
64
8 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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72
Anexos
a b
c d
e f
Figuras a-f. a) Sede da RPPN (CEC) Tinguá, Nova Iguaçu, RJ.; b) Vista da Rebio do Tinguá; c) Quintal do Sr Walter (mateiro); d) Fragmento florestal da RPPN (CEC) Tinguá; e) Equipe de campo do Programa Mata Atlântica na Rebio de Poço das Antas, Silva Jardim, RJ, da esquerda para a direita: Totonho (mateiro), Adilson (mateiro) e Alexandre (Técnico); f) Coleta de campo no Entorno da Rebio Poço das Antas.
73
g h i
j l m
n o
Figuras a-f. g) Totonho (mateiro), morador do Entorno da Rebio de Poço das Antas e auxiliar de campo do PMA. h) Sr Francisco (especialista em plantas medicinais), morador do entorno da Rebio do Tinguá; i) Sr Walter, assistente de campo do PMA, morador do Entorno da Rebio do Tinguá; j) Fruta pão (Artacarpus altilis (Park.)), utilizada como recurso alimentar no Entorno da Rebio do Tinguá; l), Coleta de campo; m) Cana do Brejo (Costus spiralis (Jacq.) roscoe) utilizada como recurso medicinal no entorno da Rebio do Tinguá; n) Jatobá (Hymenaea courbaril L), utilizada como planta medicinal e alimentícia; o) Pata de Vaca (Bauhinia forficata Link ) planta medicinal utilizada nas duas áreas estudadas.