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PATENTESTUDO O QUE VOCÊ QUERIA SABER SOBRE

MAS TINHA VERGONHA DE PERGUNTAR

F r a n c i s c o Te i x e i r a

São Paulo, 2006

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Este livro é dedicado

à memória de meu

querido e saudoso pai,

Augusto, meu melhor

amigo e incentivador,

a quem devo as

melhores recordações

da minha vida, que

permanecem intocáveis

e vivas em meu coração,

especialmente neste

ano em que celebro

o seu centenário de

nascimento.

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À minha patrocinadora, a Interfarma, que acreditou na idéia de

reeditar este livro

A Jorge Raimundo, querido amigo, que me colocou nesta guerra e

que se recusa a permitir que eu dela me retire,

A Gabriel Tannus e aos integrantes do Conselho Diretor da Inter-

farma que me estimulam sempre a aprimorar meus conhecimentos

sobre este tema tão apaixonante, nossa grande causa comum,

Aos meus amigos jornalistas que, com sua sinceridade e alto espí-

rito profi ssional, foram capazes de tomar “superdosagens” do maior

soporífero do mundo, as minhas entrevistas, e, sobrevivendo, foram

assim mesmo capazes de produzir comigo matérias interessantes. Per-

mito-me sintetizar todos eles na fi gura admirável da jornalista Maria

Helena Tachinardi, cujos artigos sobre o tema, além do próprio livro

que publicou há alguns anos, são verdadeiras aulas de Propriedade

Intelectual.

Agradecimentos

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i. Apresentação (Dep. Roberto Campos)

ii. Prefácio (Dep. Ney Lopes)

iii. Introdução (Francisco Teixeira)

iv. PERGUNTAS e RESPOSTAS

1. “Propriedade industrial” e “propriedade intelectual” são a

mesma coisa?

2. A propriedade intelectual é um conceito recente?

3. Esses direitos à propriedade intelectual são reconhecidos em

todo o mundo?

4. O Brasil tem adotado os tratados internacionais sobre pro-

priedade industrial?

5. Os direitos de propriedade industrial ganharam mais rele-

vância com a globalização?

Sumário

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6. Por que a propriedade industrial não era reconhecida no

Brasil antes da Lei de Patentes, aprovada pelo Congresso em

1996?

7. Desde quando, e por quanto tempo, o Brasil abandonou sua

tradição de pioneirismo na defesa da propriedade industrial

e deixou de reconhecer patentes?

8. Essa nova lei trata só de patentes?

9. O que é uma patente?

10. Uma patente pode ser transferida para terceiros?

11. Quanto tempo dura esse direito de exclusividade?

12. Já que os cientistas ou as empresas de pesquisas podem pa-

tentear o fruto do seu trabalho, isso signifi ca que se pode

patentear uma planta, uma semente, enfi m, até a natureza e

a vida?

13. Qual a diferença entre descoberta e invenção?

14. O que pode e o que não pode ser patenteado?

15. Quando um cientista descobre que um determinado “co-

quetel de remédios”, com uma certa proporção na dosagem

de cada componente, tem ação especialmente efi caz, como

aconteceu recentemente com a Aids, essa descoberta pode

ser patenteada?

16. O que é “pirataria”nos dias de hoje? É o mesmo que falsifi ca-

ção? Por que se diz que um produto é “pirata”?

17. Por que houve tantas pressões e protestos contra a aprovação

da Lei de Patentes?

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18. É verdade que a Lei de Patentes pode inibir a pesquisa cien-

tífi ca no Brasil?

19. Não seria melhor a existência de um período de carência

antes da vigência da lei, para que o Brasil tivesse a oportuni-

dade de primeiro desenvolver-se tecnologicamente e aí sim

reconhecer as patentes?

20. O Japão não copiava tecnologia antes de se desenvolver?

21. Qual foi o país que mais se benefi ciou pelo fato de reconhe-

cer mais amplamente o direito à patente?

22. Afi nal, patente é monopólio ou não?

23. Francamente, a patente não prejudica a indústria nacional?

24. A obrigação de pagar royalties faz aumentar os preços?

25. Não seria válido deixarmos de pagar royalties durante algum

tempo, para fi nanciar pesquisas científi cas com esse dinhei-

ro?

26. O reconhecimento das patentes estrangeiras pode causar de-

semprego e desestimular investimentos no Brasil?

27. Qualquer pessoa pode requerer patente para uma invenção?

28. A patente pode ser requerida por um grupo de pessoas, se

a invenção resultar de um trabalho de equipe? Neste caso,

todos têm que assinar o pedido de patente?

29. Onde se dá entrada num pedido de patente?

30. Como se faz um pedido de patente?

31. Os pedidos de patente são publicados no Diário Ofi cial?

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32. E os casos de invenções sigilosas que não podem ser divulga-

das?

33. O titular de uma patente pode manter seu nome em sigilo?

34. Há outras possibilidades de fraude na autoria de um pedido

de patente? Como a parte prejudicada pode defender seus

direitos?

35. O que acontece se duas pessoas tentam patentear a mesma

invenção?

36. E se alguém provar que já vinha fazendo aquele produto,

embora sem patenteá-lo, muito antes de outra pessoa entrar

com o pedido de patente do mesmo produto?

37. Se uma patente é requerida no Brasil e, na mesma época,

uma invenção similar está sendo patenteada em outro país,

quem será o detentor dessa patente?

38. Um inventor estrangeiro pode em seu país pedir o registro

de sua invenção no Brasil? Da mesma forma, um inventor

brasileiro pode no Brasil requerer a patente em outros paí-

ses?

39. Qual é a proteção conferida pela patente?

40. O que é “exaustão” de direitos de propriedade industrial?

41. O que é exaustão nacional e internacional?

42. O que é importação paralela?

43. Que teoria o Brasil adotou quanto à exaustão de direitos?

44. Podem ser feitos estudos ou pesquisas de um produto paten-

teado sem autorização do detentor da patente?

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45. A concessão de uma patente impede o preparo de medica-

mentos em farmácias de manipulação?

46. A patente autoriza a comercialização de um produto?

47. Um produto patenteado é necessariamente um sucesso de

vendas?

48. Na lei anterior, a restrição ao patenteamento de produtos

farmacêuticos aplicava-se somente aos estrangeiros? Sendo

assim, um inventor brasileiro que criasse um novo produto

farmacêutico poderia patenteá-lo no Brasil?

49. Quanto tempo demora a concessão de uma patente? E qual

o seu prazo de vigência?

50. É possível dar uma compensação ao detentor de uma paten-

te pelo tempo perdido em avaliações técnicas excessivamente

prolongadas?

51. Quanto custa obter e manter uma patente?

52. O inventor pode vender a patente do seu invento?

53. Quem recebe a concessão de uma patente fi ca obrigado a

fabricar esse produto no próprio país que o patenteou?

54. É o governo que toma a iniciativa de requerer uma licença

compulsória?

55. Há outros motivos para a concessão de licenças compulsó-

rias?

56. Uma patente pode terminar antes do prazo de vigência?

57. O que é caducidade?

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58. Como o INPI pode ajudar o inventor que deseja licenciar sua

patente?

59. O que é “microorganismo transgênico”?

60. Por que a lei brasileira não reconhece patentes para produtos

da biotecnologia?

61. As misturas de substâncias naturais, como ervas, usadas na

medicina popular, podem ser patenteadas?

62. O “direito da terra”, contra a biopirataria, citado na confe-

rência Rio-1992, foi considerado na lei brasileira?

63. E o DNA? É patenteável?

64. E os animais transformados?

65. E os clones humanos?

66. A propriedade industrial inclui o design?

67. Como se faz o registro de um desenho industrial?

68. Pode-se registrar o desenho de vários produtos de uma só

vez?

69. Quanto tempo dura esse registro?

70. E as marcas? Também têm proteção?

71. Afi nal de contas, o que é uma “marca registrada”?

72. Como é que se pede um registro de marca?

73. O que acontece depois desse pedido de registro?

74. Por quanto tempo fi ca em vigor o registro de uma marca?

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75. A lei protege todo tipo de marca?

76. A bandeira nacional pode ser registrada como marca?

77. Letras ou números podem ser registrados?

78. Pode-se patentear uma cor?

79. E um aroma?

80. O slogan de uma campanha publicitária pode ser registrado

como marca?

81. E os nomes de bebidas, como champagne, cognac, vinho do

Porto e até a cachaça? Podem ser registrados como marca?

82. E o nome de uma pessoa?

83. Já que o registro de marca vale para uma determinada linha

de produtos, isso signifi ca que uma marca conhecida, como

a Coca-Cola, por exemplo, vale só para refrigerante?

84. Como é que um brasileiro que tem uma marca de sucesso no

Brasil pode registrá-la também em outros países?

85. O dono de uma marca pode vendê-la?

86. A franquia é uma forma de licença para uso de marca?

87. Um grupo de pessoas ou empresas pode registrar uma única

marca?

88. É permitido criar-se uma marca parecida com outra marca

de sucesso?

89. O Brasil ainda pirateia marcas internacionais famosas, como

perfumes e griffes?

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90. Afi nal de contas, quem é fl agrado pirateando vai pagar por isso? Pode até ser preso?

91. A quem cabe provar que um determinado processo indus-trial não é cópia de um processo patenteado?

92. Quais são os crimes de concorrência desleal?

93. O que são “segredos de negócios”?

94. Que coisa é essa chamada pipeline?

95. Quantos pedidos de pipeline foram solicitados depois da aprovação da nova lei de propriedade industrial?

96. Mas o pipeline não é retroatividade?

97. Como é que alguém pode impedir uma patente de pipeline?

98. Por quanto tempo vigora uma patente de pipeline?

99. Os inventores brasileiros também têm direito à proteção do pipeline?

100. Por que o pipeline é tão polêmico?

101. Por que ele é tão importante para a indústria farmacêutica?

102. Quem paga os milhões de dólares que se gastam com pesqui-sa na indústria farmacêutica? É o pobre do doente?

103. Quais os caminhos para a pesquisa de novos medicamen-tos?

104. Como está a proteção da propriedade industrial nos outros países da América Latina?

105. Isso quer dizer que o Brasil levou vantagem com sua nova lei, em relação à Argentina e outros países da América do Sul?

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106. Como é que fi ca essa situação no Mercosul?

107. Se os países têm níveis diferentes de proteção da proprieda-

de industrial, isso pode difi cultar a circulação dos produtos

patenteados entre os países do Mercosul e outros países do

mundo?

108. A nova lei vai favorecer a transferência de tecnologia?

109. O INPI não deveria orientar o empresário nacional nas ques-

tões de transferência de tecnologia?

110. Agora que as patentes são protegidas por lei, qual a saída

para as empresas brasileiras nos ramos que exigem grande

avanço tecnológico, já que a tecnologia de ponta exige enor-

mes investimentos?

111. A proteção das patentes, impossibilitando a cópia, pelas em-

presas nacionais, de novos medicamentos lançados no ex-

terior, difi cultará o acesso da população brasileira às mais

recentes novidades terapêuticas?

112. A evasão de cérebros brasileiros, ou seja, a migração de cien-

tistas para trabalhar no exterior por falta de mercado de tra-

balho no Brasil, deverá aumentar ou diminuir com a nova lei

de propriedade industrial?

113. O INPI está aparelhado para atender às novas necessidades?

114. E o poder judiciário? Está preparado para a nova lei?

Apêndice: O que mudou no Brasil com a nova lei de Propriedade

Industrial

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Apresentação

Roberto CamposEx-Deputado Federal, ex-Senador e ex-ministro do Planejamento

Precisávamos de um “catecismo”, acessível ao grande público,

sobre a importância do respeito à propriedade intelectual como

fator de desenvolvimento econômico e tecnológico. Esse o objetivo

do trabalho de Francisco Teixeira, que acompanhou de perto os

cinco anos de debate no Congresso Nacional da Lei de Patentes

(Lei No 9279), aprovada em 1996.

Esse diploma legal pode ser considerado “modernizante”sob

dois aspectos principais: (1) estende a patentabilidade a indústrias

tais como produtos farmacêuticos, alimentícios e químicos que an-

teriormente não gozavam de proteção patentária, e (2) adapta a

legislação brasileira a normas internacionais como o TRIPs (Trade

Related Intellectual Property Rights), às quais o Brasil já devia obe-

diência como membro do GATT, sem, entretanto, corporifi cá-las

em lei interna.

A atitude brasileira em relação à proteção da propriedade in-

dustrial (unidos segmentos da propriedade intelectual) tem va-

riado no curso do tempo. Fomos signatários das duas convenções

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internacionais básicas — a Convenção de Paris, de 1886, que tratou

especifi camente dos direitos de propriedade industrial, e a Con-

venção de Berna, de 1886, referente aos direitos autorais. Períodos

houve, entretanto, em que, sob a infl uência do nacional protecio-

nismo nos entregamos a uma espécie de “romantismo tecnoló-

gico”, imaginando que, tolerada a pirataria durante uma fase de

transição,

baratearíamos custos e estimularíamos a inventividade nacio-

nal. Isso é que está na raiz da suspensão do reconhecimento de

patentes de “produtos” farmacêuticos em 1945, de “processos” far-

macêuticos em 1969 e 1971, assim como da desastrosa política de

autonomia tecnológica na informática, praticada desde 1975 mas

formalizada em lei em 1984. Criamos, em ambos os casos, a men-

talidade de “pingentes tecnológicos”, buscando carona no trem do

progresso sem pagar passagem. É excusado dizer que os resultados

foram calamitosos quer no tocante à informática, na qual fi camos

defasados em mais de um decênio, quer no tocante à indústria far-

macêutica. Nesta, a participação dos fornecedores nacionais de-

cresceu após a suspensão do patenteamento, e não se desenvolveu

capacidade signifi cativa de pesquisa e inovação. As multinacionais

preencheram a brecha por licenciamento ou importações, mas não

se sentiram incentivadas para a criação de centros locais de pes-

quisa.

Felizmente, há hoje uma reversão de tendências. E essa rever-

são de tendências, trazida, no caso da indústria farmacêutica pela

Lei 9.279/96, a Lei de Patentes, chegou a tempo de evitar que o

Brasil continuasse marginalizado na revolução de engenharia ge-

nética, que exerce nesta década o papel dinâmico que a informática

exerceu na década dos 80 (para nós a “década perdida”).

Há indicações de que o Brasil assistirá a uma grande expansão

dos investimentos em pesquisa e produção farmacêutica, pela rea-

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tivação de projetos paralisados e pela delegação a entidades locais

da fase de pesquisas clínicas, útil para a formação de uma massa

crítica humana para o deslanche inventivo da descoberta de radi-

cais. As possibilidades da engenharia genética animal e vegetal são

amplas no Brasil, graças à dimensão do mercado e à variedade de

condições climáticas.

Francisco Teixeira presta um útil serviço ao refutar preconcei-

tos e esclarecer conceitos, como por exemplo, as diferenças entre

“pirataria” e “falsifi cação”; entre “invenção” e “descoberta”, só sen-

do patenteáveis os produtos e processos que exibam “novidade”,

atividade “inventiva” e aplicação “industrial” (diferentemente da

simples “descoberta” de seres existentes na natureza); ou entre

“monopólio”, que extingue a competição e a “patente”, que confere

apenas exclusividade temporária de exploração e excita atividades

paralelas de busca de radicais alternativos.

Não é mera coincidência que alguns países pioneiros no desen-

volvimento tecnológico, como a Grã-Bretanha e os Estados Unidos,

tenham sido também pioneiros na formulação de leis de proteção à

propriedade intelectual e industrial. Em 1623, o Parlamento inglês

reservou à Coroa o direito de dar “cartas patentes” à invenção de

novas manufaturas. Os americanos formularam sua lei de patentes

em 1790, mas já na Constituição de Filadélfi a de 1787, em seu arti-

go primeiro (seção 8) autorizava a criação de um “sistema nacional

de patentes”, a fi m de dar aos Escritores e Inventores direito exclusi-

vo, por tempo limitado, sobre seus respectivos “Escritos” e “Desco-

bertas”. O sábio propósito dos “Founding Fathers”, profeticamente

validado dois séculos depois pela hegemonia tecnológica america-

na, era promover “o Progresso da Ciência e das Artes Úteis”.

Rio de Janeiro, dezembro de 1997.

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Prefácio

Ney LopesDeputado Federal e Professor de Direito Constitucional na UFRN

P R I M E I R A E D I Ç Ã O

Tudo que diz respeito à atual Lei de Propriedade Industrial do

Brasil tem a minha atenção prioritária. A razão é que dediquei três

anos de minha vida parlamentar ao estudo, debate e redação desse

texto. No fi nal, senti-me tranqüilo de consciência, porque o substi-

tutivo de minha autoria, como Relator da Câmara dos Deputados

(o Senado fez poucas alterações), era justamente o que pensava e

defendia como o melhor caminho para o país.

Nessa peregrinação de relator de tema tão complexo, conheci

o Dr. Francisco Teixeira. Ele representava a corrente que defendia

legislação ampla, sem restrições de convivência com o resto do

mundo. Outros tantos técnicos e consultores igualmente manifes-

taram e defenderam suas opiniões e pontos de vista. A mim cabia

ouvir os Colegas Parlamentares, ler o material apresentado, fazer a

média e colocar, no texto fi nal, as conclusões. E isto foi feito com

grande critério, sem temores e com a noção do dever de recolocar

o Brasil no cenário internacional, como uma Nação que respeita a

inteligência alheia e condena a pirataria.

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Agora sou honrado com o Prefácio do livro do Dr. Francisco

Teixeira, cuja fi nalidade básica é esclarecer dúvidas sobre Marcas

e Patentes. Trata-se de trabalho intelectual de pessoa experiente e

que realmente acompanhou passo a passo o debate sobre esta le-

gislação.

O Dr. Francisco Teixeira, embora pudesse ter optado pelo ca-

minho da análise erudita do tema, preferiu atingir os leigos. E efe-

tivamente alcançou seu objetivo. Este livro é prático, leve e muito

bem escrito. Cabe ao leitor buscar esclarecer suas dúvidas. E até

para os que conhecem a matéria o trabalho sintetiza conceitos e

regras legais úteis para o dia-a-dia do profi ssional.

O esforço do autor é compensado, sem dúvida, pela produção

de obra didática, sem precedentes na atualidade nacional. Aqui e

acolá ele emite opiniões pessoais, o que deve ser respeitado, até na

discordância. No todo, o Leitor só tem a ganhar no manuseio deste

livro esclarecedor.

Brasília, dezembro de 1997.

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PrefácioS E G U N D A E D I Ç Ã O

A primeira edição deste ótimo livro de Francisco Teixeira foi

publicada em 1997, quando se completava um ano da Lei de Pro-

priedade Industrial.

Agora são passados 10 anos e a Interfarma (Associação da In-

dústria Farmacêutica de Pesquisa) acredita que o momento é ex-

tremamente oportuno para o lançamento da segunda edição de

“Tudo que você precisa saber sobre patentes, mas tinha vergonha

de perguntar”.

Dediquei-me juntamente com Francisco Teixeira e a vários e

importantes companheiros a árdua luta de defender os princípios

da propriedade intelectual no país.

Dr. Jorge RaimundoÉ presidente do Conselho Consultivo da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa).

Ex-Presidente da GlaxoSmithKline para América Latina. Foi membro do Comitê Executivo da Glaxo, em

Londres durante 6 (seis) anos. Trabalhou também na Laborterapica Bristol, Pfi zer, Darrow e Beecham. É

advogado especializado na área de propriedade intelectual e tem cursos de marketing e gerenciamento nas

Universidades de Miami na Flórida e Columbia em Nova York. Possui vários trabalhos publicados no Brasil

e no exterior sobre Indústria Farmacêutica. É membro do Conselho Diretor da ABPI (Associação Brasileira

de Propriedade Intelectual) e participa também, de vários Conselhos de empresas e associações. É membro

benemérito da Academia Nacional de Medicina, Cidadão Honorário de Juiz de Fora e foi Condecorado pela

Rainha Elizabeth em junho de 2001, como membro da Ordem do Império Britânico (O.B.E.).

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Começamos nossa caminhada em 1987 e vimos à lei ser pro-

mulgada 9 (nove) anos depois de intenso e profícuo trabalho. Es-

tamos completando agora, 10 (dez) anos da nova lei, entretanto,

é necessário buscarmos na historia os marcos da legislação sobre

Propriedade Industrial para melhor entendermos sua trajetória.

A nossa nova lei só foi possível devido à larga tradição do Brasil

nesta área, pois desde 1809 quando foi promulgado o Alvará de

D. João VI, o tema passou a ser incorporado na nossa legislação.

Em 1883 fomos um dos primeiros países a assinar a Convenção

de Paris sobre Propriedade Industrial. Lamentavelmente em 1945

foram abolidas as patentes farmacêuticas do nosso código de pro-

priedade industrial. Em 1988 a nossa Constituição no seu artigo 5º,

inciso XXIX assegura aos autores de inventos industriais privilégio

temporário para sua utilização. Em 1994 o Brasil aderiu ao TRIPS

– Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Industrial

Relacionados ao Comércio. Em 1995 foi criada a OMC, do qual o

Brasil é membro fundador. Em 14 de maio de 1996 foi aprovada

a Lei de Propriedade Industrial nº 9.279, depois de 5 anos de dis-

cussão no Congresso Nacional. Esta nova lei inclui, entre outros, a

patenteabilidade de medicamentos. Nesta área o Brasil realmente

perdeu a tradição, pois ficamos de 1945 a 1996, portanto, 51 anos

sem patentes para produtos farmacêuticos. Com isto perdeu-se a

cultura da Propriedade Intelectual nesta área e a forma de se tratar

do assunto. A nova lei resgatou, portanto, antiga dívida que o país

tinha com os legítimos titulares de direitos sobre suas invenções na

área farmacêutica, como também colocou o Brasil em linha com

a legislação internacional em matéria de propriedade intelectual.

As conseqüências da lei foram importantes, pois foi criada a legis-

lação para exploração de medicamentos genéricos; foi criada a Lei

de Inovação; o INPI que estava sem contratar funcionários abriu

concurso em 2006 e criou a Academia, ou seja, o Centro de Treina-

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mento para Propriedade Intelectual e Marcas; o judiciário passou

a ter no Rio de Janeiro varas especializadas na área; novos investi-

mentos em ativos fixos para produção de medicamentos foram fei-

tos no Brasil; o nosso acesso a novos e importantes medicamentos

foi imediato; várias parcerias universidades/empresas foram efe-

tuadas; processos de transferência de tecnologia foram efetivados;

os nossos pesquisadores ficaram no país; o combate à pirataria foi

intensificado; o aumento das pesquisas clínicas fases II e III foi no-

tável e nossos pesquisadores estão preparando teses e estudos com

agregação de valor. Por fim as empresas farmacêuticas nacionais

começaram a pesquisar e solicitar patentes, inclusive a Fiocruz.

Lamentavelmente o INPI não pode acompanhar a agilidade

que o processo merecia, pois nestes últimos 10 anos foram feitos

20.709 pedidos referentes às preparações para fins médicos, dentá-

rios e higiene pessoal e foram concedidas somente 269 patentes.

Talvez a ingerência da Anvisa, devido ao artigo 229C da Lei,

que tira do INPI as prerrogativas de conceder patentes para me-

dicamentos sem anuência prévia da Anvisa e as várias tentativas

de projetos de leis que procuram deteriorar a lei, possam ser os

responsáveis pelo atraso na concessão de patentes. Somente uma

parceria de todos envolvidos no tema poderia agilizar o processo

no Brasil, criando a vontade política e a cultura da propriedade

intelectual.

Esta parceria poderá ser o propulsor do desenvolvimento bra-

sileiro, na área da inovação com conseqüências benéficas para o

país.

Se você tem dúvidas sobre a importância de Lei de Patentes

é fundamental que você leia este livro de Francisco Teixeira, pois

além de esclarecedor é didático, simples, objetivo e presta um gran-

de serviço a todos interessados no tema.

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Introdução

Francisco Teixeira

A idéia de escrever este livro surgiu há alguns anos, quando eu

me encontrava ainda em plena luta campal pela promulgação da

nova Lei Brasileira de Propriedade Industrial.

Naqueles tempos, de longos embates no Congresso Nacional,

os contatos com os interessados no tema eram muito intensos, em

longas conversas com jornalistas, parlamentares, funcionários do

governo e, nem sempre com muita serenidade, com estudantes. Foi

aí, neste ponto, que eu comecei a constatar que, na maioria das

vezes, as pessoas que discutiam “propriedade intelectual” pouco ou

nada sabiam sobre o assunto. E, curiosamente, alguns se recusavam

a admitir sua ignorância ou, pior, deixavam que idéias preconcebi-

das funcionassem como uma autêntica barreira ao esclarecimento

de questões às vezes meramente técnicas.

A única exceção a esta regra foram os jornalistas, que nunca

hesitaram em revelar o seu maior ou menor grau de desconheci-

mento em relação à complexa questão das patentes. Confesso que,

às vezes, cheguei quase ao desespero porque tinha que repetir, ad

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nauseam, conceitos básicos que eu, na minha arrogância, achava

que deveriam ser de domínio universal. Mas como a necessidade

faz o hábito, fui aos poucos domando a impaciência e a intransi-

gência e fui começando a gostar das explicações, revelando uma

vocação tardia de “comunicador”.

O começo foi algo tímido: listas com defi nições conceituais, es-

critas em linguagem simples, direta, desmistifi cando termos antes

incompreensíveis para aqueles que não dominassem o jargão da

Propriedade Intelectual. Depois vieram folhetos, artigos, apresen-

tações para palestras e seminários. Daí para este livro foi um salto

de imenso prazer pessoal. Da mesma forma em que este livro se

inspirou em várias perguntas de jornalistas, daí ser também dedi-

cado a eles (vide “agradecimentos”), ele é destinado àqueles que,

interessando-se pelo tema, não venham a ser forçados, como eu, a

praticar o autodidatismo.

Ao escrevê-lo, pensei não nos que perguntam e aprendem sem

timidez, como jornalistas e estudantes, mas, sobretudo (vide sub-

título do livro) naqueles que às vezes têm vergonha de perguntar –

executivos, advogados, economistas, professores, políticos e tantos

outros profi ssionais que, agora, podem ter acesso, na intimidade de

seus escritórios ou dos seus lares, aos conceitos básicos deste tema

fascinante e contemporâneo.

Agora na ocasião do décimo aniversário da promulgação da

“Lei de Patentes”, achei que seria o momento ideal para publicar

uma segunda edição, revista, da obra, cuja primeira edição se en-

contra totalmente esgotada. Espero, desta forma atender aos inú-

meros pedidos neste sentido, que muito me envaidecem. Espero

também poder repassar todas as modifi cações diretas e indiretas a

que a nossa Lei foi submetida, no decorrer destes anos e, sobretudo,

chamar a atenção para modifi cações ora em discussão no Congres-

so Nacional, que, se aprovadas, irão descaracterizá-la substancial-

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mente. Estas e aquelas serão amplamente explicadas e discutidas na

nova secção de “Apêndice”, localizada no fi nal desta edição.

Por último, uma palavra de advertência. Não procurem en-

contrar neste pequeno livro um tratado sobre o tema. Nada disso.

Trata-se, no fundo, de quase uma cartilha. Ou, como dizem meus

amigos da indústria farmacêutica, no máximo uma “bula”, mas

sem nenhuma contra-indicação ou efeito colateral.

Já me sentirei amplamente recompensado se a leitura destas

páginas servir, ao menos, de estímulo para que o leitor se interesse

e se aprofunde mais no tema, reconhecendo que, no mundo globa-

lizado de hoje, o capital mais importante é o intelectual.

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Perguntas e Respostas

1. “Propriedade industrial” e “propriedade intelectual” são a mesma coisa?

A inteligência e a criatividade humanas produzem muitos fru-

tos, mas nem sempre esses frutos são concretos: podem apresen-

tar-se também na forma de conceitos abstratos. São idéias capazes

de se concretizar na forma de obras de arte, produtos industriais e

comerciais, serviços, e também como nomes e símbolos que serão

sinais inconfundíveis da procedência e qualidade de tais produtos,

obras ou serviços.

É reconhecido por todos o direito que tem o autor de um livro,

filme, canção ou texto teatral, em relação aos resultados comerciais

de sua criação. Da mesma natureza é o direito que um inventor

deve ter sobre seus inventos.

“Propriedade intelectual” é o direito que qualquer cidadão,

empresa ou instituição tem sobre tudo o que resultar de sua inteli-

Page 34: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

gência ou criatividade. Esse direito é protegido através de diversos

instrumentos jurídicos que, cada um a sua maneira, servem para

proteger os seus titulares (ou proprietários) contra o uso não-au-

torizado de sua legítima criação, talento ou inteligência, por ter-

ceiros.

A “propriedade industrial” é um dos tipos de propriedade inte-

lectual. Abrange a proteção de atividades, produtos, idéias ou sím-

bolos que estejam relacionados a um processo industrial ou co-

mercial. É o caso das patentes, das marcas, do desenho industrial,

das indicações geográficas e dos segredos de negócios.

O outro tipo de propriedade intelectual é o “direito autoral”.

Engloba os princípios que protegem os criadores de determinadas

obras literárias, científicas, artísticas, fonográficas etc. A existência

desses direitos faz com que os autores de livros e textos em geral

recebam compensação por sua comercialização (copyrights), que

os compositores recebam direitos por suas obras musicais e, ainda,

em muitos outros casos, que os autores impeçam o uso indevido de

obras de artes plásticas, como a reprodução de gravuras, quadros e

esculturas, obras arquitetônicas ou de design, obras cinematográ-

ficas reproduzidas em videofitas, videodiscos ou discos compactos

e, até mesmo, programas de computador (softwares) ou “topogra-

fias” de circuitos integrados ou chips.

2. A propriedade intelectual é um conceito recente?

Não. O conceito de propriedade intelectual é tão antigo quanto

a inteligência humana. Desde que o homem começou a manifestar

sua expressão artística, escrevendo livros, compondo poemas ou

peças musicais, criando quadros ou esculturas, surgiu a necessida-

Page 35: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

de de ver reconhecido o seu talento. O que evoluiu com o tempo foi

a defesa comercial do fruto desse talento.

A legislação sobre patentes industriais surgiu na Inglaterra, em

1623, com o impulso da industrialização, e foi adotada em 1790

pelos Estados Unidos.

Em 1883, todos os países presentes à Convenção Internacional

de Paris (inclusive o Brasil) firmaram um importante tratado mul-

tilateral sobre a propriedade industrial, que ficou conhecido como

a Convenção de Paris. Nesse tratado, os direitos de propriedade

industrial, especificamente, começaram a ter uma proteção mais

efetiva: a Convenção de Paris sistematizou as normas de proteção

a marcas, patentes, desenhos industriais etc. Seu texto tem sido re-

visto e atualizado de tempos em tempos – 1900 em Bruxelas, 1911

em Washington, 1925 em Haia, 1934 em Londres, 1958 em Lisboa

e 1967 em Estocolmo.

Em 1886, foi criada a Convenção de Berna, considerada como

a principal convenção transnacional especificamente voltada para

os direitos autorais, impondo normas mínimas para os países sig-

natários. A proteção dos direitos autorais é automática em todos os

países-membros. Seu texto tem sido também atualizado e revisado:

1896 em Paris, 1908 em Berlim, 1914 em Berna, 1928 em Roma,

1948 em Bruxelas, 1967 em Estocolmo, 1971 e 1977 em Paris.

Os conceitos ligados à propriedade intelectual têm exigido atu-

alizações freqüentes em função da rapidíssima evolução da tecno-

logia da informação. Discute-se hoje até como proteger os direitos

autorais em ambientes abertos e dinâmicos, como a internet, onde

a transmissão de softwares e outros produtos de informática, assim

como textos e imagens, não está ainda convenientemente regula-

da.

Page 36: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

3. Esses direitos à propriedade intelectual são reconhecidos em todo o mundo?

De um modo geral, sim. Entretanto, com níveis de proteção

bastante variáveis. Na realidade, esse reconhecimento evoluiu mui-

to a partir da assinatura do acordo TRIPs, em Marrakesh, no ano

de 1994.

O TRIPs (sigla que significa Trade-Related Intellectual Pro-

perty Rights – Direitos de Propriedade Intelectual Vinculados

ao Comércio) é um pacto internacional que faz parte do tratado

geral que criou a O.M.C. (Organização Mundial do Comércio) e

que concluiu a chamada “Rodada do Uruguai”do GATT (General

Agreement on Tariffs and Trade – Acordo Geral de Tarifas e Co-

mércio).

O tratado que criou a OMC diz respeito aos aspectos gerais do

relacionamento comercial entre os países. O TRIPs trata especifi-

camente da parte relativa aos direitos de propriedade intelectual.

Embora contenha ainda algumas falhas, sua assinatura marcou um

momento realmente histórico, pois 127 países concordaram em ter

um nível mínimo de proteção da propriedade intelectual.

Os países que assinam o TRIPs obrigam-se a reescrever suas

leis nacionais para adaptá-las às normas internacionais pactuadas

nesse acordo, que abrange patentes, marcas registradas, direitos

autorais, desenhos industriais, segredos comerciais, indicações ge-

ográficas, produtos farmacêuticos, circuitos integrados e softwares

de computador.

Está previsto no TRIPs um prazo de implementação que pode

chegar, em certos casos, a vinte anos. Parece excessivo, mas pelo

menos podemos ter hoje a certeza de que até 2.014 (!) todos os

países terão que adotar esse nível mínimo de proteção. É claro que

Page 37: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

os últimos a chegar serão prejudicados pela falta de investimentos

em fontes criadoras de tecnologia. Em 2.014, a História já nos terá

ensinado que possivelmente teremos diversos outros campos de

criação a proteger...

4. O Brasil tem adotado os tratados internacionais sobre propriedade industrial?

O Brasil pode se orgulhar de ter estado sempre entre os pri-

meiros a reconhecer efetivamente os tratados internacionais nessa

área. Foi o único país da América Latina signatário do documen-

to original da Convenção de Paris. Temos, portanto, uma tradição

centenária de respeito à propriedade intelectual.

Além de ser signatário original das convenções de Berna e de

Paris, somos também o único país na América Latina a implemen-

tar o tratado de cooperação de patentes (PCT), que assegura a

qualquer inventor, dentro ou fora do Brasil, o direito de pedir o re-

gistro do seu invento simultaneamente em seu país e em qualquer

outro país-membro.

Mais recentemente, o Brasil foi um dos primeiros países em

desenvolvimento a adotar integralmente, sem o uso dos prazos de

carência, o tratado do TRIPs, cuja ratificação foi feita pelo Con-

gresso Nacional em dezembro de 1994 e também pela nova lei de

propriedade industrial, nº 9279/96.

Houve, porém, um obscuro interstício nessa tradição. Parado-

xalmente, depois de ter sido um dos primeiros países do mundo

a assinar a Convenção de Paris em sua primeira versão, o Brasil

demorou 23 anos para assinar a versão mais recente desse tratado.

Page 38: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Em 1967, vivíamos sob a política de substituição de importações:

acreditava-se que a evolução tecnológica seria conquistada ao pre-

ço de copiar sem remuneração ou explorar sem ética o produto da

inteligência alheia. É óbvio que a evolução tecnológica não aconte-

ceu por essas vias transversas. Em 1990, finalmente, o Brasil ratifi-

cou o “texto de Estocolmo”. Antes tarde do que nunca.

5. Os direitos de propriedade industrial ganharam mais relevância com a globalização?

Sem dúvida, porque o conhecimento transmite-se agora com a

velocidade dos impulsos eletrônicos da Internet. Instantaneamente

é feita a divulgação de uma invenção, de uma marca ou de um novo

design, e a proteção desses direitos tem que acompanhar o mesmo

ritmo vertiginoso com que essas novidades são disseminadas. Hoje,

o novo modelo de um BMW é acessado tanto por um menino que

mora perto da fábrica em Munique como por um fã de automóveis

no Rio de Janeiro, em Bangkok ou em Nairóbi.

Page 39: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

6. Por que a propriedade industrial não era reconhecida no Brasil antes da Lei de Patentes, aprovada pelo Congresso em 1996?

O Brasil reconhecia a propriedade industrial, mas não permitia

o patenteamento de invenções e processos em certas áreas como

química, farmacêutica ou alimentícia, e fazia isso basicamente por

conta de uma premissa absolutamente falsa: a de que copiar, co-

piar, copiar, geraria cada vez mais tecnologia.

Por que essa premissa é falsa? Porque é uma crença que contém

uma incoerência em si mesma. Se todos copiassem todo mundo,

não haveria mais incentivo para a criação original. Quem come-

tesse a ousadia de criar um conceito novo, ou uma coisa nova, na

legítima pretensão de ter algum retorno comercial com sua criação,

teria necessariamente que mantê-la em segredo para não ser copia-

do. Voltaríamos então ao obscurantismo.

A criatividade é peça primordial do sucesso das organizações e

dos profissionais no mundo de hoje. Se olharmos as empresas que

têm maior valor patrimonial, veremos que estão na vanguarda as

que têm o maior acervo de capital intelectual. Belos exemplos dessa

condição são a Microsoft – empresa construída em cima de um

conteúdo intelectual fantástico, representado pelos softwares usa-

dos hoje no nosso dia-a-dia – e também as empresas farmacêuticas

de pesquisa, cujo principal componente não é o patrimônio físico,

e sim a tecnologia existente em seus produtos.

Existem hoje em desenvolvimento mais de dez mil produtos

para tratamento ou prevenção de todas as doenças que afligem

o homem. Da mesma forma, as empresas de softwares desenvol-

Page 40: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

vem milhares de programas e aperfeiçoamentos que vão facilitar o

dia-a-dia das empresas e dos indivíduos nos próximos anos. Essas

empresas e a evolução que elas promovem simplesmente não exis-

tiriam caso não houvesse a garantia legal de que o fruto de suas

descobertas será protegido contra a ação deletéria e criminosa de

imitadores, piratas e falsificadores.

A proteção dos direitos de propriedade industrial garante a

toda a sociedade o interesse cada vez maior dos investidores que

aplicam seus recursos nessas empresas inovadoras, certos de ter

como retorno a rentabilidade proveniente de um produto da in-

teligência.

Como conseqüência da política equivocada que o Brasil adotou

durante alguns anos, não reconhecendo os direitos de propriedade

intelectual em algumas áreas, deixamos de ser criadores originais

nessas áreas e passamos a ser conhecidos como plagiadores golpis-

tas no cenário internacional. Trocamos a nossa honradez e nossa

capacitação tecnológica pelo gozo de curto prazo em benefício de

alguns privilegiados que engordaram suas contas bancárias usando

argumentos falsamente patrióticos, enquanto o país emagrecia a

olhos vistos na sua capacidade de gerar tecnologia.

Page 41: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

7. Desde quando, e por quanto tempo, o Brasil abandonou sua tradição de pioneirismo na defesa da propriedade intelectual e deixou de reconhecer patentes?

Esse período em que o nosso país mergulhou no retrocesso tec-

nológico começou a delinear-se em 1945, quando o Brasil deixa de

reconhecer patentes para produtos farmacêuticos e ganhou corpo

em 1969, quando um decreto presidencial do governo militar es-

tendeu a proibição das patentes aos processos farmacêuticos. Em

1971, ainda sob o regime militar, uma lei do Congresso Nacional

confirmou um Decreto-Lei de 1969, resultando em um Código de

Propriedade Industrial que não reconhecia patentes em determi-

nadas áreas (indústria farmacêutica, alimentícia, química etc.).

Além de não reconhecer patentes, a lei brasileira durante esse

período também permitia que cidadãos espertíssimos, inspirados

na “Lei de Gérson” (tirar vantagem em tudo), registrassem aqui,

como suas, marcas famosas e valiosas de criadores estrangeiros.

Como consumidores, podíamos ser enganados (dentro da lei)

comprando um perfume “Paco Rabanne” que parecia mas não era.

Mas corríamos riscos ainda mais sérios diante de medicamentos

colocados no mercado e que imitavam produtos farmacêuticos

originais patenteados lá fora.

Além dos perigos que a imitação desses produtos trazia para

o consumidor e da reputação negativa no cenário internacional,

esse procedimento provocou um grande prejuízo ao desenvolvi-

mento tecnológico em nosso país. Diziam alguns que a liberdade

de copiar seria um impulso para o desenvolvimento tecnológico

Page 42: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

brasileiro, mas o que de fato aconteceu foi o contrário: a falta de

proteção à propriedade industrial inviabilizou a existência de in-

dustrias nacionais realmente competitivas em setores estratégicos

como o químico, o farmacêutico e o alimentício.

O panorama só começou a mudar a partir de 1990, quando o

governo brasileiro emitiu sua nova política industrial, incluindo a

proteção à propriedade industrial como ferramenta indispensável

ao desenvolvimento econômico e tecnológico. Em 1994, o Congres-

so ratificou o TRIPs e finalmente em 1996 é aprovada a atual Lei de

Propriedade Industrial, que passou a vigorar plenamente a partir

de 15 de maio de 1997. Posteriormente, alguns anos após o início

da vigência da nova Lei, infelizmente, foram introduzidas algumas

mudanças, que começaram a enfraquecer alguns de seus aspectos

mais importantes, através de Medidas Provisórias convertidas ou

de decretos supostamente reguladores, mas que conflitavam com

o espírito e o texto da Lei. Mais ainda, subsistem no Congresso al-

guns Projetos de Lei, que, se aprovados, irão descaracterizar ainda

mais o texto original da nossa Lei. Estes pontos são discutidos mais

em detalhe no apêndice localizado no final desta edição.

Page 43: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

8. Essa nova lei trata só de patentes?

Não. A Lei 9.279 tornou-se conhecida como “Lei de Patentes”,

apenas porque esse era o seu tema mais polêmico.

Na verdade ela regula direitos e obrigações relativos à proprie-

dade industrial, que, por definição, abrange os seguintes itens:

• patentes de invenção e de modelo de utilidade;

• registro de desenho industrial;

• registro de marca;

• indicações geográficas;

• concorrência desleal.

9. O que é uma patente?

A patente é o direito de explorar comercialmente uma inven-

ção, com exclusividade, por tempo determinado. Ela funciona

como uma espécie de contrato entre o inventor e a sociedade. O

inventor compromete-se a tornar público o seu invento, recebendo

em troca o direito exclusivo de explorar comercialmente aquele in-

vento durante um período determinado. Já a sociedade se beneficia

com a divulgação pública do invento que, de outra forma, perma-

neceria em sigilo.

A patente funciona como um fator de proteção que viabiliza os

investimentos na pesquisa científica.

Page 44: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

10. Uma patente pode ser transferida para terceiros?

O detentor dos direitos de propriedade industrial pode con-

ceder a terceiros o direito de fabricação e comercialização de seu

invento, gratuitamente ou em troca do pagamento de royalties.

11. Quanto tempo dura esse direito de exclusividade?

Um certificado de patente geralmente tem o prazo de 20 anos

contados a partir da data em que se faz o “pedido de patente”. Mas

na verdade esse prazo inclui toda a fase de testes, revisão e apro-

vação do produto. Para um novo medicamento, por exemplo, isso

leva em média 12 anos, restando somente 8 anos para a comercia-

lização exclusiva pelo detentor da patente.

Findo esse prazo, o objeto da patente cai em domínio público e

pode ser utilizado por qualquer pessoa física ou jurídica.

Page 45: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

12. Já que os cientistas ou as empresas de pesquisas podem patentear o fruto do seu trabalho, isso significa que se pode patentear uma planta, uma semente, enfim, até a natureza e a vida?

Absolutamente não. A inovação executada pela mão do ho-

mem é condição indispensável à aprovação de uma patente.

Nada pode ser patenteado sem que haja uma modificação ra-

dical a ponto de transformar até um ser vivo em algo capaz de pro-

duzir, após a intervenção humana, efeitos completamente diferen-

tes dos que a natureza lhes atribuiu.

Um excelente exemplo é o processo de obtenção de insulina

por engenharia genética. Tradicionalmente, a insulina administra-

da aos diabéticos era produzida através de um processo de puri-

ficação do pâncreas do boi e do porco. Ora, por mais sofisticados

que fossem esses métodos de purificação, a insulina resultante

desses órgãos animais não era absolutamente idêntica à humana,

gerando ocasionalmente até algumas reações indesejadas em dia-

béticos mais sensíveis.

Pesquisando soluções para esse problema, um grupo de cientis-

tas de duas empresas de pesquisa (Genentech e Eli Lilly) verificou

que a bactéria scherichia coli poderia ser alterada em seu código

genético transformando-se numa verdadeira fábrica de insulina,

com características idênticas à insulina humana.

Por força do talento de uma equipe de cientistas, uma bactéria

anteriormente inútil passou a produzir insulina por DNA recom-

binante. Daí o seu patenteamento, já que a scherichia coli, depois

Page 46: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

de modificada, nada mais tinha a ver com aquela pequena ameba

cujo destino seria, na melhor das hipóteses, o esgoto público...

13. Qual a diferença entre descoberta e invenção?

Não se pode patentear uma planta, uma fruta, um legume, um

animal ou um microorganismo da maneira em que eles são encon-

trados na natureza, nem mesmo quando recém-descobertos e iso-

lados. Encontrar um novo ser vivo, por exemplo, é uma descoberta,

não uma invenção. A invenção pressupõe que uma planta, um ani-

mal ou um microorganismo tenham sido geneticamente modifica-

dos pelo homem e que sua utilização passe a ser feita de uma forma

radicalmente distinta daquela que lhe foi conferida pela natureza,

como no exemplo da bactéria citada na resposta anterior.

14. O que pode e o que não pode ser patenteado?

Essa questão está bem clara no artigo 8o da lei da propriedade

industrial:

“É patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novida-

de, atividade inventiva e aplicação industrial.”

O primeiro critério, novidade, significa que o produto deve ser

realmente uma adição a todo o conhecimento preexistente, ou, em

jargão técnico, uma adição ao estado da técnica. Estado da técnica

significa o conjunto de conhecimentos disponíveis no momento

pre-existente da invenção.

Page 47: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

O segundo critério é a presença necessária de uma atividade

inventiva. Uma invenção tem que ter originalidade, criatividade,

não poderá ser uma mera reprodução de algo óbvio ou que se en-

contre na natureza, pois isto seria considerado uma descoberta e

não uma invenção.

A terceira condição, muito importante, é a aplicação indus-

trial. A invenção deverá se revestir de características que permitam

a sua reprodução em escala industrial. As famosas invenções do

prof. Pardal, embora originais, não se enquadrariam neste último

critério.

Os modelos de utilidade que podem ser patenteados também

estão previstos na lei (Artigo 9o):

“É patenteável como modelo de utilidade o objeto de uso práti-

co, ou parte deste, suscetível de aplicação industrial, que apresente

nova forma ou disposição, envolvendo ato inventivo, que resulte

em melhoria funcional no seu uso ou em sua fabricação.”

Os grandes mestres do direito de propriedade intelectual con-

sideram que todo e qualquer processo ou produto que apresente

as três características essenciais da patenteabilidade (novidade, ati-

vidade inventiva e aplicação industrial) pode ser patenteado, não

devendo haver nenhuma restrição de ordem subjetiva. Entretanto,

a lei brasileira não seguiu este conceito mais liberal. Preferiu seguir

algumas leis em vigor em outros países que, por mera concessão

política, adotam essas restrições.

Não pode ser patenteado “o que for contrário à moral, aos bons

costumes e à segurança, à ordem e à saúde públicas”, diz o Artigo

18 da lei. Não cabe a uma lei de propriedade industrial entrar em

conceitos desse tipo. Com este excesso de zelo, o legislador esque-

ceu-se de que a patente não é uma autorização de vendas mas so-

mente uma proteção contra a imitação. Um produto patenteado

pode ter sua comercialização proibida, se for o caso, mas isso não

Page 48: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

impede que seja patenteado, até porque os costumes e valores mu-

dam: quem imaginaria, há alguns anos, campanhas de comunica-

ção de massa, assinadas pelo governo federal, incentivando o uso

de “camisinhas” durante o carnaval?

A lei também exclui da patenteabilidade vários produtos que

deveriam ter suas patentes concedidas normalmente. É o caso dos

programas de computador, cuja proteção na lei brasileira limita-se

ao copyright do direito autoral.

Também não podem ser patenteadas as “técnicas e métodos

operatórios ou cirúrgicos, bem como métodos terapêuticos ou de

diagnóstico, para aplicação no corpo humano ou animal”. Este é

outro equívoco da lei brasileira. É um absurdo não poder patente-

ar uma nova técnica cirúrgica, por exemplo, se ela é resultado do

talento, do esforço e da criatividade de um especialista ou de uma

equipe.

E por que não se permite patentear qualquer invenção relativa

à energia nuclear? Esta restrição está no mesmo Artigo 18: “subs-

tâncias, matérias, misturas, elementos ou produtos de qualquer es-

pécie, bem como a modificação de suas propriedades físico-quími-

cas e os respectivos processos de obtenção ou modificação, quando

resultantes de transformação do núcleo atômico”.

Outra restrição equivocada, em nossa opinião são as que in-

cluem as invenções biotecnológicas que não envolvam microorga-

nismos transgênicos. A lei protege, então, as invenções mais sofis-

ticadas e deixa de fora as mais tradicionais (como as resultantes de

processos simples como a fermentação) e portanto mais acessíveis

aos inventores que não dispõem de grandes recursos tecnológicos.

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15. Quando um cientista descobre que um determinado “coquetel de remédios”, com uma certa proporção na dosagem de cada componente, tem ação especialmente eficaz, como aconteceu recentemente com a Aids, essa descoberta pode ser patenteada?

Nesse caso a lei é muito clara e correta: não se pode patentear a

simples mistura de produtos preexistentes. Isso não é considerado

uma atividade inventiva, e sim uma mera justaposição de tecnolo-

gia conhecida. A mesma coisa ocorre com os complexos vitamíni-

cos.

Se um fabricante desejar, por exemplo, agregar vários produtos

em uma só cápsula, para fornecer esse “coquetel” de maneira mais

prática e segura, precisará obter autorização dos titulares de cada

patente e pagar a eles os devidos royalties.

16. O que é “pirataria” nos dias de hoje?É o mesmo que falsificação?Por que se diz que um produto é “pirata”?

Falsificação e pirataria são coisas diferentes. O crime de pi-

rataria é uma infração aos princípios da propriedade intelectual,

enquanto a falsificação é um crime que não está necessariamen-

Page 50: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

te nesse campo. Assim, um produto pirata não é necessariamente

uma falsificação, e vice-versa.

Fazer um produto semelhante a outro, sem obter autorização

de seu autor, criador ou inventor, quando esta autorização é legal-

mente necessária, é um ato de pirataria.

Digamos que eu compre em um camelô, por exemplo, uma fita

um CD ou um DVD com as últimas canções gravadas pelo cantor

Roberto Carlos. Pode ser que eu esteja comprando uma cópia cuja

produção não foi nem autorizada pelo intérprete nem pelo seu edi-

tor, e muito menos pela gravadora. Trata-se apenas de uma fita, CD

ou DVD que foram reproduzidas clandestinamente e que apresen-

tam características semelhantes ao produto original, porém sem a

mesma qualidade técnica. O mais relevante, no caso, é que a venda

dessas cópias não gera benefícios ao seu autor nem aos seus parcei-

ros que investiram na produção e na comercialização de sua obra.

Vai render lucros, sim, aos que o produziram e o comercializam

sem licença dos titulares dos direitos de propriedade intelectual.

Trata-se, portanto, de um produto pirata. Mas, a rigor, não é

uma falsificação. Um videograma ou fonograma de um artista co-

nhecido, reproduzido em uma fita cassete pirata, será sempre um

fonograma daquele artista. E não de outro cantor fazendo-se pas-

sar por ele.

É também um ato de pirataria explícita alugar uma fita de ví-

deo ou DVD que não esteja licenciada para esse tipo de comercia-

lização, mesmo que seja uma fita ou um DVD original. É o caso

das mídias que são vendidas apenas para exibição privada em re-

sidências. Auferir rendimentos comerciais utilizando esse veículo

é infração de propriedade intelectual, já que o acesso àquela obra

foi cedido pelo autor e seus parceiros apenas para um determina-

do tipo de exibição. Além disso, qualquer outra forma de exibição

com cobrança de ingressos, inclusive em um cinema, escola ou clu-

Page 51: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

be, é considerada um ato de pirataria, a não ser que a cópia alugada

seja destinada à exibição pública. Esta discussão se ampliou ainda

mais nos últimos anos com o surgimento de novas mídias como

o MP-3 e os I-Pods que utilizam arquivos eletrônicos obtidos via

Internet. Depois de uma luta intensa, que ainda não terminou, os

sítios e bancos de dados que fornecem estes arquivos ao mercado

estão sendo obrigados a pagar copyrights aos detentores dos direi-

tos autorais destas obras.

Pirataria também é o que ocorre habitualmente em escolas,

universidades e até bibliotecas públicas, quando se fazem cópias

“xerox” de livros (no todo ou em parte). Mesmo que não sejam

vendidas como apostilas, mas simplesmente xerocados por alunos,

essas cópias caracterizam um desrespeito aos direitos do autor. Em

alguns países, paga-se uma pequena taxa de direitos autorais no ato

de fazer cópias de um livro.

Já a falsificação é um crime contra autor e também contra o

consumidor. É o caso, por exemplo, de um remédio cuja emba-

lagem e características físicas têm a mesma aparência do produto

original, mas o conteúdo é falso. Ou seja, dentro de uma cápsula

vendida como se fosse antibiótico existe apenas amido de milho ou

talco, em vez dos ingredientes farmacológicos. Trata-se portanto

de uma falsificação, comparável a garrafas de uísque “batizadas”.

Ou peças de roupa copiadas de grifes famosas, com a logomarca

dessas grifes, mas produzidas sem licença em confecções de fundo

de quintal. Estes casos de falsificação constituem crimes indepen-

dentes de qualquer eventual infração aos direitos de propriedade

intelectual.

Page 52: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

17. Por que houve tantas pressões e protestos contra a aprovação da Lei de Patentes?

Interesses particulares e pessoais sempre se organizam para

evitar o corte de privilégios. O antigo código de propriedade in-

dustrial autorizava privilégios especiais para determinados empre-

sários que imitavam ou copiavam produtos de terceiros. Ou seja,

ao abrigo da lei, alguns privilegiados podiam utilizar, sem qualquer

ônus, o conteúdo tecnológico de patentes de produtos farmacêuti-

cos, alimentícios e químicos, reconhecidas no exterior mas não em

nosso país. Uma patente desse tipo exige investimentos de milhões

de dólares, além de vários anos de trabalho duro de pesquisadores

e grandes equipes de especialistas. E o retorno desses investimen-

tos, com a venda do produto, é que viabiliza novas pesquisas. Sen-

do assim, é justo plagiar?

Claro que permitir o plágio é um absurdo, mas, antes da nova

lei de propriedade industrial, um laboratório instalado no Brasil

poderia produzir e comercializar, por exemplo, produtos similares

ao AZT, ao Prozac, ao Antak e outros medicamentos famosos, sem

pagar qualquer direito aos detentores das patentes desses produtos.

Tudo isso a pretexto de desenvolver uma indústria farmacêutica

nacional.

Obviamente esse princípio não era democrático, pois signifi-

cava uma exceção consentida a um princípio geral do direito de

propriedade. É claro que este privilégio de exceção beneficiou eco-

nomicamente a muitas empresas. Nada mais natural que os privi-

legiados se organizassem para lutar por seus interesses. Também

era natural que os atingidos economicamente pela concessão des-

ses privilégios se organizassem para aboli-los. Daí a polêmica.

Page 53: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Obviamente os dois lados encontram defensores que utilizam

até argumentos ideológicos.

De um lado, estavam aqueles que defendiam seus pontos de

vista como questões de interesse nacional, de segurança da pátria,

de posicionamento político para a conquista da “independência

tecnológica” em setores estratégicos como o farmacêutico e o quí-

mico.

De outro lado, aqueles que sustentam que a indústria só pode

ser inovadora quando protegida por uma forte lei de patentes que

preservasse os investimentos de altíssimo risco em áreas tão com-

plexas.

A segunda corrente prevaleceu na votação da nova lei, por ter

entendido o Congresso Nacional que a nação brasileira somente

poderia alcançar um real desenvolvimento tecnológico a partir do

momento em que os direitos de propriedade intelectual, tão ar-

duamente defendidos pelo acordo TRIPs, fossem reconhecidos em

nosso país. O Brasil agiu certo.

A temperatura dos debates subiu algumas vezes, quando a cha-

mada “lei das patentes” estava em discussão nas duas casas do Con-

gresso Nacional, devido a alguns fatores eminentemente políticos.

Assim foi quando os Estados Unidos, em 1988, instituíram sanções

comerciais a exportadores brasileiros, como retaliação para obter

uma suposta compensação pelos prejuízos sofridos por suas em-

presas farmacêuticas cujos produtos eram legalmente imitados no

Brasil. Nesta época, aquele que defendia as patentes de medicamen-

tos era considerado um tipo de lesa-pátria ou Calabar redivivo.

A temperatura subiu também quando ocorreu a primeira vo-

tação da lei na Câmara dos Deputados, que coincidiu com um pro-

cesso de impeachment do ex-presidente Collor. Como o projeto de

lei tinha sido enviado ao Congresso por aquele presidente, o ato de

se defender essa lei passou a ser visto por alguns como “submissão”

Page 54: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

a um governo que estava sendo justamente despejado do poder por

exigência de toda a sociedade.

Felizmente, nesse caso, a razão prevaleceu sobre a emoção. O

texto que acabou sendo votado no Congresso é muitíssimo melhor,

em qualidade e nível de proteção, do que o projeto que havia sido

apresentado no governo Collor.

E a nova lei foi aprovada por maioria de votos, superior até à

que é exigida para emendas constitucionais, refletindo portanto o

consenso de mais de 80% dos congressistas. Esta votação consa-

gradora confere a essa lei um nível de legitimidade absolutamente

acima de qualquer suspeita.

O fato de não ter sido aprovada por unanimidade só faz au-

mentar o valor da lei de patentes, pois uma lei que protege a inteli-

gência é incompatível com o conceito de “unanimidade burra”, tão

bem definida pelo grande Nelson Rodrigues.

18. É verdade que a Lei de Patentes pode inibir a pesquisa científica no Brasil?

Absolutamente falso. Pelo contrário, a lei já está gerando a cria-

ção de novos projetos de pesquisa científica no Brasil. As universi-

dades sabem que não podem depender exclusivamente das escassas

verbas que o governo destina à pesquisa científica. À semelhança

de suas congêneres no exterior, nossas instituições universitárias

precisam celebrar parcerias com a iniciativa privada para viabilizar

as suas pesquisas. Além disso, poderão passar a obter recursos eco-

nômicos através da comercialização de seus inventos. Dessa forma

estarão não só garantindo o funcionamento dos laboratórios e a

conservação dos cientistas em seus quadros, como também geran-

do recursos para novas pesquisas. A lei contém, inclusive, um dis-

Page 55: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

positivo que estabelece uma regra de divisão dos recursos auferidos

por uma patente, entre os inventores e as instituições que viabili-

zam esses inventos.

Ficamos muito felizes ao saber que hoje, passados dez anos da

passagem da Lei, instituições respeitabilíssimas como a Fiocruz e

a Unicamp já possuem suas próprias patentes, aqui e no exterior.

Só este fato, por tão relevante, nos compensa largamente por tanto

esforço dispendido no processo de discussão e aprovação da nova

Lei.

19. Não seria melhor a existência de um período de carência antes da vigência da lei, para que o Brasil tivesse a oportunidade de primeiro desenvolver-se tecnologicamente e aí sim reconhecer as patentes?

Esse argumento é absurdo e os fatos comprovam que ocorre

exatamente o contrário. Depois de várias décadas sem patentes, a

indústria farmacêutica nacional não produziu um só medicamen-

to inovador.

Copiar não cria tecnologia.

Patentes, por outro lado, representam garantia de investimen-

tos privados em pesquisa. Não há desenvolvimento apenas com

investimento do Estado. Portanto, patentes são uma pré-condição

para o desenvolvimento, e não uma conseqüência.

Page 56: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

20. O Japão não copiava tecnologia antes de se desenvolver?

Sim, mas com uma grande diferença: o Japão pagava aos seus

legítimos criadores pelas cópias tecnológicas que realizava. Foi

uma estratégia completamente oposta à que alguns brasileiros “na-

cionalistas” defenderam durante as discussões da lei de patentes,

quando argumentavam que o Brasil deveria copiar livremente os

produtos criados em outros países, sem nenhum pagamento de

royalties, até que nossa própria indústria estivesse suficientemente

desenvolvida.

Ao contrário do que se divulga, o Japão sempre pagou pelo seu

acesso à tecnologia de ponta e, desta forma, tendo acesso legítimo

a ela, criou condições para que seus próprios empresários investis-

sem em tecnologia própria.

O respeito às patentes foi e tem sido um dos ingredientes do

desenvolvimento japonês.

21. Qual foi o país que mais se beneficiou pelo fato de reconhecer mais amplamente o direito à patente?

Sem dúvida, foram os Estados Unidos, cuja lei de patentes é

uma das mais antigas do mundo, com mais de dois séculos de exis-

tência.

Page 57: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

A eficiência do escritório americano de patentes é reconhecida

no mundo inteiro, como também a liberalidade da sua lei. O pro-

cesso de aprovação de uma nova patente é extremamente rigoroso,

o que dá confiabilidade ainda maior ao sistema.

As empresas investem maciçamente em pesquisa tecnológica,

com a segurança de que seus direitos de propriedade intelectual

estarão protegidos.

E inventores de todas as nações, na maioria dos casos, esco-

lhem os EUA como primeiro país onde depositam seu pedido de

patentes.

Muito importante também é destacar, no sistema norte-ameri-

cano, o tratamento especial que é conferido às cortes judiciais que

decidem litígios de propriedade intelectual. Por esse motivo, essas

cortes tornam-se fontes primárias de jurisprudência internacional

sobre o tema.

22. Afinal, patente é monopólio ou não?

As doutrinas econômicas ensinam que monopólio é uma situ-

ação em que o mercado é abastecido por uma única empresa que

fornece um produto para o qual não haja substitutos próximos.

O direito de propriedade industrial, instituindo as patentes,

não cria monopólio algum, mas sim uma exclusividade de comer-

cialização, temporária, nos estritos limites do conteúdo de uma de-

terminada patente.

Produtos patenteados de diversas empresas concorrem inclu-

sive entre si.

A patente, portanto, estimula a concorrência entre as empresas

e o próprio desenvolvimento científico. Há ótimos exemplos dessa

Page 58: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

concorrência sadia, que estimula o aprimoramento dos produtos e

o bem-estar dos consumidores:

existem 17 tipos do antibiótico cefalosporina patenteados

por 11 companhias diferentes;

se falarmos de uma das principais categorias de medicamen-

tos, os hipertensivos, teremos nada menos que 19 patentes, de 14

diferentes empresas.

Há muitos outros exemplos como estes. Será que isso é mono-

pólio???

Hoje em dia há até alternativas com patentes diferentes, até

para os produtos para tratamento da disfunção erétil, como o Via-

gra, o Cialis e o Levitra.

23. Francamente, a patente não prejudica a indústria nacional?

De forma alguma. Que indústria nacional seria essa cujos pro-

dutos não passariam de imitações e falsificações? A patente, antes

de mais nada, é garantia de reconhecimento ao poder de criação e

invenção.

O empresário nacional é plenamente capaz de criar produtos

originais que possam competir com vantagens no cenário interna-

cional. Há vários exemplos, tanto em patentes de produtos mais

populares, como as sandálias “Melissinha”, sucesso indiscutível,

quanto em inventos mais requintados, como o original sistema de

transformação do lixo em combustível, criado pelo cientista Flavio

Alterthum, da USP.

Este pesquisador, através da engenharia genética, transformou

a Escherichia coli em uma nova bactéria recombinante, usando ge-

nes de outra, a Zynomonas. Seu invento permite a produção de

Page 59: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

álcool combustível (etanol) a partir de bagaço de cana, palha de

milho, papel velho e diversos tipos de lixo.

Esse invento mereceu do Departamento de Marcas e Patentes

dos Estados Unidos a patente de número 5.000.000. O governo

norte-americano costuma conceder as patentes com números re-

dondos como uma honraria reservada a invenções especiais, que

representem contribuições de grande importância para a huma-

nidade.

Mas ironicamente a notoriedade no exterior não deu a Flávio

nenhuma honra em seu país. Ele chegou a oferecer a patente da

invenção à USP e ao CNPq, que não se interessaram. Conclusão: o

patenteamento é da Universidade da Flórida, que vendeu a licença

da bactéria à empresa Bioenergy visando à sua aplicação industrial.

E, para utilizar a tecnologia do cientista brasileiro, nosso país terá

que pagar royalties aos norte-americanos.

Se já houvesse proteção de patentes no Brasil, viabilizando o

mesmo tipo de parceria que acontece nos EUA entre indústrias e

universidades, o pesquisador teria tido muito mais facilidade de

desenvolver e patentear aqui mesmo o seu invento.

24. A obrigação de pagar royalties faz aumentar os preços?

Em primeiro lugar, não há “obrigação de pagar royalties”, por-

que a patente significa “exclusividade temporária de mercado”: dá-

se ao detentor do objeto de uma patente os direitos exclusivos de

comercializá-lo até que seu prazo se esgote. E, em grande parte dos

casos, o titular comercializa-o diretamente.

Somente nos casos em que o inventor prefere ceder os direi-

tos de comercialização a terceiros é que haverá um pagamento de

Page 60: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

royalties contratuais, por parte do licenciado, para quem lhe cedeu

aquela tecnologia.

A influência dos royalties na formação dos preços, com um

percentual que geralmente não chega a 10%, é muito inferior à in-

cidência de impostos sobre a operação direta.

O governo, através dos impostos, na grande maioria dos casos

arrecada muito mais com um invento do que o próprio inventor

ou seus parceiros comerciais.

25. Não seria válido deixarmos de pagar royalties durante um tempo, para financiar pesquisas científicas com esse dinheiro?

Esta idéia tem base num conceito que já esteve em voga há al-

guns anos mas que felizmente está caindo em desuso – a “formação

compulsória de tecnologia”, ou “industrialização a tapa”.

Essas pessoas, espertamente criativas e que gostam de tirar

vantagem em tudo, raciocinavam da seguinte forma antes da lei de

patentes: Já que não temos investimentos em tecnologia por parte

do Estado, que é pobre, nem podemos atrair investimentos priva-

dos porque o Brasil não reconhece as patentes e copiar é tão fácil,

vamos fazer os “tubarões” da tecnologia pagarem a conta. Para que

pagar royalties se eles já são tão ricos?

Essa exótica teoria rarissimamente encontra respaldo em qual-

quer país do mundo.

Os royalties pagos são o veículo mais legítimo para que um

inventor possa ser justamente remunerado pelo fruto de sua cria-

ção. O inventor bem recompensado tornar-se-á uma fonte de mais

e mais criações, que poderão resultar em inovações tecnológicas

Page 61: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

ainda melhores. Se suspendêssemos, mesmo temporariamente, o

pagamento de royalties, estaríamos tirando não só o estímulo mas

também os recursos mínimos necessários à formação de novas tec-

nologias. Além disso, estaríamos praticando um furto de proprie-

dade intelectual.

26. O reconhecimento das patentes estrangeiras pode causar desemprego e desestimular investimentos no Brasil?

Muito pelo contrário: agora, com a proteção às patentes, au-

menta no Brasil o estímulo para empregos qualificados nas indús-

trias excluídas, como a química, a farmacêutica e a alimentícia.

Essa pergunta talvez fizesse algum sentido se o não-reconhe-

cimento de patentes, durante quase cinco décadas, tivesse gerado

empregos no Brasil. Mas o que acontecia era exatamente o contrá-

rio. As indústrias nacionais beneficiadas pela falta de patentes acos-

tumaram-se a importar os principais componentes de seus produ-

tos e quase sempre foram meras misturadoras de ingredientes.

Apesar da liberdade de copiar, essas indústrias jamais conse-

guiram fabricar os insumos básicos no país, como por exemplo

aqueles ingredientes usados na produção de medicamentos. A

maior parte (e a parte mais qualificada) da mão-de-obra usada pe-

los fabricantes nacionais de medicamentos, portanto, estava fora

do Brasil, nas indústrias provedoras de tecnologia e fabricantes de

insumos básicos.

Page 62: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

27. Qualquer pessoa pode requerer patente para uma invenção?

Sim. Qualquer pessoa. E esta patente será concedida desde que

o objeto da patente atenda aos três requisitos já citados na resposta

à pergunta 14. A lei presume que o requerente tem legitimidade

para obter a patente, salvo prova em contrário.

A patente também pode ser requerida pelos herdeiros ou suces-

sores do autor, ou por um cessionário (pessoa ou empresa a quem

o autor ceda ou licencie a exploração do seu invento).

Se a invenção patenteada houver sido desenvolvida durante um

vínculo profissional (contrato de trabalho ou de prestação de ser-

viços) com uma empresa ou outro tipo de instituição, o inventor

não será o titular ou detentor da patente; entretanto, o certificado

será emitido em seu nome pessoal.

28. A patente pode ser requerida por um grupo de pessoas, se a invenção resultar de um trabalho de equipe? Neste caso, todos têm que assinar o pedido de patente?

Se a invenção ou modelo de utilidade houver sido realizada em

conjunto por duas ou mais pessoas, todas podem assinar o pedido

de patente, mas basta que uma delas o faça, “mediante nomeação

e qualificação das demais, para ressalva dos respectivos direitos”

(Artigo 6o § 3o).

Page 63: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

29. Onde se dá entrada a um pedido de patente?

No INPI – Instituto Brasileiro da Propriedade Industrial, um

órgão do Ministério do Desenvolvimento. O INPI tem sede no Rio

de Janeiro, mas os pedidos de patentes podem também ser pro-

tocolados em qualquer das suas representações nos estados e no

Distrito Federal.

30. Como se faz um pedido de patente?

Nos procedimentos previstos pela Lei de Propriedade Indus-

trial, o pedido de patentes deve conter: o requerimento; um re-

latório descritivo; desenhos, se for o caso; um resumo do que vai

ser patenteado; e comprovante de pagamento do depósito. O INPI

tem Atos Normativos que explicam detalhadamente cada um des-

ses requisitos.

Logo que é apresentado, o pedido é submetido a um exame

formal preliminar, para ver se todos os requisitos estão em ordem,

para então ser protocolado. Se faltar algum requisito (desde que

não faltem os dados relativos ao objeto, ao depositante e ao inven-

tor), o pedido poderá ser entregue mas o INPI fixará um prazo de

30 dias para que todos os itens sejam fornecidos.

A data do recibo de pagamento do depósito fica sendo conside-

rada como data de apresentação do pedido.

Page 64: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

31. Os pedidos de patente são publicados no Diário Oficial?

Atualmente são publicados na Revista da Propriedade Indus-

trial, que é editada pelo INPI. Antes da criação do INPI, eram pu-

blicados no Diário Oficial da União.

Essa publicação, entretanto, não é feita antes que decorram

18 meses, contados da data do pedido de patente, para que este

permaneça em sigilo durante todo esse período. A menos que o

depositante, por qualquer motivo, solicite que a publicação seja

antecipada.

O que se publica são apenas os dados identificadores do pedido

de patente. As demais informações (o relatório descritivo, o resumo

e inclusive os desenhos) ficam à disposição do público no INPI.

32. E os casos de invenções sigilosas que não podem ser divulgadas?

De acordo com a lei 9.279, caso o objeto da patente seja de inte-

resse da defesa nacional, esse pedido de patente terá caráter sigiloso

e não deverá ser publicado.

Há um breve capítulo da lei dedicado à “patente de interesse da

defesa nacional”, com um só artigo (no 75) que, embora não seja

muito importante na nova lei, remete-nos a alguns anos de não tão

saudosas memórias. É resquício de uma época autoritária.

É bom lembrar que este projeto de lei começou a ser elabora-

do em 1991. Até a aprovação da Lei, foram seis anos de diferença.

É óbvio que as coisas evoluíram muito nesse período, mas em 91

Page 65: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

as lembranças ainda estavam bastante vivas... então alguém achou

que as patentes de “interesse nacional” deveriam ter seus trâmites

próprios.

Isso foi, obviamente, uma questão de estratégia política para

obter apoio dos militares à aprovação da lei. Um grupo significati-

vo de militares nacionalistas engrossava o cordão dos que questio-

navam o instituto da patente. Acredito que o faziam não por terem

uma idéia preconceituosa, mas por não estarem suficientemente

informados sobre o que realmente seria o conceito de uma paten-

te... Creio que, nesse caso, a intenção dos autores do projeto de lei

foi evitar uma resistência desnecessária por parte dos militares.

Na verdade, o Artigo 75 não tem muita importância, pois res-

tringe-se a pedidos de patente originários do Brasil. Ou seja, não

prevê a possibilidade de uma patente estrangeira ser considerada

como de defesa nacional.

Seria o caso, por exemplo, de uma arma especial ou de algum

novo equipamento de proteção do sistema de defesa nacional. Ga-

rante-se a esses pedidos de patentes um sigilo obrigatório.

Quem vai definir esse caráter sigiloso ou não? O que está pre-

visto na lei é que “o INPI encaminhará o pedido, de imediato, ao

órgão competente do Poder Executivo”. Possivelmente será uma

equipe da Secretaria de Assuntos Estratégicos ou mesmo do Esta-

do Maior das Forças Armadas. Não havendo resposta em 60 dias,

o INPI deverá ignorar a solicitação de sigilo do requisitante e pro-

cederá normalmente.

Ainda nesse artigo, “é vedado o depósito no exterior de pedi-

do de patente cujo objeto tenha sido considerado de interesse da

defesa nacional, bem como qualquer divulgação do mesmo, salvo

expressa autorização do órgão competente”.

Além disso, “a exploração e a cessão do pedido ou da patente

de interesse da defesa nacional estão condicionadas à prévia auto-

Page 66: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

rização do órgão competente, assegurada indenização sempre que

houver restrição dos direitos do depositante ou do titular”.

33. O titular de uma patente pode manter seu nome em sigilo?

Ele pode solicitar ao INPI que o seu nome seja mantido em

sigilo: “O inventor será nomeado e qualificado, podendo requerer

a não divulgação de sua nomeação.” (§ 4o do Artigo 6o).

O anonimato do autor é outro aspecto curioso a respeito de

sigilo em patentes. Este procedimento pode ser perigoso em al-

guns casos. O Artigo 88, por exemplo, define que os direitos de

uma invenção ou modelo de utilidade pertencem ao empregador

que contrata profissionais para uma determinada pesquisa ou ati-

vidade inventiva. Suponhamos que alguém, de má-fé, queira dar

um drible nesse dispositivo. Registra em seu nome uma invenção

que está sendo desenvolvida na empresa onde trabalha, sem nada

informar à empresa, e pede sigilo desse registro ao INPI.

Para evitar situações assim, a empresa pode solicitar ao INPI

que lhe informe o nome do inventor, mesmo que este nome esteja

sob sigilo. Isso é possível, desde que a parte interessada tenha ra-

zões legítimas para supor que esse nome deva ser revelado.

Por que alguém desejaria sigilo em torno do seu nome? Será

que há casos em que isso ocorra de “boa-fé”, e não de “má-fé”?

Pode ser o caso de pruridos de alguns cientistas vaidosos que, às

vezes, inventam algo extremamente útil e funcional mas que é con-

siderado cientificamente como invenção de segunda classe. Então

o autor solicita, por um raciocínio elitista, que seu nome seja man-

tido em sigilo, para que sua imagem acadêmica não seja atingida.

O bolso pode ficar forrado com os resultados da invenção – isso

Page 67: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

não o preocupa – mas a sua reputação de cientista sério fica ima-

culada...

Porém, mesmo que o inventor decida manter seu nome em si-

gilo, os pedidos de patentes são sempre publicados na revista do

INPI, com exceção daqueles casos de defesa nacional.

Suponhamos, por exemplo, que um renomado cientista crie

uma enceradeira nova e não queira revelar o seu nome. O invento

vai ser publicado pelo INPI e, no lugar reservado ao nome do in-

ventor, vai aparecer: “sigilo a pedido do inventor”. Se, no entanto,

um fabricante de enceradeira desconfiar desse invento, suspeitan-

do que isso pode ser “jogada” de algum empregado, ex-empregado

ou prestador de serviço, ela se dirige ao INPI, argumentando com

razões legitimas (é fabricante, tem muitos empregados desenvol-

vendo novos projetos etc.) e solicita a divulgação do nome daquele

inventor. Possivelmente, caso concorde com as razões alegadas, o

INPI divulgará o nome do inventor, de uma forma reservada, aces-

sível ao solicitante.

Isso não está explicitado na lei, mas sim nos seus regulamentos.

E aí o solicitante responderá ao INPI se existe alguma razão de sus-

peita. A empresa poderá então denunciar: “o nome desse indivíduo

consta aqui da nossa lista de ex-empregados”. Nesse caso, o INPI

divulgará o nome e permitirá a oposição.

Page 68: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

34. Há outras possibilidades de fraude na autoria de um pedido de patente? Como a parte prejudicada pode defender seus direitos?

No caso de uma empresa que desenvolve determinada inven-

ção e, ao entrar com o pedido de patente, descobre que alguém fez

o mesmo pedido recentemente, existe a possibilidade de um em-

pregado ou ex-empregado ter feito o pedido de patente em nome

de um terceiro. As informações sobre o invento a ser patenteado

também podem ter sido levantadas para uma empresa concorren-

te, por algum processo de espionagem industrial.

A defesa contra essas práticas vai depender de perspicácia das

empresas. Daí a importância dos agentes especializados em pro-

priedade industrial, profissionais que, nas grandes empresas ou nos

grandes escritórios, cuidem exclusivamente dessa área, inclusive

fazendo a leitura atenta dos pedidos de publicação. Deverá ser um

profissional qualificado, com experiência suficiente para perceber

minúcias nos pedidos de patentes e possibilidades de fraudes.

Trata-se de um processo complicado, porque vai depender de

perícia, de uma série de detalhes técnicos e, às vezes, de arbitragem.

Hoje, as Cortes Internacionais de Arbitragem funcionam muito

bem, substituindo com vantagens a tramitação de processos na

Justiça.

No caso do Brasil, esta arbitragem pode ser feita, por exemplo,

através do Tribunal Internacional de Arbitragem, com sede em Pa-

ris, que é reconhecido como instância legítima para esse tipo de

atuação. Não é um órgão oficial, com poder de coação, mas tem

peso. Desde que a arbitragem tenha sido aceita pelas duas partes, o

Page 69: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

juiz entrega a atribuição para o árbitro e ponto final. E se não for

aceita a proposta de uma arbitragem, o juiz pode solicitar a espe-

cialistas uma perícia, que terá muita influência na decisão judicial.

35. O que acontece se duas pessoas tentam patentear a mesma invenção?

Aquele que houver apresentado o pedido primeiro (compro-

vando a data do depósito mais antiga) terá direito à patente. Isso

independe das datas de invenção ou criação.

36. E se alguém provar que já vinha fazendo aquele produto, embora sem patenteá-lo, muito antes de outra pessoa entrar com o pedido de patente do mesmo produto?

De acordo com a lei de propriedade industrial, a pessoa de

“boa-fé” que, antes da data de depósito ou de prioridade do pedi-

do de patentes, já explorava seu objeto no país, terá assegurado o

direito de continuar a exploração do objeto de uma patente, sem

ônus, como vinha fazendo anteriormente.

Somente se o negócio ou empresa dessa pessoa for alienado ou

arrendado, esse direito é transferido para os novos titulares do ne-

gócio ou empresa. De outra forma, o direito não poderá ser trans-

ferido isoladamente.

Page 70: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Esse direito não é válido somente no caso em que a pessoa te-

nha tido conhecimento do objeto da patente através da sua divul-

gação durante os doze meses que precederem a data do depósito ou

da prioridade do pedido de patente. Essa divulgação pode ter sido

feita pelo próprio inventor, pelo INPI ou por terceiros.

37. Se uma patente é requerida no Brasil e, na mesma época, uma invenção similar está sendo patenteada em outro país, quem será o detentor dessa patente?

Da mesma forma como foi respondido na pergunta 35, o ti-

tular será aquele que tiver depositado o pedido de patente em pri-

meiro lugar.

Este critério, vulgarmente denominado com first to file, é ainda

contestado por alguns setores nos EUA, que defendem a teoria do

first to invent. Os especialistas crêem, no entanto, que os norte-

americanos cederão em breve ao princípio do first to file, já que a

produção de provas de primeira invenção é extremamente difícil.

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38. Um inventor estrangeiro pode em seu país pedir o registro de sua invenção no Brasil? Da mesma forma, um inventor brasileiro pode no Brasil requerer a patente em outros países?

O que existe é um “direito de prioridade”, entre os países que

mantenham acordo de propriedade intelectual. Ou seja, você apre-

senta em seu país um pedido de patente de invenção (ou de mo-

delo de utilidade, assim como um desenho industrial ou registro

de marca) e passa a ter prioridade também nos outros países. Essa

prioridade significa que ninguém poderá, nos outros países, copiar

sua idéia e tentar patenteá-la, desde que você deposite seu pedido

nesses países, dentro de um prazo determinado.

Esse direito foi reconhecido inicialmente pela Convenção de

Paris, que dava um período bastante razoável para que um inven-

tor tivesse uma proteção preliminar em seu país e uma prioridade

para pedir a sua patente nos demais paises-membros da Conven-

ção. Somente após a perda desse prazo de prioridade é que a in-

venção ficaria desprotegida. Este princípio foi mantido no TRIPs

e é ainda mais estimulado pela formulação de pedidos e patentes

através do PCT.

No caso específico de patentes de invenção ou modelos de uti-

lidade, os pedidos de depósito poderão ser feitos simultaneamente

em todos os países que fazem parte do Tratado de Cooperação de

Patentes (PCT). A prioridade estará garantida automaticamente

com o pedido através do sistema PCT; entretanto, para a obtenção

do certificado de patentes em cada país será necessário um proces-

samento interno com cada agência oficial.

Page 72: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Com a criação e implementação dos blocos econômicos regio-

nais – do tipo União Européia, Nafta, Mercosul, APEC –, há uma

tendência para que sejam também regionalizados os pedidos de

patentes, registros de marcas etc.

Esta situação é mais evidente na União Européia, onde um in-

ventor (não só da Europa, mas de qualquer parte do mundo) pode

depositar seu pedido de patente em um escritório europeu com

sede em Munique, e daí obter um certificado de patente válido em

toda a região. Entretanto, como as leis não são idênticas, mesmo

em áreas economicamente integradas, torna-se aconselhável que o

inventor deposite também os seus pedidos em cada país-membro,

individualmente.

Um bom exemplo é o Mercosul, onde ainda não há um proce-

dimento comum para registro de patentes. Temos a esperança de

que, um dia, pelo menos as leis intrablocos regionais sejam devida-

mente harmonizadas e, desta forma, um certificado único passe a

conferir os mesmos direitos e deveres em toda a região integrada.

39. Qual é a proteção conferida pela patente?

Essencialmente essa proteção impede que um bem seja produ-

zido ou que um novo processo seja utilizado sem que haja autori-

zação especifica do titular da patente.

Desta forma (conforme estabelece o Artigo 42 da lei de pro-

priedade industrial), o titular de uma patente poderá impedir que

terceiros, sem sua autorização, produzam, utilizem, coloquem à

venda, vendam ou mesmo importem o produto objeto daquela

patente.

Page 73: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

40. O que é “exaustão” de direitos de propriedade industrial?

Trata-se do momento em que se esgota o direito que um titular

tem sobre uma patente. Geralmente, este momento é o da venda

do objeto da patente pelo titular ou licenciado. A partir do mo-

mento desta venda, cessam os direitos do detentor de patente, que

não poderá impedir sua revenda nem poderá reclamar nenhum

direito adicional já que seus direitos de propriedade se esgotaram

na primeira colocação do produto no mercado. O que se discute

aqui é se a exaustão se dá no plano internacional ou no plano na-

cional. As opiniões se dividem. Penso que deverá sempre prevale-

cer o princípio da exaustão nacional de direitos, tendo em vista a

diversidade de nível de proteção à propriedade intelectual entre os

diversos países. A verdade é que, em propriedade intelectual, dever-

se- á sempre dar prioridade irrestrita aos direitos do criador.

41. O que é exaustão nacional e internacional?

É a grande questão da pergunta anterior. Uma corrente afirma

que os direitos de propriedade intelectual se esgotam na primei-

ra venda no mercado interno de um país. A partir desta venda,

para os defensores desta corrente, o produto patenteado poderia

ser livremente exportado para qualquer país, independentemente

da vontade do detentor da patente ou seus licenciados. A isto se

denomina “exaustão internacional de direitos”, que provoca as cha-

madas “importações paralelas”.

Page 74: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

A outra corrente defende exatamente o contrário, ou seja, os

direitos de propriedade intelectual não se esgotam simplesmente

na primeira venda no primeiro mercado interno, mas a cada pri-

meira venda em cada mercado interno de cada país. Desta forma,

as importações paralelas não ocorreriam. A esta teoria deu-se o

nome de “exaustão nacional de direitos”. Como deixei bem claro

na resposta à pergunta anterior, creio firmemente nos princípios

da exaustão nacional de direitos, levando em conta que deverão

ser sempre privilegiados os direitos do criador que, por vezes, são

indevidamente reduzidos por injustificáveis dispositivos legais em

determinados países.

Há projetos de Lei em tramitação no Congresso Nacional vi-

sando à implementação da exaustão internacional de direitos em

nossa legislação. Desta forma as chamadas importações paralelas

estariam legitimadas em nosso país. Se, por um lado, o TRIPs dei-

xa esta questão ao arbítrio de cada país membro, por outro lado, os

direitos de propriedade intelectual ficariam substancialmente en-

fraquecidos, no caso da legalização das importações paralelas. Esta

questão está mais amplamente discutida no “Apêndice”, localizado

no final desta edição.

Entretanto é bom esclarecer, que a exaustão internacional de

direitos, ou importação paralela, reduz o estímulo à inovação, o

investimento na fabricação local e a geração de empregos.

42. O que é importação paralela?

É a importação de produto patenteado sem autorização ex-

pressa do titular da patente. As importações paralelas não se con-

fundem com as de produtos pirateados, imitados ou falsificados.

Estas são absolutamente proibidas pela legislação, enquanto aque-

Page 75: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

las dependerão da legislação nacional de cada país, pois além de se

tratarem de importações de produtos originais, não há proibição

destas operações no Tratado do TRIPs que, embora vete importa-

ções de produtos piratas, não excluiu a possibilidade das importa-

ções paralelas de produtos legítimos. Ficando bem claro que minha

posição é irrestritamente favorável à exaustão nacional dos direi-

tos, como colocado nas duas respostas às perguntas anterires, reco-

nheço que há controvérsias em relação a este tema, inclusive com a

existência de projetos de lei modificando a Lei atual, recomenda-se

a leitura das considerações sobre este tema no “apêndice” localiza-

do no final desta edição.

43. Que teoria o Brasil adotou quanto à exaustão de direitos?

De uma maneira geral, a teoria da exaustão nacional de direitos,

ou seja, a que preconiza que as importações de produtos patentea-

dos deverão ter autorização expressa dos detentores das respectivas

patentes ou seus licenciados. Esta posição está expressa na alínea

IV do Artigo 43. Entretanto, a mesma lei abre uma exceção impor-

tante a este princípio no parágrafo 4º do Artigo 68 que admite a

importação paralela nos casos em que o titular da patente alegar

“inviabilidade econômica” para a fabricação completa do objeto

da patente no território brasileiro, conforme dispositivo contido

na alínea I do parágrafo 1º do Artigo citado.

Vê-se portanto que aqui também prevaleceu o “jeitinho bra-

sileiro”, ou seja, não se admite a importação paralela, desde que o

titular da patente ou seu licenciado fabriquem, completamente, o

objeto da patente no Brasil. Como comentarei com mais detalhes

na resposta à pergunta 53, este procedimento é, ao meu ver, contrá-

Page 76: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

rio ao dispositivo contido na alínea 1 do Artigo 27 do TRIPs que,

textualmente, diz que “as patentes serão disponíveis e os direitos

patentários serão usufruíveis sem discriminação quanto ao local

da invenção”.

Recomendo também a leitura do “apêndice”, localizado no fi-

nal desta edição, para uma melhor compreensão deste polêmico

tema.

44. Podem ser feitos estudos ou pesquisas de um produto patenteado sem autorização do detentor da patente?

Sim. A proteção conferida pela patente, citada na resposta an-

terior, não se aplica aos casos em que o objeto ou processo paten-

teado seja usado sem fins comerciais, com finalidade experimental

relacionada a estudos ou pesquisas científicas ou tecnológicas. Este

direito está consubstanciado nos incisos I e II do artigo nº 43 da

Lei.

Mais recentemente foram introduzidas modificações neste ar-

tigo da nossa “Lei de Patentes” (Lei nº 9.279/96). Estas modifica-

ções foram feitas através de Medida Provisória, convertida na Lei

nº 10.196 de 14 de Fevereiro de 2001. O art. 1º desta nova Lei acres-

centa um inciso novo, o VII, ao artigo nº 43 da lei original. O refe-

rido inciso VII legitima “os atos praticados por terceiros não auto-

rizados, relacionados à invenção protegida por patente, destinados

exclusivamente à produção de informações, dados e resultados de

testes, visando à obtenção do registro de comercialização, no Brasil

ou em outro país, para a exploração e comercialização do produto

objeto da patente, após a expiração dos prazos estipulados no art.

Page 77: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

40”. Trocando em miúdos, a Lei foi modificada para abreviar ainda

mais o prazo de exclusividade de uma patente dando aos chamados

“genéricos” a possibilidade de chegarem ao mercado praticamen-

te no dia seguinte ao prazo de vencimento da patente do produto

pioneiro, autorizando a realização de testes de bioequivalência e

outros antes mesmo de expirar o prazo de duração de uma patente,

o que, ao nosso ver, contraria dispositivos do TRIPs que autorizam

apenas experimentos sem finalidade comercial, o que, certamente

não coincidem com as intenções puramente comerciais dos fabri-

cantes de genéricos. Mais detalhes sobre este dispositivo poderão

ser encontrados no “apêndice” localizado no final desta edição.

45. A concessão de uma patente impede o preparo de medicamentos em farmácias de manipulação?

Como sabemos, no Artigo 43 da lei de propriedade industrial

há algumas exceções à proteção conferida pela patente. Além da

exceção que citamos na resposta anterior, existe também essa: a

proteção da patente não se aplica “à preparação de medicamento

de acordo com prescrição médica para casos individuais, executa-

da por profissional habilitado, bem como ao medicamento assim

preparado”. É o caso típico de aviamento de receitas em farmácias

de manipulação.

Page 78: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

46. A patente autoriza a comercialização de um produto?

Não. De forma alguma. A patente apenas protege contra atos

de utilização não-autorizada.

Autorizar ou não a produção industrial e a comercialização de

um produto é responsabilidade de outros órgãos específicos, como,

por exemplo, o Ministério da Saúde (no caso de medicamentos,

cosméticos, alimentos industrializados e produtos de higiene e

limpeza), e o Ministério da Agricultura (alimentos de origem agro-

pecuária, defensivos agrícolas etc.).

47. Um produto patenteado é necessariamente um sucesso de vendas?

Somente um ínfimo percentual dos produtos patenteados al-

cança sucesso comercial. Para dar um exemplo em um setor onde a

patente é relativamente mais importante do que em outros, o setor

farmacêutico, em cada 5 mil produtos que iniciam o processo de

investigação, somente um chega a ser produzido industrialmen-

te e transforma-se em um produto comercialmente viável. Daí a

tornar-se um sucesso de vendas, é outro caminho tortuoso e im-

previsível.

Page 79: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

48. Na lei anterior, a restrição ao patenteamento de produtos farmacêuticos aplicava-se somente aos estrangeiros? Sendo assim, um inventor brasileiro que criasse um novo produto farmacêutico poderia patenteá-lo no Brasil?

Absolutamente, não. Embora a Convenção de Paris possa ad-

mitir áreas de exceção de patenteabilidade, ela não admite de for-

ma alguma que possa haver tratamento diferenciado entre cida-

dãos nacionais e estrangeiros.

49. Quanto tempo demora a concessão de uma patente? E qual o seu prazo de vigência?

A patente de invenção, pela lei brasileira, seguindo a recomen-

dação do TRIPs, vigora pelo prazo de vinte anos contados a partir

do pedido ou, mais tecnicamente, do depósito. Da mesma forma,

a patente do modelo de utilidade vigora por um prazo um pouco

menor: quinze anos.

Pode parecer muito longo, à primeira vista, um prazo de vinte

anos. Mas deve-se levar em conta que esse prazo começa a contar a

partir da data de depósito. Ou seja, quando se entra com o pedido

de patente, o prazo de vigência já está correndo.

Page 80: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Normalmente, a concessão de uma patente, caso não haja gran-

des conflitos técnicos, demora em torno de três anos. Portanto, o

prazo de vida útil de uma patente costuma ser, em média, de 17

anos.

No caso dos medicamentos, este prazo de vigência da paten-

te é bem menor: mesmo depois de ter sua patente concedida, o

produto farmacêutico não pode ser comercializado até que as au-

toridades de Saúde Pública estejam plenamente satisfeitas com as

demonstrações de segurança e eficácia do medicamento, objeto da

patente. Estas demonstrações exigem a realização de sofisticados e

demorados testes pré-clínicos e clínicos, que consomem em média

12 anos para sua conclusão. Portanto, no caso específico dos remé-

dios, o prazo efetivo da patente é reduzido para 8 anos.

50. É possível dar uma compensação ao detentor de uma patente pelo tempo perdido em avaliações técnicas excessivamente prolongadas?

Sim. Várias legislações, inclusive a americana e a italiana, ad-

mitem que o prazo efetivo de uma patente possa ser prorrogado

de modo a compensar o tempo perdido nos ensaios necessários à

avaliação de determinados produtos, como os medicamentos.

A lei brasileira foi extremamente cuidadosa ao incluir um dis-

positivo que praticamente se transformou em uma espécie de “va-

cina” contra a lentidão burocrática ou eventuais pendengas judi-

ciais, ao conferir a toda patente um prazo mínimo de vigência de

dez anos contados a partir da concessão do respectivo certificado.

Page 81: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Assim, se uma disputa de autoria ou a realização de um minucioso

estudo clínico, por exemplo, estenderem-se por mais de dez anos, o

prazo excedente será restaurado na concessão da patente.

51. Quanto custa obter e manter uma patente?

O custo, obviamente, vai depender do tipo de produto e do seu

nível de sofisticação científica ou tecnológica.

No caso de um novo medicamento (como já vimos na resposta

49), o processo de testes e avaliações demora cerca de doze anos. As

pesquisas iniciais para invenção do produto, somadas a esse longo

processo de aprovação, custam em torno de 360 milhões de dóla-

res.

Como vimos, a empresa que investiu na invenção tem oito

anos, em média, para sua exploração comercial, de modo a fazer

retornar o capital investido. Depois desse período, a fórmula passa

a domínio público, isto é, qualquer um pode usá-la, inclusive para

fins comerciais.

Além dos custos mencionados acima, o detentor de uma pa-

tente deverá pagar os emolumentos necessários ao INPI e os hono-

rários do agente de propriedade industrial encarregado de repre-

sentá-lo junto às autoridades, se for o caso.

Page 82: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

52. O inventor pode vender a patente do seu invento?

Sim. O inventor pode comercializar livremente a sua patente.

Pode vender e pode “alugar”. Esse “aluguel” da patente chama-se

licença voluntária: o inventor cede os direitos de comercialização

da sua patente a terceiros mediante o recebimento de uma remu-

neracão vulgarmente conhecida como royalty. Os valores e a freqü-

ência dessa forma de remuneração poderão ser fixos ou variáveis,

dependendo do acerto comercial entre as partes.

Os contratos de licença para exploração de patentes devem ser

averbados no INPI, para que produzam efeitos em relação a ter-

ceiros.

Segundo a lei, no Artigo 61 (parágrafo único), “o licenciado

poderá ser investido pelo titular de todos os poderes para agir em

defesa da patente”.

53. Quem recebe a concessão de uma patente fica obrigado a fabricar esse produto no próprio país que o patenteou?

Pelo TRIPs, claramente não. O detentor da patente poderá

exercer os seus direitos livremente, fabricando o objeto da patente

em um ou mais países e exportando-o para os países onde o pro-

duto não é fabricado.

A lei brasileira, entretanto, prevê a possibilidade de se requerer

uma licença ao detentor da patente sem que este necessariamente

concorde com a concessão da licença. As licenças concedidas dessa

Page 83: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

forma, sem o consentimento do detentor da patente, são chamadas

licenças compulsórias.

O produto com patente brasileira mas não fabricado no país

pode estar sujeito, portanto, à licença compulsória. Isso pode acon-

tecer também no caso de fabricação incompleta do objeto da pa-

tente no território brasileiro ou falta do uso integral de um proces-

so patenteado, e quando a comercialização do produto objeto da

patente não estiver satisfazendo às necessidades do mercado.

A lei, entretanto, abre uma exceção para os casos em que o de-

tentor da patente provar que a produção local é economicamente

inviável. Nestas circunstâncias, admite-se a importação.

Há atualmente tramitando no Congresso Nacional vários pro-

jetos de lei tornando ainda mais rígida as obrigação de fabricar

completamente o objeto de uma patente no território brasileiro.

Eles são analisados com mais detalhe no “apêndice” localizado no

final desta edição.

54. É o governo que toma a iniciativa de requerer uma licença compulsória?

Somente nos casos de “emergência nacional ou interesse públi-

co” a iniciativa da licença compulsória parte do governo. Para ser

mais exato: esses casos são declarados em ato do Poder Executivo

Federal.

Conforme o Artigo 71 da lei de propriedade industrial, desde

que o titular da patente ou seu licenciado não atenda à necessidade

indicada pelo governo nesses casos, “poderá ser concedida, de ofí-

cio, licença compulsória, temporária e não exclusiva, para a explo-

ração da patente, sem prejuízo dos direitos do respectivo titular”.

Page 84: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

As licenças compulsórias, sempre com um prazo limitado de

vigência e possibilidade de prorrogação, são concedidas sem exclu-

sividade, não se admitindo o sublicenciamento.

Em todos os casos de concessão de licença compulsória, a pes-

soa ou empresa que solicitar essa licença deverá ter, além de legí-

timo interesse, comprovada capacidade técnica e econômica para

explorar eficientemente o objeto da patente licenciada compulso-

riamente. A lei também determina que o produto objeto de licença

compulsória seja destinado predominantemente ao mercado in-

terno.

As licenças compulsórias concedidas não poderão ser negocia-

das com terceiros isoladamente pelo licenciado. Somente poderão

ser repassadas no caso de venda total da parte do negócio de uma

empresa, à qual o processo ou produto licenciado estiver direta-

mente vinculado.

Em 1999 o Poder Executivo, a pretexto de regulamentar, mes-

mo que extemporâneamente, o citado artigo 71 da Lei 9.279, am-

pliou os limites de concessão das licenças compulsórias por “emer-

gência nacional ou interesse público”, mesmo ao arrepio do TRIPs

e da própria Lei que estava sendo “regulamentada”. Isto foi feito

inicialmente pelo Decreto nº 3.201 de 6 de Outubro de 1999, pos-

teriormente modificado por um novo Decreto de 4 de Setembro

de 2003.

Estes decretos são, ao nosso ver, totalmente ilegais e colidentes

com o texto do TRIPs, como detalharemos no “Apêndice” localiza-

do no final desta edição.

Page 85: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

55. Há outros motivos para a concessão de licenças compulsórias?

Sim. Estes casos estão previstos também na seção III da nossa

lei de propriedade industrial. São eles:

abuso dos direitos de uma patente – conceito bastante subje-

tivo e de difícil definição;

abuso de poder econômico – conceito ligado a práticas abusi-

vas de formação de preços ou de políticas de comercialização.

dependência de uma patente em relação a outra, anterior –

“dependência”, no caso, significa que uma determinada patente,

para ser explorada, depende do acesso a outra tecnologia patentea-

da anteriormente. A lei exige, nessas circunstâncias, duas pré-con-

dições além da constatação de dependência: em primeiro lugar, o

objeto da segunda patente deverá constituir substancial progresso

técnico em relação à patente anterior. Esta condição está em de-

sacordo com o TRIPs, pois este exige, além do progresso técnico,

que a patente ofereça considerável vantagem econômica. O aspec-

to econômico foi indevidamente eliminado da lei brasileira. A se-

gunda condição é de que tenham sido esgotados todos os esforços

para a realização de um acordo entre os titulares das duas patentes.

A lei prevê que o detentor da patente anterior possa também ser

também contemplado com uma licença compulsória do titular da

patente dependente.

Page 86: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

56. Uma patente pode terminar antes do prazo de vigência?

Sim, em vários casos.

Um dos casos é a nulidade, que pode ocorrer devido a várias

razões.

A primeira razão prevista na lei é óbvia: “É nula a patente que

for concedida contrariando as disposições desta Lei.” Este artigo

(47) é digno de um conselheiro Acácio. A nulidade poderá ser total

ou poderá atingir apenas uma parte das reivindicações contidas no

pedido de patente, desde que a parte que subsistir continue sendo

patenteável por si mesma. Os artigos seguintes da lei descrevem os

detalhes administrativos da ação de nulidade.

A segunda possibilidade é a extinção da patente, que pode ser

provocada, antes da expiração do prazo de vigência, pela renún-

cia do seu titular, pela “caducidade” da patente, pela falta de pa-

gamento das taxas anuais cobradas pelo INPI, ou ainda, no caso

de pessoas domiciliadas no exterior, pela falta de um procurador

devidamente qualificado e domiciliado no país.

A partir do momento em que uma patente é declarada extinta,

o seu objeto cai em domínio público. No caso da falta de pagamen-

tos, a patente ou o pedido de patente podem ser restaurados pelo

titular, desde que os pagamentos sejam postos em dia no prazo de

três meses a partir da notificação que é feita pelo INPI.

O registro de desenhos industriais e de marcas tem critérios

semelhantes ao que ocorre com as patentes, quanto à nulidade e

quanto à extinção.

Page 87: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

57. O que é caducidade?

Caducidade é a perda de validade de uma patente por abuso ou

desuso. Importante ressaltar que a caducidade de uma patente só

ocorrerá se a concessão de uma licença compulsória não for sufi-

ciente para sanar um eventual abuso ou desuso de uma patente.

“Desuso” consiste em não explorar o objeto da patente. Ou

seja, o detentor da patente não importa nem produz localmente o

produto, provocando um desabastecimento no mercado.

Já a conceituação de “abuso” é mais subjetiva. Alegam alguns

que, por exemplo, um preço supostamente exagerado poderia con-

figurar exercício abusivo do direito de patente. Mas como deter-

minar se um preço é exagerado ou não? Fica aí uma questão para

futuros debates.

58. Como o INPI pode ajudar o inventor que deseja licenciar sua patente?

Através do processo de “oferta de licença”, descrito no Artigo

64 da lei. Nesses casos, sempre a pedido dos respectivos titulares,

o INPI oferecerá publicamente a patente para licenciamento por

qualquer pessoa interessada, ficando reduzida à metade o custo da

anuidade de manutenção destas patentes.

Nesse caso, não poderá haver licença voluntária com caráter de

exclusividade.

Page 88: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

59. O que é “microorganismo transgênico”?

A conceituação de microorganismo transgênico foi um dos as-

petos mais polêmicos da discussão e aprovação da nova lei.

O TRIPs não faz nenhuma restrição ao patenteamento de mi-

croorganismos. No Brasil, entretanto, pressionados por entidades

ligadas à Igreja Católica, nossos congressistas optaram por res-

tringir a patenteabilidade de microorganismos aos denominados

transgênicos, conforme definido no Artigo 18, parágrafo único:

“Microorganismos transgênicos são organismos, exceto o todo

ou parte de plantas ou de animais, que expressem, mediante inter-

venção humana direta em sua composição genética, uma carac-

terística normalmente não-alcançável pela espécie em condições

naturais.”

60. Por que a lei brasileira não reconhece patentes para produtos da biotecnologia?

Na realidade, a lei brasileira reconhece patentes biotecnológi-

cas mas as restringe apenas aos casos de emprego de microorganis-

mos transgênicos, deixando de fora os processos biotecnológicos

tradicionais.

O motivo desta restrição é meramente político. Alguns setores

da esquerda e da Igreja acham que isso é uma intromissão do ho-

mem na criação divina e esta não pode ser patenteada. Ora, a obra

divina não é patenteável porque ela está na natureza. Mas o que o

homem, em seu desenvolvimento científico e tecnológico, conse-

guir modificar a partir da natureza é plenamente patenteável.

Page 89: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Quando um cientista utiliza uma bactéria e faz uma alteração

no seu DNA, transformando-a em um produto útil para a saúde

das pessoas, isso não foi feito pelas mãos de Deus. É claro que a

Igreja sempre dirá que Deus inspirou, e que sem o poder divino

nada disso seria possível; mas isso é uma questão meramente te-

ológica.

Aquele produto desenvolvido por um cientista é fruto do tra-

balho do ser humano. O produto não estava daquela forma na

natureza. Se realmente alguém modificou um microorganismo,

transformando-o em uma coisa completamente diferente e com

utilização prática, isso é perfeitamente patenteável.

Infelizmente, a lei brasileira restringiu a patenteabilidade aos

microorganismos transgênicos e esqueceu, por exemplo, os fungos

e outras formas de organismos vivos que podem ser modificados.

Com isso, o texto da lei beneficiou a indústria altamente sofisti-

cada e deixou de considerar a indústria de menores recursos. Ve-

jamos, por exemplo, a cerveja. A cerveja é feita por um processo

de fermentação. Se eu descobrir uma nova maneira de obter essa

fermentação, não poderei patenteá-la no Brasil. Pela lei brasileira

isso não é possível.

Esse detalhe da lei não tem muita lógica, porque sua discussão

foi simplesmente uma questão política. Alguns setores mais radi-

cais da Igreja e da esquerda resolveram que isso pertencia a Deus. A

cerveja pertence a Deus, segundo a lei, mas um antibiótico ou ou-

tro produto altamente sofisticado, feito através de microorganismo

transgênico, pertence ao homem, porque está protegido pelo direi-

to da propriedade industrial.

Page 90: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

61. As misturas de substâncias naturais, como ervas, usadas na medicina popular, podem ser patenteadas?

Medicamentos populares já existentes não são patenteados. Só

é patenteado o que é novo. Sendo componente de um produto da

natureza – um componente da jurubeba, por exemplo – também

não pode ser patenteado.

A mera mistura de componentes desse tipo também não é pa-

tenteável. Para ser objeto de patente, a substância teria que estar al-

terada pelo homem, transformada, para ter uma outra utilização.

62. O “direito da terra”, contra a biopirataria, citado na conferência Rio-1992, foi considerado na lei brasileira?

Essas expressões, “direito à terra” e “biopirataria”, foram criadas

aqui, na Conferência Rio-1992, porque alguém resolveu criar um

novo direito da propriedade intelectual, como se aquela idéia cou-

besse nesse conceito. Isso não representa nenhuma contribuição

relevante, mas apenas procura restringir o direito de se pesquisar

uma planta por estar ali, naquele lugar.

Nessa linha de raciocínio, se alguém produzir uma alteração

genética em uma planta, por exemplo, e criar uma forma de utilizá-

la de modo diferente do que a natureza concebeu, terá que pagar

royalties ao território de onde a planta veio, mesmo que passe a

produzi-la em outro lugar?

Page 91: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Não existe nas teorias jurídicas nada parecido. Ou senão tería-

mos que passar a pagar royalties por batatas provenientes da Índia,

por exemplo. Isso é politicamente ingênuo, não tem valor algum.

O Tratado da Biodiversidade, que dizem ter sido aprovado (e

assinado), não é como o Acordo que criou a Organização Mun-

dial do Comércio (OMC). Segundo o tratado da OMC, os países

signatários não podem ter reservas; ou se aceita na íntegra ou não

se aceita. No caso do Tratado da Biodiversidade, podem ser feitas

ressalvas. A maioria absoluta dos países ignorou esse dispositivo;

ele não tem legitimidade, no Direito; não existe esse direito sobre

o que vem da terra. Não é com argumentos desse tipo que vamos

solucionar os problemas das florestas e da subsistência dos índios.

63. E o DNA? É patenteável?

Isso é outra bobagem. Obviamente o DNA não é patenteável.

Partes do corpo humano, sejam quais forem, não podem ser obje-

tos de patentes; até pelo fato de que, por definição, são “descober-

tas” e não “invenções”.

O gene, patrimônio genético, é um componente natural do or-

ganismo, portanto não é patenteável. O que acontece atualmente

em relação a esse assunto é que a ciência está tentando mapear os

genes. Um trabalho colossal: identificar cada gene entre bilhões.

Isso representa milhões de dólares em pesquisas a cada ano. Depois

de identificar, tentar descobrir qual a função de cada um dos genes.

Graças a Deus, nada disso é patenteável. É pura ciência. Quando

os pesquisadores terminarem esse trabalho, teremos descoberto a

função de cada gene, tornando cada vez mais viáveis as terapias

genéticas.

Page 92: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Não o DNA, mas as terapias genéticas, essas sim, poderiam ser

protegidas. Na herança genética de cada indivíduo, pode ser detec-

tada a propensão a uma determinada doença. Crianças com pro-

blemas poderão ser curadas até mesmo antes de nascer.

Ainda estamos longe disso. Mas com a terapia genética muitos

remédios poderão desaparecer. A proteção será sempre temporá-

ria; depois será de domínio público. E as pessoas poderão, talvez,

viver 200 anos.

64. E os animais transformados?

Isso é polêmico. A tendência mundial é pelo patenteamento.

Mas a lei brasileira não permite esse tipo de patente.

Houve muita pressão, principalmente de membros da Igreja e

de grupos de esquerda. Eles não gostam de propriedade privada,

então qualquer coisa que possa lembrar propriedade privada des-

perta um mecanismo de rejeição.

Minha posição é de que os animais transgênicos são proprie-

dade de quem os criou. Porque eles não são criados para serem

monstros, mas para uma determinada finalidade. Já existem alguns

casos, todos justificáveis. Um exemplo é o rato patenteado nos Es-

tados Unidos, que foi alterado geneticamente para nascer com um

determinado tipo de câncer, semelhante ao câncer de mama. Es-

ses animais eram utilizados na pesquisa de novos medicamentos

para tratamento do câncer de mama. Isso foi uma grande evolução.

Hoje, o câncer de mama é curável, com medicamentos desenvolvi-

dos graças à utilização desses ratos transformados.

Outro caso é o da ovelha Dolly recentemente falecida, e da sua

irmã mais nova, Molly. Esse animal está patenteado na Inglaterra.

Page 93: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Seu leite produz uma proteína que serve para a cura de determina-

das doenças. Então, é perfeitamente patenteável.

Também há exemplos de transformação de animais na indús-

tria alimentícia, como é o caso do chester, desenvolvido a partir

do frango. No Brasil, nenhum desses casos poderia ser patentea-

do, pela lei atual. Não se patenteiam animais. Pode-se, no máximo,

patentear uma marca, o processo que desenvolveu o frango, mas

nunca o frango em si.

É interessante observar que o TRIPs não tem posição sobre isso.

Acredito que o TRIPs, que é do âmbito da OMC, vai consagrar o

patenteamento de animais no futuro próximo e que o Brasil, como

signatário da OMC, terá que mudar sua legislação.

Nada disso impede o controle rígido. Eticamente você tem que

ter um controle. Experiências não podem ser feitas ao Deus dará.

Têm que ser feitas sob supervisão, autorizadas, controladas, para

que não haja acidentes indesejáveis.

65. E os clones humanos?

Nesse caso já estamos falando de um campo bem mais com-

plicado da bio-segurança. O Brasil tem para isso uma lei especí-

fica, recentemente modificada. Esse é um assunto extremamente

interessante e muito preocupante. Experiências genéticas, especial-

mente envolvendo seres humanos, têm que ser feitas dentro de cer-

tas regras e sob controle rigoroso.

Page 94: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

66. A propriedade industrial inclui o design?

Sim, porque o design, além de ser objeto de direito autoral,

gera produtos que podem ser industrializados e comercializados.

Portanto, torna-se um objeto especifico de proteção na lei de pro-

priedade industrial.

Desenho industrial, de acordo com a definição do Artigo 95

da lei é “a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto

ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto,

proporcionando resultado visual novo e original na sua configura-

ção externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial”.

As condições básicas para registro de um desenho industrial

são: a novidade e a originalidade. Importantíssimo ressaltar que

não se considera desenho industrrial uma obra de caráter pura-

mente artístico; as obras desse tipo são protegidas apenas pelo di-

reito de autor.

67. Como se faz o registro de um desenho industrial?

De modo semelhante ao pedido de patentes, o pedido de regis-

tro deve ser apresentado ao INPI, contendo um requerimento pró-

prio, relatório descritivo, reivindicações (se for o caso), desenhos

ou fotos e campo de aplicação do objeto, além de comprovante do

pagamento relativo ao depósito.

Assim como ocorre no caso das patentes, a data do depósito

será considerada oficialmente como data de apresentação do pe-

Page 95: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

dido. E nos casos de duas pessoas tentarem registrar o mesmo de-

senho, ou de alguém já estar utilizando aquele desenho industrial

anteriormente ao registro por outro autor, aplicam-se os mesmos

critérios usados com as patentes (ver perguntas 35 e 36).

A partir da concessão desses registros, o INPI fornece ao autor

um certificado de propriedade dos seus desenhos.

É bom lembrar que existem algumas restrições ao registro de

desenhos industriais. Uma dessas restrições é semelhante à que vi-

mos sobre patentes, na pergunta 14 (o que pode e o que não pode

ser patenteado): não é registrável como desenho industrial “o que

for contrario à moral e aos bons costumes”, etc.

Há restrições também para o que for considerado “forma ne-

cessária comum ou vulgar do objeto, ou ainda aquela determinada

essencialmente por considerações técnicas ou funcionais”. Ou seja,

é possível registrar o desenho de uma cadeira, por exemplo, mas

este desenho deverá ter características que o diferenciem claramen-

te das cadeiras comuns.

68. Pode-se registrar o desenho de vários produtos de uma só vez?

O pedido de registro deverá referir-se a um único objeto, mas

este poderá ter variações (20, no máximo), desde que se destinem

ao mesmo propósito e tenham entre si a mesma característica dis-

tintiva preponderante.

Page 96: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

69. Quando tempo dura esse registro?

O registro de desenho industrial vigora pelo prazo inicial de

dez anos, contados da data do depósito. Esse prazo é prorrogável

por três períodos sucessivos de cinco anos cada, ou seja, até por 15

anos, resultando em um total de 25 anos de proteção.

70. E as marcas? Também têm proteção?

Enquanto invenções e modelos de utilidade são protegidos por

um certificado de patente, as marcas (assim como os desenhos in-

dustriais) são protegidas através de um registro.

Para a lei, marcas são definidas como “sinais distintivos visual-

mente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais”.

Esse registro protege contra os seguintes crimes previstos pela

lei:

reprodução da marca, no todo ou em parte, sem autorização

do titular;

imitação da marca, de modo que possa induzir confusão;

alteração da marca de outrem, já estampada em produto

existente no mercado;

importação, exportação, venda, exposição comercial, oculta-

ção ou estoque de produto com marca pirata, reproduzida ilicita-

mente ou imitada;

colocação de produto para comercialização em embalagem

com marca alheia.

Page 97: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

71. Afinal de contas, o que é uma “marca registrada”?

É simplesmente a evidência de que um pedido de registro de

marca tenha sido devidamente aceito pelo INPI. Sua propriedade é

simbolizada pelo registro validamente expedido, sendo assegurado

ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional.

72. Como é que se pede um registro de marca?

De modo semelhante ao pedido de patente e ao registro de de-

senho industrial, sendo que cada registro de marca vale para um

único sinal distintivo. Deve ser apresentado ao INPI um requeri-

mento próprio, acompanhado de etiquetas, quando for o caso, e do

comprovante do pagamento referente ao depósito.

73. O que acontece depois desse pedido de registro?

O pedido é publicado pelo INPI, para que se apresente alguma

eventual oposição no prazo de 60 dias e, caso haja oposição, o de-

positante terá mais 60 dias para responder. Depois desses prazos,

o exame é concluído, e um certificado é expedido para comprovar

que o pedido de registro é aprovado.

Page 98: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

74. Por quanto tempo fica em vigor o registro de uma marca?

Por dez anos, indefinidamente prorrogáveis por períodos iguais

e sucessivos de dez anos cada. Ou seja, enquanto a patente e o de-

senho industrial têm um período limitado de proteção, a vigência

da marca é ilimitada, desde que seu titular renove o registro de dez

em dez anos.

A marca é um ativo de quem a desenvolveu. É um patrimônio

que pode ter até um valor superior a todo o patrimônio físico da

empresa. Atualmente, a marca “Coca-Cola” é considerada como a

mais valiosa do mundo.

O design de um produto cairá em domínio público dentro de

algum tempo, mas a marca daquele produto pertencerá para sem-

pre à empresa que a registrou, a menos que seja cedida, desativada

ou não seja renovado seu registro.

75. A lei protege todo tipo de marca?

A lei prevê três tipos básicos de marca:

I. marca de produto ou serviço – distingue produto ou servi-

ço de outro idêntico, semelhante ou afim, de origem diversa;

II. marca de certificação – atesta a conformidade de um pro-

duto ou serviço, com determinadas normas ou especificações téc-

nicas, principalmente quanto à qualidade, natureza, material utili-

zado e metodologia empregada;

III. marca coletiva – identifica produtos ou serviços provindos

de membros de uma determinada entidade.

Page 99: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

76. A bandeira nacional pode ser registrada como marca?

Obviamente não. O primeiro dos itens previstos na lei, como

não-registráveis, é exatamente este:

“Brasão, armas, medalha, bandeira, emblema, distintivo e mo-

numento oficiais, públicos, nacionais, estrangeiros ou internacio-

nais, bem como a respectiva designação, figura ou imitação.” (Alí-

nea I do Artigo 124.)

77. Letras ou números podem ser registrados?

Nunca a letra isoladamente, nem algarismos ou datas. Somente

quando “revestidos de suficiente forma distintiva”. É o caso, por

exemplo, do conhecido “S” de Senna: um registro que vale exclusi-

vamente na forma do desenho que o distingue, e não um registro

da letra “S” como marca.

78. Pode-se patentear uma cor?

Cores não podem ser patenteadas nem registradas, nem seus

nomes. A palavra “amarelo”, por exemplo, não é registrável, e a cor

amarela muito menos. Expressões de propaganda como “as amare-

linhas”, por exemplo, podem ser registradas somente como direito

autoral.

Page 100: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Entretanto, pode-se registrar como marca uma combinação de

cores, dispostas de modo peculiar e distintivo.

79. E um aroma?

Certamente a fórmula de um perfume que produza aquele

aroma poderá ser objeto de patente. Mas o aroma em si não pode

ser registrado, e só poderia ser patenteado se fosse uma completa

inovação, mas esse tipo de patente não tem precedente algum no

mundo.

O aroma do perfume funciona como apelo peculiar e atrativo

do produto, praticamente como uma “marca olfativa”, obviamente

não-registrável. O que se faz é proteger esse aroma com uma assi-

natura, uma marca do produto.

80. O slogan de uma campanha publicitária pode ser registrado como marca?

Infelizmente não. A nova lei de propriedade industrial (na alí-

nea VII do artigo 124) impede o registro como marca de qualquer

“sinal ou expressão empregada apenas como meio de propagan-

da”.

Esta restrição não existia na lei anterior e a sua proteção agora

poderá ser determinada somente pelo direito de autor. Vejamos,

por exemplo, o caso clássico de uma expressão criada anos atrás

para a propaganda de uma pastilha para pequenas irritações de

garganta. Os slogans da campanha publicitária faziam referência

Page 101: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

a um suposto “bichinho do rram-rram”. Esta expressão, que fez

sucesso, estava registrada como marca na vigência da lei anterior,

mas infelizmente na lei nova esse registro não tem mais validade. O

mesmo acontece com todos os outros slogans consagrados, como

“Isto é que é!”, da Coca-Cola.

Pode-se argumentar que existe a proteção de direito autoral

para tais expressões, mas o direito autoral pertence à agência de

propaganda, e não ao anunciante. Digamos que a agência que criou

o slogan de um determinado produto passe a atender, tempos de-

pois, ao fabricante de um produto concorrente; poderia ser alega-

da a possibilidade de que essa agência aproveitasse ou modificasse

aquele slogan para a campanha do concorrente. Isso nos parece

uma brecha perigosa.

Reforçando ainda mais essa arbitrariedade, ainda puseram um

artigo (no 233) nas disposições transitórias e finais da nova lei,

estabelecendo que “os pedidos de registro de expressão e sinal de

propaganda e de declaração de notoriedade serão definitivamente

arquivados e os registros e declaração permanecerão em vigor pelo

prazo de vigência restante, não podendo ser prorrogados.”

81. E os nomes de bebidas, como champagne, cognac, vinho do Porto e até a cachaça? Podem ser registrados como marca?

A lei proíbe o registro de “indicação geográfica ou sua imitação

suscetível de causar confusão, ou sinal que possa falsamente indu-

zir indicação geográfica” (alínea IX do Artigo 124).

Page 102: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Durante o longo período em que o Brasil manteve uma legisla-

ção defasada e frágil sobre propriedade industrial, diversas práticas

agora ilegais tornaram-se comuns e eram toleradas nos mais diver-

sos segmentos da sociedade – industriais, produtores artesanais,

comerciantes, consumidores, fiscais etc.

Hoje, produzir, vender ou simplesmente estocar produtos

como um “vinho do Porto” feito em Santa Catarina, por exemplo,

pode dar cadeia ou multa.

E não se pode, também, usar atenuantes, como “tipo”, “seme-

lhante” etc., a menos que se ressalve a verdadeira procedência do

produto. Ou seja, um queijo apresentado como “tipo Reno” teria

que estampar uma ressalva (“produzido em Nova Friburgo”, por

exemplo), com o mesmo peso da primeira indicação geográfica,

para evitar enganos.

Essas infrações ainda são muito comuns e seu controle vai dar

algum trabalho.

Os “crimes contra indicações geográficas e demais indicações”

são definidos no Artigo 192:

“Fabricar, importar, exportar, vender, expor ou oferecer à ven-

da ou ter em estoque produto que apresente falsa indicação geo-

gráfica.”

O Artigo 193, que trata dos crimes contra as indicações geográ-

ficas e demais indicações, chega a detalhes:

“Usar, em produto, recipiente, invólucro, cinta, rótulo, fatura,

circular, cartaz ou em outro meio de divulgação ou propaganda,

termos retificativos, tais como ‘tipo’, ‘espécies’, ‘gênero’, ‘sistema’, ‘se-

melhante’, ‘sucedâneo’, ‘idêntico’, ou equivalente, não ressalvando a

verdadeira procedência do produto.”

O Artigo seguinte, 194, estende essa proibição ao uso de “...mar-

ca, nome comercial, título de estabelecimento, insígnia, expressão

Page 103: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

ou sinal de propaganda ou qualquer outra forma que indique pro-

cedência que não a verdadeira.”

Há casos muito familiares entre os consumidores brasileiros,

que passaram a ser proibidos com a entrada da nova lei em vigor.

“Biscoito Champagne” e “Guaraná Champagne”, por exemplo.

Champagne é uma região da França e, portanto, seu uso em mar-

cas comerciais é uma situação geográfica. Por esse motivo alguns

biscoitos “do tipo champagne“ estão mudando sua qualificação

para “achampanhados”.

Há quem defenda o direito ao livre uso desses nomes que, mes-

mo sendo indicações geográficas, tornaram-se muito populares no

mercado. Alguns parecem ter-se tornado, até nomes genéricos de

produtos. É o caso do Cognac, que, atualmente, qualquer freguês

de botequim no Brasil sabe pedir, como “conhaque” seguido da

marca de sua preferência.

Mas para que se possa coibir o uso de uma marca como Cog-

nac Dreher, ou Guaraná Champagne da Antarctica, seria necessá-

rio que os produtores lá da região de Champagne entrassem com

uma ação judicial.

Tudo indica que, no caso do Guaraná, a própria Ambev já tra-

balha pela valorização cada vez maior de sua própria marca (“Gua-

raná Antarctica”) e poderá ir aos poucos eliminando, sem grandes

prejuízos, o termo “Champagne”, que sem dúvida era associado a

glamour, qualidade e sofisticação no produto.

Recente acordo assinado pelos fabricantes brasileiros de vi-

nho banirá de vez o uso das indicações geográficas “Champagne” e

“Cognac”, que deverão ser, obrigatoriamente, substituídas por “es-

pumante” e “brandy”, respectivamente.

Quanto à cachaça, obviamente não é uma indicação geográfi-

ca, mas sim uma referência genérica ao tipo de bebida. Indevida-

mente, por um descuido dos examinadores, a expressão “cachaça”

Page 104: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

foi registrada como marca na França, mas, ao que consta, está ha-

vendo oposição a esse registro.

82. E o nome de uma pessoa?

Obviamente o nome de uma pessoa poderá ser registrado

como marca. Os casos mais notórios são os nomes de famosos de-

signers de roupas, criadores de perfumes e até mesmo celebridades

esportivas ou artistas, que comercializam ou cedem a terceiros a

possibilidade de explorar produtos identificados pelos seus nomes.

Este é o caso de marcas como “Café Pelé”, o “S” de Senna, toda a

linha de produtos com o nome “Xuxa”, etc.

A não ser nos casos de nomes comuns, sem nenhuma notorie-

dade, é claro que o uso de nomes, pseudônimos, apelidos ou nomes

artísticos notoriamente conhecidos devem ter o consentimento do

titular, herdeiros ou sucessores. O mesmo critério vale para assi-

naturas, nomes de família e também para a imagem de terceiros (a

foto ou caricatura de uma pessoa, por exemplo).

Page 105: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

83. Já que o registro de marca vale para uma determinada linha de produtos, isso significa que uma marca conhecida, como a Coca-Cola, por exemplo, vale só para refrigerante?

Não. A lei assegura proteção especial às marcas “de alto reno-

me”, em todos os ramos de atividade. Portanto, a marca Coca-Cola

não poderá ser utilizada por fabricantes de outros produtos ou es-

tabelecimentos. Não é permitido tirar proveito gratuito da noto-

riedade alheia, dessa forma.

Existem casos de marcas de alto renome, como Playboy, Xerox,

Gilete, Brahma e muitos outros, cuja enunciação às vezes se con-

funde com o próprio produto. Playboy, por exemplo, é a marca que

dá título a uma revista mundialmente conhecida, mas há alguns

anos um empresário brasileiro conseguiu registrar no INPI um

desodorante com o mesmo nome, usando inclusive o símbolo do

coelhinho. Esse registro continua valendo, até encerrar seu prazo

de vigência, mas novos casos assim não são mais permitidos.

84. Como é que um brasileiro que tem uma marca de sucesso no Brasil pode registrá-la também em outros países?

O Brasil, como signatário do TRIPs e da Convenção de Paris,

assegura aos seus cidadãos o direito de proteger a sua marca em to-

Page 106: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

dos os países signatários desses tratados. A lei garante prioridades

e prevê prazos determinados para que esses direitos sejam conve-

nientemente registrados no exterior.

Importante ressaltar que a prioridade básica da Convenção de

Paris dura por doze meses a partir do primeiro pedido. Os deten-

tores da marca deverão utilizar este prazo para registrá-la nos paí-

ses onde houver interesse. Caso não proceda desta forma, o titular

perderá o registro nesses países.

85. O dono de uma marca pode vendê-la?

Sim, do mesmo modo como o dono de uma patente pode ne-

gociá-la com terceiros. O titular de uma marca poderá vendê-la ou

cedê-la sob forma de licença voluntária. Não existe a possibilidade

de concessão de “licenças compulsórias” para o uso de marcas, em

quaisquer circunstâncias. (Sobre licenças compulsórias, ver per-

guntas 53 a 55.)

86. A franquia é uma forma de licença para uso de marca?

Sim, mas uma franquia não se esgota com o licenciamento de

uma marca, que é um item imprescindível, mas não o único, nesse

tipo de negócio.

Quando se celebra uma franquia, cede-se não só a marca mas

também o know-how envolvido nas diversas atividades ligadas aos

produtos ou serviços identificados por aquela marca: preparação,

fornecimento, comercialização, atendimento etc. Além de forneci-

Page 107: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

mento de know-how, a franquia pode incluir equipamentos, maté-

rias-primas, produtos acabados, material promocional etc.

Um contrato de franquia da McDonald’s, por exemplo, envol-

verá não só o uso da marca, mas também a transferência de tecno-

logia no preparo dos alimentos, treinamento do pessoal envolvi-

do, política de recursos humanos, gerenciamento das unidades de

negócio, design das instalações, técnicas de marketing, campanhas

publicitárias etc.

Outro bom exemplo é o caso d’O Boticário, que começou ape-

nas como mais uma marca de produtos de toucador e hoje ofe-

rece um estilo próprio, uma maneira distinta de comercialização

de seus produtos em pontos de venda exclusivos para sua rede de

franqueados que, segundo consta, é a maior do Brasil.

87. Um grupo de pessoas ou empresas pode registrar uma marca?

Sim, através de um pedido de registro de “marca coletiva” ou

“de certificação”.

A marca coletiva identifica produtos ou serviços provindos de

membros de uma determinada entidade. É o caso de companhias

que pertençam a uma entidade comum, como, por exemplo, asso-

ciações de classe que exigem determinados parâmetros e normas

para a filiação dos seus membros. Teoricamente poderíamos ter

uma marca coletiva Abinee, ou Interfarma, ou Sindipeças, ou qual-

quer outra. O importante neste caso é que as regras de filiação à

marca coletiva sejam estabelecidas e cumpridas pelas empresas que

desejem utilizar a marca em seus produtos.

A marca de certificação é usada para “atestar a conformidade

de um produto ou serviço com determinadas normas ou especifi-

Page 108: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

cações técnicas, notadamente quanto à qualidade, natureza, mate-

rial utilizado e metodologia empregada”. É o caso dos certificados

ISO-9000, por exemplo, ou do “Selo de Pureza” dos produtores de

café. Essas marcas reúnem produtos ou serviços que possuam as

mesmas características e cujo uso está submetido a determinadas

medidas de controle.

88. É permitido criar-se uma marca parecida com outra marca de sucesso?

Absolutamente não. Isso é precisamente o que a lei pretende

evitar. Os cuidados com a qualidade e os esforços de comercializa-

ção realizados pelo detentor de uma determinada marca, fazendo

com que ela se tornasse famosa e bem-sucedida, devem ter a devida

proteção. Não seria lícito que outra pessoa ou empresa tentasse in-

devidamente auferir benefícios comerciais advindos fazendo uma

outra marca parecida com aquela marca de sucesso.

Há casos famosos de disputa de marcas parecidas. Um bom

exemplo é o dos sorvetes Hébon, cujo registro foi contestado e,

posteriormente, anulado pela marca de líder inconteste no merca-

do, a Kibon. Interessante ressaltar que, numa admirável estratégia

de marketing, os detentores do registro de marca anulado resolve-

ram criar a marca “Sem Nome”, que capitalizou positivamente em

cima da própria proibição e prevaleceu ainda por muitos anos em

substituição àquela que não pôde mais ser utilizada.

Page 109: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

89. O Brasil ainda pirateia marcas internacionais famosas, como perfumes e griffes?

Esta prática, que ocorreu extensamente nas décadas de 70 e 80,

felizmente não mais encontra guarida na lei brasileira. A nova lei

de propriedade industrial garante proteção especial para as marcas

“notoriamente conhecidas em seu ramo de atividades”. O Artigo

126 cita inclusive um dispositivo da Convenção de Paris, determi-

nando que essa proteção em nosso país se fará mesmo que a marca

não esteja previamente depositada ou registrada no Brasil.

Os oportunistas adeptos da “lei de Gérson” também passam a

ser reprimidos pela alínea XXIII do Artigo 124, que impede o regis-

tro de “sinal que imite ou reproduza, no todo ou em parte, marca

que o requerente evidentemente não poderia desconhecer em ra-

zão de sua atividade”. Se um perfumista quiser registrar aqui, por

exemplo, uma loção com a marca Christian Dior, ele não poderá

alegar que desconhece produto semelhante no mercado pelo fato

de ser um produto conhecido em outro país, fato que não poderia

ser ignorado por pessoa que milita naquele ramo comercial.

Page 110: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

90. Afinal de contas, quem é flagrado pirateando vai pagar por isso? Pode até ser preso?

Sim. A lei assegura todas as condições para que os prejudicados

por crimes contra a propriedade industrial sejam devidamente in-

denizados e ressarcidos em seus prejuízos.

Penas de detenção, que variam de três meses a um ano, ou mul-

tas, estão previstas para os que cometem crimes contra as patentes,

desenhos industriais, marcas, sinais de propaganda e indicações

geográficas, e para os que praticam concorrência desleal.

É evidente que a fiel execução destas normas dependerá de ra-

pidez e do grau de eficiência do nosso poder judiciário e da polícia.

Para auxiliá-los, a lei concede ao juiz diversas possibilidades de to-

mar as medidas necessárias, mesmo antes da citação dos acusados,

na presunção de que legítimos interesses comerciais estão sendo

lesados. Uma dessas medidas é a busca e apreensão de mercado-

rias falsificadas ou “piratas”. Mas se for constatado que houve má-

fé, mero capricho ou erro grosseiro de quem tiver requerido tais

providências, esta pessoa responderá por perdas e danos à parte

prejudicada.

A lei é extremamente clara em distinguir as penas a que esta-

rão sujeitos os infratores da propriedade industrial. No campo da

indenização civil, caberão compensações realmente substanciais. O

Artigo 210, por exemplo, estabelece de maneira muito correta que

deverão ser pagos pelos infratores os chamados “lucros cessantes”,

determinados pelo critério que em cada caso seja mais favorável ao

prejudicado.

Um desses critérios é calcular o lucro que o prejudicado teria

auferido se a violação de seus direitos de propriedade intelectual

Page 111: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

não tivesse ocorrido. Outro, é fixar o montante equivalente aos lu-

cros que foram auferidos pelo infrator. E pode-se também estimar

qual seria a remuneração que o autor da violação teria pago ao ti-

tular do direito violado, caso este houvesse concedido uma licença

que permitisse legalmente explorar o bem.

As penas de detenção poderão ser aumentadas de um terço à

metade do tempo, em casos de infrações cometidas por um repre-

sentante, sócio, empregado ou preposto do titular da patente, ou

ainda se a marca alterada, reproduzida ou imitada for famosa ou

notoriamente conhecida.

91. A quem cabe provar que um determinado processo industrial não é cópia de um processo patenteado?

Como sabemos, um processo industrial só pode ser patenteado

se for inovador e se estiver detalhadamente descrito por seus inven-

tores. Como conseqüência, a descrição desse processo será pública,

pois estará seguramente protegida por uma patente que impedirá o

seu uso não-autorizado. Quem alegar que está utilizando um pro-

cesso distinto do patenteado pode estar usando, espertamente, o

próprio processo patenteado.

No interesse de apurar a verdade, o juiz deverá determinar ao

autor do processo alternativo que demonstre claramente qual pro-

cesso ele está realmente utilizando. A isto se chama “inversão do

ônus da prova”, situação rara em que o acusado é que deve provar

a sua inocência. Mas, neste caso, cabe.

Aos que se preocupam com a inocência do acusado, que po-

deria ser prejudicado pela divulgação pública do seu invento, devo

Page 112: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

esclarecer que o juiz, para preservar a suposta originalidade do

“processo alternativo” fará correr essa investigação em segredo de

justiça, como determina a lei.

92. Quais são os crimes de concorrência desleal?

Estão muito bem definidas na lei as situações em que a pessoa

dispensa a ética ou mesmo os princípios legais para obter vanta-

gens em relação ao seu competidor.

Há 14 casos listados no Artigo 195 da lei. Citamos os mais

relevantes: divulgar informações falsas a respeito do concorren-

te (como, por exemplo, supostos defeitos no produto); desviar a

clientela de outrem por meios fraudulentos; imitar a propaganda

alheia provocando confusão entre produtos ou estabelecimentos;

adulterar ou falsificar produto em rótulo de outrem; fazer propa-

ganda atribuindo-se uma premiação que não ocorreu; subornar

um empregado da empresa concorrente para obter vantagem; di-

vulgar ou utilizar, sem autorização, segredos de negócios do con-

corrente.

93. O que são “segredos de negócios”?

São conhecimentos, informações ou dados confidenciais utili-

záveis na indústria, no comércio ou na prestação de serviços. Ge-

ralmente são detalhes técnicos ou práticos que não possuem sofis-

ticação suficiente para serem registrados como patentes mas que se

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tornam imprescindíveis para o padrão de qualidade de determina-

dos produtos ou serviços.

O aquecimento da massa a uma determinada temperatura, a

velocidade exata na confecção de uma pré-mistura, técnicas como

essas, que tornam, por exemplo, um biscoito mais crocante ou mais

fresquinho, são bons exemplos de segredos de negócio.

Essas técnicas são de propriedade do fabricante e devem ser

consideradas como informações tão valiosas quanto sigilosas. O

acesso a informações desse tipo, por parte de um empregado ou

prestador de serviço, se dá em razão da própria função exercida

por ele. Portanto, esse indivíduo poderá utilizar-se desses conhe-

cimentos exclusivamente para o exercício de sua função específica

naquela empresa. A sua divulgação a terceiros, não-autorizada, é

considerada um crime de concorrência desleal (citado nos incisos

XI e XII do Artigo 195).

Também é crime de concorrência desleal (citado no inciso

XIV) a divulgação não-autorizada de dados ou resultados de testes

por funcionário do governo que os tenha recebido na condição de

examinador do processo de aprovação de um determinado pro-

duto. Este tema é extremamente importante e inovador na lei de

propriedade industrial, para evitar fatos que já ocorreram, como

a divulgação, para concorrentes inescrupulosos, de informações

confidenciais fornecidas compulsoriamente a autoridades gover-

namentais.

Considera-se também como infrator o empresário, sócio, em-

pregador ou qualquer outra pessoa que tenha oferecido recom-

pensa ao suposto empregado para que este divulgue informações

confidenciais ou segredos de negócios.

Page 114: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

94. Que coisa é essa chamada pipeline?

Pipeline é a denominação coloquialmente utilizada para defi-

nir os produtos em desenvolvimento e que não tenham sido lan-

çados em nenhum mercado do mundo no momento em que um

determinado país muda a sua legislação de propriedade industrial

e passa a admitir patentes para esses produtos. É o caso dos produ-

tos farmacêuticos novos que passaram a ser patenteáveis no Brasil

a partir da nova lei de propriedade industrial.

O conceito de pipeline só se aplica a produtos novos que, no

momento em que a lei foi publicada no Diário Oficial, estivessem

ainda em fase de desenvolvimento e não houvessem ainda sido lan-

çados em nenhum país.

Caso o produto, antes da data da lei (15/5/96), tenha sido colo-

cado em qualquer mercado, por iniciativa direta do titular ou por

terceiro com seu consentimento, ou caso tenham sido realizados

por terceiros, no país, “sérios e efetivos preparativos para a explo-

ração do objeto do pedido ou da patente”, não será reconhecido

como integrante do pipeline e, portanto, poderá ser explorado li-

vremente, como se tivesse caído em domínio público.

Para o depósito dos pedidos de patente relativos ao pipeline, a

lei estabeleceu o prazo de 1 ano, contado da data de sua publicação.

Esse prazo terminou no dia 15 de maio de 1997.

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95. Quantos pedidos de pipeline foram solicitados depois da aprovação da nova lei de propriedade industrial?

Segundo o INPI, foram recebidos 1.198 pedidos de pipeline no

período de um ano, entre 15/5/96 e 14/5/97, previsto pela lei.

Os maiores depositantes foram empresas dos EUA, responsá-

veis por mais de 44% do total de depósitos.

Como o prazo de registro de pipeline se esgotava em 1997 e

uma patente geralmente é válida por 20 anos, os mais antigos pe-

didos aceitos foram de 1977. Entretanto, mais de 50% dos pedidos

referiam-se a depósitos efetuados nos países de origem entre 1991

e 1994.

Houve também alguns pedidos de pipeline por parte de inven-

tores brasileiros que, antes da nova lei, eram obrigados a patentear

suas invenções ou modelos de utilidade em países que reconhe-

ciam patentes.

Segundo o eminente especialista e professor Dr. Gustavo Mo-

rais, até Setembro de 2005, o INPI havia aprovado 770 dos 1198 pe-

didos de patente de pipeline, representando cerca de 64% do total.

È surpreendente saber que, mesmo decorridos dez anos da aprova-

ção da lei, o número de pendências nesta área é elevado, com nada

menos que 428 pendências. É claro que parte destas pendências

podem ser de responsabilidade do depositante, por falta de emissão

da respectiva patente no exterior, mas muitas estão simplesmente

paradas nos arquivos do INPI e poderão perder suas validades, já

que seus prazos se expirarão (se é que já não expiraram) com a data

de vencimento de suas respectivas patentes originalmente concedi-

das no exterior. Este tipo de problema burocrático repercute muito

mal para a imagem de nosso país no exterior.

Page 116: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

96. Mas o pipeline não é retroatividade?

Claro que não. Este foi um dos falsos argumentos usados pe-

los que fizeram pressão contra a aprovação da lei de propriedade

industrial.

O pipeline nada tem de retroativo, pois não inclui os produ-

tos que, por imitação, tenham sido introduzidos em qualquer país,

inclusive no Brasil, antes da publicação da lei. Os produtos já exis-

tentes em qualquer país no momento em que a lei brasileira entrou

em vigor, embora protegidos por patentes no exterior, podem ser

explorados por qualquer fabricante sem pagamento de indeniza-

ção ou royalties.

Na verdade, retroatividade seria determinar aos que se aprovei-

taram do benefício de copiar invenções alheias não-patenteáveis na

vigência da lei anterior, que passassem a pagar os direitos de pro-

priedade intelectual a partir da vigência da nova lei, aos detentores

das respectivas patentes.

Tal possibilidade, no entanto, está especificamente vetada no

Artigo 232 da nova lei.

97. Como é que alguém pode pedir uma patente de pipeline?

Em primeiro lugar, todos os pedidos de pipeline devem ser pu-

blicados na revista de patentes do INPI. Esta publicação só é feita

após um exame formal de verificação da documentação necessá-

ria para o processamento desses pedidos. A partir da publicação, é

concedido um prazo de 90 dias para que terceiros eventualmente

prejudicados possam contestar esses pedidos de patenteamento de

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pipeline. As contestações deverão estar fundamentadas em duas

razões básicas:

I. que o produto tenha sido colocado em algum mercado e

que isso possa ser comprovado por quem contesta, desmentindo a

afirmação em contrário de quem solicitou o patenteamento;

II. que o contestador prove o fato de terem sido realizados

“sérios e efetivos preparativos” no Brasil para a exploração do ob-

jeto do pedido.

Nesta última frase temos mais um critério altamente subjeti-

vo, que não é adequado a uma lei desse tipo. O que serão “sérios

e efetivos preparativos”? Como determinar o grau de seriedade e

efetividade? Supõe-se que esses requisitos se refiram à construção

de uma fábrica com equipamentos e instalações apropriados para

industrialização exclusiva do produto em questão.

98. Por quanto tempo vigora uma patente de pipeline?

O prazo da patente de um produto integrante do pipeline no

Brasil será o mesmo período que restar no país onde foi feito o

primeiro pedido de patente daquele produto.

Por exemplo, um produto cuja patente foi pedida primeiro na

França, em 1989, teria sua patente válida no Brasil até o ano de

2009, quando expira a patente no primeiro país onde foi deposi-

tada, já que o prazo da lei francesa é de 20 anos. Como a nova lei

brasileira entrou em vigor no ano de 1996, a patente desse produto

integrante do pipeline vai durar apenas 13 anos.

Esse prazo limita-se ao máximo de 20 anos, contados a par-

tir do primeiro depósito, não cabendo para o pipeline a concessão

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mínima de dez anos (que comentamos na resposta ...) a partir da

expedição da patente.

99. Os inventores brasileiros também têm direito à proteção do pipeline?

Sim. Brasileiros e outras pessoas domiciliadas no Brasil têm os

mesmos direitos oferecidos aos estrangeiros ou não-domiciliados

no país, no sentido de registrar aqui os produtos de sua invenção

cujos pedidos de patentes foram depositados no exterior antes da

vigência da nossa nova lei de propriedade industrial.

Agora os inventores brasileiros podem registrar seus inventos

no Brasil sem o receio de serem imitados, copiados e plagiados em

seu próprio país.

100. Por que o pipeline é tão polêmico?

É polêmico porque atinge a parte mais sensível do corpo hu-

mano, o bolso. A aprovação do pipeline representou um ônus que

alguns empresários lutaram para evitar, pois estavam acostuma-

dos a copiar invenções, principalmente de produtos farmacêuticos,

sem autorização dos donos dessas patentes, já que a lei anterior

não reconhecia o direito de propriedade industrial para esses pro-

dutos. Auferiram, desta forma, lucros aos quais normalmente não

teriam direito pois nada investiram para que os produtos copiados

se transformassem de sonho em realidade.

Com toda a polêmica, a aprovação do pipeline foi bastante

branda para esses empresários, porque se limita a produtos ainda

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não lançados em nenhum país e não admite “qualquer cobrança

retroativa ou futura, de qualquer valor, a qualquer título, relativa a

produtos ou processos utilizados no Brasil em conformidade com

este artigo” (232). Estão fora do conceito de pipeline e, portanto, à

disposição dos produtores nacionais, todos aqueles medicamentos

novíssimos que, embora não existam no Brasil, tenham sido lança-

dos em algum país.

101. Por que ele é tão importante para a indústria farmacêutica?

Justamente porque, na indústria farmacêutica, há um prazo

extremamente longo para desenvolvimento e para a concessão da

autorização para venda desses medicamentos inovadores. Impor-

tante lembrar que os medicamentos lidam com vidas humanas, não

podendo dessa forma correr os riscos de fracasso que muitos pro-

dutos de outros setores poderiam correr. Como a patente começa

a contar o seu prazo desde o pedido, todo esse período de testes é

perdido do prazo efetivo da patente, o que diminui bastante o es-

paço de tempo em que os investimentos podem ser recuperados.

Portanto, quando uma lei reconhece, após um longo período

de exclusão, patentes de produtos farmacêuticos, existirão vários

produtos que, já tendo perdido o prazo de prioridade de 12 meses

fixado na Convenção de Paris, estão em fase de testes para, somente

depois da conclusão desta fase, serem lançados no mercado.

Já que o Brasil queria uma mudança imediata de paradigma,

ou seja, reconhecer um direito de imediato, não havia porque não

reconhecer a patente desses produtos que, embora tecnicamente já

houvessem perdido o prazo de prioridade, não tinham ainda sido

lançados.

Page 120: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Por outro lado, os imitadores nacionais, acostumados ao lucro

fácil de copiar, resistiram em perder de imediato este privilégio.

Caso o pipeline não fosse aceito, só seriam reconhecidas as patentes

dos produtos que estivessem na fase bem inicial do seu desenvolvi-

mento. Sem o pipeline, as primeiras patentes brasileiras de produ-

tos farmacêuticos só seriam concedidas após 9 ou 10 anos do início

da vigência da lei.

102. Quem paga os milhões de dólares que se gastam com pesquisa na indústria farmacêutica? É o pobre do doente?

Quem paga em primeiro lugar – e muitas vezes não recebe nem

troco – são os acionistas da empresa que inventou e desenvolveu

esses produtos. É óbvio que, no fim do processo, o consumidor

pagará o preço final, mas este é o preço de um produto testado e

aprovado para o consumo, e não o custo de uma longínqua pro-

messa que nem sempre se transformará em realidade, como era o

caso deste então “projeto” de produto na época de sua apresenta-

ção aos representantes dos acionistas.

Importante lembrar que a maioria esmagadora dos projetos

que iniciam o processo de desenvolvimento não chegam sequer a

se transformar em produtos, o que resulta em prejuízo total para

os investidores.

Obviamente, o preço de um produto inovador deverá ser es-

tabelecido de forma a permitir que os acionistas tenham uma re-

muneração que os motive a continuar investindo em atividade tão

arriscada.

Page 121: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

A pesquisa farmacêutica é uma atividade empresarial como

outra qualquer, que somente sobrevive se produzir retorno. Não

é uma atividade filantrópica, como também não o são as escolas

privadas, os proprietários de imóveis alugados ou de escolas priva-

das. Cabe, sim, ao governo, prover o acesso a esses medicamentos

para as pessoas que não tiverem condições econômicas de fazê-lo.

Essa responsabilidade não pode ser transferida nem imputada às

empresas comerciais.

103. Quais os caminhos para a pesquisa de novos medicamentos?

Há três caminhos básicos.

O primeiro é o da química e da farmacologia tradicionais, com

a ajuda fundamental da informática, já que hoje o cientista não

trabalha mais só no tubo de ensaio, mas sim, principalmente, na

tela de seu computador, desenhando novas moléculas que poderão

se transformar em novos medicamentos.

O segundo caminho é o da biotecnologia, que, embora mais

antigo, recentemente encontrou trilhas verdadeiramente revolu-

cionárias. A manipulação genética permitiu chegar a novos me-

dicamentos que, ao invés de provocar reações químicas em nosso

organismo, curam utilizando organismos vivos que estimulam os

nossos próprios órgãos a nos livrar de muitos males que antes não

tinham tratamento.

O terceiro caminho, também revolucionário, é muito mais re-

cente e ainda dá os seus primeiros passos. Trata-se das chamadas

“terapias genéticas”. Ao invés de cuidar das doenças, iremos atacar

diretamente as suas causas, as suas origens. Este será o caminho

não só da indústria farmacêutica mas da própria medicina do fu-

Page 122: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

turo, pois as possíveis doenças passarão a ser identificadas através

da análise do DNA. Pelo código genético de uma pessoa, talvez até

antes de seu nascimento, serão identificadas suas possíveis doen-

ças, tomando-se as devidas providências de “reforço genético” para

que essas enfermidades não venham a ocorrer. Ainda mais recente-

mente temos o recurso de diagnósticos e tratamento com células-

tronco e a aplicação de implantes biológicos.

104. Como está a proteção da propriedade industrial nos outros países da América Latina?

O primeiro país da América Latina a encontrar um padrão de

primeiro mundo para a proteção da propriedade industrial foi o

México, que modificou a sua lei em 1991. O Brasil foi o segundo

a ter uma lei de alto nível, em 1996. Os outros países carecem de

um nível eficiente de proteção. O Chile, por exemplo, ainda adota

um prazo de 15 anos e não protegeu o pipeline. A Argentina tem

uma lei em desacordo com o TRIPs e que só entrou em vigor re-

centemente e com muitas restrições entre as quais a não proteção

do pipeline.

Page 123: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

105. Isso quer dizer que o Brasil levou vantagem com sua nova lei, em relação à Argentina e outros países da América do Sul?

Sem dúvida. E este foi um dos principais fatores que levaram

o nosso Congresso a aprovar mais rapidamente a nova lei, colo-

cando-a em vigor no menor prazo possível de implementação. O

nosso Ministério das Relações Exteriores enfatizou, com grande

competência, este ponto fundamental. O resultado é que os inves-

timentos nas áreas não protegidas anteriormente estão vindo para

o Brasil e não para a Argentina, por exemplo.

Os produtos exportados pelo Brasil poderão entrar na Argenti-

na porque respeitam os direitos de patentes. Mas os importados de

lá não poderão aqui entrar por estarem em desacordo com a nova

lei de propriedade industrial.

A Argentina pensou que levaria vantagem em utilizar o prazo

de carência permitido pelo TRIPs para os países que não reconhe-

ciam patentes farmacêuticas. Por isso adiou a data de implementa-

ção da sua lei. Já o Brasil percebeu que a verdadeira vantagem era

não utilizar este prazo mas, sim, sinalizar aos investidores que esta-

va pronto para mudar as suas regras e receber investimentos. Neste

caso, os argentinos ficaram com a lei de Gérson e nós ficamos com

os benefícios.

Page 124: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

106. Como é que fica essa situação no Mercosul?

A situação está um pouco confusa, porque o nível de proteção

da propriedade intelectual nos quatro países é totalmente desigual,

praticamente conflitante. O Paraguai só agora aderiu à Convenção

de Paris. A Argentina, já vimos na resposta anterior. E o Uruguai

se mantém na coluna do meio. Há várias comissões preparando o

que se convencionou chamar de “harmonização das leis no Merco-

sul”. Os progressos são lentos. Por enquanto, só há um protocolo de

marcas, com dispositivos, aliás, bastante polêmicos. As negociações

parecem um diálogo de surdos e levarão ainda muito tempo, pois

todas as regras penosamente acordadas ainda terão de ser ratifica-

das pelos congressos de cada país.

107. Se os países têm níveis diferentes de proteção da propriedade industrial, isso pode dificultar a circulação dos produtos patenteados entre os países do Mercosul e outros países do mundo?

Dificultará apenas para os produtos que infringirem as regras

consagradas pelo TRIPs para a proteção da propriedade intelec-

tual. Nestes casos, esses produtos terão sua circulação proibida

fora de seus países de origem. Mais um ponto para o Brasil, que

adaptou tempestivamente a sua lei, favorecendo diretamente seus

exportadores.

Page 125: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

108. A nova lei vai favorecer a transferência de tecnologia?

Citando novamente Nelson Rodrigues: esta resposta é o óbvio

ululante. A lei foi concebida exatamente para favorecer a trans-

ferência de tecnologia. Quando não se dá valor à propriedade da

tecnologia, não se estimula o investimento privado, indispensável

para sua criação.

Tecnologia é hoje uma mercadoria muito valiosa e, se não hou-

ver regras claras que garantam a sua propriedade, ela simplesmente

não florescerá.

109. O INPI não deveria orientar o empresário nacional nas questões de transferência de tecnologia?

O INPI existe para certificar, e não para aconselhar. Cabe a ele

apenas, neste caso, atuar como um cartório que autentica a vera-

cidade dos contratos de transferência de tecnologia. E, assim mes-

mo, somente quando as partes contratantes preferirem que o INPI

exerça este papel, para produção de efeitos junto a terceiros, ou

seja, quando for necessário provar a alguém, além das partes con-

tratantes, que o referido contrato existe e foi celebrado conforme

a lei.

Page 126: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

110. Agora que as patentes são protegidas por lei, qual a saída para as empresas brasileiras nos ramos que exigem grande avanço tecnológico, já que a tecnologia de ponta exige enormes investimentos?

Existem três saídas para as empresas brasileiras, nestes casos.

A primeira é a mais difícil e a mais onerosa, porém a mais grati-

ficante: criar tecnologia própria. É claro que esta opção não depen-

de exclusivamente da empresa, mas de uma mudança na política

educacional do próprio governo, pois não se pode criar tecnologia

no país sem uma sólida base científica.

A segunda saída, bastante interessante e recomendável, seria

comprar a tecnologia de terceiros ou mesmo associar-se a empre-

sas com mais experiência para que, juntas, partilhem recursos e

resultados.

Por último, a alternativa mais simples e acessível, mas nem por

isso menos meritória: utilizar tecnologia já em domínio público,

que, aliás, cobre todos os ramos de atividade. Ao optar por este

caminho, o empresário deverá ter em mente que seu sucesso de-

penderá do grau de eficiência que ele empregar na utilização des-

sa tecnologia. Esta alternativa está muitíssimo bem difundida no

Brasil com a produção dos medicamentos genéricos. Ao contrário

do que muita gente pensa, foi a nova lei de patentes que criou con-

dições para a implantação da política de medicamentos genéricos

no Brasil. Hoje, aolado dos produtos patenteados, convivem os ge-

néricos de qualidade certificada, que em boa hora, vieram a substi-

tuir os antigos “similares”, nem sempre com irrefutáveis predicados

de qualidade. Embora possa às vezes parecer que haja um conflito

Page 127: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

entre produtos patenteados e produtos genéricos, temos hoje, na

maioria dos países uma co-existência entre produtos patenteados,

que em breve se tornarão disponíveis para a comercialização como

genéricos, e produtos com ou sem marca própria, produzidos com

base na equivalência terapêutica dos produtos anteriormente pa-

tenteados que lhes servem como referência.

111. A proteção das patentes, impossibilitando a cópia, pelas empresas nacionais, de novos medicamentos lançados no exterior, dificultará o acesso da população brasileira às mais recentes novidades terapêuticas?

Não. Pelo contrário. Tornará mais fácil e mais rápido o aces-

so às últimas novidades terapêuticas. Quando não podiam ter pa-

tentes no Brasil, aí sim as empresas temiam o lançamento de suas

últimas novidades no mercado brasileiro, já que poderiam ser im-

punemente copiadas.

Page 128: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

112. A evasão de cérebros brasileiros, ou seja, a migração de cientistas para trabalhar no exterior por falta de mercado de trabalho no Brasil, deverá aumentar ou diminuir com a nova lei de propriedade industrial?

A médio e longo prazo, deverá diminuir. Com o incentivo a

investimentos privados em atividades tecnológicas, haverá natu-

ralmente um aumento de mercado de trabalho para esses cientistas

no Brasil. Entretanto, esse fenômeno não dependerá exclusivamen-

te da nova lei de propriedade industrial, mas de outras políticas

de incentivo à ciência e tecnologia, que deverão ser rapidamente

formuladas e implementadas pelo governo brasileiro.

113. O INPI está aparelhado para atender às novas necessidades?

Infelizmente não. Nem suas instalações, nem seus equipamen-

tos e muito menos seu pessoal.

As estatísticas do INPI indicam que o número de funcionários

decresce enquanto aumenta o número de solicitações não resol-

vidas. As instalações do INPI parecem ruínas sem qualquer valor

histórico. E os equipamentos estariam melhor em um museu na

era da pré - informática.

Page 129: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Em contraste com isso tudo, a caixa é rica, pois o órgão arreca-

da, em emolumentos e taxas, mais do que o suficiente para man-

ter-se com suas próprias pernas. Mas o órgão continua pobre por

que os recursos arrecadados pelo INPI vão para o caixa único do

Tesouro e só uma parte deles retorna para o órgão de origem. Sem

medo de errar, posso hoje afirmar que o INPI se mantém vivo por

obra e graça de um pequeno grupo, cada vez menor, de abnegados

funcionários, muito dedicados, mas que, infelizmente, estão gra-

dualmente se aposentando e deixando os quadros da instituição.

A solução para esse problema, a nosso ver, só poderia ser uma

drástica reforma do INPI. Impõe-se transformá-lo em uma “agên-

cia executiva autônoma”, desvinculada do orçamento federal. Seus

recursos seriam, nos moldes da mais moderna administração pú-

blica, aplicados em benefício dos seus usuários, ou seja, inventores,

designers, empresas industriais e comerciais etc.

A decisão de reformar o INPI depende apenas de ação do poder

executivo, pois a nova lei, no seu Artigo 239, o autoriza expressa-

mente – e sem necessidade de consulta ao legislativo – a promover

as necessárias transformações para assegurar autonomia financeira

e administrativa ao órgão responsável pela proteção da proprieda-

de industrial em nosso país.

114. E o poder judiciário? Está preparado para a nova lei?

Esta pergunta deveria ser a primeira, e não a última, pois de

nada serve uma boa lei se não houver quem bem a aplique.

Nosso poder judiciário carece de maior conhecimento, em

profundidade, sobre os temas da propriedade intelectual. A exem-

plo de outros países, deveria haver a especialização de juízos e de

Page 130: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

juízes para questões tão técnicas, que ficam muitas vezes ao sabor

das constantes inovações científicas. No mundo atual, em que a

ciência e a tecnologia avançam a um ritmo cada vez mais rápido,

uma Justiça sem especialização será mais lenta, mais cara e cada

vez mais dependente da contratação de peritos e árbitros de fora

do meio judiciário.

Page 131: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

Como disse no início deste livro, escrevê-lo foi difícil, mas tam-

bém foi puro prazer. Quando comecei a trabalhar no tema “paten-

tes”, e já lá se vão mais de dezessete anos, o Brasil começava a dar os

primeiros passos no seu novo regime democrático que se conven-

cionou chamar de “Nova República”. Não eram como os primei-

ros passos de uma criança, mas, estranhamente, pareciam com os

de alguém que, tendo sofrido de algo como uma paralisia durante

a infância, aprendeu a caminhar já adolescente. Os passos de um

adolescente já são, por sinal, muito difíceis, mesmo tendo aprendi-

do a caminhar nos primeiros anos de vida. Imagine se o aprendi-

zado tivesse que começar aos treze, quatorze anos. Assim era, para

mim, o Brasil de 1988 — um adolescente de 488 anos, recém-saído

Apêndice:O que mudou no Brasil com a nova Lei de Propriedade Industrial?

Page 132: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

da paralisia. E aquela vontade de recuperar séculos em meses nos

fez dar vários passos errados, embora na direção certa. Como o

carro de uma auto-escola, o Brasil correu para aprovar uma Cons-

tituição-Cidadã (!), cujo maior mérito foi criar dificuldades, qua-

se intransponíveis, para modificá-la. O “orgulho nacionalista”, tão

bem definido pelo nosso saudoso João Saldanha como “patriota-

da”, nos fez cometer sérios equívocos, todos em nome de uma en-

tidade etérea e indefinida, nomeada “interesse nacional”. “Interesse

Nacional” de quem, cara pálida? Dos que acham que empregos são

uma dádiva divina, um verdadeiro maná que deve ser preservado

para a vida toda? Daqueles que acham que o mercado brasileiro (aí

incluídos nós outros, idiotas, passivos e ruminantes) é patrimônio

nacional? Dos que acham que copiar, imitar e piratear são manei-

ras válidas de concorrer e disputar mercado? Dos que acham que o

mundo ainda é um punhado de aldeias disputando hegemonia?

Felizmente, acho que estas teses estão, hoje, completamente as-

sassinadas pelos fatos. O mundo globalizou-se. A competição virou

o Brasil de ponta-cabeça.

Tenho muito orgulho de ter podido contribuir para que se tor-

nasse realidade uma das peças mais fundamentais para que este

novo Brasil iniciasse a arrancada para o seu brilhante destino. A

Lei de Propriedade Industrial foi percebida pela comunidade in-

ternacional como uma das mais importantes mudanças estruturais

em nosso país. Finalmente o “malandro” deu lugar ao “criativo”, ao

“inventivo”. As regras universais do jogo dos investimentos e dos

negócios passaram a ser respeitadas no Brasil, sem subterfúgios.

Crises sempre haverá — na maioria dos casos serão furacões de

curto prazo, açoitando especuladores e capitalistas-oportunistas de

ocasião. Não são estes que constroem o progresso de uma Nação,

mas sim aqueles que pensam e investem, a longo prazo. É destes, e

não daqueles, que o Brasil precisa.

Page 133: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

O texto acima foi escrito nos idos de 1997. Fico muito orgu-

lhoso de saber que, hoje, passados oito anos, ele permanece ainda

atual. Mas, para manter viva a controvérsia, mantêm-se também

vivos e ativos aqueles que se opõem às estas idéias, na sua incansá-

vel tarefa de manter sempre atrasados os ponteiros do relógio do

progresso.

A Lei de Patentes, hoje celebrando dez anos de vida, permanece

firme, apesar de alguns solavancos que, sem dúvida, retiraram par-

te de seu viço original. Vamos a eles:

1. Anuência Prévia da ANVISA

Trata-se de um novo dispositivo (letra “c” do artigo 229 da lei

9279 de 14 de Maio de 1996) introduzido inicialmente por Medida

Provisória, renovada inúmeras vezes, e, finalmente convertida na

lei 10.196 de 14 de Fevereiro de 2001.

Este novo artigo simplesmente submete a concessão de paten-

tes de produtos e processos farmacêuticos à uma suposta “anuên-

cia prévia” da ANVISA, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária,

vinculada ao Ministério da Saúde..

É este um dispositivo absolutamente ilegal contrariando a pró-

pria Lei a que foi acrescentado. A Lei 9279, claramente, em seus

artigos 8, 10 e 18, determina o que pode ou não pode ser patente-

ável e o que pode ser ou não ser considerado como uma invenção.

Os produtos e processos farmacêuticos, como quaisquer outros, de

todos os demais ramos de atividade, são patenteáveis desde que

possuam características de novidade, atividade inventiva e aplica-

ção industrial. As exceções da Lei não incluem compostos farma-

cêuticos, como aliás preconiza o artigo 27 do TRIPs, que concede

Page 134: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

proteção patentária a todas as matérias incluídas em todos os cam-

pos da tecnologia.

Tal dispositivo revela, sobretudo, uma total ignorância a respei-

to do que seja a finalidade de uma patente: a proteção do inventor

contra os que pretendem utilizar o fruto de sua criação intelectual

sem sua autorização. A concessão de uma patente, entretanto, não

significa uma autorização para comercializar o seu objeto. Esta é

missão de autoridades regulatórias como, por exemplo, a própria

ANVISA. Confundir “proteção de autoria” com “autorização para

comercialização” é um erro primário, a que, infelizmente, foram

forçados a cometer os nossos legisladores.

A única razão a que podemos atribuir o açodamento das auto-

ridades na aprovação deste esdrúxulo artigo é a intenção delibera-

da de retardar ainda mais o processo de concessão de patentes far-

macêuticas, especialmente as de pipeline, que, como se sabe, têm

seu prazo de validade esgotado na data de expiração da patente

original no exterior.

2. Legitimação de atos praticados por terceiros não autorizados em relação a produtos patenteados

A mesma Lei 10.196 de 14 de Fevereiro de 2001, menciona-

da em “1” acima, alterou também a Lei 9.279, acrescentando mais

uma restrição aos direitos contidos em uma patente, acrescentan-

do mais uma alínea (a VII) ao artigo 43 da Lei de Patentes.

Esta restrição convalida e legaliza a realização de “atos prati-

cados por terceiros não autorizados ... destinados exclusivamente

à produção de informações, dados e resultados de testes, visando

Page 135: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

à obtenção do registro de comercialização (grifo nosso) no Brasil

ou em outro país, para a exportação e comercialização de produto

objeto da patente (grifo nosso) , após a expiração dos prazos esti-

pulados no art. 40”.

Trocando em miúdos, a lei, ao nosso ver, indevidamente, abre a

possibilidade de realização de ensaios técnicos e pesquisas realiza-

das em produtos patenteados, em plena vigência do seu período de

patente, com finalidade exclusivamente comercial. Este novo dis-

positivo está em clara contradição com os incisos I e II do mesmo

artigo 43. Estes incisos falam em exceções apenas para atos pratica-

dos por terceiros não autorizados “sem finalidade comercial desde

que não acarretem prejuízo ao interesse econômico do titular da

patente,” ou com “finalidade experimental, relacionados a estudos

ou pesquisas científicas ou tecnológicas”.

Há aqui uma óbvia intenção de favorecer a rapidíssima con-

cessão de registros para comercialização de produtos genéricos,

repetindo em nosso país o chamado “dispositivo Bolar” que tanta

polêmica vem causando nos EUA, causando reações negativas até

com detentores de patentes européias que questionam a legalidade

e a legitimidade desta incabível restrição aos direitos do detentor

de uma patente.

Importante notar que a rapidez com que as autoridades sani-

tárias aprovam registros de genéricos contrasta fortemente com a

lentidão na aprovação de produtos originais, pioneiros, inovado-

res, sem os quais, diga-se de passagem, não haveria produtos gené-

ricos, cuja utilidade não se discute, mas que, por definição, jamais

serão soluções originais e criativas para a terapia das principais

enfermidades.

Page 136: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

3. Licenças Compulsórias de Ofício

As licenças compulsórias deste tipo são previstas tanto no arti-

go 31 do TRIPs como “(licenças) para outro uso, sem autorização

do titular” quanto no artigo 71 da Lei 9279/96 como “licença com-

pulsória nos casos de emergência nacional ou interesse público”.

O decreto 3201 de 6/10/99, modificado posteriormente pelo

decreto 4830 de 4/09/03, pretende “dispor”, ou seja, regulamentar o

citado art. 71 da Lei 9279/96.

Em nossa opinião, estes decretos são absolutamente ilegais,

pois não se limitam a regulamentar uma lei, mas extrapolam ao

tentar instituir normas e conceitos absolutamente contrários ao

espírito e à letra da lei que pretendem regular.

Já na época da confecção da Lei 9279 houve a introdução, bas-

tante discutível, do termo “interesse público” como motivo de uma

possível concessão de licença compulsória quando,.na realidade, o

TRIPs só fala em casos de “emergência nacional” ou “outras cir-

cunstâncias de extrema urgência” ou em casos de “uso público não

comercial”.

Portanto, em nossa opinião, a alegação de uso por “interesse

público”, expressão usada tanto na lei como nos decretos pode ser

considerada como ampla demais e abusiva por não estar prevista

no TRIPs. De acordo com o TRIPs , a licença compulsória de ofício

só pode ser usada para remediar temporariamente uma situação

emergencial, de extrema urgência ou de uso público não comer-

cial.

A hipótese de “uso público não comercial”, embora prevista no

TRIPs, não foi incorporada à lei brasileira em nenhum dos seus

artigos. Portanto, é absolutamente ilegal que um simples decreto

regulamentador pretenda introduzir em seu texto uma circunstân-

Page 137: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

cia que gere a concessão de uma forma de licença compulsória que

não está sequer prevista na própria Lei.

Em nossa opinião, portanto, as duas expressões, “interesse pú-

blico” e “uso público não comercial” podem ser seriamente questio-

nadas judicialmente – a primeira por não estar prevista no TRIPs e

a segunda por não estar prevista na Lei 9279/96.

Importante ainda notar que no decreto 4830, a nova redação do

seu artigo 10 e, especialmente o seu parágrafo único, fica instituída

(por decreto !!!) a importação de produtos copiados sem o consen-

timento do detentor da respectiva patente, em flagrante conflito

com a Lei 9279/96 que, ao contrário, em seu artigo 42 impede lite-

ralmente tal operação, permitindo apenas, no inciso IV do artigo

43 a importação de produtos patenteados colocados no mercado

interno diretamente pelo titular ou com seu consentimento.

O referido parágrafo único do artigo 10 do Decreto 4830 diz,

literalmente, que a União adquirirá preferencialmente (e não obri-

gatoriamente) o produto que tenha sido colocado no mercado

(sem mencionar se interno ou externo) diretamente pelo titular ou

com seu consentimento, sempre que tal procedimento não frustre

os propósitos da licença (!!!)

Este artigo abre, perigosamente, as portas para a pirataria, em

clara colisão com a Lei 9279 e o TRIPs.

4. Registro de Cópias de Produtos Patenteados

Esta é outra prática absolutamente ilegal e ilegítima por parte

da ANVISA. Além de violar os dispositivos de proteção de dados

confidenciais contidos no TRIPs, trata-se de visível incentivo à pi-

rataria ao conceder a terceiros uma autorização para comercializar

Page 138: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

um produto que viola o direito de uma prioridade ou de uma pa-

tente concedida.

O ideal neste caso seria a criação de um mecanismo legal que

efetivamente promova a interconexão entre a proteção da patente

e a impossibilidade de registro de produtos de cópia antes do ven-

cimento da respectiva patente.

5. Grupo de Negociação de Anti-Retrovirais

Foi introduzido pelo Ato-portaria n° 1360 do Gabinete do Mi-

nistro da Saúde, de 21/07/03.

Em nossa opinião trata-se de mero ato voluntarista do minis-

tro, desprovido de qualquer base legal. Chega a ser risível, se não

fosse trágico, o texto do inciso II que, literalmente, afirma que “o

grupo deverá estabelecer entendimentos para negociações com as

empresas detentoras das patentes destes medicamentos para a sua

produção por laboratórios oficiais ou autorizados por este Minis-

tério, mediante licença a ser concedida voluntariamente (!!!)” .

Em suma, transformam-se os membros do “Grupo de Nego-

ciação” em algo que me lembra grupos de policiais especializados

em obter de “suspeitos” algumas “confissões voluntárias”...

Page 139: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

6. Declaração de Doha sobre TRIPs e Saúde Pública

A declaração, adotada pela O.M.C. em 14/11/01 estabelece, ba-

sicamente, o seguinte:

A extensão para 1/1/2016 do prazo de carência para a imple-

mentação das seções 5 (patentes) e 7 (proteção de informação con-

fidencial) da parte II do acordo do TRIPs para os países menos

desenvolvidos, classificação estabelecida pela O.N.U. e da qual o

Brasil não faz parte.

Que cada país membro tem o direito de conceder licenças com-

pulsórias e a liberdade para determinar os campos e as circunstân-

cias em que estas licenças são concedidas. O Brasil já fez isto em sua

Lei 9279/96,na sua seção 3 do seu capítulo VIII. As condições da lei

brasileira são mais restritas que as previstas no artigo 31 do TRIPs,

com exceção da inserção do termo “interesse público” a que já nos

referimos anteriormente. Já a expressão “circunstâncias de extre-

ma urgência”, mencionada no TRIPs e na Declaração de Doha, não

consta da Lei 9279/96, só dos decretos 3201/99 e 4830/03 que não

podem inovar dentro da lei e muito menos têm força na hierarquia

das leis para prevalecer sobre os dispositivos da Lei 9279/96. Por-

tanto, em nossa opinião, a capacidade de aplicação dos conceitos

desta Declaração, no tocante a situações de extrema urgência e, por

conseqüência, as relacionadas a HIV/AIDS, tuberculose, malária

e outras epidemias não se enquadram no ambiente atual da Lei

Brasileira de Propriedade Industrial (Lei 9279/96). Só se aplicaria

a Declaração aos casos de “emergência nacional”, claramente defi-

nidos na Constituição Federal.

Que cada país tem a liberdade de estabelecer seu próprio para

exaustão de direitos, sem possibilidade de contestação judicial,

Page 140: Inter Farm Aliv Ro Patent Es

desde que submetido aos artigos 3 e 4 do TRIPs (nação mais favo-

recida e tratamento nacional). Como o inciso IV do artigo 43 da

Lei 9279/96 admite claramente a possibilidade de “importação pa-

ralela” de produtos patenteados, não há a menor possibilidade de

questionar judicialmente a importação de produtos (patenteados)

que tenham sido colocados no mercado interno diretamente pelo

titular ou com seu consentimento.

7. Patentes de Segundo Uso (Não-Anuência)

A Matéria foi regulada no Informe Técnico da Anvisa de

25/08/04 que tornou pública a decisão da Diretoria Colegiada do

órgão, tomada em 26/11/03, que, sem maiores explicações, consi-

derou o “instituto (das reivindicações de novo uso de substâncias)

é lesivo à Saúde Pública, ao desenvolvimento científico e tecnoló-

gico do país, podendo dificultar o acesso da população aos medi-

camentos. Neste sentido, decidiu pela não concessão de anuência

prévia a casos de pedidos de patentes de segundo uso.”

Como se vê, trata-se de decisão absolutamente desprovida de

qualquer justificativa legal. Reiteramos todas as nossas observações

constantes do item “1” acima, “anuência Prévia da Anvisa”. A fun-

ção da Anvisa é de disciplinar a comercialização de certos produtos

e não decidir sobre patentes que têm a ver apenas com os conceitos

de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. O não pa-

tenteamento de um segundo uso é um atentado grave aos princí-

pios mais elementares do Direito da propriedade intelectual.

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Além dos sete pontos negativos explicados acima, tramitam

no Congresso Nacional vários Projetos de Lei com o objetivo de

diminuir os direitos de propriedade intelectual, especialmente os

relacionados a produtos e processos farmacêuticos. Dentre estes,

selecionamos os que nos pareceram mais relevantes. Vamos a eles:

a) PL 139/99 do Deputado Alberto Goldman (PSDB-SP)

Este projeto de lei propõe alterar a Lei 9279/96 incorporando

dois princípios que conflitam entre si:

A possibilidade de realizar “importações paralelas” e a obriga-

toriedade da fabricação completa do produto patenteado e o uso

integral do processo patenteado no território nacional. Se aquela

visa ao barateamento do preço de aquisição de um produto por

meio de compra no mercado externo, via importação, esta procura

uma suposta transferência de tecnologia e a expansão do parque

fabril nacional através de uma produção completa no país, a qual-

quer preço.

Na realidade a lei original é mais coerente porque estimula a

fabricação nacional ressalvando a possibilidade de importação

quando a alternativa local for economicamente inviável. O Projeto

ora em discussão propõe, irracionalmente, o exato inverso.

Não bastando esta refutação por razões meramente econômi-

cas, some-se a ela um impedimento ainda mais grave, de ordem

jurídica, que é a colisão frontal com o Artigo 27 do TRIPs que pre-

coniza a não discriminação, para efeito de exploração de uma pa-

tente, entre os produtos importados e os fabricados localmente.

Em nossa opinião, este projeto carece de fundamentação jurídica

e econômica, bem como dois dos três outros projetos de lei que se

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encontram a ele apensados: o de nº 3562/00 do Dep. Raimundo

Gomes de Mattos e o de nº 303/03 do Dep. Dr. Pinotti, que, basi-

camente, versam sobre os mesmos temas. A eventual aprovação do

PL 3562/00 seria particularmente danosa aos direitos de proprie-

dade intelectual tendo em vista que ele também trata de outros

tipos de licenças compulsórias, incluídas no Decreto 4830/03, já

comentado anteriormente.

O outro Projeto apensado, o de nº 7066/02 trata de assunto

completamente diverso, o agravamento das penas pelo crime de

pirataria. È um bom projeto, aumentando a repressão e desesti-

mulando a prática de infrações contra os direitos de propriedade

intelectual. Foi erroneamente incluído neste “pacote”.

b) PL 22/2003 do Deputado Roberto Gouveia (PT-SP)

Este projeto pretende incluir entre as Exceções à patenteabi-

lidade os medicamentos para a prevenção e tratamento da AIDS

e seus respectivos processos de fabricação, através de inclusão de

mais uma alínea (no caso a IV) no artigo 18 da Lei 9279/96. Ele

reproduz projetos anteriores dos Deputados Eduardo Jorge (PL

1922/99) e Aldo Rebelo (PL 4678/01) que a este ainda não foram

apensados.

Poderia aqui eu dissertar longamente sobre as ilegalidades

gritantes que caracterizam estes projetos, especialmente o choque

frontal com o artigo 27 do TRIPs que não permite a discriminação

de áreas para patenteamento ou até me aprofundar nos argumen-

tos econômicos liderados pelos óbvios desestímulos à pesquisa,

especialmente nesta área tão sensível, mas prefiro, para ficar mais

no tom desta publicação, reproduzir artigo de minha autoria inti-

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tulado “O Senado precisa intervir” , publicado n’O Globo de 9 de

Junho de 2005, alguns dias após a aprovação do PL na Comissão de

Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, em

caráter terminativo, pendente de recurso para discussão no Plená-

rio:

“Se um marciano visitasse Brasília na última quarta-feira, cer-

tamente ficaria desorientado. Ao se aproximar da Câmara dos De-

putados veria, com gosto, do lado de fora, muitos cartazes e faixas

pedindo o fim da pirataria com dizeres expressivos como “pirataria

é crime” ou “pirataria é desemprego”. Se, entretanto, empolgado, ele

entrasse na sala da Comissão de Constituição e Justiça, levaria um

susto muito grande e se decepcionaria. Lá, justamente na Comis-

são que tem o dever específico de defender as leis e a Constituição

do país, ao som de ruidosos manifestantes e com a complacência

dos melhores juristas que integram as bancadas ali representadas,

praticava-se um verdadeiro atentado contra as leis e tratados vi-

gentes no Brasil, e, o que é pior, a pretexto de defender aqueles que

padecem do chamado mal do século, a AIDS.

Naquele momento, como vimos nos jornais do dia seguinte,

através de uma “votação simbólica”, incluía-se na restrita lista do

que não pode ser objeto de uma patente, os medicamentos usados

na prevenção e tratamento da AIDS bem como seus respectivos

processos de obtenção. Por mais absurdo que pareça, equipararam

remédios salvadores de vidas com “o que for contrário à saúde pú-

blica (!)” , definição do que não pode ser patenteado, de acordo

com o artigo 18 da Lei de Propriedade Industrial, em vigor há mais

de 9 anos.

Há mais de dez anos atrás, com a criação da Organização Mun-

dial do Comércio (O.M.C), consagrou-se de vez o princípio básico

das relações econômicas que reconhece que a propriedade intelec-

tual é um valor determinante e decisivo na regulação das transações

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comerciais internacionais. Daí o Tratado de Marrakesh, que criou

a O.M.C., ter incluído em seu conjunto de acordos internacionais,

um, o chamado TRIPs, que regula especificamente os aspectos co-

merciais da chamada propriedade intelectual. E, todos as nações

que integram a O.M.C., hoje nada menos que 148 países, se obri-

gam a respeitar todas estas regras, sejam elas relativas a direitos au-

torais, marcas, indicações geográficas, segredos de negócio, design

e, obviamente, patentes. Ainda há certas regras de tolerância para

uma lista muito limitada de países subdesenvolvidos, dos quais o

Brasil felizmente não faz parte, tendo já expirado, no início deste

ano, todos os prazos de transição que estavam disponíveis para os

países em desenvolvimento. Portanto, hoje, todos os demais países

estão obrigados a seguir estas regras, sem a menor possibilidade de

criar exceções. Há um órgão dedicado à solução de disputas, não só

de temas relacionados à propriedade intelectual, mas de quaisquer

outros de natureza comercial, como questões de subsídios disfar-

çados, concorrência desleal e muitas outras. O Brasil, diga-se de

passagem, já se utilizou, com sucesso, destes mecanismos para pro-

teger os seus exportadores e defendê-los de práticas protecionistas

praticadas por seus parceiros comerciais.

Mas, voltando ao nosso marciano, ele deve ter ficado muito

impressionado com as declarações precipitadas manifestadas no

fragor da “vitória”, principalmente por aqueles que viam naquela

aprovação a certeza de que, finalmente poderiam ser produzidos

genéricos a preços muito menores que os praticados pelos deten-

tores de patentes. Até um marciano sabe que leis nunca retroagem

sobre direitos adquiridos. Conforta-nos saber que a experiência

dos Senadores está aí mesmo, na sua missão de revisar os arroubos

eventualmente excessivamente juvenis dos deputados de primeira

legislatura.

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Como Marte ainda não faz parte da O.M.C., nosso marciano

certamente ficaria preocupado com o destino daqueles que gosta-

riam de burlar, com uma penada “simbólica”, os direitos legítimos

de propriedade daqueles que tanto investiram em produtos salva-

dores. Como as regras do TRIPs tem que ser seguidas por todos

os membros, o nosso Brasil, se não for salvo por intervenção do

Senado e, posteriormente, pelo Plenário da Câmara, e não pelos

membros de apenas uma Comissão, por mais importante que seja,

pode vir a ser excluído da própria O.M.C.. Aí só nos restaria a pos-

sibilidade de exportar genéricos para Marte...

Mas agora, sério, onde ficam os nossos soropositivos com estas

mudanças? Teriam eles à sua disposição produtos com alto grau de

confiabilidade e qualidade, como hoje? Teriam eles acesso imediato

aos produtos de ponta, como hoje? Será melhor ficar na dependên-

cia de produtores de genéricos de medicamentos recém introduzi-

dos no mercado mundial?

Sinceramente, não vejo nenhuma vantagem econômica que

possa compensar os riscos para a saúde pública.

Vamos torcer para que o bom senso prevaleça e que os atores

desta ópera bufa se entendam e possam beneficiar os que realmente

precisam, com o suprimento dos melhores produtos de referência,

patenteados ou não, sabendo utilizar, com sabedoria e equilíbrio,

os mecanismos de equalização de interesses que a própria lei brasi-

leira de propriedade industrial dispõe.”

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c) PL 230/2003 do Deputado Dr. Pinotti (PMDB-SP)

Este projeto exclui dos direitos de patente todas as substâncias

farmacologicamente ativas e demais matérias primas componentes

de medicamentos fabricados pelos laboratórios estatais, destinados

à distribuição gratuita nos serviços do SUS. O projeto se encontra

atualmente estacionado na Comissão de Desenvolvimento Econô-

mico, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados, havendo

voto em separado pela sua rejeição. Cremos que será rejeitado, ten-

do em vista as suas flagrantes colisões com o TRIPs e pelo fato de

a Lei já possuir em seu texto mecanismos muito mais eficientes de

prevenir os abusos de preços, tais como o de licenciamento com-

pulsório por razão de práticas de abuso de poder econômico, entre

outros.

d) PL 6199/2005 do Deputado Nazareno Fonteles (PT-PI)

Este projeto, o mais recente questionamento a dispositivos de

nossa Lei de Patentes tem como autor o mesmo deputado que pro-

pugna pela “poupança fraterna”, um conceito de fundo exclusiva-

mente idealista, mas inviável economicamente.

O projeto em questão propõe a redução do prazo das paten-

tes para o máximo de 10 anos do depósito com um mínimo de 5

anos da concessão da patente. Além de inviabilizar o retorno dos

investimentos da grande maioria dos projetos de pesquisa (certa-

mente, todos os do setor farmacêutico) o nosso Deputado contesta

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um conceito unanimemente aceito, há muitos anos, por toda a co-

munidade internacional, inclusive a OMPI e a OMC, onde, desde

sempre, o prazo de uma patente é de 20 anos. Este princípio é parte

integrante do TRIPs e não seguí-lo seria, também, julgado como

gravíssima infração a um dos princípios basilares deste acordo, do

qual o Brasil é parte integrante e atuante.

Como está em fase inicial de tramitação há bastante tempo

para uma discussão racional sobre o seu conteúdo.

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