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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016
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CIDADANIA E COMUNICAÇÃO: A Interação entre representantes políticos e
cidadãos no Facebook 1
Carolina Zafino ISIDORO2
Resumo
O objetivo do artigo é discutir a interação entre cidadãos e agentes políticos durante o
exercício do mandato por meio das mídias digitais, sob a ótica da cidadania. Para isso foram
escolhidas as fanpages dos dois deputados federais mais votados no Estado de Goiás nas
eleições de 2014 e que usam o Facebook para informar e interagir com as pessoas. Partindo
de um estudo bibliográfico, a pesquisa busca entender até que ponto os representantes
públicos estabelecem uma relação comunicativa com outros atores, baseada na
racionalidade e no reconhecimento, estimulando a participação de todos no debate público.
Palavras-chave: mídias digitais; cidadania; comunicação, democracia; deputados
Introdução
As tecnologias da informação e da comunicação possibilitaram um caráter
horizontal da interação em rede, que alteraram completamente os modos de circulação do
poder. Hoje é muito difícil impedir a informação de alcançar os atores que se relacionam no
virtual. As mídias digitais permitiram ao indivíduo a possibilidade de representar-se e se
comunicar com outros atores. A própria estrutura em rede viabiliza espaços de interação
entre cidadãos.
Uma nova noção de cidadania vem sendo construída com o advento das novas
tecnologias da comunicação e da informação, no qual a comunicação se tornou não um
mero componente da democracia, mas “o seu próprio modo de ser” (SIGNATES, 2012). A
partir daí, os políticos acreditaram que conseguiriam manter um relacionamento mais fácil
com os cidadãos em espaços virtuais.
1 Trabalho apresentado no GP Comunicação para a Cidadania do XVI Encontro dos Grupos de Pesquisa em Comunicação,
evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
2 Carolina Zafino Isidoro é mestranda do PPGCOM/UFG, graduada em Comunicação Social – Jornalismo, pela
Universidade Federal de Goiás, e em Direito, pela Universidade Salgado de Oliveira. E-mail:
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As mídias sociais deram visibilidade a informações do âmbito particular e do âmbito
público. Sem as amarras dos grandes grupos de comunicação, hoje tudo é visível e
interativo, o que provoca um grande conflito de legitimidades como “um dos maiores
desafios culturais e políticos do futuro” (WOLTON, 2011, p.93).
As redes sociais, construídas nas plataformas de mídias digitais, são formadas por
pessoas, que habitam, normalmente, cidades e buscam a cidadania por meio do exercício de
seus direitos.
Na medida em que as redes se caracterizam pela existência de laços
firmados a partir de interesses comuns, é possível identificar todo tipo
de agrupamento [...], não apenas uma interação entre os participantes
[...] mas também o engajamento em questões políticas, sociais e
culturais. [...] Assim como o mundo real é levado para as redes
sociais digitais, as discussões online têm potencial de gerar atitudes e
ações no mundo físico. (MARTINO, 2014, p. 58).
Por meio dos espaços de interação das mídias digitais, verifica-se elementos que
caracterizam a Sociedade em Rede: participação, formação de identidade, colaboração e
oportunidade para as vozes minoritárias. No Brasil, apenas metade da população está
conectada à Internet, mas o acesso à rede possibilita o livre fluxo de informação, que passa
a ser compartilhada e reelaborada pelos internautas, produzindo novos sentidos. Por isso é
comum que questões públicas sejam encaminhadas para o meio virtual e vice-versa, em
uma integração com o mundo físico, contribuindo assim para o exercício dos direitos
políticos, da democracia e do debate público de assuntos de interesse coletivo.
Cidadania e Participação Política
A cidadania foi marcada por três séculos de conflitos para a conquista dos direitos
civis (século XVIII); dos direitos políticos (século XIX); e dos direitos sociais (século XX)
(MONDAINI, 2008, p. 116). Os direitos do cidadão surgem quando se compreende que a
diferenciação natural entre os homens não acarreta a existência da desigualdade entre eles.
Muitos anos se passaram até que a percepção da desigualdade, como um fato de origem
divina e imutável, fosse modificada.
As grandes revoluções - Revolução Francesa (1789), Revolução Americana (1776) e
a Revolução Industrial - produziram processos que modificaram o homem e o tiraram da
condição de súdito para torna-lo um cidadão com direitos e deveres determinados. Os ideais
da liberdade, da igualdade e da fraternidade motivaram o cidadão na luta contra a opressão.
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O ideal universal da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, elaborada
durante a Revolução Francesa, alça a lei acima dos direitos de cidadania. O documento
inspirou constituições e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada pelas
Nações Unidas.
Marshall (1967) conceitua a cidadania como um status conferido pelo Estado aos
membros integrais de uma comunidade, onde o cidadão pleno exerce a titularidade do
exercício dos direitos civis, políticos e sociais. O autor crê que alguns fatores determinam o
modo como os direitos são assegurados historicamente e associa o exercício dos direitos
pelo cidadão à classe social, à distribuição de renda, à educação, à ocupação laboral e às
experiências partilhadas da cultura. (MARSHALL, 1967, p. 62-76).
A desigualdade brasileira que possibilita a cidadania apenas a parte da sociedade
pode ser elucidada pela história do país. Carvalho (2002) acredita que vivemos uma
estadania, o que afeta a formação do cidadão, e, consequentemente, da democracia. O autor
explica as consequências desse cenário:
O Estado é sempre visto como todo-poderoso, na pior hipótese como
repressor e cobrador de impostos; na melhor, como um distribuidor
paternalista de empregos e favores. A ação política nessa visão é
sobretudo orientada para a negociação direta com o governo, sem
passar pela mediação da representação. Como vimos, até mesmo uma
parcela do movimento operário na Primeira República orientou-se
nessa direção; parcela ainda maior adaptou-se a ela na década de 30.
Essa cultura orientada mais para o Estado do que para a representação
é o que chamamos de "estadania", em contraste com a cidadania.
(CARVALHO, 2002, p.221)
A visão do Estado como um pai pelos brasileiros acaba os afastando do ideal da
cidadania e de ser um cidadão. O cidadão acaba estabelecendo com o Estado relações de
clientelismo e valorizando o Poder Executivo. Essa postura demonstra que o indivíduo
deixa de ser autor de sua própria história ao abrir mão de uma participação efetiva na
construção da história de um país, como no passado. A participação política da população
brasileira foi irrelevante nos períodos imperial e republicano, o povo não participou dos
processos da independência e nem da proclamação da república.
A Constituição brasileira de 1824 regulamentou os direitos políticos, definindo que
podiam votar apenas os homens acima de 25 anos ou aqueles com renda mínima de 100
mil-réis. As mulheres e os escravos foram excluídos por não serem considerados cidadãos.
À época, a maior parte dos cidadãos não tinha vivenciado o exercício do voto durante a
Colônia e, provavelmente, não compreendia o que era um governo representativo. Apenas
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pequena parte da população urbana entendia um pouco sobre a natureza e o funcionamento
das novas instituições. Até mesmo o patriotismo tinha entendimento restrito, já que para
muitos, não ia além do ódio ao português. O sentimento de pertencer a uma pátria comum e
soberana ainda não estava presente (CARVALHO, 2002, p.28).
O poder político patrimonial, ainda hoje, segundo Meksenas (2002), produz a
cultura do privado que se apropria do público. As pessoas não compreendem as leis como
garantia de liberdade ou de acesso aos direitos de cidadania, mas como instrumentos de
controle do Estado ou de manipulação do Poder, frente ao qual se tornam submissas, como
se recebessem um favor. Assim, a sociabilidade não é marcada pela racionalidade do
contrato social, inserida na noção de direitos, mas pelas mediações, entre o sujeito e o
agente público, as quais implicam “a prestação de favores, o pagamento de recompensas ou
o uso da influência pessoal; que passa a tomar o lugar dos direitos” (MEKSENAS, 2002,
p.59-60).
As classes dominantes no Brasil empenham-se em descaracterizar as lutas dos
trabalhadores pela cidadania. As reivindicações pela garantia da participação política foram
negligenciadas na história oficial do país. Durante o regime militar no Brasil (1964-1985), o
Estado reprimiu a participação política e monopolizou a difusão das informações, cenário
que só passou a ser mudado com as Diretas Já e a promulgação da Constituição de 88.
Mesmo com as lutas populares, a maioria enxerga os direitos no Brasil como mera retórica
a favor dos que detêm o poder. (MEKSENAS, 2002, P.62-68).
José Murilo de Carvalho (1998) explica que o clientelismo se trata de um tipo de
relação que envolve concessão de benefícios públicos entre atores políticos na forma de
empregos, benefícios fiscais ou isenções em troca de apoio político, sobretudo na forma de
voto. Nessa relação do clientelismo político sempre há troca entre atores de poder desigual,
ou seja, o Estado efetiva seu poder ao distribuir benefícios públicos em troca de votos ou
outro tipo de apoio (CARVALHO, 1998, p.229-240).
O brasileiro não tem o hábito de participar dos assuntos públicos, afinal foram
acostumados a receber as coisas dos outros, comportamento decorrente de vivermos em
uma sociedade autoritária. Para os detentores do poder, sempre foi mais fácil conduzir “uma
sociedade com predominância de analfabetos, de trabalhadores semi ou desqualificados”
(DEMO, 2009, p.25), tendo como seus representantes populistas, corruptos, demagogos e
contraventores. Demo (2009) corrobora para o entendimento da cidadania:
Cidadania não significa necessariamente visão funcionalista da
sociedade, como se fosse possível inaugurar o consenso definitivo.
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Ao contrário, na unidade de contrários, o cidadão consciente sabe que
vive dentro do conflito de interesses, marcados pela provisoriedade
do devir. Do lado dominante, investe-se tudo na inculcação da ideia
de que a ordem vigente é legítima e não deveria ser tocada, até
porque os mandantes o são por “mérito”, “superioridade”,
“consagração divina”, etc. É da lógica do poder conservar-se. Do lado
dos desiguais, a paisagem é outra. Cidadania fundamental viceja
neste lado, aquela que sabe tomar consciência das injustiças, descobre
os direitos, vislumbra estratégias de reação e tenta mudar o rumo da
história. (DEMO, 2009, p.71)
As conquistas políticas dos homens são alcançadas em meio a conflitos e lutas,
tendo como resultado direitos que vão sendo regulamentados em textos constitucionais ao
longo da história. A evolução dos direitos fundamentais está organizada nos ensinamentos
de Nathália Masson (2015, p. 191-192), orientada pelos estudos de Paulo Bonavides:
1. Primeira geração: Estão baseados na consagração dos direitos civis e políticos
clássicos, como o direito à vida, à liberdade religiosa e de crença, de ir e vir, de
reunião, de associação, de expressão, à propriedade, à participação política.
2. Segunda Geração: Estão vinculados aos direitos econômicos, sociais e culturais,
associados ao princípio da igualdade entre os homens, caracterizados como
“direitos de bem-estar”, para garantir a efetivação dos direitos individuais.
3. Terceira geração: São direitos coletivos, que agregam os direitos ao
desenvolvimento, ao progresso, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à
autodeterminação dos povos, à propriedade sobre o patrimônio comum da
humanidade, à qualidade de vida, os direitos da infância e juventude, os direitos
do consumidor.
4. Quarta geração: Surgem com a modernidade globalizada, mas ainda em situação
de expectativa para a consagração dos direitos à democracia, à informação e ao
pluralismo. Dependerá da materialização da sociedade aberta do futuro,
universal e inclinada à convivência.
5. Quinta geração: Alguns autores defendem o direito à paz.
A democracia deve ser compreendida pelo viés da proteção de direitos
fundamentais, inclusive das minorias. Os direitos são estabelecidos por leis elaboradas e
aprovadas por parlamentares nas casas legislativas; ao executivo cabe o desafio de gerir
cidades, estados e a nação com o objetivo de garantir a realização desses direitos.
Periodicamente, por meio do voto, os brasileiros escolhem seus representantes nos poderes
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legislativo e executivo. Ainda que eleitos por uma maioria, os agentes políticos são eleitos
por maiorias, mas também devem representar as minorias, garantindo o mínimo para o
exercício da democracia.
A cidadania vai muito além do exercício de direitos políticos, é o direito do nacional
a ter direitos e a exercê-los. Porém, a participação do cidadão revela o nível democrático do
Estado-nação. Ainda que o Brasil possua uma ampla legislação, a garantia do exercício
desses direitos exige a participação efetiva dos brasileiros, numa ação consciente, como
garantia de usar o poder para toda a coletividade.
A atuação dos meios de comunicação ao longo da história e dos internautas desde o
ano de 2013, com as manifestações populares no Brasil, mobilizadas pela internet, marcam
uma mudança no comportamento do eleitor/cidadão. Há um desejo no brasileiro de obter
informações, discuti-las, ampliar a participação democrática, ser melhor representado pelos
eleitos e participar mais da construção do seu país, do seu estado e de sua cidade.
Guareschi (2003) desenvolve um conceito de cidadania que atende ao exercício
buscado pelas pessoas hoje:
[...] participar ativamente na construção não apenas de
espaços políticos e burocráticos e também na necessidade de
criação de espaços que vêm responder a necessidade mais
profunda de liberdade e autonomia. Poder-se-ia dizer que eles
se materializam no desejo e necessidade das pessoas de
dizerem sua palavra, expressarem sua opinião, manifestarem
livremente seu pensamento. É o autêntico exercício da
cidadania. (GUARESCHI, 2003, p. 23).
Para esclarecer esse cenário, Cortina (2005) explica que o poder político já não se
legitima pelo contrato social, mas sim pela legitimação popular do representante ao exercer
sua soberania pela comunicação (CORTINA, 2005, p.134). Ao que parece, o exercício do
voto e o acesso às informações pelos veículos da grande mídia já não são suficientes para o
brasileiro se sentir parte do Estado-Nação e representado por políticos eleitos. Com o
advento da Internet e a popularização das tecnologias da comunicação e informação, passou
a existir para as pessoas a possibilidade de estar conectadas aos representantes eleitos e
verificando suas atuações em prol do interesse público.
Comunicação e Mídias Digitais
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A comunicação tem nas mídias digitais sua interface mais popular, já que
possibilitam interação a qualquer tempo e lugar. A partir dessa possibilidade de interação
nas redes, muitas pessoas usam as mídias digitais para defender posicionamentos e expor
suas opiniões, sobretudo, as de cunho político. Essas plataformas sustentam redes sociais
que estabelecem trocas de informações e promovem interação entre seus membros, que são
ao mesmo tempo emissores e receptores. As plataformas mais utilizadas são blogs,
microblogs, sites de relacionamento, compartilhamento de fotos e vídeos.
A comunicação digital pode ajudar no aprendizado político dos brasileiros ao dar
acesso a informações variadas da temática, originadas dos meios de comunicação
tradicionais e dos próprios internautas e o acesso ao debate nas plataformas digitais dos
agentes políticos nos espaços de interação de suas mídias sociais. O exercício dos direitos
políticos pode ser praticado com a incorporação da comunicação como momento da sua
realização.
As mídias digitais interativas são importantes para a consolidação do processo
democrático brasileiro ao reunir representantes e representados, como ensina Gomes: (a)
qualquer sujeito pode tornar-se emissor, (b) qualquer emissor pode tornar-se um receptor e
vice-versa, (c) qualquer receptor possa transformar-se em provedor de informação,
produzindo informação e distribuindo-a pela rede, ou simplesmente repassando as
informações produzidas por outros (GOMES, 2001, p.25).
Surge no espaço virtual uma nova esfera pública, caracterizada por Habermas como
um espaço da discussão, associado ao mundo físico e às interações que acontecem nas
mídias sociais: “constitui-se principalmente do agir orientado pelo entendimento, a qual tem
a ver com o espaço social gerado no agir comunicativo, não com as funções, nem com os
conteúdos da comunicação cotidiana” (HABERMAS, 1997, p.92).
Ao analisar o pensamento habermasiano, Martino (2015) reforça que os temas da
esfera pública “se caracterizam pelo engajamento que provocam, ou deveriam provocar nas
pessoas” e a relevância que assumem dentro da democracia (MARTINO, 2015, p.92-95).
Para o autor, a política nas mídias digitais está relacionada com muitas manifestações e
afirmações de identidade, na busca pela oportunidade de sensibilizar outras pessoas para
problemas e demandas sociais.
A esfera pública é, portanto, um ambiente promissor para uma ação social baseada
na intenção comunicativa. Porém, para a comunicação na esfera pública ser válida é
necessária a consideração de certos requisitos. Para garantir a racionalidade da discussão,
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Martino (2015) elenca três critérios: a) reconhecimento do interlocutor: os participantes
devem reconhecer o direito de todos de participar e emitir sua opinião; b) igualdade de
condições de participação: não pode haver hierarquia entre os participantes; c) respeito às
regras: as discussões devem ter regras claras e obedecidas por todos.
O exercício da comunicação nas mídias digitais é compreendido como um modo de
participar politicamente da sociedade. Ocupar espaços de comunicação é determinante para
a participação, para que mais e mais brasileiros possam a ter vez e voz.
Páginas de deputados federais no Facebook
Neste artigo, serão estudadas as páginas de dois deputados federais de Goiás no
Facebook, sendo este o site de relacionamento mais popular, seja por sua gratuidade,
interface amigável, ou ferramentas - mural, feed de notícias, messenger, fanpages – e
possibilidade de interação com pessoas de todo o mundo, arquivamento de fotos, vídeos e
demais dados.
As páginas ou fanpages se parecem com os perfis pessoais (pessoas físicas), mas
fornecem ferramentas exclusivas para empresas, marcas, organizações ou pessoas públicas.
As páginas possibilitam a comunicação entre organizações, empresas, celebridades e
marcas com seus consumidores, o qual neste estudo chamaremos de cidadãos. Essas as
páginas ainda possuem os seguintes critérios:
Privacidade: as informações e publicações da página são públicas e
geralmente disponíveis para qualquer pessoa do Facebook.
Público: qualquer pessoa pode curtir uma Página para se conectar a
ela e receber atualizações do Feed de Notícias. Não há limite de
pessoas para curtir uma página.
Comunicação: pessoas que ajudam a gerenciar uma Página podem
publicar nessa Página. As publicações da Página podem aparecer no
Feed de Notícias de quem curte a Página. Os proprietários da Página
também podem criar aplicativos personalizados para ela e verificar as
Informações da Página para acompanhar sua evolução e atividade.
(FACEBOOK, Central de Ajuda)
O objeto deste estudo é formado por duas páginas, verificadas no mês de maio de
2016, dos seguintes deputados: a) Delegado Waldir, do PR-GO, com 641.434 curtidas na
página https://www.facebook.com/delegado.waldir; b) Daniel Vilela, do PMDB-GO, com
33.096 curtidas na página https://www.facebook.com/danielvilelaoficial.
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a) Delegado Waldir:
Figura 1. Página no Facebook do deputado federal Delegado Waldir
O deputado federal Waldir Soares de Oliveira - Delegado Waldir - (PR-GO), 53
anos, foi eleito com 274.625 votos, pelo PSDB, nas eleições de 2014. É paranaense,
graduado em Direito, e se mudou para Goiás quando foi aprovado em concurso público
para delegado no Estado. O delegado concorreu nas eleições de 2010 e obteve pouco mais
de 40 mil votos para deputado federal. Foi eleito eleito suplente, e chegou a assumir vaga
na Câmara Federal por quatro meses. O parlamentar defende a redução da maioridade
penal, o pagamento pelo preso dos seus custos na prisão, a construção de novos presídios e
escolas, a contratação laboral de menores de 14 anos, desde que continuem estudando; o
rigor nas leis de trânsito, a unificação das Polícias, a família tradicional, as creches noturnas
para mães que trabalham a noite; a vida (é contra o aborto) e o fim da fiança e outros
direitos dos presos.
Na Câmara dos Deputados, é membros das várias comissões, dentre elas a de
Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC), Comissão Especial destinada a
estudar e propor melhorias na sistemática de análise e avaliação das contas públicas e de
conferência das transferências constitucionais (CECONTAS), Comissão Especial destinada
a elaborar proposta de Lei Orgânica da Segurança Pública no Brasil (CESEGPUB),
Comissão Especial destinada a estudar e apresentar propostas de unificação das polícias
civis e militares (CEUNIFI),
b) Daniel Vilela
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Figura 2. Página no Facebook do deputado federal Daniel Vilela
O deputado Daniel Elias Carvalho Vilela – Daniel Vilela -, 32 anos, do PMDB, foi
eleito com 179.214 votos a deputado federal nas eleições de 2014. É natural do município
de Jataí (GO) e filho do ex-governador e ex-senador Maguito Vilela, atual prefeito do
município de Aparecida de Goiânia (GO). Foi atleta profissional de futebol, mas começou
cedo na política, acompanhando o pai. É graduado em Direito e já exerceu mandato de
vereador em Goiânia e deputado estadual em Goiás.
Na Câmara dos Deputados, Daniel Vilela é membro de várias comissões, dentre elas
Comissão de Trabalho, de Administração e de Serviço Público (CTASP), Comissão
Especial destinada a estudar e apresentar propostas de reformulação da Lei Pelé, do
Estatuto de Defesa do Torcedor e das demais legislações aplicadas ao futebol e demais
esportes (CEESPORT) e a Subcomissão Especial de Agroenergia (Subagroe).
O artigo não pretende esgotar o assunto ora estudado, e a análise será aplicada em
apenas uma publicação de cada deputado. Serão verificados os critérios elencados por
Martino (2015) para que seja garantida a racionalidade da discussão - a) reconhecimento do
interlocutor: os participantes devem reconhecer o direito de todos de participar e emitir sua
opinião; b) igualdade de condições de participação: não pode haver hierarquia entre os
participantes; c) respeito às regras: as discussões devem ter regras claras e obedecidas por
todos. A verificação desses critérios precisa ser feita a fim de garantir a comprovação de
uma comunicação racional. Será incluído no item reconhecimento do interlocutor também
se o deputado reconhece o interlocutor, seja respondendo sua publicação ou utilizando os
botões curtir e compartilhar.
Postagens e Comentários
Seguindo os três critérios explicados anteriormente, foi selecionada uma única
postagem de cada deputado federal, aleatoriamente, no dia 21 de junho de 2016, uma terça-
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feira, para que seja realizada a análise. A coleta foi realizada no dia 30 de junho, às 22h.
Assim, temos:
a) Delegado Waldir
Figura 3- Postagem do dia 21 de junho de 2016 na página do Delegado Waldir
No dia 21 de junho de 2016, o parlamentar Delegado Waldir fez uma publicação
sobre projeto de lei 4938/2016, de sua autoria, que dificulta a saída temporária do preso. O
texto explica como funciona hoje o benefício da saída temporária, com permissão de até
quatro vezes ao ano, e a mudança prevista pela proposta de lei, de apenas uma saída por
ano. A publicação conta com os seguintes registros: 2 mil curtidas, 279 compartilhamentos
e 103 comentários.
Ao analisarmos os comentários quanto ao reconhecimento, Waldir curtiu 74 (não foi
contado curtidas às réplicas e tréplicas de uma mesma postagem) e não curtiu 29; respondeu
a 2 comentários. Assim, houve o reconhecimento do interlocutor pelo deputado 74 vezes.
Quanto à igualdade de condições de participação, não é permitido ao internauta visualizar
se algum comentário foi apagado pelo deputado. Entretanto, quando o parlamentar comenta
o comentário do internauta, essa publicação se mantem acima das outras, independente do
horário de publicações, sendo mais facilmente visualizada pelas pessoas. O mesmo ocorre
quando um comentário é curtido pelo deputado, ainda que se tenha observado que quanto
mais tempo passa, menos atenção é dada pelo parlamentar aos comentários dessa
publicação, já que produziu novas postagens. O último critério é o respeito às regras, porém
a página do deputado não elabora qualquer tipo de regras as quais o internauta deve
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obedecer para que participe. Também não foi verificado ofensas entre o deputado e o
internauta ou entre internauta e internauta nesta publicação.
b) Daniel Vilela
No dia 21 de junho de 2016, o parlamentar Daniel Vilela fez uma única publicação
sobre um concurso de vídeos sobre mudanças climáticas, com link externo ao Facebook.
Obteve 33 curtidas, 2 compartilhamentos e 4 comentários. Destes, curtiu apenas um e não
comentou ou compartilhou nenhum. Assim, houve o reconhecimento do interlocutor pelo
deputado apenas uma vez. Quanto à igualdade de condições de participação, não é
permitido ao internauta visualizar se algum comentário foi apagado pelo deputado. Quanto
ao respeito às regras, a página do deputado não elabora qualquer tipo de regras as quais o
internauta deve obedecer para participar. Também não foi verificada ofensa entre o
deputado e o internauta ou entre internauta e internauta nesta publicação.
Considerações Finais
Após observar a visão de alguns autores sobre o assunto e realizar uma pesquisa
inicial no contexto virtual das páginas dos deputados federais Delegado Waldir e Daniel
Vilela, verifica-se que as mídias digitais são fonte de informação para que as pessoas
conheçam melhor seus representantes no Legislativo. Assim, os indivíduos podem buscar
mais interação com o político e, talvez, vir a exercitar seus direitos políticos de forma mais
consciente.
O estudo realizado confirma que o meio virtual das mídias digitais é propício para o
debate das questões públicas junto aos cidadãos e aos seus representantes no poder
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legislativo. A interação estimula o desenvolvimento de uma cidadania, por meio das novas
tecnologias da comunicação e da informação e do exercício da comunicação, que é o
próprio modo de ser da democracia. Apenas votar já não é mais o suficiente, o cidadão quer
também ter acesso ao ser representante sem burocracias, num espaço onde possa questionar,
fiscalizar ou apoiar o agente público.
Foi verificado que ambos os deputados não respondem a todas as mensagens e,
consequentemente, não reconhece a todos, mas não foi realizado estudo para compreender
os motivos deste fato. Entretanto, nas postagens observadas, as manifestações de
concordância com o Delegado Waldir ocorreram em sua totalidade, não sendo encontrados
questionamentos ou oposições dos internautas. Porém, o internauta Lima Junior diz “Até
que enfim vejo algo efetivo deputado...” e Waldir responde: “Tem muito mais amigo. Basta
acessar esse link: http://www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_lista.asp...”. O link
direciona o cidadão para a página do deputado, no site da Câmara dos Deputados, onde
estão todas as proposições do parlamentar na Casa.
O mesmo ocorreu com Daniel Vilela, porém com números de interação bem
menores, nas quais apenas curtiu um comentário.
Ao que parece, o relacionamento entre deputados e cidadãos não se tornou mais
fácil nos espaços virtuais. Ao contrário, o virtual possibilitou o acesso direto ao político,
que passa a ter que se comunicar diretamente com as pessoas ao longo de seus mandatos.
As mídias digitais são também lugares da cidadania ao dar vez e voz aos cidadãos e
promover uma relação sem hierarquias com membros do poder público. Cabe agora a esses
atores os passos a serem dados nessa relação para que todos possam alcançar seus objetivos,
seja a identificação do perfil político que atenda aos interesses do cidadão, seja a influência
das visões do cidadão na direção a ser tomada pelo político no exercício do mandato.
A integração da experiência do mundo físico com o virtual, contribui para o
exercício dos direitos políticos, que tem o cidadão como titular de seu exercício, tendo no
ato de votar sua expressão mais popular. A outra face da moeda é o debate público de
assuntos de interesse coletivo com o agente político eleito pelos cidadãos. A internet tem
sido de grande utilidade para ampliar as vozes que antes eram silenciadas e reforçar a
prática da comunicação, voltada para a cidadania, no âmbito da democracia representativa.
Referências Bibliográficas
Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016
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CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. São Paulo: Civilização Brasileira,
2002.
CORTINA, Adela. Cidadãos do mundo: uma teoria da cidadania. São Paulo: Edições
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https://www.facebook.com/delegado.waldir. Acesso em 30 de junho de 2016.
VILELA, Daniel Elias Carvalho. Facebook. Disponível em:
https://www.facebook.com/danielvilelaoficial. Acesso em 30 de junho de 2016.
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