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::r ~ t-~ { ~ {~ S\., ~ rn ...•.•.. Coleç,ão LITERATURA E TEORIA LITERÁRIA VaI. 7 Direção de: Antonio CaUado Antonio Candid'o FICHA CATALOGRAFICA (Preparada pelo Centro de Catalogação-na-/onte do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ) Goldmann, Lucien. G572s Sociologia do romance; tradução de Alvaro Ca· bra!. Rio de Janeiro, paz e Terra, 1976. 223p. 21cm. (Literatura e Teoria Literária, V. 7). Do original em francês: Pour une sociologie du romano 1. Malraux. André, 1901- • 1. CrItica e inter- pretação. 2. Romance - Aspectos sociais. 3. Ro· mance - Filosofia. I. Titulo. 11. Série. CDD - 809.3 CDU - 82·31.09 82·31:301 82Malraux.06 76·0171 LUCIEN GOLDMANN SOCIOLOGIA DO ItOMANCE Tradução de Alvaro Cabral 2~ edição ElJ Paz e Terra

Introducao Aos Problemas de Uma Sociologia Do Romance

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GOLDMANN Lucien

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    Cole,oLITERATURA E TEORIA LITERRIA

    VaI. 7Direode:Antonio CaUadoAntonio Candid'o

    FICHA CATALOGRAFICA

    (Preparada pelo Centro de Catalogao-na-/onte doSindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ)

    Goldmann, Lucien.G572s Sociologia do romance; traduo de Alvaro Ca

    bra!. Rio de Janeiro, paz e Terra, 1976.223p. 21cm. (Literatura e Teoria Literria,

    V. 7).

    Do original em francs: Pour une sociologiedu romano

    1. Malraux. Andr, 1901- 1. CrItica e inter-pretao. 2. Romance - Aspectos sociais. 3. Romance - Filosofia. I. Titulo. 11. Srie.

    CDD - 809.3CDU - 8231.09

    8231:30182Malraux.06

    760171

    LUCIEN GOLDMANN

    SOCIOLOGIA DO ItOMANCE

    TraduodeAlvaro Cabral

    2~edio

    ElJPaz e Terra

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    Introduoaos Problemasde uma

    Sociologiado Romance

    QUANDO H 'doisanos,emjaneirode 1961,o Institutode Sociologiada UniversidadeLivre de Bruxelasnos propstomarmosa direodo grupode pesquisasde sociologiadaliteraturae consagrarmosos nossosprimeirostrabalhosa umestudodosromancesde Andr Malraux, aceitamosessaofer~ta commuitaapreenso.Os nossostrabalhossbrea socio~logia da filosofiae da literaturatrgicasno sculoXVII nonos deixavamprejulgar,de maneiraalguma,a possibilidadedeum estudosbreumaobraromanescae,aindamenos,umaobra romanescaescritaempocaquasecontempornea.Comefeito,duranteo primeiroano,empreendemossobretudoumapesquisapreliminarabrangendoos problemasdo romanceenquantogneroliterrio,pesquisapara a qual partimosdo

    '~ texto,hoje quaseclssico,- se bemqueaindapoucoconhe~

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  • cido na Frana __ de Georg Lukcs.La Thoriedu Romam1e do livro queacabarade ser publicado.da autoriade RenGirard. Mensonge Romantiqueet Verit Romanesque,2noqual o autor reencontrava.semas mencionar(e. comonosdiria depois.semas conhecer)I as anliseslukcsianas.mo-dificando-asem vrios e determinadospontos.

    O estudode La Thoriedu Romane do livro de Girardlevaram-nosa formularalgumashiptesessociolgicasquenosparecemparticularmenteinteressantese a partir dasquaisse desenvolveramas nossaspesquisasulterioressbreos ro-mancesde Malraux.

    Essas hiptesesdizemrespeito.por umaparte. homo-logia entre a estruturaromanescaclssicae a estruturadatrocana economialiberal;e, por outraparte. existnciadecertosparalelismosentresuasrespectivasevoluesulteriores.

    Comecemospor traar as grandeslinhas da estruturadescritapor Lukcs e quecaracteriza,se no a formaroma-nescaem geral,comole pensa,pelo menosum de seUSas-pectosde maior importncia(e que.provvelmente,do pon-to de vista gentico, o seu aspectoprimordial). A_fs>rmade rom_anc':...~e:._~~~~~,~,st~c!~__~.l..quecaracterizaa.exist~E-SL...".~,J1J!!h~r.iromanes

  • paraa epopia.Quantoaosoutrostrstiposconstitutivosdoromance,sbreos quaissua anliseindde, so os seguintes:

    a)'O romancedo "idealismo abstrato": caracterizadopel.'atividadedo heri e por sua conscinciademasiadoes-treitaemrelao complexidadedo mundo. (Dom Quixote,O Vermelhoe o Negro.)

    b) O romancepsicolgico,orientadopara a anlisedavida interior, caracterizadopela passividadedo heri e suaconscinciademasiadovastapara contentar~secom o queomundoda convenolhe podepropiciar (a stetipo perten-cemOblomove EducaoSentimental).Finalmente,

    c) O romanceeducativo,optandopor uma autolimita-o que, emboraconstituauma renncia pesquisaproble-mtica,no , entretanto,uma aceitaodo mundoconven~cional,nem um abandonoda escalaimplcitade valres,-autolimitaoessa que deve caracterizar~sepela expresso"maturidadeviril" (Exemplos: Wilhelm Meiste.r,de Goethe,e Heinrich, o Nooato, de Gottfried Keller).

    As anlisesde Rent.GJt3:E2.t.h quarentaanosde distn~da, coincidemfreqentementecom as de Lukcs. Tambm

    para le .2....!Q!!l_~S~__~.

  • Na obra de Girard abundamos exemplosde mediao.os romancesde cavalariaquese interpementreo Dom Ql1i~xote e a buscados valrescavalheirescos,o amanteque seinterpeentre o marido e o seu desejoda mulher, em OEternoMarido, de Dostoievski.Os seusexemplos,alis,nemsemprenosparecemescolhidoscoma mesmafelicidade.Tam~bm no estamosmuito certosde que a mediatizaosejaumacategoriato universaldo mundoromanescoquantoGi~rlrda julga. O trmodegradaoparece~nosmaisamploemaisapropriado,desdeque,bementendido,se precisea na~tu,rezadessadegradaoquandose procedea cada anliseparticular.

    Por outraparte,ao estabelecera categoriade mediao,elucidando~ae exagerandomesmoa sua importncia.Girarddotoua anlisede umaestruturaquecomportano s a for~ma de.degradaomaisimportanteentreas quecaracterizamo mundoromanesco,mas, muito provvelmente.tambmaformaque geneticamenteprimordial,aquelaque fz nascero gneroliterrio do romance,ao ter sido steengendradoemconseqnciade outrasformasderivadasde degradao.

    A 'partir da, a tipologiade Girard baseia~se,em pri~meirolugar. na existnciade duas formasde mediao,in~ternae externa,a primeiracaracterizadapelofatodeo agentemediadorserexteriorao mundoemquese desenrolaa buscado heri (por exemplo,os romancesde cavalaria.no DomQuixote), a segundapelo fato de o agentemediadorfazerpartedssemundo (o amanteem O Eterno Maddo).

    'Girard coloca nessesdois grandesgrupos qualitativa~mentediferentesa idia de um progressoda degradao.oqual se manifestapela proximidadecrescenteentreo perso~nagemromanescoe o agentemediador,e a distanciaocres~centeentressepersonageme a transcendnciavertical.

    Tentemosagora esclarecerum ponto essencialem queLukcs e Girard estoem desacrdofundamental.Histriadetlmapesquisadegradadadevalresautnticosemummun~do inautntico,o romance, necessriamente.biografiae cr~nica social.ao mesmotempo;fato sobremodoimportante,asituaodo escritorem relaoao universoque le criou ,no romance,difer'rnteda suasituaoemrelaoao universode tdasas outras formasliterrias. A essasituaoparti~cular chamaGirard humor;Luckcs,ironia. Ambosestode

    12,0

    !

    acrdoemqueo romancistadeveultrapassara conscinciadeseusherise que essasuperao(humorou ironia) este~ticamenteconstitutivada criaoromanesca.Mas os doisdivergemsbrea naturezadessasuperaoe. nesseponto.a posiode:Lukcs que nos pareceaceitvel,e no a deGirard.

    Para GJrard. o romancista.no momentoemque.escreveua sua obra, abandonouo mundoda degradaopara reen~contraI'a autenticidade,a transcendnciavertical. E por issoquelepensaquea maioriadosgrandesromancesconcluiporumaconversodo heria essatranscendnciavertical,e queo carterabstratode certosfins (Dom Quixote,O Vermelhoe o Negro, poderamoscitar tambmA Princesade Clev'es) uma iluso do leitor, ou o resultadoda sobrevivnciadopassadona conscinciado escritor.

    Semelhanteafirmao rigorosamentecontrria est~tica de Lukcs.para quemtda a forma literria (e tda agrande forma artstica,em geral) nasceda necessidadedeexprimirum contedoessencial.Se a degradaoromanescafsse verdadeiramenteultrapassadapelo escritor.e mesmopela conversofinal de certo nmerode heris.a histriadessadegradaono seriamaisquea de um incidentefor~tuito, e sua expressoteria, no mximo,o carterde umanarrativaou relatomaisou menosdivertido.

    Contudo,a ironia do escritor,suaautonomiaemrelaoaos seuspersonagens,a conversofinal dos herisromanes~cos, so realidadesincontestveis.

    Lukcs pensa,todavia,nue precisamentena medidaem.-._.--_ -- - '..- __._. __ __ . :;1 .-~.~---",.".,.----".,-----., h,h -' '''-, a- ..".QJlL_rmn~.a..crIa()i1!lagillrilcleUl11!:1niyersoregi .0

    ~l_~_~gE_ci.ot}nilJ~~~?.?,,~ssasuperaonopoderiadei)(

  • cendnciavertical,mas,simplesmente,a tomadade conscin~cia da vaidade,do carterdegradado,no s da buscaante~rior, mas tambmde tda a esperana,de tda a buscaperdida. .

    Por isso a converso um fim, e no um como.E a existnciadessaironia (a qual sempre,tambm,umaauto~ironia) que permitea Lukcs duas definiesafins, quenosparecemparticularmentefelizes,dessaforma romanesca:Ocaminhocomeou,a viagemterminou,e O romance a formada maturidadeviril, estaltima frmuladefinindomaispre~cisamente,como j vimos, o romanceeducativo,do tipoWilhelm Melster, queconcluipor umaautolimitao(renn~da buscaproblemtica.semquepor issosejaaceitoo mun~do da conveno,nem abandonadaa escala implcita devalres).

    A.~J.!!1L1:'011lance,no s~:t:ltidoquelhe emprestamLukcs,e Girard...~~rj.~tl11l.g~~~!:QJ!le..r_~Ei().J1Q!1a.1Q$valresautn~.tJC:::$,t~11l.per:11lanente.de discusso.nosei1presenta11lnaQbga...sob....a.Jr:m.--~..pgrsOnagenscOllscientes..ou.de realida~g~$()!1l:et.s~_:t;:SSesvalresexistemapenasenl f().t'11li1alstra~ta...\?;. conceptualnaconscinciado romancista,onde.sereves:,i:~tnde.tl.11lc:::art~~tico.Ora. as idias abstratasno tm

    Jygar numa obr~ literria. onde constituiriamum elementoheterogneo.

    Port~nt"",,Q3J1:'gl:>le11lc:L

  • parecesse,durantesculos,nos escritoresmaisdiferentes,nospasesmaisdiversos,tornando~sea formapor excelnciaemque se exprime,no plano literrio,o contedode tda umapoca,semquese verificasseumahomologia,ou umarelaosignificativaentreessaformae os aspectosmaisimportantesda vida social.

    A hiptesequeapresentamos,a tal propsito,parece~nosmuitosimplese, sobretudo,sugestivae verossmil,sebemquetenhamsido necessriosalgunsanos para a encontrar.

    Com efeito,.,i;lformaromanescaparece~nossera transp()~sioparaq plfino literrioda vida cotidianana sociedadein~dividualistanfiscidada produopara o mercado.Existeumahomologiarigorosaentre a forma literria,,-d_Q.rmn_ance,tafcomoacabamosdedefinir,naspegadasdeLukcse deGirard,e relaocotidianados homenscom os bens em geral; e,por extenso,doshomenscomos outroshomens,numasocie~dade..pr.odutora._parao..m.ercad.o.

    A relaonatural,s,dos homense dosbens, comefei~to, aquelaem que a produo conscientementeregidapeloconsumofuturo,pelas qualidadesconcretasdos objetos,porseu valorde uso.

    Ora, o quecaracterizaa produoparao mercado, pelocontrrio,a eliminaodessarelaoda conscinciados ho~mens,a sua reduoao implcito,graas mediaoda novarealidadeeconmicacriada por essa forma de produo:ol/a191' de troca.

    Nas outras formasde:sociedade,quandoum homemti~nha necessidadede vesturioou de casa,devia le prpriofabric~losou encomend~losa umindividuo capazde pro~duzi~lose quedeviaou podia forneceressascoisas,queremvirtudede certasregrastradicionais,querpor razesde auto~ridade,de amizade,'etc.,queraindaemcontrapaxtidade cer~tas prestaesde servios.5

    5 Na medida em que a troca se mantiver espordica,porque envolveapenasos excedentes,ou reveste-sedo carter de uma troca de valresde uso que Os indivduos ou grupos no saberiamproduzir numa eco-nomia essencialmentenatural, a estruturamental da mediaono apa-rece, ou mantm-seem plano secundrio.A transformaofundamentalno desenvolvimentoda coisifcaoresulta do adventoda produoparao mercado.

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    f

    ~

    Atualmente.para obtervesturioou casa, precisoen~contraro dinheironecessrio suaaquisio.O produtorderoupasou de casas indiferenteao valor de uso dos objetosqueproduz. A seusolhos,taisobjetosnopassamdeummalnecessrioparaobtera nicacoisaquelhe interessa,um va~lor de trocasuficientepara assegurara rentabilidadede suaemprsa.Na vida econmica,quecOllstitllLprte}l,lisiD1~portanteda vida socialmoderna,tdaa rel?p?),ltgl1tiacoIDo aspectoqualitativo

  • 11',I'1

    1

    I ,

    II

    todosos dias,umavez que soobrigadosa procurartdaa,qualidade,todoo valor de uso,de ummododegradado,pelamediaoda quantidade,do valor de troca,e isso numaso~ciedadeondetodo o esfropara se orientardiretamentenesentidodo valor de uso no teria outro resultadosenoen-gendrar indivduostambmdegradados,mas de um mododiferente----o do indivduoproblemtico.

    Assim,as duasestruturas,a deumimportantegneroro~manescoe a da troca,mostramserrigorosamentehomlogas,a umpontotal quepoderamosfalar de umas estruturaquese manifestariaem dois planosdiferentes.Alm disso,comoveremosmais adiante,a evoluoda forma romanescaquecorrespondeao mundoda coisificaos poderiaser compre..endidana medidaemqueestivesserelacionadacomumahis~tria homlogadas estruturasda ltima.

    Contudo,antesdetecermosalgunscomentriossooreessahomologiadas duas'evolues, precisoexaminaro proble-ma particularmenteimportante,parao socilogo,do processograasao quala formaliterriapdenascerda realidadeeco~nmica,e dasmodificaesqueo estudodsseprocessoobri~ga a introduzir na representaotradicionaldo condiciona-mentosociolgicoda criaoliterria.

    Um primeirofato surpreendente;o esquematradicio~nal da sociologialiterria,marxistaou.no, inaplicvelnocasoda homologiaestruturalqueacabamosde mencionar....A.maioLP-lJ'te_..-.$.__ORJ.as.ge.s.o!ologiaJitgr.ria'..estl.bd.ece,...Q.~.efEtO.J1!:J:1fl..reJa.oentr.easobr.l.slitertil.s.maisjmpor.tant~~eaconsdrzda.coletivade.tale tal gruposocialondeaqu!l;~.1l1scerl!:J:1.Neste.ponto,apQsioIlJ,l.xxistl.Jr:a,dicionl.lno

  • rio indispensvelpara realizar, seja a homologia,seja umarelaointeligvele significativaentreos diferentesaspectosda existnciasocial.

    O romanceanalisadopor Lukcse Girard j noparecesera transposioimaginriadasestruturasconscentesde"_t~l1

  • a) O nascimentono pensamentodos membrosda socie-dade burguesa, a partir do comportamento econmico e daexistncia do valor de troca, da categoriada mediaocomoforma fundamental e cada vez mais desenvolvida do pensar,com a tendncia implcita para substituir sse pensamentoporuma falsa conscinciatotal, na qual o valor mediador torna-sevalor absoluto, e o valor mediatizado desaparecercompleta~mente; ou, numa linguagem mais clara, com a tendnciaparapensar no acesso a todos os valres sob o ngulo da media~o, com o pendor para fazer do dinheiro e do prestgio socialvalres absolutos, e no simples mediaes que asseguremoacesso a outros valres de carter qualitativo.

    b) A subsistncia, nessa sociedade, de certo nmero deindivduos essencialmenteproblemticos,na medida em queo seu pensamentoe seu comportamentose conservam domi-nados pelos valres qualitativos, sem que os possam, entre-tanto, subtrair inteiramente existncia da mediao degra-dante, .cuja ao se faz sentir em todo o conjunto da estru~tura social.

    Entre ssesindivduos, situam~seem primeiro lugar todosos criadores, escritores, artistas, filsofos, telogos, homensde ao, etc., cujo pensamento e conduta so regidos, antesde tudo, pela qualidade de suas obras, sem que possam esca-par inteiramente ao do mercado e ao acolhimento da so-ciedade coisificada.

    c) No podendo obra nenhuma ser a expresso de umaexperincia puramente individual, provvel que o gneroromanesco s pudesse nascer e desenvolver-sena medida emque um descontentamentoafetivo no conceptualizado,umaaspirao afetiva visando diretamenteaos valres qualitativos,tenham-se gerado no conjunto da sociedade, ou apenas, tal-vez, entre as camadasmdias em cujo seio se recruta a maiorparte dos romancistas.7

    7 Nesteponto,surgeum problemade difcil soluo,por enquanto,equetalvezpossaserresolvidoumdiapormeiode pesquisastlociolgicasconcretas. o problemada "caixade ressonncia"coletiva,afetivaeno-conceptualizada,que permitiuo desenvolvimentoda formaroma-nesca.

    De incio,tnhamospensadoquea coisificao,dadaa suatendnciaparadissolvere integrarna sociedadeglobalos diferentesgrupospar-

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    d) Existia, enfim, nas sociedadesliberais produtoras parao mercado, um conjunto de valres que,semseremtransindi~viduais. revestiam-se,contudo, de um sentido universal e, noseio dessas sociedades, de uma validade geral. Eram os va-lres do individualismo liberal ligados prpria existncia domercado concorrente (liberdade, igualdade, propriedade, naFrana, Bildungsidealna Alemanha. com suas derivadas, to-lerncia, direitos do homem, desenvolvimentoda personalida..de. etc.). A partir dsses valres desenvolveu~sea categoriada biografia individual,que se tornou o elementoconstitutivodo romance no momento em que tomou, entrementes,a formado indivduo problemtico,isto com base em:

    1Q A experincia pessoal dos indivduos problemticosj mencionadosmais acima, na alnea b;

    2Q A contradio interna entre o individualismo comovalor universal gerado pela sociedade burguesa e as limita~es. importantes e penosas, que essa mesma sociedade im~punha, na realidade. s possibilidades de desenvolvimentodo indivduo.

    gste esquema hipottico parece-nos confirmado. entreoutras coisas, pelo fato de que. quando um dssesquatro ele-mentos, o individualismo. foi levado ao desaparecimentopelatransformaoda vida econmicae a substituioda economiade livre concorrncia por uma economia de cartis e de mo-noplios (transformao que comeaem finais do sculoXIX,

    ciaise, por issomesmo,a retirar-Ihesatcertopontosuascaractersti-casespecficas,possuaum carterde tal modocontrrio realidadetantobiolgicaquantopsicolgicado indivduohumano,que deveriagerarem todosos sreshumanos,numgraumaisou menosforte,rea-esdeoposio(ou,seelasedegradardemodoqualitativamentemaisavanado,reaesde evaso)quecriariam,assim,umaresistnciadi-fusa ao mundocoisificado,resistnciaessaque constituiriao fundoda criaoromanesca.

    Depois,pareceu-nos,entretanto,que existianessaconcepoumasuposioa priori nocontrolada:a da existnciadeumanaturezabio-lgicacujasmanifestaesexterioresno seriaminteiramentedesnatu-radaspelarealidadesocial.

    Ora, tambmpode acontecer,perfeitamente,que as resistncias,mesmoafetivas, coisificao,estejamcircunscritasa certascamadassociais, quedeverforosamentedelimitara pesquisapositiva.

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  • mascujo augequalitativoa maioriadoseconomistassituaen~tre 1900 e 1910), assistimosa uma transformaoparalelada forma romanescaque redundana dissoluoprogressivae no desaparecimentodo personagemindividual. do heri;transformaoquenos pareceucaracterizada,de maneiraex-tremamenteesquematizada,pela existnciade dois perodos:

    .a) O primeiro,transitrio,duranteo qual o desapareci-me1toda importnciado indivduoacarretaas tentativasdesubstituioda biografia comocontedoda obra romanescapelosvalresnascidosde ideologiasdiferentes.Pois se, nassociedadesocidentais,ssesvalresrevelaram-sedemasiadofrgeispara gerar formas literriasprprias,podiameven-tualmente,porm,servirdeaferidoresparaumaformaj exis-tente,queestavaprestesa perdero seuantigocontedo.Nesseplano se situam,emprimeirolugar,as idiasde comunidadee de realidadecoletiva(instituies,famlia,gruposocial,re-voluo,etc.) quea ideologiasocialistaintroduzirae desen-volverano pensamentoocidental.

    b) O segundoperodo,que comeapouco depoiscomKafka e prosseguiratao nvoromancecontemporneo,peloque um perodoainda no encerrado,caracteriza-sepeloabandonode tdae qualquertentativapara substituiro heriproblemticoe a biografia individualpor outra realidadeepelo esfropara escrevero romanceda ausnciade sujeito,da no-existnciade tda a buscaque progride,s

    evidenteque essatentativapara salvaguardara for-ma romanesca,dando-lheum -contedoaparentado,semd-vida, ao contedodo romancetradicional (stesemprefraa formaliterriada pesquisaproblemticae da ausnciadevalres positivos), mas, no entanto,essencialmentedistinto(trata-seagorade eliminardois elementosessenciaisdo con~

    8 Lukcs caracterizouo tempo do romancetradicional pela proposio:"O caminho comeou, a viagem terminou." Poder-se-ia caracterizaronvo romance pela supressoda primeira metade dsseenunciado.Oseutemposeriacaracterizadoquer pelo seguinteenunciado:"A aspiraoexiste,mas a viagemacabou" (Kafka, Nathalie Sarraute), quer simples-mentepela constataode que "a viagemj acabou,semque o caminhotivessejamais comeado" (os trs primeiros romances de RobbeGril-let).

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    I

    tedoespecficodo romance:a psicologiado heriproblem-tico e a histriade sua buscademonaca).teria de criar, aomesmotempo,orientaesparalelasno sentidode diferentesformasde expresso.Talvez haja a elementosparaumaso-ciologia do teatroda ausncia(Beckett,Ionesco,Adamov,durantecertoperodo) e tambmde determinadosaspectosda pintura no~figurativa,

    Men~ionemos,enfim, um ltimo problemaque poderiaedeveriadar lugara pesquisasulteriores.l!,}?Cl,-.!'Qp:1-:Qg13.ca

    ~[ori~tb~~Zim~~f~~~~e'\-ei~ti:da~I;~ro~f~d~~~c,bu~~i~eniUrsodeclese1.1.volvimento.ResIs'fncl'IridivIdaf~n_ ,._ ,'.--.., , ".,.................-. ..'... . ..., g..._, ..pdeapoiar~se,no seiode umgrupo,senoem.erocessosps-qUlcos'[itiTos"e"izo:o'-ncepttlzdos;"'preCIsamenfe-porquea~!.~~st~:n.~j~~'c()~s~Ie~.t.~iq~e.j)0-riam.~ter-elal?9~~J()~m~Jlt~E?~~.i1UpIicandop()~sibilidadede unIheri P?sitivo...(emprimeiro.lugar, a conscincia.oposici0llal.er()letrfa;.talcom,'~ra'esperadae previstapor Marx). no sedesenvolverams:ficielltementenas-s-ades~oclfenirs-.--"romanc'deh6iprobTemtfcodfirie-seassim,conididap:1ente opini()tradi-'a'1Eil; comquma forma literr;a.lig,a.da,~~~__Q4yi~,~his-tria e ao desenvolvimentoda burguesia,mas que no ae.:xpressoda conscinciareal ouJlossvel cl~~~l,~~(l_~~!'..--

    Mas pe-seo problemade saberse,paralelamentea essaformaliterria,no se desenvolveramoutrasformasquecor~responderiamaosvalresconscientese s aspiraesefetivasda burguesia;e, a sterespeito,permitimo-nosmencionar,attulo de sugestogeral e hipottica,a eventualidadede quea obradeBalzac,- dequeseriapreciso,partindodssepontode vista, analisara estrutura,- constituaa nicaexpressoliterriade envergadurado universoestruturado pelosval-res conscientesda burguesia:individualismo,sdede poder,dinheiro,erotismoquetriunfa dos antigosvalresfeudaisdoaltrusmo,caridadee amor.

    Sociologicamente,essa hiptese,se se revelasseexata,poderiaassociar-seao fato de quea obrade Balzacsitua-se,precisamente,numapocaemqueo individualismo,emsi a-histrico,struturavaa conscinciade umaburguesiaquees-tavaconstruindoumanovasociedadee seencontravano maiselevadoe maisintensonvel de sua real eficciahistrica.

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  • l._.:~.Subsidiriamente,conviriaindagartambmpor quemo~

    tivo, excetuandossecasonico,tal forma de literaturaro~manescas alcanouuma importnciasecundriana hist~ria da culturaocidental:por querazoa conscinciareal e asa.~pitaesda burgu~sil]arnaisconseg~ir~rncrlr::!loss~

  • Seja comofr, o esboextremamenteesquemticoqueacabamosde traar parece~nospoder fornecero quadrodeumestudosociolgicoda formaromanesca.Estudotantomaisimportantequanto,forade seuobjetoespecficp,poderiacons~tituir umacontribuioaprecivelpara o estudodas estrutu~ras psquicasde certosgrupossociaise, nomeadamente,dascamadasmdias.

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    Introduoa um Estudo Estruturaldos Romancesde Malraux

    PARA FIXAR oS limitesdo presentetrabalho,digamos,preliminarmente,quenopretende,emcasoalgum,serumes~tudo sociolgicoacabadodos escritosliterriosde Malraux.

    Semelhanteestudosuporia,comefeito,de umaparte.aelucidaode certonmerode estruturassignificativas,sus~cetveisde dar conta (pelomenosemgrandeparte) do con~tedoe do carterformalde seusescritos:e. de outraparte.a demonstraoseja da homologia,seja da possibilidadedeencontrarumarelaosignificativaentreas estruturasdsseuniversoliterrioe certonmerode outrasestruturassociais.econmicas,polticas,religiosas,etc.

    Ora. a nossainvestigaositua~seaindano primeiroes~tgio.o da anliseinterna.destinadaa delinearum primeiroesbode estruturassignificativasimanentesna obra,esboque ser muito provvelmentemodificadoe pormenorizado

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