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http://periodicoinvestigacaofilosofica.blogspot.com.br IF 1 Investigação Filosófica Revista de Filosofia ISSN: 2179-6742 Investigação Filosófica, caderno de resumos do I Encontro Investigação Filosófica (EIFIL) Rio de Janeiro, Agosto de 2015, 18 p.

Investigação Filosófica - PPGLM · Ciências Sociais. ... entende a imagem que dele traçou Platão em seus Diálogos. ... entendê-las de fato como tais se alimentarmos o preconceito

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Investigação Filosófica

Revista de Filosofia

ISSN: 2179-6742

Investigação Filosófica, caderno de resumos do I Encontro Investigação Filosófica

(EIFIL) Rio de Janeiro, Agosto de 2015, 18 p.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO LÓGICA E METAFÍSICA

Coordenador

Rodrigo Guerizoli

Vice-Coordenador

Carolina de Melo Bomfim Araújo

Revista desenvolvida em parceria com o Programa de Pós-Graduação Lógica e Metafísica (PPGLM)

da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

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INVESTIGAÇÃO FILOSÓFICA

http://periodicoinvestigacaofilosofica.blogspot.com.br/

[email protected]

Editores Responsáveis Rodrigo Reis Lastra Cid

Luiz Maurício Bentim da Rocha Menezes

Coordenadores Editoriais Luiz Helvécio Marques Segundo

Mayra Moreira da Costa

Pedro Vasconcelos Junqueira Gomlevsky

Conselho Editorial Danillo de Jesus Ferreira Leite

Guilherme da Costa Assunção Cecílio

Leandro Shigueo Araujo

Luis Fernando Munaretti da Rosa

Luiz Helvécio Marques Segundo

Luiz Maurício Bentim da Rocha Menezes

Mário Augusto Queiroz Carvalho

Mayra Moreira da Costa

Paula Akemy Araujo

Pedro Vasconcelos Junqueira Gomlevsky

Renata Ramos da Silva

Rodrigo Alexandre de Figueiredo

Rodrigo Reis Lastra Cid

Sagid Salles Ferreira

Tiago Luís Teixeira de Oliveira

Conselho Consultivo Alexandre Meyer Luz

Alexandre Noronha Machado

Carlos Eduardo Evangelisti Mauro

Desidério Orlando Figueiredo Murcho

Guido Imaguire

Mário Nogueira de Oliveira

Michel Ghins

Roberto Horácio de Sá Pereira

Rodrigo Guerizoli Teixeira

Rogério Passos Severo

Sérgio Ricardo Neves de Miranda

Ulysses Pinheiro

Equipe Técnica Logotipo: Thiago Reis

Revisor: Fábio Salgado de Carvalho

Tradutor: Giuliano Tadeu Nunes Pietoso

INVESTIGAÇÃO FILOSÓFICA

Caderno de Resumos do I Encontro Investigação Filosófica (EIFIL)

Volume 1, 2015, 18 p.

Publicação digital

ISSN: 2179-6742

1. Filosofia – Periódicos. 2. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Filosofia e

Ciências Sociais. Programa de Pós-Graduação Lógica e Metafísica. 3. Blog Investigação Filosófica.

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Sumário / Contents

Editorial................................................................................................................... 01

Resumos/Abstracts

Conferência de Abertura

A ontologia do poder em Platão e Aristóteles

Carolina Araújo............................................................................................................. 02

Mesa 1

Faca perfeita: aquela que não corta? – Platão e as propriedades de suas Ideias inteligíveis

André Luiz Braga da Silva.............................................................................................. 03

A deificação do homem: a leitura de Heráclito por Clemente de Alexandria

Fernando Rocha Sapaterro............................................................................................. 03

Sócrates, Erótico

Cesar de Alencar............................................................................................................. 04

A Política de Cléon no Livro IV de Tucídides: Peripécias da demagogia

Maria Elizabeth Bueno de Godoy................................................................................... 05

O Desafio do Filósofo na República de Platão

Luiz Maurício Bentim da Rocha Menezes...................................................................... 05

Mesa 2

Crença Verdadeira Justificada e Inferência Dedutiva

Bruno Rigonato Mundim................................................................................................. 06

O apelo ao axioma da escolha na definição de certas operações aritméticas

Guilherme T. M. Schettini............................................................................................... 06

Perceptron e sinédoque: a sociedade de controle em suas figuras e linguagem

Irlim Corrêa Lima Júnior............................................................................................... 07

Da Sociedade a Desigualdade: uma análise do homem em Rousseau

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Diogo Luiz Souza de Matos............................................................................................ 08

Mesa 3

Da conexão necessária à crença epistemológica: fundamentos da causalidade em David Hume

Cleber de Lira Farias..................................................................................................... 09

A estranheza do homem segundo Heidegger

Felipe Ramos Gall.......................................................................................................... 09

A imbricação entre obra de arte e verdade: leituras de Heidegger

Uriel Nascimento............................................................................................................ 10

Ética do Corpo e Sexualidade em Michel Henry

João Elton de Jesus......................................................................................................... 11

Mesa 4

Uma Anatomia do Ressentimento em Nietzsche

Andreia Cristini Marcos Overne..................................................................................... 12

As duas provas da existência de Deus nas Meditações Metafísicas de Descartes

Juliana Abuzaglo Elias Martins...................................................................................... 12

A concepção kantiana de juízos e a sua tábua dos juízos e das categorias

Pablo Barbosa Santana da Silva.................................................................................... 13

As mônadas de Gulliver

Raquel de Azevedo.......................................................................................................... 13

Mesa 5

Hierarquias, fatos e estados de coisas

Ana Clara Polakof.......................................................................................................... 15

Chateaubriand, estados de coisas e instanciação

Sérgio Schultz.................................................................................................................. 15

Reflexões sobre os estados de coisas sob uma perspectiva temporal

Ana Maria Corrêa Moreira da Silva.............................................................................. 16

Conferência de Encerrramento

Fazendo e Desfazendo Fazerores

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Guido Imaguire................................................................................................................ 18

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Investigação Editorial

Apresentamos nessa edição especial o Caderno de Resumos do I Encontro

Investigação Filosófica – EIFIL a ser realizado entre 21 e 25 de setembro de 2015.

Agradecemos a todos que contribuíram para a realização do encontro.

Rodrigo Cid

Luiz Maurício Menezes

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Conferência de Abertura (21/09/2015 – 9h)

A ONTOLOGIA DO PODER EM PLATÃO E ARISTÓTELES

Carolina Araújo (UFRJ)

RESUMO: Esta apresentação versará sobre algumas diretrizes preliminares de um trabalho em

construção que investiga as relações entre ser e poder na Filosofia Antiga, ou, mais especificamente, a

relação entre os cognatos dos verbos dunamai e eimi. Nesta ocasião pretendo abordar dois textos

fundamentais para o tratamento da questão: o Sofista de Platão e a Metafísica de Aristóteles.

Na primeira parte, tratarei de mostrar como, no Sofista, a hipótese da definição de ser como poder,

atribuída aos mobilistas, não é refutada, mas assimilada à teoria do ser como forma resultando em uma

teoria da afecção sem mobilidade. Na segunda parte, tratarei de mostrar como o final do livro H da

Metafísica articula a abordagem do poder como uma resposta a aporias platônicas e, em seguida,

procurarei argumentar por uma leitura dialética do livro Θ, na qual Aristóteles imputa aos platônicos o

conceito de poder segundo o movimento, para responder-lhes com a prioridade da atividade sobre o

poder e, em consequência, a defesa de um sentido não mobilista de potencialidade. Por fim, tentarei

indicar algumas incompatibilidades entre os modelos platônico e aristotélico.

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Mesa 1 (21/09/2015 – 13h30)

FACA PERFEITA: AQUELA QUE NÃO CORTA? – PLATÃO E AS

PROPRIEDADES DE SUAS IDEIAS INTELIGÍVEIS

André Luiz Braga da Silva (USP)

RESUMO: Em Tópicos 137b3-13, Aristóteles traça duas perspectivas diferentes segundo as quais é

possível dizer que uma Ideia (ou Forma) inteligível platônica possui uma determinada qualidade.

Segundo ele, a partir desses dois vieses, seria possível afirmar tanto que uma Ideia possui quanto que

não possui a mesma qualidade – dependendo da perspectiva que, em cada afirmativa, estivesse sendo

considerada.

Nos anos 60 e 70 do último século, estudiosos de “grosso calibre” como G. Vlastos (1965,

1969, 1970, 1971a e 1971b), G. E. Owen (1968) e D. Keyt (1969 e 1971) analisaram a fundo essa

distinção traçada pelo estagirita, chegando a importantes conclusões acerca da matéria. Nesse ínterim,

eles acabaram também por desenvolver aqueles que seriam os seus próprios e fundamentais conceitos

para análise da ontologia exposta pelo fundador da Academia: “atributos ideais”, “atributos próprios”,

“Distinção-P”, “Predicação Ordinária”, “Predicação Paulina” e “Autopredicação”.

No início dos anos 80, o especialista na República G. Santas (1999 (1983)) apropria-se desse

aparato conceitual e dessas análises para, brilhantemente, arguir pela defesa de uma singular e original

interpretação do papel e função da Ideia de Bem no pensamento de Platão. Santas faz uma análise da

famosa passagem do Sol (República VI 508b12-509c4), procurando demonstrar que certas afirmativas

ontologicamente problemáticas presentes no trecho corresponderiam ipsis litteris à posição do autor,

Platão, à época da composição desse diálogo – uma vez que tais afirmativas supostamente seriam

plenamente harmonizáveis com outras igualmente problemáticas do corpus platonicum, já

denunciadas pelos supra aludidos estudiosos.

Tendo isso em mente, os objetivos da presente comunicação são:

i) apresentar e explicar os referidos conceitos que aqueles estudiosos ofereceram, a partir de

Aristóteles, para compreensão da ontologia das Ideias platônicas;

ii) avaliar a compatibilidade de tais conceitos com a própria ontologia da qual eles pretendem

dar conta; e

avaliar a legitimidade do uso que Santas faz desses conceitos para fundamentar a sua interpretação da

Ideia de Bem.

A DEIFICAÇÃO DO HOMEM: A LEITURA DE HERÁCLITO POR CLEMENTE DE

ALEXANDRIA

Fernando Rocha Sapaterro (PUCSP-CAPES/FSB)

RESUMO: A investigação de predicados divinos aplicados aos mortais, desde a Grécia antiga, é um

problema filosófico claro cujo centro é o perscrutamento de sua fonte possível. Beatitude, coragem,

justiça, bondade entre outros predicados, são propriedades divinas exaltadas nos mitos e depois

deslocadas para os mortais. Pré-socráticos, Platão, Aristóteles, epicuristas, estóicos aplicam tais

predicados para os mortais, e, de algum modo, os mortais são portadores desses ou por alguma prática

ou por um aspecto de sua natureza, geralmente relativa à alma. Para Clemente de Alexandria, o

homem é um ser divino, e isso é consequência de um problema teológico-filosófico: de um lado sua

teologia afirma que deus se torna homem - o que é parte de uma afirmação dogmática - e de outro,

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encontramos sua filosofia que diz que o homem torna-se deus - o que é argumentado pelas vias da

razão. Essa dupla via é para Clemente intercambiável pois sem o esclarecimento filosófico a teologia

seria puramente um mito, e sem a teologia a filosofia não teria condições de avançar, correndo o risco

de ser um discurso vazio, multiplicador de opiniões. O esclarecimento filosófico constitui a tentativa

de elucidar o problema teológico e vice-versa, o que faz que a filosofia transite com a teologia, pois

para se fazer qualquer discurso sobre Deus é preciso, de algum modo, conhecer os atributos humanos e

elucidar por meio da razão atributos divinos passíveis de serem encontrados nos mortais. Propomos

aqui apresentar a leitura de Heráclito feita por Clemente de Alexandria no que se refere à comunhão de

predicados humano-divinos. Para isso, detemo-nos, mais especificamente, sobre um fragmento de

Heráclito de Éfeso - fragmento 62 - que serve de apoio para essa tese. Vemos, a partir dele, que

Clemente não teria condições de afirmar a deificação do homem sem ter viabilizado o trânsito dos

atributos divinos para o homem: “Imortais, mortais; mortais imortais…”. O juízo contido no

fragmento desloca o imortal para o mortal, bem como seu contrário, e o que parece paradoxal é, na

verdade, a possibilidade de uma filosofia lúcida.

SÓCRATES, ERÓTICO

Cesar de Alencar (PPGLM/UFRJ)

RESUMO: Seguindo a indicação de Charles Kahn, que nos refere ser o tema do éros de Sócrates o

mais completo daqueles presentes na literatura socrática, procurou-se traçar aqui desde Ésquines, em

quem esse tema parece ter se originado, um perfil de Sócrates como mestre e educador. O aporte de

um tal perfil centrar-se-á no método dialético enquanto tékhne para a condução da alma de seus

discípulos à visão do suprassensível, que antes e para além de poder ser plenamente conhecido, deve

ser visto. O ensino de Sócrates como abertura a que na alma se veja o melhor (agathós) será

justificado como sendo o traço fundamental do filosofar socrático, aquele mesmo que explica sua

postura como mestre e a diversidade dos que se punham como seus discípulos, e sem o qual não se

entende a imagem que dele traçou Platão em seus Diálogos. Tendo em vista o Sócrates histórico,

portanto, será preciso analisar as fontes socráticas de acordo com a metodologia desenvolvida por

estudiosos como Vilhena e Montuori, metodologia que consiste em ter a clareza de serem diferentes

perspectivas o que se encontra nos chamados logoí sokratikoí. Embora concebidas enquanto

recriações, representações de Sócrates a partir do que dele o autor desejou expressar, não se chega a

entendê-las de fato como tais se alimentarmos o preconceito moderno, comum entre os estudos

socráticos atuais, de que não passam de ficção imaginária dos autores, nada tendo que ver com o

Sócrates que existiu. É sempre em vista da referência histórica que os logoí sokratikoí se tornam

compreensíveis enquanto literatura filosófica. E será desse modo que iremos oferecer nossa análise do

perfil de Sócrates como mestre segundo as diferentes representações que nos chegaram, a fim de

mostrar que a indicação a que nos refere Charles Kahn inicialmente contradiz a tese principal de sua

investigação - qual seja, a de que a literatura socrática, e a de Platão inclusa, não passa de ficção

literária sem valor histórico. A demonstração de que o socratismo tem como traço fundamental a

abertura da alma para o melhor (situado sempre numa dimensão transcendente) é tanto um argumento

contra a defesa de uma ficcionalidade literária dos escritos socráticos quanto uma tentativa de apontar

a contribuição decisiva de Sócrates para a História da Filosofia.

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A POLÍTICA DE CLÉON NO LIVRO IV DE TUCÍDIDES:

PERIPÉCIAS DA DEMAGOGIA

Maria Elizabeth Bueno de Godoy (USP)

RESUMO: A demagogia é referência comum nos registros do século V a.C. grego, quando se trata de

Cléon. Historicamente retratado por Tucídides, reintroduzido à sequência dos eventos da guerra do

Peloponeso após a tomada do porto de Pilos, na cena do debate em Atenas, tem sua popularidade

destacada na atribuição própria ao caráter do ἀνὴρ δημαγωγὸς. O mesmo traço é exacerbado na

comédia de Aristófanes, abordado sob a alegoria doméstica da relação entre o ‘mestre’ (representação

do dêmos ateniense), e o Paflagónio, seu empregado: retrato do bajulador inescrupuloso, cujo controle

traduz-se em exageros de indulgência e lisonja, provedores da justa influência que tanto lhe apraz,

sobre a qual fundamenta sua política. O objetivo deste artigo é refletir sobre a política do Cléon

tucidideano seguindo a proposta de uma leitura dramática da narrativa do Livro IV, de cuja

perspectiva discute-se acerca dos vícios e paixões atribuídos ao seu caráter, além das implicações de

sua política, reflexo mesmo dos vícios e paixões da própria pólis ateniense. Pelo valor intrínseco

anunciado pelo historiador no prólogo de sua obra, a condição humana revela, na incerteza de tudo que

não se pode mensurar, a centralidade da escolha. Na deliberação e na contenção dos ímpetos e

conselhos persuasivos, os atos compõem, como em um cenário, a luta humana contra suas paixões. O

homem, livre para escolher e deliberar cai títere delas e já não mais dos deuses, a quem outrora

atribuía males sem conta. Entre deliberação e ato, a dramática trajetória da coletividade - corpo

político – cujo caráter revela-se aventuroso, inquieto e ambicioso, mas também inconstante e propenso

às alternâncias de suas paixões, revela assim a face avessa da conduta política de Atenas, outrora

marcada pela justeza e sobriedade de um Péricles.

O DESAFIO DO FILÓSOFO NA REPÚBLICA DE PLATÃO

Luiz Maurício Bentim da Rocha Menezes (UEAP/UFRJ)

RESUMO: O Livro II da República de Platão abre com um desafio feito por Gláucon a Sócrates para

que este prove que a justiça é, de toda maneira [παντὶ τρόπῳ], melhor do que a injustiça. Ou seja, é

tarefa de Sócrates demonstrar que a justiça sempre é superior a injustiça em qualquer situação

contrafactual, trazendo sempre benefícios àquele que pratica a justiça. Há, no entanto, um caso na

República em que o cumprimento da justiça parece não trazer benefícios ao agente, mas uma pena.

Esse é o caso do filósofo-governante e sua compulsão para governar. Se há uma relação entre justiça e

felicidade estabelecida no desafio proposto então ou (i) governar é uma injustiça e não aceitar o

governo seria, de fato, fazer justiça com o filósofo. Pois, dessa forma, existiria um caminho em que a

máxima felicidade do filósofo estaria relacionada a sua escolha justa de não governar; ou (ii) governar

é justo, mas existe um caso em que ser justo não corresponde a ser feliz. Isso abre um precedente para

que o filósofo deseje o caminho mais feliz e, assim, decida ser injusto em sua escolha, optando por não

governar. Ambas as hipóteses trazem problemas, pois desconstroem os argumentos da justiça-

felicidade e da união entre governo e filosofia. Se entendermos que cada um tem um papel a

desempenhar na cidade e que foi argumentado que aquele que melhor desenvolveria a função de

governar seria o filósofo, então é justo que o filósofo governe a cidade. No entanto, isso não resolve o

problema da relação entre a justiça e a felicidade, já que é afirmado textualmente que o filósofo

poderia levar uma vida melhor e mais feliz se não tivesse que governar. Se é justo, portanto, ao

filósofo governar, por que o governo não o torna feliz? É o objetivo desse trabalho expor o problema,

relacionando com o Desafio de Gláucon, e propor um caminho possível para a solução do caso do

filósofo-governante.

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Mesa 2 (22/09/2015 – 14h)

CRENÇA VERDADEIRA JUSTIFICADA E INFERÊNCIA DEDUTIVA

Bruno Rigonato Mundim (PUC-Rio)

RESUMO: A expressão crença verdadeira justificada se funda numa teoria do conhecimento

tripartida, na qual a legitimidade da posse de um conhecimento está condicionada à realização dos três

conceitos aí envolvidos: crença, verdade e justificação. De modo geral, essa concepção epistemológica

nos diz que: a) não podemos ter o conhecimento de algo que não cremos, mesmo que esse algo seja

verdadeiro e justificado; b) por mais que tenhamos uma crença sincera e justificada sobre algo, não o

conhecemos se esse algo for falso; c) crer em algo verdadeiro não é suficiente para termos

conhecimento sobre isso, pois, a não ser que saibamos como justificar, tal crença verdadeira poderia

ter se dado por mero acaso.

A partir dessa concepção tripartida, a apresentação propõe avaliar o papel epistemológico de uma

inferência dedutiva. Por inferência compreendemos a transição que se efetiva na passagem de certas

premissas dadas, ou assumidas, para o estabelecimento de uma conclusão, da qual se diz ser

fundamentada por aquelas. Nos restringiremos ao âmbito dedutivo das inferências, ficando de fora,

portanto, abduções e induções.

Diante desse horizonte, as seguintes questões serão de nosso interesse: o que é preciso uma inferência

ter para que a conclusão por ela estabelecida nos dê a posse de um conhecimento, ou seja, o que faz

com que premissas das quais temos uma crença verdadeira justificada possam se transformar numa

asserção que representa um novo conhecimento? A concepção Tarkiana de consequência lógica – para

toda interpretação, é impossível que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão seja falsa – é

suficiente para caracterizar uma inferência válida? Como argumentar sobre a validade de uma

inferência, sendo que a própria argumentação pressupõe o uso daquilo que está em questão, i.e.,

inferências?

Tais questões são colocadas sob a perspectiva de um debate atual sobre o estatuto epistemológico das

demonstrações lógico-matemáticas travado, sobretudo, entre Martin-Löf, Sundholm e Prawitz.

O APELO AO AXIOMA DA ESCOLHA NA DEFINIÇÃO DE CERTAS OPERAÇÕES

ARITMÉTICAS

Guilherme T. M. Schettini (UFRJ)

RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo investigar a necessidade do axioma da escolha para a

definição de algumas operações aritméticas, em particular a multiplicação com infinitos fatores.

O axioma da escolha é um dos dez axiomas da teoria canônica dos conjuntos (ZFC), que serve como

base para toda a matemática comum. Primeiramente enunciado em 1904 por Ernst Zermelo, trata-se

do mais polêmico dos dez axiomas – além de sua independência em relação aos demais axiomas já ter

sido demonstrada, alguns paradoxos, como o de Banach-Tarski, se seguem dele.

Em uma linguagem não-formal, o axioma da escolha é equivalente às seguintes proposições:

i) Toda classe pode ser bem ordenada, isto é, há um primeiro elemento para cada uma das subclasses

que ela contém (à exceção da classe vazia, evidentemente);

ii) Dada uma classe com infinitas subclasses, todas não-vazias, deve haver pelo menos uma classe que

possui exatamente um membro em comum com cada uma das subclasses da classe dada;

iii) O produto de uma multiplicação com infinitos fatores só é zero quando um dos seus fatores é zero.

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Neste trabalho, defendemos a tese de que, se é verdade, como sugere Russell, que o único

procedimento correto para a definição de uma determinada operação aritmética é a construção de uma

classe com o número de elementos exigidos [para o seu resultado], então o axioma da escolha é

também necessário para a definição da multiplicação com infinitos fatores.

Desde Zermelo, à exceção dos trabalhos de Russell e Whitehead, as investigações sobre o axioma da

escolha se desenvolveram mais no campo da teoria axiomática dos conjuntos do que na teoria lógica

das classes. Esta é propriamente a área preocupada em definir os números a partir da construção de

classes.

Finalmente, no que se refere à metodologia, este trabalho recupera o caminho lançado por Zermelo,

Russell e Whitehead, e analisa o axioma da escolha do ponto de vista da teoria lógica das classes.

PERCEPTRON E SINÉDOQUE: A SOCIEDADE DE CONTROLE EM SUAS

FIGURAS E LINGUAGEM

Irlim Corrêa Lima Júnior (PUC-Rio)

Com base nas reflexões de Gilles Deleuze no Post-scriptum sobre as sociedades de controle, em que o

filósofo francês identifica no fenômeno do controle modulatório das singularidades no mundo

contemporâneo um novo regime de dominação e uma mutação profunda do capitalismo, e ainda sob

inspiração das ideias de Paul Virilio em A máquina de visão, o qual entrevê no fluxo de velocidade a

tempo real das imagens e informações circulando através do globo uma espécie de controle cego,

maquínico e virtual (o que chama de perceptron) sobre a realidade, é a intenção do presente trabalho

relacionar alguns pontos nevrálgicos que possam avançar nessa discussão de alguma forma presentes

também em um conto de Ítalo Calvino, intitulado Memória do mundo, e no filme Sinédoque, Nova

York, escrito e dirigido por Charlie Kaufman. Tanto o filme quanto o conto são unívocos em

expressarem uma profunda crise no processo imanente de reprodução virtual do mundo psicossocial,

denunciando o revés inevitável e catastrófico no momento em que a controlabilidade representacional

dispara uma reação em cadeia a partir da qual o incontrolável assume a direção do simulacro. Com

efeito, ambos focam sua narrativa na função fio-condutor da direção, problematizada na figura do

diretor, responsável pelo controle das ações que operam e orquestram os fluxos e contrafluxos

existenciais, imagéticos e informacionais entre “vida real” e simulacro, em cujo intercâmbio pretende-

se que o mundo inteiramente seja açambarcado. No entanto, a impossibilidade de exercer um completo

controle pessoal e, além disso, a vida própria que acaba por ganhar o evento de simulação conduzem

ao colapso da função de direção, multiplicando-a e esfacelando-a pelas tramas do interior da

maquinaria, na qual o diretor deveria funcionar como arquiteto. A morte do diretor, nas duas ficções a

serem analisadas, representaria, então, não a aniquilação completa do caráter diretivo, mas a

disseminação multívoca de sua função dentro do processo, no qual direcionalidades fragmentárias e

dispersas assumiriam o controle do simulacro. Controle do incontrolável é a espécie de captura

efetuada pela máquina de visão, o perceptron, que se apropria do real e de sua temporalidade,

convertendo completamente sua produção e reprodução em automação de imagens em segmentação

contínua de cegamento, inviabilizando panópticos ou formas de controle congêneres. Se as reflexões

de Virilio auxiliam na compreensão da construção dessa maquinaria como a memória do mundo de

Calvino, por outro lado a construção narrativa por meio da figura de linguagem da sinédoque, no filme

de Kaufman, contribui para compreender a natureza das modulações espaço-temporais das

singularidades realizadas pelos agenciamentos do controle sócio-metabólico das formas de poder, bem

como sua interação. A redundância fluida, que permeia a narrativa, apresentaria a forma dessa relação

descontínua entre o todo e as partes, em que um remete ao outro fragmentariamente, mas sempre se

elidindo entre si. O todo e as partes, portanto, ramificam-se difusamente e concomitantemente

reiteram-se. A sinédoque responderia pela linguagem do processo pelo qual a sociedade de controle

instanciaria sua metaestabilidade em múltiplas e autônomas direcionalidades.

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DA SOCIEDADE A DESIGUALDADE: UMA ANÁLISE DO HOMEM EM

ROUSSEAU

Diogo Luiz Souza de Matos (UEAP)

RESUMO: A desigualdade entre os homens é visível durante toda a história da humanidade, apesar

dela ficar mais evidente na modernidade humana. Porém vale ressaltar que essa fase da desigualdade é

o que chamamos desigualdade física e política, assim já citado por Rousseau, que surge justamente

quando os homens iniciam o seu período de vivencia em sociedade. A desigualdade antecessora desta,

é definida como fator natural ou físico, que é gerada pelo próprio homem em si, mas é uma forma de

divisão entre os mais favorecidos fisicamente e intelectualmente e os que não tiveram tanta “sorte”. O

que se pode observar é que a desigualdade surge no nascimento do homem e o acompanha por toda a

sua vida, podendo ser maior e mais visível em determinadas sociedades. Assim, Rousseau em sua obra

“Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens”, faz uma análise

justamente do que origina essa desigualdade e como ela vem crescendo com o passar do tempo.

Portanto, o objetivo desse artigo é analisar o discurso de Rousseau, bem como, a influência de Thomas

Hobbes no sentido de dialogar sobre como e por que a formação da sociedade e o crescimento da

mesma contribuem tão radicalmente para a evolução da desigualdade entre os homens. Muitos autores

nos trazem esse debate sobre sociedade, sobre política dentro desse contexto, porém é Rousseau o

debatedor da questão de desigualdade a partir da sociedade. Para ele o estigma que nos trouxe a ser tão

desiguais com o semelhante é essa estruturação de viver em sociedade, ao contrário de Hobbes, por

exemplo, que nos diz que o mau não está na sociedade e sim nos homens. Essa dicotomia existente na

maneira de pensar entre Hobbes e Rousseau faz com que sejam leituras obrigatórias para tentar

entender e levantar argumentos para o que vivenciamos hoje na humanidade Uma vez que, segundo,

Rousseau a vida em sociedade é a causadora desse estigma do homem. Para fazer todo esse estudo o

presente artigo foi construído a partir de análises bibliográficas de autores supracitados que nos

remetem a essa questão da formação de sociedade e a discussão sobre o homem em si. A sociedade

vive em constante evolução e a filosofia vem para ajudar a compreender os impactos dessas mudanças

e o que elas representam na história da humanidade.

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Mesa 3 (23/09/2015 – 14h)

DA CONEXÃO NECESSÁRIA À CRENÇA EPISTEMOLÓGICA:

FUNDAMENTOS DA CAUSALIDADE EM DAVID HUME

Cleber de Lira Farias (PPGLM/UFRJ)

RESUMO: Este trabalho tem como objetivo central traçar, de acordo com o pensamento de Hume, o

fio condutor que leva o homem a inferir uma conexão necessária no que se refere as questões de fato e,

através dela, conceber a ideia de crença. Por conseguinte, investigar a importância deste fio condutor

para a construção de uma justificativa causal. Deste modo, através dos escritos humeanos Tratado da

Natureza Humana e Investigação acerca da Natureza Humana, - no Livro I, Parte III, §14 do Tratado

e §7º da Investigação, ambos, intitulados “Da idéia de conexão necessária” - busca-se encontrar a

impressão fonte da ideia de conexão necessária. Hume não está interessado em realizar uma investigação da causalidade em si, mas, antes, rejeitando a

explicação metafísica, investigar a ideia de relação causal, isto é, quais são as bases da justificação do

conhecimento humano. Assim, a questão investigada por Hume toma relevância não por um combate à

metafísica e sim da esfera psicológica envolvida, visto que não chega-se a ideia de crenças por

raciocínio dedutivo, mas por meio da experiência e do hábito. Logo, o homem ao observar que um

evento A é regularmente seguido por B, automaticamente, sem nenhuma reflexão, infere que a partir

da ocorrência de A (impressão presente) que o evento B, impreterivelmente, ocorrerá, pois a sucessão

inferida está contida na memória, adquirida por meio de experiências passadas.

A pesquisa inicia-se com os dados da percepção, que são por Hume divididos em impressões e ideias.

Não obstante isso, Hume ainda afirma que, “... as impressões sempre precedem as ideias, e que toda

ideia contida na imaginação apareceu primeiro em uma impressão correspondente” (p. 59). Ou seja,

uma pode ser verificada através da remissão a sua impressão, então a ideia é imprescindivelmente

originada na experiência.

Hume a partir dos princípios associativos destaca o de causa e efeito. Assim, ao investigar os eventos

que se relacionam fundando uma ideia de causalidade, verifica que a partir em suas qualidades

sensíveis não há nada que leve a mente humana a inferir uma conexão necessária, isto é, carece de

justificativa racional. Portanto, a ideia de conexão necessária está fundada nas experiências e em suas

repetições, gerando uma ideia de crença por meio do hábito ou costume, visto que por ele é que “...

fazemos a transição da causa ao efeito; e é de alguma impressão presente que retiramos a vividez que

transmitimos para a ideia correlata” (p. 187). Seguindo tal perspectiva, a mente habituada a uma

sequência (A-B), ao ocorrer A esperará B. Da mesma forma, ocorre, conforme o esperado pela mente

humana, essa ideia de conexão necessária que corrobora para o crescimento e vividez da crença. A

questão que é chave desta investigação é tentar buscar quais são as causas e a natureza da inferência

causal, bem como as crenças que se deposita nessa inferência, que será realizada por uma análise de

suas obras e dos comentários a elas referidas.

A ESTRANHEZA DO HOMEM SEGUNDO HEIDEGGER

Felipe Ramos Gall (PUC-Rio)

RESUMO: A questão “o quê – ou quem – é o homem?”, quem é esse ente que possui o privilégio

(privus legis – o que possui uma lei própria) ante os demais entes em relação ao Ser, talvez seja a mais

importante e fundamental questão na tarefa do pensamento, como já Kant havia pressentido. A simples

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resposta legada pela tradição, a “definição” metafísica do homem como animal rationale, tradução

latina da expressão aristotélica ζῷον λόγον ἒχον, cristalizou a compreensão da essência humana de tal

modo que ainda hoje encontra suas reverberações em um certo humanismo contemporâneo, que

entende, a partir dessa compreensão pressuposta e impensada do homem, que importa apenas

promover tal racionalidade, possibilitando ao homem ser “senhor e mestre da natureza”, tal como

desejava Descartes. Ora, Heidegger, visando destruir – em seu sentido heideggeriano mais próprio –

tal concepção cristalizada de homem, a fim de obter uma aproximação mais originária do Ser do

homem, recorrerá, em sua preleção Introdução à Metafísica, não ao pensamento filosófico, mas sim a

uma experiência grega fundamental poético-pensante (dichterisch-denkend), qual seja: a tragédia

Antígona, de Sófocles, cujo primeiro coro inicia-se com os seguintes versos: “πολλὰ τὰ δεινὰ κοὐδὲν

ἀνθρώπου δεινότερον πέλει./ τοῦτο καὶ πολιοῦ πέραν πόντου χειμερίῳ νότῳ”, e que Heidegger

traduzirá do seguinte modo: “Vielfältig das Unheimliche, nichts doch/über den Menschen hinaus

Unheimlicheres ragend sich regt”, ou seja, “Múltiplo (é) o estranho, nada, porém,/para além do

homem, de mais estranho há”. Com efeito, há presente aí uma concepção do homem como, dentre a

estranheza própria dos entes, o mais estranho dos estranhos, o estranhíssimo (τὸ δεινότατον). Há que

se considerar e analisar, por conseguinte, as duas traduções: a que Heidegger faz de δεινόν por

Unheimliche, e a que se faz de Unheimliche por estranho. Tal análise revelará o caráter de estar-

lançado do homem, de violento e imponente, de não-familiarizado, de não-pertencimento a um lar, que

abrirá a discussão para as questões da angústia, cotidianidade e autenticidade, presentes na primeira

parte de Ser e Tempo. Tais temáticas, por não mais terem sido abordadas de forma tão direta e

explícita, são muitas vezes consideradas “resolvidas” ou “ultrapassadas”, como se fossem questões

pontuais. Intentar-se-á com esse trabalho, portanto, mostrar a relevância dessas questões e temas no

pensamento heideggeriano, que não foram deixadas de lado após a “virada”, mas sim reapropriadas

em um novo solo de pensamento.

A IMBRICAÇÃO ENTRE OBRA DE ARTE E VERDADE: LEITURAS DE

HEIDEGGER

Uriel Nascimento (PUC-Rio)

RESUMO: Quer seja com Hegel, os românticos alemães, os fenomenólogos de diversas matizes ou,

mais recentemente, com os pensadores do que se chama pós modernidade, a obra de arte passou a ser

compreendida, especialmente no período que se segue a Kant, como um lugar no qual certa verdade –

ou, por vezes, a verdade – aparece e/ou ocorre. Diferindo radicalmente de Kant, para quem a verdade

se circunscrevia no campo científico, os filósofos posteriores buscarão na arte não uma possibilidade

de jogo livre entre faculdades, mas uma espécie de revelação que lhe seria exclusiva.

Posta a relevância do tema para a compreensão de certo movimento da filosofia e a centralidade de

Heidegger para a filosofia continental contemporânea, o objetivo da presente comunicação é expor, de

maneira sucinta, a compreensão da imbricação entre arte e verdade tal qual essa imbricação foi

compreendida por Heidegger.

Dentre todos esses grupos supracitados, talvez nenhum dos pensadores neles compreendidos tenha

colocado de maneira tão radical a capacidade da obra de arte dizer a verdade quanto o fez Heidegger.

Não obstante seu pensamento, especialmente a partir da década de 1930, voltar-se ao que

compreenderá como poético, o texto no qual se debruça fundamentalmente sobre a arte – A origem da

obra de Arte – situa a obra de arte não tanto como um momento ou uma possibilidade da verdade, mas

sim a possibilidade por excelência de sua aparição. Isso significa, muito exatamente, que Heidegger

caminha tanto no contrapé de Kant quanto no de Hegel: não mais uma antessala da moral – como era a

estética kantiana – nem tampouco um momento superado do Espírito – como na filosofia da arte Hegel

-, mas o lugar privilegiado dentro do qual a verdade ontologicamente encontra. Assim, Heidegger não

mais faz estética ou filosofia da arte, mas ontologia.

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A guinada em direção a uma ontologia da arte (e do poético) parece ter por pressuposto uma tese

fundamental: diferente da ciência e da técnica modernas, a obra de arte não tentaria, de maneira

nenhuma, dominar aquilo de que fala; antes, origina aquela abertura mesma de possibilidades a partir

da qual torna-se possível conceber a multiplicidade do ser. Desenraiza, portanto, aquilo que já está

sempre hodiernamente sedimentado de determinada maneira e permite que o misterioso, outrora

encoberto, apareça como misterioso. É, assim, um novo olhar sobre aquilo que está sempre ali, a mão.

Não mais uma verdade epistemológica se encontra aí, mas uma verdade ontológica. É sobre isso que o

trabalho versa.

ÉTICA DO CORPO E SEXUALIDADE EM MICHEL HENRY

João Elton de Jesus (FAJE)

RESUMO: Segundo Michel Henry, influenciada pela redução galileana que considera apenas o

material e extenso, em detrimento do aspecto sensível dos corpos, a fenomenologia histórica

permaneceu indeterminada ao focar o fenômeno apenas no aparecer objetivo. Henry, propõe, então,

uma fenomenologia originária, pois para ele, o fenômeno aparece a si mesmo, antes de tudo, não se

limitando ao corpo objetivo, pois o “por-de-fora” tem sua origem na afetividade, no sentir, no

movimento, já que os corpos reais, concretos que “povoam” o universo, são corpos sensíveis “Têm

cor, cheiro, sabor, são sonoros, possuem propriedades táteis”.

Na Encarnação, Henry diz que “essas características sensíveis que constituem o homem não derivam

do aparecer no mundo, do mundo reduzido à uma forma de Ek-stase, em seu conteúdo concreto e

objetivo, esse conteúdo sensível da sensação, deriva da vida, de modo que somente uma

fenomenologia da vida pode ser possível uma análise mais profunda do corpo real e concreto do ser

humano” (141).

Desta forma, a partir da fenomenologia da vida que se dá numa carne sensível, discutiremos sobre as

questões de gênero levando em conta que a sexualidade é da ordem do corpo de carne e a carne não

nega jamais sua materialidade incontornável tomada do ponto de vista fenomenológico, pois como

Henry aborda na obra Filosofia e Fenomenologia do corpo: ensaio sobre a ontologia biraniana “É

dessa corporeidade original que deriva as capacidades fundamentais, a de ser uma força e de agir, de

receber hábitos, de se lembrar” (12).

Essa reflexão desencadeia na questão ética, pois como Henry diz em A Barbárie “A vinda a si da vida

(...) é identicamente o movimento por meio do qual nós nos comportamos, o que somos, o que

fazemos (...) fornece todavia tudo o que ela é e tudo o que ela faz, tornando-se assim nossa própria

ação” (156)

Assim, Henry possibilita assumir um novo estatuto no horizonte do corpo subjetivo de tal sorte que a

ética do corpo e a ética da sexualidade sejam pensadas a partir da imanência absoluta da vida em que

corpo e alma constituem uma unidade inseparável na fenomenalidade do corpo próprio e portanto, da

sexualidade e da pessoa e, consequentemente, da sua vida em comunidade.

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Mesa 4 (24/09/2015 – 14h)

UMA ANATOMIA DO RESSENTIMENTO EM NIETZSCHE

Andreia Cristini Marcos Overne (UERJ)

RESUMO: O presente trabalho é fruto da pesquisa acerca do ressentimento em Friedrich Nietzsche.

O objetivo do trabalho em pauta é a compreensão do ressentimento numa perspectiva Nietzschiana. O

trabalho proposto justifica-se por sua natureza ontológica e relevância para os dias atuais e A tese em

questão a ser defendida tem como perspectiva argumentativa que forças, crescem e expandem a sua

potência, e as forças menores quando exploradas, reagem e lutam por resistir à dominação. Nesse

sentido, toda força é vontade de potência ou vontade de poder. Para ser feliz, o homem precisa afirmar

sua potência de vida. Quando essa é reprimida, ele leva uma existência subserviente, de modo reativo.

A marca reativa surge do ressentimento, onde o forte representa o mal e, por oposição, ele próprio,

como sendo o bom. A relação “Senhor” e “escravo”, faz ressoa ainda a dúvida: de onde vem o

ressentimento? O ressentimento, sentimento reincidente no humano, é tão forte que leva a crença de

que tal é inato ao ser. Nessa mesma perspectiva, mas, através do poder do discurso das suas mais

variadas plataformas escraviza seguidores, que se sentem transgressores de alguma lei ou ordem

imposta como tal frente as proibições, gerando por consequência o ressentimento. Nota-se, que é

suficiente que o indivíduo apenas deseje, para provocar o ressentimento. Fruto de uma moral

coercitiva o homem experimenta continuamente o ressentimento repressão de seus impulsos ativos.

Mas como esses impulsos não somem, é inevitável que haja um conflito entre uma moral que reprime

e a vontade de potência, que quer expandir-se. De tal modo, que o homem se torna reativo quando

vive circunscrito apenas à sua conservação, o que gera um acumulo de seu sofrimento e a necessidade

de viver cada vez mais submetido às promessas de recompensas. Diante de tal realidade, o homem

passa a ignorar um aspecto primordial da existência que é a criação, ou seja, é somente por meio da

realização da sua natureza que este cria novos valores, que distanciarão o ressentimento. Agrilhoado

pelo ressentimento e má consciência, o homem reativo se vê despossuído de sua vontade de potência

para satisfazer a sua vontade, e esta vontade é uma vontade que anseia a potência. A "fome" ou a

"falta" são constituintes à vida do homem reativo que, circunscrito apenas à conservação da sua

existência, não dando vazão à sua potência. O ressentimento adensado com a maldade, o ódio dos

habitantes daquela cidade, expressa a essência sofredora do ser ressentido.

AS DUAS PROVAS DA EXISTÊNCIA DE DEUS NAS MEDITAÇÕES

METAFÍSICAS DE DESCARTES

Juliana Abuzaglo Elias Martins (UFRJ)

RESUMO: O presente trabalho possui como tema a prova da existência de Deus, exposta por

Descartes na sua obra Meditações Metafísicas. Nesta obra, notoriamente sabida como sendo a

principal do filósofo moderno, temos o que muitos comentadores em entendem como dois argumentos

em favor da existência de Deus, ou, duas provas da existência de Deus.A primeira prova encontramos

na terceira meditação, entre os parágrafos 6 e 11. E uma segunda prova, encontraríamos na

quintameditação numa exposição que muitos denominam de argumento ontológico. Nosso objetivo é

mostrar que apesar de muitos interpretes aceitarem a existência dessas duas provas, apenas a primeira

na 3ª meditação pode efetivamente ser considerada como prova da existência de Deus, pois implica

que a partir daquele momento a existência de Deus é verdadeira e legitima como verdadeiro o

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conhecimento aceca das ideias claras e distintas, eliminando a dúvida e possibilitando a produção de

conhecimento a partir daí.

Não pretendemos aqui invalidar o argumento da Quinta meditação, porémdefenderemos a tese da

necessidade de reconhecerque diante dos dois argumentos e dos objetivos de Descartes em sua obra,

existiria um primado do argumento da terceira meditação em detrimento do argumentoda quinta.

Nesse sentido, compreendemos que o que ocorre na quinta meditação seria uma espécie de

complementação da primeira prova, mas não outra propriamente.

Ambas as provas, tanto da terceira quanto da quinta, podem ser consideradas provas por efeito, ou

seja, são argumentos que partem de efeitos para se encontrar suas causas. Na prova da terceira

meditação temos Deus como sendo a causa da idéia de perfeição e infinito. Na prova da quinta

meditação temos Deus como causa da substancia extensa, ou de um ser finito que existe

empiricamente.

Entretanto, entendemos que a importância da primeira prova se dá, pois em seu contexto, isto é, na

terceira meditação, a existência de Deus é de fundamentalrelevância para as pretensões

epistemológicas de Descartes. O filósofo naquele momento de sua obra, ao provar que deus existe e é

veraz, legitima o conhecimento das ideias claras e distintas, e elimina a duvidado deus enganador.

Trata-se, portantoda base que possibilita todos os outros conhecimentos expostos por Descartes nesta

obra, serem desenvolvidos e produzidos. Mesmo o argumento na quinta meditação, mostraremos que

depende desta primeira prova pois objetiva mostrar que as essências dos corpos extensos, claras e

distintas, são verdadeiras, e conhecidas primeiramente antes do que os próprios corpos. Pretendemos

assim analisar e esclarecer estas questões e suas respectivas passagens para a defesa de nossa tese, da

existência de algum primado da primeira prova sobre a segunda.

A CONCEPÇÃO KANTIANA DE JUÍZOS E A SUA TÁBUA DOS JUÍZOS E DAS

CATEGORIAS

Pablo Barbosa Santana da Silva (UFF)

RESUMO: No presente texto é defendido que Kant possui duas concepções de juízo que, como o

defendemos aqui, podem ser conciliadas. Na Crítica da razão pura, na primeira seção da dedução

metafísica das categorias, Kant define o juízo como o ato de julgar e o entende como equivalente a um

conceito complexo. Em contraste, na dedução transcendental das categorias, na segunda edição da

crítica, (§19) Kant destaca que todo juízo possui validade objetiva por implicar o conhecimento de um

objeto. Tratamos ainda da classificação kantiana dos juízos na Crítica da razão pura, sua tábua dos

juízos,além do paralelismo entre a tábua dos juízos e a tábua das categorias e de alguns problemas da

dedução metafísica.

AS MÔNADAS DE GULLIVER

Raquel de Azevedo (PUC-Rio)

RESUMO: As viagens de Gulliver, publicado por Jonathan Swift em 1726, são um dos muitos

experimentos herdeiros da monadologia de Leibniz. Das sociedades que encontra, Gulliver é sempre a

sombra, isto é, os níveis de indistinção a partir dos quais se destaca um mundo: o homem-montanha

que põe em evidência os pequenos liliputianos, o devir-imperceptível entre os habitantes (humanos e

animais) de Brobdingnag. Se Leibniz compara a decisão divina de criação do mundo com maior

quantidade de essência a um jogo em que se trata de colocar o máximo de peças em uma área dada, as

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transformações de Gulliver se destinam a distinguir esses máximos e mínimos, são, em suma,

operações de integração. As multiplicidades que compõem cada sociedade são encaixadas pelo

viajante. Sendo, porém, a integração uma operação sempre aproximada, os rastros que Gulliver

carrega de cada lugar ao fim de suas viagens – os pequenos animais de Lilipute, o pente feito com os

pelos da barba do rei, os ferrões de vespa – são como que os restos infinitesimais dessa operação

sempre inacabada. O mar é o meio de deslocamento das pequenas percepções. Os europeus precisam

refazer seus mapas, diz Gulliver à medida que vai encontrando territórios desconhecidos. Para Leibniz,

uma nova cartografia estava necessariamente associada à visão, ou, dito de outra forma, a visão seria o

melhor modelo do conhecimento. Ao considerar os diferentes modos para se livrar do gigante que lhes

penalizava com tão altos gastos, a corte liliputiana avaliou que o mais adequado seria arrancar-lhe os

olhos, visto que quando fora atacado pelas minúsculas flechas do povo inimigo de Lilipute (ao roubar-

lhes a esquadra tal como um menino moveria barquinhos na parte rasa do mar), o único temor de

Gulliver foi por seus olhos. Leibniz diz que quando lançamos várias pedras na água, cada uma faz

círculos que se cruzam sem se destruir, mas quando o número de pedras é muito grande, o olho se

perde. Perder o olho é como cair no aturdimento da completa indistinção. Gulliver evita perdê-lo –

para as flechas, para o contínuo – com os óculos – uma lente. Se levar o objeto à vizinhança do olho é,

para Leibniz, uma forma de aumentar a adequação entre a coisa e o pensamento, se, no limite, o

conhecimento verdadeiro é aquele em que o objeto está ele mesmo no olho – a óptica –, o que faz o

microscópio, porém, explica Michel Serres em Le système de Leibniz et ses modèles mathématiques, é

medir um novo afastamento. As lentes multiplicam o objeto numa poeira inumerável, abrem novos

mundos. O problema é menos de diminuir a distância entre esses mundos que pensar uma relação

entre eles. O telescópio seria, para Serres, o instrumento que aproximaria os mundos. Seu erro está em

identificar o conhecimento ao espectro da luz visível e não à totalidade do espectro da radiação

eletromagnética. Este trabalho se propõe a pensar, a partir do texto de Swift, uma monadologia se

erigindo para além dos limites do espectro da luz visível.

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Mesa 5 (25/09/2015 – 13h30)

HIERARQUIAS, FATOS E ESTADOS DE COISAS

Ana Clara Polakof (PUC-Rio)

RESUMO: Numa ontologia realista, a aceitação de uma hierarquia para evitar paradoxos parece estar

generalizada a partir dos resultados obtidos por Whitehead e Russell (Principia Mathematica, 1910). A

ontologia de Chateaubriand, baseada nelas, não é uma exceção. Porém, a hierarquia por ele proposta

tem características que a fazem única, o que é importante no desenvolvimento de distinções

ontológicas desde uma perspectiva realista. Ela é uma hierarquia flexível e cumulativa. É flexível pois

as propriedades podem-se combinar com entidades de níveis diferentes (uma propriedade lógica de

nível 2, diversidade2, pode se combinar com um objeto de nível 0, Chateaubriand, e com um objeto

de nível 1 como a propriedade ser dentista). É cumulativa porque uma propriedade pode aparecer em

mais de um nível (temos diversidade1 que pertence ao nível 1, diversidade2 que pertence ao nível 2, e

assim até o infinito). Nela são incluídos os objetos concretos de nível 0, as propriedades (lógicas e não

lógicas) a partir do nível 1, e os estados de coisas (instanciações de propriedades em objetos e/ou

propriedades) também a partir do nível 1. Nessa hierarquia é também possível estabelecer uma teoria

de tipos que diferencia as entidades: os objetos têm tipo 0; as propriedades têm um tipo complexo

baseado no nível, na aridade e no tipo dos argumentos da propriedade: << λ, κ>, τ0, τ1, ...>; e os

estados de coisas têm o tipo ainda mais complexo: <<< λ, κ>, τ0, τ1, ...>, τ0, τ1 ...>.

Esta apresentação visa argumentar que, se aceitamos como base uma ontologia como a de

Chateaubriand, é possível estabelecer que os estados de coisas por ele propostos podem ser separados

em dois tipos de entidades: os fatos e os estados de coisas. A separação entre estas entidades – não

considerada por Chateaubriand, que vê os termos como sinônimos – leva a modificações necessárias

na ontologia que a enriquecem. A distinção que propomos está baseada na entidade na qual a

propriedade de nível superior é instanciada: os fatos são instanciações de propriedades de nível 1 em

objetos, como em <ser filósofo, Chateaubriand>; enquanto os estados de coisas são instanciações de

propriedades de nível 2 ou superior em propriedades de nível inferior, como em <Existência2,

Diversidade1>. Esta diferença tem repercussões nas características lógico-ontológicas das entidades:

elas pertencem a diferentes níveis (os fatos pertencem só ao nível 1, os estados de coisas a níveis

iguais ou superiores ao 2), e elas têm tipos diferentes (o dos fatos será mais fixo que o dos estados de

coisas), como mostraremos.

Nossa proposta apresenta uma modificação substancial à ontologia de Chateaubriand, que

envolve a aceitação de uma entidade a mais na sua ontologia. Argumentaremos que a adição dos fatos

à ontologia resulta num esclarecimento dos distintos comportamentos ontológicos que se observam

entre entidades de nível 1 e entidades de nível igual ou superior a 2, e não numa adição desnecessária

de entidades.

CHATEAUBRIAND, ESTADOS DE COISAS E INSTANCIAÇÃO

Sérgio Schultz (PUC-Rio)

RESUMO: No primeiro volume de Logical Forms, Chateaubriand propõe uma ontologia platonista de

objetos e propriedades organizados em uma hierarquia de tipos lógicos. Também, temos estados de

coisas ou fatos, que são caracterizados intensionalmente como a instanciação de uma propriedade por

outras propriedades ou objetos dos tipos apropriados. Com isto, defende-se uma concepção realista de

verdade como identificação de estado de coisas. A instanciação é assumida como uma relação

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substancial ocorrendo em todos os níveis a partir do segundo, que é o nível mais baixo a contar tal

relação. Assim, a ontologia de Chateaubriand torna-se um alvo para argumentos como os Regressos de

Bradley, na literatura contemporânea, que se constituem em um dos principais problemas a assolar

concepções de predicação e estados de coisas. Dadas as teses sobre fatos e instanciação, é

inquestionável a existência do regresso na ontologia de Logical Forms, resta saber se os regressos são

viciosos ou não. Em minha apresentação, distinguirei entre versões semânticas e metafísicas do

regresso de Bradley e argumentarei que, em ambos os casos, eles são inócuos. Em sua versão

semântica, o argumento parte da divisão do enunciado em partes denotativas e da pergunta sobre o que

distingue uma proposição genuína como “Sócrates é sábio” de uma lista com os nomes de Sócrates e

da propriedade ser sábio. Se apelamos para a cópula como expressando a relação de instanciação que,

então, forneceria unidade à proposição, coloca-se imediatamente o problema sobre o que distingue a

proposição e a lista que denota Sócrates, a propriedade e a relação de instanciação. Argumentarei que

Chateaubriand escapa deste problema ao conceber expressões predicativas não somente como

denotando propriedades, mas sim como dizendo algo acerca dos sujeitos do enunciado. Desta forma,

ele não necessita recorrer à instanciação para dar conta da unidade da proposição. Contudo, o

problema do regresso metafísico permanece intocado. Nesta versão, o argumento parte diretamente da

explicação de estados de coisas ou fatos a partir da relação de instanciação. O regresso é gerado na

medida em que, ao explicar o fato de Sócrates ser sábio, dizendo tratar-se da instanciação da

propriedade ser sábio por Sócrates, alcançamos um novo estado de coisas que também necessita ser

explicado, a saber, o estado de coisas do objeto instanciar a propriedade. Dada a caracterização inicial,

este fato teria que ser explicado recorrendo a uma relação de instanciação de ordem superior à

primeira, dizendo, desta vez, que objeto e propriedade instanciam a relação ser instância de, e assim

ad infinitum. A tentativa de explicar estado de coisas apenas introduziria novos estados de coisas para

serem explicados. Argumentarei que o regresso somente é vicioso se a pergunta sobre estados de

coisas é entendida como a questão sobre em virtude do que a é F ou sobre a eliminação ou redução de

estados de coisas. Porém, estas são formas incorretas de formular a pergunta sobre estados de coisas

na ontologia de Chateaubriand.

REFLEXÕES SOBRE OS ESTADOS DE COISAS SOB UMA PERSPECTIVA

TEMPORAL

Ana Maria Corrêa Moreira da Silva (PUC-Rio)

RESUMO: Em Logical Forms, Oswaldo Chateaubriand (2001, 2005) apresenta uma Ontologia que

admite, além de objetos concretos e propriedades abstratas, estados de coisas, entendidos como a

instanciação de propriedades por objetos, ou ainda de propriedades por outras propriedades. Esses

estados de coisas são uma categoria ontológica própria, não superveniente de seus constituintes, como

aspectos do mundo denotados ou identificados por proposições verdadeiras. Considerando que estados

de coisas podem ser formados por objetos concretos espaciotemporais, como, por exemplo, o estado

de coisas denotado pela proposição “Aristóteles escreveu a Metafísica”, podemos nos perguntar se o

caráter espaciotemporal de um constituinte influencia a natureza do estado de coisas como um todo.

Neste sentido, Chateaubriand admite que, se Aristóteles não tivesse existido, tampouco existiriam os

estados de coisas que o contivessem, pois eles seriam tão temporais quanto o próprio filósofo. Assim,

de um modo geral, estados de coisas não existiriam antes da existência de seus constituintes, caso estes

fossem objetos. O mesmo não parece ocorrer no caso de propriedades, pelo fato de elas serem tomadas

como entidades abstratas atemporais, de modo que estados de coisas que somente contivessem

propriedades seriam tão atemporais quanto elas.

A atribuição de um caráter temporal aos estados de coisas pode trazer algumas consequências para

uma ontologia realista como a de Chateaubriand, que ainda não foram suficientemente analisadas. Por

exemplo, temos a questão fundamental de se o tempo é uma propriedade do estado de coisas, ou se ele

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Investigação Filosófica, Caderno de Resumos EIFIL, 2015. (ISSN: 2179-6742)

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é um constituinte dele, ao lado dos objetos e propriedades. Outra questão é quanto à existência dos

estados de coisas passados e futuros, juntamente com os estados de coisas presentes, menos

controversos. Se os estados de coisas futuros são admitidos nessa ontologia, eles podem ser

considerados como estados de coisas meramente possíveis, cuja realização ainda não está determinada.

Essas questões inserem-se numa discussão metafísica maior sobre a natureza do tempo, em que se

pode ou não aceitar a irrealidade e a indeterminação do futuro, como no debate entre as teorias do

Eternalismo, Presentismo, Growing-Universe e Branching-Future. Para os adeptos do Branching-

Future, como, por exemplo, Storrs McCall (A Model of the Universe, 1994), os estados de coisas

futuros meramente possíveis já existem no presente, de forma ramificada, dos quais apenas um se

realizará, não se tendo, porém, como determinar qual. Quando o presente chega, as possibilidades não

realizadas são eliminadas (drop off), num permanente decréscimo de realidade.

Neste trabalho, pretendemos relacionar a concepção de Chateaubriand de que estados de coisas

existem temporalmente, como instanciações de propriedades identificadas por proposições

verdadeiras, com a doutrina do Branching-Future, que confere realidade aos estados de coisas

possíveis futuros. Nosso objetivo é refletir sobre algumas consequências semânticas e metafísicas da

admissão da tese de que o futuro está indeterminado, em particular quanto ao valor de verdade das

proposições sobre os futuros contingentes, e em geral quanto aos problemas gerados pela introdução

do tempo como categoria ontológica.

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Conferência de Encerramento (25/09/2015 – 16h)

FAZENDO E DESFAZENDO FAZEDORES

Guido Imaguire (UFRJ)

RESUMO: A noção de “truthmakers” ou “fazedores de verdade” se tornou central para a metafísica

analítica nas últimas décadas. Em geral, ela é considerada uma herdeira ou instância da noção

Leibniziana do princípio de razão suficiente. Na verdade, penso que fazedores de verdade são apenas

mais um caso de um ímpeto metafísico geral, e enganoso, de se “postular fazedores”: postula-se

entidades que “fazem” ou cumprem todo tipo de tarefa teórica: postula-se fazedores de sentido,

fazedores de validade, fazedores de similaridade, etc. Como muitas outras noções filosóficas, o limite

entre o uso e o abuso é muito tênue. Pretendo discutir a aplicação de fazedores de verdade para a

solução do Problema dos Universais, algo que se tornou uma espécie de nova ortodoxia metafísica.

Mostrarei que fazedores de verdade não podem fornecer o explanans que o problema exige. Uma

alternativa positiva deve ser apresentada. Em particular, argumentarei que “desfazer” ou “dissolver”

fazedores pode ser filosoficamente muito mais proveitoso do que postulá-los.