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Narrador: (Som da citara e dos sinos tubulares) Este… (som de rufo do tambor) é o Ismael (som corneta e pratos), é um coelho bravo que vive no bosque. Tem uma família muito grande, 52 irmãos!... Mas, de todos os seus filhos, o pai, coelho Maltese escolheu o Ismael para estar sempre junto de si e ensinar-lhe tudo o que ele sabia. Ismael: Porque o meu pai é o coelho mais inteligente de todo o bosque! Narrador: O coelho Maltese era o coelho mais respeitado de todo o bosque, pois era o mais sábio, mais rápido e o mais inteligente de sempre! Coelho Maltese: Meu filho Ismael, eu falo todas as línguas do bosque, a dos peixes do lago (barulho de peixes a mergulhar na água), a dos pássaros (som passarinhos), a língua das árvores (som de vento), e vou-te dizer um segredo, eu sei perceber a língua dos Homens! Narrador: O coelho Maltese começou a ensinar tudo o que sabia ao seu filho, como encontrar comida nas quatro estações do ano, como encontrar água nos verões mais quentes e secos, e mostrou-me quem são os seus inimigos e como evitá-los. Ismael: Quem são os nossos inimigos, pai? Coelho Maltese: Temos vários. Temos o Javali e o saca- rabos, que são animais grandes e feios e são capazes de ficar horas (som de relógio) escondidos no mato e a caminhar sem fazer barulho, apesar do seu tamanho, e de repente aparecem (som de pandeireta)… e já é tarde de mais. Ismael: E temos mais inimigos pai? Coelho Maltese: Sim. Temos a raposa. Ela só ataca de noite, mas é perigosa pois é muito silenciosa e paciente, e podemos não perceber que ela está mesmo ao pé de nós…. (som crescente do tambor) 1

Ismael e Chopin

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Page 1: Ismael e Chopin

Narrador: (Som da citara e dos sinos tubulares) Este… (som de rufo do tambor) é o Ismael (som corneta e pratos), é um coelho bravo que vive no bosque. Tem uma família muito grande, 52 irmãos!... Mas, de todos os seus filhos, o pai, coelho Maltese escolheu o Ismael para estar sempre junto de si e ensinar-lhe tudo o que ele sabia.

Ismael: Porque o meu pai é o coelho mais inteligente de todo o bosque!

Narrador: O coelho Maltese era o coelho mais respeitado de todo o bosque, pois era o mais sábio, mais rápido e o mais inteligente de sempre!

Coelho Maltese: Meu filho Ismael, eu falo todas as línguas do bosque, a dos peixes do lago (barulho de peixes a mergulhar na água), a dos pássaros (som passarinhos), a língua das árvores (som de vento), e vou-te dizer um segredo, eu sei perceber a língua dos Homens!

Narrador: O coelho Maltese começou a ensinar tudo o que sabia ao seu filho, como encontrar comida nas quatro estações do ano, como encontrar água nos verões mais quentes e secos, e mostrou-me quem são os seus inimigos e como evitá-los.

Ismael: Quem são os nossos inimigos, pai?

Coelho Maltese: Temos vários. Temos o Javali e o saca-rabos, que são animais grandes e feios e são capazes de ficar horas (som de relógio) escondidos no mato e a caminhar sem fazer barulho, apesar do seu tamanho, e de repente aparecem (som de pandeireta)… e já é tarde de mais.

Ismael: E temos mais inimigos pai?

Coelho Maltese: Sim. Temos a raposa. Ela só ataca de noite, mas é perigosa pois é muito silenciosa e paciente, e podemos não perceber que ela está mesmo ao pé de nós…. (som crescente do tambor)

Narrador: O Ismael ficou cheio de medo (som da águia) e é então que olha para o céu e vê uma águia.

Coelho Maltese: Esta é a águia. Ela vê tudo lá de cima, e se nos vê a sair da toca começa a fazer círculos por cima de nós e mergulha em voo (som de um objecto a cair).

Ismael: E podemos escapar à águia pai?

Narrador: O coelho Maltese explicou que sim, bastava que estivesse atento… E por fim o pai, explicou ao Ismael outro dos seus grandes inimigos… O Homem!

Ismael: E o homem é um animal perigoso?

Coelho Maltese: Sim, os seres humanos são perigosos, mas também são estúpidos?

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Narrador: O Ismael não percebeu a frase, mas o pai explicou-lhe que os Homens estão sempre a falar alto e fazem muito barulho quando caminha (castanholas a fazer o som de passos), logo podem facilmente esconder dele.

Ismael: Mas os homens não têm nada de bom?

Coelho Maltese: Claro que têm!

Narrador: O pai explicou que os Homens podiam comunicar uns com os outros através da escrita, algo que só os seres humanos eram capazes de fazer e entender… os seres humanos e o coelho Maltese!... E ele ensinou ao seu filho.

Durante todo esse ano (som de relógio) o pai ensinou ao Ismael tudo o que sabia, andavam sempre juntos pelo bosque (som dos passos). Pouco tempo depois o Ismael sentia-se feliz, cheio de força e inteligência, pois ao contrário dos outros coelhos e dos outros animais do bosque ele conseguia sobreviver ser problemas.

Do bosque, via-se ao longe umas colinas onde havia uma casa muito grande, que estava meio abandonada, as janelas e as portas raramente abriam e de noite (som das janelas e portas a ranger), via-se uma luz apenas numa ou duas divisões da casa. Vivia lá uma senhora, chamada Luísa, que tomava conta da casa com um cão muito velhote, o Argos. Antes viviam lá mais pessoas, mas tinham-se mudado para a cidade.

Ismael: O que é uma cidade pai?

Coelho Maltese: É um sítio muito grande onde vivem muitos homens e mulheres. Com muita confusão e muito barulho.

Ismael: E eles gostam de viver lá?

Coelho Maltese: Uns sim, outros não!

Ismael: Então, os que não gostam, porque é que vivem lá?

Narrador: Os Homens são estranhos, explicou-lhe o pai, e nem sempre escolhem o que os faz mais feliz!

Como era um coelho curioso, o Ismael começou a aproximar-se cada vez mais da casa, mas um dia que ia distraído acabou por se meter no caminho da Luísa que caiu no chão (som de flauta pendular e pandeireta) e muito zangada disse:

Luísa: Sai daqui coelho de um raio, se não eu vou atrás de ti até te apanhar!... ai as minhas costas! (sons de algo a estalar)

Narrador: Mas o Ismael começou a ganhar o hábito de ir lá todos os dias, e cada vez se aproximava mais e mais, até que num dia de Outono, o Ismael ouviu um som maravilhoso como nunca tinha ouvido.

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Ismael: Uau! Que som tão bonito! Espero que este som nunca mais acabe!... Mas, o som vem de dentro da casa! Vou chamar o meu pai para vir ouvir também (sons do Ismael a correr pelo bosque)!

Narrador: Quando chegou à toca do pai e o levou para ao pé da casa (som de bater à porta com caixa chinesa) para ele ouvir aquele som, ele disse:

Coelho Maltese: Que saudades deste som!... Isto é a melhor coisa que os homens são capazes de fazer, chama-se música!

Ismael: E para que serve a música?

Narrador: O mais incrível é que para esta pergunta o pai não tinha resposta, pois na verdade a música não tem uma função específica! A música só serve para ser ouvida e apreciada!

Entretanto na casa a Luísa conversava com a sua amiga Gertrude.

Luísa: Agora tenho um hóspede cá em casa.

Gertrudes: E quem é ele?

Luísa: É um músico da Polónia, chamado Chopin. Ele está muito doente, passa o dia a tossir, mas todos os dias ao fim da tarde, senta-se a tocar piano horas e horas.

Gertrudes: E o que faz ele aqui?

Luísa: É amigo da minha patroa. E veio para cá para recuperar da sua doença.

Narrador: O Ismael estava curioso, e todos os fins de tarde, ia ouvir o senhor Chopin a tocar. E cada vez se aproximava mais da porta para ouvir melhor. E ali estava o senhor Chopin, curvado sobre o piano, de cabelos despenteados e cara muito séria e triste, e as mãos corriam o piano como se tocassem sozinhas.

Todos os fins de tarde o Ismael ouvia música que parecia voar entre as árvores. E por falar em árvores, estão a ver aquela árvore ali ao fundo, é a eternidade, uma árvore com que o Ismael gostava muito de conversar.

E num dia que o Ismael voltava para casa distraído depois de ouvir a música do senhor Chopin, a eternidade decidiu falar com ele.

Eternidade: Estás muito pensativo Ismael.

Ismael: Que susto! (som do Ismael a cair) Desculpa, estava a pensar noutras coisas!

Eternidade: Eu sei, estavas a pensar na música do senhor Chopin!

Ismael: Sim estava, já não passo sem esta música na minha vida!

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Eternidade: Tens razão Ismael, a música é algo fantástico, pois eu também já não passo sem a música!... Não fiques tão espantado, eu também oiço, ou achas que as árvores não gostam de música?

Ismael: Vocês, arvores, vêm e ouvem tudo?

Eternidade: Sim, nós os castanheiros, podemos viver mais de cem anos sempre a ouvir e a escutar!

Ismael: Mas só podem ver o ouvir o que está à vossa volta, pois não te consegues mexer!... Se pudesses sair daí por um dia, o que gostavas de ver?

Eternidade: O mar (som de água)!... O mar fica muito longe daqui, e é uma espécie de lago, mas é salgado, e é tão grande tão grande que não dá para ver o fim dele!... É uma espécie de lugar mágico que pode ser tranquilo (som da cítara, sinos tubulares e pratos), mas também pode ser muito selvagem (som do tambor, pandeireta e triangulo)!

Narrador: O Ismael despediu-se da eternidade e foi para casa pensar na conversa que tinha tido com a eternidade (som dos passos do Ismael).

Num dos fins de tarde em que o Ismael foi ouvir a música do senhor Chopin, o Ismael ganhou coragem e entrou dentro da sala onde estava o senhor Chopin, para ouvir melhor, e ficou escondido a ouvir. Mas de repente, com um grande estrondo uma rajada de vento fez fechar a porta da sala (Som de vento e do tambor) e com o susto o Ismael saltou bem para o centro da sala, assustando o senhor Chopin que espantado ficou a olhar para ele.

Chopin: Um coelho bravo por aqui?... Não fiques assustado! Vieste à procura de comida?

Narrador: O Ismael estava tão nervoso que se esqueceu que tinha prometido ao pai que nunca diria a nenhum Homem que sabia compreender a língua deles. E abanou a cabeça a dizer que não.

Chopin: Estás a dizer que não? Tu percebes o que eu digo? Tu queres ver que enlouqueci! Tu entendes-me, mas não consegues falar é isso?

Narrador: Chopin estava espantado e nervoso começou a andar pela sala (Som dos passos – caixa chinesa) e durante um pouco ficaram os dois parados a olhar um para o outro.

Chopin: Se não vieste à procura de comida, o que vieste cá fazer? … Viste ouvir música? Sim? A sério? Tu sabes que eu sou? Isto é incrível! Ouve coelhinho, isto vai ser um segredo nosso, ok? Sabes do que tenho pena de não saber o teu nome!

Narrador: O Ismael procura algo na sala que me permitisse comunicar, e então manda o açucareiro ao chão (som do açucareiro a cair) e com o açúcar espalhado escreve o seu nome no chão.

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Chopin: Tu escreves? Ismael é o teu nome!... Ismael também sabes ler e escrever música? Bem Ismael, se continuarmos amigos talvez te possa ensinar, porque essa é a minha profissão, escrever música. Chama-se a esta profissão compositor, sabias? Vou-te dar alguns nomes de alguns dos melhores compositores de sempre: Temos o Mozart que escreveu, por exemplo a “Flauta mágica”, e Bach que escreveu a “tocatta e fuga em ré menor” e temos o Beethoven, que escreveu entre muitas outras obras o “fur Elise”… Por Falar em Beethoven, ainda ontem tive um sonho com ele, vou-te contar como foi: Estava eu a tocar piano e o Beethoven aparece.

----------------Inicio do sonho (Som de cítara e sinos tubulares) -------------------

Beethoven: Chopin, como estás?

Chopin: Beethoven, por aqui?

Beethoven: É verdade, estou de passagem por aqui para dar uns concertos a aproveitei para te visitar. Como estás?

Chopin: Um pouco doente, mas continuo a compor, e sinto que mais cedo ou mais tarde vou compor qualquer coisa de grandioso!

Beethoven: Ainda bem Chopin. Olha, aproveito para te mostrar um trecho da nona sinfonia que vou tocar no meu concerto amanhã, este trecho chama-se o hino da alegria (toca flauta).

--------Acaba o sonho (som de cítara e sinos tubulares) -------

Chopin: Mas, claro que este sonho nunca poderia ser real, pois quando ele morreu eu tinha apenas 14 anos, e ele compôs a nona sinfonia já surdo no seu último ano de vida.

Narrador: Durante todo aquele inverno, o Ismael e o Chopin foram-se tornando cada vez mais amigos, mais estranha amizade não deve ter existido nunca!

Mas o Inverno estava a ser muito rigoroso (som de vento, chuva e trovões) e não estava a fazer nada bem à saúde do Chopin, mas quanto mais doente estava, mais ele trabalhava ao piano sem descanso!

Chopin: Olha Ismael, acho que nunca escrevi uma música tão bonita como esta! Parece uma música para ser ouvida de noite, vou chamar-lhe “Nocturnos” O que achas?... Achas uma boa ideia? Então deixa-me tocar-te a minha nova música.

Ismael: Esta é a melhor música que o Chopin escreveu!

Narrador: Pensou o Ismael enquanto voltava para a sua toca. No entanto no dia seguinte quando chegou à casa para ouvir o senhor Chopin ouviu a Luísa a Conversar com a Gertrudes.

Luísa: Ele está muito doente, e a madame George veio busca-lo para ele ir para a cidade para se tratar!

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George: Coitado! Também, tanta música deve fazer-lhe mal à cabeça.

Ismael: Não, não pode ser. O senhor Chopin não se pode ir embora!.,, Muito menos assim, sem se despedir de mim!

Narrador: O Ismael tentou todo o dia aproximar-se durante dias do Chopin, mas a senhora George não saia de ao pé dele.

George: Não sejas teimoso Frédéric! Estás muito doente, tens que vir embora comigo para seres tratado.

Chopin: Eu não me posso ir embora! Tenho primeiro que acabar os “nocturnos” e tenho que ter primeiro uma conversa com o meu amigo Ismael.

George: Quem é o Ismael? A Luísa disse-me que nunca cá esteve ninguém contigo, que estives-te sempre sozinho a tocar piano. Já estás é a delirar da febre!

Chopin: Não, não estou a delirar! O Ismael existe.

George: Vá, vem descansar!

Narrador: Todos os dias o Ismael rondou a casa, até que ao terceiro, viu que o Chopin estava só na sala, mas tinha com ele malas de viagem e uma cara muito triste.

Chopin: Ismael, ainda bem que chegas-te! Tenho estado à tua espera para te dizer que tenho de me ir embora. Já sabias? Vá, não fiques triste, eu vou ficar bem, tenho é pena de me ir embora e de tu ficares sem música!... Mas tenho uma coisa para ti, um presente. Esta é a partitura dos “nocturnos”, não há nenhuma cópia desta música, e quero que fiques com ela, para passares aos teus filhos e eles passarem aos filhos deles, até que um dia seja entregue aos humanos para que estes possam ouvir a melhor música composta por Frédéric Chopin. Porque os seres vivos vão-se embora deste mundo, mas a música fica para sempre!

Narrador: E assim o Chopin foi embora com a senhora George, e as tardes e as noites ficaram silenciosas (som de grilos)

Ismael: Se não fosse a partitura que o Chopin me deu e que eu guardo como um tesouro, eu ia achar que tuda esta história não tinha passado de um sonho.

Narrador: O tempo foi passando e o Ismael ficou velhinho, e ai escolheu o mais inteligente dos seus filhos e ensinou-lhe tudo o que o seu pai lhe tinha ensinado, e deu-lhe a pauta de Chopin.

Ismael: Um dia, quando for a altura certa, a música há-de ser encontrada e será mostrada aos homens a mais bela de todas as músicas de Chopin, o meu grande e genial amigo!

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