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ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 FASHION LAW E PROPRIEDADE INTELECTUAL: UMA ANÁLISE DOS MÉTODOS DE PROTEÇÃO DE ATIVOS ORIUNDOS DA INDÚSTRIA DA MODA

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PIDCC, Aracaju, Ano VII, Volume 12 nº 01, p.001 a 029 Fev/2018 | www.pidcc.com.br

FASHION LAW E PROPRIEDADE INTELECTUAL: UMA ANÁLISE DOS MÉTODOS DE PROTEÇÃO DE ATIVOS ORIUNDOS DA INDÚSTRIA DA

MODA1 FASHION LAW AND INTELLECTUAL PROPERTY: AN ANALYSIS OF ASSET

PROTECTION METHODS FROM THE FASHION INDUSTRY

FASHION LAW Y PROPIEDAD INTELECTUAL: UN ANÁLISIS DE LOS MÉTODOS DE PROTECCIÓN DE ACTIVOS ORIENTALES DE LA INDUSTRIA DE LA MODA

Cíntia Bell de Oliveira2 Kelly Lissandra Bruch3

RECEBIBO 09/02/2018 APROVADO 18/02/2018 PUBLICADO 12/03/2018 Editor Responsável: Carla Caldas Método de Avaliação: Double Blind Review E-ISSN: 2316-8080 DOI:10.16928 RESUMO A proteção dos ativos oriundos da indústria da moda pela propriedade intelectual é assunto controverso, dadas as especificidades dos métodos de proteção e as características intrínsecas aos produtos do ramo. Nesse contexto, o objetivo do presente trabalho é analisar cada uma das categorias – patente, direito autoral, desenho industrial e marca – a fim de avaliar seus respectivos requisitos e extrair eventual aplicabilidade de cada um deles no contexto da moda. Para tal, foi feita uma análise doutrinária, legal e jurisprudencial que indica os pontos controversos e apresenta os benefícios e as dificuldades relativas a cada um dos métodos de proteção, apontando-se, ao final, de que maneira seria possível aplicar cada um dos métodos ao ramo. Por fim, realizou-se uma análise conjunta dos resultados encontrados com o fito de demonstrar-se que há espaço para a proteção da propriedade intelectual (em todos os seus aspectos) no contexto da moda, como também que é possível selecionar o método de proteção mais adequado a partir do objeto que se pretende proteger e da função que se pretende abarcar. Assim, conclui-se que, em se tratando de matéria-prima ou processo de produção, adequada será a proteção através de patente. Em caso de produto final de caráter artístico, a proteção poderá se dar por direito autoral. O desenho industrial, por sua vez, será aplicável quando a intenção for proteger o aspecto ornamental do produto

1 Este artigo foi extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Direito Econômico e do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel da bacharel Cinta Bell Oliveira. 2 Bacharel em Direito pela UFRGS, [email protected], Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, número de identificação do ORCID, https://orcid.org/0000-0001-5540-1766. 3 Doutora em Direito pela UFRGS, [email protected], Faculdade de Direito e Centro de Estudos e Pesquisas em Agronegócios da Universidade Federal do Rio Grande do Sul número de identificação do ORCID, https://orcid.org/0000-0003-2565-0790, ResearcherID: P-2282-2017.

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particular. Por fim, tanto o produto em si quanto o estabelecimento em geral poderão obter proteção através da marca. Palavras Chave: Direito da Moda. Propriedade Intelectual. Patente. Direito autoral. Desenho Industrial. Marca. Propriedade industrial. Direitos intelectuais. Ativos intangíveis. ABSTRACT The protection of fashion assets by intellectual property is a controversial subject, given the specificities of the protection methods and the intrinsic characteristics of the fashion products. In this context, the objective of this paper is to analyze each of the methods - patent, copyright, design patent and trademark - in order to evaluate their respective requirements and to extract the applicability of each one of them to the fashion context. In this sense, a doctrinaire, legal and case law analysis will be made in order to indicate the controversial aspects of the subject and to determine the benefits and difficulties related to each one of the methods of protection, pointing out, in the end, how it would be possible to apply each one of methods to the fashion context. Finally, a joint analysis of the results will be made with the aim of demonstrating that not only all of the Intellectual Property methods of protection are applicable to fashion assets, but also that it is possible to select the best method of protection from the analysis of the object that will be protected and the functionality that will be secured. Thus, when it comes to raw material or production process, patent protection will be adequate. In the case of an artistic product, the protection may be given by copyright. The design patent will be applicable when the intention is to protect the ornamental aspect of the particular product. Finally, both the product itself and the establishment in general can obtain protection through Trademark. Key-words: Fashion Law. Intellectual Property. Patent. Copyright. Design patent. Trademark. Industrial property. Intellectual rights. Intangible assets. RESUMEN La protección de los activos provenientes de la industria de la moda por la propiedad intelectual es asunto controvertido, dadas las especificidades de los métodos de protección y las características intrínsecas a los productos del ramo. En este contexto, el objetivo del presente trabajo es analizar cada uno de los institutos - patente, derecho de autor, diseño industrial y marca - a fin de evaluar sus respectivos requisitos y extraer eventual aplicabilidad de cada uno de ellos en el contexto de la moda. Para ello se hizo un análisis doctrinal, legal y jurisprudencial que indica los puntos controvertidos de la cuestión y presenta los beneficios y las dificultades relativas a cada uno de los métodos de protección, señalando, al final, de qué manera sería posible aplicar cada uno de los métodos a la rama. Por último, se realizó un análisis conjunto de los resultados encontrados con el fin de demostrar que no sólo hay espacio para la protección de la propiedad intelectual (en todos sus aspectos) en el contexto de la moda, como también que es posible seleccionar el método de protección más adecuada a partir del objeto que se pretende proteger y de la función que se pretende abarcar. Así, se concluye que, en lo que se refiere a materia prima o proceso de producción, adecuada será la protección a través de patente. En caso de producto final de carácter artístico, la protección podrá darse por derecho de autor. El diseño industrial, a su vez, será aplicable cuando la intención es proteger el aspecto ornamental del producto particular. Por último, tanto

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el producto en sí como el establecimiento en general pueden obtener protección a través de la marca. Palabras Clave: Derecho de la Moda. Propiedad intelectual. Pat. Derecho autoral. Diseño industrial. Marca. Propiedad industrial. Derechos intelectuales. bienes intangibles. INTRODUÇÃO

A história da moda atravessa os séculos refletindo os costumes e os acontecimentos da sociedade (PEDROZO, 2015, p. 18). Todavia, a verdadeira difusão da moda ocorreu através da Revolução Industrial, que permitiu a industrialização e a produção em massa da vestimenta (MAIA, 2016, p. 5). A indústria da moda percebeu um crescimento exponencial a partir do século XIX, tendo sido estimada em 2,4 trilhões de dólares no ano de 20174. Somente no Brasil, em 2017, o faturamento da cadeia têxtil e de confecção atingiu 45 bilhões de dólares5. É inegável, portanto, a importância social e econômica desse segmento da indústria, de maneira que não causa surpresa o interesse, o desenvolvimento e a especialização do Direito nessa área de atuação.

Antes de adentrar no mérito do estudo, cabe destacar que, ao falar-se em indústria da moda, está-se fazendo referência a um contexto global que abarca não só os produtos finais de conhecimento do público em geral – como roupas, sapatos e acessórios –, mas sim todas as etapas, processos, origens e materiais que resultam nesse produto final. Sendo assim, a indústria da moda referida no presente estudo engloba o processo de produção da matéria-prima, as novas tecnologias envolvidas na confecção de materiais, as disposições criativas e originais desses materiais, as novas formas de apresentação dos produtos finais, a distinguibilidade entre os estabelecimentos comerciais do meio e tudo que pode ser envolvido pelo universo fashion.

Feita essa consideração, passa-se ao tema geral do presente trabalho. Fashion law, ou Direito da Moda, não é um ramo do direito propriamente dito, mas sim um conjunto de conhecimentos provenientes de diversas áreas aplicados especificamente a este contexto multifacetado da indústria da moda. Dentre as matérias abarcadas pelo Fashion law estão propriedade intelectual, contratos, direito internacional, direito do consumidor, direito do trabalho, direitos humanos, dentre outras. Trata-se, portanto, de uma área cujo objeto originalmente exige uma abordagem interdisciplinar.

Nesse sentido, o tema específico da monografia é a análise do Direito da Moda por meio da ótica da propriedade intelectual, visando a responder a seguinte pergunta: quais são os métodos de proteção de propriedade intelectual mais apropriados para cada ativo intangível6 oriundo do ramo da moda, no âmbito do Direito Brasileiro?

O objetivo geral do trabalho é analisar a legislação e a doutrina especializada, a fim de verificar como cada categoria da propriedade intelectual pode responder como método de proteção dos bens intangíveis relacionados à moda.

Os objetivos específicos compreendem a análise de quatro métodos de proteção abarcado pelos direitos de propriedade intelectual, notadamente patentes de invenção, direitos autorais, desenho industrial e marcas, para verificar como cada um deles

4Disponível em http://economia.ig.com.br/2017-02-02/mercado-da-moda.html. Acesso em 10/12/2017. 5 Disponível em http://www.abit.org.br/cont/perfil-do-setor. Acesso em 10/12/2017. 6 Conforme explanado por Bruch (2006, p. 16), “a propriedade intelectual se constitui do conjunto de princípios e de regras que regulam a aquisição, o uso, o exercício e a perda de direitos e de interesses sobre ativos intangíveis diferenciadores que são suscetíveis de utilização no comércio”.

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poderia ser inserido no contexto da indústria da moda; a análise dos benefícios que podem ser trazidos de cada um dos métodos para a proteção dos ativos intangíveis relacionados com moda; a compreensão de quais dificuldades cada um dos métodos apresenta nesta aplicação; e a apresentação das adequações que cada método apresenta para a proteção dos ativos intangíveis relacionados com moda;

Como será demonstrado ao longo do presente trabalho, cada método de proteção possui objetos, funções e requisitos diferenciados, os quais por muitas vezes vão de encontro à pretensão de proteção dos produtos oriundos da indústria da moda. De maneira diversa, observar-se-á que, em determinadas ocasiões, os métodos podem se sobrepor, sendo possível a proteção concomitante através de mais de uma categoria para uma mesma criação, embora cada qual apresente funções diferentes.

Não bastasse a controvérsia acerca da viabilidade de proteção dos ativos intangíveis relacionados com moda pela propriedade intelectual, considerando seus requisitos formais, há, ainda, uma ampla discussão acerca da real necessidade dessa proteção, levando-se em conta o salutar funcionamento do mercado e as práticas concorrenciais.

Assim, há quem defenda que a indústria da moda paradoxalmente prosperou através das cópias, que estimularam a inovação e a competição. Nesse sentido, Raustiala e Springman, no renomado artigo “The Piracy Paradox: Innovation and Intellectual Property in Fashion Design” (traduzido livremente como “O Paradoxo da Pirataria: Inovação e Propriedade Intelectual no Design de Moda”), publicado na revista Virginia Law Review em dezembro de 2006, afirmam que, mesmo estando os principais produtos da indústria fora do âmbito de proteção da propriedade intelectual, o segmento desenvolve uma variedade significativa de roupas e acessórios em uma velocidade surpreendente, motivo pelo qual não haveria necessidade de se conferir proteção adicional a esses artigos.

Por outro lado, há quem sustente que a ausência de direitos de propriedade intelectual no ramo incentiva os copiadores e desencoraja investimentos em novas criações. Esses afirmam que as cópias reduzem a rentabilidade dos produtos originais, prejudicando o mercado, bem como impedem que os criadores de designs inovadores sejam devidamente ressarcidos pela comercialização dos produtos que desenvolveram. Em resposta ao artigo publicado por Raustiala e Springman acima referido, Hemphill e Gersen, em sua publicação “The Law, Culture, and Economics of Fashion” (traduzida livremente como “A Lei, Cultura e Economia da Moda”), publicada na revista Stanford Law Review em março de 2009, apontam que os opositores ao regime de proteção erroneamente deixam de diferenciar os fenômenos de “close copying” e “shared trends”, tratando-os como equivalentes.

Conforme explica Furri-Perry (2013, p. 17) “a cópia fiel é uma cópia linha-a-linha de um design e parece quase, se não exatamente, idêntica ao design original, enquanto cópia interpretativa é um design original que segue uma tendência atual”7. Assim, a propriedade intelectual, para esses autores, deveria ser utilizada como forme de prevenir o fenômeno do “close copying”.

No entanto, cumpre frisar, desde já, que o presente trabalho não pretende analisar aspectos mercadológicos, como concorrência desleal, ou mesmo as consequências econômicas advindas de eventual proteção por propriedade intelectual dos ativos intangíveis relacionados à moda, bem como não procura estabelecer se a proteção é de

7 “[…] close copy is a line-by-line copy of a design and looks almost if not exactly identical to the original design, while an interpretational copy is an original design itself that follows a current trend.” Tradução nossa.

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fato imprescindível ou não. Nesse sentido, o estudo visa somente analisar os métodos de proteção e verificar a adequação de cada um deles aos produtos do ramo, estabelecendo se há ou não a possibilidade de lançar-se mão desses instrumentos no contexto.

O método utilizado no desenvolvimento do artigo é o exploratório e a técnica de pesquisa empregada é a revisão bibliográfica e legislativa (constitucional e infraconstitucional), bem como a análise jurisprudencial, que permite a compreensão do problema. Nesse sentido, levando-se em conta a novidade do tema e a consequente escassez de doutrina específica, são analisadas posições acadêmicas obtidas por meio de artigos publicados tanto em revistas especializadas quanto em anais de congressos. Ainda, é dado destaque a decisões judicias nacionais e internacionais relacionadas à matéria, a fim de demonstrar-se como a jurisprudência tem lidado com a questão.

Nesse sentido, frisa-se que, em que pese se tenha recorrido à doutrina e à jurisprudência estrangeira a fim de melhor explicar as controvérsias e entendimentos aplicáveis (visto que o Fashion law foi desenvolvido inicialmente nos Estados Unidos e na Europa, sendo trazido para o Brasil apenas recentemente), o presente estudo não pretende fazer uma análise de direito comparado, mas sim trazer um panorama geral da relação entre direito, moda e propriedade intelectual, destacando principalmente a legislação nacional. Importa, ainda, esclarecer que o trabalho não tratará da doutrina do “trade-dress” ou “conjunto-imagem”, o qual envolve diversas facetas da propriedade intelectual aplicadas simultaneamente, resultando em uma concepção integrada que afeta todos os âmbitos de uma empresa.

Por fim, destaca-se que a presente pesquisa tem como objetivo fomentar o debate relacionado ao tema, apresentando os bônus e os ônus de cada método de proteção para os artefatos provenientes da indústria da moda, constatando que não há uma única e correta resposta definitiva para o problema apresentado. 1. PATENTE

O presente item fará uma análise acerca das particularidades do instituto jurídico da patente, a fim de averiguar a viabilidade da utilização desse método de proteção da Propriedade Industrial no contexto da indústria da moda. Ao final, demonstrar-se-á para que nicho da indústria esse método de proteção é mais viável e adequado. 1.1 Método

As invenções 8 são protegidas, em termos de Propriedade Industrial, pela categoria denominada de patente, prevista tanto no art. 5, inciso XXIX da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/1988) quanto no art. 8 da Lei nº 9.279/1996.

Para que seja caracterizada como invenção9, a solução a ser protegida deve preencher três requisitos básicos: novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. Barbosa (2002, p. 1-2) define os referidos pressupostos técnicos da seguinte maneira:

8 “Uma invenção pode ser definida como a solução de um problema técnico não encontrável na natureza” (SILVEIRA, 2014, p.80). 9 Cumpre destacar a diferença entre invenção e descoberta: “enquanto a invenção é uma criação nova, a descoberta é a mera revelação de algo que já se encontrava na natureza.” (LABRUNIE; JABUR; SANTOS, p. 101-102).

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a. Novidade - que a tecnologia ainda não tenha sido tornada acessível ao público, de forma a que o técnico, dela tendo conhecimento, pudesse reproduzi-la. b. Atividade Inventiva - que a inovação não decorra obviamente do estado da arte, ou seja, que o técnico não pudesse produzi-la simplesmente com o uso dos conhecimentos já acessíveis. c. Utilidade Industrial - que a tecnologia seja capaz de emprego, modificando diretamente a natureza, numa atividade econômica qualquer.

No Brasil, existem dois tipos de patente: as patentes de invenção e as patentes de

modelo de utilidade. Patente de invenção é aquela conferida ao produto ou procedimento inteiramente novo, cuja estruturação constitui uma “solução para um problema técnico existente” (LABRUNIE; JABUR; SANTOS, 2007, p. 104). Patente de modelo de utilidade é aquela conferida ao objeto (ou parte desse) cuja aplicação resulta em uma melhoria técnica a um invento anteriormente criado (OMPI; INPI, 2016, Módulo 7, p. 2).

Pode-se dizer que o objetivo maior visado pela obtenção de um registro de patente é a exclusividade temporária conferida ao inventor para exploração do invento. Nesse sentido, a patente pode ser vista como uma forma de recompensa ao investimento e tempo gastos com o fito de se desenvolver a nova tecnologia. O Estado, por sua vez, utiliza o instituto da patente como forma de estímulo, visto que as novas criações serão utilizadas na indústria nacional, fomentando a economia (LABRUNIE; JABUR; SANTOS, 2007). 1.2. Benefícios conferidos pelo instituto

No que diz respeito à esfera particular do inventor, um dos principais benefícios conquistados mediante a obtenção de uma patente é a exclusividade de exploração do invento (produção, uso e comercialização) que lhe é conferida. Esse poder sobre a criação dá ao criador uma vasta gama de possibilidades, as quais incluem a cessão e o licenciamento oneroso do bem protegido, consoante artigos 58 e 61 da LPI.

Todavia, cumpre destacar que eventual abusividade na conduta exploratória poderá acarretar no licenciamento compulsório da patente (art. 68), caso haja comprovação, por exemplo, de ausência de uso do bem, ou mesmo abuso de poder econômico.

1.3. Dificuldades de aplicação à indústria da moda

A obtenção de um registro de patente de invenção ou modelo de utilidade no contexto do Direito da Moda pode ser considerada como uma exceção à regra. Tal fenômeno pode ser explicado por diversos fatores, sendo o primeiro deles a disposição constante no art. 10, IV, da LPI, referente a não consideração como invenção ou modelo de utilidade as obras literárias, arquitetônicas, artísticas e científicas ou qualquer criação estética.

Levando-se em conta que os produtos finais da indústria da moda (roupas, calçados, acessórios em geral) são fundamentalmente criações estéticas, por vezes sendo caracterizadas como artísticas, fica clara a barreira presente no caso: tais criações sequer podem ser consideradas, de acordo com a legislação nacional, invenções ou modelos de utilidade, inviabilizando seu registro através da patente.

Além disso, a proteção desses bens mediante patente encontra óbice em um de seus pilares fundamentais: o requisito da novidade, descrito por Barbosa como “a essência da protectibilidade da solução técnica” (2002, p. 2).

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De outra forma, as próprias características do processo para obtenção de uma carta-patente dificultam a busca por essa forma de proteção no contexto da indústria da moda.

Em primeiro lugar, importa frisar que se trata de um setor extremamente dinâmico, cujas mudanças ocorrem em uma velocidade considerável, ao passo que os procedimentos formais para obter-se uma patente, no Brasil, podem demorar até onze anos10. Mesmo em países nos quais o backlog11 é consideravelmente inferior, como nos Estados Unidos, onde o tempo de espera é de aproximadamente dois anos12, ainda assim o procedimento não é rápido o suficiente para atender às necessidades de um setor que se renova a cada nova estação do ano, quando são lançados os novos produtos em agrupamentos conhecidos como coleções, conforme ressalta Maia (2016).

Em segundo lugar, o processo é não só demorado, como também custoso. O valor da anuidade aumenta conforme o passar do tempo, permanecendo a obrigatoriedade de pagamento anual após a concessão da carta-patente. Desta forma é fácil compreender o porquê de a onerosidade estar relacionada a pouca procura por esse método de proteção em um contexto tão efêmero. Novamente, essa não é uma característica exclusiva da realidade brasileira, sendo mencionada tanto por Herzeca e Hogan (2013, p. 194) quanto por Jimenez e Kolsun (2014, p. 61) em relação ao contexto norte americano.

1.4. Adequação

Não obstante as dificuldades narradas no subtópico anterior, cabe grifar que o instituto da patente não é de todo estranho à realidade da indústria da moda. Isso porque, em que pese os produtos finais como roupas, acessórios e sapatos estejam distantes dos requisitos e procedimentos inerentes a tal método de proteção, de maneira diversa se mostram as matérias-primas que podem ser utilizadas para sua confecção.

A inovação na indústria têxtil ganha cada vez mais espaço no cenário mundial, sendo que esse incentivo pode encontrar sua origem nas mais diversas motivações de mercado: produtos destinados a melhorar a performance de atletas de alto desempenho, produtos sustentáveis, produtos destinados a facilitar a recuperação de uma condição médica, produtos com a finalidade de aprimoramento estéticos, etc.

Nesse contexto, a busca por patentes destinadas a proteger tais criações técnicas vem aumentando, visto que a possibilidade de se obter exclusividade na confecção e comercialização de tais produtos – ou fornecer licenças para que terceiros o façam, obtendo-se os devidos royalties – é uma vantagem de mercado, a qual já foi apontada pela própria Organização Mundial da Propriedade Intelectual em sua publicação “Um ponto no tempo: o uso inteligente da Propriedade Intelectual por empresas do setor têxtil” (OMPI, 2005, p. 6).

Diversos são os exemplos que podem ser mencionados a fim de elucidar a relevância das patentes para o setor têxtil e, consequentemente, para a indústria da moda. A empresa dinamarquesa Novozymes possui mais de 4.200 patentes e pedidos de patentes relacionados majoritariamente ao uso de enzimas para tratamento de tecidos (OMPI, 2005, p. 6); a empresa italiana Grindi Srl detém a patente do tecido Suberis,

10 1Informação disponível em http://www.portaldaindustria.com.br/agenciacni/noticias/2014/04/brasil-ocupapenultima-posicao-em-ranking-de-patentes-validas/. Acesso em 15/10/2017. 11 Termo utilizado para designar a demora no processo de obtenção de uma patente. 12 Informação disponível em http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2016/09/brasil-leva-ate-11- anos-para-conseguir-aprovar-patente-de-um-produto-novo.html. Acesso em 15/10/2017.

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fabricado a partir de cortiça, conhecido por ser leve, macio, lavável, resistente a manchas e à prova de fogo e água (OMPI, 2005, p. 6); a Crocs, Inc. possui a patente relativa ao seu famoso calçado feito de espuma, registro esse que foi considerado válido pela U.S. Court of Appeals for the Federal Circuit, órgão colegiado de segundo grau estadunidense, por se tratar de um design não óbvio (HERZECA; HOGAN, 2013, p. 190); a Nike, Inc., que desenvolveu produtos em parceria com a Apple, “patenteou inserções de sapato e outros dispositivos para rastrear as coordenadas de GPS, frequências cardíacas e outros indicadores corporais dos corredores enquanto o usuário faz exercícios”13 (HERZECA; HOGAN, 2013, p. 192).

Todavia, é importante destacar que a obtenção de patentes no contexto brasileiro é, em geral, um desafio, não estando as criações técnicas oriundas da indústria da moda imunes a essa realidade. Um exemplo negativo a ser mencionado envolve a busca por patentes referentes ao desenvolvimento de novos tecidos sustentáveis, os quais a princípio estariam de acordo com os requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial inerentes ao instituto.

A partir de uma análise dos dados disponíveis no Banco de Patentes do INPI14, realizada com base em diversas combinações de termos afins, como, por exemplo, “tecidos sustentáveis /biodegradáveis /ecológicos” 15 , foram encontradas onze patentes16, dentre as quais duas ainda constam como pedidos, não havendo decisão definitiva sobre a concessão, e nove constam como arquivadas, todas com base nos mesmos dois artigos da Lei nº 9.279/96: o art. 33, referente a falta de pedido de exame de patente (que deve ser feito após 36 meses do depósito do pedido), e o art. 86, referente a falta de pagamento de anuidades.

Conclui-se, portanto, que, em que pese o instituto da patente seja teoricamente adequado para promover a proteção de parte das criações oriundas da indústria da moda – no caso, criações técnicas relacionadas à indústria têxtil, e não ao produto final comercializado no ramo –, é necessário que se faça um estudo prévio para que se avaliem os ônus e os bônus desse método de proteção, a fim de concluir-se pela necessidade do registro, dadas as dificuldades na sua obtenção, em especial no cenário brasileiro.

2. DIREITO AUTORAL

O segundo item do presente estudo versa sobre a categoria Direito Autoral e sua relação conturbada com a indústria da moda. A partir da análise da legislação específica, da orientação doutrinária e do posicionamento jurisprudencial, buscar-se demonstrar quais características deve necessariamente conter a obra para obter proteção mediante direito de autor, bem como se seria possível identificar tais características nas criações oriundas da indústria da moda.

2.1. O método

13 “Nike, Inc. [...] has patented shoe inserts and other devices to track the GPS coordinates, heart rates and other bodily indicators of runners while the wearer exercises”.Tradução nossa. 14 SALÃO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UFRGS, XXVIII, 2016, Porto Alegre. Tecidos Sustentáveis: Viabilidade de Registros de Patentes no Brasil no Contexto do Fashion Law. Anais... Porto Alegre: UFRGS, 2016. 15 As expressões foram utilizadas tanto no título quanto no resumo, sem que tenha sido estabelecido período determinado. 16 BR 10 2012 016007 2 A2; C1 0400442-6 E2; PI 0800441-2 A2; PI 0701110-5 A2; PI 0400442-6 A2; MU 8902536-9 U2; MU 8901699-8 U2; PI 0609479-1 A2; PI 0105900-9 A2; BR 10 2014 025807 8 A2; PI 0700950-0 A2.

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Carlos Alberto Bittar (2015, p. 27) ao conceituar Direito de Autor, o define como sendo “o ramo do Direito Privado que regula as relações jurídicas advindas da criação e da utilização econômica de obras intelectuais estéticas e compreendidas na literatura, nas artes e nas ciências”. Em suma, são protegidas por direito autoral as obras intelectuais que refletem uma “criação do espírito”, devendo necessariamente ser expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, conforme art. 7 da Lei n. 9.610/1998. Assim, meras ideias não possuem o condão de obter tal proteção, de acordo com o art. 8, I, da Lei n. 9.610/1998.

De pronto, importa frisar a diferença crucial entre o direito autoral e a patente: enquanto no segundo caso são protegidas as invenções novas, que possuem atividade inventiva e aplicação industrial, sendo terminantemente excluídas do âmbito de proteção as criações estéticas, no primeiro caso, pelo contrário, a estética se mostra como um elemento fundamental da obra a ser protegida, conforme Bittar (2015).

Em relação aos requisitos necessários à proteção através de direito autoral, Barbosa, Souto Maior e Ramos (2010, p. 430 e seguintes) estipulam sete: deve o autor da obra ser uma pessoa humana17, o resultado final da criação deve ser passível de imputação ao autor, a obra deve necessariamente ser uma criação intelectual, a obra deve ser externalizada em algum meio, a criação não pode ser elencada nas proibições legais (art. 8º da Lei 9.610/98 – Lei de Direitos Autorais - LDA), deve haver novidade na criação (no sentido de não ser cópia de uma obra pré-existente) e a obra deve possuir contributo mínimo, que, para os doutrinadores, seria “o mínimo grau criativo necessário para que uma obra seja protegida por direito de autor” (BARBOSA, SOUTO MAIOR e RAMOS, 2010, p. 281).

Sobre tal classificação, cumpre frisar que, em que pese os autores citem expressamente o requisito da “novidade” como sendo referente à vedação de cópia de obra pré-existente, o melhor termo a ser empregado no caso seria “originalidade”. Isso porque, conforme abordado já abordado, nova é a obra que jamais foi antes percebida no mundo, sendo totalmente única do início ao fim, enquanto original é a obra que apresenta traços de esforço mínimo de seu criador, distinguindo-a de obras pré-existentes, conforme preceitua Esteves (2013). Em que pese não seja levado em conta o mérito da obra a ser protegida – não se valora a sua qualidade, uma vez que se trata de questão subjetiva (BITTAR, 2015, p. 46) – é imprescindível que a criação seja original, a fim de que possa ser percebida como uma criação artística.

Os artigos 7º e 8º da LDA elencam, respectivamente, as obras que podem ser protegidas pelo direito de autor e aquelas que não podem. Em que pese o caráter exemplificativo do art. 7º seja consensual, a possível taxatividade do art. 8º não é pacificada pela doutrina. Nesse sentido, Barbosa (2013, p. 275) aponta que a lei brasileira, deixou de “definir positivamente o seu objeto”, abrindo uma ampla margem de criações que possivelmente poderiam ser resguardadas pelo direito de autor. O entendimento de que o rol do art. 8º poderia ser exemplificativo também é adotado por Crivelli (2012, p. 51-52), que aduz que importa analisar o requisito da originalidade para que se discipline quais obras poderiam ou não ser excluídas da proteção do direito de autor.

Portanto, pode-se concluir que a legislação brasileira permite que haja certa margem de interpretação quanto às obras que poderiam ser protegidas pelo instituto,

17 Embora comecem a surgir controvérsas a este respeito.

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enquanto procura determinar expressamente aquelas que não poderiam, em que pese parte da doutrina afirme que o rol do art. 8º não deveria ser interpretado restritivamente.

2.2. Benefícios conferidos pelo instituto

Em primeiro lugar, para os direitos autorais não há necessidade de um registro formal da obra intelectual a ser protegida (art. 18 da LDA), bastando a mera externalização da criação por qualquer meio, torna o método por muitas vezes gratuito e de fácil acesso.

Todavia, caso seja de interesse do autor, o registro formal pode ser realizado, conforme for sua natureza, perante a Biblioteca Nacional, a Escola de Música, a Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Instituto Nacional do Cinema, ou o Conselho Federal Arquitetura e Urbanismo, a fim de se assegurarem os direitos18.

Cabe grifar que o direito de autor não reconhece limites territoriais, em especial a partir da entrada em vigor da Convenção de Berna, assinada por 175 países19, a qual impõe o tratamento nacional para todos os signatários.

Ressalta-se também que o mérito e a qualidade da obra não são levados em consideração para fins de atribuição de direitos de autor. Esse critério é de suma importância, pois qualquer tentativa de atribuição de juízo de valores para fins de concessão de proteção mediante direito autoral poderia prejudicar de maneira desproporcional o criador. A decisão sobre a qualidade da obra é invariavelmente impregnada de subjetividade, não podendo o legislador se basear em critérios tão abstratos para definir o objeto de proteção do instituto (BITTAR, 2015, p. 46). Esse também pode ser considerado um benefício inerente a essa forma de proteção, pois não precisa o autor se ocupar com as características particulares de sua criação, desde que respeitadas as vedações constantes no art. 8º da Lei 9.610/98.

Especificamente no que diz respeito à indústria da moda, em especial em relação à produção em larga escala praticada por diversas empresas do setor, faz-se mister destacar um ponto interessante trazido por Pedrozo (2015, p. 21), que aduz que “o fato de haver a reprodução de obras não as exclui de serem obras artísticas, pois as mais conhecidas e mais protegidas são as que possuem em sua própria espécie a fabricação em série, como os livros, discos, filmes, etc.”. Assim, o fato de haver produção em larga escala, por si só, não seria hábil a afastar a possibilidade de incidência de direito de autor sobre as criações da moda.

Outro atrativo do direito autoral é o tempo de proteção concedido à obra intelectual. Durante toda a sua vida o autor detém os direitos patrimoniais e morais sobre a sua obra, sendo que, após a sua morte, os seus herdeiros ainda serão detentores dos direitos patrimoniais e parte dos direitos morais (art. 24, §1º da LDA) por mais setenta anos, contados de 1° de janeiro do ano subsequente ao de seu falecimento.

Nesse sentido, o próprio caráter dúplice da proteção por direito autoral, abrangendo tanto direitos patrimoniais quanto morais, é uma inegável vantagem em relação às outras formas de proteção da Propriedade Intelectual.

18 Conforme a Lei 9.610 (BRASIL, 1998, art. 19) e a Lei 5.988 (BRASIL, 1973, art. 17 caput e §1º). Destaca-se que, com a divisão do CONFEA e a separação da Arquitetura (agora representada pelo CAU, segundo a Lei 12.378/2010), há uma discussão sobre qual dos dois órgãos poderia realizar o registro. 19 Disponível em http://www.OMPI.int/export/sites/www/treaties/en/documents/pdf/berne.pdf, acesso em 05/11/2017.

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Além disso, existência de direitos extrapatrimoniais confere ao criador um poder muito mais amplo sobre a criação e sobre a forma como a criação pode ser tratada. No caso do direito da moda, considerando-se a hipótese de uma réplica de pior qualidade feita por um concorrente, poderia ser debatida não só a questão de eventuais perdas patrimoniais decorrentes da comercialização do produto, como também poderia o criador obter vantagem pecuniária pela mera violação à integridade de sua criação, segundo Skibinski (2017, p. 56).

Por fim, é de extrema relevância frisar que, em relação aos produtos oriundos da indústria da moda, objetos do presente estudo, não há qualquer vedação expressa prevista no art. 8º da LDA. Em que pese seja discutível o caráter taxativo do rol elencando no artigo, conforme já mencionado, a mera ausência de menção a tais produtos depõe a favor de sua proteção por direito autoral, desde que respeitados os requisitos de criatividade e originalidade na confecção da obra.

2.3. Dificuldades de aplicação à indústria da moda

A principal dificuldade em relação à proteção de artigos de moda por direito autoral é a questão do caráter utilitário de tais bens. A bipartição da Propriedade Intelectual entre Direito Autoral e Propriedade Industrial é fundamentada no critério da utilidade, de maneira a conferir às criações utilitárias proteção através de patentes, desenhos industriais e marcas.

Nesse sentido, parte da doutrina defende que as obras passíveis de proteção por direito autoral não podem possuir caráter utilitário, como invariavelmente possuem os bens da indústria da moda – roupas, calçados, bolsas, etc. Esse entendimento é consubstanciado por Cerqueira (2012, p. 207). Da mesma forma se posicionam Rosina (2014, p. 108-109), ao dispor que “uma camisa, por ser um objeto funcional, não pode ser protegida por direito autoral, mas a estampa do tecido utilizado para fazer a camisa sim”. Assim também Maia (2016, p. 09).

No entanto, tal posicionamento não é unânime. Jabur e Santos (2014, p. 221) afirmam que “as obras utilitárias também podem ser protegidas pelo direito de autor, pois a lei não veda a finalidade utilitária da obra, somete exige que exista uma finalidade também estética”. Rocha (2003, p. 28) sustenta que os objetos utilitários e de design que provocam “emoção estética” são obras artísticas e, portanto, podem ser protegidas por direito de autor. Bittar (2015, p. 45-46), ao diferenciar obras de finalidade estética de obras utilitárias, faz uma ressalva em relação à “obra de arte aplicada”, a qual ensejaria proteção tanto por direito autoral quanto pelos métodos relativos à propriedade industrial, em especial o desenho industrial.

Em relação a tal debate, a Comissão Especial de Propriedade Imaterial da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de São Paulo, se posicionou no seguinte sentido (ALVARENGA; ABRÃO, 2006, p. 92):

Resumidamente, concluíram que quando se tratar de forma necessária para a obtenção de um resultado técnico, não existe proteção autoral, sendo protegível somente como desenho industrial, observadas as condições de registrabilidade: novidade e originalidade; havendo valor artístico separável da utilidade, a proteção se dá tanto por registro de direito autoral quanto por de desenho industrial (cumulatividade de proteções).

Quanto a tal colocação, cumpre frisar que a expressão “resultado técnico” foi mal empregada, pois, conforme será abordado no tópico subsequente, a proteção conferida

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pelo desenho industrial se limita ao caráter estético do objeto, não abarcando seu resultado técnico (o que somente poderia ser feito através de patente de invenção). Todavia, tem-se que a ideia geral do posicionamento seria determinar que a criação será passível de proteção por direito autoral somente quando demonstrar valor artístico, ao passo que, se houver somente uma espécie de variação da forma comum que seja original, o item será protegido por desenho industrial.

Além da questão da utilidade dos artefatos, a proteção dos bens oriundos da indústria da moda por direito autoral também pode encontrar óbice no requisito legal da originalidade. Abrão (2014, p. 571) sustenta que o direito autoral não seria aplicável à indústria da moda, pois se trata de um setor extremamente dinâmico, que sofre alterações muito rápidas e cujos produtos sempre são baseados em alguma tendência preexistente.

Todavia, conforme Bittar (2015, P. 47), a originalidade possui caráter relativo:

Ademais, apresenta a originalidade caráter relativo, não se exigindo, pois, novidade absoluta, eis que inexorável é, de um modo ou outro modo, o aproveitamento, até inconsciente, do acervo cultural comum. Basta a existência, pois, de contornos próprios, quanto à expressão e à composição, para que a forma literária, artística ou científica ingresse no circuito protetor do Direito de Autor.

Esse entendimento também é sustentando por Skibinski (2017, p. 56) e pela

doutrina estrangeira, conforme exposto por Herzeca e Hogan (2013, p. 263). Portanto, em que pese haja divergência quanto à aplicabilidade do direito autoral

aos produtos oriundos da indústria da moda, é possível concluir que a corrente majoritária, encabeçada por Ascensão e Bittar, defende que, ao menos em certas circunstâncias, quando houver relação intrínseca entre o caráter artístico e utilitário do produto seja preenchido, ainda que minimamente, o requisito da originalidade, é possível tal proteção, combinada ou não com a proteção através da propriedade industrial.

2.4. Adequação

Em que pese não haja impedimento formal de proteção de criações da indústria da moda por direito autoral, conforme demonstrado acima, há que se destacar que o instituto não possui ampla aplicabilidade no setor estudado. Para que se determine a viabilidade de proteção por esse método é necessário fazer um estudo crítico do objeto a ser protegido a fim de se concluir por sua originalidade.

Um dos conflitos judiciais mais famosos relacionados ao direito autoral e ao direito da moda foi o travado entre a grife de luxo francesa Hèrmes Internacional e a empresa brasileira Village 284. Em 1984, após uma conversa durante uma viagem de avião entre o chefe executivo da Hèrmes, Jean-Louis Dumas, e a atriz e cantora Jane Birkin, o empresário decidiu criar uma bolsa em sua homenagem, a Birkin bag, cujo design à época era extremamente inovador e singular20. A inconfundível bolsa acabou por se tornar um ícone de moda cobiçado por celebridades e almejado por pessoas de todas as nacionalidades, o que lhe conferiu um status diferenciado no ramo.

Ocorre que, em 2010, a grife brasileira Village 284 lançou uma coleção de produtos intitulada “I’m not the original” (“eu não sou a original”, em tradução livre), na qual constava uma bolsa cujo design era exatamente o mesmo que o da Birkin bag,

20 Histórico extraído da página oficial da Maison Hèrmes, disponível em: https://www.hermes.com/us/en/story/106191-birkin/. Acesso em 05/11/2017.

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porém confeccionado com tecido de moletom, custando em média R$400,00 (em contraponto ao preço de uma Birkin original, que custa em média R$30.000,00). Assim, a Hèrmes notificou a empresa extrajudicialmente, requerendo a cessação da comercialização do produto, haja vista a violação de seus direitos autorais e a concorrência desleal.

A Village 284, por sua vez, interpôs ação que tramitou na 24ª Vara Cível da Comarca de São Paulo, buscando a declaração de inexistência de relação jurídica derivada de suposta relação de direito autoral e de concorrência desleal, alegando já ter a Birkin bag caído em domínio público. A Hèrmes contestou a ação e propôs Reconvenção sustentando que a Village 284 fez uma cópia exata de seu modelo consagrado objetivando o lucro, ao passo que a Village respondeu à Reconvenção questionando a existência de um registro de desenho industrial da bolsa, o qual de qualquer maneira já teria caído em domínio público, bem como refutando a incidência de direito de autor por ser a bolsa fabricada industrialmente e por ter sido criada por Jean-Louis Dumas, e não pela Hèrmes.

Em sede de sentença, o juiz João Omar Marçura decidiu que, no caso, era cabível a proteção por direito autoral, já que (i) Jean-Louis Dumas criou a bolsa nos exercícios de suas funções, (ii) a Birkin bag detém valor por sua natureza artística, sendo uma verdadeira obra de arte, de maneira que seu aspecto funcional figura em segundo plano, e (iii) observou-se cópia servil do produto com o fito de confundir a clientela. Assim, foi reconhecida a proteção do produto por direito autoral e determinada a cessação da produção e comercialização da bolsa da Village 284, tendo sido a sentença mantida em segundo grau21

O reconhecimento da viabilidade de proteção de produtos oriundos da indústria da moda por direito autoral também se deu em diversos outros casos, como, por exemplo, João Batista Castilhos da Rocha vs. Arezzo22 e Gilson Pereira Martins (G Blues Indústria e Comércio) vs. C&A23. Em ambos os casos os produtos objeto de disputa tratavam-se de criações artísticas singulares – João Batista desenvolveu artefatos através de técnica de marchetaria, utilizando instrumentos por ele criados, enquanto Gilson Pereira criou bolsas em formatos inusitados, como boca e chinelo – e foi arguido, em sede de contestação, a inaplicabilidade do direito de autor por serem criações utilitárias ou não exclusivas. Ambas as sentenças reconheceram o caráter artístico dos produtos e sua originalidade, de maneira a viabilizar a proteção através de direito autoral

Por outro lado, no caso Puket (IMB Têxtil) vs. C&A24, no qual a Requerente alegou violação ao seu direito autoral por confecção de linha de lingerie e meias contendo estampas de “carinhas estilizadas”, as decisões de primeiro e segundo grau25 foram categóricas ao refutar tal possibilidade, uma vez que inexistente a originalidade, pois, conforme sustentado em sede de contestação, tratava-se de tendência de mercado.

21 Apelação Cível nº 0187707-59.2010.8.26.0100, 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. 22 Processo nº 001/1.05.0034980-4, Vara Cível do Foro Regional Partenon da Comarca de Porto Alegre/RS 23 Processo nº 0072174-63.2004.8.19.0001, 6ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro/RJ 24 Processo nº 0010660-44.2003.8.26.0068, 6ª Vara Cível da Comarca de Barueri/SP. 25 Apelação Cível nº 9111351-15.2006.8.26.0000, 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

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Ainda, foi disposto que a confecção de tal forma se tratava de mera ideia, não sendo passível de proteção por direito autoral.

Conclui-se da análise dos casos supracitados que, em respeito à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, só foi reconhecida a incidência de direito autoral nos casos em que demonstrada irrefutavelmente a originalidade e criatividade na confecção do produto discutido, gerando uma obra inegavelmente artística, visto que “estilos, métodos ou técnicas não são objeto de proteção intelectual”26. Assim, tem-se que, em relação aos produtos da indústria da moda, a busca por tal proteção só é adequada quando tratar-se de criação única, com potencial visivelmente artístico, diferenciada e que não se enquadre em qualquer padrão vigente até o momento de sua confecção

3. DESENHO INDUSTRIAL

O desenho industrial é um dos métodos de proteção de propriedade intelectual mais utilizados na indústria da moda. O presente tópico trata sobre os requisitos necessários à obtenção de um registro de desenho industrial, quais produtos poderão ser protegidos por tal método e como se dá a sua relação com a indústria da moda. 3.1. O método

Existem diversos produtos industriais que não se enquadram na categoria “invenções”, porém que são considerados originais devido ao fato de possuírem uma configuração visual distintiva em relação a objetos anteriores (art. 97 da LPI), bem como novos por não estarem compreendidos no estado da técnica (art. 96 da LPI). Tais produtos são protegidos por desenho industrial, definido pela legislação específica da seguinte maneira:

Art. 95. Considera-se desenho industrial a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial

Segundo Cerqueira (2012, p. 213), a proteção por desenho industrial se destina

aos produtos industriais que apresentam “aspecto novo que, além de distingui-los de outros semelhantes, os torne mais agradáveis à vista, já pela sua ornamentação, já pela forma que apresentam”, definindo-os como “produtos de arte aplicada”. O referido autor frisa que o objetivo é “a produção artística de objetos industriais, e não a produção industrial de objetos de arte” (CERQUEIRA, 2012, p. 206), destacando que, enquanto nas criações puramente artísticas o valor estético provém do trabalho e da habilidade do próprio autor, nos produtos industriais o valor artístico muitas vezes advém do próprio material utilizado (CERQUEIRA, 2012, p. 206-207).

O instituto tem como objeto de proteção, portanto, a forma única conferida ao objeto de fabricação industrial. É importante desvincular a forma da função técnica, uma vez que, caso a forma seja necessária para se atingir a finalidade do produto, não há que se falar em desenho industrial, mas sim em modelo de utilidade (SILVEIRA, 2007, p. 291). Desta forma, “enquanto os desenhos industriais são sobrepostos a um produto, os modelos industriais27 constituem a sua própria forma” (SILVEIRA, 2007,

26 Recurso Especial nº 906.269/BA (2006/0248923-0), Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros, T3 – Terceira Turma, DJ 29/10/2007. 27 Cumpre destacar que o Autor utiliza a expressão “modelos industriais” porquanto essa era a nomenclatura utilizada o antigo Código da Propriedade Industrial (Lei nº 5.772/1971), revogado pelo advento da LPI.

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p. 293). O autor inclui na categoria de utensílios protegidos por desenho industrial “os recipientes, móveis, artefatos de metais, de cerâmica, de joalherias, objetos de moda e qualquer produto industrial” (SILVEIRA, 2007, p. 293- 294)

Considerando as definições (e distinções) conferidas nos tópicos anteriores aos requisitos de originalidade e novidade, a princípio pode parecer contraditório que ambos se apresentem, concomitantemente, como necessários à proteção por desenho industrial. Todavia, importa frisar que, no caso, tais conceitos possuem uma interpretação diferenciada. Ocorre que a originalidade, quando analisada sob a ótica do desenho industrial, é verificada a partir da aplicação da forma ao objeto, e não a partir da forma em si, conforme leciona Silveira (2007, p. 286)

[...] nas obras de arte a originalidade se refere à forma considerada em si mesma, enquanto para os desenhos industriais a forma em si pode não ser original, desde que o seja a sua aplicação, isto é, a originalidade nesse caso consistiria na associação original de uma determinada forma a um determinado produto industrial

O mesmo entendimento é consubstanciado por Cerqueira (2012, p. 216):

Se os elementos utilizados são vulgares, mas a composição do autor possui caráter original, o desenho ou modelo pode ser objeto de direito exclusivo, devendo-se apreciar não a originalidade de seus elementos isolados, mas a originalidade da composição, a combinação de seus elementos, o seu conjunto ou arranjo especial.

Assim, pode-se mencionar como exemplo a confecção de uma linha de bolsas

em formato de raio. Em que pese o formato de raio em si não seja original, é inegavelmente original confeccionar uma bolsa nesse formato, restando preenchido tal requisito. Nesse sentido, Barbosa (2009, p. 45) acrescenta que a criação ornamental “deve ter determinado grau de inventividade estética capaz de resultar na efetiva distinguibilidade da nova configuração se comparada a produtos similares”.

A mesma lógica é aplicada ao requisito da novidade: A novidade de um desenho industrial pode consistir na composição do conjunto, mesmo que suas partes sejam conhecidas. Segundo Poillet, tais criações, quando não despertam nenhum sentimento estético, satisfazendo apenas o gosto da moda, somente podem ser protegidas pela lei de desenhos e modelos, caso contrário entram no domínio da propriedade artística. (SILVEIRA, 2007, p. 292) Com efeito, o desenho é uma criação ornamental e acessória a um produto industrial; assim, é ao ato de aposição do desenho ao produto que se elege como relevante para determinar a novidade, ou não. (BARBOSA, 2013, p. 69).

Cerqueira (2012, p. 216) resume a diferença na interpretação dos conceitos ao

apontar que a legislação se contenta com o caráter relativo dos requisitos:

Não se exige do autor, nem isso seria possível, que produza obra absolutamente nova ou original, criando formas inteiramente inéditas, novos estilos ou efeitos até então desconhecidos. Contenta-se a lei com a novidade relativa do desenho ou modelo, negando proteção apenas aos que carecem de qualquer traço original ou que reproduzam outros já conhecidos.

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Assim, são protegidos por desenho industrial os objetos ornamentais bidimensionais ou tridimensionais de caráter estético que conferem ao produto um design original e novo, sendo que tais requisitos são observados a partir da aplicação da forma ao produto, podendo tal forma já ser conhecida, desde que disposta de maneira inovadora.

Em que pese exista uma ampla gama de produtos que podem ser protegidos por tal instituto, a lei estabelece expressamente aqueles que não podem: (i) qualquer obra de caráter puramente artístico (art. 98 da LPI) – visto que é imprescindível a aplicação industrial –, (ii) qualquer obra contrária à moral e aos bons costumes (art. 100, I, da LPI) e (iii) a forma necessária comum ou vulgar ou, ainda, a forma essencialmente técnica ou funcional (art. 100, II, da LPI).

Cumpre ressaltar, ainda, que o registro de desenho industrial não dispõe de exame de mérito – como ocorre no caso da patente –, somente de exame preliminar formal. Assim sendo, é latente a maior celeridade no processo e a diminuta burocracia envolvida, o que facilita a obtenção do registo. Por outro lado, a ausência de um exame preliminar de mérito fragiliza o instituto, pois viabiliza o registro de desenhos que não atendem de maneira satisfatória os requisitos de originalidade e novidade, podendo ser contestados posteriormente. Todavia, cabe grifar que, após a concessão do registro, é possível que o titular ou mesmo terceiros solicitem o exame de mérito (art. 111 da LPI). 3.2. Benefícios conferidos pelo instituto

A obtenção do registro de desenho industrial confere aos titulares “privilégio temporário, que lhes assegura o direito de usar, gozar, e dispor de sua obra, bem como o de explorá-la, comercial e industrialmente, de modo exclusivo” (CERQUEIRA, 2012, p. 197). Não bastante, a legislação prevê a possibilidade de um único registro abarcar a proteção de até vinte variações do objeto, desde que se destinem ao mesmo propósito e guardem entre si a mesma característica distintiva preponderante (art. 104 da LPI)

Comparando-se o registro de desenho industrial à obtenção de uma carta patente, o processo é consideravelmente mais simples e mais rápido, bem como menos custoso.

No mais, a própria OMPI e o INPI reconhecem que “a elaboração de formas novas e originais faz com que os produtos industriais tenham um maior apelo visual em relação aos seus concorrentes, representando um acréscimo ao valor comercial” (OMPI; INPI, 2016, Módulo 6, p. 2). É evidente, portanto, que a possibilidade se registrar o design inovador, vinculando-o ao seu criador, é de extremo interesse da indústria da moda.

3.3. Dificuldades de aplicação à indústria da moda

Em primeiro lugar, conforme já referido, a LPI estabelece de maneira expressa que não serão protegidas por desenho industrial as obras de caráter puramente artístico, as formas necessárias ou comuns dos objetos ou, ainda, a forma essencialmente técnica ou funcional. Em relação ao primeiro critério, dificilmente um produto oriundo da indústria da moda deteria caráter puramente artístico, haja vista sua inafastável faceta utilitária, de maneira que é possível afirmar que a viabilidade da proteção, nesse contexto, não encontraria óbice em tal vedação. No entanto, as formas necessárias ou essencialmente funcionais podem se apresentar como um obstáculo, pois os produtos dessa indústria, em sua maioria – senão todos – partem de formas comuns e funcionais

Tome-se como exemplo uma calça ou uma camisa. Ambos detêm em suas respectivas formas características comuns ou vulgares que viabilizam sua funcionalidade – como o formato da calça para que caibam as pernas e a estrutura da

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camisa para que possa ser vestida adequadamente – caso contrário esses itens não atingiriam o seu objetivo final, que seria o de vestir. Assim, somente poderão ser protegidas as formas ornamentais que, anexadas ao molde vulgar do produto, configurem uma criação original e nova. Herzeca e Hogan (2013, p. 184) destacam, ainda, que o caráter dinâmico e extremamente mutável da indústria da moda diminui o interesse na proteção de uma forma ornamental específica e constante.

A originalidade e a novidade, por sua vez, também poderão dificultar a obtenção do registro, pois a maioria dos produtos no contexto da moda não possuem características tão distintivas a ponto de preencherem tais requisitos.

Não bastassem os empecilhos legais acima mencionados, cumpre destacar que, ainda que o processo para obtenção de um desenho industrial seja consideravelmente mais rápido e menos custoso do que aquele relativo à patente, o procedimento por muitas vezes não se adequa ao ritmo acelerado do processo criativo e comercial da indústria da moda. No mais, a inexistência de um exame preliminar de mérito fragiliza o instituto, pois a ausência de uma análise prévia apurada sobre as características particulares do registro viabilizam impugnações diversas após a sua concessão.

Por fim, há que se destacar o fato de que a proteção via desenho industrial está limitada ao território no qual foi obtido o registro – em especial no caso do Brasil, que não é signatário do Acordo de Haia –, o que também dificulta o emprego desse instituto no contexto globalizado da moda.

3.4. Adequação

Não obstante seja o desenho industrial considerado pela OMPI (2005, p. 3) como o método de proteção mais relevante para a indústria da moda, importa destacar que o instituto não se adequa a todo e qualquer produto proveniente desse meio, mas sim principalmente a ornamentos específicos empregados em joias, acessórios em geral, sapatos, bolsas, entre outros. Isso porque nesse tipo de produto é consideravelmente mais fácil empregar uma forma distintiva original e nova sem que se perca seu aspecto utilitário e sem que se caia na vedação à proteção de elementos comuns ou essencialmente funcionais. No caso da vestimenta, por outro lado, o emprego desse método de proteção é menos comum, porém não inexistente, conforme destacam Herzeca e Hogan (2013, p. 184).

A título exemplificativo, cita-se a empresa de calçados Grendene S.A., que detém aproximadamente dois mil depósitos de pedidos e registros de desenho industrial referentes a calçados e seus ornamentos perante o INPI28.

De modo geral, portanto, são os acessórios, sapatos e bolsas os principais objetos visados quando se trata de proteção através de desenho industrial. Ademais, como visto, os autores frisam que a opção pelo desenho industrial é usualmente tomada quando se trata de produtos que provavelmente perdurarão no tempo, independentemente das tendências passageiras da indústria. Essa relação é explicada pelo investimento financeiro e pelo tempo dispendido com a obtenção de registro perante o órgão competente, conforme Maia (2016, p. 12).

Cumpre destacar, ainda, que a proteção por desenho industrial muitas vezes poderá ser cumulada com a proteção por direito autoral, conforme abordado no tópico anterior. Uma vez que a proteção por direito de autor independe de registro formal, o

28 Informação extraída de pesquisa no banco de dados de desenhos industriais do INPI utilizando o CNPJ da empresa no campo de depositante.

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desenho industrial muitas vezes é utilizado como forma de se obter prova da titularidade daquela criação, facilitando o reconhecimento judicial de proteção em caso de violação (JABUR; SANTOS, 2014, p. 231).

Em que pese tal prática seja usual, importa repisar que as criações passíveis de proteção por direito autoral podem ser registradas por si só em tal categoria perante os órgãos competentes, independendo do registro de desenho industrial para acumular material comprobatório.

4. MARCA

O quarto e último tópico do presente trabalho aborda o instituto da marca e sua ampla aplicação à indústria da moda, utilizando da doutrina especializada e da jurisprudência com o fim de estipular quais seriam as melhores formas de aplicar o método nesse contexto.

4.1. O método

A marca pode ser definida como “todo sinal distintivo aposto facultativamente aos produtos e artigos das indústrias em geral para identificá-los e diferenciá-los de outros idênticos ou semelhantes de origem diversa” (CERQUEIRA, 2012, p. 253).

O signo, portanto, não só identifica o produto e o diferencia dos concorrentes, como também estabelece um canal de informação e comunicação com o consumidor (MORO, 2009, p.5), o qual, ao identificar o sinal distintivo da marca, reconhece as características particulares do produto.

Assim, a doutrina estabelece que a marca possui cinco funções primordiais (COPETTI, 2010, p. 41 - 47): função distintiva, função de indicação de origem (do produto e do responsável por sua fabricação), função econômica (valorização da marca), função de qualidade e função publicitária.

No Brasil, a legislação específica não determina expressamente o que poderia ser objeto de proteção através do instituto, limitando-se a definir como registráveis “os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais” (art. 122 da LPI). Todavia, a lei discrimina tudo aquilo que não é registrável como marca (art. 124 da LPI), o que engloba desde cores (salvo se dispostas de modo distintivo) e sinais genéricos até nomes próprios (exceto se autorizados) e a forma necessária, comum ou vulgar do produto que será protegido.

Em relação à distintividade como requisito para a obtenção de um registro de marca, cabe destacar que nem sempre o caráter distintivo será observado originariamente no objeto a ser protegido. Existe a possibilidade de a capacidade distintiva ser adquirida através do uso do sinal no mercado, fato que ensejou o surgimento da doutrina conhecida como secondary meaning (Moro, 2009, p. 159).

Existem, ainda, alguns princípios que norteiam o direito marcário (COPETTI, 2010, p. 49-54): o princípio da disponibilidade determina que o sinal a ser registrado deve ser livre, no sentido de não pertencer a terceiro ou à toda a comunidade; o princípio da anterioridade garante à primeira pessoa que requerer o registro o direito de exclusividade sobre aquele sinal; o princípio de territorialidade determina que o registro da marca somente é válido no país em que foi conferido; o princípio da especialidade impõe a exclusividade sobre o uso da marca somente dentro do âmbito de atividade do titular (podendo marcas que possuem o mesmo nome atuar em atividade distintas, por exemplo); e, por fim, o princípio da afinidade, o qual incide quando uma marca adquire eficácia fora da classe na qual originalmente foi protegida, porquanto, segundo o INPI, “o risco de confusão ou associação indevida também se manifesta no caso de bens ou

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serviços de espécies distintas, quando guardam, entre si, características semelhantes ou estreita relação”29

Ademais, os tipos de marcas registráveis são definidos pela legislação de cada país. No Brasil, segundo a classificação adotada pelo INPI, a marca pode ser nominativa – quando formada por palavras, neologismos e combinações de letras e números -, figurativa – quando constituída por desenho, imagem, ideograma, forma fantasiosa ou figurativa de letra ou algarismo –, mista – quando combina imagem e palavra – e tridimensional – a forma de um produto, quando é capaz de distingui-lo de outros produtos semelhantes.

Em relação às marcas tridimensionais, importa dispor brevemente sobre as diferenças entre esse instituto e o desenho industrial. Conforme visto no tópico anterior, os requisitos para que se obtenha o registro de desenho industrial são a novidade e a originalidade, enquanto o principal requisito para a obtenção de um registro de marca é a distintividade, não sendo necessário que o sinal seja original ou novo (MORO, 2009, p. 260). Assim, segundo Moro (2009, p. 262) enquanto a marca “exige que a forma tridimensional seja capaz de identificar o produto ou serviço assinalado como um todo”, o desenho industrial “visa a diferenciar a forma aplicada ao objeto de outras já existentes”.

Nesse sentido, cabe destacar as considerações feitas por Moro (2009, p. 261) acerca da diferenciação entre os institutos:

O exemplo de uma embalagem de perfume pode esclarecer melhor a questão. Ao solicitar a proteção por desenho industrial dessa forma em três dimensões, requer-se a proteção de uma forma de embalagem [...] enquanto, no caso de uma marca, ela pode ser o elemento distintivo do próprio produto, ou seja, do próprio perfume. [...] Como marca, a forma tridimensional pode ser de tal forma arbitrária que em nada se pareça ou tenha que ver com o produto que assinala, o que não ocorre com o desenho industrial, que parte do objeto ao qual será aplicado, seja ele uma cadeira, uma mesa, um cabide, um armário, etc. [...] Além do mais, a marca obedece ao princípio da especialidade, enquanto, apesar de terem uma vinculação ao objeto a que são aplicados, os desenhos industriais não admitem tal limitação. Entende-se que, para ser marca, não basta a forma em três dimensões ter uma configuração diferenciada. Isso é necessário, mas não será suficiente se não for essa forma capaz de distinguir os produtos ou serviços por ela assinalados

No mais, existem ainda as marcas de alto renome (art. 125 da LPI) e as marcas

notoriamente conhecidas (art. 126 da LPI), às quais são asseguradas proteções especiais. As marcas de alto renome constituem uma exceção ao princípio da especialidade, pois seu renome transcende o segmento de mercado original, sendo assegurada a proteção em todas as classes (COPETTI, 2010, p. 72). São exemplos de marcas de alto renome a Coca-Cola, a Faber-Castell e a Ferrari, todas reconhecidas como tal pelo INPI30. Por outro lado, as marcas notoriamente conhecidas constituem uma exceção ao princípio da territorialidade, pois demandam a recusa ou a invalidação de registro de sinal que reproduza ou imite marca que inegavelmente é conhecida

29 Disponível em http://manualdemarcas.inpi.gov.br/projects/manual/wiki/PDF. Acesso em 03/12/2017. 30 Disponível em http://www.inpi.gov.br/menu-servicos/marcas/marcas-de-alto-renome. Acesso em 03/12/2017.

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naquele país, independentemente de estar previamente depositada ou registrada no local (COPETTI, 2010, p. 75). 4.2. Benefícios conferidos pelo instituto

Ao analisar-se o instituto da marca através de seus requisitos e características legais, observa-se que, de todos os métodos abordados no presente trabalho, é o que menos impõe óbices à proteção de produtos oriundos da indústria da moda.

Cabe frisar que a marca, por ser um bem imaterial, é suscetível de reprodução ilimitada e simultânea (MORO, 2009, p. 7). Observadas as formalidades procedimentais, pode a marca perdurar por tempo indeterminado, o que se apresenta como uma grande vantagem para o seu titular, pois auxilia no desenvolvimento e no reconhecimento dos produtos por ele comercializados, consolidando a empresa em seu nicho de mercado. Esse fator é extremamente relevante para a indústria da moda, pois, como se sabe, trata-se de segmento no qual o status detém suma importância.

É claro, pois, que a amplitude de aplicação do instituto, associada à sua durabilidade, são os principais fatores responsáveis por consagrar a marca como sendo o método de proteção da propriedade intelectual mais utilizado pelo ramo da moda. Nesse sentido se manifestam Herzeca e Hogan (2013, p. 63):

Existem circunstâncias nas quais o direito de autor e as patentes não protegerão a moda. E mesmo onde essas formas alternativas de proteção são aplicáveis, elas só podem proteger o trabalho de um titular por um período limitado. A proteção através de marca registrada, em contraste, pode perdurar para sempre, desde que os consumidores realmente usem a marca para identificar uma fonte específica.31

Importante, também, é a característica da marca de não só englobar todos os produtos individualmente concebidos, como também o próprio estabelecimento comercial em si. A proteção de eventuais produtos individuais somada àquela conferida ao acervo como um todo é uma opção a ser tomada pelo titular, pois não é obrigatória – porém, em alguns casos, pode ser relevante.

Maia (2016, p. 14) traz como exemplo de amplitude da aplicação do instituto da marca a grife Burberry, a qual detém tanto registros gerais quanto específicos, inclusive no Brasil:

Como exemplo de marca geral e específica pode-se citar a grife Burberry. Ela é titular no Brasil de 09 registros de marcas que podem ser consideradas marcas gerais. Todos eles fazem referência a produtos ou serviços ofertados, tais como: vestuário, perfumaria, cosméticos, relógios e etc. O signo Burberry está presente em todos os produtos e serviços ofertados pela empresa titular. Ainda assim, ela registrou como marca o seu xadrez típico em diversos países (no Brasil, registrado sob o nº 822964147), ou seja, ele é uma de suas marcas específicas.

Não obstante a magnitude do método, destaca-se que o registro de marca é

relativamente fácil de se obter, desde que a marca seja distintiva e não sucumba a qualquer das vedações legais (art. 124 da LPI). Ainda, não é um método caro, considerando-se que as principais taxas a serem pagas, sendo que o depósito por meio eletrônico é mais barato do que o realizado por via física. 31 “There are instances in which copyright and patent law will not protect fashion. And even where these alternate forms of protection are applicable, they can only protect the work of an owner for a limited period. Trademark protection, in contrast, can go on forever, as long as consumers actually use the mark to identify a specific source.” Tradução nossa.

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Por fim, cumpre destacar que é possível ao titular do registro de marca licenciar o seu uso (art. 130, II, da LPI), sendo essa outra maneira de lucrar através da marca. 4.3. Dificuldades de aplicação à indústria da moda

Levando-se em conta o caráter globalizado da indústria da moda, pode-se mencionar como fator negativo na aplicação do instituto da marca o fato de que seu registro está restrito aos limites territoriais do país que o concedeu, excetuando-se eventual aplicação do disposto no Acordo e no Protocolo de Madrid aos países signatários, o que não é o caso do Brasil.

Além dessa limitação, considerando-se as particularidades da indústria da moda, uma das vedações que precisam ser cuidadosamente observadas é aquela referente ao aspecto funcional do sinal que visa a obter proteção. A marca jamais protegerá o aspecto necessário ao uso daquilo que se pretende registrar, conforme Castro (2017, p. 41).

[...] um sinal, quando possui um aspecto funcional, não é passível de registro. É a chamada Doutrina da Funcionalidade, na qual uma cor só será passível de registro marcário se a mesma não for essencial para o uso ou propósito do que se identifica, ou se não afetar seu custo ou qualidade. Desta doutrina, ainda cabe falar de seu desdobramento: a chamada Funcionalidade Estética, que expõe que quando um aspecto tem somente a intenção de melhorar o seu design e tornar o produto mais desejável, atraente de forma comercial, esse aspecto não padece de proteção, pois o consumidor é atraído ao design. Como visto anteriormente, para que uma cor seja registrada como marca, é necessário que haja uma reputação, e, portanto, é difícil definir aonde a funcionalidade estética começa e aonde o aspecto puramente reputacional acaba.

Do trecho acima transcrito extrai-se que a Funcionalidade Estética se apresenta

como uma forma de diferenciar o objeto de proteção do desenho industrial do objeto de proteção da marca. Em qualquer caso, há que se observar eventual funcionalidade do sinal que se pretende registrar, em especial ao se tratar de marcas tridimensionais associadas a produtos como sapatos, bolsas, dentre outros. 4.4. Adequação

Conforme pontua Maia (2016, p. 12), o instituto da marca extrapola os limites

legais e econômicos concernentes à propriedade industrial, possuindo a capacidade única de adentrar no imaginário dos consumidores e influenciar suas escolhas e seus estilos de vida, em especial ao tratar-se do ramo da moda.

A adequação do uso da marca como forma de proteção do produto em si pode ser exemplificada pelo caso judicial mais famoso do Direito da Moda: Christian Louboutin vs. Yves Saint Laurent. Christian Louboutin é um designer francês de calçados que se tornou famoso por confeccionar sapatos cujas solas são laqueadas em vermelho vivo. O icônico solado vermelho passou a ser item extremamente cobiçado pelos consumidores do ramo, sendo que o registro marcário do solado vermelho foi concedido nos Estados unidos na Classe Internacional nº 25 em 200832.

Ocorre que, em 2011, a grife Yves Saint Laurent, outra gigante da alta costura, lançou uma linha de sapatos denominada “Cruise”, na qual todos os exemplares eram

32 Red Sole Mark, nº 3361597.

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monocromáticos, incluindo alguns na cor vermelha. Dessa forma, Louboutin propôs ação judicial nos Estados Unidos 33 por contrafação de marca, falsa designação de origem e concorrência desleal. Em resposta, Saint Laurent afirmou que o registro do solado vermelho não era válido por deter caráter funcional e não ser suficientemente distintivo.

Em primeira instância, decidiu-se pela invalidade do registro de Louboutin sob o argumento de que uma cor não seria registrável como marca; somente um conjunto de cores dispostas em certo padrão distintivo poderia ser. Assim, Louboutin recorreu e, contando com o apoio da renomada joalheira Tiffany & Co., habilitada como Amicus Curiae – a qual detém o registro de marca monocromática em tom azul34, utilizada na confecção de suas famosas embalagens –, obteve decisão parcialmente favorável no sentido de reconhecimento do secondary meaning adquirido pelos solados vermelhos, o que lhe garantia a validade do registro da marca. Todavia, foi determinado que a marca só seria válida em relação a sapatos cujo conjunto contrastasse com o solado vermelho (apostila essa que foi incluída no registro nº 3361597). Dessa forma, Saint Laurent pôde continuar comercializando sua linha de sapatos monocromáticos.

Conforme destaca Castro (2017, p. 48), o “solado vermelho não é aspecto funcional, pois a cor em nada interfere na funcionalidade do sapato”. Poder-se-ia defender, no entanto, a aplicação da já mencionada doutrina da Funcionalidade Estética – ocorre que, no caso, essa seria afastada ante a inegável reputação conferida pelo uso da cor. Assim, a autora demonstra que, no caso de Louboutin, o reconhecimento da validade da marca era imprescindível, dada a importância e a distintividade do solado vermelho no contexto. Todavia, a questão continua a gerar debate no ramo jurídico. Recentemente, o Tribunal Europeu de Justiça dispôs que o solado vermelho de Louboutin não é uma entidade separada da forma do próprio sapato, e, em sendo uma forma, não poderia ser registrado como marca de acordo com a legislação da União Europeia35.

Existem, ainda, diversos exemplos de adequação do registro marcário ao contexto geral de uma empresa do setor da moda, ou seja, a definição de uma única marca que represente todo o acervo daquela empresa. Dentre eles, citam-se dois dos processos judicias movidos pela grife Louis Vuitton no Brasil. O primeiro deles diz respeito ao embate judicial travado entre a renomada grife e a empresa brasileira Viviton36, a qual também possuía registros marcários perante o INPI. A argumentação de contrafação de marca prosperou em relação às marcas nominativas e mistas, em face da semelhança gráfica e fonética que possibilitava a associação entre as marcas, embora o público alvo fosse diferente. Em outros termos, a Viviton utilizou o renome da Louis Vuitton para ascender no mercado, embora não concorresse diretamente com ela, em claro comportamento parasitário. Assim, em observância ao princípio da especialidade, foi determinado que a Viviton cessasse a utilização de sua nomenclatura.

Posteriormente, Louis Vuitton ajuizou outra ação com fundamento em seus registros marcários37, dessa vez em desfavor de Inca Comercial Exportadora Ltda., por

33 Docket nº 11-3303-cv, Christian Louboutin S.A. vs. Yves Saint Laurent Am. Holding, Inc. 34 Registros nº 2184128, 2359351, 2416795 e 2416794. 35 Processo movido pela Louboutin contra a grife holandesa Van Haren. Informação disponível em: https://mobile.nytimes.com/2018/02/06/business/christian-louboutin-shoes-red-trademark.html?smid=fb-nytimes&smtyp=cur&referer=https://m.facebook.com/. Acesso em 23/02/2018. 36 Brasil, TJSP, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, AC 0212964-86.2010.8.26.0100, Relator Des. Ricardo Negrão, DJ 22.09.2014. 37 Brasil, TJSP, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, AC 0006882-24.2012.8.26.0562,

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tentativa de importação de produtos falsificados da grife. Da mesma maneira que no caso anterior, a questão em discussão não era a eventual possibilidade de induzir-se o consumidor em erro, pois certamente o público alvo da grife não seria ludibriado pelo produto falsificado (inclusive devido ao preço de mercado). A intenção da ação era impor que a Inca cessasse a comercialização indevida, visto que essa não só feria o direito de exclusividade da titular, como também manchava a imagem da marca Louis Vuitton no mercado. Ao final, a Louis Vuitton saiu vitoriosa, tendo sido os produtos retidos no Porto de Santos e impedida a sua comercialização

Cabe grifar que, em ambos os casos, diversos eram os tipos de produtos contrafeitos, desde bolsas até perfumes. Assim, foi possível lograr êxito na cessação da comercialização de uma variedade de produtos com base em uma marca de aspecto geral.

Com base na análise da doutrina e da jurisprudência abordadas, chega-se à conclusão que, caso a intenção seja obter uma marca de uso generalizado para todo o acervo da empresa, o ideal seria que o registro se desse nas modalidades nominativa, figurativa e mista. Dessa forma, o sinal distintivo não seria limitado a uma única forma e, por isso, poderia abarcar diversos produtos diferentes, vinculando-os a uma mesma origem. De maneira diversa, caso a intenção seja proteger uma peça em específico, o registro através da marca tridimensional parece mais adequado, pois associa a uma única forma tridimensional todo o histórico de origem, qualidade e renome de uma empresa.

Por fim, destaca-se que a proteção através de marca tridimensional pode ser concomitante a outros métodos de proteção da propriedade intelectual, como, por exemplo, o desenho industrial e o direito de autor. O solado vermelho de Louboutin pode ser entendido como um aspecto ornamental original e novo, passível de proteção através de desenho industrial, assim como pode ser visto como a expressão artística do espírito criativo de seu criador, podendo ser protegido por direito autoral. O solado pode, ainda, representar em sua forma toda uma concepção distintiva relacionada a uma origem comercial única, associando-se à marca tridimensional. No primeiro caso, protege-se a formatação do objeto em particular; no segundo caso, protege-se a concepção artística nele inserida; no terceiro caso, protege-se o ativo intangível relacionado à origem do produto, remetendo ao consumidor que aquele item faz parte de todo um acervo com características particulares. 5. CONCLUSÃO

O presente artigo apresentou os métodos de proteção da propriedade intelectual e os vinculou as suas possíveis aplicações aos ativos vinculados à indústria da moda. Da análise feita, pôde-se concluir que, apesar das controvérsias, é viável adequar cada um dos institutos a pelo menos uma funcionalidade no contexto da moda.

No primeiro tópico foi possível observar que a aplicabilidade do instituto da patente à indústria da moda é limitada à composição e aos processos de fabricação inerentes à sua matéria-prima – no caso, o tecido, peças metálicas, acessórios, dentre outros. Levando-se em consideração os requisitos de novidade, aplicabilidade industrial e atividade inventiva, somente esses produtos poderiam formalmente obter uma carta-patente, bem como justificariam o investimento em um processo longo, caro e

Relator Des. Ricardo Negrão, DJ 07.08.2012.

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predominantemente demorado, o qual não se adequa, em geral, ao contexto dinâmico do segmento da moda.

O segundo tópico, por sua vez, demonstrou que o direito autoral é aplicável ao ramo da moda se considerarmos a relatividade do requisito da originalidade, bem como a viabilidade de se proteger itens de caráter utilitário que detenham qualidade artística – conhecidos como “obra de arte aplicada” –. Assim, são passíveis de proteção por esse método, por exemplo, as estampas desenhadas pelos estilistas, bem como itens particulares que adquiram faceta artística, criativa e original, e se diferenciem do padrão até então vigente. Não se nega, no ponto, que a averiguação prática de tal característica seja consideravelmente difícil, porém denota-se que não há qualquer vedação legal expressa que impeça a proteção desses itens por direito autoral.

No terceiro tópico analisou-se o instituto do desenho industrial, considerado pela própria OMPI como sendo o principal método de proteção de artefatos de moda. Conforme demonstrado, a proteção do aspecto ornamental de caráter estético se adequa perfeitamente às necessidades do ramo, considerando a interpretação diferenciada dos requisitos de originalidade e novidade. Todavia, deve-se observar a vedação legal ao registro de formas necessárias ou comuns dos objetos, o que pode apresentar certa dificuldade em um contexto tão utilitário quanto o da moda. Ainda, destacou-se que, em que pese relativamente mais simples, mais rápido e mais barato do que o processo de registro de patente, o procedimento de registro de desenho industrial ainda se mostra inadequado a uma indústria tão dinâmica quanto à da moda. No mais, é necessário avaliar-se a adequação de registro de forma ornamental específica e constante nesse contexto tão mutável.

Cabe destacar que a “obra de arte aplicada”, conforme disposto por Bittar (2015, p. 45-46), enseja dupla proteção, tanto por direito autoral quanto por desenho industrial. Nesse sentido, o desenho industrial muitas vezes é utilizado como uma forma de registro formal do objeto protegido (dispensável quando se trata de direito de autor), a fim de obter-se proteção mais forte e material probatório mais amplo em caso de litígio legal.

O quarto tópico, por sua vez, demonstrou a ampla aplicabilidade do instituto da marca à indústria da moda, tanto em relação à empresa em si e todo o seu conteúdo, através das marcas nominativas, figurativas e mistas, quanto em relação aos produtos particulares, através das marcas tridimensionais. Nesse ínterim, destacou-se que a marca tridimensional difere do desenho industrial por identificar o produto ou serviço como um todo, representando o elemento distintivo do próprio produto, enquanto o desenho industrial se limita a diferenciar a forma do objeto de outras preexistentes.

Desta forma, conclui-se que, para que se delimite a forma de proteção mais adequada, é necessário avaliar-se o objeto que se pretende proteger e a função que se pretende abarcar. Em se tratando de matéria-prima ou processo de produção inovadores, adequada será a proteção através de patente.

Em caso de produto final de caráter artístico, criativo e original, a proteção poderá se dar por direito autoral, considerando-se que o aspecto utilitário não constitui uma vedação à essa proteção. Assim, quando o ativo em questão se tratar de criação que possa ser entendida como uma obra de arte, será passível de proteção por direito autoral.

O desenho industrial, por sua vez, será aplicável ao contexto quando a intenção for proteger o aspecto ornamental original e novo do produto, ou seja, a disposição física do ornamento conferido ao item, respeitadas as vedações ao aspecto puramente funcional.

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Por fim, tanto o produto em si quanto o estabelecimento em geral poderão obter proteção através da marca, sendo esse, claramente, o método de proteção da propriedade intelectual mais amplamente utilizado no contexto da moda. Percebe-se, nesse sentido, que as decisões judiciais mencionadas no presente estudo corroboram com as conclusões ora narradas.

Por fim, expõe-se, abaixo, quadro exemplificativo que resume as conclusões alcançadas com o presente estudo.

Tabela 1: Quadro comparativo dos principais métodos de proteção da propriedade intelectual aplicada ao Fashion Law.

MÉTODO OBJETO DE PROTEÇÃO BENEFÍCIOS DIFICULDADES ADEQUAÇÃO

Patente

Invenções ou modelos de

utilidade, ou seja, criações técnicas

novas, não óbvias, com aplicabilidade

industrial.

• Exclusividade de uso e comercialização;

• Período de proteção de até 20 anos para

invenções e 15 anos para modelos de

utilidade.

• Vedação de proteção às criações estéticas;

• Preenchimento do requisito de novidade; • Processo de registro

longo, lento e caro; • Proteção nacional.

Indústria têxtil – confecção de novos

tipos de tecidos, peças, etc, e processos de

fabricação.

Direito Autoral

Obras intelectuais originais e

criativas que refletem uma “criação do

espírito” e são fixadas em meio

tangível.

• Exclusividade de uso e comercialização;

• Período de proteção: toda a vida do autor + em geral 70 anos após a sua morte; • Ausência de registro

formal (gratuidade); • Proteção internacional

(Berna)

• Controvérsia quanto à proteção de produtos com caráter utilitário; • Preenchimento do

requisito de originalidade.

• Estampas de tecidos, fotografias;

• Produtos únicos, originais e criativos,

com potencial inegavelmente

artístico, que não se enquadrem em

qualquer padrão vigente até o

momento de sua confecção.

Desenho Industrial

Forma ornamental bidimensional ou

tridimensional que possa ser aplicada

a um produto, proporcionando resultado novo e

original com fabricação industrial.

• Exclusividade de uso e comercialização;

• Possibilidade de um único registro abarcar a proteção de até vinte variações do

objeto; • Proteção da forma

estética.

• Preenchimento dos requisitos de novidade e

originalidade; • Processo de registro

frágil e caro para a indústria;

• Proteção nacional; • Vedação à proteção de

formas necessárias ou essencialmente

funcionais.

• Produtos que tendem a permanecer por certo tempo no

mercado, independentes de

tendências; • Sapatos e acessórios

como joias, bolsas, óculos, etc.

Marca

Signos distintivos nominativos,

figurativos, mistos ou

tridimensionais.

• Aplicável tanto em relação à empresa como um todo

quanto em relação a produtos particulares;

• Registro relativamente simples;

• Reprodução ilimitada e simultânea;

• Duração por tempo indeterminado.

• Proteção nacional; • Vedação de proteção ao

aspecto necessário ao uso daquilo que se pretende registrar.

• Designação da empresa em si e do seu acervo no geral; • Itens particulares

tridimensionais que indiquem a origem

do produto.

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ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 FASHION LAW E PROPRIEDADE INTELECTUAL: UMA ANÁLISE DOS MÉTODOS DE PROTEÇÃO DE ATIVOS ORIUNDOS DA INDÚSTRIA DA MODA

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ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 SISTEMA NACIONAL DE INOVAÇÃO E TRIPLE HELIX: PESQUISA NA BIBLIOTECA DIGITAL BRASILEIRA DE TESES E DISSERTAÇÕES

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SISTEMA NACIONAL DE INOVAÇÃO E TRIPLE HELIX: PESQUISA NA

BIBLIOTECA DIGITAL BRASILEIRA DE TESES E DISSERTAÇÕES

NATIONAL SYSTEM OF INNOVATION AND TRIPLE HELIX: RESEARCH IN THE BRAZILIAN DIGITAL

LIBRARY OF THESES AND DISSERTATIONS

SISTEMA NACIONAL DE INNOVACIÓN Y TRIPLE HELIX: INVESTIGACIÓN EN LA BIBLIOTECA DIGITAL

BRASILEÑA DE TESIS Y DISERTAS

Camila Bueno Alfredo, Universidade do Extremo Sul Catarinense. email: [email protected], https://orcid.org/0000-0003-1706-9699

Adriana Carvalho Pinto Vieira, INCT/PPED/UFRJ, email: [email protected], http://orcid.org/0000-0002-9408-721X

Julio Cesar Zilli, Universidade do Extremo Sul Catarinense, email: [email protected], http://orcid.org/0000-0003-3794-0576

RECEBIBO 09/02/2018 APROVADO 18/02/2018 PUBLICADO 12/03/2018 Editor Responsável: Carla Caldas Método de Avaliação: Double Blind Review E-ISSN: 2316-8080 DOI:10.16928

RESUMO No Século XXI, tudo ocorre de uma maneira acelerada e, boa parte desse ritmo acelerado decorre do sistema capitalista, que busca eficiência e maximização dos lucros. Para que uma empresa consiga “sobreviver” é preciso acompanhar a evolução e estar em constante e rápida mutação. O presente estudo tem por objetivo compreender a interação existente entre Estado, Indústria e Universidade, bem como seus reflexos no desenvolvimento socioeconômico, e, ainda, apresentar os resultados da pesquisa realizada junto à Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), sobre o Sistema Nacional de Inovação e o modelo Triple Helix. A partir do objetivo proposto, os procedimentos metodológicos adotados se valeram de uma análise qualitativa, descritiva e exploratória, com pesquisa bibliográfica, com coleta de dados na doutrina e na plataforma DBTD, procurando compreender o elo existente entre as pesquisas acadêmicas e a inovação, assim como demonstrar o papel fundamental que as universidades exercem no desenvolvimento de um país. A relevância socioeconômica do estudo está na necessidade de se identificar a importância das pesquisas acadêmicas e da interação entre Indústria, Governo e Universidade para inovação e para o desenvolvimento socioeconômico do país, expostas pelo Triple Helix. Palavras-chave: Inovação. Indústria. Governo. Universidade. Desenvolvimento.

ABSTRACT In the 21st Century everything happens in an accelerated way, and much of this accelerated rhythm stems from the capitalist system, which seeks efficiency and profit maximization. For a company to be able to "survive" it is necessary to keep pace with evolution and to be

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constantly and rapidly changing. The present study aims to understand the interaction between State, Industry and University, as well as its repercussions on socioeconomic development, and also present the results of the research carried out with the Brazilian Digital Library of Theses and Dissertations (BDTD), on the System of Innovation and the Triple Helix model. Based on the proposed objective, the methodological procedures adopted were based on a qualitative, descriptive and exploratory analysis, with a bibliographical research, with data collection in the doctrine and on the DBTD platform, trying to understand the link between academic research and innovation, as well as such as demonstrating the key role that universities play in the development of a country. The socioeconomic relevance of the study is the need to identify the importance of academic research and the interaction between Industry, Government and University for innovation and socioeconomic development of the country, exposed by Triple Helix. Keywords: Innovation. Industry. Government. University. Development.

RESUMEM En el siglo XXI, todo ocurre de una manera acelerada y, buena parte de ese ritmo acelerado deriva del sistema capitalista, que busca eficiencia y maximización de las ganancias. Para que una empresa pueda "sobrevivir" es necesario acompañar la evolución y estar en constante y rápida mutación. El presente estudio tiene por objetivo comprender la interacción existente entre Estado, Industria y Universidad, así como sus reflejos en el desarrollo socioeconómico, y, además, presentar los resultados de la investigación realizada junto a la Biblioteca Digital Brasileña de Tesis y Disertaciones (BDTD), sobre el " Sistema Nacional de Innovación y el modelo Triple Helix. A partir del objetivo propuesto, los procedimientos metodológicos adoptados se valieron de un análisis cualitativo, descriptivo y exploratorio, con investigación bibliográfica, con recolección de datos en la doctrina y en la plataforma DBTD, buscando comprender el eslabón existente entre las investigaciones académicas y la innovación, así como como demostrar el papel fundamental que las universidades ejercen en el desarrollo de un país. La relevancia socioeconómica del estudio está en la necesidad de identificar la importancia de las investigaciones académicas y de la interacción entre Industria, Gobierno y Universidad para la innovación y para el desarrollo socioeconómico del país, expuestas por el Triple Helix. Palabras Claves: Innovación. La indústria. Gobierno. Universidad. Desarrollo.

1. INTRODUÇÃO

No Século XXI, tudo ocorre de uma maneira acelerada e, boa parte desse ritmo

acelerado decorre do sistema capitalista, que busca eficiência e maximização dos lucros. Para

que uma empresa consiga “sobreviver”, é preciso acompanhar esse ritmo e estar em constante

e rápida mutação, na atualidade isso se denomina inovação. A inovação está atrelada, na visão

de inúmeros autores, como a garantia de competitividade de uma empresa. Ao se falar de

empresa, em via de regra, remetemo-nos à propriedade privada e excluímos a participação do

Estado (SCHUMPETER, 1988; XIMENES, 2001; SERAFIM, 2011; SANTOS, et al., 2011;

VIEIRA, 2017).

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No entanto, nos últimos anos, vem se atentando para a necessidade de cooperação

entre Empresas e Governo, que é um aparato do Estado, para o progresso de ambos. Outro elo

que vem ganhando visibilidade na atualidade é o papel das Instituições de Ensino Superior,

mais precisamente das Universidades que possuem, no seu cerne, o ensino, a pesquisa e a

extensão, e a pesquisa é um elemento importantíssimo para a inovação.

Neste sentido, para o presente estudo parte-se do seguinte questionamento: Que

destino é dado às inúmeras pesquisas desenvolvidas na Universidade? De um certo modo,

entende-se que as pesquisas realizadas na academia podem auxiliar as empresas no processo

de inovação e, que uma cooperação entre Empresas, Governo e Universidade poderia ser um

mecanismo impulsionador da inovação e do desenvolvimento socioeconômico. Essa interação

é melhor estudada a partir da análise do modelo Triple Helix (TH).

Cada país possui uma realidade distinta. No entanto, a inovação se faz necessária

para todos eles. Uma parte dessa necessidade decorre da atual interação entre os países, sendo

que o mercado está interligado, permitindo as pessoas fazerem compras em inúmeros países.

Para acompanhar essas necessidades do mercado, nasce o Sistema Nacional de Inovação

(SNI). Alguns países possuem um sistema forte e bem estruturado, enquanto outros ainda

estão em formação, como é o caso do Brasil.

Dentro do chamado Sistema Nacional de Inovação, os Núcleos de Inovação

Tecnológicos (NIT) desempenham uma importante função, que é reflexo da interação entre

Empresa, Governo e Universidade. A relevância social do estudo do tema está na necessidade

de se identificar a importância das pesquisas acadêmicas para o desenvolvimento

socioeconômico do país. O presente estudo tem por objetivo compreender a interação entre

Empresa, Governo e Universidade, bem como seus reflexos no desenvolvimento

socioeconômico, e, ainda, apresentar os resultados da pesquisa realizada junto à Biblioteca

Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), com o propósito de obter informações

referentes às Universidades que possuem estudos ligados ao TH e ao SNI.

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Para atingir os objetivos, valer-se-á da seguinte questão norteadora: Qual o

volume e quais Universidades se voltam para o estudo do modelo Tríplice Helix, do Sistema

Nacional de Inovação e dos Núcleos de Inovação Tecnológica? e Qual o reflexo da

necessidade de inovação para o desenvolvimento do país? Para isso, utilizou-se uma análise

qualitativa, descritiva e exploratória, com pesquisa bibliográfica, com coleta de dados na

doutrina e na plataforma DBTD.

O trabalho está estruturado em seis seções, iniciando com esta introdução. A segunda

apresenta o funcionamento do Sistema Nacional de Inovação. A terceira expõe os conceitos

apontados pela teoria Triple Helix A quarta seção discorre sobre os procedimentos

metodológicos adotados para realização do artigo. A quinta seção é realizada a análise da

revisão sistemática com base na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações. Por fim

são se tece as considerações finais sobre o estudo proposto.

Conceituando Inovação e o Sistema Nacional de Inovação

Na atualidade, as empresas precisam se reinventar rotineiramente para satisfazer

aos anseios de seus consumidores, além de se manter no mercado e se sobressair à

concorrência. O mercado busca atingir seus objetivos, nos dias atuais, principalmente por

meio da inovação, tendo em vista que no meio empresarial, é objetivo final como aponta

Serafim (2011).

Conforme aponta Vieira (2017), ainda nos das atuais há uma certa confusão para

se saber o que é invenção e o que é uma inovação, embora os conceitos sejam bastante

distintos. A maioria das pessoas provavelmente associaria uma invenção a algo tangível e

novo. Os novos produtos usam novos conhecimentos para criar algo novo, talvez um artefato,

um serviço ou um equipamento. As invenções são uteis se tiverem potencial para permitir que

as pessoas façam coisas de maneiras melhores e diferentes, ou que façam coisas que elas

gostariam de fazer, mas não podiam fazer antes. Elas são uteis quando podem satisfazer um

desejo ou necessidade que, sem elas, permaneceria inalcançável, mas nem sempre as

invenções podem ser postas imediatamente em uso benéfico. Para Schumpeter (1988) a inovação é a destruição criadora, que está na essência da

dinâmica do capitalismo, quando novas tecnologias surgem como ondas (ondas de Kondratieff),

acompanhadas do aumento da produtividade do capital e do trabalho, uma vez que os empresários

terão vantagens competitivas em relação aos seus concorrentes tecnologicamente defasadas.

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Ainda o autor, diferenciou invenção de inovação, o que decorre de sua capacidade

de gerar riqueza. “Uma invenção é uma ideia, esboço ou modelo para um novo ou melhorado

artefato, produto, processo ou sistema. Uma inovação, no sentido econômico somente é

completa quando há uma transação comercial envolvendo uma invenção e, assim, gerando

riqueza” (SCHUMPETER, 1988).

O Manual de Oslo, em sua terceira edição, publicado em 2005 pela Organização

para Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), responsável pelas definições

mundialmente adotadas sobre inovação, traz uma importante modificação: expandiu o

conceito de inovação, incluindo o setor de serviços e retirando a palavra “tecnológica” da

definição de inovação, ou seja, é possível se fazer inovação em produtos, em processos, em

serviços, em marketing e sistemas organizacionais.

Desta forma, se buscarmos o significado da palavra inovação, encontraremos

simplesmente “ação ou ato de inovar” (XIMENES, 2001). Mas, esta palavra engloba muito

mais que isso. Atualmente ela é um importante mecanismo de competitividade, fazendo com

que algumas empresas se destaquem em detrimento de outras.

A Inventta (2016), que é um grupo reconhecido de estudos da inovação no país,

define a inovação como sendo “[...] a exploração com sucesso de novas ideias. E sucesso para

as empresas, por exemplo, significa aumento de faturamento, acesso a novos mercados,

aumento das margens de lucro, entre outros benefícios” (INVENTTA, 20016)1. Ou seja, para

ser considerada uma inovação, não basta criar ou modificar, mas fazer com que esta criação

ou modificação chegue ao mercado. E, somente será considerada inovação quando ela cria um

valor para empresa, ou seja, quando ela tiver um desempenho econômico gerando retorno

para os envolvidos no processo (SERAFIM, 2011).

As inovações ganham diversas classificações, subdividindo-as em decorrência do

objeto focal da inovação ou pelo seu impacto. É importante destacar que a necessidade

constante de inovação está atrelada ao modelo de economia capitalista, um sistema econômico

que visa fins lucrativos aos “empresários” ou aos detentores das propriedades privadas.

Schumpeter coloca as empresas em um ponto central de importância no que diz respeito ao

desenvolvimento econômico, “[...] mediante a denominada acumulação criativa e acumulação

de conhecimentos não transferíveis em determinados mercados tecnológicos e,

principalmente, da capacidade de inovação” (SANTOS, et al., 2011, p. 03).

1 Disponível em: < http://inventta.net/radar-inovacao/a-inovacao/>. Acesso em: 27 jun. 2016.

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Ainda, para Schumpeter (1988), a inovação é a responsável pelo “movimento” da

economia, tirando as empresas da inercia, fazendo com que essas busquem novas maneiras de

atingir seus fins, o que reflete de forma direta no desenvolvimento da economia. A isso, ele

chama de “destruição criativa”, em que as inovações são superadas, dando lugar, assim, a

outras. Considera ainda o autor que, a inovação é uma parte do ciclo, no qual o empresário

inovador cria e os demais são empurrados a copiá-lo para se manter no mercado, sendo que as

empresas que não se adaptarem a esse processo estão fadadas ao fracasso.

O Manual de Oslo tem por objetivo orientar e padronizar conceitos, metodologias

e construção de estatísticas e indicadores de pesquisa de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D),

de países industrializados. Este instrumento caracteriza quatro “tipos” ou categorias de

inovação, dentre elas: inovação de produto, inovação do processo, inovação de marketing e

inovação organizacional (OCDE, 2006).

É deste instrumento que se extrai os conceitos de cada um dos tipos de inovação,

apresentados na Tabela 1:

Tabela 1 – Conceitos de inovação de acordo com o Manual de Oslo

Inovação de Produto

É a introdução de um bem ou serviço novo ou significativamente melhorado no que concerne a suas características ou usos previstos. Incluem-se melhoramentos significativos em especificações técnicas, componentes e materiais, softwares incorporados, facilidade de uso ou outras características funcionais.

Inovação de Processo

É a implementação de um método de produção ou distribuição novo ou significativamente melhorado. Incluem-se mudanças significativas em técnicas, equipamentos e/ou softwares.

Inovação Organizacional

É a implementação de um novo método organizacional nas práticas de negócios da empresa, na organização do seu local de trabalho ou em suas relações externas.

Inovação de Marketing

É a implementação de um novo método de marketing envolvendo mudanças significativas na concepção ou na embalagem do produto, no posicionamento do produto, na promoção do produto ou na formação de preços.

Fonte: OCDE (2006).

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Ainda, a inovação pode ser caracterizada como inovação aberta e inovação

fechada. A inovação aberta busca seu máximo por meio de parcerias. Essas parcerias podem

ser com outras empresas ou organizações. A parceria que vem ganhando cada vez mais

espaço na contemporaneidade e entre empresas e universidades.

De acordo com Silva e Dacorso (2006), demonstram os autores que a maior parte

do conhecimento não está no ambiente da empresa. Para eles, a inovação aberta “[...] consiste

na utilização de conhecimento externo para agregar valor ao negócio, tendo em vista que

grande parte das ações estratégicas a serem incorporadas pelas empresas advém de lugares

fora dos limites organizacionais” (SILVA; DACORSO, 2006, p. 253). Santos et. al (2011)

defende que esse modelo permite maior disseminação do conhecimento.

A inovação aberta propõe abrir as fronteiras da empresa para viabilizar inovações, a partir de combinações interna e externa de recursos, tendo em vista dois objetivos principais: absorver recursos externos (gerados fora da empresa); permitir que os internos que não forem utilizados pelo negócio possam ser licenciados para fora, de forma que outras empresas tenham a oportunidade de aproveitá-los. (SANTOS et. al, 2011, p. 13).

Para Chesbrough (2012) a inovação aberta pode ser descrita como o processo de

inovação no qual as industrias e as organizações promovem ideias, pensamentos, processos e

pesquisas abertos, a fim de melhorar o desenvolvimento de seus produtos, promover melhores

serviços para seus clientes, aumentar a eficiência e reforçar o valor agregado. Para o autor, é a

combinação de ideias internas e externas, como também, caminhos internos e externos para o

mercado, de modo a avançar no desenvolvimento de novas tecnologias em produtos e

processos. Esta nova lógica irá explorar a difusão do conhecimento ao invés de ignorá-lo.

Neste sentindo, muda o papel da função da pesquisa, pois expande o papel dos pesquisadores

internos a fim de incluir não apenas geração de conhecimento, mas também a intermediação

do conhecimento (CHESBROUGH, 2012).

Por outro lado, a inovação fechada aposta na qualificação da mão de obra, “[...]

limita o processo inovador aos conhecimentos, conexões e tecnologias desenvolvidos dentro

das organizações, sem participação de instituições externas ou outras empresas no processo”.

(SANTOS et. al, 2011, p. 08).

Portanto, a inovação é considerada o pilar de manutenção da competitividade de

uma empresa, o motor do crescimento econômico. É preciso se ater a sociedade se encontra

na chamada era da informação, em que as fronteiras entre países estão extremamente

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reduzidas (decorrente da globalização), fazendo com que o mercado se torne altamente

interligado.

Em meio a esses laços, surge o Sistema Nacional de Inovação (SNI). Para Villela

e Magacho (2009, p. 03) o SNI caracteriza-se como sendo: Um Sistema Nacional de Inovação pode ser visto como um grupo articulado de instituições dos setores público e privado (agências de fomento e financiamento, instituições financeiras, empresas públicas e privadas, instituições de ensino e pesquisa, etc.), cujas atividades e interações geram, adotam, importam, modificam e difundem novas tecnologias, sendo a inovação e o aprendizado seus aspectos cruciais.

Por si só, a conceituação já coloca vários pontos complexos, o mesmo ocorre em

sua atuação no meio empírico. Faz-se necessário ressaltar que o SNI vai se desenrolar de

maneira distinta, conforme o nível de desenvolvimento de cada país. Nesta perspectiva, “[...] é

consenso na literatura sobre o tema que o Brasil possui um SNI imaturo, pouco eficiente, se

comparado aos Sistemas de Inovação de países desenvolvidos” (VILLELA; MAGACHO,

2009, p. 03). Neste sentido, o SNI é o arcabouço de fatores que influem na ampliação e na

promoção da inovação, e em alguns países terão mais quesitos favoráveis que outros.

Dentre estes fatores, destaca-se a importância de um ambiente favorável para a

inovação. O Brasil é considerado imaturo no seu SNI, porém um grande passo foi dado com a

criação da Lei nº 10.973, de 02 de dezembro de 2004 (Lei da Inovação), que dispõe sobre

incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo. Atualmente

reformulada pela Lei 13.243, de 11 de janeiro de 2016. A Lei nº 11.196, de 21 de novembro

de 2005, conhecida como Lei do Bem, que institui o Regime Especial de Tributação para a

Plataforma de Exportação de Serviços de Tecnologia da Informação (REPES), o Regime

Especial de Aquisição de Bens de Capital para Empresas Exportadoras (RECAP) e o

Programa de Inclusão Digital (BRASIL, 2016).

Três atores se sobressaem, e a união destes influi na inovação, são eles: Governo,

Universidade e Empresas, também chamada de iniciativa privada. O modelo que interage

entre esses atores foi denominado Triple Helix (TH), do qual tenta explicar a importância de

cada um dos atores e a necessidade se sua interação para o progresso da inovação.

Apresentando a Triple Helix

O modelo Triple Helix (TH), em português Hélice Tríplice, vem ganhando

espaço, de um lado algumas críticas ao modelo e, de outro, as afirmações de sua importância.

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Esta teoria foi desenvolvida por foi Etzkowitz e Leydesdorff, no final da década de 1990.

Etzkowitz é um estudioso de renome internacional em estudos de inovação, criador da

Universidade Empreendedora e conceitos Triple Helix, presidente da Triple Helix Association

e cofundador da Triple Helix Conference Series Internacional.

Para Valente (2010, p. 01), expõe que ao desenvolverem esta teoria, tinham o

intuito de “[...] descrever o modelo de inovação com base na relação Governo, Universidade e

Indústria”. Arantes e Serpa (2013) acrescentam ainda que, nos ideais desta teoria, há uma

tentativa de explicar a interação entre Estado, Indústria e Universidade e como ela é capaz de

impulsionar o desenvolvimento econômico e o desenvolvimento do conhecimento, tanto local

quanto em âmbito regional.

Etzkowitz e Leydesdorff afirmam que só teorizaram o que já ocorria na prática.

Segundo os autores, esta teoria surgiu a partir da observação do Massachussetts Institute of

Technology (MIT). Etzkowitz, em uma entrevista à Valente (2010, S/P), reafirma esta ideia:

Eu extraí a teoria da prática, ao analisar o papel do Massachussets Institute of Technology (MIT), no estado da Nova Inglaterra, nos EUA, nos anos 1930 e 1940. Ali, eles já funcionavam de acordo com a hélice tríplice, mas não tinham a terminologia, nem uma teoria. Eu apenas escrevi essa história no meu livro “MIT and the rise of entrepreneurial science”. Foi daquela análise que eu extraí a ideia.

Portanto, a teoria da TH segundo Etzkowitz (2003) prevê que a chave para o

aperfeiçoamento das condições para a inovação está na relação entre governo, universidade e

indústria, conforme apresentado na Figura 1. Neste modelo o autor salienta que o papel do

governo é ser uma fonte de relações contratuais que dão garantias de interações e trocas

estáveis. A universidade é tida como fonte de tecnologia e conhecimento. Já a indústria é vista

como o núcleo da produção.

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Figura 1: Ilustração do modelo Triple Helix.

Fonte: Etzkowitz (2003) .

Neste contexto, verifica-se que pela teoria da TH deve ocorrer uma interação, um

fluxo entre os três agentes envolvidos no processo de inovação: governo, universidade e

empresa.

No entanto, este modelo foi moldado e superado com o passar dos anos.

Inicialmente, configurava-se em um modelo estático. O Governo era o protagonista, ou seja,

ele controlava as indústrias e a universidade (ARRANTES; SERPA, 2013). O seu sucessor,

chamado de modelo Laissez-Faire, centrava-se na separação entre Empresa, Governo e

Universidade, ocorrendo a integração apenas quando necessária. No modelo atual da Triple

Helix, há uma relação intensa e constante entre Empresa, Governo e Universidade.

Atualmente a TH é tratada como um modelo, não mais como uma teoria (VALENTE, 2010,

S/P).

Esta interação, de acordo com alguns autores, é condição sine qua non para a

sustentabilidade e progresso da economia. “Para uma economia que atualmente é baseada no

conhecimento e na inovação, a interação entre Universidade, Empresa e Governo se torna

destaque para seu crescimento” (CHAIS, et. al, 2013, p. 02). Nos anos 90, duas correntes se

destacam em âmbito internacional: a primeira corrente foi denominada de Segunda Revolução

Acadêmica, que debatia a interação entre Universidade e Empresa.

Apontam-se alguns fatores que explicam o porquê desta interação, por parte da

empresa, como: custo crescente das pesquisas e sua importância para manter a

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competitividade, o compartilhamento dos custos e também dos riscos, o ritmo frenético da

introdução das inovações, o que incluiu o fator tempo e ainda a diminuição dos recursos do

governo para o setor. Por parte da universidade, as restrições para obter recursos

governamentais, a possibilidade de financiamento por parte das empresas e a legitimação da

comunidade acadêmica perante a sociedade foram fatores que contribuíram para o interesse

por essa interação (CHAIS, et. al, 2013).

A segunda corrente foi denominada de Importância das Relações com o Entorno

na Competitividade das Empresas, de inspiração schumpeteriana e, tem em seu ponto central,

a inovação. Para esta teoria, as inovações que ocorrem no ambiente interno das empresas são

decisivas à competitividade de um país, entendendo ter a universidade um papel importante,

mas distinto das visões anteriores, que a destacam pela importância na realização da pesquisa

básica (CHAIS, et. al, 2013). Nesta perspectiva, a universidade foi entendida também como

produtora de conhecimento que capacitava as pessoas para inovar, dando à universidade um

lugar privilegiado nessa relação.

Exposto um panorama geral do surgimento e das fases evolutivas do modelo

Tríplice Helix, buscaremos compreender a importância e o papel de cada ator, ou seja, de

cada hélice. Iniciamos com o Governo, aqui compreendido como o detentor e gestor dos

aparatos e recursos públicos. Para Fonseca (2001, p. 69), o autor aponta o Governo como o

responsável pela preparação do ambiente favorável e como financiador.

Desse modo, o principal papel do Governo, no que concerne à inovação tecnológica, portanto, é o de prover os incentivos corretos ao desenvolvimento e à difusão de idéias, por parte do setor privado (ações indiretas). Promover um ambiente político, econômico e institucional que estimule as empresas a investir em ciência, tecnologia, pesquisa e desenvolvimento.

No que tange ao ambiente econômico favorável, o Governo precisa manter o país

em uma posição sólida, a fim de que investidores nacionais e estrangeiros enxerguem como

um investimento de baixo risco o investimento no país.

As empresas possuem um papel mais ativo, que vai desde o desenvolvimento, a

integração até a liderança do processo. São responsabilidades dos entes privados na

constituição da TH: “Desenvolver produtos e serviços inovadores; Promover a interação com

os centros de transferência de tecnologia da comunidade científica; Liderar os processos de

mudança” (ABDALA, et. al, 2009, p. 08). No entanto, elas enfrentam também algumas

limitações, como, por exemplo, “[...] pouca capacidade de investimentos em inovação e

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desenvolvimento de tecnologias e despreparo acadêmico e tecnológico para a condução de

pesquisas” (ABDALA, et. al, 2009, p. 08).

De acordo com Abdala (2009) as organizações não deixam de visar ao lucro, pois

é sua característica principal, mas elas firmam parcerias, a fim de obter o conhecimento capaz

de gerar a inovação e, consequentemente, garantir a competitividade necessária para

permanecer no mercado. A outra hélice, a Universidade, agrega inúmeras responsabilidades,

dentre elas: “[...] a tarefa de promover o desenvolvimento econômico e social por meio de

novas estruturas organizacionais, como centros interdisciplinares” (ABDALA, et. al, 2009, p.

07).

A Universidade é composta por três pilares: o ensino, a pesquisa e a extensão.

Não cabe a ela unicamente capacitar profissionais para o mercado de trabalho. Na atualidade,

deseja-se que a Universidade seja uma instituição empreendedora. Um dos principais fatores

para que isso ocorra decorre do quadro docente. É necessário que os professores sejam

empreendedores e apresentem esse conceito a seus alunos.

Nesse sentido, é preciso ter atenção com a qualidade do corpo docente de uma Universidade, pois essa qualidade está positivamente relacionada ao envolvimento da academia no patenteamento, na capacidade empreendedora da universidade e de seus acadêmicos. Dessa forma, os professores que possuem maior envolvimento empreendedor são aqueles que irão transmitir essa capacidade e motivação em sala de aula, formando, assim, jovens comprometidos com o desenvolvimento econômico de um país (CHAI, et. al, 2013, p. 05).

Entre as incumbências da Universidade na TH destaca-se: “criar fontes de novos

conhecimentos e tecnologias; estabelecer relações com as empresas e os governos; criar novas

áreas de atuação” (ABDALA, et. al, 2009, p. 07). Contudo, outro fator está ligado

intimamente à Universidade, que é a superação de desigualdades e possibilidade de ascensão

social, o que reflete de forma direta no desenvolvimento socioeconômico, segundo Santos

(1999, p. 212): “[...] a procura pelo ensino superior deixou de ser apenas a procura de

excelência e passou a ser também a procura de democracia e igualdade, representando para

todo um novo contingente de sujeitos a chance de inserção social e a melhoria de suas

condições de vida”.

Desta forma, a busca pela inovação é também a busca por pessoas qualificadas,

capazes de realizarem pesquisas. Essa qualificação só é possível com o Ensino Superior, e

mais precisamente por universidades que possuem inseridas em sua estrutura a pesquisa.

Assim, a inovação, além de ser necessária para as empresas, é promotora de desenvolvimento

econômico, bem como impulsionadora do desenvolvimento social.

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A interação entre Universidade, Empresa e Governo no Brasil possui algumas

peculiaridades, isso decorre também do fato de o Brasil não possuir uma forte política de

inovação. Para Abdala et. al (2013), o modelo de Triple Hélice precisa ser repensado no

Brasil, pois não ocorre de fato uma interação entre as hélices.

Os Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT) é uma das mais evidentes interações

entre Governo, Universidade e Empresa ou setor privado no Brasil.

Em 1998, iniciou-se uma discussão sobre a importância da Propriedade Industrial para o desenvolvimento econômico do país, principalmente em relação à internacionalização da economia. Nessa década, ficou evidente a falta de uma legislação nacional que contemplasse e norteasse as ações dessa área em desenvolvimento, pois os NITs possuíam nomenclaturas diferentes, ações desencontradas e totalmente sem foco. Essa situação foi crucial para a criação da Lei Nacional de Inovação em 2004 (CHAI, 2013, p. 09).

A Lei de Inovação (Lei nº 10.793/2004) considera os NITs como “[...] Núcleo de

Inovação Tecnológica (NIT): estrutura instituída por uma ou mais Instituição Científica,

Tecnológica e de Inovação (ICTs), com ou sem personalidade jurídica própria, que tenha por

finalidade a gestão de política institucional de inovação e, por competências mínimas, as

atribuições previstas nesta Lei” (BRASIL, 2016).

O artigo 16 da desta Lei, em seu primeiro parágrafo atribui inúmeras

competências aos NITs, dentre elas:

Art. 16. Para apoiar a gestão de sua política de inovação, a ICT pública deverá dispor de Núcleo de Inovação Tecnológica, próprio ou em associação com outras ICTs. § 1o São competências do Núcleo de Inovação Tecnológica a que se refere o caput, entre outras: I - zelar pela manutenção da política institucional de estímulo à proteção das criações, licenciamento, inovação e outras formas de transferência de tecnologia; II - avaliar e classificar os resultados decorrentes de atividades e projetos de pesquisa para o atendimento das disposições desta Lei; III - avaliar solicitação de inventor independente para adoção de invenção na forma do art. 222; IV - opinar pela conveniência e promover a proteção das criações desenvolvidas na instituição; V - opinar quanto à conveniência de divulgação das criações desenvolvidas na instituição, passíveis de proteção intelectual; VI - acompanhar o processamento dos pedidos e a manutenção dos títulos de

2 Art. 22. Ao inventor independente que comprove depósito de pedido de patente é facultado solicitar a adoção de sua criação por ICT pública, que decidirá quanto à conveniência e à oportunidade da solicitação e à elaboração de projeto voltado à avaliação da criação para futuro desenvolvimento, incubação, utilização, industrialização e inserção no mercado (BRASIL, 2016).

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propriedade intelectual da instituição. VII - desenvolver estudos de prospecção tecnológica e de inteligência competitiva no campo da propriedade intelectual, de forma a orientar as ações de inovação da ICT; VIII - desenvolver estudos e estratégias para a transferência de inovação gerada pela ICT; IX - promover e acompanhar o relacionamento da ICT com empresas, em especial para as atividades previstas nos arts. 6o a 9;

X - negociar e gerir os acordos de transferência de tecnologia oriunda da ICT (BRASIL, 2016).

A Lei de Inovação, assim como a Lei do Bem, é considerada como um avanço

significativo no tocante à inovação para o país. Ao inverso do que ocorre nos países

desenvolvidos, o maior investidor no setor, no caso brasileiro, é o Estado. “No Brasil, o

Governo é responsável por 60,2% do total dos gastos nacionais com Pesquisa e

Desenvolvimento (P&D), enquanto os outros 39,8% são provenientes de capital privado”

(CASTRO; SOUZA, 2012, p. 126).

Um importante instrumento de visibilidade são as pesquisas acadêmicas. Ao

analisar o que está sendo pesquisado na academia, é possível obter um panorama de qual o

interesse dos pesquisadores brasileiros pela temática. É notório que as pesquisas acadêmicas

têm capacidade de influenciar o meio social, pois o pesquisador é visto como um elemento

neutro, com argumentos sólidos a partir de seus estudos.

Procedimentos Metodológicos

Para este estudo foi realizado uma pesquisa bibliográfica, de cunho qualitativo,

“[...] a qual consiste no levantamento de referências teóricas já analisadas e publicadas, por

meio de escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites”

(FONSECA, 2002, p. 32). Levando em consideração ao fato de que, na contemporaneidade,

as plataformas digitais são um excelente local para pesquisas, o estudo foi fundamentado em

uma pesquisa na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD).

A Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) tem por objetivo integrar, em um único portal, os sistemas de informação de teses e dissertações existentes no país e disponibilizar para os usuários um catálogo nacional de teses e dissertações em texto integral, possibilitando uma forma única de busca e acesso a esses documentos. O IBICT coleta e disponibiliza apenas os metadados (título, autor, resumo, palavra-chave, etc.) das teses e dissertações, sendo que o documento original permanece na instituição de defesa. Dessa forma, a qualidade dos metadados coletados e o acesso ao documento integral são de inteira responsabilidade da instituição de origem. (IBICT, 2016, S/P).

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A pesquisa foi realizada na modalidade “todos os campos”, a qual contempla a

busca por título, autor, assunto, instituição de ensino e tag, possibilitando uma varredura

ampla do termo pretendido. Realizou-se a busca com os termos “Sistema Nacional de

Inovação”, “Núcleo de Inovação Tecnológica”, “Triple Helix” e “Tríplice Hélice”. Cada

termo foi buscado separadamente na modalidade “todos os campos”.

Revisão Sistemática: pesquisa no banco de dados na Biblioteca Digital Brasileira de

Teses e Dissertações.

Com o intuito de identificar as produções brasileira nas temáticas referentes ao

SNI, do modelo TH e dos NIT, foi realizado uma busca na Biblioteca Digital Brasileira de

Teses e Dissertações (BDTD), que reúne em suas plataformas as teses e as dissertações

defendidas no país, e tem em seu intuito dar visibilidade a esses estudos.

A plataforma BDTB permite as buscas na modalidade “todos os campos”,

contemplando buscas por título, autor, assunto, instituição de ensino e tag, e, na modalidade

“busca avançada”. É possível limitar por instituição, recursos, grau (tese ou dissertação) e

idioma. Inicialmente, foi inserido na plataforma BDTD o termo “Sistema Nacional de

Inovação”, na modalidade de busca “todos os campos”, localizando 314 estudos, distribuídos

em 30 instituições de ensino, variando o número de estudos produzidos em cada uma delas.

Tabela 2 – Instituição e número de pesquisas pelo termo “Sistema Nacional de Inovação”

INSTITUIÇÃO NÚMERO DE ESTUDOS

INSTITUIÇÃO NÚMERO DE ESTUDOS

UNICAMP 42 UNESP 7

UNB 36 UCB 5

USP 28 UFPB 5

UFG 17 UFRN 5

UFSC 17 UNISINOS 5

PUC-RIO 16 INMETRO 4

UFRGS 14 INPA 4

METODISTA 12 UFES 4

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UFPE 12 UFS 4

UFSCAR 12 ITA 3

FIOCRUZ 11 UFLA 3

UFTM 11 UFMS 3

UFPR 10 UFRPE 3

UFMG 9 UFV 3

FGV 7 IPM 2

TOTAL: 30 Total: 314

Fonte: BDTD (2016).

Pelo termo “Núcleo de Inovação Tecnológica”, foram encontrados 78 estudos,

sendo 55 dissertações e 23 teses, elaborados nas seguintes Instituições de Ensino:

Tabela 3 – Instituição e número de pesquisas pelo termo “Núcleo de Inovação Tecnológica”

INSTITUIÇÃO NÚMERO DE ESTUDOS

INSTITUIÇÃO NÚMERO DE ESTUDOS

USP 13 IPM 01

UFSC 09 ITA 01

UNICAMP 06 MACKENZIE 01

UFLA 05 PUC_PR 01

UFPR 05 UERJ 01

UTFPR 05 UFES 01

UFSCAR 04 UFPE 01

UFG 03 UFTM 01

UFRGS 03 UFV 01

UFS 03 UNESP 01

FGV 02 UNIFOR 01

METODISTA 02 UNISINOS 01

UCS 02

UNB 02

IEN 01 TOTAL: 28 Total: 78

Fonte: BDTD (2016).

Na busca pelo termo “Triple Helix”, localizaram-se 56 estudos, 37 dissertações e

19 teses, levando em consideração a possível variação de nomenclatura. Buscou-se também

pelo termo “Tríplice Hélice”, localizando 38 estudos, 30 dissertações e 8 teses. Ao confrontar

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os estudos encontrados pelos termos “Triple Helix” e “Tríplice Hélice”, constatou-se que seis

estudos se repetiam, possuindo os seguintes títulos e instituições de origem:

Tabela 4 – Títulos das pesquisas encontradas

TÍTULO INSTITUIÇÃO PARQUE TECNOLÓGICO DE FÁRMACOS E BIOCIÊNCIAS DE

PERNAMBUCO: UMA ANÁLISE DA IMPORTÂNCIA DA UFPE NA INDUÇÃO E NA IMPLANTAÇÃO

UFPE

SISTEMA DE INOVAÇÃO BASEADO EM CONHECIMENTO E O MODELO TRÍPLICE HELICE: UNIVERSIDADE NA CONSTRUÇÃO DA VANTAGEM COMPETITIVA DO SETOR DE TECNOLOGIA DA

INFORMAÇÃO DE PERNAMBUCO

UFPE

FERRAMENTAS PARA ADEQUAÇÃO DAS LINHAS DE PESQUISAS DE INSTITUTOS DE PESQUISA: O EXEMPLO DO IPEN

USP

FATORES QUE INFLUENCIAM A PROBABILIDADE DE OCORRÊNCIA DE INOVAÇÃO TECNOLÓGICA EM MICRO E

PEQUENAS EMPRESAS BRASILEIRAS: UMA ANÁLISE QUANTITATIVA DOS DADOS DA PINTEC 2008

FGV

COMUNICAÇÃO E COORDENAÇÃO INTEGRADAS PARA ARTICULAR UNIVERSIDADE-EMPRESA-GOVERNO: UM

AMBIENTE DE INOVAÇÃO PARA O CAFÉ

UFLA

A PARTICIPAÇÃO DOS ENTES UNIVERSIDADE, INDÚSTRIA E GOVERNO EM INCUBADORAS DE BASE TECNOLÓGICA

UFSC

Fonte: BDTD (2016).

Os demais, conforme demonstrado na Tabelas 5, ao lado direito são as instituições

que utilizam o termo Triple Helix, e do lado esquerdo as instituições que utilizam o termo

Hélice tríplice.

Tabela 5 – Instituição e número de pesquisas pelos termos “Triple Helix” e “Hélice tríplice”

INSTITUIÇÃO NÚMERO DE ESTUDOS

INSTITUIÇÃO NÚMERO DE ESTUDOS

UNB 9 UFPE 5

UCS 4 UNB 5

UFRN 4 UFSC 4

UFRGS 3 UCS 3

UFSC 3 UFLA 3

UNICAMP 3 UFRN 3

USP 3 FGV 2

UERJ 2 UERJ 2

UFAL 2 UNISINOS 2

UFLA 2 PUC_RIO 1

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UFPE 2 UEL 1

UFSM 2 UFBA 1

UFV 2 UFSM 1

UNESP 2 UFV 1

UNISINOS 2 UNICAMP 1

FGV 1 UNIFOR 1

PUC_RIO 1 USP 1

PUC_RS 1 UTFPR 1

UEL 1

UFBA 1

UFC 1

UFPR 1

UFS 1

UFU 1

UNIFOR 1

UTFPR 1

TOTAL: 26 Total: 56 TOTAL: 18 Total: 38

Fonte: BDTD (2016).

Ao analisar estes dados extraídos da BDTD, é possível constatar que o Brasil

possui um número significativo de produção referente à temática. Os estudos não estão

concentrados em uma única região e instituição de ensino. É possível constatar também que

algumas instituições possuem um foco mais empreendedor e, possuem um maior número de

produção em detrimento de outras instituições, onde a inovação está adentrando de maneira

gradativa.

Considerações Finais

Em meio as incertezas e as instabilidades que permeiam o mercado na atualidade,

cabe as empresas encontrarem maneiras de se manter competitivas e, consequentemente, no

mercado. Nesta perspectiva, a inovação deixa de ser uma alternativa e passa a ser uma

necessidade. O empresário empreendedor, movido pelo sistema capitalista ao empreender, faz

com que os demais tentem superá-lo, girando o mercado. Os demais empresários, se

decidirem não empreender, estão fadados ao fracasso.

Etzkowitz e Leydesdorff, ao analisar o MIT, enxergaram que, naquele caso

empírico, existia uma relação entre Indústria, Governo e Universidade. A partir desta análise,

criou-se a teoria da Triple Helix, que, posteriormente, evoluiu para um modelo. Neste modelo,

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cada um dos atores representa uma hélice e cada um compõe esse conjunto por razões

distintas, mas conciliáveis.

O Governo precisa que a economia circule para que isso lhe garanta mais

arrecadação, sem a qual ele não consegue fazer funcionar a máquina estatal. A inovação

garante a permanência do mercado competitivo. Ele desempenha o papel de financiador,

embora não devesse ser o principal financiador, além de ser o responsável por manter um

ambiente favorável à inovação. As empresas ou indústrias dependem da inovação para sua

manutenção, porém são altos os custos das pesquisas, bem como de ser uma corrida contra o

tempo. Sem inovação uma empresa deixa de ser competitiva, o que acarreta diminuição ou,

até mesmo, extinção dos lucros, que é seu fim.

Por esses motivos, a hélice Governo e a hélice Indústria viram a hélice da

Universidade como um importante aliado, pois, é na Universidade que se concentra o maior

número de pesquisadores no Brasil e um grande número nos demais países. Ainda, é na

Universidade que está o conhecimento e é dele que decorre a pesquisa (básica e aplicada), que

é um requisito para a inovação. Neste sentido, a Universidade contribui com a transmissão do

conhecimento e com a realização de pesquisas. Por outro lado, ela precisa realizar pesquisa e

extensão para garantir o seu status como Universidade, a fim de se reafirmar socialmente, ou

seja, dar uma resposta concreta à sociedade.

Com o atual estágio de globalização, as fronteiras entre os países são cada vez

mais irrisórias e a inovação cada vez mais necessária. Em decorrência disso, os países

sentiram a necessidade da criação de um Sistema Nacional de Inovação. É unanimidade entre

os estudiosos do tema, que o Brasil não possui um forte SNI, mas que a promulgação da Lei

nº 10.973, de outubro de 2004, conhecida como Lei de Inovação (por muitos até considerada

como uma política industrial), e a Lei nº 11.196, novembro de 2015, conhecida como Lei do

Bem, foram passos importantes para o fortalecimento do SNI brasileiro. No entanto, ainda

está longe do seu ideal. A falta de excelência do SNI no Brasil decorre principalmente por ser

o Governo o maior investidor em pesquisa e inovação no Brasil, enquanto, nos países

desenvolvidos, onde o SNI é bastante desenvolvido, a maior parte dos investimentos advém

do setor privado.

Os NITs são atualmente a experiência mais próxima da consolidação da TH no

Brasil, eles possuem inúmeras competências que lhe foram atribuídas legalmente. A partir

dessas constatações, evidencia-se que a inovação está atrelada ao conhecimento. O

conhecimento, por sua vez, é indissociável ao ensino. Em decorrência disso, a Universidade

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assume um papel central nesta interação e, sendo assim, cabe a ela o ensino que gera o

conhecimento, que é requisito para a geração da inovação, e esses dois fatores (inovação e

educação) são essenciais para o desenvolvimento socioeconômico de um país.

A partir do novo Marco Legal da Ciência e Tecnologia, acredita-se que seja uma

nova fase para P&D e C&T no Brasil, a partir do momento que estabelece novos critérios de

incentivo à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo, com vistas à

capacitação tecnológica, ao alcance de autonomia tecnológica e ao desenvolvimento do

sistema produtivo nacional e regional no país. Os principais destaques são: a) Dispensa da

obrigatoriedade de licitação para compra ou contratação de produtos para fins de pesquisa e

desenvolvimento; b) Regras simplificadas e redução de impostos para importação de material

de pesquisa; c) Permite que professores das universidades públicas em regime de dedicação

exclusiva exerçam atividade de pesquisa também no setor privado, com remuneração; d)

Aumenta o número de horas que o professor em dedicação exclusiva pode dedicar a

atividades fora da universidade, de 120 horas para 416 horas anuais (8 horas/semana); e)

Permite que universidades e institutos de pesquisa compartilhem o uso de seus laboratórios e

equipes com empresas, para fins de pesquisa (desde que isso não interfira ou conflita com as

atividades de pesquisa e ensino da própria instituição); f) Permite que a União financie, faça

encomendas diretas e até participe de forma minoritária do capital social de empresas com o

objetivo de fomentar inovações e resolver demandas tecnológicas específicas do país; g)

Permite que as empresas envolvidas nesses projetos mantenham a propriedade intelectual

sobre os resultados (produtos) das pesquisas.

No presente estudo, ao se realizar uma busca na Biblioteca Digital Brasileira de

Teses e Dissertações com os termos “Sistema Nacional de Inovação”, “Núcleo de Inovação

Tecnológica”, “Triple Helix” e “Tríplice Hélice”, constatou-se que existem inúmeras teses e

dissertações referentes à temática, oriundas de inúmeras universidades. Neste sentido, pode

ser inferir como um ponto positivo para o avanço da inovação no país, mas ao mesmo tempo,

reconhece-se que o Brasil está longe de chegar ao nível de excelência, no que se tange à

inovação.

Concluiu-se também que a necessidade por inovação propulsiona tanto o

desenvolvimento social quanto o desenvolvimento econômico. Acredita-se que o pilar da

inovação são as pesquisas produzidas nas universidades, estimulando a educação, o que

proporciona um instrumento eficaz para o desenvolvimento do país.

REFERÊNCIAS

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O FUNDAMENTO FILOSÓFICO DO COPYRIGHT À LUZ DAS CONCEPÇÕES UTILITARISTAS EM JEREMY BENTHAM E JOHN STUART MILL

THE PHILOSOPHICAL FOUNDATION OF COPYRIGHT IN LIGHT OF UTILITARIANS CONCEPTIONS IN

JEREMY BENTHAM AND JOHN STUART MILL

FUNDACIÓN FILOSÓFICA DEL COPYRIGHT A LA LUZ DE LAS CONCEPCIONES UTILITARIAS EN JEREMY BENTHAM Y JOHN STUART MILL

Geraldo Magela Freitas Tenório Filho1

Querino Mallmann2

RECEBIBO 12/02/2018 APROVADO 20/02/2018 PUBLICADO 12/03/2018 Editor Responsável: Carla Caldas Método de Avaliação: Double Blind Review E-ISSN: 2316-8080 DOI:10.16928

RESUMO

Os direitos autorais foram alvo de inúmeras transformações ao longo dos anos, em razão de seu processo evolutivo, no qual vislumbra a prevalência de seu aspecto patrimonialista. Essas relações sociojurídicas se intensificaram a partir do surgimento da internet, ambiente no qual os sujeitos se valeram para produção e disseminação das criações intelectuais, originando a sociedade informacional. Entretanto, muitas dessas condutas, das formas como estavam sendo praticadas, violavam os direitos do autor. Deste modo, faz-se necessária a adoção de concepções filosóficas legitimamente desenvolvidas, essenciais à fundamentação jurídico-filosófica dos direitos autorais, resguardando os direitos de autor, sem prejudicar à coletividade. Assim, contribui-se para efetivação do caráter funcional atribuído aos direitos autorais, protegendo-se os direitos fundamentais do autor e o acesso à cultura, insculpidos na Constituição Federal. PALAVRAS-CHAVE: Direitos Autorais. Patrimonialismo. Sociedade da Informação. Utilitarismo. Função Social.

ABSTRACT The author’s rights pass through many changes over the years, due to evolutionary process, in which glimpse the prevalence of patrimonial aspect. These social-legal relations intensified from emergence of the internet, environment in which the subjects invoke to production and dissemination of intellectual creations, originating the information society. However, lots of those practices, of the forms were being practiced, violated authors’s rights. Therefore, it’s necessary the adoption of philosophical conceptions legitimately developed, essential to legal- 1 Mestrando em Direito Público, pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL/AL). CV: http://lattes.cnpq.br/8907755287709770. E-mail: [email protected]. ORCID ID: 0000-0002-5840-7327. 2 Doutor em Direito pela UNISINOS, Rio Grande do Sul. Professor da Faculdade de Direito e do Mestrado em Direito da Universidade Federal de Alagoas – UFAL, onde ministra a disciplina: “Direito da Propriedade Intelectual”. CV: http://lattes.cnpq.br/2702091606416581. E-mail: [email protected]. ORCID ID: 0000-0003-3451-5478.

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philosophical foundation of copyright, protecting copyright without prejudice to the collectivity. So, contribute to realization of functional character assigned to author’s rights, protecting the fundamental author’s rights and the access to culture inscribed in the Federal Constitution. KEYWORDS: Author’s Rights. Patrimonialism. Information Society. Utilitarism. Social Function.

RESUMEN Los derechos de autor han sido objeto de innumerables transformaciones a lo largo de los años, debido a su proceso evolutivo, en el que vislumbra la prevalencia de su aspecto patrimonialista. Estas relaciones sociojurídicas se intensificaron a partir del surgimiento de Internet, ambiente en el cual los sujetos se valieron para la producción y diseminación de las creaciones intelectuales, originando la sociedad informacional. Sin embargo, muchas de esas conductas, de las formas como estaban siendo practicadas, violaban los derechos del autor. De este modo, se hace necesaria la adopción de concepciones filosóficas legítimamente desarrolladas, esenciales a la fundamentación jurídico-filosófica de los derechos de autor, resguardando los derechos de autor, sin perjudicar a la colectividad. Así, se contribuye a la efectividad del carácter funcional atribuido a los derechos de autor, protegiéndose los derechos fundamentales del autor y el acceso a la cultura, insculpidos en la Constitución Federal. Palabras-clave: Derechos de autor. Patrimonialismo. Sociedad de la Información. El utilitarismo. Función Social.

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1 INTRODUÇÃO

Os direitos autorais sempre mantiveram o aspecto patrimonialista como elemento

primordial, o que se justifica na construção histórica dos direitos autorais. Desde o império

greco-romano, eram privilégios concedidos pelo monarca, a título real (direito de propriedade),

a um número restrito de pessoas, não necessariamente os autores, os quais detinham

prerrogativas sobre as criações intelectuais, por um determinado lapso temporal.

Essa disciplina real foi norteada por concepções filosóficas utilitaristas, a partir da

limitação do direito autoral por um determinado lapso temporal, o qual, transcorrido, concede

à coletividade o direito de acesso livre à criação intelectual. Além do viés jusnaturalista, na

medida em que, conforme o pensamento Lockeano, se aproxima a propriedade material com a

imaterial, composta por bens intangíveis.

Com a invenção da imprensa, feito atribuído à Johannes Gutenberg (1400-1468), no

século XV, os impressores realizavam a exploração econômica da obra, mais uma vez presente

o aspecto patrimonial ou capitalista de obtenção de lucro, de forma que os autores ficaram

desamparados juridicamente, gozando de proteção normativa, a posteriori3.

Em momento posterior, o The Statute of Anne (1970) ou Estatuto da Rainha Ana, de

10 de abril de 1710. Foi elaborado pela Rainha Ana I, da Grã-Bretanha, com o intento de

resolver as disputas envolvendo autores e editores no tocante às criações autorais, com destaque

para a situação dos livreiros franceses, detentores de privilégios de exploração exclusiva das

criações intelectuais.

3 ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito autoral. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 4.

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Novos ares foram trazidos pela Revolução Francesa (1789-1799), atribuindo a

concepção filosófica iluminista à propriedade intelectual, a partir das contribuições de autores

como Voltaire (1694-1778) e Diderot (1713-1784), culminando, em seguida, na elaboração de

diplomas internacionais tuteladores dos direitos de autor, como, por exemplo, a Convenção de

Berna (1886).

Naquele período, a utilização das obras intelectuais, em razão do seu caráter restritivo

e escasso, era facilmente controlável pelos titulares dos direitos autorais ou seus sucessores.

Todavia, com o advento da internet, novas práticas socioculturais começaram a ser realizadas

no ambiente da sociedade informacional4, cuja troca de informações na rede assumiu

proporções incomensuráveis. Nesse sentido, as criações intelectuais, aprimoradas em razão do

aparato tecnológico, foram difundidas no ambiente virtual a um número cada vez maior de

usuários, sem haver o controle do autor sobre eventuais usos, autorizações e proibições. Para

os libertários, essa atitude não geraria a escassez das criações intelectuais, como ocorre em

relação à propriedade material. Pelo contrário, em perspectiva utilitarista, salvaguardariam o

bem-estar da coletividade, obtendo o acesso às obras como bens culturais juridicamente

tutelados.

Em razão desse cenário hodierno, surge como problemática a ser enfrentada no

decorrer do presente estudo, como promover a conciliação político, legislativa e judiciária, dos

direitos fundamentais do autor e acesso à cultura resguardados à coletividade?

Para cumprir o intento, realiza-se o estudo abordando determinados aspectos

essenciais à compreensão da temática trazida à baila, a saber:

Inicialmente, apresentam-se algumas considerações sobre o processo evolutivo dos

direitos autorais, destacando à prevalência da perspectiva patrimonialista ao longo da história.

Ademais, expõe-se os principais aspectos relativos aos sistemas anglo-saxão (copyright) e

francês (droit d’auteur) dos direitos autorais justificados, respectivamente, pela doutrina ético-

filosófica utilitarista, exposta, sobretudo, pelos teóricos Jeremy Bentham (1748-1832) e John

Stuart Mill (1806-1873) e pelas contribuições filosóficas manifestadas por autores como John

Locke (1632-1704), apresentando à propriedade material como bem jurídico natural, absoluto

e perpétuo. Os direitos autorais, quando limitados temporalmente, não mais reconhecendo seu

caráter absoluto, trazem à baila o fim utilitário voltado à satisfação da felicidade coletiva,

efetiva, no plano autoral, a partir da liberação das obras à sociedade.

4 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

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No segundo tópico, explicita-se as mudanças de perspectivas autorais na sociedade da

informação, com prevalência do caráter humanista dos direitos de autor e sua função social,

direcionada ao progresso econômico e tecnológico da coletividade, a partir da disseminação das

criações intelectuais. Em momento seguinte, tece-se algumas considerações sobre o utilitarismo

surgido entre os séculos XVIII e XIX, a partir das contribuições de filósofos e economistas

ingleses, destacando-se como seus principais expoentes, Jeremy Bentham (1748-1832) e John

Stuart Mill (1806-1873).

Por fim, elenca-se as principais contribuições de John Stuart Mill para conciliação

entre o direito individual do autor com a filosofia utilitarista, influenciado por diversos teóricos,

entre os quais, Aristóteles (384 a. c. – 322 a. c.), Nicolau Maquiavel (1469-1527), Francis Bacon

(1561-1626), Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-1704) e David Hume (1711-

1776).

Conclui-se pela necessidade de conciliação, no âmbito político, legislativo e judiciário,

os direitos fundamentais do autor, morais e patrimoniais, sem macular os interesses da

sociedade informacional, ávida a disseminar os bens culturais na rede, com o auxílio dos meios

tecnológicos colocados à sua disposição. Com isso, efetiva-se à função social atribuída aos

direitos autorais (artigo 5º, XXIII, da Constituição Federal), bem como outros direitos

fundamentais como, por exemplo, o acesso à cultura (artigo 215, da CRFB/88).

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2 O PATRIMONIALISMO5 COMO LINHA PREVALENTE NA HISTÓRIA DOS DIREITOS AUTORAIS: A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL

Inicialmente, faz-se necessário tecer algumas considerações sobre o processo

evolutivo pelo qual perpassou o direito autoral. A compreensão da evolução histórica de

qualquer ramo jurídico não deve ser vislumbrada como mero saudosismo, atividade inútil ou

supérflua, mas como elemento essencial para a melhor compreensão dos tempos atuais. Não

cabe afirmar que algo pretérito não se relaciona com o presente. Pelo contrário, a análise do

direito autoral na atualidade pressupõe o entendimento do horizonte histórico pelo qual

perpassou, à luz de suas fases evolutivas.6

Os direitos autorais incidem sobre quase todas as produções do intelecto humano,

sejam elas criativas (produções artísticas, manifestações culturais, científicas e publicitárias ou

industriais (invenções e modelos de utilidade). Apresenta natureza jurídica controvertida, desde

os primórdios, até os dias atuais7. Isso porque, em seu âmbito, atuam direitos de cunho moral

ou personalíssimos e direitos patrimoniais.

O direito de autor apresenta natureza jurídica híbrida, dúplice ou sui generis. Ao autor

reconhece-se dois feixes de direitos. Um deles diz respeito aos direitos cunho moral ou pessoal

5 Consiste em um conceito elaborado pelo sociólogo alemão Max Weber (1864-1920), no final do século XIX. Refere-se a um modo de dominação específico, incidente sobre as esferas econômica e sociopolítica. Ou seja, trata-se da dominação patrimonial, muitas vezes assumida pelo Estado, mediante sua imperatividade perante à sociedade. No Brasil, essa temática foi desenvolvida por diversos autores, entre os quais: Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro, Florestan Fernandes, Victor Nunes Leal, José Oswaldo de Meira Penna e Paulo Mercadante. 6 MORAES, Rodrigo. Os direitos morais do autor: repersonalizando o direito autoral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 31. 7 GANDELMAN, Henrique. De Gutemberg à internet: direitos autorais na era digital. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 23-24.

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(personalíssimos), consagrados no artigo 24, da Lei nº 9.610/98. Eles atuam como vínculos que

unem o autor ou criador à obra intelectual, tutelando os direitos inerentes à sua personalidade.

Surgem com a criação da obra, produzindo efeitos perenes e mantendo o liame com o criador8.

O outro âmbito refere-se aos direitos patrimoniais (artigo 29, da referida lei)9, relativos

à exploração econômica das obras juridicamente tuteladas10. Esses direitos salvaguardam uma

série de prerrogativas de cunho pecuniário, surgidas com a criação da obra e manifestadas, em

concreto, com a sua comunicação ao público11. Referem-se à comunicação e à circulação das

obras intelectuais no grande mercado, sendo objeto de exploração econômica por meio de todos

os processos técnicos existentes ou que venham a ser inventados no futuro12.

O direito autoral, em sua gênese, nasce como a síntese de interesses monárquicos e da

burguesia ascendente, representada pela classe de comerciantes de livros (livreiros ou editores),

organizados em corporações, os quais, gradualmente, concediam, além dos privilégios13,

direitos de reprodução. Ou seja, compreende o direito do editor sobre as obras literárias e

escritos em geral, além de gravuras e outras criações intelectuais14.

Na antiguidade, a noção de autoria era desconhecida pela maioria dos povos. No

oriente médio, as narrativas épicas, religiosas, tragédias, poesias, dentre outros gêneros

literários, referiam-se às lendas. Suas autorias eram atribuídas a figuras mitológicas, deuses ou

heróis divinizados, ou ainda, se tornavam anônimas. A paternidade da obra, direito moral, não

era atribuída ao seu legítimo criador, e sim, aos deuses cultuados pelos povos antigos15.

Durante a Idade Média, em razão da exclusividade monástica, havia o monopólio do

saber ou elitização do conhecimento. Desde já se vislumbra os traços patrimonialistas, como

forma de dominação ou poder nas esferas econômica e sociopolítica, tendo em vista a restrição

8 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de autor. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 69. 9 Não obstante haja previsão dos direitos morais e patrimoniais do autor na legislação autoral brasileira, é factível a sua conformidade com a legislação internacional. Nesse sentido, a previsão desses aspectos relativos ao direito de autor também encontra azo, por exemplo, na Convenção de Berna, em seus artigos 6 bis, 9, a ser estudado em momento oportuno, tópico 2.1.1 desse estudo. 10 BRANCO JÚNIOR, Sérgio Vieira. Direitos autorais: princípios gerais. In: Roteiro de Curso da Fundação Getúlio Vargas 2008.2. Rio de Janeiro: FGV, 2008. p. 13. 11 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de autor. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 71. 12 GUEIROS JÚNIOR, Nehemias. O direito autoral no show business: tudo o que você precisa saber. vol. 1 – A música. Rio de Janeiro: Gryphus, 2005. p. 59. 13 Os privilégios atuam como direitos de natureza econômica, não autoral, utilizados, inclusive, para o controle das vendas pelos livreiros, um instrumento político e de censura, conforme preceitua FRAGOSO, João Henrique da Rocha. Direito autoral: da antiguidade à internet. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 48. 14 FRAGOSO, João Henrique da Rocha. Direito autoral: da antiguidade à internet. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 47. 15 BARROS, Carla Eugênia Caldas. Manual de direito da propriedade intelectual. Sergipe: Evocati, 2007, p. 467.

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do acesso às criações intelectuais produzidas. O Estado, desde já, estabeleceu mecanismos de

controle com o fim de satisfazer as classes dominantes, sobretudo a burguesia, além do

monopólio religioso.

O ato de escrever possuía elevado custo, sendo uma atividade lenta e dispendiosa. Os

escritos, até meados do século XV, eram manuscritos pelos copistas. A representação dessa

realidade pode ser vislumbrada no filme “O Nome da Rosa”, de 1986, inspirado no romance

homônimo do escritor italiano Umberto Eco16, lançado em 1980. Os monges, conforme descrito

na obra, transcreviam os manuscritos para as suas bibliotecas, contribuindo para o

aprimoramento cultural da sociedade17.

Na idade moderna (séculos XV e XVIII), a partir da invenção da imprensa ou prensa

por tipos móveis, idealizada pelo inventor alemão Johannes Gutenberg (1398-1468), fixou-se

definitivamente a escrita e as ideias puderam ser disseminadas em larga escala (industrial).

Nesse momento, intensifica-se a problemática da proteção jurídica do direito autoral, sobretudo

no tocante à remuneração dos autores e os direitos de reprodução e utilização das criações

intelectuais. Os governantes detinham o controle dos privilégios sobre as obras, os quais podiam

ser revogados conforme os interesses dos próprios concedentes, e resguardados, na maioria das

vezes, aos editores, em detrimento dos autores18.

Com o progresso tecnológico, ocorreu a disseminação das criações intelectuais,

ampliando a possibilidade de propagação das obras à coletividade. Os livros puderam ser

impressos em larga escala, com reduzido custo. Isso conduziu à sociedade a clamar pela

regulamentação do direito autoral, demandando-se novas modalidades de proteção normativa19.

Todavia, não se pode afirmar que o surgimento do direito autoral ocorreu apenas com

o advento da imprensa. Isso porque, deve-se vislumbrar os fatos pretéritos relevantes para a

formação desse ramo jurídico, como os casos de plágio, ocorridos na antiguidade greco-romana.

Durante um longo período, a proteção autoralista vem sendo reconhecida, a partir dos

privilégios concedidos aos autores e editores20. Não obstante sejam admitidos os méritos do

surgimento da imprensa para a regulamentação desse direito.

No tocante ao caráter patrimonialista, até a invenção da escrita, o ato de escrever não

possuía finalidade lucrativa. Com a tipografia, começaram a surgir relações patrimoniais

16 ECO, Humberto. O nome da rosa. Rio de Janeiro: Record, 1995. 17 HAMMES, Bruno Jorge. O direito de propriedade intelectual. São Leopoldo/RS: Unisinos, 2002. p. 20. 18 GANDELMAN, Henrique. De Gutemberg à internet: direitos autorais na era digital. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 26. 19 MORAES, Rodrigo. Os direitos morais do autor: repersonalizando o direito autoral. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 35. 20 BARRETO, Tobias. Estudos de Direito. São Paulo: Bookseller, 2000. p. 452.

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envolvendo as criações intelectuais. Escrever tornou-se uma prática não apenas lúdica, como

também comercial, com potencial econômico, na sociedade capitalista.

A Revolução Francesa, em 1789, período de intensa agitação política e social na

França, proporcionou a efervescência dos direitos individuais de liberdade, igualdade e

fraternidade. A partir de então, ocorreu o reconhecimento da primazia do autor, em seu âmbito

moral ou personalíssimo, sobre a criação intelectual, no tocante aos seus aspectos patrimoniais.

O regime de privilégios começou a ser combatido, sobretudo às práticas de contrafação

(reprodução não autorizada). O liberalismo econômico e político, oriundo da classe em

ascensão (burguesia), proporcionou a supressão dos monopólios reais sobre as criações

intelectuais.

No Brasil, também se constatou a reverberação das raízes patrimonialistas na

construção da proteção jurídica autoral. A primeira disposição normativa autoral foi

estabelecida pelo Decreto Imperial de 1827, responsável pela criação dos cursos jurídicos em

nosso país, salvaguardando, em seu artigo 7º, privilégios exclusivos de exploração da obra aos

Lentes, por um período de 10 anos. A essas figuram eram resguardados os direitos patrimoniais

pela criação das obras utilizadas nos cursos jurídicos. Ainda em âmbito nacional, foi criada, em

1830, a proteção penal dos direitos autorais, conforme dispõe o artigo 261, do Código Criminal,

datado do mesmo período.

Em nosso país, o direito autoral esteve consagrado, por um longo período, no Código

Civil de 1916. Reduzia-se à condição de direito real, sendo reconhecida sua autonomia somente

em 1973, com o advento da Lei nº 5.988/73. O aspecto monetário sempre esteve presente na

legislação autoral pátria, como em outros países, a exemplo do copyright anglo-saxão, melhor

estudado em momento oportuno. Tem-se a prevalência do ter em detrimento do ser, operando-

se uma maior atenção para os grupos econômicos em detrimento do autor21.

Para melhor compreensão do tratamento jurídico conferido ao direito de autor, faz-se

mister apresentar os principais aspectos relativos aos sistemas jurídicos que os tutelam – o

sistema francês (droit d’auteur) e inglês (copyright), sendo esse, influenciado por duas

concepções teóricas que o justifica filosoficamente: a teoria utilitarista, cujos principais

expoentes são Jeremy Bentham (1748) e John Stuart Mill (1806-1873); e a teoria do direito

natural, de cunho jusnaturalista, influenciada pelo filósofo inglês John Locke (1632-1704).

21 MORAES, Rodrigo. Os direitos morais do autor: repersonalizando o direito autoral. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 51.

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2.1 Os sistemas – inglês (copyright) e francês (droit d’auteur) dos direitos autorais: um debate entre a teoria utilitarista e a concepção do direito natural do autor em John Locke

O âmbito inglês foi responsável por inaugurar a normatividade moderna de proteção

aos direitos autorais. Nele surgiu o copyright, sistema adotado pelos países anglo-saxões,

especialmente o Reino Unido, além dos Estados Unidos da América (EUA), Israel, África do

Sul, entre outros. Ele se fundamenta no âmbito patrimonial dos direitos autorais, ou seja, em

seu caráter econômico, no qual se destaca a autorização do autor para reprodução das criações

intelectuais no plano físico ou virtual. Salvaguarda-se, desde o século XVIII, o direito de cópia

nos países de língua inglesa, como, por exemplo, os EUA. Esse direito permanece disciplinado

na Constituição norte-americana (1787) e no Copyright Act (1790).

Além disso, sua origem remonta, em termos legais, à Inglaterra, no século XVIII,

período no qual foi editada a primeira legislação autoral, o Estatuto da Rainha Ana (Statute of

Anne), em 10 de abril de 1710. Diploma normativo elaborado pela Rainha Ana I, da Grã-

Bretanha, com o intento de resolver as disputas envolvendo autores e editores no tocante às

criações autorais. Entre essas demandas, destaca-se o conflito entre as livrarias de Paris e as das

províncias, em razão daqueles terem obtido um decreto real salvaguardando-lhes o direito

exclusivo de publicação de novas obras de escritores da atualidade, enquanto que os livreiros

das províncias ficavam limitados a editar clássicos e a revender edições parisienses22.

22 PIMENTA, Eduardo. Princípios de direitos autorais: um século de proteção autoral no Brasil (1898-1998). Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 5.

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O Estatuto, surgido a partir da convergência de interesses financeiros da burguesia,

sobretudo dos impressores e livreiros ingleses23, refletiu consideravelmente sobre a disciplina

dos direitos autorais, extinguindo a perpetuidade, a partir da limitação do tempo de proteção da

obra; eliminando o controle prévio ou censura, possibilitando a qualquer indivíduo figurar como

editor ou impressor; além de tornar o copyright um verdadeiro direito salvaguardado ao autor

e não mais aos editores, como ocorria anteriormente, conforme demonstrado.

A partir desse período de efervescente tutela do autor, vislumbra-se duas teorias

direcionadas à justificação do direito autoral. A primeira denomina-se teoria utilitarista. Essa

concepção teórica, cujos principais aspectos serão melhor explicitados em tópico específico do

trabalho, surgiu como uma doutrina ético-filosófica apresentada, sobretudo, pelos teóricos

Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873).

À luz do pensamento de Jeremy Bentham, o qual desprezava profundamente a ideia

dos direitos naturais, o mais relevante objetivo a ser atingido consiste em maximizar a

felicidade, salvaguardando o prazer dos indivíduos em detrimento da dor. A utilidade é

caracterizada como algo que traga prazer ou felicidade e evite a dor ou o sofrimento, devendo-

se essa máxima ser buscada pelos cidadãos e legisladores24. A posteriori, no século XIX, John

Stuart Mill versou para conciliação entre os direitos individuais com a filosofia utilitarista,

defendendo a liberdade do indivíduo e não interferência governamental25.

A teoria do direito natural26 também foi utilizada para justificação da propriedade

autoral. Ela foi desenvolvida pelo filósofo inglês John Locke (1632-1704), com fulcro sua teoria

do fruto do trabalho (labor theory of property). Essa noção atribuída aos direitos autorais

corrobora com o argumento de que o autor é detentor do direito de propriedade sobre sua criação

intelectual, inerente à própria obra. Salvaguarda-se ao autor a propriedade sobre o fruto de seu

labor.

John Locke, pensador iluminista, defensor do liberalismo clássico27 e influenciador de

filósofos franceses como François-Marie Arouet ou Voltaire (1694-1778) e Jean-Jacques

23 FRAGOSO, João Henrique da Rocha. Direito autoral: da antiguidade à internet. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 52. 24 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 48. 25 MILL, John Stuart. On liberty. Cambridge Texts in the History of Political Thought: Cambridge University Press, 2005. 26 Para maiores explicações, recomenda-se a leitura de LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo: ensaio relativo à verdadeira origem, extensão e objetivo do governo civil. São Paulo: Ed. Martin Claret, 2005. 27 O liberalismo clássico ou tradicional, surgido no século XIX, na Europa e Estados Unidos da América (EUA), consiste é uma filosofia político-econômica voltada à tutela da liberdade individual, limitando-se o poder estatal

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Rousseau (1712-1778), teceu relevante contribuição para a teoria da propriedade, manifestada

em algumas de suas obras: Carta Acerca da Tolerância28, Ensaio Acerca do Entendimento

Humano29 e Segundo Tratado Sobre o Governo Civil, em seu capítulo V30. Para ele, os homens

se reúnem em comunidades, subordinando-se a um governo comum, a fim de preservar a sua

propriedade, inalienável, além dos direitos à vida e à liberdade31, em sentido diverso ao

pensamento manifestado por Thomas Hobbes (1588-1679), em sua obra intutlada Leviatã, o

qual reconhece à inalienabilidade apenas ao direito à vida32.

A compreensão da liberdade, à luz da teoria dos direitos naturais, deve ser analisada

no ambiente social. No tocante ao direito de propriedade, ele se configura como um bem

tangível (material) ou intangível (intelectual), ao passo que a noção de propriedade, conforme

o pensamento de John Locke, aplica-se não apenas aos bens materiais, como também se refere

a qualquer direito, como o de autor. Sobre esse direito opera-se a possibilidade de escassez,

leciona David Hume, ao passo que, no tocante à utilização dos bens materiais, a prática de

justiça se demonstra inútil quando eles se apresentam em larga escala ou escassos. A escassez

deve-se ao fato da valoração atribuída ao bem como ávido a gerar alguma utilidade e

proveniente do esforço humano.

Para o direito autoral, na sociedade contemporânea, compreendido como bem

imaterial, a noção de escassez deve ser vislumbrada com cautela, ao passo que, o

desenvolvimento tecnológico permitiu a disseminação das criações intelectuais em larga escala

por meio da internet, contrariando o caráter limitador conferido às criações intelectuais na

antiguidade.

Muitos países norte-americanos, tais como, Massachusetts, New Hampshire e Road

Island, consagraram em seus estatutos jurídicos a noção do copyright como um direito de

propriedade, à luz do pensamento Lockeano. A Declaração da Independência dos Estados

Unidos da América, de 04 de julho de 1776, possui fundamentação teórica na obra John

em razão da lei, além de salvaguardar o direito de propriedade. Teve como principais expoentes Adam Smith, John Locke, Voltaire, Montesquieu, entre outros. Para eles acreditavam o mercado, sem intervenções governamentais, é o mais eficiente mecanismo para satisfazer as necessidades humanas e canalizar recursos para seus usos mais produtivos, aduz QUINTON, Anthony. Conservatism. In: A Companion to Contemporary Political Philosophy. Oxford: Blackwell Publishing. p. 246. 28 LOCKE, John. Carta acerca da tolerância. Tradução de Anoar Aiex. São Paulo: Abril Cultural, 1983. 29 LOCKE, John. Ensaio acerca do entendimento humano. Tradução de Anoar Aiex. São Paulo: Nova Cultural, 1999. 30 LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo: ensaio relativo à verdadeira origem, extensão e objetivo do governo civil. São Paulo: Ed. Martin Claret, 2005. 31 LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo: ensaio relativo à verdadeira origem, extensão e objetivo do governo civil. São Paulo: Ed. Martin Claret, 2005. 32 HOBBES, Thomas. Leviatã. Tradução de João P. Monteiro e Maria Beatriz da Silva. São Paulo: Abril Cultural, 1994.

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Locke33, principalmente nas seções 161, 223, 225 e 230, do seu Segundo Tratado sobre o

Governo Civil34.

As teorias mencionadas apresentam alguns aspectos conflitantes, na medida em que a

utilitarista salvaguarda um direito de monopólio temporário aos autores, fazendo-se necessária

à observância de certas formalidades para o seu exercício. A jusnaturalista, por sua vez,

reconhece a perpetuidade dos direitos autorais, dotado de dimensão moral ou pessoal,

prescindindo de quaisquer aspectos formais como pressuposto para o gozo desse direito. O

impasse reside no fato que se deve compreender o direito de autor como natural, associado à

noção de que, após a publicação da obra, ao autor é tutelado apenas um monopólio temporal

sobre a obra35.

À título ilustrativo, o conflito teórico suscitado reverberou na prática, sobretudo em

razão das alterações efetivadas pelo Estatuto de 1710. Pairavam interesses comerciais,

associados às concepções teóricas, morais e jurídicas. Destaca-se o evento denominado

“Batalha dos Livreiros” (Battle of the Booksellers), ocorrido durante a transição do modelo

feudalista ou pré-capitalista de produção, baseado nas Corporações de Ofício e nos privilégios

reais, para um modelo capitalista de produção industrial, iniciado no século XVIII36.

Os editores londrinos procuravam manter os monopólios reais que lhes foram

concedidos. Para tanto, pleitearam o reconhecimento, não mais de um privilégio real, e sim, de

um “common law copyright do autor” ou direito natural do autor. Esse argumento era utilizado

para consagrar os interesses comerciais dos editores no tocante à exploração exclusiva da obra.

Em sentido contrário, os argumentos utilitaristas resguardam os direitos dos novos editores,

localizados nas províncias, defensores do fim dos monopólios, do livre mercado editorial e da

limitação temporal para a fruição dos direitos autorais37.

Na França, entre os séculos XVIII e XIX, surgiu o droit d’auteur. Nele vislumbra-se

uma aproximação com concepção utilitarista e consequencialista de justificação dos direitos

dos autores, destacando-se o interesse social. Não obstante também se identifique a

33 LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo: ensaio relativo à verdadeira origem, extensão e objetivo do governo civil. São Paulo: Ed. Martin Claret, 2005. 34 STERN, Kenneth D. John Locke and the Declaration of Independence. In: Cleveland Marshall Law Review, Ohio, v. 15, 1966. p.186-195. 35 PATTERSON, Lyman Ray. Copyright in historical perspective. Nashville: Vanderbilt University Press, 1968. 36 LOEWENSTEIN, Joseph. The author’s due: printing and the prehistory of copyright. Chicago: The University of Chicago Press, 2002. 37 ROSE, Mark. Authors and owners: the invention of copyright. Harvard University Press, 1993. p. 4-5.

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compreensão jusnaturalista do direito autoral como um direito de propriedade, sem prejuízo de

seu aspecto moral38.

Esse sistema se apresenta no período revolucionário francês, de 1789. Naquele

período, até então, somente eram reconhecidos direitos os direitos patrimoniais de autor, não

amparando os direitos morais, os quais passaram a ser considerados, pela jurisprudência

francesa, no início do século XIX. Ele se apresenta como um sistema de concepção jurídica

latino-germânica, inspirado nos decretos da Assembleia Constituinte Francesa (1791-1793) e

reconhecido na Convenção de Berna (1886). Versa para o reconhecimento do autor e sua

criação intelectual, como instrumento de sua propriedade.

Nesse cenário europeu, sobretudo na França, foram abolidos os privilégios concedidos

aos editores, livreiros e autores. O direito de autor passou a ser tutelado por diversas legislações.

Mesmo antes da Revolução Francesa, a Coroa já se manifestada em consonância com o caráter

individualista e privatista dos direitos de autor, concedendo-o, em detrimento dos privilégios

dos editores (privilèges en librairie), privilégios ao autor (privilèges d'auteur).

No tocante às contribuições teóricas essenciais à construção histórica do droit

d’auteur, destacam-se: Denis Diderot (1713-1784) e Marie Jean Antoine Nicolas de Caritat

Condorcet (1743-1794). O primeiro ressaltou a proximidade entre a propriedade literária e as

demais propriedades imobiliárias, defendendo-a como um direito absoluto e perpétuo dos

autores e editores, sobre as criações intelectuais. Salvaguarda-se a extensão do direito de autor

aos editores. Assim, a propriedade intelectual assume o caráter de direito fundamental do

indivíduo, sendo resguardado ao autor e editor, o qual, adquirindo os direitos patrimoniais sobre

as obras, goza do direito de utilizar-se dela como lhe convier em repetidas edições39.

Reconhece-se a naturalização do direito de autor sobre suas obras, como propriedade

absoluta, inviolável, transmissível por tempo indeterminado. Coaduna-se com os interesses

comerciais da época, visto que, ao se ampliar a natureza protetiva do direito de autor aos

empresários, os permitiu exercer o controle sobre as criações do intelecto, em substituição ao

monopólio anteriormente exercido, em razão da concessão de privilégios reais, tutelando os

interesses da classe burguesa em ascensão40.

38 ALVES, Marco Antônio Souza; PONTES, Leonardo Machado Pontes. O direito de autor como um direito de propriedade: um estudo histórico da origem do copyright e do droit d’auteur. In: Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis: CONPEDI, 2009. p. 9881. 39 DIDEROT, Denis. Carta sobre o comércio do livro. Tradução de Bruno Feitler. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2002. p. 52-69. 40 ALVES, Marco Antônio Souza; PONTES, Leonardo Machado Pontes. O direito de autor como um direito de propriedade: um estudo histórico da origem do copyright e do droit d’auteur. In: Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis: CONPEDI, 2009. p. 9883.

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Além do discurso promovido por Diderot, a contextura intelectual e política do século

XVIII foi marcada por outras visões concorrentes. À luz de um ideal social, os revolucionários

pregavam o fim da propriedade privada e a livre circulação das obras, em conformidade com o

interesse público e o ideal iluminista, motivado por Condorcet. Esse autor, por sua vez,

corrobora com argumentos utilitaristas e consequencialistas, considerando utilidade pública a

disseminação das obras à coletividade, em sentido contrário à censura prévia, ao monopólio

real e comercial. Ele compreende que a propriedade literária, em sentido diverso da propriedade

sobre os bens materiais, não deriva da ordem natural, devendo-se vislumbrar sua função social.

O verdadeiro progresso das luzes pressupunha liberdade de criação, reprodução e difusão do

conhecimento e da arte, sendo inadmissível a apropriação individual dos bens culturais41.

Em sentido contrário à noção de propriedade intelectual vinculada à material, Pierre-

Joseph Proudhon também se manifesta no sentido de que o autor, antes de ser pai de sua obra,

é fruto de seu tempo e cultura, herdeiro da civilização e das ideias que o precederam. Ademais,

em perspectiva utilitarista, compreende que o direito autoral perpétuo é inútil, ao passo que as

obras guardam sua efemeridade, transformando-se, renovando-se, com o passar do tempo42.

Hodiernamente, não obstante às diferenças teóricas pontuais, os dois sistemas

mencionados se aproximam. Muitas formalidades resguardadas pelo copyright foram abolidas

pela Convenção de Berna (1886). Além disso, no âmbito do sistema anglo-saxão, tutela-se,

ainda que em menor intensidade, os direitos morais do autor, sem prejuízo da maior relevância

atribuída aos elementos patrimoniais, servindo de estímulo ao progresso econômico e

tecnológico.

Os sistemas copyright e droit d’auteur harmonizam-se em diversos aspectos. Suas

dissonâncias são associadas, principalmente, às estratégias mercatórias e ao desenvolvimento

tecnológico, devido às diferentes fundamentações jurídico-filosóficas às quais se filiam. Cabe

ressaltar que “ainda existem muitas arestas a serem aparadas para que se possa afirmar que está,

ao menos, havendo um processo de uniformização de procedimentos dos dois sistemas de

proteção”43.

41 CONDORCET, Jean-Antoine-Nicolas de Caritat. Fragments sur la liberte de la presse. In: Oeuvres de Condorcet. Tome 11. Paris: Firmin Didot Frères, 1847. p.253-314. 42 PROUDHON, Pierre-Joseph. Les majorats littéraires: examan d’un projet de loi ayant pour but de créer, au profit des auteurs, inventeurs et artistes, un monopole perpétuel. Bruxelles: Alphonse Ledégue, 1862. 43 MALLMANN, Querino. A natureza jurídica do direito da propriedade intelectual: o direito de autor. In: Revista do Mestrado em Direito da UFAL (Universidade Federal de Alagoas), v. 2, n. 3, 2008. Maceió: Edufal, 2008. p. 224.

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Na sociedade atual, é factível a natureza volátil do direito autoral, ao passo que o

progresso científico e tecnológico trouxe à baila inúmeras questões a serem resolvidas no plano

legislativo e judiciário, relativas à utilização das criações intelectuais na internet, no ambiente

denominado ciberespaço, como se verá adiante. Sociedade massificada, conforme vislumbra

Ortega y Gasset (1883-1955), reunida em torno de uma coincidência de desejos, ideias e modos

de ser44. No plano dos direitos autorais, atualmente, a compreensão social se manifesta a partir

da interação entre os indivíduos no ambiente virtual, ávidos à produção e ao compartilhamento

das obras intelectuais.

Sendo assim, cumpre tecer algumas considerações pertinentes à sociedade

contemporânea, em pleno século XXI, marcada por mudanças radicais no plano

comunicacional, provenientes da revolução tecnológica, a partir do desenvolvimento de redes

horizontais de comunicação organizadas em torno da internet e da comunicação sem fio45. Essa

sociedade é compreendida como sociedade da informação ou sociedade em rede, como

denomina o sociólogo espanhol Manuel Castells.

3 AS MUDANÇAS DE PERSPECTIVAS AUTORAIS NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO: O CARÁTER HUMANISTA DOS DIREITOS DE AUTOR E SUA FUNÇÃO SOCIAL

Diante da realidade autoral vivenciada no século XXI, é mister romper com a lógica

patrimonialista atribuída aos direitos de autor, consagrando seu caráter existencial, direcionado

à tutela da dignidade da pessoa humana. A vocação humanista é inerente ao direito autoral e da

qual não pode se dissociar. Salvaguarda-se a visão antropocêntrica do indivíduo, reconhecendo-

o a capacidade de autodeterminação, ou seja, agir conforme seu livre arbítrio46. Essa noção

jurídica da dignidade se associa ao pensamento desenvolvido por Immanuel Kant (1724-1804).

Para ele, o ser humano deve ser considerado um fim em si mesmo, e não meio. Sendo facultado

ao homem determinar a si mesmo e agir conforme à lei47.

A repersonalização reverberada sobre o Direito Civil, também possui reflexos no

Direito Autoral, o qual, em razão da constitucionalização do direito48, deve observância aos

44 ORTEGA Y GASSET, José. A rebelião das massas. Edição eletrônica: Ed. Ridendo Castigat Morais, 2002. p. 62. 45 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. Paz e Terra. 2007. p. 11. 46 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 32. 47 KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. In: Os Pensadores – Kant (II), Tradução de Paulo Quintela. São Paulo: Abril Cultural, 1980. p. 134-135. 48 Compreendida como “a irradiação dos efeitos das normas (ou valores) constitucionais aos outros ramos do direito”, entre os quais se destaca o direito autoral. Para maiores considerações vide: SILVA, Virgílio Afonso da.

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ditames insculpidos na Carta Magna de 1988. O diploma constitucional consagra a dignidade

da pessoa humana em seu artigo 1º, III, como fundamento da República Federativa do Brasil.

A Lei nº 9.610/98 deve ser interpretada à luz da Constituição Federal. Os direitos morais do

autor são iluminados pelo fundamento elencado, estando intimamente ligados.

É imprescindível a reconstrução da disciplina autoral à luz dessa perspectiva

autoralista contemporânea, voltado à tutela da dignidade do autor, valor supremo do regime

democrático. Todavia, muitos caminhos ainda devem ser traçados, tendo em vista que, nas

legislações autorais de inúmeros países, ainda se destaca o aspecto patrimonial, tutelando-se

muitas vezes o investimento ou a lucratividade em detrimento do criador49.

Diante da evolução do conhecimento humano e científico, impulsionado pelo

desenvolvimento tecnológico, sobretudo no setor informático e de telecomunicações, a ciência

jurídica não pode ficar inerte, fazendo-se necessário evoluir progressivamente, adaptando-se

aos dispositivos legais e atribuindo-lhes interpretações jurídicas coerentes com essa nova

realidade50. Dentre os ramos jurídicos atingidos, destaca-se o direito autoral, na medida em que

a internet proporcionou uma maior facilidade de acesso e difusão das criações intelectuais e o

surgimento de novos usos, não abrangidos pela legislação autoral.

No mundo virtual, atuam novos intermediários culturais51, direcionados à manipulação

dos bens intelectuais, artísticos e culturais, conferindo-lhes elevado valor de troca, em razão de

sua exploração comercial, e, por conseguinte, modificando a lógica do consumo52. A internet

salvaguardou uma maior interatividade virtual entre os indivíduos em detrimento dos meios

físicos tradicionais, repensando a noção de cidadania e espaço público53.

As tecnologias da informação e comunicação (TIC)54 proporcionam a integração do

mundo (bens e sujeitos) em redes globais de instrumentalidade. Os computadores

A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 18 e ss. 49 ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito da internet e da sociedade da informação. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 130-132. 50 EHRHARDT JÚNIOR, Marcos Augusto de Albuquerque. Sociedade da informação e o direito na era digital. In: Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 44, jul. 2007. p. 01. 51 BOURDIEU, Pierre. Distinction: a social critique of the judgment of taste. Cambridge: Harvard University Press, 1984. 52 FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e pós-modernismo. Tradução de Júlio Assis Simões. São Paulo: Studio Nobel, 1990. p. 28. 53 FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e pós-modernismo. Tradução de Júlio Assis Simões. São Paulo: Studio Nobel, 1990. p. 64-67. 54 As novas tecnologias da informação e comunicação (TIC) surgiram no contexto da revolução informacional ou telemática, desenvolvida, sobretudo, na década de 1990. Elas facilitam a captação, transmissão e distribuição das informações nas redes telemáticas, atuando em diversos âmbitos (comercial, industrial, educacional, etc).

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revolucionaram a comunicação entre os indivíduos, gerando uma série de comunidades

virtuais55. Operou-se a remodelação do sujeito na sociedade, na qual emergiram novas formas

de armazenamento, processamento e distribuição das informações por meios eletrônicos,

intensificando as relações socioeconômicas, em diversos contextos56.

Essas novas relações sociais, econômicas e culturais estruturam-se no âmbito da

sociedade da informação. As primeiras considerações sobre esse tipo societário foram

apresentadas por autores como os sociólogos estadunidenses Daniel Bell57, Sally Burch58, entre

outros. Foram atribuídas designações distintas para caracterizar essa mudança social, tais como:

sociedade informática59, sociedade pós-capitalista ou do conhecimento60, sociedade da pós-

informação ou digital61, sociedade informacional62. Embora haja uma pluralidade de termos,

ambos convergem à identificação da sociedade na contemporaneidade.

Esse estágio vivenciado pela sociedade, na contemporaneidade, é vislumbrado como

o modo de desenvolvimento socioeconômico, responsável por salvaguardar a aquisição, o

armazenamento, o processamento, a valorização, a transmissão, a distribuição e a disseminação

das informações, satisfazendo a necessidade dos indivíduos e desempenhando um relevante

papel na atividade econômica e qualidade de vida dos cidadãos. Como traços caraterísticos da

sociedade informacional, destacam-se a desmaterialização dos suportes informacionais, os

quais transcendem o meio físico e a globalização das fontes e da acessibilidade da informação,

convergindo o plano das telecomunicações e o setor informático63.

Enquadram-se nessa terminologia, os computadores pessoais, o correio eletrônico, a internet, entre outras tecnologias e métodos. 55 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. Paz e Terra. 2007. p. 57. 56 REIS, Jorge Renato dos; DIAS, Felipe da Veiga. A constitucionalização do direito privado brasileiro: a perspectiva do direito autoral. In: REIS, J. R.; BOFF, S. O.; DIAS, F. V.; PELLEGRINI, G. K. F.; TOLOTTI, S. M. (Organizadores). Estudos de direito de autor no constitucionalismo contemporâneo. Curitiba: Multideia, 2011. p. 29. 57 BELL, Daniel. O advento da sociedade industrial: uma tentativa de previsão social. São Paulo: Cultrix, 1978. Ele caracterizou a sociedade pós-industrial como informacional, à luz de uma revolução técnico-científica, reconhecendo a produção de outros tipos de bens, de natureza intelectual, por exemplo. 58 BURCH, Sally. Sociedade da informação / sociedade do conhecimento. In: AMBROSI, A.; PEUGEOT, V.; PIMENTA, D. Desafios das palavras: enfoques multiculturais sobre as sociedades da informação. Ed. VECAM, 2005. 59 SHAFF, Adam. A sociedade informática: as consequências sociais da segunda revolução industrial. São Paulo: UNESP; Brasiliense, 1996. 60 DRUCKER, Peter Ferdinand. Sociedade pós-capitalista. São Paulo: Pioneira, 1994. 61 NEGROPONTE, Nicholas. A vida digital. São Paulo, 1995. 62 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999. 63 CORREIA, Miguel Pupo. Sociedade de informação e direito. In: Revista de Derecho Informático, n. 12, 2009. p. 04-08.

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O novo paradigma técnico-econômico suscitado, dotado de elevado potencial

transformador das atividades sociais, políticas e econômica64, ocasionou a ruptura das fronteiras

físicas, eliminando as distâncias entre os sujeitos e bens. A noção temporal desvinculou-se do

espaço físico, como obstáculo intransponível, sendo possível a conexão entre os indivíduos, nas

mais diversas localidades do globo65. Esse fenômeno motivou-se, sobretudo, em razão da

evolução da informática, culminando no surgimento da cibercultura, a qual tornou possível a

leitura da realidade, traduzida pela linguagem digital, automatizando a informação66.

Não se pode olvidar que o direito, oriundo do meio social e sobre o qual incide,

disciplinando-o, deve ficar atento à evolução dos meios tecnológicos, os quais trazem à baila

uma série de implicações jurídicas. O ramo autoral, por abranger as criações intelectuais

passíveis de compartilhamento no âmbito virtual, também se influencia por essas questões. Em

razão disso, os direitos de autor não podem representar um empecilho ao desenvolvimento

socioeconômico, flexibilizando sua regulação de tal forma que os interesses do autor e da

coletividade sejam prejudicados67. Faz-se necessário encontrar um ponto de encontro razoável

entre o progresso tecnológico e os princípios básicos do direito, concebidos no mundo analógico

e linear68.

Um ambiente que merece atenção especial dos juristas, tendo em vista suas diversas

implicações sobre os direitos autorais, consiste na internet. Inicialmente, ela foi estruturada, em

1957, a fim de permitir a interligação de redes de computadores nos Estados Unidos da América

(EUA), para fins militares, capitaneados pelo ARPA (Advanced Research Projects Agency),

agência governamental direcionada para o desenvolvimento de projetos avançados de

pesquisa69. Isso ocorreu no contexto da Guerra Fria (1945-1991), período no qual haviam

disputas estratégicas e conflitos indiretos entre os EUA e a União Soviética, com o intento de

conquistar a hegemonia política, econômica e militar, em âmbito mundial.

64 TAKAHASHI, Tadao (org.). A sociedade da informação do Brasil Livro Verde. Brasília: Ministério da Ciência e Tecnologia, 2000. p. 05. 65 BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as consequências humanas. Tradução de Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999. p. 85-86. 66 LEMOS, André. Cibercultura: tecnologia e vida social na cultura contemporânea. Porto Alegre: Sulina, 2013. p. 99. 67 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de autor. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 39. 68 PARDO, Julián Rodriguez. El derecho de autor em la sociedad de la información. In: Comunicación y sociedad, vol. XIV, n. 01, 2001. p. 125-153. 69 EHRHARDT JÚNIOR, Marcos Augusto de Albuquerque. Sociedade da informação e o direito na era digital. In: Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 44, jul. 2007. p. 5.

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Quanto aos seus aspectos conceituais, são várias as definições encontradas para a

internet. Em geral, compreende-se como um instrumento através do qual se permite a

interligação de milhares de redes de computadores, convergentes, adotando-se os mesmos

padrões de transmissão de dados e informações70. Outros autores a compreendem como um

grande banco de dados ao qual sempre incluímos mais informações e, uma salvaguardado o

acesso à internet, nos conectamos a ele71. Ou seja, atua como uma rede que congrega outras

redes de computadores, pessoas e informações, ou meio de comunicação que possibilita “a

interação de muitos com muitos, num momento escolhido, em escala global”72.

Com o passar dos anos, a internet deixou de possuir fins exclusivamente militares e

governamentais, expandindo-se pelas universidades e laboratórios de pesquisas. Na década de

1990, surgiram consideráveis avanços nessa seara, a partir das contribuições do cientista

britânico Timothy John Berners-Lee, mais conhecido como Tim Berners-Lee. Ele foi o

responsável por permitir o acesso às informações na rede, por meio de hipertextos, criando o

World Wide Web (WWW)73, sendo possível a conexão ente clientes e servidores, via HTTP74.

A utilização da internet como sistema comunicacional fez com que, em 1995, 16

milhões de usuários estivessem conectados; 2001, mais de 400 milhões; 2005, 01 bilhão de

usuários; 2010, aproximadamente 02 bilhões de internautas. Inúmeras atividades econômicas,

sociais, políticas e culturais estruturam-se através da rede mundial de computadores,

intensificando as relações entre os indivíduos75.

A partir das novas perspectivas vislumbradas para o direito autoral, diante das

mudanças históricas dos institutos jurídicos, adaptando-se às novas exigências sociais voltadas

ao desenvolvimento e propagação das novas tecnologias de informação e comunicação76. O

direito de autor, além de suas principais funções: direcionada ao reconhecimento da autoria,

70 EHRHARDT JÚNIOR, Marcos Augusto de Albuquerque. Sociedade da informação e o direito na era digital. In: Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 44, jul. 2007. p. 5. 71 DORIA, Pedro R. Manual para a internet. Rio de Janeiro: Revan, 1995. p. 33. 72 CASTELLS, Manuel. A galáxia da internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. p. 08. 73 O Word Wide Web (WWW) atua como um conjunto de padrões e tecnologias que permitem a utilização da internet por meio dos programas navegadores (browsers), valendo-se dos hipertextos e da multimídia. Isso proporciona ao usuário maior facilidade na utilização da internet e permite a obtenção de resultados mais precisos, sobretudo no tocante ao acesso à informação na rede, conforme EHRHARDT JÚNIOR, Marcos Augusto de Albuquerque. Sociedade da informação e o direito na era digital. In: Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 44, jul., 2007. p. 5. 74 HTTP (Hypertext Transfer Protocol) ou protocolo de transferência de hipertexto, permite a comunicação entre sistemas de informação e a transferência de dados entre redes de computadores. Esse protocolo permite a transferência de páginas HTML (HyperText Markup Language) – linguagem utilizada para produção de páginas na web, do computador para a internet. 75 CASTELLS, Manuel. A galáxia da internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. p. 08. 76 CARBONI, Guilherme. Função social do direito de autor. Curitiba: Juruá, 2008. p. 27.

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promocional, econômica e política; apresenta uma função social efetivada a partir da

“promoção do desenvolvimento econômico, cultural e tecnológico, mediante a concessão de

um direito exclusivo para a utilização e exploração de determinadas obras intelectuais por um

certo prazo, findo o qual, a obra cai em domínio público e pode ser utilizada livremente [...]”77.

Associada à noção de incentivo, produção e difusão das obras intelectuais, destaca-se

a fundamentação utilitarista atribuída ao copyright. Por meio dela, resguarda-se ao autor o

direito exclusivo de exploração econômica de sua obra, limitado a determinado lapso temporal.

Nossa legislação autoral, Lei nº 9.610/98, em seu artigo estabelece o prazo de 70 anos, período

em que perdura os direitos do autor, contado do ano subsequente ao de seu falecimento,

obedecida a ordem sucessória elencada no Código Civil. Após esse período a obra cai em

domínio público, condição jurídica na qual obra não possui o elemento do direito real ou de

propriedade (patrimonial), não havendo, assim, restrição de uso de uma obra por qualquer um

que queira utilizá-la. A disseminação das obras intelectuais caídas em domínio público se

intensifica ainda mais no contexto atual da sociedade da informação, diante das facilidades

proporcionadas pela internet no tocante ao compartilhamento de arquivos contendo criações do

intelecto humano.

Vale ressaltar que essa limitação temporal se aplica apenas aos direitos patrimoniais.

Em sentido diverso, aos direitos morais, são reconhecidos os mesmos atributos dos direitos da

personalidade, sendo irrenunciáveis, inalienáveis e perpétuos, conforme disposto no artigo 27,

da Lei nº 9.610/98. Sendo assim, é possível ao autor renunciar seus direitos patrimoniais,

comercializando a obra, mantendo-se o autor tutelado em seu aspecto personalíssimo ou moral.

Diante do exposto, faz-se necessário elencar os principais aspectos da teoria

utilitarista, doutrina ético-filosófica corroborada especialmente por Jeremy Bentham (1748-

1832) e John Stuart Mill (1806-1873), em consonância com o princípio do bem-estar máximo,

consoante o qual os indivíduos devem sempre agir de forma a proporcionar o maior bem-estar

possível, em prol da coletividade. Essa corrente doutrinária é essencial para compreensão do

direito autoral, não como um elemento patrimonial exclusivo, absoluto, monopolizado, e sim,

como algo volátil, no sentido econômico, e que, sem deixar de tutelar o autor, privilegia o acesso

à cultura, pulverizada pelos bens intelectuais.

77 CARBONI, Guilherme. Função social do direito de autor. Curitiba: Juruá, 2008. p. 97.

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4 A JUSTIFICAÇÃO UTILITARISTA DO COPYRIGHT EM JEREMY BENTHAM

O utilitarismo surge como doutrina ético-filosófica, entre os séculos XVIII e XIX, a

partir das contribuições de filósofos e economistas ingleses, destacando-se como seus principais

expoentes, Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873), responsáveis pela

aplicação do princípio da utilidade no âmbito político, legal, econômico, entre outras questões.

Não obstante, o pensamento utilitarista já ser utilizado na antiguidade, pelo filósofo grego

Epicuro de Samos (341 a. c. – 270 a. c.), entre outros pensadores da Grécia Antiga.

Também foi praticado na Inglaterra, pelo bispo Richard Cumberland, filósofo

moralista do século XVII, sem prejuízo das contribuições de Francis Hutcheson (1694-1746) e

David Hume (1711-1776). Influenciou as ideias desenvolvidas por Peter Singer, aplicando o

fundamento utilitarista para resolução de conflitos morais vivenciados nos séculos XX e XXI.

Ele praticou um utilitarismo distinto de sua visão clássica, privilegiando às diferenças, em

sentido diverso àquele, sempre voltado à maximização do prazer e redução da dor78.

78 SINGER, Peter Albert David. Vida Ética: Os melhores ensaios do mais polêmico filósofo da atualidade. Tradução de Alice Xavier. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002.

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A doutrina utilitarista compreende a natureza benéfica das ações praticadas pelos

indivíduos quando elas proporcionam à máxima felicidade do âmbito coletivo. Adota-se uma

perspectiva eudemonista, consoante a qual a busca pela felicidade, em âmbito individual e

coletivo, pressupõe a adoção de ações que conduzam a esse fim. A felicidade, corroborada por

Aristóteles, na Antiguidade, consagra uma natureza principiológica cujo alcance prescinde à

realização de atos voltados à sua consecução79.

O utilitarismo, na medida em que se apresenta como um critério geral de moralidade

eudemonista, incide sobre as ações individuais e políticas, no âmbito social, político e jurídico.

A ação moralmente correta é aquela que promove a felicidade de todos, analisando-se as

consequências dos atos praticados, de forma a somente produzir resultados positivos.

Reconhece-se, como objetivo moral, a maximização da felicidade. A coisa certa a fazer consiste

naquela que proporcionará utilidade para todos os indivíduos, ou seja, qualquer coisa que

ocasione prazer ou felicidade, evitando a dor e o sofrimento80.

À luz das definições de Jeremy Bentham, o princípio da utilidade caracteriza-se como

“aquele que aprova ou desaprova qualquer ação, segundo a tendência que tem a aumentar ou a

diminuir a felicidade da pessoa cujo interesse está em jogo, ou, o que é a mesma coisa em outros

termos, segundo a tendência a promover ou a comprometer a referida felicidade”81. Analisa-se

a justeza da ação conforme as consequências produzidas, no sentido de gerar dor ou prazer aos

indivíduos82. Condutas praticadas pelos sujeitos para consigo mesmo, para com os outros de

forma positiva ou negativa. No cômputo geral das consequências das ações praticadas, uma

ação só pode ser considerada correta caso gere mais prazer do que dor e só pode ser condenada

caso gere mais dor do que prazer83. Não existem ações boas e más em si mesmas, cabendo

analisar os fins pretendidos e o que proporcionam à coletividade

A corrente apresentada norteia-se em diversos fundamentos principiológicos. De

início, tem-se a noção de bem-estar (físico, moral e intelectual), objetivo que deve ser visado

em toda ação moral praticada pelo indivíduo. Ademais, corrobora-se com o consequencialismo,

79 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W. D. Ross. In: Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1991. 80 BETHAM, Jeremy. An Introduction to the Principles of Moral and Legislation. Edinburgh: William Tait, 1843. p. 09-10. 81 BETHAM, Jeremy. An Introduction to the Principles of Moral and Legislation. Edinburgh: William Tait, 1843. p. 10. 82 SINGER, Marcus. Actual Consequences of Utilitarianism. In: Mind, Oxford, v. 86, n. 341, jan. 1977. p. 67. 83 BETHAM, Jeremy. An Introduction to the Principles of Moral and Legislation. Edinburgh: William Tait, 1843. p. 69-70.

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termo filosófico de autoria de Elizabeth Anscombe (1919-2001), em sua obra intitulada Modern

Moral Philosophy84, de 1958, na qual se demonstra que um agente é responsável tanto pelas

consequências intencionais de seu ato, como também pelas não intencionais. Portanto, as

consequências deveriam ser levadas em consideração quando se faz juízos sobre o correto/certo

ou errado/incorreto.

Cabe analisar o saldo líquido de bem-estar proporcionado à coletividade de indivíduos

afetados pelas ações. Admite-se o sacrifício de uma minoria em prol do bem comum,

compensando-se o aspecto negativo. Sem prejuízo da exigência ou dever de maximização do

bem-estar geral. A imparcialidade e universalismo, epistemologicamente analisado por

Immanuel Kant (1724-1804)85, são conceitos inerentes ao utilitarismo, os quais atribuem aos

prazeres e sofrimentos ou dores a mesma relevância, independente dos indivíduos afetados.

Para Bentham, todos nós somos governados pelos sentimentos de dor e prazer, nossos

mestres soberanos, do quais provém a compreensão de certo e errado86. Esse fundamento se

aplica ao âmbito social e legislativo, visto que devem ser elaboradas leis que maximizem a

felicidade da comunidade em geral, constituída por cidadãos e legisladores, sendo inadmissível

a rejeição a esse argumento moral87.

Quando trazido o utilitarismo para o âmbito do copyright, o direito dos autores se

caracteriza como um direito que lhes é atribuído, por um determinado lapso temporal, para que

possa explorar comercialmente, e com exclusividade, a sua criação, justificando-se essa

prerrogativa em razão de atuar como um instrumento de incentivo à produção do intelecto e,

por conseguinte, remuneração dos seus autores. Verdadeiro monopólio temporário conferido

aos autores, a partir do cumprimento de certas formalidades.

O Estatuto da Rainha Ana (Statute of Anne), de 1710, consagrou o direito autoral como

um instrumento essencial à consecução do bem comum, salvaguardando à perspectiva

iluminista de promoção e circulação do conhecimento. Esse caráter utilitarista foi reconhecido

no julgado elaborado pela Câmara dos Lordes (The House of Lords of the United Kingdom),

em 1774. Esse caso foi de grande relevância em matéria literária. A situação fática diz respeito

ao livreiro escocês, Alexander Donaldson, proprietário de um negócio voltado à realização de

reimpressões baratas dos clássicos, foi acusado de pirataria, quando publicou uma edição de

84 ANSCOMBE, Gertrude Elizabeth Margaret. Modern Moral Philosophy. In: Philosophy 33, n. 124, jan. 1958. 85 KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. In: Os Pensadores – Kant (II), Tradução de Paulo Quintela. São Paulo: Abril Cultural, 1980. 86 86 BETHAM, Jeremy. An Introduction to the Principles of Moral and Legislation. Edinburgh: William Tait, 1843. 87 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 48-49.

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James Thomson, “The Seasons”, trabalho para o qual, Thomas Becket e um grupo de outros

livreiros e impressores de Londres afirmou ter o direito de impressão. Questiona-se, portanto,

a natureza jurídica do copyright, seria ele um direito legal, uma licença limitada, pertencente

ao Estado ou um direito comum, perpétuo e absoluto88.

A perspectiva utilitarista, evidenciada no Diploma de 1710, também reverberou sobre

a legislação norte-americana de 1790, no âmbito do Capítulo I, Seção 8, o qual salvaguarda a

necessidade de promoção, pelo poder público, do progresso da ciência e das artes úteis,

garantindo, por tempo limitado, aos autores e inventores, do direito exclusivo aos seus escritos

ou descobertas. Embora, em muitas ocasiões, as Cortes britânicas tenham se manifestado em

sentido contrário, posicionando-se favorável à concepção Lockeana relativa à propriedade do

copyright, a exemplo do caso Edred versus Ashcroft, ocorrido em 2003, no qual a Suprema

Corte dos Estados Unidos da América (Supreme Court of the United States of America),

versando para extensão do prazo de proteção conferido às criações intelectuais,

especificamente, na situação fática, livros e animações.

Indaga-se pela possibilidade de aplicação da corrente utilitarista à legislação autoral

brasileira, influenciada pelo direito de autor. A resposta é positiva, em se tratando dos seus

aspectos patrimoniais, tendo em vista que esses direitos perduram por 70 anos (artigos 41 a 45,

da Lei nº 9.610/98), caindo em domínio público, após o transcurso do prazo. A partir de então,

a criação intelectual torna-se acessível à coletividade, salvaguardado o desenvolvimento

econômico e tecnológico, em cumprimento à sua função social, proporcionando um benefício

coletivo.

Sem prejuízo dos aspectos positivos trazidos pela doutrina suscitada ao âmbito dos

direitos autorais, cumpre destacar algumas objeções a essas disposições teóricas, manifestadas

por Michael J. Sandel, filósofo político e professor de filosofia política na Universidade de

Harvard (Harvard University), nos Estados Unidos da América (EUA). Muitos acusam o

utilitarismo de inobservância aos direitos individuais, ao considerar apenas a soma das

satisfações, desprezando o indivíduo, de per si.

Algumas situações fáticas foram elencadas para justificar essa lógica utilitarista e sua

rejeição por violar “normas fundamentais de decência e do respeito no trato humano”89: a

88 ROSE, Mark. The Author as Proprietor: Donaldson v. Becket and the Genealogy of Modern Authorship (1988). 89 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 51.

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situação ocorrida na Roma Antiga, onde cristãos eram jogados aos leões no Coliseu para fins

de diversão pública. O cálculo utilitarista, nesse caso, considera o êxtase coletivo dos

espectadores em detrimento dos cristãos90.

A partir desse fato, indaga-se também sobre a justificativa da tortura em interrogatórios

de suspeitos de terrorismo. O argumento favorável à tortura filia-se ao cálculo utilitarista, ao

colocar em cheque a situação na qual um terrorista é preso e milhares de cidadãos encontra-se

em perigo, sendo admissível torturá-lo para obtenção da informação sobre a localidade da

bomba e evitar o dano à coletividade. Embora, muitos utilitaristas sejam contrários a tortura

para obtenção de informações, pois essas, quando extraídas desse modo, não são confiáveis,

além de figurar como um desrespeito aos direitos humanos e à dignidade da pessoa humana.91

Ademais, na situação apresenta por Michael Sandel, intitulada “A cidade da

felicidade”, o autor remonta ao conto de Ursula Kroeber Le Guin, denominado The Ones Who

Walk Away from Omelas92. Trata-se da cidade de Omelas, na qual inexiste aspectos nocivos à

comunidade. Em um porão situação na cidade encontra-se uma criança trancada e abandonada,

na medida em que todos acreditam que a felicidade, a beleza da cidade, as amizades, a saúde e

demais benefícios coletivos só seriam atingidos a partir do sofrimento da criança, justificando-

o por força bem-estar geral93.

Outra objeção apresentada ao argumento utilitarista diz respeito ao trato conferido aos

valores, considerados, pelos utilitaristas, como moeda comum. Assim, todas as preferências

possuem o mesmo peso, no cômputo geral da moralidade. Para àqueles que se opõem a essa

compreensão, não seria possível colocar na mesma balança valores de naturezas distintas.

Destaca-se eventos nos quais se aplica a lógica utilitarista, a partir de uma análise de custos e

benefícios94.

A primeira dessas situações refere-se aos “benefícios do câncer de pulmão”. Ela

envolve a empresa Philip Morris e sua atuação na República Tcheca. A fim de conter o aumento

dos impostos governamentais, a instituição analisou o custo-benefício dos efeitos do tabagismo

no orçamento do país. O estudo elencou que o governo possui maior lucratividade com o

90 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 51-52. 91 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 52-53. 92 GUIN, Ursula K. Le. The Ones Who Walked Away from Omelas. In: BAUSCH, Richard. Norton Anthology of Short Fiction. Nova York: W. W. Norton, 2000. 93 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 54-55. 94 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 55-56.

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consumo de cigarros pela população, isto porque, embora os fumantes demandem elevados

custos à saúde, eles morrem cedo, poupando o poder público de gastos com tratamentos de

saúde, pensões e abrigos para idosos. O argumento utilitarista, nessa situação, foi colocado de

forma equivocada, visto que, aduz Sandel, “uma análise mais ampla de custo e benefício

acrescentaria moral uma quantia o custo da morte prematura para o fumante e sua família”, em

detrimento dos gastos dessa morte para o governo95.

Outro caso em que se aplica a lógica utilitarista, sem prejuízo das demais situações

analisadas por Michael Sandel, envolve a fábrica de automóveis Ford, em especial, o modelo

Ford Pinto, no ano de 1970. A Ford Motor Company, em análise do custo benefício, dispôs que

o benefício de consertar as unidades defeituosas não compensaria os custos para equipar cada

veículo a fim de tornar o tanque de combustível mais seguro, preservando a vida dos

proprietários96.

Tendo em vista essas inúmeras objeções ao argumento utilitarista, buscou-se renovar

suas bases, adaptando-as à proteção dos direitos fundamentais. Assim, o caráter humanista foi

utilizado para reformular a doutrina utilitária, atribuindo-se maior relevo à dignidade da pessoa

humana e aos direitos individuais, entre os quais se destacam os direitos autorais e industriais,

consagrados na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, incisos XXVII, XXVIII, alíneas

a e b e XXIX, inseridos no Título II, Capítulo I, correspondente ao rol dos direitos e garantias

individuais. Para tanto, foram relevantes as contribuições filosóficas de John Stuart Mill (1806-

1873), discípulo de Jeremy Bentham (1748-1832). Ele procurou, a partir das considerações

iniciais de Bentham, estabelecer uma conciliação entre os direitos individuais e a filosofia

utilitarista, conforme ficará demonstrado no tópico seguinte.

95 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 56-57. 96 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 57-59.

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5 EM DEFESA DA LIBERDADE: AS CONTRIBUIÇÕES DE JOHN STUART MILL PARA CONCILIAÇÃO ENTRE O DIREITO INDIVIDUAL DO AUTOR COM A FILOSOFIA UTILITARISTA

John Stuart Mill (1806-1873), filho do utilitarista James Mill (1773-1836), amigo e

seguidor de Jeremy Bentham (1748-1832). Mill foi educado por seu pai, vislumbrando, desde

a sua infância, os diálogos dele com Bentham. Seus escritos refletem sua interação com o

empirismo inglês, teoria do conhecimento, a qual o compreende como proveniente da

experiência sensorial do observador. Ele possui diversos teóricos adeptos, entre os quais,

Aristóteles (384 a. c. – 322 a. c.), Nicolau Maquiavel (1469-1527), Francis Bacon (1561-1626),

Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-1704) e David Hume (1711-1776).

John Mill se vale do método indutivo, raciocínio voltado à compreensão da ciência a

partir da observação, ou seja, da análise dos casos particulares, a fim de extrair uma verdade

geral. Os argumentos indutivos extraem das premissas fundamentos para a conclusão,

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desprovidos de definitividade97. Parte-se de premissas particulares, em busca de uma lei

universal.

O autor buscou conciliar os direitos e garantias fundamentais individuais com a

filosofia utilitarista adotada por seu antecessor Jeremy Bentham. Para tanto, em sua obra On

Liberty98, de 1859, defende a liberdade do indivíduo para fazer o que quiser, desde que não

ocasione danos a outrem. O poder público não deve interferir na liberdade individual a fim de

tutelar o cidadão ou impor as crenças da maioria. Não havendo prejuízo ao próximo, os sujeitos

são livres para agirem, mantendo o domínio total sobre o seu corpo e a sua mente. Para ele, a

liberdade pressupõe considerações utilitaristas, como instância final para a resolução de todas

as questões éticas, considerando os interesses dos indivíduos como serem em constante

evolução99.

Stuart Mill preocupou-se, também, em conciliar a liberdade individual com a justiça

social, compreendendo a necessidade de cada indivíduo como ser responsável por atuar na

melhora de sua posição social. Converge com Bentham no tocante à necessidade de que toda

ação seja voltada a maximizar a felicidade ou prazer e reduzir a dor. No entanto, em sentido

contrário àquele, considera a qualidade do ato praticado pelo sujeito, no exercício de sua

autonomia individual. Nesse sentido, considera que “(...) a qualidade é tão levada em conta

quanto a utilidade, seria absurdo supor que a avaliação dos prazeres dependesse unicamente da

quantidade”. A coletividade100 incide sobre as ações individuais, não obstante, em algumas

situações, deva-se considerar os limites à autonomia individual.

Para Mill, a maximização da utilidade deve ser feita em longo prazo e não de maneira

imediatista, caso a caso101. Ele corrobora que a observância à liberdade individual conduzirá à

máxima felicidade humana. Sandel, analisando os efeitos da liberdade evidenciados por Mill,

aduz que eles não fornecem uma base moral efetiva para os direitos individuais, em razão de

97 COPI, Irving; COHEN, Carl. Introduction to logic. New York: Macmillan Publishing Company, 2008. p. 45-46. 98 MILL, John Stuart. On liberty. Cambridge Texts in the History of Political Thought: Cambridge University Press, 2005. 99 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 64. 100 Associado a esse termo, tem-se a noção de coletivismo. Perspectiva filosófica, política, religiosa, econômica ou social, quem enfatiza a natureza humana como elemento cultural essencial para manter coesão entre os indivíduos, atuantes em comunidade. Para os liberais, essa concepção põe em cheque a individualidade e diversidade no meio social, em prol de uma identidade comum, reduzindo à liberdade na medida em que se privilegia a atuação do poder público para o cumprimento dos objetivos coletivistas. 101 MILL, John Stuart. On Liberty. England: Penguin Books, 1980. p. 1-8.

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alguns fatores. Destaca-se o fato de que o respeito aos indivíduos como pressuposto para o

progresso social, acaba por limitar esses direitos em razão da coletividade. Além disso, ao

fundamentar os direitos individuais à luz da filosofia utilitarista, desconsidera-se a noção de

que a violação dos direitos de alguém, além dos seus efeitos coletivos, ocasiona um mal ao

indivíduo102.

A felicidade máxima da vida humana não deve ser atingida considerando a moral

utilitarista, sem sentido absoluto, ou seja, forçando os indivíduos a agirem conforme os

costumes e convenções ou a opinião dominante103. O exercício das faculdades humanas

perceptivas pressupõe a realização de escolhas. A realização de algo por costume não implica

em nenhuma escolha, na medida em que o sujeito não foi capaz de discernir e desejar a melhor

conduta a ser adotada. As capacidades mentais devem ser estimuladas constantemente, a partir

da avaliação dos atos praticados104.

Em sua obra Utilitarianism, Mill demonstra a distinção, pelos utilitaristas, dos prazeres

mais elevados e menos elevados. Os superiores produzem mais virtudes mais nobres, ou seja,

prazer intenso e duradouro105. No entanto, o pensamento de Jeremy Bentham não realiza essa

distinção, compreendendo todos os valores em uma única escala. Para ele, as experiências são

diferenciadas em razão da quantidade de prazer e dor que proporcionam e não de maneira

qualitativa, como expressa Mill ao corroborar com a existência de valores com maior relevo e

outros, banais106.

A efervescência dos direitos fundamentais, em detrimento da violação da esfera

individual pela autoridade estatal, refletiu o pensamento iluminista da época, no século XVIII.

O iluminismo foi um movimento cultural surgido na Europa, naquele período, o qual, em uma

perspectiva racional, buscou reformar a sociedade e o conhecimento herdado da tradição

medieval. Corroborava com o conhecimento apurado da natureza, além de promover a interação

cultural, em detrimento da intolerância religiosa e estatal. Ele foi defendido por diversos

filósofos, tais como: Denis Diderot (1713-1784), Jean Le Rond d'Alembert (1717-1783),

Voltaire (1694 -1778) e Montesquieu (1689-1755).

102 Acentua-se a noção de individualismo, conceito político, moral e social que corrobora com a liberdade do indivíduo frente a um grupo, à sociedade ou ao Estado. 103 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 65-66. 104 MILL, John Stuart. On Liberty. England: Penguin Books, 1980. p. 29-39. 105 MILL, John Stuart. Utilitarianism. Indianapolis: Hakett Publishing, 1979. 106 SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de Heloisa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 67-68.

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Esse movimento influenciou os ideais libertários da Revolução Francesa (1789-1799),

período de profunda agitação política e social no ambiente francês, em oposição aos interesses

da monarquia absolutista. Defendiam-se os fundamentos principiológicos da liberdade,

igualdade e fraternidade (liberté, égalité, fraternité), culminando na Declaração dos Direitos do

Homem e do Cidadão (1789), de grande relevo na consagração dos direitos individuais, em

uma concepção jusnaturalista, a qual os compreende como direitos naturais, universais e

exigíveis a qualquer tempo, sendo inerentes à natureza humana.

Outro momento de bastante relevância na efetivação dos direitos e garantias

fundamentais, especialmente do direito à liberdade, foi a Revolução Americana, também

compreendida como Guerra da Independência dos Estados Unidos da América (EUA), ocorrida

em 1776, após a assinatura do Tratado de Paris (1763), responsável por extinguir a Guerra dos

Sete Anos (1756-1763). Como diploma normativo resultante desse momento histórico destaca-

se a Declaração da Independência dos Estados Unidos da América (EUA), momento em que as

Treze Colônias da América do Norte declararam sua independência perante à Grã-Bretanha.

Seus dispositivos foram influenciados pelo pensamento Lockeano, reconhecendo

expressamente o direito natural dos indivíduos, como direitos inerentes, anteriores ao Estado e

a sociedade. Em razão das leis naturais, salvaguarda-se ao homem o direito à vida, liberdade e

igualdade107.

Para os defensores da liberdade individual, destaca-se noção de um Estado mínimo,

limitado à proteção dos indivíduos “contra a violência, o roubo, a fraude, a fiscalização do

cumprimento de contratos” 108, conforme dispõe Robert Nozick (1938-2002), em sua obra

intitulada Anarquia, Estado e Utopia, na qual apresenta as funções do Estado moderno,

apresentado objeções ao liberalismo, socialismo e conservadorismo, expondo uma nova teoria

de justiça redistributiva, fundada em um modelo utópico de Estado mínimo. Essa limitação

estatal faz-se necessária, ao compreender que qualquer outra forma de Estado mais amplo, viola

os direitos da pessoa109.

Além disso, existem aqueles que corroboram pela ausência total do Estado.

Denominam-se libertários, os anarquistas franceses do século XIX, ao passo que defendem a

107 STERN, Kenneth D. John Locke and the Declaration of Independence. In: Cleveland Marshall Law Review, Ohio, v. 15, 1966. p. 186-195. 108 NOZICK, Robert. Anarquia, Estado e Utopia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1991. p. 42. 109 NOZICK, Robert. Anarquia, Estado e Utopia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1991. p. 171.

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liberdade pessoal, política e jurídica, como elemento nuclear da sociedade, não conferindo

autoridade e poder ao Estado.

Aplicando-se a perspectiva libertária ao plano dos direitos autorais, o download de

músicas da internet não viola esses direitos, visto que não há escassez da criação intelectual,

como ocorre em relação aos bens materiais (propriedade material, por exemplo). Pelo contrário,

opera-se sua disseminação à coletividade, contribuindo para efetivação do direito de autor,

consagrado, dentre outros diplomas, na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, incisos

XXVII, XXVIII, XXIX, no rol dos direitos e garantias fundamentais, e do direito à cultura,

também salvaguardado na Carta Magna, em seu artigo 215. Em perspectiva utilitarista,

salvaguarda o bem-estar geral, ao obter o acesso às criações intelectuais.

O filósofo Karl Raimund Popper (1902-1994), à luz da teoria evolucionista do Estado,

em sua obra “A Sociedade Aberta e Seus Inimigos” ou “The Open Society and Its Enemies”,

volume 1, intitulado “O Fascínio de Platão”. Clássico da filosofia política, lançado no auge da

Segunda Guerra Mundial, em 1945, Popper tece inúmeras críticas ao historicismo teleológico,

reconhecendo-o como método falho que produz nenhum resultado de valor, na medida em que

busca tornar a história compreensível através de uma interpretação teística, ou seja, crença em

um Deus, dotado de valor supremo110. Para ele, o historicismo conduz necessariamente a uma

sociedade "tribal" e "fechada", com total desprezo às liberdades individuais. Ademais, expõe

objeções às concepções adotadas por filósofos como Platão (427 a. c. – 347 a. c.), Georg

Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831) e Karl Marx (1818-1883), acusando-os de totalitários

por sustentarem suas filosofias políticas no historicismo.

Não se admite a interferência do Estado em sentido contrário aos novos usos das

criações intelectuais, ao passo que figuram como relações sociais ocorridas na

contemporaneidade que demonstram a natureza evolutiva do direito, fundando seus valores em

processos sociais de adaptação111. O direito positivo é responsável pela regulamentação dos

indivíduos, em ambiente físico ou virtual, com fulcro nesses preceitos disseminados

socialmente.

No plano dos direitos autorais, demanda-se, a partir da realidade de disseminação das

criações intelectuais com o auxílio dos recursos tecnológicos desenvolvidos na sociedade

informacional, uma conciliação política, legislativa e judiciária, entre os direitos fundamentais

110 POPPER, Karl. A sociedade aberta e seus inimigos. Vol. 1. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1974. p. 22. 111 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Sistema de ciência positiva do Direito. Tomo I. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972.

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do autor e acesso à cultura. A sociedade é livre para utilizar as criações intelectuais, como

instrumentos de aprimoramento cultural, desde que reconhecidos os direitos morais e

patrimoniais do autor.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

À luz das contribuições doutrinárias apresentadas no transcurso do estudo,

vislumbrou-se, historicamente, o contexto evolutivo pelo qual perpassou os direitos autorais,

atuantes, a priori, como instrumentos de propriedade conferidos a um número limitado de

pessoas, para a realidade vivenciada pelos indivíduos, na sociedade informacional. Nela,

surgem novos usos sobre as criações intelectuais, outrora não abrangidos pela doutrina ou

legislação autoral vigente, demandando a adequação dessas novas relações socioculturais.

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Assim, buscou-se suscitar novos caminhos direcionados ao enfrentamento da

problemática apresentada. Para tanto, elencou-se, primeiramente, a prevalência do caráter

patrimonial ao longo do processo evolutivo dos direitos autorais, com destaque para os sistemas

copyright e droit d’auteur, apresentando-se sua fundamentação filosófica utilitarista e

jusnaturalista do direito de propriedade material e imaterial, diante dos diplomas normativos

consagradores dessas perspectivas, seja nos países adeptos do common law ou àqueles de

tradição romano-germânica, como é o caso do Brasil.

Em seguida, situou-se os direitos de autor no contexto da sociedade informacional,

evidenciando como essas relações sociais, jurídicas e econômicas, repercutem sobre os direitos

mencionados. Com a evolução informática, rompeu-se com as fronteiras físicas, o que

proporcionou a compreensão da realidade a partir do meio digital. A produção e o

compartilhamento das criações intelectuais na internet, demandou uma atenção especial dos

juristas, fazendo-se necessário repensar a sistemática autoral vigente à luz dessas novas práticas,

destacando-se a lógica utilitarista, conciliando os direitos fundamentais do autor e à cultura.

A partir de então, a fim de buscar dirimir a problemática suscitada, evidenciou-se

contribuições doutrinárias relevantes que, não obstante tenham sido originalmente empregadas

para fundamentação jurídico-filosófica do copyright, inspiram novas soluções jurídicas para os

conflitos presentes na realidade atual vivenciada pelos direitos autorais na sociedade da

informação. Reconhece-se a liberdade dos indivíduos, autores ou não, para compartilharem as

criações intelectuais, desde que não violem os interesses do autor, detentor, além dos direitos

patrimoniais, do caráter moral ou personalíssimo que lhes é inerente e o vincula à sua produção

do intelecto.

Diante do exposto, busca-se a harmonização dos direitos fundamentais resguardados

ao autor (artigo 5º, XXVII, da CRFB/88) e o acesso à cultura (artigo 215, da CRFB/88). Com

isso, têm-se o efetivo gerenciamento dos direitos de autor, o qual possui a total liberdade sobre

suas criações intelectuais, autorizando determinados usos e vedando outros à sociedade, desde

que sua conduta não afete os demais indivíduos. Pelo contrário, versa-se para funcionalização

das criações intelectuais, resguardando o progresso econômico e tecnológico, fins visados pela

sociedade capitalista hodierna.

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REFERÊNCIAS

ALVES, Marco Antônio Souza; PONTES, Leonardo Machado Pontes. O direito de autor como um direito de propriedade: um estudo histórico da origem do copyright e do droit d’auteur. In: Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis: CONPEDI, 2009. p. 9881.

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ABORDAGEM CRÍTICA SOBRE O ACORDO TRIPS E O ACESSO A MEDICAMENTOS

CRITICAL APPROACH TO THE TRIPS AGREEMENT AND ACCESS TO MEDICINES ENFOQUE CRÍTICA SOBRE EL ACUERDO TRIPS Y EL ACCESO A MEDICAMENTOS

Rafaella Dias Gonçalves1 orcid.org/0000-0001-7288-3904

RECEBIBO 12/02/2018 APROVADO 20/02/2018 PUBLICADO 12/03/2018 Editor Responsável: Carla Caldas Método de Avaliação: Double Blind Review E-ISSN: 2316-8080 DOI:10.16928

RESUMO

O setor de medicamentos sofreu e vem sofrendo uma remodelação diante de novos desafios industriais em todo o mundo e especialmente após a introdução do Acordo TRIPS na OMC. O objetivo deste artigo é o breve enfoque sobre o acordo TRIPS e o acesso a medicamentos, com abordagem na análise crítica - sobre como os direitos de propriedade intelectual podem aumentar o custo dos medicamentos, através das medidas TRIPs / ADPIC + (mais), no direito interno e - nas vantagens dos países desenvolvidos no bilateralismo pós-TRIPs. PALAVRAS-CHAVE: Medicamentos. Acordo ADPIC. Propriedade intelectual

ABSTRACT

The drug industry has suffered and is being reshaped in the face of new industrial challenges around the world and especially after the introduction of the TRIPs agreement in the WTO. The purpose of this article is to provide a brief overview of the TRIPS agreement and access to medicines, focusing on the critical analysis of how intellectual property rights can increase the cost of medicines through Trips / TRIPS + measures, in domestic law and - the advantages of developed countries in post-TRIPS bilateralism. KEYWORDS: Medications. I agree to TRIP. Intellectual Property

RESUMEN

1 Mestranda em Direito Constitucional (2016/2018) pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal. Investigadora em Direito Civil da Universidade de Sevilla. Mestranda visitante no Mestrado em Análises Econômicas e Políticas Públicas (2017/2018) pela Universidade de Salamanca (USAL), Espanha. Pós-Graduanda em Direito Público, Direito do Trabalho e Direito Previdenciário (2014) pela Universidade Estácio de Sá (FIC) – Ceará - Brasil. Advogada inscrita Na Ordem dos Advogados do Brasil (2011). Bacharela em Direito (2010) pela Universidade Estácio de Sá (FIC) – Ceará - Brasil │[email protected]

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El sector de medicamentos ha sufrido y sofre una remodelación ante los nuevos desafíos industriales en todo el mundo y sobre todo tras la introducción del acuerdo ADPIC en la OMC. El objetivo de este artículo es el breve enfoque sobre el acuerdo ADPIC y el acceso a medicamentos, con enfoque en el análisis crítico - de cómo los derechos de propiedad intelectual pueden aumentar el costo de los medicamentos, a través de medidas Trips / ADPIC + (más), en el derecho doméstico y - en las ventajas de los países desarrollados en el bilateralismo post-ADPIC. PALABRAS CLAVE: Medicamentos. Acuedo ADPIC. Propiedad Intelectual

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1. INTRODUÇÃO

Remonta-se no fim do século XX e início do XXI2, o período em que se deu a mais

expressiva colaboração entre duas potências da economia mundial – a dos Estados Unidos (EU)

e a da União Européia (UE), no tocante à propriedade intelectual (3) (4).

Esse movimento se iniciou com a Rodada Uruguai do GATT5 em Punta del Este, em

setembro de 1986, ocasião em que a propriedade intelectual foi suscitada “para garantir que

medidas e procedimentos com o objetivo de fazer cumprir os direitos de propriedade intelectual

não se tornem barreiras para o comércio justo”.6

Por contraste ao protagonismo da OMPI (7) (8), as referências feitas a esse regime no

GATT eram muito vagas e apresentavam-se com caráter marginal9. Como cediço, o objetivo

fundamental do GATT era garantir o funcionamento do princípio do comércio livre no mercado

mundial e, portanto, nem pelos seus fins e nem pela sua estrutura, fomentou o regime da

propriedade intelectual, que não formava parte do comércio de produtos que constituía o núcleo

do GATT10.

2 Acerca da evolução e quadro institucional da propriedade intelectual no âmbito do Direito Europeu, cfr: UBERTAZZI (2006: 29-86). 3 Desde o momento em que os Estados Unidos da América, juntamente com as restantes potências industrializadas, optaram por incentivar a proteção da propriedade intelectual no marco do GATT, ficou claro que se tratava de proteger os interesses dos países desenvolvidos nos países menos desenvolvidos. Para tornar possível este tratamento, veio à tona a relação entre os direitos de propriedade intelectual e o comércio, provocando um autêntico “matrimónio de conveniência”, que ninguém podia imaginar pouco tempo antes. Para maiores desenvolvimentos sobre o tema: RICKETSON (1995: 872 e ss). 4 A inclusão no Ciclo Uruguai, do tema da propriedade intelectual não foi tranquila e consensual. Os EUA e o Japão, apresentaram propostas que englobavam todos os direitos de propriedade intelectual e acentuavam a necessidade de uma aplicação efetiva. Dentre outros, o Brasil e a Argentina opunham-se à inclusão deste tema no Ciclo, como sublinha GERVAIS (2001: 10). 5 General Agreement on Tariffs and Trade [Acordo Geral de Tarifas e Comércio]. (N.T.) 6 Lista de assuntos para negociações no texto da reunião ministerial do GATT datado de 20 de setembro de 1986. 7 http://www.marcasepatentes.pt/files/collections/pt_PT/1/2/10/Convenção%20da%20OMPI.pdf, para Cfr. a Convenção que instituiu a OMPI. 8 A OMPI devido a circunstâncias políticas converteu-se rapidamente num organismo que apesar dos esforços dos seus dirigentes não logrou aportar soluções eficazes, e que, por estar dominado pelos países menos desenvolvidos carecia de credibilidade para ajudar nas necessidades dos países desenvolvidos, em especial, os Estados Unidos da América. Muitos dos países em desenvolvimento e dos novos países industrializados não eram membros de acordos internacionais relevantes em matéria de propriedade intelectual. Havia muitas dúvidas sobre o sistema de resolução de litígios da OMPI e do grau de respeito devido aos direitos de propriedade intelectual. Para maiores ilações sobre o tema, cfr: ALMEIDA (2004): “Os esforços da OMPI em modernizar a propriedade intelectual eram inglórios fora de um sistema de comércio multilateral submisso a uma lógica amplamente merceológico-mercável (mas desigual).” 9 A expressão é de INFANTE (2005: 52), referindo-se aos artigos do GATT que fazem menção à propriedade intelectual (artigos IX, XII, n.º 3, alínea c) (iii); XVIII, secção B, n.º 10, e XX, alínea d). 10 Neste sentido, CERVIÑO e CERRO (1994: 18).

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Mas, “a centelha que acendeu o trabalho rumo ao Acordo TRIPS11 [Acordo sobre

Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio]” GERVAIS (2003)

veio da União Europeia, em março de 1990, sob a forma do Draft Agreement on Trade- Related

Aspects of Intellectual ftroperty Rights [Esboço para Acordo sobre Aspectos dos Direitos de

Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio].

Em seguida, os Estados Unidos12 fizeram também seu próprio esboço para um acordo

com uma linguagem tão semelhante, que Daniel Gervais conjecturou ser produto de “consultas

transatlânticas” GERVAIS (2003), resultando, da imbricação de esforços das referidas potências,

o Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual ftroperty [Acordo sobre Aspectos dos

Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio] ou TRIPS (13) (14).

Ocorre que, a questão de grande repercussão sobre o referido acordo é o acesso a

medicamentos no espaço global, cujo TRIPS, no entendimento de ANQUILINO (2012: 152),

estaria permitindo companhias farmacêuticas a recorrerem a práticas de capturas de renda, em

que pudessem cobrar preços elevados, assim como pressionar os governos a perseguir as

empresas nacionais produtoras de cópias ou similares provenientes de paises onde não existe

patente de produto, ao mesmo tempo que vertem a investigação e desenvolvimento em doenças

de menor interesse a populações menos favorecidas15.

Com efeito, o tema é sobretudo importante e delicado, porque está umbilicalmente

ligado à saúde pública e quando se fala em saúde pública está em causa o seguinte:- o acesso a

medicamentos e recentes tecnologias que desenvolvam novos tratamentos para todos os

doentes, em qualquer país do Mundo; - a definição de políticas de saúde pública;- o respeito

pelas normas do regime de propriedade intelectual no plano interno e no plano internacional,

em especial o Acordo TRIPS/ADPIC16, por forma a obter e administrar os direitos em matéria

de patentes de medicamentos;- e ainda, a forma como se pratica o comércio internacional e o

11 Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights. (N.T.) 12 Sobre a posição da indústria norte-americana, defensora de um sistema de propriedade intelectual forte, de forma tendenciosa a salvaguardar a competividade, cfr., entre outros, GRANSTRAND (1999: 39 e ss). 13 GERVAIS (2003) explica que “esta estrutura ‘comum’ foi finalmente adotada e, submetida a poucas mudanças, serviu como base para o Tratado que emergiu”. Ibid. 14 O motivo pelo qual os Estados Unidos e a União Europeia foram tão convincentes em um espaço de tempo, como observou Peter Drahos, é porque “do ponto de vista do comércio imediato, a globalização da propriedade intelectual realmente só beneficiou os Estados Unidos e em menor medida a Comunidade Europeia” DRAHOS, (2003). 15 Isto é, o investimento em lifestyle drugs, em vez de pesquisa em lifesa-ving drugs. Cfr. DEERE (2009: 95). 16 As siglas TRIPS representam a denominação em língua inglesa de Trade Related Aspects of Intellectual Property Rights; as siglas ADPIC são a sua designação em castelhano, Acuerdo sobre los Aspectos de los Derechos de Propriedad Intelectual relacionados com el Comercio.

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tipo de acordos estabelecidos entre os Governos, determinantes no acesso aos medicamento e

meios tecnológicos necessários aos cuidados de saúde.

Portanto, o objetivo deste estudo é a breve abordagem sobre o acordo TRIPS e o acesso

a medicamentos, com enfoque na análise crítica - de como os direitos de propriedade intelectual

podem aumentar o custo dos medicamentos, através de medidas Trips/ADPIC + (mais), no

direito doméstico e – nas vantagens dos países desenvolvidos no bilateralismo pós-TRIPS.

2. O ACORDO TRIPS E A PATENTEABILIDADE DOS PRODUTOS

FARMACÊUTICOS

O impacto do regime da propriedade intelectual no que respeita o direito à saúde é

imensurável.17 O acesso aos medicamentos e à medicina18 parece ser aos olhos da OMC um

direito humano19 com implicações e responsabilidades enormes para a indústria farmacêutica.

Na génese do Acordo TRIPS estiveram os medicamentos. A justificação da indústria

farmacêutica para este fato é a necessidade de incentivar a pesquisa e a inovação na área dos

fármacos. Esta explicação apresentada sob a forma de “dogma” pode ser e é cada dia mais

questionada (20) (21). E há quem avalize a ideia de que a inclusão da matéria da propriedade

intelectual neste Acordo ficou a dever-se exclusivamente à pressão de alguns administradores

executivos de outras tantas companhias farmacêuticas americanas, entre as quais CEO (Chief

Executive Officer) da Pfizer, Edmund Pratt22.

O que ocorre é que o Acordo TRIPS obriga os países membros da OMC a adotar

determinadas regras de propriedade intelectual, em especial a obrigatoriedade de reconhecer a

17 Cfr. a leitura de: Obijiofor AGINAM, Between Life and Profit: Global Governance and the Triology of Human Rights, Public Health and Pharmaceutical Patents, North Carolina Journal of International Law and Commercial Regulation 31 (2006: 903). 18 Por isso nesta matéria, existe uma “trilateral cooperation” ou a “cooperação internacioanal”, pois cooperam entre si, as diferentes agências, a OMS, a Organização Mundial de Propriedade Intelectual, e o OMC. Sobre este sistema, vide, o relatório das três organizações, WHO, WIPO, WTO, Promoting Acess to Medical Technologies and Innovation, Intersections between Public Health, Intelectual Property and Trade, 2012, pp. 21- 24. 19 Sobre isto, vide, de Holger P. HESTERMEYER (2004: pp. 125-144), Access to Medication as a Human Right, Max Planck, UNYB, 8 , disponível em http://www.mpil.de/shared/data/pdf/pdfmpunyb/hestermeyer_8.pdf. 20 A partir dos países em desenvolvimento se percebeu a estratégia dos países desenvolvidos. Nesse sentido, Cfr. a leitura de Carlos Primo Braga, The Economics of Intellectual Property Rights and the GATT: a view from the South, Vanderbilt Journal of Transnational Law, 22, 1989, pp. 243 e segs. Evidente também foi o risco potencial de que a propriedade intelectual se regulasse pelo “clube dos ricos”, expressão extraída do autor: SEGADE (2001: 215). 21 Veremos mais adiante sobre algumas medidas do TRIPS mais no ordenamento jurídico interno brasileiro. 22 Cfr. entre outros, BELLMANN, DUTFIELD e ORTIZ (2003: 24).

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patenteabilidade dos produtos farmacêuticos, o que há algumas décadas era desconhecido na

maioria dos países em desenvolvimento e que, não há muito tempo se previa nos países

desenvolvidos23.

Outrossim, mesmo não justificando suas falhas24, fato inegável é que o Acordo TRIPS

tentou superar as diversificadas críticas tecidas às Convenções25 que lhe precedeu, como por

exemplo: - a não exigência de uma harmonização, ainda que mínima (seja no plano do direito

substantivo seja no plano do direito adjetivo), entre ordenamentos jurídicos, sendo certo que as

referidas Convenções estabelecem algum conteúdo mínimo, aos Estados membros é deixada

grande liberdade de conformação interna, por vezes desajustada aos interesses das empresas

multinacionais. - a ausência de sistemas obrigatórios de resolução de litígios entre Estados ou

sistemas sancionatórios em relação a membros que não cumpram as obrigações consagradas

nas Convenções.

2.1. Harmonização do acordo TRIPS com ordenamentos jurídicos nacionais

Os objetivos da harmonização dos ordenamentos jurídicos nacionais no domínio da

propriedade intelectual não são os objetivos últimos do Acordo TRIPS. O que se pretende

ressaltar é que a propriedade intelectual não constitua um obstáculo ao livre comércio

internacional.

Entretanto, ainda na rodada do Uruguai, a advertência que se fazia para os países

menos desenvolvidos era de que os titulares das patentes26 passariam a ter a possibilidade de

23 Inegável que o referido acordo representa a tentativa mais ambiciosa de regular e proteger adequadamente os distintos bens imateriais em todo o Mundo. Mas, no entendimento de LIBÓRIO (2006: 406): “(...) ao mesmo tempo, institui um sistema global de propriedade intelectual, nos termos do qual essas barreiras são reerguidas ainda que em benefício direto de outros agentes.” 24 Ou o seu mau uso por parte dos países desenvolvidos em detrimento dos países em desenvolvimento. Vide item 05 deste artigo acerca do bilateralismo pós-TRIPS. 25 Até à data de celebração do Acordo TRIPS, a propriedade intelectual baseava-se, a nível internacional, fundamentalmente na Convenção da União de Paris de 1883 e na Convenção de Berna de 1886. Ambas as Convenções ditam que qualquer litígio relativo à interpretação e aplicação das convenções pode ser levado ao Tribunal Internacional de Justiça (artigos 28.º e 33.º respectivamente), mas tal situação nunca aconteceu. Como ensina INFANTE (2013: 1622): “(...) em contraste, desde que as disposições básicas das Convenções de Paris e Berna foram incorporadas por referência no Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio (...), já vários litígios relativos a ambas as Convenções foram dirimidos no âmbito do sistema de resolução de litígios da OMC.” Sobre as soluções apresentadas e permitidas, nesta área pela primeira Convenção, leia-se também, KUNZ-HALLSTEIN (1989: 87 e segs). O autor sublinha que esta Convenção dispõe de mecanismos que garantem um cumprimento efetivo das suas disposições, mas reconhece o seu caráter arcaico. 26 Uma patente é um direito exclusivo que se obtêm sobre invenções. O objeto inventivo pode ser um produto ou um processo. Estamos perante um contrato entre o Estado e o requerente da patente, pelo qual este obtêm o direito exclusivo a produzir e comercializar a sua invenção. Concedida a patente, o seu titular passa a deter em absoluto o direito de impedir que terceiros, sem o seu consentimento, usem, fabriquem, vendam ou importem produtos ou

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manter altos os preços dos medicamentos patenteados deixando-os assim fora do alcance de

muitas pessoas, principalmente as mais pobres. Elevado o preço dos medicamentos no mercado

internacional, o direito à saúde ficaria gravemente lesado. 27

Assim, a OMC afirmava que para o Acordo TRIPS vigorar no âmbito nacional, os

Estados deveriam recepcionar as suas regras nas leis internas de propriedade intelectual, cuja

“internalização” visava reduzir o potencial impacto negativo no acesso aos medicamentos por

parte de países menos desenvolvidos28.

Além disso, outro atrativo para assinatura do referido acordo era a possibilidade de

cláusulas de flexibilidade/elasticidade29, cujo reconhecimento aos países em desenvolvimento

estaria condicionado a implementação de medidas legislativas e regulamentares no plano

interno (as quais, não podem resultar num nível inferior de compatibilidade com o disposto no

TRIPS – cláusula stand-still), limitando-se à negociação de períodos transitórios ou exceções

temporais (artigos 65.º e 66.º do Acordo TRIPS) 30.

Vale ressaltar, contudo, que o Acordo TRIPS ao exigir um nível mínimo de tutela (quer

no plano substancial, quer no domínio processual) a implementar nos ordenamentos jurídicos

nacionais o princípio do tratamento nacional31 tem pouco de nacional, pois o regime jurídico

dos direitos de propriedade intelectual será, em grande parte, imposto pelo regime internacional

consagrado no Acordo TRIPS.

processos patenteados. Vide a respeito destas noções, A Handbook on the WTO TRIPS Agreement, Antony Taubman, Hannu Wager, Jayashree Watal (Eds.), Cambridge University Press, 2012, pp. 95-108, bem como, os artigos 27.º e 28.º do Acordo TRIPS, in, www.wto.org/ e o síte www.marcasepatentes.pt , onde encontramos esta informação. 27 O fato de o Acordo que deu origem à OMC ter sido negociado num pacote único, facilitou a tarefa de convencer os países em desenvolvimento a aceitarem regras mais rígidas para os direitos de propriedade intelectual em troca de promessas de compensações nas áreas agrícola e dos produtos têxteis. 28 No grupo de disposições sobre patentes em especial, contam-se primeiramente o n.º 1 e o n.º 2 do artigo 27.º do Acordo TRIPS que permitem aos membros, no primeiro caso, redigirem a sua legislação nacional e especialmente o requisito de patenteabilidade que é a novidade, no sentido de não considerarem novas as invenções que tenham por objeto usos novos ou secundários de medicamentos, e no segundo caso, de excluírem da patenteabilidade dos métodos diagnósticos, cirúrgicos ou terapêuticos de pessoas ou animais, bem como de plantas e animais. 29 Vários exemplos demonstram que a o uso das flexibilidades previstas no TRIPS resultou na redução dos preços de medicamentos. O Ruanda, em 2006, sancionou uma lei determinando que os medicamentos genéricos fossem usados, quando disponíveis, em todos os programas de tratamento. Em Julho de 2007, este pais fez saber que iria usar a flexibilidade constante da decisão da OMC de 30 de Agosto de 2003, para importar uma combinação genérica de medicamentos, em dose fixa, para tratar aproximadamente 21 mil pessoas com HIV/SIDA durante um ano, por apenas US$0,19 por comprimido. Cfr. novamente em www.wto.org . 30 Para países desenvolvidos, o prazo para aquela implementação ia até 1996, para países em desenvolvimento o prazo corria até Janeiro de 2000, para economias em transitório (ex-economias socialistas) até janeiro de 2000 e finalmente, para os países com menor desenvolvimento, até janeiro de 2001. Cfr. SENHORAS (2007). 31 O princípio do Tratamento Nacional será melhor visto no Sub tópico seguinte, que trata dos princípios estruturantes da OMC.

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2.1.1 Princípios estruturantes da OMC

O Acordo TRIPS não se dirige a mercadorias ou serviços, mas sim a pessoas. Com

efeito, confere através dos membros da OMC, direitos e obrigações. O primeiro princípio a

destacar é o princípio do tratamento nacional, princípio estruturante da OMC, que se traduz na

ideia de que “cada membro concederá aos nacionais de outros Estados-membros, um

tratamento não menos favorável do que o que concede aos seus próprios nacionais, no que se

refere à proteção da propriedade intelectual”32, e que está presente no artigo 3.º do Acordo

TRIPS33, pretendendo proteger os titulares de direitos de propriedade intelectual. A presença

expressa deste princípio no TRIPS tem uma carga simbólica, na medida em que já era o

resultado do artigo 2.º, a sua incorporação no Acordo, pela importação dos princípios das

convenções de Paris, Berna e Roma.

Por sua vez, o princípio do tratamento da nação mais favorecida (34)(35) , princípio

distintivo da OMC e também vivo no Acordo GATT e no Acordo Geral sobre o Comércio de

Serviços, foi uma inovação jurídica no domínio da propriedade intelectual, pois à época do

GATT tinha apenas como objeto mercadorias. O objetivo por detrás disto foi o de impedir que

existam discriminações entre nacionais de países membros diferentes, assegurando-se uma

uniformidade no comércio internacional (36)(37).

Os princípios mencionados38, além de dar guarida ao princípio da não discriminação,

possuem por finalidade o amparo a um comércio livre a nível mundial, através da consecução

de idênticas condições de mercado. O seu regime jurídico é reflexo da instituição de um modelo

de concorrência internacional, enraizado num mercado sucessivamente liberalizado. Este

32 A disposição refere-se a “tratamento não menos favorável” e não a igualdade de tratamento como parece resultar do artigo 2.º/1 da Convenção da União de Paris, o que, nas palavras de GERVAIS (2003: 102), legitimará a possibilidade de os estrangeiros gozarem de um melhor tratamento que os nacionais. 33 Para maiores aprofundamentos sobre o art. 3º, Cfr. ob. já. cit: GERVAIS (2003: 98-101). 34 Inserto no artigo 4º do Acordo TRIPS. 35 Cfr. GERVAIS (2003: 102-110). 36 Vale dizer que qualquer tratamento preferencial reconhecido aos nacionais de um país, na sequência de um acordo bilateral, é imediatamente estendido aos nacionais de todos os outros Estados-membros, afastando-se qualquer hipótese de discricionariedade nas relações entre membros. 37 Os artigos 7.º e 8.º do Acordo tratam dos seus objetivos e dos princípios que presidem à sua interpretação e aplicação. Atribuímos especial ênfase à necessidade de a proteção e aplicação dos direitos de propriedade intelectual deverem “contribuir para a promoção da inovação tecnológica e para a transferência e divulgação de tecnologia”, à possibilidade de os membros adoptarem “medidas necessárias para proteger a saúde pública e a nutrição”, ou ainda, à pertinência de um cenário de adopção de medidas, com o fim de “impedir a utilização abusiva de direitos de propriedade intelectual” pelos seus titulares, ou simplesmente, a proteção, através de adequadas medidas, da“ transferência internacional de tecnologia.” 38 Para maior aprofundamento sobre os princípios do tratamento nacional e da nação mais favorecida, no contexto do Acordo TRIPS, cfr: TAUBMAN, WAGER e WATAL (Eds) (2012: 16-18).

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modelo de trocas tem a pretensão de querer ser global e concêntrico (tornando inadmissíveis

regimes jurídicos internos que beneficiem os agentes económicos nacionais).39

Mas, se tem por objetivo ser concêntrico, deverá no mesmo talante não beneficiar

agentes econômicos internacionais em detrimento dos nacionais, como vem ocorrendo em

alguns países em desenvolvimento, em que a má elaboração da lei interna torna desarmônico

todo o sistema, na medida em que beneficia corporações e indústrias farmacêuticas, na sua

maioria, de países desenvolvidos, resultando na elasticidade abusiva do monopólio patentário

do fármaco.

3. TRIPS + (MAIS) / UNILATERAL. ELASTICIDADE ABUSIVA DE

PATENTEABILIDADE DE MEDICAMENTOS

Existem imensas circunstâncias em que permitir a manutenção do monopólio de uma

patente pode lesar o interesse público, tornando injustificável o acesso exclusivo do titular da

patente ao mercado. Neste ponto, repousa a crítica mais frequente que é feita à OMC, que é a

de que é insensível aos temas da saúde pública e que o Acordo TRIPS é muitas vezes olhado

no sentido de apenas se interessar pela proteção das grandes corporações. 40

Na área da saúde pública, existem muitas situações em que a persistência da defesa da

propriedade intelectual pode revelar-se contrária ao interesse público. Isto pode se dar, por

exemplo, na situação em que a proteção da patente se dá pela proibição da concorrência de

medicamentos genéricos, podendo esta prática restringir o acesso a fármacos e tratamentos

39 Cfr. PICONE e LIGUSTRO (2003: 403). 40 Miguel Rodriguez Mendonza, ex-Diretor Adjunto da OMC, afirmou numa intervenção pública em 2001, em Girona, que estas críticas têm pouco fundamento. “(...) En cuanto al Acuerdo TRIPS de la OMC, conviene referirse a la reciente controversia legal em los Tribunales sudafricanos. El Acuerdo refleja un balance entre la necesidade de incentivos para in-vestigar y desarrollar nuevos productos y la necesidad de po-ner estos productos a la disposición de los consumidores, to-mando em cuenta sus necesidades particulares, por esto cuenta com mecanismos que permiten las licencias obligatorias, las importaciones paralelas y los precios diferenciados.” Vide a sua intervenção em La Unión Europea y el Comercio Internacional: limites al libre Comercio, Girona, 25 de Abril de 2001, Francina Esteve Garcia (coord.), Universitat, Diversitas (24).

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médicos inovadores. Nestes casos, o licenciamento compulsório (41)(42) e outras medidas43

podem remediar ou até atenuar os possíveis efeitos negativos da proteção patenteária (44)(45).

Com efeito, o vínculo entre o comércio internacional e a propriedade intelectual ainda

não indicia uma completa uniformização dos regimes jurídicos internos, tanto mais que o artigo

1.º/1 do TRIPS, permite que os membros consagrem níveis mais elevados de proteção do que

os previstos naquele acordo, na medida em que o livre comércio internacional só deseja que a

propriedade intelectual não seja óbice à sua plena realização.

41 Licença compulsória é uma das flexibilidades permitidas pelo Acordo TRIPS. A utilização de alguns mecanismos de flexibilização do TRIPS asseguram a disponibilidade de medicamentos a partir da “elasticida-de”, afirma MUSUNGU (2008: 436-446), da propriedade intelectual, pois é sabido, que as patentes de medicamentos concedem direitos exclusivos aos titulares das mesmas, permitindo que se cobre acima dos custos marginais de produção, o que torna os medicamentos patenteados mais caros em comparação com produtos similares, produzidos em ambiente competitivo. Cfr. a Revista Internacional de Direitos Humanos, S. Paulo, 2006, N.º 4, Ano 3, Texto de Justice C. Nwobike, Empresas Farmacêuticas e Acesso a Medicamentos nos países em Desenvolvimento: o caminho a seguir. Sob o ponto de vista do titular da patente, a mera ameaça da licença compulsória faz com que este reavalie o seu acesso ao mercado ou a estratégia de preço. Na opinião de DUTFIELD (2013: 153), “Patent portfolios are the main magnet for outside inves-tors – which also include larger science-based firms – and the larger the portfolio (usually measured by the quantity of pa-tents rather than their quality), the greater the interest from investors. 42 Pode-se dizer que o TRIPS causou profundas modificações no ordenamento jurídico brasileiro, especialmente no que se refere à patenteabilidade de produtos e processos farmacêuticos. O Brasil demonstrou que a legislação de que dispõe sobre o uso efetivo de flexibilidades relacionadas com a saúde pública, pode ser muito importante nas negociações de fármacos antirretrovirais a preços mais baixos. Cfr. ABBOTT e REICHMAN (2007: 321 e segs). Mediante ameaça de conceder licenciamento compulsório (ao abrigo do artigo 31.º do TRIPS), o Brasil negociou reduções significativas nos preços daqueles fármacos em 2001, 2003, 2005 e 2006. Em 4 de Maio de 2007, após infrutíferas e prolongadas negociações com a farmacêutica Merck Sharp & Dohme, foi concedida uma licença compulsória, por interesse público de patentes referentes ao Efavirenz, para fins de uso público não comercial. Foi a primeira quebra de patente de um medicamento no Brasil, por Decreto n.º 6.108 do Presidente da República. O prazo de proteção desta patente expirou em 7 de agosto de 2012. Esta informação e outras muito relevantes sobre o processo deste medicamento no Brasil em, Direitos de Propriedade intelectual & Saúde Pública, o acesso universal aos medicamentos anti-retrovirais no Brasil, de Maristela Basso/ Calixto Salomão Filho/Fabrício Polido/Priscilla César, IDCID, 2007, pp. 90-94. 43 A própria União Europeia adoptou, através do Regulamento (CE) n.º 816/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Maio de 2006, 356 relativa à concessão obrigatória de patentes respeitantes ao fabrico de produtos farmacêuticos destinados à exportação para países com problemas de saúde pública. Disponível em:http://www.marcasepatentes.pt/files/collections/pt_PT/1/6/26/Regulamento%20CE_816_2006_Concessão%20obrigatória%20Patentes%20prod%20farmacéuticos.pdf . Acesso em 17 de maio de 2017. 44 Consulte-se o quadro 1. da Nota Informativa do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o HIV/SIDA, em www.unaids.org.br , p. 3, que esclarece que as licenças compulsórias são mecanismos usados pelas autoridades públicas para a utilização de uma invenção protegida por uma patente, pelo Governo ou por terceiros, sem o conhecimento do seu detentor, sujeito a indemnização na forma de royalty (artigo 31.º/h do TRIPS). 45 A União Europeia adotou, através do Regulamento (CE) n.º 816/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Maio de 2006, relativa à concessão obrigatória de patentes respeitantes ao fabrico de produtos farmacêuticos destinados à exportação para países com problemas de saúde pública. Disponível em: http://www.marcasepatentes.pt/files/collections/pt_PT/1/6/26/Regulamento%20CE_816_2006_Concessão%20obrigatória%20Patentes%20prod%20farmacéuticos.pdf . Acesso em 18 de maio de 2017.

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Nesse sentido, consideramos que alguns ordenamentos internos excedem o “nível mais

elevado de proteção”, conduzindo a uma abusiva elasticidade de patente no direito interno,

denominada de TRIPS + (mais) ou unilateral.(46) (47).

É o que vem ocorrendo no Brasil, onde recentemente foi elaborado um estudo pela

UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), a pedido da ABIFINA48, cuja conclusão

apontou que a prorrogação das patentes de 9 medicamentos para além dos 20 anos (do depósito

do pedido) permitidos pela Lei 9273/9649 e condição minima exigida pelo acordo TRIPS no

art. 33°, em razão da demora em analisar os pedidos pelo INPI50 , está causando um custo para

o Estado brasileiro de pelo o menos 2 bilhões adicionais.

É o caso do antirretroviral Intelence, no tratamento de pessoas com o vírus HIV. O

pedido de patente foi depositado no Brasil pela empresa Janssen, do grupo americano Johnson

& Johnson, em 24 de setembro de 1999. A patente só foi concedida em 19 de novembro de

2013, 14 anos depois. Isso significaria que o medicamento só teria mais seis anos de proteção

até sua patente expirar. Graças à prorrogação prevista pela lei interna, sob os auspícios do

Acordo TRIPS, a patente da droga ganhou mais quatro anos de validade para completar os dez

anos de vigência previstos na LPI e o custo disso aos cofres brasileiros foi de apenas: R$ 27

milhões.

46 “refers to laws that re-strict flexibility under TRIPS or provide more protection than the TRIPS requires”, no conteito de Cynthia M. Ho, An Overview os TRIPS-Plus Standards, Loyola University Chicago School of Law, 2011, pp. 225, disponível em http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1933252 . Lembrando que ao caso concreto, aplica-se ao direito doméstico diferenciando-se do TRIPS Plus. Vide Nota 40. 47 O TRIPS + (mais) ou unilateral diverge do TRIPS Plus, onde por sua vez, estes últimos referem-se a acordos bilaterais desatrelados do plano multilateral em que albergam regras diversas das consolidadas no âmbito da OMC, através do TRIPS. Nas palavras de Matthew Turk, “TRIPS Plus refers to provisions in subsequent trade agree-ments between members that increase the baseline level of in-tellectual property protection. These provisions are most com-monly found in the bilateral trade agreements of United States, and usually take one of two general forms. Some provisions require the implementation of a more extensive standard, commonly by either increasing the term of protection or ex-panding intellectual property protection to new áreas. The sec-ond type of provision eliminates interpretations and flexibilities that were previously left open under TRIPS. Because the sec-ond type often forecloses interpretations of TRIPS that were explicitly emphasized as important by the Doha Declaration, such provisions are best understood as conscious attemps by developing countries to contract out of the flexibilities in TRIPS.” Cfr. deste autor, o artigo intitulado, Bargaining and Intellectual Property Treaties: The case for a Pro-Development Interpretation of TRIPS but not TRIPS PLUS, pp. 122 e 123, New York University, 2010. 48 Disponível em: http://www.abifina.org.br/arquivos/download/parecer_ie_ufrj.pdf . Acesso em 15 de maio de 2017. 49 o parágrafo único do artigo 40 da LPI está sendo discutido judicialmente através de uma Ação de Inconstitucionalidade protocolizada em maio/2016 (ADI5529) perante o Supremo Tribunal Federal Brasileiro, que entre outras motivações, alega que essa extensão legal viola o direito à saude e consequentemente o direito à vida Essa informação está disponível em: http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/ADI5529.pdf . Acesso em 16 de maio de 2017. 50 O instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI), estima que, atualmente, 1.082 patentes de medicamentos se beneficiam da prorrogação. Entre os pedidos que esperam análise e que poderão usufruir do tempo adicional estão outras 2.437 patentes.

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Com efeito, empresas nacionais não podem produzir genéricos enquanto a patente

perdurar, o que resulta no excesso desmensurado do monopólio patentário de corporações

farmacêuticas estrangeiras – in casu, da empresa do grupo americano Johnson & Johnson.

4. SISTEMA DE RESOLUÇÃO DE LITÍGIOS NO ÂMBITO DA OMC – CASO

CONCRETO (RECLAMAÇÃO DS 199)

Devido a sua obrigatoriedade, todos os membros da OMC estão sujeitos aos

mecanismos do órgão de solução de controvérsias51 que os pode penalizar caso se desrespeitem

os seus Acordos. O Sistema de resolução de litígio da OMC teve por escopo garantir que as

medidas e processos destinados a assegurar a proteção efetiva daqueles direitos, não sejam eles

próprios obstáculos ao legítimo comércio internacional.

Como já dito neste estudo52, após os anos 2000, o Brasil apresentou sucessivas

ameaças de conceder licença compulsória (ao abrigo do art. 31º do TRIPS), vindo, então, a

negociar reduções significativas nos preços de fármacos atirretrovirais.

Por conseguinte, obteve ganho na na maior batalha já enfrentada a nivel de quebra de

patentes de medicamentos, com a licença compulsória do fármaco Efavirez, mediante o

pagamento de uma compensação financeira, conhecida como royalties e sob o fundamento de

situação excepcional de emergência nacional em matéria de saúde pública.

Com efeito e no uso do sistema de controvérsias da OMC, em 8 de Janeiro de 2001,

os EUA apresentaram formalmente uma reclamação contra o Brasil no Órgão de Resolução de

Litígios da OMC53, questionando a interpretação do artigo 68.º da sua Lei de Patentes

brasileira54, que dispõe sobre o licenciamento compulsório decorrente da não fabricação local

da invenção protegida pelo titular da patente a ela associada.

A enorme repercussão sobre o caso, juntamente com a importância do tema do acesso

à saúde, levou entretanto a um acordo entre os dois países, em 25 de Junho de 2001. Ambos se

comprometeram a solucionar futuras disputas, por meio de negociações bilaterais, restando

ainda da composição o dever do Governo brasileiro, em particular, notificar previamente o

51 Cfr. o Anexo 2 que constitui o Memorando de Entendimento sobre as Regras e Processos que regem a Resolução de Litígios aplicável ao TRIPS. Para consulta no já citado site da OMC. 52 Vide nota 43. 53 Cfr. a Reclamação DS199, consultas requeridas em 30 de Maio de 2000. Para consulta em http://www.wto.org/spanish/tratop_s/dispu_s/cases_s/ds199_s.htm . 54 Cfr. a já cit. Lei de Propriedade Intelectual n.º 9.279 de 14 de Maio de 1996.

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Governo norte-americano sobre a possível concessão de licenças compulsórias baseada naquele

normativo55.

5. UM BREVE BALANÇO DO PÓS-TRIPS

A repercussão das regras do TRIPS sobre os preços dos fármacos adquiridos pelos

Estados afeta o acesso dos doentes aos medicamentos, o que inevitavelmente constitui a

violação do direito fundamental à saúde e à vida, uma vez que faz nascer direitos de

exclusividade para as empresas farmacêuticas, favorecendo o aumento de preços dos

medicamentos comprados pelos Estados.

Por essa razão, em 2001 os países em desenvolvimento adotaram a Declaração Doha

sobre o Acordo TRIPS e a Saúde Pública, como forma de exibir estas preocupações. Embora

esta não tivesse alterado o TRIPS, serviu para implantar nos Estados-membros, todas as

flexibilidades que constavam do TRIPS, relacionadas com a proteção da saúde pública e além

do mais, fortalecer a liberdade para a incorporação de outras flexibilidades de interesse

nacional para a saúde56.

Desse modo, e diante da urgência do tema, emergia uma cooperação internacional57

em que as ações dos Governos pós-TRIPS no campo do direito à saúde, deveriam, pois, estar

alinhada não somente com os princípios da Declaração de Doha58, mas também com a

55 Estima-se que estas políticas tenham poupado ao Brasil, cerca de US$ 1,2 biliões no custo de aquisição de antirretrovirais entre 2001 e 2005. Cfr. esta informação e outras também relevantes sobre este caso em http://ictsd.org/i/news/12456/ 56 “The recent Doha Declaration on TRIPS and Public Health is a good example of such a possible coherent reading of WTO provisions on taking into account potentially relevant human rights law.” Cfr. Gabrielle Marceau, WTO Dispute Settlement and Human Rights, European Journal of International Law, 13 (2002), pp. 753. Disponível em http://ejil.oxfordjournals.org/content/13/4/753.full.pdf . Acesso em 24 de maio de 2017. 57 Indiscutível que o direito à saúde surge em estreita conexão com o princípio da dignidade humana, com o direito à vida e à integridade física e por isto, é um direito fundamental positivado nas Constituições dos Estados Democráticos de Direito e não menos certo que a sua real efetivação está intrinsecamente ligada, não apenas à vontade política do legislador, mas também às disponibilidades financeiras ou materiais, que por sua vez dependem de fatores que os Estados, no plano interno, não dominam. Neste sentido, Cfr. SUZANA (2015: 222). A autora vem entendendo que a reconstrução dos direitos sociais requer pensar muito além da função garantística do Estado, mas além, num modelo de Estado ajustado a economia de mercado e de “regulação em rede” e a “cooperação internacional”. 58 A agenda de Doha para o desenvolvimento teve como principal preocupação, a saúde pública, a segurança alimentar, ambiental, a garantia de transferência de tecnologia para os países mais pobres, a eliminação das restrições ao comércio e à concorrência nestes países, o crescimento económico sustentado, a eliminação das barreiras pautais e outros obstáculos aos produtos originários dos países menos desenvolvidos, a eliminação da burocracia, a não exigência de reciprocidade com os países pobres. Cfr. a respeito, WTO, Doha Declarations; WHO, the Road to Doha and Beyond – a road map for sucessfull concluding the Doha development agenda; Annual Report, tudo isto no já cit.: www.wto.org .

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Declaração Política sobre HIV/SIDA de 10 de Junho de 2011, adotada pela Assembleia Geral

das Nações Unidas59 e com a Estratégia Global e Plano de Ação sobre Saúde Pública, Inovação

e Propriedade Intelectual, da Assembleia Mundial de Saúde, de 2008.60

Acontece que a referida proteção à propriedade intelectual pode de alguma maneira

explicar a busca contínua do bilateralismo no mundo pós-TRIPS, pelos países desenvolvidos,

especialmente por aqueles que têm indústrias farmacêuticas e biotecnológicas significativas,

como os Estados Unidos e alguns da União Européia.

Com efeito, diante do crescimento de registros de patentes internacionais pelos países

em desenvolvimento (61)(62), como o Brasil e a Índia e principalmente depois da adoção da

Declaraçao de Doha em 2001, os EUA começaram a negociar vários acordos de livre comércio

com alguns países em desenvolvimento (mas também desenvolvidos) que incluem capítulos

onde claramente se restringem as flexibilidades permitidas ao abrigo do TRIPS na regulação de

produtos farmacêuticos.63

Inicialmente seria possível pensar que o bilateralismo, estratégia que os Estados

59 Vide o conteúdo desta Declaração que impõe aos Estados-membros da ONU, as suas diretrizes e programas em www.onu.org.br. Contudo é precisamente em Doha, que se adopta uma Declaração sobre a relação do TRIPS com a saúde pública. Aí se estabelece que este Acordo em nada impede que os países membros adotem medi-das para proteger a saúde pública. Nestes termos, este instrumento reconhece que o Acordo TRIPS admite flexibilidade suficiente para os países adoptarem licenças obrigatórias, definirem situações de emergência, como nos casos de SIDA, tuberculose, malária e outras epidemias, e a liberdade de consentirem importações paralelas. O Conselho TRIPS é incumbido de encontrar mecanismos para resolver a situação dos países que não detenham indústria farmacêutica ou que esta seja insuficiente (esta preocupação advém do artigo 31.º/f, que supõe o contrário). Por fim, a Declaração, torna extensivo até 2016, o prazo para os países menos desenvolvidos implementarem as disposições do TRIPS, em relação às patentes de produtos farmacêuticos. 60 Cfr. o já referido site da OMC, www.wto.org/ . 61 Como bem nota Susy Frankel, no seu paper intitulado, Challenging TRIPS-Plus Agreements: The Potential Utility of Non-Violation Disputes, Victoria University Of Wellington Legal Research Papers, Vol. 2, n.º 9, 2012, pp. 3 e ss, estes acordos são, na maioria das vezes exercidos sob coação, quanto mais não seja porque são feitos entre partes que possuem uma grande desigualdade e diverso poder económico. Os EUA e a União Europeia são normalmente as partes que “dão as cartas” neste tipo de negociações, impondo os seus interesses aos países menos desenvolvidos em troca de concessões, muitas vezes, altamente protetoras dos grandes monopólios industriais. Disponível em http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1528329 . Acesso em 22 de maio de 2017. 62 As negociações de acesso à OMC são um exemplo da situação na qual os países em desenvolvimento se viram obrigados a aceitar regras TRIPS PLUS. O Cambodja, por exemplo, que é membro da OMC desde 2004, foi obrigado a renunciar à prorrogação do prazo de aplicação do Acordo TRIPS até 2016, que a Declaração de Doha, concede a todos os países em desenvolvimento, sendo forçado a aceitar um prazo que se venceu em 2007. Embora os membros da OMC tenham declarado que não abririam um processo de resolução de controvérsias contra aquele país se ele recorresse ao prazo máximo, algumas dúvidas permanecem. Cfr. a respeito desta posição devem ler-se os seguintes Papers: Cambodia´s Accession To The WTO, How The Law of The Jungle is Applied to one of the World Poo-rest Countries, 2003, Oxfam International; de Rebecca Povarchuk, Cambodia´s WTO Accession: A Strenuous but necessary step for a Poor Nation Seeking Economic Property, Pacific Rim Law & Policy Journal Association, 2004, Disponível em https://digital.law.washington.edu/dspacelaw/bitstream/handle/1773.1/703/13PacRimLPolyJ645.pdf?sequence=1 . Acesso em 20 de maio de 2017. 63 Cfr. o estudo de ABBOTT (2005: 349-356).

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Unidos usaram com êxito para pressionar os países em desenvolvimento, a concordarem com

suas exigências sobre a propriedade intelectual antes do TRIPS, teria sido erradicado, mas não.

Não só o bilateralismo continuou a crescer como se expandiu continuamente.64 Desde 2000, os

Estados Unidos concluíram os Acordos de Livre Comércio (FTAs) (65) (66) bilaterais com

Jordânia, Chile, Singapura, Austrália, Bahrein, Marrocos, El Salvador, Nicarágua, Honduras,

Omã e Coréia. A União Européia também concluiu ou mostrou interesse em começar as

negociações dos FTAs bilaterais com Asean67 [Associação das Nações do Sudeste Asiático],

Guatemala, El Salvador, Honduras, Nicarágua, Costa Rica, Panamá, Índia, Coréia, Argentina,

Brasil, Paraguai e Uruguai. A Austrália, o Canadá, o Japão e a Nova Zelândia fizeram seus

próprios FTAs com outros países.

A consequência óbvia para isto é de que fortalecer leis e mecanismos reguladores de

propriedade intelectual favorece as indústrias farmacêuticas e de biotecnologia. Como bem

explica Carlos Correa:

Esses novos acordos de livre comércio, negociados fora da Organização Mundial do Comércio, requerem altos níveis de proteção à propriedade intelectual mais para os medicamentos do que aqueles decretados pelo Acordo TRIPS, e em alguns casos vão além do que é requerido nos países em desenvolvimento que os promovem.68

E os resultados do bilateralism pós-TRIPS são gravídicos, como ainda aponta CORREA

(2006: 399-404), pois os mecanismos de proteção à propriedade intelectual mais fortes

requeridos por esses acordos bilaterais “reduz o acesso a medicamentos” e estão sujeitos à

“opinião contrária de suas autoridades da saúde pública”.69

Trata-se de um paradoxo o fato de, apesar dessas desvantagens, o mundo em

64 “Durante 2006, mais de 100 países em desenvolvimento se engajaram em mais de 67 negociações comerciais bilaterais ou regionais, e assinaram mais de 60 tratados bilaterais de investimentos. Mais de 250 acordos comerciais regionais e bilaterais agora regulam mais de 30% do comércio mundial, enquanto uma média de dois tratados bilaterais de investimento por ano foram realizados nos últimos dez anos.” Oxfam Briefing Paper, Signing Away The Future, março de 2007, p. 5. Disponível em https://www.oxfam.org/sites/www.oxfam.org/files/Signing%20Away%20the%20Future.pdf/ Acesso em 20 de maio de 2017. 65 Cfr. Free Trade Agreements. (N.T.). 66 “(...) the interpretation approach used in FTAs is potentially of far-reaching effect. It can enhance the possibility of avoiding the seeming conflict be-tween TRIPS and FTAs. With development of Trade, the proliferation of FTAs will create more and more new rules after the establishment of WTO. The justification between TRIPS and TRIPS PLUS and the interpretation of the justification and TRIPS by FTAs will improve the establishment of TRIPS PLUS as well as promote the untangling of the evermore complicated ´spaghetti bowl´ of TRIPS PLUS.” Cfr: Susy Frankel, no seu papper intitulado, Challenging TRIPS-Plus Agreements: The Potential Utility of Non-Violation Disputes, Victoria University Of Wellington Legal Research Papers, Vol. 2, n.º 9, 2012, pp. 19-47, sobra a criação de FTAs. 67 Cfr. Association of the South East Asian Nations. (N.T.) 68 Cfr. CORREA (2006: 399-404). 69 Idem.

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desenvolvimento estar aceitando a agenda bilateral dos países desenvolvidos e isto tem um

impacto imensurável e desastroso no acesso aos medicamentos,70 que implica investimentos

avultadíssimos por parte dos Governos destes países.71

É claro que esse paradoxo tem uma explicação, pois mundo em desenvolvimento não é

irracional nem indiferente ao impacto que proteções mais fortes à propriedade intelectual

impõem sobre a saúde de suas populações. Se alguém procurar uma resposta, pode parecer que

ela se encontra em suas expectativas, estimulados pelos países desenvolvidos, de que a longo

prazo a aquiescência às suas exigências sobre a propriedade intelectual vão acelerar a

transformação de suas economias em desenvolvimento para desenvolvidas.

No entanto, além disso, o que o TRIPS e o bilateralismo pós-TRIPS impõem aos países

em desenvolvimento, são regimes internacionais que efetivamente os priva de sua capacidade

de adaptá-los a seus propósitos e implementam políticas concernentes ao reconhecimento e ao

cumprimento da propriedade intelectual.72

Prova que, as benesses concedidas pelo Acordo TRIPS em favor dos países em

desenvolvimento, que lhes dá a possibilidade de importação de medicamentos genéricos,

mediante o mecanismo das licenças compulsórias, a acrescer à capacidade de produção por

alguns países de versões genéricas de medicamentos que entraram no mercado, antes da entrada

em vigor do TRIPS, as doações feitas pelos Estados e por algumas empresas multinacionais,

bem como as fortes pressões e iniciativas das Organizações Não Governamentais em favor do

direito à saúde, ainda não são suficientes para resolver o problema do acesso aos medicamentos.

6. CONCLUSÃO

Não resta qualquer dúvida de que a garantia da saúde depende da obtenção de

medicamentos, sendo este um instrumento e um direito. Um instrumento para assegurar o

direito à vida e um corolário do direito humano à saúde, onde o seu consumo racional pode

curar e reduzir as taxas de mortalidade e aumentar a qualidade de vida.

70 Cfr. a interessante informação constante no site da Organização Médicos Sem Fronteiras em http://www.msf.org.br/conteudo/126/o-acordo-trips/ Acesso em 20 de maio de 2017. 71 Cfr. ob.já.cit: DUTFIELD (2013: 144-152). 72 Como ensina WADE (2003: 621 e sgs): “As regras que estão sendo redigidas nos acordos multilaterais e bilaterais definitivamente impedem que os países em desenvolvimento busquem os tipos de políticas industriais e tecnológicas adotadas pelos países do Leste Asiático que se desenvolveram recentemente e pelos que se desenvolveram anteriormente quando estavam em desenvolvimento.”

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É o Estado que deve providenciar que as políticas e programas de saúde garantam o

acesso aos medicamentes existentes e que estes sejam disponibilizados em determinado

território, em quantidades suficientes. Nesta matéria, as regras sobre as patentes dos

medicamentos estão no centro da controvérsia e ao mesmo tempo, podem constituir a solução

para o problema.

Outrossim, sabe-se que o desenvolvimento de um novo medicamento é um processo

bastante complexo que envolve um grande investimento e um risco grande por parte das

empresas farmacêuticas. De 10 mil substâncias ativas em investigação, apenas uma será

desenvolvida e posteriormente comercializada. Apenas um em cada cinco medicamentos

comercializados irão gerar receitas suficientes, antes de expirar a patente, para compensar a

despesa realizada com a pesquisa.73

É inegável também que a proteção da propriedade intelectual é muito importante para

a indústria farmacêutica. Sem a atribuição destes direitos não existe qualquer entrave a que

terceiros explorem, sem custos, as invenções e que o TRIPS representa uma significativa

expansão dos direitos da propriedade intelectual e, para além de em grande medida ter resultado

da influência dos privados titulares daqueles direitos, compõe um fórum influente de exercício

do poder privado.74

Além do mais, não se podem olvidar os objetivos que presidiram à sua criação e que

motivam o seu progresso: - reduzir as distorções e os entraves ao comércio internacional; -

promover uma proteção adequada e eficaz dos direitos de propriedade intelectual; - garantir que

as medidas e processos destinados a assegurar a proteção efetiva daqueles direitos, não sejam

eles próprios obstáculos ao legítimo comércio internacional, tenham, de certo modo, mobilizado

a arena internacional na cooperação internacional ao acesso a medicamentos, a partir de uma

governance75, como o modo pelo qual o conjunto de instituições políticas é tocado a agir na

intenção da gestão dos assuntos humanos.

Talvez, um bom e recente exemplo de governança sobre esteja ocorrendo no quadrante

europeu, em que se verifica o “Projeto de conclusões do Conselho "Incentivar a cooperação

73 Cfr. a fonte: EFPIA, The Innovative Pharmaceutical Industry. A Key asset to the European Union, em http://www.efpia.eu/content/default.asp?PageID=559&DocID=5347 . 74 Para maior aprofundamento Cfr. SELL (2003: 7). 75 Para maiores desenvolvimentos sobre Governance: KALDOR (2000: 284).

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voluntária entre os sistemas de saúde, impulsionada pelos Estados-Membros"76, fruto de

estudos e resultados do pós-TRIPS, que tem por objetivo, assegurar o elevado nível de proteção

a saúde, incentivar a cooperação entre os Estados-Membros no domínio da saúde pública.77

Mas, os avanços sobre o tema em nível mundial ainda estão resilientes e desalinhados,

sendo evidente que a celebração do Acordo TRIPS ainda é uma vitória dos países mais

desenvolvidos, entre os quais se destacam os E.U.A, o Japão, e alguns países da União Europeia,

sendo por isso mesmo, encarado por alguns, como “um dos veículos do imperialismo de maior

sucesso na história”.78

76 Disponível em: http://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-9519-2017-INIT/pt/pdf Acesso em 02 de junho de 2017. 77 Ver também: Resolução do Parlamento Europeu, de 2 de março de 2017, sobre as opções da UE para melhorar o acesso aos medicamentos – 2016/2057(INI) e Diretiva 2011/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2011, relativa ao exercício dos direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços, artigo 3.º, alínea l), (JO L 88 de 4.4.2011, p. 45), disponíveis em http://www.consilium.europa.eu/en/home/ 78 Expressão de T. Srinivasan, apud ob. já. cit. INFANTE (2005: 498).

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ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DAS ATIVIDADES DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA NA UNIVERSIDADE BRASILEIRA: ESTUDO DE CASO DA UNVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS (UFMG)

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AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DAS ATIVIDADES DE TRANSFERÊNCIA DE

TECNOLOGIA NA UNIVERSIDADE BRASILEIRA: ESTUDO DE CASO DA

UNVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS (UFMG)

Prof. Vasco Azevedo DVM, M.Sc, Ph.D, Livre docente, Professor Titular, F.BAS

(Fellow of the Brazilian Academy of Sciences). Head of the Department of General Biology.

ORCID:http://orcid.org/0000-0002-4775-2280

Samuel Ayòbámi Akínrúlí Mestrando

Resumo

Na maioria dos países emergentes do mundo, como é o caso do Brasil, as universidades produzem todos os anos uma quantidade significativa de invenções inovadoras e, para muitos estudos, elas podem constituir as melhores fontes de propriedade intelectual para as indústrias que, consequentemente, gerariam crescimento e desenvolvimento econômico. No entanto, para entender esse processo, torna-se necessário o questionamento sobre a colaboração entre a universidade-indústria, a transferência de tecnologia e o desempenho do escritório de transferência de tecnologia. Assim, analisando os dados disponíveis de uma das principais universidades brasileiras, o desempenho do escritório de transferência de tecnologia e inovação (TTO) é verificado usando um indicador métrico de desempenho geral específico para diagnosticar e fornecer uma visão abrangente do TTO da Universidade Federal de Minas Gerais especificamente em relação às patentes de medicamentos, bem como sua tendência em inovação tecnológica como meio de se indicar os fatores para um TTO bem-sucedido.

Palavras-chave: Propriedade intelectual; patente; desempenho; transferência de tecnologia; inovação na universidade.

PERFORMANCE EVALUATIONS OF TECHNOLOGY TRANSFER ACTIVITIES IN A

BRAZILIAN RESEARCH UNIVERSITY: THE CASE STUDY OF UNVERSIDADE

FEDERAL DE MINAS GERAIS (UFMG)

Abstract

In most emerging countries of the world as Brazil, Universities produce a significant amount of groundbreaking inventions every year and, to many studies, they may constitute the best sources of intellectual property to the industries which would consequently generate economic growth and development. However, to understand this process, a need to inquire into the university-Industry Collaboration, technology transfer and the technology transfer office performance, becomes necessary. Thus, analyzing the available data of one of the leading

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Brazilian universities, the performance of the innovation and technology transfer office (TTO) is verified using specific overall performance metric indicator in order to diagnose and provide a comprehensive overview of the Universidade Federal de Minas Gerais' TTO on drug patents, its trend in technology innovation as means to indicating the factors for a successful TTO.

Keywords: Intellectual property; patent; performance; technology transfer; university innovation.

Abstracto

En la mayoría de los países emergentes del mundo como Brasil, las universidades producen una cantidad importante de innovaciones cada año y, para muchos estudios, pueden constituir las mejores fuentes de propiedad intelectual para las industrias que en consecuencia generarían crecimiento económico y desarrollo. Sin embargo, para comprender este proceso, es necesario consultar la colaboración entre la universidad y la industria, la transferencia de tecnología y el rendimiento de la oficina de transferencia de tecnología. Por lo tanto, al analizar los datos disponibles de una de las principales universidades brasileñas, se verifica el desempeño de la oficina de innovación y transferencia de tecnología (TTO) utilizando un indicador de métrica de desempeño general específico para diagnosticar y brindar una visión integral de la Universidade Federal de Minas Gerais 'TTO en patentes de medicamentos, su tendencia en innovación tecnológica como medio para indicar los factores para una TTO exitosa. Palabras llave: Propiedad Intelectual; Patentar; Actuación; Transferencia Tecnológica; Innovación Universitaria. 1. Introduction

In an environment of fierce competition and trade liberalization, where innovation processes

are based on the appropriation of knowledge, scientific and technological progress, the

protection of Intellectual Property increasingly integrates the strategy adopted by the leading

organizations, research centers and governments of countries. Research centers in Brazil are

formed by both private and public organizations though uneven.

There are several public private research projects which are considered to be objective to few

specific goals of private companies. Notwithstanding, the public sector has been the cornerstone

of knowledge generation and impart (Chiarini & Vieira 2012). In other words, the government

is responsible for the highest amount of direct investment in scientific researches either through

infrastructural facilities mostly in public universities or through short and long term research

sponsorship programs of the Ministry of science and technological Innovation – Ministério da

Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) through its research finance mechanism like Conselho

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) and Financiadora de Estudos

e Projetos (FINEP), and indirect investment through subsidiary or tax holidays whereby the

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government incentivizes private companies to invest their taxes in scientific researches and

sometimes through rules of law mandating companies to invest stipulated amount of their profit

in researches (Law n° 11.196, of December 21, 2005 known as the “Lei do Bem”).

Thus, it is shown in this study that despite the huge amount of government investment in

scientific researches, the yardstick for its investments success has, for decades until recently,

been publishing of scientific articles, manuscripts etc. which makes Brazil soar – 13th position

from 2010 through 2015 – amongst the highest publishers of academic scientific researches in

the world (SJR 2016), however, paying a prize for the innumerous publication, which is less

interest in patenting of new processes and invention, that further entangles with less

applicability or transfer of the generated knowledge to production processes in the industries

and extensive gap between the universities / research centers, the Industries and the government

being the highest risk bearer of academic researches, and as such the famous Triple Helix Model

ceases to ideally hold in this context. Otherwise, there would be an interweavement of the 3

helices, University – Industry – Governments, wherein the position of each one influences, and

is influenced by, the other’s position. Thus, the functions of each of the entities are altered,

institutional boundaries are no longer clear and hybrid institutions emerge (Etkowitz, 2008).

Brazil, despite being one of the highest producers of basic scientific researches, it is still not

one of the highest patenting countries in the world. This situation further leads to failure in its

economy industries’ competitiveness and transferability of technologies between the Brazilian

research centers and the industries. As such, most technologies used in the process of production

are either licensed by foreign companies or imported from multinational companies’ home

offices and adapted to the Brazilian production system, thereby causing capital flight and a slow

growth in the applicability of its huge amount of basic scientific researches (Akinruli, 2016).

Despite recent attempts through some public-private initiatives to revert the case, there still

exist an enormous gap between the industries and the university / research centers as to choices

of adopted technology and choices of production technology. There is the need to increase

understanding of the real situation and performance of the Brazilian universities in relation to

technology invention, transfer and management. As such, many Brazilian universities have

recently embarked on fostering their own technology transfer offices – TTO, which are

becoming increasingly important, given concerns regarding the universities’ desire to maximize

the returns to their intellectual property, especially the patents they own. The Federal University

of Minas Gerais – UFMG also shares this zeal to grow in its technology innovation as it tries

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to maximize through its TTO called Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica –

CTIT.

Consequently, the purpose of the present study is to assess the developments and performances

of scientific research, patenting (especially drug patents), and the technology transfer activities

of Federal University of Minas Gerais (Universidade Federal de Minas Gerais –UFMG)

through its TTO (CTIT) within the year 1990 through 2013. Finally, a future perspective of

these activities of the TTO is given.

2. Theoretical Background

Intellectual property refers to creations of the mind, such as inventions; literary and artistic

works; designs; and symbols, names and images used in commerce. These could be protected

in law by, for example, patents, copyright and trademarks, which enable people to earn

recognition or financial benefit from what they invent or create. Thus, A patent is an exclusive

right in the country or region in which a patent has been filed and granted for an invention,

which is a product or a process that provides, in general, a new way of doing something, or

offers a new technical solution to a problem. To obtain a patent, technical information about

the invention must be disclosed to the public in a patent application. As such, the patent owner

has the exclusive right to prevent or stop others from commercially exploiting the patented

invention. By striking the right balance between the interests of innovators and the wider public

interest, the intellectual property system aims to foster an environment in which creativity and

innovation can flourish (WIPO 1987).

Historically, we can observe that the process of economic development of countries was

founded on certain bases on their national institutions and public policies (Freeman 1987, 1988;

Lundvall 1988, 1992; Nelson 1988, 1992, 1993; Pelikan 1988; Mazzucato & Perez, 2015).

Developing Countries, in their quest for growth, approach the successful Developed Nations

and rely on effective government support, represented by incentives to economic activity,

sometimes by protectionist measures.

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In Brazil, until the 30s of the 20th century, the economy was primarily based on agricultural

production for export. However, changes in the international scene, due to the effects of the

crisis and the end of the Second World War, led the government to introducing a policy of

import substitution aimed at strengthening domestic industry (Baer 1972; Furtado 1985, 1989,

Prado Jr. 1964, 1969). Subsequently, the process of industrialization in Brazil and other

Developing countries was not able to fully breakaway from the past conditions of dependency

(Campos, 2007). Therefore, the need for funding to support industrialization through import

substitution prevented the internalization of all stages of the production chain and required

technological accumulation (Blakeney, 1987). However, economies of developing countries

have then also depended on technology being implicitly embedded in equipment and machinery

as well as explicitly accessed via patent licensing (World Bank 2008).

Thus, the issue of access to advanced technologies, produced in developed countries economy

gained relevance for the development of developing countries. The transfer of foreign

technology was consolidated as a major source of innovation for the peripheral economies.

However, generated situations by technical absorptive capacity of the importing institution, the

existence or not of appropriate public policies, the international division of labor and the low

bargaining power of developing countries in determining conditions for technology transfer,

usually involve disadvantageous conditions for developing countries with regard to the

commercial terms of technology imports (Figueiredo 2013; Akinruli, 2016).

In Brazil, the Federal Constitution of 1988 in its Chapter IV – Science and Technology in its

Articles 218 and 219, already has an essential role of the state as a promoter of scientific and

technological development, and promoting the welfare of the population focusing also on

technological autonomy. The lack of government planning in the 1980s and 1990s contributed

decisively to the fragility of the national economy as well as in the industrial, scientific and

educational policy. Subsequently, the scientific technology delay is more than evident when

compared to some countries, mainly because of budget constraints, low investment of national

Gross Domestic Product – GDP and a regional imbalance of investment, added to the huge

regional disparities, since 50% of these financial contributions is made by the federal

government (Silva & Motta, 2008).

With the prospect of recovery of economic growth, based on improved indicators for Science,

Technology and Innovation, one of the newer instruments to encourage innovation, scientific

and technological research in the Brazilian productive environment is Law n° 10.973, of

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December 2, 2004 known as the “Lei da Inovação Tecnológica or LIT” (Technological

Innovation Law), regulated by Decree n°5.563, of October 11, 2005. This law is further shaped

by a new law known as “novo marco legal da inovação” Law n° 13.243 of January 11, 2016

bringing important contributions to the national technological development as a new paradigm

for the sector in Brazil.

2.1. Technological Innovation and Economic Development

The Innovation theme becomes an increasingly frequent subject in the Brazilian society. The

LIT (Lei da Inovação Tecnológica) states in Article 2 paragraph IV that innovation is an

“introduction of novelty or improvement in productive or social environment that results in new

products, processes or services” (LEI da Inovação Tecnológica, 2004). Tidd, Bessant and Pavitt

(2005) argue that innovation is an imperative process, and that this is closely related to

technology, market and organization. Furthermore, it was argued that successful innovation is

based on strategy, effective internal and external relationships, facilitating mechanisms of

change and a supportive organizational context (Tidd et al., 2005).

According to Cysne, (2005) the social growth and power of nations are directly responsible for

the capacity of technological innovation and the transfer and application of technology

enterprises in each country (Cysne, 2005). Innovation has become a fierce competition between

companies and countries, and handling technological knowledge leads to economic and

political domination, in the view of Staub (2001). And, in that scope of intense scientific and

technological competition, Technological Innovation Centers are immersed.

Giovanni Dosi (1982), Technological Paradigms in their work and Technological Trajectories,

published in the journal Research Policy, bringing in the question, for example, pillars of

conventional economic thought, as the assumption of the “price mechanism” as the main

instrument of competition between firms; and the premise of the market “equilibrium

tendency”.

In an attempt to understand the role of technology and technological change in the economic

development process, the aforementioned author investigated two major explanations for

technical progress used as premises of neoclassical current. The first, known as “demand-pull

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theory”, put market forces as the main mechanism responsible and supportive of technological

change. Therefore, it would be the recognition of the needs of the society by the productive

sector, would boost this sector in order to make efforts to meet those needs. However, according

to the author, this theory would not have succeeded in producing sufficient evidence to conclude

that the needs signaled by the market would be the driving force of innovative activity.

Dosi questioned a number of characteristics of the demand-pull approach, among them, a

reactive concept, passive and mechanical, technological change in the face of market

conditions, the inability of the theory to define why and when certain technological

developments happen instead of others, and the fact that the theory neglects of the inventive

capacity changes occurring over time, which showed no relationship in changes in market

conditions (Dosi, 1982).

The second neoclassical theory criticized by Dosi and driving force of technological innovation,

was known as “technology push theory”. This current delegated to increasingly rapid changes

in scientific knowledge, and the consequent search for practical applications for this knowledge,

the role of driving force of innovation. However, on this approach, the author drew attention to

some aspects: the growing complexity of the innovation process, and the role of science and R

& D in this process, and the relative autonomy of the firm, and the inherent uncertainty of

innovative activity, one needs to “bet” to a hypothesis, which in turn has a limited and known

choices, and set of results. Dosi further defines “technological paradigm” as “model” and a

“pattern” of solution of selected technological problems, based on selected principles derived

from natural sciences and on selected material technologies.

Based on the concepts associated with the Schumpeter theory, it is possible to observe

characteristics of the evolution of technology and its implications for economic development.

A given technological paradigm establishes a possible notion of progress from its technical and

economic aspects. Therefore, the technological trajectory to be covered in search of new

solutions to issues associated with that paradigm. And the maintenance or disruption of these

paradigms is often related to economic cycle characteristics of the development process

(Freeman & Perez, 1988; Nelson & Winter, 1982).

2.2. The Brazilian Structure of Science, Technology and Innovation

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Despite the lacks of specific regulations and detailing, Matias-Pereira and Kruglianskas (2005)

defines the Brazilian technological innovation law (Lei da Inovação Tecnológica – LIT) as an

important institutional tool to leverage and support the Brazilian industrial technology policy.

Other documents such as the White Paper on Science, Technology and Innovation Ministry of

Science and Technology (2002) had already pointed out the implementation of an effective

National System of Science, Technology and Innovation (STI) in the country as one of its

strategic directives.

The Brazilian structure of Science, Technology and Innovation is much younger compared to

other developed countries. Matias-Pereira and Kruglianskas (2005) argue that countries should

move consistently in scientific and technological knowledge. In the Brazilian case, the

Innovation theme is also somehow an issue in the margins of the civil society. The responsible

for the formulation and implementation of the National Policy on STI is the Ministry of Science,

Technology and Innovation (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação – MCTI). Created

by Decree nº 91.146 of March 15, 1985, later consolidated in Chapter IV of the Constitution of

1988 and attends a longstanding desire of the Brazilian Academy of having a public agency

with direct administration like the central stakeholder structure of the national science and

technology. In the Brazilian context, there is a National Council for Science and Technology

(Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia), created by Law n° 9.257 of 09 January 1996,

formed by representatives of the Government, Industry and Academy, whose skills consulted

on industrial policies.

Staub (2001) states that one of the strategic challenges for Brazil is rebuilding the productive

capacity and building more capacity to innovate in technology-intensive sectors. New

legislation for the regulation of Intellectual Property, along with government incentive

programs for University Partnership – Company are to Santos (2009), a new scenario in the

national context of promoting technological innovation. Whereas in Rapini and Righi (2007)

there is the firm academic belief that University – Industry interaction is specific to each country

and is always dependent on national science and technology infrastructure.

2.3. Technology Transfer

Technological advancement is frequently linked to economic progress and social benefits.

Advancing technologies also forms much of the business of university scientific research.

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Frequently, however, university research is not smoothly, or even successfully, transferred to

industry (Markham et al., 1999). Wittamore et al. (1998) adopted a working definition of

technology transfer as: the transfer of new knowledge, products or processes from one

organization to another for business benefit. Other authors emphasize the importance of the

‘‘techniques and skills to operate’’ the technology as well as the ‘‘managerial skills’’ required

to exploit it (Czinkota et al., 2002). While Tidd et al. (2001) affirm that the need for ‘‘user

education’’ by the supplier of the technology and ‘‘transfer support’’ are also important

concerns.

Technology transfer is not a new business phenomenon. Though, the emerging considerable

literatures on technology transfer over the years agree that defining technology transfer is

difficult due to the complexity of the technology transfer process (Robinson, 1991). The

definitions depend on how the user defines technology and in what context (Chen, 1996;

Bozeman, 2000). The term technology transfer can be defined as the process of movement of

technology from one entity to another (Souder et al., 1990; Ramanathan, 1994). The transfer

may be said to be successful if the receiving entity, the transferee, can effectively utilize the

technology transferred and eventually assimilate it (Ramanathan, 1994). The movement may

involve physical assets, know-how, and technical knowledge (Bozeman, 2000).

Technology transfer has also been used to refer to movements of technology from the laboratory

to industry, developed to developing countries, or from one application to another domain

(Philips, 2002). In a very restrictive sense, where technology is considered as information,

technology transfer is sometimes defined as the application of information into use (Gibson &

Rogers, 1994). In this sense, economists such as Arrow (1969) and Dosi (1988) have analyzed

technology transfer on the basis of the properties of generic knowledge, focusing particularly

on variables that relate to product design. Mittleman and Pasha (1997) have attempted a broader

definition stating that technology transfer is the movement of knowledge, skill, organization,

values and capital from the point of generation to the site of adaptation and application. Thus,

technology transfer is one of the key stimulating gears of scientific knowledge generation and

exploration as well as intellectual property rights protection with the capacity of establishing

economic growth and development when properly applied and well managed.

3. Methodology

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The methodology employed, disclosed and described in detail in this study reflects a

combination of various performed tasks in the research and an assembly of materials used for

this purpose. The goal of this scientific activity is comprehensively summarized in an attempt

to obtain a better understanding of the interdependently involved fields. Moreover, we attempt

to bridges the gap between the observation of reality and scientific theory, thereby searching

for their tangential points. To reach our result, all Intellectual Property (IP) activities and IP

contracts of UFMG were studied singly in loco and semi-structured interviews which guides

understanding of the peculiarity of each analyzed technology and its related contract (s) thereby

keeping our chance of error to its barest minimum. Furthermore, the retrieved data was

narrowed down to focusing more on the ones related to drug patents which has the Brazilian IP

classification A61K, and later compared to data from other sources including INPI, WIPO, and

EPO, which were collected from their respective available database on the internet.

Data Collection Methods: The method used in data collation of our case study can be

characterized as: quantitative conducted through comparative analyzes of data collected from

various sources including both Brazilian and international database. By the nature of this

research, we opted for a case study of phenomenological nature, with the creation of data based

on theoretical propositions, as suggested by Eisenhardt (1989) and Barratt et al (2011).

Data Sources, Validity and Reliability: As for the quality of the study, calculated measures

were taken on the construct validity and reliability suggested by Yin (1994). In order to avoid

errors related to the construct validity, the research is backed up by a wide range of related

literature as well as using multiple sources of evidence to buttress the emphasis. As for

reliability, some sort of nationally and internationally reliable institutions’ databases served as

sources of the analyzed primary and secondary data. These include information from the

database of Universidade de Minas Gerais – CTIT, the Brazilian Instituto Nacional de

Propriedade Industrial – INPI’s SINPI, the European Patent Office – EPO’s Espacenet, and the

World Intellectual Property Organization – WIPO's Patent Scope.

Based on earlier studies of researchers like Tseng & Raudensky (2014); Trune, Goslin (1998);

Rogers, Ying, Joern (2000); Thursby, Thursby (2003); Litan, Mitchell, Reedy (2007); Roessner,

Bond, Okubo, Planting (2009); Xu, Parry, Song (2011) and those by Anderson, Daim, Lavoie

(2007), Abrams, Leung, Stevens, (2009), York, Ahn (2012), Foltz, Barham, Kim (2000),

O’Shea, Allen, Chevalier, Roche (2005), West (2012) and Kurman (2011), the performance

measure for a TTO can be quantified by the following metrics: a) TTO revenue, b) number of

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invention disclosures, c) number of patent applications, d) number of patents granted, e) number

of licenses signed, f) number of start-ups formed, g) research expenditure of university

scientists, h) expenditure of patenting activities, i) operation expenditure, j) number of new

commercial products, k) employment and productivity growth of startup partners, l) changes in

stock prices of industrial partners, etc. However, in the present study, only few of these metrics

are adopted for the quantitative evaluation of TTO performance for the research universities –

UFMG due to the restricted level of access to some specific data. Therefore, it should be noted

that TTOs in emerging countries like Brazil may be reluctant or, according to the organizational

customs, not permit total access to all necessary data as it may have been in the case of the

United State of America where the scenarios have drastically changed after the passage of the

Bayh-Dole Act by United States Congress in 1980.

4. Results and Discussion

UFMG’s Position Amongst the Six Leading University Patent depositors in Brazil

Foremost, we highlight UFMG’s position amongst the six leading university patent depositors

in Brazil. The evolution of seeking patent protection by Brazilian higher education institutions,

called universities in the period 1990-2010 (Luciana, 2013) can be seen in Graph 1, below:

Graph 1 – Brazilian University Patent Deposit Trend (1990-2010).

Source: INPI’s database.

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During this period of study, a total of 3,189 filings of patents were accomplished by 103

depositors from national institutions in the country. In order to enable a more detailed

discussion and view the dispersion of deposits between universities a ranking was built,

included in Table 1 below, which simply contains the universities with more than sixty (60)

patent applications, which are twelve (12), responsible for the total of 2,486 applications found.

Table 1 – Brazilian University Patent Deposit Ranking (1990-2010)

Source: INPI’s database.

From Table 1, it can be seen that the State University of Campinas (UNICAMP) ranks first with

a slight difference to the second place, the University of São Paulo (USP). The Federal

University of Minas Gerais (UFMG), which appears in the third position, appears to have a

slight advantage over fourth place, the Federal University of Rio de Janeiro (UFRJ). It is also

observed that all twelve universities that appear in this group are public, highlighting the

importance of government policies and guidelines for the establishment of the current standard

of teaching and research as well adequate budget to maintain the quality of the implemented

research and operating apparatus to perform the administrative and technical activities for the

protection of Intellectual Property assets. It is observed that UFMG’s patented invention is

more concentrated on the subclass A61K – “preparations for medical purposes”, with 70

occurrences and subclass C07K – “Peptides”, with 30 in C12N – “Microorganisms or enzymes”

with 19, C07C – “acyclic or carbocyclic compounds”, with 15 and G01N – “Research and

Ranking Institution Acronyms State N° of Doc. (%)

1st Universidade Estadual de Campinas UNICAMP SP 651 22,16

2nd Universidade de São Paulo USP SP 550 18,69

3rd Universidade Federal de Minas Gerais UFMG MG 344 11,71

4th Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ RJ 274 9,33

5th Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS RS 128 4,32

6th Universidade Federal do Paraná UFPR PR 102 3,47

7th Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho UNESP SP 98 3,34

8th Universidade Federal de Santa Catarina UFSC SC 75 2,55

9th Universidade Federal de Viçosa UFV MG 70 2,38

10th Universidade Federal de São Carlos UFSCAR SP 68 2,31

11th Universidade Federal de Pernambuco UFPE PE 63 2,14

12th Universidade de Brasília UNB DF 63 2,14

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analysis of materials by their physical or chemical properties” with 14. It is however notable

that up to the year 2010, UFMG was the second highest depositor of drug patent with the IP

classification A61K, which is of utmost relevance to our case study.

The Federal University of Minas Gerais – Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

According to the MEC, UFMG is one of the universities that receive the most funding from the

federal government, since it is one of those that most offers courses and programs for teaching,

researches and extension (MEC 2014). UFMG is also one of the largest centers of innovation

in Brazil. According to the National Institute of Industrial Property (INPI) in 2010, UFMG was

the Brazilian institution that most deposited patents.

Current Data of UFMG's Production as at April, 2016

Table 2 – UFMG’s Production Indicators (2016) Number of professor at UFMG 2.940

Number of professors with lattes 2.902 (98,71%)

Registered number of units (faculties) 23

Number of patents 762

Número de laboratórios 573

Sources: Elaborated by the authors

We hereby highlight that as at the year 2016, the UMFG’s department with the highest number

of patent deposit (194) is the Biology Science Institute (Instituto de Ciências Biológicas – ICB)

despite it being with the fourth highest (8%) amount of professors and second highest amount

of laboratories (119), followed by the Engineering school which is the second highest depositor

of patents despite being with third highest amount of professors (10,7%) and has 173

laboratories. It is also notable that the Faculty of Medicine (Faculdade de Medicina) is with the

highest amount of professors (13,7%) though has lesser amount of laboratories (29) compared

to others and deposited 15 patents. The faculty of Pharmacy has 2,5 % of the professor to its 33

laboratories and produced 72 patents deposit. These show that many contingencies determine

what is researched, who researches, and facilities as well as resources for technology

development. Subsequently, we shall see the evolution of patents in UFMG and their transfer

focusing more on the drug patents.

Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT – UFMG)

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At the Federal University of Minas Gerais (Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG),

the management of intellectual property and innovation activities is exercised by the UFMG

Center for Technological Innovation called Coordenadoria de Transferência e Inovação

Tecnológica – CTIT, which is subordinate to the Dean of Researches (Pró-Reitoria de

Pesquisa), according to its internal regulations, observing the provisions of Art. 16 of law

10.973/04, art.17 of Decree 5.563/2005 and resolution N° 08/98 with the University Council’s

approval.

As such, CTIT which was founded in 1997 ordained with the responsibility of organizing and

managing all UFMG’s intellectual property and related innovation. It is also noteworthy to

include that all registered patent deposited by UFMG’s members of staff within 1992 and 1997

using the university’s equipment and resources before the existence of CTIT were all in the

researchers’ names as patentees as guided most often by the INPI, but later regulated by CTIT

and the ownership transferred to UFMG while they remain the inventors.

CTIT is permitted to celebrate UFMG’s technology transfer licensing agreements for granting

the right of use or exploitation of creation, wherein UFMG stands as the proprietor or co-

proprietor of the creation, either through exclusive proprietary and non- exclusive proprietary.

Decision on exclusivity of transfer or licensing is overseen by the Reitoria de Pesquisa (the

Dean of Research), who hears CTIT, for the purposes mentioned in its regulatory, and should

be preceded by the publication of a notice, which must comply with the provisions of paragraph

3, art. 6 of Law 10.973/2004 and art. 7 of Decree 5.563/2005.

Results of Analyses of the activity data of UFMG and CTIT (1990 and 2013)

This aspect shows the result of the exploration of available information of all drug patent of

UFMG deposited with the National Institute of Industrial Property – INPI between 1996 and

2013 being the available data in the INPI’s database, as well as the academic evolution in all

units of UFMG which has available data from 1990 through the first month of 2014. These shall

be compared with other relevant data to this study from CTIT – UFMG as shown below. It is

noteworthy, based on the verified database of the Brazilian INPI, that there are no records of

Drug Patents by UFMG before the year 1996, while there is no published IPC for all patents in

the year 2013 by the responsible organ in Brazil - INPI which makes a part of this analysis, i.e.

Deposited Medicament / Drug Technology from UFMG, limited to the year 2012, therefore we

shall not consider the year 2013 in the analysis of Drug Patent Deposit (IPC=A61).

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Table 3 – Performance data of UFMG and CTIT (Jan./1990 – Mar./2014)

Year Total

Scientific Production

Total Annual Patent Deposit

Drug Patent Deposit

(IPC=A61)

Total n° of Contracts

Transfer / Licensing Contracts

Transferred / Licensed Drug

Patents (IPC=A61)

Other Contracts

1990 1363 0 0 0 0 0 0 1991 1656 0 0 0 0 0 0 1992 2153 1 0 0 0 0 0 1993 2407 0 0 0 0 0 0 1994 3133 0 0 0 0 0 0 1995 3792 2 1 0 0 0 0 1996 4493 10 3 0 0 0 0 1997 5392 27 16 0 0 0 0 1998 5990 1 0 0 0 0 0 1999 7078 3 1 0 0 0 0 2000 7885 10 3 0 0 0 0 2001 8207 20 10 0 0 0 0 2002 9231 27 12 0 0 0 0 2003 9696 22 7 6 2 2 4 2004 10047 27 12 4 4 0 0 2005 11608 21 8 7 3 2 4 2006 11571 32 18 4 0 0 4 2007 12563 42 22 10 0 0 10 2008 13120 45 23 19 3 2 16 2009 13204 46 16 22 6 0 16 2010 12803 64 20 12 4 0 8 2011 13488 75 22 23 7 1 16 2012 13491 80 10 44 8 1 37 2013 10316 77 0 44 13 2 31 2014 492 NA NA NA NA NA NA 2015 NA NA NA NA NA NA NA

TOTAL 19.5179 632 204 195 49 10 146 Source: Elaborated by the authors

Year: A range of 23 years from 1990 – 2013;

Total Scientific Production: Total annual amount of scientific publication;

Total Annual Patent Deposit: Total annual amount of deposited patents with INPI;

Drug Patent Deposit (IPC=A61): Total annual amount of deposited drug patents with INPI

Total nº of Contracts: Total annual amount of UFMG’s contracts exercised by CTIT

Transfer / Licensing Contracts: Total annual unit of contracts involving licensing and technology transfer.

Transferred / Licensed Drug Patents (IPC=A61): Total annual amounts of patents involved in licensing and

transfer contracts.

Other Contracts: All other existing contracts between CTIT and other organizations.

NA: Data not available.

In order to avoid inconsistency due to unavailability of complete data, we have limited our use

of data collection from the database to the year 2013.

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Notably, when the data obtained from both database of INPI and CTIT were compared; it was

observed that there were some differences in the recorded number of patents by year as shown

below. Nevertheless, we have chosen to use the highest registered number between both sources

of our variables as demonstrated above in table 11 since it is not possible to affirm that one of

both is the most correct.

In order to better understand the dynamics and functionality of UFMG and its intellectual

property and innovation management sector, CTIT, we hereby explore the available records of

its annual patent activities and scientific knowledge production since the year 1990 till date, i.e.

from January 1990 to December 2013 as shown above in table 3.

Furthermore, Drug Patents is defined as patents with the IPC classification A61, while Other

Contracts as in Table 3 are all the contracts involving UFMG’s technological innovation

exercises including partnership with other institutions except Licensing and transfer contracts.

In other words, Total Contracts less Transfer/Licensing Contracts equals Other contracts.

As shown on table 3 above, we shall consider some variable that are extracted from primary

sources like CTIT’s database which include employees’ records, transaction documents,

Contracts, files, etc., as well as the INPI’s database. Collated data from INPI’s database are

available to the generality of the public on the website’s Patent Search Engine (Sinpi). Based

on this, a discussion is presented below using the variables:

Graph 2 – UFMG: Total Annual Output of Scientific Production Compared to Patent Deposit (1990-2013).

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Source: Elaborated by the authors

On graph 2, we show a comparison of two variables which could be a way of quantifying the

level of disparity between the overall academic production and the possible economic return

derived from it. Here we compare the annual growth in scientific publication from academic

researches to the annual growth in patenting in UFMG. Therefore, it is observed that the

scientific publications rise annually in an increasing rate to tens of thousands along the years

with its current maximum being 13,491 in 2012, while patenting crawls in tens with its current

maximum being 80 according to findings of this present research. This depicts the huge level

of discrepancy between publishing and patent application.

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Graph 3 – UFMG: Total Annual Patent Deposit Compared to Annual Medical Patents (1990-2013).

Source: Elaborated by the authors

Graph 3 shows the annual growth of total deposited Patents compared to total deposited drug

patents along the last twenty-three years. It is observed that before the year 1995, UFMG owned

only one patent deposited in 1992, which implies that the patenting culture is still almost at its

cradle today considering the required period for the granting of a patent. Furthermore, findings

of this research depict herein that though the first 10 years (first decade – 1992 through 2001)

of patenting, the annual growth of total patents attained the maximum of 27 patents amongst

which drug patents (IPC A61) were 16 as recorded in 1997. The second decade (2002 through

2011) portrays annual growth of patents attaining over a double growth of 64 patents as

recorded in the year 2011. In the third decade (2012 – till date), the growth rate of patenting is

maintained, therefore reaching 75 in 2012 and the maximum of 80 in 2013 respectively. On the

other hand, Annual deposit of drug patents experienced a downward slope to its barest

minimum being zero (0) IPC A61 patent in 1998 (still in the first decade of UFMG’s patenting).

However, subsequent years seem to be redeeming as annual drug patents increases to attain its

maximum of 23 in the year 2008 of the second decade of patenting (2002 through 2011). The

years 2012 and 2013 demonstrate a recent decline as the annual deposit of drug patents are at

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22 and 10 respectively. Nevertheless, the record of 10 in 2013 is to some extend arguable that

there may be some recent patent deposit which are not yet given IPC classification or not made

available by INPI, since the finding of this research detects that publishing of IPC takes a long

process and the INPI often demonstrate backlogs in some of its processes.

Graph 4 – The Trend of UFMG's Established Patent Based Contracts by CTIT (1990-2013).

Source: Elaborated by the authors

Graph 4 shows the result of the inquiry into UFMG’s contracts exercised by CTIT along the

years of study. As such we distinct the annual amount of technology transfer/licensing from

other contracts established by CTIT through its “departamento Juridico” (Law department). As

such it is shown that in the first decade (1992 -2001) of UFMG’s patenting, there was no record

of any patent or technology transfer contract. In the second decade of patenting (2002 through

2011), UFMG registered an annual growth of total contracts up to 23 in 2011 while

transfer/licensing contracts strived to attain 7 in amount registered in the same year, 2011 and

other contract i.e. the non-transfer/licensing contracts reached 16 accordingly. In the third

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decade (2012 till date), there was a recent doubled increase in the year 2012 to the maximum

of 44 total amount of contracts which remains constant in the following year 2013 whereas, the

annual growth of total amount of transferred/licensing contracts increases to 8 in 2012 and 13

in 2013 respectively. Here other contracts are negatively related to transferred/licensing

contracts i.e. the higher the transferred/licensing contracts, the lesser the other contracts.

Graph 5 – The Growth Rate of UFMG's Deposited and Transferred / Licensed Drug Patents Compared to

Other Patent Deposits and Contracts (1990-2013).

Source: Elaborated by the authors

Graph 5 shows a comparison of the annual growth in amount of patents, drug patents (IPC

A61), as well as the annual growth in total amount transferred/licensing of drug patents (IPC

A61). Here, the findings of this research show that drug patent has a huge percentage in

UFMG’s annual amount of deposited patents and transfer and there is a high level of

discrepancy between the annual amount of deposited drug patents (IPC A61) and annual

amount of transferred drug patent. While the annual growth rate of deposited drug patents (IPC

A61) is in its tens, Transfer/licensing of drug patents demonstrates a stunted annual growth rate

at the maximum of 2 throughout the years of study.

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Despite its position as the third highest depositor of patent in the Brazilian national ranking as

at 2010 as shown in table 5, it is observed that the growth rate of patent deposit at UFMG is not

any close to its massive publication of scientific articles on yearly bases. Nevertheless, it may

be too ambitious to have attempted to equate both variables i.e. Total Scientific Production and

Total Patent Deposit as depicted on Graph 2, but this kind of comparison is to provoke a tilt

toward patenting culture showing evidence that there exist many researches done in UFMG

despite the low rate of deposit.

We may then consider other variables to measuring the performance of UFMG /CTIT in

knowledge production and applicability of the generated knowledge to economic growth. For

a specific or conjunction of knowledge to be economically viable its worth must be quantifiable

monetarily. This upholds the need for identifying the characteristics of a given knowledge and

thus its protection on the one hand as an invention or process, through invention patent or utility

model, or through the use of other means of protection like preserving it as knowhow to a

technology or its process on the other hand.

Given these contingencies, we hereby compare the total amount of patented technologies on

annual bases with the growth rate of patented drug technologies as shown on Graph 15. As

such, it was discovered that the drug patents i.e. patents with the IPC classification A61 equal

32.3% (204 patents) of the total UFMG’s patents and the yearly trend as shown on Graph 15

and only 5% (10 patents) has been successfully transferred. Whereas the national university

patent analysis demonstrated that UFMG is the second highest depositing university of drug

patent (A61) immediately after the Federal University of São Paulo as earlier demonstrated in

this study.

In the course of this study, it was detected that about 195 contracts were established by the

CTIT along the years between 1990 and 2013. According to the analyzed data from the law

department of CTIT, it was in 2003 that the first set of contracts was recorded. These contracts,

whose objects are patent, know-how, trademark, Industrial design, and Software, were

established between UFMG and various institutions like universities and industrial companies

on diverse economic platforms involving technology transfer, Licensing, Incubation, Co-

proprietorship and Research, and Technical Partnership, Technology Tests, etc.

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Coherently, we observe that Total amount of Contract has grown at an increasing rate along the

years of study, while Transfer and Licensing Contracts grow as well, but at a much slower rate

compared to other kinds of contracts established along the year of study.

Finally, the collated data on UFMG’s drug patents were compared with patents of other

classification as well as the established contracts involving these classes of patents. As such,

we discovered that technological transfer is growing slowly along these years, but the

transfer/licensing of drug patents is at the barest minimum. The total amount of transferred drug

patents is only 10 since the inception of CTIT, being 14.3% of the total transferred patents,

5.1% of UFMG’s total drug patents, 3.6% of the total amount of established contracts at CTIT,

and 1.1% of the total amount of UFGM’s patents which is due to a very low level of the

Brazilian pharmaceutical industry’s objective towards university-industry innovation which is

notably cultural.

Apart from the Licensing and transfer of technology, CTIT has a record of some other contracts

along these years of study, which include Research, Technical, and cooperate Partnership in the

development of new technologies, Co-Ownership contracts of technologies, Services contracts,

Technology Test contracts, Use of didactic material contracts, Incubation Contract, etc. As

such, findings of this research show that CTIT portrays a certain level of seriousness and

willingness to establish various types of institutional relationships which may contribute to

business innovation. Therefore, in a way of awareness creation to interested groups and

members of the public, a list of invented technologies (UFMG’s Drug patents, as well as others),

with which this research is done, should be made available for easy access.

5. Conclusion

This research has been deliberately focused on a broad inter-discipline view. In order to

comprehend the complexity of the structure of patenting and transfer of invented technologies

generated from domestically produced knowledge and researches in the University, we have

delved into observing and defining the structure of each key element to technology transfer in

the local and national context.

Economic growth and advancement can be attained by strengthening the links between the

University, Industry and the Government, therefore establishing a strong knowledge based

economy, where there should be a better and desirable interaction between these three key

elements, the University-Industry-Government.

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The Brazilian Government invests in education and basic researches through public and private

universities, though not as much as the developed countries, but remains the highest investor in

its nation. This investment reflects in the government’s annual budget and expenditure and as

such should have better returns in the local knowledge generation as well as economic, human

and social capital and development, as favorable policies are employed to regulate and stimulate

the industries towards innovating and investing in technological researches.

Most industries function with a unique culture often distinct from the expected due to their

origins, visions, missions, objectives and legal status. Most appear to be influenced by, or

inherit foreign operational and strategic culture, which may be sometimes positive or

detrimental to the local economic advancement. The pharmaceutical Industry in Brazil

therefore has its own structure whereby multinational companies compete with the local

companies apart from the necessarily huge investment in basic researches which slims the

chances of local companies of competing on equal grounds. Nevertheless, most pharmaceutical

companies own laboratories and run some researches independently or in collaboration with

the universities since it may be much cheaper.

Technology transfer and licensing is sometimes the fastest solution to technological necessities,

and as such, companies go into transfer and/or licensing contracts in the case of a patented

technology or know-how which is not patented knowledge but has economic and monetary

values attached to it based on its originality and peculiarity.

Nevertheless, the UFMG’s CTIT has been working tirelessly to guarantees improvements and

bridge the huge gap between the industry and the university. In its contracts, it is glaring that

CTIT renders some grooming of many companies operating without R&D segment, as such

CTIT becomes responsible for the transferred or licensed technology as well as monitoring of

the use in its production process and good negotiating possibilities that entice both big

pharmaceutics and small scale industries.

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RECEBIBO 12/02/2018

APROVADO 22/02/2018

PUBLICADO 12/03/2018

Editor Responsável: Carla Caldas | Método de Avaliação: Double Blind Review | E-ISSN: 2316-8080 | DOI:10.16928

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ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 FREUD, SIGMUND. O HOMEM MOISÉS E A RELIGIÃO MONOTEÍSTA.

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PIDCC, Aracaju, Ano VII, Volume 12 nº 01, p.001 a 010 Fev/2018 | www.pidcc.com.br

RESENHA

FREUD, Sigmund. O homem Moisés e a religião monoteísta. Trad. de Renato Zwick. Porto Alegre: LP&M,2014. 187 p.

RECEBIBO 12/02/2018 APROVADO 22/02/2018 PUBLICADO 12/03/2018 Editor Responsável: Carla Caldas Método de Avaliação: Double Blind Review E-ISSN: 2316-8080 DOI:10.16928

RESUMO

A resenha considerou a tradução feita pela LP&M do livro de Freud O homem Moisés e a religião monoteísta, antes publicada no Brasil no volume XXIII das Obras Completas da Imago Editorial, do Rio de Janeiro, lançada nos anos 70. Essa tradução é mais elegante, poética e viva que a utilizada nas Obras Completas, que foi feita a partir da edição inglesa mais empirista e em linguagem mais pedante. O livro pretendia explicar porque os judeus foram perseguidos ao longo da história. Freud encontra a razão na forma de viver a religião judaica, ainda próxima da forma psicológica que, na visão de Freud, explicava a origem das religiões, a morte do macho alfa do grupo pelos irmãos seus filhos e, posteriormente, a incorporação de sua imagem e interdições de caráter moral na psicologia do grupo. Esse processo foi trabalhado a partir do esquema neurótico e da observação freudiana de que a doença vinha do retorno simbólico dos fatos esquecidos à força ou reprimidos. Para isso, Freud reconta a história de Moisés ligada à formação do povo judaico, afastando-se do texto bíblico para justificar a existência de dois Moisés, fundidos em um, e duas religiões de origem, uma trazida o Egito e outra vivida na região do Sinai. Os elementos delas foram fundidos, mas a maior parte da religião egípcia, do deus Aton, foi esquecida e, mais tarde, recuperada no movimento profético. As explicações de Freud foram muito contestadas pela intelectualidade judaica e por filósofos como Martin Buber. A maior dificuldade dessa obra está em que ela emprega categorias elaboradas por Freud para entender o mundo mental na análise de questões sociológicas, históricas, antropológicas e religiosas. Isso significou o uso inadequado dessas categorias não ajustadas aos objetos analisados, dando ao trabalho a aparência de superficialidade.

Palavras-chave : Religião. Judaismo. Psicologia. Antropologia. Freud

RESUME

La revue a examiné la traduction faite par LP & M de L'Homme Moïse et de la Religion Monothéiste de Freud, précédemment publié au Brésil dans le Volume XXIII des Éditions complètes d'Imago Editorial, Rio de Janeiro, lancé dans les années 1970. Cette traduction est plus élégante, poétique et vivant que celui utilisé dans les œuvres complètes, qui a été faite à

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partir de l'édition anglaise la plus empiriste et dans un langage plus pédant. Le livre est destiné à expliquer pourquoi les Juifs ont été persécutés à travers l'histoire. Freud trouve la raison dans la manière de vivre la religion juive, toujours proche de la forme psychologique qui expliquait l'origine des religions, la mort du mâle alpha du groupe par ses frères et sœurs, et plus tard l'incorporation de son image et de ses interdits moraux en psychologie de groupe. Ce processus a été élaboré à partir du schéma névrotique et de l'observation freudienne que la maladie provenait du retour symbolique des faits forcément oubliés ou refoulés. Pour cela, Freud raconte l'histoire de Moïse liée à la formation du peuple juif, loin du texte biblique pour justifier l'existence de deux Moïse, fusionnés en un seul, et deux religions source, on a l'Egypte et l'autre a vécu dans la région Sinaï. Les éléments d'en source, on a l'Egypte et l'autre a vécu dans la région Sinaï. Les éléments d'entre eux ont été fusionnés, mais la plupart de la religion égyptienne, le dieu Aton, a été oublié et retrouvés plus tard dans le mouvement prophétique. Ce processus a été élaboré à partir du schéma névrotique et de l'observation freudienne que la maladie provenait du retour symbolique des faits forcément oubliés ou refoulés. Pour cela, Freud raconte l'histoire de Moïse liée à la formation du peuple juif, s'éloignant du texte biblique pour justifier l'existence de deux Moïse, fusionnés en un, et deux religions originales, l'une amenée en Egypte et l'autre vécue dans la région de Sinaï. Les éléments d'entre eux ont été fusionnés, mais la plupart de la religion égyptienne, le dieu Aton, a été oubliée et plus tard récupérée dans le mouvement prophétique. Les explications de Freud furent largement contestées par l'intelligentsia juive et par des philosophes comme Martin Buber. La plus grande difficulté de ce travail est qu'il emploie des catégories élaborées par Freud pour comprendre le monde mental dans l'analyse des questions sociologiques, historiques, anthropologiques et religieuses. Cela signifiait l'utilisation inappropriée de ces catégories non ajustées aux objets analysés, donnant à l'œuvre l'apparence de superficialité. Mots-clés: Religion. Judaïsme. Psychologie. Anthropologie. Freud

A editora LP&M lançou uma nova tradução do livro de Sigmund Freud que se

encontra no volume XXIII das Obras Completas da Imago Editorial, do Rio de Janeiro, publicada nos anos 70. A nova tradução é mais elegante, poética e tem linguagem mais viva que a utilizada nas Obras Completas, que fora traduzida da tradução inglesa e concebida numa linguagem mais empirista e pedante que o texto original. O homem Moisés e a religião monoteísta segue a linha de outros anteriormente traduzidos pela LP&M como O mal-estar na cultura e O futuro de uma ilusão, que igualmente abordam o diálogo de Freud com a Antropologia, a Sociologia e a Religião. O texto original de O homem Moisés e a religião monoteísta foi pensado como romance histórico e escrito num estilo literário nada adequado aos textos científicos, pois o autor pretendia tocar em questões profundas, sublimes e inquietantes, algumas relacionadas à sua experiência pessoal. Assim, a tradução inglesa, que foi um trabalho indireto de tradução, perdeu muito da beleza, originalidade e profundidade do texto original, agora resgatado com essa nova tradução direta do alemão.

Essa nova tradução teve ainda o mérito de incluir dois comentários esclarecedores: um itinerário para uma leitura de Freud de Paulo Endo e Edson Souza e um prefácio escrito por Betty Bernardo Fuks. O primeiro destaca a novidade representada pela psicanálise entre as teorias psicológicas desenvolvidas no século passado e realça a capacidade dessa teoria para iluminar outras áreas do saber. A noção de inconsciente de Freud, como assinalam os comentadores, representou “uma ruptura epistemológica” (p.

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8) com a visão da neurofisiologia prevalente na Psicologia da época. Não se tratava simplesmente de apresentar o inconsciente, outros já o haviam identificado, “mas de explicar seu dinamismo e estabelecer uma clínica que tivesse o inconsciente como núcleo”. Quanto ao livro mesmo, observam os dois comentadores, além de sua contribuição aos estudos psicanalíticos, ele faz um “reexame das teses historiográficas basilares da cultura judaica e da religião monoteísta a partir do arsenal psicanalítico”. O outro texto introdutório é o prefácio. Trata-se de um trabalho mais longo e de maior envergadura, que entra em questões que merecem ser comentadas porque ajudam a compreender o livro de Freud. Deve-se lembrar que O homem Moisés e a religião monoteísta foi escrito nos últimos momentos de uma liberdade incomum vivida pela comunidade judaica durante mais de duzentos anos na Europa central. Essa liberdade iniciada no século XVIII terminou com o nazismo e a repressão nazista fez Freud evitar a publicação do texto, por algum tempo, temendo que sua publicidade aumentasse a perseguição à psicanálise. O livro entra na delicada questão dos motivos que historicamente levaram à perseguição dos judeus ao longo da história. Além do mais nascia no momento de uma segunda dor, a dissidência de Carl Gustav Jung, circunstância que leva o autor a se identificar com o irascível Moisés que diante do povo idólatra impôs à Espada o culto ao Deus sem imagens. Quanto ao livro mesmo ele foi escrito em três ensaios, possuindo no último maior extensão e uma composição incomum, dois prefácios e duas partes. Além das explicações sobre a figura histórica de Moisés, a prefaciadora lembra que Freud retomou o problema da origem das religiões a partir do funcionamento do aparelho psíquico. Ela ainda explica que o livro teve os dois primeiros ensaios publicados separadamente, “ambos movidos pelo desejo de extrair o estrangeiro do centro da familiar identidade judaica”. E a autora comenta também as partes nas quais o texto se afasta da interpretação bíblica: a existência de dois Moisés, a religião judaica ter origem em dois deuses distintos: Jeová e Aton, o primeiro semita e o segundo egípcio e a origem egípcia de Moisés. Em relação a esse último assunto, o texto de Freud pretendeu esclarecer o caráter estrangeiro do judeu. Como Moisés inventa a nacionalidade judaica “todo judeu está para além da raça, da língua e do essencialismo”. Assim Freud explicou o motivo do estrangeiro estar no centro da identidade judaica.

O primeiro ensaio é pequeno, foi escrito em pouco mais de dez páginas. O título é Moisés, o egípcio, revelando a compreensão de Freud de que a origem nacional do criador do monoteísmo judaico não é judaica. E Freud começa a contestação pelo nome que não é judaico, mas egípcio, significando filho de... Assim, temos a maior probabilidade de que um “portador de um nome egípcio fosse ele próprio um egípcio” (p. 35). Freud reconhece que apenas o nome não assegura a origem de Moisés e completa suas observações mencionando um livro de Otto Rank, psicanalista que considerava o caráter lendário ou mitológico de todos os fundadores dos povos. E entre os vários personagens comentados por Rank se destacava o Rei Sargão de Agade, cuja origem nas águas e o ser adotado no palácio o conduziu à condição de Rei da Babilônia. E essa lenda tão semelhante à de Moisés não é única, há outros casos nos quais uma criança abandonada foi adotada por uma família real e se tornou governante. Também para os medos, “Ciro é um conquistador estrangeiro, pela via da lenda do abandono, ele se transforma em neto do rei medo” (p. 39). Na lenda bíblica, a história tem o mesmo enredo, o filho de uma família humilde vai parar nas águas e é adotado pela filha do faraó

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tornando-se um príncipe do Egito. Isso leva Freud a concluir que Moisés é um egípcio. Apesar do esforço em estudar as lendas originárias dos povos, ainda assim não se pode dizer que pela semelhança com tantas outras lendas Moisés fosse egípcio. Isso o obriga a buscar melhores justificativas.

O segundo ensaio bem mais longo que o inicial denomina-se Se Moisés era um egípcio... Ele começa fazendo uma síntese do anterior: “afirmei que da hipótese de que Moisés havia sido um egípcio se derivavam conclusões importantes e de grande alcance, mas que eu não estava pronto para defendê-las publicamente, pois repousavam em possibilidades apenas psicológicas e que carecem de uma prova objetiva” (p. 45). O fato de Moisés haver se feito líder de um povo atrasado e abandonado o seu país, reforçou, até para os egípcios, a convicção de que ele era estrangeiro. E se fora criado entre os egípcios é natural que praticasse uma religião egípcia, sendo importante explicar porque ele ensina algo diferente da religião egípcia. Ela proclama um Deus único, “onipotente e inacessível, de quem não se suporta a visão, não é permitido fazer qualquer imagem sua e nem sequer pronunciar seu nome” (p. 46). No Egito, diversamente, habitavam muitos deuses com origem e dignidade distintas, alguns objetos naturais como o sol, a lua, o céu ou a terra. A religião de Moisés condenava todo tipo de bruxaria, que estavam presentes nas religiões egípcias. Essas diferenças, considerando-se que Moisés deu aos judeus uma religião egípcia pede uma explicação. Freud a formula assim: “é possível que a religião que Moisés deu ao povo judeu fosse, afinal sua própria religião, uma religião egípcia, embora não a egípcia”. E então, de que religião estamos falando? Freud julga que fosse a religião de um jovem faraó Amenófis IV, que governou por volta de 1375 a. C. Ele implantou no Egito um monoteísmo rigoroso contrário ao politeísmo milenar e aos hábitos locais de vida. Antes dele governar, o grande conquistador Tutmés III, levara as fronteiras do Egito para bem longe. O fato do Egito haver se tornado uma grande potência universal, com o faraó governando sobre povos estrangeiros desde a Síria até a Núbia, ajudou a popularizar a ideia de um Deus universal, como o era o poder do faraó. A extensão do Império dava a esse Deus o caráter de universalidade. Amenófis IV louva o sol como o criador, embora não se refira a um objeto material, mas o toma como expressão de um Deus cuja energia se manifesta nos raios de sol e assegura a vida, intuição que precedeu a descoberta dos efeitos da radiação solar. Esse rei fez algo novo e notável, ele não apenas assume a ideia de um Deus universal, mas faz dele único, um Deus que não tem outro a seu lado. Assim, “ele acrescentou algo novo que permitiu que a doutrina do deus universal só então se transformasse em monoteísmo” (p. 51). Essa religião se desenvolveu lentamente durante o reinado de Ikhnaton, que reprimiu com força crescente qualquer oposição e chamou deus de Aton. Assim permaneceu por algum tempo até que depois de um período de anarquia, por volta de 1350 a. C., a antiga religião foi restabelecida e a religião de Aton abolida. Para Freud, é essa religião extinta que Moisés transmitiu aos judeus. Explicou Freud (p. 54): “se Moisés era um egípcio e se transmitiu aos judeus sua própria religião, essa era de Ikhnaton, a religião de Aton”. Embora essa religião tenha deixado poucos vestígios entre os egípcios, e ela somente tenha ganho configuração mais completa entre os judeus por volta do ano 800 a. C., Freud entende que se possa identificar as duas. Se substituirmos o nome Adonai (Deus de Israel) por Aton essa configuração inicial devia ser, para Freud, a religião que Moisés transmitiu ao povo. A razão apresentada é que embora fosse um monoteísmo universal, na versão inicial essa religião nada falava da vida após a morte, o que seria esperado de um monoteísmo

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com tal configuração, mas essa recusa de tratar da vida após a morte era característica da religião de Aton. Isso decorria do propósito de combater a crença em Osíris, o deus dos mortos, um dos mais importantes e populares deuses da religião tradicional. Além dessa característica, o costume da circuncisão, que era um hábito egípcio bem arraigado, foi transmitido aos judeus por Moisés. A Bíblia o liga aos tempos de Abraão, mas Freud julga que isso não invalida o fato de que esse costume era popular e universal entre os egípcios. Além disso, não há evidência de que os judeus tivessem assimilado esse hábito e o praticassem antes de saírem do Egito. Então não faria sentido sua introdução depois que saíram de lá, isso é ainda mais verdade se o propósito de Moisés fosse simplesmente libertar o povo para lhes dar uma existência autônoma. O costume penoso apenas serviria para lembrar o tempo em que estiveram sob o antigo dominador. Porém sua manutenção poderia ser explicada se fosse associada à crença religiosa egípcia, razão adicional proposta por Freud. A hipótese de que Moisés fora criado na corte do faraó, significa que ele era da alta nobreza ou da família real e fora treinado para liderar. Talvez aspirasse tornar-se faraó, mas com a completa destruição da religião de Aton, depois da morte de Ikhnaton e antes de Haremhab restabelecer a autoridade estatal, pareceu-lhe mais razoável iniciar um novo Império, mantendo-se fiel a sua fé do que abandoná-la e permanecer no Egito. Para Freud foi o que ocorreu. Um êxodo pacífico somente aconteceria nesse período, por volta do século XIII a. C., precisamente quando se supõe que tenha ocorrido. Nos séculos posteriores os faraós governaram com grande severidade. Assim, na condição de líder prestigiado, Moisés assumiu a liderança das tribos semitas e as conduziu para fora do Egito de uma forma completamente distinta da apresentada no livro do Êxodo (p. 59): “caberia supor que esse êxodo ocorreu de maneira pacífica e sem perseguição. Ele foi possibilitado pela autoridade de Moisés, e não existia na época um poder central que pudesse impedi-lo”.

O destino dessa migração teria que ser Canaã, uma região do antigo Império egípcio que fora ocupado por tribos guerreiras de arameus. Além disso, ao sul da palestina viviam tribos parentes das que saíram do Egito sob o comando de Moisés. Por isso, as castas religiosas judaicas posteriores, que negaram que Moisés lhe transmitira uma religião egípcia também precisavam explicar a introdução do costume da circuncisão. É possível que os primeiros compiladores do texto desconhecessem a origem egípcia do costume, mas isso foi refeito no episódio em que Deus se aborrece com Moisés e ele foi circuncisado pela mulher para ser salvo da ira divina. Quanto ao temperamento de Moisés o mais provável é que ele fosse um homem colérico, isto é, que se irrita facilmente. E, parece razoável a Freud, (p. 63): “que muitos traços de caráter que os judeus introduziram na ideia inicial de seu deus, ao chamá-lo de ciumento, severo e implacável, no fundo terem sido tomados da lembrança de Moisés”. Por outro lado, o Moisés que conduz o povo até Canaã está ligado às cidades de Cades e Midiã. Ele eleva uma serpente de bronze no acampamento, para proteger do ataque de serpentes. Ele age de forma diferente do homem que guiou o povo do Egito, condenando toda prática de feitiçaria. E outro motivo proposto por Freud é que se instaurou uma tradição de que Moisés foi morto numa das revoltas contra o fundador da religião. Tratava-se de uma religião muito espiritualizada, incapaz de oferecer conforto para aquele momento e por sua vez, o rigor com que foi imposta estimulou as revoltas contra o líder. Mais tarde, será essa ideia do deus de Moisés que os profetas propagarão e que, recuperada, permanecerá integrada ao judaísmo. E, no

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que se refere ao povo que foi para Canãa, parte não viveu a experiência do Egito, pois eram membros de tribos parentes das que de lá vieram e às quais se juntaram para formar o povo de Israel. Encontra-se nisso, para Freud, a razão do povo haver se dividido depois de se estabelecer em Canaã em dois Reinos, o de Judá e o de Israel. Por sua vez, o deus das tribos que viviam fora do Egito era Jeová. Apenas alguns costumes e elementos da religião de Aton, a circuncisão entre eles, entraram no culto a Jeová por concessão aos sacerdotes das tribos que vieram do Egito. Somente mais tarde, o aspecto ético da religião de Aton, o monoteísmo e o propósito de (p. 84): “uma vida na verdade e na justiça (são postos) como a mais alta meta para os seres humanos” foram recuperados. No texto bíblico, para evitar referências a Cades, a origem da religião foi associada ao episódio do Sinai e a figura do antigo líder justaposta ao novo. Assim, além da concessão aos líderes que vieram com Moisés do Egito (p. 82): “também se desmentia com sucesso o fato de sua eliminação violenta”.

Freud enxergou no estudo das tradições bíblicas que denominavam Deus de Jeová e Eloim, a confirmação de que originalmente se tratavam de dois deuses. A partir desse ponto do ensaio, Freud se ocupa de mostrar como no texto bíblico se fundem a ideia de dois Deus e dois líderes num único Deus e líder. O segundo Moisés descrito como manso e paciente não podia ser a mesma pessoa que conduziu o povo para fora do Egito e cujas manifestações de descontrole emocional são seguidamente relatadas. Temos assim a história do povo judeu recontada por Freud (p. 87): “duas massas populares que se reúnem para formar a nação, desagregação dessa em dois reinos, dois nomes para Deus nos textos fontes da Bíblia, as quais acrescentaremos duas: duas fundações de religião (...) e dois fundadores de religião, ambos chamados pelo mesmo nome, Moisés, e cujas personalidades temos de separar uma da outra”. A tradição, parece-lhe, fundiu os líderes e a religião numa coisa única. Do ponto de vista doutrinal esse processo se daria mais tarde com a tradição Deuteronomista, código sacerdotal, que foi composta depois de 586 a. C., quando o templo foi destruído. As tentativas de conciliação irão alterar e modificar os textos anteriores, neles introduzindo mandamentos e instituições daqueles dias como forma de lhes assegurar legitimidade psicológica.

O último ensaio é maior que os dois primeiros juntos e foi composto em duas grandes partes. O primeiro possui duas notas preliminares. Na primeira delas, Freud comenta que a crença em Deus foi extirpada da Rússia comunista, mas que foram impostas outras formas de coação e de controle da livre investigação, o que não favoreceu como poderia a expansão da psicanálise. Na segunda nota o autor expressa sua convicção que, desde a publicação de Totem e Tabu, em 1912, ficara convencido de que (p. 93): “os fenômenos religiosos só podem ser compreendidos segundo o modelo de nossos conhecidos sintomas neuróticos do indivíduo, isto é, como retorno de acontecimentos significativos, há muito esquecidos, da pré-história da família humana”. Esse entendimento, avaliou Freud, se posto a público poderia provocar mal-estar na Igreja Católica, sob cuja proteção ele vivia em Viena naqueles dias. Por isso, explica, adiou a publicação até que um momento mais favorável surgisse. Depois dessas notas ele fez um resumo dos ensaios anteriores concluindo no ponto em que chegara no segundo ensaio (p. 103): “as doutrinas mosaicas que de início não receberam atenção, mas que entraram em vigor após o transcurso de um longo intervalo e, por fim, se impuseram de maneira permanente”. O que explicaria essa dinâmica?

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O terceiro ensaio procura responder essa questão. Freud começa recordando em que consiste uma neurose pós-traumática, ela se desenvolve algum tempo depois de um acontecimento doloroso. Isso que aparentemente nada tem a ver com a história contada até aqui se torna chave de interpretação. Ele usa esse raciocínio para explicar o fato bíblico. Em resumo, as tribos que deram origem a Israel tinham motivos diferentes, mas importantes para esquecer o que se passara com o líder que conduzira o povo na saída do Egito. E, para ocultar sua morte, deixaram de lado os elementos da religião de Aton, que viera com a parte que migrara do Egito. Com o passar dos anos, essa religião inicial recusada será, gradualmente, recuperada e Jeová, o Deus vulcânico da Península do Sinai, vai tomando a forma do deus de Moisés. Esse processo pode ser comparado com o que se passou em outros povos, mas uma analogia com o universo psicológico parece ao autor uma prova melhor. Chamamos traumas a experiências dolorosas que são esquecidas, mas que depois retornam. Freud explica (p. 110): “a gênese da neurose remonta sempre e por toda parte a impressões infantis bastante precoces”. O desafio, no caso em análise, é entender se há algo próprio das experiências traumáticas, uma vez que fatos traumáticos para uns podem não ser para outros. Freud explica que os traumas neuróticos têm origem na primeira infância, especialmente entre 2 e 4 anos, são esquecidos pois se referem a impulsos sexuais ou agressivos. Quanto aos fenômenos neuróticos que daí decorrem seus efeitos podem ser repetidos, provocando a tendência ou compulsão à repetição, mas que também são esquecidos por serem muito duros. As lembranças indesejadas promovem reações defensivas. As fugas dessas lembranças reprimidas ou esquecidas se concretizam nas inibições e fobias que não obedecem ao pensamento lógico e nem respondem à realidade externa. Raramente a neurose se mantém do mesmo modo da infância até a vida adulta, normalmente há um período de latência em que o desenvolvimento da pessoa não revela os efeitos desse trauma. É o que acontece com uma criança muito nova que havendo presenciado cenas sexuais dos pais tenta revivê-las com a mãe, mas sendo repreendido por ela passa a ver o pai como ameaça. Essa criança tende a esquecer esses fatos, o desejo e a repressão, e passa o resto da infância de forma tranquila, mas na adolescência desenvolve uma impotência sexual. Em outras palavras, conteúdos agressivos e/ou sexuais (p. 119): “que deixaram consequências permanentes, mas que na maioria dos casos foram rechaçados, esquecidos, e mais tarde, após longa latência, entraram em ação e produziram fenômenos semelhantes a sintomas em sua estrutura e tendência”. Freud acreditou que esse mecanismo psicológico poderia ser aplicado ao que se passa nas hordas primitivas. Assim concluiu da leitura de Darwin, que dizia que nessas tribos, o macho principal era dono de todas as mulheres e expulsava ou cadastrava os filhos rebeldes. Algumas vezes, os filhos pequenos eram protegidos pela mãe e conseguiam permanecer no grupo e substituir o velho líder quando de sua morte ou envelhecimento. Uma variação dessa organização vem com a reunião dos irmãos ameaçados que, reunidos num grupo, atacam e matam o velho pai e, em seguida, o devoraram. De forma simbólica realizaram o comportamento observado na psicanálise onde se constata que a criança não só teme, mas tem o pai como modelo. A evolução desse modelo social vem com a renúncia dos impulsos agressivos contra o pai e a recusa do desejo de possuir a mãe e as irmãs. Freud avalia que esse processo está na origem da religião totêmica. Ele diz (p. 122): “estamos autorizados a reconhecer no totemismo (...) a primeira manifestação da religião na história humana, e confirmar sua ligação, existente

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desde início, com configurações sociais e obrigações morais”. Embora seja difícil a comprovação histórica dessa interpretação Freud julga que elas tenham boas evidências de serem verdadeiras. E elas revelam uma fixação, na história familiar e retorno do material esquecido depois de muito tempo, como se observa na neurose e psicose, pois também nessa última se observou que a ideia delirante tinha conteúdos de verdade esquecida.

Todo esse esquema psicanalítico seria adotado na explicação do monoteísmo, considerando-se, inicialmente, sua origem no poder universal dos faraós, mas que foi desvinculada da questão territorial e assumida pelo povo judeu. Depois de um período de latência, a crença ressurge e é guardada como patrimônio de um povo que se sente escolhido por Deus. Freud enxerga na crença cristã, construída pelo judeu Paulo de Tarso, uma fantasia compensatória do mecanismo psíquico antes descrito, a morte de Deus seria o pecado original e a morte do filho o ritual de expiação dessa culpa primitiva. Nesse sentido, Cristo é o representante dessa fantasia de expiar a morte do pai primitivo. E, por sua vez, a comunhão cristã (p. 127): “repete o conteúdo da refeição totêmica, mas apenas em seu sentido terno, que exprime adoração, e não em seu sentido agressivo”. Se o judaísmo foi a religião do pai, o cristianismo é a do filho. Com Paulo a nova religião realizou um regresso à sua formação inicial, recusando a mediação do povo judeu e se estendendo a toda a humanidade. Isso mereceu de Freud a seguinte avaliação (p. 129): “com relação ao retorno do recalcado, o cristianismo foi um progresso, e a religião judaica, a partir daí, foi em certa medida um fóssil”. Parece-lhe crível que o arrependimento pela morte de Moisés fez surgir, entre os judeus, a fantasia do Messias. Se Moisés foi o primeiro messias, Cristo foi seu substituto. A perseguição aos judeus, observada ao longo da História, tem origem no ciúme que se originou da crença judaica de ser povo escolhido. Se o eixo do raciocínio se limita às religiões judaica e cristã, Freud entende que o islamismo repete o mesmo esquema e que as religiões racionais do oriente são também uma variação desse culto ancestral.

Na segunda parte do ensaio Freud fez uma recapitulação de suas afirmações sobre a nacionalidade de Moisés e outros temas, reescrevendo e ajustando as ideias. Ele explica que dos povos antigos que viveram entorno do Mar Mediterrâneo, o povo judeu é o único que conserva o nome e a mesmas características dos tempos antigos, revelando grande capacidade de resistir às perseguições. Ao se declarar o preferido do Pai temido, não é difícil entender o ciúme dos outros povos. O fato do Messias também vir desse povo não ajudou a superar a discriminação, antes trouxe mais ódio aos judeus. A tenacidade do povo judeu era uma característica de Moisés e foi transmitida por ele. Fica, por explicar, o que é um grande homem, capaz de realizar façanha tão relevante como a liderança no êxodo. Não se pode encontrar uma resposta convincente nos talentos do indivíduo, nem na sua inteligência e nem nos seus feitos. Para Freud, os traços de um grande homem como Moisés (p. 152): “são traços paternos e que nessa correspondência consiste a essência do grande homem, por nós buscada em vão”. E a morte de Moisés, que havia impregnado seu Deus com características próprias, apenas repetiram o ritual ancestral. A recuperação de sua religião foi um processo da psicologia de massa, onde muitas pessoas recuperaram a religião de Moisés em troca de recompensas psicológicas como a de se sentir um povo escolhido por Deus. Essa crença foi fortalecida na história dos judeus com a festa da Páscoa e evocada para testemunhar a preferência de Deus, ao mesmo tempo que lhe garantia a presença de um Deus especialmente poderoso. Entre as prescrições de

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ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 FREUD, SIGMUND. O HOMEM MOISÉS E A RELIGIÃO MONOTEÍSTA.

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Moisés para comprovar a grandeza de Deus (p. 156): “estava a proibição de fazer uma imagem de Deus, ou seja, a coação a adorar um deus que não se pode ver”. Isso de alguma forma reforçou a ideia de espiritualidade pela preterição da percepção sensível. Esse processo de espiritualização se passa com a substituição da figura materna pela paterna, processo vivido por outros povos como os gregos, na maldição da Oréstia de Ésquilo. A figura materna é demonstrada pelos sentidos, mas a paterna representa um progresso cultural de valorização da abstração. Com o aumento da espiritualidade (p. 158): “Deus foi elevado a um nível superior de espiritualidade”.

Freud lembra que quando se deixa de atender um impulso por risco externo isso causa desprazer, mas que quando isso decorre de uma interdição do supereu então além do desprazer, a interdição traz a sensação de satisfação. Nesse sentido, a figura de Moisés funciona como uma espécie de supereu, embora a elevação espiritual pelo retorno a seu deus não seja coisa o mesmo que a renúncia dos impulsos no universo psicológico. Aos poucos processa-se a seguinte mudança (p. 162): “a religião que começou com a proibição de fazer uma imagem de Deus evolui sempre mais no decorrer dos séculos para uma renúncia dos impulsos”. Ou seja o ideal de ser justo e virtuoso significa a renúncia dos instintos. O totemismo propôs uma limitação ao acesso sexual da mãe e irmãs e trouxe como produto a convivência pacífica entre os irmãos. Porém, independente da forma assumida pela religião, quando a sociedade e o supereu estabelecem o que é bom ou mau o que faz é interditar o instinto que ameaça o pai. O propósito da exogamia era a vontade do pai primitivo e continua presente na sociedade. A religião ensinará a interdição como sendo um propósito que Deus introduziu no coração do homem. Essa interdição funciona no processo de identificação dos filhos com os pais. Uma menina no início da vida está identificada com a mãe, mas aos poucos se afasta dela e a contesta. Com o tempo e depois de ter seus próprios filhos, ela se torna cada vez mais parecida com sua mãe. Quanto ao sucesso do recalcamento, Freud esclarece que ele é parcial, pois quase sempre a restrição é vencida por uma satisfação substituta porque o supereu não identifica a ameaça presente. Na neurose esse reaparecimento do reprimido é o sintoma.

Nas últimas páginas do ensaio Freud explica que retomaria aspectos já mencionados no decorrer do livro e recorda que o fundamental das teses psicológicas agora comentadas já se encontrava em Totem e Tabu. Ele explica que há diferenças entre o retorno do recalcado no caso dos povos primitivos e na crença num elemento perdido recuperado no caso do judaísmo. Porém ambos (p. 177): “são muito semelhantes aos que conhecemos na psicopatologia, mas não inteiramente os mesmos”. O retorno do reprimido no espaço social decorre das condições culturais que lhe acrescenta contornos importantes. A ética surge na sociedade devido a consciência de culpa, matamos o pai primordial e isso nos faz infelizes. A religião cristã introduz um elemento nessa infelicidade, o reconhecimento da culpa alivia o sofrimento. Os judeus (p. 182): “não reconheceram que mataram deus, enquanto nós admitimos e fomos purificados dessa culpa”. Dessa forma, Freud concluiu seu texto acreditando haver encontrado as razões pelas quais o povo judeu foi perseguido na História.

Este livro de Freud foi concebido para responder uma questão pessoal de grande significado, entender as razões da perseguição movida ao povo judeu ao longo da História, fato que o nazismo dera cores dramáticas. Para fazê-lo, ele entrou em questões ligadas à formação do povo judeu e em crenças que foram responsáveis pela

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JOSÉ MAURICIO DE CARVALHO, THAIS CAROLINE REIS DE ÁVILA, WALLACE FÉLIX CABRAL SILVA 10

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sobrevivência e identidade judaicas em situações adversas. E, nessa tarefa, ele foi contra essas crenças e nelas enxergou as razões da perseguição. Talvez, por isso, não tenha percebido a artificialidade de transportar categorias que desenvolveu para o mundo mental na análise de questões sociológicas e religiosas e ainda pior pela extensão antropológica e histórico-cultural com que tratou o tema. Por essa razão, seu texto mereceu críticas de diversos autores, as mais significativas e detalhadas elaboradas pelo filósofo judeu Martin Buber que observou a necessidade de rigor histórico e hermenêutico na abordagem de questões com tamanha amplitude cultural. Como um de nós já chamou atenção no livro Martin Buber, a filosofia e outros escritos sobre o diálogo e a intersubjetividade. (São Paulo, Filoczar, 2017, p. 63): “Buber considera O homem Moisés e a religião monoteísta superficial e concebido sobre bases frágeis, a interpretação do livro do Êxodo, suas explicações sobre o significado da religião, como igualmente as razões elencadas pelo psicanalista para o antissemitismo”. Na abordagem histórica dos fatos narrados no Êxodo, Buber desenvolve uma hermenêutica histórica construída em trabalhos como O Reino de Deus (1936) e Os ensinamentos dos profetas (1942). De modo que ao redigir o livro Moisés (1944), onde, entre outras coisas respondeu a Freud, tinha elementos para deixar de lado as tradições javista, eloísta, sacerdotal. Quanto à interpretação histórica Buber, ela assumiu uma metodologia que aprendera de seu mestre Willhelm Dilthey e se completou com as observações de Paul York Wartenberg. Entre elas a advertência de não utilizar categorias contemporâneas no estudo das antigas manifestações religiosas, pois isso mais falsifica que esclarece o problema. Apesar das críticas que o texto mereceu de filósofos e teólogos, a edição atual apresenta um autor preocupado com problemas humanos, honesto e direto em suas análises. Nesse sentido, suas observações são a de alguém conectado com os problemas de seu tempo e cada vez menos identificado com o racionalismo dos tempos modernos, como já se pensou.

José Mauricio de Carvalho (Dr.)

[email protected] UNIPTAN /FAPEMIG

Thais Caroline Reis de Ávila [email protected] PIBIC/IPTAN/FAPEMIG

Wallace Félix Cabral Silva [email protected] PIBIC/IPTAN/FAPEMIG

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ISSN ELETRÔNICO 2316-8080 JASPERS, KARL. RAZÃO E CONTRA-RAZÃO NO NOSSO TEMPO.

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RESENHA

JASPERS, Karl. Razão e contra-razão no nosso tempo. Lisboa, Minotauro, s.d.

José Mauricio de Carvalho (Dr.) [email protected]

Professor IPTAN/FAPEMIG/FUNADESP

Jacqueline Giselle Farias Fernandes [email protected]

PIBIC/IPTAN/FAPEMIG

Larisa Ellen Silva e Silva [email protected] PIBIC/IPTAN/FAPEMIG

RECEBIBO 12/02/2018 APROVADO 22/02/2018 PUBLICADO 12/03/2018 Editor Responsável: Carla Caldas Método de Avaliação: Double Blind Review E-ISSN: 2316-8080 DOI:10.16928 Esse livro foi publicado originalmente em alemão, em 1950, com o título Vernunft und Widervernunft in unse rer Zeit. Ele reúne três conferências do filósofo alemão Karl Jaspers intituladas respectivamente: a exigência científica, a razão e o combate à razão. Mereceu diversas traduções, a utilizada nessa resenha é a portuguesa, com prefácio de Delfim Santos que resume o eixo principal da obra (p. 7): "o contrário da razão não é extrínseco à própria razão". Com essa frase o filósofo português se dá conta da profunda crítica que Jaspers faz ao marxismo e à psicanálise na defesa do que parecem ser os valores essenciais da razão e da ciência moderna. Ele quer mostrar que inimigos da razão podem surgir entre os que dizem cultivá-la. Nesse livro Jaspers entra ainda em outras questões que marcam seu pensamento: a Filosofia nos situa no mundo permitindo ir além das necessidades vitais; a tradicional questão do Ser ou o sentido último da realidade mostra que o Ser mesmo se oculta além da razão, mas que se mostra parcial e gradualmente nela ao longo do tempo; a recuperação da razão significa afirmar o melhor da tradição iluminista, deixando de lado os exageros do falso iluminismo que atribui à razão mais do que ela pode dar; a razão ajuda a entender o mito, as crenças e a verdade oculta que eles escondem e orienta para superar os erros do que neles se coloca contra ela razão; defende a independência íntima combatida pelos totalitarismos. No primeiro capítulo Jaspers examina a tradição filosófica. Ele verifica que não há consenso entre os filósofos quando definem o conhecimento, exceto entre os pensadores católicos pela adesão (p. 13): "ao pensamento tomista". Em seguida, observa que a tradição filosófica é marcada pelos avanços da ciência, de modo que (p. 14): "a ciência é a condição de qualquer verdadeira filosofia". No entanto, é preciso examinar criticamente as contribuições da ciência. Para mostrar os problemas que podem surgir abordará duas teorias que se apresentam como científicas: o marxismo e a psicanálise, expressões de um tempo em que a crítica à razão, vinda de dentro da ciência, ganhou força.

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JOSÉ MAURICIO DE CARVALHO, JACQUELINE GISELLE FARIAS FERNANDES, LARISA ELLEN SILVA E SILVA

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Jaspers explica que Marx entende a história do trabalho como ponte para a compreensão da história como um todo. Para ele, as revoluções até o momento só serviram para novos grupos chegarem ao poder, mas nenhuma conseguiu o essencial: modificar conjuntamente a realidade social e o homem. Em contrapartida, ele esclarece (p. 16): "A revolução comunista, pelo contrário, subverterá o conjunto social, transformando ao mesmo tempo o homem". Isso é apontado como fundamental porque somente um homem novo será capaz de criar uma nova sociedade, pois, explicava Marx, com a revolução industrial, o homem tornou-se ainda mais alienado que em outros períodos da história. Marx apostava no conhecimento não só para interpretar os acontecimentos, como fizera até então a Filosofia, mas para transformar a sociedade pela divulgação dos mecanismos de exploração do trabalho. E assim, ele deu à essa compreensão do que seja Filosofia e do seu papel social o status de ciência. No entanto, avalia Jaspers, Marx deixa de proceder como verdadeiro cientista quando assim procede (p. 19): "pois nunca atribui real importância a um setor particular. Possui uma concepção total das coisas". Fazendo assim atua como filósofo e não como cientista.

A filosofia marxista articula-se como metafísica materialista, mas de um materialismo diferente do consagrado pela Física e Química modernas. Marx entende que a História humana pode ser interpretada segundo os mesmos princípios utilizados pelas ciências da natureza e ele trabalha na perspectiva de uma história única (p. 21): "é a história da evolução natural até ao homem". O filósofo apresenta esse modelo histórico como verdadeira ciência, mas revela uma fé tendenciosa no movimento histórico.

Num tempo que valoriza a ciência, apresentar-se como teoria científica significa falar de uma verdade absoluta. No entanto, o que fez o marxismo foi elaborar uma interpretação da História, que sob o rótulo de científica, quer prevalecer sobre outros modelos. Além disso, apresenta-o como saber absoluto e articulador de um saber completo do mundo, que não é próprio da ciência moderna. Jaspers assim o explica (p. 27):

Num mundo privado de Deus, Marx levantou-se como um profeta; adotou os padrões que podem contentar todo mundo. Fez-se arauto de uma ciência que não o é, o chefe autoritário que não fala em nome de Deus, mas em nome da ciência, tal como ele a conhece.

Numa perspectiva semelhante, a psicanálise de Freud, apresenta-se como ciência capaz de revelar a intimidade do homem e, mais do que isso, promete sua salvação. Avançando além dos limites da Medicina, sai da esfera dessa, preparando-se para submetê-la.

Quando porém o conhecimento psicanalítico é assumido como fé, ele resiste a seus próprios princípios e se afasta da metodologia da ciência moderna. Assumido como crença o método psicanalítico aponta para o dogmatismo. Erros de concepção da ciência promovem esses equívocos como, por exemplo (p. 29): "confundir a compreensão do sentido dos fenômenos com a sua explicação causal".

O nosso conhecimento científico limita-se até onde alcançam as categorias da ciência. Essa metodologia conscientemente utilizada permite ao homem saber o que ele conhece e o que desconhece. Quando reduz a consciência a objeto, a psicanálise dela retira a

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liberdade e quando o faz, em nome da prática médica, oculta algo fundamental da condição humana.

Portanto, Marxismo e Psicanálise, à parte de suas legítimas contribuições para a Sociologia e a Psicologia, tornam-se problema quando adotam postura de ciências totais e recusam a crítica. A ciência moderna é aberta a crítica, sem ela torna-se dogmática e sem restrições éticas converte-se em manifestação de Poder. Em seguida, Jaspers conclui o capítulo dizendo que para chegar ao saber científico é preciso possuir um objeto definido e um método rigoroso, mas para pretender dizer a Verdade total é preciso (p. 48):

um método científico que permita desvendar a mentira e um conhecimento total e de uma exteriorização em pretensos mitos. Este método logrará mais ainda: lançará os alicerces de toda a probidade intelectual, e foi este o tema de nossa dissertação de hoje.

No capítulo seguinte, Jaspers examinará a razão. A razão, ele diz, é mais que a inteligência, ela sempre está em movimento, é contrária ao arbítrio e a presunção. Ela não se manifesta fora de uma limitada comunicação, nunca esgotando a mensagem que pretende comunicar. Dela se pode dizer (p. 52): "que permite o conhecimento de si, a humildade, pois conhece as limitações humanas" e ainda "procura sempre escutar, sabe esperar, é oposto dos entusiasmos afetivos que toldam a visão". Pode-se então perguntar: qual é o objetivo da razão? Responde o filósofo (p. 53): "O que visa não é apoderar-se por qualquer preço de uma qualquer verdade, mas buscar a única verdade." O que aparece ao homem é a tentação de abandonar a busca dessa verdade única. Diante da questão uma pergunta emergiu na tradição filosófica (p. 59): "por que, em última análise, deve existir alguma coisa, porque não haveria o nada?" Essa pergunta nos coloca diretamente em contato com o Ser e com a dúvida de como chegar até ele, pois (p. 60): "ele é o inapreensível, o impenetrável, aquilo que, precedendo todo o humano pensamento, se lhe vem oferecer". A questão do Ser, portanto, é a questão fundamental da Filosofia, mas as tentativas de o alcançar nunca têm perfeito êxito. Estamos diante de algo que se mostra na razão, mas que é maior do que ela. A consciência do uno, eterno e verdadeiro aparece, para Jaspers, com o nome de razão englobante. Essa razão se encaminha para o uno e é liberta de toda finitude. Ela foi assim apresentada pelo filósofo (p. 60): "Esta razão englobante, que se desvia de toda a finitude a fim de se encaminhar para o uno, faz subitamente reaparecer tudo o que é e dirige-nos a uma linguagem inteiramente nova e maravilhosamente transparente". O eterno vislumbrado pela razão somente se mostra na história, ainda que não se revele perfeitamente no tempo. É a história que vincula o eterno, o uno e o verdadeiro com o presente. Porém se ele não se revela perfeitamente no tempo, sem a razão ficamos prisioneiros de nossa historicidade e perdemos contato com o eterno, ou uno. Assim, a razão englobante permite reconhecer uma realidade que está além do que a razão pode perceber, mas que se mostra nela parcialmente.

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Quando a razão não tem espaço emerge um primeiro viver cheio de apetites (p. 64): "um princípio antiracional, um certo primum vivere, que a si mesmo se atribui a pré-existência". Esse princípio aprisiona a vida, renega a palavra e a ação e funciona como um inimigo da razão. Eis como se coloca a contradição (p. 65): "enquanto o pensamento posto a serviço da razão permanece crítico, exigindo a verdade, o pensamento que se faz servo do querer viver não busca senão os sofismas que o justificam". A razão não aparece sempre e nem sempre ganha destaque. Nosso tempo presta culto a contra-razão e isso tem consequências que é preciso evitar. Nos tempos em que a verdade não prevalece os resultados são desastrosos (p. 66): "os estados totalitários provam-nos que se pode embrutecer povos inteiros, quer privando-os de informação, quer lhes proibindo qualquer forma de discussão pública, quer habituando-os a alimentarem-se de mentiras". Procurar a verdade, exercitar a liberdade é um movimento contrário a nossa natureza que prefere guiar-se pela necessidade, pelos instintos. Justo por isso, no mesmo sentido de Kant, diz o filósofo (p. 69): "será preciso abandonar o nosso natural dado, o eu sou como sou, para nos repensarmos a nós próprios e reencontrarmos no fundo do nosso coração a seriedade de toda a responsabilidade". Quando consideramos a realidade do homem concreto nos damos conta da importância da moral ao lado da procura sincera pela verdade. E a moral (p. 73): " não é função da utilidade pública e o amor ao próximo não representa um sentimento pequeno burguês, mas a força de gravitação que torna coerente qualquer civilização". Assim o amor e a razão se aproximam, como observou Platão. Diz o filósofo (p. 76): "O amor não é a razão, mas se encontra de tal modo impregnada por ele que Platão concebia o amor e o conhecimento como uma única e mesma coisa". O amor é que dá plenitude à existência, quando ele orienta as escolhas elas parecem definitivas, mas o amor também pode cessar, deixando o indivíduo no sofrimento e solidão. Se a razão se perde, a Filosofia se encontra igualmente perdida, pois a missão da Filosofia é buscar a razão. É a razão que permite a crescente comunicação e revela o que está escondido no mundo. O compromisso com o verdadeiro, recusa tudo o que contradiz, menospreza e desnatura a verdade. Por isso, (p. 81): "o homem que conheceu o travo da razão jamais poderá renunciar a ele". E se o mundo a recusa, cabe a razão resistir aos ataques que recebe. No terceiro capítulo, Jaspers apresenta as lutas da razão em nosso tempo, pois nos dias de hoje a razão não enfrenta apenas resistência comum, mas uma hostilidade assassina. Ela luta contra o espírito anti-filosófico que menospreza a verdade. Eis o que ele diz (p. 87/88): "Tal inimigo, decidido a nada saber da verdade, é o espírito antifilosófico; sob o rótulo do verdadeiro, exalta tudo quanto contradiz, menospreza e desnatura a verdade". Esse espírito antifilosófico colhe o seu poder no murmúrio confuso, na penumbra, no saber dogmático, no feitiço, na magia, na aventura, no nosso ser que sente um impulso a uma pretensa unidade. Há ocasiões em que a antirazão e a antifilosofia servem-se da razão e da filosofia. O mito, na história da cultura, é uma forma de expressar a verdade, mas quando se entrega aos ídolos não exprime a verdade e a falsifica. Ele o esclarece (p. 93):

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Mas tudo se passa diferentemente na alternativa oposta: prendermo-nos incriticamente nos mitos significa entregar-nos aos ídolos. O sentido não é já o de uma penetração da razão pela qual a essência das coisas se transmita em imagens que, até nos fatos quotidianos, exprimam uma face da realidade.

O pensamento mágico afasta-se da vida. A multidão enxerga nos mágicos os anunciadores de uma nova época. Em todos os campos as massas seguiram os advinhos e deixaram-se enganar por eles. Porém, em nossos dias, deixar-se ludibriar por esse encantadores e mágicos é perder o sentido e a importância da verdade e por consequência também perder a liberdade. Explica Jaspers que sem a razão seguimos os encantadores e mistificadores como os carneiros do navio de Panurge, história do livro Pantagruel de Rabelais, que mergulharam nas águas do mar depois que um deles foi ali atirado porque balia e os demais o seguiram naquele destino terrível. Assim também se passa conosco quando (p. 98): "renunciando à razão renunciamos também à liberdade. Descobrimo-nos aptos a seguir qualquer forma de totalitarismo e, como o rebanho, acompanhamos o carneiro de Panurge, que nos arrastará para a catástrofe, para o crime, para a morte infamante". A razão é como o ar que respiramos e do qual necessitamos. Porém evitamos esse ar mesmo tendo dele necessidade. A Filosofia quer um homem livre, fora da sedução dos totalitarismos. O respeito à razão, que foi uma boa herança do iluminismo, parece difícil em nosso tempo. Nesse sentido o homem se esquece de Deus, o que é próximo de esquecer-se de si mesmo. A razão necessita mais de autenticidade, do que de argumentos, pois seu produto vem pelo ato racional. Diz Jaspers que a razão caminha (p. 105): "com a lúcida consciência de não possuir a verdade e somente caminhar em sua busca". Isso significa que a razão está à procura da verdade, mas não tem a sua posse. A universalidade é o espaço correto para a razão caminhar. Lutar pela razão é lutar pela Filosofia e pela ciência. Assim, apesar das inúmeras dificuldades do nosso tempo, Jaspers encontra esperanças de que a razão vencerá seus inimigos (p. 106): "Na medida de sua atividade, a razão dá-nos a esperança de que esta afirmação de si mesma acabará por vencer as forças da contra-razão e da anti-razão" A vitória da razão nunca está assegurada, mas se encontra nela nossa única possibilidade de vida autêntica. Travar-se-á na universidade o combate espiritual pela razão: ela é a cidadela da razão pura na sociedade ocidental. O ensino, na instituição universitária, serve exclusivamente para despertar a atenção. Esta ação nas universidades, encontra-se ameaçada, com todo o nosso mundo e os nossos valores. Desde 1914, quando irrompeu a 1ª Grande Guerra, as forças da antirazão vem ganhando força. Contudo, mesmo que o futuro pareça eliminar as esperanças, a razão não se desespera em seu caminhar. E assim termina o livro com a força da esperança no destino da razão (p. 116): "A razão assemelha-se à revelação de um mistério, perpetuamente acessível a cada um de nós, ela é silencioso espaço para onde, graças ao pensamento, é consentido a todos retirarem-se". Este pequeno livro com três conferências é um trabalho importante de defesa da razão e da ciência. Ele mostra como a Filosofia e a atividade científica ajudam o homem a se

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posicionar na vida, fornecem-lhe orientação para enfrentar os problemas que o afligem, asseguram a independência íntima, propõe um sentido para a existência autêntica, ajuda a clarear os problemas que afligem a humanidade, a preparar a busca da verdade, a insistir na necessidade da boa comunicação, a descobrir a razão englobante como forma de buscar o Ser além da consciência intencional. Os instrumentos que Jaspers utiliza defender a Razão e a Ciência é a crítica ao modo como o Marxismo e a Psicanálise, apesar de suas notáveis contribuições para a Sociologia e a Medicina, quando elas vão além da genuína ciência e pretendem ser ciências totais. Portanto, ele retoma e aprofunda o tema do capítulo oitavo da Introdução ao pensamento filosófico denominado Psicologia e Sociologia. Naquele capítulo ele menciona as perversões sofridas por essas ciências, reafirmando o que já anunciara em 1931 em Die geistige Situation der Zeit (A situação espiritual de nosso tempo). Ali dissera que perdendo contato com a metodologia das ciências modernas e com a parcimônia e o compromisso com a verdade, que é própria da Filosofia, produz-se erros sobre a aparência de verdade. Essa perversão leva a superstição científica e nos afasta de nós mesmos. O livro portanto, além de coerente revela o caminhar de uma reflexão que se mantém nos mesmos rumos ao longo do tempo.