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JARDIM BOTÂNICO 250 ANOS E 5 CONTINENTES EM LISBOA

JARDIM 250 ANOS - ulisboa.pt · de D. José, a pensar na educação dos netos, os príncipes D. José e D. João, tarefa que colocou nas mãos do naturalista italiano Domingos Vandelli

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JARDIM BOTÂNICO 250 ANOS

E 5 CONTINENTES EM LISBOA

Viajar por cincocontinentessem sair de LisboaPatrimónio. O Jardim Botânico da Ajuda tem uma árvore única naEuropa, um dragoeiro com 400 anos e mais de 1 600 plantas. A celebrar250 anos, junta uma série de atividades a uma das melhores vistas da cidade

MARINA MARQUES

Os muros, altos de mais de doismetros, escondem um tesouro en-tre a Calçada da Ajuda e a Calçadado Galvão: o Jardim Botânico daAjuda, primeiro centro científicode Lisboa, pioneiro no ensino daHistória Natural a nível europeu noséculo XVIII, o primeiro do génerocriado em Portugal e o 15.° da Eu-ropa. Um dragoeiro com 400 anos,uma árvore única em jardins botâ-nicos europeus e mais de 1600 plan-tas são algumas das jóias guarda-das nesses três hectares e meio quetransportam os visitantes numaviagem por cinco continentes. Mashá mais a descobrir neste jardim,nascido Real em 1768poriniciativade D. José, a pensar na educaçãodos netos, os príncipes D. José e D.João, tarefa que colocou nas mãosdo naturalista italiano DomingosVandelli.

"Era um jardim que nos temposantigos era considerado como umcentro de interesse. E porquê? Porser um jardim de buxo bonito? Pe-las plantas? O interesse do jardimresidia também no facto de ser umlocal de aclimatação para plantasnecessárias para a agricultura etambém para desenvolver a eco-nomia e o comércio. Nessa altura,por exemplo, era muito importante

o comércio de anil, que era retiradode plantas. O que interessava mes-mo ao marquês de Pombal era a ex-ploração e o conhecimento sobreplantas para ligar essas plantas àindústria", contextualizaDalila Es-

pírito Santo, diretora do Jardimdesde " 12 de fevereiro de 2002", si-

tua, de cor.Por isso, Vandelli mandou vir

plantas vivas e sementes de todo omundo, chegando a colecionarmais de 5000 espécies. Algumasdas árvores do terraço superior sãoainda desse tempo e até há umamais antiga do que o próprio Jardim."Sabemos que é assim porque háuma cartaapedirautorizaçãoaD. Jo-sé para que viesse da Madeira umconjunto de seis dragoeiros, exem-plares j á adultos. Este é um desses",indica a investigadora. No entanto,Dalila Espírito Santo acredita que amais antiga árvore do Jardim atéveio de mais longe. "É em Cabo Ver-de que os dragoeiros espontâneostêm esta forma hemisférica", refere,apontando para os 23 metros de

copa da árvore que, no terraço su-perior, parece envolver uma escul-tura em ferro. Alguns ramos caíram

em 2006 e esta foi a solução encon-trada por "um especialista em ár-vores, o belga Bruno de Grunne",conta.

Mesmo ao lado, com os densosramos apoiados numa estruturametálica e com bancos a convida-rem a uma leitura, a tal árvore únicaem jardins botânicos europeus,uma Schotia afra.

Visitas para todas as idadesMantendo a ligação ao ensino, esteJardim, que viu as tropas francesasinvadir o país, assistiu à implanta-ção da República e que em 19 10 in-tegrou o Instituto Superior de Agro-nomia, oferece visitas guiadas pen-sadas para todas as idades e al-gumas aulas dos futuros arquitetospaisagistas passam por aqui.

"Temos visitas guiadas para alu-nos do secundário, com temasrelacionados com o que estão aaprender na escola, e programaspensados para crianças a partir dos3 anos." Vai desde encontrar cam-peões do jardim (qual é a plantamais gorda, a mais alta) ou sim-plesmente brincar no terraço infe-rior à procura dos príncipes escon-didos entre os cerca de quatro qui-lómetros de buxo geometrica-mente desenhados pelos dois jar-dineiros que diariamente aí traba-lham. "Essa é a visita dos 3 anos.Quando encontram os príncipes,há rebuçados. Quanto mais pe-queninos são, mais brincadeira

têm, mas aprendem sempre algu-ma coisa", conta com um sorriso.

"Plantas de todo o mundo" é o tí-tulo de uma das visitas. "Mostra-mos as características das plantasque há em cada região. Por exem-plo, ali na América do Sul [junto aorestaurante Estufa Real] estão as

plantas da família das bromeliá-ceas, de que é exemplo o ananás.Também temos lá erva-das-pam-pas, uma planta da Argentina trazi-da para a Europa por um jardinei-ro francês no século XIX que se tor-nou uma das maiores invasoras anívelmundial. Massemainfiores-cência, para a podermos controlar.Temos ainda goiabas e pitangas.Na América Central, há muitas aga-ves, plantas em roseta que termi-nam em espinho. EmÁfrica, o quehá são aloés", vai dizendo, qual guiaturística, entre os canteiros no pisosuperior do Jardim, nos quais está

organizada a coleção, por regiõesfitogeográficas, atualmente commais de 1600 plantas, todas devi-damente "legendadas".

"Quase conseguimos aqui verpandas", atira, quando passamospelos bambus. Na verdade, os úni-cos animais que os 36 mil visitantes

que por ali passaram em 20 1 7 pu-deram ver foram os pavões. Paraalémdeinsetos, claro.

O jardim dos aromas é o espaçopor excelência das atividades parafamílias, local onde se fazem infu-sões e com os olhos vendados se

apuram os sentidos para identifi-car as plantas utilizadas. Há igual-mente visitas gerais, para famíliascom crianças entre os 6 e os 10

anos, mais viradas para a botânicaou para a história. E neste ano, nasquintas-feiras de agosto, pelas 19.00,haverá visitas guiadas ao pôr do Sol,numa das muitas atividades pen-sadas para celebrar os 250 anos doJardim Botânico da Ajuda, na suamaioria de participação gratuita,bastando comprar o bilhete de en-trada (dois euros para adultos, umeuros para crianças e grátis paramenores de 6 anos) e fazer inscri-ção.

A reforçar a ligação ao ensino,Dalila Espírito Santo lembra que"também fazia parte do Jardim oGabinete de História Natural e aCasa de Risco, e a completar ocomplexo científico existiam aindaos laboratórios de Química e o deFísica". "Este foi o primeiro núcleocientífico de Lisboa e era conside-rado pioneiro no ensino da Histó-ria Natural a nível da Europa", des-taca.

Três estufas completam o con-junto. Numa delas funciona o res-taurante Estufa Real - "a renda do

espaço permite a sustentabilidadedo Jardim", aponta-, outra está re-pleta de plantas suculentas e umaterceira, a que D. Luís mandouconstruir para a sua coleção de 300espécies de orquídeas acolhe des-de 2015 a coleção de orquídeasde um casal finlandês, Tuulikki ePekka Ranta, onde estão reunidascerca de 250 dessas 300 espécies."É já uma das mais importantescoleções europeias", assinala a di-retora.

Diferentes vidasNem só de momentos bons se faz

esta história de 250 anos. Foi preci-samente no Gabinete de HistóriaNatural que Vandelli armazenou osmateriais que o explorador Alexan-dre Rodrigues Ferreira ia enviandodo Brasil. "Quando voltou do Brasilteve o desgosto de ver tudo arma-zenado, sem ter sido estudado ouclassificado. Muito desse materialfoi levado durante as invasões fran-cesas e está no Museu Nacional deHistória Natural em Paris. Nessa al-tura, Vandelli é acusado de compa-drio com os franceses e é deporta-do para a ilha Terceira", conta a di-retora.

"Seja por causa das invasõesfrancesas seja por causa do descui-do em que o jardimpossater caído,em 1811, quando [FélixdeAvellar]Brotero fica responsável pelo Jar-dim, faz umalista do que encontrae dessa lista já só fazem parte 1300plantas", continua.

Novo revés já no século XX. Emfevereiro de 1941, a passagem deum furacão partiu e arrancou ár-vores. "Foi um caos", lembra. "De-pois do furacão, foi chamado umarquiteto paisagista, que era pro-

fessor do Instituto Superior deAgronomia, Caldeira Cabral, quefoi o nosso primeiro arquiteto pai-sagista." Para aproveitar a paisa-gem, sugeriu que não se voltasse aplantar árvores no terraço inferior,restituindo-se o desenho de buxooriginal. "O desenho que serviu a

essa reconstituição é do século XX(1846) e há fotografias no ArquivoNacional, de 1945, que mostram obuxo aí com uns 30 cm de altura esó com o desenho exterior. Estava,portanto, em construção", conta adiretora.

O jardim, tal como hoje se podever, resulta de um trabalho inicia-do em 1993 pela arquiteta e entãodiretora Cristina Castel-Branco,que, com o apoio do Prémio Con-servação do Património Europeu,recuperou a coleção botânica, res-taurou o sistema de rega e instalouo Jardim dos Aromas. Mais recen-temente, por iniciativa da Associa-

ção dos Amigos do Jardim Botâni-co da Ajuda, foi restaurada a Fontedas 40 Bicas, no centro do terraçoinferior. As bicas voltaram a jorrarágua e as serpentes, peixes alados,

cavalos-marinhos e figuras míticas

que preenchiam o imaginário doséculo XVIII recuperaram os con-tornos.

Em jeito de remate deste traba-lho, uma das últimas aquisições doJardim Botânico, através do IndexSeminum, sistema de troca de se-mentes para fins de investigação aoqual pertencem cerca de mil jar-dins botânicos em todo o mundo,foi "uma série de plantas para colo-car no lago, próprias de sítios pan-tanosos, e que não crescem tantocomo as que lá estavam antes, danossa coleção, que eram muito vo-lumosas e não só tiravam beleza àfonte como rebentavam com oscanteiros", explica. "As plantas já es-tão a germinar", conta. Se tudo cor-rer bem, não demorará muito a se-rem colocadas na fonte, comple-tando o cenário do Jardim Botânicoda Ajuda, de onde se desfruta deuma das mais belas vistas de Lis-boa, atravessando oTejo e pousandona Margem Sul, com o Cristo-Rei amoldar a paisagem.

MOMENTOS DE FESTA

FESTA DA PRIMAVERA> Nos dias 21 e 22 de abrilhaverá exposições de f Lores e

plantas de produtores e asso-ciações que se juntam à cole-

ção do Jardim. No domingoatua o Coro Infantil daUniversidade de Lisboa.

EXPOSIÇÃODE CERÂMICA> No dia 25 de abril é inaugu-rada a exposição de cerâmicade António Vasconcellos

Lapa, que povoará de dra-gões, pássaros e caracóis

ojardim.

TEATRO INFANTIL> Entre 1 de junho e 15 de

julho, o Grupo de TeatroAnimArte, que tem sede no

Jardim, apresenta o espetá-cuLo deste ano.

FINS DE TARDECOM MÚSICA> Durante as quintas-feirasde julho e também no dia 31,

sempre às 18.00, diversos gé-neros musicais para um fimde tarde diferente.

TEMPOS LIVRES> De 18 de junho a 16 de julho,o Jardim convida as criançasdos 4 aos 12 anos a respirarar puro, produzir e represen-tar uma peça de teatro, plan-tar e até adotar uma pLanta.

FESTA BARROCA> A 23 de setembro é recriadaa visita do Marquês de Pom-bal ao Jardim Botânico da

Ajuda por altura da sua fun-

dação.