Jardins Burle Marx

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    CAMINHOS DA ARQUITETURA MODERNA EM FORTALEZA:

    A CONTRIBUIO DO PAISAGISTA ROBERTO BURLE MARX

    Ricardo Alexandre PaivaArquiteto e urbanista, Mestre e Doutorando em Arquitetura e Urbanismo pela FAUUSP

    e-mail: [email protected] Rua D. Antnia de Queiroz, 435/52 So Paulo - SPTel: 11 21578880

    Beatriz Helena Nogueira DigenesArquiteta e urbanista, Mestre e Doutoranda em Arquitetura e Urbanismo pela FAUUSP

    Professora Assistente do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFCe-mail: [email protected] Rua Frei Mansueto 483 - Fortaleza-Ce

    CEP: 60.175-070 Tel: 85 3267 5550 Fax: 85- 3366-7496

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    CAMINHOS DA ARQUITETURA MODERNA EM FORTALEZA:

    A CONTRIBUIO DO PAISAGISTA ROBERTO BURLE MARX

    O presente trabalho trata do paisagismo moderno em Fortaleza, enfocando os projetos do arquiteto RobertoBurle Marx em obras pblicas e privadas. As manifestaes da arquitetura moderna surgiram em Fortaleza

    tardiamente e foram introduzidas por intermdio da atuao da primeira gerao de arquitetos, inicialmenteformados nas escolas de arquitetura do sudeste do Pas e do Recife e posteriormente por meio da produodos profissionais egressos da Escola de Arquitetura de Arquitetura da UFC, fundada em 1965. O projeto depaisagismo, entretanto, na maioria das vezes, no foi incorporado s obras emblemticas de arquitetura defeio moderna, ao contrrio do que ocorreu em outros centros urbanos do Nordeste, como Recife eSalvador. A insero e difuso do paisagismo moderno em Fortaleza resultaram da parceria do arquitetoAccio Gil Borsi com o paisagista Roberto Burle Marx, cuja produo se iniciou em jardins residenciais,ampliando posteriormente para obras pblicas. Esforos recentes empreendidos por pesquisadores doNordeste redundaram em significativa contribuio para a compreenso do legado de Roberto Burle Marx arquitetura e ao paisagismo modernos em nossa regio. Por outro lado, constata-se que apesar da vasta ediversificada literatura sobre a obra de Roberto Burle Marx, existem escassas referncias acerca de suasobras em Fortaleza. objetivo dessa pesquisa, pois, estudar a produo do arquiteto e paisagista RobertoBurle Marx na capital cearense, enfocando duas obras de maior relevncia, a saber: O Centro

    Administrativo do Banco do Nordeste do Brasil e a Sede do Grupo Empresarial J. Macedo. Nesse sentido,os resultados deste artigo buscam produzir um registro de suas obras, constando de dados histricos etcnicos, desenhos e imagens. A produo de Burle Marx em Fortaleza constitui importante acervo a serdocumentado e justifica-se pela sua contribuio na difuso do paisagismo moderno na Cidade, bem comopela relevncia da preservao deste patrimnio histrico, cultural e paisagstico da capital cearense.

    Palavras-Chave: arquitetura e paisagismo moderno, Roberto Burle Marx, Fortaleza.

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    CAMINHOS DA ARQUITETURA MODERNA EM FORTALEZA:

    A CONTRIBUIO DO PAISAGISTA ROBERTO BURLE MARX

    1 ARQUITETURA E PAISAGISMO MODERNOS NO BRASIL: UMA RELAO DE

    ORIGEM.A compreenso do processo de formao e desenvolvimento do paisagismo moderno no Brasil

    indissocivel das manifestaes do modernismo arquitetnico. Esta relao de origem se sustenta

    em alguns pressupostos em comum, a saber:

    - A negao dos valores culturais dos movimentos historicistas do final do sculo XIX e incio do

    sculo XX. Enquanto a arquitetura moderna condenava as prticas neoclssicas, eclticas e

    neocoloniais, o paisagismo moderno nasce da recusa da disciplina formal e decorativa dos

    modelos dos jardins de carter historicista, sejam das estruturas simtricas e geomtricas de

    influncia clssica, sejam das estruturas foradamente naturais de influncia romntica. Ambas as

    tendncias foram importadas e adotadas de forma irrefletida como smbolos de uma pretensa

    modernidade, inclusive no uso de espcies vegetais exgenas, negando a paisagem local.

    - A promoo da sntese entre tradio, representada pela herana cultural colonial, e

    modernidade, com a absoro das influncias das vanguardas europias - devidamente

    condicionada realidade scio-cultural. Tal processo de transculturao se justificava pela

    necessidade de afirmar a identidade nacional, preocupao permanente do contedo

    programtico da arquitetura moderna brasileira. No caso especfico do paisagismo moderno, estasntese se materializou, principalmente, por intermdio da utilizao de exemplares da flora

    brasileira associados a arranjos compositivos mais abstratos de certa influncia pictrica

    (sobretudo cubista).

    Ambos os pressupostos foram movidos pela nsia de colocar a arquitetura moderna e, como

    conseqncia, o paisagismo, como expresses culturais da identidade pretendida, com relevante

    significado social, pois:

    No resta dvida que o empenho dos arquitetos foi decisivo para o fortalecimento do papel

    do paisagismo e a redefinio de contedos da disciplina no Brasil como nunca antes havia

    sido possvel. Por outro lado, criou condies favorveis para que surgissem paisagistas

    comprometidos com as causas modernas caso de Mina Kablin Warchavchik e Roberto

    Burle Marx (DOURADO, 2001:81).

    Nesta direo, podemos destacar dois exemplos emblemticos que caracterizam a relao de

    origem entre a arquitetura e o paisagismo modernos no Brasil.

    O primeiro se refere residncia do arquiteto russo Gregori Warchavchik na Rua Santa Cruz

    (1928) em So Paulo projeto de sua prpria autoria. Considerada a primeira casa modernista no

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    Brasil, apesar das contradies na adoo dos princpios do racionalismo de matriz corbuseana, a

    composio da sua ambincia inovadora foi reforada pelo jardim projetado pela paisagista e

    esposa do arquiteto Mina Kablin, que, em consonncia com a esttica moderna da residncia e

    com economia de meios, introduziu uma vegetao menos densa e de caractersticas locais

    atravs da utilizao de cactos, conferindo ao jardim uma conotao diferenciada em relao s

    caractersticas dos anteriores.

    O segundo se refere gnese da arquitetura moderna no contexto da reforma do ensino na

    Escola de Belas Artes empreendida por Lcio Costa, que, ciente da importncia de contextualizar

    a arquitetura paisagem, estimula a vocao de Roberto Burle Marx pelos caminhos do

    paisagismo. As proposies modernas de Burle Marx se insinuam primeiramente na Residncia

    Alfredo Schwartz (1930) no Rio de Janeiro, para depois ganhar uma dimenso mais ampla,

    quando passou a propor jardins pblicos, junto experincia singular da arquitetura moderna

    brasileira ocorrida no Recife sob o comando de Luis Nunes. Roberto Burle Marx transgride vrios

    paradigmas at ento em voga no tratamento de jardins pblicos e privados, despertando uma

    nova viso da paisagem, por intermdio principalmente da valorizao das qualidades intrnsecas

    das espcies vegetais brasileiras e articulao coerente com a arquitetura e o projeto moderno,

    caracterstica efetivamente iniciada no Edifcio do Ministrio de Educao e Cultura (1937-45) no

    Rio de Janeiro.

    2 O PROTAGONISMO DE BURLE MARX

    A projeo internacional da arquitetura moderna brasileira devedora das contribuies de

    Roberto Burle Marx. A importncia do paisagista para a arquitetura moderna brasileira transcende

    a suposta subordinao e complementao do projeto paisagstico ao edifcio. Sua elevada

    contribuio cultura artstica, arquitetnica e urbanstica coloca o paisagismo em um plano mais

    elevado de importncia, ao pretender estabelecer uma relao diferenciada entre o homem

    moderno e a natureza, na medida em que o jardim responde a uma funo social, que se funda na

    higiene, na educao e na arte (SIQUEIRA, 2001).

    A sua viso de paisagem provm da sua formao humanista, visvel em sua trajetria biogrficaque se entrelaa figura carismtica do artista e paisagista. Sua profunda intimidade com a

    natureza e seu repertrio cultural vasto e erudito convergem para intervenes conscientes na

    paisagem, implantando novos mtodos e prticas de projeto.

    Provavelmente, Burle Marx introduziu (...) mudanas nos procedimentos de trabalho sob a

    influncia do que se operava em arquitetura, com a sistematizao racional e a

    padronizao das etapas de projeto, desde os estudos iniciais at o detalhamento completo,

    empreendidas pelos arquitetos modernos (DOURADO, 2001:87).

    Freqentemente seus jardins so analisados sob o ponto de vista pictrico, seja porque Burle

    Marx enveredou pelas artes plsticas, seja porque alguns de seus estudos de jardins se

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    assemelhavam a composies pictricas abstratas. No entanto, preciso admitir que embora as

    duas prticas (de artista e de paisagista) se alimentem reciprocamente, Burle Marx reconhece que

    o jardim no uma cpia da natureza nem a reproduo mecnica dos procedimentos artsticos.

    Sob este aspecto, entende o jardim como uma elaborao com elementos naturais referenciados,

    segundo ele, nas leis que orientam os problemas artsticos, como contraste, textura, relao

    entre volumes, harmonia e oposio de cores (BURLE MARX, 1991). As especificidades dos

    jardins so reforadas para ele quando revela: Nunca pensei em fazer um jardim bidimensional,

    jardim sempre tem uma terceira dimenso. E outra coisa importante a quarta dimenso: o tempo

    necessrio para se observar esse espao (BURLE MARX, 1991).

    As suas pesquisas no campo da botnica alertaram muito precocemente para a necessidade de

    uma conscincia ecolgica e ambiental, assunto da vez atualmente. Estas preocupaes

    abrangentes de Burle Marx e a amplitude de sua atuao profissional fizeram-no um dos

    paisagistas mais importantes do sculo XX, sendo sua obra estudada e citada por estudiososbrasileiros e de vrios outros pases. No entanto, devido quantidade de projetos realizados pelo

    paisagista, a literatura sobre a sua obra no deu conta ainda do estudo da diversidade de

    experincias e parcerias em vrios lugares do Brasil.

    3 A INSERO DO PAISAGISMO MODERNO EM FORTALEZA: BURLE MARX E OS

    JARDINS DA RESIDNCIA BENEDITO DIAS MACEDO.

    Em toda a sua trajetria profissional, Burle Marx desenvolveu diversos projetos na Regio

    Nordeste, sobretudo na cidade do Recife, porm, diferentemente do que se sucedeu na capitalpernambucana e a despeito do seu desenvolvimento scio-cultural favorvel ao desenvolvimento

    da arquitetura moderna, a cidade de Fortaleza recebe as influncias modernistas tardiamente. Um

    primeiro conjunto de influncias pontuais e incipientes se faz sentir na dcada 1950, com o retorno

    terra natal de alguns arquitetos formados na Escola de Arquitetura na Universidade do Brasil,

    entre os quais Enas Botelho, Jos Liberal de Castro e Neudson Braga. Um segundo momento

    pode ser identificado com a fundao da Escola de Arquitetura da Universidade Federal do Cear,

    criada em fins de 1964 por alguns poucos arquitetos 1.

    A fundao da Escola serviu como ponto de inflexo na transformao da produo

    arquitetnica e na introduo da arquitetura moderna em Fortaleza. O curso de Arquitetura

    era reconhecido como o grande centro de referncia cultural da Universidade e da Cidade

    (CASTRO, 1982).

    A arquitetura moderna em Fortaleza se desenvolveu, portanto, a partir da atuao dos primeiros

    arquitetos da Cidade e dos egressos da Escola de Arquitetura. No entanto, na maioria dos casos,

    o projeto de paisagismo no foi incorporado ao arquitetnico, comprometendo o desenvolvimento

    1A comisso responsvel pela instalao da Escola de Arquitetura era formada pelos arquitetos Liberal de Castro, Neudson Bragaformados no Rio de Janeiro, Armando Farias e Ivan Brito formados no Recife, sob a liderana acadmica de Hlio Duarte.Posteriormente, juntaram-se ao corpo docente os arquitetos Roberto Martins Castelo, formado na UNB e Jos Furtado da Rocha Juniorformado na FAUUSP.

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    local do paisagismo, uma vez que no se constituiu nem uma cultura para a necessidade de

    tratamento paisagstico das reas no edificadas, nem tampouco havia profissionais arquitetos

    especializados nesta prtica.

    Pode-se admitir, sem reservas, que a insero do paisagismo moderno em Fortaleza se deu em

    condies bastante especficas: fruto da parceria j consolidada em outros projetos no Nordesteentre o arquiteto Accio Gil Brsi e Roberto Burle Marx e constitui-se, sobretudo, de jardins

    residenciais privados voltados para a elite empresarial local, uma vez que a contratao de

    arquitetos de grande renome era vista como smbolo de status para estas famlias.

    O exemplo mais emblemtico desta parceria em Fortaleza foi o jardim da residncia do

    empresrio Benedito Dias Macedo, concluda precisamente em 1968, onde passou a funcionar

    posteriormente, em fins da dcada de 1970, a Sede do Grupo Empresarial J. Macedo 2.

    Com desenho elaborado, os canteiros sinuosos, a paginao do piso, os espelhos dgua, a

    criao de elevaes na topografia e a vegetao que compem o projeto so concebidos de

    forma a por em evidncia a arquitetura da residncia. A associao de linhas curvas e retas dos

    canteiros e espelhos dgua 3 contrapem-se ortogonalidade predominante da edificao,

    procedimento adotado com freqncia pelo paisagista na maioria de seus projetos. Sendo assim

    os seus (...) jardins realizam uma espcie de transio entre a arquitetura e a natureza, (...),

    promovem uma sorte de compensao sensual ao racionalismo da arquitetura moderna.

    (SIQUEIRA, 2001).

    A introduo do paisagismo moderno em Fortaleza ocorre alheia s atividades dos arquitetoslocais e se restringe a um ambiente demasiadamente privado. Esta primeira experincia erudita

    no campo do paisagismo, malgrado as suas qualidades intrnsecas, no repercutiu efetivamente e

    quantitativamente na Cidade. Acrescente-se a isto o fato de que, embora Burle Marx tenha

    concebido jardins pblicos em Fortaleza, como no projeto para Avenida Aguanambi, Avenida

    Presidente Castelo Branco (Leste-Oeste) e Avenida Jos Bastos, todos em 1973, nenhum foi

    executado.

    No incio da dcada de 1990, Burle Marx elaborou seu ltimo projeto na Cidade. Trata-se do

    Jardim Botnico de Fortaleza, localizado na Fazenda Raposo no municpio de Maracana, Regio

    Metropolitana de Fortaleza. Esse projeto, ainda no executado, relevante no s pelo seu

    potencial socioeconmico e qualidade plstica bem como pelas premissas ambientais e

    programticas estabelecidas para o mesmo (BEZERRA e MOURA, 2007).

    2Com a mudana de uso, houve a necessidade de ampliao de rea fsica e foi construdo outro bloco no terreno (projeto tambm do

    arquiteto Gil Borsi), para atender ao novo programa. O bloco, com trs pavimentos mais pilotis, ocupa a face oeste do terreno. Oacrscimo, entretanto, no significou descaracterizao do conjunto, que, ao contrrio, conserva equilbrio harmonioso, ao adotar amesma linguagem da residncia, diferenciando-se desta pela verticalizao.3Elemento recorrente em seus projetos, Burle Marx sempre que possvel utiliza o espelho dgua como lar botnico (...), criando umjardim aqutico no qual poder realizar verdadeiros quadros vegetais(LEENHARDT, 1994:29).

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    Figura 01 Planta de Situao Antiga Residncia Benedito MacedoFonte: Arquivo Pessoal Arquiteta Fernanda Rocha

    Figura 02 Vista Area Antiga Residncia Benedito MacedoFonte: Arquivo Pessoal Arquiteta Fernanda Rocha

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    4 JARDINS DE BURLE MARX EM FORTALEZA

    A atuao de Roberto Burle Marx em Fortaleza 4se materializou em vrios outros projetos. Ainda

    da parceria com Borsi surgiram os seguintes projetos: a sede da Receita Federal (1973) em

    Fortaleza, importante edifcio da arquitetura moderna na Cidade, realado pelo tratamento

    paisagstico dado quadra no qual est implantado e a Vicunha Nordeste S.A. Indstria Txtil(1982), que assim como a Hering do Nordeste, busca humanizar, atravs dos jardins, os espaos

    fabris. Um projeto de grande visibilidade de Roberto Burle Marx, pelo seu carter de uso coletivo,

    trata-se dos jardins laterais anexo ao Theatro Jos de Alencar, um primeiro projeto executado em

    1973 e o atual, projeto de 1990, por ocasio da restaurao do teatro. Este jardim constitui um

    espao diferenciado na estrutura fundiria do entorno, contribuindo ainda para realar a elevao

    lateral do edifcio histrico tombado pelo IPHAN em 1964. O jardim cumpre importante ligao

    entre o ptio interno do teatro que separa o foyer e a sala de espetculos e o ambiente

    urbano. Alm da sombra criada pela vegetao arbustiva, um dos elementos de maior interesse o muro posterior totalmente tomado por trepadeiras servindo de cenrio para um pequeno palco

    para apresentaes artsticas externas.

    A partir de meados da dcada de 1980, Burle Marx ser contratado, sobretudo para conceber

    alguns projetos residenciais: Residncia Denise Pontes (1980), Residncia Pio Rodrigues Neto,

    1988; Edifcio Portal da Enseada (1985), mas tambm outros corporativos como o Centro

    Empresarial Clovis Rolim Ltda. (1988) e hoteleiros como Hotel Colonial (1975), projeto do

    arquiteto Jos Liberal de Castro, recentemente demolido e o antigo Hotel Caesar Park (1990),

    atual Grand Marquise. O projeto dos jardins do Centro Administrativo do Banco do Nordeste,

    realizado na dcada de 1980, merece destaque pelo porte e pelo seu bom estado de

    conservao.

    4As informaes foram gentilmente cedidas pelo Escritrio Burle Marx.

    Figura 03: Situao Ministrio da Fazenda

    de Fortaleza (1975)Fonte: Acervo Arq. Walter Lobo (Ministrio da Fazenda)

    Figura 04: Jardins Theatro Jos de Alencar (1990)Fonte: Acervo da Autora

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    5 OS JARDINS DO CENTRO ADMINISTRATIVO DO BANCO DO NORDESTE DO

    BRASIL

    A implantao do Centro Administrativo do Banco do Nordeste em Fortaleza (1983/1984), no

    Bairro do Passar teve como premissas a centralizao das atividades administrativas da

    instituio e a necessidade de uma grande gleba de terra, uma vez que o partido arquitetnicorequerido era horizontal. A soluo adotada para setorizar a diversidade de funes

    administrativas diferenciadas resultou na implantao de blocos horizontais interligados por uma

    grande coberta metlica. A extensa cobertura foi concebida para promover a integrao dos

    diversos blocos, conferindo um sentido de unidade ao complexo e condicionada por questes de

    conforto, sobretudo a proteo contra a insolao.

    O paisagista Roberto Burle Marx foi contratado na categoria de notria especialidade tcnica e,

    em parceria com os autores do projeto arquitetnico5, Marcos Th6e Wesson Nbrega, projetou

    os jardins das reas sob a coberta, assim como de todo o stio. O projeto de paisagismo,

    sobretudo das reas entre os blocos, contribuiu enormemente para criar a unidade to desejada

    pelos arquitetos.

    Os blocos foram concebidos racionalmente como um grande pavilho de dois pavimentos (trreo

    e pavimento superior), estruturados modularmente em funo dos pilares, vigas e esquadrias

    (alumnio e vidro) perifricos, permitindo grande flexibilidade nos lay-outs internos. Os apoios da

    estrutura metlica se localizam propositadamente dentro da malha estrutural dos blocos e se

    situam exatamente no eixo dos espaos entre os blocos. Em ambas as extremidades dos blocosforam situadas as reas de copa, sanitrios e shafts. A circulao entre os blocos garantida por

    caminhos centrais e perifricos no trreo e por uma passarela metlica no pavimento superior,

    proporcionando uma integrao funcional bastante eficaz e de forte presena plstica.

    Os jardins se inserem entre os blocos como extenses verdes das reas de trabalho,

    intermediados pelo balano da estrutura de concreto que mais se assemelha a uma varanda,

    pensada para proteger os panos de vidro da insolao e como apoio para as jardineiras pr-

    moldadas de concreto (que infelizmente no foram construdas). Em contrapartida, os blocos se

    inserem nos jardins como se estivessem soltos do cho, uma vez que o pavimento trreo se eleva

    do solo e o jardim adentra sob o piso.

    Os ptios entre os blocos sofreram diversidade de tratamento com relao sua configurao

    inicial (paginao, canteiros, jardineiras e vegetao) em funo dos nveis do terreno projetado. A

    diferenciao mais relevante nos jardins se encontra na praa central, onde se d o acesso

    principal do complexo, com a subtrao de um bloco, permitindo, assim, uma maior diversidade

    formal. A diferena de nvel entre o acesso e a passarela central vencida com escadarias e

    5A rea total do terreno de 26,50 ha, sendo 36.000m2 de rea construda, 18.000m2 de rea de jardins sob a coberta e 20 ha derea projetada de jardins externos.6A maioria das informaes acerca do projeto foram gentilmente cedidas pelo arquiteto Marcos Th, em entrevista concedida ao autorem junho de 2007.

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    rampas intercaladas com canteiros de concreto e espaos de convivncia intermedirios, em um

    jogo formal abstrato e dinmico, permitindo uma percepo diferenciada do jardim medida que

    se eleva o ponto de observao. Nesta praa, lugar de carter cvico para a instituio, a

    vegetao humaniza as formas predominantemente ortogonais dos caminhos, dos canteiros e da

    prpria paginao do piso. A elevada altura da coberta possibilita a insero de espcies vegetais

    de mdio porte, sobretudo palmeiras delgadas, em meio vegetao rasteira dos canteiros.

    No caso dos jardins entre os blocos, apesar da diversificao do desenho, possvel identificar

    certos pontos em comum, como: a permeabilidade no sentido longitudinal, atravs de caminhos

    lineares que so interrompidos por reas maiores de permanncia dotada de bancos; a paginao

    do piso, que obedece a uma modulao de placas de concreto de 0,50 x 0,50m moldadas em

    formas de fibra de vidro; a presena de totens metlicos como suportes para xaxins e vasos para

    plantas epfitas, (concebidos como elementos verticais se contrapem horizontalidade

    predominante dos blocos e favorecem a visibilidade dos jardins nas reas de trabalho dopavimento superior, ratificando a sua viso de jardim como um espao tridimensional); a

    predominncia de linhas retas, associadas s segmentos de crculos e a utilizao diversificada

    de canteiros com grama, cascalho e seixo rolado, proporcionando um tratamento heterogneo nas

    texturas e cores do jardim.

    Para alm da rea coberta, Burle Marx projeta os jardins do stio como um grande parque,

    integrando as ruas internas, reas de estacionamento e acessos em geral. visvel no seu projeto

    a preocupao em manter as espcies vegetais existentes e compor as novas em grupos,

    formando associaes lineares mais orgnicas. Burle Marx utilizou amostras locais e provenientes

    da estufa do seu stio, empregando plantas tropicais do Haiti e de outros pases, principalmente as

    exuberantes palmeiras. Era proposta do paisagista criar uma estufa no prprio lugar para facilitar

    a manuteno e reposio das espcies vegetais, idia que no foi levada a cabo.

    Conforme o arquiteto Marcos Th, projetista, funcionrio e responsvel pela manuteno do

    Centro Administrativo do BNB, os jardins mantm as caractersticas originais do projeto,

    verificando-se poucas mudanas quanto vegetao, principalmente na substituio das reas

    gramadas por jibias7

    . A manuteno feita por aguao direta nas reas internas entre osblocos e na externa feita com o reaproveitamento total da gua tratada, proveniente da estao

    de tratamento de esgoto por meio de bombeamento de recalque e pelo processo de asperso

    pressurizada.

    7Epipremnum pinnatum

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    Figura 06 Planta Praa Central Centro Administrativo do BNBFonte: Banco do Nordeste do Brasil

    Figura 05 Planta Jardins Blocos Centro Administrativo do BNBFonte: Banco do Nordeste do Brasil

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    Figura 07 Foto Jardins Blocos Centro Administrativo do BNBFonte: Acervo do Autor

    Figura 08 Foto Jardins Blocos Centro Administrativodo BNB

    Fonte: Acervo do Autor

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    Por fim, verifica-se que os jardins do Centro Administrativo do BNB so considerados pelos

    usurios como o prolongamento da arquitetura, proporcionando ambientes agradveis que so

    apropriados como espaos dotados de significado e identidade. Neste sentido, os jardins

    cumprem uma funo didtica, na medida em que despertam nos usurios a presena da

    natureza em meio s atividades do cotidiano, contribuindo atravs dos seus atributos plsticos,

    porque no dizer artsticos, para a sua visibilidade e conseqente preservao.

    6 CONSIDERAES FINAIS

    O trabalho de Roberto Burle Marx deve ser tomado como referncia importante para o

    desenvolvimento do paisagismo em Fortaleza ao suscitar uma nova viso de paisagem, por

    intermdio principalmente da valorizao das qualidades intrnsecas das espcies vegetais e da

    articulao coerente com a arquitetura. Vale salientar, no entanto, que o carter privado de

    algumas obras, a falta de manuteno e conservao, as interferncias nos jardins e a precria

    sistematizao da documentao dificultam a compreenso do significado histrico, cultural e

    paisagstico da obra do paisagista em Fortaleza.

    Enfim, a carncia de estudos especficos e locais sobre a vasta obra de Burle Marx revela a

    importncia da pesquisa, pois pretende, por intermdio do incio da documentao deste acervo,

    contribuir para a sua valorizao, conservao e preservao. O trabalho, ao registrar este

    legado, almeja ainda suscitar a criao de grupos de estudos no ambiente acadmico a fim de

    produzir um inventrio completo da obra de Burle Marx em Fortaleza.

    7 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    BEZERRA, Ricardo F. ; MOURA, N. B. . Burle Marx e a Fazenda Raposa - um projeto para ojardim botnico de Fortaleza. In: Paisagem na Histria - Jardins e Burle Marx no Norte e Nordeste,2007, Recife. Paisagem na Histria - Jardins e Burle Marx no Norte e Nordeste, 2007.

    CASTRO, Jos Liberal de. Cear, sua arquitetura e seus arquitetos. In: Cadernos Brasileiros deArquitetura: Panorama da Arquitetura Cearense Vol. I, So Paulo, Projeto Editores, 1982.

    DOURADO, Guilherme Mazza. Preldio do Paisagismo Moderno no Brasil. In: Revista Paisagem eAmbiente n. 14. So Paulo: Editora FAUUSP, 2001.

    LEENHARDT, Jacques (org); Nos jardins de Burle Marx; So Paulo: Editora Perspectiva, 1994.

    MARX, Roberto Burle. O prazer de viver e trabalhar com a natureza. [Entrevista de Burle Marx aGuilherme Mazza Dourado]. Projeto. So Paulo, n.146, p.58-63, out, 1991.

    MOTTA, Flavio L. Roberto Burle Marx e a nova viso da paisagem So Paulo, Nobel, 1983.

    SIQUEIRA, Vera Beatriz. Espaos da Arte Brasileira - Burle Marx. 1. ed. So Paulo: Cosac & NaifyEdies, 2001.

    Agradecemos aos professores Ricardo Bezerra e Fernanda Rocha, ao Escritrio Burle Marx e ao

    arquiteto Marcos Th pelas valiosas contribuies para a concretizao deste artigo.