22
145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES * * Ex-Secretário-Geral da OEA e membro da Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas. Ex-Secretario General de la OEA y miembro de la Comisión de Derecho Internacional de las Naciones Unidas.

JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

145

DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS

DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS

JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES *

* Ex-Secretário-Geral da OEA e membro da Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas. Ex-Secretario General de la OEA y miembro de la Comisión de Derecho Internacional de las Naciones Unidas.

Page 2: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

146

Page 3: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

147

I1 A minha idéia é trazer-lhes um pouco o que está na pauta da comunidade internacional com maior vigor, e que é a chamada reforma das Nações Unidas. Reforma das Nações Unidas é uma atividade, um pensamento, se quiserem, desde a origem da ONU. Desde que a ONU se fundou. Pensava-se que estava um pouco imperfeita e aí a origem deste movimento de reforma que agora atinge um momento importantíssimo. Para disciplinar as nossas idéias, vou me basear no relatório que o grupo de 16 pessoas convidadas pelo Secretário Geral apresentou a Kofi Annan em dezembro de 2004.

Vamos começar então pelo episódio que me pareceu significativo. Existe no

Rio de Janeiro, não sei se nos seus países, um programa de televisão que traz filmes antigos. Há algumas semanas, vi um filme, revi o filme, muito curioso, e este filme, no canal Retro, trazia a história de um cientista que havia conseguido criar um raio tão poderoso que aniquilava as coisas, os edifícios, aniquilava todos os objetos que atingisse. Para este cientista, o raio era um instrumento de chantagem. Ele teve que dar uma demonstração do poder do raio,e escolheu o quê? Escolheu o edifício das Nações Unidas em Nova York. A primeira coisa que fez o cientista com o seu raio destruidor foi aniquilar as Nações Unidas.

Acho isso muito simbólico. Há muita gente que quer aniquilar as Nações

Unidas. Vamos então procurar saber por quê. E depois vamos tentar responder as perguntas: vale a pena salvar as Nações Unidas? Vale a pena manter a ONU? E por quê?

Vivemos num mundo, como sabemos, muito mais difícil, muito mais

complexo, perigoso, ameaçador do que nossos pais viveram, porque estamos no vórtice de forças sobre as quais não há ainda controle.

Conhecemos todos a idéia de Hanna Arendt, no tempo do nazismo, em que

ela falava da banalidade do mal. Nós estamos, talvez, pelas circunstâncias em que vivemos, estamos enfrentando a banalidade do medo, nós vivemos com medo. Não temos uma das liberdades fundamentais que é a liberdade de não temer. Todos nós tememos, e isso se verifica de uma forma dramática quando recordamos o assassinato pela polícia inglesa de um brasileiro inocente em Londres, e não foi por acaso, porque ele foi assassinado com 8 tiros na cabeça depois de estar dominado. E vejo uma expressão do medo, do medo desse compatriota meu que, perseguido por uma pessoa em trajes civis – não era um policial fardado com uma arma na mão – e ele teve que procurar a sua defesa. E por outro lado, o medo do policial de que ele fosse trazer uma bomba que causasse prejuízo à população e aos bens. É um fato lamentável por todas as razões, injusto. Os inocentes sempre são vítimas das injustiças do nosso mundo, especialmente agora.

1 A primeira parte deste trabalho se apresenta em português, enquanto que a segunda parte se encontra em espanhol.

Page 4: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

148

Temos também nessa circunstância as restrições às liberdades civis. O maior triunfo do terrorismo é abalar as nossas convicções, prejudicar a nossa fé nos valores da democracia, nos valores da convivência civil, naquilo que se chama usualmente de “liberdades fundamentais”. Já não temos a liberdade de ir e vir. Somos vigiados por não sei quantas câmeras de televisão. A nossa privacidade é invadida quando, por exemplo, as nossas pastas, mochilas ou malas são abertas pelas autoridades, policiais ou não. Às vezes não são autoridades policiais, são agentes de empresas terceirizadas. Não é mais a polícia que tem o monopólio dessa atividade, dessa ação, são também empresas terceirizadas.

Portanto, uma primeira reflexão devemos fazer: até que ponto vamos aceitar

que o combate ao terrorismo traga a destruição dos nossos valores fundamentais, nos impeça de exercer os nossos direitos numa democracia. Atos terroristas, não é necessário recordarmos em detalhes, mas apenas mencionar, Nova York, Madrid, Londres, mais divulgados, mais trágicos talvez, mas não esquecer Egito, não esquecer Indonésia, Siri Lanka, que não foram trazidos com a mesma ênfase à opinião pública, mas são atos que também compõem este quadro.

Ao lado desse fenômeno atual temos outro, também expressão de violência,

que é o crime organizado. O crime organizado que muitas vezes se alia ao terrorismo, que se alimenta com o narcotráfico. Tudo isso cria para nós uma situação altamente instável no mundo que nós quereríamos depois da queda do muro de Berlim, mais estável, mais pacífico, mais cooperativo. Não vimos isso, vimos o contrário.

Hoje nos temos ameaças, desafios para a comunidade internacional. As

ameaças e desafios – e também ofereço esta idéia ao debate – que só podem ser respondidos e enfrentados pelo multilateralismo. Mas, vem um outro traço definidor da realidade atual, o unilateralismo: o uso unilateral da força tem se afirmado no nosso mundo. De um lado, temos toda a ameaça, mais do que ameaça toda a realidade do terrorismo, do crime organizado, também a realidade da emergência de conflitos antigos, com roupagem nova, ou conflitos novos trazendo inquietações antigas, sejam elas de origem política, étnica, ou religiosa. E temos também uma resposta unilateral, que em vez de resolver o problema, complica ainda mais a situação.

Por isso o Secretário Geral das Nações Unidas convidou 16 pessoas para que

se dedicassem a estudar as ameaças, os desafios e as possíveis mudanças nas Nações Unidas. Esses 16 foram o Sr. Henry Moussa, do Egito, Secretário Geral da Liga dos Estados Árabes; o Sr. Anan Paniarachun, da Tailândia, ex-Primeiro Ministro do seu país que foi o presidente do grupo; o Sr. Brandt Scaworoft, dos Estados Unidos da América; que foi consultor de segurança nacional do governo americano; o Sr. David Hannay, do Reino Unido, ex-Representante Permanente do seu país nas Nações Unidas; o Sr. Enrique Iglesias, que todos nós conhecemos, presidente do BID; o Sr. Garrett Evans, da Austrália, ex-Ministro das Relações Exteriores do seu país; a Sra. Gro Bruckland, que foi Primeira Ministra da Noruega e ex-Diretora da Organização Mundial da Saúde; a Sra. Mary Chinery Hesse, de Gana, que foi Diretora Adjunta da Organização Internacional do

Page 5: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

149

Trabalho; a Sra. Nefig Sadik, do Paquistão, ex-Diretora Executiva de População das Nações Unidas; o Sr. Chang Chi Cheng, da China, ex-Vice-Primeiro Ministro do seu país; o Sr. Robert Badinter, da França, Senador do seu país; a Sra. Sadako Ogata, do Japão, foi Comissária das Nações Unidas para os Refugiados; o Sr. Salim Salim, ex-Secretário Geral da Organização da Unidade Africana; o Sr. Satishi Nambiar, da Índia, ex-Tenente General do Exército do seu país, e o Sr. Igneiev Primakov, da Rússia, que foi Primeiro Ministro da Federação Russa. Vemos 16 pessoas – completa esta lista, naturalmente, o nacional brasileiro que está falando – os 16 tivemos como mandato apresentar ao Secretário Geral idéias, análises que lhe permitissem levar aos países um outro relatório, que é esse que está aqui, do Secretário Geral, intitulado Dentro de uma maior liberdade, em que ele recolhe idéias, propostas nossas e também idéias e propostas do relatório sobre as metas do milênio, chamado Relatório Sachs. O nosso relatório, a meu ver, sofreu desequilíbrio em favor de uma visão anglo-saxônica do problema. Tivemos decisão tomada por consenso, a não ser em 2 pontos a que depois vou me referir, e toda decisão por consenso significa que não se atinge o melhor grau de decisão. O consenso sempre leva a um arranjo de posições, talvez um mínimo denominador comum de posições.

Mas o que fizemos, e por que agora? Os 60 anos da ONU, todos sabemos, na

origem 50 Estados, São Francisco com vocação universalista, predominância do idealismo, experiência anterior foi um malogro da Sociedade das Nações. Dizia-se então que a I Guerra Mundial tinha sido a guerra para acabar com todas as guerras, mas durante as atividades da Sociedade das Nações ocorreram agressões à paz cometidas pelos próprios membros da Sociedade das Nações: o Japão invadiu a Manchúria, a Itália invadiu a Etiópia, a União Soviética invadiu a Finlândia e os alemães começaram a sua expansão impulsionados pela ideologia nazista.

A Sociedade das Nações já falava em segurança coletiva, mas tinha um

pecado original: a Sociedade das Nações não condenava a guerra. O que veio a acontecer com o Pacto Briand-Kellog de 1928, onde há a condenação explícita do recurso à guerra, mas este Pacto foi assinado fora da Sociedade das Nações.

Após a II Guerra Mundial tivemos uma nova experiência idealista, era a

experiência das Nações Unidas. Era a retomada do multilateralismo, a idéia de transformar os canhões em arados e o preço pago nesse momento foi o veto, foi ter um Conselho Permanente no qual os 5 maiores vitoriosos da guerra tivessem um valor maior do que os demais, portanto, tivessem a faculdade de vetar qualquer resolução do Conselho. As esperanças das Nações Unidas, na sua origem, foram rapidamente corroídas pela realidade dos conflitos, sobretudo o conflito ideológico da guerra fria – que só foi fria para alguns e para outros muito quente, morreram pessoas, destruíram-se Estados – mas, enfim, como elemento de análise, para facilitar a compreensão, chama-se este período de “guerra fria”. Guerra fria, o enfrentamento bi-polar, enfrentamento ideológico que paralisava as atividades do Conselho; houve recurso ao veto reiteradas vezes – é o caso de todos os membros permanentes, uns mais outros menos – mas enquanto isso, outra vertente das Nações Unidas realizava objetivos e atingia metas importantes

Page 6: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

150

da cooperação internacional. Por exemplo, foi nesta época que tivemos a descolonização, foi nesta época que se começou o debate sobre comércio, comércio internacional como fator de desenvolvimento, foi nesta época, sobretudo, que se começou a enfrentar a necessidade de que os países fossem ajudados nos seus processos de desenvolvimento. Foi nesta época que se fortaleceu a Organização Mundial da Saúde, a União das Telecomunicações, a UNESCO como expressão da cooperação na ciência, na cultura e na educação. Portanto, estes organismos e essas agências especializadas dão uma luz diferente à análise das Nações Unidas como um organismo malogrado. Não foi e não é. Temos na nossa observação luz e sombra, no meu entender, temos mais luz do que sombra.

Em 2005 são 191 Estados membros. Temos um mundo unipolar. Sei que

algumas interpretações do sistema internacional que falam em polaridades difusas ou uma unipolaridade qualificada. Mas vejo que há uma hiperpotência, portanto, nós estamos, queiramos ou não, num mundo unipolar. E também temos novos atores que emergiram nos tempos mais recentes: temos as organizações não-governamentais e temos todo o sistema financeiro internacional que se afirma com maior presença, temos grupos que se reúnem, sobretudo o Grupo dos 8, na realidade não são os países mais desenvolvidos do mundo, são os 7 países mais desenvolvidos do mundo que convidam um, a Federação Russa, que não está economicamente no mesmo nível. Temos também a afirmação do poder nuclear, nós temos e vamos ver mais adiante, examinando a aplicação do Tratado de Não-Proliferação (TNP), vamos verificar que o tratado é um malogro, porque não impediu proliferação, seja ela horizontal, seja ela vertical. Os países nucleares, as potências nucleares aperfeiçoam os seus artefatos nucleares e os seus vetores de lançamento e enquanto outros países nuclearmente armados, se apresentam: Índia, Paquistão, Israel e talvez alguns que nós ainda não possamos identificar.

Algumas estatísticas para completar este nosso quadro: temos 34 países mais

distantes das metas do Milênio. Vocês se lembram que as metas do milênio foram estabelecidas no ano de 2000 em uma reunião de Chefes de Estado e Chefes de Governo. Eram metas de desenvolvimento, mas desenvolvimento considerado em todos os seus componentes, e metas específicas, e agora, no mês que vem, os Chefes de Estado e de Governo vão examinar como foram ou não cumpridas estas metas. E aí se acrescenta à agenda dos Chefes de Estado e de Governo esse relatório do qual falei e que vamos depois examinar.

Temos 34 países que estão distantes das metas e 22 destes países estão em

situação de conflito armado ou emergem de recentes conflitos armados. Temos 842 milhões de pessoas subnutridas no mundo e mais de 1 bilhão que vivem abaixo da linha de pobreza, com 1 dólar diário. Cerca de 30 milhões de pessoas na África sofrem da SIDA, que aqui no Brasil, não sei por que se chama AIDS. É a praga do mundo moderno. No mundo medieval havia pragas, e temos a nossa praga. Mais de 40 países, neste momento, enfrentam conflitos de interesses violentos, internos e há mais de 12 milhões de refugiados no mundo. Imaginem a carga que isto significa para a comunidade internacional.

Page 7: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

151

Todos sabemos que a riqueza mundial, em vez de ser melhor distribuída, aumenta a desigualdade na sua distribuição. A tecnologia moderna criou novos desejos, novos interesses, novas frustrações. Nós vivemos em uma época de tempos históricos distintos. Há países que estão na vanguarda do século XXI, há outros que estão saindo do século XX e há muitos que ainda estão na época medieval, pelas suas relações sociais, pelas suas condições individuais. Portanto, há um descompasso de tempo na comunidade internacional, que temos também que levar em conta.

Kofi Annan disse uma vez que o mundo vive uma encruzilhada. O problema

não é viver uma encruzilhada. Sempre estamos em uma encruzilhada, sempre temos que decidir alguma coisa. A questão é decidir bem. É saber qual o caminho a seguir nesta encruzilhada. E por que agora se convocou este grupo de 16, e por que agora, no mês de setembro, os Chefes de Estados e de Governo dos Estados membros vão se reunir para decisões cruciais? Talvez seja a derradeira oportunidade de recuperar o sistema multilateral. Por que isso? Algumas razões: o debilitamento do papel político das Nações Unidas em matéria de paz e segurança; o uso unilateral da força contra o direito internacional e contra a Carta das Nações Unidas; toda a violência que vivemos e, menor razão mas importante, o Secretário Geral termina o seu mandato no ano que vem. Seria importante que ele levasse aos Estados membros o resultado da sua experiência, das suas reflexões no cargo, o resultado de todo o seu trabalho com idéias que pudessem trazer algum motivo de esperança, de expectativa positiva para o mundo em que vivemos.

O texto do nosso relatório, chamado Para um mundo mais seguro, nossa

responsabilidade comum, é inspirado exatamente no que diz o título. Somos todos responsáveis pela segurança do mundo. Somos todos responsáveis. Portanto, devemos agir em conseqüência da aceitação dessa responsabilidade. Não devemos entregar a um Estado ou a um grupo de Estados esta que é a nossa responsabilidade coletiva. É, portanto, um relatório inspirado na confiança no multilateralismo. Todo ele é dirigido à recuperação dos ideais antigos, pelo menos da ONU – 60 anos e antes, um ideal quase secular. Não há receitas, não há prescrições sobre como fazer. Nunca alcançaremos a paz perpétua de Kant. Mas alcançaremos aquela paz que permita a todos os Estados, a todas as populações um mínimo de segurança, de progresso, de proteção, e aos indivíduos a promoção dos seus direitos e a defesa de todos e de cada um.

Vejo nesse percurso que as Nações Unidas, a despeito de tudo do que a

acusam – de omissões, de falhas – ainda são a melhor resposta aos problemas que vivemos. Ainda são a melhor resposta às ameaças e aos desafios que se apresentam no presente e também podem se projetar para o futuro. Não há como enfrentar esses problemas a não ser com uma visão em conjunto e numa ação coletiva.

A minha idéia, como temos 2 tempos, é hoje discutir um pouco as ameaças,

os desafios, e amanhã entrar no debate sobre as reformas. Em geral este nosso grupo foi chamado de “Grupo da Reforma da ONU”, “Grupo da Reforma do

Page 8: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

152

Conselho de Segurança”, e foi muito mais do que isso. Esses pontos de reforma institucional são pontos decorrentes das conclusões a que chegamos quanto às ameaças e aos desafios.

Identificamos algumas categorias de desafios, sem nenhuma hierarquia entre

elas. As ameaças de caráter econômico e social: pobreza, doenças infecciosas, degradação ambiental. Aqui vem uma primeira novidade, que é reconhecer em um documento desta importância a pobreza como uma ameaça à segurança e à paz internacional. Depois, os conflitos entre Estados. Se não temos uma expressão maior de beligerância entre Estados, detemos a potencialidade de ocorrerem estes conflitos entre Estados devido a situações como a da Cashemira, o Oriente Médio, como os temores que se possam levantar ou sentir ou identificar quanto às ameaças que possam apresentar a Coréia do Norte, por exemplo. Há uma potencialidade de conflitos bélicos.

Outra categoria que identificamos é a dos conflitos intra-Estados, que

acontecem dentro do território de cada Estado: guerra civil, genocídio, atrocidades, violência contra a população civil. E esse sim talvez seja a maior expressão da dificuldade, da ameaça que nós temos que enfrentar neste momento.

Depois identificamos também as armas de destruição em massa – nucleares,

químicas, biológicas – como uma ameaça à paz e à segurança internacional. Vamos ver como tratar esta ameaça: documentos, acordos, convenções, há uma disciplina jurídica, mas há também uma indisciplina de fato. O terrorismo e finalmente o crime organizado internacional.

Ressaltamos um traço também novo que é a interdependência de todas estas

categorias. Não achamos que se possa enfrentar cada uma delas isoladamente, porque todas estão interligadas. A pobreza tem a ver com o crime organizado, e o crime organizado com o terrorismo. O terrorismo pode obter armas de destruição em massa, portanto, tudo está interligado e requer, assim, uma resposta que leve essa circunstância em consideração.

Talvez vimos que nenhuma sociedade está imune a essas ameaças. Ninguém

está em uma redoma de cristal, em uma torre tão elevada que se encontre imune a essas ameaças já identificadas. Sabemos também e deixamos registro, que a compreensão de segurança diverge conforme a geografia, conforme o poder, a situação econômica. Para a África, que está sofrendo uma tragédia com a enfermidade da SIDA que está destruindo os países, não tem sentido chegar com soluções para a destruição das armas nucleares, não é esse o problema da África. Não é esse o problema, por exemplo, da América Latina. Nós temos outros tipos de problema: temos o problema do crime organizado, o problema da violência urbana, temos o problema também da degradação ambiental. Nos outros países, por exemplo, os mais poderosos, que foram alvos de atos terroristas, o terrorismo passa a ser a ameaça a se combater prioritariamente. No inicio do nosso trabalho, que levou 1 ano – nós produzimos este relatório com 101 recomendações ao Secretário Geral – havia o pensamento de que o que nós iríamos fazer seria considerar o terrorismo e medidas para combater o terrorismo. Ora, isso era uma

Page 9: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

153

visão parcial do problema, que foi abandonada. Em outros países, nos nossos da América Latina sobretudo, a pobreza é uma ameaça. Não são ameaças os pobres. A pobreza é que é uma ameaça, uma ameaça à segurança interna, e o fato inédito no nosso relatório é aceitar a pobreza como ameaça à segurança internacional. E me pergunto como se passou tanto tempo para se reconhecer este fato.

Outro aspecto importante do relatório é o seu humanismo. A pessoa é o

cuidado central do nosso relatório. O relatório aceita o conceito de segurança humana. Os povos são considerados os alvos da proteção e aí o relatório aceita o conceito da “responsabilidade de proteger”. O relatório ressalta os Estados soberanos como atores principais, as soberanias são harmonizadas nas ações coletivas. O relatório confirma que só se pode atuar no sistema internacional mantendo o conceito de soberania. E a esse respeito, me parece, pela experiência vivida, que é interessante ouvir vários comentaristas políticos falarem do colapso da soberania. Não há mais soberania, mas eles falam, eu tenho essa visão, eles falam no colapso na diluição da soberania dos outros, nunca da própria soberania, do seu próprio Estado. Nós vivemos, não sei por quanto tempo mais, com todas as restrições que se possam levantar, com todos os comentários, nós vivemos ainda em um mundo que se compõe de Estados soberanos, e só estes podem aceitar, admitir responsabilidades internacionais. A responsabilidade vai com a soberania.

Este conceito de “responsabilidade de proteger”, que nós incluímos no

relatório, não é a mesma coisa do direito ou dever de ingerência, de que já ouvimos falar, sobretudo estimulados por universidades e por governos europeus. Haveria um dever de unilateralmente intervir em um Estado em condições de falência. O conceito de responsabilidade de proteger é diferente. O exercício soberano de um Estado deve ter como objetivo principal o seu próprio povo. O Estado deve exercer o seu poder para proteger, para melhorar, para aprimorar as condições do seu próprio povo. Do momento em que, por qualquer razão, sobretudo o colapso do Estado, quando o Estado não tem mais condições de exercer a sua soberania interna, a comunidade internacional é chamada, de acordo com este conceito, a agir, mas é a comunidade internacional, não é um país. Este é também um aspecto importante do nosso relatório.

Outros pontos que poderíamos levantar para o nosso debate tem a ver com a

degradação ambiental como ameaça à paz e à segurança internacional. Neste ponto, o nosso relatório ressaltou a importância do Protocolo de Kioto, insistindo em que as promessas feitas sejam cumpridas e também propusemos que os Estados se dediquem a buscar outras fontes renováveis de energia. O que também ressaltamos, e aqui voltando aos conflitos intra-Estados, é a necessidade de que o Conselho de Segurança utilize o Tribunal Penal Internacional para os casos de crimes de guerra e crimes contra a humanidade, conforme lhe faculta o texto do Estatuto de Roma.

Uma reflexão: o Conselho de Segurança tem excedido de suas atribuições, as

atribuições que lhe foram dadas pela Carta, e, baseado talvez no artigo 21 que permite a criação de órgãos subsidiários, vai avançando nesse terreno de criação de órgãos, e cria tribunais, como já vimos tribunais ad hoc. O artigo não é

Page 10: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

154

destinado, pelo menos na minha interpretação, a esse tipo de criação de órgãos. Citei o número equivocado do artigo, é o artigo 29 da Carta, que diz: “O Conselho de Segurança poderá estabelecer órgãos subsidiários que julgar necessários para o desempenho de suas funções.” Ora, um pouco forçado interpretar que o tribunal ad hoc da ex-Yugoslávia é um tribunal que auxilia o Conselho de Segurança a exercer as suas atribuições. Há o Tribunal Penal Internacional, e este é resultado de debates entre os Estados. Deve ser utilizado.

Quanto às armas de destruição em massa, o TNP (Tratado de não-

proliferação de armas nucleares) não impediu o desenvolvimento de armas sofisticadas pelas potências nucleares, não impediu que houvesse uma expansão horizontal. As potências nucleares não cumpriram as suas obrigações dentro do TNP. A meu ver, o TNP é um tratado pelo menos discutível quanto ao seu resultado. A sua origem, a meu juízo, é viciada, não foi um tratado negociado por todos, mas imposto, foi um tratado negociado pelas 5 potências nucleares, mas imposto aos demais.

Há neste capítulo do nosso relatório um ponto que eu queria trazer ao

conhecimento, para informação de todos, é o seguinte: a Agência Internacional de Energia Atômica, todos nós conhecemos, tem as suas atribuições em matéria de controle de verificação e de cumprimento de salvaguardas para o uso pacífico da energia atômica. O nosso relatório pediu que os Estados iniciassem e concluíssem com a brevidade necessária as negociações de um ajuste, um acordo, que habilite a Agência Internacional de Energia Atômica a atuar como fiadora do suprimento de material físsil a usuários civis. Quem supriria esse material físsil? Aquelas empresas por ela – a Agência – autorizadas e a preço de mercado. Vamos guardar esta idéia: o relatório propõe que os países negociem um acordo pelo qual a Agência Internacional de Energia Atômica vai atuar como fiadora de contratos comerciais para que estes países obtenham material físsil de empresas, 4 ou 5 que o produzem no mundo.

Outra sugestão, que é complementar a esta, que os Estados voluntariamente

instituam uma moratória de duração limitada – falava-se em 10 ou 15 anos. E essa moratória significava que eles, durante este período, não construiriam instalações de enriquecimento ou reprocessamento e tão pouco continuariam a utilizar a que já tivessem. Portanto, estes países estariam bloqueados no desenvolvimento da sua tecnologia nuclear, estariam bloqueados na obtenção de material físsil para as suas usinas. Todos falamos de uma atividade de fins pacíficos. Um país pode ter minério, pode ter alcançado por si próprio tecnologia nuclear, pode ter construído por recursos próprios instalações para processamento ou reprocessamento de material físsil. Mas o relatório dizia “parem aí por 10 anos, por 15 anos”. Ora, não há nada provisório, sabemos que o provisório tende a se tornar permanente. É uma situação para cortar a possibilidade de esses países se desenvolverem nuclearmente. Eu me afastei do consenso, discordei dessas 2 propostas. E para não prejudicar o conjunto do relatório, enviei cartas ao Secretário Geral, Kofi Annan, e ao Diretor Geral da Agência de Energia Atômica, El Baradei, com as minhas razões. E quais eram as minhas razões: primeiramente, não acredito que se possa realizar o que se encomenda à Agência. A Agência não pode ser fiadora de

Page 11: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

155

um contrato entre um Estado e uma empresa privada. A moratória, como insinuei há pouco, afeta os direitos dos países ao uso pacífico da energia nuclear. E mais: eu identificava uma proteção nessas duas sugestões a 4 ou 5 empresas, uma delas, a mais famosa e a mais importante, a da Europa, supridoras de material físsil, todas elas, claro, de países industrializados. Considerei que não era aceitável a alegação de exigência de segurança quando acompanhadas de conveniências empresariais. Não sei o que vai acontecer mais adiante. Quanto às armas químicas, o relatório diz que esta é a oportunidade de eliminá-las completamente. Até agora, das 70 mil toneladas de agentes declarados, somente foram destruídos 3 mil. Isto é uma ameaça à segurança internacional.

Chegamos aqui – quero deixar um tempo para o nosso diálogo – chegamos ao

terrorismo. O grupo insistiu muito na neutralização das causas estruturais do terrorismo, o seu componente econômico e social, a pobreza, o desemprego, a humilhação, o desespero. O seu componente político: a ocupação estrangeira, a intolerância, a debilidade dos Estados em colapso. Existem nas Nações Unidas 12 convenções internacional contra o terrorismo. E também existem ajustes, recomendações subsidiárias quanto ao financiamento desta atividade. O nosso relatório insta os Estados membros a assinarem e ratificarem estas convenções, mas também pede que haja negociação de uma convenção geral contra o terrorismo, idéia que já está latente há muito tempo nas Nações Unidas. O nosso relatório não é omisso quanto ao terrorismo de Estado. Reconhecemos que existe o terrorismo de Estado, achamos que este fenômeno, esta realidade está contemplada nas convenções de Genebra e nos seus protocolos. Não omitimos, o que é importante. Considero, por exemplo, e agora estamos na época em que há 60 anos atrás foram vistas estas tragédias, que a bomba atômica sobre Hiroshima e Nagasaki foi um ato de terrorismo de Estado. Também creio que as bombas V1 e V2, disparadas contra Londres, também foram um ato de terrorismo de Estado. Não foram atos de guerra. Foi a destruição de civis, foi o objetivo de atemorizar pelo horror populações civis. Também podemos por na mesma chave o bombardeio de Dresden. Eu não acho que os fins justifiquem os meios. Tem que haver compatibilidade entre meios e fins. Acumulam-se nas Nações Unidas definições e tentativas de definições do terrorismo. O nosso grupo chegou a uma definição e ofereceu aos Estados membros esta definição para a sua consideração. Nós definimos assim: “qualquer ação além daquelas especificadas nas convenções antiterrorismo existentes, nas convenções de Genebra e na resolução 1566/2004 do Conselho de Segurança, cujo propósito seja causar a morte ou danos físicos sérios a civis e não combatentes, quando o objetivo de tal ação, por sua natureza ou contexto, seja intimidar a população ou compelir um governo ou um organismo internacional a atuar ou abster-se de atuar de determinada maneira.”

Achamos que esta era uma proposta abrangente, não é a única, pode haver

outras, mas esta, no nosso entender, recolheu todos os elementos conhecidos para uma definição. Achamos também que não há, como já disse, o combate isolado ao terrorismo. E uma outra vertente nesta matéria e também na questão do crime organizado internacional é a lavagem de dinheiro. Propusemos a negociação de uma convenção contra esta prática de lavagem de dinheiro que limite o uso indiscriminado do sigilo bancário e a expansão dos paraísos fiscais. Duvido muito

Page 12: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

156

que esta sugestão seja aceita, mas, está lá. Esta é a de mais difícil aceitação, e muito mais fácil aceitar as nossas sugestões em matéria nuclear do que em matéria de lavagem de dinheiro.

O problema que está em todas as agendas é o do uso da força e com este tema

concluo, para depois entrarmos no nosso diálogo. O uso da força: a Carta das Nações Unidas disciplina o uso da força no seu artigo 51 e no capítulo VII. São 2 únicas exceções ao artigo 2o §4 da Carta: só se pode usar a força em legítima defesa, de acordo com o artigo 51 da Carta, mesmo assim comunicando o fato ao Conselho de Segurança, e no capitulo VII, de acordo com uma decisão do Conselho de Segurança.

Rejeitamos a decisão discricionária no uso da força, mesmo pelo Conselho de

Segurança, e recomendamos alguns critérios básicos que o Conselho de Segurança deveria levar em consideração ao autorizar o uso da força.

Primeiro, a gravidade da ameaça: ela é suficientemente clara, séria? O

propósito correto? Este propósito é prioritariamente o de prevenir ou impedir a ameaça?

Segundo: a condição de última instância. Esperamos que todas as medidas

não militares se esgotem antes de apelar para a força. A proporcionalidade dos meios, a escala, a intensidade e a duração da ação militar devem respeitar um mínimo necessário. E a avaliação das conseqüências. O uso da força traria conseqüências piores do que a inação do Conselho de Segurança?

Achamos muito importante porque disciplina o uso da força. O Conselho de

Segurança apela reiteradamente para a aplicação do capitulo VII da Carta. Esta não é uma orientação, uma medida que reforce a própria Carta, ao contrário, acho que debilita, fragiliza o uso da força como previsto na Carta. Nossa proposta, portanto, é retomar a Carta com um conceito que nunca houve, nunca se estabeleceram conceitos para que o Conselho de Segurança autorize o uso da força.

Quanto ao artigo 51, não achamos que devesse ser modificado. Mas claro que

as coisas mudaram desde 1945. Há situações em que a iminência da execução da ameaça é tão grande que justifica uma medida de defesa. Não achamos que a mera suposição da existência de ameaça possa justificar uma ação preventiva. Há uma interpretação estrita do artigo 51 em que é necessária a agressão. Até agora não temos uma definição de agressão nas Nações Unidas. Temos em outras áreas, na área jurídica temos uma definição, nas Nações Unidas, não temos. Há ameaças claras no mundo contemporâneo. Devemos ponderar muito. Esta é uma situação muito delicada, distingue o que é resposta a uma ameaça que se concretiza do que é prevenção daquilo que supomos venha a ser uma ameaça. Isso fica muito claro em algumas situações recentes. Amanhã veremos as reformas, as mudanças, e também um pouco do relatório do Secretário Geral. Estou à disposição de todos para as perguntas e comentários.

Page 13: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

157

II2 Ayer vimos un conjunto de amenazas sobre el sistema internacional, sobre la

comunidad internacional. Y esas amenazas provocan desafíos para los Estados miembros de las Naciones Unidas que deben ser llevados en consideración. El desafío mayor es la reafirmación del multilateralismo como única solución eficaz para enfrentar, para combatir, para obstruir esas amenazas. No hay otra forma de defensa de la comunidad internacional que no sea la acción colectiva. Por esta razón ya he mencionado el informe del Grupo de los 16, el grupo convocado por el Secretario General. Un mundo más seguro, nuestra responsabilidad común, este es el objetivo y el punto de partida al mismo tiempo de todos los desafíos con que tenemos que convivir en estos tiempos y, naturalmente, en el futuro más cercano. Este desafío central, por lo tanto, es la afirmación del multilateralismo.

¿Cuales son los obstáculos a la afirmación del multilateralismo? El primero

obstáculo es evidente: estamos en una coyuntura internacional donde hay una hiperpotencia. Estamos, como ya mencionado ayer, en un sistema unipolar. Hay algunas opiniones divergentes que no aceptan esta simplificación y piensan que hay polaridades difusas, pero la realidad de todos los días nos indica que hay una superpotencia, que puede ser calificada en materia de comercio, en materia talvez de ciencia y tecnología, pero no es una potencia que encuentre rival en materia militar y en materia económica. Este es el dato fundamental. Si aceptamos esta realidad y nada hacemos para modificarla, seguimos viviendo, pero en condiciones cada vez más difíciles, por la simple razón que no tendremos ninguna fuerza de decisión en el proceso internacional. Eso ya demostró que no sirve como solución, porque todas las veces recientes donde la fuerza unilateral ha sido impuesta, los resultados, como todos nosotros conocemos, son malos para la comunidad internacional.

Hay la necesidad -y ese es el otro desafío- de contener el poder en el sistema

internacional. ¿Pero como se hace para contener el poder? Por la reafirmación del derecho internacional como forma de organizar las relaciones entre los Estados, el respeto al derecho internacional, su reafirmación, su consolidación es el otro desafío que tenemos delante de nosotros. Estas dos circunstancias apuntan para la reafirmación de las soluciones multilaterales. Las soluciones unilaterales que sean de un país o de un grupo de países, ya vimos en Irak, en la ex-Yugoslavia, vimos que un país o un grupo de países tomando decisiones unilaterales no contribuye para la paz y la seguridad internacional.

Esta es mi visión cada vez más nítida, más clara, más precisa: la solución es

llamar a la comunidad internacional, obtener una decisión de la comunidad internacional, la participación de la comunidad internacional, de los Estados de la comunidad internacional, representada en las Naciones Unidas. Todos los Estados tomando decisiones, porque sienten, creen que la responsabilidad es conjunta. Y las acciones que son consecuencia de las decisiones políticas tendrán más fácil

2 La primera parte de este trabajo se presenta en portugués, mientras que la segunda parte se encuentra en español.

Page 14: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

158

aceptación y mayor efectividad. ¿Y cómo hacerlo? Llegamos al capítulo de las mudanzas institucionales en las

Naciones Unidas. También está en el mandato recibido por este grupo que llevó un año para producir resultado y tuvo algunas situaciones difíciles para enfrentar, porque ha recibido la contribución de las sociedades nacionales. No solamente el grupo se reunió cada dos meses en reuniones formales, sino también recibió la contribución en cuarenta reuniones, en todas las regiones, de la sociedad civil, en seminarios, workshops, y otras reuniones convocadas por gobiernos o por organismos no gubernamentales. Aquí en Brasil, hemos tenido una reunión en febrero del año pasado, pero hubo reuniones en Europa, en China, India, en muchos países donde había interese mayor por el trabajo de la Organización y de la Comisión.

Por lo tanto, fue informado este resultado por una carga enorme de opiniones,

comentarios y discusiones. Por lo tanto, yo podría decir que es un resumen del sentimiento general en los países miembros de las Naciones Unidas. Pero el informe no fue destinado a los países miembros, el informe fue pedido y destinado al Secretario General. Fue distribuido a los países miembros y, como todos los documentos de Naciones Unidas, no era un documento pedido por la Asamblea General, era un documento pedido por el Secretario General. Yo digo eso porque, por su vez, el Secretario General envió a los países miembros su propio documento, donde están casi todas las 101 recomendaciones presentadas en nuestro documento.

Esta es la idea que ofrezco a nuestra reflexión, a nuestro debate: los desafíos

son la afirmación del multilateralismo y la afirmación del derecho internacional como límite a las acciones del poder.

Vamos a las mudanzas: se decía en el inicio de nuestro trabajo que era un

grupo destinado a reformar las Naciones Unidas, un grupo de combate al terrorismo. Ya he tenido la ocasión de explicar que hemos hecho mucho más que esto. Las reformas, las mudanzas propuestas son decurrentes, son consecuencia, de los 2 otros capítulos: el de las amenazas y el de los desafíos; no son reformas para reformar solamente. Las Naciones Unidas, desde su fundación, están involucradas en algún ejercicio de cambio, de mudanzas, de reformas. Porque las Naciones Unidas, desde el origen, han sentido algunas omisiones, algunas dificultades, así que, desde ese momento, se empezó a pensar en cambios, en reformas. Hay una comisión de reformas de las Naciones Unidas que tiene más de 20 años de trabajo. Pero llegó el momento en que no es más posible insistir en el debate, en la discusión. Es necesario hacer realidad los cambios. Esta es la derradera oportunidad que tienen las Naciones Unidas de reafirmarse, de revitalizarse, porque me parece que si no son aceptados los cambios propuestos, vamos a tener no la disolución de las Naciones Unidas, pero una organización ineficaz, irrelevante, talvez en el mismo camino de la Sociedad de Naciones. Esto sería catastrófico, trágico para la comunidad internacional. Nosotros tenemos en las Naciones Unidas una organización apta por su Carta, sus objetivos, su filosofía, a organizar el mundo, pero para eso es necesario aceptar el

Page 15: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

159

multilateralismo como solución, en primer lugar, y los cambios que sean necesarios para la efectiva acción de las Naciones Unidas. Estos cambios que hemos propuesto de acuerdo con el pedido del Secretario General.

Vamos rápidamente ver lo que ha sido propuesto para los principales órganos

de las Naciones Unidas. Empecemos por la Asamblea General que es el órgano de composición universal donde están representados casi todos los países del mundo – 191. Algunos pocos están fuera, no son miembros de las Naciones Unidas. Pero podemos decir que la Asamblea General es la expresión de la comunidad internacional como un todo. El primer desafío para la Asamblea General es que trabaje para alcanzar un consenso para un nuevo concepto de seguridad internacional. Este nuevo concepto, que vimos un poco ayer, tiene puntos importantes para dar respuestas a las amenazas, y este nuevo concepto de seguridad tiene que ver con la seguridad humana, tiene que ver con todos nosotros. No es que nuestra propuesta sea de transformar las Naciones Unidas en un órgano representativo de los ciudadanos del mundo. Las Naciones Unidas van a seguir como un órgano de Estados soberanos que se reunirán para considerar temas e decidir acciones. Pero no hay que se olvidar que la Carta de las Naciones Unidas dice: nosotros, los pueblos de las Naciones Unidas. La base, el fundamento de las Naciones Unidas son los pueblos de nuestros países y van a actuar por intermedio de sus gobiernos, no puede ser de otra manera, pero insisto en que los pueblos son la base, el fundamento, la meta y el objetivo de las Naciones Unidas. Esta filosofía de nuestro trabajo tiene mucho que ver con el humanismo, con la persona.

En la verdad, la Asamblea General, en los tiempos que curren, ha perdido un

poco su efectividad. Porque se transformó en una sociedad de debates y discusiones, con resoluciones repetitivas, con materias que llevan muchos años en su agenda y una de nuestras propuestas es justamente depurar la agenda de la Asamblea General, eliminando temas que no tienen más razón de ser, o porque llevaran tantos años sin decisión, o porque las decisiones no pueden ser aplicadas por ser totalmente irrealistas.

Este es el primer cambio en la Asamblea General, disminuir la carga temática

en su agenda y traer para este órgano temas que tienen que ver con problemas contemporáneos, los más importantes temas contemporáneos. El Consejo de Seguridad, como todos nosotros sabemos, tiene la responsabilidad prioritaria en temas de paz y seguridad. Pero la Asamblea General también tiene que ver con estos mismos temas, y ya ejerció su autoridad en la materia en los años 50, en una resolución llamada Unidos para la paz, motivada por la guerra de Corea, que ustedes se acuerdan.

Tenemos también en estos principales órganos de las Naciones Unidas el

ECOSOC-Consejo Económico y Social. Desde su origen, es uno de los más importantes consejos de la organización, donde se reunían los países para discutir los temas económicos y sociales, evidentemente. Su agenda tenía la importancia necesaria para que los Ministros de Hacienda o de otras áreas de los gobiernos fueran discutir sus propias economías en ese ambiente. Después se creó un círculo

Page 16: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

160

vicioso: los Ministros no iban porque los temas no estaban más a la altura de ellos, al nivel de decisiones ministeriales. Y los temas no estaban en esta condición porque los ministros no iban. Así el ECOSOC se diluyó, se tornó un poco irrelevante y solamente era de interés para los países porque en el ECOSOC se hacían las elecciones para otros órganos de Naciones Unidas. Nuestra propuesta en el ECOSOC es de retomar el consejo como el lugar donde se puede discutir estos temas, buscando que estén en el ECOSOC los representantes de las instituciones de Bretton Woods, que vengan al ECOSOC discutir estos temas con los países miembros también. Vamos a ver se hay receptividad en esa materia.

Otro tema muy importante donde nosotros hemos propuesto una solución para

cambiar la imagen de este órgano, que no fue totalmente aceptada por el Secretario General en su propio informe, es la Comisión de Derechos Humanos. La Comisión de Derechos Humanos viene deteriorando su trabajo, perdiendo autoridad, siendo el objeto de muchas críticas por parte de los países y especialistas, organismos no gubernamentales. Y pierde su autoridad cuando debía, al revés, reforzar su autoridad. Nuestra propuesta fue de transformar la Comisión de Derechos Humanos, que, en ese momento es compuesta por países elegidos, en una especie de Asamblea General, donde todos participen. La Comisión de Derechos Humanos tendría una composición universal. Es una propuesta polémica, tan polémica que no fue aceptada por el Secretario General. También otra propuesta nueva es que, saben todos ustedes, hay un alto comisario de Naciones Unidas para los derechos humanos. Nuestra propuesta es de que este alto comisario produzca a cada año un informe sobre la situación de los derechos humanos en todos los Estados miembros. La realidad actual es que se producen informes sobre determinados países. Nuestra propuesta es una obligación, una responsabilidad para el alto comisario que produzca informes sobre todos los países miembros. Esto también fue una propuesta polémica que no fue aceptada en el informe del Secretario General. El adoptó una idea suiza de transformar la comisión en un consejo. Entonces tendríamos, además del ECOSOC, el Consejo de Seguridad y el Consejo de Derechos Humanos. A mí me parece que nosotros estamos transformando una comisión en consejo, evidentemente de mayor jerarquía, pero hemos mantenido las mismas dificultades para elegir los miembros del Consejo que tenemos en estos días para elegir los miembros de la Comisión. Esto no va a modificarse. Claro que da mayor importancia, mayor visibilidad, la Comisión transformarse en Consejo. No creo que los países van a aceptar esta propuesta. Talvez nuestra propuesta podría recibir mayor apoyo de los países miembros.

Una novedad es la Comisión para la Construcción de la Paz. Todos

conocemos las operaciones de mantenimiento de la paz en las Naciones Unidas: el peacekeeping, después se transformó en peacemaking, y después en peace enforcement, pero hay un vacío en toda esta actividad y el vacío es qué hacer cuando ya se estableció la paz y cuando salen los cascos azules de los países. ¿Qué hacer? Habría necesidad de crear un órgano, una comisión, algo para llenar ese vacío, para no dejar el país volver a la situación de anarquía o de violencia. Y esta comisión de construcción de la paz tendría como objetivo apoyar los países en situación pos-conflictual, darles una asistencia, no solamente de organización,

Page 17: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

161

sino también una asistencia para la obtención de recursos financieros, y para esto la comisión estaría conectada con el Consejo de Seguridad y con el ECOSOC. Por el ECOSOC también iría a buscar algún tipo de respaldo de las instituciones de Bretton Woods.

También hicimos algunas propuestas para la secretaría. La secretaría, como

toda secretaría de organismos internacionales, tiene una tendencia a auto-preservarse y ampliar su poder en número de integrantes y espacios administrativos. Nosotros hemos preferido que la secretaría tuviera mejores condiciones para actuar en ese nuevo mundo, en esas nuevas coyunturas internacionales, siendo que entre los miembros de la secretaría hay personas de la mayor calidad, se perfeccionaran en actividades de prevención de conflictos, por ejemplo, actividades de mediación de conflictos, en actividades para la construcción de la paz y que el Secretario General tuviera un grupo específico para actuar en esas circunstancias. Esto fue aceptado, está en la propuesta del Secretario General.

Aún hay algunos cambios que son importantes también. Ustedes saben que la

Carta habla de “estados enemigos”, que son todos los estados que han combatido las Naciones Unidas durante la II Guerra Mundial. Estos estados son todos miembros de las Naciones Unidas, incluso miembros elegidos del Consejo de Seguridad. Dos de ellos están entre los tres mayores contribuyentes de Naciones Unidas: Alemania y Japón. Era una incongruencia grave que la Carta mantuviera estas restricciones en relación a estos países. Por lo tanto, nosotros propusimos esto, que va a ser aprobado por unanimidad, evidentemente.

Otra enmienda secundaria importante es el capítulo XIII de la Carta, que

habla del Consejo de Tutela. El Consejo de Tutela ya no tiene más objetivo, porque ya cumplió su tarea. Ya no hay más estado bajo tutela en las Naciones Unidas, todo el proceso de descolonización fue un éxito de Naciones Unidas, entonces hay que eliminar de la Carta este capítulo.

Hay también algunas referencias a un órgano que jamás ha funcionado

plenamente, que es el Estado Mayor Militar, que asesoraba o debería asesorar el Consejo de Seguridad. Ya se verificó que eso no tendría razón de ser, sería también eliminado. ¿Por qué no se ha hecho eso que es de aceptación general antes? Porque había una dificultad general de tocar en la Carta de las Naciones Unidas. Se pensaba que tocar en la Carta sería acabar con las Naciones Unidas, porque entonces habría la posibilidad de propuestas de todas las naturalezas: políticas, económicas, que crearían posiblemente un caos. Pero en ese momento ya se admite que es necesario rever la Carta. Para realizar estas reformas que estamos pensando y proponiendo. Esto está disciplinado en la Carta, artículo 108, que dice que las enmiendas a la Carta necesitan del voto de dos tercios de los miembros de la Asamblea General, por lo tanto, dos tercios de 191. Hagan las cuentas y llegamos a 128 aproximadamente, si no estoy equivocado. Además de la aprobación de las enmiendas tienen que ser ratificadas por dos tercios de los miembros y por todos los miembros permanentes del Consejo de Seguridad. Aquí tenemos un punto que después vamos a analizar cuando hablamos del Consejo de

Page 18: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

162

Seguridad. En la Asamblea General no hay el instituto del veto, pero en el proceso de ratificación y de enmiendas a la Carta se necesita la ratificación de los 5 miembros permanentes. No es técnicamente correcto decirse que hay veto en ese proceso. Ese sistema de ratificación de la Carta está en las Naciones Unidas, desde su origen, desde San Francisco. La Carta fue ratificada de esta manera. La Carta es un tratado y las enmiendas a un tratado deben seguir los mismos caminos y condiciones del tratado original.

El año pasado hubo una enmienda a la Carta para ampliar los miembros del

Consejo de Seguridad no permanentes y los miembros del ECOSOC. En ese momento de la votación en la Asamblea General, dos de los países miembros permanentes votaron “no”, no apoyaron, no respaldaron. Pero fue adoptada la enmienda con los dos tercios exigidos y los dos países, ambos permanentes, que habían votado “no” aceptaron el resultado y ratificaron la enmienda contra la cual se habían pronunciado. Es para enseñar que no hay el ejercicio del veto en ese momento, pero si hay ese obstáculo que sería la ratificación por todos los miembros.

Llegamos al Consejo de Seguridad, el tema de nuestro trabajo, que más

emociona, que más despierta interés. Nosotros hicimos un trabajo para reformar el Consejo de Seguridad, pero una reforma en el Consejo de Seguridad es una consecuencia de todo lo que estudiamos, todo lo que examinamos y también una consecuencia de las modificaciones institucionales que hemos tratado de presentar. Vamos hacer unas consideraciones preliminares del origen del Consejo. El Consejo fue pensado por primera vez, la más remota referencia estaría en la Sociedad de las Naciones, después de la I Guerra Mundial, donde había un consejo permanente pero no con este tipo de responsabilidad. La Sociedad de las Naciones no ha condenado la guerra, se ha preocupado por la seguridad internacional pero no ha condenado la guerra como la Carta de las Naciones Unidas lo hace en su artigo inicial. En Ialta se reunieron algunos líderes, Churchill, Roosevelt y Stalin. Fue la primera idea de crearse un grupo de países victoriosos dentro de una nueva organización mundial, y este grupo tendría responsabilidades y privilegios especiales. Francia estuvo ausente de esta reunión de Ialta, pero después si, por la fuerza de la personalidad de De Gaulle, se unió a este grupo. Después también la China. ¿Cuál fue el criterio de creación del Consejo de Seguridad? El criterio era el de los países vencedores, pero no de todos ellos, hubo más de 5 países vencedores en la II Guerra Mundial, incluso Brasil luchó en Italia, sus soldados estaban allá, pero no era uno de los más poderosos, los victoriosos con mayor expresión de poder. Y el poder fue la razón que justificó este grupo restricto de países a los cuales se ha atribuido el privilegio del veto. El veto fue el precio pagado para la existencia de las Naciones Unidas.

Nosotros podríamos hacer un ejercicio académico y pensar si los 5 de San

Francisco serían los mismos 5 ahora, 60 años después. Tenemos ahora 5 países, los mismos de 1945, pero 3 de ellos son europeos. Hay una presencia mayoritaria de europeos en este grupo. Además, en 1945, en San Francisco estuvieron reunidos antes de la primera bomba atómica. La bomba atómica creó una realidad distinta, y no es coincidencia que los 5 actuales países miembros permanentes son

Page 19: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

163

potencias nucleares. No se puede decir que los 5 son los países de mayor expresión económica en el mundo, no lo son. Se puede decir que están fuera de este grupo dos países militarmente nucleares: India y Pakistán. Y un país que no se declara nuclear ante todas las evidencias que apuntan en ese sentido que es Israel. Por lo tanto, no es la arma nuclear una razón de tener una credencial de miembro permanente. Algunas coincidencias no son determinantes.

Es evidente que algunos países han alcanzado mayor expresión de poder en

este momento de que tenían en 1945, por ejemplo la China; y otros han perdido esta expresión de poder, por ejemplo, la Federación Rusa – después vamos a tratar de este asunto – Francia y el Reino Unido, no son los mismos de 1945. Hay una aceptación de esta situación por efecto del objetivo mayor de preservar las Naciones Unidas como el ámbito donde todos nosotros podemos discutir nuestras cuestiones y problemas. Vamos a ver que de hecho el Consejo de Seguridad ha actuado en acuerdo a los objetivos originales. Vamos a ver los documentos del Consejo de Seguridad. El Consejo estuvo inactivo ante crisis, por ejemplo la crisis de Berlín no fue al Consejo de Seguridad. El Consejo de Seguridad no ha resuelto con que haya tenido en su agenda la cuestión de los misiles soviéticos en Cuba, en el año 1962. No fue el Consejo que ha resuelto, el problema fue discutido en el Consejo de Seguridad pero fue resuelto en negociaciones bilaterales entre los Estados Unidos y Unión Soviética. Si vamos estudiar otras crisis internacionales, llegaremos a la conclusión de que la condición de miembro permanente del Consejo de Seguridad trae un poco de inmunidad a estos países. No hablo de impunidad, talvez debería serlo, pero de inmunidad. Por ejemplo, la crisis de Vietnam jamás fue tratada en el Consejo de Seguridad. La crisis de Argelia jamás llegó al Consejo de Seguridad. La crisis de los conflictos y amenazas a la paz internacional en Irlanda del Norte jamás llegó al Consejo de Seguridad. Tampoco llegó el problema de Chechenia, y tampoco la del Tibet. Todas estas amenazas a la paz y la seguridad internacional, donde participaran como principales protagonistas miembros permanentes del Consejo de Seguridad jamás llegaron a este Consejo.

Hay una situación también interesante para esa reflexión (traigo todas estas

realidades para nuestra reflexión). Crisis de Suez, como todos saben, provocada por la nacionalización del Canal decretada por el Presidente Nasser, causó una reacción evidentemente de mayor violencia por parte del Reino Unido y de Francia. ¿Qué pasó? Había una amenaza de veto a cualquier resolución, veto por parte de Francia y de los ingleses a cualquier resolución sobre el problema. Con creatividad se votó y se aprobó una resolución procesal donde se decía que este problema pasaba del Consejo por decisión del propio Consejo a la Asamblea General de las Naciones Unidas, y así se resolvió el problema.¿Por qué? Por causa de una decisión procesal. Eso es importante sobre todo para nosotros en Brasil: fue la primera vez que Brasil envió un contingente de soldados en una operación de Naciones Unidas en Suez.

Hay otros ejemplos de la actuación del Consejo que estrictamente tuvieron

naturaleza interna, problemas internos. No es novedad ahora que el Consejo trate de cuestiones que a rigor, estrictamente, serían asuntos internos de los Estados.

Page 20: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

164

Por ejemplo, después de la guerra, había la candidatura de España como miembro de las Naciones Unidas y en España seguía Franco como dictador. Fue un momento de gran polémica en Naciones Unidas y el Consejo de Seguridad tomó para su deliberación la llamada “cuestión española”. Era el Consejo de Seguridad actuando en una situación interna: qué hacer con España después de la guerra. Más recientemente, ustedes se acuerdan de todos los problemas y dificultades internacionales y la reacción de los países contra las prácticas racistas del apartheid en África del Sur. A rigor, como decían los propios sur-africanos del gobierno racista de entonces, aquél era un problema interno, de legislación interna. Pero el Consejo de Seguridad actuó y además del Consejo, la Asamblea General. Y ahí viene una reflexión que tiene que ver con lo que les he dicho, porque había pueblos en situación de persecución y violencia, y el Consejo de Seguridad actuó en esa situación.

Otras cosas también deberíamos considerar, como por ejemplo algunos

episodios que no han tenido la participación del Consejo de Seguridad. Participaron algunos grupos de países. Es un peligro, una amenaza que debemos neutralizar: transformar, por ejemplo, la OTAN – que es un pacto militar – en un brazo policial de algunos países. Es un riesgo tremendo. La OTAN era un pacto militar a la época de la guerra fría y había otro pacto militar como contrapartida, el Pacto de Varsovia. El Pacto de Varsovia se acabó, la OTAN se quedó sin enemigo pero los países miembros de la OTAN han revisado su concepto estratégico, que era limitado al teatro europeo, pero ahora se amplía para todo el mundo. La OTAN, dentro de su nuevo concepto estratégico, puede actuar en cualquier país del mundo, de acuerdo con sus Estados miembros. A mí me parece que esto es una disminución de la autoridad de las Naciones Unidas, por eso que hablo de la dificultad que tenemos cuanto al unilateralismo. Unilateralismo no es una expresión solamente de un país, puede también ser una expresión de un grupo reducido de países.

El Consejo de Seguridad, por su propia iniciativa, está en ese momento

expandiendo sus atribuciones, de acuerdo con la Carta. Ejemplo, el Consejo de Seguridad creó 2 tribunales ad hoc – Yugoslavia, por ejemplo, Ruanda – pero no está en sus atribuciones crear tribunales, y ya ha un tribunal internacional creado por un tratado negociado universalmente. ¿Por qué? El Consejo interpretó de forma extensiva el artículo que le da atribuciones de crear órganos subsidiarios. Un tribunal no me parece ser un órgano subsidiario del Consejo de Seguridad.

Nosotros vamos a ver, entre las razones para cambiar el Consejo de

Seguridad, la proporción de los miembros de las Naciones Unidas y de los miembros del Consejo de Seguridad. Tengo aquí algunas anotaciones: en 1945, teníamos 50 Estados miembros y los miembros del Consejo de Seguridad representaban 21% de la membresía. En el año 2005, tenemos 191 países miembros y 15 del Consejo de Seguridad, lo que representa cerca de 8% de los países. Hay un evidente descompaso entre el número de países miembros y el número de países en el Consejo de Seguridad. De un lado, la actuación cada vez más enfática del Consejo de Seguridad en todos los temas, y todo pasa a ser una amenaza a la paz y seguridad internacional, menos aquellas situaciones que tienen

Page 21: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

NAÇÕES UNIDAS…; NACIONES UNIDAS…

165

que ver directamente con los 5 miembros permanentes. Llevamos eso en consideración, si hay un aumento de responsabilidades del Consejo de Seguridad, es evidente que tiene que haber, correspondientemente, un aumento de representatividad y de su legitimidad. Nosotros no llegamos – siempre que digo “nosotros” me refiero a los miembros del grupo – a una sola propuesta, enviamos dos propuestas al Secretario General y él trasmitió a los países miembros estas mismas dos propuestas. Lo que tenemos entonces como reforma del Consejo tiene que ver con la membresía y con la composición, y tiene que ver también con los métodos de trabajo.

De los métodos de trabajo, la primera cosa es el veto. Llegamos a la

conclusión que no es políticamente realista eliminar el veto. Nosotros no hemos propuesto la eliminación del veto. Me acuerdo que un nacional de un país miembro permanente del Consejo declaró en una reunión que tocar en el veto es acabar con las Naciones Unidas. Es una expresión directa, sencilla y definitiva. Bueno, si no podemos acabar realísticamente con el veto, por lo menos propusimos que el veto sea limitado, restricto, sea una excepción a las decisiones del Consejo, y no haya la prodigalidad a su utilización como dice, por ejemplo, el capítulo VII de la Carta. El uso debería ser limitado. Y también hemos propuesto alguna cosa que pienso que no va a funcionar: una votación indicativa, que traiga consecuencias para todos. Hay un voto no formal, no vinculante, más si público. Tenemos esta propuesta y cada uno va a decir como votaría. Se puede mismo cambiar cuando llegue el voto formal, pero este voto indicativo tiene también una idea restrictiva, limitativa. Si no podemos acabar con el veto, por lo menos vamos a limitarlo. Hay propuestas de reconsiderar el instituto del veto dentro de 10 o 15 años.

¿Cuales son las propuestas en materia de composición? Tenemos 2 modelos:

modelo A crea 6 nuevos miembros permanentes, sin veto, y 3 nuevos miembros no permanentes, con mandato de 2 años; el modelo B no crea miembros permanentes, pero establece una nueva categoría de 8 miembros con mandato de 4 años renovables, sería una especie de semi-permanente, para simplificar, y uno de 2 años. Todos los 2 modelos aumentan la membresía del consejo para 24 miembros. Nuestro trabajo no menciona candidatos, no debe hacerlo porque es una responsabilidad de los países miembros. Ahora, por la noticia de los periódicos, vemos que está en plena discusión para obtención de respaldos para cada uno de los 2 cuadros, de 15 para 24, siendo que uno tiene como miembros permanentes más 6 y el otro no tiene miembros permanentes, pero crea los miembros con 4 años de mandato renovables, en número de 8.

Otro aspecto que tiene que ver con esta propuesta es que ustedes saben que

las elecciones de Naciones Unidas se proceden dentro de los grupos regionales. En nuestra región tenemos el GRULAC, el Grupo Latinoamericano y del Caribe, así como tenemos el grupo africano, el asiático, etc. Dentro de esta propuesta había una recomposición de los grupos, por la cual el GRULAC recibiría los Estados Unidos de América y Canadá y se transformaría en el grupo Américas, para efectos de las elecciones para el Consejo, en un primero momento, talvez, después eso podría ampliarse para todas las elecciones en Naciones Unidas.

Page 22: JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES - oas.org€¦ · 145 DESAFIOS, AMEAÇAS E MUDANÇAS NAS NAÇÕES UNIDAS DESAFÍOS, AMENAZAS Y CAMBIOS EN LAS NACIONES UNIDAS JOÃO CLEMENTE BAENA SOARES

J. C. BAENA SOARES

166

Enrique Iglesias, otro miembro latinoamericano del grupo, y yo nos hemos opuesto a esta transformación de nuestro grupo GRULAC en un grupo intitulado Américas. Ya está registrada la nuestra discordancia en el documento, pero yo personalmente fue muy enfático y mi colega norteamericano me preguntó ¿por qué estás tan vehemente en esta propuesta sencilla de cambiar el Grupo Latinoamericano y del Caribe? Le contesté por la simple razón que no quiero ni ustedes ni Canadá en nuestra casa, claro. Imaginen lo que significaría para todos nosotros latinoamericanos y caribeños que son miembros de un grupo ya consolidado, que no tiene nuestro grupo apenas funciones o responsabilidad de elegir candidatos, pero también la coordinación política, traer Canadá y Estados Unidos. Los Estados Unidos están por encima del bien y del mal, pero Canadá no, iba a disputar con nosotros los puestos electivos en Naciones Unidas. Esto realmente no fue decidido, está en nuestro documento con las objeciones de Enrique Iglesias y las mías.

Tenemos que terminar porque vamos a establecer un diálogo con ustedes de

mayor tiempo que ayer. Llegamos a las conclusiones de nuestro documento, que reiteran los objetivos que aquí he manifestado. El informe del Secretario General recoge algunas de nuestras propuestas, no todas, como hemos visto algunos ejemplos. Pero resalto la importancia del concepto de la seguridad humana dentro de la seguridad internacional y la paz internacional. También resaltamos en nuestro documento que una contribución que consideramos muy importante, no solamente por causa de los autores, sino porque objetivamente es importante y urgente – esto me gustaría señalar – hay una oportunidad que no va a repetirse ahora, y cuando digo ahora es en el mes de septiembre, en Nueva York, con la presencia de 191 jefes de Estado y de Gobierno.