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A HISTÓRIA DA ERVA-MATE EM MATO GROSSO DO SUL Desde o fim do século XIX a erva-mate foi assumindo papel importante como produto chave da economia do nosso antigo sul do estado de Mato Grosso, quando Tomás Laranjeira conseguiu um arrendamento de terras, criou a Companhia Mate Laranjeira e iniciou a exploração de imensos ervais nativos existentes na região onde surgiria a povoação de Ponta Porã. A produção de erva-mate semipreparada (cancheada) seguia para Argentina, seu principal mercado consumidor, onde possuía Tomás Laranjeira possuía escritório e beneficiadora para o produto. Ele utilizava milhares de trabalhadores (majoritariamente paraguaios), mantidos em condições de trabalho subumanas. É verdade que realizou grandes investimentos e adquiriu grande poder e prestígio, chegando a ser o maior contribuinte da Fazenda Estadual no início do século XX. Por este motivo tem a presença e atividades dessa grande empresa realçada, possuindo o domínio quase exclusivo sobre a produção e exportação da erva-mate na região. Mas, apesar de ser o primeiro concessionário legal, ele não era o único, no entanto, é certo que, graças a suas estreitas relações com o poder público, conseguia afastar os concorrentes, uma vez que não possuíam os outros produtores a ‘lei ao seu lado’.

JORNAL - A história da erva-mate em MS

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A HISTÓRIA DA ERVA-MATE EM MATO GROSSO DO SUL

Desde o fim do século XIX a erva-mate foi assumindo papel importante como

produto chave da economia do nosso antigo sul do estado de Mato Grosso,

quando Tomás Laranjeira conseguiu um arrendamento de terras, criou a

Companhia Mate Laranjeira e iniciou a exploração de imensos ervais nativos

existentes na região onde surgiria a povoação de Ponta Porã.

A produção de erva-mate semipreparada (cancheada) seguia para Argentina, seu

principal mercado consumidor, onde possuía Tomás Laranjeira possuía escritório

e beneficiadora para o produto.

Ele utilizava milhares de trabalhadores (majoritariamente paraguaios), mantidos

em condições de trabalho subumanas. É verdade que realizou grandes

investimentos e adquiriu grande poder e prestígio, chegando a ser o maior

contribuinte da Fazenda Estadual no início do século XX. Por este motivo tem a

presença e atividades dessa grande empresa realçada, possuindo o domínio

quase exclusivo sobre a produção e exportação da erva-mate na região.

Mas, apesar de ser o primeiro concessionário legal, ele não era o único, no

entanto, é certo que, graças a suas estreitas relações com o poder público,

conseguia afastar os concorrentes, uma vez que não possuíam os outros

produtores a ‘lei ao seu lado’.

Mesmo assim, nesse extremo sul de Mato Grosso, após a Guerra do

Paraguai (1864-1870), configurou-se um complexo universo econômico,

envolvendo muitos outros atores, incluindo atividades agropecuárias e comerciais,

além da extração ervateira. Inúmeros migrantes e imigrantes vieram para a região.

E, apesar dos conflitos que sua presença provocou com a Companhia, muitos

deles se dedicaram aos trabalhos ervateiros, não sendo desprezível o papel dos

produtores independentes.

No século XX, o domínio da Companhia foi diminuindo, especialmente a

partir da década de 1930, com as novas políticas desenvolvidas em Mato Grosso

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pelo governo do presidente Getúlio Vargas e os conflitos relacionados à

renovação ou não das concessões de terras à Companhia.

Foi quando surgiu o projeto da “Marcha para Oeste”, em 1938, no início do

Estado Novo, com as idéias de nacionalização das fronteiras sul-mato-

grossenses, especialmente com o Paraguai, adotando o Governo Federal medidas

afim de enfraquecer a Companhia. Dentre elas recusou-se a renovar seu contrato

de arrendamento, impôs taxas sobre a erva-mate cancheada e apoiou os

produtores ervateiros independentes da empresa, com a criação do Instituto

Nacional do Mate e de cooperativas de produtores.

Enfim, em 1943, o governo federal criou a Colônia Agrícola Nacional de

Dourados (CAND) em plena área antes arrendada a Companhia Mate Laranjeira,

onde surgiram as cidades da região de Dourados. O Governo afrontava

diretamente a empresa e as velhas oligarquias regionais a ela ligadas. A CAND

era um projeto de desenvolvimento do capitalismo no campo, para ocupar os

espaços geográficos que acreditavam ser semipovoados, com terras férteis em

abundância.

Uma vez criada a CAND, começaram a distribuição lotes gratuitos a

milhares de colonos, sobretudo nordestinos, além de mineiros, paulistas e tantos

outros brasileiros, com recursos mais acessíveis e significativos amparos aos

colonos no começo, com casa e ajudas da administração. No entanto, na década

de 1950 o número de colonos aumentou de forma descontrolada, a situação saiu

muito do controle, o que impediu um melhor atendimento das necessidades de

todos.

Com a CAND, as pessoas antes vinculadas à economia ervateira e a

Companhia Mate Laranjeira se viram tendo que buscar trabalho nos

empreendimentos de colonização. Alguns fixaram residência nas terras da CAND,

em Dourados, Campo Grande, Ponta Porã, indo morar em colônias particulares ou

mesmo se tornaram empregados de colonos que passaram a produzir erva-mate.

O mais importante é notar que essas pessoas tinham conhecimento adquirido da

vivência no mundo ervateiro e ficaram disponíveis como mão de obra.

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Finalmente, no ano de 1965, a Argentina com o aumento da produção

interna e sua auto-suficiência no abastecimento de erva-mate, suspendeu as

importações do Brasil, especialmente de Mato Grosso, o que para muitos autores

teria sido o fim das atividades ervateiras no estado, tendo em vista que seu

consumo interno era ínfimo. De importadora a Argentina passaria a exportar erva-

mate, como acontece ainda hoje, competindo inclusive com os estados produtores

do Brasil em mercados internacionais.

Sabemos que a atividade de produção ervateira persistiu na região entre

os colonos, ainda durante alguns anos, depois de 1965, e mesmo até os dias

atuais em condições diferentes. Sobre isso temos exemplos, como relatos de ex-

colonos e parentes destes, e ainda outras fontes. Em nossos dias temos visto

muitas fábricas de erva-mate em Dourados e região, que compram matéria prima

do Paraná e da Argentina, que empacotam e vendem o produto. É assim que

temos a erva-mate para o tereré ou para o chimarrão, este último mais comum

entre os descendentes sulinos.

José Antonio Fernandes – Professor de História e atualmente mestrando em

História pela UFGD, Universidade Federal da Grande Dourados;

[email protected]