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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
GISELLY FRANCO DE OLIVEIRA DE LIMA
JOSÉ DE ALENCAR: UM PROJETO DE ABOLIÇÃO PARA O BRASIL
CURITIBA 2009
2
GISELLY FRANCO DE OLIVEIRA DE LIMA
JOSÉ DE ALENCAR: UM PROJETO DE ABOLIÇÃO PARA O BRASIL
Monografia apresentada à disciplina de Estágio Supervisionado em Pesquisa Histórica como requisito parcial para a conclusão do curso de História, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná. Orientadora: Profª Drª. Joseli Maria Nunes Mendonça.
CURITIBA 2009
3
RESUMO
No início dos anos 1870, a abolição da escravidão foi objeto de debate no
Parlamento brasileiro, devido a inclusão, na pauta parlamentar, do projeto do qual resultou a Lei do Ventre Livre. Naquele período, José de Alencar ocupava uma cadeira de Deputado pela província do Ceará e foi radicalmente contra a aprovação do projeto. Argumentando contra o projeto, Alencar chamou a atenção para a questão econômica, indicando a necessidade de se manter a mão-de-obra cativa em uma economia essencialmente agrícola. Defendeu também a idéia de que a abolição não deveria ser feita por meio de leis, mas deveria resultar de uma modificação nos costumes da sociedade brasileira. Alencar manifestou suas opiniões por meio de vários discursos, proferidos entre os anos de 1870 e 1871 e que são as fontes para este estudo. Pouco tempo depois, uma outra questão importante para a organização do mercado de trabalho recebeu a atenção de Alencar: em 1877 ele manifestou sua posição em relação à colonização estrangeira, que ganhava força no período. Em concordância com seus argumentos quanto à escravidão, Alencar também defendia o principio da não intervenção do estado nas questões referentes à imigração, ou seja, para ele, apenas a imigração espontânea seria adequada para a nação. Após retomar brevemente alguns aspectos da vida pessoal, da produção literária e da inserção política de Alencar, esta monografia procura interpretar suas propostas para as redefinições que ocorriam no mercado de trabalho brasileiro do século XIX.
Palavras-chave: História do trabalho. Brasil - século XIX. Abolição da escravidão. José de Alencar.
4
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO...................................................................................05 2. UM DEDICADO “CATURRINHA”.....................................................08
2.1UMA PASSAGEM QUASE “ANÔNIMA”.............................................09 2.2ESTRÉIA COMO FOLHETINISTA:.....................................................11 2.3 AS PRIMEIRAS OBRAS....................................................................12 2.4 AS POLÊMICAS CARTAS DE ERASMO..........................................14 2.5 A IMPORTÂNCIA DE ALENCAR PARA A LITERATURA
BRASILEIRA.......................................................................................16 3. CORAÇÃO LITERATO, SANGUE POLÍTICO.....................................18 3.1. UMA FAMÍLIA DE LIBERAIS ATUANTES.........................................18 3.2 OS PRIMEIROS PASSOS NA POLÍTICA...........................................20 3.3 UM MINISTRO INSOLENTE...............................................................21 3.4 ELEITO, PORÉM NÃO EMPOSSADO................................................24 3.5 CONSERVADOR OU LIBERAL? MONARQUISTA OU REPUBLICANO?.......................................................................................24 4. O “ELEMENTO SERVIL” POR JOSÉ DE ALENCAR:........................27 4.1 UMA QUESTÃO PONTUAL: LIBERTAR OU NÃO O VENTRE ESCRAVO.................................................................................................47 4.1.1 Os trâmites da lei.......................................................................28 4.1.2: O conteúdo da Lei ....................................................................29 4.2 ALGUMAS DISCUSSÕES NO PARLAMENTO..................................31 4.2.1: As Participações de Alencar.....................................................31 4.3 SOBRE A LEI Nº.2040........................................................................32 4.4 ALENCAR, O PARTIDO CONSERVADOR E A QUESTÃO DO “ELEMENTO SERVIL”..............................................................................34 4.5. COMBATES COM UM IMPERADOR................................................36 4.6. O PRINCÍPIO DA NÃO-INTERVENÇÃO...........................................37 4.7. POR UMA REFORMA LENTA E GRADUAL.....................................40 4.8. SOBRE A IMIGRAÇAO ESTRANGEIRA...........................................42 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................44
REFERÊNCIAS.........................................................................................46
5
1. INTRODUÇÃO: Este estudo está inserido no conjunto da produção historiográfica sobre a
organização do mercado de trabalho e do processo que culminaria com a
libertação dos escravos no Brasil, em fins do século XIX. Nele, será abordada a
posição de José de Alencar frente às propostas das quais decorreram a
aprovação da Lei nº. 2040 de 1871, conhecida como Lei do Ventre Livre. Neste
sentido, o estudo está centrado na análise das posições e projetos de Alencar
expressas e encaminhadas no âmbito parlamentar e em um período bastante
definido: os anos de 1870 e 1871.
Para desenvolver esta pesquisa foram utilizados os pronunciamentos feitos
por José de Alencar na Câmara dos Deputados entre os anos de 1870 e 1871 e
que estão disponíveis em uma compilação publicada pela referida Câmara em
1977 por ocasião do centenário da morte deste político1.
José de Alencar viveu de 1829 a 1877. Ao longo de sua vida exerceu
importantes cargos públicos. Foi Deputado pela província do Ceará, eleito nas
eleições de 1861 e novamente em 1869, sendo reeleito em 1872; ocupou também
o cargo de Ministro da Justiça entre os anos de 1868 a 1870. Foi também o
candidato mais votado para a posição de senador nas eleições de 1870, cargo
que não exerceu por não ter sido nomeado pelo imperador.
Sua vida caracterizou-se pela produtividade, seja ela literária ou discursiva,
em que sempre deixou claras suas posições e opiniões, envolvendo-se, inclusive,
em muitas querelas, graças a sua forte personalidade.
Temos por objetivo, portanto, analisar os discursos proferidos por Alencar
nos anos de 1870 e 1871 especificamente aqueles que versam sobre a discussão
da Lei Rio Branco, assunto daquele momento na política brasileira. Nestes
discursos Alencar manifestava expressamente suas opiniões não apenas sobre a
lei, mas sobre a própria escravidão. Ressaltamos também que não serão
1 ALENCAR, José de. Discursos parlamentares de José de Alencar, 1829-1877. Brasília, Câmara dos Deputados, 1977. Disponível também nos Anais da Câmara dos Deputados, versão on-line: www2.camara.gov.br
6
abordados nesta pesquisa os trabalhos literários de nosso protagonista, ficando
assim restrita aos seus escritos e discursos políticos.
O “elemento servil” sempre foi uma questão crucial para a organização da
sociedade brasileira e permeava todos os seus aspectos desde o moral até o
econômico. Em uma economia essencialmente agrícola e erigida na força do
trabalho escravo qualquer decisão que atingisse ou ameaçasse as bases deste
sistema deveria ser, no mínimo, discutida à exaustão.
Robert Conrad no prefácio de sua obra considerou que “sem uma poderosa
oposição do exterior e o exemplo moral de outras nações, afetando as altas
esferas do governo brasileiro, o Brasil dificilmente teria agido para se privar de
suas fontes de escravos” 2.
E, em meados do século XIX a luta pela abolição ganhava novo fôlego com
uma adesão importante. A pessoa do Imperador passou a corroborar com a
causa emancipacionista, posição difícil, pois “desafiar a escravatura era um
terrível empreendimento, até mesmo para um Imperador, numa sociedade ainda
dominada por potentados rurais” 3.
Vários projetos de lei tratando da questão da mão-de-obra, não apenas
escrava, mas também livre, passaram a ser discutidos pela Câmara dos
Deputados, dentre elas a “Lei do Ventre Livre” promulgada em 1871, momento
em que concentramos nossos estudos e análises, e em que encontramos grande
parte dos discursos proferidos por Alencar sobre a escravidão. Além destes
pronunciamentos também nos utilizamos de um discurso seu sobre a mão-de-
obra imigrante, datado de 1877, pois nos pareceu relevante analisar suas
opiniões também sobre este assunto, tendo em vista a estreita relação deste
assunto com a questão da escravidão e da abolição.
Este estudo está dividido em três capítulos.
O primeiro apresenta uma breve biografia de José de Alencar. Priorizamos,
então, sua formação acadêmica em Direito, alguns aspectos de sua vida pessoal,
e principalmente seu trabalho como escritor, cuja importância para a literatura
brasileira se fez inquestionável e conferiu a Alencar um lugar na posteridade.
2 Conrad, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil:1850-1888; tradução de Fernando de Castro Ferro. Rio de Janeiro: Civilização brasileira; Brasília:INL,1975.Prefácio à edição brasileira, p.XV. 3 Ibidem .p.90
7
Procuramos, no decorrer deste capítulo relacionar a produção literária de Alencar
com outros escritos, especialmente os de natureza política, como os que
compuseram a série intitulada “Cartas Políticas de Erasmo”, uma coleção de
missivas destinadas ora ao povo, ora ao Imperador, cujo teor abrangia os mais
importantes assuntos do Império no momento, tais como a Guerra do Paraguai e
a chamada questão do “elemento servil”. 4
O segundo capítulo dedica-se ao aspecto político da vida de Alencar. Nele,
procuramos mostrar que o convívio familiar facilitara sua inserção na vida política.
A família Alencar, desde há muito, se encontrava engajada na política brasileira.
Sua avó, D. Bárbara, fora prisioneira nos tempos da Confederação do Equador,
seu pai, o Senador Alencar, esteve envolvido na organização do Clube Maiorista,
de onde partiram as idéias e ações que levariam à emancipação precoce de D.
Pedro II. 5Apesar de ter crescido rodeado por doutrinas liberais, Alencar optou por
aderir ao Partido Conservador, partido este que defenderia em muitas ocasiões e
com o qual considerava identificar-se intimamente. Segundo ele, a maturidade de
espírito e de idéias o fizera um conservador; liberais foram apenas os anseios de
sua juventude. 6
O terceiro capítulo deste trabalho dedica-se à análise dos discursos
proferidos por Alencar entre os anos de 1870 e 1871, quando foi deputado na
Assembléia Geral pela província do Ceará; além de um pronunciamento sobre
imigração européia datado de 1877. Na análise, ressaltamos as suas posições,
opiniões e expectativas frente à escravidão e seu posicionamento quanto à
questão da inserção de mão-de-obra imigrante.
Analisar seus objetivos e seus argumentos, portanto,é a tentativa de
compreender suas propostas de um projeto de abolição para a sociedade
brasileira.
4 Ver: MAGALHÃES JÚNIOR, Raimundo. José de Alencar e sua época. São Paulo: LISA -Livros Irradiantes, S/A, 1971. MENEZES, Raimundo de. José de Alencar: literato e político. 2ª edição. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e científicos, 1977. SILVA, Hebe Cristina. Imagens da escravidão: uma leitura dos escritos políticos e ficcionais de José de Alencar. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas. São Paulo: 2004. 5 ALENCAR, José de. Como e porque sou romancista. 2ª Edição. Campinas: Pontes, 2005.p. 25-26. 6 Apud, Magalhães Junior; p.266.
8
2. UM DEDICADO “CATURRINHA” 7.
“A impressão que se tem, ao encará-lo pela primeira vez, como seu tipo de homem pequeno e aparentemente zangado, de rosto escondido sob a espessa barba, é mais de temor que mesmo de satisfação, ou respeito. Zangado, orgulhoso, severo, misantropo quase.
8”
Escrever acerca da vida e obra de José de Alencar pode, em um primeiro
momento, parecer tarefa corriqueira e até mesmo simples. Contudo ao nos
debruçarmos sobre o numeroso material dedicado ao romancista percebemos
uma grande dificuldade; não tanto em relação à quantidade, mas quanto à
qualidade do material disponível. Muitos dos estudos biográficos não preservam o
“distanciamento” necessário entre o pesquisador e seu objeto, fornecendo um
resultado um quanto fantasioso e romanesco da pessoa de Alencar,
especialmente nos trabalhos que priorizam sua vida literária. Por isso, nas
páginas que se seguem procuramos, na medida do possível, abstermo-nos de
ênfases desnecessárias, apresentando alguns fatos que consideramos
importantes na trajetória deste personagem; que como veremos tinha grande
desejo de “passar à posteridade” 9.
Neste capítulo apresentaremos ao leitor nosso protagonista, conhecido por
seus romances, tais como Senhora, Lucíola e o Guarani, entre outros. Por meio
de uma breve biografia, mostraremos detalhes de sua curta, porém fecunda vida,
desde seu nascimento em 1829 no Ceará, passando por sua produção literária e
folhetinista entre outros aspectos até chegarmos à sua morte em 1877. Serão
excluídos aqui os aspectos e características de sua vida política que merecerão
um capítulo próprio.
Em 1826, na Província do Ceará, têm inicio entre o sacerdote, que havia sido
ordenado em 1823, José Martiniano de Alencar e sua prima em primeiro grau Ana
Josefina de Alencar, o “romance ilícito” (nas palavras do próprio Alencar-o pai- no
7 De acordo com os biógrafos, “Alencar 2º o caturrita”era assim chamado na escola por sua estatura baixa e seu semblante carregado, ver :MAGALHÃES JÚNIOR. Op. Cit.p.6. 8 MENEZES. Op. Cit.. p.10 9Ibidem.
9
ato de reconhecimento de seus filhos)10. Ana Josefina em 1829 dá à luz ao
primogênito, homônimo ao pai, José Martiniano de Alencar.
A família cresce e, contando já com mais dois filhos, em 1837 a família
Alencar inicia sua “caminhada” rumo à corte. Já instalados na antiga Rua do
Conde no Rio de Janeiro, José inicia seus estudos no Colégio de Instrução
Elementar, este era dirigido por Januário Mateus Ferreira, pessoa que exercerá
grande influência e merecerá grande respeito do já adulto Alencar11. Dedica-se
muito aos estudos, sempre galgando e mantendo o grau de “monitor da turma”,
lugar pelo qual mantinha muito zelo.
Graças a sua aptidão, Alencar passa a ter em seu lar a função de “ledor”, e
em sua autobiografia escreveu sobre esta função: “com a qual me desvanecia
como nunca me sucedeu depois no magistério ou no parlamento” 12. E lia,
segundo ele, com tal empenho que provocava comoção entre os ouvintes e até
em si mesmo. Em sua biografia Alencar, apesar de não afirmar, aponta para este
período de sua infância como um dos formadores de sua tendência para as letras,
especialmente para o estilo literário do Romantismo, balizador juntamente com a
faculdade de desvendar charadas, desenvolvida também na infância13.
2.1 UMA PASSAGEM QUASE “ANÔNIMA”.
Tendo findado os estudos no Rio, Alencar dirige-se a São Paulo em 1843
para completar o preparatório com a finalidade de ingressar na magistratura, o
que consegue três anos depois. Neste período já demonstra sua tendência para
as letras fundando, juntamente com alguns colegas, em seu primeiro ano como
acadêmico, uma revista semanal chamada Ensaios Literários14.
De acordo com Araripe Junior, citado por Raimundo de Menezes, a
passagem de Alencar pela academia é quase obscura, sempre tolhido e
reservado, prefere não participar das festas comuns na faculdade e na república
10MAGALHÃES JUNIOR, Op. Cit. p4. 11 ALENCAR, José. Como e porque sou romancista. 2ª Edição. Campinas: Pontes, 2005. p.21. 12
Ibidem, p. 23 13 MAGALHÃES JUNIOR, Op. Cit.p.26-33. 14
MENEZES. Op. Cit. p.54.
10
em que morava15. É neste período que trava maior contato com as obras dos
grandes autores internacionais, e esforça-se por compreendê-las apesar do
grande obstáculo da língua, lê Victor Hugo, Balzac, Alexandre Dumas entre
outros.
Em 1847, viaja em férias para Fortaleza. Segundo muitos biógrafos, é nesta
viagem que se inicia o “namoro” pelas coisas de sua terra que serão
características marcantes de sua obra.
Segundo Menezes:
Desenham-se-lhe a cada instante na tela das reminiscências as paisagens de seu pátrio Ceará. Devora as paginas dos alfarrábios de noticias coloniais, e busca com sofreguidão um tema para um romance, ou pelo menos um protagonista, uma cena, uma época16.
Passa então a cursar o terceiro ano do curso de Direito em Olinda,
conseguindo aprovação plena. Em 1848 regressa a São Paulo para matricular-se
no quarto ano; em 29 de outubro de 1849 forma-se em direito, retornando então à
Corte.
Com o diploma de bacharel é convidado a trabalhar no escritório de
advocacia de Dr. Caetano Alberto Soares onde trabalhará por quatro anos; este
período é lembrado por Alencar não tanto pelas horas de trabalho na burocracia,
mas por um fato que “seria cômico, se não fosse trágico”.
Já desde sua mocidade Alencar mantinha seus pequenos escritos literários,
tendo inclusive iniciado um “esboço regular de um romance”. Como passava
grande parte do dia em seus afazeres no escritório, havia trancado estes seus
manuscritos, seu “precioso tesouro”, em uma cômoda. Sem que soubesse alguém
os havia colocado na estante, e:
Daí, um desalmado hóspede, todas as noites quando queria pitar, arrancava uma folha que torcia a modo de pavio e acendia na vela. Apenas escaparam ao incendiário alguns capítulos em dois canhenhos, cuja letra miúda a custo se distingue no borrão de que a tinta, oxidando-se com o tempo, saturou o papel17.
15 Ibidem, p.50. 16 Ibidem, p. 56. 17 ALENCAR. Op. Cit. p.52.
11
Acabava assim a primícia da obra alencariana. Chamava-se Os
Contrabandistas e, segundo ele, conservava a vitalidade de seus 18 anos. Ao
escrever sua obra Como e porque sou romancista, a tinha por um dos melhores e
mais felizes de quantos haviam sugerido sua imaginação.
2.2 ESTRÉIA COMO FOLHETINISTA:
O Correio Mercantil em 1853 passa a ser comandado por Francisco
Otaviano, antigo colega de academia de Alencar, que devido às grandes
responsabilidades políticas estava em vias de abandonar seu rodapé dominical de
grande sucesso. Imediatamente lembra-se de Alencar para substituí-lo. Este
havia trabalhado por um breve período no Diário do Rio de Janeiro, e aceitou com
prazer e temor o cargo oferecido; em breve nasceria uma coluna de grande
sucesso: Ao Correr da Pena. Neste folhetim semanal, Alencar tratava de todos os
assuntos, desde representações líricas, ao tráfico de africanos, segundo
Magalhães Junior nestas crônicas é possível observar boa parte das influencias
literárias da formação de Alencar. 18
Neste período sofre uma grande decepção amorosa, cai de encantos por
Francisca Calmon Nogueira Vale da Gama, filha de viscondes. Conhecem-se nas
bodas de Otaviano e novamente encontram-se no salão do conselheiro Nabuco
de Araújo, eram os anos de 1855, José já contava com 26 anos. O moço não é
afeito a valsas e a moça escolhe outro para lhe fazer par, Alencar sente-se
ofendido e termina o namoro, logo Francisca parte para o exterior com a família e
Alencar fica decepcionado. Nas palavras de Menezes “mais tarde, nos heróis dos
seus romances Diva e Senhora ‘extravasará o ressentimento de moço pobre,
resultante desse amor fracassado’“. 19
Como seu folhetim versasse sobre todos os assuntos do país, Alencar
acabava por muitas vezes atraindo opiniões não muito afeitas aos seus
comentários, e não tolerava intromissões e censuras em seus textos. Esta
característica o faria demitir-se do Correio Mercantil.
18 MAGALHÃES JUNIOR, Op. Cit. p.31. 19 MENEZES. Op. Cit.. p. 74.
12
Em 1855, Alencar passa a discutir e a opor-se às concessões feitas para
exploração de terras e construção de estradas à companhias que compravam e
vendiam suas ações em especulação financeira. Sua crônica em meados de julho
trazia frases como “Enfim hoje não se pensa em casamento rico, nem em
sinecuras; assinam-se ações, vendem-se antes das prestações e ganha-se
dinheiro por ter tido o trabalho de escrever seu nome”20.
Logo a censura do jornal passa a cortar trechos de sua página,
apresentando no lugar apenas linhas pontilhadas. Alencar prefere então enviar
para que seja publicada no próprio jornal sua carta de despedida e demissão, que
sai também com cortes. A relação de Alencar com o amigo Francisco Otaviano
sofre um grande desgaste. Ele pede, inclusive, para que cessem as publicações
sob o título Ao Correr da Pena, pois entende que “como um filho” este lhe
pertence. Não demoraria muito para que fosse convidado a trabalhar em outro
jornal O Diário do Rio de Janeiro, desta vez não apenas como folhetinista, mas
como redator-chefe. Inicia-se então o período de maior produção literária de sua
vida21.
2.3 AS PRIMEIRAS OBRAS:
Depois de ter retornado brevemente à advocacia, dada sua saída do Correio,
logo é chamado para escrever para o Jornal do Comércio, porém não aceita o
convite e acaba escrevendo apenas dois folhetins, sem o título que tanto o
agradava. Em outubro de 1856 é convidado a assumir a gerência e a redação do
Diário do Rio de Janeiro. O desafio consiste em reerguer o jornal, que vinha
agonizando e agora havia sido vendido e buscava reconquistar seu espaço.
Toda a experiência como jornalista deixaria grandes impressões em Alencar,
que escreve:
É longa a história desta luta, que me absorveu cerca de três melhores anos de minha mocidade. Aí se acrisolaram as audácias que desgostos, insultos, nem ameaças conseguiram quebrar até agora; antes parece que as afiam com o tempo. 22
20 Apud, MENEZES. p.107. 21 MENEZES. Op. Cit. p. 109. 22 ALENCAR. Op. Cit. p.55
13
De fato como veremos em tempo, audácia era característica que não faltaria
a Alencar.
Em 1856 já em plena atividade no Diário nosso protagonista, sob
pseudônimo Ig, envolve-se em uma polêmica com o Imperador Pedro II,quando
criticou a obra A Confederação dos Tamoios que havia sido elogiada pelo
monarca que havia inclusive patrocinado sua publicação. O Imperador chega
mesmo a sair em defesa de Domingos José Gonçalves de Magalhães, autor da
obra. Com o pseudônimo Outro amigo do poeta, publica no Jornal do Comércio
quatro artigos intitulados Reflexões às cartas de Ig. Mais tarde Alencar publicaria
suas críticas em folheto e assumiria sua autoria.
Este período em que trabalhou no Diário é marcado pela publicação de seu
primeiro romance, Cinco Minutos, publicado segundo ele por um “mimo de festa”
aos assinantes da folha em “meia dúzia de folhetins que iam saindo dia por dia”23.
A esta obra logo se seguiu A Viuvinha e depois O Guarani, uma de suas obras
mais conhecidas e a primeira que apresenta claramente uma de suas
características mais marcantes: a valorização e exaltação do nacional, do
brasileiro. O Guarani é publicado diariamente em folhetim entre os meses de
janeiro e abril de 1857, Ceci e Peri passariam à posteridade como tanto queria
seu criador.
Neste mesmo ano Alencar lançou-se como autor de peças teatrais. Nesta
atividade Alencar conheceu o ápice: com peças de grande sucesso de crítica e
público, como “O Demônio Familiar”. Mas também o declínio com a peça “As asas
de um Anjo” que sequer pode ser encenada por ter sido considerada imoral.
Decepcionado, abandona em 20 de julho de 1858 o Diário retornando ao
escritório de advocacia em que trabalhava até ser convidado por José Tomás
Nabuco de Araújo para trabalhar como consultor no Ministério da Justiça;
assumindo também neste mesmo ano a cátedra de professor de direito mercantil
no Instituto Mercantil, onde permaneceria até 1860.
O ano de 1860 marca sua vida também por um grande dissabor: o pai o
“velho Senador Alencar” a quem o filho muito respeita, falece em março, sendo
inclusive sepultado com batina; segundo Menezes “como primogênito, José é
23 Ibidem. p.56
14
quem mais sofre. Devota ao pai acendrada admiração” 24.Logo partiria para seguir
os passos do pai na carreira política como veremos no segundo capítulo.
Como vimos deve ter sido inesquecível a dama que o abandonou aos vinte e
seis anos, pois só agora aos trinta e cinco anos apaixona-se. A escolhida é
Georgiana Augusta Cochrane, prima da namorada que o desprezara. Casam-se a
20 de junho de 1864. E, segundo Menezes em um casamento muito simples, de
acordo com a família Cochrane e com o temperamento arredio do noivo. 25
Desta união nascerão Augusto, mais tarde diplomata e Mário, que se tornará
escritor. Logo depois do casamento refugia-se em casa e publica As minas de
Prata, em 1865, outra grande obra: Iracema. Neste mesmo ano inicia-se um
importante capítulo de sua vida: começa a escrever e publicar as Cartas de
Erasmo.
2.4 AS POLÊMICAS CARTAS DE ERASMO:
Em 17 de novembro de 1865 aparece uma nova publicação, às quintas-
feiras e vendida nas principais livrarias do Rio de Janeiro: as Cartas ao
Imperador, assinadas apenas por Erasmo. São inicialmente dez cartas26 que,
tendo como conteúdo principal elogios e conselhos ao Imperador atraem grande
interesse do público que logo ficam sabendo quem é seu autor: José de Alencar.
O primeiro assunto abordado nas cartas é a guerra contra o Paraguai. Na
segunda carta o tom torna-se mais efusivo, em relação aos que “tratam da cousa
pública não por devoção, porém, repouso apenas de ocupações mais
lucrativas”27. Conclama o Imperador à ação através do uso do Poder Moderador,
alegando que, para exercer o poder, o Imperador não dependia de agentes ou de
conselheiros, bastaria sua soberana vontade. 28
Na segunda série das Cartas de Erasmo, como ficaram conhecidas as
missivas, publicadas entre os meses de junho a começo de agosto, Alencar muda
24 MENEZES. Op. Cit. p.152 25 MENEZES. Op. Cit. p.198. 26 O mesmo autor, Raimundo de Menezes, ora afirma terem sido 10 cartas, ora fala em nove; Magalhães Junior por sua vez não diz quantas seriam as cartas. 27 Apud, MENEZES.Cartas de Erasmo, 2ª carta. 28 Apud, MENEZES. Cartas de Erasmo, 10ª carta.
15
o destinatário. Desta vez remete-as ao povo, e o principal assunto tratado
continua sendo a guerra contra o Paraguai. Nelas, Alencar fazia censuras e
críticas ao comando das tropas brasileiras e questionava a razão de ser do
conflito:
“A Guerra que sustentamos é desde sua origem um tecido de incongruências e desacertos (...) É incrível! A tática de guerra parece dirigida ao fim inaudito de fazer do soldado brasileiro um covarde. (...)”. 29
Defendia a entrega do comando das tropas ao Marquês de Caxias, segundo
Magalhães Junior, com orientações vindas do Partido Conservador e com vias de
promover uma mudança política por meio de uma crise no campo militar.
Como sabemos, Caxias acaba assumindo as tropas e levando ao fim uma
guerra, que era para ser rápida e eficaz, mas que se arrastou por muitos anos e
trouxe grandes temores ao imperador.
Afastando-se de cena por algum tempo, Alencar reaparece com suas Novas
Cartas de Erasmo ao Imperador, em 24 de junho de 1867, desta vez tratando de
temas como emancipação, donativo imperial e a guerra.
Três destas missivas tratam do tema da emancipação e, segundo Hebe
Silva, na primeira delas Erasmo tenta mostrar ao imperador que o fato de ele
apoiar as discussões acerca da abolição refletia uma preocupação não com os
interesses nacionais, mas sim com a aprovação e louvores das nações
estrangeiras, especialmente da Inglaterra. 30
Em momentos de grande insolência chama o imperador aos deveres para
com o povo. O trecho que segue está reproduzido nos anexos da dissertação de
Silva, e segundo ela, foram retiradas de um volume encontrado na Biblioteca
Nacional:
Vós, Monarca, cingido do esplendor da majestade, vós, o primeiro no estado, não tendes o direito que reside no ínfimo dos cidadãos, no mísero proletário, como no vagabundo coberto de andrajos. Não sois uma pessoa; não tendes individualidade; não há sob o manto imperial que vos cobre o eu livre e independente.
29 Apud,MAGALHÃES JUNIOR, op. Cit. P.175. Cartas de Erasmo ao Povo. 30 SILVA, Hebe Cristina. Imagens da escravidão: uma leitura dos escritos políticos e ficcionais de José de Alencar. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas. São Paulo: 2004. p.49.
16
A nação que vos fez inviolável e sagrado vos privou da personalidade (...). Vossa honra é a da nação como ela a sentir; vossa dignidade a do império brasileiro (...). 31
Alencar, sem rodeios, escreve sobre assuntos que se faziam caros à pessoa
do Imperador, como a guerra com o Paraguai e a política de emancipação.
Mostrava-se coerente não apenas em seus escritos anônimos como em sua
postura pública, irritando muitos dos grandes nomes da política da época,
especialmente o senador Zacarias de Góis e Vasconcelos com quem entraria em
conflito várias vezes32.
Outro fato que merece destaque e que demonstra um pouco da
personalidade de Alencar ocorreu quando, por um decreto imperial Alencar foi
agraciado com o oficialato da Ordem da Rosa, por seu trabalho na literatura.
Segundo Menezes, há duas formas de recusar uma condecoração, uma discreta,
que seria simplesmente não comparecer à repartição para pegar a condecoração,
e outra a recusa ostensiva de maneira pública, “verdadeira desconsideração ao
Imperador”. Como não poderia deixar de ser Alencar prefere a segunda, e publica
no Jornal do Comércio, sem grandes explicações que não poderia aceitar tal
mercê; acumula-se assim mais um mal-estar com o imperador33.
Com a extinção do cargo de consultor jurídico do Ministério, ocupado por
Alencar durante quase dez anos, este se viu sem função permanecendo por
algum tempo no ostracismo. Mas, como veremos no capítulo seguinte, logo ele
voltaria à cena política, e desta vez ocupando um cargo muito importante e de
grande prestígio.
2.5 A IMPORTÂNCIA DE ALENCAR PARA A LITERATURA BRASILEIRA:
Segundo Silva, Alencar se via incumbido da missão patriótica de
confeccionar obras que “traduzissem” o país34, ele mesmo considerava-se um
precursor da produção literária brasileira, afirmando ter aberto uma estrada, agora
31 Apud, SILVA. Op. Cit. Anexos. Trecho extraído da 3ª carta, Novas cartas de Erasmo ao Imperador. 32 MAGALHÃES JUNIOR. Op. Cit. p.184. 33 MENEZES. Op. Cit. p. 225. 34 SILVA. Op. Cit. p.94.
17
tapeçada de flores, mas que fora aspérrima e cheia de indiferença e desdém,
“desbravando as urzes da intriga e da maledicência” 35.
Elegeu o romance como forma preferida para suas obras e dedicou uma
obra para explicar esta preferência, a já aqui citada Como e porque sou
romancista. Este gênero, já conhecido do público nacional desde o século
anterior, se mostrava bastante adequado em suas características, em suas
origens européias, ao propósito de criação de uma literatura genuinamente
nacional, haja vista a faculdade romanesca de primar pelo olhar atento e analítico
do escritor à realidade que o cercava. 36
E em suas obras literárias, Alencar buscava inserir as características
brasileiras, ao que chamava a “cor local”, descrevendo a natureza exuberante, a
população indígena que representava beleza e liberdade selvagem. Os indígenas
para o autor, como indica Silva, representavam o passado brasileiro e deviam,
pois, ser incluídos nas obras na forma de personagens ilustres: exaltá-los
equivalia a exaltar o passado nacional. 37 Alencar primava também pelo
diferencial lingüístico e pelos regionalismos.
Sua influência era já reconhecida em seu tempo, o que é evidenciado pela
visita que lhe faz um jovem escritor que, vindo do Nordeste, bate lhe a porta em
busca de apoio devido ao prestígio de que Alencar desfrutava; o nome deste
escritor: Antonio Castro Alves. Tecendo muitos elogios ao jovem envia-o com
carta de recomendação em mãos a Machado de Assis; prova de sua importância
e das relações que mantinha com outros escritores. Além das obras já citadas ao
longo do texto, não poderíamos deixar de mencionar outras obras de grande
importância escritas já no fim da vida de Alencar, como Ubirajara e Senhora
publicados, ambos, em 187438.
35 ALENCAR. Op. Cit. p.65. 36 SILVA. Op. Cit . p.97. 37 Ibidem,p.110. 38 MAGALHÃES JUNIOR, op. Cit.
18
3. CORAÇÃO LITERATO, SANGUE POLÍTICO:
O único homem novo e quase estranho que nasceu em mim
com a virilidade foi o político. Ou não tinha vocação para essa
carreira, ou considerava o governo do estado coisa tão
importante e grave, que não me animei nunca a ingerir-me
nesses negócios. Entretanto eu saía de uma família para quem
a política era uma religião e onde se haviam elaborado grandes
acontecimentos de nossa história39
.
Neste capítulo veremos como a política esteve presente na vida de José de
Alencar, mesmo antes de nascer. Partiremos do engajamento político da família
Alencar, sua presença e participação em grandes momentos da História do Brasil;
e, como, apesar de deixar clara sua preferência pela literatura, deixou-se
arrebatar para os cargos públicos e para as tribunas.
3.1. UMA FAMÍLIA DE LIBERAIS ATUANTES:
A família Alencar era oriunda de Portugal, da região do Alentejo. Seu bisavô,
Capitão Leonel Pereira de Alencar, foi o primeiro a migrar e estabelecer-se em
Pernambuco. Sua filha, avó de José, D. Bárbara envolvera-se ativamente na
revolução republicana de 1817 e, juntamente com seu filho José de Alencar,
chegou a ficar quatro anos na prisão. Com a vitória do movimento
constitucionalista em Portugal, Alencar - o pai - praticamente saiu da cela para
uma cadeira de deputado na Corte de Lisboa. Iniciou assim uma ativa carreira
política que exerceria grande influência em seu filho mais velho, José de Alencar.
Quando da notícia da independência do Brasil, achava-se Alencar -o pai-
cumprindo seu mandato como deputado em Lisboa. Juntamente com outros
brasileiros, rumam para a Inglaterra que favorecia a independência. Regressando
ao Brasil é eleito deputado constituinte, mas a dissolução da Assembléia Geral
provoca nele uma decepção, e passa a fazer parte do movimento revolucionário
no Ceará, em 1824, quando novamente é preso. Como aponta Magalhães,
39 ALENCAR. Op. Cit. p.45
19
mesmo participando de dois movimentos republicanos e, principalmente anti-
portugueses, o padre rebelde nem por isso teria barrada sua ascensão política. 40
Logo Alencar retornaria à cena política como deputado geral eleito tanto pela
província do Ceará como de Minas Gerais. Optou pela cadeira da primeira e,
contando com grande prestígio, acabou eleito presidente da Câmara. Ocupou
também outros cargos de destaque, como senador e presidente da Província do
Ceará, em 1834.
Anos depois já residindo na Corte Alencar - o filho- veria acontecer em sua
casa reuniões que culminariam em grande mudança para a história política
brasileira. O velho Senador Alencar promovia em sua residência as reuniões do
Clube Maiorista, do qual era secretário, que tentava minar o sistema de regências
e promover a declaração da maioridade do monarca; fato que se consolidou
alguns anos depois41.
O menino Alencar, que contava com apenas 11 anos na época lembra
destas noites principalmente pelas delícias gastronômicas, e assim descreve-as
em sua obra Como e porque sou romancista:
Uma noite por semana, entravam misteriosamente em nossa casa os altos personagens filiados ao Clube Maiorista de que era presidente o Conselheiro Antônio Carlos e secretario o Senador Alencar.Celebravam-se os serões em um aposento do fundo, fechando-se nessas ocasiões a casa às visitas habituais, a fim de que nem elas nem os curiosos da rua suspeitassem do plano político vendo iluminada a sala da frente. Enquanto deliberavam os membros do Clube, minha boa mãe assistia ao preparo de chocolate com bolinhos, que era costume oferecer aos convidados por volta de nove horas, e eu, ao lado com impertinência de filho querido, insistia por saber o que ali ia fazer aquela gente. (...) Até que chegava a hora do chocolate. Vendo partir carregada de tantas guloseimas a bandeja que voltava completamente destroçada, eu que tinha os convidados na conta de cidadãos respeitáveis, preocupados dos mais graves assuntos, indignava-me ante aquela devastação e dizia com a mais profunda convicção: - o que estes homens vêm fazer aqui é regalarem-se de chocolate. 42
40 MAGALHÃES JUNIOR, Op. Cit. p.4 41 Ibidem. 42 ALENCAR. Op. Cit. p.25-26
20
Além destas o Senador Alencar também se envolveu em outras incursões
políticas, sendo mesmo acusado de ser cúmplice da Revolução Praieira de 1848
em Pernambuco. Reconhecendo a importância do pai, Alencar reclama da falta
de reconhecimento deste por parte da sociedade brasileira: “(...) e, todavia
ninguém se lembrou ainda de memorar o nome do Senador Alencar, nem mesmo
por esse meio econômico e uma esquina de rua” 43.
A influência do pai foi muito importante para a formação política do filho,
contudo um fato merece destaque, apesar de ter sido criado em uma família
permeada pelos ideais liberais e bastante atuantes, Alencar se tornaria um
conservador assumido e convicto; como veremos.
3.2 OS PRIMEIROS PASSOS NA POLÍTICA:
Alencar há algum tempo mantinha relações com a política graças a seu
cargo de consultor jurídico do Ministério da Justiça como já mencionamos neste
estudo. Mas é a partir da morte do pai, em 1860, que decide investir em sua
carreira política. Impulsionado pelo Senador Eusébio de Queirós, licencia-se de
seu cargo e parte para o Ceará para disputar uma cadeira como deputado. Nas
eleições de 1861 é eleito, tomando posse em 23 de maio daquele ano.
Menezes afirma que a expectativa em torno do nome de Alencar é enorme e
todos aguardam ansiosos por seu primeiro discurso, haja vista já ter erigido boa
fama como romancista, além de trazer em si a responsabilidade de dar
continuidade ao nome Alencar na política:
Eis que todos aguardam, na certeza de que a tribuna da Câmara será para ele mais uma vitória consagradora. Tal, porém, desgraçadamente não acontece. Naquela tarde, ao discursar, pela primeira vez, profunda e penosa impressão causa. Sem tipo físico (magro e pequenino), sem voz (“falando entre línguas”, sem gestos desembaraçados (as mãos presas ao corpo), a oração que profere não tem nenhum brilho. “Todos esperavam um tenor de retórica e o que surgiu foi um senhor baixote e barbaçudo que parecia a um tempo vítima de gaguez e amnésia”.44
43 Ibidem. p.32 44 MENEZES. Op. Cit. p. 165.
21
Alencar discursa sobre vários temas ao longo dos dias e vai se
familiarizando à sua nova função. Sua fala aborda questões como a criação de
um tribunal de contas, o orçamento e o voto popular. Esta primeira legislatura
duraria pouco tempo, pois em 13 de maio de 1863 a Câmara é dissolvida. Ainda
neste mesmo ano Alencar lançou novamente sua candidatura, sendo derrotado;
mas esta primeira experiência fora suficiente para forjar um orador sagaz.
3.3 UM MINISTRO INSOLENTE
Como vimos devido às suas Cartas de Erasmo e à recusa em receber a
Ordem da Rosa, Alencar vira ser extinto seu cargo de consultor. Assim sendo,
não era mais nem deputado, nem consultor e decide, então, abrir seu próprio
escritório de advocacia alcançando êxito em suas funções e conseguindo uma
boa carteira de clientes.
Mas no dia 15 de julho de 1868 recebe em seu escritório a visita de Luís
Antonio da Silva Nunes, que vinha em nome do Barão de Muritiba e do
Conselheiro Paulino José Soares de Sousa dizer-lhe que estavam em vias de
elaboração do novo gabinete a ser presidido pelo Visconde de Itaboraí e que
contavam com seu nome para assumir a pasta do Ministério da Justiça. A
princípio, recusa dizendo-se sem forças para assumir tal empreitada; mas dada a
insistência decide ir ter com Itaboraí.
Formava-se assim um gabinete estritamente conservador e arredio ao
debate acerca da emancipação dos escravos, assunto que, como veremos no
capítulo seguinte, se fazia presente em grande parte das discussões,
especialmente tendo em vista a atenção dada pelo imperador ao assunto.
Magalhães Junior assim descreveu a passagem de Alencar pelo ministério:
Alencar era, então, um servidor dedicado ao gabinete e ardia em zelos, na defesa do imperador e da monarquia. Mas, incompatibilizado, primeiro com Paulino de Sousa e Cotegipe, e, depois com o próprio imperador, só seria ministro por um ano e meio. 45
45 MAGALHÃES JUNIOR, Op. Cit. P. 193
22
O tempo em que esteve neste ministério ainda, que tenha sido de curta
duração, foi bastante movimentado e significou muito para a vida de nosso
protagonista. Em mais uma de suas rusgas com o Imperador, esta por motivo
ínfimo de etiqueta e burocracia, incomodava-se por nunca saber qual traje vestir
para qual ocasião e com os constantes escrutínios do Imperador que fazia
questão de se ater a pequenos detalhes, mandando ao Ministro uma infinidade de
bilhetes querendo ser informado de cada decisão; segundo Menezes existem na
Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional 55 bilhetes enviados pelo Imperador
ao ministro Alencar e cerca de 32 bilhetes do ministro para o monarca.
Alguns fatos da ordem de segurança pública também permearam o
trabalho de Alencar no ministério. Como em 2 de dezembro de 1868, dia do
aniversário de D. Pedro II, quando foi publicado, anonimamente, no Jornal do
Comercio,uma versalhada aparentemente de exaltação à pessoa do monarca.
Contudo, os versos compunham um acróstico satírico que passara despercebido
pela redação do jornal, mas não pelos leitores, que logo decoraram o poemeto e
recitavam pelas esquinas. Alencar, como ministro, para cumprir suas obrigações
mandou instaurar inquérito, que não deu em nada; vale contudo reproduzir aqui o
acróstico “O bobo do rei faz annos” que tanta discórdia gerou:
Oh! Excelso monarca, eu vos saúdo! Bem como vos saúda o mundo inteiro, O mundo que conhece as vossas glorias... Brasileiros, erguei-vos, e de um brado O monarca saudai, saudai com hinos! Do dia de dezembro o dois faustoso, O dia que vos trouxe mil venturas! Rebomba ao nascer d’alva a artilharia E parece dizer em som festivo Império do Brasil, cantai, cantai! Festival harmonia reine em todos; As glorias do monarca, as são virtudes Zelemos, decantando-as sem cessar. A excelsa imperatriz, a mãe dos pobres, Não olvidemos também de festejar Nesse dia imortal que é para ela O dia venturoso em que nascera Sempre grande e imortal Pedro II
46.
46 MENEZES. Op. Cit. p 237.
23
Outro fato que merece destaque por sua peculiaridade ocorre em 1869
quando acontecem na Corte conflitos entre os estudantes da Escola Central e
guardas urbanos. O episodio foi motivo para mais um bilhete do imperador que
logo quis saber o que aconteceu e quais providências seriam tomadas pelo
ministro, que se exaspera e envia à Sua Majestade uma ríspida correspondência
que assim terminava:
Essa inspeção minuciosa que Vossa Majestade Imperial deseja exercer sobre o país na melhor intenção e com o pensamento de bem usar de sua alta e benéfica atribuição moderadora, toma aos olhos da nação um aspecto que se não coaduna, nem com o espírito sinceramente constitucional do Soberano, nem com a dignidade de seu Ministro da Justiça. Entende a opinião pública e mui sensatamente, que o zelo de V.M.I. em investigar do procedimento das autoridades subalternas é sintoma infalível, ou de uma desconfiança no ministro, ou de um exercício pessoal da atribuição executiva. O ministro de V.M.I. faltaria à lealdade e dedicação devidas a seu Monarca, se não houvesse abolido um estilo que expunha a Coroa, desairando o seu Gabinete47.
Chega a ser espantoso que um ministro tão impertinente tenha
permanecido tanto tempo em suas funções, contudo logo chegaria o momento em
que mais uma vez seria contra os desejos imperiais e deixaria sua cadeira de
ministro.
Mas não apenas de desavenças foram seus dias de ministro. Alencar
também trabalhou em várias iniciativas de ordem jurídica, das quais podemos
citar seu projeto de alteração do Código do processo Criminal, apresentado em 16
de julho de 1869, outro que versava acerca do habeas-corpus. Em 15 de
setembro deste mesmo ano referendaria o decreto nº. 1695, que transformava em
lei o projeto aprovado pela Câmara e pelo Senado do Império sobre leilões de
escravos, em que proibia a separação de marido e mulher, o filho do pai ou mãe
quando menores de 15 anos, além de proibir a exposição pública em pregão48.
Este fato seria por ele retomado muitas vezes ao defender-se das acusações de
ser escravocrata, como veremos no próximo capítulo.
47 Apud, Menezes. p. 193. História de Dom Pedro II.Volume II-Fastigio- 1870/1880.Companhia Editora Nacional, 1939, p. 141-142. 48 MAGALHÃES JUNIOR, Op. Cit. p. 209.
24
3.4 ELEITO, PORÉM NÃO EMPOSSADO.
Alencar decide afastar-se do Ministério, em janeiro de 1870, por
divergências com outros membros do gabinete, especialmente com Cotegipe, e
também para tentar eleger-se senador. Consultando o monarca este lhe diz que
“apreciaria mais que tivesse um gesto de abnegação do que se concorresse à
eleição”49, mas, apesar dos avisos imperiais, empolgado com a possibilidade de
galgar cargo idêntico ao que ocupara o pai, lança candidatura.
Consta que Alencar obteve a maioria dos votos, mas quem dava a “palavra
final” nas eleições para senadores era o monarca, e em 27 de abril por meio de
Carta Imperial são escolhidos os senadores pelo Ceará. Eram eles Domingos
José Nogueira Jaguaribe, primo de Alencar e o segundo mais votado e Jerônimo
Martiniano Figueira de Melo, o quinto em votação. Segundo registra Menezes,
imensa e geral é a surpresa. Grande a desilusão. Nunca se poderia acreditar que
fosse rejeitado nome tão ilustre.Tal preterição é dos maiores golpes sofridos na
vida por Alencar. 50 Como havia sido eleito em 1869, Deputado geral, em 1870
retornou à Câmara, sendo reeleito em 1872 quando foram convocadas novas
eleições e novamente em 1875 tendo permanecido até agosto de 1877, quando
se retirou por agravarem-se seus problemas de saúde.
O capítulo a seguir primará pela análise dos discursos proferidos por Alencar
neste último período de sua carreira política, momento este em que discursou em
abundancia e sobre diversos temas, especialmente sobre a reorganização do
mercado de trabalho brasileiro.
3.5 CONSERVADOR OU LIBERAL? MONARQUISTA OU REPUBLICANO?
Alencar sempre se definiu como conservador e agiu como tal em grande
parte de sua vida como político. Contudo, depois de sua saída do Ministério,
passou a legislar como oposição ao gabinete conservador que permanecia no
poder, travando embates com Cotegipe e outros. Além disso, se opôs
frontalmente a certos atos imperiais, como, quando da solicitação de D. Pedro II 49 Ibidem, p. 217. 50 MENEZES. Op. Cit. p. 260.
25
para realizar uma viagem ao exterior a fim de cuidar da saúde da imperatriz, o
deputado manifestou-se afirmando ser um desperdício tal viagem, que em nada o
exterior tem a oferecer de melhor à saúde daquela.
As acusações de ter “virado a casaca” passaram a ganhar força quando, em
1872, começou a ser publicado no jornal A República uma de suas obras então
inéditas. O jornal liberal havia iniciado suas atividades em 1870, mesmo ano em
que a ala mais avançada do Partido Liberal havia fundado o Partido Republicano.
Segundo Magalhães Junior, neste jornal muitos de seus princípios viriam ao
encontro das posições tomadas por Alencar. E os republicanos tinham grandes
habilidades em atrair políticos descontentes e dissidentes para seu partido.
Mas se há característica de si mesmo que Alencar sempre fazia questão de
reiterar era sua afirmação de monarquista e conservador. Em seus discursos na
Câmara dos Deputados sempre se valia da Inglaterra como exemplo de
monarquia aliada ao sistema representativo, para ele a melhor forma de governo.
Acusado de ter sido liberal na origem e posteriormente mudado de partido
afirma que liberal fora na infância dada a influência de sua família, contudo,
Alencar, citado por Magalhães, assegura que tendo amadurecido e
compreendendo melhor a liberdade, tendo a razão esclarecida seus princípios
convergem para o Partido Conservador; afirma também que o Partido Liberal
nunca contou com seus serviços, tendo erigido sua vida pública nas bases
conservadoras.
De acordo com Hebe Silva, “o conservador por excelência caraterizava-se
pela prudência, que a seu ver (de Alencar) significa ‘não antecipar-se’, aceitar
somente as ‘doutrinas amadurecidas’“. 51
Um conservador imbuído de pensamentos liberais, monarquista ferrenho e
de uma personalidade introspectiva, o que muitas vezes o colocava em situações
conflitantes mesmo com seus próprios ideais, como quando das muitas querelas
e discordâncias em relação às atitudes e à própria pessoa do monarca. Tendo
sido mesmo acusado de ter “namorado” com os liberais, Alencar não deixava de
afirmar:
51 SILVA. Op. Cit p.29.
26
(...) Sou monarquista sincero e convicto. Mas, como nunca
professei o fetichismo da realeza, espero o triunfo para minhas
idéias da civilização do povo, nunca de sua ignorância.
Quero que meu país seja monarquista, não pela rotina, mas por
verdadeira fé nesta instituição; e, para isso é necessário que
estude as doutrinas opostas e se esclareça com a livre
discussão (...). 52
Estas definições a ele atribuídas teriam reflexos em suas opiniões sobre
questões importantes que insurgiam na cena política do momento, e o terceiro
capítulo deste trabalho visa compreender estas posturas assumidas por Alencar,
de maneira específica no que concerne à “questão do dia” da política brasileira
nos anos de 1870: a discussão da emancipação dos escravos e a colonização
estrangeira, enfim a reorganização do mercado de trabalho e das relações entre
estes diferentes modos de mão-de-obra.
52 Apud, MAGALHÃES JUNIOR; p.266.
27
4. O “ELEMENTO SERVIL” POR JOSÉ DE ALENCAR:
Chamam-nos de escravocratas, de retrógrados, de espíritos tacanhos e ferrenhos, que não recebem os influxos da civilização. Procuram assim atemorizar-nos com a odiosidade que de ordinário suscitam as idéias condenadas e os sentimentos egoísticos.
53
O terceiro capítulo deste trabalho dedica-se à análise das posições tomadas
por Alencar quanto à escravidão, e, sobretudo, como ele defendeu estas
posições, seus argumentos e expectativas. Para tanto, se fará necessário
retomarmos a questão pontual da escravidão nos anos de 1870, a elaboração, os
debates e, a posteriori, a promulgação da Lei Rio Branco ou a chamada Lei do
Ventre Livre.
4.1 UMA QUESTÃO PONTUAL: LIBERTAR OU NÃO O VENTRE
ESCRAVO.
Qualquer lei que atingisse diretamente o sistema escravista encontraria na
sociedade brasileira um eco bastante efusivo, seja em favor da manutenção do
status quo, ou em favor de mudanças. Assim fora quando das discussões sobre a
extinção do tráfico atlântico de escravos, que se arrastou desde o início das
pressões por parte da Inglaterra, em 1807, até sua efetivação, em 1851. Esta
medida, ainda que causasse uma dificuldade quanto à obtenção de escravos, não
atingia diretamente a relação entre senhores e escravos, haja vista alcançar o
caráter “macro” da instituição.
A lei de 1871, contudo é a primeira a alcançar um caráter “micro” dentro da
sociedade escravista. A extinção do tráfico não atingia diretamente os
proprietários em relação aos escravos que já possuíam; apenas inibia a novas
aquisições por suprimento atlântico54. A libertação do ventre, por sua vez, atingiria
as relações familiares e senhoriais de uma maneira antes não vista na sociedade
53 ALENCAR, José de. Discursos parlamentares de José de Alencar, 1829-1877. Brasília, Câmara dos Deputados, 1977.p. 228. 54 Sabemos que após a extinção do tráfico atlântico houve aumento considerável do tráfico interno, o que continuou de certa forma possibilitando o aumento de plantéis de escravos em algumas regiões, marcadamente no centro-sul cafeicultor. Ver: HOLANDA. Op. Cit. pp. 155-156.
28
brasileira. Portanto, não se poderia esperar consenso ao propor-se uma reforma
desta monta.
A seguir veremos as principais propostas contidas no projeto do qual
resultou a Lei do Ventre Livre, em torno do qual José de Alencar envolveu-se de
forma intensa.
4.1.1 Os trâmites da lei:
O projeto de lei que viria a ser promulgado em 28 de setembro de 1871
surgiu como um adendo às vontades manifestadas pela Coroa em ver discutida
com maior disposição a questão do “elemento servil”. Essa disposição do
Imperador já era perceptível quando em 1867 dedicou um tópico da Fala do Trono
à questão. Desta forma, os projetos apresentados por Pimenta Bueno ao
Conselho de Estado logo ganharam uma comissão composta por Nabuco de
Araújo, Sales Tôrres Homem e Sousa Franco com fins de elaborarem uma
proposta para ser apresentada à Câmara55.
Devido às constantes mudanças na formação dos gabinetes, e conforme a
orientação política de seus chefes, alguns favoráveis à discussão e outros que
preferiam postergá-la, ora a questão da reforma era priorizada, ora era
propositadamente esquecida.
Um dos gabinetes que fez “vistas grossas” ao projeto que já tramitava
visando a libertação do ventre foi justamente o Gabinete Itaboraí, do qual José de
Alencar fez parte. Como já vimos, nosso protagonista ocupou, naquele Gabinete,
a pasta da Justiça. Tal Gabinete, para acalmar a situação de pressão por uma
reforma, fez com que tramitasse com maior agilidade o projeto apresentado por
Silveira da Motta, que previa a proibição da venda de escravos em leilão e que
tramitava desde 1864.Segundo Sérgio Buarque de Holanda, com fins
conciliatórios e para postergar a discussão da libertação dos nascituros, o próprio
Alencar assinou a lei de proibição dos leilões em 1869. 56
55 HOLANDA, Sérgio Buarque de. “O Encaminhamento Político do Problema da Escravidão no Império”. In HOLANDA (org). História Geral da Civilização Brasileira. Tomo II, 3º volume. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil-DIFEL,1987, p. 206. 56 Ibidem, p. 207.
29
Há então um período de redefinições dentro do próprio partido conservador,
alguns em favor da manutenção do status quo, outros por uma reforma lenta e
gradual; estes em sua maioria por temor de opor-se aos desejos da Coroa.
Seguem-se novos gabinetes, e, por fim, o terceiro desde Itaboraí, presidido
por Visconde do Rio Branco que aceleraria as discussões do projeto e venceria a
ampla resistência intra-partidária que havia. Desta forma, acirravam-se os
debates. Alguns dos quais veremos detalhadamente a seguir. Uma das
estratégias adotadas pelos adversários da reforma era a de postergar a discussão
e a votação do projeto para depois de 30 de setembro, quando se encerrariam as
sessões, aniquilando as possibilidades de aprovação do projeto.
Contudo, a proposta passou pela Câmara e, contando com o apoio dos
liberais, tramitou rapidamente pelo Senado. Assim, poucos dias antes do
encerramento da sessão legislativa, o projeto foi aprovado e levado à sanção pela
Princesa Regente.57
Desta forma, como aponta Holanda, o Partido Conservador que já havia
conquistado para si os louros da extinção do tráfico em 1850 também colhia as
honras de presidir o gabinete que aprovara a libertação do ventre.58
4.1.2: O conteúdo da Lei:
Apesar de terem sofrido revés com a aprovação da lei não podemos deixar
de pontuar que os interesses dos escravistas foram de certa forma levados em
conta na elaboração do texto da lei. Ainda que não totalmente contemplados, os
senhores de escravos não sofreriam as conseqüências da lei de maneira
imediata.
Isto porque a prerrogativa de decidir quanto ao destino dado a estas
crianças permanecia sendo dos senhores de suas mães que teriam a obrigação
de criá-los e tratá-los até os 08 anos de idade. A partir desta idade caberia ao
senhor optar pela indenização ou usufruir dos serviços do menor até os 21 anos
completos.59
57 D. Pedro II encontrava-se então na Europa em licença consentida pelos parlamentares para tratamento de saúde de D. Teresa Cristina, viagem esta à qual Alencar se havia oposto, tendo discursado efusivamente sobre a inutilidade de tal viagem. 58 HOLANDA, op. Cit. p.211. 59 Ibidem. pp.210-211.
30
Assim sendo apesar de ter sido uma medida bastante combatida pelos
antiabolicionistas, a Lei Rio Branco afetava as estruturas da instituição a médio e
a longo prazo, uma vez que, na prática, as relações entre senhores e escravos
permaneceria inalterada ao menos pelos próximos oito anos.
Outras mudanças importantes também constavam no texto da Lei Rio
Branco, além das que mencionavam a libertação do ventre, tais como a criação
do que viria a ser chamado de Fundo de Emancipação dos Escravos, fundo este
composto pela taxa paga pelos proprietários e de outros recursos que seriam
destinados a emancipação; e a permissão legal de ter o escravo a chance de
formar pecúlio, seja por meio de heranças, doações, legado ou mesmo por fruto
de seu trabalho, desde que autorizado por seu senhor, e, tendo este escravo
obtido pecúlio em valor igual ao seu valor, ser-lhe-ia facultado o direito a compra
de sua liberdade.Além destas medidas foram, na mesma lei, declarados libertos
os escravos pertencentes à nação, os dados me usufruto à Coroa, bem como os
das heranças vagas. 60
Como demonstra o conteúdo da lei, ainda que representasse uma ruptura
com o sistema vigente até então, havia a preocupação da manutenção da
autoridade senhorial não apenas sobre o escravo, mas agora também sobre o
nascido livre. Analisando a introdução da possibilidade de utilizar os serviços dos
nascituros no projeto original, Joseli Mendonça considera:
A idéia da manutenção do atrelamento pessoal entre os senhores e as crianças a que se propunha a libertar mostrou-se grandemente sedutora. (....) mesmo que houvesse a opção de entregar a criança para ser criada por uma instituição pública esta opção caberia exclusivamente ao senhor.
Desta forma um dos primeiros problemas indicados pelos opositores da lei
parecia estar sanado: o “temor” de um enfraquecimento dos laços senhoriais
acabou por se tornar mais uma forma de manutenção da soberania do
proprietário. Ainda de acordo com Mendonça:
Nesse ponto [ao colocar aos senhores a possibilidade de manter consigo os nascidos após a lei até que completassem 21 anos] a lei de 1871 ao mesmo tempo em que “desapropriou” os senhores
60 HOLANDA, op. Cit. p. 210;
31
dos frutos do ventre de suas escravas, outorgou-lhes a exclusividade da escolha sobre o destino das crianças que tornara livres e estabeleceu a possibilidade do atrelamento pessoal, tornando essas crianças obrigadas a prestação de serviços aos senhores de suas mães.61
Hebe Silva também demonstra outras implicações da lei, que passava a
promover a intervenção do Estado donde antes havia o domínio exclusivo dos
senhores, ou seja, na concessão de alforrias. 62
4.2 ALGUMAS DISCUSSÕES NO PARLAMENTO:
O projeto que trazia em si a emancipação do ventre havia sido elaborado em
1867, e como sabemos só seria aprovado em 1871. O tempo compreendido entre
a elaboração e a efetivação da lei foi permeado pela instabilidade e pela
discussão política acerca da questão.
Entre modificações no texto, propostas de emendas entre outros, foram
realizadas várias sessões, sobretudo a partir de 1870 quando assume a
presidência do gabinete o Visconde do Rio Branco e são reafirmados os
interesses em ver aprovadas as propostas.
4.2.1: As Participações de Alencar:
O fato é que a lei de 1871 tornou-se referência a todos os estudiosos da
escravidão, e este contexto de alterações políticas e sociais importantes foi o
período em que Alencar mais atuou, e os discursos que proferiu neste período
revelam muito de sua opinião sobre a questão da escravidão. Suas falas
ocorreram em datas chave no processo de discussão e posterior aprovação da
Lei Rio Branco: dois deles datam de 11/07/1871 e 13/07/1871 período
imediatamente anterior a aprovação da lei. Mas quais eram as opiniões de
Alencar sobre a libertação do ventre? Vejamos.
61 MENDONÇA, Joseli Maria Nunes. Entre a mão e os anéis: a Lei dos Sexagenários e os caminhos da abolição no Brasil. Campinas: Editora da UNICAMP, 1999. p. 102. 62 SILVA, op. Cit. p.23.
32
4.3 SOBRE A LEI Nº. 2040:
Opondo-se desde o início à proposta de emancipar o ventre escravo, Alencar
usou em muito a tribuna para expor suas posições sobre o projeto que então
tramitava na Câmara. A liberdade do ventre, considerava Alencar, era uma “idéia
funesta”. Contra ele, prometia, “me empenharei com todas as forças, porque
entendo que há de ser fatal e há de produzir calamidades capazes de apavorar o
próprio Governo”. 63
Dentre seus argumentos para rejeitar a lei estavam o temor de uma
revolução social que ela propiciaria, posto que iria fomentar o ódio, as intrigas e
revoltas por parte daqueles que, considerando-se injustiçados, estariam fadados a
permanecerem escravos. Isso, segundo Alencar, abriria margem para
questionamentos sobre a legitimidade da escravidão enquanto instituição. Nesse
sentido ele afirmava
A liberdade compulsória, a pretexto de salvação, ou de arbitramento, é uma arma perigosa que se forja para os ódios, as intrigas e malquerenças das localidades; e com a qual se há de violar o asilo do cidadão, perturbar a paz das famílias, e espoliar uma propriedade que se pretende garantir.64
Outro argumento utilizado por ele dizia respeito à organização familiar dos
escravos, que no seu entender, seria alterada pela libertação dos nascituros. Para
ele, a lei faria surgir famílias híbridas, em que um filho escravo poderia ter um
irmão livre, que, a princípio, poderia até mesmo vir a ser senhor dos pais e dos
irmãos.65 Assim, a lei criaria a condição para misturar trabalhadores livres com
escravos, contaminando o trabalho livre com os “vícios gerados pela escravidão”,
produzindo assim péssimos trabalhadores e também acabando com as
esperanças de, por meio do trabalho e do “merecimento” obter dos senhores a
manumissão. Comentando o projeto diz Alencar:
Quando a lei do meu país houver falado essa linguagem ímpia, o filho será para o pai a imagem de uma iniqüidade; o pai será para o filho o ferrete da ignomínia; transformareis a família em um antro de discórdia; criareis um aleijão moral, extirpando do
63 ALENCAR, José de. Discursos parlamentares de José de Alencar, 1829-1877. Brasília, Câmara dos Deputados, 1977. Discurso de 10/07/1871. p.208. 64 Ibidem.Discurso de 13/07/1871. p.240 65 Ibidem. p.241
33
coração da escrava esta fibra que palpita até no coração do bruto: o amor materno. (...) a emancipação do ventre equivale a criar famílias híbridas, (...) rouba toda a esperança dos adultos, condenando-os ao cativeiro perpetuo; desmoraliza o trabalho livre, misturando nas habitações, livres com escravos (...) contamina a nova geração, criando-a no seio da escravidão, ao contato dos vícios que ela gera. 66
Sendo assim, para ele a libertação do ventre não era apenas perigosa
enquanto geradora de conflitos sociais, mas gerava conflitos internos na própria
família; o respeito e até o amor materno estariam colocados em risco com a
aprovação da lei.
Argumento interessante defendido por ele dizia respeito às relações entre
senhores e escravos, entre negros e brancos desenvolvidas na sociedade
brasileira. Segundo Alencar, os costumes e a índole brasileira haviam impregnado
a escravidão de relações afáveis e caridosas, proporcionando a união entre as
raças, sendo quase uma relação de servidão e não de escravidão. E, portanto, a
emancipação do ventre solaparia estas tão generosas relações, criando o
antagonismo entre raças “que viveram sempre unidas, retribuindo uma com sua
proteção os serviços da outra”. 67
Nem mesmo os argumentos de que a instituição da escravidão ia de
encontro aos princípios cristãos o convencia a aceitar o projeto. Sobre isto,
afirmava que nunca a religião deveria servir de arma política ou instrumento de
reforma, devendo, portanto instigar através de seus conselhos e orientações na
“cadeira sagrada” a revolução moral que antecederia a revolução das leis no que
concerne à escravidão. Assim sendo não deveria a Igreja manifestar suas
opiniões no ambiente político, nem ser usada como argumento para aqueles que
se colocavam a favor da promulgação da lei. Neste sentido, afirmava:
A religião é a luz que se difunde pela humanidade; ela purifica nossa alma, regenera os costumes; mas não é, não deve ser nunca uma arma política, um instrumento de reforma (...) Não é aqui nesse recinto que a religião tem a palavra, mas na cadeira sagrada de onde seu verbo inspirado deve infundir nos costumes um espírito benéfico, apresentando a revolução moral que tende a extinguir o cativeiro o mais breve que se pensa.68
66 Ibidem. Discurso dia 13/07/1871. pp. 240-241. 67 Ibidem. Discurso dia 13/07/1871. p. 240. 68 Ibidem. Discurso dia 13/07/1871. p. 235.
34
Não devendo então a religião misturar-se com a política, Alencar restringia a
discussão do projeto, aos parlamentares que de modo geral neste momento
dividiam-se em liberais e conservadores. Alencar alinhava-se com estes últimos;
defendendo de forma eloqüente os ideais partidários, especialmente quanto à
questão da escravidão, como veremos a seguir.
4.4 ALENCAR, O PARTIDO CONSERVADOR E A QUESTÃO DO
“ELEMENTO SERVIL”.
Como apontamos anteriormente, a questão da emancipação ou de quaisquer
assuntos relacionados à escravidão causava frisson nos políticos brasileiros,
tendo inclusive causado a cisão de um partido forte e bem organizado tal era o
Partido Conservador. Alencar, conforme sabemos, pertencia convictamente a tal
partido. Qual teria sido, então, sua postura quando da apresentação, feita por seu
partido, do projeto a que ele se opunha? Teria permanecido incólume em suas
opiniões ou as teria flexibilizado? No período de discussão da lei, vários discursos
foram proferidos por Alencar na Câmara dos Deputados. Nestes discursos,
Alencar esclarecia claramente sua condição no interior do partido e fazia
considerações acerca de quais seriam as legítimas posturas de um conservador.
Um dos discursos, o que proferiu em 14 de maio de 1870, permite recuperar
suas posições. Neste discurso, Alencar respondia algumas acusações de que
teria publicado, na folha Dezesseis de Julho, de propriedade sua e de seu irmão
Leonel e órgão declaradamente conservador, artigos que fariam menção a uma
oposição entre os interesses da Coroa e os do Gabinete então presidido pelo
Visconde de Itaboraí. A confrontar tais acusações, Alencar comentou sobre sua
condição dentro do partido que acabara de “fissurar-se”. Dizia Alencar, então,
estar isolado no seio de seu partido que, segundo ele, caminhava para a
concordância com os liberais no que concernia à aprovação de leis anti-
escravistas. Afirmava também que nunca havia pretendido que o partido fosse
35
escravista, pois, segundo ele, “todos nós brasileiros desejamos ardentemente ver
desaparecer do país esta instituição (...)”.69
Apesar de expressar tanto desejo de ver abolida a escravidão
conservadoramente destacava que cabia ao partido Liberal e suas convicções o
ato de apresentar uma proposta sobre a reforma. Aos conservadores cabia resistir
a elas e conter o que chamou “revolução social”, para que a abolição se
realizasse gradualmente; sobre isso afirmava:
A idéia da emancipação pelos meios diretos é do Partido
Liberal; deixemos que ele a realize a seu tempo; a nós, conservadores, cumpre resistir-lhe, para que a revolução, ao menos se opere gradualmente; do contrário, as consequências serão funestas70.
Definindo a diferença que entendia haver entre liberais e conservadores,
pontuava:
O Partido Liberal marcha na vanguarda, aventa as idéias, aponta-as à opinião, lança-as na discussão; o Partido Conservador, ao contrário, não aceita doutrinas que não estejam bastante amadurecidas; em vez de antecipar-se, acompanha, segue atrás da opinião71.
Estas palavras se fazem bastantes congruentes com os pensamentos
expressos por ele em suas outras obras72, especialmente quando se defende de
acusações de seus inimigos políticos de que seria muito mais um liberal que um
conservador. Alencar sempre assegurava que liberais haviam sido os anseios da
juventude, o tempo e amadurecimento o havia feito naturalmente um conservador.
Apesar de assim ser Alencar, no momento das discussões da lei na Câmara,
portava-se como oposição a seu partido, uma vez que o gabinete formado neste
período era conservador. Naquele momento assumia uma postura de dissidência
ao seu partido e nesta condição não media esforços em apontar o inconveniente
da aprovação da lei. Expressava também sua hostilidade para com o gabinete,
que, segundo ele, havia se afastado do partido ao defender idéias do “Partido
adverso”. Para ele, a posição do gabinete acabou por promover a dilaceração do
69 Ibidem. p.185. 70 Ibidem, p. 190. Discurso dia 3/09/1870. 71 Ibidem, p.202.Discurso dia 10/07/1871. 72 Ver obras citadas ao longo do trabalho, tais como Novas Cartas Políticas de Erasmo e a publicação em A
República.
36
Partido Conservador, cabia a ele, então, defender com energia a integridade de
seu partido. 73
Faz-se necessário compreendermos as causas desta divergência entre os
interesses professados por Alencar como inerentes ao Partido Conservador e a
posição assumida por este mesmo partido acerca da questão da escravidão,
assume vital importância então uma outra instituição tão cara a Alencar: a Coroa
e a própria pessoa do Imperador.
4.5. COMBATES COM UM IMPERADOR:
Para Alencar o principal promotor da convulsão social que se aproximava
com a aprovação das leis pró-emancipação era o próprio Imperador, sua relação
com o monarca, como vimos, já vinha sendo desgastada desde há muito, e em
atos de insolência já havia afirmado que a neutralidade era uma qualidade a ser
desenvolvida por D. Pedro II. 74
Em seus discursos permanece a posição de ataque à pessoa do Imperador e
em frases duras afirma que Sua Majestade queria erigir fama, glória e
reconhecimento por parte da opinião estrangeira às custas de destruir um dos
pilares da sociedade brasileira. De forma bastante contundente afirma que
haveria outras reformas que causariam benefícios muito superiores às
provocadas pela alforria do ventre, dentre elas “ a alforria do voto, cativo do
governo; a alforria da justiça, cativa do arbítrio; a alforria do cidadão, cativo da
Guarda Nacional e, (...) a alforria do país, cativo do absolutismo, cativo da
prepotência do Governo pessoal”. Como afirmava não havia, porém, interesse em
promover tais reformas, pois:
essas emancipações não têm em seu favor as declamações da filantropia européia(...) esses interesses máximos do país não tem uma voz francesa dizer a alguém: “Senhor, por este ato vosso nome adquirirá uma fama imperecível”. 75
73 ALENCAR, op. Cit. Discurso de 11/07/1871. p.217. 74 Ver: Novas Cartas políticas de Erasmo. 75 Ibidem, pp.226-227. Discurso de 13/07/1871.
37
As palavras eram clara referência à resposta dada por D. Pedro à Junta
Francesa de Emancipação em 1866. Nessa resposta afirmava que a
emancipação era questão de forma e oportunidade. Segundo Holanda, a carta
enviada pelo Imperador à Junta Francesa, indicava as simpatias da Coroa pela
causa da emancipação e criava um comprometimento moral para o Brasil perante
a comunidade internacional. Além disso, tal missiva havia sido enviada em
secreto para a Europa, sendo conhecida no Brasil apenas depois de já ter sido
divulgada na Europa. 76
O fato de ter sido divulgada primeiramente no estrangeiro e só então ter
vindo a público no Brasil também foi alvo de críticas por parte de Alencar:
Os brios nacionais se confrangem, pensando que, de improviso, por causa de um elogio, sem preparo, sem estudo prévio, nem audiência do País, por um traço de pena, se decretou uma revolução desta ordem! E levou-se o desprezo a tal ponto que o País não teve conhecimento do fato senão de torna-viagem!. 77
Para Alencar, ao governo não cabia arbitrar acerca destas questões, haja
vista a imparcialidade que deveria ser adotada pelo monarca, pelo que ao postar-
se ao lado dos abolicionistas, tolhia o princípio da discussão e do livre julgar por
parte da sociedade brasileira como um todo. Em seu olhar, a própria luta gerada
pelo antagonismo das idéias, quais sejam a da emancipação direta ou indireta, ou
dos princípios liberais e conservadores não existia, o que havia era a “luta do
Poder com a Nação; a luta do elemento oficial contra os interesses máximos do
país”. 78
4.6. O PRINCÍPIO DA NÃO-INTERVENÇÃO:
Em coerência com seus argumentos, Alencar, que considerava não ser
correto para um imperador arbitrar sobre as questões da emancipação, também
considerava impróprio de um governo legislar sobre causas que entendia ser
76 HOLANDA. Op. Cit. P. 206. 77 ALENCAR, Discursos..... p. 227. 78 Ibidem, pp. 225. Discurso de 13/7/1871.
38
exclusivamente de caráter particular; especialmente se a “causa” era a questão
do “elemento servil”.
Afirmando-se sempre um defensor da emancipação, desde que bem
organizada e principalmente desde que almejada pela sociedade brasileira,
Alencar afirmava que antes de existirem as leis que colocariam um fim na
escravidão deveria acontecer uma mudança nos costumes dos brasileiros, a
sociedade deveria deixar de ser escravistas, para então as leis também deixarem
de sê-lo. Em seu discurso de 14/05/1870 apontava:
Todos nós brasileiros desejamos ardentemente ver desaparecer do País essa instituição; todos nós brasileiros fazemos votos para que deixemos de formar no mundo civilizado a exceção triste (digamos a verdade), que muito breve teremos infelizmente de constituir. Mas desta convicção à idéia de promover a abolição, em uma época recente, por meio de medidas diretas e legislativas, há uma distância imensa. 79
De acordo com ele, era inadequada uma reforma da instituição escravista
que partisse do “alto”. A seu ver, a abolição deveria ser efetivada primeiramente
nos costumes, nos hábitos e nas práticas sociais. O clamor por tais reformas
deveria partir da opinião pública, da população em geral, pois enquanto o Brasil
se compreendesse como sociedade dependente de mão-de-obra escrava não
haveria demanda por mudanças. Assim sendo, não era por intermédio de leis
impostas à sociedade que a escravidão deveria ter um fim. E sobre a questão da
opinião pública dizia:
Eu, senhores me regozijo e me felicito por ver que já uma vez a opinião pública no Brasil tomou tão decididamente a iniciativa de uma grande reforma social e que há de realizá-la mais prontamente do que o poderão fazer os representantes da Nação, os legisladores do País. E com mais sabedoria, sem abalo, sem ofensa de direito adquirido e de uma maneira, como já tive ocasião de o dizer muito mais digna do Brasil. Ninguém então se lembrará de apregoar, as nações estrangeiras não poderão acreditar, que o legislador do Império, que uma força superior impôs a seu País a emancipação contra a sua vontade, contra seus votos. Será a própria Nação que, por meio de sacrifícios parciais de esforços comuns, realizará essa reforma e dará espontaneamente esse belo exemplo de respeito à civilização moderna80.
79 Ibidem. Discurso dia 14/05/1870.pp.186-187 80 Ibidem.
39
Sua proposta era a mão-inversa, ou seja, aos costumes se sucederiam as
leis: primeiro a abolição na prática, depois a emancipação legal. Neste sentido,
dizia ele: “fui um dos primeiros que se inscreveram na cruzada santa que trabalha
por extinguir a escravatura, não na lei, mas nos costumes que são a medula da
sociedade” 81.
Sendo assim, caberia ao governo viabilizar e ampliar as iniciativas de
manumissão privada que já ocorriam em grande monta neste período, votando
cotas para a emancipação assim o governo se tornaria coadjuvante no processo
de promoção da emancipação, mas que seria protagonizado pelos proprietários;
uma vez que apenas a eles cabia arbitrar sobre uma propriedade sua; dizia ele:
“Que as assembléias provinciais votem cotas para a emancipação, coadjuvando,
assim, a iniciativa particular e as nobres aspirações do espírito público” 82. Além
de respeitar o direito à propriedade, julgava que a emancipação realizada através
da iniciativa individual engrandeceria e enobreceria a própria sociedade brasileira,
deveria haver uma demanda social por esta mudança, demonstrando assim a
grandeza do povo brasileiro.
(...) a tendência manifesta para operar esta reforma espontaneamente, sem a necessidade de uma lei, o que seria muito mais glorioso para nós. Seria a emancipação feita pela nação, levada a efeito por um impulso nobre da sociedade brasileira. Pois esta glória o governo nos quer extorquir, quer esbulhar dela o país e fazer um troféu para...não direi para quem.83
Portanto, em suas concepções o governo não deveria legislar sobre causas
que ele considerava que não lhe competiam, não deveria forçar a sociedade
aceitar reformas impostas por um anseio de glorias externas como já
demonstrado anteriormente. Como uma avalanche ia se sucedendo as
intervenções do governo sobre a questão.
Seu discurso de 13 de julho de 1871 é bastante esclarecedor quanto a estas
posições por ele defendidas, como no trecho que se segue:
81 Ibidem, Discurso de 13/07/1871p.197. 82 Ibidem. Discurso de 14/05/1870 p. 188. 83 Ibidem. Discurso de 13/07/1871p.203.
40
Ainda repercutem neste recinto as palavras sinistras, proferidas pelo nobre Ministro da Justiça; ainda me sinto estremecer recordando aquela ingênua e triste confissão: ‘A pedra arrancada de seu alvéolo, do cimo da montanha, disse S. Exª., não pode mais parar, há de rolar até a base’. Essa pedra é a questão da emancipação, essa pedra é a proposta que está aí sobre a mesa. O nobre Ministro tinha razão, ela foi arrancada lá das alturas inacessíveis e arrojada ao precipício por uma mão possante, por essa mão que, na frase da sociedade abolicionista, confere a liberdade neste país de servos. Ela foi arrancada das alturas inacessíveis e, arrojada de despenhadeiro em despenhadeiro, arrasta após si o Gabinete de 07 de março que, não podendo conter o impulso que lhe imprimiram, rolará até o abismo, se a opinião pública o não amparar, se nós o não salvarmos. 84
A mão de que falava Alencar eram, tanto as posições tomadas pelo
Imperador, quanto as pressões estrangeiras sofridas pela sociedade brasileira em
favor da emancipação.
4.7. POR UMA REFORMA LENTA E GRADUAL:
Seguindo suas concepções acerca da escravidão, Alencar afirmava que as
reformas propostas irrompiam de forma abrupta e eram levantadas por
propagandistas e agitadores que queriam erigir um nome as custas da ruína de
uma nação.
Defendendo-se da alcunha de escravista e retrógrado afirmava que a calma
e a firmeza de suas convicções o fazia verdadeiramente um filantropo. Aos
emancipadores interessava apenas a glória, a ele interessava a reabilitação e a
civilização dos cativos, “fazer homens livres, membros úteis da sociedade,
cidadãos inteligentes, e não hordas selvagens atiradas de repente no seio de um
povo culto”85.
Retrógrados, considerava, eram os próprios abolicionistas, que queriam
fazer retroceder a nação matando sua “primeira indústria”: a lavoura. Além disso,
pretendiam libertar sem preparar, ao contrário dos opositores à lei que visavam,
segundo ele, a redenção dos cativos “como queria Cristo”. Dirigindo-se aos que
considerava que fossem abolicionistas, argumentava:
84 Ibidem. Discurso de 13/07/1871. p. 225. 85 Ibidem.p. 228.
41
Vós quereis a emancipação como uma vã ostentação. Sacrificais os interesses máximos da pátria a veleidades de glória. Entendeis que libertar é unicamente subtrair do cativeiro, e não vos lembrais de que a liberdade concedida a essas massas brutas é um dom funesto; é o fogo sagrado entregue ao ímpeto, ao arrojo de um novo e selvagem Prometeu! Nós queremos a redenção de nossos irmãos, como queria Cristo. Não basta para vos dizer à criatura, tolhida em sua inteligência, abatida na sua consciência: ‘Tu és livre; vai; percorre os campos como uma besta fera...’ Não senhores, é preciso esclarecer a inteligência embotada, elevar a consciência humilhada, para que um dia, no momento de conceder-lhe a liberdade, possamos dizer: ‘Vós sois homens, sois cidadãos. Nós vos remimos não só do cativeiro, como da ignorância, do vício, da miséria, da animalidade em que jazíeis!’. 86
Através deste trecho podemos vislumbrar a apreensão de Alencar sobre as
consequências do cativeiro sobre a índole, a inteligência e o comportamento dos
escravos. Por isso, uma libertação que não viesse acompanhada de outras
medidas de preparação dos libertos tornaria a manumissão não um ato de
bondade ou caridade, mas sim de torpeza e maldade. No mesmo sentido,
afirmava Alencar:
Nós queremos a reabilitação daqueles que um erro do passado abateu; vós quereis a emancipação por uma simples vaidade; para vós a liberdade não é senão o combustível que acenderá a luz da vossa glória, de reformadores e propagandistas.87
Reconhecedor de que a escravidão havia sido um erro e de que a abolição
deveria ser efetivada, Alencar era partidário de modificações lentas que não
colocassem em risco, nem a sociedade livre, nem a população a ser liberta. Para
Alencar, portanto a abolição deveria ser acompanhada de medidas que pudessem
preparar os escravos para serem livres. Além disso, deveria ser realizada pela
iniciativa privada, por meio da mudança de costumes da sociedade brasileira, e
não por meio de leis.
Alencar tratou da emancipação, sobretudo nos anos 1870 e 1871. Em 1877,
ele voltaria às questões referentes ao trabalho, desta vez discorrendo sobre a
colonização estrangeira. Nessa abordagem ele mostra-se muito coerente com
86 Ibidem. 87 Ibidem. Discurso de 13/07/1871.p.229.
42
seus propósitos apresentados anos antes, quando da discussão da Lei do Ventre
Livre.
4.8. SOBRE A IMIGRAÇAO ESTRANGEIRA:
Concomitante às afirmações de que cabia à iniciativa privada promover a
emancipação, ele criticou também a imigração promovida pelo poder público.
Chamando-a de “tráfico de europeus”:
Confiemos nas nossas forças, tenhamos fé nos nossos destinos, conservemos vivo, possante o sentimento da nossa individualidade de povo, e havemos de ser um grande Império, sem necessidade de recorrer a esse tráfico de europeus, muito mais odioso do que o de africanos, embora se disfarce com o nome de colonização88.
Alencar considerava que a imigração não deveria ser favorecida pelo
governo, mas sim realizada de forma espontânea, e não com pretextos de suprir o
mercado brasileiro de mão-de-obra. Para ele, não eram necessários imigrantes
para o trabalho na grande lavoura, pois havia já muitos braços no Brasil. Além de
se correr o risco de forjar apenas cópias de nações européias e não uma nação
genuinamente brasileira89. Em seus discursos apontava a necessidade de se
manter vivo o sentimento nacional:
Enquanto o sentimento nacional foi forte e enérgico, nós tivemos um povo cheio de civismo e independência. (...) As coisas vão caminhando de modo que em muito pouco tempo a Corte do Império, não na população mas no espírito, há de ser mais portuguesa, mais inglesa e mais francesa do que brasileira.90
Em um momento em que as vozes mais instruídas da nação clamavam pelo
advento da imigração estrangeira, Alencar mostrava-se contra tais iniciativas, e
afirmava estar vendo surgir em seu meio um “fetichismo do estrangeiro”, o que
geraria a falta de elementos necessários para se construir uma nação.
88 Ibidem. Discurso de 07/05/1877. p. 55. 89 Ibidem, pp52-65. 90 Ibidem.p.57.
43
Predominasse a imigração, ele considerava, o Brasil novamente se tornaria
colônia de alguma outra nação poderosa. Ao contrário ele considerava:
Mas, felizmente, senhores, esta não é a verdade. Nós temos todos os elementos para ser uma grande nação; o que necessitamos é perseverança e confiança em nós mesmos. No dia em que nos emanciparmos da tutela da Europa e mostrarmos que podemos viver sem os seus colonos e sem os seus capitais, o dinheiro e a população estrangeira hão de imutar o nosso país.91
Em seus escritos literários Alencar sempre demonstrou seu desejo em forjar
a nação brasileira a partir dela mesma. Temos como exemplo máximo as figuras
de Ceci e Peri da obra O Guarani. Promotor da ascensão do pensamento
originariamente brasileiro, como não poderia deixar de ser opõe-se à colonização
que vem ganhando força nos ano finais do século XIX.
Ao longo das páginas deste trabalho, ao considerar a maneira Alencar via a
questão da emancipação, vimos que um de seus princípios mais claros era o que
aqui denominamos de princípio da não intervenção. Em seu discurso sobre a mão
de obra imigrante este princípio se faz central mais uma vez.Para ele, o problema
não residia no fato de estar ocorrendo a imigração européia, mas sim na
promoção da imigração feita pelo governo brasileiro. Segundo ele a “foi a
colonização oficial que matou a emigração espontânea“. 92
91 Ibidem, p. 57. 92 Ibidem. p.57.
44
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS:
De modo geral observamos que a produção historiográfica sobre a questão
da emancipação ao classificar os sujeitos que estiveram inseridos nos debates
sobre a abolição da escravidão, tende a opor dois grupos: os escravistas e os
abolicionistas, ficando Alencar sempre entre os primeiros. Contudo, ao
analisarmos as obras de alguns historiadores, especialmente depois de travar um
contato maior com as obras do próprio Alencar, passamos a lê-las de uma outra
maneira, facultando conclusões diversas, que não impliquem em reducionismos.
José Murilo de Carvalho em sua obra Pontos e Bordados93, ao discutir a
questão da escravidão, encontra pontos de comparação entre a obra de Alencar,
sobretudo as Cartas de Erasmo, e a obra do Bispo Azeredo Coutinho, que no
século XVIII escreveu a obra “Análise sobre a Justiça do Comércio do Resgate
dos Escravos da Costa da África”. Em seu artigo, Carvalho expõe as razões dos
abolicionistas e as dos escravistas, dentre eles, Alencar. Carvalho afirma:
Seus argumentos em favor da manutenção da escravidão apresentam sólida base econômica e histórica. No entanto, ele às vezes deixa escapar argumentos que, pela intensidade da linguagem em que são envolvidos, fazem suspeitar que sejam os mais relevantes. São razões políticas. Mas não da política nacional de José Bonifácio. São razões políticas de sua classe de proprietários de escravos94.
Observamos no decorrer deste estudo, contudo, que o argumento da Razão
Nacional também se encontravam presentes nos argumentos de Alencar, que
naquele momento opunha-se à abolição.
Robert Conrad em obra já citada neste estudo, por sua vez, aloca Alencar
entre os opositores da Lei do Ventre Livre, o que de fato era, e entre outros
excertos cita a opinião de Alencar diante da posição do Imperador frente a
questão da emancipação, conforme já vimos anteriormente. De modo geral,
Conrad, não classifica Alencar como escravista. 95
93 CARVALHO, José Murilo de. Pontos e Bordados: escritos de história e política. Escravidão e razão nacional. As batalhas da abolição. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998. 94 Ibidem, p.54. 95 CONRAD. Op. Cit.pp.110-120.
45
Podemos mencionar ainda a obra de Ricardo Martins Rizzo, que relaciona as
posições de José de Alencar frente à escravidão a partir do prisma jurídico e não
hesita em afirmar: Alencar era antiabolicionista e mesmo antigradualista. No
mesmo artigo, porém aponta: “incorporou e desenvolveu até as últimas
consequências, argumentos utilizados pelos escravocratas mais convictos, coisa
que não era” 96. Consideramos que mais interessante que classificar José de
Alencar é buscar interpretar suas posições em relação às medidas de
encaminhamento da abolição e da imigração no Brasil da sua época. Por isso,
analisamos as opiniões expressas por Alencar, não para classificá-lo como
“escravista” ou “abolicionista”, mas procurando entender suas posições sobre o
encaminhamento que ele defendia ser o melhor para a então chamada “questão
servil”, estabelecendo a relação entre essas posições e suas convicções políticas,
recuperando seu projeto de transformação da sociedade brasileira.
Alencar defendeu seus ideais, não apenas enquanto político, mas também
em suas obras literárias. Seu projeto de forjar uma nação genuinamente brasileira
expressava-se também na maneira de conduzir as relações escravos/ senhores.
Pensava que a abolição devesse se fazer através de mudanças que primeiro se
dariam no modus vivendi da sociedade brasileira e depois seriam tornadas em
leis.
Alencar foi derrotado em 1870. O projeto que tanto combateu foi aprovado
pelo Parlamento brasileiro, sob o comando de um gabinete de seu partido – o
Conservador. Da mesma forma, suas críticas à imigração subvencionada não
foram incorporadas às políticas imigratórias do governo brasileiros: pelo menos
em relação às províncias do Centro Sul cafeeiro, a imigração subvencionada foi o
padrão adotado a partir dos anos 1880.
Esta política oficial de imigração subvencionada, entretanto, Alencar não
chegou a conhecer. No mesmo ano em que combatera esta maneira de proceder
a imigração, em 1877, acometido por sérios problemas de saúde, para os quais
foram inúteis as viagens ao exterior e a busca pela recuperação, Alencar faleceu,
vitimado pela tuberculose. Em 12 de dezembro de 1877, Alencar deixava um
96 RIZZO, Ricardo Martins. A arrogância da teoria contra a lei: direito, escravidão e liberdade em José de Alencar. Revista Prisma Jurídico. V.6.p.243-262. São Paulo:2007.
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grande legado, tanto literário quanto político. Alcançava de certa forma, o que
havia desde muito cedo desejado: o reconhecimento das gerações futuras.
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REFERÊNCIAS
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liberdade em José de Alencar. Revista Prisma Jurídico. V.6.p.243-262. São
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Outros documentos utilizados:
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Janeiro, 1867, s/ref.
______________. Cartas Políticas de Erasmo ao Imperador.
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