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Colônia Pirianito: trajetórias de imigrantes japoneses no norte do estado
do Paraná
JOSÉ JUNIO DA SILVA (UFPR)1
Esta comunicação busca entender experiências de vida de imigrantes
japoneses produzidas na Colônia Pirianito (hoje Uraí), fundada em 1936, no
Norte do Paraná, pela Companhia Nambei Tochi Kabushiki Kaisha. A presença
de colonos nipônicos em Pirianito insere-se no avanço das frentes pioneiras,
nos espaços da colonização e da fronteira agrícola, vigentes no norte do
estado no início do século XX. As balizas temporais compreendem o ano de
fundação da Colônia Pirianito (1936) e o da venda dos remanescentes de suas
terras à Companhia Brasileira de Rami, em 1956. Os objetivos da pesquisa
são: entender Uraí como espaço de interrelações, priorizando o contato dos
nipônicos com grupos de nacionais, a relação estabelecida entre os nipônicos e
nipo-brasileiros com a produção do rami, compreender as produções da cultura
material deixadas pelos japoneses e seus descentes no espaço de Uraí. A
perspectiva metodológica da micro-história está presente nesta pesquisa, tendo
em vista nosso objeto, a própria imigração nipônica para o Brasil, e a iniciativa
do governo japonês em financiar o projeto de emigração. Ressaltamos a
importância da memória dos imigrantes e de seus descendentes, nipo-
brasileiros, para a realização desta pesquisa, além de documentos fotográficos
que produzem explicações sobre a cultura material deixada pelo grupo nipônico
em Uraí. A relevância e pertinência da pesquisa se justificam pela sua
particularidade, pelas especificidades do objeto e dos referenciais de análise
* doutorando em História pela Universidade Federal do Paraná, bolsista pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Orientando do professor Dr. Sérgio Odilon Nadalin.
2
que demarcam a historiografia no campo de estudos sobre imigração japonesa
no Paraná e no Brasil. O desafio da pesquisa busca a reflexão sobre o espaço
de Uraí destacando como personagens principais o grupo nipônico e seus
descendentes.
Palavras-chave: Colônia Pirianito (Uraí); produção do rami; trajetórias de vida.
O objetivo deste artigo é o estudo da emergência e formação da Colônia
Pirianito, resultante do empreendimento imobiliário da Nambei Tochi Kabushiki
Kaisha em área do Norte do Paraná, futuramente denominada de Uraí. As
atividades da empresa se inserem, concomitantemente, em contextos
específicos da expansão da atividade industrial no Japão, da política imigratória
do estado brasileiro e da política agrária e de povoamento do estado do Paraná.
Portanto, a abordagem na perspectiva de escalas remete-nos às considerações
sobre o processo de ocupação do Norte do estado do Paraná, em seus
momentos distintos. Dos objetivos deste artigo consta, também, o propósito de
analisar a atuação desta empresa relacionada em dar suporte ao trabalho dos
primeiros colonos nas principais atividades econômicas de Pirianito e as
articulações comunitárias. De modo subsequente, nossa atenção irá reter-se
sobre os sujeitos históricos e suas relações cotidianas, a produção do rami, e as
lógicas sociais de colonos nipônicos e nipo-brasileiros investidos na tarefa de
edificação de Pirianito.
O desenvolvimento do núcleo habitacional foi relativamente rápido, com
ocupação dos lotes urbanos e rurais. A presença prévia de japoneses na região
norte do estado pode ser associada ao ritmo da ocupação de Pirianito. Os
japoneses estavam fixados na Fazenda Barboza Ferraz desde 1913, ocupados
no cultivo do café e atraídos pela fertilidade da terra. Em 1917, estavam
presentes em Cambará, na Vila Japonesa, e em 1927 na Fazenda Nomura, em
Bandeirantes. No ano seguinte, sua presença era registrada em Cornélio
3
Procópio2. O empreendimento da “Paraná Plantation Ltda” na região do Norte
Novo de Londrina e a extensão dos trilhos da Ferrovia, atravessando o Rio
Tibagi, somam-se aos fatores favoráveis ao fortalecimento da corrente
migratória japonesa e ao desenvolvimento da Colônia Pirianito.
O início de desmatamento é dedicado ao corte e limpeza da vegetação
baixa sob as grandes árvores. Para a roçada, a foice era suficiente e o corte de
cipós e trepadeiras deveria ser feito pela raiz para não comprometer a direção
da queda das árvores. Na segunda etapa do trabalho, procede-se a derrubada
das grandes árvores com o machado. Nesta fase, o trabalho de derrubada é
conjugado. As árvores médias recebem fendas no lado da frente e de trás,
calculada a direção que deverão cair, pois serão derrubadas pelo tombamento
das árvores grandes. Riukiti Yamashiro, quando lavrador na Colônia Cedro,
derrubou e limpou uma área para plantar milho e diz “todos tiveram que
aprender a usar machado e foice, pois em Okinawa nunca haviam derrubado
mata natural” 3.
O processo de derrubada das grandes árvores exige procedimentos
diferentes. As de madeira de lei (peroba e cedro, por exemplo), cujos troncos
têm o mesmo diâmetro e atingem a altura de 5 metros ou mais, exigem apenas
o trabalho com o machado. Contudo, figueiras e pau-d´alho, cujos troncos são
de base larga e diâmetro grande, exigem a técnica de andaime, em geral, com
1,5 metros de altura. Sobre ele inicia-se outra fase que exige o trabalho de dois
homens no manejo do serrote – “trança” – com 2 metros de comprimento,
fazendo um corte horizontal no tronco. Em seguida, corta-se obliquamente a
parte superior com o machado. Repete-se o procedimento na parte oposta do
2 RESENDE, Tereza Hatue de. Ryu Mizuno. Saga japonesa em terras brasileiras. Curitiba: SEEC; Brasília: INL, 1991, p. 85. STADNIKY, Hilda Pivaro e BARROS PINTO, Meyre Eiras. Contribuição ao estudo da presença nipo-brasileira no Norte Novo de Maringá. In: DIAS, Reginaldo B. & GONÇALVES, José Henrique Rollo. Maringá e o Norte do Paraná. Estudos de História Regional. Maringá: EDUEM, 1999, p.239-254, p.241. 3 YAMASHIRO, José. Trajetória de duas vidas. Uma história de imigração e integração. São Paulo: Cultura Editores Associados, 2001, p.50.
4
tronco. As raízes também exigem cuidados e as partes salientes devem ser
cortadas com o machado. Após uns 3 meses, as árvores estarão secas para a
queimada, que deve ser feita após um período de 7 dias contínuos de seca.
Depois de terem desmatado a área, os trabalhadores começaram a
fazer as primeiras obras de infraestrutura e assegurar as comunicações com as
comunidades vizinhas, em direção a Cornélio Procópio. A área original da
Colônia incorporou 2 mil alqueires da Companhia Barbosa, acarretando uma
nova divisão das terras, cujos lotes tinham a dimensão de 2 alqueires.
Feita a limpeza do terreno, plantaram arroz, feijão e milho e passaram a
construir suas casas. Nesses primeiros tempos, a produção abundante do
arroz era saudada com alívio, pois garantia a sobrevivência. Depois disso, era
só esperar pelo café, que era considerado como “a árvore que dava o dinheiro”.
Depois de plantado, o cafezal demoraria 4 ou 5 anos para começar a produzir,
sendo necessário nesse período sobreviver com outras plantações4.
A construção das casas de imigrantes não exigiu qualquer esmero
arquitetônico e o maior cuidado era com as goteiras em épocas de chuvas. Os
troncos das palmeiras, abundantes na região, foram cortados em quatro partes
e aproveitados como paredes e o telhado, em geral, feito de sapé. Tal qual a
descrição de Yamato Kinjo, na Fazenda Floresta, em Itu. “As casas eram de
sapé, com paredes de pau-a-pique e chão de terra batida” 5, ou a de Riukiti
Yamashiro, que ao chegar à Fazenda Cedro “ergueu um barracão de 6 metros
por 3 no meio do mato, utilizando juçara partida ao meio em vez de tábua, cipó
substituindo cordas e, para a cobertura, sapé que havia em abundância” 6.
4 HANDA, Tomoo. O imigrante japonês. História de sua vida no Brasil. op. cit. 268. 5 ARAI, Jhony. Viajantes do sol nascente. História dos imigrantes japoneses. São Paulo: Editora Garçoni, 2003, p. 29-30. 6 YAMASHIRO, José. Trajetória de duas vidas. Uma história de imigração e integração. op. cit. p. 49.
5
Em geral, quando se derruba a mata é feita a plantação do café. Porém,
em razão da sobrevivência, essas terras são aproveitadas para a produção do
arroz ou algodão. Em geral, são culturas intercalares com o café. Nos cafezais
onde os pés estão no primeiro ao segundo ano as culturas são semeadas,
comumente em três fileiras, que serão diminuídas para duas quando o café
estiver no terceiro ano. No quarto ano de desenvolvimento do cafeeiro, a
semeadura é reduzida para uma fileira ou não se efetuam mais as culturas
intercalares7. Cultivar a “árvore do arroz” era para os imigrantes japoneses uma
aspiração constante. Cultivar o arroz significava, no seu entender, retornar à
atividade de agricultor, na verdadeira acepção da palavra8. Desde a época em
que trabalharam nas fazendas de café, eles tinham na rizicultura a maior de
suas aspirações. Produzir este cereal para que pudessem fartar-se nas
refeições.
Muitos escolheram os brejões para o plantio de arroz. São áreas
freqüentemente existentes às margens dos rios, que na época das chuvas
ficam alagadas. Utilizava-se uma máquina de capina – ou carpideira – para
formar regos, sobre os quais jogavam as sementes com as mãos, e por último
a carpideira cobria as sementes. Para esse tipo de operação, apenas uma
mula era suficiente. Com a chegada das chuvas, o terreno alagava-se, exigindo
a capina. Se as precipitações fossem boas estava garantido o rápido
crescimento do arroz. Os agricultores se ocupavam de ceifar os grãos,
utilizando a foicinha japonesa e, depois, do esbagoamento, no qual as hastes
carregadas eram batidas contra o banco – um estrado confeccionado de finos
galhos, em geral estreito e longo, em forma de “U”. Um pano colocado em
torno dos bancos, em forma de cortinado, e outro debaixo deles, impediam que
os grãos soltos se espalhassem. A separação dos ciscos normalmente era
7 NISHIKAWA, Daijiro. Produção e circulação de produtos agrícolas. In: Assimilação e integração dos japoneses no Brasil. Petrópolis: Vozes; São Paulo: EDUSP, 1973, p.273-301, p. 278-9. 8 HANDA, Tomoo. O imigrante japonês. História de sua vida no Brasil. op. cit. p. 362.
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efetuada com a ajuda do vento e da tarara9. Os grãos eram passados na
peneira, e as espigas remanescentes eram esbagoadas com o karazao, uma
espécie de vara usada para essa finalidade pelos lavradores japoneses. Assim,
não havia como faltar o mochi10 nas comemorações do ano novo e aniversário
do Imperador.
Foto n 1: Pirianito. Rizicultura 1. (1947) Fonte: acervo pessoal de Jorge T. Takano.
Contudo, quando o nível da água começava a baixar apareciam os
mosquitos disseminadores da malária, revelando-se pouco rentável a rizicultura
de varjões, pois, além de tudo, neste tipo de produção o arroz torna-se
extremamente quebradiço após o beneficiamento, perdendo valor na
comercialização. Na Colônia de Cacatu, no litoral paranaense, onde também foi
cultivado arroz, Ryu Mizuno mostrou-se muito preocupado com a incidência da
maleita e a falta de assistência médica11. No final de 1939 a Colônia Pirianito
9 Ibidem. p. 372-374. 10 Bolinho feito de arroz, é uma iguaria oferecida aos deuses, especialmente no Ano Novo.
Segundo a crença, simboliza o sol e a lua ou o homem e a mulher. Colocado na sala principal
ou em uma mesinha no altar xintoísta da casa como uma oferenda aos deuses, o mochi
simboliza a expectativa de felicidade e prosperidade no ano que se inicia.
11 RESENDE, Tereza Hatue de. Ryu Mizuno. Saga japonesa em terras brasileiras. op. cit. p. 90.
7
conheceu a epidemia de maleita, que assolou o local até 1942. Michiko
Sugahara, assim a relatou:
Em 1942, nós pegamos maleita, eu também peguei. Quando chegava assim meio dia assim pode ficar em qualquer lugar, mas dava calor e depois frio. E pode ficar debaixo de três, quatro acolchoados que não adianta. Dava tremor... ficava tremendo. Então, a gente já era acostumada, quando chegava meio dia a gente ia assim prá fora. Ficava em cima de um tronco no solão quente e a gente ficava lá... no sol quente. Não curava, mas a gente lá ficava. Depois quando passava o frio, aí vinha a febre. Aí a gente vinha para dentro de casa, aí entrava na cama. Mas daí, tomei quinino, tomei umas injeções paludam (sic), aí sarou, mas pelo tanto que tomei ficou mais de anos e anos assim, forte demais, adormecida a nádega. Ficou adormecida de tão forte que era o remédio12.
Na estação ferroviária de Congonhas, permanecia Hikoma Udihara,
revendedor de lotes da Paraná Plantation, recomendando aos passageiros
para que fechassem as janelas do vagão para se precaverem contra mosquitos
portadores do mal da maleita. As medidas tomadas no combate ao mal, soro
de quinino, e mais tarde, com a recomendação da Universidade de São Paulo,
recorreu-se a novos medicamentos, entre eles um injetável (americano), foram
suficientes para debelar o mal. Contudo, não conseguiu evitar um abalo nas
vendas das terras. Relatórios da Nambei indicam que em 1941 havia 509
famílias, das quais 221 eram japonesas. A população total compreendia 2.510
pessoas, das quais 46% eram nipônicas. Do total de áreas cultivadas (952
alqueires), 647 alqueires pertenciam aos japoneses.
Em decorrência, a partir de 1936, registra-se grande afluxo de capitais
japoneses no Brasil, particularmente nos setores de beneficiamento, fiação e
exportação de algodão. Por outro lado, agricultores japoneses foram
incentivados para a produção de algodão e, amparada em capitais japoneses,
12 Entrevista de Michiko Sugahara concedida a Evandir Codato, em 18 de abril de 1985, em sua residência em Urai, duração de 2:30 minutos.
8
a cotonicultura desenvolveu-se rapidamente13. Assim, o algodão era comprado
e beneficiado por firmas nipônicas e por elas exportado em navios japoneses.
No Japão, é fundada a Nishi Haku Menka Kabushiki (Sociedade
Algodoeira Brasil-Japão Ltda), que aglutinava entre seus acionistas fiações
japonesas, importadoras de algodão e companhias de colonização e que se
destinava à importação de algodão brasileiro. No Brasil, esta sociedade operou
sob o nome de BRAZCOT, investindo na compra, beneficiamento e exportação
de algodão. Outra parceira, a Casa Bancária BRATAC, foi fundada
especificamente para fornecer crédito à colônia japonesa. Por problemas de
legislação relacionados à Carta de 1937, a Casa Bancária foi transformada em
Banco América do Sul, como banco da colônia japonesa14. Portanto, a
conjugação de interesses compreendia migração planejada, produção
orientada e investimentos japoneses.
A investida do Cartel das indústrias têxteis japonesas expressa seus
interesses pelo algodão, seda, juta, junco e rami. De um lado, a proeminência
do capital japonês no setor algodoeiro ao longo dos anos 1930 e, de outro, a
atuação das companhias colonizadoras e o patrocínio oficial do governo
japonês na migração planejada, encorajam-nos na reflexão da solidariedade
étnica e no fortalecimento dos valores simbólicos dos imigrantes aqui
estabelecidos.
No âmbito dos interesses pelas fibras, no final dos anos 1930, a
indústria japonesa incentivou experiências com o rami, relacionadas à
aclimatação e à qualidade. Em 1938, Seiki Murakami trouxe da estação
experimental da província de Miyazaki uma variedade e tentou divulgá-la no
13 Consultar: CODATO, Evandir. Colonização Agrícola: A Colônia Três Barras – 1932-1970.
Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de História da Universidade Federal do Paraná, 1981. 14 VIEIRA, Francisca Isabel Schurig. O japonês na frente de expansão paulista: o processo de absorção do japonês em Marília. São Paulo: Pioneira/EDUSP, 1973, p. 54-5.
9
Estado de São Paulo. O rami entra em Pirianito por intermédio Reikiti Matsui,
engenheiro da Nambei Tochi Kabushiki Kaisha que observa o ótimo
desenvolvimento que essa lavoura teve na Fazenda Anhumas, estado de São
Paulo. Posteriormente, imigrantes japoneses residentes em Anhumas
deslocaram-se para Pirianito. Assim como foi feito com a fibra no Estado de
São Paulo, os imigrantes plantaram o rami na gleba Pirianito. De uma maneira
surpreendente, o resultado da plantação foi superior ao das plantações de
Anhumas.
Com o resultado do primeiro cultivo, a produção começou a ser
expandida, tendo sido comercializada tanto no Brasil quanto no exterior. A
qualidade da produção possibilitou a plantação em escala comercial e a
importação, do Japão, de máquinas de desfibramento. O rami desenvolveu-se
muito bem em Pirianito, despertando o interesse da empresa de Fiação e
Tecelagem Tóquio de Rami S/A, que tinha o objetivo de montar uma filial de
fiação e tecelagem nesta Colônia. Em virtude dos bons resultados, em 1941, a
empresa de Fiação e Tecelagem Tóquio de Rami adquiriu 400 alqueires em
Pirianito, para a plantação de rami.
Contudo, devido à II Guerra Mundial, a indústria de fiação e tecelagem de
rami acabou por não se instalar no município, coincidindo com as medidas do
governo brasileiro para apreender todos os bens dos imigrantes japoneses. No
entanto, a produção ocorreu somente depois da Segunda Guerra. Em 1946,
ficaram prontas as instalações da Cibram. Em 1959, em Uraí, começaram a
funcionar as máquinas de industrialização pertencentes à Itimura, conhecido
como “Rei do Rami”.
Em decorrência dos bons resultados obtidos nesse setor a cidade de
Uraí contou, no auge do desenvolvimento do rami, com a Companhia Indústria
Paranaense de Rami (CIPRA), de propriedade da família Itimura, a Imperial
Fibras e a Uraí Rami S/A. A fibra do rami, pertencente à família das fibras
10
longas, tem em média 150 a 200 milímetros de comprimento, a exemplo do
linho, juta, sisal e cânhamo. Apresenta alta resistência, considerada três vezes
superior à do cânhamo, quatro vezes à do linho e oito vezes à do algodão. A
lavoura de rami encontrou condições altamente favoráveis ao seu
desenvolvimento na Colônia Pirianito.
Em termos de processo produtivo, esta cultura apresenta baixo padrão
tecnológico, sendo bastante intensiva no uso da mão-de-obra, da qual exige
muito esforço físico. O corte do rami é uma atividade braçal extremamente
exaustiva, com processos altamente demandantes de esforço físico. Além
disso, a máquina periquito utilizada na sua descorticagem é perigosa e
ineficiente, redundando na alta incidência de acidentes de trabalho. A
defasagem tecnológica e as precárias condições de trabalho completam o
quadro de dificuldades para os trabalhadores do setor.
O processo de beneficiamento é constituído da descorticagem e da
desgoma. A primeira etapa é feita ainda no campo, através de máquinas
desfibradoras ou descorticadoras, sendo as mais utilizadas conhecidas como
periquitos, que separam as cascas das hastes. A desgomagem, por sua vez, é
feita nas indústrias via processos químicos.
Após o corte dos caules, o rami era carregado nos ombros até a máquina
periquito, que retorcia a planta, descascando seu caule. A fibra era retirada da
parte externa do caule, sendo as folhas descartadas. Sob o sol quente, a
máquina era operada e necessitava de várias pessoas para realizar diversas
operações.
Passava-se o caule do rami, no mínimo duas vezes pelo interior da
máquina, separando a fibra do restante da planta. Era um trabalho arriscado,
principalmente pelo último homem, aquele responsável em colocar o rami no
interior da máquina, por um orifício grande o bastante para passar as mãos
11
juntas. A foto abaixo indica, não apenas a quantidade de trabalhadores para
operá-la, mas, também a proximidade física entre homem e máquina, como se
um fosse extensão do outro.
Foto n.2: Máquina Periquito, descorticagem do rami. Fonte: acervo pessoal de Jorge T. Takano.
Em Uraí, no auge do rami, vários acidentes envolvendo trabalhadores
foram notificados em jornais e revistas e denunciados aos sindicatos dos
trabalhadores devido à amputação dos dedos ou braços que eram puxados
juntamente com o caule para dentro do orifício da máquina. Uraí chegou a
receber o título de “cidades dos homens sem braços”, em finais da década de
1970.
Depois de separada do caule, a fibra era colocada em varais para secar.
As fibras de rami de Pirianito tinham uso em diversos estados brasileiros,
também eram exportadas para vários países, prioritariamente para o Japão.
Eram usadas na confecção de sacarias, barbantes e fios, em geral.
12
De modo amplo, com o objetivo de entender as relações estabelecidas
pelos imigrantes japoneses e seus descendentes no espaço da Colônia
Pirianito. Serão analisadas, também, as estratégias relacionais desenvolvidas
pelos diferentes sujeitos que acompanham a passagem para outros lugares,
seus contextos de referência, as contradições das quais são portadores, a
construção do outro, considerando interações e respectivos processos de
inserção na sociedade receptora.
Referências:
RESENDE, Tereza Hatue de. Ryu Mizuno. Saga japonesa em terras brasileiras. Curitiba: SEEC; Brasília: INL, 1991, p. 85. STADNIKY, Hilda Pivaro e BARROS PINTO, Meyre Eiras. Contribuição ao estudo da presença nipo-brasileira no Norte Novo de Maringá. In: DIAS, Reginaldo B. & GONÇALVES, José Henrique Rollo. Maringá e o Norte do Paraná. Estudos de História Regional. Maringá: EDUEM, 1999.
YAMASHIRO, José. Trajetória de duas vidas. Uma história de imigração e integração. São Paulo: Cultura Editores Associados, 2001. HANDA, Tomoo. O imigrante japonês. História de sua vida no Brasil. São Paulo: T.A.Queiroz; Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, 1987. ARAI, Jhony. Viajantes do sol nascente. História dos imigrantes japoneses. São Paulo: Editora Garçoni, 2003. NISHIKAWA, Daijiro. Produção e circulação de produtos agrícolas. In: Assimilação e integração dos japoneses no Brasil. Petrópolis: Vozes; São Paulo: EDUSP, 1973. CODATO, Evandir. Colonização Agrícola: A Colônia Três Barras – 1932-1970. Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de História da Universidade Federal do Paraná, 1981.
VIEIRA, Francisca Isabel Schurig. O japonês na frente de expansão paulista: o processo de absorção do japonês em Marília. São Paulo: Pioneira/EDUSP, 1973.
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