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A MORTE E O ARQUÉTIPO CRIANÇA

Jung e a Individuação Desenvolvimento desde o nascimento até o final da vida. Conceito de Metanóia: na metade da vida o fluxo da energia psíquica

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A MORTE E O ARQUÉTIPO CRIANÇA

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Jung e a Individuação

Desenvolvimento desde o nascimento até o final da vida.

Conceito de Metanóia: na metade da vida o fluxo da energia psíquica reverte: em vez da adaptação ao mundo externo, e a necessidade de dar respostas eficientes e conscientes às demandas do mundo, o sentido do fluxo energético se inverte numa tentativa de adaptação à alma. Buscamos o sentido.

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Individuação: definições

Não podemos individuar, por exemplo, trancando-nos numa cela, só podemos individuar na nossa vida concreta, nós aparecemos nas nossas ações, e em nenhum lugar mais. A verdadeira consciência tem que ser baseada na vida experimentada, não basta apenas falar sobre as coisas. Isto dá um tipo de compreensão consciente, mas não é individuação.

Individuação é realização através da vida. Quando, por exemplo, uma célula se divide e se diferencia, e se desenvolve numa certa espécie de planta ou animal, este é um processo de individuação. Individuação significa que nós nos tornamos aquilo que somos, que realizamos o nosso destino, que consumamos todos os determinantes contidos no germe... tornamo-nos o modelo original com que nascemos. (p. 180-181 - Seminário das Visões)

 

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Se alguém vive só a metade ou a terça parte da vida, para que serve o viver? Qual é o seu sentido? A vida só vale se está sendo realmente vivida. De outro modo, é semelhante a uma pereira que floresce em cada primavera mas nunca produz sequer uma pêra. Sabem que Cristo mesmo amaldiçoou simbolicamente a figueira que não produzia frutos. Pessoas que vivem de modo infrutífero são como aquela figueira que tinha que ser amaldiçoada, porque tais pessoas não cumprem a vontade do Senhor. Se querem viver, têm que viver a vida com a totalidade do seu ser. Muitas vezes não podemos aceitar isso, porque nossas entranhas começam a murmurejar; somos demasiadamente estéticos, ou, como dizemos, demasiadamente morais. Mas então não podemos viver, não cumprimos o sentido de nossas vidas, e não resolvemos o problema do nosso próprio existir. (p.54)

Assim, o inconsciente sempre tenta produzir uma situação impossível, para forçar o indivíduo a lançar mão de seus melhores recursos. De outra forma, o indivíduo usa pouco suas melhores aptidões, não se completa, não se realiza. (p.65)

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Vejam, Cristo fez tentativas desesperadas para ensinar seus discípulos que eles não deviam imitá-lo, que eles deviam viver suas próprias vidas, que só então eles seriam como ele. Mas eles não entenderam: eles o tomaram como Deus, e sua vida como um mistério divino, eles deixavam para ele a tarefa muito alegremente; preferiam esconder-se atrás dele, organizar uma igreja onde tais eventos como Cristo nunca aconteceram. Ninguém tentou viver sua própria vida, como Cristo viveu a sua... (p. 132)

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Arquétipos 1. Jung observa que existem experiências

humanas típicas, que caracterizam toda e qualquer vida humana.

2. Jung, kantiano, parte do pressuposto de que o ser humano sempre compreende o mundo segundo as mesmas ferramentas mentais: perceptivas, cognitivas e afetivas.

Os fenômenos só podem ser pensados dentro das categorias:

1. Quantidade: Unidade, Pluralidade e Totalidade.2. Qualidade: Realidade, Negação e Limitação. 3. Relação: Substância, Causalidade e Comunidade.4. Modalidade: Possibilidade, Existência e Necessidade.

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Arquétipos:

Molduras mentais organizadoras, de natureza abstrata, as quais, sendo um conjunto de instruções sem conteúdo simbólico ou representações, nunca podem ser experimentados diretamente.

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Sempre deparo de novo com o mal entendido de que os arquétipos são determinados quanto ao seu conteúdo, ou melhor, são uma espécie de “idéias” inconscientes. Por isso devemos ressaltar mais uma vez que os arquétipos são determinados apenas quanto à forma e não quanto ao conteúdo, e, no primeiro caso, de modo muito limitado. Uma imagem primordial só pode ser determinada quanto ao seu conteúdo no caso de tornar-se consciente, e, portanto, preenchida com o material da experiência consciente. O arquétipo é um elemento vazio e formal em si, uma possibilidade dada a priori da forma de sua representação. (JUNG, 2007/1931. p.155 – Arq e Inc Col)

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Arquétipos:

Experiências necessárias: nascimento, mãe e pai, desenvolvimento da consciência, relacionamento, adaptação social, envelhecimento e morte.

Quando polarizados, determinam o modo como percebemos as coisas, como organizamos as informações, como compreendemos, como sentimos e como atuamos.

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Arquétipo CriançaNa compreensão da Psicologia Analítica, na aproximação da morte há oportunidade de emergir uma atitude correspondente à constelação do arquétipo criança:

A criança frente à morte dos pais

A criança frente à própria morte

Os pais frente à morte da criança

O desenvolvimento da noção de mortalidade na criança

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Arquétipo Criança Cada nova etapa conquistada na

diferenciação da consciência confronta-se com a tarefa de encontrar um novo símbolo correspondente a esta etapa, a fim de conectar a vida do passado, ainda existente em nós, com a vida do presente, se este ameaça furtar-se àquele. (p. 267)

O ser imortal e que sempre se renova frequentemente surge como criança.

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Para enfrentar a adversidade trata-se da constelação dos arquétipos do herói e da criança.

Para enfrentar a morte, apenas o arquétipo da criança.

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Não se trata da invencibilidade ou da tenacidade do herói.

O mito da criação ocidental define o humano como consciente da própria finitude. O corpo e o ego se sabem mortais e, em geral, não querem morrer.

Para lidar com a morte alheia precisamos de rituais e atribuição de sentido.

Para lidar com a própria, a constelação do arquétipo criança.

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Fernando Pessoa – O Guardador dos Rebanhos

Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.Ele é o humano que é natural,Ele é o divino que sorri e que brinca.E por isso é que eu sei com toda a certezaQue ele é o Menino Jesus verdadeiro.E a criança tão humana que é divinaÉ esta minha quotidiana vida de poeta,E é porque ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre,E que o meu mínimo olharMe enche de sensação,E o mais pequeno som, seja do que for,Parece falar comigo.

A Criança Nova que habita onde vivoDá-me uma mão a mimE a outra a tudo que existeE assim vamos os três pelo caminho que houver,Saltando e cantando e rindoE gozando o nosso segredo comumQue é o de saber por toda a parteQue não há mistério no mundoE que tudo vale a pena.

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A criança como passado

Imaturidade Infantilidade História Raiz

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A criança como passado

O estado originário

Não podemos nos livrar de nosso fundamento arquetípico do mesmo modo que não podemos nos livrar do corpo sem cometer suicídio. A vida é entendida como processo histórico.

Se rompemos com o passado, a consciência fica desenraizada, sucumbindo a todas as sugestões, tornando-se susceptível a contaminação psíquica. (p.267)

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A criança como presente

Compensação, correção das unilateralidades, ou da rigidez da consciência.

A necessária unilateralidade da consciência é fonte de transgressões contra os instintos.

Se a experiência de finitude é arquetípica, as defesas contra a consciência do limite são frutos da unilateralidade da consciência, identificada com o arquétipo do herói.

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Talvez tenha havido uma separação violenta na pessoa em relação ao seu caráter originário a favor de uma persona arbitrária. Ela torna-se carente de infância, artificial.

É quando nos esquecemos de que as coisas só acontecem “Deo concedente”: se Deus quiser.

“Se a mamãe deixar”

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A criança como futuro

A Criança é o futuro em potencial.

Uma antecipação de desenvolvimentos futuros.

A criança prepara uma futura transformação da personalidade.

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Nascimento milagroso

Significa nascimento não empírico, não biológico: parto virginal, a partir de órgãos não naturais, etc.

Nascimento psíquico

Dos lugares mais inesperados, nas formas mais irreconhecíveis, surge o novo símbolo integrador.

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O indivíduo encontra-se numa situação de conflito doloroso, paralisado, sem saída. A libido regride até as origens do ser.

“Da colisão dos opostos a psique inconsciente sempre cria uma terceira instância de natureza irracional, inesperada e incompreensível. Apresenta-se ela sob uma forma que não corresponde nem ao sim, nem ao não, sendo rejeitada pelos dois.” (p.285)

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Um conteúdo novo, importante mas desconhecido, exerce efeito fascinante sobre a consciência.

Excede em inteireza a consciência dilacerada pelos opostos, sendo um símbolo da totalidade.

Chamamos de símbolos redentores os unificadores.

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Ameaças à criança

A atitude de recusa da consciência – que não reconhece o novo: rejeição da mãe.

O inconsciente está sempre pronto a devorar de novo suas criações. A destruição é parte inevitável do jogo: aparece nos sonhos como ameaça de ser devorado por animais, dragões e cobras, de trem descarrilando. Perigo de dissolver-se no inconsciente, na coletividade: de dar respostas indiferenciadas à nova situação, que são quase que induzidas pela indiferenciação psíquica dos que circundam a pessoa que se prepara para morrer.

Solidão, depressão e desesperança

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Mas a criança é dotada de um poder superior, que se impõe contra todas as probabilidades.

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Invencibilidade da Criança

Paradoxo: criança entregue e indefesa frente a inimigos poderosíssimos, sempre ameaçada pelo perigo de extinção, mas possuindo forças que ultrapassam muito a medida humana. (p.289). A criança arquetípica é invencível porque ela carrega a libido do símbolo. Tem, como qualquer arquétipo, força compulsiva.

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A eterna criança no homem é uma experiência do indescritível, uma incongruência, uma desvantagem e uma prerrogativa divina, um imponderável que constitui o valor ou o desvalor último de uma personalidade. (p.300)

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A criança representa o mais forte e inelutável impulso do ser, isto é, o impulso de realizar-se a si mesmo.

É UMA IMPOSSIBILIDADE DE SER-DE-OUTRA-FORMA

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Fernando Pessoa: O Guardador dos Rebanhos

Quando eu morrer, filhinho,Seja eu a criança, o mais pequeno.Pega-me tu no coloE leva-me para dentro da tua casa.Despe o meu ser cansado e humanoE deita-me na tua cama.E conta-me histórias, caso eu acorde,Para eu tornar a adormecer.E dá-me sonhos teus para eu brincarAté que nasça qualquer diaQue tu sabes qual é.

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Referências

JUNG, C.G. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. OC IX/1. Petrópolis: ed Vozes, 2007

JUNG, C.G. Seminário das Visões

JUNG, C.G. Tipos Psicológicos

SAMUELS, A. Jung e os Pós Junguianos.