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A doutrina da Justificação pela Fé, uma das doutrinas centrais da Igreja Protestante explicada.
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JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ
Joelson Gomes
Introdução:
Ao começarmos o estudo desta maravilhosa doutrina de como
Deus nos aceita em sua presença, vamos olhar o que os primeiros
protestantes ensinavam sobre o assunto.
A Confissão de Fé Belga (1561) diz no seu artigo 20:
Cremos que Deus que é perfeitamente misericordioso e justo, enviou seu Filho para tomar a natureza humana que havia cometido a desobediência, com o fim de satisfazer e lavar o castigo dos pecados por meio se sua amarga paixão e morte. Assim, pois, demonstrou Deus sua justiça contra seu Filho quando lançou sobre ele nossos pecados; e derramou sua bondade e misericórdia sobre nós que éramos culpáveis e dignos de condenação, entregando seu Filho a morte por nós, movido por um amor perfeito, e ressuscitando-o para nossa justificação, para que por Ele tivéssemos a imortalidade e a vida eterna.1
O Catecismo de Heidelberg (1563), afirma na pergunta
60: “Como és justificado diante de Deus?”
Só pela verdadeira fé em Jesus Cristo, de tal sorte que, ainda que minha consciência me acuse de haver pecado gravemente contra todos os mandamentos de Deus, não havendo guardado jamais nenhum deles, e estando sempre inclinada a todo mal, sem merecimento nenhum meu, só por sua graça, Deus me atribui e dá a perfeita satisfação, justiça e santidade de Cristo como se não houvesse eu tido, nem cometido algum pecado, pelo contrário, como se eu mesmo tivesse cumprido aquela obediência que Cristo cumpriu por mim, contanto que eu abrace estas graças e benefícios com verdadeira fé.2
1
* Joelson Gomes é pastor reformado, formado em Teologia (Th.B.) pelo Seminário Teológico Congregacional do Nordeste (órgão filiado a ASTE e a AETAL), faz parte do quadro de Ministros da ALIANÇA das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil, e do corpo de liderança da Igreja Evangélica Congregacional da Vitória- PE.
? Creemos y Confessamos: A Confeción de Fé de los Paises Bajos (Rijswik: FELIRE, 1987), p. 41.2 El Catecismo de Heidelberg (Rijswik: FELIRE, 1993), p.98.
A Confissão de Fé de Westiminster (1648).
Aqueles a quem Deus eficazmente chama, também livremente justifica; não por infundir neles a justiça, mas por perdoar seus pecados e por considerar e aceitar suas pessoas como justas; não em razão de qualquer coisa neles operada ou neles feita, mas unicamente em consideração da obra de Cristo; não por imputar-lhes para justiça sua própria fé, ao to de crer, ou qualquer outra obediência evangélica; mas por imputar-lhes a obediência e satisfação de Cristo, quando eles o recebem e nele e em sua justiça repousam pela fé; fé esta que não possuem em si mesmos, pois que é um dom de Deus.3
Portanto, esta doutrina é uma característica dos protestantes
reformados, sempre ensinaram que a justificação do ser humano
pecador diante de Deus se dá unicamente pela fé em Cristo, sem o
recurso das obras, e baseia-se no seu sacrifício na cruz. Este é o
ensino das Escrituras, assim, agora observemos e provemos esta
doutrina como foi explicada, com a Bíblia.
1. Origem e significado da justificação.
a) A Origem da justificação- A justificação se origina
diretamente em Deus, é só por sua graça que Ele propicia
esta bênção ao ser humano perdido (Rm. 5:8, 18-19).Tudo
acontece pela iniciativa divina. Em sua soberania Deus
poderia deixar os pecadores mortos em seus pecados, mas
pelo seu infinito amor resolveu justifica-los (Tt. 2: 11; 3:7).
Nesta operação o pecador não entra com nada, o que conta
é o amor e graça de Deus manifestado em Jesus Cristo (Jo.
1:17).
b) O significado da justificação- A justificação não significa,
como alguns podem pensar, o ato de fazer alguém justo.
Mas sim, é o ato de declarar, considerar que o réu é inocente
e justo, sem defeito ou mácula. Tudo isto sem a presença de 3 Capítulo 11, seção 1; a Declaração de Savoy (Confissão de Fé histórica dos Congregacionais) 11.1 segue o mesmo ensinamento.
méritos ou favor por parte do réu. O Dr. William Barclay nos
diz que todos os verbos terminados em oô no idioma grego ,
não são verbos que fazem algo a alguém, mas que
consideram, tratam, alguém como algo.4 E a palavra grega
para justificar é dikaioô.
Olhando Rm 8: 33-34, fica mais fácil para entender. Observe
os meus destaques:
Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus
quem os justifica. Quem os condenará? É Cristo Jesus quem
morreu, ou antes, quem ressuscitou, o qual está a direita de
Deus, e também intercede por nós.
Veja as palavras justificar e condenar contrastadas neste
versículo. Assim,
1. Quem condena não torna ninguém condenado, apenas
declara que a pessoa está condenada.
2. Quem justifica não torna ninguém justo, mas declara aquela
pessoa justa.
Isto porque a palavra justificar na Bíblia tem um sentido judicial.
Sempre diz respeito as relações do ser humano com as sagradas leis
do código divino, perante as quais são declarados justos ou culpados.
Assim, o justificado não se transforma num justo, ele é declarado
justo, pela justiça de Cristo que é imputada (atribuída, aplicada) a ele.
Na época da Reforma Protestante a Igreja Romana convocou
um concilio para a cidade de Trento, começando em 1545. Neste
concilio, entre outras declarações, foi aprovado que não era somente
pela atribuição ou crédito da justiça de Cristo em favor do pecador,
4 BARCLAY, William. Romanos (Barcelona: CLIE, 1995), pp. 77-78.
que ele poderia ser justificado. Observe algumas decisões deste
concílio obre o assunto:
Cânon 9- Se alguém disser que o pecador é justificado somente pela fé, querendo dizer que nada coopera com a fé para a obtenção da graça da justificação; e se alguém disser que as pessoas não são preparadas e predispostas pela ação de sua própria vontade- que seja maldito.Cânon 11- Se alguém disser que os homens são justificados unicamente pela imputação da justiça de Cristo ou unicamente pela remissão dos seus pecados, excluindo a graça e amor que são derramados em seus corações pelo Espírito Santo, e que permanece neles; ou se alguém disser que a graça pela qual somos justificados reflete a vontade de Deus- que seja maldito.5
Para a Igreja Romana, a justiça de Cristo tinha que ser, de
alguma forma, infundida para dentro do cristão, de forma que o
pecador se transformaria num justo. A conseqüência disso é que as
pessoas passaram a buscar se justificar com seus próprios méritos,
suas obras, pela melhoria de caráter; e a entender que são
justificadas pela sua própria vontade. E este ainda é o ensino da
Igreja romana hoje, pois as decisões do Concílio de Trento não foram
revogadas.
Isto biblicamente é um erro, pois a justificação é um ato
da livre graça de Deus, sem está atrelada a nenhuma obra nossa,
mas unicamente pela obra de Cristo na cruz a nós atribuída,
creditada. Escreve C. H. Mackintosh:
Nós estávamos sob a maldição, por que não tínhamos guardado a Lei; porém Cristo, o homem perfeito engrandecendo a Lei e tornando-a honrosa, devido ao fato de a haver cumprido perfeitamente, foi feito maldição por nós sendo pendurado no madeiro. Assim, na sua vida ele engrandeceu a Lei de Deus; e na sua morte levou a nossa maldição. Portanto, agora não há para o crente maldição, nem ira, nem condenação: embora tenha de comparecer no Tribunal de Cristo, este tribunal ser-lhe-á tão favorável então como agora o é o trono da graça. O tribunal manifestará a sua verdadeira condição, isto é, que nada existe contra ele: o que ele é, foi Deus quem realizou. Ele é obra de Deus. Deus tomou-o no estado de morte e condenação e fê-lo exatamente como queria ele fosse. O próprio juiz apaga os seus pecados e é a sua justiça de forma que o tribunal não deixará de lhe ser favorável; mais ainda, será a declaração pública, autorizada e plena, feita ao céu, à terra e ao inferno, de que aquele que é
5 Citados em DE WITT, John Richard, etc. e tal O Que é a Fé Reformada? (Recife: Os Puritanos, 2001), p. 62.
lavado de seus pecados no sangue do Cordeiro é tão limpo quanto Deus pode torna-lo (1 Jo. 5:24; Rm. 8:1; 2Co. 5:5, 10-11; Ef. 2:1-0). Tudo que era preciso fazer, o Próprio Deus fê-lo, e certamente ele não condenará a sua própria obra. A justiça que era perdida, Deus a proveu; e, portanto, não achará nenhum defeito nesse suprimento.6
Isto é a justificação pela fé, a declaração de que as exigências da Lei
divina foram cumpridas e satisfeitas, tudo isso em Cristo.
2. A necessidade da justificação.
Porque o ser humano deve ser justificado diante de Deus? Bem, a
Bíblia nos afirma que Deus é justo (Dt.32:4; Rm.3:25-26), todos os
seus atos são corretos. Como então Ele poderia salvar pecadores, que
haviam descumprido a sua Lei? Era seu desejo salvar, mas Ele não
poderia colocar todos no céu, seria um ato de injustiça, teria que
haver um jeito de Deus justificar estes pecadores,, mas permanecer
justo. Jesus Cristo foi a resposta. O ser humano precisava ser
justificado por que estava em uma situação de desespero diante de
Deus. Observe:
a) A falta de justiça do ser humano- Deus havia
estabelecido um padrão de justiça para o ser humano, a
santidade de sua Lei (Lv. 11:45; 19:2; Mt. 5:48; 1Pd. 1:13-16)
, e este não havia atingido este padrão. Assim, para resolver
este problema só a justificação pela fé, pois a justiça que o
ser humano não tinha, Deus providenciou para ele em Cristo
(Rm .3:21-26). O sacrifício de Cristo propiciou a justiça que
faltava ao homem (1Pd. 2:24).
Mas como é possível ter esta justiça diante da Lei de Deus, se eu não
a cumpri, ao contrário, eu a quebro todo dia? Veja o que a morte de
Cristo fez.
6 Estudos Sobre o Livro do Êxodo, 2ª ed.(Lisboa: Depósito de Literatura Cristã, 1978), pp. 87-88.
Satisfação das exigências da Lei. Toda lei é feita
para ser cumprida (Rm .2:13; Gl. 3:12). A justificação
do ser humano diante de Deus exige a perfeita
observância da Lei. (Lv. 18:5; Rm. 10:5; Tg. 2:10), mas
o homem está em pendência para com esta Lei. E a
sentença para quem está nessa situação é a morte
(Dt. 27:26; Gl. 3:10-12; Hb. 10:28). Cristo satisfez tudo
isso com sua morte.
a) A Lei exigia o cumprimento, Cristo a cumpriu (Mt.
5: 17; Jo. 8:46; 1Pd. 1:19; 1Jo. 3:5);
b) A Lei exigia o nosso pagamento com a morte por
não tê-la cumprido. Cristo foi este pagamento morrendo
(2Co. 5:21; Gl. 3:13). Se nós estamos nEle, e Ele é nosso
substituto, é como se morrêssemos também. A Lei agora
não pode exigir que eu faça mais nada para me salvar.
Satisfação da necessidade de justiça do homem.
O ser humano natural está em um estado de
pendência, como vimos, pois necessita ser justo,
cumprir a justiça da Lei, para ter vida, mas não é (Ec.
7:20; Rm. 3:19; Tg. 2:10). Jesus ao vir a terra, sendo
sem pecado e justo, atribui a Sua justiça na conta dos
que exercerem fé nEle (Rm. 3:24; Fp. 3: 8-9).
Satisfação da justiça de Deus. A Lei do Senhor
havia sido ultrajada pelo ser humano, descumprindo-a.
Esta Lei é o padrão do caráter de Deus, ele não
salvará ninguém que não se enquadre nesse padrão.
Jesus Cristo foi o único que cumpriu a Lei satisfazendo
a justiça divina. Ele não conheceu pecado (1Pd. 1:19;
2:22; 1Jo. 3:5), e se pecado é a quebra da Lei (1Jo.
3:4), Cristo não a quebrou. Assim, a justiça que Deus
que Deus exigia do homem, Cristo a teve em Si
mesmo, por isso pôde ir a cruz em lugar de pecadores.
Cristo, através de sua obediência e morte, quitou plenamente o débito de todos aqueles que são assim justificados, e fez uma justa, real e plena satisfação à justiça de seu Pai, em favor deles. Todavia, visto que lhes foi dado pelo Pai, e sua obediência e satisfação aceitas em lugar deles, e ambas gratuitamente, e não por algo existente neles, sua justificação é tão somente da livre graça; para que tanto a exata justiça quanto a rica graça de Deus fossem glorificadas na justificação dos pecadores.7
3. A base da justificação.
Muitos acham estranho como um Deus que é amor (1Jo. 4:8), pode
condenar pecadores, mas se esquecem que este mesmo Deus é
justiça (Gn. 18:5; Ed. 9:15; Sl. 11:7; Ez. 33:20), e os seus atributos,
justiça e amor, não podem se chocar. Sabedores desta justiça de
Deus, uma boa pergunta seria; “Como um Deus justo pode justificar
pecadores, em que se baseia ele?”
Deus se baseia no sacrifício de Cristo. Ele não nos vê como nós
mesmos somos, seres humanos pecadores, mas Ele nos vê em, e
através de Cristo. Em Rm. 3:24-25 Paulo nos diz que Deus fez de
Cristo uma propiciação em favor dos seus. Usando este termo o
apóstolo está tratando de algo muito importante instituído no Antigo
Testamento: o propiciatório. Vamos entender isso:
Olhando Ex. 25: 17-22, notamos que quando Deus mandou Moisés
fazer a Arca da Aliança, disse que a tampa seria um propiciatório.
Esta palavra vem do verbo propiciar, que significa: tornar favorável,
aplacar. Ali, na tampa da Arca, que era este propiciatório, Deus disse
que seria o lugar dEle se encontra com a raça humana, falar com
Moisés (Ex. 25:22; Lv. 16:2; Nm. 7:89). Era nesse lugar que, uma vez
7 Confissão de Fé de Westiminster, XI.iii
por ano, o sumo sacerdote entrava e fazia um sacrifício de um
cordeiro pelos pecados de todo o povo da nação de Israel (Lv. 16:14-
15), e assim desviar a ira de Deus para com o pecado. Deus então
não via o povo de Israel nos seus pecados, mas via o povo através do
propiciatório, onde o sacrifício havia sido feito. Com vinda de Cristo,
Nosso Senhor se tornou o Sumo Sacerdote e o sacrifício, o que
oferece e o que é oferecido (Rm. 4:25; 5:1-2, 25; Hb. 9:11-15).
A Lei de Deus havia sido quebrada pelo homem pecador, a ira
divina se acende para com o pecado, Cristo deu a Sua vida para
propiciar, aplacar a ira divina contra o mal. Recebeu em Si a
condenação (Is. 53:4-5). Assim, do mesmo jeito que Deus olhava o
povo israelita através do sacrifício do cordeiro feito no propiciatório,
hoje Ele vê os salvos através do sacrifício de Jesus na cruz. Escreve o
pastor congregacional Josué Gonçalves de Oliveira:
Como se vê, a cruz foi o lugar da reconciliação. Ali; o homem foi em direção a Deus, e Deus desceu ao seu encontro. A cruz foi o ponto de contato, entre aterra e o céu, entre o pecador e Deus. Somente ali seria possível a nossa justificação, pois o preço do resgate foi pago por Jesus, o nosso eterno substituto.8
E Charles Spurgeon completa:
Ademais, lembrem-se de que Ele nos vê em Cristo. Eis que ele tem posto o Seu povo nas mãos do filho do Seu amor. Ele até mesmo nos colocou no corpo de Cristo; “porque somos membros do Seu corpo, da Sua carne, e dos Seus ossos”. Ele vê que morremos em Cristo, que nEle fomos sepultados, e que nele ressuscitamos. Assim como o Senhor Jesus Cristo é do agrado do Pai, assim também nós somos do agrado do Pai; porque estarmos em Cristo nos identifica com Cristo. Se, pois, nossa aceitação por Deus está baseada na aceitação de Cristo por Deus, ela fica firme, e é um argumento imutável diante do Senhor Deus para Ele nos fazer o bem. Se ficássemos diante de Deus em nossa retidão individual, nossa ruína seria certa e rápida; mas em Jesus a nossa vida está oculta além do perigo. Creiam firmemente que a não ser que Deus rejeite a Cristo, ele não poderá rejeitar o Seu povo; a não ser que Ele repudie a expiação e a ressurreição, não poderá lançar fora aqueles com quem Ele fez aliança no Senhor Jesus Cristo.9
8 O Aspecto Jurídico da Justificação, 2ª ed. (São Paulo: Edição do autor, 1982), p. 39.9 A Perseverança na Santidade (São Paulo: PES, s/d), p. 13.
A base da aceitação do pecador como justificado diante de
Deus é o ato sacrificial de Cristo na cruz (1Jo. 2:1-2).
4. A garantia da Justificação.
Para saber o que garante a justificação do salvo é preciso ler com
atenção Rm. 4:25:
“o qual (Jesus) foi entregue por causa das nossas
transgressões, e ressuscitou por causa da nossa
justificação.”
A Bíblia de Estudo de Genebra comentando este texto nos informa:
A morte e a ressurreição de Cristo são dois aspectos de uma única obra salvífica. Na primeira parte, Cristo levou sobre si a pena legal pela nossa culpa. Na segunda parte, a ressurreição de Cristo confirmou que sua morte foi uma oferta suficiente e eficaz pelo pecado, tendo agradado ao Juiz Supremo.10
Paulo ensina que Cristo foi entregue pelos pecados dos salvos e
que a Sua ressurreição foi a base legal da justificação deles. Por que a
ressurreição de Jesus foi tão importante para a justificação? Observe:
a) Cristo ao ir para cruz foi condenado em lugar dos que crêem
nEle e ao ressuscitar foi justificado em lugar deles também.
Como assim? Devemos prestar atenção no seguinte:
a.1) O pacto das obras- No Éden Deus entrou em uma aliança,
um pacto de obras com o primeiro ser humano, Adão, como
representante da humanidade diante dEle (Gn. 2:17). Adão não
tinha vida inerente em si mesmo, sua vida dependia de ele
cumprir as determinações do pacto de Deus, ser obediente. Diz a
Confissão de Fé de Westiminster: “O primeiro pacto feito com
10 A Bíblia de Estudo de Genebra (AT, NT) (São Paulo: Cultura Cristã, 1999), p. 1324.
o homem foi um pacto de obras, no qual a vida foi prometida a
Adão e, nele à sua posteridade, sob a condição de perfeita e
pessoal obediência”.11
E a Declaração de Fé de Savoy:
Deus fez um pacto de obras e vida com os nossos primeiros pais e todos os seus descendentes neles, mas eles sendo seduzidos pela subtileza e tentação de Satanás voluntariamente transgrediram a lei de seu Criador, e romperam o pacto comendo o Fruto Proibido. 12
Isto pode ser visto nos termos do pacto feito por Deus; se a
desobediência trouxe a morte, a obediência consequentemente traria
a vida.
a.2) Na história da salvação Cristo é chamado de o “último Adão” (1
Co. 15:45), e Ele também entrou em um pacto de obras em favor
nosso favor. Como Adão era o representante de uma raça caída (Rm.
5:12), Cristo é cabeça de uma nova raça (Rm. 5:17-19; 1Co. 15:21-22,
45-49). O primeiro Adão quebrou o pacto (Gn. 3: 1-6; Os. 6:7), o
segundo, Cristo, o cumpriu totalmente (Rm. 5:19; Hb. 5:7-8; 10:9).
Esta obediência de Cristo desfaz a desobediência de Adão e por isso
Ele pode ser nosso sumo sacerdote (representante) diante de Deus.13
Agora, é importante frisar que Cristo tem duas diferenças básicas
para com Adão.
Primeiro: Cristo fez algo que Adão nunca teve que fazer, isto é,
satisfazer a ira de Deus pela quebra do pacto das obras. Adão pecou,
porém Cristo teve que se submeter ao julgamento de Deus por causa
11 Capítulo II, seção ii12 Cap. 6, seç. 1. Tradução minha do original: “God having made a covenant of works and life, thereupon, with our first parents and all their posterity in them, they being seduced by the subtlety and temptation of Satan did willfully transgress the law of their creation, and break the covenant in eating the forbidden fruit”.13 Para este assunto vd.: BERKHOF, L. Teologia Sistematica, 3ª d. (Grand Rapids: T.E.L.L., 1976), pp. 250-259.
da rebelião de adão que afetou toda a sua posteridade. Ele levou
sobre si o castigo que a rebelião de Adão provocou (cf. Is. 53:4-12).
Segundo: Cristo é verdadeiro homem e verdadeiro Deus, por isso
recebe uma recompensa maior do que o primeiro Adão. Pois pela Sua
fidelidade foi exaltado acima de tudo (Fp. 2:9-11). Jesus foi obediente
até a morte, cumpriu os termos do pacto, e ganhou sua recompensa
(Jo. 17:4-6; Hb. 5:7-8).
Quando lemos 1Tm. 3:16; Hb. 2:10; 5:8-10; vemos que os
escritores dizem que ele foi, “aperfeiçoado, justificado no Espírito”.
Mas como, se Cristo já era perfeito? A ressurreição de Cristo, sua
volta da morte pela operação do Espírito (Rm. 1:4; 8:11), foi a sua
justificação diante de Deus, não pelos seus pecados, mas pelos dos
que Ele representava. Então, se como já vimos na parte 3, sobre o
propiciatório, Deus nos vê em Cristo, que é a propiciação, nós
somos justificados nEle, a justificação de Cristo foi para nosso favor.
Se Cristo que foi o sacrifício não ressuscitasse, recebesse a vida de
volta, isto queria dizer que Deus não havia aceito sua oferta, e ele
permaneceria morto (o salário do pecado), e nós estaríamos mortos
também. Veja como escreve Paulo:
E, se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã, a vossa fé; e somos tidos por falsas testemunhas de Deus, porque temos asseverado contra Deus que ele ressuscitou a Cristo, ao qual ele não ressuscitou, se é certo que os mortos não ressuscitam. Porque, se os mortos não ressuscitam, também Cristo não ressuscitou. E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, e ainda permaneceis nos vossos pecados (1Co. 15:14-17, grifos meus).
Mas porque Cristo ressuscitou da morte, recebeu a vida, isso significa
que ele pagou o resgate pelo pecado, e porque não tinha pecado
pode ter a vida de volta. Como ele era sem pecado, a justiça que Ele
recebeu com Sua vida obediente e sua morte, não foi para ele, mas
para os que Ele representava.14
14 Vd. Para detalhes IRONS, Lee. “Ressuscitado para nossa Justificação” em Os Puritanos (4/6, 1996), pp. 21-24.
5. Os resultados da Justificação.
A justificação pela fé nos coloca diante de Deus:
1- Em uma nova relação (Rm. 5:1). Só depois de
justificados é que temos paz com Deus do qual antes
éramos inimigos (Cl. 1:20-21;2:13), por causa dos
nossos pecados (Is. 59: 1-2).
2- Em uma nova posição (Jo. 1:11-12; Gl 3:26), antes
as criaturas que não eram filhos, assumem a posição
de filhos pela fé na obra de Cristo.
...diante de Deus não estamos no nosso eu, mas sim em Cristo. É “nEle” que estamos “perfeitos”. Deus vê o crente em Cristo, com Cristo e como Cristo. Esta é a sua condição imutável e posição eterna. “O despojo do corpo e da carne” é efetuado pela “circuncisão de Cristo” (Cl. 2:11). O crente não está na carne, posto que a carne esteja nele: acha-se unido a Cristo no poder de uma vida nova e sem fim, e esta vida inseparavelmente ligada a justiça divina, na qual o crente está perante Deus. O Senhor Jesus tirou tudo que era contra o crente e trouxe-o para perto de Deus, no mesmo favor que Ele próprio goza. Em resumo: Cristo é a sua justiça. Isto põe fim a todas as questões, responde a todas as objeções, e impõe silêncio a todas as dúvidas. “Porque assim o que santifica, como os que são santificados, são todos de um” (Hb. 2:11) (Grifos meus).15
Assim, diante de Deus e justificados por fé, temos a mesma
posição de Cristo, pois é em Cristo que Deus nos vê. A esse amor que
chama e justifica só nos resta glorificar e servir em submissão
voluntária. A Ele, Deus, seja a glória!
Endereço do autor:
15 MACKINTOSH, C. H. Estudos Sobre o Livro do Êxodo, 2ª ed. (Lisboa: Depósito de Literatura Cristã, 1978), p. 57.