JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

Embed Size (px)

Citation preview

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    1/169

    JUVENALEODRAGOEOUTROSFOLHETOS

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    2/169

    Juvenal e o Drago

    As Proezas de um Namorado Mono

    O Testamento do Canco de Fogo

    A Histria do Boi Misterioso

    Casamento e Divrcio da Lagartixa

    O Cavalo que Defecava Dinheiro

    A Bela Adormecida no Bosque

    O Dinheiro (E o Testamento do Cachorro)

    Uma Viagem ao Cu

    Histria do Cachorro dos Mortos

    SUMRIO

    ORIENTAES PARA IMPRESSO:

    Para imprimir no tamanho do cordel, selecione im-presso de 2 pginas por folha com orientao vertical

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    3/169

    JUVENAL E O DRAGO E OUTROS FOLHETOS1

    Tomei contato com a poesia de Leandro Gomes deBarros ainda na infncia. No atravs da leitura de folhetos,mas por via oral, atravs de meu pai, de meu av e outraspessoas da regio onde nasci, no interior do Cear. Nuncaesqueci as estrofes iniciais da Peleja de Manoel Riacho como diabo e fragmentos de A Batalha de Oliveira e Ferrabrs.

    Anos depois fui descobrindo os autores das narrativas ouvi-das na infncia e fui me interessando de modo mais siste-

    mtico pela obra desta grande poeta. Esta antologia uma pequena amostra da riqueza ediversidade da produo de Leandro Gomes de Barros. Mui-tos pesquisadores j apontaram as linhas temticas presen-tes na obra do poeta. Destacamos a seca, o amor, os temasheroicos, a stira aos mais diversos segmentos sociais, a per-sonicao de animais (a famosa tpica dos tempos em queos bichos falavam), o cangao, a sogra, dentre fontes outras. Como se trata de uma antologia voltada para umaseleo do Mestrado em Linguagem e Ensino, espera-se queos leitores, alm de identicar temas e procedimentos for-mais, reitam sobre as possibilidades de abordagem dos fo-lhetos no espao escolar.

    Desejamos que a Antologia seja um estmulo lei-tura mais detida de rica obra de Leandro Gomes de Barros.

    Campina Grande, 26 de maio de 2015

    Jos Helder Pinheiro Alves

    UFCG-CH-UAL-POSLE

    1 Seleo dos folhetos: profa. Naelza de A. Wanderlei e Jos Hlder Pinheiro Alves

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    4/169

    JUVENALEODRAGO

    Quem ler esta histria todaDo jeito que foi passada

    Ver que o falso vil

    Nunca nos serviu de nada

    A honra e a fidelidade

    Sempre foi recompensada.

    Morava um campons

    No subrbio dum ducado

    J fazia sete anos

    Que ele tinha enviuvado

    S ficou com dois filhinhos

    No que mais tinha cuidado.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    5/169

    02

    O velho adoeceu muito

    Conhecendo que morria

    Um casebre e trs carneiros

    S era o que possua

    Deu como herana aos filhos

    E morreu no mesmo dia.

    Ficaram ambos sozinhosUma moa e um rapaz

    Disse ela ao irmo:

    A partilha voc faz

    Fique l com os carneiros

    Que no valor so iguais.

    Ficou ela na choupana

    Cumprindo a sorte fatalO seu nome era Sofia

    E o dele era Juvenal

    Que pensava em aventura

    Atrs do bem ou do mal.

    03

    Juvenal disse irm:

    Eu no posso ter demora

    V viver com seu padrinho

    Que amanh vou embora

    Junto com os meus trscarneiros

    Por este mundo afora.

    Quando foi no outro dia

    Limpou dos carneiros a l

    Muniu-se do necessrio

    Despediu-se da irm

    Seguiu com os trs carneiros

    s 6 horas da manh.

    Quando bateu meio-diaEle estava descansando

    Na sombra dum arvoredo

    Os trs carneiros pastando

    Viu que um sujeito estranho

    Perto dele ia chegando.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    6/169

    04

    Aquele sujeito estranho

    Tinha sado bem cedo

    Caando com trs cachorros

    No penhasco dum rochedo

    Foi descansar neste dia

    Naquele mesmo arvoredo.

    Chegando no arvoredoFoi dizendo: Oh! Meu rapaz

    So seus aqueles carneiros

    Que eu vejo ali por detrs?

    Quer trocar pelos cachorros?

    Veja o negcio que faz.

    Juvenal lhe respondeu:

    Ns no podemos trocarOs meus carneiros no matoProcuram se alimentar

    A passo que seus cachorros

    preciso eu sustentar.

    05

    Lhe disse o desconhecido:

    Nenhum dos trs ruim

    Na hora que estou com fome

    Basta s dizer assim:

    Rompe Ferro, mos obra

    Traz pra ele e para mim.

    - Cada um desses cachorros um grande defensor

    Se acabam, morrem lutando:

    Em defesa do senhor

    So chamados Rompe Ferro

    Ventania e Provedor.

    Juvenal pensou um pouco

    De ficar sem os cordeirosMas lembrou-se que os ces

    So amigos verdadeiros

    Lhe disse: est feita a troca

    Pode levar os carneiros.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    7/169

    06

    Dizia o rapaz consigo:

    Na troca no fiz vantagem

    Andar com estes trs ces

    Precisa muita coragem

    s duas horas da tarde

    Seguiu a sua viagem.

    Mais tarde chegou-lhe a fomeNo tinha onde comprar

    Fez como o sujeito disseNo momento de trocar

    - Rompe Ferro, mos obra!

    O cachorro foi buscar.

    Toda ordem que ele dava

    O cachorro obedeciaMandou ele s 5 horas

    Antes de findar-se o dia

    Trouxe-lhe uma linda cesta

    Cheia de comedoria.

    07

    Juvenal pegou a cesta

    Quando acabou de jantar

    Deu ela aos ces dizendo:

    Comam at se fartar

    Eu com trs amigos desses

    No temo de viajar.

    Quando os trs ces acabaramDavam pulos de alegria

    Um corria atrs do outro

    Em tresloucada folia

    Fazendo festa ao moo

    Que satisfeito sorria.

    Juvenal seguiu viagem

    Cada vez mais animadoNaquela zona esquisita

    Com seus cachorros de lado

    Foi dormir no outro dia

    Na terra doutro reinado.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    8/169

    08

    J fazia um ms e tanto

    Que ele andava de viagem

    No p duma grande serraAvistou uma carruagem

    At para dois cavalos

    Era difcil a passagem.

    Ele vendo a carruagemFoi logo se aproximando

    Viu dentro uma linda moa

    Vinha de longe chorando

    O cocheiro muito triste

    Suspirava de vez em quando.

    Juvenal viu a princesa

    Em pranto sem se calarDirigiu-se ao cocheiro

    - Desculpe eu lhe perguntar

    Que vem ver esta princesa

    Nas brenhas deste lugar?

    09

    Quase sem poder falar

    O cocheiro respondeu:

    A princesa est chorando

    Mas o culpado no fui eu

    D licena, eu vou contar

    O caso como se deu.

    - Daqui a cinquenta lguasExiste um grande reinado

    Que passou mais de cem anos

    Sendo o povo devorado

    Por um monstro horrendo e feio

    Misterioso e malvado.

    - impossvel contar

    A fora que a fera tinhaNo respeitava princesaDuque, nem rei, nem rainha

    Devorou toda a polcia

    O exrcito e a marinha.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    9/169

    10

    - O povo todo alarmado

    Morrendo sem remisso

    Por toda parte que ia

    No achava proteo

    O rei no tinha recurso

    Para remir a nao.

    - O rei j muito nervosoS esperava morrer

    Um dia estava dormindo

    Ouviu uma voz dizer:

    Vou te propor um negcio

    Responda se quer fazer.

    - Eu sou a tirana fera

    Que venho me despedirPretendo dar-lhe um descanso

    E deixar de o perseguir

    Se o senhor prometer

    Fazer o que vou pedir.

    11

    - Se acaso aceita o negcio

    Desde j fique avisado

    Pra me mandar todo ano

    Num lugar determinado

    Uma das moas bonitas

    Que tiver no seu reinado.

    - Eu s fao este negcioPra cessar a mortandade

    Se o senhor no cumprir

    E usar de falsidade

    Eu venho de l da furna

    Devorar toda a cidade.

    - Diante desta ameaa

    O rei ficou sem aoComo ele enfrentaria

    To grave situao?

    O jeito era dar apoio

    proposta do drago.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    10/169

    12

    - Ento o rei sujeitou-se

    A todo ano mandar

    Uma das moas bonitas

    Que tivesse no lugar

    Daqui vai ela pra furna

    Para a fera devorar.

    - esse o motivo justoDa nossa grande tristeza

    Pra aqui j tenho trazido

    Muitas filhas da pobreza

    Mas hoje tocou de sorte

    A esta infeliz princesa.

    Juvenal ficou imvel

    Vendo a triste narraoPerguntou ao cocheiro:

    Onde habita esse drago?

    Numa furna desta serra

    E apontou com a mo.

    Juvenal disse ao cocheiro:

    Vou fazer uma loucura

    Ando percorrendo terra

    Em busca duma aventura

    No vou deixar essa fera

    Comer esta criatura.

    - No digo por pabulagem

    Nunca temi inimigo

    Eu junto com meus trs ces

    S Deus poder comigo

    Enfrento um cento de feras

    No digo que vi perigo.

    Disse o cocheiro princesa:

    Acho bom se apearTodas que vm para aqui

    Vo a ele se entregar

    Se vossa alteza no for

    O monstro vem lhe buscar.

    13

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    11/169

    Ela a desceu do carro

    Transpassada de tristeza

    Juvenal com muita pena

    Desta morte sem defesa

    Chamou os seus trs cachorros

    Acompanhou a princesa.

    O cocheiro que estava

    Quase morto de pavor

    Gritou para Juvenal:

    Aonde vai, meu senhor?

    Volte da, no prossiga

    O monstro devorador!

    Juvenal nem deu ouvidos

    Ao que ele estava dizendoPorm de repente viu

    A montanha estremecendo

    Conheceu no mesmo instante

    Que a fera vinha descendo.

    14

    Ia a princesa na frente

    Juvenal mais atrasado

    Quando a fera viu a moa

    Deu um urro agigantado

    At os trs ces ficaram

    Com o cabelo arrepiado.

    A a fera avanou

    Para agarrar a princesa

    Juvenal tomou a frente

    Porm no mostrou fraqueza

    Depois gritou: Rompe-Ferro

    Preciso tua defesa!

    Quando Rompe-Ferro ouviu

    O grito do seu senhorQue tinha enfrentado a fera

    Sem ter medo nem pavor

    Partiu pra cima do monstro

    Como um raio abrasador.

    15

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    12/169

    O moo era destemido

    Com seu cachorro valente

    Eles dois incorporados

    Lutando com a serpente

    Juvenal no ferro frio

    E o co fiel pelo dente.

    Era um monstro sem feitio

    De um corpo descomunal

    Todo coberto de escamasMais duras do que metal

    Tudo era mole, na ponta

    Do punhal de Juvenal.

    A moa vendo o embrulho

    Pender pro fundo da grutaDando cada rabiaca

    Com uma fora absoluta

    Vendo a hora que o rapaz

    Se acabava na luta.

    16

    Ajoelhou-se por terra

    Implorando ao Criador:

    - Valei-me, Pai Poderoso

    Livrai-me deste terror

    Salvai tambm este moo

    Do drago devorador!

    - Tambm prometo, Senhor

    Meu pranto no fingido

    Se nesta luta sangrenta

    O jovem no for ferido

    Quando voltar ao reinado

    Farei dele meu marido!

    E l no fundo da gruta

    A luta era tenebrosaA serpente dava urros

    E rabiaca raivosa

    Fazendo tremer a terra

    Naquela gruta rochosa.

    17

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    13/169

    Esse monstro possua

    No grande corpo um lugar

    Debaixo da asa esquerdaQue quem pudesse acertar

    Com um pequeno ferimento

    Era capaz de o matar.

    Rompe-Ferro, experienteNesse lugar farejou

    Debaixo da asa esquerda

    De repente mergulhou

    No lugar mais perigoso

    O cachorro abocanhou.

    Viu-se logo a diferena

    Quando o cachorro mordeuO monstro deu um esturro

    Que toda a terra tremeu

    Na segunda abocanhada

    A serpente esmoreceu.

    18

    Assim que Juvenal viu

    A fera desanimar

    Sentou-se pra outro lado

    Dizendo: Vou descansar

    E deu ordem a Rompe-Ferro

    Para acabar de matar.

    Disse o rapaz: Para que

    Ningum duvide da histria

    Que briguei com este monstro

    Na luta alcancei vitria

    Tiro dois dentes da fera

    Para servir de memria.

    Quando a moa viu-se livre

    Daquele horrendo animalFoi ajoelhar-se chorandoDiante de Juvenal

    Pedindo pra acompanh-la

    At a corte real.

    19

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    14/169

    - Exijo que v comigo

    Para meu pai conhecer

    Esse homem destemido

    Que me salvou de morrer

    Mesmo pra recompens-lo

    Da forma que merecer.

    - Ters l no meu reinadoTeu nome reconhecido

    Por todos da minha corte

    Hs de ser bem recebido

    O mundo ser ciente

    Do teu valor merecido.

    - Tu salvaste minha vida

    Enfrentando este dragoComo tambm te arriscando

    Salvaste a minha nao

    Portanto aqui te entrego

    Alma, vida e corao.

    20

    Disse ele: Eu nada quero

    Do benefcio que fiz

    Desejo que sua alteza

    Siga em paz, seja feliz

    Vou v-la de hoje a trs anos

    Na capital do pas.

    O cocheiro no pensavaO moo a fera matar

    Ele que estava de longeOuvindo a serra zoar

    Quase morria de medo

    Nem se moveu do lugar.

    Juvenal, muito vexado

    No pde mais ter demora

    Disse princesa: Desculpe

    Eu no ir com a senhora

    Botou-a na carruagem

    Despediu-se e foi embora.

    21

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    15/169

    A imagem do rapaz

    Gravou-se divinamente

    Ante os olhos da princesa

    To linda, casta, inocente

    E uma paixo sublime

    Germinou rapidamente.

    Juvenal nunca pensouQue a sua protegida

    Fosse cair novamente

    Nas mos da fera homicida

    Que o tal cocheiro imundo

    Quisesse tirar-lhe a vida.

    O cocheiro seguiu com ela

    Adiante lhe perguntou:Vossa alteza pagou bem

    quele que lhe salvou?

    Disse ela: Quis pagar-lhe

    Mas ele no aceitou.

    22

    Com os olhos de traidor

    Lhe respondeu o cocheiro:

    Aquele que lhe salvou

    um grande aventureiro

    Anda vagando no mundo

    No precisa de dinheiro.

    - Se Vossa Alteza quiserCom muita facilidade

    Pode fazer num momento

    A minha felicidade

    Dizer que matei a fera

    Que devorava a cidade.

    - A senhora nada perde

    Me fazendo este favorPois aquele aventureiro

    bruto, no tem valor

    Vossa Alteza perde tempo

    Se for consagrar-lhe amor.

    23

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    16/169

    Disse a princesa ao cocheiro:

    Eu no sou desconhecida

    No vou contar uma histria

    Que no foi acontecida

    Tornando-me facinorosa

    Pra quem salvou minha vida.

    - Nem permito que um JudasCovarde, vil, descabido

    Insulte desta maneira

    Um moo to destemido

    Que no sendo Deus e ele

    Agora eu tinha morrido.

    Iam passando uma ponte

    O cocheiro disse assim:O fulano no precisa

    Arranje isto pra mim

    Se a senhora no fizer

    Aqui mesmo dou-lhe fim!

    24

    - Lhe atiro da ponte abaixo

    O diabo tem que a levar

    Quando eu chegar na corte

    Se algum me perguntar

    Eu digo: A fera comeu-a

    Ningum vai mais procurar.

    Assim, a infeliz princesaConhecendo que morria

    Jurou perante ao cocheiro

    Fazer como ele queria

    E aquele horrendo segredo

    Por ela ningum sabia.

    - Eu juro perante a Deus

    Que negarei a verdadeQuando chegar l na corte

    Farei a vossa vontade

    Digo que mataste a fera

    Que devorava a cidade.

    25

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    17/169

    O cocheiro olhou pra ela

    Riu-se de satisfao:

    - Agora sim, princesinha

    Sou um grande cidado

    Serei perante o monarca

    O grande heri da nao.

    Quando chegaram na corteA cidade estremeceu

    Dizia o povo em delrio:

    A princesa no morreu

    O cocheiro trouxe ela

    A fera no a comeu!

    Quando o rei viu a princesa

    Quase morre de alegriaE contaram a histria

    Como o cocheiro queria

    O rei muito interessado

    Toda a histria dele ouvia.

    26

    Disse o cocheiro: - Monarca

    D-me licena narrar

    Quando chegamos na furna

    Que fiz o carro parar

    Eu disse para a princesa:

    - Acho bom se apear.

    - Ela a desceu do carroTranspassada de tristeza

    Eu fiquei com muita pena

    Dessa morte sem defesa

    Saquei pelo meu punhal

    E acompanhei a princesa.

    - A princesa como estava

    Quase morta de pavorMe disse: deixe-me s

    Volte corte, por favor,

    Volte daqui, no prossiga

    O monstro devorador!

    27

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    18/169

    - Eu a no dei ouvidos

    Ao que ela estava dizendo

    Porm de repente vi

    A montanha estremecendo

    Conheci no mesmo instante

    Que a fera vinha descendo.

    - Ia a princesa na frenteEu ia mais atrasado

    Quando a fera viu a moa

    Deu um urro agigantado

    Confesso que at fiquei

    De cabelo arrepiado.

    - Mas uma coisa dizia:

    No deixe a moa morrerSe salvares a princesa

    Muito feliz hs de ser

    Portanto, enfrenta o perigo

    Repara o que vais fazer.

    28

    - A a fera avanou

    Para agarrar a princesa

    Ligeiro, tomei a frente

    Porm no mostrei fraqueza

    Nunca pensei, Majestade

    Possuir tanta destreza.

    - Era um monstro sem feitioDe corpo descomunal

    Todo coberto de escamas

    Mais duras do que metal

    Porm tudo ficou mole

    Na ponta do meu punhal.

    - Danei-lhe uma punhalada

    Chega seu corpo rangeuA fera deu um esturroQue toda a terra tremeu

    Na segunda punhalada

    A serpente esmoreceu.

    29

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    19/169

    - Acabei de lhe matar

    Como quem no faz vantagem

    Botei a linda princesa

    Sem fora na carruagem

    Deixei a fera estendida

    Voltei ento da viagem.

    O povo todo deu crenaAo que o cocheiro dizia

    O rei disse: - s um heri

    Mostraste ter valentia

    Vou promover-te a fidalgo

    Da alta aristocracia.

    Apertou ele nos braos

    Cheio de contentamentoDizendo: minha filha vive

    Pelo teu merecimento

    Como no posso pagar-te

    Dou-te ela em casamento.

    30

    A princesa quando ouviu

    Falar-se em tal casamento

    Mudou de cor de repente

    Quase d-lhe um passamento

    - Oh! Meu Deus, dizia ela

    Pra que fiz tal juramento?!

    E correndo pra seu quartoNum pranto descomedido

    Exclamava: meu bom pai

    Oh! Quanto tenho sofrido!

    Mandai Juvenal, meu Deus

    Coitado, ele foi trado!

    - Pelo dio e ambio

    De um imundo cocheiroVou perder o meu amigo

    O meu heri verdadeiro

    Dai-lhe um aviso, meu pai

    Deste plano traioeiro!

    31

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    20/169

    - Ah! Se eu pudesse agora

    Contar tudo a Majestade

    Dizer que este cocheiro

    No quer contar a verdade

    Mas devido a minha jura

    Perdi a felicidade!

    Leitor, deixemos aquiFechada em seu aposento

    A bela e meiga princesa

    Lamentando o seu tormento

    E vamos ver Juvenal

    Onde est nesse momento.

    Depois de salvar a moa

    O belo moo saiuEm busca de outra aventura

    A viagem prosseguiu

    Junto com os trs cachorros

    Em outro reino dormiu.

    32

    Naquela noite sonhou

    Que estava num reinado

    Em uma linda manh

    E o castelo engalanado

    De rosas e lindas flores

    Era o solo atapetado.

    Um perfume inebrianteRecendia no espao

    Belas damas sorridentes

    Tinha ele em cada brao

    Vestindo finas fazendas

    E faces de fino trao.

    Num lindo trono de ouro

    Se via a linda princesaTrajando um vestido branco

    De fulgurante beleza

    Trazendo vu e capela

    Deslumbrante na riqueza.

    33

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    21/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    22/169

    Mas depois disse consigo:

    No posso temer traio

    Sei mesmo que a princesa

    Me ama de corao

    Saberei toda a verdade

    Ao regressar nao.

    - E se algum atrevidoUm covarde ou traidor

    Tiver forado a princesa

    A recusar meu amor

    Nesse dia fico louco

    Bebo sangue do impostor.

    Confiando na princesa

    No punhal e no DivinoJuvenal seguiu viagem

    Sempre como peregrino

    Com seus cachorros do lado

    Protegendo o seu destino.

    36

    E assim passou um ano

    E Juvenal prosseguia

    Sua vida aventurosa

    Pensando voltar um dia

    Pois ele disse princesa

    Com trs anos voltaria.

    Deixemos ele um instanteE voltemos ao reinado

    Onde o cocheiro covarde

    Viu seu plano coroado

    Era agora heri do rei

    S faltava ser casado.

    A princesa em casamento

    No queria ouvir falarO rei marcou para um ano

    Dali se realizar

    No tempo ela adoeceu

    Somente pra no casar.

    37

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    23/169

    Foi uma doena sria

    Acompanhada de dor

    Mas tudo isso arranjadoPor conhecido doutor

    Bem pago pela princesa

    Filha do imperador.

    O cocheiro aperreadoSempre junto a majestade

    Pedia para apressar

    Este lao de amizade

    Temendo que com mais tempo

    Se descobrisse a verdade.

    O comentrio na rua

    Era bem desencontradoUm dizia que o cocheiro

    De fato tinha lutado

    Com a fera desumana

    Que devorava o reinado.

    38

    Outro porm respondia

    Que era combinao

    O rei no queria dar

    A filha para o drago

    E mais tarde quem pagava

    Eram os filhos da nao.

    Paremos aqui, leitorDeixemos isso pra frente

    Vamos saber como passa

    A princesinha doente

    Seu pai estava ficando

    Severo e muito exigente.

    Assim passou-se dois anos

    Com mais um fazia trsDisse o rei a sua filha:Hs de casar desta vez

    Eu garanti a teu noivo

    De no passar deste ms.

    39

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    24/169

    A moa mais uma vez

    Lembrou-se de Juvenal

    Exclamou: - Tudo acabou-se

    Minha sina foi fatal

    Vou casar-me com um monstro

    Traidor como chacal!

    Faltavam apenas dois diasPara o grande casamento

    O castelo em rebolio

    Era grande o movimento

    Enfeites, bolos e comida

    Tudo estava em andamento.

    Na vspera do casamento

    Viu-se entrar um viajanteLevando mais trs cachorros

    Dum tamanho extravagante

    Era Juvenal que vinha

    Em busca de sua amante.

    40

    Juvenal ouviu dizendo

    Por uma felicidade:

    Casa hoje um grande heri

    Com a filha da majestade

    Por que matou o drago

    Que devorava a cidade.

    Juvenal, cego de raivaNa mesma hora rompeu:

    Esse homem mentirosoSem ver o monstro correu

    O drago de quem se fala

    Quem matou ele foi eu.

    As praas ouvindo a fala

    Daquele nobre senhorDisseram logo: - Est preso

    Infame conspirador

    Maltratando em praa pblica

    O genro do imperador!

    41

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    25/169

    Juvenal pulou pra trs

    E bateu palma ao seu co

    Partiu pra ele dizendo:

    Sou filho de outra nao

    Ainda vindo o exrcito

    Eu no me entrego priso.

    A travou-se uma lutaOs ces entraram no meio

    Em menos de meia hora

    Era estandarte feio

    Que o rei l do palcio

    Escutou o tiroteio.

    Foram dar parte ao rei

    Da grande calamidadeDizendo: a tem um moo

    Que hoje entrou na cidade

    Tem morto tanto soldado

    Que uma barbaridade.

    42

    - Ele conduz trs cachorros

    So trs panteras iguais

    O homem briga por dez

    Pula mais que Satans

    Da sua espada sai fogo

    Igual s chamas infernais.

    O noivo com a notciaDoeu-lhe no pensamento

    Disse o rei aos convidados:

    Demorem a um momento

    Esperem minha chegada

    Pra fazer o casamento.

    O rei chegou, foi entrando

    No meio da multidoGritou: est garantido

    Quem fez a revoluo

    Quero saber como foi

    O princpio da questo.

    43

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    26/169

    Com a chegada do rei

    O povo todo acalmou

    Juvenal com os trs ces

    Um arranho no levou

    Chegou pra perto do rei

    Por esta forma falou:

    - Sua Alteza v sabendoNunca fui homem malvado

    Pretendo contar-lhe tudo

    Da forma que foi passado

    Mas quero que minha histria

    Seja ouvida no reinado.

    Dali mesmo o rei levou

    Juvenal para o saloPra contar de que maneiraPrincipiou a questo

    Quando o moo entrou na sala

    Tudo mudou de feio.

    44

    A moa ao ver seu amante

    Chorou de tanta alegria

    Por saber que toda a farsa

    Ele agora descobria

    E finalmente depois

    Com ela se casaria.

    Mas quando o cocheiro viuAquele recm-chegado

    Conheceu logo os cachorros

    Ficou da cor de um finado

    E disse consigo mesmo:

    Agora estou desgraado!

    Disse Juvenal ao rei:

    Me disseram sem maldadeHoje casa um grande heri

    Com a filha da majestade

    Porque matou o drago

    Que devorava a cidade.

    45

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    27/169

    - Eu fiquei cego de raiva

    Porque isso no se deu

    E disse: ele mentiroso

    Sem ver o monstro correu

    O drago de quem se fala

    Quem matou ele foi eu.

    A os soldados todosMe deram voz de priso

    Eu gritei por meus cachorros

    E fiquei de prontido

    Por esse grande motivo

    Principiou a questo.

    - Lutei pelo meu direito

    Como qualquer um lutavaMe acabava lutando

    Mas eu no me entregava

    O cu virava fumaa

    A terra se desmanchava.

    46

    - Estou contando a histria

    Que a condio me obrigou

    A fera de quem se fala

    Este homem que matou

    A princesa testemunha

    De tudo que se passou.

    O rei chamou a princesaPra contar o que sabia

    Ela prontamente veio

    Transpassada de alegria

    Desabafar esta mgoa

    Que h trs anos sofria.

    Ela a continuou

    Para todo mundo ver:- Meu pai est perguntando

    Porque deseja saber

    Sim senhor foi este o homem

    Que me salvou de morrer!

    47

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    28/169

    - Quando eu fiquei no bosque

    Onde o cocheiro deixou

    Que ia subindo a serraEste homem me acompanhou

    Foi lutar com o drago

    Eu vi quando ele o matou.

    - Quando ele matou o monstroNesta mesma ocasio

    Arrancou dois grandes dentes

    Julgando ter preciso

    Se no perdeu inda tem

    Os dois dentes do drago.

    - Depois o moo levou-me

    Botou-me na carruagemMuito decente e modesto

    Como quem no faz vantagem

    Ali apertou-me a mo

    E seguiu sua viagem.

    48

    - Agora o cocheiro, sim

    Fez verdadeira traio

    Ele pensava, meu pai

    Que no tinha punio

    Mas vou contar a mido

    Toda sua narrao.

    O cocheiro saiu comigoAdiante me perguntou:

    Vossa alteza pagou bem

    quele que lhe salvou?

    Eu lhe disse: fui pagar-lhe

    Mas ele no aceitou.

    - Disse ele: sendo assim

    Me d vossa proteoDizendo em casa a seu paiQue eu matei o drago

    Todo mundo lhe acredita

    E ningum dir que no.

    49

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    29/169

    - Ento eu disse pra ele:

    Nunca fui desconhecida

    No vou contar uma histria

    Que no foi acontecida

    Usando de falsidade

    Pra quem salvou minha vida.

    - Nem permito que um JudasCovarde, vil, descabido

    Insulte desta maneira

    Um homem to destemido

    Que no sendo ele e Deus

    Agora eu tinha morrido.

    amos perto da ponte

    Quando ele disse assim:Abra seus olhos, princesa

    Arranje isto pra mim

    Se a senhora me negar

    Aqui mesmo dou-lhe fim.

    50

    - Lhe atiro da ponte abaixo

    O diabo tem que a levar

    Quando eu chegar na corte

    Que algum me perguntar

    Eu digo: a fera comeu-a

    E ningum vem procurar.

    - Eu que estava sozinhaConhecendo que morria

    Jurei perante o cocheiroFazer como ele queria

    Jurando mais que o segredo

    Por mim no se descobria.

    - E foi assim, meu bom pai

    Que pude me defenderDe ser lanada da ponte

    De afogar-me e morrer

    Mas Deus, protetor dos fracos

    Fez a verdade vencer.

    51

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    30/169

    A descobriu-se tudo

    O rei ficou se mordendo

    Disse para o cocheiro:

    Voc vai morrer sabendo!

    Mandou por quatro carrascos

    Tirar-lhe o couro ele vendo.

    Casou-se a linda princesaCom o valente Juvenal

    Repercutiu a notcia

    Por toda a posse real

    Rolou festa quinze dias

    No palcio imperial.

    Juvenal no outro dia

    s seis horas da manhMandou um grande cortejo

    Buscar sua linda irm

    Aquela menina esbelta

    Da face cor de rom.

    52

    Quando os ces viram a menina

    Ficaram de prontido

    E disseram a Juvenal:Est finda a nossa misso

    Queramos ver se a riqueza

    Mudava teu corao.

    Os ces eram encantadosNo podiam ter demora

    Se viraram em trs pssaros

    Alvos da cor da aurora

    Disseram: adeus, Juvenal!

    Voaram e foram embora.

    53

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    31/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    32/169

    02

    Vivia o rapaz sofrendo

    Grande contrariedade

    Chorava ao romper da aurora

    Gemia ao virar da tarde

    A moa era como um pssaro

    Privado da liberdade.

    Porque Joo-mole, o pai dela

    era um velho perigoso,

    Embora que Z-pitada

    Dizia ser revoltoso,

    Adiante o leitor ver

    Qual era o mais valoroso.

    Marocas vivia triste

    Pitada vivia em nsia,

    Ele como rapaz moo

    No vigo de sua infncia,

    Falar depende de flego

    Porm obrar sustncia.

    03

    Disse pitada a Marocas,

    Eu preciso lhe falar

    J tenho toda certeza,

    Que necessrio a raptar,

    noite espere por mim

    Que havemos de contratar.

    Disse Marocas a Zezinho:

    Papai no de brincadeira,

    Diz Z-pitada, ora esta!

    Voc pode ver-me as tripas,

    Porm no ver carreira.

    Diga a que hora hei de ir,

    Eu dou conta do recadoInda seu pai sendo fogo,

    Por mim ser apagado,

    Eu juro contra minh'alma

    Que seu pai corre assombrado.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    33/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    34/169

    06

    A febre j me atacou,

    Sinto frio horrivelmente.

    Com muita dor de cabea,

    Uma enorme dor de dente,

    Esta me dando a erisipela,

    J sinto o corpo dormente.

    Antes eu hoje estivesse

    Encerrado na cadeia,

    De que morrer na desgraa,

    E d'uma morte to feia,

    Veja se pode arrastar-me,

    Que minha cala est cheia.

    Por alma de sua me,

    E pela sagrada paixo,

    Me arraste por uma perna

    E me bote no porto,

    A moa quis arrast-lo,

    No teve onde pr a mo.

    07

    Ela tirou-lhe a botina,

    Para ver se o arrastava,

    Mas era uma fedentina,

    Que a moa no suportava,

    Aquela matria fina

    J todo o cho alagava.

    Disse a moa: quer um beijo?

    Para ver se tem melhora?

    Ele com cara de choro,

    Respondeu-lhe, no, senhora,

    Beijo no me salva a vida,

    Eu s desejo ir-me embora.

    Ento lhe disse Marocas,

    Para ver se tem melhora?

    Ele com cara de choro,

    Respondeu-lhe, no, senhora,

    Beijo no me salva a vida,

    Eu s desejo ir-me embora.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    35/169

    08

    Ento lhe disse Marocas,

    Desgraado!... eu bem sabia,

    Que um ente de teu calibre,

    No pode ter serventia.

    Creio que fostes nascido

    Em fundo de padaria.

    Meu pai ainda no veio

    Eu hoje estou sozinha,

    Z-pitada a se ergueu,

    E disse, oh minha santinha!

    A moa meteu-lhe o p,

    Dizendo: vai-te murrinha!

    E deu-lhe ali uma lata,

    Dizendo: est a o poo,

    Voc ou lava o quintal

    Ou come um cachorro ensolso,

    Se no eu meto-lhe os ps

    No lhe deixo inteiro um osso.

    09

    Disse ele, oh! meu amor!

    O corpo todo me treme,

    Minha cabecinha est,

    Que s um barco sem leme,

    Parece-me faltar o pulso,

    O Anjo da Guarda geme.

    Ento a moa lhe disse:

    O senhor lava o quintal

    Olhe uma tabica aqui!...

    Lava por bem ou por mal,

    Covardia para mim,

    crime descomunal.

    E l foi nosso rapaz

    Se arrastando com a lata,A moa ali ao p dele,

    Lhe ameaando a chibata,

    Ele exclama chorando

    Por amor de Deus no bata.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    36/169

    10

    Vai miservel de porta

    Quero j limpo isso tudo,

    Um homem de sua marca

    Pequeno, feio e panudo,

    S tendo sido criado

    Onde se vende miudo.

    Disse o Z quando saiu:

    Eu juro por Deus agora,

    Ainda uma moa sendo

    Filha de Nossa Senhora,

    E olhar para mim, eu digo:

    Degraada, v embora.

    Nesta histria o leitor viuQuem era Canco de Fogo

    Era aquele que dizia:

    - A vida mesmo um jogo

    P'ra morrer no falta tempo

    P'r'a dar no precisa rogo.

    Roubar de quem tem demais

    E forma de caridade

    Tirar dez de quem tem vinte

    Est na regularidade

    Quem no precisa de tudo

    Basta ficar-lhe a metade.

    B

    O TESTAMENTODECANCODEFOGO

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    37/169

    02

    Foi o que Canco de Fogo

    Dissera na hora da morte

    A fortuna tem o peso

    Que tem a tirana sorte

    A desgraa quando vem

    No respeita quem forte.

    Quando ele viu que morriaChamou a mulher p'ra junto

    E disse: - Minha mulher

    No precisa chorar muito

    No h tempo mais perdido

    Do que chorar pelo defunto.

    Disse um filho: - Vou chamar

    Com pressa um facultativoAli tem um mdico bom

    Inteligente e ativo

    Disse Canco: - asneira

    Dar remdio a quem est vivo.

    03

    Agora depois de morto

    Voc o mande chamar

    Pergunte quanto ele quer

    Para me ressuscitar

    E diga logo; eu s pago

    Se meu pai se levantar.

    - Isso no, disse-lhe o filhoMorrendo a se liquida

    Disse-lhe Cano: - Meu filho

    Isso coisa conhecida

    O que consente a morte

    No faz com que eu volte vida

    A pessoa que tomar

    Remdio p'ra no morrerE como quem salga a carne

    Depois dela apodrecer

    E rezar para So Bento

    Depois da cobra morder.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    38/169

    04

    Chegou um frade e lhe disse:

    - Venho ajud-lo a morrer

    Disse Canco de Fogo

    - Tenho que agradecer

    - Deite-se a para um canto

    Cuide logo em se torcer.

    - 'torcer como'? Disse o fradeDisse Cano: - Meu amigo

    O senhor no vem morrer

    Para ir junto comigo?

    O frade respondeu: - Vtes!

    Um burro quem vai contigo.

    Disse Canco de Fogo:

    - Se eu no tivesse prostradoTinha voc que sair

    Cortez e civilizado

    S entraria em casa

    Depois que fosse chamado.

    05

    - Meu irmo, lhe disse o frade

    Eu vim aqui exort-lo

    O inferno est aberto

    O Diabo a esper-o

    As chamas do purgatrio

    Esto prontas para queim-lo.

    Disse-lhe o Canco de Fogo:- Frade eu quero que me d

    Explicao do inferno

    Lhe peo como merc

    No inferno ainda haver

    Um Diabo como voc?

    Eu no mandei-o chamar

    Ns no temos amizadeEu nunca quis relaes

    Com cigano nem com frade

    Apenas tenho a dizer-lhe

    Dane-se por caridade.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    39/169

    06

    Agora quero que chame

    O juiz e o escrivo

    De alguns bens que restam

    Vou fazer a doao

    Vou fazer publicamente

    Minha recomendao

    Entrou em casa o juizJunto com o escrivo

    Foram logo para o quarto

    Aonde estava Canco

    O juiz disse: - Aqui estou

    A sua disposio.

    Disse o juiz: - O senhor

    Tem uns bens pala deixar- Sim senhor: disse Canco

    Eu no posso levar

    Se algum quiser ir comigo

    Tem um bom frete a ganhar

    07

    O escrivo disse: - No brinque

    Repare que a morte crua

    - Pode at ser cozinhada

    Pode vir vestida ou nua

    Eu brinco c com a minha

    Voc l respeite a sua.

    O juiz lhe perguntou:- Voc no tem dois sobrados

    Quer deix-los com algum?

    Disse Canco: - Esto vexados

    Ou vocs so dois gatunos

    Ou meus filhos so bastardos

    Disse o juiz: - Ora essa

    Entenda-se esta charadaGente em casa lhe esperando

    O senhor dando massada

    Eu fazendo falta l

    Devido a sua embrulhada.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    40/169

    08

    Disse o Canco: - Meu amigo

    Voc assim no vai bem

    Vexames trazem fadigas

    Das quais no escapa algum

    Padre, juiz, escrivo

    No fazem falta a ningum.

    Puxou um papel lacradoDe dentro do travesseiro

    Entregou-o ao juiz

    E disse: - Leia-o primeiro

    Veja quem eu constituo

    Como meu testamenteiro.

    Sessenta mil cruzeiros

    Que tenho depositadosNo banco nacional

    Trs casas e dois sobrados

    Esto fora do testamento

    Sero inventariados.

    09

    Ao Dr. Joo Cerqueira

    Escrivo dos testamentos

    Deixo em Belo Horizonte

    Na praa dos Sacramentos

    A casa nmero 100

    Com todos os compartimentos.

    Ao Dr. Alves da LiraEu deixo em Canta Galo

    A casa nmero 6

    Na rua So Gonalo

    E o stio dos Ausentes

    Na capital de So Paulo.

    Disse o juiz: - Oh! senhor

    E, muita dignidadeO senhor dar tanta coisa

    Por sua livre vontade

    A mim e ao escrivo

    Isso ter muita bondade.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    41/169

    10

    - No doutor: - disse Canco

    Meus filhos fcam a

    Podem precisar um dia

    Os senhores so daqui

    Disse o doutor: - Precisando

    J sabem, eu moro ali.

    Saram numa palestraO juiz e o escrivo

    Dizendo um ao outro:

    - Foi sublime aquela ao

    S ns dois nos livraramos

    De um calote de Canco.

    Morreu Canco de Fogo

    A mulher participou;Poucos minutos depois

    O juiz se apresentou

    Da uns dez minutos

    O tabelio chegou.

    11

    Disse o juiz mulher

    - Seu marido j morreu

    Com relao ao enterro

    Deixe que quem faz sou eu

    Eu no quero que despenda

    Um centavo do que seu.

    Fique com essa importnciaPorque talvez necessite

    Mandou fazer catacumba

    Foi quem fez todo convite

    Disse mulher de Canco;

    - Com a senhora estou quite.

    Depois de quarenta dias

    Que Canco tinha morridoProcedeu-se o inventrio

    Foi tudo bem dividido

    Filhos e mulher de Canco

    Cada qual foi bem servido.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    42/169

    12

    O juiz depois pensou

    Que havia preciso

    De exigir a escritura

    Da famlia de Canco

    Chegou l no encontrou

    Quem desse definio.

    Mas depois disse consigo:Eu tenho provas legais

    Provo com o testamento

    No precisa nada mais

    Tratou de tomar o trem

    Partiu p'ra Minas Gerais.

    Saltou em Belo Horizonte

    Foi ao hotel almoouIndagou onde era

    Uma pessoa ensinou

    A rua at era perto

    Num instante ele chegou.

    Quando o doutor viu o prdio

    Sorriu-se a de contente

    Examinou-o por fora

    Achou-o muito excelente

    Tinha cem palmos de fundo

    E setenta e dois de frente.

    Ento batendo na portaCom pouco um homem chegou

    - Que deseja cavalheiro?

    O homem lhe perguntou

    - Sou dono deste prdio

    O homem a o fitou.

    - De qual prdio meu senhor'?

    - Deste aqui que voc mora- Isso conto do vigrio

    cedo ainda no hora

    A bateu o postigo

    Nem falou mais, foi embora.

    13

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    43/169

    O Dr. Joo Cerqueira

    Disse: momentos danados

    Ficou possesso de tudo

    Porm minutos passados

    Foi ao cartrio e mandou

    Dar busca nos registrados.

    Foi ao cartrio e bateuSaiu o tabelio

    O doutor disse: - me consta

    Que o colega escrivo

    E eu venho em seu cartrio

    Decidir uma questo.

    E puxou a do bolso

    Os papis do testamentoE disse: - O colega veja

    Se acha este apontamento

    Veja se no legal

    Todo este meu documento.

    14

    Encontraram a escritura

    Da casa j referida

    Vendida pelo doutor

    Flix Teixeira Guarida

    Comprada por uma rf

    Da viva Margarida.

    - Colega como foi isso?Pergunta o tabelio

    - Foi um conto do vigrio

    Passado por um ladro

    Disse o tabelio: Este

    igualmente a Canco

    - Pois foi esse tal Canco

    Que mora no Rio de JaneiroDisse-lhe o tabelio:

    - Esse um grande estradeiro

    Quando ele era pequeno

    Roubou o mundo inteiro.

    15

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    44/169

    Aqui mesmo certa vez

    Uma noite de So Joo

    Um ladro veio roubar-lhe

    Ele roubou o ladro

    E o gatuno por isso

    Acabou-se na priso.

    O ladro tinha dois milQue de algum tinha roubado

    E julgando que Canco

    Fosse algum vendilho de gado

    Foi ver se passava um quengo

    Mas foi quem saiu quengado.

    Disse o gatuno a Canco:

    - Patro eu tenho dinheiroDesejo fazer srias

    Transaes com o cavalheiro

    Disse Canco: - E preciso

    Que eu examine primeiro.

    16

    O ladro quando ouviu isso

    Ficou bastante assombrado

    O Canco de fogo disse:

    - Ladro! Eu sou delegado

    Desde trs horas da tarde

    Que tinha sido avisado

    O ladro ficou imvelSem saber o que fizesse

    Pensou se aquele dinheiro

    Se acaso Canco o quisesse

    Seria o meio que ele

    Uma escapula lhe desse.

    - Meu moo, disse o ladro

    Por vida de vossos paisPeo por Nossa Senhora

    Deixe-me aqui em paz

    Me solte, que lhe prometo

    Nunca hei-de roubar mais.

    17

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    45/169

    A tirou o dinheiro

    E disse: - Senhor delegado

    Pegue dois mil cruzeiros

    Aceite do seu criado

    Canco tomou o dinheiro

    E disse; - V com cuidado.

    Botou-lhe um cerco por foraAdiante denunciou-o

    A patrulha foi atrs

    Minutos depois pegou-o

    O gatuno reconheceu

    Que outro gatuno roubou-o.

    O gatuno confessou

    Quando a polcia o prendeuAinda caaram Canco

    Ele desapareceu

    O gatuno na cadeia

    Deu-lhe bexiga e morreu.

    18

    Um preto aqui fazendeiro

    No tempo da escravido

    Botou-o como empregado

    E ele uma ocasio

    Foi a um comprador de escravo

    E l vendeu o patro.

    Meteu o cobre no bolsoE ningum o pde achar

    O preto viu-se apertado

    P'ra se desembaraar

    O que Canco tinha feito

    Deu trabalho desmanchar.

    Passou quengadas enormes

    Com tanta facilidadeEnto nas empresas dele

    Tinha tal felicidade

    Que nunca pde cair

    Em poder da autoridade.

    19

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    46/169

    Eu no sei como o colega

    Mora no Rio de Janeiro

    No sabia que Canco

    Era o maior estradeiro

    - Estradeiro, no: ladro

    Um falsrio verdadeiro.

    Tambm o Dr. CerqueiraFicou encolerizado

    Passou em Belo Horizonte

    Uma noite incomodado

    Pelo conto do vigrio

    Que Canco tinha passado.

    Dizia: - Sou escrivo

    Nunca roubei um vintmTrinta, quarenta cruzeiros

    No roubo de ningum

    O roubo que eu considero

    E o que passa de cem.

    20

    E eu, fazer o enterro

    Do Diabo do ladro

    Gastar seiscentos cruzeiros

    Sem a mnima preciso

    Dar sepultura ao gatuno

    Como se fosse um baro.

    Raios te partam danadoL por onde tu andares

    O prejuzo que tive

    No inferno hs de pagares

    Tenho f na Providncia

    Que l tu tens de amargares.

    Quase trezentos cruzeiros

    Nesta viagem gasteiQuando o Diabo morreu

    Quantas passadas eu dei

    Gastei meu tempo e dinheiro

    Veja agora o que lucrei?

    21

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    47/169

    Tambm voltou apitando

    Com a carranca mais feia

    Chegou em casa deitou-se

    E no quis saber da ceia

    E l soube que oj uiz

    J tinha ido cadeia.

    Porque foi em Canta CaloVer a casa que herdou

    Na Rua So Gonalo

    A dita casa encontrou

    O morador era o dono

    A quem ele o intimou.

    Como o dono no saiu

    Botou-o a pulso p'ra foraO homem foi polcia

    Prendeu-o na mesma hora

    O botaram num asilo

    Quase que no vai embora.

    22

    O escrivo logo cedo

    Foi casa de Canco

    E disse para a mulher:

    - Seu marido era um ladro

    Depois de morrer roubou-me

    Eu sendo dele escrivo.

    A senhora viu a casaQue ele pra mim deixou-a

    Sendo a casa de uma rf

    Que o Diabo no comprou

    Disse a mulher de Canco

    - Doutor ele no levou-a

    O meu marido deixou

    O prdio que o senhor dizDeixou vinte e dois estados

    Que tem o nosso pas

    Ficou para quem quisesse

    Ele nada disso quis.

    23

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    48/169

    O doutor correu e disse:

    - Tambm garanto senhora

    Se Deus bot-lo no cu

    Pode esperar pela hora

    De uma quengada dele

    Que bota Deus para fora.

    Porque eu nunca encontreiLadro fino como aquele

    Desgraado do defunto

    Que sepultar-se com ele

    Eu acho Canco capaz

    De roubar os ossos dele.

    E a senhora tambm

    Desculpe a minha ousadiaVossa merc herdou dele

    Costume e categoria

    Pois a mulher do filsofo

    Aprende a filosofia.

    24

    A mulher disse: - Doutor

    Meu marido no roubava

    Mas com algum escrivo

    Que ele se acostumava

    Sendo um pouco inteligente

    Muitas coisas decorava.

    Ele chamou os senhoresQuando estava aqui prostrado

    Porque queria imitar

    O Cristo crucificado

    Queria morrer tambm

    Com um ladro de cada lado.

    O doutor sabe que a gente

    Estando perto de morrerAs vezes sente remorsos

    E teme de se perder

    Dizem que no outro mundo

    A pessoa h de sofrer.

    25

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    49/169

    O doutor no viu o frade

    Vir tambm por sua vez

    E, no viu o meu marido

    Que barulho logo fez

    Disse: - Chamei dois ladres

    No preciso de trs.

    A lhe disse o escrivo:- D licena vou embora

    Sou obrigado a dizer

    Que tenho medo da senhora

    Eu acho vossa excelncia

    Capaz de vender-me agora.

    - At logo senhor doutor

    Disse a mulher de CancoAqui fico s suas ordens

    Se acaso houver preciso

    Tem uma empregada aqui

    A sua disposio.

    26

    - Dana-te cachorra doida...

    Disse o escrivo correndo

    O Diabo quem vem c

    Ainda estando morrendo

    O quengo do teu marido

    Em ti agora estou vendo.

    27

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    50/169

    A HISTRIADOBOIMISTERIOSO

    Leitor, vou narrar um fatoDe um boi da antiguidade

    Como no se viu mais outro

    At a atualidade

    Aparecendo hoje um desses

    Ser grande novidade.

    Durou vinte e quatro anos

    Nunca ningum o pegou

    Vaqueiro que tinha fama

    Foi atrs dele chocouCavalo bom e bonito

    Foi l porm estancou.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    51/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    52/169

    04

    No serto de Quixelou

    Na fazenda Santa Rosa

    No ano de vinte e cinco

    Houve uma seca horrorosa

    Ali havia uma vaca

    Chamada "Misteriosa".

    Isso de MisteriosaFicou o povo a chamar

    Porque um vaqueiro disse

    Indo uma noite emboscar

    Uma ona na carnia

    Viu isso que vou narrar.

    Era meia-noite em ponto

    O campo estava esquisitoHavia at diferena

    Nos astros do infinito

    Nem do nambu nessa hora

    Se ouvia o saudoso apito.

    05

    Dizia o vaqueiro: eu estava

    Em cima dum arvoredo

    Quando chegou esta vaca

    Que me causou at medo

    Depois chegaram dois vultos

    E ali houve um segredo.

    O vaqueiro viu que os vultosEram de duas mulheres

    Uma delas disse vaca

    Parte por onde quiseres

    Eu protegerei a ti

    E aos filhos que tiveres.

    Ali o vaqueiro viu

    Um touro preto chegarEnto disseram os vultos

    So horas de regressar

    Disse o touro montem em mim

    Que o galo j vai cantar.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    53/169

    06

    A clareou a noite

    O vaqueiro pde ver

    Eram duas moas lindas

    Que mais no podia haver

    O touro era de uma espcie

    Que ele no soube dizer.

    Ele ento ouviu montarViu quando o touro saiu

    A vaca se ajoelhou

    E atrs dele seguiu

    Depois veio a ona e ele

    Atirou-lhe, ela caiu.

    Por isso teve essa vaca

    Da em diante esse nomeUns chamavam-na feiticeira

    Outro a vaca lobisomem

    Diziam que ela era a alma

    De um boi que morreu fome.

    07

    O coronel Sezinando

    Fazendeiro dono dela

    Se informando da histria

    No quis que pegassem ela

    Disse que o morador dele

    No tirasse leite nela.

    No ano de vinte e quatroPouca chuva apareceu

    Em todo serto do Norte

    A lavoura se perdeu

    At o prprio capim

    Faltou chuva no cresceu.

    Ento entrou vinte e cinco

    O mesmo vero trincadoMorreu muita gente fome

    Quase no escapa o gado

    Escapou alguma rs

    L num ou noutro cercado.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    54/169

    08

    A vaca misteriosa

    No houve mais quem a visse

    O dono no importava

    Que ela tambm sumisse

    Podia at pegar fogo

    Que na fumaa subisse.

    A vinte e quatro de agostoData esta receosa

    Que quando o diabo pode

    Saltar-se e dar uma prosa

    Pois foi nesse dia o parto

    Da vaca misteriosa.

    Dela nasceu um bezerro

    Um pouco grande e nutridoPreto da cor de carvo

    O pelo muito luzido

    Representando j ter

    Um ms ou dois de nascido.

    09

    Um vaqueiro da fazenda

    Assistiu ele nascer

    Foi noite casa grande

    Ao coronel lhe dizer

    O coronel disse ento:

    - Se nasceu, deixe crescer.

    Em maro de vinte e seisEstava o inverno pegado

    O coronel Sezinando

    Mandou juntar todo o gado

    Que ele queria saber

    Que reses tinham escapado.

    Ento a misteriosa

    Pde vir no meio do gadoTrazia o dito bezerro

    Grande e muito bem criado

    O que era de vaqueiro

    Vinha tudo admirado.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    55/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    56/169

    12

    Mas o boi se fez no casco

    E no campo se estendeu

    Gritou-lhe o vaqueiro: - Boi

    Tu no sabes quem sou eu!

    O boi que boto o cavalo

    carne que apodreceu.

    Com menos de meia lguaEstava o vaqueiro perdido

    No soube em que instante

    O tal boi tinha sumido

    Estava o cavalo suado

    E j muito esbaforido.

    Voltou ento o vaqueiro

    Sem saber o que fizessePensando ao chegar em casa

    Ento que histria dissesse

    Se pegando com os santos

    Que o coronel no soubesse.

    Contou ento o vaqueiro

    O que se tinha passado

    Dizendo que aquele boi

    S sendo bicho encantado

    Se havia mandinga em boi

    Aquele era batizado.

    No outro dia seguiramSeis vaqueiros destemidos

    Em seis cavalos soberbos

    Dos melhores conhecidos

    Pois s de cinco fazendas

    Puderam ser escolhidos.

    Foi Norberto da Palmeira

    Ismael do RiachoCalixto do P da Serra

    Flix da Demarcao

    Benvenuto do Desterro

    Z Preto do Boqueiro.

    13

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    57/169

    Tinha j ido dizer

    Na fazenda Santa Rosa

    Que o vaqueiro Apolinrio

    Da fazenda Venturosa

    Tinha encontrado com o boi

    Da vaca misteriosa.

    O coronel duvidouQuando contaram-lhe o fato

    Disse a pessoa: - Os vaqueiros

    J seguiram para o mato

    O coronel foi atrs

    Saber se aquilo era exato.

    Disse ento Apolinrio

    Que andava campeandoViu um boi preto bem grande

    E dele se aproximando

    Viu no lado esquerdo o ferro

    Do coronel Sezinando.

    14

    - Pois bem, disse o coronel

    Esse garrote encantado

    Quando desapareceu

    Inda no estava ferrado

    Foi-se orelhudo de tudo

    Nem sequer estava assinado.

    Pois tem na orelha esquerdaTrs mossas mais um canzil

    Tem na orelha direita

    Brinco lascado e funil

    O ferro da Santa Rosa

    Est nele a marca buril.

    Foram onde Apolinrio

    tarde o tinha encontradoPouco adiante estava ele

    Numa malhada deitado

    Levantou-se lentamente

    Como quem estava enfadado.

    15

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    58/169

    A tratou de partir

    Em desmedida carreira

    O coronel Sezinando

    Disse ao vaqueiro Moreira:

    - Aquele no h quem pegue

    Voltemos, pois asneira.

    Disse o vaqueiro Norberto:- Eu posso no o pegar

    Porm s me desengano

    Quando o cavalo cansar

    Nunca vi boi na igreja

    Para padre o batizar.

    Norberto tinha um cavalo

    Chamado "Rosa do campoCalixto do P da Serra

    Um chamado "Pirilampo

    O de Apolinrio, "Nisce

    Era de raa de pampo.

    16

    O do vaqueiro Ismael

    Chamava-se "Perciano

    O do ndio Benvenuto

    Chamava-se "Soberano

    Flix tinha um poldro preto

    Chamado "Riso do Ano".

    O do vaqueiro Z PretoTinha o nome de Calixto

    Dentre todos os cavalos

    Aquele era o mais bonito

    Era filho de um cavalo

    Que trouxeram do Egito.

    Era meio dia em ponto

    Quando formaram carreiraO boi fazia na frente

    Uma nuvem de poeira

    Nos riachos ele pulava

    De uma a outra barreira.

    17

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    59/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    60/169

    - Tenho sessenta e dois anos

    Em clculo no tenho um erro

    E disse que me faltasse

    O cho para o meu enterro

    Quando aquela vaca fosse

    A me daquele bezerro.

    Disse o coronel: - Voc um caboclo cismado

    No deixa de acreditar

    Nisso de boi batizado

    E mesmo aquele no

    O tal bezerro encantado.

    - No ? Ora se no !

    Veremos se ele ou noVossa senhoria ajunte

    Os vaqueiros do serto

    Do Rio da Prata ao Par

    E depois me diga ento.

    20

    Disse o coronel: - Caboclo

    Z Preto no pegou ele?

    - Ora! Pegou, coronel

    Mas no sabe o que h nele

    Dou a vida se houver um

    Que traga um pelo dele.

    - Eu digo com conscinciaSenhor coronel Sezinando

    O boi misterioso

    Para que estar lhe enganando?

    O boi filho de um gnio

    Uma fada o est criando.

    - A me d'gua do Egito

    Foi quem deu-lhe de mamarA fada de Borborema

    Tomou-o para criar

    Na Serra do Araripe

    Foi ele se batizar.

    21

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    61/169

    O coronel Sezinando

    Dizia: - Eu no acredito

    Na fada de Borborema

    E na me d'gua do Egito

    Gnio e fada para mim

    um dito esquisito.

    Quarenta e cinco vaqueirosSaram para peg-lo

    Dizia o ndio: - S hoje

    Eles podiam encontr-lo

    No dia de sexta-feira

    Duvido de quem ach-lo.

    E de fato nesse dia

    Nem o rastro dele viramVoltaram para a fazenda

    No outro dia partiram

    s nove horas do dia

    No rastro dele seguiram.

    22

    Na garganta de uma serra

    Acharam ele deitado

    Na sombra de uma aroeira

    Estava ali descuidado

    Pulou instantaneamente

    Na rapidez de um veado.

    O boi entrou na caatingaQue no procurava jeito

    Moror, jurema branca

    Ele levava de eito

    Rolava pedra nos cascos

    Levava angico no peito.

    Disse Fernandes de Lima

    Um dos vaqueiros paulistas:- De todos esses cavalos

    No h mais um que resista

    Dormirmos aqui, convm

    Ningum perd-lo de vista.

    23

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    62/169

    Dormiram todos ali

    Naquele campo to vasto

    Pearam a cavalgadura

    Deixaram ganhar o pasto

    s seis horas da manh

    Seguiram logo no rastro.

    O cavalo SoberanoAo ver o rastro do boi

    Gemeu, pulou para trs

    E o ndio gritou: Oi!

    Deixou os outros vaqueiros

    Correu para trs, se foi.

    Disse o ndio Benvenuto:

    - Eu no posso campearO cavalo est doente

    preciso descansar

    Faz muitos dias que corre

    E eu preciso regressar.

    24

    Ento disse o coronel:

    - Existe aqui um mistrio

    Antes de haver este boi

    Voc no era to srio?

    Voc faz do boi uma alma

    E do campo um cemitrio.

    Benvenuto respondeu:- Haja o que houver, vou embora

    Querendo me dispensar

    Pode me dizer agora

    V quem quiser, eu no vou

    No posso mais ter demora.

    Andaram duzentos metros

    Logo adiante foram vendoUm vaqueiro disse: - Olhe

    O boi ali se lambendo

    Tambm no houve um vaqueiro

    Que no partisse correndo.

    25

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    63/169

    O campo tinha uma lgua

    Sem ter nele um p de mato

    Esse boi corria tanto

    Que s veado ou um gato

    Ento fazia uma sombra

    Pouco maior que a de um rato.

    Disse o Lopes do Exu:- Juro f de cavaleiro

    No sairei mais de casa

    Chamado por fazendeiro

    Vendo o cavalo e a sela

    E deixo de ser vaqueiro.

    s cinco horas da tarde

    Pretenderam regressarEnto os cavalos todos

    No podiam mais andar

    Os vaqueiros no podiam

    Tanta fome suportar.

    26

    Voltaram para a fazenda

    E tornaram a contratar

    A 21 de novembro

    Cada um que ali chegar

    O coronel Sezinando

    Lhes mandaria avisar.

    O coronel SezinandoHomem muito caprichoso

    Tirou trs contos de ris

    Disse: - para o venturoso

    Que venha a esta fazenda

    E pegue o boi misterioso.

    A vinte e um de novembro

    Venceu-se o trato afinalA fazenda Santa Rosa

    Ficou como um arraial

    Ou uma povoao

    Numa noite de Natal.

    27

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    64/169

    J um criado chamava

    O povo para o almoo

    Quando viram ao longe um vulto

    Divulgaram ser um moo

    Ento vinha num cavalo

    Que parecia um colosso.

    Era um cavalo caxitoTinha uma estrela na testa

    Vaquejada que ele ia

    Ali tornava-se em festa

    Ganhou numa apartao

    Nome de "Rei da Floresta".

    Chegou ento o vaqueiro

    Saudou a todos daliPerguntou: - Qual dos senhores

    o coronel aqui?

    Apontaram o coronel

    Disseram: - esse a.

    28

    O coronel perguntou-lhe:

    - De que parte s, cavaleiro?

    - Eu sou de Minas Gerais

    Disse o rapaz, sou vaqueiro

    Vim porque soube que aqui

    Existe um boi mandingueiro.

    Disse o coronel: - ExisteEsse boi misterioso

    Tem-se corrido atrs dele

    Ele sai vitorioso

    J tem sado daqui

    Vaqueiro at desgostoso.

    - Queria ver esse boi

    Disse sorrindo o vaqueiroTenho vinte e quatro anos

    Nunca vi boi feiticeiro

    Disse o coronel: - Pegando-o

    Ganha avultado dinheiro.

    29

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    65/169

    - Quem peg-lo em pleno campo

    Disse a o coronel

    Ganhar pago por mim

    Um relgio e um anel

    Tem mais trs contos de ris

    Em ouro, prata ou papel.

    - Salvo se algum o pegarQuando ele estiver doente

    Ou lhe atirando de longe

    Isso coisa diferente

    H de pegar pelo p

    Ele bom perfeitamente.

    Disse o moo: - No aceito

    Objetos nem dinheiroEu s desejo ganhar

    A vitria de um vaqueiro

    Esse seu menor criado

    filho de um fazendeiro.

    30

    - De sbado a tera-feira

    Descansados a cabea

    Disse o coronel, tarde

    Quem for vaqueiro aparea

    Sairemos quarta-feira

    Antes que o dia amanhea.

    Na quarta-feira seguiuComo tinha contratado

    O povo que o coronel

    tarde tinha avisado

    Eram dez horas do dia

    Inda o boi viram deitado.

    Disse o vaqueiro de Minas:

    - Perdi de tudo a viagemEu pegando um boi daquele

    No conto por pabulagem

    Para o cavalo que venho

    Inda dez no vantagem.

    31

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    66/169

    - Pensei que fosse maior

    Segundo o que ouvi falar

    Parece at um garrote

    Que criou-se sem mamar

    Um bicho manso daquele

    Faz pena at derrubar.

    Porm o cavalo aViu o boi se levantar

    Estremeceu e bufou

    Fastou e quis se acuar

    Que deu lugar ao vaqueiro

    Daquilo desconfiar.

    A chegou-lhe as esporas

    E o cavalo partiuEm menos de dois minutos

    O boi tambm se sumiu

    Deu uns trs ou quatro pulos

    Ali ningum mais o viu.

    32

    O boi entrou na caatinga

    Com o vaqueiro tambm

    Por dentro do cipoal

    Que no passava ningum

    Tanto que o coronel disse:

    - Socorro ali ningum tem.

    Eram seis horas da tardeEstava o grupo reunido

    Sem notcia do vaqueiro

    Que atrs do boi tinha ido

    Via-se a batida apenas

    Por onde tinha seguido.

    Um dizia: - Ele morreu

    Outro que tinha cadoOutro dizia: - O vaqueiro

    Arrisca-se ter fugido

    No pde pegar o boi

    Voltou de l escondido.

    33

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    67/169

    Acenderam o facho e foram

    Por onde tinham entrado

    Acharam sempre roteiro

    Por onde tinham passado

    O coronel Sezinando

    J ia desenganado.

    Passava da meia-noiteGritaram ele respondeu

    O coronel acalmou-se

    E disse: - Ele no morreu

    Porm o grito era longe

    Que quase no se entendeu.

    Trs horas da madrugada

    Foi que puderam o acharMas o cavalo cado

    Sem poder se levantar

    E ele mais contrariado

    Sem poder quase falar.

    34

    O coronel perguntou-lhe

    O que tinha sucedido

    Respondeu que tal desgraa

    Nunca tinha acontecido

    Dizendo: - Antes casse

    E da queda ter morrido.

    - O cavalo em que eu vimNingum nunca viu cansado

    Correu um dia seis lguas

    Inda no chegou suado

    E da carreira de hoje

    Ficou inutilizado.

    - No volto a Minas Gerais

    Porque chego com vergonhaOs vaqueiros j esperam

    Uma notcia risonha

    Eu chegando l com essa

    Do-me uma vaia medonha.

    35

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    68/169

    - Menos de cinquenta passos

    Inda me aproximei dele

    Inda estirei a mo

    Mas no pude tocar nele

    Apenas posso dizer

    No sei que boi aquele.

    - Nunca vi bicho correrCom tanta velocidade

    S lampejo de relmpago

    Em noite de tempestade

    Nem peixe n'gua se move

    Com tanta facilidade.

    Ele um boi muito grande

    Tem o corpo demasiadoNo sei como corre tanto

    Dentro de um mato fechado

    Por isso que muitos pensam

    Que seja um boi encantado.

    36

    O coronel disse a:

    - Acho bom tudo voltar

    Disse o vaqueiro de Minas:

    - No precisa descansar

    Vejam se do-me um cavalo

    Que vou me desenganar.

    O coronel SezinandoChamou Mamede Veloso

    Lhe disse: - Mamede, v

    fazenda do Mimoso

    Diga ao vaqueiro que mande

    O cavalo "Perigoso".

    - Diga que mate uma vaca

    Leve queijo e rapaduraE v esperar por ns

    Na Fazenda da Bravura

    Diga que somos sessenta

    Leve jantar com fartura.

    37

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    69/169

    - O vaqueiro cumpriu tudo

    Que seu amo lhe ordenou

    Deu o cavalo a Mamede

    Puxou a vaca e matou

    s onze horas do dia

    Ento Mamede chegou.

    Trouxe o cavalo cardoCom a espcie de rudado

    Disse o vaqueiro de Minas:

    - Oh! Bicho de meu agrado

    Lhe disseram: - O nome dele

    Foi muito bem empregado.

    O vaqueiro levantou-se

    Com o guarda-peito no ombroSe aproximou do cavalo

    Passou-lhe a mo pelo lombo

    O cavalo deu um sopro

    Que quase causa-lhe assombro.

    38

    Ento o vaqueiro disse:

    - Eu vou experimentar

    Se o cavalo Perigoso

    Presta para campear

    Disse ento o coronel:

    - Cuidado quando montar.

    - Veja que ele j matouCom queda quatro vaqueiros

    Os que causaram mais pena

    Foram dois piauizeiros

    Ento respondeu o Srgio:

    - No eram bons cavaleiros.

    Quando o vaqueiro montou

    O cavalo se encolheuChegou-lhe ainda as esporas

    O sangue logo desceu

    Quase trs metros de altura

    Ele da terra se ergueu.

    39

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    70/169

    Mas o cavaleiro era destro

    Ali no desaprumou

    Chegou-lhe ainda as esporas

    Ele de novo pulou

    Esse pulo foi to grande

    Que tudo se admirou.

    Fez uma curva no saltoTirou pelos quartos a sela

    O vaqueiro era um heri

    Saltou aprumado nela

    Dizendo: - Hoje achei um testo

    Que deu na minha panela.

    Saltou mas no afrouxando

    Ambas as rdeas do cavaloSabia que se soltasse

    Ningum podia peg-lo

    Dizendo: - O cavalo serve

    Vou logo experiment-lo.

    40

    Selou de novo o cavalo

    E tornou a se montar

    Tanto que o coronel disse:

    - Este sabe cavalgar

    O cavalo conheceu

    Ali no quis mais saltar.

    Passava do meio diaQuando os vaqueiros saram

    Acharam o rastro do boi

    Todos sessenta seguiram

    Adiante encontraram ele

    No limpo que todos viram.

    Srgio, o vaqueiro de Minas

    Foi o primeiro que viuPerguntou:- Ser aquele

    Que l do mato saiu?

    Todos disseram: - aquele

    A o Srgio partiu.

    41

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    71/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    72/169

    Porm o vaqueiro disse:

    - Aonde entrares eu entro

    Se tu entrares no mar

    Viro-me em peixe, vou dentro

    Algum que for procurar-me

    Acha-me morto no centro.

    O boi com facilidadeO trancadilho rompeu

    Quase no centro do vo

    O vaqueiro conheceu

    O cavalo Perigoso

    Da carreira adoeceu.

    - Diabo!,disse o vaqueiro

    Est doente o PerigosoAh! Boi do diabo enfim

    Te chamas Misterioso

    Eu puxei a meu av

    Que morreu por ser teimoso.

    44

    Voltou para o campo limpo

    O cavalo to suado

    Com um talho no pescoo

    Um casco quase furado

    De forma que o vaqueiro

    No pde voltar montado.

    s oito horas da noiteVieram os outros chegar

    A estrada que o boi fez

    Deu para tudo passar

    Cinquenta e nove cavalos

    Sem nenhum se embaraar.

    - Colega, cad o boi?

    Perguntou o SezinandoO Srgio se levantou

    E respondeu espumando:

    - Coronel, eu j pensei

    Que s me suicidando.

    45

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    73/169

    - Suicidar-se por qu?

    O Srgio ento respondeu:

    - O coronel no est vendo

    O que j me sucedeu?

    Matei meu cavalo aqui

    Inutilizei o seu.

    Disse o coronel: - Faz penaPerigoso se acabar

    Porm nosso, paguei-o

    Ningum mais vem o cobrar

    E dou vinte pelo seu

    Se dois ou trs no pagar.

    Eram sessenta cavalos

    Uns de diversos sertesE todos esses no iam

    A todas apartaes

    Em vaquejadas garbosas

    Mostraram lindas aes.

    46

    Havia um cavalo russo

    Chamado Paraibano

    Carioca, Rio-grandense

    Paturi e Pernambucano

    Paulista e Vitoriense

    Flor do Prado e Sergipano.

    Pombo Roxo e PapagaioFlor do Campo, Catingueiro

    Soc Boi, Canrio Verde

    Patola e Piauizeiro

    guia Branca e Bem-te-vi

    Flecha Peixe e Campineiro.

    E os outros que aqui no posso

    Seus nomes mencionarEra tambm impossvel

    Quem me contou se lembrar

    melhor negar o nome

    Do que depois enganar.

    47

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    74/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    75/169

    O coronel disse a ele:

    - Eu fico penalizado

    No digo que se demore

    Porque seu pai tem cuidado

    Veja se volta em janeiro

    Que me acho preparado.

    Ento o Srgio saiuNo pde se demorar

    O coronel Sezinando

    No deixava de pensar

    Por que forma aquele boi

    Ningum podia pegar.

    Chamou o escravo e lhe disse:

    - Monte num cavalo e v Fazenda do Desterro

    Diga ao vaqueiro de l

    Que eu mando dizer a ele

    Que sem falta venha c.

    50

    O escravo cumpriu todo

    O dever de portador

    Achou a casa fechada

    Perguntou a um morador

    Se sabia do vaqueiro

    Esse disse: - No senhor.

    Ento o morador disse:- Na noite de sexta-feira

    O ndio foi ao curral

    Deixou aberta a porteira

    Saiu montado a cavalo

    E levou a companheira.

    Voltou o escravo e disse

    Tudo que tinha sabidoQue na sexta-feira noite

    O ndio tinha sado

    E carregou a mulher

    Como quem sai escondido.

    51

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    76/169

    - Inda v mais essa agora!

    O coronel exclamou

    Aquele bruto saiu

    E no me comunicou

    Que diabo teve ele

    Que at o gado soltou?

    No outro dia foi lAchou a casa fechada

    Ento a porta da frente

    Tinha ficado cerrada

    At a mala de roupa

    Inda estava destrancada.

    O fazendeiro com isso

    Ficou muito constrangidoPensava logo em crime

    Que pudesse ter havido

    O ndio no tinha causa

    Porque sasse escondido.

    52

    Ento mandou gente atrs

    Pelo mundo a procurar

    No achou uma pessoa

    Que dissesse eu vi passar

    Em todo serto que havia

    Ele mandou indagar.

    Ento o povo diziaQue o ndio era feiticeiro

    E uma fada pediu-lhe

    Que no fosse mais vaqueiro

    A fada transformou ele

    Em um veado galheiro.

    Os faladores diziam

    Que ele foi assassinadoE talvez o coronel

    Tivesse mesmo mandado

    Matar ele e a mulher

    Para ficar com o gado.

    53

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    77/169

    Outros diziam ao contrrio

    At juravam que no

    Os dois cavalos do ndio

    Aonde botaram ento

    Mesmo assim o coronel

    No fazia aquela ao.

    Bem encostadinho ao ndioUma velha fiandeira

    Morava numa casinha

    E fiava a noite inteira

    Disse que quase se assombra

    Ali numa sexta-feira.

    Disse: - meia-noite em ponto

    Eu inda estava fiandoEm casa de Benvenuto

    Eu ouvi gente falando

    Espiei por um buraco

    Vi chegar um boi urrando.

    54

    A velha disse: - Deus mande

    A cascavel me morder

    Se de l de minha casa

    No ouvi o boi dizer

    Boa noite, Benvenuto

    Eu s venho aqui te ver.

    - O boi disse outras palavrasQue eu de l no pude ouvir

    O caboclo e a mulher

    Disso ficaram a sorrir

    O boi, o ndio e a mulher

    Todos eu vi sair.

    - A fui guardar o fuso

    E a cesta de algodoCredo em cruz! Dizia eu

    Aquilo arte do Co

    So coisas do fim do mundo

    Bem diz Frei Sebastio.

    55

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    78/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    79/169

    Uma noite de So Joo

    Na fazenda Santa Rosa

    S a noite de Natal

    Estaria to venturosa

    Porque em todo serto

    Aquela era a mais garbosa.

    Trs classes ali danavamEm redobrada alegria

    No salo da casa grande

    Os lordes da freguesia

    Em latadas de capim

    A classe pobre que havia.

    O leitor deve saber

    Do estilo do sertoO que no fizer fogueiraNas noites de So Joo

    Fica odiado do povo

    Tem fama de mau cristo.

    58

    O coronel Sezinando

    Derrubou uma aroeira

    E vinte e oito pessoas

    Carregaram essa madeira

    Para o ptio da fazenda

    E fizeram uma fogueira.

    Estava a noite vinte e trsDo ms do Santo Batista

    Como outra no serto

    Nunca tinha sido vista

    S faltava ali a msica

    Discurso e fogos-de-vista.

    Estava o povo todo ali

    Uns danando e outros bebendoUm prazer demasiado

    Em tudo estava se vendo

    Mais de cinquenta pessoas

    Assando milho e comendo.

    59

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    80/169

    Meia-noite mais ou menos

    Pde o povo calcular

    O galo pai do terreiro

    Estava perto de cantar

    Quando viram um touro preto

    No ptio se apresentar.

    Meteu os cascos na terraCobriu tudo com poeira

    Soltou um urro to grandeQue ouviu-se em toda ribeira

    Deixou em cima da casa

    Toda a brasa da fogueira.

    Dos cachorros da fazenda

    Nem um sequer acudiuO gado urrava de medo

    Parte do povo fugiu

    O coronel Sezinando

    Foi o nico que saiu.

    60

    Ainda viu o vulto dele

    Que pelo ptio ia andando

    Chamou os cachorros todos

    Esses fugiram uivando

    O povo todo em silncio

    J muitos se retirando.

    Ento acabou-se a festaO povo se debandou

    Os moradores de perto

    L um ou outro ficou

    Aquele claro garboso

    Em escuro se tornou.

    No outro dia s dez horas

    O coronel SezinandoEstava com sua mulher

    No alpendre conversando

    Quando o ndio Benvenuto

    Chegou e foi se apeando.

    61

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    81/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    82/169

    - Eu atrs dele no vou

    No lhe trago no engano

    Pois no quero desgostar

    Meu cavalo Soberano

    Por eu ir l uma vez

    Tive castigo de um ano.

    Z Preto do BoqueiroNaquela hora chegou...

    Perguntou ao coronel

    - O que foi que se passou?

    Respondeu o coronel:

    - Foi o co que se soltou.

    Disse Z Preto: - Eu tambm

    Venho aqui bem receosoO coronel me conhece

    V que no sou mentiroso

    Inda agora quando vinha

    Vi o Boi Misterioso.

    64

    - Na Malhada do Balo

    Passei, e ele deitado

    Foi o boi que veio aqui

    Eu fiquei desconfiado

    Porque vi o chifre dele

    E parece estar queimado.

    Srgio, o vaqueiro de MinasNesse momento chegou

    Disse: - Senhor coronel

    s suas ordens eu estou

    Pois recebi o recado

    Que o coronel me mandou.

    Disse o Srgio: - Eu recebi

    Do coronel um recadoQue no dia vinte e sete

    Estava o povo contratado

    Pois o Boi Misterioso

    Tinha j sido encontrado.

    65

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    83/169

    Ento disse o coronel

    Que o recado no mandou

    Ali contou a mido

    A cena que se passou

    E disse: - Z Preto agora

    Me disse que encontrou.

    Nisso chegou um vaqueiroUm caboclo curiboca

    O nariz grosso e rolio

    Da forma de uma taboca

    Em cada lado do rosto

    Tinha uma grande pipoca.

    - Bom dia, Seu coronel!

    Disse o tal recm-chegado- Tenha o mesmo o cavaleiro

    Respondeu desconfiado

    Dizendo, dentro de si:

    De onde este danado?

    66

    O coronel perguntou-lhe

    - De que parte , cavaleiro?

    - Do serto de Mato GrossoRespondeu o tal vaqueiro

    - A que negcio que vem?

    Perguntou-lhe o fazendeiro.

    - Venho a vossa senhoriaA mandado do patro

    Ver um Boi Misterioso

    Que existe neste serto

    O coronel quer que pegue

    Me d autorizao.

    - Meu patro bom vaqueiro

    Disse-lhe o desconhecidoSoube que desta fazenda

    Um boi tinha se sumido

    Mandou-me ver se esse boi

    J havia aparecido.

    67

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    84/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    85/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    86/169

    - Voc bem v o cavalo

    Que eu venho montando nele

    E conhece meu patro

    Sabe que o cavalo dele

    O boi a se virou

    E olhou bem para ele.

    A desceu do oiteiroEm desmarcada carreira

    Deixando por onde ia

    Uma nuvem de poeira

    O curiboca gritou-lhe:

    - No corra, que asneira.

    Ento seguiram no campo

    Onde tudo se avistavaO cavalo do caboclo

    Fogo da venta deitava

    Dava sopro na campina

    Que tudo ali se assombrava.

    72

    O coronel disse a todos:

    - Devemos seguir atrs

    Est decidido que ali

    Anda a mo do Satans

    Convm agora ns vermos

    Que resultado isso traz.

    Bem no centro da campinaHavia uma velha estrada

    Feita por gado dali

    Porm j estava apagada

    Depois com outra vereda

    Faziam uma encruzilhada.

    Iam o vaqueiro e o boi

    Pela dita cruz passarAli enguiava a cruzOu tinha ento que voltar

    Devido a outros vaqueiros

    No havia outro lugar.

    73

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    87/169

    Mas o boi chegando perto

    No quis enguiar a cruz

    Tudo desapareceu

    Ficou um foco de luz

    E depois dela saram

    Uma guia e dois urubus.

    Tudo ali observouO fato como se deu

    Dizendo que o cho se abriu

    E o campo estremeceu

    Pela abertura da terra

    Viram quando o boi desceu.

    Voltaram todos os homens

    O coronel constrangidoO boi e o tal vaqueiro

    Terem desaparecido

    A terra abriu-se e fechou-se

    Ps tudo surpreendido.

    74

    Julgam que a guia era o boi

    Que quando na terra entrou

    Ali havia uma fada

    Em uma guia o virou

    O vaqueiro e o cavalo

    Em dois corvos os transformou.

    O coronel SezinandoFicou to contrariado

    Que vendeu todas as fazendas

    E nunca mais criou gado

    Houve vaqueiro daqueles

    Que um ms ficou assombrado.

    L ainda hoje se v

    Em noites de trovoadasAvaca misteriosa

    Naquelas duas estradas

    Duas mulheres falando

    Rangendo os dentes e chorando

    Onde as cenas foram dadas.

    75

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    88/169

    L

    CASAMENTOEDIVRCIODALAGARTIXA

    No se h que viva no mundo

    que no deseje gozar.

    Desde o velho criancinha

    Quer a vida desfrutar e tudo

    aspira o amor,

    Porque viver diz: - Amar.

    Disse Lagartixa um dia:

    - Eu s ficarei solteira

    se no achar nesta terra

    um diabo que me queira.

    Procurei desde as casas

    at o largo da feira.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    89/169

    02

    Mame com quarenta anos

    tava ficando titia,

    mas tomou uma cachaa

    da mais forte que havia,

    foi feira, achou papai,

    voltou rica neste dia.

    - o que eu fao tambm...Tomo um dia uma cachaa,

    vou para a porta da rua,

    ali nem mosquito passa.

    E s volto com um marido

    ou emprestado ou de graa.

    Mame dizia uma coisa

    que eu achava muito exato:"Quando faltar o cachorro,

    se pode caar com gato.

    E no tenho um desses dois,

    ento bota a me no mato".

    03

    Uma tia disse a ela:

    - Minha filha no se veixe!

    Respondeu a Lagartixa:

    - O que vier na rede peixe.

    Eu vou procurar marido,

    se achar muito trago um feixe.

    Lagartixa ento saiuvendendo azeite s canadas.

    Encontrou com o Calango,

    uma alma dispersada,

    que andava com a molstia

    procurando namorada.

    o Calango suspirava

    pela vida de casado.A Lagartixa tambm

    tinha se desenganado

    que no acharia nunca

    quem fosse seu namorado.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    90/169

    04

    Quando o Calango viu ela,

    ficou todo animado.

    Disse consigo: j sei,

    hoje volto transformado...

    Tambm disse a Lagartixa:

    j encontrei namorado...

    Cumprimentaram-se amboscom grande contentamento,

    o Calango com requebros,

    ela com derretimento.

    Com cerimnias um do outro,

    no trataram casamento.

    Ela perguntou-lhe apenas

    como que ele se chamava.Ele perguntou a ela

    onde o pai dela morava,

    se a me no tinha cime

    quando ela passeava.

    05

    Respondeu a Lagartixa:

    - O papai faz cara feia.

    Tem dias que ele se zanga,

    jura de meter-me a peia,

    mas saio na lua nova

    e volto na lua cheia...

    Era um namoro rombudo...Ela chamava neguinho,

    Calango flocava a cauda,

    pedia a ela um beijinho...

    A Lagartixa dizia:

    - Espere a, meu anjinho!

    O velho s vezes dizia:

    - Eu quero sinceridade.A me dela ento dizia:

    .o,- Meu velho, isto bestidade,

    rapaz brincar com uma moa

    so coisas da mocidade.

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    91/169

    06

    Voc j est esquecido

    do tempo do nosso amor?

    Eu era como uma abelha,

    voc, como um beija-flor!

    Eu desfrutava em seus braos

    o mais suave calor!

    A me afrouxava ela,sendo uma moa solteira.

    Calango dava-lhe o brao,

    iam passear na feira.

    Se a fome no os apertasse,

    passavam a semana inteira.

    O pai de nada sabia,

    porque vivia por fora.Calango meteu-se dentro

    como quem diz: - agora!

    O velho de longe assim

    no v se a filha namora.

    07

    Ora, o pai da Lagartixa

    era um pobre analfabeto,

    entendia que Calango

    fosse um mulato correto.

    Quando veio abrir os olhos,

    foi tarde, j tinha neto.

    E foi o velho lagartose queixar autoridade,

    dizendo que o Calango

    fez-lhe aquela falsidade:

    desonrou a sua filha

    sendo de menor idade.

    Nesse tempo o Cururu

    era subdelegado.O velho foi l chorando

    porque andava injuriado.

    O Cururu disse: - Volte,

    que voc ser vingado...

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    92/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    93/169

    10

    Casou-se sempre o Calango,

    embora fosse obrigado.

    Botou um grande negcio,

    O tratou de ser homem honrado.

    A Lagartixa em trs dias

    vendeu dali tudo fiado.

    O Calango comprou tudofiado ao Camaleo,

    entregou Lagartixa,

    foi tratar de uma eleio.

    Quando voltou no achou

    nem onde tinha a armao.

    At o prprio balco

    ela o tinha empenhado,deu para embrulhar sabo

    o livro do apurado;

    os utenslIos da venda

    tudo j tinha voado.

    11

    O Calango com aquilo

    entristeceu de repente,

    exclamou: - Mulher danada,

    voc me deixou doente.

    Me diga agora que conta

    Presto eu ao seu parente?

    A Lagartixa lhe disse:- No precisa se vexar,

    seu primo Camaleo

    por isso no vai lhe dar

    D-lhe uma satisfao,

    diga que vai arranjar...

    O Calango respondeu:

    - Eu no passo. por velhaco...Respondeu-lhe a Lagartixa:

    - Voc ainda d cavaco?

    Os calotes do comrcio

    hoje se chamam "buraco".

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    94/169

    12

    Ento o Calango disse:

    - Veja se bota o almoo...

    Respondeu-lhe a Lagartixa:

    - Tenha pacincia, moo,

    falta de dois vintns

    eu ontem comi ensosso.

    E se voc voltou liso,dana-se agora o negcio,

    pode arrumar logo a trouxa

    e vamos abrir divrcio.

    Caixeiro sem capital

    s nos lucros ter scio.

    Marido sem nem um X

    no quero, que no me acode,no tem que ficar zangado

    nem que puxar o bigode,

    mulher hoje em dia luxo

    e luxo s tem quem pode.

    Mame dizia ao papai:

    "Se estiver aborrecido,

    me avise logo com tempo,

    pode ficar prevenido,

    da forma que eu mudo a saia

    mudo tambm o marido".

    E note bem que j fezmais de ms que estou casada

    e no agento mais

    esta vida assim privada.

    Trabalhar para comer?

    Vote, seu Z, vai l nada...

    O Calango disse a ela:

    - Mulher, no fale em divrcio!Respondeu-lhe a Lagartixa:

    - Voc parece um becio...

    Escolha, de duas uma:

    ou deix-lo ou dar-lhe um scio.

    13

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    95/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    96/169

    Mulher feia e homem ruim

    isto todo dia aumenta,

    a fartura j tanta

    que o mundo no se agenta.

    Eu fui ver se achava um,

    Encontrei mais de quarenta.

    Disse o Calango: - Meu paito bem casado viveu!

    A Lagartixa lhe disse:

    - Ento era como o meu...

    Mame tinha dez maridos,

    nove foi papai quem deu.

    O namoro suja o nome,

    eu conheo que exato.Mas eu no tenho dinheiro,

    namoro cachorro e gato,

    do ar s deixo urubu

    e da terra, carrapato.

    16

    Por favor oua mais essa,

    se no for verdade, diga,

    capricho familiar

    resulta sempre a intriga,

    honestidade no veste,

    honra no enche barriga.

    O Calango disse a ela:- Minha me viveu honrada,

    se acabou nua e com fome,

    porm nunca foi manchada...

    Respondeu a Lagartixa:

    - Tambm morreu desgraada.

    Minha av morreu velhinha,

    porm no lugar que iaquinze, vinte namorados

    todas as vezes trazia,

    fora muitos que ficavam

    que meu av no sabia.

    17

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    97/169

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    98/169

    Limpou as armas bem limpas

    e amolou o faco,

    escovou o bacamarte,

    apertou o cinturo,

    muniu bem a cartucheira

    e seguiu na direo.

    Levou como testemunhao Besouro-mangang,

    e avisou o Papa-vento

    que se preparasse l...

    Disse o Papa-vento: - Digalhe

    que pode vir, estou c.

    Chegou ento o Calango

    e falou ao Papa-vento:- Um de ns descer hoje

    ao cho do esquecimento,

    eu j dei terminaes

    at do meu testamento.

    20

    Ento disse o Papa-vento:

    - A vida quase uma peta.

    O risco que corre a broca

    corre tambm a marreta;

    eu no sou como sagi,

    para morrer com careta.

    Ento disse a Lagartixa:- Quero ver quem cai primeiro.

    O que ganhar j se sabe

    que foi o melhor guerreiro.

    Eu corro os bolsos do morto

    para ver se tem dinheiro.

    Calango atirou primeiro,

    Papa-vento se livrou,naquele mesmo momento

    nele tambm atirou;

    Calango era muito destro

    do tiro se desviou.

    21

  • 7/25/2019 JUVENAL E O DRAGAO e Outros Folhetos

    99/169

    Tr