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DAS DIFERENTES RAÇAS HUMANAS PARA O ANÚNCIO DAS PRELEÇÕES DE GEOGRAFIA FÍSICA DO SEMESTRE DE VERÃO DE 1775 IMMANUEL KANT Tradução, introdução e notas de ALEXANDRE HAHN Universidade Federal do Pará Introdução O ensaio Das diferentes raças humanas, publicado em 1775, foi inicialmente concebido como um anúncio das preleções (Vorlesungen) de geografia física, que seriam ofertadas por Kant no semestre de verão daquele ano na Universidade de Königsberg. De acordo com Daniel Heinrich Arnoldt (1706-1775), era costume em Königsberg, durante o século XVIII, que apenas os cursos dos professores (titulares ou associados) fossem anunciados no catálogo oficial de preleções (Catalogus lectionum), impresso em latim. Os docentes privados (Privatdozenten) deviam anunciar suas preleções no quadro de avisos (schwarzes Brett) da universidade, ou podiam ainda divulgá-las mediante a distribuição de breves prospectos ou programas, que delineassem o teor das preleções que pretendiam oferecer naquele semestre. 1 Kant fez uso desse recurso de redigir pequenos ensaios acadêmicos, como forma de divulgação de suas preleções, em sete ocasiões: nos semestres de verão de 1756, 1757 e 1758, nos semestres de inverno de 1759/1760, 1762/1763 e 1765/1766, e, por último, no semestre de verão de 1775. 2 Mas, curiosamente, esses ensaios poucas informações fornecem 1 Cf. ARNOLDT, Daniel Heinrich. Ausführliche und mit Urkunden versehene Historie der Königsbergischen Universität. Teil I. Königsberg: Hartung, 1746, p. 199. 2 Os ensaios publicados são os seguintes: Novas observações para a elucidação da teoria dos ventos (M[agister] Immanuel Kants neue Anmerkungen zur Erläuterung der Theorie der Winde, wodurch er zugleich zu seinen Vorlesungen einladet), como anúncio das preleções do semestre de verão de 1756; Projeto e anúncio de um curso de Geografia Física (Entwurf und Ankündigung eines Collegii der physischen Geographie nebst dem Anhange einer kurzen Betrachtung über die Frage: Ob die Westwinde in unsern Gegenden darum feucht seien, weil sie über ein großes Meer streichen), como anúncio das preleções do semestre de verão de 1757; Novo conceito doutrinário do movimento e do repouso (M. Immanuel Kants Neuer Lehrbegriff der Bewegung und Ruhe, und der damit verknüpften Folgerungen in den ersten Gründen der Naturwissenschaft, wordurch zugleich seine Vorlesungen in diesem halben Jahre angekündigt werden), como anúncio das preleções do semestre de verão de 1758; Ensaio de algumas considerações sobre o otimismo (Versuch einiger Betrachtungen über den Optimismus von M. Immanuel Kant, wodurch er zugleich seine Vorlesungen auf das bevorstehende halbe Jahr ankündigt) como anúncio das preleções do semestre de inverno de 1759/1760; A falsa sutileza das quatro figuras silogísticas (Die falsche Spitzfindigkeit der vier syllogistischen Figuren erwiesen von M. Immanuel Kant) como anúncio das preleções do semestre de inverno de 1762/1763; Anúncio do plano das preleções do semestre de inverno de 1765/1766 (M. Immanuel Kants Nachricht von der Einrichtung seiner Vorlesungen in dem

Kant, Immanuel - Das diferentes raças humanas (Traduzido por Alexandre Hahn)

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DAS DIFERENTES RAÇAS HUMANAS PARA O ANÚNCIO DAS PRELEÇÕES DE GEOGRAFIA FÍSICA DO SEMESTRE

DE VERÃO DE 1775

IMMANUEL KANT

Tradução, introdução e notas de ALEXANDRE HAHN

Universidade Federal do Pará

Introdução

O ensaio Das diferentes raças humanas, publicado em 1775, foi inicialmente

concebido como um anúncio das preleções (Vorlesungen) de geografia física, que

seriam ofertadas por Kant no semestre de verão daquele ano na Universidade de

Königsberg. De acordo com Daniel Heinrich Arnoldt (1706-1775), era costume em

Königsberg, durante o século XVIII, que apenas os cursos dos professores (titulares ou

associados) fossem anunciados no catálogo oficial de preleções (Catalogus lectionum),

impresso em latim. Os docentes privados (Privatdozenten) deviam anunciar suas

preleções no quadro de avisos (schwarzes Brett) da universidade, ou podiam ainda

divulgá-las mediante a distribuição de breves prospectos ou programas, que delineassem

o teor das preleções que pretendiam oferecer naquele semestre.1 Kant fez uso desse

recurso de redigir pequenos ensaios acadêmicos, como forma de divulgação de suas

preleções, em sete ocasiões: nos semestres de verão de 1756, 1757 e 1758, nos

semestres de inverno de 1759/1760, 1762/1763 e 1765/1766, e, por último, no semestre

de verão de 1775.2 Mas, curiosamente, esses ensaios poucas informações fornecem

1 Cf. ARNOLDT, Daniel Heinrich. Ausführliche und mit Urkunden versehene Historie der

Königsbergischen Universität. Teil I. Königsberg: Hartung, 1746, p. 199. 2 Os ensaios publicados são os seguintes: Novas observações para a elucidação da teoria dos

ventos (M[agister] Immanuel Kants neue Anmerkungen zur Erläuterung der Theorie der Winde, wodurch er zugleich zu seinen Vorlesungen einladet), como anúncio das preleções do semestre de verão de 1756; Projeto e anúncio de um curso de Geografia Física (Entwurf und Ankündigung eines Collegii der physischen Geographie nebst dem Anhange einer kurzen Betrachtung über die Frage: Ob die Westwinde in unsern Gegenden darum feucht seien, weil sie über ein großes Meer streichen), como anúncio das preleções do semestre de verão de 1757; Novo conceito doutrinário do movimento e do repouso (M. Immanuel Kants Neuer Lehrbegriff der Bewegung und Ruhe, und der damit verknüpften Folgerungen in den ersten Gründen der Naturwissenschaft, wordurch zugleich seine Vorlesungen in diesem halben Jahre angekündigt werden), como anúncio das preleções do semestre de verão de 1758; Ensaio de algumas

considerações sobre o otimismo (Versuch einiger Betrachtungen über den Optimismus von M. Immanuel Kant, wodurch er zugleich seine Vorlesungen auf das bevorstehende halbe Jahr ankündigt) como anúncio das preleções do semestre de inverno de 1759/1760; A falsa sutileza das quatro figuras silogísticas (Die falsche Spitzfindigkeit der vier syllogistischen Figuren erwiesen von M. Immanuel Kant) como anúncio das preleções do semestre de inverno de 1762/1763; Anúncio do plano das preleções do semestre de

inverno de 1765/1766 (M. Immanuel Kants Nachricht von der Einrichtung seiner Vorlesungen in dem

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acerca do programa das preleções anunciadas. Com exceção do Anúncio do plano das

preleções do semestre de inverno de 1765/1766, os demais ensaios tão-somente

dissertam sobre algum tópico relativo a uma das preleções, e apenas brevemente

(apressadamente), em um único parágrafo, mencionam as preleções ofertadas naquele

semestre e os textos a serem utilizados. Na verdade, Kant parece ter dispensado pouca

atenção aos detalhes de alguns desses ensaios. Por isso, como indica uma carta enviada

à Blumenbach em 5 de agosto de 1790, ele não parece muito simpático ao interesse de

terceiros em reimprimir tais ensaios, pois considerava que alguns deles haviam sido

concebidos de forma muito apressada (flüchtig) e superficial.3

Kant lecionou geografia física pela primeira vez no semestre de verão de 1756, e

reofertou quarenta e oito vezes esse curso até o ano de 1796. Como se tratava de uma

novidade (já que foi ele quem introduziu esse assunto no currículo da Universidade de

Königsberg), o curso não seguia qualquer texto base oficial (contrariando uma exigência

daquela época nas universidades prussianas), em vez disso baseava-se apenas sobre as

próprias anotações do filósofo. A partir do semestre de inverno de 1772/1773, esse

curso começou a ser alternado com o curso de antropologia (novidade também

introduzida por Kant). Esses cursos constituíam aquilo que o filósofo chamava de

“exercício preliminar [Vorübung] no conhecimento do mundo”4 e visavam fornecer aos

estudantes orientações pragmáticas, para o uso dos conhecimentos e habilidades outrora

adquiridos, “úteis não apenas para a escola, mas também para a vida”.5 Em outras

palavras, os cursos de geografia física e antropologia foram concebidos como um

sumário cosmológico provisório que devia introduzir os estudantes, ao final de sua

Winterhalbenjahre, von 1765/1766); e Das diferentes raças humanas (Von den verschiedenen Racen der Menschen zur Ankündigung der Vorlesungen der physischen Geographie im Sommerhalbenjahre 1775, von Immanuel Kant der Logik und Metaphysik ordentlichen Professor) no semestre de verão de 1775. Com exceção do ensaio de 1775 (o qual talvez fosse dispensável, uma vez que nessa época Kant já era professor titular da cátedra de lógica e metafísica), todos os ensaios anteriores foram redigidos por ele na condição de docente privado.

3 KANT, “Briefwechsel”. In: KANT, Immanuel. Kants gesammelte Schriften. Hrsg.: Bd. 1-22 Preußische Akademie der Wissenschaften, Bd. 23. Deutschen Akademie der Wissenschaften zu Berlin, ab Bd. 24 Akademie der Wissenschaften zu Göttingen. Band 11. Berlin und New York: Walter de Gruyter, 1900ss, p. 185. (Para simplificar, as referências aos textos da edição da Academia serão abreviadas da seguinte forma: AK XI 185. Neste sentido, os algarismos romanos representam o volume, e os algarismos arábicos a página citada).

4 KANT, Von den verschiedenen Rassen der Menschen, 1775, A 12; AK II 443. (As referências precedidas pela letra “A” ou pela letra “B” dizem respeito à paginação original dos escritos de Kant, conforme a edição de Wilhelm Weischedel – KANT, Immanuel. Werke in sechs Bänden. Hrsg. von Wilhelm Weischedel. Darmstadt: WBG, 1983).

5 Idem.

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formação, no duplo campo do mundo (natureza e homem), “a fim de nele poder ordenar

todas as experiências futuras segundo regras”.6

Embora o ensaio de 1775 trate de um tópico aparentemente antropológico, Kant

entende que a discussão acerca das raças humanas diz respeito ao campo da geografia

física. Isto porque, para ele, tal discussão pertence à história da natureza do gênero

humano, que se propõe a ensinar sobre “a alteração que as criaturas da terra (plantas e

animais) sofreram por meio de migrações naturais, e sobre as derivações originadas do

protótipo do gênero fundamental dessas criaturas”.7 Por ser mais do que uma mera

descrição do estado presente das coisas da natureza, essa história deveria “[reduzir] uma

grande quantidade de espécies aparentemente diferentes a raças do mesmo gênero”,8 e,

desta forma, proporcionar um sistema físico para o entendimento. Assim, tendo em vista

que a geografia física se ocupa apenas das peculiaridades (Merkwürdigkeiten) da

natureza, o homem é tomado comparativamente por ela, em diversas regiões da Terra,

tão-somente segundo a diferença de sua forma (Bildung) natural e cor.9 A antropologia

pragmática, por outro lado, não se interessa pela mera diversidade do homem, pelo

homem considerado simplesmente como um ser animal que está no mundo, ou seja, por

aquilo que a natureza faz do homem. Em vez disso, ela se dispõe a conhecer o homem

como cidadão do mundo, ou melhor, a investigar “o que ele faz de si mesmo, ou pode e

deve fazer como ser que age livremente”.10 Quanto ao lugar da discussão acerca das

raças humanas, Kant é muito elucidativo ao dizer que “o conhecimento das raças

humanas, como produtos pertencentes ao jogo da natureza, ainda não faz parte do

conhecimento pragmático do mundo, mas apenas do conhecimento teórico dele”.11

O ensaio de 1775 foi revisado e publicado novamente em 1777, com vários

acréscimos e a supressão de alguns trechos referentes ao anúncio da preleção de

geografia física, em um volume intitulado Der Philosoph für die Welt (O filósofo para o

mundo), editado por Johann Jacob Engel (1741-1802), mas sem grandes alterações de

conteúdo. Apoiado na teoria de Georges Louis Leclerc, conde de Buffon (1707-1788),

que sustenta que a unidade do gênero físico (natural) dos animais se baseia na sua

6 Idem. 7 Ibidem, B 140-141; AK II 434. 8 Ibidem, B 141; AK II 434. 9 KANT, Entwurf und Ankündigung eines Collegii der physischen Geographie, 1757, AK II 9. 10 KANT, Anthropologie in pragmatischer Hinsicht, 1798, BA IV; AK VII 119. 11 Ibidem, BA VI-VII; AK VII 120.

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capacidade de procriação conjunta de crias férteis,12 o ensaio defende que há apenas um

único gênero humano, que não abarca espécies diferentes, e que descende de um único

tronco (ou gênero fundamental). Em vista disso, Kant pode ser classificado como um

monogenista, que discorda das posições de Voltaire (1694-1778), Henry Home (Lord

Kames) (1696-1782) e outros poligenistas, “os quais sustentam que as raças humanas

originam-se de diferentes fontes genéticas e, portanto, não são membros da mesma

espécie”.13

Kant acredita poder explicar as raças humanas como derivações que ocorrem em

conformidade ou em desconformidade com o tronco (gênero) original.14 A distinção

hereditária entre as raças humanas seria, segundo ele, provocada por certos agentes

climáticos, como o ar e o sol.15 Mas, o filósofo não atribui diretamente a esses agentes

as diferenças hereditárias entre as raças, pois acredita que “dificilmente o acaso ou

causas físico-mecânicas podem produzir um corpo orgânico, tampouco acrescentarão

algo à força procriadora deste último, isto é, causarão algo que se auto-reproduz em uma

forma particular ou na relação das partes”.16 Kant está convencido que tais distinções se

devem tão-somente ao desenvolvimento ocasionalmente diferente (motivado pelos

mencionados agentes externos) dos germes e predisposições naturais presentes no

homem. Segundo ele, há no homem (bem como em todos os animais e plantas) certas

capacidades predeterminadas, como que inatas, dispostas como um cuidado preventivo

da natureza, a fim de preservá-lo e adequá-lo à diversidade do clima e do solo.17 Neste

12 Cf. KANT, Von den verschiedenen Rassen der Menschen, 1775, A 2 / B 126; AK II 429. 13 LOUDEN, Robert B. General Introduction. In: KANT, Immanuel. Anthropology, history, and

education. Edited by Günter Zöller and Robert B. Louden. Translated by Mary Gregor, Paul Guyer, Robert B. Louden, Holly Wilson, Allen W. Wood, Günter Zöller, and Arnulf Zweig. 1st ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2009, p. 7.

14 Essas derivações também podem ser entendidas como variações hereditárias que mantêm algo constante em longas procriações.

15 Kant também menciona a qualidade do solo (umidade ou aridez) e a alimentação como agentes causadores de distinções hereditárias. Todavia, para ele, tais agentes não são capazes de instituir algo constante, uma vez que a simples mudança de solo e alimentação extinguiria aquelas distinções hereditárias em poucas gerações.

16 KANT, Von den verschiedenen Rassen der Menschen, 1775, A 7 / B 142; AK II 435. 17 Assim, por exemplo, “nos pássaros de uma mesma espécie, que tem de viver em diferentes

climas, existem germes para o desenvolvimento de uma nova camada de penas, quando vivem no clima frio, mas que são coibidos quando eles devem permanecer no clima moderado” (KANT, Von den

verschiedenen Rassen der Menschen, 1775, A 6 / B 139; AK II 434). Da mesma forma, “tendo em vista que, em uma terra fria, o grão de trigo precisa estar mais protegido contra o frio úmido do que em uma terra seca ou quente, reside nele uma predeterminada capacidade ou predisposição natural de criar pouco a pouco uma pele mais espessa” (idem).

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sentido, as quatro raças humanas (branca, calmuca, negra e hindu)18 seriam

respectivamente o resultado da ação de quatro causas naturais distintas sobre o tronco

humano original, quais sejam: o frio úmido, o frio seco, o calor úmido e o calor seco.

Para sustentar essa tese, Kant apresenta uma série de descrições (apoiadas em relatos de

terceiros) das peculiaridades dos povos que se enquadrariam em cada uma das

mencionadas raças, e das condições climáticas das regiões em que vivem ou viveram.

A despeito do caráter politicamente sensível e polêmico da discussão racial, bem

como de algumas afirmações pejorativas acerca de diferentes grupos étnicos, o ensaio

kantiano Das diferentes raças humanas (1775) merece atenção, pois, além de contribuir

para a história e a filosofia da ciência,19 ilustra o emprego de princípios teleológicos

(germes e predisposições) para explicar capacidades “inatas”, tanto de plantas quanto de

animais, em vista da adaptação ao meio-ambiente. Ainda que, nesse ensaio, o emprego

de princípios teleológicos tenha um foco explicitamente biológico (físico), ele pode ser

tomado como parâmetro para o uso filosófico (metafísico), cujo delineamento mais

pormenorizado pode ser encontrado no ensaio Sobre o uso de princípios teleológicos na

filosofia (1788).20 Soma-se aos mencionados ensaios,21 o ensaio Determinação do

conceito de uma raça humana (1785), no qual Kant acrescenta novos detalhes à

discussão acerca das raças humanas,22 e exemplifica mais uma vez a investigação

teleológica da natureza física do gênero humano.

A presente tradução se baseia na edição de Wilhelm Weischedel das Obras de

Kant.23 A escolha se deve ao fato de ser uma das poucas edições que contempla as

18 Kant acredita “ser necessário admitir apenas quatro raças do gênero humano, a fim de poder

derivar delas todas diferenças perpetuantes e identificáveis à primeira vista” (KANT, Von den

verschiedenen Rassen der Menschen, 1775, A 4 / B 133; AK II 432). 19 Segundo Zöller e Wilson, devido aos motivos mencionados, “a teoria de Kant da história

natural das espécies humanas não tem encontrado a contínua atenção acadêmica que ela merece, em termos de seu conteúdo filosófico e sua contribuição para a história e a filosofia da ciência” (ZÖLLER, Günter; WILSON, Holly. Introduction to “Of de different races of human beings”. In: KANT, I. Anthropology, history, and education, 2009, p. 497 – nota 4). De acordo com eles, são exceções a obra Les races humaines selon Kant de Raphaël Lagier (Paris: Presses Universitaires de France, 2004) e o artigo “Kants Konstruktion des Begriffs der Rasse und seine Hierarchisierung der Rassen” de Annette Barkhaus (in Biologisches Zentralblatt 113, 1994, p. 197-203).

20 Para mais informações sobre o uso de princípios teleológicos em filosofia, confira a “Crítica da faculdade de juízo teleológica”, segunda parte da Crítica da faculdade do juízo (1790).

21 Zöller e Wilson entendem que os ensaios de 1775, 1785 e 1788 constituem uma trilogia acerca da história natural do gênero humano. Cf. ZÖLLER; WILSON, Introduction to “Of de different races of human beings”, 2009, p. 83.

22 Mais elementos, que contribuem com discussão kantiana acerca das raças humanas e a história natural do gênero humano, podem ser encontrados na primeira seção da segunda parte da Geografia física

(1802). 23 KANT, I. Werke in sechs Bände. Hrsg. von Wilhelm Weischedel. Darmstadt: WBG, 1983.

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versões de 1775 e 1777 do ensaio. Também foram consultadas a edição da Academia de

Ciências de Berlim das Obras reunidas de Kant,24 as traduções para o inglês de J. M .

Mikkelsen,25 de Holly Wilson e Günter Zöller,26 bem como a tradução francesa de

Stéphane Piobetta.27 Note-se que a letra “A”, que aparece ao lado do texto, corresponde

à paginação da primeira edição e a letra “B” à da segunda. As siglas “NT”, “NE”, e

“K”, que aparecem no final das notas, significam, respectivamente, nota do tradutor,

nota da edição de Wilhelm Weischedel, e nota original do texto de Kant. O pontilhado,

que sublinha alguns trechos, significa que aquele segmento foi todo acrescentado na

segunda edição (B) do texto.

24 KANT, I. Kants gesammelte Schriften. Hrsg. von der Preußische Akademie der Wissenschaften, Deutschen Akademie der Wissenschaften zu Berlin, und Akademie der Wissenschaften zu Göttingen. Band 11. Berlin und New York: Walter de Gruyter, 1900ss.

25 KANT, I. “Of the different human races”. In: BERNASCONI, Robert; LOTT, Tommz Lee (eds.). The Idea of Race. Indianapolis: Hackett Publishing, 2000.

26 KANT, Immanuel. “Of the different races of human beings”. In: KANT, Immanuel. Anthropology, history, and education. Edited by Günter Zöller and Robert B. Louden. Translated by Mary Gregor, Paul Guyer, Robert B. Louden, Holly Wilson, Allen W. Wood, Günter Zöller, and Arnulf Zweig. 1st ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2009.

27 KANT, Immanuel. “Des différentes races humaines”. In: KANT, Immanuel. Opuscules sur

L’Histoire. Traduction de Stéphane Piobetta. Introduction, notes, bibliographie et chronologie par Philippe Raynaud. Paris: Flammarion, 1990.

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| DAS DIFERENTES RAÇAS HUMANAS

| 1) DA DIFERENÇA DAS RAÇAS EM GERAL28

No reino animal, a divisão natural em gêneros [Gattungen] e espécies [Arten]

funda-se na lei comunitária da reprodução [Fortpflanzung], e a unidade dos gêneros não

é outra coisa que a unidade da força procriante [zeugenden Kraft], que vale

universalmente para uma certa diversidade de animais. Por isto, a regra | buffoniana,29 a

qual afirma que animais que procriam [erzeugen] conjuntamente crias [Junge] férteis

pertencem a um único e mesmo gênero físico (não importa a diferença de feição

[Gestalt] que os mesmos possam ter), na verdade, tem de ser vista apenas como a

definição de um gênero natural de animais em geral, em contraste a todos os gêneros

escolares dos mesmos. A divisão escolar se baseia em classes e divide por semelhança.

A divisão natural, por outro lado, leva em conta troncos [Stämme] e divide os animais

segundo parentescos, com vistas à procriação [Erzeugung]. Aquela proporciona um

sistema escolar para a memória, essa última um sistema natural para o entendimento: a

primeira tem por objetivo unicamente intitular as criaturas, a segunda colocá-las sob

leis.

| De acordo com esses conceitos, todos os homens sobre a vasta Terra [Erde]

pertencem a um único e mesmo gênero natural, pois, ainda que | diferenças também

possam ser encontradas na sua feição, procriam [zeugen] sem exceção filhos fecundos.

Dessa unidade do gênero natural, que nada mais é do que a unidade da força procriadora

[Zeugungskraft] válida para eles no seu conjunto, pode-se citar apenas uma única causa

natural: a saber, que todos eles pertencem a um único tronco [Stamm], do qual,

desconsideradas as suas diferenças, eles descenderam ou ao menos poderiam ter

28 Segue adjacente em A: “A preleção que eu anuncio será antes um proveitoso entretenimento

do que uma penosa ocupação. Por isto, a investigação que acompanha este anúncio conterá algo para o entendimento, entretanto, mais como um jogo para o mesmo do que uma profunda pesquisa”. (NE)

29 Georges Louis Leclerc, conde de Buffon (1707-1788), foi um naturalista, matemático, biólogo, cosmólogo e escritor francês. As idéias de Buffon influenciaram Jean-Baptiste Lamarck e Charles Darwin. A obra mais célebre de Buffon é a História natural, geral e particular (Histoire naturelle,

générale et particulière [1749-1788], composta por 36 volumes, com 8 volumes adicionais publicados após a sua morte por Bernard de Lacépède). Essa obra englobava o conhecimento do mundo natural até o momento. Nela, Buffon estudou as semelhanças entre os seres humanos e os macacos, considerando a possibilidade de um ancestral comum. Buffon propôs a identificação das espécies através da sua capacidade de gerar descendência fértil. Assim, os animais pertenceriam à mesma espécie se fossem capazes de produzir descendentes férteis. Cf. SONNINI, C. S. (Ed.). Histoire naturelle: histoire de l’âne. vol. XXII. Paris, 1808, pp. 279ss. (NT)

A 2

B 125

B 126

A 3

B 127

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descendido. No primeiro caso, os homens não apenas pertencem a um único e mesmo

gênero, mas também a uma família; no segundo, eles se parecem uns com os outros,

mas não são aparentados, e ter-se-ia de admitir muitas criaturas locais; uma opinião que

multiplica o número de causas sem necessidade. Um gênero animal que tem

simultaneamente um tronco comum não tem espécies diferentes (pois estas representam

justamente as diferenças da descendência [Abstammung]); mas sim, | variações entre si

que se chamam derivações [Abartungen], caso sejam hereditárias. Os sinais hereditários

da descendência, se estão de acordo com a sua origem, chamam-se transmissões

[Nachartungen]; mas, caso a derivação não pudesse mais produzir a formação original

do tronco [ursprüngliche Stammbildung], ela se chamaria degeneração [Ausartung].

Dentre as derivações, isto é, as diferenças hereditárias dos animais que

pertencem a um mesmo tronco, aquelas que não só se mantém em si constantes em

todos os transplantes [Verpflanzungen] (transferências para outras regiões) em longas

procriações [Zeugungen], como também sempre geram crias híbridas [halbschlächtige]

no cruzamento com outras derivações do mesmo tronco, chamam-se raças. As

[derivações] que mantém constante o distintivo das suas derivações em todos os

transplantes e, portanto, transmitem [algo],30 mas que no cruzamento com outros não

necessariamente geram híbridos, chamam-se variantes [Spielarten]; no entanto, as

[derivações] que | freqüentemente não transmitem [algo] constante, variedades

[Varietäten]. Inversamente, a derivação que procria híbridos com outras derivações,

mas que aos poucos se extingue mediante o transplante, chama-se uma linhagem

[Schlag] particular.

Deste modo, negros e brancos não são, de fato, espécies diferentes de homens

(pois provavelmente31 pertencem a um tronco); mas, certamente, são duas raças

diferentes; porque cada uma delas se perpetuou em todas as regiões e, ambas

necessariamente procriam juntas filhos híbridos ou bastardos [Blendlinge] (mulatos).

Por outro lado, louros e morenos não são raças diferentes de brancos; porque um

homem louro também pode ter filhos totalmente louros de uma mulher morena, embora

cada uma dessas derivações se conservem em todos os | transplantes ao longo de várias

gerações. Por isto, eles são variantes de brancos. Por fim, a | qualidade [Beschaffenheit]

do solo (umidade ou aridez) e a alimentação provocam igualmente aos poucos, nos

30 Acréscimo de B. (NE) 31 Acréscimo de B. (NE)

B 128

B 129

A 4

B 130

Page 9: Kant, Immanuel - Das diferentes raças humanas (Traduzido por Alexandre Hahn)

animais de um mesmo tronco e raça, uma distinção hereditária ou linhagem,

principalmente em vista do tamanho, da proporção dos membros (grosso ou delgado), e

do caráter natural [Naturell],32 que, apesar de ser hibridamente assimilada [anartet] no

cruzamento com [indivíduos] estranhos [fremden], desaparece em poucas gerações

sobre um outro solo e com outra alimentação (mesmo sem alteração do clima). É

interessante notar a linhagem diversa dos homens conforme a diferença dessas causas,

onde ela [a linhagem] é reconhecível na mesma terra [Land] meramente de acordo com

as províncias (como os Beócios, que habitavam um solo úmido, se distinguiam dos

Atenienses, que habitavam um solo árido), cuja diferença muitas vezes apenas é

identificável por um olho atento, mas ridicularizada por outros. O que pertence apenas

às | variedades e é, portanto, em si mesmo hereditário (embora não constante), pode

com o tempo, mediante matrimônios que permanecem continuamente na mesma

família, produzir aquilo que eu denomino de linhagem familiar, onde algo característico

finalmente se enraíza tão profundamente na força procriadora que se aproxima de uma

variante e se perpetua como tal. Acredita-se ter constatado esse algo característico na

antiga nobreza de Veneza, em particular nas damas. Ao menos na recém descoberta ilha

do Taiti33 as mulheres nobres são em geral maiores na estatura do que as mulheres

comuns. – Baseia-se sobre a possibilidade de instituir uma duradoura linhagem familiar,

mediante uma cuidadosa seleção de nascimentos degenerados daqueles nascimentos

habituais [einschlagenden], a idéia do senhor Maupertuis34 de criar [ziehen] em alguma

32 De acordo com o dicionário dos irmãos Grimm, Naturell significa “a particularidade espiritual

inata, a inclinação natural e a espécie do ânimo do homem” (DEUTSCHES WÖRTERBUCH von Jacob Grimm und Wilhelm Grimm. vol. 13. Leipzig: S. Hirzel, 1854-1960 [Quellenverzeichnis 1971], coluna 445). Segundo o Léxico Meyer, Naturell é o “conteúdo da completa particularidade corporal do indivíduo, na medida em que a sua particularidade espiritual é permanentemente influenciada mediante [esse conteúdo]” (MEYERS Großes Konversations-Lexikon, Leipzig, vol. 14, 1908, p. 455). Segundo Kirchner e Michaëlis, “Naturell chama-se a propriedade inata ao homem, que abrange constituição, temperamento, o modo de pensar e sentir. Também se pode falar de um caráter natural do povo, do sexo, e da idade” (KIRCHNER, Friedrich; MICHAËLIS, Carl. Wörterbuch der Philosophischen Grundbegriffe. Leipzig, 1907, p. 386). (NT)

33 Apesar de o Taiti ter sido descoberto em 1606, pelo navegador português Pedro Fernandes de Quirós (1563-1615), a serviço da coroa espanhola, Samuel Wallis (1728-1795), capitão inglês, foi considerado o descobridor da ilha em 1767. Foi, no entanto, o explorador francês Louis Antoine de Bougainville (1729-1811) que tornou o Taiti famoso na Europa, por meio da publicação Vouyage autour

du Monde (1771). Nesse livro, a ilha é descrita como um paraíso, no qual homens e mulheres viviam felizes em inocência, afastados da corrupção da civilização. Seu relato sobre a vida nessa ilha ilustra o conceito de “bom selvagem” e supostamente teria influenciado pensamentos utópicos de pensadores como Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). (NT)

34 O filósofo, matemático e astrônomo francês Pierre Louis Moreau de Maupertuis (1698-1759), na obra Vénus physique (1745), sustentava que todos os organismos descendiam de uma fonte original comum. Segundo ele, as pequenas alterações, que os mesmos apresentavam com relação aos progenitores ao longo das gerações, se deviam a acasos e erros na reprodução. Tais erros ocorreriam devido a um erro na “memória” que organizaria, no embrião, a união das partes ou “sementes” masculina e feminina.

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província uma linhagem de homens nobres por natureza, | em que inteligência

[Verstand], competência e integridade fossem hereditárias. Um empreendimento

[Anschlag] que, em minha opinião, é em si mesmo factível, mas provavelmente evitado

pela sábia natureza, uma vez que justamente na mistura do mal com o bem residem os

grandes motivos [Triebfedern] que põem em atividade as forças [Kräfte] latentes da

humanidade, e as forçam [nötigen] a desenvolver todos os seus talentos e a se aproximar

da perfeição da sua determinação [Bestimmung]. Quando a natureza pode atuar sem

interrupção (sem transplante ou mistura estranha) ao longo de várias gerações, então ao

final ela sempre produz uma linhagem duradoura que torna continuamente identificável

os povos, e seria denominada uma raça, se o característico não parecesse demasiado

insignificante e não fosse demasiado difícil de descrever, a fim de fundar sobre ele uma

divisão [Abteilung] particular.35

| 2) DIVISÃO DO GÊNERO HUMANO NAS SUAS DIFERENTES RAÇAS

Eu acredito ser necessário admitir apenas quatro raças do mesmo, a fim de poder

derivar delas todas diferenças perpetuantes e identificáveis à primeira vista.36 Elas são

1) a raça dos brancos, 2) a raça negra, 3) a raça huna (mongolóide ou calmuca), e 4) a

raça hindu ou indiana. Eu acrescento ainda à primeira raça, que têm seu domicílio mais

distinto na Europa, os Mouros (Mauritanos da África), os Árabes (conforme Niebuhr37),

o tronco dos povos [Völkerstamm] turco-tártaro e os Persas, da mesma forma | todos os

restantes povos da Ásia que através das restantes divisões não estão particularmente

excluídos dessa raça. A raça negra do hemisfério norte é nativa (autóctone) apenas na

África, [e] a do hemisfério sul (fora da África) provavelmente | só é nativa em Nova

Guiné, no entanto, em algumas ilhas vizinhas, ela se resume a meros transplantes. A

Sendo assim, a partir de uma mesma espécie, resultariam numerosas outras aparentadas entre si, por causa dos diferentes graus de “erro”. Cf. MAUPERTIUS, Système de la nature, tese 56. In: MAUPERTIUS, P. L. M. de. Oeuvres. vol. II. Lyon, 1756, p. 159. (NT)

35 Acréscimo de B. (NE) 36 Acréscimo de B. Em A consta: “Eu acredito ser suficiente quatro raças do mesmo, a fim de

poder derivar delas todas diferenças perpetuantes e hereditárias”. (NE) 37 Carsten Niebuhr (1733-1815), matemático alemão, integrou uma expedição científica

dinamarquesa ao Oriente entre 1761 e 1767. Das impressões de Niebuhr acerca da expedição resultaram duas obras: a primeira, Reisebeschreibung nach Arabien und den umliegenden Ländern (Descrição da

viagem à Arábia e às terras vizinhas), foi publicada num único volume em 1772; e a segunda, Beschreibung von Arabien (Descrição da Arábia), a respeito da expedição à Arábia, em três volumes publicados sucessivamente em 1774, 1778 e 1837. (NT)

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raça calmuca parece ser mais pura entre os Cochotes,38 pouco39 pura entre os

Torgotes,40 mais misturada com sangue tártaro entre os Zíngaros,41 e é exatamente a

mesma raça que nos tempos mais remotos levava o nome dos Hunos, mais tarde o nome

dos Mongóis (em sentido amplo) e agora leva o nome dos Oirates.42 A raça indiana é,

na terra desse nome, muito pura e antiqüíssima, mas distinta do povo que vive do outro

lado da península da Índia. Dessas quatro raças eu acredito poder derivar todos os

caracteres hereditários restantes, ou como raças mistas ou como raças nascentes

[angehende]; das quais o primeiro tipo é aquele que descendeu da mistura de diferentes

raças, e o segundo aquele que ainda não está suficientemente familiarizado ao clima,

para assumir totalmente o caráter da raça desse clima. Assim, a mistura | do sangue

tártaro com o sangue huno produziu semi-raças nos Caracalpaques,43 nos Nagas44 e em

outros. O sangue indiano, misturado com o dos antigos Citas45 (no e em torno do

Tibete) e em certa medida com o sangue huno, talvez tenha gerado como raça mista os

habitantes que vivem do outro lado da península da Índia, os Tonquinêses46 e os

Chineses. Os habitantes da costa glacial norte da Ásia são um exemplo de uma raça

huna nascente, na qual o cabelo negro uniforme, o queixo sem barba, o rosto plano e

longitudinal e os olhos pouco abertos mostram o efeito da zona glacial sobre um povo,

que em tempos recentes foi conduzido de uma região de clima ameno para esse

domicílio. O mesmo também aconteceu com os Lapões do Mar,47 um descendente do

povo Húngaro, que após não muitos séculos já estão bem implantados [eingeartet] na

particularidade | da região de clima frio, ainda que eles fossem procedentes de um povo

bem desenvolvido [wohlgewachsenen] na zona temperada. Por fim, os Americanos

38 Os Cochotes (Koschottischen) são um dos quatro subgrupos dos Oiratos da Mongólia

Ocidental. (NT) 39 Em A: “menos”. (NE) 40 Os Torgotes (Torgöts) constituíram uma das tribos Mongol Eleuta que viveu originalmente no

leste da Mongólia até serem expulsos por outras tribos por volta de 1616. (NT) 41 Os Zíngaros (Dsingorischen) formam um povo nômade, normalmente chamado de Cigano,

cuja origem provavelmente se encontra na Índia. (NT) 42 Oirates (Ölöts) é a nomenclatura comum a várias tribos nômades da Mongólia, cuja origem

ancestral está na Zungaria e em Amdo, regiões do oeste da China e também oeste da Mongólia. (NT) 43 Os Caracalpaques (Karakalpaken) formam um grupo étnico turco que vive na região sul do

Mar de Aral. (NT) 44 Naga (Nagajen) é um termo coletivo para grupos étnicos do nordeste do subcontinente

indiano. (NT) 45 Os Citas (Skythen) foram um povo nômade de pastores que viveu nas estepes do norte do Mar

Cáspio, cuja língua, o antigo osseto ou alânico, pertencia ao grupo das línguas iranianas (como o persa e o curdo). (NT)

46 Os Tonquinêses (Tonkinesen) são aqueles que habitam ou são naturais de Tonquim, uma região do Vietnã. (NT)

47 Os Lapões (Lappen) ou Sami formam um grupo étnico que vive em uma região que abrange o norte da Suécia, Noruega, Finlândia e da península de Kola. (NT).

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parecem ser uma raça huna ainda não completamente implantada, pois no noroeste mais

extremo da América (onde toda suposição acerca do povoamento dessa parte do mundo

a partir do nordeste da Ásia se baseia no fato de as espécies de animais concordarem em

ambos os lugares), na costa norte da Baía de Hudson, os habitantes são muito parecidos

com os Calmucos. Mais ao sul, o rosto torna-se, de fato, mais aberto e altivo, mas | o

queixo sem barba, o cabelo uniformemente negro, a cor marrom avermelhada do rosto,

da mesma forma a frieza e a insensibilidade do caráter natural [Naturell], são claros

vestígios do efeito de uma longa estadia em regiões frias [e], como nós veremos em

breve, vão desde a região mais ao norte dessa parte do mundo | até a Ilha dos Estados.48

A longa estadia dos ancestrais dos Americanos no nordeste da Ásia e na vizinha região

noroeste da América trouxe à perfeição a forma [Bildung] calmuca; mas a rápida

disseminação dos seus descendentes para o sul deste continente [aperfeiçoou] a forma

americana.49 A partir da América nada mais foi povoado. Pois, nas ilhas do Oceano

Pacífico todos os habitantes, excetuando-se alguns negros, são barbados; mais

propriamente, eles fornecem alguns sinais da origem dos Malaios, bem como da origem

dos habitantes nas ilhas Sudanesas; e a forma de governo feudal [Lehnsregierung] que

encontramos na ilha do Taiti, que também é a constituição [Staatsverfassung] corrente

dos Malaios, comprova essa suposição.

A razão, para tomar negros e brancos por raças básicas, está por si mesmo clara.

No que diz respeito às raças indiana e | calmuca, o amarelo-oliva que subjaz em maior

ou menor grau aos pardos de terras quentes tampouco pode nos primeiros ser derivado

de algum outro caráter nacional conhecido, quanto o rosto original dos segundos, e

ambos deixam uma marca inextirpável [unausbleiblich] em copulações mistas.

Exatamente isto vale para a raça americana, que é impactada pela forma calmuca e com

ela ligada mediante uma mesma causa. O indiano oriental, mediante a mistura com o

branco, gera os mestiços [Mestizen] amarelos, da mesma forma, o americano com [o

branco, gera] os vermelhos, e o branco com o negro [gera] os mulatos, e o americano

com [o negro] os caboclos ou caraíbas pretos: os quais são sempre reconhecidamente

48 A Ilha dos Estados (Staaten-Eilande) é uma ilha argentina, situada próxima ao Estreito de Le

Maire, na extremidade leste do arquipélago da Tierra del Fuego. (NT) 49 Acréscimo de B. (NE)

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qualificados de bastardos [Blendlinge] e provam sua origem a partir de autênticas

raças.50

| 3. DAS CAUSAS IMEDIATAS DA ORIGEM DESSAS DIFERENTES RAÇAS

Os fundamentos de um determinado desenvolvimento [Auswickelung], que

residem na natureza de um corpo orgânico (da planta ou do animal), chamam-se germes

[Keime], se esse desenvolvimento concerne a partes particulares; mas, se ele concerne

apenas ao tamanho ou a relação das partes entre si, eu os denomino predisposições

naturais [natürliche Anlagen]. Nos pássaros de uma mesma espécie [Art], que tem de

viver em diferentes climas, existem germes para o desenvolvimento de uma nova

camada de penas, quando vivem no clima frio, mas que são coibidos quando eles devem

permanecer no clima moderado. Tendo em vista que, em uma terra fria, o grão de trigo

precisa estar mais protegido contra o frio úmido do que em uma terra seca ou quente,

reside nele uma predeterminada capacidade [Fähigkeit] ou predisposição natural

[Naturanlage] de criar pouco a pouco uma pele mais espessa. Esse cuidado [Fürsorge]

da natureza em preparar sua criatura, através | de medidas preventivas escondidas

internamente, para todos os tipos de circunstâncias futuras, a fim de que ela se conserve

e seja adequada à diversidade do clima ou do solo, é admirável e produz, na migração e

no transplante dos | animais e plantas, aparentemente novas espécies, que nada mais são

do que derivações e raças do mesmo gênero, cujos germes e predisposições naturais se

desenvolveram apenas ocasionalmente de diferentes maneiras ao longo do curso do

tempo.51

50 Acréscimo de B. Em A: “[...] copulações mistas. O modo [Art] como as restantes raças

imperfeitas podem ser derivadas dessas também contribui para tomar as mencionadas raças como raças fundamentais [Grundrassen]”. (NE)

51 Nós habitualmente tomamos as denominações Descrição da Natureza e História da Natureza no mesmo sentido. Mas, está claro que o conhecimento das coisas da natureza, como elas agora são, sempre deixa a desejar o conhecimento daquilo que elas foram anteriormente, e por qual série de alterações passaram para chegar ao seu estado presente em todos os lugares. A História da Natureza, da qual nos falta quase tudo ainda, ensinar-nos-ia sobre a alteração da forma da terra, bem como sobre a alteração que as criaturas da terra (plantas | e animais) sofreram por meio de migrações naturais, e sobre as derivações originadas do protótipo do gênero fundamental [Stammgattung] dessas criaturas. Ela provavelmente reduziria uma grande quantidade de espécies aparentemente diferentes a raças do mesmo gênero, e transformaria o agora tão detalhado sistema escolar de Descrição da Natureza em um sistema físico para o entendimento. (K)

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| O acaso ou leis mecânicas gerais não podem produzir tais combinações. Por

isso, nós temos de considerar esses desenvolvimentos ocasionais como pré-formados

[vorgebildet]. Mas, mesmo lá onde nada se mostra conforme a fins [zweckmäßiges], a

mera faculdade de reproduzir o seu particular caráter adquirido já é prova suficiente:

que foi encontrado um germe especial ou predisposição natural na criatura orgânica.

Pois, coisas externas certamente podem ser causas ocasionais, mas não causas

produtoras daquilo que necessariamente é herdado [anerbt] e transmitido [nachartet].

Dificilmente o | acaso ou causas físico-mecânicas podem produzir um corpo orgânico,

tampouco acrescentarão algo à força procriadora deste último, isto é, causarão algo que

se auto-reproduz em uma forma particular ou na relação das partes.52 Ar, sol e

alimentação podem modificar o crescimento do corpo de um animal, entretanto, essa

alteração não está simultaneamente dotada de uma força procriante [zeugenden Kraft],

que seria capaz de se auto-reproduzir também sem essa causa; antes sim, o que deve se

reproduzir [fortpflanzen] já tem de estar previamente situado na força procriadora

[Zeugungskraft], bem como previamente determinado a um desenvolvimento

[Auswickelung] ocasional, segundo as circunstâncias que a criatura pode enfrentar e nas

quais deve se | conservar firmemente. Pois, nada de estranho aos animais53 que fosse

capaz de aos poucos afastar a criatura da sua determinação original e essencial pode

adentrar na força procriadora, e produzir verdadeiras degenerações que se

perpetuariam.54

| O homem foi determinado [bestimmt] para todos os climas e para todas as

qualidades de solo; conseqüentemente, diversos tipos de germes e predisposições

naturais tinham de estar nele preparados [bereit], para serem oportunamente

desenvolvidos ou contidos, a fim de que ele se adéqüe ao seu lugar no mundo, e

pareçam no curso das procriações como que inatas e feitas para isso. Nós queremos,

segundo esses conceitos, examinar [durchgehen] todo o gênero humano sobre a vasta

Terra e aduzir causas conforme ao fim [zweckmäßige] de suas derivações, onde as

causas naturais não podem ser perfeitamente discernidas, por outro lado, [também

aduzir causas] naturais onde nós não podemos assegurar os fins [Zwecke]. Destaco aqui

apenas que | ar e sol parecem ser aquelas causas que influem mais profundamente na

52 Doenças algumas vezes são hereditárias. Mas, não necessitam de organização, apenas de um

fermento de fluídos danosos, que se reproduzem mediante infecção [Ansteckung]. Elas também não são necessariamente assimiladas [anarten]. (K)

53 Acréscimo de B. (NT) 54 Em A: “perpetuam”. (NE)

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força procriadora e produzem um desenvolvimento duradouro dos germes e das

predisposições, isto é, que podem estabelecer uma raça; em comparação, uma

alimentação especial pode, na verdade, produzir uma linhagem de homens, mas o

diferencial dessa linhagem se extingue rapidamente em transplantes. O que deve aderir

na força procriadora não necessita afetar a manutenção da vida, mas sim a sua fonte,

isto é, os primeiros princípios [Prinzipien] da sua constituição [Einrichtung] animal e

movimento.

O homem, deslocado na zona glacial, teve de degenerar [ausarten] aos poucos

para uma estatura menor; porque nessa [estatura], se a força do coração permanece a

mesma, a circulação sanguínea ocorre em menor tempo, a pulsação também se torna

mais rápida e a temperatura do sangue maior. Com efeito, Cranz55 não apenas deparou-

se com os Groenlandeses | muito abaixo da estatura dos europeus, como também com

uma notável superioridade do calor natural de seus corpos. Mesmo o mal-entendido

entre a estatura total do tronco e as pernas curtas dos povos que vivem mais ao norte é

conveniente ao clima, já que essas partes do corpo, devido à sua distância do coração,

correm mais risco no frio. Todavia, a maioria dos atualmente conhecidos habitantes da

zona glacial parece ser apenas forasteiro tardio nesse lugar; como os Lapões, que junto

com os Finlandeses descenderam [entsprungen sind] de um mesmo tronco [Stamm],

qual seja, do tronco húngaro, apenas ocuparam o domicílio atual após a emigração dos

últimos (do leste da Ásia), e certamente já estão implantados [eingeartet] em um grau

considerável nesse clima.

Mas, se um povo nórdico é forçado a suportar durante longo tempo a influência

do | frio da zona glacial, então modificações ainda maiores têm de ocorrer com ele.

Todo desenvolvimento, por meio do qual o corpo apenas desperdiça seus fluídos

[Säfte], tem de ser aos poucos inibido nessa ressequida região. Por isso, os germes do

crescimento capilar são reprimidos com o tempo, de modo que sobram apenas aqueles

germes que são indispensáveis para a necessária cobertura da cabeça. Por causa | de

uma predisposição natural, as partes salientes do rosto, o qual menos é capaz de uma

cobertura, tornam-se gradativamente mais planas devido a um cuidado da natureza, a

fim de melhor se preservarem, já que essas partes continuamente sofrem com o frio. A

55 David Cranz (1723-1777), teólogo e missionário alemão, ganhou fama como historiador após

publicar em 1765 os relatos de sua viagem missionária à Groenlândia na obra História da Groenlândia (Historie von Grönland). Cf. CRANZ, David. Historie von Grönland. Leipzig, 1765, pp. 177ss. (NT)

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protuberante elevação abaixo dos olhos e os olhos semi-abertos e pestanejantes parecem

estar arranjados para a proteção dos mesmos, em parte contra o frio dessecante do ar e

em parte contra o reflexo da luz na neve (contra o qual os Esquimós também precisam

usar óculos | de neve), como se também pudessem ser tomados imediatamente como

efeitos naturais do clima, já que em regiões de clima ameno são perceptíveis apenas em

diminuta medida. Assim, aos poucos surge o queixo sem barba, o nariz achatado, lábios

finos, olhos pestanejantes, o rosto plano, a cor [da pele] marrom-avermelhada com

cabelos pretos, com uma palavra, a forma calmuca do rosto, a qual se enraizou em uma

longa seqüência de procriações no mesmo clima até [estabelecer] uma raça duradoura,

que se conserva se um tal povo logo posteriormente adquirir um novo domicílio em

uma região [de clima] ameno.

Sem dúvida, questionar-se-á: com que direito eu posso derivar das profundezas

do norte e do nordeste a forma [Bildung] calmuca, que agora é encontrada em sua

grande totalidade em uma região [de clima] | ameno? Minha justificativa [Ursache] é

esta. Heródoto56 já no seu tempo relatou que os Argipeus, habitantes de uma terra

localizada ao pé de altas montanhas, em uma região que pode ser tomada pela região

das montanhas Urais, eram calvos e tinham narizes achatados e cobriam suas árvores

com brancas cobertas (presumivelmente ele se refere a tendas de feltro). Essa feição

[Gestalt] pode ser encontrada agora em maior ou menor medida no nordeste da Ásia,

mas particularmente na parte noroeste da América, que pôde ser descoberta a partir da

Baía de Hudson, onde, de acordo com algumas informações recentes, os habitantes têm

a aparência de autênticos Calmucos. Considere-se agora que, em tempos remotos,

animais e homens têm de ter passado nessa região entre Ásia e América, uma vez que

um mesmo tipo de animais se encontra nas regiões frias de ambas as partes do mundo;

[além disso,] que essa raça humana mostrou-se primeiramente por volta de 1000 anos

antes da nossa contagem de tempo (segundo | Guignes57) para além do rio Amur aos

Chineses, e que aos poucos desalojou dos seus domicílios outros povos dos troncos

[Stämme] tártaro, húngaro e outros; assim, não parecerá totalmente forçada essa

descendência [Abstammung] de regiões frias.

56 Heródoto (c.484-c.425 a.C.), historiador e geógrafo grego, considerado o “pai da história”, provavelmente foi o primeiro a descrever o passado de forma não épica ou crônica, considerando-o um problema filosófico, cuja pesquisa podia revelar o conhecimento do comportamento humano. Sobre os Argipeus, Cf. HERODOTOS. Herodoti historia: cum vita Homeri. vol. I. Oxonii: Joannes Henricus et Jacobus Parker, 1858, Livro IV, § 23, p. 317. (NT)

57 Joseph de Guignes (1721-1800), orientólogo e sinologista francês. Cf. GUIGNES, Joseph de. Histoire générale des Huns. vol. I, Parte II, Paris, 1756, pp. 16ss. (NT)

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Porém, o que é o mais importante, a saber, a derivação dos Americanos, como

uma raça não totalmente implantada, de um povo que a longa data tem habitado a

região mais setentrional, é absolutamente confirmada pelo | crescimento suprimido do

cabelo em todas as partes do corpo exceto na cabeça, pela cor vermelho-ferrugem das

regiões frias e pela cor cobre-escuro das regiões quentes dessa parte do mundo. Pois, o

marrom-avermelhado (como um efeito da acidez do ar) parece ser tão apropriado ao

clima frio, quanto o marrom-oliva (como um efeito do fluído alcalóide da bile) às

regiões quentes, | sem considerar por um momento o caráter natural [Naturell] dos

Americanos, o qual revela uma força vital parcialmente exaurida,58 que pode ser tomada

como o efeito mais natural de uma região fria do mundo.

Por outro lado, o calor mais úmido do clima quente tem de mostrar efeitos em

um povo, que se tornou velho o suficiente [nesse clima] para assimilar [anarten]

completamente seu solo, que são absolutamente opostos aos efeitos anteriores. Nesse

caso, será procriada justamente a forma contrária à forma calmuca.59 O crescimento das

partes esponjosas do corpo teve de aumentar no clima quente e úmido; por isso, um

volumoso nariz arrebitado e lábios grossos. | A pele teve de se tornar oleosa, não apenas

a fim de mitigar a forte transpiração, mas para evitar a nociva aspiração da umidade

putrefata do ar. A abundância de partículas de ferro, que comumente são encontradas

em qualquer sangue humano e aqui é diminuída na substância celular através da

transpiração de ácidos fosfóricos (razão pela qual todos os Negros fedem), causa a

pretidão [Schwärze] que transparece na epiderme, e o forte teor de ferro no sangue

também parece ser necessário para prevenir a debilidade de todas as partes. O óleo da

pele, que enfraquece a mucosidade alimentar indispensável para o crescimento dos

cabelos, quase não permite a procriação de uma pelugem para cobrir a cabeça. Aliás, o

calor úmido é favorecedor do forte crescimento dos animais em geral, e breve, surge o

Negro, que está bem adaptado ao seu clima, | a saber, é forte, corpulento, ágil; mas, que,

58 Nota acrescentada em B: “Apenas para citar um exemplo, os escravos vermelhos

(Americanos) são usados apenas para serviços domésticos no Suriname, porque são demasiado fracos para o trabalho no campo. Para este trabalho são necessários Negros. Não obstante, não faltam aqui meios de coerção; mas, os nativos desta parte do mundo carecem de capacidades [Vermögen] e resistência [Dauerhaftigkeit]”. (NE)

59 Acréscimo de B. (NE)

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ao abrigo do rico suprimento alimentar da sua terra natal, [também] é indolente, mole e

desocupado.60

O nativo do Hindustão pode ser considerado como proveniente [entsprossen] de

uma das mais antigas raças humanas. Sua terra, que é limitada ao norte por altas

montanhas e atravessada de norte a sul até a ponta da sua península por uma longa

cadeia de montes (onde eu ainda incluo ao norte o Tibete, talvez o lugar de refúgio

universal do gênero [Geschlecht] humano durante a última grande revolução da nossa

Terra e viveiro [desse gênero] após [tal revolução]), tem em uma região afortunada a

mais perfeita drenagem de águas (escoamento para dois mares), que existe em nenhuma

outra parte situada na região afortunada61 do continente da Ásia. Por conseguinte, essa

terra podia estar seca e habitável em tempos mais antigos, pois tanto a península leste

da Índia quanto a | China (porque nela os rios, em vez de se separarem, correm

paralelos) tinham de estar ainda desabitadas naqueles tempos de inundações. Portanto,

aqui pôde se estabelecer [gründen] no longo curso do tempo uma sólida raça humana. O

amarelo-oliva da pele dos Indianos, a autêntica cor cigana que subjaz [na pele] mais ou

menos marrom-escura de outros povos do leste, também é igualmente característico e

constante na transmissão [Nachartung] tal qual a cor preta dos Negros, e parece ser,

junto da forma [Bildung] restante e do caráter natural [Naturelle] diverso, tanto o efeito

de um calor seco quanto os últimos do calor úmido. Segundo o senhor Ives,62 as

doenças comuns dos Indianos são vesículas obstruídas e fígados inchados. Mas, sua cor

congênita é como que ictérica e parece demonstrar uma contínua secreção da bile no

sangue que, enquanto | saponácea, talvez dissolva e volatilize os fluídos espessos e,

desta maneira, resfrie o sangue ao menos nas partes externas. A causa das mãos frias

60 Em A: “Por outro lado, o calor mais úmido do clima quente tem de mostrar efeitos em um

povo, cuja região mais proveitosa é justamente aquela na qual a influência [do calor e da umidade] é mais forte, se atualmente ele é velho o suficiente [nesse clima] para assimilar [anarten] completamente seu solo, que são absolutamente opostos aos efeitos anteriores. A perda de fluídos causada pela transpiração (devido ao calor da região) e o calor implicou que os germes do crescimento dos cabelos, enquanto [germes] de um desperdício dos mesmos [fluídos], fossem reprimidos, exceto na cabeça. A pele teve de se tornar oleosa, a fim de que essa transpiração fosse mitigada. (A cor preta desse povo pode ser vista como um efeito secundário da diminuição das partes de ferro que estão contidas no sangue de todo animal, mediante a particular propriedade transpirante dos fluídos.) O crescimento das partes esponjosas do corpo teve de aumentar no clima quente e úmido; por isso, o volumoso nariz arrebitado e lábios grossos. Breve, surgiu o Negro, que está bem adaptado ao seu clima: é forte, corpulento, ágil de sangue quente, mesclado, e indolente, devido à flacidez do recipiente.” (NE)

61 Acréscimo de B. (NE) 62 Edward Ives (1719-1786), viajante e cirurgião naval inglês. Cf. IVES, Edward. A Voyage from

England to India in the year MDCCLIV: Also a journey from Persia to England by an unusual route. New York: Elibron Classics, 2005 (1ª ed. London, 1773), pp. 443ss – primeiro apêndice do autor. (NT).

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dos Indianos63 e | talvez (ainda que não se tenha observado isso) de uma em geral baixa

temperatura do sangue, que os torna capaz de suportar sem prejuízo o calor do clima,

pode bem ser uma autodefesa da natureza a isso ou a algo semelhante, para afastar por

meio de uma certa organização (cujo efeito se mostra na pele) aquilo que estimula o

sangue.64

63 Eu tinha, na verdade, lido em outro lugar que esses Indianos possuem a particularidade [de ter]

mãos frias apesar do grande calor [da região em que vivem], e que isso devia ser um fruto de sua sobriedade e moderação. Contudo, quando eu tive o prazer de conversar, em sua passagem por Königsberg, com o senhor Eaton, viajante detalhista e perspicaz que serviu alguns anos como cônsul holandês e chefe do seu estabelecimento em Basra etc., assim ele me informou que, quando dançou em Surat com a esposa de um cônsul europeu, ficou admirado em sentir nela as mãos suadas e frias (o hábito das luvas ainda não é por lá adotado), e | lá ele manifestou aos outros sua estranheza, a qual recebeu por resposta: ela teve uma mãe Indiana e essa propriedade seria nela hereditária. Ele também atestou que, caso se visse as crianças dos Parsis junto daquelas dos Indianos, de imediato a diferença das raças tornar-se-ia evidente na cor branca dos primeiros e na cor amarelo-escuro dos segundos; da mesma forma, [atestou] que os Indianos ainda teriam em si, na sua constituição física [Baue], o diferencial de que suas pernas seriam mais longas do que a relação habitual entre nós. (K)

64 Em A: “[...] ainda desabitadas naqueles tempos de inundações. Nessa época, esse território também parece ter estado desconectado por longo tempo de todos os territórios da Ásia. Pois, a grande região que está situada entre | as montanhas Mustagh e Altai, da mesma forma entre a Pequena Bujara e a Dauria e corta o Hindustão ao norte, bem como por outro lado isola ao oeste a Pérsia e a Arábia do resto do mundo, comporta territórios [Länder] que ou têm nenhum ou apenas perto das costas têm um curto declive para o mar, (Buache chama de plataformas esses mesmos territórios horizontalmente elevados) e, portanto, [são] por assim dizer bacias de antigos mares que aos poucos secaram, como parece confirmar a areia que cobre quase em toda parte a superfície dos mesmos, e presumivelmente é um sedimento de antigas águas calmas. // As plataformas chamam-se planos; porque o pé, que está situado no interior de suas montanhas, está em muitas partes horizontalmente encoberto por areia, e elas não têm nenhum declive extenso no seu solo. Motivo pelo qual elas também abarcam muitos rios que secam na areia e não alcançam o mar, uma situação que não se encontra em nenhum outro lugar no mundo. Todos os desertos de areia são planos elevados (plataformas) e todos os planos elevados são desertos de areia: uma estranha sentença [Satz] acerca da construção da Terra. Elas devem ser vistas como bacias secas, porque estão rodeadas por elevações, e como elas ao todo detêm a passagem da água, sua areia está elevada acima do pé das montanhas mais próximas ou internas, elas não recebem e nem deságuam rio algum. O cinturão, a partir da fronteira da Dauria [passando] sobre a Mongólia, Pequena Bujara, Pérsia, Arábia, Núbia, o Saara, até o Cabo Branco, é o único desse tipo que se encontra sobre o [planeta] terra e parece bastante coeso. // Portanto, o Hindustão, no tempo [em que esteve] cortado do resto do mundo, (o que também se pode dizer da África, por meio do deserto do Saara, da visível bacia de um antigo mar), pôde estabelecer [gründen] em longos cursos do tempo uma sólida raça humana. O amarelo-oliva da pele dos Indianos, a autêntica cor cigana que está na origem [da pele] mais ou menos marrom-escura de outros povos do leste, é igualmente característico e constante na transmissão [Nachartung] tal qual a cor preta dos Negros, e parece ser, junto com a forma [Bildung] restante e o caráter natural [Naturelle] diverso, tanto o efeito de um calor seco quanto os últimos do calor úmido. Da mistura do Indiano com o branco resultam os mestiços amarelos, bem como [da mistura] do Americano [com o branco] os vermelhos, ou [da mistura] do último com o Negro os caboclos, (os caraíbas pretos) os quais são ao todo bastardos [Blendlinge] e provam sua origem a partir de raças autênticas. // Pergunta-se: com qual das raças atuais o primeiro tronco humano [Menschenstamm] provavelmente pode ter tido a maior semelhança, então presumivelmente declarar-se-ia, embora sem aquele preconceito devido à suposta maior perfeição de uma cor em relação à outra, diante da raça dos brancos. Pois, o homem, cujos descentes deviam se implantar [einarten] em todas as regiões, pôde ser o mais hábil para isso se nos primórdios ele estava adequado ao | clima temperado; porque tal [coisa] está situada no centro entre as fronteiras externas dos estados [Zustände] nos quais ele devia chegar. E aqui mesmo nós também encontramos desde os tempos mais antigos a raça dos brancos.” (NE)

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Page 20: Kant, Immanuel - Das diferentes raças humanas (Traduzido por Alexandre Hahn)

Agora tem-se aqui hipóteses, que65 ao menos têm suficiente fundamento

[Grund] para contrabalançar outras hipóteses que consideram as diferenças do gênero

humano tão inconciliáveis que, por isso, elas têm antes de admitir muitas criações

locais. Dizer com Voltaire,66 “Deus que criou a rena na Lapônia | para consumir o

musgo dessa área fria, também criou no mesmo lugar os Lapões para comer essas

renas”, não é uma má concepção para um poeta, mas um recurso ruim para o filósofo,

que não tem permissão para abandonar a cadeia das causas naturais,67 como lá, onde ele

a enxerga manifestamente ligada à imediata fatalidade [Verhängniss].68

Com boa razão atribui-se agora as diferentes cores das plantas a falta de ferro

em distintas seivas. Tendo em vista que todo sangue de animal contém ferro, então nada

nos impede de atribuir justamente às mesmas causas as diferentes cores dessas raças

humanas. Desta forma, o ácido clorídrico, o ácido fosfórico, ou a volátil alcalose dos

canais excretores da pele, manifestaria mais ou menos [de forma] vermelha, preta ou

amarela as partículas de ferro no retículo. Mas, no gênero [Geschlechte] dos brancos,

isso de modo algum manifestaria o ferro | dissolvido nos fluídos, e assim comprovaria a

perfeita mistura dos fluídos e robustez [Stärke] dessa linhagem dos homens

[Menschenschlags] frente aos demais. No entanto, [trata-se aqui] apenas de um breve

incentivo à investigação em um campo, no qual eu sou demasiado forasteiro, a fim de

com alguma confiança apenas ousar hipóteses.

65 Em A: “as quais”. (NE) 66 François-Marie Arouet (1694-1778), mais conhecido pelo pseudônimo Voltaire, foi um

ensaísta e filósofo iluminista francês. Voltaire defendeu a originalidade dos Lapões contra Buffon, que os derivava em sua Histoire naturelle dos Samoiedos. Cf. VOLTAIRE, Essai sur les moeurs et l’esprit des

nations. In: VOLTAIRE, F. M. A. Oeuvres complètes de Voltaire. vol. XII. Paris: Garnier Frères, Libraires-Éditeurs, 1878-1885, cap. 119, p. 222; e VOLTAIRE, Histoire de l’empire de Russie. In: vol. XVI, cap. 1, p. 400. (NT)

67 Em A: “coisas da natureza [Natursachen]”. (NE) 68 Segue adjacente em A, como último parágrafo do corpo de texto: “A geografia física, que eu

aqui anuncio, pertence a uma idéia que eu tomo de uma proveitosa classe acadêmica, que eu posso chamar de exercício preliminar [Vorübung] no conhecimento do mundo. Esse conhecimento do mundo, que para isso serve, pode providenciar o pragmático [das Pragmatische] a todas as ciências e habilidades outrora adquiridas; desta maneira, elas tornam-se não apenas úteis para a escola, mas também para a vida, e através do qual o aprendiz que concluiu sua formação é introduzido no cenário de sua determinação, a saber, no mundo. Aqui há um duplo campo diante dele, do qual ele necessita um sumário provisório, a fim de nele poder ordenar todas as experiências futuras segundo regras, qual seja, a natureza e o homem. Mas, ambas as partes precisam ser cosmologicamente consideradas nesse sumário, isto é, não segundo aquele que contenha seus objetos [Gegenstände] nos singulares pormenores (física e doutrina empírica da alma), mas que nos permita perceber a sua relação no todo, ao qual eles pertencem e no qual cada um ocupa seu lugar próprio. O primeiro ensinamento eu denomino geografia física e o fixei como preleção de verão, o segundo chamo de antropologia, e guardo para o inverno. As restantes preleções desta metade do ano já foram publicamente indicadas no devido lugar”. (NE)

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Nós enumeramos quatro raças, sob as quais todas as variedades desse gênero

devem ser compreendidas. Mas, todas as derivações precisam de um gênero

fundamental [Stammgattung], que nós temos ou de fazer passar por já extinto ou

selecionar aquele [gênero] das derivações presentes, com as quais nós melhor podemos

comparar o gênero fundamental. Naturalmente, não se pode esperar encontrar, agora,

em algum lugar no mundo, a feição [Gestalt] humana original inalterada. Justamente

devido à essa propensão [Hange] da natureza de assimilar em longas procriações o solo

em toda parte, a feição humana [Menschengestalt] em todo lugar tem de sofrer |

modificações locais. Contudo, a parte da Terra [situada] do 31º até o 32º grau69 de

latitude no velho mundo (o qual em vista da população também parece merecer o nome

de velho mundo) é, com razão, tomada por aquela parte na qual é encontrada a mais

afortunada mistura de influências das regiões frias e quentes, e também a maior riqueza

em criaturas da terra; onde também o homem, porque a partir [desse lugar] ele está

igualmente bem preparado para todos os transplantes, e teria de estar em menor medida

suprimido da sua forma original [Urbildung]. Mas aqui, além de nós encontrarmos

brancos, também [encontramos] habitantes morenos, cuja feição nós queremos assumir

como aquela mais próxima do gênero fundamental. [A derivação] mais próxima desse

gênero fundamental parece ser a feição loura pura de tenra pele branca, cabelo

avermelhado, olhos azuis pálidos, que no tempo dos Romanos habitou a região norte da

Alemanha e (segundo outros | testemunhos) mais para o leste até as montanhas Altai,

sempre com imensas florestas em uma região bastante fria. Agora a influência de um ar

frio e úmido, que adiciona nos fluídos uma propensão ao escorbuto, produz finalmente

uma certa linhagem de homens, que teria prosperado até a constância de uma raça, se

nessa região mesclas [Vermischungen] estranhas não tivessem tão freqüentemente

interrompido o progresso da derivação. Portanto, nós podemos ao menos incluir isso

numa aproximação das verdadeiras raças, e então essas raças em conexão com as causas

naturais de sua formação [Entstehung] deixam se reunir sob o seguinte sumário.

69 Na Edição da Academia, consta: “52º grau”. (NE)

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Page 22: Kant, Immanuel - Das diferentes raças humanas (Traduzido por Alexandre Hahn)

Gênero fundamental [Stammgattung] Brancos de cor morena

Primeira raça

Louro puro (Europa setentrional) do frio úmido

| Segunda raça

Vermelho-cobre (América) do frio seco

Terceira raça

Preto (Senegâmbia) do calor úmido

Quarta raça

Amarelo-oliva (Indianos) do calor seco

4. DAS CAUSAS OCASIONAIS DO ESTABELECIMENTO DE RAÇAS

DIFERENTES

Não importa qual fundamento de explicação [Erklärungsgrund] se possa aceitar, o

que causa a maior dificuldade na diversidade das raças sobre a superfície da terra é o

seguinte: semelhantes terras e regiões não contêm a mesma raça; a América em seu

clima mais quente não revela uma forma indiana do leste, nem muito menos uma forma

de negros nativa da terra; na Arábia ou Pérsia não há amarelo-oliva indiano; apesar de

essas terras concordarem muito em clima e condição do ar com aquelas terras, | etc. No

que concerne à primeira dessas dificuldades, ela se deixa responder de forma bastante

compreensível a partir do tipo de população dessa região. Neste caso, se alguma vez se

instituiu uma raça como a atual mediante longa permanência da sua tribo [Stammvolks]

no nordeste da Ásia ou na vizinha América, então nenhuma influência futura do clima

pôde transformar essa raça em uma outra raça. Pois, apenas a forma fundamental

[Stammbildung] pode degenerar em uma raça; mas, essa raça, onde ela alguma vez

fixou raiz e suprimiu outros germes, resiste justamente por isso a toda transformação,

porque o caráter da raça se tornou uma vez predominante na força procriadora.

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Page 23: Kant, Immanuel - Das diferentes raças humanas (Traduzido por Alexandre Hahn)

Mas, no que diz respeito à localidade da raça negra, que é própria apenas da

África70 (na sua maior | perfeição na Senegâmbia), da mesma forma que a raça indiana

está encerrada nessa terra (fora da qual ela parece estar hibridamente assimilada para o

leste), eu acredito que as causas disso estão situadas em um mar local do tempo antigo,

que manteve afastado tanto o Hindustão quanto a África de outras terras [Länder]

comumente próximas. Pois, a região que vai da fronteira da Dauria [passando] sobre a

Mongólia, Pequena Bujara, Pérsia, Arábia, Núbia, o Saara até o Cabo Branco, em uma

conexão apenas levemente interrompida, parece-se em sua maior parte com o solo de

um antigo mar. As terras nessa zona são aquelas que Buache71 denomina de plataforma,

a saber, | planos horizontalmente elevados nos quais as montanhas lá situadas em parte

alguma tem um declive acentuado, no qual seu pé está horizontalmente enterrado sob a

areia; por isso, os rios, que são poucos por lá, têm apenas um curso breve e secam na

areia. [Esses planos] são semelhantes a bacias de mares antigos, porque estão rodeados

por elevações que no seu interior, considerado no todo, impedem a passagem da água.

Por isso, nem podem receber [annehmen] nem desaguar [auslassen] um grande rio,

sobre o qual a maior parte do sedimento de um calmo e antigo mar também está

encoberto por areia. A partir disso, torna-se agora compreensível como o caráter indiano

não pôde fixar raiz na Pérsia e Arábia, que naquele tempo ainda serviam como bacia de

um mar, quando o Hindustão presumivelmente já estava povoado a longa data. Da

mesma forma, tanto a raça negra quanto a raça indiana | pôde se conservar longo tempo

sem se misturar com o sangue nórdico, porque ela foi cortada daquele sangue nórdico

justamente por esse mar. A descrição da natureza (estado da natureza no tempo

presente) é de longe insuficiente para indicar a causa da diversidade das derivações.

Tem-se de, por mais que com direito se seja inimigo de opiniões atrevidas, ousar uma

história da natureza, a qual é uma ciência independente, que perfeitamente poderia se

mover sucessivamente de opiniões para conhecimentos [Einsichten].72

70 Na calorosa região sul, também há um pequeno tronco de Negros que | se alastra até as ilhas

vizinhas, dos quais se devia acreditar que, por causa da mistura com homens de hibridação [Halbschlag] quase indiana, não são nativos dessa região, mas sim que há muito tempo atrás foram aos poucos conduzidos para uma comunidade, na qual os Malaios tinham relação com a África. (K)

71 Philippe Buache de la Neuville (1700-1773), foi um geógrafo francês, autor da obra Atlas

physique (1753), conhecido pelos estudos das estruturas da superfície da Terra. Sobre a introdução do conceito de plataformas (platôs), Cf. BUACHE, Essai de géographie physique. In: Mémoires de l’Académie Royale des Sciences, 1753, p. 404. (NT)

72 Acréscimo de B. (NE)

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