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A falta de acesso à educação e outras políticas públicas sempre contribuiu para a pouca organização das comunidades rurais – não era diferente nas comunidades de Lagoa da Preta e Capoeira do Milho, no município de Várzea da Roça, Semiárido da Bahia. No entanto, uma coisa unia as famílias: a participação nas celebrações católicas aos domingos. Foi nesses encontros dominicais que, há 20 anos, começou a ser discutida a importância de uma associação comunitária que reunisse as famílias das redondezas em torno de lutas comuns. Os debates, os anseios e as dificuldades vivenciados pelas comunidades levaram à criação da Associação Comunitária de Lagoa da Preta e Capoeira do Milho, tendo como primeiro projeto a criação de uma roça comunitária e a construção de uma casa de farinha, como lembra José Santana, conhecido como Zó, da Capoeira do Milho: “Foi da comunidade religiosa que surgiu nossa Associação e a partir da roça comunitária começamos a nos organizar, conquistamos a casa de farinha e não paramos mais de lutar por melhorias para a comunidade”. PRODUÇÃO DE RAÇÃO PARA OS ANIMAIS Desde o inicio, as famílias passaram a ser acompanhadas pela Cáritas Diocesana de Ruy Barbosa, atualmente Unidade Gestora do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) da Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA). As primeiras ações da Cáritas se voltaram para o incentivo à produção de forragem e o estoque de alimentos para o rebanho. Motivadas pela estória de José do Egito – que apresenta a importância de aproveitar o período das chuvas para estocar a produção para uso nos tempos de estiagem – as famílias adotaram como prática várias técnicas Bahia Ano 6 | nº 999 | outubro | 2012 Várzea da Roça - Bahia Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Lagoa da Preta e Capoeira do Milho: organização para a Convivência com o Semiárido 1 Mandioca: base da produção de ração na comunidade Agricultores reunidos na Casa de Ração Comunitária

Lagoa da Preta e Capoeira do Milho: organização para a Convivência com o Semiárido

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A falta de acesso à educação e outras

políticas públicas sempre contribuiu para a pouca

organização das comunidades rurais – não era

diferente nas comunidades de Lagoa da Preta e

Capoeira do Milho, no município de Várzea da

Roça, Semiárido da Bahia. No entanto, uma

coisa unia as famílias: a participação nas

celebrações católicas aos domingos. Foi nesses

encontros dominicais que, há 20 anos, começou

a ser discutida a importância de uma associação

comunitária que reunisse as famílias das

redondezas em torno de lutas comuns.

Os debates, os anseios e as dificuldades

vivenciados pelas comunidades levaram à criação da Associação Comunitária de Lagoa da Preta e

Capoeira do Milho, tendo como primeiro projeto a criação de uma roça comunitária e a construção de

uma casa de farinha, como lembra José Santana, conhecido como Zó, da Capoeira do Milho: “Foi da

comunidade religiosa que surgiu nossa Associação e a partir da roça comunitária começamos a nos

organizar, conquistamos a casa de farinha e não paramos mais de lutar por melhorias para a

comunidade”.

PRODUÇÃO DE RAÇÃO PARA OS ANIMAIS

Desde o inicio, as famílias passaram a ser

acompanhadas pela Cáritas Diocesana de Ruy

Barbosa, atualmente Unidade Gestora do

Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) da

Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA). As

primeiras ações da Cáritas se voltaram para o

incentivo à produção de forragem e o estoque de

alimentos para o rebanho. Motivadas pela estória

de José do Egito – que apresenta a importância

de aproveitar o período das chuvas para estocar a

produção para uso nos tempos de estiagem – as

famílias adotaram como prática várias técnicas

Bahia

Ano 6 | nº 999 | outubro | 2012Várzea da Roça - Bahia

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Lagoa da Preta e Capoeira do Milho: organização para a Convivência com o

Semiárido

1

Mandioca: base da produção de ração na comunidade

Agricultores reunidos na Casa de Ração Comunitária

aprendidas nos cursos de Convivência com o Semiárido. Entre essas práticas, destacam-se o cultivo de

plantas adaptadas ao clima, como a palma forrageira, e a produção de feno e silagem.

Em 2012, quando o semiárido enfrenta uma das maiores secas das ultimas décadas, as famílias

se obrigaram a utilizar quase todo o seu estoque de forragens para o rebanho. “Esperamos até março

pelas trovoadas, não choveu e agora complicou; a gente não aumentou o estoque porque tínhamos

silagem para mais de quatro meses de alimentação dos animais”, explica o agricultor Manoel Orlando

de Santana, apelidado de Landinho, da Lagoa da Preta.

O depoimento parece de um “desprevenido”, mas a comunidade era, de longe, a mais preparada

de Várzea da Roça, pois diante da estiagem, nenhum animal morreu comprovadamente por falta de

alimento. Em agosto de 2012, as famílias ainda possuíam silagem produzida há mais de dois anos.

Nas comunidades vizinhas, há mais de três meses já havia famílias sem comida para o rebanho,

muitos venderam seu criatório a preços muito baixos, com um prejuízo ainda difícil de ser estimado.

Agora Landinho usa a palma que não cortava há 15 anos – passa na forrageira, misturado com milho.

A lição aprendida com a atual seca é que a sustentabilidade das propriedades no Semiárido

passa pela organização e pela ESTOCAGEM – de água, de sementes, de comida para os animais, etc...

CONQUISTAS DA COMUNIDADE

Além da roça comunitária, atualmente a

Associação de Lagoa da Preta e Capoeira do

Milho tem casa de ração, fábrica de biscoito, uma

ampla sede, casa de farinha com 02 fornos

elétricos, unidade de experimentação da

Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola

(EBDA) na roça comunitária e a Casa do Mel.

Recentemente, a Associação passou a ser

administrada, além da diretoria, por comissões

que são responsáveis pela roça comunitária,

casa de farinha, grupo de mulheres e fundo

rotativo solidário, uma iniciativa recente. As famílias também possuem tecnologias de captação de água

de chuva, como as cisternas de consumo humano e algumas cisternas-calçadão para produção de

alimentos, a exemplo de Seu Rael que produz hortaliças e plantas frutíferas.

Pela diversidade encontrada nessas comunidades, Lagoa da Preta e Capoeira do Milho, com

cerca de 60 famílias, já são referências para a região: são famílias e técnicos que vêm conhecer essa

experiência de organização, desenvolvimento sustentável, segurança alimentar e nutricional,

embasada nos elementos da Convivência com o Semiárido e na valorização do saber e do

conhecimento popular.

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Agricultores/as na sede da associação comunitária

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