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Pós-Graduação em Direito Público Disciplina: Direito Administrativo Aplicado LEITURA OBRIGATÓRIA – AULA 5 Autor: Rogério Sanches Cunha

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Pós-Graduação em Direito Público

Disciplina: Direito Administrativo Aplicado

LEITURA OBRIGATÓRIA – AULA 5

Autor: Rogério Sanches Cunha

LEITURA OBRIGATÓRIA – AULA 1

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Crimes contra a Administração Pública

Peculato apropriação e desvio (peculato próprio)

Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito pró-prio ou alheio:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

Sujeitos do crime:

O peculato somente pode ser cometido por funcionário público, entendido es-te no sentido mais amplo trazido pelo art. 327.

Apesar de próprio, o crime em tela admite o concurso de pessoas estranhas aos quadros da administração.

Segundo enuncia o art. 552 da CLT, “os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais ficam equipara-dos ao crime de peculato, julgados e punidos na conformidade da legislação penal”. Assim, apesar de seus diretores não serem considerados funcionários públicos (sequer por equiparação), o fato por eles praticado fica igualado ao peculato.

No entanto, sabendo que o sindicato, com o advento da Constituição Federal de 1988, perdeu a característica de braço direito do Estado, encontramos vozes na doutrina e na jurisprudência pugnando a não recepção deste dispositivo (art. 552 CLT), vedando-se a ingerência do Estado no sindicalismo (nesse sentido: TRF 4ª R. – ACr 2000.04.01.127506 – SC – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Vladimir Freitas – DJU 20.11.2002).

Tratando-se de Prefeito Municipal, a conduta se subsume ao disposto no art. 1° do Decreto-Lei n° 201/67.

Aliás, veremos que os delitos trazidos pelo artigo 1° do referido Decreto, em-bora funcionais, se desvinculam dos delitos contra a Administração Pública definidos no Código Penal (arts. 312 a 326), constituindo figuras penais autônomas e específi-cas do prefeito e seus substitutos, que são os únicos sujeitos ativos.

Sujeito passivo é o Estado, lesado no seu patrimônio, material e moralmente. Se o bem apropriado for de propriedade particular, também este será vítima do cri-me.

Tipo objetivo:

O caput do art. 312 pune o que a doutrina chama de peculato próprio, cuja ação material do agente consiste na apropriação ou desvio de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo.

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Analisaremos as duas condutas criminosas separadamente.

Na primeira – apropriação -, o agente apodera-se de coisa que tem sob sua posse legítima, passando, arbitrariamente, a comportar-se como se dono fosse (uti dominus). Na verdade, corresponde a um tipo especial de apropriação indébita, qua-lificada pelo fato de ser o agente funcionário público, no exercício da sua função, prejudicando não só a moral, mas o patrimônio da Administração.

Apesar de tema bastante controvertido, por posse (art. 1.196 do CC) entende parcela da doutrina abranger também a mera detenção (art. 1.197 do CC). Outros, porém, não misturando as duas situações, preconizam para a hipótese da simples detenção um caso de peculato-furto (art. 312, § 1°).

Requer a norma que o agente inverta posse alcançada “em razão do cargo”, ou seja, posse inerente às suas atribuições normais, não havendo peculato quando a entrega do bem tenha acontecido meramente “por ocasião do cargo”, sem qualquer vínculo com a competência funcional por ele exercida. Inexistindo relação entre a posse invertida e o ofício desempenhado pelo agente, estará configurado o delito de apropriação indébita; alcançada a posse da coisa mediante engodo, ardil ou outro meio fraudulento, haverá o crime de estelionato; se, entretanto, decorre de violên-cia ou grave ameaça, estaremos diante de um delito de roubo.

Na hipótese do desvio (ou malversação), o funcionário dá destinação diversa à coisa, em benefício próprio ou de outrem, podendo o proveito ser material ou moral, auferindo vantagem outra que não necessariamente a de natureza econômica. É também pressuposto desta modalidade criminosa que o funcionário tenha a posse lícita do bem e que, depois, o desvie.

Quando o desvio de verba se dá em proveito da própria administração, com utilização diversa da prevista em sua destinação, temos configurado o crime do art. 315 do CP.

Apesar de farta jurisprudência no sentido de que o bem jurídico aqui protegi-do (moral administrativa) mostra-se incompatível com a aplicação do princípio da insignificância (STF, HC 87478/PA, rel. Min. Eros Grau, 7.3.2006), entendemos que deve ser aquilatado o caso concreto. Assim, a coisa material apropriada ou desviada sem relevante valor para a Administração-vítima (selo comum, peças ferroviárias sem uso, sucatas e outras bagatelas), não constitui crime.

Tipo subjetivo:

Pune-se a conduta dolosa, expressada pela vontade consciente do agente em transformar a posse da coisa em domínio (peculato apropriação) ou desviá-la em pro-veito próprio ou de terceiro (peculato-desvio). Não há crime sem o propósito de in-corporação ou desvio definitivo da coisa.

Discute-se se haverá o crime em caso de ânimo de uso. A resposta está umbi-licalmente ligada à natureza da coisa apoderada (ou desviada) momentaneamente. Sendo a coisa consumível com o uso, existe o crime; se não consumível, teremos me-ro ilícito civil. Desse modo, inexistiria o crime se o agente utilizasse mão-de-obra pública e equipamentos pertencentes à Administração, com nítida intenção de devol-ve-los, ficando a punição restrita à esfera cível, administrativa ou política.

Devemos, porém, observar que, em se tratando de Prefeito ou seu substituto (Vice-Prefeito, Presidente da Câmara de Vereadores, ou qualquer outro membro da respectiva mesa do legislativo que houver assumido o cargo, substituindo ou suce-

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dendo o Prefeito), o Decreto-lei n° 201/67, além de outros crimes funcionais, equi-parou a utilização irregular dos bens, rendas ou serviços públicos à apropriação e o desvio de bens e rendas públicas, cominando-lhe pena de 2 (dois) a 12 (doze) anos de reclusão, o que acaba por demonstrar a gravidade da conduta (art. 1°, inc. II).

Consumação e tentativa:

O crime de peculato próprio, na sua primeira modalidade (apropriação) se consuma no momento em que o funcionário se apropria do dinheiro, valor ou bem móvel de que tem posse em razão do cargo, dispondo do objeto material como se dono fosse, v.g. retendo-o, alienando-o etc..

No caso do desvio, ocorre a consumação quando o funcionário altera o destino normal da coisa, pública ou particular, empregando-a em fins outros que não o pró-prio.

Nas duas condutas a caracterização do crime não reclama lucro efetivo por parte do agente, pouco importando se a vantagem visada é conseguida ou não.

Podendo a execução ser fracionada em vários atos - crime plurissubsistente -, a tentativa mostra-se perfeitamente possível.

Peculato furto (peculato impróprio)

§ 1º. Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou con-corre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

Também denominado pela doutrina de peculato impróprio, o peculato furto previsto no § 1° do artigo em comento caracteriza-se não pela apropriação ou desvio, mas subtração de coisa sob guarda ou custódia da Administração. Aqui, o agente, também servidor público típico ou atípico, não tem a posse, mas, valendo-se da fa-cilidade que a condição de funcionário lhe concede, subtrai (ou concorre para que seja subtraída) coisa do ente público ou de particular sob custódia da Administração.

Parece claro ser pressuposto do crime que o agente se valha, para galgar a subtração, de alguma facilidade proporcionada pelo seu cargo, emprego ou função. Sem esse requisito, haverá apenas furto (art. 155 do CP).

Peculato culposo

§ 2º. Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

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Previsto no § 2°, ocorre quando o funcionário, através de manifesta negligên-cia, imprudência ou imperícia, infringe o dever de cuidado objetivo, criando condi-ções favoráveis à prática do peculato doloso, em qualquer de suas modalidades (apropriação, desvio, subtração ou concurso para esta).

Haverá o crime culposo se o agente público negligente concorre para a prática de delito não funcional, como por exemplo, um furto?

Apesar da maioria negar, entendemos possível, vez que a ação delituosa do servidor é idêntica e o dano à Administração exatamente o mesmo.

O crime se consuma no momento em que se aperfeiçoa a conduta dolosa do terceiro, havendo necessidade da existência de nexo causal entre os delitos, de ma-neira que o primeiro tenha possibilitado a prática do segundo.

Tratando-se de modalidade culposa do delito de peculato, inviável a forma tentada.

Reparação do dano

§ 3º. No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.

A razão deste dispositivo legal poderá ser encontrada no princípio “ao inimigo que foge, a ponte d’ouro”.

Tal benefício, limitado à modalidade culposa, não exclui as sanções de ordem administrativa.

Peculato mediante erro de outrem

Art. 313. Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

O delito em estudo se assemelha à figura da apropriação de coisa havida por erro, aqui qualificada pela condição funcional do sujeito ativo.

Inverter o agente, no exercício do seu cargo, a posse de valores recebidos por erro de terceiro. O bem apoderado, ao contrário do que ocorre no peculato apropria-ção, não está naturalmente na posse do agente, derivando de erro alheio.

O erro do ofendido deve ser espontâneo, pois, se provocado pelo funcionário, poderá configurar o crime de estelionato (art. 171 do CP).

PECULATO ELETRÔNICO

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INOVAÇÕES ADVINDAS COM A LEI N° 9.983/00

A Lei n° 9.983/00 acrescentou duas novas figuras incriminadoras ao art. 313, as quais, entretanto, não guardam nenhuma semelhança com o delito de peculato. Mesmo assim, talvez pela posição topográfica das novas figuras, a doutrina as tem qualificado como peculato eletrônico.

Inserção de dados falsos em sistema de informações (AC)

Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a in-serção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: (AC)

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (AC) (Ar-tigo acrescentado pela Lei nº 9.983, de 14.07.2000, DOU 17.07.2000).

Considerações iniciais:

Tutela-se aqui a Administração Pública no que concerne à guarda de dados, que somente devem ser modificados para o atendimento do interesse público, nos limites estabelecidos.

Sujeitos do crime:

Sujeito ativo é somente o funcionário público autorizado, isto é, aquele que estiver lotado na repartição encarregada de cuidar dos sistemas informatizados ou banco de dados da Administração Pública. Desconsidera-se, no caso, a definição am-pla trazida pela norma do art. 327 do Código Penal, sendo perfeitamente possível o concurso de agentes (art. 30 do CP).

Observa Rui Stoco que:

Não sendo o funcionário autorizado, sua conduta não se subsu-me apenas ao novo delito de ‘inserção de dados falsos em sis-tema de informações’, mas se o legislador equiparou o funcio-nário público ao particular, quando não esteja autorizado a operar o sistema, caberá então concluir que não ficará impune. Inserir dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados cor-retos nos sistemas informatizados é o mesmo que falsificá-los. O banco de dados constitui um documento virtual, que pode ser materializado de diversas formas.

Está-se diante de um falso ideológico, em que o agente – funci-onário público – comete o crime prevalecendo-se do cargo, sub-sumindo-se a hipótese, em tese, no art. 299 e seu parágrafo único.

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(STOCO, Rui & Outros, ob. cit., pg. 3837. Compartilha desse mesmo entendimento Waldo Fazzio Júnior, ob. cit., p. 111).

A conduta típica ofende diretamente os interesses da Administração Pública, e, indiretamente, também o do administrado eventualmente prejudicado com a fal-sidade ou suprimento de dados.

Tipo objetivo:

Na primeira parte do tipo em estudo, pune-se a conduta de inserir (introduzir, implantar) ou facilitar, mediante ação ou omissão, a inserção de dados falsos.

Já na segunda parte, é incriminada a alteração ou exclusão, indevida, de da-dos corretos, ou seja, a desfiguração dos arquivos, de modo a alterar os registros originais.

Nas duas hipóteses deve o agente agir prevalecendo-se do acesso privilegiado inerente ao seu cargo, emprego ou função pública.

Tipo subjetivo:

É o dolo, caracterizado pela vontade consciente de praticar as condutas típi-cas, aliado ao fim específico de obter vantagem indevida para si ou para outrem, ou para causar dano (elemento subjetivo do tipo).

Consumação e tentativa:

O delito em questão consuma-se com a prática de qualquer um dos núcleos do tipo, independente da obtenção da indevida vantagem ou dano buscado pelo agente (delito formal ou de consumação antecipada).

Sendo possível o fracionamento do iter, a tentativa é perfeitamente possível.

Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações (AC)

Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de in-formações ou programa de informática sem autorização ou soli-citação de autoridade competente: (AC)

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. (AC)

Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Ad-ministração Pública ou para o administrado. (AC) (Artigo acres-centado pela Lei nº 9.983, de 14.07.2000, DOU 17.07.2000).

Considerações iniciais:

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Enquanto no dispositivo anterior protegem-se os dados componentes de um sistema, busca-se, agora, tutelar o próprio sistema de informações ou programa de informática.

Sujeitos do crime:

Sujeito ativo é o funcionário público, típico ou por equiparação, independente do cargo que ocupa. Diferente do artigo antecedente, o tipo em questão não limita a incriminação ao servidor autorizado a atuar em sistemas de informática.

É possível a participação do particular, desde que saiba, por ocasião dos fa-tos, da condição especial ostentada pelo funcionário autor (art. 30 do CP).

Sujeito passivo é o Estado, mais especificamente a Administração Pública. O administrado eventualmente prejudicado com a malfadada alteração ou modificação é igualmente vítima (mediata) do delito.

Tipo objetivo:

O tipo penal prevê duas condutas para a prática desse crime: a primeira é a de modificar o próprio sistema, dando-lhe nova forma; a segunda, sua alteração, conturbando a sua forma original.

A distinção mais significativa entre este delito (art. 313-B) e o anteriormente estudado (art. 313 – A) é que naquele pune-se a inserção ou facilitação de dados fal-sos ou alteração ou exclusão indevida de dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública, enquanto neste o que se coíbe é a ação física de modificar ou alterar o próprio sistema ou programa de informática. Naquele o agente não ingressa no sistema operacional (software), mas apenas falsifi-ca os arquivos do programa. Neste o funcionário altera a própria programação de modo a modificar o meio e modo de geração e criação de arquivos e dados. Se naquela outra figura aproxima-se da falsidade ideológica, nesta sob estudo tem-se a falsificação e adulteração física ou material de toda uma programação (Rui Stoco e Outros, ob. cit., pg. 3840).

Tipo subjetivo:

É o dolo, ou seja, a vontade consciente de praticar os núcleos do tipo, sem autorização ou solicitação da autoridade competente. Não se exige qualquer finali-dade específica do agente, bem como se mostra irrelevante a obtenção de eventual resultado.

Não existe a forma culposa.

Consumação e tentativa:

Consuma-se o delito com a modificação ou alteração do sistema ou programa de informática, objetos materiais do tipo penal em estudo. A tentativa é teoricamen-te possível.

A eventual existência de dano, ao invés mero exaurimento, serve como causa de aumento de pena, conforme disposto no parágrafo único do artigo em comento.

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Concussão

Art. 316. Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamen-te, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em ra-zão dela, vantagem indevida:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.

Considerações iniciais:

Tutela-se, no caso, a Administração Pública em um de seus princípios básicos: a moralidade. Além disso, em plano secundário, busca-se a proteção do patrimônio do particular constrangido pelo ato criminoso do agente.

Sujeitos do crime:

O agente visado pela lei é o funcionário público no sentido amplo do direito penal (art. 327 do CP), incluindo também aquele que, apenas nomeado, embora ain-da não esteja no exercício da sua função, atue criminosamente em razão dela.

O particular poderá concorrer para a prática delituosa, desde que conhecedor da circunstância subjetiva elementar do tipo, ou seja, de estar colaborando com ação criminosa de autor funcionário público (art. 30 do CP).

Atento ao princípio da especialidade, se o sujeito ativo for Fiscal de Rendas, praticará crime contra a ordem tributária previsto no art. 3°, inc. II, da Lei n° 8.137/90.

Tratando-se de policial militar, o crime será o do artigo 305 do Código Penal Castrense.

Sujeito passivo é a Administração Pública, concomitantemente com a pessoa constrangida, podendo ser esta particular ou mesmo outro funcionário.

Tipo objetivo:

A conduta típica consiste em exigir o agente, por si ou por interposta pessoa, explícita ou implicitamente, vantagem indevida, abusando da sua autoridade pública como meio de coação (metus publicae potestatis). Trata-se de uma forma especial de extorsão, executada por funcionário público.

Na exigência feita pelo intraneus há sempre algum tipo de constrição, in-fluência intimidativa sobre o particular ofendido, havendo necessariamente algo de coercitivo. O agente impõe, ordena, de forma intimidativa ou coativa, a vantagem que almeja e a que não faz jus. É preciso, porém, não confundir exigência com solici-tação, porque, no caso de mero pedido, o crime será outro: corrupção passiva, pre-visto no artigo art. 317 do CP.

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Deve o agente deter competência para a prática do mal prometido. Faltando-lhe poderes para tanto, mesmo que servidor, outro será o crime (extorsão). Aliás, tratar-se-á de extorsão e não concussão o caso em que o agente apenas simula a qua-lidade de agente público, não ostentando, na realidade, os atributos anunciados.

Ao se referir a vantagem indevida, entendemos que a lei buscou incriminar qualquer tipo de proveito proibido, ainda que não econômico e patrimonial, como, v.g. a sentimental, sexual etc.. Respeitáveis opiniões, porém, lecionam que o conte-údo da vantagem indevida deve ser, necessariamente, de natureza econômica. Nesse sentido Rui Stoco (ob. cit. p. 3854).

Tratando-se de vantagem devida, o agente responderá por outro crime.

Muito se discute o tratamento penal para a conduta do médico servidor do SUS que, em prejuízo do paciente, recebe “custos adicionais” em exame já homologado pelo órgão previdenciário. Entendemos (ciente de que aqui podemos estar inovando doutrinariamente) que o comportamento ilícito poderá configurar concussão, corrup-ção passiva ou estelionato, a depender do caso concreto. Vejamos.

Se o médico exige do paciente “custo adicional” para realizar a operação mé-dica, não há que se negar a efetiva prática do crime de concussão. No entanto, se nada exige, preferindo solicitar (simples pedido), o delito será o de corrupção passi-va (art. 317 do CP). Por fim, se engana o doente, dizendo que a complementação é justa e devida (alegando, por exemplo, que o SUS não cobre determinada operação médica) o crime será o de estelionato (art. 171 do CP), não havendo, na hipótese, nenhuma intimidação.

Tipo subjetivo:

O crime de concussão só pode ser praticado com dolo, isto é, deve o agente, voluntariamente, de modo consciente, exigir, para si ou para outrem, vantagem in-devida, abusando da função pública exercida ou que irá exercer.

Consumação e tentativa:

Consistindo a conduta criminosa em exigir, fica claro, desde logo, tratar-se de delito formal (ou de consumação antecipada), perfazendo-se com a mera coação, independente da obtenção da repugnante vantagem. Aliás, o seu recebimento espe-lha simples exaurimento (interferindo na pena) e não elemento constitutivo do cri-me.

Fracionado o iter, admite-se a tentativa, exemplificando a doutrina com o ca-so da carta extorsionária interceptada antes de chegar ao conhecimento do lesado. Nélson Hungria, por sua vez, lembrado por Arthur Cogan, repudia o citado exemplo, entendendo configurar o caso nada mais que uma intenção criminosa não exteriori-zada (COGAN, Arthur, op. cit. pg. 36).

Corrupção passiva

Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la,

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mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa.

§ 1º. A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de prati-car qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcio-nal.

§ 2º. Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.

Sujeitos do crime:

Sujeito ativo do crime é o funcionário público, sem distinção de classe ou ca-tegoria, podendo ser típico ou equiparado (art. 327 do CP), ainda que afastado do seu exercício. Também aquele que ainda não assumiu o seu posto, mas em razão de-le, solicita ou recebe a vantagem ou promessa de vantagem indevida, pratica o delito de corrupção.

Se o funcionário for Fiscal de Rendas, comete o crime contra a ordem tributá-ria previsto no art. 3°, inc. II, da lei n° 8.137/90 (princípio da especialidade). Se o agente for testemunha, perito não oficial, tradutor ou intérprete em processo judici-al, policial, administrativo ou em juízo arbitral, o crime será o do art. 342 C.P., com a pena aumentada de 1/3 (art. 342, § 1º).

O particular colaborador responde pelo crime, desde que ciente das qualida-des do agente público autor (art. 30 CP).

Sujeito passivo é o Estado ou, mais especificamente, a Administração Pública, bem como a pessoa constrangida pelo agente público, desde que, é claro, não tenha praticado o crime de corrupção ativa.

Aliás, convém lembrar que a conduta do corruptor subsumir-se-á ao disposto no artigo 333 do CP, excepcionando-se, dessa forma, a teoria monista ou unitária do concurso de pessoas (art. 29 do CP). Comumente, o corruptor é pessoa alheia aos quadros da Administração, o que não impede que um funcionário público pratique referida conduta criminosa.

Tipo objetivo:

São três as condutas típicas: solicitar (pedir), explícita ou implicitamente, vantagem indevida; receber referida vantagem; e, por fim, aceitar promessa de tal vantagem, anuindo com futuro recebimento.

Na primeira hipótese, a corrupção parte do intraneus; é o próprio funcionário público quem toma a iniciativa da mercancia, requerendo que a vantagem lhe seja concedida ou a promessa lhe seja feita. Aqui reside a diferença marcante entre os crimes dos arts. 316 e 317 do CP. A ação do funcionário, no caso da concussão, re-presenta uma exigência, seguida ou não do recebimento, e, no caso da corrupção passiva, representa uma solicitação (pedido), de igual modo seguida ou não do rece-bimento.

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Já na segunda hipótese, supõe-se uma dação voluntária. A iniciativa é do cor-ruptor, podendo este transferir a vantagem até de modo simbólico. Receber e dar são idéias correlatas: a primeira depende da segunda.

A última hipótese refere-se à aceitação de promessa de uma vantagem inde-vida. A palavra “promessa” deve ser entendida na sua acepção vulgar (consentir, anuir). Também nesta hipótese a corrupção parte do corruptor.

Todas as condutas típicas acabam por enfocar a mercancia do agente com a função pública. Aliás, consoante o conceito de Pessina, lembrado por Bento de Faria, a corrupção passiva é a “prostituição da pureza do cargo pela parcialidade ou pelo interesse” (Cf. Código Penal Brasileiro - vol. V/pg. 512). No dizer de Magalhães No-ronha, “nada mais é que o comércio ignóbil da função” (Cf. Direito Penal, volume IV, 24ªed., Saraiva, 1988, pg. 256).

O Código Penal Militar (art. 308) prevê apenas duas modalidades de conduta no crime de corrupção passiva, quais sejam: o recebimento da vantagem indevida ratione offici ou a aceitação da promessa de referida vantagem, não contemplando a modalidade de solicitar. Neste caso, partindo a corrupção do servidor militar, com-petirá à Justiça Comum processá-lo e julgá-lo pelo crime de corrupção passiva co-mum, ante a ausência de previsão desta conduta no Código Castrense.

Existe corrupção ainda que a vantagem seja entregue ou prometida não dire-tamente ao funcionário, mas a um familiar seu (mulher, filhos etc.).

Para a existência do crime deve haver um nexo entre a vantagem solicitada ou aceita e a atividade exercida pelo corrupto. Assim, embora funcionário público, caso não seja o agente competente para a realização do ato comercializado, não há que se falar em crime de corrupção, faltando-lhe um dos extremos legais constituti-vos do tipo, podendo, nessa hipótese, ocorrer exploração de prestígio, estelionato etc.

Com relação caráter da vantagem indevida solicitada, recebida ou prometida, a mesma discussão travada no crime de concussão aqui se repete.

Classifica-se como imprópria a corrupção que visa a prática de ato legítimo, e, como própria, a que tiver por finalidade a realização de ato injusto.

Se a vantagem ou recompensa é dada ou prometida em vista de uma ação, po-sitiva ou negativa, futura, a corrupção denomina-se antecedente; se é dada ou pro-metida por uma ação, positiva ou negativa, já realizada, chama-se subseqüente.

Tipo subjetivo:

É o dolo, consistente na vontade consciente dirigida a qualquer dos verbos es-tampados no tipo. Não se pune a forma culposa.

Consumação e tentativa:

Nas modalidades solicitar e aceitar promessa de vantagem, o crime é de natu-reza formal, consumando-se ainda que a gratificação não se concretize. Já na moda-lidade receber, o crime é material, exigindo efetivo enriquecimento ilícito do autor.

Admite-se a tentativa apenas na modalidade solicitar, quando formulada por meio escrito (carta interceptada). Assim não entendem Antonio Pagliaro e Paulo José

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da Costa Jr, para quem a mera solicitação lançada por escrito na carta já faz consu-mar o delito (op. cit. p. 121).

Corrupção passiva qualificada:

De acordo com o § 1° do art. 317 do CP, pune-se mais severamente o corrupto que retarda ou deixa de praticar ato de ofício ou o pratica com infração do dever funcional. O que seria mero exaurimento passou a ser considerado causa de aumento de pena (exaurimento penalizado). Aqui, o agente cumpre o prometido, realizando a pretensão do corruptor.

Se a violação praticada pelo agente público constitui, por si só, um novo cri-me, haverá concurso formal ou material (a depender do caso concreto) entre a cor-rupção passiva e a infração dela resultante. Nessa hipótese, no entanto, a corrupção deixa de ser qualificada, pois do contrário estaríamos no campo do bis in idem, con-siderando-se o mesmo fato duas vezes em prejuízo do funcionário réu.

Corrupção passiva privilegiada:

Nesta figura criminal, o agente, sem visar satisfazer interesse próprio (auri sacra fames), cede a pedido, pressão ou influência de outrem (art. 317, § 2°, do CP).

“É o caso dos famigerados ‘favores’ administrativos, comuns na reciprocidade do tráfico de influências. Também, corriqueiros na corrupção paroquial das adminis-trações locais” (FAZZIO JÚNIOR, Waldo, op. cit. pg. 190).

O crime, nesta figura, é material.

Currículo Resumido

Rogério Sanches

Professor da ESMP

Promotor de Justiça (SP)

Como citar este artigo

CUNHA, Rogério Sanches. Crimes contra a Administração Pública. Disponível em: www.direitocriminal.com.br. Material da 5ª aula da Disciplina: Direito Administra-tivo Aplicado, ministrada no Curso de Pós Graduação em Direito Público - Anhan-guera-Uniderp | Rede LFG.