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Departamento de Historia I Facultade de Xeografía e Historia Universidade de Santiago de Compostela LESENHO E AQUAE FLAVIAE: DOIS MODELOS DE ASSENTAMENTO CENTRAL E DUAS LÓGICAS LOCACIONAIS DE ÉPOCA PRÉ-ROMANA E ROMANA João Mário Martins da Fonte Santiago de Compostela 2009

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Departamento de Historia I

Facultade de Xeografía e Historia

Universidade de Santiago de Compostela

LESENHO E AQUAE FLAVIAE: DOIS MODELOS DE

ASSENTAMENTO CENTRAL E DUAS LÓGICAS LOCACIONAIS

DE ÉPOCA PRÉ-ROMANA E ROMANA

João Mário Martins da Fonte

Santiago de Compostela

2009

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Departamento de Historia I

Facultade de Xeografía e Historia

Universidade de Santiago de Compostela

LESENHO E AQUAE FLAVIAE: DOIS MODELOS DE

ASSENTAMENTO CENTRAL E DUAS LÓGICAS LOCACIONAIS

DE ÉPOCA PRÉ-ROMANA E ROMANA

João Mário Martins da Fonte

Trabalho de Investigação Tutelado para a obtenção do Diploma de Estudos Avançados

Programa de doutoramento “Arqueoloxía, Historia da Antigüidade e Ciencias e Técnicas

Historiográficas”

Orientador: Marco V. García Quintela (Professor Titular do

Departamento de Historia I, Facultade de Xeografía e Historia,

Universidade de Santiago de Compostela)

Co-orientador: César Parcero Oubiña (Científico Titular do Consejo

Superior de Investigaciones Científicas)

Santiago de Compostela

2009

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Agradecimentos

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer ao meu tutor Marco V. García

Quintela, por se ter mostrado sempre interessado e disponível

Um agradecimento muito particular vai para César Parcero Oubiña, meu co-

orientador da tese, e para Pastor Fábrega Álvarez, sem os quais teria sido

impossível realizar o presente trabalho. Ajudaram-me em tudo e mais alguma

coisa. Estou extremamente grato por todos os conselhos e orientação que me

deram.

Quero também realçar e agradecer a Francisco Sande Lemos e Gonçalo Cruz,

com que iniciei o estudo da “zona dos grandes povoados” do Noroeste

Peninsular.

A Alfredo González Ruibal por ser uma permanente fonte de inspiração e de

conhecimento.

Uma palavra especial de gratidão vai para todos os meus colegas do

Laboratorio de Patrimonio (LaPa-CSIC), onde existe um ambiente de trabalho e

de companheirismo excepcional. Bem hajam!

Centro-me agora nos agradecimentos mais “familiares”. Aos meus pais, que

tudo sempre me deram e fizeram. À minha irmã, meu verdadeiro exemplo e

inspiração e ao Nuno, por estar sempre disponível para me ouvir, aconselhar e

ajudar ao longo dos meus projectos e, já agora, ao “puto” que acaba de chegar!

Last but not the least, à Liliana, por tudo, por estar sempre presente, pela

paciência, pela ajuda, pelo amor e carinho, enfim, por me ter “aturado” e

continuar a “aturar”.

Esperemos que isto seja apenas o início!

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Resumo

No âmbito do presente trabalho de investigação, pretendemos comparar dois

modelos regionais de lugar central, um de época pré-Romana, o Castro do

Lesenho (Boticas, Portugal), um oppidum de finais da Idade do Ferro, e outro

de época romana, Aquae Flaviae (Chaves, Portugal), uma cidade romana

capital regional da parte oriental do Conventus Bracarensis. O objectivo

principal consiste na identificação e problematização de duas lógicas

locacionais distintas, que se poderão associar a diferentes decisões culturais e

sociais.

Com recurso a procedimentos analíticos baseados em tecnologias geo-

espaciais, procuraremos modelizar e objectivar de forma compreensível algo

tão evidente como o facto de se tratar de dois tipos de assentamento

diferentes.

Partiremos da hipótese de que tanto o Lesenho como Aquae Flaviae estão

relacionados com zonas de trânsito, mas estão-no de forma distinta, segundo

lógicas locacionais que se procurarão objectivar através da metodologia

analítica que nos propomos desenvolver.

Encaramos este trabalho como um ponto de partida para um futuro projecto de

investigação mais amplo.

.

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Abstract

In the present research work, we aim to compare two models of regional central

place, one dating of the pre-Roman period, the Lesenho hillfort (Boticas,

Portugal), an oppidum of the Late Iron Age, and other of the Roman period,

Aquae Flaviae (Chaves, Portugal), a Roman city regional capital of the eastern

part of the Conventus Bracarensis. The main objective is the identification and

discussion of two distinct locational factors, which may be associated with

different cultural and social decisions.

Using analytical procedures based on geo-spatial technologies, we seek to

model and objectify in an understandable way something as the obvious fact

that they are two different types of settlement.

The hypothesis is that both Lesenho and Aquae Flaviae are related to areas of

mobility, but in different way, according to different locacional conditions which

will be specify through the analytical methodology that we propose to develop.

We see this work as a starting point for a future and more extensive research

project.

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Lesenho e Aquae Flaviae: dois modelos de assentamento central e duas lógicas locacionais de época pré-Romana e Romana

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ÍÍNNDDIICCEE GGEERRAALL

11.. EENNQQUUAADDRRAAMMEENNTTOO EE AABBOORRDDAAGGEEMM TTEEÓÓRRIICCAA .......................................... 66

1.1. Objectivos gerais .............................................................................. 8

1.1.1. Mudança, continuidade e conflito nos finais da Idade do Ferro ....... 8

1.1.2. A nova materialidade das relações sociais: os oppida .................. 10

1.1.3. Sobre a cronologia destes processos ........................................... 21

1.1.4. Visões sobre a “romanização” ....................................................... 24

1.1.5. Identidade e cultura material ......................................................... 29

1.2. Objectivos concretos ..................................................................... 34

1.3. Hipóteses ........................................................................................ 39

1.4. Apresentação dos casos de trabalho ........................................... 41

22.. MMEETTOODDOOLLOOGGIIAA EE DDEESSEENNVVOOLLVVIIMMEENNTTOOSS .................................................... 4477

2.1. Análise locacional .......................................................................... 48

2.1.1. Visibilidade .................................................................................... 50

2.1.2. Acessibilidade ............................................................................... 53

2.1.3. Altitude Relativa ............................................................................ 58

2.2. Mobilidade Potencial ...................................................................... 62

33.. CCOONNSSEEQQUUÊÊNNCCIIAASS .................................................................................................................... 7711

44.. BBIIBBLLIIOOGGRRAAFFIIAA .............................................................................................................................. 8844

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João Mário Martins da Fonte

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ÍÍNNDDIICCEE DDEE FFIIGGUURRAASS

Figura 1. Citânia de Santa Luzia, Viana do Castelo (Direcção Regional de

Cultura do Norte). ................................................................................................. 12

Figura 2. Citânia de Briteiros (Sociedade Martins Sarmento). ....................... 13

Figura 3. Duas contas policromas de pasta vítrea aparecidas em S. Caetano,

Chaves (Cardoso 1943: 113, fig. 3). ..................................................................... 14

Figura 4. Piroga 4 do rio Lima (Alves e Rieth 2007: 13-14, figs. 21 e 22)...... 14

Figura 5. Piroga 5 do rio Lima (Alves e Rieth 2007: 32-33, figs. 64 e 65)...... 15

Figura 6. Ortofotomapa do Castro da Mina (Câmara Municipal de

Montalegre). ......................................................................................................... 16

Figura 7. Representação tridimensional da localização do Castro de

Carvalhelhos (Boticas) através da elevação do ortofoto a partir do modelo digital

de elevações (Câmara Municipal de Boticas). ..................................................... 17

Figura 8. Planta topográfica do Castro de Carvalhelhos (Santos Júnior 1984).

............................................................................................................................. 17

Figura 9. Carta geológica de Portugal à escala 1:50000 (folha 6D) referente à

envolvente próxima do Castro de Carvalhelhos. O quadrado indica a localização

aproximada do Castro de Carvalhelhos. .............................................................. 18

Figura 10. Ortofotomapa do Castro do Pedrário (Câmara Municipal de

Montalegre). ......................................................................................................... 19

Figura 11. Levantamento topográfico (em cima) e registo gráfico de um dos

tramos de muralha (em baixo) do Castro do Pedrário (Casa de Ramalde -

Direcção Regional de Cultura do Norte). .............................................................. 20

Figura 12. Ortofotomapa do Castro do Cabeço (Câmara Municipal de

Boticas). ............................................................................................................... 20

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Lesenho e Aquae Flaviae: dois modelos de assentamento central e duas lógicas locacionais de época pré-Romana e Romana

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Figura 13. Levantamento topográfico (em cima) e registo gráfico de duas

estruturas circulares (em baixo) do Castro do Cabeço (Casa de Ramalde –

Direcção Regional de Cultura do Norte). .............................................................. 21

Figura 14. Estela do Muiño de San Pedro, Verín (em cima: Museo

Arqueolóxico Provincial de Ourense, em baixo: Taboada Cid 1988-89: 88-90). .. 30

Figura 15. Estátua-menir de Chaves (Jorge e Almeida 1980: 16, fig. 7). ...... 31

Figura 16. O guerreiro mais monumental proveniente do Outeiro Lesenho

(Museu Nacional de Arqueologia). ....................................................................... 32

Figura 17. Estela da Pastoria (Rodríguez Colmenero 1997a: 235-236, nº 237).

............................................................................................................................. 34

Figura 18. Padrão dos Povos de Aquae Flaviae (Museu da Região Flaviense).

............................................................................................................................. 37

Figura 19. Organização administrativa Romana do Noroeste Peninsular, com

a localização de Aquae Flaviae e Bracara Augusta no contexto do conventus

Bracarensis (adaptado de Tranoy 1981). ............................................................. 38

Figura 20. Localização do Castro do Lesenho e de Aquae Flaviae no contexto

do Noroeste Peninsular. ....................................................................................... 43

Figura 21. Perfil topográfico entre o Lesenho e Aquae Flaviae. .................... 44

Figura 22. Delimitação do Lesenho sobreposta ao ortofoto (59_2). .............. 45

Figura 23. Delimitação de Aquae Flaviae sobreposta ao ortofoto (34_3). ..... 45

Figura 24. Cálculo de visibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae. .............. 51

Figura 25. Acessibilidade do Lesenho (isocronas de 7,5’, 15’, 30’, 45’ e 60’).56

Figura 26. Acessibilidade de Aquae Flaviae (isocronas de 7,5’, 15’, 30’, 45’ e

60’). ...................................................................................................................... 56

Figura 27. Comparativa entre a acessibilidade do Lesenho e de Aquae

Flaviae. ................................................................................................................. 57

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Figura 28. Duas situações diferentes de proeminência de um ponto em

relação à sua envolvente, sendo que em ambas o valor da média ponderada é o

mesmo, mas o da média tipificada é diferente para cada caso, além de que o

valor de altitude relativa no gráfico de baixo é mais baixo porque o desvio padrão

tem um valor mais elevado, pois há diferenças de altitude mais acentuadas

(Fábrega Álvarez 2004: 24, fig. 11). ..................................................................... 59

Figura 29. Cálculo de densidade viária, onde é possível constatar a

localização de Aquae Flaviae numa zona de alta densidade viária. .................... 66

Figura 30. Cálculo de caminho óptimo e comparação com o traçado da Via

VXII entre Bracara Augusta e Aquae Flaviae. ...................................................... 67

Figura 31. Representação tridimensional da localização do Castro do

Lesenho através da elevação do ortofoto a partir do modelo digital de elevações.

............................................................................................................................. 74

Figura 32. Em cima: Reconstituição ideal do Lesenho (desenho: Anxo

Rodríguez Paz); em baixo à esquerda: levantamento topográfico do Lesenho

(Câmara Municipal de Boticas); em baixo à direita: recorte da fotografia aérea

(8814) do voo USAF de 1958 do Lesenho (Instituto Geográfico do Exército). ..... 74

Figura 33. Representação tridimensional da localização de Aquae Flaviae

através da elevação do modelo digital de elevações. .......................................... 77

Figura 34. Representação tridimensional da localização de Aquae Flaviae

através da elevação do ortofoto a partir do modelo digital de elevações. ............ 78

Figura 35. Colar articulado e bracelete em ouro aparecidos no Alto da

Pedisqueira, Chaves (Cardoso 1944, figs. 3 e 2). ................................................ 79

Figura 36. Um dos torques de Codeçais do “tipo flaviense” aparecidos na

Veiga de Chaves (Cardoso 1965, est. III, nº2). .................................................... 79

Figura 37. Depósito de lanças em bronze de Lamachã (Vilaça 2006: 79, fig.

38). ....................................................................................................................... 81

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Lesenho e Aquae Flaviae: dois modelos de assentamento central e duas lógicas locacionais de época pré-Romana e Romana

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ÍÍNNDDIICCEE DDEE GGRRÁÁFFIICCOOSS

Gráfico 1. Superfície aproximada do Lesenho e de Aquae Flaviae. .............. 46

Gráfico 2. Quantificação da visibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae. .... 52

Gráfico 3. Visibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae por intervalos (buffer

de 800, 2000, 5000 e 20000 metros). .................................................................. 53

Gráfico 4. Quantificação da acessibilidade do Lesenho e Aquae Flaviae por

intervalos de tempo (isocronas de 7,5’, 15’, 30’, 45’ e 60’). .................................. 55

Gráfico 5. Incremento da acessibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae entre

os intervalos de 7,5’ e 60’. .................................................................................... 58

Gráfico 6. Comparativa entre a altitude relativa tipificada do Lesenho e Aquae

Flaviae. ................................................................................................................. 60

Gráfico 7. Altitude relativa ponderada do Lesenho por intervalos (buffer de

800, 2000 e 20000 metros). ................................................................................. 61

Gráfico 8. Altitude relativa ponderada de Aquae Flaviae por intervalos (buffer

de 800, 2000 e 20000 metros). ............................................................................ 61

Gráfico 9. Percentagem de linhas MADO que são visíveis desde o Lesenho

(buffer de 800, 2000, 5000 e 20000 metros). ....................................................... 68

Gráfico 10. Percentagem de visibilidade desde o Lesenho (buffer de 800,

2000, 5000 e 20000 metros). ............................................................................... 68

Gráfico 11. Percentagem de linhas MADO que são visíveis desde Aquae

Flaviae (buffer de 800, 2000, 5000 e 20000 metros). ........................................... 69

Gráfico 12. Percentagem de visibilidade desde Aquae Flaviae (buffer de 800,

2000, 5000 e 20000 metros). ............................................................................... 69

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1. ENQUADRAMENTO E ABORDAGEM TEÓRICA

Nesta primeira parte, procuraremos enquadrar o presente trabalho dentro

de um programa de investigação mais amplo, nomeadamente a análise das

paisagens de poder e das dinâmicas sociais e territoriais ocorridas nos finais

da Idade do Ferro e inícios de época Romana, centrado especificamente na

área Meridional do Noroeste Peninsular, onde surge o processo de

“oppidização” e onde têm lugar complexas políticas de interacção cultural,

em particular com o mundo Mediterrânico, que irá constituir o meu futuro

projecto de doutoramento.

Também é indicado mencionar aqui a perspectiva teórica a partir da qual

este trabalho vai ser desenvolvido:

Arqueologia da Paisagem – visa analisar o resultado da acção

humana sobre a paisagem, encarada como um produto sociocultural

criado pela objectivação no meio da acção social, resultante da

simbiose entre o meio físico e a presença humana (Criado Boado

1993, 1999). Procura também analisar as formas de construção

social da paisagem através da monumentalização da acção social: a

arquitectura monumental coincide com formas complexas de

subsistência baseadas no controlo e no acesso diferencial a

determinados recursos críticos e na modificação humana do meio,

supondo a configuração espacial dessas mudanças estruturais,

sendo que a monumentalidade é entendida como uma forma de

reprodução social (ibid.).

Teoria Pós-Colonial – no sentido de encarar os encontros de tipo

colonial segundo uma perspectiva mais complexa e dinâmica e

desprovida de preconceitos apriorísticos e que contemple a

diversidade de contextos e de experiências (Fernández Martínez

2006; Gosden 2004).

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Teoria da Agência – incorporando-se os agentes à análise social

segundo uma perspectiva pós-colonial, considerando-se que os

indígenas não são meros receptores passivos de outras “culturas

superiores”, senão agentes activamente involucrados no processo de

negociação social e identitária, visando-se uma aproximação

multivocal à Arqueologia, através da construção de narrativas mais

flexíveis, dinâmicas e complexas (Dobres e Robb 2000). Os

indivíduos serão encarados como agentes principais no processo de

mudança social, rejeitando-se a noção dos indivíduos enquanto

“actores” inconscientes de um sistema social pré-determinado ou

passivamente influenciados por factores/forças externas (Grau Mira

2007).

Teoria dos Sistemas Mundiais – mais que falar de centros e de

periferias, interessa-nos mais para o presente caso os conceitos

alternativos desenvolvidos por Sherrat (1993, 1994) de núcleo e de

margem, onde o maior dinamismo de mudança cultural do primeiro

acaba por influenciar o segundo, embora seja uma influência

desarticulada e espontânea, não havendo também naturalmente uma

dependência económica da margem em relação ao núcleo. Os

conceitos de centro e de periferia implicavam uma posição

dominante do primeiro em relação ao segundo, sendo que no caso

da aplicação dos conceitos de núcleo e de margem a trajectória

evolutiva das sociedades “marginais” é mais atenuada que no caso

das “periféricas”. É um tipo de abordagem que pretende superar as

tradicionais dicotomias entre as mudanças de carácter endógeno e

as influências de origem externo, afastando-se tanto do difusionismo

mecanicista como das interpretações meramente “autóctones”, que

pareciam ignorar as constantes e complexas interacções culturais

entre as sociedades humanas (García Sanjuán 2005).

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1.1. Objectivos gerais

Neste ponto, centrar-nos-emos na apresentação e contextualização do

âmbito geral dentro do qual este trabalho vai ser desenvolvido, abordando o

amplo problema histórico ao qual os resultados deste trabalho pretendem

parcialmente contribuir. É importante frisar que aqui serão expostos temas

bastante ecléticos, mas que sem dúvida estão relacionados com o trabalho

que aqui abordamos e, sobretudo, apresentamos aqui as bases teóricas para

o nosso subsequente trabalho de investigação doutoral.

Visto que se trata aqui de referir e contextualizar o amplo problema

histórico ao qual procuramos parcialmente contribuir, consideramos

fundamental enquadrar essa questão dentro do actual debate teórico ao

nível europeu em torno dos processos históricos ocorridos entre finais da

Idade do Ferro e inícios de época Romana (Haselgrove e Moore 2007).

Para tal, é fundamental uma tentativa de aproximação ao estudo e

análise dos processos de mudança sociopolítica, territorial e identitários

ocorridos na Idade do Ferro e época Romana, de forma a se tentar construir

uma narrativa compreensível sobre os processos de mudança cultural e com

vista a se tentar elaborar uma narrativa coerente que vise interpretar e dar

sentido às transformações ocorridas na paisagem, nos assentamentos, na

estrutura social e na cultura material, partindo do pressuposto da

heterogeneidade cultural e da variabilidade regional.

1.1.1. Mudança, continuidade e conflito nos finais da Idade do Ferro

De partida, é necessário termos em conta a crescente variabilidade e

especialização da paisagem e dos assentamentos nos finais da Idade do

Ferro, sendo que alguns sítios têm um uso intensivo, bem como

determinados espaços para a realização de actividades específicas. É no

final da Idade do Ferro que emergem centros regionais de produção e

intercâmbio, sendo que o intercâmbio deve ser encarado como um processo

de criação e mediação de relações sociais, onde a cultura material

desempenha um papel fundamental nesse processo social. A cultura

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Lesenho e Aquae Flaviae: dois modelos de assentamento central e duas lógicas locacionais de época pré-Romana e Romana

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material tem um papel activo na construção e legitimação do poder e na

mediação das relações sociais, pois é um mecanismo através do qual se

incrementa e manifesta poder e diferenciação social. O consumo de

materiais “exóticos” e a adopção de técnicas e de práticas forâneas

estimuladas pelo contacto cultural, por sua vez motivado pelo intercâmbio,

devem ser encarados como “caminhos” para a mudança cultural e social,

pois o contacto cultural é uma forma de estímulo social.

Será de destacar o papel da guerra e da violência social e da própria

fortificação como factor social, enquanto tecnologias de poder e como formas

de reprodução social, de consolidação e de identificação do grupo. A guerra

poderá ser percepcionada como um elemento de controlo social e como uma

expressão de domínio, associada ao desenvolvimento de sociedades

complexas e à emergência da competência pelo território e pelos recursos,

dando origem a tensões sociais, que se vão manifestar materialmente em

formas de coerção social e também de coesão social.

Efectivamente, as fortificações têm um claro sentido polissémico e

multidimensional, podendo ser utilizadas como uma forma de se negociar o

poder da comunidade e a própria identidade colectiva, com um sentido

interno relacionado com a coesão social e outro externo direccionado para a

coerção social. Em contextos coloniais podem eventualmente relacionar-se

com um sentimento de insegurança social e de potencial agressão, pelo que

sem dúvida devem ser encaradas como um elemento social activo (González

Ruibal 2008a). Os processos coloniais agudizam as tensões sociais e

acentuam as contradições sociais e a competência social entre as

comunidades locais, suportam regimes hierárquicos, fomentam o conflito

intracomunitário e promovem novas formas de violência física e simbólica

(Ibid.).

A guerra tem um claro papel estrutural a nível social, pois a

generalização e monumentalização final da fortificação, que parece deixar de

ter uma disposição funcional efectiva, traduz-se na aceitação social da forma

em que a definitiva divisão social irá ocorrer (Parcero Oubiña no prelo;

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João Mário Martins da Fonte

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González García et al. no prelo). A maximização da componente guerreira da

sociedade manifesta-se, inclusivamente, no facto de que a forma do

guerreiro vai ser a eleita pelos indivíduos proeminentes para se

representarem socialmente na fase final da Idade do Ferro (Parcero Oubiña

no prelo; González García et al. no prelo). Esta questão enlaça bem com o

que poderia ser definido como a mudança de umas “sociedades guerreiras”

a umas “sociedades com guerreiros” (González García 2009a; González

García et al. no prelo), conceitos definidos a partir dos trabalhos

antropológicos de P. Clastres (2001).

Não podemos deixar de mencionar uma definição que pensamos que se

ajusta na perfeição ao conceito de muralha que compartimos: “La muralla de

cualquier poblado fortificado es el resultado de la agencia social, de un

esfuerzo colectivo, realizado para erigir un espacio monumental, social y

simbólico. Esta arquitectura serviría, por supuesto, de sistema defensivo, de

protección del recinto, pero a su vez delimita el espacio para la acción social,

deviene un mecanismo de cohesión social, se convierte en una herramienta

de control y coerción de la propia comunidad y constituye un elemento

monumental, creado para ver y ser visto, concebido como una

materialización del prestigio del poblado de cara al exterior.” (Ayán Vila et al.

2007).

1.1.2. A nova materialidade das relações sociais: os oppida

Na Segunda Idade do Ferro, as actuais regiões de Trás-os-Montes

Ocidental e a zona Meridional da Província de Ourense (Fonte 2008; Fonte

et al. 2008; González Ruibal 2009) poderão eventualmente ser encaradas

segundo uma perspectiva de cultura de fronteira, de hibridização e

transculturalismo dos produtos culturais, embora com especificidades

regionais, tendo em conta a confluência de elementos culturais de

procedência diversa. As sociedades híbridas, embora no fundo todas as

sociedades de uma forma ou de outra sejam híbridas, são produto de

complexos e diversificados intercâmbios entre diferentes tradições culturais,

sendo que a cultura material é fundamental como uma forma de construir e

manter relações sociais e de negociar identidades; a cultura material como

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um importante meio para a comunicação cultural e que está activamente

envolvida na formação do contexto cultural.

O Castro do Lesenho pode eventualmente ser encarado como um

“oppidum de fronteira”, já que parece revelar o desejo de projectar uma

imagem de poder e fortaleza numa zona culturalmente crítica, parecendo

que se reforçam determinados valores culturais e ideológicos do “núcleo”, ao

mesmo tempo que se “absorvem” outros valores culturais e se criam outros

específicos (González Ruibal 2009).

A contrastar com os oppida litorais e pré-litorais, onde é perceptível uma

organização densa e complexa do espaço doméstico (González Ruibal

2006), os oppida destas zonas mais interiores, tomando o exemplo do Castro

do Lesenho (Martins et al. 2010), não parecem revelar uma organização

interna semelhante, já que o espaço doméstico parece estruturar-se em

plataformas artificiais, que se adaptam à acidentada topografia, o que é

perfeitamente visível, por exemplo, no Castro de Saceda (González Ruibal

2005: 270-271). Parece ocorrer antes um investimento social na construção

e elaboração das estruturas defensivas, em particular das muralhas (Fonte

2008). Poderão tratar-se de duas formas distintas de construção de

elementos visíveis na paisagem associados a diferentes identidades sociais,

embora em íntima inter-relação.

É particularmente interessante a relação entre os oppida litorais, como S.

Lourenço (Esposende), Santa Luzia (Viana do Castelo) (Figura 1), Bagunte

(Vila do Conde) ou Terroso (Póvoa de Varzim), os pré-litorais, como Briteiros

(Guimarães) (Figura 2), Sanfins (Paços de Ferreira), S. Julião (Vila Verde) ou

Monte Mozinho (Penafiel) e os oppida do interior, como o Lesenho, povoado

central de uma zona abundante em recursos minerais metálicos e onde

parece terem havido determinados povoados especializados na extracção

mineira (Fonte et al. no prelo a). É possível que os povoados costeiros

actuassem como intermediários entre os comerciantes mediterrânicos e as

comunidades pré-litorais e estas últimas como intermediários entre os

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primeiros e as comunidades interiores, que forneciam o estanho e o ouro

(Lemos et al. no prelo; Lemos 2009a, 2009b).

Figura 1. Citânia de Santa Luzia, Viana do Castelo (Direcção Regional de Cultura do Norte).

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Figura 2. Citânia de Briteiros (Sociedade Martins Sarmento).

Evidentemente que o número de importações mediterrânicas decresce

da costa para o interior, além de que a nível qualitativo os objectos que

aparecem na costa não são os mesmos que aparecem no interior (González

Ruibal 2007: 315). Na costa produzia-se uma negociação dos significados

dos objectos a partir de parâmetros culturais locais e apenas uma parte

desses objectos continuaria em direcção ao interior (ibid.). Em zonas

interiores, surgem objectos que são facilmente transportáveis, sobretudo

contas de pasta vítrea (Figura 3), embora talvez se pudessem tratar de

elementos que seriam mais compreensíveis e assimiláveis por estas

comunidades interiores, cujos princípios culturais e formas de organização

social diferiam das do litoral (González Ruibal 2006-07: 512-534).

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Figura 3. Duas contas policromas de pasta vítrea aparecidas em S. Caetano, Chaves (Cardoso 1943:

113, fig. 3).

Recentemente, foi dada a conhecer a recuperação de duas pirogas

monóxilas no rio Lima datadas entre os séculos IV e II a.C. e com prováveis

influências construtivas mediterrânicas (Alves e Rieth 2007) (Figuras 4 e 5).

Segundo os referidos autores, as pirogas destinavam-se ao atravessamento

entre as margens do rio Lima, embora possam também eventualmente ter

sido utilizadas para navegação interior

Figura 4. Piroga 4 do rio Lima (Alves e Rieth 2007: 13-14, figs. 21 e 22).

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Figura 5. Piroga 5 do rio Lima (Alves e Rieth 2007: 32-33, figs. 64 e 65).

Dentro do grupo de povoados provavelmente especializados na

actividade mineira, poderão enquadrar-se, por exemplo, os castros da Mina

(Montalegre) (Figura 6) e de Carvalhelhos (Boticas) (Figuras 7 e 8). A

localização e implantação dos mesmos parece estar bastante condicionado

pela proximidade em relação a cursos de água, particularmente em

meandros de rios ou ribeiros, onde a corrente é mais fraca e os sedimentos

se depositam por gravidade com mais facilidade, não possuindo qualquer

controlo territorial sobre a envolvente (Fonte et al. no prelo a). É possível que

grande parte da actividade metalúrgica se centralizasse no Lesenho, tendo

em conta os dados da última intervenção arqueológica realizada no sítio

(Martins et al. 2010), tendo-se constatado a ocorrência de actividade

metalúrgica relacionada com a produção de estanho, sendo depois

possivelmente distribuída e intercambiada em direcção sobretudo ao litoral,

zona onde a demanda motivada pela interacção cultural com o mundo

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mediterrânico era mais intensa. Sem dúvida que a interacção entre ambas

zonas deve ter provocado estímulos sociais mútuos bastante relevantes.

Estas zonas têm uma tradição de longue durée (pelo menos desde o

Bronze Final) de poderosas economias políticas geridas por elites com uma

tendência para a centralização e as ligações de longa distância, motivando a

geração estrutural de desigualdades sociais.

Pelo contrário, parece que outras comunidades mais interiores, afastadas

destes focos de interacção cultural, optaram antes pelo isolacionismo

cultural, desenvolvendo mecanismos que impediam as desigualdades

sociais, dando origem a formas sociais mais igualitárias e indivisas (Sastre

Prats 2002, 2009).

A percepção da existência destas diferentes economias políticas é

fundamental para se entender a diversidade da cultural material e das

paisagens, mas também a emergência de divergentes identidades colectivas

no Noroeste Ibérico nos finais da Idade do Ferro (González Ruibal no prelo).

Figura 6. Ortofotomapa do Castro da Mina (Câmara Municipal de Montalegre).

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Figura 7. Representação tridimensional da localização do Castro de Carvalhelhos (Boticas) através da

elevação do ortofoto a partir do modelo digital de elevações (Câmara Municipal de Boticas).

Figura 8. Planta topográfica do Castro de Carvalhelhos (Santos Júnior 1984).

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Realizaram-se no Castro de Carvalhelhos, localizado na envolvente

próxima do Lesenho, numerosas e consecutivas campanhas de escavação

anuais, dirigidas por Joaquim Rodrigues dos Santos Júnior (1984). No

âmbito desses trabalhos foi recolhida grande quantidade de escória, parte

possivelmente resultante da fundição de cassiterite para obtenção do

estanho, além da possível evidência de um forno metalúrgico. Surgiram

também diversos elementos metálicos, sobretudo em bronze. A descoberta

fortuita em 1965 de 200 kg de cassiterite (Santos Júnior 1984), no lado

nascente do castro, escondidos sob um penedo, parece comprovar a

produção de estanho. Na zona envolvente do povoado existem abundantes

vestígios de mineração, quer antiga, possivelmente de época Romana, quer

moderna, do século XX, relacionada com a “febre” do volfrâmio, sendo

relativamente abundantes as ocorrências de estanho (Sn) e de volfrâmio (W)

(Figura 9).

Figura 9. Carta geológica de Portugal à escala 1:50000 (folha 6D) referente à envolvente próxima do

Castro de Carvalhelhos. O quadrado indica a localização aproximada do Castro de Carvalhelhos.

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González Ruibal (2006-07: 502) interroga-se sobre a possibilidade de as

actividades metalúrgicas se terem eventualmente concentrado nos lugares

centrais, que, por sua vez, favoreceram uma maior organização e

desenvolvimento das redes comerciais de média e larga distância. Um

desses casos poderá ter sido o Castro do Lesenho, pelo que seria provável

que os pequenos castros, possivelmente dependentes dos primeiros, se

dedicassem sobretudo à actividade extractiva mineira.

Paralelamente, existiam outros povoados de estrutura e dimensões

consideráveis, que controlavam pontos-chave do território, possivelmente até

de forma complementar em relação aos lugares centrais, como os castros do

Pedrário (Montalegre) (Figura 10 e 11) e do Cabeço (Boticas) (Figura 12 e

13).

Figura 10. Ortofotomapa do Castro do Pedrário (Câmara Municipal de Montalegre).

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Figura 11. Levantamento topográfico (em cima) e registo gráfico de um dos tramos de muralha (em

baixo) do Castro do Pedrário (Casa de Ramalde - Direcção Regional de Cultura do Norte).

Figura 12. Ortofotomapa do Castro do Cabeço (Câmara Municipal de Boticas).

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Figura 13. Levantamento topográfico (em cima) e registo gráfico de duas estruturas circulares (em

baixo) do Castro do Cabeço (Casa de Ramalde – Direcção Regional de Cultura do Norte).

1.1.3. Sobre a cronologia destes processos

Tanto no caso do Lesenho, como de Carvalhelhos, ainda que com as

maiores cautelas possíveis em relação a este último sítio dado a ausência de

informação estratigráfica, as cronologias parecem apontar para os dois

últimos séculos a.C. e possivelmente primeira metade do século I d.C.

Tradicionalmente (Almeida 1983; Acuña Castroviejo 1996), considerou-

se que os oppida surgiram a partir da conquista romana do Noroeste, pelo

que o apogeu destes grandes povoados teria ocorrido a partir da época de

Augusto. F. Queiroga (2007: 175-177) afirma que os Romanos induziram, ou

forçaram mesmo, as comunidades indígenas a construir estes oppida

segundo os seus próprios padrões, tendo sido encorajadas a mudar-se para

estes centros como forma de controlar e aculturar estas comunidades.

Outros autores (Sastre Prats 2004: 103-106), matizando um pouco tais

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ideias, consideram estes lugares centrais como resultado de uma influência

indirecta do imperialismo romano, considerando que alguns oppida podem

ter tido origem em época pré-provincial, enquanto outros parecem tratar-se

de novas fundações de finais do século I a.C. ou início do século I d.C.,

embora a consolidação destes lugares centrais responda já aos processos

de integração no mundo Romano. Alguns autores (Martins 1990),

defendendo um processo endógeno de intensificação económica,

consideram fundamental a precoce pacificação da parte Meridional do

Noroeste relativamente aos territórios mais setentrionais, bem como a sua

maior proximidade em relação ao Sul da Península.

No entanto, existem actualmente bastantes dados que atestam que os

oppida se geram antes da efectiva conquista Romana do Noroeste, sendo,

sobretudo, um processo indígena, estimulado na sua etapa final pelos

contactos sistemáticos com o mundo Romano. A datação destes lugares

centrais coincide bastante bem com o mesmo fenómeno no resto da Europa

temperada, onde o seu desenvolvimento é normalmente associado ao

período de La Tène C, a partir de mediados do século II a.C. (González

Ruibal 2008b: 920-925). Todavia, mais que um todo homogéneo com uma

evolução unilinear, devemos antes contemplar uma multiplicidade de

experiências históricas particulares a diferentes escalas antes e depois da

chegada dos Romanos (González Ruibal 2006-07: 328-349). Como nas

demais regiões europeias, não houve "a sociedade da Idade de Ferro", mas

várias sociedades da Idade do Ferro, superando o tradicional “modelo

triangular” aplicado às sociedades da Idade do Ferro (Hill 2006).

Sem dúvida que os oppida supuseram uma nova tecnologia de poder,

embora tivessem existido outras mais, como a própria decoração

arquitectónica, que recorria a símbolos partilhados por toda a comunidade

como forma de justificar e consolidar o poder das elites. Assistimos a partir

de meados dos dois últimos séculos antes do câmbio de era à criação do

que se denominou “grande estilo” (Earle 2002: 16 in González Ruibal 2007:

306), que são típicos das chefaturas complexas e das sociedades mais

hierárquicas e desigualitárias e formam parte dos seus mecanismos de

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construção do poder e de diferenciação social. Esta multiplicação e

visibilização da cultura material é uma forma evidente de se marcar e

acentuar as diferenças sociais. Estes elementos permitiram articular uma

ideologia mais hierárquica e centralizadora, associada a novas formas de

controlo social, como o chamado “proto-urbanismo” (organização ortogonal

do espaço interno), mas também de restrição do poder das elites, como os

edifícios comunitários, o que pode ter favorecido a criação de uma identidade

social comum (González Ruibal 2008b: 922-925). Evidentemente que o

contacto e a pressão Romana pode ter acelerado e/ou precipitado todo este

processo, embora talvez não se tenha tratado de um processo unidireccional

e mono-causal. É necessário entender os oppida em relação estrutural a

toda uma série de fenómenos sociais, políticos e culturais que ocorrem no

sul da Callaecia entre os séculos II a.C. e I d.C. (González Ruibal 2008b:

924).

A formação de lugares centrais é provável que tenha gerado fenómenos

não só de sinecismo e de concentração populacional, possivelmente

acompanhados por um aumento da produção, especialização e da geração

de excedentes, mas também de hierarquização territorial e social. Esta

hierarquização implica uma diferenciação funcional dos assentamentos e

não apenas uma variabilidade de tamanhos e monumentalidade construtiva,

ou seja, requer o surgimento de lugares centrais dos quais depende a

articulação de um território povoado por assentamentos de carácter

secundário (Sastre Prats 2004: 105). Claro está que existe o problema

cronológico, pois muitas vezes é bastante difícil de se aferir acerca da

coetaneidade entre determinados sítios.

Todavia, é interessante constatar que têm sido identificadas novas

formas de povoamento disperso em zonas de vale, com a particularidade de

surgirem nas escavações arqueológicas destes povoados estruturas

circulares e cultura material indígena e de serem aparentemente não

fortificados, possivelmente na dependência e presumivelmente coetâneos de

oppida, como no caso do povoado da Quinta do Paço, na base do Castro de

Santo Estevão da Facha (Ponte de Lima) (Almeida 2003), ou do povoado de

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Saa, na base da Citânia de Santa Trega (A Guarda, Pontevedra) (inédito,

informação de Xulio Carballo Arceo). Por outro lado, consideramos ainda não

devidamente explicitados determinados conceitos como o de “castros

agrícolas” (Almeida 2003), uma vez que não é evidente, à partida, uma

exclusiva especialização, como expressa este conceito, destes povoados na

actividade agrícola. Por exemplo, consideramos que o Castro de Lovelhe

(Vila Nova de Cerveira) (Almeida 2000; Morais 2005) e o Outeiros dos

Picoutos (Esposende) (Morais 2005) estariam muito mais vocacionados para

a actividade comercial, actuando como entrepostos comerciais associados à

rede viária e à navegação marírimo-fluvial, à semelhança das Torres de

Oeste (Naveiro López 2004) na vizinha Galiza (Pontevedra). Como

entreposto comercial, destaca-se, na zona Meridional do Noroeste, Cale

(Porto), localizada no Morro da Sé ou da Penaventosa, importante

ancoradouro desde pelo menos a Idade do Ferro (Morais 2005; Silva 2009).

A localização geo-estratégica destes locais motivou que em época Romana

se transformassem em vici.

A ocupação efectiva do Noroeste na época de Augusto não supôs o fim

dos oppida e dos castros. Todavia, a partir de mediados do século I d.C. as

formas pré-romanas de ocupação da paisagem foram dando

progressivamente lugar à instalação de outro tipo de assentamentos (Pérez

Losada 2002). A par do estabelecimento destes novos assentamentos

romanos, que emergem em redor da capital de civitas, está a construção da

rede viária romana e também o aproveitamento intensivo dos recursos.

1.1.4. Visões sobre a “romanização”

Procuraremos também rever e problematizar o conceito de

“Romanização” segundo uma perspectiva pós-colonial, com vista ao

desenvolvimento de leituras alternativas à tradicional ideia de

“Romanização”, através do desenvolvimento de modelos de mudança social

e identitária mais dinâmicos, flexíveis e complexos e que contemplem

também a experiência do “outro” indígena, que será considerado como

agente activo no processo de negociação social, entendido como um

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conjunto de práticas sociais de assimilação e integração de elementos

culturais locais e globais.

Tradicionalmente, a “Romanização” era vista como um processo

unidireccional e unívoco que não contemplava a complexidade da cultura

indígena e a diversidade de contextos e de experiências (Jíménez Díez

2008: 37-57).

Segundo recentes perspectivas, a “Romanização” é percepcionada como

um “sistema estruturado de diferenças” (Woolf 1998: 310), onde as

comunidades indígenas, apesar da sua integração como provinciais dentro

do império Romano, conservam determinadas tradições culturais,

reelaborando-as e adoptando outras, que servem para diferenciá-las do resto

da “população romana” do império, afirmando-se com maior intensidade as

individualidades e dando origem a formas culturais híbridas distintas às pura

e estritamente clássicas, formando-se uma identidade múltipla fruto da

interacção cultural entre indígenas e romanos e não da mera aculturação dos

indígenas (Mattingly 2004).

No seguimento destas ideias desenvolvidas sobretudo por G. Woolf

(1997, 1998) e mediante uma perspectiva de adopção da cultura romana e

de expansão do imperialismo romano num contexto local e global, no sentido

da “romanização” como uma primeira “globalização”, embora persistam

determinados traços culturais locais e regionais, R. Hingley (2005: 47) afirma

que “Becoming Roman in this way allows for both the imperial context of

social change and the local adoption of this identity to co-exist. Influential

people are seen to have been keen to adopt Roman culture because this

helped them to negotiate their own power simultaneously in local and in

imperial contexts. (…) It was also in the interest of the Roman administration

actively to promote the adoption of Roman ways among provincial elites,

because these were the people at the very core of the local self-government

who created the stability of relations that we term the empire of Rome.”

É impossível sustentar a existência de uma cultura romana “standard” e

“superior” adoptada da mesma forma pelas populações conquistadas, sendo

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perceptível no registo arqueológico uma “resistência” à mudança através da

cultura material, que se resignifica através de determinados referentes

identitários, manifestando-se uma forma concreta de estar e de ser no

mundo.

É possível que o processo de interacção cultural entre indígenas e

romanos tivesse permitido que as comunidades indígenas fossem capazes

de se adaptar ao processo de expansão imperial romana aproveitando as

vantagens dos seus novos contextos, nomeadamente através do

desenvolvimento de determinadas aspectos das suas identidades

preexistentes e dos recursos dos seus territórios (Hingley 2005: 102-105).

Estas “experiências discrepantes” (Mattingly 1997) manifestam-se de formas

alheias à identidade romana “standard”, que é central nas narrativas

romanocêntricas (elaboradas a partir de uma perspectiva Romana), dando

conta da diversidade de contextos e de experiências que tiveram lugar por

todo o império. O conceito de experiências discrepantes é aplicado no

sentido de terem havido diferentes respostas e reacções em relação à

cultura romana.

A “Romanização” poderá ser entendida como um conflito entre a tradição

e a modernidade, dando origem a formas culturais híbridas, tal como sucede

em determinadas sociedades pré-modernas e pré-industriais. Neste período

de mudança social e cultural, as comunidades indígenas recorrem a

elementos tradicionais como forma de atenuar o sentimento de ansiedade e

de insegurança ontológica e como uma forma de resistência cultural. Ao

mesmo tempo, a administração romana evitava bastantes custos e esforço

na gestão do território, pelo que é mais que provável que a resistência

directa indígena fosse mínima, embora estando em curso uma gradual

negociação cultural e social. Neste novo contexto, as elites indígenas detêm

um papel fulcral, actuando como intermediárias entre as comunidades

indígenas e a administração romana, sendo esta habilidade social que lhes

confere novas formas e oportunidades de negociação do poder.

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A investigação sobre a “romanização”, particularmente nos séculos XIX e

XX, imbuída por uma visão eurocêntrica e motivada pelos contextos coloniais

modernos, centrou-se em grande medida na premissa determinista de que o

mundo Romano aculturou os povos conquistados e dominados, substituindo

linearmente a cultura nativa pelo modo de vida “superior” e “estandardizado”

romano, sendo que foi amplamente aceite pelos indígenas, pois

supostamente significava paz e progresso, negligenciando-se o complexo

processo de interacção cultural, antes percepcionado em termos de

aculturação entre as populações conquistadas e o império Romano. As

comunidades locais são agentes decisivos neste processo de interacção

cultural entre indígenas e Romanos.

Ainda no período pré-conquista houveram contactos entre indígenas e

Romanos, se bem que mais de índole comercial. No período de conquista as

alianças entre o poder Romano e as elites indígenas foram extremamente

importantes, facilitando a integração das comunidades indígenas dentro do

espaço político romano (Pitillas Salañer 2003). Mesmo após a conquista, no

seio das comunidades locais, continuaram a persistir determinados

elementos culturais precedentes, se bem que já enquadrados num contexto

cultural distinto. Poderá considerar-se o período pós-conquista como uma

época de transição e de fusão cultural, tendo em conta e negociação social e

identitária que tem lugar, sendo, sem dúvida, um período de mudança

estrutural, mas de mudança com recurso à tradição, enquanto noutras zonas

parece que ocorre uma mudança mais profunda e radical, sobretudo visível

nas zonas mineiras, devido à necessidade de se mobilizar mão-de-obra para

as explorações mineiras e também de se criarem as infra-estruturas

adequadas e necessárias (Orejas e Sánchez Palencia 2002). Esta mudança

em forma de continuidade não implica nem a inexistência de qualquer forma

de mudança, nem a perduração mimética das formas culturais precedentes,

embora este processo tenha claramente por base a cultura indígena

(Parcero Oubiña et al.: 247). Com os Flávios parece que efectivamente se

consolida a "romanização" do Noroeste (Carvalho 2008). Mais do que

uniformidade devemos antes falar de diversidade cultural.

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Como alternativa, a “Romanização” poderá ser encarada como um

encontro de tipo colonial e como uma mudança cultural e social segundo um

processo multifacetado e de negociação bidireccional, fruto da complexa

combinação de identidades culturais e não da mera aculturação dos

indígenas por parte de Roma, ocorrendo uma variedade de experiências em

relação ao “ser romano”, pois “ser romano” não significa assimilar um tipo de

cultura ideal e superior, mas antes adquirir uma determinada posição no

complexo sistema de diferenças estruturadas em que residia o poder

romano, sendo que as elites locais criavam através da cultura material a sua

própria versão local da identidade romana (Wells 1999: 119-121).

São bastante interessantes os conceitos de “kitsch” introduzido por A.

González Ruibal (2006-07: 613-615) e de “crioulização” da cultura material

por J. Webster (2001), enquanto leituras alternativas em relação ao

complexo processo de negociação social e identitária através da cultura

material. As sociedades indígenas adoptam a cultura e identidade romana

através da sua adaptação à sua própria cultura e identidade tradicionais,

dando origem a formas culturais e identitárias híbridas.

No entanto, convém ressalvar que, directa ou indirectamente, os

encontros de tipo colonial, embora compreendam uma evidente negociação

social e identitária, também geram situações de tensões, competência social

e conflitos (González Ruibal 2008a). Efectivamente, a expansão de Roma a

partir do século II a.C. pode ter despoletado e acelerado os processos de

“tribalização” das sociedades indígenas, pois este processo é favorecido pela

interacção cultural entres estas últimas e as sociedades estatais (Wells 1999:

116-119), ao qual o próprio processo de “oppidização” não será indiferente.

Por outro lado, não podemos simplesmente negligenciar as complexas

dinâmicas históricas das comunidades autóctones (Martins 1990; González

Ruibal 2006-07), sobretudo tendo em conta que já pelo menos desde o

século V a.C. o Noroeste mantinha relações permanentes de intercâmbio

com o mundo Mediterrâneo e consequentemente uma maior abertura e

predisposição para complexos processos de interacção social e cultural

(González Ruibal 2004).

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O próprio hábito epigráfico, tradicionalmente considerado como um

verdadeiro elemento “romanizador”, parece que se introduz de forma gradual

(González García e Barja de Quiroga no prelo), particularmente em contexto

rural, sendo que a introdução e desenvolvimento da epigrafia está

relacionada com um vocabulário preexistente, onde alguns indivíduos

pretendem marcar as diferenças sociais com o resto da população mediante

a sua individualização, recorrendo a formas tipicamente romanas, como a

epigrafia e o suporte, para acentuar essas diferenças, mas fazendo-o

recorrendo a imagens e por vezes suportes que sejam reconhecíveis e

identificáveis para o resto da população (Rose 2003), mantendo-se também

muitas vezes outros elementos indígenas como a onomástica ou o origo.

1.1.5. Identidade e cultura material

Tendo em conta o exposto anteriormente, consideramos relevante

abordar de forma particular alguns elementos que poderão corroborar a

negociação social e identitária, bem como as formas de apropriação e

transformação da cultura indígena que ocorrem na fase inicial da dominação

romana. Assim, entre muitos outros possíveis, decidimos prestar alguma

atenção à estela do Muiño de San Pedro (Taboada Cid 1988-89) (Figura 14),

à estátua-menir de Chaves (Jorge e Almeida 1980) (Figura 15) e a inscrição

latina gravada na estátua do guerreiro mais monumental do Lesenho (cujo

estudo se encontra em curso) (Figura 16), enquanto elementos que poderão

relacionar-se com um processo de ressemantização de elementos pretéritos

carregados de memória e de tradição num momento onde justamente a

mencionada negociação social e identitária ocorre. Esta reutilização de

determinados elementos do passado carregados de memória e simbolismo

poderá ser encarada como uma forma de legitimação das novas estratégias

de poder.

Tanto a estela do Muiño de San Pedro, como a estátua-menir de Chaves,

poderão tratar-se de elementos reutilizados em época Romana, deixando

agora de lado possíveis reutilizações anteriores. No entanto, são duas

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reutilizações distintas. Em relação ao primeiro, a reutilização materializou-se

através da gravação de uma inscrição latina com nomes indígenas1. No caso

do segundo, a reutilização materializou-se através do seu reaproveitamento

como material construtivo nas obras de construção da ponte romana de

Aquae Flaviae. Todavia, em relação a este último caso, tal trata-se apenas

de uma hipótese, pois não há evidência de que a mesma tenha realmente

sido reutilizada como material construtivo, sendo que apenas sabemos que

apareceu no rio Tâmega, mesmo ao lado da ponte romana.

Figura 14. Estela do Muiño de San Pedro, Verín (em cima: Museo Arqueolóxico Provincial de

Ourense, em baixo: Taboada Cid 1988-89: 88-90).

Partindo então do pressuposto de ambas reutilizações, procuraremos

agora diferenciá-las melhor. Por um lado, a estela do Muiño de San Pedro,

onde se gravou uma inscrição latina como forma de ressemantizar um

elemento pretérito carregado de memória e de simbolismo, comportamento

1 Latroni / us Celt / iati · F(ilius) / H(ic) S(itus) E(st) (Taboada Cid 1988-1989: 81).

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compreensível numa zona rural e onde a componente indígena seria ainda

bastante acentuada (González García 2009b).

Por outro lado, a estátua-menir de Chaves, cuja reutilização, a

comprovar-se o seu reaproveitamento como material construtivo na ponte

romana, representa uma ruptura cultural total, uma damnatio memoriae,

talvez perceptível num local urbanizado e fortemente “romanizado” como

Aquae Flaviae (González García 2009b). É possível que em contextos rurais

e indígenas a povoação ainda poderia atribuir algum significado cultural a

este tipo de elementos pretéritos, enquanto em âmbitos urbanos e

“romanizados” como Aquae Flaviae, este tipo de elementos carecia já de

qualquer valor cultural, pelo que seriam apenas apreciados como material

pétreo (González García 2009b).

Figura 15. Estátua-menir de Chaves (Jorge e Almeida 1980: 16, fig. 7).

Tal como no caso da reutilização da estela do Muiño de San Pedro, o

mesmo poderá ter eventualmente sucedido no caso na inscrição latina

inédita gravada no escudo do guerreiro mais monumental do Lesenho. No

entanto, não nos iremos alongar em demasia em tratar esta questão, pois o

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estudo e contextualização desta inscrição encontra-se em curso. Todavia,

será necessário realçar que é possível que a inscrição se tenha sobreposto à

decoração do escudo.

Figura 16. O guerreiro mais monumental proveniente do Outeiro Lesenho (Museu Nacional de

Arqueologia).

Com a gravação de ambas epígrafes o que se pretendia era

possivelmente marcar as diferenças existentes entre determinados

indivíduos indígenas e o resto da comunidade mediante a sua

individualização numa época de crescente negociação social e identitária.

Para tal, recorreu-se a uma forma cultural romana, a epigrafia, que servia

ainda mais para marcar e reforçar essas diferenças. No entanto, importa

também realçar que ambas inscrições foram gravadas sobre suportes

imbuídos de memória e de simbolismo e que eram reconhecíveis para a

maioria da população indígena, sendo também elementos que

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preteritamente estavam provavelmente associados a uma individualização

de personagens guerreiras.

Os indivíduos gravados na estela do Muiño de San Pedro e no guerreiro

do Lesenho poderão relacionar-se de alguma forma com os “friendly kings”

referidos por alguns autores (Creighton 2006; García Quintela 2002; Wells

1999), sendo que as elites locais parecem expressar o seu status e

identidade através duma simbiose entre elementos locais e elementos

romanos num contexto cultural e social em plena negociação e mudança.

Esta emergente classe aristocrática indígena converteu-se num agente

principal neste processo de negociação social e identitária com o mundo

Romano.

Na estela da Pastoria2 (Rodríguez Colmenero 1997a: 235-236, nº 237)

(Figura 17), por exemplo, ocorre algo semelhante, embora de forma inversa.

Neste caso, num suporte tipicamente romano, uma estela funerária, foi

inscrita uma forma cultural romana, uma inscrição epigráfica, embora se

recorra a um vocabulário visual com umas claras conotações indígenas,

além de que alguns dos antropónimos gravados são indígenas e recorre-se

também ao C invertido como forma de se indicar o origo.

2 Camalus / Borni f(ilius) · / hic situs / est annor(um) / XXX exs C Tardu(m) / frater facie(ndum) / Ael(i)us curavit.

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Figura 17. Estela da Pastoria (Rodríguez Colmenero 1997a: 235-236, nº 237).

Estes elementos corroboram o papel activo da cultura material na

construção e negociação do poder, resultando, por vezes, em materiais

híbridos, particularmente quando as bases de poder estão em plena

transformação, embora se trate de uma transformação dialéctica, onde se

recorre à tradição como forma de resistência cultural à mudança. É possível

que a integração no império das comunidades indígenas se trate antes de

um processo progressivamente assumido mais do que imposto.

1.2. Objectivos concretos

A partir do amplo problema histórico exposto anteriormente, cabe agora

evidenciar a dimensão parcial deste trabalho, especificando-se o que e como

se pretende abordar e analisar em concreto.

O objectivo principal deste trabalho consiste em contrapor dois modelos

de lugar central de âmbito regional: um de época pré-romana, materializado

no Castro do Lesenho (Boticas, Norte de Portugal), e outro de época

romana, consubstanciado em Aquae Flaviae (Chaves, Norte de Portugal),

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com o intuito de se identificarem duas lógicas locacionais distintas, inerentes,

por consequência, a diferentes estruturas culturais e sociais.

Partimos do pressuposto de que a paisagem é um produto sociocultural,

resultante da materialização espacial da acção social sobre o meio natural,

encontrando-se constituída por três dimensões ou níveis distintos: espaço

físico ou natural, espaço social e espaço pensado ou simbólico (Criado

Boado 1993, 1999). A paisagem não é algo eterno e imutável, senão um

produto dinâmico resultante da acção social, que se vai construindo de forma

progressiva e que no presente é o resultado da sobreposição de sucessivas

paisagens. Sem dúvida que as dimensões da paisagem anteriormente

expostas são indissociáveis e complementares, embora nos iremos centrar

em particular no espaço social, mas partindo do espaço físico e terminando

no espaço simbólico.

Deste modo, incidiremos em particular nas condições de localização dos

assentamentos, partindo da ideia de que a localização dos sítios não é

aleatória, senão que obedece a determinados critérios que estão

condicionados por determinados factores locacionais, que procuraremos

quantificar quantitativa e qualitativamente, e motivados por determinadas

decisões sociais (Parcero Oubiña e Fábrega Álvarez 2006). Também

procuraremos incidir nas formas de monumentalização da paisagem, já que

a arquitectura monumental coincide com formas complexas de subsistência

baseadas no acesso diferencial e no controlo de determinados recursos

críticos e na modificação humana do meio, supondo a configuração espacial

dessas mudanças estruturais. Deste modo, procuramos analisar a

complexificação social através da construção monumental, sendo que a

monumentalidade é entendida como uma forma de reprodução social.

Para o presente caso, interessa-nos também definir o que entendemos

por lugar central em época pré-Romana e Romana, consubstanciados,

respectivamente, no Castro do Lesenho e em Aquae Flaviae.

Antes de mais, será conveniente explicitarmos um pouco o conceito de

lugar central. No âmbito dos modelos processuais de análise de

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territorialidade teórica, um dos conceitos que mais aplicabilidade teve em

Arqueologia foi, precisamente, o de Lugar Central. A teoria do Lugar Central

deriva da Geografia Humana, visando a análise da distribuição das

povoações e suas áreas de influência e atracção, que procura explicar a

hierarquização do território através de factores como o tamanho, densidade

e proximidade aos núcleos de povoação e que assume que o mercado

funciona como princípio organizador do território, obviamente monopolizado

pelos núcleos considerados centrais. Esta teoria teve forte aplicação

arqueológica, sobretudo ao nível das sociedades estatais com um forte

componente de mercado e com um desenvolvimento de carácter urbano

acentuado, embora tenham havido diversas tentativas de aplicação desta

teoria a contextos pré-históricos. A crítica mais frequente à aplicação

arqueológica desta teoria centrou-se, como não podia deixar de ser, na

dificuldade de trasladação a sociedades pré-capitalistas e inclusive pré-

históricas de um modelo concebido para analisar a territorialidade da

economia capitalista. A Teoria do Lugar Central está intimamente

relacionada, sobretudo em estudos processuais de análise arqueológica do

território, com o desenvolvimento e aplicação de procedimentos analíticos

como os Polígonos de Thiessen, ou Polígonos Voronoi, utilizados

fundamentalmente para o estabelecimento de áreas teóricas de influência,

nomeadamente as áreas de captação de recursos, de cada assentamento,

unicamente com base à proximidade e à densidade de assentamentos que o

rodeiam, sendo que cada polígono engloba apenas o território que fica mais

perto do seu assentamento do que de qualquer outro, embora sem propor

hierarquias de forma apriorística (García Sanjuán 2005).

Por um lado, Aquae Flaviae é central no sentido de se tratar de um

núcleo administrativo de segunda categoria no âmbito de estrutura de

povoamento romano do Noroeste Peninsular, que concentra (centraliza)

actividades políticas, administrativas, económicas e seguramente também

sociais (residência de “personagens importantes”). A partir da mansio de Ad

Aquas da Via XVII, Aquae Flaviae foi promovida no período flaviano a

Municipium Latinum, convertendo-se na capital regional da Gallaecia

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Meridional Interior, com base no seu carácter de caput viarum e na

interpretação que se faz do significado histórico do Padrão dos Povos de

Aquae Flaviae (Fonte 2006; Pérez Losada 2002; Rodríguez Colmenero

1997a), embora dependente da capital conventual: Bracara Augusta (Figura

18).

Figura 18. Padrão dos Povos de Aquae Flaviae (Museu da Região Flaviense).

Segundo alguns autores (Lemos 1999, 2002; Martins 2000, 2006; Martins

et al. 2005; Morais 2005b), a localização de Bracara Augusta possui uma

óbvia centralidade, quer no contexto mais alargado do conventus

Bracarensis (particularmente na sua metade Ocidental), quer no contexto

mais restrito da região controlado pelos Bracari, entre os vales do Cávado e

Ave, surgindo como epicentro das comunicações para Norte, Sul, Este e

Oeste (Figura 19). Da mesma forma, Aquae Flaviae parece ter também uma

localização bastante central, nomeadamente no que respeita à metade

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Oriental do Conventus Bracarensis, mas também no que refere à sua

envolvente imediata, além de ser também um epicentro viário (Figura 19).

Figura 19. Organização administrativa Romana do Noroeste Peninsular, com a localização de Aquae

Flaviae e Bracara Augusta no contexto do conventus Bracarensis (adaptado de Tranoy 1981).

Por outro lado, o Lesenho é central num outro sentido: trata-se de um

dos oppida descritos anteriormente, sendo um núcleo que concentra

população e, provavelmente, funções específicas, embora ainda não esteja

claro que tipo de “centralidade sociopolítica” possa ter tido, ainda que,

segundo alguns autores (Alarcão 2004; Rodríguez Colmenero 1997) teria

sido a capital de um dos populi/civitates citados por Plínio e Ptolomeu.

Entendemos também como necessária a identificação e explicitação

clara e objectiva da parte metodológica do trabalho, nomeadamente o uso de

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procedimentos analíticos baseados em tecnologias SIG como forma de

abordagem a determinados problemas históricos, sobretudo para evitar que

pareça que o trabalho consiste apenas numa simples e clara comprovação

de algo tão evidente como que o Lesenho e Aquae Flaviae são dois tipos de

assentamento distintos.

É importante insistir em duas coisas: uma, que a intenção principal deste

trabalho é propor e demonstrar metodologias de análise que poderão ser

aplicadas a conjuntos de registo mais amplos e inclusive diferentes; e a

segunda, que é importante tratar de modelizar e objectivar o que parece por

demais evidente, ou seja, expressar de forma contrastável em que consistem

essas evidentes diferenças, neste caso concreto entre a lógica locacional do

Outeiro Lesenho e de Aquae Flaviae, de tal forma que o óbvio (verificar que

são dois sítios distintos) possa ser caracterizado em termos compreensíveis

e objectivos (como e porque são distintos). Claro que em futuros trabalhos,

quando se analisem outros casos de trabalho e conjuntos de registo mais

amplos, as diferenças locacionais podem ou não ser tão óbvias, ou inclusive

pode ser discutível se essas diferenças realmente existem ou não.

1.3. Hipóteses

Partindo dos objectivos anteriormente expostos, serão agora formuladas as

hipóteses concretas de trabalho, ou seja, as perguntas às quais buscamos

uma resposta clara através da análise que nos propomos a realizar.

De partida, serão formuladas duas hipóteses específicas em relação a cada

um dos sítios.

Hipótese 1: a localização e a implantação de Aquae Flaviae está

primordialmente condicionada pela sua posição num lugar de passagem e de

cruzamento de caminhos; secundariamente, pelo seu posicionamento central

num espaço geográfico bem definido que teve dimensão territorial e política.

Partindo do pressuposto do carácter de caput viarum de Aquae Flaviae, a

sua localização estará condicionada pelas vias que entram e saem da cidade

ou estarão antes as vias condicionadas pela localização de Aquae Flaviae?

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Existirão alguns elementos pré-determinantes que condicionaram de alguma

forma a localização de Aquae Flaviae?

Á primeira vista, será de destacar a aparente localização geoestratégica

de Aquae Flaviae, enquanto nó viário, centro político-administrativo,

comercial e de transportes. A via XVII, enquanto via principal que ligava

Bracara Augusta a Asturica Augusta, percorrendo importantes zonas

mineiras, poderá ter determinado e condicionado a localização de Aquae

Flaviae, bem como da restante rede de povoamento satélite. A restante rede

viária é mais provável que tivesse sido condicionada pelo próprio

povoamento, centralizado em torno de Aquae Flaviae (Amaral 1993). A

localização estratégica de Aquae Flaviae, numa confluência fluvial e

terrestre, foi fundamental para o controlo estratégico do hinterland

envolvente, criando-se um verdadeiro lugar central para onde todos os

caminhos convergiam. Sem dúvida que a mineração foi um dos principais

recursos que motivou o florescimento de Aquae Flaviae, onde possivelmente

essa actividade se centralizava, sendo mesmo possível que se tivesse

tratado de uma “civitas mineira” (Lemos e Martins no prelo).

Hipótese 2: Lesenho é uma localização onde a centralidade se

manifesta de outra forma, nomeadamente através da monumentalização, a

defensibilidade e o controlo visual sobre, e não a posição em (como Aquae

Flaviae), lugares de passagem importantes, entendidos como pontos-chave

na paisagem e/ou grandes extensões territoriais. Neste caso, a centralidade

não seria necessariamente espacial, nem implicaria o mesmo tipo de

funções, como no caso de Aquae Flaviae.

Será conveniente recalcar que é possível que tanto o Lesenho como

Aquae Flaviae estejam relacionados com importantes zonas de trânsito,

embora tal seja mais claro em relação a Aquae Flaviae, mas estão-no de

forma distinta, segundo lógicas distintas que se procurarão objectivar através

das metodologias analíticas que nos propomos desenvolver.

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1.4. Apresentação dos casos de trabalho

Procuraremos aqui apresentar de forma genérica o conjunto do registo com

o qual vamos trabalhar para contrastar estas hipóteses, sendo que a

metodologia será tratada e desenvolvida no ponto seguinte.

Os sítios que aqui abordamos, o Castro do Lesenho e Aquae Flaviae,

localizam-se, respectivamente, nos concelhos de Boticas e Chaves e nas

freguesias de S. Salvador de Viveiro e de Santa Maria Maior. Ambos situam-

se no distrito de Vila Real e na província de Trás-os-Montes e Alto Douro no

Norte de Portugal (Figura 20).

Em primeiro lugar, será conveniente indicar a informação de que

dispúnhamos de partida. Possuíamos a cartografia em formato digital à

escala 1:10000 (equidistância de curvas de nível de 5 metros) dos concelhos

de Boticas e de Chaves, bem como os ortofotos, que nos foram gentilmente

cedidos pela Câmara Municipal de Boticas e pela Associação de Municípios

do Alto Tâmega (AMAT), respectivamente. A partir da informação altimétrica

disponível (curvas de nível e pontos cotados) elaboramos o modelo digital de

elevações (MDE), que basicamente trata-se de uma representação digital e

matemática contínua da distribuição espacial das variações altimétricas do

terreno (topografia). Dispúnhamos também de um modelo digital de

elevações do Noroeste Peninsular com 80 metros de resolução3, que

utilizamos para as análises de maior amplitude, como as de visibilidade e as

de mobilidade, enquanto para as restantes análises usamos o modelo digital

descrito anteriormente. A Câmara Municipal de Chaves amavelmente cedeu-

nos a cartografia digital à escala 1:2000 de Chaves, com a qual realizamos o

modelo digital de elevações que ilustra a figura 33.

Adquirimos directamente ao Instituto Geográfico do Exército (IGEOE) o par

estereoscópico do voo USAF de 1958 da envolvente do Lesenho. A Câmara

3 Fonte dos dados topográficos: Shuttle Radar Topography Mission (http://www2.jpl.nasa.gov/srtm/).

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Municipal de Boticas cedeu-nos o levantamento topográfico que realizaram

do Lesenho.

De seguida, procedemos à localização e à delimitação dos dois sítios.

Optámos antes por integrar nas análises a delimitação a mais aproximada

possível dos sítios, mais do que simplesmente localizarmos um simples

ponto, de forma a também obtermos mais rigor nas análises realizadas.

Efectuamos a delimitação (Figuras 22 e 23 e Gráfico 1) dos sítios por foto-

interpretação a partir dos ortofotos de que dispúnhamos. A delimitação do

Lesenho não supôs nenhum problema, já que o delimitamos directamente

pela última muralha do recinto. Já a delimitação de Aquae Flaviae é mais

problemática e complicada, pois desconhecem-se os limites exactos da

cidade romana, pelo que tratou-se forçosamente de uma delimitação

aproximada, sobretudo com base em critérios topográficos e também pela

distribuição e concentração dos vestígios arqueológicos de época alto-

imperial (Carneiro 2003, 2005, 2009; Rodríguez Colmenero 1997b; Silva et

al. 2006-07).

Todos os trabalhos analíticos, que em seguida se detalham, foram

realizados e implementados no software ArcGIS 9.2 da ESRI

(http://www.esri.com/), mediante licença institucional do CSIC.

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Figura 20. Localização do Castro do Lesenho e de Aquae Flaviae no contexto do Noroeste Peninsular.

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Figura 21. Perfil topográfico entre o Lesenho e Aquae Flaviae.

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Figura 22. Delimitação do Lesenho sobreposta ao ortofoto (59_2).

Figura 23. Delimitação de Aquae Flaviae sobreposta ao ortofoto (34_3).

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Gráfico 1. Superfície aproximada do Lesenho e de Aquae Flaviae.

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2. METODOLOGIA E DESENVOLVIMENTOS

Neste ponto, procuraremos entrar plenamente no trabalho analítico realizado

para abordar os objectivos concretos anteriormente expressos, através da

contrastação das hipóteses definidas e usando o registo descrito. Trata-se

de apresentar a metodologia e o procedimento de análise que foi

desenvolvido, bem como os resultados obtidos.

Os estudos da dimensão espacial e territorial em Arqueologia

experimentaram uma forte evolução durante os últimos trinta anos, sendo

que neste momento é algo que está plenamente estabelecido e que foi

adquirindo uma tremenda complexidade, sobretudo com a aplicação e

desenvolvimento de novas tecnologias como os SIG, as quais oferecem uma

grande capacidade analítica, não se limitando ao mero armazenamento de

dados geográficos (García Sanjuán 2005).

As primeiras aplicações analíticas dos SIG à Arqueologia remontam aos

finais dos anos setenta do século passado (García Sanjuán 2005), embora

sejam totalmente excepcionais. Durante a década de oitenta desse mesmo

século, em países como os Estados Unidos da América, Canadá e Inglaterra

os SIG aparecem sobretudo ligados à análise preditiva de sítios

arqueológicos no contexto da protecção e gestão patrimonial. Nos inícios da

década de noventa os SIG começam a generalizar-se em muitos países,

embora ainda em circuitos relativamente limitados (García Sanjuán 2005).

Nos finais da década de noventa e inícios do século XXI assiste-se a uma

verdadeira revolução em todos os âmbitos: investigação, gestão,

administração, universidades e empresas. Assim, ainda que desde há já

algum tempo os SIG sejam rotineiramente utilizados em Arqueologia, a

generalização do uso destes recursos é relativamente mais recente. Estas

tecnologias inovadoras supuseram uma verdadeira revolução no estudo e na

percepção do território, uma vez que permitem a obtenção de uma série de

dados e informações que escapam à simples observação, muitas vezes

subjectiva e desacertada.

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Nos finais dos anos oitenta assistiu-se a uma mudança na concepção do

registo arqueológico. Este deixou de estar apenas centrado no sítio

arqueológico em si, passando a conceber-se a uma escala superior,

convertendo-se a paisagem no objecto a partir do qual se constrói o próprio

registo. A paisagem é encarada como um produto sociocultural criado pela

objectivação no meio da acção social, resultante da simbiose entre o meio

físico e a presença humana, tal como preconiza a chamada Arqueologia da

Paisagem (Criado Boado 1993, 1999). Por sua vez, a Arqueologia da

Paisagem está intimamente associada aos conceitos de Paisagem Cultural e

de Património Cultural, relacionados com a construção antrópica da

paisagem. O Património Cultural está relacionado com os produtos da

actividade humana e respectivas evidências sobre um determinado território,

quer intencionais quer involuntárias, tangíveis e intangíveis, consequência de

processos históricos e sociais. A Paisagem Cultural relaciona-se com o

resultado da acção das actividades humanas sobre um determinado espaço,

sendo uma realidade complexa, integrada por componentes naturais e

culturais, tangíveis e intangíveis.

A análise da territorialidade implica um necessário e prévio

reconhecimento do território que forneça os dados necessários para a

análise e interpretação territorial, mantendo, por isso, uma relação estreita e

sequencial (García Sanjuán 2005). Deste modo, e como em qualquer

disciplina científica, a recolha e preparação dos dados precede a análise e

interpretação dos mesmos.

2.1. Análise locacional

Em primeiro lugar, será realizada uma análise locacional individual e

comparativa entre ambos os sítios, com base nas seguintes variáveis:

visibilidade, que diz respeito ao domínio visual sobre a envolvente;

acessibilidade, que se refere às condições de mobilidade entre um povoado

e a sua envolvente e altitude relativa, que nos permite aproximar ao grau de

proeminência de um sítio desde a sua envolvente (visibilização). Algumas

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destas variáveis serão combinadas entre si e outras aprofundadas em mais

detalhe. Tomamos por base os trabalhos desenvolvidos por C. Parcero

Oubiña (2000, 2002) e P. Fábrega Álvarez (2004). Este procedimento

analítico encontra-se bem sistematizado em Parcero Oubiña e Fábrega

Álvarez 2006.

O objectivo fundamental da análise locacional reside na tentativa de

propor uma resposta coerente a partir de critérios quantificáveis a uma

pergunta elementar: porque os sítios estão onde estão? Tem por base uma

estratégia comparativa que visa discriminar as semelhanças e as diferenças

da lógica locacional de um determinado grupo de sítios, procurando detectar

as variáveis locacionais mais significativas e não uma reconstrução positiva

das estratégias de povoamento e das condições originais de cada sítio. A

análise locacional é uma forma concreta de se tentar objectivar a localização

dos sítios que, por sua vez, responde a determinadas decisões sociais,

partindo-se do pressuposto de que há uma série de critérios que

condicionam essas decisões e determinados factores que concretizam essas

decisões. A partir da análise é teoricamente possível aproximarmo-nos a

essas questões sociais e culturais. No entanto, as decisões locacionais não

têm porque ser evidentes nem directamente inferíveis, embora obviamente

seja necessário partir-se de um determinado modelo teórico, procurando

aprofundar-se em que medida determinadas decisões locacionais priorizam

uns critérios sobre outros, através de uma análise comparativa com vista a

se determinarem e quantificarem as variáveis mais significativas. O fim

último é a aproximação a mais fundamentada possível ao tipo de estratégias

e decisões sociais que estão por detrás da eleição de determinados sítios,

percepcionando sempre a paisagem como uma realidade multidimensional.

Para este caso, procuramos ter em conta as mesmas variáveis para os dois

sítios, de forma a partirmos de uma aproximação comparativa, com vista à

análise das condições potencias que podem ter influenciado a localização

dos sítios, sendo que o que se pretende é avaliar a variabilidade mais do que

uma reconstrução positiva dessas condições (Parcero Oubiña e Fábrega

Álvarez 2006).

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2.1.1. Visibilidade

A análise de visibilidade é um dos mais fortes contributos e mais

recorrentes que os SIG prestaram aos estudos de paisagem, pois as ideias

de visibilidade e intervisibilidade sempre foram importantes nas análises e

interpretações arqueológicas (Wheatley e Gillings 2002), sobretudo no que

diz respeito aos estudos de Arqueologia Espacial e de Arqueologia da

Paisagem.

Através de um simples algoritmo, e tendo como base um Modelo Digital

de Elevações (MDE), os SIG permitem realizar cálculos de visibilidade a

partir de um determinado ponto considerado como ponto de observação,

permitindo discriminar entre zonas vistas e não vistas (cálculos binários onde

os pixéis assinalados pelo valor 1 correspondem às áreas visíveis desde o

ponto a partir do qual se realizou o cálculo de visibilidade e os assinalados

por 0 correspondem às zonas não visíveis desde esse ponto), posto que um

cálculo de visibilidade é a soma de linhas de visibilidade adjacentes que

formam a totalidade da área em torno ao ponto de observação (Zamora

Merchán 2008). Também é possível incluir parâmetros adicionais como

podem ser a altura do observador e do observado, o ângulo de visão, entre

outros. Os tipos de cálculo de visibilidade mais utilizados no software ArcGIS

são o Line of Sight (intervisibilidade) e o Viewshed (campo de visão), se bem

que este último pode ter diversas variantes, como por exemplo Multiple

Viewshed, Cumulative Viewshed e Gradient Viewshed. Já antes do

aparecimento dos meios informáticos se havia tratado o tema da visibilidade,

particularmente ao nível da análise processual de territorialidade teórica

(García Sanjuán 2005), embora sem a precisão e detalhe agora alcançados.

Como já foi referido, a análise de visibilidade diz respeito ao cálculo, a

partir de um determinado local, do domínio visual sobre a envolvente, pelo

que se procurará avaliar se realmente a visibilidade foi um factor

determinante para a eleição de ambos sítios. Consideramos a visibilidade de

duas formas distintas: uma quantitativa, referente ao cálculo das superfícies

visíveis desde cada sítio e outra qualitativa, relativa à disposição espacial

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dessas superfícies em torno aos sítios (Parcero Oubiña e Fábrega Álvarez

2006: 76).

Em primeiro lugar, a partir da delimitação de cada local, optámos por

calcular a visibilidade a partir da área de cada um e não apenas a partir de

um ponto na zona mais elevada. O primeiro cálculo consistiu na

determinação das superfícies visíveis desde ambos sítios (Figura 24).

Procuramos também quantificar esse cálculo (Gráfico 2).

Figura 24. Cálculo de visibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae.

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Gráfico 2. Quantificação da visibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae.

Através de uma rápida análise da figura e do gráfico é possível verificar

que o Lesenho possui um espectro visual bastante mais amplo do que

Aquae Flaviae, além de que a visibilidade parece estar bastante distribuída a

nível territorial, ao contrário de Aquae Flaviae, cuja visibilidade parece estar

claramente focalizada numa zona concreta.

O anterior poderia ser bastante óbvio simplesmente com visitar ambos

sítios e observar a paisagem, mas é possível efectuarem-se mais coisas

para além de se determinar o que se vê e o que não se vê, sendo um

exemplo o que a seguir detalhamos. Assim, de forma a se pormenorizar um

pouco mais a análise e a se discriminar e avaliar os distintos padrões de

controlo visual sobre a envolvente, optámos por dividir a visibilidade em

quatro intervalos de distância consecutivos: um intervalo imediato de 800

metros, definido a partir de critérios de visibilidade directa; um intervalo de

larga distância de 20 quilómetros e dois intervalos intermédios arbitrários, um

de 2 e outro de 5 quilómetros. Procuramos também expressar de forma

quantificável estes intervalos de visibilidade (Gráfico 3).

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É possível verificar que a curta e a média distância (buffer de 800, 2000 e

5000 metros) Aquae Flaviae possui mais controlo visual do que o Lesenho,

enquanto a longa distância (buffer de 20000 metros) a situação inverte-se,

ou seja, o Lesenho possui um controlo visual superior a Aquae Flaviae. Esta

diferença é bastante interessante, pois os diferentes tipos de controlo visual

sobre a envolvente imediata opõem-se à quantidade de território controlado

visualmente, além de indicarem diferentes padrões de visibilização: o

Lesenho vê-se de muitos sítios e a larga distância, pelo que se trata

claramente de um referente visual a larga distância. É necessário evidenciar

que o controlo visual a larga distância está bastante condicionado pela

capacidade perceptiva do ser humano, enquanto a percepção que se tem de

um sítio a larga distância pode resultar num factor mais significativo.

Gráfico 3. Visibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae por intervalos (buffer de 800, 2000, 5000 e

20000 metros).

2.1.2. Acessibilidade

Entendemos por acessibilidade as condições de mobilidade entre um

povoado e a sua envolvente, tendo em conta a distância e as características

da superfície em causa (Fábrega Álvarez 2004: 16-19). Para este caso, o

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cálculo de acessibilidade centrou-se prioritariamente na avaliação da

potencialidade defensiva dos povoados com base na inacessibilidade dos

mesmos e também como se orienta o movimento em direcção à envolvente,

embora também possa ser aplicado para se analisar a conexão com a

potencialidade produtiva da envolvente.

Para o cálculo de acessibilidade, derivamos do modelo digital de

elevações os mapas de fricção (que define a rugosidade do terreno e os

diferentes níveis de resistência ao movimento, pois, por exemplo, é bastante

mais difícil atravessar declives acentuados e mesmo cruzar rios e são

justamente esses factores que procuramos ter em conta) e de custo (que

traduz o esforço que implica o movimento, sendo que a distância e a

direcção do movimento não são os únicos factores que implicam esforço no

movimento, mas também a própria fricção do terreno), para os quais se

tiveram em conta como elementos principais os declives e a orientação dos

mesmos, calculados a partir do algoritmo isotrópico proposto por Tobler

(1993). Adicionalmente, incorporou-se à análise a imagem completa da rede

hidrográfica da zona, com a finalidade de definir os rios como áreas

bloqueadas para a mobilidade, basicamente para evitar que os caminhos

coincidam com os rios. O mapa de fricção, em formato raster, foi calculado a

partir da soma dos declives com o traçado dos rios, já depois de os rios

terem sido definidos como áreas restringidas à mobilidade. Para calcularmos

o mapa de custo, também em formato raster, definimos como variáveis os

seguintes elementos: o modelo digital de elevações, o mapa de fricção, a

orientação dos declives e uma tabela definida a partir de um algoritmo

isotrópico de Tobler (1993) relacionado com o ângulo e o sentido do

movimento, ou seja, consideramos que pode influir no movimento a

topografia do terreno, os declives e a orientação dos mesmos e também o

ângulo e o sentido do movimento, além da rede hidrográfica, já que

“bloqueamos” os rios para que a mobilidade não coincida com essas zonas.

No final e a partir do mapa de custo, reclassificamos o mesmo em isocronas

de tempo (de 7,5, 15, 30, 45 e 60 minutos), entendendo as isocronas como

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linhas que unem pontos à mesma distância temporal e definindo-se como

velocidade média de deslocação de um ser humano 5 km/h.

Como em relação ao cálculo anterior, procuramos expressar esta

variável de forma quantificável (Gráfico 4).

Gráfico 4. Quantificação da acessibilidade do Lesenho e Aquae Flaviae por intervalos de tempo

(isocronas de 7,5’, 15’, 30’, 45’ e 60’).

Através da análise do gráfico, verificamos claramente que, em qualquer

um dos intervalos de tempo definidos, Aquae Flaviae é bastante mais

acessível em relação à envolvente do que o Lesenho, que, por sua vez,

privilegia a inacessibilidade sobre a envolvente como uma variável locacional

bastante marcada. Nas figuras 25 e 26 expressamos de forma gráfica a

acessibilidade de ambos locais e na figura 26 comparamos também de forma

gráfica a acessibilidade dos dois sítios.

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Figura 25. Acessibilidade do Lesenho (isocronas de 7,5’, 15’, 30’, 45’ e 60’).

Figura 26. Acessibilidade de Aquae Flaviae (isocronas de 7,5’, 15’, 30’, 45’ e 60’).

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Figura 27. Comparativa entre a acessibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae.

De forma a analisarmos o incremento da superfície acessível entre os

intervalos de 7,5 e de 60 minutos, optámos por calcular a proporção desse

incremento. Este cálculo permite comparar a situação dos povoados em

relação à superfície acessível imediata (isocrona de 7,5 minutos) e à

superfície que se estende para além das proximidades dos povoados

(isocrona de 60 minutos) (Fábrega Álvarez 2004: 19). Para tal, dividimos a

superfície acessível ideal da isocrona de 7,5 pela de 60 minutos, sendo o

resultado do incremento de 64. De seguida, dividimos a superfície real de

acessibilidade das isocronas de 7,5 e de 60 minutos de cada povoado. Deste

modo, se o incremento for superior a 64 supõe uma melhoria das condições

de acessibilidade do povoado à medida que nos afastamos e, pelo contrário,

se for inferior a 64, as condições de acessibilidade são bastante piores à

medida que nos afastamos, priorizando antes a acessibilidade imediata

(ibid.). Optámos também por quantificar esta variável (Gráfico 5).

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Gráfico 5. Incremento da acessibilidade do Lesenho e de Aquae Flaviae entre os intervalos de 7,5’ e

60’.

Verificamos através da análise do gráfico que Aquae Flaviae prima a

acessibilidade à sua envolvente imediata (isocrona de 7,5 minutos) com

respeito à sua envolvente mais ampla (isocrona de 60 minutos), já que

apresenta valores abaixo de 64, enquanto o Lesenho valoriza antes a

inacessibilidade à sua envolvente imediata (isocrona de 7,5 minutos) com

respeito à sua envolvente mais ampla (isocrona de 60 minutos), pois

apresenta valores acima de 64.

O Lesenho encontra-se numa zona naturalmente inacessível e à medida

que nos afastamos surgem terrenos com mais acessibilidade, sendo que em

relação a Aquae Flaviae ocorre justamente o contrário, o que revela dois

processos distintos: um que prima a inacessibilidade à envolvente imediata

(Lesenho) e outro que prima a acessibilidade à envolvente imediata (Aquae

Flaviae).

2.1.3. Altitude Relativa

Escolheu-se este indicador como uma forma de nos aproximarmos ao

grau de proeminência e de destaque visual (visibilização) dos povoados, pelo

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que a intenção principal é avaliar e comparar a relação altimétrica entre cada

povoado e respectiva envolvente (Parcero Oubiña e Fábrega Álvarez 2006:

77). Assim, decidimos determinar os alcances dessa relação,

nomeadamente através de definição de três intervalos de curta, média e

larga distância: 800, 2000 e 20000 metros.

Recorremos a dois tipos de cálculos: altitude relativa tipificada (= altitude

máxima do povoado – altitude média da envolvente / desvio padrão) e

altitude relativa ponderada (= altitude máxima do povoado – altitude média

da envolvente / altitude média da envolvente) (Fábrega Álvarez 2004: 23-24).

A principal diferença entre uma e outra reside no facto de que a primeira

(altitude relativa tipificada) tem em conta as irregularidades do terreno e a

frequência e variabilidade das mesmas (desvio padrão) (Figura 28).

Figura 28. Duas situações diferentes de proeminência de um ponto em relação à sua envolvente,

sendo que em ambas o valor da média ponderada é o mesmo, mas o da média tipificada é diferente

para cada caso, além de que o valor de altitude relativa no gráfico de baixo é mais baixo porque o

desvio padrão tem um valor mais elevado, pois há diferenças de altitude mais acentuadas (Fábrega

Álvarez 2004: 24, fig. 11).

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De forma a melhor expressarmos os resultados dos referidos cálculos,

decidimos quantificar os resultados (Gráficos 6, 7 e 8).

Gráfico 6. Comparativa entre a altitude relativa tipificada do Lesenho e Aquae Flaviae.

Mediante a análise do gráfico, verificamos que a proeminência do

Lesenho é relativamente regular, não havendo grande disparidade entre os

valores a curta (buffer de 800 metros) e a longa distância (buffer de 20000

metros), onde mantém um destaque visual bastante assinalável. Pelo

contrário, a proeminência de Aquae Flaviae é bastante mais desigual, pois a

curta distância destaca visualmente, enquanto a longa distância a

proeminência é mesmo negativa.

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Gráfico 7. Altitude relativa ponderada do Lesenho por intervalos (buffer de 800, 2000 e 20000 metros).

Gráfico 8. Altitude relativa ponderada de Aquae Flaviae por intervalos (buffer de 800, 2000 e 20000

metros).

Os resultados expressos pelos dois gráficos anteriores permitem-nos

complementar os resultados do gráfico 6. Podemos verificar que o Lesenho

tem um claro destaque a longa distância (buffer de 20000 metros) e que vai

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diminuindo à medida que nos aproximamos. Aquae Flaviae, por seu lado,

revela uma situação completamente contrária, já que tem algum destaque a

curta distância (buffer de 800 metros), enquanto a longa distância o ressalte

visual é já negativo.

Os resultados da altitude relativa complementam, e mesmo reforçam, os

resultados anteriormente apresentados de visibilidade e de acessibilidade, já

que a significação territorial de Aquae Flaviae está claramente relacionada

com a sua envolvente imediata, o que se ajusta bastante ao carácter

histórico de nó viário que Aquae Flaviae possuiu, enquanto a significação do

Lesenho está muito mais condicionada pela relação com a sua envolvente

mais alargada. Aquae Flaviae é um referente territorial imediato, ao passo

que o Lesenho é um referente a larga distância.

2.2. Mobilidade Potencial

A mobilidade é uma característica inerente ao ser humano, que percebe

e se desloca. Estas acções constituem, essencialmente, a forma que adopta

o ser humano de relacionar-se com o meio, compreendendo-o,

conceptualizando-o e intervindo sobre o mesmo.

Os estudos de mobilidade, da mesma forma que os de visibilidade, têm

já alguma tradição nos estudos arqueológicos, se bem que só recentemente

se prestou real valor à questão, pois a incorporação de tecnologias SIG

reforçou claramente a sua relevância nos estudos territoriais, já que tornou

possível a realização de estudos detalhados relacionados com as limitações

naturais de circulação (Fábrega Álvarez e Parcero Oubiña 2007; Llobera

2000).

Aproximações mais tradicionais à mobilidade, como a análise das redes

de comunicações e caminhos históricos, consideram o movimento em si

como um factor secundário, importando antes a existência positiva das

evidências materiais de mobilidade. O caso do estudo das vias romanas, que

tem já uma longa tradição, é paradigmático, sendo que na maior parte das

vezes os estudos são realizados sem o recurso a uma base cartográfica

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mínima e onde o importante é definir-se o traçado correcto e principal das

vias, sem muitas vezes se terem em conta outro tipo de aspectos também

eles bastante relevantes. Deste modo, a arqueologia centrou-se,

tradicionalmente, num aspecto concreto da mobilidade: a sua materialização,

cujo referente mais directo são os caminhos. Estes podem existir como

consequência de decisões mais ou menos conscientes e, por exemplo,

enquanto muitos caminhos são produto da fricção do ser humano no seu

incessante movimento, outros, pelo contrário, são projectos minuciosamente

desenhados. É bastante provável que, em muitos casos, os caminhos das

sociedades pré-industriais se tenham materializado quase de forma

inconsciente e que aquelas decisões que afectaram a sua materialização

apenas se tenham ido adoptando à medida que se reafirmou o seu traçado.

Todavia, em muitos casos, particularmente em contextos pré-históricos,

esta materialização da mobilidade não pode ser documentada pelo registo. A

análise da relação entre o registo e a estrutura potencial de um território

oferece-nos uma alternativa que possibilita uma aproximação ao tema da

mobilidade em contextos pré-históricos. Trata-se de uma aproximação que

não é recente nem original, tendo sido impulsionada com a incorporação de

novas tecnologias (SIG) e renovada com novas propostas teórico-

metodológicas como a que aqui nos ocupa.

A análise que propomos não pretende reconhecer a rede viária da área

estudada, mas antes analisar a relação existente entre um conjunto de

localizações e a sua proximidade a zonas com maior ou menor

potencialidade para fazer permeável o território.

A análise da mobilidade potencial é um interessante complemento às

análises locacionais descritas anteriormente. A variável mobilidade será

abordada a uma escala essencialmente geral, procurando aproximarmo-nos

ao facto de ambos sítios estarem ou não relacionados com zonas de trânsito

natural.

Em termos metodológicos, a proposta de partida do nosso estudo

baseia-se na possibilidade de nos aproximarmos à análise das formas de

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mobilidade através dos processos de simulação que permitem as

ferramentas SIG. Esta ideia baseia-se numa trajectória, já bastante assente,

de análise da mobilidade por meio de SIG, o que constitui uma das linhas

mais frutíferas de aplicação à análise arqueológica deste tipo de ferramentas

(como Llobera 2000; Fairén Jiménez 2004; Grau Mira 2004). Estas

aproximações fundamentam-se na determinação dos factores físicos que

condicionam o movimento, concretizados nas noções de fricção (a maior ou

menor dificuldade que diferentes partes do terreno oferecem ao movimento)

e custo (o esforço necessário para movimentar-se entre dois pontos tendo

em conta a distância linear que os separa e a fricção do terreno). Os

modelos mais recorrentes para a determinação da fricção e do custo

consistem em considerar que a rugosidade do terreno (declives) e os cursos

de água são os factores mais influentes e, além disso, os mais acessíveis a

uma consideração quantitativa.

No nosso caso, para analisar a mobilidade através de ferramentas SIG,

recorremos a dois tipos de análises concretas: caminhos óptimos (shortest

path) e ao chamado MADO – Modelo de Acumulación del Desplazamiento

Óptimo (Fábrega Álvarez 2006). Os caminhos óptimos, que normalmente

são um cálculo que está disponível em qualquer pacote de software SIG,

representam simplesmente as linhas que unem dois ou mais pontos (um

ponto de origem e um ou mais pontos de destino) pelo traçado mais fácil, isto

é, o mais acessível em termos de custo de mobilidade. O cálculo do MADO é

baseado em modelos hidrológicos (Fábrega Álvarez 2006), sendo uma

determinação similar aos caminhos óptimos, com a diferença essencial de

que não tem em conta os pontos de destino. O que faz é revelar as linhas de

trânsito natural a partir de um ponto de origem dado e sem um fim

determinado, definindo uma rede hierárquica de movimento natural. Ambas

determinações são o resultado da combinação de duas variáveis essenciais

para a determinação de mapas de custo: distância e fricção do terreno. A

diferença é que os caminhos óptimos são linhas que unem dois pontos

predefinidos, enquanto no MADO as linhas partem de um ponto predefinido

mas não procuram chegar a nenhum destino concreto, senão simplesmente

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recorrer às zonas pelas quais resulta mais fácil “naturalmente” movimentar-

se.

A partir do modelo digital de elevações do Noroeste derivaram-se os

mapas de fricção e de custo, para os quais se tiveram em conta como

elementos principais os declives e a orientação dos mesmos, calculados a

partir do algoritmo isotrópico proposto por Tobler (1993). Adicionalmente,

incorporou-se à análise a imagem completa da rede hidrográfica da zona,

com a finalidade de definir os rios como áreas bloqueadas para a mobilidade,

basicamente para evitar que os caminhos coincidam com os rios. O mapa de

fricção, em formato raster, foi calculado a partir da soma dos declives com o

traçado dos rios, já depois de os rios terem sido definidos como áreas

restringidas à mobilidade. Para calcularmos o mapa de custo, também em

formato raster, definimos como variáveis o modelo digital de elevações, o

mapa de fricção, a orientação dos declives e uma tabela definida a partir de

um algoritmo isotrópico de Tobler (1993) relacionado com o ângulo e o

sentido do movimento.

De forma a analisarmos a estrutura potencial do território ao nível da

mobilidade, distribuímos de forma automática (através do software) uma

série de pontos aleatórios (50) pelo terreno e, desde cada um,

determinamos, a partir do mapa de custo, os caminhos naturais em termos

de esforço, utilizando, para tal, o cálculo explicitado anteriormente (MADO).

No entanto, não é possível localizar as zonas de cruzamento mais

reincidentes a partir da referida hierarquização. Neste sentido, as zonas de

cruzamento são também pontos-chave para entender uma rede de

comunicação. Um cálculo simples que nos permite reconhecer estas

situações é o de densidade viária. Trata-se de localizar as zonas nas quais

existem muitas possibilidades potenciais para ser atravessadas, ou para

onde convergem muitas linhas de mobilidade (zonas de cruzamento). Desta

forma, isolamos os valores mais altos de densidade viária da zona, que

classificamos em três categorias: 1, 2 e 3, sendo esta última (3) a que

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representa os valores mais altos de densidade (aquelas zonas que

potencialmente representam uma maior intensidade de cruzamentos).

Figura 29. Cálculo de densidade viária, onde é possível constatar a localização de Aquae Flaviae numa zona

de alta densidade viária.

Parece claro que a mobilidade, entendida como uma componente

fundamental na estruturação do território, foi um factor locacional bastante

mais determinante para Aquae Flaviae do que para o Lesenho. A análise de

densidade viária (Figura 29), realizada a partir de um cálculo de MADO,

corrobora o carácter histórico de caput viarum que Aquae Flaviae ostentou.

Por outro lado, a própria passagem da Via XVII deverá ter condicionado

sobremaneira a localização de Aquae Flaviae, tanto mais que Ad Aquas era

uma mansio da referida via, à qual não terá sido indiferente o seu carácter

natural de nó viário e a possível relevância histórica do local. O traçado da

Via XVII parece ter estado determinado por outros factores que não

simplesmente os de mobilidade natural (no sentido de implicar menor esforço

e custo de movimento). É provável que estivesse condicionado por

determinados elementos, nomeadamente a passagem por determinadas

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zonas mineiras. A coincidência entre o traçado da Via e o caminho óptimo

calculado entre Bracara Augusta e Aquae Flaviae é apenas relativa (Figura

30).

Figura 30. Cálculo de caminho óptimo e comparação com o traçado da Via VXII entre Bracara Augusta e

Aquae Flaviae.

Por último, consideramos que seria interessante comparar, a nível

percentual, as linhas de MADO com a superfície visível calculadas a partir do

Lesenho e de Aquae Flaviae, de forma a avaliarmos se o controlo visual das

linhas potenciais de mobilidade foi ou não um critério locacional decisivo

para a implantação de ambos sítios. Assim, como no caso da análise de

visibilidade, recorremos de novo à definição de quatro intervalos: um de curta

distância de 800 metros, dois intermédios de 2000 e 5000 metros e um

último de longa distância de 20000 metros. De novo, optámos por expressar

de forma quantificável os resultados (Gráficos 9, 10, 11 e 12).

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Gráfico 9. Percentagem de linhas MADO que são visíveis desde o Lesenho (buffer de 800, 2000, 5000

e 20000 metros).

Gráfico 10. Percentagem de visibilidade desde o Lesenho (buffer de 800, 2000, 5000 e 20000 metros).

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Gráfico 11. Percentagem de linhas MADO que são visíveis desde Aquae Flaviae (buffer de 800, 2000,

5000 e 20000 metros).

Gráfico 12. Percentagem de visibilidade desde Aquae Flaviae (buffer de 800, 2000, 5000 e 20000

metros).

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Mediante a observação e exame dos gráficos anteriores, pode-se

constatar que esta análise não é demasiado significativa, particularmente em

relação ao Lesenho, já que relativamente a Aquae Flaviae permite-nos

reforçar a hipótese de que o controlo visual a curta (buffer de 800 metros) e

média distância (buffer de 2000 e 5000 metros) é efectivamente intenso,

diminuindo bastante a larga distância, o que complementa a própria análise

de visibilidade que apresentamos previamente. Todavia, será de destacar a

relevância metodológica desta análise, que em determinados casos pode

revelar situações bastante interessantes.

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3. CONSEQUÊNCIAS

Para terminar, torna-se necessário sintetizar tudo o que foi previamente

apresentado, propondo-se uma interpretação dos resultados do trabalho

realizado em função dos pressupostos de que partíamos.

Além disso, consideramos também necessário perspectivar este trabalho

em termos de continuidade, pois tendo em conta que um TIT se entende

como uma introdução à investigação e a uma carreira de investigador, trata-

se agora de mostrar em que direcções futuras é possível dar continuidade ao

trabalho realizado, de forma a seguir contribuindo aos objectivos gerais e ao

amplo problema histórico de que partimos no início.

Deste modo, a partir dos resultados apresentados e do próprio processo

de análise realizado, podemos extrair as seguintes observações como forma

de resumo genérico.

A nível metodológico, a principal observação está relacionada com as

possibilidades analíticas e interpretativas que as tecnologias geo-espaciais

nos oferecem, tendo em conta que os SIG nos proporcionam uma forma de

representar e modelizar a realidade, além de nos permitirem analisar

grandes conjuntos de informação e de constituírem uma boa ferramenta para

se extrair dos nossos dados elementos de trabalho diferentes e válidos.

Consideramos que os indicadores que utilizamos nas análises foram

bastante satisfatórios, já que nos permitiram atingir os objectivos a que

inicialmente nos propusemos, bem como contrastar e complementar as

hipóteses de que inicialmente partíamos. No entanto, em futuros trabalhos,

além destes indicadores, pensamos que será interessante introduzirem-se

novas variáveis e aprofundarem-se outras, como por exemplo a mobilidade,

desenvolvidas e aplicadas em relação a conjuntos de registo mais amplos,

de forma a se avaliar quais os factores locacionais mais relevantes na

localização dos sítios.

Da possível interpretação dos resultados deste trabalho, cabe destacar a

caracterização em termos mensuráveis e comparativos de dois modelos

locacionais distintos, que obedecem a diferentes decisões culturais e sociais,

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além de constituírem diferentes formas de assentamento e de centralidade

espacial, embora ambos se tivessem constituído como centros a partir dos

quais se dirigiu a exploração económica e a ordenação política da paisagem

em épocas distintas. Por outro lado, foi possível distinguir determinadas

nuances e diferenças importantes que, por simples “lógica”, não pareciam

tão evidentes.

O primeiro modelo locacional, materializado no Lesenho, caracteriza-se

por possuir um amplo espectro visual, sobretudo a larga distância, não

havendo convergência visual sobre uma zona concreta, além de também ser

um sítio bastante visível desde a envolvente. Caracteriza-se, também, por

apresentar uma inacessibilidade bastante acentuada, sobretudo em relação

à sua envolvente imediata, tendo também um destaque visual bastante

marcado, em particular a larga distância. Estas características combinam-se

com uma forte artificialização do Lesenho, visível, sobretudo, na profunda

monumentalização das estruturas defensivas e da própria estatuária de

guerreiros. Maximizam-se, claramente, as componentes de visibilidade, no

sentido de ver e ser visto, particularmente a larga distância, de

inacessibilidade e de monumentalidade, sendo através destas características

territoriais que se expressa a centralidade do Lesenho na paisagem (Figuras

31 e 32).

Num recente trabalho que realizamos e que se encontra no prelo (Fonte

et al. no prelo b), abordamos a análise territorial do médo vale do rio Ave,

centralizado pela Citânia de Briteiros. Constatamos que o controlo territorial

deste oppidum converge para o vale do Ave, corredor natural de circulação,

e para a Serra da Cabreira, barreira natural que divide o Entre Douro e

Minho e Trás-os-Montes Ocidental. É também um sítio bastante proeminente

na paisagem e de acessibilidade condicionada. Esta localização contrasta

claramente com o vicus das Taipas, que se situa bastante próximo de

Briteiros e no mesmo vale, embora já condicionada pela proximidade à rede

viária Romana. No entanto, a lógica locacional e a estrutura formal de

Briteiros é bastante diferente da do Lesenho, o que nos pode estar a indiciar

a variabilidade cultural e regional do processo de “oppidização” e mesmo do

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de “romanização”, quando comparada com a localização dos núcleos

romanos.

Os oppida ocupam posições proeminentes e destacadas na paisagem,

com ampla visibilidade sobre o território, especialmente a larga distância,

além de serem lugares bastante conspícuos, com escassa acessibilidade e

bastante visíveis desde a envolvente, visibilidade que é reforçada pelas

criações monumentais artificiais, devido aos acusados declives que rodeiam

os povoados, onde os factores locacionais mais decisivos passam a ser os

estratégicos, sendo que a proximidade aos terrenos com melhores aptidões

produtivas deixa de ser um factor locacional importante, o que contrasta com

a concentração populacional que ocorre nos oppida (Parcero Oubiña et al.

2007: 221).

Este processo de “oppidização” originou um processo de modificação

das formas de estruturação da paisagem, desenvolvendo-se agora um

modelo de paisagem mais complexo e hierárquico, onde os oppida passam a

ser elementos centrais a nível territorial. Os factores de localização descritos,

aliados aos também já referidos processos de concentração populacional,

contrastam com uma exploração intensiva da envolvente, sendo um primeiro

indício de algum tipo de estruturação territorial em torno dos mesmos, pelo

que certamente existiriam alguns assentamentos secundários dependentes

dos oppida (Parcero Oubiña et al. 2007: 222-223), além de que se situam

geralmente de forma equidistante entre si, o que parece indicar uma

processo de polarização e de estruturação supra-local das redes de

povoamento (Silva 2007). Evidentemente que os oppida não são povoados

orientados à auto-suficiência, pois o equilíbrio entre a povoação e a

capacidade produtiva da envolvente é claramente desigual, acelerando-se o

risco de complexificação e de hierarquização social.

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Figura 31. Representação tridimensional da localização do Castro do Lesenho através da elevação do

ortofoto a partir do modelo digital de elevações.

Figura 32. Em cima: Reconstituição ideal do Lesenho (desenho: Anxo Rodríguez Paz); em baixo à

esquerda: levantamento topográfico do Lesenho (Câmara Municipal de Boticas); em baixo à

direita: recorte da fotografia aérea (8814) do voo USAF de 1958 do Lesenho (Instituto Geográfico

do Exército).

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O segundo modelo locacional, materializado em Aquae Flaviae, define-se

por possuir uma visibilidade muito mais convergente e intensa sobre uma

zona concreta, neste caso particular sobre a depressão tectónica Régua-

Verín-Chaves, via natural de circulação Sul-Norte, além de ser um sítio

bastante visível a curta e média distância. É também um local amplamente

acessível, primando o acesso à sua envolvente imediata, parecendo

concentrar linhas de mobilidade, o que se adequa bastante ao carácter de

caput viarum que Aquae Flaviae ostentou, além de que o controlo visual

sobre as linhas potenciais de mobilidade natural centra-se a curta e a média

distância. Apresenta uma proeminência visual bastante desigual, destacando

particularmente a curta distância, sendo a visibilização a longa distância

praticamente nula. Neste caso, parece antes nitidamente valorizar-se a

acessibilidade e controlo visual sobre zonas concretas relacionadas com a

mobilidade, além de o destaque visual se centrar também a curta distância, o

que pode estar a indicar que a centralidade de Aquae Flaviae se manifesta

de uma forma distinta e mesmo contraposta relativamente ao Lesenho. A

localização de Aquae Flaviae é mais significativa em relação à envolvente

imediata, o que pode corroborar o seu carácter de nó viário, que favoreceu

que Aquae Flaviae se convertesse num importante núcleo urbano de cariz

regional dentro do aparelho estatal Romano, onde se concentraram diversas

funções de tipo específico (Figuras 33 e 34).

Por outro lado, a centralidade de Aquae Flaviae, e das cidades romanas

em geral, era também reforçada pela arquitectura pública monumental e pelo

urbanismo (e também pela religião e o imperador), que serviu para colocar

Roma e o Império Romano no dia-a-dia das comunidades provinciais,

reproduzindo o poder, a ideologia e a cultura da sociedade Romana (Revell

2009).

O povoamento romano, particularmente o relacionado com os núcleos

urbanos e os aglomerados secundários, parece que se situa

sintomaticamente em lugares preferentes de controlo das vias terrestres e

das rotas marítimo-fluviais, visando o controlo dos nós estratégicos de

comunicação, constituindo uma nova lógica de economia de mercado,

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visando a organização, controlo e exploração intensiva do território e dos

recursos. Há uma correlação bastante evidente entre as novas formas de

povoamento romano e a estrutura viária. Muitos povoados fortificados

mantêm-se ocupados até finais do século I d.C. devido ao facto de a sua

localização geo-estratégica ter servido necessidades no âmbito da nova

matriz de povoamento, em particular de controlo da rede viária (Martins et al.

2005). Alguns destes povoados fortificados são transformados em

aglomerados secundários romanos (vici), como, por exemplo, o Castro de

Alvarelhos (Trofa), Monte Mozinho (Penafiel) ou Monte Padrão (Santo Tirso),

enquanto outros transfiguram-se mesmo em cidades, como Tongobriga

(Marco de Canavezes). Os povoados fortificados que se encontram mais

afastados destas novas dinâmicas, vão sendo paulatinamente abandonados

e substituídos por povoados romanos de nova fundação, criando-se novas

centralidades e uma nova organização da paisagem (Carvalho 2008).

Significativamente, esta situação é acompanhada pelo desaparecimento na

epigrafia do C invertido na transição do século I para o II d.C. (González

Ruibal 2006-07).

Deste modo, é possível que estes diferentes modelos de mobilidade e de

controlo territorial se correspondam também com distintos modelos

locacionais e, consequentemente, com distintas formas de estruturação

territorial e social.

Estes diferentes modelos locacionais poderão corresponder-se com

distintos contextos culturais e com distintas formas de organização territorial

e sociopolítica em época pré-Romana (fase final da Idade do Ferro) e

Romana (alto-imperial), além de constituírem diferentes modelos de

centralidade espacial provavelmente consecutivos. É provável que o

Lesenho, que até aí desempenhou um papel fundamental na estruturação

sociopolítica indígena, tenha perdido essa importância à raiz do

reordenamento territorial introduzido pela administração romana, onde

assumem particular importância as capitais de civitates e os novos centros

urbanos, sobretudo os que assumem estatuto municipal com os Flávios,

como Aquae Flaviae.

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Contudo, mais que um todo homogéneo com uma evolução unilinear,

devemos antes contemplar uma multiplicidade de experiências históricas

particulares a diferentes escalas antes e depois da chegada de Roma

(González Ruibal 2006-07: 328-349).

Figura 33. Representação tridimensional da localização de Aquae Flaviae através da elevação do

modelo digital de elevações.

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Figura 34. Representação tridimensional da localização de Aquae Flaviae através da elevação do

ortofoto a partir do modelo digital de elevações.

No entanto, será necessário ter-se em conta outro tipo de factores que

possam ter influenciado a localização dos sítios. Em relação a Aquae

Flaviae, é possível que a sua localização esteja também condicionada por

determinados factores preexistentes, como poderão ser os depósitos do

Bronze Final - colar articulado e bracelete em ouro (Cardoso 1944) (Figura

35) e da Segunda Idade do Ferro - torques em ouro (Cardoso 1942, 1965)

(Figura 36), pela estátua-menir de Chaves (Jorge e Almeida 1980) (Figura

15) e até pela própria relevância termal do sítio, que já desde época pré-

histórica poderá ter exercido bastante interesse e atracção. Em Bracara

Augusta, por exemplo, coloca-se a hipótese de a colina da cividade, onde se

implantou a cidade romana, ter sido em época pré-romana um local “neutral”,

comunitário e simbólico, de agregação e de interacção entre comunidades,

ao qual a sua localização geoestratégica também não terá sido alheia, assim

como não parece ter sido alheia a implantação da posterior cidade romana

(Lemos 1999, 2007-08; Lemos et al. no prelo; Morais 2005a). No entanto, tal

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como no caso de Bracara Augusta (Martins 2000), não há qualquer evidência

que suporte a existência de um povoado fortificado da Idade do Ferro na

colina onde posteriormente se implantou Aquae Flaviae. Os elementos

supracitados parecem antes indiciar que se trataria de um outro tipo de sítio,

que não de âmbito habitacional.

Figura 35. Colar articulado e bracelete em ouro aparecidos no Alto da Pedisqueira, Chaves (Cardoso

1944, figs. 3 e 2).

Figura 36. Um dos torques de Codeçais do “tipo flaviense” aparecidos na Veiga de Chaves (Cardoso

1965, est. III, nº2).

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Num recente artigo, A. Rogers (2008) tenta explorar diferentes

alternativas para se percepcionar a implantação de algumas cidades

romanas no Reino Unido e de que forma essa implantação pode ter sido

influenciada pela significação de determinados locais religiosos na Idade do

Ferro. Considera que podem ter havido diversos factores que influenciaram a

implantação das cidades romanas, embora pondere que determinados

factores simbólicos preexistentes e a importância, por exemplo, das

nascentes termais, não devem ser negligenciados ou considerados menos

relevantes que os factores estratégicos.

Em relação ao Lesenho, cuja cronologia ocupacional pode ter-se iniciado

no Bronze Final (com base em algumas cerâmicas que apareceram

descontextualizadas), é possível que o facto de constituir um verdadeiro

monumento natural, sendo um lugar altamente visível, com um perfil

extremamente característico e rochedos naturalmente monumentais, possa

também ter sido um factor relevante para a eleição do sítio, tornando-se num

referente lugar mnemónico e de tradição com uma topografia mítica

partilhada (Bradley 2000), embora faltem ainda os dados necessários que

corroborem ou não esta possibilidade. Tanto o Lesenho como a envolvente

próxima possuem alguns locais com arte rupestre, que podem ter funcionado

como uma forma de marcar de forma “especial” esse local.

A confirmar-se o início da ocupação do Lesenho no Bronze Final, é

possível que fosse coetâneo com um depósito de lanças em bronze

encontradas em Lamachã (Montalegre), local bastante próximo do próprio

Lesenho (Santos Júnior 1968) (Figura 37).

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Figura 37. Depósito de lanças em bronze de Lamachã (Vilaça 2006: 79, fig. 38).

Claro que é difícil analisar-se de que forma estes factores foram realmente

relevantes ou não, pois é bastante complicado quantificar e objectivar tais

elementos, além de também ser necessário avaliar se realmente se tratam

de factores complementares ou alternativos, embora em jeito de hipótese

nos pareça que são complementares.

Todavia, pensamos que pode tratar-se de uma forma de complementar e

enriquecer a nossa leitura, mas também como uma forma de fornecer uma

outra via interpretativa à análise que realizamos. Este tipo de elementos

acima enunciados podem existir em muitos sítios, mas tanto Aquae Flaviae

como o Lesenho estão onde estão possivelmente pela convergência dessas

razões com outras, que são as que nos propusemos analisar.

Citando a Giddens (1995: 11), “in non-capitalist societies everyday life

was geared to tradition, with time experienced as part of the re-enactment of

traditional practices”, pelo que elementos culturais como a tradição e a

memória teriam no seio das sociedades pré-industriais uma clara relevância

social e simbólica. Em períodos de transição social, neste caso entre o final

da Idade do Ferro e início de época Romana, o recurso à tradição e à

memória poderá ter significado um meio de resistência cultural, associada a

formas de reutilização e de resignificação de elementos pretéritos imbuídos

de memória e de simbolismo, num contexto de interacção cultural e de

negociação social e identitária e de “experiências discrepantes” (Mattingly

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1997, 2004) num âmbito local e global (Hingley 2005). Gera-se um conflito

entre a tradição e a modernidade, dando origem a produtos culturais

híbridos, onde cada vez mais o “indivíduo” se procura reafirmar num contexto

de mudança social, sendo o imperialismo Romano um processo dialéctico,

nada homogéneo e estático, onde tanto indígenas como romanos são

agentes activamente envolvidos. Como afirmaram Gosden e Lock (2003: 79)

“Becoming Roman is not just about adopting novel forms of material culture

and architecture; it is also concerned with manipulating links with the past.

The emphasis in debates about Romanization has been on adoption of the

new and the giving up of heeold identities. As we hope to have shown,

change in the first few centuries A.D. was not just about taking up new ways,

but also maintaining old ones, which have new powers and significances.

This is not to say that, the more things changed, the more they stayed the

same, but rather to argue that social power derived not just from taking up

newly Romanized ways, but through strategic links to older forms of

genealogy and their expression through the landscape. The villa-house at

Alfred's Castle symbolises the complex links between ancient and modern

involved in becoming Roman.”.

Para finalizar, torna-se necessário perspectivar este trabalho em termos

de continuidade, especificamente através da sua contextualização dentro de

um programa de investigação mais amplo, nomeadamente a análise das

paisagens de poder e das dinâmicas sociais e territoriais ocorridas nos finais

da Idade do Ferro e inícios de época Romana, centrado especificamente na

área Meridional do Noroeste Peninsular, onde tem lugar o processo de

“oppidização” e onde ocorrem complexas políticas de contacto cultural, em

particular com o mundo Mediterrânico, que irá constituir o meu futuro

projecto de doutoramento. Obviamente que este trabalho trata-se de um

ponto de partida, mas que tem associada uma lógica de continuidade e de

desenvolvimento e alargamento da área de trabalho e dos objectos de

estudo.

Por último e perspectivando já um futuro projecto de investigação,

consideramos que o trabalho analítico realizado se ajusta perfeitamente à

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análise das problemáticas históricas que abordamos na primeira parte, uma

vez que encaramos a dimensão territorial como fundamental para se

extraírem daí possíveis interpretações de âmbito sociopolítico, económico e

cultural, pois, além de se descrever e analisar intuitivamente os

assentamentos e o território, é necessário analisar-se a variabilidade

segundo uma perspectiva potencial e não reconstrutiva, procurando-se

avaliar se as diferenças locacionais entre determinados assentamentos

correspondem realmente a diferentes modelos culturais e sociais.

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