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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA DEPARTAMENTO DE LETRAS E PEDAGOGIA – DLP Pós-Graduação Mestrado em Ciências da Linguagem Campus de Guajará-Mirim (RO) Hildeniza Castro da Silva Furtado LEVANTAMENTO DE LEXIAS CARACTERÍSTICAS DOS FALARES DO GUAPORÉ, COM ESPECIAL MENÇÃO DOS POSSÍVEIS BANTUÍSMOS. Guajará-Mirim/RO 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA DEPARTAMENTO DE LETRAS E PEDAGOGIA – DLP

Pós-Graduação Mestrado em Ciências da Linguagem Campus de Guajará-Mirim (RO)

Hildeniza Castro da Silva Furtado

LEVANTAMENTO DE LEXIAS CARACTERÍSTICAS DOS

FALARES DO GUAPORÉ, COM ESPECIAL MENÇÃO DOS

POSSÍVEIS BANTUÍSMOS.

Guajará-Mirim/RO 2009

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Hildeniza Castro da Silva Furtado

LEVANTAMENTO DE LEXIAS CARACTERÍSTICAS DOS FALARES DO GUAPORÉ, COM ESPECIAL MENÇÃO DOS

POSSÍVEIS BANTUÍSMOS.

Dissertação apresentada ao Curso de

Ciências da Linguagem da Universidade Federal

de Rondônia (UNIR) como requisito parcial para

Obtenção do título de Mestre em Ciências da

Linguagem – Etnolinguística Africanista.

Orientadora: Profª.Pós Drª Geralda Angenot-de Lima

Guajará-Mirim/RO 2009

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Copryight by Hildeniza Castro da Silva Furtado. Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução total ou parcial desta dissertação, desde que citada a fonte,

devendo ser comunicado tal ato à Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR,

Campus de Guajará-Mirim ou pelo endereço eletrônico [email protected].

Catalogação Biblioteca do Campus de Guajará-Mirim/UNIR.

FURTADO, Hildeniza Castro da Silva

Levantamento de lexias características dos falares

do Guaporé, com especial menção dos possíveis bantuísmos.

- Guajará-Mirim, RO: [s.n.], 2009

Orientadora: Profª Pós- Drª Geralda de Lima V. Angenot.

Dissertação (mestrado) – Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR,

Campus de Guajará-Mirim, 2009.

1. Vale do Guaporé 2. Quilombolas 3. Bantuísmos

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Esta dissertação foi aprovada pela banca examinadora e julgada suficiente como um

dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Ciências da Linguagem, opção

Etnolinguística Africanista, e aprovada em sua forma final pelo programa de Pós-

Graduação em Ciências da Linguagem da Fundação Universidade Federal de Rondônia.

Guajará-Mirim, 28 Fevereiro de 2009.

Prof. Pós Dr. Jean- Pierre Angenot Coordenador do Curso de Mestrado

Do Campus de Guajará-Mirim

BANCA EXAMINADORA

Profª Pós-Drª Geralda de Lima V. Angenot____________________________________ Orientadora e Presidente da Banca Universidade Federal de Rondônia

Profª Pós-Drª Katherine Bárbara Kempf______________________________________ Membro da Banca Universidade Federal de Rondônia Prof Pós-Dr.Daniel Mutombo Huta-Mukana__________________________________ Membro Externo Institut Supériour Pédagogíque Université de Mbujimayi R.D.Congo Prof. Pós Dr. Jean-Pierre Angenot__________________________________________ Suplente Universidade Federal de Rondônia

Guajará-Mirim/RO 2009

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Dedicatória

Dedico este trabalho a meu Pai:

Almembergue Miguel da Silva (in memorian).

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SUMÁRIO

DEDICATÓRIA........................................................................................ v SUMÁRIO..................................................................................................vi RESUMO...................................................................................................vii ABSTRACT..............................................................................................viii ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS UTILIZADOS.............................................................................................ix Introdução....................................................................................................x CAPÍTULO I – HISTÓRICO – CULTURAL

1. A colonização do vale do Guaporé.................................................11 1.1 A presença dos negros na Amazônia..................................................14 1.1.1 A escravidão dos negros......................................................................18 1.1.2 A saída dos brancos de Vila Bela da Santíssima

Trindade condiciona o apogeu dos negros.................................22 2. Quilombolas do Guaporé: um pouco de cultura..........................24

2.1 A Festa do Divino: um pouco de história...........................................25 2.1.1 A Festa do Divino........................................................................26 2.1.2 Alguns cânticos para receber o divino......................................28 2.2. A dança do chorado.....................................................................29 2.3 Festa de São Benedito....................................................................30 2.4 Festa do Congo...............................................................................30 2.5 Festa das Três Pessoas

CAPÍTULO II – LEVANTAMENTO DOS DADOS 1. Os dados...........................................................................................31 2. Os informantes................................................................................32 3. Análise dos dados............................................................................33 3.1 Corpus Levantado..........................................................................34

3.2Quadros Específicos......................................................................127 a) Prováveis Lexias Africanas.........................................................127 b)Lexias encontradas no Guaporé que não estão inclusas nos dicionários pesquisados..............................................128 c) Lexias encontradas no Guaporé e no dicionário de bantuísmos........................................................130

3.3 Expressões Encontradas.............................................................130 3.4 Os dados levantados e a relação de referência Para os pretos do Guaporé...............................................................130 Considerações Finais.........................................................................132 Bibliografia.........................................................................................134

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RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo principal fazer um levantamento das lexias

específicas do falar das comunidades quilombolas1 do Vale do Guaporé. Essas

comunidades apresentam características idiossincráticas significativas, porque são

formadas pelos descendentes de negros, escravos e libertos, que contribuíram à

povoação do Vale durante o período colonial e imperial, em conflito ou em convivência

com os Ameríndios da região. Assim, principiamos o nosso trabalho por um esboço da

contextualização histórica e cultural relacionada a presença negra na Amazônia,

focalizando Vila Bela e em particular o Vale do Guaporé, área de nossa pesquisa. Para

fazer o levantamento dos dados, recorremos principalmente aos conhecimentos de

pessoas mais antigas e detentoras da cultura, tais como as benzedeiras, rezadeiras, etc .

Coletamos uma lista de lexias e expressões de provável origem bantu, algumas dessas

lexias já conhecidas em outras comunidades rurais de afro-descendentes, outras em todo

o Brasil e algumas sobre as quais nada encontramos como informações nos materiais

pesquisados.

Palavras-chave: Vale do Guaporé – quilombolas - bantuísmo

1 Conforme o uso do termo atualmente aceito de “quilombola”, cf. o artigo de Valdélio Santos Silva, Afro-Asia nº 23, 2000, Salvador, Ufba, Rio das Rãs à luz da noção de quilombo.

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ABSTRACT

The purpose of the current essay is to present a survey and a preliminary analysis of the

lexies which are specifics of the maroon communities of the Guaporé Valley; these

communities, formed by descendants of black people, former slaves or not, present

significant idiosyncratic characters, because they developed during the colonial and

imperial period, and populated the Valley, conflicting or living in peace with the

Amerindians. First we present the historical and social context of Black Amazonia,

focalizing Vila Bella and the Guaporé Valley, where we worked out our survey. Our

informants were the ancients of the communities, like “benzedeiras” and “rezadeiras”

(healers). We collected lexies and expressions of probable Bantu origin, some of them

yet collected in other afro-brazilian rural communities, others yet belonging to

Vernacular Brazilian Speech, and some of them unknown by dictionaries and other

available sources of informations about Vernacular Brazilian Speech.

Keywords : Guaporé Valley – maroon communities - bantuism

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ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS UTILIZADOS Afr. – africana Cf. – conforme CONAq – Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais

Quilombolas.

Contrv. - controvérsia IBDF – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal Ior. – Ioruba Lat.- Latim Orig. – origem Pl. – plural PPB – Português Popular Brasileiro

Prov. – provavelmente PVB – Português Vernacular Brasileiro Quicg. – quicongo Quimb.-Quimbundo Regr. Regra Tb. – também Voc. – vocativo

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Introdução A presente pesquisa tem por objetivo um levantamento das lexias regionais

usadas nas comunidades de quilombolas2 do Vale do Guaporé; essas comunidades

apresentam características idiossincráticas significativas, porque são formadas pelos

descendentes de negros, escravos e libertos, que contribuíram à povoação do Vale

durante o período colonial e imperial, em conflito ou em convivência com os

Ameríndios.

A pesquisa foi realizada com benzedeiras, rezadores e antigos moradores do

Vale do Guaporé que hoje residem em Guajará-Mirim. A variedade do português

popular brasileiro (PPB) falado se coaduna com o PPB do Mato Grosso, seguindo a rota

dos bandeirantes3; no entanto, os africanos e descendentes de africanos traziam consigo

a herança de diversas línguas maternas – africanas – (em particular as línguas bantu),

que eram faladas por eles; esta herança se manifesta mais claramente no léxico; por

isso, faz-se necessário identificar a origem (etimológica) dos bantuismos atestados na

variedade dialetal do português falada pelos afro-descendentes conhecidos como

quilombolas do Vale do Guaporé, no Estado de Rondônia, até então nunca levantados,

contribuindo assim a um dicionário etimológico de afro-brasileirismo.

No primeiro capítulo, abordaremos a colonização do Vale do Guaporé, falando

da contextualização histórica, já que Portugal procurava assegurar a posse da região, até

chegar ao processo de abandono da região e os negros firmarem sua presença no Vale,

não havendo necessidade dos mesmos se esconderem em áreas menos acessíveis. Esse

momento da história condiciona a saída dos brancos de Vila Bela da Santíssima

2 Conforme o uso do termo atualmente aceito de “quilombola”, cf. o artigo de Valdélio Santos Silva, Afro-Asia nº 23, 2000, Salvador, Ufba, Rio das Rãs à luz da noção de quilombo. 3 Os quais, segundo Heitor Megale, de fato falavam galego-portugês, o que explicaria algumas das peculiaridades deste PPB.

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Trindade para um novo momento: o apogeu dos negros. Abordaremos as festas que são

de suma importância para manter a identidade negra do Vale, viva até hoje. Não

esquecendo que hoje, em Guajará-Mirim, existe um número significativo de pessoas

oriundas do Guaporé em Geral e em particular de Vila Bela. Famílias inteiras foram se

deslocando aos poucos até Guajará, trazendo consigo a Festa do Divino, as benzedeiras

e rezadores, suas histórias e seu sotaque. O que justifica, nesse primeiro momento, uma

pesquisa em Guajará.

No segundo capítulo, faremos uma abordagem das lexias levantadas, onde nós

referimos ao Dicionário de Bantuísmos de Jean Pierre Angenot e Geralda de Lima V.

Angenot, e aos dicionários Aurélio e Houaiss. As verificações nos levaram a quadros

específicos como: as lexias encontradas somente no Guaporé, as que são prováveis

africanas conforme os dicionários consultados, as que encontramos somente nos

dicionário Aurélio e Houaiss e as expressões que fazem parte do dia-a-dia dos

informantes. Essas lexias e expressões é que dão vida ao conhecimento que eles detêm.

E, finalmente, as considerações finais, que apontam para a necessidade de se

fazer pesquisas de cognatos para podermos colaborar a um dicionário etimológico do

português.

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CAPÍTULO I: HISTÓRICO-CULTURAL

1. A Colonização do Vale do Guaporé: Contextualização História

"Quem disse que não somos nada, que não temos nada para oferecer? Repare nossas mãos abertas, trazendo as ofertas do nosso viver".

(Refrão de uma música cantada na dança do Congo)

A história de Vila Bela tem causado muita curiosidade entre os pesquisadores,

porque a historiografia mato-grossense reserva pouco espaço para Vila Bela, conhecida

como "a cidade do ouro, das ruínas e das negras finas4".

A coroa portuguesa começou a se embrenhar na selva Amazônica pelos vales do

Madeira - Mamoré- Guaporé. Essa região seria utilizada como um elo entre as colônias

do sul e do extremo norte. Para assegurar a posse sobre a região do Vale do Guaporé

fez-se necessário a entrada dos bandeirantes e a presença militar assegurada pelas

construções militares. No entanto, o principal motivo para a ocupação dessa região foi a

descoberta de ouro no rio Cuiabá.

Para que a ocupação do Vale fosse estável era considerado necessário o

aprisionamento de índios e negros. Os bandeirantes viviam em permanente conflito com

os índios e castelhanos que queriam ocupar a região do oeste para leste. Assim,

4 Esta frase foi retirada do site www.vilabelamt.com.br . A autoria não está especificada.

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D.Antônio Rolim de Moura recebe a incumbência de tomar posse da região disputada e

povoar o Vale do Guaporé, sendo necessário, então, criar a capitania de Mato-Grosso.

Para assegurar a presença portuguesa e facilitar a coleta de impostos, Vila Bela da

Santíssima Trindade foi escolhida capital da província de Mato-Grosso, garantindo

então o povoamento da região. Desde então, ficou conhecida como “a cidade do ouro,

das ruínas e das negras finas5”.

Vila Bela não foi escolhida por acaso para ser a capital. Levou-se em conta o seu

ponto estratégico, seu relevo plano era apropriado para uma boa defesa militar, novas

jazidas auríferas eram descobertas, enfim, o rio Guaporé favorecia o acesso fluvial, por

isso a necessidade de construções militares. Essas construções serviriam para

estabelecer divisas e garantir a retirada do ouro que ali era encontrado em abundância.

O grande problema era abastecer a nova capital, já que os produtos vindos da capitania

de São Paulo ficavam muito caros, tendo em vista o percurso a ser enfrentado. A

solução foi a criação da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, com sede

em Belém, que atingiria a região guaporeana navegando pelos rios componentes da

bacia Amazônica – Amazonas, Madeira e Guaporé. Por ali entravam alimentos, roupas,

instrumentos de trabalho e escravos africanos.

Para aumentar a exploração do ouro, os mineradores compravam escravos, que com

o passar do tempo morriam por causa das endemias, e os que não eram afetados pelas

doenças sumiam no meio da mata sem deixar vestígios. Os escravos fugidos

aquilombavam-se ao norte das minas e muito deles iam para a banda dos vizinhos

castelhanos (atual Bolívia). A coroa sentia a necessidade de aumentar a produção do

ouro e os bandeirantes juntavam-se para capturar os foragidos. Os bandeirantes

matavam quem resistisse e destruíam tudo que encontravam em sua frente. A rota e a

5 Conforma nota 3 da página 10.

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captura eram por: Galerinha, Taquaral, Piolhinho e Pedras Negras. Os bandeirantes

contavam com a ajuda do próprio quilombola que fora aprisionado e sob tortura – como

colocar a mão na madeira em brasa – diziam a localização dos negros foragidos. Os

negros ainda enfrentavam os cabixis, porque muitas mulheres dos cabixis eram

roubadas pelos africanos e crioulos. O Vale do Guaporé tornou-se o palco de uma

guerra em prol do ouro.

A produção do ouro entra em declínio no Mato-Grosso em 1734. Na ocasião da

descoberta do ouro a cidade de Vila Bela ficou conhecida como “campos d’ouro”, aos

poucos foi deixando de ser “campos d’ouro” e passou a ser apenas um vale. O Vale do

Guaporé foi sendo abandonado e por não se erguerem cidades ao redor tudo foi sendo

esquecido. Os mineradores que ali se instalaram procuraram regiões mais ricas. Ficaram

no Vale somente negros libertos que vivam em situações de abandono.

Vila Bela da Santíssima Trindade foi resistente, desbravada, edificada, cultivada.

Suas grandes construções em pedra canga foram fruto da sagacidade e tenacidade de um

povo que não esmoreceu, que lutou e luta até hoje para sobreviver e expressar o seu

direito de ser negro.

Aos negros que para lá foram levados negou-se tudo, como por exemplo, o nome de

origem; os patrônimos foram atribuídos conforme a posição ou ocupação de cada

família na comunidade; escolhidos também conforme eles prestavam serviço à igreja

Católica.

Quando Vila Bela foi “abandonada” em 1820, e quase perdeu sua qualidade de

município em 1878, ficaram apenas as pessoas que não tinham para onde ir. Nesse

contexto nasce uma comunidade que até hoje é resistente e fiel aos seus antepassados.

Maria de Lourdes Bandeira, analisando documentos oficiais e relatos, mostra que

praticamente durante100 anos (1860-1960) Vila Bela foi exclusivamente negra.

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Hoje existe em Guajará-Mirim uma comunidade significativa de pessoas oriundas

do Guaporé em geral, e em particular de Vila Bela. Como já frizamos, famílias inteiras

foram se deslocando aos poucos até Guajará, trazendo consigo a Festa do Divino, as

benzedeiras e rezadores, suas histórias e seus sotaques.

Em se tratando da história dos negros do Vale do Guaporé é necessário abordar

ainda dois temas importantes e que muitas vezes são ignorados, tantos pelos

pesquisadores como pela população em geral:

1.1 A presença dos negros na Amazônia

A Amazônia é conhecida muitas vezes apenas como o berço da cultura indígena

do país, no entanto, a presença dos negros em algumas partes de sua região é

significativa. Negros e índios muitas vezes em briga, e outras tantas vezes juntos, fazem

parte dessa história. Além do aprisionamento dos índios, houve a escravidão dos negros,

cujos descendentes até hoje vivem nesta região. Mas por que falar da presença dos

negros na Amazônia? Porque fazem parte da nossa história; porque ajudaram a formar a

cultura diversificada que temos aqui; e porque encontrei perguntas como: “... E

existiram quilombos na Amazônia? Não eram apenas índios?”. Em vista a tantos outros

questionamentos convem afirmar que é real a presença dos negros na Amazônia. Pois

isso não são fatos apenas, são histórias do Guaporé e que estão vivas até hoje.

A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais

Quilombolas (Conaq), estima que existam cerca de mil comunidades quilombolas na

Amazônia, sendo que o Pará concentra 335 delas e o Maranhão 535. São números que

muitos ignoram.

A história procurou ignorar a presença do negro na Amazônia, inclusive suas

relações com os índios. Apenas alguns historiadores afirmam a entrada dos negros pelos

portos de São Luís e Turiassú, no Maranhão e em Belém (PA), vindos principalmente

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da atual Guiné, Angola, Congo e Moçambique. Eles afirmam que os negros entraram na

Amazônia por volta de 1755 com a criação da Companhia Geral do Grão Pará e

Maranhão.

No estado de Rondônia a presença negra se manifesta através de três

comunidades ainda pouco entrosadas: (a)os remanescentes quilombolas do Guaporé,

com muitos membros estabelecidos hoje na cidade de Guajará-Mirim; (b) os

descendentes afro-caribenhos de Barbados e Granada, que se concentram em Porto-

Velho; e (c) os migrantes negros de todo o país que se fixaram principalmente na BR

Porto-Velho – Vilhena.

No Vale do Guaporé encontramos três comunidades de remanescentes

quilombolas: Santo Antônio do Guaporé, Pedras Negras e Senhor Jesus, sendo esta

última localizada às margens do rio São Miguel, afluente do Guaporé. A Vila de Santo

Antônio localiza-se, atualmente, em áreas da Reserva Biológica do Guaporé, enquanto

Pedras Negras situa-se na área da RESEX Estadual de Pedras Negras e Senhor Jesus

ocupa uma área tomada por fazendas e confinada com a REBIO Guaporé. Todos os

povoados são constituídos por uma população negra descendente dos antigos

quilombolas locais, abundantes na região. Essas áreas passaram a ser citadas, nos relatos

de viajantes de quilombos desmantelados ao longo do Guaporé, notadamente nas

proximidades de Vila Bela, antiga capital local.

As populações de Santo Antônio, Pedras Negras e Senhor Jesus foram

constituídas a partir de pequenos grupos quilombolas, formados por escravos que

trabalharam na construção do Real Forte Príncipe da Beira a partir de 1783; de

foragidos que escaparam à destruição dos quilombos do Piolho (Quariterê), Joaquim

Teles, Mutuca, ou ainda, de negros provenientes de quilombos instalados nos territórios

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castelhanos, situados à margem esquerda do Guaporé e que retornaram aos territórios

portugueses, após a progressiva saída dos brancos da região.

A presença dos quilombolas às margens do Guaporé pode ser explicada a partir

do processo de abandono da região pelas elites brancas. Não havendo mais necessidade

de esconderem-se em áreas menos acessíveis, as populações quilombolas da região do

Riozinho e do São Miguel, afluentes do Guaporé, mudaram-se para as suas margens,

tornando-se visíveis e estabelecendo-se como pequenos proprietários, agricultores,

extrativistas, dando origem ao povoado de Santo Antônio. Pedras Negras constituiu-se

originalmente em área de um destacamento militar colonial, e era famoso por sua

insalubridade e enorme distância de qualquer outro centro de ocupação colonial. Em

meados do séc. XIX, os negros ocuparam progressivamente o espaço abandonado pelos

brancos, tornando-se a única população brasileira a residir na região e garantir a

integridade das fronteiras diante dos vizinhos de origem castelhana. Senhor Jesus é

resultado da penetração quilombola pelos afluentes do Guaporé, resultado da fuga dos

negros que buscavam se proteger dos Capitães-do-Mato e, mais tarde da busca por áreas

de exploração da borracha e da poaia, sob menor competição do que às margens do rio

Guaporé, ou ainda, em função do desmantelamento de comunidades negras situadas nas

áreas onde o IBDF fundou, na década de 1980, a REBIO Guaporé.

No final do séc. XIX, essas populações negras vinculavam-se ao município de

Vila Bela da Santíssima Trindade, também marcado pela predominância absoluta de

uma população de origem escrava e de procedência africana6. Todas estas vilas

estiveram vinculadas ao município de vila Bela da Santíssima Trindade até a criação do

município de Guajará-Mirim, em 1928.

6 A presença de negros na região do Guaporé é citada em todos os documentos referentes à região. Sobre Vila Bela, o trabalho mais completo é o de Maria de Lourdes Bandeira, intitulado: Território negro em espaço branco, publicado pela editora Brasiliense – 1988.

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Os povoados do Guaporé ampliaram sua população por ocasião da demanda pela

borracha, quer no início do séc. XX, quer na década de 1940, quando adentraram no

Guaporé os soldados da borracha. Preocupados com a produção da borracha e da poaia,

as autoridades estimularam a entrada de nordestinos na região, enquanto afirmavam que

os negros locais eram preguiçosos e avessos aos trabalhos na indústria gomífera.

Porém, mesmo recusando a submissão completa à nova ordem patronal que se

estruturava a partir dos seringais, os negros locais inseriram-se nas estruturas de

produção, recolhendo livremente a borracha e a poaia e vendendo aos que julgavam

melhores pagadores. Para acalmar as tensões com os novos proprietários dos seringais

locais, esses mesmos negros pagavam rendas anuais em espécie, garantindo, assim, seu

direito de comercializar livremente a maior parte de sua produção.

Os habitantes das comunidades negras de Santo Antonio, Pedras Negras e

Senhor Jesus consideram-se parte da natureza da região em que vivem. Compõem-se

como um conjunto de camponeses negros, habitantes das várzeas do alto do Guaporé e

São Miguel, tornando viável sua sobrevivência e reprodução.

Maria de Lourdes Bandeira (o.c.) faz uma análise minuciosa das condições dos

negros em Vila Bela da Santíssima Trindade; achamos importante compartilhar a ótica

da autora. Todos os livros pesquisados não são ricos em dados quanto o da autora citada

acima. Os momentos da história abordada pela autora são dois: o momento de

escravidão dos negros em Vila Bela, e o apogeu dos negros por deterem conhecimento

que os brancos não detinham. E, portanto, aqui serão colocadas conforme a visão da

autora.

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1.1.1. A escravidão dos negros

Maria de Lourdes Bandeira fez uma análise da sociedade de Vila Bela abordando

dois aspectos: (a) Vila Bela dos Brancos; (b) Vila Bela dos Pretos; procurando entender

a formação da identidade étnica dos negros que ali vivem.

Após a escolha de Vila Bela para capital da província de Mato-Grosso fez-se

necessário expandir a fronteira capitalista e para que isso acontecesse era necessário o

povoamento da região. Nesse quadro histórico houve a entrada dos brancos e

indispensavelmente os negros fazem parte da construção desta cidade como mão de

obra escrava.

Rolim de Moura chega a afirmar a importância dos negros em Vila Bela dizendo:

“os brancos sem eles em toda parte da América, e principalmente em minas quase se

pode dizer que são inúteis7” (1882:122-123). Maria de Lourdes afirma que “no primeiro

século de sua história, Vila Bela foi essencialmente dos brancos, ainda que sua

população fosse, como se demonstrou no capítulo anterior, constituída principal e

majoritariamente de negros8”. Os brancos detinham o poder e, apesar de serem a

minoria, dominavam o território negro.

As expedições e o aprisionamento dos índios não garantiam a presença dos

brancos onde prevaleciam negros e mestiços. Aprisionavam-se índios para assegurar o

investimento dos brancos. Aldeias inteiras foram dizimadas, sobrevivendo apenas quem

conseguisse escapar.

Com a descoberta de ouro no Rio Galera, afluente do Guaporé, inicia-se um

processo migratório que em 1736 provocou o despovoamento de Vila Bela: “e somente

na villa ficaráo sete homens brancos entre secullares e clérigos e alguns carijos que a

7 Maria de Lourdes Bandeira pág. 79. 8 Ibidem

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gente preza só algum page que serviá a seo senhor de porta a dentro: chegaraó se a

vender negros a quinhentas oitavas de ouro (1975:37)9“.

Diz Maria de Lourdes na pág. 85 que a escolha feita por D.Antônio Rolim de

Moura foi arrogante, pois o mesmo desconhecia o terreno alagadiço da região do

Guaporé. Mas, nada disso impediu o povoamento de Vila Bela. Para a coroa portuguesa

quem fosse criminoso e quisesse vir para essa região sua pena era perdoada e as

condenações esquecidas. Tudo servia para os objetivos da coroa portuguesa, com isso

brancos cheios de dívidas, pessoas que estavam sem perspectivas vieram para o Vale

para fazer parte de sua sociedade, passando a serem conhecidos como homens dispostos

a se aventurarem na região. “Rolim de Moura defendeu a concessão do “privilégio de

couto pelo tempo que for servido para que os criminosos possam de qualquer parte

recolher-se áquele distrito e chamar suas culpas para ali se livrarem, sendo obrigados

depois disso, por esta mercê, a residirem três anos no mesmo lugar. E ficando incursos

em pena de degredo ou morte cível este se lhe comuta à proporção em anos de

residência (1982:36)10”.

A fraude dos quintos, a instabilidade local, o difícil acesso, o contrabando, as

faisqueiras se esgotando, a agricultura não se desenvolvendo como deveria, as mais

diversas endemias, tudo isso leva Vila Bela a desfalecer em seus objetivos. “Essa

reputação consolidou-se historicamente e ensejou explicações estereotipadas da saída

dos brancos e da permanência dos pretos. As qualidades físicas da raça negra foram

sempre destacadas no discurso branco. Entre elas, a força e a resistência são definidas

como propriedades biológicas distintivas. O discurso da superioridade física dos negros

9 Maria de Lourdes Bandeira pág.82 10 Idem pág.89

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se coloca assim como contraponto da ideologia da superioridade social e cultural dos

brancos11”.

Devido a tantas doenças o branco acabava recorrendo aos negros e índios para

obter a cura das doenças através do tratamento natural, podemos dizer: da carga cultural

de negros e índios. Daí os conhecimentos de negros e índios começarem a se incorporar

na cultura dos brancos, não porque apreciavam o traço cultural, mas por questão de

necessidade. Negros e índios trocavam convivência dentro dos quilombos e fora deles

também. “Os negros assumem papel relevante na dinâmica cultural. Eles emergem

como agentes de mudança tanto na reelaboração das práticas culturais brancas, como

na introdução de suas próprias práticas e como mediadores privilegiados da

assimilação de práticas indígenas12”.

Mas a realidade em relação aos pretos é outra. Muitos morreram cedo, e muitos

chegavam apenas aos quarenta anos de idade. No entanto, o que os fez sobreviver,

mesmo em menor número, foi a solidariedade entre eles. Foi aí que resolveram se juntar

e estabelecer regras para viverem em coletividade dentro dos seus princípios étnicos e

culturais. Este traço permanece até hoje, pois todos os informantes entrevistados falam

da saudade que é viver em grupo. “Lá era bom, todos nós ficava junto, aqui é

diferente13”. O ser diferente fala do cozinhar juntos, cantarem juntos e festejar juntos o

que é divino.

Quando a capital de Mato-Grosso mudou para Cuiabá o declínio era inevitável. A

cada vez mais o quadro vai se agravando. Para encontrar uma solução os mineiros

começam a produzir aguardente e açúcar. Como se não bastasse a situação deplorável

em que se encontrava aquela população, a Provisão Régia de 12/06/1743 ordenou a

destruição de todos os engenhos. Foi um passo a mais para que Vila Bela entrasse em

11 Idem pág. 92 12 Idem pág. 97 13 Palavras da informante F, que hoje mora em Guajará-Mirim.

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declínio. Por longos 100 anos ela se sustentou com mão de obra escrava, negando aos

negros oportunidades como seres humanos, reduzindo-os ao status de escravos.

As doenças não escolhiam a cor da pele, dizimavam tanto negros quanto brancos e

índios. Apesar dos brancos considerarem os negros resistentes às doenças, não foi sua

resistência física que os fizera sobreviver em número maior que os outros, foi a união

dos mesmos. Os governantes davam as doenças como desculpa para o declínio, no

entanto, a falta de mão de obra era o fator principal.

Maria de Lourdes destaca o papel dos negros no vale do Guaporé: “Pretos de

Angola e de Guiné vindos diretamente da África ou de outras Capitanias da Colônia

lavraram, faiscaram, socavando terras, barrancos e leitos de rios, montes e chapadas.

Plantaram e colheram; remaram canoas, comboiaram o comércio; construíram ruas,

porto, palácio, igrejas, quartéis, casas de residência, edifícios públicos; levantaram

engenhos, moeram e fabricaram cachaça, açúcar e rapadura; pescaram, caçaram e

criaram gado; cuidaram dos doentes e enterraram mortos; integraram forças militares,

lutando, guardando a segurança da cidade, da fronteira e dos caminhos do ouro;

enriqueceram e utilizaram rios e organizações religiosas; abriram estradas; fizeram

festas; reconstruíram quando as águas destruíram. Excluindo-se o poder, em quaisquer

de suas formas ou expressões, não uma só atividade que não fosse sustentada pelos

pretos14”.

14 Maria de Lourdes p.113.

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1.1.2 A saída dos brancos de Vila Bela da Santíssima Trindade condiciona o

apogeu dos negros.

Com a saída dos brancos os negros começam a se organizar politicamente,

culturalmente e etnicamente. “A saída dos brancos não condicionou, nem esculturou a

sua forma, mas o sistema de relações raciais entre brancos e pretos continuou

operante. Após a saída, os brancos intervieram em todos os momentos do processo, de

fora para dentro, refletindo a diferença, como espelho étnico, devolvendo a imagem da

semelhança entre indivíduos pretos. A manipulação da semelhança/diferença pelos

pretos constituiu o fundamento da energia criadora da comunidade negra15”. Os

negros não se isolaram por definitivo. Havia a necessidade do intercâmbio com os

brancos por causa dos mantimentos que eram escassos, e por os negros deterem o poder

do conhecimento para a sobrevivência. Um exemplo é a agricultura na qual os negros

detinham todo o conhecimento trazido do lugar de origem. E por serem coletivamente

mais forte isso fez manter o grupo sempre em união. Aliás, em se tratando de negros,

podemos citar como característica principal o trabalhar em coletividade.

A transformação de Vila Bela se deve ao fato de sua economia. Mas os brancos

que não conseguiam acompanhar a produção agrícola dominada pelos negros passaram

por dificuldades por não se adaptarem ao novo quadro político. Porque o comando da

cultura, da economia, da política passa a ser dominada pelos negros, fazendo-se

necessário os brancos começarem a reaver seus conceitos em relação aos negros, e

estudar uma nova forma de relação social. Não que os brancos deixaram de ter o

domínio total, mas agora era necessário avaliar a visão que tinham da “diferença de cor,

raça, credo”. Não podiam descartar totalmente os negros.

15 Idem p. 124

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Os negros passam, então, a ficar com as terras abandonadas pelos brancos. Alguns

senhores de escravos ficaram ali e usavam os negros para plantar o que iriam consumir,

no entanto, isso não duraria muito tempo. Para os brancos era a decadência econômica e

para os pretos era a liberdade, tanto como seres humanos, como a liberdade para se

organizarem para cultivar a terra e realizarem suas práticas religiosas que para alguns

senhores de escravos eram proibidas. Um novo quadro cultural começa a surgir e os

pretos começam a entrar em algumas esferas sociais antes proibidas. Aos poucos as

casas que estavam desocupadas foram sendo ocupadas pelos negros. A desorganização

econômica dos brancos significou a organização dos negros e seu apogeu.

Vila Bela era vista no país como a cidade das endemias, o território mais insalubre

que existiu e os negros manipulam essa visão a seu favor, como comenta Maria de

Lourdes em um trecho de seu livro: “Esse trecho documenta, de forma explícita e

inequívoca, a manipulação étnica que os pretos conscientemente faziam da fama da

insalubridade de Vila Bela. Reforçando o clichê de que essa insalubridade afetava

inelutavelmente aos brancos, os negros construíam o discurso do território étnico de

Vila Bela como lugar de pretos. E a conquista do território era essencial à constituição

da comunidade de pretos16”.

Os negros sobreviveram e souberam tirar proveito do quadro caótico em que se

encontrava Vila Bela, transformaram a seu favor o que os brancos diziam perdido, não

só em relação à economia, mas uniram-se num propósito de manterem viva sua cultura

que é que os ligava a sua origem, porque era isso que os levaria unidos para o futuro.

“Com a mesma condição social (livres), a mesma origem racial (pretos), e a

territorialidade étnica assegurada, os pretos de Vila Bela passaram a esculturar e

16 Maria de Lourdes, pág.137.

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compartilhar um destino comum, tornando-se todos co-responsáveis pela sobrevivência

individual e coletiva dentro da mesma comunidade étnica17”.

2. Quilombolas do Guaporé: um pouco de cultura

Os negros sempre tiveram papel importante na cultura do nosso país, porque eles

passaram a se organizar através da herança cultural que para cá trouxeram. Eles

herdaram “as ruínas” de Vila Bela. Aos poucos começaram a dominar o espaço deixado

pelos brancos e reconstruíram à luz de sua cultura e a partir da ótica de mundo que

possuíam. Lutando para afirmarem sua identidade étnica e cultural reviviam a dança, a

música, as cantigas de roda. A dança do congo é, talvez, a marca mais forte de sua

identidade. A cultura reorganizou os negros enquanto comunidade, porque é dessa

forma que ela age. Porque a cultura tem sua autonomia e pode transformar a economia,

as relações sociais.

Em Vila Bela existe a Festa do Divino, A Festa do Congo, a Festa das Três

Pessoas e a Festa de São Benedito. A Festa do Divino (a denominação integral é :

“Festa do Divino Espírito Santo”) difere da Festa das Três Pessoas (Deus, Jesus,

Espírito Santo) não só pelo nome, mas também porque os cânticos são diferentes, e que

a navegação no rio, integrando outras comunidades do Guaporé aos festejos, é exclusiva

do Divino. Dentro da Festa do Congo é dançado o Chorado. Tudo possui uma

conotação histórico-cultural e todas essas manifestações culturais levam a afirmação da

população de Vila Bela enquanto negros. Alguns dos informantes mais velhos atestam a

existência de danças como a do Cururu e a da Navalhada que é parecida com a do

chorado. Eles afirmam que nem os mais novos sabem da existência dessas danças, por

se haver perdido.

17 Idem pág. 137-138.

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Tentamos captar o significado de algumas dessas festas, talvez não pela ótica

negra, mas apenas para termos alguns dados a respeito do que significam estas

manifestações culturais.

2.1 A Festa do Divino: um pouco de história18 O Vale do Guaporé possui uma diversidade cultural rica. São: Pedras Negras,

Costa Marques, Versalhes, Rolim de Moura, Pimenteiras, Limoeiros, povoados que

vivem em harmonia planejando a Festa da Alegria que é a Festa do Divino.

Por mais de cem anos comemora-se a Festa do Divino, no vale do Guaporé. Esse

povo é conhecido como os Peregrinos do Espírito Santo, afirmando para a sociedade

que divino e eterno é o espírito santo. Diz a História oficial que a festa veio de Portugal,

criada no século XIV pela rainha D. Isabel, trazida para o Brasil no século XVI. Diz-se

também que, com a popularidade da festa, houve influencia na escolha do título de D.

Pedro I, quando ele proclamou a independência do Brasil; Dom Pedro foi chamado de

imperador porque o título era mais familiar aos brasileiros. Em certas vilas ou cidades –

como era em Ilhas das Flores – o imperador do divino com sua corte davam audiências

recebendo tratamento digno de um rei. Antes de a festa se espalhar pelo vale, ela só era

realizada em Ilhas das Flores. Primeiro imperador de Ilhas das Flores foi Pedro Braga e

a imperatriz Lúcia de França. No vale do Guaporé havia necessidade de vir à festa por

causa da devoção do povo. Manoel Fernandes Coelho, por intermédio da irmandade da

Santíssima Trindade, conseguiu a coroa de prata para que o povo do Vale venerasse o

divino, permanecendo de 1894 até 1932 em Ilhas das Flores. Manoel, então, entrou em

contato com a irmandade que resolveu fazer um sorteio para decidir onde a festa ficaria.

Ou seria sorteado Taruman ou Rolim de Moura. Ganhando Rolim de Moura.

18 Narrativa tirada da fita VHS da “Festa do Congo”. Festança 1999. Vila Bela da Santíssima Trindade.

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Em 1934, os moradores de Taruman protestaram junto ao bispo de Cuiabá para

poderem também realizar a Festa. O bispo orientou Francisco Xavier Rey, bispo de

Guajará-Mirim e líder religioso católico do Vale do Guaporé, para que a irmandade

criasse o estatuto da Festa. Dom Rey determinou então que ficasse em Rolim de Moura

até que a população pudesse construir igrejas e povoados. Dom Rei estabeleceu o

rodízio das cidades e povoados que hoje organizam a festa e recebem a coroa.

2.1.1 A Festa do Divino

O rio Mamoré e o Guaporé, por terem somando juntos uma área de extensão de

1350 km na fronteira com a Bolívia, obrigam os devotos do divino a preparar a festa

com mais ou menos um ano de antecedência. A irmandade do divino escolhe através de

sorteio o imperador e a imperatriz da Festa. A escolha é feita pelos chamados “irmãos

de copo”, onde é colocado o nome dos candidatos dentro de um copo para sorteio. As

condições para se candidatar a imperador ou imperatriz é ter conduta irrepreensível e

uma vida conjugal exemplar. Depois do sorteio o imperador e a imperatriz escolhem o

encarregado do batelão do Divino (o barco que levará a coroa). A embarcação que

durante 45 dias visitará todos os povoados ribeirinhos com o símbolo do Espírito Santo:

a bandeira vermelha, o Cetro e a Coroa. O batelão coberto com folhas de palmeiras

amareladas será a embarcação mais esperado pelos beradeiros. Para os beradeiros o

batelão representa o sagrado, a solução para os problemas humanos. Os devotos dizem

que ao aproximar-se o batelão o som da selva é abafado e que o único som que se escuta

é os dos meninos que cantam dentro da embarcação.

O caixeiro19 é quem marca o ritmo para os proeiros dentro da embarcação.

Quando o batelão está perto de aproximar-se da comunidade um outro caixeiro fica em

19 O caixeiro é o que toca o intrumento denominado “caixinha” para receber o divino.

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terra para ajudar o mesmo a vencer a força da correnteza. Quando ele vê o que o batelão

venceu a correnteza ele vai aos poucos aliviando o ritmo da batida da caixinha.

O batelão é remado por doze homens chamados de remeiros, selecionados entre

os que fizeram promessas ao divino. Esses doze homens representam os apóstolos que

acompanhavam Jesus. Na cultura do Guaporé ser escolhido para ser remeiro é como

receber uma segunda graça, porque ao remar o batelão por 45 dias a penitência se

transformará em um prêmio no final.

Com três tiros de morteiro é anunciada a chegada do batelão. O salveiro que é

encarregado da ronqueira (carregada com pólvora disparada a meia-noite, quatro da

manhã, ao amanhecer e ao anoitecer) faz saudações ao divino enquanto se aproxima da

comunidade que está à espera.

Nas comunidades as mulheres têm o dever de prepararem as comidas para

receber o batelão com o divino. Quando os devotos começam a ouvir o som dos

meninos cantando, o som do violão mestre, a melodia, e o som do mestre caixeiro, eles

vibram porque o divino está naquele lugar. Antes de encostar, o batelão dá três voltas a

meia-lua, saudando os foliões. Os devotos entram então na água até a cintura e com

velas nas mãos, cheios de emoção saúdam mais uma vez o divino.

Após atracar, o encarregado de guardar a coroa entrega ao imperador a coroa, e o

cetro à imperatriz. Começa então a adoração ao símbolo do espírito santo. Os devotos

num gesto de intimidade se ajoelham e beijam as bandeiras. O imperador coloca a coroa

cheia de fitas na cabeça dos devotos. A imperatriz oferece o cetro para os fiéis beijarem.

Em seguida a coroa irá para a igreja onde ficará, e durante toda sua estadia no povoado

haverá festa para representar a alegria de receber a coroa.

Ao amanhecer o dia, o devoto que passou a noite toda em festa esquece o

profano e se entrega a fé. A coroa inicia a peregrinação por todas as casas. Ao final,

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ergue-se o mastro com a bandeira e o símbolo da pomba. Em outros tempos a bandeira

trazia o nome da próxima cidade que haveria festa. E vai-se então o divino para mais

um povoado.

2.1.2 Alguns cânticos para receber o divino:

Chegando o barco:

Titoso20 é quem chega O amor deste Senhor Certamente vai gozar lá no céu redentor. Coroa dando meia lua quando o batelão chega: A pombinha vem voando Entre fitas e laços de flores Vem dizendo: Viva! Viva! Todos os moradores. Coroa chega batelão encosta com o cetro: Chega em tudo seu devoto Com seu joelho no chão Venham receber agora Deste senhor a benção. Coroa para entrar na igreja: Deus te salve casa santa Onde Deus fez a morada Entre pia de água benta E a hóstia consagrada. Coroa para entrar na igreja: Entrai ó pomba celeste Na casa da santidade Onde mora as três pessoas Da santíssima trindade.

20 O informante B diz ser mesmo a palavra Titoso e não ditoso.

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2.2 Dança do Chorado

A dança do chorado é realizada juntamente com a Festa do Congo, o significado

desta festa é ligado ao sistema de escravidão e tortura em que os negros viviam.

Chorado significa “coração sangrando ou coração chorando”. Os informantes disseram

que esta dança foi criada pelas mulheres negras e escravas. Somente as mulheres podem

tocar os instrumentos. Para elas era a forma de atraírem a atenção dos senhores para o

livramento de seus maridos e de seus filhos do tronco ou de qualquer outro castigo que

lhes era imposto. Quando os homens eram levados ao tronco, as mulheres negras se

vestiam de forma bem elegante conforme sua cultura e com sua sensualidade iriam

dançar para seus senhores para obterem o livramento ou o aliviamento do castigo de

seus maridos e filhos. Elas sabiam que não agüentariam por muito tempo o castigo

severo que sofriam. Dançavam rodopiando, levantando um pouco da beirada de suas

saias e cantando alegremente com movimentos sensuais dos ombros. Quando a

dançarina se “acoca” (palavra dita pela informante C que, para ela, quer dizer se baixar

sensualmente), está na hora de pegar um padrinho e é este que vai lhe pagar as bebidas.

Após o pagamento da bebida, as melhores dançarinas colocam as garrafas em suas

cabeças para demonstrarem equilíbrio em meio ao sofrimento. Se a dança agradasse aos

Senhores, estes livravam os negros do tronco ou aliviavam o castigo. Esta dança era a

forma que elas acharam de chorar por dentro o sofrimento e externar a alegria para

livrar da morte os que estavam ligados ao seu coração. Até hoje dançam o chorado, mas

como forma de manifestação cultural.

Maria de Lourdes afirma em seu livro “Território negro em espaço branco”, na

pág. 208 que: “O chorado centra suas origens na tradição dos bailados pastoris

portugueses, adaptando traços de origem africana, como o ritmo e a coreografia”.

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2.3 Festa de São Benedito

São Benedito é o escolhido pela comunidade negra como o santo dos negros.

Para eles São Benedito21 é o maior de todos. Devido ao preconceito em relação à cultura

e à religião afro-brasileira, os negros deram nomes católicos às suas entidades.

2.4 Festa do Congo

A festa do Congo em Vila Bela da Santíssima Trindade é a luta travada entre os

dois reinados africanos : o do Congo e o de Bamba. Maria de Lourdes melhor descreve

a Festa: “O enredo inicia com a chegada da embaixada de “pretinhos de Guiné”, do

Rei de Bamba, cantando e dançando, fazendo várias evoluções nos espaços que lhes

são reservados. O Embaixador comanda as figuras e o Secretário vem no meio das

duas fitas, atrás do Embaixador. O Rei do Congo convoca seu Secretário e ordena que

seja verificado que “gente são essa”. O Embaixador, depois de muitas falas, apresenta-

se ao Rei do Congo para entregar-lhe a mukamba22 do Rei de Bamba que exige, em

guerra, o cumprimento da promessa de casamento com a princesa do Congo. O Rei do

Congo, sentindo-se injuriado, manda prender o Embaixador e ordena ao Secretário de

guerra o início da guerra, que termina com a rendição do partido do Rei de Bamba.

Subjugada, a Embaixatriz pede paz, aceita pelo Rei do Congo23”.

2.5 Festa das Três pessoas

A Festa das Três Pessoas é a festa do Santo que vela por Vila Bela. É de

fundamental importância seu papel na comunidade, é ele quem protege a cidade desde

sua fundação. Ele atua nas lavouras protegendo-as. Não fazer a festa é deixar a cidade

21 Para eles São Benedito foi cozinheiro do divino por muito tempo e agora está a serviço dos negros como marca de identidade negra. Incorpora-se na festa ao Santo a dança do Congo. Na festa honra-se a geração passada. Para os negros, ele vela por suas vidas. 22 Mukamba é mesmo que mensagem. 23 Maria de Lourdes pág.238-239.

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vulnerável para todo tipo de desgraças. “Nóis num podi abandonar o santo sinão ele

abandona você24”.

PARTE II – LEVANTAMENTO DOS DADOS

1. Os dados

Os dados foram levantados em Guajará-Mirim com antigos moradores do

Vale do Guaporé. Foram feitos em forma de nota porque os informantes não aceitaram

que eu usasse o gravador devido à timidez, ou talvez, por outra razão desconhecida.

Minha presença foi de uma estranha que quer saber histórias de negros,

uma curiosa. Com o passar do tempo, depois de algumas visitas e conversas informais

sobre diversos assuntos que eram diferentes dos que a pesquisadora gostaria de abordar,

eles passaram a me ver como alguém que poderia escrever e registrar um pouco da

história deles que eles consideram estar embutida em cada palavra levantada.

Num primeiro momento eles iam contado histórias e eu anotava as palavras que

me chamavam a atenção; nas outras vezes, eles mesmos ditavam as palavras. Um dos

informantes fez uma lista de palavras afirmando que era para facilitar o meu trabalho.

Muitas vezes eu chegava e estava a família reunida e a partir das conversas entre eles eu

fazia as anotações. Outras vezes eu falava as palavras que estão no dicionário de

bantuísmos de Jean Pierre Angenot e eles confirmavam ou não e davam o significado.

Participei na casa de uma das informantes do preparativo da comida para a Festa

do Divino e ali estavam todos reunidos. Eles disseram que era a melhor hora para eles

verem a família reunida num só propósito. Uma das informantes chegou a dizer que:

“Temos que escolher entre a cultura e o costume25”. Ao indagar a mesma o porquê ter

que escolher entre a cultura e o costume ela respondeu: “Porque quando nóis tava lá

24 Palavras do informante A. 25 Informante C, falando da tristeza que é estar afastada da sua terra “Pedras Negras”.

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vivia na cultura, mais a vida ficou difici e foi preciso escolher o costume de Guajará pra

criar nossos fio26”. Assitistimos uma fita antiga com a festa do Congo, a do Divino e

ouvimos um cd do Grupo Quariterê de Vila Bela.

2. Os informantes

Os informantes estão assim classificados:

INFORMANTE IDADE

Informante A (homem) 99

Informante B (homem) 98

Informante C (mulher) 75

Informante D (homem) 70

Informante E (mulher) 80

Informante F (mulher) 74

Informante G (homem) 69

Informante H (mulher) 68

Todos os informantes escolhidos são oriundos do Vale do Guaporé.

Classifiquei-os por letra respeitando a escolha deles de não serem identificados. Alguns

chegaram a dizer que falando de sua cultura eles já estariam sendo identificados porque

eles são a própria cultura. Nenhum deles terminou sequer o primeiro grau. É importante

dizer que escolhi pessoas de terceira idade por deterem o conhecimento cultural bem

vivo dentro deles. Tentei entrevistar pessoas mais novas mais não obtive tanto sucesso

como obtive com os informantes da terceira idade.

26 Idem

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3. Análise dos dados

Classificamos os dados da seguinte forma:

3.1 Corpus Levantado: abaixo uma visão geral da coleta feita que está

subdividido da seguinte forma:

- a primeira coluna apresenta as lexias e expressões que foram levantadas no

decorrer da pesquisa, transcritas dentro do sistema ortográfica usado para o

PVB, seguido de uma transcrição fonética (usando os símbolos da API) . O

primeiro critério observado foi o levantamento de lexias que eram

desconhecidas para a pesquisadora; o segundo critério foi a busca no

dicionário das lexias já existentes para verificar a sua semântica e a sua

origem; o terceiro critério aplicado foram os critérios morfológicos e

semânticos, ou seja, a verificação da morfologia comum entre as línguas

banto comparada a do português, levando em conta as inevitáveis adaptações

morfológicas (entendida como uma vertente fonológica e uma vertente

gramatical) que podem ocorrer em contato e acomodação de línguas, como

também, o significado de origem e suas possíveis ampliações ou reduções

semânticas. Considerando também que o significado para essas comunidades

é a tradução para o Português Vernacular Brasileiro (PVB) proposta pelos

próprios informantes e não pela interpretação que é feita pela pesquisadora.

- na segunda coluna remetemos ao Dicionário de Bantuísmos de Jean Pierre

Angenot e Geralda de Lima V. Angenot27; verificamos que nem todas as

lexias levantadas na nossa pesquisa já haviam sido resgistradas em

pesquisas; assim sendo, as colunas 2 e 3 se encontram “vazias” quando a

27 Glossário dos Bantuísmos Brasileiros: Jean Pierre Angenot e Geralda de Lima V. Angenot, o.c.

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lexia levantada é “exclusiva” do Guaporé, ou seja, não é de nosso

conhecimento que tenham sido atestadas em outras comunidades.

- a terceira coluna assinala as lexias do corpus que foram encontradas nos

dicionários de português: usei o dicionário eletrônico HOUAISS e o

AURÉLIO.

- a quarta e última coluna contém alguns comentários que achamos

necessário colocar para melhor compreensão do leitor; alguns desses

comentários constam dos dicionários consultados, outros foram feitos pela

pesquisadora; estes últimos encontram-se em itálico. O que estiver em

negrito são dados do Dicionário de Bantuísmos.

O corpus contém 497 (quatrocentos e noventa e sete) lexias e expressões. Não

podemos deixar de chamar a atenção para o fato de que, numa pesquisa “in situ”, essa

coleta com certeza seria ampliada.

Lexias e Expressões do Guaporé, com seu significado

Dicionário de Bantuísmos

Dicionários Pesquisados

Comentário

1. ãã: parar; parar de mexer. “Ãã, não pode bater.” [ãã]

Trata-se de um idiofone que parece constar na maioria das línguas do mundo.

2.Abancar: sentar, se acomodar. “Pode se abancar seu Zé!”. [aba)N»ka]

abancar (a) fugir; sair em fuga (b) correr (c) perseguir Kik baNgika

Abancar¹ guarnecer de bancos; assentar-se tomar assento. Datação 1783. Abancar² dispor(-se) em torno de banca ou mesa; sentar ou assentar(-se) à banca ou à mesa; permanecer demoradamente em algum lugar ou se instalar em algum lugar com tal

O dicionário não comenta a etimologia, colocamos no quadro do galego-português como uma probabilidade. No sentido de Abancar2

O Houaiss diz ser de origem obscura e ainda comenta que José

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intenção.Datação de 1858. Abancar³ correr, fugindo de alguma coisa ou perseguindo-a; começar,iniciar. Datação de 1949

P.Machado, levanta a hipótese de uma origem africana. Cabe então um estudo mais detalhada para termos a etimologia. Não podemos descartar a possibilidade de ser africana para o sentido de correr, fugir.

3.Aburicá: deteriorar, estragar. “Se tu deixar a camida aí ela vai aburicá”. [abuRi»ka]

aburicá, taburicá (a) ruim, mau (b) fazer mal, destruir completamente

(c) apanhar doença incurável causada por feitiço

(d) feder (e) deteriorar (f) profanar Kik + Yor tabika destruir; deteriorar

+ (i$)bu@ra e$ke@@ perjuriar, fazer mal

4.aca: mau humor. “Você está com muita aca hoje”. [»ακå]

aca, macaca (a) má sorte, azar (b) mau humor aca, inhaca, uca (c) cachaça ruim que deixa morrinha

(d) mau cheiro corporal Kik maNkaNka má-sorte mwaka mau cheiro, morrinha

Kim nuuka mau cheiro, morrinha

¹Aca parte da renda ou colheita devida a funcionário com cargo hereditário de distrito ou aldeia; tença ou saldo concedido pelos antigos príncipes do Concão, antiga província do Estado de Bombaim, especialmente aos dessais e aos oficiais militares, para sustento da armada; a datação de 1764. ²Aca cheiro ruim fedor; cachaça de má qualidade ou de gosto ruim; a datação é de 1913; ³Aca relativo a ou

O dicionário diz: ¹Aca [segundo Dalgado, do conc.-mart. hakka < ár. haqq 'direito'; f.hist. 1764 acca, 1890 haca, 1890 haka]; ²Aca [segundo Nascentes, de iaca; ver 1inhaca]; ³ Aca [origem obscura]; Aca [lat.cien. gên. Acca (1855)].

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indivíduo dos acas, povo pigmeu da África central; a datação é de 1949; Aca design. comum às plantas do gên. Acca (por vezes incluído no gên. Psidium), da fam. das mirtáceas, que reúne seis spp., nativas da América do Sul.

5. Acocá: Agachar. [ακ ∪κα]

¹acocar cobrir (alguém) de mimos; acarinhar; ²colocar-se de cócoras;

Os dicionários dizem ser de origem duvidosa. Esta lexia tem uma relação com cócoras. A origem é obscura; c.f. o Houaiss foi atesta em 1561 o que torna pouco provável uma origem africana.. É necessário um estudo mais detalhado.

6.Afu: dita após pronunciar o nome de uma pessoa morta, que é acompanhada pelo gesto de bater com o nós dos dedos em algum objeto de madeira, a fim de isolar a possibilidade de uma corrente negativa que atrai a morte. [α»φυ]

O Dicionário de Bantuísmos atesta também como: cufar (a) morrer (b) sucumbir Kim kufa morre, perecer, falecer

¹ave design. comum aos animais vertebrados, ovíparos, da classe Aves; pessoa que ludibria outros; velhaco, trapaceiro; mulher que trabalha e dança nos barracões de pajelança; a datação é do séc. XIII. ²ave forma us. em saudação, equivalente a 'salve'; a datação é do séc.XIII. Desconjurar agir em desacato; atacar, desacatar; esconjurar ('fazer juramento', 'exorcizar', 'fazer desaparecer', 'amaldiçoar', 'ordenar', 'lamentar-se').

O dicionário diz que no nível informal a forma desconjuro aparece com intensa exclamação para renegar o diabo, afastar as tentações ou apenas como sinal de desaprovação. O dicionário não dá a datação.

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7.Aloitá: brigar. “Para de aloitá menino!”. alojtá obs.: ainda temos “Mãe, os meninos aloitaram”; “Mãe, os meninos estão aloitando”. [αλοϑ∪τα]

.Envolver(-se) em luta corporal; lutar

O dicionário Aurélio diz que esta palavra vem de loita. [Do latim] luta. Cf. o dicionário sua outra forma é aloite [de loita].Lida, esforço, luta. Não possui datação histórica.

8.Alossé: ficar a vontade. Ex.: “Esses meninos ficaram alossé hoje”. [αλ ∪σ∈]

Não foi encontrado nada no dicionário a respeito desta lexia. Possivelmente pode ser uma forma específica do Guaporé podendo ter origem africana ou indígena?

9.Aluá: refresco feito de milho torrado conhecido também como chicha.

[alu»Wa]

aluá, aruá, ualuá bebida refrescante preferida de caboclo, feita de cascas de abacaxi fermentadas por três dias, em um pote de barro com água, carroços de milho, raiz de gengibre e rapadura

Kik-Kim-Umb wala, walwa suco, refresco

Hau a$lewa$, ruwa suco, refresco

¹aluá bebida refrigerante feita de farinha de arroz (ou de milho) ou de cascas de frutas (esp. abacaxi, raiz de gengibre esmagada ou ralada), açúcar ou caldo de cana e sumo de limão; aruá; a datação é de 1578. ²aluá doce tradicional do Natal, feito com amêndoas, farinha, manteiga, coco e pinhão; a datação é de 1727.

O dicionário Houaiss propõe a etimologia:quimb. walu'a 'id.'; var. aruá; f.hist. 1578.

10.Amancebado: Pessoa que tem um caso amoroso. “Chica tá amancebada com

Ligado ou ferrado a alguma coisa; que ou quem vive em

A datação é de 1568. Do latim “manceps”

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João”. [αµãσε∪βαδΥ]

mancebia ou concubinato; amante.

(tomar na mão).

11.Amigado: casais que moram juntos e não são casados no papel. “Maria é amigada com Chico”. [αµι∪γαδΥ]

Que se amigou; amasiado, amancebado.

O registro histórico é do séc. XV.

12.Angolê: nome de gêmeo, correspondente a São Cosme. [a)Ngo»le]

angolê nome de gêmeo, correspondendo a São Cosme

Kik-Kim Ngore gêmeo

13.Angu: mistura de comida; massa feita de farinha de milho, arroz ou mandioca. Confusão. Ex.: “Tu fez o teu angu, agora coma”, ou seja, você arrumou confusão agora se vira para sair dela. [a)N»gu]

angu (a) massa feita de farinha de milho, arroz ou mandioca

(b) mistura confusa (c) trapalhada (d) mixórdia (e) intriga, mexerico (f) topônimo: rio [MG] Kim waNgu

(a)Massa espessa que se faz misturando, ao fogo, farinha de milho (fubá), de mandioca ou de arroz, com água e, às vezes, sal; (b)Falta de ordem; angu-de-caroço, confusão, complicação, rolo; Briga que envolve muitas pessoas; angu-de-caroço, banzé, rolo, sururu.A datação é de 1799.

O Houaiss diz: de origem africana, mas de étimo obscuro. A datação é de 1789.

14.Anjico/angico: Apelido comum na comunidade. [a)¯»ZikU]

anjico, angico (a) antiga nação africana no Brasil.

(b) árvore utilizado na construção

¹Angico árvore do gênero Piptadenia, da família leguminosas, subfamília mimosóidea de madeira utilíssima; a datação é de 1871. ²Angico - Negro banto da costa sudeste da África, e que tomou, no Brasil, a denominação genérica de Moçambique.

Os dicionário diz ser de origem obscura. No entanto, Nei Lopes admite a possibilidade do quicongo nsiki 'nome da árvore Morinda citrifolia'.

15.Apresentado: Pessoa gaiata(atrevida, enxerida). “Ô menino apresentado!”. [απΡεζε)∪ταδυ]

Que ou aquele que se apresenta; que despreza o recato; saliente, atrevido.

A datação é de 1261.

16.Apresentamento: pessoa enxerida; que tem enxerimento.

Enxerir: meter-se em assuntos alheios, tornar-se inoportuno;

A datação é do séc. XIII.

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Uma pessoa que se mete em tudo quanto é assunto. “Deixa de apresentamento João”. [απΡεζε)τα∪µε)τυ]

intrometer-se; buscar conquista amorosa (freq. de forma impertinente ou insistente); tentar namorar

17.Aquá: expressão de dúvida, de esquecimento. “- Mãe sabia que João foi embora!? - Aquá! Tô pra ver.” [ακυ∪α]

18.Ariado: perturbado. [αΡια∪δΥ]

¹Areado com muita areia, cheio ou coberto de areia; que está sem dinheiro; a datação é de 1597. ²Areado que está distraído, absorto; que está ou se sente desnorteado, desorientado; a datação é de 1602.

19.Aringa: agrupamento, senzala. [a»Ri)Ngå]

aringa (a) agrupamento (b) senzala. Kik-Kim nziNga campo fortificado entre os negros na África.

Cafre

Campo fortificado de chefes de tribos africanas. A datação é de 1881.

O dicionário diz: orig.contrv., tido como afr. do Cafre (???).

20.Arruaça: briga na rua. [αηυ∪ασα]

Motim, tumulto ou desordem de rua; conflito envolvendo várias pessoas; briga, confusão. A datação é de 1881.

O dicionário não dá uma etimologia provável.

21.Auê: bagunça. [αυ∪ε]

Situação dominada por grande alvoroço; confusão, tumulto, rebelião. A datação é de 1970.

Prov. afr.; segundo Cacciatore, termo us. em cânticos dirigidos aos orixás e entidades, do ior. a'we 'meu amigo'..

22.Ave: cf. afu [a∪ϖε] Variação:[α∪φε]

23.Avuro: muito, avuro

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demasiado. [a»vuRU]

muito, demasiado. Kik-Kim kiavulu

24.Babá: Tratamento dado as amas pretas e velhas, no entanto, hoje dá-se a qualquer ama-seca, ama-de-leite. Ou, empregada que cuida somente de crianças. [ba»ba]

Babá, bá (a) tratamento respeitoso para mameto.

(b) tratamento que era dado as amas pretas e velhas mas hoje a qualquer ama-seca, ama-de-leite.

Kik-Kim kiba@aba criadeira, ama de leite

¹babá tratamento carinhoso com que se deferem os meninos e rapazes jovens; datação é de 1345. ²babá empregada doméstica que cuida das crianças; ama-seca, ama-de-leite; a datação é do séc. XVI. ³babá bolo de massa muito leve, ger. com passas, e embebido em calda com rum ou licor etc; a datação é de 1899. babá nos cultos iorubas e em seus derivados, pai ou ancestral; em alguns candomblés, título de reverência com que se designa Oxalá; a datação é 1933. babá arbusto rasteiro (Solanum agrarium) da fam. das solanáceas, nativo do Brasil. babá babalaô ('pai-de-santo')

Nei Lopes diz que pode ter orig. no quimb. baba 'dar palmadinhas para fazer adormecer crianças, acalentar'.

25.Babaça: coisa sem valor. “Isso é uma babaça”; “Que babaça!”. [ba»baså]

babaça coisa sem valor Kik babasa

O dicionário diz que é c.f. MABAÇA : irmão ou irmã gêmea; epíteto do orixá duplo Ibêji. A datação de babaça é de 1939. Mabaça não possui datação.

A origem que mostra o dicionário é: quimb. E quicg. Ma’basa, pl. de ka’basa ‘gêmeo’; pl. formado com o pref. Ba- ou ma-; daí as var. babaça e, babaço.

26.Babaca: imbecil; vulva. “Você é um babaca”.

babaca vulva. Kik-Kim

(a) Que ou o que é ingênuo; tabaca, simplório, tolo,

Conforme o dicionário é um lat. Hispânico

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[ba»bakå]

mubaki, mabaka

babaquara. (b) Que ou o que não tem vivacidade ou inteligência; bobo. (c) Sem conteúdo ou interesse; irrelevante, superficial. Vulva. A datação é de 1939.

baburrus,a,um ‘tolo, basbaque, simplório’; as noções de ‘nesciedade’ e ‘infantilismo’ fazem supor ligação com cog. De baba-; acp. Tabu de babaca ‘vulva’ pode ser relacionada à cog. De baba- pela forma e pelo semanticismo; há quem assinale nexo com o port. Basbaque, outros admitem possível infl. De bobo; ver bab- e bob-; o voc. Tb. Tem sido associado ao tupi babaquara, formado de mbae’be ‘nada’ + kwa’a ‘saber’ + suf. De agente –ara lit. ‘o que nada sabe, mas manda’; 1939 é a data para a acp. ‘vulva’ e 1969 é a data para a acp. ‘bobo’.

27.Babaquara: velho. “Você ta parecendo um babaquara”. [baba»kwaRå]

babaquara (a) velho, decrépito (b) influente, poderoso Kik babakala

Habitante do interior, ger. pouco instruído e de modos simples; roceiro, caipira. Que ou o que se revela bobo; parvo, pateta, babaca. Que ou o que exerce grande influência, tem grande poder.

Segundo Nascentes, do tupi (???) mbae'be 'nada' + kwa'a 'saber' + suf. de agente –ara. Manteve-se o sentido de “velho” no Guaporé, as outras semânticas

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se perderam. 28.Babáu: foi-se; acabou. [ba»bau9]

babáu foi-se, acabou-se! Kik babau

No dicionário encontramos: ¹babau exclamação indicativa de que a perda de algo é irreversível; a datação é de 1632. ²babau personagem do reisado e do bumba-meu-boi; a datação é de 1958. ³babau nos babaçuês e batuques, sacerdote dirigente e sacrificador dos animais oferecidos aos orixás, voduns e entidades caboclas; maitatá;

Nei Lopes registra uma forma babau em quimb. com sentido de 'foi-se!'; e ainda diz que talvez relacionada com o voc. ior. baba 'pai, chefe', cf. babá, confere sentido ³babau.

29.Baculo: velho, ancião, o mais velho do culto afro. [ba»kulU]

baculo baculo(a) velhos, anciões (b) os mais velhos do culto.

Kik-Kim bakulu bacuro orixá, santo nos cultos congo e angola

O dicionário Aurélio diz que baculo é equivalente de baculi[do lat. Baculus]bastão,caule; Baculiforme, baculífero [equiv.baculo].

Não encontrei datação. É uma palavra que não existe no dicionário com o mesmo sentido do Guaporé e dos Dicionários, mas que existe no vocabulário do povo.

30.Bagunça: auê!; desordem. [ba»gu)nså]

bagunça (a) desordem, baderna, remexido, confusão

(b) pândega ruidosa. Kik bulugusa, buluNgunza

Máquina de remover aterro; Falta de ordem; confusão, desorganização; Farra ruidosa; baderna, bagunçada.

Os dicionários Aurélio e Houaiss não registram uma origem provável. Mas sua datação é de 1926.

31.Balangandã /barangandã: coleção de ornamentos ou amuletos em metal ou prata, em forma de liga, medalhas, peixes. [bala)Nga)n»da)] [baRa)Nga)n»da)]

balangandã, balagandã, barangandã

(a) coleção de ornamentos ou amuletos, em metal ou prata, em forma de figa, medalhas, chaves, peixes, meia-lua, etc., usada pelas baianas em dias de festa.

(b) penduricalhos

Ornamento de metal em forma de figa, fruto, animal etc., que, preso a outros, forma uma penca us. pelas baianas em dias de festa; serve tb. como objeto decorativo, lembrança ou, se miniaturizada, jóia ou bijuteria;

O dicionário Houaiss diz que é de origem onomatopéica, por causa do barulho que esses pendentes fazem. Onomatopéica???

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balangandã (a) testículos balangue (a) testículos Kik-Kim bulaNgaNga balouçar > mbalaNgaNga penduricalhos Kik mbalaNge Kim malaNga

berenguendém [No passado era us. esp. na festa do Senhor do Bonfim, em Salvador, pendente da cintura ou do pescoço das afro-brasileiras, e constituía amuleto contra o mau-olhado e outras forças adversas.]

32.Bamba: bastão, vara. [»ba)mbå]

bamba (a) bastão, vara

¹bamba [bambúrrio]. ²bamba que ou o que é muito valente; valentão; conhecedor profundo de determinado assunto; bambambã.

O dicionário diz ser do quimb. mbamba 'mestre'; para a acp. 'valentão', Nei Lopes levanta hipótese de um quicg. ebamba-ngolo 'valentão'. É necessário um estudo mais profundo para chegar ao étimo.Os diferentes sentidos nos remetem para outras línguas prováveis.

33.Bambi: veado, gazela. [ba)m»bi]

bambi (a) veado, gazela (b) frio. Kik-Kim mbambi Umb ombambi

Mal que dificulta o parto, atribuído a falso juramento ou promessas não cumpridas;

O dicionário diz o seguinte: palavra crioula de origem obscura..

34.Bangüê: padiola feita de cipós entrelaçados que era usado para transportar cadáveres de escravos. [ba)N»gwe]

bangüê (a) padiola feita de cipós entrelaçados, que era usada para transportar cadáveres de escravos

(b) espécie de liteira usada no campo, para transportar crianças, enfermos ou mortos

(c) serve também para carregar a bagaceira da moenda e materiais de construção para o

(a)Padiola tosca para carregar terra e materiais de construção; (b) padiola us. para transportar cadáveres; (c) nos engenhos, espécie de padiola em que se leva o bagaço da cana para a bagaceira após a moagem; (d) couro de boi com varas atadas nas

Segundo Nei Lopes, pal. banta de orig.contrv.; para Nascentes, quimb. mba'ngwe, de que informa não saber o significado.

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canteiro de obra (d) canal ladrilhado por onde escorre a espuma das tachas de açucar

(e) engenho-de-açucar primitivo

(f) topônimo muito comum na zona açucareira do nordeste.

(a-c) Kik baNgi < baNga padíola de cipós entrelaçados

(d) Kik mwanze <mwanzai canal, rego

(e) Kik mwaNge casa de cana-de-açúcar

(e) Kim nzo mweNge casa de cana-de-açúcar

extremidades no qual se transporta terra para os aterros; (e) espécie de liteira com teto e cortinado de couro, para o transporte de mulheres, crianças e enfermos. A datação é de 1899.

35.Bancar: querer aparentar o que não é. [ba)N»ka]

bancar (a) fingir, simular alguma coisa ou ato

(b) dar-se ares de Kim kubaNga, kubaNka fazer

Servir de banqueiro em (jogo de azar); Sustentar financeiramente (algo ou alguém) ou levantar capitais necessários para o financiamento de (uma empresa ou empreendimento); financiar; Fazer-se de; fazer as vezes ou o papel de; fingir. A datação é de 1913.

36.Bandola: preá, espécie de rato comestível. [ba)n»dolå]

bandola preá, espécie de rato do campo comestível.

Kik baNgala Kim mbeNgula

¹bandola cinto do qual pendem cartucheiras de pólvora; saco de serapilheira us. na colheita de cacau; vela armada improvisadamente em verga, antena ou trave, devido a desarvoramento ('perda dos mastros') de veleiro; a datação é do séc. XVII ²bandola bandolim

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tenor; a datação é de 1922.

37.Banduleiro: criança sem fazer nada; atoa. [βã<δυλεϑ∪ΡΥ]

Bandoleiro [subst. indivíduo que pratica assaltos, roubos; bandido; indivíduo que mente, trapaceia]. Bandoleiro[adjt. inconstante nos amores, nas amizades; sem paradeiro certo; errante; sem ocupação; vadio, ocioso. A datação é de 1600.

No dicionário está grafado “bandoleiro”, no Guaporé a pronúncia é claramente “banduleiro”.

38.Bangola: esperto; gabola. [ba)N»golå]

bangola esperto, gabola. Kik baNgula

Encontramos no dicionário bangolar=andar ao acaso; O dicionário diz: segundo Nei Lopes, palavra. banta, mas de orig.controvérsia.

39.Banguela/banguelo: ato de escangalhar cachos de coco do engaço; desdentado.

[ba)N»gelå] [ba)N»gelo]

banguela (a) ato de escangalhar cachos de coco do engaço

banguela, banguelo (b) desdentado ou quem tem a arcada dentária falha na frente.

(a) Kik baNgala fender, rachar

(b) Kik kibaNgala fenda (nos dentes)

(a) benguela ('indivíduo, povo e acp. adjetivas') (b) que ou quem se ressente da falta de um ou mais dentes na parte frontal de uma ou de ambas as arcadas; banguelo; (c) que ou quem pronuncia mal as palavras, como se não possuísse dentes na parte frontal da arcada; que ou quem fala incorretamente; banguelo.

A datação desta palavra é de 1899, e possui sentido diferente no Guaporé. Para Nei Lopes é top. Benguela (Angola) tomado como subst. com a mesma orig. da f.divg. benguela; as acp. 2 e 3 ligam-se ao fato de os benguelas, na África, no passado, usarem limar os dentes incisivos.

40.Bangula: embarcação de pesca. [ba)N»gulå]

bangula, mangula barco de pesca. Kik mbaNgula

Embarcação de pesca que tem semelhanças com a garoupeira; bangula; calungueira.

O dicionário diz que é de orig.obsc.; segundo Nei Lopes, regr. de bangular. Sua

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datação é de 1899.

41.Bangulê: dança dos negros batendo palmas e saltando. [ba)Ngu»le]

banguelé, banguelê, bangulê

briga, arruaça, confusão. Kik-Kim mbaNgile (procurar) briga

Fon ZElE (procurar) briga

Espécie de jongo, acompanhado de palmas e cuíca; Banguelê briga em que se envolvem muitas pessoas; banzé, bangulê.

A datação é de 1899. O dicionário diz ser afr. segundo Nascentes; para Nei Lopes, contrv., do quicg. e quimb. bangula 'destruir, desorganizar' ou do umbd. vangula 'falar'.

42.Banhá: tomar banho. [βã∪α]

banhar (a)dar banho em ou tomar banho; lavar(-se); (b) tomar banho de assento.

A datação é do séc. XIII. O dicionário Houaiss diz ser do latim vulgar.

43.Banheira: bacia. [βãεϑΡα]

(a) bacia de aço inoxidável ou de plástico na qual são banhados os filmes nos processos de revelação, fixação etc.; (b) aparelho sanitário em forma de uma cuba grande, no qual a pessoa lava o corpo ou se deixa lavar. A datação é de 1831.

O dicionário diz que a etimologia é: fem. substv. de banheiro; ver balne(o)-.

44.Banto: é conhecido no vale do Guaporé como um povo africano, não como um conjunto de línguas. [∪βãτΥ]

Grande conjunto de línguas do grupo nigero-congolês oriental faladas na África, do quinto paralelo da latitude norte (altura de Cabinda) até o Sul, reunidas basicamente por critério morfossintático e lexical.

banto ba pref. de pl. + ntu 'homem', indicando que mu ntu sing. 'homem, indivíduo'

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45.Banza(r): ficar pensativo, triste, pasmado de mágoas, sentir banzo. “Hoje é festa do divino é proibido ficar banza”. [»ba)nzå]

banzar (a) ficar pensativo, triste, pasmado de mágoas, sentir banzo

(b) andar à toa, errar. (a) Kik-Kim kubanza pensar, refletir

(b) Kik-Kim kubanza andar nervoso, agitado, sem rumo

(a) pegar de surpresa ; surpreender, pasmar, espantar. (b) ficar pensativo; cismar, matutar.

A datação é de 1707. O dicionário Houaiss diz: antepositivo, do port. banzo (deverbal), de banzar, de balançar, com síncope do -l- intervocálico, no sentido, em banzar, de 'ficar tonto', por metáfora marítima, em mar banzeiro (sXVI); de outro lado, banzo ocorre como subst. masc. e adj. 'triste, abatido; nostalgia dos escravos africanos', conexo quase certamente com o subst. fem. banza 'povoação dos negros africanos, residência dos sobas ou chefes tribais na África' (1591), do quimb. máza; é improvável que os usuários, salvo os eruditos, tenham discriminado significante e significado no uso do el.comp. banzo, pelo menos no Brasil, desde o momento em

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que coexistiram; infelizmente, banzo no sentido africano está por ora só referido a partir do sXIX, o que deve sofrer retrodatação, com a pesquisa; os der. ou conexos são banza, acima citado, banzado, banzão, banzar, banzativo, banzé, banzear, banzeira, banzeiro, banzento, banzo.

46.Banzo: nostalgia mortal dos africanos em cativeiro. “João está com banzo hoje”. [»bafl)nzU]

banzo (a) nostalgia mortal dos africanos em cativeiro

(b) saudade. Kik-Kim mbanzu lembrança, saudade

Este primeiro significado é datado em 1561 que é cada uma das duas peças longas e laterais do bastidor de bordar; E este outro siginificado é datado de 1871 que é

processo psicológico causado pela desculturação, que levava os negros africanos escravizados, transportados para terras distantes, a um estado inicial de forte excitação, seguido de ímpetos de destruição e depois de uma nostalgia profunda, que induzia à apatia, à inanição e, por vezes, à loucura ou à morte

O dicionário diz que é origem duvidosa prov. regr. de banzar, mas, segundo Nei Lopes, afr. do quicg. mbanzu 'pensamento' ou do quimb. mbonzo 'saudade, paixão';

47.Baquité: sacola com alguma coisa dentro. “Passa esse baquité pra mim por favor!”.

Espécie de cesto que as índias costumam trazer às costas.

A datação é de 1913 e o dicionário diz que é

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[βακι∪τ∈]

provavelmente de origem tupi. O dicionário diz que é uma espécie de samburá que é um cesto de cipó ou de taquara.

48.Baranga: mulher feia. “Essa mulher é uma baranga”. [βα∪Ρãγα]

(a)de baixa qualidade; de pouco ou de nenhum valor; (b) mulher feia, deselegante, mal-ajeitada.

Segundo Nei Lopes, do quicg. mbalanga 'hérnia umbilical'.

49.Bata: é o ato de bater o cereal colhido com cacetes para debulhar os grãos. [»batå]

bata ato de bater o cereal colhido com cacetes, a fim de debulhar os seus grãos..

Kik-Kim bata bater até rachar, estalar, debulhar + português bater

Bata o que serve como ração comida; ¹bata variedade oriental de algodão; traje feminino solto e largo abotoado na frente do decote à barra e etc; ²bata ação de bater as ramas do feijão para deles desprender os grãos; batedura. ³bata lugar onde se mora habitação.

O dicionário Houaiss data bata de 1544, e indica origem hindustani. bhata, bhatha ou bhátá 'id.'; no ¹bata diz que é de 1836; para todos ele dá a mesma origem. No entanto, o dicionário Aurélio diz que possivelmente é de origem germânica.

50.Batelão: barco grande. [βατε∪λão]

(a)barcaça de madeira ou ferro, ger. rebocada, us. para transporte de carga pesada; (b) embarcação movida a remo ou a reboque, us. no comércio fluvial (c) canoa pequena e alta, de grande pontal.

O dicionário Houaiss diz que vem de batel + -ão talvez p. infl. do it. batellone 'barco a remo de grande dimensão'. De origem portuguesa, datada em 1454. O dicionário Aurélio diz ser aumentativo de batel que é um pequeno barco. A etimologia:

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[Do fr. ant. batel, atual bateau.]

51.Baticum: batimentos contínuos. [batSi»ku)]

baticum (a) barulho ou batimentos continuados, sucessão de marteladas

(b) palpitação, pulsação forte do coração e das artérias.

Kik-Kim vatitutitu pulsante, palpitante, batido continuado

(a) Ruído de sapateado e palmas, como nos batuques. (b) Sucessão de marteladas. (c). Pulsação forte do coração e das artérias. (d) Barulho provocado pela queda de um corpo pesado na água. (e) Discussão acalorada. (f) Falatório, falario. [Cf. bate-cu.]

52.Batiduro: comer muito. Ex.: “Batiduro na comida que ele fez”. [βατΣι∪δυΡΥ]

Bater duro?

53.Batuca(r): repetir a mesma coisa intensamente; dançar batuques; tocar tambores e bumbos. [batu»ka]

batucar (a) repetir a mesma coisa insistentemente;

(b) dançar batuque, tocar tambores e bumbos

(c) fazer barulho ritmado com pancadas

(d) bater com força, repetidamente.

Kik-Kim vutuka > vutikila

Kik-Kim vutukila + português bater

[De batuque + -

ar2.] (a)Dançar e cantar o batuque (1). (b)Fazer barulho ritmado com pancadas. (c)Bater repetidamente com força; martelar. (d) Dar o ritmo de, percutindo: (e)Tocar (música popular ritmada) ao piano.

O dicionário diz ser de orig.contrv; ligado a bater e o suf. verbal -ucar; ver 1bat-. A datação é de 1727.

54.Batucajé: som agudo e forte produzido pelo som de atabaques; dança profana e barulhenta ao som de atabaques. [batuka»ZE]

batucajé (a) som agudo e forte produzido pelos atabaques

(b) dança profana e barulhenta au som de atabaques.

Kik vutukilawe

[De batuque + elemento de or. afric., poss.] (a)Dança profana ao som de tambores. (b)O ruído produzido pelo toque dos atabaques.

O dicionário Houaiss diz que provavelmente é formado de batuque e ior. a'je 'feiticeiro' (???). A datação é de 1959.

55.Batuque: batimentos rítmicos. [ba»tukI]

batuque (a) ruído, som muito forte

(b) ação de fazer ruído

Ato ou efeito de batucar, de bater com reiteração, de dar pancadas seguidas, de

No dicionário Houaiss orig.contrv.; segundo

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com batimentos rítmicos.

fazer ritmo ou barulho desta maneira; batucada

Nascentes, regr. de bater; segundo AGC, regr. de batucar; para Cacciatore, talvez do ronga batchuk 'tambor, baile'; Nei Lopes sugere associação com o verbo quimb. tuka 'saltar'.

56.Beleléu: sumir (morrer). “Ele foi para o beleléu”. [bele»lEu9]

beleléu (a) “ir para beleléu” = morrer, sumir, desaparecer

(b) frustrar-se, malograr-se, fracassar.

Kik mbelele cemitério Kim mbalale cemitério

Morte;desaparecimento; malogro.

57.Bengala: pequeno bastão. [be)N»galå]

bengalá bastão pequeno . Kim mbaNgala bastão >hindustani?

Pequeno cajado de se conduzir na mão feito de cana de Bengala.

O dicionário diz que vem do hindustani “Bang-alaya” 'reino do banga ou vanga', povo primitivo que habitou a região; a literatura sânscrita antiga faz referência a esse reino, embora ele não tenha tomado parte ativa na lendária guerra descrita no Mahábhárata; Bangla desh é 'Bengala livre', usualmente Bangladesh; o top. dá origem ao subst.com. nas várias acp.; 'bastão' red. de cana de Bengala; var. top. Bengla,

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Bangala, Bangla; var. gentílico com suf. bengalense e bengalês; o subst. também apresenta numerosas formas variantes; f.hist. c1543 bengala 'tecido', 1561 bengala subst. 'natural ou habitante de Bengala', sXVI Bengala top., sXVI cana de Bengala 'cajado'

58.Bengo: espécie de capim. [»be)NgU]

bengo (a) espécie de capim (b) espécie comestível de preá

(c) viela (d) designação depreciativa de ruas estreitas e tortuosas, caminhos escuros, quase intransitáveis

(e) vendola, lugar ou estabelecimento mal freqüentado.

(a) Kik mbeNgu (b) Kik mbeNgi (b) Kim dibeNgu (c) Kik-Kim mbeNgo, mbuNgu

¹bengo rua estreita e sinuosa; caminho recôndito, escondido; lugar pouco ou mal freqüentado; estabelecimento comercial muito modesto; birosca, tendinha; ²bengo préa

Segundo Nei Lopes, quimb. dibengu 'rato'; a datação é de 1958.

59.Benguela: uma personagem histórica, escrava, que se tornou chefe de um quilombo, conhecida também como Tereza de Quariterê. [be)N»gelå]

benguela denominaçâo provavelmente dada pelo tráfico negreiro aos ovimbundos provenientes do antigo reino de Benguela, a sudoeste de Angola, cuja língua majoritária é o umbundo; rua estreita e tortuosa

(a)dos benguelas; banguelas. (b) relativo a benguela ou ao povo benguela. (c) povo banto que habita a reigão de Benguela (Angola).

Não possui registro histórico.

60.Beradeiro: o ribeirinho.

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[βεΡα∪δειΡο] 61.Berimbau: arco musical, instrumento indispensável na capoeira. [beRi)m»baU9]

[biRi)m»baU]9

berimbau (a) arco-musical indispensável na capoeira

(b) pessoa alta, magra e bem esguia.

Kik-Kim madimbau

Umb omadimbau

Instrumento idiofone de origem banta que consiste num arco de madeira retesado por um fio de arame e com uma meia cabaça (caixa de ressonância) presa ao dorso da extremidade inferior

O dicionário Houaiss diz: orig.duv., o dicionário diz ser prov. quimb. mbirim'bau; f.hist. 1536 birimbao

62.Berimbelos: coisas penduradas. [βεΡι)βΕλoσ]

63.Biatá: joeirar, passar em peneira. “Hoje vou biatá o feijão”. [biJa»ta]

biatá passar em peneira, joeirar, limpar milho, feijão, etc. após colheita.

Kik-Kim kubia@ta joeirar, peneirar

Umb okupiata joeirar, peneirar

64.Biboca: casa; lugar sujo. [bi»bokå]

biboca (a) casa, lugar sujo (b) por extensão, bodega, pequena venda.

Kik lomboka / biboka lugar, casa suja, escura

(a) sanga ou barranco produzido por águas de enxurrada ou por outras causas naturais; (b) vale acentuado e de difícil acesso; (c) depressão úmida e sombria nas encostas; grota, socavão, sovaco de serra; (d) lugar ermo.

A datação é de 1870. O dicionário diz ser provavelmeno do tupi *ïmbï'mboka 'buraco, local de difícil acesso', do tupi ï'mbï 'terra, solo, chão' e 'mboka 'abertura, fenda' ou 'oka 'casa, toca'.

65.Bilha: vaso para colocar água (pequena), sem haste. [βι∪× ]

(a) vaso bojudo e de gargalo estreito, ger. de barro, us. para água, leite, vinho e outros líquidos potáveis; (b) moringa

O dicionário diz que é de origem francesa bille (1164); e ainda diz ser de orig.contrv.; acp.orig. (sXIII) 'bolinha, coisa de pouco valor', por ext. 'objeto de forma arredondada'; acp. de tec

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(c1900) 'pequena esfera sobre que se opera rotação de certos mecanismos'; prov. do antigo b.-frânc. *bikkil 'dado, ossinho, pequena bola'; no port., billa é do sXIIIe bilha, do sXVII

66.Bimba: termo injurioso referente a ânus. [»bi)mbå]

bimba (a) termo injurioso equivalente a ânus, traseiro, e empregado geralmente na expressão “tomar na bimba”

(b) pênis de criança (c) pênis pouco desenvolvido.

(a) Kik mbimba mesmo significado

(b-c) Kik vimba inchaço, pênis, cacete

(b-c) Kim Zimba inchaço, pênis, cacete

(a)a parte superior interna da(s) coxa(s); (b)virilha; (c)o pênis, ger. infantil ou de reduzidas dimensões; pimba;

segundo Nei Lopes, talvez quimb. 'mbimba 'cacete, cajado' dê orig. à acp. 'pênis' e, p.ext., 'coxa'; ou talvez umbd. 'mbimba 'cortiça, medula vegetal, madeira leve' dê orig. à acp. 'coxa', em cruzamento com quicg. 'mbimbi 'tronco de bananeira ou de palmeira'; a datação é de 1858.

67.Binga: : chifre; ponta de chifre para guardar tabaco, pó, ou pólvora. [»bi)Ngå]

binga (a) chifre (b) ponta de chifre de boi torneada, própria para guardar tabaco em mpó ou pólvora para espingarda de caça

(c) corno, chifrudo, marido traído

(d) homem sem importância

(e) espécie de cascalho em forma de chifre

(f) tipo de colibri, beija-flor

(g) isqueiro tosco usado no interior

(a)Isqueiro feito com a ponta de um chifre e uma lasca de pedra, que se atrita com uma lâmina de ferro ou de aço (ger. um pedaço de lima), provocando uma faísca que inflama a bucha de algodão; (b)artifício, fuzil, papa-fogo; (c)lampião de querosene.

Quimb. mbinga 'chifre'. A datação é de 1899.

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(h) lampião de querosene

68.Biraia: prostituta. [bi»Rajå]

biraia prostituta de classe baixa. Kik biwaia Kim kiwaia

(a)mulher reles ou má; (b)megera; (c)prostituta.

O dicionário diz que é de origem obscura, e não possui datação histórica.

69.Biringa: pênis de criança. [bi»Ri)Ngå]

biringa (i) pênis. (a-f) Kik mvimba chifre (a-f) Kim mbiNga chifre (g-h) Kik mwiNga isqueiro, lampião

70.Birita: cachaça ou tomar uma cachaça. [bi»Ritå]

birita gole de cachaça [Alto São Francisco]

Aguardente de cana-de-açúcar; cachaça

O dicionário diz ser de origem obscura. Não possui datação.

71.Biscate: mulher da vida. [βισκϑτΣι]

(a)trabalho de pouca monta; (b)bico; (c)prostituta.

A datação é de 1899.

72.Bobó: comida feita de uma variedade de feijão, inhame, ou bananda da terra, com camarão. [bo»bç]

bobó (a) começo de gravidez (b) pessoa indesejável (a) Kik mbobo inchação

¹bobó comida de origem africana, feita com feijão ger. mulatinho, cozido até a consistência de uma papa, com azeite de dendê e temperos;creme de inhame,aipim ou fruta-pão cozido com azeite de dendê e temperos; ²bobó indivíduo tolo, bobo; ³bobó ação de excitar o pênis com a boca.

Jeje bo'bo 'comida de origem africana feita com feijão'; a filiação do sentido 'prenhez' a este étimo é apenas supositícia; a datação é de 1899.

73.Boboca: pessoa boba, que diz ou faz coisas insensatas. [bç»bçkå]

boboca desdentado. Kik momoka

Kim maboboka

¹boboca biboca (vale acentuado); ²boboca que ou quem diz coisas insensatas; ³boboca sem dente.

O dicionário diz ser do quimb. uabo'boka 'desdentado'. A datação é de 1899.

74.Bobocona: pessoa parada que não vê o tempo passar. [b b 'kονα]

O mesmo que boboca.

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75.Bocado: muito. [βο∪καδΥ]

(a)Porção de alimento que se leva de uma vez à boca. (b)Pedaço, porção. (c)Pequena quantidade de qualquer coisa. (d)Intervalo de tempo. (e)Parte do freio que fica dentro da boca da cavalgadura; bocal. (f)Passadio, sustento.

A datação é de 1258. [Sin. (bras.): bocada, biró.]

76.Bode: menstruação. [»bodZI]

bode, menstruação. Kik mbodi Kim mboZi

¹bode o macho da cabra;cabrão;indivíduo que usa cavanhanque;indivíduo feio, repugnante. ²bode moeda do passado usado em Cambaia, antiga cidade portuária da Índia portuguesa. ³bode pequeno disco de cera preta usado na cabeça dos ladins e seus vizinhos zulus.

O dicionário diz que é de orig.obsc., talvez pré-romana; ver bod-, a datação é do séc. XV.

77.Bodó: bolinho de trigo com leite, ovo. [β ∪δ ]

(a)Cascudo-comum; (b)Bajurqui.

Esta palavra tem da datação de 1922 e o dicionário diz que é de origem obscura.

78.Boga: ânus, especialmente o da mulher. [»bogå]

boga ânus, traseiro. Kik-Kim mboga ânus, traseiro (geralmente de mulher)

(a)design. comum a alguns peixes teleósteos perciformes da fam. dos esparídeos, que inclui os pargos; (b)ânus;

O dicionário diz ser do: Grego. bóks através do lat. bóx,ócis 'espécie de peixe', (doc. boca em Plínio) e difundido nas línguas român., prov. boga (sXIII), esp. boga (1423), fr. bogue (1554) A datação é de 1258.

79.Bogó: copo de couro usado no jogo de dados.

bogó (a) vaso de couro com

(a) bocó (b) Vaso de couro com

O dicionário diz ser de origem

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[bç»gç]

que se tira água de cacimba

(b) copo de couro usado no jogo de dados.

Kik-Kim kiboNgu

que se tira água de cacimba. (c)Copo de couro usado no jogo de dados.

obscura. Não possui datação.

80.Bolão de barro: mulher gorda. [β ∪λãωδεβα∪ηo]

81.Bolar: rolar. [bo»la]

bolar entrar em transe, incorporar a entidade.

Kik-Kim mbokola entrar em transe + português bolar cair, rolando como uma bola

¹bolar acertar (algo)com... bolar;alcançar, tocar; acertar onde a mira se dirigia; ²bolar nas religiões afro-brasileiras, receber em seu corpo(um orixá ou entidade afim); ³bolar relativo a bolo(terra).

A datação é de 1543, e o dicionário não dá uma origem provável.

82.Bololô: pessoa gorda e forte. [bolo»lo]

bololô confusão, barulho. Kik bololo Kim + Fon Ngololo + gbolçlo@

Yor bo@robo$ro + português bolo confusão

No dicionário bololô remete a Bolo('briga', 'confusão', 'concentração')

A datação é do séc. XX.

83.Borocotó: terreno escabroso com muitos altos e baixos, escavado ou obstruído de terras. [bçRçkç»tç] [bRçkç»tç]

borocotó, brocotó (a) terreno escabroso com muitos altos e baixos, escavado ou obstruído de pedras

(b) sulco irregular aberto por águas pluviais em ruas sem calçamento.

Kik-Kim mbulukutu

(a)terreno desigual, esburacado;buraco fundo; (b)fenda cavada por enxurradas em ruas de terra batida

Nei Lopes lembra o quicg. boloko'to, onom. us. para indicar 'ranger de dente, sapato etc. diante de algo duro' e, p.ext. 'ruído de passos em caminho cheio de pedras e paus', a datação é de 1899. Enquanto Nei Lopes dá uma provável origem africana o dicionário Aurélio diz ser do tupi.

84.Borocoxô: pessoa triste.

borocoxô pessoa envelhecida,

(a)que ou quem está envelhecido e/ou

Para Nei Lopes, do quicg.

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[boRoko»So] fraca, sem coragem. Kik + Yor bulukuloto + ogbo@ ku$jç @ku$jç

alquebrado; (b)que ou o que é ou está desanimado; aborrecido;

boloko'to 'o que caminha devagar e penosamente';

85.Bozó: oferenda propiciatória; encantamento. “Ele fez um bozó para mim”. [bo»zç]

bozó (a) oferenda propiciatória (b) feitiço, malefício. Kik (a) mbo@ozo encantamento

(a)Jogo de dados em que estes são atirados dentro de um cilindro de folhas-de-flandres ou de um copo de couro, só se descobrindo o lance depois de feitas as apostas. (b)Esse cilindro, nesse jogo ou em jogos análogos: (c) Determinada quantia que dois ou mais parceiros combinam deixar de lado cada vez que um deles ganha, e que, findo o jogo, será dividida entre os participantes da combinação. (d) Barato; (e) bruxaria;

De orig. afr., segundo Cacciatore prov. do quimb. mbonzo 'tristeza', o voc. liga-se à prática divinatória fânti-axânti, de jogar pequenos objetos sobre um tabuleiro ritual, para consultas oraculares, donde acp. 'feitiço, magia negra'

86.Branda: muita conversa. Ex.: “Ele ta branda hoje”, ou seja, com muita conversa. [∪βΡãδ ]

Não é atestada nem no dicionário de bantuísmo e nem no de português.

87.Brevezinho: Cordão com a oração de nossa senhora do bom parto. [βΡΕϖε∪ζιΥ]

De “breve” (a)De pouca duração; rápido, transitório: (b)De pouca extensão ou tamanho; pequeno, curto: (c)Leve, ligeiro: (d).Conciso, lacônico, resumido: (e)Escapulário que contém uma oração.

O dicionário diz ser do latim.”breve”.

88.Brocotó: cf. borocotó [βΡ κ ∪τ ]

89.Brucutar: procurar remexendo, fazendo barulho. “Para de brucutar menina!”. [bRuku»ta]

brucutar procurar remexendo, fazendo barulho.

Kik bulukuta

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90.Brucutu: homem negro, forte e rude. [bRuku»tu]

brucutu, burucutu (a) homem forte e rude (b) veículo policial usado para dispersar manifestantes de rua.

Kim bulukutu + português bruto

(a)indivíduo feio, malfeito, grande; (b)indivíduo grosseiro, não civilizado; (c)carro blindado us. para reprimir manifestações, passeatas, tumultos públicos etc.

O dicionário diz que é de origem onomatopéica(???) e não tem datação.

91.Budum: cf. burdum. [βυ∪δυ⊃]

92.Bugerê: comida que se prepara rápido. [βΥγε∪Ρε]

93.Buginganga: Coisas de pouco valor, cacarecos, quinquilharias. [buZi»ga)Ngå]

bugiganga (a) dança de macacos ou de bonecos

(b)bugiarias, bagatelas, coisa de pouco valor; quinquilharias

(c) topônimo: rio [RS] mogiganga grupeto de farçantes Kim kabuZaNgaNga esquilo

Árabe ?

(a)objeto de pouco ou nenhum valor ou utilidade; quinquilharia; (b)ninharia, insignificância (c)rede para pescar, de envolver, que se arrasta para terra (d)na Espanha, pequena companhia de farsantes que representava algumas comédias e autos pelos vilarejos do interior

A datação é do séc. XVII.

94.Buiu: cobra grande, sucuri; pode ser apelido de menino. [∪bυιυ]

Atestado na Bahia como apelido

95.Bulir: mexer. [bυ∪λι]

(a)mover-se, agistar-se de leve,mexer-se, deslocar-se; (b)balançar( o navio); (c)tocar em algo ou alguém; mexer em.

O dicionário diz ser do latim.

96.Bumba/bumbo: pancada, surra: tambor, bombo. [»bu)mbå]

[»bu)mbΥ]

bumba, (a) pancada, surra (b) tambor, bombo

Palavra imitativa de uma batida rápida ou de uma ação rápida e decidida; zás .

O dicionário diz ser de orig.contrv; prov. Onomatopéica (???).; há que se

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considerar a hipótese de orig. no quicg. mbumba 'bater'.

97.Bumbar: surrar, espancar; bater o bombo [bu)m»ba]

bumbá (a) surrar, espancar, bater (b) tocar, bater o bombo. (a) Kik nza mbuma tambor de madeira, muito grande e comprido

(b) Kik zunza mbuma fazer música com muito ruído, com tambo

Kik bumba bater

(a)Zabumba; (b) surrar, desancar, esbordar.

O dicionário diz ser de 1927 e não dá uma origem.

98.Bumbum/bunda: nádegas. [bu)m»bu)] [»bu)ndå]

bumbum traseiro. Kik-Kim mbumbu bunda nádegas, traseiro. Kik-Kim mbunda nádegas, ânus

(a) estrondo contínuo repetido; (b) som de zabumba; (c)nádegas.

O dicionário diz ser de 1881 e diz que é de origem onomatopéica (???).

99.Bundá: cacarecos. [bu)n»da]

bundá trastes velhos, cacarecos

Cacaréus. O dicionário diz ser de origem africana. (não especificada)

100.Burdum: com sovaqueira, mau cheiro. Ex.: “Francisco está com burdun”. [βυη∪δυ)]

budum mau cheiro corporal. Kik-Kim kibuzu

No dicionário de bantuísmos não encontramos burdum e sim a palavra budum que tem o mesmo siginificado que burdun.

101.Buzum: mau cheiro. [bu»zu)]

buzum, mau cheiro corporal. Kik-Kim kibuzu

102.Cabaço: hímen, virgindade. [ka»basU]

cabaço hímen, virgindade da mulher

Kik-Kim kabasu hímen

(a) o fruto da cabaceira; (b)o hímen; a virgindade da mulher; homem casto.

Voc. formado a partir de cabaça; da f.fem. term. em -a depreendeu-se, p.ana., a f.masc. term. em -o, com algumas acp.

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Semelhantes e novas acp.; f.hist. 1500 cabaaco, 1500 cabaaço. O dicionário diz ser do quimbundo.

103.Cacaio: paneiro(uma espécie de cesto). [ka»kajU]

Saco ou alforje carregado nas costas e preso por baixo dos braços.

A datação é de 1913, e o dicionário Houaiss diz que é de origem duvidosa. O dic. Aurélio diz ser provavelmente do quimbundo.

104.Caçamba: Tipo de veículo usado para remoção de terra. [ka»sa)mbå]

caçamba (a) balde preso numa corda para tirar água dos poços

(b) qualquer balde (c) tipo de veículo usado para a remoção de terra

Kim kisambu cesto grande

O dicionário diz ser do quimb. kisambu 'cesta, cesto grande', a datação é de 1899.

105.Cacarucaia/cacurucai: ancião; velho; idoso. [kakaRu»kajå]

cacurucai, cacurucaia, cacurucaio, cacurucaje

(a) ancião, velho (b) tratamento para Preto-Velho

cacurucaia expressão usada para exorcisar Cariapemba

No dicionário cacurucaio “alma de escravo negro cultuada em algumas seitas, p.ex., na macumba”.

O dicionário diz ser do quimbundo.

106.Cacete: (a) Bordão curto de madeira, porrete; (b) pênis.

[ka»setSI]

cacete (a)bordão curto de madeira, porrete

(b) importuno,maçante Umb katSite pauzinho

(a) pedaço de madeira resistente, mais ou menos cilíndrico, de comprimento não muito grande, ger. mais grosso numa das pontas, e us. esp. para desferir pancadas, ou para servir de apoio etc.; (b)borduna, cachamorra, cachaporra.

A datação é de 1831; o dicionário diz ser de origem controvérsia.

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107.Cachaça: aguardente, bebida alcoólica. [ka»Saså]

cachaça, cachacha, quixaxa

(a) aguardente que se obtém mediante a fermentação e destilação do mel ou borras do melaço

(b) qualquer bebida alcoólica

(c) paixão, amor ardente, inclinação por alguém ou por alguma coisa

Kik kisasa água ardente, que fermenta, excitante

(a) espuma grossa que se forma durante a primeira fervura do caldo de cana us. na produção de açúcar, e dele retirada para servir de alimento (ger. na forma de beberagem fermentada) ou para obtenção de bebida alcoólica; (b) aguardente.

A datação é de 1635, e o dicionário diz que é do latim vulgar, ele descarta qualquer hipótese de ser étimo africano, o que precisa ser investigado. O dicionário diz ainda que, o registro do 1º documento é do séc. XIII.

108.Cachimbá: fumar o cachimbo. [kaSi)m»ba]

cachimbá (a) fumar cachimbo, fumegar, exalar vapores

(b) meditar, ponderar (a) Kik-Kim kuSimpa, kuSimba fumar

(a) fumar cachimbo, dar ou tirar cachimbadas

O registro histórico é de 1712.

109.Cachimbo: pipo de fumar, tubo para fumar terminado numa espécie de concha. [ka»Si)mbυ]

cachimbo pipo de fumar Kik nziNgu pequeno tição fumegante

Kim nzimu pequeno tição fumegante

Utensílio para fumar feito de madeira, barro ou outros materiais, que consiste num tubo delgado que tem, numa das extremidades, um recipiente (fornilho) onde se coloca e se faz arder tabaco ou outro produto, e, na outra extremidade, uma abertura ou bocal por onde se aspira a fumaça

A datação é de 1680. Embora os dicionários apontem para origem controvérsia dizem que pode ser do quimb. Kixima.

110.Cacimba: vasilha. [ka»si)mbå]

cacimba (a) poço de água potável (b) fonte (c) vasilha Kik-Kim kisima, kisimbu vasilha

¹cacimba (a)Cova que recolhe a água dos terrenos pantanosos. (b)Poço cavado até um lençol de água. (c)Escavação em baixadas úmidas ou no leito de um rio, na qual a água se acumula como num poço. (d) Olho-d'água, fonte; nevoeiro úmido, sereno ou chuva miúda que se forma em certas regiões

Do quimb. Kixima. ¹cacimba f.hist. 1575 quicima, 1675 cacimba; ²cacimba f.hist. 1680 casibo.

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costeiras e insulares africanas (p.ex., Serra Leoa e Cabo Verde), ger. de efeitos desagradáveis.

111.Caçoar: mangar, rir de alguém. [κα∪συ ]

(a)fazer caçoada, galhofa ou chacota de; provocar riso ou hilariedade acerca de alguém ou algo determinado, com palavras ou atos espirituosos ou engraçados, que manifestam humor, ironia, malícia, desdém etc.; (b) escarnecer, gracejar, troçar, zombar

112.Caçote: rã; jarro de barro. [ka»sçtSI]

caçote pequeno sapo ou rã Kik-Kim kazote

¹caçote designação popular para os anuros (sapos e pererecas) de pequeno porte;Rã. ²caçote cabeçote.

[Do quimb. risote, com troca do pref. por ka, 'rãzinha'.] A datação é de 1278.

113.Cacuia:morrer; acabar; desaparecer. [ka»kujå]

cuia (a) alma, espírito de morte

(b) assombração, fantasma

quicuia assombração Kik kiNkuja

Cemitério. O dicionário de português não dá sua etimologia provável, nem sua datação.

114.Caçula/caçulo: o mais novo dos filhos ou dos irmãos (raspa de tacho). Caçulo, caçulê. [ka»sulå] [ka»sulU]

caçula, caçulê, caçulo (a) o mais novo dos filhos ou dos irmãos

(b) o último a se manifestar no “barco”

Kik kasuka o último filho

Kim kasule o último filho

Umb okwasula o último filho

¹caçulo (a)ato ou trabalho realizado por duas pessoas que socam ao pilão produtos como arroz, café, milho etc., alternando os movimentos de elevar a mão ('peça do pilão') e de baixá-la para amassar ou triturar o produto (b)movimento característico dessa atividade ou trabalho;

O dicionário diz que a origem é quimb. kasule 'último filho', a datação é de 1871

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sula. ²caçulo o mais novo dos filhos ou dos irmãos.

115.Cacunda de pé: chute. “Vou te dá uma cacunda de pé”. [ka»ku)ndådΖι∪πΕ]

116.Cacunda: costas; dorso; corcova; pessoa que tem problema na coluna. [ka»ku)ndå]

cacunda, cadicunda, car(i)cunda, corcunda

(a) costas, dorso (b) corcova, giba Kik-Kim kadikunda

¹cacunda (a) corcunda (deformidade; pessoa); (b)aquele que dá proteção, abrigo, refúgio; (c)que ou que roga pelas costas. ²cacunda dorso, costas.

A datação é de 1899, e o dicionário diz que segundo Nei Lopes, do quimb. kakunda 'corcova, giba'; cp. carcunda

117.Cafanga: resmungar, raiva. [ka»fa)Ngå]

cafanga (a) resmungo (b) melindre (c) recusa falsa ou simulada

cafangar, cafungar, fungar

(a) resmungar com raiva cafangar (b) maldizer, blasfemar (c) ameaçar, gabando-se de proeza

(d) zombar (a) Kik NkafuNga (b) Kik-Kim kafuna <kafa

(c-d) Kik-Kim kuva@Nga

(a) melindre; suscetibilidade; escrúpulo. (b) recusa falsa ou simulada.

O dicionário diz ser possivelmente de oriem africana. E diz ainda, do quicg. kifwanga 'preguiça, indolência; qualquer coisa que perdeu sua força, seu valor, sua inteligência; pobreza' ou do quimb. kufunga 'zangar-se'. A datação é de 1899.

118.Cafiote: negro pequeno, moleque. [kafi»JotSI]

cafiote negro pequeno, negrinho, moleque

Kik kafiote

(a)mala ou baú velho; (b)depósito de objetos de pouco valor

Segundo Nei Lopes, de mfioti, palavra criada pelos ambundos para ridicularizar os cabindas, grupo do Norte de Angola.

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119.Cafofo: quarto, moradia pequena. [ka»fofυ]

cafofo (a) quarto, recanto privado, lugar reservado com coisas velhas e usadas

(b) sepultura (c) terreno pantanoso onde a decomposição de matérias orgânicas ocasiona exalações características das águas apodrecidas em charcos

(a-b) Kik-Kim kafwofo lugar de coisas mortas

(c) Kik muufu > kamufuufu lugar que exala mau-cheiro

¹cafofo terreno pantanoso ou alagadiço que exala mau cheiro devido aos materiais orgânicos em decomposição nas águas estagnadas;

²cafofo (a)buraco de alicerce de casa, muro ou outra construção; (b)cova, sepultura; (c)lugar onde os escravos ficavam guardados antes de serem vendidos; (d)lugar onde se mora; casa, apartamento.

Segundo Nei Lopes, prov. do quimb. kifofo 'cego', ou ufofo 'cegueira'. Não possui datação.

120.Cafua:esconderijo, casebre. [ka»fuWå]

cafua (a) antro, cova, esconderijo

(b) habitação miserável, casebre

(c) quarto escuro em que se prendiam alunos castigados (arcaico)

Kik kafwalala lugar obscuro, sombrio

(a)Antro, cova, caverna, esconderijo. (b)Habitação miserável. (c) Quarto escuro onde se prendiam os alunos castigados; cafundó.

O dicionário diz ser banto, mas o étimo é contrv.; f.hist. 1727 cafû.

121.Cafuçu: negro retinto; feio; indivíduo grosseiro. [kafu»su]

cafuçu (a) negro retinto, feio (b) indivíduo grosseiro, disforme

(c) o diabo, pessoa perversa

(b) Kik kiafunzu < funza grosseiro, disforme

(a) o diabo; (b) indivíduo sem qualquer qualificação; (c)sujeito preguiçoso; inútil.

Segundo Nei Lopes, de prov. orig. banta (cp. cafute) ou talvez cafuzo, a primeira acp. Derivando as segg.

122.Cafundó: lugar distante.

cafundó, fundo lugar distante e atrasado,

(a)baixada estreita entre encostas ou lombas

A datação é de 1889, o

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[kafu)n»dç]

na expressão popular “onde Judas perdeu as botas”

Kik-Kim mfundu

altas e íngremes; (b)local de difícil acesso, esp. quando situado entre montanhas ou quando longínquo e pouco habitada;

dicionário diz que é de origem africana porém controvérsia.

123.Cafuné: ato de coçar fazendo carinho. [kafu»nE]

cafuné (a) ato de coçar, de leve, a cabeça de alguém, dando estalidos com as unhas para provocar sono

(b) pequeno dendê intercalado aos grandes

(a) Kik kafunile < kafa ação de bater, estalar com os dedos

(b) Kik kafuni restos da noz de dendê

(a)estalido produzido com as unhas na cabeça de outrem como quem cata piolhos (b).carícia em geral, esp. com a ponta dos dedos no couro cabeludo de outrem; afago, mimo (tb. us. no pl.) (c)menino, criança (d)indivíduo baixo e franzino (e)peteleco que se dá na orelha (f)dendezeiro pequeno, intercalado entre os grande.

A datação é de 1789. Segundo Nei Lopes, do quimb. kifune, sing. de ifune 'estalidos produzidos com os dedos na cabeça'; para Nasc., do quimb. kifunate 'entorce, torcedura, torção'; segundo AGC, do quimb. kafu'ndu 'cravar, enterrar'.

124.cafuza/cafuzo: mestiço de negro e índio. [ka»fuzU]

cafuzo, carafuzo (a) mestiço de negro e índio

(b) mestiço de cor preta, embaciada, cabelo corrido e grosso

Kik-Kim Nkaalafunzu de cor embaciada; misturado, mestiço

Diz-se de, relativo a ou filho de negro e índia (ou vice-versa).

Orig.contrv., segundo Nasc., forma contrata de carafuzo; Óscar Ribas sugere o quimb. kufunzaka 'desbotar'; f.hist. 1881 cafusa, 1889 cafuso.

125.Cajirê: prática religiosa oculta próxima da magia negra; feitiçaria. [ka)Zi»Re]

canjerê, canjira, canjirê (a) sessão de feitiçaria (b) feitiço jarê (c) religião afro-brasileira praticada em Lençois, zona da Chapada Diamantina, no Estado da Bahia, que no século XVIII exigiu grande contingente de escravos para a exploração de

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suas minas Kik-Kim ka¯Zile ação de abençoar <ka¯Zila

126.calango: largato maior que a largatixa comum. [ka»la)NgU]

calango, calangro (a) lagarto maior que lagartixa

(b) bíceps Kik Nkalanda Kim dikalaNga

(a)Designação comum a vários reptis lacertílios, teídeos, principalmente os de pequeno porte, que vivem ger. no solo, na terra ou em pedreiras, alimentando-se de pequenos artrópodes ou vermes. (b)Designação comum a alguns iguanídeos pequenos. (c)O bíceps. (d)Membro de um grupo de salteadores que invadiram o CE entre 1873 e 1880. (e) Bezerro novo, pequeno. (f)Versão mineira do coco de embolada (v. coco2), originário de Alagoas.

Do quimb. kalanga 'lagarto'; quanto às acp. de cantoria e dança, fica dúvida, segundo Nei Lopes: seriam elas assim chamadas em alusão ao movimento do réptil, ou o nome viria do hauçá kalango 'tambor feito de madeira ou de cabaça'?; f.hist. 1873-1880 calangro 'salteador'

127.Calangro: cf. calango [ka»la)NgRU]

128.Caldeirão: panela [kaudei∪rãw]

Caldeira grande, esp. panela ('vasilha para cocção de alimentos') de grandes dimensões, com alça ou alças e de forma cilíndrica ou esferóide, com fundo chato, us. princ. para cozimento em água fervente

A datação é 1364. De origem latina

129.calombo/catombo: inchaço. [ka»lo)mbU] [ka»to)mbU]

calombo inchaço, montículo, protuberância

Kik moNgo

Kim kadoNgo

(a)Inchação endurecida e protuberante, esp. A que é aparente na superfície do corpo;

(b)qualquer tumefação, como calo, calosidade, nódulo, pálula, tubérculo ou pequeno tumor

Segundo Nei Lopes, de orig. banta, mas de étimo contrv. A datação é de 1707.

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130.Calundu: mais antiga denominação do culto afro. Pode-se dizer a uma pessoa que está de mau-humor. [kalu)n»du]

calundu, lundu (a) a mais antiga denominação de culto afro-baiano, registrado no século XVII

calundu (b) mau-humor, amuo lundu, mulundu (b) dança de origem africana de par solto, acompanhada de canto, que teve seu esplendor no Brasil em fins do séc. XVIII e começo do séc. XIX. Daí em diante, canção solista, influenciada pelo lirismo da modinha e freqüentemente de caráter cômico

(a) Kik-Kim kalundu obedecer um mandamento, realizar um culto com música e dança

(b) Kik kilunda o que recebe o espírito

(b) Kim kialundu o que recebe o espírito

(a)estado de ânimo caracterizado por mau humor e irritabilidade, e claramente manifestado pelo comportamento; (b)candomblé ou qualquer seita afro-brasileira contemporânea; (c) festas ou celebrações de origem ou caráter religioso, acompanhadas de canto, dança, batuque e que ger. representavam um pedido ou consulta a divindades ou entidades sobrenaturais.

Quimb. kalu'ndu 'ente sobrenatural que dirige os destinos humanos e, entrando no corpo de alguém, o torna triste, nostálgico'; 1671-1696 é a data para o s.m.pl. 'culto religioso', e 1889, para o s.m. 'mau humor'

131.Camará: camarada. [kama»Ra]

camará, cabra, cambada camarada, termo muito empregado em cânticos folclóricos

Kik-Kim kambala + português “camarada”

macamba (a) camarada, companheiro

(b) freguês (c) espécie de inhame, mandioca

(a) arbusto (Lantana camara) da fam. das verbenáceas, nativo do Brasil (CE até RS), de folhas opostas, flores amarelas, laranja ou vermelhas e bagas roxo-escuras; camarajuba, camará-de-espinho, cambará, cambará-de-chumbo, cambará-de-espinho, cambarajuba, cambará-miúdo, cambará-verdadeiro;

O dicionário diz ser do tupi kamba'ra 'designação comum a diversas plantas das famílias das verbenáceas e das solanáceas'.

132.Cambada: agrupamento de pessoas.

cambada camarada, termo muito empregado em cânticos folclóricos

(a)quantidade de objetos pendurados, enfiados ou amarrados em algum suporte (fio,

A datação é do séc. XVI.

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[ka)m»badå]

Kik-Kim kambala + português “camarada

gancho, argola, pedaço de pau etc.) (b)molho de chaves; cambulha (c)grande porção ou quantidade de coisas; cambulha, cambulhada (d)grupo ou bando de indivíduos maus, ordinários ou criminosos; corja, súcia (e)grupo de pessoas com alguma característica comum (p.ex., da mesma classe social ou família, ou que têm a mesma função etc.)

133.Cambondo: tocador de atabaque. [ka)m»bo)ndU]

cambondo, cambona, cambono

tocador de atabaque, dos toques sagrados

Kik-Kim kambondo

Em alguns candomblés de ritos angola-congo e caboclo, tocador de atabaque.

A datação é de 1899. Segundo Cacciatore, do quimb. kambundu 'negrinho';

134.Camburi: banana roxa. [ka)mbu»Ri]

camburi banana-roxa Kik-Kim kamburi

135.Candomblé: lugar de adoração de práticas religiosas. [ka)ndo)m»blE]

candomblé, canombé (a) local de adoração e de práticas religiosas afro-brasileiras d Bahia

(b) o culto ou o conjunto de crenças religiosas dedicadas a divindades africanas (santos)

(c) a cerimônia pública festiva

(d) pejorativamente, cerimônia de magia negra, de feitiçaria, de macumba

candomblé, candombé (e) associações religiosas afro-brasileiras, espécie de igrejas independentes, cada qual dirigida por uma personalidade sacerdotal (pai ou mãe-de-santo), submetida apenas à

Religião animista, original da região das atuais Nigéria e Benim, trazida para o Brasil e aqui estabelecida, talvez já no início do sXIX, por africanos apresados pelo tráfico escravagista, e na qual sacerdotes e adeptos encenam, em cerimônias públicas e privadas, uma convivência com forças da natureza e ancestrais

Obs.: cf. orixá

Embora o dicionário afirme ser de origem banta, ele diz que é de origem controvérsia. A datação é de 1899.

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autoridade suprema dos inquices, voduns ou orixás, e organizadas por linhas hierárquicas bem definidas entre homens (cf. ogã) e mulheres, mas privilegiando as mulheres, sempre a maioria no grupo

(f) local e conjunto de suas cerimônias públicas, geralmente na casa de residência do líder religioso

Kik-Kim-Umb kandombele < kulombela < lomba

136.Canga: tecido em que as mulheres sustentam a criança em volta do corpo. [»ka)Ngå]

canga tecido usado como saída-de-praia

Kik NkaNga <kaNga amarrar; tecido com que as mulheres sustentam a criança amarrada em volta do corpo

Retângulo ou triângulo de tecido que se enrola ger. da cintura para baixo, por cima da roupa de banho; saída-de-praia.

O registro histórico é de 1982.

137.Cangaceiro: pessoa que gosta de fazer o mal. [»ka)NgασειΡΥ]

Malfeitor fortemente armado que andava em bando pelos sertões do Nordeste, notadamente ao longo das três primeiras décadas do sXX

A datação é de 1899.

138.Cangaço:gênero de vida do cangaceiro. [ka)N»gasU]

cangaço (a) o gênero de vida do cangaceiro

cangaço, engaço (b) pedúnculo e espátula do coqueiro que se desprendem da árvore quando secos

(a) Kik-Kim koNganso, NkaNgunsu bando, grupo de bandoleiros

(b) Kik-Kim mwasu

(a)Engaço de uvas depois de pisadas e de extraído o vinho. (b) O conjunto das armas dos cangaceiros. (c)O gênero de vida dos cangaceiros; cangaceirismo. (d)Objetos de uso de casa pobre. (e) Pendúnculo e espata do coqueiro, que se desprendem da árvore quando secos.

A datação é de 1789.

139.Cangalha: cesto cangalha Artefato de madeira ou A datação é de

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colocado em lombo de burro para transportar mantimentos. [ka)N»ga¥å]

cesto posto emlombo de burro, para transportar galinhas, mantimentos, etc.

Kik kaNgala

ferro, ger. Acolchoado, que se apõe ao lombo das cavalgaduras para pendurar carga de ambos os lados

1518.

140.Cangingin/candindin: espécie de licor afrodisíaco. Usando muito para os dançarinos da dança do Congo. [ka)NZi(Zi(]

[ka)Nδι(δι(]

Cangingin é sinônimo de cachaça no dicionário.

141.Cangonha/encangada: bananas geminadas. [ka)N»go¯å]

cangonha diz-se das bananas geminadas

Kik kaNga¯a

No dicionário maconha (droga).

A datação é de 1913.

142.Canguru: iguaria feita de milho. [ka)Ngu»Ru]

canguru pessoa alta, magra, esquelética

Kik kaNgolo +português “canguru”

Design. comum a diversos mamíferos marsupiais saltadores

A datação é de 1938.

143.Canjica: papa de milho. [ka)¯»Zikå]

canjica (a) papa de milho verde ralado a que se junta leite de coco, açucar, cravo e canela

(b) “tocar fogo na canjica” = insuflar alguém

(c) “socar canjica” = ficar muito tempo de pé

(d) “fogo na canjica!” = avante, prá frente, vamos trabalhar!

Kik-Kim kandZika

Papa cremosa de milho verde ralado e cozido com leite e açúcar; corá, jimbelê, curau.

A datação é de 1725. O dicionário diz que pode ser do quibumdo ou quicongo.

144.Cansado: feio. “Ô menino cansado!”. [kã∪sadυ]

Que se aborreceu; enfastiado; que se estragou; gasto;velho.

O registro histórico é do séc. XIII.

145.Cântara: vasilha de barro para colocar água (grande). Essa vasilha tem haste. [∪kãtaΡ ]

Espécie de cântaro bastante bojudo e com boca de grande diâmetro.

A datação é de 1257.

146.Canzuá: casa suja. [ka)n»zWa]

canzuá, ganzuá (a) a casa do candomblé (b) pejorativamente, casa

Nos candomblés de rito banto, a casa onde se realizam as cerimônias

Quimb. ka pref. dim. + nzua 'cabana'

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suja e estragada Kik-Kim kanswa local de rezas, de benção

religiosas.

147.Canzumbi: cf. zumbi [zu)m»bi] [kazu)m»bi]

Capanga: guarda costas. [ka»pa)Ngå]

capanga (a) guarda-costas, jagunço

(b) pequena bolsa que se leva a tiracolo

(c) partida de diamantes comprada por capangueiro

(a) Kik-Kim kimpuNga, kimbaNgala

(b) Kim kimaNga sacola

(a)Bolsa pequena, de tecido, couro ou plástico, us. a tiracolo por viajantes, esp. comerciantes de pedras preciosas; (b)bocó, mocó; (c)guarda-costas.

A datação é de 1868, origem diz ser quimb. Kapanga.

148.Capenga: manco. [ka»pe)Ngå]

capenga, pengo (a) manco, coxo (b) diz-se de um serviço mal feito ou mal acabado

Kik kiapeNga Kim kimpeNga Umb okupeNga torto, desajeitado, andar manquejando

Que ou aquele que capenga, puxa da perna; coxo, manco, perneta.

A datação é de 1899, o dicionário diz ser de origem controvérsia.

149.Capuco: sabugo de miho. [ka»pukU]

capuco sabugo de milho Kik-Kim kapupu sabugo, cálice floral + português capucho, invólucro da flor

Sabugo de milho; batuera.

O dicionário diz ser de orig.duv.; prov. do quimb. kipupu 'sabugo de milho'.

150.cara-de-tacho: pessoa de má aparência. “Tu tá com cara-de-tacho hoje”. [karadΖι∪ταΣω]

151.Careca: calvo. [ka∪Ρεκ ]

careca calvo Kim makorika calvície

Que ou quem é calvo; falta de cabelos.

Nei Lopes diz ser do quimb. kaleka 'calvo', mas afirma que pode ser um portuguesismo; ver care(c)-; f.hist. 1778 créca, 1844 careca

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152.Carimbo: marca ;selo. [ka»Ri)mbU]

carimbo selo, sinete, sinal público com que se autenticam documentos

Kik-Kim-Umb kandimbu, kindimbu marca

Peça de metal, de madeira ou de borracha, contendo letras, números ou figuras em relevo, us. para marcar ou autenticar, à tinta, documentos, identificar livros, roupas etc.

A datação é de 1844, o dicionário diz ser do quimb. Kirimbu.

153.Cariru: cf. caruru [kaRi»Ru]

154.Carité: barco grande. [kaΡι∪τΕ]

155.Caruru: iguaria feita a base de quiabo cortado, temperado com camarões secos, dendê, cebola, pimenta. [kaRu»Ru]

caruru, calulu, cariru (a) iguaria feita à base de quiabo cortado, temperado com camarões secos, dendê, cebola, pimenta, prato típico da cozinha baiana

caruru (b) nome genérico para várias espécies de folhas da família das amarantáceas

(c) festa votiva, em homenagem a Cosme-Damião e aos Ibêji, geralmente para pagar promessa ou por quem tem filhos gêmeos

(d) qualquer festa em que for servido o caruru

(a) Kik-Kim kalulu, kalalu prato típico à base de folhas

(b) Kik nlulu folha comestível amarga, bredo

(b)Kim kalulu folha comestível amarga, bredo

Prato afro-brasileiro feito de quiabos, a que se acrescentam camarões secos e peixe, e temperado com cebola, azeite de dendê, pimenta-malagueta, amendoim, castanha-de-caju etc. Obs.: cf. calulu

A datação é de 1776, e o dicionário diz que pode ser de origem tupi, assim como, africana. Para o tupi o dicionário dá a orgiem caá-rurú;e para origem africana ele dá kalulu.

156.Catimbó: atabaque. [katSi)m»bç]

timbau atabaque catimbó, atabaque Kik tibau, zibau

(a)Culto de feitiçaria que combina elementos da magia branca européia com elementos negros,

A datação é do séc. XVIII; os dicionários não dão uma origem certa.

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catimbau, catimbó prática de feitiçaria ou baixo espiritismo

catimbó topônimo: serra [CENTRO, NORDESTE

ameríndios e católicos; liderado por um 'mestre' que defuma os assistentes com seu cachimbo, e a quem se recorre para resolver problemas diversos, seja para o bem, seja para o mal; (b)catimbau, catimbaua.

157.Catingar: ter cheiro desagradável. [ka»tSi)Ngå]

catinga, caxinga (a) cheiro fétido e desagradável do corpo humano, de certos animais e de comidas deterioradas

catinga (b) avareza (c) azar, má-sorte caxinga topônimo catingar ter catinga (a) Kik kaniNga (a) Kim katiNga (b-c) Kik-Kim niNga

Cherar mal; exalar mais cheiro.

A datação é de 1873.

158.Catitá: fofocar. [kaτΣι∪τ ]

Não consta em nenhum dicionário.

159.Catiteira: fofoqueiras. [kaτΣιτεϑΡ ]

Não consta em nenhum dicionário.

160.Catoco/cotoco: pedaço pequeno de alguma coisa. [ko»tokU] [ka»tokU]

cotoco, catoco, pitoco (a) faca pequena e ordinária

(b) qualquer pedaço pequeno de alguma coisa

(a) Kik kotooto

Pequeno pedaço de um objeto qualquer; cotoco (a ponta extrema de um membro do qual se amputou uma parte; coto).

Orig.duv.; prov. alt. de cotoco; Nei Lopes considera voz africana: do quimb. mutoko 'metade, pedaço', através da f. dim. Katoko; a datação é do séc. XX.

161.Catombo: cf. calombo [καλο(⊃βο]

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162.Catucá/cutucar: tocar alguém disfarçadamente para lhe despertar a atenção, sem que os demais o percebam. [kutu»ka] [katu»ka]

cutucar, catucar tocar alguém disfarçadamente para lhe despertar a atenção , sem que os demais o percebam.

Tocar esp. com os dedos ou com o cotovelo em outrem, a fim de chamar-lhe a atenção.

O registro histórico é de 1899, e o dicionário diz ser de origem controvérsia. Embora o dicionário diz ser de origem duvidosa Nascentes prefere derivar do tupi kutuc.

163.Cavaco: pedaço de pau verde para definir o leite. [ka∪ϖαχο]

(a) farpa ou lasca produzida pelo desbaste da madeira; acha, cavaca (b)Cavaquinho.

A datação é do séc. XV. Origem duvidosa.

164.Caxambu: atabaque. [ka»Sa)mbU]

caxambu (a) espécie de membrafone, atabaque

(b) topônimo

Dança afro-brasileira, semelhante ao batuque e com canto responsorial, ao som do caxambu ('tambor') e de cuícas; cacumbu

O dicionário diz que é de origem controvérsia. Nei Lopes diz que provavelmente é de origem banta. A datação é de 1899.

165.Caxexa: pequeno, raquítico. [ka»SeSå]

caxexa muito pequeno, raquítico Kik-Kim sisa <sisi, sisu

Pequeno, raquítico (diz-se de pessoa ou animal).

O dicionário diz ser apenas de origem obscura.

166.catinga: cheiro desagradáel do corpo humano; animais; comidas estragadas. [ka»tSi)Ngå]

catinga, caxinga (a) cheiro fétido e desagradável do corpo humano, de certos animais e de comidas deterioradas

Odor desagradável ou nauseante.

A datação é de 1727. Orig.contrv.; Renato Mendonça cita autores que prendem o voc. ao rad. tupi kati 'odor pesado', mas aponta outros que consideram africana a orig. do termo; observe-se que Bluteau registra-o como 'palavra de Angola'; Nei Lopes acredita tratar-se de voc.

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banto; A. G. Cunha levanta, em AGC, a hipótese de uma possível relação com caatinga e, no indice analítico dos étimos tupis (DHPT), o mesmo autor registra o tupi ka'tinga = catinga 'mau cheiro', exemplificando com ajurucatinga e piracatinga (ver a etim. destes voc.); cp. ainda o esp. catinga 'odor forte e desagradável de certos animais e plantas' que Corominas dá como proveniente do guarani katí 'odor pesado'.

167.Caxinga: cf. catinga [κα∪Σιγα]

168.Caxingá: fazer lentamente. [kaSi)N»ga] “Faça o que estou mandando sem caxingá”.

caxingá retardar, fazer lentamente Kik kuziNga

169.Caxixi: saquinho de palha, provido de alça que o tocador de berimbau segura juntamente com a vareta com que tange o instrumento musical. [kaSi»Si]

caxixi (a) saquinho de palha, provido de alça, que o tocador de berimbau segura juntamente com a vareta com que tange o instrumento musical

caxixi, mucaxixi (b) miniatura de cerâmica (potes, panelas, etc.) que serve de brinquedo para

¹ caxixi diz-se de ou aguardente ordinária de cana, feita do aproveitamento da borra da garapa; ²caxixi cestinha de vime em forma de badalo, provida de alça na parte superior

A datação é de 1913. O dicionário diz ser provavelmente od quimb. Kaxaxi.

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crianças e onde secoloca o caruru oferecido a Cosme e Damião

(a) Kik kisisi (a) Kim kisasi (b) Kik-Kim mukasisi miniatura

170.Caxumba: papeira. [ka»Su)mbå]

caxumba parotidite, papeira Kik mavumba

Kim kulukumba

parotidite epidêmica

A datação é de 1899. Orig.duv.; segundo AGC, de orig. incerta, talvez afr.; Nei Lopes sugere “do quimb.: ou da fusão de uhaxi 'papeira' com humba 'coisa redonda, forma circular' ou de kiatumba, part.pas. kutumba 'inchar'“.

171.Chamego: pessoa que anda muito junta com a outra.. [Σαυ∪µεγυ]

(a)estado de desassossego, de agitação; excitação, inquietação; (b)excitação que leva ao ato libidinoso;

O registro histórico é de 1844. O dicionário diz ser de origem controvérsia.

172.Chicha: bebida feita de milho para servir na festa do Divino. [∪ΣιΣ ]

(a)qualquer porção de carne;qualquer guloseima; (b)bebida alcoólica ger.feita com mandioca mel e água, mas tb com milho ou frutas fermentadas; (c)tradução de palavra por palavra de texto literatura clássica us. Esp. Por iniciantes no etudo línguas antigas.

A datação é de 1789. O dicionário Aurélio diz ser provavelmente de origem indígena.

173.Chimpanzé: espécie muito conhecida de macaco. [Si)mpa)n»zE]

chimpanzé espécie muito conhecida de macaco

Kik kimpeensi, tSimpenze

Design. comum aos primatas do gên. Pan, da fam. dos pongídeos.

De uma língua indígena do Congo (prov. sob a f. kampenzi ou

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kimpenzi), a datação é de 1899.

174.Choradinho:uma das partes da festa do Congo onde só as crianças dançam. [ΣοΡα∪δΖιο]

175.Chorado: com coração sangrando (partido). “Ele tá chorado”. [Σο∪ΡαδΥ]

176.Cochilar: dormir levemente. [koSi»la]

cochilar (a) dormitar, dormir levemente

(b) descuidar-se

Dormir de leve; cabecear com sono; dormitar, toscanejar; passar pelo sono.

A datação é de 1671-1696. O dicionário diz que pode ser de origem africana. E ainda diz que há controvérsia quanto ao étimo; Renato Mendonça aponta o quimb. koxila 'dormitar', apoiando-se em Pereira do Nascimento, hipótese antes apontada por João Ribeiro em A língua nacional; JM lembra ainda a informação de Jacques Raimundo que acredita tratar-se de voc. do dialeto de Benguela (Angola) (o)kutchila, que significa 'dançar', mas aplicado em alusão ao bambear da cabeça.

177.Cochilo: ato de cochilar. [koSi»lo]

cochilo (a) ato de cochilar (b) descuido

Ato ou efeito de cochilar, de cabecear com sono; sono leve

A datação é de 1913. Derivação de cochilar.

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Kik-Kim kuSila

178.Cocoroca: cf. coroca [κ κ ∪Ρ κ ]

179.Coisa, Coisar: utilizado para dar nome as coisas que se esquecem. Ex.: “Pega essa coisa aí pra mim por favor!”. [koι∪ζα]

180.Congo: nome de uma dança onde só os homens dançam. [»ko)NgU]

Congo (a) toque, especialmente para Congombira

(b) nacão-de-candomblé cuja terminologia religiosa é de base essencialmente banto

(c) designação dada ao africano bacongo proveniente do reino do Congo

indivíduo dos congos ('povos'); bacongo

De uma língua banta, prov. quicg. 'kongo;o voc. significaria 'dívida', talvez como 'região, país, povo tributário do rei de Angola';

181.Coque: pancada na cabeça com o nó nos dedos. [»kokI]

coque pancada na cabeça com o nó dos dedos

Kik kofi

(a)pancada leve na cabeça , aplicada com os nós dos dedos com vara; croque;cocre; (b)material sólido de origem mineral ou vegetal , que consiste principalmente de carbono c/ pequeno percentual de hidrogênio; (c)cozinheiro mestre cuca; (d)apanhado de cabelo enrolado em espiral em forma de concha; (e)cola-amarga.

Para: (a) a datação é de 1583; (b)1890; (c)1899; (d)1938;

182.Coroca: velho, caduco. [kç»Rçkå]

coroca, cocoroca, curuca (a) velho, caduco, decrépito, adoentado, pela idade avançada

(b) mulher velha e feia (a) Kik-Kim Nkuluka Kik-Kim kutuka, kuluka Kik-Kim kolokota

(a)enfraquecido,enfermiço ou acabado pelas doenças da velhice; indivíduo velho e feio; curungo, coróia,curuça. (b)anum-coroca.

A datação é de 1875. O dicionário diz ser do tupi.

183.Correia: laço trançado de couro de boi. [ko∪heϑ ]

Tira estreita feita ger. de couro ou de outro material resistente,

A datação é de 1278 o dicionário diz que sua

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relativamente comprida, us. para atar, cingir (alguma coisa)

origem remete ao latim.

184.Cotó: pessoa que tem braço ou perna mutilado ou alguma parte do corpo pequena. [kç»tç]

cotó (a) que tem o braço ou perna mutilada

(b) galinha sem rabo

(a)indivíduo que tem braço ou perna amputado; aleijado; (b)tipo de faca grande; cutelo;

Sua datação é de 1706-1710. O dicionário diz que é do francês “couteau”.Embora diga que é de origem obscura. (-Kol- perna, banto)

185.Cuca: negra velha. [»kukå]

cuca, acuca, macuca, mucuca

(a) negra velha, coroca (b) bruxa, bicho-papão (c) bicho-papão do universo dos contos e acalantos brasileiros, ser fantástico que aterroriza crianças, imaginado como uma mulher muito velha e feia como uma coruja, geralmente associada à figura do negro e tida como devoradora de criancinhas desobedientes

Kik-Kim makuka, mukuka pessoa muito velha + português coca bicho-papão

(a)entidade fantástica em que se mete medo nas crianças; papão; (b)mulher feia e velha; (c)mestre-cuca; (d)bolo de origem alemã; (e)rolo que se faz depois da roçagem com o mato; quicuca;ticuca; (f)poeira que se levanta da mó (pedra de moinho) e se deposita ao redora dela; (g)modo de vida caracterizado pela ostentação, pelo luxo desmedido; (h)antiga moeda de cinco réis.

A datação é de 1899. Para Nei Lopes, (b) do umbd. kuka ou quimb. iakuka 'velho; (c)do inglês “cook”. Embora o dicionário diga que é de origem controvérsia Nei Lopes afirma que é de origem africana.

186.Cuíca: instrumento feito com um pequeno barril que faz vibrar o tambor produzindo ronco. [»kWikå]

cuíca instrumento feito com um pequeno barril que temnuma das bocas uma pele bem estirada e em cujo centro está presa uma pequena vara, a qual, ao ser atritada com a palma da mão, faz vibrar o tambor, produzindo ronco

Kik-Kim mwita, pwita

Umb opwita

(a)tipo de tambor que contém em seu interior uma varinha ou tira de couro em contato com a membrana e que, ao ser friccionada, produz um som rouco; (b) tipo de mamíferos

marsupiais da família dos dedefiíldeos

A datação é de 1817. O dicionário diz que é de origem tupi.

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187.Curau: angu, feito de milho verde, moído, cozido com açúcar. [ku»RaU9]

curau espécie de angu, feito de milho verde, moído e cozido com açucar

[SP] Makua

(a)caipira; que ou quem deixa o sertão;retirante; que ou quem se comporta como novato; inexperiente; bisonho; (b) canjica;

O dicionário diz ser de origem obscuram e no entanto, afirma ser do quimb. kudia 'comida'; a datação é de 1899.

188.Curiá: olhar alguma coisa. [kuRi»Ja]

curiá, cuniá, cudiá comer Kik-Kim kudia@

189.Curiacuca: cozinheira encarregada do ritual. [kuRiJa»kukå]

curiacuca (a) cozinheira (b) a encarregada da comida ritual

Kik-Kim kudiakuka

190.Curinga: certa figura do jogo de cartas com valor indeterminado. [ku»Ri)Ngå]

curinga (a) pessoa esperta (b) certa figura do jogo de cartas com valor indeterminado

Kik-Kim ku@di@Nga enganar

(a)indivíduo versátil que se presta a múltiplas e diferentes funções; (b)jogador capaz de atuar em várias posições numa equipe; (c)ator que faz diversos papaeis numa mesma peça; (d)carta de baralho.

A datação é de 1899. Segundo Nascentes, quimb. kuringa 'matar'; para Nei Lopes, a acp. do quimb. kuringa é 'fingir'; f.hist. 1899 curinga, a1951 coringa

191.Cutucar/catucar: Tocar alguém disfarçadamente para lhe despertar a atenção, sem que os demais o percebam. [kutu»ka] [katu»ka]

cutucar, catucar tocar alguém disfarçadamente para lhe despertar a atenção , sem que os demais o percebam.

(a)tocar esp. com os dedos ou com o cotovelo em outrem, a fim de chamar-lhe a atenção; (b)tocar levemente alguma coisa, seja com as próprias mãos, seja fazendo uso de um artefato;

A datação é de 1899. Possível origem tupi ku'tuka.

192.Decifrar: explicar alguma coisa que está difícil de entender. [desi∪φΡα]

Resolver, desvendar, solucionar.

A datação no dicionário é de 1523.

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193.Dendê: fruto da palmeira. [de)n»de]

dendê (a) palmeira (Elaesis guineensis) ou sua fruta

(b) óleo vermelho obtido da palmeira dendê, de grande uso na culinária religiosa afro-brasileira e baiana

(c) óleo de palma no português de Portugal

(d) bruxaria, magia negra, coisa feita

(e) moça assanhada, espevitada

(f) expressão “vadiar na tina do dendê” = esbofar-se, esfaltar-se

(g) topônimo muito comum para ruas, ladeiras, etc

(a) Kik-Kim ndende Umb ondende (b) Kik-Kim ndende

(a) fruto do dendezeiro; (b) semente desse fruto; coconote.

A datação é de 1836. O dicionário diz ser do quimb. ndende 'palmeira'

194.Dendenjê: faceiro, feliz. [de)nde)n»Ζε]

Não consta em nenhum dicionário.

195.Dengo/dengue: carinho. [»de)NgI] [»de)NgUe]

dengue, dengo, mendenga, mendengue

(a) choradeira, birra de criança

(b) manha, treta (c) melindre feminino, faceirice

(d) afeminação, trejeitos afetados

(a-b) Kik-Kim ndeNge manha, criancice, cólera pueril

(c-d) Kik-Kim mundeNge mulher jovem, faceira, suscetibilidade feminina

(a) denguice; (b)melindre feminino; (c)faceirice;feitiço; requebro; (d)birra ou choradeira de criança;

A datação é de 1836. Para Corominas provavelmente do quimb. Ndeng.

196.Dengue: cf. dengo [»de)NgUe]

197.Desconjure: c.f. ave [δεσκο∪(ΖυΡε]

198.Desileiado:agrupado; reunido. [desileϑαδΥ]

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199.Difruso: gripado [di∪fΡυσυ]

200.Dindim: clitóris. [dZi)n»dZi)]

dindim clítoris Kik ndidi

201.Dor em pito: chamar atenção. [dohe(πιτω]

Dar um pito? No PVB existe no sentido de repreender.

202.Dunga: homem corajoso, valentão. [»du)Ngå]

dunga (a) homem valente, corajoso

(b) chefe, maioral Kik-Kim kinduNge hábil, esperto, inteligente

(a)sujeito sem igual em sua especialidade; exímio; (b)homem valente; (c)homem importante; chefe; maioral;

Segundo Nei Lopes, do quicg. ndunga 'pessoa de grande porte'; entre os bacongos de Angola, ndunga designa cada um dos zindunga, homens pertencentes a uma importante sociedade secreta; a datação é de 1899.

203.Encabular: Envergonhar-se, acanhar-se. [e)Nkabu»la]

incabular (a) envergonhar, acanhar-se

(b) aborrecer, amuar Kik kivula Kim kulebula envergonhar, kuluvula amuar Kik kimbula

(a)provocar ou sentir vergonha ou encabulação; acanhar(-se), vexar(-se); (b)provocar azar,encaiporar; (c)causar preocupração;

Nei Lopes, por sua vez, sugere estar relacionado com o quimb. kulebule 'envergonhar'. A datação é do séc. XX.

204.Encafifar: encucar com alguma coisa. [ε(ϑκαι∪φα]

(a)encher(-se) de timidez; (b)envergonhar(-se), acanhar(-se)

Datação de 1899.

205.Enconstado:próximo, por perto. [e)Nkos∪tadu]

(a)situado junto a; colado; (b)quen se arrima a alguma coisa;apoiado.

O registro desta palavra é do séc. XV.

206.Engabelar: Seduzir, agradar para enganar. [e)Ngabe»la]

engambelar, engabelar seduzir, agradar para enganar

[PE] Kim Ngombo adivinho,

(a)induzir (alguém) a engano, com intuito de obter compensação ou livrar-se de encargo, obrigação,

O dicionário diz: João Ribeiro e Renato de Mendonça supõem orig. afr.,

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feiticeiro promessa etc.

no quimb. ngmbular 'fazer adivinhações'A datação é de 1899.

207.Entonado: arrumado. [ε(το∪ναδυ]

Que recebeu entonação; entoado

A datação é de 1981.

208.Estúrdio: pessoa esquisita. [εσ∪τυρδιυ]

(a) que denota estranheza, esquisitice (diz-se de qualquer coisa); incomum, esquisito;

Não possui datação no dicionário.

209.Fazer manga: voltar pelo mesmo caminho. [fazer∪mãNga]

210.Fazia: falava. [φα∪ζια]

Do verbo fazer. Este verbo não tem nada a ver com o sentido do Guaporé, que é sinônimo de falava.

211.Feijão com corredor: feijão com osso da canela do boi. [feϑ∪α(ωkõko∪hedo]

212.Fiofó/Fio: ânus Transcrição: [fJo»f ç]

fiofó ânus Kik mfio@kolo, mviovo

Ânus. A datação é de 1951. O dicionário diz que vem de Feofó,segundo Nei Lopes provavelmente bantu fioto.

213.Foi embora: morreu. “Minha mulher foi embora”. [foiε(∪βοΡα]

No Guaporé não se fala “Morreu” porque atrai desgraças para a vida dos entes queridos.

214.Folhado: pessoa gaiata (enxerida). “Esse menino é muito folhado”. [fo∪×αδυ]

Nos dicionários significa o que folhas; não tem nada a ver com o sentido do Guaporé.

215.Forró: arrasta pé. [fo»xç]

forró arrasta-pé, farra, folia Kik fwofwo

Baile popular, em que se dança aos pares com música de origem

A datação é de 1913;

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nordestina; arrasta-pé; festejo ruidoso.

216.Forrobodó: confusão. [foxobo»dç]

forrobodó arrasta-pé, algazarra, confusão, folia

Kik fwofwo mbanvo@ grande forró

(a)Baile popular; arrasta-pé;festança. (b)confusão;tumulto;briga.

A datação é de 1899. O dicionário diz vir de forbodó comum em toda protugal. O dic. Aurélio dá como origem controvérsia.

217.Fuá: pele ressecada que quando coça sai um pó. Obs.: De nenhum dos informantes eu ouvi que fuá é alguma coisa dessarumada. [fu»Wa ]

fuá folia, algazarra (b) cf. fubá Kik-Kim mfwanza, mufufwa

(a)comentário maldoso; intriga, mexerico; (b)caspa; (c)pó extremamente fino resultante da descamação da pele arranhada.

A datação é de 1890; o dicionário diz que é de origem obscura.

218.Fubá: farinha de milho. [fu»ba]

fuba (a) farinha de milho ou arroz

(b) espécie de doce de amendoim, farinha e açucar pulverizado

Kik-Kim (a) mfuba Kik-Kim (c) mfuba <mfumfu pó, peira

Kik (d) mfumbu pelo, cabelo ruço

(a)farinha de milho ou de arroz com a qual se faz angu; (b)situação confusa; desordem; rolo;

O dicionário diz ser do quimb. fuba, quicg. mfuba 'fécula, farinha; a datação é de 1680.

219.Fuçar: remexer; procurar. [fu∪σα]

(a) remexer (as coisas) à procura de algo; (b)bisbilhotar;sondar.

A datação é de 1961.

220.furunfar: bater, fazer sexo. [fu)Ρυn»fa]

funfar (a) bater funfar, fofar, furunfar (b) fazer sexo, copular (homem)

Kik-Kim fumfa

A datação é de1789;o dicionário diz que é de origem duvidosa.

221.Funfar: cf. furunfar [fun»fa]

222.Fungar: respirar com dificuldade. [fu)N»ga]

fungar (a) aspirar fortemente com ruído

(b) respirar com dificuldade

(a)aspirar ruidosamente pelo nariz; inspirar; (b)resmungar,resmonear;

O dicionário diz provir do quimb. kafunga 'farejar'; ver funga-. A datação é de

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(c) absorver ou respirar pelo nariz

(d) cheirar rapé (e) resmungar (f) ficar zangado (g) ficar zangado (h) farejar Kik-Kim fuNga, fuNka

(c)produzir som, absorvendo ar, pelo nariz.

1789.

223.Furdunço: confusão, barraco, agitação. [fux»du)nsU]

furdunço, furdunça (a) festança popular (b) barulho, desordem Kik vurundunzu <vumvunzu

(a)baile popular, p.ext., qualquer festa popular; (b)movimentação com barulho, algazarra, desordem

Embora o dicionário diga que é de origem controvérsia, diz também que às vezes considerado de orig. banta, do quicg. ma-fulu + nguzu 'cólera + força'.

224.Futricar: mexer em alguma coisa. [futRi»ka]

futricar fuxicar

(a)fazer intriga(s); mexericar, fuxicar; (b)trapacear nos negócios; (c)provocar alguém de modo impertinente.

A datação é de 1899.

225.Fuxicar: fazer mexerico. [fuSi»ka]

fuxicar (a) mexericar, segredar, fazer fuxico, candonga

(b) remendar, alivanhar (a) Kik fuuzia (a) Kim kuseka (b) Kik futika (b) Kim fuZika

(a)fazer fuxico(s), intriga(s); futricar, mexericar; (b)futucar;procurar;remexer;revolver;

A datação é de 1899.

226.Fuzarca: farra; folia; desordem. [fu»zaxkå]

fuzarca farra, folia, pândega, estardalhaço

Kik mvwazakana Kim funzanza

(a)diversão ou festividade, grande e agitada, envolvendo muitas pessoas, música, bebida, brincadeiras; (b)farra, folia, pândega, troça;

A datação é do séc. XX.

227.Fuzuê: algazarra. [fuzuWe]

fuzuê, fruzuê algazarra, barulho, confusão

Kik mvwazile Kim funzanzile

(a)folia coletiva, ruidosa, animada por música, dança, alegria; carnaval, folia, funçanata, pândega; (b)briga;confusão;

Para Nei Lopes, de fuzo 'arrasta-pé', este do quicg. mvunzu 'confusão' ou do quicg. fusu

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desordem;

'turbilhão das águas de um rio'. A datação é do séc. XX.

228.Gaiteiro: sanfoneiro. [gaϑτεϑΡυ]

(a)que desperta a atenção pela vivacidade; vistoso, chamativo; (b)que gosta de festa, folias; folião, festeiro;

A datação é do séc. XIV (cf. gaita).

229.Galalau: homem muito alto. [galalaw]

galalau, galapau, garajau, garapau, varapau

homem magro, muito alto

Kik-Kim juNgalalaw Yor ga$ga$ra o@

Homem de estatura elevada; galalão, galerão.

A datação é de 1890.

230.Gamela: tipo de bacia feita de madeira. [ga∪µελ ]

Vasilha de madeira ou de barro, de vários tamanhos, em forma de alguidar ou quadrilonga, us. para dar de comer aos porcos, para banhos, lavagens e outros.

A datação é do séc. XIII. O dicionário diz vir do latim.

231.Gangorra: balanço de crianças. [ga)N»goxå]

gangorra balanço de crianças, formado por uma tábua pendurada em duas cordas

Kik kaNgala, kaNgula

(a)Prancha retangular, comprida, apoiada somente no centro, que duas crianças, cada qual sentada numa de suas extremidades; (b)engenho primitivo de cana-de-açúcar; (c)armadilha para apnhar animais bravios.

A datação é de 1752.

232.Garapa: caldo de cana feito com açúcar. [ga»Rapå]

garapa, guarapa (a) caldo da cana, quando destinado à destilação

(b) qualquer líquido que se põe a fermentar para depois ser destilado

(c) bebida refrigerante de mel ou de açucar com água, a que pode se adicionar gotas de limão

(d) coisa fácil de conseguir

(a)caldo extraído da cana-de-açúcar; (b)qualquer líquido que se põe a fermentar para depois ser destilado;

O dicionário diz ser de origem controvérsia; a datação é de 1638.

233.Gengibirra: bebida feita de milho torrado. [Ζε(<Ζι∪βιηα]

(a)espécie de cerveja de gengibre, cuja composição inclui ,

A datação é de 1899.

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além gengibre, frutos, açúcar, ácido tártárico, fermento de pão e água ; (b)água ardente de cana; cachaça.

234.Gingar: andar bambaleando o corpo. [Zi)N»ga]

jingar (a) andar bamboleando o corpo

(b) curvar-se, obrar-se ora num sentido, oro noutro.

Os Jingas (dZiNga) sãonegros congueses do norte de Angola, os quais, segundo a fama, têm o hábito de bambolearem o corpo, quando andam.

(a)agitar-se; balançar-se; (b)curvar-se para um e outro lado;

O dicionário diz ser de origem obscura. O datação é de 1516 para a forma “gingrar”, aparentemente não atestada no Brasil, do séc XIX. para “gingar”

235.Gômito: vômito. [∪gomitu]

236.Gonga: saco de caçador. [»go)Ngå]

gonga (a) preparado de carvão usado para fins ritualísticos

(b) saco, sacola (a) Kik-Kim NkaNga (b) Kik-Kim NgoNga saco de caçador

Roupa (ger. Masculina) muito gasta pelo uso.

237.Gongá: um tipo de cestinho com tampa. [go)N»ga]

gongá (a) santuário, templo congo-angola, geralmente ao ar-livre, em espaço aberto

(b) espécie de sabiá (c) pequena cesta com tampa

(a)na umbanda e em alguns cultos afro-religiosos, heterodoxos, denominação do altar; (b)recinto onde fica esse altar; (c)pequena cesta provida de tampa.

A datação é de 1899. Para Nei Lopes, do quimb. ngonga 'cesto; cofre; sacrário'; segundo Cacciatore, do quimb. ngong(u)e 'segurança'.

238.Gorô:força, poder. [go»Ro]

gorô força, poder Kik Ngolo

239.Gratificação: menstruação. “Estou de gratificação”. Palavra usada pelas idosas.

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[γΡατιφικα∪σãΩ] 240.Gronga:feitiçaria por meio de beberagem. [»gRo)Ngå]

gronga (a) feitiçaria por meio de beberagem

(b) intriga (c) coisa mal feita, geringonça

(a)qualquer artefato malfeito, com arcabouço frágil e funcionamento precário; (b)sortilégio ´por intermédio de ingestão de bebidas preparadas pro curandeiros; feitiçaria.

A datação é de 1891.

241.Gunga: berimbau médio. [»gu)Ngå]

gunga, gungo (a) berimbau médio, geralmente acompanhado do contra-gunga

(b) instrumento consagrado no Sultão-das-Matas e usado apenas nas festas cerimoniais

(c) homossexual (d) ladrão (a-b) Kik NguNga, NguNgu

(c) Kik NguNga (d) Kik-Kim Ngumba

Berimbau. A datação é do séc. XX. O dicionário diz ser do quimb. ngonga 'arco musical'.

242.Guri: criança. [gu∪Ρι]

Menino, cirança. A datação é de 1890 e o dicionário diz vir do tupi gwï'ri.

243.Ileiado: espalhado, (usado em caso de parentes). Cf. “disileiado”. [ιλειϑαδυ]

244.Imbambi: nome dado a uma entidade chamada “Erê”. [i)mba)m»bi]

imbambi nome de erê Kik imbambi

245.Inhaca: fedor. [i»¯akå]

aca, macaca (a) má sorte, azar (b) mau humor aca, inhaca, uca (c) cachaça ruim que deixa morrinha

(d) mau cheiro corporal

(a) senhor supremo; rei. (b)fedor exalado por pessoa ou animal;má sorte freqüente de alguém. (c)

A datação é de 1899; Para (a) yaka 'jaga', título do rei, numa língua banta; cp. 3jaca e 1jaga;

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Kik maNkaNka má-sorte mwaka mau cheiro, morrinha

Kim nuuka mau cheiro, morrinha

Para (b) o dicionário diz: segundo Nascentes, do tupi yakwa 'odoroso'; segundo Nascentes, do tupi yakwa 'odoroso'; Para

246.Invocar: chamando a entidade que faz a festa no candomblé. [i)n»vok ]

Chamar em auxílio, pedir proteção.

A datação é do séc. XVI. Empréstimo erudito ao latim : o seu uso no contexto das religiões afro-brasileiras caracteriza muito provavelmente um “calque” (tradução de uma expressão de origem africana), reforçado pela influência da Igrja Católica no Guaporé.

247.Invoco: feitiço sortilégio. [i)n»vokU]

invoco feitiço, sortilégio Kik mpioco Fon nunvçku@, nuboko@ objeto de sacrifício

Vem de invocar. Extensão do calque acima ?

248.Istúcia: pessoa que faz fofoca [is∪τυσια]

249.Jaca: uma fruta.. [»Zakå]

jaca chefe supremo [RJ]

(a)Fruto da jaqueira; (b)chefe superior de várias tribos africanas; régulo; soba.

O registro histórico é de 1535.

250.Jacundá: tucunaré (uma espécie de peixe). [Ζακυ(<∪δ ]

(a)design. comum a vários peixes teleósteos, do gên. Crenicichla; (b)dança indígena em círculo que evoca a pesca do jacundá.

O dicionário diz vir tupi yaku'nda 'peixe da família dos ciclídeos'; f.hist. 1618 jacundâ, c1631 iacunda, 1895 jacundá.

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251.Jagunço: homem valente; guarda costas de algum senhor de engenho. [Za»gu)nsU]

jagunço (a) valentão (b) guarda-costa de algum senhor de engenho ou fazendeiro

Kik-Kim haNgunso

Cangaceiro, criminoso ou qualquer homem violento contratado como guarda-costa por indivíduo influente.

Nei Lopes sugere o quimb. junguzu ou o ior. jagun-jagun 'soldado'; f.hist. 1877 jagunço, 1889 jagunso

252.Jiló: homem de cabeça grande, ou esquecido/ Fruto do jiloeiro. [Zi»lç]

jiló (a) fruto do jiloeiro, de sabor amargo

(b) diz-se de um homem magro e cabeçudo

Kik-Kim ndZilu

Furto do jiloeiro. O dicionário diz ser de origem africana.; Nascentes deriva do quimb. njimbu; já Nei Lopes, do quioco jilo 'berinjela de fruto oval', citando o quimb. luó 'muito amargo'; f.hist. 1730 gilô, 1889 jiló

253.Jinga: maneira de balancear o corpo. (cf. gingar) [»Zi)Ngå]

jinga (a) tipo de caneco usado nos engenhos para baldear o caldo da cana

(b) movimento fundamental do jogo de capoeira, do qual partem todos os golpes defensivos ou ofensivos

(c) personagem rainha da congada

(d) nome de um povo e de uma língua de Angola

Kik (a) tSiNga pequena cabaça usada como caneco

Kik-Kim (b) siNga enrolar, serpentear, balancear o corpo

(a)língua do grupo quimbundo; (b)indivíduo dos jingas; (c)grupo étnico que habita Angola.

A datação é de 1899. O dicionário diz vir do quimbundo. (É mnecessário averiguar de que maneira isso se coaduna com a etimologia proposta para “gingar”) Jingar e Ginga – não importa como escreve é a mesma coisa.

254.Jinim: as partes genitais da mulher.

jeni, zinim, jinim partes genitais da mulher Kik ndZini

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[Zi»ni)]

Fon sE@li$

255.Jira: oração, reza. [»ZiRå]

jira, enjira (a) oração, reza, o ato de louvar as divindades em congo-angola

(b) sessão de umbanda. Kik-Kim ndZila, nzila ato de louvar, rezar

(a)nos candomblés angola-congo e na umbanda, roda de fiéis em que se cultuam com cânticos e danças rituais, ger. girando em círculo, as entidades ('seres espirituais') do terreiro ou centro; canjira, enjira; (b)suposta corrente espiritual criada com essa roda; (c)sessão em que tais ritos acontecem.

A datação é do séc. XX. Provavelmente do quimb. njila 'giro'. Seria uma caso de derivação de origem múltipla (cruzamento), como no caso de ginga ?

256.Jongo: dança dos negros na fazenda. [»Zo)NgU]

jongo dança dos negros nas fazendas

[RJ, MG, SP]

Dança de roda de origem africana do tipo batuque ou samba, com acompanhamento de tambores, solista no centro e eventual presença da umbigada, cujo canto é do tipo estrofe e refrão.

O dicionário Houaiss diz ser de orig.contrv.; Nascentes deriva do quimbd. jihungu 'nome de um instrumento musical dos negros', assim como Angenot et alii; Nei Lopes dá como étimo o umbd. onjongo 'nome da dança de um povo banto da região de Angola'; o registro é de 1877.

257.Juriti: rolinha. [ΖυΡι∪τΣι]

Design. comum às aves columbiformes da fam. dos columbiformes, esp. dos gên. Leptotila e Geotrygon; jeruti, juruti.

Do tupi yuru'ti 'ave columbiforme'; f.hist. 1728 jurití, 1730 juritî, 1781 juritiz, 1857

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jurity.

258.Lamba: chicote; tala de couro. [»la)mbå]

lamba (a) chicote, verga (b) tala de couro (c) trabalho pesado, penoso, feito à força

Kik-Kim mbamba Fon lamba@ Yor lagba$ malamba (a) infelicidade (b) lamúria Kik-Kim malamba

Desgraça, infortúnio

O dicionário diz que a origem é quimb. lamba 'desgraça, desventura, miséria', e o registro da palavra é de 1880.

259.Lambança: barulho, desordem, sujeira. [la)m»ba)nså]

lambança rezinga, barulho, desordem

(a) manifestação ruidosa que gera desordem; barulho, confusão, tumulto; (b) aquilo que se pode lamber e comer

A datação é de 1899.

300.Lelé: maluco. [le»le]

lelé (a) maluco, adoidado (b) ingênuo, simplório (c) indolente Kik lele Fon-Yor lilE@

Que ou aquele que age insensatamente, apresentando sinais de loucura; doido, biruta, maluco.

O dicionário diz que a origem é obscura.e não possui datação.

301.Lengalenga: conversa fiada, enganosa, briga. [le)Nga»le)Ngå]

lengalenga conversa fiadsa, enganosa, discurso sem fim, longo, enfadonho

Kik-Kim leNgaleNga <kulaNga enganar alguém

Conversa, narrativa ou peça de oratória enfadonha e monótona; ladainha, cantilena.

A datação é de 1858 e o dicionário não diz uma etimologia provável.

302.Lombra: preguiça. [∪lõ⊃βΡα]

Qualquer efeito produzido pelo uso de drogas, esp. de maconha.

Não tem registro histórico e o dicionário afirma como origem obscura e que talvez possa ser de lomba, lombeira.

303.Luático: pessoa que tem lundum. [lu∪ατΣικυ]

Vem de lua?

304.Lundum/lundu: lundu, mulundu (a) dança de par A região de

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mudança de humor. Conforme calundu. [lu)n»du]

(a) mau humor; (b) dança de origem africana de par solto, acompanhada de canto, que teve seu esplendor no Brasil em fins do séc. XVIII e começo do séc. XIX. Daí em diante, canção solista, influenciada pelo lirismo da modinha e freqüentemente de caráter cômico

(a) Kik-Kim kalundu obedecer um mandamento, realizar um culto com música e dança

(b) Kik kilunda o que recebe o espírito

(b) Kim kialundu o que recebe o espírito

separado, de origem africana, em compasso binário com primeiro tempo sincopado; mulundu [Trazida pelos escravos bantos, com meneios e requebros de forte apelo sensual, manteve esse caráter jocoso e tornou-se dança de salão muito em voga no Brasil do sXVIII ao início do sXX.] (b) estado de mau humor; amuo; zanga.

origem dos quiocos, e tb. um top. Lundu em Moçambique; cf. calundu ('seita'); f.hist. 1803 lundú.

305.Macaca: mau humor. [ma»kakå]

macaca (c) feminino de macaco (d) expressão “dar tiro na macaca” = ficar no barricão

(a-b)Kik maNkaNka

(a)a fêmea do macaco; (b)mulher feia; (c)má sorte; azar;

O dicionário diz que se origina do latim.

306.Macamba: camarada. [maka)m»ba]

O dicionário de bantuísmos diz que é conforme Camba ou camba: cambar fugir, escafeder-se [médio São Francisco]

Nome por que os escravos se chamavam uns aos outros quando pertencentes a um mesmo dono

De 1858, e o dicionário diz que é do quibumdo.

307.Maconha: variedade de fumo cuja folha e flores são usadas como narcóticos. Chamada muito mais de poaia no Guaporé. [ma»ko¯å]

maconha variedade de cânhamo, cujas folhas e flores são usadas como narcótico

Kik-Kim mako¯a, maka¯a

Droga de efeito entorpecente preparada com os ramos, folhas e flores do cânhamo.

O registro é de 1926 e o dicionário diz que é do quimb. makanha

308.Macumba: manifestações religiosas afro brasileiras.

macumba (a) denominação genérica para as manifestações religiosas afro-brasileiras, de base

Designação genérica dos cultos afro-brasileiros originários do nagô e que receberam influências de outras

A datação é do séc. XX, o dcionário diz que a origem é do quibumdo ou do

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[ma»ku)mbå] congo-angola, que incorporam orientações ameríndias, católicas e espíritas, com predominância do culto ao caboclo e preto-velho.

(b) sessão de feitiçaria, de magia-negra

(c) denominação popular das manifestações religiosas afro-brasileiras no Rio de Janeiro e em zonas rurais de várias regiões brasileiras

Kik-Kim makuba reza, invocação

religiões africanas (p.ex., de Angola e do Congo), e tb. ameríndias, católicas, espíritas e ocultistas.

quicongo [ma’kôba].

309.Mafuá: conjunto de coisas velhas; fora de uso. [ka»fuWå] [ma»fuWå]

O dicionário de bantuísmos diz que é conforme cafua (a) antro, cova, esconderijo

(b) habitação miserável, casebre

(c) quarto escuro em que se prendiam alunos castigados (arcaico)

Kik kafwalala lugar obscuro, sombrio

mafuá (a) conjunto de coisas velhas, fora de uso

(b) lugar onde se guardam desordenadamente essas coisas

(c) feira ou parque de diversões

Kik-Kim mufwa

(a) Parque de diversões ou feira de prendas ou jogos, esp. Com transmissão de música ruidosa nos alto-falantes; (b) ausência de ordem, de arrumação; bagunça; confusão; rolo. (c) baile popular.

Nei Lopes sugere procedência do quicongo mfwa.

310.Malafa/malofo: cachaça; bebida votiva de exu e caboclo. [ma»lafU] [ma»lafå]

malafo, malafa, marafo, marufo

cachaça, bebida votiva de Exu e do caboclo

Kik-Kim malafu, maravu

marufo, maluvo, maruvo

No candomblé de caboclo e em cultos por ele influenciados, bebida alcoólica que serve aos assistentes, e que os caboclos e os Exus tomam; marafa, marofo.

Cacciatore diz que prov. cruzado com o pl. quimb. Malufu (sic). .

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vinho ou qualquer outra bebida alcoólica.

Kim maluvo vinho de palma

311.Maluco:doido. [ma»lukU]

Maluco doido

Que ou aquele que sofre de distúrbios mentais; doido, louco, alienado

O registro histórido é de 1873.

312.Malungo: irmão de criação ou irmão de leite. [ma»lu)NgU]

malungo (a) companheiro, irmão de barco

(b) o negro companheiro de embarcação de África (arcáico)

(c) irmão-de-criação ou irmão-de-leite

Kik NkwanluNgu irmão, companheiro do mesmo barco

(a)aquele que participa das atividades, das amizades, do destino etc. de outro; camarada, companheiro, parceiro;

(b)título por que se tratavam reciprocamente os escravos africanos que tinham vindo da África na mesma embarcação; (c)irmão colaço ou de criação; (d)indivíduo nascido no mesmo ano, mês, dia e, se possível, hora, que outra pessoa.

O dicionário diz se de orig.contrv.; ger. ligado ao pref. ma (pl. ou col.) + quicg. lungu ou quimb. ulungu 'embarcação'; Nascentes propõe o quimb. maluga 'camarada, companheiro'; Nei Lopes contesta essas etimologias, lembrando que há o quioco malunga, pl. de lunga 'homem, marido, macho', o quicg. malungu, pl. de lungu 'sofrimento', e o quicg. madungu 'pessoa desconhecida, estrangeiro', e a orig. do voc. poderia provir de cruzamento de todas essas acp. A datação é de 1688.

313.Mandinga: bruxaria, pequeno feitiço.

mandinga (a) bruxaria, ardil (b) mau-olhado

(a) indivíduos dos mandingas , povo de religião

O dicionário data de 1716 e diz que é de origem

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[ma)n»dZi)Ngå] Kik-Kim maziNga ação de complicar, de impedir também por feitiço

predominantemente maometana da região norte da África ocidental; mande; (b)língua falada pelos mandingas; (c)feitiço; bruxaria.

banta.

314.Mandraque: feiticeiro. [ma)n»dRakI]

mandraque (a) feiticeiro, mágico (b) figura de história em quadrinhos

Kik mando@ka <lukoka Kik mando@ki

No dicionário “mandraqueiro” que significa mandigueiro, ou seja, feiticeiro.

A datação mandigueiro é de 1789.

315.Mangar: zombar.

[ma)N»ga]

mangar (a) zombar, troçar, vangloriando-se

(b) caçoar, afetando seriedade

Kik maNga vangloriar-se de coisas recebidas e injuriar os outros

(a)Escarnecer fingindo seriedade; caçoar; (b)expor alguém ao ridículo, ao desdém.

O dicionário atesta como sendo de 1789 e diz ser de origem duvidosa.

316.Mango: festa; aproveitar a festa do divino. “Hoje eu vou cair no mango”. [»ma)NgU]

Mentiroso. (a)parte de objeto, utensílio, ferramenta; (b)o pênis; (c)unidade monetária; (d)dinheiro; capital. (e)chicote de cabo curto

¹mango a datação é do séc. XV; lat.vulg. *manìcus, der. de manus,us 'mão'; ver man(i/u)-; ²mango a datação é de 1930; do esp. mango < lat. manìcus, der. de manus,us 'mão'; divg. de 1mango; ver man(i/u)-.

317.Manjuba: pênis muito grande. [ma)¯»Zubå]

manjuba, manjuva pênis muito grande, de tamanho descomunal

Kik manvumba

Kim mandZimbu

(a)Design. comum aos peixes teleósteos clupeiformes; (b) o pênis; (c)comida; refeição; (d)enxame de peixes novos que procuram as cabeceiras dos rios .

A datação é de 1890; para Nascentes a origem é do tupi.

318.Mão de cinza: pessoa que faz macumba; macumbeira. [ma)¯ωδΖι∪σι(⊄ζ ]

319.Maraca: instrumento maraca No dicionário maracá A datação é de

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músical. [ma»Rakå]

instrumento

que é chocalho indígena, us. em festas, cerimônias religiosas e guerreiras.

1561, o dicionário atesta como sendo tupi. (Convém analisar a alternância maracá/maraca).

320.Maracutaia: trapaça. [maRaku»tajå]

maracutaia engodo, trapaça Kim madiakutola

Negócio escuso, manobra ilícita, esp. em política ou administração; traficância, fraude, falcatrua.

A datação é de 1989, e o dicionário diz que é de origem obscura, e ao mesmo tempo diz que talvez seja do tupi.

321.Marafo: aguardente; cachaça. [ma»Rafo]

marafo, marufo cachaça, bebida votiva de Exu e do caboclo

Kik-Kim malafu, maravu

aguardente de cana; cachaça

O dicionário diz que marufo vem de maluvo que tem como significado: bebida obtida da fermentação da seiva de uma palmeira conhecida como 1bordão, muito apreciada em alguns países africanos; .

322.Maria Isabel: charque com arroz. [ma»RiJåisa∪bΕΩ]

Diz ser em homenagem a princesa Isabel que libertou os negros da escravidão.

323.Maria Padilha: entidade (exu fêmea); ladrona, maledicente. [ma»RiJå pa»dZi¥å]

maria padilha entidade muito popular e muito temida, tida como Exu, fêmea, ladrona, maledicente e escrava de Oxum

Kik-Kim mabiala mpaadinzila o grande inquice do caminho + português “Maria”

324.Maribondo: vespa. [maRi)m»bo)ndU]

marimbondo vespa Kik-Kim dibondo

No dicionário marimbondo: (a)design. comum e

O dicionário diz ser do quimb. mari'mbondo; a

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Umb alimbondo imprecisa aos insetos himenópteros, esp. da fam. dos vespídeos e pompilídeos, sociais ou solitários, ger. maiores e dotados de ferrão, distinguindo-se das vespas por manterem as asas anteriores longitudinalmente dobradas quando estão pousados; caba (b)vespa ('designação comum') (c)dança de roda de caráter, em que um figurante se posta ao centro com um pote de água, dançando e pulando (d)designação dada pelos portugueses aos brasileiros, à época da Independência (e)design. dada aos pernambucanos contrários ao decreto imperial de 18 de junho de 1851 que instituiu o registro de nascimentos e óbitos

datação é de 1716.

325.Marufo: cf. marafo [µα∪Ρυφο]

326.Massapé: terra argiloso ótima para o cultivo de cana-de-açucar. [masa»pe]

massapê, massapé terra argilosa, comum na região do Recôncavo, ótima para cultura da cana-de-açucar

Kik museNge + português “massa” substância pastosa

Kim museke + português “massa”substância pastosa

(a) terra argiloso de SE e BA , formada pela composição dos calcários cretáceos, preta quase sempre, e ótima para a cultura de cana-de-açúcar; (b) caule do benjoim.

A datação é de 1663.

327.Massassá: feijão com arroz, o famoso baião de dois. [masa∪sa]

328.Matula: saco com matula (a)multidão de gente A datação é de

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comida pronta com um tipo de lanche quando saiam para a roça . [ma»tulå]

torcida, pavio rústico, de algodão, que se embebe no óleo depositado numa espécie de concha de barro e que serve de candeia

ordinária; vadios;súcia; corja; matulagem. (b)alforje para viagem; farnel.

1899.

329.Maxixe: fruto do maxixeiro. [ma»SiSI]

maxixe (a) fruto do maxixeiro (b) dança urbana, de par unido, originária do Rio de Janeiro

maxixar dançar maxixe (a)Kik-Kim mansise, masisi

(b)Kik-Kim mansiki <siNka balancear o corpo de lá para cá, de todos os lados, a exemplo de um bêbado

Planta Cucumis anguria, que dá o maxixe.

A datação é de 1730, e o dicionário diz que é do quimbundo [maxi’xi].

330.Mazuca: dança onde os homens tiram as mulheres para dançarem, não podendo ocorrer o contrário. [ma∪zuka]

No dicionário encontrei Mazurca: dança polonesa em compasso ternário.

A datação para Mazurca é de 1856.

331.Miçanga ou buginganga: vidros coloridos próprios para colares e brincos. [mi»sa)Ngå]

miçanga (a) contas de vidros coloridas, próprias para colares, brincos

(b) guia, espécie de rosário para o pescoço, formado de colares de contas rituais nas cores do santo

Kik-Kim minsaNga

(a)pequena conta colorida de massa de vidro; (b)adorno feito com contas desse tipo; (c)coisa de nenhum ou pouco valor; buginganga.

A datação é de 1706 e o dicionário diz que provém do quimbundo.

332.Miçanga: cf. buginganga. [mi»sa)Ngå]

333.Minhoca: pênis de criança. [mi»¯okå]

quinioca, nioca, nhoca (a) cobra, serpente (b) personagem de conto popular

minhoca (a) verme anelídeo (b) pessoa muito magra Kik-Kim ¯oka

(a)design. comum aos animais anelídeos; (b)o pênis;

O dicionário diz que é de origem obscura e a datação é de 1560. (averiguar o sentido dessa ocorrência seicentista).

334.Mocambar: viver em mocambar

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mocambo. [moka)m»ba]

viver em mocambo Kik mukambu refúgio, esconderijo

335.Mocambo: refúgio de escravos na floresta. [mo»ka)mbU]

mocambo, mucambo (a) esconderijo de escravos na floresta, equivalente a quilombo

(b) choça, palhoça, casebre

(c) cerrado de mato ou moita onde se esconde o gado

(d) topônimo muito comum no Brasil

mucambo (e) mucambo = nome de antigo engenho do Recôncavo

(f) mucambo = topônimo muito comum na região do Recôncavo

Refúgio, ger. em mata, de escravo(s) foragido(s); quilombo

A datação é de 1535. Essa datação, conforme A.G. da Cunha, remete a textos referentes às antigas “possessões” portuguesas na África. Assim mesmo, orig.contrv.; quimb. mu'kambu 'cumeeira' (Nascentes) ou mu + kambu 'esconderijo' (Renato Mendonça, apud JM); MS (1813) registra a acp. 'habitação feita nos matos pelos escravos pretos fugidos, qualquer choça ou palhoça do Brasil, para habitação ou para recolherem os que vigiam lavouras';

336.Mochila: bolsa pequena de caça. [mo»Silå]

muxila (a) bolsa pequena de caça, usada a tiracolo, ferramenta deCatendê e Oxóssi

(b) pau-de-nagô, pedaço de galho de laranjeira utilizado para escovar os dentes, ainda comum no interior da Bahia

(a)Kik-Kim nzila espécie de saco de inquice, em forma de envelope,

Saco de lona ou tecido sintético resistente que se leva às costas seguro por correias, us. por soldados, excursionistas, escolares etc

A datação´é de 1619.

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levado a tiracolo (b) Kik-Kim nsilu, nsila

337.Mocó: nome para ruelas e becos. [mç»kç]

mocó (a) saco de palha trançado com alças para transporte de mantimentos ou de pequenos embrulhos

(b) lugar em que caem, perdendo-se, os papagaio de papel ou pipas

(c) nome muito comum de ruelas e becos

(d) amuleto (a)Kik mukolo

(b) Kik mukoko alçapão (d) Kik mooko

(a) roedor caviideo, semelahnte a cobaia; (b) homem matuto, da roça; (c) bolsa de tiracolo para pequenas provisões; (d)variedades de algodão nordestino.

. A datação é de 1618 e o dicionário diz que é provavelmente tupi. É encontrado somente na BA.

338.Mocororó: arroz grudado na panela. [m κ Ρ ∪Ρ ]

mocororó bebida refrigerante semelhante ao aluá

(a)Denominação comum a várias bebidas fermentadas; (b)limonito encontrado na região aurífera da BA; (c)cascalho de diamante.

O dicionário diz ser do tupi. Não possui datação.

339.Mocotó: tornozelos; pernas grossas. [moko»tç]

mocotó (a) tornozelo, pernas grossas

(b) patas de bovinas, sem casco, usadas como iguaria de mesmo nome

(c) mão-de-vaca (a)Kik-Kim kooto pernas, patas

(b) Kik makooto

(a)Pata de bovino, sem o casco; chambaril, mão-de-vaca; (b) tornozelo.

Segundo Nascentes, tupi mboko'tog 'que faz balançar'; a datação é de 1836.

340.Moito: mato, floresta. [»moI9»tU]

moitumba, moito (a) mato, floresta (b) encruzilhada Kik munto@ margem da floresta onde se enterra oferendas

(a)Kim matumbu (b)Kik munto mpambuka encruzilhada para oferendas

Variação de “moita”?

341.Molambo: trapo, farrapo.

molambo (a) trapo, farrapo, pedaço

(a)pedaço de pano velho, roto e sujo;

A datação é de 1848 e o

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[mo»la)mbU]

de pano velho, roto e sujo

(b) fraco, sem caráter, pessoa em completa decadência moral

(a)Kik-Kim mulamba mulumbi pedaço de pano velho

(b) Kik-Kim mulambu fraco, débil

farrapo; (b)roupa velha e/ou em mau estado; (c)indivíduo sem força moral, determinação, firmeza.

dicionário diz ser do quimbundo.

342.Molejo: movimento sensual feminino das cadeiras. [mo»leZU]

molejo movimento feminino das cadeiras

Ato ou efeito de menear o corpo, de requebrar-se, de gingar

O dicionário não diz a etimologia e diz que a datação é do séc. XX

343.Moleque: menino, garoto. [mo»lekI] [mu»lekI]

moleque, muleque (a) menino, garoto, rapaz (b) meninote negro (c) divertido, pilhérico, travesso

(d) canalha, velhaco (a,b) kik-Kim-Umb mi-

/mu-/a nleeke jovem, garoto, discípulo, subordinado

(c) Kik-Kim nleku

(a) menino novo de raça negra ou mista; (b)garoto de pouca idade; (c)pessoa brincalhona, trocista, engraçada.

A datação é de 1716; quimb. muleke 'garoto, filho pequeno'.

344.Mona: irmão ou irmã nos cultos afro. [»monå ]

mona (a) irmão ou irmã na religião

(b) criança, menino-macho

(a)menino ou menina; rapaz ou moça muito jovem; filho, filha;

(b)criança.

A datação é de 1537-1583. O dicionário diz que há controvérsia na origem. No entanto, o dicionário Aurélio diz ser do quimbundo.

345.Mondrongo: cara de pau; preguiçoso. [mo)n»dRo)NgU]

mondrongo, mondongo, mundongo, mundrongo

(a) sujeito disforme (b) pessoa desprezível,suja e desmazelada

(c) alcunha depreciativa que era dada aos portugueses

(d) inchaço, tumor (a-b)Kik munduNgu figura grosseira

(a) indivíduo disforme; mostrengo; indivíduo preguiçoso; (b) alcunha de português (v.galego); (c)inchação.

A datação é do séc. XX.

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(c)Kik munduNgu, mundundu

(d) Kik-Kim doNgo 346.Moqueca: guisado de peixe. [mo»kEkå] [mu»kEkå]

moqueca, muqueca (a) guisado de peixe ou de mariscos, podendo também ser feita de galinha, carne, ovos, etc., regado a leite-de-coco, azeite-de-dendê e pimenta

(b) diz-se de alguma coisa mole, misturada, sem consistência

Kik-Kim mukeka < kuteleka guisar

(a)guisado de peixe, frutos do mar, carne ou ovos, feito com leite de coco, dendê e bastante tempero; (b)cataplasma caseira feita com folhas de mangueira e fumo, que em forma de compressa, é empr. na cura de cefaléias.

A datação é de 1836 e o dicionário diz vir do quimbundo.

347.Moringa: pote de barro para conservar a água. [mo∪Ρι(γα]

moringa, moringue, muringa, muringue

bilha, cântaro de barro em forma de garrafa, bojudo e comprido para conter e refrescar água

Kik-Kim mudiNgi

Vaso de barro bojudo e de gargalo estreito us. para acondicionar e conservar fresca a água; bilha de barro para água fresca potável.

A datação é de 1890. segundo Nascentes, cafre muringa; Nei Lopes relaciona ao nhungue muringa (correspondente ao quimb. muringi ou mudinge) 'bilha de barro para água de beber'.

348.Morteiro: o que faz o barulho para anunciar a chegada do Divino. (Sem pólvora). [moh∪teιΡυ]

Canhão curto mas de largo diâmetro, através do qual são lançadas pequenas bombas

A datação é de 1524-1585. O dicionário diz que vem do latim.

349.Mouron: estaca. [moΩ∪Ρõ]

No dicionário “mourão”: cada uma das estacas mais grossas ou postes nas estacadas, à qual são fixadas horizontalmente varas mais finas, formando uma cerca.

A datação é de 1008 e provavelmente tem origem pré-romana conforme diz o dicionário.

350.Muamba: feitiço; muamba (a)cesto para transporte A datação é de

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fraude, roubo. [»mWa)mbå]

(a) feitiço, bruxedo (b) contrabando, fraude, roubo

(a) Kik wamba (b) Kik-Kim muhamba

de mercadorias em viagem; carreto; (b) roubo ou furto de mercadorias nos portos

1890. Segundo Nei Lopes, quimb. muhamba 'cesto comprido para transportar cargas em viagem'.

351.Mucama: criada; escrava. [mukã⊃m ]

Conforme camba. Ver macamba, acima.

No Brasil e na África portuguesa, escrava ou criada negra, ger. jovem, que vivia mais próxima dos senhores, ajudava nos serviços caseiros e acompanhava sua senhora em passeios.

A datação é de 1789. O dicionário diz vir do quimb. mukama 'escrava concubina'; f.hist. 1813 mucamba.

352.Mucamba: recado, mensagem. “Entrega essa mucamba pra mim?” [mu»ka)mbå]

mucamba (a) petrechos de uso, de trabalho

(b) objetos

(a)mucama; (b) em alguns candomblés de rito angola-congo, auxiliar do sexo feminino; mumbanda.

A datação é de 1881. O dicionário diz vir do quimbundo makamba.

353.Mucambo: esconderijo de escravos na floresta. [mu»ka)mbU]

mocambo, mucambo (a) esconderijo de escravos na floresta, equivalente a quilombo

(b) choça, palhoça, casebre

(c) cerrado de mato ou moita onde se esconde o gado

(d) topônimo muito comum no Brasil

Mocambo: refúgio, ger. em mata, de escravo(s) foragido(s);

Variação de Mocambo, cf essa lexia.

354.Muçum: mau cheiro (buzum, burdun, xirim). [musu(⊃]

Muçum no dicionário é um peixe teleósteo sinbanquiforme.

No dicionário “muçum” vem do Tupi. No entanto, no Guaporé, “muçum” tem o mesmo sentido de burdun.

355.Mufufa: confusão.

mufufa confusão

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[mu»fufå] Kik-Kim mufufwa 356.Mumbica: jarro; pote. [mu)m»bikå]

mumbica magro, raquítico, sem graça

Kik mumbika

Bezerro magro, raquítico, pouco desenvolvido;

O dicionário diz ser de origem do quicg. mbika, de bika 'abandono, abandonar'; a datação é de 1899.

357.Munguzá/Muncunzá: mingau de milho. [mu)Ngu)n»za]

[muku)n»za]

mungunzá, mucunzá, mugunzá

milho debulhado, cozido em leite de côco, sal e açucar

Kik mugenza

Kim mugunza

Espécie de mingau feito de milho branco com leite e leite de coco, temperado com açúcar e canela

O dicionário diz ser do quimb. mukunza 'milho cozido'; a datação é de 1861.

358.Muvuca: confusão. [mu»vukå]

muvuca (a) confusão, agitação (b) festa familiar de última hora, improvisada

Kik muvuka, mavuka

Grande confusão; tumulto

O registro é de 1976 e o dicionário diz ser do quicongo mvúka.

359.Nagô: palavra que consta no verso de um canto divino, uma divindade. [na∪go]

Indivíduo dos nagôs, designação de qualquer negro escravizado, comerciado na antiga Costa dos Escravos e que falava o ioruba

Jeje anago, nagôr, denominação atribuída pelos falantes dessa língua aos de língua ioruba tomados coletivamente, e que se generalizou no Brasil, a datação é do séc. XX.

360.Nasurdino: pessoa safada. “João é nasurdino, e como!”. [nasuΡ∪δινυ]

361.Navalhada: dança com damas de vestido rodado, ficavam rodando levantando a saia. [nava∪×αδ ]

Golpe com navalha ('instrumento')

A datação é de 1789.

362.Negócio/coisa: termo usado para algo que não se lembra mais. “Pega esse negócio aí pra mim?”

Coisa: aquilo que se está tratanto ou falando.(1532). Negócio: trato mercantil; comércio;

Provém do latim.

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[ne∪g σιΥ] [∪κοιζα]

qualquer coisa.(1293).

364.Nenê/Neném: criança; ou apelido muito usado na família. [ne»ne] [nE»ne)]

nenê, neném (a) tratamento com que a ama escrava distinguia as irmãs mais velhas de uma criança

(c) mais tarde, confundindo-se com o inglês nany, aplicou-se a qualquer criança, bem como foi usado como apelida familiar.

Kim nene grande

Sinonímia de bebê (criança recém-nascida).

Para “bebê” a datação é de 1877.

365.Nhonhô: senhor fulano de tal., usado quando não se sabe o nome da pessoa, no caso de homens. [ο∪ο]

No dicionário “nhonhô” é ioiô que sig. Tratamento reverente dispensado originalmente aos brancos, esp. ao patrão ou proprietário, pelos escravos e seus descendentes; nhonhô, nhô.

A datação é de 1899.

366.Olelê, olalá: refrão comum na música popular. [ola»la] [ole»le]

olalá refrão muito comum na música popular brasileira olelê cf. olalá Kik-Kim leele, wee lelelee

Umb oleele interjeição de alegria, animação + português olé

367.Oratório: altar onde se ascende vela para o divino. [oΡα∪τ Ριo]

Compartimento de uma casa consagrado à oração.

É do séc. XV, e o dicionário diz que é do latim.

368.Pacaia: sovaco, axila. [pa»kajå]

pacaia sovaco, axila Kik-Kim mpaka¯a

Diz-se de cigarro ou charuto de má qualidade; pacaio.

O dicionário diz que é de origem obscura e não dá o registro histórico da palavra. Macaia/pacaia é usado no Brasil para tabaco, cigarro de palha e é indicado como sendo

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bantu 369.Pacova: banana comprida. [pa∪kov ]

banana ('fruto')

O dicionário diz ser do tupi pa'kowa 'banana'; o registro é de 1576.

370.Pacú: piratininga.(uma espécie de peixe). [pa∪κυ]

Design. comum a vários peixes teleósteos.

Do tupi e o registro histórico é de 1777.

371.Pacupeba: é o peixe denominado pacu. [paku∪pΕβ ]

Peixe teleósteo , caraciforme, caracídeo da bacia amazônica.

A datação é de 1877. O dicionário diz ser do tupi *paku'pewa

372.Pancoso: bem arrumado, bem vestido. “Nego pancoso.” [∪pãnkozo]

373.Pandorô: feiticeiro. [pa)ndo»Ro]

pandorô feiticeiro, cobé Kik mpandulu

No dicionário “pandoro” que quer dizer feiticeiro. A ortoepia é ô.

O dicionário diz ser de origem obscura. E não possui registro histórico.

374.Paquete: menstruação. “Ela hoje ta de paquete!”. [pa∪ketΣι]

Conjunto dos diversos tipos de pêlo que podem ser us. na confecção de chapéus.

O registro é de 1899, e o dicionário diz ser de origem obscura.

375.Paranga: quando se perde o pedaço de alguma coisa. [pa»Ρa)Ngå]

palanga, paranga (a) leigo, não iniciado (b) homem fraco, covarde, sem autoridade

Kik mpoluNga

No dicionário existe “parango” (pacote de maconha).

O registro histórico é de 1969. E o dicionário diz ser de origem obscura.

376.Parapeito: sutiã. [paΡ ∪πειτυ]

(a)parte superior de uma trincheira que protege seus defensores, mas que não os impede de atirar sobre ela; (b)parede ou outro tipo de proteção que se ergue na altura do peito ou pouco mais abaixo;à borda de janelas, varandas, terraços, pontes etc. (c)peça de pedra, granito, madeira etc.

O registro histórico é de 1647. E o dicionário diz vir do it. parapetto (a1308) 'id.' < lat.medv. parapectus.

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que integra a parte inferior de uma janela e serve para apoiar quem nela se debruça.

377.Pau-de-nego: rubafo (peixe traíra). [pawdΖι∪νεγω]

378.Pengó: coxo. [pe)N∪∪γ ]

Indivíduo pouco inteligente; tolo, parvo; coxo.

O dicionário diz ser de origem obscura e não dá a datação.

379.Perdi: deixei. “- Maria você trouxe a matula?” “ – Não, perdi.” [πεηδΖι]

380.Perrengue: birrento. [pe»xe)NgI]

perrengue (a) birrento (b) tardonho, moroso

(a)Que ou o que é teimoso, birrento; (b)situação difícil; aperto.

A datação é de 1836. E o dicionário diz ser do espanhol “perrengue”.

381.Pichilinga: apelido para pessoa de pequena estatura. [piSi»li)Ngå]

pichilinga candeia de folha-de-flandres

Coisa muito pequena. O dicionário diz que deve ter dois étimos distintos. E diz também ser de origem obscura. Não possui registro histórico. Pixilinga no Houaiss

382.Pintado: surubim. [πι(⊄∪ταδυ]

(a)Que se pintou. (b)surubim-pintado (peixe).

É como os negros chamam o surubim, no Guaporé. No dicionário a datação é de 1698. E diz que provavelmente venha do tupi “suru’wi”. Provavelmente por causa das pintas que o peixe possui.

383.Piranha-caju: piranha vermelha. [πι∪Ρα(ακα∪ΖΥ]

Piranha vermelha. É como os negros dos quilombos do Guaporé

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chamam a piranha. O dicionário não dá a datação nem a origem provável.

384.Piranha-moura: piranha amarela específica do Guaporé. [πι∪Ρα(αµουΡ ]

Um peixe específico do Guaporé, cf.os negros que lá vivem.

385.Piripeça: passando por uma dficuldade. [πιΡι∪πΕσ ]

No dicionário “peripécia”: (a) lance de narrativa, peça teatral; poema; (b) sucesso imprevisto; ncidente; aventura.

A datação é de 1624.

386.Pisquila: pessoa franzina e de pequena estatura. [pis»kilå]

pisquila pessoa franzina e de pequena estatura

Kik sikila

Pessoa franzina e de pequena estatura.

Origem obscura, conforme diz o dicionário e não possui registro histórico.

387.Pito: chamar atenção; puxar a orelha. “Eu vou te dar um pito”. [∪pito]

(a) Na Grécia antiga, vaso grande de cerâmica p/ guardar vinhos ou cereais; (b) cachimbo; cigarro; (c) repreensão; (d) Libélula.

Para (c) a datação é de 1913 e diz provavelmente de origem africana.

388.Pitombo: caroço formado da pancada. [pi»to)mbU]

pitombo tumefação cutânea, caroço especialmente formado na testa, resultado de pancada

Kik noNgo, bituNgu

Fruto das pitombeiras. Não diz a origem provável e nem registro histórico.

389.Poeirismo: muita poeira. “Hoje tá com muito poeirismo”. [ποεϑ∪ΡισµΥ]

390.Pombajira:exu fêmea, espírito invocado na macumba. [po)mba»ZiRå]

bambojira, bombojira, pombajira

entidade congo-angola equivalente a Exu

pombajira Exu-fêmea que reparte com o Exu Bambojira o controle das encruzilhadas e caminhos, e exerce

Na umbanda popular e na quimbanda, um Exu-fêmea; Bombonjira

O dicionário diz vir de uma língua banta.

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influência sobre os namoros, noivados e casamentos desfeitos. É tida como protetora das prostitutas

Kik-Kim mpemba ndZila nome de inquice, a cruel alvura do caminho mpembu mpambo ia ndZila

o enviado do caminho 391.Povil: goma. [πο∪ϖιω]

392.Pra frente: pessoa gaiata, que gosta de chamar atenção. [πΡα∪φΡε(⊄τΣι]

393.Prendada: boa dona de casa. “Ô nega prendada!”. [pΡε(⊄∪δαδ ]

Dotado de prenda(s), de habilidade(s)

A datação é de 1209.

394.Prenha: grávida. [πΡε(∪ ]

No dicionário PRENHE, referente a gestação.

A datação é do séc. XIII.

395.Procuração: procurar saber a verdade. Ex. “Vou fazer procuração do que você está falando”. [πΡοκυΡα∪σãυ]

Delegação; autorização.

Esta palavra tem como origem o latim. A datação é de 1205. No Guaporé o sentido é derivado do verbo “procurar”.

396.Proeiros: remadores do barco do divino. [πΡοειΡυσ]

Marinheiro de proa de embarcação miúda e que trabalha com o croque.

A o registro histórico desta palavra é de 1285.

397.Quá/Aquá: expressão de dúvida, de esquecimento. [∪kω ] [α∪κω ]

398.Quáquá: expressão de risadas usadas nas danças para expressar felicidade. [∪kω ∪κω ]

No dicionário Aurélio é onomatopéia de gargalhada.

399.Quariterê: Tereza de quarité ou Tereza de Bengala, uma escrava que revolucionou os quilombos no Guaporé. É usado no Guaporé para representar

Dizem que o quilombolo foi chamado de Quariterê por causa do nome dessa escrava.

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força. [κωαΡιτε∪Ρε] 400.Quebra-galho: mulher que mesmo sendo casada “quebrava o galho” de homens que não tinham mulheres. Transar para fazer um favor para alguém que está só. [kΕβΡα∪γα×υ]

Qualquer pessoa , ou recurso, ou coisa que ajuda a resolver uma dificuldade , a quebra um galho.

401.Quenga: Prostituta. [»ke)Ngå]

quenga (a) guisado de galinha e quiabo

(b) cuia, vasilha feita da metade da casca de um coco

(c) o conteúdo da vasilha (d) prostituta de baixa classe

(e) coisa imprestável, sem valor

(f) “chupar na quenga” = aborrecer-se, vexar-se

(a)Kik peNga (b)Kik keNga metade da noz do coco

(d)Kik Nkemba (d)Kim peNga (e)Kik-Kim NkaNga

Mulher que exerce a prostituição; meretriz.

O dicionário diz vir do quimb. kienga 'tacho', o registro histórico é de 1836.

402.Quengo: cabeça. [»ke)NgU]

quengo (a) cabeça de coco (b) inteligência, talento (c) indivíduo esperto, trapaceiro, que sabe fazer quengada

(d) o endocarpo do coco (a-c) Kik kieNga (d) Kik keNga

Cabeça; espertalhão. O registro histórico é de 1899.

403.Quenta: mulher sexualmente promíscua. [»ke)Nτ ]

404.Quentão: bebida feita de gengibre com álcool para servir na festa do divino. [»ke)Nτ Υ]

Bebida preparada com aguardente de cana fervida com gengibre, canela e açúcar.

A datação é do séc. XX.

405.Quiabo: fruto do quiabeiro.

quiabo fruto do quiabeiro

Design. comum a várias plantas da fam.

O registro histórico dessa

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[»kJabU]

(Hibiscus esculentus), muito usado na cozinha cerimonial afro-brasileira e baiana

Kik-Kim kiNgombo > kiNgambo > kiambo

das malváceas, esp. às do gên. Hibiscus

palavra é de 1730 e o dicionário diz ser provavelmente africana.

406.Quiamba: coisa feita, magia, feitiçaria. [»kJa)mbå]

quiamba coisa-feita, magia, feitiçaria, preparação mágica

407.Quilombo: povoação de escravos fugidos. [ki»lo)mbU]

quilombo (a) povoação de escravos fugidos

(b) auto popular figurando escravos fugidos que lutam pela posse da rainha, mas terminam derrotados e vendidos como escravos

Kik-Kim kilombo aldeamento

Local escondido. O registro histórico desta palavra é do séc. XVI, e o dicionário afirma que é de origem africana, provavelmente do quimbundo.

408.Quilombola: escravo fugido. [kilo)m»bolå]

quilombola escravo refugiado em quilombo

Kik-Kim kilomboli

Escravo fugido para o quilombo.

A datação desta palavra é de 1855. É necessário um estudo mais complexo, porque o dicionário diz ser de origem controvérsia e em seguida diz que é de uma mistura de tupi com o quimbundo.

409.Quimbanda: sacerdote de macumba. [κι(⊃∪βã<δα]

Chefe religioso; sacerdote, curandeiro.

A datação é de 1899. O dicionário diz que é do quimbundo.

410.Quindim: doce feito da gema de ovo, coco e açúcar. [ki)n»dZi)]

quindim (a) dificuldades (b) particularidades, minúcias

(c) graça, meiguice (d) doce feito de gema de ovo, coco e açúcar

(e) benzinho, amorzinho

Doce feito de gema de ovo, açúcar e leite de coco

Segundo Nei Lopes quicg. kénde 'grande pudim de mandioca ou milho fresco' através de um prov. dim. aport.

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(tratamento carinhoso) (a-b) Kik ntinti escrupuloso, difícil

(c) Kik ntinti delicadeza

'quendinho'; a datação é de 1880.

411.Quiosque: lugar onde se vendem frutas e verduras. [∪kioskΙ]

Caramanchão ger. de madeira, em estilo oriental, que se instala em parques e jardins.

O registro histórico em português é de 1839. A palavra passou do persa para o turco, de lá para o italiano (1594), em seguida para o francês (1608), e finalmente do francês para o português, mudando de forma e de sentido.

412.Quirera: farelo da sobra de arroz. [ki∪ΡΕΡ ]

Milho quebrado que se dá aos pintos e aos pássaros.

Não possui datação e o dicionário diz vir do tupi “Ki’rera”.

413.Quitanda: pequeno estabelecimento onde se vendem verduras e frutas. [ki»ta)ndå]

quitanda (a) pequeno estabelecimento onde se vendem verduras e frutas

(b) tabuleiro em que os vendedores ambulantes expõem a sua mercadoria

(c) nome de um antigo engenho no Recôncavo

Kik-Kim kitanda

Local onde se fazem negócios.

A datação é de 1681; quimb. kitanda 'feira' < kitânda 'estrado de bordão entrelaçado que servia de colchão'

414.Quitute/quitutinho: comida pouca feita em panela pequena; um doce de sabor apurado. [ki»tutSI]

quitute iguaria de apurado sabor Kim kitutu indigestão

Comida refinada. Tradicionalmente do quimb. kitutu 'indigestão'; a datação é de 1858.

415.Quizumba: briga, confusão. [ki»zu)mbå]

quizumba rolo, briga, confusão

Confusão; rolo. Para Nei Lopes, prov. alt. de quizomba 'festa'; o registro é do séc. XX.

416.Rabo de saia: Mulher. Não possui

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namorada. [∪ηαβυδΖι∪σαι ]

datação e nem origem provável.

417.Ramalhetas: quatro meninas que na festa do Congo levam as flores. [hama∪×ετ σ]

418.Rancheira: dança quase igual a mazuca. [hã<∪ΣειΡ ]

dança popular, de compasso ternário, de provável origem árabe, estilizada na Argentina e difundida no Rio Grande do Sul

O registro histórico desta palavra é do séc. XX.

419.Ranchinho: casinha de palha. [ηã<∪∪ΣιΥ]

Casebre rural. A datação é de 1858.

420.Rapariga: prostituta. [ηαπα∪Ριγ ]

Namorada. A datação é do séc.XIII.

421.Rasurar: brigar, esculhambar. [ηαζυ∪Ρ ]

Fazer rasuras em; riscar, raspar

A datação é do séc. XX.

422.Remeiro: que rema o barco do divino. [he∪µειΡυ]

Que rapidamente obedece ao impulso dos remos.

A datação é de 1367.

423.Requisito: pessoa que não tem palavra. [ηεκιζιτυ]

Requerido. O registro é de 1652.

424.Rincha: briga entre vizinhos. [ηι(<Σ ]

No dicionário “rixa” contenda; briga.

A datação é de 1096 e diz vir do latim.

425.Robafo ou lobó: peixe traíra. [ηυ∪βαφυ]

Traíra. Ver em Rubafo

426.Ronqueira: uma espécie de canhão instalado na proa do batelão. [ηο(∪κειΡ ]

Artefato pirotécnico que dispara com grande estampido;

A datação é do séc. XVII.

427.Rufar: bater com força. [ηυ∪φ ]

Produzir rufo(s) [em viola, em tambor]

O registro histórico é de 1836. O dicionário sugere origem onomatopéica

428.Rufei:bati. [ηυ∪φει]

Vem de rufar.

429.Sacana: canalha, patife. [σα∪καν ]

Que ou quem é libertino, devasso.

Nei Lopes propõe vir do quicg. sàkana 'brincar, divertir-se; o registro

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histórico é do séc. XVIII.

430.Salveiro: uma espécie de canhão que anuncia a chegada do batelão (usa pólvora). [σαω∪ϖειΡυ]

O dicionário registra “salveira” que é dispositivo pirotécnico para dar salvas.

O dicionário não dá etimologia nem datação.

431.Samba: dança e música popular brasileira; confusão. [»sa)mbå]

samba, semba (a) título de mameto samba (b) cerimônia pública de macumba

(c) dança e música popular brasileira de compasso binário e acompanhamento sincopado

(d) a música que acompanha essa dança

(e) por extensão, festividade barulhenta acompanhada de dança

(f) qualquer cerimônia pública, religiosa, afro-brasileira

(g) confusão, barulho, briga

Dança de roda semelhante ao batuque, com dançarinos solistas e eventual presença da umbigada, difundida em todo o Brasil.

O dicionário diz: banto mas de origem controvérsia. O dicionário Aurélio diz ser do quimbundo semba ‘umbigada’.

432.Sambalelê: refrão usado na modalidade do samba. [sa)mbale»le]

sambalelê refrão muito usado em qualquer modalidade de samba

Kik-Kim samba olele

433.Sambar: dançar o samba; se meter em confusão. [»sa)mbå]

sambar (a) dançar o samba (b)diz-se de uma peça de roupa ou de outro objeto de uso pessoal quando está ou fica folgado, dançando no corpo

(c) sair-se mal, ser preso (a)Kik-Kim nsamba (b)Kik-Kim kusamba rezar, orar (c-d)Kik-Kim samba, semba

Dançar; movimentar-se ao som do samba.

O registro histórico é de 1899.

434.Sanzala: alojamentos destinados aos escravos.

sanzala, senzala (a) alojamentos que eram

Aldeia tradicional africana.

Do quimb. sa'nzala

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[sa)n»zalå]

destinados aos escravos no Brasil

(b) morada mítica dos inquices

(c) pequenas construções em espaço aberto no terreiro, nas quais se encontram trancados os “escravos” de cada caboclo

'povoação'; de 1899.

435.Saracotear: dançar; rodar o salão. “Nós vamos para a festa para saracotear”. [σαΡα∪κοτΣι ]

Mover-se ou agiar-se freneticamente.

A datação é de 1634 e o dicionário diz ser de origem obscura.

436.Sentido (a): triste. “Ela está sentida com João”. [σε(<∪τΣιδυ]

Que se ofende ou melindra facilmente; suscetível, sensível.

A datação é do séc. XIII,

437.Senzala: alojamento que eram destinados os escravos. se)n»zalå cf387

sanzala, senzala (a) alojamentos que eram destinados aos escravos no Brasil

(b) morada mítica dos inquices

(c) pequenas construções em espaço aberto no terreiro, nas quais se encontram trancados os “escravos” de cada caboclo

alojamento que, nas antigas fazendas ou casas senhoriais, que abrigava os escravos; embala

A datação é de 1771; quimb. sa'nzala 'povoação' (com dissimilação); a datação é de 1771.

438.Serenado: tá serenando. “Hoje a noite tá serenado”. [σεΡε∪ναδυ]

No dicionário tem “serenado” que sig. Garoa rápida.

439.Sirimão: cavalheiro da dança do chorado que paga a bebida para as moças. Seu irmão. [σιΡι∪µãω]

440.Songamonga: pessoa desajeitada. [so)Nga»mo)Ngå]

songamonga desajeitado, sem graça Kik suNgumuka

Pessoa sonsa e disfarçada.

A datação é de 1889.

441.Suan: parte do dorso do boi (espinhasso). “Hoje eu vou comer um suan”. [συα(<]

442.Sunga: cuecas de banho.

sunga (a) calçaõ de criança

Traje de banho masculino.

O dicionário Aurélio diz que

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[»su)Ngå]

(b) calções de banho-de-mar

(c) cuecas Kik suNga

deriva de “sungar ( do quimbundo ku-sunga ‘puxar’).

443.Surdão: murro. “Eu vou te dar um surdão”. [συρδãυ]

444.Tabaca: partes genitais da mulher. [ta»baka]

tabaco, tabaca, babaca (a) vulva (b) partes genitais da mulher

Kik-Kim babaki, tiba@ki, tibaku <mubaki

Genitália feminina. O dicionário diz que é de origem controvérsia.

445.Tabaco: fumo. [ta»bako]

. Qualquer subproduto das folhas dessas plantas, como o cigarro e o charuto qualquer subproduto das folhas dessas plantas, como o cigarro e o charuto; ou genitália feminina

A datação é do séc. XVI-XVII.

446.Taca: tira de couro que açoitava os animais. [∪takå]

taca (a) fasquia de madeira, em forma de bordão, presa por uma correia ao pulso, empregada para esbordoar os escravos e depois substituída pelo relho

(b) tira de coura com que se açoitam os animais.

Kim ritaka estaca

Fasquia de madeira em forma de bordão e presa ao pulso por uma correia.

A origem é controvérsia e a datação é de 1899.

447.Tacho: uma panela grande onde se prepara as iguarias das festas afro; ou alguém que é cara de pau. Ex.: Olha a cara de tacho dele! [∪ταΣο]

Recipiente de ferro, cobre, alumínio, barro etc., com asas ou de cabo, us. esp. para fins culinários;

Registro histórico 1574-1590.

448.Tanga: tapa sexo; qualquer pano para tampar as partes genitais. [»ta)Ngå]

tanga (a) tapa-sexo, qualquer pano para tapar as partes genitais

(b) calção de banho (c) parte inferior do biquíni

Kik-Kim taNga tapa-sexo

Espécie de lençol enrolado ao corpo us. por negros que chegavam ao Brasil como escravos

O registro histórico é de 1789; quimb. tanga ou ntanga 'pano, capa'

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449.Tapiri: casa. [ταπι∪Ρι]

Palhoça, choupana construída para abrigar provisoriamente seringueiros, lavradores etc.

O dicionário diz ser do tupi; a datação é de 1928.

450.Tata: tratamento respeitoso que serve para avó, avô. [»tatå]

tata, tatá (a) pai (b)tratamernto respeitoso, título equivalente a ogã

Kik-Kim taata pai, título honorífico

No candomblé de rito angola e das seitas umbandistas por ela influenciadas , título de chefe de terreiro ou do chefe de um conjunto de templos. Na cabula, denominação das entidades cultuadas.

No Guaporé o tratamento é para os mais antigos. O dicionário atesta como sendo do quimbundo

451.Tibum: referente a mergulho, uma queda na água. [tSi»bu)]

tibum onomatopéia referente ao mergulho, a uma queda n´água

Kik tibu onomatopéia referente à ação de cair na água, de mergulhar

Ruído produzido da queda de algo na água.

452.Tijuco: lama. [tΣι∪Ζυκο]

Lugar de solo mole. Charco, pântano, atoleiro.

A datação é de 1585 e o dicionário diz ser provavelmente do tupi.

453.Tipóia: tira de pano que se prende ao pescoço para descansar o braço machucado. [tSi»pojå]

tipóia (a) suporte de rede (b) rede pequena para dormitório de criança

(c) lenço ou tira de pano que se prende ao pescoço para descansar braço ou mão doente

Kik-Kim kipoji, tipoji rede

Palaquim de rede. Rede pequena.

O dicionário diz ser de origem africana. E a Datação é de 1584.

454.Titica: coisa pouca; merda de galinha. [tSi»tSikå]

titica (a) merda, excremento de aves

(b) coisa sem valor (c) “titica de galinha” = dito com desprezo sobre alguém ou alguma coisa

Kik-Kim tiitika, matika

Excremento, esp. de aves; caca; pessoa ou coisa insignificante, desprezível, ruim, repulsiva

O registro histórico é de 1899 e o dicionário diz ser provavelmente africana.

455.Toba: ânus. [»tobå]

toba ânus Kik-Kim mutumba

Ânus. Segundo Nascentes a etimologia é tupi.

456.Trelaram: transaram.

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[τΡΕ∪λαΡã⊃] 457.Trelê: transar, fazer amor. “Vamos trelê?”. [τΡε∪λε]

No dicionário tem treler que significa mostrar-se metido

458.Treleção: transação. [τΡελε∪σãυ]

459.Tribufu: negro feio e mal encarado. [tΡιβυ∪φυ]

Pessoa feia

Sem datação e sem registro histórico.

460.Trisquim: um bocadinho; de leve. [τΡισ∪κι(⊃]

461.Truvisca: bêbada mas não muito; a pessoa está meia lá meia cá. [τΡυ∪∪ϖισκ ]

462.Tubiá: queimar, ascender fogo. [tubi»Ja]

tubiá (a) fogo (b) candeeiro, fogão (c) quente, claro, aceso (d) queimar, acender o fogo

Kik tuia Kim tubia

463.Tutu: feijão cozido, engrossado com farinha. [(∪tutu]

tutu (a) papão, ente imaginário que amedronta crianças, freqüente em acalantos e contos populares

(b) feijão cozido, engrossado com farinha, toucinho de porco e carnes salgadas

(c) mandachuva, fanfarrão, gabola

(d) dinheiro (a) Kik-Kim kitutu (b) Kik-Kim tutu (c) Kik ntutu (d) Kik tuntu abundância de qualquer coisa

Iguaria de feijão cozido, misturado com farinha de mandioca ou de milho; ungui, ungüi

O registro é de 1899, e o diconário diz que talvez seja quimbumdu.

464.Umbanda: religião afro-brasileira. [u)m»ba)ndå]

umbanda (a) religião afro-brasileira que surgiu no século XX com assimilação de elementos do espiritismo kardecista e do catolicismo

Religião nascida no Rio de Janeiro, entre o fim do sXIX e o início do sXX, que originalmente congeminava elementos espíritas e bantos, estes já

O registro histórico é do séc. XX, e o dicionário diz ser do quimbundo.

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(b) por extensão, bruxedo, magia branca

quimbanda, embanda, imbanda

(a) curandeiro, vidente, ocultista, sacerdote de macumba

(b) feitiço (pejorativo) (c) feiticeiro Kik-Kim-Umb banda tabu, coisa sagrada, bruxedo > bandala invocar os espíritos, suplicar

Kik-Kim kimbanda Umb ovimbanda

plasmados sobre elementos jeje-iorubas, e hoje apresenta-se segmentada em variados cultos caracterizados por influências muito diversas (p.ex., indigenistas, catolicistas, esotéricas, cabalísticas etc.)

465.Uruca: má sorte. [u∪Ruk ]

O dicionário registra urucá que é uma espécie de chocalho indígena.

466.Urucubaca: jogar uma macumba, ou azar. [uRuku»bakå]

urucubaca má sorte, azar Kik lukubuka

Má sorte no que se faz ou intenta; ziquizira.

O registro é do séc. XX.

467.Urupá: azar. “Eu estou com urupá hoje”. [υΡυ∪π ]

Indígena pertencente ao grupo dos urupás

O registro é do séc. XX.

468.Urupim: recipiente contendo os restos das oferendas feitas para as divindades. [υΡυ∪πι(⊃]

469.Vara-pau: cf. galalau [ϖαΡα∪παω]

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470.Vatapá: prato típico da cozinha afro-brasileira. [vata»pa]

vatapá prato típico da cozinha baiana, espécie de purê de farinha de mandioca ou pão de véspera, leite de coco, zeite-de-dendê, amendoim, gengibre e castanha de caju, ralados ou moídos, tradicionalmente feito para acompanhar o caruru

Kik vwatampa < kintampa plural: matampa : papa ou vasilha de papas Kim kitaba papas Fon vEtEba papas preparadas com dendê

Iguaria muito apreciada, que tem por base pão amolecido (ou farinha de trigo) a que se acrescentam carne de peixe desfiada, camarão fresco, camarão seco e temperos, como sal, gengibre, coentro, cebola, leite de coco, amendoim e castanha-de-caju, torrados e moídos, além de azeite-de-dendê e pimenta-malagueta, que pode ser oferecida em molho à parte

O registro é de 1899 e o dicionário diz ser de origem ioruba.

471.Viramundo: nome de exu. [viRa»mu)ndU]

viramundo (a) nome de Exu (b) grilhão de ferro, pesado, com que se mantinham presos os escravos

Kik ndZila mbondo o grilhão do caminho

No dicionário “vira-mundo”: espécie de pesado grilhão de ferro com que se prendiam os pulsos ou os tornozelos dos escravos negros; entidade dos candomblés de caboclo.

Viramundo é prov. calque de uma expressão que qualfica exu.

472.Votias: notícias. [∪votΣιασ]

473.Vou montar: vou embarcar. [ϖουµο(<∪τ ]

474.Vuvuvu: briga, confusão; apressado. [vuvu»vu]

vuvuvu pressa em fazer alguma coisa

Kik-Kim vuvu

No dicionário tem VuVu que significa: instrumento de percussão de origem africana us. nos ranchos de reis que parece fazer soar a palavra vu; confusão.

475.Xangô: orixá dos raios e dos trovões. [Σα((<∪γο]

Orixá ioruba dado como o quarto rei (lendário) de Oyo, na Nigéria, cuja epifania são os raios e os trovões

O registro histórico é do séc. XX.

476.Xaque-xaque: Um instrumento

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instrumentos musicais de negros africanos. [Σα∪κΙΣα∪κΙ]

tipo o chocalho.

477.Xaxaxá: uma dança latino-americana. [ΣαΣα∪Σα]

478.Xequerê: instrumento musical dos negros. [Seke»Re]

xequerê instrumento musical dos negros

No dicionário “xequeré”: Instrumento musical, outrora us. nos candomblés.

Segundo Cacciatore, ior. xekere 'id.'; a datação é do séc. XX.

479.Xereca: vulva, partes genitais da mulher. [Se»rekå]

xereca vulva Kik kileka

Genitália feminia. O registro é de 1960 e o dicionário diz ser de origem obscura.

480.Xingar: insultar: ofender. [Si)N»ga]

xingar insultar, ofender com palavras, injuriar

Kik-Kim siNga

Agredir por meio de palavras insultuosas, injuriosas; ofender, descompor, destratar, afrontar

O registro é do séc. XVII, e o dicionário diz ser do quimbundo.

481.Xinxar: puxar o cabelo de outra pessoa. [Σι(<Σ ]

482.Xirimbau: cavalheiro das danças. [ΣιΡι(⊃∪βαυ]

483.Xixia: merda de galinha. [∪ΣιΣι ]

484.Xodó: amante;namorado. [So»dç]

xodó (a) namoro, paixão, apego, chamego

(b) namorado Kik luzolo, nzolo Kim kizola, kizodi Fon-Ewe xo)to) amante, amigo

Indivíduo com quem se estabelece um vínculo amoroso; namorado, amante

O registro é de 1902.

485.Xibiu: cf. xereca [Σι∪βιυ]

486.Xota: cf.xereca [∪Σ τ ]

487.Xoxota: cf. xereca [Σ ∪Σ τ ]

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488.Zabumba: tambor de madeira, grande e comprido. [za)m»bu)mbå]

bumba, (a) pancada, surra (b) tambor, bombo zabumba (a) bombo (b) conjunto instrumental popular no nordeste do Brasil, constituído de pífanos, caixa e bombo

bumbá (a) surrar, espancar, bater (b) tocar, bater o bombo. (a) Kik nza mbuma tambor de madeira, muito grande e comprido

(b) Kik zunza mbuma fazer música com muito ruído, com tambo

Kik bumba bater

Sonoridade provocada por pancada ou batida

O registro é de 1721, e o dicionário diz ser de origem controvérsia.

489.Zangar: andar ao acaso ou irritar-se. [»za)Ngå]

zanga (a) irritação (b) briga Kik-Kim nzaNga, nzandu zangar (a) irritar-se, aborrecer-se (b) provocar mau-humor

Causar mau humor a; amolar, irritar

A datação é de 1789.

490.Zanzar: vagar; andar sem rumo. [∪ζã<ζ ]

Andar ao acaso. Orig.duv.; do quimb. nzanza 'altura, elevação', ou do quimb. anzenza, pl. de munzenza 'ingênuo, estúpido', ou ainda do cinianja kutsantsa 'descansar depois do trabalho'; o registro é de 1899.

491.Zinga: vara comprida usada pelos canoeiros. [∪ζι(<γ ]

vara comprida com que se impulsiona embarcação miúda (canoa, jangada etc.) em águas rasas;

O dicionário diz ser de origem controvérsia; a datação é de 1899.

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492.Zinim: partes genitais da mulher. [zi»ni)]

zinim, jeni, jinim partes genitais da mulher Kik nzini, ndZini vagina

493.Ziquizira: urucubaca. [ζικιζιΡα]

Azar; urucubaca. A datação é de 1950.

494.Zonzeira: atordoado; vertigem; desorientado. [»zo)nzειΡ ]

zonzo atordoado, tonto, distraído

Kik-Kim kinzanzu

Tomado por tonteira, vertigem; com a mente ou os sentidos perturbados; aturdido, desnorteado, desorientado.

A datação é de 1899.

495.Zonzo: atordoado, zonzo. [»zo)nzU]

zonzo atordoado, tonto, distraído

Kik-Kim kinzanzu zonzar ficar zonzo, sentir zonzeira

Kik zanza Kim nzana andar em estado de êxtase

Com a mente ou os sentidos perturbados; aturdido, desnorteado, desorientado.

A datação é de 1899.

496.Zumbi: alma errante, fantasma que vagueia. [zu)m»bi]

zumbi, (a) alma errante, fantasma que vagueia em casa altas horas da noite

(b) pessoa de hábitos noturnos

zumbi, cazumbi (c) pessoa muito magra e pálida

(d) líder da República de Palmares, o Gangazumbi, sucessor de Gangazumba

(a-b) Kik mvumbi (c) Kik kamvumbi (d) Kik nzumbi auxiliar, ajudante canzumbi, cazumbi alma penada, de outro mundo

Kim kanzumbi

Alma que vagueia a horas mortas; cazumbi

A datação é de 1681. O dicionário diz ser do quimbundo.

497.Zunzum/zunzunzum: barulheira, boato.

zunzum, zunzunzum (a) barulheira

Boato. A datação é de 1771.

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[zu)n»zu)]

(b) boato Kik kizunzu + onomatopéia portuguesa

Utilizamos dois dicionários eletrônicos: Aurélio e Houaiss. Verificamos a

datação pelo dicionário Houaiss, pois é mais completo que o Aurélio.

Nas lexias encontradas entre os descendentes de quilombolas do Guaporé que

constam do Dicionário de Bantuísmos de Jean Pierre Angenot e Geralda de Lima V.

Angenot, algumas tem significados diferentes no Guaporé. Podemos supor que as lexias

que possuem a mesma forma, mas conteúdo semântico diferente, integraram o

vocabulário dos quilombolas vindo de fontes diferentes; podemos também pensar que a

origem seria comum, e que foi mantido a semântica em alguns grupos e outros se

distanciaram do sentido, perdendo o conteúdo semântico de origem e criando um novo.

Em lexias como “abancar”, “aca” e outras, a forma é a mesma e a semântica

difere. Então, nos perguntamos: Será que não seria uma palavra com a mesma forma e

com origem em outras línguas? Trata-se de palavras com origem diferente que no

contato de línguas se misturaram e se transformaram numa só. São casos de

coalescência.

Levaram-se em conta nesta pesquisa os diversos marcos temporais da

colonização do Brasil e dos contatos de línguas africanas com o português. Existem

vocábulos de origem africana que entraram no português antes mesmo da chegada dos

português no Brasil ( confere datação de cacimba, bunda e caçamba).

Algumas lexias como “auê” e outras, nós questionamos o dicionário em relação

a semântica, pois no Brasil inteiro o significado é “confusão”. Então, consideramos um

lexia pan-brasileira.

Temos ainda uma vasta pesquisa a ser feita, pois estamos, como foi dito

anteriormente, na ponta de um “iceberg”. Por exemplo, em “babaca” a datação dada é

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simplesmente o registro da escrita, enquanto que provavelmente esta lexia já fazia parte

do PVB há muito mais tempo. Por isso, faz-se necessário uma pesquisa para

procurarmos cognatos nas línguas africanas, pois se existirem os cognatos,

estabelecidos conforme os procedimentos rigorosos da lingüística histórica, teremos

demonstrado a procedência destas lexias.

Em “balangandã” o dicionário diz ser de origem onomatopéica, no entanto, a

semântica nos leva à origem africana; sendo assim, a origem africana é mais provável

do que aquela dada pelo dicionário.

Estas reflexões nos levaram a propor uma série de quadros específicos que estão

a seguir:

3.2 Quadros específicos

a) Prováveis lexias africanas: em relação ao étimo das palavras que possuem

provável origem africana é necessário um estudo mais complexo para atestar se é

um vestígio banto: não existe ainda nenhuma fonte confiável onde possamos obter

tal informação. Mostraremos aqui apenas uma lista lexical uma vez que já

mencionamos o significado no quadro acima.

1. abancar 51. cafuza/cafuzo 101. malafa/malofo 2. aca 52. calango/calangro 102. malungo 3. aluá 53. calombo/catombo 103. mandinga 4. angu 54. calundu 104. marafo/marufo 5. anjico/angico 55. cambondo 105. marinbondo 6. aringa 56. candomblé 106. maxixe 7. auê 57. canjica 107. miçanga/buginganga 8. babá 58. canzuá 108. mocambo 9. babaça 59. canzumbi/zumbi 109. mocotó 10. bamba 60. capanga 110. molambo 11. bambi 61. capuco 111. moleque 12. bangola 62. careca 112. mona 13. bangüê 63. carimbo 113. moqueca 14. banguela/banguelo 64. caruru/cariru 114. moringa

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15. bangulê 65. catitá 115. muamba 16. banto 66. catoco/cotoco 116. mucama 17. banzar 67. caxambu 117. mucamba 18. banzo 68. caxinga/catinga 118. mucambo 19. baranga 69. caxixi 119. mumbica 20. batucajé 70. caxumba 120. munguzá/muncunzá 21. batuque 71. chimpanzé 121. muvuca 22. bengo 72. cochilar 122. nagô 23. berimbau 73. cochilo 123. pacaia 24. bimba 74. congo 124. pito 25. binga 75. cuca 125. quenga 26. bobó 76. curau 126. quiabo 27. boboca 77. curinga 127. quiabo 28. bobocona 78. dendê 128. quilombo 29. borocotó/brocotó 79. dengo/dengue 129. quilombola 30. borocoxô 80. dunga 130. quimbanda 31. bozó 81. encabular 131. quindim 32. bumba/bumbo 82. engabelar 132. quitanda 33. bundá 83. fiofó/fio 133. quitute/quitutinho 34. burdun/budum 84. fubá 134. quizumba 35. cabaço 85. fungar 135. sacana 36. cacaio 86. furdunço 136. samba 37. caçamba 87. fuzuê 137. sanzala 38. cacarucaia/cacurucai 88. gangá 138. senzala 39. cachimbo 89. gunga 139. sunga 40. cachimbá 90. jagunço 140. tanga 41. cacimba 91. jiló 141. tata 42. caçuloa/caçulo 92. jinga 142. tipóia 43. cacunda 93. jira 143. titica 44. cafanga 94. jongo 144. tutu 45. cafiote 95. lamba 145. umbanda 46. cafofo 96. lundum/lundu 146. vatapá 47. cafua 97. macamba 147. xequerê 48. cafuçu 98. maconha 148. xingar 49. cafundó 99. macumba 149. zanzar 50. cafuné 100. mafuá 150. zumbi

b)Lexias encontradas no Guaporé que não estão inclusas nos dicionário pesquisados,

nem no Dicionário de Bantuísmos, tanto em relação a semântica quanto ao fato de

estarem registradas nos dicionários. Algumas delas fogem muito da semântica da

primeira datação registrada. É um fato a ser pesquisado. Não descartamos a

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possibilidade de que essas palavras ou expressões existam em outras comunidades.

Ou que são derivadas de palavras galegas, do tupi, banto etc...

1. ãã 2. alossé 3. aquá 4. Batiduro: bater duro? 5 beradeiro 6 berimbelos 7 bugerê 8 buiu 9 carité 10 catitá 11 catiteira 12 Choradinho: dança 13 Chorado: dança 14 Coisar (?) 15 curiá 16 curiacuca 17 dendegê 18 desileiado 19 difruso 20 Folhado: gaiato 21 Gômito: vômito 22 gratificação 23 istúcia 24 Luático: vem de lua? 25 Maria Isabel: charque com arroz 26 massassá 27 mazuca 28 mocambar 29 nasurdino 30 pancoso 31 Pau-de-nego: um peixe 32 Perdi: deixei 33 Piranha-moura 34 poeirismo 35 povil 36 quariterê 37 quenta 38 quirera 39 ramalhetas 40 sirimão 41 suan 42 surdão 43 trelaram

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44 trelê 45 uruca 46 urupim 47 votias 48 Xaque-xaque 49 xinxar 50 xaxaxá 51 xirimbau 52 xixia

c. Lexias encontradas no Guaporé e no Dicionário de Bantuísmos

1 aburicá 2 angolê 3 avuro 4 biringa 5 branda 6 brucutar 7 burdun 8 buzum 9 cajirê 10 camburi 11 caxingá 12 dindim 13 gorô 14 Maria Padilha 15 moito 16 mufufa 17 Olelê, olalá 18 quimba 19 sambalelê 20 tubiá 21 urupá 22 xangô 23 zinim 24 ziquizira

3.3 Expressões encontradas

1) Bolão de barro (mulher gorda). Esta expressão foi dita para mim pelo informante

quando eu perguntei como era sua esposa. Em seguida ele respondeu: - Bolão de

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barro. E continuou dizendo que eu não servia para casar com ele, pois mulher

“bolão de barro” era seu tipo.

2) Cabeça louvando a Deus – criança que nasce com a cabeça comprida.

3) Cacunda-de-pé (chute). “Vou te dá uma cacunda-de-pé”.

4) Cara-de-tacho. Pessoa que é de má aparência.

5) “Hoje eu vou comer um suan” (parte do dorso do boi).

6) “Vou te dar uma dor em pito”. Vou chamar tua atenção.

7) Fazer manga (voltar pelo mesmo caminho). “Vai, mas você vai ter que fazer

manga”.

8) Feijão com corredor (feijão com osso da canela do boi).

9) Foi embora (morreu). “Minha mulher foi embora”.

10) Maria Isabel (charque com arroz).

11) Pau de nego (rubafo).Nome de um peixe.

12) Pra frente (pessoa enxirida).

3.2 Os dados levantados e a relação de referência para os pretos28 do Guaporé:

Os pretos do Guaporé têm uma relação significativa com cultura e religião e

cada palavra possui uma importância muito grande neste relacionamento. Os pretos do

Guaporé são muito religiosos e é essa qualidade que, basicamente, comanda a vivência

entre as famílias e as divindades cultuadas. Eles se reconhecem como descendentes de

escravos e os mais velhos fazem questão de cultivar as tradições.

Para eles, a palavra “morte” não deve ser pronunciada. Ao chegarmos à casa de

um dos informantes perguntamos sobre sua esposa e ele disse: “Ela foi embora29”,

28 Nenhum dos informantes gosta de ser chamado de “negro”. Preto para eles é símbolo de raça verdadeira. Nego é para quem não assume sua identidade.

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ficamos muito triste e perguntamos por que ela o tinha abandonado, sua bisneta nos

interrompeu e disse que ele não podia falar a palavra morte. Pronunciar esta palavra é

atrair maldição para sua vida. E quando se tem notícia que alguém morreu é necessário

falar “Afu/ave, ou desconjure”. Eles preferem pensar que um dia ela voltará do que

pensar que nunca mais a verá.

Podemos notar, ainda, que a África é muito presente no cotidiano dos pretos do

Guaoporé. As comidas e bebidas são de suma importância na relação com a divindade

cultuada. Chegamos à casa dos informantes e observamos que toda a família estava ali

cozinhando para receber o “Divino”. Receber o Divino é tão importante quanto ser

escolhido como o Apóstolo Remeiro. Cozinhavam num buraco no chão com muita

lenha dentro. Eles sempre estão muito unidos nos afazeres, conservando o que Lourdes

Bandeira diz sobre a convivência em grupo, que foi a parte primordial para a

sobrevivência dos mesmos.

O que dá vida aos pretos do Guaporé são as significações que cada palavra tem

para eles. Não é só uma mera palavra é muito mais que isso. Não é só um apelido

“buiu”, “pichilinga”, mas é a história que tem por detrás dos nomes, como é o caso

destes apelidos. Cultuam o anonimato, aquilo que nós não podemos saber, como o que

está por detrás das rezas, do “cajirê”. A nós é permito chegar até certo ponto. Existem

coisas que vão morrer com eles. O que entendemos dessa atitude? Que o que nós não

podemos saber só é para os “pretos” escravos e descendentes de escravos, ou seja, para

os membros da comunidade que mantém a cultura. Esse “segredismo” tem raízes

culturais, mas é devido também a descriminação: essas coisas são “escondidas” porque

os brancos não respeitam “as coisas dos pretos”, etc... Este seria um tema para outro

tipo de pesquisa.

29 Informante A.

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Considerações Finais

Podemos dizer aqui que o contato lingüístico-cultural entre os povos de

diferentes origens que se tornaram presentes no Guaporé está explícito nos elementos

que compõem o léxico, que é a parte da língua que esta mais aberta a entrada de novos

elementos, podendo assim aumentar seu leque de informações. Nos levantamentos

feitos verificamos que, para a maioria das lexias, faltam ainda muitas informações

confiáveis para se chegar a conclusões válidas a respeito de suas origens, o que é

compreensível, uma vez que sabemos da resistência ideológica de nossa sociedade à

valorização da influência africana na formação da cultura brasileira. Com a comunidade

do Guaporé não foi diferente. Apesar da riqueza lingüística e cultural dessa comunidade

somente agora esta começando a despertar o interesse científico pelos valiosos

conhecimentos seculares.

As lexias levantadas refletem as condições sócio-históricas do Guaporé e

levantam questionamentos como: é africana ou ameríndia? Vem das línguas românicas?

“O que não se pode contestar é a afirmação de que, por parte das línguas africanas, as

línguas banto foram as mais importantes no processo de configuração do perfil do

português brasileiro, devido à Antigüidade e superioridade numérica de seus falantes e

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a grandeza da dimensão, no tempo e no espaço, alcançada pela sua distribuição

humana no Brasil colonial30”.

Assim, acreditamos que para um melhor estudo das lexias que não são de origem

românica, e/ou que não constam das variedades do português trazidas para o Brasil

pelos colonizadores, é indispensável uma pesquisa séria referente a busca de possíveis

cognatos dessas formas léxicas, com objetivo de encontrar a etimologia ou pelo menos

informações mais fiáveis; e tal aplicação deveria ser feita tanto com enfoque nas línguas

ameríndias como nas africanas, assim contribuindo para a elaboração de um dicionário

etimológico sério do português do Brasil, que ainda não existe e portanto dificulta

nossas pesquisas.

30 Yeda Pessoa de Castro. A matriz africana no português do Brasil. Artigo. Pg 108-109.

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137

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Eletrônico da Língua Portuguesa. Versão 5.0. Positivo Informática ltda. HEINE, Bernd; NURSE Derek.2000. African Languages – An Introduction.Cambridge University Press. HOUAISS, Antônio et al. 2007.Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro. Versão 2.0. HUTA –MUKANA. Daniel Mutombo. Introduction a la Lingüística Africana. LIMA, José Leonildo. VilaBela da Santíssima Trindade – MT: sua fala, seus cantos. Dissertação (Mestrado em Lingüística) – IEL. UNICAMP, Campinas. LOPES, Nei. 2003. Novo Dicionário banto do Brasil, RJ, Pallas. MUTAKA, Ngessimo. TAMANJI. Pius Ngwa. 2000. Introduction to African Linguistics.Lincom Europa. MEGALE, Heitor (org). 2000. Filologia Bandeirante – Estudos 1, São Paulo: Humanitas. MOURA, Clóvis. 1987. Quilombos – Resistência ao escravismo. São Paulo: Ática. NUNES, José Horta, PETTER Margarida (orgs). 2002. História do Saber Lexical e constituição de um léxico brasileiro, SP, Humanitas/FFLCH/USP, Pontes. PETTER, M. (orgs). 2002. História do Saber lexical e contituição de um léxico brasileiro. São Paulo: Campinas, Humanitas. TEIXEIRA, Marco Antônio Domingues. 2006. Quilombolas de Santo Antônio do Guaporé: conflito nas relações socioambientais em área de reserva ecológica. Porto-Velho, Work Paper/UNIR. TEIXEIRA, M.A.D., & FONSECA, D.R. de 2001. História regional (Rondônia), 2.ed., Porto Velho, Rondônia. FITA VHS – “Festa do Congo” Festança de 1999. Vila Bela da Santíssima Trindade. www.vilabelamt.com.br

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