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Governo do Estado do Rio de Janeiro Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente LEVANTAMENTO SÓCIO-AMBIENTAL DA COMUNIDADE DO AVENTUREIRO, RESERVA BIOLÓGICA ESTADUAL DA PRAIA DO SUL E PARQUE MARINHO ESTADUAL DO AVENTUREIRO (versão preliminar). Autora: Deise Cristina L. C. S. e Benevides Chefe de Serviço da Reserva Biológica da Praia do Sul e Parque Marinho Este documento descreve sucintamente informações sócio-ambientais sobre a comunidade do Aventureiro, a Reserva Biológica Estadual da Praia do Sul (RBPS) e o Parque Marinho Estadual do Aventureiro (PEMA), na Ilha Grande, Estado do Rio de Janeiro. Foi elaborado a partir do trabalho cotidiano da autora junto à comunidade, como chefe de serviço da Feema na REBIO Praia do Sul e PEM Aventureiro nos últimos dois anos e, como moradora da comunidade, desde 2003. Este estudo expedito foi realizado em campo e levanta a realidade sócio-ambiental da comunidade local e apreendeu parte do conhecimento acumulado pelos moradores sobre os ecossistemas e sobre suas expressões sociais, culturais e econômicas. Espera-se que este documento permita tanto a orientação dos moradores e gestores na condução das práticas cotidianas da nova unidade, quanto ao planejamento, em médio e longo prazo, das atividades de preservação e conservação ambiental e de promoção da qualidade de vida da comunidade local. Este primeiro esforço de elaboração participativa pode permitir a redação de uma primeira versão formal e a identificação de lacunas de conhecimento, assim como a indicação de ações para preenchê-las. Deve, portanto ter caráter dinâmico, sendo a ele incorporadas, periodicamente, novas informações e recomendações a partir do desenvolvimento de pesquisas técnicas e científicas, identificadas como prioritárias, e do monitoramento sistemático das atividades e das decisões tomadas pelas instâncias gestoras da nova Unidade de Conservação. A organização deste levantamento foi orientada por um estudo publicado pela WWF, sobre a implementação de Reservas de Desenvolvimento Sustentável no Brasil. LEVANTAMENTO DE INFORMAÇOES SÓCIO AMBIENTAIS DISPONÍVEIS SOBRE A ÁREA Ao longo de gerações e a mais de dois séculos comprovadamente habitam famílias que possuem intensa relação de dependência e adaptação com as condições ecológicas locais e as formas de exploração dos recursos naturais são variadas e pouco impactantes, o que é confirmado através da baixa densidade demográfica. A utilização de meios de produção simples, a ocorrência de ecossistemas em bom estado de conservação e em condições que permitam uma oferta significativa de água e das espécies utilizadas e a presença de traços culturais que refletem o conhecimento prático dos ecossistemas 1

Levantamento Sócio-Ambiental do Aventureiro

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Governo do Estado do Rio de Janeiro Fundação Estadual de Engenharia do Meio AmbienteLEVANTAMENTO SÓCIO-AMBIENTAL DA COMUNIDADE DO AVENTUREIRO, RESERVA BIOLÓGICA ESTADUAL DA PRAIA DO SUL E PARQUE MARINHO ESTADUAL DO AVENTUREIRO (versão preliminar).Autora: Deise Cristina L. C. S. e Benevides Chefe de Serviço da Reserva Biológica da Praia do Sul e Parque MarinhoEste documento descreve sucintamente informações sócio-ambientais sobre a comunidade do Aventureiro, a Reserva Biológica Estadual da

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Governo do Estado do Rio de Janeiro

Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente

LEVANTAMENTO SÓCIO-AMBIENTAL DA COMUNIDADE DO AVENTUREIRO, RESERVA BIOLÓGICA ESTADUAL DA PRAIA DO SUL E PARQUE MARINHO ESTADUAL DO AVENTUREIRO (versão preliminar).

Autora: Deise Cristina L. C. S. e Benevides

Chefe de Serviço da Reserva Biológica da Praia do Sul e Parque Marinho

Este documento descreve sucintamente informações sócio-ambientais sobre a comunidade do Aventureiro, a Reserva Biológica Estadual da Praia do Sul (RBPS) e o Parque Marinho Estadual do Aventureiro (PEMA), na Ilha Grande, Estado do Rio de Janeiro. Foi elaborado a partir do trabalho cotidiano da autora junto à comunidade, como chefe de serviço da Feema na REBIO Praia do Sul e PEM Aventureiro nos últimos dois anos e, como moradora da comunidade, desde 2003. Este estudo expedito foi realizado em campo e levanta a realidade sócio-ambiental da comunidade local e apreendeu parte do conhecimento acumulado pelos moradores sobre os ecossistemas e sobre suas expressões sociais, culturais e econômicas.

Espera-se que este documento permita tanto a orientação dos moradores e gestores na condução das práticas cotidianas da nova unidade, quanto ao planejamento, em médio e longo prazo, das atividades de preservação e conservação ambiental e de promoção da qualidade de vida da comunidade local. Este primeiro esforço de elaboração participativa pode permitir a redação de uma primeira versão formal e a identificação de lacunas de conhecimento, assim como a indicação de ações para preenchê-las. Deve, portanto ter caráter dinâmico, sendo a ele incorporadas, periodicamente, novas informações e recomendações a partir do desenvolvimento de pesquisas técnicas e científicas, identificadas como prioritárias, e do monitoramento sistemático das atividades e das decisões tomadas pelas instâncias gestoras da nova Unidade de Conservação. A organização deste levantamento foi orientada por um estudo publicado pela WWF, sobre a implementação de Reservas de Desenvolvimento Sustentável no Brasil.

LEVANTAMENTO DE INFORMAÇOES SÓCIO AMBIENTAIS DISPONÍVEIS SOBRE A ÁREA

Ao longo de gerações e a mais de dois séculos comprovadamente habitam famílias que possuem intensa relação de dependência e adaptação com as condições ecológicas locais e as formas de exploração dos recursos naturais são variadas e pouco impactantes, o que é confirmado através da baixa densidade demográfica.

A utilização de meios de produção simples, a ocorrência de ecossistemas em bom estado de conservação e em condições que permitam uma oferta significativa de água e das espécies utilizadas e a presença de traços culturais que refletem o conhecimento prático dos ecossistemas

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locais, que não valorizam o excessivo acúmulo de bens e capital. As atividades econômicas envolvem o turismo, artesanato, sistemas agroflorestais, pequena agricultura familiar diversificada, pesca e ciclagem de resíduos orgânicos que já são conhecidas e praticadas pela comunidade e apresentam grande potencial de sustentabilidade para o local.

Inicialmente, uma interação sócio-ambiental que permite a sobrevivência da comunidade caiçara do Aventureiro está ligada a utilização de água doce que tem o seu abastecimento feito por quatro principais rios que podem ser considerados córregos e desembocam na praia do Aventureiro,e o rio do Simão Dias que desemboca no costão rochoso, próximo a Ponta da Resingueira.

A utilização da água é feita através de redes de abastecimento de mangueiras ou canos que chegam as caixas de água, na maioria dos casos ocorre quebra das bóias de contenção, que é causada pela força da água em dias de chuva e é bem comum as torneiras ficarem abertas constantemente ou terem suas caixas vazando por um ladrão. Existem barragens feitas de pedras e cimento para o abastecimento particular, feitas nos leitos dos córregos e o SAAE construiu uma represa e instalou uma caixa de água de 10000l para o abastecimento comunitário que é utilizada por poucas casas.

Um fator que a comunidade e suas formas de utilização da água doce interferem no meio ambiente é a eliminação de resíduos domésticos diluídos em água. As fossas entram em contato direto com o solo, normalmente sem suspiro para gases e têm tamanhos entre dois e dez metros cúbicos, muitas casas e estabelecimentos possuem até quatro fossas, devido ao enchimento dos sistemas de retenção de esgoto. A água residual da maioria das residências e estabelecimentos é eliminada nos córregos, na praia ou em alguma encosta, sem que sofram nenhum tipo de tratamento.

Entre as benfeitorias e moradias existe estreita dependência dos recursos naturais procedentes de extração e em todas as construções sem exceção, foram utilizadas rochas de córregos ou de algum lugar próximo da edificação, que são quebradas por técnicas primitivas, a areia grossa das praias ou córregos e a argila proveniente de encostas. Isso está ligado à qualidade de vida, quanto à praticidade de se erguer residências e seus anexos.

Ao longo de vinte anos, muitos materiais de construção foram substituídos, como o revestimento dos telhados, que era feito de sapê, as paredes eram erguidas com base de tramas de bambu, colunas de uma palmeira conhecida como “Issara”, e o preenchimento das paredes era de uma massa de argila com sapê, o piso das casas eram de argila batida com a bainha das folhas de coqueiro e as paredes eram revestidas de um tipo de solo esbranquiçado, com consistência argilosa ; tabatinga, o que dá um aspecto de massa corrida, estas construções, feitas artesanalmente são conhecidas como casas de estuque.

Existem características semelhantes entre a arquitetura dos caiçaras, casas de estuque, com janelas e portas pequenas feitas manualmente, são geralmente casas baixas e os com banheiros e cozinhas de fogão a lenha externos. Uma característica peculiar são os fogões de antigamente conhecidos como tacunduba e eram feitos com três pedras em circulo, onde era encaixada a panela e a lenha queimava ao redor aquecendo as pedras e o alimento. Esta denominação dada ao fogão, é identificada por mera semelhança com a pedra da Tacunduba, que está localizada entre a Reserva Biológica da Praia do Sul, Parque Marinho do Aventureiro e Parque Estadual da Ilha Grande.

As condições marítimas apresentam um papel importante no comportamento social desta comunidade que está intimamente adaptada, tanto as intempéries provindas do oceano quanto a utilização de recursos naturais variados ao longo do ano, as variações climáticas têm influência direta nas manifestações sociais. O deslocamento pelo mar é muito representativo diante de aspectos importantes como a escolaridade acima do sexto ano, os tratamentos e consultas médicas, compras de óleo diesel; fonte principal de energia para abastecer os barcos e geradores de energia elétrica, gás, alimentos, produtos e serviços oferecidos no Continente. Conforme as estações do ano as condições marítimas se alteram e a comunidade se prepara para ressacas e

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maresias freqüentes. As marés, os ventos, as formas das nuvens e muitos conhecimentos práticos sobre o meio facilitam a previsão do tempo pelos caiçaras.

A pesca artesanal da tainha, historicamente ligada ao povo do Aventureiro ocorre no Parque Marinho do Aventureiro nas épocas da corrida da tainha. Antes da criação da Reserva, nas lagoas do Sul e Leste, cercados e redes de pesca que eram montados no braço que liga as lagoas, com madeira e pedaços de redes, como mecanismo de permitir a entrada e impedir a saída das tainhas na lagoa do Sul e assim era controlado o tamanho dos peixes extraídos, as épocas de reprodução eram acompanhadas, essa atividade acontecia na forma de manejo e a utilização dessa espécie, que exercia uma função de subsistência muito importante, devido a tainha ser grande fonte de energia, a gordura extraída dos peixes era combustível para lamparinas, os peixes e ovas em demasia que não eram consumidos em poucos dias, eram salgados e os seus prazos de consumo são estendidos por mais de três meses, a ova da tainha é um complemento nutricional de imenso valor, mas o consumo de peixes das lagoas pela comunidade caiçara do Aventureiro é muito pequeno e a atividade de pesca de tainha atualmente se restringe a área do Parque Marinho e não corresponde as expectativas, pois a pesca predatória reduziu muito o tamanho dos cardumes.

Há cerca de 100 anos atrás muitos conhecimentos sobre pesca artesanal ainda persistem e pescadores locais utilizavam de anzóis e lanças de madeira, as fibras das raízes de plantas como o imbé, imberana, e timumpeba, o bambu e o cipó-batata são utilizadas para o feitio de artefatos de pesca como o samburá, caniços e cestarias e a confecção de redes de pesca por algumas famílias que são feitas em diferentes moldes e tamanhos para cada modalidade de pesca como: corvineiras, traineiras, arraste, cercada, cerco de espera, rede de espera e tarrafa.

Estas modalidades de pesca são praticadas de acordo com cada época do ano e a incidência de específicos peixes. A pesca em traineiras de grande porte que trabalham na costa brasileira trouxe durante muitos anos renda para muitas famílias do Aventureiro, mas com a queda da produção pesqueira da sardinha, os homens desistiram e hoje pescam pelas proximidades do Parque Marinho do Aventureiro com suas redes, barcos e canoas. E quando as condições marítimas permitem sempre tem algum morador pescando nos costões rochosos, ou de canoa, ou de barco, ou na areia.

O conhecimento da fauna e a utilização da coleta para alimentação, ou comercialização como é o caso de peixes é rico e diversificado, além da pesca existem outras formas de exploração dos recursos faunísticos que estão adaptados a um sistema de coleta de alimentos voltados para a pesca, animais que são largamente utilizados por pescadores para se fazer isca, é o camarão de água doce; pitu, coletado nos córregos do Aventureiro e do Demo e o tatuí coletado nas areias das praias do Aventureiro, Demo, Sul e Leste. Os crustáceos como siris e caranguejos, moluscos bivalves como mexilhões e ostras são coletados para alimentação, nas pedras e costões rochosos.

Entre o conhecimento prático sobre fauna é observado um a rápida identificação por moradores adultos, das pegadas, rastros, ruídos, sons emitidos, ninhos, tocas, épocas de reprodução e locais estratégicos onde certos animais possam ser encontrados. No passado os animais caçados poderiam ser considerados a base alimentar e poderiam ser consumidos mais de três vezes na semana, dentre os animais caçados, espécies de mamíferos,répteis e aves, com maior preferência a lagartos, paca, cutia, tatu, preá, com peso corporal acima de dois quilos. Atualmente a caça é praticada como forma de lazer, e é muito reprimida, devido ao fato da existência da lei dos crimes contra a fauna, ser de conhecimento dos moradores.

Existe a extração de diferentes tipos de madeira para : sustento de telhados ( jequitirao – madeira, guapeba, guarana), colunas (casca- preta, guapeba, issara e varas de mangue), moinhos de mandioca, pilões, gamelas (araçarana e muçutaíba), cabos para enxadas e machados (murta, murici, guareta, remos (cubatã de remo, cubitinga, caxeta) , canoas ( ingá- flecha, cedro e guapuruvu), objetos domésticos (guaraná e esporão de galo), artesanatos, rolos de canoas, lenha e no passado os caules de determinadas leguminosas eram utilizados para tingir tecidos.

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Atualmente não mais ocorre a confecção de canoas, devido a proibição do órgão ambiental, as árvores eram cortadas com machado e devem ter mais de sessenta centímetros de diâmetro, no local do corte a árvore é moldada com uma ferramenta chamada enxó.

Algumas famílias preservam a medicina tradicional, que é muito utilizada e privilegiada pela distância do atendimento médico e são comuns canteiros medicinais próximos às casas e o conhecimento de espécies florestais, onde cascas de árvores, raízes e folhas são utilizadas no tratamento de doenças.

Ao redor de antigas ruínas e ao redor das casas é facilmente observado pequenos sistemas agroflorestais, onde ao meio de espécies florestais, estão bambuzais, pequenos canaviais, coqueiros, bananeiras, árvores frutíferas como fruta - pão, cambucá, grumixama, carambola, laranja da terra, tangerina, limão, abacate, jabuticaba, jambo, goiaba, araçá, pinha, manga, jaca e devido a caracterização destes sistemas pode-se indicar a presença daquelas famílias na área há mais de cem anos no mínimo.

A agricultura marcou o passado de todas as famílias caiçaras do Aventureiro, e era realizada na vertente leste das montanhas, cujos pontos máximos correspondem aos pontos 3, 4 e 5 do mapa dos limites da Reserva, e há 50 anos para trás era chamado o morro do capim-melado, no qual garantiu a subsistência dessa população durante mais de um século, o cultivo principal sempre foi o de mandioca, sendo observado em pelo menos oito variedades (mandiocas bravas, que são consumidas apenas na forma de farinha, devido a alta toxicidade, e são dos tipos: vareta, maricá, preta e bordão de Santo Antonio e outras variedades, que podem ser consumidas como farinha ou simplesmente cozidas, são as mandiocas dos tipos: manteiga, rosa, roxa e branca), todo o processo de produção de farinha era e é feito manualmente em casas de farinha e a produção anual por família chegava a mais de trezentos quilos e atualmente não passa dos cinquenta quilos, também já existiram cafezais e plantações de arroz em algumas lavouras familiares, em geral as roças são uni familiares e apresentam uma agricultura diversificada, com a utilização de aceiros para evitar a extensão das queimadas, as dimensões dos roçados variam de cem a mil e duzentos metros quadrados e são plantados feijão, mandioca, milho, batata – doce (com as variedades: marambaia, cambadinha, pão e roxa), abóbora , cana e outros muitos cultivares. Nos arredores do roçado, sempre se encontram variedades de banana, que são observadas em quinze tipos: São Tomé, flor, veiaco, de cachos, nanica, nanicão, maranhão, dágua, prata, preta, ouro, maçã, porco, casada, da terra e também coqueiros, canaviais e bambuzais que são plantados para demarcar o território dos roçados e das tigüeras. Os cuidados diários com os roçados são principalmente para se evitar formigas, ervas daninhas e possíveis invasores como mamíferos roedores como as capivaras e roedores. Atualmente existem no máximo quinze áreas de roçados, enquanto outras áreas estão em pousio e são denominadas as áreas de tigüera.

A comunidade do Aventureiro e seus serviços turísticos oferecidos produzem resíduos sólidos que são ensacados e acumulados em um ponto próximo ao cais e fazem contato direto com o solo do local. Uma área vulnerável a inundação marítima e estes resíduos não sofrem qualquer processo de seleção ou limpeza e a presença de insetos e ratos, indicam a presença de matéria orgânica ao meio do lixo doméstico.

O apelo turístico do local, não citando apenas o Aventureiro, mas a Ilha Grande em geral, leva a uma ligação ou interação do viajante com o meio e isso leva a interação quase que forçada destes a conhecer todas as praias e locais de grande beleza cênica a que foram atraídos. Entre as classes sociais existem variedades das formas de turismo e devido ao fato da Angra dos Reis ser uma cidade que abriga uma das maiores frotas de lanchas particulares no Brasil e dessa forma a Ilha Grande se torna mais acessível tanto por lanchas, quanto por helicópteros ou pequenos aviões, os turistas praticantes de treking, também aparecem com grande freqüência. vindos do Abraão pela trilha da Parnaioca. Neste tipo de turismo de rápido e fácil acesso são realizadas muitas vezes coletas de seres vivos, mergulhos e caça submarina, nos limites da Reserva e Parque Marinho, tais evidencias de irregularidades ambientais são descobertas com peculiar rapidez pelos caiçaras do Aventureiro, que são fieis exploradores do local e na maioria das vezes observa de perto muitos tipos de exploração feitas por visitantes.

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IDENTIFICAÇÃO E SISTEMATIZAÇÃO DE LACUNAS DE CONHECIMENTO.

No passado, por volta de 60 anos muitos antigos moradores locais efetuaram venda de terrenos com grandes extensões, e existe a possibilidade desses documentos de propriedade ainda estarem sobre juízo, apesar de a população tradicional residir no local e ocupar a área em questão, possuindo títulos de ocupação de terrenos da União, anualmente sendo cobrados. Portanto são desconhecidos os detentores de documentos que comprovem a posse de terrenos no local.

Possivelmente muitos exemplares da diversidade da Ilha Grande, sendo eles terrestres, ou aquáticos, conhecidos por nomes vulgares, localmente conhecidos pela comunidade caiçara, possivelmente não possuem identificação científica.

IDENTIFICAÇÃO, EM CAMPO, DOS DIVERSOS SEGMENTOS SOCIOCULTURAIS, ECONÔMICOS E POLÍTICOS ENVOLVIDOS COM A ÁREA A SER PROTEGIDA.

Os segmentos socioculturais são os mais antigos, devido a cultura , tanto a tradição ligada ao catolicismo, quanto as condições de isolamento do ambiente natural, que não propicia muitas mudanças culturais, a não ser pela atração de turistas, que alterou o perfil do caiçara local, estes que vivem principalmente da oferta de recursos utilizados ao longo de gerações.

O que diz respeito à pesca e ainda existe, é a pescaria da lula que ocorre normalmente na primavera e verão e coincidi com o fenômeno de ressurgências marítimas e muitos moradores cumprem como um ritual e saem todos os dias de madrugada para pescar, podem chegar a três meses de duração o período da pesca da lula e aumenta significativamente a renda familiar,pela venda da lula, o araste de praia, também causa comoção de boa parte da comunidade que de canoa ou a pé, vão até o local e quando preciso, ajudam a puxar a rede para a areia, ocorre nas praias do Parque Marinho do Aventureiro, outros costumes como a própria confecção dos artefatos de pesca, caça, agricultura estão presentes em quase todas as casas.

A arquitetura primitiva, o conhecimento prático do meio sobre detalhes da flora, fauna, solos, clima e cultivos de animais e plantações de forma rústica, está impregnado muitas vezes na linguagem, no olhar, na desconfiança, no isolamento das mulheres e crianças em casa.

A igreja local representa uma instituição muito importante culturalmente e há mais de 120 anos acontece uma comemoração festiva acompanhada de missa, onde são batizadas as crianças do local, uma procissão e um leilão para arrecadação de fundos para a igreja, em homenagem a padroeira do local; a Santa Cruz, nessa festa a maioria dos moradores, antigos moradores e seus amigos e familiares participam e colaboram com os preparativos, além do festeiro oficial e sua equipe que são sempre escolhidos na festa do ano anterior.

Dentre os moradores existe um exemplo de solidariedade entre os afins ou familiares que diante situações em que a ajuda de poucas ou muitas pessoas é necessária. Como a construção de casas, carregamentos pesados, fazer colheita de algum cultivar de feijão, milho, mandioca, fazer farinha, fazer canoa ou simples coisas como desmalhar os peixes de uma rede, ajudar num arraste de peixes, cuidados com crianças e dessa forma vão trocando gentilezas e estruturando vínculos.

A organização econômica da comunidade está composta por núcleos familiares que são fechados em uma ou mais famílias com vínculos familiares estreitos, como pais e filhos, apesar dos núcleos familiares poderem ter uma ou mais famílias, cada unidade familiar possui estruturas econômicas individuais de subsistência, que provem de salários, ou aposentadorias, ou pensões e

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outras fontes de renda, além dos recursos naturais extraídos que são indispensáveis e servem de complemento na renda e isso inclui água doce, frutos do mar, bananas, cocos, frutos, argila, cipós e plantas medicinais, que são recursos naturais que possuem ofertas significativas e não exigem grandes esforços para a exploração e utilização destes no local, o que fornece subsídios para melhorar muito a qualidade de vida dessas pessoas.

Dentre os moradores que possuem vinculo empregatício com um órgão público, existem representações em cargos municipais ( professora, agente comunitário de saúde, merendeira escolar, zelador escolar, 4 garis), estaduais (3 servidores da FEEMA). A área em questao está sob tutela dos órgãos ambientais do Governo do Estado do Rio de Janeiro ( IEF e FEEMA), mas devido algumas instituições municipais beneficiarem os moradores, como escola primária até o quinto ano, limpeza pública da praia do Aventureiro, recolhimento do lixo no cais uma vez por mês e resgates emergenciais realizados pela Defesa Civil, ocorrem operações de levantamentos residenciais e topográficos, alem da cobrança anual do IPTU realizados pela Prefeitura de Angra dos Reis na praia do Aventureiro.

A comunidade caiçara do Aventureiro vota no município de Angra dos Reis, na praia do Provetá, Ilha Grande.

Diante da regularização da permanência dessa comunidade na área em questão as ong’s Sociedade Angrense de Proteção Ecológica (SAPÊ) e o Comitê de Defesa da Ilha Grande (CODIG), são instituições que vêm prestado muito apoio e esclarecimentos.

LEVANTAMENTO RÁPIDO, EM CAMPO, DAS PRINCIPAIS CARACTERISTICAS BIOFÍSICAS DA ÁREA.

A praia do Aventureiro, posicionada na parte Sul da Ilha Grande, voltada para a vertente Leste, está dentro de uma enseada, denominada Saco do Aventureiro, área de Mata Atlântica, com características de floresta ombrófila mista nas proximidades da praia e costão rochoso.

A floresta ombrófila presente nas encostas e matas ciliares, com composições florísticas que indicam áreas com idades entre cinco e cem anos de regeneração, apresentando áreas acima da cota altimétrica de 250 metros que possuem florestas em bom estado de conservação, possivelmente com idades acima de 70 anos, acima dessa faixa é perceptível uma área em que foi incendiada acidentalmente há 40 anos atrás, o fogo atravessou pela vertente oposta e abismou a população com labaredas de mais de 10 metros de altura, que desciam a montanha. A zona de ocupação da comunidade está centralizada abaixo da cota altimétrica de 40m, com pouca declividade, abrange a extensão da praia do Aventureiro e parte de um costão rochoso, possui uma área com aproximadamente 30 ha., a comunidade é abastecida de quatro principais fontes de água doce (pequenos rios com leitos de até três metros de largura). Uma área circundante a esta, que está acima da área de ocupação e atinge a cota altimétrica 250, possui declividades acima de 40 graus, e são observadas a agricultura diversificada e a retirada de água em mangueiras. Acima dessa cota é observada extração de madeira em pequena escala e a caça.

A pluviosidade é marcada por um inverno seco e um verão que chega a chover por até duas semanas, a direção e velocidade dos ventos também são determinantes para as mudanças climáticas, e são observados pela comunidade com muita atenção.

IDENTIFICAÇÃO PRELIMINAR DO ESTADO DOS ECOSSISTEMAS ABRANGIDOS E AVALIAÇÃO DA POSSIBILIDADE DA RECUPERAÇAO DE ÁREAS DEGRADADAS.

Os ecossistemas do Parque Marinho, que vêm sendo sensibilizados pela pesca predatória, desde muito antes de sua criação, sofrendo redução na diversidade e na quantidade de peixes ao longo de 25 anos, mas a pesca no local ainda garante parte da fonte protéica consumida pelos

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moradores locais. No entanto pode–se considerar que o estado do ecossistema marinho está muito prejudicado e muitas espécies são encontradas raramente.

Dentre possibilidades de recuperação da fração do ecossistema marinho em que a comunidade utiliza, a área do Parque Marinho compreende a uma boa parte. Dentre avaliações de possibilidades de recuperação deve-se a respeito da legislação pertinente ao Parque Marinho, mas as pescarias predatórias ocorrem geralmente durante a noite e a fiscalização é prejudicada, dessa forma a implantação de recifes artificiais por toda área do Parque Marinho inviabilizaria muitas modalidades de pesca e iria criar condições viáveis para que se estabeleçam novos ambientes protegidos. Tal implantação envolveria segmentos sociais importantes para o desenvolvimento sustentável da comunidade caiçara do Aventureiro.

A hidrografia, ou a porção de ecossistemas aquáticos de água doce em que abrangem os contatos freqüentes da comunidade caiçara está relacionada diretamente aos sistemas lagunares das Praias do Sul e do Leste que sofrem influência direta das marés e são praticamente monitorados pelos caçadores e moradores de muitas praias da Ilha Grande.

Num aspecto de preservação, recuperação, defesa e manutenção da diversidade biológica, a presença de membros da comunidade caiçara do Aventureiro que convivem e habitualmente percorrem a grande planície das lagoas pode ser vista de forma positiva, pois, se fizessem isso com a freqüência que fazem, porém com um caráter conservacionista e impedindo formas ilegais de caça e pesca, iriam participar efetivamente da proteção ambiental, sabendo que apenas a comunidade caiçara do Aventureiro seria beneficiada pela forma de utilização sustentável de recursos naturais, como peixes e moluscos.

A área ocupada possui quatro pequenos leitos de córregos fragilizados, assoreados em boa parte de suas margens e a mata ciliar até a cota 40 está muito comprometida por descaracterizações na flora, ou devido a cortes providenciais, ou roçados, ou são áreas de serventia doméstica, ou foram substituídos para o plantio de bananais. Dentre maneiras de recuperação dos córregos, seria uma recaracterização natural das margens, desde a região prejudicada, onde o leito possui declives e muitas rochas, até a área de praia sem declives e com características de um pequeno mangue, realizando a retirada de espécies indesejáveis, ou que esteja descaracterizando o ambiente e o plantio de mudas, produzidas através de matrizes da área da Reserva Biológica .

Um detalhe fundamental, é a construção de sistemas ecológicos de saneamento básico e conscientizar a comunidade em relação ao uso da água dos córregos, e de como são delicados esses pequenos ecossistemas hidráulicos e de como respondem negativamente a usos inadequados, como a retirada de pedras e areia e o lançamento de resíduos domésticos .

No que abrange a zona de ocupação que é onde a comunidade possui contato direto com o solo, não existe nenhuma área completamente degradada, a não ser os quintais, roças e tigüeras recentes, a vegetação na zona de ocupação é bastante descaracterizada por espécies que não são nativas da Mata Atlântica. Acima da cota 40, existe uma vegetação nativa muito mais presente, em desenvolvimento constante, entremeada por roçados. Acima a cota 200 é sentida a falta de muitas espécies florestais, como maçaranduba, muçutaíba, ingá-flecha, palmeira issara, espécies de Ipê, entre outras madeiras resistentes, representantes de mata secundária tardia e primária que são raramente encontradas.

A possibilidade de marcações de matrizes das espécies mais raras na área da Reserva é uma forma de manutenção da diversidade e dessa forma fazer a produção de mudas de árvores e de plantas medicinais mais utilizadas para que sejam introduzidas na área em questão, numa forma de manejo, provocando o regate cultural, e o uso comunitário dos recursos.

SISTEMATIZAÇÃO E ANÁLISE DO TIPODE OCUPAÇÃO DA ÁREA. A área de ocupação, onde se encontram as residências e seus anexos, atingem seu ponto

máximo, entre a cota 40 e 50, é composta por construções uni pavimentadas, sem laje e com

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áreas inferiores a 100 metros quadrados, nessa zona existem 53 edificações, sendo duas de patrimônio do órgão ambiental do Estado do Rio de Janeiro, uma escola do Município de Angra dos Reis, onze casas de veraneio ( pessoas sem vínculos com o local), três casas de posse de moradores locais alugadas para terceiros, quatro casas vazias, três casas de farinha; onde é feito o beneficiamento da mandioca, vinte e nove casas habitadas por moradores locais e dezesseis casinhas para geradores de energia. Seis pequenos ranchos que são divididos entre afins, próximos à praia, onde são guardadas as canoas e redes. As áreas exploradas para camping se encontram nos quintais de vinte residências de moradores locais. A área acima da cota 40 e a faixa de areia podem ser consideradas de uso comunitário, para utilização de recursos naturais e lazer. O contingente de moradores oscila entre 85 e100 moradores, devido a famílias locais que residem em Angra por motivos particulares e passam feriados e épocas de temporada no Aventureiro.

LEVANTAMENTO DO CONTINGENTE DE NÃO MORADORES USUÁRIOS DOS RECURSOS NATURAIS DA ÁREA.

Considerando a área da Reserva Biológica, os moradores da Praia do Provetá, caçam, capturam pássaros e pescam no Parque Marinho, em embarcações com sonda, sonar e redes maiores que 1 km de extensão, havendo exceções de pescadores artesanais do local, que colocam redes de espera, pescam garoupa, lula e outros tipos de pescaria. Os moradores das praias da Longa, Araçatiba, Vermelha, Tapera e Sitio Forte, caçam e pescam nas lagoas indiscriminadamente, na área da Reserva é comum se encontrar armadilhas e as picadas de caçadores e restos de fogueiras de seus acampamentos, muitos equipamentos de pesca, como redes e botes estão escondidos entre a vegetação ao redor das lagoas do Sul e do Leste.

LEVANTAMENTO DAS FORMAS E GRAUS DE ORGANIZAÇÃO SOCIAL E PRODUTIVA.

A comunidade caiçara do Aventureiro, composta por núcleos familiares bem definidos, as funções de homens e mulheres são divididas, os homens interagem socialmente, entre si e com turistas na praia, enquanto as mulheres são mais caseiras e caladas. As residências com proximidade são normalmente de pais e filhos, que se casam e constroem suas casas próximas a dos seus pais.

A organização produtiva envolve desde segmentos mais primitivos, como a agricultura familiar diversificada, que não envolvem fertilizantes nem pesticidas, até a máxima organização, entre os homens, nos momentos em que vão cercar de canoas os cardumes de peixes próximos do costão rochoso, ou na beira da praia.

O turismo foi a atividade que mais gerou renda e isso levou a comunidade a um nível de organização produtiva mais elevada.

A associação de moradores do Aventureiro tem um papel fundamental no aspecto de organização social, pois além de incentivar os moradores a se organizarem em ações positivas, também realiza a função de receber os turistas, os encaminharem aos campings, realizando a cobrança de diárias com preços tabelados, registrando cada visitante e distribuindo a renda entre os donos dos campings, essa atitude acabou com a inadimplência de alguns turistas e evitou a permanência de pessoas dormindo ou acampando nas praias.

Os proprietários de barco do local possuem uma posição privilegiada, pois realizam pescarias, levam o pescado para vender no Continente, fazem fretes e têm a liberdade de irem e voltarem para Angra quando necessitam ou os convêm.

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AVALIAÇÃO PRELIMINAR SOBRE O POTENCIAL DE SUSTENTABILIDADE ECÔNOMICA E AMBIENTAL DAS ATIVIDADES DE EXPLORACAO DE ESPAÇOS E RECURSOS NATURAIS.

Visto que a sustentabilidade econômica se abre em muitas vertentes relativas ao turismo de qualidade. O potencial de sustentabilidade econômica poderia englobar passeios terrestres com guias, marítimos em barcos de moradores, o serviço de bares e restaurantes, a venda de artesanatos, a reciclagem, reaproveitamento ou venda do lixo produzido, a produção de um viveiro de plantas ornamentais, a construção de um espaço comunitário com quiosques, apicultura, a construção de um museu caiçara, com apresentação de vídeos, artesanatos, artefatos culturais e cursos de artesanato local, a criação de um logotipo para produtos produzidos pelos moradores locais.

A sustentabilidade ambiental, diante de tantas perspectivas possíveis, fica ameaçada, sabendo a enorme carência de informações e a necessidade de se aplicar um curso intensivo de educação ambiental, voltado para adultos analfabetos e semi-analfabetos, crianças e jovens.

Devem ser previstas ações de apoio à organização social e produtiva dessa comunidade, que privilegie o aprimoramento das práticas e formas de atuação já existentes.

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Mapa de Casas e Roças da Praia do Aventureiro (2008)

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LEGENDA MAPA

Quadrados cor de abóbora : roças

Linhas pretas : córregos

Círculos brancos: casas

1- Eliane / veraneio

2- Manoel/ vazia

3- Manoel/ camping

4- Roberto/ veraneio

5- A. Osório/ vazia

6- Duas casas/ veraneio

7- Anísio/ veraneio

8- Alexandre/ veraneio

9- Angelina /vazia

10- Zuleica

11- Sidney

12- Lucia

13- Vera/ veraneio

14- Sidney/ casa de farinha/ bar/camping

15- Zuleica/ bar/ camping/ casa de farinha

16- Duas casas FEEMA

17- Escola

18- Ruben/ camping

19- Adriana /alugada

20- Cida

21- Djamil/bar/ camping

22- Mário/bar/camping

23- Valdomiro/camping

24- Criste

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25- Flávio

26- Jorge/ camping

27- Amarildo/camping

28- Cláudio

29- Adilson/ camping

30- Vagner

31- Neuzeli

32- Roberto/veraneio

33- Larissa/bar/ camping ( não é local)

34- Magali/veraneio

35- Clementino/ camping

36- Zé/ camping/ casa de farinha

37- Edinaldo/camping

38- Roseno/ bar/ camping

39- Oldair

40- Antonio/ bar/ camping

41- Zeca/ camping

42- Chalé

43- Benedito/ camping

44- Luiz/bar/ camping

45- Alexandre/ veraneio

46- Luciano/camping

47- Lucia/vazia

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