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 DESIGN E AVALIAÇÃO DE INTERFACES HUMANO-COMPUTADOR  HELOÍSA VIEIRA DA R OCHA MARIA CECÍLIA CALANI BARANAUSKAS INSTITUTO DE COMPUTAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS 

[LIVRO] Design e avaliação de interfaces humano-computador.pdf

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  • DESIGN E AVALIAO DE

    INTERFACES

    HUMANO-COMPUTADOR

    HELOSA VIEIRA DA ROCHA

    MARIA CECLIA CALANI BARANAUSKAS

    INSTITUTO DE COMPUTAO

    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

  • Para Mariana e Daniel Para Vitinho (meu anjo), Cibele e Vitor

    nosso amor ...

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    PREFCIO A comunidade profissional interessada na interao humano-computador data do incio da dcada de 80, poca em que os computadores pessoais comearam a ganhar mercado e escapar ao uso restrito de especialistas. O desenvolvimento da rea nas ltimas duas dcadas gerou um corpo de conhecimentos que tem ganhado espao dia a dia junto indstria de software. Exemplo disso so os laboratrios de usabilidade de software e departamentos especiais em design criados nas grandes fabricantes de software como o caso da Xerox, Apple, etc. . Interao Humano-Computador (IHC) pode ser definida como a disciplina relativa ao design, avaliao e implementao de sistemas computacionais interativos para uso humano e aos fenmenos que os cercam. No Brasil recente a preocupao com a rea, refletida na insero da disciplina nas diretrizes curriculares para os cursos de graduao em Cincia da Computao. Tambm a formao de uma comunidade de acadmicos e profissionais da indstria tem se consolidado a partir de eventos cientficos na rea. J foram realizados cinco Workshops sobre Fatores Humanos em Sistemas Computacionais. O primeiro (IHC98) aconteceu junto ao Simpsio Brasileiro de Engenharia de Software (SBES), em Maring, PR. e o segundo (IHC99) ocorreu em paralelo ao Brasiliam Symposium on Computer Graphics and Image Processing (SIBGRAPI), sob os auspcios do Instituto de Computao e da Faculdade de Engenharia Eltrica da Unicamp. No ano 2000 aconteceu o terceiro encontro (IHC2000), em Gramado, RS, seguido do quarto (IHC2001) em Florianpolis, SC e do quinto (IHC2002) em Fortaleza. Este livro, escrito originalmente para a Escola de Computao 2000, aconteceu em um momento conjuntural importante onde havia demanda tanto institucional quanto na rea da indstria de software para um texto no assunto, o que se refletiu em sua edio original esgotada em um ms aps seu lanamento. Buscando responder procura que tem acontecido desde ento, lanamos esta re-impresso do livro. Este livro uma contribuio ao processo de ensino na rea de Interfaces e Interao Humano-Computador, a partir de referncias clssicas que fundamentam a prtica de IHC, bem como atravs de literatura recente que aponta para novas teorias, mtodos e processos de design e avaliao de software. A proposta do livro resultado da prtica das autoras em pesquisa relacionada ao design e avaliao de ambientes computacionais para o usurio final e construda nos ltimos dez anos no ensino de disciplinas sobre design, implementao e avaliao de interfaces humano-computador em cursos de graduao e ps-graduao no Instituto de Computao da Unicamp. O livro procura abordar os fundamentos da rea, bem como apontar para suas novas fronteiras, em um espao adequado ao ensino introdutrio da disciplina. No pretendemos, portanto, esgotar o assunto, embora procuremos apresentar o design e avaliao de interfaces, entendendo-os como parte de um mesmo processo de criao de software para o usurio final.

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    O livro est estruturado em cinco captulos onde: no Captulo 1 fazemos uma apresentao geral da rea e definimos a terminologia e conceitos bsicos utilizados nos demais captulos; no Captulo 2, so aprofundados aspectos relativos aos fatores humanos envolvidos no processo de interao humano-computador, tanto capacidades fsicas como capacidades cognitivas so tratadas nesse captulo; no Captulo 3 discutido o processo de design de interfaces sob diferentes perspectivas explorando tambm os aspectos organizacionais e sociais do contexto do usurio e de suas atividades; no Captulo 4 so discutidas tcnicas de avaliao de interfaces nas diferentes fases de sua implementao, do design implementao completa ou de um prottipo; finalmente no Captulo 5, fazemos uma discusso geral dos resultados dessa rea de estudo e aplicao, analisando os impactos individuais e sociais das atuais interfaces de usurio e apontando para o provvel advento de uma nova computao. Estaremos dando ao tema um tratamento tanto terico quanto prtico, pois todos os aspectos tericos sero apresentados em paralelo a exemplos reais que os ilustram. Os conceitos apresentados, dependendo do interesse do leitor, podem ser imediatamente utilizados tanto em situaes reais de desenvolvimento de software, quanto no ensino de IHC. Pelo menos isso que temos observado junto aos nossos alunos, muitos deles profissionais vinculados a empresas e universidades. O livro, portanto, um esforo no sentido de se ter uma publicao nacional sobre o assunto e voltado para um amplo pblico que compreende pesquisadores, profissionais da indstria de software, educadores e estudantes que estejam interessados em explorar e contribuir no desenvolvimento de sistemas computacionais usveis. Um website acompanha o livro (http://www.ic.unicamp.br/proj-ihc/DAIHC.html), incluindo apontadores para material adicional ao contedo de cada captulo e para outros temas correlatos a IHC e no diretamente tratados no livro. Adicionalmente pretendemos incluir nesse website informao e material de apoio para professores e estudantes tornando disponvel material didtico, projetos e exerccios prticos no sentido de apoiar e documentar o desenvolvimento de cursos na rea.

    Helosa Vieira da Rocha

    Maria Ceclia Calani Baranauskas

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    AGRADECIMENTOS Como o final de milnio inspira novos caminhos a explorar, a Escola de Computao do ano 2000 no poderia ser diferente. Agradecemos Comisso Organizadora pela oportunidade que gerou este livro. Este livro tem implcita a contribuio de pessoas que tm compartilhado conosco, ao longo dos anos, a necessidade do rompimento de barreiras entre pessoas e computadores. Queremos agradecer a nossos alunos e ex-alunos da Cincia da Computao que nos motivam a discutir e trabalhar para a construo de conhecimento na rea de Interfaces e Interao Humano-Computador. Muitos certamente identificaro suas contribuies no livro. desnecessrio lembrar o papel que teve o Instituto de Computao da Unicamp em nos dar espao para o projeto inicial do livro e ao Nied-Unicamp pela sua concretizao nesta edio. Por isso tambm agradecemos. Da mesma forma, agradecemos aos nossos colegas, por nos fazerem lembrar desta tarefa a todo o momento, no corredor, e por estarem sempre solcitos a nos ajudar quando preciso. Agradecemos Luciana A. S. Romani, que se responsabilizou pela construo do site que acompanha este livro e ao Juliano Schimiguel pelo trabalho de reviso desta edio. Tambm agradecemos ao Daniel R. C. Silva pela ajuda na editorao final e Letcia Lampert, que generosamente nos autorizou a utilizar o logotipo de sua criao para o IHC99. Quem j escreveu um livro sabe do tempo e da ateno que roubamos de nossas famlias. Para elas nossos agradecemos especiais.

    Caminhante, no h caminho. Faz-se caminho ao caminhar.

    Leonardo Boff

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    SUMRIO CAPTULO 1 - O QUE INTERAO/INTERFACE HUMANO-COMPUTADOR 1 Introduo 3 Interface Humano-Computador 7 Uma Primeira Definio de Interfaces 8 Evoluo de Interfaces e sua Conceituao 9 Metforas de Interfaces 12 Interao Humano-Computador 13 Desafios de IHC 15 Objetivos de IHC 17 A Multi(Inter) (Trans) Disciplinaridade em IHC 18 Princpios de Design 24 Partindo dos objetos que nos cercam 24 Usabilidade de Sistemas Computacionais 27 Usabilidade na Web 34 Interfaces Internacionais 38 Referncias 42 CAPTULO 2 - FUNDAMENTOS DE FATORES HUMANOS EM IHC 45 Introduo 47 A Psicologia da Interao Humano-Computador 48 Uma Teoria Clssica para o Processamento de Informao no Homem 49 O Sistema perceptual 50 O Sistema Motor 53 O Sistema Cognitivo 54 Mecanismos da Percepo Humana 64 As Bases Neurais da Memria Humana 80 O Modelo GOMS 88 Modelos Mentais 94 Referncias 99 CAPTULO 3 - PARADIGMAS DA COMUNICAO HUMANO-COMPUTADOR E O DESIGN DE INTERFACES 101 Introduo 103 Engenharia Cognitiva 104 Manipulao Direta 107 Modelos do Design de Software 112 Engenharia de Usabilidade 118 O Uso de Guidelines em Design 122 Metforas no Design de Interfaces 125

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    Olhando Mais de Perto o Assunto 125 Como Gerar Metforas Adequadas na Interface 127 Design Baseado em Cenrios 130 Design Participativo 134 Mtodos Etnogrficos em Design de Interfaces 140 Observao Direta ou Indireta? 142 Semitica em Sistemas Computacionais 146 Referncias 153 CAPTUO 4 - AVALIAO DE INTERFACES 159 Introduo 161 Objetivos da Avaliao 162 Inspeo de Usabilidade 165 Objetivos da Inspeo 165 Mtodos de Inspeo 167 Avaliao Heurstica 168 Como conduzir uma Avaliao Heurstica 168 Ex. de Problemas Encontrados na Avaliao Heurstica 173 Graus de Severidade 183

    Caractersticas de Problemas de Usabilidade encontrados pela Avaliao Heurstica 184

    Percurso Cognitivo 185 Uma Primeira Descrio 186 Descrio Detalhada do Procedimento de Percurso 187 Definindo as Entradas para o Percurso - Fase Preparatria 188 Percorrendo as Aes - Fase de Anlise 189 Registro da Informao Durante a Avaliao 191 Estrias de Sucesso e Estrias de Fracasso 191 Exemplos de Estrias de Sucesso 191 Caractersticas Comuns de Sucessos 192 Exemplos de Estrias de Fracassos 193 Como usar Resultados do Percurso para Corrigir Problemas 198 Escopo e Limitaes do Mtodo 199 Teste de Usabilidade 200 Objetivos e Plano de Teste 201 Etapas de um Teste 203 Pensando em Voz Alta 204 Medidas de Performance 205 Consideraes Finais 207 Referncias 209

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    CAPTULO 5 - PERSPECTIVAS DAS INTERFACES HUMANO-COMPUTADOR - O ADVENTO DE UMA NOVA COMPUTAO 213 Introduo 215 Um Pouco de Histria 216 O Ciclo de Vida da Tecnologia 220 Da Computao para a Comunicao 222 Acesso Universal Tecnologia Computacional 224 A Problemtica da Tecnologia Atual 229 Haveria uma Soluo Mgica? 234 Por uma Disciplina de Design de Software ou Design da Interao 237 Referncias 241

  • CAPTULO 1 ____________________________________________________________________

    O QUE INTERAO/INTERFACE HUMANO-COMPUTADOR

    The ideal system so buries the technology that the user is not even aware os its presence. The goal is to let people get on with their activities, with the technology enhancing their productivity, their power, and their enjoyment, ever the more so because it is invisible, out of sight, out of mind. People should learn the task, not

    the technology. They shoul be able to take the tool to the task, not as today, where we must take the task to the tool. And these tools should folow three axioms of

    design: simplicity, versatility, and pleasurability Norman, 1998, pg xii

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    INTRODUO

    Novas tecnologias provem poder s pessoas que as dominam. Sistemas computacionais e interfaces acessveis so novas tecnologias em rpida disseminao. Explorar o poder do computador tarefa para designers que entendem da tecnologia e so sensveis s capacidades e necessidades humanas. A performance humana no uso de computadores e de sistemas de informao tem sido uma rea de pesquisa e desenvolvimento que muito se expandiu nas ltimas dcadas. Isso tem sido feito usando-se poderosas ferramentas computacionais na anlise de dados coletados de acordo com mtodos da Psicologia Experimental. Outras contribuies tambm advm da Psicologia Educacional, do Design Instrucional e Grfico, dos Fatores Humanos ou Ergonomia, e bem mais recentemente, da Antropologia e da Sociologia. Interfaces de usurio tm produzido importantes estrias de sucesso tais como a da Netscape, America Online, Universal Online, ou Yahoo. Elas tambm tem produzido intensa competio, disputas por direitos autorais (por exemplo, Apple e Microsoft com relao interface Windows), mega fuses (como a recente entre a America Online e TimeWarners), etc. Individualmente, interfaces de usurio tm mudado a vida de muitas pessoas: mdicos esto podendo fazer diagnsticos mais precisos; crianas esto expandindo os horizontes em ambientes de aprendizagem; artistas grficos podem explorar mais possibilidades criativas; e pilotos tm mais segurana em seus vos. Entretanto, algumas mudanas so perturbadoras e at desastrosas; freqentemente usurios tm que lidar com frustrao, medo e falha quando encontram design excessivamente complexos, com terminologia incompreensvel e caticos. O crescente interesse no projeto de interfaces do usurio bastante claro nos mais variados tipos de sistemas (Figuras 1.1, 1.2). Processadores de texto, ferramentas de edio, e softwares de manipulao de imagens so amplamente utilizados

    FIGURA 1.1 TELAS DO SIG ARCVIEW COM

    MAPA MOSTRANDO A MALHA MUNICIPAL DO

    ESTADO DE SO PAULO

  • 4 Design e Avaliao de Interfaces Humano-Computador ____________________________________________________________________

    FIGURA 1.2 TELA DO JOGO DO ALVO DESENOLVIDO PELO NIED - UNICAMP NO PROJETO DE

    FORMAO DE RECURSOS HUMANOS PARA A EMPRESA ENXUTA Correio eletrnico, vdeo conferncia e a WWW tm oferecido novas mdias para comunicao. Bibliotecas digitais de imagens tm se expandido em aplicaes que vo da medicina (Figura 1.3) at a explorao do espao.

    Figura 1.3 IMAGENS OBTIDAS DO SITE VISIBLE MAN QUE POSSUI UMA VASTA BIBLIOTECA DE

    REFERNCIAS MDICAS

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    Visualizao cientfica e simuladores remotos permitem experimentos seguros e treinamento a baixo custo. Acesso pblico e educacional a sites de museus (Figura 1.4), bibliotecas ou fontes de informao governamentais esto se ampliando (Figuras 1.5,1.6).

    FIGURA 1.4 SITE DO MUSEU DE ARTE DE SO PAULO PGINA DE ENTRADA E PGINA

    PRINCIPAL DA EXPOSIO VIRTUAL DO MICHELANGELO

    FIGURA 1.5 SITES DA BIBLIOTECA NACIONAL E BIBLIOTECA DA ESCOLA DO FUTURO DA USP

  • 6 Design e Avaliao de Interfaces Humano-Computador ____________________________________________________________________

    FIGURA 1.6 FONTES DE INFORMAO DO GOVERNO

    BRASILEIRO SOBRE DADOS

    ESTATSTICOS (IBGE) E AIDS Ferramentas computacionais especficas e ambientes de programao permitem construir prottipos rpidos como as ferramentas de auxilio ao design de produtos industriais. Muitos de ns usam vrios produtos eletrnicos, como os gravadores de vdeo cassete, fornos de microondas, telefones, etc. Arte, msica, esportes e entretenimento so atualmente auxiliadas e suportadas por sistemas computacionais. Profissionais das mais diferentes reas tm contribuido significativamente para todo esse desenvolvimento, e dentre estes podemos destacar: ! Designers de software tm explorado maneiras melhores de organizar

    informao graficamente. Eles tm desenvolvido linguagens de consulta e facilidades visuais para entrada, busca e sada de informao. Tm usado sons (msica e voz), representaes tridimensionais, animao e vdeo para melhorar o contedo e a expresso das interfaces. Tcnicas como manipulao direta, tele-presena, e realidade virtual mudam a maneira de interagir e de pensar sobre computadores.

    ! Desenvolvedores de hardware tm oferecido novos design de teclados e

    dispositivos de apontamento, alm dos displays de alta resoluo. Eles tm projetado sistemas com resposta rpida para complexas manipulaes tridimensionais. Tecnologias que permitem entrada e sada por voz, entrada por gestos, telas de toque, em muito tm aumentado a facilidade de uso dos computadores.

    ! Desenvolvedores na rea de tecnologia educacional esto criando tutorais

    online, e materiais de treinamento e explorando novas abordagens de discusses em grupo, ensino a distncia, apresentaes de vdeo etc. Designers grficos esto fortemente envolvidos com o layout visual, seleo de cores e animao. Socilogos, antroplogos, filsofos, administradores esto tratando do

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    impacto organizacional, ansiedade computacional, treinamento, grupos de trabalho distribudos, suporte computacional ao trabalho cooperativo, e mudanas sociais em geral.

    Portanto, estamos vivendo um momento vital e estratgico para os desenvolvedores de interfaces. Pode-se dizer que a tecnologia est pronta. Temos portanto as pontes e tneis construdos e agora as estradas precisam ser pavimentadas e as sinalizaes pintadas para tornar possvel o pesado trfico da grande leva de usurios (Schneiderman, 1998). Neste captulo estaremos apresentando a rea de Interfaces Humano-Computador de modo a poder situar e apresentar ao leitor os problemas, a terminologia e conceitos envolvidos nessa rea de estudo e aplicao. Vale lembrar que muitos dos aspectos aqui apresentados sero aprofundados em captulos subsequentes. INTERFACE HUMANO-COMPUTADOR Quando o conceito de interface surgiu, ela era geralmente entendida como o hardware e o software com o qual homem e computador podiam se comunicar. A evoluo do conceito levou incluso dos aspectos cognitivos e emocionais do usurio durante a comunicao. Muito embora algumas pessoas ainda possam se lembrar dos antigos teletipos, comum hoje em dia pensarem na interface como a tela e o que nela mostrado. O nome interface tomado como algo discreto e tangvel, uma coisa que se pode desenhar, mapear, projetar e implementar, "encaixando-a" posteriormente a um conjunto j definido de funcionalidades. Um dos objetivos deste livro acabar com essa idia substituindo-a por outra que ajude os construtores de interfaces a irem na "direo correta". De acordo com Brenda Laurel (1990) a "direo correta" aquela que leva o usurio a ter mais poder. Por exemplo, uma nova verso de um editor de textos comumente oferece o dobro de opes que a verso anterior. E com isso se espera que o usurio possa customizar melhor seu uso e conseguir atingir objetivos mais complexos. Este objetivo nem sempre conseguido, pois o enorme conjunto de funes a as convenes de interface que devero ser aprendidas de modo a se poder usufruir as pretensas novas qualidades, na maioria dos casos, deixam o usurio atnito e cansado. Certamente as melhoras acrescentadas ao produto oferecem ao usurio mais poder e qualidade ao produto final, oferecendo mais graus de liberdade na sua concepo. Mas tudo isso se perde quando o custo para o usurio muito alto. O que acontece que a nova verso adotada, muitas vezes por problemas de compatibilidade entre diferentes verses de um produto, mas toda melhoria deixada de lado e o usurio continua usando o mesmo domnio de funes que ele j

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    conhecia. Concluindo, para que o usurio tenha mais poder, preciso sim, que mais funcionalidade seja oferecida mas fundamental a facilidade de uso. UMA PRIMEIRA DEFINIO DE INTERFACES Primariamente, como j dissemos, se visualiza uma interface como um lugar onde o contato entre duas entidades ocorre (por exemplo, a tela de um computador). O mundo est repleto de exemplos de interfaces: a maaneta de uma porta, uma torneira, a direo de um carro, etc. A forma das interfaces reflete as qualidades fsicas das partes na interao. A maaneta de uma porta projetada para se adequar natureza da mo que ir us-la, o mesmo acontece com o cmbio de um carro (observe que a localizao do cmbio dentro do carro sugere o uso por uma pessoa destra). Existem tesouras de dois tipos uma para pessoas destras e outra para pessoas canhotas. O que muitas vezes esquecido que a forma da interface tambm reflete o que pode ser feito com ela. Tomando o exemplo da maaneta, podemos ver que no mundo existem diversos formatos de maaneta e de acordo com o formato sabemos como deve ser aberta uma porta: girando a maaneta no sentido anti-horrio, empurrando a porta, puxando a porta, etc. (Norman, 1988). O mesmo acontece com a forma das torneiras onde se deve girar ou empurrar ou levantar uma alavanca, etc. Nos exemplos anteriores da porta e da torneira que foram feitas para serem abertas por um humano podemos dizer que o humano o agente e a porta (ou torneira) so os pacientes dessa ao. Mas, temos tambm as portas, ou torneiras, que abrem automaticamente quando identificam atravs de um sensor ou uma cmera a presena de algum (mesmo que esse algum no queira abrir a porta). Nesse caso o sentimento que temos de quem est controlando a interao bastante diferente. Em muitos banheiros pblicos existem instalados aqueles secadores automticos de ar quente para mos e muitas vezes, mesmo no querendo us-los eles se ligam porque nos encostamos prximos a eles ou sem querer passamos a mo perto do sensor. E as torneiras que sempre se fecham antes de acabarmos de lavar as mos? Nesses casos, no mais o humano que est no controle da interao. Portanto, podemos ter como uma definio de base, que uma interface uma superfcie de contato que reflete as propriedades fsicas das partes que interagem, as funes a serem executadas e o balano entre poder e controle (Laurel, 1993).

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    EVOLUO DE INTERFACES E SUA CONCEITUAO

    Interface tornou-se uma tendncia (ou moda, como nomeiam os mais incrdulos) como um importante conceito a ser explorado nos ltimos anos, e isso largamente atribudo a introduo dos computadores Macintosh da Apple. Certamente, quando se pensa hoje em dia em Interfaces Humano-Computador (IHC) imediatamente se visualiza cones, menus, barras de rolagem ou talvez, linhas de comando e cursores piscando. Mas certamente interface no s isso. Podemos fazer um histrico analisando a gerao de interfaces, da mesma forma com que analisamos geraes de computadores, ou seja, fazendo um forte paralelo com os componentes de hardware que as suportam (Tesler, 1991). Nielsen(1993) apresenta uma tabela onde ele faz esse relacionamento e tambm qualifica a categoria de usurios de computadores em cada gerao, o que de absoluta relevncia para o desenvolvimento de interfaces (Tabela1.1).

  • GERAO TECNOLOGIA DE

    HARDWARE MODO DE

    OPERAO LINGUAGENS DE PROGRAMAO

    TECNOLOGIA TERMINAL

    TIPO DE USURIOS

    IMAGEM COMERCIAL

    PARADIGMA DE INTERFACE DE

    USURIO -1945 pr-histrica

    Mecnia e eletromecnica

    Usado somente para clculoes

    Movimento de cabos e chaves

    Leitura de luzes que piscam e cartes perfurados

    Os prprios inventores

    Nenhuma (computadores no sairam dos laboratrios)

    Nenhum

    1945-1955 pioneira

    Vlvulas, mquinas enormes e com alta ocorrncia de falha

    Um usurio a cada tempo usa a mquina ( por um tempo bastante limitado)

    Linguagem de mquina 001100111101

    TTY. Usados apenas nos centros de computao

    Especialistas e pioneiros

    Computador como uma mquina para clculos

    Programao, batch

    1955-1965 histrica

    Transistores, mais confiveis. Computadores comeam a ser usados fora de laboratrios

    Batch (computador central no acessado diretamente)

    Assembler ADD A,B

    Terminais de linha glass TTY

    Tecnocratas, profissionais de computao

    Computador como um processador de Informao

    Linguagens de Comando

    1965-1980 tradicional

    Circuito integrado. relao custo-benefcio justifica a compra de computadores para muitas necessidades

    Time-sharing Linguagens de alto nvel (Fortran, Pascal, C)

    Terminais full screen, caracteres alfa-numricos. Acesso remoto bastante comum

    Grupos especializados sem conhecimento computacional (caixas automticos, p.ex.)

    Mecanizao das atividades repetitivas e no criativas

    Menus hierrquicos e preenchimento de formulrios

    1980-1995 moderna

    VLSI. Pessoas podem comprar seu computador.

    Computador pessoal para um nico usurio

    Linguagens orientadas a problemas/objetos (planilhas de clculo)

    Displays grficos. estaes de trabalho, portveis

    Profissionais de todo tipo e curiosos

    Computador como uma ferramenta

    WIMP (Window,Icons,Menus, e Point devices)

    1995- futura

    Integrao de alta-escala. Pessoas podem comprar diversos computadores

    Usurios conectados em rede e sistemas embutidos

    No imperativas, provavelmente grficas

    Dynabook, E/S multimdia, portabilidade simples, modem celular

    Todas as pessoas Computador como um aparelho eletrnico

    Interfaces no baseadas em comando.

    TABELA 1.1 - GERAO DE COMPUTADORES E DE INTERFACES DE USURIOS (ADAPTADO DE NIELSEN,1993, P.50

  • O que Interface/Interao Humano-Computador 11 ____________________________________________________________________

    De modo semelhante Walkers (1990) faz uma anlise histrica da evoluo de interfaces sob o aspecto do tipo de interao entre o usurio e o computador. No incio havia um rela-cionamento um a um entre uma pessoa e o computador atravs de chaves e mostradores das primeiras mquinas como o ENIAC ou UNIVAC, EDVAC (foto ao lado)1.

    O advento dos cartes perfurados e do processamento em batch substituiu essa interao direta entre o homem e o computador por uma transao mediada pelo operador do computador. Time sharing e o uso dos teletipos trouxeram novamente o contato direto e conduziram o desenvolvimento das interfaces de linhas de comando e orientadas por menu (Figura1.7). O estilo de dilogo bastante simples, onde uma pessoa faz alguma coisa e o computador responde

    FIGURA 1.7 TELAS DE UM PROGRAMA COM ESTRUTURA DE DILOGO POR MENU E LINEAR

    Essa noo simplista de uma conversao levou ao desenvolvimento de um modelo de interao que trata o humano e o computador como duas entidades diferentes que conversam intermediadas por uma tela.

    1 Extrada de http://ei.cs.vt.edu/~history/index.html em fev./2000

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    Avanos da Lingstica tm demonstrado que dilogo no linear, ou seja, quando dizemos alguma coisa, voc pensa sobre o que dissemos e a d uma resposta, ns vamos pensar sobre a resposta e a ., e assim por diante. Portanto, para que o dilogo efetivamente ocorra necessria a existncia, ou a construo, de um meio comum de significados. As atuais interfaces grficas explicitamente representam o que vem a ser esse meio de significados comum, pela aparncia e comportamento dos objetos na tela. Este conceito d suporte a idia de que uma interface um contexto compartilhado de ao no qual tanto o computador como o humano so agentes (Laurel, 1993). Enganos, resultados inesperados e mensagens de erro so evidncia tpica de uma quebra na conversao, onde o pretenso meio de significados comum torna-se uma seara de desentendimentos. A noo de metforas de interfaces (Carroll et al., 1988; Wozny, 1989) foi introduzida para prover s pessoas um esquema do funcionamento da interface que prevenisse tais desentendimentos, ou seja, facilitassem a criao desse contexto compartilhado. Por que metforas? METFORAS DE INTERFACE Metforas so parte integrante de nosso pensamento e linguagem. Elas aparecem no somente na poesia ou literatura, mas em nossa linguagem cotidiana. E geralmente as pessoas no se do conta de que esto usando metforas, elas so invisveis. Alguns exemplos bastante comuns: gastar dinheiro, atacar, defender e destruir um argumento; tratar superficialmente um assunto; trnsito engarrafado; etc. As metforas funcionam como modelos naturais, nos permitindo usar conhecimento familiar de objetos concretos e experincias para dar estrutura a conceitos mais abstratos. As caractersticas de metforas em nossa linguagem so as mesmas que governam o funcionamento de metforas de interfaces. Da mesma forma que metforas invisveis permeiam nossa linguagem cotidiana elas o fazem nas interfaces que usamos e projetamos (Erickson, 1990). Por exemplo, um usurio quando arrasta um documento de um diretrio (ou pasta) para outro nos sistemas gerenciadores de arquivos de ambientes Windows, ele efetivamente acredita que est mudando o documento de lugar e o que efetivamente ocorre que o apontador para o arquivo mudou (apontador tambm uma metfora). Como as metforas so usadas como modelos, uma metfora de interface que sugira um modelo incorreto pode causar dificuldades para o usurio. Por exemplo, o clssico caso das funes cortar e colar dos editores atuais - quando se corta algum objeto ele fica guardado em um buffer (usurios principiantes acham que sumiu) e quando se cola em outra parte o objeto no cola como no real, ele "empurra" (para fazer a real funo de colar preciso marcar e depois colar).

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    E tambm, mesmo boas metforas, no funcionam em sua totalidade. Por exemplo, considerando-se a metfora da mesa de trabalho (desktop metaphor) dificilmente as pessoas conseguem explicar satisfatoriamente o funcionamento de uma funo como a de busca, por exemplo, pois ela diverge significativamente da pretendida referncia ao mundo real. Nesses casos, metforas servem como auxiliares ao entendimento atuando como mediadores cognitivos cujos rtulos so menos tcnicos que os do jargo computacional. Mesmo no funcionando sempre, o seu uso crescente, especialmente em interfaces grficas, favoreceu (ou forou) a expanso do domnio da rea de design de interfaces, com contribuies mais que relevantes de outras especialidades como design grfico e industrial, lingstica, Psicologia e Educao dentre outras. Portanto, uma importante contribuio da abordagem metafrica foi ter tornado o design e estudo de interfaces uma preocupao inter(multi)(trans)disciplinar. Nas prximas sees deste captulo, e no decorrer do livro como um todo, estaremos clarificando essa natureza inter(multi)(trans)disciplinar tanto no design como na avaliao de interfaces. No Captulo 3 voltaremos a discutir sobre o entendimento e uso de metforas no design de interfaces. Concluindo, o que vimos nessas primeiras sees que no se consegue ter um conceito simplista de interface como os aspectos do sistema com os quais o usurio tem contato, ou ainda a um pouco mais elaborada linguagem de entrada para o usurio, linguagem de sada para a mquina e um protocolo de interao (ACM CHI'85). No se pode pensar em interfaces sem considerar o ser humano que vai us-la, e portanto interface e interao so conceitos que no podem ser estabelecidos ou analisados independentemente. E no decorrer deste livro ao nos referirmos a interfaces estaremos focando a interao, o que para ns d a amplitude desejada ao termo interface, pois pensar somente na "interface" pensar muito pequeno. As preocupaes usuais dos designers de interfaces - criar tipos mais legveis, melhores barras de rolagem, integrar cor, som e voz - so todas importantes, mas so secundrias. A preocupao primeira deve ser a de melhorar o modo como as pessoas podem usar o computador para pensar e comunicar, observar e decidir, calcular e simular, discutir e projetar.

    INTERAO HUMANO-COMPUTADOR (IHC) Para que os computadores se tornem amplamente aceitos e efetivamente usados eles precisam ser bem projetados. Isso de maneira alguma quer dizer que o design deve ser adequado a todas as pessoas, mas os computadores devem ser projetados para as necessidades e capacidades de um grupo alvo. Certamente, usurios em geral no devem ser obrigados a pensar sobre como o computador funciona, da mesma forma que o funcionamento mecnico de um carro no preocupao da maioria das pessoas. Entretanto, a posio dos pedais, direo e cmbio tm muito impacto sobre

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    o motorista, como tambm o design de sistemas computacionais tm efeito sobre seus usurios. Empresas produtoras de software tm despertado para idia de que a melhora no aspecto fsico da interface do usurio proporciona maiores chances de sucesso de mercado. Para explorar essa nova dimenso do produto surgiu um termo amplamente usado - interface amigvel ou sistema amigvel (user-friendly). Na prtica o significado do amigvel est associado somente a uma interface, ou melhor, aos elementos na tela serem esteticamente mais agradveis ou bonitos. Muito embora tenha implicado num avano com relao s antigas interfaces, muitas empresas usaram o termo simplesmente como um atrativo de mercado. A maioria dos sistemas continua no atendendo s necessidades de seus usurios que tem que lidar com interfaces que mais parecem inimigas. E um outro aspecto, o de quo pouco adequado esse termo: primeiro, desnecessariamente antropomrfico, usurios no precisam de mquinas para serem amigas, eles precisam de mquinas que lhes facilitem na execuo de suas tarefas; segundo, significa que as necessidades dos usurios podem ser descritas em apenas uma dimenso, mais ou menos amigvel - diferentes usurios tm diferentes necessidades e o que amigvel para um pode ser muito tedioso para outro. Por outro lado, pesquisadores estavam preocupados em como o uso de computadores pode efetivamente enriquecer o trabalho e a vida das pessoas. Em particular, eles estavam analisando as capacidades e limitaes humanas, ou seja, estudando o lado humano da interao com sistemas computacionais. Isso implicava em procurar entender os processos psicolgicos das pessoas quando interagem com computadores. Entretanto, com o desenvolvimento da rea, em paralelo com avanos tecnolgicos, tornou-se claro que outros aspectos ligados ao usurio e ao uso dos computadores precisavam ser includos: treinamento; prticas de trabalho; estrutura administrativa e organizacional; relaes sociais; sade; e todos os demais fatores importantes para o sucesso ou fracasso no uso de computadores. O termo Interao Humano-Computador (IHC) foi adotado em meados dos anos 80 como um meio de descrever esse novo campo de estudo. E como j dissemos, o termo emerge da necessidade de mostrar que o foco de interesse mais amplo que somente o design de interfaces e abrange todos os aspectos relacionados com a interao entre usurios e computadores. Muito embora, ainda no exista uma definio estabelecida para IHC, acreditamos que a seguinte definio incorpora o esprito da rea no momento: IHC a disciplina preocupada com o design, avaliao e implementao de sistemas computacionais interativos para uso humano e com o estudo dos principais fenmenos ao redor deles A Figura 1.8 tenta expressar o conjunto de componentes contidos nessa definio.

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    FIGURA 1.8 - INTERAO HUMANO-COMPUTADOR ADAPTADA DA DESCRIO DO COMIT

    SIGCHI 1992 Concluindo, IHC trata do design de sistemas computacionais que auxiliem as pessoas de forma a que possam executar suas atividades produtivamente e com segurana. IHC tem, portanto, papel no desenvolvimento de todo tipo de sistema, variando dos sistemas de controle de trfego areo onde segurana extremamente importante, at sistemas de escritrio onde produtividade e satisfao so os parmetros mais relevantes, at jogos, onde o envolvimento dos usurios o requisito bsico. DESAFIOS DE IHC Dado o rpido desenvolvimento da tecnologia, mais os conflitos e compromissos dos objetivos de um design e mais as diferentes componentes (e reas de estudo) que caracterizam IHC, sem dvida alguma ela uma rea com ricos desafios.

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    O desenvolvimento de mquinas mais rpidas e com maior poder de processamento, em conjunto com melhorias de tecnologias de hardware e software no pra, e abre inmeras possibilidades para IHC. Dispositivos especiais possibilitam ao usurio "pegar" objetos dentro de um espao virtual, e mesmo movimentar-se atravs de um espao de realidade virtual. Aplicaes multimdia, onde som, grficos estticos e dinmicos, vdeo e texto so interligados so comuns hoje em dia. Desenvolvimentos recentes em telecomunicaes tm possibilitado que grandes quantidades de diferentes tipos de informao possam ser enviadas atravs de redes. Imagens, vdeo, som e texto podem ser transmitidos com perda mnima de eficincia e qualidade. Informaes de bancos de dados existentes em todo o mundo podem ser obtidas pelas pessoas de suas prprias casas. Essas mudanas trazem dois importantes desafios aos designers de IHC (Preece et al, 1994): Como dar conta da rpida evoluo tecnolgica? Como garantir que os design ofeream uma boa IHC ao mesmo tempo

    que exploram o potencial e funcionalidade da nova tecnologia? Um exemplo clssico desses problemas so os aparelhos de vdeo cassete. Enquanto a maioria das pessoas no tem problema algum em colocar uma fita, iniciar uma gravao ou dar um play, adiantar ou atrasar a fita, elas freqentemente no acham assim to fcil acertar o timer de forma a gravar um programa em um tempo futuro. Para a maioria dos gravadores de vdeo no bvio, a partir da interface entre a pessoa e a mquina, como a informao deve ser especificada para o sistema, e muito menos a resposta do sistema (quando existe) clara. Certamente, se descobre que as coisas no funcionaram bem quando j muito tarde. Tentando minorar essa dificuldade, muitos aparelhos de vdeo atualmente provem um display das funes no televisor, mas mesmo assim as dificuldades permanecem (minoradas sem dvida alguma). O mesmo acontece com relao aos atuais aparelhos telefnicos. Enquanto as funcionalidades estavam restritas ao suporte de uma conversao tudo ia muito bem. Mas atualmente, a tecnologia permite conversas entre mais que duas pessoas; o sinal de que no est ocupado j no significa mais isso, pois os telefones tem bip que permite a interrupo, sem desligar, de uma conversa para atender outra; podemos transferir nossas ligaes para outro nmero; etc. E a, a mesma interface para dar conta de todas essas novas funcionalidades ficou complexa e no mais bvia. As pessoas tm problemas quando tentam operar essas funes e muitas desistem. No existe como negar que muitos sistemas computacionais foram projetados com interfaces extremamente pobres. O ponto que precisa ser entendido que aumentar a funcionalidade no pode ser uma desculpa para um design pobre. Deve ser possvel projetar boas interfaces cujos controles tm operaes e efeitos relativamente bvios e que tambm provem um feedback imediato e til.

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    Um bom exemplo o dado por Norman (1988) com relao aos carros. Observando os controles dos painis dos carros atuais podemos ver que eles tm cerca de 100 controles ou mais - dez ou mais para o equipamento de som, 5 ou mais para o sistema de ventilao, outros tantos para as janelas, limpadores de pra-brisa, luzes, para abrir e fechar portas, para dirigir o carro, etc. A maioria das pessoas, com pouca tentativa e erro (quase sempre enquanto dirige) ou aps uma rpida olhada no manual, tem poucos problemas em lidar com todo o domnio de funes. Por que isso acontece, se no existe termo de comparao entre o nmero de funes e controles de um carro e de um gravador de vdeo? O que torna a interface do carro to boa e a do vdeo to pobre? Uma das razes que o feedback nos carros imediato e bvio. Tambm, as pessoas que j dirigiram qualquer carro sabem o que esperar pois, muito embora, os carros sejam diferentes, a posio da maioria dos controles a mesma ou similar, e smbolos similares so usados para indicar suas funes. Portanto, os desafios de IHC so evidentes e a procura de solues estabelece os objetivos da rea que ao serem centrados no humano e no na tecnologia so sempre atuais. OBJETIVOS DE IHC

    Os objetivos de IHC so o de produzir sistemas usveis, seguros e funcionais. Esses objetivos podem ser resumidos como desenvolver ou melhorar a segurana, utilidade, efetividade e usabilidade de sistemas que incluem computadores. Nesse contexto o termo sistemas se refere no somente ao hardware e o software mas a todo o ambiente que usa ou afetado pelo uso da tecnologia computacional. Nielsen (1993) engloba esses objetivos em um conceito mais amplo que ele denomina aceitabilidade de um sistema (Figura 1.9). A aceitabilidade geral de um sistema a combinao de sua aceitabilidade social e sua aceitabilidade prtica. Como um exemplo de aceitabilidade social, podemos mencionar os sistemas atuais de controle das portas de entrada em bancos. Apesar de serem benficos socialmente pois tentam impedir situaes de assalto onde os usurios dos bancos ficam em srio risco, no so aceitos socialmente pois levam a que qualquer pessoa que queira entrar no banco tenha que esbarrar na porta trancada por inmeras vezes at se desfazer de todo e qualquer objeto suspeito (o problema que no se sabe quais os objetos que impedem a entrada). A aceitabilidade prtica trata dos tradicionais parmetros de custo, confiabilidade, compatibilidade com sistemas existentes, etc., como tambm da categoria denominada "usefulness"

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    FIGURA 1.9 - ATRIBUTOS DE ACEITABILIDADE DE SISTEMAS (ADAPTADO DE NIELSEN, 1993)

    "Usefulness'" refere-se ao sistema poder ser usado para atingir um determinado objetivo. Novamente essa categoria uma combinao de duas outras: utilidade e usabilidade. Utilidade deve verificar se a funcionalidade do sistema faz o que deve ser feito, ou seja, se um jogo efetivamente diverte e um software educacional auxilia o aprendizado. Usabilidade a questo relacionada a quo bem os usurios podem usar a funcionalidade definida e este um conceito chave em IHC, que trataremos mais detalhadamente ainda neste captulo. Portanto, a aceitabilidade de um sistema tem muitos componentes (da a complexidade da tarefa), e IHC tem, de certa forma, que atender aos compromissos de todas essas categorias. Mas, como temos afirmado e reafirmado, a pesquisa de IHC fundada na crena de que o centro e ponto bsico de anlise so as pessoas usando um sistema computacional. Suas necessidades, capacidades e preferncias para executar diversas tarefas devem informar os meios como os sistemas devem ser projetados e implementados. As pessoas no devem ter que mudar radicalmente para se adequar ao sistema, o sistema sim deve ser projetado para se adequar aos seus requisitos. A MULTI(INTER)(TRANS)DISCIPLINARIDADE EM IHC

    Estabelecidos os objetivos de IHC tem-se a parte mais difcil que a de que forma conseguir estes objetivos. Isso envolve uma perspectiva multidisciplinar, ou seja, resolver os problemas de IHC analisando diferentes perspectivas em seus multifacetados fatores: segurana, eficincia e produtividade, aspectos sociais e organizacionais, etc. Um resumo dos principais fatores que devem ser levados em conta pode ser visto na Tabela 1.2 (Preece, 1994). Primeiramente, tem-se os fatores relacionados com o usurio como o conforto, sade, ambiente de trabalho ou ergonomia do equipamento

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    a ser utilizado. Analisar esses fatores tarefa bastante complexa pois eles no so independentes, interagem fortemente uns com os outros.

    Outro ponto que em muito aumenta a complexidade da anlise dos fatores ligados ao usurio, que eles no so homogneos em termos de requisitos e caractersticas pessoais. Humanos compartilham muitas caractersticas fsicas e psicolgicas, mas so bastante heterogneos em termos de qualidades como habilidades cognitivas e motivao. Essas diferenas individuais tm importncia fundamental no design da interface de um sistema computacional.

    FATORES ORGANIZACIONAIS TREINAMENTO, POLTICAS,

    ORGANIZAO DO TRABALHO, ETC.

    FATORES AMBIENTAIS BARULHO, AQUECIMENTO,

    VENTILAO, LUMINOSIDADE, ETC.

    SADE E SEGURANA

    estresse, dores de cabea, perturbaes

    musculares, etc.

    capacidades e processos cognitivos

    O USURIO motivao, satisfao,

    personalidade, experincia, etc.

    CONFORTO posio fsica, layout do equipamento, etc.

    INTERFACE DO USURIO dispositivos de entrada e sada, estrutura do dilogo, uso de cores, cones,

    comandos, grficos, linguagem natural, 3-D, materiais de suporte ao usurio, multimdia, etc.

    TAREFA fcil, complexa, nova,

    alocao de tarefas, repetitiva, monitoramento, habilidades, componentes, etc.

    RESTRIES custos, oramentos, equipe,

    equipamento, estrutura do local de trabalho, etc. FUNCIONALIDADE DO SISTEMA hardware, software, aplicao

    PRODUTIVIDADE aumento da qualidade, diminuio de custos, diminuio de erros,

    diminuio de trabalho, diminuio do tempo de produo, aumento da criatividade , oportunidades para idias criativas em direo a novos

    produtos, etc. TABELA 1.2 - FATORES EM IHC (ADAPTADO DE PREECE, 1994, P.31)

    Voltemos ao exemplo dos carros, considerando agora os bancos. Se todos tivessem o mesmo formato, nenhuma dificuldade haveria para o designer projetar sempre o banco ideal. Comparado com diferenas psicolgias, as diferenas fsicas podem ser

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    consideradas triviais de lidar. Um modo de tratar essa diversidade projetar sistemas flexveis que possam ser "customizados" de forma a se adequar s necessidades individuais. Isto, de certa forma, est sendo feito no design dos bancos nos carros atuais, onde um bom nmero de modos para ajuste so disponveis. Tambm, sistemas computacionais, como editores de texto por exemplo, oferecem atualmente uma srie de opes para se adequar experincia e preferncia de usurios. Portanto, na anlise dos fatores humanos envolvidos em IHC diversas disciplinas so necessrias(Figura 1.10).

    FIGURA 1.10 - DISCIPLINAS QUE CONTRIBUEM EM IHC (ADAPTADO DE PREECE, 1994, P. 38) Temos as principais: Psicologia Cognitiva, Psicologia Social e Organizacional, Ergonomia (termo europeu) ou Fatores Humanos (termo americano) e a Cincia da Computao. Outras reas de estudo que tem tido uma crescente influncia em IHC incluem: Inteligncia Artificial, Lingustica, Psicologia, Filosofia, Sociologia, Antropologia, Engenharia e Design. CINCIA DA COMPUTAO contribui provendo conhecimento sobre as possibilidades da tecnologia e oferecendo idias sobre como explorar todo o seu potencial. Tambm os profissionais de computao tm se preocupado em desenvolver ferramentas de software auxiliares ao design, implementao e manuteno de sistemas: linguagens de programao, ferramentas de prototipao, sistemas de gerenciamento de interfaces de usurio (UIMS), ambientes de design de interfaces de usurio (UIDE), ferramentas de debugging e teste, etc. Alguns esforos tm sido feitos no sentido de prover mtodos rigorosos de analisar a forma como IHC projetada e incorporada em sistemas, que incluem arquiteturas de sistemas, abstraes e notaes. Conceitos de reuso e de engenharia reversa tambm so utilizados em IHC. Em particular, tem havido a preocupao de prover meios para que designers iniciantes possam reusar trabalhos de colegas mais experientes, como bibliotecas de cdigo, por exemplo. Os sofisticados sistemas grficos usados em visualizao e em realidade virtual tambm so resultados da cincia da computao.

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    PSICOLOGIA COGNITIVA. A preocupao principal da Psicologia entender o comportamento humano e os processos mentais subjacentes. A Psicologia Cognitiva adotou a noo de processamento de informao como modelo para o comportamento humano e tenta colocar tudo que vemos, sentimos, tocamos, cheiramos, etc. , em termos desse modelo. Como poder ser visto no Captulo 2, importantes tpicos de IHC so o estudo da percepo, ateno, memria, aprendizagem, soluo de problemas, etc. O objetivo da Psicologia Cognitiva tem sido o de caracterizar esses processos em termos de suas capacidades e limitaes. Por exemplo, uma das principais preocupaes da rea nos anos 60 e 70 era identificar a quantidade de informao que podia ser processada e lembrada de uma s vez. Recentemente, existe a preocupao em caracterizar o modo como as pessoas trabalham entre si e com vrios artefatos, entre eles o computador. Um dos principais resultados desses estudos a cognio distribuda. Psiclogos cognitivistas tm se preocupado em aplicar princpios psicolgicos em IHC usando uma variedade de mtodos: desenvolvimento de guidelines, uso de modelos para predizer a performance humana no uso de computadores, mtodos empricos para testar sistemas computacionais, etc. PSICOLOGIA SOCIAL tem como preocupao estudar a natureza e causas do comportamento humano no contexto social. Pode-se resumir as preocupaes bsicas da Psicologia Social em quatro pontos (Vaske e Grantam, 1990):

    a influncia de um indivduo nas atitudes e comportamentos de outra pessoa impacto de um grupo sobre o comportamento e as atitudes de seus membros impacto de um membro nas atividades e estrutura de um grupo relacionamento entre estrutura e atividades de diferentes grupos

    E a tecnologia desempenha um papel importante em todos esses aspectos. A PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL d aos designers o conhecimento sobre estruturas organizacionais e sociais e sobre como a introduo de computadores influencia prticas de trabalho. Em grandes organizaes, por exemplo, o computador serve tanto como meio de comunicao, quanto para fazer a folha de pagamento e contabilidade em geral, para controlar entrada e sada de pessoas, etc. Isso envolve entender a estrutura e funcionamento de organizaes em termos de autoridade e poder, tamanho e complexidade, eficincia, fluxo de informao, tecnologia, prticas de trabalho, ambiente de trabalho e contexto social. Modelos de mudanas organizacionais com a incluso da tecnologia so bastante teis a esse entendimento. FATORES HUMANOS, OU ERGONOMIA, teve um grande desenvolvimento a partir da segunda grande guerra, atendendo a demanda de diversas disciplinas. Seu objetivo conceber e fazer o design de diversas ferramentas e artefatos para diferentes ambientes de trabalho, domsticos e de diverso, adequados s capacidades e necessidades de usurios. O objetivo maximizar a segurana, eficincia e confiabilidade da performance do usurio, tornando as tarefas mais fceis e aumentando os sentimentos de conforto e satisfao. As primeiras contribuies dos

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    especialistas em fatores humanos para IHC foram no design do hardware (teclados mais ergonmicos, posies do vdeo, etc.) e nos aspectos de software que poderiam resultar em efeitos fisiolgicos adversos nos humanos, como a forma da apresentao de informao na tela do vdeo. LINGSTICA

    o estudo cientfico da linguagem (Lyons, 1970). Muita ateno tem sido dada atualmente aos resultados da lingstica como fontes de conhecimento importantes para IHC. O uso imediato e mais tradicional o de explorar a estrutura da linguagem natural na concepo de interfaces, principalmente para facilitar o acesso e consulta a bases de dados. Tambm na concepo de linguagens de programao mais fceis de serem aprendidas resultados da lingstica esto presentes (por exemplo, na linguagem de programao Logo, voltada para a Educao). Estudos derivados, que consideram o estudo da linguagem enquanto forma de comunicao, no apenas textual, tm tido muita relevncia hoje em dia em IHC (Semitica e Engenharia Semitica, que sero tratadas no Captulo 3, so um exemplo). Tambm na internacionalizao de interfaces e localizao de software a lingstica tem tido um papel cada vez mais importante. Internacionalizao a preocupao em isolar os fatores culturais de um produto (por exemplo, textos, cones, datas etc.) de outros que podem ser considerados genricos culturalmente. Localizao exatamente o processo de colocar os aspectos culturais em um produto previamente internacionalizado (Russo e Boor, 1993). INTELIGNCIA ARTIFICIAL (IA) um ramo da cincia da computao cujo objetivo desenvolver sistemas computacionais que exibam caractersticas que ns associamos com inteligncia no comportamento humano. A preocupao central com o desenvolvimento de estruturas de representao do conhecimento que so utilizadas pelo ser humano no processo de soluo de problemas. Mtodos e tcnicas de IA, tais como o uso de regras de produo, tm sido usados por IHC no desenvolvimento de sistemas especialistas e tutores com interfaces inteligentes. IA tambm se relaciona com IHC no processo de interao dos usurios com interfaces inteligentes no sentido do uso de linguagem natural (textual e falada), na necessidade do sistema ter que justificar uma recomendao, nos sistemas de ajuda contextualizados e que efetivamente atendam s necessidades dos usurios, etc. Atualmente, grande nfase tem sido dada no desenvolvimento de agentes de interfaces inteligentes, que auxiliam os usurios na navegao, busca de informao, organizao da informao, etc. O objetivo no uso desses agentes o de reduzir a sobrecarga cognitiva que muitos usurios tm atualmente ao lidar com a quantidade de informao apresentada, na maioria das vezes, de forma hipertextual. FILOSOFIA, SOCIOLOGIA E ANTROPOLOGIA

    so, das disciplinas que contribuem com IHC, as tradicionalmente denominadas soft sciences (Preece, 1994). Com isso, se est querendo dizer que elas no esto diretamente envolvidas com o design real de um sistema computacional do mesmo modo que as hard sciences que oferecem mtodos, tcnicas e implementaes. Elas esto mais diretamente envolvidas com os

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    desenvolvimentos da tecnologia de informao e com a transferncia de tecnologia. Isso na verdade vem mudando, pois atualmente mtodos da Sociologia e Antropologia tm sido aplicados no design e avaliao de sistemas. Uma dessas tcnicas a etno-metodologia onde a premissa bsica no assumir um modelo a priori do que vai acontecer quando as pessoas usam o computador, ao invs disso, analisar o comportamento na observao do que acontece durante o uso em seu contexto real de uso. Portanto, a nfase em entender o que acontece quando as pessoas se comunicam entre si ou com as mquinas, enquanto e depois que isso acontece, e no modelar e predizer de antemo como o faz a Psicologia Cognitiva. A razo da aplicao desses mtodos na anlise de IHC a de que uma descrio mais precisa da interao entre usurios, seu trabalho, a tecnologia em uso e no ambiente real de uso precisa ser obtida. Trabalho cooperativo auxiliado pelo computador (CSCW) o qual objetiva prover ferramentas de software que possibilitem a execuo cooperativa (compartilhando software e hardware) de tarefas uma rea de aplicao e desenvolvimento que depende diretamente do resultado dessa descrio.

    ENGENHARIA

    uma cincia aplicada direcionada construo e testes empricos de modelos. Basicamente, a Engenharia usa os resultados da cincia em geral na produo de artefatos. Na maioria dos aspectos, a grande influncia da engenharia em IHC tem sido via Engenharia de Software.

    DESIGN tem oferecido a IHC conhecimento mais que evidente, como por exemplo na rea de design grfico. Muitos autores, afirmam que o envolvimento e o crescente interesse de designers grficos no projeto de telas de sistemas computacionais consolidou IHC como uma rea de estudo. O processo de design de IHC tambm foi influenciado pela prtica de design grfico. Por exemplo, a prtica de gerar diversas alternativas para serem avaliadas em sesses de brainstorming entre colegas logo no incio de um projeto tem sido adotada atualmente por um grande nmero de designers de interfaces. Com o advento da WEB, como uma nova mdia de comunicao, dificilmente se tem uma equipe de desenvolvimento que no tenha um designer grfico. A contribuio dessas disciplinas em IHC certamente uma via de duas mos, ou seja, certamente IHC alterou tambm a prtica em cada uma dessas disciplinas. Por exemplo, hoje em dia no existe engenheiro ou designer que no faa uso de ferramentas de design tanto para produzir projetos arquitetnicos ou mecnicos quanto para fazer o projeto de uma nova cadeira. E de modo mais geral, em todas essas reas, ferramentas de visualizao, busca, compilao, anlise de informao tm sido geradas e amplamente utilizadas.

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    PRINCPIOS DE DESIGN Se pensamos na complexidade da maioria dos sistemas computacionais, vemos que o potencial de se ter uma precria IHC bastante alto. Da alguns autores definirem prncipios bsicos que ajudem a garantir uma boa IHC. PARTINDO DOS OBJETOS QUE NOS CERCAM Norman (1988), partindo da experincia de observar e vivenciar as frustaes que as pessoas experimentam com objetos do cotidiano que no conseguem saber como usar, com embalagens que parecem impossveis de serem abertas, com portas que mais parecem uma armadilha, com mquinas de lavar e secadoras que tm se tornado cada vez mais poderosas e confusas, identifica alguns princpios bsicos de um bom design, que segundo ele, constituem uma forma de Psicologia - a Psicologia de como as pessoas interagem com objetos. Os quatro princpios (visibilidade e affordances; bom modelo conceitual; bons mapeamentos e feedback), como veremos a seguir, so altamente interrelacinados e difceis de serem tratados e estudados isoladamente. Visibilidade e Affordances

    O usurio necessita ajuda. Apenas as coisas necessrias tm que estar visveis: para indicar quais as partes podem ser operadas e como, para indicar como o usurio interage com um dispositivo. Visibilidade indica o mapeamento entre aes pretendidas e as aes reais. Indica tambm distines importantes - por exemplo, diferenciar a vasilha do sal da do acar. A visibilidade do efeito das operaes indica se a operao foi feita como pretendida, como por exemplo, se as luzes foram acesas corretamente, se a temperatura de um forno foi ajustada corretamente, etc. A falta de visibilidade que torna muitos dispositivos controlados por computadores to difceis de serem operados. A ttulo de ilustrao, vamos considerar um exemplo muito simples j mencionado anteriormente, o das portas. Quantos de ns j experimentamos frustraes no uso de portas cuja funcionalidade extremamente simples - abrir e fechar, e nada mais. Muitas vezes empurramos portas que deveramos puxar, abrimos para a direita quando deveria ser para a esquerda, empurramos portas que deveriam ser deslizadas em alguma direo, que tambm muitas vezes no descobrimos qual . As partes corretas deveriam estar visveis. Designers deveriam prover sinais que claramente indicassem que uma porta deveria ser empurrada, simplesmente colocando a barra de empurrar em um dos lados da porta e nada no outro. Os pilares de suporte deveriam estar visveis e tudo isso

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    sem nenhum prejuzo da esttica to largamente procurada. A barra horizontal para empurrar e os pilares so sinais naturais e portanto naturalmente interpretados, conduzindo ao que se denomina de design natural (Norman, 1988). Outro exemplo clssico de falta de visibilidade, que tambm j mencionamos, o dos modernos telefones, com mltiplas funes e com uma interface de uso que no as deixa visveis. E um exemplo favorvel o dos carros, que oferecem uma boa visibilidade na maioria de suas inmeras funes. A mente humana extraordinria no processo de dar sentido ao mundo. Considere os objetos - livros, rdios, eletrodomsticos, mquinas de escritrio, etc. - que fazem parte de nossa vida. Objetos com um bom design so fceis de interpretar e entender. Eles contm "dicas" visveis de sua operao. Objetos com design pobre so difceis e frustantes de usar. Eles no provem indicaes ou o que muito pior, provem, muitas vezes, falsas "dicas". Affordance o termo definido para se referir s propriedades percebidas e propriedades reais de um objeto, que deveriam determinar como ele pode ser usado. Uma cadeira para sentar e tambm pode ser carregada. Vidro para dar transparncia, e aparenta fragilidade. Madeira d solidez, opacidade, suporte, e possibilidade de escavar. Botes so para girar, teclas para pressionar, tesouras para cortar, etc. Quando se tem a predominncia da affordance o usurio sabe o que fazer somente olhando, no sendo preciso figuras, rtulos ou instrues. Objetos complexos podem requerer explicaes, mas objetos simples no. Quando estes necessitam rtulos ou instrues porque o design no est bom.

    Bom modelo conceitual

    Um bom modelo conceitual permite prever o efeito de aes. Sem um bom modelo conceitual opera-se sob comando, cegamente. Efetua-se as operaes receitadas, sem saber que efeitos esperar ou, o que fazer se as coisas no derem certo. Conforme as coisas vo dando certo, aprende-se a operar. Agora, quando as coisas do errado ou quando se depara com situaes novas necessita-se de um maior entendimento, de um bom modelo. Consideremos o exemplo de uma tesoura. Mesmo que nunca tenhamos visto uma anteriormente, claro o seu limitado nmero de funes possveis. Os buracos deixam claro que algo deve ser colocado neles, e a nica coisa lgica de se colocar e que pode encaixar so os dedos. Os buracos tm affordances, que possibilitam os dedos serem inseridos. O tamanho dos buracos provem restries que limitam quais dedos podem ser usados: o buraco maior sugere diversos dedos e o menor apenas um. O mapeamento entre os buracos e os dedos ento sugerido e restringido pelos buracos. Entretanto, a operao no limitada colocao dos dedos corretos. A tesoura ir funcionar com qualquer

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    dedo. Consegue-se entender a tesoura e seu funcionamento porque suas partes so visveis e as implicaes claras. O modelo conceitual portanto claro, e at bvio, e existe um efetivo uso de affordances. Um contra exemplo, o de um relgio digital simples, com dois ou at quatro botes no mostrador. Para que servem esses botes? Como descobrir se so de puxar e empurrar e no girar? Como acertar a hora, a data? No existe um relacionamento evidente entre os controles e suas funes, nenhum mapeamento aparente. Para objetos do dia a dia, modelos conceituais podem ser bastante simples, mas quando consideramos, a complexidade de sistemas computacionais a relevncia de um bom modelo mais que bvia.

    Bons mapeamentos Mapeamento o termo tcnico para denotar o relacionamento entre duas entidades. No caso de interfaces, indica o relacionamento entre os controles e seus movimentos e os resultados no mundo. Vamos novamente recorrer ao exemplo dos carros e os mapeamentos envolvidos em dirigir um carro. Quando queremos ir para a direita, devemos virar o volante tambm para a direita (sentido horrio). O usurio identifica dois mapeamentos: o controle que afeta a direo e que o volante precisa ser virado em uma de duas direes. Ambos so arbitrrios, mas a roda e o sentido horrio so escolhas naturais: visveis, muito relacionada ao resultado esperado, e provem um feedback imediato. O mapeamento facilmente aprendido e sempre lembrado. Mapeamentos naturais, aqueles que aproveitam analogias fsicas e padres culturais, levam ao entendimento imediato. Por exemplo, comum designers utilizarem analogias especiais: para mover um objeto para cima, move-se o controle tambm para cima (Norman, 1988). Problemas de mapeamento so muitos e uma das principais causas das dificuldades que os usurios encontram no uso de objetos. Tambm retomando, consideremos os telefones. Suponha que se deseja redirecionar as ligaes de um nmero para outro. As instrues so geralmente do seguinte tipo: tecle #, em seguida o nmero 9 e finalmente o nmero para o qual deseja desviar suas chamadas. Uma descrio incompleta de um procedimento arbitrrio. O que acontece se eu errar no meio do caminho o que fao? Por que #? Por que 9? E a ausncia de feedback outro aspecto. Como sei se deu certo ou no?

    Um objeto fcil de ser usado quando existe um conjunto visvel de aes possveis, e os controles exploram mapeamentos naturais. O princpio simples mas raramente incorporado aos design.

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    Feedback

    Retornar ao usurio informao sobre as aes que foram feitas, quais os resultados obtidos, um conceito conhecido da teoria da informao e controle. Imagine falar com uma pessoa sem ouvir sua prpria voz (a famosa ausncia de "retorno" que os msicos tanto reclamam nos palcos), ou desenhar com um lpis que no risca, ou seja, sem nenhum feedback. Acreditamos no ser necessrio retomar os exemplos clssicos j amplamente discutidos: carros (bom feedback) e telefones (nenhum feedback para algumas funes mais avanadas). Exemplificando com interfaces computacionais, quantos de ns mandamos imprimir documentos em impressoras de rede e sempre nos deparamos com problemas clssicos: qual foi mesmo a impressora? a impresso j terminou ou no? o documento foi mesmo impresso ou houve algum problema? acabou o papel da impressora (que est em outra sala muitas vezes bem distante) antes do trmino da impresso?

    Um aspecto interessante e que pode ser depreendido desses exemplos que mencionamos o que Norman (1988) chama de paradoxo da tecnologia. A tecnologia oferece potencial para tornar nossa vida mais simples e agradvel, e cada nova tecnologia traz mais benefcios. E ao mesmo tempo adiciona tamanha complexidade que faz aumentar nossa dificuldade e frustao. O relgio um bom exemplo disso. Ningum tinha problemas com os clssicos relgios cuja nica funo era marcar as horas e com um nico boto conseguiamos fazer todos os ajustes necessrios. Os relgios digitais atuais ampliaram em muito as funcionalidades bsicas: eles marcam data, do alarme, so cronmetros, mostram hora no mundo todo e os mais modernos mostram inclusive o horrio mundial da WEB. Mas adicionar todas essas funes causa problemas. Como fazer o design de um relgio com tantas funes e ao mesmo tempo limitar seu tamanho, custo e complexidade de uso? Quantos botes deveriam ter os relgios para torn-los fceis de aprender e operar? No existem respostas simples. Sempre que o nmero de funes excede o nmero de controles, o design torna-se arbitrrio e no natural, e complicado. A mesma tecnologia que simplifica a vida provendo um maior nmero de funcionalidades em um objeto, tambm a complica tornando muito mais difcil aprender, e usar. Esse o paradoxo da tecnologia e o grande desafio dos designers minimizar esses efeitos. USABILIDADE DE SISTEMAS COMPUTACIONAIS Nielsen (1993) j mais direcionado para sistemas computacionais explora o design e prope princpios que levem a um aumento da usabilidade, que como vimos um dos critrios que definem a aceitabilidade de um sistema (Figura 1.9). Nielsen explicita seus princpios de design a partir de alguns slogans, que ele define como slogans de usabilidade. A seguir apresentamos alguns deles:

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    Sua melhor tentativa no boa o suficiente

    impossvel fazer o design de uma interface tima simplesmente baseado em nossas melhores idias. Usurios tem um potencial infinito para mal interpretar elementos de interface e para fazer suas tarefas de modo diferente do que imaginamos. Portanto, o design sempre melhor se trabalhamos baseados no entendimento do usurio e de suas tarefas. Sempre temos que nos preocupar em validar ou avaliar nossos design usando as diferentes formas de avaliao existentes (o Captulo 4 trata especificamente de avaliao de interfaces) e estar abertos para efetuar um redesign a partir dos resultados dessas avaliaes.

    Usurio est sempre certo A atitude do designer quando verifica que o usurio tem problemas de interao com um determinado aspecto da interface, no deve ser a de julgar que o usurio ignorante ou ento, que ele no tentou o suficiente ou ainda, deixar passar que um dia o usurio aprende. Por exemplo, quando escrevemos um determinado procedimento de operao e verificamos que o usurio sempre erra em uma determinada parte do procedimento, certamente a soluo no colocar um aviso em destaque do tipo LEIA CUIDADOSAMENTE ESSE TRECHO. O que deve ser feito aceitar que o texto est mal escrito e que precisa ser reformulado. Portanto, o designer de interfaces deve adquirir uma certa humildade e aceitar a necessidade de modificar uma "grande idia" de forma a resolver problemas dos usurios.

    Usurio no est sempre certo Tambm no se deve ir ao extremo de construir uma interface somente a partir do que os usurios gostariam. Usurios freqentemente no sabem o que bom para eles. Qualquer um de ns teria dificuldades em prever como gostaramos de interagir com um sistema em potencial com o qual no temos nenhuma experincia. Temos a tendncia de rejeitar a priori qualquer grande inovao em objetos com os quais estamos familiarizados e que atendem satisfatoriamente nossas necessidades.

    Usurios no so designers Uma soluo simples para atender a diversidade de usurios seria a de prover interfaces flexveis que pudessem ser amplamente customizadas e a cada usurio teria exatamente a interface que melhor lhe satisfizesse (anlogo aos bancos de carros modernos mencionados anteriormente). Estudos demonstram que usurios novatos no customizam suas interfaces, mesmo quando essas facilidades esto disponveis (Jorgensen e Sauer, 1990). Mas existem alguns outros bons motivos para no se dar customizao uma importncia indevida: primeiro, customizao fcil somente se puder produzir um design coerente a partir do conjunto de opes disponveis; segundo, o processo de customizao

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    tambm vai exigir uma interface e portanto adiciona complexidade; terceiro, muita customizao leva a que cada usurio tenha uma interface muito diferente de outro usurio (isso dificulta, por exemplo, o pedido a ajuda entre colegas que um dos principais mtodos de help usado tanto por novatos como por especialistas (Sellen e Nicol, 1990)); e quarto, usurios nem sempre adotam as decises de design mais apropriadas.

    Designers no so usurios

    Designers so humanos e certamente usam computadores, mas so diferentes de usurios em diversos aspectos bsicos: a experincia computacional e o conhecimento dos fundamentos conceituais do design do sistema. Conseqentemente o designer olha uma determinada tela ou uma determinada mensagem e acredita que so perfeitamente claras e adequadas, mesmo que sejam incompreensveis para quem no conhece o sistema. Conhecer sobre um sistema uma via de mo nica, impossvel voltar e fazer o papel de um novato.

    Menos mais (less is more)

    Uma das frequentes solues de design que tm sido adotadas colocar no sistema todas as opes e caractersticas imaginveis, pois se tudo est disponvel ento todos ficaro satisfeitos. Essa tendncia verificada nos softwares, como editores de texto por exemplo, que a cada nova verso tem dobrado de tamanho gerando o fenmeno denominado 'fatware' (Perratore et al, 1993). Cada elemento em uma interface acarreta uma sobrecarga ao usurio que tem que considerar se o usa ou no. Ter poucas opes, as necessrias tarefa, geralmente significa uma melhor usabilidade, pois o usurio pode se concentrar em entender essas poucas opes.

    Help no ajuda (help doesnt)

    Muitas vezes, seno na maioria delas, vemos usurios perdidos tentando encontrar informao na enorme quantidade de material de help que acompanha um sistema, e quando a encontra no consegue entend-la. Tambm, a existncia de helps acrescenta mais complexidade interface e na maioria das vezes sem grande efetividade. Em qualquer situao, deve-se ter claro que a existncia de um help no pode ser usada como desculpa para um design ruim. Sempre melhor o usurio poder operar um sistema sem ter que usar um help e o design deve usar isso como um requisito bsico.

    Usabilidade definida em funo de mltiplos componentes e tradicionalmente associada com cinco atributos de usabilidade (Nielsen, 1993): Facilidade de aprendizagem (learnability)

    O sistema precisa ser fcil de aprender de forma que o usurio possa rapidamente comear a interagir. Segundo Nielsen, o mais importante atributo de usabilidade, por ser a primeira experincia que qualquer usurio tem com um

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    sistema. Certamente existem sistemas para aplicaes altamente especializadas e complexas onde se prev um extenso trabalho de treinamento em seu uso, mas na maioria dos casos um sistema deve ser fcil de aprender. Quando se analisa a facilidade de aprendizagem, preciso ter em mente que geralmente o usurio no aprende toda uma interface antes de comear a us-la. Pelo contrrio, o aprendizado ocorre do uso. Portanto, esse fator avaliado em funo do tempo que o usurio demora para atingir um suficiente grau de proficincia na execuo de suas tarefas.

    Eficincia O sistema precisa ser eficiente no uso, de forma que uma vez aprendido o usurio tenha um elevado nvel de produtividade. Portanto, eficincia refere-se a usurios experientes, aps um certo tempo de uso. Um modo tpico de avaliar esse atributo definir de alguma forma o que significa um usurio experiente e avaliar um grupo desses executando tarefas tpicas de um sistema.

    Facilidade de relembrar (memorability) O sistema precisa ser facilmente relembrado, de forma que o usurio ao voltar a us-lo depois de um certo tempo no tenha novamente que aprend-lo. Esse atributo tanto se refere a usurios casuais (que uma categoria com um nmero grande de usurios na maioria dos sistemas) como para aqueles sistemas utilitrios que so inerentemente usados em periodos especficos como os sistemas para confeco de relatrios de atividades trienais, de imposto de renda, etc. Certamente, aumentar a facilidade de aprendizagem tambm torna a interface mais fcil de ser relembrada, mas tipicamente usurios que retornam a um sistema so diferentes dos usurios principiantes. Raramente se avalia esse item, mas notvel a preocupao com ele nas modernas interfaces grficas onde tudo que for possvel visvel. Usurios desses sistemas no precisam lembrar o que est disponvel, pois o sistema sempre o relembra quando necessrio.

    Erros Neste contexto, erro definido como uma ao que no leva ao resultado esperado, um "engano" portanto. O sistema precisa ter uma pequena taxa de erros, ou seja, o usurio no pode cometer muitos erros durante o seu uso e, em errando, deve ser fcil a recuperarao, sem perda de trabalho. Erros catastrficos (o usurio perder seu trabalho, no perceber que errou, etc.) no podem ocorrer.

    Satisfao subjetiva Os usurios devem gostar do sistema, ou seja, deve ser agrdvel de forma que o usurio fique satisfeito ao us-lo. Esse atributo muito relevante quando se

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    considera sistemas usados fora do ambiente de trabaho, tais como jogos, sistemas domsticos em geral, etc. Para esses sistemas o entretenimento e envolvimento so muitas vezes, valores mais importantes que velocidade de processamento (claro, quando esta no compromete o resultado). Nielsen (1993) ressalta que satisfao subjetiva como atributo de usabilidade diferente dos estudos que avaliam atitudes gerais das pessoas com relao a computadores. Esses estudos so efetuados no contexto da aceitabilidade social de computadores (LaLomia e Sidowski, 1991) e no como atributo de usabilidade. Entretanto, certamente os sentimentos que as pessoas tm com relao a computadores em muito afeta sua interao com um determinado sistema. Pouco se conhece sobre a relao entre atributos de um determinado sistema e a atitude geral de uma pessoa com relao a computadores. Um dado importante que usurios que percebem que tm um alto grau de controle sobre os computadores tm atitudes positivas com relao a ele (Kay, 1989). E dar controle ao usurio no das solues atuais de design mais freqentes, muito pelo contrrio. Satisfao subjetiva pode ser medida simplesmente perguntando ao usurio sobre suas opinies subjetivas. Para um nico usurio o resultado desse questionamento subjetivo, mas quando se considera muitos usurios, a mdia das respostas passa a ser uma medida objetiva. Isso o que feito na maioria dos estudos de usabilidade. Tipo de questionrios usados e formas de avaliar satisfao subjetiva so tratados no Capitulo 4.

    O que se pode depreender dos princpios de usabilidade que eles tratam basicamente de dois aspectos: a tarefa e as caractersticas individuais dos usurios. Portanto, mais uma vez, conhecer o usurio fundamental para se fazer o design de um sistema usvel. Entender os principais modos de classificar usurios ajuda a fazer um bom design que atenda a maior diversidade desses. Na anlise do usurio sua experincia um fator relevante, e essa experincia deve ser analisada em trs dimenses: com relao ao uso do sistema, com relao ao uso de computadores em geral e com relao ao domnio da aplicao. Nielsen (1993) apresenta essa diferenciao em um grfico que ele denomina de cubo do usurio (Figura 1.11). O importante ressaltar que o uso do sistema altera, e tem como um de seus objetivos, a categoria do usurio (um novato no um eterno novato) e isso tem importantes implicaes no design. Algumas interfaces so e devem ser projetadas com nfase apenas em novatos - sistemas de informao sobre museus ou quiosques em parques e exposies, sistemas que necessariamente so alterados anualmente, etc. - que so categorias de sistemas onde a facilidade de aprendizagem o requisito mestre. Mas a maioria das interfaces projetada tendo em vista tanto os expertos como os novatos e portanto precisa acomodar ambos os estilos (no esquecendo que

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    novatos so futuros especialistas). Freqentemente, interfaces que so boas para novatos tambm o so para especialistas, mas sempre possvel prover mltiplos estilos de interao, de tal forma que os usurios iniciem aprendendo um estilo mais fcil e depois migrem para outro mais eficiente.

    FIGURA 1.11 - TRS DIMENSES DAS DIFERENTES EXPERINCIAS DE USURIOS (ADAPTADO DE NIELSEN, 1993, P.44)

    Um modo tpico de permitir essa evoluo natural do aprendizado inicial para um uso mais eficiente o uso de aceleradores na interface. Aceleradores so elementos de interface que permitem que usurios realizem tarefas freqentes de forma mais rpida. Exemplos so as teclas de funo, abreviao de nome de comandos, uso de duplo-clique para ativar objetos, etc. Muitos sistemas tambm provem dois conjuntos de menu, os menus curtos para novatos e os longos para usurios mais experientes. Isto permite ao sistema oferecer um maior conjunto de opes para os usurios mais avanados sem confundir os principiantes. Importante estar ciente de que ter ambos os estilos de interao aumenta a complexidade da interface e pode vir a ser um problema. Portanto importante, fazer o design da interface de tal modo que o principiante no esteja exposto ao modo especialista. Por exemplo, sistemas que possibilitam o uso de comandos em sua forma abreviada devem ser cuidadosos no sentido de prover tambm a forma extensa em mensagens de erro e helps, por exemplo. A experincia com computadores tambm tem um impacto no design da interface. Usurios experientes em um amplo conjunto de aplicaes tm mais idia de que caractersticas procurar e de como o computador normalmente trata vrias situaes. Especificamente, usurios com experincia em programao so aptos a usar as macro-linguagens e outros meios mais complexos de combinar comandos em aplicaes simples, no orientadas a programao, como editores de texto, por exemplo.

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    Finalmente, a terceira dimenso que a experincia no domnio da tarefa tem importncia fundamental. Interfaces projetadas para especialistas podem fazer uso de terminologia e jargo especfico de uma rea de especialidade. Usurios com pouca experincia tero que ter mais explicao sobre o que o sistema faz e sobre o que as diferentes opes significam, e a terminologia usada no pode ser to abreviada e densa quanto a dirigida para especialistas. Por exemplo, consideremos um sistema auxiliar a escolha de investimentos financeiros. Caso o sistema seja dirigido a no especialistas muito cuidado deve ser tomado dada a complexidade do domnio e a especificidade de sua terminologia. Poucos de ns sabe diferenciar, por exemplo, uma ao ordinria de uma preferencial, no mercado de aplicao em aes. Diferenas entre usurios tem outras dimenses alm da experincia. Alguns fatores so fceis de serem verificados, como a idade (Czaja, 1988) e sexo (Fowler e Murray, 1987). Outros so menos bvios como diferenas em habilidades de raciocnio (Gomez et al, 1986), estilos de aprendizagem (Sein e Bostron, 1989), etc. Diferenas culturais tambm so extremamente relevantes e sero tratadas quando discutirmos interfaces internacionais. Parece complexo, e realmente o , obter timos graus de usabilidade em todos os atributos simultaneamente. Compromissos so inerentes ao processo de design. Por exemplo, o desejo de evitar erros catastrficos pode levar a se ter uma interface menos eficiente de usar, no estilo das interfaces que a cada ao solicita ao usurio a confirmao e a re-confirmao antes da ao ser executada. Ento, importante estabelecer os objetivos de usabilidade a serem atingidos, quais os atributos a serem priorizados e isso definido pelo contexto especfico ao qual dirigido um projeto. Em aplicaes de escritrio, domsticas e de entretenimento - processadores de texto, jogos, softwares educacionais, etc. - facilidade de aprendizagem, baixa taxa de erros e satisfao subjetiva so fundamentais e devem ser maximizados. A escolha das funcionalidades adequadas nesse tipo de sistemas muito difcil, pois toda gama de usurios deve ser alvo e certamente mais que desejvel uma evoluo agradvel do nvel principiante para o especialista. Sistemas crticos - controle de trfego areo, reatores nucleares, operaes militares, etc. - so sistemas de alto custo onde espera-se alta confiabilidade e efetividade. Tambm so sistemas altamente complexos onde um treinamento aceitvel de forma a obter rapidamente ausncia de erro, mesmo sob estresse. Satisfao subjetiva menos valorizada pois os usurios so bem motivados. E como so sistemas de uso freqente a memorizao naturalmente obtida. Eficincia portanto o atributo base do design de sistemas dessa categoria. Sistemas de uso comercial e industrial - banco, seguros, reserva area, aluguel de carros, gerenciamento de carto de crdito, etc. - que so de uso amplo, exigem um elevado custo de treinamento. Ento facilidade de aprendizagem fundamental de

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    forma a se ter performance rpida para muitos a custos razoveis. Satisfao subjetiva tem importncia modesta pois os usurios so motivados ao uso e a memorizao obtida a partir do uso freqente. Os sistemas exploratrios, cooperativos e criativos - enciclopdias eletrnicas, escrita cooperativa, tomada de deciso, simulao cientfica, sistemas para composio musical, diagnstico mdico, auxiliares de projetos de arquitetura, etc. - so sistemas geralmente direcionados a usurios peritos no domnio da tarefa, mas no experientes com computadores. So usurios altamente motivados e a preocupao central do design a de deixar o computador transparente de forma a que o usurio somente se preocupe com a tarefa. Ento, baixa taxa de erros e facilidade de aprendizagem devem ser os atributos mais relevantes. Certamente, no podemos nos esquecer que existem outras consideraes que no a usabilidade que levam a design que viola princpios de usabilidade. Por exemplo, consideraes quanto a segurana freqentemente requerem acesso a controles que no "passam" em nenhuma avaliao de usabilidade. Certamente, mensagens de erro construtivas so difceis em resposta a senhas erradas. Outros sistemas, tm funes escondidas do usurio comum, como por exemplo, funes especias de boot ou de utilizao apenas pela administrao do sistema, por exemplo. USABILIDADE NA WEB Dados disponveis apontam que em 1998 cerca de trs bilhes de dlares deixaram de ser ganhos na WEB norte-americana por causa de design mal feito de pginas, que dificultava a compra em vez de facilitar. Essa estimativa d conta de um debate que ganha cada vez mais espao: como equilibrar o uso de recursos visuais capazes de atrair a ateno do usurio e ao mesmo tempo tornar os sites fceis de entender e usar? A questo pode ser parafraseada: Como fazer uso da tecnologia disponvel e ao mesmo tempo aumentar a usabilidade de sites da Web? Com cerca de 10 milhes de sites na Web em Janeiro de 2000 (com a previso de cerca de 25 milhes at o final do ano e 100 milhes em 2002), usurios tm mais escolhas que nunca. Por que ento eles iriam gastar seu tempo em algo que confuso, lento, e que no satisfaz suas necessidades? Como dissemos no incio deste captulo, o nmero de pessoas que usa a Internet est crescendo sem parar. O crescimento trouxe mudanas no perfil do usurio. No comeo predominavam os especialistas e agora predominam os novatos, que mal sabem ligar o computador e que algumas vezes tem rejeio a ele. Assim, deslumbrar-se com a tecnologia no tem mais razo de ser. Com a enorme oferta de alternativas, usurios da Web tem uma notvel impacincia e insistncia em

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    gratificao imediata. Se no conseguem entender como usar um Website em poucos minutos, eles concluem que no vale a pena perder seu tempo. E ento o abandonam. Usabilidade assumiu uma importncia na economia da Internet como nunca teve antes (Nielsen, 1999). No desenvolvimento tradicional de produtos, usurios no experimentam a usabilidade do produto at que o tenham comprado. Por exemplo, somente quando se compra um VCR que se descobre, o que bastante comum, o quanto difcil program-lo. Mas isso no importa mais para o fabricante, em um primeiro momento, pois a compra j foi faturada. A indstria de software j tem um pouco mais de preocupao com a usabilidade de seus produtos, dado o suporte que preciso ser dado ao usurio e que tem um custo altamente significativo no produto. A Web reverteu esse cenrio. Agora o usurio experimenta a usabilidade de um site antes de se comprometer a us-lo e antes de ter gasto qualquer dinheiro com potenciais compras e a equao bastante simples: no design de produtos e de softwares tradicionais, usurios pagam antes e

    experimentam a usabilidade depois na Web usurios experimentam a usabilidade antes e pagam depois. Portanto, clara a extrema importncia da usabilidade no design para a Web. Um exemplo muito citado o da IBM dos Estados Unidos (Figura 1.12). A empresa constatou que o recurso mais popular em seu site era a funo de busca, porque as pessoas no conseguiam descobrir como navegar, e o segundo mais popular era o boto de ajuda. A soluo foi um amplo processo de redesign, envolvendo centenas de pessoas e milhes de dlares. Resultado: na primeira semana depois do redesign, em fevereiro de 1999, o uso do boto de ajuda caiu 84% enquanto as vendas aumentaram 400%.

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    FIGURA 1.12 PGINAS DO SITE DA IBM AMERICANA

    Outro exemplo, tambm bastante conhecido, o site da Amazon Books (Figura 1.13). No incio ele era exuberante, mas ultimamente ele tem mudado muito, perdendo os "fogos de artifcio" em favor da funcionalidade e rapidez e, principalmente, do relacionamento com o usurio.