Livro - Influenza

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Fanfic de Twilight

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BNUS TRS: DESVARIOS| 39

Twilights FanficFanfiction.NET publicationCannon Edward Cullen

Influenzapor Lisa Black

Romance Drama Histrico Heterossexualidade Sobrenatural

"Nos tempos antigos, a enfermidade foi atribuda aos deuses, devido influncia que se pensava que eles exerciam sobre a humanidade. Naquele setembro de 1918, eu cheguei a acreditar que Deus estava punindo os homens pelas suas atitudes vis e egostas na busca pelo poder, lanando sobre o mundo o que provavelmente seria a pior pandemia conhecida pela histria. Para mim, aquela era a nica explicao plausvel para o que designaram ser a Influenza Espanhola; mesmo que eu constantemente me questionasse se era um real merecedor dela ao contra-la".

Copyright 2008 Lisa BlackEditores: Lazy Liesel1 edio em janeiro de 2008

CIP-BRASIL: CATALOGAO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ_______________________________________________________________________________________________________________BLACK, Lisa, 1987-Influenza / Lisa Black 1ed. Rio de Janeiro: Fanfiction.NET, 2008. 172p.ISBN 625306. 40337161. Livros e leitura Fico. 2. Influenza Histrico - Sobrenatural 2012-2013 Fico. 3. Twilight, 2007-2011 Fanfiction. 4. Fico brasileira._______________________________________________________________________________________________________________

[2008]Fanfiction.NETwww.fanfiction.netSumrio

Prlogo4A Famlia Masen5O Escritrio10O Indcio14O Outono Sombrio20A Influenza23O Renascer27Eplogo36

Bem, esse o meu presente para a Dressa, minha amiga secreta da Seo JL do frum 3V, e eu espero imensamente que ela goste dele!!! (e vocs tambm, claro. XD).Enfim, Twilight no me pertence, pertence Stephenie Meyer e Summit Entretainment. Ento, apesar de sentir uma vontade imensa de roubar os Cullen para mim, no posso fazer isso...T.T L.B.

Prlogo

Comeou com a cabea explodindo de dor e os olhos ardendo como fogo em brasa. Depois vieram a inapetncia, a parca sensao de prostrao e, por fim, os calafrios; eu tentava me aquecer, mas no havia manta nem cobertor que os parasse. Eu no conseguia mais dormir, agonizando em meio a delrios e pesadelos medida que a febre aumentava. A dor consumia o meu corpo e, em raros estados de semi-conscincia, minha mente gritava: voc vai morrer, Edward Masen.Era a Influenza Espanhola, eu sabia. E aquilo era pior do que morrer na guerra.

Essa denominao Influenza Espanhola ou Gripe Espanhola partiu do pressuposto de que a molstia havia se originado na Espanha e/ou l fizera o maior nmero de vtimas; outros dizem que recebeu esse nome porque a Espanha foi o primeiro pas a noticiar que em vrios lugares havia civis morrendo por conta dessa doena. Mas cincia controversa a respeito do assunto e h quem diga que ela se originou em campos de treinamento militar no interior dos Estados Unidos e se propagou na Europa, quando os soldados americanos partiram para l.11

CAPTULO TRS: REGRAS| 13

CAPTULO IA Famlia Masen

A msica era a nica capaz de me acalentar quando tudo parecia difcil de ser suportado. A cada acorde executado, eu vertia de mim todo o fluxo de pensamentos que me corroia por dentro e me sentia um pouco mais liberto dos grilhes nos quais acorrentava a minha prpria alma. E, naqueles tempos taciturnos, eu passava a maior parte do meu tempo livre tocando. Harmonizava dores e tristezas; alegrias, amores e pesares. E mais dores. As que eram minhas, e as que no eram. Principalmente, as dores dela.E naquela tarde sombria de agosto, eu vertia o silncio de suas palavras.

Os meus dedos corriam suaves pelas teclas do piano; o tom da melodia que delas retirava era lgubre. Uma sucesso rtmica de sons que eu no saberia tocar de modo anlogo se desejasse produzi-la novamente. Aquela no era uma composio, eram sentimentos. Toda a carga de sentimentos que provinha dos pensamentos dela naquele momento transformada em msica.A maioridade civil passava a ser de 18 anos; o alistamento militar era obrigatrio e Edward j possua 17 anos.Eu podia ver, mesmo estando de olhos fechados, todas as linhas de aflio que ela buscava ocultar de mim em seu rosto.Meu puro e corts Edward, tendo que portar armas e matar pessoas por uma causa que no era dele.Eu sentia o medo e a angstia dela ao pensar que eu teria que macular minhas mos com sangue de semelhantes por causa da guerra.Em algum lugar da Europa, civis e militares morriam. E em menos de um ano, meu filho pode ser um deles.Eu podia imaginar meu corpo mutilado, em estgio de decomposio, em algum campo de batalha. Meu tmulo em Chicago seria meramente simblico e eu seria enterrado em solo europeu, junto centena de outros homens. Meus pais talvez recebessem mritos pela minha morte honrada, em defesa dos interesses da ptria.As teclas afundaram de modo rspido com o peso das minhas mos e um unssono grave e desacorde ecoou pelo recinto. Eu abri os olhos e inspirei fundo, retirando meus dedos do teclado. Uma paz desvirtuada se alastrou por todo o meu exterior, dando uma vazo maior ao suplcio interno dos meus pensamentos. E a minha frente, sob o vo de entrada da sala de msica, percebi que os orbes verdes de Elisabeth Masen me estudavam atentamente."Edward",ela murmurou, to logo notou que eu tambm a observava, forando-se a esboar um sorriso pacfico, que eu no retribui.

"Meu pai j chegou?", questionei, desviando do seu olhar padecido, e mirei as teclas de marfim do piano, inexpressivo. Sabia o motivo pelo qual ela viera at ali e estava cansado de refletir sobre ele comigo mesmo. E, muito menos, desejava retrat-lo a fundo com ela por agora. Ainda tnhamos tempo at que a hora derradeira chegasse.

"No ainda, mas eu creio que ele estar conosco em breve", ela me respondeu, solcita. "Ele deve saber...", ela completou, esperando certa reciprocidade da minha parte. Eu permaneci impassvel, ainda a mirar o teclado do piano; mas eu sabia que minha me no desistiria to facilmente.Instantes depois, os passos dela ecoaram em meus ouvidos enquanto vinha at mim. Eu a aguardei, inerte, e senti suas mos delicadas pousarem em meus ombros."Querido, juntos, ns podemos pensar numa forma de...", ela comeou, num timbre meio incerto, silenciando quando notou minhas mos se sobreporem s dela. Eu observei seu rosto apurado por um breve perodo e, gentilmente, eu as retirei dos meus ombros e me ergui da cadeira em que estava sentado. Ela no se manifestou quanto minha reao. Calado, caminhei at a janela, enunciando implicitamente que no gostaria de falar sobre aquele assunto. Pus as mos no bolso e recostei a cabea no vidro da janela. Observei o comeo do entardecer na cidade, como se nada mais no mundo me fosse mais agradvel do que desfrutar daquele breve momento.

As pessoas l fora transitavam calmamente pelas ruas, passando uma tranqilidade e uma falsa idia de rotina que eu sabia que no era compartilhada entre todos. Eu procurei me focar nelas, esquecendo as minhas prprias preocupaes e as da Sra. Masen."Edward...", ela insistiu num ar meio angustiado, tornando a se aproximar de mim a passos calculados; eu senti suas mos em meus ombros mais uma vez, apertando-os fortemente. "Ns poderamos; eu sei que poderamos. Seu pai possui certa influncia e..."."No, no poderamos. A senhora sabe que no, me. Idealizar algo impossvel de ser concretizado s vai tornar a situao ainda mais difcil", eu a interrompi de forma suave, procurando traz-la de volta realidade. "E eu posso no ir para a guerra. desnecessrio ficar remoendo isso agora; no temos certeza dos fatos ainda"."E se voc for, filho?", ela retorquiu num tom rouco. "Voc no pode simplesmente pedir para que eu no me preocupe com isso. Eu no suporto sequer pensar na idia de perd-lo, Edward, voc meu nico filho. E o seu pai, como ficaria?".Eu me virei para encar-la e ela, instintivamente, recuou alguns passos para me observar melhor. Seus olhos verdes estavam vazios de desalento, mas ela ainda sustentava em si seu porte forte e altivo. Respirei fundo e retribui o seu olhar com uma expresso serena.

"Eu s no quero que sofra por antecipao, me", eu falei pausadamente, tentando amenizar um pouco da sua preocupao. "Para mim, essa guerra chegou ao limite; a Europa est devastada e eu creio que os pases envolvidos no agentaro por muito tempo. Eu no me surpreenderia se ela acabasse daqui a alguns meses; cedo ou tarde, eles entraro num acordo"."Espero que cedo" ela ressaltou num sussurro rouco, sorrindo de modo tnue para mim. Eu assenti com um meneio de cabea, voltando a olhar para a janela. Era minha esperana tambm. Podia no admitir para os outros, mas eu tambm no queria ir guerra. Receber mritos por forrar o cho de cadveres no era o que eu considerava uma atitude nobre. Matar algum, mesmo que por obedincia, no me deixava menos resignado. Aceitar isso era contrariar meus prprios princpios, mesmo tendo amor minha ptria; ao mesmo tempo em que no aceitar faria com que uma desgraa casse sobre a minha famlia e sobre mim mesmo.

Permanecemos assim por tempo indeterminado, at que minha me se afastou lentamente. Eu olhei para ela, apenas para observ-la dar as costas para mim e se retirar da sala em profundo silncio, fechando a porta atrs de si. Suspirei e voltei a dedilhar no piano, sabendo que meu comentrio no serviu em nada para diminuir a intranqilidade de minha me.Mas, naquela vez em especial, eu no cheguei a tocar por muito tempo. Cerca de meia hora depois, selei as teclas do piano e caminhei para fora do cmodo. Do corredor, eu j podia ouvir minha me a cuidar dos seus afazeres com esmero; seus ps movimentando-se graciosamente pelo piso de madeira de lei enquanto despejava ordens para os poucos criados que tnhamos. Eu sabia que a casa era para minha me o que o piano agora era para mim; ela era a sua vlvula de escape particular, e no havia como faz-la pensar de forma diferente.Respirei fundo e me enclausurei no meu quarto. Deitei na cama num gesto cansado e permaneci a fitar o teto, um tanto quanto entediado. Queria evitar encar-la para que no precisasse ver novamente em suas feies o quanto ela ainda se prostrava por causa daquela maldita notcia. Era importuno aquele comportamento dela assim como o fato de no conseguir parar de pensar sobre isso nem que eu desejasse.As horas correram morosas at que meu pai finalmente estivesse em casa. No soube ao certo se em algum momento eu cheguei a dormir, mas me mostrei insatisfeito por isso no ter ocorrido quando minha me entrou no meu quarto e disse que o jantar j ia ser servido. Cogitei a possibilidade de alegar que estava um pouco indisposto e preferia ficar deitado, mas apenas me ergui da cama e a acompanhei lentamente, contrafeito.Eu no poderia dizer que ramos uma das famlias mais ricas da cidade, mas ns vivamos financeiramente bem. Meu pai era um excelente advogado, o que fazia dele um indivduo bem prestigiado no meio jurdico local. Isso, claro, no fazia dele algum menos ocupado e era certo dizer que eu e minha me no o vamos com muita freqncia. Por isso, para os Masen, era praticamente indiscutvel o fato de que todos deveriam sentar-se mesa juntos para a realizao das refeies, excetuando momentos excepcionais (a maioria irrefutvel deles consistia num julgamento que durava um tempo maior do que necessrio e meu pai no podendo comparecer por conta disso). Eu sabia que no havia alegria maior para a Sra. Masen do que ocupar o lado esquerdo de meu pai mesa enquanto me via a sua frente; no entanto, enquanto avanava pelo corredor, peguei-me desejando que meu pai no tivesse comparecido ao jantar aquela noite, pois deduzia que o assunto recairia na reduo da maioridade novamente.Para meu alvio, meu pai sequer mencionara que gostaria de tratar sobre a questo, mas seu olhar cansado me dizia que ele procuraria saber o que eu pensava a respeito, em outra ocasio. Minha me, para minha intensa surpresa, pareceu querer respeitar o nosso mutismo e o jantar sucedeu de forma solenemente silenciosa. Mal sabamos ns que, quase um ms depois, o alistamento militar seria um dos nossos menores problemas.Afinal, de uma forma ou de outra, eu jamais chegaria aos meus 18 anos. CAPTULO IIO Escritrio

Um calor morno e uma brisa suave prenunciavam um outono singularmente agradvel aquele ano. As janelas abertas do escritrio aliviavam um pouco o calor que sentia e eu apreciei aquele leve frescor por alguns instantes enquanto ajudava meu pai a organizar alguns dos seus papis nos arquivos. Eu sabia que intimamente ele s fazia isso para que eu, assim como ele, optasse por seguir a carreira jurdica na Universidade de Chicago. No entanto, eu no tinha tanta certeza se essa era a minha verdadeira vocao. Para falar a verdade, nem sabia ao certo para o qu especificamente desejava estudar em uma faculdade.Eu gostava de tocar piano; as pessoas comentavam que eu era bom nisso. Eu estava convicto de que tocava bem o suficiente, e at compunha minhas prprias sinfonias. Talvez, quem sabe, eu pudesse seguir a carreira de msico. Talvez meu pai ficasse, no mnimo, decepcionado, eu cria. Ou talvez, quem sabe, muito provavelmente, meu pai ameaasse me deserdar se eu no tirasse aquela idia estpida da cabea.Observei o Sr. Edward Masen e ri com o pensamento. Ele apenas arqueou a sobrancelha para mim, certamente perguntando-me o que era to engraado."Ah, no, o senhor no ia querer saber...", eu mencionei num meio sorriso. "E no nada to importante assim, eu s lembrei de algo engraado".

"Algo engraado... Tambm vou acha muito engraado ver voc correndo atrs dos meus papis se deixar algum escapar pela janela...", ele murmurou, risonho. Eu entendi perfeitamente a implcita mensagem no tom zombeteiro dele e voltei a ateno para os documentos que estavam em minha mo."Eu, honestamente, no vejo necessidade do senhor guardar tantas coisas, meu pai", eu mencionei serenamente, depois de um tempo. "E como tem a estranha capacidade de desorganiz-los quase sempre".

"No so coisas, so documentos. O que significa dizer que eles so importantes para alguma coisa", ele retorquiu, sem tirar os olhos dos que estavam sobre a mesa do escritrio. Percebi, com uma careta, que ele me deixou a fazer o trabalho sozinho, mas no disse nada. "E eu no sou to organizado como voc", ele ergueu o olhar e me encarou por alguns instantes. "Espero que o senhor acabe com isso antes do jantar"."Por ano, tipos, ordem numrica e alfabtica?", questionei sem muito entusiasmo. No era a primeira vez que eu lia os processos mais antigos, quando ele me pedia para separar os casos por "assunto". Agradeo por ele ter um arquivo particularmente grande agora e me poupar de ter que ler boa parte deles novamente.Ele concordou com um murmrio e eu suspirei, voltando a organizar os tais documentos. O meu trabalho e o dele sucedeu de forma silenciosa por um longo perodo, a no ser pelo rudo de papis sendo folheados e gavetas de madeira se fechando. Em um determinado momento, meu pai soltou um longo suspiro e eu voltei o olhar para ele calmamente."Algum caso muito difcil?", perguntei de modo involuntrio, esperando que ele no achasse que eu estava muito interessado, porque eu particularmente no estava. Meu pai suspirou novamente e desviou o olhar para mim."Nem tanto... S estou um pouco cansado", ele falou, esfregando a nuca lentamente com uma das mos antes de prosseguir. "E como anda a organizao?"."No melhor o senhor descansar um pouco?", eu rebati, observando-o de forma sria. Os olhos de meu pai estavam brilhantes demais para algum em seu estado normal."No, eu j estou terminando", ele respondeu e voltou a ateno para o que fazia novamente. Eu o estudei por alguns instantes e, inspirando profundamente, prossegui no meu servio.Cerca de uma hora depois, minha me entrou no escritrio, perguntando se ns dois gostaramos de um lanche. Eu respondi que no e observei-a de soslaio, perguntando-me mentalmente se seria perceptvel para ela como foi para mim a pequena suposio de meu pai estar querendo ficar doente. Ela analisou meu pai por alguns instantes, aps ele ter respondido que tambm no queria nada, e eu vi suas expresses mudarem para uma preocupada."Edward, amor, voc est se sentindo bem?", ela questionou com o cenho franzido, aproximando-se dele calmamente. Eu vi meu pai se aprumar na cadeira e, revirando os olhos, imaginei que ele iria dizer que sim."Eu estou...", ele comeou, no tom evidentemente convincente e eu respirei fundo."Querendo ficar resfriado", eu o interrompi de modo meio entediado, folheando um processo como quem no quer nada. Eu senti o olhar de meu pai sobre mim e esperei pelo sermo iminente por t-lo interrompido, mas o comentrio da minha me foi mais gil. Suspirei, aliviado."Resfriado?", ela questionou, observando meu pai calmamente.

"No estou querendo ficar resfriado, Lizzy, s uma pequena...", ele retorquiu, teimoso."Indisposio", eu e minha me completamos, de imediato. No era a primeira vez que ele usava essa desculpa quando percebia que no estava bem e ns, assim como ele, tnhamos plena conscincia disso. "; ns sabemos", eu completei, divertido, e ns trs rimos um pouco.

"E tambm sabem que eu preciso acabar isso ainda hoje", ele argumentou depois de um tempo, agora um pouco mais srio." melhor o senhor descansar um pouco, pai; se quiser, eu posso tentar resolver para o senhor... O que quer que seja", disse, num suspiro.

"No necessrio Edward, acho que eu posso terminar amanh", ele murmurou num ar cansado, enquanto se erguia da poltrona calmamente. Ele e minha me se retiraram do escritrio, mas eu permaneci no recinto, voltando a mexer nos processos de meu pai.Aquela seria a ltima conversa que teramos. Na manh seguinte, ele seria levado para o hospital, quase inconsciente, e l morreria dias depois, sem jamais ter recobrado a conscincia novamente.CAPTULO IIIO Indcio

Andando pelas ruas de Chicago aquela tarde, eu percebi que uma atmosfera mrbida rondava a cidade. Essa sensao me perseguiu durante toda a minha caminhada, e, de certo modo, percebi que a razo estava na maneira diversa que as pessoas choravam pelos seus mortos na guerra. Havia algo maior do que canhes e armas; algo que estava oculto por uma lona branca de uma carroa que rapidamente passara por mim, poucos minutos antes.Foi perceptvel o cheiro de putrefao que dela se desprendia e eu me senti completamente nauseado. Olhei para trs e observei o veculo se afastando, levando o odor de morte para outras localidades. Antes que eu o perdesse de vista, porm, tive a impresso de ter visto um brao roxo se sobressaindo da proteo, aps uma brusca chacoalhada da carroa.Meus olhos se prenderam por alguns instantes na esquina em que o coche havia dobrado. Eu no era o nico que a observara; outros com pele assimtrica minha tambm a acompanharam com pesar; seus rostos estavam molhados por lgrimas. Alguns deles, ao me notarem ali, parado, substituram o sofrimento por dio, como se eu estivesse difamando-os por haver compartilhado aquele momento com eles. Eu no me importei com o fato de estar muito prximo a um dos bairros negros da cidade, a receber olhares de repulsa dos ex-escravos. Eles choravam por aqueles corpos arroxeados e sem vida; eu entendia a dor deles, e esperava no chorar por um dos meus, pela mesma razo.Meu pai ainda estava no hospital, inconsciente. Os mdicos no sabiam informar ao certo o que ele tinha para ns e, por preveno, no nos era permitido visit-lo. Debatemos com os mdicos sobre a proibio vrias vezes, mas eles apenas diziam que estavam dando o mximo de si para reanim-lo; porm eu sabia que, por trs, falavam uns para os outros que no havia muito a se fazer, a no ser com que a morte dele seja a menos dolorosa possvel. Isso me deixava mais frustrado e irritado do que insatisfeito, e uma aflitiva sensao de impotncia se alastrava em mim por saber que no podia fazer nada quanto ao fato.O Sr. Masen, meu pai, no era o nico caso daquela estranha doena e a imprensa j comeava a espalhar rumores de que a Influenza Espanhola havia chegado aos EUA; rumores estes que o governo constantemente procurava abafar, mas que os mdicos j comprovavam ser verdadeiros. Eu j ouvira falar coisas atrozes sobre a molstia, contudo no saberia informar se todas elas possuam algum teor de seriedade. Tudo o que tinha plena convico sobre ela fora que j causara um nmero alarmante de mortes na Europa e que, no raro os casos, levava o paciente a bito. Fora isso restava somente alguns cuidados preventivos informados pelo jornal de trs dias antes como zelar pela sua higiene; evitar aglomeraes, principalmente noite; evitar excessos fsicos e causas de resfriamento; e no fazer visitas. A matria havia falado parcialmente sobre alguns sintomas da "tal doena desconhecida", alertando que o doente, aos primeiros sintomas, deveria ser mantido em repouso e no receber visitas (no hospital ou em casa); dizia que o fato afastava as complicaes e o contgio... Para mim, isso implicitamente significava dizer "abandone o doente e espere que ele morra".Respirando fundo, voltei a caminhar e cheguei minha casa, sentindo a cabea meio pesada. O aroma de morte ainda estava impregnado em minhas narinas e meu estmago embrulhava. Eu notei que minha me no estava, e deduzi que ela ainda estivesse no hospital, tentando ter notcias sobre meu pai. Eu estive l pela manh, mas a resposta que obtive ainda era a mesma dos quatro ltimos dias.O banho que tomei relaxou o meu corpo, mas no conseguiu afastar a imagem do brao arroxeado e a lembrana daquele odor ftido da minha mente. A cabea doa de forma branda e irritante, e eu tentei me manter ocupado at que o jantar fosse servido.Eu castigava as teclas do piano com meus geis dedos, num implcito e ansioso desejo de repelir aquele insalubre silncio. Como que por um conluio sem ndole e previsibilidade, os poucos criados da casa estavam quietos. Eles no deslocavam mveis; eles no comentavam sobre o cotidiano; eles no riam ou choravam; eles nem ao menos chegaram a me incomodar, questionando sobre o estado de sade do Dr. Masen... Cheguei a pensar que nem mesmo eles tivessem alguma esperana; talvez nem mesmo eu desejasse persistir na idia de ainda t-la e me repreendia constantemente por isso.Uma chuva suave que comeou a cair ruidosamente sobre os telhados no contribuiu para melhorar o meu estado de soturnidade. Subsistiu uma desamornia manifesta entre a minha msica e a da natureza, como se fosse desejo delas que eu prezasse somente a presena da ltima.Minha cabea latejava e os pensamentos que a povoavam tornavam-se suplcios internos. Eu s desejava esquecer tudo o que acontecia, pelo menos por um momento; ansiava esquecer que aquele brao arroxeado iria pertencer a meu pai, muito em breve.Deveria me sentir culpado pela sensao torpe e prematura de luto por meu pai, como se inconscientemente desejasse a sua morte?Eu no saberia informar.Minhas mos pararam de correr sobre o teclado e o rudo dos pingos de chuva ficou ainda mais evidente. Eu o apreciei por um perodo, porm fui consternado por uma incomum soledade. Eu estava solitrio naquela casa e o pensamento me atemorizou.A prpria idia da morte havia me atemorizado.Ns nascemos para morrermos um dia; esse o dogma dos seres vivos. Todos sabem; todos acreditam; e todos dificilmente aceitam. Eu no aceitava. Senti algo pingar nas costas da minha mo e limpei o rastro da lgrima que escorreu pelo meu rosto com certa ira.

"Molstia maldita...", murmurei para mim mesmo antes de respirar profundamente. Uma parca movimentao na casa anunciou a volta de minha me e eu fui ter com ela, esperando obter alguma notcia animadora sobre o estado de sade de meu pai.Inconsciente, sem mostrar melhoras.Minha me repetira a resposta que obtive pela manh e eu tornei a suspirar.Meus olhos ardiam e minha cabea pesava, mas eu me mantive indiferente a isso boa parte do tempo. No horrio do jantar, forcei-me a consumir a refeio, tentando no observara cabeceira que meu pai sempre ocupava agora vazia e imaginar que permaneceria daquele modo. A recordao do odor podre voltou a me abater e eu afastei o prato de mim, repulsivamente.Minha me me encarou, intrigada. Eu me ergui da cadeira e apenas mencionei que estava cansado e ia me retirar, e que eu no sentia fome. Ela me olhou por alguns instantes e apenas murmurou um simples "Est bem, filho, descanse". Eu assenti e segui o trajeto at meu quarto.Eu deitei em minha cama com a roupa do corpo e fechei os olhos calmamente. Amanh estaria melhor... Eu s precisava repousar um pouco.Precisava parar de pensar em tudo o que acontecia e o sono profundo era o blsamo que eu necessitava no momento."Molstia maldita...", repeti involuntariamente, j um pouco sonolento. "Eu queria esquecer que voc existe", completei num sussurro rouco, pouco antes de adormecer.Mal sabia eu que j a havia contrado e que, muito em breve, passaria a ser mais uma vtima dela.

N/A: Er... Bem, abusando da minha liberdade potica, eu acabei criando "algumas" suposies. Eu penso que a Influenza Espanhola tenha atingido primeiro as camadas mais pobres da populao (l-se aqui ex-escravos, em sua maioria esmagadora e praticamente absoluta) e que o caso s se tornou realmente preocupante quando comeou a atingir os mais ricos, o que deixou a pandemia mais pblica, por assim dizer.Eu tambm supus e em quase todos os casos, isso, infelizmente, no s uma suposio que os pobres dessa poca no tinham tanto ou quase nenhum acesso a uma assistncia mdica digna, ento, procuravam se curar dessa gripe por conta prpria, pensando ser alguma comum. De qualquer forma, os mdicos inicialmente pensavam que se tratava de uma gripe comum e receitavam o tratamento, mas com o tempo ficou evidente que era no se curava de forma to simples.Eu juntei isso a uma outra informao que obtive em minhas pesquisas "internuticas", que dizia que, na poca em que a doena se alastrou no Brasil, as pessoas, desesperadas, depositavam os corpos dos familiares nas ruas, com medo de contrarem a doena tambm (e o Governo recolhia, em comboios).E, para finalizar, corpo de quem morre vtima da doena adquire um aspecto arroxeado.N/A 2: E como a prpria Stephenie (a autora) informou, a Influenza Espanhola ou Gripe Espanhola , atingiu os Eua a partir do ms de Setembro de 1918. Eu no sou a maior entendedora do assunto e confesso que foi meio suado descobrir um pouco mais sobre a doena, mas vou falar o pouco que sei sobre ela... Hehehehehe.

A Influenza Espanhola conhecida como uma das maiores pandemias do mundo, pela "simples" razo de ter matado cerca de vinte a quarenta milhes de pessoas em um perodo maior do que um ano. Entre maro de 1918 e maio de 1919, ela teve trs ciclos mundiais. O segundo e considerado mais terrvel perodo, devido ao registro de intenso nmero de mortes comeou em setembro de 1918 e terminou em janeiro de 1919.Havia duas formas de manifestaes da doena. A primeira, considerada benigna, no levava o paciente a bito se tratada de forma adequada (ela poderia, tambm, evoluir para o quadro mais letal da doena). Os sintomas eram temperatura elevada; falta de apetite; debilidade; catarro nasal e traqueobrnquico; sensao de mal-estar; urinas escuras; olhos brilhantes e lngua branca, ligeiramente azulada (esses eram os principais sintomas que ocorreram no primeiro perodo da manifestao da doena). A outra, mais letal, tinha como suas principais manifestaes as que acarretavam congesto pulmonar e complicao gastrintestinal, a pneumnica, a broncopneumnica e a toxmica (intoxicao relativa presena de substncias nocivas na corrente sangunea, produzidas por microorganismos).Agora, uma informao que minha, especificamente (, gente, mais uma suposio... rs). Para a fic, eu me baseei na idia de que, como a fase mais letal da pandemia s surgiu no ms de setembro de 1918, os primeiros pacientes a contraram em sua forma mais benigna, e esta evoluiu para a mais letal com o tempo, passando a ser espalhada sob essa "nova" forma. No sei se algo certo de se pensar, mas, bem, como eu disse antes acho que estou ficando repetitiva demais... risos , eu tenho todo direito de usar de forma plena a linda e maravilhosa e salvadora liberdade potica (como um amigo meu sempre diz... Rs.) e vocs vo entender se eu tiver feito alguma besteira, no mesmo? Rs.15

CAPTULO QUATRO: PRIMCIAS| 19

CAPTULO IVO Outono Sombrio

quela manh, eu no acordei melhor do que quando eu havia dormido. Eu raramente tive momentos agradveis de sono e havia passado a maior parte do tempo acordado, a fitar o teto escuro do meu quarto e a refletir sobre assuntos que no desejava. Meus olhos ardiam e a cabea doa ainda mais do que eu imaginava; eu afundei a palma das minhas mos nos olhos por alguns instantes, como se o fato fosse capaz de cessar a dor evidente.Respirando fundo, forcei-me a sair da cama e seguir para a sala de refeies, no desejando ser uma preocupao a mais para minha me, e tambm para tentar ocupar minha mente para me impedir ter novos e constantes pensamentos nocivos. Um calafrio percorreu o meu corpo quando me vi livre das cobertas. Outro se seguiu ao primeiro e eu no sei ao certo se foi pelo fato de me sentir um pouco quente, ou se pela parca idia que havia se passado pela minha cabea de que eu tambm havia contrado a influenza." s um resfriado comum, Edward, s um resfriado comum", murmurei para mim mesmo, tentando esquecer o segundo pensamento, e me ergui da cama lentamente.O Edward que me encarou do espelho de corpo estava mais plido do que o normal e havia visveis olheiras ao redor dos seus olhos, deixando evidente que o sono no foi suficiente para repor suas energias. Os orbes esverdeados parecerem estranhamente brilhantes, como percebi estarem o de meu pai, dias atrs. Aquela era uma das evidncias, alm das outras duas ou trs que j sentia. Eu automaticamente trinquei o maxilar, contendo a vontade de pr a minha lngua para fora e verificar se ela estava "branca, ligeiramente azulada", como dizia o jornal." s um resfriado comum, Edward, e voc est ficando paranico", acusei entre dentes e desviei o olhar do espelho, seguindo logo o caminho que me levaria sala de refeies.Pelo j habitual silncio e pela mesa vazia, deduzi que minha me no estava em casa mais uma vez. Agradeci mentalmente ao fato, pois assim evitaria perguntas quanto ao meu estado. Um novo calafrio percorreu o meu corpo e eu, instintivamente, abracei a mim mesmo para me aquecer.Eu estava assim porque a temperatura havia cado um pouco, pensei lentamente. Talvez eu devesse vestir algo mais quente.Como ontem, eu no sentia fome e, a passos arrastados, voltei para o quarto. Os msculos tambm incomodavam, como se no dia anterior eu tivesse me esforado demais fisicamente; sentia-me fatigado. Eu rapidamente descartei a idia de vestir um casaco, forar algum alimento garganta abaixo e resolver alguns assuntos pendentes que teria que solucionar no dia. Suspirando de satisfao, escorreguei dentro das cobertas e fechei os olhos ardentes.Os calafrios no cessaram, como anteriormente havia pensado que ocorreria. Eles pareciam piorar a cada instante, e eu encolhi o corpo, numa v tentativa de aquec-lo e fazer com que os pequenos e constantes tremores diminussem.O repouso afastava as complicaes e o contgio, eu murmurei em pensamento a frase da matria, o repouso afastava as complicaes e o contgio..."Eu estou ficando paranico", tornei a repetir, abrindo os olhos calmamente, piscando algumas vezes devido ao ardor que sentira aumentar neles.A janela a minha frente mostrava um cu nublado e uma suntuosa rvore, com suas folhas alternando entre o mais intenso tom avermelhado e o mais simples dourado. Algumas eram jogadas ao solo pela leve brisa que soprava, outras lutavam silenciosamente e para permanecer nos galhos, ainda dependuradas neles e balanando lentamente. Eu me recordei de que, quando muito mais novo, gostava de observar as gradativas mudanas que nela ocorriam no decorrer das estaes.Num breve lapso, eu me comparei a uma daquelas folhas fragilmente unidas aos galhos e observei a mais escura delas atentamente. Como ela, eu aguardava. Como ela, eu soube que no viveria mais para ver outro inverno. Eu permaneceria nesse quarto e esperaria pela minha morte, assim como a folha esperava ser arrancada da rvore pelo vento.Eu permaneci na cama na mesma posio, ainda a fitar aquela folha avermelhada, apenas sentindo cada um dos calafrios que me assolavam e a dor em minha cabea. Talvez minha lngua estivesse mesmo branca ou azulada. Por mais que recusasse a admitir para mim mesmo, eu estava com a doena que tantas vezes chamei de maldita. Eu havia contrado a Influenza Espanhola.Enterrei parcialmente o rosto no travesseiro e suspirei. Sem perceber, acabei adormecendo, e despertei devido a uma leve agitao na casa. Ainda cansado e a sentir calafrios, permaneci inerte, tentando escutar o que ocorria.Percebi que eram passos apressados e firmes, que se aproximavam cada vez mais. Eu j previ o que aconteceria e aguardei em silncio. Segundos depois, a porta do meu quarto se abria num rudo brusco. Com certo esforo, observei o vo e encontrei minha me a me encarar com os olhos marejados; uma expresso de temor e desespero contorcia a sua face."No me diga que... Voc tambm...", ela falou num murmrio desconexo. Eu respirei fundo e desviei o olhar, voltando a fitar a janela."Sim", respondi numa voz rouca e a ouvi reprimi um soluo. Cerrei os olhos e me encolhi ainda mais nas cobertas.21

CAPTULO SEIS: PUNIO| 23

Ainda aquela tarde, eu seria levado para o hospital, ainda plenamente consciente, e ardendo em febre. Ainda aquela tarde, receberamos a notcia de que meu pai havia morrido. E, dias depois, minha existncia como Edward Masen seria selada para sempre. CAPTULO VA Influenza

Eu estava enfastiado de tudo; daquele impertinente e maldito silncio no qual se resguardava todas as vezes que nossos olhares, to iguais em tons e realces, se encontravam. Eu sabia que, assim como o meu pai, havia contrado a Influenza Espanhola, afinal, aquele era o assunto mais abordado na cidade nos ltimos dias e no tinha como eu no estar ciente dos seus sintomas. Sabia que nada me levaria a crer que minha me no estava ciente dos riscos que corria ao permanecer no meu leito, a zelar por mim. E sentia dentro de mim mesmo que havia algo de errado com ela e ela se recusava a falar sobre ele comigo.Elisabeth Masen tambm estava doente.No entanto, l estava ela envolta em sua assistncia para comigo, um tanto quanto calada, mrbida e trgida, procurando esquecer algo que constantemente ia a seus pensamentos. Mrtires internos transformados em vozes de sua mente, que constantemente diziam que minha morte estava prxima. No importava para ela o fato de estar do mesmo modo; para minha me, bastaria que eu estivesse bem e a salvo.Ela no sabia o quanto isso era doloroso para mim, v-la acabar com sua prpria vida, gradativamente, por causa de um caminho que no tinha mais volta. Num futuro iminente, eu iria morrer; e no havia nada com o que ela pudesse fazer quanto a isso.Eu lutava para me manter lcido, mas obter sucesso estava cada vez mais difcil. Meus msculos estavam modos de dor e o tremor inexorvel do meu corpo no cessava. Eu no sabia mais se meu corpo queimava de febre, ou estava gelado como o de um cadver; tudo o que eu poderia informar era que eu sentia muito frio.Eu lamuriava em gemidos entrecortados por tosses ruidosas e, em algum ponto do que restava da minha conscincia, eu sabia que o meu quadro piorava cada vez mais.Ouvia gritos, gemidos e choros; alguns deles vinham de mim mesmo, outros tantos, dos leitos ao meu redor.Eram frutos da minha mente, ou sombras da realidade...?Era impossvel discernir. Tambm havia aquela voz rouca, penosa, distante, que eu sabia pertencer a Elisabeth. Seu tom suave dizia que eu estava melhorando, que eu ficaria bem... Palavras vs de consolo para algum sem esperana.Eu queria pedir para que ela fosse embora, mas tudo o que consegui foi transformar involuntariamente palavras em tosses. Ento, eu me forava a abrir os olhos, tentando passar para ela um conforto que no possua, mas no conseguia ver a sua face nitidamente. As pessoas para mim no tinham mais rostos; elas no passavam de vultos promscuos, carregando em suas feies fantasmagricas sorrisos macabros. Elas sussurravam para mim, prenunciando ansiosamente minha morte; e eu gritava de volta, dizendo ser esse o meu maior desejo enquanto silenciosamente ordenava para que sumissem e me deixassem em paz.A voz de minha me afastava esses devaneios, pelo menos por alguns instantes. Havia outra tambm, mais grave e aveludada, que eu no conhecia, mas me transmitia calma e certa segurana. Ela aliviava parcialmente a dor e penso que ele deveria ser o mdico que me tratava. Apesar de achar intil prolongar ainda mais o sofrimento de algum com morte certa, eu tentava agradecer a ele por isso, mesmo que todas as tentativas no fossem satisfatrias. Aquelas duas vozes eram as mais prximas, ento, eu constantemente procurava me centrar nelas, apesar de j no entender o que elas falavam; elas eram as nicas que sustentavam a perca parcela de conscincia que ainda me restava.Eu tentava esquecer o sofrimento pelo qual passava, mesmo sabendo que no era possvel. A dor ainda estava ali; o frio ainda estava ali; eelasainda estavam ali, espreita, esperando. A cada vez que eu abria os olhos, elas olhavam para mim e gargalhavam. Suas faces se tornavam cada vez mais vis, como se o agravamento da minha molstia as alimentasse. Quando eu no abri mais os olhos, temendo v-las mais uma vez, elas invadiram o refgio do meu consciente.As vozes diziam que iriam me levar para o inferno. Eu no saberia dizer se pequei o suficiente para merec-lo, mas elas estavam obstinadas o suficiente para eu dar credibilidade s suas palavras. Elas calaram as que me mantinham presos realidade e eu passei a oscilar entre um estado de semi-conscincia e inconscincia plena.Eu me via na guerra, matando pessoas... Eu me via conversando com meu pai no escritrio... Eu me via no cemitrio, olhando para a lpide dos meus pais, lado a lado... Eu me via rindo com colegas de universidade... Eu me via olhando para os rostos arroxeados de meu pai e de minha me, que me encaravam com seus olhos arregalados e inertes... Eu me via observando aqueles rostos cadavricos novamente... Delrios; sonhos; lembranas. As cenas se misturavam, cada vez mais intensas e funestas, depois tudo escurecia. As vozes voltavam e o ciclo recomeava. Incansvel. Agonizante. Elas diziam que iam me levar para o inferno, mas eu sentia que j estava nele. A Influenza Espanhola era o meu inferno.Inferno... Inferno... Inferno...Meu pescoo comeou a queimar; sua dor se sobreps s outras que eu sentia. Depois os ombros, os braos... Eu no sentia mais frio, eu queimava. Cada parte do meu corpo queimava, como se partculas de fogo estivessem me consumindo, aos poucos. A dor era lancinante e eu busquei por ar, com a pouca capacidade pulmonar que me restava. Eu estava numa fogueira; as vozes ainda zombavam de mim, rindo sarcasticamente. Eu comecei a lamuriar e a tentar mover o corpo, para afastar aquelas chamas de mim, mas elas s pioraram.Elas no vinham de fora, vinham de dentro. De dentro de mim; elas estavam sob a minha pele. Elas estavam destruindo o meu interior, para depois atingir o exterior. A dor piorou e eu desejei arranc-las de l; aquelas brasas malditas que consumiam o meu corpo. Tentei cravar minhas unhas no meu brao e arranhar a minha pele, mas isso s fez o ardor piorar ainda mais.Em algum ponto da minha tenra decadncia, eu pude ouvir os gritos surdos que inconscientemente escapavam da minha garganta. Eu dobrava e contorcia meu corpo, tentando, de alguma forma, abrandar aquele sofrimento. E eu voltava a tentar me arranhar, numa muda splica para aqueles seres tirarem aquilo de mim. Eu pedia a morte rpida e indolor, mas ela no vinha. Eu pedia a Deus misericrdia, mas Seus ouvidos se fecharam para mim. Era como se eu estivesse fadado a passar o resto dos meus dias naquele sofrimento.Algo eterno; pungente. Eu gritei novamente, pedindo para isso parar; pedindo para que algum inexistente me ajudasse. Eu j no agentava mais. As vozes no mais gargalhavam; elas pareciam se deliciar silenciosamente com o meu infortnio.O ar comeou a faltar dos meus pulmes e eu senti as batidas do meu corao ficarem cada vez mais pesadas. Alguma parte de mim sabia que eu estava perdendo o que me restava de lucidez, aos poucos... E alguma parte de mim se sentia imensamente grato e aliviado pela doena ter atingido seu estgio derradeiro.

Eu iria morrer, finalmente.28

CAPTULO SETE: CACAU| 27

CAPTULO VIO Renascer

Eu tive a parca sensao de estar recobrando a conscincia novamente e, malogrado, percebi que no havia morrido ainda; aquela no seria a primeira vez que isso ocorria, mas eu esperava que fosse a ltima. Eu lutei contra o fato com todas as foras que julgava ter, ansiando mergulhar novamente naquele breu que a febre alta proporcionava. Eu no desejava mais dor; no desejava ter novos desvarios e ser atormentado pelos constantes pesadelos que povoavam meu sono; no desejava mais ofegar em busca de ar e perceber que o caminho que o levaria at os pulmes estava cada vez mais obstrudo; no desejava mais implorar mentalmente por algo capaz de aquecer-me ou esfriar-me. Eu preferia morrer a ter que passar por aquilo novamente. Queria que Deus selasse minha existncia naquele maldito corpo carnal e julgasse logo se eu era merecedor do paraso ou do inferno.Mas apenas tudo ao meu redor revoluteou e, aos poucos, eu retomei a sensibilidade em meu corpo. Esperei pelo inevitvel sofrimento e surpreendi-me num breve lapso ao constatar que as dores que me consumiam haviam diminudo de forma considervel e a frio mordaz que antes sentia parecia ter cessado. A queima interna tambm. Por uma espcie de milagre, eu estava melhor; talvez at curado, eu cria.Permaneci de olhos fechados, incapaz de acreditar que estava restabelecido, julgando apenas ser aquele um bom desvario. Talvez a doena tivesse atingido propores to intensas que me deixava incapaz de sentir mais dores. Ou, talvez, quem sabe, eu estivesse mesmo morrendo. A mente se mantm slida quando as pessoas esto para morrer? Seria essa sensao de estranho alvio, um sinal de que minha alma est se desligando do corpo? Eu esperava que sim.

Ele est acordando.Foi o que obtive em resposta aos meus questionamentos, vinda de uma voz gentil que ecoou dentro de minha mente.Espero que ele esteja bem.Ela falou novamente, ao mesmo tempo em que meus ouvidos passaram a captar uma sbita movimentao ao meu lado. Eu forcei minhas plpebras pesadas a se abrirem num suspiro.O recinto estava mal-iluminado, mas isso no impediu meus olhos de protestarem pela recente falta de uso. Eu pisquei at que um teto branco que no me era familiar entrasse em foco, fazendo-me chegar concluso de que no estava em casa.Eu deveria estar no hospital, pensei enquanto a mesma voz continuava a falar comigo.Espero que ele lide com isso melhor do que eu; que eu consiga faz-lo ver o lado melhor de ser o que agora e..."Mame...?", murmurei de forma rouca e involuntria, mesmo que o timbre daquela voz que falava comigo me fosse desconhecida. O rudo de passos cessou e aquela voz, subitamente, silenciou. Eu, de alguma forma, podia perceber pelos meus sentidos que havia algum ao meu lado. Eu virei o rosto para encar-la, mas no encontrei as esmeraldas de minha me a me observarem com seu peculiar modo doce e preocupado; em lugar delas, havia um homem, que me mirava com uma expresso compenetrada. Os traos finos e singulares do seu rosto, alm de seus cabelos loiros e olhos to durados e puros, faziam-me associ-lo figura de um anjo.

"Lamento, Edward, mas Elisabeth no est mais entre ns. Eu sou Carlisle Cullen, mdico do hospital em que esteve internado, se no se recorda", ele respondeu com a voz aveludada e ela, de alguma forma, me pareceu familiar. Ela me inspirava confiana. "Sua me ficou ao seu lado no leito o quanto pde, mas acabou sucumbindo doena", ele fez uma breve pausa antes de prosseguir. "Ela me pediu para que o salvasse, de qualquer maneira. Eu fiz o que estava a meu alcance".

Eu assenti, num gesto mudo de agradecimento. Primeiro meu pai e, agora, minha me... Uma outra espcie de dor me consumiu por dentro ao ter cincia de que um dos meus inmeros pesadelos era real, mas eu me mostrei incapaz de transform-la em lgrimas; era como se eu estivesse seco por dentro. Suspirei fundo, percebendo s agora que o respirar j no me era to difcil. Desviei o olhar do Dr. Cullen e voltei a fitar o teto.Foi mais difcil do que eu pensei que deveria ter sido, mas ele me parece em boas condies. Talvez no fosse assim to necessrio repetir com ele o que eles haviam feito comigo. Uma teria sido o bastante...?"Onde eu estou?", eu questionei, o interrompendo. Espantei-me com o fato de ele estar falando com outra pessoa e eu sequer ter notado a aproximao dela, mas no me preocupei em olh-lo novamente.

"Em minha casa", ele respondeu brandamente."Sua casa?", eu o observei de forma meio intrigada. Lentamente, ergui o tronco e me recostei na cabeceira da cama, convicto de que no sentia mais dores. Fiquei aliviado ao comprovar que era verdade. "Por que me traria at a sua casa, se nem me conhece, Dr. Cullen?", inquiri num murmrio.Vai ser difcil contar a ele..."Como eu lhe informei antes, Edward, eu realizei o ltimo pedido da sua me".Mais ainda acreditar em minhas palavras. Eu dificilmente acreditaria, se estivesse no lugar dele... "Eu o salvei". Deve ser s uma lenda para ele... Mas necessrio que ele saiba...Eu senti minha cabea latejar, meio confuso com o que tinha acabado de ser perceptvel para mim. Carlisle Cullen estava falando comigo e, ao mesmo tempo, aquela mesma voz dizia algo completamente diferente em minha mente. Pressionei a testa com fora e contorci meu rosto numa careta."Como voc faz isso?", sussurrei de modo transtornado, quase no ouvindo minha voz. "Como voc faz essas coisas?", repeti num tom mais firme, pressionando a testa com mais fora."O que voc est sentindo, Edward?", ele questionou em seguida. E em minha mente a mesma voz dizia o quanto estava preocupada e o quanto no esperava por aquela reao. O tom apressado de sua voz fizeram meus ouvidos zunirem e tudo revolutear novamente. Eu queria expuls-la de l, mas parecia impossvel; ela parecia cada vez mais alta; mais intensa; mais onipresente; mais..."Pare!", ordenei, cerrando os olhos e retraindo meu corpo contra a cabeceira da cama. Algo se estilhaou prximo a mim, mas eu no me importei.Parar?"Pare", repeti entre dentes. A minha voz me soou longnqua; a dele, ainda mais prxima.Parar? Com o qu? Com o que ele quer que eu pare?"Pare com isso!", insisti, percebendo que minha voz estava rouca.O que est acontecendo...? Ser que deu algo errado... Mas..."EU MANDEI PARAR!", esbravejei, cerrando os olhos com fora e comprimindo ainda mais a cabea com minhas mos. O rudo de algo se despedaando se tornou ainda mais alto; ele tambm ecoava em minha mente, assim como a voz do Dr. Cullen e meus prprios pensamentos. Por um momento, acreditei que o que estava se partindo era o meu crnio e o comprimi ainda mais com as mos; eu queria fazer isso, se o fato fosse capaz de expulsar a outra voz do Dr. Cullen de l."Edward, escute-me!" a voz dele soou de forma moderada, se sobrepondo outra em minha mente, at que ambas silenciaram. Eu permaneci a segurar a minha cabea e passei a esconder o rosto nos joelhos, apreciando apenas ouvir o som forte da minha respirao alterada. Logo depois, eu notei as mos dele se fecharem sobre os meus pulsos e permiti que o Dr. Cullen as afastasse da minha cabea. Gradativamente, ergui o rosto e abri os olhos, encontrando-o a me encarar com uma expresso condolente. "Diga-me o que est acontecendo com voc", ele pediu de forma branda.

"Diga-me osenhoro que est acontecendocomigo, Dr. Cullen", eu retorqui num ar arrastado, observando-o com desconfiana. Ele retirou as mos do meu pulso e esperou. O silncio de sua mente me fez suspirar, aliviado. "O que essa voz em minha cabea? Como faz isso?".O fato foi perceptvel para mim por um breve momento, mas eu percebi que o homem a minha frente pareceu estar um tanto quanto surpreso com o meu questionamento. Porm, to logo essa impresso passara, vi o Dr. Cullen me mirando da mesma forma calma de antes, ao mesmo tempo em que aquela voz em minha mente dizia, meio admirada, que eu era como Aro. E que tudo estava explicado agora."No, no est, Dr. Cullen", eu rosnei, impaciente."Voc se acostumar com o tempo", ele me disse, no mesmo tom aveludado de antes, e um sorriso solene cortou o seu rosto. Eu no retribu o sorriso e ele prosseguiu. "Voc possui o dom de Aro, um velho amigo meu. No o mesmo, mas muito parecido; at melhor, atrevo-me a acrescentar... Voc l pensamentos, Edward".A afirmao do Dr. Cullen foi absurda, porm eu no podia negar que era fundamentada. Mesmo que fosse humanamente impossvel algum ter o dom de ler a mente das pessoas, aquela era a nica explicao para o fato de eu, supostamente, estar tendo acesso ao que ele pensava. Ento, s me restaria aceitar que a mente das pessoas agora me era como um livro aberto e difano, como se fosse um acontecimento trivial...Gargalhei em ludbrio ao deduzir que aquela era a minha quimera mais insensata e duradoura."Acredite em mim, voc no est devaneando, Edward", o Dr. Cullen disse pausadamente, sobrepondo-se, com facilidade, aos meus risos, mesmo que sua voz tenha soado levemente baixa."Oh, no?", eu parei de rir e retorqui com sarcasmo. "Interessante saber que em toda a minha vida, eu nunca cheguei a reparar que possua tal dom", avaliei, ainda mais irritado do que antes. "Por que agora o teria?"."Porque voc como eu agora... Voc um vampiro, Edward", ele respondeu de forma diligente."Eu sou um vampiro?", eu tornei a rir. "Desculpe-me a indelicadeza, Dr. Cullen, mas o senhor tem certeza de que est perfeitamente bem das faculdades mentais?", questionei num tom levemente trocista. Supunha que aquilo talvez no pudesse ser um sonho; era provvel que a influenza espanhola tenha levado com ela parte da minha racionalidade e agora eu estava internado num manicmio, com algum igualmente insano que pensa ser um vampiro. a verdade. Acredite em mim. E a voz que eu achava ser a do pensamento de Carlisle Cullen certamente era fruto da minha mente j doentia."Vampiros no existem; s uma lenda estpida", eu rebati num grunhido.

"Em toda lenda h um fundo de verdade", ele disse simplesmente."Oh, sim, certo, eu sou um vampiro. Devo tomar cuidado com estacas de madeira, gua benta e crucifixos?", ironizei num arquear de sobrancelha, ao que ele sorriu de forma tnue para mim."No necessrio", ele explicou calmamente."No necessrio", repeti no mesmo tom. "Bem, e o que eu vou fazer agora? Sair correndo daqui e atacar o pescoo de donzelas inocentes?", disse num ar carregado e ele tornou a sorrir."No s de donzelas inocentes. De qualquer humano, para ser mais preciso", ele respondeu no mesmo tom solcito de antes. Eu sorri meio de lado, deixando transparecer toda a incredulidade em minhas expresses. "Sei que algo difcil de acreditar, Edward. Mas eu posso lhe provar que o fato de sermos vampiros algo bem real".

"Mesmo? Ento, Dr. Cullen, prove-me que um vampiro", desafiei. E Carlisle Cullen sorriu novamente, se dispondo a provar que era um vampiro. Minha incredulidade, aparentemente, servia-lhe como uma singela distrao.Minha cabea latejou e, parcamente, algumas imagens surgiram em minha mente. Sua mente se abriu para mim e eu tive acesso s suas lembranas mais obscuras. Eu inspirei fundo quando elas comearam a correr velozes em meus pensamentos. De forma impetuosa, as recordaes e as sensaes dele pareceram ser minhas tambm. Eu pude ver o suplcio de sua transformao e o tomei por meu; eu a senti tambm, pois havia passado por ela algum tempo atrs e entendido como um sintoma da molstia que me abatera. Eu vi suas tentativas de suicdio e percebi que ele sara intacto de todas elas. Eu vi suas tentativas de comer algo mais tradicional e a cena grotesca que era expuls-la involuntariamente de dentro de si. Era torvo notar que havia em mim todo aquele irreprimvel desejo por sangue que ele tivera no perodo em que se prostrou devido ao esforo de se manter abstinente.Os msculos estavam rgidos e minha garganta queimava; minha boca ficara subitamente seca e meu estmago se contraiu de fome. Um lquido estranho com um gosto metlico fluiu at meus lbios e eu prendi a respirao. Eu me vi desejando atacar aquelas pessoas de sua memria; eu me imaginei atacando-as e apreciando, por breves instantes, o sangue escorrer sobre a pele delas antes de sug-lo com ardor. As imagens se foram novamente e, piscando vrias vezes, notei o rosto sisudo do Dr. Cullen a me encarar."Voc...", murmurei, ainda inebriado por aquele excntrico instinto que se apoderava de mim. "Isso no real.Vocno real. apenas um sonho...", completei num sussurro rouco; mesmo que intrinsecamente acreditasse que tudo aquilo que sentia no podia ser simplesmente fruto da minha mrbida imaginao. real. Voc no pode ignorar o fato de que tambm sente o mesmo. Voc sabe que sim, Edward.O pensamento dele respondeu antes mesmo que ele se dirigisse a mim verbalmente. "Eu no quis acreditar quando o mesmo ocorreu comigo e isso no contribuiu para melhorar a minha prpria situao. Retrair essa vontade s vai lhe trazer mais sofrimentos. No queira cometer o erro que cometi". Havia compaixo naquelas palavras e eu, de alguma forma, senti-me tocado por elas... Mas no completamente."Voc repugnou o ser no qual foi forosamente transformado durante anos; no entanto, fez o mesmo comigo... Por qu?", questionei de modo meticuloso, encarando-o num ar incisivo. No sabia ao certo o que pensar a respeito. Euno queria pensara respeito. Aquela era uma situao absurda; e eu simplesmente me impedia de analis-la de forma mais racionalizada. Talvez ficasse realmente louco se tentasse.Era um pensamento constante em minha mente, ter algum como eu ao meu lado. Em seu leito de morte, sua me pediu para que o salvasse. E ela parecia saber que eu no era como os outros... Eu olhei para voc e, simplesmente, no pude negar-lhe o pedido. Mesmo que, por um instante, no entendesse ao certo como uma me podia desejar algo assim para um filho.Ele me falou em pensamentos, mais uma vez. Por detrs dele, de algum modo, eu revivia o momento derradeiro de minha me atravs dos seus olhos. Suspirei. "Talvez voc entenda minha motivao, um dia", ele completou de modo calmo."E o que motivaria algum a transformar outro em um monstro?", perguntei com a voz contida e os olhos meio estreitados, no sabendo ao certo se o que sentia pelo Dr. Cullen era afeto ou repulsa.

"H uma escolha, Edward. Voc pode ou no ser o monstro que diz ser", ele me disse, no aparentando ter se subvertido s minhas palavras. A calma que dele emanava chegava a ser perturbadora. "Sendo fruto do acaso ou no, eu acabei por descobrir um modo alternativo para suprir o anseio por sangue humano. No algo que o substitui por completo, mas o suficiente para manter a nossa subsistncia e nos deixa fortes o suficiente para sermos capazes de resistir a ele", ele me observou por alguns instantes antes de prosseguir. "Eu me alimento com o sangue de animais. No algo relativamente fcil, pois isso contraria a real natureza da nossa espcie, mas espero que faa o que achar melhor para voc. Seria compreensvel se voc optar por no seguir a minha forma de vida, Edward".Eu sustentei o olhar afetuoso e srio do Dr. Cullen por um longo perodo. Ele apenas esperou por uma resposta minha, paciente, com sua mente e sua voz intricadas num silncio solene. Respirei fundo."Ensine-me a ser como voc, Carlisle", eu murmurei de forma impassvel e ele assentiu com um meneio de cabea em resposta.E foi assim que eu despertei para minha nova existncia.

Eplogo

Ns, vampiros, somos seres acima da linha do compreensvel. O axioma da humanidade. O que sabemos da nossa origem so somente suposies. Nenhum vampiro antigo o suficiente possui plena convico para declarar-se o primeiro de todos. Houve sempre um antes dele e, antes dele, houve outro. Um outro que no se sabe o paradeiro.Mas, evidenciando os fatos, no preciso pensar muito para deduzir que, independentemente do que somos ou de quem ou o qu nos criou, vampiros so como aberraes da natureza.Somos amaldioados. Seres destinados a vagar pelo mundo por toda a eternidade, sem uma razo certa para existir. Ns caminhamos com o mundo a acompanhar suas mudanas, mas ns sempre continuaremos os mesmos. Passaremos por guerras, pandemias e violncias e sobreviveremos. Veremos o que outrora nos eram semelhantes padecerem e saberemos que jamais poderemos ser como eles... O tempo passar por ns e ns passaremos pelo tempo. uma idia tentadora para os que temem a morte, o viver para sempre. Sei que vrios dos humanos que me cercam ansiariam estar no meu lugar. Eu, no entanto, daria a minha imortalidade a eles se isso pudesse ser capaz de devolver a humanidade que um dia perdi. Se ainda fosse o garoto de dezessete anos que um dia eu fui e tivesse escolha, acredito que preferiria morrer como humano. Mas eu no tive escolha; Carlisle me transformou no que sou agora e eu nada pude fazer quanto a isso, a no ser aceitar o fato.Contudo, eu no o odeio por isso. No odeio Carlisle por ter me transformado. Agora, quase noventa anos depois do meu ltimo despertar, eu entendo as motivaes que o levaram a me transformar num vampiro. Eu tambm entendo as que o levaram a fazer com Esme o mesmo que fez comigo. Entendia agora a razo para que ele tivesse feito isso com Rosalie, e a de Rosalie no que dizia respeito a Emmett.Eu entendo todos eles porque descobri que a imortalidade vazia e perturbadora; ns precisamos de algo que nos faa resistir a ela, para no sucumbirmos loucura ou ao tdio. Como humanos, ns tememos a solido. E, como humanos, buscamos extermin-la da maneira que nos possvel. E quando o que conseguimos no suficiente para preencher o vazio metafrico que sentimos por dentro, samos em busca algo novo capaz de preencher; ou simplesmente buscamos ocupar a mente para que no haja espao para a mera lembrana da sua existncia.Apegar-se a humanos e t-los como companhia nunca foi algo relativamente fcil: mesmo se ele fosse forte o bastante para resistir sua natureza, o vampiro, mais cedo ou mais tarde, os perderia por conta da sua mortalidade, e aquilo era algo difcil de ser superado. No foi difcil para Carlisle deduzir isso e ele procurava, de todas as formas, no se afeioar demais aos humanos.Carlisle viu, inicialmente, na medicina, uma maneira de venc-la. Ele estava perto dos humanos, mas nunca perto o bastante para se deixar prximo a eles. Ser mdico ocupava sua mente contra a solido, mas chegou ao ponto em que ele no se viu capaz de suport-la; ento, motivado pelo pedido de minha me, ele me transformou. Viu em mim o filho que ele nunca seria capaz de conceber; algum para o qual ele no necessitasse fingir ser algo que no . E depois veio Esme, que o completou de outra forma. Veio Rosalie, mas ela no me completou como Carlisle e Esme esperavam. Veio Emmett, que fez a Rosalie o que ela no foi capaz de fazer comigo. Vieram tambm Jasper e Alice, mas eles j se complementavam por si mesmos. E, quando eu menos esperava,elaveio.

Isabella Swan.Uma mortal cujo maior infortnio dentre todos os que ela tem a estranha capacidade de atrair para si mesma foi ter um vampiro apaixonado por ela. A garota que anseia que eu faa algo que eu julgo ser inconcebvel de ser feito com ela... Torn-la imortal.

Eu cometi o maior erro que um vampiro seria capaz de fazer: sentir algo pelo que, naturalmente, a sua presa. Por isso, tenho uma preocupao maior em proteg-la do mundo e, acima de tudo, de mim mesmo. Mas eu sei que no posso fazer isso para sempre, pois um dia eu a perderei para sua natureza humana. E, ao lembrar-me disso, penso se agiria como Carlisle, ou se seria capaz de resistir ao impulso e o desespero quando estivesse ciente de que a hora derradeira de Bella havia chegado; se eu seria capaz de v-la morrer em meus braos, impassvel, tudo para apenas faz-la digna de um lugar que, em minha suposio, nunca serei capaz de entrar se um dia deixar de existir..."Se Bella estivesse para morrer, voc seria capaz de transform-la, Edward?".

Aquela uma pergunta pela qual eu jamais ansiaria em poder saber a resposta. Eu j pensei t-la perdido uma vez, e no estou certo de que seria capaz de lidar com isso novamente. Eu no estou certo em dizer que conseguiria existir sem Bella mais uma vez; e tenho receio dos desejos dos meus prprios pensamentos para impedir que isso acontea.