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2018 edição revista, atualizada e ampliada Manual de DIREITO CONSTITUCIONAL NATHALIA MASSON

Livro Man de Direito Constitucional - editorajuspodivm.com.br · ò X & Z /E E U > o o X A Essência da Constituição X õ Ð X _ o ] W Lumen Juris U î ì ì õ U X î í X. 30

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2018

6ª edição

revista, atualizada e ampliada

Manual deDIREITO

CONSTITUCIONAL

NATHALIA MASSON

CAPÍTULO 1

TEORIA DA CONSTITUIÇÃO

SUMÁRIO • --

-. Questões; .1. Questões

1. INTRODUÇÃOO vocábulo “Constituição” tem no verbo latino constituere sua origem etimológica e

sua conformação semântica, vez que o mesmo exterioriza o ideal de constituir, criar, deli-mitar abalizar, demarcar1. O termo exprime, pois, o intuito de organizar e de conformar seres, entidades, organismos.

É nessa acepção que se pode considerar a Constituição enquanto o conjunto de nor-mas fundamentais e supremas, que podem ser escritas ou não, responsáveis pela cria-ção, estruturação e organização político-jurídica de um Estado.

De acordo com Georges Burdeau2, a Constituição é o Estatuto do Poder, garantidora da transformação do Estado – até então entidade abstrata – em um poder instituciona-lizado. É o que permite a mudança de perspectiva que ocasiona o abandono do clássico pensamento de sujeição absoluta às imposições pessoais de governantes, para a obediência voltada a uma entidade (Estado), regida por um documento: a Constituição.

Curso de Direito ConstitucionalDroit constitutionnel et institutions politiques -

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson28

Torna-se, pois, a Constituição, um documento essencial, imprescindível. Todo Estado a possui. Porque todo Estado precisa estar devidamente conformado, com seus elementos essenciais organizados, com o modo de aquisição e o exercício do poder delimitados, com sua forma de Governo e Estado definidas, seus órgãos estabelecidos, suas limitações fixadas, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias asseguradas.

Em suma, a Constituição é a reunião das normas que organizam os elementos constitu-tivos do Estado3.

Ressalte-se, todavia, estarem o termo “Constituição” e sua conceituação permanente-mente em crise4, já que os estudiosos não acordam quanto à uma definição, existindo uma pluralidade de concepções que fornecem noções acerca do assunto. Não se espera, no entan-to, que algum dia seja diferente. Como Constituições são organismos vivos5, documentos receptivos aos influxos da passagem do tempo, em constante diálogo com a dinâmica social, sempre haverá alguma dificuldade em sua delimitação, haja vista sua mutação constante, seu caráter aberto e comunicativo com outros sistemas.

Quanto ao Direito Constitucional, é um dos ramos do Direito Público, a matriz que fundamenta e orienta todo o ordenamento jurídico. Surgiu com os ideais liberais atentando--se, a princípio, para a organização estrutural do Estado, o exercício e transmissão do poder e a enumeração de direitos e garantias fundamentais dos indivíduos. Atualmente, preocupa-se não somente com a limitação do poder estatal na esfera particular, mas também com a fina-lidade das ações estatais e a ordem social, democrática e política.

Em uma análise pormenorizada, pode-se estudar o Direito Constitucional tendo por base três perspectivas distintas: o Direito Constitucional geral, o Direito Constitucional es-pecial e o Direito Constitucional comparado.

A primeira atém-se à definição de normas gerais para o Direito Constitucional, estabele-cendo, por exemplo, conceitos (significado para locuções essenciais à compreensão da disci-plina, como “Direito Constitucional”, “Constituição”, “poder constituinte”, dentre outras), classificações e métodos de interpretação das Constituições.

A segunda ocupa-se em estudar a Constituição atual de um Estado específico. A terceira é tida como um método descritivo de análise e se subdivide em três categorias de estudo: critério temporal ou vertical, o qual compara Constituições de um mesmo Estado, elabora-das em épocas diferentes (ex: comparação entre a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 com a Constituição do Império de 1824); critério espacial ou horizontal, que se atém à comparação de Constituições vigentes em Estados distintos, que podem ou não ser contíguos (ex: comparar a nossa atual Constituição com as Constituições de outros países da América Latina ou com a Constituição da Nova Zelândia); por fim, critério baseado na forma de Estado elegida (ex: comparar as Constituições dos países que adotam como forma de Estado a federada).

Curso de Direito Constitucional positivoCurso de Direito ConstitucionalCurso de Direito Constitucional

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 29

2. CONCEPÇÕES DE CONSTITUIÇÃO

2.1. Introdução

Partindo da premissa de que a definição precisa do vocábulo “Constituição” é tarefa árdua, eis que o termo presta-se a mais de um sentido, reconhece-se uma gama variada de concepções que tencionaram desvendá-lo, cada qual construída a partir de uma distinta for-ma de entender e explicar o Direito. Em que pese serem todas muito diversas e possuírem bases teóricas muitas vezes opostas, são de grande valia doutrinária, pois foram possivelmente adequadas em algum momento histórico (ou segundo um específico prisma de análise) e for-necem os elementos para a síntese dialética que o constitucionalismo contemporâneo oferta hoje.

Far-se-á referência, nos itens seguintes, aos sentidos e as concepções de maior reper-cussão que disputam a conceituação adequada do termo.

2.2. Constituição sob o prisma sociológicoAo conceito sociológico associa-se o alemão Ferdinand Lassalle que, em sua obra “A

essência da Constituição”, sustentou que esta seria o produto da soma dos fatores reais de poder que regem a sociedade.

Segundo esta concepção, a Constituição é um reflexo das relações de poder vigentes em determinada comunidade política. Assemelhada a um sistema de poder, seus contornos são definidos pelas forças políticas, econômicas e sociais atuantes e pela maneira como o poder está distribuído entre os diferentes atores do processo político. Isso significa que Constituição real (ou efetiva) é, para o autor, o resultado desse embate de forças vigentes no tecido social.

Oposta a esta, tem-se a Constituição escrita (ou jurídica) que, ao incorporar num texto escrito esses fatores reais de poder, os converte em instituições jurídicas. Todavia, essa Cons-tituição escrita não passa de um mero “pedaço de papel”, sem força diante da Constituição real, que seria a soma dos fatores reais de poder, isto é, das forças que atuam para conservar as instituições jurídicas vigentes.

Como num eventual embate entre o texto escrito e os fatores reais de poder estes últimos sempre prevalecerão, deverá a Constituição escrita sempre se manter em consonância com a realidade, pois, do contrário, será esmagada (como uma simples “folha de papel") pela sua incompatibilidade com o que vige na sociedade.

O autor exemplifica a essencial consonância entre o texto escrito e a realidade fática com uma interessante metáfora:

Podem os meus ouvintes plantar no seu quintal uma macieira e segurar no seu tronco um papel que diga: “Esta árvore é uma figueira”. Bastará esse papel para transformar em figueira o que é macieira? Não, naturalmente. E embora conseguissem que seus criados, vizinhos e conhecidos, por uma razão de solidariedade, confirmassem a inscrição existente na árvore de que o pé plan-tado era uma figueira, a planta continuaria sendo o que realmente era e, quando desse frutos, destruiriam estes a fábula, produzindo maçãs e não figos.6

A Essência da Constituição Lumen Juris

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson30

Por outro lado, quando há inequívoca correspondência entre a Constituição real e a escrita, estaremos diante de uma situação ideal, em que a Constituição é compatível com a realidade que ela pretende normatizar. Deste modo, para Ferdinand Lassale, só é eficaz aquela Constituição que corresponda aos valores presentes na sociedade.

2.3. Constituição sob o aspecto políticoA percepção de Carl Schmitt, elaborada na clássica obra “Teoria da Constituição”, ven-

tila um novo olhar sobre o modo de se compreender a Constituição: não mais arraigada à distribuição de forças na comunidade política, agora a Constituição corresponde à “decisão política fundamental” que o Poder Constituinte reconhece e pronuncia ao impor uma nova existência política.

Sob o prisma político, portanto, pouco interessa se a Constituição corresponde ou não aos fatores reais de poder, o importante é que ela se apresente enquanto o produto de uma decisão de vontade que se impõe, que ela resulte de uma decisão política fundamental oriun-da de um Poder Constituinte capaz de criar uma existência política concreta, tendo por base uma normatividade escolhida.

Para o autor, a compreensão do vocábulo “Constituição” passa ainda pela aceitação de que o documento constitucional é um conjunto de normas que não estão conectadas por nenhuma unidade lógica. Os dispositivos só se assemelham no aspecto formal, pois estão todos inseridos num mesmo documento e não podem ser alterados por lei ordinária; sob o ponto de vista material os dispositivos integrantes da Constituição variam: enquanto uns são cruciais para a comunidade (porque referem-se à estruturação do Estado ou aos direitos fundamentais), outros só estão ali para se protegerem de uma modificação por lei ordinária, pois não trazem conteúdo de grande relevância jurídica e política.

A leitura que o autor faz dessa diversidade de normas na Constituição cria uma dico-tomia que as divide em “constitucionais” (aquelas normas vinculadas à decisão política fundamental) e em “leis constitucionais” (aquelas que muito embora integrem o texto da Constituição, sejam absolutamente dispensáveis por não comporem a decisão política fun-damental daquele Estado).

Desta forma, constitucionais são somente aquelas normas que fazem referência à decisão política fundamental, constituindo o que hoje denominamos de “normas mate-rialmente constitucionais”. Todos os demais dispositivos inseridos na Constituição, mas es-tranhos a esses temas, são meramente leis constitucionais, isto é, nos dizeres atuais: somente formalmente constitucionais.

2.4. Constituição em sentido jurídicoNa percepção jurídica a Constituição se apresenta enquanto norma superior, de obe-

diência obrigatória e que fundamenta e dá validade a todo o restante do ordenamento jurídico.

Esta concepção foi construída a partir das teses do mestre austríaco Hans Kelsen, que se tornou mundialmente conhecido como o autor da Teoria Pura do Direito. Observe-se,

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 31

porém, que a teoria pura não é somente o título de uma obra e sim de um empreendimento que tencionava livrar o Direito de elementos estranhos à uma leitura jurídica de seu objeto – isto é, visava desconsiderar a influência de outros campos do conhecimento como o polí-tico, o social, o econômico, o ético e o psicológico, uma vez que estes em nada contribuíam para a descrição das normas jurídicas – possibilitando que o Direito se elevasse à posição de verdadeira ciência jurídica.

Kelsen estruturou o ordenamento de forma estritamente jurídica, baseando-se na cons-tatação de que toda norma retira sua validade de outra que lhe é imediatamente superior.

Segundo o autor, no mundo das normas jurídicas uma norma só pode receber validade de outra, de modo que a ordem jurídica sempre se apresente estruturada em normas superio-res fundantes – que regulam a criação das normas inferiores – e normas inferiores fundadas – aquelas que tiveram a criação regulada por uma norma superior.

Essa relação de validade culmina em um escalonamento hierárquico do sistema jurídi-co, uma vez que as normas nunca estarão lado a lado, ao contrário, apresentarão posiciona-mentos diferenciados em graus inferiores e superiores.

Para exemplificar sua teoria, Kelsen sugere que partamos de um fenômeno jurídico in-dividual, como uma sentença. Acaso se pergunte por que a mesma é obedecida, o autor soluciona a questão remetendo o questionador ao código que autoriza ao juiz decidir o caso através da prolação da decisão – já que o código funciona como norma superior fundante que confere validade jurídica à sentença.

Mas a esta pode seguir-se outra pergunta, relativa à razão de o código ser válido. Por mais uma vez Kelsen nos remete a norma superior que dá validade ao código: o legislador está devidamente autorizado pela Constituição a editar as leis; deste modo, ao fazê-lo, está obedecendo a Constituição.

Esta última, todavia, também compõe o sistema normativo e, como todas as outras normas, depende que algo lhe confira validade: se uma norma somente adquire tal status a partir de uma outra norma, será preciso admitir que existe uma norma fundamentando a Constituição7.

Pode ser que a atual Constituição vigente em determinado Estado tenha sido criada mediante uma lei autorizada pela Constituição anterior, retirando sua validade deste docu-mento. Mas este último também pode ter sua validade questionada e assim sucessivamente, até se chegar à primeira Constituição daquele Estado, provavelmente criada através da eman-cipação de um Estado frente a outro – revolução ou declaração de independência.

Ainda assim, frente a essa primeira Constituição (que não esteja em disputa e seja, por-tanto, eficaz8), a questão da validade permaneceria imperiosa, principalmente porque se não

Hans Kelsen. Ensaios Introdutórios.

-

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson32

for devidamente resolvida, toda a cadeia de fundamentação deixa de fazer sentido: afinal, acaso se perca o fundamento da Constituição, esta não estará apta a validar mais nada, os códigos perderiam seu suporte e, por conseguinte, os atos que nele se fundamentam também. O sistema desmoronaria.

Essa cadeia de validade ou hierarquia do Direito deve, portanto, encontrar um ponto final sob pena de se chegar ao infinito, já que toda norma dependerá de uma superior e assim indefinidamente.

A busca por esse último alicerce da ordem normativa levou Kelsen a construir a teoria da norma fundamental, que irá justificar a validade objetiva de determinada ordem jurídica positiva. Chega-se a esta norma básica quando não se admite um único passo para trás na ca-deia de validade jurídica, pois ela será a norma superior por excelência, única a não depender de outra que lhe dê suporte.

E esta independência é característica que decorre do próprio sentido que ela possui: não é um documento factual, mas sim algo pressuposto. Kelsen explica melhor:

A norma que representa o fundamento de validade de uma outra norma é, em face desta, uma norma superior. Mas a indagação do fundamento de validade de uma norma não pode, tal como a investigação da causa de um determinado efeito, perder-se no intermi-nável. Tem de terminar numa norma que se pressupõe como a última e a mais elevada. Como norma mais elevada, ela tem de ser pressuposta, visto que não pode ser posta por uma autoridade, cuja competência teria de se fundar numa norma ainda mais elevada. [...] Uma tal norma, pressuposta como a mais elevada, será aqui designada como norma fundamental. [...] Todas as normas cuja validade pode ser reconduzida a uma e mesma norma fundamental formam um sistema de normas, uma ordem normativa. A norma fundamental é a fonte comum da validade de todas as normas pertencentes a uma e mesma ordem normativa, o seu fundamento de validade comum (grifo nosso)9.

Ao se valer, pois, dessa pressuposição – de que há uma norma básica, através da qual todas as outras podem ser identificadas numa sequência de atribuição de validade –, Kelsen demonstrou se submeter à influência de Kant no que diz respeito a aceitação de que em todo ramo do conhecimento haverá de se reconhecer alguma pressuposição10.

Para finalizar a análise da concepção jurídica, deve-se dizer ainda que foram desenvolvi-dos dois sentidos para o vocábulo “Constituição”:

(i) no primeiro, lógico-jurídico, “Constituição” significa a “norma fundamental hi-potética”, que não é posta, mas sim pressuposta, e que positiva apenas o comando “obede-çam a Constituição positiva”;

(ii) o segundo, jurídico-positivo, traz “Constituição” como norma positiva suprema, que fundamenta e dá validade a todo o ordenamento jurídico, somente podendo ser alte-rada se obedecidos ritos específicos.

Teoria Pura do Direito.-

Teoria do Direito Lumen Juris

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 33

Em conclusão, a concepção puramente normativa da Constituição não considera se o docu-mento constitucional é estabelecido por alguma vontade política, tampouco se reflete fielmente os fatores reais de poder que regem a sociedade. Ao contrário, vê a Constituição enquanto um conjunto de normas jurídicas prescritivas de condutas humanas, devidamente estruturadas e hie-rarquizadas num ordenamento escalonado, que encontra seu fundamento de validade definitivo e último na norma fundamental, ponto de convergência de todas as normas integrantes do sistema jurídico e fundamento de validade transcendental de toda a estrutura normativa.

2.5. Concepção culturalista da Constituição (a busca por alguma conexão entre os sentidos anteriormente apresentados)Esta acepção desenvolve-se a partir da consideração de que a Constituição é um pro-

duto da cultura, pois assim como a cultura é o resultado da atividade criativa humana, o Direito também o é.

Para esta concepção, a Constituição se fundamenta simultaneamente em fatores sociais, nas decisões políticas fundamentais (frutos da vontade política do poder constituinte) e tam-bém nas normas jurídicas de dever ser cogentes. Com isso, congrega todas as concepções anteriores, criando o ambiente jurídico favorável ao surgimento de uma Constituição total, com aspectos econômicos, morais, sociológicos, filosóficos e jurídicos reunidos com o fito de construir uma unidade para a Constituição.

Esse conceito de Constituição total agrega, numa mesma e unitária perspectiva, variados aspectos (econômicos, morais, sociológicos, filosóficos e jurídicos), o que afasta a visão estreita acarretada pelo isolacionismo das acepções anteriormente estudadas.

Para a teoria culturalista não parece adequado explicar a Constituição como um mero fato social, como pretenderam os adeptos da concepção sociológica. Isso porque em que pese as perspectivas social, econômica e história influenciarem, claro, o desenvolvimento da ordem jurídica, esta última não se reduz a um simples produto das infraestruturas sociais. Também a limitação da Constituição à decisão política fundamental tem sua importância – especialmente no que se refere à robustez conferida à doutrina do poder originário enquanto tradução da vontade política da nação – mas não explica satisfatoriamente o conceito. Por último, a percepção jurídica também não parece, aos partidários da leitura culturalista, uma acepção completa haja vista se dissociar em demasia das bases empíricas que a produziram, desconsiderando completamente a realidade social concreta que ela visa normatizar.

É nesse sentido que alguns autores têm demonstrado inequívoca predileção pelo cultura-lismo como forma de entender e explicar o conceito de Constituição. De acordo com Dirley: “Devemos, porém, confessar que a concepção de Constituição como fato cultural é a melhor que desponta na teoria da Constituição, pois tem a virtude de explorar o texto constitucional em todas as suas potencialidades e aspectos relevantes, reunindo em si todas as concepções – a sociológica, a política e a jurídica – em face das quais se faz possível compreender o fenômeno constitucional"11.

11. Curso de Direito Constitucional.

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 73

indiretamente, o que evidenciou um novo enfraquecimento da Federação e a consequente centralização política no âmbito da União.

A ordem constitucional outorgada também previa a possibilidade de suspensão dos di-reitos políticos, na hipótese de abuso de direitos individuais, como da liberdade de expressão, de reunião e de associação (art. 151, parágrafo único), além de estender à Justiça Militar a competência para julgar civis pela prática de crimes contra a segurança interna ou contra as instituições militares (art. 173, caput).

A primeira emenda feita à Constituição de 1967 acabou por alterá-la por completo. Em razão disso, a maioria da doutrina fila-se à ideia de que a Emenda Constitucional nº 1 de 1969 (de 17.10.1969, com entrada em vigor em 30.10.1969) foi utilizada como mecanismo de outorga de um novo texto constitucional, o qual, embora reafirmasse parte dos dispositi-vos da Carta de 1967, introduziu alterações significativas para o sistema constitucional. Em linhas gerais: fortaleceu ainda mais a figura do Presidente da República; alargou as hipóteses autorizadoras da suspensão dos direitos políticos; além de estabelecer as penas de morte, de prisão perpétua, de banimento ou confisco, nos casos de guerra “psicológica adversa, ou re-volucionária ou subversiva, nos termos que a lei determinar” (art. 153, § 11).

Conquanto o documento de 1969 tenha mantido, sob o aspecto formal, nossa condição jurídica de Estado Democrático de Direito, em verdade, a exacerbação dos poderes previstos ao Presidente da República, assim como as inúmeras hipóteses de suspensão de direitos indi-viduais, faziam com que essa locução não passasse de uma quimera.

Por último, insta registrar que a EC 26, de 27.11.1985, convocou a Assembleia Na-cional Constituinte que, entre fevereiro de 1987 a outubro de 1988, confeccionou o texto constitucional vigente, do qual esta obra, precipuamente, se ocupa.

8. QUADRO SINÓTICO

INTRODUÇÃO 1

conjunto de normas fundamentais e supremas, que podem ser escritas ou não, responsáveis pela criação, estruturação e organização político-jurídica de um Estado.

CONCEPÇÕES DE CONSTITUIÇÃO 2

Introdução aos sentidos e as concepções de maior repercussão

2.1

Constituição sob o prisma sociológico

conceito sociológico Ferdinand Lassalleo produto da soma dos fatores reais de poder que regem a sociedade. 2.2

Constituição sob o aspecto político

Carl Schmitt

“decisão política fundamental” - 2.3

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson74

Constituição em sentido jurídico

norma superior, -fundamenta e dá validade a todo o restante do ordenamento jurídico.

Hans Kelsenestritamente jurídica

toda norma retira sua validade de outra que lhe é imediatamente superior.

Concepção culturalista (a busca por alguma conexão

entre os sentidos anteriormente apresentados)

a Constituição é um pro-duto da cultura

--

CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES 3

Quanto à origem

Democrática --

3.1

Outorgada

-

Quanto à origem

Cesarista

-

-

3.1

Dualistas (ou convencionadas)

--

-

Quanto à estabilidade

(mutabilidade ou processo de modificação)

Imutável--

3.2

Transitoriamente imutável

-

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 75

Quanto à estabilidade

(mutabilidade ou processo de modificação)

Fixa-

3.2

Rígida

-

Flexível-

Transitoriamente flexível

-

-

-

Quanto à estabilidade

(mutabilidade ou processo de modificação)

Semirrígida

---

-3.2

Quanto à forma

Escrita

3.3

Não escrita

-

-

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson76

Quanto ao modo de elaboração

Dogmática

-

Histórica-

Quanto à extensão

Analítica

-

Concisa

Quanto ao conteúdo Material

--

Quanto ao conteúdo Formal

-

-

-

-

(1)

(2) -

-

(3) -

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 85

CONSTITUIÇÃO DE 1967 E A EMENDA CONSTITUCIONAL

Nº 1/1969

-

-

caput

-

-

9. QUESTÕES

9.1. Questões objetivas

1. (TRT 21ªR/Juiz/TRT 21ªR/RN/2011) Leia as assertivas seguintes e indique a resposta correta:

-

--

-

2. (CESPE/Defensor Público/DPE/MA/2011) O art. 102, caput, da CF dispõe que compete ao STF, preci-puamente, a guarda da Constituição, o que implica dizer que essa jurisdição lhe é atribuída para im-pedir que se desrespeite a Constituição como um todo, e não para, com relação a ela, exercer o papel de fiscal do poder constituinte originário, a fim de verificar se este teria, ou não, violado os princípios de direito suprapositivo que ele próprio havia incluído no texto da mesma CF. Por outro lado, as cláu-sulas pétreas não podem ser invocadas para sustentação da tese da inconstitucionalidade de normas

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson86

constitucionais inferiores em face de normas constitucionais superiores, porquanto a CF as prevê apenas como limites ao poder constituinte derivado ao rever ou ao emendar a CF, elaborada pelo poder constituinte originário, e não como abarcando normas cuja observância se impôs ao próprio poder constituinte originário com relação a outras que não sejam consideradas cláusulas pétreas, e, portanto, possam ser emendadas. Ação não conhecida por impossibilidade jurídica do pedido. ADI 815, relator min. Moreira Alves, DJ, 10/5/1996 (com adaptações).

3. (FCC/Analista Judiciário/TRE/PE/2011) No tocante à interpretação das normas constitucionais, o Prin-cípio da Força Normativa da Constituição determina que:

-

4. (INSTITUTO CIDADES/Defensor Público/DPE/GO/2010) A maioria da doutrina constitucionalista ad-mite a especificidade da interpretação constitucional e lista alguns princípios a serem observados nessa tarefa. Quando o intérprete se depara com duas normas constitucionais aparentemente con-traditórias e incidentes sobre a mesma situação fática, o princípio aplicável é o da:

5. (TRT 23ªR/MT/Juiz do Trabalho/TRT 23ªR/2012 - Adaptada) Analise as proposições abaixo e indique a alternativa correta:

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 87

6. (CESPE/Analista Judiciário/AL/2012) A respeito de Constituição e aplicabilidade das normas constitu-cionais, analise a assertiva abaixo:

7. (PGR/Procurador/2011– Adaptada) Analise a assertiva abaixo:

-

8. (TRT 23ªR/Juiz/TRT 23ªR/2011– Adaptada) No que tange aos princípios constitucionais e à interpre-tação constitucional, marque a opção CORRETA à luz da doutrina constitucional contemporânea:

-

-

9. (VUNESP/Defensor Público/DPE/MS/2014 - Adaptada) No que se refere à Hermenêutica Constitucio-nal, analise as assertivas:

-

-

10. (CESPE/Juiz/TJ/AL/2008) Para Konrad Hesse, as normas jurídicas e a realidade devem ser consideradas em seu condicionamento recíproco. A norma constitucional não tem existência autônoma em face da reali-dade, e a Constituição não configura apenas a expressão de um ser, mas também de um dever ser. Assim, para ser aplicável, a Constituição deve ser conexa à realidade jurídica, social, política; no entanto, ela não é apenas determinada pela realidade social, mas também determinante desta.

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson96

53. (ESAF/Procurador da Fazenda Nacional/PGFN/2015 - Adaptada) Considerando a história constitucio-nal do Brasil, julgue a assertiva:

54. (TRF 3ªR/Juiz Federal Substituto/TRF 3ªR/2016 - Adaptada) Considere a história constitucional do Brasil e julgue a seguinte assertiva:

55. (Vunesp/Titular de Serviços de Notas e de Registros – Remoção/TJ-SP/2012) “No Brasil tivemos, até hoje, 8 (oito) Constituições: 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, 1969 e 1988, muito embora alguns autores não considerem a emenda constitucional de 1969 como uma nova Constituição”. O texto

-

9.2. Questões discursivas

1. (CESPE/Juiz/TJDFT/2014 – Adaptada) Em relação à hermenêutica constitucional e ao poder de alterar a Constituição, responda justificadamente ao seguinte quesito:

2. (TRF 2ªR/Juiz Federal/TRF 2ªR/2013) Diferencie as técnicas decisórias da interpretação conforme a Constituição e da inconstitucionalidade parcial sem redução de texto, fornecendo ao menos um exemplo de aplicação de cada uma delas.

3. (FCC/Magistratura Estadual/TJCE/2014) Se queremos caracterizar não apenas a interpretação da lei pe-los tribunais ou pelas autoridades administrativas, mas, de modo inteiramente geral, a interpretação jurídica realizada pelos órgãos aplicadores do Direito, devemos dizer: na aplicação do Direito por um órgão jurídico, a interpretação cognoscitiva (obtida por uma operação de conhecimento) do Direito a aplicar combina-se com um ato de vontade em que o órgão aplicador do Direito efetua uma escolha entre as possibilidades reveladas através daquela mesma interpretação cognoscitiva. Com este ato, ou é produzida uma norma de escalão inferior, ou é executado um ato de coerção estatuído na norma jurídi-ca aplicada. Através deste ato de vontade se distingue a interpretação levada a cabo pela ciência jurídi-ca. A interpretação feita pelo órgão aplicador do Direito é sempre autentica. Ela cria o Direito. (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Trad. De João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1987, p. 369). Numa analogia a um texto final de uma obra de Wittgenstein, lógico que Kelsen privou em seus tempos de Viena, segundo o qual não se pode falar, deve-se calar, poderíamos dizer que para o nosso jurista, o que a ciência jurídica não pode descrever, deve omitir. Esta coerência de Kelsen com seus princípios metódicos, porém, nos deixa sem armas. Sua renúncia pode ter um sentido heroico, de fidelidade à ciência, mas deixa sem fundamento a maior parte das atividades dogmáticas, as quais dizem respeito à hermenêutica. E ademais não explica a diferença entre a mera opinião do doutrinador, que busca, com os meios da razão jurídica, o sentido da norma. A diferença, em termos de aceitação, resta meramente política. Ou seja, para Kelsen, é possível denunciar, de um ângulo filosófico (zetético), os limites da her-menêutica, mas não é possível fundar uma teoria dogmática da interpretação. (JUNIOR, Tércio Sampaio Ferraz. Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: Atlas, 2 ed.; p.263). Considerando os textos citados acima e o tema da interpretação do Direito no pensamento de Hans Kelsen, responda:

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 97

Gabarito questões objetivas

Gab. Fundamentação legal, jurisprudencial ou doutrinária Onde encontro no livro

1 C

-

-

-

-

-

2 C

-

-

-

-

-

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson98

Gab. Fundamentação legal, jurisprudencial ou doutrinária Onde encontro no livro

3 B

-

4 B

-

--

-

-

-

5 E

-

-

-

-

--

6 F

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 99

Gab. Fundamentação legal, jurisprudencial ou doutrinária Onde encontro no livro

7 V

-

-

-

8 B

-

-

8 B

-

9

F

V

--

-

10 B

-

--

-

--

Cap. 1 • TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 111

Gab. Fundamentação legal, jurisprudencial ou doutrinária Onde encontro no livro

55 B

--

-

Gabarito questões discursivas

Item Fundamentação legal, jurisprudencial ou doutrinária Onde encontro no livro

1

-

-

2

--

-

2

caput-

MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Nathalia Masson112

Item Fundamentação legal, jurisprudencial ou doutrinária Onde encontro no livro

3

A

-

B

-

C

-

-