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Um mapa da aao e organizaao dos
grupos skinheads no
estado do Parana
~ ~
Odiados e Orgulhosos
Ricardo Ampudia
Odiados e Orgulhosos
Ricardo Ampudia
Reviso
Jeferson Augusto Gonalves
Jean Souza
Eveline Martins
Orientao
Prof. Ms. Rafael Schoenherr
Capa e projeto grfico
Ricardo Ampudia Talachia
Livro-reportagem apresentado como Trabalho de
Concluso de Curso para obteno do ttulo de
bacharel em Comunicao Social Jornalismo na
Universidade Estadual de Ponta Grossa.
2006
s vtimas da intolerncia
Sumrio
Introduo
Captulo 1- As origens
O incio do skinhead
Oi!Oi!Oi!
Captulo 2 - Tomando posio
Nem direita, nem esquerda
We are the reds!
Pela Direita
Sangue e Honra
Blood & Honour no Brasil
Hamerskins Nation
Captulo 3- Futebol e pancadaria
Holligans
Ultras
Medo na Copa
Hooligans Brasileiros
Captulo 4 - Carecas do Brasil
Do punk ao careca
Nazistas moda da casa
Carecas do ABC
Captulo 5 - Carecas no Paran
Carecas de Londrina
Encontro marcado
Fascismo brasileira?
Carecas de Maring
Verses
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
Captulo 6 - Carecas de Curitiba
A primeira gangue de Curitiba
Sulismo
Punks vs Carecas
Carecas da capital
Trads
Captulo 7 - A ideologia do dio
A escalada da intolerncia na Europa
Nazismo reformado
A grande mentira do sculo XX
Herana nazista no Brasil
Carrascos fugitivos
Captulo 8 - Poder Branco
Sangue imigrante, sangue ariano
Hitler vai te matar
Curitiba White Power
Os fatos
O caso
Os alvos
No banco dos rus ou
Ministrio Pblico versus Curitiba White Power
Captulo Final
Por que ainda no nos livramos do nazismo?
Boas iniciativas e a observao final
Odiados e Orgulhosos
Ns, Carecas do Brasil, somos contra
racistas,
comunistas,
anarquistas,
neonazistas e
outros lixos que existem em nossa Ptria.
Somos ultra-conservadores sim!
Porque Deus criou o homem e a mulher
e no existe uma terceira opo.
Temos todo o direito de no aceitar vocs
libertrios que no fazem nada para ajudar
o Brasil e s ficam fazendo manifestos idiotas
ao invs de lutar por uma causa maior,
contra as drogas, corrupo, por exemplo,
esses sim so verdadeiros problemas que temos.
ODIADOS E ORGULHOSOS, SEMPRE! OI!
PELO NOSSO BRASIL,
NOSSA SOBERANIA!
CARECAS DO BRASIL
ETERNAMENTE.
LONGA VIDA AO OI! E A NS!*
*(extrado do fanzine CONSCINCIA OI!Carecas do Vale do Paraba- Jacare-SP)
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8
Introduao~
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
No era a primeira vez que ouvia essa histria, j a tinha
ouvido outras vezes, cada vez com uma maior riqueza de detalhes. A
verdade que ele nunca gostou muito de tocar nesse assunto, mas
sempre o fazia com a inteno de reforar a idia de que
precisvamos ficar atentos para no sermos os prximos.
Era noite, sentamos em cima de um tijolo de frente um para o
outro, em sua casa que, durante aquela reforma s tinha um cmodo
de madeira, dividindo espao com meias paredes de alvenaria que
ele mesmo estava levantando.
C.M. punk, tem 28 anos, no consigo precisar desde
quando nos conhecemos, mas eu tambm era punk, colvamos
juntos, tivemos uma banda, brigamos, deixamos de nos falar at que
um dia ele apareceu em minha casa dizendo pra gente deixar as
desavenas de lado. Ele me ensinou a maioria das coisas que eu sei
sobre a contracultura punk e me incentivou deveras a escrever este
livro.
Enchemos nossos copos de vinho, sob a luz de uma fraca
lmpada colocada do lado de fora, fazia frio.Vou colocar esse som
aqui, disse ele de dentro do casebre, estendendo a mo pra fora
segurando a capa de um vinil do Fear of God e depois a cabea:
Conhece?.
- Me conta aquela histria do teu ataque l, como que foi?
- Vixi, foi nervoso, disse ele apreensivo. Foi uma mo assim:
A gente tava voltando de um som com vrias bandas punks
no campus da Federal. Samos em dois casais com uma criana de
uns oito meses num carrinho de beb. A gente at brincou no
caminho, o beb tava dormindo e a gente ficou dizendo que ele tinha
curtido o som.
A passou por ns um Jipe Toyota e deixou um cara num
ponto de nibus um pouco a nossa frente, mas nem demos bola.
Quando dobramos a esquina vimos uns seis caras na outra ponta da
quadra e achamos a movimentao estranha e j nos ligamos.
Tentamos desviar, atravessando a rua, passando pelo ponto de
nibus.
Quando a gente tava passando pelo ponto, esse cara que
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desceu antes, virou e me bateu com um soco ingls no rosto. Eu
atordoei na hora, me recuperei e comecei a sair na mo com o cara,
nisso os outros que estavam na esquina vieram correndo e gritaram
careca, punk. Corre!.
Pedimos para as meninas fugirem com o beb, um dos
carecas ainda correu atrs da me e cortou as costas dela com um
faco, mas o companheiro dela segurou o cara com uma corrente.
Ficamos s ns dois contra os sete caras e resolvemos fugir.
Sa correndo por uma rua escura com dois caras atrs de mim, um
deles ficou no meu encalo, estava com um capuz e alguma coisa na
mo. Ainda lhe perguntei: o que foi que eu te fiz?, a tropecei e
ca, j em posio fetal, pra me proteger.
Ele me bateu duas vezes na cabea com uma machadinha,
por sorte, eu protegia a cabea e pegou minha mo, na hora nem
percebi o que tinha acontecido, fiquei no cho at quando eu ouvi o
barulho de tiros, disparados pra cima por um cara pra apartar a
briga, e os carecas dispersaram.A o jipe passou e todo mundo fugiu
nele.
Foi s ento que percebi o que tinha acontecido com minha
mo, que estava toda ensangentada com os nervos todos expostos.
O cara dos tiros se aproximou e vi que era um conhecido nosso da
rua, que j chamou o Siate em seguida.
O Siate chegou mais rpido do que a gente imaginava,
estavam ali perto atendendo uma outra ocorrncia de um garoto de
rua que tinha sido espancado por uns caras, atrs da Igreja, na
Saldanha Marinho.
Mas quando chegaram l o garoto j tinha morrido. Depois
testemunhas disseram que viram o mesmo jipe cinza circulando por
l naquela noite.
O M., outro punk que me acompanhava tambm tomou uma
machadada na mo. Eu passei por vrias cirurgias e alguns meses
de recuperao, mas fiquei bem, ele j teve os movimentos da mo
comprometidos.
Durante o perodo de recuperao eu fiquei morando na
casa de um amigo. Num certo final de semana, mesmo detonado, fui
num show pra rever a galera e nessa noite no voltei pra l, fiquei na
casa de uns outros punks.
No outro dia de manh, fiquei sabendo que eles [os carecas]
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estiveram l e num moc ali perto me procurando, dizendo que iam
terminar o servio.
Na segunda-feira, logo depois desse dia, quando fomos ao
centro expor nossos artesanatos, a calada onde a gente expunha
estava toda pichada em vermelho Contra-ataque skinhead, anar
cu Oi!Oi!Oi! e duas machadinhas cruzadas.
A tomei a deciso: Vou embora antes que os caras me
matem, sa de Curitiba e no pretendo nunca mais voltar a morar
l.
Eu me perguntava: a troco de que algum devotaria seu
tempo e disposio para acabar com vida de outros? Que tipo de
ideologia era essa, que prega o dio e a intolerncia e quem so essas
pessoas?
Essas respostas nunca viriam nas pginas dos jornais, nem
nos noticirios da TV. Muitas histrias semelhantes a essa ficaram
ocultas, por medo, e s so ouvidas no submundo da rua, na
convivncia dos grupos contraculturais e minorias tnicas, que tm
de arrumar modos para se proteger e no entrar para as estatsticas.
Foi compartilhando desse medo, o de ser o prximo, que me
aproximei de uma bem montada rede clandestina de informaes a
respeito de neonazistas e carecas, mantida por punks de diversas
cidades do estado. Todo punk sabe da movimentao em sua cidade.
Faltava desvendar o que era mito e o que era real, descobrir a
verdadeira retrica dos grupos skinheads paranaenses. Durante
quase um ano, reuni estrias e entrevistas, alm de passar horas
revirando papis de arquivo e recortes de jornal e at arriscar meu
prprio pescoo numa aproximao mais real desse mundo.
O medo era freqente nas entrevistas, o anonimato era
pressuposto bsico at para conversas por e-mail. A grande maioria
de meus entrevistados preferiu usar apenas as iniciais, quando muito
apenas deixaram revelar seu primeiro nome.
Iniciei as investigaes tentando descobrir onde se
concentravam os grupos organizados de skinheads no estado. Ouvi
boatos sobre o Sudoeste, cidades como Mal. Cndido Rondon e
Cascavel.
Outras histrias remetiam a um quase folclrico nazista de
dois metros e tanto de Cianorte, que hoje bombeiro. Mas as
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investigaes s renderam frutos nas cidades de Curitiba, Londrina
e Maring, alm de suas respectivas regies metropolitanas.
Talvez seja mesmo no subrbio das grandes cidades que as
culturas skinhead e careca se desenvolvam e assim desde sua
origem, como veremos adiante. Mas isso no descarta a hiptese
desse tipo de atividade criminosa (me refiro ao neonazismo) se
desenvolver bem debaixo de nossos olhos em lugares jamais
imaginados.
O trabalho que segue pretende alertar a todos sobre a real
ameaa neonazista existente no pas e no estado do Paran, bem
como descriminalizar a to rica e, infelizmente, por vezes deturpada
contracultura skinhead.
As pessoas pensam que parania, mas uma coisa
real. C.M.
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A origem
Odiados e Orgulhosos
1
Odiados e Orgulhosos
O incio do skinhead
Na dcada de 1960, o mundo viveu umas das mais intensas
pocas no que diz respeito ao surgimento e disseminao das
contraculturas juvenis, contestao dos valores morais da poca,
do autoritarismo e do uso da violncia como forma de protesto.
A Inglaterra tinha uma efervescncia cultural peculiar,
sendo a casa dos Beatles, dos pubs undergrounds e de uma cena
musical que evolua a partir do rocknroll e ainda contava com uma
diversidade de culturas convivendo nas grandes cidades, fruto da
imigrao de jamaicanos e asiticos, atrs do progresso que o boom
econmico traria at a dcada de 70 .
Foi na segunda metade da dcada de 60 que os primeiros
skinheads ingleses surgiram. A cultura skin deriva principalmente
da conjuno de trs outras culturas juvenis: os hardmods, os Rude
boys jamaicanos e os hooligans.
Os primeiros so remanescentes radicais da cultura Mod,
surgida no fim da dcada de 50 e propagada ao mundo
principalmente por cones do rock como a banda The Who. Eram
rapazes briges que se vestiam com terninhos caros e
sapatos impecveis.
Os hardmods surgiram aps 1964 de um
grupo de adeptos que queria se distinguir dos mods
que rejeitavam a violncia como parte de sua
cultura.
Nessa poca o Mod j estava em decadncia
e mostrava sua face violenta. As brigas em pubs
eram cada vez mais constantes e as roupas
engomadas foram ento substitudas por algo mais
confortvel e eficiente para uma possvel briga:
botas e camisas. Ter o cabelo muito comprido nestas
situaes tambm no favorecia, o que foi cada vez
mais baixando o corte dos hardmods.
1
At 73 a Europa viveu a chamada poca de ouro. Com o crescimento da indstria e, conseqentemente dos postos de trabalho, levas de imigrantes chegaram Inglaterra, o que anos
mais tarde, quando a era dourada acabou, causaria uma grave crise social.
1
17
Os Rude Boys eram um grupo de jovens jamaicanos,
amantes do ska (msica rpida, com metais, mais acelerado que o
reggae) e usavam terninhos com mangas curtas e calas com o
coturno mostra. Os primeiros skins eram filhos de operrios que
dividiam o bairro com migrantes jamaicanos e seus filhos, que
trataram de importar a cultura Rudeboy para a Ilha.
J os hooligans apareceram na cena cultural europia aps a
Copa de 1966, que iniciou um grande boom entre os ingleses: a
paixo pelo futebol. Os jovens aprenderam a freqentar os estdios,
a irem em partidas fora de casa e, como era tpico da juventude da
poca, arranjar confuso.
Verdadeiros campos de batalha se formaram nas
arquibancadas por garotos armados de pedras, alambrados, laranjas
e botinas (da o termo bootboy - como so chamados os skins que
vo aos estdios), quanto maior era a represso policial mais a
confuso ia sendo levada para fora dos estdios, chegando s
estaes de metr, pubs e becos.
Em 1969, skinhead era o termo cunhado para definir este
novo grupo de garotos arruaceiros, provenientes dessa mescla
cultural, de visual caracterstico pela cabea raspada, camisas
justas, calas jeans curtas ou dobradas o modelo preferido era
Levis, feita para usar na altura do quadril, mas eram puxadas para a
cintura, da a necessidade de um suspensrio e coturnos bem
engraxados, sempre dispostos a brigar.
Mas o que definia um verdadeiro skinhead ingls no era
apenas seu visual, mas o esprito rueiro, o orgulho de pertencer a um
grupo, de ter nascido e vivido em um lugar, da advinham as
qualidades mais admiradas pelos skins: a fora, a honra e o orgulho.
Oi!Oi!Oi!
No final de 1970, as coisas no iam bem para os skinheads.
O governo ingls resolveu tomar providncias quanto ao seu mau
comportamento, para limpar a imagem do pas na imprensa do
mundo todo, um verdadeiro toque de recolher foi imposto aos skins
londrinos.Qualquer um de botas e cabea raspada andando pelas
2
-
-
2
O termo skinhead era utilizado devido ao penteado curtoquepossibilitava ver o courocabeludo.
18
ruas era alvo da polcia, sedenta por faz-los andarem na linha.
A cultura skinhead era associada puramente violncia,
justamente pela garotada mais nova na cena, que s se importava em
confrontar gangues rivais ou qualquer um que usasse jaqueta de
couro e topete brilhantina.A dura represso policial e alguns
amigos na cadeia levaram muitos a aposentarem o suspensrio e
optar por uma vida mais comum.
O surgimento do punk, em 1976, parecia ter abafado de vez o
esprito de 69 (como ficou conhecido a raiz do skinhead - a primazia
do vestir, os bailes de reggae e ska jamaicanos e as gangues de
bairro), mas, pelo contrrio agitou um novo levante dos skins
ingleses.
Em 1976, os Sex Pistols despontavam como um tapa na cara
do mercado musical. Apontada como a primeira banda punk, era
composta de garotos mal vestidos, declaradamente a favor das
drogas e da libertinagem, cantando composies nada educadas,
num estilo extravagante que ia alm do que tinha se visto nos palcos
at ento.
Mas poucos anos depois, o discurso vazio do vocalista
Johnny Rotten e seu empresrio Malcon Mclaren, dono de uma loja
de roupas caras num boulevard da cidade, j no fazia mais a cabea
dos punks londrinos interessados em mudar o estado das coisas, em
combater a misria e o militarismo.
As incessantes aparies dos Pistols na mdia deixaram de
ser chocantes e, em 1978, a atitude punk de contestar o consumo e a
moda havia sido abocanhada pelo prprio mercado e alguns
anunciavam que a essncia do punk havia morrido.
Enquanto isso acontecia, de 76 a 78, alguns punks ingleses,
desiludidos com o punk de boutique que fazia o circuito nada
underground da cidade, raspavam a cabea em sinal de repdio aos
falsos punks e adotavam a rua como o lugar dos acontecimentos.
Nascia o esprito rueiro e, na esteira do punk rueiro,
surgiam bandas como Cock Sparrer, Angelic Upstarts, Cockney
Rejects, e a mais importante de todas, Sham 69. Pela primeira vez as
mesmas pessoas que curtiam o som nas gigs eram as mesmas que
estavam no palco e as gigs iam pipocando pela Inglaterra.
3
3
Festivais de msica promovidos de/para skinheads, o termo tambm usado pelos punks
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As confuses nos shows iam sistematicamente acabando
com as bandas, os partidrios do National Front e do British
Moviment, organizaes da extrema-direita inglesa, que se
encarregavam de fechar gigs antifascistas sempre apareciam
procurando uma briga ou outra.
Quando no eram eles eram partidrios da Rock Against
Racism - organizao juvenil da esquerda inglesa que promovia
shows de bandas contra o racismo - acusando as bandas de ligaes
com o neonazismo e propaganda xenfoba.
A simpatia com a direita tornara-se, j em 76, um grave
problema para a cena musical inglesa, a mdia acusava qualquer
banda cujo pblico era formado por skins, de fascistas e partidrios
do NF. A questo que as acusaes comeavam a ser paranicas, e
qualquer um que no tomasse partido seria fascista para os
tablides.
At a banda Selecter, do respeitado selo 2Tone, que pregava
o anti-racismo at no nome, chegou a ser acusada pelo tablide
ingls Evening News de hitlerismo dos sete membros da banda,
apenas um era branco, o que no se encaixa exatamente no bitipo
dos soldados de Hitler.
Dentro deste conturbado cenrio onde poltica se misturava
com msica, Gary Bushell,
jornalista conhecedor da cena das
ruas, percebeu uma nova linha
mus ica l , ma i s p rx ima do
s e n t i m e n t o r u e i r o e d a s
arquibancadas dos estdios.
Bushell cunhou o termo Oi!
para defini-la - conta-se que o termo
vem da msica Oi!Oi!Oi! da banda
Cockney Rejects e, segundo George
Marsha l l , um sk inhead de
Glasglow, autor do livro A Bblia do
Skinhead, se devia insistncia do vocalista Stinky Tuner em repetir
o grito ao invs do costumeiro um, dois, trs - e lanou o LP pioneiro
4
-
4
2tone quer dizer dois tons, o xadrez de branco e preto era usado nas logos do selo, que foi um dos primeiros a lanar discos voltados para os skins.
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do gnero, Oi! The lbum, no fim de 1980, reunindo Angelic
Upstarts, Cockney Rejects, entre outras, revelando a ainda
desconhecida 4Skins, banda que melhor definiria o Oi! anos mais
tarde.
Mas a questo que se tornara crucial nas culturas jovens da
Inglaterra dos fins de 1970 era que todas estavam sobre um muro e
deveriam escolher para qual lado cair, podendo ser para a direita e
serem acusadas de xenofobia e racismo pelos tablides ingleses ou
poderia ser para a esquerda e serem usados como massa de manobra
do Socialists Workers Party (Partido dos Trabalhadores Socialistas,
ala da esquerda do parlamento ingls) e ainda verem suas gigs
destrudas por membros do NF.
A verdade que os skinheads no queriam se envolver com
poltica nenhuma. Bandas como a Last Resort pediam aos
espectadores que arrancassem de suas roupas qualquer smbolo que
identificasse uma posio poltica antes de entrarem nos shows e o
vocalista da 4Skins respondia as saudaes nazistas da platia
dizendo: No precisa levantar a mo que eu no vou fazer
chamada.
Nem o escrnio, nem as precaues foram suficientes para
evitar que o Oi! fosse tachado de msica neonazista e as coisas
ficaram realmente srias depois do conflito entre asiticos, na sua
maioria paquistaneses migrantes, e skinheads durante uma gig do
4Skins em Southall, bairro londrino de maioria asitica, em julho de
1981.
O pub onde acontecia o show ficou completamente
destrudo pelo fogo, assim como boa parte do bairro e da estao de
metr. Era o que faltava para sujar a barra do movimento skinhead
ingls, para sempre rotulados de nazistas, longe do esprito de 69,
de msica por diverso.
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22
2Tomando posiao~
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
Nem direita, nem esquerda
A idia de manter uma distncia segura de
qualquer posio ideolgica sempre foi
assimilada por boa parte das bandas inglesas que fizeram parte da
cena original dos skinheads. Mesmo aps 1980, quando o
movimento se definia em diversas partes do mundo como um
movimento, no mnimo, nacionalista.
Eis que em 1986, um grupo de Mineapollis chamado
Carecas contra o racismo, deu origem ao projeto Anti-Racist Action
(Ao Anti Racista), para congregar skinheads na luta contra o
racismo e a xenofobia.
Inspirado na idia, em Nova York, um grupo de skins fundou
a organizao Skinheads Against Racial Prejudice (Skinheads
Contra o Preconceito Racial), organizada em sedes regionais.
Roddy Moreno, vocalista da banda inglesa The Opressed, visitou
Nova York por volta de 89 e gostou da idia, expandindo-a para a
Europa, criando sees por l.
A SHARP prega a distncia da contracultura skinhead dos
partidos e organizaes polticas, sejam elas de direita ou esquerda e
pregam uma atitude positivamente anti-racista, num argumento de
lgica j que, sem o ska e os rudeboys jamaicanos, o skinhead nem
existiria.
Hoje a SHARP mais uma designao pessoal, de uma
atitude anti-racista, existem pessoas que se afirmam SHARPs
mesmo sem serem filiados a uma seo. No Brasil, apesar de no
existirem sees reconhecidas, muitos indivduos se dizem
SHARPs, principalmente na regio Sul, em Curitiba, por exemplo,
onde existem diversos skinheads tradicionais (prezam o esprito de
69) e SHARPs.
We are the reds!
No s o neonazismo produzira jovens violentos e dispostos
a destruir bares e crnios em nome de sua posio poltica. Em
25
meados de 1984, em Paris, um grupo de jovens skins resolveu se
encarregar de fazer a segurana de festivais de msica e congressos
do Partido Socialista, mantendo os fachos longes.
O visual era uma mescla dos coturnos skinheads, dos
suspensrios dos operrios socialistas e adornos e penteados que
lembravam indgenas, da o trocadilho, triplamente empregado,
surgiam os Redskins.
Pela Frana comearam a surgir caadores de skinheads
neonazistas, grupos como Lenin Killers, Red Action Skinhead e os
temidos Red Warriors que tinham como emblema uma foice
cruzada com um basto de beisebol. Musicalmente, o grupo era
to misto quanto o visual adotado, bandas como a inglesa The
Redskins, faziam algo prximo do hardrock, enquanto a basca
Kortatu produzia uma mistura de dub e hiphop.
Os redskins viram sua cultura se mesclar ao skinhead
ressurgimento da cultura skin original atravessou o Canal da
Mancha, j perto da dcada de 90. Os redskins passaram a adotar o
termo Redskinheads e espalharam-se pela Europa sempre atreladas
extrema-esquerda, reunindo inclusive anarquistas.
Para congregar todos os skinheads anarquistas e comunistas
do mundo nasce, em 1993, em Nova York, a RASH (Red &
Anarchist SkinHeads), contando posteriormente com sees na
Frana, Colmbia, Chile, Itlia, Quebec (Canad), Pas Basco e
Espanha.
O RASH passou a designar uma opo poltica de cada skin.
Pode-se dizer, por exemplo, que fulano rash, mas a RASH
United quem reconhece as sees pelo mundo todo e que devem
necessariamente aceitar todos os pontos de sua carta de princpios,
que inclui a ausncia de sectarismo, o combate ao racismo,
homofobia e ao machismo, bem como ao fascismo. Outro ponto do
documento rejeita a autoridade da polcia e recusa qualquer tipo de
cooperao com ela.
Na Amrica do Sul, o movimento ainda forte na
Colmbia e Chile. No Brasil, existem apenas duas pequenas sees
uma em So Paulo, oficialmente reconhecida pela RASH e outra em
Fortaleza, ainda em fase de reconhecimento.
Um dos integrantes da RASH So Paulo, que se deixou
identificar apenas como Janana, conta que o grupo tem atualmente
26
Os Redwarriors faziam a guarda
dos comcios dos partidos socialistas
franceses e ainda caavam naziskins pela
cidade.
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
27
Arquivo/Carecas do Interior
Barricata
Zine/website
cerca de 20 membros diretos e mais cerca de 30 membros de
apoio, que se envolvem nas atividades de alguma forma, mas no
tm poder de voto e deciso. Segundo ela, a seo paulista foi
reconhecida com o apoio da RASH Portugal.
A relao dos skins vermelhos com os Carecas - skins
nacionalistas e Integralistas - no nada boa. De acordo com Janana
existem alguns amigos ou militantes do grupo que so SHARP ou
anarquistas, mas no existe contato com nenhuma seo organizada.
Quanto aos carecas, simplesmente no os reconhecemos como
skins, dispara.
Todo esse amor compartilhado tambm pelos Carecas do
Subrbio. O zine Filhos da Ptria, de Ribeiro Preto, So Paulo, traz
uma matria sobre os Redskins, intitulada Galinhas Vermelhas,
trazendo a alegao de que a histria sobre os skins comunistas
surgirem primeiro falsa: Essa histria comeou com uma banda
inglesa chamada Redskins, que era um a mistura de estudantes
comunas fs de soul e rockabillies [...] O visual dos Redskins e seus
fs era diferente dos skinheads verdadeiros [...] Foram ridculos
tanto ideologicamente quanto visualmente.
Quando perguntada sobre a histria de os primeiros skins j
serem nacionalistas, Janana nega. Independente do que era no
princpio, acreditamos que assim como a idia do punk rock evoluiu
e modificou-se, o mesmo se d conosco, se antes os skins no
estavam abertamente posicionados a esquerda, hoje esto, estamos
aqui promovendo o que acreditamos, lutando por nosso espao,
diz.
Pela Direita
Ainda no incio dos anos 1970, o British
National Party (Partido Nacional Britnico),
partido de extrema-direita ingls ganhava fora nas ruas atravs do
British National Front (conhecido como Frente Nacional), uma
organizao paramilitar que agia nas ruas da capital inglesa,
agredindo homossexuais, imigrantes e principalmente atacando
sedes de partidos comunistas, aos quais se opunham radicalmente.
A situao da ilha no ia bem desde os anos 60 quando uma ,
28
onda de histeria contra a imigrao comeou a tomar corpo pela voz
do parlamentar Enoch Powell, durante um discurso em 1968,
quando afirmou que a Inglaterra veria rios de sangue se no
tomasse medidas para conter a invaso estrangeira no pas .
At 1976, o discurso do Front e de Powell no fazia muito
sentido para a maior parte da populao inglesa, at que os tablides
se encarregaram de transformar dezenas de refugiados vindos de
Malaui em centenas de milhares, num movimento de xodo, um
prato cheio para a extrema-direita e seu discurso xenfobo.
Foi nas ruas que o National Front, atravs do Young
National Front (ala jovem do NF), encontrou jovens torcedores
fanticos dos times locais e arruaceiros convictos que, porm, se
preservavam das drogas, se importavam com a famlia e
valorizavam o trabalho.
Os skinheads se tornaram a linha de frente da ultradireita
inglesa, se divertindo na noite fazendo o paki bashin -
malhao do paki, como era conhecida perseguio aos
migrantes orientais - e participando das reunies do Partido, que por
sua vez financiava gigs e at montou um selo para distribuir discos
de msica ariana, o White Noise Club.
No s os skinheads tiveram contato com a extrema-direita,
alguns punks londrinos fundaram, em 1978, o Punk Front, grupo
que reunia punks que compartilhavam das idias neonazistas,
conhecidos como NaziPunks ou HatePunks. No entanto, o
movimento nunca chegou a crescer muito, pela prpria rejeio de
outros grupos punks, na sua maioria anarquistas ou comunistas. O
movimento ainda existe em pequena escala na Alemanha, Sucia,
Estnia, Litunia e Chile, onde os nazipunks se envolveram, em
2005, na morte de um anarcopunk.
Em 1979, o NF contava com cerca de 15 mil filiados, mas
boatos na imprensa sobre a ndole de seus representantes polticos,
acusando-os de corrupo de menores, por exemplo, fizeram
muitos skins desertarem e engrossarem as fileiras do British
5
6
g
5
Powell era do Partido Trabalhista ingls, ala da esquerda do parlamento, que no gostou nada de
seu discurso e o expulsou da sigla aps o episdio.
6
interessante ressaltar que o bashing era praticado desde os anos 60 pelos skinheads interessados em arruaa e confuso e no somente pelos neonazistas
29
Movement, uma associao abertamente nazista e que deixava os
meios polticos de lado, mais interessados em violncia.
Sangue e Honra
Na dcada de 80, a parceria da gravadora alem - a
Alemanha Oriental mostrou-se campo frtil para os neonazistas,
pela rejeio ao comunismo e pelo sonho da reunificao - Rock-o-
Rama com a White Noise comeou a no render bons frutos, quando
o endividamento de uma com a outra atrapalhou os projetos de
muitas bandas.
frente do racha estava Ian Stuart, vocalista da banda
Skrewdriver que outrora, anos antes, havia sido apontada como
uma das melhores bandas punks pela crtica musical e acabou se
envolvendo assumidamente com o NF em 1979 que, para competir
com o WNC, criou a Blood&Honour (Sangue e Honra, em
portugus) atualmente uma das maiores organizaes da juventude
neonazista pelo mundo, com sees em cerca de 17 pases, segundo
o site oficial do grupo.
Stuart ainda participou da criao da Combat 18 (18
equivalem s letras A e H, de Adolf Hitler), uma organizao
neonazista nascida nas arquibancadas dos estdios ingleses, junto
torcida organizada Chelsea HeadHunters. A Combat 18 ficou
conhecida por publicar em 1992, ano de sua criao, o boletim
RedWatch com nomes e endereos de comunistas e antifascistas, e
incitar a violncia contra eles.
No dia 24 de Setembro de 1993, Ian Stuart morreu num
acidente de carro, seus seguidores alegam que o acidente foi uma
sabotagem promovida pelo Servio de Inteligncia Britnica,
embora no haja nenhuma prova disso. O aniversrio de sua morte
celebrado pelo mundo todo pelas duas organizaes, que se uniram.
7
7 Sangue e Honra era a inscrio que vinha grafada nas facas dos soldados das tropas SS
30
Blood & Honour no Brasil
Na Argentina, a Blood&Honour/Combat18 conta com uma
seo que promove gigs atravs principalmente do grupo Legin
Negra, cujo lder conhecido como Sikito. Os neonazistas
portenhos so acusados de crimes de intolerncia no pas, sobretudo
contra os SHARPs, movimento com muitos adeptos no pas.
Existem ainda boatos de que abrigam neonazistas procurados pela
polcia de outros pases da Amrica do Sul, como um chileno
supostamente envolvido na morte de um SHARP de quinze anos de
idade, em Santiago, em 2005.
Em Julho de 2006, um grupo intitulado White Power So
Paulo (WPSP) lanou seu site na Internet, retirado do ar alguns dias
depois e relanado atravs de um servidor americano, j que a
legislao daquele pas permite tal prtica sob a alcunha de
liberdade de discurso. Uma semana aps o lanamento, os
neonazistas do WPSP ainda realizaram colagem de cartazes pelo
ABC Paulista, com dizeres pelo orgulho da raa branca e contra a
imigrao.
Segundo fontes seguras e que no se deixaram revelar, a
ao foi deflagrada com o intuito de mostrar servio para os
integrantes da BH Argentina. Sikito, segundo a fonte annima,
visitaria o Brasil em Agosto do mesmo ano, para negociar com
Alemo e Charles - apontados como mentores do WPSP - a criao
de uma seo da Blood&Honour no pas.
Charles j havia inclusive tentado iniciar, sem sucesso, uma
seo dos Hammerskins no Brasil.
Hamerskins Nation
We are fighting for the Hammerskins
We never lose. We always win!
Num mundo em que os skinheads representam o que h de
melhor na sociedade, ns somos o que de melhor existe nos
skinheads!, assim se autodefinem os hammerskins, filiados da
Hammerskins Nation (HSN), espalhados em sees pelo mundo
31
todo e que acreditam ser a elite dos skinheads neonazistas.
A HSN surgiu em meados de 1988, em Dallas, no Texas,
atravs de skinheads ligados a grupos que pregam a supremacia
branca como a Klu Klux Klan e decepcionados com a falta de ao
de skinheads ligados a tambm americana White Arian Resistance
(Resistncia Ariana Branca, outro grupo da juventude neonazista,
surgido na Sucia com ramificaes na Amrica).
Sob o lema Hammerskins Forever, Forever Hammerskins, o
grupo estabelece rgidas regras para reconhecer uma seo e filiar
novos membros ao que eles entendem como uma irmandade.
Tentar desistir de ser um hammerskin pode ter srias
conseqncias.Um homem foi encontrado crucificado em
Sacramento, nos Estados Unidos, no final dos anos 80, por querer
sair de um grupo que pregava a supremacia branca.
Os hammerskins so considerados o grupo skinhead
neonazista mais violento, com sees Canad, Inglaterra, Frana,
Alemanha, Holanda, Hungria, Portugal, Espanha, Nova Zelndia e
Austrlia.
O nome e a logo do grupo so inspiradas no clipe The Wall,
da banda Pink Floyd. Lanado em 1982, o filme relata uma histria
fictcia de uma anti-heri chamado Pink, que tem uma vida
humilhante desde sua infncia e um dia, durante uma alucinao
causada pelas drogas, imagina-se um ditador fascista, lder de uma
nao sob a bandeira de dois martelos sobre um escudo.
O Pink Floyd fez muito sucesso nas dcadas de 1970 e 80,
com seu rock progressivo inovador e letras ora psicodlicas, ora
contestadoras e nada tem a ver com o neonazismo.
Independentemente se pertencem a um grupo organizado ou
no, os skinheads neonazistas se intitulam White Power (Poder
Branco), mais conhecidos pelas iniciais WP. So supremacistas
brancos, negam o holocausto, idolatram Hitler e seus comandantes,
fazendo saudaes caractersticas e ostentando smbolos como a
sustica e a cruz celta.
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Espalhada por 17 pases no mundo , a Blood&Honour promove todos os anos uma grande
festa em homenagem pstuma a Ian Stuart, seu criador, misturando msica e racismo.
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
33
Website: Blood&Honour International
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Futebol e pancadaria
3
Odiados e Orgulhosos
Hoolligans
All seater grounds the rucking's no more
But up at the station we'll still have a war
Youre just a hooligan
A hardcore hooligan THE BUSSINESS - HARDCORE HOOLIGAN
Hooliganismo o termo utilizado para definir o
comportamento vndalo, violento e apaixonado de torcedores de
futebol, a palavra hooligan tem origem incerta, mas provavelmente
remonta transcrio errnea da palavra Hooley, nome de uma
gangue de Islington, e foi cunhado em 1898.
O comportamento hooligan to antigo quanto o termo, logo
nos primrdios do futebol ingls, ligado classe operria, centrada
em bairros, torcedores aterrorizavam as vizinhanas dos rivais,
provocando brigas e danificando propriedades.
Os enfrentamentos violentos entre torcedores de futebol
tornaram-se incontrolveis na ilha bret durante a dcada de 1970,
quando os estdios se tornaram verdadeiros campos de batalha. A
cada fim de partida as torcidas se encontravam para confrontos com
hora marcada em estaes de trem, ou portes do estdio.
O bero dos hooligans a Inglaterra, mas o termo
associado pela imprensa a torcidas organizadas em toda a Europa e
at no Brasil.
O fenmeno hooligan s tomou corpo mundialmente pela
cobertura da imprensa, taxada pelos prprios torcedores de
difamadora, sendo os jornalistas to odiados quanto a polcia.
Entre os mais tradicionais grupos ingleses esto os
torcedores do West Ham United, Manchester United, Nottingham,
Millwall e Liverpool. Os torcedores deste ltimo foram
protagonistas das duas maiores tragdias da histria do futebol
europeu: The Heysel disaster e The Hillsborough disaster
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8
A multido e as arquibancadas acabaramMas na estao ainda teremos uma guerra
Voc um hooligan
Um hooligan da pesada
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Juventus FC x Liverpool FC final da Copa dos Campees
Os torcedores do Liverpool derrubam a grade que os separa do setor
neutro (para ambas as torcidas), onde a maioria dos torcedores era do Juventus,
que passam a revidar com pedaos de pedra e barras de ferro do prprio
alambrado.
A torcida do Liverpool, em maior nmero, acua os torcedores rivais
junto murada que os separa da arquibancada trrea, a polcia entra em ao e
provoca mais correria e pnico, o muro no resiste e cai. Dezenas de torcedores
caem e morrem, outros so pisoteados na fuga.
Ao todo, 39 pessoas morreram. O Liverpool foi banido de competies
internacionais por dez anos, dos quais seis foram cumpridos e os demais times
ingleses banidos por cinco anos dos campeonatos europeus.
Liverpool x Nottingham - final do Campeonato Ingls.
Os estdios ingleses tiveram de dar respostas s aes dos hooligans
e s cenas de guerras travadas nas torcidas, uma delas foi o uso de altas
grades de ao em volta do campo. Os estdios europeus costumavam apenas
ter telas protetoras com a torcida bem prxima ao campo, para reprimir as
invases e o arremesso de objetos.
Em Hillsborough o problema no foram os hooligans, mas
justamente as medidas de segurana adotadas. Para a partida, um campo
neutro, fora das cidades sede dos times foi escolhido, esperando ento menos
torcedores.
O fato que s trs horas da tarde uma multido se aglomerava nos
portes do estdio, que no estava preparado para tanta gente e os torcedores
foravam a entrada para no se atrasar para o incio da partida.
Sem ter para onde ir, uma verdadeira multido em pnico se
esmagava nas grades do campo, alguns tentavam escal-las e eram impedidos
pela polcia, dezenas de pessoas morreram pisoteadas ou sufocadas.
As autoridades policiais e os organizadores do evento foram
culpados pela morte de 96 torcedores e outros 766 feridos. A partir desse dia,
o juiz ingls conhecido como Taylor decretou novas regras para a composio
dos estdios, removendo as grades em volta do campo e exigindo dos clubes
que as cadeiras fossem numeradas, a fim de evitar a superlotao das
arquibancadas.
Heysel Stadium Bruxelas. 29 de Maio de 1981
Hillsborough Stadium, 15 de Abril de 1989.
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Aps os incidentes, o parlamento ingls instaurou leis
rgidas na punio e controle dos hooligans que podem ser proibidos
de freqentar estdios e terem passaporte apreendido durante
partidas internacionais.
Ultras
Hooligans parece mesmo apenas um termo da imprensa
europia para designar o comportamento arruaceiro de jovens
torcedores bbados e briges. Na dcada de 1980, os torcedores
italianos cunharam o termo Ultra, para designar o que se entende
como a filosofia hooligan, o jeito de torcer.
As ultras so torcidas organizadas com diretoria executiva e
ligadas muitas vezes prpria diretoria do time, participando de
decises e arrecadaes de fundos para o clube. No Brasil, o termo
no muito usado, mas se encaixa na descrio das Organizadas.
Existem quatro mandamentos do estilo ultra de torcer:
Jamais sentar durante uma partida, no importa o resultado;
Nunca para de cantar ou gritar o nome de seu time; Comparecer a
todos os jogos possveis, no importando as distncias ou custos e
Lealdade curva. Este ltimo faz referncia aos locais que as
torcidas elegem para ficar durante as partidas, podendo ser na curva
sul, norte ou laterais das arquibancadas - via de regra, a curva o
local mais barato para se ver jogo em um estdio - especificando no
prprio nome a lealdade ao local, como os Ultras Sur (Real Madrid,
da curva sul).
Fenmeno cada vez mais comum na Europa, no fim da
dcada de 90, a ligao das Ultras com a extrema-direita tem
preocupado as autoridades, principalmente com a crescente onda
racista e xenfoba que assola a Europa desde os anos 80.
As torcidas de times como o Lazio, da Itlia, exibem
bandeiras com smbolos fascistas e entoam gritos de guerra racistas.
O Lazio SS tem tradio de torcedores e jogadores da extrema-
direita, entre eles o jogador Paolo Di Canio, que comemorou a
vitria sobre o Roma fazendo a saudao fascista com o brao
direito - onde tem tatuado a palavra Dux (Duce, o Fhrer italiano) -
em homenagem a Alessandra Mussolini, neta do ditador e fiel
39
torcedora do Lazio. Di Canio foi multado pela Federao Italiana de
Futebol em dez mil euros.
Nos campeonatos espanhis de 2004 e 2005, vrios
jogadores foram ofendidos pelas torcidas dos prprios times, como
o caso de Ronaldo, que foi hostilizado pela torcida Ultras Sur do
Real, que imitava sons de macaco a cada vez que o jogador tocava na
bola. O lateral Roberto Carlos tambm foi ofendido pela torcida do
La Corua, que gritava frases racistas. O time foi condenado a pagar
apenas 786 dlares de multa.
A Ultras Sur, do Real e a Irriducibili, do Lazio so
certamente as duas torcidas mais ligadas extrema-direita na
Europa, aparecendo nos estdios portando bandeiras com susticas,
cruzes celtas e frases anticomunistas e racistas.
Medo na Copa
Durante a Copa da Alemanha, em 2006, o medo da polcia
local no eram apenas os terroristas do Isl, a ameaa hooligan fez
os governos europeus tomarem medidas drsticas para coibir as
brigas entre torcidas.
O medo era justificvel. Um ano antes, em maro de 2005,
cerca de 200 hooligans alemes quebraram lojas aps um amistoso
contra a Eslovnia, em Celje, naquele pas, causando uma
verdadeira crise diplomtica.
O ministro do Interior alemo veio a pblico pedir desculpas
ao governo esloveno e reiterar que medidas duras seriam tomadas
para a segurana durante a Copa.
Um ms antes do incio do torneio, em 2006, a Alemanha
divulgou seu plano de conteno para os hooligans: todos aqueles
que j fossem fichados seriam advertidos em suas casas e locais de
trabalho para no comparecerem aos estdios, se fossem pegos
prximos aos "anis de segurana - crculos imaginrios ao redor
dos estdios - deveriam se apresentar at trs vezes por dia s
autoridades policiais e, se insistissem em ir ao estdio seriam presos.
Em Hamburgo, a segunda maior cidade do pas, foi construda uma
cadeia especial para comportar at 150 hooligans.
A Inglaterra por sua vez convocou 3.330 supostos hooligans
40
a entregar seus passaportes durante o perodo de realizao da Copa,
aqueles que no o fizessem ou tentassem viajar durante este perodo
de tempo poderiam cumprir at seis meses de priso ou condenados
a pagar multa de 7.250 euros.
Mesmo assim, durante a Copa alguns distrbios ocorreram,
cerca de 170 torcedores, entre eles um grupo de skinheads alemes,
foram presos aps o jogo entre Alemanha e Polnia e outros 20
alemes e ingleses na partida entre Inglaterra e Paraguai. Ainda
foram presos nove hooligans ingleses que tentaram furar o bloqueio
fronteirio e entrar na Alemanha pela Repblica Tcheca.
Hooligans Brasileiros
Ser hooligan ter amor ao time, beber e, se necessrio,
tretar, assim Nen, da torcida Fanticos, do Atltico Paranaense,
me definiu o que ser hooligan. Segundo ele, entre as torcidas mais
fortes e organizadas do estado esto a Imprio, do Coritiba, a
Falange, do Londrina e a prpria Fanticos. Mas a torcida do Rio
Branco, de Paranagu, tambm osso duro de roer, complementa.
O envolvimento dos skinheads com as torcidas organizadas
vem da sua identificao com a paixo operria que demonstram os
torcedores e a demarcao do territrio, demonstrar fora no grito,
no tamanho de suas bandeiras e hinos de amor ao time. Um das
caractersticas do hooligan ir ao estdio apoiar seu time do
corao, independente do lugar, relata Guilherme, torcedor
incondicional do Londrina Esporte Clube, o Tubaro, time que
segundo ele tem sido injustiado pelos governos da cidade. um
time de porte para a segunda diviso, mas est na terceira, reclama.
Os skinheads que se identificam com as torcidas organizadas
e a paixo hooligan so chamados de bootboys, basicamente so
skins que amam seu time, cerveja e msica Oi!. O nome bootboy
vem dos coturnos usados pelos jovens ingleses amantes de futebol
que, sob presso da polcia, conseguiam apenas se armar com
coturnos com biqueiras de ferro para enfrentar as torcidas
adversrias. Mais tarde, at o coturno foi proibido no estdio, sendo
inclusive confiscados na entrada dos jogos, a ento os tnis Adidas,
modelo Slk, muito parecidos com chuteiras, passaram a fazer parte
41
do visual hooligan, eram especialmente confortveis para correr da
polcia.
No Paran, os bootboys que se organizam para ver o lado
so apenas pequenos grupos, indo sempre aos estdios torcer pelo
seu time. Hoje as torcidas esto perdendo a graa, esto querendo
dar tiro, pegar de galera, o intuito no esse, diz Guilherme.
Na imprensa inglesa, os confrontos entre torcidas brasileiras
so constantemente noticiados como confuses entre hooligans. Na
verdade a denominao se encaixa s caractersticas desse tipo de
confuso - hora marcada, vandalismo e violncia gratuita - mas o
termo no utilizado por aqui.
Na dcada de 90, as brigas entre torcidas organizadas
causaram vergonha mundial ao pas e clamaram pela urgncia de
polticas que coibissem a ao das organizadas, que foram proibidas
aps um confronto entre as torcidas Mancha Verde, do Palmeiras e
Independente, do So Paulo, na final da Copa So Paulo de Juniores,
em 1995, resultando em pelo menos trs mortes.
A partir da as torcidas organizadas foram impedidas de
adentrar o estdio com qualquer bandeira, faixa ou camisa que as
identificassem, mas aos poucos a medida foi perdendo fora e elas
foram voltando aos estdios.
Os confrontos tornaram a acontecer mesmo depois da
criao do Estatuto do Torcedor em 2003, que exigia dos times
responsveis pelos campos, um sistema eficiente de segurana e
separao das torcidas.
Mesmo assim, em maio de 2006, a torcida organizada
Camisa 12, do Corinthians, tradicional time paulista, entrou em
confronto com a polcia quando tentou invadir o campo para
interromper o jogo no qual seu time foi desclassificado da Copa
Libertadores da Amrica, pelos argentinos do River Plate.
Aps o confronto, a Federao Paulista de Futebol baixou
uma portaria impedindo as organizadas de entrarem nos estdios por
90 dias e prometeu identificar e banir dos estdios os responsveis
pelo tumulto.
A medida no foi suficiente. Menos de 90 dias depois, as
torcidas paulistas voltaram a protagonizar confrontos nas ruas e
arquibancadas, ora contra torcidas adversrias, ora contra a prpria
42
polcia.
O maior medo dos cartolas e autoridades do esporte
brasileiro que se medidas eficazes no forem tomadas, a
candidatura do pas para sediar a Copa do Mundo, em 2014, acabe
sendo prejudicada.
Ultras do CSKA Sofia intitulados CSKA SS Front
fazem saudao nazis ta durante par t ida
Paolo Di Cani fazendo ato que lhe rendeu multa de dez
mil euros, durante jogo contra a Roma
Odiados e Orgulhosos
43
AP
DW
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Carecas do Brasil
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
4
Do punk ao careca
Vamos para a rua
Juntar a nossa turma
Careca!Careca!
Fruto do crescimento econmico e do boom da indstria
automobilstica, So Paulo, que outrora chamou ateno pelos
casares de grandes cafeicultores e imigrantes italianos, via surgir
na dcada de 1970, nas Zonas Leste e Norte o maior reduto de
cultura proletria do pas.
Na periferia da cidade e fronteiria ao ABC paulista, no
haveria lugar mais adequado ao surgimento da cultura punk e, mais
tarde, da cultura skinhead do que a Zona Leste paulistana.
Em 1976 o punk explodia pelo mundo e o Brasil se tornara
terreno frtil para a contracultura, mas assistiu ao seu declnio na
dcada seguinte, assim como a Inglaterra.
Pelos idos de 1982, O comeo do fim do mundo como
ficou conhecido o primeiro concerto de msica punk no Brasil,
marcava o renascimento do punk, mais voltado a uma ao social e
politizao do movimento do que antes, mas as tretas na platia
entre punks e garotos de cabea raspada vindos da Zona Leste,
moldavam algumas diferenas cruciais dos movimentos juvenis
brasileiros.
O movimento punk estava abalado, diversas gangues punks
haviam se formado, a diviso principal era entre os punks da city,
freqentadores do centro da cidade e os punks do subrbio, vindo
do fundo da Zona Leste e regio do ABC.
Os primeiros taxavam os punks do subrbio de vndalos e
ganguistas, enquanto estes acusavam os punks da city de playboys e
traidores do movimento, por terem se vendido ao new wave - a nova
onda do punk, embalada por letras vazias e embalos danantes, pura
diverso, distante das aspiraes revolucionrias de quem queria
mudar o rumo do pas, ainda sob o Regime Militar.
Era usual a violncia entre os dois grupos quando se
9
9
Trecho de msica da banda Neurticos, que participou do festival O Comeo do Fim do Mundo, em 1982, apontada como a primeira a usar o termo careca em uma msica.
47
encontravam e ficava claro que o movimento do subrbio tinha um
carter proletrio mais forte, marcado pelo moralismo, por uma
cobrana de uma postura mais sria e coerente, inclusive no modo
de se vestir. Em oposio ao punk new wave e as roupas rebitadas e
sujas, os punks do subrbio prezavam um visual mais limpo, alguns
at raspando a cabea.
Em 1982, quando os punks lanaram uma ofensiva no
campo do discurso para desmistificar a imagem que tinham perante
a imprensa e a sociedade, alguns punks da ZL e ABC se posicionam
radicalmente contra este punk, que no acreditavam mais ter
coerncia, e se denominam carecas do subrbio.
Baseada numa moral mais rgida no que diz respeito
famlia e trabalho e demonstrando preocupao com os rumos da
ptria, at numa retomada da histria e dolos nacionais, a cultura
careca foi se moldando e criando afinidades com a cultura
skinhead inglesa, porm com peculiaridades que distinguem o
movimento brasileiro.
Demorou pouco para a tendncia paulistana se alastrar pelo
pas e, numa oposio ao punk e a degradao dos valores da
famlia, de Deus e da ptria. Surge o movimento Carecas do Brasil,
agrupando todos os Carecas do Subrbio das vrias metrpoles do
pas.
A proposta era ousada, unir carecas do pas todo, todos eles
com suas peculiaridades regionais, os carecas de Campo Grande,
por exemplo, pregavam o dio contra os paraguaios, enquanto os
paulistanos atacavam nordestinos e os cariocas tinham uma posio
antiestadunidense. Da que sairiam as definies e rachas entre os
Carecas do Brasil, interessados em unificar um movimento
nacionalista, contra o racismo e o imperialismo e um movimento
neonazista, encabeados pelos paulistanos, mas copiados pelo
pessoal do Sul, com uma concepo racista e orgulho de ter sangue
europeu. 10
10
A imigrao europia se deu com mais vigor nestas reas, So Paulo com
colnias italianas e o sul com os alemes.
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Nazistas moda da casa
Com o ttulo Neonazistas esto de volta s ruas, o jornal O
Estado de SP alertava as autoridades, em 19 de maio de 1989, sobre
as manifestaes relativas ao aniversrio do Fhrer, que seriam
levadas a cabo por um grupo de carecas na capital paulista, com
direito a queima de fogos e distribuio de panfletos.
Foi por volta de 1987 que a ideologia careca comeou a
tomar corpo e se definir, a princpio confusa, com mesclas de
xenofobia, regionalismos e uma atrao pelo nazismo hitlerista.
Neste ano foi fundada a Frente Nacionalista Brasileira, com o
intuito de unir os Carecas do Brasil sob uma nica sigla, para unir e
lutar pelo pas, mas a unio era vista com maus olhos pelo
movimento do Subrbio, que enxergava na partidarizao do
movimento um mal que o fadaria desunio.
Os regionalismos eram claros, os carecas da capital paulista
eram duramente criticados pela violncia que usavam contra os
retirantes nordestinos, pelos carecas de outros estados como Mato
Grosso do Sul, que acreditavam que o verdadeiro inimigo do pas
eram os estrangeiros.
Em Campo Grande, destacavam-se os zines Coturnos, de
1992 e o zine que se auto-proclamava revista Xenofobia, do ano
anterior, ambos apoiadores da banda campo-grandense
Carbonrio, que se destacava na cena careca nacional junto com a
banda Vrus 27.
Bradando pela soberania e patriotismo, ambos os zines
atacavam os estrangeiros, o Coturnos trazia j no editorial do seu
primeiro nmero: o Mato Grosso do Sul foi palco de gloriosas
vitrias sobre os imundos paraguaios. Hoje esse povo entope minha
cidade e rouba nosso empregos, essa a real ameaa ao povo
brasileiro.
As matrias do zine se confundiam patriotismo e
elogio ao nazismo matrias sobre as ligaes do
filsofo Heidegger com o nazismo, uma notcia sobre a
possibilidade de Hitler estar vivo no Chile e um confuso cartaz
com o emblema dos Carecas do Brasil onde se v uma a runa Odal, e
dois lees celtas. Os smbolos germnicos e celtas so muito usados
entre
, passando por
11
49
pelos neonazistas, que assimilaram a idia do exrcito de Hitler,
numa evocao do arianismo.
J o Xenofobia trazia em seu tambm primeiro nmero,
incitaes ao uso da violncia contra os inimigos, artigos sobre
empresas multinacionais e pregando o dio contra os judeus, numa
matria onde se l: Afinal o que as pessoas pensam do nazismo?
Ser que aquela histria contada pelos judeus atravs da
manipulao da Histria ainda a mais aceita?. A reportagem
consistia numa enquete feita sob critrios no explicitados com
pessoas de nvel universitrio sobre o que achavam do nazismo de
Hitler, a maioria aprovava.
Nos trechos de cartas de leitores e contatos v-se ainda a foto
de um skinhead identificado como Valdemir, de BH, vestindo uma
braadeira nazista. O Xenofobia ainda trazia uma histria em
quadrinhos onde o enredo consistia em um skinhead que espancava
turistas estrangeiros.
O movimento paulista, por sua vez, tinha suas
peculiaridades. Os Carecas do Subrbio eram criticados por
defenderem a violncia contra migrantes do Nordeste e a capital
paulista contava com movimentos como a Juventude Paulista, de
1990, de cunho separatista.
Outro grupo paulistano que pregava a emancipao do
estado era o Orgulho Paulista, que acreditava numa So Paulo
branca, usando da violncia e da propaganda contra os migrantes
nordestinos e negros. No era um grupo grande, mas eram
articulados com pgina na Internet e panfletagem pela cidade. Por
volta de 1999, o grupo foi dissolvido assim que seus lderes foram
presos.
Os paulistas do ABC, alis, foram os primeiros a criar
grupos neonazistas articulados e ganharam a ateno da grande
mdia e das autoridades quando, em 23 de Setembro de 1992, um
bando de skinheads neonazistas atacou a Rdio Atual, emissora
voltada para o pblico nordestino, disparando tiros contra o prdio e
pichando slogans racistas e xenfobos. Um dia antes, no Rio de
11
A afirmao do antroplogo suo Reiff Told Newsmen que dizia ter encontrado Hitler numa aldeia indgena ao sul de Santiago, segundo ele o homem conhecido como Adolfo havia chego,
segundo os aldees, num submarino, acompanhado de uma bela mulher que seria, supostamente,
Eva Braun.
50
Cartaz do incio do movimento Carecas do Brasil, com propaganda anti-semita e
smbolos nrdicos. Na poca a ideologia do grupo no estava bem definida.
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
51
Janeiro, um grupo de carecas causou tumulto que resultou em uma
morte durante o show da banda de punk rock Ramones, no Caneco.
No dia 26 de Setembro, em Porto Alegre, um cemitrio judaico teve
suas tumbas profanadas com susticas e frases anti-semitas.
Um movimento coordenado destas dimenses no poderia
ser ignorado pela mdia, que tratou de investigar - ou no mnimo
noticiar - os diversos grupos que agiam no pas. Talvez tenha
comeado a a confuso a respeito da ideologia dos grupos.
Carecas do ABC
Ainda no incio do movimento careca, em 1982, o grupo da
regio conhecida como ABC paulista (que abrange as cidades de
Santo Andr, So Bernardo e So Caetano) se destacava por serem
mais organizados e com uma ideologia melhor definida. Nas suas
fileiras estavam negros e filhos de nordestinos, unidos em torno da
causa operria, de uma moral trabalhadora para o progresso do pas,
longe de racismos e de encantos com Hitler.
O ABC sempre foi mais politizado que o subrbio. Sempre
nos envolvemos mais com questes polticas, indo a reunies
Integralistas e congressos de cunho nacionalista, diz D.M.S,
careca do ABC com quem consegui contato atravs da Internet, por
intermdio de um skinhead de Curitiba. Segundo ele o grupo
organizado e so engajados socialmente Ns fazemos alguns
concertos para arrecadar roupas para doar. Arrecadamos agasalhos e
distribumos nos centros comunitrios da regio. Ns tambm
temos uma academia de luta e deixamos que as pessoas da
comunidade treinem de graa se no puderem pagar, conta.
Os Carecas do ABC foram acusados pela mdia de
protagonizarem dois episdios de violncia na regio, o ataque a
Rdio Atual, em 92 e o mais recente em 2003, quando dois garotos
punks foram obrigados por um grupo de carecas a pularem de um
trem em movimento, um deles acabou perdendo a vida. Perguntei
sobre o assunto a S.M.D.:
- Algum reivindicou o ataque a Radio Atual, em 92?
- No, tanto no reivindicaram que sobrou para os Carecas
52
do ABC.
- E os moleques que jogaram do trem em Mogi? Quem
estava envolvido?
- Sobre quem estava envolvido prefiro nem dizer e eram
garotos novos [os envolvidos], no estavam h um ano sequer no
rol.
- Eram ABC?
- No eram ABC, se fossem no fariam aquela besteira.
- Como a represso policial a?
- Dura (risos). O engraado que a polcia sabe muito bem a
diferena entre Carecas e WPs, sabem tambm quais os grupos de
Carecas existem em So Paulo. Acontece que a mdia para vender
jornais ou ter audincia sempre nos coloca como nazis, como viles.
O que engraado, porque ns fazemos parte de uma juventude que
no faz uso de drogas, pregamos a moral, amamos nossa ptria, mas
parece que isso crime, enquanto os punks, queimam a bandeira
nacional, usam drogas, pregam a libertinagem e todos acham isso
bonito.
Ele ainda me relatou sobre a integrao entre os diversos
grupos no pas, incluindo carecas do Nordeste, Rio de Janeiro e at
outros pases como Argentina.
Conhecidos como rapados, existe na Argentina um
movimento skinhead de terceira posio (termo usado para definir
os nacionalistas) muito semelhante aos Carecas, com quem mantm
afinidades. Eles sabem que o nacionalismo que pregamos no
imperialista. Lutamos pela soberania de nossa ptria, assim como
eles lutam pela deles, finaliza S.M.D.
Casos de violncia e alardes na mdia sobre grupos
neonazistas agindo, como no ABC, foi que me levaram at a cidade
de Londrina, no norte do Paran, procurar entender quem estava por
trs de tanto barulho.
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54
Carecas do Parana
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
5
Carecas de Londrina
O primeiro relato que ouvi sobre os carecas de Londrina veio
de Juca, arteso que estava de passagem por Ponta Grossa, em 2005,
e com o qual eu tinha amigos em comum. Uma figura nica,
espalhafatoso e contador de causos, que afirmava sempre aps a
quarta ou quinta cerveja que j havia participado da terceira
formao do Sepultura.
Juca morou em Londrina por dois anos, aps desistir da
profisso de tecnlogo em engenharia de telecomunicaes e virar
arteso, viajando de cidade em cidade.
Uma de suas estrias remetia a uma certa madrugada,
quando voltava do trabalho para casa pelo Calado, no centro de
Londrina, e percebeu uma movimentao de alguns jovens bebendo
em torno de um banco. Ele j sabia da perseguio dos skinheads
aos hippies , mas resolveu continuar em frente: Quando resolvi
voltar j era tarde, mermo.
O grupo de carecas cercou Juca, tomou sua mochila e sua
camiseta. Eu usava uma camiseta com uma caveira fumando um
cigarro com uma folha de cannabis ao fundo. Eles me fizeram tirar e
disseram que era apologia s drogas e que eram contra, depois
arrancaram minha mochila com meus trabalhos e instrumentos
dentro e arremessaram em cima de uma marquise, da onde s fui
retirar no dia seguinte, relatava, num peculiar jeito de contador de
estrias, interpretando os personagens com diferentes tons de
vozes, gesticulando compulsivamente como se brigasse com
algum que no estava ali.
Quinze dias mais tarde voltava ele por um caminho diferente
quando resolveu passar em um bar do caminho tomar uma dose.
J dentro do bar se deparou com o mesmo grupo de carecas: A eu
vi que no tinha mais jeito, pedi uma pinga e fiquei me enrolando,
acho que demorei uma meia hora pra tomar uma dose de pinga, ria
ele.
Juca saiu apressado do bar e foi perseguido, mas desta vez
no fugiu, parou. Eles disseram: 'Ah pegou a mochila de volta', a
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12
Hippie como os skinheads chamam os artesos, que no reivindicam, tampouco aceitam o termo.
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eu disse que era trabalhador e s tava voltando pra casa, eles
disseram: 'se tu trabalhador ento tudo bem, mas apologia s
drogas a gente no permite, se virmos voc com aquela camiseta de
novo, vai tomar um pau.' Depois disso, vazei. T louco, ficar
fugindo de careca todo dia? Vrios amigos tomaram pau, eu sa de
l.
Encontro marcado
Inmeras coincidncias me levaram minha primeira
entrevista com um careca. Foi atravs de uma amiga que havia
estudado no ensino mdio com uma garota que havia se tornado
skinhead, a quem encontrou certa vez no nibus, voltando para casa,
que iniciei meus contatos. Aps inmeros telefonemas e
levantamento de dados, tomei um nibus para Londrina, em meados
de maio.
Meu contato era Guilherme, dos Carecas de Londrina, o
encontro estava marcado para a tarde de sbado, encontraria ele
mais a amiga da minha amiga, que resolveu ir junto para garantir
que tudo corresse bem.
No horrio marcado l estvamos ns na Rua Piau, centro
de Londrina, aflitos, esperando na esquina, enquanto ningum
chegava. O cheiro de bolo ia pairando pelo ar quando de uma moto
desce um rapaz alto e forte de pele morena, que caminha em nossa
direo.
- Vocs que so da entrevista?
- Isso, voc que o Guilherme? Tudo bom?
- Tudo beleza.
- Vamos sentar ali pra conversar, disse eu apontando um
banco da praa do outro lado da rua.
Escolhemos a ponta de um banco, ainda que ningum
tivesse comentado nada a respeito, fora escolhido a dedo como
sendo o nico lugar onde algum pombo no pudesse cagar em
nossas cabeas, fato mais do que comum em Londrina
. Expliquei a ele sobre o livro, sobre minhas intenes e
naquela 13
poca
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iniciamos uma longa conversa:
- Quantos so os Carecas de Londrina, hoje?
- Chegou uma poca que havia 50 pessoas usando visual,
dizendo que era careca, mas na verdade s queriam arranjar
confuso, achando que andar em turma ia virar homem. Homem se
forma em casa estudando, trabalhando e no na rua, querendo bater
em todo mundo. A os mais velhos, que realmente fazem a cena, so
os que tm que segurar a bronca de bandido, de polcia, de punk, a
troco de um z man que entrou s pra fazer baguna.
- Como feito o recrutamento? Como o cara vira um
careca?
- Ento, antigamente achvamos que volume era o que
importava, saamos na rua recrutando todo mundo. Hoje em dia o
recrutamento feito com mais cautela, quem chega pra conhecer a
idia a gente passa um material, mas deixa o cara de molho um
tempo pra ver qual a idia dele, seno o cara sai achando que
careca briga, dar porrada.
- Quais so os princpios dos carecas realmente?
- A idia baseada no lema Deus, Ptria e Famlia. A postura
do careca de trabalhar, estudar, valorizar o corpo, no usar drogas.
- Todos os carecas so envolvidos com a direita?
- No Brasil, eu penso que ou o cara da direita careca ou
whitepower nazista, que na real no tem nada a ver com careca.
- E os SHARPs e RASHs?
- Esse negcio de SHARP e trads coisa do cara que no
quer se envolver com o lance poltico, no quer dizer 'sou direita,
sou esquerda a ele diz que apoltico, que tradicional. RASH eu
nunca vi, dizem que existe, mas eu nunca vi.
- O que o movimento faz pela comunidade? Quais so os
projetos pra pr em prtica essas idias?
- Temos projetos sociais como uma academia de boxe onde
priorizamos a comunidade carente para incentivar o esporte,
tambm fazemos arrecadao de agasalhos e alimentos durantes os
shows para entregar as entidades como os Narcticos Annimos. S
13
Londrina enfrentou em 2006 uma superpopulao de pombos que culminou num programa de extermnio das aves na cidade.
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que a gente no faz questo que todo mundo saiba disso porque isso
no vende, o que vende aparecer na TV que careca bateu em punk e
tudo mais. Tem muito cara de 40, 50 anos que participa das reunies,
mas tem famlia, casado, com filhos, ento no se assume como
careca pelo risco de sair na rua e ser atacado por um monte de
bandido e drogado a.
- Qual a opinio de vocs a respeito dos punks?
- Tem um pessoal aqui em Londrina que se diz punk, que
come lixo na rua, mas quando aperta pega o carto de crdito, vai ao
banco, passa e come. E da ele fez algum bem pra sociedade? O punk
hoje, em Londrina, est totalmente distorcido, a partir do momento
em que ele quer impor o vandalismo, a anarquia na cidade, impor
que a sociedade hipcrita, quando o hipcrita ele, que acorda de
manh e escova os dentes com uma pasta de uma empresa
multinacional. Prega o fim do capitalismo, mas fica pedindo
dinheiro no calado.
A rivalidade entre punks e carecas na cidade j havia
resultado em algumas confuses. Um dia antes eu havia conversado
com Gabriel, estudante de Cincias Sociais da UEL, que teve a
perna fraturada ao pular de um muro de quase cinco metros quando
fugia de quatro carecas, aps passar em frente a uma academia de
boxe, prxima rodoviria: Estvamos em grupo, com vrias
garotas junto, eu estava de moicano levantado, quando eles saram e
gritaram Se correr pior', contou.
- E a respeito da homossexualidade?
- Cada um faz o que quer da vida. A partir do momento em
que o indivduo se assume como homossexual, independente disso,
ele um cidado, ento deve ser respeitado como um cidado. Mas
ele tem que cumprir com os direitos de um cidado. Assim como ele
tem direito de dizer que homossexual eu tenho o direito de dizer
que no gosto, mas a partir do momento que ajo com violncia estou
errado.Temos que transmitir a idia e mostrar que a vida que ele est
levando no leva a nada.
- Vocs se assumem integralistas, essa viso do Integralismo
como um fascismo brasileira, verdadeira?
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- No. As pessoas confundem o integralismo com o
fascismo, o que mentira. O integralismo foi o nico pensamento
poltico que lutou contra o fascismo, contra o nazismo. uma
postura voltada para defesa do cidado e no s do Estado. Passa na
novela da Globo os integralistas matando um monte de gente, mas
ningum fala que o comunismo matou muito mais gente que o
nazismo, com Lnin e Stalin.
- Existem partidos integralistas no Brasil hoje?
- Existem alguns partidos que compactuam da idia do
Integralismo, mas no se assumem como Integralistas, como o
caso do PRONA, do Doutor Enas e do Partido Nacionalista
Democrtico, fundado por um pessoal do Exrcito. So partidos
pequenos, creio que com essa nova lei dos 5% muitos desses
partidos vo sumir.
- E as mulheres, qual a funo delas dentro do grupo? O que
elas podem fazer?
- Tudo. Tm os mesmos direitos de qualquer um l dentro,
mas tambm os mesmos deveres. Se ela entra no movimento tem
que ter postura ntegra, existem pessoas que prezam pela ordem, se
eu tenho uma namorada ela minha namorada, ela no vai ficar
rodando banca.
Guilherme relata o caso de uma garota que namorava um
integrante do grupo at que um dia se separaram. Numa certa gig, a
garota tinha bebido alm da conta e comeou a dar bola pra um
outro integrante, novato. Ele foi avisado de que no deveriam ficar,
pois o ex-namorado ainda gostava dela, conta. Apesar do aviso, o
novato resolveu ficar com a garota. Ambos foram espirrados do
grupo, ele, como j havia sido advertido para no fazer aquilo, teve
uma punio mais severa, completou. Apesar da insistncia,
Guilherme no relatou que tipo de punio seria, disse apenas que
ele foi expulso do grupo e ainda acabou tomando uns tapas do ex-
namorado da garota.
Aps a entrevista ficamos em um posto, tomando cerveja e
trocando algumas idias, Guilherme ainda me passava a indicao
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14
De acordo com a nova Lei Eleitoral, vlida para as eleies de 2006, os partidos que no alcanarem 5% dos votos para a Cmara dos Deputados perdem direitos fundamentais como
formao de bancada e Fundo Partidrio.
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de novos contatos quando um grupo de punks passou do outro lado
da rua. Al que belezinha, disse rindo. Essa mina a [apontando
uma garota no grupo] a famlia dela tem grana, ela treinava com a
gente l na academia. Para andar com esses caras eles pedem pra
essas menininhas ir l e tirar xerox dos fanzines e panfletos pra eles,
a pode andar junto, continuou, rindo com ar de inconformado.
Nos despedimos, agradeci e partimos.
Fascismo brasileira?
O projeto ufanista de Plnio Salgado foi por muito tempo
associado a uma espcie de fascismo brasileiro, isso devido s
semelhanas com projetos fascistas da poca
como na Itlia de Mussolini, Portugal de
Salazar e Alemanha de Hitler.
Alm disso, a simbologia e ritos
integralistas davam ainda mais margem para as
acusaes. Eles usavam a saudao Anau! -
voc meu irmo, em tupi - numa reverncia
com o brao direito estendido, semelhante
saudao nazista e cultuavam a letra grega
Sigma () como bandeira,.
A historiografia est aos poucos
mudando essa concepo. Na verdade o projeto
integralista tinha caractersticas prprias de um contexto brasileiro
do fim dos anos 20, onde se buscava retomar uma identidade
nacional, Plnio era um modernista, do grupo conhecido como pau-
brasil, que buscava nacionalizar a arte brasileira., diz o professor
titular do Departamento de Histria da Universidade Estadual de
Ponta Grossa, Niltonci Batista Chaves, pesquisador do assunto.
Segundo Chaves, a aproximao dos integralistas com o
fascismo ou nazismo se dava pela simpatia no ocultada por Plnio
Salgado a Mussolini e pela propaganda exercida sobre os
imigrantes alemes e italianos. Era comum os integralistas
divulgarem panfletos entre os colonos dizendo 'se estivesses na
Alemanha serias nazista, se estivesses na Itlia serias fascista, se
ests no Brasil, sejas Integralista', conta.
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Apesar destas simpatias e de ser caracterizado como um
modelo de governo autoritrio, onde o projeto de sociedade
conduzido por um nico lder e onde a vontade coletiva se
sobrepunha vontade do indivduo, o Integralismo no promovia o
racismo, pelo contrrio, reverenciava a miscigenao das raas que
compe a identidade nacional. O projeto integralista propunha uma
sociedade que retomasse os verdadeiros valores da ptria, contra a
europeizao da cultura e dos costumes e contra o comunismo ateu.
O anti-semitismo, no entanto, aparece na figura de Gustavo
Barroso, importante lder integralista, que acusava os judeus de
serem os responsveis pelo incio do endividamento do pas.
O Integralismo se idealizou inicialmente atravs da figura de
Plnio Salgado, nos anos 30, trazida a pblico pelo manifesto de 07
de Outubro de 1932, quando foi fundada a Ao Integralista
Brasileira (AIB).
No Paran, o Integralismo se desenvolveu principalmente na
regio dos Campos Gerais e no Sudoeste do Estado. Ponta Grossa,
por exemplo, contava com um ncleo maior do que o da capital
Curitiba. Eram cerca de 1000 filiados, divididos em trs sedes na
cidade, eram em nmeros maiores do que os comunistas, conta
Chaves. E eram pessoas influentes na poltica da cidade, tendo
inclusive representantes na Cmara, completa.
A AIB foi posta na ilegalidade em novembro de 1937, com a
instaurao do Estado Novo, nas mos de Getlio Vargas. Mesmo
assim, no ano seguinte um grupo de integralistas tentou tomar de
assalto o Palcio Guanabara, sede do governo no Rio, episdio que
ficou conhecido como Levante Integralista. Os insurgentes foram
duramente reprimidos, muitos torturados e fuzilados. Plnio
Salgado se exilou em Portugal, onde permaneceu at o fim do
regime no Brasil.
Hoje, os integralistas brasileiros se renem sob a bandeira da
Frente Integralista Brasileira, fundada em 2004, presente em 12
estados brasileiros, que realiza reunies periodicamente e mantm
em So Paulo um rgo independente conhecido como A Casa de
Plnio Salgado, um centro cultural que guarda material de estudos e
propaganda integralista.
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Carecas de Maring
A entrevista em Londrina me possibilitou outros contatos e o
esboo de um mapa dos carecas no Paran. O movimento
organizado no estado era menor do que imaginava inicialmente,
abrangeria apenas a regio da capital Curitiba e ao norte com
Londrina, incluindo Rolndia, Camb, Apucarana e Ibipor, e
Maring, incluindo Sarandi, Paissandu e Marialva.
O contato em Maring foi um pouco mais difcil, partiu de
uma srie de e-mails que demoravam semanas para serem
respondidos e a entrevista s foi concretizada por um programa de
mensagens instantneas, na madrugada de um domingo.
Segundo R.R, dos Carecas de Maring, atualmente o
movimento conta com oito pessoas na ativa, mas j tiveram mais de
50 nas suas fileiras, mas so pouco ativos devido a questo de
tempo. Ningum tem tempo pra trampo voluntrio, no. Tudo
quebrado, no mximo uma doao de sangue e olha l, todo mundo
trampa direto, diz.
Os Carecas de Maring j foram acusados de diversos casos
de violncia na cidade, principalmente contra homossexuais e
punks. De acordo com R.R., como pediu para ser identificado, o
grupo perseguido pela imprensa na cidade: Toda vez que alguns
moleques metem a porrada em travesti na rua falam que foi a gente.
H um tempo atrs uns mano mataram um traveco e a culpa caiu na
gente, nem tentaram saber quem foi e j saiu no jornal que fomos
ns, s porque um dos moleques estava com a cabea raspada,
afirma.
- Vocs perseguem os travestis?
- Ah cara... nem tem disso de perseguir no. S no curtimos
o que eles fazem...
- Mas se trombar na rua?
- Depende do humor (risos)
A respeito dos punks R.R. conta orgulhoso o fato de no
haverem mais punks organizados na cidade: J at teve, agora tem
uma mulecadinha querendo faze uma cena, mas a damos uns
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Cartazes de gigs organizadas
pelos Carecas do Brasil.
Em 2004, os Carecas de Londrina
sediaram o Inverno OI!, um dos eventos
da agenda anual.
Reunimos umas 500 possoas, veio
nibus de Porto Alegre, Curitiba,
Maring, Ribeiro Preto, conta
Guilherme, orgulhoso.
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
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sacode nos moleques e eles nem aparecem mais de visu. J corta na
raiz mesmo, conta e ainda comenta: Eu at levo de boa outros
skins que no so carecas, depende da forma como agem, agora
punk no passa. So podre, um bando de drogado que se destri e
tambm suas famlias e s muito tempo depois vo ver o que
fizeram, isso se perceberem. Ficam zuando a cidade, pichando tudo,
quebrando as coisas na rua, no tomam banho. No tem como
algum em s conscincia aceitar um tipo de coisa como essa.
- Mas isso no suja a imagem do movimento careca?
- Por que sujaria? NINGUM GOSTA DESSES CARAS
MESMO.
Verses
J perto do fechamento do livro, consegui um contato do
outro lado em Maring, o ex-militante anarcopunk que prefere ser
identificado como Bruno Tolstoi me relatou que Maring j foi
palco de confrontos violentos entre punks e carecas, dos quais ele
prprio foi vtima.
Em 2000, Bruno tinha 16 anos e voltava da escola para casa
de bicicleta quando foi perseguido por um careca que tentou jog-lo
contra um caminho estacionado e depois o agrediu. S quando as
agresses cessaram que o careca, conhecido como Cabral, disse que
era careca do Brasil e foi embora.
Bruno no se machucou muito e preferiu nem dar queixa na
polcia. Menos de um ms depois, voltava para a casa a p quando
foi agredido repentinamente com socos no rosto por um careca.
Em seguida veio outro careca, mas dessa vez pelas costas e,
sem que eu visse, comeou a me agredir fisicamente; acabei caindo
no cho e enquanto levava pontaps pude ver mais adiante outros
dois carecas se aproximando correndo, um deles como se fosse
bater um pnalti, tendo minha cabea como alvo, no fosse a
esquiva, tinha acertado, conta.
Segundo ele, dessa vez foi registrado boletim de ocorrncia
e ele prprio pesquisou a rotina dos integrantes do movimento
careca da cidade, que seriam uns dez. A principio, no vou negar,
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pensei em mat-los, ou pelo menos um deles, mas essa idia logo
saiu da minha cabea, pois durante a efetuao da pesquisa no pude
deixar que algum sentimento de empatia me ocorresse quando
observei a vida completamente desregrada e sem futuro que eles se
auto-impuseram. Tambm me questionei seriamente se eu gostaria
de acrescentar mais um elo nesse grilho de violncia, diz Bruno,
que hoje adepto da filosofia zenbudista.
Outro relato impressionante de Maring diz respeito a um
levante punk contra os carecas nazistas da cidade, em 2002.
A ex-militante punk Fernanda conta que os naziskins
comearam a surgir na cidade desde 1998, causando confuso em
diversos lugares, mas sem muita argumentao ou propaganda.
Ningum entendia direito o que eles pensavam, eles chegavam,
batiam e iam embora fazendo saudaes nazistas, relata.
Em 2002, o movimento punk de Maring estava bem
articulado. Aps o espancamento de um casal de punks por cerca de
dez skinheads, os grunges e punks da cidade resolveram se unir para
um revide. O pessoal foi atrs deles em um bar onde costumavam
ficar, prximo a Copel. Dessa vez os skins estavam em menor
nmero, a o pessoal entrou no bar e quebrou eles, com direito a
garfadas e garrafadas, conta.
Segundo ela, aps esse episdio comeou uma semana de
terror para os punks em Maring, dois dos skinheads agredidos
foram para no hospital em estado grave e o resto do grupo jurou os
punks de morte. Certo dia eles chegaram em trs na frente da casa
de uma garota onde nos reunamos, apedrejaram a casa toda,
arrombaram a porta e quebraram tudo o que tinha l dentro. Quando
voltamos l no outro dia vimos que no dava pra salvar nada.,
desabafa.
Fernanda e seu companheiro perceberam que no seria uma
boa idia continuar em Maring e foram embora da cidade, junto
com o resto do grupo:
- Fomos ento pra Curitiba, mas quando chegamos l
percebemos que a coisa era ainda pior.
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Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
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Div
ulgao/Care
cas de Londrina
Odiados e Orgulhosos
Odiados e Orgulhosos
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Carecas de Curitiba
Povo forte, terra fria, sangue quente.
Gente limpa honesta e decente
que tem orgulho daquilo que s seu
de viver feliz, na terra onde nasceu
Curitiba - Mo-de-Ferro
Capital do estado, com quase dois milhes de habitantes
(1.788.560, segundo o Censo de 2000) Curitiba reconhecidamente
um dos plos culturais no Paran. No surpreende que a cidade
abrigue inmeras tribos urbanas, entre elas o skinhead, que achou no
jeito curitibano de ser - considerado bairrista, pouco receptivo e
tradicionalista terreno frtil para crescer.
Na cidade os grupos se dividem principalmente em Trads
(skinheads tradicionais, se ligam mais ao ska e reggae, so
apolticos), SHARPs, Carecas do Subrbio e White Powers.
Curitiba tambm conhecida como a capital do psychobilly no Sul,
contando com um festival anual do gnero que lembra o Oi! e agrada
a alguns skinheads.
A primeira gangue de Curitiba
O primeiro grupo de skins curitibanos de que se tem notcia
comeou em 1986, ainda com pouca ideologia e organizao. Quem
conta Gustavo, da banda Mo-de-Ferro - que o mesmo define
como uma banda de rock de rua, que traz nas letras, futebol,
cerveja e temas paranistas, tendo inclusive um acorden no line up.
ramos poucos, sete ou oito, nunca nos preocupamos em
nos contar. Era 1986/87. ramos pis, bem burros, inocentes e
irresponsveis. A violncia era o que nos guiava. Brigvamos muito
com punks, metaleiros, darks e new waves. A ideologia era confusa.
Falava-se muito em nacionalismo, mas eu no conseguia entender
bem o que era o que se falava. Tnhamos a notcia de que skinheads
16
-
16
Em uma pesquisa publicada pelo jornal Gazeta do Povo em 30 de Julho de 2006, de autoria prpria, foram entrevistadas pessoas que so oriundas de fora da capital mas l residem. Dentre as
palavras que melhor definiriam os curitibanos 55,7% dos entrevistados optaram por
Fechado/Introvertido, 18,8% os consideram Conservadores e, 17,4% os definiram como
Arrogantes.
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eram nazistas. Tudo isso era irrelevante. A briga era o que valia.,
afirma.
Segundo ele, o grupo acabou pouco tempo depois de uma
briga mais feia, quando cada um tomou um caminho diferente.
Daquele grupo, s eu estou na ativa atualmente, depois de muito
tempo no meu canto, conta.
Sulismo
Apesar do nacionalismo, os skins curitibanos daquela poca
j compartilhavam da idia do Sulismo - separao da regio Sul do
resto do pas - de acordo com Gustavo, havia naquela poca uma
banda no grupo chamada Resistncia Nacional, que tinha no
repertrio uma msica chamada Por um pas menor.
Gustavo nega o rtulo de separatista para sua banda atual,
mas assume ser partidrio da idia. Falar em Sulismo parece
sempre perigoso. inevitvel a associao com racismo, excluso,
xenofobia. Mas no nada disso. Nossa postura sempre a do
orgulho. Temos pouco e nos orgulhamos daquilo que temos e
somos, no caso, sulistas. Isso decorre do orgulho da prpria rua,
convivncia de bairro, das caractersticas de nossa cidade natal e
seus habitantes, que so to peculiares, diz.
Para ele, a idia de um Brasil unido no deu certo e a
emancipao das regies, cada qual com caractersticas culturais
bem definidas seria a soluo. Nossa regio Sul carrega uma gama
imensa de pontos de semelhana entre as culturas e tradies de seus
trs estados, a ponto de implicar no fcil reconhecimento da falta de
uma unidade nacional com o resto do Brasil. O Brasil no deu certo,
fato. E a auto-afirmao de seus povos, j divididos em regies
uma sada honrosa e promi