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Atividade de interpretação de texto baseado em crônica
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Livro: um objeto
anacrônico?
MILTON HATOUN - O ESTADO DE S.PAULO 30 Abril 2010 | 00h 00
Num artigo publicado em 2007, José Mindlin escreveu que o livro "tanto pode continuar sua trajetória de mais de 550 anos, como pode desaparecer em sua forma atual; mas apesar do risco de uma afirmação categórica, não tenho dúvidas em afirmar minha convicção de que vai permanecer". (O Futuro do Livro Sessenta Visões: Estúdio Substância/editora Olhares/ Ipsis Gráfica e Editora) Concordo com o otimismo de Mindlin, cuja biblioteca eu tive o privilégio de conhecer: uma biblioteca tão grandiosa e rica que você se sente inibido de escrever até um bilhete. Há livros que servem apenas de entretenimento. E há livros cujo conteúdo e linguagem são bem mais complexos; por exemplo, alguns dos livros que José Mindlin relia e cultuava: Grande Sertão: Veredas, os volumes de Em busca do Tempo Perdido, os Ensaios de Montaigne... Esses livros pedem e até exigem um leitor sofisticado, apaixonado e corajoso. Do livro mais fácil ao mais complexo, há algo em sua elaboração, algo essencial que diz respeito ao pensamento, a um modo particular de ver o mundo ou de imaginá-lo. Deixando a subjetividade de lado mas não totalmente à margem, penso que o livro eletrônico já é em certos países um concorrente ao livro de papel. Talvez seja mais exato dizer, ainda citando Mindlin, que "a leitura encontrou formas paralelas de existência". Ou seja, o texto na tela é uma das alternativas ao livro. Para um leitor compulsivo que viaja muito, é preferível levar um e-book no bolso a carregar uma mala de livros. Mas para um leitor razoavelmente sedentário e aí entram a subjetividade e as delícias do gosto é mais prazeroso escolher um livro na estante de sua casa ou de uma biblioteca e lê-lo com interesse e paixão, anotando frases ou trechos que expressam uma ideia, reflexão, cena ou diálogo relevantes. Apesar do avanço da tecnologia eletrônica que um dia nos permitirá ler textos flutuando no ar -, o livro de papel ainda tem algo de artesanal na sua concepção e impressão. Talvez no futuro ele seja um objeto de culto
e prazer de uma imensa minoria de seres anacrônicos. Mas quem - a não ser cartomantes e poderosas mentes apocalípticas pode prever o futuro? Não oponho qualquer resistência ao livro digital, muito menos ao computador, que facilitou a vida de todo mundo. Afinal, qualquer texto de Kafka, na tela ou no papel, será um texto de Kafka. A questão mais funda e, no limite, sem resposta, é saber se no futuro haverá leitores de Kafka.
Outro dia soube que uma edição eletrônica de um dos meus livros já estava disponível. Minha reação foi tão fria quanto a luz branca da tela. Porque nessa edição eletrônica não consigo sentir o processo da escrita desse texto: as várias versões do manuscrito e as sugestões indicadas pelos editores. Um processo até certo ponto artesanal, que a edição de um livro exige: da fonte a ser usada no miolo à escolha da capa, os textos da orelha e da
quarta-capa, o tipo de papel, etc. Talvez muitos jovens de hoje não sintam falta desse processo que é ao mesmo tempo artesanal e tecnológico. Mas para um dinossauro que ainda usa sua caligrafia para esboçar a primeira versão de um texto, o lado artesanal é importante. Além disso, essa frase de um conto de Machado de Assis faz pleno sentido se lida no papel: "Sim, minha senhora... As palavras têm sexo." Uma amiga embriagada por novidades eletrônicas me disse que ao manusear um e-book ela poder escutar o farfalhar das folhas de papel e até sentir o cheiro da tinta, como se a tela tivesse sido impressa. "Tudo é incrivelmente parecido com um livro", ela disse. Bom, se o e-book é uma espécie de duplo ou sósia virtual do livro de papel, então este viajante imóvel prefere o original. Por fim, rabisquei este poemeto, que agora dedico à memória de José Mindlin: Haverá um último livro Sobre a morte do livro? Leremos palavras no ar Ou na tela de um objeto invisível? O verbo folhear será esquecido? A frase: Vou abrir um livro Será um insulto? Uma profanação? Um sacrilégio supremo? Em cada página impressa O livro desafia o tempo.
A biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin é um órgão da Pró-reitoria de Cultura e Extensão Universitária da Universidade de São Paulo (USP), criado para abrigar e integrar a coleção doada por José Mindlin e sua esposa Guilta.
Análise da leitura
1. A crônica é um gênero narrativo que tem como base um
fato do cotidiano ou uma notícia jornalística. Em geral, é
publicada em jornais ou revistas e, depois, em livro.
a. Em que fato do dia a dia o autor se baseia para a
produção da crônica em estudo?
b. No primeiro parágrafo, o cronista se refere a José
Mindlin (1914-2010), empresário e bibliófilo paulista
que doou os livros de sua valiosa biblioteca à
Universidade de São Paulo. Assim como o cronista,
você concorda com a opinião de Mindlin em relação à
continuidade dos livros? Esclareça sua resposta.
2. Segundo o cronista, “você se sente inibido de escrever até
um bilhete”, diante do rico acervo da biblioteca de Mindlin.
a. Faça uma pesquisa sobre essa biblioteca e explique por
que o cronista, embora também seja um profissional da
escrita, se sentiu inibido ao conhecê-la.
b. Que sentido expressa o emprego da palavra até no
contexto?
3. Ao mencionar a diversidade de conteúdos dos livros, o
cronista apresenta alguns títulos de obras que Mindlin
apreciava.
a. Que tipo de obras você imagina que um leitor com as
características atribuídas a Mindlin – “sofisticado,
apaixonado e corajoso” – lê?
b. Pode-se dizer que o autor valoriza mais os livros cujo
conteúdo e linguagem exigem maior preparo do leitor?
Por quê?
4. Observe que o cronista desenvolve suas ideias em
1a pessoa: “Concordo com o otimismo de Mindlin”;
“Não oponho qualquer resistência ao livro digital”.
a. Explique que efeito produz o uso dessa pessoa no
texto.
b. Pode-se dizer que o texto em estudo é uma crônica
argumentativa, porque nele predomina a intenção de:
( ) instruir o leitor com suas ideias;
( ) informar sobre o futuro do livro;
( ) apresentar um ponto de vista e fazer o leitor
refletir;
( ) entreter e persuadir o leitor.
5.Ainda no terceiro parágrafo, o cronista menciona qual é a
situação do livro eletrônico no mundo.
a. Explique o que ele sugere ao dizer: “Deixando a
subjetividade de lado –mas não totalmente à margem”.
b. Tanto Mindlin como o cronista entendem que o livro
eletrônico constitui uma nova alternativa para a leitura
de textos. Em sua opinião, o livro eletrônico e o livro
impresso vão coexistir como objetos de leitura?
Esclareça sua resposta.
6. Como o autor expõe no texto, o livro eletrônico oferece
vantagens para “um leitor compulsivo que viaja muito”. Por
outro lado, de que forma se pode perceber que o cronista se
considera “um leitor razoavelmente sedentário”?
7.O cronista destaca uma característica interessante do livro
impresso. Ele afirma que o livro de papel continua a ter um
“lado artesanal”, mesmo sendo produzido na era tecnológica.
Diante disso, o autor supõe que o livro vai se tornar “um
objeto de culto e prazer de uma imensa minoria de seres
anacrônicos”. Interprete o contraste das ideias (paradoxo) na
expressão destacada.
8.De acordo com o texto, o cronista reconhece a importância
do computador no mundo contemporâneo.
a. Qual parece ser a grande preocupação do autor, caso o
livro impresso venha a desaparecer?
b. Explique por que o processo artesanal na criação do
livro impresso parece fundamental para o escritor.
9.O autor se declara “um dinossauro”, por escrever à mão a
primeira versão de seus textos. Apesar de toda a tecnologia,
esse recurso também é utilizado por outros escritores.
a. Em sua opinião, por que certos escritores ainda
mantêm esse elo tão forte com o texto manuscrito?
b. De que forma você elabora os seus textos: prefere
escrever à mão ou digitar? Explique por quê.
10.Nos últimos parágrafos, o cronista reitera seu apreço pelo
livro de papel e tenta imaginar o futuro do livro, passando da
prosa para a poesia. Por que, antes de apresentar seu poema,
ele se declara um “viajante imóvel”?
11.Observe que o texto apresenta em sua estrutura certas
palavras e expressões que funcionam como elementos de
coesão ou de ligação entre palavras, orações e parágrafos,
estabelecendo uma sequência coerente das ideias. Explique o
sentido expresso pelos elementos de coesão destacados nas
frases a seguir. Situe-as no contexto.
a. “Apesar do avanço da tecnologia eletrônica – que um
dia nos permitirá ler textos flutuando no ar –, o livro de
papel ainda tem algo de artesanal na sua concepção e
impressão.”
b. “Por fim, rabisquei este poemeto, que agora dedico à
memória de José Mindlin.”
c. “Além disso, esta frase de um conto de Machado de
Assis faz pleno sentido.”
12.Há palavras que retomam o que já foi dito, evitando a
repetição de ideias e, às vezes, sintetizando-as. Explique a
que palavras, orações ou parágrafos as palavras destacadas a
seguir se referem no texto, estabelecendo coesão.
a. “Esses livros pedem e até exigem um leitor sofisticado,
apaixonado e corajoso.”
b. “Talvez no futuro ele seja um objeto de culto e
prazer.”