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prtica pedaggica para ambientes virtuais

Interface Humano Computador:Gildsio Guedes

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Gildsio Guedes

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Interface Humano Computador: prtica pedaggica para ambientes virtuais

Gildsio Guedes Fernandes

TERESINA FEVEREIRO/2009

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Interface Humano Computador Interface Humano Computador: Prtica pedaggica para ambientes virtuais Reitor Prof. Dr. Luiz de Sousa Santos Jnior Vice-Reitor Prof. Dr. Edwar de Alencar Castelo Branco Conselho Editorial Liana Rosa Brito Cardoso Leda Mara Barreto Cavalcante Cleidinalva Maria Barbosa Oliveira Projeto Grfico Joo Paulo Barros Bem Editorao: Joo Paulo Barros Bem Capa: Cleidinalva Maria Barbosa Oliveira Impresso: Editora Grfica da UFPI

Gildsio Guedes

Ficha catalogrfica elaborada pela Biblioteca da Universidade Federal do Piau G925i Guedes, Gildsio Interface Humano Computador: prtica pedaggica para ambientes virtuais. Teresina: EDUFPI, 2008. 218 p: Inclui Bibliografia: 1. Tecnologias digitais 2. Ambientes virtuais 3. Interface humano-computador. I. Universidade Federal do Piau/Universidade Aberta do Piau. II. Ttulo. CDD 371-33

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Com a mesma simplicidade que acredito na bondade de Deus para transformar o homem acredito na fora das novas tecnologias para transformar nossa carente realidade. Gildsio Guedes Fernandes

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Dedico este trabalho ao meu pai, Raimundo Fernandes (in memoriam) e minha me Raimunda Guedes que, pacientemente, me orientaram ao longo da vida, s duas filhas Denise e Milena, ao meu irmo Gilberto e ao meu sobrinho Fluiman por suas presenas em minha vida.

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9 AGRADECIMENTOS Ao amigo e companheiro de lutas pelo desenvolvimento da Universidade Federal do Piau, Professor Doutor Luiz de Sousa Santos Jnior, por seu estmulo permanente. Ao professor, Jos Aires de Castro Filho, meu orientador no Doutorado, por sua contribuio na minha descoberta da grandiosidade da Educao. Cleidinalva Maria Barbosa Oliveira, por sua indispensvel colaborao na digitao e na formatao do texto. Francisca Augisiana, por sua compreenso nas horas difceis e seu afago nos momentos agradveis. Aos meus familiares: amigos, principalmente ao meu irmo primognito Gilvan Guedes, com quem vivi momentos agradveis na minha infncia, Clia Janurio e a todos meus outros irmos e irms que fortaleceram meus vnculos afetivos. Um agradecimento especial s mulheres na pessoa de rica Madeira Reis, afilhada querida e Anita A. Madeira, me das minhas duas filhas, por terem me dado sentido vida. Aos colegas professores e funcionrios do Departamento de Informtica e Estatstica da Universidade Federal do Piau, por seu apoio incondicional.

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Sumrio

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SUMRIO CAPTULO 1 INTRODUO........................................................................25 CAPTULO 2 - ELEMENTOS TERICOS DA MEDIAO SIMBLICA PARA APRENDIZAGEM EM REDE DE COMPUTADORES.............................31 2.1 Introduo........................................................................................ 31 2.2 Scioconstrutivismo......................................................................... 19 2.2.1 Sntese das teses bsicas da abordagem vygotskiana...................... 22 2.2.2 A mediao simblica de Vygotsky...................................................23 2.3 Semitica.........................................................................................29 2.4 Integrao da mediao simblica com as tecnologias digitais............................................................................................................41 CAPTULO 3 - DESIGN E PERCEPO VISUAL PARA WEB: INSTRUMENTOS NA MEDIAO SIMBLICA DA INTERFACE HUMANO-COMPUTADOR............................................................................59 3.1 Introduo........................................................................................ 59 3.2 Percepo visual e organizao das formas......................................50 3.3 Percepo visual e cor..................................................................... 69 3.4 Consideraes finais........................................................................ 71 CAPTULO 4 - INTERFACE HUMANO/COMPUTADOR: MODELOS, CARACTERIZAO E EVOLUO..............................................................81 4.1 Introduo........................................................................................ 81 4.2 Metforas de interface computacional................................................ 74 4.2.1 Classificao de metforas de interface computacional...................... 77 4.2.2 Evoluo dos tipos de interface utilizadas nos computadores desde sua origem..................................................................................... 79 4.3 Linhas gerais para construo de interfaces.......................................85 4.4 Os cones como elementos de interface grficas............................... 88 4.5 Requisitos bsicos das plataformas virtuais de aprendizagem........... 90 4.6 Consideraes finais........................................................................ 93 CAPTULO 5 - AVALIAO DA INTERFACE HUMANO/COMPUTADOR............101 5.1 Introduo........................................................................................101

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5.2 Mtodos tradicionais de avaliao.................................................... 98 5.3 Critrios gerais de avaliao de interfaces computacionais................ 100 5.4 Critrios para definio de interfaces, Scapin e Bastien..................... 105 5.4.1 Conduo........................................................................................ 106 5.4.1.1Presteza..........................................................................................106 5.4.1.2Agrupamento/distino entre itens................................................. 108 5.4.1.3Feedback imediato.......................................................................... 109 5.4.1.4Legibilidade.................................................................................... 110 5.4.2 Carga de trabalho............................................................................. 111 5.4.2.1Brevidade....................................................................................... 111 5.4.2.2Densidade informacional.................................................................. 113 5.4.3 Controle explcito............................................................................. 114 5.4.3.1Aes explcitas do usurio............................................................. 114 5.4.3.2Controle do usurio..........................................................................115 5.4.4 Adaptabilidade 5.4.4.1Flexibilidade....................................................................................116 5.4.4.2Considerao da experincia do usurio.......................................... 117 5.4.5 Homogeneidade / coerncia / consistncia....................................... 119 5.4.6 Significao dos cdigos e denominaes....................................... 119 5.4.7 Gesto de erros............................................................................... 120 5.4.7.1Proteo contra os erros.................................................................. 120 5.4.7.2Qualidade das mensagens de erro...................................................121 5.4.7.3Correo de erros........................................................................... 122 5.4.8 Compatibilidade............................................................................... 123 5.5 As heursticas de Jakob Nielsen....................................................... 123 5.6 Os oito princpios de Ben Shneiderman............................................ 126 5.7 As sete heursticas de Cludia Dias para portais corporativos.............127 5.8 Mtodos no destinados formalmente avaliao de ambientes web.......................................................................................................... 134 5.9 Avaliao de softwares educativos....................................................134 5.10 Mtodo ergopedaggico interativo de avaliao para produtos educacionais informatizados........................................................ 135 5.10.1 Categoria de critrios de comunicao apresentados no MAEP........ 136 5.11 Critrios para anlise de produtos educacionais informatizados..........139 5.12 Aspectos tcnicos: Norma International Organization for 141 Standardization No 9241......................................................................

Sumrio

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5.13 Consideraes finais....................................................................... 145 CAPITULO 6 - Interface Humano Computador e Uma Prtica Pedaggica 6.1 Introduo 6.2 Dez heursticas para ambientes digitais e virtuais para Educao a Distncia (EaD)........................................................................................................ 129 6.3 Parmetros para construo de um modelo conceitual em forma de checklist destinado a avaliar a interface de ambientes virtuais de educao. 135 6.3.1 Parmetros para adequao da interface de Ambientes Virtuais de Educao (AVE).................................................................................................. 6.3.2 Mdulo I - Modelo de Avaliao da interface de um Ambiente Virtual de Educao (Adequado para Educadores)..................................................... 6.3.3 Mdulo II Modelo de Avaliao da interface de um Ambiente Virtual de Educao. (Para especialistas com conhecimento de computao e experincia em EaD)................................................................................................... REFERNCIAS......................................................................................... 211 Sobre o autor ........................................................................................... 217

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Figuras

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FIGURASFIGURA 1 Elementos mediadores de Vygotsky......................................................................37

FIGURA 2 Ciclo ABCD de avaliao de produtos educacionais informatizados para ensino a distncia.....................................................................................................................55 FIGURA 3 Percepo visual e organizao das formas: mudana de direo, forma e cor/anomalia........................................................................................................................63 FIGURA 4 Percepo visual e organizao das formas: pea com balano..........................................................................................................................................................64 FIGURA 5 FIGURA 6 FIGURA 7 FIGURA 8 Percepo visual e organizao das formas: pea sem balano.................64 Percepo visual e organizao das formas: nveis de concentrao.........65 Percepo visual e organizao das formas: continuidade............................65 Percepo visual e organizao das formas: contraste...................................66

FIGURA 9 Percepo visual e organizao das formas: direo dos determinantes. Padro de busca................................................................................................................................67 FIGURA 10 Percepo visual e organizao das formas: direo transmite informao..........................................................................................................................................67 FIGURA 11 Percepo visual e organizao das formas: fechamento ou clausura................................................................................................................................................67 FIGURA 12 Princpio de figura-fundo.........................................................................................68 FIGURA 13 Percepo visual e organizao das formas: gradao e radiao..............68 FIGURA 14 Percepo visual e organizao das formas: harmonia (exemplo 1)...........69 FIGURA 15 Percepo visual e organizao das formas: harmonia (exemplo 2)...........69 FIGURA 16 Percepo visual e organizao das formas: movimento real........................70

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FIGURA 17 Percepo visual e organizao das formas: movimento ilusrio.................70 FIGURA 18 (a),(b),(c) e (d) Percepo visual e organizao das formas: exemplos de pregnncia de Wertheimer. (a) semelhana; (b) dois fatores de proximidade; (c) fatores de semelhana..................................................................................................................................71 FIGURA 19 Percepo visual e organizao das formas: figuras com e sem melhor proximidade........................................................................................................................................72 FIGURA 20 Percepo visual e organizao das formas: repetio com direo..........73 FIGURA 21 Percepo visual e organizao das formas: repetio com rotao..........73 FIGURA 22 Percepo visual e organizao das formas: figuras com simetria e assimetria (O homem de Leonardo da Vinci, simetria bilateral).............................................74 FIGURA 23 Percepo visual e organizao das formas: similaridade por tamanho e forma....................................................................................................................................................75 FIGURA 24 Percepo visual e organizao das formas: similaridade da forma favorecendo a observao das colunas e no das linhas das figuras .............................................75 FIGURA 25 Percepo visual e organizao das formas: iluso de Luckiesh e percepo espacial.......................................................................................................................................76 FIGURA 26 Monalisa, Leonardo da Vinci: exemplo do uso de sombra.............................77 FIGURA 27 cones inquestionveis............................................................................................94 FIGURA 28 Categoria de critrios comunicacionais...........................................................139 FIGURA 29 Tipos de interface propostas para utilizao em educao a distncia...149 FIGURA 30 Tipos de tecnologias versus nvel de assimilao das informaes.........150 FIGURA 31 Estilos de aprendizagem para alunos aprendizes em EaD..........................151 FIGURA 32 Modelo de interface adaptativa..........................................................................159 FIGURA 33 Viso da interface do Solar..................................................................................161

Lista de tabelas

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FIGURA 34 Viso da interface do e-ProInfo...........................................................................162. FIGURA 35 Viso da interface do Moodle adotado na UFPI..............................................165

LISTA DE QUADROS E TABELASQUADRO 01 Tricotomia na categorizao dos signos............................................................50 QUADRO 02 Aplicaes e metforas associadas.....................................................................86 QUADRO 03 Caractersticas da qualidade de software.........................................................144 QUADRO 04 Caractersticas de cada estilo de aprendizagem em ambientes virtuais de aprendizagem...................................................................................................................................152 QUADRO 05 Caractersticas gerais da maioria dos ambientes virtuais de aprendizagem....................................................................................................................................................155 QUADRO 06 Caractersticas especficas da maioria dos ambientes virtuais de aprendizagem.....................................................................................................................................................156 QUADRO 07 Ferramentas administrativas dos ambientes virtuais de aprendizagem.....156 QUADRO 08 Ferramentas de apoio ao professor dos ambientes virtuais de ensino e aprendizagem...................................................................................................................................157 QUADRO 09 Ferramentas de apoio aos usurios de ambientes virtuais de aprendizagem.....................................................................................................................................................157 QUADRO 10 Ambiente administrativo (ou ambiente vermelho) do e-ProInfo....................163 QUADRO 11 Ambiente do curso (ou ambiente azul) do e-ProInfo.......................................164 QUADRO 12 Ambiente da turma (ou ambiente amarelo) do e-ProInfo...............................164 QUADRO 13 Formato da lista de verificao para o modelo................................................188

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Lista de abreviaturas e/ou siglas

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LISTA DE ABREVIATURAS E/OU SIGLASAGU Advocacia Geral da Unio AVA Ambientes Virtuais de Aprendizagem AVE Ambientes Virtuais de Educao AVEA Ambientes Virtuais de Ensino e Aprendizagem BB Banco do Brasil B bom CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior CD Compact Disc CD-ROM Compact Disc Read Only Memory CEF Caixa Econmica Federal CEP Cdigo de Endereamento Postal C&T Cincia e Tecnologia COBOL COmmon Business Oriented Language CPF Cadastro de Pessoa Fsica CPU Unidade Central de Processamento DNA Desoxirribonucleia Acid DVD Video Disc E Excelente e-business electronic business e-commerce electronic commerce e-learning electronic learning e-mail electronic mail e-procurement electronic procurement EaD educao a distncia ECT Empresa de Correios e Telgrafos EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria EUA Estados Unidos da Amrica FACED Faculdade de Educao [da UFC] FAQ frequently asked questions Fortran FORmula TRANslation [ translator] GNU/GPL General Public License Hard Hardware HTML HyperText Markup Language I Insuficiente IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente IBM International Business Machines IEC International Eletrotechnical Comission IES Instituio de Ensino Superior

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IFES Instituio Federal de Ensino Superior IHC Interface Humano/Computador ISO International Organization for Standardization MAEP Mtodo Ergopedaggico Interativo de Avaliao para Produtos Educacionais Informatizados MB muito bom Mcm meios de comunicao de massa MEC Ministrio da Educao Moodle Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment N No NIED Ncleo de Informtica Aplicada Educao NPD Ncleo de Processamento de Dados ONG organizao no governamental O T timo PC personal computer PE pssimo PEI produto educacional informatizado PHP Hypertext Preprocessor PI Piau PP publicidade e propaganda ProInfo Programa Nacional de Informtica na Educao PUC-RJ Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro R regular RGB red, green e blue RH recursos humanos RSS Realy Simple Syndication S Sim SAU Servio de Atendimento ao Usurio SGBD Sistema Gerenciador de Banco de Dados SBC Sociedade Brasileira de Computao ScormSharable Content Object Reference Model SE software educativo SEED Secretaria de Educao a Distncia SGBD Sistema Gerenciador de Banco de Dados Soft Software Solar Sistema On-line de Aprendizado [ou] Ambiente On-line de Aprendizado TDs tecnologias digitais TICs tecnologias de informao e de comunicao TV televiso

Lista de abreviaturas e/ou siglasUFC Universidade Federal do Cear UFPI Universidade Federal do Piau UFSC Universidade Federal de Santa Catarina UNICAMP Universidade Estadual de Campinas vs. W3C WIMP WIS WYG ZDP Versus World Wide Web Consortium window, icon, menu, pointing device what you see what you get zona de desenvolvimento proximal

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Prefcio PREFCIO Objetiva-se, em nvel macro, apresentar de forma conceitual as principais recomendaes para construir textos, imagens e grficos luz das recomendaes da Interface Humano Computador (IHC), especificamente, a usabilidade e a funcionalidade de sistema de computao para ambientes da internet. A partir da, objetivo especfico, dentro do contexto terico, apresentar heursticas e parmetros para construir um modelo conceitual de avaliao de interfaces computacionais de ambientes virtuais para Educao a Distncia (EaD). Em relao usabilidade, vrios atributos so considerados na interface computacional, destacando-se facilidade de aprendizagem, eficincia de uso, facilidade de memorizao, baixas taxas de erro e satisfao subjetiva. A funcionalidade, que engloba as camadas de programao e da base de dados, leva-se em considerao a consistncia dos dados produzidos no ambiente virtual e a facilidade de adequao tarefa das principais funes, com nfase nos mecanismos de comunicao, de coordenao, de interao e de administrao do ambiente. Para a construo do modelo de cada aprendiz, recomendamos a ampla reviso bibliogrfica e a anlise geral da interface de diferentes ambientes computacionais.

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INTRODUO1 INTRODUO

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O termo interface humano-computador emergiu na segunda metade dos anos 80, como forma de descrever novo campo de investigao preocupado no somente com o design da interface de sistemas computacionais, mas, tambm, com o foco de interesse e de demandas do pblico. No obstante a falta de concepo devidamente estabelecida, face citada dificuldade de formar conceitos, Rocha (2003) define IHC como a rea preocupada com design, avaliao e implementao de sistemas computacionais interativos para uso humano, e, ainda, com o estudo dos principais fenmenos subjacentes a eles. Dentre os elementos que garantem boa interface em computao, destacamos as ferramentas funcionais, capazes de melhorar a segurana, a usabilidade e a utilidade dos sistemas computacionais. As interfaces para usurios humanos so produtos de trabalhos interdisciplinares, que agregam profissionais de campos distintos, dentre psiclogos, projetistas grficos, escritores, engenheiros ergonmicos, antroplogos, socilogos e analistas de sistemas, em torno do objetivo comum de aperfeioar a aprendizagem da funcionalidade dos sistemas. Reforamos, porm, ser contraditrio e sem importncia pensar em interfaces computacionais sem considerar o usurio. Por conseguinte, os termos interface, interao e usabilidade no podem ser analisados separadamente. Por isto, ao longo de toda a pesquisa, quando nos referirmos s interfaces ergonmicas ou s interfaces amigveis, estamos nomeando a interao entre sistemas computacionais e o ser humano, ou seja, enfatizamos a melhor adequao da usabilidade dos sistemas computacionais s tarefas de interao com o usurio. E mais, a denominao interface amigvel ou interface agradvel designa a interface capaz de disponibilizar estmulos visuais, como cores, formas, fontes, texturas e outros elementos, de forma equilibrada e harmnica, visando no saturar a viso nem sobrecarregar a capacidade de assimilao dos sujeitos diante do crescente fluxo informacional, como Batista (2003) chama a ateno. Em se tratando da interface interativa, refere-se quela que propicia ao indivduo controlar as atividades dos sistemas de computao, de forma fcil e gil, e tambm de maneiras variadas, sem provocar erros no momento de uso. Nesse contexto, o ambiente virtual de aprendizagem pode

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se tornar um sistema de computao mais adequado no uso e na aplicao. Moran et al. (2000) assinalam que estamos ultrapassando os modelos predominantemente individuais rumo aos de grupos. As mdias unidirecionais, como o impresso, a televiso (TV) e o rdio, talvez permaneam com tais traos por mais algum tempo, embora o caminho preponderante para a educao conduza s mdias interativas, com destaque para a internet e suas aplicaes. Porm, h percalos. Por exemplo, um dos paradoxos das tecnologias de informao e comunicao que, se, a princpio, so implantadas e implementadas para tornar as tarefas mais simples e agradveis, cada inovao tecnolgica pode adicionar certa complexidade em seu emprego e, s vezes, frustraes nas configuraes dos equipamentos que os usurios finais dispem, como o caso da verso 2007 do word, conhecida como Word Vista, em que novas funcionalidades foram adicionadas, a interface da verso anterior modificada, mas a aceitao junto aos usurios baixa em comparao a verso modificada. Sob esta tica, na viso de Silva (2002), nos ambientes virtuais, quando da utilizao das TIC e das Tecnologias Digitais (TD), o aluno , ao mesmo tempo, usurio, aprendiz e leitor. Usurio de um ou mais dispositivos; aprendiz de contedos formatados para a web, sem a mediao do professor presencial; leitor de uma interface, quase sempre na vertical, que necessita de uma linguagem apropriada tarefa do usurio. Em sua condio de usurio, demanda meios de comunicao; como aprendiz, no pode dispensar o conjunto de doutrinas, princpios e mtodos de educao e instruo que tendem a um objetivo prtico, ou seja, os recursos da pedagogia; como leitor, muito importante que tenha uma interface adequada com os princpios de usabilidade. Tudo isto como forma de viabilizar e aperfeioar os processos de ensino e de aprendizagem. S que, ao contrrio da educao presencial, que rene professor e aluno num mesmo espao fsico, a maioria das aes da EaD pode se dar mediante outras formas de contato humano, como exemplo, atravs de um ambiente virtual de aprendizagem com usabilidade adequada tarefa do usurio que o foco principal deste texto. Usabilidade

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Introduo

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O termo usabilidade se origina na cincia cognitiva e significa fcil de usar. Nos primrdios do decnio de 80, passa a integrar as reas de psicologia e ergonomia. A este respeito, Nielsen (1993) apresenta cinco atributos para usabilidade que contribuem para boa interface: facilidade de aprendizagem, eficincia de uso, facilidade de memorizao, baixas taxas de erro e satisfao subjetiva. Prosseguindo, definio constante da norma da International Organization for Standardization (ISO, No 9241-11), Guidance on usability (1998), diz que usabilidade a capacidade de um produto ser utilizado por indivduos em busca de atingir objetivos especficos com eficcia, eficincia e satisfao. A mesma norma apresenta mais concepes, que podem nos ajudar na compreenso do que , de fato, a usabilidade. Saiba mais Usurio quem interage com o produto. Contexto de uso conjunto ou todo ou totalidade, que incorpora, ento, usurios, tarefas, equipamentos (hardwares, hards), dispositivos, softs e o ambiente fsico e social em que o produto est inserido para sua utilizao. Eficcia preciso e completeza com que os usurios atingem objetivos especficos, acessando a informao correta ou obtendo os resultados esperados. A preciso est associada correspondncia entre qualidade do resultado e critrio especificado, enquanto a completeza a proporo da quantidade-alvo atingida. Eficincia preciso e completeza com que os cidados atingem os objetivos pretendidos no que se referem aos recursos gastos (em termos quantitativos). Satisfao conforto e nvel de aceitao do produto, mensurados por estratgias e instrumentos subjetivos ou objetivos. Posteriormente, a partir da ISO/ IEC [International Eletrotechnical Comission] No 9126 (1991), o termo usabilidade ultrapassa os limites da psicologia aplicada e da ergonomia e passa a fazer parte do vocabulrio tcnico de temas, como TIC e IHC. Todas essas concepes convergem para outra definio, presente no bojo dos sistemas de informaes com interfaces amigveis, a interatividade. A usabilidade percebida como qualidade de uso, isto , interao entre usurio e o sistema. s vezes, um mesmo sistema ideal para algu-

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mas pessoas, mas completamente ou medianamente inadequado para outras. Ela pode ser mais genrica medida que os sistemas so mais flexveis, entendendo-se, aqui, flexibilidade como o atributo concernente capacidade do sistema em se adaptar ao contexto e s demandas da audincia. E, talvez, a eficcia figure como o principal motivo que justifica a preferncia de algum por determinado produto. Assim sendo, os sistemas com objetivos educacionais devem ser dotados de traos fundamentais para que sua aplicabilidade favorea a usabilidade, levando ao melhor desempenho nos processos de ensino e de aprendizagem. Ao tempo que o software educativo deve ser gerado de forma que seus signos e seus instrumentos mediadores sejam utilizados de forma objetiva, dando prioridade interatividade e criatividade do ser humano, tambm necessita ser atraente e interessante para despertar a ateno da criana/do aprendiz/do estudante. Utilidade De acordo com Silva (2002) o termo utilidade vai alm da usabilidade, a utilidade sempre tem se constitudo em motivo de preocupao na gerao de sistemas computacionais. Alinha-se com as funes centrais que um sistema est apto a desenvolver, com eficcia. E, consequentemente, mantm forte vnculo com a capacidade do sistema em produzir corretamente as informaes, no importa se acessadas de formas e/ou em perodos diferentes. A preocupao com a utilidade antecede os estudos de usabilidade, pois sua meta principal oferecer ambiente de informaes confiveis. Ora, se um sistema agradvel, de fcil aprendizagem e consequente uso, de imediato, atende aos parmetros de usabilidade. Porm, se no suprir as exigncias do pblico-alvo, fatalmente, seu uso limitado ou nulo. Em resumo, os sistemas de computao devem ser interessantes para suscitar interesse, mas, tambm, adequados aos objetivos, s metas e s tarefas a que se prope. O termo utilidade comumente denominado tambm de funcionalidade. Objetivos do texto Em relao ao objetivo geral, pode ser assim enunciado:

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Introduo

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Desenvolver modelo conceitual para avaliar a interface humano-computador utilizada em ambientes virtuais na web. Ento, os objetivos especficos so: Estudar a usabilidade da interface computacional de ambientes virtuais da web. Analisar a funcionalidade de ambientes virtuais voltados para web. Levantar parmetros para construir modelo conceitual de avaliao de interfaces de sistemas computacionais. Estrutura do texto Em termos estruturais, visando consecuo dos objetivos propostos, o texto consta de seis captulos, afora a listagem bibliogrfica. Enquanto a introduo traz a concepo dos principais termos adotados no decorrer do texto e apresenta sua relevncia e seus objetivos em consonncia com as questes de pesquisa. O captulo dois discute alguns elementos de mediao, que podem facilitar a organizao da informao para gerar conhecimentos, centrados no socioconstrutivismo que tem como base o pensamento de Lev Seminovitch Vygotsky (1896-1934) e na teoria da semitica de Charles Senders Pierce. No captulo trs, discorremos sobre design e percepo visual para web. Inicialmente, relata princpios norteadores para construo de ambientes computacionais baseados no apenas nas recomendaes de usabilidade das interfaces, mas, tambm, nos estudos de comunicao e percepo visuais, tendo como referencial a organizao das formas e da Gestalt e os princpios de proximidade, repetio, contraste, alinhamento e cor, para construo de textos e de imagens em monitores de vdeos. Quanto ao captulo quatro, so apresentados os paradigmas vigentes para a interface humano-computador (IHC), com nfase para a caracterizao e evoluo das interfaces computacionais, sobretudo, as mudanas expressivas ocorridas desde os anos 70, explicitando os modelos iniciais, como interfaces de linhas de comando at as metforas de interfaces atuais como

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WIMP e interfaces amigveis. Por seu turno, o captulo cinco refere-se avaliao da IHC. A abordagem enfoca, sobretudo, a concepo, o desenvolvimento e a avaliao de interfaces computacionais obedecendo aos atributos de usabilidade, de forma ampla, que incorpora desde heursticas para sistemas de computao de qualquer rea at recomendaes de usabilidade para portais corporativos e indicadores destinados construo de ambientes educacionais. No captulo seis temos a concluso do texto com nfase nas Dez Heursticas propostas para o desenvolvimento de interfaces para web. Ao final, meno s fontes bibliogrficas e eletrnicas consultadas. Para pensar Escreva algumas recomendaes para construo de textos na web baseado na sua experincia acadmica como usurio da internet. Discuta com seus colegas de turma sobre a importncia da satisfao do usurio na leitura de um texto na internet.

ELEMENTOS TERICOS

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2 ELEMENTOS TERICOS DA MEDIAO SIMBLICA PARA APRENDIZAGEM EM REDE DE COMPUTADORES 2.1 Introduo Para traarmos relao entre processo educacional e desenvolvimento cognitivo, a priori, essencial a identificao de elementos tericos sobre a aprendizagem e o desenvolvimento cognitivo, em busca de enquadramento das questes de pesquisa antes enunciadas, que pressupem adequao de elementos mediadores, de interesse pedaggico, aos conceitos que cercam a noo de usabilidade dos sistemas computacionais. Sob este ponto de vista, encontramos na abordagem de L. S. Vygotsky, ou simplesmente, abordagem vygotskyana ou, ainda, scio-histrico-cultural ou sciointeracionismo ou socioconstrutivismo, principalmente, no contexto da mediao simblica uma das perspectivas promissora e uma das sustentabilidades terica para a consecuo do objetivo central antes enunciado: construir modelo conceitual para avaliar a IHC utilizada em Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA) na modalidade EaD. Isto significa que nosso trabalho de doutoramento recorre a Vygotsky. Sua linha de pensamento est devidamente representada em dois ttulos centrais A formao social da mente: o desenvolvimento dos processos psicolgicos superiores (1998) e Pensamento e linguagem, de 2000, cujas contribuies permitem o redimensionamento do campo terico e metodolgico sobre o estudo da formao de conceitos, principalmente, por trabalhar com a funo mediadora, no que diz respeito cognio, quando afirma que a ao do sujeito sobre os objetos socialmente mediada pelo outro, atravs de instrumentos e signos. Mas neste captulo abordamos tambm, em busca de sustentabilidade terica para a pesquisa os conceitos definidos por Peirce (2003) usados na Semitica quando apresenta de maneira clara a definio de signos dividindo-os em categorias de Primeiridade, Secundidade e Terceiridade com incluso dos mais utilizados em interfaces computacionais, quais sejam: cones, ndices e smbolos. Por sua importncia e em complemento ao exposto neste captulo apresentamos uma abordagem completa da teoria da forma, ou seja, da formao de imagens, enfatizando que captamos a informao visual de muitas

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maneiras, destacando-se artigos publicados e a internet. A teoria da forma desenvolvida ao longo do sculo 20 por Max Wertheimer (1810/1943), Wolfgang Kohler (1887/1967), Kurt Koffka (1861/1941) e no Brasil representada por diversos pesquisadores entre os quais Gomes Filho (2004) autor de Gestalt do Objeto, um livro que discorre sobre sistema de leitura visual da forma, e Engelmann (1978c) que publicou trabalhos sobre os primrdios da Gestalt no sculo passado. A abordagem da teoria da forma feita em separada no captulo III do presente trabalho. 2.2 Socioconstrutivismo Exploramos os elementos tericos do socioconstrutivismo, com o intento de produzir informaes sobre aspectos de implicaes educacionais atualizadas, que contribuam com o estudo e a comparao de elementos mediadores do uso de interfaces computacionais. Por exemplo, enquanto o termo mediao (conceito-chave do presente estudo), ganha, em Vygotsky, diferentes denominaes, como: interao social, signo, instrumento, unidade, formao de conceitos etc., nesta tese, adotamos funcionalidade, usabilidade, interatividade, a forma das partes da interface, a organizao e exibio das informaes no vdeo, a representao do cone etc., o que nos permite traar certa correlao. Em outras palavras, a busca de explorar elementos tericos capazes de fortalecer a prtica concreta dos processos de ensino e de aprendizagem em atividades de uso e de aplicao das TIC. Essa busca, em sua totalidade, nos permite entender as implicaes das idias de Vygotsky para a educao tendo como referncia a mediao. Dentre elas, a qualificao do ensino, o papel da imitao no aprendizado e a funo benfazeja do professor na dinmica das interaes interpessoais e na ao recproca entre os usurios de computadores com os objetos de produo de novos conhecimentos, para identificar elementos que, de certa forma, esto diretamente relacionados e complementam a ergonomia da interface humano computador em ambientes virtuais de aprendizagem. O princpio orientador do paradigma vygotskyano a dimenso sciohistrica do psiquismo. Para tanto, investiga como as reaes naturais de resposta aos estmulos so biologicamente herdadas. Ao se entrelaarem de forma interativa com os processos culturalmente organizados, favorecem

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transmutaes qualitativas nos modos de ao, relao e representao do homem. Cada indivduo aprende a ser homem. A relao homem-meio , sempre, mediada por produtos culturais humanos, como o instrumento e o signo, e, ainda, pelo outro, num propiciar contnuo de caminhos alternativos para a soluo de situaes-problema. Contudo, a idia de Vygotsky, de que a interveno de outras pessoas fundamental para a formao de cada sujeito no deve ser considerada como proposta de carter autoritrio ou como conduta postulada ao ensino tradicional, onde o professor dita regras e o aluno as absorve, de forma quase instantnea. Porque seu propsito na pesquisa no fazer uso do experimento como determinante das condies que controlam o comportamento nem tampouco ser especulativo. Seus princpios derivam de abordagem, que privilegia a natureza dos processos psicolgicos superiores, e admite quo complexa a tarefa de conduzir e de explicar cientificamente os comportamentos. Para Vygotsky, o importante comprovar que o experimento deve desvendar os processos encobertos pelo comportamento habitual. Da precisa prover o mximo de oportunidades para que o indivduo experimental se engaje nas mais diversas atividades que possam ser observadas e no somente controladas. Sob esta tica, seu mtodo experimental alinha-se com os mtodos histricos propostos pelas cincias sociais, procurando explicar o progresso da conscincia e do intelecto humano. Integra esse processo tanto a histria da cultura e da sociedade como a histria do aprendiz. Oferecer diversas oportunidades tambm um dos princpios da usabilidade de interface computacional, quando recomenda de forma explcita disponibilizar de vrias formas o acesso informao de um sistema de computao para facilitar caminhos para usurios inexperientes, dispor atalhos para usurios experientes, seguindo o contexto e a cultura de cada um, principalmente naquilo que lhe comum e familiar de forma clara e adaptvel. A adaptabilidade de um sistema referente capacidade de reagir conforme o contexto e em consonncia com as necessidades e preferncias do usurio. Dois subcritrios emanam da adaptabilidade: flexibilidade e considerao da experincia individual. Aqui, vale a pena lembrar que uma interface no atende, ao mesmo tempo, a totalidade dos usurios em potencial. Ento, para que no provoque efeitos negativos sobre o indivduo, sem-

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pre conforme o contexto, a interface deve se adaptar ao pblico-alvo. Por outro lado, quanto mais variadas so as maneiras de efetivar uma tarefa, maiores so as chances de o usurio escolher e dominar uma delas no curso de seu aprendizado. Deve-se, portanto, lhe fornecer procedimentos, opes e comandos diversificados para o alcance de um mesmo objetivo. De antemo, Vygotsky (1998) nutre o intuito de conhecer a origem das caractersticas psicolgicas humanas. Para a consecuo de tal meta, se concentra no no produto per se do desenvolvimento, e, sim, no prprio processo de estabelecimento das formas superiores. O objetivo da anlise dinmica tenta alterar o carter automtico, mecanizado e fossilizado das formas superiores de comportamento, fazendo-as retornar sua origem, mediante o experimento. E nessa busca para identificar a procedncia dos traos psicolgicos, Vygotsky analisa o comportamento e o psiquismo dos mamferos superiores mais prximos da espcie humana, como o caso do chimpanz (macaco antropide), que graas aos avanos da engenharia gentica, mais recentemente, maio de 2003 o cientista americano Morris Goodman sugeriu, em um estudo publicado na revista cientfica PNAS, como detentor de 99,4% de semelhana com o desoxirribonucleia acid (DNA) do homem (homo sapiens). Mesmo assim, j quela poca, Vygotsky visava reconhecer as principais diferenas e semelhanas do chimpanz com o homem e entender as relaes entre o psiquismo humano e a cultura, especialmente, a partir da observao das aes humanas. Saiba mais Sobre o scio construtivismo de Vygotsky no dicionrio virtual Wikipdia http://pt.wikipedia.org/wiki/Lev_Vygotsky. Leia o primeiro captulo do livro: Formao social da Mente de Vygotsky. 2.2.1 Sntese das teses bsicas da abordagem vygotskiana Enfatizamos que so cinco as teses bsicas da abordagem de Vygotsky (1998, 2000), particularmente, as que propiciam reflexes no campo da educao, so elas:

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Tese 1 Sobre a relao indivduo x sociedade; Tese 2 Sobre a origem cultural das funes psquicas; Tese 3 Sobre a base biolgica de como funciona o crebro; Tese 4 Sobre a conservao das caractersticas bsicas dos processos psicolgicos; Tese 5 Sobre a caracterstica de mediao presente na atividade humana. Tese 5 Sobre a caracterstica de mediao presente na atividade humana. A tese 5, no obstante as demais, a que mais nos interessa em virtude da maior relao com o objeto de estudo de nossa tese. De forma que para Vygotsky (1998), toda e qualquer atividade humana, ou toda relao do indivduo com o ambiente mediada por instrumentos, tcnicas, sistemas de signos (dentre os quais merecem meno a linguagem, a escrita e o uso de nmeros), construdos coletivamente por intermdio de meios ou ferramentas auxiliares das aes humanas. A aptido e/ou a capacidade de criar tais ferramentas exclusiva da espcie humana, de tal modo que a mediao ganha espao de destaque na perspectiva scio-histrica, haja vista que atravs dos instrumentos e dos signos que os processos de funcionamento psicolgico so fornecidos pela cultura. Sobre este item, autores do posfcio do mencionado livro A formao social da mente... reiteram a gerao e o emprego de estmulos auxiliares ou artificiais como inerentes e importantes condio humana. Comeam na infncia e permitem que situaes inditas e diversificadas sejam alteradas graas interveno do homem. So esses instrumentos, tcnicas e signos os responsveis pela mediao dos seres humanos entre si e deles com o mundo. Ao contrrio do que se imagina, o homem, enquanto sujeito de conhecimento, no mantm acesso imediato aos objetos. Sua relao com o mundo no direta e se efetiva por meio de sistemas simblicos, os quais representam a realidade. A linguagem, antes citada, um signo mediador por excelncia, vez que carrega em si os conceitos generalizados e elaborados pela cultura. Por isso, exerce papel central, em sua condio de principal sistema simblico de todos os grupos humanos, e que se interpe entre sujeito e objeto de conhecimento.

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Interface Humano Computador 2.2.2 A mediao simblica de Vygotsky

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Retomamos Vygotsky (1998, 2000), para quem a ligao homem/mundo no se configura como relao direta, mas, fundamentalmente, uma vinculao mediada. E o mundo real por ele idealizado envolve o meio ambiente em que vivemos, a cultura prevalecente e o processo histrico em sua totalidade. Na mesma linha de pensamento, Lvi-Strauss (apud LARAIA, 2005), define cultura como sistema simblico gerado Vygotsky pela mente humana, e de forma acumulativa. Disponvel em: As funes psicolgicas superiores apresentam tal estruhttp://www.ucc.ie/acad/appsoc/ tmp_store/mia/Library/archive/ tura, que entre o homem e o mundo real h diferentes mediavygotsky/index.htm dores. Estes agem como ferramentas auxiliares da atividade humana, ampliando a capacidade de ateno e de memria e, sobretudo, permitindo maior controle voluntrio do homem sobre suas atividades. Para Vygotsky (2000), h dois tipos de mediadores: os instrumentos e os signos, os quais mantm certa analogia, mas traos bastante diferentes. Os dois so fundamentais para o aprimoramento das funes psicolgicas superiores, distinguindo o ser humano dos demais animais, o que permite conceber a mediao como essencial para efetivar atividades psicolgicas voluntrias, intencionais e/ou controladas pelos sujeitos. Os instrumentos so elementos interpostos entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho, ampliando as possibilidades de transformao da natureza, o que lhe permite dizer que so eles objetos sociais e mediadores da relao entre o indivduo e o mundo em aes concretas. Os signos, por seu turno, agem como instrumentos de atividade psicolgica de maneira anloga ao papel de um instrumento no trabalho, o que justifica a denominao vygotskyana de instrumentos psicolgicos. So orientados para o prprio sujeito, norteando as aes psicolgicas dos indivduos e dos grupos sociais, sem exercer funes em aes concretas, tais como fazem os instrumentos. Para o autor de A formao social da mente (VYGOTSKY, 1998), ao longo da evoluo da espcie humana e do crescimento de cada indivduo, registram-se duas mudanas qualitativas fundamentais no uso dos signos. Primeiro, a utilizao de marcas externas, as quais se transmutam em processos internos de mediao. Segundo, so desenvolvidos sistemas sim-

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blicos, que organizam os signos em estruturas complexas e articuladas. Para ele,o uso de signos auxiliares rompe com a fuso entre o campo sensorial e o sistema motor, tornando possvel novos tipos de comportamento. A criana que anteriormente solucionava os problemas impulsivamente, resolve agora atravs de uma conexo estabelecida entre o estmulo e o signo auxiliar correspondente. (VYGOTSKY, 2000, p. 46).

No caso de adultos, a memorizao mediada est sendo to utilizada sob formas diversificadas, que so muitas as modalidades de associaes de fatos e aes, para que o esquecimento no se d. Por exemplo: associar o ano do nascimento de algum com fato importante da histria; vincular dia/ ms de seu nascimento ao de outra pessoa; trocar uma corrente ou o relgio de um brao para outro a fim de lembrar um compromisso assumido. Nesses tipos de evidncias, estamos acostumados a incluir instrumentos mediadores com o uso de figuras e de cores. Para pensar Por fim, ao tempo que Vygotsky (1998, 2000) classifica os mediadores em signos e instrumentos, ele mesmo afirma que, a partir de uma perspectiva psicolgica, ambos podem ser includos numa s categoria. A relao lgica entre o uso de signos e o de instrumentos , ento, representada por esquema grafo (Figura 1), que mostra esses conceitos includos dentro da concepo mais ampla de atividade indireta (mediada). Atividade mediada

Signo

Instrumento

Figura 1 Elementos mediadores de Vygotsky. Fonte: VYGOTSKY (2000. p.71)

ainda Vygotsky quem enfatiza a funo do instrumento como condutor da influncia humana sobre o objeto da atividade, determinando, inevitavelmente, mudanas nos objetos. Enquanto isto, o signo no modifica em

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nada o objeto da operao psicolgica, vez que orientado internamente. Como discutido em momento anterior, a mediao figura como conceito central para a compreenso das concepes vygotskyanas sobre o funcionamento psicolgico. Na acepo de Oliveira (2000, p. 26), de forma ampla e abrangente, mediao [...] o processo de interveno de um elemento intermedirio numa relao; a relao, ento, deixa de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento. No caso de Vygotsky, a cognio humana, intersubjetiva e discursiva, impreterivelmente mediada. Dizendo de outra forma, a ao do sujeito sobre o objeto mediada socialmente pelo outro e pelos signos, com a ressalva de que a abordagem vygotskiana distingue dois tipos de elementos mediadores: os instrumentos e os signos, cujos atributos distintivos so bastante diferentes. A noo bsica do uso da mediao, enquanto termo conceitual, para Vygotsky, est fundamentada na no associao estmulo-resposta do aprendizado. Ao contrrio. Seu referencial est nas formas superiores do comportamento humano, em que o indivduo modifica a circunstncia de estmulo, como parte do processo de resposta a ela, estruturando a atividade produtora das atitudes comportamentais como base do termo mediao. De fato, o pressuposto fundamental e norteador do arcabouo terico e metodolgico do paradigma vygotskyano o conceito de mediao. Neste contexto, a mediao revela grandes aproximaes com o materialismo histricodialtico, retomando-se a informao de que Vygotsky trata a noo de mediao homem-mundo pelo trabalho e agrega os instrumentos utilizao de signos. Isto , a mediao se objetiva no conceito de converso, superao, relao constituinte eu x outro (conscincia), intersubjetividade, subjetividade etc. Portanto, o objeto da psicologia e da psicologia social o fenmeno psicolgico, que s existe graas s mediaes. Tal fenmeno mediado e no imediato. E essa mediao, como desgnio da relao eu x outro e da intersubjetividade, consiste em contribuio expressiva, que define sua relevncia na dimenso scio-histrica. Complementando, afirmamos que a mediao em si mesma processo. No o ato em que alguma coisa se interpe, isto , a mediao no est entre dois termos que estabelecem relao. a prpria relao, e, portanto, configura-se como o processo de interveno de um elemento intermedirio numa relao. Quer dizer, a relao deixa de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento.

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Aprofundando a tese cinco do item 2.2.1, que contempla a mediao presente na atividade humana, Vygotsky tambm afirma que os instrumentos e os signos so elementos bsicos, responsveis pela mediao simblica, a qual assinala a relao do homem com o mundo e com o outro, desenvolvendo suas funes psicolgicas superiores. Os primeiros, os instrumentos, desempenham a funo de regular as aes sobre os objetos. Os signos, por seu turno, assumem o papel de regular as aes sobre o psiquismo das pessoas ou possuem o poder de controlar voluntariamente sua atividade psicolgica. Representam alguma coisa diferente de si mesmo, substituindo e expressando eventos, ideias e situaes. Por conseguinte, servem como recurso para ampliar sua capacidade de ateno, de memria e de acmulo de informaes. Alm do mais, o emprego de instrumentos e a adoo de signos esto sempre acoplados, no decorrer da evoluo da espcie humana e de cada um, em particular. tambm por isto, que Vygotsky, em suas pesquisas, investiga o papel mediador dos instrumentos e dos signos na atividade psicolgica e nas mutaes do homem, no percurso de vida. Em sua anlise da funo mediadora presente nos instrumentos elaborados para as aes humanas, admite que os homens no apenas geram instrumentos para execuo de tarefas especficas, mas tambm so capazes de conserv-los para uso futuro; da mesma forma que esto aptos a preservar e transmitir suas funes para outras pessoas, alm de aperfeioar instrumentos antigos e produzir outros, mais inovadores. A mediao pelos signos (as diferentes formas de semiotizao) possibilita e sustenta a relao social, vez que consiste em processo de significao. Este favorece a comunicao entre as pessoas e a passagem da totalidade s partes e vice-versa. E mais, a mediao no a presena fsica do outro. A corporeidade (a presena corprea do outro) no garante a mediao, que pode se dar (e se d) por intermdio dos signos, das palavras, da semitica e dos instrumentos de mediao. Alis, ainda em relao aos signos, Vygotsky admite que, durante certo tempo, os considerou como estmulo auxiliar e veculo para o controle do comportamento, sem priorizar suficientemente seu significado. A evoluo de pesquisas e de estudos, porm, lhe permitiu, em fase posterior, transmutar o signo de instrumento auxiliar (algo que est no lugar de outro) para o signo como veculo (alguma coisa vazia, mas que pode veicular alguma coisa).

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Vygotsky (1998) procura, ento, observar as leis bsicas que definem a estrutura e o desenvolvimento das operaes com o sistema de signos do aprendiz. Para tanto, estabelece relao com a memria, haja vista que, em sua viso, o cerne da memria est na capacidade de os seres humanos se lembrarem de fatos atravs dos signos. Argumenta que sua pesquisa revela coerncia com a ideia de que a internalizao dos sistemas de signos produzidos culturalmente acarretam transformaes importantes nas atitudes. Essa inferncia lhe permite perceber a cultura como algo dinmico, distante do imobilismo e da inrcia. a cultura como palco de negociaes, cujos membros se encontram em constante movimento de recriao e de reinterpretao de informaes, conceitos e significados, ou seja, a internalizao das prticas culturais assume papel supremo, concorrendo para a evoluo do homem. Ademais, retomando os signos e os instrumentos em IHC, lembramos que, para Vygotsky (2000), a probabilidade de combinarem elementos dos campos visuais presentes e passados, por exemplo, o instrumento e o objeto num nico campo de ateno conduz reconstruo bsica de outra funo fundamental, qual seja, a memria. Em sua percepo, o uso de mediadores incrementa a capacidade de ateno e de reteno da memria e, sobretudo, permite maior controle voluntrio do sujeito sobre suas aes. Como dito anteriormente, instrumentos e signos so fundamentais para o desenvolvimento das funes psicolgicas superiores. Trata-se de pressuposto que coincide com os princpios bsicos da IHC, em que atividades presentes so representadas por cones, considerados instrumentos mediadores, capazes de facilitar a memria em aes futuras. Mais do que isso, pode criar condies para a adoo de sistema mediado, incluindo elementos efetivos do passado e do presente. Indo alm, reforamos que os cones auxiliares da rea da tela do computador organizam o campo visual, viabilizam a funcionalidade do sistema e, alm disso, assumem a funo de facilitar tal funcionalidade de forma agradvel. Isto porque, reduzem o esforo de memorizao e a carga de trabalho no momento de execuo de cada ao que lhes atribuda. Esses elementos podem ser sintetizados por meio de figuras do mundo real e universal, textos em destaque e em cores. As representaes mediadas pelos/e com os cones em IHC fazem parte de intenes e de aes e, s vezes, contribuem com a satisfao no ato de realizao das aes.

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No caso da IHC, os estudos tm estimulado a apresentao de figuras, imagens e fontes atravs de cones, que se configurem como mediadores adequados quer seja em forma de signos e de instrumentos, ao mesmo tempo, diferentemente da viso apresentada por Vygotsky em que a analogia bsica entre o signo e instrumento a de funo mediadora. O instrumento tem papel bsico na viabilizao da ao, enquanto o signo essencial na diminuio do espao de visualizao para realizao da ao, no presente e no futuro. Esta parece ser, salvo melhor juzo, a diferena bsica do entendimento do que signo e instrumento na viso de Vygotsky e na abordagem da IHC. Na IHC, as figuras devem possuir significado para que sirvam de estmulos auxiliares memorizao. Os cones, por seu turno, devem ser trabalhados, pesquisados e construdos a fim de que representem, com clareza e sem ambiguidades, a ao que lhes atribuda por intermdio do sistema computacional. Logo, os cones computacionais conduzem a uma mudana no no objeto em si, como nos instrumentos de Vygotsky, mas na ao a ser realizada para proporcionar a funcionalidade do sistema e do instrumento maior, no caso, o computador, o qual incorpora o cone por meio desse mesmo sistema. Tudo isto reitera os princpios bsicos da IHC, onde atividades presentes so representadas por cones. Estes podem ser classificados como instrumentos mediadores que exigem a memria em aes futuras e, tambm, criam condies para a consolidao de um sistema mediado, o qual incorpora elementos efetivos, tanto do passado como do presente para viabilizar a funcionalidade dos sistemas computacionais. 2.3 Semitica Em Vygotsky (2000) as funes psicolgicas superiores apresentam tal estrutura, que entre o homem e o mundo real h diferentes mediadores. Estes agem como ferramentas auxiliares da atividade humana, ampliando a capacidade de ateno e de memria e, sobretudo, permitindo maior controle voluntrio do homem sobre suas atividades. Para Vygotsky (2000), como visto anteriormente, h dois tipos de mediadores: os instrumentos e os signos, os quais mantm certa analogia, mas traos bastante diferentes, o que permite conceber a mediao como essencial para efetivar atividades psicolgicas voluntrias, intencionais e/ou controladas pelos sujeitos. J semitica,

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denominao empregada, sobretudo, por Charles Sanders Peirce (EUA: 18391914), para nomear a cincia geral do signo, por sua vez, analisa a ligao e o significado das partes que a compem. Independente das linhas constantes na esfera da semitica, mesmo sem descer a detalhes por fugir da essncia de nossa tese, acrescentamos que existem inmeras definies que rondam esse termo. Para Peirce (2003), por exemplo, a semitica a doutrina formal dos signos. Signo qualquer coisa que representa algo a algum sob determinados aspectos ou capacidades. Isto , refere-se cincia geral dos signos, que estuda os fenmenos culturais como sistemas de significao. Consequentemente, tenta explicar como o ser humano constri significados por meio de sua interao com os signos disponveis no mundo, at porque, como Nth (1998) argumenta, a necessidade de constru-los inerente ao ser humano: ele aprende graas interao com o mundo, ou seja, com os signos existentes no mundo. Desta forma, quando da utilizao da semitica para o design de interfaces instrucionais para os alunos, estas so visualizadas como artefato de metacomunicao, atravs do qual o docente envia mensagens para os discentes expressas via interface. O emprego contnuo das TIC, no decorrer dos processos de ensino e de aprendizagem, permitem que a mensagem do professor assuma natureza dinmica e interativa. A instruo incorpora amplo conjunto de signos palavras, grficos, figuras, vdeos, sons, imagens e outros instrumentos disponveis ao alunado por intermdio de sistemas computacionais. Alis, entendemos que os conceitos, em qualquer rea que utilize imagem, som, gestos, entonao, cores e outras manifestaes no verbais nem textuais, so de fundamental importncia na educao on-line, porque tambm so construtores de novos conhecimentos e facilitam a manuteno dos traos culturais. o que afirma Nojima (1999, p. 15), em palavras literais:A leitura do mundo antes de tudo visual e no-verbal. O signo exerce a mediao entre o pensamento e o mundo em que o homem est inserido. Os signos podem ser intermedirios entre a nossa conscincia subjetiva e o mundo dos fenmenos. Pensamos com signos e em signos. O pensamento existe na mente como signo, mas para ser conhecido precisa ser exteriorizado pela linguagem. A expresso do pensamento circunscrita pela linguagem.

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Peirce definiu signo da seguinte forma:[...] Um signo, ou Representmen, um Primeiro que se coloca numa relao tridica genuna tal como um Segundo denominado seu Objeto, que capaz de determinar um Terceiro, denominado seu Interpretante, que assume a mesma relao tridica com seu Objeto, na qual ele prprio est em relao com o mesmo Objeto. (PEIRCE, 2003, p. 63).

O filsofo norte-americano Charles Sanders Peirce (18391894), estudado e mencionado maciamente nas universidades brasileiras, por sua doutrina dos signos, calcada no pensamento do alemo Imanuel Kant (1724 - 1804), autor da obra clssica Crtica da razo pura, apresenta interessante teorizao sobre o conhecimento humano. Isto porque, no obstante a quantidade e a variao de estudos empreendidos desde a Grcia antiga, com alcance no Ocidente ao longo dos scuImanuel Kant Disponvel em: los, a obra de Peirce, alis, lembrado como um dos fundadohttp://www.gla.ac.uk/departments/ philosophy/Personnel/susan/ res do pragmatismo, tem algo de inovador, no momento em WebpagesSCATS0506/ MartynSandy/kant.htm que analisa o processo mediante o qual o homem apreende e interpreta o mundo, situando o processo de significaes na conscincia. Dentre as teorias e pesquisas registradas at ento, de uma forma ou de outra, todos os estudiosos parecem acordar que a teoria do conhecimento traz implcita o questionamento constante sobre a possibilidade de o sujeito ser em si mesmo capaz de conhecer efetivamente a verdade dos fenmenos e dos fatos que o cercam, de forma contnua e em instncias variadas. De forma similar, h consenso sobre o fato de que o conhecimento configura-se como produto advindo tanto do contato do sujeito com o meio exterior quanto da relao de sua conscincia com a realidade externa, o que comporta nova indagao: o que , afinal, a realidade? E ento que Peirce formula sua doutrina dos signos fundamentada na multiplicidade possvel de apreenso da realidade, realidade esta, que traz subjacente o contato do homem com estmulos distintos e formas tambm distintas de apreenso sensorial, envolvendo os cinco sentidos. Sentidos, em sua acepo de funes orgnicas viso, olfato, paladar, audio e tato que buscam o

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prazer e abarcam as faculdades intelectuais, de tal forma que os estmulos captados so devidamente transmutados em representaes, mediante a racionalidade, caracterstica do homem. Em se tratando da representao, tal como Peirce sintetiza, consiste na substituio do objeto per se por um pensamento relacionado a ele, de forma to intensa e plena, que essa construo mental chega a se confundir com o objeto em si mesmo. Isto , a semiose , essencialmente, um processo de representao, no qual o signo ocupa o lugar de e, por conseguinte, com frequncia, confundido com a coisa representada. Exemplificando: a imagem acstica de um signo lingustico no a palavra falada (o som material) e, sim, a impresso psquica desse som; a cruz remonta ao cristianismo; o vermelho dos semforos remete advertncia pare e assim sucessivamente. Para Peirce, o modelo de signo abrange uma trade, constituda por um fundamento, um objeto e o interpretante, sendo esse ltimo elemento um signo aperfeioado que se forma na mente do indivduo. Sob tal tica, o signo a representao que o sujeito estabelece, em busca de efetivar a cognio, recorrendo para tanto aos processos mentais, apoiados no pensamento, na percepo e na classificao. Dizendo de outra forma: quando o homem apreende algo, (re)constri e (re)elabora mentalmente as informaes recebidas, formando uma ideia relacionada a esse algo. E lgico que no se trata Peirce Disponvel em: de relao causa x efeito nem tampouco um processo linehttp://blog.pindundin.de/2008/11/ 29/peircean-abduction-explained/ ar e unvoco, em que o contato com a realidade conduz formulao mental. Em oposio, no processo de assimilao e representao, atuam elementos decisivos, quais sejam intuio, sensibilidade e pensamento. Em se tratando da intuio, a partir de Peirce, ou mais fielmente, de Kant, percebemos que se refere ao contato direto ser humano/objeto, responsvel por uma representao imediata, que antecede qualquer forma de pensamento organizado, o que imprime efemeridade e fragilidade representao. Ou seja, em sua condio de elemento passageiro, a intuio s pode ser pensada por meio da sensibilidade ou do entendimento. Logo, a sensibilidade vai alm: diz respeito capacidade humana de tecer representaes em consonncia com as emoes e os sentimentos que os objetos produzem.

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Para pensar Quem nunca recorreu a um perfume ou a uma cano para associar lembranas aparentemente perdidas de algum? Por fim, em sntese bem elaborada de Morato (2008), os indcios semiticos do mundo objetivo so organizados atravs de conceitos fundamentais e imprescindveis ao conhecimento dos objetos fenomnicos, o que vale dizer que a assimilao dos indcios filtrados e distribudos em categorias especficas favorece o pensamento organizado por representaes, ou melhor, por signos, para ser mais fiel linha peirciana. Vemos, portanto, que a doutrina semitica de Peirce retoma a intuio, a sensibilidade e o entendimento em modalidades ou categorias, comumente designadas como primeiridade, secundidade e terceiridade. semelhana do que ocorre com a intuio, a sensibilidade e o pensamento, primeiridade, secundidade e terceiridade tambm no subsistem isoladamente. Ao contrrio, a primeiridade est contida na secundidade; e primeiridade e secundidade conjugadas integram a terceiridade. Tambm de forma semelhante ao que ocorre com intuio, sensibilidade e pensamento, os estmulos da primeiridade no esto aptos a gerar um signo definido que assuma as representaes. Geram somente qualisignos, concebidos como representao mais primria dos fenmenos. Referem-se apenas pura qualidade e se aparecem como mera qualidade na sua relao com o objeto, s podem ser cones, haja vista que qualidades no representam nada, mas somente se apresentam. Se no representam, no so signos no sentido mais restrito do termo. No caso da secundidade, j se d certo nvel de relao entre conscincia e mundo exterior rumo aos sin-signos, que envolvem um ou mais qualisignos. E, como vimos, ao se fundirem, primeiridade (intuio) e secundidade (sensibilidade) conduzem terceiridade, (pensamento) que se constitui por legi-signos, dotados de significao advinda da atuao de convenes socioculturais e lingusticas. Em nvel de terceiridade, o signo legi-signo, porquanto no representa seu objeto graas ao carter de qualidade (hipocone) e nem graas a uma conexo de fato (ndice). O seu poder de representao resulta de conveno social ou coletiva. E como Morato (2008) refora, inexiste intuio sem sensibilidade.

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Inexiste primeiridade se no for ela pensada pela secundidade. E a terceiridade o elemento que fornece o entendimento necessrio consumao dessas categorias precedentes. Trata-se de um conjunto de elementos em dependncia recproca, distantes de qualquer resqucio de isolacionismo, ainda que os elementos da trade quali-signo, sin-signo e legi-signo mantenham caractersticas mpares de apreenso da realidade, o que corresponde a afirmar que possuem seu prprio espao, seu prprio tempo, sua prpria configurao, e, sobretudo, sua prpria funo. Na segunda tricotomia da semitica Peirce, estudamos o signo em sua relao com o objeto, conduzindo ao cone (do grego eikn, nos, imagem, do latim icone). Esta figura como variao do signo. Aproximase do objeto que representa, conservando aparncia prxima ou idntica. Mantm, ainda, relao de semelhana ou analogia com o referente (fotografia, diagrama, mapa etc.) por evocar intensamente certas qualidades ou caractersticas de algo ou que muito representativo dele. Isto significa que o cone , sempre, [...] a possibilidade do efeito de impresso que ele est apto a produzir ao excitar os nossos sentidos. (SANTAELLA, 1987, p. 86). Como decorrncia, o interpretante que est apto a produzir , tambm, ele mesmo, apenas uma possibilidade ou um rema, na concepo de conjectura ou hiptese. Por isto, diante de cones, costumamos dizer: parece um monstro; parece um elefante e assim por diante. Por exemplo, independente das raas diversificadas existentes mundo afora, um cavalo se assemelha aos demais, a no ser quando o vocbulo cavalo atrelado a outros termos para novas acepes, como: cavalo-boi, cavalo-de-batalha, cavalo-de-crista, cavalo-de-co etc., que evocam interpretaes alheias ao universo dos quadrpedes. Da mesma forma, um computador, em qualquer marca, modelo, tamanho etc. faz com que o indivduo associe a palavra a um equipamento capaz de receber, armazenar e enviar dados, e de efetuar, sobre estes, sequncias previamente programadas de operaes aritmticas e lgicas, no importa suas variaes: computador de grande porte ou mainframe; computador eletrnico digital; computador pessoal; notebook. E mais, segundo Barthes (1989, p. 316), o paradoxo estrutural fotogrfico consiste no fato de que a fotografia transmuta um objeto inerte em

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linguagem, mas, paradoxalmente, [...] transforma a incultura de uma arte mecnica na mais social das instituies. Ao mesmo tempo em que , por definio, o real, a fotografia provoca uma reduo do objeto imagem, reduo esta, que altera a proporo, a perspectiva e a cor do objeto. Assim, contrariando o senso comum, afirma-se que a fotografia no a realidade em si mesma, embora se firme como o seu perfeito analogon. Isto , a denotao na mensagem fotogrfica se origina no fato de que, dentre todas as estruturas de informao, a fotografia a nica constituda por uma mensagem que parece se esgotar per se. Sua plenitude analgica to forte que parece inviabilizar qualquer tentativa de descrever. Descrever, no sentido de acrescentar fotografia um cdigo lingustico, o qual constitui, inevitavelmente, uma conotao imposta ao anlogo fotogrfico. Mas, o estatuto puramente denotante da fotografia, vinculado sua perfeio e aproximao da realidade passa a ser um mito, pois h a chance real de conotao da fotografia, entendida, como atribuio de sentido translato ou subjacente, s vezes, de teor subjetivo, que se imprime mensagem fotogrfica, e que se d em nveis distintos da produo fotogrfica. Isto nos permite inferir que a fotografia nem a cpia fidedigna nem tampouco reproduo exata do item fotografado, e, assim sendo, tambm figura como exemplo apropriado em se tratando do cone. Tudo isto nos faz inferir que os cones so representaes de um conceito abstrato ou concreto, cujo alvo transmitir, sem ambiguidades, o significado a ele associado, o que pressupe reconhecimento imediato e sem dificuldades por parte do usurio. Esclarecido este primeiro ponto a impossibilidade de completude do signo lingustico , mediante o exemplo da fotografia, to decantada por sua fora imagtica, lembramos que, ainda para Peirce, h um terceiro elemento, qual seja, o ndice ou o indicador. No contm, necessariamente, semelhanas com o objeto representado, mas somente traos que evidenciam a inter-relao representao x objeto. Equivale a dizer que, no ndice, as semelhanas com o objeto so sempre dedutivas. Tudo o que existe ndice ou pode atuar como ndice, desde que se comprove a relao com o objeto de que parte e com o qual mantm inter-relao. Portanto, ndice um signo que indica uma outra coisa com a qual est factualmente atrelado.

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o caso das flores onze-horas. Como se abrem apenas s 11h00min horas, ao se abrirem, indicam que so 11h00min horas. Dizendo de outra forma, os signos indicam, invariavelmente, algo ou algum processo. Por exemplo, uma pegada na areia de uma praia longnqua denuncia a passagem de algum por aquelas bandas; as cinzas postas num cinzeiro evidenciam a presena (remota ou no) de algum fumante; um notebook contendo arquivos recm-atualizados um indcio de sua utilizao h pouco tempo. Logo, os ndices pressupem, sempre, relao causal com o referente. E tudo isto os difere do smbolo, cuja semelhana com o objeto estabelecida por algum instrumento de alcance social, como uma lei, uma norma institucional, uma conveno social presente em determinado grupo social e assim por diante. Sob tal perspectiva, o smbolo um signo que se estabelece a partir de um pensamento organizado que o direciona para determinada funo representacional, podendo, pois, ser incorporado categoria da terceiridade, vez que substitui o objeto em sua totalidade. Isto corresponde a afirmar que os smbolos so signos, que podem ser completamente arbitrrios na aparncia. Consequentemente, implicam aprendizado por parte dos sujeitos e da coletividade, em geral. o caso, por exemplo, dos hinos nacionais. Se, a priori, no mantm quaisquer resqucios de similitude com o objeto ou fenmeno representado, ao serem executados ou ouvidos, induzem a populao daquele pas a evocar sentimentos de nacionalidade. Um brasileiro, com nvel mnimo de instruo, ao escutar Ouviram do Ipiranga s margens plcidas..., de imediato, associa essas palavras com o Brasil-nao. Exemplo ainda mais emblemtico so os smbolos que perfazem os sinais de trnsito, com alcance universal. Assim sendo, a concepo peirciana acerca do signo simblico sustenta que, no caso do smbolo, o fundamento de sua relao com o objeto reside, exatamente, no fato de que ele , irreversivelmente, interpretado como signo do objeto. Em outras palavras, o carter representativo do smbolo consiste em ser uma regra que determina o interpretante de natureza geral (outro signo genuno, argumento), a tal ponto que deixaria de ser signo, caso no existisse o interpretante. A terceira tricotomia em Peirce reporta relao do representamem

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com seu interpretante. Isto , segundo palavras literais de Morato (2008), os signos da terceira ramificao peirciana interatuam com o entendimento articulado [...] atravs da associao de conceitos ou ideias estruturadas de maneira sofismtica. O rema [...] aponta se seu objeto tal ou tal coisa oferecendo alguma caracterstica dele, e, por conseguinte, decisivamente, presta informaes sobre o objeto, ainda que esta no seja sua funo no sentido mais estrito do termo. Exemplificando: a meno ao termo santificado de imediato, conduz a interpretaes invariavelmente atreladas ao substantivo santo, em qualquer de sua variao de significado: algum que vive segundo preceitos religiosos; algum bem-aventurado; algum bondoso em extremo, a ponto de suportar atropelos e maldades; algum canonizado pela Igreja; algum puro ou imaculado; algo que no pode ser violado ou profanado etc. Ainda para Peirce, o discisigno ou dicente, elemento posterior, se configura como signo, o qual se limita a descrever determinada situao, sem, no entanto, categoriz-la nem como falsa nem como verdadeira. A este respeito, Morato (2008) recorre ao exemplo da assertiva Todo homem mortal em que o dicente se apoia em diferentes signos remticos. Se o ndice sempre dual, ou seja, ligao de uma coisa com outra, o interpretante do ndice no vai alm da constatao de uma relao fsica entre existentes, isto , no vai alm de um dicente, signo de existncia concreta. E por meio desses discisignos que constitui novo elemento, o argumento. Como os demais elementos antes explorados (intuio, sensibilidade e pensamento; primeiridade, secundidade e terceiridade), o argumento no figura como representamem independente, mas lana mo de remas e dicentes:O argumento um representamem que porta uma lei, um juzo ou raciocnio, efetivando o processo do conhecimento com uma concluso silogstica. Como um axioma, o argumento conjuga um termo isolado (homem) que o rema, como uma proposio (Todo homem mortal), que o dicente, de modo a gerar um raciocnio por meio de um silogismo: Todo homem mortal. Scrates um homem. Logo, Scrates mortal. (MORATO, 2008).

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Para sumarizar tal discusso, tomamos como referncia quadro que sintetiza a tricotomia presente na categorizao mais usual dos signos: (1o) a relao do signo consigo mesmo; (2o) a relao do signo com seu objeto dinmico; (3o) a relao do signo com seu interpretante. QUADRO 1 Tricotomia na categorizao dos signosSigno 1 consigo mesmo Signo 2 com seu objeto Signo 3 com o interpretante 1 quali-signo CONE Rema 2 sin-signo NDICE Dicente 3 legi-signo SMBOLO ArgumentoFonte: SANTAELLA, L. O que semitica. 5. ed. So Paulo: Brasiliense, 1987. p. 84.

Por fim, acrescemos que, ao estudar a EaD, reconhecemos como um dos mritos da teoria de Peirce o de traduzir pressupostos filosficos via teoria sistemtica capaz de esclarecer o processo cognitivo por intermdio de semioses. No entanto, sem dvida e como o prprio Pierce admite ao longo de sua produo intelectual, qualquer que seja o signo lingustico, incompletude e complementaridade so inevitveis, o que refora, com veemncia, a premissa presente em todas as leituras semiticas nenhum signo lingustico autossuficiente, exigindo, com frequncia, conhecimento por parte do espectador do contexto em que se produziu determinada representao. O pensamento de Pierce e de seus seguidores, enfatizam que o signo lingustico, em seus trs nveis sgnicos cone; ndice e smbolo nunca uma classe de objetos, e sim, o que o objeto representa na mente humana durante o processo semitico. Quer dizer, a partir das palavras de Peirce, traduzidas por Santaella (1987), [...] no h nenhuma linguagem que possa se expressar em nvel puramente simblico, ou indicial ou icnico, o que nos faz reiterar a incompletude e a complementaridade do signo lingustico, considerando os trs nveis sgnicos nele presentes. Especificamente, no mundo da informtica e da EaD, quando nos referimos ao cone, estamos fazendo aluso a desenhos diminutos adotados em telas, menus e janelas de terminais de vdeo de computadores e a outras formas eletrnicas de sadas e entradas de dados, representando certas

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funcionalidades do sistema em uso. A inteno precpua e central contribuir com a IHC. Em ambientes informatizados ou nas interfaces de sistemas computacionais, o termo cone empregado para qualquer imagem pequena destinada a abrir uma aplicao; substituir um comando ou uma linha de comando de linguagem de programao; destacar e provocar um evento; proceder qualquer tarefa de uso corrente; encaminhar uma sequncia de procedimentos de um sistema computacional etc. Sob esta tica, estudiosos e informticos acordam que os cones contribuem com o design de interfaces, no sentido de incrementar a interao mquina x homem. Podem estar representados simplesmente como figuras no plano ou em forma de botes na tela do computador, mas com aparncia tridimensional. Ao simularem objetos fsicos conhecidos do mundo real e profissional, usuais s pessoas, ou conceitos abstratos, tambm familiares, atuam como metforas. E quanto aparncia tridimensional dos cones, esta admite duas verses, a depender de seu estado: pressionado para o boto que est ativado e normal para o no ativado. A distino dos estados do boto pode ser esclarecida com mais facilidade, mediante a adoo de cores que modificam o estado (ativado/desativado). Nesses modelos tridimensionais de botes, o uso de recursos (volume, sombreamento, reflexos e iluminao) favorece a aparncia final do sistema multimdia e aproxima o indivduo de um ambiente mais agradvel. Ademais, a variedade de cones presentes nos ambientes informatizados refora sua posio de destaque nos estudos de ergonomia da IHC. Trata-se de tema explorado por diferentes autores, como os referendados no decorrer deste trabalho, com enfoques variados e distintos, mas, com certeza, ainda demanda resultados mais sistematizados em direo possibilidade (ainda remota) de bancos de dados de cones grtis e livres, a ponto de permitirem consolidao em nvel mundial e de forma padronizada. Ao lado da nsia de novos conhecimentos, h, sempre, por trs das pesquisas em evoluo, disputas por espao no mercado de softwares, do capital intelectual empregado e dos recursos que podem ser gerados diante da criao de um cone inquestionvel sob o ponto de vista dos usurios. Como adendo, repetimos que, na informtica e em suas derivaes, os cones mantm o significado antes expresso: pequenos desenhos utilizados em telas, menus, vdeos etc., sempre com o fim de aprimorar a IHC. No entanto, como habitual, as pessoas vinculam os cones semitica a tal

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ponto que as interfaces computacionais, desde os meados da dcada de 90, adotam todos os tipos de signos, no obstante a prevalncia do cone, tratado, com mais detalhes, no captulo III do presente trabalho. Finalizando, reiteramos que o estudo de usabilidade em sistemas computacionais procura mediadores para os usurios atravs da IHC e a semitica analisa a ligao e o significado das partes que compem esses mediadores. De incio, esses elementos esto em forma de cores, imagens ou smbolos. Posteriormente, se transformam em instrumentos que podem ser teis para viabilizar tarefas predefinidas pelos sistemas computacionais. Saiba mais A Semitica (do grego semeiotik ou "a arte dos sinais") a cincia geral dos signos e da semiose que estuda todos os fenmenos culturais como se fossem sistemas sgnicos, isto , sistemas de significao.] 2.4 Integrao da mediao simblica com as tecnologias digitais. Apesar da aparente complexidade da abordagem vygotskyana (scio-histrico-cultural, sciointeracionismo ou socioconstrutivismo), responsvel por rupturas das teorias em torno da psicologia da poca, sobretudo no que diz respeito s funes psicolgicas superiores, enfrentamos dificuldade de acesso totalidade de seus trabalhos originais. Mesmo assim, graas a estudiosos de facetas da obra de Vygotsky, a exemplo de Martha Khl Oliveira, autora da publicao, Vygotsky, aprendizado e desenvolvimento: um processo scio-histrico, e de outros, como Celso Antunes, o fato que o socioconstrutivismo vem adquirindo popularidade em diferentes pases, incluindo o Brasil. A maior parte dos textos que discute esse paradigma terico est, porm, traduzida para o ingls, francs, espanhol e italiano, com prevalncia da lngua original (russo) e do alemo, registrando-se, ainda, a existncia de manuscritos no publicados. Dentre os soviticos, destaca-se o estudo de Alexander Romanovich Luria, integrante Alexander Romanovich do grupo inicial que acompanhou os estudos iniciais da escoDisponvel em: la sovitica de psicologia. Na mesma linha de pensamento http://www.isfp.co.uk/russian_thinkers/alexander_luria.html

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de Vygotsky (2000), qual seja, a nfase para a anlise gentica da relao entre pensamento e palavra escrita, ele segue adiante de forma mais sistematizada, em busca de estabelecer caminhos para uma teoria da conscincia, em seu livro tambm j arrolado, Pensamento e linguagem: as ltimas conferncias de Luria, Luria(1986). Alm do mais, em geral, os autores que estudam o pensamento vygotskyano, enfatizam sua aplicabilidade ao universo da educao, reconhecendo, no entanto, que h dificuldades e divergncias ainda sem respostas, em torno da zona de desenvolvimento proximal e da compreenso dos nveis de desenvolvimento, o real e o potencial. Entretanto, dentre os temas mais divulgados na atualidade, na esfera do sciointeracionismo, esto os que aludem dimenso cognitiva. Prevalece a faceta intelectual do indivduo, com preocupao em integrar e analisar dialeticamente os aspectos cognitivos e afetivos do funcionamento psicolgico humano. O homem concebido, essencialmente, como um ser que pensa, raciocina, deduz e abstrai, mas tambm como um indivduo que sente, se emociona, deseja, imagina e se sensibiliza. Na realidade, se, na atualidade, a criana capaz de fazer, mediante a interveno de algum, decerto, amanh, pode ser feito com total autonomia, bastante coerente com a estrutura de sua construo terica sobre as funes psicolgicas humanas. Isto permite concluir que a abordagem vygotskyana fornece psicologia e educao, mesmo nos dias de hoje, contribuies originais e de maior qualidade, sugerindo novo paradigma que possibilita novo olhar em direo ao aprendiz, com base na interao e na mediao constantes em todo o processo de desenvolvimento e de ensino e aprendizagem, prevendo interveno na realidade social na qual ele se insere. Obviamente, Vygotsky no constri uma abordagem com respostas para todas as questes suscitadas no cotidiano no contexto da educao. No entanto, contribui imensamente, ao buscar caminhos que auxiliam na resoluo dos problemas existentes poca, com os quais continuamos a nos deparar, mesmo em se tratando de outro momento histrico e realidade distinta observada em seu pas. A verdade que os seres humanos mantm, basicamente, as mesmas caractersticas, idnticas constituies orgnicas, desejos e sonhos similares. Ademais, retomando os signos e os instrumentos em IHC, lembramos

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que, para Vygotsky (2000), a probabilidade de combinarem elementos dos campos visuais presentes e passados, por exemplo, o instrumento e o objeto num nico campo de ateno conduz reconstruo bsica de outra funo fundamental, qual seja, a memria. Em sua percepo, o uso de mediadores incrementa a capacidade de ateno e de reteno da memria e, sobretudo, permite maior controle voluntrio do sujeito sobre suas aes. Em outras palavras, instrumentos e signos so fundamentais para o desenvolvimento das funes psicolgicas superiores, distinguindo o homem dos demais animais. A mediao consiste, pois, em elemento essencial para possibilitar as atividades psicolgicas voluntrias ou intencionais, controladas pelo prprio indivduo. Tudo isto reitera os princpios bsicos da IHC, onde atividades presentes so representadas por cones. Estes podem ser classificados como instrumentos mediadores que exigem a memria em aes futuras e, tambm, criam condies para a consolidao de um sistema mediado, o qual incorpora elementos efetivos, tanto do passado como do presente. Indo alm, reforamos que os cones auxiliares da rea da tela do computador organizam o campo visual, viabilizam a funcionalidade do sistema e, alm disso, assumem a funo de facilitar tal funcionalidade de forma agradvel. Isto porque, reduzem o esforo de memorizao e a carga de trabalho no momento de execuo de cada ao que lhes atribuda. Esses elementos podem ser sintetizados por meio de figuras do mundo real e universal, textos em destaque e em cores. As representaes mediadas pelos/e com os cones em IHC fazem parte de intenes e de aes e, s vezes, contribuem com a satisfao no ato de realizao das aes. No caso da IHC, os estudos tm estimulado a apresentao de figuras, imagens e fontes atravs de cones, que se configurem como mediadores adequados, quer seja em forma de signos e de instrumentos, ao mesmo tempo, diferentemente da viso apresentada por Vygotsky em que a analogia bsica entre o signo e instrumento a de funo mediadora. O instrumento tem papel bsico na viabilizao da ao, enquanto o signo essencial na diminuio do espao de visualizao para realizao da ao, no presente e no futuro. Esta parece ser, salvo melhor juzo, a diferena bsica do entendimento do que signo e instrumento na viso de Vygotsky e na abordagem da IHC. Na IHC, as figuras devem possuir significado para que sirvam de estmulos auxiliares memorizao. Os cones, por

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seu turno, devem ser trabalhados, pesquisados e construdos a fim de que representem, com clareza e sem ambiguidades, a ao que lhes atribuda por intermdio do sistema computacional. Logo, os cones computacionais conduzem a uma mudana no no objeto em si, como nos instrumentos de Vygotsky, mas na ao a ser realizada atravs da funcionalidade do sistema e do instrumento maior, no caso, o computador, o qual incorpora o cone por meio desse mesmo sistema. Assim sendo, um sistema computacional destinado aos processos de ensino e de aprendizagem via Rede deve levar em considerao, no mnimo, o aprendiz, a internet, o computador e o docente, formando um ciclo, que segue essa trajetria para agir de forma integrada e iterativa, a que denominamos, aqui, de ciclo ABCD:

Aprendiz

Board (Internet)

Docente

Computador

Figura 2 Ciclo ABCD de avaliao de produtos educacionais informatizados para ensino a distncia. Fonte: Pesquisa Direta

O aprendiz (A), embora situado no inicio do extremos do ciclo, se comunica e se relacionam, permanentemente, com os demais componentes do ciclo alimentando interao imprescindvel na modalidade de ensino via rede de computadores. Nessa inter-relao, lana mo de vrias formas e de vrios tipos de elementos, considerados mediadores dos processos de ensino e de aprendizagem. A internet representa as ferramentas de comuni-

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cao, coordenao, cooperao e administrao para a informao, constituindo, um quadro (board), representado pela letra B do ciclo. Trata-se de um quadro formado por esses e outros recursos de rede. Mas, o computador (C) sozinho no facilita tanto quanto se acompanhado de boa interface com imagens, smbolos, cores, textos etc., de forma esttica ou em movimento e, s vezes, utilizando elementos mediadores que podem facilitar a execuo das atividades em rede. O docente (D), situado no extremo final do ciclo, se comunica e se relaciona, permanentemente, alimentando interao imprescindvel na modalidade de ensino via rede de computadores com o aprendiz que fica no extremo inicial do mesmo ciclo, usando como este os dispositivos disponveis que podem proporcionar a interao. Para pensar Decerto, essas colocaes despertam questionamentos: Em que situao, os elementos mediadores utilizados nas interfaces computacionais so semelhantes aos empregados e definidos nas pesquisas de Vygotsky? Qu