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. ., MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL EXCELENTÍSSfMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO TRIBUNAL FEDERAL. Supremo Tribunal Federal ADI 0004899- 15/01/2013 17:19 9929898-88.2013. 1. 00.0000 1111111111111 lllllllll/1/1 11111 lllll/11/ll 11111 llllllllllllllllllllllllllll A PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA em excrcício 1 , com fundamento nos artigos 102, I, "a" c "p" e 103, VI, ela Constituição Federal, e nos dispositivos da Lei 9.868/99, vem ajuizar AÇÃO D IRETA DE I NCONSTJTUC ION AL lD ADE, com pedido ele MEDIDA CAUTELAR, para que esse c. Supremo Tribunal Fede ral dê inter pr etação confo rm e a Constituiçáo Federal ao § elo art. 11 ela Lei 9.504, ele 30 ele se Lembro ele 1997, para qu e a ex pressão ''apresentação das contas ", que i nl egra o co nce it o ele quitação eleitoral, presente no referido dispositivo legal, seja enle nelid a em se u se ntid o substanc ial , em consonância com a ordem consli luci ona l, e o apenas literal, devendo a certidão ele quitação eleitoral abranger, a apresentação regular das co nt as el e campanha. I Nos lermos da Portaria PGR n" 430 ele 15 de agosto de 2011.

lllllllll/1/1 lllll/11/ll 11111 llllllllllllllllllllllllllll · 1111111111111 lllllllll/1/1 11111 lllll/11/ll 11111 llllllllllllllllllllllllllll A PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA

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. .,

MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

EXCELENTÍSSfMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPRE~10 TRIBUNAL FEDERAL.

Supremo Tribunal Federal ADI 0004899- 15/01/2013 17:19

9929898-88.2013. 1. 00 .0000

1111111111111 lllllllll/1/1 11111 lllll/11/ll 11111 llllllllllllllllllllllllllll

A PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA em

excrcício 1, com fundamento nos artigos 102, I, "a" c "p" e 103, VI, ela

Co nstituição Federal, e nos dispositivos da Lei 9.868/99, vem aju izar AÇÃO

DIRETA DE I NCONSTJTUCIONALlDADE, com pedido ele MEDIDA

CAUTELAR, para que esse c. Supremo Tribunal Federal dê interpretação

confo rme a Constituiçáo Federal ao § 7° elo art. 11 ela Lei 9.504, ele 30 ele

se Lembro ele 1997, para que a ex pressão ''apresentação das contas ", que i nlegra o

co nceito ele quitação ele itoral, presente no referido dispositivo legal, seja

enlenelida em seu sentido subs tancial , em consonância com a ordem

consli luci ona l, e não apenas literal, devendo a certidão ele quitação eleitoral

abranger, a ap resentação regular das contas ele campanha.

I Nos lermos da Portaria PGR n" 430 ele 15 de agosto de 2011.

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I. Do dispositivo legal a que se r·equer a interpr·etação conforme a

Constituição Feder·al-

J. O dispositivo a que se requer a interpretação conforme a Constituição

Federal foi incluído na Lei 9.504/97 pela Lei 12.034/09 e possui a seguinte

redação:

Art. li (. . .)

,.,~· 7º A certidüo de quitaçào eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocaçàes do Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresen.taçào de contas de campanha eleitoral.

2. Tal dispositivo normativo estabelece o conteúdo ela certidão ele quitação

eleitora l, emitida pela Justiça Eleitoral, cuja apresentação é condição para o

registro ele candidaturas a cargos elet ivos, conforme prevê o art. :t 1, § 1°, VI, ela

Lei 9.504/97, em sua redação original, verbis:

Art. 11. Os partidos e coligaçtJes solicitarüo à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até as dezenove horas do dia 5 dejulho do ano em que se realizarem as eleiçôes.

§ 1 o O pedido de registro deve ser instruído corn os seguintes documentos:

I- cópia da ata a que se refere o art. 8°;

I!- autorização do candidato, por escrito;

111- prova de.fi!iaçüo partidária;

IV- declaraçüo de bens, assinada pelo candidato:

V - cópia do título eleitoral ou certidào, fornecida pelo cartório eleitoral, de que o candidato é eleitor na circunscriçüo ou requereu sua inscriçüo ou transferência de domicílio no prazo previsto no art. 9";

VI- certidrlo de quitaçiio eleitoral; ~'""""~:~ :~: ::~"?

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3

VIl - certidDes crmunais fornecidas pelos órgclos de

dislribuiçào da Justiça Eleitoral, Federal e Estadual;

VJJJ -fotografia do candidato, nas dimensões estabelecidas em inslruçào da Justiça Eleitoral, para efe ito do disposto no .)~· 1 o do art. 59.

( .. .)

3. A tese sustentada na presente ação direta ele inconstitucionalidade é a ele

que a única exegese compatível com a Constituição Federal ela ex pressào

"aprescnlaçã.o el e contas", co nsta nte elo § 7° elo art. 11 el a Lei 9.504/97, é aquela

que a entende em seu sentido substancial, interpretando-a, portanto, como a

apresentação totalmente regular da prestação de contas de campanha (em tempo

oportuno e sem que sejam detectadas falhas que lhes comprometam a

regul aridade). Como será exposto, a interpretação literal da norma em questão,

atualmente refe rendada pelo Tribunal Superior Eleitoral em diversos precedentes,

importa em violação ao dever constitucional ele prestação ele contas (art. 17, 111 , e

70, parúgrafo único) , ao princípio ela moralidade para o exercício el o mandato e ao

dever el o Estado ele proteger a normalidade e a legitimidade das eleições contra o

abuso ele poder eco nômico (art. 14, § 9°).

II - Do Direito -

4. A ex igência da apresentação ela certidão de quitação eleitoral como

co ndição para o regis tro ele candidaturas foi positivada na Lei 9.504/97, em vista

do qu e cleterrn i na o seu art. ] 1, § 1 o, Vl, supra transcri lo.

5. Na ausê ncia ele previsão normativa específica sobre a abrangência do

conceito ele quitação eleitoral , o Tribunal Superior Eleitoral editou a Resolução

21.823/04, segundo a qu al, entre outras si tu ações, a ausência ele regular prestação

ele cont<~s de campanha constituiria obstáculo à obtenção ele certidão de quitação

eleitoral2•

-~:~.- --·

<:"'..::::<' ' ". ==--===-,;:::::.:.:::::

2 D.l - Di ;ír io de Just iça , Volume J , Data 05/07/2004, p. 03. R.ITSE - Rev ista de .Jurisprudência do TS E, Vol ume 15, Tomo 2, p. 4 1 J .

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4

6. Tal orientação tem impor·tância central para a efetividade da

legislação clcitontl c do pn)pr·io pr·incípio r·ctmblicano, cstr·uturantc do

Estado 131-asilcir·o, pois a pr·cstação de contas de campanha é o único meio

colocado it disposição da Justiça Eleitoral para promover o controle da

ar-recadação c dos gastos de campanha eleitoral c, assim, gar·antir o r·cspcito

a divcr·sas nor·mas, cujo ob.ietivo é tor·nar· efetivos pr·cccitos constitucionais

como o cquilíbr·io na disputa eleitoral c a pr·oteção das eleições contra o

abuso de podu econômico. Entre tais normas, estão, por· exemplo: o respeito

aos limites de gastos, a proibição de recebimento de r·ecur·sos de fontes

vedadas c a obediência às nonnas que regem a movimentação tinanccir·a dos

r·ccursos de campanha'·

7. O entendimento acima exposto, acerca da abrangência do conceito de

quitação eleitoral, vigorou nas eleições de 2006 e, por consequência, naquelas

eleições, candidatos que não prestaram contas elos recursos utilizados em eleições

anteriores tiveram seus registros de candidatura indeferidos, por ausência ele

quitação eleitoral.

S. Na elaboração elas instruções relativas às eleiçôes de 2003, a

jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral avançou e a Resolução 22.715/08-

que regulamentou a arrecadação e aplicação dos recursos de campanha nas

eleições municipais - estabeleceu, em seu art. 41, § 3°, que "a decisc7o que

desaprovar as contas de candidato implicará o impedimento de obter a certidão

de quilaçào eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu ".

9. Nesse contexto, considerava-se impedimento para obtençüo ela

certidão ele quitação eleitoral a hipótese de não apresentação das contas, de

apresentação extempor[mea ou, ainda, ele desaprovação, durante o período elo

mandato para o qual o candidato concorreu, até a efetiva apresentação.

3 As normas sobre arrecadação c aplicação de recursos nas campanhas eleitorais estão previstas nos artigos J7 a 27 da Lei 9.504/97.

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5

10. Em 2009, sobreveio a Lei 12.034/2009, que incluiu, no art. 11 da Lei

9.504/97, dispositivo que define a abrangência da certidão ele quitação eleitoral. O

* 7'\ incluído no referido dispositivo legal, dispõe que:

''A certidão de quitaçào eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocaçôes da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pelo Justiça Eleitoral e ntio remitidas, e a apre!;elltaçfio de CO/lias de campanha eleitoral."- destaquei.

11. Após a referida alteração legislativa, no julgamento do PA 594-

59/DF\ o e. Tribunal Superior Eleitoral decidiu que, mesmo após as alterações

trazidas pela Lei 12.034/2009, a satisfação elo requisito ela quitação eleitoral

exige, além ela apresentação elas contas, sua correspondente aprovação. Isso

porque, conforme clefencliclo na ocasião pela maioria elos ministros elo Tribunal

Superior Eleitoral , o termo "apresentação" deveria ser entendido em seu sentido

substancial e não meramente literal.

12. Também editada após a entrada em vigor ela Lei 12.034/2010, a

Resolução/TSE n° 23.217 (que dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos

por partidos políticos, candidatos e comi.tês financeiros e, ainda, sobre a prestação

de contas nas eleições ele 2010), em seu artigo 41, inciso l, estabeleceu que:

"Art. 4 I. A decisclo que julgar as contas eleitorais como nclo prestadas acarretará:

I - ao candidato, o impedimento de obter a certidtío de quitaçtío eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu, persistindo os eleitos da restriçclo até a eletiva apresentaçclo das contas;"

13. lnobstante, ao julgar processos referentes a registros de candidaturas

para as eleições de 2010, o Tribunal Superior Eleitoral deferiu registros com

fundamento na lese ele que, com a ecliçáo ela Lei n° 12.034/09, a mera

4 D.lc 23 .09.2010.

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ó

apresentação ele contas ele campanha seria suficiente para a obtenção ela certidão

de quitação eleitoral, não havendo que se falar em sua aprovação"'.

14. No entanto, ao editar a Resolução 23.376/12 (que dispõe sobre a

arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos, candidatos e comitês

financeiros e, ainda, sobre a prestação ele contas nas eleições de 2012), o Tribunal

Superior Eleitoral seguiu a mesma linha anteriormente exposta, ao estabelecer, no

artigo 52, ~ 2°, ela citada Resolução, que a desaprovação das contas ele campanha

impediria a obtenção da certidão ele quitação eleitoral.

l5 . Posteriormente, em v irtucle ela modificação na composição elo

Tribunal Superior Eleitoral, em 28.06.2012, editou-se a instrução n° 1542-

64.20ll.6.00.00\ alterando a Resolução 23.376/12, para excluir do citado artigo

52 o seu ~ 2°. Novamente, foi promovida drástica guinada na jurisprudência, que

passou a orientar-se no sentido de que a simples apresentaçáo ele contas ele

campanha se ria suficiente ü obtenção da quitação eleitoral, fazendo tábula rasa

elas disposições em contrário contidas nas Resoluções n° 22.715 e 23.217.

16. Assim, apesar da relevftncia elos processos de prestação de contas,

segundo a atual interpretação do Tribunal Superior Eleitoral acerca elo art. 11, ~

7'\ da Lei n° 9.504/97, candidatos cujas prestações de conta foram desaprovadas

pela Justiça Eleitoral não mais estão impedidos de disputar novas eleições, já que

a desaprovação ele suas contas ele campanha não implica na impossibilidade de

obtenção da certidão ele quitação eleitoral. Com efeito, segundo entendimento

majoritário do Tribunal Superior Eleitoral, firmado nas Eleições de 2012: " a

rejeiçào das contas de candidato apresentadas em raztío de eleiçüo anterior nüo

irnpede a obtençào da quitaçüo eleitoral, a teor do disposto no art. 11, § 7': da

Lei no 9. 504197, com a redaçcl.o dada pela Lei n° f 2. 03412009. " 7

c:::._: ___ _____ c:. ____ ... -~

5 O acórdão que inaugurou tal posicionamento nas Elei.ções de 2010 foi proferido no Recurso Especi<il Eleiloralno 442.363/RS, rei. Ministro Arnaldo Yersiani, julgado em 28.09.2010.

ó Public:1da no D.JE 27.07.2012. 7 Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n° 12255 , Acórdilo ele 06/:12/2012, Relator

Min. Henrique Neves da Silva , Publicação:Publicado em Sessão, Data 06/12/2012.

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-_. 7

J 7. Ocorre que a restrição ü obtenção da quitação eleitoral, com

fundamento na rejeição das contas de campanha, objetiva resguardar os princípios

constitucionais da moralidade, da probidade e da transparência - sob pena de

esvaziar-se completamente o seu conteúdo, já que a prestação ele contas ele

campanha consistirá, apenas, em processo meramente formal, desprovido ele

qualquer consequência jurídica.

18. Os números disponibilizados pela própria .Justiça Eleitoral

evidenciam as consequências da falta de eficácia elas normas referentes ü

prestação de contas, cuja interpretação, até o momento, tem sido submetida a

constantes alterações jurisprudenciais: segundo levantamento da Corregedoria elo

e. Tribunal Superior Eleitoral, em março de 2012, 21.000 (vinte e um mil)

candidatos haviam tido suas contas desaprovadas pela .Justiça Eleitoral ::; , face ao

descumprimento das normas que regem a arrecadação e os gastos ele recursos para

custear campanhas eleitorais. Tal número certamente é resultado da ausência de

consequ ências jurídicas decorrentes da prática de irregularidades na

movimentação de recursos de campanha.

19. Assim , o posicionamento atual do Tribunal Superior Eleitoral, ao

esv<IZlar o conteúdo do dever dos candidatos prestarem contas, permitindo a

impunidade daqueles que praticam irregularidades graves na movimentação de

recursos nas campanhas eleitorais, contraria as diretrizes constitucionais, üs quais

eleve conformar-se todo o sistema jurídico eleitoral.

20. De início , a interpretação fixada pelo Tribunal Superior Eleitoral

destoa ela relevância dada pela Constituição ü prestação ele contas eleitorais.

Con[orme determina o art. 17, lU, ela Carta ela República, a criação, fusão,

incorporação e a ex li nção elos parti elos políticos deverá obedecer, entre oul ros

prece itos , a prestação ele contas à Justiça Eleitoral. A parti•· desse preceito, tem-

8 Informação cilada pela Exccknlíssima Senhora Ministra Nancy Anclrighi , Corregedora do Tribumd Superior EleitoraL Disponível em: hltp:Uwww.tsc.ju s. br/nolicia s-lsc/20 J 2/M a rco/ca nd i da los-nas-ci c i coes-20 .12-d cvct n-esta r -Cl 1m-cnntas-d c-ctmpa n h:t !!PrOv::tcl ::ts .

_ .• ...w-

~··./

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8

se que o dever de prestar contas é inerente à vida política de par·tidos c

candidatos, sendo imper·ativo o r·cspeito a esse dever· como pressuposto da

par·ticipação política daqueles que pleiteiam cargos eletivos.

21. Mas há mais. Nos termos do art. 70, parágrafo único, da Constituição

Federal, "prestará contas qualquer pessoafísica ou jurídica, pública ou privada,

que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores

públicos ou pelos quais a Uniào responda, ou que, em nome desta, assuma

ob,.igoçtíes de natureza pecuniária."

22. Não pode ser olvidado que parte considerável elos gastos rea li zados

nas campanhas eleitorais envolve a movimentação ele recursos públicos, advindos

elo Fundo Partidário (arl. 44, lU, da Lei 9.096/95). Apenas a título de exemplo, c

para dcmonstn1r a gr·andc relevância dos rccm·sos públicos anualmente

destinados aos partidos políticos, em 2011, o Fundo Par·tid~írio distr-ibuiu o

valor total de R$ 307.317.749,00 (trezentos c sete milhões, trezentos c

dezessete mil , setecentos c quarenta c nove reais), entre os 29 partidos então

existentes no Brasil, conforme informações disponibilizadas pelo Tr·ibunal

S uper·ior Eleitoral em sua página na rede mundial de computador·cs~ .

23. E, segundo inform ações elo Jornal "O Estado ele São Paulo", obtidas

a partir ela análise de dados disponibili zados pela Justiça Eleitoral, os 29 Partidos

Políticos que di sputaram as eleições de 2012 utilizaram, nas campanhas para as

eleições municipais, R$ 180.000.000 (cento e oitenta milhões de reais)

provenie ntes elo Fundo Partid ário , em valores distribuídos a candidatos e

diretórios regi onai s ou municipais 10•

24. Em tal contexto, considerada a relevância constitucional elo dever ele

prestar contas, a interpretação que destitui ele qualquer consequência a

9 Lei 9.096/95- Art. 44. Os recursos oriundos elo Fundo Partid <'irio seri:io apli ca dos: ( .. . ) 111- no alislamcnlo c campanhas clcilorais.

I O Partidos usam R$ 180 milhões do Fundo Partidário para campanhas clcilorais. Disponível em hU.JlJLwww. cst ad <lo.com. b r/ no Li c i as/ i mprcs~o. pa ri. i dos-u s~ m -r-1 RO-m i I hocs-do-l'u nclo -pari i da rio­

J)< lra -Cé.llllp<lllh<IS-clc i lor;lis,968424,11.hl m. Acesso em 1] /01/2013 .

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9

desa provação das contas ele candidatos e, portanto, esvaz ta o próprio conteúdo

desse dever, é claramente inconstitucional.

25. Afinal, se a própria existência de um partido político é condicionada

ao dever ele prestar el e contas, se ria ele todo incoerente supor a irre lcvft ncia, para

cl"citos eleitorai s, ela desaprovação das contas de campanha. Apenas a demonstrar

como se r i a desarrazoado interpretar-se li ter ai mente a expressão "apresentação ele

contas", eleve se r ressa ltado qu e situações menos ofensivas ao reg ime jurídico

e le ito ra l - como a daquele qu e não paga uma determinada multa eleitoral (por

exemplo, por ausência ele prestaçüo el e serviços ü Justiça Eleitoral) - são

s ufi c ie nt es para caracterizar a ausência de quitação e leitoral.

26. Nesse sentido, o pos icionamento externado pelo e. Ministro Ricardo

Lcwandowski, em voto proferido no Tribunal Superior E leitoral:

"(. . .) De foto , a exegese das norrnas do nosso sistema eleitoral deve ser

pautada pela normalidade e pela legitimidade do pleito, valores nos

quais se inclui o dever de prestar contas à Justiça Eleitoral (art. 14, §" 9",

e 17, 111, ambos da Constitu içc7o).

Nesse sentido, entendo que nc7o se pode considerar quite com a Justiça

Eleitoral o candidato que teve suas contas desaprovadas pelo órgclo

constitucionalmente competente. Na verdade, posicionamento em sentido

contrário esvaziaria por completo o processo de prestaçâo de contas,

fazendo desse importante instrumento de controle da normalidade e da

legitimidade do pleito uma mera formalidade, sem repercussâo direta na

e4era jurídica do candidato.

Ademais. nr.lo me parece adequada a interprelaçào no sentido de que,

seja qual .fár o resultado do julgamento da prestaçüo de contas

(aprovaçc7o, desaprovaçc7o, aprovação com ressalvas ou m1o

apresentaçclo, art. 30 da Lei 9.5041 1997) a consequência para a quitaçào

eleitoral seria rigorosarnente a mesma.

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10

Tenho que tal conc!usào equipara situaçties dij"erentes, violando o

princípio da isonomia. É que, como bem assentou Celso Antônio

Bandeira de Mello , "nào se podem interpretar como desigualdades

legaltnente certas situações, quando a lei mio haja 'assumido' ofator tido

como desequiparador".

Com eleito, ao interpretar a nova redaçào do art. 11 , ,\r; r, da Lei das

EleiçtJes, entendo deva ser considerado o tratamento substancialmente

igualitário contemplado pelas Leis 9.09611995 e 9.5041199 7.

Penso que, ao rej"erir-se à "apresentaçào de contas de campanha" no art.

li , § 70, da Lei 9. 50419 7, a norma direcionou-se às hipóteses em que as

contas sejom apresentadas regularmente, não sendo suficiente, portanto,

a sua mera "apresenlaçào", ainda que eventualmente irregular. " 11

27. Válido também destacar, a esse respeito, o posicionamento do e.

Ministro Marco Aurélio, em voto igualmente proferido no Tribunal Superior

Eleitoral :

"Senhor Presidente, quando este Tribunal se pronunciou, no campo

administrativo, acerca da matéria, considerou-se a razào de ser do

que hâ na partefinal do ::,\' r do artigo 11 da Lei no 9.50411997.

Hâ rej"erência, não resta dúvida, à apresentaçào de contas de

campanha à Justiça Eleitoral, mio apenas para se atender a um

aspecto formal, mas para se perquirir sobre a harmonia ou nào

dessas contas com o vrdenamentojurídico.

Contrapõe-se à apresentaçc7o a nc7o apresentaçào. Cabe indagar se,

apresentadas as contas, vindo à bolha a glosa desta Jus/ iça

Especializada, nc7o ocorrendo a ultrapassagem das eleições

subsequenles, esse candidato, pelo simples aspecto formal de havê­

las apresentado, está quite com a Justiça Eleitoral. Nào lerá

falhado , na tentativa de lograr um cargo público? Nâo lerá

, . ·----.:.:. --=--:::~

LI Voto proferido no Processo Administrativo n" 59459, Acórdão ck<D~í.ósãcrllí~R;~J:a.J.:ê.P-Min :· ... Arnaldo Versiani , Relator designado Min. Ricardo Lewandows ki . Publicação: D.JE- Diário da

.Justiça Elclrônico, Data 23/9/2010, p. 21.

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11

claudicado quanto à lisura das contas di.sponibilizadas para exame

por setores técnicos da Justiça Eleitoral? li possível ((firmar,

polencializando-se apenas o aspectoformaf em detrimento dofúndo,

ser suficiente dirigir-se ao protocolo da .Justiça Eleitoral e

apresentar contas, pouco importando a boa ou a mâ procedência

delas? A própria ordem natural das coisas contraria a limitaçâo que

se pretende dar à parte .final do .)\ r do artigo 11 da Lei n°

9. 50411997. Nesse caso, haveria situaçtío jurídica apenas de

fachada, de vitrina, quanto ao alo positivo da apresentaçào das

contas.

Jl finalidade da norma mio é essa, a menos que também se assente

que, apresentadas as contas, haja o exaurimento do dever do

candidato, sem a necessidade sequer do pronunciamento da Justiça

Eleitoral sobre a regularidade. Ao interpretar-se que está quite com

a Justiça Eleitoral quem apresentou contas em campanha e o fez de

.fórma irregular, será necessário concluir - para haver coerência -

que basta essa apresentaçào, nclo devendo proceder-se a qualquer

ancíl i se.

Senhor Presidente, nâo consigo emprestar ao § r do artigo J I da

Lei 11 ° 9.50411997 sentido limitativo quanto aos elementos

conducentes a obter-se a certidào de quitaçclo eleitoral. A rejeição

das contas está compreendida no preceito como fator determirwnle

para nclo se alcançar a certidc7o de quitaçclo. A referência a esta,

contida no início do preceito, norteia o alcance da parte final, da

expressclo 'apresentaçc7o de contas' " 12•

28. Por fim, a interpretação literal elo § 7° elo art. 11 da Lei 9.504/97

afronta, ainda, os requisitos constitucionais estabelecidos para o exercício elo

direito político de ser votado, pois, conforme bem anota Roclrigo López Zílio, a

Emenda Constitucional ele Revisão n° 04/94 "inseriu novos elementos no texto

lego/ previsto no § 9" do art. 14 da Const ituiçüo Federal, (..) e (..) por força de

12 Voto proferido nn jlllgamcnlo elo HESPE N°: 153163 (REspc) - MT, AC. DE 22/03/201 1, Rei.: Min. Marco Aurélio, Rei. designado: Min. Dias Tolloli.

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moni/estaçüo do poder constituinte derivado, acolheu-se, de modo explicito, em

rnatério eleitoral, a probidade administrativa e a moralidade para o exercício do

rnondato como diretrizes balizadoras dos limites da inelegibilidade "13.

29. Vale dizer, a Constituição ela República impõe, explicitamente, em

matéria eleitoral, a observfmcia aos princípios ela moralidade e da probidade -

razão suficiente para que a desaprovação de contas de campanha obste a obtenção

ela quitação ele i tora!, e, portanto, elo registro ele cancliclatu r a.

30. Em verdade, a literal interpretação elo artigo 11, § 7°, ela Lei n°

9.504/97 representa verdadeiro estímulo ao abuso de poder econômico nas

eleições, em violação não apenas aos princípios ela moralidade e da probidade,

mas, principalmente, à própria democracia, ao criar situação de grave impunidade

para aquele que dificultar ou mesmo impedir o controle ele gastos eleitorais

realizados pela Justiça Eleitoral, bem como por comprometer a lisura e o

equilíbrio da disputa elo pleito eleitoral.

3]. A interpretação que o Tribunal Superior Eleitoral vem dando ú

expressão "apresentação elas contas", constante do§ 7° elo art. 1:1 ela Lei 9.504/97,

viola, ele forma clara, o princípio da proporcionalidade em sua vertente da

proibição da proteção deficiente, pois fragiliza ele forma desproporcional os

preceitos constitucionais que consagram o dever ele prestar contas, a proteção elas

eleições contra o abuso ele poder econômico, bem como os princípios ela

moraliclacle e ela probidade.

32. Tal interpretação há ele ser considerada .inconstitucional por esse e.

Supremo Tribunal Federal, que eleve fixar a interpretação conforme a

Constituição ao dispositivo legal em comento, a qual, como já exposto, deve

considerar, ü luz ela unidade ela Constituição Federal ele 1988, que a quitação

eleitoral não pode ser obtida pela mera apresentação ela prestação de contas ele

campanha, mas sim, apenas por sua apresentação regular. Vale dizer: a quitação

J3 ZÍLIO, Rodrigo Lópcz. Direito Eleitoral. 2" cd. Curitiba: Verbo .Jurídico, 2010, pág. 164.

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clcitontl, para fins de r·cgistn> de candidatura, dcvcni ser· dada apenas ao

candidato que tiver apr·cscntado r·cgularmcntc c, ainda, que não tiver· contas

r·cfcr·cntcs a campanhas clcitor·ais antcr·ior·cs desaprovadas pela .Justiça

l!:lcitoral.

33. A interpretação proposta é a única coerente com os princípios

constitucionais que informam o sistema eleitoral e, por isso, eleve prevalecer.

Afinal, conforme explica Canotilho 14, "nas relaçties entre o sistema eleitoral e os

elementos constitutivos do principio democrático - designadarnente o principio

da igualdade - se estabeleceu uma prevalência e uma reserva de constituiçào" e,

dessa forma, os princípios constitucionais ligados ao sistema eleitoral possuem

"um caráter constitutivo para a definição e conformaçào de todo o sistema

eleitoral."

UI -Do pedido cautelar·-

34. Estão presentes todos os requisitos autorizadores para a concessão ele

medida cautelar.

35. Os argumentos expostos demonstram a plausibiliclacle do direito

invocado, bem como a necessidade de que esse e. Supremo Tribunal Federal dê

interpretação conforme a Constituição Federal ao* r elo art. 1:1 ela Lei 9.504/97,

na forma supra proposta.

36. Por sua vez, o periculum in mora decorre da urgência em definir o

conteúdo do conceito ele quitação eleitoral, no que se refere~~ prestação de contas

de campanha, definição essa fundamental para o processo eleitoral. Ademais,

deve ser ressallado que a Justiça Eleitoral, no momento, analisa as prestações de

contas dos candidatos que concorreram nas Eleições de 2012, sendo de todo

recomendável que tal análise ocorra já a partir elas balizas ele interpretação fixadas

14 CANOTILHO, J . .J. Gomes. Dire ito Constitucional. 6" cd. Coimbra: Almcclina, 1993, p. 419.

. -- - -~ C-=--------

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por esse c. Supremo Tribunal Fcelcral, quanto üs implicações elas decisões que

eventualmente desaprovem as contas ele campanha.

37. Assim , requer-se o deferimento de medida liminar, para que se dê

interpretação conforme a Constituição Federal ao§ 7°, elo art. 11 ela Lei 9.504/97,

de forma a afastar a exegese que considera suficiente para obtenção da certidão ele

quitação eleitoral a mera apresentação elas contas de campanha.

lV -Do pedido-

38. Por fim, requer ctue, colhidas as informações ncccssúrias e ouvido o

Aclvogaclo-Geral ela União, conforme previsto no§ 3° do art. 103 da Constituição

ela República, seja determinada vista dos autos ü Procuradoria Geral ela

República, para manifestação e, ao final, seja julgado procedente o pedido, para o

fim ele se dar interpretação conforme a Constituição Federal ao § 7° do art. 11 ela

Lei 9.504/97, ele forma que a expressão "apresentação de contas", constante elo

referido dispositivo legal, seja compreendida em consonância com os preceitos

constitucionais, para o fim de impedir que aqueles que tenham suas contas

desaprovadas pela Justiça Eleitoral obtenham certidão ele quitação eleitoral.

Br·asília, 10 de janeiro de 2013.

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Procuradora-Geral da República em exercício