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LUCIANE SOUZA SOARES FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS Mestrado em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem - LAEL Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP 2007

LUCIANE SOUZA SOARES - sapientia.pucsp.br SOUZA... · no sentido de tornar-se capaz de trabalhar com textos, valorizar a bagagem cultural do grupo/classe e, principalmente, identificar

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LUCIANE SOUZA SOARES

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

Mestrado em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem - LAEL

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP 2007

LUCIANE SOUZA SOARES

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem, sob a orientação da Profª. Drª. Maria Cecília Camargo Magalhães.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP 2007

Banca Examinadora

___________________________________

___________________________________

___________________________________

Dedico esta dissertação aos meus pais, Ieda Souza Soares e Pedro Soares e

ao meu irmão Anderson Souza Soares pelo amor, carinho e apoio.

Amo vocês, obrigada!

À Professora Dra. Maria Cecília Camargo Magalhães, pela orientação, incentivo e por me possibilitar a oportunidade de

refletir sobre as questões históricas e culturais que se ligam ao ofício de ser professor.

AGRADECIMENTOS

Nestes últimos 2 anos, e em todo este tempo de desenvolvimento e pesquisas, muitos fatos

aconteceram e muitas pessoas passaram por minha vida e impactaram, de alguma forma, meu dia-

a-dia e, conseqüentemente, este trabalho. Tanta coisa a dizer...Por onde começar???

Agradeço a Ivone Bezerra, a pessoa que me "achou" no meio de tantos. Aos professores do LAEL,

a Maria Lucia e Márcia, que sanaram todas as minhas dúvidas sobre os cursos, sempre com muita

paciência ...

A EMEI Vereador Alex Freua Netto (minha escola!!!) e aos meus queridos alunos. Sem vocês nada

teria acontecido!!!

A Neide Poppov, Diretora da EMEI, que ofereceu o espaço necessário para que eu pudesse

desenvolver as atividades e suportar esta dissertação, dando-me todo o suporte.

A Julia, professora participante, que aceitou a empreitada de desenvolvimento desta pesquisa, se

expôs como profissional, prontificando-se na ajuda de construção deste sonho. Mesmo após minha

saída da escola, deu continuidade, junto aos outros professores da unidade escolar, ao plano que

desenvolvemos, mostrando que a aplicação deste conteúdo é possível.

A Coordenadoria da Educação da Freguesia/Brasilândia, especialmente a Maria Antonieta

Carneiro - Tiêta, pelo convite, por acreditar em meu potencial, em meu trabalho, por me incentivar

a percorrer este caminho.

As minhas amigas da Coordenadoria : Fernanda, Maria Isabel, Sonia, Denise, Rose e Bruna, pelo

apoio e incentivo nas horas de angústia e aflição... Ao Paulo, por me incentivar profissionalmente,

com seus ouvidos sempre prontos a escutar minhas histórias...

Aos meus amigos do LAEL: Cristina, Adriana, Fernando (Bibo), João, Ermelinda, Daniela (BH),

Belinha (PR), Adriana (Jundiaí), por serem meus interlocutores, pela troca de informações, pelas

conversas de bar e, principalmente, pela alegria de estarmos juntos!!! Muito Obrigada!!!

A Otília, por ter participado da Banca de qualificação, ajudando-me a finalizar este trabalho.

A Vanessa e Paula Eugenie, por acreditarem em meu trabalho, pela fidelidade e amizade

incondicionais!!!

A Carol, por me ajudar na tradução do resumo em inglês.

As minhas grandes amigas Daniela e Ana Lia ( Kekinha ), que me ajudaram a ser uma nova mulher

(muito mais moderna!!!!) em um momento de transição tão complicado em minha vida. Obrigada

pelas viagens, pelas visitas a Vila Madalena (Viva os encontros no Genésio em tantos domingos à

tarde!!!), pelas compras, pela troca de experiências, por me mostrarem um lado da vida

desconhecido e suuuuuuuper divertido. Muito Obrigada pela companhia!!! Amo vocês!!! "A vida

pode ser do jeito que a gente quiser "...

Ao Professor Dr. Frederic Saujat, muito obrigada pelo interesse e valorização do trabalho do

professor. Graças à sua visita na EMEI Vereador Alex Freua Netto, o trabalho se tornou visível e

tudo aconteceu...

Gostaria de agradecer especialmente à Professora Dra. Anna Rachel Machado e ao Professor Dr.

Rosalvo Gonçalves Pinto. Vocês são essenciais em minha vida! Me ensinaram o verdadeiro

sentido da importância do outro no processo de ensino/aprendizagem. Vocês me fizeram entender

que o sujeito se constitui a partir do outro.

A Cássia e Marina, fofíssimas!!! Pelos momentos de brincadeiras e pelo amor...

Agradeço aos meus pais Ieda e Pedro, meu irmão Anderson e ao meu primo Leandro, pela

estrutura familiar, pelos valores sólidos que me fizeram ser quem eu sou...

Agradeço a tantas outras pessoas que não estão citadas neste texto, mas que também me

ajudaram na realização deste sonho...

Se tivesse que resumir e agradecer em poucas palavras, certamente diria: Obrigado Deus!!!! Pelas

oportunidades e por viver dias incríveis nestes meus 28 anos!!!

Que venha o doutorado !!!

RESUMO

Esta pesquisa, fruto de um trabalho voluntário que investiga o

desenvolvimento de um processo colaborativo entre duas professoras de uma

Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI), visa à construção colaborativa e

reflexiva de sentidos sobre os significados relativos ao trabalho profissional,

voltado para a preparação de tarefas com os alunos, em contextos que propiciem

a compreensão das ações, inserção de transformações e a construção

colaborativa do conhecimento.

O estudo foi realizado na perspectiva da teoria da atividade sócio-

histórico-culural (Vygotsky, 1934/1996, 1934/2002, 1930/2002; Leontiev,

1977/2003, 1959/1998; Engeström, 2003, 2002, 1999, 1987). O discurso foi

abordado através do dinamismo dessa perspectiva, inserido em um sistema de

atividade coletiva, no qual os sujeitos atribuem sentidos aos significados relativos

ao ofício de ser professor de uma EMEI e assumem diferentes papéis nas práticas

mediadas pela linguagem. Esta pesquisa considera como pressupostos teóricos

os estudos de Brookfield (1987), Freire (1970), Giroux (1997), Morales (1998) que

discutem formas de ensinar e de desenvolver o pensamento crítico, tendo as

perguntas como instrumento de mediação semiótica na formação do profissional

crítico. Este estudo é de cunho colaborativa (Magalhães, 1998/2002; Liberali,

1999/2002), pois se trata de um processo investigativo que objetiva a observação,

intervenção e análise de transformações (ou não) nas práticas pedagógicas das

participantes. A discussão dos dados, pauta-se a teoria da atividade, com foco na

descrição dos sistemas e na análise do discurso, com base em Kerbrat-Orecchioni

(1996), que contempla os princípios que regem o sistema de turnos em uma

conversação, as relações horizontais e verticais e a noção de polidez.

A discussão dos resultados revelou que o trabalho reflexivo realizado

nas oito sessões programadas, aqui apresentadas, desencadeou a transformação

da concepção de ensino-aprendizagem da professora, que tinha, a princípio,

receio e dificuldades em trabalhar com as reais potencialidades das crianças,

limitando suas atividades à mera cópia de letras, famílias silábicas e palavras.

Após o término deste estudo, percebeu-se uma mudança na atitude da professora

no sentido de tornar-se capaz de trabalhar com textos, valorizar a bagagem

cultural do grupo/classe e, principalmente, identificar seu papel como um elemento

mediador e possibilitador das interações entre os alunos e destes com os objetivos

de conhecimento. Os resultados apontam, também, para a transformação

relacionada à percepção de que o ofício da professora é mais amplo do que a

mera repetição. Sua intenção é a de ampliar o repertório de cada criança,

permitindo a troca de informações e experiências entre elas e, ainda, propiciando

o contato com a arte produzida pelos homens ao longo de sua história.

ABSTRACT

This research, which comes from a voluntary project that investigates the

development of a cooperative process between two teachers at a kindergarten

public school (Escola Municipal de Educação Infantil – EMEI), wishes the

cooperative and reflexive construction of the senses about the meanings related to

professional work, focusing on the preparation of chores with students, in contexts

that make them comprehend their actions, inserting transformations and the

cooperative building of knowledge.

The research was based on the perspective of the socio-historical and

cultural activity theory (Vygotsky, 1934/1936, 1934/2002, 19830/2002; Leontiev,

1977/2003, 1959/1998; Enfeström, 2003, 2002, 1999, 1987). The speech was

prepared through the dynamism of this perspective, inserted on a collective activity

system, in which the subjects attribute senses to the meanings related to the fact of

been a teacher at a public school (EMEI) and taking different places in uses of the

language. This study is based on theorist presupposes of Brookfield (1987), Freire

(1970), Giroux (1997), Morales (1998) that discuss ways of teaching and

developing the critical thinking, having the questions as an instrument of semiotic

meditation in the development of a critic professional. This study is cooperative-

based (Magalhães, 1998/2002; Liberali, 1999/2002), due to the fact that this is an

investigative process that aims the observation, intervention, and analysis of

transformations (or not) in the pedagogical practice of the participants. The

discussion of the data is based on the theory of the activity, focusing on the

description of the systems and the analysis of the speech, with basis on Kerbrat-

Orecchioni (1996), which admires the principles that react to the system of

conversation turns, the horizontal and vertical relations in the notion of politeness.

The discussion of the results revealed that the reflexive job

accomplished in eight programmed sessions, presented here, created the

transformation of the teaching-learning conception of the teacher, that was, at first,

afraid of and had difficulties in working with real potential of the kids, limiting their

activities to the mere copy of letters, syllables and words. After the end of this

study, it was realized a change in the teacher’s behavior, in the sense of been able

to work with texts, valuing the cultural knowledge of the group/ class and, specially,

identifying its job as a mediate element and an interactive maker among the

students and the latter with aims of knowledge.

The results point, also, to the transformation related to the perception

that the importance of the teacher is to create another transformation that deals

with respect to the perception that the teacher’s aim is wider than a simple

repetition. The teacher’s intention is to broaden the repertory of each child,

allowing the trade of information and experiences among them and, furthermore,

allowing the contact with art made by men throughout history.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 01

CAPÍTULO 1 – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 07

1.1. – Teoria da Atividade 08

1.1.1. – História 11

1.1.2. – Sistema de Atividade e o Ciclo Expansivo de Aprendizagem

– Implicações Metodológicas 18

1.1.3. – Constituição do Sujeito 22

1.1.4. – Instrumentos de Mediação Semiótica e a Linguagem 24

1.1.5. – Sentidos e Significados 27

1.1.6. – Definindo Cultura e Contexto 30

1.1.7. – Zona Proximal de Desenvolvimento e as Oportunidades de

Aprendizagem 31

1.1.8. – Contradições e Conflitos no Sistema de Atividade 39

1.2. – Reflexão 45

1.2.1. – O Processo Reflexivo na Formação de Professores 46

1.2.2. – Sessão Reflexiva como Espaço para Formação do Professor

Crítico 48

1.2.3. – Discussão e Formação Crítica 51

1.3. – Pressupostos Teóricos para Análise dos Dados 56

1.3.1. – As Práticas Comunicativas 57

1.3.2. – O Sistema de Turnos 58

1.3.3. – As Relações Interpessoais 60

1.3.4. – Perguntas como Instrumento de Mediação Semiótica 63

CAPÍTULO 2 – METODOLOGIA DE PESQUISA 65

2.1.– Pesquisa Crítica de Colaboração 65

2.2. – Contexto e Local de Pesquisa 66

2.3. – Participantes 67

2.3.1. – Professora-pesquisadora 68

2.3.2. – Professora Participante 69

2.4. – Procedimento de Coleta de Dados 69

2.4.1. – Sessões Reflexivas 69

2.5. – Procedimento de Análise de Dados 73

2.5.1. – Análise Descritiva dos Sistemas de Atividade 74

2.5.2. – Análise do Discurso 77

2.6. – Aspectos Éticos na Pesquisa 78

2.7. – Questões de Confiabilidade 79

CAPÍTULO 3 – DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 80

3.1. – Sentidos Revelados pelas Professoras sobre seu Trabalho 80

3.1.1. – Sessões Reflexivas Iniciais 82

3.1.2. – Sessões Reflexivas Intermediárias 86

3.1.3. – Sessões Reflexivas Finais 89

3.2. – Regras e Divisão de Trabalho 93

3.2.1. – Sessões Reflexivas Iniciais 94

3.2.2. – Sessões Reflexivas Intermediárias 99

3.2.3. – Sessões Reflexivas Finais 103

3.3. – As Sessões Reflexivas como espaço para Formação de professores

Críticos 108

CONSIDERAÇÕES FINAIS 118

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 125

ANEXOS 133

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Modelo do Primeiro Momento da Teoria da Atividade 12

Figura 2 – A estrutura da Atividade de Leontiev 14

Figura 3 – Modelo do Segundo Momento da Teoria da Atividade 15

Figura 4 – Modelo do Terceiro Momento da Teoria da Atividade 17

Figura 5 – Ciclo Expansivo de Aprendizagem 20

Figura 6 – Sessões Reflexivas 76

Figura 7 – Sistema de Atividade – Sessão Reflexiva 23/11/2005 109

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Princípios da Teoria da Atividade 10

Quadro 2 – Zona Proximal de Desenvolvimento nas Diferentes Pesquisas 38

Quadro 3 – Conflitos e Contradições nos Sistemas de Atividade 44

Quadro 4 – Os Tipos de Reflexão 48

Quadro 5 – Os Tipos de Perguntas 55

Quadro 6 – Quadro de Análise 74

Quadro 7 – Quadro de Análise do Discurso 78

Quadro 8 – Sentidos iniciais, intermediários e finais da Professora 93

Quadro 9 – Ação 111

Quadro 10 – Ação 113

LUCIANE SOUZA SOARES

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

Mestrado em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem - LAEL

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP 2007

LUCIANE SOUZA SOARES

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem, sob a orientação da Profª. Drª. Maria Cecília Camargo Magalhães.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP 2007

Banca Examinadora

___________________________________

___________________________________

___________________________________

Dedico esta dissertação aos meus pais, Ieda Souza Soares e Pedro Soares e

ao meu irmão Anderson Souza Soares pelo amor, carinho e apoio.

Amo vocês, obrigada!

À Professora Dra. Maria Cecília Camargo Magalhães, pela orientação, incentivo e por me possibilitar a oportunidade de

refletir sobre as questões históricas e culturais que se ligam ao ofício de ser professor.

AGRADECIMENTOS

Nestes últimos 2 anos, e em todo este tempo de desenvolvimento e pesquisas, muitos fatos

aconteceram e muitas pessoas passaram por minha vida e impactaram, de alguma forma, meu dia-

a-dia e, conseqüentemente, este trabalho. Tanta coisa a dizer...Por onde começar???

Agradeço a Ivone Bezerra, a pessoa que me "achou" no meio de tantos. Aos professores do LAEL,

a Maria Lucia e Márcia, que sanaram todas as minhas dúvidas sobre os cursos, sempre com muita

paciência ...

A EMEI Vereador Alex Freua Netto (minha escola!!!) e aos meus queridos alunos. Sem vocês nada

teria acontecido!!!

A Neide Poppov, Diretora da EMEI, que ofereceu o espaço necessário para que eu pudesse

desenvolver as atividades e suportar esta dissertação, dando-me todo o suporte.

A Julia, professora participante, que aceitou a empreitada de desenvolvimento desta pesquisa, se

expôs como profissional, prontificando-se na ajuda de construção deste sonho. Mesmo após minha

saída da escola, deu continuidade, junto aos outros professores da unidade escolar, ao plano que

desenvolvemos, mostrando que a aplicação deste conteúdo é possível.

A Coordenadoria da Educação da Freguesia/Brasilândia, especialmente a Maria Antonieta

Carneiro - Tiêta, pelo convite, por acreditar em meu potencial, em meu trabalho, por me incentivar

a percorrer este caminho.

As minhas amigas da Coordenadoria : Fernanda, Maria Isabel, Sonia, Denise, Rose e Bruna, pelo

apoio e incentivo nas horas de angústia e aflição... Ao Paulo, por me incentivar profissionalmente,

com seus ouvidos sempre prontos a escutar minhas histórias...

Aos meus amigos do LAEL: Cristina, Adriana, Fernando (Bibo), João, Ermelinda, Daniela (BH),

Belinha (PR), Adriana (Jundiaí), por serem meus interlocutores, pela troca de informações, pelas

conversas de bar e, principalmente, pela alegria de estarmos juntos!!! Muito Obrigada!!!

A Otília, por ter participado da Banca de qualificação, ajudando-me a finalizar este trabalho.

A Vanessa e Paula Eugenie, por acreditarem em meu trabalho, pela fidelidade e amizade

incondicionais!!!

A Carol, por me ajudar na tradução do resumo em inglês.

As minhas grandes amigas Daniela e Ana Lia ( Kekinha ), que me ajudaram a ser uma nova mulher

(muito mais moderna!!!!) em um momento de transição tão complicado em minha vida. Obrigada

pelas viagens, pelas visitas a Vila Madalena (Viva os encontros no Genésio em tantos domingos à

tarde!!!), pelas compras, pela troca de experiências, por me mostrarem um lado da vida

desconhecido e suuuuuuuper divertido. Muito Obrigada pela companhia!!! Amo vocês!!! "A vida

pode ser do jeito que a gente quiser "...

Ao Professor Dr. Frederic Saujat, muito obrigada pelo interesse e valorização do trabalho do

professor. Graças à sua visita na EMEI Vereador Alex Freua Netto, o trabalho se tornou visível e

tudo aconteceu...

Gostaria de agradecer especialmente à Professora Dra. Anna Rachel Machado e ao Professor Dr.

Rosalvo Gonçalves Pinto. Vocês são essenciais em minha vida! Me ensinaram o verdadeiro

sentido da importância do outro no processo de ensino/aprendizagem. Vocês me fizeram entender

que o sujeito se constitui a partir do outro.

A Cássia e Marina, fofíssimas!!! Pelos momentos de brincadeiras e pelo amor...

Agradeço aos meus pais Ieda e Pedro, meu irmão Anderson e ao meu primo Leandro, pela

estrutura familiar, pelos valores sólidos que me fizeram ser quem eu sou...

Agradeço a tantas outras pessoas que não estão citadas neste texto, mas que também me

ajudaram na realização deste sonho...

Se tivesse que resumir e agradecer em poucas palavras, certamente diria: Obrigado Deus!!!! Pelas

oportunidades e por viver dias incríveis nestes meus 28 anos!!!

Que venha o doutorado !!!

RESUMO

Esta pesquisa, fruto de um trabalho voluntário que investiga o

desenvolvimento de um processo colaborativo entre duas professoras de uma

Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI), visa à construção colaborativa e

reflexiva de sentidos sobre os significados relativos ao trabalho profissional,

voltado para a preparação de tarefas com os alunos, em contextos que propiciem

a compreensão das ações, inserção de transformações e a construção

colaborativa do conhecimento.

O estudo foi realizado na perspectiva da teoria da atividade sócio-

histórico-culural (Vygotsky, 1934/1996, 1934/2002, 1930/2002; Leontiev,

1977/2003, 1959/1998; Engeström, 2003, 2002, 1999, 1987). O discurso foi

abordado através do dinamismo dessa perspectiva, inserido em um sistema de

atividade coletiva, no qual os sujeitos atribuem sentidos aos significados relativos

ao ofício de ser professor de uma EMEI e assumem diferentes papéis nas práticas

mediadas pela linguagem. Esta pesquisa considera como pressupostos teóricos

os estudos de Brookfield (1987), Freire (1970), Giroux (1997), Morales (1998) que

discutem formas de ensinar e de desenvolver o pensamento crítico, tendo as

perguntas como instrumento de mediação semiótica na formação do profissional

crítico. Este estudo é de cunho colaborativa (Magalhães, 1998/2002; Liberali,

1999/2002), pois se trata de um processo investigativo que objetiva a observação,

intervenção e análise de transformações (ou não) nas práticas pedagógicas das

participantes. A discussão dos dados, pauta-se a teoria da atividade, com foco na

descrição dos sistemas e na análise do discurso, com base em Kerbrat-Orecchioni

(1996), que contempla os princípios que regem o sistema de turnos em uma

conversação, as relações horizontais e verticais e a noção de polidez.

A discussão dos resultados revelou que o trabalho reflexivo realizado

nas oito sessões programadas, aqui apresentadas, desencadeou a transformação

da concepção de ensino-aprendizagem da professora, que tinha, a princípio,

receio e dificuldades em trabalhar com as reais potencialidades das crianças,

limitando suas atividades à mera cópia de letras, famílias silábicas e palavras.

Após o término deste estudo, percebeu-se uma mudança na atitude da professora

no sentido de tornar-se capaz de trabalhar com textos, valorizar a bagagem

cultural do grupo/classe e, principalmente, identificar seu papel como um elemento

mediador e possibilitador das interações entre os alunos e destes com os objetivos

de conhecimento. Os resultados apontam, também, para a transformação

relacionada à percepção de que o ofício da professora é mais amplo do que a

mera repetição. Sua intenção é a de ampliar o repertório de cada criança,

permitindo a troca de informações e experiências entre elas e, ainda, propiciando

o contato com a arte produzida pelos homens ao longo de sua história.

ABSTRACT

This research, which comes from a voluntary project that investigates the

development of a cooperative process between two teachers at a kindergarten

public school (Escola Municipal de Educação Infantil – EMEI), wishes the

cooperative and reflexive construction of the senses about the meanings related to

professional work, focusing on the preparation of chores with students, in contexts

that make them comprehend their actions, inserting transformations and the

cooperative building of knowledge.

The research was based on the perspective of the socio-historical and

cultural activity theory (Vygotsky, 1934/1936, 1934/2002, 19830/2002; Leontiev,

1977/2003, 1959/1998; Enfeström, 2003, 2002, 1999, 1987). The speech was

prepared through the dynamism of this perspective, inserted on a collective activity

system, in which the subjects attribute senses to the meanings related to the fact of

been a teacher at a public school (EMEI) and taking different places in uses of the

language. This study is based on theorist presupposes of Brookfield (1987), Freire

(1970), Giroux (1997), Morales (1998) that discuss ways of teaching and

developing the critical thinking, having the questions as an instrument of semiotic

meditation in the development of a critic professional. This study is cooperative-

based (Magalhães, 1998/2002; Liberali, 1999/2002), due to the fact that this is an

investigative process that aims the observation, intervention, and analysis of

transformations (or not) in the pedagogical practice of the participants. The

discussion of the data is based on the theory of the activity, focusing on the

description of the systems and the analysis of the speech, with basis on Kerbrat-

Orecchioni (1996), which admires the principles that react to the system of

conversation turns, the horizontal and vertical relations in the notion of politeness.

The discussion of the results revealed that the reflexive job

accomplished in eight programmed sessions, presented here, created the

transformation of the teaching-learning conception of the teacher, that was, at first,

afraid of and had difficulties in working with real potential of the kids, limiting their

activities to the mere copy of letters, syllables and words. After the end of this

study, it was realized a change in the teacher’s behavior, in the sense of been able

to work with texts, valuing the cultural knowledge of the group/ class and, specially,

identifying its job as a mediate element and an interactive maker among the

students and the latter with aims of knowledge.

The results point, also, to the transformation related to the perception

that the importance of the teacher is to create another transformation that deals

with respect to the perception that the teacher’s aim is wider than a simple

repetition. The teacher’s intention is to broaden the repertory of each child,

allowing the trade of information and experiences among them and, furthermore,

allowing the contact with art made by men throughout history.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 01

CAPÍTULO 1 – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 07

1.1. – Teoria da Atividade 08

1.1.1. – História 11

1.1.2. – Sistema de Atividade e o Ciclo Expansivo de Aprendizagem

– Implicações Metodológicas 18

1.1.3. – Constituição do Sujeito 22

1.1.4. – Instrumentos de Mediação Semiótica e a Linguagem 24

1.1.5. – Sentidos e Significados 27

1.1.6. – Definindo Cultura e Contexto 30

1.1.7. – Zona Proximal de Desenvolvimento e as Oportunidades de

Aprendizagem 31

1.1.8. – Contradições e Conflitos no Sistema de Atividade 39

1.2. – Reflexão 45

1.2.1. – O Processo Reflexivo na Formação de Professores 46

1.2.2. – Sessão Reflexiva como Espaço para Formação do Professor

Crítico 48

1.2.3. – Discussão e Formação Crítica 51

1.3. – Pressupostos Teóricos para Análise dos Dados 56

1.3.1. – As Práticas Comunicativas 57

1.3.2. – O Sistema de Turnos 58

1.3.3. – As Relações Interpessoais 60

1.3.4. – Perguntas como Instrumento de Mediação Semiótica 63

CAPÍTULO 2 – METODOLOGIA DE PESQUISA 65

2.1.– Pesquisa Crítica de Colaboração 65

2.2. – Contexto e Local de Pesquisa 66

2.3. – Participantes 67

2.3.1. – Professora-pesquisadora 68

2.3.2. – Professora Participante 69

2.4. – Procedimento de Coleta de Dados 69

2.4.1. – Sessões Reflexivas 69

2.5. – Procedimento de Análise de Dados 73

2.5.1. – Análise Descritiva dos Sistemas de Atividade 74

2.5.2. – Análise do Discurso 77

2.6. – Aspectos Éticos na Pesquisa 78

2.7. – Questões de Confiabilidade 79

CAPÍTULO 3 – DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 80

3.1. – Sentidos Revelados pelas Professoras sobre seu Trabalho 80

3.1.1. – Sessões Reflexivas Iniciais 82

3.1.2. – Sessões Reflexivas Intermediárias 86

3.1.3. – Sessões Reflexivas Finais 89

3.2. – Regras e Divisão de Trabalho 93

3.2.1. – Sessões Reflexivas Iniciais 94

3.2.2. – Sessões Reflexivas Intermediárias 99

3.2.3. – Sessões Reflexivas Finais 103

3.3. – As Sessões Reflexivas como espaço para Formação de professores

Críticos 108

CONSIDERAÇÕES FINAIS 118

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 125

ANEXOS 133

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Modelo do Primeiro Momento da Teoria da Atividade 12

Figura 2 – A estrutura da Atividade de Leontiev 14

Figura 3 – Modelo do Segundo Momento da Teoria da Atividade 15

Figura 4 – Modelo do Terceiro Momento da Teoria da Atividade 17

Figura 5 – Ciclo Expansivo de Aprendizagem 20

Figura 6 – Sessões Reflexivas 76

Figura 7 – Sistema de Atividade – Sessão Reflexiva 23/11/2005 109

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Princípios da Teoria da Atividade 10

Quadro 2 – Zona Proximal de Desenvolvimento nas Diferentes Pesquisas 38

Quadro 3 – Conflitos e Contradições nos Sistemas de Atividade 44

Quadro 4 – Os Tipos de Reflexão 48

Quadro 5 – Os Tipos de Perguntas 55

Quadro 6 – Quadro de Análise 74

Quadro 7 – Quadro de Análise do Discurso 78

Quadro 8 – Sentidos iniciais, intermediários e finais da Professora 93

Quadro 9 – Ação 111

Quadro 10 – Ação 113

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

1

INTRODUÇÃO

Este pesquisa, fruto de um trabalho voluntário que investiga o

desenvolvimento de um processo colaborativo entre duas professoras de uma

Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI), visa à construção colaborativa e

reflexiva de sentidos sobre os significados relativos ao trabalho profissional,

voltado para a preparação de tarefas com os alunos, em contextos que

propiciem a compreensão das ações, inserção de transformações e a

construção colaborativa do conhecimento.

O processo de desenvolvimento profissional das professoras é

apresentado e discutido por meio de múltiplas vozes: a voz da professora

participante que conta suas experiências de aprendizagem, suas histórias de

vida, seu modo de ver e interpretar o mundo; a voz da professora-pesquisadora

que expõe seus medos e os sentidos atribuídos ao processo de formação

contínua de professores e, por fim, a voz de autores diversos, expressa

através da fundamentação teórica do trabalho, os quais discutem questões

sobre a formação crítica e reflexiva de professores e pelos quais se procura

encontrar, nesse coro de vozes, o fio condutor do trabalho.

Esta seção se organiza em cinco partes: na primeira, descreve-se a

motivação inicial deste trabalho, a segunda, apresenta as questões teóricas, a

terceira, o objetivo (a pergunta de pesquisa), a quarta, a relevância da mesma

e a quinta, a estruturação da dissertação.

Tudo começou quando ...

O marco inicial desse projeto foi o ano de 2005, quando iniciei o

mestrado em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem no LAEL (PUC –

SP). Nesta época tinha como objetivo realizar uma pesquisa sobre a pedagogia

social, a fim de dar continuidade ao trabalho de conclusão de curso da

graduação. Estava bastante empolgada com os conteúdos aprendidos nas

disciplinas que estava cursando e fazia questão de compartilhar conhecimentos

tão importantes com a coordenadora pedagógica da escola em que trabalhava,

assim como com minhas colegas de JEI (Jornada Especial Integral).

A coordenadora pedagógica começou a se envolver com as teorias

comentadas por mim e me propôs a realização de um projeto de formação com

as professoras. Sua proposta era estudarmos juntas as teorias de ensino-

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

2

aprendizagem para que ela, nas reuniões pedagógicas, pudesse trabalhar com

o grupo de professores e agentes escolares. Aceitei o desafio, reorganizei o

projeto de pesquisa e iniciei o trabalho com a coordenadora. Visualizava a

possibilidade de desenvolver uma pesquisa, de fato, colaborativa, pois a

demanda adveio da Unidade Educacional.

Após a reorganização do projeto de pesquisa, marcamos a primeira

sessão reflexiva, na escola, em sua sala – a sala da coordenação – que durou

pouco mais de quinze minutos. Ali, percebi a tensão e o constrangimento da

coordenadora pedagógica em falar sobre sua prática. Conseguimos realizar

três sessões reflexivas e, na última, a coordenadora apresentou-se bastante

nervosa, começou a chorar e dizia repetidas vezes, que estava com vergonha.

Na semana seguinte ela entrou de licença médica, na qual permaneceu até

abril de 2006.

Quando percebi que havia “perdido” meu sujeito de pesquisa, uma

sensação de medo me invadiu, pois, teria que modificar o objetivo de pesquisa,

iniciar novas investigações de outros conhecimentos com outros participantes

e, assim, realizar novas adequações. A Júlia (professora que acompanhou toda

minha trajetória na prefeitura e o processo de seleção do mestrado),

percebendo minha angústia, se propôs realizar o trabalho e sistematizar o que

já fazíamos há um ano, porém, sem planificar nossas ações e aprofundá-las

teoricamente.

A partir daí, reorganizei novamente o projeto de pesquisa e iniciamos

as sessões reflexivas. Assim, surgiu a idéia de se transformar esta experiência

em um estudo sistemático que investigasse os sentidos que atribuímos ao

processo de ensino-aprendizagem, às visões de professor e de aluno, uma vez

que essas são culturalmente construídas e se instalam em nossas mentes,

podendo distorcer nossa visão de mundo e criar barreiras que, muitas vezes,

impedem ou restringem nossa ação.

O medo e ansiedade que eu, assim como a Júlia (professora

participante) demonstramos ter do diferente, daquilo que desconhecemos ou

pouco sabemos, bem como o foco nas dificuldades, nas limitações, restrições,

incapacidades, nos obstáculos, e não no potencial a ser desenvolvido, na

criatividade, nas possibilidades, acabam contribuindo para aumentar o fosso da

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

3

exclusão social e escolar, afetando a auto-estima e o processo de ensino-

aprendizagem tanto dos alunos como das professoras.

Questões teóricas

A questão de pesquisa pôde ser relacionada e compreendida com a

ajuda da teoria da atividade (Engeström e Cole, 1997; Engeström, 1999;

Russell, 2002; Kozulin, 1998; Daniels, 2003; Sellman, 2001; Steiner, 1996) que

me forneceu a sustentação teórica e evidenciou, para esta dissertação, a

importância da historicidade, da multiplicidade de vozes e dos instrumentos

mediadores, questões já discutidas por Vygotsky e Leontiev, além de oferecer

o instrumental de análise e organização de dados.

Neste trabalho, o conjunto de sessões reflexivas é, então,

considerado como um sistema de atividade, cujos sujeitos são a professora-

pesquisadora e a professora participante (Júlia), e cujo objeto é a preparação

dos professores frente aos desafios apresentados na sala de aula e na

sociedade em contextos específicos de ensino-aprendizagem, objeto este que

passa por um processo de transformação, do foco na competência

comunicativa para o foco também na formação de professores críticos e

reflexivos.

Nesse quadro, são discutidos a constituição do sujeito (Vygotsky,

1982; Daniels, 2003; Wertsch, 1985, Wells, 2000), os sentidos e significados

(Vygotsky, 1982; Smolka, 2004; Gonzalez Rey, 2004), cultura e contexto (Cole,

1996; Bronfenbrenner, 1979; Valsiner, 1998), destacando-se também os

conceitos de mediação e zona proximal de desenvolvimento (Lantolf, 2000;

Cole, 1996; Daniels, 2003; Van der Veer e Valsiner, 1998; Moll, 1996;

Vygotsky, 1934/1998; Wertsch, 1985; Lee e Smagorinsky, 2000; Hedegaard,

2002; Putney et al, 2000; Wells, 2000; Hassan, 2002). Esses conceitos me

permitiram compreender a sessão reflexiva e o processo de ensino-

aprendizagem das participantes. Juntam-se a esses tópicos a discussão sobre

a formação do professor (Magalhães, 2002; Celani, 2001) e a formação do

professor crítico e reflexivo (Giroux, 1997; Brookfield, 1987; Freire, 1996;

Magalhães, 1996).

O trabalho que desenvolvo com a professora participante nas

sessões reflexivas tem, portanto, o objetivo de investigar o desenvolvimento de

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

4

um processo colaborativo entre as professoras de uma Escola Municipal de

Educação Infantil (EMEI), visa à construção colaborativa e reflexiva de sentidos

sobre os significados relativos ao trabalho profissional voltado para a

preparação de tarefas com os alunos em contextos que propiciem a

compreensão das ações, inserção de transformações e a construção

colaborativa do conhecimento.

Discuto os posicionamentos, pontos de vista e ações das

participantes e como cada um deles pode operar para reverter o quadro em

que elas atuam, contribuindo, assim, para a formação de cidadãos, professores

críticos e reflexivos e agentes transformadores, perante seus pares e perante a

sociedade, na difícil e complexa tarefa de possibilitar que a transformação

escolar possa ser realidade.

Objetivo e pergunta de pesquisa

Levando-se em consideração as questões complexas apontadas

acima, as quais foram, gradativamente, vindo para a cena, esta dissertação

objetiva, então, investigar o desenvolvimento de um processo colaborativo

entre duas professoras de uma Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI),

visa à construção colaborativa e reflexiva de sentidos sobre os significados

relativos ao trabalho profissional voltado para a preparação de tarefas com os

alunos em contextos que propiciem a compreensão das ações, inserção de

transformações e a construção colaborativa do conhecimento.

Para isso, faz-se necessário conhecer, por um lado, os sentidos que

as professoras atribuem às concepções de professor, de aluno e de ensino-

aprendizagem e, por outro, como se dá a constituição dos sujeitos (no caso, as

participantes), bem como as ações que viabilizam a formação de professores

críticos e reflexivos, nas sessões reflexivas. Procuro responder, assim, à

pergunta fundamental de pesquisa:

Como a linguagem organiza a formação colaborativa d o

professor?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

5

Relevância da pesquisa

Dessa forma, por abordar tanto o processo de ensino-aprendizagem

das professoras nas sessões reflexivas, como a constituição de sujeitos críticos

e reflexivos, na perspectiva da teoria da atividade, esta dissertação pode se

constituir numa contribuição para a área de ensino-aprendizagem e formação

de professores.

Diversos são os pesquisadores que estudam e trabalham com a

questão da formação de professores e/ou trabalho do professor no Programa

de Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem da PUC – SP, LAEL. Entre

outros, destaco Celani (2001), Magalhães (2004, 2000, 1998, 1996, 1994),

Machado (2004, 1998), Liberali (2004, 2000, 1998, 1996, 1994), Romero

(1998), Estefogo (2001), Ninin(2002), Pepe (2003), Ramos (2003), Damionovic

(2004) e Motta (2004), entre outros.

Além do tema e dos tópicos que são discutidos, esta dissertação

pretende inovar por tratar-se de uma pesquisa entre duas professoras que

lecionam na mesma Unidade Educacional e que, sozinhas e por iniciativa

própria, iniciam um trabalho de desenvolvimento profissional e, a partir daí,

elaboram atividades para seus alunos em sala de aula.

Estrutura da dissertação

Esta dissertação se organiza em três partes. A primeira parte

compreende um capítulo teórico que se desdobra em quatro seções distintas,

iniciando-se com a discussão sobre a teoria da atividade, a qual fornece

subsídios e direcionamento para a discussão dos demais itens, permitindo o

entendimento do sistema de atividade que é aqui investigado: as sessões

reflexivas. Em seguida, a fundamentação teórica discute e apresenta as

questões referentes à formação de professores reflexivos e críticos. Finalizo o

capítulo da fundamentação teórica discutindo a teoria da análise, da qual fazem

parte a teoria da atividade e a análise do discurso com base em Kerbrat-

Orecchioni (1996).

O segundo capítulo refere-se à metodologia e discute o contexto da

pesquisa, os participantes, os procedimentos de coleta e de análise dos dados,

incluindo aqui o entendimento dos sistemas de atividade e as ferramentas

discursivas, tais como o levantamento dos conteúdos temáticos e das

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

6

modalizações. As perguntas, assumidas como instrumentos de mediação

semiótica, também são usadas como procedimento de análise.

O terceiro capítulo discute os dados e os resultados da pesquisa.

Conclui-se o trabalho no capítulo quarto, explorando-se as

possibilidades de sua futura expansão e avaliando o processo de

aprendizagem-desenvolvimento das participantes.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

7

Capítulo 1 – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Este capítulo tem por objetivo apresentar e discutir os fundamentos

teóricos que dão sustentação ao trabalho e que me permitirão responder às

perguntas de pesquisa, fornecendo suporte necessário para a discussão dos

resultados. A importância da discussão teórica está em permitir que o

pesquisador amplie o seu olhar e trave um diálogo constante com seus dados.

Nesse projeto, a discussão teórica possibilitou-me tecer ligações, trouxe

sentido e voz para as minhas histórias e para os relatos da professora

participante, para nossas aulas e para os sentidos que eu e a professora

atribuíamos e atribuímos ao ensino-aprendizagem-desenvolvimento.

Para isto, este capítulo divide-se, então, em quatro partes. Na

primeira, discuto a teoria da atividade, apresentando seu histórico e

características, para em seguida discutir os conceitos que me permitirão

entender os componentes do triângulo, representação gráfica da atividade ou

sistema de atividade, como: a constituição do sujeito, os instrumentos de

mediação semiótica, objeto e resultado, divisão de trabalho, regras e

comunidade e a relação entre eles que pode resultar em contradições ou

conflitos. Nesse momento são discutidos também a linguagem como

instrumento de mediação semiótica, assim, como significado e sentido,

contexto e cultura.

A segunda parte objetiva discutir o conceito de dialogia bakhtiniana,

pois é nessa prática que eu e a professora manifestamos nossos sentidos.

A terceira parte investiga questões referentes à formação contínua e

reflexiva dos profissionais da educação e aos conceitos de reflexão e de

colaboração.

Finalmente, na última parte, apresento a base teórica de análise de

dados, que inclui Kerbrat-Orecchioni (1996), especificando os princípios que

regem o sistema de turnos em uma conversação, as relações horizontais e

verticais e a noção de polidez.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

8

1.1. Teoria da Atividade

Inicio esta seção definindo a teoria da atividade (TA) e explicando a

relevância dessa abordagem para esta dissertação, para, em seguida, traçar

um histórico, desde o surgimento, começando com as discussões de Vygotsky

(1982) sobre a consciência e chegando até as concepções de Engeström.

A teoria da atividade é definida por Russell (2002) como uma

abordagem filosófica e heurística, que permite estudar as diferentes formas da

ação humana, mediadas por instrumentos, levando sempre em consideração

fatores históricos e culturais. Esta teoria enfatiza a mediação semiótica, a

importância do uso de instrumentos ou artefatos no processo de aprendizagem.

A aprendizagem não é apenas uma simples internalização da informação, mas

um movimento expansivo que envolve transformação no uso de instrumentos e

na forma como os indivíduos usam estes instrumentos para ensinar e aprender,

para transformar e serem transformados.

Sobre esse aspecto, Lantolf (2000) argumenta que, para Vygotsky,

os seres humanos não agem diretamente sobre o mundo físico, precisando

fazer uso de ferramentas que permitam, então, que ajam no mundo, no modo

de viver e na natureza das relações humanas. Essas ferramentas são os

instrumentos ou artefatos físicos e psicológicos, os quais são criados pela

cultura e são passados para as outras gerações com algum tipo de

transformação. Cada geração transforma sua herança cultural de acordo com

suas necessidades.

Como características da teoria da atividade, Cole (1996) aponta a

ação sempre mediada pelo contexto sócio-histórico, a idéia da mente como

algo que surge na atividade mediada conjunta das pessoas, sendo então co-

construída; aponta também os indivíduos como agentes ativos em seu próprio

desenvolvimento, embora não ajam em cenários de sua própria escolha e, por

último, mostra a ligação com outras áreas do conhecimento como as ciências

sociais e biológicas.

São cinco os princípios, que segundo Engeström (1999), resumem a

teoria da atividade:

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

9

1. o sistema de atividade é coletivo, mediado por artefatos e

orientado para um objeto, com as ações e operações geradas neste

sistema fazendo com que ele se realize e se reproduza a si mesmo;

2. há uma multiplicidade de vozes presentes nos sistemas devido a

múltiplos pontos de vista, interesses e tradições de seus

participantes, que trazem para os sistemas dos quais participam suas

histórias e experiências;

3. os sistemas de atividade são transformados ao longo do tempo e

só podem ser compreendidos em toda a sua complexidade, se sua

história puder ser estudada;

4. as contradições são fontes de mudança e de desenvolvimento,

gerando perturbações e conflitos, mas possibilitando mudanças na

atividade. Nessa teoria, as atividades coletivas são culturalmente

mediadas e orientadas por um objeto e motivo comuns. Entretanto,

como nem todos os sujeitos envolvidos na mesma atividade

compartilham o mesmo objeto, isso ocasiona, na maioria das vezes,

um conflito entre o individual e o coletivo, entre o que é internalizado

e o que é externalizado. As contradições ocorrem, também, entre os

participantes da atividade, que trazem para a mesma histórias e

práticas distintas, entre sujeito e instrumento, entre regras e sujeito,

divisão de trabalho e outros elementos no sistema. Como

instrumento de análise, a teoria da atividade possibilita identificar

tanto o conflito, como a fonte geradora de contradições e tensões

que, possivelmente, poderão se transformar em conflitos.

5. Estas possíveis transformações geram um ciclo expansivo, que

pode ser compreendido como um trabalho na zona proximal de

desenvolvimento. Pesquisadores como Sellman (2001), Engeström

(1999) e Cole (1996) têm desenvolvido pesquisas sobre as

contradições internas em um sistema de atividade, como forças

dinamizadoras para mudança e desenvolvimento, interessando-se

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

10

também por esse movimento na atividade e em descrever como os

sistemas interagem e expandem.

O quadro abaixo sistematiza esses princípios e os relaciona com a

situação estudada:

Quadro 1 – Princípios da Teoria da Atividade

Teoria da Atividade

Síntese dos princípios Realização nesta pesquisa

1. Sistema de atividade coletivo é a unidade de análise -coletivo e mediado por artefatos e orientado para o objeto;

- se realiza pelas ações e operações; - ações individuais e do grupo são entendidas como parte do sistema

O conjunto de sessões reflexivas realizadas é um sistema de atividade coletivo, do qual participamos eu e a professora. O objetivo desse sistema é o desenvolvimento das participantes e o resultado é a aprendizagem do aluno.

2. Multiplicidade de vozes no sistema - múltiplos pontos de vista; - múltiplos interesses e tradições; - a divisão de trabalho cria posições diferentes para os participantes; - os participantes têm histórias distintas; - múltiplas camadas em seus artefatos e regras; - os sistemas interagem; - o sistema é fonte de questionamento e inovação

São os textos trazidos pelas participantes -e a voz de seus autores - para leitura e estudo, são também as vozes das outras profissionais que trabalham na Unidade Educacional e as prescrições das instituições que regem a Unidade (Coordenadoria da Educação, Secretaria Municipal da Educação).

3. Historicidade - os participantes têm sua história e estão inseridos em contextos diversos; - os sistemas são transformados ao longo do tempo; - a história da atividade, seu objeto, instrumentos e idéias teóricas precisa ser estudada.

As histórias e experiências das participantes são determinantes para entender a função que as participantes exercem (contexto sócio-histórico-cultural) e a posição dos sujeitos no sistema.

4. Contradições - fontes de mudança e desenvolvimento; - geram perturbações e conflitos, mas também renovam tentativas de mudar a atividade

As contradições observadas nesse sistema, como, por exemplo, a visão de aluno e de professor e a concepção ensino-aprendizagem geraram contradições no mesmo.

5. Transformações expansivas - as contradições e possíveis transformações geram um ciclo expansivo, que pode ser compreendido como um trabalho na zona proximal de desenvolvimento.

São os questionamentos das tarefas organizadas pelas participantes, com possibilidades de análise e refacção das estratégias.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

11

Nesta dissertação, como já apontei, a sessão reflexiva é entendida

como um sistema de atividade coletivo, do qual participam eu e a professora. O

objeto desse sistema é o desenvolvimento dos participantes e o resultado a ser

alcançado é a aprendizagem do aluno. Existe nele uma multiplicidade de vozes

trazidas pelos participantes, a minha e a da professora, além de suas histórias

e experiências, e da herança cultural de suas comunidades. A teoria da

atividade mostrou-se adequada para entender a complexidade deste contexto,

no qual estão presentes questões sociais, culturais e históricas, permitindo-me

tecer a ligação entre a teoria e a prática e apontando para a necessidade de

investigar historicamente os sujeitos e os sistemas nos quais participam.

Passo, a seguir, a discutir o histórico da teoria da atividade.

1.1.1. Histórico

A teoria da atividade tem raízes históricas oriundas de três vertentes:

a filosofia clássica alemã de Kant e Hegel, os escritos de Marx e Engels e a

psicologia soviética fundada por Vygotsky, Luria e Leontiev. O termo surgiu na

década de 20, na escola histórico-cultural soviética de psicologia, emergindo

dos estudos de Vygotsky sobre a consciência. O conceito representa a

essência da psicologia soviética e vem passando por transformações desde

sua elaboração.

Em seus primeiros estudos sobre a consciência, Vygotsky (1982)

sugere que a atividade socialmente significativa pode ser considerada como

geradora de consciência por meio da relação com os outros. Nenhuma outra

teoria tinha conseguido explicar, anteriormente, o funcionamento da

consciência e a origem dos processos psicológicos superiores, que são

produtos da atividade mediada. Nesse estudo, ele conseguiu romper o círculo

vicioso da explicação da consciência pela consciência, do comportamento pelo

comportamento, quando traçou, segundo Kozulin (1998), uma delimitação entre

o objeto de estudo e o princípio explanatório1. Para Vygotsky, o comportamento

1 Foi essencial para o trabalho de Vygotsky a especificação para a psicologia do princípio marxista sociometodológico da transformação do indivíduo e da espécie por meio do uso de instrumentos. A atividade prático-crítica transforma a totalidade do que existe; é esta atividade revolucionária que, segundo Newman e Holzman (1993/2002), é essencial e especificamente humana. Tal atividade “derruba” a pseudonoção superdeterminante empirista, idealista e materialista vulgar de “atividade” particular – o que, na realidade, isto é, na sociedade, é comportamento. A distinção ente mudar

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

12

e a mente humanos devem ser considerados como ações intencionais, ao

invés de serem apenas respostas biológicas e adaptativas. A atividade ocupa,

então, o lugar do traço na fórmula behaviorista, do estímulo e resposta:

E – R

transformando-se em:

objeto ↔ atividade ↔ sujeito,

fórmula na qual tanto o sujeito como o objeto são historicamente e

culturalmente construídos. O papel das ferramentas psicológicas como

mediadoras entre a ação e o objeto da ação é fundamental para a

transformação das funções mentais elementares em superiores. O conceito de

mediação pode ser, dessa forma, entendido como um processo de intervenção

de um elemento intermediário, entre o sujeito e o objeto e estende-se para a

interação homem-ambiente pelo uso de instrumentos e de signos. Para

Vygotsky, o uso de instrumentos ou artefatos modifica fundamentalmente todas

as operações psicológicas. Com essa discussão sobre mediação,

instrumentos, funções psicológicas superiores, processos intermentais e

intramentais, internalização, etc., Vygotsky elabora o conceito de atividade,

sem ter, no entanto, usado esta terminologia. No modelo triangular o foco

estava na interação entre o sujeito e o objeto, mediada pelo artefato

cultural/instrumento.

Figura 1 – Modelo do primeiro momento da teoria da atividade

particularidades e mudar totalidades é vital para se entender a metodologia instrumento-e-resultado e, portanto, a atividade revolucionária.

Meios \ Mediacionais (instrumentos)

Sujeito (s) Objeto

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

13

Engeströn (1999) explica que a limitação desse primeiro momento da

teoria da atividade está na unidade de análise que é direcionada para o

indivíduo.

Leontiev expressou a mesma preocupação de Vygotsky, ao explicar

os aspectos específicos que diferenciam o homem do animal, formulando o

conceito de atividade, caracterizando os motivos humanos e a consciência

como algo cultural e historicamente construídos e, por isso, diferente dos

motivos dos animais. Ele considerou a atividade como um processo coletivo,

composto por ações orientadas para um objetivo e operações, consideradas

como funções psíquicas, condicionadas pelas condições materiais e pelos

instrumentos disponíveis.

O conceito de atividade é, então, ampliado por Leontiev (1978), que

explica a diferença crucial entre uma ação individual e uma ação coletiva. A

distinção entre atividade, ação e operação foi a base do seu modelo da

atividade de três níveis. Leontiev considera que as atividades humanas,

dirigidas por objetos a serem alcançados, são orientadas por ações

intencionais. Enquanto uma atividade é orientada para o objeto e por um

motivo, as ações são orientadas por metas e as operações por condições. A

ação é planejada antes de sua execução, executada sem um planejamento

prévio, bastando apenas uma análise das condições atuais para a realização.

Quando uma ação é repetida várias vezes e alcança um nível de maturidade

para que possa ser executada sem um planejamento prévio, ela passa para o

nível da operação. Dessa forma, a operação é uma ação que se tornou comum

no contexto de uma atividade. Leontiev não chegou, entretanto, a expandir

graficamente o triângulo de Vygotsky.

Leontiev (1977) destaca que o motivo é coletivo, ao contrário das

metas, que são individuais, explorando a idéia de metas parciais e globais,

idéia que viria a ser estendida, no futuro, por Engeström.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

14

ATIVIDADE OBJETO/MOTIVO

AÇÃO META

OPERAÇÃO CONDIÇÕES

Figura2 – A estrutura da atividade de Leontiev

Somente no final dos anos 70, o conceito de atividade voltou à

discussão com a publicação de: “The Concept of Activity in Soviet Psychology”,

por James Wertsch. Desde então, tem havido um interesse crescente pelo

tema, com destaque para Engeström, ue reestrutura o modelo inicial da teoria

de Vygotsky e de Leontiev, acrescentando a esse modelo outras estruturas,

como regras e divisão de trabalho, dando origem à um segundo momento da

teoria. A comunidade é formada pelos sujeitos que compartilham o mesmo

objeto e as regras e divisão de trabalho são consideradas novas formas de

mediação. As regras são normas implícitas ou explícitas, estabelecidas por

convenções e relações sociais na comunidade. A divisão de trabalho, por sua

vez, refere-se à forma de organização da comunidade para alcançar um

resultado. Todas essas formas de mediação possuem um desenvolvimento

histórico próprio com características particulares relacionadas ao contexto em

que foram desenvolvidas.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

15

INSTRUMENTO

OBJETO/MOTIVO

SUJEITO SENTIDO RESULTADO

SIGNIFICADO

REGRAS COMUNIDADE DIVISÃO DE TRABALHO

Figura 3 – Modelo do segundo momento da teoria da a tividade

Engeström expandiu a representação triangular usada por Leontiev

para focalizar as inter-relações entre sujeito individual e a sua comunidade,

além de enfatizar a importância das contradições na atividade como a força

motriz para a mudança e, conseqüentemente, para o desenvolvimento. As

mudanças e movimentos são processos contínuos em uma atividade,

decorrentes de crises, contradições e rupturas, que provocam, por sua vez,

conflitos que motivam as transformações e inovações no sistema coletivo. Essa

sua preocupação com o movimento, as transformações e inovações nos

sistemas de atividades, levaram-no a elaborar um ciclo expansivo, marcado

pelos conceitos de interiorização e exteriorização. Como já apontado por

Vygotsky (1982), a interiorização está ligada à reprodução da cultura e a

exteriorização à criação de artefatos que possam ser usados para transformar

a cultura. Há uma ênfase maior na exteriorização como uma agência ativa na

aprendizagem e no desenvolvimento.

Tanto a internalização como a externalização são processos básicos

de atividades humanas, sendo que a primeira refere-se à reprodução da

cultura, uma vez que o ser humano internaliza conhecimentos, conceitos,

valores e significados, reproduzindo-os em suas relações sociais, enquanto a

segunda refere-se à criação de novos artefatos que vão possibilitar a

transformação. Ambos os processos estão intimamente ligados, com uma

relação dialógica entre continuidade e mudança, reprodução e transformação,

que se constitui no maior desafio da pesquisa sobre a atividade, cujas

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

16

mudanças, resistências à mudança, transformação e estagnação serão

analisadas à luz da historicidade.

Dessa forma, a atividade não é somente a soma dos elementos que

a compõem, mas constitui-se em um sistema próprio, de atividade coletiva,

com instrumentos, regras, papéis e estrutura. São indivíduos ou grupos de

indivíduos que interagem, fazendo uso de instrumentos, para a transformação

de um objeto, com um motivo compartilhado para alcançar determinado

resultado, e são essas interações que poderão ser consideradas como um

sistema de atividade. Podem ser considerados, então, como um sistema de

atividade, a escola, a família, um clube, uma instituição, uma sala de aula, uma

disciplina, uma companhia. O mundo não é dividido, organizadamente, em

sistemas de atividade, conforme discutido por Russell (2000). Cabe ao

pesquisador definir o sistema de atividade, com base nos objetivos de sua

pesquisa e fazendo uso da lente que a teoria da atividade fornece para a

investigação e observação do sistema.

O sistema de atividade como unidade de análise envolve a

compreensão do sistema e do sujeito. O pesquisador constrói o sistema de

atividade como se estivesse olhando de cima, conseguindo, assim, ter uma

visão do todo. O estudo de um sistema de atividades se transforma, então, em

uma construção coletiva e de múltiplas vozes, no qual os conceitos

vygotskianos como zona proximal de desenvolvimento, mediação semiótica,

instrumentos, internalização e externalização passam do abstrato para o

concreto, podendo ser visualizados na atividade.

Com o reconhecimento internacional da teoria da atividade, questões

referentes à multiplicidade de perspectivas, às múltiplas vozes dos sistemas e

às redes interagentes de sistemas vieram à tona, fazendo com que Engeström

expandisse o modelo anterior, levando esses fatores em consideração. Além

desses aspectos, ele também deu prosseguimento às discussões sobre a

aprendizagem escolar e sobre a que transcende os limites institucionais da

escola e passou a questionar o compartilhamento do objeto, dando origem ao

terceiro momento da teoria da atividade. Isso porque os sujeitos da atividade,

muitas vezes, não compartilham o mesmo objeto.

Nessa direção, Engeström (1999:35) afirma que a atividade divide-se

em múltiplas ações e, por estarem associadas às ações, as metas não se

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

17

vinculam à atividade vista globalmente. Para ele, “a atividade é alcançada pela

negociação, pela orquestração e pela luta constantes entre as diferentes metas

e perspectivas de seus participantes. A construção de objetos mediada por

artefatos é, então, um processo colaborativo e dialógico, em que diferentes

perspectivas e vozes se encontram, colidem e fundem.”

O terceiro momento da teoria da atividade promove, então, um

entendimento mais amplo dos sistemas de atividade e também da formação de

redes de sistemas. Nas redes de sistemas, ou seja, na interação de dois ou

mais sistemas de atividade, podem ocorrer contradições e tensões na definição

do motivo e do objeto, dando origem, então a um novo sistema, com o

desdobramento do objeto. O desenho abaixo ilustra esta possibilidade e retrata

uma situação na qual os sujeitos da atividade têm objetos diferentes ,

construindo conjuntamente um terceiro, formando, assim, um outro sistema.

Essa possibilidade de construção e redefinição do objeto constitui-se no grande

potencial criativo da atividade.

Figura 4 – Modelo do terceiro momento da teoria da atividade

Artefato Mediador

Objeto 1 – desenvolver a compreensão do profº sobre as tarefas realizadas em sala de aula.

Regras Comunidade Divisão de Trabalho (sessão reflexiva A)

Objeto 2 Objeto 2

Objeto 3 – desenvolver tarefas ou estratégias de ensino na compreensão do processo de E-A do aluno e na transformação do profº.

Artefato Mediador

Objeto 2 – desenvolver a compreensão do profº sobre como os alunos aprendem

Regras Comunidade Divisão de Trabalho (sessão reflexiva B)

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

18

A unidade de análise da teoria da atividade é a ação, mas quando

nos referimos a um sistema de atividade, o foco de análise pode estar tanto no

grupo de pessoas que compartilham, ou não, do mesmo objeto e motivo, como

nos instrumentos que são usados e em quais instrumentos são usados para

mediar a trajetória dos sujeitos em direção ao objeto. O sistema de atividade é,

por isso, uma unidade de análise flexível, que permite a busca de respostas

para questionamentos. Segundo Russell (1997), o sistema de atividade é

construído e reconstruído pelos participantes que fazem uso de instrumentos,

incluindo os instrumentos discursivos. Discuto a seguir, o sistema de atividade

e o ciclo expansivo de aprendizagem e suas implicações metodológicas.

1.1.2. Sistema de atividade e o ciclo expansivo de aprendizagem –

implicações metodológicas

Esta seção objetiva complementar a discussão sobre a teoria da

atividade, apresentando o ciclo expansivo de aprendizagem, um instrumento

que permite ao pesquisador, que usa a teoria da atividade como

fundamentação teórica e como base de análise, observar e investigar a

atividade como um sistema em movimento, sendo considerado como um

instrumento metodológico e de análise. Como tal, ele é utilizado na pesquisa de

trabalho desenvolvimental, tipo de pesquisa que se associa à teoria da

atividade, a qual será, também, discutida nesta seção.

Como já mencionado anteriormente, com a projeção internacional da

teoria da atividade, ampliaram-se as discussões a respeito dessa abordagem, o

que levou Engeström a sistematizar o movimento observado nos sistemas,

provocado pelas contradições e conflitos, criando assim o ciclo expansivo de

aprendizagem. Segundo Engeström (1999), o ciclo expansivo é uma contínua

construção e resolução de tensões e contradições em um sistema de atividade

que envolve objeto, ferramentas mediadoras e as perspectivas dos

participantes envolvidos. Nele há uma preocupação com o levantamento das

raízes históricas da atividade, iniciando-se com um questionamento da prática

e com a constatação das contradições. Esse ciclo revela a dimensão da

atividade, como algo que está em constante movimento e que é coletiva.

Além de revelar o constante movimento e a historicidade no sistema,

o ciclo expansivo tem importância crucial para o entendimento dos processos

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

19

de internalização e externalização no sistema de atividade. Steiner (2000)

enfatiza a tensão entre internalização e externalização, tensão essa que

contribui para a construção do novo. A internalização promove sistematização

e reorganização para uns, conflito para outros, fazendo com que o

conhecimento seja construído, reconstruído e transformado, o que Steiner

chama de síntese dialético-criativa. Cada um internaliza o conhecimento de

uma forma diferente, processando-o e transformando-o com base na sua

realidade e sócio-história. A externalização, por sua vez, está ligada à

capacidade criativa do ser humano e é devida, principalmente, ao uso que ele

faz dos instrumentos. Ambos os processos estão ligados à reprodução e

transformação da cultura.

Engeström (1999) confirma, então, que um sistema de atividade é

uma formação de múltiplas vozes e que o ciclo expansivo é uma re-

orquestração dessas vozes, de diferentes pontos de vista e abordagens dos

participantes. Esse ciclo é composto por diversas etapas, iniciando- se com:

• questionamento sobre a prática devido a possíveis

contradições, tensões e conflitos;

• análise da situação, buscando as raízes históricas e

empíricas;

• modelo da nova estrutura da atividade que oferece soluções

para as contradições encontradas na primeira etapa;

• exame da nova estrutura, experimentando-a, afim de observar

e aprender suas limitações, potencial e dinâmica;

• implementação da nova estrutura, com aplicação prática,

melhorias e expansão conceitual;

• reflexão e avaliação do processo;

• consolidação da nova prática.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

20

O desenho abaixo sistematiza as etapas do ciclo expansivo de

aprendizagem

Figura 5 – Ciclo expansivo de aprendizagem

Neste trabalho, o ciclo expansivo de aprendizagem foi importante na

medida em que me possibilitou entender o movimento e transformação dos

sistemas de atividade analisados, no caso as sessões reflexivas. Compreendo

que essas etapas fazem parte de investigações que objetivam intervenção e

transformação. Entretanto o ciclo expansivo inova por enfatizar a historicidade

no sistema e por propiciar um olhar mais dirigido aos elementos (sujeito, objeto,

regras, instrumentos, divisão de trabalho, comunidade), as relações entre eles

Questionar * Então Ju, como foi atividade? O que você sentiu da sala? * E como você fez? * E aí, depois da leitura você propôs o que? * Sentiu dificuldade em realizar atividade? * Qual foi o ponto alto da atividade?

Consolidar

Analisar Então, Ju, o que eu tinha pensado pra gente estar fazendo é trabalhar com texto.

Modelar Do D, Então, poderíamos trabalhar primeiro com um texto maior que tenham palavras com D, aí desse texto a gente tira uma frase principal e que tenha palavras com D e, depois a gente vai para a palavra com o D, depois para as sílabas – família silábica e depois pra letra.

Examinar Implementar

Passei o texto na lousa, li duas vezes primeiro, depois eu lia e eles repetiam, perguntei se algum deles queria ler, todos levantaram as mãos!

Refletir Acho que é a leitura mesmo, eu lendo, eles lendo, eles querendo ler, se envolvendo na atividade, toda hora eles queriam ler,

levantavam a mãozinha. Mesmo não sabendo, lógico que eles não sabem, só de estar olhando e repetindo, acho que isso foi o melhor!

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

21

e as possíveis contradições e conflitos que podem ocorrer ou que já estão

instaladas no sistema.

O tipo de pesquisa que faz uso desse instrumento metodológico,

conforme já apontado anteriormente, é a pesquisa de trabalho

desenvolvimental, que objetiva investigar contextos sociais diversos, os quais

estão em constante transformação. Ela começou a ser estudada por

Engeström, na segunda metade dos anos 90. É multidisciplinar e utiliza-se dos

conceitos vygotskianos no quadro da teoria da atividade e acrescenta à

pesquisa etnográfica algumas outras características como a historicidade, a

intervenção, observação e possível transformação dos sistemas de atividade. A

sociedade é vista muito mais como uma rede de sistemas de atividade

interligados e menos como uma pirâmide de estruturas fixas.

O pesquisador tem a possibilidade de entender o ambiente e as

relações no trabalho, na escola e em outros contextos, levando em

consideração as contradições, a historicidade e a natureza coletiva dessas

relações. Além disso, pode interferir no sistema de atividade, propondo novos

modelos de ação e fornecendo novos instrumentos para os participantes,

permitindo, dessa forma, a expansão e transformação do sistema.

No formato desta dissertação não foi utilizado o modelo da “pesquisa

de trabalho desenvolvimental”. Quando tomei conhecimento dele, minha

pesquisa já estava em andamento, com a coleta de dados já finalizada.

Entretanto, julgo necessário destacar sua relevância e a contribuição dada ao

desenvolvimento do meu trabalho, tanto para a fase de seleção e organização

da fundamentação teórica, com ênfase na historicidade, quanto para a adoção

das perspectivas da multiplicidade de vozes e do uso de instrumentos

mediadores, bem como, ainda, para a organização dos dados e o

encaminhamento da análise.

Depois de ter apresentado a teoria da atividade, com sua definição,

histórico e implicações metodológicas, passo a discutir a questão da

constituição do sujeito, o que me possibilitará compreender a posição dos

sujeitos participantes da minha pesquisa no sistema de atividade, naquilo que

trazem para o sistema, de onde vêm e como são constituídos.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

22

1.1.3. Constituição do sujeito

. Esta seção objetiva, portanto, discutir a constituição do sujeito com

base na teoria vygotskiana. No quadro sócio-histórico e cultural, o ser humano,

diferentemente do animal, constitui-se como resultado de experiências

históricas, que são transmitidas pelas gerações anteriores, de experiências

sociais e processos biológicos, como o crescimento e a maturação orgânica.

Vygotsky, com base em Spinosa, afirma que o desenvolvimento biológico e o

desenvolvimento cultural formam uma unidade, o que explica o

desenvolvimento psicológico e da consciência. Ele fala, então de um sujeito

ativo e histórico, com uma consciência construída a partir de mediações

sociais, incluindo aqui também a afetividade.

Para a compreensão do sujeito, é necessário que se entenda, em

primeiro lugar, as relações sociais presentes na vida e no ambiente onde está

inserido. Este ambiente está em constante mutação e, com o aponta Wells

(2000), entre outros, há a necessidade de se estudar não somente a história do

sujeito, como também a história do grupo social ao qual pertence.

Assim, como bastante discutido por Wertsch, Daniels e outros

seguidores de Vygotsky, o desenvolvimento ontogenético, ou seja, o

desenvolvimento do próprio ser, não pode ser visto como uma trajetória

isolada, mas sim, como relacionado aos eventos sociais com os quais este

indivíduo está envolvido (microgenética); às instituições como a família, o

trabalho, a escola, ou seja, os lugares onde estes eventos acontecem; ao pano

de fundo sociocultural em que essas instituições se situam (sócio-história) e,

finalmente, à espécie (filogenética).

Dessa forma, a vida do indivíduo, o trabalho e o comportamento

baseiam-se na utilização ampla das gerações anteriores, o que Vygotsky

chama de experiência histórica. A isso se junta o relacionamento com outras

pessoas ou experiência social, o que permite que estabeleçamos relações e

conexões com fatos, lugares e experiências e conhecimentos que foram

vivenciados por outros. As relações sociais são, dessa forma, consideradas

como fundamentais, não só nos primeiros anos de vida, mas ao longo de toda

a vida. Desde o início, as relações são construídas na interação, por meio de

ações que são compartilhadas e que se estabelecem nos processos dialógicos.

Segundo Rossetti-Ferreira (2004), ao agirem, as pessoas transformam seus

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

23

parceiros de interação e são transformadas por eles, alterando também os

sistemas nos quais participam. O ser humano constitui-se, então, na relação

com o outro e com o mundo e as características pessoais vão sendo

construídas na história interacional de cada um.

Na teoria da atividade, o sujeito é coletivo, pois mesmo quando nos

referimos a um indivíduo, ele é socialmente construído e faz parte de um grupo.

Esse sujeito traz para o sistema de atividade uma série de experiências e

histórias pessoais, habilidades cognitivas, características de personalidade e

traços de caráter que foram definidos culturalmente e traduzem a comunidade

ou o meio a qual pertencem. A relação entre sujeito e objeto é mediada pelas

ferramentas, as quais podem tanto permitir como restringir a ação.

Neste trabalho, com foco no desenvolvimento profissional das

participantes, discutirei a constituição do sujeito professor, apresentando

questões históricas e discursivas que determinam a sua constituição e influem

no seu processo de aprendizagem e desenvolvimento (ofício). Discuto,

também, o sujeito professor, focalizando os sentidos e significados atribuídos à

visão de professor, visão de aluno e concepção de ensino-aprendizagem.

Além disto, por considerar a formação contínua na sessão reflexiva

como um sistema de atividade, espaço de negociação e de formação das

participantes, com base em Freire (1996), Giroux (1997) e Brookfield (1987),

faz-se necessário definir a constituição da atividade crítica, no caso, do

professor. Por professor crítico entendo o professor que tem a liberdade de se

expor e trazer a sua realidade, o seu conhecimento cotidiano para a cena,

ligando-o ao conhecimento científico, aquele que é trabalhado na sessão

reflexiva. É também aquele que, através de uma educação problematizadora,

tem a possibilidade de enxergar o mundo por uma outra perspectiva, podendo,

então, transformá-lo. Entender isso foi relevante para a transformação do meu

ensinar, o que será retomado na seção sobre a discussão e o uso de perguntas

como instrumentos de mediação semiótica na formação das participantes como

profissionais críticos.

Discuto, a seguir, os instrumentos de mediação semiótica, dentre

eles a linguagem, que é produzida social e historicamente e é o instrumento

fundamental no processo de constituição do sujeito.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

24

1.1.4. Instrumento de mediação semiótica e linguage m

Esta seção objetiva discutir os instrumentos de mediação semiótica

com ênfase na linguagem, o mais importante instrumento de mediação

semiótica, como apontado por Vygotsky. Ele propõe que o comportamento

humano só pode ser entendido na história de cada indivíduo e que as forças

sociais, culturais e históricas desempenham papel fundamental para o

desenvolvimento do ser humano. Na tentativa de diferenciar o ser humano do

animal, ele se interessou por essa incrível capacidade humana de construir e

usar instrumentos.

Os instrumentos mediadores servem, assim, como meios pelos quais

o indivíduo age sobre fatores sociais, culturais e históricos, sofrendo, ao

mesmo tempo, a ação deles. A idéia de mediação traz consigo uma série de

implicações acerca do controle, feito por meio de forças externas e internas.

Vygotsky (1934/1998) afirma que os seres humanos controlam a si mesmos

“de fora para dentro” por meio de sistemas simbólicos e culturais. Com o auxílio

dos signos, o ser humano pode controlar voluntariamente sua atividade

psicológica e ampliar sua capacidade de atenção, memória, retenção de

informações, através do anotar, da escrita de diário, do fazer associações, e

pode, dessa forma, exercer influência no seu meio através desses instrumentos

abstratos, os quais têm o poder de transformar a atividade humana, criando

novos processos psicológicos.

Ao mostrar que os instrumentos ocupam lugar de destaque no

quadro sociocultural, Vygotsky (1934/1999) diz que os seres humanos, além

dos instrumentos físicos, fazem uso de instrumentos semióticos que medeiam

a atividade intelectual. O conhecimento acadêmico, por exemplo, pode ser

considerado como instrumento cultural, permitindo que sucessivas gerações

tenham acesso a ele, modificando-o e adaptando-o para a solução de novos

problemas, conforme discute Wells (1998).

Considerando o sistema de atividade, a forma como os sujeitos usam

os instrumentos (Newman & Holzman, 2002; Russell, 2002 e Wells, 2000) pode

transformar a atividade, à medida que esses sujeitos criam novos instrumentos

ou novos usos para o mesmo instrumento. Wells (1998) afirma também que,

quando os instrumentos são usados para que o sujeito consiga alcançar o

objetivo de uma ação, esse uso pode ser considerado como uma operação,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

25

através da qual a ação é realizada. Um exemplo disso é o uso do dicionário

para a compreensão de palavras em um texto. Entretanto, quando o indivíduo

ainda está aprendendo a fazer uso do instrumento, isso se mantém no nível da

ação, pois ela exige ainda atenção consciente.

A discussão sobre instrumentos semióticos ficaria incompleta,

entretanto, sem se enfatizar a importância da linguagem, considerada como o

maior instrumento de mediação semiótica. Segundo Vygotsky (1934/1999), a

linguagem é o sistema simbólico fundamental que organiza os signos em

estruturas complexas. Ela permite lidar com objetos do mundo exterior, mesmo

quando estão ausentes, promove a abstração, a generalização a partir de uma

idéia inicial; ordena o real em categorias conceituais; é usada para

comunicação e permite a transmissão e assimilação de informações e

experiências acumuladas. Tem, então, um papel fundamental de organizadora

do pensamento e das funções psicológicas superiores e a sua função

primordial é a comunicação.

Como, também apontado por Vygotsky, em relação ao processo de

desenvolvimento da consciência infantil, quando a criança começa a conhecer

o que a rodeia, com a ajuda da fala torna-se possível a produção de novas

relações com o ambiente, além de nova organização do comportamento. Toda

a fala é social, incluindo a fala interna ou egocêntrica, que pode ser

considerada como um instrumento do pensamento que ajuda a criança a criar

soluções para possíveis problemas ou dúvidas. Mesmo mais tarde, na fase

escolar, a fala egocêntrica continua como organizadora do pensamento.

Dessa forma, segundo Vygotsky, a linguagem imprime três

mudanças essenciais para as funções psicológicas superiores:

• possibilidade de lidar com os objetos do mundo exterior,

mesmo quando eles estão ausentes;

• generalização, abstração e análise de conceitos;

• comunicação, o que possibilita a preservação, transmissão e

assimilação de informações e experiências acumuladas pela

humanidade, ao longo da história.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

26

O trabalho de Vygotsky sobre a mediação semiótica não chega,

entretanto, a tratar do discurso, da importância do falante (para quem, de

quem, o que, de onde e porque fala), nem de como o discurso é estruturado.

Wertsch (1985) sugere que esta lacuna poderia ser preenchida com a teoria de

Bakhtin sobre os gêneros do discurso. Hassan (2002) aponta que a análise do

discurso poderia contribuir para um olhar mais detalhado para a mediação

semiótica, enfatizando que além da ação, objeto, motivo e resultado, essa

análise poderia contribuir para a compreensão das transformações propostas

pela teoria da atividade.

Também Wells (1998) salienta que o discurso lingüístico

desempenha um papel mediador vital, tanto na negociação dos objetivos a

serem alcançados, como nos meios utilizados para alcançá-los. O discurso

também permite que os aprendizes percebam a importância do que aprendem

e para que aprendem, possibilitando tanto a internalização como a

externalização da informação.

Neste trabalho, a discussão sobre a linguagem como um instrumento

de mediação semiótica é fundamental, pois fazendo uso desse instrumento, as

professoras poderão alterar a sua posição na comunidade escolar em que

atuam, fazendo esse processo avançar no microcosmo da sessão reflexiva.

O uso das perguntas como instrumento de mediação semiótica para

a formação e desenvolvimento da professora nas sessões reflexivas é outro

aspecto que será discutido na base teórica de análise de dados, ligando-se,

portanto, a esse tópico e destacando a importância dos instrumentos.

Trato, a seguir, das questões de sentido e significado, que, segundo

Moita Lopes (2002), são construídos quando agimos no mundo social e são

definidores da realidade social à nossa volta e de nós mesmos. Esses

significados e sentidos construídos nas práticas discursivas, segundo ele,

revelam como os indivíduos compreendem o mundo, a si mesmos e aos

outros. Os indivíduos têm, portanto, suas identidades sociais construídas nas

interações sociais das quais participam, tendo o discurso um papel central

como força mediadora dos processos de construção das identidades sociais,

como o confirma Moita Lopes:

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

27

“Nossa diferença consiste no fato de que nossas faces estão viradas

uma para a outra; podemos ler em cada ser humano uma história composta em um

mundo social, e podemos lê-la somente porque somos membros de tal mundo.”

(Backhurst e Sypnowich, 1995, apud Moita Lopes, 2002:198)

Moita Lopes acrescenta que nossas identidades são multifacetadas e

não são fixas, considerando que mostramos a face social a partir do que o

outro representa para nós e, também, em quem é o outro, podendo ser

contraditórias, o que é revelado no discurso.

1.1.5. Sentido e significado

O significado da palavra é um fenômeno do pensamento para

Vygotsky (1934/1999), já que o pensamento se concretiza pela fala. Em sua

opinião, os significados das palavras não se referem apenas a associações do

som a determinados objetos, mas são formações dinâmicas, um processo que

passa por transformações e variações. No seu livro “Pensamento e linguagem”,

ele diz que o significado da palavra é sempre uma generalização ou um

conceito. Além disto, o significado da palavra evolui em função da mudança da

consciência.

“O significado de uma palavra representa um amálgama tão estreito do

pensamento e da linguagem, que fica difícil dizer se se trata de um fenômeno da

fala ou de um fenômeno do pensamento. Uma palavra sem significado é um som

vazio; o significado, portanto, é um critério da palavra, seu componente

indispensável” (Vygotsky, 1934/1999:150)

O sentido, por sua vez, é a soma de todos os eventos psicológicos

que a palavra desperta na consciência dos agentes. É todo complexo, fluido e

dinâmico. O significado é uma das zonas do sentido, mais estável e precisa.

Uma palavra, segundo Vygotsky, adquire o seu sentido no contexto em que

surge, e contextos diferentes podem alterar o sentido. Ele discute o papel do

contexto para a construção do sentido, explicando que uma palavra inserida

em um contexto pode ter um sentido diferente, sendo este mutável e complexo.

A palavra está inserida em uma sentença que, por conseguinte, se insere em

um parágrafo, este no livro e o livro na série de obras do autor.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

28

Nesse quadro, a unidade lingüística de análise é a palavra,

considerada como a unidade do pensamento, a qual não se refere a algo

concreto, mas a uma generalização. Dessa forma o significado de uma palavra

une tanto o pensamento, como a linguagem. Uma palavra sem pensamento é,

então, algo morto e um pensamento que não é verbalizado em palavras

permanece como uma sombra. As palavras têm, assim, uma importância

fundamental tanto para o desenvolvimento do pensamento como para o

desenvolvimento histórico da consciência.

Segundo Smolka (2004), as crianças nascem e vivem em um mundo

cheio de significados e, logo, começam a fazer sentido das práticas, vivendo,

sentindo e sofrendo as relações com os outros e com o mundo. Os significados

e a construção dos sentidos fazem parte da vida humana, segundo a autora, e

são diversas as áreas do conhecimento, da Filosofia e Antropologia à

Lingüística Aplicada, que problematizam essa questão. Para iniciar essa

discussão, faz-se necessário, ainda segundo Smolka (2004), definir signo, de

onde vem a palavra significar, “chamamos de signos a tudo o que significa

algo, e entre estes, encontramos também as palavras...Toda palavra é signo,

mas nem todo signo é palavra...” Para Vygotsky, o signo é um instrumento

psicológico que tem a função de auxiliar o indivíduo nas suas atividades

psíquicas, fazendo com que ele amplie sua capacidade de atenção, memória e

acúmulo de informações, por exemplo, destacando sua característica

mediadora.

A construção do sentido se faz na relação com o outro em um

contexto particular e é com o outro que nos apropriamos do mundo. A realidade

será percebida, diferentemente, por cada sujeito, principalmente, devido aos

sentidos que este sujeito atribui à realidade. Segundo González Rey (2004), o

sentido é sempre o resultado de um processo de subjetivação associado a um

contexto concreto e imerso no sistema de sentidos subjetivos que caracterizam

a vida do sujeito. O sentido é, então, uma síntese subjetiva de dimensões

culturais, sociais e históricas, que estão implicadas nas ações do sujeito. Para

esse autor, o sentido mescla-se, também, com as emoções e outros elementos

da vida psíquica, o que contribui para a configuração de novos sistemas de

sentidos, os quais vão além dos significados já construídos.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

29

Com base no monismo de Spinosa, Vygotsky já abordava em sua

obra a preocupação com a integração dos aspectos cognitivos e afetivos do

funcionamento psicológico humano, demonstrando ser o homem um ser que

pensa, raciocina, deduz e abstrai, mas também um ser que sente, se

emociona, deseja, imagina e se sensibiliza. Biologia, intelecto e afeto se unem

e formam um sistema dinâmico de significados. Os sujeitos têm, então, uma

possibilidade diferenciada de produção de sentido, devido aos diferentes

fatores históricos, culturais, sociais e emocionais. Assim, a produção de sentido

de uma família, por exemplo, está associada, segundo González Rey (2004),

aos processos simbólicos e emocionais produzidos nas histórias vivas e

diferenciadas entre os membros da família. O sentido é, portanto, inseparável

do sujeito e dos fatores históricos, culturais e sociais que o acompanham.

Neste trabalho, essa discussão é relevante por possibilitar-me tecer

ligações entre os sentidos que as participantes atribuem à concepção de

ensino-aprendizagem, visão de professor e de aluno e os fatores históricos,

como a escolha do ofício de ser professor por cada uma das participantes. Em

função disto, a posição dos sujeitos se altera nos sistemas de atividade.

No sistema de atividade, os sujeitos assumem papéis e

posicionamentos, atribuem novos sentidos às suas práticas e ações nas

interações, provocando um movimento de transformação pessoal e coletivo.

Sofrem essas contínuas transformações discursivas e ideológicas, experiências

passadas, percepções presentes e expectativas futuras, e pelo uso que fazem

dos instrumentos. De fato, um dos desafios dos teóricos neo-vygotskianos é

tentar entender esse movimento constante nos sistemas, provocado pela

relação sujeito e contexto, na qual estão presentes possibilidades e limitações,

que fazem parte do processo de desenvolvimento.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

30

1.1.6. Definindo cultura e contexto

Contexto e cultura são dois conceitos empregados nos trabalhos com

base sociocultural e histórica. Entretanto, conforme discutido por Valsiner

(1998), ainda existem problemas tanto na conceituação, como na forma em

que contexto e cultura são trabalhados teórica e metodologicamente.

A cultura é entendida por Valsiner (1998) como uma organização

sistêmica dos processos semióticos e históricos e de suas diferentes

manifestações. Cole (1995) completa essa definição, acrescentando que a

cultura é a história no presente é a acumulação de experiências sociais da

humanidade. Moll (2000) afirma que a definição mais comum de cultura é

aquela ligada à diferenciação de grupos de pessoas de determinados países, o

que os mexicanos ou os britânicos fazem, por exemplo, com base na história

das sociedades.

No quadro sociocultural, a cultura é compreendida, portanto, como

algo que fornece ao indivíduo os sistemas simbólicos de interpretação da

realidade, um processo de recriação e reinterpretação de informações,

conceitos e significações. Inclui, segundo Ratner (1997), conceitos sociais,

valores, instituições, princípios de comportamento, divisão de trabalho, formas

de controle de poder e distribuição de oportunidades.

Em Vygotsky (1934/1999), cultura e contexto são fundamentais,

principalmente quando considera que as funções psicológicas superiores

originam-se das relações entre indivíduos, em ambientes culturalmente

organizados, tendo como base as operações com os signos. Ele afirma, então,

que os processos de funcionamento mental do homem são fornecidos pela

cultura, através da mediação. A cultura não é pensada por ele como algo

pronto, mas como uma espécie de “palco de negociações” (Rego, 1995:55), no

qual os indivíduos estão em um constante movimento de recriação e

reinterpretação de conceitos e de significados. A relação do indivíduo com o

meio não é uma relação direta, mas mediada pelos instrumentos e signos,

fornecidos pela cultura, como já mencionei anteriormente.

Ao discorrer sobre contexto, Cole (1996) faz uma distinção entre os

dois conceitos, o que circunda e o que entrelaça o indivíduo, com base em

Bronfenbrenner (1979), que discute o desenvolvimento humano na perspectiva

ecológica. Bronfenbrenner concebe o contexto como camadas dispostas em

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

31

círculos concêntricos, sendo o meio composto por diversos contextos sociais e

culturais, como casa, escola e trabalho. A contribuição mais importante do seu

trabalho refere-se ao estudo das relações entre os múltiplos contextos, dos

quais as crianças e suas famílias participam. Cole (1996) expande a discussão

de Bronfenbrenner, enfatizando as conexões ente as camadas do contexto e

acrescentando que essas camadas podem ser transformadas, reformadas e

apagadas, além de interferirem umas nas outras.

A imagem de contexto representada por círculos concêntricos corre o

risco de expressar algo que está contido em, como no exemplo de um grupo de

alunos que é parte de uma sala de aula, que é parte da escola, que, por sua

vez, é parte da sociedade, enfatizando uma idéia unilateral e determinista. Os

círculos concêntricos precisam ser interpretados sob uma terceira dimensão,

tendo múltiplas relações, em movimentos de fora para dentro e de dentro para

fora, de um lado para outro, e assim por diante, para enfatizar a importância

dos fatores históricos e culturais, do uso dos instrumentos, da consciência e do

objeto para a transformação de cada círculo.

Neste texto, a discussão sobre a cultura e contexto possibilitou-me

expandir e tecer as ligações entre as raízes da escolha de um ofício – ser

professor – e as atitudes das participantes nas sessões reflexivas, assim como,

seus posicionamentos como sujeitos e aprendizes em busca do

desenvolvimento profissional. O quadro da pesquisa sociocultural, segundo

Cole (1996), permite-nos juntar mente e ação, indivíduo e grupo, contextos

macro e micro e historicidade, de forma que possamos perceber como os

indivíduos são posicionados no sistema da atividade, quais são as

possibilidades para ação e o que eles podem fazer com elas.

1.1.7. Zona proximal de desenvolvimento e as oportu nidades de

aprendizagem

Nesta seção abordo a questão da zona proximal de desenvolvimento

(ZPD), conceito criado por Vygotsky como uma metáfora, conforme lembra

Steiner (1996), para ajudar a explicar como ocorre a aprendizagem social e

participativa. Para esta pesquisa, que investiga o desenvolvimento de um

trabalho colaborativo entre duas professoras de uma Escola Municipal de

Educação Infantil (EMEI) visando à construção colaborativa e reflexiva de

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

32

sentidos sobre os significados relativos ao trabalho profissional, voltado para a

preparação de atividades com os alunos em contextos que propiciem a

compreensão das ações, inserção de transformações e a construção

colaborativa do conhecimento, a discussão sobre a zona proximal de

desenvolvimento é importante na medida em que permite investigar a

aprendizagem e o desenvolvimento como uma construção social.

Na concepção vygotskiana de zona proximal de desenvolvimento,

aquele que sabe mais ou é considerado o par mais competente, segundo Lee e

Smagorinsky (2000), precisa entender e estar atento em como o outro

compreende a tarefa e quais são os recursos cognitivos que ele traz para a

mesma. A interação entre os pares, daquele que tem mais conhecimento com

aquele que é considerado menos experiente e que, portanto, tem menos

conhecimento sobre determinado assunto, é negociada através da linguagem e

do uso de instrumentos.

Wells (2000) também enfatiza o papel da linguagem como

instrumento de mediação na zona proximal de desenvolvimento. Além de

funcionar como mediadora do conhecimento e experiência dos participantes da

interação, a linguagem é um meio de construir e refletir sobre as ações do

presente, passado e futuro, sobre as pessoas e instrumentos envolvidos e a

relação entre eles.

O conceito de zona proximal de desenvolvimento teve e tem, até

hoje, bastante repercussão na área educacional, tendo sido apropriado por

diferentes vozes, com interpretações diversas, principalmente porque Vygotsky

não teve tempo, devido à sua morte prematura, de desenvolver melhor e

expandir esse conceito. São duas as interpretações que ele dá a esse conceito

em sua obra.

A primeira interpretação pode ser encontrada em “A formação social

da mente” e é caracterizada como a distância entre o nível de desenvolvimento

real que é determinado pelas habilidades na solução de problemas exibidas por

um indivíduo quando ele está só, e o nível de desenvolvimento potencial,

determinado pelas habilidades desse indivíduo quando ele tem a colaboração

de um par ou de pares mais competentes. A partir dessa conceituação

vygotskiana inicial de zona proximal de desenvolvimento, Bruner (1977)

introduziu a noção de andaime (“scaffolding”), referindo-se à assistência do par

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

33

mais desenvolvido para o menos desenvolvido. Cazden (1979, apud Daniels,

2003) expandiu essa noção de andaime, categorizando diferentes tipos de

assistência.

Essa interpretação tem sido amplamente divulgada na escola e

pedagogicamente utilizada como o oferecimento do suporte inicial, o qual será

retirado mais tarde. Também outros autores, como Wood (1976), já tinham

definido a construção de andaime como uma forma de assistência do adulto ou

do par mais experiente que possibilita à criança ou ao novato solucionar um

problema, que estaria longe de seu alcance sem essa assistência, a ênfase

aqui exposta acima, afirmando que a colocação de andaime se concentra mais

na distribuição entre pessoas do que no uso de artefatos. Para ele, a colocação

do andaime implica em simplificar o papel do aprendiz e não da tarefa.

A maneira como essa ajuda é distribuída e conceituada varia de

autor para autor. Engeström e Cole (1997), por exemplo, usam o termo

“distribuição cognitiva” para se referir ao trabalho de colocação de andaime,

ligando-o a uma imagem do ensino que se estende através de outras coisas e

pessoas. O mais importante nessa discussão, porém, é que a zona proximal de

desenvolvimento ligada à colocação de andaimes levanta questões específicas

sobre como a cultura é interiorizada pela mediação dos outros, sobre o grau de

assistência exigido pelo aprendiz, a ajuda oferecida pelo outro, no caso da

aprendizagem escolar, o professor ou o par mais experiente, e o nível de

controle dessa ajuda.

Segundo Wood (1978, apud Daniels, 2003), o nível de controle é

dependente do progresso do aprendiz no entendimento da tarefa e também no

quanto ele necessita ou não da ajuda para prosseguir na execução da mesma.

Day e Cordon (1993) fizeram estudos comparativos entre a instrução com e

sem andaimes e concluíram que os alunos tiveram resultados melhores de

aprendizagem na instrução com andaimes.

Essa versão, entretanto, pode se referir a um processo de mão

única, em que aquele que coloca o andaime também o constrói e o apresenta

ao outro, apontando para uma visão simplista e unilateral da ação do outro,

sem levar em consideração o lugar da aprendizagem no mundo social. Tal

versão tem sido, por esse motivo, essencialmente unidirecional e específica,

alvo de críticas (por exemplo, Magalhães, 1996). A internalização é, nessa

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

34

visão, considerada como uma aquisição individual de conhecimento. A questão

precisa ser examinada com cuidado, levando-se em consideração a ajuda sim,

a qual poderá ser negociada colaborativamente.

A segunda interpretação de zona proximal de desenvolvimento é a

“cultural” e define a zona proximal de desenvolvimento como a distância entre o

conhecimento científico fornecido pela escola e o conhecimento cotidiano do

aluno, afirmando que a junção desses dois conhecimentos produz o

conhecimento verdadeiro. Esta versão é encontrada na última grande obra de

Vygotsky, “Pensamento e Linguagem” (1934/1987), na qual ele estuda o

desenvolvimento dos conceitos científicos na infância.

Essa ligação entre o conhecimento científico e espontâneo é,

também, discutida por Hedegaard (2002) em seus trabalhos, mostrando a

necessidade de o professor combinar os conhecimento e as habilidades que a

criança já traz para a escola, com aquilo que a escola pretende ensinar. Ela

comenta que o bom ensino é aquele que consegue relacionar experiências

com a parte teórica, com a contribuição de todos. A ligação entre os conceitos

espontâneos, que surgem da experiência prática, e os conceitos científicos,

que são ensinados e aprendidos na escola, é vista como ponto crucial do

trabalho na zona proximal de desenvolvimento e é chamado por ela de

movimento duplo do ensinar e do aprender, um movimento do concreto para o

abstrato.

Nessa abordagem, o professor trabalha as atividades considerando

não somente o conhecimento científico, específico de determinada área, mas

também, com o objetivo de poder contar com a participação e engajamento dos

alunos, ele propõe a solução de problemas que são significativos para o

estágio de desenvolvimento em que se encontram os alunos e o contexto

social no qual eles se inserem. Isso, segundo Hedegaard (2002), favorece a

colaboração entre professor e aluno e entre alunos na tentativa de resolver

problemas em uma determinada área do conhecimento.

Schneuwly (1992) também considera a zona proximal de

desenvolvimento como a distância entre o conhecimento científico e o cotidiano

e associa essa zona a uma zona de tensão e conflito, entre esses dois tipos de

conhecimento. Ele propõe uma zona de tensão entre fatores internos

(pessoais) e os fatores externos (situação e condições sócio-culturais). Para

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

35

ele, o ensino cria a zona proximal de desenvolvimento, já que provoca conflito

entre o novo e o que é sabido. Ao tentar solucionar um conflito, o indivíduo tem

a oportunidade de se desenvolver, dando a origem a novas formas de

funcionamento psicológico. O ensino dá novas ferramentas para que o

indivíduo construa as funções psicológicas superiores, além de promover a

fusão dos conceitos cotidianos ou espontâneos com os científicos.

Esses conceitos constituem um sistema de relações e

generalizações contido nas palavras e determinado por um processo histórico-

cultural e construções culturais internalizadas durante o processo de

desenvolvimento. Vygotsky distingue os conceitos cotidianos ou espontâneos,

que são construídos na experiência pessoal, concreta e cotidiana das crianças,

dos conceitos científicos que são adquiridos através do ensino sistemático.

No artigo: “Signifying in the zone of proximal development”, Lee

(2000) aborda e sistematiza os conceitos científicos e espontâneos. Para ele os

conceitos espontâneos, que se desenvolvem na comunidade de prática, são

situacionais, empíricos e práticos. Já os científicos são sistemáticos, relativos

ou generalizáveis, e se distanciam do concreto. As funções mentais

necessárias para a aquisição de conceitos científicos são: atenção deliberada,

memória lógica, abstração, capacidade para comparar e diferenciar e um meio

ambiente desafiador. Lee (2000), em seu estudo sobre “signifying”, gênero oral

de comunicação usado pela comunidade africana nos Estados Unidos, explica

que esse discurso pôde dar suporte aos alunos em uma aula de literatura, na

interpretação de textos literários. Esse discurso foi, então, considerado como

uma ponte que permitiu a ligação entre o conhecimento espontâneo e o

científico na zona proximal de desenvolvimento. Dessa forma, Lee (2000) junta

as duas interpretações de ZPD, andaime e cultural.

Além das duas interpretações acima, de Vytoksky, uma terceira

interpretação, a “coletivista” ou “social” é dada por Engeström (1987), que

define a zona proximal de desenvolvimento como a distância entre as ações

cotidianas dos indivíduos e a forma historicamente nova da atividade social que

pode ser coletivamente gerada. Há uma ênfase nos processos de

transformação social e na natureza conflituosa da prática social,

potencializando a influência do social, principalmente devido ao conflito que é

gerado no grupo. Essa visão está ligada à teoria da atividade, na qual a zona

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

36

proximal de desenvolvimento pode ser compreendida como um espaço de

transformação e reorganização do sistema de atividade.

Essa visão social de zona proximal de desenvolvimento é

compartilhada por Putney et al. (2000), que, entretanto, preferem usar o termo

“oportunidades de aprendizagem’, focalizando no modo como são criadas

essas oportunidades. À medida que o indivíduo interage com o outro, no

contexto escolar, ele adquire o conhecimento e, também, o modo como

aprender. O desenvolvimento não é linear, previsível, mas é cultural, histórico,

dinâmico e interativo, tanto para o indivíduo como para o grupo. A

aprendizagem, segundo eles, é uma construção social, na qual o indivíduo se

forma e ajuda na formação do grupo, em um processo contínuo de interação, o

qual promove sistematização e reorganização para uns e conflito para outros.

O conhecimento é, então, construído, reconstruído e transformado, com base

na sócio-história de cada indivíduo.

Também Lave e Wenger (1991), com seu conceito de “comunidades

de prática”, elaboraram uma definição de zona proximal de desenvolvimento

que se encaixa nessa terceira interpretação. Eles estendem o conceito de

aprendizagem para além do contexto escolar, levando em consideração a

natureza conflituosa da prática social, na relação dos novatos com os mais

experientes. A aprendizagem não é somente um processo de transferência ou

assimilação, mas envolve também transformação.

Neste trabalho, a zona proximal de desenvolvimento pôde ser

entendida, em primeiro lugar, na elaboração da dissertação, como um processo

gerador de conflitos mediado pela ação do outro. Aponto o conflito provocado

pela orientadora, pela banca de qualificação e outros pares de leitores do

trabalho, o conflito provocado pela exposição aos fundamentos teóricos e pela

necessidade de achar as ligações entre o discutido teoricamente e os dados e

as perguntas de pesquisa e, por último, o conflito gerado na elaboração escrita

do trabalho, tendo em mente os leitores críticos.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

37

Em segundo lugar, como zona de construção, pelo trabalho que eu

juntamente com a professora realizávamos para ser desenvolvido com os

alunos durante o ano letivo de 2006. Esse trabalho esteve sempre apoiado na

colaboração e ajuda mútua, não apenas nas sessões que realizávamos

quinzenalmente, mas, também, no cotidiano escolar e nos conflitos que

surgiam durante as aulas.

E, por último, tomo a zona proximal de desenvolvimento como uma

zona de negociação, percebida nas discussões das sessões reflexivas sobre a

visão de professor, de aluno e das concepções de ensino-aprendizagem.

Concluo esta seção enfatizando a importância do conceito de zona

proximal de desenvolvimento para o ensino-aprendizagem-desenvolvimento

das participantes e ressaltando a relevância do mesmo para a reflexão e

mudança do meu ensinar e do ensinar da professora participante e para a nova

forma como passamos a olhar o processo de ensino-aprendizagem de nossos

alunos. Os conceitos teóricos, segundo Davydov (1988 apud Engeström,

1997), promovem a formação de funções metacognitivas de alto nível, como

reflexão, análise e planejamento. E foi, realmente, a partir do acesso a esses

conceitos, que o refletir sobre a sala de aula e sobre o processo de ensino-

aprendizagem pôde propiciar transformações no meu ensinar e no ensinar da

professora participante, fazendo com que nossas salas de aula passassem a

ser um espaço de negociação, como conseqüência das sessões reflexivas.

O quadro a seguir resume as diversas interpretações da zona

proximal de desenvolvimento, organizando os teóricos e suas definições, além

de indicar como esse conceito foi considerado nesta dissertação.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

38

Quadro 2 – Interpretações de ZPD

ZONA PROXIMAL DE DESENVOLVIMENTO NAS DIFERENTES PES QUISAS Andaime Cultural Social Vygotsky Vygotsky Engeström

Distância entre o que o indivíduo faz sozinho e o que será capaz de fazer com suporte de um par mais capaz.

A distância ente o conhecimento científico fornecido pela escola e o conhecimento cotidiano do aluno, afirmando que a junção destes dois conhecimentos produz o conhecimento verdadeiro

A distância ente as ações cotidianas dos indivíduos e a forma historicamente nova da atividade social que pode ser coletivamente gerada.

Wood Hedegaard Putney et al Progresso do aprendiz, entendimento da tarefa e também no quanto ele necessita ou não da ajuda para prosseguir na execução da mesma.

A ligação entre os conceitos espontâneos e os conceitos científicos é vista como o ponto crucial do trabalho na ZPD e é chamado, por ela, de movimento duplo do ensinar e aprender, um movimento do concreto para o abstrato.

Oportunidade de aprendizagem. Aprendizagem como construção social e transformação, com base na sócio-história de cada indivíduo.

Engeström e Cole Schneuwly Lave e Wenger Distribuição cognitiva ou como o sistema de ensino se estende.

A distância entre o conhecimento científico e o cotidiano e associa essa zona a uma zona de tensão e conflito, ente estes dois tipos de conhecimentos.

Comunidades de prática, levando em consideração a natureza conflituosa da prática social, na relação dos novatos com os mais experientes.

Daniels Lee Russell A colocação de andaime se concentra mais na distribuição ente pessoas do que no uso de artefatos, implica em simplificar o papel do aprendiz e não da tarefa

O “signifying”, gênero oral de comunicação usado pela comunidade africana nos Estados Unidos, serviu como um suporte na interpretação de textos literários.

Os sistemas de atividades são dinâmicos e apresentam constantemente oportunidades de aprendizagem e transformação.

Zona Proximal de desenvolvimento nesta dissertação Como o conhecimento espontâneo é trabalhado nas sessões reflexivas, servindo de base para o conhecimento científico.

Como construção: trabalho que eu juntamente com a professora realizava para ser desenvolvidos com os alunos durante o ano letivo de 2006. Trabalho esse que esteve apoiado na colaboração e ajuda mútua, não apenas nas sessões que realizávamos quinzenalmente, mas, também, no cotidiano escolar e nos conflitos que surgiam durante as aulas.

ZPD como zona de conflito e negociação, promovendo oportunidades de aprendizagem. ZPD no sistema de atividade como espaço para movimento e transformação.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

39

Depois de ter trabalhado os conceitos relevantes para o

entendimento dos sistemas de atividade, tais como: constituição do sujeito,

instrumentos de mediação semiótica, sentido e significado, cultura e contexto e

zona proximal de desenvolvimento, passo para a última seção da primeira

parte da fundamentação teórica, referente à discussão sobre a teoria da

atividade, abordando as contradições e conflitos no sistema de atividade.

1.1.8. Contradições e conflitos no sistema de ativi dade

Contradições e conflitos são inevitáveis nos sistemas de atividade.

Eles são como molas propulsoras de movimento e transformação. Por essa

razão, considero importante abordar, nesta seção, a definição de conflito, para

em seguida olhar mais detidamente para ele no sistema de atividade.

A palavra conflito é derivada do latim, “confligere”, que significa bater

ou lutar, degladiar com o outro, dando margem a duas definições. A primeira

afirma que conflito é uma luta, uma batalha que se estabelece entre duas

forças opostas, em razão de crenças e idéias, podendo resultar em um atrito

físico. A segunda definição afirma que essa situação também pode acontecer

psicologicamente, como uma tortura, uma ansiedade, uma incompatibilidade

entre os desejos da própria pessoa. Assim, tendo a palavra uma significação

psicológica e material, o conflito pode ser tanto externo como interno. Há,

portanto, um dualismo na concepção da palavra e o conceito é,

inevitavelmente, produto da atividade humana.

A teoria sobre conflito sofreu a influência das visões mecanicista e

organicista de mundo, ou seja, de como os indivíduos são controlados ou

manipulados pela sociedade, em um movimento de fora para dentro; ou de

como são orientados nas suas ações por eles mesmos, em um movimento de

dentro para fora. Dahrendorf (1959, apud Sellman, 2001) identifica quatro

modelos de conflito:

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

40

• de negociação, com foco nas ações das duas partes que

querem chegar a um acordo;

• cognitivo, com foco na tentativa de uma parte influenciar a

outra;

• modelo de aprendizagem, com foco na interação como

processo de aprendizagem;

• modelo de processos de reação, com foco na descrição da

ação em resposta à última ação.

Mesmo nos modelos acima, ainda é possível verificar a dicotomia

entre interno e o externo, entre o conceitual e o comportamental, ente o

indivíduo e o grupo. Os modelos de conflito que focalizam somente um dos

aspectos apresentam uma visão reducionista de conflito. Por isso, um modelo

mais adequado de conflito deveria compreender tanto a relação do indivíduo

como do grupo ao qual pertence, quanto a influência das forças internas e

externas e, além disso, o histórico do conflito e a sua resolução, para abranger

a origem, o ponto de ruptura e a resolução.

A teoria da atividade, considerando o que foi discutido acima,

consegue compreender e analisar o conflito, já que leva em conta tanto o

indivíduo como a ação coletiva, mediados por instrumentos ou artefatos

culturais, e oferece uma visão de mundo dialética como uma alternativa para a

dicotomia entre as visões mecanicista e a organicista de conflito. As atividades

coletivas são culturalmente mediadas e orientadas por um objeto comum.

Entretanto, como já mencionei, nem todos os sujeitos envolvidos na mesma

atividade compartilham o mesmo objeto, o que ocasiona, na maioria das vezes,

um conflito entre o individual e o coletivo, entre o que é internalizado e o que é

externalizado por cada um dos participantes. Como instrumento de análise, a

teoria da atividade possibilita identificar tanto o conflito, como a fonte geradora

de contradições e tensões que, possivelmente, poderão se transformar em

conflitos, os quais, segundo Sellman (2001), podem ser:

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

41

• burocráticos: na organização vertical da atividade coletiva, ou

seja, na hierarquia que governa uma série de sistemas, como

por exemplo, políticas educacionais, escola, sala de aula,

família;

• de interesses: pessoas com objetos diferentes;

• sistêmicos: organização lateral da atividade coletiva, ou seja, a

relação de um sistema com sistemas vizinhos.

Engeström (1999) refere-se a quatro tipos de contradições que

podem afetar um sistema de atividade. Uma contradição não é um conflito, mas

uma variação ou diferença de práticas e princípios. A contradição pode causar

um conflito, que poderia ser uma discordância, um choque de opiniões e uma

falta de aceitação do outro. As contradições são, assim, canais potenciais que

conduzem ao conflito. Ele as classifica as em:

• contradição interna primária - no sistema de atividade e a

atividade que o produziu. Engeström exemplifica esse tipo de

contradição citando, no contexto médico, a variedade de

remédios. Eles não são apenas drogas que objetivam a cura

das enfermidades, mas também são “commodities” com

preços, fabricadas para um mercado, anunciadas e vendidas

para obter lucro. Os médicos, em geral, enfrentam esse tipo

de contradição no seu dia-a-dia, quando têm que optar por

uma ou outra. Neste trabalho, as contradições primárias são,

principalmente, causadas entre instrumentos, objeto e sujeito.

Por exemplo: a professora participante não consegue, num

primeiro momento, ensinar, sem a utilização da cópia;

• contradição secundária - entre os elementos do sistema de

atividade e algo novo. Como as atividades são sistemas

abertos, a introdução de um novo elemento, como por

exemplo, uma nova tecnologia ou um novo objeto, pode

provocar contradições no sistema. As contradições, por

conseguinte geram conflitos, os quais podem mudar a

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

42

atividade. A contradição secundária no trabalho acontece

quando a professora participante precisa utilizar outros

instrumentos para suas aulas, como o texto, a necessidade de

interagir mais com o grupo/classe;

• contradição terciária - entre as possíveis ações que formam

o objeto coletivo, principalmente entre algo que é proposto e

algo que já é um padrão dominante. Novos procedimentos

podem ser formalmente implementados, mas, provavelmente,

haverá alguma resistência dos participantes que podem insistir

nas práticas antigas. Entre o objeto: o ensino a partir da cópia

desconectada do contexto do grupo/classe, por exemplo.

Também as experiências anteriores de ensino e de

aprendizagem podem ter influência no sistema de atividade da

sessão reflexiva e, conseqüentemente, na sala de aula, e

• contradição quaternária - entre o sistema de atividade e

outros sistemas interligados. No trabalho esse tipo de

contradição pode ser percebido pela forma como um sistema

interfere no outro. O que a professora participante traz de seu

contexto, do sistema de atividade familiar e de sua história de

vida para o sistema de atividade das sessões reflexivas.

Neste trabalho, como já mencionado acima, as contradições são

geradas, principalmente, em razão dos sentidos que construímos sobre visão

de professor, visão de aluno e concepção de ensino-aprendizagem. O que já

sabemos e fazemos, os procedimentos que são parte integrante de nossa

prática, passam do nível da operação, já automatizados, para o nível da ação,

quando passamos a repensá-los. Isso gera uma contradição, que pode ou não

levar ao conflito, dependendo de como o professor encara o novo ou teme a

mudança. São causadas também pelo uso que os sujeitos fazem ou não dos

instrumentos, pelas regras e pela introdução de algo novo, que pode ser tanto

uma regra como um instrumento ou uma nova divisão de trabalho.

Em suma, as contradições são inevitáveis no sistema de atividades,

fazendo com que novos estágios qualitativos e formas de atividades possam

emergir como solução para as contradições do estágio anterior. Isto, na

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

43

realidade, é o que sempre acontece quando algo que, a princípio, era uma

exceção à regra, se transforma, mais tarde, em um fenômeno universal. Assim,

qualquer melhoria, qualquer alteração na forma de trabalhar, por exemplo,

aparece primeiro como um desvio, uma exceção e, na medida em que é aceita

pelos outros participantes do grupo, se transforma em uma norma. São,

portanto, formas que possibilitam o desenvolvimento expansivo da atividade. O

quadro abaixo sistematiza os tipos de conflitos e contradições que podem

ocorrer nos sistemas de atividade e também os que podem acontecer neste

trabalho.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

44

Quadro 3 – Conflitos e contradições nos sistemas de atividade

Conflitos Burocráticos De interesse Sistêmicos

Organização vertical do grupo

Pessoas com objetos diferentes

Organização lateral da atividade coletiva

Conflitos nos sistemas de atividade do trabalho Apesar de existir, formalmente, um espaço para o desenvolvimento profissional na Unidade Educacional (JEI), este não é utilizado para este fim.

As professoras com objetos diferentes dentro do mesmo sistema de atividade. A professora pesquisadora tinha como objeto o desenvolvimento profissional das participantes e a professora participante tinha como objeto reproduzir as atividades realizadas por mim (professora-pesquisadora).

A forma como um sistema interfere no outro. O que a professora participante traz do seu contexto, do sistema de atividade familiar para o sistema de atividade das sessões reflexivas.

Contradições Primárias Secundárias Terciárias Quaternárias

Entre cada elemento do sistema de atividade

Entre os elementos do sistema de atividade e algo novo

Entre as possíveis ações que formam o objeto coletivo, principalmente entre algo que proposto e algo que já é um padrão dominante.

Entre o sistema de atividade e outros sistemas interligados

Contradições nos sistemas de atividade nesta disser tação Entre instrumentos, por exemplo: Instrumento mediação/sala = cópia; Instrumento mediação/sessões reflexivas = discute-se sobre a utilização de textos/ outras estratégias a serem utilizadas com os alunos.

Entre o uso de um instrumento novo e o sujeito, como por exemplo, quando a professora participante precisa utilizar outros instrumentos para suas aulas, como o texto, a necessidade de interagir mais com o grupo/classe e, por vários momentos, em seus relatos sobre sua aulas, acaba utilizando a cópia e, com isso, não interage com o grupo/classe.

Entre o objeto: ensinar os alunos a partir da cópia desconectada do contexto do grupo/classe, por exemplo. Também as experiências anteriores de ensino e de aprendizagem podem ter influência no sistema de atividade da sessão reflexiva e, conseqüentemente, da sala de aula.

O que a professora participante traz de seu contexto, do sistema de atividade familiar e de sua história de vida para o sistema de atividade das sessões reflexivas.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

45

Finalizo a primeira parte da fundamentação teórica enfatizando a

relevância da teoria da atividade para o meu trabalho, primeiro por orientar a

direção da discussão teórica e, segundo, por possibilitar organizar a atividades

de investigação, análise e apresentação dos resultados em torno dos sistemas

de atividade, o que contribuiu para trazer uma nova perspectiva para a

dissertação. Passo, em seguida para a discussão de reflexão.

1.2. Reflexão

Esta seção tem como finalidade discutir o processo reflexivo na

formação do professor, a sessão reflexiva como espaço para formação do

professor crítico e a importância da discussão na formação crítica.

1.2.1. O processo reflexivo na formação de professo res

Frente a todas as mudanças de informação, comportamentais e a

atual crise de valores por que o mundo passa, é com ansiedade e preocupação

que eu e a professora participante buscamos alternativas para nosso trabalho.

Como a linguagem, assumida como mediadora das práticas

discursivas, constitui-se num dos enfoques básicos desta pesquisa, é pelo

diálogo entre mim e a professora, num contexto de reflexão crítica, que

procuramos promover a percepção de nossos problemas no cotidiano escolar

e, tentarmos, juntas, traçar caminhos para solucioná-los. Como bem lembra

Amaral (apud Alarcão, 1996:99), “uma prática reflexiva leva à (re)construção de

saberes, atenua a separação entre teoria e prática e assenta na construção de

uma circularidade em que a teoria ilumina a prática e a prática questiona a

teoria”.

Entretanto, como alerta Libâneo (2000:85), é necessário usar de

cautela quanto à valorização do pensamento e do saber de experiência do

professor sem critérios, pois poderíamos cair num

“populismo pedagógico em que se quer descobrir uma ‘essência’ de

professor, na sua cotidianeidade, na sua experiência, na sua ingenuidade,

insegurança, infelicidade ... sem ajudá-lo a tomar consciência de suas práticas

(muitas delas são inadequadas) e a desenvolver as competências necessárias

para o desempenho profissional. Aí é que se destaca o papel da teoria, não como

direção da prática, mas como apoio à reflexão sobre a prática.”

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

46

Libâneo (2000) defende uma reflexão da prática pelo próprio

professor, na qual ele é ajudado a compreender o seu próprio pensamento e a

refletir de modo crítico sobre a sua prática. Sabendo da importância de os

alunos aprenderem a pensar, serem críticos, resolverem problemas, é preciso

que esses aspectos sejam inicialmente desenvolvidos com os professores. Não

é apenas aprender a pensar, mas um pensar epistêmico (Libâneo, 2000:87),

que alie as capacidade básicas de pensamento com elementos conceituais que

ajudem o indivíduo a entender o momento histórico e reagir a ele.

Para Perrenoud (2002:43), as pessoas refletem espontaneamente

sobre suas práticas, porém, “se esse questionamento não for metódico nem

regular, não vai conduzir necessariamente a tomadas de consciência nem

mudanças”.

Com base em Libâneo (2000) e Perrenoud (2002), podemos dizer

que reflexão é um pensamento determinado, direcionado a uma ação (esteja

ela realizada ou em planejamento, ou mesmo acontecendo) que sofre a análise

do sujeito pensante. Essa análise traz consigo um histórico desse sujeito. Um

histórico formado de suas experiências socioculturais, de suas crenças e

valores subjetivos que influenciam a direção e profundidade dessa reflexão.

Autores como Nóvoa (1997), Placco (2000), Alarcão (1996, 2002),

Magalhães (1994, 1996, 1998) e Marin (2000) defendem a idéia de que os

professores devem ser parceiros na organização de projetos, grupos de

estudos e busca de soluções para as dificuldades do cotidiano escolar. Assim,

os professores tornam-se reflexivos, pois o processo colaborativo entre eles

permite (Magalhães, 1996) uma construção conjunta de discussões críticas

sobre valores, sentidos, teorias de ensino-aprendizagem e questões práticas

encontradas no contexto escolar.

De acordo com Conterás (2002:91), a formação de professores pode

ser fundamentada em três concepções, com base epistemológica: o

especialista técnico, o profissional reflexivo e o intelectual crítico. A concepção

que interessa a esta pesquisa é a da formação do profissional reflexivo crítico,

pois acredito que seja a forma de trabalho que ajuda o professor a abordar as

situações problemáticas da prática, rever seus posicionamentos e situar-se

num contexto histórico.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

47

Dewey foi um dos precursores da discussão sobre a reflexão nas

atividades educativas, fazendo um contraste entre ação reflexiva e ação

rotineira. Para Dewey (1959:14), a reflexão “não é simplesmente uma

seqüência, mas uma conseqüência – uma ordem de tal modo consecutiva que

cada idéia engendra a seguinte como seu efeito natural e, ao mesmo tempo,

apóia-se na antecessora ou a esta se refere”. De acordo com Dewey (1959),

seriam necessárias três atitudes pessoais para desenvolver o processo de

reflexão:

• espírito aberto: desarmar-se de resistência para ouvir os

outros e tentar compreender seus posicionamentos, não como

avaliação, mas como colaboração;

• responsabilidade: ser capaz de ponderar suas ações e

demonstrar sua preocupação em relação às conseqüências

que podem ter tais ações (nos níveis: pessoal, social, político

e ético) e

• empenho: predisposição para romper com situações de rotina

e enfrentar situações de desafio e conflito em suas práticas.

Aliadas a essas três atitudes que permeiam as ações dos

professores envolvidos no processo reflexivo, há outras características de

reflexão percebidas nas atuações dos professores em suas práticas

pedagógicas. Van Manen (1977) indica essas características nos três níveis de

reflexão que estão embasadas nos três tipos de interesses habermasianos. O

quadro abaixo foi organizado com base em Liberali (1998;2000) e Romero

(1998).

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

48

Quadro 4 – Os tipos de Reflexão

Tipos Características Técnica Este tipo de reflexão permite ao educador previsão e controle de eventos,

visando a eficiência e eficácia dos meios para atingir determinados fins. O educador estaria preocupado em alcançar objetivos pré-estabelecidos e decididos por outros, apoiando-se em descobertas através de estudos, seminários, conferências, manuais de livros, palestras com sugestões. Muitas vezes esse tipo de reflexão reprime, impede o brotar da criatividade e o poder de decisão, habilidades tão necessárias aos professores.

Prática Este tipo de reflexão faz o educador partir de uma tentativa de encontrar soluções para a prática na prática. Refere-se aos problemas da ação que não são passíveis de serem resolvidos de forma instrumental. O interesse está no conhecimento que facilita o entendimento com os outros. Com esse tipo de reflexão, o educador relaciona os seus objetivos a alcançar e os problemas da ação ao seu fazer pedagógico, baseando-se no senso-comum.

Crítica Este tipo de reflexão engloba as duas anteriores e valoriza critérios morais que embasam a ação do sujeito. Seus objetivos estariam relacionados à compreensão de suas ações e implicações de ordem ética e moral para si próprio e para seus alunos. O educador ocupa-se das implicações éticas e morais de suas ações e com as implicações nas instituições das quais faz parte. As ações pessoais são analisadas em contextos histórico-sociais mais amplos e seu interesse é buscar uma direção para proporcionar maior autonomia e emancipação aos participantes envolvidos.

Tomando por base Liberali (1994), para quem refletir é um ato

consciente que leva a revisar crítica e racionalmente aquilo que se faz, com o

objetivo de reformular a ação, posso entender que a participação nas sessões

reflexivas possibilita um exercício de autoquestionamento que propicia um

distanciamento das ações para conhecê-las, compreendê-las e reorientá-las.

Mas não apenas refletir para avaliar e se ausentar do compromisso de

transformação. É refletir para repensar em novas atitudes e posicionamentos.

Ao realizar as sessões reflexivas, é importante promover momentos de reflexão

crítica pois, para (Kemmis, 1987), isso implica num processo de auto-avaliação

que coloca os participantes na ação, na história da situação, participando da

atividade social e, acima de tudo, tendo uma determinada postura diante dos

problemas.

1.2.2. Sessão reflexiva como espaço para formação d o professor crítico

Nesta seção apresento a sessão reflexiva como espaço para a

formação e desenvolvimento de professores críticos, que possam interferir

positivamente em sua sala de aula e, por conseguinte, em sua unidade escolar,

sendo a língua considerada como uma força libertadora, tanto em termos

culturais, como profissionais, como pensava Freire (1996).

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

49

Na abordagem sociocultural de ensino-aprendizagem alteram-se os

papéis do professor, do aluno e do conteúdo. Há uma preocupação em trazer

para o espaço de aprendizagem o conhecimento de mundo e o conhecimento

cotidiano, ouvir e levar em consideração o que o outro já sabe e o que pensa

sobre os temas e assuntos a serem explorados, ligando-os àqueles que estão

previstos a serem abordados.

A sessão reflexiva transforma-se, então, em um espaço de

negociação e de construção colaborativa. O conhecimento torna-se significativo

na medida em que é possível relacioná-lo ao contexto e aos aspectos

socioculturais. O coordenador da sessão - a professora-pesquisadora, no caso

deste trabalho -, é parte integrante do grupo, servindo como mediador entre o

conhecimentos cotidiano e o científico, fornecendo instrumentos para que a

participante consiga superar suas dificuldades e consiga se movimentar no

processo de aprendizagem e desenvolvimento. A visão de educação como

transmissão de conhecimento cede espaço para a aprendizagem como uma

produção colaborativa, em que os participantes envolvidos no processo

compartilham múltiplas fontes de informação, incluindo seus conhecimentos

prévios.

Nessa mesma perspectiva, Wells (2000) também defende a idéia de

aprendizagem como um processo construtivo e colaborativo. Faz, entretanto,

uma crítica à forma tradicional como a aprendizagem vem sendo trabalhada

nas escolas, principalmente devido ao currículo extenso que precisa ser

cumprido, aos testes que exigem a memorização dos conteúdos e à falta de

suporte pedagógico das escolas, em geral, para seus professores. As escolas,

segundo ele, ainda enfatizam a transmissão do conhecimento e habilidades,

através da “entrega” que precisam fazer do conteúdo programático de um

currículo desenhado, independentemente das necessidades e aspirações dos

alunos, impedindo a aprendizagem, ao invés de possibilitá-la. Além disso, por

considerar a aprendizagem como um resultado do ensino e como um processo

de transmissão de conhecimentos, eles acabam criando alunos que evitam se

expor ao inesperado, ao não previsível, e que são bem sucedidos, pois

obedecem a regras e se encaixam no modelo do bom aluno. Infelizmente,

podemos transpor esse exemplo para a formação dos professores e por essa

razão que abordo esse assunto.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

50

A educação, conforme comentada acima, constitui um sistema de

atividade, que deixa de promover alguma mudança na sociedade, pelos

problemas apontados. As mudanças acontecem nos sistemas de atividade,

salas de aula, escolas e sociedade, quando os participantes percebem-se

como agentes transformadores, podendo, então, transformar os sistemas dos

quais participam. Para isso, a sessão reflexiva, para este trabalho, precisa ser

um espaço de colaboração, de investigação e de formação de professores

críticos, havendo, então, a necessidade de negociar as atividades que

desafiem os participantes e que sejam, acima de tudo, significativas. Em

síntese, conforme discutido por Wells (2000), a sala de aula/ sessão reflexiva

deve:

• ser uma comunidade colaborativa, na qual os participantes

compartilhem objetivos comuns, sendo a colaboração

determinante para se alcançar este objetivos;

• ter atividades significativas que possam envolver os

participantes e não apenas habilidades isoladas;

• ter atividades que consigam motivar participantes diferentes,

que trazem para este contexto suas histórias e experiências;

• ter um currículo que seja um meio e não um fim, para realizar

atividades que tenham significação pessoal e social.

A preocupação com o transcender tanto a sessão reflexiva como a

sala de aula, para que professores e alunos sejam capazes de interferir

positivamente na construção de uma sociedade mais justa, menos

preconceituosa e que saiba lidar com a diversidade, encaixa-se, portanto,

dentro de um quadro sociocultural de ensino-aprendizagem, o qual pressupõe

um diálogo constante ente os participantes da interação, fazendo com que a

sessões reflexiva sejam um espaço colaborativo e de formação de sujeitos

críticos.

Concluo a seção, enfatizando que as sessões reflexivas

transformaram-se nesse espaço, onde as participantes, através da língua,

aprendem a se colocar, a repensar o seu papel, a ter voz para colocar suas

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

51

posições e pontos de vista, contribuindo para a construção de um espaço mais

democrático e significativo.

A seguir, apresento a discussão como instrumento de mediação

semiótica para a formação do professor crítico.

1.2.3. Discussão e formação crítica

Nesta seção, defino a discussão como forma de ensinar e de

desenvolver o pensamento crítico, e as perguntas como instrumento de

mediação semiótica na formação do profissional crítico, com base em

Brookfield (1987), Freire (1970) e Giroux (1997). Freire (1970), afirma que as

perguntas são importantes na formação da consciência crítica e do

conhecimento verdadeiro. Para ele, o mundo pode e precisa ser mais justo,

mais bonito e mais democrático e a educação é o caminho para a libertação.

Ela pode resgatar a condição humana, atuando contra os efeitos da opressão,

contribuindo para a humanização.

Em sua obra “Pedagogia do Oprimido”, ele argumenta que vale a

pena lutar pela democracia, que a educação crítica é um elemento básico para

a mudança social e que a ideologia política é inseparável de nossa

compreensão do mundo, do poder e da vida moral que aspiramos ter. A sua

grande inspiração, nesta obra, foi a elaboração de uma teoria de mudança

social e compromisso, para que os cidadãos pudessem se tornar sujeitos da

história e agentes críticos de seu próprio destino.

Nessa mesma linha, Brookfield (1987) comenta que, para os sujeitos

desenvolverem o pensamento crítico, é necessário, em primeiro lugar, que haja

um espaço, onde eles se sintam livres para se colocar, para expressar suas

idéias e seus pontos de vista. Cada sujeito traz para este espaço as suas

experiências e suas histórias, que são socialmente construídas e que passam a

fazer parte do mesmo. Portanto, no caso das sessões reflexivas, o

coordenador, precisa encorajar os participantes a falar de suas experiências

que demonstram como foram constituídos, como pensam e agem. Entretanto,

essas experiências precisam ser problematizadas para que possam ser

instrumentos de aprendizagem e desenvolvimento, para que haja um

movimento na zona proximal de desenvolvimento da atividade.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

52

A discussão na sessão reflexiva é, então, uma forma de viabilizar o

processo de desenvolvimento do pensamento crítico, revelando a diversidade

de opiniões sobre assuntos complexos e permitindo que o conhecimento

cotidiano seja parte integrante da sessão reflexiva. A discussão é, assim, um

processo democrático, do qual todos podem participar e se expressar,

argumentar e contra-argumentar, respeitar a opinião do outro, etc. Assim, a

sessão reflexiva pode ser um lugar onde os participantes aprendem a se

colocar, a discutir idéias. Por isso, quando os participantes percebem que suas

opiniões têm valor e são levadas em consideração, não há como prever as

diferentes perspectivas que podem aparecer na sessão reflexiva. Para que isso

aconteça, Giroux (1997) enfatiza ser necessário que o professor/coordenador

da sessão reflexiva:

• esteja consciente de seu papel, fazendo perguntas para dar

prosseguimento ao assunto, parafraseando quando a opinião

não está clara e fazendo a ligação de uma idéia com outra;

• e os participantes prestem atenção no que o outro diz, já que

muitas vezes o professor/coordenador não tem paciência para

ouvir a opinião dos participantes, levando-a em consideração,

por sentir-se ainda como detentor do saber;

• e os participantes tenham humildade para perceber que

sempre aprendemos uns com os outros;

• e os participantes se preocupem com o desenvolvimento de

cada um. A sessão reflexiva/sala de aula colaborativa é

aquela na qual participantes e professor/coordenador se

responsabilizam pela aprendizagem do outro e

• e participantes tenham boa vontade para discutir, trazendo

para a cena evidências, dados, argumentos e contra-

argumentos.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

53

Além do processo democrático, a discussão é crítica, conforme

comentado por Giroux (1997), quando os participantes tomam parte com

mentes abertas e dispõem-se a argumentar e contra-argumentar, quando a voz

é dada a eles, para que possam falar de suas experiências sociais, falar das

diferenças e discutir tópicos que fortaleçam a cidadania. Ser ouvido é ser

respeitado. Quando falamos e não somos ouvidos, sentimos que não temos

voz, que estamos sendo ignorados e desrespeitados.

A educação problematizadora com base nas perguntas, também é

defendida por Freire (1970), que afirma ser esta capaz de levar o aprendiz a

adquirir as habilidades de tomada de decisão necessárias para se tornar um

participante ativo, um agente criticamente consciente na vida da comunidade.

Para ele, o educador democrático é aquele que sabe ouvir os representantes

de minorias, que são basicamente oprimidas. Se não aprendermos como ouvir

essas vozes, não aprenderemos como falar. É preciso saber ouvir as vozes

silenciadas, para procurar formas que poderão propiciar o processo de leitura

do mundo silencioso que está em íntima relação com o mundo dos

participantes. Isso significa que o coordenador da sessão/professor deve estar

imerso na experiência histórica e concreta dos participantes, não de forma

paternalista, para falar por eles, mas para verdadeiramente ouvi-los.

Além de ser um processo crítico e democrático, Brookfield e Preskill

(1999) definem a discussão como um processo que envolve reciprocidade e

movimento, troca e questionamento, colaboração e cooperação, formalidade e

informalidade, e apontam como principais benefícios desse processo:

• ajudar os participantes a ter um entendimento crítico sobre o

tópico e a explorar diversas perspectivas;

• aumentar a consciência e a tolerância para com a

ambigüidade e expor os participantes à diversidade de

opiniões;

• encorajar os participantes a ouvir e demonstrar respeito pela

opinião do outro;

• aumentar a agilidade intelectual e desenvolver a capacidade

de comunicação de idéias e significados;

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

54

• desenvolver a aprendizagem colaborativa e

• ajudar a desenvolver capacidade de síntese.

Para viabilizar, então, a discussão na sessão reflexiva, faz-se

necessário analisar os tipos de perguntas e como elas podem ser instrumentos

de mediação semiótica para a formação de sujeitos críticos. Lucioli (2003)

trabalha em sua dissertação de mestrado com diversos tipos de perguntas que

fazem parte da sala de aula de inglês. Ela cita autores que pesquisam o

assunto: Fernandes (1992), Coracini (1995), Feuerstein (2002) e Marins (2003),

ente outros. Os tipos de perguntas propostos por Brookfield e Preskill incluem

as que pedem mais evidência e informação sobre os fatos, perguntas que

permitem ligar a opinião de um participante com a do outro e as que permitem

colocar-se no lugar do outro.

Já Morales (1998) propõe as perguntas para verificar o progresso

dos participantes, consolidar o que já foi aprendido, diagnosticar problemas de

aprendizagem e também para estimular o pensamento crítico e criativo.

Nesta pesquisa, as perguntas como instrumento de mediação

semiótica objetivam possibilitar:

• a reflexão sobre a visão de professor e aluno e

concepções de ensino-aprendizagem;

• a reflexão sobre experiências e histórias pessoais

que se ligam ao tópico em pauta;

• a percepção de aprendizagem-desenvolvimento;

• desenvolvimento do pensamento crítico.

O quadro abaixo sistematiza os tipos de perguntas discutidos nessa

seção e os que serão investigados nesta dissertação.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

55

Quadro 5 – Tipos de perguntas

Autores Tipos de perguntas Brookfield e Preskill (1999)

- que pedem mais evidência e informação; - que pedem explicação ou esclarecimento - abertas com como e por que; - que possibilitam ligar a opinião de um participante com outro; - hipotéticas que permitem o colocar-se no lugar do outro.

Morales (1998) Perguntas que possibilitem: - verificar o progresso do grupo; - consolidar o que foi aprendido; - diagnosticar problemas do aprendizado; - estimular o pensamento crítico e criativo.

Soares (2007) a ligação do conhecimento cotidiano com o científico; - que possibilitem a reflexão sobre a visão de professor, aluno e concepção de ensino-aprendizagem; - que possibilitem aos participantes trazer suas experiências e histórias para a cena; - que possibilitem aos participantes perceber o que aprenderam; - aos participantes o desenvolvimento do pensamento crítico.

Concluo esta seção retomando Freire (1970), segundo o qual, para

que o professor seja realmente um educador, ele precisa desafiar a liberdade

criativa de seus alunos, para que eles se tornem donos de sua própria história.

Assim, os professores precisam transcender sua tarefa meramente instrutiva e

assumir a postura ética de um educador, que acredita na autonomia, liberdade

e desenvolvimento daqueles que educa. O desafio, segundo ele, é não tentar

salvar este mundo, romantizando-o, mantendo o oprimido como que

acorrentado a essas condições românticas e o educador em sua posição de

servir o oprimido, encarando-o como herói romântico. O que ele propõe é um

profundo respeito pela identidade cultural, pela linguagem, pela capacidade,

cor e gênero do outro. Em suma, que os alunos (as professoras, em nossa

dissertação) possam ter nas salas de aula/sessão reflexiva o espaço onde

aprendam a se constituírem como cidadãos críticos.

Esta seção, que apresentou a discussão como uma forma de

viabilizar a formação do pensamento crítico nas sessões reflexivas, finaliza a

terceira parte da fundamentação teórica, que objetivou discutir a reflexão,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

56

abordando a sessão reflexiva como espaço para a constituição do professor

crítico. Faço, a seguir, a apresentação da base teórica para a análise de dados.

1.3. Pressupostos teóricos para Análise dos Dados

Nesta seção, apresento a base teórica para análise dos dados, da

qual fazem parte a teoria da atividade, com análise descritiva dos sistemas, e a

análise do discurso. A teoria da atividade oferece, para o pesquisador, além da

base para discussão teórica, uma base de análise não reducionista, que

permite compreender os dados, ajudando a estruturá-los, sem, entretanto,

prescrever o que deve ser procurado, indicando a necessidade de levarmos em

consideração a importância do contexto e da historicidade dos elementos da

atividade.

Nessa abordagem, portanto, a atividade não é uma simples ação,

mas uma ação coletiva, culturalmente e historicamente mediada. Segundo

Engeström (1987), os trabalhos que utilizam a teoria da atividade como

sustentação teórica devem orientar a análise para os componentes do sistema

de atividade, o qual é composto pelos seguintes elementos:

• os participantes da atividade;

• os instrumentos de mediação semiótica que são usados no

trabalho;

• as regras que orientam como eles trabalham;

• o objeto para o qual os membros dessa comunidade dirigem

seu trabalho;

• a comunidade de onde vêm os participantes;

• a forma como o trabalho é dividido;

• os resultados esperados dessa atividade.

Assim, neste trabalho, os eventos organizam-se como sistemas de

atividade, no qual são descritos e analisados os elementos, a relação entre

eles, os sistemas que os sujeitos trazem para os sistemas e os conflitos e

movimentos que promovem transformações, uma análise que tem um base

descritiva.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

57

A análise descritiva dos sistemas permite uma melhor compreensão

desses eventos e a busca dos sentidos que os sujeitos expressam sobre as

coisas do mundo, nesse caso específico, os sentidos que eles atribuem às

visões de professor e de aluno e às concepções de ensino-aprendizagem,

análise esta que passa pela subjetividade do próprio pesquisador.

Além da análise dos sistemas, faço, também, neste trabalho, a

discussão dos princípios que regem o sistema de turnos em uma conversação,

as relações horizontais e verticais e a noção de polidez, com base em Kerbrat-

Orecchioni (1996). Analiso, também, os tipos de perguntas que permitem a

reflexão crítica das participantes.

1.3.1. As práticas comunicativas

Para Kerbrat-Orecchioni (1996), todas as práticas comunicativas são

procedimentos ordenados que obedecem a esquemas preestabelecidos

segundo certas regras funcionais. As regras que regem as interações verbais

são de natureza diversa e podem distinguir-se em três grandes categorias, as

quais operam níveis distintos:

a) regras que permitem a gestão da alternância de turnos, ou seja, a

construção dessas unidades formais que são os turnos;

b) regras que intervêm no nível das relações interpessoais. É um

sistema de direitos e deveres que podem ou não ser satisfeitos pelos

interagentes. Quando as regras conversacionais são infringidas, precisam ser

compensadas para que não ocasionem efeitos negativos no andamento da

interação e

c) regras que regem a organização estrutural da interação e se

referem aos princípios de coerência interna. Uma conversação é uma

organização que obedece a regras de encadeamento sintático, semântico e

pragmático.

Neste trabalho serão abordados os dois primeiros itens que servirão

como base para a discussão dos dados.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

58

1.3.2. O sistema de turnos

Para Kerbrat-Orecchioni (1996), o diálogo em uma conversação

pressupõe a presença de minimamente dois interlocutores que falem cada um

de uma vez. Dessa forma, em um primeiro nível de análise, toda interação se

apresenta como uma sucessão de turnos verbais em que os agentes se

sujeitam a um sistema de direitos e deveres em que:

• o locutor (L1) tem o direito de usar a palavra por um certo

tempo, mas também deve passá-la a outro em um dado

momento e

• seu sucessor (L2) precisa deixar L1 falar e também deve

escutá-lo enquanto usa a palavra. Cumpre-lhe, também,

devolver a palavra a quem lhe havia cedido.

Portanto, a atividade dialogal tem por fundamento o princípio da

alternância de turnos, que estabelece que numa conversa a função locutora

deve ser ocupada sucessivamente por diferentes locutores. Acrescente-se que

uma conversação é caracterizada idealmente por um equilíbrio:

• relativo de turnos e

• relativo à focalização do discurso que deve centrar-se em L1 e

L2, lutando contra não somente aquele que monopoliza a

palavra, mas também contra que mantém um discurso

exclusivamente autocentrado.

A atividade dialogal requer que fale uma pessoa de cada vez, por

isso a mudança de turno pode ser feita de várias maneiras. Às vezes ela ocorre

obedecendo a certos papéis institucionais, em que um agente é incumbido

dessa função, como um moderador em um debate ou um presidente de uma

sessão. No entanto, na maioria das vezes, as mudanças de turnos são

acertadas pelos próprios participantes de modo que assim que L1 termine o

seu turno, passe para L2. Isso pode suscitar problemas, como saber o

momento de efetuar a operação de troca de turnos ou estabelecer quem terá a

vez.

Normalmente o final de um turno é assinalado pela estrutura verbal

que manifesta a completude sintático-semântica do enunciado, pelos sinais

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

59

prosódicos que se referem ao abrandamento da fala, pela diminuição da

intensidade da voz e pelos sinais gestuais, que são explicitados pelo olhar fixo

no interlocutor, pelo remate da gesticulação iniciada, a que se segue o

relaxamento da tensão muscular.

Finalmente, quando L1 manifesta o desejo de passar a palavra,

surge o problema de estabelecer a quem ela deverá ser passada, em se

tratando de mais de dois participantes.

O sucessor pode ser escolhido mediante procedimentos verbais, isto

é, indicação explícita contida na conversa, ou não verbais, isto é, orientação do

corpo e direção do olhar de L1. Quando L1 não escolhe seu sucessor, a troca

de turno ocorre por auto-seleção. Nesse caso, pode acontecer superposição de

vozes, quando se apresentam muitos candidatos ao mesmo tempo para ocupar

o turno. Embora ele seja freqüente, não deve ocorrer demasiadamente e

tampouco prolongar-se muito. Logo, deve acontecer uma negociação entre os

manifestantes para que apenas um prevaleça. Essa negociação pode ser

realizada de forma agressiva ou cortês, implícita ou explícita. Ao contrário,

pode ocorrer o caso de nenhum candidato se apresentar para o preenchimento

do turno ocasionando um silêncio mais ou menos prolongado, que também

deve ser evitado, mas que pode acontecer devido ao não entendimento dos

sinais de encerramento de turno de L1 ou pela falta de desejo ou meios de

assegurar a continuidade conversacional requerida pelos sucessores

potenciais.

Além dos silêncios e das superposições, o sistema de troca de turnos

pode também ser passível de interrupções, que consistem na tomada da

palavra por L2 antes que L1 tenha terminado o seu turno. As interrupções são,

normalmente, manifestações de invasão de território e ameaça à face, mas às

vezes são cooperativas e lisonjeiras e podem ser interpretadas diferentemente,

de acordo com a cultura dos interlocutores. Podem também ocorrer em um

momento de pausa interna no turno, que L2 interpreta como pausa final, mas,

na maioria das vezes, provocam superposição vocal.

Outra falha no sistema de turnos é a intromissão que se caracteriza

pela tomada de turno por uma pessoa que não foi eleita como sucessora, ou

mesmo uma pessoa não autorizada a usar a palavra como uma criança ou um

subalterno.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

60

Portanto, a organização dos turnos de fala consiste na aplicação de

certas regras, as quais são pouco coercitivas, visto que as transgressões são

normalmente bem toleradas. No entanto, se as infrações excederem um certo

limite de tolerância, podem provocar efeitos catastróficos para a interação.

1.3.3. As relações interpessoais

Segundo Kerbrat-Orecchioni (1996), as relações interpessoais

referem-se à distância horizontal ou vertical que se instaura entre os

interagentes durante a interação. Discutirei cada uma delas a seguir:

Relação Horizontal – esta dimensão da relação remete ao fato de

que na interação os parceiros podem estar mais ou menos próximos ou, ao

contrário, afastados. Ela depende, ao mesmo tempo, das características

externas e internas da situação de interação, segundo um princípio que é

válido em todas as formas que a relação interpessoal pode assumir.

Toda a relação se desenvolve num quadro específico e implica a

presença de determinadas pessoas dotadas de atributos apropriados e que

mantêm um certo tipo de vínculo afetivo (dados externos). Nesse quadro

ocorrerá um certo número de eventos e será permutado um certo número de

sinais – mentais, paraverbais e não verbais, (dados internos).

Os procedimentos produzidos na interação são determinados, em

grande parte, pelos dados externos, mas as pressões contextuais deixam

espaço para que a interação seja negociável entre os participantes.

A distância e a familiaridade entre os participantes pode se

manifestar por marcadores verbais e não verbais.

Marcadores Não Verbais – a distância (psicossocial) é marcada

inicialmente pelo espaço físico entre os interagentes. Também os gestos

constituem excelentes indicadores do estado da relação, particularmente os

gestos de toque. A postura manifesta o grau de intimidade, seja pela orientação

do corpo, pelo caráter mais ou menos displicente das atitudes, pela duração e

intensidade dos contatos oculares. A intimidade ou a distância também podem

ser manifestadas pelos dados paraverbais, como a intensidade articulatória e o

timbre de voz.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

61

Marcadores Verbais – manifestam a familiaridade e a intimidade, ou

não, entre o locutor e seus interlocutores através dos termos de

endereçamento de que fazem uso. Também os temas que são abordados na

interação estão relacionados com o grau de intimidade entre os interlocutores

(os temas que tratamos com desconhecidos não são os mesmos que tratamos

com amigos).

Portanto, há numerosas maneiras que um locutor pode usar para

explicitar a distância que deseja imprimir na relação. Ele pode se afastar ou se

aproximar fisicamente, elevar ou suavizar a voz, usar vocabulário mais popular

ou mais formal. Nas sociedades ocidentais, as regras que regem os

marcadores da distância ou da intimidade são provavelmente débeis, ou seja,

sua aplicação não é automaticamente determinada pela situação comunicativa.

Convém assinalar que a distância interpessoal geralmente evolui no

transcurso de uma interação no sentido de uma aproximação. Outro aspecto

que vale a pena mencionar é que, contrariamente à relação vertical que

veremos a seguir, a horizontal é por natureza simétrica, isto é, os participantes

revelam a mesma atitude: proximidade ou distância, sendo raro ocorrer

assimetria.

Relação Vertical – esta dimensão da relação entre os interagentes

durante a interação refere-se ao fato de que eles não se acham em pé de

igualdade uns com os outros. Um agente pode se encontrar em uma posição

de poder, dominação, e o outro em posição de dominado. A distância vertical,

diferentemente da horizontal, é assimétrica, o que se reflete no nível de seus

marcadores verbais, por exemplo, pela utilização dos pronomes de tratamento.

Em certos tipos de interações chamadas de inegualitárias, como, por

exemplo, entre adulto e criança, professor e aluno, médico e enfermeiro, etc., a

desigualdade entre os participantes decorre do contexto; repousa sobre fatores

como idade, sexo, status e papel interacional. No entanto, o sistema de

posições não se reduz apenas aos dados contextuais, mas também ao que

fazem os interagentes e ao que se passa ao longo da interação.

Marcadores Não Verbais – a posição entre os participantes é

marcada por diversos fatores, como: aparência física dos participantes, seus

trajes, a disposição dos assentos, a postura imponente ou humilde, o jogo de

olhares.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

62

Marcadores Verbais – a posição hierárquica entre os participantes é

marcada por vários aspectos verbais, tais como a forma de endereçamento

(pronomes de tratamento, emprego de título), os aspectos quantitativos no uso

dos turnos (quem fala mais e por mais tempo), a interrupção ou intromissão

(normalmente característica participantes de posição elevada), a organização

estrutural da interação (abertura ou fechamento das principais unidades

conversacionais caracteriza, também, posição elevada).

Além disso, L1 se coloca em posição elevada em relação a L2

quando executa um ato potencialmente ameaçador para seu território ou para

sua face (ordem, crítica, recriminação). De outro lado, L1 é posto em posição

inferior quando é vítima de tal ato ou ele próprio ocasiona um ato ameaçador a

sua face (confissão, autocrítica), o que analiso a seguir nos aspectos

referentes à polidez.

Polidez – é impossível descrever eficazmente o que se passa nas

trocas comunicativas sem levar em consideração certos princípios da polidez,

na medida em que tais princípios exercem pressões muito fortes sobre os

enunciados.

Segundo o sistema de Brown e Levinson (1987), a noção de polidez

é entendida no seu sentido mais amplo, abrangendo todos os aspectos do

discurso regido por regras e cuja função é preservar o caráter harmonioso da

relação interpessoal. Ela ultrapassa as conhecidas fórmulas contidas nos

manuais do saber viver, que se preocupam basicamente em descrever os

comportamentos à mesa, o uso de vestimentas e a arte da conversação. De

fato, a polidez se aplica aos comportamentos verbais e não verbais, mas

tratarei aqui exclusivamente da polidez lingüística.

Segundo Brown e Levinson, todo o indivíduo possui duas faces, a

saber:

Face Negativa – diz respeito aos territórios do eu (território corporal,

espacial, temporal, bens materiais, segredos);

Face Positiva – diz respeito ao conjunto de imagens valorizantes

que os interlocutores constroem e tentam impor por iniciativa própria na

interação.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

63

Assim, em toda a interação entre dois participantes, há quatro faces

que se confrontam. Ao longo da interação, os locutores são levados a realizar

um certo número de atos, verbais e não verbais, que, muitas vezes, constituem

ameaças potenciais para uma das faces; atos de ameaça à face (FTA).

Nessa perspectiva, os atos de linguagem podem ser classificados em

quatro categorias em relação aos FTA:

a) Atos Ameaçadores para a Face Negativa daquele que os Comete.

É, por exemplo, o caso de oferecimento ou de promessa que alguém propõe

efetuar e que pode, no futuro, lesar seu próprio território;

b) Atos Ameaçadores para a Face Positiva de quem os Comete. É,

por exemplo, o caso de uma confissão, uma desculpa, uma autocrítica e outros

comportamentos autodegradantes;

c) Atos Ameaçadores para a Face Negativa de quem os Sofre. São

violações territoriais de natureza não verbal, como contatos corporais,

agressões visuais, sonoras, olfativas ou de natureza verbal como a ordem,

solicitação, conselho e

d) Atos Ameaçadores para a Face Positiva de quem os Sofre. São

todos aqueles atos capazes de pôr em perigo o narcisismo de outrem, como a

crítica, o insulto, a gozação ou o sarcasmo.

As duas primeiras categorias dizem respeito aos atos auto-

ameaçantes e as duas últimas à polidez como uma atitude do locutor em

relação a seus interlocutores.

Finalizando, a perda da face é uma derrota simbólica que se tenta,

na medida do possível, evitar que ocorra a si mesmo e aos outros, objetivando

a preservação da face.

1.3.4. Perguntas como instrumento de mediação semió tica

Conforme já mancionado anteriormente, as perguntas são

instrumentos que podem possibilitar a formação do pensamento crítico (Giroux,

Freire e Brookfield). Nesta dissertação, elas fazem parte dos procedimentos de

análise, na investigação da sessão reflexiva como espaço de formação de

professores críticos.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

64

Também Kerbrat-Orecchioni (1992) entende as perguntas como

instrumentos mediadores entre os participantes em uma interação. Para ela, as

perguntas permitem o agir sobre o outro, provocando uma reação. A pergunta

é, dessa forma, um ato iniciativo da conversação que exige do interlocutor uma

reação, estabelecendo-se uma relação mútua ente enunciador e interlocutor.

Ao analisar os tipos de perguntas, é importante que seja também

observada a distribuição dos turnos, ou seja, quem toma a iniciativa de

introduzir e de encerrar os temas e com que objetivos. Kerbrat-Orecchioni

refere-se a isso, como já mencionei anteriormente, como análise dos turnos da

fala, os quais marcam a interação verbal. Segundo ela, todas as práticas

comunicativas são procedimentos ordenados, que obedecem a esquemas

preestabelecidos, segundo regras funcionais. Essas regras permitem a

alternância de turnos, a organização da interação e das relações interpessoais.

Para que haja um diálogo, é necessário que os interlocutores

participem da interação em turnos. Assim, toda interação se apresenta como

uma sucessão de turnos de fala, com alternância da tomada da palavra pelos

participantes da interação. A atividade dialógica tem, então, por fundamento

esse princípio da alternância, como já comentado anteriormente. Entretanto,

em uma sessão reflexiva, essa interação é caracterizada, geralmente, pelo

número maior de tomadas de turno pelo pesquisador ou coordenador da

sessão, que tem por objetivos iniciar e expor o tema, organizar a discussão,

propiciar a participação de todos, tentar fazer a ligação do conhecimento

cotidiano com o científico e propiciar a formação do pensamento crítico.

Entretanto, isto não ocorreu dessa forma nesta pesquisa e, eu, como

pesquisadora, tive o número menor de turno e palavras na interação, como

será analisado e discutido no próximo capítulo.

Nesta dissertação, tanto os tipos de pergunta, como quem inicia os

temas, retoma ou introduz outro, serão aspectos a serem abordados na análise

e discussão dos resultados.

No primeiro capítulo apresentei, portanto, os fundamentos teóricos

que dão sustentação a esta dissertação, abordando a teoria da atividade, a

dialogia de Bakhtin, a reflexão e a teoria para a análise e discussão dos dados.

No segundo capítulo apresento os procedimentos metodológicos a serem

adotados na análise dos dados.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

65

Capítulo 2 – METODOLOGIA DE PESQUISA

Apresento, neste capítulo, as questões referentes à metodologia de

pesquisa, dentre elas: a escolha, definição e justificativa da metodologia

adotada; a descrição do contexto em que ela foi realizada; a caracterização dos

sujeitos participantes; os procedimentos de coleta de dados; os procedimentos

de análise dos resultados; os aspectos éticos e as questões de confiabilidade.

2.1. Pesquisa crítica de colaboração

Este trabalho é uma pesquisa crítica de colaboração, conforme

discutida por Magalhães (1998, 2002, 2004) e Liberali (1999, 2002). É crítica

por ser um processo investigativo que objetiva a observação, análise e

transformação de ações, nas sessões reflexivas. Neste contexto, a sessão

reflexiva é considerada como um espaço de formação de sujeitos críticos,

onde, tanto a pesquisadora como a professora participante, poderão colaborar

para abrir novos caminhos, tentando transformar a sala de aula e a escola.

É colaborativa, por pressupor que tanto professora, quanto

pesquisadora, aprendam a ter voz para falar de suas experiências e sobre os

sentidos que imprimem a essas experiências. É colaborativa por objetivar e

propor transformação, por intervir na ação de aula e no próprio

desenvolvimento profissional das participantes. É colaborativa e é crítica, por

possibilitar transformação para a professora e para a pesquisadora. Colaborar,

segundo Magalhães (2004:74), significa agir:

agir no sentido de possibilitar que os agentes participantes tornem

seus processos mentais claros, expliquem, demonstrem, com o objetivo de criar,

para os outros participantes, possibilidades de questionar, expandir, recolocar o

que foi posto em negociação. Implica, assim, conflitos e questionamentos que

propiciem oportunidades de estranhamentos e de compreensão crítica aos

interagentes.

Embora esta pesquisa utilize a teoria da atividade, como base teórica

e como instrumento metodológico e de análise, ela não tem o formato de uma

pesquisa de trabalho desenvolvimental tal como o tipo de pesquisa que vem

sendo utilizado pelos teóricos que trabalham com a teoria da atividade,

conforme já discutido anteriormente, no capítulo 1. O pesquisador deve, então,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

66

formatar a pesquisa dentro de um ciclo expansivo de aprendizagem, o que

implica em uma organização que contempla discussão teórica, coleta de

dados, análise de dados, nova proposta para a ação, implementação e revisão

da ação proposta.

Nessa perspectiva, altera-se a forma de olhar para os dados,

buscando-se organizá-los em sistemas de atividade, os quais permitem

entender a relação entre, de um lado, os elementos, as contradições e os

conflitos e, de outro, a transformação presentes nos mesmos. Além disso, tais

sistemas permitiram que as experiências vivenciadas pela pesquisadora e pela

professora participante tivessem uma outra dimensão, ou seja, fossem

consideradas como sistemas de atividades nos quais estão implicados o uso

que elas fazem dos instrumentos, os sentidos que imprimem às suas ações e

ao ensino-aprendizagem, a maneira como elas se constituem como sujeitos e o

modo como essas posições de sujeito podem ser alteradas.

Dessa forma, a presente pesquisa pode ser considerada como uma

pesquisa crítica de colaboração com base na teoria da atividade. Apresento a

seguir, o contexto e local da pesquisa.

2.2. Contexto e local da pesquisa

Os dados para esta discussão foram coletados por mim, professora-

pesquisadora. A pesquisa que desenvolvo tem como objetivo gerar discussões

entre professoras (professora-pesquisadora e professora de Escola Municipal

de Educação Infantil - EMEI) para a construção colaborativa e reflexiva de

sentidos sobre os significados relativos ao ofício de ser professor de uma

EMEI. Portanto, o foco está na relação da professora-pesquisadora com a

professora de Educação Infantil para a preparação de seu trabalho em

contextos que propiciem compreensão das ações, inserção de transformações

e a construção colaborativa do conhecimento.

Os dados foram coletados entre o final de 2005 e início do ano de

2006 através de Sessões Reflexivas marcadas a partir dos horários de

formação (JEI – Jornada Especial Integral). Essas sessões tiveram duração de

1 hora, sendo gravadas em áudio. Foram realizadas dentro de uma EMEI

situada em um bairro da periferia da cidade de São Paulo, o qual se encontra

em crescente expansão e, por isso, é carente de serviços eficientes de saúde,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

67

habitação e educação. Os alunos da EMEI envolvida pertencem a uma camada

economicamente desfavorecida. Ao lado da EMEI existe um terreno baldio

utilizado como ponto de tráfico e consumo de drogas.

A escola recebe diariamente cerca de 850 crianças de 4 à 6 anos de

idade, distribuídas em três períodos: manhã (7:00 às 11:00 horas),

intermediário (11:10 às 15:10 horas) e vespertino (15:20 às 19:20 horas).

Trabalham na escola 18 professores, um coordenador pedagógico, um diretor,

um assistente de direção, um assistente administrativo, um inspetor de alunos,

8 agentes escolares e 2 vigias. O edifício tem uma disposição retangular das

salas de aula. No andar superior do edifício localizam-se as oito salas de aula e

os oito banheiros, quatro masculinos e quatro femininos. No térreo encontram-

se: secretaria, que inclui a sala da direção e da assistente de direção; a sala

dos professores, que inclui a sala da coordenadora pedagógica; os banheiros

da direção, dos professores e dos agentes escolares, o refeitório e a cozinha.

No exterior da escola existe um parque de areia com pedras e brinquedos de

concreto e madeira. A escola serve uma refeição por período, sendo um lanche

nos períodos da manhã e vespertino e um almoço no período intermediário. Os

salários dos professores da Rede Pública de Ensino oscilam em torno de R$

1.100,00 por mês, sendo que nesta Unidade Educacional treze dos dezoito

professores trabalham em dois turnos. Dos treze professores que exercem

dupla jornada, sete lecionam em outras escolas próximas, enquanto os

restantes (seis professores) trabalham os dois períodos na mesma escola.

Essa jornada excessiva acarreta cansaço e lhes deixa pouco tempo para

investir na formação contínua.

2.3. Participantes

Faço a seguir a apresentação das participantes da pesquisa com um

sucinto biodata de ambas.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

68

2.3.1. Professora – Pesquisadora

A professora-pesquisadora é formada em Pedagogia pela

Universidade Presbiteriana Mackenzie, na qual também fez sua especialização

na mesma área. Vem atuando há dois anos na área de educação infantil na

Rede Municipal de Ensino da Prefeitura de São Paulo, atendendo a crianças de

cinco a seis anos, no período vespertino.

Anteriormente, em 1999, havia iniciado um trabalho no Programa

“Andrezinho Cidadão”, na cidade de Santo André. Esse Programa tinha como

objetivo atender crianças e adolescentes de/na rua, com foco em seu retorno

ao núcleo familiar ou às casas-abrigo. Nesse mesmo período, através da Força

Sindical, lecionou informática em vários sindicatos de São Paulo, Santo André

e São Bernardo. Conjuntamente com a informática, esse trabalho tinha por

objetivo desenvolver a cidadania a partir de discussões sobre esse tema. Com

base no registro dessas discussões foi confeccionada uma revista contendo o

resultado dos trabalho desenvolvidos durante o curso.

Posteriormente, no período de 2000 a 2003, atuou no SENAC/SP, na

coordenação de dois grupos de alunos no Programa “Educação para o

Trabalho”, que atendia adolescentes economicamente desfavorecidos na faixa

etária de quinze a dezoito anos.

No ano de 2005 a professora-pesquisadora ingressou no Mestrado

de Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem na PUC-SP, tendo a

oportunidade de começar a participar de discussões sobre questões teórico-

práticas consideradas fundamentais para o ofício docente. Sentindo

necessidade de compartilhar essa experiência acadêmica e os

questionamentos por ela suscitados com sua companheira de trabalho, tomou

a iniciativa de pedir autorização à direção e à coordenação da Unidade

Educacional para organizar e desenvolver um estudo com a professora Júlia.

Inicialmente, ambas se dedicaram a discussões sobre os sentidos atribuídos ao

ofício de ser professor e as dificuldades a ele inerentes. Essa discussão

conduziu naturalmente à leitura de teóricos e especialistas sobre o assunto e,

no ano seguinte, à organização de um plano de curso para o trabalho com a

leitura e a escrita.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

69

2.3.2. Professora - Participante

A professora-participante Júlia é casada há dezoito anos, tem três

filhos (um menino de onze anos, uma menina de seis e outra de um ano de

idade). Fez curso de Magistério em uma escola estadual, lecionou durante sete

anos e, há seis anos atrás formou-se em Pedagogia pela Faculdade

Mozarteum. Iniciou sua carreira na Prefeitura Municipal de São Paulo em

janeiro de 2003. Neste ano, lecionou para o 3º estágio (crianças de 6 à 7 anos

de idade) e, nos últimos dois anos, assumiu o 2º estágio, iniciando parceria

com a professora-pesquisadora.

As participantes trabalham juntas desde 2004 nas atividades no

parque, nas datas comemorativas e na realização da JEI (Jornada Especial

Integral), discutem informalmente questões sobre educação e sobre a situação

da escola onde estão lotadas, procurando sempre melhorar o atendimento aos

pais e aos alunos. Antes da proposta deste estudo, as participantes nunca

haviam discutido questões mais sistematizadas sobre a educação infantil e a

prática em sala de aula.

2.4. Procedimentos de Coleta de Dados

Os dados foram coletados na própria Unidade Escolar onde as

participantes lecionam, no período de outubro de 2005 a fevereiro de 2006 e,

no período de férias, ocorreram na casa da professora. O dados das Sessões

Reflexivas foram coletados através de gravações em áudio. A professora foi

consultada sobre a possibilidade de ser parceira de uma pesquisa acadêmica e

ficou animada em participar da mesma.

2.4.1. SESSÕES REFLEXIVAS

Sessão – 03/11/2005

Esta sessão aconteceu no dia 03/11 na escola onde trabalham as

participantes, no refeitório dos professores. Os participantes estavam dispostos

numa mesa redonda um ao lado do outro, havendo na interação um bom

contato visual e físico.

Nesta sessão, a professora-pesquisadora procurou não interferir na

fala da professora, para que esta pudesse se sentir mais confiante e

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

70

confortável para falar sobre suas ansiedades e angústias em relação à sua

própria profissão e formação. O objetivo dessa sessão foi proporcionar à

professora a oportunidade de levantar os sentidos atribuídos ao ofício de ser

professor e, na medida do possível, relacionar a teoria a ser estudada (sócio-

interacionismo) à sua prática.

Sessão – 23/11/2005

Esta segunda sessão ocorreu com o intuito de continuar a discussão

precedente, objetivando mudar, acrescentar ou esclarecer questões da sessão

realizada em 23/11.

A discussão foi organizada em torno de algumas lacunas deixadas

na sessão anterior, cuja transcrição estava à disposição das participantes. Vale

a pena ressaltar que, nesta sessão a professora Júlia estava bastante ansiosa

em conseguir alternativas para seu trabalho com o grupo de alunos pois, o ano

letivo estava terminando e algumas crianças iriam para o Ensino Fundamental

por determinação da Lei Federal. Ocorreram mais intervenções por parte da

professora-pesquisadora. As participantes terminaram a sessão com o

propósito de trabalhar com a leitura, escrita e organização abstrata de

pequenos textos. Ao final da jornada de trabalho, realizaram o fechamento da

sessão com o feedback das atividades desenvolvidas pela professora Júlia.

Esta avaliou o trabalho positivamente, percebendo a facilidade e interesse dos

alunos por esta nova atividade e condução do trabalho.

Sessão – 13/12/2005

Esta sessão ocorreu também na escola. As participantes discutiram a

atividade “boi da cara preta”, tendo a professora Júlia descrito como trabalhou

com a mesma com os alunos em sala de aula. Junto com as crianças, a

professora cantou a canção, depois explicou o que era canção de ninar e, em

seguida, iniciou a atividade de leitura propriamente dita do texto. Relatou como

os alunos realizaram as atividades de interpretação do texto e avaliou

positivamente o trabalho a partir de textos, pois, a classe permaneceu mais

atenta e interessada.

Iniciou um planejamento para o trabalho em 2006 com crianças do 3º

Estágio e, nesse processo, descreveu a mudança de postura que sentiu ao

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

71

modificar o instrumento de seu trabalho: de letras e sílabas para trabalhar com

textos e interpretação.

Sessão – 03/01/2006

As participantes realizaram esta sessão na cozinha casa da

professora Júlia. Estavam envolvidas por um clima muito amigável e um

entusiasmo grandioso, a ponto de não conseguirem se organizar direito, pois,

as duas queriam falar o que haviam pensado! Iniciaram a sessão discutindo os

textos “Aquisição da linguagem escrita”, “As relações entre pensamento e

linguagem” e a “Interação entre aprendizado e o desenvolvimento: ZDP”, do

livro da Teresa Cristina Rego, previamente lidos.

Discutiram sobre a forma mecânica de leitura e a importância de o

aluno atribuir significado ao que está lendo/escrevendo e, atrelado a isso, o

sentido da cópia nas atividades propostas para os alunos.

Sessão – 16/01/2006

Esta sessão foi realizada também na residência da professora. O

entusiasmo era tanto que, tiveram que priorizar o que iriam realizar: a

discussão dos textos ou das atividades elaboradas. Priorizaram a discussão

das atividades e iniciaram com a atividade “diário da Clara”. Assinalaram a

relevância do texto descritivo e da importância da autobiografia de Clara, pois

no início do ano as crianças estão se conhecendo, conhecendo a escola, seus

funcionários, a professora, o entorno da escola e, através dessa atividade,

poderiam estabelecer maior contato com elas e suas famílias através de

pesquisa enviada para casa com a participação dos pais e/ou responsáveis.

Nessa atividade, perceberam que ofereceriam maiores possibilidades às

crianças de falarem, interagirem e, principalmente, de se sentirem

protagonistas de seu próprio processo de ensino-aprendizagem.

As professoras conseguiam perceber a diferença de seus trabalhos

anteriores com o que estavam elaborando para o início de ano (2006),

identificavam nas atividades elaboradas os conceitos discutidos através dos

textos da Teresa Cristina Rego e a sua importância no processo de ensino-

aprendizagem das crianças.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

72

Sessão – 25/01/2006

A professora Júlia iniciou a sessão, explicando a atividade que

elaborou “meu nome é Luceli”, salientou a importância da atividade por se

tratar de um texto descritivo, em que Luceli relata e descreve onde mora, do

que gosta, do que tem medo, ela fala sobre a escola, sua idade, nome,

animais. A professora Júlia descreveu todo o procedimento de trabalho com

essa atividade – leitura, escrita, construção de textos, palavras – a

possibilidade em resgatar brincadeiras de roda, o trabalho com numerais,

higiene, entre outros.

Aqui é importante relatar a valorização que a professora atribuiu à

participação e à opinião do aluno e, principalmente, ao trabalho coletivo.

Sessão – 09/02/2006

A professora-pesquisadora iniciou a sessão propondo a leitura e

discussão dos textos “O papel da construção do conhecimento” e “O papel do

professor mediador na dinâmica das relações interpessoais” do livro da Teresa

Cristina Rego, para discutirem o problema do ensino-aprendizagem.

Perceberam através dos textos lidos que a proposta que estavam construindo

para o ano de 2006 atrelava-se à concepção sócio-interacionista, e que essa

mudança não seria fácil na prática, porém, possível. Discutiram a importância

da heterogeneidade e da oportunidade que os alunos terão de trabalhar e

conviver com todos os outros alunos sem que isso fosse avaliado como

indisciplina mas sim, como aprendizado. Finalizaram a discussão planejando

outras atividades, pontos importantes a serem desenvolvidos.

Sessão – 24/02/2006

As participantes realizaram a avaliação do trabalho. A professora

Júlia salientou a mudança de sua postura e que, de fato, sentia necessidade de

mudança, porém, não sabia como e de quê maneira iniciar esse processo de

transformação.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

73

2.5. Procedimentos de análise de dados

Esta seção objetiva apresentar os procedimentos utilizados para

análise dos dados, dentre eles: análise do discurso com o levantamento dos

conteúdos temáticos, das escolhas lexicais, das modalizações, além das

perguntas como instrumentos de mediação semiótica.

O objetivo dessa pesquisa é desenvolver um trabalho colaborativo

entre esta professora-pesquisadora e uma professora de uma Escola Municipal

de Educação Infantil (EMEI), tendo em vista a construção colaborativa e

reflexiva de sentidos sobre os significados relativos ao ofício de ser professor

de uma EMEI, para a organização de espaços colaborativos de reflexão, e,

para isto, faz-se necessário conhecer os sentidos que as professoras têm

sobre seu trabalho; quais são as regras e a divisão de trabalho que organiza a

atividade de formação profissional e, por fim, como se constitui essa atividade

entre as professoras. A análise organiza-se, então, em torno de temas

relacionados à pergunta de pesquisa:

Como a linguagem organiza a formação colaborativa d o professor? Foram analisadas oito sessões reflexivas. O quadro abaixo

apresenta e relaciona os procedimentos de coleta, os temas e os

procedimentos de análise.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

74

Quadro 6 – Quadro de análise

Procedimentos de

Coleta

Temas Procedimentos de

Análise

Sessões Reflexivas Sentidos iniciais e finais

das professoras sobre

seu trabalho.

Análise do discurso:

conteúdo temático,

modalizações e escolhas

lexicais.

Sessões Reflexivas Regras e divisão do

trabalho que organiza

essa atividade e sua

transformação no

andamento do trabalho.

Análise do discurso:

conteúdo temático,

polidez, análise de

turnos e tipo de

perguntas.

Sessões Reflexivas Constituição da atividade

de formação profissional

de duas professoras.

Análise do discurso:

conteúdo temático,

modalizações e escolhas

lexicais.

A seção seguinte demonstra como é feita a análise descritiva dos

sistemas de atividade, apresentando e descrevendo o seu funcionamento nas

sessões reflexivas.

2.5.1. Análise descritiva dos sistemas de atividade

A análise descritiva dos sistemas de atividade objetiva observar e

descrever os elementos desses sistemas, as relações que se estabelecem

entre eles e as ações que deles fazem parte, ações essas mediadas pelo

discurso.

Conforme já discutido no capítulo 1, que discute a base teórica de

análise de dados, os trabalhos que utilizam a teoria da atividade como

sustentação teórica, ferramenta metodológica e de análise, devem orientar a

análise para os componentes do sistema de atividade, o qual é composto pelos

seguintes elementos:

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

75

- os participantes da atividade;

- os instrumentos de mediação semiótica que são usados no

trabalho;

- as regras que orientam como os participantes trabalham;

- o objeto para o qual os membros da comunidade dirigem seu

trabalho;

- a comunidade de onde vêm os participantes;

- a forma como o trabalho é dividido;

- os resultados esperados desta atividade;

- as possíveis contradições e conflitos presentes no sistema.

Dessa forma, neste trabalho, no qual investigo o desenvolvimento

de um trabalho colaborativo entre duas professoras de uma Escola Municipal

de Educação Infantil (EMEI) que visa à construção colaborativa e reflexiva de

sentidos sobre os significados relativos ao trabalho profissional voltado para a

preparação do trabalho com os alunos em contextos que propiciem a

compreensão das ações, inserção de transformações e a construção

colaborativa do conhecimento; os eventos organizam-se como sistemas de

atividade. A figura abaixo representa o sistema de atividade da sessão

reflexiva, o qual é analisado descritivamente, em seguida.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

76

Figura 6 – Sessões Reflexivas

Neste sistema, que representa a atividade de formação na sessão

reflexiva, os sujeitos são as professoras.

Dessa forma, o objeto de atividade da pesquisadora é a formação e

o desenvolvimento profissional do professor crítico que faz uso da língua como

instrumento de comunicação semiótica para aprender a ser e formar cidadãos

críticos que possam interferir positivamente na sociedade, possibilitando a

mudança nas atitudes.

Para a professora participante o objeto da atividade de aprender e

desenvolver também é um objeto em transformação, sendo que, ela percebe

com as ações nas sessões reflexivas a importância da interação, do papel do

outro no processo de ensino-aprendizagem-desenvolvimento e o uso da língua

para aprender e ensinar a ser crítica e cidadã, fazendo com que sua voz e a

dos alunos sejam ouvidas.

Os instrumentos que utilizo nas sessões reflexivas são os

procedimentos de perguntas, os textos pedagógicos, o planejamento de

atividades para os alunos e as transcrições das sessões reflexivas.

A comunidade a qual pertencem a professora-pesquisadora e a

professora-participante inclui a escola, na qual ambas trabalham há dois anos,

espaço importante para a construção de sua identidade de professoras de

Instrumentos de mediação: textos, tarefas, transcrição, sessão reflexiva

Sujeito: professora pesquisadora e professora participante

Regras: normas e padrões que regulam a sessão reflexiva, como por exemplo, anotações, elaboração de atividades para os alunos.

Comunidade: escola, direção, universidade.

Divisão de trabalho: o que faço como pesquisadora e o papel da professora participante nas sessões reflexivas

Objeto: desenvolvimento das professoras participantes

Resultado: Profº com alto nível de conscientização sobre seu papel social; Aprendizagem do aluno; Transformação da escola

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

77

Educação Infantil. A universidade, na qual a professora-pesquisadora faz seu

mestrado, é igualmente parte da comunidade, pois, a possibilitou fazer uso de

outros instrumentos como o suporte teórico para a sua prática, enfatizando aqui

o conhecimento sobre a formação de professores críticos e reflexivos, a teoria

sociocultural e a teoria da atividade.

As regras, por sua vez, referem-se às normas que professora

participante e pesquisadora seguem nas sessões reflexivas como, por

exemplo, o seu planejamento, a elaboração de suas tarefas, a forma como

participam nessas sessões e o que nelas utilizam ou podem utilizar. A divisão

de trabalho, nesse caso, refere-se aos papéis, o papel da pesquisadora que

prepara as sessões reflexivas, seu material, dá instruções, promove interação,

bem como e o papel da professora participante, que através de seu

engajamento, formula perguntas, responde aos questionamentos, interage,

elabora atividades, realiza a leitura de textos e trabalha em parceria.

A próxima seção trata da análise do discurso, outro procedimento

de análise.

2.5.2. Análise do Discurso

Para o procedimento “análise do discurso” são utilizadas as

seguintes ferramentas discursivas: levantamento dos conteúdos temáticos com

as escolhas lexicais e as modalizações. Além disto, analiso o tipo de pergunta

que são feitas nas sessões reflexivas, considerando-as como instrumentos de

mediação semiótica para a formação e desenvolvimento de profissionais

críticos. A análise do tipo de pergunta inclui também a distribuição dos turnos,

ou seja, quem toma a iniciativa de introduzir e de encerrar os temas e com que

objetivos.

O quadro abaixo relaciona os temas com as ferramentas discursivas

que serão usadas na análise do discurso.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

78

Quadro 7 – Quadro de Análise do Discurso

Temas Procedimentos de Análise

Sentidos iniciais e finais das

professoras sobre seu trabalho.

Levantamento dos conteúdos

temáticos, modalizações e escolhas

lexicais.

Regras e divisão do trabalho que

organiza essa atividade e sua

transformação no andamento do

trabalho.

Levantamento dos conteúdos

temáticos, polidez, análise de turnos e

tipo de perguntas.

Constituição da atividade de formação

profissional de duas professoras.

Levantamento dos conteúdos

temáticos, modalizações e escolhas

lexicais.

Esta seção tratou da apresentação dos procedimentos de análise

de dados e a próxima discute os aspectos éticos da pesquisa.

2.6. Aspectos Éticos na Pesquisa

Esta seção objetiva apresentar alguns procedimentos que

garantiram o respeito e a observância de aspectos éticos da pesquisa da área

educacional e social. Dentre eles, destaco:

• carta de consentimento que foi assinada pela professora, dando

permissão para que os dados coletados fossem utilizados pela

pesquisadora;

• a informação dada à professora de que a sessão reflexiva estava

sendo gravada, possibilitando-lhe a escuta de algumas sessões.

As transcrições de algumas sessões também foram lidas pela

mesma;

• a Unidade Escolar, onde os dados foram coletados, foi

comunicada, oficialmente, sobre o projeto, seus objetivos e

procedimentos de coleta de dados.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

79

A pesquisa não objetivou apenas a investigação sobre o processo de

formação de professores, mas buscou colaborar, de alguma forma, com a

melhoria das relações sociais, pois através do diálogo entre as participantes,

foram sendo criados espaços para que todos pensassem sobre sua atuação

em sala de aula e, coletiva e colaborativamente, construíssem de forma

reflexiva os sentidos sobre os significados relativos ao ofício de ser professor

de uma EMEI. A seção seguinte apresenta as questões de confiabilidade.

2.7. Questões de Confiabilidade

Nesta seção, apresento os procedimentos que garantem a

veracidade e a confiabilidade da pesquisa, que neste trabalho foram os

seguintes:

• os dados gerados estão guardados em fitas e em arquivos de

word, com as devidas transcrições que estão igualmente

anexadas no final deste trabalho;

• as apresentações do trabalho em congressos e seminários, ao

longo de todo o período de mestrado;

• o exame de qualificação, prestado em 09/10/2006, no Programa

de Pós-graduandos em Lingüística Aplicada e Estudos da

Linguagem – LAEL/PUC – SP. Nesse exame foi apresentada

grande parte do trabalho de análise, quando importantes críticas

e sugestões redirecionaram parte do mesmo, o que representou

um momento especial de discussão e reflexão sobre os conceitos

construídos, no sentido de garantir ainda mais o rigor necessário

para nossas conclusões.

Neste capítulo foram apresentadas as questões referentes à

metodologia, como o tipo de pesquisa, os procedimentos de coleta e de análise

de dados, os aspectos éticos e de confiabilidade. O capítulo seguinte refere-se

à discussão dos resultados da pesquisa..

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

80

Capítulo 3 – DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Este capítulo objetiva apresentar e discutir os resultados da

pesquisa, interpretando-os à luz dos fundamentos teóricos que dão

sustentação à esta dissertação, com base nos quais pretendeu-se responder à

pergunta de pesquisa:

Como a linguagem organiza a formação colaborativa d o

professor?

O capítulo divide-se em três partes, referindo-se aos três temas

abaixo, relacionados à pergunta de pesquisa:

• Sentidos revelados pelas professoras sobre seu tra balho;

• Regras e divisão de trabalho que organizam a ativi dade de

formação e sua transformação no andamento da

pesquisa;

• As sessões reflexivas como espaço de formação de

professores críticos.

Na próxima seção discutem-se os resultados da pesquisa que respondem à

pergunta acima citada.

3.1. Sentidos revelados pelas professoras sobre seu trabalho

Esta seção objetiva apresentar e discutir os sentidos iniciais,

intermediários e finais das professoras sobre os papéis de professor, de aluno

e de ensino-aprendizagem, a partir das sessões reflexivas.

Para iniciar esta discussão, saliento que um professor não é somente

um profissional técnico que transmite conhecimentos produzidos por outros, um

sujeito determinado por mecanismos sociais, mas um agente que assume sua

prática a partir dos sentidos que atribui a seu papel com base em sentidos

sobre ensinar-aprender, que possui conhecimentos e um saber-fazer

provenientes do contexto sócio-histórico-cultural de sua atividade, com base no

qual organiza regras e divisão de trabalho na sala de aula. Portanto, o

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

81

professor, consciente ou não, organiza sua prática com base em sua vivência,

sua história de vida, sua afetividade e seus valores. Seus saberes estão

enraizados em sua história de vida e em sua experiência do ofício de professor.

Assim, os sentidos atribuídos a seu papel não são somente representações

cognitivas, mas possuem também dimensões afetivas, normativas e

existenciais. Tais sentidos agem, muitas vezes, como crenças e certezas

pessoais a partir das quais o professor filtra e organiza sua prática. Esse

processo liga-se à constituição do sujeito, que conforme discutido por Vygotsky

(1982/1999), Smolka (2004) e González Rey (2004), é resultado de

experiências históricas, sociais e culturais que nos são transmitidas pelas

gerações anteriores. Os sentidos que atribuímos à escola e ao papel do

professor são inseparáveis da nossa própria constituição como sujeitos e de

nossas experiências históricas e culturais, como apontado, no exemplo abaixo:

... É! (risos), é!, porque, então você vê, é aquela questão: como eu

aprendi assim , tipo, tipo decoreba mesmo, como eu decorei tudo, então pra

mim foi fácil!, decorei! Então, eu fico tentando imaginar eles assim também ,

dando aquela decorada para depois eles irem aprendendo , né? (Sessão

Reflexiva 23/11/2005)

A citação acima permite observar os sentidos que a professora Júlia

construiu do ofício de ser professor (transmissor de conhecimentos). Ela

expressa o que pensa sobre como os alunos devem aprender (decorando os

conhecimentos transmitidos pelo professor) e, conseqüentemente, sobre sua

concepção de ensino-aprendizagem (concepção tradicional de ensino).

Assim como se viu nesse exemplo, os dados revelaram sentidos

construídos ao longo da caminhada profissional das professoras. Optei por

organizá-los a partir das sessões reflexivas, considerando-os em três

momentos: as sessões reflexivas iniciais que se caracterizaram por narrativas

de experiências pessoais e profissionais; as sessões reflexivas intermediárias,

caracterizadas por interações a partir de leituras teóricas e relação teoria-

prática e as sessões reflexivas finais, caracterizadas por planejamentos e

discussões de tarefas com base nos estudos realizados.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

82

3.1.1. Sessões reflexivas iniciais

Esta sessão revela os sentidos iniciais produzidos pela professora

participante sobre sua compreensão dos papéis do professor e dos alunos nas

práticas de sala de aula e do ensino-aprendizagem, tal como foi se revelando

nas conversas sobre as práticas didáticas e nas discussões de textos teóricos

em sua relação com essas práticas. A professora traz, então, para a sessão

reflexiva, os sentidos que construiu ao longo de sua vida, com suas

experiências anteriores de aprendizagem, sobre o papel do aluno

(decorar/depósito) e do professor (transmissor de conhecimentos).

Várias citações mostram que, nesse início de trabalho uma

concepção de ensino tradicional embasava o trabalho da professora Júlia,

como por exemplo, a grande valorização dada à cópia. É importante observar

que, como descrito na contextualização de Júlia, a cópia fez parte de sua vida

escolar:

...Então, eu vou te falar, não, não, não é fácil, viu! Apesar que, ééé,

como eu gosto do ensino fundamental, eu sou agitada, então, ‘Vamos

gente!Vamos! Vamos! Já fizeram?’ (risos), então, eles pegaram aquele ritmo

de fazerem, eu estou dando a lição, eles já estão m e entregando , né? Então

quer dizer, eles fazem rápido, ééé, então as crianças copiam , a maioria, copia

bem , mas entender que é que tá! Não são todos que compreendem (...) então

copiar eles copiam muito bem, o entendimento ..., sabe aquela, eu tenho ainda

comigo na cabeça, ééé, a quantidade, então eu vou dando , eu quero dar é o

alfabeto! (Sessão Reflexiva 03/11/2005)

Considera-se aqui uma abordagem do processo ensino-

aprendizagem que se fundamenta numa prática educativa e na sua

transmissão através dos anos de escolarização. O ensino, nessa concepção,

está centrado no professor , portanto, volta-se para o que é externo ao aluno:

o conteúdo (“(...) a quantidade, então eu vou dando (...)”). O aluno apenas

executa prescrições que lhe são fixadas (“(...) eu vou dando a lição, eles já

estão me entregando (...)”), portanto, é considerado como inserido num mundo

que irá conhecer através das informações que lhe serão fornecidas e que se

decidiu serem as mais importantes e úteis para ele. É um receptor passivo até

que, repleto de informações necessárias, pode repeti-las a outros que ainda

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

83

não a possuam (“(...) como eu decorei tudo (...) imaginar eles assim também,

dando aquela decorada para depois eles irem aprendendo, né?”). Para a

professora, o papel do aluno é acumular e armazenar informações. Quando a

professora diz “(...) eu quero dar é o alfabeto!”, ela sublinha, ainda mais a

concepção de educação como um produto, já que os modelos a serem

alcançados estão pré-estabelecidos: decorar o alfabeto, daí a ausência de

ênfase no processo. Trata-se, pois, da transmissão de idéias selecionadas e

organizadas logicamente pela professora.

Nesse quadro, a reprodução dos conteúdos feita pelo aluno, na

maioria das vezes, de forma automática e sem variações, é considerada como

um poderoso e suficiente indicador de que o produto está assegurado

(“(...)então, as crianças copiam, a maioria, copia bem (...)”).

Sua didática se resume em “dar lição”, (“(...) eu estou dando a lição,

eles já estão me entregando (...)”). Percebe-se aqui, a utilização freqüente, pela

professora, do método expositivo, como forma de transmissão de conteúdo,

concebendo assim, o magistério como a arte centrada na figura da professora,

como aponta, também, o recorte abaixo:

...Então, ser professor é o ensinar mesmo né, não só o ensinar a

ler e a escrever, é o ensinar praticamente tudo! Por que as nossas crianças do

jeito que elas vem pra cá, elas vem sem saber muitas coisas ...” (Sessão

Reflexiva 03/11/2005)

Aqui pode-se notar que o trabalho intelectual do aluno será

propriamente iniciado, propriamente, após a exposição da professora. A escola

é vista, a partir do recorte acima, como local da apropriação do conhecimento,

por meio da transmissão de conteúdos e confrontação com modelos e

demonstrações. A ênfase, portanto, não é colocada no aluno, mas na atuação

da professora (que precisa ensinar praticamente tudo), para que a aquisição do

patrimônio cultural seja garantida. O aluno nada mais é do que um ser passivo,

um receptáculo de conhecimentos escolhidos e elaborados por outros para que

ele deles se aproprie (Freire, 1970).

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

84

Entretanto, no decorrer do trabalho de formação, Júlia começa a

questionar sua atuação. Não apenas questiona, mas descreve a situação de

sala de aula e toma a decisão de não mudar, como, por exemplo, na sessão

reflexiva de 03/11/2005:

...Então quer dizer, o problema está comigo? (...) Sabe, fica aquela

questão, com esta sala (...) não dá, não dá! Com esta sala e u não consigo!

Então, sou eu que não consigo levar esta sala? De repente, de repente, eu

não consegui levar esta sala!?! Então, é complicado! (...), vou me desgastar

tanto, vou gritar tanto que vou ficar sem voz! Então, acho que, às vezes, não

vale a pena! Então, eu prefiro dar a lição no caderno mesmo , pelo menos eu

vou dar, eles vão fazer, faz uma atrás da outra , vai fazendo, fazendo, fazendo

sabe? (Sessão Reflexiva 03/11/2005)

As contradições, que ocorrem no sistema de atividade, provocaram

um movimento, criando um ciclo expansivo de aprendizagem (Engeström,

1999), que é uma contínua construção e resolução de tensões e contradições

que envolvem o objeto, instrumento de mediação e os sentidos construídos

pelos sujeitos envolvidos. A professora, ao falar sobre a possibilidade de

trabalho com seu grupo/classe, pôde expressar sentidos (com esta sala não

consigo trabalhar) e, apesar de se questionar, ela se justifica e, transfere para

os alunos a responsabilidade pela indisciplina quando afirma: “(...) vou me

desgastar tanto, vou gritar tanto que vou ficar sem voz!(...)”. Surgem, aqui, as

desculpas no que se refere ao atendimento dos alunos quando se precisa

individualizar, pois o restante do grupo/classe fica isolado quando se atende a

um dos alunos particularmente. É difícil para a professora identificar as

necessidades dos alunos, uma vez que usualmente quem fala é ela própria.

Dessa forma, há a tendência a se tratar a todos igualmente, todos deverão

seguir o mesmo ritmo de trabalho, repetir as mesmas coisas, adquirir, pois, os

mesmos conhecimentos (“(...) Não vale a pena! Então, eu prefiro dar a lição no

caderno mesmo,(...), eles vão fazer, faz uma atrás da outra(...)”). Assim, o

problema passa a ser a indisciplina dos alunos, e não a concepção de ensino-

aprendizagem revelada pela metodologia/ didática usada pela professora.

Portanto, ao invés de fazer as crianças se responsabilizarem sobre a ação,

Júlia quer transmitir conhecimentos e o modo como as crianças devem realizar

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

85

tal tarefa. Isso ocorre porque ela entende o processo de ensino-aprendizagem

a partir de uma concepção tradicional, de que ela deve transmitir o

conhecimento sem a participação e colaboração dos alunos.

Júlia percebeu sua limitação por não conseguir interagir com os

alunos, chamar sua atenção e, conseqüentemente, poder ensinar-lhes algo.

Chama atenção, no discurso de Júlia, o número de negativas que ela

emprega nesse curto recorte da sessão reflexiva, o que revela o quão difícil foi

a aceitação de seu papel enquanto professora, o quanto o seu discurso é

impeditivo e como ela percebeu toda a limitação no ambiente e nos alunos.

... com esta sala não dá, não dá ...

... com esta sala eu não consigo!...

... sou eu que não consigo levar esta sala?...

... não vale a pena!...

Júlia fala de suas dificuldades na sala de aula, causadas pela falta de

atenção e indisciplina dos alunos. Seu discurso indica mágoa com as crianças

que não mantém a disciplina.

A presença da modalização apreciativa (“... às vezes, não vale a

pena!...”) reforça o discutido acima e indica a avaliação de Júlia sobre o que

acontece em suas aulas.

De fato, muitos professores têm dificuldades de refletir sobre a sua

prática, o que possibilitaria transformar a sua ação, em função das

necessidades de seus alunos, conforme discutido por Magalhães (2002) e

outros formadores de professores. Os professores, em geral, transformam-se

em meros aplicadores de técnicas, sem levar em consideração o contexto e as

experiências de seus alunos.

No início do trabalho de pesquisa, a professora Júlia subestimava a

capacidade dos alunos em aprender sem a utilização da cópia como

instrumento de ensino-aprendizagem:

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

86

...É, vamos ver se a minha sala consegue, né? ”

“Ah, porque eles não se prendem muito aaa, não se prendem muito

a nada . É aquela meia dúzia que se interessa e muitos ficam dispersos,

conversando, brincando, né? (Sessão Reflexiva 23/11/2005)

Mais uma vez, os excertos revelam que a professora entende o

ensino-aprendizagem como instrumento-para-resultado que, segundo Newman

e Holzmam (1993:51), marxistas de todas as tendências reconhecem que o

uso do instrumento tem impacto sobre as categorias de cognição.

Instrumentos-para-resultados tanto são análogos a (bem como produtores de)

equipamentos cognitivos quanto os produz (por exemplo, conceitos, idéias,

crenças, atitudes, emoções, intenções, pensamento e linguagem) que são

completos e utilizáveis para um fim particular. Portanto, Júlia cria uma zona de

desenvolvimento para resultado e não uma zona revolucionária que, segundo

os mesmos autores (1993:55), tem por objetivo a transformação de totalidades.

Assim, pude concluir que a professora não visualiza a ZDP como instrumento-

e-resultado.

3.1.2. Sessões reflexivas intermediárias

Conforme estudávamos, discutíamos e elaborávamos as atividades e

as realizávamos em sala de aula com os alunos, o sentido da professora sobre

o papel de aluno, a interação e o papel do professor foi gradualmente sofrendo

alterações, porém, com muita resistência, principalmente em relação aos

aspectos relacionados à cópia.

...Achei excelente porque, eu passei mais tempo trabalhando com

eles e, percebi que eles ficaram mais entusiasmados . Trabalhamos com

música, com palavras fáceis, no caso BOI que é fácil, com cópia (...) eu acho que

essa atividade foi ótima (Sessão Reflexiva 13/12/2005)

O entusiasmo da professora demonstrado com a presença da

modalização apreciativa (“Achei excelente ...”), com as novas descobertas em

sala de aula, fica evidenciado pelos comentários, marcados pelas escolhas

lexicais, no recorte acima como: “(...) passei mais tempo trabalhando com eles

(...)”, “(...) eles ficaram mais entusiasmados (...)”. Isso demonstra a construção

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

87

de um novo sentido para o ensino-aprendizagem dos alunos: eles são capazes

de se envolver com as atividades propostas e aprender. Aparece aqui o

movimento do objeto/ do sistema de atividade, a professora inicia a tomada de

uma nova ação, porém, sua prática continua atrelada à cópia. O trabalho

docente pode ser abordado e analisado neste momento das sessões reflexivas

em função da experiência da professora (Vygotsky, 1982/1999), quer dizer, do

trabalho e do modo como é vivenciado e recebe significado por ele e para ele.

Aqui, a experiência prática pode ser vista como um processo de aprendizagem

espontânea que permite à professora adquirir certezas quanto ao modo de

controlar fatos e situações do trabalho, atribuindo-lhes sentidos como o que se

observa em relação à cópia. Essas certezas correspondem a crenças e hábitos

cuja permanência vem da repetição de situações e de fatos. Podemos observar

isto, no excerto já comentado da sessão reflexiva de 23/11/2005, em que a

professora afirma que aprendeu por meio da repetição/ memorização e acredita

que seus alunos poderão aprender da mesma forma. Assim, sua prática se

pauta em métodos que privilegiam a repetição e memorização, por mais que

nesse momento (sessão reflexiva de 13/12/2005) ela demonstre acreditar na

capacidade dos alunos e no papel das ações mediadas por ela. Essa

característica pode ser observada também, no excerto abaixo:

...Então, eu acho que assim, é o texto assim rodado pra eles fica

bom, fica mais organizado e a criança se prende mais , porque, eles não estão

só copiando da lousa porque, no caso, se torna cansativo, eles copiam

muitas vezes e não gravam né . Aqui, eles não precisam estar copiando todo o

texto, é mais fácil, acho que eles gravam melhor a letra (...) então percebi que

eles ficam mais centrados na lição e como têm várias folhas é, posso estar

ficando mais tempo com eles, dando maior atenção para cada mesa (Sessão

Reflexiva 13/12/2005)

Aqui já existe a percepção da professora de que existiu um

planejamento para as ações desenvolvidas em sala de aula e isso se reflete no

comportamento dos alunos, “(...) mais centrados(...)” e na própria interação

estabelecida entre a professora e os alunos, “(...) posso estar ficando mais

tempo com eles, dando maior atenção para cada mesa.”.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

88

As sessões reflexivas são, então um sistema de atividade, cujo

objeto está se transformando (Engeström, 1999), à medida que os sujeitos

agem e interagem, usando o discurso como instrumento de mediação

semiótica. Este espaço pode colaborar na transformação de identidades,

conforme discutido por Moita Lopes (2002), e pode propiciar a constituição de

um novo professor, mais seguro de seu potencial, que pode repensar o seu

papel de cidadão e a sua ação na sociedade.

Aos poucos, Júlia passou a estabelecer relações entre os textos

pedagógicos que estudávamos com sua prática, conforme observação do

trecho da sessão reflexiva de 03/01/2006:

... No texto quando ela fala assim: ‘... enfatiza-se de tal forma a

mecânica de ler e que está escrito que se acaba obscurecendo a linguagem escrita

como tal’, assim, no caso, isso é o que acabo fazendo, quando dou a f amília ,

por exemplo, a família do B BA BE BI BO BU, no caderno eles assim,

mecanicamente eles estão copiando mais isso não significa que foi gravado, eles

não raciocinam assim, pra ter a compreensão de que aquilo é o B (Sessão

Reflexiva 03/01/2006)

Júlia começa a atribuir sentido ao planejamento, à importância da

interação e, conseqüentemente, percebe o aumento de interesse dos alunos.

Eee, da gente estar trabalhando mais tempo, eu fico mais tempo

conversando com eles, e é o que propicia os alunos estarem se organizando

mais , e organizando mesmo, mentalmente o que está se passando quando a

gente lê o texto e quando trabalhamos item por item, né, todo mundo junto , não

como eu fazia, que eu passava caderno por caderno, uma letra qualquer (...). e

aqueles, também, que estavam copiando, realmente, eles estavam apenas

copiando, aquilo não estava sendo gravado, aprendido, não tinha significado (...).

(Sessão Reflexiva 03/01/2006)

No trecho acima, a professora deixa claro que os alunos tiveram a

oportunidade de discutir o tema, expressar suas idéias. Isso confirma a

importância de trazer, para a sala de aula, experiências dos alunos,

informações e histórias, que precisam ligar-se ao texto trabalhado, para dar

vida e significado a ele. Portanto, Júlia começa a possibilitar que outras vozes

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

89

se coloquem durante a aula (Bakhtim/Voloshinov, 1929/1995). Entretanto,

essas experiências precisam ser problematizadas para que possam ser

instrumentos de aprendizagem, para que haja um movimento na zona de

desenvolvimento proximal (ZDP).

É, esmiuçar o texto, né? Então, a gente, o professor, tem que estar

junto com eles, com os alunos, ééé, então, ta entra ndo e atuando na ZDP , né?

(...) Então, o professor tem que estar atuando diretamente, senão, não tem como

eles estarem aprendendo, além do que corre-se o risco de eu cair no mesmo

problema do ano passado, cópia, cópia, cópia sem sentido para o aluno e, não

proporcionar aprendizagem de fato, como pressupõe Vygotsky. (Sessão Reflexiva

16/01/2006)

A professora percebe que a concepção de Vygotsky sobre as

relações entre desenvolvimento e aprendizado, e particularmente sobre a ZDP,

estabelece forte ligação entre o processo de desenvolvimento e a relação do

aluno com seu ambiente sócio-cultural e com sua situação de sujeito que não

se desenvolve plenamente sem o suporte do outro. É na ZDP que sua

interferência enquanto professora, juntamente com a de outros, é mais

transformadora. A implicação dessa concepção vygotskiana para o ensino

escolar é imediata. Se o aprendizado impulsiona o desenvolvimento, então a

escola, na figura do professor, tem um papel essencial na construção do ser

psicológico do aluno. A professora começa a perceber que tem o papel

explícito de interferir na ZDP dos alunos, provocando avanços que não

ocorreriam espontaneamente.

3.1.3. Sessões reflexivas finais

O recorte abaixo parece indicar que a professora considera o dar voz

aos alunos como importante para o ensino-aprendizagem e como uma

possibilidade de formar alunos críticos. Nota-se que, neste momento da

pesquisa (sessão reflexiva 09/02/2006), há uma preocupação de introduzir as

atividades, escutando, em primeiro lugar, a opinião dos alunos. A professora

expressa também outro sentido para ZDP, que se liga à visão cultural de ZDP,

definida como a distância entre o conhecimento científico fornecido pela escola

e o conhecimento cotidiano do aluno. É a ligação dos dois que produz o

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

90

conhecimento verdadeiro, conforme discutido por Vygotsky (1934/1987). Júlia

começa a entender que essa ligação entre os conhecimentos espontâneos,

que surgem da experiência prática, e os conceitos científicos, que são

ensinados e aprendidos na escola, é vista, por Vygotsky, como ponto crucial do

trabalho de ZDP.

Então, é, através dos textos tem mais a ver com, com esse texto aqui

“o papel do outro na constituição do conhecimento”, ele tem mais a ver com que a

gente está trabalhando, com texto, que vai, realmente estar fazendo este pa pel

de mediador e, isso era o que não acontecia antes, que era só uma cópia, uma

coisa jogada , então, a gente não estava assim, ééé, praticamente não estava

assim, ouvindo mesmo o aluno, a gente não sabia o q ue o aluno já sabia, a

gente não estabelecia aquela troca . Agora, com os textos, eu acho que fica mais

fácil pra gente trabalhar, a gente vai estar sempre em contato com eles, a gente vai

estar o tempo todo, através das questões (...) (Sessão Reflexiva 09/02/2006)

Saber escutar o aluno não significa concordar com sua leitura de

mundo e se acomodar. Respeitar e escutar sua opinião é, antes de tudo,

procurar ser simpático a ela. É a maneira com a qual o professor com o aluno e

não sobre ele, tenta a superação de uma maneira ingênua por uma outra mais

crítica de se colocar e entender o mundo que o cerca. No fundo, o professor

que respeita e escuta seu aluno, reconhece a história real do saber, o caráter

histórico do processo de ensino-aprendizagem, assumindo, dessa forma, a

humildade crítica própria de seu papel mediador.

Na penúltima sessão reflexiva (09/02/2006), a professora já tem

consciência do seu papel e da transformação ocorrida:

... através desses textos, a gente vai, igual ao que você falou,

redefinir nossa função , né, porque não tem como estar chegando na classe/na

criança se a gente não mudar nosso papel, né? (...) Eu tinha aquela

preocupação da sala muito heterogênea, não conseguia trabalhar né, mais agora,

vejo que o importante é que ela seja mesmo assim, heterogênea, porque através

da diferença que a gente vai conseguindo que uma criança ajude a outra, eles vão

ter a oportunidade de trabalhar com todos da sala, (...). Então, através dessa

minha transformação e mudança de atitude, de postur a comecei a perceber

também que muitas vezes, quando as crianças estavam conversando que,

normalmente, a gente não deixa eles abrirem a boca, que através dessas

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

91

conversas eles estão se conhecendo, descobrindo várias coisas juntos e, o

mais importante que aprendi, é que a gente também p ode estar aprendendo,

conhecendo eles (alunos) e descobrindo com cada um deles, dos alunos (...)

(Sessão Reflexiva 09/02/2006)

O excerto acima, sessão reflexiva 09/02/2006, indica também a

importância da interação no processo de aprendizagem e o papel do outro

(Vygotsky, 1934/1987). Isto parece evidenciar o sentido que Júlia atribui à

interação, à aprendizagem e ao trabalho na ZDP, ao outro, o par mais

competente para mediar a ação na ZDP. Nesse excerto a visão de ZDP da

professora parece ser a visão reducionista que privilegia a participação e o

nível de ajuda daquele que “sabe o conteúdo”, considerando-o, sempre, como

o par mais competente. Realmente, a princípio, essa pode ter sido sua visão do

papel daquele que “sabe mais” como o par mais desenvolvido. Entretanto, logo

a professora pôde perceber que no trabalho na ZDP ocorrem inúmeras outras

formas, muitas vezes não previsíveis, levando-se em consideração o que cada

um traz para o processo de aprendizagem.

Ao enfatizar a importância do outro no processo de aprendizagem, o

que pode ser percebido no excerto acima, é que a professora expressa outros

sentidos construídos sobre a ZDP, como uma zona de construção, onde alunos

aprendem com os outros, assim como ela, também, participa desse processo,

construindo novos conhecimentos (“(...) eles estão se conhecendo,

descobrindo várias coisas juntos e, o mais importante que aprendi, é que a

gente também pode estar aprendendo, conhecendo eles (alunos) e

descobrindo com cada um deles, dos alunos (...)”). Isso é fundamental e esse

processo contínuo de interação promove sistematização, reorganização de

conhecimentos para uns e a construção de novo conhecimento para outros,

conforme discutido por Lee e Smagorinsky (2000) e apontado no capítulo 1. O

papel do outro na aprendizagem é fundamental, não na visão unilateral,

somente do mais competente para o menos competente, mas como algo

recíproco, uma relação dinâmica, que conforme já mencionado, promove uma

contínua construção e reorganização do conhecimento.

A interação, nesse caso, conforme exemplificado no excerto acima, é

fundamental e permite que um aluno ajude o outro a compreender a tarefa, a

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

92

organizar e a trazer para a cena aquilo que sabe ou que ainda não percebeu

que sabe, sendo a linguagem o instrumento de mediação semiótica que

viabiliza esse processo. Isso possibilita troca, ampliação e organização de

vocabulário para que os alunos possam ter mais opções para expressarem

suas opiniões sobre si mesmos e sobre os outros. Esse trabalho pode ser

entendido como um movimento na ZDP, como discutido por Steiner (1996), Lee

e Smagorinsky (2000), Putney et al (2000) que consideram a aprendizagem

como social e participativa.

Isso me remete à discussão sobre a formação cidadã (Gentili, 2001),

que não se limita a direitos e deveres, mas à possibilidade de transformar a

sala de aula em um espaço, no qual os alunos possam questionar e refletir

sobre a forma de agir e como isso interfere no comportamento do outro (o que

também ocorre nas sessões reflexivas).

A discussão em sala de aula e nas sessões reflexivas (Giroux, 1997;

Freire, 1970; Brookfield e Preskill, 1999) permite o desenvolvimento do

pensamento crítico, principalmente quando os participantes têm a oportunidade

de expressar suas opiniões sobre assuntos complexos, o que envolve regras

de participação como o saber ouvir, tomar o turno, concordar ou discordar,

completar o pensamento do outro. Cabe ao professor ou coordenador da

sessão sistematizar essas regras, fazendo com que os participantes percebam

que aquele espaço é um microcosmo onde eles podem ensaiar a participação

efetiva na comunidade.

Isso liga-se à discussão de Hedegaard (2002) sobre o bom ensino,

aquele que consegue combinar conhecimentos e habilidades que o aluno traz

para a escola, com aquilo que a escola pretende ensinar, ou seja, há uma

relação das experiências com a parte teórica, para a qual todos podem

contribuir.

Finalizo essa seção, com um quadro que sintetiza os sentidos da

professora, tanto os que atribuía e os desconstruiu, como aos novos que

construiu sobre os papéis de professor, aluno e concepção de ensino-

aprendizagem.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

93

Quadro 8 - Sentidos iniciais, intermediários e fina is da

professora

Sentidos

Temas Iniciais Intermediários Finais

Papel de Professor

Professor é visto como transmissor do conhecimento.

Valorização da mediação (ZDP) e interação.

Importância do papel mediador do professor.

Papel de Aluno Alunos repetidores; Decoram e copiam o conteúdo transmitido; Alunos desinteressados, bagunceiros.

Os alunos aprendem melhor quando interagem com o outro (professor/aluno).

Interação gera desenvolvimento; Os alunos são capazes de aprenderem sem cópia.

Concepção de ensino-

aprendizagem

Concepção tradicional de ensino, pautado na transmissão do conhecimento e na valorização da cópia.

Valorização: - do planejamento; - das atividades significativas para os alunos; - do trabalho com diferentes tipos de textos.

Valorização da construção significativa do conhecimento.

3.2. Regras e divisão de trabalho

Nesta seção, discuto as regras e a divisão de trabalho que

organizaram a atividade de formação nas sessões reflexivas e seu papel na

transformação dos sentidos sobre ensinar e aprender na EMEI.

Para discutir as ações da professora e as minhas nas oito sessões

reflexivas, essa seção foi organizada em três momentos, conforme

semelhanças e diferenças nas ações das participantes e, dessa forma, as

regras que dirigiram o trabalho de formação. As sessões diferiam quantos aos

seus objetivos e isso contribuiu para que fossem mudadas as regras e a

divisão de trabalho.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

94

3.2.1. Sessões iniciais – 03/11/2005 e 23/11/2005

Este primeiro momento (03/11/2005 e 23/11/2005) teve como

objetivo proporcionar à professora a oportunidade de analisar os sentidos

atribuídos ao ofício de ser professor de uma EMEI.

Durante as sessões, procurei não interferir na fala da professora,

para que ela pudesse se sentir mais confiante e confortável ao se expressar

sobre suas ansiedades e angústias em relação à sua formação e profissão.

Isso pode ser visto no excerto abaixo, no qual a professora discorre sobre sua

formação, como resposta a nossa conversa, anterior à gravação em áudio, de

que para a pesquisa seria importante conhecer como se deu a sua formação

profissional:

...Então, porque foi assim. Não foi assim, eeuuu optei em fazer ooo

magistério. Né? Foi uma coisa praticamente imposta, né? Porque na época era o

que tinha à tarde, não tinha mais o ensino médio na escola à tarde, e, então foi o

que sobrou, porque não podia estudar à noite, sobrou o magistério. Então, foi

assim né? Pratica... imposto. Aí, eu comecei. Mais assim, não era o que eu

pensava, não era o que eu queria, né? A minha formação no magistério, aí eu fui

me adaptando né? Também não era aquela coisa “Eu não quero!”, eu vou me

adaptando. Aí, eu fui me adaptando, e a professora era muito tradicional, né?

Então, a gente, sabe, a gente, a gente viu no caso, Piaget muito, muito o pouco

que estava no livro, foi aquilo. Ela nunca entrou em detalhe e nada, porque o que

ela passava para a gente, era você fazer aquela pastiiinha, sabe?, fazer os

“exercíciozinhos” de motricidade, coordenação, sabe, era o que ela dava. E ela era

bem nova na época, ela tinha 26 anos, ela era bem nova, né. EEE, o Vygotsky, a

gente nunca nem ouviu faalaarr, só na faculdade, sabe. Então, foi um negócio que

passou em brancas nuvens. Então, quando eu me formei mesmo, você não, a

gente não tinha aquela base, não posso falar nem em base, mas a gente tinha

aquela pasta, né? EEE, a gente não fazia estágio, nosso estágio o que era? Você

dar flooor para a criança, você dar lanche para a criança, porque não tinha

funcionário na escola, sabe, então foi uma formação assim, né? Não foi formação.

Então, eu só fui pegar os alunos e ter contato, quando eu entrei mesmo na, no

Estado. Aí, comecei como estagiária, então como estagiária, eu ia e pegava a sala

quando o professor faltava e, dava aquela continuação do, continuação não, não

era nem continuação, ooo, muitas vezes o professor passava alguma coisa para

você dar dando, outras vezes você olhava o que tinha no caderno e ia passando, e

era de primeira à quarta série, né? (Sessão Reflexiva 03/11/2005)

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

95

Como coordenadora das sessões, essa postura de não intervir em

seus primeiros momentos mostra que meu principal objetivo era criar um

espaço colaborativo para a avaliação dos sentidos e uma posterior discussão.

Isso se caracteriza como uma constituição de ZDP de instrumento-para-

resultado (Newman e Holzman, 1993), pois não ocorre intervenção de minha

parte. Minhas ações estão pautadas em uma fundamentação teórico-

metodológica voltada ao desenvolvimento profissional apoiado em teorias

críticas e em discussões vygotskianas de relação dialética entre a

aprendizagem e desenvolvimento (Newman e Holzman, 1993). Isto é, a

transformação do professor (desenvolvimento) é conseguida pela reflexão

crítica dos sentidos, pela compreensão dos significados epistemológicos,

políticos e éticos das ações e dos relacionamentos entre discussões e a prática

teórica em ações de sala de aula. Assim, a construção do novo conhecimento e

o escapar da alienação (Leontiev, 1978) são dependentes desse processo

reflexivo crítico (Gitlin, 2005).

Nesta primeira sessão, participo pouco (com 28 “turnos” e 476

palavras) demonstrando atenção, curiosidade e empatia em relação às

histórias de vida e profissional da professora. Utilizo meus turnos para dar boas

vindas, explicar o trabalho de pesquisa que será realizado e intervir com

pequenos comentários e perguntas. Apesar de ter poucos turnos, todos os

temas dessa sessão foram introduzidos por mim. Outro fator determinante para

esta minha postura foi o cuidado para não perder o sujeito de pesquisa. Como

dito anteriormente, quis proporcionar um espaço de colaboração e confiança

em que ela pudesse se sentir à vontade, sem se sentir julgada ou

desvalorizada.

Essas interpretações me permitem entender que a regra que

organizou os papéis nessa sessão propiciou uma clara divisão de papéis:

professora-pesquisadora pergunta e entende a professora Júlia, que, por sua

vez, fala e é entendida pela professora-pesquisadora. Embora Júlia relatasse

sua experiência, exemplificando este relato, não houve questionamentos que

pudessem criar conflitos, a fim de que a construção de conhecimento se desse

com o novo em contato com o velho, o externo com o interno. Não houve

colaboração nem no questionamento das colocações da professora nem na

construção de significados.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

96

A segunda sessão reflexiva (23/11/2005) apresenta poucas

novidades em relação à anterior. O objetivo desse segundo momento foi

retomar e continuar a discussão precedente, proporcionar reflexões acerca das

concepções de aluno, ensino-aprendizagem e iniciar um trabalho diferenciado

tendo como foco o uso de textos e não mais de palavras isoladas.

Inicialmente, começo a sessão propondo um trabalho pautado em

texto, pois, durante a sessão anterior, a professora relatou a importância que

ela atribuía à cópia. Aqui, tento fazer uma contraposição entre a cópia e o

trabalho com base em textos. Pergunto o que irá trabalhar com as crianças e

continuo explicando como vamos conduzir a atividade, conforme mostra o

excerto abaixo:

Pesq.:...Então Ju, o que eu tinha pensado pra gente estar fazendo é

trabalhar com texto. Hoje você vai trabalhar o que com as crianças?

Ju: Bom, hoje vou trabalhar a família silábica do D.

Pesq.: Do D, então,

poderíamos trabalhar primeiro com um texto maior que tenham palavras com D, aí

desse texto a gente tira uma frase principal e que tenha palavras com D, aí desse

texto a gente vai para a palavra com o D, depois para as sílabas – família silábica e

depois pra letra.

Ju: Certo!

Pesq.: No texto, a gente primeiro lê uma vez para eles, com o texto na

lousa lê marcando com o dedo, aí depois, a gente pede para que eles leiam junto

com a gente, depois vai passando por cada mesinha, na verdade eles passam a

decorar o texto e, depois ver: “Alguém quer ler?”, e deixar alguém se prontificar a

ler o texto. E aí, o que você acha? (Sessão Reflexiva 23/11/2005)

Nesse momento, meu papel como formadora foi direcionar o que

Júlia iria realizar em sala de aula. Meu objetivo era que ela experienciasse uma

situação de ensino-aprendizagem diferente daquela que ela já utilizava. Então,

proponho um novo trabalho com base em textos; entretanto, não explico o

porquê dessa proposta e assim, meu papel passa a ser de imposição e

autoritário. Dessa forma, minha ação nesse momento não deixa de ser

diferente do que a professora faz com o aluno.

Em resposta à pergunta acima, a professora começa a subestimar a

capacidade dos alunos em realizarem esta atividade sem o artifício da cópia e

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

97

a se queixar do comportamento e da falta de interesse de cada criança, como

já discutido na seção anterior. Neste momento, questiono o resultado da cópia:

Pesq.: Mas a cópia está dando resultado significativo? Eles estão

aprendendo de fato com a cópia? (Sessão Reflexiva 23/11/2005)

Assim, tento criar um conflito em relação à concepção metodológica

da professora a fim de resgatar as oportunidades que perdi na primeira sessão,

provocando um trabalho que criasse conflitos e, isso pôde ser observado após

a aula, quando avaliamos a atividade desenvolvida junto aos alunos:

Pesq.: Então Ju, como foi a atividade? O que você sentiu da Sala?

Ju: Foi assim, foi bom! Eles participaram né, teve essa participação do

grupo, todos se interessaram em querer ler! Se eu fosse deixar todos lerem,

iríamos ler até o final da aula! (...)

Pesq.: Qual foi o ponto alto da atividade?

Ju: Acho que é a leitura mesmo, eu lendo, eles lendo, eles querendo

ler, se envolvendo na atividade, toda hora eles queriam ler, levantavam a

mãozinha. Mesmo não sabendo, lógico que eles não sabem, só de estar olhando e

repetindo, acho que isso foi o melhor! (Sessão Reflexiva 23/11/2005)

Neste segundo momento, minha participação como coordenadora da

atividade de formação é maior: intervenho mais, questiono. Entretanto, isso não

inibiu a participação da professora.

As regras de participação nessa sessão reflexiva permitiram a divisão

de trabalho com mais eqüidade. As participantes entraram na discussão com

seus argumentos da prática vivida e conseguiram concretizar um pouco mais a

relação entre teoria e prática.

De acordo com Magalhães (1998), a colaboração pressupõe uma

atitude solidária entre agentes que buscam atribuir significados às suas

práticas através do questionamento de seus valores, escolhas e sentidos. Isso

pode ter acontecido nos excertos anteriores, pois a exposição das participantes

as levou a questionarem as metodologias. Nós não reconstruímos uma prática

de fato, apenas confrontamos (Smyth, 1992) valores com a realidade que

enfrentamos e tentamos iniciar um processo de transformação.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

98

Todavia, mesmo utilizando-se dessas estratégias que, sem dúvida,

estabelecem uma relação de proximidade (Kerbrat-Orecchioni, 1996) entre mim

e a professora, observam-se intervenções que deixam claro o meu poder. No

primeiro excerto apresentado nesta subseção, assumo esse poder, configuro,

planifico todos os passos do trabalho a ser desenvolvido com o texto para a

professora, deixando pouca margem para relativizações. Por outro lado, ao

utilizar “...[nós ] poderíamos trabalhar primeiro com um texto maior que tenham

palavras com D, aí desse texto a gente tira uma frase principal e que tenha palavras

com D, aí desse texto a gente vai para a palavra com o D, depois para as sílabas –

família silábica e depois pra letra. ...”, a pesquisadora assume a responsabilidade

enunciativa da solicitação feita à professora participante. Isso pôde revelar que

a pesquisadora procura horizontalizar a relação ali estabelecida (Kerbrat-

Otrcchioni, 1996).

Com relação à professora, no tocante ao funcionamento da polidez

(Kerbrat-Orecchioni, 1996), o excerto demonstra um claro engajamento no

tema proposto por mim (“Acho ótimo!) após a exposição da proposta de

trabalho com texto.

Conforme a discussão realizada na fundamentação teórica que

tem como base Kerbrat-Orecchioni (1996), as estratégias de polidez

utilizadas pela professora revelam o seu grande grau de consciência

quanto a sua posição na interação: assume a posição inferior que lhe

cabe, ora engajando-se no tema proposto pela professora-pesquisadora,

ora concordando com ela, ora numa demonstração de modéstia,

colocando-se como uma pessoa que não domina completamente o

conhecimento.

No entanto, percebe-se, na interação, que essas estratégias,

mais do que situar a professora em posição inferior, permitem-lhe disputar

uma posição superior com a professora-pesquisadora, pois, por meio de

tais estratégias, a professora impõe à professora-pesquisadora o dever de

também realizar o trabalho de proteção de face, evitando ameaças à

imagem das participantes da interação.

Nessa breve análise de polidez, o instrumental oferecido por Kerbrat-

Orecchioni indica caminhos mais seguros na análise das relações de poder que

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

99

permeiam as interações face-a-face. Assim, escapa-se do risco de utilizar

análises unilaterais que consideram um único detentor do poder, tendo em

vista sua posição hierárquica na interação. A proposta de Orecchioni auxilia na

compreensão da conversação como um movimento que pode ser dinamizado

por qualquer um dos seus participantes, e por isso mesmo, não pode ser

completamente antecipado por aquele que, em princípio, ocupa a posição alta.

Entendo nessas interpretações que a regra que se estabeleceu nessa

sessão foi de transmissão (coordenadora da sessão/professora-pesquisadora),

porém com menos passividade da professora. Ao questionar sobre a cópia (e

acredito que isso ocorreu também na primeira sessão reflexiva), dou-lhe a voz

e passo a ouvi-la e, nesse momento, a professora participa mais ativamente,

expondo seu ponto de vista. Assim, percebo maior participação no discurso e

na dinamicidade da atividade. A divisão de trabalho parece estar mais

equilibrada.

3.2.2. Sessões Intermediárias – 13/12/2005, 03/01/2 006 e 16/01/2006

Este segundo momento (13/12/2005, 03/01/2006 e 16/01/2006) tinha

como objetivo promover a discussão sobre o trabalho com texto e a

conseqüente interação com o grupo/classe, incentivando uma maior

participação dos alunos, bem como examinar o papel mediador do professor e

planejar atividades mais interativas. Tinha como objetivo, também, a discussão

dos textos: “Aquisição da linguagem e escrita”, “As relações entre pensamento

e linguagem” e a “Interação entre aprendizado e desenvolvimento: ZPD”, do

livro de Teresa Cristina Rego.

A base da nossa discussão, nessas sessões, foi a forma mecânica

de leitura e a importância de o aluno atribuir significado para o que está

lendo/escrevendo e, correlato com esse tema, o sentido da cópia nas

atividades propostas para os alunos.

A professora é quem inicia a sessão de 13/12/2005 descrevendo,

detalhadamente, a atividade realizada com os alunos denominada “Boi da cara

preta”. Ao longo do seu relato, eu fazia algumas perguntas que visavam a

incentivar o estabelecimento da relação entre as teorias e a atividade

elaborada, como se pode ver no excerto abaixo:

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

100

Pesq.: Qual a diferença que você vê desse trabalho que desde que a

gente começou a estudar você ta tendo e do trabalho que você teve antes?

Ju: Então, eu acho assim, é o texto assim rodado pra eles fica bom,

fica mais organizado e a criança se prende mais, porque, eles não estão só

copiando da lousa porque, no caso, se torna cansativo, eles copiam mais muitas

vezes eles não gravam né. Aqui, eles não precisam estar copiando todo o texto, é

mais fácil, acho que eles gravam melhor a letra porque, a letra está mais bonita,

impressa. Então, percebi que eles ficam mais centrados na lição e como tem várias

folhas é, posso estar ficando mais tempo com eles, dando maior atenção para

cada mesa.Antes eu passava na lousa e, eu perco tempo, faço a linha na lousa,

até copiar todo o texto pra eles já passou muito tempo. Aqui como está tudo pronto

eu ganho mais tempo! E pra eles é melhor também, né? Valeu mais a pena!!!

Certo?! (Sessão Reflexiva 13/12/2005)

Percebo pelos dados, que a professora inicia nosso encontro com a

descrição de uma atividade planejada por ela, fato que demonstra uma

descentralização nas orientações que, até então, partiam de mim. Isso permite

que a professora vá além do que planejei, ocorrendo o surgimento de

momentos de conflito e reflexão crítica.

Esse momento apresenta maior participação e envolvimento das

participantes, com discussões e comentários sobre a atividade elaborada pela

professora. Com essa atitude das participantes, iniciamos o planejamento para

o trabalho em 2006 para crianças do 3º estágio da pré-escola (5 a 6 anos de

idade). Aqui a professora teve a possibilidade de explicitar e descrever a

transformação que sentia ao modificar o instrumento de trabalho de letras e

sílabas soltas para o trabalho com textos e interpretação.

Nas sessões de 03/01/2006 e 16/01/2006 já percebo a professora

mais engajada e criando oportunidades de se posicionar, o que provoca

maiores possibilidades de criação de conflitos. A professora já tem

conhecimento desses conceitos de alfabetização e metodologias, devido aos

cursos de formação e consegue discuti-los bem e, no excerto abaixo, vê-se que

ela consegue relacionar o texto lido com o trabalho que realiza em sala de aula.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

101

Ju: No texto quando ele fala assim: “...enfatiza de tal forma a mecânica

de ler o que está escrito que se acaba obscurecendo a linguagem escrita como

tal...”, assim, no caso, isso é o que acabo fazendo na sala de aula, quando eu dou

a família, por exemplo, a família do B, BA, BE, BI, BO, BU – no caderno eles

assim, mecanicamente eles estão copiando mais isso não significa que foi

gravado, eles não raciocinam assim, pra ter a compreensão de que aquilo é o B...

(Sessão Reflexiva 03/01/2006)

Iniciamos a sessão com a elaboração e discussão da atividade

“Diário da Clara”. Ressaltamos a importância do texto descritivo e da

autobiografia de Clara, pois, no início do ano letivo as crianças estão se

conhecendo, conhecendo a escola, seus funcionários, a professora, o entorno

da Unidade Escolar e, através dessa atividade, poderíamos estabelecer maior

contato com elas e suas famílias por meio de pesquisa enviada para casa com

a participação dos pais e/ou responsáveis. Nessa atividade privilegiamos as

possibilidades para as crianças falarem, interagirem e, principalmente, se

sentirem protagonistas de seu próprio processo de ensino-aprendizagem.

Neste momento, a professora conseguia perceber a diferença entre

seu trabalho anterior e o que agora estava elaborando. Já era capaz de

identificar nas atividades construídas os conceitos discutidos através dos textos

da Teresa Cristina Rego e a sua importância no processo de ensino-

aprendizagem das crianças, como nos demonstra o excerto abaixo:

Ju: é, esmiuçar o texto, né? Então, a gente, o professor, tem que estar

junto com eles, com os alunos, ééé, então, ta entrando mesmo nessa ZDP ,

atuando né?, assim, mediando, fazendo aquela mediação , né, por que senão,

sozinhos não tem como eles estarem fazendo os exerc ícios né . A gente pode

estar lendo, lendo, lendo mas, temos que estar passando o nome na lousa para

eles estarem copiando, em um primeiro momento né, estar destacando este

nome no texto para que eles possam comparar com a e scrita da lousa . Para

que eles possam, também, perceber através da lista dos nomes da sala que

podem ter o nome de alguma amiga – Clara que outros nomes iniciam com a letra

C, que outras letras aparecem em lugares diferentes em nomes distintos, e assim,

vai! Então, o professor tem que estar atuando diretamente, senã o, não tem

como eles estarem fazendo, além do que corre-se o r isco de eu cair no

mesmo problema do ano passado, cópia, cópia, cópia sem sentido para o

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

102

aluno e, não proporcionar aprendizagem de fato, com o pressupõe Vygotsky,

né? (Sessão Reflexiva 16/01/2006)

Acredito que os momentos de conflito surgem quando há implicação

do eu na fala, quando ela traz a experiência e essas experiências e opiniões se

relacionam com o que foi lido no texto, fato que percebo durante todas as

sessões e não apenas nessa.

No excerto acima, a Júlia relaciona a teoria com a prática quando

exemplifica o conceito de ZDP. Assim, ela provoca sua própria ZDP (Vygotsky,

1934/2003) buscando em sua exemplificação relacionar o conhecimento

científico ao cotidiano. Esse momento provoca reflexão pois, a professora revê

suas atitudes, de acordo com Liberali (1994:11), como forma de conhecimento;

a reflexão pode ser vista como um ato criador que parte do conhecimento e

entendimento da ação para a posterior transformação dela.

No recorte abaixo, é possível observar o posicionamento enunciativo

da professora. A princípio Júlia refere-se às duas professoras, a ela e à

professora-pesquisadora, (“... a gente...”), depois fala com o uso da voz social,

(“...Então, o professor...”). Finaliza essa fala com a implicação do eu (“...corre-

se o risco de eu cair no mesmo problema do ano passado,...”), conseguindo,

nesse momento, relacionar a teoria com a prática.

Ju: é, esmiuçar o texto, né? Então, a gente , o professor, tem que estar

junto com eles, com os alunos, ééé, então, tá entrando mesmo nessa ZDP,

atuando né?, assim, mediando, fazendo aquela mediação, né, porque senão,

sozinhos não tem como eles estarem fazendo os exercícios né. A gente pode

estar lendo, lendo, lendo mas, temos que estar passando o nome na lousa para

eles estarem copiando, em um primeiro momento né, estar destacando este nome

no texto para que eles possam comparar com a escrita da lousa. Para que eles

possam, também, perceber através da lista dos nomes da sala que podem ter o

nome de alguma amiga – Clara que outros nomes iniciam com a letra C, que

outras letras aparecem em lugares diferentes em nomes distintos, e assim, vai!

Então, o professor tem que estar atuando diretamente, senão, não tem como eles

estarem fazendo, além do que corre-se o risco de eu cair no mesmo problema do

ano passado, cópia, cópia, cópia sem sentido para o aluno e, não proporcionar

aprendizagem de fato, como pressupõe Vygotsky, né? (Sessão Reflexiva

16/01/2006)

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

103

Neste momento intermediário, posso entender que as regras que se

estabeleceram nesses encontros foram além da transmissão, mas houve

atuação e iniciativa da professora. Houve questionamento que provocou um

trabalho criando conflitos e promovendo a construção de conhecimento novo,

permitindo, dessa forma, seu contato com o velho (Schneuwly, 1994). Houve

uma avaliação, iniciada por mim, reforçando uma divisão de trabalho,

distinguindo-se o da professora do meu, que, na maioria das vezes, encerro as

sessões reflexivas. As regras de participação estão mais claras e o clima de

confiança entre as participantes promove mais discussões. Alguns

questionamentos da questão teoria-prática surgem, o que mostra a intervenção

da professora na condução das sessões, evidenciando que a divisão do

trabalho permite a inclusão de suas dúvidas, propostas e questionamentos.

3.2.3. Sessões Finais – 25/01/2006, 09/02/2006 e 24 /02/2006

Estes momentos (25/01/2006, 09/02/2006 e 24/02/2006) tiveram

como objetivo elaborar e discutir a atividade “Meu nome é Luceli”. Este texto é

descritivo, e nele Luceli relata e descreve onde mora, do que gosta, do que tem

medo, fala sobre sua escola, sua idade, nome, animais. A professora Júlia

descreveu todo procedimento de trabalho com essa atividade – leitura, escrita,

construção de textos, palavras, a possibilidade em resgatar brincadeiras de

roda, o trabalho com numerais, higiene, entre outros. Além da elaboração

dessa atividade, realizamos a leitura e discussão dos textos “O papel da

construção do conhecimento” e “O papel do professor mediador na dinâmica

das relações interpessoais” do livro da Teresa Cristina Rego, a fim de debater

sobre os processos de ensino-aprendizagem. Percebemos através dos textos

lidos que a proposta que estávamos construindo para o ano de 2006 estava em

sintonia com a concepção sócio-interacionista, e que, além disso, essa

mudança não seria fácil, porém, possível.

Discutimos, também, a importância da heterogeneidade e da

oportunidade que os alunos terão em trabalhar e conviver com todos os outros

alunos sem que isso fosse avaliado como indisciplina, mas sim, como

aprendizado. Finalizamos a discussão planejando outras atividades – pontos

importantes a serem discutidos e desenvolvidos para o ano de 2006.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

104

Neste instante, é importante relatar a valorização que a professora

expressou em relação à participação e à opinião dos alunos e, principalmente,

ao trabalho coletivo, como mostram os excertos abaixo:

Ju: Então, aí, eu, esse texto aí que é, o texto de uma aluna mesmo que

montou, achei interessante tá trabalhando com ele, porque ele fala sobre, posso

ler? “MEU NOME É LUCIELI.

EU TENHO 9 ANOS E MORO NA CHÁCARA SANTA MARIA.

A MINHA CASA FICA PERTO DO POMAR. EU ADORO COMER

GOIABA NO PÉ. AO LADO DA MINHA CASA PASSA UM RIO. EU ADORO

NADAR NO RIO.

AQUI TEM MUITOS ANIMAIS. EU GOSTO DOS CACHORROS E

TENHO MEDO DE COBRAS.

EU ESTUDO NA ESCOLA PALMIRA. EU GOSTO DE LER E DE

JOGAR QUEIMADA.

EU GOSTO MUITO DE MORAR NA CHÁCARA, PORQUE MORO

PERTO DA NATUREZA”. Achei interessante o texto porque é o texto de uma

criança, ela descreve o lugar onde mora, de que gosta, do que tem medo, da

escola, ela fala bastante coisa sobre ela e, achei interessante estar passando para

eles. (Sessão Reflexiva 25/01/2006)

Ju: Uma atividade que a gente pode fazer, a gente pode fazer uma

lista de brinquedos preferidos da classe, posso estar colocando 10 itens e eles

escolherem 6 nomes de que mais gostam. E, assim, um estar ajudando o outro na,

na mesinha para estar escolhendo, né. (Sessão Reflexiva 25/01/2006)

Neste excerto percebo o reflexo da nossa discussão sobre ensino-

aprendizagem, à luz da teoria sócio-histórico-cultural. A Júlia escolheu um texto

de uma aluna para ser trabalhado com o grupo/classe, demonstrando, a partir

dessa escolha, a valorização da produção infantil. Esse texto traz temas

importantes para a faixa etária das crianças com as quais estamos trabalhando

e, principalmente, Júlia desenvolve tarefas, a partir do texto, que contemplam o

conceito de ZDP, da importância do outro, conforme discutido por Vygotsky (

(...) E, assim, um estar ajudando o outro na, na mesinha para estar

escolhendo, né.).

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

105

As regras estabelecidas nessa sessão, que vem se realizando como

normas, respeito mútuo, liberdade de participação e conhecimento do que

estamos falando, possibilitam um discurso polifônico (Bakhtim, 1929/1995),

pois há um diálogo cumulativo entre o eu e o outro, no qual as diferentes vozes

entram em contato através da enunciação. A divisão de trabalho não se realiza

numa situação de eqüidade completa, pois há o predomínio da voz da

pesquisadora ao abrir e fechar discussões e retomar os turnos das sessões

anteriores.

O objetivo da última sessão reflexiva (24/02/2006) foi avaliar as

sessões, além de encerrar as atividades de pesquisa.

Ao realizar essa avaliação, tive um objetivo: saber em que aspectos

as sessões ajudaram a professora participante. Para isso, acreditei que a

orientação poderia ajudá-la a pensar no assunto (orientação esta que ocorreu

antes de iniciarmos a gravação da sessão).

Inicio a sessão explicando como ela seria realizada. Em seguida,

faço perguntas referentes aos aspectos tratados nos encontros que poderiam

ter ajudado na sua prática em sala de aula.

Nessa última sessão, a professora apresenta sua avaliação sobre as

sessões: em que aspectos as sessões foram aproveitadas e a importância

delas para a formação contínua de professores. Isso demonstra que o

processo reflexivo vivenciado através das sessões por mim e pela professora

fez repensarmos nossa prática, embora, por vezes, não se conseguisse uma

atitude crítica consistente para mudanças como, por exemplo, em relação à

questão da cópia. Apesar de ter diminuído seu uso e de a professora ter

atribuído outro sentido à mesma no decorrer do processo, analisando global e

atentamente as sessões, observamos que ela continua sendo, ainda, uma

prática usual, porém, não sistemática e central.

Os encontros permitiram às participantes tomarem decisões e se

conscientizarem dos limites das próprias posturas. Essa discussão me remete

ao conceito de ZDP proposto por Schneuwly, pois na zona de conflito

considerou-se a relação entre o desenvolvimento e os conflitos do próprio

indivíduo, das suas relações com o meio social e com os demais indivíduos. As

sessões proporcionaram a mim, enquanto professora-pesquisadora, repensar

minhas ações junto às crianças, meu papel social e profissional na criação e

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

106

desenvolvimento de um espaço de discussão com os pares. Em outras

palavras, essa zona de conflito envolveu o resultado da intersecção entre duas

lógicas, a da educação (sessões reflexivas) e a do desenvolvimento individual

(das participantes).

Constatamos também que as vozes das participantes realizaram

toda a sessão. As regras estabelecidas para a realização da avaliação

tornaram-se normas explícitas estabelecidas nas relações daquele momento.

Até essa última sessão estiveram sob meu comando as regras e a divisão de

trabalho, pois eu, na maioria das vezes, iniciava e finalizava o encontro.

Ao interpretar esses momentos das sessões reflexivas, posso

perceber que as professoras participam nos encontros com seus

posicionamentos, fazendo perguntas, ajudando uma à outra nas respostas,

procurando estabelecer relações da teoria com a prática de sala de aula..

Nas sessões, percebe-se no discurso das participantes a descritiva

de ações, aspecto que está relacionado a um tipo de reflexão que envolve

teoria e prática. Como já exposto, a teoria, tomada como ponto de partida de

discussão com a prática, é a base da qual se parte para a compreensão do

conhecimento científico que permite a crítica da própria ação.

Observei, também, que nas interações dialogais analisadas, as

participantes estabeleceram uma interação com bastante contato visual e

físico, a linguagem é informal e os termos de endereçamento são relativos à

segunda pessoa do discurso. Assim sendo, parece haver uma diminuição da

relação desigual, embora nenhum status tenha sido alterado. É por isso que a

professora detém maior quantidade de turnos e palavras. São atribuições de

seu papel como sujeito da formação contínua explicar sua formação,

concepção de ensino-aprendizagem, de aluno/criança, de educação infantil,

explicar como organiza e administra as aulas planejadas junto à professora-

pesquisadora, enquanto esta gerencia as atividades, introduzindo-as,

explicando-as e finalizando-as. Seu papel em uma concepção de ensino sócio-

interacionista inclui, além de dirigir as atividades de formação contínua, ajudar

a professora a desenvolver posturas que sejam mais eficientes quanto ao seu

objetivo no aprendizado de seu ofício. Na verdade a professora-pesquisadora

procura desenvolver atividades metacognitivas, que envolvem as capacidades

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

107

de estabelecer objetivos, de selecionar e adaptar as habilidades apropriadas a

determinado contexto. As perguntas e intervenções da professora-

pesquisadora têm como objetivo levar a professora a pensar como conseguir

melhorar sua atuação como alfabetizadora, estimulando sua capacidade de

refletir sobre seu processo enquanto professor. O uso que a professora-

pesquisadora faz de seus turnos propicia contextos para o autodirecionamento

da professora. Assim, um primeiro passo para a mudança nos processos

educacionais seria conscientizar os educadores sobre a necessidade de

ouvirem o que os estudantes têm a dizer sobre seus próprios processos

educativos, no intuito de ampliar sua compreensão sobre a educação e isso

ocorre em qualquer instância de formação, inclusive na de formação em

serviço. Desse modo, as atividades reflexivas propiciam espaço para que a

professora se expresse e a professora-pesquisadora entenda suas

representações sobre seu ofício.

Retomando toda a análise, pode-se concluir que o trabalho reflexivo

realizado nas oito sessões programadas e aqui apresentadas ajudou a iniciar a

transformação de concepção de ensino-aprendizagem da professora que, nas

primeiras sessões, tinha receio e dificuldades em trabalhar com as reais

potencialidades das crianças limitando suas atividades à mera cópia de letras,

famílias silábicas e palavras. Na penúltima sessão reflexiva percebe-se uma

mudança de atitude no sentido de ela ser capaz de trabalhar com textos,

valorizar a bagagem cultural do grupo/classe e, principalmente, identificar seu

papel enquanto um elemento mediador e possibilitador das interações entre os

alunos e destes com os objetos de conhecimento. Enfim, outra mudança de

atitude verificada diz respeito à percepção de que seu ofício é mais amplo do

que a mera repetição, sua intenção deve ser a de ampliar o repertório de cada

criança, permitindo a troca de informações e experiências entre os colegas e,

ainda, propiciando o seu contato com a arte produzida pelos homens ao longo

de sua história.

Finalmente, através do diálogo entre as participantes, foram sendo

criados espaços para que ambas pensassem sobre sua atuação em sala de

aula e, coletiva e colaborativamente, construíssem de forma reflexiva os

sentidos sobre os significados relativos ao ofício de ser professor de uma

EMEI.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

108

3.3. As sessões reflexivas como espaço para formaçã o de professores

críticos

Esta seção objetiva discutir as sessões reflexivas como um espaço

de formação de professores críticos, com foco nas perguntas como

instrumentos de mediação semiótica. Para isso apresento e discuto uma

sessão, ocorrida no dia 23 de novembro de 2005, a qual constituiu-se em um

evento marcante e representativo do trabalho que foi realizado neste período

de formação. O procedimento de coleta foi a gravação da sessão em áudio. Os

procedimentos de análise incluem o levantamento dos conteúdos temáticos, os

tipos de perguntas e a distribuição dos turnos, ou seja, quem toma a iniciativa

de introduzir os temas e com que objetivos, conforme relacionado abaixo:

• análise do sistema de atividade;

• levantamento dos conteúdos temáticos da sessão reflexiva, com

as escolhas lexicais em negrito;

• análise dos tipos de perguntas.

Apresento abaixo o sistema de atividade, representativo dessa

sessão reflexiva, para, em seguida, analisá-lo.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

109

Figura 7 – sistema de atividade – sessão reflexiva 23/11/2005

Neste sistema os sujeitos são a professora-pesquisadora e a

professora participante. As professoras trazem para o mesmo suas

experiências, os sentidos que atribuem aos papéis de professor, aluno e

concepção de ensino-aprendizagem e a sua própria constituição de sujeito, que

faz de cada uma, um ser único e complexo, uma mistura de cultura, história e

herança psicológica. Todos esses fatores, mais o uso que fazem ou não dos

instrumentos disponíveis nas sessões reflexivas e, particularmente, em suas

classes, têm uma influência direta na posição que ocupam no sistema.

A professora-pesquisadora, como aquela que desenvolve seu

trabalho de pesquisa, está imersa em assuntos teóricos, dentre eles a

constituição do sujeito, a sessão reflexiva como espaço de formação de

professores críticos, a relação do conhecimento científico com o cotidiano, o

que ela tenta trazer para a sessão reflexiva, para que a sua prática possa

exprimir aquilo em que acredita e o que discute teoricamente.

Textos, tarefas, transcrições e a própria sessão reflexiva são

utilizados como instrumentos. Dessa forma, o objeto desse sistema de

Instrumentos de mediação: textos, tarefas, transcrição, sessão reflexiva.

Sujeito: professora pesquisadora e professora participante.

Regras: participação em uma discussão: quem fala, como fala, tomada de turno, respeito à opinião do outro.

Comunidade: escola, direção, universidade.

Divisão de trabalho: professora pesquisadora faz perguntas e tenta expandir o conhecimento ligado à realidade da professora participante; Professora participante dá exemplos de histórias vivenciadas por ela.

Objeto: competência comunicativa e reflexão sobre os papéis de professor, aluno e concepção de ensino-aprendizagem.

Resultado: Percepção de aprendizagem para fortalecimento da auto-estima e formação de professores críticos.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

110

atividade é desenvolver a competência comunicativa das participantes, dando a

elas a oportunidade de perceberem o quanto aprenderam até essa data e

também de refletir sobre os papéis de professor, aluno e concepção de ensino-

aprendizagem. O resultado esperado seria, então, a percepção da

aprendizagem com o fortalecimento da auto-estima e a formação de

professores críticos que sejam capazes de refletir sobre a construção de sua

identidade profissional e sobre o processo de ensino-aprendizagem de seus

alunos.

Outros instrumentos utilizados nesse sistema foram as perguntas e

as histórias das participantes, o que propiciou oportunidades de aprendizagem

e uma expansão do conhecimento, provocando movimento no sistema. As

regras referem-se ao como participar de uma discussão e de trabalho em

grupo, como saber ouvir, dar opinião, respeitar a opinião do outro e emitir a sua

própria.

Na divisão de trabalho, a professora-pesquisadora assume o papel

de intermediária da discussão, fazendo perguntas para que a professora

participante tenha a oportunidade de expressar suas opiniões, objetivando

propiciar a reflexão e o pensamento crítico. A professora Júlia participa fazendo

perguntas, respondendo e interagindo com a professora-pesquisadora seja

para tirar dúvidas, seja para trocar informações. Neste trabalho, é enfatizada a

troca, o colaborar com o outro, propiciando assim oportunidades de aprender e

reorganizar a informação, destacando o trabalho na ZDP, como uma

construção social.

Os quadros abaixo apresentam as ações que compuseram essa

sessão reflexiva, apontando os objetivos e os instrumentos utilizados. Além

disso, os quadros apresentam os conteúdos temáticos e também os tipos de

perguntas.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

111

Quadro 9 – Ação

Sistema de atividade – sessão reflexiva 23/11/2005 Conteúdos temáticos Exemplos

Concepção de ensino-aprendizagem para a professora Júlia

Introduzido pela professora-pesquisadora. Objetivo: discorrer sobre suas dificuldades como professora e sobre sua visão de ensino-aprendizagem.

“Então Júlia, o que eu tinha pensado pra gente estar fazendo é trabalhar com texto. Hoje você vai trabalhar o que com as crianças? ”

Importância da cópia para a professora Júlia Introduzido pela professora-pesquisadora. Objetivo: explicar quais os resultados da cópia em sala de aula.

Júlia: “Acho ótimo! É, vamos ver se a minha sala consegue né? (...) Ah, por que eles não se prendem muito a nada. É aquela meia dúzia que se interessa e muitos ficam dispersos, ficam conversando, brincando, né? O que eu passo na lousa , é, eles copiam, fazem né, a maioria faz, mas não tem aquele interesse . Pesq.:”Mas a cópia está dando resultado significativo? Eles estão aprendendo de fato com a cópia? ”.

Papel do aluno para a professora Júlia Introduzido pela professora-pesquisadora. Objetivo: explicar porque a professora Júlia acha que os alunos não conseguem realizar a tarefa.

“No texto, a gente lê uma vez para eles, com o texto na lousa, lê marcando com o dedo, aí depois, a gente pede para que eles leiam junto com a gente, depois vai passando por cada mesinha.(...) e deixar alguém se prontificar a ler o texto. E aí, o que você acha?(...)Por que você acha que eles não conseguem? ”

Perguntas Tipo de perguntas “Hoje você vai trabalhar o quê com as crianças?”

Pergunta inicial para introduzir o tópico.

“Mas a cópia está dando resultado significativo? Eles estão aprendendo de fato com a cópia?”

Pergunta é objetiva (sim ou não) mas pode ser considerada desencadeadora de reflexão.

“E aí, o que você acha?”; “Por que você acha que eles não conseguem?”

Pergunta para provocar reflexão.

A ação acima descrita objetivou apresentar o tópico e discutir sobre a

visão do papel do aluno e da concepção de ensino-aprendizagem. O tema foi

introduzido pela professora-pesquisadora e houve interesse da professora

Júlia, principalmente porque ela pôde contribuir com suas histórias e

experiências. A professora-pesquisadora perguntava, solicitava a participação

da professora Júlia e escutava as respostas. Júlia, apesar de concordar com a

utilização de textos em seu trabalho, realiza um comentário que subestima a

capacidade de seus alunos para a realização de tal tarefa (“Acho ótimo! É,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

112

vamos ver se a minha sala consegue né?”). Seu comentário traduz o sentido que ela

atribui à visão que ela tem de seu aluno.

A professora-pesquisadora, então, faz uma pergunta com o objetivo de

possibilitar a reflexão sobre o ocorrido e pede a opinião de Júlia (“Mas a cópia está

dando resultado significativo? Eles estão aprendendo de fato com a cópia?”).

A discussão durante a sessão reflexiva, como discutida por Freire (1970),

Giroux (1997) e Brookfield (1987), pode promover o pensamento crítico, se os

professores tiverem a liberdade para expor seus pontos de vista e se o coordenador

da sessão estiver preparado para levar em consideração o que é trazido para a cena,

respeitando e fazendo com que os professores aprendam a ouvir e argumentar. As

perguntas que a professora-pesquisadora faz, no decorrer do excerto acima, objetivam

em, primeiro lugar, introduzir o tópico para, em seguida, permitir que a professora

participante, dê seus exemplos e mostre suas experiências, o que colabora para um

melhor entendimento dos sentidos que vão aparecendo a partir do relato da professora

Júlia e do tópico que está sendo tratado. Esse procedimento aponta, assim, para um

trabalho na ZDP, como construção social, (Ptney, Engeström, Lave e Wenger), na qual

o conhecimento é construído, reconstruído e transformado, com base na sócio-história

de cada indivíduo.

A professora-pesquisadora parece concordar com Wells (2000), que

considera a aprendizagem como um processo construtivo e colaborativo, no qual a

professora Júlia participa ativamente, trazendo suas histórias e experiências para a

sessão reflexiva, as quais passam a fazer parte do conteúdo da sessão.

O acima discutido relaciona-se também à discussão de Vygotsky, com base

no monismo de Spinosa, sobre a constituição do sujeito, que é uma fusão de aspectos

cognitivos, psicológicos, afetivos e emocionais. O sentir-se bem e capaz influi no

processo de aprendizagem e faz com que o sujeito atribua novos sentidos à

aprendizagem.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

113

Quadro 10 – Ação

Sistema de atividade – sessão reflexiva 23/11/2005 Conteúdos temáticos Exemplos

Avaliação da proposta de trabalho com textos. Introduzido pela professora-pesquisadora. Objetivo: avaliar a proposta apresentada pela professora-pesquisadora.

“Então Júlia, como foi a atividade? O que você sentiu da sala? ”

Relato sobre a disciplina dos alunos. Introduzido pela professora. Objetivo: avaliar o impacto da proposta realizada no comportamento dos alunos

Júlia:“Eu lia e eles liam em cima. Eles não leram sozinhos, né? Então, eu lia e eles repetiam, repetiam o que eu ia lendo, né? Eles queriam ir lá na frente, colocar o dedo embaixo das palavras . Mas tem um porém, faltaram 11 alunos então, fica mais fácil trabalhar! Menos alunos é bem mais fácil! Eles não tinham tempo de ficar um cutucando o outro, a sala ficou mais arejada, mais fácil trabalhar! Pesq.: E aí, depois da leitura você propôs o que?(...)Você sentiu dificuldade em realizar a atividade ”

Perguntas Tipo de perguntas “Então Júlia, como foi a atividade? O que você sentiu da sala?”; “Você sentiu dificuldade em realizar a atividade”

Pergunta inicial para introduzir o tópico.

“E aí, depois da leitura você propôs o que?”

Pergunta organizadora para saber se a professora entendeu a proposta de trabalho e levantar suas dificuldades.

Concluo, a partir do excerto acima, que à medida que as

participantes interagem, elas têm a possibilidade de rever, reorganizar e

sistematizar o conhecimento, transformando-o, o que provoca um movimento

constante na ZDP de cada indivíduo e da atividade. Dessa forma, a

aprendizagem é considerada um processo de construção social, no qual o

indivíduo se forma e ajuda na formação do outro.

O comentado acima me remete ao que Brookfield e Preskill (1999)

destacam como aspectos fundamentais em uma discussão: como ajudar o

outro a ter um entendimento crítico sobre o que está sendo discutido,

examinando outras possibilidades e aumentando a agilidade intelectual e a

compreensão dos significados e sentidos de determinadas situações, fazendo

com que o sujeito atribua novos sentido para outras práticas e ações. No caso

das sessões reflexivas isso fica ainda mais evidenciado, já que estas são um

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

114

lugar privilegiado para se falar, explorando o que as professoras fazem em sala

de aula através do discurso, conforme apontado por Moita Lopes (2002).

Entretanto, muitas vezes, o coordenador da sessão não se sente

preparado para fazer a mediação entre o conteúdo explorado e a prática em

sala de aula. Celani (2001) e Magalhães (2002) estudam a formação desse

profissional e enfatizam a necessidade de uma formação reflexiva e crítica que

permita a ele repensar a sua ação, levando em consideração quem são os

professores do grupo que coordena, como se constituíram, quais suas

experiências de aprendizagem e de que forma o que aprendem pode contribuir

para que eles sejam profissionais e cidadãos melhores.

Para a professora-pesquisadora, esse tem sido um aprendizado

constante. O fato de estar envolvida com discussões teóricas sobre cidadania e

formação crítica permite que ela repense sua ação nas sessões reflexivas e em

suas próprias aulas e tente formar alunos críticos e cidadãos.

A interação, neste caso, é fundamental e permite que as

participantes se ajudem mutuamente a compreender a tarefa, a organizar e a

trazer para a cena aquilo que sabem ou que ainda não perceberam que sabem,

utilizando a linguagem como instrumento de mediação semiótica que viabiliza

esse processo. Esse trabalho pode ser entendido como um movimento na

ZDP, como discutida por Steiner (1996), Lee Smagorinsky (2000), Putney et al.

(2000), que consideram a aprendizagem como social e participativa.

Além disso, os fatores culturais e o contexto no qual esses

professores se inserem são determinantes. A cultura, na concepção

vygotskiana, é algo que fornece ao indivíduo instrumentos simbólicos para que

ele compreenda a realidade, em um constante movimento de recriação e de

reinterpretação de conceitos e significados. O contexto, por sua vez, ou seja,

todos os sistemas de atividade nos quais esses indivíduos tomam parte,

entrelaça-se com os aspectos sociais e culturais e exerce influência na própria

constituição do indivíduo. Isso se relaciona à discussão de Cole (1996), que

expande o conceito de Bronfenbrenner (1979) sobre contexto, definindo-o

como camadas dispostas em círculos concêntricos, enfatizando que essas

camadas interferem umas nas outras, provocando transformações. De fato,

pelo que pôde ser observado nos dados das oito sessões reflexivas, a posição

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

115

do sujeito pode ser alterada, conforme a influência dos contextos nos quais

participa.

Por isso, para compreender o sujeito, é necessário entender suas

relações com os outros, seu ambiente e a forma como se insere no mundo,

investigando não somente a sua história, mas a história do grupo social ao qual

pertence (Vygotsky, 1982; Wells, 2000; Daniels, 2003; Wertsch, 2000). Daí a

relevância de investigar os outros sistemas, dos quais os professores

participam e as possibilidades que são oferecidas a eles nesses sistemas para

poder entender a sua constituição como sujeitos e como aprendizes.

A sessão reflexiva é finalizada com a conversa/avaliação da

atividade proposta pela professora-pesquisadora. As perguntas que a

professora-pesquisadora usa, nesse excerto, objetivam a percepção da

aprendizagem e o desenvolvimento do pensamento crítico. Percebe-se que a

professora-pesquisadora pede para que Júlia explique suas impressões, o que,

posteriormente, na terceira sessão reflexiva, promoverá um repensar e a busca

de argumentos para convencer o outro, movimento fundamental na construção

do pensamento crítico.

A professora-pesquisadora demonstra saber ouvir a voz da

professora Júlia, abrindo um espaço para que ela pudesse ter um

entendimento crítico sobre o tópico discutido, aumentando a tolerância para a

diversidade de opiniões e encorajando-a a falar de suas experiências

(Brookfield e Preskill, 1999).

Finalizo esta seção, sistematizando os resultados da discussão dos

dados, que objetivaram responder à seguinte pergunta de pesquisa:

Como a linguagem organiza a formação colaborativa d o

professor?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

116

A sessão reflexiva se organiza, como um espaço para a formação de

professores críticos, quando:

- as professoras têm a possibilidade de manifestar suas opiniões,

ouvem e são ouvidas, aprendem a argumentar, a tentar convencer o outro, a

tomar o turno, a concordar ou discordar e, conseqüentemente, a interagir com

respeito pelo outro;

- há a preocupação de fazer a relação entre o conhecimento

científico com o cotidiano, evidenciando um trabalho na ZDP, na concepção

cultural, o que possibilita o engajamento maior das professoras, que trazem

para a sessão reflexiva suas experiências e histórias, as quais podem ser

compartilhadas e problematizadas;

- as professoras conseguem perceber o que aprenderam e como

aprenderam, cabendo à professora-pesquisadora propiciar esses momentos,

colaborando para aumentar a auto-estima da professora, principalmente pelo

fato de se descobrir capaz de agir e interagir;

- as múltiplas vozes conseguem vir para a cena da reflexão;

- há movimento expansivo e transformação no sistema de

aprendizagem;

- há a preocupação de conhecer quem são os sujeitos que participam

do sistema de atividade, de onde vêm, como se constituem como aprendizes e

quais foram suas experiências anteriores de aprendizagem;

ou ainda, quando a ênfase é dada:

- nos instrumentos de mediação semiótica, por se reconhecer a

importância disso para criar novas zonas de desenvolvimento;

- na aprendizagem como um processo de construção social, no qual

o papel do outro é fundamental e a interação é um processo contínuo que

promove sistematização e reorganização do conhecimento, com base na sócio-

história de cada um;

- na sessão reflexiva como espaço de formação de professores

críticos;

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

117

- no uso de perguntas como instrumentos de mediação semiótica na

formação do professor crítico;

- e, finalmente, no ser possível.

Nesse capítulo pretendeu-se responder à pergunta de pesquisa, que

abrange tanto os sentidos que as professoras atribuíram e atribuem aos papéis

de professor, aluno e concepção de ensino-aprendizagem, como também à

constituição do professor e a sessão reflexiva como espaço de formação de

professores críticos.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

118

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao chegar ao final deste trabalho e examinar o processo de

construção do mesmo, tenho clareza o bastante para perceber o que significou

para mim e para a Júlia. Um ciclo expansivo de aprendizagem que me

fortaleceu e que me impulsiona para seguir caminhos que apontam para outras

direções e para uma certeza: os que trabalham na área de formação de

professores não podem esperar mudanças em sua atuação junto a seus

alunos, se não mudarem a sua forma de atuar junto ao próprio professor. Para

que se possa ajudá-los na tarefa de construção de novos conhecimentos

(incidir na sua “zona de desenvolvimento proximal” – ZDP) é preciso partir

daquilo que ele sabe. Essa terá sido uma das importantes lições deste

trabalho. Nesse sentido, entendo que o pensamento de Vygotsky, que tem

inspirado tantas reflexões no que diz respeito às questões relativas ao

desenvolvimento psicológico e à linguagem, as inspira também no que se

refere à questão da formação dos professores. Para Júlia, as sessões

reflexivas se transformaram em um momento de troca e negociação. Um

espaço onde pôde se fortalecer como sujeito crítico, para poder expressar sua

voz.

Investiguei o movimento causado pelas contradições entre os

sentidos já construídos e os novos, o peso da sócio-história, o uso dos

instrumentos e as limitações ou possibilidades impostas por eles e pelo meio.

Meu processo...

No início desse percurso, difícil foi conseguir conter meu entusiasmo

com as muitas descobertas de possibilidades de transformar minha atuação

enquanto professora, colaborar com a professora Júlia e, conseqüentemente,

com a escola. Difícil foi escrever tudo isso, priorizar, planificar, focalizar e

organizar todas as informações. O trabalho para realizar as leituras e para

construir uma fundamentação teórica, que desse sustentação para tudo o que

estava vivenciando durante as sessões reflexivas, foi intenso, prazeroso e

gratificante, mas ao mesmo tempo conflituoso, já que me levava para outras

leituras e discussões. Sem dúvida, tudo isso constituiu-se numa ampliação do

campo de pesquisa, mas com um grande risco de perder-me pelo caminho.

Tudo era interessante, tudo merecia seu espaço nessa dissertação, mas como

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

119

fazer? Foi um árduo e demorado percurso, mas, finalmente, pude compreender

que esse trabalho configurou-se num ponto de partida e não num final de um

processo. Concluo, portanto, que a partir desse momento inicia-se um novo

caminhar!

Os dois anos de mestrado marcaram e mudaram minha vida e meus

objetivos profissionais. Esse tempo foi sentido como tempo de aprendizagem

intensa, das muitas descobertas e da possibilidade de unir a teoria à prática.

Nesse período, pude cursar disciplinas, encontrar pessoas e com

elas compartilhar as alegrias, angústias e tristezas da vida acadêmica,

profissional e pessoal. Alegria por compartilhar e aprender com essas pessoas

a ser uma leitora crítica, preocupada em dar sugestões pertinentes para a

melhoria dos projetos e, principalmente, aprender com elas a ouvir e

internalizar críticas sobre o meu projeto. Angústia com a pressão da

orientadora, a querida Ciça, por temer a censura castradora dos acadêmicos,

por ter medo de não encontrar o fio da meada. Angústia por me envolver em

coisas demais, ser convidada a trabalhar na Coordenadoria de Educação

Freguesia/Brasilândia e não poder estar presente em todos os eventos

familiares.

As pilhas de livros e de textos que se amontoavam por todos os

cômodos de minha casa foram companhias permanentes neste percurso. Além

deles, a participação em simpósios, cursos e congressos foi marcante para

meu desenvolvimento e, com eles, os contatos e as trocas de informações

foram se ampliando, a visibilidade do projeto foi crescendo.

As qualificações – as informais e a formal – foram etapas que

trouxeram novos rumos para a dissertação. As informais realizadas pela

Adriana, Cristina, Ermelinda e João, todos colaborando com sugestões e

questionamentos que me fizeram repensar, afinar, trocar a ordem, tirar

algumas coisas e acrescentar tantas outras. Já na qualificação formal, pude me

valer das orientações apresentadas pela Professora Drª. Anna Rachel

Machado e, pela hoje doutora, Otília Ninin.

Os dias que antecederam a qualificação (momento em que escrevo

essa conclusão), me faziam acordar no meio da noite preocupada, pensando

na dissertação e tentando achar um rascunho e caneta para registrar os

pensamentos desenvolvidos pela insônia. Assim, pude entender estes dois

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

120

anos de LAEL, perceber o processo de escrita da dissertação como um

processo de gestação e de nascimento, que exige força, paciência, que mexe

com meu ser e faz com que, no processo do entendimento que acontece aos

poucos, sinto a presença de Deus e, emocionada, agradeço! Penso nas

bênçãos derramadas, no sofrimento que gera aprendizagem e

desenvolvimento, recordo todas as pessoas envolvidas no processo e choro.

Finalmente, nasceu!

Com a elaboração desta dissertação, aprendi que essa visão de

ensino-aprendizagem, na perspectiva sócio-histórico-cultural, pode colaborar

para transformar a escola em um lugar onde são formadas pessoas críticas,

para poderem atuar na sociedade e, por conseguinte, transforma-la. Percebi o

incrível poder e a pesada responsabilidade que nós, professores temos em

nossas mãos e aprendi que ações simples podem ter um efeito grande na

constituição do sujeito e na transformação de sistemas de atividade dos quais

participamos.

Aprendi que o mais importante é conseguir relacionar o conceito

cotidiano, do senso comum, ou seja, aquilo que cada um traz para a sessão

reflexiva da sua experiência e história, com o conceito científico, aquilo que é

ensinado e aprendido. A junção desses dois tipos de conhecimento produz o

conhecimento verdadeiro e é o ponto crucial do trabalho que acontece na zona

de desenvolvimento proximal, conforme discutido por Vygotsky e pelos neo-

vygotskianos. É um conhecimento que implica problematizar, é fazer uso de

perguntas como instrumentos de mediação semiótica, as quais possibilitam a

formação do pensamento crítico.

Além da visão cultural de ZPD, entendi que a aprendizagem e

desenvolvimento são um processo de construção social, mediado pela ação do

outro, no qual há uma fusão de experiências históricas e culturais e os sujeitos

estão em constante formação e ajudam na formação de outros sujeitos.

A investigação sobre os sentidos, que entendia (e entendo) fazer

parte do processo de ensino-aprendizagem dos alunos e das participantes da

pesquisa, foi determinante para perceber que não adianta iniciarmos um

trabalho de preparação para a escola, sem termos a oportunidade de refletir

sobre as questões históricas e culturais que se ligam ao ofício de ser professor.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

121

A educação na visão sociocultural e a formação crítica têm muito a

colaborar para revelar a situação acima apontada. Portanto, tanto a

preparação do professor, como a prática de sala de aula precisam ser

reavaliadas. Em que medida damos aos nossos alunos a oportunidade de fazer

ligações do conhecimento científico com o conhecimento espontâneo? De que

forma enfatizamos a aula como um modo de ser no mundo, como uma forma

de fazer com que nossa voz seja ouvida e respeitada? Como fazer uso de

novos instrumentos ou mesmo usar, de formas diferentes, alguns que já fazem

parte da nossa prática? Como trazer para a sala as experiências e histórias dos

alunos e professores, de modo que elas passem a fazer parte integrante do

currículo? Como podemos formar professores e alunos críticos que possam

interferir positivamente na sociedade, como cidadãos? Essas constituíram as

questões importantes que foram suscitadas e discutidas ao longo deste

trabalho e que podem colaborar para um melhor entendimento e atuação em

contextos de formação de professores.

Dessa forma, esse trabalho aponta para a necessidade de formação

do professor para trabalhar na escola. Entretanto, não basta o conhecimento

sobre a necessidade dos alunos. O professor precisa ser formado como um

educador crítico e cidadão que possa valorizar o espaço da sala de aula como

decisivo para a formação de alunos críticos e cidadãos. Só poderemos

transformar o nosso discurso cidadão em prática efetiva, se tivermos

oportunidade de vivenciar esse discurso na sala de aula, viabilizando-o em

ações.

Cabe a nós, estudiosos dedicados à lingüística aplicada, que

acreditamos no poder da linguagem como instrumento de mediação semiótica,

que estudamos e trabalhamos com a teoria sociocultural e que nos propomos

analisar os discursos humanos, dar início a este processo de mudança e

transformação, começando pelo nosso próprio discurso e ação, nos sistemas

de atividade dos quais participamos. Estaremos, assim, contribuindo para que

os professores desconstruam os sentidos negativos que geralmente atribuem

ao ensino-aprendizagem dos alunos.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

122

Para onde vamos...

“Era uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um

pássaro para mantê-lo cativo em sua casa. Conseguiu pegar um filhote de

águia. Colocou-o no galinheiro junto com as galinhas. Comia milho e ração

própria para galinhas. Embora a águia fosse o rei/rainha de todos os pássaros.

Depois de cinco anos, este homem recebeu em sua casa a visita de

um naturalista. Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:

- Esse pássaro aí não é galinha. É uma águia.

- De fato – disse o camponês. É águia. Mas eu a criei como galinha.

Ela não é mais uma águia. Transformou-se em galinha como as outras, apesar

das asas de quase três metros de extensão.

-Não – retrucou o naturalista. Ela é e será sempre uma águia. Pois

tem um coração de águia. Este coração a fará um dia voar às alturas.

-Não, não – insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará

como águia.

Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia,

ergueu-a bem alto e desafiando-a disse:

-Já que você de fato é uma águia, já que você pertence ao céu e não

á terra, então abra suas asas e voe!

A águia pousou sobre o braço estendido do naturalista. Olhava

distraidamente ao redor. Viu as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou

para junto delas.

O camponês comentou:

-Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha!

-Não – tornou a insistir o naturalista. Ela é uma águia. E uma águia

será sempre uma águia. Vamos experimentar novamente amanhã.

No dia seguinte, o naturalista subiu com a águia no teto da casa.

Sussurrou-lhe:

-Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe!

Mas quando a águia viu lá embaixo as galinhas, ciscando o chão,

pulou e foi para junto delas.

O camponês sorriu e voltou à carga:

-Eu lhe havia dito, ela virou galinha!

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

123

-Não – respondeu firmemente o naturalista. Ela é águia, possuirá

sempre um coração de águia. Vamos experimentar ainda uma última vez.

Amanhã a farei voar.

No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo.

Pegaram a águia, levaram-na para fora da cidade, longe das casas dos

homens, no alto de uma montanha. O sol nascente dourava os picos das

montanhas.

O naturalista ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe:

-Águia, já que você é uma águia, já que você pertence ao céu e não

à terra, abra suas asas e voe!

A águia olhou ao redor. Tremia como se experimentasse nova vida.

Mas não voou. Então o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do

sol, para que seus olhos pudessem encher-se da claridade solar e da vastidão

do horizonte.

Nesse momento, ela abriu suas potentes asas, grasnou o típico kau-

kau das águias e ergueu-se, soberana, sobre si mesma. E começou a voar, a

voar para o alto, a voar cada vez para mais alto. Voou ... voou ...até confundir-

se com o azul do firmamento...” (Boff, 1997: 27-34).

Ao finalizar esta dissertação, penso em asas, no vôo dos pássaros e

o quanto e como essas metáforas estão presentes no meu trabalho de

professora. Hoje, vem viva, na mente e na ponta do lápis, a imagem, a

metáfora do pássaro, das asas. E penso nos meus alunos, na exclusão social,

no preconceito. Penso nos meus encontros com a Júlia e, penso no ser

possível. Na discussão, nas sessões reflexivas, nos sentidos construídos e

atribuídos, na liberdade de se expressar, no fortalecimento das asas, na

percepção da força que cada um pode descobrir em si. Na responsabilidade de

ser um multiplicador do ser possível.

O professor tem, sim, esse poder, de dar asas, de motivar e

incentivar o vôo. Eu aprendi a criar espaços de discussão e reflexão com a

Júlia e aprendi que posso, que ela pode, que cada um pode transformar os

sistemas de atividade, nos quais participamos, como o ser possível. O vencer o

limite com o ser possível, usando, para isto, instrumentos que podem ser novos

ou velhos, não importa. Importa, sim, o novo olhar, o que fazer e com o que

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

124

fazer para o ser possível. E a sociedade pode ser muito melhor com o ser

possível. As asas estão prontas e fortalecidas. E vou voar em direção a um

sonho que começou a ser sonhado desde o início do trabalho com a formação

de professores – formá-los para trabalhar com a heterogeneidade, com a

história de cada aluno, respeitando-a e valorizando-a.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

125

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ANEXOS

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

134

Sessão Reflexiva – Lu – 03/11/2005

Pesq.: Me fala um pouquinho sobre a sua formação.

Lu: Silêncio.

Pesq.: Desde quando você entrou no magistério

Lu: Então, por que foi assim. Não foi assim,

eeuuu optei em fazer ooo magistério. Né? Foi uma coisa praticamente imposta, né?

Por que na época era o que tinha à tarde, não tinha mais o ensino médio na escola à

tarde, e, então foi o que sobrou, por que não podia estudar à noite, sobrou o

magistério. Então, foi assim né? Pratica... imposto. Aí, eu comecei. Mais assim, não

era o que eu pensava, não era o que eu queria, né? A minha formação no magistério,

aí eu fui me adaptando né? Também não era aquela coisa “Eu não quero!”, eu vou me

adaptando. Aí, eu fui me adaptando, e a professora era muito tradicional, né? Então, a

gente, sabe, a gente, a gente viu no caso, Piaget muito, muito o pouco que estava no

livro, foi aquilo. Ela nunca entrou em detalhe e nada, por que o que ela passava para a

gente, era você fazer aquela pastiiinha, sabe?, fazer os “exercíciozinhos” de

motricidade, coordenação, sabe, era o que ela dava. E ela era bem nova na época, ela

tinha 26 anos, ela era bem nova, né. EEE, o Vygotsky, a gente nunca nem ouviu

faalaarr, só na faculdade, sabe. Então, foi um negócio que passou em brancas

nuvens. Então, quando eu me formei mesmo, você não, a gente não tinha aquela

base, não posso falar nem em base, mas a gente tinha aquela pasta, né? EEE, a

gente não fazia estágio, nosso estágio o que era? Você dar flooor para a criança, você

dar lanche para a criança, por que não tinha funcionário na escola, sabe, então foi

uma formação assim, né? Não foi formação. Então, eu só fui pegar os alunos e ter

contato, quando eu entrei mesmo na, no Estado. Aí, comecei como estagiária, então

como estagiária, eu ia e pegava a sala quando o professor faltava e, dava aquela

continuação do, continuação não, não era nem continuação, ooo, muitas vezes o

professor passava alguma coisa para você dar dando, outras vezes você olhava o que

tinha no caderno e ia passando, e era de primeira à quarta série, né?

Pesq.: Esse estágio era referente ao magistério?

Lu: É, assim. Não, não era referente ao magistério. Já tinha terminado o magistério, e

então para você poder começar, antes de você prestar algum concurso, você podia

entrar como estagiária. Tinha essa opção, né, eee, você ia até a delegacia de ensino,

preenchia um cadastro e, eles iam chamando. Tinha escola que estava precisando,

você escolhia as escolas. Era até fácil assim, depois de algum tempo tiraram essa

fu7nção do estagiário, era bom, era bom, né? Então, eu fui aprender aí, aí que eu fui

aprendendo mesmo, mais aquela, primeira à quarta série, nada deeee, deee educação

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

135

infantil, né, nada de educação infantil. Então, aí, quando surgiu uma sala, aaa vice-

diretora, ela, ela perguntou se eu queria, né, pegar uma sala que estava vaga. E ela

tinha, eu podia ta pegando, por que como estagiário a gente ficava dois anos só, né, aí

como eu peguei a sala, aí, eu já, já peguei a sala e, ficava como estagiário de manhã e

ficava à tarde como ACT.

Pesq.: O que significa ACT?

Lu: Aí, não sei a sigla viu, eu sei que “Fulano é ACT, ACT”, tem lá o que significa

mais, eu nunca procurei saber, por que, aí que coisa ridícula né (risos), mais eu nunca

procurei saber o que era ACT, o que não era grande coisa também não, por que, a

assim, aqueles professores mais velhos eles vêem a gente assim, “Você não passou

no concurso !’, então ACT está abaixo, abaixo do abaixo do lixo acho (risos). Então, lá

eu só tinha amizade com uma professora lá, só uma é que vinha, conversava,

emprestava material, então as outras, nossa, ACT não vale muita coisa não sabe?

Não é que nem aqui, a gente tem as meninas que são adjunto né, que é praticamente

o que a gente fazia, eu to dando aula a mesma coisa, né, e a gente tem uma amizade

normal. Lá não, sabe, tinha aquela separação, mais tudo bem! Aí eu dei aula no

Estado, fiquei 7 anos e oito meses, aí de repente eu saí, não quis mais o Estado,

assim, saí, larguei mesmo, não quis saber, e quando surgiu a, o concurso para a

prefeitura eu, aí sim, eu fiz a faculdade, já estava fazendo a faculdade, aí já é outra

coisa, por que você vê outras coisas...

Pesq.: Aí você, mais aí você

entrou na faculdade de pedagogia porquê?

Lu: Por que eu ia perder o magistério, eu ia perder o magistério se eu não fizesse até

2007, quem, né, a gente perde o magistério. Aí, eu falei “Não, vou fazer”, por que já

que eu estava, né, na, não é que, eu comecei a dar aula comecei gostar, né, eu vi que

tinha alguma, alguma coisa a ver comigo, né, não tudo a ver, mais alguma coisa

(risos) a ver. Era bom, é legal ,né, eu passei por muitas escolas, conheci muitas

pessoas boas assim, né. Uma escola é diferente da outra, tudo é diferente. Os

professores são diferentes, a direção é diferente, cada lugar é um lugar, então, é muito

legal, né. Então, aí eu comecei na, fiz a faculdade e, como o concurso já ia sair já logo

no final do ano, eu tava terminando a faculdade, foi tudo assim, mais fácil né, prestei,

passei eee, já vim para cá, já escolhi aqui mesmo e, aqui que eu comecei com

educação infantil. Apesar de já ter na formação no magistério, o último ano era

educação infantil, mas eu não me lembro de ter visto nada de educação infantil, nada,

sabe, nada, nada, nada, nada. Era a continuação daquela pastinha ...

Pesq.: Isso já na faculdade?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

136

Lu: Não, não, não, no magistério que você tem o último ano é educação infantil, mais

muito assim, muito sabe? Uma coisa muito fraca. Por que a minha sala de magistério

foi a segunda a se formar, então era assim, os professores muitos não sabiam nem a

matéria direito que davam dando, por que eu tive ô, no último ano, tive histórias

infantis, era uma matéria, a professora veio era de língua portuguesa e ela falou assim

“ô gente, é, essa, educação infantil, essa matéria assim de histórias infntis, eu não sei

nem como vou dar dando para vocês!” Então, a gente tinha um caderno, aquele

caderno que parece uma ata né, então nesse caderno era escrito todo o livro de, de,

não vou lembrar o nome da matéria, de, mais uma matéria específica do magistério, e

que era transcrito lá, e no final, você tinha essa parte de, durante os três anos o livro

foi passado para este caderno, e no final tinha essas histórias infantis. Então, éééé,

ela contava tudo que ela pesquisou, ela vinha contar para a gente, sabe assim, o

fundamento da, da história infantil de uma ou outra né, por que nem ela sabia. Então

aquela coisa bem “dada nas coxas”mesmo sabe.

Pesq.: E aí na pedagogia você viu alguma coisa de educação infantil?

Lu: Então, aí sim, aí na Pedagogia eu já vi alguma coisa, não muito também por que,

tinha uma professora que dava aula, ela dava duas matérias que agora eu não me

lembro, então, a matéria dela era dado no magistério. A gente trabalhava com coisas

assim, trabalho manuais, o que eu tinha que ter feito lá, alguma coisa no magistério,

ela repetiu, tangran, blocos lógicos, material concreto para você trabalhar com a

criança assim, éééé, grosso, fino, áspero, liso, e, como a gente dava muito seminário,

né, a gente trabalhava muito com seminário né, a gente procurava dar dando essas

aulas de educação infantil também, e no final, a gente sempre dava um brincadeira

para estar trabalhando com a criançada né. Nessa matéria específica a gente viu

alguma coisa de educação infantil né, mais aquele negócio, quando eu vim para a

educação infantil, a minha idéia ainda, ainda é toda de ensino fundamental, então, por

exemplo, eu estou com as crianças, eles são pequenos, mais na minha cabeça, eu

vejo eles maiores, eu vejo eles assim, como se eles estivessem com 7/ 8 anos não

consigo vê eles pequenos, eu só consigo enxergar eles pequenos quando estão perto

dos pais, aí eu vejo que eles são pequenos, éééé, estranho né, então, eu converso

com eles como se eles tivessem 7 anos, éééé, então quando eu vou dar, a matéria

mesmo que eu vou estar trabalhando com eles éééé, então na minha cabeça, eles

estão entendendo, eu sei que não é, né, eu explico, explico e depois fica, sabe, eu

sinto aquela falha como, não foi bem expli8cado porque eles são pequenos, sabe,

então é difícil assim, para eu ta saindo do ensino fundamental e estar aqui com eles,

sabe. Então, no primeiro ano, meu primeiro ano que eu entrei aqui na escola com o

terceiro estágio, era um pouco mais fácil por que eles já tinham uma base, então eu

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

137

trabalhava como primeira série, né, agora, o ano passado quando peguei segundo

estágio, eu já fiquei meio perdida, e esse ano então vicheeeeeeeee, esse ano, eu já

peguei a sala da outra professora né, eu ano acho que foi pior, então, eles, como eu

queria, assim, ah, eu já quero pegar, não escrevendo, mas sabe, eles copiando, eles

sabendo pelo menos o nome, que é o que eu pegava na primeira série mesmo,

entendeu? E pegando eles assim, cru, ééééé, difícil, né? E quando eu peguei agora,

no meio do ano, então eles não sabiam nem usar o caderno, não sabiam usar a linha,

sabe? Então, tive que começar do zero, e até hoje quando aluno vai escrever, ele não

pega uma linha para escrever, ele pega duas, três linhas, aquela letrona sabe?, então,

é aquela coisa que tinha que ser trabalhada lá no começo e que não foi!, o que teria

que ter sido feito e não foi! Não é que eu culpo a menina, a Renee, no caso né?, ela

trabalha a educação infantil que eu acho certo, eu já quero trabalhar ensino

fundamental.

Pesq.: Qual é a educação infantil que você acha certa?

Lu: Então, que é trabalhar assim, igual éééé, as brincadeiras mesmo, as musiquinhas,

trabalhar bastante com sucata, com brinquedos mesmo. Por que quando eu dou

brinquedos para eles, eu fico louca com eles brincando, por que eles fazem aquele

auê! Eu não quero que saia nada fora, sabe? Então tipo, fulano está naquela mesa, o

fulano tem que ficar naquela mesa, não tem que ficar saindo, misturando os

brinquedos, eu não gosto nem que misture os brinquedos. É, e isso é horrível, por que

eu vejo assim, né, exemplo em casa, minhas crianças quando brincam com os

brinquedos eu faço separar tudo, “ah, casinha, isso aqui é casinha é aqui, é bloquinho

de montar é aqui, é maquiagem é aqui, é carrinho é aqui”, eu faço eles separarem

tudo, não gosto de ver aquela muntueira! Nossa, sabe, eu me sinto mal! Então,

quando eles misturam, nossa, eu falo “Vamos gente! Vamos gente! Vamos separar!

Separar!”, hoje em dia eles já não misturam tanto os brinquedos! Ce vê, e é ruim isso!

Eu não consigo trabalhar! Se vejo aquela coisa misturada, eu não consigo trabalhar!

Não consigo pegar aquele monte de brinquedo e vou dando tudo misturado. Aí as

crianças ficam “Professora, e a fazendinha?”, quer dizer a fazendinha já era, por que

um cavalo ta aqui, um boi está ali, então né?, então eu falei, “Não, vamos separar

tudo!” As meninas brincam com as panelinhas, as bonecas, tudo separadinho, os

meninos tive que comprar a fazendinha, eles gostam de carrinho, tudo separado!

Então, ééééé, difícil!! Entendeu, ta separando, ainda, na minha cabeça ainda é

complicado por que, eu não fiquei muitos anos dando aula, só sete anos e meio, não

são tantos anos. Mais na minha cabeça está tão sedimentado que agora é difícil parar!

É difícil parar! Então, eu acho, há muitas falhas assim, quando eu estou trabalhando.

To dando letra maiúscula, eu trabalho como na primeira série,né? Eeee, eu não

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

138

deveria ser assim, deveria ta trabalhando, éééé, bem assim, bem para a idade deles,

pegar a letrinha pendurar no pescoço, várias crianças com aquela letrinha no pescoço,

ah, mais eu não tenho essa paciência, sabe, de estar fazendo, aí tem meia dúzia

berrando, gritando, correndo, né? Aí, se eu começo alguma coisa assim eu já

desanimo, por que eu to vendo aquele povo que não está interessado, pó que tem

aqueles que quê brincar, tenho o Mateus que é bem bebê, que agora está na minha

mesa, sabe? Então, eu tenho que dar atenção para ele, e tenho que trabalhar

diferente com coisas bem de bebê, sabe? Então, ééé ....

Pesq.: que é um estágio a menos .....

Lu: isso a menos! Por que o Mateuszinho era para estar

no primeiro estágio, então, eu dô, assim, pego uma lição para ele separado, então o

que eu faço, “Ô, esse é um quadrado!”, aí eu desenho um quadrado para ele, “Pega o

lápis vermelho!”, ele não sabe qual é, daí eu dou o lápis para ele. “Pinta dentro!”, aí ele

fica pintando dentro, então fica. Antes eu tinha que ficar em cima, por que a gente não

via nem a cor do lápis, lápis de cera né? Agora ele já consegue pintar um pouco mais

forte! “Ô, agora é o círculo!”, faço o círculo para ele, “Pinta dentro com lápis amarelo!”,

então, trabalho as cores primárias primeiro com ele né?, eee, não saí disso ainda, das

cores primárias, por que ele não sabe! E as formas né? E as formas, e colagem que

eu dei para ele, “Cola o barbante no quadrado!”, agora ele já consegue já,

devagarzinho. Ele faz certinho, ele já está conseguindo, né? No círculo, no quadrado

e, eu acho que no retângulo também. Mais, assim, eu tenho que fazer um trabalho

com ele separado, né? Ainda com vinte pulando né, pulando, gritando, correndo, e,

mesmo assim, eu tento dar aquela atenção para ele. Então, eu vou te falar, não, não,

não é fácil viu! Apesar que ééé, como eu gosto do ensino fundamental, eu sou agitada,

então “Vamos gente! Vamos! Vamos! Vamos! Já fizeram?” (risos), então, eles já

pegaram aquele ritmo de fazerem, eu estou dando a lição eles já estão me

entregando, né? Então quer dizer, eles fazem muito rápido, ééé, então, as crianças

copiar eles copiam, a maioria, copia bem, mas entender que é que ta! Não são todos

que compreendem, “Essa é a letra A. Essa é a letra B”, sabe, então copiar eles copiam

muito bem, o entendimento..., sabe aquela, eu tenho ainda comigo na cabeça, ééé, a

quantidade, então eu vou dando, eu quero dar é o alfabeto! Sabe, eles tem que estar

copiando, copiando o nome, ta copiando o alfabeto! Éééé, eles vão saber as letras? Aí

é que ta! Eles vão saber! Então, é um ou outro que sabe, né! Então, para estar

trabalhando esse entendimento deles eu ainda não consigo, estar trabalhando de um

jeito que eles vão estar identificando bem as letras, sabe, aí, aí, eu não consigo, não

consigo chegar ainda aí, essa aula acho que faltei!!!

Pesq.: Éééé, o que você acha de ser professora? E qual é a função do professor?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

139

Lu: Então, ser professor é o ensinar mesmo né, não é só o ensinar a ler e escrever, é

o ensinar praticamente tudo! Por que as nossas crianças do jeito que elas vem pra cá,

elas vem sem saber muita coisa, por que, em casa a família deveria estar ensinando e

eles não sabem, então, ser professor é você estar ensinando tudo, né, tudo! Eu acho

assim, como a gente tem muita criança na sala eu não consigo chegar em todas, eu

acho que não dá para chegar em todos! Então tem aqueles que você vê que são mais

espertos que você vai ensinando e eles vão aprendendo, mais tem aqueles que você

tem que dar uma atenção maior, então, eu vejo que eu sinto essa falha em mim! Né?

O Wesley Santos, vai para a primeira série e não consegue copiar o nome! Consegue

copiar assim, eu ponho em baixo da folha e ele passa por cima, assim! A Tacila

também, vai para a primeira série e não sabe nada! Nada! Nada! Do mundo!, sabe?,

nada coitada, e vai para a primeira série. Aí, eu tinha que ter mais tempo com esses

alunos, estar trabalhando várias coisas como, cores, então quer dizer, é uma outra

fase, em cima do Mateus, né, estão numa fase superior a do Mateus, eles entendem

um pouco mais, só que, tem algumas falhas neles também! Sabe, eu acho que vem, é

de família! Sabe, é difícil falar né, é difícil, eu to falando um negócio que eu também

não entendo!!! É só o que eu acho,né? Igual, a mãe da Tacila, ela não pode ajudar por

que é analfabeta, então, a menina já perdeu muita coisa por que os alunos que você

dá a lição e a mãe trabalha em casa, nossa!, Eles estão indo muito, eles estão

progredindo né?, Por exemplo, a Gabriele, ela não, ela tem problema de linguagem,

ela não fala nada direito, né, eles não conseguem entender nada o que ela fala! Ela

não escrevia nada, agora!, ela já consegue copiar, já, já, consegue fazer o nome,

então, a mãe mandou o caderno! Além da lição que eu mando, aquelas lições que são

soltas, a mãe mandou o caderno, então além das folhas, ela vai fazendo as lições que

eu vou mandando né?, Ela está entendendo? Entender mesmo, ela não está

entendendo! Ela não sabe o que é A, B, ela não sabe! Mais o nome dela ela já

consegue copiar por que, ela não conseguia fazer nada, né?, Se você pedir: “Circule

essa letra”, ela não sabe o que é circular, ela sai circulando tudo! Ela não sabe o que é

o A, então, sei lá, é algum outro probleminha que ela também têm. Eu tinha que ter

mais tempo com ela? Tinha, mais...não dá! Sabe, na minha sala eu fico muito tempo

assim, “Fulano, senta!’, “Beltrano, não corre!”, “Fulano, onde ce ta?”, ta lá no banheiro,

vamos lá buscar o menino, vamos lá, vamos lá, e o Fulano está se molhando, sabe,

então eu perco muito tempo com isso! Olhando esses que estão bagunçando!

“Professora, fulano me bateu!”, “Professora, fulano me arranhou!”, “Professora, tem

gente chorando!”, aí, então, é fogo né? São as falhas né?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

140

Pesq.: Eeee, essas falhas você, ééé, você já vê que estas falhas são problemas da

função do professor? Ou você acha que tem mais problemas da função de ser

professor?

Lu: É, se a gente for entrar e ver todos os problemas, no caso, o professor né, o que a

gente enfrenta, a gente não daria aula! Eu tiro por mim, por exemplo, éééé, eu estou

aqui, dou aula tudo né, mais a minha cabeça, muitas vezes, está em casa! Por causa

das crianças, então, esse é um problema? Eu acho, que esse é um problema para

mim, muitas vezes, eu não consigo separar ....

Pesq.: Mais você acha que todo o problema da função do professor parte de você?

Lu: Não! Não só de mim, eu citei um problema né? Citei um problema. Outro

problema, eu teria que ter mais tempo para estar trabalhando as aulas, quer dizer, nós

fazemos a JEI, então, tudo bem, a gente lê os livros, discute ...

Pesq.: A gente discute na JEI?

Lu: NNNão!, não, não mais seria o que? A gente deveria estar discutindo o livro, o que

a gente faz né?, Éééé, tudo bem, a gente não faz , mais eu poderia estar fazendo

outra coisa, eu acho, não estar lendo os livros, eles são até bons mais, eu poderia

estar éééé, éééé, montando a minha aula para estar trabalhando com eles. Eu poderia

estar montando três aulas diferentes por que, eu tenho tantos problemas na sala, eu

tinha que montar três aulas diferentes, que é o que eu queria, então, eu não posso

fazer, não tem como sabe, não tem como, em casa eu tenho as crianças, entendeu?,

não tem como!, por mais que eu queira né?. Eu acho assim, a JEI ela tinha, um dia

nós discutiríamos um livro, um texto ou alguma coisa referente, sabe, mais nos outros

dias eu queria estar montando aula para os meus alunos,né! Então, a gente lê os

livros, tudo bem são livros ótimos mais, a gente não discute eles né?, e, e, eu não faço

as minhas aulas. Então, quando eu entro nas minhas aulas às vezes eu não sei o que

eu vou dar!! Né, por que em casa não deu para eu montar, aqui também não!, então,

então, aí é mais um problema! É mais um problema! Ééé, algum outro problema? Ás

vezes, os próprios pais! Eles acham que é o professor que tem que estar dando tudo

mesmo, educando, né?, estar ensinando, então tem muitos pais que não cooperam

né? Não ajudam! Então, por exemplo, manda a lição de casa, tem aluno que não traz

a lição de casa desde três semanas atrás, então, a mãe não está vendo isso! Puxa!

Não olha a mochila pelo menos uma vez na semana! “Fulano, você fez a lição?”, “Ah,

não fez, vamos dar uma olhadinha!”, sabe rapidinho. Tenho aluno que faz sozinho,

então quer dizer, ele não leu o, não sabe ler, não sabe o que esta pedindo o texto

então, ele só pinta! A mãe não podia estar, pelo menos, dando uma olhadinha! Sabe,

à noite correndo, por que, eu faço isso em casa, to fazendo a janta o Caio vem com o

material dele e, é ali, na hora! Sabe, eu to fazendo comida vou olhando, olhando a

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

141

Júlia, vendo o que a Priscila fez à tarde, essa correria, sabe?, então, acho que falta um

pouquinho de interesse dos pais, entendeu? Acha que a criança só está pintando, não

lê nem o enunciado do que está pedindo, acha que é só pintar! Então, esse é um outro

problema que vejo, os pais que não cooperam! Só!

Pesq.: Só não, mais tudo isso!!! Se a gente for ver é muitas coisa!

Lu: UHUHU!

Basicamente é isso. Se a gente for procurar vamos encontrar mais. Basicamente é

isso!

Pesq.: E isso te incomoda!

Lu: Ééééé, UHUHUH!!!

Pesq.: Quais são seus objetivos como professora?

Lu: (silêncio) Oobbjetivos?! Não sei, ai, se eu tenho algum objetivo! Por que a minha

vontade assim, é uma vontade que eu tenho, ééé, no caso, de estar melhorando. Já

que eu estou na Educação Infantil, eu queria me infiltrar mesmo na Educação Infantil!

Então, algum objetivo de eu ta assim, estudando mais, assim, eu pretendo mais,

como eu tenho a Júlia pequenininha, então, eu nem penso nas coisas que eu tenho

vontade de fazer, eu nem penso, por que eu preciso estar cuidando dela, então, eu,

eu, eu não quero misturar isso, as vontades que eu tenho. Então, quando ela crescer

mais eu começo a pensar em ter vontade (risos). Sabe, igual quando aconteceu com a

Priscila, ela nasceu, eu parei de trabalhar, não dei mais aula, quando ela começou a

crescer então, “Ta bom, agora eu vou fazer a faculdade, e eu vou dar aula!”, daí ela já

não estava tão dependente, aí eu podia ter vontade! Eu não gosto muito de misturar

assim....

Pesq.: Mais assim, mesmo você ééé, nas conversas que

tivemos nestes dois anos, uma coisa que você quer muito fazer é a pós...

Lu: Isso!!! (sorriso) É eu quero muito!

Pesq.: Mais tirando isso, tirando esta questão da

pós, qual é o seu objetivo como professora, aqui, na EMEI? Essa vontade de fazer a

pós você vai deixar um pouquinho mais para frente, como professora o ano que vem,

não que esse ano não dê, mesmo porque, nada está perdido! Então, vamos melhorar,

até o final do ano qual é o seu objetivo?

Lu: Aí! É! Ô! Se fosse até o final do ano o meu objetivo, a minha vontade, é que eu

consiga, pelo menos, é ah, não a classe inteira, lógico que isso eu não vou conseguir

mas, uma pequena quantidade deles que conheçam as letras ou metade do alfabeto,

isso não é pedir demais né? Ah, eu não sei! Essa era uma vontade que eu tinha! Era

uma vontade mais....Ce vê, isso é difícil! Agora, por exemplo, para o ano que vem, que

eu vou estar com a classe desde o início, eu vou estar fazendo tudo do meu jeito! Vou

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

142

estar iniciando com o caderninho desde o começo, eles já vão estar sabendo usar a

linha, então, eu quero estar fazendo um trabalho assim, diferente mesmo né, seguir

algum livro, sabe, para eu não me perder. Fazer como você faz!, Eu achava se eu

seguisse o livro eu, ééé, ia me perder, por que o livro não segue o alfabeto, eu queria

aquela coisa assim, como chama, ce vê, não perdi as raízes do tradicional, seguir o

bendito do alfabeto. Eu achava se eu não desse na ordem, eu iria me perder! Apesar

que agora eu acho que não é tanto assim, mais antes eu achava que se eu não

seguisse eu iria me perder. Sei lá, coisa boba né, mais.......

Pesq.: Não, não é boba! Isso é importante para você!

Lu: É né? Mais o ano que vem eu tiro, nas

férias, alguns dias para estar fazendo um projeto de como eu vou trabalhar durante o

ano inteiro, como você faz! Que é o que eu não consegui fazer! Nunca consegui fazer

esse projeto. Que é para eu estar seguindo, seguindo, mesmo para eu não me perder.

Que é o que acontece muito. Eu me perco, vou pegando o que as outras meninas vão

me .... Por que quando eu entrei aqui, eu trabalhava como, as meninas iam me dando

os materiais e eu ia passando, então, o que elas davam eu dava, então, quer dizer, eu

ia atrás delas! As crianças já vieram do segundo mesmo, eram delas, então foi aquele

seguimento que eu dei. Agora, como eu peguei o segundo o ano passado, aí eu já me

perdi né? Aí, eu ia estar dando o início, eu ia estar dando o início, eeee, eu is estar

dando o início, assim, errei muito, acho que errei muito, em não estar iniciando, é

melhor pegar o terceiro que já está meio caminho andado, você continua, agora no

segundo, você inicia, é difícil, sabe, é difícil.....

Pesq.: Principalmente quando a gente não tem experiência!

Lu: Então, aí é que está! Como,

como é que eu vou iniciar? O que eu posso estar dando? Então, o certo é estar

fazendo o projetinho e ir seguindo, que é o que eu vou fazer o ano que vem para eu

não me perder. Então, uma outra questão é que a escola poderia estar trabalhando

né. Foi falado nas reuniões mais assim, é, é, é um trabalho né, trabalhoso entendeu, é

trabalhar com os pais, sabe, do pai estar vindo um dia, da gente estar trabalhando

desde o cuidar do nenê até como arrumar uma casa. Eu acho que tem tantas falhas

aí, era uma coisa que eu acho que eu gostaria de fazer, sabe. Tudo bem, a gente

trabalha com as crianças tudo, isso aí é algo que você vai ver só lá na frente não é, e

os pais muitas coisas não foram trabalhadas com eles né? Muitos vieram lá do

Nordeste, eles não tem, eles não sabem como se cuida de uma criança, não sabe dar

banho mesmo, aquela coisa que, são matérias que deveriam ter na escola e que não

tem, sabe puericultura? Que tinha a muitos anos atrás e eu acho que deveria voltar,

por que a mulherada que está aí não sabe éééé, não sabe criar filho, não sabe cuidar,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

143

larga vai para a escola, larga na creche depois larga na EMEI e, vai largando nas

escolas, por que o Estado cuida, a prefeitura cuida, o CEU cuida e, elas mesmas não

cuidam, sabe? Então, é onde a gente pega muitas das nossas crianças assim com

muita falta de tudo ,né. Falta de tudo, educação, carinho, de tudo, você vê, até de

conversa, a própria fala, na minha sala mesmo, muitos, tem muito problema de fala na

sala. O ano passado não tinha tanto, no outro ano também não tinha já, este ano,

sabe, sabe, você vê como está o negócio! Então, para você estar trabalhando com a

criança que não sabe nem falar!!!! É muito complicado!

Pesq.: Ééééé, eu comecei a pesquisa com a Cris, com a Coordenadora da Escola,

mais por problemas pessoais a gente teve que, eu tive que prosseguir com a pesquisa

com você e, eu gostaria que você falasse mesmo por que você aceitou participar

desse trabalho de pesquisa?

Lu: É legal a gente estar, se vê, eu to falando, eu acho que é interessante essa

análise. Pó que você vai fazer uma análise né, de tudo que eu estou falando, né?

Pesq.: É mais ou menos. Por que a gente vai construir juntas. Iremos começar um

processo de construção do ofício de professor que antes, sistematicamente, a gente

não tinha, eram conversas informais

Lu: é, entre nós! Então, eu acho

ótimo isso assim, por que, você vai ver que, mesmo eu me formando lá atrás, que

quanta coisa, quantas falhas tiveram, e que, então, quer dizer, não é só comigo, né.

Então, é um geralzão né. O professor é muito mal formado? É, o professor é muito mal

formando, então, os anos que foram vindo o professor foi se deteriorando, foi se

deteriorando né, então, foi se deteriorando, o que se aprendia há vinte anos atrás, hoje

em dia, a gente não se, não se aprende. A formação do professor, ficou muito, muito,

muito assim desgastada, ééé, tiveram muitas falhas, é um negócio que precisava ser

revisto mesmo. O magistério agora é ensino superior então, ele tinha que ser muito

revisto, muito, em todas as matérias, não é só, principalmente, principalmente, o

básico este tinha que ser muito revisto!

Pesq.: Quais as necessidades que você espera que este trabalho de pesquisa que

estamos começando hoje venha suprir? O que você gostaria que a gente discutisse,

que a gente visse. Quais as necessidades que você tem e que você vê que é

importante pra gente, não ficar também só no falatório mas agir. O que você espera

que a gente discuta, veja ?

Lu: Olha, assim, eu acho interessante estar vendo outras falas assim, de outros

professores. É, para ver se eles sentem também essa dificuldade, que eu sinto, no

caso, eu sou nova na Educação Infantil, ééé, o pessoal que já está a mais tempo né,

que já sabe lidar mais, ééé, seria interessante estar vendo outras falas. Eu também

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

144

gostaria de estar vendo estas outras falas para eu poder eééé, me achar né! Meu pé

está lá no ensino fundamental. As meninas mais velhas né, a gente nunca sentou para

estar conversando mesmo, então, né? A maneira como elas trabalham é interessante

estar vendo outras maneiras de você trabalhar, né. Por exemplo, matemática, então,

de repente, eu não sei trabalhar matemática na Educação Infantil. Sabe, tudo aquilo

de pegar os palitinhos, sabe, já tentei mais, eu sinto esta dificuldade. Era interessante

estar vendo outras maneiras de, outros tipos de trabalho, no caso pra mim né? Agora

para você eu não sei (risos)

Pesq.: Eu acho interessante a gente sentar. O nosso problema aqui é a gente

conseguir um espaço comum.

Lu: É verdade, a gente não tem, é verdade! Nesse horário

só nós mesmo!

Pesq.: E aí, só com a gente como vamos fazer?

Lu: UUUU, deixa eu ver? Então, a gente poderia estar trabalhando e, trazendo livros

mesmo sobre Educação Infantil. Eu tava lendo, alguns da Marlene? Marlene? Marlene

Freire?

Pesq.: Madalena Freire.

Lu: Madalena Freire, e ela fala muito sobre creche, educação infantil. Então, quando

eu li para o concurso, li muito rápido né, para pegar o enfoque dela né, éé, não li muito

a fundo, ela fala bastante sobre educação infantil então, eu acho interessante.

Gostaria que a gente pegasse alguns autores que fale sobre educação infantil. Tem

muitos que escrevem maneiras de estar trabalhando, brincando, educação física que

trabalha com jogos. Eu até tenho em casa, alguma apostila, brincadeiras com jogos

que ta lá mais, eu não consigo nem pegar! No nosso horário de parque, a gente podia

estar trabalhando com eles de outro lado, pegar 70 alunos para brincar também é

complicado, né! Mais assim, enquanto uma turma brinca no parque a outra poderia

estar fazendo outra coisa, ta separando mesmo, né! Eu tenho as brincadeiras mais eu

não ouso pegar! Na verdade, eu preciso estar vestindo a camisa da Educação Infantil,

que é uma coisa que eu ainda não fiz!

Pesq.: Só pra gente fechar, ééé, como você vê seus alunos, principalmente, da

Educação Infantil? Você olha para eles e você os vê de que forma?

Lu: Ai, eu olho para eles assim, ai, eu vejo que eles éééé, aí, não sei, eles vão ser tão

mal formados, sabe? Por que, os que já vão para primeira série não deveriam ir.

Então, na primeira série éééé, a professora vai sentir esta dificuldade, vai estar

trabalhando com educação infantil, então ela vai ter que dividir a sala. Trabalhar como

educação infantil com eles que tem este problema. Então, eles vão ser muito mal

formados. Vão ser passados para a segunda sem saber nada, e para terceira e quarta

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

145

e assim sucessivamente, sabe, então, eles vão aprender quando, lá para a quarta

série, quinta sabe-se lá Deus quando?! Uma sala de quarenta alunos então, o que eu

vejo é que eles serão mal formados!

Pesq.: O que é educação infantil para vocÊ?

Lu: Educação Infantil é o brincar, a hora da música mesmo, trabalhar com fantoche,

que eu acho legal, eu gosto disso, trabalhar com fantoche, mais éééé, o problema que

eu sinto na sala, o dia que eu levei o fantoche nossa!!! A sala pegou fogo, eu não

conseguia falar, eles pareciam que estavam vendo coisa de outro mundo, ficaram tudo

nossa!!! Eles adoraram, adoraram, mais eu não conseguia nem, nem, falar com eles.

Deixei eles pegarem os fantoches, brincaram, mais, eu sinto que se eu fosse dar um

peça com fantoche, nossa!!!! Ia, não dá! A sala não obedece! Na hora que é para ficar

quietos eles não ficam! Você vê na hora do filme né, são poucos aqueles que se

concentram, sabe, eles não tem aquele interesse de assistir o desenho, o filme. Eles

tem uma falta de concentração, nada, nada, nada segura eles ali! Não é a sala inteira,

mas tem aquela meia dúzia que eles tiram todo mundo do sério! Sabe, então, acho

que em casa eles não sentam para assistir uma televisão, eles não ficam quietos, não

prestam atenção! Acho que a mãe fala “Vai lá brincar, ficam lá pulando ! Vai para a

rua!”, aí, fica aquela criança agitada, agitada que até dormindo não fica quieto! Se eu

for dar um teatrinho, por que eu tinha vontade de dar um teatrinho e tudo, ééé, a

história não sai. Por exemplo, quando eu vou ler uma história, eu vou ler a história,

então fica aquela, aquele monte de pergunta assim, fora do livro né, coisa, sabe, coisa

que não tem nada a ver! Estou contando a história e eles ficam perguntando,

perguntando, perguntando, e a história fica ali parada. É difícil eu conseguir ler uma

historinha até o final né, por que um pergunta né, eu sei que é idiota coitado! Mais,

sabe, não tem como você terminar a história, “Fulano, espera!”, “Posso terminar a

história? Depois você faz a pergunta!”, as hist’rias são pequenas, cinco páginas eeee,

se eu paro, como já tentei fazer quando vou contar a história, “o que vocês estão

achando?”, aí vira aquela zona ahhhh, aí, não consigo voltar, já fico nervosa e fecho o

livro!!! Então quer dizer, o problema está comigo? Eu não sei contar história? Sabe,

fica aquela questão, com esta sala........ não dá, não dá! Com esta sala eu não

consigo! Então, sou eu que não consigo levar esta sala? De repente........, de repente

eu não consegui levar esta sala!?! Então é complicado! Tem coisas que eu quero dar

aí eu falo assim “Aí, eu não vou dar por que......”, ai, eu vou me desgastar tanto, vou

gritar tanto que vou ficar sem voz!!!!! Então, acho que às vezes não vale a pena! Então

eu prefiro dar a lição no caderno mesmo, pelo menos eu vou dar eles vão fazer, faz

uma atrás da outra, vai fazendo, fazendo, fazendo sabe? Então, ta vendo, às vezes eu

quero até dar alguma coisa nova mais não...... eu vou ficar tão desgastada que eu

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

146

prefiro não dar! Eu acho que na sala deveria ter uma pessoa para auxiliar, enquanto

eu to preparando já tem uma pessoa que ta “Ô, senta!”, “XIIIIIII!”, que ficaria

controlando, controlando mesmo esses alunos por que ,né, eles não param! Então, eu

tinha até vontade sabe, mais desanima, eu vou te falar a verdade! Dá aquele

desânimo! Não é fácil né? (risos).

Pesq.: Ah, então ta bom, Lu! Então, a gente continua na próxima sessão. Vamos ver

algo que nos anime e nos alimente porque, não é fácil,não!!!

Lu: Né? Vou desmaiar!!!!!!!! (risos) – Prontinho!

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

147

Sessão Reflexiva – Lu - 23/11/2005

Pesq.: Então Lu, o que eu tinha pensado pra gente estar fazendo é trabalhar com

texto. Hoje você vai trabalhar o que com as crianças?

Lu: Bom, hoje vou trabalhar a família silábica do D.

Pesq.: Do D, Então, poderíamos trabalhar

primeiro com um texto maior que tenham palavras com D, aí desse texto a gente tira

uma frase principal e que tenha palavras com D e, depois a gente vai para a palavra

com o D, depois para as sílabas – família silábica e depois pra letra.

Lu: Certo!

Pesq.: No texto, a gente primeiro lê uma vez para eles, com o texto na lousa lê

marcando com o dedo, aí depois, a gente pede para que eles leiam junto com a gente,

depois vai passando por cada mesinha, na verdade eles passam a decorar o texto e,

depois ver: “Alguém quer lê?”, e deixar alguém se prontificar a lê o texto. E aí, o que

você acha?

Lu: Acho ótimo! É, vamos ver se a minha sala consegue, né?

Pesq.: Por que você acha que eles não conseguem?

Lu: Ah, por que eles não se prendem muito aaa, não se prendem muito a nada. É

aquela meia dúzia que se interessam e muitos ficam dispersos, ficam conversando,

brincando né? O que eu passo assim na lousa, é, eles copiam, fazem né, a maioria

faz, mas não tem aquele interesse.

Pesq.: Mas a cópia está dando resultado significativo? Eles estão aprendendo de fato

com a cópia?

Lu: Então, o que eu vejo, veja bem, a questão da cópia! A questão da cópia, num

primeiro momento é assim, pra você estar sabendo utilizar o caderno, né. Eu acredito

na cópia nesse sentido. Saber utilizar o caderno, saber utilizar a linha, por que eu

comecei o caderno, né, no meio do ano. Então, até hoje tem aluno que não consegue.

Na hora da cópia eles fazem antes da linha, antes da demarcação da linha, escrevem

antes da demarcação da linha né, então tem isso. ÈÈÈÈÈ, não tem ainda, enquanto

uns já terminaram, aaa,aaaa, a lousa toda, né, tem uns que ainda estão na primeira

linha ainda, então, aluno que vai para a primeira série e não tem ainda assim, como

vou dizer, raappiiddeezzzz na escrita certo! Então, essa questão de a cópia ta dando

resultado de gravar né, como se diz ......

Pesq.: aprender....

Lu: éééé, aprender, não! Por que eu perguntei pra, pra Daniele: “ Daniele me mostra o

A.” - mostrou o A; “Cadê o B?”, “Aí, eu esqueci!”. Isso por que eu tinha trabalhado um

dia antes com a letra B, família silábica, dei um texto, porém não li com eles, só pedi

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

148

para circular a letra B e ela não gravou! Isso por que eu já venho trabalhando sempre,

eu vou e volto com as palavras né.

Pesq.: Mais, a letra sozinha, o alfabeto sozinho, ele não tem significado, na verdade,

ele é uma coisa abstrata.

Lu: É!

Pesq.: Então, ele sozinho ......né?

Lu: É! (risos), é!, por que, então, cê vê, é aquela questão: como eu aprendi assim, tipo,

tipo “decoreba” mesmo, como eu decorei tudo, então pra mim foi fácil!, decorei! Então,

eu fico tentando imaginar eles assim também, dando aquela decorada para depois

eles irem aprendendo,né? Cê vê, é muito complicado né, eu não consigo, aquele

objetivo mesmo que eu tenho, realmente eu não consigo. Mas é o que eu penso, no 3º

estágio é onde vai ser dada a continuidade e eles vão estar absorvendo melhor, não

é? Eu queria assim, como nós estamos no 2º é aquele momento mesmo de copiar a

letra, entendeu?

Pesq.: Mas você acha que eles não tem condições de aprender?

Lu: Não! Eles tem condições de aprender.........

Pesq.: aprender assim, ......

Lu: tem, tem, tem, .........

Pesq.: aprender a ler

mesmo!

Lu: isso,

tem, eu aprendi a ler eu tinha 5 anos, entendeu, mas, éééé. Eu teria que ta

trabalhando, também de outra forma, sabe, trabalhar com o concreto mesmo, sabe.

Mas, sinceramente, eu me sinto completamente desanimada! Quando eu começo a

explicar que eu vejo aquele, aquela turma que não está nem aí,

aaaaaaaaaaa,ohohohohohoh, eu prefiro dar alguma coisa para eles copiarem,

estarem fazendo do que. Eu fico, na hora que eu estou explicando eu tenho que gritar

na sala, sabe, eu tenho que gritar, eu tenho que pedir silêncio, tenho que ficar falando,

aí, eu estou explicando vem um “Professora, posso ir ao banheiro?”, “Professora,

fulano me bateu!”, sabe, eu to parecendo um palhaço lá na frente, sei lá, eu fico louca

com isso! Então, eu vou desanimando, sabe, eu vou desanimando. Não é como a

minha turma do ano passado que eu não precisava ficar berrando tanto, chamava

atenção, falava, tal mas, não era assim, olha, esse ano....sinceramente.....tipo assim,

eu “larguei de mão”, é bem isso mesmo! Fora esses que vão para a primeira série,

muitos, eu tenho os que vão para a primeira série que é os que menos se interessam,

menos se interessam, sabe, é os que menos se interessam! Eu mando a lição de

casa, que nem o Tiago: “Tiago, você fez a lição de casa?”, “Ah, meu irmão pegou!”, ele

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

149

não traz nem o estojo! “Tiago, cadê o seu lápis?”, “Ah, meu irmão quebrou!”, eu já não

tenho mais, agora eu já não tenho mais lápis, já não tenho mais! Então, sabe, aquela

falta de material. O Gustavo é outro que vai para a primeira série, não traz um lápis,

antes quando eu tinha eu dava, “Ah, meu filho, pega o lápis de cor para você fazer,

pede emprestado!”, aí, ele ficou ontem o tempo todo ele fez o que? Uma linha! Ele

copiou só o BA BE BI BO BU, só! Isso por que eu tinha feito até a letra T né, fiz a

família silábica até o T, maaaassssss, como eu te falei, eu faço isso mais para segurar

eles na,na,na,na mesa mesmo né? EEEEE, tem aqueles que são rápidos mesmo, eles

copiam, são rápidos, que é um ou outro que vai para a primeira série que está bom!

Pesq.; E aí, o que você acha desta proposta?

Lu: Eu acho jóia! Vamos fazer isso! Eu acho, né, vamos procurar, né, eu vou fazer

assim, vou estar separando alguns alunos né, ontem eu fiz isso, eee, para tentar fazer

o trabalho, né, eu vou separar e aí vamos ver!!!

Pesq.: E aí, a proposta é a seguinte, é a gente fazer isso e, logo depois da aula ter

encerrado, a gente escreve rapidinho como foi?, como sentimos?, o que fizemos?, pra

na próxima vez que a gente conversar, a gente parte daí.

Lu: Ótimo!

Pesq.: Né, e ver o que a gente precisa mudar, o que a gente ...

Lu: Posso falar do Samuel? O Samuel ele, você vê ele senta sozinho pra tentar copiar,

então eu estou explicando, “Professora, posso ir ao banheiro?”, “Vai,vai”, aí ele volta,

“Professora vou pegar o papel, ta”, aí volta, “Professora, posso fazer xixi?”, Puxa!!!,

acabou de vir do banheiro, então quer dizer, ele não fez nada, ele não foi no banheiro,

ficou brincando lá fora, aí ele pede para beber água, sabe, então ele faz o que? Uma

linha!!! Copia uma linha e só!!!

Pesq.: E se você conversar com ele e disser: “Olha, na hora que a professora estiver

explicando ...”

Lu: Isso, “...Não pode pedir para ir ao banheiro, nem beber água...”, já fiz

isso! Não adianta! Sabe, entra por um ouvido e sair pelo outro? Sempre explico, daqui

um segundo vem “Professora, posso beber água?”, sabe, gente é incrível como não

entra ...sabe, (Silêncio), é incrível, ahahahahahah, olha! Ah! É aquela questão,

quando trabalhei com fundamental, sabe?, Eles vem com essas idéias assim, sabe, é

você falar e não conseguir chegar assim, no cérebro deles! “Gente, silêncio agora,

presta atenção!”, “Gente, não é para ir ao banheiro agora!” e o menino vir “Professora,

posso ir ao banheiro?”, “Professora, posso tomar água?”, não dá!, não dá! Ahahahah,

não! Vou te falar! (silêncio) Ah, aí, você vai estar na sala, ou não?

Pesq.: Não, não, só se você quiser? Se

você achar melhor eu ficar na sala?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

150

Lu: Não, não precisa! Se você quiser dar uma olhada para ver como vai ser? Mas você

vai ver, ahahahah, o que que é isso! (silêncio) Sabe, não dá! É um que bate, é um que

vem, sabe, ah, não tem jeito!

Pesq.: Lu, o que é essencial é a gente estará desenvolvendo o raciocínio abstrato, por

que quando a gente vira e fala assim: “Então, como foi a aula ontem?” , retomar a aula

de ontem...

Lu: Então, essa questão, você veja bem, oh, como eu tinha, tinha passado para eles

circular a letra, ooo, a família, aí, já não foi mais a letra foi a família do B, aí, ontem

quando pedi para que copiassem, eles queriam circular também! “Gente, hoje não é

para circular, hoje é para copiar!”, aí toda hora vinha um “Professora, qual é para

circular? É para circular qual?, “Gente, hoje não é para circular, hoje é para copiar!”,

então, ta vendo, alguma coisa até gravou né? É mais é aquela coisa, não são todos! É

o que são mais interessados! Muitos querem só brincar, brincar, brincar!

Pesq.: Vamos tentar?

Lu: Vamos, vamos!

Após a aula...

Pesq.: Então Lu, como foi atividade? O que você sentiu da sala?

Lu: Foi assim, foi bom,! Eles participaram né, teve essa participação do grupo, todos

se interessaram em querer ler! Se eu fosse deixar todos lerem, iríamos ler até o final

da aula!

Pesq.: E como você fez?

Lu: Passei o texto na lousa, li duas vezes primeiro, depois eu lia e eles repetiam,

perguntei se algum deles queria ler, todos levantaram as mãos!

Pesq.: E quem leu?

Lu: Então, assim, ler sozinhos eles não, não conseguiram decorar!

Pesq.: E aí, como você fez?

Lu: Eu lia e eles liam em cima. Eles não leram sozinhos, né? Então, eu lia e eles

repetiam, repetiam o que eu ia lendo, né? Eles queriam ir lá na frente, colocar o dedo

em baixo das palavras. Mas tem um porém, faltaram 11 alunos então, fica mais fácil

trabalhar! Menos alunos é bem mais fácil! Eles não tinham tempo de ficar um

“cutucando” o outro, a sala ficou mais arejada, mais fácil trabalhar!

Pesq.: E aí, depois da leitura você propôs o que?

Lu: Então, eles fizeram a cópia, fizeram a cópia. Destaquei uma palavra que foi DEDO,

escrevi DEDO na lousa e desenhei, aí, em baixo, eu falei para eles: “Gente, eu vou

destacar uma palavra aqui – DEDO – depois que vocês copiarem a gente vai , vocês

vão copiar esta palavra sozinhos em baixo, e depois, vamos colocar a família”, aí, eu

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

151

coloquei DA DE DI DO DU, aí eu mostrei que juntando o DE com o DO forma a

palavra DEDO. Isso por que nós tivemos uma hora só, por que tivemos que vir ensaiar

para a formatura e, por isso, não foram todos que terminaram a cópia, assim, de

copiar,né.

Pesq.: E o que você sentiu conforme eles iam copiando, você sentiu alguma reação

diferente?

Lu: Não, eles estão se acostumando a copiar, né. Eu dou muitas palavras, dou muitas

palavras então, copiar eles copiam bem mas, eu fiz assim, já que eu trabalhei com o

D, fui chamando lá na frente e perguntava, por exemplo, umas letras do alfabeto e

qual letra tinha sido trabalhada, então, aí a decepção né, “Me mostra o A”, que é o que

eles sabem mais né, “Com que letra nós trabalhamos hoje?”, “Ah, esqueci!”, sabe,

depois de ler, de ler, de ler muitas vezes, muitas vezes mesmo a criança consegue

esquecer o que acabou de fazer!

Pesq.: Você sentiu dificuldade em realizar atividade?

Lu: Não! Não! Foi bastante tranqüilo, eu já deveria ter começado desse jeito desde o

começo. É que assim, se eu tivesse começado desde o início é talvez eles não... A

minha preocupação é que eles utilizem o caderno direito, da maneira adequada. Eu

sempre faço isso no começo do ano esse ano já não deu, já comecei na metade do

ano então, não tive tempo pra fazer alguma coisa mais elaborada. Mas foi ótimo!

Pesq.: Qual foi o ponto alto da atividade?

Lu: Acho que é a leitura mesmo, eu lendo, eles lendo, eles querendo ler, se

envolvendo na atividade, toda hora eles queriam ler, levantavam a mãozinha. Mesmo

não sabendo, lógico que eles não sabem, só de estar olhando e repetindo, acho que

isso foi o melhor!

Pesq.: Ah, que bom!

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

152

Sessão Reflexiva – Lu - 23/11/2005

Pesq.: Então Lu, o que eu tinha pensado pra gente estar fazendo é trabalhar com

texto. Hoje você vai trabalhar o que com as crianças?

Lu: Bom, hoje vou trabalhar a família silábica do D.

Pesq.: Do D, Então, poderíamos trabalhar

primeiro com um texto maior que tenham palavras com D, aí desse texto a gente tira

uma frase principal e que tenha palavras com D e, depois a gente vai para a palavra

com o D, depois para as sílabas – família silábica e depois pra letra.

Lu: Certo!

Pesq.: No texto, a gente primeiro lê uma vez para eles, com o texto na lousa lê

marcando com o dedo, aí depois, a gente pede para que eles leiam junto com a gente,

depois vai passando por cada mesinha, na verdade eles passam a decorar o texto e,

depois ver: “Alguém quer lê?”, e deixar alguém se prontificar a lê o texto. E aí, o que

você acha?

Lu: Acho ótimo! É, vamos ver se a minha sala consegue, né?

Pesq.: Por que você acha que eles não conseguem?

Lu: Ah, por que eles não se prendem muito aaa, não se prendem muito a nada. É

aquela meia dúzia que se interessam e muitos ficam dispersos, ficam conversando,

brincando né? O que eu passo assim na lousa, é, eles copiam, fazem né, a maioria

faz, mas não tem aquele interesse.

Pesq.: Mas a cópia está dando resultado significativo? Eles estão aprendendo de fato

com a cópia?

Lu: Então, o que eu vejo, veja bem, a questão da cópia! A questão da cópia, num

primeiro momento é assim, pra você estar sabendo utilizar o caderno, né. Eu acredito

na cópia nesse sentido. Saber utilizar o caderno, saber utilizar a linha, por que eu

comecei o caderno, né, no meio do ano. Então, até hoje tem aluno que não consegue.

Na hora da cópia eles fazem antes da linha, antes da demarcação da linha, escrevem

antes da demarcação da linha né, então tem isso. ÈÈÈÈÈ, não tem ainda, enquanto

uns já terminaram, aaa,aaaa, a lousa toda, né, tem uns que ainda estão na primeira

linha ainda, então, aluno que vai para a primeira série e não tem ainda assim, como

vou dizer, raappiiddeezzzz na escrita certo! Então, essa questão de a cópia ta dando

resultado de gravar né, como se diz ......

Pesq.: aprender....

Lu: éééé, aprender, não! Por que eu perguntei pra, pra Daniele: “ Daniele me mostra o

A.” - mostrou o A; “Cadê o B?”, “Aí, eu esqueci!”. Isso por que eu tinha trabalhado um

dia antes com a letra B, família silábica, dei um texto, porém não li com eles, só pedi

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

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para circular a letra B e ela não gravou! Isso por que eu já venho trabalhando sempre,

eu vou e volto com as palavras né.

Pesq.: Mais, a letra sozinha, o alfabeto sozinho, ele não tem significado, na verdade,

ele é uma coisa abstrata.

Lu: É!

Pesq.: Então, ele sozinho ......né?

Lu: É! (risos), é!, por que, então, cê vê, é aquela questão: como eu aprendi assim, tipo,

tipo “decoreba” mesmo, como eu decorei tudo, então pra mim foi fácil!, decorei! Então,

eu fico tentando imaginar eles assim também, dando aquela decorada para depois

eles irem aprendendo,né? Cê vê, é muito complicado né, eu não consigo, aquele

objetivo mesmo que eu tenho, realmente eu não consigo. Mas é o que eu penso, no 3º

estágio é onde vai ser dada a continuidade e eles vão estar absorvendo melhor, não

é? Eu queria assim, como nós estamos no 2º é aquele momento mesmo de copiar a

letra, entendeu?

Pesq.: Mas você acha que eles não tem condições de aprender?

Lu: Não! Eles tem condições de aprender.........

Pesq.: aprender assim, ......

Lu: tem, tem, tem, .........

Pesq.: aprender a ler

mesmo!

Lu: isso,

tem, eu aprendi a ler eu tinha 5 anos, entendeu, mas, éééé. Eu teria que ta

trabalhando, também de outra forma, sabe, trabalhar com o concreto mesmo, sabe.

Mas, sinceramente, eu me sinto completamente desanimada! Quando eu começo a

explicar que eu vejo aquele, aquela turma que não está nem aí,

aaaaaaaaaaa,ohohohohohoh, eu prefiro dar alguma coisa para eles copiarem,

estarem fazendo do que. Eu fico, na hora que eu estou explicando eu tenho que gritar

na sala, sabe, eu tenho que gritar, eu tenho que pedir silêncio, tenho que ficar falando,

aí, eu estou explicando vem um “Professora, posso ir ao banheiro?”, “Professora,

fulano me bateu!”, sabe, eu to parecendo um palhaço lá na frente, sei lá, eu fico louca

com isso! Então, eu vou desanimando, sabe, eu vou desanimando. Não é como a

minha turma do ano passado que eu não precisava ficar berrando tanto, chamava

atenção, falava, tal mas, não era assim, olha, esse ano....sinceramente.....tipo assim,

eu “larguei de mão”, é bem isso mesmo! Fora esses que vão para a primeira série,

muitos, eu tenho os que vão para a primeira série que é os que menos se interessam,

menos se interessam, sabe, é os que menos se interessam! Eu mando a lição de

casa, que nem o Tiago: “Tiago, você fez a lição de casa?”, “Ah, meu irmão pegou!”, ele

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

154

não traz nem o estojo! “Tiago, cadê o seu lápis?”, “Ah, meu irmão quebrou!”, eu já não

tenho mais, agora eu já não tenho mais lápis, já não tenho mais! Então, sabe, aquela

falta de material. O Gustavo é outro que vai para a primeira série, não traz um lápis,

antes quando eu tinha eu dava, “Ah, meu filho, pega o lápis de cor para você fazer,

pede emprestado!”, aí, ele ficou ontem o tempo todo ele fez o que? Uma linha! Ele

copiou só o BA BE BI BO BU, só! Isso por que eu tinha feito até a letra T né, fiz a

família silábica até o T, maaaassssss, como eu te falei, eu faço isso mais para segurar

eles na,na,na,na mesa mesmo né? EEEEE, tem aqueles que são rápidos mesmo, eles

copiam, são rápidos, que é um ou outro que vai para a primeira série que está bom!

Pesq.; E aí, o que você acha desta proposta?

Lu: Eu acho jóia! Vamos fazer isso! Eu acho, né, vamos procurar, né, eu vou fazer

assim, vou estar separando alguns alunos né, ontem eu fiz isso, eee, para tentar fazer

o trabalho, né, eu vou separar e aí vamos ver!!!

Pesq.: E aí, a proposta é a seguinte, é a gente fazer isso e, logo depois da aula ter

encerrado, a gente escreve rapidinho como foi?, como sentimos?, o que fizemos?, pra

na próxima vez que a gente conversar, a gente parte daí.

Lu: Ótimo!

Pesq.: Né, e ver o que a gente precisa mudar, o que a gente ...

Lu: Posso falar do Samuel? O Samuel ele, você vê ele senta sozinho pra tentar copiar,

então eu estou explicando, “Professora, posso ir ao banheiro?”, “Vai,vai”, aí ele volta,

“Professora vou pegar o papel, ta”, aí volta, “Professora, posso fazer xixi?”, Puxa!!!,

acabou de vir do banheiro, então quer dizer, ele não fez nada, ele não foi no banheiro,

ficou brincando lá fora, aí ele pede para beber água, sabe, então ele faz o que? Uma

linha!!! Copia uma linha e só!!!

Pesq.: E se você conversar com ele e disser: “Olha, na hora que a professora estiver

explicando ...”

Lu: Isso, “...Não pode pedir para ir ao banheiro, nem beber água...”, já fiz

isso! Não adianta! Sabe, entra por um ouvido e sair pelo outro? Sempre explico, daqui

um segundo vem “Professora, posso beber água?”, sabe, gente é incrível como não

entra ...sabe, (Silêncio), é incrível, ahahahahahah, olha! Ah! É aquela questão,

quando trabalhei com fundamental, sabe?, Eles vem com essas idéias assim, sabe, é

você falar e não conseguir chegar assim, no cérebro deles! “Gente, silêncio agora,

presta atenção!”, “Gente, não é para ir ao banheiro agora!” e o menino vir “Professora,

posso ir ao banheiro?”, “Professora, posso tomar água?”, não dá!, não dá! Ahahahah,

não! Vou te falar! (silêncio) Ah, aí, você vai estar na sala, ou não?

Pesq.: Não, não, só se você quiser? Se

você achar melhor eu ficar na sala?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

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Lu: Não, não precisa! Se você quiser dar uma olhada para ver como vai ser? Mas você

vai ver, ahahahah, o que que é isso! (silêncio) Sabe, não dá! É um que bate, é um que

vem, sabe, ah, não tem jeito!

Pesq.: Lu, o que é essencial é a gente estará desenvolvendo o raciocínio abstrato, por

que quando a gente vira e fala assim: “Então, como foi a aula ontem?” , retomar a aula

de ontem...

Lu: Então, essa questão, você veja bem, oh, como eu tinha, tinha passado para eles

circular a letra, ooo, a família, aí, já não foi mais a letra foi a família do B, aí, ontem

quando pedi para que copiassem, eles queriam circular também! “Gente, hoje não é

para circular, hoje é para copiar!”, aí toda hora vinha um “Professora, qual é para

circular? É para circular qual?, “Gente, hoje não é para circular, hoje é para copiar!”,

então, ta vendo, alguma coisa até gravou né? É mais é aquela coisa, não são todos! É

o que são mais interessados! Muitos querem só brincar, brincar, brincar!

Pesq.: Vamos tentar?

Lu: Vamos, vamos!

Após a aula...

Pesq.: Então Lu, como foi atividade? O que você sentiu da sala?

Lu: Foi assim, foi bom,! Eles participaram né, teve essa participação do grupo, todos

se interessaram em querer ler! Se eu fosse deixar todos lerem, iríamos ler até o final

da aula!

Pesq.: E como você fez?

Lu: Passei o texto na lousa, li duas vezes primeiro, depois eu lia e eles repetiam,

perguntei se algum deles queria ler, todos levantaram as mãos!

Pesq.: E quem leu?

Lu: Então, assim, ler sozinhos eles não, não conseguiram decorar!

Pesq.: E aí, como você fez?

Lu: Eu lia e eles liam em cima. Eles não leram sozinhos, né? Então, eu lia e eles

repetiam, repetiam o que eu ia lendo, né? Eles queriam ir lá na frente, colocar o dedo

em baixo das palavras. Mas tem um porém, faltaram 11 alunos então, fica mais fácil

trabalhar! Menos alunos é bem mais fácil! Eles não tinham tempo de ficar um

“cutucando” o outro, a sala ficou mais arejada, mais fácil trabalhar!

Pesq.: E aí, depois da leitura você propôs o que?

Lu: Então, eles fizeram a cópia, fizeram a cópia. Destaquei uma palavra que foi DEDO,

escrevi DEDO na lousa e desenhei, aí, em baixo, eu falei para eles: “Gente, eu vou

destacar uma palavra aqui – DEDO – depois que vocês copiarem a gente vai , vocês

vão copiar esta palavra sozinhos em baixo, e depois, vamos colocar a família”, aí, eu

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coloquei DA DE DI DO DU, aí eu mostrei que juntando o DE com o DO forma a

palavra DEDO. Isso por que nós tivemos uma hora só, por que tivemos que vir ensaiar

para a formatura e, por isso, não foram todos que terminaram a cópia, assim, de

copiar,né.

Pesq.: E o que você sentiu conforme eles iam copiando, você sentiu alguma reação

diferente?

Lu: Não, eles estão se acostumando a copiar, né. Eu dou muitas palavras, dou muitas

palavras então, copiar eles copiam bem mas, eu fiz assim, já que eu trabalhei com o

D, fui chamando lá na frente e perguntava, por exemplo, umas letras do alfabeto e

qual letra tinha sido trabalhada, então, aí a decepção né, “Me mostra o A”, que é o que

eles sabem mais né, “Com que letra nós trabalhamos hoje?”, “Ah, esqueci!”, sabe,

depois de ler, de ler, de ler muitas vezes, muitas vezes mesmo a criança consegue

esquecer o que acabou de fazer!

Pesq.: Você sentiu dificuldade em realizar atividade?

Lu: Não! Não! Foi bastante tranqüilo, eu já deveria ter começado desse jeito desde o

começo. É que assim, se eu tivesse começado desde o início é talvez eles não... A

minha preocupação é que eles utilizem o caderno direito, da maneira adequada. Eu

sempre faço isso no começo do ano esse ano já não deu, já comecei na metade do

ano então, não tive tempo pra fazer alguma coisa mais elaborada. Mas foi ótimo!

Pesq.: Qual foi o ponto alto da atividade?

Lu: Acho que é a leitura mesmo, eu lendo, eles lendo, eles querendo ler, se

envolvendo na atividade, toda hora eles queriam ler, levantavam a mãozinha. Mesmo

não sabendo, lógico que eles não sabem, só de estar olhando e repetindo, acho que

isso foi o melhor!

Pesq.: Ah, que bom!

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

157

Sessão Reflexiva – Lu – 03/01/06

Pesq.: Então, eu trouxe o livro da Teresa Cristina Rego do Vygotsky e a gente vai

estudar a parte da “Aquisição da linguagem escrita”, e vai tentar ta fazendo uma

relação entre os exemplo, o dia-a-dia da sala de aula e o que o texto nos diz, a teoria,

até, em relação ao que a gente ta conversando no que diz respeito a linguagem oral e

escrita, ta bom? Vamos lá!

Lu: No texto quando ele fala assim: “... enfatiza-se de tal forma a mecânica de ler o

que está escrito que se acaba obscurecendo a linguagem escrita como tal ...”, assim,

no caso, isso é o que acabo fazendo na sala de aula, quando eu dou a família, por

exemplo, a família do B, BA BE BI BO BU – no caderno eles assim, mecanicamente

eles estão copiando mais isso não significa que foi gravado, eles não raciocinam

assim, pra ter a compreensão de que aquilo é o B ....

Pesq.: eles não atribuem um

sentido ...

Lu: sentido pra aquela letra, pra aquilo. No caso, quando eu dei o texto do

BOI DA CARA PRETA, como é uma música, eu acho, eu acho não, ééé, teve mais

sentido, por que a gente trabalha com música e isso faz com que a criança acabe

compreendendo melhor. Então, aquela palavra BOI ficou bem marcado.

Pesq.: e a própria letra em si, né? Por que no exercício é a gente explorou todas as

possibilidades do texto, então eles entenderam não só o que era cantiga de ninar, mas

a letra “do que que a menina tem medo? É de careta!”, o por que o BOI da cara preta

poderia ter várias outras caras, assim como a menina poderia ter medo de várias

outras coisas...

Lu: a gente fez uma análise do texto, pra eles ficou mais claro do que eu só ir dando

as letras e palavras pra eles copiarem e não estar trabalhando mais a fundo. O texto

do BOI DA CARA PRETA foi trabalhado, desenhado, discutido, eu ouvi mais o que

eles tinham a dizer sobre as coisas, lemos cantamos, então teve várias...

Pesq,: várias formas de expor a

atividade.

Lu: Quando o texto fala: “... o domínio desse sistema complexo de signos fornece novo

instrumento de pensamento, na medida, em que aumenta a capacidade de memória,

registro de informações etc, propicia diferentes formas de organização e permite um

outro tipo de acesso ao patrimônio da cultura humana que se encontra registrado nos

livros e outros portadores de texto. Enfim, promove modos diferentes e ainda mais

abstratos de pensar e se relacionar como mundo, com as pessoas e com o

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

158

conhecimento.”, da maneira como eu estava trabalhando, passando só as famílias ou

letras do alfabeto para eles estarem copiando, não conseguia chegar nessa, ééé, os

signos para eles não significavam nada. Eram os signos mais não tinham os

significados,né! Eu trabalhando com o texto, ééé, a gente cantando a música, lendo o

texto pra eles é mais evidente, eles entendem mais, tem um significado. Quando, por

exemplo, eu quero trabalhar com a palavra BOI, eu a trabalhei dentro de um texto,

dentro de uma música então, para eles ficou mais fácil pra eles estarem

compreendendo né? Eee, da gente estar trabalhando mais tempo, eu fico mais tempo

conversando com eles, e é o que propicia eles estarem organizando mais a,

organizando mesmo, mentalmente o que está se passando quando a gente lê o texto

e quando eu venho trabalhando item por item, né, todo mundo junto, não como eu

fazia, que eu passava caderno por caderno uma letra qualquer ou uma família

qualquer, enquanto os que eu passei primeiro estavam terminando tinha uns que não

tinha nem passado ainda a lição, então, ele estava disperso, conversando brigando,

bagunçando. E aqueles, também, que estavam copiando, realmente, eles estavam

apenas copiando, aquilo não estava sendo gravado, aprendido, não tinha significado

pra ele, por que eles estava de olho no colega que estava bagunçando. Aí, por

exemplo, se eu desse a família do B BA BE BI BO BU – então, pra ir bem rápido, eles

copiavam o que, bbbbbbbbbbbbbb, aaaaaaaaaaa, bbbbbbbbbbbbb,eeeeeeeee, e por

aí vai (risos) pra que/ Para acabar logo pra continuar brincando e, trabalhando com o

texto assim, isso não acontece, eles não tem tempo de conversar, o que eles forem

conversar, vão conversar comigo sobre o texto.

Pesq.: Então, você percebe que eles não conversam por que eles estão gostando de

fazer a lição ou é por que você está mais em cima?

Lu: Risos – aí, ééé, eu acho que são os dois! Por que eu estando mais junto assim,

né, trabalhando mais junto, eles prestam mais atenção e acabam gostando e se

interessando mais na atividade, certo? É, então como diz no texto “... o aprendizado

da escrita, este produto cultural, construído ao longo da história da humanidade, é

entendido por Vygotsky como um processo bastante complexo que é iniciado pela

criança muito antes da primeira vez que o professor coloca um lápis em sua mão e

mostra como formar letras.”, então, na minha sala a única criança que conseguiu

atingir este processo foi a Rayssa, ela consegue escrever algumas palavras. Quando

fazíamos listagem de palavras de uma determinada letra, ela trazia várias palavras

dela mesma...

Pesq.: Ela conseguia identificar o som da consoante com a vogal ....

Lu: isso ela consegue, o

nome de familiares, bichos, formava pequenas frases, ela é alfabética.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

159

Pesq.: E aí, assim, uma coisa que eu acho interessante a gente distinguir aqui é, não é

por que a criança copia que ela conseguiu entender...

Lu: É isso é verdade! É a questão da sondagem, você dá aquele emaranhado de

lição, o alfabeto inteiro, pro aluno chegar eee, “Qual é a letra A?”, “Não sei!” – não

sabe identificar a letra A, ou sabe identificar e não sabe a letra, né? Não sei viu, é

complicado!

Pesq./Lu: Ele sabe falar mais não sabe escrever... (risos)

Lu: Resumindo né, não sabem!!! Então, todo aquele trabalho né, que eu tive durante o

ano com o alfabeto, famílias silábicas de cópia, eu posso dizer que, no finalzinho, se

resumiu a pequenas, pequenos fragmentos???

Pesq.: Não, eu acho assim, é a gente conforme vai estudando, adquirindo experiência

dando aula, a gente vai percebendo o que dá certo o que dá errado...

Lu: é verdade!

Pesq.: se a gente for ver, você ta dando aula pra Educação

Infantil há 3 anos, então é algo novo pra você também, e que agora você ta

conseguindo perceber algumas coisas que antes você não percebia e, aí, a gente vai

mudando. Agora, se não tivesse uma experiência que incomodasse não teria o

avanço...

Lu: é verdade!

Pesq.: então, a gente perceber, olhar,

vê que não deu certo e tentar fazer de outro jeito, isso é bacana!

Lu: É, então, o ano que vem eu já quero trabalhar tudo assim, é interessante estar

fazendo o planejamento já tudo assim, tudo em cima né?

Pesq.:é, agora é começar a trabalhar e estudar,certo?

Lu: Ta certo! (risos)

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

160

Sessão Reflexiva – Lu – 16/01/06

Pesq.: Então Lu, hoje a gente vai começar a fazer um outro exercício baseado

naqueles textos é, da Tereza Cristina Rego do livro do Vygotsky, ee, até agora a gente

leu “Aquisição da linguagem escrita”, “As relações entre pensamento e linguagem” e a

“ Interação entre aprendizado e desenvolvimento: ZDP” e, a partir desses conceitos a

gente vai ta elaborando a nossa atividade, ta bom?

Lu: Ta bom!!!

Pesq.: Então, vamos lá!!!

Lu: Ééééé, então, esssseeee, esse. Bom, a gente pode ta iniciando então com a letra,

no caso, com a letra D, então, esse texto achei bonitinho “O diário da Clara” e, então

eu vou ta lendo, vou ta lendo pra gente poder tirar algumas atividades, ta? “DIÁRIO

DA CLARA

EU NASCI NO DIA 6 DE JULHO.

EU ADORAVA MEUS URSOS DE PELÚCIA.

AOS 6 ANOS, EU ADORAVA DANÇAR BALÉ.

AOS 7 ANOS EU GOSTAVA DE ESTAR JUNTO COM AS MINHAS AMIGAS DA

ESCOLA.”. Então, você vê, ele é bem curtinho e, então, eu acho interessante ta, a

gente pode estar iniciando, como a gente fez o B, a gente pode estar dando o D, não

tem problema não estar seguindo o alfabeto, não ter aquela seqüência, né? Éééé....

Pesq.: Agora, por que você

achou interessante iniciar com este texto logo no primeiro mês de aula?

Lu: Ah, então, por que o texto vai falar do menino, de uma criança, é, no caso, “nasci

dia 6 mês de julho”, “ aos 6 anos”, é a idade em que eles vão estar, então eu acho que

tem a ver com eles.

Pesq.: Além da possibilidade da gente trabalhar com nome, com a escrita, conhecê-los

um pouco melhor ....

Lu: Isso, é quando a gente , no início

trabalha com o nome é fundamental né, agora no início para eles estarem se

conhecendo né?

Pesq.: Certo!!!

Lu: Então, aí ééé, ....

Pesq.: Então essa parte seria o item que a gente estabeleceu na outra

atividade como “EU LEIO O TEXTO” ...

Lu: É, a gente lê o texto com eles, como vai falar de diário, a gente explica primeiro o

que é um diário, né, e, a maioria não vai saber mesmo o que é um diário, o que é feito

né com o diário. Eles não sabem que o diário você escreve sobre seu dia-a-dia. Então,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

161

aí lido o texto, a gente podia estar tirando questões relacionadas ao entendimento do

texto, né?

Pesq.: Que a gente denominou “EU CONVERSO SOBRE O TEXTO”.

Lu: Isso!!! Então, eu tinha pensado assim, primeiro, perguntar quem escreveu o diário?

No caso, é a Clara. Eles vão estar falando a Clara aí, a gente escreve na lousa o

nome Clara e eles copiam, né? Posso, também, estar destacando o nome Clara, eee,

antes da gente estar trabalhando com este texto eu quero já estar colocando o nome

deles assim, bem em evidência lá, fazer aquela listagem com os nomes já para estar

trabalhando mesmo assim, com os nomes (silêncio) com os nomes próprios! E, aí,

depois, uma segunda questão, sobre o texto né, a gente pode ta falando sobre os

acontecimentos, assim, como os acontecimentos se dão, no caso né, seria assim, na

mesma época? Eles vão estar analisando né, por que, no caso, ela vai contar sobre

vários dias da vida dela né, então, são de épocas diferentes. Completando, eles tem

que perceber no texto que os acontecimentos eles se dão em épocas diferentes:

nascimento, que aos seis anos ela gostava de dançar, aos sete ela gostava de estar

com as amigas dela da escola, então, para eles perceberem esta cronologia né? Essa

linha do tempo aí!

Pesq.: Isso!!!

Lu: Então, aí, a gente pode estar explicando para eles, se eles já viram algum diário,

se eles conhecem, já viram algum álbum de fotografia...

Pesq.: ta levando...

Lu: ta levando, isso, então, podia estar levando um álbum de

fotografia né. Por que, normalmente, os álbuns contam a história né? A criança

pequenininha, depois ela faz um aninho, tem toda uma história né! Quando vai à praia,

é toda uma história mesmo de vida da pessoa. Então, eu achei legal ta colocando isso

também, para eles estarem analisando,né?

Pesq.: Aí, eu acho que de interpretação fica bacana né?

Lu: Três questões já ta bom!!!

Pesq.: Aí, o item “EU ENTENDO MELHOR O TEXTO”, este é extremamente

necessário, aí, eu gostaria de saber de você, se você acha necessário mesmo, o

porque você acha necessário?

Lu: Ah, então, ééé, depois que a gente for ler o texto, depois que eles já tiverem

completado este entendimento do texto, ahahahah, deixa eu ver, ahahahah, fazer uma

análise mais, pegar eééé,

Pesq.: esmiuçar o texto

Lu: é, esmiuçar o texto, né? Então, a gente, o professor, tem que estar junto com eles,

com os alunos, ééé, então, ta entrando mesmo nessa ZPD, atuando né?, assim,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

162

mediando, fazendo aquela mediação, né, por que senão, sozinhos não tem como eles

estarem fazendo os exercícios né. A gente pode estar lendo, lendo, lendo mas, temos

que estar passando o nome na lousa para eles estarem copiando, em um primeiro

momento né, estar destacando este nome no texto para que eles possam comparar

com a escrita da lousa. Para que eles possam, também, perceber através da lista dos

nomes da sala que podem ter o nome de alguma amiga – Clara, que outros nomes

iniciam com a letra C, que as outras letras aparecem em lugares diferentes em nomes

distintos, e assim, vai! Então, o professor tem que estar atuando diretamente, senão,

não tem como eles estarem fazendo, além do que corre-se o risco de eu cair no

mesmo problema do ano passado, copia, copia, copia sem sentido para o aluno e, não

proporcionar aprendizagem de fato, como pressupõe Vygotsky, né? Então, dentro do

“EU ENTENDO MELHOR O TEXTO” podia ta pegando assim, ééé, qual o nome da

menina que escreveu o diário?, Quando que ela faz aniversário? Para que eles

possam perceber o dia e o mês, a gente tem que estar trabalhando sempre dia e mês

senão, não gravam, eles se perdem, ainda não é formado a seqüência de tempo, de

dia, ainda não tem. Eles poderiam procurar no texto, o nome preferido do brinquedo

dela e escrever, grifar ou pintar o nome no próprio texto, a gente tem que estar

explorando muito o texto, tudo que tiver!

Pesq.: E aí, eu acho que deu! A gente já fez uma interpretação do texto geral e um

pouco mais específica, aí a gente poderia entrar no item que nós definimos como “EU

ESCREVO O TEXTO”, e aí, aqui eu acho importante eles começarem a estar

escrevendo e, estar se apropriando de coisas deles próprios, né? Então, o nome, o dia

em que nasceu, a idade, mais aí, tudo a gente vai ter que estar muito próximo deles

ajudando bastante. E, aí, para e3les fazerem esta relação de uma maneira mais

confortável, o que a gente faz? O que você acha de a gente deve fazer?

Lu: Éééé, então, aí no caso, ééé, a gente podia estar fazendo uma ficha né, uma ficha

de dados, no caso assim, eles colocassem o nome, que normalmente a maioria já

sabem do ano passado, se colocar a data do nascimento ééé, como a gente tem a

ficha dos alunos do início do ano com as datas do nascimento, a gente pode ta

completando a data de nascimento no crachá de mesa, o nome na frente e, atrás a

gente pode estar colocando a data do nascimento, que é muito importante, por que,

normalmente eles não sabem mesmo né, é um ou outro que avisa no dia do

aniversário. A idade né, faria, então esta ficha. Eeee, no caso assim, eles estarem

desenhando, assim, desenhando eles, por que sempre no início do ano a gente dá

família, dá auto-retrato, a gente poderia estar mandando para casa também, para eles

estarem fazendo este auto-retrato primeiro, aí, eles poderiam estar trazendo, por que

dentro desse auto-retrato, a gente podia estar colocando outras questões também, no

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

163

caso, a cor dos olhos, a cor dos cabelos, e como são os cabelos, o número de quanto

eles calçam, né, ta pedindo para a mãe estar mandando e na sala de aula pode

também estar olhando né, olhando os números, eee, falar quantos dentes eles já

perderam, a gente pode estar contando né?, para que a gente possa trabalhar

conjuntamente com numerais, também!

Pesq.: E aí entrar no que eles gostam ou não gostam de fazer, né? Brinquedo favorito,

animais de que mais gosta, comida que mais gosta, então, eles pintam, desenham e,

em seguida, escrevem os nomes do que desenharam.

Lu: esta atividade eles fazem sozinhos né, o professor não precisa estar interferindo,

né?

Pesq.: Aonde você acha que o professor pode estar interferindo aqui?

Lu: Então, no caso, dessa questão do brinquedo e tudo, o aluno faz sozinho, o

professor não precisa estar interferindo, né

Pesq.: Eu acho que, melhor,

aonde o professor pode estar interferindo aqui, ou você acha que o professor não

precisa interferir?

Lu: Acho que é só, no caso, por exemplo, no meu brinquedo favorito, no nome do

brinquedo, por que de repente eles não vão estar sabendo escrever o nome do

brinquedo: bola, boneca pipa, aí, no caso só o nome. Então, eles estarão desenhando

e a gente verificando os desenhos e colocar na lousa os nomes. “Então, crianças!

Quem escolheu boneca, copia aqui BONECA. Quem escolheu a bola, copia, BOLA”,

assim, e ver o que eles gostam mais mesmo né? Como se fosse uma pesquisa.

Pesq.: Lu, a gente está trabalhando com 3º estágio, você acha que eles não

poderiam, por exemplo, nesses exercícios, que tem preferência, eles poderiam estar

fazendo sozinhos? Mesmo escrevendo da maneira deles, como eles acham...

Lu: Sozinhos? (silêncio). Da maneira deles? (silêncio). Ééééé, (silêncio), podem?! A

gente pode estar dando, eles podem estar escrevendo da maneira deles

Pesq.: Você acha que eles são capazes?

Lu: Por exemplo, uma palavra como CACHORRO, eu já acho difícil. Agora, se eles

escolherem BOLA, BONECA, é fácil! Mais, algumas palavras são difíceis. Mas pode-

se tentar!!!

Pesq.: Não, mais e aí, ....

Lu: cada um escreve do seu jeito

Pesq.: depois

Lu: e, aí,

mostra na lousa e depois, eles podem estar comparando e escrevendo ao lado do que

eles escreveram, para eles fazerem uma comparação

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

164

Pesq.: Muito bom!

Lu: Né, do que eles acham

Pesq.: do que eles pensaram

Lu; do que eles pensaram em

relação ao que é!

Pesq.: Muito bom!

Lu: Estou pensando que neste item tudo o que eles levantarem como coisas favoritas

a gente, poderia estar fazendo uma listagem na lousa para ampliar o repertório deles!

Pesq.: Aí, a gente pode passar para o outro item que é “EU APRENDO A LER E A

ESCREVER”. Aí de novo, ou a gente volta ou a gente continua, no caso, com as

questões deles. O que você acha que devemos colocar?

Lu: Ta trabalhando com o nome, né?

Pesq.: Aí, já começa a trabalhar com nome deles?

Lu: Isso, deles. Tanto é que, já estaremos com a lista pronta com os nomes da classe

para ficar bem evidente, né. Então, pode colocar, né, eles escrevem o nome, contam

quantas letras tem no nome, qual é a primeira letra do nome, qual é a última, se

existem letras que se repetem. Poderíamos estar trabalhando com alfabeto móvel, põe

o alfabeto na mesinha, eles ficam montando a, o nome, aí, conforme eles vão

montando os nomes, eles vão copiando na folha. A gente pode estar pegando vários

nomes da classe e eles estarem colocando a primeira letra de cada nome,

identificando, né?

Pesq.: Por que você acha que é importante destacar a primeira letra do nome?

Lu: Éééé, eles gravam tudo mais fácil se, estabelecem relação de outras palavras com

a primeira letra de seu próprio nome, o nome da mãe, do pai, do irmão,ah, eles

reconhecem e gravam melhor as letras identificando-as em outras palavras depois.

Pesq.: Agora, a gente poderia pensar em uma atividade que eles pudessem realizar

em grupo, apesar que todas as propostas anteriormente, a troca de opinião e o

contato com os outros coleguinhas torna-se essencial a interação entre eles, mas, o

que estou falando, é de uma atividade que privilegie ainda mais este contato, esta

interação. O que você sugere?

Lu: Eles poderiam estar escrevendo os nomes dos amiguinhos da mesinha, um ajuda

o outro, utilizariam o crachá dos colegas, não é? Em cima dos nomes dos colegas eles

poderiam estar circulando de azul o nome que tem mais letras, de amarelo o que tem

menos letras. Poderiam estar contando o número de letras de cada nome e colocando

o algarismo ao lado do nome.

Pesq.: Nestas atividades sempre estaríamos trabalhando a primeira letra das

palavras?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

165

Lu: Acho bom! É bom estar trabalhando a primeira, né?

Pesq.: Por que?

Lu: Tem que ter um início de destaque, acho que a primeira sempre é interessante,

tanto é, que você faz aquela listagem sempre a primeira letra do nome a gente

destaca, acho que é mais fácil para eles.

Pesq.: Aí, você trabalha dessa forma só com nome?

Lu: Não, aí a gente pode estar colocando outras palavras, para depois, eles poderem

relaciona-las. Poderíamos pegar outras palavras para que eles pudessem

desmembra-las, por exemplo, a palavra PÃO, desmembra nos quadrinhos o P, o A, e

o O colocando-os nos quadrinhos e, desta forma a gente pode fazer com outras

palavras maiores, BOLO que já tem 4 letras, LEITE que tem 5 letras, BANANA que

tem 6.

Pesq.: Aí, no item “EU CONHEÇO UM POUCO MAIS “ a gente poderia fazer qual

atividade? Pensando nos textos que a gente leu, no que a gente está estudando?

Lu: No início do ano a gente trabalha bastante com família né, já que a gente deu o

auto-retrato, dar a família é bom, por que eles podem estar trazendo de casa o nome

do pai, da mãe pra ta completando mesmo dentro dessa, nessa atividade.

Pesq.: Certo! Então, na sua opinião, esta atividade foi baseada em que conceito que a

gente estudou do Vygostsky? E, por que você achou importante que fosse baseada

nesse conceito?

Lu: Essa atividade é pra gente ta trabalhando mesmo na ZDP, o professor tem que

estar atuando ali né, por que é onde o aluno vai poder estar aprendendo, vai estar

entendendo, se não tiver essa mediação ééé, fica difícil do aluno aprender, chega no

final do ano com a sensação de que eles, como posso dizer, estão fracos, por que , a

gente não atuou como deveríamos atuar.

Pesq.: Legal!

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

166

Sessão Reflexiva – Lu – 25/01/06

Pesq.: Vamos lá?

Lu: Então, aí, eu , esse texto aí que é, o texto de uma aluna mesmo que montou, achei

interessante ta trabalhando com ele, por que ele fala sobre, posso ler? MEU NOME É

LUCIELI.

EU TENHO 9 ANOS E MORO NA CHÁCARA SANTA MARIA.

A MINHA CASA FICA PERTO DO POMAR. EU ADORO COMER GOIABA NO PÉ.

AO LADO DA MINHA CASA PASSA UM RIO. EU ADORO NADAR NO RIO.

AQUI TEM MUITOS ANIMAIS. EU GOSTO DOS CACHORROS E TENHO MEDO

DE COBRAS.

EU ESTUDO NA ESCOLA PALMIRA. EU GOSTO DE LER E DE JOGAR

QUEIMADA.

EU GOSTO MUITO DE MORAR NA CHÁCARA, PORQUE MORO PERTO DA

NATUREZA. Achei interessante o texto por que é o texto de uma criança, ela descreve

o lugar onde mora, do que gosta, do que tem medo, da escola, ela fala bastante coisa

sobre ela e, achei interessante estar passando para eles.

Pesq.: Até por que ta no começo do ano e, em cima desse texto, a gente pode fazer

algumas atividades para eles se conhecerem, né.

Lu: Então, esse texto da pra tirar muitas coisas, nome, idade, ôôô, animais.

Pesq.: Aí, o que você pensou em estar fazendo com este texto?

Lu: Então, né, num primeiro momento a gente vai falar sobre o texto, discutir sobre ele,

perguntar sobre o nome da menina, onde ela mora, que lugar é esse, o que é uma

chácara, o que é pomar, por que normalmente, a criança num sabe o que é, né? Não

sabe nem que a goiaba vem do pé, ela só vê na feira, então não sabe o que é! A

menina do texto fala que gosta de nadar, aqui a gente já pode estar falando sobre

esportes. Ela ainda fala sobre animais, podemos explorar animais domésticos e

selvagens. Ela diz a escola em que estuda, a gente pode explorar também o nome da

nossa escola, por que eles não sabem.

Pesq.: Ela fala sobre queimada, na hora do pátio podemos brincar de queimada!

Lu: é, explicar o jogo e brincar. Podemos trabalhar com as seguintes perguntas: Quem

escreveu o texto? Onde ela vive? Ela gosta desse lugar? Por que?

Pesq.: Aí, a gente pode desmembrar o nome da menina, eles separarem letra por letra

nos quadrinhos, contar quantas letras tem o nome, qual é a primeira e a última letra, o

que mais podemos trabalhar?

Lu: Qual é o animal preferido dela? Desenhar o cachorro e colocar o nome ao lado do

desenho, e o mesmo faria com o animal que ela tem medo. E, pode estar tirando

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

167

frases para eles estarem completando no texto. Então, olha o texto e completa a

atividade com palavras do texto. Aqui eles estarão comparando para ver que palavra

está faltando.

Pesq.: E até, estar trabalhando com as palavras e conceitos principais do texto, né?

LU: Isso, uhuhuhuh!

Pesq.: Legal! No item “EU ESCREVO TEXTOS”, o que você sugere?

Lu: Então, ééé, a gente poderia estar pedindo para eles desenharem alguma coisa de

que eles gostam né, uma coisa que eles gostam de estar fazendo, eee, depois estar

escrevendo o que eles gostam de fazer, então: “Ah, eu gosto de brincar de bola!” ,

então, eles vão estar pintando eles brincando de bola e, em seguida escreve a frase.

Pesq.: Mais aí, você vai trabalhar com o que a maioria gosta ou o que cada criança

gosta mesmo de fazer? Como você vai trabalhar?

Lu: Então, aí, a gente tem que ver, péra aí, ééé, no caso, teria que ser um por um.

Pesq.: e aí aqui você, na hora da escrita eles não poderiam estar escrevendo sozinhos

e fazer daquele jeito que fizemos na semana passada?

Lu; Poderia estar colocando assim EU GOSTO DE ..........., e cada um colocaria do

que gosta e assim por diante! E depois faço a correção de um por um, junto com eles.

Poderíamos colocar também, alguma coisa que me deixa feliz, triste, alguma coisa

que dá medo. Aí, como o texto a menina faz um relato sobre a vida dela, a gente pode

estar trabalhando ééé, para eles estarem relatando coisas sobre a vida deles também

né?

Pesq.: interessante por que você já no, na outra sessão você tinha trabalhado

com a questão do diário, do álbum de fotografias então, este texto complementa,

também, um outro gênero de falar sobre si, né?

Lu: é verdade, de falar sobre eles. Então, assim, ô, é o nome, o que eles gostam,

então o mesmo desenho que fizeram lá vão escrever aqui, tudo que desenharam vão

escrever aqui, como se fosse uma fichinha, né? Na parte “EU APRENDO A LER E

ESCREVER”, a gente pode estar trabalhando ééé, por exemplo, se a gente for estar

trabalhando com a letra A, a gente dá uma frase para que eles circulem todas as letras

A da frase. A gente pode estar dando várias palavras para eles pintarem a primeira

letra, e colocarem os nomes com os desenhos para eles estarem ligando, né, e assim,

a gente deve fazer junto mesmo, mediando a atividade. E, para complementar esta

atividade, como dei o exemplo anteriormente do A, nessa atividade eles teriam que

pintar todas as letrinhas A das palavras para perceberem que ela pode aparecer em

qualquer lugar da palavra. Poderíamos fazer uma atividade com conjuntos de palavras

que começassem com a mesma letra, por exemplo, PANELA, PAVÃO, PATO eles

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

168

podem estar escolhendo a palavra , juntamente com o desenho, né, e pode estar

copiando no quadrinho. E isso, pode ser feito com uns 3 ou 4 conjuntos de palavras.

Pesq.: E aí, uma atividade, por que assim, a gente não pode esquecer que o Vygotsky

privilegia a interação, a aprendizagem com o outro. Então, que atividade a gente pode

fazer para priorizar ainda mais essa interação?

Lu: Uma atividade que a gente pode fazer, a gente pode fazer uma lista de brinquedos

preferidos da classe, posso estar colocando 10 itens e lês escolherem 6 nomes de que

mais gostam. E, assim, um estar ajudando o outro na, na mesinha para estar

escolhendo,né. Acho que tipo uma votação dos brinquedos que eles mais gostam. A

gente também, poderia estar trabalhando sílabas, né, eu adoro sílabas (risos)! Então,

a gente poderia pegar assim, dar as palavrinhas já em sílabas e eles pintariam as

sílabas iguais.

Pesq.: O objetivo seria eles identificarem em várias palavras as sílabas iguais?

Lu: é, eu teria que estar falando, né?

Pesq.: Você acha que eles não conseguem identificar as sílabas iguais sozinhos?

Lu: Não!, as sílabas iguais sim, mas, por exemplo, eles não sabem que o BO é BO,

que o LA é LA, eles não sabem o nome da sílaba. Depois, pegar as palavras e

separar em letras mesmo, então, cada letra em um quadrinho diferente, para trabalhar

somente a letra.

Pesq.: Aí, a gente pode no “EU CONHEÇO UM POUCO MAIS”, estar dando um outro

texto, assim como a gente fez no Diário da Clara que foi a atividade da Sessão

passada né?

Lu; é a gente pode estar dando um texto de entrevista, tenho este que foi feito com a

Renata, ô. “QUANTOS ANOS VOCÊ TEM?

EU TENHO SEIS ANOS.

QUANDO VOCÊ COMEÇOU A JOGAR FUTEBOL?

AOS CINCO ANOS.

POR QUE VOCÊ ESCOLHEU O FUTEBOL?

PORQUE MEU IRMÃO E MEU PAI GOSTAM MUITO E EU JOGO COM ELES.

VOCÊ JÁ GANHOU ALGUMA MEDALHA?

SIM. GANHEI UMA MEDALHA NO CAMPEONATO DA ESCOLA E OUTRA NO

CLUBE”. É interessante por que é um relato de uma menina e se encaixa com os

outros textos que estamos já discutindo! A gente pode estar abordando o tema esporte

e, qual é o que a turminha gosta de fazer, é interessante. Ainda, a gente pode fazer

uma listagem de esportes preferidos, colocar 10 esportes e estar tirando assim, 4 os

que são mais votados.

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

169

Pesq.: Certo! E aí, nesta atividade qual é a relação que você faz com o que estamos

estudando, lendo e conversando e com o que você fazia antes?

Lu:! Eu acho assim, ééé, não tem nada a ver com o que fazia no ano passado. Agora,

parece que estou mais envolvida e já posso prever o que irá acontecer, estou mais

planejada, mais segura

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

170

Sessão Reflexiva – Lu - 09/02/06

Pesq.: Hoje, a gente leu e vai discutir “o papel do outro na construção do

conhecimento” e “o papel do professor mediador na dinâmica das relações

interpessoais” dentro da escola, da sala de aula. Então, a gente começa a discutir

sobre “ o papel do outro”. E aí, o que você achou? Acrescentou ou não? Quais as

relações você estabeleceu?

Lu: Então, é, através dos textos tem mais a ver com, com esse texto aqui “o papel do

outro na construção do conhecimento”, ele tem mais a ver com que a gente está

trabalhando, com texto, que vai, realmente estar fazendo este papel de mediador e,

isso era o que não acontecia antes, que era só uma cópia, uma coisa jogada, então, a

gente não estava assim, eéé, praticamente não estava assim, ouvindo mesmo o aluno,

a gente não sabia o que o aluno já sabia, a gente não estabelecia aquela troca. Agora,

com os textos eu acho que fica mais fácil pra gente estar trabalhando, a gente vai

estar sempre em contato com eles, a gente vai estar o tempo todo, a través das

questões, a gente vai estar sabendo ta tirando deles o conhecimento mesmo, né? A

gente vai estar tentando chegar neles mesmo, através do texto, vê se eles

internalizam, era coisa que não acontecia antes, por que as coisas eram jogadas, as

letras eram jogadas...

Pesq.: a gente vai estar trabalhando com algo que é significativo pra eles, com uma

história, né, não é algo isolado, que não tem significado nenhum, né? A gente vai

estar mais perto, conversando mais e, principalmente, atuando mais, que antes, eu

acho que a gente ééé não conseguia. E não é que não conseguia porque a gente não

fazia, é por que eu acho que a gente ééé, não tinha parado para pensar nessas

questões que, agora, a gente ta parando para estudar, analisar, né? Pra redefinir

nossa atuação.

Lu: É, então, através desses novos textos, a gente vai, igual ao que você falou,

redefinir a nossa função mesmo né, por que não tem como estar chegando na classe/

na criança se a gente não mudar nosso papel,né?

Pesq.: E essa mudança de papel você vê como?

Lu: Ah! Então, agora eu acho que vai ficar mais fácil né, de estar trabalhando, eu acho

que vou conseguir atingir o meu propósito sempre deles estar aprendendo, mais

sempre concluía que a maioria deles não aprendia, né? Eu acho, que agora, eles vão

aprender melhor com essa maneira de trabalhar, vai ser mais fácil! Eu tinha aquela

preocupação da sala, como a sal era sempre heterogênea, não conseguia trabalhar

né, mais agora, eu estou vendo que o importante é que ela seja mesmo assim,

heterogênea, por que através das diferenças que a gente vai estar conseguindo que

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

171

uma criança ajude a outra, eles vão ter a oportunidade de trabalhar com todos da

classe, porque, a gente tinha sempre aquela questão, sempre a mesma mesinha,

sempre as mesmas crianças, quem sabia, sabia, quem não sabia continuava sem

saber, de lado e, trabalhando nesta perspectiva, com a heterogeneidade, é melhor por

que um vai ajudar o outro, quem sabe mais vai auxiliar aquele que não está sabendo.

E, o legal é estar trocando eles né, para que possibilite mesmo esta troca de

informação. Então, através dessa minha mudança de atitude, de postura eu comecei a

perceber também que muitas vezes quando as crianças estavam conversando, que

normalmente, a gente não deixa eles abrirem a boca, que através dessas conversas

eles estão se conhecendo, eles estão descobrindo várias coisas juntos e, o mais

importante que aprendi, é que a gente também pode estar conhecendo eles e

descobrindo cada um dos alunos, não mais ficar podando as conversas entre eles mas

que, o professor esteja participando e, então, através dos textos a gente pode sempre

estar dando essa possibilidade, entrega o texto, conversa sobre o assunto, deixa eles

também conversarem sobre o assunto assim, a gente vai estar sempre atuando junto

com eles oferecendo várias opções dentro do texto, das questões trabalhadas, eles

poderão estar discutindo, rediscutindo pra ta chegando a um objetivo comum entre a

gente e, estar propiciando através dos textos informações sobre várias outras

situações que os deixem curiosos, incentivadas a aprender. Esses textos que você

trouxe e que a gente discutiu foi extremamente importante e que deveria ser na JEI

(Jornada Especial Integral) por que, através dessa discussão teórica deu para refletir

sobre as prática e perceber algumas coisas em que estava equivocada e, assim,

consegui enxergar e transformar minha prática. Eu percebi, que a gente deixa de

estudar e vai trabalhar sempre com aquela mesmice e a gente acaba caindo, como

vou dizer, nesse marasmo e as crianças acabam ficando... uma ou outra que pega,

que aprende e os outros ficam assim a deus dará e, se eu tivesse talvez, lido os textos

antes, quer dizer, se a gente tivesse conversado antes tudo, a gente poderia ter feito

um outro trabalho no ano passado, ter trabalhado diferente.

Então, esse texto, “o papel da imitação no aprendizado”, eu acho que tem muito a ver

com a Julia, né, normalmente, ela imita não só a descida do sofá, muitas coisas que

eu faço ela acaba imitando sabe, é engraçadinho, né? Ele fala aqui do desenho, ele

tem razão, muitas vezes a gente dá mesmo o desenho pronto pra eles só pintarem né,

eles acabam não tendo o trabalho de elaborar e, algumas vezes eu trabalhei a

questão de dar o quadro de algum artista para eles estarem reproduzindo foram

pouquíssimas vezes, normalmente dava-se tudo pronto mesmo pra eles pintarem,

então, uma questão interessante que gosto de dar é quando eles assistem o desenho

e depois reproduzem a parte que mais gostou do filme, que mais significou para eles,

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

172

isso eu acho bom, por que eles tem que pensar sobre o que eles mais gostaram, como

vão fazer para representar essa personagem ou esse trecho do filme e, isso acho

bacana. Agora, com relação a brincadeira e sua importância e, a gente, normalmente

não deixa né? Trinta e tantas crianças, a gente tem medo que algo acontece, a sala de

aula é pequena, a linha do tempo e o período do parque é pouco.

Pesq.: Vamos pensar na nossa linha do tempo, que não mudou, ainda mais agora que

você mudou de período e tem que dar almoço e sua duração é ainda maior do que os

lanches, e aí, você pensa em possibilitar esse espaço da brincadeira como a autora

fala: início, meio e o fim, finalizar a brincadeira, né, como você pensa em fazer, qual o

horário que você acha adequado, você vai separar um dia, enfim, como você irá se

organizar?

Lu: O que eu pensei assim, por exemplo, o horário do parque, se esse horário for 40

min. Eu posso ta dando um dia de parque livre, no outro dia posso estar dando uma

brincadeira dirigida né, eles não tem que necessariamente que ficar dentro do parque

onde a gente poderá brincar de roda, então, eu quero estar utilizando aqueles cds de

cantigas pra ta trabalhando mesmo com a brincadeira dirigida. E, pensei em um

terceiro dia, em pegar aqueles brinquedos de sala de aula e leva-los lá para baixo,

eles dividem e, assim, dá tempo deles brincarem, juntarem e guardarem nos 40 mins.

Aí, eu não vou ter aquela bagunça que tinha em sala de aula, eles muito exprimidos,

né, pra brincar e, aí não dá mesmo para brincar de carrinho, as meninas querem fazer

uma cozinha não dá, fica tudo muito apertado.

Pesq.: Quando você for trabalhar com brincadeira de roda, você poderá leva-la e dar

continuidade na sala de aula por exemplo, as normas, você estabelece as normas da

brincadeira, se tiver a cantiga como normalmente tem, então, o trabalho de texto será

com a cantiga, você já vai estabelecer um vinculo entre o que aconteceu no parque

com o que acontecerá em sala de aula.

Lu: É verdade, pensei em utilizar essas cantigas em textos mesmo né, a gente pode

estar trabalhando o texto da cantiga e depois estar brincando né?

Pesq.: Outra coisa que eu pensei e gostaria de discutir com você ééé, você gosta de

mexer com tinta, montar brinquedo, então poderia trabalhar um texto que ensinasse a

montar um brinquedo, e aí, lá no parque você faria isso. A gente poderia elaborar

atividades nesse sentido também?

Lu: Eu acho ótimo, é ta promovendo a brincadeira mais, por que a gente deixava a

brincadeira muito de lado não é não?

Pesq.: A gente não explorava o que poderíamos explorar e, aí, se a gente for pensar

em tudo que a gente ta fazendo a gente vai ter, em uma primeira parte, da história da

própria criança, história de outras crianças, a gente vai ter uma segunda parte, que é a

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

173

parte de cantigas e, a gente pode ter uma terceira parte que são de brincadeiras,

brinquedos, etc. e, a gente pode explorar isso nas atividades com texto em sala de

aula. Então, por exemplo, como que se faz um bilboquê, então a gente faz a atividade

nesse mesmo sistema que a gente vem trabalhando e desenvolvendo com os textos

aí, depois faz o bilboquê com as crianças.

Lu: Então, isso é muito legal!

Pesq.: Então, faz a brincadeira de roda e depois a gente explora esta brincadeira em

sala de aula, como a gente fez com “O boi da cara preta” que é uma brincadeira que

as meninas fazem, brincam bastante. A gente também pode fazer uma outra parte,

mais aí, eu já não sei como podemos viabilizar isso, e a gente precisa pensar se isso é

de fato viável, né, uma parte de receitas e, aí faz ...

Lu: Existem coisas que dá pra levar e fazer na sala né? Coisas secas, né?

Pesq.: Tentar ééé trabalhar com isso, além do que com isso a gente vai mostrando os

tipos de textos, que é o que a gente ta trabalhando, a partir do momento que a gente

trabalha a cantiga de ninar, que a gente pega uma carta, um auto-retrato, um

brinquedo, uma receita, então, a gente ta trabalhando com vários tipos de textos e

mostrando a função de cada um, a função da escrita e, se a gente for pensar, às

vezes, a gente deixa de lado a função da escrita, o porquê é importante a gente saber

escrever? O porquê que a gente escreve as coisas? Então, a gente pode trabalhar

com estes diferentes tipos de textos, o que você acha?

Lu: Eu acho ótimo!

Pesq.: Vamos pensar melhor nisso, então!

Sessão Reflexiva – Lu - 24/02/06

Pesq.: Esta é a nossa última Sessão eu queria que a gente fizesse um apanhado geral

de como foram estas oito Sessões, o que foi bom, ruim, quais as mudanças que você

percebeu durante esse processo de estudo, ta bom?

Lu: Ta! Achei que teve uma mudança radical da maneira como eu trabalhava e como

eu pretendo agora estar trabalhando, então, foi uma mudança assim, gritante, então

eu estou mudando toda minha maneira de agir, essa mania de estar trabalhando

somente com o alfabeto, com sílabas soltas, agora vamos trabalhar com textos, dar

um significado com a questão das palavras, então, dentro do texto vão ter várias

palavras, então, não vou mais trabalhar com as palavras soltas. Então, tudo isso é

uma grande mudança e achei que valeu super a pena. A maneira que eu via antes

precisava ser mudado.

Pesq.: Por que que você viu a necessidade de mudar?

FORMAÇÃO CONTÍNUA: CAMINHOS E DESCAMINHOS

174

Lu: Assim, ééé, eu ficava naquela mesmice de sempre né, eu via que não tinha

resultado no final do ano, tudo que eu tinha dado não sutiã efeito! Objetivo eu tinha

mas não conseguia alcançar! E, isso, fazia não dar resultado nenhum. Agora não, com

o trabalho com o texto vou estar direcionando o trabalho, vou estar mais perto das

crianças, conhece-las melhor, falar com elas, estabelecer uma relação! Outro ponto

importante, é do planejamento, normalmente, eu não trabalhava o planejamento, eu

não montava um planejamento para mim. Lógico que tinha aquelas metas básicas do

que eu tinha que fazer durante o ano, mais nunca havia pensado com seriedade sobre

o assunto. Com o estudo, nós elaboramos um planejamento anual, é isso está me

dando mais segurança e, sei que se for necessário poderei modifica-lo conforme a

realidade dos meus alunos mais, agora, sei como fazer e desenvolver isso!

Gostaria muito de agradecer a possibilidade em estar com você estudando sobre

Vygotsky, de você estar compartilhando tudo o que você está aprendendo no

mestrado ah, e agora que você nos deixou (risos) desejar toda a sorte do mundo na

Coordenadoria de Educação você merece, obrigada!

Pesq.: Eu que tenho que agradecer você ter se disponibilizado em participar desse

trabalho, Valeu!

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