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Os Lusíadas O léxico A linguagem adotada por Luís de Camões na criação d’Os Lusíadas distancia-se da normalmente utilizada pelos escritores seus contemporâneos, pelo que esta não pode ser considerada como um modelo de linguagem clássica. Tal distanciamento é notório através de três processos distintos: O latim é notório o cuidado de substituir o vocabulário corrente por um vocabulário culto; e o Latim, língua dos poetas, filósofos e geógrafos, era considerado mais nobre do que o vocabulário coloquial. As metonímias/metáforas surgem como um outro processo de evitar as palavras vulgares, na medida em que Camões se serve destas figuras de estilo para atribuir um outro nome a uma determinada palavra ou expressão. Por exemplo, “flores” em lugar de faces do rosto; “ouro” em lugar de cabelo/dinheiro; “lenho” em lugar de nau; “argento”, “líquido estranho”, “Tétis” ou “Dione” em lugar de mar, etc. Por vezes as metonimias e as metaforas contêm, referências à mitologia greco-latina. As perífrases através do uso de um numero de palavras maior do que o necessário para exprimir uma determinada ideia, Camões atribui peculiaridade ao discurso. Os narradores Ao longo da obra camoniana Os Lusíadas, Camões mantém a presença de um narrador principal que vai adotando várias personalidades, que conduzem a narração. São elas: Vasco da Gama, que narra a História de Portugal e a viagem desde Lisboa até Moçambique; Camões (o narrador principal), que relata a viagem de Vasco da Gama desde Moçambique até à Índia e toda a viagem de regresso; Paulo da Gama, que, em Calecut, explica o significado das 23 figuras representadas nas bandeiras; Fernão Veloso, que descreve o episódio dos Doze de Inglaterra;

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Os Lusíadas

O léxico

A linguagem adotada por Luís de Camões na criação d’Os Lusíadas distancia-se da normalmente utilizada pelos escritores seus contemporâneos, pelo que esta não pode ser considerada como um modelo de linguagem clássica. Tal distanciamento é notório através de três processos distintos: O latim é notório o cuidado de substituir o vocabulário corrente por um vocabulário culto; e o Latim, língua dos poetas, filósofos e geógrafos, era considerado mais nobre do que o vocabulário coloquial. As metonímias/metáforas surgem como um outro processo de evitar as palavras vulgares, na medida em que Camões se serve destas figuras de estilo para atribuir um outro nome a uma determinada palavra ou expressão. Por exemplo, “flores” em lugar de faces do rosto; “ouro” em lugar de cabelo/dinheiro; “lenho” em lugar de nau; “argento”, “líquido estranho”, “Tétis” ou “Dione” em lugar de mar, etc. Por vezes as metonimias e as metaforas contêm, referências à mitologia greco-latina. As perífrases através do uso de um numero de palavras maior do que o necessário para exprimir uma determinada ideia, Camões atribui peculiaridade ao discurso.

Os narradores

Ao longo da obra camoniana Os Lusíadas, Camões mantém a presença de um narrador principal que vai adotando várias personalidades, que conduzem a narração. São elas: Vasco da Gama, que narra a História de Portugal e a viagem desde Lisboa até

Moçambique; Camões (o narrador principal), que relata a viagem de Vasco da Gama desde

Moçambique até à Índia e toda a viagem de regresso; Paulo da Gama, que, em Calecut, explica o significado das 23 figuras

representadas nas bandeiras; Fernão Veloso, que descreve o episódio dos Doze de Inglaterra; Júpiter, que, através de profecias, anuncia para os portugueses “feitos

ilustres” no Oriente; Adamastor, que vaticina “ventos e tormentas desmeddas”, “naufrágios,

perdições de toda a sorte” para a gente ousada que navego nos seus mares; Ninfa Sirena, que descreve glórias futuras dos Portugueses; Tétis, que aponta os lugares onde os portugueses hão de realizar feitos

heroicos.

A mitificação do herói

Os Lusíadas não cantam apenas a viagem marítima e a história portuguesa, mas revelam, também, o espírito do homem da Renascença que acredita na experiencia e na razão. De facto, a viagem, mais do que a exploração dos mares, exprime a passagem do desconhecido para o conhecimento experiencial.

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A Ilha dos Amores, no final da obra, não passa de um mito construído com elementos da cultura greco-latina (as ninfas) elaborado para o efeito específico que Camões visa – enaltecer os feitos heroicos dos argonautas, bem como a sua consequente divinização. Tem uma simbologia muito peculiar, visto que enaltece a importância excecional do acontecimento nuclear do poema – a viagem de descoberta do caminho marítimo para a Índia.

Esta viagem propiciou o engrandecimento do Império e a difusão da fé Cristã, desmistificou conjeturas, desvendou mistérios, permitindo aos nautas conhecer a verdade e o outrora desconhecido. Tais obras são dignas de serem recompensadas, pelo que Vénus faz os navegadores portugueses aportar à Ilha dos Amores, uma ilha paradisíaca, povoada de ninfas nuas, que lhes deleitaram os sentidos. Tal deslumbramento dos nautas pelo erotismo da “ilha” simboliza a necessidade de uma comunhão dos homens com o divino na procura da suprema harmonia.

Os navegantes, que chegaram à Índia, ultrapassando inúmeras adversidades e oferecendo os seus serviços em prol da pátria, merecem realmente a mitificação. Neste sentido, a grandeza dos descobrimentos também se mede pela grandeza do prémio, e esse foi o da imortalidade, simbolicamente representado na união homens-deusas. Assim, os nautas, vitoriosos, ascendem à sublimação, fazendo cair do pedestal as antigas divindades, e atingindo a tão merecida fama.

Em suma, a Ilha dos Amores representa a essência da vida – o Amor e o Conhecimento – e é o símbolo da capacidade dos Portugueses na exploração dos mares, bem como da sua divinização, pelos grandes feitos que alcançaram. O desconhecido torna-se conhecido e o mistério é desvendado, os nauta divinizados.

A epopeia Humanista

Revela-se, particularmente, a partir do Canto V, o pendor humanista da obra: - Epopeia empenhada em mostrar a capacidade da realização do homem, a

vitória sobre a natureza adversa, o alargamento dos limites do saber;- Epopeia humanista, ainda, pela sua vertente pedagógica: o poeta propõe aos

portugueses modelos de perfeição, conjugando, por exemplo, as “armas e as letras”.

Sínteses intercalares

Canto I

Navegação no Índico/ concílio dos Deuses no Olimpo: confronto entre Vénus e Baco;

Decisão favorável aos Portugueses; Chegada à Ilha de Moçambique;

Contraste entre negros e brancos; Curiosidade dos Moçambicanos, diálogo; Visita do Régulo às Naus; Constatação das diferenças religiosas; Ódio dissimulação do Rei mouro; Instigações de Baco contra os Portugueses; Cilada; Simulação de arrependimento por parte do Rei e oferta

traiçoeira de um falso piloto;

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Partida em direção a Quílola; Intervenção providencial de Vénus: desvio da frota com o auxílio de ventos

contrários, impedindo a entrada em Quílola; Novas tentativas do falso piloto; Chegada a Monbaça; Novas ciladas instigadas por Baco; Exclamações de Camões.

Canto II

Convite traiçoeiro do Rei de Monbaça para a armada entrar na cidade; Vasco da Gama envia dois condenados a terra para tirar informações; Encontram Baco disfarçado de sacerdote cristão numa igreja; O Gama decide desembarcar; Vénus e as Nereides impedem-no de entrar no porto; O falso piloto e os outros mouros que se encontravam nas naus, julgando-se

descobertos, atiram-se ao mar; Agradecimento do Gama a Deus e pedido de ajuda; Vénus vai ter com Júpiter e lamenta-se da falte de apoio para os Portugueses; O pai dos Deuses garante-lhe futuro glorioso para os seus protegidos; O Deus Mercúrio é enviado a terra para aparecer em sonhos a Vasco de Gama,

indicando-lhe o caminho e para lhes preparar uma boa receção no próximo porto;

Viagem até Melinde; Receção hospitaleira por parte do povo; O Capitão é convidado a desembarcar; Gama, cauteloso, responde que não está autorizado pelo seu Rei a descer,

mas convida o Rei de Melinde a subir a bordo; Visita do Rei e festejos em terra e no mar; O Rei pede a Gama que lhe fale dos Portugueses e de Portugal.

Canto III

Camões pede a Calíope, musa inspiradora da poesia épica, que o ajude em tarefa tão exigente;

Vasco da gama inicia o seu longo discurso ao Rei de Melinde: Primeiro fala do seu país e da situação geográfica; Depois refere a História de Portugal:

∞ História primitiva – do Luso a Viriato;∞ Conde D. Henrique: formação do condado Portucalense;∞ Reis da 1ª Dinastia.

Canto IV

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Continua a referência à História de Portugal: Reis da 1ª Dinastia (conclusão); Reis da 2ª Dinastia;

Convite a Vasco da Gama para comandar a armada (D.Manuel I); Partida das naus, da Praia de Belém, em Lisboa, a 8 de julho de 1497/ o velho

Restelo.

Canto V

Continuação da narração da viagem feita por Vasco da Gama ao Rei de Melinde:

Viagem até ao Equador/ Oceano Atlântico; Fenómenos Marítimos – fogo de Santelmo e tromba marítima; Paragem na Baía de Santa Helena: a aventura de Fernão Veloso; Passagem do Atlântico para o Índico; Confronto com o Gigante Adamastor; Boa receção das populações da costa Oriental Africana/ Chegada ao

Rio dos Bons Sinais; Doença entre os marinheiros: escorbuto; Passagem pelo canal de Moçambique, com os graves problemas

contados anteriormente; Chegada a Melinde;

Novos lamentos de Camões, sobre a desvalorização da arte da poesia.

Considerações do Poeta – Canto V

O poeta começa por mostrar como o canto, o louvor, incita à realização dos feitos; dá em seguida exemplos do apreso dos antigos pelos seus poetas, bem como da importância dada ao conhecimento e à cultura, que levava a que as armas não fossem incompatíveis com o saber.

Não é, infelizmente, o que se passa com os portugueses: não se pode amar o que não se conhece, e a falta de cultura dos heróis nacionais é responsável pela indiferença que manifestam pela divulgação dos seus feitos.

Apesar disso, o poeta, movido pelo amor à pátria, reitera o seu propósito de continuar a engrandecer, com os seus versos, as “grandes obras” realizadas.

Desta forma, manifesta a vertente pedagógica da sua epopeia, na defesa da realização plena do homem em todas as suas capacidades.

Canto VI

Festa de despedida em Melinde; Partida para a Índia com pilotos experientes: a viagem;

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Baco, em desespero, desce ao palácio de Neptuno e solicita-lhe um novo consílio, desta vez dos deuses do mar, convencendo-os a destruíram os portugueses. Éolo, deus do vento, fica encarregado de soltar os ventos;

Os portugueses navegam calmos e confiantes: Fernão Veloso conta a história dos doze de Inglaterra e do Magriço;

Violentíssima tempestade; Prece de Vasco da Gama a Deus; Vénus manda as ninfas seduzir e amansar os ventos; Índia à vista; Vasco da Gama agradece à Divina providência, julgando ter havido um

milagre; Camões medita sobre o verdadeiro valor da Glória.

Considerações do Poeta – Canto VI

Vencidos os perigos e os medos, desvendados os segredos, é realizada a obra, e a chegada, finalmente, é possível.

Continuando a exercer a sua função pedagógica, o poeta defende um novo conceito de nobreza, espelho do modelo da virtude renascentista: a fama e a imortalidade, o prestigio e o pode, adquirem-se pelo esforço – na batalha ou enfrentando os elementos, sacrificando o corpo e sofrendo pela perda dos companheiros; não se é nobre por herança, permanecendo no luxo e na ociosidade, nem pela concessão de favores se deve alcançar um lugar de relevo.

Canto VII Chegada a Calecute; Camões elogia o espírito de cruzada e critica os outros países que não

seguem o mesmo exemplo; Descrição da Índia; Vasco da Gama manda um mensageiro anunciar a sua chegada a Calecute; O mensageiro desperta a curiosidade entre as gentes da Índia, pelo seu tom

de pele e modo de trajar; Monçaide, um mouro do norte que conhece a fama dos portugueses e fala

hispânico, recebe-o em sua casa e fala da Índia e das suas gentes; Gama decide desembarcar e visitar o Samorim; O capitão Português é recebido pelo Catual, governados da cidade, e passeia-

se pelas ruas de Calecute; Vasco da Gama é recebido pelo Samorim no seu palácio e expõe-lhe o

objetivo da sua viagem: levá-lo a fazer um pacto de Paz, Amizade e Comércio com El-Rei D. Manuel I;

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O Catual quer informações sobre os portugueses e Monçaide aconselha-o a ir visitar as naus;

O Catual é recebido a bordo e pede a Paulo da Gama que lhe fale da bandeira que tem cenas históricas pintadas;

Camões pede inspiração, desta vez às ninfas do Tejo e do Mondego e lamenta-se da ingratidão dos seus contemporâneos que não lhe dão o valor que ele julga merecer.

Considerações do Poeta – Canto VII

Est. 2 a 14 – Percorrido tão longo e difícil caminho, é momento para que, na chegada a Calecute, o poeta faça novos louvores aos Portugueses. Exalta, então, o seu espírito de cruzada, a incansável divulgação da Fé por África, Ásia, América “E se mais mundos houver, lá chegará”, inserindo, assim, a viagem à Índia na missão transcendente que assumiram e que é marca da sua identidade nacional.

Por oposição, critica duramente as outras nações europeias – os Alemães “soberbo gado”, o “duro Inglês”, o “Galo indigno”, os italianos que, “em delicias/ Que o vil ócio que no mundo traz consigo,/ Gastam as vida” – por não seguirem o seu exemplo no combate aos infiéis.

Est. 78 a 87 – Numa reflexão de tom marcadamente autobiográfico, o Poeta exprime um estado de espírito bem diferente daquele que caracterizava, no Canto I, a invocação às Tágides – “ cego, / (…) insano e temerário”, percorre um caminho “árduo, longo e vário”, e precisa de auxílio porque, segundo diz, teme que o barco da sua vida e da sua obra não chegue a bom porto. Uma vida que tem sido cheia de adversidades, que enumera: a pobreza, a desilusão, o desterro, os perigos do mar e da guerra, entre outros. Em retribuição, recebe novas contrariedades – de novo a crítica aos contemporâneos e o alerta para a inevitável inibição do surgimento de outros poetas em consequência de tais exemplos.

Porém, a critica aumenta de tom na parte final, quando são enumerados aqueles que nunca cantará e, implicitamente, denuncia abundarem na sociedade do seu tempo: os ambiciosos, os que sobrepõem os seus interesses aos do “bem comum e do seu Rei”, os dissimulados, os exploradores do povo, que não defendam “que se pague o suor da servil gente”.

No final, retoma à definição do seu herói – o que arrisca a vida “por seu Deus, por seu Rei”.Nota: A definição como anti-heroicos dos atos de quem se serve do poder para seu interesse pessoal, bem como dos que exploram e oprimem o povo, mesmo que servindo diligentemente o rei, é uma crítica social e política de grande coragem e frontalidade.

Canto VIII

Paulo da Gama explica ao Catual o significado das figuras históricas representadas nas bandeiras;

Baco provoca novas intrigas, aparecendo em sonhos a um sacerdote muçulmano que convoca pessoas da sua religião e indispõe-los contra os portugueses;

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Decidem subornar os Catuais e estes retardam a decisão de fazer o acordo com os portugueses;

Vasco da Gama apela ao Samorim e este quer que ele confere que os portugueses não são quem dizem ser;

Vasco da Gama argumenta com palavras inspiradoras de Vénus e diz que partirá logo, pois só pretende o tal tratado e especiarias para provar ao Rei D. Manuel I que cumpriu sua missão;

O Rei acredita nele e desconfia dos seus conselheiros; O Catual impede Gama de partir e procura que as naus se aproximem de

terra; Vasco da Gama apercebe-se da cilada e, no dia seguinte, pede-lhe de novo

para ir falar como Samorim; O Catual, com medo, propõe a liberdade em troca de mercadoria; Vasco da Gama escreve ao irmão e paga o resgate, sendo solto; Camões faz novas conjeturas sobre o poder corruptor do ouro.

Considerações do Poeta – Canto VIIIA propósito da narração ao suborno do Catual e das suas exigências aos

navegadores, são agora enumerados os efeitos perniciosos do ouro – provoca derrotas, faz dos amigos traidores, mancha o que há de mais puro, deturpa o conhecimento e a consciência, os textos e as leis são por ele condicionados, está na origem de difamações da tirania dos reis, corrompe até os sacerdotes sob a aparência da virtude.

Retomando a função pedagógica do seu canto, o Poeta aponta um dos males da sociedade sua contemporânea, orientada por valores materialistas.

Canto IX Os dois feitores que tinham vindo a terra com o resgate são aprisionados

para retardar a partida, pois uma poderosa armada turca está a chegar; Monçaide avisa o Gama e este mantém a bordo dois mercadores importantes

indianos; A família destes intercede junto do Samorim e faz-se a troca de reféns; Monçaide consegue as especiarias para o Gama e parte com os portugueses; Partida: regresso à Pátria – missão cumprida; Vénus prepara uma merecida recompensa para os descobridores: uma ilha

onde repousem da sua árdua tarefa e, simultaneamente, satisfação os sentidos, numa perspetiva carnal;

Na Ilha dos Amores: confraternização amorosa entre os marinheiros e as ninfas;

Conselhos de Camões aos que aspiram à imortalidade.

Considerações do Poeta/ Ilha dos Amores – Canto IX

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Estando os navegantes na viagem de regresso a Portugal, Vénus prepara-lhes, com a ajuda das ninfas e do seu filho cupido, uma recompensa pelos perigos e tormentas que enfrentaram vitoriosos. Fá-los aportar numa ilha paradisíaca, povoada por ninfas amorosas que lhes deleitam os sentidos. Numa atitude estudada de sedução, as divindades fingem-se assustar-se com a presença dos marinheiros mas logo se rendem aos prazeres do amor.

Esta ilha não existe na realidade, mas na imaginação, no sonho que dá sentido à vida, sonho esse que permite atingir a plenitude da Beleza, do Amor, da Realização.

Neste sentido, a grandeza dos descobrimentos também se mede pela grandeza do prémio, e esse foi o da imortalidade, simbolicamente representado na união homem-deusas.

O Poeta não perde o ensejo, no final do canto, de esboçar o perfil dos que podem ser “nesta Ilha de Vénus recebidos”, reiterando valores como a justiça, a coragem, o amor à pátria, a lealdade ao reino.

Desta forma, independentemente das circunstâncias históricas, se construirá uma sociedade mais justa – “E todos tereis mais, e nenhum menos” -, atingindo-se, então, a verdadeira e merecida fama.

Simultaneamente, o poeta não deixa de sublinhar a importância da vontade da consecução dos nossos objetivos, porque “quem quis, sempre pode”.

Canto X

Tétis e as outras Ninfas oferecem um banquete aos navegadores portugueses; Uma ninfa, cantando, vaticina feitos futuros para o peito lusitano; Camões interrompe para solicitar a Calíope que o faça recuperar o gosto e o

poder da escrita, pois está velho e cansado; A Ninfa saliente feitos sobretudo relacionados com os futuros governadores

da Índia; Tétis leva Gama ao alto de um monte, onde lhe mostra a grande Máquina do

Mundo, só vista por seres divinos, e descreve-lhe os lugares onde os portugueses irão praticar feitos heroicos;

Tétis comunica-lhe que é tempo de partir; Chegada a Portugal; Camões finda a leitura do Poema ao Rei D. Sebastião e exorta-o a reconhecer

o valor dos que o servem e a cometer, ele também, feitos gloriosos no norte de África, pondo-se à sua disposição como soldado, para o servir, e como poeta, para o cantar.

Considerações do poeta – Canto X – Ilha dos Amores/ Invocação a Calíope No banquete com que homenageiam os navegantes, uma ninfa profetiza

futuras vitórias dos portugueses. É momento para o poeta interromper e pedir inspiração a Calíope, musa da poesia épica e da eloquência, uma vez que a “Matéria” é elevada, sublime, digna de ser cantada numa epopeia e não em poesia vulgar.

Novamente, através de um tom marcadamente autobiográfico, o Poeta refere aspetos da sua vida, queixando-se do envelhecimento e dos desgostos que o vão levando à morte. Assim, o Poeta pede a Calíope que lhe permita levar a cabo esta expressão do amor pela pátria, uma vez que sento um menor gosto pela escrita.

Canto X – a Máquina do Mundo

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A Máquina do Mundo era composta por 11 esferas (ou céus):

No centro, a Terra, formada pelos quatro elementos (terra, água, fogo e ar);

Sobre esta esfera assentava o céu da Lua, seguindo-se os céus de Mercúrio, Vénus,

Marte, Júpiter, Saturno e o do Sol; Sobre os céus destes planetas, estava a oitava esfera, onde se encontrava as

constelações; Depois vinha a nona esfera. Cristalina ou Segundo móbil; Envolvendo todas as anteriores, estava o décimo céu ou o primeiro móbil; A cobrir todos estes céus materiais, havia o Empíreo, fixo, morada dos bem-

aventurados.

Considerações do Poeta – Canto XO Poeta encerra a sua obra, condenando o abandono a que em Portugal se

votam às letras e exortando D. Sebastião a continuar a série de vitórias portuguesas em Marrocos.

É, mais uma vez, o lamento sentido de um poeta que se sente injustiçado por ver que está a “cantar a gente surda e endurecida”, insensível à arte e mergulhada não no amor à pátria, mas sim “No gosto da cobiça e na rudeza/ Duma austera, apagada e vil tristeza”.

Neste desencanto, há ainda uma centelha de esperança, quando, ao dirigir-se ao Rei D. Sebastião, “Senhor só de vassalos excelentes”, capazes de tudo enfrentar e suportar, o Poeta o exorta a fazer renascer a glória portuguesa através de uma serie de conselhos: favorecer todos os súbditos de acordo com a sua aptidão, aliviar o país de lei rigorosas, valorizar o saber dos experientes, ter apreso pelos guerreiros que dilatam a Fé e o império – a sua mensagem resume-se aos versos “ Não se aprende, Senhor, na fantasia/ Sonhando, imaginando ou estudando, / Senão vendo, tratando e pelejando”.

Perante a indiferença e o esquecimento a que esta cotado, Camões não se inibe de apresentar os seus contributos a que, em muito, poderão contribuir para a exaltação épica do rei e da pátria – “honesto estudo”, “longa experiencia” e “engenho”.

Assim, só falta ao poeta ser aceite por D. Sebastião de modo a que, ao cantar os seus feitos, Alexandre Magno, herói da antiguidade clássica, passe a ter o Rei Português com modelo, em vez de invejar a glória de Aquiles.

Mensagem: Os Lusíadas encerram com uma mensagem abarca o passado, o presente e o futuro – a glória do passado deverá ser encarada como um exemplo presente para construir um futuro glorioso. Camões deposita no Rei a esperança de que saiba

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aproveitar e estimular as energias dos portugueses para dar continuidade à glorificação do “peito lusitano”.