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Instituto de Economia da UFRJ Apostila de Macroeconomia Edson Peterli Guimarães curso externo 1 INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA 1 Edson Peterli Guimarães ** 1.INTRODUÇÃO ................................................................ 1 2. MEDINDO O PRODUTO .............................................. 3 2.1. A Mensuração do Produto .................................................. 5 2.1.1. Distinção entre Produto Bruto e Produto Líquido ......................... 7 2.1.2. Renda Nacional e Renda Pessoal .................................................. 7 2.1.3. Produto Real e Nominal ................................................................ 9 2.2. Índices de Preços ................................................................ 10 2.3. O Excedente Econômico .................................................... 11 2.3.1. O valor do excedente econômico ............................................... 14 3. IDENTIDADES BÁSICAS........................................... 16 3.1. Uma Economia Simples ..................................................... 16 3.2. Introduzindo o Governo e o Mercado Externo. .............. 18 3.3. Renda e o Balanço de Pagamentos ................................... 20 .3.3.1. Aspectos monetários do Balanço de Pagamentos ....................... 22 3.3.2. Ampliando o modelo .................................................................. 23 4. FUNÇÃO CONSUMO E DEMANDA AGREGADA .. 24 5. MOEDAS E BANCOS .................................................. 28 5.1. Um pouco da moeda na macroeconomia ......................... 31 5.2. Bancos ................................................................................. 34 5.2.1. Um pouco de política monetária brasileira .................................. 36 5.3. Taxa de Câmbio ................................................................. 38 5.3. 1. Taxa de Câmbio Real ................................................................. 39 5.4. taxa de câmbio e taxa de juros .......................................... 40 1 Apostila para curso externo. Pede-se não citar. Revisão em junho de 2010 ** Professor Associado do Instituto de Economia e coordenador da Pós-Graduação em Comércio Exterior (ECEX) da UFRJ. 1. INTRODUÇÃO Esta nota explicita alguns aspectos e conceitos econômicos para auxiliar a compreensão de algumas políticas governamentais e seus efeitos na economia. As empresas, os consumidores, o Estado e demais instituições fazem escolhas e tomam decisões econômicas baseados em uma multiplicidade de fatores, dentre os quais o preço é o principal, pois é por meio deles que as escolhas econômicas são feitas. Os preços, contudo, são continuamente modificados, já que são governados por princípios inerentes a uma lógica milenar: a interação entre oferta e demanda de bens e serviços. Esses princípios são representados por conjuntos de ações individuais que com o avanço das sociedades deram origem aos agregados econômicos. A macroeconomia estuda justamente os inter-relacionamentos dos agregados econômicos, tais como, poupança, consumo, investimento, tributação, gastos governamentais, exportação, importação e outros. É uma disciplina funcional que desvenda as propriedades entre os agregados econômicos através do estudo de causas e efeitos. A macroeconomia ensinada nas escolas de economia é uma disciplina recente. Surgiu nos anos de 1960/70 e vem sendo, desde então, palco de aperfeiçoamentos e discussões que sugerem certo distanciamento de uma estrutura teórica única. Seus fundamentos e princípios foram estabelecidos por John Maynard Keynes nos anos de 1920 e a aplicação deles pela política governamental nos Estados Unidos para debelar a grande depressão que havia se instalado naquele país em 1929, foi muito bem sucedida À idéia central era de que o desemprego causado pelo grande depressão em 1929 nos Estados Unidos da América não era voluntário: ele existia porque as empresas não desejam empregar mão-de-obra mesmo com salários ínfimos quando não

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INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA1

Edson Peterli Guimarães**

1.INTRODUÇÃO ................................................................ 1

2. MEDINDO O PRODUTO .............................................. 3 2.1. A Mensuração do Produto .................................................. 5 2.1.1. Distinção entre Produto Bruto e Produto Líquido ......................... 7 2.1.2. Renda Nacional e Renda Pessoal .................................................. 7 2.1.3. Produto Real e Nominal ................................................................ 9 2.2. Índices de Preços ................................................................ 10 2.3. O Excedente Econômico .................................................... 11 2.3.1. O valor do excedente econômico ............................................... 14 3. IDENTIDADES BÁSICAS ........................................... 16 3.1. Uma Economia Simples ..................................................... 16 3.2. Introduzindo o Governo e o Mercado Externo. .............. 18 3.3. Renda e o Balanço de Pagamentos ................................... 20 .3.3.1. Aspectos monetários do Balanço de Pagamentos ....................... 22 3.3.2. Ampliando o modelo .................................................................. 23 4. FUNÇÃO CONSUMO E DEMANDA AGREGADA .. 24

5. MOEDAS E BANCOS .................................................. 28 5.1. Um pouco da moeda na macroeconomia ......................... 31 5.2. Bancos ................................................................................. 34 5.2.1. Um pouco de política monetária brasileira .................................. 36 5.3. Taxa de Câmbio ................................................................. 38 5.3. 1. Taxa de Câmbio Real ................................................................. 39 5.4. taxa de câmbio e taxa de juros .......................................... 40

1 Apostila para curso externo. Pede-se não citar. Revisão em junho de 2010

**Professor Associado do Instituto de Economia e coordenador da Pós-Graduação

em Comércio Exterior (ECEX) da UFRJ.

1. INTRODUÇÃO

Esta nota explicita alguns aspectos e conceitos econômicos para auxiliar a compreensão de algumas políticas governamentais e seus efeitos na economia. As empresas, os consumidores, o Estado e demais instituições fazem escolhas e tomam decisões econômicas baseados em uma multiplicidade de fatores, dentre os quais o preço é o principal, pois é por meio deles que as escolhas econômicas são feitas. Os preços, contudo, são continuamente modificados, já que são governados por princípios inerentes a uma lógica milenar: a interação entre oferta e demanda de bens e serviços.

Esses princípios são representados por conjuntos de ações individuais que com o avanço das sociedades deram origem aos agregados econômicos. A macroeconomia estuda justamente os inter-relacionamentos dos agregados econômicos, tais como, poupança, consumo, investimento, tributação, gastos governamentais, exportação, importação e outros. É uma disciplina funcional que desvenda as propriedades entre os agregados econômicos através do estudo de causas e efeitos.

A macroeconomia ensinada nas escolas de economia é uma disciplina recente. Surgiu nos anos de 1960/70 e vem sendo, desde então, palco de aperfeiçoamentos e discussões que sugerem certo distanciamento de uma estrutura teórica única. Seus fundamentos e princípios foram estabelecidos por John Maynard Keynes nos anos de 1920 e a aplicação deles pela política governamental nos Estados Unidos para debelar a grande depressão que havia se instalado naquele país em 1929, foi muito bem sucedida À idéia central era de que o desemprego causado pelo grande depressão em 1929 nos Estados Unidos da América não era voluntário: ele existia porque as empresas não desejam empregar mão-de-obra mesmo com salários ínfimos quando não

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existem pessoas com dinheiro para adquirir os seus produtos. Por outro lado, as pessoas não tem dinheiro para adquirir os produtos justamente porque não tem emprego, constituindo, portanto, situação assemelhada ao cão correndo em busca de sua própria cauda. Anteriormente, a teoria econômica baseada no livre mercado sugeria que trabalhador nas suas escolhas optava conscientemente por trabalhar determinado numero de horas por dias dedicando outras tantas ao lazer. Assim, a crise de 1929 seria um evento passageiro, pois a teoria econômica baseada no livre jogo das forças de mercado informava que não haveria desemprego involuntário. O lazer em detrimento ao trabalho era voluntario: era a opção escolhida pelo trabalhador. A politica governamental contra a depressão, apoiada nos ensinamentos de Keynes, consistia justamente em criar renda por meio de estímulos governamentais: compras de bens e serviços pelo estado cujos pagamentos significavam transferência de renda do estado para a sociedade. Observe que as aquisições do Estado não perseguiam critérios de rentabilidade privada. A ideia era dar condições (renda) as famílias para que se adquiram produtos e serviços, reativando os investimentos privados. Até hoje, guardadas as devidas proporções, é assim.

Para não fazermos confusão entre o objeto de estudo da macroeconomia e sua aplicação pela política governamental devemos distinguir as apreciações de caráter valorativo que evocam a idéia de juízo de valor - economia normativa - das apreciações de caráter factual - economia positiva.

A economia positiva preocupa-se com a descrição de fatos, circunstâncias e relações na economia. Qual a taxa de desemprego atual? Como um nível mais elevado de inflação afeta o emprego dos fatores de produção? Em que medida um imposto sobre a gasolina afeta o seu consumo? Estes são alguns exemplos de problemas que apenas podem ser resolvidos com referência a fatos e que, portanto, são determinados, geralmente, de forma

empírica. Podem ser problemas fáceis ou complicados, mas todos eles se situam na esfera da economia positiva.

A ação dos formuladores da política pertence ao campo da economia normativa que envolve julgamentos éticos e de valor. Qual o nível de inflação que deve ser tolerado? Deverão os impostos afetar mais os ricos para ajudar os pobres? Deverá a despesa com o setor de saúde pública ser financiada pela Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) ou outra modalidade de imposto deve ser criada? Estas são algumas questões que têm valores profundamente enraizados ou julgamentos de natureza moral. Poderemos discuti-los, mas não resolvê-los através da ciência ou do apelo aos fatos. Não existem respostas certas ou erradas acerca do nível que a inflação deva ter, do nível de pobreza que deva ser admitida ou, ainda, do nível de gastos com a saúde pública que o país necessita. Estes problemas são resolvidos com ações políticas.

O estudo da macroeconomia requer o conhecimento prévio da construção dos agregados econômicos. Mensuramos o produto de uma economia e as partes que o compõem aplicando princípios contábeis e denominamos esta parte do estudo da macroeconomia de Contabilidade Nacional.

As contas nacionais fornecem as medidas efetivas dos agregados econômicos que compõem a estrutura funcional do Produto e da Renda de um país. Estudamos a contabilidade nacional não somente porque ela nos fornece medidas de desempenho da economia mensuradas pela produção de bens e serviços, mas também porque evidencia as relações funcionais entre elas partindo de três variáveis macroeconômicas básicas: Produto, Renda e Despesa. Os bens e serviços produzidos (produto) significam dispêndios: despesa com os fatores de produção que serão consumidos por meio da renda paga aos proprietários dos fatores de produção. Assim, a Renda, a Despesa e o Produto podem ser decompostos em termos de os agregados

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econômicos; tributação e gastos do governo, rendas dos exportadores e gastos com importação, poupança e investimento e os pagamento aos fatores de produção2.

2. MEDINDO O PRODUTO

O Produto Nacional Bruto (PNB) e o Produto Interno Bruto (PIB) são as medidas mais divulgadas pelos meios de comunicação. O PNB e o PIB são as medidas agregadas de tudo o que foi produzido em termos de bens finais pelos fatores de produção que são à força de trabalho, os recursos naturais e o capital e suas contrapartidas nominais sãos os salários, juros e alugueis respectivamente.

O PNB contabiliza os rendimentos da produção de empresas nacionais localizadas no país e no exterior, cujos fatores de produção são de propriedade dos residentes (nacionais). Ao mesmo tempo, não considera o rendimento auferido pelos não-residentes dentro das fronteiras do país. As entradas e saídas desses rendimentos são contabilizadas no Balanço de Pagamentos e representam os pagamentos e recebimentos devidos a juros, lucros, dividendos, royalties, ordenados e salários ao pessoal trabalhando no estrangeiro e também pela utilização de marcas e patentes, dentre outros. A diferença (saldo) entre as entradas e saídas desses pagamentos registrado no Balanço de Pagamentos do país é denominada de renda líquida enviada ao exterior (RLEX).

O PIB, por seu lado, evoca a idéia de território. Ele mensura o valor total dos bens e serviços finais produzidos dentro das fronteiras do país independente da propriedade dos fatores de produção, sejam eles nacionais (residentes) ou estrangeiros (não residente), em um período determinado. Assim, o PIB tende a ser maior do que o PNB nos países em desenvolvimento ou

2 Ver IBGE, notas metodológicas, 2008.

subdesenvolvidos, já que contabiliza as saídas de renda das filiais, subsidiárias ou controladas de multinacionais dentro das fronteiras nacionais que geralmente são superiores a renda recebida pelos residentes dos seus investimentos feitos no exterior.

Na passagem dos anos 80 para os anos 90 no século XX, a maioria dos países passou a adotar políticas neoliberais que favoreceram o livre jogo das forças de mercado em detrimento das ações governamentais reguladoras dos mercados. Com esse contexto, os investidores sentiram-se a vontade para transladar seu capital para os países que ofereciam maior rentabilidade. Empresas passaram a adotar uma lógica de maximização de lucros e crescimento da firma fragmentando os seus processos de produção entre vários países de modo a constituir produtos mais baratos do que aqueles produzidos em uma só localidade. Esse processo ficou denominado de globalização produtiva.

Assim, os investimentos diretos externos e os fluxos internacionais de bens e serviços aumentaram substancialmente ao final do século XX. Pelos dados da UNCTAD entre 1980 e 90 o crescimento dos fluxos de investimentos externos diretos no mundo foi de 283%. Nos dez anos seguintes o crescimento alcançou a surpreendente marca de 567%. No ano de 2008, o fluxo total de investimento externo direto foi de 1,7 trilhões de dólares. No ano de 1980 esse valor representava apenas 54 bilhões de dólares. No período de 1990 a 2000 o crescimento do comércio internacional foi de 85% e entre o ano 2000 e 2008 o crescimento foi de 149%, totalizando um comércio neste último ano de 16 trilhões de dólares. Assim, a maioria dos países passou a enfatizar mais a divulgação do PIB do que o PNB caracterizando com mais propriedade as condições e circunstâncias de geração de valor do mercado doméstico, com certa independência da origem do capital que o constitui.

O PNB e o PIB, bem como a contrapartida a Renda, nos fornecem informações agregadas. Suas quantificações representam o quanto de produtos finais foi constituído, em

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determinado período pelas habilidades das forças de trabalho intermediadas pelas técnicas de produção existentes. Os papéis desempenhados pelas instituições privadas e públicas na geração do produto, as capacidades técnicas de produção, as habilidades das forças de trabalho e toda uma rede complexa de fatores intervenientes na vida social de um povo influenciam a quantidade de produtos gerados socialmente. Isoladamente, contudo, essas medidas pouco informam sobre vários aspectos relacionados à saúde, educação, segurança e bem-estar da sociedade. Por hora, vamos tratar tanto o PNB quanto o PIB simplesmente como Produto.

A medida do Produto representa o valor de todos os bens e serviços finais correntemente produzidos na economia e avaliados a preços de mercado. É, portanto, uma medida básica do esforço da comunidade frente a suas condições históricas e regionais na criação de mercadorias, em um dado período. Inclui o valor de bens produzidos, como automóveis, aves, e ovos, juntamente com o valor de serviços, como o corte de cabelos ou o atendimento médico.

Do conceito de Produto depreendemos:

a) A renda total dos assalariados e daqueles que recebem juros, alugueis, lucros e dividendos originam-se pela criação do Produto, e que, portanto,

b) A despesa agregada criada em um período determinado com bens e serviços na economia é igual ao valor do Produto.

A mensuração do Produto não avalia certas atividades econômicas difíceis, ou até mesmo impossíveis, de medir, tais como; poluição, agressão ao meio ambiente, o trabalho de voluntários, os serviços domésticos realizados pelos cônjuges e a perda em eficiência e produtividade devidas a fatores externos (custo Brasil, por exemplo). No Brasil, estima-se que parcela razoável do produto total origina-se do trabalho informal

(vendedores ambulantes e trabalhadores sem carteira assinada, por exemplo). Essa parcela de produção e outras como a obtida através de trabalhos voluntários não são incluídas no PIB, uma vez que não geram contrapartidas em pagamentos nominais aos fatores de produção.

De fato, a maioria dos países não fornece estatísticas oficiais de algumas realidades da vida moderna. Os engarrafamentos de trânsito requerem maior produção de combustível, bem como reduz a vida útil dos veículos. O tabaco, além de fazer parte do produto, eleva os custos com a saúde de camada expressiva da população (parcela dos fumantes ativos e passivos). Há evidências científicas de que substâncias fabricadas pelo homem estão destruindo a camada de ozônio que protege animais, plantas e seres humanos dos raios ultravioletas emitidos pelo Sol. O governo e as empresas (gastam) contratam instituições especializadas no monitoramento e descobrimento de produtos e processos produtivos que atenuam ou extingam os efeitos maléficos causados pelo avanço do progresso industrial. Novos medicamentos são criados para combater doenças causadas pela poluição ambiental e de pele devido a maior incidência de raios ultravioletas. Estudos de logística vêm sendo demandados para reduzir custos causados pela ineficiência dos transportes. A maior incidência de criminalidade requer novas armas e aparato policial mais abrangente, etc.

Estas perdas e ganhos tendem a serem ignoradas pelas estatísticas governamentais que mensuram o Produto a partir de cálculos que requerem somente os gastos efetivos, não interessando se eles foram compensatórios ou não em relação aos malefícios causados pelo progresso técnico ou ineficiência econômica.

Sanuelson & Nordhaus (2001) caracterizam que com a intenção de corrigir a ênfase excessiva dada pelo PNB e pelo PIB à produção material, uma medida diferente da vida econômica,

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chamado bem-estar econômico líquido (ou BEEL), foi proposta nos Estados Unidos. O BEEL tem crescido desde 1929, o que faz pensar que os níveis de vida efetivos têm aumentado. Mas o BEEL tem crescido menos depressa que o Produto medido convencionalmente, o que confirma que a mera avaliação monetária a preços de mercado deixa escapar muitos aspectos importantes da vida econômica. Muitos países atualmente têm se preocupado em mensurar os efeitos deletérios no meio ambiente causado pelo progresso econômico e ineficiência econômica, inclusive o Brasil, para propor medidas concretas de acerto produtivo com preservação ambiental e maior bem-estar social.

No ano 1993, o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) desenvolveu e passou a recomendar a indicação do IDH – Índice de Desenvolvimento Humano – como indicador do desenvolvimento dos países. A sua metodologia usa como parâmetros não somente a renda, mas também índices de longevidade e nível educacional. No rank de 177 países que participam das Nações Unidas, o Brasil alcançou a 84ª posição ficando atrás de países como o Uruguai, o Panamá e a Argentina no ano de 2010, para citar somente aqueles dentre os países da América Latina.

Esta, inclusive, tem sido uma tendência cada vez mais presente na economia contemporânea: a indicação e elaboração de pesquisas que apontem não somente o alcance da produção com base na disponibilidade dos recursos produtivos, mas sim a adequada consideração com os processos produtivos de forma global com vistas ao melhoramento dos indicadores sociais. Para reforçar essa argumentação, vale frisar que algumas empresas, sob o manto universal da preservação ambiental e busca por um maior bem-estar da população, têm dedicado parcelas de seus investimentos a projetos de cunho social e frequentemente apresentam em seus balanços os investimentos sociais que fizeram.

2.1. A MENSURAÇÃO DO PRODUTO

As medidas do Produto referem-se ao valor de todos os bens e serviços finais na economia num dado período. Inclui o valor de bens como bicicletas e suco de laranja e o valor de serviços de corretagem de títulos, transporte, serviços médicos, etc. Cada item é avaliado ao preço de mercado, sendo todos os valores dos bens finais somados para se obter o Produto. Numa economia simples que produz vinte bananas, cada uma avaliada a 30 centavos, e sessenta laranjas avaliadas a 25 cada, o Produto seria igual a R$ 21 (21 = 0,30 x 20 + 0,25 x 60).

Há certas sutilezas no cálculo do Produto. Em primeiro lugar, estamos falando de bens e serviços finais. A ênfase na palavra final é uma forma de termos a certeza de não estarmos incorrendo em dupla contagem. Por exemplo, não devemos incluir o preço total de um automóvel no Produto depois incluir também o valor dos pneus que foram vendidos ao fabricante do automóvel. Os componentes do carro, vendidos pelos fabricantes, são chamados de bens intermediários e seu valor é incluído no Produto ao ser contabilizado o custo/preço do automóvel.

Na prática, evita-se a dupla contagem trabalhando-se com o conceito de valor adicionado ou agregado. A cada etapa da produção de um bem, somente o valor adicionado ao produto naquela etapa da fabricação conta como parte do valor do produto. O valor do algodão retirado da terra improdutiva inicialmente pelo camponês tem valor porque o camponês transformou a terra em algo de valor: algodão. A seguir o valor do fio produzido pelo tecelão com o algodão menos o valor deste (o algodão), é o valor adicionado ao algodão que o transforma no fio do tecelão. Continuando esse processo; o fio incorpora certo valor através do trabalho, ou processo de transformação, fazendo surgir o tecido e o tecido, sofrendo processo semelhante, em camisa. A soma dos valores adicionados a cada etapa do processo produtivo será igual ao valor da camisa vendida. Em outras palavras, o valor adicionado

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em cada etapa produtiva é igual ao preço do bem ou serviço subseqüente menos os preços dos insumos imediatamente antecedentes. Os pagamentos aos fatores de produção que foram requeridos em cada etapa produtiva dentro da indústria têxtil, por exemplo, são entendidos como fluxos de renda e correspondem à sua soma ao valor dedicado ao setor de confecções. Este, por sua vez acrescenta valor à cadeia produtiva ao produzir os artigos de vestuário, colocando por fim a disposição do comerciante, que acrescenta mais valor ao aproximar esses artigos do consumidor final.

O valor que se adiciona ou se agrega nas distintas etapas compõe um processo de transformação engendrado pelo trabalho humano. Ademais, o maquinário, as instalações, os métodos de gestão (financeira, produtiva, contábil, etc.) e demais materiais que entram na composição de um produto final foram criados também, no passado, pelo trabalho humano. Assim, o Produto representa a medição do “esforço humano” histórica e regionalmente determinado. Quando mais desenvolvido um país menor será o esforço humano dedicado a reprodução social, ou alternativamente maior será o produto social, por conta do desenvolvimento tecnológico acumulado. De fato, quanto mais desenvolvido um país menor será o esforço humano “presente” na elaboração dos bens que atendam as necessidades materiais de seus cidadãos, conquanto maior seja o estoque de maquinário e desenvolvimento tecnológico acumulado. Em 2005 estima-se que o PIB brasileiro foi superior a 600 bilhões de dólares enquanto o do EUA foi superior a 11 trilhões de dólares!

O Produto é mensurado em termos nominais, isto é, em termos de preços observados no mercado. Por um lado, pelos pagamentos efetuados aos fatores de produção: salários e lucros (inclui rendas do capital: dividendos, aluguéis, juros, tributos e subsídios governamentais), formando a Renda e por outro, alternativamente, pelos preços somados dos produtos finais

produzidos/adquiridos pela sociedade, formando o Produto. Assim, Renda é igual a Produto.

O Produto e a Renda consistem, assim, no valor correntemente produzido. Ficam excluídas não só os insumos e bens intermediários, mas as transações de bens já existentes, como moradias ou obras de arte antigas. Contabilizamos a construção de novas casas, ou a reforma das já existentes como partes do Produto, porém não adicionamos as transações comerciais dos imóveis já existentes e dos automóveis de segunda mão. Contamos, contudo, como parte do Produto o valor dos honorários dos corretores de imóveis e de automóveis. O corretor fornece um serviço ao aproximar vendedor e comprador e isso é considerado como um trabalho especializado corrente.

Quando contabilizamos todas as transações efetivadas em um período ¬ incluindo os insumos e demais compras e venda ¬ denominamos esta medida de Valor da Produção.

A mensuração do Produto é feita a preço de mercado ou a custo de fatores. É importante saber que os preços de mercado incluem impostos indiretos, como o imposto sobre vendas e vários impostos de consumo, e assim o preço de mercado dos bens não é igual ao preço contabilizado pelo vendedor da mercadoria. O preço da mercadoria líquido de impostos indiretos (IPI e ICMS, por exemplo) constitui o custo de fábrica que vem a ser a quantia recebida pelos fatores de produção, deduzida de encargos tributários, que participaram na fabricação do produto ( custo dos fatores). O Produto pode, portanto ser avaliado a preço de mercado e a custo de fatores (exclui os impostos). Esse ponto torna-se importante ao relacionarmos o Produto à Renda recebida pelos fatores de produção, pois parte desta ultima compõe a receita do estado.

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2.1.1. DISTINÇÃO ENTRE PRODUTO BRUTO E PRODUTO LÍQUIDO

O Produto Líquido (PL) distingue-se do Produto Bruto pela dedução que se faz desse último da depreciação do estoque de capital que acontece no decorrer do período. Por exemplo, uma dona de casa vê sua casa se depreciar com o tempo e o empresário observa suas máquinas se desgastarem com o uso. Se não se empregassem recursos para manter ou substituir o capital existente, o produto não poderia ser mantido em seu nível corrente. Assim utilizamos o conceito de PL como medida da taxa de atividade econômica que poderia ser mantida por longos períodos, dados o estoque de capital e força de trabalho existente. A depreciação é aquela parcela do produto que deve ser assegurada para se manter a capacidade de produção da economia no nível preexistente e assim a deduzimos do Produto Bruto para obter o PL. Tendemos a trabalhar com o Produto Bruto mais do que com o PL por serem as estimativas de depreciação bastante imprecisas e também porque esses dados não são rapidamente encontrados.

Para o perfeito entendimento, podemos imaginar um trabalhador que ganhe dinheiro suficiente somente para garantir a sua sobrevivência e de sua família i, e, repor energias para continuar trabalhando e a família continuar vivendo. Qual o seu produto bruto? O quando ele ganhou com a sua produção. Qual o seu produto líquido? Nenhum, pois tudo que ele ganhou foi exatamente para repor sua energia gasta no processo produtivo.

2.1.2. RENDA NACIONAL E RENDA PESSOAL

A Renda Nacional se aproxima do conceito de Produto Nacional. Precisamente ela é:

RN= PNB - (depreciação + impostos indiretos).

A Renda Pessoal é a Renda Nacional descontada as

rendas ganhas por pessoas jurídicas (lucros das empresas) e adicionada as transferências líquidas destinadas ao setor pessoal. O nível da renda pessoal é importante por ser um determinante primordial do consumo das famílias e dos hábitos de poupança.

São três os itens a serem deduzidos da Renda Nacional:

1. Lucros das empresas (antes dos impostos) que evidentemente não fazem parte da renda pessoal.

2. Os juros líquidos relativos aos empréstimos efetuados entre residentes e não residentes.

3. Contribuições fiscais de pessoas físicas e jurídicas e que, em essência, são tributos pagos ao setor governamental e, portanto não integram a Renda Pessoal.

Adicionamos três itens:

Pagamentos de transferências as pessoas, consistindo em vários benefícios: seguro-desemprego, restituições de Imposto de Renda, benefícios aos aposentados e esquemas de bolsas as famílias dedicados aos pobres e outros sob diversas modalidades.

Renda de juros pessoal, que é a renda de juros de pessoas físicas proveniente de todas as fontes. Esse item, juntamente com os juros líquidos subtraídos acima, assegura que os juros deixados na renda pessoal consistam somente em juros recebidos pelas famílias.

Dividendos (lucro distribuído pelas empresas, depois do imposto).

Depois de efetuados esses ajustamentos, o resultado representa uma medida da renda recebida por indivíduos e pelos negócios de pessoas físicas. A Renda Pessoal Brasileira se contabiliza mensalmente, ao contrário da Renda Nacional, que é

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publicada trimestralmente.

Embora tenhamos chegado à Renda Pessoal, partindo da Renda Nacional e fazendo ajustamentos subseqüentes, reconhecemos que também seria possível construir uma estimativa da Renda Pessoal verificando seus componentes. De modo particular, a Renda Pessoal consiste na renda do trabalho, aluguéis, dividendos e a renda de juros acrescida de transferências governamentais de várias ordens, menos os tributos.

Note-se que os efeitos de altas taxas de juros e da carga tributária no Brasil têm implicações sensíveis para a Renda Pessoal. A princípio, o fato de elas serem altas implicaria em uma transferência de renda do Governo aos poupadores líquidos (geralmente os ricos) que aplicam em títulos do Governo ou fundos de Renda Fixa. Assim, toda a sociedade através dos aumentos de impostos ou da dívida interna financia o aumento da riqueza dos poupadores líquidos. Além disso, os devedores líquidos (que geralmente são os pobres) são penalizados por altas taxas de juros cobradas de bancos influenciados pela taxa de juros oferecida pelo Governo – vulgo SELIC. A preocupação de cunho distributivo sugere que no agregado os efeitos da taxa de juros sejam compensados (o que é pago pelo Governo aos poupadores é igual ao que é gasto pelos devedores). No entanto, não há garantias de que isso realmente ocorre. Esse aspecto serve para ilustrar como as decisões econômicas focadas em determinados aspectos podem ter efeitos secundários nem sempre esperados ou desejados.

Um fato digno de nota é a distribuição de renda no Brasil. Ela é uma das mais concentradas dentre todos os países. O índice geralmente usado por economistas e formuladores de políticas públicas que procuram mensurar os níveis de desigualdade é o coeficiente de Gini3. Em 2003, pelos cálculos desse coeficiente o

3 O coeficiente de Gini se calcula como uma razão das áreas no diagrama da

curva de Lorenz. Se a área entre a linha de perfeita igualdade e a curva de Lorenz

Brasil ficou atrás apenas de Serra Leoa, na África. Isso significa dizer que do montante produzido, medido pelo PIB, poucos no Brasil (1% da população ) se apropriam da maior parcela dele (50% do produto) ao passo que os demais, que são muitos (99%), apropriam-se do restante do produto4. Para o caso brasileiro este coeficiente tem girado ao redor de 0,60 para os anos entre 2000 e 2010, com posicionamento dentre os 5 países com distribuição de renda mais concentrada do mundo. A divisão da renda nacional reflete, portanto, questões sensíveis como à participação da mão-de-obra na produção, as taxas de lucro praticadas pelo setor privado, transferências de rendas, distribuição patrimonial na sociedade e outras.

Produto e Renda Pessoal Disponível

Pagamentos aos fatores de produção= PNB PNB – renda líquida enviada ao exterior= PIB PIB – depreciação =PL PL – imposto indiretos = RN RN – lucros – encargos sociais + juros + rendas de capital+ transferências governamentais = Renda pessoal

Renda pessoal – impostos pessoais= Renda pessoal disponível.

é A, e a área abaixo da curva de Lorenz é B, então o coeficiente de Gini é igual a A/(A+B). Esta razão se expressa como percentagem ou como equivalente numérico dessa percentagem, que é sempre um número entre 0 e 1, onde 0 indica que todas as riquezas são apropriadas de forma igual pela sociedade e 1 que toda a riqueza é concentrada em uma única pessoa.O coeficiente de Gini pode ser calculado com a Fórmula de Brown, que é mais prática:

onde:

G = coeficiente de Gini X = proporção acumulada da variável "população" Y = proporção acumulada da variável "renda"

4 Ver (2005) IPEA dados.

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2.1.3. PRODUTO REAL E NOMINAL

O Produto Nominal mede o valor do produto em um dado período, aos preços do período ou, como se diz às vezes, em moeda corrente. Assim, o Produto nominal do ano de 2010 mede o valor dos bens produzidos em 2010, a preços de mercado do ano de 2010. O Valor do produto, contudo, muda de ano para ano, por duas razões. A primeira é que a quantidade de bens produzidos varia. A segunda é que os preços de mercado também variam. Imaginemos uma economia que produzisse exatamente os mesmos produtos em termos de quantidade e qualidade durante dois anos, mas os respectivos preços aumentem ao final do segundo ano fossem 100% mais caro do que os observados no primeiro ano. O Produto nominal do segundo ano seria maior (o dobro em termos nominais), muito embora o produto físico real da economia não tivesse se alterado.

O produto Real é uma medida que tenta considerar variações do produto físico da economia, entre diferentes períodos. O Produto Real é medido, na contabilidade nacional, aos preços de um ano de referência. Isso significa que ao calcularmos o Produto Real, o produto físico de hoje é multiplicado pelos preços que prevaleceram naquele ano (de referência), a fim de se obter a medida do que valeria a produção de hoje, se vendida aos preços do ano de referência.

Podemos exemplificar supondo uma economia que produzisse apenas bananas e laranjas. A produção e os preços hipotéticos de bananas e laranjas em dois anos são mostrados na tabela abaixo.

O Produto Nominal no ano de referência era de 11,25 um e o Produto Nominal atual, 21,00um, representando um aumento de 87%. Contudo, grande parte do aumento do Produto Nominal é puramente resultado do aumento de preços entre os dois anos e não reflete aumento da produção física. Ao calcularmos o Produto Real atual, pela avaliação da produção do mesmo ano, a preços do ano de referência, encontraremos 13,80 um para o Produto Real, representando um aumento de 23% ao invés de 87%. O acréscimo de 23% espelha uma medida melhor do aumento do produto físico da economia do que o acréscimo de 87%, por conta de aspectos monetários.

Vemos pela tabela que a produção de bananas elevou-se em 33%, enquanto a de laranjas 20%, do ano de referência ao dias de hoje. Nessas condições, deveremos assim situar a nossa medida do aumento de Produto Real entre 20 e 33%. O aumento do Produto Real depende dos preços de mercado observados em algum ano passado, os quais foram utilizados para esse cálculo.

UMA ILUSTRAÇÃO DO PRODUTO REAL E NOMINAL

Produto nominal do ano de referência

Produto nominal atual Produto real atual

produção Preço unit. Valor total produção Preço unit. Valor total produção Preço unit. Valor total

15 bananas 0,15c $ 2,25 20 bananas 0,30c $ 6,00 20 bananas 0,15c $ 3,00

50 laranjas 0,18c $9,00 60 laranjas 0,25c $15,00 60 laranjas 0,18c $10,80

Produto total $11,25 Produto total $21,00 Produto total $13,80

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2.2. ÍNDICES DE PREÇOS

O cálculo do Produto Real nos fornece uma medida útil da inflação, conhecida como deflator do Produto que é a razão entre o Produto nominal e o real. Ele serve como medida da inflação a partir do período em que os preços do ano referenciado foram utilizados para o cálculo do Produto Real

Voltando ao exemplo da Tabela 1, chegamos a uma medida da inflação, entre os anos hipoteticamente considerados, pela comparação do valor do Produto com os preços atuais e o valor do produto com os preços do ano de referencia. A relação entre o Produto Nominal e o Real atual é de 1,52 (21 / 13,80). Em outras palavras o produto é 52% mais elevado hoje do que quando avaliado aos preços mais baixos do ano de referência. Atribuímos, portanto, o aumento de 52 % à variação de preços ou inflação, no período considerado..

Uma vez que o deflator se baseia em um cálculo que inclui todos os bens produzidos pela economia, ele é um índice de preços abrangente utilizado para medir inflação. No Brasil ele é denominado Índice Geral de Preços (IGP).

As instituições que trabalham com as estatísticas calculam além do IGP, outros índices ou “deflatores” para produtos restritos a cestas de bens pré-definidas. Abaixo listamos alguns deles calculados para os produtos brasileiros.

Índice de Preços por Atacado (IPA) Disponibilidade Interna. Índice Nacional de Custo da Construção (INCC). Índice de Preços ao Consumidor (IPC). Índice de Preços ao Consumidor (IPC – FIPE). Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

Os índices de preços ao consumidor, por exemplo, se baseiam em cestas de bens adquiridos somente pelo consumidor

urbano. Os preços coletados dos produtos contidos nesta cesta são ponderados por quantidades previamente fixadas. Essas quantidades somente são alteradas quando ocorrem mudanças bruscas e, ou, de caráter estrutural no padrão de consumo desse estrato da população. Assim, esses índices restritos medem o custo de dada cesta de bens que é a mesma de ano para ano.

A cesta de bens incluída no índice Geral de Preços (IGP), contudo, difere de ano para ano, pois depende daquilo que é produzido pela economia a cada ano. Os produtos avaliados no IGP, em dado ano, são os mesmos que a economia produziu naquele ano. Quando a safra de milho for grande, recebe peso correspondente no computo do IGP. Ao contrário, os demais índices de preço medem o custo de um pacote fixo de bens que não varia com o correr do tempo.

Os índices restritos incluem automaticamente os preços dos importados, enquanto o índice Geral de Preços inclui apenas o preço de bens produzidos no país, embora estes incorporem, em certos casos, a variação de preço dos insumos importados.

Para atenuar essas distorções entre os índices os órgãos que cuidam das estatísticas nacionais utilizam uma média entre os índices restritos para expressar o IGP

Um índice de preços relevante é o Índice de Preços por Atacado (IPA). Ele é uma medida do custo de determinada cesta de bens que não são adquiridos no varejo. Ele difere do IPC, pois levam em conta as matérias-primas e produtos semi-acabados Difere também na finalidade, uma vez que se destina a medir os preços num estágio preliminar do sistema de distribuição.

Enquanto o índice de preços ao consumidor mede os preços onde as famílias urbanas efetivamente gastam — quer dizer, no varejo — o IPA se estrutura a partir da primeira transação comercial significativa. Essa diferença é importante porque transforma o IPA num índice flexível de preços, capaz de assimilar variações no nível geral de preços, ou no IPC, algum tempo antes

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delas ocorrem efetivamente.

Por essa razão o IPA e mais particularmente os índices de "construção civil" são usados como um dos indicadores dos ciclos econômicos sendo atentamente observados pelos analistas do mundo dos negócios.

A mecânica dos índices de preços pode ser ilustrada pela fórmula do índice de preços demonstrada abaixo. Esse índice é denominado de Laspeyres. Vemos que no denominador do primeiro termo as quantidades Q e os preços P estão cotados no ano t-1 de referência e o numerador fixa a quantidade naquele ano considerando os preços atuais (t).

Observe que ele é diferente do aplicado no exemplo anterior onde utilizamos os mesmos preços do período de referência na produção atual. O índice de Laspeyres considera as quantidades fixas entre os períodos a preços nominais (de hoje). No exemplo anterior os preços não variavam, mas sim as quantidades. Existem outras medidas para se calcular índices de preços e quantidades e tantos outros podem ser criados, a depender do objetivo que se persegue e da criatividade do analista

econômico.

Índice de preços = ( Pit Q

it-1 / Pi

t-1 Qit-1) X 100

2.3. O EXCEDENTE ECONÔMICO

Os produtos constituídos nas sociedades modernas podem ser representados por quatro grandes categorias de uso:

1. Serviços, 2. Bens de consumo final, 3. Bens intermediários, e; 4. Bens de capital

Nas sociedades mais desenvolvidas, os indivíduos já possuem quase toda ordem de bens essenciais para tocarem suas vidas e de suas famílias com conforto e dignidade. Podem por isso destinar, com certa folga, fatores de produção para a fabricação de bens de capital, bens intermediários, desenvolvimento tecnológico e ao próprio aprimoramento dos fatores de produção. Em outras palavras, os bens e serviços produzidos não destinados a população correspondem ao que denominamos excedente econômico que são destinados a:

a) um consumo intermediário ¬ das empresas ¬ e

b) um consumo não diretamente ligado a reprodução social ¬ bens de capital.

Sociedades menos desenvolvidas carecem dos bens essenciais a população e demandam por isso maiores esforços produtivos para produzi-los. Sobram, portanto, uma quantidade menor de fatores para serem empregados em melhorias produtivas, desenvolvimento tecnológico e fortalecimento do setor produtor de bens de capital. Assim, o modo como se constitui o excedente econômico, sua dimensão e sua distribuição entre as classes e estamentos de classe sociais contribuem para aprumar os graus de desenvolvimento econômico dos países ¬nivel de bem-estar da sociedade.

Vamos estilizar esse fenômeno de outra maneira. A utilização de tecnologias que vão sendo aprimoradas ao longo do tempo estabelece uma tendência secular nas sociedades que é a de utilizarem cada vez mais mão-de-obra no manejo das novas tecnologias em detrimento da mão-de-obra não qualificada5. Essa tendência vem favorecendo a área de serviços reduzindo o tempo e

5 Vale contextualizar que a mão de obra especializada não corresponde

à mão de obra qualificada, uma vez que o avanço técnico, no limite, pode restringir a capacidade do trabalhador a atividades mais simples, não estimulando desempenhos mais qualificados.

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o número de trabalhadores nas áreas industriais e agrícolas. De fato, o avanço do progresso técnico tem criado novas funções que são exercidas pelos engenheiros, contadores, médicos, professores, estudantes, economistas, gerentes, diretores, controladores, administradores, funcionários públicos e toda sorte de atividades distantes do trabalho associado diretamente à esfera produtiva. Essas atividades enxergam por “cima da produção material” o desenvolvimento do sistema capitalista.

O sustento da parcela da população não diretamente vinculada à produção material é possível mediante a existência de uma produção objetiva superior ao custo do trabalho despendido. Dito em outras palavras, somente quando a sociedade chega ao estágio de criar produtos além das suas necessidades imediatas é que alguns membros poderão ser liberados para outras atividades não diretamente ligadas a produção de bens materiais essenciais à reprodução social.

Para facilitar o entendimento da categoria excedente econômico, vamos imaginar uma economia bem rudimentar, primitiva, sem a figura de um chefe e seus sequazes e sem relações com outras comunidades. A produção desta economia se resume a bens que são imediatamente consumidos por todos igualmente. Com o passar do tempo, essa sociedade vai descobrindo formas mais eficientes de obter os bens necessários a sua sobrevivência cujo limite significa uma produção superior a sua necessidade imediata. Essa diferença é o produto excedente que com o avanço tecnológico vai sendo cada vez maior.

A formação do excedente econômico, inicialmente agrícola, permitiu que alguns camponeses fossem liberados da atividade campesina ¬ de proverem sua subsistência direta do solo ¬ para produzirem artefatos e ferramentas destinados a aumentar a produtividade das culturas agrícolas. A mão-de-obra liberada foi se organizando e trocando os artefatos cada vez mais aprimorados

pelos alimentos de subsistência que necessitavam6. Historicamente, assim, nasceram as cidades.

O deslocamento dessa população do campo para determinadas áreas geográficas constitui o que hoje chamamos de centros urbanos industriais. São aglomerações de seres humanos que desenvolvem diversas atividades: culturais, mercantis, industriais, financeiras e toda sorte de atividades não relacionadas com a exploração direta do solo.

Desde as aglomerações mais primitivas, o elemento geral propiciador dos bem materiais e serviços demandados pela sociedade é o trabalho humano. Uma definição de excedente econômico bem simples e precisa é considerá-lo como tudo aquilo que se produz além do que o ser humano necessita para se reproduzir socialmente. Essa afirmativa é valida para qualquer sistema de produção observado ao longo da história humana. O excedente econômico, uma vez constituído, é objeto de disputas entre as classes e grupos sociais em todos os modos de produção historicamente observados. Nos sistemas de produção que antecederam o capitalismo (escravidão, feudalismo, servidão e qualquer modo de produção pré-capitalista) os exercícios

6 Do ponto de vista histórico, nos primórdios da civilização, a

evolução e descobrimento de novos instrumentos concernentes à sobrevivência da humanidade exigiram algum tempo de seus membros, ou de alguns deles, que trocaram o tempo dedicado à busca de alimentos na forma tradicional pelo tempo de construção das novas ferramentas. A passagem da vara de pescar para o tarrafo (rede de pesca) e o surgimento do arado puxado por animais, e mais tarde o mecanizado, em substituição ao arado manual nas atividades agrícolas, por exemplo, requereu alguma perda/troca de consumo presente em favor de melhor consumo no futuro. Observe que as quantidades de bens e serviços que estarão disponíveis no período seguinte serão maiores, pois serão construídas com novas ferramentas que aumentam a produtividade do trabalho. Com as novas técnicas, no mesmo espaço de tempo, os membros da coletividade produzem mais alimentos em relação ao período anterior.

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utilizados por determinados grupos ou classes sociais para se apropriarem do excedente econômico geralmente se estabeleciam por meio da pilhagem e coerção explicita freqüentemente com o emprego da força.

No sistema de produção atual esta apropriação é mais sutil. O trabalhador fornece um valor adicionado ao processo de produção superior àquela parcela correspondente a sua atividade cuja valoração significa um equivalente monetário denominado salário. Em outras palavras o trabalho excedente é a diferença entre o valor criado pelo trabalho e o que é pago na forma de salário. Essa é a fonte do excedente econômico que no capitalismo toma a forma de lucro.

Para que esse excedente econômico no sistema atual corresponda à parcela da produção social uma vez retirado os salários pagos é preciso que duas condições sejam satisfeitas. A primeira é que o trabalhador produtivo seja assalariado e segundo que ele produza não apenas valor econômico, mais valor excedente.

Esse aspecto é importantíssimo para entender a lógica de geração do excedente econômico no capitalismo. De fato, a reprodução da relação capitalista por meio do assalariamento e geração de um valor excedente é sancionada contratualmente mediante a aceitação do trabalhador dessa situação permitindo a apropriação do excedente por parte daqueles que não estão diretamente ligados a esfera da produção.

Ampliando esse conceito, o empresário autônomo (uma doceira, por exemplo) preenche uma das condições do modo de produção capitalista que é a de produzir mercadorias ¬ela está envolvida na esfera produtiva. Contudo, ela é uma produtora independente e, portanto, não reproduz as relações sociais especificamente capitalistas que permitem a apropriação do produto excedente.

Por outro lado, atividades assalariadas relacionadas a esfera da circulação da mercadorias, como aquelas ligadas ao comércio, as finanças e aos serviços pessoais e contratadas diretamente pelo consumidor final não são consideradas produtivas no sentido colocado anteriormente, pois apesar de trabalho excedente, não há geração de valor excedente. Por um conceito de exclusão, as demais atividades que não se inserem diretamente na esfera da produção são denominadas improdutivas. Elas não geram um valor material excedente apropriado por outrem.

A palavra improdutiva posta neste conceito, não tem nada de pejorativo. A rigor, a dinâmica do desenvolvimento do sistema capitalista vai propiciando ao longo do tempo mais trabalho improdutivo e menos trabalho produtivo. O progresso técnico cada vez requer menos trabalhado produtivo para suprir as crescentes necessidades da sociedade e mais trabalho improdutivo fundeado no excedente econômico.

A contabilidade empresarial percebe com clareza essa distinção de trabalho produtivo e improdutivo, ao designar o trabalho produtivo como custo da mão-de-obra ou custo direto e as atividades consubstanciadas no trabalho improdutivo ¬gerentes, diretores, pessoal de marketing, advogados, contadores e toda sorte de atividade não ligada diretamente a esfera da produção¬ como despesas indiretas ou administrativas.

O excedente econômico é, assim, o que sobra uma vez garantida histórica e geograficamente à reprodução social. Ele é o produto poupado, não consumido. Essa parcela pode ser dedicada a educação, em melhorias na saúde, no desenvolvimento tecnológico de novos produtos ou processos, segurança contra inimigos externos e internos e tantas outras coisas demandadas de modo particular ou social. O investimento privado mensurado pelas estatísticas oficiais compreende somente àquela parte do excedente econômico destinada exclusivamente a ampliação da

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capacidade produtiva dos bens e serviços demandados pela sociedade de modo mais imediato. Uma proxi para esse investimento é, portanto, a categoria denominada Formação Bruta de Capital Fixo.

Atualmente o excedente econômico mundial é absurdamente grande. Ele foi alcançado pelos sucessivos avanços tecnológicos ao longo da história, particularmente os do último século. Assim, a sociedade foi liberando sua mão-de-obra da produção de mercadorias destinadas a reprodução de suas famílias orientando-a para todo um complexo de atividades cujos desenvolvidos autenticam justamente a maior liberação da mão-de-obra envolvida na esfera da produção. O trabalho improdutivo, assim constituído fora da esfera produtiva, deve ser mensurado como uma parte do excedente gerado pelo trabalho produtivo.

Fica claro o aspecto conflituoso da disputa por todos pelo excedente econômico. Por decorrência lógica, das formas contratuais estabelecidas para produzir o excedente econômico subordinam-se os modos pelos quais se distribui esse mesmo excedente entre as classes sociais.

2.3.1. O VALOR DO EXCEDENTE ECONÔMICO

A teoria macroeconômica convencional trata a questão do excedente econômico de modo diferente. Ela desconsidera a existência da luta entre os donos dos fatores de produção ¬ força de trabalho; capital e recursos naturais ¬ que são os trabalhadores, latifundiários/rentistas e empresários, pela posse de parcelas do excedente econômico. A distribuição de renda resulta, assim, da luta estabelecida no seio da produção. Para a teoria convencional, no entanto, a esfera da produção representa uma função técnica cuja magnificência é produzir tecnicamente os produtos e serviços demandados sem considerar os destinos que histórica e socialmente lhes são outorgados pelos poderes de barganha envolvidos na disputa por parcela do produto social.

De qualquer modo, para a teoria convencional o excedente econômico é reduzido teoricamente à parcela do produto não consumida: é, portanto, a produção poupada que se sobrepõe as reais condições de posse e determinação da geração do excedente econômico. Promove-se, assim uma máxima econômica: a sociedade se abstém de parcela do consumo presente ¬poupança¬ na expectativa de trocá-lo por um consumo maior no futuro.

Abster-se do consumo presente, propiciando a formação de um excedente econômico, só faz sentido se realmente formos trocá-lo por um consumo futuro mais vantajoso. Por outro lado, requer-se que alguém queira trazer para hoje seu consumo que só seria efetivado no futuro. À medida dessa troca entre excedentes econômicos no tempo chamamos de juros e constitui um prêmio aos parcimoniosos e uma penalidade aos consumidores ansiosos. A taxa de juros mede assim o valor do excedente econômico amanhã em relação ao existente hoje. Acontece que não conhecemos o amanhã e trocamos, portanto, uma coisa conhecida por outra formada por expectativas.

De fato, ninguém se abstém do consumo presente em troca de nada. Trocar o poder de compra não exercido hoje, ou seja, poupado, por maior consumo no futuro faz parte da essência do desenvolvimento econômico e isso requer que os bens a disposição da sociedade no futuro represente um valor maior do que aquele poupado ¬ no período precedente. A questão da poupança versus investimento envolve, portanto, aspectos de temporalidade. Em termos macroeconômicos o conjunto de todas as poupanças individuais e compulsórias tem como destino o investimento para disponibilizar maior quantidade de produtos a disposição da sociedade no tempo7.

7 No plano individual uma pessoa faz seu pé de meia ¬poupa¬ para

consumir mais e melhor no futuro. Em muitos casos, ele acredita que sua renda futura diminuirá e, portanto seria mais vantajoso se precaver poupando hoje. Ele joga o seu poder de compra “grandioso” hoje para o futuro com distribuição

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A Igreja Católica nos idos do mercantilismo se posicionou contra a existência dos juros, sob a alegação que o tempo a Deus pertence. Os homens não estariam habilitados a cobrar (taxas de) juros nas relações que envolvessem crédito e débito tendo o tempo como parâmetro. Essa afirmativa, digamos divina, não resistiu à percepção pela sociedade que de fato a taxa de juros representa uma medida da quantidade de produtos adicionais obtida no futuro em relação ao período anterior. Ela tem competência para identificar-se com o que chamamos de retorno do capital ou simplesmente retorno do investimento.

A questão central é que nada sabemos sobre o futuro. Não sabemos qual será o valor do amanhã e, portanto não podemos medi-lo para estimar com precisão a taxa de juros (R). Assim, só podemos estimar ¬ formar expectativas de ¬ quanto valerá o excedente no futuro com base nas condições atuais ( 1/1+R).

A tríade poupança ¬ investimento ¬ excedente econômico é a parcela ulterior da renda cujo tamanho depende do gasto presente (consumo) nos mercados de bens e serviços. Países desenvolvidos geralmente têm excedentes econômicos superiores aos existentes em sociedades menos desenvolvidas cujos comprometimentos do produto para consumo presente das famílias tendem a ser mais elevados.

Essa tríade é essencial para entendermos a dinâmica da economia. Todos desejam obter maiores parcelas do excedente econômico. Quando trabalhamos acima das nossas necessidades imediatas criamos um excedente econômico: poder de compra

adequada no tempo. Na maioria dos países parte dessa poupança é coletiva e compulsória, como no caso brasileiro da aposentadoria do Ministério da Previdência Social. Algumas empresas adotam o sistema de Fundo de Pensão para seus funcionários, geralmente de caráter não compulsório, em adição ao

sistema previdenciário governamental. A ideia por trás dessa tomada de decisão

do individuo é a constituição de uma renda permanente com distribuição igualitária

durante a sua vida.

adicional (poupança) que quando somados formam os fundos de recursos financeiros disponíveis aos investimentos. Geralmente, utilizamos nosso poder de compra adicional hoje fazendo aplicações financeiras. Estamos disponibilizando nosso poder de compra presente para alguém que deseja ou necessita de empréstimos. Quando agimos assim, não estamos fazendo investimento, mas participando indiretamente das lucratividades dos investimentos, pois são por meio delas que os prestamistas (aqueles que assumiram as obrigações de dívida) nos pagam os encargos (taxa de juros) do excedente econômico ¬poupança¬ que ofertamos.

De fato, os investidores competem entre si e é por isso natural que contraiam empréstimos buscando uma eficiência superior para assim obterem parcelas de mercados dos concorrentes. Nesse processo, os investidores contabilizam suas necessidades de créditos em relação ao total de seu passivo e em muitos casos contraem novas dívidas para pagamento das anteriores, sucessivamente. Nesse processo, pelo menos dois resultados são esperados. O primeiro é um aumento dos juros, pois cada investidor não conhece a estratégia de expansão das firmas concorrentes e todos concorrem para obter empréstimos. O segundo é um excesso de oferta produtiva que irá contribui para a queda generalizada da rentabilidade do capital investido. Esse é um dos mecanismos clássicos de crise do sistema capitalista 8.

8Para as entidades que compõem o sistema financeiro interessa

somente a cobrança de seus serviços de intermediação das operações entre devedores e credores. Assim, quanto mais devedores melhor é... para eles. Entretanto, são eles que avaliam os riscos dos empreendimentos produtivos e, portanto, sob o manto da proteção dos depósitos que gerenciam visando a maior rentabilidade de seu trabalho jogam as taxas de juros de captação de recursos para baixo e elevam por conta dos riscos – ou perda de credibilidade dos investidores – a taxa de empréstimo para cima. Quando o circuito poupança-taxa de captação - empréstimo- taxa de aplicação não se realiza recorrem aos bancos centrais. Afinal os poupadores abriram mão de seu consumo presente e os

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Caracteristicamente, uma vez iniciado processo de crise, todos contribuem inicialmente para aprofundá-lo ao buscarem maiores parcelas de um excedente econômico cujo valor esta diminuindo. Os rentistas lutarão por maiores retornos de seus excedentes econômicos (rentabilidade dos papeis financeiros), os empresários competirão com mais vigor em busca de mercados promissores para seus investimentos (realização de lucros) e os trabalhadores lutarão por melhores condições (salários) para assegurar a continuidade da reprodução social.

3. IDENTIDADES BÁSICAS

Para o desenvolvimento de algumas identidades e relações macroeconômicas básicas simplificaremos inicialmente nossa análise omitindo a distinção entre Produto e Renda Nacional. Na maioria das vezes, desprezaremos a depreciação e a diferença entre Produto Bruto e Produto Líquido, bem como a diferença entre investimento bruto e líquido. Desprezaremos também os impostos e as transferências governamentais. Assim, Renda e Produto serão tratados como conceitos idênticos apenas por conveniência de exposição. Mais na frente essas omissões serão desconsideradas e trataremos as relações macroeconômicas incluindo o governo e as relações econômicas com os demais países.

3.1. UMA ECONOMIA SIMPLES

Y = C + I

investidores calcularam mal o rendimento dos seus rendimentos justamente porque com taxas de juros maiores a sociedade decidiu abrir mão de seu consumo presente tendo em vista um melhor consumo no futuro. Quando o Banco Central intervém, o prejuízo dos processos de escolhas entre poupadores e investidores, sob a gêrencia das instituições privadas do sistema financeiro, é socializado.

O Produto (Renda) Y é descrito em termos de bens e serviços constituídos pela despesa em consumo (C) e em investimento (I). Vale dizer, o que é produzido em uma coletividade necessariamente são bens destinados ao consumo popular (bens e serviços finais) ou a composição dos investimentos (bens de capital). Do ponto de vista da contabilidade nacional a equação acima é realmente uma identidade.

O próximo passo é encontrar uma identidade correspondente à identidade acima para examinarmos o destino da Renda. Uma parte será gasta em consumo e parte será poupada. Assim podemos escrever.

Y=S + C

A identidade acima nos diz que da totalidade da renda uma parte é destinada ao consumo de bens e serviços finais e o complemento forma a poupança.

Então: C + I = Y = C + S

I = Y – C = S

Esta última identidade constitui um resultado importante. Mostra primeiramente que, nesta economia simples, a poupança é idêntica à renda menos consumo. O investimento é, portanto, idêntico à poupança após a apuração contábil.

No mundo real, as firmas por vezes produzem bens em quantidades superiores ao desejado pelos consumidores. Essa acumulação de estoque para as contas nacionais faz parte do investimento feito pela empresa no período considerado e, portanto, é computado como tal (como se as firmas tivessem vendido as mercadorias para si mesmas). Pode ocorrer, também, de elas produzirem menos daquilo que os consumidores desejam, em um período considerado. Para a contabilidade nacional não interessa se os empresários calcularam mal a demanda potencial

Renda Consumo

Investimento

Poupança

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pelos seus produtos. Para ela interessa somente contabilizar o que foi produzido e vendido pelos preços cotados.

E importante reconhecer, portanto, que as decisões entre poupar e investir durante o ciclo de apuração da contabilidade nacional não são formadas pelos mesmos elementos que as regem. No entanto, uma situação de equilíbrio macroeconômico é pensada quando as expectativas dos investidores e poupadores ¬ entre o quanto investir e o quanto poupar ¬ se aproximam. É obvio que essas expectativas estão longe de levarem, no mundo real, as popanças a baterem igualmente com as expectativas do quanto os investidores querem para entabular os seus negócios e vice-versa

A totalidade dos investimentos pode expressar parcela de um aumento de estoque involuntário como resultado de erros por parte dos produtores que esperavam vender mais do que na realidade o fizeram. Dito de outra forma, a maior poupança, que pode ser representada pelo excesso de investimento em relação aos gastos de consumo, resulta de os indivíduos decidirem consumir menos (mesma medida dos estoques involuntários) e assim, poupar mais do que o esperado pelas empresas. A situação contrária pode ocorrer levando os consumidores a poupar menos e, portanto, consumirem mais do que o esperado pelos produtores que planejaram seus investimentos subestimando a demanda potencial, no caso: o nível de consumo.

Essas situações são muito comuns. Isso ocorre porque as pessoas têm o livre arbítrio para fazerem o que bem entenderem com a sua renda. Aqui temos outra máxima: o livre arbítrio que os indivíduos possuem em relação ao seu gasto.

Essa máxima ficou conhecida como o principio da demanda efetiva. O exercício da vontade pelos indivíduos em relação a sua renda é a causa primária da demanda por bens, serviços e investimentos na economia. O consumidor ao decidir o que gastar em consumo estará, por conseguinte, também definindo o que será poupado, em relação a sua renda total. Por enquanto,

vamos apreender uma intuição bem razoável que é maiores (menores) níveis de renda possibilitam maiores (menores) poupanças, pois quanto maior a renda, menor será o gasto relativo com o consumo, apesar de em termos absolutos eles estarem crescendo. Assim, o nível de renda da economia representa o domínio e as decisões com respeito ao quanto consumir e investir o contradomínio.

Considerando os elementos que põem em movimento o mundo econômico, os empresários ao perceberem que investiram mais do que os consumidores desejavam consumir se sentirão forçados a reduzir preços ou seus investimentos no sentido de diminuírem seus estoques. A situação contrária também pode acontecer, isto é, no curso da produção ¬ vendas, o consumo pode se posicionar além do que as empresas investiram. Como a demanda é superior a quantidade de produtos disponíveis os preços serão majorados e, ou, as empresas investirão rapidamente para prover a quantidade de bens e serviços desejados. Esses movimentos de aproximação e afastamento entre poupança e investimento acontecem porque os consumidores e os investidores criam expectativas com respeito ao mundo econômico e eles têm o livre arbítrio com respeito ao seu nível de consumo, a formação de suas poupanças e o quanto e quando desejam investir.

Os economistas nos seus esforços investigativos acerca o mundo econômico, pensam a economia como, primeiramente estando em equilíbrio: poupança igual a investimento, para depois então estimarem o quanto ela se distancia deste ponto, ou seja, estimam as divergências entre as expectativas dos diversos atores econômicos frente ao mundo econômico presente. Os resultados alcançados são então apropriados pelos formuladores da política econômica que procuram então influenciar o livre-arbítrio que os indivíduos possuem em suas escolhas econômicas individuais e usam para isso instrumentos de política fiscal e monetária, ajustando os gastos das parcelas das rendas recebidas pelos detentores dos fatores de produção.

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Através de ações fiscais (tributação e gastos do governo) e monetárias (quantidade de moeda), a política econômica procura influenciar as expectativas, com vistas a calibrar os níveis de poupança e investimento para conduzir a economia a um nível de renda ou produto que os aproxime.

A renda pode também pode ser escrita em termos distributivos como Y =

Salários + Lucros. Toda a sociedade é envolvida no processo produtivo, mas

somente uma parcela participa diretamente produzindo mercadorias: a mão-

de-obra direta. Os demais participam indiretamente e, portanto tem seus

pagamentos baseados na geração do lucro (excedente econômico) –

engenheiros, professores, contadores, médicos, diretores, presidentes de

empresa e outros. As atividades desenvolvidas por eles denominam-se de

trabalho indireto. Eles põem em marcha atividades essenciais ao processo

produtivo, mas ao mesmo tempo, distante dele, fazendo o progresso técnico

avançar aumentando a produtividade, reduzindo custos e melhorando a

qualidade de vida. A dinâmica do sistema econômico é justamente essa:

liberar mão-de-obra direta do processo produtivo.

Com o avanço da sociedade moderna, não percebemos com clareza as

atividades diretamente relacionadas ao processo de produção daquelas que não

o são e que, portanto participam dos lucros referenciados na equação acima.

Em outros termos, qual é a real dimensão do excedente econômico é uma

questão em aberto. Atualmente, dizemos que o excedente econômico é o que

sobra uma vez satisfeita às necessidades históricas e socialmente determinada.

Como essas necessidades são infinitas, o excedente econômico passa a ser

uma categoria analítica conceitualmente igual ao investimento, poupança e

lucro para a teoria macroeconômica convencional. Dissolve-se aparentemente,

assim, na sociedade atual a sobreposição do trabalho indireto sobre o trabalho

direto.

Quando os governos aumentam os impostos eles estão se apropriando do

excedente econômico; a princípio para redistribuí-lo de forma mais eficiente e

manter as funções básicas do Estado. Os empresários e os trabalhadores

quando advogam e lutam por aumentar sua renda, seja remarcando preços, no caso dos empresários, ou movimentos grevistas por maiores salários, no caso

dos trabalhadores, estão em verdade tentando se apropriar de maiores parcelas

do excedente econômico. De modo geral, a existência de um excedente

econômico permite que algumas instituições sobrevivam como a Igreja, as

ONGs e o Estado para dar cabo de funções essenciais no mundo moderno.

3.2. INTRODUZINDO O GOVERNO E O MERCADO EXTERNO.

Podemos aproximar essa economia simples ao mundo atual considerando a existência do governo e das relações econômicas com os demais países. De modo singelo podemos, sem perda de conteúdo, decompor o PNB pela ótica do destino da produção. Assim, ele corresponde as categorias listadas a seguir.

PNB = C + I + G + X – M

Os gastos do governo são representados pela letra G ¬ gastos correntes, de investimento, transferências para o setor privado, incluindo o pagamento de juros. A inclusão das transações econômicas com demais países é representada pelas exportações líquidas: exportações (X) menos importações (M) de bens, serviços, incluindo os pagamentos e recebimentos internacionais de rendas devidas a utilização dos fatores de produção e transferências unilaterais caracterizadas por doações, de toda ordem.

Como vimos, a Renda Nacional (Y) é igual ao PNB menos os impostos indiretos (T). Então:

PNB – T = Y;

Y = C+ S;

Gastos do governo

Exportação

Importação

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C= Y - S

Fazendo as devidas substituições na identidade do PNB obtemos:

Y + T = Y — S + I + G + X — M

Arrumando os termos:

S – I = (T – G) + (X – M)

O que essa identidade enuncia é que o desequilíbrio entre poupança e investimento do setor privado (S — I) é acompanhado por desequilíbrios no orçamento público (T — G) e, ou, nas exportações liquidas (X — M).

Em outras palavras, quando o investimento privado é maior do que a poupança nacional a interpretação é que a economia contou com o ingresso de poupança externa complementar. Esse complemento é justamente os ingressos de recursos externos caracterizados na identidade por M que serão superiores as exportações (X) ma medida para realizar os investimentos além daquele que seria possível somente com a poupança nacional.

Resumindo, investimentos superiores a poupança doméstica ou gastos governamentais maiores do que a receita tributária implica em desajustamentos na economia doméstica que propiciam a entrada de poupança externa. Contrariamente, interpretamos a poupança doméstica acima dos investimentos como um saldo positivo líquido com o exterior e, portanto o país é um exportador de poupança (de capital). Raramente o saldo positivo externo significa receita tributária acima dos gastos governamentais, pois tal situação sugere que o governo estaria tendo “Lucros”; dificilmente a sociedade aceitaria pagar impostos acima das necessidades do Estado para o cumprimento de suas funções.

As linhas de gastos do governo são, geralmente, bastante numerosas em função das atividades demandadas pela sociedade. O Estado geralmente cuida do provimento da saúde, arca com o

saneamento, fornece educação pública e segurança aos seus cidadãos, para citar as funções mais usuais, nos países ocidentais. Cabe ao Estado também efetuar transferências ao setor privado e prover infra-estrutura adequada a sociedade elevando seu bem-estar. Quando os gastos se apresentam maiores que a tributação, o financiamento é obtido por meio do lançamento de títulos de dívida pública. Esses títulos são leiloados pelo Banco Central contendo cláusulas contratuais indicativas de valor e data de resgate no futuro.

No caso brasileiro, a política governamental prioriza o estabelecimento do superávit primário do governo que é construído pelas receitas tributarias menos as despesas correntes e investimento do setor público. Ele indica do total arrecadado pela tributação para cumprir as funções tradicionais do estado, o que restou para ser utilizado no resgate e pagamento dos juros dos títulos públicos lançados no passado com vencimento presente ou futuro. Atualmente o superávit primário encontra-se ao redor de 2% do PIB (em 2009).

No Brasil, O conceito de superávit primário inicialmente foi usado para diferenciar o que era gasto corrente do que era mero pagamento de juros da dívida pública. A partir da orientação do FMI, nos anos 90, o superávit primário passou a ser instituído por metas definidas previamente. Assim, os parâmetros da arrecadação tributária passaram a ser calibrados para formarem uma receita maior do que aquela requerida pelo Estado para os gastos imediatos com o provimento de suas funções básicas. Por conta do estabelecimento de metas de superávit primário os tributos arrecadados foram continuamente elevados. Atualmente, a carga tributaria brasileira encontra-se como uma das maiores do mundo em proporção ao PIB. A carga tributária brasileira, em 2009 foi cerca de 40 %, superior à dos Estados Unidos (25,77%) e do Japão (26,28%), por exemplo. É inferior, no entanto, à carga tributária de países como a Suécia (51,35%), Dinamarca (49,85%) Bélgica (46,85%) e França (45,04%), que apresentam economias

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com alto grau de bem-estar social causado justamente por políticas públicas adequadas.

Observe que na identidade acima a elevação da tributação com a redução dos gastos correntes governamentais ou de infraestrutura rebatem no mercado externo atenuando as importações (M). Vale dizer, o alcance do equilíbrio externo neste caso, se dá em detrimento das possibilidades de crescimento da economia doméstica impulsionada pelos gastos governamentais. Pelo lado das exportações, elas são autônomas e dependem dos demais países desejarem nossos produtos e terem dinheiro para comprá-los.

De fato, o maior desempenho exportador pode atenuar os efeitos adversos na economia causados pelo estabelecimento das metas para o superávit primário. No entanto, a receita das exportações depende essencialmente das circunstâncias e condições dos nossos parceiros comerciais externos. Já as importações podem ser controladas por meio de políticas de contração da demanda agregada. Por esse motivo os ajustamentos macroeconômicos exercidos sobre o mercado doméstico visam à redução das importações de modo a reduzir a necessidade de novos empréstimos externos.

3.3. RENDA E O BALANÇO DE PAGAMENTOS

Na seção anterior relacionamos as transações econômicas do país com os parceiros internacionais introduzindo na contabilidade nacional um agente externo (X-M) em adição as contas das famílias, do governo e das empresas. As relações econômicas do país com o resto do mundo foi olhada de forma compacta não fazendo distinção entre as variações de estoques patrimoniais dos residentes decorrentes das relações econômicas internacionais. Essa seção faz essa decomposição por meio do estudo do Balanço de Pagamentos.

O Balanço de Pagamentos registra as transações econômicas entre residentes e não residentes de um país. As transações são efetuadas tanto pelo setor público quanto pelo setor privado e incluem o comércio de bens e serviços e os pagamentos pela utilização de fatores de produção de propriedade dos residentes e não residentes e as transações com ativos financeiros.

A tabela abaixo foi extraída do Banco Central do Brasil e contempla o Balanço de Pagamentos Brasileiro no ano de 2009.

Seu método contábil é o de partidas dobradas onde um registro representa a natureza econômica e outro à contrapartida monetária ou financeira. Sua mensuração é feita, no caso brasileiro, em dólar americano.

Faz-se distinção entre as transações por conta corrente – bens e serviços e pagamentos unilaterais (doações, por exemplo) – e as transações de ativos monetários e financeiros. Dentro desta última, se faz distinção entre as de curto prazo e longo prazo, dependendo se o vencimento do ativo seja inferior ou não a um ano e também se os ativos financeiros são de natureza autônoma ou compensatória.

Desde os anos 50, quando o padrão de acumulação mundial se alterou radicalmente por conta do espetacular desenvolvimento tecnológico originado pela II Guerra Mundial, as relações entre países se tornaram intensas. Esse fenômeno produziu um debate em torno da definição apropriada de um déficit no balanço de pagamento, bem como da apresentação das contas que o integram. Vale observar que o Balanço de Pagamento e um balanço e como tal o ativo é igual ao passivo e, portanto, seu saldo será necessariamente igual à zero.

Transações Correntes (CT) – Conta Capital e Financeira (CKF) = 0

Se a combinação entre o saldo em transações corrente e a

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conta de capital e financeira resultar em déficit (superávit) o pensamento convencional é que as condições econômicas entre o país e o resto do mundo criaram um excesso de demanda (de oferta) de divisas internacionais. No ano de 2009, o saldo em transações correntes foi negativo em cerca de 24 bilhões de dólares, inferior ao ingresso pela conta de movimentos de capital que girou ao redor de 71 bilhões. A diferença é exatamente retratada na variação de haveres externos (H) ¬ resultado do balanço¬ com o resto do mundo.

Assim,

(CT) – (CKF) – H = 0

Os haveres externos representam justamente a variação da reservas internacionais (com o sinal trocado).

(CT) – (CK) = H = Δ RI

Observe que o saldo em conta corrente negativo, embora

possa ser coberto pela conta capital e financeira, contabilmente indica, na mesma medida, a necessidade de financiamento externo que no final das contas representa um endividamento externo naquele montante. O Brasil, que vinha tendo saldos negativos em conta corrente no Balanço de Pagamentos durante os anos 70 e 80 do século XX renegociou a sua dívida externa com os bancos internacionais em julho de 1992, através de acordos que alteraram o perfil da dívida. O elemento essencial desse tipo de acordo foi à renovação da dívida, mediante sua troca por bônus de emissão de títulos internacionais brasileiros, cujos termos envolvem abatimento do encargo da dívida, seja sob a forma de redução de seu principal, seja por alívio da carga de juros.

BALANÇO DE PAGAMENTOS DO BRASIL Nome da conta 2009 Balança comercial (saldo) 25290

Exportação de bens (fob) 152995

Importação de bens (fob) -127705

Serviços e rendas (líquido) -52930

Serviços (líquido) -19245

Serviços (receita) 27728

Serviços (despesa) -46974

Rendas (líquido) -33684

Rendas (receita) 8826

Rendas (despesa) -42510

Transferências unilaterais correntes (líquido) 3338

Transações correntes (saldo) -24302

Conta capital e financeira (líquido) 71301

Conta de capital (líquido) 1129

Conta financeira (líquido) 70172

Investimento direto total (líquido) 36033

Investimento brasileiro direto - IBD (líquido) 10084

IBD - participação no capital (líquido) -4545

IBD - empréstimos intercompanhia (líquido) 14629

Investimento estrangeiro direto - IED (líquido) 25949

IED - participação no capital - inclui reinvestimento - total (líquido) 19906

IED - empréstimo intercompanhia - total (líquido) 6042

Investimento em carteira - total (líquido) 50283

Investimento brasileiro em carteira - IBC (líquido) 4125

IBC - ações de companhias estrangeiras - total (líquido) 2582

IBC - títulos de renda fixa - LP e CP (líquido) 1542

Investimento estrangeiro em carteira - IEC (líquido) 46159

IEC - ações de companhias brasileiras - total (líquido) 37071

IEC - títulos de renda fixa - total (líquido) 9087

Derivativos - total (líquido) 156

Derivativos - ativos (líquido) 322

Derivativos - passivos (líquido) -166

Outros investimentos - total (líquido) -16300

Outros investimentos brasileiros - OIB - total (líquido) -30376

Outros investimentos estrangeiros - OIE total (líquido) 14076

Erros e omissões -347

Resultado do balanço 46651

Fonte; Banco Central do Brasil.

Reservas internacionais

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O governo brasileiro desde aquela época, esta autorizado a realizar operações de compra e venda de títulos da dívida mobiliária externa. Eles são renegociados ou trocados por outros títulos (de emissão interna ou externa), para fins de redução do estoque (ou encargos) da dívida, com alongamento dos seus prazos, ajuste no perfil do endividamento público e incentivo a projetos específicos. No final do ano de 2009 a divida externa brasileira composto por títulos internacionais correspondia a 277 bilhões de dólares, pelos dados do Banco Central.

.3.3.1. ASPECTOS MONETÁRIOS DO BALANÇO DE PAGAMENTOS

Vamos introduzir, agora, alguns aspectos monetários do Balanço de Pagamentos. Existe uma relação íntima entre as variações das reservas cambiais e a base monetária, já que a moeda nacional é de curso forçado. O ingresso de moeda estrangeira destinado aos residentes, sob qualquer modalidade, deve ser convertido em moeda nacional, à taxa de câmbio prevalecente. De igual modo, os não residentes do país são inclinados a não recebem pagamentos em moedas estrangeiras, salvo se o país não adota o curso forçado de sua moeda ou mantenha acordos de aceitação pelo mercado doméstico de determinadas moedas estrangeiras9.

9 Existe um conjunto razoável de países que aceitam moedas

estrangeiras pré-determinadas em suas transações internas. Os países do MERCOSUL, Brasil, Argentina, Uruguai, e Paraguai, por exemplo, assinaram recentemente um acordo de Crédito Recíproco que significa a aceitação nas transações de importação e exportação entre eles da moeda nacional do parceiro comercial. A Argentina, por exemplo, há pouco tempo atrás, adotou um sistema cambial ancorado no dólar.: Internamente era utilizado tanto a moeda nacional

Quando os ingressos de moeda estrangeira são maiores do que as saídas de moeda nacional, temos um saldo positivo de reservas internacionais que recebem sua contraparte em moeda nacional. Quando o contrário ocorre; os importadores pagam mais pelos produtos externos que os exportadores recebem por suas vendas externas, o efeito é de contração da liquidez doméstica.

Isso pode ser mais bem entendido com o auxilio das contas do Balanço do Banco Central, como apresentado a seguir.

Balanço Simplificado do Banco Central

ATIVO PASSIVO

Reservas internacionais ( RI) Dinheiro primário (H)

Crédito Público (CP)

Assim, do balanço simplificado acima se deduz que:

∆RI = ∆H — ∆CP

Esse é um modelo de balanço ideal do Banco Central. A variação das reservas internacionais líquidas ∆RI rebate na diferença entre a variação de dinheiro e o crédito público do Banco Central. (composto pelos títulos da dívida pública).

Uma queda nas reservas internacionais – situação de déficit externo - indica que os residentes contrataram bens e serviços ou compraram ativos do resto do mundo além do que receberam por suas vendas externas. A variação do dinheiro primário ∆H será, portanto negativa, contraindo a liquidez interna. No limite, esta situação faz com que os preços domésticos caiam, os juros subam, os investimentos sejam refreados e o desemprego aumentado. Em resumo: a demanda agregada se contrai.

quanto a moeda norte-americano nas transações internas a uma taxa de conversibilidade fixada.

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Como a importação de um país é função do nível de atividade econômica, ela se contrai ajustando automaticamente o Balanço de Pagamentos.

Uma elevação nas reservas internacionais sugere efeitos justamente contrários: a liquidez doméstica aumenta, os juros caem favorecendo novos investimentos e o desemprego diminui. Neste caso, a economia doméstica ao se apresentar aquecida requererá quantidade adicional de importáveis e como as exportações são autônomas em relação ao nível de renda interna, o Balanço de Pagamentos também se ajusta automaticamente. Assim, podemos imaginar que o Balanço de pagamentos pode ter movimentos alternados entre déficits e superávits ao longo do tempo, o que sugere que no longo prazo ele encontra-se em equilíbrio.

E razoável supor, no entanto, que os governos não sigam os ensinamentos postos pela idéia do ajuste automático do Balanço de Pagamento, pois sua validade depende de que os demais países persigam também esses ensinamentos. Para que de fato, o ajustamento automático se verifique é necessário que todos os países utilizem seus Bancos Centrais como caixas de compensação, abrindo mão de suas políticas ativas como medida compensatória em face de um déficit externo. É pouco provável que os países utilizem suas políticas fiscais e monetárias para apoiar a formação de um sistema internacional cooperativo em detrimento ao seu mercado doméstico.

Na existência de desequilíbrio externo caracterizado por déficit externo, os países procuram atenuar os efeitos monetários deletérios no mercado doméstico adotando, por um lado, políticas favoráveis a contratação de dívidas externas para saldar o pagamento das importações acima da receita obtida com as exportações.

O Banco Central, pelo lado doméstico, se vê pressionado a ampliar seus créditos públicos (CP) no montante requerido pelo endividamento externo. Assim, a redução da liquidez - na ausência

de uma política ativa do Banco Central - por conta da variação negativa no dinheiro primário (H), é esterilizada e os efeitos negativos na economia doméstica que seriam causados pela contração da demanda agregada são postergados.

O aumento do crédito público ∆CP pode ser utilizado para estabilizar o volume de dinheiro primário que sofreria redução por conta de uma variação negativa no saldo comercial externo. Como não houve contração da liquidez, as condições no mercado doméstico não se alteram e o déficit do saldo em conta corrente do Balanço de Pagamentos passa a ser financiado por empréstimos. Essa política é denominada de esterilização dos efeitos monetários do Balanço de Pagamento.

3.3.2. AMPLIANDO O MODELO

Quando ampliamos a relação contábil do balanço do Banco Central para incluí-lo no sistema bancário consolidado temos:

Balanço Consolidado do Sistema Bancário

ATIVO PASSIVO

Reservas internacionais (RI) M2

Crédito Doméstico (CD*)

∆ (X—M) = ∆RI = ∆M2 — ∆CD*

Essa perspectiva financeira monetária compreende a aquisição de ativos externos pelo sistema bancário por meio da expansão monetária e da expansão do crédito. M2 é a denominação para os meios de pagamentos, constituídos pelo papel-moeda em poder do público mais os depósitos a vista de curto e longo prazo nos bancos comerciais. Podemos considerar o crédito doméstico (CD*) como composto pela soma do crédito ao

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setor público (CP) mais o crédito ao setor privado não-bancário (CD).

Assim;

∆CD* = ∆CP + ∆CD

Desde que se supõe que o déficit público seja financiado mediante o recurso do endividamento público com o sistema bancário, temos:

∆CP = ∆G - ∆T

Substituindo os termos encontramos:

∆ (X—M) = ∆RI = ∆M2 — ∆CD — (∆G — ∆T)

Uma queda em RI, mantendo-se M2 constante implica em expansão do crédito doméstico (∆CD) ou alternativamente em um

aumento do déficit público (∆G>∆T)

Essa identidade é utilizada pelo FMI na recomendação de programas de ajustamento do Balanço de Pagamentos em diversos países com déficit persistentes, como forma de reduzir a demanda agregada. Os cálculos de engenharia financeira são amplamente utilizados para sugerir tetos ao crédito público (CP) e ao setor privado não-bancário (CD) em relação a expansão de M2. Em casos mais dramáticos, como resultou ser no caso brasileiro a partir de meados dos anos de 1980, a redução do déficit público para níveis compatíveis com a redução da demanda agregada passou a ser alcançada através da aplicação de metas para o superávit primário.

No caso brasileiro, programas de privatização do estado e “enxugamento” da máquina estatal foram também adotados como forma de reduzir o déficit público, nos anos 90 do século passado. A aplicação dessa política monetária adicionada à elevação dos

juros domésticos contraindo o crédito (∆CD) reduz a demanda agregada e resulta em variação positiva das reservas internacionais, com as quais se pagam (os encargos da) divida externa e se ajusta o Balanço de Pagamentos.

4. FUNÇÃO CONSUMO E DEMANDA AGREGADA

Como vimos anteriormente, a Contabilidade Nacional trata a quantificação da Renda e do Produto e de seus componentes (gastos do governo, tributação, consumo, investimento, poupança, importação e exportação) como variáveis independentes uma das outras. Ela inventaria esses agregados em um determinado período de tempo em termos monetários, ou seja, em moeda corrente. Podemos, depois, depurá-los dos aspectos monetários, expressando seus valores em moeda constante ou em moeda internacional, mas essa quantificação é feita sem relacioná-los funcionalmente. A disciplina macroeconomia faz justamente esse “dever de casa”.

Os níveis da Renda e do Produto são determinados, em maior ou menor medida, pelo comportamento de seus componentes. De fato, uma das principaís relações entre os agregados econômicos foi estabelecida há muito tempo, provavelmente no período Anterior a Cristo (AC): um acréscimo nos investimentos gera um aumento proporcionalmente maior na Renda (Y).

∆Y = k ∆I

k>1

No entanto, quais os elementos que determinam esse acréscimo (dado pelo parâmetro k)?. Por que os investimentos em uma localidade geram aumentos na renda diferentes quando efetuados em outras localidades? Essas e outras questões só foram respondidas nos anos 20 do século XX, com a simultânea formalização das contas nacionais.

Como o que se produz depende da existência de uma

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demanda (procura pelos produtos), os investimentos terão maior ou menor retorno dependendo do nível da demanda agregada. Os níveis de demanda agregada, por seu lado, dependem dos níveis de renda. Vale dizer o gasto em bens e serviços (C) é uma função do nível de renda (Y) e crescem proporcionalmente (∆C/∆Y) em relação a crescimento dela (∆Y). A idéia é que em curto prazo essa proporcionalidade seja constante, pois não se espera que a economia possa constituir, em um espaço de tempo não muito grande, volumes substanciais de excedente econômico no curto prazo de modo a alterar os hábitos de consumo da sociedade.

Níveis de renda extremamente baixos sugerem um consumo além daquele determinado pelas condições da renda, porque existe um consumo autônomo Ca que não se inclui na norma contábil para mensurar a renda: consumo de subsistência, troca direta de mercadorias sem intervenção da moeda, compra e venda informal, etc. Desse modo, a variação marginal no consumo é determinado pelos acréscimos marginais na renda é essa relação tende a ser estável caso não ocorra algum fenômeno extemporâneo capaz de alterar os hábitos de consumo da sociedade. Essa estabilidade constitui um poderoso preditivo ao resultado dessa relação que denominamos de propensão marginal a consumir (PmgC).

C= f (Y)

C= Ca + ∆C/∆Y. ∆Y

Acréscimos na renda geram acréscimos no consumo. Quanto maior a renda, menor será o acréscimo no consumo ocasionado por um acréscimo no nível de renda. Quando a renda é pequena qualquer acréscimo nela, contrariamente, tende a ser tolamente carreado para o consumo. Assim, o campo de variação corresponde a 0 < PmgC > 1.

Vejamos um exemplo microeconômico, como argumento de força. Se aumentarmos a renda do Ronaldinho, jogador de futebol, em algumas dezenas de milhares de reais é muito provável que seu consumo permaneça estável, ou seja, não se altere, uma vez que ele já tem satisfeito muito das necessidades básicas e não básicas. Assim, acréscimos marginais no seu consumo oriundo de acréscimos marginais na sua renda serão bastante pequenos: sua propensão marginal a consumir aproxima-se de zero. O mesmo não ocorre com o indivíduo que recebe um salário mínimo, por exemplo. Acréscimo na renda serão muito provavelmente destinados ao consumo e sua PmgC será próxima ou igual a um. Transporte a idéia desse exemplo para a economia como um todo, fazendo associação com países ricos e pobres.

Substituindo C = Ca + ∆C/∆Y. ∆Y na identidade básica de Renda em economia simples: Y= C + I, um aumento na renda causado por um acréscimo no investimento corresponderá à solução de:

∆Y= Ca + (∆C/∆Y) ∆Y + ∆I

Chamando (∆C/∆Y) = b = PmgC e desenvolvendo, temos:

∆Y= Ca +(1/1—b). ∆I

Observamos que o parâmetro k da equação original é plenamente determinado pela PmgC, ou seja pelo b. Os investimentos serão mais ou menos rentáveis em termos de acréscimos no nível de renda dependendo da magnitude de b. Quanto mais próximo de zero, menor será o multiplicador dos investimentos e quanto mais próximo de um, maior o efeito multiplicador dos investimentos, em termos de acréscimos nos

Propensão marginal a consumir PmgC Multiplicador dos investimentos

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níveis de Renda. Existem várias razões pelas quais as empresas multinacionais abriram filiais em países em desenvolvimento e atualmente governos estaduais, como no caso brasileiro, barganham para que elas se situem em seus estados. Certamente a diferença das PmgC entre países e regiões nacionais é variável que as empresas podem utilizar para as tomada de decisão ou como lemento de poder de barganha.

Um aspecto muito importante diz respeito ao financiamento do investimento. Do ponto de vista macroeconômico, o desenvolvimento acima sugere que o investimento é auto financiado. Os investimentos requerem uma poupança prévia, mas uma vez iniciado o ciclo de investimento, ele se financia a si mesmo, acrescendo-se a poupança colocada a disposição do Sistema Financeiro. De fato, se b é a propensão marginal a consumir, o restante da renda não gasta em consumo destina-se a poupança. Vale dizer, uma vez satisfeitas as necessidades da sociedade, o excesso de renda sobre o consumo transforma-se em poupança a disposição dos investidores. Esse excesso é justamente o complemento denominado propensão marginal a poupar: PmgS = 1—b.

Vamos utilizar um argumento demonstrativo: Suponhamos que a PmgC de uma comunidade seja 30% e a PmgS seja o restante: 70%. Para um pacote de investimentos de 100.000 un, o acréscimo no nível de renda depois de sucessivos ciclos de geração de renda será:

∆Y = (1/1—0,3) X 100.000 un,= 142.857,14 un,

Um acréscimo nos investimentos de 100.000,00 inicialmente será destinado ao consumo e a poupança, numa distribuição de 0,3 e 0,7, respectivamente, da renda aumentada em 100.000 un, Obviamente, a despesa agregada ou consumo foi acrescido de 30.000 un,. Os fatores de produção foram pagos perfazendo 100.000,00 e deste, 30.000 un, foram utilizados como consumo, levando, então, o produtor a aumentar sua produção

para satisfazer essa demanda adicional.

Como a renda foi acrescida de 30.000.00 devemos reparti-la entre consumo e poupança. Pela propensão marginal a poupar e a consumir, caberá ao consumo um adicional de 9.000 un, e o restante 21.000 un, destinados ao estoque de poupança. O ciclo se repete: teremos agora um acréscimo na renda 2.700 un, determinado pela despesa agregada de 9.000 un, e o restante do acréscimo na renda indo para a poupança (6.300 un,) O quadro abaixo procura caracterizar os n ciclos dos investimentos geradores de renda, consumo e poupança. Podemos perceber que o acréscimo na renda, no consumo e na poupança em cada ciclo do investimento forma uma progressão geométrica.

∆Y ∆C ∆S

1 100.000 30.000 70.000

2 30.000 9.000 21.000

4 9.000 2.700 6.300

4 2.700, 810 1890

. . . .

. . . .

n. . . .

1428.000, 100.000

Observe que:

70.000 . s + 70.000 . s2 + 70.000 . s3 + . .+ 70.000. sn-1.

Então: 70.000. 1/(1- s) = 100.000 que é igual ao investimento inicial.

Comprova-se, assim, que os investimentos são auto ¬ financiáveis do ponto de vista macroeconômico, pois o valor inicial dos investimentos retorna ao sistema financeiro, sob a forma de poupança em montante igual.

Podemos desenvolver pensamentos assemelhados ao multiplicador dos investimentos para determinar as funcionalidades

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existentes entre as diversas categorias macroeconômicas na atualidade. A primeira delas é que parte da renda gerada é destinada aos impostos. Assim, a renda que deve ser considerada para os gastos com o consumo é a renda disponível Yd =Y – T:

Onde T representam os tributos do governo.

A PmgC que deverá compor o multiplicador dos investimentos nas sociedades modernas deve ser ligeiramente modificada, pois parcela da renda destinada ao consumo e a poupança é capturada pelo Fisco.

Assim C = (C)∆Yd ∆Yd

Visto essa restrição, vamos continuar considerando as relações existentes nas economias modernas. Em termos de acréscimos no nível renda é indistinto se ele é derivado de um aumento da exportação, do investimento ou dos gastos governamentais em obras públicas (denominados de investimentos improdutivos). Essas categorias quando efetivadas geram ciclos de renda - produto que vão se distribuindo no sistema econômico entre salários ¬ consumo e poupanças ¬ e investimento, na medida determinada pela PmgC da sociedade.

∆Y = (1/1-b) ∆G; ∆Y = (1/1-b) ∆I; ∆Y = (1/1-b) ∆X

Diferentemente ocorre com as transferências governamentais destinadas a obras assistenciais como bolsa família, no caso brasileiro atual, ou auxílio natalidade e pagamento aos aposentados, dentre outras. Estes recursos não caracterizam investimentos no sentido restrito. Eles não têm o mesmo poder multiplicador convencional dos investimentos, pois se destinam a um consumo imediato. Uma vez efetuada a transferência governamental (TR), pressupõe-se que ela seja imediatamente utilizada – extinta. Nestes termos seu efeito multiplicador de renda no sistema econômico é sensivelmente menor (toda a renda

transferida – Tr - aumenta a parcela da renda destinada exclusivamente ao consumo) em relação aos demais.

∆Y=b ∆y + b∆Tr

De maneira semelhante podem ser considerados os cortes nos impostos indiretos. Eles representam uma transferência de renda ao consumidor final, ocasionada pela redução das alíquotas dos impostos indiretos. Seu multiplicador é idêntico o das transferências governamentais – incide diretamente sobre a PmgC.

∆Y=b ∆y + b∆T

Finalmente, vale destacar as categorias econômicas que enfraquecem os multiplicadores convencionais. Eles podem ser considerados como estabilizadores dos multiplicadores, pois atenuam os choques que os gastos exercem no crescimento da renda. Eles são basicamente dois: as importações e os impostos. Em termos de acréscimo na renda, as importações são traumáticas, pois significam uma evasão de renda. Os impostos, por seu lado, reduzem o poder dos multiplicadores porque incidem direta ou indiretamente sobre o consumo e investimento, mas retornam ao sistema econômico doméstico sob as várias modalidades de gastos púbicos.

O efeito da tributação já foi observado anteriormente. Vejamos o efeito que as importações têm em termos de acréscimo na renda. Importações são destinadas ao consumo e, portanto depende do nível de renda, tal como o consumo. Em outros termos, existe uma propensão marginal a importar (m) em função do nível de renda. Quanto mais se expande a atividade econômica, mas insumos e bem de consumo estarão sendo importados. Assim;

m= ∆M/∆Y. ∆Y,

Observe que na identidade ampliada as importações compõem a oferta agregada, mas significam uma diminuição da demanda doméstica:

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Y + M = C + I + G + X

Então:

Y = C + I + G – M + X

∆Y = b ∆Y + I + G – m ∆Y + X

∆Y – b∆ y + m ∆y = I + G + X

Assim, como os aumentos na receita oriunda da atividade exportadora e dos gastos em investimentos privados e governamentais isoladamente ou em conjunto implicam em aumentos na renda nacional, maiores serão as importações já que elas são aumentam proporcionalmente ao aumento da renda em uma proporcionalidade mensurada pela propensão marginal a importar (m). A magnitude da propensão a importar m depende do grau da auto-suficiência do país quando a renda se expande devido aos gastos públicos, investimentos e maiores receitas da atividade exportadora. Assim;

∆Y = [1/(1-b + m)] (∆I + ∆G + ∆X)

5. MOEDA E BANCOS

Vamos introduzir alguns conceitos importantes sobre a unidade de medida que mensura o produto e os agregados que o formam. Atualmente aceitamos a moeda emitida pela Casa da Moeda e por meio de sua quantidade cotamos os preços de todas

as coisas. Isso é bem prático e facilita enormemente a nossa vida. A rigor, para se medir o produto de uma economia pode-se utilizar qualquer bem ou serviço. Um apartamento vale três carros, o bilhete do teatro vale quatro cervejas e por aí vai. Com o avanço das trocas, uma mercadoria vai sendo eleita como denominador de todas as outras: a ela damos à denominação de moeda ou meio de troca. Os preços de todas as mercadorias são, portanto cotados em moedas e sancionados pelas trocas, ou seja: pelo mercado.

A mercadoria-moeda que serve para expressar com mais facilidade o valor das demais abriga alguns atributos necessários para ser utilizada como meio de troca: divisível e recomposta, durabilidade, não perecível, de transporte relativamente fácil, não ter utilidades relevantes intrínsecas e oferta invariável. Olhado sob esse ângulo, a moeda não é instituída por convenção ou por imposição legal. Ela surge naturalmente intermediando a troca direta entre mercadorias (escambo) em todas as transações de compra e venda. Ela, como em um passe de mágica, ganha novos atributos e funções no meio econômico, além de meio de troca e denominador comum: ela assume as funções de reserva de valor: poder de compra.

Assim, a moeda se transforma em dinheiro ($$) e pode também ser representada por bens e serviços ¬ casa, automóvel, títulos financeiros, etc. Contudo, eles são mensurados por meio da moeda que será eleita dentre todas as mercadorias O poder de compra ¬ $$ ¬ expressa o poder social que uns tem sobre os outros. Esse $$ é riqueza que para a ciência econômica somente subsiste quando alguém é dono dela.

Os indivíduos podem escolher entre reservar seu poder de compra (sua riqueza) em moedas ou em outros bens. É dessa possibilidade de escolha – escolher ficar mais líqüido ou menos – que resulta a dinâmica do mundo econômico atualmente. Voltaremos a esse ponto mais na frente.

Os metais preciosos como o ouro e a prata nas sociedades

Oferta agregada Demanda

agregada

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antigas desempenharam muito bem o papel de meio de troca. Os soberanos cunhavam as moedas e lhes outorgavam garantias de aceitação. Com o avanço das civilizações, eles foram sendo separados de sua existência material enquanto moeda (útil para a troca) para se materializarem em dinheiro ¬ $$ ¬ poder de compra.

Do ponto de vista lógico - histórico podemos caracteristicamente contextualizar três tipos de sistema monetário.

a) Padrão-ouro,

b) Moeda- conversível, e;

c) Moeda- inconversível

Antigamente, o sistema monetário era totalmente assentado no padrão-ouro. As moedas eram de ouro e sua quantidade era razoavelmente fixa ao longo do tempo. Naquela época, o dinheiro ou a riqueza estava personificado em outras coisas, como a terra, no período feudal, nos desígnios divinos, como na época dos faraós no Egito e nas características distintivas do ser humano em algumas comunidades primitivas. Moedas de ouro existiam mais como meio de troca e denominador comum e menos como reserva de valor. Mesmo assim, exercia certo fascínio entre os homens, a ponto de Judas trair Cristo por um punhado delas.

Com o avanço das trocas, a moeda passou cada vez mais a ser requisitada não somente como meio de troca, mas como um objeto possuidor de poderes mágicos: como reserva de valor, poder de compra e expressão de riqueza. A moeda passou a ser um símbolo personificando poder. Ter moeda era ter $$. Era a época do capital mercantil.

A moeda como reserva de valor é eminentemente criada pelo imaginário coletivo. A moeda historicamente passa a ser dinheiro ($$) quando não somente é um denominador comum das demais mercadorias e, portanto útil às trocas, mas quando possui a propriedade intrínseca de ter valor e por isso aceitação geral como

medida da riqueza material que os indivíduos possuem. Com o avanço das sociedades ela vai se personificando em poder (valor) através das relações de compra e venda

Quando a moeda tem um valor intrínseco reconhecido socialmente, como os metais preciosos, há uma forte inclinação para que todos procurem representar sua riqueza ou poder de compra também pela moeda. Há relatos na história, todavia, que antigamente muitos soberanos forçavam as suas “casas das moedas” a secretamente substituir partes dos metais preciosos embutidos nas moedas por metais menos nobres e, assim, ficarem mais ricos. Esse evento foi cunhado de “degradação da moeda”, pois reduzia o seu valor intrínseco, aumentando sua quantidade.

Atualmente, a moeda não tem valor intrínseco e muito menos lastro nos metais preciosos. Ela tem seu reconhecimento social, se transmudando em riqueza, a partir dos governos que as emitem. Neste cenário, as pessoas escolhem como querem guardar a sua riqueza: sob a forma mais líquida – moeda – ou sob a forma não tão líquida: em bens e serviços.10.

A perda do valor intrínseco e lastro em metais preciosos da moeda foram acontecimentos lógicos - históricos. Com o avanço do capitalismo, instituiu-se a moeda-papel, que, em verdade, era um título de crédito com o indicativo da quantidade de metais preciosos que seu possuidor tinha direito por tê-lo depositado em alguma instituição bancária. A qualquer momento o detentor do titulo poderia ir ao “banco privado” e resgatar seus metais preciosos. Era a época do sistema monetário conversível.

10

De fato, concepção da moeda tem implicações profundas no imaginário das pessoas. Os brasileiros dizem usualmente, por exemplo, “preciso ganhar dinheiro”. Os norte-americanos usam a expressão: “make money”. Há uma diferença fundamental entre ganhar e fazer dinheiro, apesar de todos almejarem no final terem mais poder de compra ($$). É todos preferem essa forma mais líquida de riqueza –em moeda - desde que ela não perca seu valor em relação às outras mercadorias menos liquidas.

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Em termos históricos, esse sistema monetário não foi duradouro. Muitos bancos privados onde os indivíduos guardavam seus metais preciosos utilizavam os depósitos deles para efetuarem empréstimos por meio da emissão de títulos de créditos muito acima das quantidades de ouro e prata depositados em seus cofres, cobrando, obviamente, um preço (juros) por esse serviço. Eles calculavam o quanto de saques espaçados no tempo o real proprietário do dinheiro efetuaria: o restante ficava a disposição para empréstimo. A história mostra que a existência desse sistema monetário foi bastante curta. Requeria “freios” que segurassem a ganância dos banqueiros. Assim, foram criadas normas que impedissem o lançamento de títulos de crédito em valores muito superiores a quantidade de moeda depositada nas instituições bancárias. Esse sistema de padrão monetário conversível foi substituído por um sistema inconversível cujo curso da moeda foi instituído por força de lei. Esse é o nosso padrão monetário atual. Neste sistema, prevalece a confiança na moeda ou em quem a emite em detrimento do valor intrínseco ou de lastro em metais preciosos.

O sistema monetário atual, com moedas inconversíveis, é garantido pelos Estados Nacionais. Cabe a eles certificarem o papel – moeda emitida pela casa da moeda. A moeda nacional personifica, portanto, o poder do Estado, pois todos os débitos e créditos processados na sociedade atual são feitos por meio de moeda. Alguns Estados evocam até o divino para garantir esse poder à moeda (como caracteriza a expressão in god we trust colocada no verso da notas emitidas pelo governo dos Estados Unidos).

Estilizando a situação, a moeda inconversível emitida pelo Estado precisa ser controlada, pois sua quantidade mensura a riqueza material e todos os bens e serviços finais são por ela precificados, inclusive os fatores de produção, como a mão-de-obra, o capital e a terra. Variações nas ofertas monetárias implicam em variações nos preços dos produtos finais e fatores de produção

gerando efeitos na distribuição das rendas entre as classes sociais e em seus estamentos.

Quando as variações na oferta monetária são percebidas pela sociedade, todos querem defender seu poder de compra e sua riqueza. Por isso, os Estados Nacionais procuram manter os níveis da oferta monetária adequada à demanda social por ela. Uma oferta excessiva em relação à demanda gera efeitos deletérios. A moeda tem seu valor diminuído em relação aos demais bens e serviços que ela precifica. Ela se enfraquece e vai perdendo sua utilidade como reserva de valor: todos irão preferir ter sua riqueza em bens e serviços que se valorizem11. Uma quantidade restrita também não é desejável, pois dificulta as iniciativas voltadas para expandir a economia ¬ preços diminuem e juros se elevam, nesta situação.

11

Em algumas situações, mercadorias se transformam em moeda - meio de troca -independentemente da existência da moeda legal. Suprimimo-nos da moeda legal e logo outra será posta em seu lugar como $$. Veja o exemplo nos presídios, onde alguns bens como chocolate, cigarro, celular e outros bens passam a funcionar como $$ entre os presos. Na última crise da Argentina, os produtores agrários estavam pagando com grãos a compra de fertilizantes, ferramentas e até tratores e automóveis. As moedas eram: soja, trigo, girassol e milho. Todas à prova da política governamental de corralito (bloqueio de depósitos) e desvalorização da moeda legal. Nessa época, outras moedas foram criadas como os patacones improvisados por algumas províncias argentinas.

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No Peru do século XVI e demais países da América do Sul colonizados

pelos espanhóis, os metais preciosos eram utilizados como adornos e não

como moeda. Os espanhóis ficaram maravilhados e os carregaram para a

Europa, pois lá, ouro e prata eram $$. No Brasil, a cana de açúcar foi

especiaria eleita para ser produzida e comercializada na Europa e ela era

trocada por escravos pelos colonizadores em um circuito de compra e

venda fechado denominado “exclusivo comercial” ou “pacto colonial”: a

colônia só poderia comercializar com o país colonizador. No Brasil

colonial a função da moeda como meio de troca e denominador comum era

exercida pelo metal precioso, mas a função reserva de valor ($$) não: o

número de escravos que o senhor de engenho era dono representava o $$.

Somente no século XIII, com a intensificação contra o tráfico negreiro e o

ciclo da mineração é que esta concepção dos escravos como reserva de

valor foi sendo abandonada.

A escravidão foi reinventada na era mercantil, depois de ter existido na

antiguidade e extinta no período feudal. O escravo era considerado riqueza

somente nas colônias. Foi justamente a não adoção do sistema escravo

(escravo como moeda) na metrópole que permitiu engenhosamente as

metrópoles forjarem a dependência de suas colônias.

5.1. UM POUCO DA MOEDA NA MACROECONOMIA

Estabelece-se, assim, nas economias atuais, uma relação íntima entre a quantidade de moeda gerenciada pelos governos, e a produção de bens e serviços: o lado real da economia. Para uma corrente de economistas, a moeda teria a propriedade de expandir o produto, ou ampliando o conceito: de forjar maior ou menor crescimento econômico. Outra corrente de economistas, os monetaristas, sugere que a moeda não tem essa propriedade. Os fatores de produção com os quais se estabelece a produção estão dados e assim o produto no longo prazo não pode ser maior ou

menor. Políticas monetárias podem ser efetivas no curto prazo, mas não no longo prazo.

Uma das primeiras tentativas de se estabelecer o relacionamento entre a moeda e o produto deveu-se a Irving Fischer (1867-1947). Ele formulou uma identidade bastante interessante entre a quantidade de moeda e o produto que ficou conhecida como a teoria quantitativa da moeda:

MV=PT

Onde M é a quantidade de moeda, V = velocidade de transações; P = preço médio de todos os bens transacionados, e T = todas as transações realizadas com moeda.

A velocidade de transações (V) é a quantidade de vezes que a moeda (M) se torna receita ou gasto, ao mesmo tempo. T é maior que o Produto, pois inclui os pagamentos de insumos, mão-de-obra, aquisição de artigos usados, títulos financeiros, ações e etc. PT recebe a denominação pelas contas nacionais de Valor da Produção. Um valor muito superior do que foi efetivamente constituído de bens e serviços finais pelos fatores de produção, em um período. Esses bens e serviços finais formam a categoria Renda ou Produto, como vimos anteriormente.

As abordagens posteriores introduziram modificações substanciais. A primeira delas foi relacionar a quantidade de moeda existente com a geração da renda ou produto. A renda é a multiplicação de um índice de preços pelo produto (as quantidades de produtos finais). Sendo assim:

M V = PY

Há duas modificações essenciais em relação a identidade de Fischer. A primeira é que a quantidade de moeda relaciona-se a Renda Nacional (Y) ou ao Produto (Media ponderada de preços vezes quantidade de bens finais) e não ao Valor da Produção. A segunda é que V significa velocidade da renda e não velocidade das transações. Exprime, portanto, o número de vezes que a

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moeda se torna renda para alguém, durante o período de tempo considerado. Na versão de Fischer o V corresponde ao número de vezes que o dinheiro é gasto.

Nessa nova abordagem o parâmetro V se refere ao número de vezes que a moeda se torna dinheiro ($$) para alguém. Exemplo, Maria tem uma confecção e vende uma camisa para o João. Maria deduz do faturamento os custos e embolsa uma parcela do ganho com a venda da camisa, denominada lucro. Com o lucro ela pode ampliar ou dar continuidade a seu negócio de fazer e vender camisas ou adquirir outros bens em outras lojas cujos proprietários têm o mesmo comportamento. Assim a quantidade de moeda multiplicada pela velocidade renda mensura o poder de compra em detrimento de sua função de meio de troca, como observado na identidade formulada por Fischer.

Nestas versões, a variação na quantidade de moeda é plenamente capturada pela formação dos preços. Supõe-se que a velocidade da renda ou das transações, como na versão de Fischer, depende institucionalmente dos hábitos da sociedade e estes não mudam constantemente. Assim variações na oferta monetária se transmitem diretamente aos preços dos bens e serviços.

A idéia de variações nos preços causadas por variações na oferta monetária introduziu novas idéias com respeito à moeda. Basicamente, os indivíduos podem preferir guardar sua riqueza em outros bens e serviços e não sob a forma líquida da moeda corrente. Essa concepção serviu para incluir a idéia de guardar $$ sob a forma de moeda. Em outras palavras, a oferta de moeda ganhou sua contraparte: a demanda por ela. Essa nova concepção foi formulada por A. Marshall & A. C. Pigou e ficou conhecido como equação de Cambridge, já que seus autores eram professores da universidade de Cambridge, na Inglaterra:

M = K(renda X preços) ou M/Preços= K Renda

Ela é basicamente idêntica a anterior ¬ pois K seria 1/V: o

inverso de V ¬, com a distinção de que o parâmetro K corresponde à proporção da renda nominal que é mantida como moeda pela sociedade em um período de tempo determinado. Colocada nestes termos, K indica quanto em média às pessoas desejam manter moeda para exprimir poder de compra: envolve um processo de escolha entre reter saldos monetários ou estoques de bens e serviços.

O parâmetro K sendo governado por processos de escolhas individuais significa que a moeda segue os mesmos princípios que utilizamos para escolher outros bens e serviços para assegurar poder de compra ($$). Na versão anterior a velocidade renda (V) era um parâmetro mecânico. Tanto em um caso como no outro, V e K não mudariam debaixo condições econômicas estáveis, mas suas interpretações são bem distintivas.

Nos anos de 1950, Nilton Friedman, professor da Universidade de Chicago, ampliou a equação acima para incluir a idéia de que os processos de escolha entre guardar moeda e outros bens dependem das diferenças dos rendimentos que se deixa de receber por preferir um ativo em relação a outro. Ele introduziu o futuro nos processos de escolha entre bens e serviços e o bem mais líquido que é a moeda.

Nesta abordagem monetarista, o parâmetro K da equação anterior não é constante: não supomos que a demanda por automóvel seja fixa, mas sim que ela depende do preço do automóvel e de sua valorização no mercado. Em verdade, ele ampliou um conceito que já estava estabelecido desde o final dos anos de 1920, por outro autor, muito famoso, John Maynard Keynes.

Para Keynes a procura por moeda, ou preferência pela liquidez, está basicamente determinada pelo preço da moeda que será igual aos rendimentos financeiros que se obtêm quando a emprestamos para alguém. Por isso, a variação de K depende da oferta e demanda monetária, ou em outras palavras: do preço da

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moeda sancionado pelo mercado. Esse preço é a taxa de juros.

De fato, os indivíduos procuram moeda por que têm despesas cotidianas que somente com elas são efetivadas. Eles também precisam de moeda para se precaver dos infortúnios que possam ocorrer no futuro e que em alguns casos exigem para solução dinheiro vivo. Eles optam também por terem dinheiro em mãos da forma mais líquida – moeda – para especular. Oportunidades de negócios requerem em muitos casos $$ vivo para serem concretizadas.

O dinheiro para especular é aquele que excede as necessidades do consumo diário. Ele é destinado a formação de poupança cuja magnitude depende da risco com relação as incertezas dos investimentos futuros. Ele se destina muito razoavelmente às aplicações financeiras cujos fundos formados serão colocados a disposição do investidor-empresário. Assim, quanto mais fundos disponíveis para empréstimos, melhores condições de investimentos existiriam, já que o preço da moeda, neste caso, diminui, ampliando a disponibilidade de bens e serviços ofertados a sociedade.

De fato a maior quantidade monetária reduz a taxa de juros, pois a sociedade tem mais moeda para especular (comprar mais ativos financeiros). A renda (Y) ou o coeficiente (K) aumentam desde que a quantidade da moeda não se transmita imediatamente para os preços dos bens e serviços.

Para a escola monetarista de Chicago, capitaneada por Friedman, o parâmetro K não se altera, pois as variações nas ofertas monetárias se transmitem aos preços, mais cedo ou mais tarde. Para essa escola de pensamento as variações nas quantidades de moeda não exercem efeitos reais sobre a produção no futuro.

O enfoque central dessa escola é que variações na oferta monetária não possuem a propriedade de modificar a riqueza da sociedade em longo prazo, pois os preços dos ativos modificados

decorrentes da variação da oferta monetária voltariam a manter as mesmas relações de preço entre eles em futuro não muito distante12. Por isso os monetaristas da escola de Chicago advogam que a política monetária é inócua favorecendo a idéia de que o controle monetário deva ser restrito, uma vez que a expansão da oferta monetária não tem a propriedade de elevar o produto no longo prazo.

Resumindo na versão moderna, a demanda por moeda Md é uma função direta do produto (Y) do nível de preço (P) e uma função inversa da taxa de juros (R).

.

Md= P.L(Y; R)

As variações na oferta monetária Ms enquanto não se transmitem aos preços podem influenciar o nível do produto bem

12

O desejo pela posse das coisas é formado pela observação das condições reais da economia. Podemos desejar tudo o tempo todo, mas razoavelmente sabemos o que poderemos conseguir no futuro. Os desejos são, assim, formados com base no que já possuímos inteirados com as reais condições econômicas observadas. Os desejos são ilimitados, mas eles são satisfeitos de maneira incremental: uma vez satisfeito um desejo criamos outros. Assim, os desejos governam o longo prazo em um processo de negociação com o consumo presente. Desse modo, as variações nos preços não têm o poder de alterar as posições desejadas pelos indivíduos com respeito ao seu nível de consumo e bem-estar futuro. A escola monetarista parece se apoiar nesta argumentação: valores são governados pelo imaginário das pessoas em termos de consumo futuro versus consumo presente e no longo prazo ajustamentos nos preços hoje podem ter influências em curto prazo, mas não alteram a riqueza imaginada em longo prazo, uma vez que os desejos são mais poderosos do que o imediatismo: o curto prazo.

Demanda por moeda

Índice de Preços

Produto e taxa de juros

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como a taxa de juros. Para os monetaristas as variações na oferta monetárias não exercem papel preponderante na riqueza e no emprego dos fatores de produção no longo prazo: a moeda não tem a propriedade de alterar a quantidade existente de riqueza e dos fatores de produção disponíveis a sociedade no curto prazo.

5.2. BANCOS

A terceira função da moeda do ponto de vista lógico histórico como vimos é desempenhar o papel de reserva de valor: poder de compra acumulado. Os limites da atuação dos bancos são fixados justamente pelo fato da moeda representar a riqueza material acumulada de uma sociedade.

Do ponto de vista lógico, o banco somente exerce suas funções quando existe um excedente econômico monetário. A tendência secular do progresso técnico de aumentar cada vez mais o produto, por meio dos ganhos de produtividade, propicia maiores excedentes econômicos cujo ambiente de acumulação e guarda são as instituições do sistema financeiro. O limite de alcance do sistema financeiro está estabelecido justamente, portanto, pela grandeza do excedente econômico depositado em suas instituições13.

Engenhosamente os bancos passam a emprestar parcela dos depósitos que ficam sob sua guarda: Essa parcela é a totalidade dos depósitos menos os encaixes bancários14 ¬ parcelas

13 Os bancos perseguem, vão atrás, do excedente econômico, tal qual,

por analogia, as farmácias se instalam onde existem doenças e $$ para venderem a cura ou o controle delas. Se desejarmos saber se uma região ou localidade é rica, ou seja, se as possibilidades de geração de excedente econômico se verificam de modo eficiente, bastar olhar a quantidade de agências bancarias ali instalada. A correlação será positiva e significativa, com certeza.

14 Encaixe voluntário é a parcela que os bancos estimam dos depósitos

efetuados que estarão a disposição dos correntistas e o encaixe compulsório é a parcela assegurada dos depósitos totais no banco central para fazer frente a erros

que os bancos estimam guardar em seus cofres para fazer frente aos saques dos depositantes. O resultado da diferença entre o total depositado pelos correntistas menos os encaixes bancários e o quanto os bancos tem disponível para emprestar.

O devedor com um título de crédito ao portador, emitido pelo banco, pode trocá-lo por mercadorias e o vendedor ao receber esse titulo – um cheque, por exemplo - pode descontá-lo no banco, ou utilizá-lo para adquirir outros bens e serviços. Assim, adicionavam-se ao estoque dos depósitos bancários originais, mais poder de compra representada agora pelos títulos de crédito dos bancos. Criou-se dinheiro –poder de compra - em um valor muito superior àquele representado pela quantidade de moeda existente.

Como que em um passe de mágica, o poder de compra da sociedade aumenta através das intermediações de crédito e débito do sistema bancário. A totalidade dessas intermediações condicionada a taxas de encaixes bancários corresponde ao que denominamos de Meios de Pagamento (M1).

M1=PMPP + Dvbc

Um exemplo ilustrativo da expansão dos meios de pagamentos é feito a seguir:

Sendo o depósito a vista inicial = H e os encaixes bancários igual a r (parcela do depósito que os bancos estimam que não seja retirada imediatamente s) sucede que:

ΔM1 = H

de cálculos dos depósitos voluntários pelos bancos comerciais.

PAPEL-MOEDA

EM PODER DO

PÚBLICO

DEPÓSITO A

VISTA NOS

BANCOS

COMERCIAIS

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ΔM2= H (1-r) parcela que o banco emprestará e que se converterá em novo depósito a vista

ΔM3= H (1- r) (1- r) = H (1- r)2 idem . . . . . . . . . ΔMn= H (1- r)n-1

idem, corresponde a n-1 conversões de depósitos a vista.

* * * * * * * * Σ ΔM= H/r Soma dos depósitos

bancários ocasionados pelo depósito original ΔH = acréscimo total no M1.

Algumas operações efetuadas pelo sistema financeiro criam ou destroem meios de pagamento. Há uma criação de meios de pagamento quando o público recebe haveres monetários ¬ papel moeda e, ou, depósitos à vista ¬ de o setor bancário dando em contrapartida haveres não monetários, o que aumenta, por conseguinte, o saldo dos meios de pagamento disponível a população. Há uma destruição dos meios de pagamento, quando o processo se dá no sentido inverso: a população entrega haveres monetários aos bancos recebendo em troca haveres não monetários. A simples abertura de uma conta corrente não cria ou destrói meios de pagamento, mas os empréstimos propiciados por essa abertura de conta sim.

Grande parte da destruição e criação dos meios de pagamento origina-se nos bancos centrais por meio de suas operações ativas. Os empréstimos a governos e autarquias de modo indireto, o redesconto concedido a bancos comerciais, o as reservas cambiais e a compra e venda de títulos da Divida Pública em poder do publico são operações que criam ou destroem meios de pagamento. A elevação nos saldos das operações ativas dos bancos centrais inicia o processo de criação dos meios de

pagamento. Em seguida o sistema financeiro responde pela multiplicação no sistema econômico daqueles haveres monetários iniciais.

Os bancos centrais também procuram controlar os meios de pagamento estabelecendo regras constitutivas de um fundo de reserva formado por uma parcela dos depósitos a vista nos bancos comerciais denominado de “encaixe compulsório”. Quando o governo aumenta (diminui) o percentual do encaixe compulsório em relação aos depósitos à vista é certo afirmar que houve destruição (criação) dos meios de pagamentos. O fundo de reserva também pode ser utilizado para auxiliar as instituições integrantes do sistema financeiro no caso de alguma(s) delas ter problemas de financiar suas posições de caixa15.

Assim, os bancos privados operam duas caixas em relação ao montante dos depósitos a vista. Um fica no banco central (encaixe compulsório) e o outro no banco privado (encaixe voluntário). O segundo disponibiliza dinheiro para os correntistas fazerem seus saques e compensarem seus cheques e o primeiro é um instrumento de política monetária.

O banco central estabelece uma Taxa de Redesconto Bancário (TRB) que é aplicada quando os bancos privados solicitam reforço de caixa para continuar tocando suas operações de crédito e débito. É claro que o banco desprovido de reserva pode solicitar empréstimos a outros bancos privados que tenham excessos de reservas, mas as taxas de juros girarão ao redor da TRB.

Os governos estimam a totalidade dos meios de pagamentos (M1) disponível para conservá-lo em linha com o lado

15 No caso brasileiro no final do século passado foi criado o Proer

(Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional) justamente com essa finalidade. Os seus recursos eram totalmente oriundos dos encaixes compulsórios.

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real da economia. O conceito de M1 corresponde a quantidade em valor monetário dos ativos ($$) mais líquidos disponíveis na economia.

Existem conceitos de meios de pagamentos que envolvem ativos menos líquidos. No caso brasileiro, o conceito de meios de pagamento (M2), por exemplo, corresponde à adição ao M1 do estoque de depósitos de poupança e títulos privados. O conceito de meios de pagamento M3 equivale ao M2 mais as quotas de fundos de renda fixa e os títulos públicos federais, que dão lastro à posição líquida de financiamentos em operações compromissadas entre o público e o setor financeiro. Já o conceito de M4 compreende o M3 mais os títulos públicos de detentores não financeiros.

O exercício desse controle é feito por meio de um conjunto de mecanismos e instrumentos de políticas monetárias que, como vimos, criam e destroem meios de pagamento.

5.2.1. UM POUCO DE POLÍTICA MONETÁRIA BRASILEIRA

De modo geral admite-se que o principal papel a ser desempenhado pelos bancos centrais é o de controlar a liquidez na economia. O objetivo é evitar que excesso de recursos financeiros ¬ crédito e moeda ¬ acessíveis a todos possa propiciar uma demanda por bens e serviços superior a capacidade de oferta produtiva das empresas. Esse desequilíbrio poderia por em vigor pressões inflacionárias. Alternativamente os bancos centrais podem no caso de certa escassez de moeda e crédito agir no sentido de ampliar os meios de pagamento disponível a sociedade como forma de estimular a oferta produtiva.

Os instrumentos clássicos para os bancos centrais orquestrarem a liquidez da economia são três: a) os depósitos compulsórios dos bancos no banco central b) taxas de redesconto que são os juros cobrados pelo banco central aos demais bancos e

c) operações de open market que consiste na compra e venda de títulos públicos empreendida pelo banco central.

Qualquer variação desses instrumentos implica em alterações no volume de crédito modificando, portanto o volume dos meios de pagamentos e da taxa de juros.

No Brasil, a calibragem dos meios de pagamentos pelos instrumentos tradicionais para precificar o dinheiro, ou dito de outra forma: fixar a taxa de juros da economia tem alcance menor por conta da SELIC que não é uma taxa de juros (como muitos pensam), mas uma sigla que significa Sistema Especial de Liquidação e Custódia.

Os títulos de dívida pública em mão das instituições financeiras ficam depositados virtualmente no ambiente desse sistema e são negociados entre elas gerando fluxos de transferências no montante determinado pelas necessidades de dinheiro das instituições. È uma troca de títulos por dinheiro e vice versa.

“Tratando-se de um sistema de liquidação em tempo real, a liquidação de operações é sempre condicionada à disponibilidade do título negociado na conta de custódia do vendedor e à disponibilidade de recursos por parte do comprador. Se a conta de custódia do vendedor não apresentar saldo suficiente de títulos, a operação é mantida em pendência pelo prazo máximo de 60 minutos ou até 18h30min, o que ocorrer primeiro ¬ não se enquadram nessa restrição as operações de venda de títulos adquiridos em leilão primário realizado no dia.” (extraído de http://www.bcb.gov.br)

As instituições com excesso de caixa no banco central o transferem para os bancos tomadores de empréstimos e estes transferem títulos públicos que possuem, em valor equivalente e que estão depositados no sistema SELIC, para os emprestadores. Eles pagam uma taxa de juros aos financiadores tomando por base a taxa SELIC ¬ geralmente um valor um pouco abaixo desta.

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A figura acima extraída do site do Banco Central mencionado ilustra uma operação entre instituições que procuram zerar ao final do dia suas posições. O Banco Central fixa, ao final do dia, a remuneração dos títulos públicos com base nos juros praticados no financiamento interbancário naquele dia.

O Conselho de Política Monetária (COPOM) fixa a taxa juros para o período entre suas reuniões ¬ geralmente superior a um mês ¬ com base na taxa média dos financiamentos diários, com lastro em títulos federais, apurados no Sistema Especial de Liquidação e Custódia. É muito importante observar que essa taxa de juros vai, portanto, a reboque da taxa definida pelo mercado interbancário.

A taxa de juros fixada pelo COPON não reina no controle

do volume dos meios de pagamentos. Esse controle é exercido pelos mecanismos

tradicionais ¬ depósito compulsório, taxa de redesconto e operações de open market.. A taxa de juuros fixada pelo COPON

reina no mundo dos rentistas, pois a taxa SELIC estabelece a remuneração direta de parte da dívida pública com a qual se manifesta indiretamente no valor da remuneração global da dívida, impactando as despesas do Tesouro Nacional. Só para se ter idéia da ordem de grandeza, um aumento de ½ % na taxa SELIC implica em despesas superiores a 15 bilhões de reais no ano, maiores, portanto que o valor dedicado ao programa bolsa família em 2009 (próximo a 11 bilhões de reais, pelos dados do Ministério do Desenvolvimento Social).

Quando o banco central utiliza as operações de open market, colocando títulos federais com compromisso de recompra pagando taxas SELIC atraentes para enxugar a liquidez, os depósitos nos mercados financeiros de outros países com taxas de rendimentos inferiores orientam-se para cá em busca de ganhos especulativos. O efeito do enxugamento da liquidez da economia é assim atenuado em favor dos rentistas ¬ nacional e estrangeiro ¬ e do fortalecimento momentâneo das reservas internacionais (efeito blindagem da economia contra o contágio das crises em outros países).

Em meados do ano de 2010, a dívida líquida do setor público representou cerca de 40% do PIB (valor próximo a R$1, 3 trilhão).

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5.3. TAXA DE CÂMBIO

De modo geral, os preços dos bens e serviços são cotados em moedas nacionais e se equivalem na moeda eleita como internacional por meio de taxas de câmbio: razão – ou relação – entre duas moedas de países diferentes. Assim, a taxa de câmbio é o preço em moeda nacional de uma unidade de moeda estrangeira16.

A taxa de câmbio é formada no mercado cambial ¬ onde se compra e vende as moedas estrangeiras ¬ que existe simplesmente pelo fato de os países imporem um curso forçado à suas moedas nacionais.

A taxa de câmbio representa, portanto, a uma relação que espelha a diferença entre preços dos bens e serviços semelhantes fabricados em dois países diferentes.

Pa R$ = e PbU$

Onde:

P= preço do produto no país A e no país B, cotado em suas respectivas moedas nacionais R$ (Brasil); U$ (Estados Unidos da America, por exemplo), e:

e = taxa de câmbio.

Os preços dos ativos são diferentes entre países por várias

16 Esse é o método denominado direto. O método indireto

conste em encontrar a taxa de câmbio medindo o preço da moeda nacional em ternos da moeda estrangeira. Por simplificação didática estaremos neste capitulo utilizando o método de apuração direta: o preço de uma unidade monetária estrangeira cotada em moeda nacional.

razões. A produtividade e o salário entre os países são diferentes correspondendo às diferentes especializações do trabalho contidas em cada um deles. Se elas fossem iguais, bem como as condições pelas quais se distribuem os seus ganhos entre trabalho e capital, a taxa de câmbio seria igual à unidade. Segundo, existem riscos associados à aquisição do ativo estrangeiro em relação ao ativo nacional: a informação tende a ser imperfeita, ou seja, nem todos têm acesso a ela igualmente. Por fim, uma série de outros efeitos que vão desde o custo de transporte até diferenças entre as legislações que regem as sociedades contribui para que a formação dos preços domésticos seja diferente entre países influenciando o preço da moeda estrangeira cotado em moeda nacional. Contudo, não havendo restrição ao comércio, esses preços alcançado pelas forças do mercado se igualariam.

Os principais participantes deste mercado são os exportadores, importadores, instituições financeiras e demais pessoas que pelos motivos mais diversos desejam possuir moeda estrangeira ou trocá-la pela moeda nacional, como os turistas, por exemplo.

Como os demais preços da economia, a taxa de câmbio é governada pela interação dos que querem desfazer-se da moeda (vender) e dos que dela necessitam (comprar). E eles o fazem, geralmente como um passo prévio à troca de um ativo estrangeiro. Somente em casos muito especiais os indivíduos guardam moeda estrangeira encarando-a como um ativo absoluto. Essas interações entre compra e venda de moedas se reflete em um mercado: o mercado cambial.

Grande parte das opções efetivadas pela posse da moeda estrangeira atualmente são motivadas pelo desejo de trocar poder de compra presente pelo poder de compra no futuro. Procuram valorizar sua riqueza (poder de compra acumulado) que pode estar constituída em vários bens como uma empresa, ativos financeiros, propriedades e etc. Quando alguém compra moeda estrangeira, o faz para comprar bens, serviços ou títulos no estrangeiro como

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forma de ampliar sua riqueza.

A relação exemplificada abaixo indica que U$ 1,00 vale em moeda nacional R$ 1,81. No entanto, no momento imediatamente posterior essa relação pode se alterar, uma vez que os preços dos bens e serviços dos países são governados por princípios que envolvem escolhas entre ter ativos monetários e em bens e serviços influenciando a taxa de juros dos países. Como a taxa de câmbio é determinada pela oferta é demanda da moeda ela mantém um contato intimo com a taxa de juros dos países.

R$ 1,81 = US$ 1 ou R$ 1,81 / US$ 1

Com esta relação estabelecida no tempo presente (t) os indivíduos fazem suas opções de consumo e investimento em escala internacional utilizando somente uma unidade de medida (uma moeda) para cotar bens e serviços semelhantes produzidos em diversos países e adquirem aquele com preço mais atraente.

Em mercados de informação perfeita, sem custos de transporte, sem barreiras tarifárias e não tarifárias ao comércio internacional e outros obstáculos as trocas entre países, os preços entre produtos iguais produzidos em diferentes países iriam se igualando por meio da arbitragem. Essa intuição é tão forte que sugeriu a formulação por David Ricardo no século XVIII da lei do preço único no comércio internacional, Assim, para um determinado bem ou serviço (i) a taxa de câmbio corresponde a relação que iguala seu preço em dois mercados diferentes¬ um local (L) e um estrangeiro (*) cotados por uma moeda somente.

PLI = e P*i

A lei do preço único, em verdade, dá consistência a Teoria da Paridade do Poder de Compra (IPPC). Essa teoria estabelece que cestas de bens (CB) iguais produzidas em diferentes países recebem diferentes preços (P) aos olhos dos respectivos consumidores nacionais mas ao .longo do tempo eles vão adquirindo os bens nos mercados cujos custos são menores.

A PPC formulada desta forma é uma versão correlata para a determinação da taxa de câmbio. Sustentada teoricamente pela lei do preço único, os processos de arbitragem fariam com que a PPC tendesse a unidade.

PPC = PCBa / PCBb

Esse conceito foi ampliado para incluir as variações nos níveis de preços entre países. Essa ampliação foi denominada de Paridade do Poder de Compra Relativo e significa que as variações da taxa de câmbio decorrem das variações nos níveis de preços dos países considerados.

(e t – e t-1)/ e t-1= [(Pat – Pa

t-1)/ Pat-1] – [(Pb

t – Pbt-1)/ P

bt-1]

5.3. 1. TAXA DE CÂMBIO REAL

Ela foi inicialmente formulada no início do século passado pelo economista Gustav Cassel (1919). Ela determinar os níveis em que se deveriam fixar as paridades, quando variassem os preços dos bens. A taxa de câmbio real mensura justamente a defasagem de ajustamento da PPC relativa. Assim, a taxa de câmbio real (R)

R = e X variação de preços no país estrangeiro/ variação de preços

no país local (L)

Para o cálculo da taxa real de câmbio, geralmente se elege uma época que será tomada como base e fazemos o nível geral de preços nos dois países igual a 100 para a taxa cambial dessa época..

Depois, é só considerar o mesmo cálculo com os novos níveis de preços da data que queremos determinar a taxa de câmbio real.

R = e t0 X (P*to – P*t-1)/ (PLto – PL

t-1)

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Comparamos a taxa real com a taxa nominal atual (t) para avaliarmos se esta valorizada, desvalorizada ou manteve-se constante em relação àquela da data base. Desta forma, se o câmbio em valores correntes permanecesse igual e ocorrer inflação internamente, verificar-se-ia uma queda do câmbio real. Por outro lado, se houver inflação externa, ocorre um aumento no câmbio.

5.4. TAXA DE CÂMBIO E TAXA DE JUROS

Os aplicadores no mercado financeiro especulam com respeito às expectativas de variações da taxa cambial ao longo do tempo. Eles comparam os retornos dos títulos em seus países com os retornos dos títulos em outros países computando as suas expectativas com respeito à variação cambial no período considerado da aplicação. Imaginemos que os retornos dos títulos públicos brasileiros tenham um retorno determinado por uma taxa de juros superior a de outros países. Os aplicadores internacionais preferirão adquirir esses títulos aqui em vez daqueles ofertados em seus países de origem cujo retorno é menor. No entanto, a efetividade dessa aplicação dependerá da expectativa que o aplicador tenha com respeito à taxa de câmbio que vigorará no dia de retorno do seu capital ao país de origem em relação a taxa de câmbio que vigorava no ato de entrada no mercado estrangeiro. Isso pode ser ilustrado de modo didático pela relação abaixo17.

17 Essa relação foi inicialmente formulada por Krugman& Obstfeld

(2003)

Rbr < R* + (e t+1 – e t) / e t

De modo assemelhado, se não houver manipulação da taxa de câmbio pelos governos ela estará em equilíbrio quando os depósitos de todas as moedas oferecem a mesma taxa de rendimento esperado. E isso será alcançado por um sistema de arbitragem que leva as taxas mais rentáveis a cair com o acréscimo de aplicações e as de outros países a subirem por escassez de recursos. Isto significa que a taxa cambial determinada em cada país, no caso de livre movimentação, iguala os rendimentos obtidos nos distintos países devido às diferenças entre taxas de juros.

Como qualquer ativo, podemos comprar dólares para especular ou adquirir produtos estrangeiros. A qualquer momento, os preços dos bens, serviços e títulos de um país são comparados aos de outros países pelo mecanismo da taxa de câmbio. Todos aqueles que operam nestes mercados procuram tirar vantagens de qualquer diferença significativa entre os preços dos ativos nacionais e estrangeiros olhando as respectivas taxas de câmbio.

Taxa de rendimento esperado no Brasil

Taxa de rendimento esperada no país estrangeiro

Taxa de câmbio na data de entrada da moeda estrangeira

Expectativa da taxa de câmbio na data de saída

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A segunda guerra mundial propiciou um conjunto substancial de

inovações ¬ na área de informativa, novos materiais, precisão balística,

energia nuclear, e outros ¬, que a partir dos anos 50 foram incorporados

aos setores industriais de diversos países expandindo a produção e

amplificando substancialmente o comércio exterior. Os países ao termino

da segunda guerra previram esse fenômeno. Assim, o dólar foi adotado

como a moeda internacional cumprindo o papel de facilitador das trocas

internacionais. Para que o sistema funcionasse eficazmente os países em

comum acordo deveriam aceitar o dólar como moeda internacional e fixar

o valor de sua moeda ao dólar de modo estável. Sob garantias de que os

Estados Unidos se comprometiam a manter a paridade de sua moeda

estável em relação ao preço do ouro, eles manteriam a paridade de suas

moedas constante em relação ao dólar. Assim, após a Segunda Guerra

Mundial o mundo orquestrou um cenário internacional, onde se

convencionou que o dólar americano seria a moeda internacional com

adoção do sistema de câmbio fixo pelos países membros das Nações

Unidas.

Atualmente a maioria dos países adota o sistema de taxas de

câmbio flutuante. Os Estados Unidos haviam emitido dólares de forma

crescente desde a década de 1950 para suportar não só suas transações

internas, mas as internacionais. Esse excessivo acúmulo de dólares elevou

o grau de incerteza com respeito ao estabelecimento do dólar como moeda

de reserva de valor internacional. Novos atores como o Japão e os países

árabes – produtores de petróleo –contribuíram para desestabilizar a

paridade dólar – ouro. A elevada produtividade do Japão tornava os

produtos mais baratos domesticamente, mas a adoção do câmbio fixo

impedia que os ganhos de produtividade tornassem seus produtos mais

competitivos no mercado internacional, por exemplo. Em meados da

década de 70, praticamente todos os países tinham abandonado a paridade

cambial fixa. Assim, os fluxos dos ativos financeiros foram ganhando

espaço no mercado internacional e hoje em dia são preponderantes. Tem

um giro de 15 a 20 vezes superior o de bens e serviços.