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UFRJ Rio de Janeiro 2008 Rommulo Mendes Carvalho Barreiro MACROESTRUTURAS BIOEROSIVAS EM CONCHAS DE MOLUSCOS DO PÂNTANO DA MALHADA (HOLOCENO), CABO FRIO, RIO DE JANEIRO Dissertação de Mestrado (Geologia)

MACROESTRUTURAS BIOEROSIVAS EM CONCHAS DE MOLUSCOS DO PÂNTANO DA MALHADA (HOLOCENO), CABO FRIO, RIO DE JANEIRO

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Dissertação de Mestrado apresentado ao Programa de pós graduação em Geologia da UFRJ

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UFRJ Rio de Janeiro

2008

Rommulo Mendes Carvalho Barreiro

MACROESTRUTURAS BIOEROSIVAS EM CONCHAS DE

MOLUSCOS DO PÂNTANO DA MALHADA (HOLOCENO), CABO

FRIO, RIO DE JANEIRO

Dissertação de Mestrado (Geologia)

UFRJ

Rio de Janeiro Fevereiro 2008

Rommulo Mendes Carvalho Barreiro

MACROESTRUTURAS BIOEROSIVAS EM CONCHAS DE

MOLUSCOS DO PÂNTANO DA MALHADA (HOLOCENO), CABO

FRIO, RIO DE JANEIRO

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Geologia, Instituto de Geociências, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como requisito necessário à obtenção do grau de Mestre em Ciências (Geologia).

Área de concentração:

Paleontologia e Estratigrafia

Orientadoras:

Drª. Claudia Gutteres Vilela Drª. Maria Célia Elias Senra

BARREIRO, Rommulo Mendes Carvalho

Macroestruturas bioerosivas em conchas de moluscos do Pântano da Malhada (Holoceno), Cabo Frio, Rio de Janeiro / Rommulo Mendes Carvalho Barreiro - - Rio de Janeiro: UFRJ / IGeo, 2008.

xv, 85f. : 25il., 1 apênd.;

Dissertação (Mestrado em Geologia) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geociências, Programa de Pós-graduação em Geologia, 2008.

Orientadoras: Claudia Guterres Vilela, Maria Célia Elias Senra

1. Geologia. 2. Paleontologia e Estratigrafia – Dissertação de Mestrado. I. Vilela, Claudia Gutterres. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geociências, Programa de Pós-graduação em Geologia. III.. Macroestruturas bioerosivas em conchas de moluscos do Pântano da Malhada (Holoceno), Cabo Frio, Rio de Janeiro

Rommulo Mendes Carvalho Barreiro

MACROESTRUTURAS BIOEROSIVAS EM CONCHAS DE

MOLUSCOS DO PÂNTANO DA MALHADA (HOLOCENO), CABO

FRIO, RIO DE JANEIRO

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Geologia, Instituto de Geociências, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como requisito necessário à obtenção do grau de Mestre em Ciências (Geologia).

Área de concentração:

Paleontologia e Estratigrafia

Orientadoras:

Drª. Claudia Gutterres Vilela Drª. Maria Célia Elias Senra

Aprovada em: 26/02/2008

Por:

_____________________________________ Presidente: Dr. Ismar de Souza Carvalho, IGEO/UFRJ

_____________________________________ Dr. Antônio Carlos Sequeira Fernandes, MN/UFRJ

_____________________________________ Drª. Rita de Cassia Tardin Cassab, DNPM

vi

Dedico este trabalho a Maria da

Conceição, minha avó, que esteve

ao meu lado por todo este período.

vii

Agradecimentos

À professora Doutora Maria Célia Elias Senra (UNIRIO) pela orientação do trabalho realizado e dedicação demonstrada durante minha vida acadêmica. À professora Doutora Claudia Gutterres Vilela pela orientação acadêmica do mestrado. Aos professores Doutor Antonio Carlos Sequeira Fernandes (MN/UFRJ) e Doutora Assunta D´Alessandro (Universitat di Bari/ Itália) por ceder parte da bibliografia utilizada. Aos amigos Márcio Aguiar da Costa, Natalia Pereira Benaim, Thatyanna Ramos Barreira, Diana Mariani e Marcela da Silva Rosa, pelas revisões gramaticais e contextuais e à equipe do Núcleo de Estudos Tafonômicos (NEST/UNIRIO) pelo auxílio nas coletas realizadas. Ao Programa de Pós-graduação em Geologia do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio de Janeiro e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo suporte financeiro.

viii

Resumo

BARREIRO, Rommulo Mendes Carvalho. Macroestruturas bioerosivas do Pântano da Malhada (Holoceno), Cabo Frio, Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2008. xv, 85f. Dissertação (Mestrado em Geologia) – Programa de Pós-graduação em Geologia, Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008. Bioerosão é a denominação dada aos processos de degradação de substratos litificados por ação biológica. Seu estudo em substratos bioclásticos vem adquirindo notabilidade nas últimas décadas, contribuindo de forma significativa para ciências como a Icnologia, a Ecologia das interações e a Paleontologia. A atividade bioerosiva, um dos mais importantes processos ocorrentes no limiar Geologia-Biologia, por ser de natureza física, química ou ambas, resulta na produção de sedimentos em ambientes marinhos. Pesquisados em detalhe, estes elementos ampliam o horizonte de conhecimento acerca dos organismos, com difícil preservação, que habitaram ambientes pretéritos, bem como a variedade das estruturas por eles produzidas. Caracteriza-se por ser uma ferramenta fundamental na compreensão de processos evolutivos e paleoecológicos ocorridos no período que vai desde o Cambriano até o Holoceno. Este trabalho se propõe ao estudo icnotaxonômico e a análise quantitativa das macroestruturas bioerosivas encontradas em conchas de Anomalocardia brasiliana, Crassostrea rhizophorae e Ostrea cf. puelchana provenientes das coquinas da planície costeira de Cabo Frio (Região do Pântano da Malhada). São identificadas seis icnoespécies: Entobia laquea, E. paradoxa, Caulostrepsis taeniola, Maeandropolydora aff. sulcans, Oichnus simplex e O. paraboloides. Estruturas estas produzidas por esponjas clionaídeas, poliquetas espionídeos e gastrópodos naticídeos e muricídeos. São interpretados padrões de simbiose entre organismo invasor e hospedeiro, estudo geométrico das estruturas e deduções paleoambientais. Palavras-chave: Bioerosão, Holoceno, Icnologia.

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Abstract

BARREIRO, Rommulo Mendes Carvalho. Macroestruturas bioerosivas do Pântano da Malhada (Holoceno), Cabo Frio, Rio de Janeiro [Macrobioerosion structures from Pântano da Malhada (Holocene), Cabo Frio, Rio de Janeiro] Rio de Janeiro, 2008. xv, 85f. Dissertação (Mestrado em Geologia) – Programa de Pós-graduação em Geologia, Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008. Bioerosion is the name given to the processes of hard substrate degradation by biological means. Its study in bioclastic substrate becomes in the last few decades more notable and has been contributing in a significant way for sciences as Ichnology, Ecology of the interactions and Paleontology. The bioerosive activity is one of the most important common processes in the Geology-Biology threshold. It results in the production of sediments in marine environments through physical and/or chemical means. These traces widen the horizon of knowledge concerning the organisms with difficult preservation that had inhabited paleoenvironments, as well as the variety structures produced by them. It is characterized for being a basic tool in the understanding of evolutionary and paleoecologic processes, in particular of the occurrences in the period between Cambrian and Holocene. This work focuses icnotaxonomy study and the quantitative analysis of the bioerosive macrostructures present in shells of Anomalocardia brasiliana, Crassostrea rhizophorae and Ostrea cf. puelchana from the Cabo Frio coastal plain shellbed (Pântano da Malhada region). They are identified in six icnoespecies: Entobia laquea, E. paradoxa, Caulostrepsis taeniola, Maeandropolydora aff. sulcans, Oichnus simplex and O. paraboloides. These structures were produced by clionaid sponges, spionid polychaetes and naticid and muricid gastropods. This work interpreted standards of symbiosis between invading organism and host, geometric study of the bioerosive structures and paleoenviromental deductions.

Key-words: Bioerosion, Holocene, Ichnology

x

Lista de figuras

Figura 1: Esquema representativo das classes etológicas atuais. 6

Figura 2: Esquema da perfuração produzida por esponjas clinaídeas. 12

Figura 3: Esquema apresentando as fases de crescimento de A a E. Escalas

com valor de 0,5 mm. 14

Figura 4: Esquema do padrão geral de perfurações produzidas por poliquetas. 18

Figura 5: Esquemas da geometria transversal das perfurações completas e

incompletas de muricídeos e naticídeos (B). 21

Figura 6: Mapa de localização da área de estudo (Pântano da Malhada). 24

Figura 7: Perfil sedimentar da área de estudo. 25

Figura 8: Imagens da área de estudo. 27

Figura 9: Esquemas de mediação dos eixos de A. brasiliana e ostreóideos. 29

Figura 10: Diagrama de setores para as valvas de (a) A. brasiliana e (b)

ostreóideos. 30

Figura 11: Esquema de um indivíduo de A. brasiliana em posição de vida no

sedimento. As setas simbolizam as correntes hídricas criadas pelos sifões

inalante e exalante. 31

Figura 12: Esquema de um indivíduo de C. rhizophorae em posição de vida. As

setas escuras simbolizam os movimentos da valva superior, as setas claras

simbolizam as correntes hídricas criadas pelo manto. 31

Figura 13: Histogramas de distribuição das medidas do eixo antero-posterior de

A. brasiliana nas três localidades. 41

Figura 14: Freqüências das estruturas bioerosivas de cada produtor, em A.

brasiliana bioerodidas por localidade de coleta. 42

Figura 15: Freqüências das estruturas bioerosivas de cada produtor em valvas

bioerodidas de ostreóideos por localidade de coleta. Legenda: Cr: C.

rhizophorae, Op: O. cf. puelchana. 42

Figura 16: Boxplot’s de distribuição das valvas de A. brasiliana nas localidades

agrupadas segundo presença e ausência bioerosão de esponja e poliquetas. 43

Figura 17: Boxplot’s de distribuição das valvas direitas e esquerdas de C.

rhizophorae de #SP agrupadas por bioerosões de esponja e poliquetas e em 44

xi

ausente e presentes.

Figura 18: Freqüências dos setores com estruturas bioerosivas de poliquetas

em A. brasiliana. 45

Figura 19: Freqüências das conchas com estruturas bioerosivas de poliquetas

nos setores central e marginal, tanto no periostraco quanto no hipostraco em C.

rhizophorae e O. cf. puelchana. 46

Figura 20: Freqüências das bioerosões por poliquetas na face externa

(periostraco) nas valvas de ostreóideos de acordo com a quantidade de

estruturas encontradas (raro, moderado e abundante). 47

Figura 21: Freqüências das bioerosões por poliquetas na face interna

(hipostraco) nas valvas de ostreóideos de acordo com a quantidade de

estruturas encontradas (raro, moderado e abundante). 47

Estampa 1 63

Estampa 2 64

Estampa 3 65

Estampa 4 66

Estampa 5 67

xii

Lista de tabelas

Tabela 1: Dados quantitativos de exemplares encontrados nas amostras

estudadas 68

Tabela 2: Valores absolutos e freqüências de valvas de ostreóideos

bioerodidos por esponjas. 68

Tabela 3: Freqüências das estruturas bioerosivas em valvas de A. brasiliana. 69

Tabela 4: Freqüências das estruturas bioerosivas de poliquetas em valvas de

ostreóideos. 70

xiii

Lista de quadros

Quadro 1: Alguns exemplos de icnotáxons produzidos por bioerosão e suas

respectivas classificações etológicas. 7

xiv

Sumário Agradecimentos .................................................................................................. vii

Resumo .............................................................................................................. viii

Abstract ........................................................................................ ...................... ix

Lista de figuras ........................................................................................ ............. x

Lista de tabelas ........................................................................................ ........... xii

Lista de quadros ................................................................................................ xiii

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................. 1

1.1. Objetivos ....................................................................................................... 4

2. ICNOLOGIA E BIOEROSÃO .......................................................................... 5

2.1. Bioclausuras ................................................................................................ 8

3. AGENTES E PROCESSOS ............................................................................ 9

3.1. Esponjas ...................................................................................................... 10

3.2. Poliquetas .................................................................................................... 15

3.3. Gastrópodos ................................................................................ ................. 18

4. ÁREA DE ESTUDO ......................................................................................... 22

4.1. LOCALIDADES DE COLETA ...................................................................... 25

4.1.1. Reserva Tauá............................................................................................ 25

4.1.2. Sítio da Paz .............................................................................................. 26

4.1.3. Fazenda Junqueira ................................................................................... 26

5. MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................... 28

5.1. Coleta do material ....................................................................................... 28

5.2. Tratamento laboratorial ................................................................................ 28

5.3. Tratamento estatístico .................................................................................. 32

6. RESULTADOS ................................................................................................ 33

6.1. Icnotaxonomia .............................................................................................. 33

6.2. Análise quantitativa das populações de moluscos representadas nas

coquinas.............................................................................................................. 41

6.3. Análise quantitativa das estruturas bioerosivas .......................................... 43

6.4. Distribuição espacial da bioerosão produzida por poliquetas .................... 45

7. DISCUSSÃO ................................................................................................... 48

xv

8. CONCLUSÕES ............................................................................................... 53

Referências bibliográficas ................................................................................... 55

Glossário ............................................................................................................. 62

Apêndice 1 – Tabelas ......................................................................................... 68

1

1. INTRODUÇÃO

O estudo de estruturas bioerosivas em substratos rochosos e bioclásticos vem

adquirindo notabilidade nas últimas décadas devido a contribuições à Icnologia,

Ecologia das interações e Paleontologia. Esta realidade, entretanto, não se aplica ao

Brasil, onde o estudo ainda é incipiente.

As estruturas bioerosivas são resultantes de processos biológicos em

substratos litificados ou lignificados, nos quais ocorre dissolução ou raspagem, com

posterior remoção do material por organismos vivos, representando atividades de

predação e habitação. São denominadas bioerosões, termo proposto por Neumann

em 1966, porém seu conhecimento vem desde meados do século XIX, quando Lyell

(1842) denomina de lithophagi e lithodomi os moluscos que perfuram o substrato

para própria habitação.

A atividade bioerosiva, por ser de natureza física, química ou ambas, resulta

na produção de sedimentos em ambientes marinhos, a partir da degradação de

esqueletos carbonáticos. Acker & Risk (1985) mostram que qualquer tratamento de

sedimentologia carbonática ou modelo de fácies que ignora o efeito da bioerosão

corre o grave risco de estar incompleto. Dentro de uma concepção tafonômica, a

bioerosão é um dos mais importantes processos ocorrentes no limiar Geologia-

Biologia.

Estudadas dentro da Icnologia como icnofósseis, as bioerosões são

importantes registros que auxiliam o estudo geológico e paleontológico, ampliando

nossa imagem dos organismos com difícil preservação que habitaram ambientes

pretéritos (Ekdale, 1978).

O estudo em bioerosão pode ser utilizado como ferramenta em análises

paleoecológicas (Boekschoten, 1966, 1967), reconstruções paleoambientais

(Boeckshoten, 1967; Arua, 1982; Bromley & D’Alessandro, 1987; Lorenzo & Verde,

2004), processos tafonômicos (Walker & Goldstein, 1999; Pickerril et al., 2002;

Farinati et al., 2005), interpretações paleobatimétricas (Bromley, 1978; Nielsen et

al.,2003; Försterra et al., 2005), bem como na compreensão de processos evolutivos

(Baumiller et al., 1999; Harper, 2005; Ekdale, 2006; Tapanila, 2006a) e de interações

2

predador-presa (Kowaleski et al.,1998; Roopnarine & Beussink, 1999; Dietl &

Alexander, 2000).

Seus processos de formação são estudados em programas de monitoramento

ambiental (Rützler, 1975, 2002; Silina, 2003; Ward-Paige et al., 2005), pesquisa de

“patologias” causadas por infestações em conchas de moluscos cultivados para o

comércio (Handley & Bergquist, 1997; Mortensen et al., 2000; Boscolo & Giovanardi,

2002; Silina, 2006) e padrões de sedimentologia (Rützler, 1975; Acker & Risk,1985).

A bioerosão é o principal processo ecológico no ciclo dos carbonatos, tanto

nas áreas temperadas, quanto nas tropicais (Hutchings, 1986 apud Calcinai et al.,

2003).

As estruturas bioerosivas podem ser produzidas por moluscos, anelídeos,

esponjas, algas, entre outros, sendo registradas desde o Cambriano até o Holoceno

(Taylor & Wilson, 2003). Além dos organismos que produzem furos distintos, a

bioerosão é complementada por seres que formam ninhos, arranham, raspam,

mordem ou mesmo causam atrito no fundo marinho ou em materiais a eles

associados. Engloba relações simbióticas e de predação (Martin & Britayev, 1998)

com ampla aplicação ambiental.

Os fatores ambientais com maior relevância em cenários marinhos, que

influenciam na composição das assembléias de traços fósseis são: batimetria,

substrato, oxigênio e hidrodinâmica (Ekdale,1985); em comunidades atuais, Ward-

Paige et al. (2005) citam ainda a influência do aporte de detritos e nutrientes

terrestres (poluição) no aumento da população de esponjas clionaídeas perfurantes,

aumentando, assim, a bioerosão em substratos carbonáticos localmente.

As macroperfurações são estruturas com dimensões transversais maiores que

um milímetro (Ekdale, 2006). São produzidas quase exclusivamente por bioerosões

de domichnia, servindo de habitação ao ocupante por toda a vida.

Uma das principais características da malacofauna do Pântano da Malhada é

a predominância numérica de conchas de moluscos das seguintes espécies:

Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1791), Anadara cheminitzi (Philippi, 1851),

Anadara brasiliana (Lamarck, 1819), Anadara ovalis Brugière, 1789, Crassostrea

rhizophorae (Guilding, 1828), Dendostrea frons (Linnaeus, 1758), Lucina pectinata

(Gmelin, 1791), Ostrea cf. puelchana d´Orbigny, 1842, Protothaca antiqua (King &

3

Broderip, 1835), Tellina sp. Linnaeus 1758, Acteocina candei (d’Orbigny, 1841),

Bulla striata Bruguière, 1792, Cerithium atratum (Born, 1778), Mitrella albovittata

Lopes,Coelho & Cardoso, 1965, Nassarius vibex (Say, 1822), Neritina virginea

(Linnaeus, 1758), Odostomia canaliculata Adams, 1850, Antalis disparile (d’Orbigny,

1842). Destas destacam-se Anomalocardia brasiliana, Crassostrea rhizophorae e

Ostrea puelchama com estruturas bioerosivas preservadas (Barreiro & Senra, 2005,

2006; Barreiro et al., 2006).

O Pântano da Malhada, localizado na Região dos Lagos do estado do Rio de

Janeiro, apresenta níveis de coquinas com extensão em área de aproximadamente

60.000 m2 e alto grau de preservação. Estes depósitos, inicialmente estudados por

Senra et al. (2002, 2003, 2004), têm excelente exposição na Reserva Tauá,

atualmente um Sítio Paleobiológico (Castro et al., 2006) cadastrado na SIGEP

(Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleobiológicos).

As coquinas estão relacionadas à última transgressão marinha ocorrida

durante o Holoceno na região (5.100 anos AP), que propiciou a formação de um

corpo lagunar onde desaguavam os rios da região, sendo depois ressecado após a

regressão marinha subseqüente (4.900 anos AP) (Castro et al., 2006).

A pesquisa em bioerosão dispõe de grande potencial para o

conhecimento macroevolutivo e macroecológico de organismos perfuradores e suas

estratégias comportamentais (Tapanila, 2006a). a morfologia das perfurações é,

contudo, muito variável e, em muitos casos, extremamente simples, raramente

permitindo a determinação precisa do organismo produtor (Bromley, 1978). Apesar

do amplo conhecimento destas estruturas, ainda se faz necessário um detalhamento

dos padrões de perfuração relacionados ao tipo de ambiente e às respostas do

hospedeiro ao agente, bem como os mecanismos fisiológicos envolvidos, além de

estabelecer modelos quantitativos das icnotramas em relação aos diversos táxons

providos de exoesqueleto carbonático. Essa pesquisa, portanto, pode contribuir com

o melhor entendimento das relações ecológicas entre organismos diferentes

(sinecologia) ou na relação organismo/substrato (autoecologia do organismo

perfurador). Poderá fornecer informações relativas à fidelidade do registro fossilífero,

uma vez que parte dos esqueletos é enfraquecida e se torna suscetível aos agentes

hidrodinâmicos e biológicos.

4

As perfurações provocadas por organismos endolíticos possuem dois

atributos que os transformam em potenciais ferramentas para a interpretação

paleoambiental. (1) As perfurações são, de certa forma, diageneticamente

indestrutíveis. (2) Elas são preservadas genuinamente in situ em relação ao seu

substrato (concha). (3) Em coquinas de natureza autóctone, podem adquirir valor

estratigráfico.

1.2. Objetivos

O presente trabalho tem por objetivo o estudo icnotaxonômico das

macroestruturas bioerosivas encontradas em conchas do Pântano da Malhada, com

indicação de seus produtores, relações ecológicas e paleoambientais.

5

2. Icnologia e Bioerosão

Icnologia é a ciência que se ocupa do estudo dos vestígios resultantes das

atividades de organismos em substratos consolidados (litificados e lignificados) ou

inconsolidados (sedimentos). Pode apresentar duas divisões: a Paleoicnologia, que

estuda os icnitos do passado (icnofósseis ou traços fósseis), e a Neoicnologia,

estudo dos icnitos recentes.

Icnitos ou traços são estruturas biogênicas recentes ou fósseis que refletem o

comportamento do organismo. Estão, de certa forma, relacionadas à morfologia de

seu produtor, tais como pegadas, pistas, escavações e perfurações, incluindo ainda

coprólitos, gastrólitos, regurgitólitos, ninhos, teias de aranha, casulos (tecidos ou

feitos por cimentação de sedimentos), marcas de mordidas, entre outras (Fernandes

et al., 2002; Bertling et al., 2006).

A definição mais atual de traço fóssil, proposta por Bertling et al. (2006), o

aponta como estrutura morfologicamente recorrente resultante da atividade vital de

um organismo individual (ou grupo monoespecífico de organismos) que modifica o

substrato.

Os traços fósseis devem ser vistos como resultantes da combinação de três

parâmetros intimamente ligados: substrato, organismo produtor e comportamento

(Gibert et al., 2004). Segundo Ekdale (1985), os icnofósseis podem fornecer

informações das populações como abundância, diversidade e densidade, dados

relevantes na interpretação das estratégias populacionais (espécies oportunistas ou

de equilíbrio).

Apresentam uma parataxonomia (icnotaxonomia) regida pelo Código

Internacional de Nomenclatura Zoológica que os define como “trabalho fossilizado

de organismos” (“fossilized work of organisms”) (ICZN, 1999, Art. 1.2.1). A

icnotaxonomia apresenta os níveis de icnoespécie e icnogênero. Subespécie e

subgênero são também aceitos na sistemática icnológica, apesar de raramente

usados (Rindsberg, 1990 apud Bertling et al., 2006). O ICZN (1999, Art. 10.3)

permite o uso de icnofamílias para que sejam aplicadas do mesmo modo que os

6

níveis inferiores. Estas deveriam, contudo, ser baseadas somente na morfologia das

estruturas e não na biologia do produtor (Bromley, 1996 apud Bertling et al., 2006).

Além da classificação icnotaxonômica, há a classificação etológica. Proposta

primeiramente por Seilacher (1953 apud Gibert et al., 2004), desde então se tornou

o meio mais robusto e completo de agrupar os traços fósseis em um nível acima do

icnogenérico.

O primeiro sistema de classificação etológico agrupava cinco categorias de

estruturas. Após contribuições mais recentes, se encontra atualmente com doze

categorias (Figura 1), assim denominadas: Repichnia, estruturas de locomoção

direta; Pascichnia, estruturas de locomoção com alimentação; Fodinichnia,

estruturas de habitação com alimentação; Domichnia, estruturas de habitação;

Cubichnia, estruturas de repouso; Fugichnia, estruturas de fuga; Agrichnia,

estruturas de armadilha e cultivo; Praedichnia, marcas de predação; Aedifichnia,

estruturas de construção sobre o substrato; Equilibrichnia, estruturas de reajuste

gradual; Calichnia, estruturas de nidificação; e Fixichnia, marcas de ancoragem e

fixação (Fernandes et al., 2002; Gibert et al., 2004).

Figura 1: Esquema representativo das classes etológicas atuais (fonte: Gibert et al., 2004).

As estruturas bioerosivas, portanto, se enquadram em cinco categorias: duas

exclusivamente bioerosivas (Praedichnia e Fixichnia) e três que englobam também

estruturas de bioturbação (Domichnia, Equilibrichnia e Pascichnia). Alguns exemplos

podem ser vistos no quadro a seguir.

7

Quadro 1: Alguns exemplos de icnotáxons produzidos por bioerosão e suas respectivas classificações etológicas (modificado de Gibert et al., 2004).

Classe Estrutura bioerosiva Produtores Icnotáxons

Domichnia Furos e galerias biválvios Gastrochaenolites

Teredolites *

esponjas Entobia

sipunculídeos Trypanites

anelídeos Caulostrepsis

Maeandropolydora

Trypanites

cirripédios Rogerella

briozoários Iranema

Pennatichnus

Pinaceocladichnus

foronídeos Talpina

Fixichnia estruturas de fixação

superficial

cirripédios Centrichnus

biválvios Centrichnus

braquiópodes Podichnus

gastrópodos Renichnus

briozoários Stellichnus

Leptichnus

Pascichnia raspagens e ranhuras gastrópodos Radulichnus

poliplacóforos Radulichnus

equinóides Gnathichnus

Praedichnia furos, durofagia,

cicatrizes, mordidas

gastrópodos Oichnus

cefalópodos Oichnus

crustáceos "cicatrizes durofágicas"

peixes "cicatrizes durofágicas"

vertebrados "mordidas"

Equilibrichnia Galerias com

"spreiten"

Biválvios Gastrochaenolites vivus *

Legenda: (*) estruturas que não ocorrem em conchas de moluscos.

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2.1. Bioclausuras

Para alguns autores (eg.: Palmer & Wilson, 1988; Taylor, 1990; Tapanila,

2005), há ainda um grupo distinto de traços fósseis, intimamente ligado aos

processos de bioerosão produzidos por organismos endossimbiontes.

Quando um endossimbionte penetra o esqueleto de seu hospedeiro, este, em

alguns casos, reage à invasão e cria uma estrutura calcificada que isola o organismo

invasor. Este processo pode ser observado em corais e em moluscos produtores de

concha. Nestes, há a formação de uma estrutura denominada ampola nacarada

(Boscolo & Giovanardi, 2002).

Palmer & Wilson (1988) dão a estas estruturas a denominação de

bioclausuras, que seriam caracterizadas pelo aprisionamento de um organismo

infestante (de corpo mole) por crescimento esquelético do hospedeiro. Taylor (1990)

as classifica como bioimuração, por se tratarem da preservação como molde da

morfologia de um organismo em uma estrutura esquelética externa não própria.

Para Tapanila (2005), elas são classificadas como traços fósseis e

compreendem uma nova classificação etológica, denominada Impedichnia

(estruturas isolamento ao organismo invasor). Representam, no registro fossilífero,

antigas interações simbióticas (hospedeiro invasor), configurando-se como

deformações no esqueleto do hospedeiro.

Porém, Bertling et al. (2006) não consideram a bioclausura uma estrutura

abrangida pelo conceito de traço fóssil, pois, assim como a pérola, não se trata de

modificação no crescimento padrão do organismo, o que dispensa a existência da

classe Impedichnia. Para estes autores, a bioclausura deve ser estudada dentro da

Paleopatologia.

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3. AGENTES E PROCESSOS

Grupos de invertebrados marinhos desprovidos de defesas corporais contra

predadores desenvolveram, ao longo da evolução, o hábito endolítico. Vivendo

dentro de perfurações, produzidas para sua proteção, adquirem uma estrutura

externa protetora e obtêm a vantagem de ocupar um espaço inapropriado para a

maioria dos seres vivos (Zundelevich et al., 2007).

A escavação de um “lar” em um substrato duro não é uma tarefa fácil para um

invertebrado simples. Penetração e remoção de materiais mineralizados requer uma

anatomia especializada, habilidade comportamental variada e um considerável gasto

de energia (Ekdale, 2006).

Além das perfurações de habitação, existem aquelas que representam o

hábito alimentar durófago, ou seja, pequenos orifícios em carapaças carbonáticas

que auxiliam na retirada da carne da presa.

Segundo Warme (1975), pelo menos doze filos de animais estão envolvidos

nos processos bioerosivos, além de alguns grupos de plantas e protozoários. Dentre

estes, os mais óbvios e provavelmente os mais importantes organismos perfurantes

são: algas e fungos microscópicos, esponjas clionídeas, sipunculídeos, anelídeos

poliquetas, biválvios foladídeos, gastrópodos, crustáceos, equinóides, peixes e

briozoários (Taylor et al., 1999).

Estudos de laboratório confirmaram que fatores físicos e químicos de

diferentes origens interferem no recrutamento larvar de organismos dependentes do

substrato duro (Sebesvari et al., 2006).

Perry (2000) mostra que em corais tanto recentes quanto fósseis, as

bioerosões de maior expressão são aquelas ocasionadas por esponjas, sendo as

estruturas produzidas por poliquetas um componente secundário. E que a

abundância relativa de estruturas produzidas por vermes em relação àquelas

produzidas por esponjas sugere que o material seja de um ambiente de águas

rasas, favoráveis para a proliferação de poliquetas.

10

3.1. Esponjas

Dentre os numerosos organismos com habilidade de perfurar rochas

carbonáticas, as esponjas, principalmente da família Clionaidae, são de especial

interesse, devido a seu modo eficiente de penetração no substrato e por produzirem

grãos carbonáticos de formato típico (“chips”) que podem ser facilmente identificados

na fração lamosa dos sedimentos marinhos (Rützler, 1975). Grandes quantidades de

sedimento são produzidas por estas esponjas e alguns substratos são dominados

por seus fragmentos (Acker & Risk, 1985).

Considerando que muitas esponjas apresentam defesas químicas e/ou

mecânicas contra predadores, aquelas que não as têm podem apresentar a

vantagem competitiva de usar elemento esquelético como proteção. Tal estratégia

se baseia em perfurar estruturas sólidas de composição carbonática, que estão

inacessíveis para a maioria dos predadores e obter o benefício adicional de usar um

espaço não disponível a seus concorrentes (Zundelevich et al., 2007).

A erosão por esponja produz uma série de câmaras e galerias conectadas

dentro do substrato calcário onde a esponja vive, o organismo mantém contato com

o exterior através de papilas inalantes e exalantes ou, em algumas vezes, por meio

de um tecido incrustante (Calcinai et al., 2003).

As esponjas perfurantes desenvolveram um meio peculiar de penetração no

substrato. Ao se fixarem, usam células cauterizantes (corrosivas) que separam

fragmentos de CaCO3 (com tamanho variando entre 15-85m) da rocha,

transformando-os em grãos de calcário. Uma pequena depressão é produzida

quimicamente, com a utilização de anidrase carbônica e ácido fosfatase, em torno do

grão, isolando-o do substrato, que depois é transferido para fora do corpo da

esponja pelos canais de circulação de água e pelo ósculo. Esses dois processos de

corrosão e transporte dos grãos constituem a perfuração química e mecânica

respectivamente (Zundelevich et al., 2007; Calcinai et al., 2003).

As taxas de bioerosão dependem de alguns fatores bióticos e abióticos, que

incluem: disponibilidade de nutrientes e alimentos (Holmes et al., 2000), estado

fisiológico do organismo (Rützler, 1975), densidade e tipo de substrato onde o

organismo perfura (Hutchings, 1986).

11

Estímulo mecânico, alta intensidade luminosa, fortes correntes e,

possivelmente, baixa temperatura parecem acelerar o processo escavador em

ambientes coralíneos (Rützler, 1975).

Zundelevich et al. (2007), em laboratório, estimaram uma taxa total de

bioerosão do carbonato de cálcio em 340170g/m² por ano, sendo 260g/m²

dissolvidos quimicamente e o restante mecanicamente. Este estudo mostrou que a

taxa de bioerosão química é cerca de três vezes maior que a mecânica,

confrontando os dados de Rützler (1975), que estimou, em observações in situ, a

bioerosão total em 256g/m² por ano, estipulando que somente de 2 a 3% do

substrato seriam dissolvidos.

Esponjas perfurantes provavelmente datam do Devoniano (Tapanila, 2006b) e

as morfologias das perfurações, similares às formas modernas, são abundantes em

rochas cretáceas e mais recentes (Acker & Risk, 1985).

Suas estruturas bioerosivas são classificadas sob o icnogênero Entobia

Bronn, 1838, uma perfuração complexa com múltiplas aberturas e câmaras (Figura

2). Apresenta dezoito icnoespécies, que foram descritas com base nas

configurações tridimensionais (Gibert et al., 1998). Este icnotáxon é conhecido

desde pelo menos o Devoniano Médio (Tapanila, 2006b).

Calcinai et al. (2003) estudaram (em microscopia eletrônica de varredura) os

diferentes padrões estruturais das paredes internas das perfurações produzidas por

dois gêneros diferentes de esponjas clionaídeas. Eles consideram as variedades

estruturais um efeito diferenciado da morfologia dos pseudópodos de cada gênero,

mostrando, com isso, que as microesculturas internas das perfurações são

idiomórficas, ou seja, são específicas para cada grupo perfurador.

12

Figura 2: Esquema da perfuração produzida por esponjas clinaídeas (adaptado de Bromley & D’Alessandro, 1984)

Para Bromley & D’Alessandro (1984) as morfologias das estruturas (Entobia)

são influenciadas por fatores bióticos e abióticos, entre eles:

a) Natureza e estrutura do substrato: esponjas bioerosivas são restritas a substratos

calcários totalmente litificados (calcita e aragonita). Contudo, se o substrato possui

pequena área para fixação (e.g.: conchas de moluscos), a perfuração se torna

estenomórfica. Além disso, as heterogeneidades do substrato podem influenciar

fortemente a morfologia da perfuração.

b) Natureza do ambiente: gradiente fótico, hidrodinâmica, presença de incrustantes e

predadores. Em áreas propícias, as esponjas podem completar seu crescimento

ontogenético rapidamente, ao passo que esponjas mal localizadas podem usar sua

energia na construção de longos canais exploratórios na procura de melhores

condições de habitação. Em conchas parcialmente enterradas, as esponjas

cessam abruptamente seu crescimento abaixo da linha do sedimento.

13

c) Proximidade de outros organismos endolíticos: nos locais onde outras perfurações

(como: Trypanites e Caulostrepsis) estão ainda ocupadas por seus produtores, a

esponja evita o contato com estes e, onde estas estruturas são abundantes, a

esponja competidora é forçada a escavar um sistema estenomórfico entre e ao redor

de tais estruturas. Quando duas esponjas ─ da mesma espécie ou de espécies

diferentes ─ ocupam um mesmo substrato simultaneamente, ocorre um crescimento

lateral de cada uma, por canais exploratórios finos e curtos, que não chegam a

intercomunicar os dois indivíduos na região de proximidade, modificando, assim, a

morfologia drasticamente (Bromley & Tendal, 1973).

d) Tipos de esponjas perfurantes: cada espécie de esponja perfurante reflete

diferentes padrões anatômicos durante a escavação das galerias no substrato,

resultando em perfurações idiomórficas.

De acordo com Bromley & D’Alessandro (1984), o crescimento (ontogenia)

das esponjas dentro do substrato apresenta fases distintas de desenvolvimento e

maturação (Figura 3):

Fase de crescimento A: Imediatamente após o recrutamento, a esponja jovem

penetra no substrato produzindo finos canais exploratórios que se ramificam e

espalham radialmente a partir do ponto de abertura. Assim sendo, na zona mais

jovem de uma perfuração madura, onde o crescimento linear está ainda ativo, a

morfologia se apresenta como finos canais exploratórios.

Fase de crescimento B: Atrás da zona de crescimento linear, o diâmetro do furo é

aumentado por crescimento lateral. Normalmente neste estágio, formas nodulares

(“cameradas”) começam a se dilatar localmente formando as câmaras propriamente

ditas, ao passo que as formas não cameradas apresentam um formato de galhos de

árvore.

14

Fase de crescimento C: Nesta fase é alcançada uma morfologia relativamente

estável, representada por grandes áreas da perfuração tendo características

peculiares, como o tamanho da câmara, dimensões dos canais intercamerais, etc. O

formato radial original do sistema pode ainda ser visível. Muitas esponjas perfurantes

não ultrapassam essa fase.

Fase de crescimento D: O crescimento lateral sucessivo continua a ampliar as

câmaras e ramificações, permanecendo apenas um pequeno resíduo de substrato

entre as câmaras. Novas ramificações são introduzidas na área entre os ramos

existentes, até que o formato radial original seja mascarado. Em algumas formas

nodulares, ocorre a fusão de câmaras vizinhas, produzindo cavidades largas e

compostas.

Fase de crescimento E: Algumas esponjas continuam a crescer lateralmente. A

fusão associada destrói todas as características iniciais da perfuração e produz uma

câmara única ou poucas cavidades ou, ainda, um sistema de túneis não nodulares

de grandes extensões.

Figura 3: Esquema apresentando as fases de crescimento de A a E. Escalas com valor de 0,5mm (adaptado de Bromley & D’Alessandro, 1984).

15

3.2. Poliquetas

Os poliquetas são invertebrados bentônicos que desenvolveram uma série de

estratégias de vida para interagir com outros organismos. A escavação de substratos

carbonáticos, ligada à sobrevivência de formas imaturas, é um importante

mecanismo responsável pela produção de galerias em conchas.

A família Spionidae reúne espécies, dentro dos gêneros Polydora, Dipolydora

e Crazziella, com a habilidade de escavar substratos compostos por carbonato de

cálcio, tais como rochas carbonáticas, corais, algas calcárias coralinas incrustantes,

e também conchas de biválvios e gastrópodos. São animais sedentários que

apresentam dois palpos longos, finos e protráteis, com corpo apresentando mais de

180 segmentos (Boscolo & Giovanardi, 2002).

Em gastrópodos e biválvios é maior o grau de invasão por Polydora (29% e

23%, respectivamente) e, por isso, estão envolvidos na maioria das relações

parasitárias por poliquetas (Martin & Britayev,1998).

Os estudos iniciais apontavam que as perfurações eram produzidas

mecanicamente. Entretanto, evidências mais recentes indicam desgaste químico,

com secreção de ácido acético, associado à escavação mecânica, com raspagem

dos cristais de calcita da concha pelo quinto segmento modificado para abrasão

(McDiarmid et al., 2004; Silina, 2006; Wisshak & Neumann, 2006).

Tinoco-Orta & Cáceres-Martínez (2003) desenvolveram estudo detalhado

sobre a atividade bioerosiva de Polydora, gênero que tem como hábito viver no

interior de galerias em forma de U perfurados na concha do hospedeiro,

apresentando duas aberturas fundidas em forma de 8 (oito). A parte anterior do

anelídeo emerge da galeria e se alimenta de partículas tiradas do sedimento

superficial ou do material em suspensão na coluna d’água com o auxílio dos palpos

(Blake & Evans, 1973).

Os tubos não são produzidos por polidorídeos adultos, mas por suas larvas

quando estas se fixam, bem como por indivíduos pós-larvais durante o estágio de

recrutamento (Liu & Hsieh, 2000).

16

Nos polidorídeos, o recrutamento e a fixação ao substrato estão relacionados

ao acúmulo de argila na superfície da concha. A turbulência da água pode ter um

papel negativo no processo de infestação, pois além de comprometer a fixação,

remove larvas recém-fixadas. De acordo com Mortensen et al. (2000), a presença de

sedimentação lamosa pode causar um ambiente favorável à proliferação de larvas

de Polydora.

Diferentes parâmetros foram identificados como positivos e negativos no

processo de fixação de larvas, pós-larvas e formas jovens. São eles: conteúdo

orgânico do sedimento, distribuição do tamanho do grão, presença de formas jovens

e adultos coespecíficos, metabólitos haloaromáticos de organismos simpátricos e a

presença de bactérias (Sebesvari et al., 2006).

Silina (2003) mostra que o aumento no gradiente de bioerosão das conchas

está ligado a um aumento gradual no conteúdo de matéria orgânica nos sedimentos

de fundo. Este é um fator favorável ao desenvolvimento de bactérias e fitoplâncton,

que é uma fonte de alimentos para poliquetas. Bactérias e diatomáceas são os itens

de maior importância na dieta de polidorídeos que escavam conchas (Silina, 2006).

Galerias de Polydora em ostras estão relacionadas ao aumento da salinidade da

água (Almeida et al., 1997).

As larvas de poliquetas geralmente se fixam e melhor sobrevivem na margem

de crescimento da valva superior de ostreóideos ─ onde o suprimento de nutrientes

e oxigênio para a larva é mais favorável devido às correntes hídricas ─ e,

preferencialmente, nas fendas formadas pelas lamelas de crescimento, que são

locais propícios ao acúmulo de argila, apresentando, assim, um microclima ótimo

para seu assentamento. Perfurações nas fendas indicam taxas de sedimentação

pelítica indispensáveis ao recrutamento larvar (Silina, 2006).

Nos substratos ocupados por poliquetas, é comum a abundância de

indivíduos. A infestação é mais freqüente em moluscos previamente infestados do

que naqueles livres de vermes, mostrando, assim, uma preferência na invasão em

moluscos pré-infestados. Adultos preexistentes produzem um tipo de estímulo

químico à fixação de larvas, como ocorre em outros invertebrados (Tinoco-Orta &

Cáceres-Martínez, 2003; Silina, 2006).

17

Em biválvios semiendobentônicos a fixação de larvas de Polydora se dá em

torno da abertura sifonal, posição de alojamento vantajosa em relação a outras

regiões da superfície da concha, pois permite que o verme se alimente de partículas

que estão sendo inaladas ou expelidas pelo molusco (Tinoco-Orta & Cáceres-

Martínez, 2003). Tal preferência pode ser vista em conchas de A. brasiliana, onde as

perfurações encontram-se com maior freqüência na região posterior, local onde se

formam as correntes inalantes (Barreiro & Senra, 2006).

Quando a infestação é grande, a concha é enfraquecida e torna o molusco

mais suscetível à predação por crustáceos, além de potencializar a fragmentação

sob transporte hidráulico acentuado (Bower & McGladdery, 2003).

Segundo Blake & Evans (1973), as perfurações não entram em contato com a

parte mole do animal, pois o mesmo secreta camadas de conchiolina que são, em

seguida, cobertas por nácar, uma proteção contra a invasão do poliqueta, formando

uma estrutura denominada ampola nacarada. As galerias (Figura 4) podem se

apresentar no formato em U (mais comum), formato em Y, em forma de pêra,

complexos ramificados e depressões rasas, com ou sem ampola nacarada.

Em conchas de mexilhões, as ampolas nacaradas se desenvolvem mais

freqüentemente na valva direita (superior) que na esquerda (inferior), devido a

exposição relacionada à luminosidade e acúmulo de sedimento fino próprios para a

fixação larvar. O percentual de mexilhões com ampolas aumenta na mesma

proporção que a quantidade de pelitos nos sedimentos de fundo e a idade dos

moluscos. Isso se deve ao maior conteúdo de carbono orgânico em sedimento

lamoso que em sedimento arenoso (Silina, 2006).

As perfurações provenientes da ação de polidorídeos são classificadas nos

icnogêneros Caulostrepsis Clarke, 1908, contendo seis icnoespécies, e

Maeandropolydora Voigt, 1965, com cinco icnoespécies.

18

Figura 4: Esquema do padrão geral de perfurações produzidas por poliquetas. Icnogêneros (A) Caulostrepsis e (B) Maeandropolydora.

3.3. Gastrópodos

Exemplos clássicos de interações que deixam traços fósseis são as

perfurações de natureza predatória em esqueletos mineralizados de invertebrados.

Geralmente, podem ser distinguidas facilmente de furos de origem não biogênica.

Perfurações biogênicas aparecem em vários táxons paleozóicos, mais comuns em

braquiópodes do que em moluscos. Estruturas bioerosivas ligadas ao hábito

alimentar de gastrópodos carnívoros se apresentam como um único furo circular (ou

subcircular), na superfície externa da concha, atravessando-a perpendicularmente

em toda a espessura e se afunilando na extremidade interna (Baumiller et al., 1999).

A curiosidade sobre as perfurações em conchas e carapaças antecede muitos

séculos, pois desde a época de Aristóteles, é sabido que alguns gastrópodos

marinhos apresentam a capacidade de perfurar buracos em conchas de biválvios,

cracas, etc., para o consumo dos tecidos moles internos (Clelland, 1999).

A presença de furos nos esqueletos mineralizados de invertebrados marinhos

tem uma história geológica que remonta ao Pré-Cambriano Superior (Baumiller,

1996).

Abertura

19

Kowalewski et al. (1998) interpretaram a história evolutiva das perfurações

predatórias em três fases. A fase paleozóica, que se estende do Pré-Cambriano

Superior ao Carbonífero, é ilustrada pela aparição de predadores com uma

estratégia perfurante relativamente bem-sucedida (0,3-0,5 ocorrências por milhão de

anos) em braquiópodes, pequenos fósseis com conchas, moluscos bentônicos, entre

outros. No final desta fase (Devoniano ao Carbonífero), os predadores perfuravam

principalmente braquiópodes articulados, enquanto gastrópodos platiceratídeos se

tornavam importantes parasitas de equinodermas sésseis. Durante a fase mesozóica

(Permiano ao Cretáceo Inferior), predadores perfurantes eram tão raros que seu

registro não passa de poucas perfurações isoladas (< 0,1 ocorrência por milhão de

anos). Esta fase pode ser interpretada como o intervalo em que os perfuradores

possuíam uma adaptação perfurante latente. Por algum motivo, o grupo não se

tornou bem-sucedido e difundido, ou esta característica era facultativa para o hábito

alimentar. A fase cenozóica (Cretáceo Superior ao Holoceno) representa uma

segunda expansão dos perfurantes, associados a uma maior diversificação dos

predadores durófagos. Os perfuradores, especialmente os gastrópodos

prosobrânquios que se alimentam de moluscos, tornaram-se cada vez mais comuns

(> quatro ocorrências por milhão de anos).

Gastrópodos perfurantes atuais ocorrem nos Prosobranchia, ordem

Mesogastropoda (família Capulidae e superfamílias Naticoidea e Tonnoidea), e

ordem Neogastropoda (superfamília Muricoidea), nos Opistobranchia, ordem

Nudibranchia (família Vayssiereidae) (Bromley, 1981; Clelland, 1999). Estão

presentes desde a zona entre-marés até 270 m de profundidade e a maioria é

encontrada em águas rasas costeiras (Carriker, 1981 apud Clelland, 1999).

Segundo Cintra-Buenrostro et al. (2005), a maioria das perfurações presentes

em moluscos biválvios é resultado da predação por gastrópodos naticídeos e

muricídeos. O tamanho, forma e localização das perfurações são evidências para a

identidade, tamanho, comportamento e preferência por presa de predadores

perfurantes.

Para Roopnarine & Beussink (1999), a morfologia da presa é também um

importante componente no exame da dinâmica predatória no registro fossilífero.

Os gastrópodos predadores possuem uma pequena glândula especializada

(~1,00-2,5 mm de diâmetro), denominada órgão acessório perfurador (accessory

20

boring organ – sistema ABO), essencial no processo de perfuração. O sistema ABO

está localizado na extremidade da probóscide dos naticídeos e na sola do pé de

muricídeos e sua habilidade na dissolução do substrato depende da composição da

concha, temperatura e composição iônica do meio aquoso circundante (Clelland,

1999).

Duarte & Holler (1986), em estudo sobre a preferência de presas pelo

gastrópodo muricóideo Thais haemastoma (Linnaeus, 1767), observaram que sua

dieta está relacionada à disponibilidade de presas e à relação de tamanho predador-

presa.

O tamanho da presa é determinado por exame tátil da concha pela

probóscide e região anterior do pé (Carriker & Van Zandt, 1972 apud Clelland, 1999)

e a localização das presas é dada por quimiopercepção, porém Lorenzo & Verde

(2004) apontam que este método não é totalmente eficaz. Os autores observaram,

em seu material de estudo, uma perfuração na face interna da concha, indicando

que o gastrópodo atacou a presa morta.

O processo de perfuração consiste na dissolução química associada à

raspagem mecânica pela rádula da seguinte maneira: o periostraco é removido com

movimentos circulares pela rádula, expondo a concha calcária; em seguida, o

sistema ABO é posicionado e secreta substâncias ácidas (enzima ácido fosfatase,

ácido clorídrico e agente quelante de cálcio) que amolecem a concha; a rádula,

então, raspa o material que foi dissociado, aprofundando o furo; este processo de

alternância de dissolução e raspagem se repete novamente até que o furo se

complete e a parte carnosa do animal seja atingida. Quando o furo atravessa a

concha, a probóscide do gastrópodo, então, é evertida para dentro do orifício

produzido e começa a consumir a presa. Os fragmentos da concha resultantes do

processo de escavação são engolidos pelo gastrópodo (Clelland, 1999).

O mecanismo de raspagem em muricídeos e naticídeos é diferente. Nos

primeiros o odontóforo (e a rádula) são capazes de rotaciornar 180° enquanto, nos

últimos, a rotação é de somente 90° (tornando-se necessário um maior número de

repetições da raspagem durante o processo). As taxas de perfuração giram em torno

de 0,33 mm por dia para muricídeos e 0,54 mm por dia para naticídeos, variando de

acordo com a espécie de gastrópodo. Estas baixas taxas fazem com que um furo

21

leve em torno de três dias para ser completado, dependendo da espessura da

concha a ser perfurada (Clelland, 1999).

Essas peculiaridades se refletem nas morfologias das estruturas resultantes

(Figura 5): perfurações feitas por muricídeos apresentam um formato de cone

invertido, com a base chata, pois o material é removido uniformemente durante o

processo. Já as perfurações de naticídeos, quando incompletas, possuem uma

elevação central, pois o material é removido por partes (Bromley, 1981; Clelland,

1999).

Figura 5: Esquemas da geometria transversal das perfurações completas (esquerda) e incompletas (direita) de muricídeos (A) e naticídeos (B).

Perfurações por predação podem enfraquecer as conchas dos biválvios,

submetendo-as a tendências tafonômicas. A dimensão do furo, o número de

perfurações e ainda a sua ocorrência na valva direita ou esquerda afetam, também,

a hidrodinâmica do bioclasto. Conchas perfuradas, com densidade menor, podem

ser preferencialmente transportadas e soterradas (Walker & Goldstein, 1999).

Segundo Lorenzo & Verde (2004), esta bioerosão não é indicativa de

ambientes específicos, apenas evidencia aspectos comportamentais dos

gastrópodos predadores e registram relações interespecíficas entre estes e suas

presas. Contudo, não havendo registro do fóssil corporal do predador, a perfuração

delineia um retrato mais próximo da biodiversidade de uma assembléia.

Estas estruturas correspondem ao icnogênero Oichnus Bromley, 1981.

Podem estar presentes em biválvios, gastrópodos e outros grupos, como cirripédios

e poliquetas coloniais (sabelídeos) (Duarte & Holler, 1986).

22

4. ÁREA DE ESTUDO

As planícies costeiras são superfícies geomorfológicas deposicionais de baixo

gradiente, formadas por sedimentação predominantemente subaquosa, que

margeiam corpos de água de grandes dimensões, como o mar ou oceano,

representadas comumente por faixas de terrenos recentemente (em termos

geológicos) emersos e compostos por sedimentos marinhos, continentais, flúvio-

marinhos, lagunares, paludiais, em geral de idade quaternária (Suguio, 2003).

Na região costeira do estado do Rio de Janeiro ocorre uma série de

ambientes de sedimentação quaternária gerados em sistemas deposicionais de

origem continental e transicional/marinha. Tais depósitos são mais desenvolvidos na

porção que vai de Niterói até o limite com o estado do Espírito Santo do que no setor

de Paraty até Mangaratiba. Contém sedimentos sílticos e/ou areno-argilosos ricos

em matéria orgânica, separando terraços arenosos pleistocênicos, podendo

freqüentemente conter grande quantidade de conchas de moluscos de ambientes

lagunares (Silva & Cunha, 2001).

O desenvolvimento desta planície costeira foi, em grande parte, guiado pelas

direções estruturais do embasamento, que exerceram controle sobre a formação de

baías e sobre a disposição dos remanescentes rochosos interiores às antigas baías

que passaram a receber sedimentos provenientes das terras altas (Silva & Cunha,

2001).

Neste contexto, localiza-se a região compreendida pelo Pântano da Malhada

(22°44’48”/22°47’07” S – 42°01’14”/41°59’52” W – entre os municípios de Cabo Frio

e Armação dos Búzios), uma área de quase 60.000 m² (Figuras 6, 7 e 8), que

apresenta um expressivo nível conchífero subordinado ao intervalo pelítico (Senra et

al., 2003; Senra & Silva e Silva, 2005). Este intervalo que se destaca pela sua

singularidade geológica e pelo estado de preservação ambiental resultante de um

evento transgressivo-regressivo marinho ocorrido no Holoceno (Castro et al., 2006).

Estes depósitos foram originados na formação de um grande sistema lagunar,

por ocasião da fase de submersão, que antecedeu o nível máximo de 5.100 anos

A.P.. O litoral foi invadido pelo mar, formando sistemas lagunares, que se

23

estabeleceram por detrás de ilhas-barreiras como na desembocadura do rio Paraíba

do Sul ou nos cursos inferiores dos rios Itabapoana, Macaé e São João.

Alguns pontos representam depósitos provenientes de manguezais, pois são

caracterizados por sedimentos, em geral pelíticos, localmente arenosos e, quase

sempre, ricos em matéria orgânica, podendo conter fragmentos de madeira e

conchas de moluscos (Martin et al., 1997). Durante esse período, o nível relativo do

mar na região do Pântano da Malhada situava-se em torno de 5,0 m acima do nível

atual no centro da paleolaguna e 0,5 m na borda (Castro et al., 2006).

Análises anteriores efetuadas no Pântano da Malhada registraram sedimentos

estuarinos, que correspondem parcialmente à atual planície litorânea de Cabo Frio,

acumulados diretamente sobre rochas do embasamento cristalino ou do Grupo

Barreiras (Senra et al., 2002). A biodiversidade das assembléias e sua análise

tafonômica mostram que pertencem a sub-ambientes relacionados aos diferentes

eventos de inundação marinha (Senra et al., 2005).

A seqüência sedimentar na área da planície litorânea de Cabo Frio contém

intervalos pelíticos, arenosos e bioclastos intercalados (Figura 7). O ambiente

deposicional foi interpretado como um ambiente estuarino com manguezal a

hipersalino, e uma laguna hipohalina e fluvial com base na microfauna de

foraminíferos obtidos em duas localidades (Rodrigues & Carvalho, 1980). Senra et

al. (2002) sugerem ambiente lagunar e, posteriormente, Bernardes & Senra (2006)

reconheceram condições estuarinas conforme a distribuição da malacofauna.

Embora não existam dados concretos sobre a causa da mortandade

generalizada das espécies de conchas, atribui-se a mesma a uma rápida regressão

ocorrida por volta de 4.900 anos A.P., gerando possivelmente condições de

hipersalinidade. O depósito de coquina situado a aproximadamente 4,0 m acima do

nível do mar atual representa evidência inquestionável de nível marinho pretérito

mais elevado (Castro et al., 2006).

24

Figura 6: Mapa de localização da área de estudo (Pântano da Malhada). Fonte: CPRM, 2001 (adaptado).

Falha Contracional

25

Figura 7: Perfil sedimentar da área de estudo.

4.1. LOCALIDADES DE COLETA

4.1.1. Reserva Tauá (22°45’45” S, 41°59’52” W)

O intervalo sedimentar é composto por argila cinza na base, seguido de um

depósito bioclasto-suportado (Figura 8B e C), densamente empacotado, a uma

profundidade de 40 cm, sobreposto por argila castanho-avermelhada, seguida uma

camada de turfosa no topo.

Neste local foram identificados os biválvios Anomalocardia brasiliana,

Dendostrea frons, Tellina sp., Ostrea cf. puelchama; os gastrópodos Bulla striata,

Nassarius vibex, Neritina virginea, Odostomia canaliculata, Acteocina candeii, e o

escafópodo Antalis disparile.

26

4.1.2. Sítio da Paz (22°45’31” S, 41°59’50” W)

Na localidade o perfil sedimentar amostrado apresenta 1,80 m de argila cinza

com o nível de bioclastos intercalado a uma profundidade de 0,40 m. A

concentração de conchas é matriz-suportada argilosa, fortemente empacotada

(Figura 8D e F). Das três localidades é a que apresentou menor diversidade nas

amostras obtidas das coletas mecânicas, enquanto a coleta manual evidenciou

espécies ainda não registradas na região.

Foram identificadas nesta localidade os biválvios Anomalocardia brasiliana,

Tellina sp., Protothaca antiqua, Lucina pectinata, Ostrea cf. puelchana e Crassostrea

rhizophorae; os gastrópodos Bulla striata e Mitrella albovittata e o escafópodo Antalis

disparile.

4.1.3. Fazenda Junqueira (22°44’55” S, 42°01’20” W)

A concentração de conchas é moderadamente empacotada, bioclasto

suportada, em matriz areno-argilosa, onde a fração areia está presente em cerca de

50% da matriz (Figura 8E). Nela foram identificados os biválvios Anomalocardia

brasiliana, Crassostrea rhizophorae, Ostrea cf. puelchana, Lucina pectinata, Tellina

sp., Protothaca antiqua, Anadara cheminitz, A. brasiliana, A. ovalis, os gastrópodos

Bulla striata, Cerithium atratum, Neritina virginea e o escafópodo Antalis disparile.

27

Figura 8: Imagens da área de estudo. (A) Vista geral do Pântano da Malhada; (B) afloramento na Reserva Tauá; (C) seção da coquina na Reserva Tauá; (D) seção da coquina no sítio da Paz; (E) Fazenda Junqueira, ponto de coleta próximo ao canal de drenagem do rio Uma; (F) ponto de coleta do sítio da Paz próximo ao canal de drenagem.

28

5. MATERIAIS E MÉTODOS

5.1. Coleta do material

As coletas foram realizadas durante as campanhas bianuais do Núcleo de

Estudos Tafonômicos-NEST/UNIRIO, entre outubro de 2002 e setembro de 2006,

fornecendo um total de oito amostras das seguintes localidades: Reserva Tauá, sítio

da Paz e fazenda Junqueira. Os procedimentos de campo incluíram medições dos

intervalos sedimentares, verificação de coordenadas geográficas (GPR) e análise

das propriedades tafonômicas.

Para designação das localidades, adotaram-se os sinais: #RT: Reserva Tauá,

#SP: sítio da Paz, #FJ: fazenda Junqueira.

Nas coletas da Reserva Tauá e Fazenda Junqueira, foram empregadas

cavadeiras manuais e o material foi acondicionado em embalagens plásticas

rotuladas. No Sítio da Paz, a coleta foi realizada com uma retroescavadeira para

retirar amostras de 68 dm3 de sedimento, das quais foram analisados 2 kg de cada.

5.2. Tratamento laboratorial

O tratamento laboratorial para todas as amostras consistiu de lavagem em

água corrente, peneiramento, triagem manual e identificação dos bioclastos até o

nível de espécie (quando possível) e análise de feições tafonômicas bioerosivas.

Foram considerados apenas os exemplares com umbo e eixo antero-posterior

completos medindo no mínimo 6,00 mm. Como o grau de desarticulação dos

biválvios não foi considerado, os termos valva e concha são empregados como

sinônimos, embora na prática tenham significados diferentes.

A análise das bioerosões nas conchas de A. brasiliana englobou: (a) medida

em milímetros do eixo antero-posterior, utilizando um paquímetro com erro de leitura

de 0,05 mm; (b) valva direita ou esquerda; (c) localização da bioerosão de acordo no

diagrama por setores (Figura 9A); e (d) identificação do tipo de perfuração (furos

29

isolados, canais em forma de U ou galerias cameradas). Já nas conchas dos

ostreóideos, consideraram-se as seguintes características: (a) medida do eixo umbo-

palial; (b) valva direita (superior) ou esquerda (inferior); (c) localização da bioerosão

de acordo com o diagrama setorizado (Figura 9B); (d) presença ou ausência de

bioerosão nas faces externa (periostraco) e interna (hipostraco) da valva; (e)

identificação do tipo de perfuração.

Figura 9: Esquemas de mediação dos eixos de (a) A. brasiliana e (b) ostreóideos. Legenda:EAP- eixo antero-posterior, EUP- eixo umbo-palial.

Para a localização das perfurações ocasionadas por poliquetas e

gastrópodos, foi elaborado um diagrama de setorização da superfície das valvas.

Para A. brasiliana, estipularam-se nove setores (Figura 10A), assim denominados:

antero-dorsal (AD), dorsal (D), postero-dorsal (PD), anterior (A), central (C), posterior

(P), antero-ventral (AV), ventral (V), postero-ventral (PV). Nos ostreóideos dois

setores (Figura 10B): central, englobando o centro da valva e seu umbo (C), e

marginal, periferia da valva (M).

A diferença nos diagramas de setorização se deve à morfologia funcional de

cada grupo estudado (Figuras 11 e 12). Os biválvios venerídeos, ao qual pertence

à espécie A. brasiliana, apresentam hábito endobentônico semi-endobentônico,

projetando sua região posterior, onde estão posicionados seus sifões inalante e

exalante, para fora do sedimento. Já os biválvios ostreóideos possuem hábito

epibentônico, com a valva esquerda (inferior) se fixando ao substrato e a valva

A B

30

direita (superior) livre. Provocam, a partir de movimentos de abrir e fechar da valva

superior, a criação de uma bolsa dentro da cavidade do manto, onde ocorre a

movimentação da água, que se faz ao redor de toda a margem da valva.

Figura 10: Diagrama de setores para as valvas de (a) A. brasiliana e (b) ostreóideos (abreviações no texto).

Devido também à grande plasticidade morfológica das conchas de

ostreóideos, a medida do eixo antero-posterior não foi considerada, por não

representar com fidelidade a idade do indivíduo.

As ampolas nacaradas e perfurações de poliquetas foram quantificadas de

acordo com os seguintes parâmetros: raro, para conchas com infestação/perfuração

<10%; moderado, entre >10% <40%; e abundante, >40%.

A geometria das galerias produzidas por poliquetas foi classificada em

formato em U, ramificado ou linear, bem como entre transfixantes ou não.

A identificação das estruturas bioerosivas dentro da icnologia se deu através

da comparação dos dados morfológicos analisados com bibliografia específica de

descrição dos icnogêneros e icnoespécies (Häntzschel, 1975; Bromley, 1981;

Bromley & D’Alessandro, 1983, 1984).

A B

31

Figura 11: Esquema de um indivíduo de A. brasiliana em posição de vida no sedimento. As setas simbolizam as correntes hídricas criadas pelos sifões inalante e exalante.

Figura 12: Esquema de um indivíduo de C. rhizophorae em posição de vida. As setas escuras simbolizam os movimentos da valva superior, as setas claras simbolizam as correntes hídricas criadas pelo manto.

32

As estruturas bioerosivas representativas foram fotografadas em microscópio

estereoscópio da marca Olympus (modelo XTZ-5) com o auxílio do programa Image-

Pro Plus® versão 5.1.1.38, que também auxiliou nas medições digitais das

estruturas.

5.3. Tratamento estatístico

Os dados quantitativos e qualitativos das bioerosões inseridos no Microsoft

Excel serviram de base para a confecção de gráficos no programa RGui de

estatística, que possibilitou a construção de histogramas e boxplot’s, bem como

gráficos no próprio Microsoft Excel.

Os histogramas mostram como se comportam variáveis numéricas contínuas

(medidas dos eixos) e os boxplot´s mostram como essas dados se distribuem em

grupos definidos por variáveis qualitativas (e.g.: presença e ausência de bioerosão).

Além do cálculo das freqüências da bioerosão, utilizou-se teste de hipótese

onde se verificou a diferença entre duas amostras de uma mesma população. Para

isto, nos baseamos em duas possibilidades: a hipótese nula (H0), que considera não

haver diferença entre as amostras, e a hipótese alternativa (H1), que julga as duas

amostras diferentes. Quando p > 0,10, é possível afirmar que as amostras são iguais

e aceitar H0. Do contrário se p < 0,10, as amostras têm uma diferença significativa. O

valor p representa a possibilidade de se estar errando ou não na escolha das

hipóteses. Para o teste das hipóteses, foram utilizados os testes Kruskal-Wallis.

O teste Kruskal-Wallis verifica a diferença entre amostras a partir de um valor

estatístico calculado com a ordenação dos valores das amostras. Este teste é

utilizado quando a população é considerada não paramétrica, ou seja, não segue um

parâmetro definido.

33

6. Resultados

O exame das estruturas bioerosivas com base na geometria estrutural e

morfologia evidenciou seis icnoespécies dentro de quatro icnogêneros a seguir

descritos.

6.1. Icnotaxonomia

Icnogênero Entobia Bronn, 1837

Icnoespécie-tipo: Entobia cretacea Portlock, 1843

Classificação etológica: Domichnia.

Distribuição estratigráfica: Devoniano ao Holoceno.

Diagnose: Perfuração em substratos carbonáticos, consistindo de câmaras únicas

ou cadeias/redes de galerias conectadas a superfície do substrato por poucas ou

numerosas aberturas. A morfologia é fortemente modificada pela sua ontogenia. As

galerias apresentam um aumento progressivo no diâmetro durante o crescimento,

em algumas formas, as dilatações, a distâncias mais ou menos regulares, produzem

um sistema de câmaras próximas e interconectadas (“cameração”), porém em

algumas formas estruturais esta característica não se faz presente. A superfície

interna da perfuração possui uma microestrutura cuspidada que pode ser perdida em

espécimes mais maduros. Finas apófises podem aparecer em todas ou na maioria

das superfícies do sistema (Bromley & D’Alessandro, 1984).

34

Entobia paradoxa (Fischer, 1868)

Estampa 01: Fig. C, D, E e F, Estampa 04: Fig. E e F.

Diagnose: Perfuração camerada, composta nos estágios mais maduros por uma

rede de câmaras muito irregulares, com uma morfologia amebóide, com arranjo em

duas séries paralelas a superfície do substrato. Todas as câmaras são

interconectadas e o formato se torna extremamente irregular devido ao afunilamento,

como pescoços de diversos comprimentos nos espaços de substrato que separam

cada câmara da sua vizinha. Em formas mais maduras, uma fusão parcial das

câmaras permite a formação de galerias não cameradas, usualmente variável em

diâmetro e ausente de características diagnósticas. Possui aberturas com formas

circulares, geralmente com baixa densidade na superfície (Bromley & D’Alessandro,

1984).

Descrição: Câmaras de geometria muito irregular, dispostas de forma a ocupar o

máximo de espaço no substrato. Canais intercamerais reduzidos a orifícios que

comunicam a câmaras vizinhas, ou, algumas vezes, modificados em pescoços

alargados das câmaras. Nem todas as câmaras se conectam à superfície, as que

possuem conexão para o exterior a fazem por orifícios ou, com menor freqüência

através de um curto canal de abertura. Algumas câmaras estão fusionadas gerando

galerias de geometria amebóide.

Comentários: Os espécimes de A. brasiliana apresentaram estruturas do tipo E.

paradoxa, com câmaras irregulares distribuindo-se pelo interior da concha, em

estágios ontogenéticos, que segundo a classificação de Bromley & D’Alessandro

(1984) variaram da Fase A até a Fase D, não ocorrendo a Fase E. Ao microscópio

estereoscópio as faces internas das perfurações, mostraram uma microescultura em

forma de pequenas fossas semicirculares justapostas, de superfície polida com raio

(r) entre 37,97 m e 56,96 m e área média de 7.862,63 m² (Estampa 01: Figura

E).

35

Entobia laquea Bromley & D’Alessandro, 1984

Estampa 01: Fig. A e B; Estampa 02: Fig. A; Estampa 04: Fig. C e D.

Diagnose: Perfuração camerada composta, nos estágios maduros, por redes e

tramas de pequenas câmaras dispostas em séries subparalelas à superfície do

substrato. As câmaras, variáveis em formato, se afunilam abruptamente perto das

constrições que as separam das outras câmaras vizinhas. Elas estão organizadas

em cadeias curtas, mais ou menos arqueadas, que circundam pequenos espaços de

uma forma que lembram pequenos laços. As aberturas, de formatos circulares,

raramente fusionadas e ovaladas, são pequenas, numerosas e com distribuição

irregular, abrindo-se diretamente na câmara ou em um diminuto canal de abertura

(Bromley & D’Alessandro, 1984).

Descrição: Perfuração com câmaras de geometria esférica a subesférica,

distribuídas em séries que lembram cordões de contas dispostas paralelamente e a

superfície do substrato com sinuosidade dentro do substrato. Aberturas pequenas e

circulares, dispostas aleatoriamente na superfície. Canais de abertura muito curtos

ou inexistentes. Câmaras muito próximas umas das outras, fazendo com que os

canais intercamerais sejam curtos, ou mesmo, se apresentem como uma pequena

constrição entre duas câmaras vizinhas. Em alguns pontos ocorre a fusão de duas

câmaras devido ao alargamento das mesmas.

Comentários: Estrutura encontrada em conchas de C. rhizopharae e O. cf.

puelchana. A visualização da parte interna da perfuração foi facilitada pelo grau de

preservação dos bioclastos que apresenta lamelas que se desprendem umas das

outras expondo as camadas mais internas da concha. As faces internas das

câmaras se apresentaram de forma polida, sem a presença de uma microescultura

característica. As câmaras possuíam diâmetros variando entre 0,21 mm e 0,78 mm

(média 0,46 mm) com volume médio de 0,23 mm³ e suas aberturas (para o exterior)

possuíam raio variando entre 34,3 m e 240,5 m, com média de 182,0 m. Entobia

36

laquea é facilmente confundida com E. geometrica, se diferenciando da segunda

apenas pelo seu menor tamanho das câmaras. As conchas de C. rhizophorae

provenientes da fazenda Junqueira não possuem estruturas bioerosivas produzidas

por esponjas.

Icnogênero Caulostrepsis Clarke, 1908

Icnoespécie-tipo: Caulostrepsis taeniola Clarke, 1908

Classificação etológica: Domichnia.

Distribuição estratigráfica: Devoniano Inferior ao Holoceno.

Diagnose: Estruturas perfurantes tubulares, totalmente inseridas no substrato com

formato de bolsa ou orelha, produzidas por uma galeria moldada em U, possuindo

abertura única para o exterior. A superfície interna da perfuração se mostra polida,

sem qualquer ornamentação. Estruturas mais complexas podem ser produzidas pelo

desenvolvimento de múltiplos lóbulos no plano básico do U. Os ramos da galeria

podem ser distinguíveis através de toda sua extensão e separados por um tabique

central ou podem se fusionar formando uma bolsa oval ou achatada sem separação

central. Podem ocorrer estados intermediários envolvendo uma depressão axial. Na

porção distal a largura é no mínimo o dobro da espessura, o corte transversal pode

mostrar uma geometria oval-comprimida, elíptica, formato em oito ou semelhante a

um halter. Na abertura a largura é notavelmente menor que na porção distal, mas o

corte transversal deve ter o mesmo formato do corte transversal da porção proximal.

Ela pode ser modificada por ramificações superficiais ou depressões em forma da

calha, normalmente de dois a quatro divergindo da abertura (Bromley &

D’Alessandro, 1983).

Comentários: Caulostrepsis engloba seis icnoespécies e se diferencia de

Trypanites por apresentar dupla abertura ou seção transversal achatada, e de

37

Maeandropolydora pela ausência de galerias cilíndricas bem desenvolvidas e por

possuir os ramos paralelos ao longo de toda sua extensão.

Caulostrepsis taeniola, Clarke 1908

Estampa 02: Fig. C; Estampa 04: Fig. A, B e C; Estampa 05: Fig. A, B, C, D e E.

Diagnose: Galeria cilíndrica, disposta em formato de U estreito que algumas vezes

se alarga tomando um aspecto de língua. As faces internas do centro da perfuração

estão sempre interconectadas por um tabique. As galerias se fusionam próximas à

abertura. Corte transversal mediano em formato de halter e da abertura em formato

de 8 (Bromley & D’Alessandro, 1983).

Descrição: Estrutura perfurante composta por uma galeria cilíndrica dobrada ao

meio formando um U, podendo ás vezes se mostrar sinuosa ao longo do interior do

substrato. Corre paralela ao substrato em extensões variáveis, podendo às vezes

mudar de direção e atravessar a concha perpendicularmente (transfixante), entrando

em contato com sua superfície interna. As faces internas interiores da estrutura se

conectam por um pequeno espaço, formando, assim, um tabique (e não um septo

completo) que separa os dois ramos da perfuração. O corte transversal ao longo do

corpo da estrutura bem como da abertura se mostra com forma de 8 ou halter, na

região distal (base do U) sempre em forma de halter, onde há a formação de uma

pequena bolsa. A abertura pode ser perpendicular ao substrato ou formar um ângulo

inclinado em relação a ele, dando origem a pequenas calhas antes que se aprofunde

no substrato.

Comentários: Estrutura encontrada nas três espécies de moluscos estudadas. Sua

extensão e sinuosidade estão relacionadas ao tamanho da concha e disponibilidade

de substrato para a perfuração. Em alguns casos estava associado a estruturas

denominadas ampola nacarada, estrutura esta que é a resposta do molusco ao

ataque do organismo perfurador invasor. As galerias apresentaram largura média de

0,38mm (variando entre 0,23 mm e 0,53 mm) com o tabique central tendo largura

média de 0,26 mm (variando entre 0,12 mm e 0,34 mm).

38

Icnogênero Maeandropolydora Voigt, 1965

Icnoespécie-tipo: Maeandropolydora decipiens Voigt, 1965

Classificação etológica: Domichnia.

Distribuição estratigráfica: Cretáceo ao Holoceno.

Diagnose: Galerias longas e cilíndricas contendo duas ou mais aberturas, entrando

através do substrato sinuosamente, ou em contorções irregulares. As galerias

podem estar em contanto, paralelas entre si em pares, com ou sem fusão. Podem

ocorrer pequenos ou grandes giros, os ramos podem estar separados pelo tabique

ou formar uma bolsa (Bromley & D’Alessandro, 1983).

Comentários: Maeandropolydora se diferencia de Caulostrepsis por apresentar

duas aberturas distintas em posições não fusionadas.

Maeandropolydora aff. sulcans Voigt, 1965

Estampa 02: Fig. F; Estampa 05: Fig. C e D.

Diagnose: Galeria cilíndrica apresentando pelo menos duas aberturas,

irregularmente contorcida, geralmente disposta em curvas, nunca apresentando

fusão onde as paredes exibem contato mútuo; tabique ausente (Bromley &

D’Alessandro, 1983).

Descrição: Estruturas perfurantes em forma de calha, como a metade de um cilindro

esculpida no substrato formando curvas e voltas assimétricas. Diâmetro constante,

39

direção constante paralela à superfície, comprimento variável. Profundidades

variáveis, desde pequenas ranhuras no substrato até fossas moderadamente

profundas bem delimitadas, em alguns casos a perfuração entra no substrato

chegando a formar galerias internas.

Comentários: Diferentemente das estruturas descritas em Bromley & D’Alessandro

(1983), as presentes no Pântano da Malhada se apresentam pequenas e algumas

vezes associadas a perfurações do tipo Caulostrepsis, indicando que talvez sejam

perfurações incompletas deste icnogênero. Possuem pouca sinuosidade e larguras

que variavam entre 0,37 mm e 0,30 mm com média de 0,34 mm.

Icnogênero Oichnus Bromley, 1981

Icnoespécie-tipo: Oichnus simplex Bromley, 1981

Classificação etológica: Praedichnia.

Distribuição estratigráfica: Cambriano ao Holoceno.

Diagnose: Furos com geometria de circular a subcircular, de origem biogênica em

substratos duros. A perfuração pode atravessar o substrato penetrando-o, ou

simplesmente terminar dentro dele como uma depressão rasa ou profunda (Bromley,

1981).

Comentários: Por se tratarem de estruturas de origem predatória ou parasitária

(Bromley, 1981; Baumiller, 1996; Nielsen et al., 2003), são restritas a substratos

carbonáticos esqueletais, como conchas de moluscos e braquiópodes, tecas de

foraminíferos e carapaças de equinodermos.

40

Oichnus simplex Bromley, 1981

Estampa 03: Fig. B, D e E.

Diagnose: Oichnus possuindo forma circular ou subcircular simples, eixo mais ou

menos perpendicular a superfície do substrato. Quando esta estrutura não penetra

por completo o substrato o final distal é achatada e hemisférica (Bromley, 1981).

Descrição: Furos circulares, cônicos, perpendiculares à superfície da concha,

atravessando-a de um lado ao outro. Diâmetro do furo na face externa da concha

(periostraco) sempre maior que o diâmetro na face interna (hipostraco). Paredes

lisas sem ornamentações, ou evidenciando a microestrutura da concha.

Comentários: Estruturas presentes em A. brasiliana, C. rhizophorae e O. cf.

puelchana. No material estudado ocorre sempre de maneira individual e completa

(com sucesso), nunca em duplicidade, preferencialmente no centro das valvas de

venerídeos e em ostreóideos nas proximidades das margens. O diâmetro da

circunferência externa apresentou medidas entre 2,24 mm e 3,08 mm e o diâmetro

da circunferência interna apresentou medidas entre 1,68 mm e 2,40 mm.

Oichnus paraboloides Bromley, 1981

Estampa 03: Fig. A, C e F.

Diagnose: Oichnus tendo um formato esférico parabolóide, truncado, nos casos em

que a perfuração atravessa diretamente o substrato (Bromley, 1981).

Descrição: Furos circulares e semicirculares, parabólicos ou esféricos,

perpendiculares à superfície da concha, atravessando-a de um lado ao outro, ou

41

terminado em fundo cego com pequena elevação central. Diâmetro do furo na face

externa da concha (periostraco) sempre maior que o diâmetro do final da perfuração.

Paredes parabólicas, lisas sem ornamentações, ou evidenciando a ultraestrutura da

concha.

Comentários: Estruturas presentes nas três espécies estudadas. Ocorrem sempre

de maneira única, nunca em duplicidade e distribuição nas conchas similar a O.

simplex. Dois exemplares representavam tentativa de predação sem sucesso, pois o

furo não chegava a atravessar a concha por completo (Estampa 03: Figuras C e D).

Diâmetro externo com tamanho máximo de 3,48 mm e mínimo de 2,12 mm ,

diâmetro interno (nos furos completos) com medida máxima de 1,74 mm e 2,26 mm.

6.2. Análise quantitativa das populações de moluscos representadas nas

coquinas

As amostras provenientes das localidades forneceram exemplares (#RT:

n=1216, #SP: n=308, #FJ: n=172) de A. brasiliana, cujas medidas do EAP

demonstraram a estrutura etária da população estudada (Figura 13).

Figura 13: Histogramas de distribuição das medidas do eixo antero-posterior de A. brasiliana nas três localidades.

Para o total de estrutura bioerosivas encontradas em A. brasiliana a

perfuração por esponja apresentou 18,75%, perfuração por poliquetas 79,75% e

predação por gastrópodo 1,50%.

42

Figura 14: Freqüências das estruturas bioerosivas de cada produtor, em A. brasiliana bioerodidas por localidade de coleta (abreviações no texto).

Figura 15: Freqüências das estruturas bioerosivas de cada produtor em valvas bioerodidas de ostreóideos por localidade de coleta. Legenda: Cr: C. rhizophorae, Op: O. cf. puelchana (demais abreviações no texto).

Para os ostreóideos as estruturas bioerosivas se comportaram da seguinte

forma: 3,45%; 71,43% e 25,125 de esponjas, poliquetas e gastrópodos

respectivamente.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

#RT #SP #FJ Total

Esponja

Poliqueta

Gastrópodo

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Cr #SP Cr #FJ Op #FJ Total

Esponja

Poliqueta

Gastrópodo

43

6.3. Análise quantitativa das estruturas bioerosivas

A partir das medições obtidas do eixos EAP (de A. brasiliana nas três

localidades) e EUP (C. rhizophorae de #SP), e do registro dos traços de perfuração

obtiveram-se os diagramas boxplot´s indicando as diferenças nos subgrupos

ausente e presente (Figuras 16 e 17).

Figura 16: Boxplot’s de distribuição das valvas de A. brasiliana nas localidades agrupadas segundo presença e ausência bioerosão de esponja e poliquetas.

44

As diferenças entre os grupos ausente e presente para as bioerosões de

esponjas em A. brasiliana foram corroborados pelo teste Krukal-Wallis que apontou

os seguintes valores de p: 1,72∙10-4 e 0,028 para #RT e #FJ respectivamente. Este

mesmo teste desconsiderou a diferença entre os grupos ausente e presente de

perfuração de esponjas em #SP com valor de p igual a 0,84.

Para as bioerosões de poliquetas em A. brasiliana o teste apontou os

seguintes valores de p: 2,47∙10-6; 9,7∙10-3 e 0,009 em #RT, #SP e #FJ

respectivamente para os grupos ausente e presente.

Figura 17: Boxplot’s de distribuição das valvas direitas e esquerdas de C. rhizophorae de #SP agrupadas por bioerosões de esponja e poliquetas e em ausente e presentes.

45

Um exemplar de C. rhizophorae apresenta pequenos pontos elevados em sua

face interna (hipostraco) conforme a (Estampa 02: Figura B), interpretada como

ampola nacarada, resposta às perfurações por esponja.

6.4. Distribuição espacial da bioerosão produzida por poliquetas

As estruturas produzidas por poliquetas são as mais abundantes em relação

as demais estruturas.

Comparações entre as taxas de bioerosão por poliquetas nas valvas direita e

esquerda de A. brasiliana, não demonstraram variações, nem entre as localidades,

porém há uma acentuada diferença entre os setores da concha afetados (Apêndice

01: Tabela 03, Figura 18).

Figura 18: Freqüências dos setores com estruturas bioerosivas de poliquetas em A. brasiliana em (a) #RT, (b) #SP, (c) #FJ e (d) total das amostras (maior porcentagem em vermelho e segunda maior em laranja).

46

Ocorrem diferenças também nas freqüências dos setores das conchas de

ostreóideos que apresentam as bioerosões de poliquetas, bem como nas faces

interna (hipostraco) e externa (periostraco) das mesmas (Figuras 19, 20 e 21).

Figura 19: Freqüências das conchas com estruturas bioerosivas de poliquetas nos setores central e marginal, tanto no periostraco quanto no hipostraco em C. rhizophorae e O. cf. puelchana (porcentagem em azul simboliza a freqüência de conchas com estruturas pressentes nos dois setores, o negrito simboliza as maiores freqüências).

47

Figura 20: Freqüências das bioerosões por poliquetas na face externa (periostraco) nas valvas de ostreóideos de acordo com a quantidade de estruturas encontradas (raro, moderado e abundante).

Figura 21: Freqüências das bioerosões por poliquetas na face interna (hipostraco) nas valvas de ostreóideos de acordo com a quantidade de estruturas encontradas (raro, moderado e abundante).

0%

20%

40%

60%

80%

100%

direita esquerda direita esquerda

C. rhizophorae O. cf. puelchana

raro

moderado

abundante

0%

20%

40%

60%

80%

100%

direita esquerda direita esquerda

C. rhizophorae O. cf. puelchana

raro

moderado

abundante

48

7. DISCUSSÃO

A distribuição das medidas do eixo antero-posterior dos exemplares de A.

brasiliana convertida aos histogramas demonstra padrão populacional normal da

espécie onde predomina o número de formas jovens, reportando ainda o episódio de

morte não seletiva ou catastrófica. A representação para #FJ é invertida, com

predomínio de formas adultas, fato que pode ser explicado pelo tipo de material

coletado no entorno de tocas de crustáceos decápodes. Estes artrópodes

remobilizam bioclastos do nível de conchas até 20 cm abaixo da superfície, como

registrado na planície costeira do Paraná (Ângulo et al., 2002). Tal fato, não invalida

o estudo das perfurações tendo em vista que há representatividade de todas as

classes de tamanho e o material provém das coquinas, ou seja, têm a mesma

origem que os demais, considerando sua ampla distribuição horizontal.

Conchas de A. brasiliana de #RT com medidas do eixo antero-posterior entre

6,00 mm e 34,15 mm, média de 14,51 mm e mediana de 12,00 mm (Apêndice 01:

Tabela 01). Apresentam 4,84% bioerosão por esponjas, 22,91% bioerosão por

poliquetas e 0,16% predação por gastrópodo.

Em #SP as valvas de A. brasiliana têm as medidas do eixo antero-posterior

entre 6,00 mm e 31,00 mm, média de 14,55 mm e mediana de 13,00 mm; e 0,65%

possuíam bioerosão por esponjas, 9,42% bioerosão por poliquetas e 0,32%

predação por gastrópodo. Conchas de C. rhizophorae têm as medidas do eixo

umbo-palial entre 21,00 mm e 133,00 mm, com média de 57,08 mm e mediana de

57,00 mm (Apêndice 01: Tabela 01), 11,68% registraram bioerosão por esponjas,

33,23% bioerosão por poliquetas e 1,20% predação por gastrópodo.

Na localidade de #FJ as valvas de A. brasiliana têm as medidas do eixo

antero-posterior variando entre 7,00 mm e 32,05 mm, média de 20,45 mm e mediana

de 22,00 mm (Apêndice 01: Tabela 01), das quais 8,14% apresentavam bioerosão

por esponjas, 6,40% bioerosão por poliquetas e 1,74% predação por gastrópodo. As

conchas de C. rhizophorae apresentam as medidas do eixo umbo-palial entre 11,00

mm e 68,00 mm, média de 38,95 mm e mediana de 40,00 mm (Apêndice 01: Tabela

01), 63,16% possuíam bioerosão por poliquetas. As valvas de O. cf. puelchana

49

apresentam as medidas do eixo umbo-palial entre 9,00 mm e 33,00 mm, com média

de 17,92 mm e mediana de 17,00 mm (Apêndice 01: Tabela 01), 24,49% tem

bioerosão por esponjas, 44,90% por poliquetas e 6,12% predação por gastrópodo.

A bioerosão por esponja teve maior expressão nas valvas esquerdas do que

nas direitas (Apêndice 01: Tabela 02), tanto para a espécie C. rhizophorae (16,46%

contra 7,06%, respectivamente), quanto para O. cf. puelchana (33,33% contra

10,53%, respectivamente).

Os estágios são comuns a todas as esponjas com hábito perfurador, como

apontado por Bromley & D’Alessandro (1984) que designaram cinco fases de

crescimento, as iniciais são definidas por finos canais exploratórios radiais e a última

representada por fusão das câmaras ou sistema de túneis extensos. Em razão disso

a icnotaxonomia fica prejudicada nas duas fases sendo a classificação

icnoespecífica de Entobia possível nas fases B, C e D.

A microescultura observada nas faces internas das câmaras de Entobia

paradoxa apresenta um padrão estrutural semelhante à microescultura produzida

pela esponja perfurante do gênero Cliona durante o ato escavador, conforme

demonstrado por Calcinai et al. (2003).

A ausência da microescultura das câmaras de Entobia nas valvas de

ostreídeos, deve-se provavelmente ao padrão lamelar de crescimento da concha,

que dificulta sua preservação.

Em A. brasiliana a região posterior das valvas apresenta maior freqüência de

aberturas de tubos de poliquetas: 58,64%, no setor posterior; 17,28%, no setor

postero-dorsal e 7,82%, no setor dorsal. Enquanto que a região ventral apresenta

baixa freqüência de perfurações: 2,67%, setor anterior; 0,41%, setor antero-ventral e

3,29%, setor ventral. Estruturas de ampola nacarada foram observadas em 7,92%

das valvas com bioerosão por poliqueta. E perfurações transfixantes foram

observadas em 33,96% dos bioclastos (Apêndice 01: Tabela 03).

Já em C. rhizophorae foi observada uma diferença significativa nas

freqüências das valvas esquerdas e direitas afetadas pela bioerosão de poliqueta

(Apêndice 01: Tabela 04). Na localidade #SP há uma preferência por valvas direitas

(54,12%) em relação às esquerdas (11,59%), ao contrário de #FJ, que apresenta

preferência por valvas esquerdas (70,0%) em relação às valvas direitas (55,56%).

50

Porém quando observamos o total de valvas analisadas desta espécie, vimos que a

preferência é por valvas direitas (54,19%) em relação às valvas esquerdas (14,92%).

Em O. cf. puelchana a diferença entre as valvas bioerodidas mostrou-se irrelevante

(42,11% das direitas e 46,67% das esquerdas).

Estas bioerosões em C. rhizophorae apresentam localização com maior

freqüência na região periférica de ambas as valvas (68,69% para valvas direitas e

50,54% para as esquerdas); e na face externa, periostraco (95,96% para direitas e

89,25% para esquerdas), em relação à face interna, hipostraco (30,30% para as

direitas e 39,78% para as esquerdas) (Apêndice 01: Tabela 04). Estruturas de

ampola nacarada estão presentes em 41,41% das valvas direitas e 21,51% das

valvas esquerdas.

Foi observada diferença nos tamanhos das valvas de A. brasiliana utilizadas

como substrato pelas esponjas e poliquetas perfurantes, como evidenciam os

boxplot´s (Figura 15) montados a partir das medidas do eixo antero-posterior das

conchas com e sem a presença das perfurações. Fato este corroborado pelo teste

Kruskal-Wallis com valores abaixo de p abaixo de 0,10, confirmando a preferência

de valvas maiores pelos poliquetas perfurantes.

Em virtude da grande variedade morfológica apresentada por C. rhizophorae

e O. cf. puelchana causado pelo crescimento não isométrico, associado à pequena

quantidade amostral, os ostreóideos provenientes da #FJ não puderam ser

estudados estatisticamente na correlação entre estruturas bioerosivas e tamanho

das valvas.

Não foi observada diferença entre os tamanhos de conchas de C. rhizophorae

com e sem bioerosão de esponjas (Figura 16).

Em relação às demais espécies estudadas os ostreóideos mostram maiores

taxas de bioerosão provavelmente por se tratarem de espécies com hábito

epibentônico, sendo assim mais suscetíveis ao recrutamento das larvas planctônicas

de esponjas e poliquetas perfurantes.

Nas conchas de O. cf. puelchana a localização da bioerosão teve maior

freqüência na região periférica 37,50% para valvas direitas e região central 42,86%

para as esquerdas (Figura 18). A face externa (periostraco) apresentou maior

freqüência de estruturas bioerosivas tanto nas valvas direitas (100%) quanto nas

51

esquerdas (78,55%) em relação à face interna (hipostraco) (Figuras 19 e 20).

Estruturas de ampola nacarada estão presentes em 12,50% das valvas direitas e

7,16% das valvas esquerdas.

As conchas de O. cf. puelchana são planas ou até mesmo convexas o que

não permite acumulo de matéria orgânica, indispensável ao recrutamento larvar.

A preferência pela região posterior das valvas de A. brasiliana e marginal de

C. rhizophorae e O. cf. puelchana corroboram Tinoco-Orta & Cáceres-Martinez

(2003) que destacam a freqüência do poliqueta invasor por regiões da concha onde

se encontram as correntes hídricas produzidas pelos sifões ou manto.

No Sul e Sudeste brasileiro são conhecidas dez famílias de poliquetas.

Destas, a família Spionidae é representada por dez gêneros e quinze espécies, das

quais Polydora neocaeca Williams & Radashevsky, 1999 e P. cornuta Bosc, 1802

são as únicas encontradas no inteiro de galerias por ela perfuradas (Amaral et al.,

2006). As medidas do diâmetro e comprimento corporais destas espécies são

compatíveis com as medições encontras em Caulostrepsis e Maeandropolydora.

Perfurações por poliquetas geradoras de fraturas nas conchas (Estampa 05:

Figura E) não foram quantificadas, porém pôde-se observar que estas potencializam

a fragmentação dos bioclastos devido ao enfraquecimento da estrutura cristalina

original.

A presença de ampolas nacaradas representam o ataque do organismo

invasor quando o hospedeiro ainda se encontrava vivo, enquanto que perfurações

transfixantes representam o ataque quando o hospedeiro já se encontrava morto,

descaracterizando a exigência primordial de correntes hídricas ricas em nutrientes,

que explica a localização preferencial das perfurações.

A presença de pequenas elevações arredondadas (ampolas) na superfície

interna da valva de C. rhizophorae (Estampa 02: Figura B) com presença de Entobia

é interpretada como a resposta do organismo vivo ao ataque da esponja perfurante.

Ao atravessar a concha, a esponja entra em contato com o epitélio do manto do

molusco e o induz a secretar uma fina camada de conchiolina e carbonato de cálcio

para se isolar e proteger do organismo invasor, num processo parecido com aquele

formador de pérolas.

52

Não se encontrou literatura de ampolas nacaradas referentes ao ataque de

esponjas em conchas de moluscos, possivelmente devido a maioria do estudos

sobre bioerosão por esponjas abordarem substratos coralíneos.

As perfurações atribuídas à atividade predatória de gastrópodos muricídeos

(Oichnus simplex) foram provavelmente produzidas pela espécie Stramonita

haemastoma (Linnaeus, 1767), gastrópodo carnívoro pertencente à família

Muricidae, que apresenta registro nos sedimentos provenientes do Pântano da

Malhada.

Em A. brasiliana as perfurações se localizavam preferencialmente na região

central da valva, com um exemplar ocorrendo na região dorsal (umbonal). Possuíam

raio da circunferência externa máximo de 1,72 mm e mínimo de 1,13 mm, e da

circunferência interna máximo de 1,20 mm e mínimo de 0,84 mm. Todas as

estruturas estavam completas, e a razão entre os raios externo e interno girou em

torno de 1,38.

Já em C. rhizophorae e O. cf. puelchana estas estruturas ocorrerem sempre

na valva direita (superior), preferencialmente, na região marginal. Possuem raio

máximo externo de 1,16 mm e mínimo de 1,09 mm, o raio da circunferência interno,

quando o furo era completo, apresentava medida máxima de 0,92 mm e mínima de

0,87 mm, com razão média de 1,28 entre os raios da circunferência externa e

interna.

O. cf. puelchana é uma ostra com pequenas dimensões e relativamente

delgada, e os exemplares de Stramonita haemastoma, seu possível predador são

também pequenos, o que explica as maiores taxas de predação, nesse biválvio.

O possível produtor das estruturas O. parabolóides não pôde ser deduzido,

porém acredita-se que seja pertencente à família Naticidae, sem representante nos

sedimentos das localidades por se tratar de uma espécie de corpo mole.

53

8 -CONCLUSÕES

A bioerosão com maior expressão observada nas amostras foi produzida por

poliquetas, seguida das produzidas por esponjas e por último, a predação por

gastrópodos.

Há uma preferência pelo local de assentamento de larvas de poliquetas na região

posterior de Anomalocardia brasiliana e marginais de Crassostrea rhizophorae e

Ostrea cf. puelchana, regiões onde se formam as correntes exalantes e inalantes

das espécies.

Valvas de Anomalocardia brasiliana adultas são selecionadas para a fixação das

larvas de polidorídeos, fato este corroborado pelos testes estatísticos,

possibilitando afirmar que os poliquetas são substrato-seletivos, ao menos em

relação ao tamanho do bioclasto.

Existem variações na morfologia de Entobia nas espécies, devido à microestrutura

das conchas.

A despeito das restrições quanto à natureza do ambiente para perfurações por

esponja, estas ocorrem associadas a poliquetas que necessitam de condições

opostas.

Conchas com traços de poliquetas e esponjas concomitantes podem sugerir que

as últimas são posteriores à presença das primeiras.

As estruturas bioerosivas do icnogênero Entobia foram produzidas pelo gênero

Cliona (Demospongiae: Hadromerida: Clionaidae), gênero que não deixou registro

microscópico nos depósitos estudados.

O padrão de perfuração de Caulostrepsis e Maeandropolydora sugere que o

organismo produtor é um polidorídeo.

Há o registro indireto de gastrópodos naticídeos representadas pelas estruturas

de Oichnus paraboloides.

A identificação das icnoespécies englobadas pelo icnogênero Entobia é

complexa, pois algumas delas apresentam características muito sutis, que podem

54

facilmente ser mascaradas pela ontogenia da perfuração e pelo estenomorfismo

imposto pelo substrato.

Ampolas nacaradas não devem ser consideradas como icnofósseis, mas sim

como estruturas representativas de paleopatologias.

Este estudo é o primeiro no registro de ampolas nacaradas como reação ao

ataque de esponjas perfurantes.

Com este estudo pode-se observar que as estruturas bioerosivas por si só não

são suficientes para uma interpretação paleoambiental precisa, porém deve-se

ressaltar a sua importância como ferramenta acessória em conjunto com outros

dados (sedimentológicos, geoquímicos, etc.) para uma reconstrução mais próxima

da realidade.

A relação entre as taxas de bioerosão de poliquetas e esponjas indica um

ambiente de águas rasas, com aporte de sedimentos finos constante e altas

concentrações de matéria orgânica, durante o Holoceno da Planície Costeira de

Cabo Frio.

55

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GLOSSÁRIO

Abertura: abertura na superfície do substrato que conecta o lúmen da perfuração com o exterior. No icnogênerio Entobia representa o ósculo da esponja vivente.

Apófises: pequenas projeções em formato de agulha que se extendem de todas as superfícies da perfuração de esponjas. Câmaras: porções dilatadas, globulares ou fusiformes, nos sistemas de perfurações por esponjas. Camerada: morfologia das perfurações de esponjas que apresentam partes alargadas ao longo dos canais, lembrando um cordão de contas, que formarão mais tarde as câmaras propriamente ditas. Canal de entrada: canais subcilíndricos ou suavemente cônicos que conectam as câmaras ou galerias com as aberturas na superfície do substrato. Canal intercameral: canais subcilíndricos que interconectam as câmaras. Canal exploratório: a porção mais juvenil da perfuração de esponja, onde predomina o crescimento linear, consistindo de canais finos e ramificados. Endolítico: qualidade do organismo que vive dentro de substratos litificados (rochas, conchas, carapaças, etc.) e que apresenta habilidade perfuradora. Estenomórfico: morfologia da perfuração que é restringida pelo espaço disponível no substrato, por exemplo conchas de moluscos. Galeria: passagem principal da perfuração, onde vive o organismo endolítico. Idiomórfico: característica peculiar a perfuração representada pelas diferenças nos grupos produtores. Microescultura: características morfológicas microscópicas da superfície da perfuração. Tabique: região central elevada em forma de mureta que divide os canais e câmaras das pefurações. Endosimbionte: organismo que vive dentro de um hospedeiro ou de sua carapaça, sem, contudo, ser prejudicial a ele. Bioimuração: do inglês bioimmuration, se trata de um modo de preservação que resulta do crescimento orgânico sobre um organismo séssil. Organismos de corpo mole (ou com pouquíssima mineralização) podem se preservar quando um outro organismo séssil (de carapaça mineralizada) cresce sobre seu corpo, formando assim um molde externo do organismo substrato.

63

Estampa 01

Figura A: Vista externa de Entobia laquea em C. rhizophorae. Figura B: Vista das câmara internas de Entobia laquea em C. rhizophorae. Figura C: Vista externa de E. paradoxa em A. brasiliana. Figura D: Corte transversal em A. brasiliana mostrando câmaras de E. paradoxa. Figura E: Microescultura da câmara de E. paradoxa em A. brasiliana. Figura F: Corte transversal em A. brasiliana mostrando câmaras de E. paradoxa. Escalas de 5mm em A, B e C; e 0,5mm em D, E e F.

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Estampa 02

Figura A: Vista externa de Entobia laquea em C. rhizophorae. Figura B: Ampolas nacaradas de esponja em C. rhizophorae. Figura C: Caulostrepsis taeniola em A. brasiliana. Figura D: Ampola nacarada (seta) de poliqueta em A. brasiliana. Figura E: Ampolas nacaradas (setas) de poliquetas em C. rhizophorae. Figura F: Maeandropolydora aff. sulcans em C. rhizophorae. Escalas de 5mm.

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Estampa 03

Figura A: O. paraboloides completo em A. brasiliana. Figura B: O. simplex completo em A. brasiliana. Figura C: O. paraboloides incompleto em O. cf. puelchana. Figura D: O. simplex incompleto em C. rhizophorae. Figura E: O. simplex completo e C. taeniola (setas) em O. cf. puelchana. Figura F: O. paraboloides completo em C. rhizophorae. Escalas de 5mm em A e B; 0,5mm em C, D, e F; 1mm em E.

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Estampa 04

Figura A: Aberturas de C. taeniola em C. rhizophorae. Figura B: C. taeniola em O. cf. puelchana. Figura C: C. taeniola associado a E. laquea em C. rhizophorae. Figura D: Fase B de E. laquea em C. rhizophorae. Figura E: Corte transversal de câmara de E. paradoxa em A. brasiliana. Figura F: E. paradoxa em A. brasiliana. Escalas de 5mm em A, B e F; 1mm em C e D; 0,5mm em E.

67

Estampa 05

Figura A: Aberturas de C. taeniola na região posteriro de A. brasiliana. Figura B: Detalhe Aberturas de C. taeniola em A. brasiliana. Figura C: A. brasiliana com C. taeniola e M. aff. sulcans. Figura D: M. aff. sulcans na região posteiror A. brasiliana. Figura E: Perfuração transfixante de poliqueta em A. brasiliana. Figura F: C. taeniola no hipostraco de A. brasiliana. Escalas de 5mm em A, B, C e D; 1cm em E e F; 0,5mm em E.

A B

C D

E F

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Apêncie 01 : Tabelas Tabela 01: Dados quantitativos de exemplares encontrados nas amostras estudadas.

Tabela 02: Valores absolutos e freqüências de valvas de ostreóideos bioerodidos por esponjas.

Espécie Valvas analisadas

Com bioerosão por esponja Com bioerosão por poliqueta

Localidade valvas direitas valvas esquerdas valvas direitas valvas esquerdas

Direitas Esquerdas Total total % total % total % total %

C. rhizophorae 170,00 164,00 334 12 7,06 27 16,46 92 54,12 19 11,58537 #SP

C. rhizophorae 9,00 10,00 19 0 0,00 0 0,00 5 55,56 7 70 #FJ

O. puelchana 19,00 30,00 49 2 10,53 10 33,33 8 42,11 14 46,66667 #FJ

Os valores dos eixos se referem às medições do eixo antero-posteiror para A. brasiliana e do eixo umbo-palial para as espécies de C. rhizophorae e O. puelchana. Legenda: #SP- Sítio da Paz e #FJ – Fazenda Junqueira.

Espécie Medidas dos eixos (mm)

Valvas

direitas

Valvas

esquerdas

Bioerosão por

Localidade Total esponja poliqueta gastrópodo

máximo mínimo média mediana total % total % Total % total % total %

A. brasiliana 33,15 6,00 14,51 12,00 622 51,07 596 48,93 59 4,84 279 22,91 2 0,16 #RT 1218

A. brasiliana 31,00 6,00 14,55 13,00 151 49,03 157 50,97 2 0,65 29 9,42 1 0,32 #SP 308

A. brasiliana 32,05 7,00 20,45 22,00 136 79,53 35 20,47 14 8,14 11 6,40 3 1,74 #FJ 171

C. rhizophorae 133,00 21,00 57,08 57,00 170 50,90 164 49,10 39 11,68 111 33,23 4 1,20 #SP 334

C. rhizophorae 68,00 11,00 38,95 40,00 9 47,37 10 52,63 0 0,00 12 63,16 0 0,00 #FJ 19

O. puelchana 33,00 9,00 17,92 17,00 19 38,78 30 61,22 12 24,49 22 44,90 3 6,12 #FJ 49

69

Tabela 03: Freqüências das estruturas bioerosivas em valvas de A. brasiliana.

Legenda: AD – antero-dorsal, D – dorsal, PD – postero-dorsal, A – anterior, C – central, P – posteiror, AV – antero-ventral, V – ventral, PV – postero-ventral, n – quantidade de bioclastos apresentando estruturas bioerosivas.

Reserva Tauá Sítio da Paz Faz. Junqueira

Total Freq.(%) n % n % n %

Valv

as

direitas 122 53,28 15 55,56 4 44,44 141 53,21

esquerdas 107 46,72 12 44,44 5 55,56 124 46,79

Lo

cali

zação

AD 3 0,70 0 0,00 0 0,00 3 0,62

D 35 8,20 3 6,12 0 0,00 38 7,82

PD 74 17,33 10 20,41 0 0,00 84 17,28

A 11 2,58 4 8,16 1 7,14 16 3,29

C 25 5,85 1 2,04 0 0,00 26 5,35

P 247 57,85 30 61,22 8 57,14 285 58,64

AV 2 0,47 0 0,00 0 0,00 2 0,41

V 12 2,81 1 2,04 0 0,00 13 2,67

PV 14 3,28 0 0,00 5 35,71 19 3,91

A. nacarada 19 8,30 1 3,70 1 11,11 21 7,92

Transfixantes 72 31,44 14 51,85 4 44,44 90 33,96

70

Tabela 04 : Freqüências das estruturas bioerosivas de poliquetas em valvas de ostreóideos.

Crassostrea rhizophorae Ostrea puelchana

direita % esquerda % direita % esquerda %

Localização

central 10 10,10 18 19,35 1 12,50 6 42,86

periferico 68 68,69 47 50,54 3 37,50 3 21,43

ambas 21 21,21 28 30,11 4 50,00 5 35,71

Periostraco

abundante 13 13,13 11 11,83 4 50,00 7 50,04

moderado 25 25,25 20 21,51 4 50,00 2 14,22

raro 57 57,58 52 55,91 0 0,00 2 14,29

total 95 95,96 83 89,25 8 100,00 11 78,55

Hipostraco

abundante 0 0,00 4 4,30 0 0,00 5 35,67

moderado 4 4,04 5 5,38 0 0,00 0 0,00

raro 26 26,26 28 30,11 0 0,00 0 0,00

total 30 30,30 37 39,78 0 0,00 5 35,67

Ampola

nacarada

abundante 4 4,04 1 1,08 0 0,00 0 0,00

moderado 9 9,09 3 3,23 0 0,00 0 0,00

raro 28 28,28 16 17,20 1 12,50 1 7,16

total 41 41,41 20 21,51 1 12,50 1 7,16