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MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

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MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

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RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA N? 12 - PE

(Registro n? 89.0008629-4)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg Recorrente: José Pereira de Araújo Filho

Recorrido: Tribunal d~ Justiça de Pernambuco Impetrado: Comandante-Geral da Polícia Militar de Pernambuco Advogado: Dr. João Monteiro de Melo Filho

EMENTA: «Administrativo. Ato discricionário.

O ato discricionário, quando motivado, fica vinculado ao motivo que lhe serviu de suporte, çom o que, se verificado ser o mesmo falso ou inexistente, deixa de subsistir. Mandado de segurança deferido».

ACÓRDÃO Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

dar provimento ao recurso para reformar a sentença e deferir o mandado de segurança, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei . . Brasília, 23 de agosto de 1989 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERB, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ARMANDO ROLLEMBERG: Mandado de Segurança requerido ao Tribunal de Justiça de Pernambuco foi ali rela-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 917

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tado pelo Desembargador Mauro Jordão de Vasconcellos, que assim suma­riou a questão posta nos autos:

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«José Pereira de Araújo Filho está devidamente qualificado na peça inicial de fi. 2, com apoio no parágrafo 21, do artigo 153, da Constituição Federal e artigo 1?, da Lei n? 1.523, de 31 de dezem­bro de 1951, impetra Mandado de Segurança contra ato do Exmo. Sr. Ce!. da Polícia Militar, Walter Benjamin de Medeiros, devida­mente qualificado ria referida peça processual.

Alega o impetrante o seguinte: que prestou concurso público para ingressar no Curso de Formação de Sargentos, curso que após oito meses de duração, facultaria promoção automática à gradua­ção de 3? Sargento PM, foi divulgado na imprensa falada e escrita da Capital e teve as suas normas publicadas em Boletim do Coman­do Geral, resultando terem sido inscritos cerca de 3.800 homens.

Satisfeitas as condições de inscrição, fora o impetrante subme­tido á todas as provas, logrando aprovação entre os vinte primeiros classificados, sendo, em conseqüência, matriculado; decorridos mais de dois meses de atividade em que o impetrante. enfrentou as mais sérias dificuldades, fora surpreendido com o seu desligamento e conseqüente cancelamento de matrícula, através de evasiva publica­ção em Boletim do Comando qeral «Desligado por inadaptação à vida policial-militar».

Afirma que as razões invocadas teve origem em uma pesquisa efetuada por um Cabo da Polícia Militar eUI Nazaré da Mata, onde residia o impetrante, pesquisa que denunciava ter o impetrante sido candidato a Vereador pelo PMDB e que em seus discursos criticava a violência policial-militar.

Faz. alegações ao que diz respeito a sua formação familiar e ao seu comportamento, conceito de natureza moral, sobretudo no que diz respeito à família e às Instituições.

O impetrante salienta na matéria de fato, por derradeiro, que a transformação político-social vivida no País, objetivando o exercício da plena democracia, reconduziu ao Poder nomes sobeja­mente conhecidos pelo espírito contestatório, não se entendendo as­sim, um nefasto ato de uma autoridade administrativa, tolhendo, sem nenhum respaldo legal, o futuro do impetrante, simplesmente amoldado ao contido em um relatório repleto de informações fac­ciosas.

Faz transcrição da disposição do § 21-, do artigo 153, da Cons­tituição Federal e baseia-se na disposição do Estatuto dos Policiais militares, isto é, Lei n? 6.783, de 16 de outubro de 1974, que prevê no seu artigo 109: (fI. 3).

«O licenciamento do serviço ativo aplicado somente às praças se efetua: I - a pedido e n - «ex ofício», § l? - O

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licenciamento a pedido poderá ser concedido, desde que não haja prejuízo para o serviço, à praça engajada ou reengajada que contenha, no mínimo, a metade do tempo de serviço a que se obrigou. § 2? - O licenciamento «ex ofício» será feito na forma da legislação peculiar: a) por conclusão de tempo de serviço; b) por conveniência do serviço; e c) a bem da discipli­na)).

Traz referências doutrinárias e jurisprudencial sobre o conceito de direito líquido e certo, sustenta a necessidade da concessão da li­minar, para, no final, pedir a notificação da autoridade impetrada ,a fim de prestar as informações e o julgamento procedente do man­dado para tornar nulo de fato e de direito o ato lesivo já acima mencionado.

A petição inicial está instruída com o instrumento de mandato, as instruções do Concurso publicadas no Beletim da Polícia Militar e o Boletim no qual foi o impetrante licenciado do serviço ativo da corporação.

Traz algumas declarações sobre a conduta do próprio impe­trante, declaração fornecida pela Técnica do DERE da Mata Norte, Professora Auxiiiar da FESP, do Vigário da Paróquia de Nazaré da Mata, do Deiegado de Polícia, do Juiz da 1 ~ Vara de Assistência Ju­diciária da Comarca do Recife, além de uma declaração do Tiro de Guerra em que serviu o impetrante».

Proferiu o relator, depois, voto, indeferindo o mandado de segurança ao ~undamento de que o ato impugnado, lastreado que era, de acordo com a iei, na conveniência do serviço, era discricionário e, portanto, não dependia de justificação,' sendo tal voto acolhido pela maioria.

Restaram vencidos três desembargadores cujos votos foram fundamen­tados no entendimento de que se o ato fora motivado, como ocorrera, com a afirmação de que o impetrante não se havia adaptado à vida policial mili­tar, ficara vinculado à existê'ncia do motivo invocado, como sustentou Hely Lopes Meirelles no Direito Administrativo Brasileiro.

Da decisão foi interposto recurso extraordinário para o Supremo Tri­bunal Federal, que, distribuído ao Ministro Sydney Sanches, mereceu de S. Exa., em face da promulgação da Constituição de 1988, a decisão seguinte:

«1. Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acór­dão denegatório de mandado de segurança, em instância única (Tri­bunal de Justiça).

2. Em situação assemelhada, no julgamento de questão de or­dem no Agravo de Instrumento n? 131.291-RJ, decidiu o E. Plená­rio do STF, em data de 26-4-1989 (relator o eminente Ministro Oc­távio Gallotti):

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« ...

2. Com a instalação do Superior Tribunal de Justiça (art. 27, § I?, das Disposições Transitórias de 1988), reputa-se o extraordinário automaticamente convertido em recurso ordi­nário para aquela Corte (Constituição, art. 105, n, b).

3. Não estando sujeito a juízo de admissibilidade, na origem, o recurso ordinário, determina-se o processamento, como tal, do recurso originariamente interposto ... » (Dl de 19-5-89 - pág. 8.443).

3. Em seu douto voto, salientou o ilustre relator: «Em se cuidando de mandado de segurança decidido, em

única instância, por Tribunal Estadual, o recurso cabível, sem distinção sobre versar ou não matéria constitucional, passou a ser o ordinário, para o Superior Tribunal de Justiça, nos ter­mos do art. 105, n, b, da Constituição em vigor».

4. Adotando, «mutatis mutandis», os fundamentos deduzidos nesse precedente, considero convertido, ipso iure, o recurso extraor­dinário em ordinário, dele, por isso mesmo, não conheço e determi­no a remessa dos autos ao E. STJ, competente para julgá-lo.»

Com vista dos autos à Subprocuradoria opinou pelo não conhecimento do recurso porque não ventilada no acórdão questão de direito federal, e, se conhecido, pelo seu improvimento.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ARMANDO ROLLEMBERG (Relator): A Constituição de 1988, no art. 105, inciso n, letra b, estabelece que compete ao Superior Tribunal de Justiça julgar, em recurso ordinário, os mandados de segurança decididos em única instância pelos tribunais dos Estados, quando denegatória a decisão, sem condicionar o cabimento de tal recurso à apreciação, pela decisão recorrida, de questão de direito federal.

- Não há, assim, impedimento ao conhecimento do recurso, e por isso passo a examinar a decisão no mérito.

Hely Lopes Meirelles, estudando os atos administrativos, depois de acentuar a diferença entre os atos vinculados e os discricionários, escreve:

920

«A teoria dos motivos determinantes funda-se na consideração de que os atos administrativos, quando tiverem sua prática motivada, ficam vinculados aos motivos expostos, para todos os efeitos jurídi­cos. Tais motivos é que determinam e justificam a realização do ato, e, por isso mesmo, deve haver perfeita correspondência entre eles e a realidade. Mesmo os atos discricionários, se forem motiva­dos, ficam vinculados a esses motivos como causa determinante de

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seu cometimento e sujeitam-se ao confronto da existência e legitimi­dade dos motivos indicados. Havendo desconformação entre os mo­tivos determinantes e a realidade, o ato é inválido.

A propósito dessa teoria, hoje corrente na prática administrati­va dos povos cultos, o Prof. Francisco Campos assim se manifesta: «Quando um ato administrativo se funda em motivos ou pressupos­tos de fato, sem a consideração dos quais, da sua existência, da sua procedência, da sua veracidade ou autenticidade, não seria o mes­mo praticado, parece-me de boa razão que, uma vez verificada a inexistência dos fatos ou a improcedência dos motivos, deva deixar de subsistir o ato que neles se fundava.» E, invocando a autoridade de Jeze, o publicista pátrio remata: «A teoria dos motivos determi­nantes me parece de irrecusável procedência, quando estabelece que os atos do Governo, se a lei os legitima mediante certos motivos (a­tos vinculados) ou quando o próprio Governo, podendo praticá-los sem motivo declarado (atos discricionários), declara, entretanto, o motivo, não poderão, em um e outro caso, continuar a subsistir desde que o motivo, que, de acordo com a lei, é necessário para legitimá-los ou o motivo invocado ou declarado pelo Governo não contém a realidade ou se verifica improcedente por não coincidir com a situação de fato em que consistia o seu pressuposto.»

Acolhendo a mesma doutrina, Ranelletti é peremptório em ne­gar validade ao ato que se apresenta divorciado dos motivos deter­minantes de sua prática: «Se la causa deU atto amministrativo man­ca, o e falsa, o illecita, Fatto e illegittimo e quindi invalido».

Exemplificando, para maior compreensão, diremos que, se o superior ao dispensar um funcionário exonerável ad nutum, decla­rar que o faz por improbidade de procedimento, essa «improbida­de» passará a ser o motivo determinante do ato e a sua validade e eficácia ficarão na dependência da efetiva existência do motivo de­clarado. Se inexistir a declarada «improbidade», ou não estiver re­gularmente comprovada, o ato de exoneração será inválido, por au­sência ou defeito do motivo determinante. No mesmo caso, porém, se a autoridade competente houvesse dispensado o mesmo funcioná­rio sem motivar a exoneração (e podia fazê-lo, por se tratar de ato decorrente de faculdade discricionária), o ato seria perfeitamente válido e inatacável.

Por aí se conclui que, nos atos vinculados, a motivação é obri­gatória; nos discricionários, é facultativa, mas, se for feita, atua co­mo elemento vinculante da Administração aos motivos declarados, como determinantes do ato. Se tais motivos são falsos ou inexisten­tes, nulo é o ato praticado».

Examinando-se a questão posta nos autos à luz de tais conceitos, chega-se à conclusão de que o ato impugnado no mandado de segurança ca­rece de apoio legal.

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o impetrante, como se viu do relatório, ingressou, por concurso, no Curso de Formação de Sargentos da Polícia Militar de Pernambuco e teve a sua matrícula concelada ao fundamento de que não se havia adaptado à vi­da policial-militar (fI. 17), inadaptação que, como esclarecido nas informa­ções prestadas pela autoridade impetrada, fora apontada «em pareceres emitidos por órgãos de informação, a nível estadual e federal, de onde este Comando Geral inferiu que as posições assumidas por ele, em sua recente militância político-partidária e político-estudantil, foram profundamente an­tagônicas às manifestações essénciais do valor, do dever e da ética policial­militar».

Ora, o procedimento do impetrante que teria caracterizado a sua não adaptação à vida policial-militar, como se vê, não consistiu em atos pratica­dos após a sua matrícula no Curso de formação dé Sergentos, e sim ante­riormente, quando exercia atividade político-partidária e participava da política estudantil, não se prestando, portanto, para caracterizar inadapta­ção à vida militar.

Mais ainda. Residiria tal procedimento, como foi alegado pelo impe­trante sem contestação, no fato de, quando candidato a vereador pelo PMDB, ter criticado a violência policial-militar, o que não caracteriza in a­daptação para a vida militar.

Finalmente não é possível deixar-se de dar valor, em favor do procedi­mento do impetrante, às declarações de ex-professora sua, do vigário de Na­zaré da Mata, do Delegado e do Comandante do Tiro de Guerra de tal ci­dade e do Juiz de Direito da 1 ~ Vara da Comarca de Recife assim formula­dos:

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«Declaro para os devidos fins que conheço o jovem José Perei­ra de Araújo Filho, desde a infância e em todo o período de escola­ridade até as atividades atuais na Faculdade, nenhuma atitude ou afirmação pode ser apontada em desabono de sua conduta, e, por ser um jovem de bons costumes e de relevantes iniciativas, é digno de todo apoio pessoal, particular e comunitário». (Maria José Ro­drigues Correia - Professora Auxiliar da FESP).

«Declaro por me ter sido solicitado verbalmente, para «todos os fins de direito, que nas funções do meu ofício, tenho acompa­nhado e orientado o jovem Jose Pereira de Araujo Filho, há seis anos, sendo o mesmo portador de excelente comportamento e de conduta irrepreensível e durante esse períod0 jamais se envolveu em fatos que viessem atentar contra qualquer regime ou facção política e sempre deu provas de responsabilidade, criatividade e dedicação a serviço da coletividade.» (Pe. José da Silva Aragão - Vigário).

«Declaro para os devidos fins que conheço o jovem José Perei­ra de Araújo Filho, há vários anos e que nada pode ser apresentado que desabone a sua conduta moral, cívica e religiosa dentro da co-

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munidade em todo e qualquer setor da vida pública e privada. Du­rante o período mais inflamado dos comícios políticos o acompa­nhei de perto e nada pode s..:r apontado em suas atividades e afir­mações que pudesse contrariar os interesses do regime vigente; pelo contrário, deu testemunho de patriotismo e lisura, tanto no serviço militar inicial no Tiro de Guerra desta cidade, como também no exercício de funções educacionais na comunidade, sempre merecen-

. do inteira confiança». (Delegado/Gauwestony Brasileiro Filho).

«Em homenagem ao mérito, declaramos que o Reservista José Pereira de Araújo Filho, durante a prestação do Serviço Militar ini­cial, manteve excelente atividade e modelar comportamento, como o confirmam as suas alterações e a observação do modo como de­sempenhou os encargos que lhe foram atribuídos, fazendo jus a es­ta prov~ de distinção dos seus superiores hierárquicos. Recebeu o Certificado de Reservista n? 707.093 Série A. T. G. em Nazaré da Mata - PE, 20 de dezembro de 1981.» (Comandante do Tiro de Guerra).

«Tendo preparado e presidido as eleições de 15 de novembro de 1982, na 23~ Zona Eleitoral de Pernambuco, integrada pelós mu­nicípios de Nazaré da Mata, Tracunhaém e Buenos Aires, posso as­segurar"' que o jovem José Pereira de Araújo Filho, a quem conhe­ço, há mais de (5) anos, teve conduta irrepreensível nos comícios e movimentos de que participou, àquela ópoca, na qualidade de can­didato a vereador, tratando-se de pessoa de conduta ilibada e ideo­logicamente sadio». (Joaquim Rodrigues de Castro - Juiz de Direi­to da 1 ~ Vara de A. Judiciária da Comarca do Recife).

Meu voto, por tais razões, é provendo o recurso para deferir o manda­do de segurança.

EXTRATO DA MINUTA

RMS n? 12 - PE - (Reg. n? 89.0008629-4) - ReI.: O Sr. Ministro Armando Rollemberg. Recte.: José Pereira de Araújo Filho. Recdo.: Tribu­nal de Justiça de Pernambuco. Impdo.: . Comandante Geral da Polícia Mi­litar de Pernambuco. Adv.: Dr. João Monteiro de Melo Filho. .

Decisão: A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso para reformar a sentença e deferir o mandado de segurança. (23-8-89 - 1 ~ Tur­ma).

Participaram do julgamento os Srs. Ministros Pedro Acioli, Geraldo Sobral, José de Jesus e Garcia Vieira. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

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MANDADO DE SEGURANÇA N? 40 - DF (Registro n~ 89.7432-6)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral Impetrante: Auto Posto San Diego Ltda. Impetrado: Ministro de Estado das Minas e Energia Litisconsortes: Atlantic de Petróleo e Auto Posto de Serviços Trevo

Ltda. Advogados: Drs. Marcos Alberto Sant'Anna Bitelli, Aloisio Cordeiro

de Faria e Luis Antonio Tavolaro

EMENTA: Mandado de Segurança. Registro de Revende­dor de Combustíveis Automotivos. Outorga. Motivação.

I - Conquanto a permissão se inclua entre os atos pra­ticados no exercício do Poder discricionário da Administra­ção, esta se autolimita quando estabelece regras e condições para o processamento dos pedidos e respectiva outorga. In ca­su, as Resoluções CNP n~s 7/85 e 16/87; ao erigirem tais re­gras impõe que a autoridade ministerial, somente através de decisão motivada, venha a modificar, em grau de recurso hie­rárquico, decisão do Conselho Nacional do Petróleo.

II - Se o requerimento de Registro de Revendedor foi indeferido pelo CNP em razão da proximidade de postos, um dos elementos previstos na Resolução n~ 7/85, não poderia o Sr. Ministro de Estado com fulcro em parecer destituído de fundamento, conceder a outorga pois, não expondo, de forma objetiva, as razões pelas quais divergia da decisão do Conse­lho Nacional do Petróleo, deixou imotivado o ato.

III - Segurança concedida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, conce­

der o Mandado de Segurança, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julga­do.

Custas, como de lei. Brasília, 8 de agosto de 1989 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro GERAL­

DO SOBRAL, Relator.

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RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL: Auto Posto San Diego Ltda. mais outras revendeQ)ras de derivados de petróleo e álcool etílico hidratado combustível, impetraram segurança contra ato emanado do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Minas e Energia autorizativo da instala­ção de um posto de gasolina na Av. Ipanema, 520, Vila Angélica, na cidade de Sorocaba, Estado de São Paulo.

Aduzem as impetrantes, a prol de' sua pretensão, que, devidamente au­torizadas pelo CNP, vêm explorando o comércio de revenda de com­bustíveis automotivos. Entretanto, esclarecem, em decorrência de pedido feito ao CNP pela Cia Atlantic de Petróleo SI A, em favor da firma Auto Posto de Serviço Trevo, concernente a autorização para a instalação de um novo posto de gasolina na mesma avenida onde situada as impetrantes, a poucos metros de distância, o CNP, em considerando as normas técnicas, a propósito, indeferiu o pedido. As impetradas, em seguida, recorreram ao Colegiado do CNP que, considerando as circunstâncias da proximidade dos outros postos, e à luz de análises técnicas, indeferiu o pedido do recurso. Irresignadas, as impetradas, mais uma vez, usando da faculdade insculpida no art. 17, inciso n, do Decreto 95.729/88, interpuseram recurso para o Exmo. Sr. Ministro de Estado das Minas e Energia que, esteando-se em pa­recer da Consultoria Jurídica, houve por bem dar provimento ao recurso deferindo às impetradas, de conseguinte, o registro do novo posto.

De conseqüência, o ato atacado foi proferido arbitrariamente, com inobservância dos requisitos legais exigidos pelo CNP ferindo, destarte, di­reito delas, impetrantes, «e da coletividade em geral, ao ir de encontro ao interesse do abastecimento nacional de combustíveis.»

Concluem, em razão disso, pedindo o deferimento «writ» para invali­dar o ato impugnado, confirmando-se a decisão do CNP que indeferira o pedido de autorização.

Prestando informações (fls. 63/67), sustentou a autoridade reputada coatora a legalidade do ato impugnado. Os litisconsortes passivos pronunciaram-se secundando as razões postas pela autoridade informante.

Nesta instância, o Ministério Público Federal opinou pela concessão da segurança.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL (Relator): Adoto, como razão de decidir, o judicioso parecer do Ministério Público Federal, da lavra do ínclito Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo A. F. Sollberger, assim posto:

«A outorga de registro de revendedor de combustíveis automo­tivos se classifica como permissão, que é o «ato administrativo ne­gociai, discricionário e precário, pelo qual o Poder Público faculta

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ao particular a execução de serviços de interesse coletivo, ou o uso especial de bens públicos, a título gratuito ou remunerado, nas con­dições estabelecidas pela Administração» (Hely Lopes Meirelles, Di­reito Administrativo Brasileiro, 13~ ed. pág. 147).

Embora a permissão, por sua natureza, se inclua entre os atos praticados no exercício do poder discricionário, o certo é que, no caso de registro de Posto Revendedor, a Administração se autolimi­tou, ao estabelecer, nas Resoluções CNP n?s 7/85 e 16/87, regras e condições para o processamento dos pedidos e respectiva outorga (fls. 41/57).

Nessas condições, a permissão deverá atender ao disciplinamen­to das referidas resoluções, especialmente ao que estabelece o art. 10 da Resolução n? 7, verbis:

Art. 10. Na análise de pedido de Registro ou de Reloca­lização, o Conselho, através de seus órgãos Técnicos, verifica­rá, prioritariamente, o interesse do Abastecimento Nacional dos derivados de petróleo e do AEHC, devendo considerar no exame do pedido:

I - documentação apresentada; 11 - postos existentes na área;

lU - consunio médio da área considerada; IV - localifação e distância dos postos existentes

em relação ao pleiteado; V - viabilidade econômica, em função do consu­

mo médio da área; VI - número de postos revendedores que possui o

interessado. Não há dúvida de que a regulamentação deixou ampla margem

para a decisão administrativa, na medida em que a análise dos ele­mentos a considerar envolve um alto grau de subjetividade. Contu­do, embora comportando avaliação subjetiva, a decisão não pode deixar de levar em consideração tais elementos, sob pena de nulida­de.» (fls. 143/145).

Mais adiante, após percuciente análise da situação fática, obtempera o ilustre parecerista, verbis:

926

Não se discute a competência do Senhor Ministro das Minas e Energia para, em grau de recurso, rever as decisões do Conselho, mantendo-as ou modificando-as. Neste último caso, entretanto, de­verá fazê-lo em decisão motivada.

Pela motivação, ensina Hely Lopes Meireles, «O administrador público justifica a sua ação administrativa, indicando os fatos que ensejam o .ato e os preceitos jurídicos que autorizam sua prática» (id. ib. pág. 157).

Claro está que, nos autos discricionários, a justificação é dis­pensável, mas, no caso em exame, como vimos, cuida-se de decisão

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vinculada à regulamentação· aprovada pelas Resoluções CNP n? 7/85 e 16/87.

Ora, como bem acentua, ainda, o acatado Hely Lopes Meirel­les, «nos autos vinculados ou regrados, e especialmente nos que im­portem atividades de jurisdição (decisões administrativas), mais se acentua o dever de motivar, porque, em tais casos, a ação adminis.: trativa está bitolada estreitamente pela lei ou pelo regulamento, im­pondo ao administrador a obrigação de demonstrar a conformação de sua atividade com todos os pressupostos de direito e de fato que condicionam a eficácia e validade do ato» (id. ib., pág. 158).

Observe-se, a propósito, que a justificativa, não necessita, obri­gatoriamente, constar do ato; basta que ela possa ser encontrada no processo administrativo, no parecer ou manifestação que lhe serviu de suporte (O.A. Bandeira de Mello, Princípios Gerais de Direito Administrativo, Forense, voI. I, pág. 470).

No caso em exame, vê-se que o recurso hierárquico interposto pela Atlantic e pelo Auto Posto Trevo foi apreciado pela Consulto­ria Jurídica do MME através do parecer CJ n? 443/88, que, na ver­dade, se resume a um simples Relatório, uma vez que, na parte opi­nativa, limita-se seu ilustre signatário a dizer que a matéria é «da­quelas cujo deferimento ou não, devem fIcar ao arbítrio de S. Exa. o Senhor Ministro» (sic).

Esse parecer foi aprovado pelo Consultor Jurídico em sin?elo pronunciamento, no qual S. Sa. opina no sentido de que, «em con­sonância com a orientação adotada em situações semelhantes, seja conhecido e provido o recurso, para o fim de ser deferido o registro do Posto Revendedor de que se trata». (fI. 26).

Evidentemente, o dever de motivar a decisão que acolhe o re­curso não se satisfaz com o simples enunciado que o mesmo é pro­vido «em consonância com a orientação adotada em situações se­melhantes».

Já se viu que o requerimento de Registro de Revendedor, apre­sentado pela Atlantic em nome do Auto Posto Trevo, foi indeferido pelo CNP em razão da proximidade de postos, um dos elementos que a Resolução n? 7/85 manda considerar na apreciação de tais pedidos.

Assim, não poderia a douta Consultoria Jurídica do MME ter opinado pelo provimento do recurso sem antes expor, sucinta mas objetivamente, as razões pelas quais divergia da decisão do Con.se­lho.

Não o fazendo, deixou imotivado o despacho ministerial, acar­retando a sua nulidade». (fls. 146/148).

Consoante frisei, faço minhas as razões vertidas no douto parecer pois quaisquer acréscimos às judiciosas razões nele postas seriam despiciendas.

Isto posto, concedo a segurança como pedido. É o meu voto.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 927

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VOTO - VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO MIGUEL FERRANTE: À vista dos autos, convenci-me de que o parecer da douta Subprocuradoria-Geral da Repúbli­ca, cujos fundamentos o eminente relator adotou como razões de decidir, dá adequado tratamento à espécie em exame.

Na realidade, só através de decisão motivada poderá o Ministro das Minas e Energia modificar, em grau de recurso hierárquico, decisão do Conselho Nacional do Petróleo, e, na hipótese, tal não ocorreu.

Com propriedade, aduz o citado parecer da ilustrada Subprocuradoria­Geral da República:

«No caso em exame, vê-se que o recurso hierárquico interposto pela Atlantic e pelo Auto Posto Trevo foi apreciadó pela Consulto­ria Jurídica do MME através do parecer CJ n? 443/88, que, na ver­dade, se resume a um simples Relatório, uma vez que, na parte opi­nativa, limita-se seu ilustre signatário a dizer que a matéria é «da­quelas cujo deferimento ou não, devem ficar ao arbítrio de S. Exa. o Senhor Ministro» (sic).

Esse parecer foi aprovado pelo Consultor Jurídico em singelo pronunciamento, no qual S. Sa. opina no sentido de que, «em con­sonância com a orientação adotada em situações semelhantes, seja conhecido e provido o recurso, para o fim de ser deferido o registro do Posto Revendedor de que se trata». (Fi. 26).

Evidentemente, o dever de motivar a decisão que acolhe o re­curso não se satisfaz com o simples enunciado que o mesmo é pro­vido «em consonância com a orientação adotada em situações se­melhantes».

Já se viu que o requerimento de Registro de Revendedor, apre­sentado pela Atlantic, em nome do Auto Posto Trevo, foi indeferi­do pelo CNP, em razão da proximidade de postos, um dos elemen­tos que a Resolução n? 7/85 manda considerar na apreciação de tais pedidos.

Assim, não poderia a douta Consultoria Jurídica do MME ter opinado pelo provimento do recurso sem antes expor, sucinta mas objetivamente, as razões pelas quais divergia da decisão do Conse­lho.

Não o fazendo, deixou imotivado o despacho ministerial, acar­retando a sua nulidade.»

Adiro, assim, ao voto do digno relator, data venia.

VOTO (VOGAL)

o EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Senhor Pre­sidente, pediria vênia ao eminente Relator para dissentir de seu entendimen­to.

928 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

Page 14: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

No caso concreto, trata-se de poder discricionário e parece-me, quantum satis, houve fundamentação. A ilustre autoridade coatora, valen­do-se da manifestação da Consultoria Jurídica, e a ela fazendo reportagem, opinou, contrariamente, ao órgão cuja decisão estava sujeita à sua revisão.

Trata-se de matéria que se enquadra no Juízo da conveniência e opor­tunidade. Não afronta data venia, o princípio da legalidade. Em razão .dis­so, pedindo mais uma vez vênia, denego a segurança.

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 40 - DF - (Reg. n? 89.7432-6) - Rei.: O Exmo. Sr. Min. Geraldo Sobral. Impte.: Auto Posto San Diego Ltda. Impdo.: Ministro de Estado das Minas e Energia. Litisconsortes: Atlantic de Petróleo e Auto Posto de Serviços Trevo Ltda. Advs.: Drs. Marcos Alberto Sant'Anna Bitel­li, Aloisio Cordeiro de Faria e Luis Antonio Tavolaro.

Decisão: A Seção, prosseguindo no julgamento, por maioria, vencido o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro, concedeu o Mandado de Segurança. (8-8-89 - P Seção).

Os Srs. Ministros Ilmar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Miguel Ferrante, Pedro Acioli e Américo Luz votaram com o Relator. O Sr. Minis­tro Carlos Velloso não compareceu à Sessão por motivo justificado. Presi­diu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

--e --

MANDADO DE SEGURANÇA N? 51 - DF (Registro n? 89.0007443-1)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Ilmar Galvão Impetrantes: Gilson Fiorenzano Reis e outros Impetrado: Ministro de Estado do Exército Advogado: Dr. José David de Oliveira Campos

EMENTA: Mandado de segurança. Administrativo. Ensi­no. Extinção de colégio militar. Pretensão de alunos nele ma­triculados no sentido de que o estabelecimento seja mantido em funcionamento até a conclusão de seu curso. Ilegitimida­de.

Ausência, no caso, de ·qualquer disposição, legal ou esta­tutária, que abrigue tal pretensão.

Data de desativação do estabelecimento de ensino, fixada a critério da Administração Militar, no estrito exercício de suas atribuições legais.

Segurança denegada.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 929

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ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

indeferir o mandado de segurança, na forma do relatório e notas taquigráfi­cas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 13 de junho de 1989 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro ILMAR

GALV ÃO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GALVÃO: Gilson Fiorenzano Reis e mais seis pais de menores impúberes, alunos do Colégio Militar de Belo Horizonte, todos devidamente .qualificados na inicial, impetraram a presente segurança, na condição de representantes legais dos sobreditos me­nores, objetivando compelir o Ministro do Exército a manter em funciona­mento o mencionado estabelecimento de ensino, a fim de possibilitar a fre­qüência de seus ditos filhos, nas séries 1 ~, 2~ e 3~, do segundo grau, em que se acham matriculados.

Disseram haver sido surpreendidos com a edição, pela autoridade indi­cada, da Portaria n? 691, de 20-7-88, por meio da qual foi desativado o Co­légio em questão, antes, portanto, de haverem os menores supracitados con­cluído o seu curso, ato esse que, se concretizado, os exporá ao risco de fica­rem sem estudar, com prejuízo para a carreira militar que foi objeto de sua opção, já que, em Belo Horizonte, inexiste estabelecimento similar.

Aduziram que, quando se submeteram ao concurso para ingresso no Colégio Militar, o fizeram com o objetivo de concluir o curso, que vai da 5~ série, até o 3? ano do segundo grau; e que os colégios militares se desti­nam a proporcionar assistência educacional a filhos· e órfãos de militares, prevendo o Decreto n? 72.724/78, regulamentador da Lei n? 6.265/75, que será ela ministrada em níveis de I? e 2? graus.

Disseram, ainda, que a educação é um direito assegurado pela Magna Carta (art. 205), havendo de ser ministrada em igualdade de condições e gratuitamente, em estabelecimentos oficiais (art. 206).

Assim, ao ingressarem no Colégio Militar,adquiriram o direito de ali concluírem o seu curso.

Em s'uas informações, esclareceu a autoridade impetrada que a adoção de medidas tendentes à extinção do Colégio Militar de Belo Horizonte e ou­tros, bem como a sua formalização, deveu-se a ponderáveis interesses da Administração, consu!,stanciados na necessidade de reformular-se o ensino

930 R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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preparatório e assistencial do Exército, para melhor aproveitá-lo em ativida­de fim, como também para diminuir os encargos da Força no que se refere à área educacional, que representa uma missão complementar.

Sustentou, mais, que a Portaria foi baixada com base em competência que lhe foi delegada no art. 28, do Decreto n~ 93.188/86, havendo sido as­segurado aos alunos o direito de transferência para outros colégios militares ou para a Escola Preparatória de Cadetes de Fortaleza.

Em douto parecer de sua lavra, o Dr. Paulo A. F. Sollberger, digno Subprocurador-Geral da República, argüiu, preliminarmente, a decadência, ao argumento de que foi pela Portaria n~ 810, de 4-8-87, e não pela men­cionada na inicial (n~ 621, de 20-7-88), que se deu a extinção do Colégio Militar de Belo Horizonte, já que esta última, no que se refere ao Colégio de Belo Horizonte, se limitou a lembrar que a sua desativação deveria estar concluída até dezembro de 1988, para que suas instalações pudessem ser uti­lizadas pelo CPOR, a partir de janeiro de 1989.

Quanto ao mérito, pôs-se de acordo com as informações, ao asseverar que se trata de ato praticado por autoridade competente e que a questão da criação e manutenção dos estabelecimentos de ensino militares está reserva­da .à discrição do Poder Executivo, a quem cabe decidir quando e onde criá-los. julgando ainda da conveniência de mantê-los em funcionamento ou extingui-los, quando as circunstâncias assim recomendarem, presentes os su­periores interesses da coletividade.

Alegou, por fim, que já se acha em pleno funcionamento o CPOR/BH, que ocupa as instalações que pertenciam ao Colégio Militar, encontrando-se os Impetrantes devidamente matriculados em outros estabe­lecimentos de ensino, alguns, inclusive, no Colégio Militar do Rio de Janei­ro, o que lhes assegura a continuidade de seus estudos, sem maior prejuízo.

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Mandado de segurança. Administrativo. Ensi­no. Extinção de Colégio Militar. Pretensão de alunos nele ma­triculados no sentido de que seja ele mantido em funciona­mento até a conclusão de seu curso. Ilegitimidade.

Ausência, no caso, de qualquer disposição, legal ou esta­tutária, que abrigue tal pretensão.

Data de desativação do estabelecimento de ensino fixada a critério da Administração Militar, no estrito exercício de suas atribuições legais.

Segurança denegada. O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GALV ÃO (Relator): O que preten­

dem os impetrantes não é impedir a extinção do Colégio Militar de Belo Horizonte, decretada pela Portaria Ministerial n~ 810, de 4 de agosto de

R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 931

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1987, mas vê-lo funcionando até a conclusão de seus cursos no citado esta­belecimento, desiderato que encontra óbice na Portaria n? 691, de 20-7-88, na qual foi programada a sua desativação para dezembro/88.

Não há, pois, como se ter por intempestiva a presente impetração, ajui­zada dentro do prazo de 120 dias, contado do segundo ato mencionado.

Rejeito a preliminar, suscitada pela douta Subprocuradoria-Geral da República.

Conforme se viu, o que sustentam os impetrantes é que não cabia à au­toridade impetrada interromper o funcionamento do Colégio antes que hou­vessem eles concluído o curso para o qual se habilitaram. Não haveria, pois, discricionariedade da Administração quanto ao momento do definitivo fechamento das salas de aula, circunstância que, ao revés, estaria vinculadá à ausência absoluta de corpo discente.

Fundamentam sua tese no dever geral de educar imposto ao Estado, pelo artigo 205 da vigente Constituição Federal e na destinação dos Colé­gios Militares à assistência educacional dos filhos e órfãos de militares, que estaria prevista no Decreto n? 72.724/78, regulamentador da Lei n? 6.265/75.

Estariam, por isso, investidos no direito de concluírem seu curso médio no citado estabelecimento.

Por mais lamentável, entretanto, que seja a decisão governamental, to­mada no sentido de reduzir a rede dos afamados colégios militares, não se pode ver nas objeções levantadas pelos impetrantes um empecilho ao seu cumprimento.

Na verdade, a extinção de apenas um estabelecimento de ensino públi­co, entre tantos mantidos pelo Poder Público, não importa a extinção do ensino estatal no Brasil, não podendo ser visto como violação do dever constitucional de educar.

Por outro lado, a assistência educacional a filhos e órfãos de militares pode ser ministrada por inúmeros meios, não implicando o dever de manter educandários privativos, mormente a cargo de órgãos especializados, como os militares, a cujos responsáveis não se pode negar a prerrogativa de dis­por quanto à melhor destinação que, a seu juízo, há de ser dada aos recur­sos públicos por eles administrados. ' .

Relembre-se, por derradeiro, que não há direito do aluno a que o esta­belecimento de ensino por, ele freqüentado, seja mantido em funcionamento até a conclusão de seu curso.

Ao matricular-se em uma escola, investe-se ele na situação jurídica de aluno, que tem caráter geral e impessoal, comumente denominada de esta­tutária ou objetiva, porque estabelecida por meio de ato-regra que, como se sabe, não gera, por si só, direito adquirido. Para que dessa condição de membro do corpo discente resultasse direito à manutenção da escola, em

932 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

Page 18: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

funcionamento até a conclusão do curso, haveria mister que norma ou re­gra particular assim dispusesse, em especial, circunstânçia que, todavia, não foi demonstrada pelos Impetrantes.

Assim sendo, não há que se falar em violação a direito ou abuso de poder, de parte da autoridade impetrada, capaz de ensejar a provídência ju­risdicional postulada.

Meu voto, portanto, é pela denegação da segurança.

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 51 - DF - (Reg. n? 89.0007443-1) - ReI.: O Sr. Min. Ilmar Galvão. Impetrantes: Gilson Fiorenzano Reis e outros. Impetrado: Ministro de Estado do Exército. Advogado: Dr. José David de Oliveira Campos.

Decisão: A Seção, por unanImidade, indeferiu o mandado de segurança (13-6-89 - l~ Seção).

Os Srs. Ministros José de Jesus, Garcia Vieira, VicenteCernicchiaro, Carlos Velloso, Miguel Ferrante, Américo Luz e Geraldo Sobral votaram com o Relator. O Sr. Ministro Pedro Acioli não compareceu à sessão, por motivo justificado.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG. --.--

MANDADO DE SEGURANÇA N? 52 - DF (Registro n~ 89.7444-0)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Américo Luz Impetrantes: Vera Lúcia da Costa de Albuquerque Maranhão e cônjuge Impetrado: Ministro de Estado das Relações Exteriores Advogado: Dr. Inemar Baptista Penna Marinho

EMENTA: Mandado de segurança. Passaporte requerido por diplomata aposentado. Preliminar de incompetência do STJ para julgar o pedido.

No âmbito do Ministério das Relações Exteriores, a com­petência para apreciar pedido de expedição de passaporte é do Chefe da Divisão de Passaportes (Decreto n~ 84.548/80, arti­go 6~) ..

Determinada a remessa dos autos à Justiça Federal de 1 ~ Iflstância, competente para o julgamento da causa (CF, artigo 109, inciso VIII).

Mandado de segurança não conhecido.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 933

Page 19: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as ac'ima indicadas.

Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, . não conhecer do mandado de segurança e determinar a remessa dos autos à

Justiça Federal de 1 ~ Instância, na forma do relatório e notas taquigráficas anexas, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 27 de junho de 1989 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro AMÉRI­CO LUZ, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Adoto o elaborado pela douta Subprocuradoria-Geral da República (fls. 27/28):

«Vera Lúcia da Costa de Albuquerque Maranhão, funcionária pública federal, e seu marido Annibal Alberto de Albuquerque Ma­ranhão, diplomata aposentado, impetram a presente segurança apontando como autoridade coatora o Sr. Ministro das Relações Exteriores.

Alegam que, em 13-2-89, entregaram à Divisão de Passaportes do Itamarati seus passaportes diplomáticos, com prazo de validade já esgotado, para serem substituídos por outros.

Aduzem que, após sofrerem verdadeira via crucis, foram infor­mados, «oficiosamente», que esses documentos não lhes serão for­necidos «em atendimento à ordem direta do Ministro das Relações Exteriores, por razÕes reservadas» (sic).

Em conseqüência, invocando direito líquido e certo à obtenção dos passaportes diplomáticos, impetraram o presente writ para o fim de compelir a autoridade impetrada a lhes fornecer ditos passa­portes, em substituição dos antigos.

As informações ministeriais, prestadas por telex, esclarecem: «A prorrogação dos passaportes de que são titulares os ora im­

petrantes fora solicitada mediante preenchimento do formulário existente para pedido de concessão ou prorrogação de passaportes diplomáticos e de serviço, e em nenhum momento foi dada aos in­teressados informação formal sobre a tramitação do pedido, encontrando-se o assunto em exame para definição da situação fun-. cional de Annibal Alberto Albuquerque Maranhão.»

O eminente parecerista, Dr. Paulo Sollberger, preliminarmente opinou pelo não conhecimento do mandamus, afirmando que a competência para

934 R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

Page 20: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

deferir pedidos de passaporte é do Chefe da Divisão de Passaportes e, no mérito, pelo seu não conhecimento, dada a ausência de interesse de agir, porquanto a simples possibilidade de que venha a ser praticado ato lesivo ao direito dos impetrantes não justifica o uso do remédio heróico.

Concedi a medida liminar, nos termos em que foi requerida na inicial (Lê às fls. 4/5).

É o relatório.

VOTO

b EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ (Relator): O parecer exa­rado pela ilustrada Subprocuradoria-Geral da República suscita a seguinte questão preliminar, in verbis (fls. 28/29):

«No âmbito do Ministério das Relações Exteriores, a compe­tência para deferir pedidos de passaporte e assiná-lo é do Chefe da Divisão de Passaportes (Dec. 84.541/80, art. 6?), autoridade a quem se dirigiram os impetrantes mediante o preenchimento de for­mulário, como o que se vê à fI. 17.

O Sr. Ministro das Relações Exteriores não praticou qualquer ato que justificasse o ajuizamento do .writ perante essa Colenda Corte e, tampouco, consoante se esclareceu, foi dada aos impetran­tes, em nome de S. Exa., qualquer informação sobre um possível indeferimento do pedido de passaporte. .

Nessas condições opinamos, prelimirtarmente, pelo não conhe­cimento do mandamus, por falta de legitimidade passiva ad causam da autoridade apontada como coatora, remetendo-se os autos à Justiça Federal de Primeira Instância, Seção Judiciária do Qistrito Federal, a quem compete processar e julgar originariamente a lide (art. 109, VIII, da CF).»

Realmente, cabe razão ao eminente representante do Ministério Público junto a este Tribunal.

Em conseqüência, voto pelo não conhecimento do pedido, determinan­do a remessa dos autos à Justiça Federal de Primeira Instância, competente para julgar a questão suscitada. .

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 52 - DF - (Reg. n? 89.7444-0) - Rei.: O Sr. Min. Américo Luz. Impetrantes: Vera Lúcia da Costa de Albuquerque Maranhão e cônju­ge. Impetrado: Ministro de Estado das Relações Exteriores. Advogado: Ine­mar Baptista Penna Marinho.

Decisão: A Seção, por unanimidade, não conheceu do mandado de se­gurança e determinou a remessa dos autos à Justiça Federal da 1 ~ Instância (27-6-89 - l~ Seção).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989 .. 935

Page 21: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

Os Srs .. Ministros Geraldo Sobral, Ilmar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro, Miguel Ferrante e Pedro Acioli votaram .com o Relat,or.

O Sr. Ministro Carlos Velloso não participou do julgamento. Presidiu a sessão o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

--e--

MANDADO DE SEGURANÇA N~ 54 - DF (Registro n~ 89.0007447-4)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Ilmar Galvão Impetrante: Rádio Imprensa SI A Impetrado: Ministro de Estado das Comunicações Litisconsorte: Rádio Jornal Fluminense Ltda. Advogados: Drs. Sérgio do Rego Macedo e outro e Paulo Seabra de

Noronha e outros

EMENTA: Administrativo. Radiodifusão. Interferências de uma emissora nas transmissões de outra. Mandado de se­gurança visando compelir o Ministério das Comunicações a coibir a irregularidade.

Interferências negadas pela autoridade e pela emissora apontada como irregular, com base em laudo de medição, ela­borado por técnicos indicados pelas partes em lide.

Palavra final que somente poderá ser obtida por meio de perícia técnica judicial, que não se comporta no rito do man­dado de segurança.

Ausência de direito líquido e certo, que conduz à carência da ação.

Ressalvada à Impetrante a faculdade de renovar a sua pretensão pela via ordinária.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

julgar a Impetrante carecedora da segurança, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 27 de junho de 1989 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro ILMAR GAL VÃO, Relator.

936 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

Page 22: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GALV ÃO: Rádio Imprensa SI A impetrou a presente segurança contra o Ministro das Comunicações, objeti­vando compeli-lo a impor à Rádio Fluminense a obrigação de reduzir sua potência para 10 KW - que é a força limite para não haver interferência no sinal da Impetrante - como condição de voltar a operar radiodifusão na Torre do Sumaré, no Rio de Janeiro .

. Disse ser pioneira em FM, operando desde 1956, na cidade do Rio de Janeiro, e que, no início de 1982, a Rádio Jornal Fluminense, que tem per­missão para operar em Niterói, teve sua torre de operação transferida para o local acima indicado, com mais de 100 KW e a 810 metros de altura, em frontal desatendimento às regras que regem a espécie.

Disse mais que, a partir de então, o 2~ harmônico da aludida emissora faz com que os 150 KHz de desvio de modulação lateral invadam profunda­mente a freqüência da Impetrante, causando in defensáveis interferências em suas transmissões, e diminuindo, sensivelmente, a qualidade de seu som.

Acrescentou que, em razão de denúncia das irregularidades levadas ao Dentel e à autoridade impetrada, surpreendentemente, acabou por pena­lizar a Impetrante, com a mudança de seu canal, medida que, todavia, não chegou a concretizar-se, havendo, antes, sido objeto de revogação que, não obstante, veio desacompanhada de qualquer providência tendente à debela­ção dos apontados problemas de interferência, que lhe têm causado insu­portáveis prejuízos, com a fuga de clientes, em razão da má qualidade do som transmitido.

Assim, no seu dizer, encontrando-se já identificada a causa da indese­jável interferência, resta apenas ao Impetrado pôr em execução o comando

. da regra inscrita no art. 49 do Regulamento dos Serviços de Radiodifusão (Dec. n~ 52.795163), segundo a qual, «positivando-se a intervenção prejudi­cial, a estação responsável será obrigada a interromper, imediatamente, as suas irradiações até a remoção da causa acima referida».

O pedido foi no sentido da concessão da segurança, para o fim de constranger o Impetrado a impor à Rádio Jornal Fluminense a obrigação de reduzir sua potência para 10 KW, como condição de voltar a operar na Torre do Sumaré.

Em suas informações, sustentou o Impetrado que o transmissor da Rá­dio Jornal Fluminense tem potência efetiva de apenas 38,07 KW, operando numa altitude de 787,21 m, sendo, por outro lado, destituída de qualquer procedência a alegação de que afeta o fundamento da Impetrante, confor­me prova o «laudo de medição» elaborado por técnicos indicados pelas em­presas envolvidas, o qual atesta a inexistência de qualquer tipo de interfe­rência prejudicial.

Aduziu haver-se constatado não interferências, mas produto de inter·· modulação entre todas as estações instaladas no Alto do Sumaré, o que le-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 937

Page 23: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

vou o Ministério a determinar a mudança de freqüência de operação da Im­petrante, idéia que, todavia, foi abandonada, à verificação de que a provi­dência, de ordinário muito simples, no caso da Impetrante seria onerosa, já que, junto com a estação de FM, e no mesmo canal, explora ela serviço es­pecial de música funcional.

Também respondeu a Rádio Jornal Fluminense Ltda., repisando, de modo geral, os argumentos da autoridade.

A douta Subprocuradoria-Geral da República, pondo-se de acordo com as informações, opinou pelo indeferimento do pedido, por se tratar de pos­tulação incompatível com o rito escolhido.

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Administrativo. Radiodifusão. Interferências de uma emissora nas transmissões de outra. Mandado de se­gurança visando compelir o Ministério das Comunicações a coibir a irregularidade.

Interferências negadas pela autoridade e pela emissora apontada como irregular, com base em laudo de medição ela­borado por técnicos indicados pelas partes em lide.

Palavra final que somente poderá ser obtida por meio de perícia técnica judicial, que não se comporta no rito do man­dado de segurança.

Ausência de direito líquido e certo, que conduz à carência da ação.

Ressalvada à Impetrante a faculdade de renovar a sua pretensão pela via ordinária.

o EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GALV ÃO (Relator): Como mos­tra o relatório, a controvérsia existente entre as partes, nestes autos, gira em torno de matéria de fato, já que se discute sobre interferências da Rádio Jornal Fluminense nas transmissões da Rádio Imprensa, ambas com suas antenas instaladas no Alto do Sumaré, no Rio de Janeiro.

Com efeito, enquanto a Impetrante afirma que os desvios de modula­ção lateral da primeira emissora invadem profundamente a freqüência da segunda, causando indefensáveis interferências em suas transmissões e dimi­nuindo sensivelmente a qualidade do seu som, o Impetrado, acompanhado da Rádio Jornal Fluminense, sustenta que medições realizadas por técnicos indicados pelas próprias empresas envolvidas atestaram a inexistência de quaisquer tipos de interferência prejudicial, conforme laudo cuja cópia está anexada às informações.

Como facilmente se percebe, trata-se de questão que somente poderá ser esclarecida mediante perícia técnica judicial, meio de provà que não se

938. R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

Page 24: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

comporta no curso de mandado de segurança, ação cujo procedimento não prevê a fase de instrução, por isso que se destina à proteção de direito líqui­do e certo, isto é, demonstrado, de DIano, com a inicial.

Assim sendo, meu voto é pela cJ.rência da segurança, ressalvada à Im­petrante a faculdade para renovar a sua pretensão pela via ordinária.

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 54 - DF - (Reg. n? 89.0007447-4) - Rei.: O Sr. Min. lImar Galvão. Impetrante: Rádio Imprensa SI A. Impetrado: Ministro de Estado das Comunicações. Litisconsorte: Rádio Jornal Fluminense Ltda. Advoga­dos: Dr. Sérgio do Rego Macedo e outro e Dr. Paulo Seabra de Noronha e outros.

Decisão: A Seção, por unanimidade, julgou a Impetrante carecedora da segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (27-6-89 - 1 ~ Se­ção).

Os Srs. Ministros José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro, Miguel Ferrante, Pedro Acioli, Américo Luz e Geraldo Sobral votaram com o Relator. O Sr. Ministro Carlos Velloso não participou do julgamento. Presidiu o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

--.--MANDADO DE SEGURANÇA N? 60 - DF

(Registro n? 89.7453-9) .

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Carlos M. Velloso Impetrantes: Erivaldo Coelho Bastos e outros Impetrado: Ministro de Estado das Comunicações Advogado: Dr. Geraldo Andrade FonteIes

EMENTA: Administrativo. Telefone. Transferência. Co­mercialização do direito de uso. Linhas adquiridas anterior­mente à Portaria n? 209, de 6-8-1986.

I - Linhas telefônicas adquiridas anteriormente à Por­taria n? 209, de 1986, do Ministro de Estado das Comunica­ções. Legitimidade de sua comercialização. Segurança deferi­da, para que possam as impetrantes prosseguir no exercício re­gular de seu ramo de negócios - a comercialização do direito de uso de linhas telefônicas adquiridas, por elas ou por tercei­ros, anteriormente à Portaria n? 209, de 6-8-1986.

n - Mandado de Segurança deferido, em parte.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 939

Page 25: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, deferir

em parte o mandado de segurança, nos termos do relatório e notas taqui­gráficas anexas, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 15 de agosto de 1989 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente.' Ministro CARLOS

M. VELLOSO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS MÁRIO VELLOSO: Erivaldo Coelho Bastos, Nicotel Telecomunicações Ltda., Center Fone Iguatemi Ltda., Américo Augusto Leite, Teles-Parra Comunicações e Sei."vice Tel Te­lecomunicações impetraram mandado de segurança contra ato do Senhor Ministro das Comunicações, consubstanciado na expedição da Portaria n? 209, de 6-8-86, através da qual foi expressamente proibida a transferência do direito de uso de telefone em todo o País.

Argumentam que a proibição de transferir os terminais telefônicos, isto é, os direitos de uso e gozo para outrem, viola direito adquirido e está lhes causando grandes danos, inclusive com a possibilidade de falências e insol­vências. Isso porque não .podem explorar a atividade fim de seu comércio - compra e venda de linhas telefônicas ~ para a qual foram devidamente autorizadas pela Portaria n? 663, de 18-7-79, do MiniCom, regulamentada pela Norma n? 5/79.

A liminar requerida foi deferida à fI. 75, para assegurar a situação an­terior, tendo o despacho de fI. 87 restringido os seus efeitos aos terminais telefônicos disponíveis pelas impetrantes ou a elas confiados para negocia­ção, comprovadamente, até a data da impetração.

A autoridade apontada como coatora, notificada, prestou as informa­ções (fls. 103/131). O eminente Ministro Bueno de Souza, Relator, indefe­riu pedidos de admissão como litisconsortes ativos (fls. 98 e 101).

A ilustrada Subprocuradoria-Geral da República, oficiando às fls. 277/278, opinou pelo indeferimento do writ, afirmando que o entendimento adotado pelo Egrégio Tribunal Federal de Recursos é de que as empresas de intermediação de linhas telefônicas só têm o direito de transferir as linhas que possuíam em seu próprio nome, no momento da edição da Portaria n? 209. Ressalta, ainda,· que as impetrantes não comprovaram a titularidade do direito de uso de uma só linha telefônica.

É o relatório.

940 R. Sup. Trib. Just., Brasilia, 1(3):915-1003, novo 1989.

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VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO C\RLOS M. VELLOSO (Relator): A es­pécie é igual a que foi por mim examinada por ocasião do julgamento, no extinto TFR do MS 114.920-DF. Proferi, então, o seguinte voto:

«O impetrante, Américo Garcia, firma individual, presta servi­ços «na compra e venda de linhas telefônicas e locação de linhas te­lefônicas)) (fI. 25).

Os litisconsortes Manuel Antônio Meirelles da Costa, Humber­to Maurício Ganzaroli e João Polo não demonstraram, nos autos, a

. que título exercem o comércio em torno de linhas telefônicas, tam­pouco comprovaram que são titulares do direito de uso de linhas te­lefônicas (fls. 72/73 e 74/76).

Os litisconsortes Lojitel Telecomunicações S/C Ltda., Loc Te-) lefones Ltda. e Agibrás Assessoria e Comunicações S/C Ltda. comprovaram que estão legitimamente constituídos para a comer: cialização do direito de uso de linhas telefônicas (fls. 77/78, fls. 81/82, fls. a5/89 e fls. 92/94). O mesmo ocorreu com relação a Jo­sé Carlos da Silva, que é corretor autônomo (fls. 96/99). Idem, idem, relativamente a Celso Ferreira da Silva (fls. 100/103). JoteI - Assessoria e Telecomunicação S/C Ltda. (fls. 77/78) e Bauru Center Phone S/C Ltda. (fls. 77/78) comprovaram que estão regu­larmente constituídas para a comercialização do direito de uso de li­nhas telefônicas (fls. 108/111, fls. 114/117). Reinaldo Alves Corrêa (fls. 77/78) é corretor autônomo (fls. 119/131). TeI Center Ibira­puera Assessoria de Telecomunicações S/C Ltda. tem «por objetivo a intermediação de negócios em geral, excluídos os imobiliários» (fls. 135/138) ..

o pedido é para que possam as impetrantes «conünuar seu la­bOf)) , assim para que «possa voltar a exercer regularmente suas ati-vidades ... )). .

Assim posta a questão, a segurança é de ser deferida, em parte, para que possam os impetrantes· prosseguir no exercício regular de seu ramo de negócios - comercialização do direito de uso de linhas telefônicas, que foram por eles ou por terceiros adquiridas anterior­mente.à Portaria n? 209/86.

Repórto-me, para assim decidir, ao voto que proferi por oca­sião dó juigamento do MS 115.230-DF, no qual acentuei:

«O pedido é para que possa a impetrante <qnosseguir no exercício regular do seu ramo de negócios, posto ·que é isso seu direito constitucional.»

R~ Sup. Trib. Just., Bràsília, 1(3):915-1003, novo 1989~ 941

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A impetrante, conforme consta do seu contrato social (fls. 7/10), tem «por objetivo social a compra, venda e loca­ção de linhas telefônicas ... » (Contrato, cl. 4~). A sua consti­tuição deu-se anteriormente à Portaria n? 209, de 6-8-1986.

Estou em que a Impetrante tem razão.

Porque, conforme acentuei no voto que proferi por oca­sião do julgamento do MS 114.968-DF e do MS 115.251-DF, não importa se os telefones pertençam, ou não, à impetrante. O que importa é que a Portaria n? 209, do Ministro de Estado das Comunicações, retirou do comércio algo que, licitamente, estava no comércio. Ora, a impetrante foi constituída para ex­plorar o comércio em torno de linhas telefônicas (Contrato, cláusula 4~, fI. 7). Destarte, a citada Portaria n? 209, de 6-8-86, causa-lhe dano, porque impede que ela exerça atividade que vinha exercendo, licitamente, com o apoio e o estímulo do poder público.

A segurança, pois, deve ser deferida, para que a impe­trante continue a exercer referida atividade, em torno de li­nhas telefônicas adquiridas, por ela ou por terceiros, anterior­mente à citada Portaria n? 209. Porque, repete-se, tais linhas, adquiridas anteriormente à citada Portaria n? 209, estavam no comércio e não podem, sem causar lesão a direito, ser retira­das do comércio.

No voto que proferi por ocaSlao do julgamento do MS 113 .007 -DF, examinei a questão em pormenor. Faço anexar cópia do referido voto - MS 113.007-DF - para boa com­preensão do meu pensamento. Reporto-me, outrossim, ao vo­to que proferi no MS n? 114.968-DF e MS n? 115.276-DF.

Do exposto, defiro, em parte, o wrÍt, para assegurar à impetrante o direito de prosseguir no exercício regular do seu ramo de negócios - compra, venda e locação de linhas telefô­nicas adquiridas, por ela ou por terceiros, anteriormente à Portaria n? 209. de 6-8-1986.»

Do exposto, defiro, em parte, a segurança, para que possam os impetrantes prosseguir no exercício regular do seu ramo de negócios - comercialização do direito de uso de linhas telefônicas, que fo­ram por eles ou por terceiros adquiridas anteriormente à Portaria n? 209/86.» .

Também aqui faço anexar cópia do voto que proferi por ocasião do julgamento do MS·n? 113.007-DF, ao qual me reporto.

942 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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Do exposto, defiro, em parte, a segurança, para que possam os impe­trantes prosseguir no exercício regular do seu ramo de negócios - comer­cialização do direito de uso de linhas telefônicas, que foram por eles ou por terceiros adquiridas anteriormente à Portaria n? 209/86.

ANEXO

MS n? 113.007-DF

VOTO (VISTA)

o EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO: O eminente Mi­nistro Gueiros Leite, Relator, assim sumariou a espécie:

. «Maria Helena Teixeira Santos impetra mandado de segurança contra a Portaria n? 209, de 6 de agosto de 1986, do Senhor Minis­tro de Estado das Comunicações, incluindo no processo, como litis­consorte passiva necessária, a Telebrasília - Telecomunicações de Brasília S.A.

A finalidade do writ é obter a transferência para o seu nome de aI2-arelho telefônico já instalado em sua residência, o que cumpre à Telebrasília fazer, mas que se diz a tanto impedida pela Portaria n? 209/86'; a qual a impetrante reputa ilegal e inconstitucional, por afetar o seu direito de propriedade.

Despachei determinando à impetrante comprovasse a existência da dupla coação, mas a mesma somente juntou a portaria (fi. 13). Daí por que solicitei informações, que me foram prestadas pelo Sr. Ministro das Comunicações (fls. 18/45) e, pela Telebrasília, às fls. 61/66.

Nas primeiras informações alega-se, preliminarmente, a impos­sibilidade da impetração do writ contra a Portaria n? 209/86, como norma em tese que proibiu, de modo generalizado, as transferências do direto ao uso de telefones em todo o País e alterou o regime vi­gente, da Norma n? 5, Portaria n? 663/79, que permitia tais trans­ferências.

Ressalte-se - diz lá - que a norma constante da Portaria 209, embora proibitiva, não é auto-aplicável, porquanto a transferência nela vedada, enquanto facultada, deveria ser processada perante a concessionária prestadora do serviço, a esta cabendo, concretamen­te, deferir ou não a transferência cio telefone (fI. 21).

No mérito defende-se a legitimidade formal do ato impugnado, devido à competência do Ministro para baixá-lo (art. 85, incisos n e IV, da CF, e art. 39. Decreto-Lein? 200/67) nas áreas de teleco­municações e serviços postais, em substituição ao ConteI, que pas­sou a integrar a estrutura do Ministério como órgão de assessora­mento (fi. 23).

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Essa competência envolveria, por isso mesmo que se trata da telefonia como um serviço público, embora concedido, a transferi­bilidade ou não dos direitos do usuário à prestação do serviço tele­fônico, como assinante que apenas adere às condições impostas pe­las concessionárias em contratos impregnados da prevalência do in­teresse coletivo.

Em resumo, sustenta o informante que é da essência do serviço público a sua intransferibilidade, porquanto o único direito do usuário é o de haver a prestação do serviço, enquanto satisfizer suas obrigações junto ao concessionário. Contudo, admite a permis­são anterior das transferências de assinaturas do serviço telefônico público urbano (fi. 33).

Nunca se vislumbrou, porém, na faculdade de transferência, a . idéia de permitir-se a especulação, através de um verdadeiro comér­cio de telefones, em que terceiros e até mesmo empresas intermedia­doras substituíssem as concessionárias na tarefa de oferecer o servi­ço que é delas e para com isso obter lucros (fI. 34).

Tem-se argumentado que a transferência do direito de uso do serviço telefônico é legítima,. por ter valor econômico. Na realidade, esse propalado valor econômico somente existe em razão da transfe­ribilidade do direito de uso e da demanda reprimida. Acabada esta e com ela a escassez, o valor econômico tenderá a diminuir e a de­saparecer, evitando-se o desnaturamento do instituto da concessão.

O que vinha ocorrendo por mera liberalidade de anteriores nor­mas regulamentares, pode agora ser coibido pelo mesmo poder que permitiu as transferências a terceiros, tanto mais porque O' assinante não compra o telefone às concessionárias, que apenas recebem pela. colocação do áparelho e pelas tarifas do serviço.

Quanto ao problema da alegada inconstitucionalidade da por­taria, em face do art. 153, § 2?, da CF, sustentá a autoridade infor­mante que a palavra lei, no texto, refere-se ao diploma no seu senti­do material e não formal. Assim, qualquer ato normativo legítimo praticado por autoridade competente pode determinar obrigação fa~ zer ou não fazer (fI. 38).

No que concerne" igualmente, ao art. 153, § 3?, não há como pensar-se em direito adquirido do assinante, quando é dado ao po­der concedente alterar, sempre que julgar de interesse público, as normas regulamentares que regem a concessão, aí incluída a forma de fruição do serviço público ao usuário (fI. 38).

Finalmente, negam as informações os rumores da repercussão da medida na área econômico-social e reafirmam que se havia cria­do no País uma verdadeira indústria de atravessadores no processo

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de aquisição do direito às assinaturas de telefones, impondo-se ao poder concedente limitar o número de assinaturas que uma pessoa possa ter (fI. 42).

E esclarecem: «Em razão disso, verifica-se, hoje, que há pessoas, nos

grandes centros principalmente, possuidoras de 300 ou mais assinaturas. De posse delas, essas pessoas, ainda com base na faculdade de transferência, repassavam-nas a terceiros, por preços astronômicos, ou as locavam, igualmente, por preços abusivos. Além disso, multiplicavam-se em todo o País os ca­sos de transferências feitas a mais de uma pessoa, caracteri~ zando crime de estelionato. Na realidade, essa comercialização ilegítima, e às vezes criminosa, ao invés de atender à popula~ ção, estava trazendo prejuízos -enormes, além de desprestigiar o serviço público. O clamor popular fazia-se sentir, não só através do noticiário permanente da imprensa, como de incon­táveis correspondências dirigidas ao Ministério das Comunica­ções e até mesmo à Presidência da República, sempre no sen­tido de cobrar ao Governo, senhor do serviço, providências para pôr fim a esse descalabro.» (FI. 41).

A Telebrasília S.A. informou, às fls. 61/66, que não poderia deixar de cumprir a portaria ministerial, dadas as suas atribuições de mera empresa operadora dentro do sistema. Daí por que argüiu várias preliminares quanto ao cabimento do mandado de segurança, desde a sua (dela) ilegitimidade passiva ad causam até a carência de ação da impetrante.

No mérito, acompanha as informações ministeriais (fls. 63/65). A ilustrada Subprocuradoria-Geral da República, em parecer

da lavra do Dr. Paulo A. F. Sollberger, opina pela denegação do writ (fls. 69/82), valendo-se, em parte, dos argumentos contidos nas informações da 1 ~ autoridade impetrada, mas aperfeiçoando-os no relativo à natureza das relações entre o usuário e o serviço público, no Brasil, onde

« ... 0 instrumento jurídico pelo qual se estabelece o víncu­lo entre concessionário e usuário jamais contém cláusulas que não constituam simples repetiçã{) de disposição de lei ou de regulamento emanado da autoridade administrativa.» (Fi. 74).

S. Exa. votou, em seguida, deferindo a segurança, no que foi acompa­nhado pelo Sr. Ministro Torreão Braz. Assim o voto do Sr. Ministro Guei­ros Leite:

«A impetrante alega haver adquirido de Camilo Andrade Frois o telefone número 273.9173, que já se encontra instalado em sua re­sidência, fato ocorrido ànteriormente à edição da Portaria n? 209/66.

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Comprova a aqmslçao com um recibo de pagamento, à fI. 8, por cópia xerox, documento contra o qual não foi argüida qualquer irregularidade ou material, nas informações.

Procurei nos autos, além da indigitada portaria, o ato pelo qual a Telebrasilia S.A. teria deixado de atender ao pedido de transferência do telefone para a impetrante, mas sem êxito.

Sou levado, portanto, a considerar a perfectibilidade material e formal negócio de compra e venda. E acreditar no que disse a impetrante, que a TelebrasHia se negara a fazer a transferência do telefone para o seu nome 3).

Essa negativa teria sido apenas verbal, mas veio a ser confir­mada pela TelebrasHia em suas informações, primeiramente por não contestá-la e depois por afirmar que apenas cabia cumprir a portaria ministerial sub censura, a saber:

« ... ainda que a proibição contida na cogitada portaria pudesse 'ser tachada de ilegal, assim mesmo a autoridade do presidente da operadora, no caso o da Telebrasilia, não dispõe de competência para corrigi-la, visto que somente lhe resta cumprir, como fielmente vem cumprindo, o que lhe determina o poder concedente.» 63).

Dispõe o art. 131 Código Civil que as declarações constan-tes de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários. E o Código de Processo Civil também, no seu art. 368, que repete a linguagem do arL 131 e recohhece em tais decla­rações a qualidade de prova pré-constituída.

Essa prova presume-se verdadeira, presunção que se robustece se expressa ou tacitamente reconhecida em juízo, pela parte à qual é oposta, valendo como documento autenticado, sempre que o ato por ela instrumentado não reclamar forma especial (Amaral Santos, Comentários ao CPC, IV vol., Forense, 1 ~ ed., 1976, pág. 180).

Conforme já disse e repito, o negócio instrumentado às fls. 8 não foi contestado pela Telebrasília, nem pelo Senhor Ministro das Com unicações.

Tratando-se de mera quitação, não recebeu, por isso mesmo, o atavio da testemunhança em dobro, nem a transcrição no registro público para valer erga omnes.

Mas isso me parece normal, pois o contrário me levaria a pen­sar em excesso em negócio tão simples, prova demais ou prova ne­nhuma.

Não há dúvida, porém, que a transferência de um aparelho te­lefônico pelo usuário não é um negócio comum, mas vinculado às normas editadas pelo poder concedente e constantes, até mesmo, dos termos de concessão, normas essas que obrigam não apenas o concessionário do serviço, mas também os usuários.

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No âmbito das transferências de culação opera indiscutivelmente.

Assim é que, trazido à colação Geral da República, encontra-se nos autos a ga de 1947, que estabelecia normas para dos serviços telefônicos no

Dela se lê, na Cláusula 3~, que a aparelhos telefônicos em prédio ta em favor de pessoa que aH residisse, vo assinante, nos casos de 108).

Todavia, nem sempre a transferência

Também consta do mesmo contrato para o

essa vin,

do (antigo) Distrito Federal cláusula em que se nas redes geral e locais, que o contratante teria o direito de cobrar vinte mil réis para cada nova ligação das mas tivessem sido desHgadas por falta de !"UI'ó<U'""""

do telefone, ou pela transferência da rp","\"n,n

a terceiros antes de expirado o prazo respectivo (cf. - fls. 97/98).

Essa é, igualmente, a orientação das informações (fI. 32), onde se lê que desde o surgimento telefônico no País, no final do século passado até 1968, as transferências de assi­natura do serviço eram vedadas. Mas, diante de surgidos com transferências clandestinas, o poder concedente decidiu permi­tir fossem atendidos pedidos de transferência de assinaturas de um usuário para um candidato, quando formulados interessados perante a concessionária.

Posteriormente e diante da continuidade dos casos de reprimida e de transterências clandestinas, foram sobre transferências de assinaturas de serviço telefônico ur-bano, com aplicação geral.

Foi sob a regência da Portaria n? 663, de 18-7-1979 - a última que antecedeu à Portaria impugnada - que se o negócio da compra e venda pela impetrante.

Assim, muito embora o relacionamento entre o poder conce­dente e o concessionário, como entre este e o assinante se faça através de contratos regidos pelo direito regra sofre exceções. E a intransferibilidade apregoada nas informa­ções, como sendo da essência do serviço público, nem sempre se es­tende aos usuários que, conforme foi admitido pela própria autori­dade impetrada, sendo público e notório, pôde valer-se da compra e venda de aparelhos telefônicos corno aplicação lucrativa de merca­do, através da participação financeira de promitentes assinantes nos investimentos das empresas concessionárias de serviço de telefonia,

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plano surgido da deficiência de recursos governamentais para a ex­pansão do setor, prevendo-se que o pretendente participasse até mes­mo do capital da h olding , que no caso outra não era senão a pró­pria Telebrás S.A. (fls. 36/37).

Se é certo que houve abusos, não devendo a escassez de um serviço público servir de motivo para desnaturar-se a essência do instituto da concessão de tal serviço, não é cabível, porém, submeter-se o adquirente de um único aparelho telefônico ao mes­mo tratamento drástico dispensado aos chamados especuladores de mercado, aqueles que faziam o «comércio de telefones» à margem das concessionárias. Nem pretender, pelo uso legal de baixar nor­mas regulamentares, fazê-las retroagir para atingirem negócios ante­riormente permitidos.

1 A 1 ~ autoridade impetrada alega que a Portaria n? 209/86 é re­

gra de caráter geral, dirigida a todas as concessionárias e a todos os assinantes do serviço público de telefonia e não a um deles em par­ticular, configurando lei el!l tese.

Desse modo, sendo lei em tese, por configurar ato normativo, baixado por autoridade originariamente competente para disciplinar a espécie, contra a portaria não cabe mand~do de segurança, con­forme reiterada jurisprudência, já cristalizada na Súmula 266, do· STF.

De fato - dizemos nós - não cabe mandado de segurança contra a lei em tese, mesmo que se abstraia do sentido de lei como ato legislativo strictu sensu, para tê-la. como certos atos administra­tivos, que, embora não sejam commune praeceptum, revestem a forma de mandamento escrito, como é o caso da portaria.

Aqui, todavia, sob a forma de norma geral, temos uma porta­ria que encobre ato materialmente administrativo de aplicação ime­diata e traz em si o objetivo desejado, atingindo situações indivi­duais específicas e dando lugar à impetração do mandado de segu­rança.

Basta ler o seu item I: « ... ficam proibidas as transferências do direito de uso de

telefones em todo o País.» É, sem dúvida, norma de natureza proibitiva, que 'impõe ao in­

divíduo obrigação negativa, com efeitos que nascem imediatamente do texto.

Não há sequer necessidade de ato administrativo posterior, a . exemplo do caso dos autos, porque as concessionárias - também

coagidas pela norma - apenas se oporão à prática de qualquer al­teração de estado de fato anterior.

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Seria absurdo, porém, conforme comenta Seabra Fagundes, exigir-se que o indivíduo, «convencido da sua ilegitimidade (da nor­ma), aguarde o peso da sanção conseqüente da desobediência, para só então valer-se do controle jurisdicional» (Cf. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário, 6~ ed., rev. e atualiza­da, 1984, Saraiva, pág. 225).

A própria ilustrada Subprocuradoria-Geral da República admi­te que a Portaria n? 209, ao proibir as transferências de aparelhos telefônicos,atingiu-Ihes, ípso facto, ante iure, o valor econômico do respectivo direito de uso, no seguinte trecho de seu parecer:

« ... É que, na realidade, esse valor econômico somente existe em razão da possibilidade de transferência da' assinatura e dà escassez de telefones. Proibida a transferência ad negotia, como ocorreu por força da Portaria n? 209/86, complementa­da pela de n? 219/86, deixa esse direito de uso de ter o valor econômico que lhe propiciava a possibilidade de transferência. (Omissis).» (Cf. Dl de 7-10-1986, págs. 185578/9).

É certo, fala o parecerista em transferência ad negotia como a dizer da diferença entre atividade econômica e serviço público, pois este, segundo a doutrina de Jeze, é campo de atuação do Estado, constituindo a sua atividade na área econômica indiscutível exceção.

De fato é assim, mas desde que se tome a atividade econômica no sentido estrito de atividade privada ou com fins exclusivamente lucrativos, fora, portanto, da noção jurídica do serviço, caracteriza­do pela supremacia do interesse público sobre o privado.

Na relação poder concedente e poder concedido, a idéia é a se­guinte: embora o exercício da atividade possa ser atribuído a pes­soas jurídicas de direito privado, estas aderem às condições contra­tuais fixadas e alteráveis unilateralmente, submetendo também o usuário.

Isso é truísmo jurídico. Mas há situações variantes, em que a atividade econômica pode desenvolver-se mais intensamente, através do sistema de autofinanciamento, que é deferido pelo poder conce­dente ao concessionário do serviço telefônico, assunto sabido. '

Temos o caso da, Telemig, cujo contrato lhe permite lançar mão desse recurso, para a implantação ou ampliação do serviço ur­bano ou interurbano de telefonia, em que o promitente assinante participa financeiramente nos investimentos da empresa concessio­nária.

Converte-se em valores mobiliários (ações da Telebrás, a holding das concessionárias) a participação do público nos seus au­mentos de capital. E como bem acentuou Antônio Roberto Pires de Lima, Assessor Jurídico da própria Telemig, na impossibilidade

,« ... de prestação dos serviços à totalidade comunitária dele padecente, por força de aspectos de economia e técnica,

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adotou a Administração medida tangencial, legitimada pela ausência de recursos suficientes.»

(Cf. Considerações em torno do Serviço Público de Tele­comunicações e da Penhora de Telefones, Rev. Jur. das Co­municações, n? 2/84).

É pela participação financeira, portanto, que se alcança a assi­natura, direito de haver, em caráter individualizado e permanente, em instalações de uso particular, a prestação do serviço público te­lefônico, mas que não foge, daí em diante, à regulamentação admi­nistrativa comum (aut. e obro cits., pág. 9).

Eis, pois, a convicção de que nem sempre pode ser tão rígida a posição do poder concedente, porque, se está obrigado a reconhecer o direito de uso do assinante in rem propriam, não poderá negá-lo ao usuário in re aliena, quando constituído, ou transmitido, por ato inter vivos (Código Civil, art. 675), enquanto temporariamente des­tacado da propriedade (usufruto restrito, CC, art. 713), que é da União.

Contrário à transferência do direito de uso do telefone, por es­tar o serviço público de telefonia desentranhado, pela Constituição, do perímetro do mundo econômico, o ilustre Assessor Jurídico da Telemig, Antonio Roberto Pires de Lima, já citado (pág. 12), admi­te, contraditoriamente a esse ponto de vista,

a) que o assinante é o usuário a quem se confere ou reconhece o direito de haver, em caráter personalizado e permanente, em ins­talações de uso particular, a prestação do serviço (pág. 9), como conseqüência da participação financeira daquele nos investimentos das empresas concessionárias;

b) que às empresas concessionárias é dada apenas a explora­ção, sendo-lhes defeso ceder o domínio do serviço, senão a título precário para terceiro, ou melhor, nos termos da regulamentação regente (textua1, fI. 12).

Ora, o que foi desentranhado do mundo econômico não pode ser objeto de investimento financeiro. E o de que se trata, na hipó­tese, não é da cessão de domínio do serviço, realmente intangível, mas da assinatura ou do uso, in rem proprÍam ou in re aliena.

Não nega, tampouco, o referido autor (como outros) que a ju­risprudência dos tribunais deitou por terra os clamores publicísticos das concessionárias e, titulando o bem cessível como direito de uso, fê-lo expropriar através da penhora do aparelho telefônico (pág. 13).

O Tribunal Federal de Recursos já decidiu que, tendo sido efe­tivada a penhora, a subseqüente transferência da linha telefônica (direito de uso de assinante) importara em fraude à execução (AC n? 88.2421RJ, 4~ Turma, 15 de fev. 1984).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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o Supremo Tribunal Federal também já decidiu que estando o usuário, titular da transferência do aparelho, devidamente formali­zada, em dia com o pagamento das mensalidades, impossível o seu desligamento por ato unilateral do concessionário (RT J 106/1170 a 1171, RE 98.931/RJ, l~ Turma).

2

A 2~ impetrada argúi, às fls. 61 a 63, a sua ilegitimidade passi­va ad causam, porque' não dispõe de poder para corrigir as possíveis ilegalidades impugnadas, restando-lhe apenas fielmente cumprir, como vem cumprindo, o que lhe determina o poder conce­dente.

Por isso mesmo foi chamada aos autos, por encontrar-se jungi­da à norma ministerial, furtando-se ao pedido de transferência do aparelho telefônico da impetrante. Como não se pretende aqui a su­pressão da Portaria n? 209, mas apenas dos seus efeitos quanto à usuária do telefone, importa se obrigue a tanto a Telebrasília, comO longa manus do poder concedente.

3

No RE n? 98.931/RJ, citado, aflora-se o mesmo ponto aqui ressaltado, qual o de que a autoridade impetrada, baseada em reso­lução posterior, pretendeu atingir a situação juríd,ica do impetrante, que se formara antes (RTJ 106/1171). .

O Ministro Pádua Ribeiro, votando recentemente no Mandado de Segurança n~ 113.008/DF, decidiu que a Administração pode re­vogar os seus atos praticados em harmonia com a lei, por não mais convir a sua subsistência. Todavia, os particulares não podem ser afetados nos seus legítimos interesses, que se tenham consolidado à sombra de orientação que a Administração pode revogar os seus atos praticados em harmonia com a lei, por não mais convir a sua subsistência. Todavia, os particulares não podem ser afetados nos seus legítimos interesses, que se tenham consolidado à sombra de orientação que a Administração considerava conveniente ao interes­se público.

A mudança de critério só pode atingir atos futuros.

4

Há, pois, lesão a reparar e direito líquido e certo a proteger pela via do writ, que concedo.

É como votO».

Pedi vista dos autos e os trago, a fim de retomarmos o julgamento do mandado de segurança.

Passo a votar.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, nov, 1989. 951

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Há serviços públicos e serviços públicos. O eminente Ministro Moreira Alves, em conferência que pronunciou no X Simpósio Nacional de Direito Tributário, sobre o tema Taxa e Preço Público, realizado em São Paulo, em 19 de outubro de 1985, informou que a Suprema Corte, recentemente, cuidou do problema das Taxas Judiciárias, possibilitando-lhe estabelecer classificação dos serviços públicos, assim: a) serviços públicos ínsitos à so­berania, que são serviços de natureza indelegável, relativamente facultati­vos. O serviço judiciário, por exemplo. Esses serviços são remunerados por

. taxa; b) serviços públicos essenciais. ao interesse público, obrigatórios para o particular, remunerados, também, por taxa. Exemplo: a coleta de lixo; c) serviços públicos não essenciais, prestados no interesse público, mas que o particular poderá deles abrir mão, sem que, com isto, prejudique a coletivi­dade. Estes últimos admitem a concessão - o que não acontece com os dois primeiros - e são rem1,lnerados por preços públicos. (Vittório Casso­ne, ,Célia Pacheco Teixeira e Carlos Toledo Abreu Filho, «X Simpósio Na­cional de Direito Tributário: Taxa e Preço Público», Resenha Tributária, Seção 1.3, Edição 5, 1986, Comentário 1.3).

A colocação feita pelo eminente Ministro Moreira Alves, colocação que é, aliás, da Corte Suprema (RepJ:esentação n? 1094-SP), é científica e possi­bilita ·desdobramento. Um desses, é que há serviços públicos e serviços pú­blicos. Destarte, não é possível afirmar, radicalmente, que não há direito adquirido em torno de um serviço público. Pode haver, por exemplo, em torno do serviço público não essencial, remunerado por preço público,. caso em que pode .haver concessão. É o caso do serviço de tele-fones. Esse servi­ço, . aliás, é posto à disposição do público mediante o sistema de autofinan­ciamento. De regra, a implantação do serviço urbano ou interurbano de te­lefonia é feita com a participação financeira do usuário nos investimentos da empresa concessionária, compra de ações, etc. Com propriedade, escre­veu o eminente Ministro Gueiros Leite, no seu voto:

«É pela participação financeira, portanto, que se alcança a as­sinatura, direito de haver, em caráter individualizado e permanente, em instalações de uso particular, a prestação do serviço público te­lefônico, mas que nã.o foge, daí em diante, à regulamentação admi­nistrativa comum (aut. e obr. cits., pág. 9).»

O direito de uso, pois, do telefone, que resulta da assinatura, não é conferido, gratuitamente, ao usuário, mas por este adquirido. Há, pelo me­nos, vinte anos que isto ocorre no Brasil, certo que, no princípio deste mês de dezembro, os grandes jornais do País ostentaram grandes anúncios, pu­blicados pelas concessionárias, do plano de expansão dos telefones, concla­mando o público a adquiri-los, mediante pagamento de preço à vista e a prazo, com financiamento concedido pelas próprias concessionárias.

É com base nessa realidade, que tanto esta Egrégia Corte quanto o Co­lendo Supremo Tribunal Federal consagraram a legitimidade da penhora do

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direito de uso do telefone. No AgPt n? 35.569-MG, Rêlator o Sr. Ministro Jorge Lafayette, decidiu a Egrégia 1 ~ Turma:

«Embargos de terceiro. Penhora sobre direito de uso do apare­lho telefônico.

Se o aparelho telefônico, em si, juntamente com os equipamen­tos, rede, etc., pertence à concessionária dos serviços, o direito ao seu uso, dotado de valor econômico, pertence ao usuário, e é alie­nável, em princípio, não se provando, no caso, existência de proibi­ção à sua cessão.

Pode, em conseqüência, a penhora, em execução contra o usuário, recair sobre esse direito:

Rejeição dos embargos de terceiro, oferecidos pela concessioná­ria dos serviços telefônicos.» (Dl 18-3-74).

Esclareça-se que a agravante, no .caso indicado, era a Cia. Telefônica de Minas Gerais.

Na AC n? 54.554-MG, por mim relatada, apelante a Telecomunicações de Minas Gerais S.A. - Telemig, apelada a União Federal, a Egrégia 4~ Turma decidiu:

«Processual Civil. Telefone. Penhora. Embargos de terceiro.

I - O direito de uso de aparelho telefônico possui valor econômico e, como tal, é penhorável, como o é a própria empresa concessionária de serviço público (CPC, art. 678).

II Embargos de terceiro opostos pela concessionária rejei­tados.

In Precedentes do TFR e do STF.

IV Recurso desprovido.» (Dl 11-9-80).

* * * No meu voto, disse eu:

«Em diversas sentenças que proferi,. como Juiz Federal em Mi­nas, sustentei a tese no sentido de que o direito de uso de aparelho telefônico possui valor econômico e, como tal, é penhorável. O que deve ser reconhecido é que o aparelho telefônico em si, seus equipa­mentos, rede, cabos, etc., pertencem à concessionária. O uso, toda­via, que tem valor econômico, este pertence ao assinante. E não nos consta, nem a apelante o provou, que seja proibida a transferência de tal uso. Pergunta-se: poderia o assinante, cumpridas as formali­dades próprias, transferir esse uso a outrem? A resposta é afirmati­va. Ora, se tal transferência pode ser feita assim, livremente, pela vontade do assinante, na maioria das vezes em troca de bom dinhei­ro (a prova disso são os inúmeros anúncios de «compra e venda» de telefones estampados nos jornais, o que é notório), por que não poderia sê-lo judicialmente, a fim de responder por um débito do assinante com uma entidade pública?

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 953

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Esta Eg. Corte, por mais de uma vez, acolheu o entendimento acima (AgPt n? 35.569-MG, Relator Ministro Jorge Lafayette Gui­marães, decisão de 24-10-73).

tos.

A Corte Suprema, a seu turno, decidiu: «Telefone. O seu direito de uso é penhorável. Se a pró­

pria empresa concessionária de serviço público é penhorável (CPC, art. 678), não faz sentido pretender excluir-se do ato de constrição judicial direito de uso, decorrente de contrato cele­brado com terceiro, de bem àquela pertencente.

Ademais, a alienação do direito ao uso em leilão não acarreta nenhum obstáculo à sua aquisição, vez que o adqui­rente estará ciente de que haverá de aderir às normas discipli­nadoras daquele direito e, em aderindo, não se lhe poderá ne­gar o uso.

RE conhecido, mas improvido.» (RE n? 86.172-MG, Re­lator Ministro Cordeiro Guerra, RTJ 88/969).

Diante do exposto, confirmo a sentença, por seus fundamen-

Nego provimento ao apelo.»

Corte Suprema, no RE 86.172-MG, Relator o Sr. Ministro Cordeiro Guerra, decidiu:

«Telefone. O seu direito de uso é penhorável. Se a própria empresa concessionária de serviço público é pe­

nhorável (Código de Processo Civil, art. 678), não faz sentido pre­tender excluir-se do ato de constrição judicial direito de uso, decor­rente de contrato celebrado com terceiro, de bem àquela pertencen­te.

Ademais, a alienação do direito ao uso em leilão não acarreta nenhum obstáculo à sua aquisição, vez que o adquirente estará ciente de que haverá de aderir às normas disciplinadoras daquele di­reito e, em aderindo, não se lhe poderá negar o uso.

RE conhecido, mas improvido.» (RTJ 88/969)

Ressalte-se que as concessionárias est.imulavam a venda dos telefones, em anúncios, como um excelente investimento, conforme demonstrou o Sr. Ministro Pádua Ribeiro, em voto recente, neste Plenário. As contas de tele­fones traziam, até, um número da bolsa de telefones, para obtenção de in­formações a respeito de compra e venda de telefones.

Em síntese, durante cerca de vinte anos, no Brasil, o direito de uso do telefone foi colocado no comércio, pelo próprio Poder Público, que, além de praticá-lo, o estimulava. De um momento para o outro, quer-se proibir

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esse comércio. Isto talvez seja possível, é claro, para o -futuro. Os telefones adquiridos pelos usuários no sistema de livre comércio deverão permanecer como tal, sob pena de se fazer tábda rasa do princípio da boa-fé, princípio que orienta o regime administrativo, já que «EI principio de la buena fe es exigibfe eu los actos jurídicos, en ei ejercicio de los derechos y en ei cumpli­miento de-las obligaciones», ensina Gonzales Perez (<<El Principio General de la Buena Fe en eI Uerecho Administrativo», Madrid, 1983, p. 16), e por­que, a lição é de Larenz (<<Derecho de Obligaciones», ed. esp., Madrid, 1958, 1/144), citado por Gonzales Perez, (ob. cit., pág. 26), «La salvaguar­dia de la buena fe y eI mantenimiento de la confianza forman la base deI tráfico jurídico y, en particular, de toda la vinculación jurídica individual. Por esto, eI principio no puede limitarse a las relaciones obrigatorias, sino que es aplicable siempre que exista una especial vinculación jurídica, y en este sentido puede concurrir, por tanto, en ei Derecho de cosas, en eI Dere­cho procesaI y ei Derecho público.» Bem por isso, conclui Gonzales Perez, o princípio da boa-fé aplica-se tanto a atos discricionários quanto a vincula­dos, certo que o caráter público_ de, certos interesses públicos não implica oposição ao interesse privado. Vale transcrever a lição de Gonzales Perez:

«Por supuesto, el de buena fe, corno los demás principios gene­rales, constituye uno de los más preciados criterios a tener en cuen­ta aI enjuiciar las actuaciones discrecionales, y tendrá en ellas su más amplio campo de aplicación. Pero jugará también un decisivo papel cuando la Administración realice actividades regladas. Porque corno tal principio informará la interpretatión de la norma, acto (l

contrato que reglamenten la actividad, admás de imponer, sin dis­tinción alguna, que el ejercicio de derechos o potestades y ei cum­plimiento de obligaciones y deberes se conforme a las exigenci~s de la buena fe.

c) y, por último, tampoco excluye la consideración de la buena la distinta naturaleza de los intereses en juego. Pues el carácter pú­blico de ciertos intereses, no implica oposión ni desvinculación deI

. interés privado. No existen intereses públicos «impersonales» distin­tos de los que interesan particularmente a los ciudadanos. Los inte­reses públicos y los intereses privados están implicados entre si has­ta tal punto que qualquier interés público es, también, interés privado». (J. Gonzales Peres, ob. cit., págs. 28/29).

Ora, durante anos e anos o direito de uso do telefone foi, não custa re­petir, objeto de comércio, era livremente transferível, desde que obedecidas certas exigências, sempre com o beneplácito e até com o estímulo do Poder Público; mudar as regras do jogo, inopinadamente, é fazer, conforme fala­mos, tábula rasa do princípio da boa-fé que deve orientar e predominar nas relações Administração-Administrado.

Diante do exposto, adiro ao voto do eminente Ministro Gueiros Leite. Defiro, destarte, o writ.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 955

Page 41: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

VOTO (VOGAL)

o EXMO. SR. MINISTRO MIGUEL FERRANTE: No extinto Tribu­nalFederal de Recursos sustentei que a Portaria n? 209/86, do Ministro das Comunicações, não feria direito adquirido ao vedar a transferência do uso de linhas 'telefônicas, adquiridas antes de sua publicação. A propósito ano­to, entre outros, o voto que proferi no julgamento dOaMS n? 114.464-DF ..

Inobstante, prevaleceu entendimento contrário que, por fim, a própria administração veio a convalescer, através de instruções baixadas nesse senti­do.

Assim, diante do fÇl.to superveniente que favorece à impetração, acom­panho o eminente relator, com ressalva do meu ponto de vista. ,.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr.. Presidente, indeferi­ria esse tipo de mandado de segurança, mas depois que o próprio Poder Público voltou atrás, no sentido de tornar legítimos determinados contra­tos, passei a acompanhar a jurisprudência do Tribunal.

Com esta ressalva, acompanho o eminente Ministro Relator.

VOTO (VENCIDO)

O E~MO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Senhor Pre­sidente, na sessãó anterior externei o meu entendimento quanto à natureza jurídica do contrato, chamado de locação da linha de Telecomunicações. E a portaria - que regula, de modo genérico, e que não se confunde cóm a homônima de ato administrativo - encerra conjunto de obrigações de quem, no caso, o locatário, adere àquelas condições. Estabelece que somen­te poderá ser transferida linha com a anuência expressa do prestador de ser­viço. A concessionária está, portanto, prcitegida através da Portaria do Sr. Ministro das Comunicações. Não afrontou direito do locatário, porquanto, no instante em que celebrou o contrato, estava expressa a ressalva da proi­bição da transferência.

Pedindo respeitosa vênia à egrégia Seção, denego a segurança.

EXTRATO DE MINUTA

MS n? 60 - DF - (Reg. n? 89.7453-9) - Relator: Exmo. Sr. Min. Carlos M. Velloso. Impetrantes: Erivaldo Coelho Bastos e outros. Impetra­do: Ministro de Estado das Comunicações. Advogado: Dr. Geraldo Andra­de Fonteles. '

Decisão: A Seção, por maioria, vencido o Sr. Ministro Vicente Cernic­chiaro, deferiu em parte o mandado de segurança. (15-8-89, 1 ~ Seção).

956 R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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Os Srs. Ministros Miguel Ferrante, Pedro Acioli, América Luz, Geral­do Sobral, llmar Galvão, José de Jesus e Garcia Vieira votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG.

-- 8--

MANDADO DE SEGURANÇA N? 61 - DF (Registro n? 89.7454-7)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral Impetrantes: Eoje Telecomunicações SI A e outro Impetrado: Ministro de Estado das Comunicações Advogados: Drs. Salvador Fernando Sal via e outros

EMENTA: Mandado de segurança. Portaria n? 209/86 do Ministro das Comunicações. Direito adquirido.

I - Nesta ,egrégia Corte predomina· o entendimento de que a Portaria n? 209/86, do Ministério das Comunicações, não pode ser aplicada retroativamente.

11 - Segurança concedida; em parte,a fim de assegurar às impetrantes o direito de comercializar os telefones que te­nham sido adquiridos por elas, ou por terceiros, antes da vi­gência da malsinada Portaria.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, venci­

do o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro, conceder em parte o mandado de segurança, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 8 de agosto de 1989 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro GERAL­

DO SOBRAL, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL: Eoje Telecomunica­ções SI A e Jorge Telecomunicações SIC Ltda. impetraram mandado de se­gurança contra ato do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Comunicações, que, através da Portaria n? 209, de 6-8-86, proibiu a transferência do direi­to de uso de telefones em todo o País.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 957

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Alegam os impetrantes, em síntese, que «têm por objetivo principill a prestação de serviços de assessoramento nas negociações de transferência de linhas telefônicas, auxiliando os particulares, titulares do direito de uso de telefones, em transações referentes a compra e venda dos mesmos ... », e que «sempre' atuaram de acordo com a legislação específica pertinente à maté­ria, cumprindo também com as obrigações fiscais, trabalhistas e financeiras previstas em lei». Ocorre que «em virtude de tal ato, as empresas que atuam no mercado telefônico estão impedidas de continuar exercendo as funções para as quais foram criadas, acarretando-lhes prejuízos econômico­financeiros definitivos, visto que estão sendo impedidas de exercerem uma atividade lícita, sem a qual não poderão cumprir com as suas obrigações fi­nanceiras e trabalhistas, levando-as, sem dúvida, à falência, ou ao encerra­mento puro e simples de suas atividades, com enormes prejuízos para seus titulares e funcionários». Aduzem, ainda, que a aludida portaria é desprovi­da de qualquer sustentação em nosso ordenamento jurídico, por ferir dispo­sição contratual que permite a transferência do direito de uso do telefone; bem como por desrespeitar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Por este motivo, pediu a concessão da medida liminar e, ao final, a segurança em definitivo a fim de permitir às empresas o livre exercício e a continuida­de daS atividades anteriormente desenvolvidas.

Procéssado com liminar e notificada a autoridade apontada como coa­tora, advieram as informações de fls. 70/93, sustentando a legitimidade do seu conteúdo e a falta de ofensa à Constituição.

Instado, o douto Ministério Público manifestou-se pelo indeferimento do writ.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR: MINISTRO GERALDO SOBRAL (Relator): Senhor Presidente, a matéria já é por demais conhecida nesta egrégia Corte, haja vista os inúmeros mandados de segurança impetrados contra a mencionada Portaria n? 209, de 6-8-86, do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Comuni­cações.

No que pertine a competência da autoridade impetrada para a prática do ato parece-me não haver divergência.

Quanto ao mérito, comungo o mesmo entendimento esposado pelo eminente Ministro Armando Rollemberg, no sentido de que «revogação do ato administrativo é princípio de direito, não podendo se dar sem que sejam mantidos os efeitos por ele produzidos e, conseqüentemente, no caso dos autos, o direito do detentor do uso de linhas telefônicas em tal momento, a proceder à. respectiva transferência».

No mesmo sentido é o pronunciamento do preclaro Ministro Pádua Ri­beiro, quando, ao apreciar o Mandado de Segurança n? 113.008-DF (7935307), in RITFR n? 154/301, em sua ementa, assim dispôs:

958 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

Page 44: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

«EMENT A. Mandado de Segurança. Ato normativo. Ca­bimento, no caso.

Administrativo. Concessão. Telefones. Direito de uso. Proibição da transferência em todo o País. Portaria n? 209, de 6-8-86, do Ministro das Comunicações. Necessidade de .res­peitar as situações jurídicas definitivamente constituídas antes da sua promulgação. Ato administrativo. Revogação. Efeitos.

I - Cabe mandado de segurança contra portaria que contém, em si mesma, medida coercitiva, sendo apta, por si . só, independente da atuação de qualquer outra autoridade, a causar lesão a direito de que as impetrantes se julgam titula­res.

11 - A administração pode revogar os seus atos prati­cados em harmonia com a lei, por não mais convir a sua sub­sistência. Todavia, os particulares não podem ser afetados nos seus legítimos interesses, que s.e tenham consolidado à sombra de orientação que a Administração considerava conveniente ao interesse público. A mudança de critério só pode atingir atos futuros.

111 - No caso, tendo editado normas, admitindo a trans­ferência de assinaturas de telefones e a sua locação, não pode a Administração, ao revogá-las, deixar de respeitar as situa­ções jurídicas constituídas sob a sua égide. Resolução n? 12, de 12 de março de 1968, do Contel.Portarias n?s 351, de 26-6-72, 663, de 18-7-79, e 209, de 6-8-86, do Ministro das Co­municações. Aplicação da Súmula n? 473 do STF.

IV - Ao conceder a segurança, entendeu a maioria de restringi-la às linhas telefônicas adquiridas até a data de vigên­cia da Portaria atacada (Voto-médio do Ministro Armando Rollemberg e José Dantas).

V - Mandado de segurança conhecido e concedido, em parte.»

Com estas considerações e tendo em vista que o presente mandamus é semelhante ao ora sub judice, concedo, em parte, a segurança, a fim de as­segurar às impetrantes o direito de comercializar os telefones que tenham si­do adquiridos por elas, ou por terceiros, das concessionárias de serviço tele­fônico, anteriormente à publicação da Portaria n? 209, de 6-8-86.

É o meu voto.

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Senhor Pre­sidente, é a primeira vez que voto matéria do conteúdo versado nesta Segu­rança. Então, pediria vênia ao Tribunal para fazer algumas considerações.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 959

Page 45: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

Trata-se, na hipótese, de po.rtaria baixada pelo. Exmo.. Sr. Ministro. de Estado. das Co.municações. To.davia, não. tem, a não. ser literalmente, identi­dade co.m a po.rtaria - ato. de direito. administrativo. - que disciplina a atuação. interna de órgão.s. A entidade cedente, prestado.ra de serviço. de te­lefo.nia, ao. celebrar co.m o. lo.catário. o. respectivo. co.ntrato. - que é de no.rmas-padrão. - co.nsta de po.rtaria o.riginária. Co.nstitui, po.rtanto., co.n­junto. de direito.s e deveres que vincula o. prestado.r do. serviço. e o. lo.catário.. Essa po.rtaria o.riginária, que é a de número 663, de 1979, estabelece que a lo.cação..é o. direito. de usar, em caráter individualizado., equipamento.s e cir­cuito.s especiais de telefo.nia, o.u de haver a prestação. de serviço. telefônico. público. em caráter individualizado. e tempo.rário. em instalações de uso. par­ticular~

Além disso., a Cláusula 17.1 estabelece que a sublo.cação. e a transferên­cia co.m co.ntrato. de terceiro. dependem de prévia auto.rização. da prestado.ra. Acrescente-se, a prestação. desse serviço. é nitidamente de interesse público.. Em sendo. assim, data venia, há po.ssibilidade de o. Estado. intervir para ga­rantir o. equilíbrio. do. prestado.r do sefviço. e do. usuário..

Sendo. assim, e acentuando. mais uma vez que o. co.ntrato. é de adesão., não. há, no. meu mo.do. de ver, co.m a devida vênia, direito líquido. e certo. do. impetrante para exigir a co.mercialização.. A cessão. co.nfere a alguém a Po.s­sibilidade de transferir a o.utrem direito.s e o.brigações. Evidentemente, no.s limites do.s direito.s e o.brigações do. cedente. Se o. lo.catário. da prestação. de serviço. de telefo.ne vinculo.u-se a uma no.rma ao. afirmar que a transferência depende de auto.rização. da prestado.ra, data venia, sem que esta o.co.rra, não. po.de legitimamente o.perar.

Assim sendo., pedindo. mais uma vez vênia ao. Egrégio. Tribunal, denego. a segurança.

VOTO (VOGAL)

O EXMO. SR. MINISTRO MIGUEL FERRANTE: No. extinto. Tribu­nal Federal de Recurso.s sustentei que a Po.rtaria n~ 209/86, do. Ministro. das Co.municações, não. feria direito. adquirido. ao. vedar a transferência do. uso. de linhas telefônicas, adquiridas antes de sua publicação.. A pro.pÓsito. ano.­to., entre.o.utro.s, o. vo.to. que pro.feri no. julgamento. do. MS n? 114.464-DF.

Ino.bstante, prevaleceu entendimento. co.ntrário. que, po.r fim, a própria administração. veio. a co.nvalescer, através de instruções baixadas nesse senti­do..

Assim, diante do. fato. superveniente que favo.rece à impetração., aco.m­panho. o. eminente relato.r, co.m ressalva do. meu po.nto. de vista.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente, também fixava-me na po.sição. aqui explicada pelo. eminente Ministro. Miguel Ferran-

960 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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te, denegando a segurança. Mas houve ato ministerial posterior admitindo a comercialização de linhas telefônicas nos casos nele especificados.

Para mim a matéria está vencida no Tribunal. Por isso, pedindo vêniá ao eminente Ministro Vicente Cernicchiaro, acompanho o voto do eminente Ministro Relator.

EXTRA TO DA MINUTA

MS n? 61 - DF - (Reg. n? 89.7454-7) - ReI.: O Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral. Imptes.: Eoje Telecomunicações S/A e outro. Impdo.: Ministro de Estado das Comunicações. Advs.: Drs. Salvador Fernando Sal­via e outros.

Decisão: A Seção, por maioria, vencido o Sr. Ministro Vicente Cernic­chiaro, concedeu em parte o mandado de segurança. (8-8-89 - 1 ~ Seção).

Os Srs. Ministros Ilmar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Miguel Ferrante, Pedro Acioli e Américo Luz votaram com o Relator. O Sr. Minis­tro Carlos Velloso não compareceu à Sessão por motivo justifícado. Presi­diu a Sessão o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

--e--

MANDADO DE SEGURANÇA N? 68 - DF (Registro n? 89.0007460-1)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Ilmar Galvão Impetrantes: Alfredina Sant'Ana e outros Impetr:ados: Ministro de Estado do Trabalho e Ministro-Chefe da Se­

cretaria de Administração Pública da Presidência da República

Advogado: Dr. Afonso Lobato Madeira

EMENTA: Direito administrativo. Funcionalismo. Arqui­vistas. Registro profissional.

Deferido em função das normas regulamentares vigentes à época, o registro autorizado pela Lei n? 6.546/78, art. I?, IV, não pode sofrer a genérica e indiscriminada revisão insti-· tuída sob sanção de cancelamento compulsório (Portaria ln­terministerial n? 3.369/86, item IV, redação da Portaria n? 3.402186), senão com ofensa aos princípios inscritos no art. 153, § 3?, da Constituição Federal. Proteção mandamental de­ferida, ressalvado à administração o poder de rever, caso a ca­so, os registros porventura sob suspeita de ilegalidade, por fraude na sua obtenção, assegurada aos respectivos indiciados a mais ampla defesa.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, nov. 1989. 961

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ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

deferir parcialmente o mandado de segurança, na forma do relatório e no­tas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado

Custas, como de lei. Brasília, 13 de junho de 1989 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro ILMAR

GALVÃO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GALV ÃO: A douta Subprocura­doria-Geral da República, no parecer de fls., da lavra de seu eminente titu­lar, Dr. Paulo A. F. Sollberger, resumiu com exatidão a espécie, in verbis:

962

«Alfredina Sant' Ana e outro~ (20) arquivistas do Serviço Públi­co Federal imp~train a presente segurança contra· atos dos Srs. Mi­nistro do Trabalho e Ministro-Chefe da Secretaria da Administra­ção Pública da Presidência da República, consubstanciados na Por­taria Interministerial n? 3.369, de 4-11-86, e na Instrução Normati­va n? 187, de 24-12-86.

Argumentam os impetrantes que os registros como arquivistas, por eles obtidos nas Delegacias Regionais do Trabalho, de acordo com a Lei n? 6.546/78 e Decreto n? 82.590/78, são imodificáveis e definitivos, não se sujeitando, assim, às novas exigências para a comprovação da habilitação previstas na citada Portaria Interminis­terial n? 3.369/86, que, em seu item IV, com a redação dada pela Portaria n? 3.402, de 16-12-86, dispôs:

«IV - Para os efeitos da Lei n? 7.446, de 20 de de­zembro de 1985, os registros de Arquivistas, concedidos após 5-7-78, com base no item IV do artigo I? da Lei n? 6.546/78, cuja documentação esteja em desacordo com a presente Porta­ria, serão revistos pelas Delegacias Regionais do Trabalho que os emitiram, concedendo-se o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, a contar da data da publicação desta Portaria, a seus portadores para apresentarem às respectivas Delegacias Regio­nais do Trabalho a documentação exigida, a fim de revalidá­los. O não cumprimento da exigência implicará cancelamento do registro e a publicação do. ato no Diário Oficial da União».

Sustentam, ainda, que, pelas mesmas razões, não estão obriga­dos a atender o requisito da. escolaridade - conclusão do 2? ciclo colegial ou 2? grau de ensino - que entendem haver sido exigido pela Instrução Normativa n? 187.

Ro Supo Tribo Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 19890

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Pedem, por conseguinte, lhes seja concedida a segurança para reconhecer a validade de seus registros profissionais e assegurar-lhes a reclassificação na Categoria Funcional de Arquivista com base nesses registros.

As informações ministeriais sustentam, em preliminar, o desca­bimento do writ e, no mérito, defendem a legalidade do ato impug­nado, invocando a Súmula n? 473 do Colendo Supremo Tribunal Federah>.

No curso do feito, requereram sua admissão na relação processual, co­mo litisc.onsortes impetrantes, outros dez arquivistas, alegando encon­trárem-se nas condições descritas na inicial.

O parecer do órgão do Ministério Público foi no sentido da concessão parcial da ordem, «ressalvada à Administração a faculdade de rever ex offido, caso a caso, os registros sob suspeita de terem sido ilegalmente con­cedidos».

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Direito administrativo. Funcionalismo. Arqui­vistas. Registro profissional.

Deferido em função das normas regulamentares vigentes à época, o registro autorizado pela Lei n? 6.546/78, art. I?, IV, não pode sofrer a genérica e indiscriminada revisão insti­tuída sob sanção de cancelamento compulsório (Portaria In­terministerial n? 3.369/86, item IV, redação da Portaria n? 3.402186), senão que com ofensa aos princípios inscritos no art. 153, § 3?, da Constituição Federal. Proteção mandamen­tal deferida, ressalvado à Administração o poder de rever, ca­so a caso, os registros porventura sob suspeita de ilegalidade, por fraude na sua obtenção, assegurada aos respectivos indi­ciados a mais ampla defesa.

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL VÃO (Relator): Ao opinar do modo acima exposto, assim argumentou o ilustrado parecer da douta Subprocuradoria-Geral da República:

«A preliminar de não cabimento do mandado de segurança é suscitada ao fundamento de haver o mesmo sido impetrado contra a lei em tese.

Contudo, fixando a malsinada Portaria 3.369/86 um prazo de 45 dias para os interessados revalidarem seus regiúros de Arquivis­tas, tem-se que se trata, no caso, de ato de efeitos concretos, que traz em si o mesmo resultado pretendido, independentemente de qualquer ato executório (Hely Lopes Meireles, «Mandado de Segu­rança e Ação Popular», 1O~ ed., pág. 15).

R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, nov. 1989. 963

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964

Entendemos, assim preliminarmente, cabível o mandamus. No mérito, a Lei n? 6.546/78, que regulamentou as profissões

de Arquivistas e de Técnicos de Arquivo, estabeleceu: Art. I? O exercício das profissões de Arquivistas e de

Técnico de Arquivo, com as atribuições estabelecidas nesta lei, só será permitido:

11 - aos diplomados no exterior por cursos supe­riores de Arquivologia, cujos diplomas sejam revalidados no Brasil na forma da lei.

111 - aos Técnicos de Arquivo portadores de certi­ficados de conclusão de ensino de 2? grau;

IV - aos que, embora não habilitados nos termos dos itens anteriores, contem, pelo menos, cinco anos iilinterruptosde atividade ou dez intercalados, na data de início da vigência desta lei, nos campos profissionais de Arquivologia ou da Técnica de Arquivo;

A seu turno, o Decreto n? 85.590/78, regulamentando o item IV do art. I? da Lei 6.546, dispôs que as atividades profissionais se­riam comprovadas mediante a apresentação de documentos que de­monstrem irrefutavelmente o exercício (art. 5?, § 2?) .

. Tal comprovação, no que se refere àqueles que, no Serviço PÚ­blico, vinham exercendo de fato funções de arquivista, foi feita me­diante a apresentação de certidões e declarações assinadas pelos res­pectivos chefes.

Esses documentos, não raro fornecidos graciosamente, soma­dos a uma deficiente avaliação, por parte das Delegacias de Traba­lho, das verdadeiras atribuições de um Arquivista ou de um Técnico de Arquivo, possibilitaram o registro de pessoas sem habilitaç~o pa­ra o ~xercício dessas profissões.

Foi precisamente tal situação que a Portaria 3.369/86 procurou corrigir ao determinar a revisão de todos os registros cuja documen­tação estivesse em desacordo coma nova regulamentação por ele aprovada. Esse regulamento passou a exigir a comprovação de exercício da profissão mediante amostragem de trabalhos, com oes­clarecimento de que somente poderiam ser considerados «os traba­.lhos que se enquadram nas atribuições dos Arquivistas, definidas na Lei n? 6.546/78.

A Administração, é certo, «pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos» (Súmula 473 do STF).

Assim, constatado e comprovado o favorecimento nas declara­ções ou o erro na concessão dos registros, pode a Administração,

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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em cada caso concreto, rever o registro, para anulá-lo. Não pode fazê-lo, entretanto, indiscriminadamente, à luz de critérios e exigên­cias não previstos na regulamentação vigente à época dos registros.

A malsinada portaria, sob esse aspecto, atinge direitos adquiri­dos e ofende atos jurídicos perfeitos; é injusta, além do mais, por­que desestabiliza situações consolidadas pelo tempo, trazendo o de­sassossego e a insegurança a um grupo numeroso de servidores, cu­ja maioria certamente faz jus ao registro obtido.

Mas não é só. A Portaria Interministerial padece ainda do vício de ter ultrapassado os limites estabelecidos no decreto que a autorizou.

Com efeito, dispõe o Decreto n? 93.480, de 20-10-86:

«Art. 1 ~ Para os efeitos de reclassificação e de ingresso . nas categorias funcionais de Arquivista e de Técnico de Arqui­vo do Grupo-Arquivo do Serviço Civil do Poder Executivo, será exigido o registro profissional previsto no art. 4~ da Lei n~ 6.546, de 4 de julho de 1978.

Art. 2~ O Ministério do Trabalho e a Secretaria de Ad­. ministração Pública da Presidência da República, em conjun­to, expedirão normas complementares à realização do registro de que trata este decreto».

Como se vê, o citado decreto não autoriza a expedição de nor­mas destinadas a rever registro definitivamente concedido; as nor­mas complementares ali referidas são aquelas que foram julgadas necessárias «à realização do registro» ou seja, à sua concessão.

Assim, há de ser entendido o decreto, em consonância com os princípios inscritos no § 3~ do art. 153 da Constituição.

Quanto à Instrução N ormativa n~ 187/86, nela não se encontra a exigência contra a qual se insurgem os impetrantes, conforme se pode verificar da publicação de fI. 16.

Nessas condições, opinamos pela concessão parcial da ordem, ressalvada à Administração a faculdade de rever, ex offido, caso a caso, os registros sob suspeita de terem sido ilegalmente concedidos.

Até lá, porém, deverão os registros surtir os efeitos que lhe são próprios, inclusive o de, a par de outras exigências, servir de habili­tação para reclassificação ou ingresso nas categorias funcionais de Arquivista e Técnico de Arquivo, do Serviço Civil do Poder Execu­tivo».

Trata-se de entendimento que já foi acolhido em precedentes deste Tri­bunal, conforme mostram os seguintes acórdãos:

Ro Supo Tribo Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 19890 965

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«Ementa: Registro profissional - Arquivistas - Decreto 93.480/86 - Portaria Interministerial 3.369/86.

Possibilidade de anulação dos atos administrativos relati­vos ao registro como arquivista, uma vez demonstrado erro ou fraude. Inadmissível, entretanto, fazê-lo de modo indiscri­minado, sem exame do caso concreto». MS n? 115.637-DF (9.527.427).

ReI.: Min. Eduardo Ribeiro.

«Ementa: Funcionalismo. Arquivista. Registro Profissio­. nal.

Deferido em função das normas regulamentares vigentes à época, o registro autorizado pela Lei n~ 6.546/78, art. 1 ~, IV, não pode sofrer a genérica e indiscriminada revisão insti­tuída sob sanção de cancelamento compulsório (Portaria In­terministerial n~ 3.369/86, item IV, redação da Portaria n~ 3.402/86), senão que com ofensa aos princípios inscritos no art. 153, § 3~, da ConstituiçãO Federal. Proteção mandamen­tal deferida, ressalvada à administração o poder de rever, caso a caso, os registros porventura sob suspeita de ilegalidade, por fraude na sua obtenção, assegurada aos respectivos indiciados a mais ampla defesa.

MS n~ 115.674-DF (9.528.962) ReI.: Min. José Dantas

Ante o exposto, meu voto é no sentido de deferir também parcialmente a ordem em favor dos impetrantes e seus litisconsortes, nos termos dos pre­cedentes trànscritos.

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 68 - DF - (Reg. n? 89.0007460-1). ReI.: O Sr. Min. Ilmar Galvão. Imptes.: Alfredina Sant' Ana e outros. Impdos.: Ministro de Estado do Trabalho e Ministro-Chefe da Secretaria de Administração Pública da Presidência da República. Adv.: Dr. Afonso Lobato Madeira.

Decisão: A Seção, por unanimidade, deferiu parcialmente o mandado de segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (13-6-89 - 1 ~ Se­ção).

Os Srs. Ministros José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro, Miguel Ferrante, Américo Luz e Geraldo Sobral votaram com o Relator.

O Sr. Ministro Carlos Venoso não participou do julgamento.

O Sr. Ministro Pedro Acioli não compareceu à sessão, por motivo jus­tificado. Presidiu o Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

966 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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MANDADO DE SEGURANÇA N? 84 - DF (Registro n? 89.7476-8)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Pedro Acioli Impetrante: Distribuidora de Comestíveis Disco SI A Impetrado: Ministro de Estado do Trabalho Advogado: Dr. Fernando Neves da Silva

EMENTA: Mandado de Segurança. Direito de associa­ção. Liberdade sindical.

I - Presente ato feridor de direitos líquidos e certos é passível a concessão do writ.

II - Segurança concedida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a Egrégia 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, á unanimi­

dade, deferir o mandado de segurança, na forma do relatório e notas taqui­gráficas constantes destes autos e que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 27 de junho de 1989 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro PEDRO

ACIOLI, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLI: A matéria está assim su­mariada no parecer da douta Subprocuradoria-Geral da República, nestes termos:

«Trata-se de mandado de segurança impetrado pela Distribui­dora de Comestíveis Disco S.A. contra ato do Senhor Ministro de Estado do Trabalho, consubstanciado em decisão que, negando provimento a recurso administrativo, entendeu de manter o enqua­dramento sindical da impetrante na Categoria Lojistas do Comér­cio, revogando, assim, o seu anterior enquadramento na categoria Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios.

o ato, ora impugnado, resta assim '!azado, verbis: 'Considerando o que dos autos consta e tendo em vista as

resoluções da Comissão do Enquadramento Sindical, resolvo, conhecer, porque tempestivo, o recurso interposto pela Distri-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 967

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968

buidora de Comestíveis Disco S/A, com sede na Rua General Padilha n? 64, São Cristóvão - Rio de Janeiro/RJ e 65 (sessenta e cinco) filiais em todo o Brasil, contra a resolu­ção do citado órgão colegiado proferida nos autos do Pro­cesso MTb 24.370.005427/87, apensado ao Processo MTb 24.370.018754/86, para, no mérito, negar-lhe provimento, por falta de amparo legal, mantendo, em conseqüência, os termos da decisão recorrida'.

São as· seguintes as razões alegadas pela empresa: 1. que a Comissão de Enquadramento Sindical, sem

considerar a diligência feita pela Delegacia Regional do Traba­lho no Estado do Rio de Janeiro, decidiu, sem ouvir a empre­sa, pelo seu enquadramento na categoria econômica, 'Lojistas do Comércio' (estabelecimentos de tecidos, de adorno e aces­sórios, de objetos de arte, de louças finas, de cirurgia, de mó­veis e congêneres).

2. que surpreendida por essa decisão, interpôs rp,curso objetivando seu enquadramento na categoria específica (Co­mércio Varejista de Gêneros Alimentícios).

3. que a Comissão de Enquadramento Sindical negou provimento ao recurso, mantendo o enquadramento sindical da impetrante na categoria 'Lojistas do Comércio', por deci­são publicada no DO de 25 de julho de 1988.

4. que, em conseqüência, apresentou pedido de reconsi­deração, que não tem previsão legal, nem efeito suspensivo, sobre o qual a CES não se pronunciou ou deu andamento. (fls. 146/147).

Do ato acima referido extrai-se que o Sr. Ministro de Estado do Trabalho entendeu de refutar recurso da impetrante interposto contra decisão da Comissão de Enquadramento Sindical (CES), aos argumentos, em suma, de que não procediam as alegações postas no apelo administrativo. Desta forma, remete-se a decisão atacada aos fundamentos da decisão da CES, que se balizou no fato de que sendo impossível determinar-se a atividade preponderante da empre­sa optou pela Categoria mais abrangente, qual seja, Lojista do Co­mércio.

A impetrante, por sua vez, sustenta que a sua atividade pre­ponderante é a de comercialização de gêneros alimentícios, e que tal teria sido sobejamente comprovado no curso do processo adminis­trativo, além do que, não há suporte ou razões que determinassem a mudança da impetrante de categoria.

Solicitadas as informações, estas limitam-se a sustentar o ato e aduzem que, «ante a improcedência dos argumentos trazidos pela impetrante, resta-nos salientar que até o advento da nova Constitui-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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ção recentemente promulgada, o enquadr:amento sindical inseria-se na área do poder discricionário da Administração, cabendo-lhes, nos termos do art. 575 da CLT, promover a revisão bienal no 'qua­dro de atividades e profissões para adequá-los à realidade da con­juntura econômica e profissional, assim como dirimir dúvidas e controvérsias a respeito do assunto_» (Fls. 149).

Isto posto, tem-se que a controvérsia colocada neste writ cinge­se ao correto enquadramento da impetrante.» (Fls. 154/156).

Opinou o órgão do Ministério Público Federal pela concessão da segu­rança, para que a impetrante continue integrando a Categoria do Comércio Varejista Alimentício, como desejado.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLI (Relator): A questão ver­sada nos autos foi adequadamente examinada pela culta Sub procurado­ria-Geral da República, no seu lúcido parecer de fls. 154/158, que ao concluí-lo opinou pela concessão da segurança, valendo-se desses argumen­tos (fls. 156/157):

«No caso vertente, a questão se torna mais simples diante do advento da Nova Carta, em face da interpretação dos arts. 8?, I e lI, ou seja, a Constituição de 1988 substituiu o enquadramento ofi­cial (de onde o ato impugnado deriva com base no permissivo das normas consolidadas, forte nos arts. 570 e segs.) pelo espontâneo que prescinde de quaisquer interferências da ordem estatal.

Em particular, o ato ministerial tem origem em consulta for­mulada pelo Juízo da 34~ JCJ/RJ, no que tem este como pólo ge­rador, não um litígio ou controvérsia relacionada com o enquadra­mento, mas o simples exercício do poder discricionário permitido à época. Daí, o ato a que se visa impugnar prescinde da discussão de qual seria o órgão competente, se a CES ou a Justiça do Trabalho ou outro mecanismo, par.a. dirimir tal controvérsia, e conseqüente­mente se pode nortear a questão tão-só pelo aspecto da espontânea vontade assegurada pela Carta Maior da impetrante integrar ou não determinada categoria.

A impetrante a largo tempo integra Categoria Comércio Vare­jista de Gêneros Alimentícios e, por outro lado, o ato impugnado não demonstra eventual impossibilidade da empresa em pertencer aos quadros desta categoria, assim como tudo indica que a firma tem laços evidentes com as bases associativas que deságuam nesta categoria sindical; daí, associando-se a estes aspectos a atual liber­dade que o Texto Maior confere ao enquadramento, seja este patro-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 969

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nal ou não, e ao fato de que inexiste violação aos princípios da uni­dade sindical e contrafaccional, nada obsta seja o ato afastado para que o impetrante volte a pertencer à categoria desejada.

Desta forma, estando o ato impugnado em flagrante contraste com o Novo Texto, a segurança é de ser concedida nos seus termos, em razão da ocorrência de ilegalidade superveniente.»

Acresça-se ainda, como bem esclarece a impetrante que «a Comissão de Enquadramento Sindical tem, ·em casos semelhantes, enquadrado empre­sas com a mesma atividade da requerente na categoria pretendida. É o caso, por exemplo, da Rede Barateiro de Supermercados S.A., ProCesso MTb 317490 (DO, 10-10-81) ou da Ponte Alta Comercial Ltda., .. Processo MTb 319199/83 (DO, 5-10-84).»

Ademais, desde que é livre a organização sindical, cabe a cada um es­colher livremente o sindicato que deseja associar-se, afastando portanto, a competência do Ministério do Trabalho de decidir se determinada pessoa física ou jurídica deve filiar a este ou àquele sindicato. Assegura, apenas aos sindicatos decidir sobre a vontade de filiação dos membros da categoria que representa.

De tudo se conclui, daí certamente a impossibilidade de se manter o ato atacado, por ferir direito líquido e certo do impetrante.

«Direito líquido e certo é o que resulta de fato certo, e fato certo é aquele capaz de ser comprovado de plano, por documento inequívoco», na expressão do ilustre Pro f. Theotonio Negrão, in RT J 83/130, 83/855 -Código de Processo Civil, 18~ edição, pág. 865, nota n? 7 no artigo I? da Lei 1.553/51.

Com essas considerações, defiro a segurança.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

MS n~ 084 - DF - (Reg. n~ 8.974.768) - Relator: O Exmo. Sr. Mi­nistro Pedro Acioli. Impetrante: Distribuidora de Comestíveis Disco S/A. Impetrado: Ministro de Estado do Trabalho. Advogado: Dr. Fernando Ne­ves da Silva.

Decisão: a 1 ~ Seção, por unanimidade, àeferiu o mandado de seguran­ça. (27-6-89 - 1 ~ Seção).

Votaram com o Relator, os Exmos. Srs. Ministros Américo Luz, Geral­do Sobral, Ilmar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro e Miguel Ferrante. O Sr. Ministro Carlos Velloso não participou do julga­mento.

970 K. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, nov. 1989.

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MANDADO DE SEGURANÇA N? 101 - DF (Registro n~ 89.7494-6)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro América Luz

Impetrante: Washington Luiz Poplade Impetrado: Ministro de Estado da Justiça Advogado: Dr. Márcio A. da Costa Neto

EMENTA: Mandado de segurança. Pretensão a que se declare nulo procedimento disciplinar instaurado contra o im­petrante. Alegação de vícios não comprovada.

Não se presta o mandado de segurança a apuração de fa­tos simplesmente alegados e não comprovados de plano.

Inexistência de elemento objetivo a traduzir possível ameaça a direito subjetivo do impetrante.

Carência de direito à impetração. Mandado de segurança não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as ácima indicadas. Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

não conhecer do mandado de segurança, na forma do relatório e notas ta­quigráficas anexas, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas como de lei. Brasíli~, 26 de junho de 1989 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro AMÉRI­

CO LUZ, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Washington Luiz Popla­de, funcionário público, Agente de Polícia Federal, pede concessão de segu­rança para ver declarado nulo ab initio ou sobrestado, até decisão final de processo penal, procedimento disciplinar instaurado, apontando como auto­ridade coatora o Exmo. Sr. Ministro da Justiça, com quem, estariam os res­pectivos autos.

Segundo expõe, em decorrência de flagrante lavrado contra o impetran­te, foi instaurado processo disciplinar no qual se propôs a sua demissão a bem do serviço público. A seu ver tal processo está eivado de vícios insaná­veis e, inobstante a independência das esferas administrativa e penal, so-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 971

Page 57: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

mente da apuração através deste último ficará assegurado seu direito a am­pla defesa, como requisito imprescindível à validade daquele outro, com possibilidade de solução mais justa.

Em suas informações sustenta a digna autoridade não haver praticado qualquer ato lesivo ao direito do impetrante, pelo que entende deva ser o mesmo julgado carecedor da ação de segurança, ou, então, denegada a or-dem, por falta de certeza ou liquidez do direito invocado. .

A douta Subprocuradoria-Geral da República opina pelo indeferimen­to do writ (fls. 22/25).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ (Relator): As bem­lançadas informações da indigitada autoridade coatora evidenciam, frente:: aos fatos alegados na inicial e documentos que a instruem, o seguinte:

1?) A inexistência de ato atribuível ao Exmo. Sr. Ministro da Justiea; 2?) A inexistência, também, de elemento objetivo a traduzir possível

ameaça ao direito subjetivo do impetrante por parte da autoridade ministe­rial;

3?) Nãó se vislumbra qualquer direito do impetrante a que se possa atribuir os requisitos de certeza e liquidez necessários à utilização da via mandamental;

4?) Constituem matéria de fato e insuscetíveis de apreciação no âmbito estrito do writ of mandamus, as alegações do impetrante quanto à existên­cia de nulidade insanável no processo disciplinar ou a ocorrência de cercea­mento de defesa.

As citações jurisprudenciais feitas no douto parecer' da ilustrada· Subprocuradoria-Geral da República, às fls. 23 fine/24, elucidam ainda mais o descabimento da impetração.

Voto, portanto, no sentido de não se conhecer do presente mandado de segurança.

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 101 - DF - (Reg.' '89.7494-6) - Rel.: O Sr. Min. Américo Luz. Impte.: Washington Luiz. Poplade. Impdo.: Ministro de Estado da Justiça. Adv.: Márcio A. da Costa Neto.

Decisão: A Seção, por unanimidade, não conheceu do mandado de se­gurança (27-6-89 - 1 ~ Seção).

Os Srs. Ministros Geraldo Sobral, Ilmar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro, Miguel Ferrame e Pedro Acioli votaram com o Relator.

O Sr. Ministro Carlos Velloso não participou do julgamento. Presidiu a sessão o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

972 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989

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MANDADO DE SEGURANÇA N? 125 ~ DF (Registr," n? 89.7520-9)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Pedro Acíolí Impetrante: AnacJino Valéria Alves

Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica Advogados: Drs. Ruy Guardiola e outros e Francisco de Assis Carva­

lho da Silva

EMENTA: Mandado de segurança. Ausência de liquidez e certeza do direito.

I - Restou demonstrada a ausência de direito líquido e certo a amparar a pretensão jurídica deduzida.

II - Segurança denegada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Egrégia 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, à unanimi­dade, indeferir o mandado de segurança, na forma do relatório e notas ta­quigráficas constantes destes autos e que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 27 de junho de 1989 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro PEDRO ACIOLl, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLl: Anaclino Valério Alves impetra a presente segurança buscando que se faça sua promoção nas filei­ras da Aeronáutica ao posto de Brigadeiro-do-Ar, ao argumento de que mais uma vez foi prejudicado o seu direito líquido e certo, em face de pro­cedimento administrativo inadequado.

Alega que existente julgado (MS 115.710-DF) onde ficou assegurado, por acórdão da lavra do Ilustre Ministro Gueiros Leite, o seu direito à pro­moção, porquanto determina o acórdão que a administração reconheça o direito do impetrante a promoção em ressarcimento de preterição à promo­ção que a lei assegura e prevê.

Eis o inteiro teor do acórdão que o impetrante afirma assegurar seu di­reito à promoção:

«Mandado de segurança. Militar. Princípio da garantia de de­fesa.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 973

Page 59: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

1. O princípio da garantia de defesa é constitucional e sobre­paira a todas as leis. O processo administrativo sem oportunidade de defesa ou com defesa cerceada é nulo. ' .

2. Desconstituição de ato que envolve punição indireta, que se localiza em área de reserva discricionária da Administração Mili­tar, embora não absoluta, nem inteiramente alheia ao controle ju­risdicional.

3. Concessão do writ (fls. 36). Às fls. 63 dos autos repousa a Portaria de n~ 925/GMI onde o Exmo.

Sr. Ministro da Aeronáutica torna insubsistente a Portaria n~ 916/GMI, de ·28-10-86, que transferiu para a reserva remunerada o CeL-Av. Anaclino Va­

lério Alves. Processado sem liminar, foram colhidas as informações, onde a autori­

dade apontada coatora afirma que a segurança no feito anterior fora conce­dida para assegurar ao impetrante tão-somente o direito de reabertura do processo de escolha, com a defesa ou justificação do impetrante, que ante­riormente lhe fora negado, bem como a permanência do mesmo na ativa e, assim, foi cumprido pela Força Aérea, não existindo, sob hipótese alguma, o direito líquido e certo almejado pelo impetrante.

Acostado o parecer da douta Subprocutadoria-Geral da República, colhe-se a manifestação pela denegação da segurança.

É o relatório.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLI (Relator): Anteriormente o impetrante houvera ingressado com mandado de segurança junto ao ex­tinto TFR, cujo julgado obteve a pardal segurança com o voto prolatado pelo Exmo. Sr. Ministro Gueiros Leite, no que foi acompanhado pelos de­mais integrantes do Eg. Tribunal.

Asseveram as informações, bem como o parecer da SGR, que a segu­rança não fora concedida com a finalidade que lhe empresta o impetrante, porquanto não lhe asseguram o direito à promoção, mas tão-somente o re­torno à ativa e concurso com os pares, a promoção ao posto de Brigadeiro­do-Ar.

É certo que, do anterior exame do MS 115.710-DF, restou firme enten­dimento de que o impetrante guardava todas as condições a que se lhe fosse conferida dita promoção.

É ver ó voto proferido por V. Exa. o Ministro Gueiros Leite, nos ter­mos a seguir transcritos:

974

«O impetrante, militar exemplar (v. fls. 14, 15, 18, 20, 21, 25, 26, 32/43 e 74177), após servir durante mais de trinta e cinco anos à Força Aérea e de haver sido promovido por merecimento a Coronel-Aviador, pretendeu ingressar no Quadro de Acesso para promoção, por escolha, ao posto de Brigadeiro-do-Ar.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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A sua pretensão começou a ser manifestada em 1984 e estendeu-se, no tempo, até julho de 1986, em sete persistentes tenta­tivas recursais correspondentes a cada etapa de organização dos res­pectivos Quadros, pois há uma quota compulsória que, destinada à regularidade de acesso nos diferentes Quadros, se renova periódica e obrigatoriamente, em datas básicas, sempre que haja um mínimo de vagas para promoção e 'que tal mínimo não se tenha alcançado como as vagas ocorridas no respectivo ano-base. As quotas compul­sórias são aplicadas sempre que houver, no posto imediatamente abaixo, oficiais que satisfaçam as condições de acesso» (fl. 39).

Mais adiante, com a peculiar precisão que orna seus pronunciamentos, verb~ra o Ministro Gueiros que:

«O impetrante verrumou nos recursos todos os tópicos impedi­tivos e permissivos do seu ingresso, como Oficial, em Quadro de Acesso ou Lista de Escolha, argumentando com. o fato de que até aquela data fora considerado habilitado ao ingresso no QAE, sem que existisse, ou fosse alegada, qualquer contrariedade às condições essenciais (fls. 47/51), cons1antes do art. 15, Lei n? 5.821/72, a sa-ber: .

a) interstício; b) aptidão física; c) conceito profissional; d) conceito moral» (fls. 42/43).

e prosseguindo, assevera que: «Considero, por tudo isso, que a Comissão de Processo de Es­

colha avançou juízo acima e além da rigidez das normas militares, mesmo no âmbito de sua discricionariedade. E ainda mais porque, mesmo que o Oficial apresente deficiências em seus conceitos -moral e profissional, poderá ser submetido a um período de Observação Especial.

Isto consta do art. 63, caput, do Decreto n? 89.509/84. Ora, esse tratamento, se fosse o caso do impetrante, também

lhe teria sido negado, apesar do parecer do Diretor-Geral do DE­PED (fI. 30v.).

E ainda. Mesmo se persistissem as deficiências, o Oficial poderia ser con­

siderado não-habilitado para integrar o Quadro de Acesso, mas em caráter provisório (art. 63, § 2?).

Acrescente-se que até mesmo o Oficial que deixasse de ser pro­movido por não ter sido incluído em Quadro de Acesso, devido a não satisfazer as condições de acesso, por motivo independente de sua vontade, poderia ter a promoção considerada pela CPO, em ressarcimento de preterição, ao satisfazê-las, e integrar o Quadro de Acesso (art. 65, caput)>> (fls. 46/47).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 975

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e arremata, dizendo que:

976

«É sabido que o critério de escolha, em tais casos, é «aquele que defere ao Presidente da República, com base na lei, a escolha do Oficial, dentre os mais credenciados para os cargos de comando, chefia ou direção» (Lei n? 5.821/72, art. 7?).

Esse critério - que se apresenta diverso dos princípios regula~ dores das promoções em geral - decorre, contudo, da índole da organização militar, que se apóia em bases hierárquicas e disciplina­res rígidas (Constituição Federal, art. 90).

Essa rigidez não dispensa, porém, os atributos legais de refe­rência, a partir do ingresso do Oficial em Quadro de Acesso até a inclusão na Lista de Escolha (Lei n? 5.821/72, art. 15).

No regulamento da Arma, por exemplo, as condicionantes sub­jetivas são o conceito profissional, resultante da avaliação das qua­lidades profissionais do Oficial, mas que levará em conta as infor­mações constantes dos assentamentos do militar (Decreto n? 91.725/85, art. 5?).

O conceito profissional é aferido através de dados concretos, tais como a cultura geral e profissional, eficiência revelada no de­sempenho de cargos e comissões, potencialidade para o desempenho de cargos mais elevados, capacidade de liderança, iniciativa, preste­za de decisão, resultados dos cursos regulamentares realizados, de­dicação profissional, realce entre os seus pares e no cumprimento das obrigações e deveres militares estatutários (art. 5?, parágrafo único).

Ora, todas essas qualidades indicariam o impetrante à escolha para a promoção, quanto mais à sua inclusão nos Quadros de Aces­so e para os quais foi cogitado cinco vezes. No cotejo com os de­mais colegas, dele se disse que estava acima da média, no campo militar, administrativo, profissional e ético (fI. 30).

Basta folhear os autos, às fls. 12, 14, 15, 18, 20, 21, 24, 25, 26,27, 31/43.

VIII

Sem receio de errar, porque apoiado nas palavras do Ten.­Brig.-do-Ar. George Belham da Motta, Diretor-Geral do DEPED - «pela análise feita (omissis) , sugiro eu (do impetrante) reingres­. so no QAE, ficando sua seleção à promoção a Oficial General para quando da confecção da Lista de Escolha» (fls. 30 e v. - não en­contro empeço, nos autos, ao ingresso do impetrante no Quadro de Acesso.

A sua não-inclusão reveste-se não só de injustiça mas também de ilegalidade, que reputo flagrante, pois resulta da afronta ao art. 15, Lei n? 5.821/72.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):91S-iOO3, novo 1989.

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A autoridade militar não podia fugir à explicitação das condi­ções de acesso do candidato e ao procedimento levado a efeito para avaliação do seu conceito profissional (Lei n? 5.821/72, art. 15, pa­rágrafo único; Decreto n? 89.509/84, arts. 58 a 59).

Quanto ao conceito moral, que é considerado essencial, resulta de avaliação, pela CPO, das qualidades revelaqas pelo Oficial ao longo de sua vida militar, à vista das informações regulamentares constantes dos assentamentos. O conceito moral deve abranger, en­tre outros, os aspectos de caráter e conduta às obrigações e deveres militares constantes do respectivo Estatuto (art. 6?, parágrafo úni­co, Decreto n? 89.509/84).

A avaliação desse conceito resultará das Fichas de Conceito do Oficial (art. 14), podendo a Comissão solicitar, em qualquer época, às fontes habilitadas a emiti-los, conceito e informações (art. 15), de acordo com as normas elaboradas pelo Presidente da Comissão (art. 16).

O conceito moral serve, igualmente, corno requisito ao ingresso no Quadro de Acesso e na Lista de Escolha, de modo que a seleção do Oficial para o alto posto de Brigadeiro-do-Ar é um julgamento realizado à base de critérios, é certo, preponderantemente subjeti­vos, muito embora hauridos em padrões legais e regulamentares, corno são, entre outros, as fichas de conceito do Oficial (art. 14).

Há, pois, gabaritos, a partir dos quais são feitas as avaliações, nunca aleatórias, nem tampouco inteiramente objetivas, mas sempre adequadas.

IX

O trabalho que envolve avaliação de mérito de Oficial, a cargo de u'a Comissão e de sua Secretaria, é, em princípio, sigiloso, incluindo-se no sigilo a respectiva documentação (Decreto n? 89.509/84, arts. 39, parágrafo único, e 47, § 1 ?).

Daí por que, no caso do impetrante, embora tenha ele integra­do, por cinco vezes, a Faixa de Cogitação - que é composta pelos Coronéis selecionados para os Quadros de Acesso por Escolha ao posto de Brigadeiro, obedecendo-se apenas a precedência hierárqui­ca (art. 56) - a dita Comissão jamais declinou as razões que a le­varam a recusá-lo, nos recursos decididos pelo Ministro.

Mas o fato é que, protegido pelo disposto no art. 17, Lei n? 5.821/72, o impetrante interpôs muitos recursos e conseguiu desven­dar as razões das continuadas recusas.

R. SlIj1. Trih. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 977

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Conforme foi referido antes, ficou esclarecido que ele havia si­do acusado por um colega, também Coronel e possível concorrente, acusação não registrada porque feita verbalmente, oficiosamente e sem caracterização (fls. 30 e v.).

A Comissão sabia da irrelevância de uma acusação não escrita e não registrada, porque isso consta do regulamento da Arma (De­creto n? 89.509/84, art. 28, parágrafo único).

E mais que, as autoridades que tivessem conhecimento de atos graves capazes de influir, contrária e decisivamente, na inclusão ou permanência do Oficial em qualquer dos Quadros de Acesso, deve­riam colhê-los por escrito e via hierárquica, para evitar-se a influên­cia de boatos e intrigas no julgamento e escolha do candidato en­volvido.

Isso está dito - repita-se - no parecer do Ten.-Brig.-do-Ar, Diretor do DEPED, quando sugeriu o reexame da avaliação do im­petrante, com base na sua Ficha de Conceito Individual, sem levar em conta as acusações aleatórias, por inexistência de registros ofi­ciais na OM ou na CISA (fls. 30 e v.).

Mas a Comissão - repita-se também - não levou em conta esse parecer e fez tábula rasa do art. 28, parágrafo único, do Decre­to n? 89.509/84, que exige o registro documental da acusação, lan­çando assim juízo preconcebido e ilegal sobre a conduta ética do candidato.

Esse defeituoso juízo levou a Comissão e, juntamente com ela, a digna autoridade impetrada, a causar lesão ao impetrante, proces­sualmente porque, não havendo sindicância ou inquérito, descarta­da seria u'a acusação que, somente se oficial, permitisse a ampla defesa do acusado, por isso mesmo não utilizada» (fls. 49/54).

concedeu, por fim, a segurança parcial, mas reconheceu que, pelos cri­térios objetivos de avaliação, o impetrante guardava todas as condições pa­ra granjear a promoção.

Deixou claro, na sua inteligência, o referido voto, que a administração não contou com a precisão nas informações, tampouco razões a respaldar a negativa continuada em proceder a promoção do Impetrante.

Renovada a impetração ª,O entender do impetrante, pelo não cumpri­mento da decisão judicial, colhidas as informações, estas fazem ver que as decisões da Administração, além dos critérios objetivos, obedecem à subje­tividade da Função, que não está subordinada ao crivo judicial, porquanto dizem respeito a interesses interna corporis e voltados para a estrutura da própria Força.

978 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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Isto bem está demonstrado nas informações à fI. 80, quando se diz:

«O ingresso no generalato não é assegurado a todos os oficiais. Há que se atender a determinados requisitos, o que nem todos con­seguem, e ater-se no número de vagas existentes» (fI. 80).

e mais adiante afirma:

«Ora, está explicitado no texto desta Informação que, para se atingir o generalato, há que percorrer todo um processo determina­do na Lei de Promoções. Mesmo que o Cel~ Anaclino Valério Alves houvesse integrado o QAE esse fato por si só não lhe asseguraria a promoção a Brigadeiro. Necessário seria que fosse escolhido para integrar a Lista de Escolha e que esta fosse sancionada pelo Presi­dente da República» (fi. 82).

De tudo há de se concluir que, apesar de o julgado anterior haver reco­nhecido o direito de o impetrante retornar à ativa e, de conseqüência, con­correr a novo processo seletivo, não foi assegurada a promoção que ora se pleiteia, porquanto os critérios subjetivos do Alto Comando da Aeronáutica refogem a análise jurídica, porquanto circunscritos ao interesse e conveniên­cia da Administração.

Aliás, outro não foi o entendimento da Subprocuradoria-Geral da Re­pública em seu parecer, ao assim afirmar:

«Fundamenta-se o impetrante em decisões do Plenário da Egré­gia Corte que, segundo ele, teria assegurado promoção em ressarci­mento de preterição ao posto de Brigadeiro-do-Ar.

Daí por que pede a insubsistência de ato da autoridade impetra­da, que indeferiu o recurso do Impetrante, e que se lhe seja reco­nhecido o direito que invoca e efetivada a promoção desejada.

Em seguida, pede que seja submetido a S. Exa. o Sr. Presiden­te da República o decreto de promoção ao posto de Brigadeiro-do­Ar.

A v. decisão referida na inicial fez alusão à ilegalidade do ato de não reconhecimento de condições de ingresso no QAE, por não ter reconhecido na motivação existente - acusação verbal de um colega seu - insuficiência para afastá-lo naquela ocasião do QAE.

Por isso concedeu parcialmente a segurança impetrada para efeito de assegurar ao impetrante a sua permanência na ativa da Força Aérea Brasileira, anulando sua transferência anterior para a reserva, e garantindo-lhe a reabertura do processo de escolha, com a defesa ou justificação que tivesse e que lhe tenha sido negada (fI. 58).

R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915·1003, novo 1989. ·979

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Às fls. 86/87 vê-se, da leitura do Aviso n? 070/87, endereçado ao DD. Presidente deste Egrégio Tribunal que a autoridade impe­trada anulou o ato de transferência do impetrante para a reserva.

Que, logo em seguida, a Comissão de Promoções de Oficiais, na assentada de 11-11-1987 promoveu a reavaliação do nome do re­querente, sendo que o resultado não lhe foi favorável. Afirma a au­toridade impetrada naquele documento que: «jamais pesaram, nessa decisão, fatos que o impetrante supõe tenham sido alegados em seu desfavor, mas apenas o julgamento de suas qualidades para ascen­der ao generalato, em cotejo com seus iguais».

Acrescenta, ainda aquela autoridade que «a reavaliação foi fei­ta por dezessete Oficiais-Generais, que compõem a CPO, todos ad­vertidos da decisão dessa Egrégia Corte».

Salvo melhor juízo, parece que a decisão em que se apóia o im­petrante foi cumprida, já que ele voltou à ativa, foi submetido a novo processo de escolha, não tendo logrado êxito, já que outros militares, em cotejo com ele, foram preferidos.

Não há lugar, pois, para atendimento da pretensão do Autor, já que, em momento algum, foi-lhe assegurada a promoção ao pos­to de Oficial-General, pelo critério de ressarcimento de preterição» (fls. 94/96).

Diante de todo o exposto, ressai a ausência do direito ao que se plei­teia, de conseqüência, denego a segurança.

É como voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente. O Juízo de preencher ou não o militar os requisitos necessários para

entrar na lista de promoção por merecimento é prerrogativa que a legislação de regência defere ao critério de conveniência, adotado pela autoridade competente.

Acompanho o eminente Ministro Relator.

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 125 - DF - (Reg. n? 89.7520-9). Relator: O Exmo. Sr. Minis­tro Pedro Acioli. Impetrante: Anaclino Valério Alves. Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica. Advogados: Drs. Ruy Guardiola e outros e Francisco de Assis Carvalho da Silva.

980 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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Decisão: A Primeira Seção, por unanimidade, indeferiu o mandado de segurança (27-6-89 - 1 ~ Seção).

Votaram com o Relator, os Exmos. Srs. Ministros Américo Luz, Geral­do Sobral, Ilmar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro e Miguel Ferrante. O Sr. Ministro Carlos Velloso não participou do julga­mento. Sustentou, oralmente, o Dr. Francisco de Assis Carvalho da Silva pelo impetrante.

--e--

MANDADO DE SEGURANÇA N? 134 - DF (Registro n? 89.0007746-5)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira Impetrante: Mineração J. Mendes Ltda. Impetrado: Ministro de Estado das Minas e Energia Litisconsorte: Minas Itatiaiuçu Ltda. Advogados: Drs. Joarez de Freitas Heringer e Pedro Gordilho

EMENTA: Mineração. Alvará de pesquisa. Sucessão co­mercial. Direito de prioridade.

A incorporação da empresa individual por uma sociedade configura o fenômeno jurídico da sucessão comercial, que é modo legítimo de se transferir autorização de pesquisa.

Aplicação do artigo 22 do código de mineração à transfe­rência do direito de prioridade.

Segurança denegada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

indeferir o mandado de segurança, na forma do relatório e notas taquigráfi­cas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 8 de agosto de 1989 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro GARCIA VIEI~A, Relator.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 981

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RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Mineração J. Mendes Ltda. impetrou a presente segurança contra ato do Exmo. Sr. Ministro de Estado das Minas e Energia que, em processo de alvará de pesquisa de mi­nério de ferro nos Municípios de Itatiaiuçu e Mateus Leme-MG, teve decla­rado prejudicado seu pedido de prioridade, em favor de Minas Itatiaiuçu Ltda., dando provimento a recurso por esta firma interposto.

Narra a impetrante que a firma individual Vicente Esteves de Farias re­quereu inicialmente a autorização de pesquisa da área, transferindo-lhe, en­tretanto, o seu direito de prioridade por escritura pública, ainda na instru­ção do processo. A seguir, transformou sua firma individual em sociedade por quotas de responsabilidade limitada, sob a denominação de Minas lta­tiaiuçu Ltda., passando-lhe todo o ativo e passivo da firma individual.

Arquivado o pedido de pesquisa por determinação do DNPM (DO de 6-4-79), a área ficou livre a novo pedido de pesquisa, o que fez a ora impe­trante, requerendo a autorização, prioritariamente, em 9-4-79.

Por sua vez, Minas Itatiaiuçu Ltda., inconformada com o arquivamen­to do primeiro pedido, e sustentando sua qualidade de sucessora universal de Vicente Esteves de Farias, interpôs pedido de reconsideração que, indefe­rido; foi objeto de mandado de segurança (MS 107. 738-DF), obtendo limi­nar para sustar o andamento do processo administrativo da impetrante e deferimento final do pedido de desarquivamento.

Os dois processos administrativos voltaram então ao DNPM que man­teve o despacho de arquivamento, mas, em grau de recurso, a Coordenado­ria Jurídica doMME, por despacho do Ministro das Minas e Energia (DO de 27-3-87) autorizou a expedição do Alvará de Pesquisa em nome da em­presa Minas Itatiaiuçu, cómo sucessora de Vicente Esteves de Farias.

Sente-se a ora impetrante ferida em seu direito líquido e certo, porque, alega, teve prejudicado o seu pedido de pesquisa, em decorrência de um ato que sustenta ilegal, diante da impossibilidade jurídica de transformação de firma individual em sociedade. Afirma que não houve sucessão universal, nem comercial, porque a firma individual se extinguiu e, em seu lugar, nova empresa foi criada. Sustenta, ainda, a impossibilidade de transferência do direito de prioridade à obtenção da autorização de pesquisa.

Prestando informações, esclarece a digna impetrada que a autorização fora concedida a Minas Itatiaiuçu Ltda., porque concluído pela Consultoria Jurídica do Ministério ser inegável a sua qualidade de sucessora da antiga firma individual, a qual transferiu-lhe o acervo, inclusive o pedido de alva­rá, antes mesmo da escritura de cessão da prioridade à Mineração J. Men­des S.A.

Indeferida a liminar, a impetrante pediu a reconsideração do despacho, ao argumento de que a publicação do alvará, antes do julgamento do pre­sente mandamus, poderá causar-lhe danos irreparáveis (fls. 101/103).

982 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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A liminar foi, então, concedida, a fim de que fossem sobrestados os processos administrativos até decisão desta impetração (fi. 110).

Citada para integrar a lide como litisconsorte necessária, Minas Ita­tiaiuçu Ltda. ofereceu a resposta de fls. 142/157, sustentando legalmente caracterizada a sucessão e a transferência para a nbva firma, da autorização de pesquisa.

Instada a se manifestar, a Subprocuradoria-Geral da República ofere­ceu o parecer de fls. 199/211, entendendo correto o ato ministerial atacado.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA (Relator): Sr. Presiden­te, no dia 5-6-73,. a firma individual Vicente Esteves de Farias requereu au­torização de pesquisa mineral nos municípios de Itatiaiuçu e Mateus Leme, Estado de Minas Gerais, assegurando o direito de prioridade.

Em 22 de setembro de 1974, Vicente Esteves de Farias e outros sócios constituíram a sociedade por cotas de responsabilidade Ltda., Minas Ita­tiaiuçu Ltda., tendo Vicente integralizado suas cotas com o ativo e passivo (fundo de comércio) de sua firma individual Vicente Esteves de Fatias (doc. de fls. 159/164). Com isto, houve autêntica sucessão da empresa individual pela sociedade por cotas Minas Itatiaiuçu. A firma individual foi absolvida por sua sucessora, sociedade por cotas, nos termos claros da Lei das Socie­dades Anônimas (Lei 6.404/76 - art. 227), aplicável às sociedades por co­tas (Lei 3.708/19, art. 18). O ato de incorporação foi arquivado no registro de comércio (doc. de fI. 164v) e a sucessão foi reconhecida pelo DNPM, ao autorizar a empresa Minas Itatiaiuçu, como empresa de mineração, em con­tinuação à firma individual Vicente Esteves e expedindo o Alvará n? 1.774/75. Os insignes mestres Victor Nunes e Cunha Peixoto, em seus pare­ceres de fls. 169/197, fornecidos à litisconsorte, após examinarem profun­damente a questão, concluíram ter havido a sucessão. Com sua proverbial e incontestável autoridade, salientou Victor Nunes:

«Na hipótese sob exame, não se pode mais questionar se a em­presa individual foi incorporada pela sociedade em cujo patrimônio se verteu o acervo daquela, isto é, todo o seu ativo e passivo. O ato de incorporação - repita-se - foi devidamente arquivado no Re­gistro do Comércio, à vista do qual, o próprio Departamento Na­cional da Produção Mineral autorizou Minas Itatiaiuçu Ltda. a fun­cionar como empresa mineradora, em continuação à empresa indi­vidual Vicente Esteves de Farias, por ela incorporada. Nenhuma dúvida, pois, de que se operou sucessão comercial por via de cessão do ativo e passivo.»

Com a constituição da sociedade por cotas Minas Itatiaiuçu e transfe­rência para esta do fundo industrial da firma Vicente Esteves de Farias o

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 983

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direito de prioridade passou também a integrar o patrimônio da indústria Minas Itatiaiuçu. Cunha Peixoto; autor de vários livros de Direito Comer­cial, Professor emérito e Ministro aposentado do Colendo Supremo Tribu­nal Federal, ensina que:

984

«Portanto, houve na espécie a constituição de uma sociedade e a transferência dos bens pertencentes ao fundo industrial de Vicente Esteves de Farias ocorreu como integralização da cota deste sócio.

5. Assim, operou-se a cessão do fundo industrial da firma in­dividual «Vicente Esteves de Farias» para a «Minas Itatiaiuçu Ltda.», em sua universalidade, ocorrendo, pois, a sucessão comer­cial.

Esta a lição de Carvalho de Mendonça: «Na aquisição derivada, a relação entre adquirente e pre­

decessor do direito é a de sucessão jurídica. Muda-se o agente ou sujeito, mas a relação mantém-se idêntica (não igual). Os mesmos direitos, os mesmos ônus, a mesma: condição do au­tor passam ao adquirente, que vem para o lugar deste sucedit in locus ajus.

A palavra sucessão é técnica para exprimir in genere a passagem ou trânsito de um direito singular ou de uma plura­lidade de direitos singulares a pessoa (sucessio in jus, in singu­larum rerum dominium) ou a transmissão de um complexo de relações jurídicas formando unidade jurídica; (sucessio in uni­versum jus, in omne jus). No primeiro caso, diz-se sucessão ou singular ou particular. No segundo, sucessão universal.

Esta, a universal, é tida como a sucessão por excelência, visto abranger o inteiro patrimônio com todos os elementos, e verifica-se exatamente no caso de morte do predecessor, ou, ainda, na aquisição do ativo e passivo de um estabelecimento comercial.» (Tratado de Direito Comercial Brasileiro, VoI. VI, 1~ parte, págs. 1/8, n? 10).»

Waldemar Ferreira, firme nos mesmos princípios e escrevendo especificamente sobre a sucessão do fundo de comércio assinalou:

«Mais acertado seria fixar o princípio abstrato, segundo o qual a alienação do estabelecimento supõe a passagem deste com. todos os seus elementos componentes. Deve ser conside­rado como entità pulsante e vitale, que enseje ao adquirente prosseguir normalmente com seu desfruto» (ob. e vol. cits., pág. 332, n? 1.597).

E conclui na mesma página: «Dá-se, neste caso, o que se chama sucessão comercial. Desaparece o proprietário do estabelecimento, que se faz

substituir pelo adquirente. Sucede este àquele.»

R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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Ora, ser a sociedade «Minas Itatiaiuçu Ltda.» sucessora de Vi­cente Esteves de Faria é matéria pacífica por reconhecida, expressa­mente, pelo DNPM, conforme Alvará n? 1.774, de 24 de janeiro de 1975, verbis:

«Autorizar a Minas Itatiaiuçu Limitada, com sede na ci­dade de Divinópolis, Estado de Minas Gerais, sociedade na qual, por alteração contratual de 22-9-74, se transformou a firma individual Vicente Esteves de Faria, autorizada a fun­cionar pelo Alvará n? 139, de 28 de janeiro de 1971, a continuar funcionando como empresa de mineração, ficando obrigada a cumprir integralmente o que dispõe o Código de Mineração e seu Regulamento, baixado pelo Decreto 62.934, de 2-7-68, bem como as demais leis e em vigor ou que venham a vigorar sobre o objetivo da referida autorização.»

Na verdade, neste caso, a empresa continua; mantém-se inte­gralmente o patrimônio, que não foi liquidado, e esse patrimônio passou a integrar a sociedade que se forma.

E por se tratar de uma mesma empresa variando apenas a pes­soa - natural ou jurídica - que vai exercitá-la, a nova sociedade será sucessora da firma primitiva individual, de Vicente Esteves de Faria, respondendo, desse modo, pelas obrigações e, naturalmente, exercendo os mesmos direitos, que, por acaso, a competiam a firma individual desaparecida.

Esta assertiva firma-se na opinião dos doutos. Waldemar Fer­reira advertiu:

«É de ver que quem adquire estabelecimento, ainda que expressamente se não obrigue pelo passivo do vendedor toma o lugar deste, exatamente o que ele vinha desempenhando no mundo dos negócios, quiçá no mundo jurídico. Desde que an­tigo proprietário desaparece e o novo aparece à testa do mes­mo estabelecimento, este lhe sucede» (ob. e voI. cits., pág. 334, n? 1.597).

No mesmo sentido Pothier: «Quando o objeto da convenção é uma universalidade de

causas, compreende todas as coisas particulares que compõem aquela universalidade, ainda aquelas de que as partes não tive­ram conhecimento» (Tratado das Obrigações Pessoais e Recíprocas, voI. I, pág. 65, n? 99).

«Sendo fundada esta regra - acrescenta o professor francês - sobre a presunção que as partes que contratam so­bre uma universalidade de coisas têm intenção de contratar

R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 985

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sobre todas as que a compõem, tenham ou não conhecimento delas.»

6. Ora, entre os direitos da firma individual «Vicente Esteves de Faria» encontrava-se o de prioridade do pedido de autorização da área em apreço, pois, segundo o Código de Mineração a anterio­ridade do pedido de autorização para pesquisa constitui direito do requerente. Diz o art. 11 deste Diploma Legal:

«Serão respeitados na aplicação dos regimes de Autoriza­ção e Concessão, subordinados aos preceitos deste Código:

a) o direito de prioridade, que é a precedência de entrada do requerimento no DNPM, pleiteando a autorização de pes­quisa ou concessão de lavra designando por «proprietário» o respectivo requerente.»

Norma repetida pelo art. 16 do Regulamento do Código de Mi­neração - Dec. n? 62.934, de 2 de julho de 1968:

«Constitui direito de prioridade a precedência de entrada no DNPM, do requerimento de autorização de pesquisa em área considerada livre, ou de concessão de lavra de jazida de­clarada em disponibilidade, designando-se por «prioritário» o respectivo requerente».

7. Evidente, de conformidade com a melhor doutrina, que se a própria lei erige a prioridade do pedido de autorização em direito e se ele pertencia ao sucedido - Vicente Esteves de Faria, integrou­se no patrimônio da sucessora - «Minas Itatiaiuçu Ltda.» - eis que constituía uma parte do fundo de comércio conferido como co­ta social.»

Quando Vicente Esteves de Farias outorgou a procuração à impetrante, no dia 6 de novembro de 1974, para ceder o direito de prioridade (doc. de fI. 165), este direito já não lhe pertencia, porque fora transferido à socieda­de por cotas Minas Itatiaiuçu (doc. de fls. 159/174), sendo nula e sem ne­nhum efeito a venda feita (doc. de fI. 18). Ninguém pode alienar direito alheio ou transferir mais direito do que possui e Vicente já havia transferi­do o fundo de comércio de sua firma individual e com ele o direito de pre­ferência à sociedade por cotas, da qual ele era apenas um dos sócios e não o proprietário exclusivo. Se não agiu na qualidade de representante do ver­dadeiro proprietário de tal direito, a firma Minas Itatiaiuçu não poderia ce­der o aludido direito de prioridade. Se é verdade que o contrato de consti­tuição da sociedade por cotas SÓ foi registrado no dia I? de abril de 1975 (doc. de fI. 164v?), é também certo que, Vicente não poderia ceder, outra vez, um direito por ele já cedido à referida sociedade por cotas. A impe­trante foi enganada e prejudicada pela atitude incorreta de Vicente e pode, em ação própria, pleitear perdas e danos, mas não pretender anular o ato legítimo impugnado.

986 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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o direito de prioridade, garantido pelo artigo 11 do Dec.-Lei n? 227/67 (C. Mineração), foi transferido, na sucessão, à sociedade por cotas. Não existe nenhuma norma legal proibin io seja cedido tal direito. Se a própria lei (C. Mineração) reconhece como dIreito, a prioridade na obtenção do al­vará de pesquisa, e não impede sua alienação, foi ele, legitimamente, trans­ferido para a sociedade por cotas. Vitor Nunes, com clareza, acentua que:

«De um lado, o direito de prioridade, garantido pelo art. 11, alínea a do Código de Mineração, adquirido pela empresa indivi­dual Vicente Esteves de Faria, podia ser cedido a terceiro, (a) por­que não há norma legal proibitIva, e também (b) porque a versão do ativo e passivo da empresa individual no patrimônio da socieda­de por cotas, que então se organizou, era forma regular de cessão daquele direito. Por outro lado, a incorporação da empresa indivi­dual por uma sociedade configurou o fenômeno jurídico da suces­são comercial, que é modo legítimo de se transferir autorização de pesquisa, mesmo antes de aprovado o respectivo relatório. Não há qualquer razão para deixar de aplicar essa mesma norma jurídica (Código de Mineração, art. 22, 1) à transferência do direito de prio­ridade.»

Se não existe nenhuma norma legal proibindo seja alienado o direito de prioridade, assegurado pelo artigo 11 do C. de Mineração, também nada impede seja adotado o mesmo critério previsto pelo artigo 22 do mesmo Código que permite seja cedida a autorização de pesquisa aos herdeiros ne­cessários ou ao cônjuge sobrevivente, bem como na sucessão comercial: no caso, houve a sucessão comercial. Este ponto de vista é muito bem defendi­do pelo Dr. Sub procurador-Geral da República, Dr. Paulo Sollberger, em seu bem-lançado parecer de fls. 199/211. Como ele foi regularmente cedido â sociedade por cotas, não poderia ser novamente alienado por Vicente que não era mais dono dele.

Meu voto é denegando a segurança.

VOTO (VOGAL)

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Senhor Pre­sidente, firma individual é o nomen juris de pessoa física, para o exercicio de atos de mercância. O art. 22 do Código de Mineração, no inciso I, dá autorização, desde que haja sucessão comercial.

No caso, Vicente Esteves de Faria, firma individual, foi sucedido pela sociedade por cotas de responsabilidade limitada - Minas Itatiaiuçu. Em sendo assim, houve seqüência nos atos jurídicos. O sucessor adquire os di­reitos do sucedido, nos limites que eles os possui, mesmo como titular do direito de mineração.

O voto do eminente Relator coincide, às inteiras, com o meu entendi­mento; por isso secundo S. Exa., denegando a segurança.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, l(3):91S J 1003, novo 1989. 987

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EXTRATO DA MINUTA.

MS n~ 134 - DF - (Reg. n~ 89.0007746-5) - ReI.: O Exmo. Sr. Mi­nistro Garcia Vieira. Impte.: Mineração J. Mendes Ltdà. Impdo.: Ministro de Estado das Minas e Energia. Litis.: Minas Itatiaiuçu Ltda. Advs.: Drs. Joarez de Freitas Heringer e Pedro Gordilho. Sustentação oral: Dr. Pedro Gordilho, pelo litisconsorte.

Decisão: A Seção, por unanimidade, indeferiu o mandado de segurança (1 ~ Seção - 8-8-89).

Os Srs. Ministros Vicente Cernicchiaro, Miguel Ferrante, Pedro Acioli, Américo Luz, Geraldo Sobral, Ilmar Galvão e José de Jesus votaram com o Relator.

O Sr. Ministro Carlos Velloso não compareceu à Sessão por motivo justificado.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG.

988

--ct--

MANDADO DE SEGURANÇA N? 137 - DF (Registro n~ 89.0007749-0)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira Impetrante: Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Energia Elé­

trica de São Paulo Impetrado: Ministro de Estado do Trabalho Advogado: Dr. Octávio Bueno Magano

EMENTA: Processual Civil. Mandado de segurança. Lei em tese. Inexistência de lesão a direito líquido e certo. Atuali­zação de cálculo de contribuição sindical.

Se a Portaria n~ 3.313/88 apenas atualizou os valores constantes das Tabelas anexas à Portaria 3.307/88, destinadas apenas aos trabalhadores autônomos, profissionais liberais e empregadores e inaplicáveis à categoria que o impetrante re­presenta, não existe a possibilidade concreta de lesão a direito dos trabalhadores nas indústrias de energia elétrica de São Paulo.

Ademais, constitui o ato impugnado uma norma abstrata insuscetível de ser atacada através de mandado de segurança.

Precedentes do STF e do TFR. Mandado de segurança não conhecido.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos e,.1. que são partes as acima indicadas.

Decide a 1 ~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do mandado de segurança, na forma do relatório e notas ta­quigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 8 de agosto de 1989 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro GARCIA VIEIRA, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: O Sindicato dos Traba­lhadores nas Indústrias de Energia Elétrica de São Paulo impetrou o presen­te mandado de segurança coletivo contra ato do Senhor Ministro do Traba­lho, consubstanciado na Portaria 3.313, de 16 de dezembro de 1988, que atualizou, na forma de seus anexos, os valores das tabelas expedidas pela Portaria n? 3.307, de 25c 11-88, para cálculo da contribuição sindical das ca­tegorias indicadas.

Requer a suspensão dos efeitos da referida Portaria em favor de todas as pessoas que aqui figuram como substituídos - membros e associados do impetrante.

Sustenta a admissibilidade do mandado de segurança coletivo, sua legi­timidade ativa e interesse de agir, bem como a abusividade do ato impugna­do derivada da «inconciliável incompatibilidade entre não interferência na vida sindical por parte do Poder Público e pretensão deste de continuar be­neficiário de fração da receita da contribuição sindical» (art. 8? da CF de 1988) .

Alega que toda a legislação ordinária, sobre contribuição sindical tornou-se incompatível com a nova Carta Magna, razão pela qual requer o reconhecimento de sua inconstitucionalidade, ao fundamento de que:

«Ora, se a destinação especial da contribuição sindical consiste no custeio das atividades sindicais, é evidente que desfeitos os laços corporativos entre Sindicato e Poder Público, ex vi do disposto no artigo 8?, da Constituição de 1988, não pode o último continuar be­neficiário do tributo em causa.

À luz de tais considerações, logo se vê que a legislação sobre contribuição sindical; de onde consta que 20070 da receita respectiva deve ser canalizada para a conta de emprego e salário, do Ministé­rio do Trabalho (v. art. 389, da CLT), colide com a Constituição de 5 de outubro de 1988, proibitiva de interferência do Poder PÚ­blico na vida sindical.

R. Sup. Trib. JUSl., Brasília, 1(3):915-1003, ['o' .. 19H\l. 989

Page 75: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

Dir-se-á que a inconstitucionalidade da legislação ordinária, so­bre contribuição sindical, restringir-se-ia à referida parcela de 20070. Mas não é assim porque, reconhecido o fato de que toda a receita da contribuição sindical deve pertencer às entidades sindicais, não há como se manterem as demais alíquotas correspondentes à parti­cipação dos sindicatos, das federações e das confederações no mes­mo produto (60%, 15%, 5%). Impõe-se o estabelecimento de novo critério para a redistribuição da parcela de 20% não mais atribuível à conta emprego e salário do Ministério do Trabalho.»

Esclarece, ainda, que tal posicionamento gera a iminência de violação de direitos incontestes de membros e associados do impetrante, qual seja a de sofrerem descontos em seus salários, resultantes da incidência da contri­buição em causa que, nos termos do art. 180, I, da CLT, corresponde à re­muneração de um dia de trabalho. .

Solicitadas as informações de estilo, a digna autoridade apontada coa­tora prestou-as no prazo legal, argüindo as preliminares de não cabimento do mandado de segurança uma vez impetrado contra norma jurídica em te­se; ilegitimidade ativa ad causam e falta de interesse de agir.

No mérito, sustentou a legalidade do ato impugnado asseverando que a referida contribuição, por ser tributo ou por ser imposto, no entendimento de vários doutrinadores do Direito Fiscal, e integrar o Orçamento da União, não pode ter sua aplicação e discriminação dinamizadas por outra forma que não a definida no art. 589 da CLT, sem quebra do princípio da liberdade sindical inserido no art. 8? da CF, haja vista que, sendo as entida­des sindicais pessoas jurídicas de direito privado não tem sentido aplicar a receita da União a seu bel-prazer (fls. 33/43).

Oficiando no feito, -a douta Subprocuradoria-Geral da República opi­nou pelo conhecimento do writ e, no mérito, pela sua denegação (fls. 49/64).

Constam às fls. 66/69 e 80/82 petições do impetrante requerendo con­cessão da medida liminar, indeferida à fI. 83.

É o relatório.

VOTO (PRELIMINAR)

o EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA (Relator): Sr. Presiden­te, está bem claro pela inicial (fI. 2) que o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Energia Elétrica de São Paulo impetrou o presente mandado de segurança coletivo « ... contra ato do Sr. Ministro do Trabalho, consubs­tanciado na Portaria n? 3.313, de 16 de dezembro de 1988, publicada no Diário Oficial de 19 de dezembro de 1988, Seção I, p. 24714».

990

Através deste ato, resolveu o Sr. Ministro do Trabalho: «I - atualizar, na forma dos anexos que acompanham a pre­

sente Portaria, os valores das tabelas expedidas pela Portaria Minis-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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terial n? 3.307, de 25 de novembro de 1988, para cálculo da contri­buição sindical das categorias indicadas» (doc. de fI. 18).

As tabelas preparadas para o cálculo da contribuição sindical, e que acompanham a citada Portaria n? 3.307/88, são apenas duas e nenhuma de­las se refere ou se destina à categoria representada pelo impetrante (does. de fls. 18/19). A primeira (doc. de fI. 18) é para os agentes ou trabalhadores autônomos e profissionais liberais e a segunda (doc. de fI. 19) é para os em­pregadores, agente ou trabalhadores autônomos, profissionais liberais orga­nizados em firma ou empresa e entidades ou instituições com o capital arbi­trado. Em nenhuma destas Tabelas foi sequer referida a categoria dos tra­balhadores nas indústrias de energia elétrica de São Paulo, representada pe­lo impetrante.

A Portaria 3.313/88 apenas atualizou os valores das tabelas expedidas pela Portaria n? 3.307/88 que, por sua vez, atualizou os valores da Portaria 3.284/88 (doc. de fI. 45). Os valores fixados pela Portaria 3.313/88 também já foram atualizados pela Portaria n? 3.001, de 10 de janeiro de 1989 (doc. de fI. 1989). Em todas estas Portarias, os valores atualizados foram sempre para as categorias de autônomos, profissionais liberais e empregadores. Ne­nhum destes atos se destina à categoria representada pelo impetrante. So­mente a Portaria n? 3.313/88 foi impugnada neste mandado de segurança e é bom que se repita, ela apenas atualizou os valores das Tabelas preparadas para o cálculo das contribuições sindicais das categorias mencionadas nas Tabelas a ela anexas e os trabalhadores nas indústrias de energia elétrica de São Paulo não foram incluídos nas citadas Tabelas.

Não se trata, a nosso ver, de mandado de segurança preventivo porque o impetrante apresentou o ato por ele impugnado. Se já foi praticado o ato, não existe só a acusação e o receio. A lesão, se existente, já havia se concre­tizado. Mesmo que fosse admitido o caráter preventivo desta medida, não vejo como poderia existir ameaça para a categoria representada pelo impe­trante na simples atualização dos valores constantes das Tabelas expedidas pela Portaria n? 3.307/88, não impugnada pelo impetrante, se não foram sequer atualizados os valores referentes aos trabalhadores nas indústrias de energia elétrica de São Paulo. O impetrante não tem legitimidade para vir a Juízo impugnar urn:ato)que não atinge a ele próprio ou à categoria repre­sentada por ele. O ,Úb'impugnado, ainda que executado até às suas últimas conseqüências, não atiQgiria a categoria representada pelo impetrante por­que se limitou a atualiz~rvalores só aplicáveis a outras categorias profissio­nais. O ato impugnadoisimplesmente não é executável contra os trabalhado­res nas indústrias de e~êrgia elétrica de São Paulo, porque a eles não se des­tina. Não é ele capaz,' nunca, de representar qualquer ameaça real a ne­nhum direito deles e muito menos atual. Se eles não são atingidos pela mal­sinada Portaria, não têm eles legitimidade para vir a Juízo pedir a suspen­são de seus efeitos. A simples possibilidade de que a Administração possa, amanhã, vir a baixar um ato, atualizando os valores para o cálculo da con­tribuição sindical da categoria representada pelo impetrante, não representa

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ameaça capaz de justificar a presente medida heróica. Tal possibilidade não representa nenhuma ameaça objetiva e atual a qualquer direito da categoria representada pelo impetrante.

O presente mandado de segurança é contra lei em tese, o que é vedado pela Súmula n? 266 do Colendo Supremo Tribunal Federal. A Portaria im­pugnada é um ato normativo que não atinge, nem poderia atingir qualquer direito dos trabalhadores nas indústrias de energia elétrica de São Paulo. Se referida Portaria apenas atualizou os valores constantes das Tabelas anexas à Portaria 3.307/88, destinadas apenas aos trabalhadores autônomos, pro­fissionais liberais e empregadores e inaplicáveis à categoria que o impetrante representa, não existe a possibilidade concreta de lesão a direito da aludida categoria. É o ato impugnado uma norma abstrata, que não poderá, em execução, violar qualquer direito dos trabalhadores nas indústrias de ener­gia elétrica de São Paulo, porque a eles não se destina.

Não estamos diante de uma norma de efeitos concretos contra a cate­goria representada pelo impetrante. O ato impugnado não é auto-executá­vel. Não contém nenhum conteúdo ou mandamento que possa ser executa­do contra os eletricitários de São Paulo e não poderia atingir direito deles e muito menos sem um ato posterior de execução. Se a Portaria impugnada não contém, em si mesma, qualquer medida coercitiva contra os eletricitá­rios de São Paulo e não é capaz, por si mesma, sem ser baixado outro ato, de causar qualquer lesão a eles, é uma norma em tese. O TFR, em decisão plenária unânime, proferida no MS n? 123.264-DF, Relator Eminente Mi­nistro Gueiros Leite, Dl de 7-4-88, entendeu ser incabível mandado de segu­rança contra o artigo 26 da Portaria n? 3.150/86 do Sr. Ministro do Traba­lho, regulador de eleições sindicais, entendeu ser incabível o mandado de se­gurança por não ser referido dispositivo legal «portador de operacidade imediata, reclamando, para irradiação de efeitos jurídicos individuais, a in­termediação de ato administrativo concreto» e não encerrar «ordem direta, específica, dirigida a agente determinado». Neste sentido são os precedentes' do Colendo Supremo Tribunal Federal, citados pelo Eminente Relator Gueiros Leite (RTJ 110/77, 109/925, 108/81 e 90/518). O mesmo TFR, também em decisão plenária, unânime, no MS 117.183-DF, Relator Emi­nente Ministro William Patterson, Dl de 26-11-87, também entendeu ser in­cabível mandado de segurança contra a Portaria n? 377/86 do Sr. Ministro da Fazenda, que disciplinou o reajuste das prestações mensais devidas pelos participantes de grupos de consórcios para a aquisição de automóveis. Con­siderou a referida Corte ser citada Portaria lei em tese que estabeleceu ape­nas regras, de caráter normativo, a serem aplicadas em cada caso, mesmo tendo referido ato reajustado as prestações mensais e aumentado o prazo de pagamento, para todos os participantes do consórcio. Mesmo assim foi classificada como norma genérica, e não existir direito individual violado. Que dirá, então, da Portaria n? 3.313/88, que apenas atualizou valores de Portaria anterior, e de Tabelas preparadas para o cálculo da contribuição sindical de categorias a que não pertencem os eletricitários de São Paulo e

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não contém nenhuma disposição que possa atingi-los, nem mesmo após bai­xados os atos de execução.

Não conheço do mandado de segurança.

VOTO (VOGAL) ,

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Senhor Pre­sidente, o eminente Relator, em seu erudito voto, acentua que a portaria impugnada na impetração não se refere ao Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Energia Elétrica de São Paulo, impetrante do presente manda­do de segurança. Em sendo assim, realça, antes de tudo, a falta de legitimi­dade ativa, porquanto nenhum dano ou sequer perigo em tese estaria cor­rendo este Sindicato contra a afirmada intervenção indevida do Estado na sua corporação.

Em sendo assim, por falta de legitimidade ativa, declaro a impetrante carecedora da ação.

EXTRA TO DA MINUTA

MS n? 137 - DF - (Reg. n? 89.0007749-0) - Rei.: O Sr. Ministro Garcia Vieira. Impte.: Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Ener­gia Elétrica de São Paulo. Impdo.: Ministro de Estado do Trabalho. AC'I.: Dr. Octávio Bueno Magano. Sustentação oral: Dr. Luiz Rondon Teixeira de Magalhães Filho, pelos impetrantes.

Decisão: A Seção, por unanimidade, não conheceu do mandado de se­gurança. (1 ~ Seção - 8-8-89).

Os Srs. Ministros Vicente Cernicchiaro, Miguel Ferrante, Américo Luz, Geraldo Sobral, Ilmar Galvão e José de Jesus, votaram com o Relator.

O Sr. Ministro Carlos Velloso não compareceu à Sessão por motivo justificado.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG. --. --

MANDADO DE SEGURANÇA N? 138 - DF (Registro n? 89.0007750-3)

Relator: O Exmo. Senhor Ministro Waldemar Zveiter Impetrante: Abe Antônio Buiar Florestal e Empreendimentos Ltda. Impetrado: Ministro de Estado da Fazenda Advogados: Drs. Maria do Carmo R. C. Prado e outro

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 993

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EMENTA: Processual. Mandado de Segurança. Ilegitimi­dade Passiva.

I - Ilegitimidade passiva do Ministro da Fazenda, à falta de ato específico que o caracterize no mandamus como autoridade coatora.

11 - Mandado não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 2~ Seção do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, não

conhecer do pedido, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 28 de junho de 1989 (data do julgamento). Ministro BUENO DE SOUZA, Presidente. Ministro W ALDEMAR

ZVEITER, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SENHOR MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Abe An­tonio Buiar Florestal e Empreendimentos Ltda., qualificada na inicial, im­petrou mandado de segurança, contra ato do Exmo. Sr. Ministro da Fazen­da, objetivando excluir a aplicação do índice de deflação, instituído pelo Decreto n? 2.335/87 (art. 13), ao reajuste de letra de câmbio adquirida jun­to ao Banco do Estado do Paraná SI A.

Alega, em síntese, a impetrante, que em 30-4-87, adquiriu uma Letra de Câmbio EscrituraI do Banco do Estado do Paraná no valor de Cz$ 15.000.000,00, a qual seria resgatada com a quantia prefixada de Cz$ 21.341.600,00. Em 15-6-87, continua, o Governo Federal, através de medi­das tomadas pelo Ministro da Fazenda, editou o Decreto-Lei n? 2.335/87, alterado pelo Decreto-Lei n? 2.336/87, que deu ensejo a nova série de medi­das econômicas, conhecidas como «Plano Bresser» instituindo o fenômeno econômico da «deflação». Na Ipesma data, o Banco Central publicou a Cir­cular n? 1.189,onde se declaroU que o «fator deflator» a ser aplicado (item 2, inciso 11), reservava-se somente às parcelas, contratos ou prestações vencíveis após aquela data. Face a tais normas, o Banco Estadual, em 2-7 .. 87, resgatou a referida letra de câmbio, aplicando-lhe aquela tabela deflato­ra. Assim, o valor efetivamente recebido pela impetrante foi Cz$ 19.471.925,14, importando seu prejuízo em Cz$ 1.425.763,06.

Daí, alega a impetrante ser o referido decreto-lei inconstitucional, ten­do a aplicação da «tablita», no resgate da letra de câmbio, ferido seu direi­to líquido e certo, com a violação dos princípios constitucionais da legalida­de e da anterioridade que devem observar a edição de lei tributária, bem co­mo existência de direito adquirido e ato jurídico perfeito, violados.

994 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

Page 80: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

Requereu, então, a medida liminar para que fossem suspensos os efei­tos das disposições legais impugnadas, determinando-se ao Banco do Estado do Paraná SI A, o depósito «em caderneta de poupança livre» da importân­cia deduzida a título de deflação, acrescida de juros e correção monetária, a contar de 2-7-87, à disposição deste Tribunal até decisão final. Medida que restou inapreciada pelos eminentes relatores que me precederam.

Por fim, pediu a concessão definitiva da segurança, para ser ressarcida daquele valor deduzido no resgate.

Solicitadas informações (fI. 26), prestou-as a autoridade coatora, ar­güindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva ad causam e o descabi­mento do mandado de segurança, por entender que a impetração está visan­do impugnar lei em tese. No mérito, pediu a improcedência do writ por fal­ta de amparo legal (fls. 36/66).

A douta Subprocuradoria-Geral da República, em parecer de fls. 72/76, argüiu, também, a ilegitimidade passiva da autoridade impetrada, opinando, no mérito, pela concessão da segurança.

Aposentado o Exmo. Senhor Ministro Qtto Rocha (fI. 78), os autos fo­ram redistribuídos ao Exmo. Senhor Ministro Garcia Vieira (fls. 82), que a pedido da impetrante, determinou a citação do Banco do Estado do Paraná SI A para integrar a lide, na qualidade de litisconsorte passivo necessário (fI. 83).

Este afirmou, preliminarmente, não ser o destinatário, correto da cita­ção, eis que a requereu, a impetrante, na forma do art. 46 e seguintes, do CPC, devendo, então, figurar como litisdenunciado o Banestado SI A -Crédito, Financiamento e Investimento, por se constituir pessoa jurídica de direito privado, completamente distinta e responsável no trato da obrigação celebrada.

Sustenta, por isso, ser ineficaz a citação. Afirmou, ainda, com esteio na Súmula n? 266, do STF, não caber a se­

gurança para discutir lei em tese. Finalmente e também em preliminar, argúi sua ilegitimidade por ser so­

ciedade de economia mista, dotada de personalidade jurídica de direito pri­vado, não vinculada ao Ministério' da Fazenda.

No mérito, requer a denegação do mandamus, pela inexistência de qualquer ato arbitrário ou ilegal de responsabilidade sua ou do Banestado SI A - CFI, lesivo aos interesses da impetrante (fls. 87/138).

Instada a se manifestar (f( 139), a douta Subprocuradoria-Geral da República, em novo parecer, opinou nos seguintes termos (fls. 140/141):

«A circunstância de se ter citado, como litisconsorte passivo necessário, o «Banco do Estado do Paraná», não parece suficiente para superar o não cabimento do mandado de segurança, embora por motivo diverso daquele exposto no parecer de fls. 72/76.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 995

Page 81: MANDADO DE SEGURANÇA E RECURSO ORDINÁRIO

É que o Banco do .Estado do Paraná S/ A não age como autoridade, nos termos da Lei n? 1.533/51, art. 1?, § 1?

Ainda que, excepcionalmente, se possa admitir uma sociedade de economia mista, ou agente seu, revestido do caráter da «autori­dade», (para os efeitos da Lei n? 1.533/51) não é essa evidentemen­te a hipótese destes autos, onde se verifica que a Banestado Crédi­to, Financiamento e Investimento, controlada pelo Banco do Esta­do do Paraná, realizou com o impetrante um negócio jurídico co­mum, desprovido de qualquer «status» de império que pudesse au­torizar a impetração de segurança.

E, mesmo que o mandamus fosse cabível, é certo que não seria a Justiça Federal competente para expedir a ordem, pois a suposta autoridade não seria federal (art. 2?, da Lei 1.533/51 c/c art. 125, VIII, da Constituição de 67/69). O E. Tribunal Federal de Recur­sos, com maior razão, não teria como apreciar a ação em primeiro grau, visto que o ato reconhecidamente não é de Ministro de Esta­do ou qualquer outra autoridade arrolada no art. 122, I, c, da mes­ma Carta.

O ato impugnado, como visto no parecer de fI. 72, tem ampa­ro em normas de nível legal (Decretos Leis) e não em algum ato de hierarquia inferior eventualmente expedido pelo Excelentíssimo Se­nhor Ministro da Fazenda. Assim, embora pareça questionável a constitucionalidade de tais decretos-leis, a competência para o jul­gamento do feito não pode ser desse E. Tribunal. .

Do exposto, seja pela impropriedade da via eleita, seja, subsi­diariamente, pela incompetência do E. Tribunal Federal de Recur­sos, o Ministério Público Federal insiste na rejeição da segurança.»

Cumprindo o que determina o item n, do Ato Regimental n? 2, de 16-2-89, os presentes autos foram redistribuídos e, em seguida, vieram-me con­clusos.

É o relatório.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Relator): Sr. Presidente, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, nos ter­mos em que foi argüida pela digníssima autoridade impetrada (fls. 36/66) e sustentada pelos. judiciosos fundamentos expostos no parecer da douta Subprocuradoria-Geral da República (fls. 72/76 e 140/141).

Na verdade, embora apontando o Ministro da Fazenda como autor da alegada lesão ao seu direito, a impetrante, in casu, não fez sequer nenhuma indicação de ato administrativo concreto praticado pela autoridade indigita­da coatora.

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Cuidou a impetrante, tão-só, de fazer referência à edição do Decreto­Lei n? 2.335/87, do Exmo. Sr. Presidente da República, referindo-se de­pois, à Circular n? 1.119, de 15-5-87, editada pelo Banco Central, que im­pôs o «fator deflator» a ser aplicado.

A autoridade impetrada, em suas informações, argüiu sua ilegitimidade assim fundamentando (fls. 38/39):

«7. Como se vê, a impetrante cogita de ordem judicial para o fim de receber do Banestado SI A - CFI - a complementação do valor do resgate contratual do título negociado. Para tanto, pede sejam suspensos a força e o efeito das disposições legais impugna­das.

8. Ao mesmo tempo, não aponta nenhum ato in concreto que tenha sido praticado pela autoridade impetrada. Apenas, querendo cobrar, de terceiro, certos e determinados valores, impetra seguran­ça apontando o Exmo. Sr. Ministro de Estado da Fazenda como autoridade coatora.

9. A sua ilegitimidade passiva é indiscutível, pois não há ato administrativo in concreto realizado (Mandado de Segurança corretivo), nem ameaça ou fundado receio de que a autoridade im­petrada venha praticá-lo (Mandado de Segurança preventivo). O que, em verdade, existe é uma relação jurídica entre pessoas de Di­reito privado interno, cujo conteúdo consiste em uma prestação de «dare» e que tem por objeto o pagamento em 'pecúnia, de certa e determinada importância».

De ver-se, pois, a autoridade apontada pelo impetrante como c'oatora não praticou qualquer ato que se possa atribuir lesivo a direito seu, menos, ainda, líquido e certo, não podendo, por isso, figurar no pólo passivo do mandamus.

Assim e nesse sentido, já decidiu o extinto Tribunal Federal de Recur­sos, apreciando matéria idêntica, no MS n? 119.395-DF (00.0967300-8), em Sessão Plenária como resumido na ementa seguinte:

«Processual. Mandado de Segurança. - Ilegitimidade passiva da parte. Induvidoso o vício da impe­

tração, à míngua da indicação de qualquer ato de efeitos concretos praticados pela autoridade irrogada, não se conhece do pedido». (Relator: Ministro José Dantas - in Dl 28-11-88).

De igual, no que pertine à incompossibilidade de, na via estreita do writ, investir contra lei em tese, como o quer o requerente, de há muito sedimentou-se o entendimento pretoriano, cristalizado na Súmula 266 do STF.

Por isso que, acolho a preliminar suscitada e não conheço da seguran-ça.

É como voto.

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VOTO (VOGAL)

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: Senhor Presi­dente, acolho o ponto de vista do Relator no sentido da extinção do proces­so.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO: Há uma re­gra elementar que diz: sententia debet esse conformis libello, ou seja, a de­cisão deve ser conforme o pedido. Se a questão foi colocada nesses termos, e nesses termos é o pedido, também não vejo, com a devida vênia, onde se encontrar o ato administrativo. O que acontece, como já foi muito bem fo­calizado, é que houve um evidente erro na impetração do writ. Por esta ra­zão, também acompanho o eminente Relator, e, ao acompanhá-lo, peço vê­nia a S. Exa. para dar pela extinção e não pelo conhecimento do mandado de segurança.

Lembro-me de que, em uma das primeiras reuniões neste Tribunal, o eminente Ministro Eduardo Ribeiro salientava que ele votava com o Rela­tor nessas questões de terminologia sem se prender muito a filigranas por­que o importante era a substância do julgamento.

Também procuro seguir essa linha, desde que a questão não seja colo­cada em debate. Lançadas as expressões «não conhecer do mandado de se­gurança» e «extinção do mandado de segurança», vejo-me na contingência de ter que me manifestar nessa parte, optando pela expressão extinção do processo, porque, além de ilegitimidade passiva da autoridade impetrada e da evidente inépcia da inicial no caso presente, o mandado de segurança não é recurso, e de recurso é que não se conhece. O mandado de segurança é uma ação civil, de conhecimento, e, como tal, deve se sujeitar aos ditames do código.

No caso, como não chegamos ao mérito, dou pela extinção sem julga­mento do mérito.

Em síntese, acompanho o eminente Relator, com sua colocação inicial, pela extinção do processo.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: Sr. Presidente, con­tinuo com uma certa perplexidade diante do problema que se apresenta, uma vez que encontro dificuldade para conceituar como de direito privado matéria abordada em mandado de segurança. Como muito bem salientou o eminente Ministro Eduardo Ribeiro, trata-se de relação entre administrador e administrado. Não importa que, no caso, o administrador não tenha praticado qualquer ato. Mas, fato é que o impetrante está colocando assim, tentando posicionar o Ministro da Fazenda - se não me engano - no pólo passivo da relação processual, no caso.

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De modo que, apesar das sábias ponderações do eminente Ministro Athos Carneiro, que tem entendido ser possível distinguir-se, identificar-se a matéria de direito privado no mandado de segurança, para que seja fixada a nossa competência, confesso que estou perplexo, estou tendo uma dificul­dade imensa diante do problema. Inclusive, acrescento que um dos primei­ros mandados de segurança que recebi como Ministro deste Superior Tribu­nal de Justiça foi de uma empresa de São Paulo, contra o Ministro da Fa­zenda, atacando exatamente um ato normativo respeitante à aplicação da «tabUta», decorrente do «Plano Bresser». Parece-me que a temática é a mesma.

o SR. MINISTRO W ALDEMAR ZVEITER (Relator): Se aqui o inte­ressado desenvolvesse a impetração nesse sentido, eu declinaria da compe­tência, mas este mandado de segurança é sui generis. Eu nunca tinha visto uma impetração como esta. Não dá para defini-la. O impetrante, pura e simplesmente, alegou que o ato é do Ministro da Fazenda, mas o que ataca, no fundo, é a cobrança ou o pagamento que lhe foi feito a menor de uma letra financeira que havia adquirido. E o que pede é isso também. Não pos­tula a anulação do ato, quer dizer, a relação de direito material, que seria entre o administrado e o administrador. Não basta que a toda evidência que apenas alegue, é preciso que prove. Contudo, alegou, mas não provou, e a autoridade afirma: «eu não pratiquei ato nenhum». O caso era, pois, de in­deferimento da inicial. Não posso adivinhar o ato. Estou me atendo ao que a parte pediu. Ela não pede a anulação do decreto, não pede a declaração da incónstitucionalidade. Versa toda essa matéria, mas o que pede é isto: «quero que deposite o valor recebido a menor». Trata-se de um mandado de segurança visando efeitos patrimoniais. No fundo seria uma ação ordiná­ria que haveria de propor contra o Banco do Estado do Paraná, a que deu o título, tudo indica, de mandado de segurança. Neste caso, não posso, se­quer, vislumbrar aqui uma forma de declinar da competência.

Agradeço a V. Exa.

O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: Em cada caso, então vamos ter que identificar a natureza da matéria? Isso vai dificultar muito o proble­ma da fixação dessa competência, em tema de mandado de segurança.

O SR. MINISTRO BUENO DE SOUZA (Presidente): Parece-me que sim. Isto é o que está, realmente, sendo assentado ao longo dos nossos de­bates. Em cada caso, cumpre verificar se o ato que está em causa é ato ata­cado, em si mesmo; ou, se é uma relação jurídica diversa que dá ensejo à demanda.

O SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: No momento em que este en­tendimento sedimentar-se prometo render-me, se for o caso, ao entendimen­to da maioria. Mas, por enquanto, continuo achando que se trata de maté­ria da competência da Primeira Seção, datíssima vênia dos doutos pontos de vista em contrário.

Não conheço, em virtude da incompetência da Seção.

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VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Sr. Presidente, também acolho a preliminar de ilegitimidade passiva e, nesses termos, julgo extinto o processo, sem conhecimento do mérito, acompanhando o Sr. Mi­nistro Relator.

VOTO (VOGAL)

o EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: Sr. Presidente, de acor­do com a tradição da Casa, ainda quando do Federal de Recursos, não co­nheço do pedido.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: A falta de requisi­tos necessários à constituição válida da relação processual conduz à impos­siblidade de conhecer do pedido, levando à extinção do processo. De urna forma ou de outra que se expresse o julgador, o resultado é o mesmo.

Acompanho o Relator.

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 138 - DF - (Reg. n? 89.0007750-3) - ReI.: O Sr. Min. Wal­demar Zveiter. Impte.: Abe Antonio Buiar Florestal e Empreendimentos Ltda. Impdo.: Ministro de Estado da Fazenda. Advs.: Drs. Maria do Car­mo R. C. Prado e outro.

Decisão: A Seção. por unanimidade, não conheceu do pedido, nos ter­mos do votõ do Sr. Ministro Relator. (28-6-89 - 2~ Secão).

Votaram com o Relator os Srs. Ministros Fontes de Alencar, Cláudio Santos, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro, Nilson Naves, Eduardo Ri­beiro e Athos Carneiro.

1000

--e--

MANDADO DE SEGURANÇA N? 147 - DF (Registro n? 89.7960-3)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Carlos M. Velloso Impetrante: Antônio Carlos Osório Filho Impetrado: Ministro de Estado da Fazenda Advogado: Dr. Antônio Carlos Osório Filho

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EMENTA: Mandado de segurança. Consórcio. Portaria 8 do Ministro da Fazenda. Lances.

I - A Portaria n? 8, de 17-1-89, do Ministro da Fazen­da, que proíbe lances e antecipação das prestações vincendas de consórcio, não se aplica aos consórcios já formados. Prece­dente do Tribunal: MS 140-DF.

n - Mandado de segurança deferido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 1 ~ Seç,ão do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, conhe­

cer do mandado de segurança e o' deferir, nos termos do relatório e notas taquigráficas anexas, que ficam fazendo parte integrante do presente julga­do.

Custas, como de lei.

Brasília, 15 de agosto de 1989. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro CARLOS

M. VELLOSO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO: Trata-se de man­dado de segurança impetrado por Antônio Carlos Osório Filho contra ato do Senhor Ministro da Fazenda, consulbstanciado na Portaria n? 8, de 17-1-89, que proibiu lances e antecipações das prestações vincendas de consórcio de valor superior a 20070 do preço do bem objeto do plano respectivo.-

O impetrante alega, em síntese, que:

a) a competência do Ministério da Fazenda deve restringir-se ao exame prévio das normas contratuais relativas aos regulamentos sujeitos à sua aprovação;

b) «aprovado o regulamento, passa ele a gerir as relações entre os con­tratantes, deslocando-se a matéria para a órbita do Direito Privado». É, portanto, ilegal a interferência do Ministério da Fazenda em um ato jurídi­co perfeito;

c) assim sendo, «tem direito líquido e certo a efetuar antecipações, bem como oferecer lances em Assembléia, de acordo com o contrato cele­brado com o Automóvel Clube do Brasil, sem qualquer limite máximo de valores».

Por fim, requer a concessão de liminar, alegando ter sido atingido de forma inesperada pela autoridade coatora e necessitar de um carro para locomover-se.

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Às fls. 16121 a autoridade coatora presta informações, sustentando o descabimento do mandado de segurança por estar o impetrante questionan­do lei em tese. Argumenta que a portaria em questão é «norma geral e abs­trata que, em caráter genérico, dispõe sobre consórcio», sendo, portanto, inidônea a medida utilizada.

No mérito, diz que o impetrante não tinha direito adquirido, mas tão': somente expectativa de direito. «Não há direito adquirido sem incidência da norma jurídica que o constituiria, nem há incidência da norma jurídica sem que tenha havido a concretização do seu suporte fático».

À fI. 22 foi indeferida a liminar requerida, por inocorrência dos pressu­postos legais.

Oficiando às fls. 34/43, a ilustrada Sub procuradoria-Geral da Repúbli­ca opinou pelo não conhecimento do writ ou pelo seu indeferimento. Enten­de que a Portaria contém normas de caráter geral, configurando-se como lei em tese, contra a qual não é cabível mandado de segurança. No mérito, res­salta que as operações chamadas consórcio envolvem a captação de poupan­ça popular, matéria de interesse público. Dependem de autorização da Ad­ministração e sujeitam-se às disposições do regulamento e da Lei n? 5.768/71, que são as normas públicas, típicas do poder de polícia adminis­trativa. Sobre essas não podem prevalecer direitos anteriores. A alteração do regulamento «em razão de modificação da situação de fato que ditara a regra anterior» é legítima em matéria de ordem pública. Acrescenta, ainda, que a aquisição de bens pelo consórcio, por lance, é uma verdadeira compe­tição. Se o impetrante tivesse a possibilidade de efetuar lances, estaria, en­tão, em «situação privilegiada em relação aos seus concorrentes, com que­bra do prinCípio de igualdade de tratamento».

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO (Relator): A Por­taria n? 8, de 17-1-89, que proibiu lances e antecipações das prestações vin­cendas de consórcio de valor superior a vinte por cento do preço do bem objeto do plano respectivo, aqui impugmlda, tem efeitos concretos. Destar­te, não há falar em mandado de segurança contra lei em tese. Rejeito a pre­liminar argüida.

No mérito, cumpre registrar que questão idêntica foi decidida por esta Eg, Seção - MS 140-DF, Relator para acórdão o Sr. Ministro Miguel Fer­rante. Decidiu-se, então, que a Portaria n? 8, objeto da impetração, não pode atingir situações já aperfeiçoadas, vale dizer, «consórcio previamente autorizado e definitivamente constituído, com o grupo «fechado» como se diz, com todos os contratos de adesão formalizados e assinados», valendo a Portaria n? 8 «para os consórcios em formação, ou ainda não definitiva-

1002 R. sup. Trib. Just., Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989.

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mente constituídos». Noutras palavras, o ato impugnado não pode alcançar atos jurídicos perfeitos e acabados, como é a situação do impetrante.

Destarte, forte no precedente iLdicado - defiro o

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE sidente, o nobre e talentoso advogado, em

Senhor Pre-

fez menção ao Mandado de Segurança n? de que relator. Muito bem assinalou o eminente Relator, esta matéria é irmã gêmea daquela hipó­tese. Peço vênia ao Egrégio Tribunal para dissentir. Tive oportunidade de manifestar-me no sentido de não conhecer do mandado seguranç~. O no­bre impetrante impugna a Portaria n? 8 do Ministério da Fazenda, que di­tou normas a serem seguidas pelos consórcios. Não há na impetração ne­nhuma indicação de o consórcio, com base nessa portaria, haver repudiado a pretensão de fazer o lance. Em sendo assim, não demonstrado, caso con­creto, com base nessa portaria, data venia, seria o caso de não conhecimen­to do writ. No mérito, entendo e mantenho ainda o pensamento que o consórcio, dada a natureza de interesse público, dependente de autorização, ato administrativo, subordina-se permanentemente ao controle do Estado. A portaria impugnada visou - nota-se: é fato notório e conhecido as difi­culdades de maior ou menor oferta de veículo - a manter o equilíbrio en­tre os participantes do consórcio, evitando que o poder econômico de uns possa afastar a pretensão de outros. Sendo comandado por ato administra­tivo, pode ser alterado, visando ao interesse público. Não diviso ilegalmente na portaria. Além do mais, a cláusula rebus sic stantibus busca, mantidos os fatos, a mesma situação. Conseqüentemente, mudados, alterados estes fatos, também a relação jurídica muda no seu complexo de direitos e obri­gações.

Em assim sendo, pedindo vênia à egrégia Seção, não conheço do man­dado de segurança. Vencido nesta preliminar, denego o wrÍt.

EXTRATO DA MINUTA

MS n? 147 - DF - (Reg. n? 89.7960-3) - ReI.: O Exmo. Sr. Min. Carlos M. Velloso. Impetrante: Antônio Carlos Osório Filho. Impetrado: Mi­nistro de Estado da Fazenda. Advogado: Dr. Antônio Carlos Osório Filho.

Decisão: A Seção, por maioria, vencido o Sr. Ministro Vicente Cernic­chiaro, conheceu do mandado de segurança e o deferiu. 15-8-89, 1 ~ Seção.

Sustentação Oral: Usou da palavra o Dr. Antônio Carlos Osório Filho.

Os Srs. Ministros Miguel Ferrante, Pedro Acioli, Américo Geral-do Sobral, Ilmar Galvão, José de Jesus e Garcia Vieira votaram com o Re­lator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG.

R. Sup. Trib. Just., ,Brasília, 1(3):915-1003, novo 1989. 1003