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Mandado de Segurança Individual e Coletivo na Justiça do Trabalho

Mandado de Segurança Individual e Coletivo na Justiça do ... · Individual e Coletivo na Justiça do Trabalho ... Direitos individuais homogêneos ... Tal fato deixou sem proteção

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Mandado de SegurançaIndividual e Coletivo na

Justiça do Trabalho

JÚLIO CÉSAR BEBBER

Juiz do Trabalho. Doutor em Direito. Professor de Direito Processual do Trabalho.

Mandado de SegurançaIndividual e Coletivo na

Justiça do Trabalho

2ª edição

R

EDITORA LTDA.

Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-001São Paulo, SP — BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.br

Julho, 2014

Todos os direitos reservados

Índice para catálogo sistemático:

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Bebber, Júlio CésarMandado de segurança individual e coletivo na justiça

do trabalho / Júlio César Bebber. — 2. ed. — São Paulo : LTr, 2014.

1. Direito processual do trabalho — Brasil 2. Justiça dotrabalho — Brasil 3. Mandado de segurança — Brasil4. Processo civil — Brasil I. Título.

14-03860 CDU-347.919.6:347.998:331(81)

1. Brasil : Mandado de segurança individual e coletivona Justiça do Trabalho : Direito processual dotrabalho 347.919.6:347.998:331(81)

Versão impressa - LTr 5079.6 - ISBN 978-85-361-3005-7Versão digital - LTr 8004.2 - ISBN 978-85-361-3062-0

Dedicatória

Gildo Pedro Bebber, meu pai, ensinou-me muitas lições. Sua experiência de vida e seu exemplo me ensinaram, principalmente,

que um homem pode ser tudo o que desejar, não estandocondenado a ser o que o seu nascimento determinou.

A ti, meu pai, um beijo.

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Sumário

CAPÍTULO I — MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL

1. Considerações iniciais ...................................................................................................... 13

2. Breve nota histórica ......................................................................................................... 13

3. Disciplina legal ................................................................................................................. 14

4. Denominação .................................................................................................................. 15

5. Conceito .......................................................................................................................... 15

6. Natureza jurídica ............................................................................................................. 18

6.1. Natureza jurídica do instrumento .............................................................................. 18

6.2. Natureza jurídica da sentença ................................................................................... 19

7. Finalidade ........................................................................................................................ 19

8. Modalidades .................................................................................................................... 21

8.1. Quanto ao direito cuja proteção se pretende ............................................................ 21

8.2. Quanto aos efeitos pretendidos ................................................................................ 21

9. Competência (material) da Justiça do Trabalho ................................................................ 22

10. Competência funcional (originária) ................................................................................ 23

11. Competência territorial (de foro) ................................................................................... 25

12. Objeto ........................................................................................................................... 25

13. Admissibilidade e mérito do mandado de segurança ..................................................... 25

14. Ato de autoridade ......................................................................................................... 26

14.1. Autoridade por equiparação .................................................................................. 30

14.2. Ato de autoridade no contrato de trabalho ........................................................... 30

15. Omissão de autoridade na prática do ato ...................................................................... 33

16. Exequibilidade do ato praticado pela autoridade ............................................................ 33

17. Direito líquido e certo .................................................................................................... 34

18. Prazo ............................................................................................................................. 37

18.1. Constitucionalidade ............................................................................................... 38

18.2. Natureza jurídica ................................................................................................... 39

18.3. Prorrogação do termo final ................................................................................... 39

18.4. Declaração da decadência ..................................................................................... 41

8

19. Causas de exclusão ........................................................................................................ 41

19.1. Ato de que caiba habeas corpus e habeas data ................................................... 42

19.2. Ato administrativo de que caiba recurso administrativo ......................................... 42

19.3. Decisão judicial de que caiba recurso..................................................................... 44

19.4. Sentença com trânsito em julgado ........................................................................ 44

19.5. Lei em tese ............................................................................................................ 44

19.6. Ato interna corporis ............................................................................................. 46

20. Pressupostos processuais ............................................................................................... 46

20.1. Conceito ............................................................................................................... 47

20.2. Classificação .......................................................................................................... 48

20.3. Pressupostos processuais de existência .................................................................. 48

20.4. Pressupostos processuais de validade negativos .................................................... 49

20.5. Pressupostos processuais de validade positivos ...................................................... 50

21. Condições da ação ........................................................................................................ 51

21.1. Conceito ............................................................................................................... 51

21.2. Aferição in statu assertionis ................................................................................. 52

21.3. Modalidades ......................................................................................................... 53

21.4. Legitimidade para a causa ..................................................................................... 53

21.4.1. Legitimidade ativa ..................................................................................... 53

21.4.2. Legitimidade passiva .................................................................................. 54

21.5. Interesse de agir .................................................................................................... 56

21.5.1. Necessidade .............................................................................................. 56

21.5.2. Adequação ................................................................................................ 57

21.6. Possibilidade jurídica do pedido ............................................................................. 58

22. Direito individualizado incontestável .............................................................................. 59

23. Ilegalidade ou abuso de poder ....................................................................................... 60

24. Litisconsórcio ................................................................................................................. 61

24.1. Litisconsórcio ativo ................................................................................................ 61

24.2. Litisconsórcio passivo ............................................................................................ 62

25. Assistência ..................................................................................................................... 63

26. Amicus curiae ............................................................................................................... 63

27. Substituição processual do art. 3º da Lei n. 12.016/2009 .............................................. 64

28. Petição inicial ................................................................................................................. 65

28.1. Requisitos subjetivos ............................................................................................. 65

28.2. Requisitos objetivos ............................................................................................... 65

9

28.3. Instrução ............................................................................................................... 68

28.4. Cópias da petição inicial e dos documentos ........................................................... 68

29. Prova ............................................................................................................................. 69

30. Emprego da tecnologia para impetração do mandado de segurança ............................. 69

31. Competência instrutória ................................................................................................ 70

32. Controle de admissibilidade e julgamento de plano ....................................................... 70

33. Emenda saneadora ........................................................................................................ 71

34. Errônea individualização da autoridade coatora ............................................................. 72

34.1. Correção de ofício ................................................................................................. 73

34.2. Encampação .......................................................................................................... 73

35. Liminar .......................................................................................................................... 73

35.1. Natureza jurídica ................................................................................................... 73

35.2. Requisitos .............................................................................................................. 74

35.3. Discricionariedade ................................................................................................. 75

35.4. Concessão ex officio ............................................................................................ 75

35.5. Mecanismos de apoio ........................................................................................... 77

35.6. Garantia como condição para a providência liminar produzir efeito ....................... 77

35.7. Modificação e revogação ...................................................................................... 77

35.8. Pronunciamento liminar e sentença ....................................................................... 78

35.9. Eficácia .................................................................................................................. 79

35.10. Perempção .......................................................................................................... 80

35.11. Impugnação ........................................................................................................ 80

35.12. Contagem do prazo para impugnação ................................................................ 81

35.13. Inconstitucionalidade da supressão legal de concessão de medida liminar ........... 82

36. Notificação .................................................................................................................... 83

36.1. Natureza jurídica ................................................................................................... 83

36.2. Forma ................................................................................................................... 83

37. Ciência ao órgão de representação judicial .................................................................... 84

38. Autoridade administrativa e concessão de medida liminar ............................................. 84

39. Informações .................................................................................................................. 85

39.1. Natureza jurídica ................................................................................................... 85

39.2. Prazo ..................................................................................................................... 85

39.3. Valor ..................................................................................................................... 86

39.4. Pessoalidade.......................................................................................................... 86

39.5. Ausência ............................................................................................................... 87

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40. Parecer do Ministério Público do Trabalho ..................................................................... 87

41. Julgamento .................................................................................................................... 88

42. Acórdão — substituição pelas notas taquigráficas .......................................................... 88

43. Intimação da decisão à autoridade coatora e à pessoa jurídica ...................................... 89

44. Recursos das sentenças e dos acórdãos ......................................................................... 89

44.1. Legitimidade recursal ............................................................................................ 89

44.2. Interesse recursal .................................................................................................. 90

44.3. Recursos cabíveis ................................................................................................... 91

44.4. Prazos recursais ..................................................................................................... 92

44.5. Efeito não suspensivo ............................................................................................ 93

45. Remessa necessária ....................................................................................................... 93

46. Coisa julgada ................................................................................................................. 94

46.1. Coisa julgada formal ............................................................................................. 95

46.2. Coisa julgada material ........................................................................................... 95

47. Efetivação ...................................................................................................................... 96

48. Responsabilidade do impetrante por prejuízos na efetivação da ordem ......................... 97

49. Suspensão dos efeitos da decisão liminar, da sentença e do acórdão ............................ 98

49.1. Requisitos .............................................................................................................. 98

49.2. Constitucionalidade ............................................................................................... 99

49.3. Natureza jurídica ................................................................................................... 100

49.4. Competência ......................................................................................................... 101

49.5. Suspensão liminar ................................................................................................. 101

49.6. Provimentos repetitivos ......................................................................................... 102

49.7. Provimentos repetitivos supervenientes ................................................................. 102

49.8. Prazo ..................................................................................................................... 102

49.9. Cognição ............................................................................................................... 102

49.10. Contraditório ....................................................................................................... 102

49.11. Intervenção do Ministério Público ........................................................................ 103

49.12. Decisão fundamentada ....................................................................................... 103

49.13. Impugnação ........................................................................................................ 103

49.14. Duração da suspensão ........................................................................................ 104

49.15. Novo pedido de suspensão ................................................................................. 104

50. Desistência .................................................................................................................... 104

51. Honorários advocatícios ................................................................................................. 105

52. Regime financeiro .......................................................................................................... 105

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53. Repressão aos atos de improbidade processual.............................................................. 106

54. Preferência na tramitação e no julgamento ................................................................... 106

55. Alçada ........................................................................................................................... 106

CAPÍTULO II — MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO56. Noções gerais ................................................................................................................ 107

57. Legitimidade ativa ......................................................................................................... 107

58. Direito coletivo .............................................................................................................. 110

58.1. Direitos difusos ...................................................................................................... 111

58.2. Direitos coletivos em sentido estrito ...................................................................... 112

58.3. Direitos individuais homogêneos ........................................................................... 112

59. Autorização dos filiados, membros ou associados .......................................................... 113

60. Relação nominal dos substituídos .................................................................................. 114

61. Liminar .......................................................................................................................... 114

62. Litispendência e coisa julgada ........................................................................................ 114

CAPÍTULO III — MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL63. Mandado de segurança contra ato judicial ilegal ........................................................... 116

64. Causa de exclusão — possibilidade de impugnação por recurso ..................................... 116

64.1. Direito processual civil ........................................................................................... 117

64.2. Direito processual do trabalho ............................................................................... 118

64.3. Flexibilização excepcionalíssima da causa de exclusão ........................................... 119

65. Indicação da pessoa jurídica .......................................................................................... 119

66. Litisconsórcio necessário ................................................................................................ 120

67. Competência ................................................................................................................. 120

68. Legitimidade recursal da autoridade coatora ................................................................. 120

69. Impugnação do pronunciamento acerca da medida liminar ........................................... 121

70. Recursos dos acórdãos................................................................................................... 121

71. Recurso em mandado de segurança substitutivo de recurso .......................................... 122

72. Remessa necessária ....................................................................................................... 123

73. Mandado de segurança contra decisão transitada em julgado ....................................... 123

Referências bibliográficas ................................................................................................ 125

Anexo I ............................................................................................................................. 131

Anexo II ............................................................................................................................ 137

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Capítulo I

Mandado de Segurança Individual

1. Considerações iniciais

Até a Emenda Constitucional n. 45/2004, a doutrina e a jurisprudência trabalhistas conheciam unicamente os mandados de segurança contra ato jurisdicional e contra atos administrativos da própria Justiça do Trabalho.

Com a superveniência da Emenda Constitucional n. 45/2004, esse panorama foi modificado, uma vez que à Justiça do Trabalho foi atribuída a competência para processar e julgar mandados de segurança sempre que o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição (CF, 114, IV).

Diante dessa mudança no quadro jurídico, a Justiça do Trabalho passou a ser destinatária de um maior número de mandados de segurança, impondo, por conseguinte, uma maior intimidade de advogados, procuradores do trabalho e juízes do trabalho com esse instrumento de jurisdição constitucional, bem como grande criatividade no seu manejo, tendo em vista a estrutura e o funcionamento desse ramo do Poder Judiciário.

2. Breve nota histórica

Embora alguns vejam o mandado de segurança inspirado nas Ordenações Filipinas, nos writs do direito anglo-americano(1) (em especial no writ of injunction, que tem por escopo garantir o cumprimento das leis com preservação da constitucionalidade, podendo conter ordem de fazer — mandatory — ou de não fazer — prohibitory) e no juicio de amparo do direito mexicano (que tem por escopo assegurar direito individual, líquido e certo contra atos abusivos e ilegais da autoridade), é ele uma criação genuinamente brasileira. Sua fonte inspiradora foi a necessidade de purificar o habeas corpus, diante da distorção no seu uso(2).

No final do século XIX e início do XX, a doutrina passou a preconizar a utilização do habeas corpus, cujo objeto era a proteção do direito de liberdade de locomoção, também para a proteção de outros direitos. O Supremo Tribunal Federal, diante da

(1) Writ é um vocábulo de sentido genérico que serve para indicar uma ordem judicial escrita que determina a realização de um ato ou concede um direito.(2) “O mandado de segurança é ação e é remédio jurídico processual, adotados no Brasil por sugestão das extensões que tivera o habeas corpus, na feição primeira, ao tempo da Constituição de 1891. Nada tem com o contencioso administrativo, de que copiáramos, no Império, um dos exemplares mais interessantes.” (MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980. t. V., p. 335)

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ausência de outro instrumento legal de proteção aos direitos dos cidadãos, adotou essa ideia e firmou jurisprudência no sentido de conceder habeas corpus em favor de qualquer direito lesado, sempre que esse direito fosse considerado incontestável.

Com a reforma constitucional de 1926, restringiu-se o uso do habeas corpus à liberdade de locomoção. Tal fato deixou sem proteção os demais direitos fundamentais e, por isso, provocou intensa discussão sobre a necessidade de criação de um instrumento legal para proteção de direitos outros que o de ir e vir.

Esse problema, porém, somente foi resolvido na Constituição de 1934(3), que criou o mandado de segurança, sendo ele disciplinado inicialmente pela Lei n. 191/1936, seguido do CPC de 1939 (arts. 319 a 331) e da Lei n. 1.533/1951. Atualmente, o mandado de segurança está disciplinado pela Lei n. 12.016/2009, em vigência desde o dia 10 de agosto de 2009.

Embora ignorado pela Constituição de 1937, o mandado de segurança ganhou assento em todas as demais Constituições como instrumento de proteção de direitos, sempre que não se tratasse do direito de liberdade de locomoção(4). Passou a ser fundamental na escolha da demanda, portanto, o bem juridicamente tutelado que se deseja preservar.

3. Disciplina legal

O mandado de segurança tem suas bases assentadas no art. 5º, LXIX, da CF e está disciplinado na Lei n. 12.016/2009. A despeito de se tratar de lei recente, seu conteúdo revela a compilação (consolidação) de dispositivos que vigiam em normas legais esparsas (Leis ns. 1.533/1951 e 4.348/1964), com algumas adaptações, correções técnicas e terminológicas e pequenas inovações.

Discutiu-se muito à época da vigência da Lei n. 1.533/1951, que antecedeu a Lei n. 12.016/2009, se o CPC deveria ser utilizado como fonte subsidiária no mandado de segurança. A razão dessa discussão residia no fato de que a mencionada lei fazia referência à utilização do CPC unicamente em tema de litisconsórcio (arts. 19 e 20), sugerindo, assim, sua autossuficiência.

(3) CF-1934, 113, n. 33. Dar-se-á mandado de segurança para defesa do direito, certo e incontestável, ame-açado ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade. O processo será o mesmo do habeas corpus, devendo ser sempre ouvida a pessoa de direito público interessada. O mandado não prejudica as ações petitórias competentes.(4) CF-1946, 141, § 24. Para proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus, conceder--se-á mandado de segurança, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder.CF-1967, 153, § 21. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo não ampa-rado por habeas corpus, seja qual fôr a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder.EC-1969, 153, § 21. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo não ampa-rado por habeas corpus, seja qual fôr a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder.CF-1988, 5º, LXIX — conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não am-parado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

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Prevalecia, entretanto, o entendimento de que a Lei n. 1.533/1951 era incompleta, uma vez que não tratava, “por exemplo, da capacidade processual, dos procuradores, da competência, da forma, tempo e lugar dos atos processuais, das nulidades, dos requisitos da sentença, assim como de vários outros temas cuja regulamentação é indispensável para que se possa fazer um processo”(5).

Esse mesmo entendimento vale para a Lei n. 12.016/2009, não obstante a ampliação do rol de dispositivos e institutos do CPC aos quais faz expressa referência (arts. 6º, § 5º; 7º, §§ 1º e 5º; 24 e 26). Assim como a lei ab-rogada, a nova lei não é autossuficiente. Obriga, por isso, a utilização do direito processual comum em temas por ela não tratados.

Vale destacar, também, que o mandado de segurança na Justiça do Trabalho sofre certas adaptações (como veremos no curso deste estudo), diante da especialidade e da estrutura desse ramo do Poder Judiciário, bem como da legislação processual que o rege.

4. Denominação

O vocábulo mandado é originário do latim mandatum (do verbo mandare), e traduz a ideia de ordem ou determinação. Segurança, por sua vez, significa estar livre de riscos, perigos, danos ou incertezas. Daí porque, basicamente, “mandado de segurança é a ordem para remover os óbices ou sustar seus efeitos a fim de fluir a paz, com o tranquilo gozo de direitos subjetivos”(6).

Para certos juristas, o mandado é o objeto da ação de segurança, sendo esta (ação de segurança) a denominação adequada(7).

Sob o rigor técnico, porém, a denominação teria de ser demanda de segurança. Demanda é o vocábulo que exprime o pedido (requerimento) formulado na petição inicial que, no caso, é a segurança.

Não obstante isso, continuarei a utilizar a expressão mandado de segurança, por ser ela a expressão usual no meio jurídico.

5. Conceito

Segundo Hely Lopes Meirelles, mandado de segurança “é o meio constitucional posto à disposição de toda pessoa física ou jurídica, órgão com capacidade processual,

(5) OLIVEIRA, Eduardo Ribeiro de. Recursos em mandado de segurança — algumas questões controvertidas. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Mandados de segurança e de injunção. São Paulo: Saraiva, 1990. p. 280.(6) PACHECO, José da Silva. O mandado de segurança e outras ações constitucionais típicas. 4. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 154.(7) Alguns “juristas confundem, inadvertidamente, a ação de segurança com o mandado que constitui seu objeto (não objetivo) fundamental. Aquela é o continente; este o conteúdo” (TEIXEIRA FILHO, Manoel An-tonio. Mandado de segurança na Justiça do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 95).

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ou universalidade reconhecida por lei, para a proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça” (CF, 5º, LXIX e LXX; Lei n. 1.533/1951, 1º)(8).

José Cretella Júnior define mandado de segurança como “ação civil de conhecimento, de rito sumaríssimo, mediante a qual toda pessoa física, pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, sindicato, partido político, entidade de classe e associação de classe, desde que tenham, por ilegalidade ou abuso de poder, proveniente de autoridade pública, ou agente de pessoa jurídica, no exercício de atribuições do Poder Público, sofrido violação — ou tenham justo receio de sofrê-la —, de direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, a fim de que, pelo controle jurisdicional, o Poder Judiciário devolva, in natura, ao interessado, aquilo que o fato ou o ato tirou ou ameaçou tirar”(9).

Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “mandado de segurança é remédio específico contra a violação pelo poder público de direito, líquido e certo, outro que o de locomoção ou o acesso a informações pessoais”(10).

Edmir Netto de Araújo define mandado de segurança como “ação judicial consti-tucional, de rito sumário específico e objeto próprio, que é a proteção de direito líquido e certo, individual ou coletivo, de qualquer pessoa física ou jurídica, privada ou pública, de qualquer órgão ou entidade com capacidade processual, ou de universalidade legal-mente reconhecida, lesado ou ameaçado de lesão por ato ou omissão de autoridade, pública ou particular que detenha, sob qualquer fundamento legal, parcela de autori-dade inerente ao Estado, desempenhando atribuições do Poder Público, desde que não amparado esse direito por habeas corpus ou habeas data”(11).

Segundo Manoel Antonio Teixeira Filho, mandado de segurança “é o meio consti-tucionalmente previsto, de que se pode valer a pessoa, física ou jurídica, para obter um mandado destinado à proteção de direito, próprio ou de terceiro, individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade pública, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça, ou de seus representantes ou órgãos de partidos políticos ou de dirigentes de pessoa jurídica ou de pessoa natural no exercício de atribuições do poder público, no que disser respeito a essas atribuições”(12).

Para Carlos Henrique Bezerra Leite, mandado de segurança é “uma garantia, um remédio, de natureza constitucional, exteriorizado por meio de uma ação especial, posta

(8) MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 21-2.(9) CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à lei do mandado de segurança. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 1-2.(10) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 318.(11) ARAÚJO, Edmir Netto de. Mandado de segurança e autoridade coatora. São Paulo: LTr, 2000. p. 22.(12) TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Mandado de segurança na Justiça do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 95.

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à disposição de qualquer pessoa (física ou jurídica, de direito público ou privado) ou de ente despersonalizado com capacidade processual, cujo escopo repousa na proteção de direito individual ou coletivo, próprio ou de terceiro, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, contra ato de autoridade pública ou de agente de pessoa jurídica de direito privado no exercício delegado de atribuições do poder público”(13).

Sem distanciar muito dos doutrinadores citados, conceituo mandado de segurança como a ação mandamental de direito público que integra a chamada jurisdição constitucional das liberdades e que tem por escopo proteger direitos individuais e incontestáveis, violados ou ameaçados de sê-lo por ilegalidade ou abuso do Poder Público.

Disse:

a) ação, porque o mandado de segurança corresponde ao direito de provocar a tutela do Estado (direito à tutela jurisdicional), instaurando, assim, a relação processual;

b) mandamental, porque a pretensão deduzida se caracteriza pela emissão de uma ordem do juízo à autoridade coatora para que não pratique ou suspenda a prática do ato ilegal ou abusivo, ou para que pratique o ato legal omitido (infra, n. 8.2);

c) de direito público, porque é exercida contra o Estado. A ação põe em movimento a função jurisdicional do Estado, na qualidade de titular do poder jurisdicional;

d) que integra a chamada jurisdição constitucional das liberdades, porque esta é a natureza jurídica que a Constituição Federal lhe atribui (infra, n. 6.1)(14);

e) e que tem por escopo proteger direitos individuais. Por direito individual, deve-se compreender o “direito individualizado, que é aquele que tem um titular, que pode ser exercido por um titular. Esse titular nem sempre será uma pessoa física, podendo ocorrer que pessoas jurídicas possuam tal direito, assim como certos órgãos despersonalizados, mas dotados de capacidade processual, e mesmo as entidades extraordinariamente legitimadas pelo art. 5º, LXX, da Constituição Federal, no caso da defesa de direitos da respectiva coletividade, por meio do mandado de segurança coletivo” (infra, n. 22)(15);

f) incontestáveis, porque são os direitos com esta qualificação que o mandado de segurança protege (infra, ns. 7 e 22);

g) violados ou ameaçados de sê-lo, uma vez que o mandado de segurança pode ser utilizado para impedir ou reparar a lesão ao direito (infra, n. 8.2);

(13) BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. Mandado de segurança no processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1999. p. 23.(14) “Seguindo a ordem dos mecanismos ditados pela doutrina para a realização da ordem constitucional, após o controle da constitucionalidade das leis e dos atos normativos, vem a denominada jurisdição consti-tucional das liberdades onde se incluem: o habeas corpus; o mandado de segurança; o mandado de injun-ção; o habeas data; a ação popular. Pode-se dizer, então, que ‘toda a jurisdição constitucional se caracteriza como conjunto de remédios processuais oferecidos pela Constituição para prevalência dos valores que ela própria obriga’.” (BEBBER, Júlio César. Princípios do processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1997. p. 156)(15) ARAÚJO, Edmir Netto de. Mandado de segurança e autoridade coatora. São Paulo: LTr, 2000. p. 64.

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h) por ilegalidade ou abuso do Poder Público, porque o mandado de segurança é o instrumento constitucional contra ilegalidades cometidas pelo Poder Público, bem como contra a sua prepotência (infra, n. 23).

6. Natureza jurídica

O estudo da natureza da jurídica do mandado de segurança exige dupla análise: quanto ao instrumento e quanto aos efeitos da sentença.

6.1. Natureza jurídica do instrumento

Pacificou-se o entendimento de que o mandado de segurança integra a chamada jurisdição constitucional das liberdades(16). Trata-se, portanto, de uma demanda sincrética de rito especial abreviado (mas de cognição plena e exauriente), pertencente ao direito processual constitucional.

Disse:

a) demanda sincrética(17), uma vez que se destina a declarar e satisfazer o direito independentemente de processo de execução(18);

b) de rito especial(19), visto que o seu procedimento está regulado pela Lei n. 12.016/2009. “Como instrumento de uma tutela jurisdicional diferenciada, o mandado de segurança se desenvolve em um procedimento extremamente concentrado e ágil, sem dilações probatórias e favorecido pela preferência na tramitação e julgamento”(20);

c) abreviado, visto que é um procedimento eminentemente documental, embora de cognição plena e exauriente;

(16) “O mandado de segurança é uma ação constitucional de rito próprio sumaríssimo, destinada a pro-teger direito líquido e certo, ameaçado ou violado por ato praticado ilegalmente ou com abuso de poder, concedendo-se a ordem para que o coator cesse imediatamente a ameaça ou a violação.” (DIREITO, Carlos Alberto Menezes. Manual do mandado de segurança. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 21)No mesmo sentido: MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 137; ARAÚJO, Edmir Netto de. Mandado de segurança e autoridade coatora. São Paulo: LTr, 2000. p. 33.(17) O mandado de segurança é “ação no mais amplo sentido, ainda que de rito especial e sumaríssimo” (NUNES, Castro. Do mandado de segurança e de outros meios de defesa contra atos do poder público. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1967. p. 54).(18) Segundo Celso Agrícola Barbi, “o mandado de segurança é ‘ação de cognição’, que se exerce através de um procedimento especial da mesma natureza, de caráter documental, pois só admite prova dessa espécie, e caracterizado também pela forma peculiar da execução do julgado” (BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976. p. 73).Nesse mesmo sentido: BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. Mandado de segurança no processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1999. p. 24.(19) O mandado de segurança “é ação civil de rito sumário especial”. “(...) Distingue-se das demais ações apenas pela especificidade de seu objeto e pela sumariedade de seu procedimento, que é próprio e só subsi-diariamente aceita as regras do Código de Processo Civil.” (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 31.)(20) DINAMARCO, Cândido Rangel. Vocabulário do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 185.