Manifestações orais da doença inflamatória intestinal: estudo clínico

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  • THAS PROTA HUSSEIN PINCELLI

    Manifestaes orais da doena inflamatria intestinal: estudo clnico-patolgico retrospectivo

    Dissertao apresentada Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Mestre em Cincias

    rea de Concentrao: Dermatologia Orientador: Prof. Dr. Marcello Menta Simonsen Nico

    So Paulo 2010

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Preparada pela Biblioteca da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo

    reproduo autorizada pelo autor

    Pincelli, Thas Prota Hussein Manifestaes orais da doena inflamatria intestinal : estudo clnico-patolgico retrospectivo / Thas Prota Hussein Pincelli. -- So Paulo, 2010.

    Dissertao(mestrado)--Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo. Programa de: Dermatologia.

    Orientador: Marcello Menta Simonsen Nico.

    Descritores: 1. Doena de Crohn 2.Estomatite aftosa 3.Pnfigo 4.Doena inflamatria intestinal 5.Retocolite ulcerativa 6.Pioestomatite vegetante 7.Manifestaes bucais

    USP/FM/DBD-124/10

  • Esta tese est de acordo com as seguintes normas, em vigor no momento

    desta publicao:

    Referncias: sistema autor-data; adaptado de International Committee of

    Medical Journals Editors (Vancouver).

    Universidade de So Paulo. Faculdade de Medicina. Servio de Biblioteca e

    Documentao. Guia de apresentao de dissertaes, teses e monografias.

    Elaborado por Anneliese Carneiro da Cunha, Maria Julia de A. L. Freddi,

    Maria F. Crestana, Marinalva de Souza Arago, Suely Campos Cardoso,

    Valria Vilhena. 2a ed. So Paulo: Servio de Biblioteca e Documentao;

    2005.

  • DEDICO ESTA TESE...

    Aos meus pais

    Mamed,

    que onde estiver, com certeza estar orgulhoso e

    Maria Beatriz,

    exemplo de trabalho e determinao,

    sem o esforo e a dedicao de vocs, eu jamais teria chegado at aqui.

    Vocs so os grandes responsveis por minha formao moral e

    profissional.

    Ao meu irmo Guilherme,

    pelo carinho e amizade.

    minha irm Renata,

    pelo apoio, cumplicidade e carinho,

    que este trabalho sirva de estmulo para sua vida profissional.

    Ao meu marido Andr,

    pelo companheirismo e apoio constantes,

    e pela compreenso nos momentos difceis.

    minha tia Rita,

    pelo amor e presena em todos os momentos.

  • AGRADECIMENTOS

    Ao Professor Doutor Marcello Menta Simonsen Nico, orientador dessa

    dissertao e exemplo de mestre, agradeo pelos ensinamentos, dedicao

    e pacincia no desenvolvimento deste trabalho, alm do constante incentivo

    ao meu progresso acadmico.

    Professora Doutora Slvia Vanessa Loureno, pela amizade, carinho

    e dedicao e pela imensa ajuda na confeco desta tese.

    Ao Professor Doutor Evandro Ararigbia Rivitti, por sua importncia

    no meu aprendizado dermatolgico e por ter me permitido iniciar o mestrado

    em Dermatologia durante o ano complementar de minha formao.

    s Professoras Doutoras Valria Aoki, Celina Wakisaka Maruta, Zilda

    Najjar Prado de Oliveira e Neusa Yuriko Sakai Valente, pelas valiosas

    sugestes.

    Dona Eli Maria, pela pacincia e fundamental ajuda nas questes

    da ps-graduao.

    Doutora Sheyla Batista Bologna, pela enorme contribuio na

    seleo de doentes para esse trabalho.

    minha querida sogra Angelina Pugliese Pincelli, pela brilhante

    correo desta tese.

    A todos os meus mestres do Departamento de Dermatologia do

    Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina da Universidade de So

    Paulo, exemplos de sabedoria, dedicao e seriedade, agradeo pelos

  • valiosos ensinamentos e pela fundamental participao na minha formao

    dermatolgica.

    A todos os meus colegas de residncia, na pessoa da Dra. Juliana

    Dumt Fernandes, que me auxiliou na confeco final desta tese.

    Aos doentes, pois sem a participao deles, este trabalho no teria

    acontecido.

    Ao Hospital das Clnicas e Faculdade de Medicina da Universidade

    de So Paulo, por me proporcionarem aprendizado constante e

    enriquecimento intelectual dirio.

  • SUMRIO

  • SUMRIO

    Resumo

    Summary

    1. INTRODUO 01

    2. OBJETIVOS 06

    3. REVISO DA LITERATURA 08

    3.1 Retocolite ulcerativa 10

    3.2 Doena de Crohn 11

    3.3. Manifestaes extra-intestinais da doena

    inflamatria intestinal 13

    3.4. Manifestaes tegumentares da doena

    inflamatria intestinal 14

    3.4.1. Leses cutneas especficas 16

    3.4.1.1. Fissuras, abscessos e fstulas perianais 16

    3.4.1.2. Doena de Crohn por contigidade

    e metasttica 17

    3.4.2. Leses orais especficas 17

    3.4.2.1. lceras lineares e leses polipides 18

    3.4.2.2. Hiperplasia da mucosa com aspecto em

    paraleleppedo 18

    3.4.2.3. Queilite granulomatosa 19

    3.4.3. Leses cutneas no-especficas 19

    3.4.3.1. Eritema nodoso 19

  • 3.4.3.2. Pioderma gangrenoso 21

    3.4.3.3. Sndrome de Sweet 22

    3.4.4. Leses orais no-especficas 23

    3.4.4.1. Afta 23

    3.4.4.2. Edema labial e gengival 24

    3.4.4.3. Pioestomatite vegetante 25

    3.5. Tratamento da doena inflamatria intestinal 27

    4. CASUSTICA E MTODOS 30

    5. RESULTADOS 33

    6. DISCUSSO 54

    6.1. Manifestaes cutneo-mucosas de doenas sistmicas 55

    6.2. Anlise geral dos casos 57

    6.3. Afta 59

    6.4. Pioestomatite vegetante 60

    6.5. Doena de Crohn oral 65

    6.6. Consideraes finais 66

    7. CONCLUSES 68

    8. ANEXOS 70

    9. REFERNCIAS 72

    APNDICE

  • RESUMO

  • Resumo

    Pincelli, TPH. Manifestaes orais da doena inflamatria intestinal: estudo

    clnico-patolgico retrospectivo. [dissertao]. So Paulo: Faculdade de

    Medicina, Universidade de So Paulo; 2010.

    O termo doena inflamatria intestinal engloba duas doenas inflamatrias

    crnicas, imunologicamente mediadas, envolvendo o trato gastrointestinal: a

    doena de Crohn e a retocolite ulcerativa. Os sintomas intestinais so

    predominantes, porm, durante o curso da doena, podem ocorrer

    manifestaes extraintestinais, incluindo o envolvimento da cavidade oral. O

    envolvimento oral na doena inflamatria intestinal pode se dar por

    diferentes tipos de leses, sendo o tipo mais comum a afta. Leses menos

    frequentes incluem, entre outras, a pioestomatite vegetante e as leses

    granulomatosas da doena de Crohn. Apresentamos dez casos de doentes

    com manifestaes orais de doena inflamatria intestinal, sendo que, em

    alguns desses casos, essas foram essenciais para o diagnstico definitivo

    da doena, alm de reviso detalhada da literatura. O envolvimento da

    cavidade oral pode ser prvio ou simultneo aos sintomas gastrointestinais.

    Porm, na maior parte dos casos, a doena inflamatria intestinal precede o

    incio das leses orais em meses ou anos. Em muitos doentes, a

    sintomatologia intestinal pode ser mnima ou mesmo ausente, o que justifica

    exame minucioso do trato gastrointestinal em todos os doentes com leses

    orais suspeitas, mesmo na ausncia de sintomas evidentes. Geralmente, o

  • curso clnico das leses orais paralelo atividade da doena inflamatria

    intestinal, por isso as manifestaes orais so consideradas bons

    marcadores cutneos da doena.

    Descritores: 1.Doena de Crohn 2.Estomatite aftosa 3.Pnfigo 4.Doena

    inflamatria intestinal 5.Retocolite ulcerativa 6.Pioestomatite vegetante

    7.Manifestaes bucais

  • SUMMARY

  • Summary

    Pincelli, TPH. Oral manifestations of inflammatory bowel disease:

    retrospective clinical-pathologic study. [dissertation]. So Paulo: Faculdade

    de Medicina, Universidade de So Paulo; 2010.

    Inflammatory bowel disease comprises two chronic, tissue-destructive,

    clinical entities: Crohns disease and ulcerative colitis, both immunologically

    based. Bowel symptoms are predominant, but extra-intestinal complications

    may occur, including involvement of the oral cavity. Oral involvement during

    Inflammatory bowel disease includes several types of lesions: the most

    common are aphthae; uncommon lesions include, among others,

    pyostomatitis vegetans and granulomatous lesions of Crohns disease.

    Starting with a presentation of ten patients with oral manifestations, which

    were crucial for the final diagnosis of inflammatory bowel disease, a review

    on the subject is presented. Oral involvement in inflammatory bowel disease

    may be previous or simultaneous to the gastrointestinal symptoms. However,

    in the majority of cases, bowel disease precedes the onset of oral lesions by

    months or years. In many patients, the intestinal symptoms may be minimal

    and can go undetected; thus, most authors believe that the bowel must be

    thoroughly examined in all patients with suspected inflammatory bowel

    disease even in the absence of specific symptoms. Usually, the clinical

    course of oral lesions is parallel to the activity of inflammatory bowel disease;

  • therefore, oral manifestations are a good cutaneous marker of inflammatory

    bowel disease.

    Descriptors: 1.Crohn disease 2.Aphtous stomatitis 3.Pemphigus

    4.Inflammatory bowel disease 5.Ulcerative colitis 6.Pyostomatitis vegetans

    7.Oral manifestations

  • 1. INTRODUO

  • 2

    1. INTRODUO

    Sob o termo doena inflamatria intestinal estudam-se duas

    doenas inflamatrias crnicas, imunologicamente mediadas, que envolvem

    as diferentes pores do tubo digestivo: a doena de Crohn e a retocolite

    ulcerativa.

    A retocolite ulcerativa acomete primariamente a mucosa colnica,

    com extenso e gravidade variveis. A inflamao tipicamente no

    transmural e pode provocar quadro de proctite ou pancolite, dependendo da

    extenso do envolvimento. Raramente, pode ser observada inflamao ileal,

    o que torna difcil a diferenciao com a doena de Crohn (BAUMGART e

    SANDBORN, 2007). Os sintomas intestinais caractersticos incluem dores

    abdominais em clica e diarreia muco-sanguinolenta. O comprometimento

    sistmico pode estar presente, com perda de peso e anemia.

    A doena de Crohn uma doena granulomatosa que envolve

    geralmente a poro terminal do leo e inicial do clon, porm, qualquer

    poro do trato gastrointestinal pode estar acometida. O acometimento

    transmural descontnuo de vrias pores do trato caracterstico. A

    apresentao clnica depende da localizao da doena, e pode se

    caracterizar por diarreia, dor abdominal, febre e obstruo intestinal. O

    desenvolvimento de complicaes como fstulas, abscessos e doena

  • 3

    perianal grave frequente na doena de Crohn (BAUMGART e

    SANDBORN, 2007).

    Os sintomas intestinais so predominantes nas duas doenas, porm,

    durante seu curso, podem ocorrer manifestaes extraintestinais, incluindo o

    envolvimento da pele e da cavidade oral. Vinte e cinco por cento a um tero

    dos doentes com doena inflamatria intestinal iro desenvolver

    manifestaes ou complicaes extraintestinais (BAUMGART e

    SANDBORN, 2007).

    O envolvimento da cavidade oral pode ser prvio ou simultneo aos

    sintomas gastrointestinais. Na maior parte dos casos, a doena inflamatria

    intestinal precede o incio das leses orais em meses ou anos. s vezes,

    porm, o doente se apresenta com importante comprometimento da mucosa

    oral, com sintomatologia intestinal mnima ou mesmo ausente, o que justifica

    exame minucioso do trato gastrointestinal em todos os doentes com leses

    orais suspeitas. Geralmente, o curso clnico das leses orais paralelo

    atividade da doena inflamatria intestinal, por isso as manifestaes orais

    so consideradas bons marcadores tegumentares (TROST e MCDONNELL,

    2005).

    A cavidade oral mais comumente envolvida na doena de Crohn,

    com um comprometimento que varia de 0,5% a 20% (GREGORY e HO,

    1992). Tais manifestaes podem ser especficas (granulomatosas) e no-

  • 4

    especficas (no granulomatosas, podendo ocorrer tambm em outras

    situaes clnicas). Estas ltimas incluem as aftas, a pioestomatite vegetante

    e o edema gengival, bucal ou labial difuso (HARTY et al, 2005).

    Leses orais especficas (diagnsticas) da doena de Crohn

    apresentam aspecto granulomatoso histopatologia, so incomuns e

    incluem as lceras lineares profundas com margens hiperplsicas, a

    hiperplasia da mucosa bucal com aspecto em paraleleppedo e a queilite

    granulomatosa (BASU e ASQUITH, 1980; PLAUTH et al, 1991). Essas

    leses podem ocorrer em qualquer momento durante o curso da doena

    intestinal, podendo preceder os sintomas intestinais por muitos anos

    (GREENSTEIN et al, 1976; BERNSTEIN e MCDONALD, 1978; TALBOT et

    al, 1984; EKBOM et al, 1991; LISCIANDRANO et al, 1996).

    No curso da retocolite ulcerativa podem ser observadas

    manifestaes de afta e, mais raramente, pioestomatite vegetante, sendo

    esta ltima considerada como sendo importante marcador da doena.

    (THORNHILL et al, 1992; PHILPOT et al, 1992; STORWICK et al, 1994;

    CALOBRISI et al, 1995; SORIANO et al, 1999).

    A pioestomatite vegetante um achado oral raro e exclusivo

    caracterizado por abscessos pustulosos miliares e eroses acometendo a

    mucosa oral (THORNHILL et al, 1992). As pstulas podem se tornar

    confluentes, formando ulceraes lineares caractersticas (SORIANO et al,

  • 5

    1999). Os locais mais comumente envolvidos so a mucosa bucal e labial, o

    palato duro e mole e a mucosa gengival, enquanto o assoalho da boca e a

    lngua so tipicamente poupados (SORIANO et al, 1999).

    No Ambulatrio de Estomatologia da Diviso de Dermatologia do

    Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina da Universidade de So

    Paulo temos observado vrios casos de manifestaes orais ligadas a

    doena inflamatria intestinal, inclusive alguns casos onde tais

    manifestaes foram as primeiras a ocorrerem, tendo sido assim indicativas

    para que se realizasse investigao colonoscpica. Dessa forma, decidimos

    realizar o presente estudo.

  • 6

    2. OBJETIVOS

  • 7

    2. OBJETIVOS

    1. Apresentar os casos de manifestaes orais ligadas doena

    inflamatria intestinal diagnosticados e acompanhados na Diviso de

    Dermatologia do Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina da

    Universidade de So Paulo.

    2. Correlacionar os aspectos clnicos, histopatolgicos e endoscpicos

    com a atividade e evoluo da doena inflamatria intestinal.

  • 8

    3. REVISO DA LITERATURA

  • 9

    3. REVISO DA LITERATURA

    A etiopatogenia da doena de Crohn e da retocolite ulcerativa

    complexa e apenas parcialmente compreendida, mas acredita-se que

    decorra de uma ativao inapropriada e sustentada do sistema imunolgico

    da mucosa do trato gastrointestinal (PODOLSKY, 2002; GAYA et al, 2006).

    Fatores genticos parecem contribuir apenas parcialmente para seu

    desenvolvimento. Parentes de primeiro grau de doentes afetados

    apresentam um risco absoluto de 7% de desenvolverem a doena em

    qualquer das formas, enquanto que a concordncia entre gmeos

    monozigticos de 45% para a doena de Crohn e de 10% para a retocolite

    ulcerativa (CHUTKAN, 2001; GAYA et al, 2006; BAUMGART e SANDBORN,

    2007). Nota-se que a contribuio gentica para o desenvolvimento de

    doena inflamatria intestinal parece ser mais importante na doena de

    Crohn que na retocolite ulcerativa. A ausncia de um padro mendeliano de

    herana entre gmeos indica que outros fatores genticos ou ambientais

    ainda no identificados participem do desenvolvimento da doena. O

    tabagismo parece exercer efeito protetor na retocolite ulcerativa, porm

    aumenta o risco de desenvolver doena de Crohn (PODOLSKY, 2002).

    Tem sido proposto ultimamente um modelo multifatorial para a

    etiopatogenia da doena inflamatria intestinal, estando possivelmente

    envolvidos fatores genticos, ambientais e imunolgicos (imunidade inata X

  • 10

    adaptativa), com ampliao da resposta imune seguida de perpetuao e

    regulao atravs dos linfcitos T reguladores (MAYER, 2010).

    Tanto a retocolite ulcerativa quanto a doena de Crohn demonstram

    um padro de distribuio etria bimodal, com um pico na segunda ou

    terceira dcada de vida e outro durante a sexta dcada. Trinta por cento dos

    doentes com doena inflamatria intestinal so diagnosticados durante a

    infncia (PONSKY et al, 2007).

    3.1. Retocolite ulcerativa

    A retocolite ulcerativa acomete quase exclusivamente a mucosa

    colnica e a inflamao extensa, porm superficial (MOSES et al, 1998;

    CHUTKAN, 2001; XAVIER e PODOLSKY, 2007). Uma combinao de

    fatores genticos e ambientais parece estar envolvida em sua causa.

    Estudos recentes demonstraram uma taxa de 44% de concordncia entre

    gmeos monozigticos, em contraste com 3,8% de concordncia entre

    gmeos dizigticos (TYSK et al, 1988). A histria familiar se mostrou um

    fator de risco importante para o desenvolvimento de retocolite ulcerativa, e

    sugere-se que a incidncia da doena seja maior em judeus Ashkenazi

    (ROTH et al, 1989). A mucosa retal invariavelmente envolvida, e a

    inflamao se estende no sentido proximal de maneira contnua e

    confluente. A extenso proximal da retocolite ulcerativa com o acometimento

  • 11

    de todo o intestino grosso (pancolite) ocorre em at 20% dos casos (MOSES

    et al, 1998). Sinais e sintomas comuns da retocolite ulcerativa incluem

    diarreia sanguinolenta, dor abdominal, perda de peso, anemia e urgncia

    retal (CHUTKAN, 2001). A gravidade dos sintomas paralela atividade da

    doena. O diagnstico pode ser suspeitado pela radiografia contrastada do

    intestino que demonstra ulceraes mucosas, pseudoplipos e perda de

    haustraes. Entretanto, o mais importante procedimento diagnstico o

    exame colonoscpico seguido de biopsia da mucosa. Os achados

    histopatolgicos incluem a presena de mucosite ulcerativa com

    microabscessos no epitlio e numerosos neutrfilos na lmina prpria e nas

    criptas (XAVIER e PODOLSKY, 2007; PONSKY et al, 2007).

    3.2. Doena de Crohn

    A doena de Crohn uma doena inflamatria crnica que afeta mais

    comumente o trato gastrointestinal baixo, porm todas as pores do tubo

    digestivo podem estar envolvidas, do reto cavidade oral. Mais raramente,

    pode haver manifestaes na pele, no sistema msculo-esqueltico e nos

    olhos. Sua causa permanece desconhecida, apesar de diversos

    mecanismos terem sido propostos (KORZENIK, 2005). Acredita-se que o

    desenvolvimento da doena de Crohn resulte da exposio da mucosa do

    trato gastrointestinal a fatores ambientais que, num hospedeiro

    geneticamente susceptvel, desencadeariam uma ativao inapropriada do

  • 12

    sistema imune da mucosa, provocando inflamao transmural

    granulomatosa (BOUMA e STROBER, 2003). Uma alta taxa de

    concordncia entre gmeos monozigticos tem sido observada (TYSK et al,

    1988). Alm disso, parentes de primeiro grau de doentes com doena de

    Crohn apresentam risco 4 a 20 vezes maior de desenvolverem a doena

    quando comparados populao geral (TYSK et al, 1988; ORHOLM et al,

    1991). Anlises genticas detalhadas em famlias afetadas identificaram

    vrios loci de susceptibilidade para a doena de Crohn (BRANT e

    SHUGART, 2004). A mais importante associao atribuda ao gene

    CARD15 localizado no lcus IBD1 (OGURA et al, 2001). O gene CARD15

    codifica uma protena citoplasmtica, a NOD2, que se expressa nos

    fagcitos mononucleares (INOHARA et al, 2003). Polimorfismos no gene

    CARD15 inibem a via NOD2, provocando um desvio para a via da resposta

    imune inata (MARKS et al, 2006). A mucosa de indivduos com doena de

    Crohn dominada por uma populao de linfcitos T CD4, que produzem

    interferon gama e interleucina 2. A ativao da imunidade celular

    acompanhada pela produo de ampla variedade de mediadores

    inflamatrios. Tais mediadores intensificam o processo inflamatrio e

    provocam dano tecidual, que ser responsvel pelas manifestaes clnicas

    da doena (FIOCCHI, 1998). A doena de Crohn se caracteriza tipicamente

    por ulceraes transmurais regionais (PONSKY et al, 2007), com formao

    de fstulas e ulceraes mucosas (RUOCCO et al, 2007). As lceras so

    comuns na doena de Crohn inicial e geralmente ocorrem sobre as placas

    de Peyer no intestino delgado. Elas podem coalescer formando ulceraes

  • 13

    longitudinais. Inflamao crnica em placas, irregularidade focal das criptas

    e granulomas so os achados microscpicos que permitem o diagnstico de

    doena de Crohn (STANGE et al, 2006). A doena de Crohn est restrita ao

    intestino delgado em aproximadamente 30% dos indivduos, sendo que 95%

    apresentam apenas acometimento do leo terminal (ilete regional). Quarenta

    por cento dos doentes apresentam envolvimento do intestino delgado e

    grosso e, em 27% dos casos, a doena de Crohn restrita ao clon. Doena

    de localizao gstrica ou duodenal incomum. Envolvimento jejunal

    descrito em at 10% dos casos (STANGE et al, 2006). Diarreia crnica o

    sintoma inicial mais frequente. Dor abdominal e perda de peso so

    observados em 60 a 70% dos doentes antes do diagnstico. A presena de

    sangue ou muco nas fezes ocorre em at 50% dos indivduos.

    Frequentemente, sintomas sistmicos como febre, anorexia e anemia esto

    presentes. Fstulas perianais ocorrem em 10% dos doentes no momento do

    diagnstico (SCHWARTZ et al, 2002). As caractersticas histopatolgicas da

    doena de Crohn incluem infiltrado inflamatrio com agregao macrofgica

    e granulomas no caseosos (XAVIER e PODOLSKY, 2007).

    3.3. Manifestaes extra-intestinais da doena inflamatria

    intestinal

    Numerosos achados extraintestinais tm sido observados em

    associao com a doena inflamatria intestinal e so eles, muitas vezes,

  • 14

    que motivam o doente a procurar ajuda mdica (GITNICK, 1989). As

    principais manifestaes incluem alteraes articulares (semelhantes

    artrite reumatoide, espondilite anquilosante e atrite das grandes

    articulaes), irite, eritema nodoso, pioderma gangrenoso, dficits

    nutricionais, colecistopatia calculosa, nefrolitase, alteraes hepticas e

    doena tromboemblica. Muitas vezes, o controle dessas condies

    associadas obtido com o tratamento adequado da doena intestinal

    associada (HUBER, 2008).

    A ocorrncia de uma manifestao extraintestinal na doena de Crohn

    parece aumentar a predisposio para o aparecimento de outras (RUOCCO

    et al, 2007; ARDIZZONE et al, 2008). Algumas manifestaes

    extraintestinais, tais como: artrite perifrica, eritema nodoso, aftas orais e

    episclerite, esto temporalmente relacionadas atividade da doena de

    Crohn. Outras, como pioderma gangrenoso, uvete, espondiloartropatia e

    colangite primria esclerosante, seguem usualmente um curso independente

    da atividade da doena intestinal (RUOCCO et al, 2007).

    3.4. Manifestaes tegumentares da doena inflamatria

    intestinal

    Um espectro de achados cutneo-mucosos tem sido relatado em

    associao com a doena inflamatria intestinal e postula-se que essas

  • 15

    leses possam servir como marcadores da presena e atividade da doena

    (BEITMAN et al, 1981; ROONEY, 1984; LISCIANDRANO et al, 1996; KATZ

    et al, 2003).

    A cavidade oral mais frequentemente acometida na doena de

    Crohn com um comprometimento que varia de 0,5 a 20% (GREGORY e HO,

    1992). As leses orais podem se apresentar como manifestao inicial da

    doena em at 10% dos indivduos. Acredita-se que a incidncia de leses

    orais seja maior quanto mais precoce o incio da doena (HARTY et al,

    2005). Alguns estudos demonstraram 48% de envolvimento oral na

    populao infantil com doena de Crohn (PITTOCK et al, 2001; HARTY et al,

    2005).

    A predominncia da doena de Crohn oral em doentes masculinos j

    est bem estabelecida (PLAUTH et al, 1991), em contraste com a maior

    incidncia de doena de Crohn em mulheres.

    As leses cutneas e orais relacionadas doena de Crohn podem

    ser classificadas em manifestaes especficas, quando a histologia

    demonstra um padro de inflamao granulomatoso no caseoso com

    predomnio de clulas epiteliides, ou no especficas, quando o substrato

    histolgico no do tipo granulomatoso (RUOCCO et al, 2007).

  • 16

    3.4.1. Leses cutneas especficas

    3.4.1.1. Fissuras, abscessos e fstulas perianais

    As fissuras anais, os abscessos isquioretais e as fstulas perianais

    so as leses cutneas mais comuns da doena de Crohn. As fstulas

    geralmente precedem a doena intestinal clinicamente sintomtica em

    aproximadamente 4 anos. As leses perianais esto mais frequentemente

    associadas doena de Crohn de localizao colnica do que doena do

    intestino delgado. As leses geralmente se iniciam com eritema anal ou

    perianal que se torna progressivamente edematoso com colorao

    eritmato-violcea. Em casos mais avanados, a inflamao das criptas

    anais provoca o surgimento de plipos eritmato-edematosos, que podem

    progredir para a formao de fstulas anais e mltiplos abscessos

    acometendo a regio do perneo, base do pnis ou vulva, coxas e parede

    abdominal (BURGDORF, 1981). A regio umbilical, conectada ao intestino

    por uma estrutura vestigial, tambm pode estar envolvida (MCLELLAND e

    GRIFFIN, 1996). Na periferia das fstulas e abscessos, a pele se apresenta

    eritematosa, ulcerada e com cicatrizes irregulares (RUOCCO et al, 2007).

  • 17

    3.4.1.2. Doena de Crohn por contiguidade e metasttica

    Cicatrizes na parede abdominal, como de laparotomias, colostomias

    ou ileostomias tambm podem ser eventuais localizaes da doena de

    Crohn, caracterizando a doena de Crohn por contiguidade. A doena de

    Crohn cutnea tambm pode acometer locais separados do trato

    gastrointestinal por tecido normal, situao denominada doena de Crohn

    metasttica. Esse tipo de leso cutnea pode ou no seguir curso paralelo

    atividade gastrointestinal. As leses aparecem como lceras, ndulos e

    placas eritematosas envolvendo as regies inframamria, axilar e

    retroauricular, a face e as extremidades, especialmente inferiores (RUOCCO

    et al, 2007). A vulva e a regio escrotal podem ser acometidas por lceras

    solitrias ou mltiplas sobre base eritmato-edematosa.

    3.4.2. Leses orais especficas

    As leses orais podem ocorrer em qualquer momento durante o curso

    da doena inflamatria intestinal, podendo preceder os sintomas intestinais

    por muitos anos (GREENSTEIN et al, 1976; BERNSTEIN e MCDONALD,

    1978; TALBOT et al, 1984; EKBOM et al, 1991; LISCIANDRANO et al,

    1996). Por isso, o diagnstico de leses orais isoladas com alteraes

    granulomatosas histologia, pode ser bastante difcil (LOURENO et al,

    2006).

  • 18

    3.4.2.1. lceras lineares e leses polipoides

    Dentre as leses especficas, as lceras lineares e as leses

    polipoides hiperplsicas so as mais frequentemente observadas (DUPUY et

    al, 1999; PITTOCK et al, 2001; ALAWI, 2005). As lceras lineares de bordas

    hipertrficas so mais comuns na mucosa vestibular, podendo se apresentar

    com aspecto multifocal. Raramente, leses polipoides podem ser

    observadas na mucosa bucal (VERBOV, 1973; NOBLE et al, 1983).

    Plauth revisou 79 casos de manifestaes orais da doena de Crohn

    de diversas publicaes prvias, encontrando um total de 228 leses orais.

    Segundo esse autor, o edema bucal o tipo de leso oral mais comum,

    seguido pelas lceras orais e pela hiperplasia mucosa. Os locais mais

    frequentemente acometidos so os lbios, a gengiva, o sulco vestibular e a

    mucosa bucal, nesta ordem. A deteco de granulomas bastante elevada

    nas leses orais (67-77%) (PLAUTH et al, 1991).

    3.4.2.2. Hiperplasia da mucosa com aspecto em paraleleppedo

    Mltiplas leses papulosas ou polipoides envolvendo a mucosa bucal

    e os vestbulos tambm so caractersticas e, quando alinhadas com grande

    proximidade, do mucosa um aspecto em paraleleppedo (ALAWI, 2005).

    Tambm conhecida por nodularidade mucosa ou cobblestoning, a

    hiperplasia em paraleleppedo pode ser bastante dolorosa, dificultando a fala

  • 19

    e a alimentao. Constitui manifestao rara, porm altamente especfica da

    doena de Crohn (PLAUTH et al, 1991; HALME et al, 1993; LISCIANDRANO

    et al, 1996). Geralmente, o tratamento da doena intestinal suficiente para

    o controle das leses orais (TROST e MCDONNELL, 2005).

    3.4.2.3. Queilite granulomatosa

    A queilite granulomatosa se caracteriza clinicamente por edema firme,

    no doloroso e persistente dos lbios, da mucosa bucal ou da face. Fissuras

    labiais verticais podem estar presentes, como consequncia do intenso

    edema labial. A queilite granulomatosa pode se apresentar de forma isolada

    (queilite granulomatosa de Miescher) ou associada a diversas condies

    clnicas, como a doena de Melkerson-Rosenthal, a doena de Crohn e a

    sarcoidose (granulomatose orofacial) (ALAWI, 2005).

    3.4.3. Leses cutneas no-especficas

    3.4.3.1. Eritema nodoso

    Caracteriza-se por placas e ndulos eritmato-violceos inflamatrios

    localizados na superfcie extensora das extremidades, particularmente na

    regio pr-tibial das pernas. Pode se acompanhar de febre, mal estar e dor

    articular (YKSEL et al, 2009). dermatose sindrmica de mltiplas causas;

    quando relacionado doena inflamatria intestinal, est intimamente

  • 20

    relacionado atividade da doena (ARDIZZONE et al, 2008) e presena

    de artrite (TROST e MCDONNELL, 2005). De acordo com alguns estudos,

    a manifestao cutnea mais comum das doenas inflamatrias intestinais,

    sendo mais comum em mulheres (APGAR, 1991; TROMM et al, 2001;

    MENDOZA et al, 2005). Est associado doena inflamatria intestinal em

    11% dos casos, e mais frequente em doentes com doena de Crohn que

    naqueles com retocolite ulcerativa (GREENSTEIN et al, 1976; YKSEL et al,

    2009).

    Jose e colaboradores estudaram retrospectivamente 1649 indivduos

    com doena inflamatria intestinal quanto prevalncia de manifestaes

    extraintestinais e observaram prevalncia de eritema nodoso de 7,5% (JOSE

    et al, 2009).

    Histologicamente se caracteriza por paniculite predominantemente

    septal, com infiltrado inflamatrio composto principalmente por neutrfilos na

    fase aguda. Nas fases mais tardias, os neutrfilos so substitudos por

    linfcitos e histicitos, com o desenvolvimento de infiltrado inflamatrio

    granulomatoso com clulas gigantes. Hemorragia comum. Leses mais

    antigas podem apresentar fibrose septal (WINKELMANN e FRSTRM,

    1975; WHITE e HITCHCOCK, 1999).

  • 21

    3.4.3.2. Pioderma gangrenoso

    As leses so geralmente precedidas por trauma local, caracterizando

    fenmeno de patergia. O quadro tem incio como ppula eritematosa ou

    pstula, nica ou mltipla, que evolui com necrose da derme e surgimento

    de lceras profundas com bordas solapadas e centro purulento estril

    (ARDIZZONE et al, 2008).

    A incidncia de pioderma gangrenoso nos 700 indivduos com doena

    inflamatria intestinal estudados por Greenstein de 5% no grupo com

    retocolite ulcerativa e de 1,4% no grupo com doena de Crohn

    (GREENSTEIN et al, 1976).

    Yksel e colaboradores encontraram prevalncia de 2,3% em 352

    indivduos com doena inflamatria intestinal.

    Jose e colaboradores estudaram retrospectivamente 1649 indivduos

    com doena inflamatria intestinal quanto prevalncia de manifestaes

    extraintestinais e observaram prevalncia de pioderma gangrenoso de 7,5%

    (JOSE et al, 2009).

    Histologicamente nota-se ulcerao, necrose e infiltrado inflamatrio

    neutroflico proeminente, com supurao. Pode ser observada

    leucocitoclasia (BLITZ e RUDIKOFF, 2001).

  • 22

    3.4.3.3. Sndrome de Sweet

    doena do espectro das dermatoses neutroflicas. Caracteriza-se

    por surtos agudos de placas e ndulos eritmato-edmato-infiltrados de

    aspecto suculento, acometendo mais frequentemente os membros

    superiores, a poro superior do tronco e a face. Tem forte predileo pelo

    sexo feminino (87%) (TRAVIS et al, 1997; ARDIZZONE et al, 2008). Ocorre

    em distintas situaes clnicas e, quando relacionado doena inflamatria

    intestinal, parece ser mais comum na doena de localizao colnica, sendo

    mais frequentemente associado com outras manifestaes extraintestinais

    (TRAVIS et al, 1997; YTTING et al, 2005; ARDIZZONE et al, 2008). A

    sndrome de Sweet se associa atividade da doena intestinal em at 80%

    dos casos, mas pode preceder o incio dos sintomas intestinais em 21% dos

    doentes (ARDIZZONE et al, 2008).

    Histologicamente a sndrome de Sweet se caracteriza por intenso

    infiltrado inflamatrio predominantemente neutroflico na derme reticular, de

    distribuio difusa e tambm perivascular. A derme papilar mostra edema

    importante, que pode resultar em vesiculao subepidrmica. Nota-se ainda

    vasodilatao e edema endotelial (GOING et al, 1987; JORDAAN, 1989).

  • 23

    3.4.4. Leses orais no-especficas

    3.4.4.1. Afta

    Cinco a dez por cento dos doentes com doena de Crohn apresentam

    ulceraes aftosas orais. A dor e dificuldade alimentar por elas ocasionada

    piora o quadro de desnutrio (RUOCCO et al, 2007).

    A afta observada em at 10% dos doentes com doena inflamatria

    intestinal e geralmente ocorre durante a fase ativa da doena intestinal

    (DANESE et al, 2005). Caracteriza-se clinicamente por lceras

    arredondadas com halo eritematoso e pseudomembrana central de fibrina.

    Tem carter recorrente e normalmente apresenta boa resposta ao

    tratamento da doena intestinal (DANESE et al, 2005). As aftas associadas

    doena inflamatria intestinal so clinicamente idnticas s aftas comuns

    (GREGORY e HO, 1992). Tambm podem se associar a outras doenas,

    como doena celaca, HIV, doena de Behet e sndrome de Reiter. O

    diagnstico diferencial inclui o herpes simples oral e as lceras orais pelo

    vrus Coxsackie (TROST e MCDONNELL, 2005).

    Greenstein e colaboradores estudaram as manifestaes

    extraintestinais especficas e no especficas da doena de Crohn e da

    retocolite ulcerativa em 700 doentes e as aftas orais representam o tipo mais

    comum de leso oral nesses doentes. A incidncia de 4%, semelhante

  • 24

    incidncia de 6% observada em estudo similar realizado por Croft e

    Wilkinson. Greenstein e colaboradores observaram ainda, que as aftas so

    mais comumente encontradas em doentes com outras manifestaes

    extraintestinais, tais como leses articulares e cutneas (GREENSTEIN et

    al, 1976).

    Basu e Asquith relataram incidncia de aftas orais de 9% na doena

    de Crohn e de 2% na retocolite ulcerativa (BASU e ASQUITH, 1980).

    Histologicamente observa-se ulcerao da mucosa recoberta por

    espessa camada de fibrina entremeada por neutrfilos. O leito da lcera

    consiste de tecido de granulao com infiltrado inflamatrio misto, rico em

    neutrfilos (SCHROEDER et al, 1984).

    3.4.4.2. Edema labial e gengival

    Plauth e colaboradores observaram, em sua reviso de 79 casos de

    manifestaes orais da doena de Crohn, que o edema bucal o tipo de

    leso mais comumente observado, representando 27% do total de leses

    orais estudadas (PLAUTH et al, 1991).

    Harty e colaboradores, por sua vez, encontraram edema labial em

    apenas trs dos 20 doentes com doena de Crohn oral includos em sua

    srie, o que representa 15% dos casos. As ulceraes e as leses

  • 25

    polipoides da mucosa so os achados orais mais frequentes nesses doentes

    (HARTY et al, 2005).

    3.4.4.3. Pioestomatite vegetante

    A pioestomatite vegetante um quadro oral raro, caracterizado por

    leses mucosas vegetantes e pustulosas (RUIZ-ROCA et al, 2005). Foi

    descrita pela primeira vez em 1898 por Hallopeau, sendo atualmente

    considerada anlogo mucoso do pioderma gangrenoso cutneo

    (MARGOLES e WENGER, 1961; AL-RIMAWI et al, 1998). Uma forte

    associao com doena inflamatria intestinal bem documentada,

    principalmente com a retocolite ulcerativa (RUIZ-ROCA et al, 2005).

    Pioestomatite vegetante associada doena de Crohn rarssimo, havendo

    poucos relatos (CATALDO et al, 1981; HANSEN et al, 1983; NEVILLE et al,

    1985; FICARRA et al, 1993). As leses consistem de mltiplas pstulas

    miliares estreis sobre uma mucosa oral eritmato-edematosa, resultando

    em eroses superficiais alongadas, aspecto que tem sido comparado, na

    literatura, a um caminho de caracol (snail track). As leses podem afetar

    qualquer rea da mucosa oral, sendo os locais menos envolvidos a lngua e

    o assoalho da boca (MEHRAVARAN et al, 1997; RUIZ-ROCA et al, 2005).

    Leses cutneas de pioderma gangrenoso podem estar presentes nos

    doentes com pioestomatite vegetante, corroborando a hiptese de

    identidade entre esses processos (PLAUTH et al, 1991; DELAPORT et al,

    1998; HEGARTY et al, 2004). Leses cutneas vegetantes podem estar

  • 26

    presentes nas reas intertriginosas, cuja denominao, na literatura, tem

    variado: pioderma vegetante, piodermite vegetante e pnfigo vegetante,

    havendo confuso na classificao, inclusive com o pnfigo vulgar em sua

    variante vegetante (BALLO et al, 1989; SORIANO et al, 1999; RUIZ-ROCA

    et al, 2005). Mehravaran e Hegarty consideram a negatividade das provas

    de imunofluorescncia direta essencial na diagnose diferencial com o

    pnfigo vegetante (MEHRAVARAN et al, 1997; HEGARTY et al, 2004).

    Geralmente, o curso clnico paralelo atividade da doena intestinal, por

    isso a pioestomatite vegetante um bom marcador cutneo de atividade

    intestinal (MEHRAVARAN et al, 1997). Segundo Ruiz Roca e colaboradores,

    a histopatologia da pioestomatite vegetante revela acantose do epitlio com

    ulcerao superficial. Na lmina prpria, nota-se infiltrao de neutrfilos e

    eosinfilos, com presena de abscessos miliares em alguns casos (RUIZ-

    ROCA et al, 2005). De acordo com Mehravaran e colaboradores, os

    microabscessos intra e subepiteliais, com predomnio de neutrfilos e

    eosinfilos representam o achado mais importante. Infiltrado inflamatrio

    perivascular intenso na regio da lmina prpria, com neutrfilos, linfcitos e

    eosinfilos tambm so um achado frequente (MEHRAVARAN et al, 1997).

    Storwick e Mehravaran observaram tambm hiperplasia epitelial e acantlise

    focal, sendo eles os nicos autores a descreverem esse ltimo achado.

    (STORWICK et al, 1994; MEHRAVARAN et al, 1997). Mc Carthy e Cataldo

    relatam a presena de infiltrao eosinoflica em leses antigas (MC

    CARTHY e SHKLAR, 1963; CATALDO et al, 1981).

  • 27

    3.6. Tratamento da doena inflamatria intestinal

    O manejo da doena inflamatria intestinal deve ser baseado no

    diagnstico correto da mesma e na avaliao da gravidade do quadro e

    envolvimento de locais especficos (BEITMAN et al, 1981; ROONEY, 1984;

    GITNICK, 1989; THORNHILL et al, 1992; PHILPOT et al, 1992; STORWICK

    et al, 1994; CALOBRISI et al, 1995; LISCIANDRANO et al, 1996; MOSES et

    al, 1998; SORIANO et al, 1999; PODOLSKY, 2002; KATZ et al, 2003;

    XAVIER e PODOLSKY, 2007; PONSKY et al, 2007).

    Os compostos com 5-aminosalicilato ainda representam a principal

    linha de tratamento para a doena inflamatria intestinal leve a moderada

    (PODOLSKY, 2002). Estes agentes parecem atuar em vrias fases do

    processo inflamatrio e diferentes formulaes esto disponveis. Os

    corticoesteroides so geralmente reservados para os casos de falha

    teraputica aos 5-aminosalicilatos. Podem ser utilizados na forma tpica

    (leses orais) ou sistmica, e o seu emprego se limita aos surtos agudos da

    doena. A terapia de manuteno com corticoesteroides no se mostrou

    benfica e se associa a efeitos colaterais srios, tais como hipertenso,

    diabetes e osteoporose (CHUTKAN, 2001; PODOLSKY, 2002).

    Drogas imunomoduladoras e imunossupressoras, como azatioprina,

    metotrexate, ciclosporina, tacrolimus e micofenolato mofetil so utilizadas

    quando h necessidade de reduo da corticoterapia (PODOLSKY, 2002;

  • 28

    PONSKY et al, 2007). A azatioprina e o seu metablito ativo a

    mercaptopurina so os agentes imunossupressores mais comumente

    utilizados (RUOCCO et al, 2007). O mecanismo de ao dessas drogas

    envolve a supresso de subgrupos de clulas T especficos, o que explica o

    tempo prolongado necessrio para uma resposta teraputica (GOULDING,

    2004). O metotrexate tambm se mostrou eficaz no tratamento da doena de

    Crohn ativa cortico-dependente e na manuteno da remisso (FEAGAN et

    al, 2000).

    Os agentes biolgicos so as mais novas drogas em estudo para o

    manejo das doenas inflamatrias intestinais. A disponibilidade dessas

    novas molculas ofereceu um importante avano para os doentes. O

    infliximab um anticorpo monoclonal quimrico anti-TNF-, cujo mecanismo

    de ao ainda no est totalmente compreendido (VAN DULLEMEN et al,

    1995). Acredita-se que ele se ligue ao precursor do TNF da superfcie

    celular, provocando a apoptose dos moncitos (LUGERING et al, 2001).

    Diversos estudos demonstraram a eficcia do infliximab em doentes com

    doena de Crohn, principalmente naqueles com fstulas e com doena

    refratria ou cortico-dependente (PRESENT et al, 1999; HANAUER et al,

    2002). As possveis complicaes decorrentes do uso do infliximab incluem

    hipersensibilidade e reaes infuso, tuberculose e sepse (GARDAM et al,

    2003; COLOMBEL et al, 2004).

  • 29

    At 30% dos doentes com retocolite ulcerativa e 75% daqueles com

    doena de Crohn requerem interveno cirrgica para o manejo de sua

    doena (CHUTKAN, 2001). As indicaes de cirurgia nos casos de retocolite

    ulcerativa incluem transformao neoplsica, hemorragia abundante e

    perfurao. Nesses casos, a proctocolectomia geralmente curativa. J na

    doena de Crohn, a cirurgia no curativa e a necessidade de sucessivas

    intervenes cirrgicas comum. As indicaes cirrgicas incluem

    obstruo intestinal, perfurao, fstulas e abscessos (CHUTKAN, 2001).

    Os corticoesteroides tpicos e sistmicos representam o tratamento

    de escolha para os doentes com doena inflamatria intestinal e

    pioestomatite vegetante (SORIANO et al, 1999). Alm disso, o bom controle

    da doena inflamatria intestinal contribui para a remisso da pioestomatite

    vegetante.

    O tratamento das manifestaes orais das doenas inflamatrias

    intestinais depende da intensidade da manifestao intestinal. Geralmente, o

    tratamento da doena intestinal associada suficiente para o controle das

    leses orais e cutneas (MEHRAVARAN et al, 1997; RUIZ-ROCA et al,

    2005). Na ausncia de doena inflamatria intestinal, corticoesteroides e

    imunomoduladores tpicos podem ser empregados, mas a maioria dos

    autores considera como tratamento de escolha os corticoesteroides

    sistmicos em doses moderadas a elevadas, com rpida remisso (TROST

    e MCDONNELL, 2005; DANESE et al, 2005).

  • 30

    4. CASUSTICA E MTODOS

  • 31

    4. CASUSTICA E MTODOS

    Os casos includos neste estudo resultaram do atendimento de

    doentes na Diviso de Dermatologia do Hospital das Clnicas da Faculdade

    de Medicina da Universidade de So Paulo (HCFMUSP).

    O perodo de coleta de casos foi de Janeiro de 2005 a Janeiro de

    2009.

    Foram includos doentes com manifestaes orais que levaram

    diagnose de doena inflamatria intestinal ou com doena inflamatria

    intestinal previamente diagnosticada que, no curso de sua enfermidade,

    vieram a apresentar leses orais, cuja investigao demonstrou estarem

    relacionadas atividade da doena.

    Dez doentes foram includos, sendo anotados os seguintes dados:

    sexo, cor, idade, tipo de leso oral, histopatologia, imunofluorescncia direta

    da leso oral (quando realizada) e imunofluorescncia indireta (quando

    realizada). Foi tambm estudada a presena de outros achados clnicos

    relacionados doena inflamatria intestinal, assim como anormalidades

    laboratoriais, tratamento realizado, resposta clnica ao tratamento e tempo

    de remisso das leses orais.

    As leses orais foram analisadas quanto morfologia, disposio e

    topografia, dando-se nfase s leses elementares e frequncia com que

    ocorreram. Foram obtidas fotografias clnicas dos aspectos gerais ou de

    detalhes de interesse, utilizando-se cmera Nikon.

  • 32

    Obtiveram-se biopsias das leses orais com punch nmero quatro em

    todos os casos, procedendo-se s tcnicas histolgicas de rotina

    (hematoxilina-eosina) e de imunofluorescncia direta em trs casos.

    Foi realizada investigao sistmica do trato gastrointestinal atravs

    de exame colonoscpico com biopsia da mucosa em todos os doentes.

    Os doentes em que a diagnose da doena inflamatria intestinal foi

    feita a partir das manifestaes mucosas foram encaminhados para

    tratamento na Diviso de Gastroenterologia do Hospital das Clnicas da

    Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo. Os doentes

    previamente diagnosticados com doena inflamatria intestinal foram

    reencaminhados para adequao do tratamento, sendo todos eles

    posteriormente reavaliados quanto s leses orais e sintomas intestinais.

  • 33

    5. RESULTADOS

  • 34

    5. RESULTADOS

    CASO 1

    Doente feminina branca de 41 anos, com diagnstico prvio de retocolite

    ulcerativa.

    Apresentava mltiplas ulceraes aftoides na mucosa oral, alm de mltiplas

    placas eritmato-edematosas suculentas acometendo a pele da face, tronco

    e extremidades. Apresentava tambm febre, queda do estado geral e

    diarreia.

    A anlise histopatolgica da biopsia da leso oral revelou ulcerao com

    intenso infiltrado inflamatrio neutroflico na lmina prpria.

    A histopatologia das leses cutneas revelou dermatose neutroflica.

    Foi iniciado tratamento com prednisona 60mg/dia, mesalazina 3g/d e

    infliximabe uma vez a cada dois meses trs doses, com melhora completa

    das leses.

    Durante quatro anos de seguimento, no foi observada recidiva.

    Diagnose: afta e sndrome de Sweet associadas retocolite ulcerativa.

  • 36

    CASO 2

    Doente feminina branca de 23 anos, apresentando, h trs semanas,

    mltiplas ulceraes aftoides na mucosa oral, acompanhadas de eritema

    nodoso nos membros inferiores, perda de peso de 13 quilos em seis meses

    e dores abdominais.

    Foi realizada biopsia de uma leso da mucosa oral, cuja anlise

    histopatolgica revelou mucosite ulcerativa com infiltrado inflamatrio

    neutroflico na lmina prpria.

    O exame colonoscpico do trato gastrointestinal associado ao exame

    histopatolgico da biopsia da mucosa intestinal levou diagnose de

    retocolite ulcerativa.

    Foi iniciado tratamento com infliximabe uma vez a cada dois meses trs

    doses, ciprofloxacino 1g/dia, cido flico e triamcinolona tpica, com melhora

    completa das leses.

    Durante trs anos de seguimento, no foi observada recidiva.

    Diagnose: afta associada retocolite ulcerativa.

  • 38

    CASO 3

    Doente feminina branca de 25 anos, apresentando fraqueza, perda de peso

    de 20 quilos em seis meses, vmitos e diarria muco-sanguinolenta.

    O exame colonoscpico associado ao exame histopatolgico da biopsia da

    mucosa intestinal favoreceu a diagnose de doena de Crohn.

    Foi iniciado tratamento sistmico com metronidazol (1,5g/dia) e

    ciprofloxacino (1,0g/dia), assim como infliximabe a cada dois meses.

    Durante o tratamento, apresentou mltiplas ulceraes aftosas na mucosa

    do lbio inferior.

    O exame histopatolgico da bipsia de uma das leses orais revelou

    ulcerao com intenso infiltrado inflamatrio misto na lmina prpria.

    O tratamento foi modificado por infliximabe uma vez a cada dois meses

    trs doses, metronidazol 1,5g/dia e ciprofloxacino 1g/dia, com melhora

    completa das leses.

    Durante dois anos de seguimento, foi observado um episdio de recidiva

    aps um ano.

    Diagnose: afta associada doena de Crohn.

  • 40

    CASO 4

    Doente masculino pardo de 35 anos, apresentando mltiplas ulceraes na

    mucosa bucal e do lbio inferior, associadas a surtos de diarreia e perda de

    peso, relacionados a crise de retocolite ulcerativa previamente

    diagnosticada.

    Relatava ainda perda de peso e diarreia importante.

    A anlise histopatolgica da biopsia de uma leso oral revelou mucosite

    ulcerativa com intenso infiltrado inflamatrio misto na lmina prpria.

    Foi iniciado tratamento com prednisona 70mg/dia, com melhora completa do

    quadro.

    Durante trs anos de seguimento, no foi observada recidiva.

    Diagnose: afta associada retocolite ulcerativa.

  • 42

    CASO 5

    Doente feminina branca de 38 anos, com diagnose de retocolite ulcerativa

    h seis meses.

    Apresentava mltiplas ulceraes aftoides na mucosa labial superior e

    inferior, no palato mole a na regio da vula. Concomitantemente

    apresentava piora do quadro intestinal com diarreia.

    O exame colonoscpico em associao com o exame histopatolgico de

    leso da mucosa intestinal favoreceu a diagnose de retocolite ulcerativa.

    Foi realizada biopsia de uma leso oral e a anlise histopatolgica revelou

    mucosite ulcerativa com infiltrado inflamatrio neutroflico na lmina prpria.

    Diagnstico: afta associada retocolite ulcerativa.

  • 44

    CASO 6

    Doente masculino branco de 16 anos, apresentando leses orais dolorosas

    h cinco meses. Relatava ainda perda de peso de trs quilos em trs meses

    e artralgia do quadril ocasional h um ano.

    O exame oral revelou duas lceras de configurao linear de bordas

    vegetantes localizadas nos sulcos vestibulares bilateralmente.

    A histopatologia das leses revelou a presena de granulomas no

    caseosos na lmina prpria. A pesquisa de fungos e bactrias por

    coloraes especficas resultou negativa.

    A anlise endoscpica do trato gastrointestinal revelou ulceraes e eroses

    em vrias pores, cuja anlise histopatolgica mostrou infiltrado

    granulomatoso, compatvel com doena de Crohn.

    Foi iniciado tratamento com mesalazina 3g/dia, azatioprina, budesonida

    9mg/dia, sulfato ferroso, cido flico e zinco, com melhora completa do

    quadro.

    Durante trs anos de seguimento, no foi observada recidiva.

    Diagnose: doena de Crohn oral e intestinal.

  • 46

    CASO 7

    Doente feminina branca de 22 anos, apresentava, h dois anos, leses

    cutneas e orais.

    O exame oral mostrou uma rea de aderncia mucosa, linear e de aspecto

    cicatricial, circunscrevendo uma pequena cavidade epitelizada, localizada no

    sulco vestibular.

    Ao exame dermatolgico apresentava lceras profundas lineares de bordas

    induradas localizadas nas pregas das regies inframamria, axilar, inguinal,

    intergltea e coxogltea.

    O exame histopatolgico da biopsia da borda de uma lcera cutnea revelou

    dermo-epidermite crnica com esboo granulomatoso focal. A pesquisa de

    fungos e bactrias por coloraes especficas resultou negativa.

    O exame histopatolgico da leso oral revelou infiltrado inflamatrio misto

    com esboo de granuloma na lmina prpria, alm de fibrose.

    Na vigncia das leses orais e cutneas foi diagnosticada doena de Crohn

    intestinal atravs de colonoscopia com biopsia colnica.

    Diagnose: doena de Crohn intestinal e cutnea.

  • 48

    CASO 8

    Doente feminina branca de 63 anos, apresentando, h trs meses, leses

    nos lbios associadas a dor importante e dificuldade em se alimentar.

    O exame dermatolgico revelou extensas leses vegetantes exofticas com

    pequenas pstulas confluentes e eroses superficiais sobre base

    edematosa, acometendo o vermilio e a mucosa labial superior e inferior,

    recobertas por pseudomembranas friveis e crostas.

    Apresentava ainda uma placa vegetante ulcerada e destrutiva sobre a

    falange distal do hlux esquerdo, associada a onicodistrofia.

    A histopatologia da biopsia da leso mucosa revelou acantlise suprabasal

    focal, com microabscessos neutroflicos no epitlio e intenso infiltrado

    inflamatrio misto rico em eosinfilos.

    A imunofluorescncia direta revelou depsitos de IgM em corpos citoides na

    lmina prpria papilar. A imunofluorescncia indireta resultou negativa.

    A avaliao laboratorial demonstrou anemia e eosinofilia.

    A colonoscopia mostrou colite crnica leve e retite crnica leve.

    Foi iniciado tratamento sistmico com prednisona 70mg/d e dapsona

    100mg/d.

    Aps uma semana foi observada melhora significativa e aps 15 dias de

    tratamento houve cicatrizao completa das leses.

    Aps um ano, houve recidiva do quadro oral. Nova investigao

    colonoscpica nessa ocasio revelou pancolite compatvel com retocolite

    ulcerativa.

    Diagnose: pioestomatite vegetante associada retocolite ulcerativa.

  • 50

    CASO 9

    Doente feminina branca de 33 anos, com diagnstico de retocolite ulcerativa

    h oito anos. Queixava-se de leses orais dolorosas h oito meses

    acompanhando quadro de intensa diarreia.

    O exame da cavidade oral demonstrou pstulas e eroses superficiais sobre

    base edematosa acometendo os lbios, alm de exulceraes e edema na

    mucosa jugal, gengivas e base da lngua.

    A anlise histopatolgica de uma leso da mucosa labial revelou mucosite

    acantoltica suprabasal.

    A imunofluorescncia direta e indireta revelaram depsito de IgG intercelular

    (ttulo - 1/320).

    O exame colonoscpico revelou processo inflamatrio difuso do clon e reto.

    A anlise histopatolgica das biopsias de mucosa intestinal revelou colite e

    retite crnicas erosivas.

    Foi iniciado tratamento com prednisona 60mg/dia, com melhora completa do

    quadro.

    Durante trs anos de seguimento, houve recidivas ocasionais responsivas a

    baixas doses de medicamentos.

    Diagnose: pnfigo / pioestomatite vegetante associada retocolite

    ulcerativa.

  • 52

    CASO 10

    Doente masculino branco de 34 anos, apresentando leses orais h um ano.

    O exame oral revelou mltiplas pstulas miliares isoladas e confluentes

    acometendo as gengivas, base da lngua e palato, alm de edema mucoso.

    Apresentava retardo mental importante, sendo a me a informante. Esta

    referia que o doente apresentava diarreia muco-sanguinolenta havia mais de

    dez anos, sem diagnose.

    O exame colonoscpico seguido de biopsia da mucosa intestinal, realizado

    na vigncia das leses orais, revelou colite e retite crnica intensa com

    eroso, criptite aguda e eosinofilia, compatveis com retocolite ulcerativa.

    A biopsia de uma leso gengival revelou mucosite com clivagem suprabasal.

    A imunofluorescncia direta demonstrou depsito de IgG e C3 intercelular e

    a imunofluorescncia indireta mostrou-se positiva para IgG intercelular

    (ttulo - 1/2560).

    Foi iniciado tratamento com prednisona 70mg/dia, com melhora completa do

    quadro.

    Durante trs anos de seguimento, no foi observada recidiva.

    Diagnose: pnfigo/ pioestomatite vegetante associada retocolite

    ulcerativa.

  • 54

    6. DISCUSSO

  • 55

    6. DISCUSSO

    6.1. Manifestaes cutneo-mucosas de doenas sistmicas

    O estudo das manifestaes tegumentares das doenas sistmicas

    tem ganhado grande impulso nas ltimas dcadas e tem contribudo

    significativamente para a insero da Dermatologia em sua inter-relao

    com as diversas especialidades mdicas. As formas como a pele e as

    mucosas reagem aos processos patolgicos tm se mostrado por muitas

    vezes similares s dos outros rgos; sendo assim o tegumento, por seu

    fcil acesso, um excelente indicador clnico e til ferramenta para o estudo

    das doenas sistmicas. Alis, nesse sentido, o termo doena sistmica

    pode ser prefervel a doena interna, j que o tegumento (externo)

    tambm est envolvido. Em nossa viso, a existncia dessas manifestaes

    inclusive depe contra a clssica separao entre doena cutnea e

    doena sistmica, se encararmos o sistema tegumentar como um

    componente ativo e participante no funcionamento do organismo.

    A manifestao dermatolgica pode ser devida ao do processo

    geral diretamente no tegumento, apresentando ento aspecto

    histopatolgico superponvel ao que se apresenta nos outros rgos

    (manifestao doena-especfica); ou se dever atividade geral da doena,

    por liberao de mediadores inflamatrios, mediadores vasoativos ou por

    fenmenos imunolgicos secundrios ao processo geral. Essas ltimas

  • 56

    podem ser observadas ocorrendo durante a evoluo de diferentes doenas

    sistmicas no relacionadas, sendo, ento, consideradas manifestaes

    doena no-especficas. Exemplos abundam nos dois grupos:

    manifestaes cutneas especficas de sarcoidose, lpus eritematoso e

    sfilis exemplificam bem o primeiro grupo; assim, como sendo pertencentes

    ao segundo grupo, podemos elencar vasculite leucocitoclsica, eritema

    nodoso e fenmeno de Raynaud.

    Na prtica clnica h duas principais situaes onde o mdico se

    depara com manifestaes dermatolgicas de doenas sistmicas. A

    primeira, algo mais frequente, quando um doente j previamente

    diagnosticado com uma enfermidade e, no decorrer de seu processo, vem a

    apresentar um quadro cutneo-mucoso, sendo solicitada ao dermatologista

    uma opinio sobre se este tem ou no relao com o processo geral. A

    segunda, mais desafiadora, a diagnose de uma doena sistmica

    previamente no suspeitada, a partir de um quadro tegumentar. Tal

    oportunidade no muito frequente, pois necessria a conjuno de

    alguns fatores para que ocorra: a doena sistmica deve estar manifestada

    de forma mais intensa (ou caracterstica) no tegumento em um doente ainda

    sem sintomas gerais, ou com um quadro geral ainda incaracterstico,

    devendo a correta diagnose dermatolgica e sua consequente correlao

    com um quadro geral ser suspeitada com presteza. Para isso, o

    dermatologista e o patologista responsvel devem ser precisos na diagnose

  • 57

    e ter um conhecimento abrangente quanto insero do sistema tegumentar

    na economia geral do organismo.

    6.2. Anlise geral dos casos

    As manifestaes cutneo-mucosas das doenas do sistema

    digestrio so mltiplas, sendo objeto de estudos de diversas publicaes e

    captulos de livros (CALLEN e JORIZZO, 1995; BRAVERMAN, 1998). As

    publicaes dermatolgicas sobre esse assunto tratam-se, em sua grande

    maioria, de casos isolados ou sries diminutas; as maiores casusticas vm

    de estudos retrospectivos e compilaes de vrios artigos em publicaes

    de Gastroenterologia ou Odontologia (BERNSTEIN e MCDONALD, 1978;

    PLAUTH et al, 1991). Um estudo prospectivo em crianas foi recentemente

    publicado (HARTY et al, 2005). Os casos aqui estudados compareceram

    todos Clinica Dermatolgica do Hospital das Clnicas da Faculdade de

    Medicina da Universidade de So Paulo, independentemente de terem ou

    no sua doena inflamatria intestinal previamente diagnosticada. Com o

    intuito de tentar aumentar nossa casustica, um dos membros do nosso

    Grupo frequentou a Clnica de Gastroenterologia por vrios meses

    examinando a cavidade oral dos doentes com doena inflamatria intestinal;

    curiosamente, porm, nenhum outro caso foi detectado. Esse dado em

    nossa opinio refora a importncia do dermatologista na abordagem dessas

    manifestaes.

  • 58

    Dos nossos 10 casos, em cinco as leses orais foram observadas em

    doentes j previamente diagnosticados com doena inflamatria intestinal, e

    apresentaram tais leses na vigncia de surtos dessa. No entanto, em

    quatro, a correta diagnose da leso oral levou suspeita de doena

    inflamatria intestinal ainda no diagnosticada, com posterior confirmao.

    Em um desses (caso dois), a suspeita se deveu associao do quadro oral

    exuberante com uma sintomatologia geral sugestiva (febre, perda de peso,

    edema). Nos casos seis e oito, porm, as leses orais vinham

    desacompanhadas de qualquer sintoma geral bvio que levantasse suspeita,

    sendo a investigao conduzida com base em slida hiptese clnico-

    patolgica.

    No caso seis, a correlao da dor no quadril (sintoma significativo,

    porm relatado de forma pouco objetiva pelo doente) com a atividade da

    doena de Crohn foi feita apenas aps a confirmao colonoscpica da

    diagnose.

    No caso sete, a diagnose de doena de Crohn foi suspeitada a partir

    das leses cutneas; seu comprometimento oral era clinicamente discreto,

    porm foi observado esboo de granuloma histopatologia, apesar do

    predomnio de quadro fibro-cicatricial.

    No caso oito, a diagnose de retocolite ulcerativa se fez apenas aps

    um ano da caracterizao do quadro dermatolgico como pioestomatite/

  • 59

    piodermite vegetante, j que a primeira colonoscopia mostrava apenas sinais

    de colite leve no especfica, considerada no diagnstica. Aps um ano,

    frente a um novo surto de leses orais, acompanhada de diarreia mais

    intensa, uma nova colonoscopia confirmou a diagnose. Esse caso

    exemplifica bem a possibilidade de, frente a uma diagnose clnico-patolgica

    bem constituda, se suspeitar fundamentadamente de uma doena sistmica

    mesmo antes de uma sintomatologia caracterstica se instalar.

    O doente 10 apresentava retardo mental grave, sua me relacionava

    sua diarreia de longa evoluo a uma incapacidade de reter as fezes, nunca

    tendo procurado assistncia para esse sintoma. A diagnose de pioestomatite

    vegetante levou investigao colonoscpica e correta diagnose.

    6.3. Afta

    As lceras aftosas representam um distrbio na reatividade da

    mucosa oral, e mais raramente de outras mucosas ou at da pele, a diversos

    estmulos patognicos conhecidos ou no (FIELD e ALLAN, 2003). Diversas

    doenas sistmicas podem cursar com aftas na sua evoluo, como doena

    de Behet, neutropenia cclica, AIDS e doena inflamatria intestinal

    (TROST e MCDONNELL, 2005). Em todas essas situaes, o espectro

    clnico-patolgico da afta o mesmo, podendo ento ser ela considerada

    uma manifestao cutneo-mucosa caracterstica, mas no especfica, de

    atividade daquelas doenas. Acreditamos que da mesma forma devemos

  • 60

    considerar outros padres clnico-patolgicos de distrbios da reatividade

    cutneo-mucosa, como o pioderma gangrenoso, a piodermite/ pioestomatite

    vegetante e a sndrome de Sweet. Todos esses processos se caracterizam

    inicialmente por um afluxo macio de polimorfonucleares neutrfilos que iro

    provocar destruio tissular em maior ou menor grau, ocorrendo em

    perodos de atividade de diversas doenas sistmicas (FIELD e ALLAN,

    2003). A possvel identidade entre a afta, o pioderma gangrenoso, a

    piodermite/ pioestomatite vegetante e a sndrome de Sweet levantada

    quando se analisam no s seus substratos histopatolgicos como tambm

    as situaes clnicas em que ocorrem, sendo a doena inflamatria intestinal

    uma das mais caractersticas (NIGEN et al, 2003; TROST e MCDONNELL,

    2005; ARDIZZONE et al, 2008;). Em nossa doente nmero um, inclusive, as

    aftas orais eram acompanhadas de um quadro cutneo tpico de sndrome

    de Sweet. Quanto histopatologia nesse caso, tanto na pele quanto na

    mucosa observou-se um infiltrado inflamatrio rico em neutrfilos, cuja nica

    diferena foi a ulcerao presente na leso da mucosa. O aparecimento

    simultneo das leses cutneas e mucosas, e o quadro histopatolgico

    quase idntico das aftas e das leses da pele contribuem ainda mais para a

    nossa impresso quanto similaridade patogentica entre esses quadros.

    6.4. Pioestomatite vegetante

    Formas superficiais de pioderma gangrenoso so descritas na

    Literatura como semelhantes sndrome de Sweet (GIBSON, 2005), assim

  • 61

    como a piodermite vegetante considerada a forma vegetante do pioderma

    gangrenoso, sendo a pioestomatite vegetante sua expresso mucosa (AL-

    RIMAWI et al, 1998). Esses nomes refletem provavelmente diferentes

    expresses morfolgicas de um mesmo processo patolgico, caracterizado

    por uma reatividade cutneo-mucosa alterada e mediada por neutrfilos,

    devido a uma doena sistmica subjacente. Em nossa doente oito, a

    coexistncia da pioestomatite vegetante com uma leso destrutiva no hlux,

    que pode ser diagnosticada tanto como pioderma gangrenoso ou piodermite

    vegetante, refora essa hiptese.

    Como dissemos, a pioestomatite vegetante pode ser considerada o

    anlogo mucoso do pioderma gangrenoso. Porm, ao contrrio do pioderma

    gangrenoso cutneo, que observado na vigncia de diversos processos

    sistmicos (desde artrite reumatide, discrasias plasmocitrias, at doena

    inflamatria intestinal) (BENNETT et al, 2000; TROST e MCDONNELL,

    2005), a pioestomatite vegetante tem sido descrita quase sempre associada

    retocolite ulcerativa, o que ocorreu nos nossos trs doentes (MARGOLES

    e WENGER, 1961; MCCARTHY e SHKLAR, 1963; FORMAN, 1965; BALLO

    et al, 1989; CHAN et al, 1991; HEALY et al, 1994; CALOBRISI et al, 1995).

    Na Literatura, principalmente em publicaes mais antigas, a

    pioestomatite vegetante possivelmente confundida com formas vegetantes

    de pnfigo vulgar (pnfigo vegetante) (HALLOPEAU, 1898). O quadro

    histopatolgico da pioestomatite vegetante caracteriza-se por infiltrado

  • 62

    inflamatrio rico em neutrfilos e eosinfilos, podendo ser observados graus

    variveis de acantlise (STORWICK et al, 1994; MEHRAVARAN et al, 1997).

    A incluso em nossa casustica dos casos nove e dez pode ser considerada

    controversa por vrias razes. Nesses dois casos foi observada acantlise

    suprabasal do epitlio, alm de presena intensa de anticorpos IgG

    intercelulares no exame de imunofluorescncia direta, achados

    caractersticos de pnfigo vulgar. Acantlise ocorrendo em casos de

    pioestomatite vegetante foi observada por Storwick e Mehravaran, sendo

    esses os nicos autores a descreverem tais achados e, mesmo assim, num

    padro focal (STORWICK et al, 1994; MEHRAVARAN et al, 1997). Em

    nosso caso oito, a acantlise era focal, porm, nos casos nove e dez, era

    extensa. A imunofluorescncia indireta nesses dois casos revelou tambm a

    presena de auto anticorpos do tipo IgG circulantes em ttulos elevados.

    Essas caractersticas so diagnsticas do pnfigo vulgar, e dessa forma

    esses doentes tenderiam a ser categorizados como tal; no entanto algumas

    peculiaridades clnico-evolutivas merecem uma reflexo mais

    pormenorizada. Nos dois casos o quadro clnico se caracterizava por leses

    obviamente pustulosas por toda a mucosa, onde o sinal de Nikolsky no era

    obtido, e no por eroses e bolhas como no pnfigo. Alm disso, os dois

    apresentavam as leses havia bastante tempo, sendo essas sempre

    restritas mucosa e nunca progredindo para a pele, como se esperaria em

    casos de pnfigo no tratado. Mais significativamente ainda, o quadro

    mucoso tinha ntido paralelismo clnico com a atividade da doena

    inflamatria intestinal, inclusive respondendo ao tratamento da mesma com

  • 63

    as drogas antiinflamatrias. Quando se utilizaram os corticoesteroides

    sistmicos, fez-se em doses baixas, o que provavelmente no levaria a

    melhora em se tratando de pnfigo, que exige doses imunossupressoras de

    ataque.

    Esses dois casos levam-nos a tecer algumas especulaes quanto

    surpreendente observao da ocorrncia de autoanticorpos em casos de

    pioestomatite vegetante, e mesmo sobre uma possvel identidade entre essa

    e o pnfigo vulgar. Como j dissemos, autores antigos utilizavam uma

    nomenclatura confusa para manifestaes clinicamente semelhantes cuja

    natureza era desconhecida, como: pnfigo vegetante de Neumann,

    pnfigo vegetante de Hallopeau, piodermite vegetante de Azua, alm de

    pioderma vegetante e pioestomatite vegetante (HALLOPEAU, 1898;

    MCCARTHY, 1949; NELSON et al, 1977; NEVILLE et al, 1985). O advento

    das reaes de imunofluorescncia contribuiu em muito para a adequada

    distino entre essas doenas no sentido de se reconhecer quais seriam

    mediadas por autoanticorpos (portanto, variantes de pnfigo) e quais no

    (NELSON et al, 1977; NEUMANN e FABER, 1980; STORWICK et al, 1994;

    MEHRAVARAN et al, 1997; SORIANO et al, 1999). Casos como os nossos

    podem explicar a confuso dos antigos autores, assim como traz-la aos

    dias de hoje. Podemos conjecturar tambm que algumas formas do fentipo

    pioestomatite vegetante possam representar manifestaes mucosas

    mediadas por neutrfilos (e a anlogas ao pioderma gangrenoso), enquanto

    outras possam ser variantes de pnfigo.

  • 64

    Na Literatura, acantlise tem sido observada em alguns casos de

    pioestomatite vegetante (STORWICK et al, 1994; MEHRAVARAN et al,

    1997), sendo considerada um epifenmeno possivelmente devido

    exposio do epitlio mucoso ao de enzimas proteolticas do infiltrado

    inflamatrio; tais enzimas agiriam nas molculas que promovem a coeso

    epitelial, provocando a acantlise. Porm, a deteco de autoanticorpos anti-

    epiteliais em nossos casos nove e 10 indica que, ao menos em alguns

    casos, essa acantlise deva ser imunologicamente mediada, com significado

    patolgico distinto. Os ttulos elevados imunofluorescncia indireta, aliados

    acantlise significativa ao exame histopatolgico, indicam fortemente que

    tais achados possam no ser simplesmente um epifenmeno, sugerindo

    existir mesmo uma reao tipo pnfigo com expresso clnica de

    pioestomatite vegetante e relacionada doena inflamatria intestinal. O

    significado da coexistncia da doena inflamatria intestinal e produo de

    autoanticorpos antiepiteliais ainda desconhecido, mas a observao dessa

    ocorrncia levanta diversos questionamentos que merecem ser investigados.

    Pode-se especular que uma exposio de antgenos epiteliais da mucosa

    intestinal ao sistema imune durante a atividade da doena inflamatria

    intestinal poderia levar formao, atravs de um mecanismo de epitope-

    spreading, de autoanticorpos contra a desmoglena presente nos epitlios

    escamosos estratificados. Outra hiptese, um tanto simples, porm, no

    deve deixar de ser considerada: a da simples coexistncia da doena

  • 65

    inflamatria intestinal com o pnfigo vulgar, que se apresentaria clinicamente

    de forma no usual, devido a uma reatividade mucosa j alterada.

    Tais achados levam-nos a propor novas perspectivas. Para dar

    continuidade a essa nova observao ainda no descrita, nosso grupo se

    propor a realizar um estudo experimental com o soro desses doentes, j

    estocado, com o intuito de se verificar o real significado patognico desses

    autoanticorpos circulantes. Paralelamente, tentaremos identificar a natureza

    do antgeno epitelial ao qual tais autoanticorpos esto dirigidos, no intuito de

    se confirmar ou no a identidade desse com o antgeno do pnfigo clssico

    (desmoglenas).

    6.5. Doena de Crohn oral

    A ocorrncia de leses granulomatosas histopatologia, localizadas

    distncia das pores terminais do tubo digestivo bem documentada em

    alguns casos de doena de Crohn (RUOCCO et al, 2007). Leses como a do

    nosso doente seis, caracterizadas como lceras de bordas hipertrficas

    seguindo o sulco vestibular so muito raras, sendo, porm, muito

    caractersticas (DUPUY et al, 1999; PITTOCK et al, 2001; ALAWI, 2005).

    Sua observao, mesmo na ausncia de sinais sistmicos significativos,

    como ocorreu nesse doente, deve levantar suspeitas fortes e indicar

    investigao apropriada. O aspecto morfolgico dessas, lembra em muito as

    leses de doena de Crohn na pele, que se apresentam frequentemente

  • 66

    como lceras de formato linear comprometendo as pregas cutneas

    (RUOCCO et al, 2007). A doente sete apresentava extensas lceras

    flexurais com tal aspecto; no sulco vestibular observava-se uma leso de

    configurao semelhante, porm pequena. A histopatologia dessa leso

    revelou um pequeno esboo de granuloma em uma lmina prpria de

    aspecto predominantemente cicatricial. Interpretamos que nesse caso o

    aspecto observado possa representar a resoluo de uma leso especfica

    idntica do doente seis, no s por seu formato e topografia, como pela

    presena, na mesma doente, de mltiplas leses cutneas de aspecto

    similar, tanto ativas quanto cicatrizadas.

    6.6. Consideraes finais

    No foi objetivo do presente trabalho estudar detalhadamente os

    esquemas teraputicos utilizados, mesmo porque foram todos institudos

    pela equipe de Gastroenterologia; porm significativo observar que, em

    todos os doentes, a abordagem da doena de base foi suficiente para que

    fossem controladas as leses orais, ressaltando a relao das leses orais

    com o quadro geral.

    A observao e apresentao desses casos tm como intuito salientar

    o papel da pele e das mucosas como parte integrante do funcionamento do

    organismo, podendo ser alvo, como qualquer outro rgo, dos processos

    patolgicos gerais. Alm disso, o reconhecimento dessas manifestaes

  • 67

    mostra-se importante na prtica clnica: algumas dessas leses apareceram

    na vigncia de doena sistmica j diagnosticada; porm, em diversos deles,

    a correta diagnose clnico-patolgica da manifestao mucosa foi

    determinante na revelao da doena sistmica subjacente.

    De modo a nosso ver ainda mais significativo, interessantes questes

    foram levantadas, que devero ser investigadas e elucidadas por futuros

    estudos: so elas a aparente sntese de autoanticorpos antiepiteliais durante

    a atividade da doena inflamatria intestinal, alm de uma possvel

    heterogeneidade no mecanismo fisiopatolgico da pioestomatite vegetante.

    Nessa ltima, alguns casos parecem estar relacionados ligao de

    autoanticorpos circulantes ao epitlio da mucosa, aproximando-os assim do

    pnfigo vulgar, mas dele aparentemente diferindo pelo aspecto nitidamente

    pustuloso e pelo paralelismo clnico-evolutivo com a atividade do processo

    sistmico.

  • 68

    7. CONCLUSES

  • 69

    7. CONCLUSES

    1. Apresentamos 10 casos de manifestaes orais ligadas doena

    inflamatria intestinal: trs ligados doena de Crohn e sete ligados

    retocolite ulcerativa. As manifestaes orais foram: afta (cinco casos),

    pioestomatite vegetante (trs casos) e doena de Crohn oral/cutnea

    (dois casos).

    2. Em dois casos, as leses orais apareceram e foram diagnosticadas,

    levando suspeita de doena inflamatria intestinal clinicamente

    oculta, sendo diagnosticada somente por colonoscopia.

    Em um caso, a correta diagnose das leses orais levou suspeita de

    doena inflamatria intestinal, porm essa se manifestou apenas aps

    vrios meses.

    Em dois casos, as leses orais apareceram concomitantemente aos

    sinais e sintomas sistmicos, que levaram diagnose de doena

    inflamatria intestinal.

    Em cinco casos, as leses orais apareceram durante surto de doena

    inflamatria intestinal previamente diagnosticada.

    Em todos eles, o tratamento da doena de base controlou as leses

    orais.

  • 72

    9. REFERNCIAS

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