Manual de Horticultura No Modo de Producao Biologico

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Ficha tcnica Ttulo: Manual de Horticultura no Modo de Produo Biolgico Edio e Distribuio: Escola Superior Agrria de Ponte de Lima/IPVC Refios, 4990-706 Ponte de Lima Editor: Isabel de Maria Mouro Impresso: Grficas Anduria Tiragem: 750 exemplares ISBN: 978-972-97872-2-5 Depsito legal: 266827/07 Ano: 2007

Manual de Horticultura no Modo de Produo BiolgicoEditor Isabel de Maria Mouro

Financiamento Programa PO AGRO DE&D

Projecto n 747 Fertilizao de culturas em agricultura biolgica e avaliao do processo ps-colheita dos produtos

Entidades participantes

Escola Superior Agrria de Ponte de Lima IPVC

Direco Regional de Agricultura e Pescas do Norte

Cooperativa Agrcola das Serras da Boalhosa, Arga, Castro L., Peneda e Soajo

Faculdade de Eng. e dos Recursos Naturais Univ. do Algarve

Faculdade de Cincias Univ. do Porto

Universidade de Trs-os-Montes e Alto Douro

ndice

Prefcio

1. O modo de produo biolgico Isabel Mouro Escola Superior Agrria de Ponte de Lima, Instituto Politcnico de Viana do Castelo 1.1 A agricultura biolgica e a segurana alimentar 1.2 Produo e consumo de produtos biolgicos 1.3 Regras e princpios da produo biolgica agrcola vegetal 1.4 O solo como recurso essencial 1.5 Sistemas integrados de produo biolgica vegetal e animal 1.6 Converso e certificao 1.7 Economia social e ambiental 1.8 Impacto do modo de produo biolgico nas alteraes climticas Bibliografia 1 4 6 8 9 9 13 14 18

2. Material vegetal e viveiros Mrio Reis Faculdade de Engenharia e dos Recursos Naturais, Universidade do Algarve 2.1 Material vegetal 2.1.1 Importncia do material vegetal 2.1.2 Que material vegetal utilizar ? 2.1.3 Onde obter o material vegetal ? 2.2 Viveiros 2.2.1 Viveiros, para qu ? 2.2.2 Local, tipo e condies no viveiro 2.2.3 Os substratos de viveiro: caractersticas e preparao 2.2.4 Tecnologia de produo no viveiro 2.2.5 Avaliao da qualidade das plantas 2.2.6 Condies para o sucesso de um viveiro 2.2.7 Resoluo de problemas de crescimento no viveiro Bibliografia

19 20 21 22 24 27 36 49 49 50 51

i

3. Fertilidade do solo, compostagem e fertilizao Miguel Brito Escola Superior Agrria de Ponte de Lima, Instituto Politcnico de Viana do Castelo 3.1 3.2 Gesto da fertilidade do solo Compostagem e utilizao do composto 3.2.1 O processo de compostagem 3.2.2 Caractersticas do composto 3.2.3 Utilizao do composto 3.3 Fertilizantes e fertilizao 3.3.1 Nutrientes minerais 3.3.2 Fertilizantes 3.3.3 Correco mineral 3.3.4 Correco orgnica 3.3.5 Recomendao da fertilizao 3.3.6 Fertilizao com macronutrientes principais 3.3.7 Fertilizao com macronutrientes secundrios e micronutrientes Bibliografia 53 56 65 67 70 71 73 74 77 82 84 86

4. Tecnologias de produo Isabel Mouro Escola Superior Agrria de Ponte de Lima, Instituto Politcnico de Viana do Castelo 4.1 4.2 4.3 4.4 4.5 4.6 Escolha das cultivares Rotao plurianual de culturas Adubao verde e culturas de cobertura Solarizao e biofumigao Culturas protegidas Instalao das culturas e prticas culturais 4.6.1 Mobilizao do solo 4.6.2 Aspectos de segurana alimentar na aplicao de compostos 4.6.3 Inoculao com micorrizas 4.6.4 Densidade de sementeira ou de plantao 4.6.5 Prticas culturais 4.7 Controlo de infestantes 4.7.1 Medidas culturais 4.7.2 Meios fsicos 4.7.3 Medidas de eliminao 4.8 Rega 4.8.1 Gesto da gua de rega 4.8.2 Fases crticas do ciclo cultural 4.8.3 Qualidade da gua de rega 4.8.4 Sistemas de rega Bibliografia ii 87 88 93 96 98 103 105 106 107 108 109 109 111 114 116 118 118 120

5. Proteco das culturas Raul Rodrigues1 & Andr Afonso2 1 Escola Superior Agrria de Ponte de Lima, Instituto Politcnico de Viana do Castelo 2 Direco Regional de Agricultura do Norte 5.1 5.2 Introduo Pragas 5.2.1 caros 5.2.2 Moscas brancas 5.2.3 Afdeos 5.2.4 Tripes 5.2.5 Escaravelho da batateira 5.2.6 Larvas mineiras 5.2.7 Lagartas (noctudeos) 5.2.8 Lagartas da couve 5.2.9 Mosca-da-couve 5.3 Doenas 5.3.1 Mldios 5.3.2 Odios 5.3.3 Fusarioses 5.3.4 Bactrias 5.3.5 Nemtodos 5.3.6 Vrus Bibliografia 123 128 131 133 136 137 139 140 143 144 148 150 152 153 155 158 161

6. Ps-colheita e comercializao Domingos P. F. Almeida1,2 & Maria Helena Gomes2 1 Faculdade de Cincias, Universidade do Porto 2 Centro de Biotecnologia e Qumica Fina, Escola Superior de Biotecnologia, Universidade Catlica Portuguesa 6.1 6.2 6.3 6.4 Formas de comercializao e importncia da Ps-colheita Princpios da Ps-colheita Hortofrutcola A qualidade dos produtos no Modo de Produo Biolgico A operao da colheita 6.4.1 Determinao do momento da colheita 6.4.2 Cuidados na colheita Gesto da temperatura 6.5.1 Arrefecimento 6.5.2 Armazenamento frigorfico 6.5.3 Armazenamento domstico 6.5.4 O problema dos danos pelo frio Atmosfera controlada e atmosfera modificada 6.6.1 Efeito fungisttico do dixido de carbono iii 165 166 169 170 171 172 175 177 177 179 180

6.5

6.6

6.7

O etileno na Ps-colheita Hortofrutcola 6.7.1 Efeitos do etileno 6.7.2 Aplicao de etileno 6.7.3 Remoo do etileno e minimizao dos seus efeitos indesejveis 6.8 Sanidade da gua e desinfeco 6.8.1 Utilizao da gua em ps-colheita 6.8.2 Sanitizao da gua 6.8.3 Sanitizao e desinfeco de superfcies 6.9 Estratgias para a proteco contra doenas ps-colheita 6.10 Outras tecnologias ps-colheita 6.10.1 Tratamentos anti-abrolhantes 6.10.2 Irradiao 6.10.3 Revestimentos comestveis 6.11 A garantia da integridade dos produtos biolgicos 6.11.1 Operao de arrefecimento 6.11.2 Armazenamento 6.11.3 Gesto da embalagem 6.11.4 Transporte e distribuio 6.11.5 Manuseamento no retalhista Bibliografia

181 182 182 184 185 185 186 188 188 188 189 189 190 190 190 191

Glossrio

193

Bibliografia recomendada

197

iv

Prefcio

A produo e a comercializao de produtos hortcolas no Modo de Produo Biolgico exigem conhecimentos tcnicos especializados e acesso a informao que, nem sempre, est disponvel de forma sistematizada. Este Manual de Horticultura no Modo de Produo Biolgico procura tornar acessvel a agricultores e a tcnicos informao, em particular nas reas da produo de plantas em viveiro, da fertilidade do solo, compostagem e fertilizao, das tecnologias de produo, da proteco fitossanitria e da tecnologia ps-colheita de produtos hortcolas. O presente Manual foi realizado no mbito do Projecto n 747 - Fertilizao de culturas em agricultura biolgica e avaliao do processo ps-colheita dos produtos, financiado pela medida 8.1 do programa AGRO. Este projecto contou com a participao de tcnicos e investigadores da Escola Superior Agrria de Ponte de Lima do Instituto Politcnico de Viana do Castelo (ESAPL), da Cooperativa Agrcola das Serras da Boalhosa, Arga, Castro Laboreiro, Peneda e Soajo CRL (CoopBoua), da Direco Regional de Agricultura do Norte (DRAN), da Faculdade de Cincias da Universidade do Porto (FC/UP), da Faculdade de Engenharia de Recursos Naturais da Universidade do Algarve (FERN/UA) e da Universidade de Trs-os-Montes e Alto Douro (UTAD). No perodo em que decorreu o projecto, de 2004 a 2007, as experincias de campo decorreram nas instalaes da ESAPL, na CoopBoua, na Quinta Casal de Matos, Marco de Canavezes, empresa certificada no Modo de Produo Biolgico e nos Viveiros Vidaverde, Faro.

v

1.

O MODO DE PRODUO BIOLGICO

Isabel Mouro (ESAPL / IPVC) Escola Superior Agrria de Ponte de Lima, Instituto Politcnico de Viana do castelo

1.1

A agricultura biolgica e a segurana alimentar

Definio De acordo com o regulamento CE n 834/2007 (CE, 2007): A produo biolgica um sistema global de gesto das exploraes agrcolas e de produo de gneros alimentcios que combina as melhores prticas ambientais, um elevado nvel de biodiversidade, a preservao dos recursos naturais, a aplicao de normas exigentes em matria de bem-estar dos animais e mtodo de produo, em sintonia com a preferncia de certos consumidores por produtos obtidos utilizando substncias e processos naturais. O mtodo de produo biolgica desempenha, assim, um duplo papel, visto que, por um lado, abastece um mercado especfico que responde procura de produtos biolgicos por parte dos consumidores e, por outro, fornece bens pblicos que contribuem para a proteco do ambiente e o bem-estar dos animais, bem como para o desenvolvimento rural. Os elementos essenciais do sistema de gesto da produo vegetal biolgica so a gesto da fertilidade dos solos, a escolha das espcies e variedades, a rotao plurianual das culturas, a reciclagem das matrias orgnicas e as tcnicas de cultivo (CE, 2007). A agricultura biolgica promove a melhoria dos ecossistemas agrcolas e privilegia o uso de boas prticas de gesto da explorao agrcola, em lugar do recurso a factores de produo externos, tendo em conta que os sistemas de produo devem ser adaptados s condies regionais. Isto conseguido, sempre que possvel, atravs do uso de mtodos culturais, biolgicos e mecnicos em detrimento da utilizao de materiais sintticos. No entanto, muitos dos benefcios da agricultura biolgica dependem do estabelecimento do equilbrio ecolgico entre o solo, as plantas e os1

animais, e no apenas da substituio de fertilizantes e pesticidas de sntese por produtos orgnicos (FAO, 2007). Origem A agricultura biolgica, enquanto modo de produo de alimentos vegetais e animais, sem utilizao de adubos e pesticidas qumicos de sntese, de organismos geneticamente modificados, de antibiticos e hormonas, e com recurso a tcnicas que procuram respeitar o equilbrio dos ecossistemas agrrios e a biodiversidade, surgiu como reaco industrializao da agricultura e aos seus efeitos nocivos na sade humana e no ambiente. O termo agricultura biolgica (organic farming) surgiu a primeira vez no livro Look to the land (Olhando a terra), de Lord Northbourne, publicado em 1940, e est relacionado com o conceito de que a empresa agrcola deve ser considerada como um organismo. A Federao Internacional de Movimentos de Agricultura Biolgica (IFOAM), actualmente com sede na Alemanha, foi fundada em 1972, em Frana. Nos anos 80, ocorreu globalmente um grande desenvolvimento da agricultura biolgica, motivado pela maior conscincia da necessidade de proteco ambiental e pela procura de alimentos mais saudveis, por parte dos consumidores, tendo surgido em Portugal a Associao Portuguesa de Agricultura Biolgica (Agrobio), em 1985. Em 1991, a Comunidade Europeia publicou o primeiro regulamento definindo as normas do modo de produo biolgico dos produtos vegetais (CE n 2092/91) e, em 1999, dos produtos animais (Reg. CE n 1804/99). Estes regulamentos foram recentemente revogados pelo regulamento CE n 834/2007, de 28 de Junho (CE, 2007). Princpios A agricultura biolgica tem por base os seguintes princpios (IFOAM, 2007):

Princpio da sade. A agricultura biolgica deve manter e melhorar a qualidade dos solos, assim como a sade das plantas, dos animais, dos seres humanos e do planeta como um todo.

Princpio da ecologia. A agricultura biolgica deve respeitar os ciclos naturais dos ecossistemas.

Princpio da justia. A agricultura biolgica deve basear-se em relaes justas no que respeita ao ambiente e s oportunidades de vida.

2

Princpio da precauo. A agricultura biolgica deve ser gerida de uma forma cautelosa e responsvel de modo a proteger o ambiente, a sade e o bem-estar das geraes actuais e futuras.

Segurana alimentar As concluses da Conferncia Internacional da Agricultura Biolgica e Segurana Alimentar, realizada em 2007, pela Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e Alimentao (FAO), foram as seguintes (FAO, 2007):

A agricultura biolgica pode contribuir para a segurana alimentar embora o seu potencial dependa fortemente das motivaes polticas.

Novos desafios como as alteraes climticas podem ser mitigados pela agricultura biolgica atravs de medidas como o aumento da sequestrao de dixido de carbono (CO2), para alm de que a agricultura biolgica oferece opes prticas de adaptao climtica.

A segurana da gua aumenta com a agricultura biolgica, desde a qualidade da gua para consumo at diminuio da quantidade de gua necessria em solos de agricultura biolgica.

A agro-biodiversidade protegida e sustentavelmente utilizada pela agricultura biolgica.

A agricultura biolgica aumenta o equilbrio nutricional da alimentao humana, nomeadamente atravs da maior diversificao de produtos.

O desenvolvimento rural alcanado atravs da agricultura biolgica que gera rendimento e emprego, em regies onde no existem outras alternativas que no seja a utilizao do trabalho, dos recursos e do conhecimento locais.

Para que o desenvolvimento da agricultura biolgica prossiga, crucial a implementao de uma rede internacional de investigao e uma eficiente extenso de transferncia de conhecimento, devendo ser atribudo cincia agro-biolgica uma maior quantidade de fundos pblicos.

A segurana alimentar est fortemente associada s polticas agrcolas que determinam as opes s exportaes e importaes.

A segurana alimentar no apenas um problema dos pases em desenvolvimento, na medida em que a crise dos combustveis fosseis, as alteraes climticas e outras vulnerabilidades na cadeia alimentar, podem tambm ameaar as regies que actualmente apresentam segurana alimentar.3

1.2

Produo e consumo de produtos biolgicos

Produo Em 2006, a agricultura biolgica no mundo era praticada em mais de 110 pases, num total de cerca de 600.000 empresas e ocupava uma rea de 31 milhes ha, o que representava 0,7% do total da rea agrcola (SAU) dos pases considerados (Willer & Yussefi, 2007). As maiores reas de agricultura biolgica certificada situavam-se na Austrlia/Ocenia (11,9 milhes ha), seguindo-se a Europa com perto de 7 milhes ha (principalmente em Itlia, Espanha e Alemanha), a Amrica Latina com 5,8 milhes ha (53% na Argentina), a sia com aproximadamente 2,9 milhes ha (80% na China), a Amrica do Norte com 2,2 milhes ha (73% nos EUA) e a frica com perto de 0,9 milhes ha (Willer & Yussefi, 2007). Na Unio Europeia, em 2006, a percentagem de rea no modo de produo biolgico (MPB) relativamente SAU total era cerca de 4%, havendo pases que apresentavam valores mais elevados, acima de 10%, como a ustria e Suia, seguindose a Itlia com cerca de 8% (Willer & Yussefi, 2007). Em Portugal, em 2005 (IDRHa, 2007), a rea total no MPB era de 233.458 ha (6,1% da SAU total), dos quais 85,4% estavam ocupados com plantas herbceas e 14,6% com culturas arbreas (quadro 1).

Quadro 1.1 - rea destinada produo de produtos vegetais (culturas herbceas, arbreas e arbustivas) no modo de produo biolgico, em Portugal, em 2005. rea (x 103 ha) - pastagens - culturas arvenses - culturas hortcolas e plantas aromticas e medicinais 154,8 43,2 1,4 199,4 28,2 3,5 1,1 1,3 34,1 Percentagem (%) 77,6 21,7 0,7 100 82,6 10,3 3,8 3,3 100

Culturas herbceas Total

Culturas arbreas e arbustivas TotalFonte: IDRHa (2007).

- olival - frutos secos - frutos frescos - vinha

Considerando o total de 4,1 milhes de ha de culturas herbceas no MPB no mundo, em 2006, cerca de 35% estava ocupada com produo de cereais e apenas 3,7%4

estava destinada produo de culturas hortcolas no MPB e 1,7% produo de plantas aromticas e medicinais (Willer & Yussefi, 2007). Em Portugal esta percentagem bastante inferior (quadro 1.1), tornando-se evidente a escassez nacional em produtos hortcolas biolgicos, para os quais existe um mercado potencial em crescimento. A produo biolgica de produtos hortcolas, em reas apropriadas, potencialmente a produo mais rentvel no mbito das produes vegetais, com inputs fsicos relativamente baixos, embora com elevados custos de mo de obra e de gesto. Consumo O consumo de produtos biolgicos tem aumentado em todo o mundo. Em 2006, o mercado de produtos biolgicos representava aproximadamente 30000 milhes de euros (2% do mercado mundial de produtos alimentares) e espera-se que atinja os 53000 milhes de euros em 2012 (Sahota, 2007). Os pases que lideram o mercado mundial dos produtos agrcolas biolgicos so os EUA, a Alemanha, Reino Unido, Frana e Itlia. Este potencial de mercado e de valorizao por parte dos consumidores de produtos agrcolas provenientes do MPB, baseia-se essencialmente na maior qualidade dos produtos, por garantirem uma maior segurana alimentar e serem mais aromticos e saborosos. No entanto, a compreenso da qualidade por parte dos consumidores tem-se expandido para alm das caractersticas qumicas e organolpticas dos produtos, abrangendo um conceito mais vasto - valor integrado do produto - que engloba valores ticos e o impacto ambiental do modo de produo, nomeadamente na eficincia de energia, diminuio da poluio e bem estar animal (FAO, 2000). Deste modo a rastreabilidade dos produtos fundamental para produtores e consumidores, especialmente quando os produtos biolgicos acompanham os produtos da agricultura convencional, porque cada vez mais os consumidores de produtos biolgicos no so uma elite econmica, mas antes uma elite consciente e informada, que est preparada para pagar mais pelos produtos em funo da credibilidade da sua provenincia, que consta nos seus rtulos (FAO, 2007). Tendncias e perspectivas globais do mercado de produtos biolgicos A agricultura biolgica deve dar prioridade aos mercados locais, importando apenas produtos que no so produzidos na regio e exportando produtos de alto valor comercial (FAO, 2007).

5

As tendncias e perspectivas globais do mercado de produtos biolgicos (Sahota, 2007) indicam que: A produo aumentar globalmente mas a procura concentrar-se- em regies

onde os consumidores tm poder de compra. Assim, tendem a manter-se as diferenas entre pases produtores e consumidores. A procura continuar a ser superior oferta. O investimento (pblico, privado, grupos internacionais) aumentar. A quantidade de normas pblicas e privadas tende a aumentar dificultando o

comrcio global de produtos biolgicos.

1.3

Regras e princpios da produo biolgica agrcola vegetalAs regras aplicveis produo vegetal, definidas nos artigos 5, 9 e 12 do

Reg. CE n 834/2007 (CE, 2007), incluem:

A produo vegetal biolgica recorre a prticas de mobilizao e de cultivo que mantenham ou aumentem as matrias orgnicas dos solos, reforcem a estabilidade e a biodiversidade dos mesmos e impeam a sua compactao e eroso.

A fertilidade e a actividade biolgica dos solos so mantidas e aumentadas pela rotao plurianual das culturas, incluindo leguminosas e outras culturas para a adubao verde, e pela aplicao de estrume ou de matrias orgnicas, de preferncia ambos compostados, provenientes da produo biolgica.

S podem ser utilizados fertilizantes e correctivos dos solos autorizados para utilizao na produo biolgica (*), para alm da utilizao de preparados biodinmicos.

No podem ser utilizados fertilizantes minerais azotados. Todas as tcnicas de produo vegetal utilizadas devem impedir ou reduzir ao mnimo eventuais contribuies para a contaminao do ambiente. A tomada de decises em matria de produo deve ter em considerao o equilbrio ecolgico local ou regional.

A preveno dos danos causados por parasitas, doenas e infestantes deve assentar em medidas preventivas, tais como a escolha de espcies e variedades adequadas resistentes aos parasitas e s doenas (nomeadamente cultivares6

regionais), a rotao adequada das culturas, as tcnicas de cultivo, mtodos mecnicos e fsicos, processos trmicos e a proteco dos predadores naturais dos parasitas.

No podem ser utilizadas plantas geneticamente modificadas, nem outros organismos geneticamente modificados (OGM). No podem ser utilizados produtos obtidos a partir ou com interveno de OGM, como gneros alimentcios, alimentos para animais, auxiliares tecnolgicos, produtos fitofarmacuticos, fertilizantes, correctivos dos solos, sementes, materiais de propagao vegetativa, microrganismos e animais.

Em caso de ameaa comprovada para uma cultura, s podem ser utilizados produtos fitofarmacuticos autorizados para utilizao na produo biolgica (*).

Para a obteno de produtos que no sejam sementes nem material de propagao vegetativa, s podem ser utilizados sementes e materiais de propagao vegetativa produzidos segundo mtodos de produo biolgica. Para tal, quer no caso das sementes, quer no caso do material de propagao vegetativa, as respectivas plantas-me devem ter sido produzidas segundo as regras estabelecidas no presente regulamento durante pelo menos uma gerao ou, no caso de culturas perenes, dois ciclos vegetativos.

S podem ser utilizados na produo vegetal produtos de limpeza e desinfeco autorizados para utilizao na produo biolgica (*).

Deve ser minimizada a utilizao de recursos no renovveis e de factores de produo externos explorao. Deste modo, a reciclagem dos desperdcios e subprodutos de origem vegetal e animal deve ser utilizada na produo vegetal e animal.

(*) - Todos os produtos e substncias devem ser de origem vegetal, animal, microbiana ou mineral, a menos que no estejam disponveis produtos e substncias dessas origens em quantidades suficientes ou com qualidade suficiente ou no existam alternativas. Para os produtos fitofarmacuticos, se estas condies no forem observadas, s podem ser autorizados se as condies da sua utilizao exclurem qualquer contacto directo com as partes comestveis da planta (Art. 16; CE, 2007).

7

Considerando que a agricultura biolgica requer conhecimentos tcnicocientficos especficos as organizaes de produtores tm um papel decisivo na transferncia de conhecimento, formao profissional e assistncia tcnica, assim como na orientao da investigao. Apresentam tambm um importante papel no desenvolvimento de sistemas internos de controlo, contribuindo para a diminuio dos custos de certificao e de comercializao dos produtos (FAO, 2007).

1.4

O solo como recurso essencialA sustentabilidade da agricultura inclui a proteco do ambiente e da paisagem e

o MPB uma das formas de actuar de forma construtiva e equilibrada nos sistemas agrcolas, melhorando a fertilidade dos solos, promovendo o correcto uso da gua e preservando a biodiversidade. O solo de facto um recurso essencial e, por exemplo, a aplicao de compostos ao solo no MPB, resultantes da compostagem de desperdcios e subprodutos de origem vegetal e animal, uma prtica essencial e tem sido amplamente reconhecida pelo aumento da matria orgnica total, aumento de macro e micronutrientes e pela melhoria das propriedades fsicas do solo, com o aumento da porosidade e condutividade hidrulica, entre outros. A estrutura dos solos onde se pratica agricultura biolgica resulta numa melhor drenagem e movimento da gua no solo, enquanto que o aumento da matria orgnica responsvel por um aumento de reteno da gua de 20% a 40% (FAO, 2007), diminuindo deste modo as necessidades de gua de rega e promovendo melhores colheitas em situaes de seca. Hoitink et al. (1997) acrescentaram ainda que muitos dos benefcios induzidos pelos compostos, esto relacionados com um controlo biolgico sobre as doenas das razes e folhas das plantas, atravs da actividade de microrganismos na rizosfera. Em agricultura biolgica a produtividade das culturas que no tm capacidade de estabelecer simbiose com microrganismos fixadores de azoto atmosfrico est limitada, principalmente, pelas taxas de mineralizao do azoto orgnico, j que o fsforo e outros macro e micro nutrientes podem ser incorporados na forma de fertilizantes inorgnicos naturais. Por outro lado, se o ciclo das culturas for curto, como o caso da maioria das culturas hortcolas, a dependncia da disponibilidade de azoto mineral na fase de rpido crescimento vegetativo muito elevada. A concentrao de azoto mineral no solo depende da mineralizao da matria orgnica estvel existente no solo e da8

mineralizao da matria orgnica que incorporada na forma de correctivos ou fertilizantes orgnicos (Mouro et al., 2007). A gesto do azoto no solo, de modo a sincronizar a sua disponibilidade com as exigncias de crescimento e desenvolvimento fisiolgico das culturas, difcil de avaliar mas crucial para o sucesso da horticultura biolgica (Captulo 3).

1.5

Sistemas integrados de produo biolgica vegetal e animalO MPB deve ser praticado em sistemas integrados de produo vegetal e animal,

que permitem a reciclagem dos nutrientes minerais necessrios s culturas, atravs do uso correcto dos estrumes produzidos na explorao agrcola. Por outro lado, a integrao de forragens para alimentao animal na rotao plurianual das culturas, permite ainda substituir a adubao verde, pois so incorporados no solo as razes e restos destas culturas (Captulo 4). Este conceito actualmente posto em causa nas empresas de produo biolgica, praticada em grandes reas e especializadas num conjunto muito restrito de culturas, sem produo animal e que apenas tm substitudo os factores de produo sintticos por agentes de controlo biolgicos, com grande utilizao de mecanizao (FAO, 2007).

1.6

Converso e certificao

Converso O equilbrio biolgico de tal modo importante que os principais problemas de produo surgem no incio do perodo de converso. A deciso pela converso dever ser acompanhada pela procura de informao tcnica e pela anlise das potencialidades do mercado, sendo importante a experincia adquirida de outras unidades de produo. A implementao do plano de converso de exploraes agrcolas convencionais, para a produo biolgica de culturas hortcolas, das mais exigentes (Ferreira, 2007), devido complexidade do planeamento, gesto e comercializao de uma grande diversidade de culturas, com diferentes necessidades nutritivas, fitossanitrias e de mecanizao, uma vida til ps-colheita muito curta para a maioria dos produtos e um elevado consumo de mo-de-obra. O plano de produo deve contemplar a seleco das culturas (espcies e cultivares); o planeamento das rotaes; a obteno das sementes, plantas ou9

material de propagao vegetativa; as prticas culturais, incluindo a fertilizao e a proteco fitossanitria; a criao de espaos para promover a diversidade de auxiliares e o mercado potencial, incluindo o acondicionamento e a rotulagem dos produtos, bem como os canais de distribuio. A converso para o MPB, regulamentada no artigo 17 do Reg. CE n 834/2007 (CE, 2007), subordina-se s seguintes regras:

O perodo de converso tem incio no momento em que o operador notifica as autoridades competentes da sua actividade (Ministrio da Agricultura e as Secretarias Regionais das Regies Autnomas) e submete a sua explorao ao sistema de controlo (organismo de certificao de produtos);

Durante o perodo de converso, aplicam-se todas as regras estabelecidas no regulamento;

So definidos perodos de converso especficos do tipo de cultura ou de produo animal;

Numa explorao ou unidade de explorao agrcola que esteja parcialmente em produo biolgica e parcialmente em converso produo biolgica, o operador separa os produtos obtidos biologicamente dos produtos em converso, mantm os animais separados ou de modo a poderem ser rapidamente separados e mantm registos adequados que demonstrem essa separao;

A fim de determinar o perodo de converso acima referido, pode ser tido em conta um perodo imediatamente anterior data de incio do perodo de converso, desde que estejam reunidas certas condies.

O perodo de converso para o MPB , em geral, de 2 e de 3 anos, respectivamente para as culturas anuais e perenes, e durante esse perodo os produtos no podem ser comercializados como provenientes do MPB. Se o solo estiver em pousio durante 3 ou mais anos, a primeira cultura pode ser certificada. Certificao A certificao de um produto a forma de garantir a sua conformidade com as normas definidas para a sua produo. A certificao tambm se aplica a processos ou servios e da responsabilidade dos Organismos de Controlo e Certificao, cuja lista se encontra no quadro 1.2.

10

A certificao de produtos facultativa e constitui um instrumento para a comercializao, com vantagens para os produtores pois permite demonstrar que o produto cumpre os requisitos necessrios, colocando-o em vantagem competitiva, pois os compradores so facilmente informados atravs da exibio de um logtipo. Para o retalhista ou comerciante a certificao permite seleccionar produtos e produtores, de modo a satisfazer os seus clientes, transmitindo-lhes segurana. O consumidor tambm beneficia da certificao, pois pode optar pela diferena existente entre os produtos disponveis, tendo a certeza de que a informao a que no tem directamente acesso foi devidamente controlada.

Quadro 1.2 - Organismos privados de controlo e certificao de produtos no modo de produo biolgico, em Portugal, homologados pelo Ministrio da Agricultura, Pescas e Florestas. TRADIO E QUALIDADE Associao Interprofissional para os Produtos Agro-Alimentares de Trs-os-Montes Av. 25 de Abril 273 S/L 5370-202 Mirandela Tel/Fax: 278 261 410 Email: [email protected] Urbanizao Villas Aqueduto Rua Alfredo Mirante, n 1 R/c Esq. 7350-153 Elvas Tel: 268 625026; Fax: 268 626546 Email: [email protected] Rua Diana de Liz Horta do Bispo,Apt. 320 7006-804 vora Tel: 266 769564/5; Fax: 266 769566 Email: [email protected] Av. Porto de Pesca, Lote C 15, 1 C 2520-208 Peniche Tel: 262 789 005; Fax: 262 789 514 Email:[email protected] Rua Robalo Gouveia, n 1 - 1 1900-392 Lisboa Tel: 21 799 11 00; Fax: 21 799 11 19 Email: [email protected] Rua Alexandre Herculano, 68 - 1 Esq. 2520-273 Peniche Tel: 262 78 51 17; Fax: 262 78 71 71 Email: [email protected]

AGRICERT Certificao de Produtos Alimentares, Lda

CERTIALENTEJO Certificao de Produtos Agrcolas, Lda

CERTIPLANET Certificao da Agricultura, Florestas e Pescas, Unipessoal, Lda

SATIVA Desenvolvimento Rural, Lda

ECOCERT PORTUGAL Unipessoal LdaFonte: IDRHa (2007).

11

O controlo e a certificao de produtos da responsabilidade de organismos que tm de cumprir a norma de qualidade NP/EN 45011. Estes organismos tm de ser independentes, utilizar processos no discriminatrios ou imparciais, tm de ser eficazes e transparentes, distinguindo, sem equvocos, o processo de avaliao do de certificao e no podem prestar consultoria, nem participar em actividades de comercializao ou promoo dos produtos. O Conselho de Certificao com representantes dos diversos operadores, desde a produo at ao consumidor, contribui para o cumprimento desta norma, que oficialmente verificado atravs da Entidade Competente do Estado Membro, que em Portugal o Ministrio da Agricultura e as Secretarias Regionais das Regies Autnomas. O cumprimento da NP/EN 45011 deve tambm ser verificado pela exposio pblica de documentao sobre operadores com licenas e/ou produtos certificados e ainda das sanes atribudas (advertncia, suspenso ou anulao); pelo sistema interno de auditoria e pela Autoridade Nacional de Acreditao (IPAC). O controlo executado ao longo da cadeia de produo de modo a manter um nvel de rastreabilidade eficaz. O controlo inclui (i) visitas anuais de inspeco para o controlo fsico da unidade de produo e visitas aleatrias, com ou sem aviso prvio, para esclarecimento de dvidas; (ii) verificao de registos e documentos, como por exemplo o caderno de campo ou de criao de animais e (iii) colheita de amostras. Esta colheita de amostras pelo organismo de certificao de produtos, destina-se deteco da utilizao ou da contaminao de produtos ou de tcnicas de produo no autorizados no MPB. O operador no incio do processo de controlo faz uma descrio completa da unidade de produo, das actividades e das instalaes e tambm de todas as medidas a tomar para garantir o cumprimento do regulamento do MPB, acima descrito. Declara o seu compromisso em realizar estas medidas e, em caso de infraces ou de irregularidades, compromete-se a aceitar a aplicaes das medidas previstas e a informar os seus compradores, de modo garantir que sejam retiradas as indicaes referentes ao MPB. O organismo de certificao de produtos deve assegurar este procedimento, a todo o lote ou a toda a produo, onde foi detectado o incumprimento ao regulamento do MPB. Sempre que ocorrerem alteraes descrio ou s medidas gerais ou especficas, o operador deve notificar o organismo de certificao de produtos. da responsabilidade do operador manter registos de existncias e registos financeiros que12

permitam (i) identificar os fornecedores; (ii) a natureza e a quantidade dos produtos agrcolas obtidos no MPB e fornecidos unidade de produo, ou os materiais adquiridos e respectiva utilizao; (iii) a natureza, quantidade e destinatrios dos produtos obtidos no MPB, que tenham sado da unidade de produo. A contabilidade, fundamentada com os necessrios documentos comprovativos, deve demonstrar um equilbrio entre os factores de produo utilizados e os produtos obtidos.

1.7

Economia social e ambientalA agricultura biolgica pode contribuir para a vitalidade das economias rurais

atravs de um desenvolvimento sustentvel. O crescimento da agricultura biolgica abriu j novas perspectivas de emprego ao nvel da produo, transformao e servios, que se traduziram em benefcios significativos para a economia e para a coeso social das zonas rurais (Aleixo et al., 2004). Estima-se que na agricultura biolgica as exigncias mdias em mo-de-obra por unidade de rea, sejam cerca de 30% superiores s da agricultura convencional (FAO, 2007). O MPB tem ainda contribudo, em diversos pases europeus, para a conservao de regies ambientalmente sensveis e para a rentabilizao de zonas de proteco da gua, onde no permitida a produo agrcola convencional (FAO, 2000). A segurana da gua tambm aumenta com a agricultura biolgica, a nvel da qualidade da gua para consumo, da diminuio da quantidade de gua de rega necessria em solos de agricultura biolgica, devido melhor reteno de gua, e das melhores produtividades obtidas em climas com falta de gua e elevada variabilidade climtica (FAO, 2007). O MPB contribui para a conservao dos recursos naturais. Mder et al. (2002) compararam durante 21 anos diversas culturas (batata, cevada, trigo, beterraba e trevo) segundo os mtodos biolgicos e convencionais e, referiram que, no MPB, apesar de uma menor incorporao de azoto, fsforo e outros nutrientes ao solo, estimada entre 34% a 51%, a produtividade , em mdia, cerca de 20% inferior, indicando que os sistemas biolgicos utilizam os recursos de uma forma mais eficaz. Tem sido tambm demonstrado que o MPB utiliza menos energia por unidade de produto comparativamente com a agricultura convencional (Mazzoncini et al., 2007), podendo atingir uma diminuio de cerca de 33% a 56% (FAO, 2007). Na Europa, a quantidade de energia necessria para produzir 1 litro de leite no MPB cerca de 25% da energia

13

necessria na produo convencional, principalmente devido alimentao dos animais no MPB ser baseada no pastoreio em vez de raes (Aubert, 2007). O aumento da biodiversidade, nomeadamente de plantas, insectos, aves e microrganismos, tem sido tambm uma das consequncias do MPB. No estudo efectuado por Mder et al. (2002), os solos biolgicos abrigavam um maior nmero e uma maior diversidade de organismos, como os vermes e os insectos, sendo estes ltimos aproximadamente duas vezes mais numerosos e mais diversificados, incluindo aranhas e colepteros que se alimentam de diversas pragas. Os microrganismos responsveis pela decomposio da matria orgnica e as micorrizas, fungos que colonizam as razes das plantas colaborando na absoro de nutrientes, tambm foram referidos como existindo em maior quantidade nos solos onde se pratica o MPB. Deste modo, a disponibilidade de nutrientes minerais provenientes da matria orgnica do solo e a absoro dos nutrientes pelas plantas, facilitada no MPB. Os custos externos da agricultura biolgica, relacionados com o aumento da eroso dos solos, poluio da gua e morte da vida selvagem, so estimados em cerca de um tero dos custos causados pela agricultura convencional (Halweil, 2007). O MPB contribui ainda para uma reduo do transporte e do custo das transaces comerciais, atravs de uma distribuio dos produtos prioritariamente escala regional (FAO, 2007). Estima-se que o MPB conduza a uma diminuio do consumo directo e indirecto de combustveis fsseis de 10% a 70% na Europa e de 29% a 37% nos EUA, com excepo de algumas culturas como por exemplo a batata (FAO, 2007). Por exemplo, o equivalente ao azoto disponibilizado anualmente pela mineralizao da matria orgnica do solo no MPB, em fertilizantes azotados minerais utilizados na agricultura convencional, representa uma enorme poupana de combustveis fosseis no renovveis necessrios produo destes ltimos (Fliessbach, 2007).

1.8

Impacto do modo de produo biolgico nas alteraes climticasO sector agrcola responsvel por mais de 30% das causas do aquecimento

global (Aubert, 2007), devido emisso de CO2, metano (CH4) e xido nitroso (N2O), que so gases responsveis pelo aumento do efeito de estufa da atmosfera.14

Considerando a totalidade das emisses globais, estes gases contribuem para o efeito de estufa, respectivamente em 81%, 9% e 9%, para alm dos clorofluorcarbonetos emitidos pela indstria, que contribuem com 1% ( EEA, 2000). Emisses de gases de efeito de estufa pela agricultura As emisses e origem dos gases de efeito de estufa, da responsabilidade do sector agrcola, so as seguintes:

As emisses de CO2 provm principalmente da indstria de fertilizantes, da mecanizao na produo agrcola e do carbono existente no solo, que varia de acordo com o sistema de produo. Estima-se que o solo contem cerca de duas vezes mais carbono do que a atmosfera e cerca de trs vezes mais carbono do que a vegetao (Fliessbach, 2007). A desflorestao uma das principais fontes de libertao de CO2 do solo, principalmente nas regies tropicais. Nos pases desenvolvidos, a indstria de fertilizantes principalmente azotados, com recurso a energias no renovveis, contribui para o consumo de cerca de metade da energia utilizada na agricultura. Por outro lado, a intensificao cultural, com recurso a uma intensa mobilizao dos solos, provoca a diminuio da matria orgnica, com a consequente libertao de CO2. (Aubert, 2007). Em Frana, mais de 7 milhes de ha de solo agrcola apresentam valores de matria orgnica inferiores a 1,6%, enquanto que h algumas dcadas atrs este valor era superior a 2% (Aubert, 2007).

Do total do N2O libertado para a atmosfera, 61% tem origem na agricultura (EEA, 2000), nomeadamente devido aos processos de desnitrificao do azoto no solo e pelos estrumes animais em condies de anaerobiose. Na agricultura convencional estima-se que as emisses de N2O do solo representem, em mdia, 1,25% da quantidade de azoto aplicado como fertilizante mineral (Aubert, 2007), havendo, no entanto, muitos factores que afectam esta emisso, como a temperatura e o tipo de cultura. A sincronizao do azoto mineral disponvel com as necessidades das plantas crucial no MPB, porque o azoto mineral existente no solo, que no absorvido pelas plantas, ou emitido para a atmosfera na forma de amonaco (NH3), N2O ou azoto atmosfrico (N2) ou lixiviado para as guas subterrneas na forma de nitrato (NO3-).

Cerca de metade do total das emisses de CH4 so provenientes da agricultura (EEA, 2000) e so devidas principalmente aos processos de fermentao que15

ocorrem no aparelho digestivo dos animais ruminantes, mas tambm provm da fermentao nos campos de arroz e em campos alagados e da fermentao de dejectos animais. Contributo da agricultura biolgica para a diminuio das alteraes climticas O efeito da agricultura biolgica nas alteraes climticas tem sido estudado em comparao com a agricultura convencional, estimando-se que o seu contributo minimize estas alteraes.

A reteno de CO2 no solo foi avaliada em mais 12% a 15% no MPB, comparativamente com a agricultura convencional, o que representa um retorno de mais 575 kg a 700 kg de CO2 por ha e por ano (Fliessbach, 2007). No MPB o aumento e a manuteno da matria orgnica do solo (i) contribuem para o sequestro de carbono, diminuindo a sua libertao para a atmosfera. Este processo mais evidente nos sistemas mistos com produo pecuria e utilizao de pastagens (ii) e ainda, atravs da adubao verde (iii), que assumem um papel importante na gesto da fertilizao das culturas. Por outro lado, uma rotao plurianual de culturas diversificadas, com uma correcta ocupao do solo (iv), permite aumentar o fluxo de carbono da atmosfera para o solo, atravs de uma maior quantidade de CO2 absorvido pela fotossntese. No entanto, esta reteno de carbono melhor alcanada pelas plantas perenes, relativamente s plantas herbceas, e tambm pela agricultura convencional em comparao com a agricultura biolgica, devido s maiores produtividades alcanadas.

Em relao emisso de gases de efeito de estufa, estima-se que o MPB diminua a emisso de CO2 de 48% a 60% (FAO, 2007), principalmente devido no utilizao de fertilizantes qumicos de sntese (v).

As perdas de azoto para a atmosfera so tambm menores, devido menor aplicao de azoto no MPB (vi). Considerando que as emisses de N2O (e de NH3) aumentam acentuadamente quando a fertilizao azotada excede as necessidades das culturas, a probabilidade desta ocorrncia menor no MPB (Aubert, 2007).

As emisses de metano so aparentemente semelhantes nos dois modos de produo biolgico e convencional (FAO, 2007). Apesar das emisses CH4 por kg de leite serem menores nos16

sistemas

de

produo

intensivos,

comparativamente com os sistemas extensivos, o MPB poder compensar esta desvantagem, pela menor libertao de CH4, resultante da usual compostagem dos estrumes (processo aerbio) (vii), comparativamente com os processos de armazenamento dos estrumes na pecuria convencional, muitas vezes em condies de anaerobiose (Aubert, 2007).

Em concluso, o efeito do menor impacto do MPB nas alteraes climticas, nomeadamente atravs dos processos e tcnicas assinaladas de (i) a (vii), associado ao contributo do MPB para o aumento da fertilidade dos solos, aumento da reteno de gua e melhor eficincia na utilizao dos recursos, justificam a maior sustentabilidade deste modo de produo, que assim apresenta uma melhor garantia de produo de alimentos a longo prazo.

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RefernciasAleixo, A.L., Mantas, A., Ferreira, J., Ferreira, J.C. & Ribeiro, J.R. 2004. Plano nacional para o desenvolvimento da agricultura biolgica (2004-2007). Ministrio da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, Lisboa. Aubert, C. 2007. Can organic farming mitigate the impact of agriculture on global warming? International Conference on Organic Agriculture and Food Security, FAO, OFS/2007/INF, 1-2. Acedido em Julho de 2007, . CE 2007. Regulamento (CE) N. 834/2007 do Conselho, de 28 de Junho de 2007, relativo produo biolgica e rotulagem dos produtos biolgicos e que revoga o Regulamento (CEE) N. 2092/91. Jornal Oficial da Unio Europeia, 20.7.2007, L 189, 1-23. EEA 2000. Environmental signals 2001. Environmental assessment report No 8, European Environment Agency, Copenhagen, 115 p. FAO 2000. Food safety and quality as affected by organic farming. 22nd FAO Regional Conference for Europe, Porto, Portugal. Acedido em 2003, . FAO 2007. Report - International Conference on Organic Agriculture and Food Security, FAO, OFS/2007/REP, 11 p. Acedido em Julho de 2007, . Ferreira, J. 2007. Converso agricultura biolgica. Actas Portug. de Horticultura, 10, 13-21. Fliessbach A. 2007. Organic agriculture and climate change - the scientific evidence. Workshop Climate Change and Organic Farming, BioFach, Nuremberg. Halweil, B. 2007. Can Organic Farming Feed The World? International Conference on Organic Agriculture and Food Security, FAO, OFS/2007/INF, 3-4. Acedido em Julho de 2007, . IDRHa 2007. Dados estatsticos. Instituto de Desenvolvimento Rural e Hidrulica, Ministrio da Agricultura do Desenvolvimento Rural e das Pescas. Acedido em Abril de 2007, . Hoitink H A, Grebus M E & Stone A.G. 1997. Impacts of compost quality on plant disease severity. In Modern Agriculture and Environment. Kluwer Academic Pub., 363-371. IFOAM 2007. International Federation of Organic Agriculture Movements. Acedido em Maro de 2007, . Mder P., Fliessbach A., Dubois D., Gunst L., Fried P. & Niggli U. 2002. Soil Fertility and Biodiversity in Organic Farming. Science, 296, 1694-1697. Mayor 2003. Resumo dos principais resultados do projecto CONVERSION em Portugal continental. Projecto CONVERSION: Overcoming Barriers to Conversion to Organic Farming in the European Union, 5 Programa Quadro da UE. Mazzoncini, M., Belloni, P., Brberi P. & Antichi, D. 2007. Energy Analysis of Organic and Conventional Farming Systems. International Conference on Organic Agriculture and Food Security, FAO, OFS/2007/INF, 86-87. Acedido em Julho de 2007, . Mouro, I., Brito, L.M. & Coutinho J. 2007. Influence of organic and inorganic fertilizers on the growth and yield of cabbage (B. oleracea var. capitata). In: De Neve, S. et al. (eds), 16th Int. Symp. of the International Scientific Centre for Fertilizers, Belgium, 371-376. Sahota, A., 2007. Overview of the global market for organic food and drink. In: Willer H. & Yussefi M. (eds.), The World of Organic Agriculture - Statistics and Emerging Trends 2007. International Federation of Organic Agriculture Movements (IFOAM) and Research Institute of Organic Agriculture (FiBL), 9 ed., , 52-55. Willer H., Yussefi M. & Sthamer, D., 2007. The global survey on organic farming 2007: Main results. In: Willer H. & Yussefi M. (eds.), The World of Organic Agriculture - Statistics and Emerging Trends 2007. International Federation of Organic Agriculture Movements (IFOAM) and Research Institute of Organic Agriculture (FiBL), 9 ed., , 23-44.

18

2.

MATERIAL VEGETAL E VIVEIROS

Mrio Reis Faculdade de Engenharia e dos Recursos Naturais, Universidade do Algarve

2.1

Material vegetal

2.1.1 Importncia do material vegetalA escolha do material vegetal uma condio fundamental para o sucesso das culturas, por razes de natureza tcnica e econmica. Cada espcie, variedade ou cultivar apresenta exigncias ambientais prprias, que permitem o seu cultivo com sucesso em condies determinadas de solo e clima, mas que noutras condies edafoclimticas podem conduzir a resultados pouco satisfatrios. At ao incio do sc. XX, o melhoramento das plantas cultivadas fazia-se sobretudo numa escala local, em muitos casos de forma emprica pelos agricultores. Com o desenvolvimento da mecanizao na agricultura e a disponibilidade de adubos qumicos e fitofrmacos, promoveu-se a seleco cada vez mais intensa das plantas, orientada principalmente para o aumento da produtividade. A enorme diversidade de variedades regionais, cultivadas at ento, foi-se reduzindo, substitudas por novas variedades mais produtivas, embora exigindo mais investimento em factores de produo. Apenas onde a agricultura no foi sujeita a esta modernizao se mantiveram em cultivo as antigas variedades, de grande riqueza gentica. A reduo do cultivo das variedades regionais constitui um grave problema, pela perda de biodiversidade que acarreta. Estima-se que se tenha perdido, a nvel mundial desde o final do sc. XIX, cerca de 75% da diversidade gentica na agricultura. Como casos drsticos, citam-se as variedades de trigo na China que, entre 1949 e os anos 70, passaram de cerca de 10000 para apenas 1000, ou as variedades de arroz nas Filipinas onde, de milhares de variedades, se passou ao cultivo apenas de 2 em 98 % da rea desta cultura (Nierenberg & Halweil, 2005).19

De entre outros aspectos, o interesse das variedades regionais de hortcolas resulta de serem cultivadas localmente, ao longo de dezenas ou centenas de anos, apresentando caractersticas que as tornam mais adaptadas e/ou resistentes s condies dessas regies. Esta adaptao traduz-se por uma maior capacidade de sobrevivncia e de crescimento nas suas zonas de seleco e tambm, por vezes, na capacidade de produzirem com menor exigncia de factores de produo, nomeadamente para a melhoria da fertilidade do solo e a proteco contra pragas e doenas. maior adaptao local das variedades regionais pode-se ainda acrescentar, por vezes, o seu maior valor para a alimentao humana, por apresentarem uma composio qumica mais rica e variada em compostos importantes para a nutrio e a sade. Estes compostos tendem a estar presentes em menor quantidade em cultivares seleccionadas com outros objectivos, como a produtividade ou caractersticas relacionadas com o seu processamento industrial e/ou processo de comercializao. As variedades regionais constituem um manancial de biodiversidade, ameaada pela drstica reduo do material vegetal cultivado imposta pela produo em massa, em condies normalizadas. A agricultura em MPB pode beneficiar do cultivo das variedades regionais e contribuir para a conservao do patrimnio gentico das plantas cultivadas, diversificando simultaneamente a oferta aos consumidores.

2.1.2 Que material vegetal utilizar ?Para produzir segundo o MPB, o material de propagao (sementes, estacas e plantas de viveiro) deve provir de cultivo em MPB e no so autorizadas sementes ou plantas geneticamente modificadas. Contudo, devido falta de material nestas condies no mercado, a legislao prev uma derrogao que autoriza o uso de material de propagao obtido de forma convencional, se no for possvel obter material proveniente do MPB no mercado comunitrio. No entanto, para as plantas hortcolas no existe esta derrogao, pelo que as plantas tm de provir de viveiro controlado em MPB, seja um viveiro comercial, seja um viveiro existente na prpria explorao. Para a produo de hortcolas em MPB, podem usar-se as variedades ou cultivares fornecidas por empresas especializadas ou as variedades tradicionais. As sementes comercializadas no pas para o MPB so praticamente todas importadas. As sementes de variedades regionais so ainda mais difceis de obter porque, salvo raras excepes, no so comercializadas no pas.

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Os agricultores no podem comercializar as sementes das variedades regionais que cultivam (em MPB ou no) porque, na maior parte dos casos, as sementes destas variedades, pela natureza do seu modo de seleco, no conseguem cumprir os requisitos legais exigidos para a sua incluso no catlogo oficial de variedades. Este publicao, inclui apenas uma dzia de variedades de hortcolas, metade das quais de melo (Catlogo Nacional de Variedades, 2007). A associao Colher para Semear tem, preparados para publicao, dois levantamentos de variedades regionais de hortcolas nas zonas da Pennsula de Setbal e do concelho de Odemira, nas quais se referenciam respectivamente 18 e 164 variedades regionais de hortcolas cultivadas nessas zonas. Algumas destas variedades podero ser comuns a outras regies, mas aqueles nmeros do ideia do potencial de diversidade gentica que ainda possvel encontrar no pas. No Banco Portugus de Germoplasma Vegetal (BPGV) existem j registadas alguns milhares de variedades de hortcolas regionais, mas vital a criao de entidades de interface com os agricultores, que procedam multiplicao e distribuio dessas sementes. As associaes de produtores hortcolas podem desempenhar este papel com vantagem, pois so estes os principais interessados nesse material vegetal e por disporem do conhecimento necessrio para a correcta multiplicao dessas sementes. Em Portugal foi atribuda ao IDRHa/DPPQ (http://www.idrha.min-

agricultura.pt/) a misso de criar e disponibilizar aos interessados uma base de dados do material de propagao de produo biolgica disponvel no mercado.

2.1.3 Onde obter o material vegetal ?Nesta altura, foi possvel confirmar a existncia de apenas dois viveiros comerciais, que produzem plantas hortcolas em MPB no Pas (quadro 2.1).

Quadro 2.1 - Viveiros de plantas hortcolas e aromticas em modo de produo biolgico. EmpresaCARVAGRICOLA TRIPLANTA

Telefone232700040 939045642 243 570 670

Morada3660-061 Carvalhais, S Pedro do Sul R. Vale Peixe, Frade de Baixo, 2090-216 Alpiara

21

Face inexistncia de produo comercial de semente de MPB no Pas, uma alternativa para obter sementes de variedades tradicionais a troca entre agricultores. A associao Colher para Semear dinamiza esta actividade (quadro 2.2).

Quadro 2.2 - Entidades relacionadas com a obteno e conservao de sementes de variedades tradicionais de plantas hortcolas. Nome Colher para Semear Rede Portuguesa de Variedades Tradicionais Banco Portugus de Germoplasma Vegetal Telefone236 622 218 213 908 784 284 732 247 253 300 963

Morada / e-mailQt do Olival, Aguda, 3260 Figueir-dos-Vinhos e-mail: [email protected]; [email protected] Qt S Jos, S Pedro de Merelim, 4700-859 Braga e-mail: [email protected]

2.2

Viveiros

2.2.1 Viveiros, para qu ?At h poucas dcadas, a realizao de viveiros de plantas hortcolas visava sobretudo adiantar as culturas relativamente ao permitido pelas condies atmosfricas ao ar livre, encurtando os seus ciclos culturais. Este ltimo objectivo tornou-se particularmente importante na cultura protegida, desenvolvida a partir dos anos 60 com a divulgao dos filmes plsticos, porque o elevado custo do espao nas estufas justifica que este seja ocupado, o maior tempo possvel, com plantas em estdio avanado de desenvolvimento. A vulgarizao da instalao de culturas de ar livre por transplantao, aumentou a importncia de as plantas serem capazes de suportar o transporte e a plantao, de se adaptarem rapidamente, retomando o crescimento e produzirem sem atraso ou reduo relativamente s culturas semeadas no local definitivo. Tradicionalmente, transplantavam-se apenas as plantas que apresentavam reduzida crise de transplantao e que por isso podiam ser plantadas de raiz nua (quadro 2.3), mas essa limitao foi ultrapassada com o desenvolvimento da tecnologia dos viveiros, atravs da cultura individualizada das plantas em substratos.

22

Em comparao com a sementeira directa, a plantao dispensa a preparao to cuidada do solo, como a que exigida para preparar a cama da semente. No viveiro podem seleccionar-se as plantas, eliminando-se as que apresentem defeitos, melhorando a uniformidade e produtividade da cultura. Alm disso, o viveiro permite economizar semente, o que importante quando se usa semente de elevado preo. Contudo, as plantas no viveiro esto sujeitas a condies de crescimento que frequentemente diferem bastante das do local definitivo, conduzindo a insucessos na plantao se no se tomarem cuidados na escolha do momento mais propcio para a plantao e se no se efectuar um adequado acompanhamento aps a plantao, para reduzir e ultrapassar a crise de transplantao. Noutros casos, a tecnologia no viveiro pode no ter sido a mais adequada obteno de plantas de qualidade, isto , que se instalem rapidamente e que consigam alcanar a produtividade de que so geneticamente capazes. A deficiente tecnologia em viveiros est normalmente relacionada com: o tipo e volume de substrato usado; a conduo da rega e da fertilizao; e o controlo das condies ambientais, em particular, a temperatura e humidade do ar e a radiao.

Quadro 2.3 - Facilidade de transplantao de plantas de raiz nua de algumas espcies hortcolas. Fcil Couve-brculo Couve-de-Bruxelas Couve-repolho Couve-flor Alface Tomate Moderada Aipo Beringela Cebola Pimento Difcil Milho-doce Pepino Melo cantaloupe Abbora Melancia

Fonte: adaptado de Lorenz & Maynard (1988).

A realizao dos viveiros pelos prprios produtores hortcolas tem vindo a decair, optando estes por adquirir as plantas a empresas especializadas, com maior garantia de qualidade e de disponibilidade das plantas na data desejada. Estas empresas especializadas so detentoras de um elevado nvel de conhecimento sobre o desenvolvimento das plantas e a sua influncia na produtividade. Trabalhando com elevado nmero de plantas, estas empresas podem dispor de estruturas sofisticadas para o viveiro, em especial a nvel do controlo climtico, da rega e da fertilizao, cuja aplicao em pequena escala pode fazer aumentar excessivamente o custo de produo. No entanto, a realizao dos viveiros pelos prprios agricultores, em particular no MPB, apresenta mesmo assim algumas vantagens, nomeadamente:23

Mais fcil ajuste da durao do viveiro altura ideal para a plantao (por exemplo, se na data prevista o solo ainda no estiver em condies para a plantao, ou se as condies ambientais forem desfavorveis a esta operao); Maior facilidade de escolha de cultivares ou variedades, de acordo com as exigncias dos consumidores; Menor risco de introduo de doenas ou pragas na explorao; Escolha do tipo de substrato e do tamanho do alvolo (normalmente preferncia por alvolos maiores, obtendo-se plantas que apresentam menor crise de transplantao, e que normalmente produzem mais e mais cedo); Evita-se o stresse do transporte das plantas (particularmente importante em plantas como a couve-flor ou a couve-brculo).

Aos produtores no MPB nem sempre fcil obter as plantas que desejam nos viveiros comerciais, por estes serem em nmero muito reduzido e poderem no dispor das variedades desejadas, o que torna a realizao de viveiros prprios a nica soluo. No viveiro, os factores que vo condicionar a qualidade final da "planta" produzida so principalmente: as caractersticas do substrato e o seu controlo, o manuseamento do substrato, o espaamento das plantas, o controlo das condies climticas no viveiro e alguns tratamentos especficos que se podem aplicar s plantas.

2.2.2 Local, tipo e condies no viveiro2.2.2.1 Local do viveiro Para os viveiros tradicionais, sem estruturas capazes de permitir um bom controlo ambiental, a escolha do local em relao exposio ao sol era importante. O local era escolhido de entre os stios mais favorveis da explorao, de acordo com a poca do ano, isto , stios mais soalheiros no Inverno e mais resguardados do calor no Vero. A escolha da exposio solar permite desde logo regular a luz e a temperatura a que as plantas iro estar sujeitas durante o viveiro. A escolha do local em funo das caractersticas do solo era tambm importante (quadro 2.4), embora, dado que o viveiro ocupa uma reduzida rea, a melhoria das caractersticas de uma pequena parcela de solo no era muito cara. Esta melhoria era obtida normalmente com repetidas aplicaes de matria orgnica.

24

Quadro 2.4 - Qualidades do solo para viveiro.

Denso e uniforme Boa drenagem e arejamento Elevada capacidade de reteno de gua Sem formar crostas ou fendas Livre de infestantes e fitopatogeneos

2.2.2.2 Tipos de viveiros Para proteger as plantas e/ou melhorar as condies ambientais do viveiro podem utilizar-se abrigos como: quebra-ventos, redes de sombreamento, estufins, tneis ou estufas, de acordo com as circunstncias. Os viveiros comerciais realizam-se normalmente em estufas sofisticadas, que permitem produzir praticamente qualquer planta, em qualquer poca do ano. Os pequenos produtores podem recorrer a estruturas simples como os tneis pequenos, por vezes com recurso ao calor obtido nas chamadas camas quentes, para conseguirem uma proteco suficiente para as pequenas plantas no final do Inverno. A tcnica das camas quentes muito interessante pois, sem consumo de energia a no ser eventualmente na sua preparao, pode-se manter uma temperatura mais elevada a nvel da raiz e da parte area das plantas, aproveitando o calor produzido pela decomposio da matria orgnica empregue na sua construo. As camas quentes so formadas por uma camada de materiais orgnicos pouco decompostos, por exemplo estrume, de modo a que a sua decomposio seja activa e prolongada e desta forma se liberte calor suficiente durante o perodo de viveiro (figura 2.1).

Solo ou mistura com matria orgnica bem decomposta

Estrume, ou outro material, em decomposio

Figura 2.1 - Tnel com cama quente. 25

Sobre a matria orgnica pouco decomposta coloca-se uma camada de solo, de matria orgnica bem curtida ou de uma mistura dos dois, que ir constituir a cama da semente. Caso contrrio, as sementes podem ser afectadas pelo calor excessivo, por substncias fitotxicas libertadas pela matria orgnica em decomposio, ou ainda pela elevada salinidade do material mais fresco, que podem reduzir ou impedir a germinao. Posteriormente aos viveiros em solo ou em camas quentes, desenvolveram-se os viveiros em pequenos cubos de substrato, constitudo sobretudo por turfa, obtidos por prensagem em moldes, os mottes (figura 2.2). Este mtodo exige misturas especiais, para obter uma elevada coeso do substrato, e requer um maior cuidado no manuseamento, tanto no viveiro como na plantao, devido possibilidade de rotura do cubo de substrato. As misturas para mottes so constitudas por 70 a 90% de turfa negra, para garantir a coeso do material e podem incluir a maioria ou a totalidade dos nutrientes necessrios durante o viveiro. Com este sistema, as plantas j no so transplantadas de raiz nua e em alguns casos obtm-se excelentes resultados, como a maior facilidade de instalao das razes no solo e menores perdas de plantas plantao.

(a)

(b)

Figura 2.2 - (a) Mottes semeados e (b) pequeno equipamento manual para o seu fabrico.

O desenvolvimento de contentores em material plstico, em forma de tabuleiros alveolados que se enchem com substrato (figura 2.3), veio facilitar a mecanizao das operaes no viveiro, nomeadamente a sementeira, o acondicionamento e o transporte das plantas. Desenvolveram-se outros sistemas, por exemplo vasos em papel ou contentores desmontveis, mas a produo em placas com alvolos foi a que mais se popularizou.

26

Para encher as placas alveoladas usam-se substratos com propriedades fsicas adequadas a estes pequenos volumes, que chegam a ser de poucos mL por planta.(a) (b)

Figura 0.1 - Viveiros em placas alveoladas de polipropileno e de poliestireno, para produo de (a) plantas florestais e (b) culturas hortcolas.

2.2.2.3 Caractersticas e preparao dos substratos de viveiro Para obter plantas de qualidade deve-se poder controlar as condies ambientais, tanto a nvel da raiz como da parte area das plantas. Ao nvel da raiz, as variveis mais importantes so a temperatura, a disponibilidade de nutrientes e o teor de gua e de ar no substrato. Ao nvel da parte area destacam-se a temperatura, a humidade e a radiao. Em estufa, possvel aumentar o nmero e o grau de controlo destas variveis, de forma a regular o crescimento das plantas de acordo com os objectivos.

2.2.3 Os substratos de viveiro: caractersticas e preparaoOs substratos so materiais, naturais ou artificias, que substituem o solo no cultivo das plantas em contentores. As caractersticas fsicas dos substratos, nomeadamente o seu elevado espao poroso, permitem obter melhor crescimento em contentor do que com o prprio solo (quadro 2.5). Outras propriedades fsico-qumicas, como o pH ou a condutividade elctrica (CE) tambm so importantes. Sucede que estas, se no incio do cultivo no se encontrarem no nvel adequado, podem ser mais facilmente corrigidas durante o cultivo do que as propriedades fsicas do substrato. Isto , deve-se iniciar o cultivo com um material com adequadas caractersticas fsicas, porque no vamos poder alterar estas27

caractersticas durante a cultura. Pelo contrrio, durante a cultura podemos fazer evoluir ou aproximar a CE, o pH ou os nutrientes disponveis ao nvel desejado, se tal for necessrio.

Quadro 2.5 - Propriedades de um substrato de viveiro. Um substrato deve: armazenar gua, disponibilizar gua e nutrientes em quantidade adequada, ter boa drenagem, reter ar em quantidade adequada, ser suficientemente firme para suportar as razes e manter a planta direita, de preferncia, manifestar supressividade para doenas do solo. Um substrato no deve: decompor-se fisicamente (pelo menos durante o perodo de cultivo), compactar-se, tornando-se duro e pouco arejado, conter fitopatogenos, conter sementes.

O substrato deve permitir um bom crescimento e fixao da raiz e para isso tem de fornecer gua, oxignio e nutrientes, no reduzido volume dos alvolos das placas ou do motte. Para aumentar a disponibilidade de gua e de ar, o substrato deve ter um elevado espao poroso total. O espao poroso, o qual pode ser ocupado por ar e/ou, gua, normalmente muito elevado nos substratos do que nos solos, alcanando com frequncia, por exemplo em turfas, 80 a 90% ou at mais (Rivire, 1980). O conhecimento do espao poroso total num substrato apresenta, contudo, apenas um interesse relativo. Na realidade, a um mesmo espao poroso total podem corresponder volumes de ar e de gua muito diferentes, em funo do dimetro dos poros. Da ser importante uma composio granulomtrica que proporcione uma adequada repartio de ar/gua. A uma determinada tenso de gua, quanto maiores as partculas do substrato, maior ser o volume de ar e menor o de gua, ou seja, o substrato ser mais arejado e conservar menos gua aps a rega. O conhecimento da relao ar-gua permite compreender e prever o comportamento hdrico dos substratos. Substratos com diferentes caractersticas podem, por isso, ser usados para a mesma cultura, desde que se adapte a tecnologia, particularmente de rega. A capacidade de reteno de gua avalia-se laboratorialmente, sujeitando-se amostras de substrato humedecido a uma fora de suco determinada, at um mximo28

equivalente a uma coluna de gua de 100 cm (10 kPa), limite a partir do qual se admite que as plantas cultivadas em substratos, podem comear a sofrer restrio de crescimento (De Boodt e de Waele, 1968; Raviv et al., 1986). A curva de libertao de gua, que descreve a evoluo dos teores de ar e de gua com o aumento a tenso aplicada, permite obter os seguintes valores caractersticos nos substratos (De Boodt et al., 1974):

Capacidade de ar: a diferena entre o espao poroso total e o teor de gua tenso de 10 cm de coluna de gua (expressa em % de volume).

gua facilmente utilizvel: a gua libertada pelo substrato quando a tenso aplicada aumenta de 10 para 50 cm (expressa em % de volume).

gua de reserva: a gua libertada pelo substrato quando a tenso aplicada aumenta de 50 para 100 cm (expressa em % de volume). Pode-se determinar ainda a gua dificilmente utilizvel, ou seja, a % de volume

de gua retida a uma tenso superior a 100 cm de coluna de gua, a qual est pouco disponvel para utilizao pela maioria das plantas. Na Figura 0.2 comparam-se alguns materiais usados como substratos hortcolas.Variveis da curva de libertao de gua100 90 80 70 60 gua dificilmente utilizvel gua de reserva gua facilmente utilizvel Capacidade de ar

% v/v 5040 30 20 10 0 SC FS I BASubstratos (1 ano)

BU

CP

Figura 0.2 - Propriedades fsicas de alguns substratos e valores de referncia de De Boodt et al. (1974). SC, substrato comercial para o MPB (BRILL); FSI, composto da fraco slida dos chorumes de explorao pecuria leiteira convencional; BA, composto de bagao de azeitona e aparas de relva; BU, composto de bagao de uva e aparas de relva e CP, composto de casca de pinheiro e aparas de relva.

Os compostos de bagao de uva (BU) e de casca de pinheiro (CP) so bastante arejados. Pelo contrrio, o composto da fraco slida de chorume (FSI) dispe de bastante gua (cerca de 60 % (v/v) do seu espao poroso total). No quadro 2.6 comparam-se alguns compostos de resduos vegetais com um substrato comercial para o MPB.

29

Quadro 2.6 - Caractersticas fsicas de um substrato comercial base de turfa para o modo de produo biolgico e de compostos obtidos em pilhas com reviramento. (a) densidade aparente do material seco; (b) espao poroso total; (c) capacidade de arejamento; (d) gua facilmente utilizvel; (e) gua de reserva; (f) gua dificilmente utilizvel. Estas variveis esto expressas em % v/v. Materiais substrato comercial (Exclusive, Brill)1 bagao de azeitona e resduos agrcolas2 refugo de laranja, bagao de azeitona e aparas de relva com 150 dias2 com 350 dias2 bagao de uva3 casca de pinheiro3 daa 0,120 0,360 EPTb 91,9 82,1 CAc 21,2 22,4 AFUd 28,0 12,8 ARe 2,8 2,3 ADUf 40,0 44,6

0,226 0,255 0,236 0,228

84,9 83,9 84,3 85,0

18,8 15,3 59,0 32,0

29,5 32,1 1,2 10,3

2,3 2,8 1,0 3,0

34,5 32,7 23,7 39,6

Fonte: 1Coelho & Reis (2007); 2Reis et al. (2006); 3Reis (2000).

Do ponto de vista do tamanho das partculas de um substrato, o mais adequado para permitir o fornecimento de gua e suficiente arejamento, normalmente um material com textura grosseira a mdia, com partculas entre 0,25 e 2,5 mm ou com um tamanho mnimo entre 0,5 e 1,0 mm (Puustjarvi, 1982, cit. in Raviv et al., 1986). As partculas finas so menos resistentes decomposio mas apresentam maior superfcie especfica e capacidade de troca catinica (Raviv et al., 1986). Substratos com grande percentagem de partculas finas podem apresentar problemas de arejamento e reter grandes quantidades de gua a tenses elevadas, embora esta esteja pouco disponvel. Outro aspecto importante relativo ao tamanho das partculas do substrato, tal como num solo, o contacto entre as partculas de substrato e as sementes, o qual pode ser dificultado se no houver uma distribuio granulomtrica das partculas adequada ao tamanho da semente. Esta situao pode ocorrer com alguns materiais como os compostos grosseiros de casca de rvores. As discrepncias sobre valores ptimos encontradas na bibliografia (quadro 2.7) podem-se atribuir aos diferentes mtodos empregues na determinao da porosidade e a propriedades dos diferentes materiais que afectam a resposta das culturas testadas. A gua retida pelo substrato e a sua disponibilidade so habitualmente os factores limitantes mais importantes. No entanto, necessrio distinguir entre a capacidade de reteno de gua do substrato e a capacidade de a disponibilizar. Assim, materiais como a turfa tm uma grande capacidade de reteno de gua, a qual se pode encontrar maioritariamente facilmente disponvel, conduzindo a que a planta a esgote30

mais rapidamente pois, nestas condies de elevada disponibilidade, as plantas mantm uma elevada transpirao. Pelo contrrio, outros materiais podem reter menos gua, mas uma parte maior ser gua de reserva (retida a maior tenso), o que faz com que a planta se v adaptando gradualmente s condies de restrio de gua e acabe por entrar em emurchecimento mais tarde do que as plantas cultivadas em turfa (Beardsell et al., 1979).

Quadro 2.7 - Exemplo de valores recomendados para as propriedades fsicas dos substratos. Varivel Espao poroso total Capacidade de ar gua facilmente utilizvel gua de reserve gua total Densidade Contrao do volume aps secagem Granulometria Valor mnimo Valor ptimo (% v/v) > 85 20 a 30/ 10 a 45 20 a 30 4 a 10 24 a 40 < 0,4 < 30 0,25 a 2,5 mm 0,5 a 1 mm

Fonte: De Boodt & Verdock (1972); Raviv et al. (1986); Berjn et al. (2004).

Os substratos mais utilizados em viveiros de placas alveoladas podem agruparse quanto aos materiais constituintes, em dois grupos: substratos orgnicos e substratos minerais. Os substratos minerais, com algumas excepes, apresentam baixo nvel de actividade qumica, de poder tampo e de capacidade de reteno de gua e de nutrientes, pelo que a rega e a fertilizao tm ser bastante precisos. Podem ser isentos de doenas, mas permitem por isso mesmo uma fcil colonizao quando infectados. Os substratos orgnicos apresentam elevado poder tampo, boas relaes ar-gua, contm substncias hmicas que elevam a CTC e disponibilizam nutrientes. Dos materiais mais usados como substratos referem-se em seguida algumas caractersticas gerais. Solo Foi a base de algumas misturas clssicas, mas tem sido abandonado por falta de homogeneidade e por problemas sanitrios. Verifica-se, alm disso, que a grande heterogeneidade do solo pode fazer variar de forma acentuada as misturas em que se empregue. A incluso de solo na mistura pode obrigar sua desinfeco prvia. No entanto, a mistura de solo pode trazer alguns benefcios, como o aumento da capacidade de troca catinica (CTC), e a incorporao de microrganismos benficos, embora no deva ultrapassar 30% em volume na mistura para no reduzir o arejamento.31

Turfa Os substratos designados por turfa so normalmente mistura de turfas de diferente qualidade, que funo da sua origem, a qual pode ser bastante distinta. As turfas, ou suas misturas mais correntes usadas em horticultura, tm pH cido, densidade baixa, retm bastante gua facilmente assimilvel e tm uma capacidade de ar varivel. Podem apresentar-se isentas de patogneos, em funo da zona de extraco e do posterior manuseamento. Podem constituir bons substratos e ser muito teis para misturar com outros materiais, melhorando a mistura final (Figura 2.5). Podem contrairse excessivamente ao secar. Devem utilizar-se j humedecidas e manter sempre esta condio devido dificuldade de se re-hidratarem caso se deixem secar durante o cultivo.

Cascas de rvores As cascas de rvores, sobretudo de pinheiro, tm interesse localmente pelo seu baixo custo. Podem reter pouca gua embora esta situao possa ser resolvida com uma escolha adequada da granulometria. Podem necessitar de uma compostagem prvia para eliminar eventuais problemas de fitotoxidade e para melhorar algumas caractersticas fsicas.

Variveis da curva de libertao de gua100 90 80 70 60

gua dificilmente utilizvel gua de reserva gua facilmente utilizvel Capacidade de ar

% v/v 5040 30 20 10 0 SC BU 1/3 BUSubstratos

CP

2/3 CP

Figura 2.3 - Melhoria de propriedades fsicas de composto de bagao de uva e de casca de pinheiro: aumento da gua facilmente utilizvel e reduo do arejamento. SC, substrato comercial ( base de turfa); BU, composto de bagao de uva e aparas de relva; CP, composto de casca de pinheiro e aparas de relva; e mistura com 1/3 e 2/3 destes compostos e SC.

32

Serradura Necessita de uma compostagem prvia, sobretudo a serradura de madeira de Folhosas. Pode apresentar boas propriedades fsicas, de acordo com a granulometria. Pode degradar-se rapidamente, mas um bom material para incluir em misturas. Casca de arroz moderadamente resistente decomposio, melhora o arejamento da mistura e retm pouca gua. aconselhado no exceder 25 % (v/v) por causa do seu alto teor em mangans (Mn) e para no reduzir a capacidade de reteno de gua da mistura. Podem levantar problemas as sementes de plantas espontneas que vm misturadas na casca. Areia Para usar como material nico deve preferir-se a areia siliciosa, com partculas mdias a grosseiras (0,5 a 2 mm), sem mistura de limo nem argila, e de preferncia no de rio, porque as partculas redondas separam-se mais facilmente nas misturas. Em misturas com materiais orgnicos, a areia em dimetros finos (0,1 a 0,5 mm), aumenta a estabilidade da mistura porque estas finas partculas so importantes para a reteno de gua, enquanto que as partculas finas de materiais orgnicos se decompem rapidamente, reduzindo o arejamento no meio. As misturas usadas como substratos hortcolas podem incluir uma pequena percentagem de areia, ou de solo, na sua preparao. Esta mistura, embora no melhore o arejamento e reduza o espao poroso total da mistura, pode ter interesse, por exemplo, por facilitar de humedecimento dos materiais orgnicos da mistura. No entanto, nos viveiros comerciais que empregam equipamentos sensveis e caros para o enchimento e sementeira, as partculas minerais so abrasivas das peas destes equipamentos, o que leva a evitar a incluso de areia ou solo na composio dos substratos a empregues. Alm das implicaes do tamanho das partculas nas propriedades dos substratos j referidas, estes no devem apresentar partculas, ou aglomerados de partculas, muito grandes que possam obstruir os alvolos durante o seu enchimento. Perlite um material obtido industrialmente a partir de areias siliciosas de origem vulcnica, leve, frgil, cujas propriedades variam de acordo com a sua granulometria: as33

finas podem reter quase tanta gua como a turfa e as grosseiras melhoram o arejamento em misturas com materiais finos.

Vermiculite um material leve, obtido industrialmente, com menos capacidade de arejamento mas que retm mais gua do que a perlite. A vermiculite, ao misturar-se, tende a deteriorar-se fisicamente devendo, por isso, ser misturada em seco. Em granulometria fina muito usada para cobrir as sementes nas placas alveoladas.

Compostos Exigem algum esforo de preparao mas fornecem nutrientes, em particular micronutrientes, aumentam a CTC e podem ser supressivos para doenas de solo. frequente a recomendao de no ultrapassar 30 % (v/v) nas misturas, mas este valor depende muito da qualidade do composto. Como foi referido, por exemplo, o de bagao de uva muito arejado, retm pouca gua, enquanto que um composto de fraco slida de chorume pode reter bastante gua. Alguns compostos, com elevada CE, no devero ser incorporados em mais de 10% (v/v), outros, com baixa CE, podero constituir o substrato s por si. A sua heterogeneidade um problema para a generalizao do seu emprego, obrigando definio de materiais e tecnologia a usar com o objectivo de obter compostos de qualidade uniforme. Ao preparar uma mistura necessrio ter em conta que, sobretudo com materiais com partculas muito diferentes, o resultado final no est directamente relacionado com a proporo de cada um na mistura. Ocorrem interaces entre as partculas, nomeadamente o preenchimento dos espaos entre as partculas mais grossas pelas partculas finas, o que torna importante o teste da cada nova mistura, ou melhor ainda, o teste de cada mistura no mesmo tipo de contentor em que ir ser usada. Uma ideia a reter na preparao de substratos de cultivo a de que uma mistura de materiais, em determinadas propores, no determina que o substrato obtido venha a apresentar sempre as mesmas propriedades em cultivo. Na realidade, as caractersticas fsicas da mistura obtida podem variar bastante, devido: ao lote de materiais usados; forma e ao volume dos alvolos; ao manuseamento dos materiais ao preparar a mistura e forma de regar. Por exemplo, os contentores altos determinam maior arejamento no meio do que os baixos, para o mesmo substrato (figura 2.6).34

Figura 2.4 - Influncia da forma do alvolo na capacidade de ar. Fonte: adaptado de Bailey et al. (2007a).

O manuseamento dos materiais antes de os colocar nas placas muito importante. O substrato no deve ser compactado ao encher as placas para no se reduzir a sua capacidade de ar (quadro 2.8).

Quadro 2.8 - Efeito da compactao do substrato no momento do envasamento de placas de 48 alvolos, com uma mistura de turfa e vermiculite (1:1 v/v), sobre algumas propriedades fsicas. Compactao (ao encher o alvolo) Leve Mdia ElevadaFonte: Bailey et al. (2007a).

Capacidade arejamento (% v/v) 9 4 2

de

gua no disponvel (% v/v) 21 26 30

gua utilizvel (% v/v) 58 56 52

Antes de usar, os substratos orgnicos devem ser humedecidos, de preferncia de vspera, para dar tempo a absorverem gua e desta forma reduzirem a compactao que ocorre se forem colocados secos nos respectivos alvolos, causando a reduo da capacidade de ar e o aumento do teor de gua no utilizvel pelas plantas (quadro 2.9).

Quadro 2.9 - Efeito da humidade do substrato no momento do envasamento de placas de 273 alvolos com uma mistura de turfa e vermiculite (1:1 v/v), sobre algumas propriedades fsicas. Humidade (% v/v) 60 70 Variveis expressas em % do volume do alvolo Espao poroso total gua no disponvel 87 21 88 26 Capacidade de ar 2 7

Fonte: Bailey et al. (2007a).

35

A necessidade de obter plantas homogneas exige utilizar materiais com caractersticas uniformes e reprodutveis na preparao dos substratos. Na preparao de substratos procura-se combinar a enorme variedade de materiais orgnicos e inorgnicos disponvel, de modo a obter um produto final com as caractersticas finais adequadas. De preferncia, os substratos devem tambm manifestar supressividade para doenas do solo, como: Phytophthora spp., Fusarium spp., Pythium spp., Rizoctonia solani, Sclerotium rolfsii e nemtodos. Este efeito conseguido com muitos compostos obtidos sobretudo a partir de resduos agrcolas e florestais. A manifestao de supressividade comeou por ser assinalada no solo h cerca de 100 anos (Ferraz, 1992). No entanto, apenas em 1926, se associou o controlo de doenas com origem no solo presena de outros microrganismos do solo e se assumiu ser possvel actuar sobre o grau de controlo biolgico por modificao das prticas culturais (Sanford, 1926, cit. por Garrett, 1970). Pode considerar-se que, desde que respeitadas algumas exigncias mnimas, qualquer material pode ser utilizado para preparar substratos, devendo-se por isso dar ateno aos materiais disponveis em cada regio. impossvel definir um substrato ptimo. A eleio do melhor substrato varia com cada situao, pois depende de factores diversos, sobretudo tcnicos e econmicos. Diferentes substratos com propriedades distintas podem ser vantajosamente utilizados para uma mesma cultura, desde que se adapte a tecnologia empregue, em particular a dotao e a frequncia da rega, mas tambm noutros aspectos como o tamanho dos alvolos e o programa de fertilizao.

2.2.4 Tecnologia de produo no viveiroEmbora os viveiros no solo e em mottes apresentem algumas vantagens, neste trabalho, a abordagem tecnologia empregue nos viveiros direccionada para os viveiros em placas alveoladas, devido sua maior simplicidade e facilidade de utilizao. 2.2.4.1 Placas alveoladas As placas alveoladas so muito utilizadas na produo de plantas de viveiro pois permitem obter plantas com boas caractersticas para a transplantao, de rpida adaptao aps a plantao, com boas qualidades produtivas e permitem a mecanizao do processo de produo, desde a sementeira at plantao. A individualizao das36

plantas nos alvolos permite um melhor controlo do desenvolvimento areo e radical das plantas, facilita as operaes culturais, como a rega, os tratamentos fitossanitrios e o transplante, e aumenta as produes, em comparao com o viveiro tradicional no solo. Embora, em alguns casos, a individualizao e transplante com torro no aumente a produo final, relativamente ao uso de plantas de raiz nua, pode originar maior homogeneidade da produo, como na couve-brculo (Giovanni & Vincenzo, 1988). As placas so fabricados em polipropileno, polietileno ou poliestireno expandido, com diferente durao e facilidade de limpeza. O poliestireno expandido relativamente poroso e frgil, o que pode permitir a penetrao das razes, diminuir a resistncia ao manuseamento e dificultar a sua desinfeco, mas tem um baixo custo de aquisio. O polipropileno e o polietileno so mais resistentes e no se deixam atravessar pelas razes. Podem ser usados em placas de maior espessura, reutilizveis, ou menor espessura, descartveis. Existem tambm placas alveoladas biodegradveis, constitudas por fibras aglomeradas, por exemplo de turfa, mas o seu custo limita a sua utilizao a casos especiais de propagao. As dimenses exteriores das placas esto adaptadas para facilitar a mecanizao do seu manuseamento, tanto no viveiro como na plantao. A maioria tem dimenses exteriores que variam entre 64 a 78 cm de comprimento, 34 a 54 cm de largura e 4 a 8 cm de altura (Abrantes, 1989). Existem placas alveoladas com alvolos de diferentes: forma, dimenses e nmero. Os alvolos podem ter forma cilndrica, tronco cnica, tronco-piramidal ou formas intermdias. As formas que estreitam de cima para baixo permitem retirar as plantas com mais facilidade. O volume dos alvolos varia normalmente entre 12 e 35 mL, podendo os das placas para espcies como a cebola (figyra 2.7), serem menores, e noutros casos serem maiores, sobretudo para plantas ornamentais ou florestais. Como exemplo pode apontar-se o volume de 40 mL para melo, melancia, pepino, tomate e pimento; 19 mL para couves e alfaces e 16 mL para alho-francs e cebola (Azevedo & Marques, 2003). O volume do alvolo muito importante pois condiciona o crescimento da raiz com reflexos na produo final e na durao do ciclo cultural. Em muitas hortcolas, maiores plantas de viveiro originam depois maior produo precoce e total. A restrio imposta expanso da raiz, resulta numa alterao da relao do peso da parte area e da parte radicular, dado que, a parte area se v menos restringida na sua expanso do que a raiz. A escolha do tamanho do alvolo para uma dada espcie condicionada37

tambm pelo tamanho e expanso foliar (figura 2.7), que ir adquirir at ao final do viveiro, e sua exigncia em luz para um crescimento adequado.

(a)

(b)

Figura 0.3 - Tamanho dos alvelos e rea foliar de (a) cebola e (b) pimento.

O tamanho dos alvolos da placa de sementeira determina a densidade das plantas no viveiro, o que influi no desenvolvimento e na produo das plantas no campo: uma maior densidade durante o viveiro origina atraso da florao e o incio da colheita, embora reduzindo pouco a colheita total, na cultura em estufa (Tesi & Tosi, 1989). Por motivos econmicos, procura-se conjugar o menor uso de substrato e de espao, com as exigncias particulares para o crescimento de cada espcie. Regra geral, uma maior densidade reduz a necessidade de espao no viveiro mas alonga o ciclo cultural. 2.2.4.2 Rega No viveiro, a elevada uniformidade na distribuio da gua de rega uma condio indispensvel para o crescimento homogneo das plantas, para alm como bvio, da utilizao de dotao e frequncia de rega adequada espcie e fase de crescimento, ao substrato e s condies ambientais. Vrios mtodos de rega podem ser usados, nomeadamente a miniasperso, fixa ou mvel (figura 2.8), e a inundao parcial temporria ou permanente. Alm destes mtodos automatizveis, recorre-se com frequncia rega manual, com mangueira e ralo, como mtodo nico em viveiros pequenos ou como forma de compensar a rega automtica em determinadas zonas de viveiro (figura 2.8).

38

(a)

(b)

Figura 2.8 - Rega com aspersores montados em (a) rampa amovvel e (b) mangueira e ralo.

Ao regar por asperso, as gotas de gua devem ser finas, para molhar o substrato sem causar lexiviao e/ou compactao. Nos estdios iniciais de desenvolvimento pode ser prefervel nebulizao e s posteriormente um sistema que proporcione gotas finas. A forma de fornecer a gua ao substrato pode afectar a morfologia da raiz, a repartio dos assimilados, a sua fisiologia e, em consequncia, a capacidade de instalao da planta no local definitivo. Esta, depende da capacidade da raiz suportar os distrbios associados transplantao, da capacidade de absoro de gua e nutrientes e da capacidade de as razes existentes emitirem rapidamente novas razes. A crise de transplantao ocorre quando, no perodo crtico de mudana de local, a transpirao excede a absoro de gua. De uma forma geral, o excesso de gua origina razes com menos pelos radiculares, e uma deficincia de gua origina razes atrofiadas ou encaracoladas. 2.2.4.3 Fertilizao A fertilizao importante porque afecta o desenvolvimento das plantas em viveiro e, o estado nutritivo da planta na altura da transplantao, afecta tambm o desenvolvimento posterior e a produtividade da cultura (quadro 2.10).

Quadro 2.10 - Efeito do nvel de fertilizao (N-P-K) na qualidade das plantas de viveiro. Parmetro Durao do viveiro Tamanho dos lanamentos Cor dos lanamentos Crescimento da raizFonte: Bailey et al. (2007a).

Quantidade de fertilizante Baixa Intermdia grande Bom compactos Moderadamente grandes verde-claro Boa extensa Normal

Alta Bom muito grandes Estiolada possivelmente pequena

39

O substrato pode ser fertilizado previamente ou aplicarem-se os nutrientes em fertirrega. No entanto, como a fertirrega no MPB difcil por existirem no mercado poucos fertilizantes adequados, deve optar-se por incorporar o mximo possvel de fertilizantes no substrato, tendo em considerao a sensibilidade de cada espcie. Durante o viveiro podem aplicar-se fertilizantes como os extractos de composto (compost tea) ou de plantas, como a urtiga (Coelho et al., 2007) em pulverizao ou rega. Tambm se pode aplicar fertilizante slido, como a farinha de peixe, aps a 2 folha verdadeira. A farinha de peixe deve ser aplicada com precauo devido ao seu elevado teor em azoto, de 6% (Azevedo & Marques, 2003). Mais informao sobre os fertilizantes e correctivos disponveis apresentam-se no Captulo 3. Apesar do curto perodo de viveiro da maioria das espcies, a fertilizao do substrato essencial, caso contrrio o crescimento limitado, mas o excesso de nutrientes pode causar o mesmo efeito. A uniformidade na fertilizao nos viveiros adquire uma importncia especial devido limitada expanso radicular e necessidade de obter um crescimento homogneo das plantas (quadro 2.11).

Quadro 2.11 - Exemplo de valores recomendados para as propriedades qumicas dos substratos. Varivel Condutividade elctrica (dS.m-1) pH Relao C/N Matria orgnica total (p/p) Nutrientes assimilveis (mg.kg-1) Azoto ntrico Azoto amoniacal Potssio (K) Fsforo (P) Magnsio (Mg Clcio (Ca) Ferro (Fe) Mangans (Mn) Molibdnio (Mo) Zinco (Zn) Cobre (Cu) Boro (B)Fonte: Abad et al. (2004).

Valor ptimo 0,75 a 2 5,2 a 6,3 20 a 40 > 80 % 100 a 200 0 a 20 150 a 250 6 a 10 > 70 > 200 0,3 a 3 0,02 a 3 0,01 a 0,1 0,3 a 3 0,001 a 0,5 0,05 a 0,5

Dos nutrientes que devem estar presentes no substrato destacam-se o azoto, verificando-se que nveis elevados favorecem a parte area relativamente parte radicular (Tremblay & Gosselin, 1989a, 1989b) e permitem o aumento dos teores de40

outros elementos nas plantas, como P, K, Ca, Mg, Mn ou Zn, em brcolos, aipo e alface (Tremblay & Senecal, 1990). A sensibilidade das plantas composio da soluo do solo maior nas fases iniciais do seu desenvolvimento. Entre os outros nutrientes destacam-se o fsforo, o clcio e os microelementos (Hartmann et al., 1990). O fsforo pode apresentar pouca influncia na relao parte area/parte radicular (Weston e Zandstra, 1989), mas o nvel em que se encontra, alm de co